Musa, 4, 2014, p. 161-214
Preexistencias de Setúbal. 2ª campanha de escavações
arqueológicas na Rua Francisco Augusto Flamengo, nos 10-12
Da Idade do Ferro ao Período Medieval
Carlos Tavares da Silva*
Joaquina Soares**
Antónia Coelho-Soares***
Susana Duarte***
Ricardo Godinho****
RESUMO
ABSTRACT
O lote da Rua Francisco Augusto Flamengo, localizado no
casco histórico de Setúbal, forneceu ampla sequência estratigráica onde icaram impressas as grandes fases de desenvolvimento deste aglomerado urbano nos seus primórdios.
Da primeira ocupação estável, implantada no período orientalizante, recuperaram-se somente materiais, nomeadamente
cerâmicas de engobe vermelho, ânforas fenícias, cerâmicas cinzentas, remobilizados em níveis coluvionares que preencheram
fossas de abarrancamento existentes no nosso lote. Neste horizonte (Cs. 11-14), os materiais mais recentes, muito raros, podem atingir a II Idade do Ferro (séculos IV-III a. C.) ou mesmo o
período Romano Republicano (séculos II-I a. C.).
Da cidade romana, identiicou-se e escavou-se parte de um
vazadouro público do Alto Império, que forneceu entre outro
espólio um notável conjunto de terra sigillata com apreciável
número de marcas de oleiro. A selagem do vazadouro ocorreu na
segunda metade do século II. Um importantíssimo equipamento
urbano é então construído no local, talvez nos inícios do século
III, destinado a depósito público de água, com capacidade superior a 250m3, assinalando um pico de desenvolvimento urbano.
O declínio de Caetobriga torna-se evidente a partir de meados
do século IV, arrastando-se, em processo de desurbanização pelos séculos V e VI. Essa redução da vida e espaço urbanos a uma
provável aldeia ao serviço do porto, explica a periferização do
nosso lote, que recebe no período islâmico uma necrópole.
Durante o ressurgimento do burgo na Baixa Idade Média,
o espaço em apreço é integrado no recinto muralhado, mas a
memória de campo funerário permanecerá na toponímia (Rua da
Paz). Este local, certamente mera reserva em termos urbanísticos, e marginal quanto à localização das funções mais qualiicadas, foi ocupado por lixeiras domésticas nos séculos XIII-XIV.
A urbanização do lote só terá ocorrido nos séculos XVI-XVII de
acordo com informação da primeira campanha de escavações,
anteriormente publicada.
The excavated plot of the Street Francisco Augusto Flamengo, located in the historic centre of Setubal, provided a broad
stratigraphic sequence in which the major stages of development
of this urban agglomeration were represented from its beginnings to the Middle Ages.
The irst stable occupation, from the Phoenician period, had
been recovered only by artefacts, including red slip ceramics,
Phoenician amphorae, gray ceramics remobilised in levels of
colluvial nature. Rare ceramic sherds could be attributed to the
second Iron Age (IV-III centuries a. C.), or even to the Roman
Republic period (II-I centuries a. C.).
In what concerns the Roman city, we excavated part of a
public dump of the High Empire, which provided among other
artefacts a remarkable set of Terra sigillata with an appreciable
number of potter`s stamps. The sealing of the dump occurred
in the second half of the second century. An important urban
infrastructure was then built on the site, perhaps in the early
third century, intended for public water reservoir, with a capacity exceeding 250m3, marking a peak of urban development.
The decline of Caetobriga became evident from the mid-fourth
century, creeping de-urbanization in the ifth and sixth centuries.
This reduction of life and urban space explains the peripherization of the excavated area, which received a necropolis in the
Islamic period.
During the resurgence of the burgh in the late Middle Ages,
the space in question was integrated into the walled enclosure,
but the memory of the funerary ield remained in the names of
places (Rua da Paz). This site is certainly a mere reservation in
urban terms, and marginal to the location of the most qualiied
functions as domestic rubbish dumps occupied it in the XIIIXIV centuries. The urbanization of the plot has only occurred
in the XVI-XVII centuries according to the report of the irst
archaeological excavations, already published.
* Centro de Estudos Arqueológicos, MAEDS; Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ). ctavaressilva@gmail.com
** Museu de Arqueologia e Etnograia do Distrito de Setúbal (MAEDS); Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ).
joaquinasores1@gmail.com
*** Centro de Estudos Arqueológicos, MAEDS. cea.maeds@mail.telepac.pt
**** Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS) da Universidade de Coimbra. ricardomiguelgodinho@gmail.com
161
Fig. 1 - Localização da escavação na Rua Augusto Flamengo e principais intervenções arqueológicas desenvolvidas pelo Museu
de Arqueologia e Etnograia do Distrito de Setúbal, na área urbana de Setúbal: 1 - Rua Francisco Augusto Flamengo; 2- Rua
Arronches Junqueiro 32-34; 3 - Travessa dos Apóstolos; 4 - Rua Arronches Junqueiro 73-75; 5 - Rua António Joaquim Granjo;
6 - Rua António Joaquim Granjo (Casa dos Mosaicos); 7 - Travessa de João Galo; 8 - Largo da Misericórdia; 9 - Travessa de Frei
Gaspar; 10 - Travessa da Portuguesa; 11 - Av. Luisa Todi (edifício BCP); 12 - Rua Major Afonso Pala; 13 - Rua Álvaro Castelões;
14 a 16 - Rua António Januário da Silva; 17 - Rua Serpa Pinto; 18 - Rua Luís de Camões; 19 - Praça de Bocage; 20 - Praça de
Bocage / Av. Luisa Todi (edifício Montepio); 21 - Largo do Sapalinho; 22 - Rua de Bocage / Rua Augusto Cardoso (edifício Benetton); 23 - Praça de Bocage; 24 - Beco de Dona Maria; 25 - Av. 22 de Dezembro; 26 - Rua Augusto Cardoso; 27 - Praça Miguel
Bombarda; 28 - Rua Acácio Barradas; 29 - Rua António Maria Eusébio; 30 - Praça Machado dos Santos; 31 - Largo António
Joaquim Correia; 32 - Rua Dr. Estavam de Vasconcelos.
INTRODUÇÃO
Após um interregno de cerca de um ano, resultante do tempo necessário para o dono da obra proceder à demolição dos edifícios existentes no lote a
reediicar, retomaram-se os trabalhos arqueológicos
no dia 3 de Maio de 2010 que se prolongaram até
25 de Fevereiro do ano seguinte. Foram coordenados
por dois dos signatários (C.T.S. e J.S.), que contaram
com a colaboração das arqueólogas Susana Duarte e Antónia Coelho Soares, do Centro de Estudos
Arqueológicos (CEA) do Museu de Arqueologia e
Etnograia do Distrito de Setúbal (MAEDS), do bio-antropólogo Ricardo Godinho, à época na empresa
Era Arqueologia, dos técnicos de arqueologia António Júlio Costa (escavação, topograia e desenho),
Jorge Costa (desenho) e Fernanda Simões (escavação), pertencentes também ao CEA-MAEDS, e de
alguns operários fornecidos pelo dono da obra.
162
A escavação seguiu a metodologia utilizada na
1ª Campanha (Tavares da Silva et al., 2010) e teve lugar nos Loci A e C (Fig. 2), numa extensão de 209m2.
No Locus C, o mais escavado na 1ª campanha,
icou a descoberto, supericialmente, toda a área do reservatório de água da Época Romana com expressão
neste lote (esta notável estrutura prolonga-se pelo lote
situado imediatamente a norte, sob o edifício aí existente, e, a oeste, pela Rua Francisco Augusto Flamengo; escavou-se, em profundidade, no interior e até à
base do mesmo reservatório nos Qs. C-D/20-21, E20,
J-K/17-19 e L18-19 (Figs. 32-35 e 41). Neste Locus
e no A escavaram-se novas sepulturas da Época Islâmica (Fig. 41), que somadas às estudadas na anterior
campanha perfazem o número de 22; identiicou-se
uma nova fase de ocupação, centrada nos séculos XIII-XIV e representada por níveis de lixeira (Fig. 5, C.8).
No Locus A (Fig. 2), a escavação (79m2 – Qs.
B-I/3-12 e J-S/12) deu a conhecer uma extensa li-
Fig. 2 - Intervenções arqueológicas no lote a reediicar na
Rua Francisco Augusto Flamengo.
xeira do Alto Império, rica em ânforas Dressel 14.
Trata-se de contexto também até agora inédito no
lote da Rua Francisco Augusto Flamengo.
A escavação até ao substrato geológico, nos Qs.
E-G/5-8 do mesmo locus, revelou uma sequência
estratigráica com cerca de 3m de potência na qual,
além de um horizonte da Época Romana do Alto Império, estão representados níveis da Idade do Ferro. Estamos, pois, em presença de mais uma fase de
ocupação até agora desconhecida no lote em apreço
(Figs. 3 e 4, Cs. 11-14).
SEQUÊNCIAS ESTRATIGRÁFICAS
A escavação em profundidade, quer no Locus
A, quer no interior do reservatório de água da Época Romana (Locus C), revelou potentes sequências
estratigráicas que traduzem, juntamente com as estruturas exumadas, a periodização da ocupação do
nosso lote.
Locus A
Nos Qs. E-G/5-8 (Figs. 3 e 4):
C.1A – Pavimento de cimento do interior das
ediicações actualmente existentes. Esp. 0,03m.
C.1B – Sub-base do piso anterior composta por
gravilha. Esp. 0,12m.
C.2 – Nível de enchimento e regularização
constituído por entulhos que integram blocos pétreos, cerâmica de construção e fragmentos de recipientes dos séculos XVIII-XIX. Esp. 0,52m.
C.3A – Piso em tijoleira com padrão em “espinha”. Esp. 0,05m.
C.3B – Sub-base de argamassa para assentamento do piso de tijoleira da C.3A. Esp. 0,10m.
C.4 – Areia amarelo-acinzentada solta e ina,
com carvões e escassa cerâmica romana. Corresponde a depósito secundário originado a partir de níveis
de ocupação romana desmontados nas áreas de cotas
mais elevadas do lote. Esp. máxima 0,37m.
C.5 – Escorrência lenticular de arenito do substrato geológico. Conirma o episódio erosivo e de
transporte veriicado na C.4. Esp. 0,17m.
C.6 – Formação descontínua, constituída por
fossas sepulcrais pertencentes a necrópole islâmica.
C.7 – Depósito argiloso muito compacto de cor
acinzentada escura; integra abundantes materiais ce163
Fig. 3 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Peris estratigráicos obtidos no aprofundamento do Locus A.
Fig. 4 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Estratigraia do
Locus A (da C.7 à C.14).
râmicos romanos (terra sigillata, cerâmica comum,
ânforas, cerâmica de construção), vidro, metal e
fauna mamalógica. Nesta camada surgiu uma ânfora Dressel 14 com restos de “salga” de peixe. Esp.
máxima 0,60m. Datável da 2ª metade do século I e
do século II d.C.. Foi cortada pelas sepulturas islâmicas. Trata-se de lixeira. Esta camada parece ter-se
formado a partir do topo da C.8, pela consolidação
do respectivo sedimento em resultado de contaminação por sais de ferro e argila que teriam migrado da
164
C.5. Com efeito, as C.s 7 e 8 parecem integrar
o mesmo horizonte cronológico e funcional (lixeira).
C.8 – Camada arenosa de cor castanho-acinzentada com carvões, correspondente a
“lixeira”; integra cerâmica comum, ânforas
(Dressel 14 e de importação, fragmento de ânfora Dressel 14 com restos de “salga” de peixe), terra sigillata e fauna. Esp. 0,35m.
C.9A – Sedimento arenoso de cor castanho-acinzentada com algumas cinzas, carvões
e cerâmica romana. Esp. 0,20m.
C.9B – Formação areno-argilosa de cor
castanho-acinzentada mais escura que a C.9A,
desenvolvendo algumas formações lenticulares de carvões. Surgem nesta camada metais
(pregos), vidros, materiais cerâmicos romanos.
Esp. máx. 0,38m.
C.9C – Depósito argilo-arenoso compacto
de cor avermelhada escura, integrando materiais romanos. Esp. 0,15m.
C.9D – Depósito areno-argiloso castanho médio menos compacto que a C.9C, com cerâmica romana. Esp. 0,19m.
C.9E – Lentícula arenosa de cor cinzenta que se
desenvolve na extremidade nordeste da sondagem.
Esp. 0,12m.
C. 10 – Formação lenticular de escorrência de
arenito do substrato geológico. Esp. 0,08m.
C.11A – Sedimento arenoso de cor castanho-
-acinzentada escura com alguns carvões, fauna, cerâmica da Idade do Ferro. Esp. máx. 0,37m.
C.11B – Formação areno-argilosa castanho-avermelhada muito escura com carvões; desenvolve-se nos Qs. E-F/5-8, contém cerâmica da Idade do
Ferro. Esp. 0,18m.
C.12A – Depósito de areão grosseiro do substrato geológico intercalado por formações lenticulares
areno-argilosas castanho-acinzentadas, contendo cerâmica da Idade do Ferro. Esp. 0,30m.
C.12B – Formação lenticular areno-argilosa castanho-acinzentada. Esp. 0,10m.
C.13 – Arenito do substrato geológico, mesclado
com areias acinzentadas. Integra cerâmica da Idade
do Ferro. Esp. 0,32m.
C.14 – Formação arenosa, compacta, castanho
escura com materiais da Idade do Ferro. Esp. 0,08m.
C.15 – Formação lenticular de escorrência de
arenito do substrato geológico mesclado com areias
acinzentadas. Esp. 0,09m.
C.16 – Lentícula arenosa acinzentada. Esp.
0,07m.
C. 17 – Substrato geológico de arenito do Pliocénico.
No lado sul dos Qs. E-G/5 e G6, surgiu um paleotalude com ca 1,5m de altura, talhado no arenito
da formação geológica de base, que teria delimitado
depressão preenchida pelas Cs. 9A a 16.
Locus C (interior do reservatório de água)
A estratigraia do enchimento do reservatório
de água compreende os seguintes níveis (de cima
para baixo) (Fig. 5):
C.7 – Piso de argamassa de cal e areia, do período medieval cristão. Esp. ca 0,05m.
C.8 – Lixeira rica em cerâmica (séculos XIII-XIV) e restos faunísticos, materiais estes embalados por sedimento argilo-arenoso de cor castanho-acinzentada muito escura. Esp. máxima ca 0,7m.
C.9 – Lentícula resultante da desagregação do
opus signinum que reveste a face interna do muro 5
do reservatório de água. Esp. máxima ca 0,05m.
C.10 – Lixeira com abundante material da
Época Romana, como cerâmica de construção e
fragmentos de recipientes cerâmicos; ossos de mamíferos e peixes, embalados em sedimento argilo-arenoso cinzento escuro. Esp. máxima ca 0,50m.
Foi datada das primeiras décadas do século V.
C.11 – Areia argilosa castanho-clara com escasso material arqueológico. Esp. máxima ca 0,40m.
C.12 – Lixeira semelhante à da C.10. Esp. máxima ca 0,30m.
C.13 – Nível semelhante ao da C.11. Esp. ca
0,45m.
Fig. 5 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sequência estratigráica do depósito que preenchia o reservatório de água da
Época Romana (Locus C).
C.14 – Areia argilosa castanho-clara, embalando, na base, numerosos blocos pétreos, fragmentos
de opus signinum, cerâmica de construção, fragmentos de recipientes cerâmicos e restos faunísticos. Assenta directamente sobre o fundo do reservatório de
água. Corresponde aos primeiros momentos do seu
abandono, datável do século IV.
PERIODIZAÇÃO DA OCUPAÇAO HUMANA
Ocupação pré-romana
A ocupação pré-romana (Idade do Ferro orientalizante e de tradição orientalizante) encontra-se representada no Locus A em depósito sedimentar que
preenche depressão limitada a sul por paleotalude revelado pela escavação. Trata-se de uma sequência de
níveis (Cs. 11 a 14) de natureza coluvionar, formados
a partir de sucessivas acumulações de sedimentos e
materiais arqueológicos provenientes de área da ja165
Quadro 1 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Cerâmica cinzenta orientalizante (NMI).
NMI (Número Minimo de Indíviduos) - Exemplares com bordo pertencentes a recipientes distintos.
zida de cota mais elevada, em resultado de processos
de erosão e transporte. Esses materiais arqueológicos encontravam-se, pois, deslocados do respectivo
contexto primário. Formam um conjunto que tipologicamente é integrável, de um modo geral, no período orientalizante (séculos VII-VI a.C.), mas com
elementos que podem atingir os séculos IV-II/I a. C..
No que se refere à cerâmica (Figs. 6 e 7), estão presentes as seguintes categorias: cerâmica de
engobe vermelho, cerâmica cinzenta orientalizante / de tradição orientalizante, cerâmica comum ao
torno, ânforas e cerâmica manual.
A cerâmica de engobe vermelho é muito escassa: somente um prato de bordo em aba (FAF/340),
de pasta ina e textura compacta com e.n.p. não superiores a 0,5mm, e cor castanho-amarelada (Munsell 10YR5/4); engobe quase inexistente; diâmetro externo da boca ca 310mm e largura do lábio
35mm.
A cerâmica cinzenta orientalizante / de tradição orientalizante predomina largamente, com 27
exemplares, e é constituída somente por recipientes
abertos, de mesa (Quadro 1). É dominada por três
formas: a Abul I.B.1 (prato de bordo em aba mais
ou menos encurvada e sub-horizontal, ligando-se ao
interior do bojo por superfície convexa, sem aresta
nem ressalto – Mayet & Tavares da Silva, 2000, p.
48, Fig. 9); a Abul II.B.2 (taça de bordo simples ligeiramente encurvado para o interior no prolongamento do bojo – Mayet & Tavares da Silva, 2000,
p. 48, Fig. 9) e II.C.1 (tigela de bordo ligeiramente
encurvada para o interior e com espessamento interno convexo - Mayet & Tavares da Silva, 2000, p.
48, Fig. 9). Além destas três formas, ocorrem ainda,
mas representadas por escassos exemplares, as formas Abul I.B.2, II.A.1, II.A.2, II.B.1 e II.C.3.
166
Os fabricos mais comuns, por ordem decrescente de frequência, são (Quadro 1): Abul B2, A5 e
A1. Surgem ainda os fabricos Abul A3, A4, B3, A2
e B1 (Mayet & Tavares da Silva, 2000, p. 44).
As formas de cerâmica cinzenta agora apresentadas são as que ocorrem em maior abundância
nas jazidas orientalizantes da Andaluzia Ocidental.
Os pratos de bordo em aba e peril em S surgem a
partir de “inais do século VIII a.C., desenvolvem-se plenamente durante o século seguinte e decaem ligeiramente a favor das taças hemisféricas”
(Vallejo Sánchez, 2005, p. 1156). Estas últimas,
de bordo simples ou espessado internamente, são
comuns desde o século VII a.C. e tornam-se mais
frequentes durante o século VI a.C. (Vallejo Sánchez, 2005).
No território português, a cerâmica cinzenta,
embora surja e atinja grande desenvolvimento no
horizonte orientalizante, sobrevive plenamente em
ambientes do século V a.C. (p. ex. em Abul B –
Mayet & Tavares da Silva, 2000), podendo mesmo atingir o período romano republicano, como
se observou no castelo de Alcácer do Sal (Tavares
da Silva et al., 1980-81, p. 179-180), em Santarém
(Arruda, 1999-2000) ou em Leião, Oeiras (Cardoso et al., 2010-2011). De notar, porém, que na Rua
Francisco Augusto Flamengo estão por enquanto
ausentes os tipos morfológicos mais tardios, comuns em contextos posteriores ao século VI.
No estabelecimento fenício de Abul A, a Forma I.B.1, com 6,6% da cerâmica cinzenta orientalizante aí recolhida, ocorre principalmente nos níveis da Fase I (meados e 3º quartel do século VII
a.C.); encontra-se presente em Abul B (santuário de
tradição orientalizante, de inais do século VI e do
século V a.C. ), mas em percentagens muito baixas.
Fig. 6 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Ocupação pré-romana (Locus A, Cs. 14-11): 1 - cerâmica de engobe vermelho;
2-8 - cerâmica cinzenta orientalizante; 9-14 - cerâmica comum ao torno (o nº13 é uma imitação da Forma IX A da cerâmica de
tipo Kuass). Desenhos de Susana Duarte.
167
Fig. 7 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Ocupação pré-romana (Locus A, Cs. 14-11): 1-2 - ânforas; 3-8 - cerâmica manual. Desenhos de Susana Duarte.
Já as Formas II.B.2 e II.C.1 apresentam em Abul A,
respectivamente, frequências média e elevada; em
Abul B, são das mais abundantes (Mayet & Tavares
da Silva, 2000,Quadros 10 e 22).
A cerâmica comum ao torno, com 14 exemplares, comporta quase exclusivamente formas abertas
(pratos, com 5 exemplares, e taças ou tigelas, com 8
exemplares). Surgiu somente um recipiente fechado (de pasta grosseira1, bordo simples e colo alto
subcilindrico, com ca. 140mm de diâmetro interno
da boca).
A maioria dos pratos apresenta parede ligeiramente arqueada para o interior e bordo com espessamento interno convexo. Um exemplar possui
bordo em aba encurvada.
Nas taças ou tigelas predomina (6 exemplares)
a Forma 1.3.1. de Sáez Romero (2005), com diâme-
tros internos da boca compreendidos entre 140mm
e 180mm.
Destaca-se um exemplar (Fig. 6, nº13) de parede encurvada para o interior com ténue espessamento interno no bordo, de pasta muito ina2 e cor/
cozedura 3.33; a superfície é vermelha (Munsell
2.5YR 4/8) e brilhante (engobe?). Parece tratar-se
de imitação da Forma IX-A da cerâmica de tipo
Kuass (Sousa, 2009). A presença deste exemplar na
Rua F. Augusto Flamengo sugere que a ocupação
da Idade do Ferro, embora com início no período
orientalizante, pode ter atingido um amplo intervalo de inais do século IV ao II/I a.C..
O NMI de ânforas está reduzido a dois exemplares, ambos pertencentes ao tipo Ramón 10.1.2.1,
um com lábio da variante k (diâmetro interno da
boca ca. 80mm; pasta vermelha – Munsell 2.5YR
1 - Abundantes e.n.p. > 1mm.
2 - Sem e.n.p. visíveis à vista desarmada.
3 - Núcleo anegrado entre zonas supericiais avermelhadas – cozedura redutora-oxidante.
168
Fig. 8 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 9). Terra sigillata de tipo itálico: 1 - Consp. 34; terra sigillata
sudgálica: 2 e 3 - Drag. 15/17; 4-9 - Drag. 18 (o nº 9 com a marca [...] VSI); 10 - Ritt. 8. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
169
Fig. 9 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 9). Terra sigillata sudgálica: 1 e 2 - Drag. 24/25;
3-5 - Drag. 27 (o nº 5 com a marca OF PATRICI); 6 - Ritt. 12; 7 - forma indeterminada com a marca ISA[...]; 8 - forma indeterminada com a marca BIOFECIT. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
5.5/6 – e grosseira), o outro com lábio da variante n
(pasta ina4; cor/cozedura 3.3, com núcleo cinzento-esverdeado e superfícies rosadas). A variante k é,
em Abul A, exclusiva da Fase I; a n ocorre em ambas
as fases do mesmo estabelecimento fenício (Mayet
& Tavares da Silva, 2000, p. 55).
4 - Numerosos e.n.p. < 0,5mm.
170
A cerâmica manual (11 exemplares) distribui-se por recipientes abertos (4 taças em calote) e
fechados (7 exemplares: 6 potes/panelas e grandes
contentores).
As taças em calote oferecem pastas de textura
média a grosseira; foram cozidas em ambiente redu-
Fig. 10 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 9). Terra sigillata sudgálica decorada: 1 - Drag.
29; 2 - Drag. 29 ou 37; 3 - peça de jogo. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
tor, por vezes com fase de arrefecimento oxidante; o
diâmetro interno da boca, determinado somente em
um exemplar, é de 180mm.
Os “potes”/”panelas” com bordos sub-verticais
ou ligeiramente encurvados para o interior, ou ainda
extrovertidos, quer ligeiramente quer francamente encurvados para o exterior, e possuindo, em um
caso, aba oblíqua, apresentam pastas de textura média a grosseira, cozedura redutora, por vezes com arrefecimento oxidante (núcleo anegrado e superfícies
avermelhadas), e superfícies alisadas a toscas; o diâmetro interno da boca oscila entre 130mm e 200mm.
O contentor de grandes dimensões possui bordo ligeiramente encurvado para o exterior e colo de
concavidade pouco pronunciada.
Ocupação da Época Romana alto-imperial
A ocupação da Época Romana alto-imperial
está representada por extensa lixeira que integra as
Camadas 7 a 9 (9A-9D) do Locus A, selando a sequência estratigráica pré-romana atrás referida.
Esta lixeira ter-se-ia formado ao longo da se171
Seguindo a classiicação e as cronologias propostas por Genin (2007), foram
identiicadas as seguintes formas de terra sigillata sudgálica lisa: Drag. 15/17B
(40/50-90/110 d.C.); Drag. 18B (20/30110/120 d.C.); Ritt. 8A (30/40-100/110
d.C.); Drag.24/25A (15-80/90 d.C.); Drag.
27B (15-100/110 d.C.); Ritt.12B (40/50100/110). As formas de terra sigillata
sudgálica decoradas (Fig. 10) reduzem-se
à Drag. 29 e à Drag. 29 ou 37.
Das quatro marcas de oleiro em terra
sigillata sudgálica encontradas na Camada
9 (Fig. 11; Quadro 3), só duas foram identiicadas: uma (em exemplar de forma indeterminada) atribuída ao oleiro BIO, que
laborou em La Graufesenque e Le Rozier
de Nero a Vespasiano (?), segundo Polack
(2000, p. 186), ou de 50-70/80, na proposta de Genin (2007, p. 184); outra, em taça
Drag. 27, de PATRICIVS, cuja actividade
está documentada a partir de Nero e se
desenvolveu na época laviana (Polach,
2000, p. 285), ou, segundo Genin (2007, p.
228 e 229), funcionou durante o intervalo
de 70/80-150/170? d. C..
Este conjunto de terra sigillata é
aim dos provenientes das UU.EE. 1375,
1397, 1408 de Almendralejo, nº41 (Mérida) datados de 50-60 d.C. (Bustamante
Álvarez, 2013, Fig. 12). Porém, nestes
contextos, a terra sigillata hispânica está
ausente, o que não acontece na nossa Camada 9, que, como atrás referimos, forneceu um fragmento pertencente à forma
Drag.15/17 e outro à Drag.18, ambos produzidos em La Rioja.
O conjunto anfórico identiicado na
Fig. 11 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C.
9). Marcas de oleiro em terra sigillata sudgálica: 1 - [...]VSI; 2 - OF PATRICamada 9 (Fig. 26; Quadro 5) é constítuiCI; 3 - ISA[...]; 4 - BIOFECIT. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
do exclusivamente pela Dressel 14 e mostra, por um lado, escassez da sua variante
A, que, nas olarias do Largo da Misericórdia, Setúbal (Tavares da Silva, 1996),
gunda metade do século I d.C., com prolongamento
e de Abul (Mayet & Tavares da Silva, 2002) é datada
pelo século seguinte.
do período de Tibério-Claudio; por outro lado, eleO único exemplar de terra sigillata de tipo itávada frequência da variante B da mesma ânfora ‒ a
lico (Fig. 8: 1) exumado (Camada 9) pertence à forvariante mais comum nos contextos da segunda mema Consp. 34, que abarca o intervalo situado entre o
tade do século I d. C. do Pinheiro e de Abul (Mayet
inal do principado de Tibério e os Flávios (AA.VV.,
& Tavares da Silva, 1998 e 2002).
1990, p. 112).
Os artefactos exumados da Camada 9 sugerem
Na mesma camada (Figs. 8 e 9; Quadro 2)
cronologia centrada no terceiro quartel do século I d.
veriica-se o esmagador domínio da terra sigillata
C., a partir do reinado de Nero.
sudgálica sobre a hispânica (somente dois fragmentos, um da forma Drag. 15/17 e outro Drag. 18).
***
172
Quadro 2 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Terra sigillata.
173
Fig. 12 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 8). Terra sigillata sudgálica: 1-3 - Drag. 18 (o nº 3 com a
marca LL[...]); 4 - Drag. 27. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Fig. 13 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 8). Terra sigillata hispânica: 1 - Drag. 15/17; 2 - Drag.27
com a marca [...]E. FIRM; 3 e 4 - Formas indeterminadas com a marca PET EROOFI. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
174
Fig. 14 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 8). Terra sigillata decorada: 1 - sudgálica, forma
indeterminada; 2 - hispânica, forma indeterminada; 3 - hispânica Drag. 30? Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Fig. 15 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 8). Marcas de oleiro em terra sigillata: 1 - LL[...]
(em t. s. sudgálica, forma indeterminada; 2 - [...]E. FIRM, do oleiro Valerius Firmus (em t. s. hispânica, Drag.27); 3 e 4 - PET
EROOFI, do oleiro Petronius Eros. (em t.s. hispânica, forma indeterminada). Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
175
Fig. 16 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 7). Terra sigillata sudgálica: 1-3 - Drag. 27 (o nº2
com a marca [...]ECVN); 4- Drag. 18; 5-8 - Drag.24/25; 9 - Drag. 35/36. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
176
Fig. 17 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C. 7). Terra sigillata sudgálica: 1 - Drag. 33; 2 - forma indeterminada com a marca OF CAT[...], retrógrada. Terra sigillata hispânica: 3 e 4 - Drag. 15/17; 5 e 6 - Drag. 27 (o nº6
apresenta a marca VAL[...]); 7 - Drag. 35/36; 8 - Drag. 46. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Nas Camadas 8-7, a terra sigillata sudgálica
continua a predominar (Quadro 2); apresenta sete
marcas (Figs. 12-15, 16-18; Quadro 3): uma atribuível a CATLVS (em exemplar de forma indeterminada), oleiro do Sul da Gália que produziu no período
de Tibério-Cláudio (Polack, 2000, p. 201), ou entre
15-50/60 d.C. ? (Genin, 2007, p. 190), ou, menos provavelmente a CATVS, de La Graufesenque, activo entre 15 e 30 d. C. (Genin, 2007, p. 190). Este exemplar
encontrava-se deslocado do seu contexto original.
Outra marca (em exemplar de Drag. 27) é de
SECVNDVS I ou II. SECVNDVS I esteve activo no
período de Tibério-Cláudio (Polack, 2000, p. 322) ou
entre 15 e 70 d.C. (Genin, 2007, p. 243 e 244); SE-
CVNDVS II teria laborado no 3º quartel do século
I (Polack, 2000, p. 323) ou entre 70/80 e 150/170?
(Genin, 2007, p. 244).
Em terra sigillata hispânica, quase totalmente
produzida em La Rioja, surgiram, nas Camadas 8 e 7,
marcas correspondentes aos seguintes oleiros (Figs.
13 e 15; Quadro 3):
- PETRONIVS EROS (em 2 exemplares de
formas indeterminadas), oleiro de La Rioja, de 70100 d.C. (Bustamante Álvarez, 2013, Fig. 257).
- VALERIVS FIRMVS (Drag. 27), oleiro de La
Rioja5.
No que se refere à tipocronologia da terra sigillata hispânica é de salientar que: a Drag. 15/17
5 - Contámos, na análise da terra sigillata alto-imperial com a relevante colaboração dos Drs. Eurico de Sepúlveda e Inês S. A. Alves Ribeiro, a
quem muito agradecemos.
177
Álvarez, 2013, p. 115, Fig. 80).
A camada 7 forneceu também
duas lucernas (Fig. 19): uma do tipo
Deneauve VG (“lucernas de volutas
degeneradas e aletas laterais”); a outra, representada por fragmento de
disco, mostra cena de fellatio, com
estreitos paralelos em exemplar proveniente de Pompeia (Clarke, 2003,
p. 124) pertencente ao tipo Deneauve VA ou Dressel - Lamboglia 11B.
Ambos os tipos, comuns no segundo
quartel do século I d.C., atingiram o
inal do mesmo século (Deneauve,
1969; Belchior, 1969).
As cronologias estimadas para
os materiais anteriormente apresentados sugerem que a formação
das Camadas 8-7 ter-se-ia iniciado
no último quartel do século I d.C.;
prolongou-se certamente pelo século seguinte, o que é evidenciado não
só por alguns tipos de terra sigillata,
mas também pela elevada frequência
da variante C da ânfora Dressel 14
(Quadro 5), variante datada do século II na olaria romana do Pinheiro
(Mayet & Tavares da Silva, 1998).
As Camadas 8-7 forneceram artefactos deslocados do seu contexto
original, como os exemplares de ânforas Haltern 70 e Oberaden 83 (Figs.
27 e 28) que indicam que a ocupação
do local remonta, na Época Romana,
provavelmente ao período de Júlio-Cláudio, ou mesmo ao tardo-republicano (no caso da Haltern 70). O
Fig. 18 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira alto-imperial (Locus A, C.
mesmo se poderá dizer da presença
7). Marcas de oleiro em terra sigillata. Sudgálica: 1 - [...]ECVN, do oleiro Sedas fíbulas de charneira e arco triancundus I ou II; 2 - OF CAT[...], retrógrada, atribuível a Catlus ou Catus. Hisgular de tipo Ponte 41.1b (Fig. 31), o
pânica: 3 - VAL [...], atribuída a um dos oleiros Valerius. Desenhos de Susana
qual embora possa ter atingido o inal
Duarte e Ana Castela.
do século I d.C., teve a sua máxima
frequência durante a época de Augusto (Ponte, 2006, p. 347).
ocorre nas variantes c (época laviana e século II
O acentuado carácter doméstico dos compod.C.) e e-fase alto-imperial (inais do século I e sénentes desta lixeira é muito evidente não só pelos
culo II d.C.), de acordo com Bustamante Álvarez,
vestígios de utilização patentes em muitos exempla2013, p. 84 e 85, Fig. 39; a Drag.27 apresenta peris
res de terra sigillata (especialmente no fundo exterdatáveis da época de Trajano (Bustamante Álvarez,
no) e de cerâmica comum (de assinalar a abundância
2013, p. 97); a Drag. 35, com decoração de barbotie a grande diversidade morfo-funcional ‒ Figs. 20na, é datável do século II (variante b de Bustamante
25 ‒, sendo de destacar, pelo interesse cronológico
Álvarez, 2013, p. 105, Fig. 67); e a Drag. 46 surge em
que revela, a elevada frequência de bordos de paAlmendralejo, 41 (Mérida), preferencialmente, nas
nelas, potes e potinhos formando garganta interna,
UU.EE. datadas de 80-90 e 90-100 d.C. (Bustamante
e de bordos de tachos e panelas dobrados sobre o
178
Fig. 19 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Locus A, C.
7. Lucernas: 1 - lucerna de aletas laterais e volutas degeneradas, do tipo Deneauve V G; 2 - fragmento de disco
decorado com cena de fellatio. Desenhos de Ana Castela
e Susana Duarte.
Quadro 3 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Marcas de oleiro em terra sigillata.
179
Quadro 4 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Tipologia (referida à de S. Cucufate) da cerâmica comum da Época Romana (NMI), das
ocupações alto-imperial (Cs. 9-7) e baixo-imperial (Cs. 14-10).
180
Fig. 20 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 9). Cerâmica comum: 1 - tigela; 2-4 - tachos;
5-7 - panelas; 8 - potinho; 9 - talha. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
181
Fig. 21 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 8). Cerâmica comum: 1 - tigela; 2 - prato covo; 3 - almofariz
(de importação); 4-7 - tachos; 8 - panela; 9 - pote. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
182
Fig. 22 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 8). Cerâmica comum: 1 - pote; 2 - potinho; 3 - pote (de
importação?); 4 - bilha; 5 - talha; 6-8 - tampas. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
183
Fig. 23 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Cerâmica comum: 1-2 - pratos; 3-4 - prato covo; 5-8
- tigelas; 9 - taça (imitação de paredes inas); 10 - almofariz (produção itálica); 11 - almofariz (produção bética); 12 - alguidar. Desenhos
de Susana Duarte e Ana Castela.
184
Fig. 24 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Cerâmica comum: 1 - alguidar; 2 - terrina; 3-5 - tachos; 6-10 - panelas; 11 - pote. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
185
Fig. 25 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Cerâmica comum: 1 - jarro; 2 - bilha; 3-4 - talhas;
5-7 - tampas. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
ombro – Quadro 4), mas também pelos restos de cozinha, constituídos sobretudo por partes esqueléticas
de mamíferos.
Por outro lado, a lixeira continha materiais rejeitados
talvez no âmbito de actividades comerciais. Referimo-nos ao elevado número de ânforas (Figs. 26-30;
Quadro 5) em que a Dressel 14, produzida local/regionalmente e de conteúdo piscícola (dois exemplares
continham restos de preparados de peixes), e que predomina grandemente, era acompanhada por formas
importadas com origens geográicas muito diversas:
Egeu (ânfora vinária da classe 9 de Peacock & Williams), Península Itálica (ânfora vinária Dressel 2-4), sul
da França (ânfora vinária Gaulesa 4) e sul de Espanha
(ânforas Haltern 70 e oleária Oberaden 83).
186
Ocupação da época romana baixo-imperial
A ocupação baixo-imperial está representada
no lote da Rua Francisco Augusto Flamengo pelo
reservatório de água identiicado no Locus C (Figs.
32-35) durante a primeira campanha de escavações
arqueológicas e pelos níveis estratigráicos que integram o seu enchimento sedimentar.
Na escavação realizada na área deste reservatório foi posto a descoberto o que restava dos lados
sul e este, no âmbito do nosso lote.
O muro sul (m.5) que se inicia no Q. K17,
perpendicularmente ao muro este (m.6), como se
veriicou na primeira campanha, encontra-se neste
momento à vista numa extensão de 10,5m, prolon-
sido construído e abandonado no
Baixo Império. Atribuímos a sua
construção a este período pelo
facto do revestimento das paredes
e fundo ser muito rico em fragmentos de cerâmica, a qual está
ausente do revestimento das estruturas arquitectónicas (cetárias,
por exemplo) do Alto Império até
agora identiicadas em Setúbal.
Quanto à cronologia do seu
abandono, a camada mais profunda (C.14) do depósito sedimentar
que o preenchia, e que, por conseguinte, assentava directamente no
fundo, continha um conjunto artefactual (terra sigillata africana C,
na forma Hayes 45A, e africana D,
nas formas Hayes 59, 61A e 62 –
Figs. 36 e 37; Quadro 2 – ; ânforas
de importação Almagro 50 e de
produção local/regional Almagro
51c, variante B – Fig. 40; Quadro
5 – , além de um suporte de ânfora
e de cerâmica comum em que estão ausentes os bordos formando
garganta interna e são raros os dobrados sobre o ombro de panelas
– Figs. 38 e 39; Quadro 4) tipologicamente aim do de contextos
escavados no Pinheiro (“ lixeira
que cobria o nível de abandono da
cozinha do Alto Império” – Mayet
& Tavares da Silva, 1998, p. 187-191, Figs. 79-90
– e Camada 2 da sondagem LIA – Mayet & Tavares da Silva, 1998, p.194 e 75 e 95-98), contextos
datáveis da primeira metade-meados do século IV.
Esta é também a cronologia que propomos para a
formação da Camada 14 do reservatório de água.
Esta cronologia é corroborada pela atribuída à
Camada 12 do enchimento do reservatório de água,
também de lixeira; continha terra sigillata africana
D (Quadro 2) nas formas Hayes 58 e 61. No que
se refere ao material anfórico (Quadro 5), predomina o tipo Almagro 51c, mas agora na variante
C, e ocorre a ânfora Almagro 51 a-b, variante A. A
presença da Almagro 50 (mais uma vez de importação), Almagro 51 c, variante B, e Sado 1, variante
B, é vestigial. Deste modo, veriica-se que o conjunto anfórico da Camada 12 é muito semelhante ao
das últimas produções dos fornos 4 e 5 do Pinheiro
(Mayet & Tavares da Silva, 1998), datáveis do último quartel do século IV, nos quais a variante C da
Almagro 51c é dominante, a Almagro 51 a-b surge,
nessa olaria, pela primeira vez e as formas Almagro
Quadro 5 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Ânforas (NMI) da Época Romana.
gando-se para lá do limite oeste do lote, pela Rua
Francisco Augusto Flamengo.
O muro do lado este (m.6), já identiicado na
primeira campanha numa extensão de cerca de 3 m,
foi agora escavado até ao limite norte do lote, atingindo neste momento o comprimento de 8m.
Os dois troços identiicados, ainda que incompletos, permitem airmar que o reservatório, de
planta rectangular, com 3m de profundidade, teria
uma capacidade superior a 250m3 .
Veriicámos que os referidos muros eram internamente, tal como o fundo, revestidos de opus signinum rico em fragmentos de cerâmica; alargavam
na face interna e em profundidade, formando dois
ressaltos que se comportavam como contrafortes.
Na ligação das paredes com o fundo foi construída
meia cana convexa também de opus signinum.
Este reservatório de água, que, pela sua capacidade e por se localizar na área de cota mais elevada da Setúbal romana, poderia ter sido público,
abastecendo, pelo menos, parte da povoação, teria
187
Fig. 26 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 9). Ânforas do tipo
Dressel 14. A nº2 possui a marca [...]O. Desenhos de
Susana Duarte e Ana Castela.
decoração estampada do estilo Hayes A (ii),
constituída por rosetas do tipo Hayes 44 A,
dispostas perimetralmente e enquadradas por
caneluras concêntricas, e por palmetas do tipo
Hayes 4i, alternando com motivo quadrangular preenchido por recticulado, do tipo Hayes
71i; e ânforas nas formas Almagro 51c, variante C, Almagro 51 a-b, variante B, e Sado1,
variantes A e B (Quadro 5).
Ocupação do Período Islâmico
50 e Sado1 são meramente residuais.
A Camada 10 da mesma sequência estratigráica, igualmente um nível de lixeira doméstica, deve
corresponder à ocupação humana do local durante
a passagem do século IV para o século V d.C.. Com
efeito, para além da sua posição naquela sequência,
de posterioridade relativamente à Camada 12, ofereceu terra sigillata africana D (Quadro 2) na forma Hayes 91 A/B e em formas indeterminadas com
188
Durante a segunda campanha de escavações na Rua Francisco Augusto Flamengo,
foram exumados 15 indivíduos em contexto
primário, em decúbito lateral direito com a
orientação SO-NE. Estas características são
compatíveis com ritos funerários islâmicos
e são congruentes com as características observadas nos indivíduos exumados na primeira campanha. Importa referir que um dos 15
indivíduos (indivíduo 5) tinha sido já parcialmente exumado durante a primeira fase de
trabalhos. Também o esqueleto da sepultura
10 se estendia para o corte Norte, tendo sido
exumada apenas a porção que se encontrava
dentro da área escavada. O restante esqueleto
será exumado em fase de trabalhos posterior,
aquando do alargamento da área. Este indivíduo revela que os contextos funerários se prolongam para além da área intervencionada,
sendo possível que existam mais sepulturas
para além das intervencionadas.
Foram considerados os factores tafonómicos especíicos do sítio arqueológico em
questão, excluindo-se aqueles que são inerentes a todos os processos de decomposição,
assim como a preservação diferencial dos diversos
ossos devido a diferenças estruturais e morfológicas
dos mesmos (Micozzi, 1991; Darwent & Lyman,
2002) e possíveis diferenças osteobiográicas dos indivíduos, como a idade, o sexo e patologias (Nawrocki, 1995; Guy et al., 1997; Stojanowski et al., 2002;
Roksandic, 2002; Bello & Andrews, 2006). Excluiu-se, também, o processo de escavação e exumação
por se encontrar implícito.
Fig. 27 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 8). Ânforas de importação: 1 - Dressel 2-4; 2 - Classe 9
de Peacock & Williams; 3 - Haltern 70. Ânforas de produção local/regional: 4-6 - Dressel 14. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
189
190
Fig. 29 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Ânforas de produção local/regional: 1-3 - Dressel 14.
Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Fig. 28 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Ânforas de importação: 1 - Haltern 70; 2 - Oberaden
83; 3 - Gaulesa 4. Ânforas de produção local/regional: 4 - Dressel 14 (continha restos de preparados de peixe); 5 - Dressel 14 com marca
CLS; 6 - Dressel 14 com marca MO. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Avaliaram-se, assim, os seguintes aspectos devido à inluência que apresentam sobre o processo de
decomposição dos cadáveres e dos ossos:
(i) Contexto geológico e características dos depósitos em que os indivíduos se encontravam inumados (Janaway, 1996);
(ii) Hiato temporal entre a deposição do indivíduo e a sua exumação (Boddington et al., 1987);
(iii) O tipo de rito funerário (Micozzi, 1991;
Nawrocki, 1995);
(iv) A profundidade a que os indivíduos terão
sido inumados (Nawrocki, 1995; Janaway, 1996);
(v) A presença/ausência de acção de fauna e
lora (Micozzi, 1991; Janaway, 1996);
(vi) A reutilização do espaço (Pearson, 2005).
A conjugação das diversas variáveis acima re191
Fig. 30 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira do Alto Império (Locus A, C. 7). Ânfora Dressel 14, com restos de preparados
de peixe (desenhada na Fig. 28, nº4). Fotograia Arquivo MAEDS.
Fig. 31- Rua Francisco Augusto Flamengo. Locus A, C. 7. Fibulas de charneira e arco triangular do tipo Ponte 41.1b. Desenhos
de Ana Castela.
192
Fig. 32 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Planta da área escavada no Locus C, com destaque para o reservatório de água da
Época Romana.
A
Fig. 33 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Locus C. Reservatório de água da Época Romana (A), visto de oeste. Fotograia
Arquivo MAEDS.
193
Fig. 34 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Locus C. Muro 5 do reservatório de água da Época Romana, com revestimento de
opus signinum. Fotograia Arquivo MAEDS.
A
Fig. 35 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Locus C. Aspecto de sondagem realizada no interior do reservatório de água da Época Romana. A - muro 5. Fotograia Arquivo MAEDS.
194
Fig. 36 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Interior do reservatório de água, baixo-imperial (Locus C). Terra sigillata africana
C: 1- Hayes 45 A, decorada por faixa de guilhoché (C.14). Terra sigillata africana D: 2 - Hayes 59 (C. 14); 3 - Hayes 61 A (C.
14); 4 e 5 - fundos de pratos com decoração estampada (C. 10). Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
feridas resultou num estado de preservação dos esqueletos variável de pobre a excelente.
Antropologia Funerária
Os indivíduos foram invariavelmente inumados em posição primária, em sepulturas escavadas
nos depósitos naturais e/ou antrópicos, sem qualquer
tipo de estruturação positiva. As sepulturas são de
uso individual, sem qualquer reutilização funerária.
Os esqueletos encontravam-se, na generalidade, em decúbito lateral direito, ocorrendo, contudo, ligeiras variações na posição dos corpos. Estas
variações deverão estar relacionadas com rotações,
ventrais ou dorsais, pós-deposicionais dos corpos, e
que resultaram da interacção de variáveis tafonómicas e/ou pós-deposicionais com as características do
rito funerário. Efectivamente, a posição em decúbito lateral é instável, tornando-se mais susceptível a
alterações na posição do corpo. Os crânios, quando
observáveis, encontravam-se invariavelmente sobre
o lado direito, como expectável.
As mãos dos indivíduos localizavam-se, genericamente, junto à região pélvica. Não obstante, identiicaram-se também algumas pequenas variações na
posição dos membros superiores ao nível da lexão
da articulação do cotovelo (variável entre: ausência
195
Fig. 37 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Interior do reservatório de água, baixo-imperial (Locus C). Terra sigillata africana
decorada (ver Fig. 36). Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
Fig. 38 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Interior do reservatório de água da Época Romana, Locus C, C. 14. Cerâmica comum:
1 - prato; 2 - taça; 3 - almofariz da forma Dramont D2, com marca M.V [...] sobre o lábio, de produção itálica; 4-5 - alguidares;
6 - tacho; 7-8 - panelas. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
196
197
Fig. 39 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Interior do reservatório de água da Época Romana, Locus C, C. 14. Cerâmica comum:
1-3 - potes; 4 - potinho; 5 - púcaro; 6 - jarro; 7-9 - bilhas. Desenhos de Susana Duarte e Ana Castela.
198
Fig. 40 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Interior do reservatório de água da Época Romana, Locus C, C. 14. Ânforas de importação: 1-2 - Almagro 50. Ânforas e suporte de produção local/regional: 3-5 - Almagro 51c; 6 - suporte. Desenhos de Susana
Duarte e Ana Castela.
199
Fig. 41 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Área escavada nos Loci A e C com estruturas do reservatório de água da
Época Romana (Locus C) e sepulturas do Período Islâmico.
200
de lexão e lexão máxima observada a cerca de 90º).
Foi igualmente observada alguma variação ligeira na
posição dos membros inferiores. Estes encontravam-se ou estendidos ou semi-lectidos à direita. O grau
de lexão das pernas, quando semi-lectidas, variou
entre 15 – 45º nas articulações coxo-femurais e 15 –
80º nos joelhos.
A orientação dos indivíduos é constante, estando
o crânio sempre a SO e os pés a NE. A face dos indivíduos encontrava-se virada a nascente. As sepulturas
nunca foram reutilizadas funerariamente e nenhum dos
indivíduos apresentava espólio funerário associado.
ses (MacLaughlin, 1990; Scheuer & Black, 2000), o
comprimento das diáises de ossos longos (Maresh,
1970 in Scheuer & Black, 2000) e a calciicação e
erupção dentária (Ubelaker, 1989; Smith, 1991).
São considerados não adultos os indivíduos
com menos de 20 anos e adultos os indivíduos com
20 ou mais anos de idade à morte (Buikstra & Ubelaker, 1994).
Para a diagnose sexual morfológica não métrica utilizaram-se os métodos propostos por Buikstra
& Ubelaker (1994) e por Bruzek (Bruzek, 2002). Na
aplicação de métodos morfológicos métricos usaram-se os critérios propostos por Wasterlain (Wasterlain, 2000).
Discussão
As características observadas e descritas são
compatíveis com ritos funerários islâmicos: posição
do corpo em decúbito lateral direito; orientação no
sentido SO-NE; a face virada a nascente; ausência de
estruturação do interior da sepultura; ausência de espólio funerário; ausência de reutilização funerária das
sepulturas (Torres & Macias, 1995; Macias, 2005; Le
Bars, 2008; Godinho & Brazuna, 2009).
Refere-se que o ritual funerário da igreja moçárabe peninsular obrigava ao desnudamento do corpo,
à sua lavagem e ao seu amortalhamento (Torres &
Macias, 1995; Macias, 2005). De facto, ainda actualmente o corpo de um falecido deve ser lavado, perfumado e amortalhado. Após este processo é realizada uma oração funerária e o corpo é depois inumado
numa sepultura sem qualquer estruturação e coberto
com terra, sem recurso a qualquer caixão. Crê-se que
o defunto ouve o que é dito e que não tem consciência
da transição. Assim, existe uma pessoa que o informa do processo pelo qual está a passar e que os anjos
Munkar e Nakir irão à sepultura com três questões:
(i) quem é o teu Senhor, (ii) quem é o teu profeta e
(iii) qual é a tua religião. As respostas deverão ser (i)
Alá, (ii) Maomé e (iii) Islão. Caso estejam correctas,
o indivíduo passa esta fase do pós vida e vislumbra os
prazeres do paraíso (Kastenbaum, 2003).
Destaca-se que a morte é actualmente encarada,
no contexto islâmico, como uma transição e que este,
o Islão, é o veículo que garantirá uma travessia tranquila. É no paraíso que os crentes encontram a paz e a
felicidade (Kastenbaum, 2003).
Estimativa da idade à morte e diagnose sexual
Métodos
Para a estimativa da idade biológica à morte
procurou observar-se a formação e união das epíi-
Resultados e discussão
A estimativa da idade à morte permitiu concluir
a presença de oito não adultos e sete adultos. As idades dos não adultos variam entre indivíduos peri-natais e indivíduos adolescentes. A elevada presença de
indivíduos não adultos implicou um elevado número
de casos de indivíduos de sexo indeterminado (n=9).
Dos seis indivíduos diagnosticados há: duas possíveis
mulheres, três mulheres e um possível homem.
Deve ser referido que o indivíduo 5, embora
tenha sido classiicado na primeira campanha como
homem, apresenta algumas características morfológicas sexualmente dimóricas, não métricas, femininas. Atendendo a estas, e assumindo a sua maior idedignidade relativamente aos métodos métricos de
diagnóstico sexual, este indivíduo é classiicado como
possível mulher. Acresce que devido ao seu estado de
preservação apenas foi possível aferir que terá mais
de 13-17 anos, não sendo possível inirmar se terá
uma idade igual ou superior a 20 anos. Foi, assim, integrado na categoria de possível adulto (adulto?).
As análises paleodemográicas encontram-se,
genericamente, condicionadas por diversos factores.
Na presente necrópole destacam-se, desde logo (i)
a dimensão da amostra e (ii) a parcialidade da área
intervencionada, encontrando-se estas variáveis inter-relacionadas. A dimensão da amostra, embora nesta
fase dos trabalhos seja mais alargada que a recuperada
na 1ª campanha, não é suiciente para que se possa
abordar consistentemente a questão da representatividade da população de origem. A área intervencionada
é apenas parte da área total da necrópole. Atendendo
a esta parcialidade não é possível aferir se nos encontramos perante uma área especíica da necrópole
onde poderão ter sido, eventualmente, inumados indivíduos de classes bio-socio-culturais especíicas e
que a amostra constitua, assim, parte de um ou vários
segmentos da sociedade e população de origem, não
201
202
Fig. 42 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 6.
Fig. 43 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 9 (indíviduo não adulto).
Fig. 44 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 10.
Fig. 45 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 16 (indíviduo com 36-40 semanas de gestação).
Fig. 47 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 10.
Fusão do manubrío, meso-esterno e processo xifóide.
Fig. 46 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 19.
Fig. 48 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 10.
Pormenor de perda de dentição ante-mortem, com reabsorção
total dos alvéolos, e desgaste acentuado da coroa dentária.
Fig. 49 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 12.
Ante-braços esquerdo e direito, em supina. Notar a assimetria na extremidade distal dos rádios e ulnas, assim como as
curvaturas atípicas presentes na mesma região do ante-braço
direito e o espessamento do rádio direito.
Fig. 50 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Sepultura 12.
Pormenor de corpo ósseo, in situ, localizado no pescoço.
203
Quadro 6 - Dados de antropologia funerária dos indivíduos exumados, na 2ª campanha da intervenção antropológica da Rua Francisco Augusto Flamengo.
sendo a amostra, consequentemente, representativa
da população de origem.
Considerando os factores referidos não é possível realizar uma análise da estrutura (paleo)demográica da população de origem destes indivíduos. Não
obstante, pode ser mencionado que a frequência de
não adultos (46%) não deverá ser inesperada. De facto, as taxas de mortalidade dos não adultos deveria
ser mais elevada no período em causa que as actuais.
Acresce que seria, inclusivamente, expectável uma
maior frequência nas classes etárias mais baixas.
Em termos de diagnose sexual, veriica-se,
como já foi destacado, um elevado número de indivíduos não diagnosticáveis. Esta frequência condiciona
decisivamente a análise da distribuição sexual desta
necrópole. Deve ser, contudo, referida a maior presença de mulheres/possíveis mulheres relativamente
a homens/possíveis homens.
Paleopatologia
Os resultados apresentados devem ser encarados como dados preliminares. Uma análise cuidada
do material osteológico, após a sua limpeza, revelará, certamente, mais casos patológicos permitindo
uma abordagem mais consistente.
O indivíduo exumado da sepultura 6 exibia
patologias de foro oral e de foro degenerativo articular. Na patologia oral veriicou-se: um desgaste
muito acentuado da coroa dos incisivos, apresentando a dentição posterior um desgaste de graus
moderados; periodontite, inclusivamente de grau
máximo; perda ante-mortem, com reabsorção alveolar completa, de um pré-molar inferior direito. No
ombro esquerdo, nomeadamente no úmero, registou-se a presença de OA6 de grau 2.
No esqueleto da sepultura 7 registou-se a presença de casos de patologia oral e indicadores de
stress isiológico. Os casos de patologia oral consistem na perda ante-mortem dos pré-molares inferiores direitos, com total reabsorção dos alvéolos.
O indicador de stress isiológico observado é a cri-
6 - Embora seja deinida por Aufderheide & Rodríguez-Martín (1998) como uma patologia não inlamatória, Ortner (2003) adverte que numa
minoria dos casos de osteoartrose (OA) existe inlamação. É uma patologia crónica e progressiva e caracteriza-se, também, pela perda da cartilagem
articular e subsequentes lesões no osso sub-condral. Estas formam-se devido ao contacto directo entre os diversos ossos após a destruição e perda
da cartilagem (Aufderheide & Rodríguez-Martín, 1998; Rogers, 2000). Apresenta uma etiologia multifactorial, para a qual concorrem factores
como: idade, traumas, predisposição genética, presença de outras patologias, factores ambientais, obesidade e postura (Rogers, 2000; Campillo,
2001; Roberts & Manchester, 2005; Weiss & Jurmain, 2007).
204
Quadro 7 - Estimativa da idade à morte e diagnose sexual dos indivíduos exumados, na 2ª campanha da intervenção antropológica
da Rua Francisco Augusto Flamengo.
bra orbitalia de grau 17, remodelada, localizada na
órbita direita.
Apesar da baixa idade à morte do indivíduo 9
registou-se a presença de diversas patologias de foro
oral, nomeadamente: desgaste muito acentuado da coroa da dentição decidual presente; uma cárie de grau
3 num molar inferior direito decidual; tártaro de grau
2 na dentição inferior anterior e, possivelmente, uma
lesão periapical associada à cárie identiicada.
O indivíduo 10 apresenta múltiplas patologias
orais, designadamente: desgaste de grau 4 a 5 na
dentição; tártaro em toda a dentição de grau 2 a 3;
periodontite de grau máximo no alvéolo do molar inferior esquerdo ainda presente; a perda ante-mortem
dos dentes inferiores posteriores esquerdos com reabsorção alveolar completa. Para além destas evidencia,
igualmente, patologias de foro degenerativo articular
(OA e nódulos de Schmorl8) e não articular (espigas
laminares). A OA observada é de grau 1 e localiza-se nas vértebras torácicas. Os nódulos de Schmorl
localizam-se no segmento torácico (T5 a T12) e
lombar (L1 e L2). As espigas laminares identiicadas localizam-se, tal como os nódulo de Schmorl,
no segmento torácico e lombar, afectando desde a
T2 à L2. Por im, foi igualmente registada a fusão
dos 3 elementos do esterno, nomeadamente do manúbrio, meso-esterno e processo xifóide. O relevo
das junções manúbrio - meso-esterno - processo xifóide é suave, indiciando que a fusão poderá ser de
foro de desenvolvimento e não de natureza degenerativa (Barnes, 1994; Scheuer & Black, 2000).
No indivíduo 11, uma possível mulher com 25
ou mais anos de idade à morte, apenas foram registados casos de patologia oral. Estes são constituídos
por: exposição completa da dentina dos dentes presente devido a desgaste acentuado da coroa dentária;
tártaro; periodontite de grau máximo; e perda ante-mortem, com reabsorção alveolar completa, de toda
a dentição superior e dos dentes inferiores posteriores.
O esqueleto exumado da sepultura 12 apresen-
7 - A cribra orbitalia apresenta lesões semelhantes às observadas na hiperostose porótica, mas localizadas no “tecto” das órbitas. Tal como
na hiperostose porótica, as mudanças no tecido ósseo são predominantemente bilaterais. Esta última é encarada como um estágio mais grave
relativamente à cribra orbitalia (Wapler et al., 2004; Blom et al., 2005; Roberts & Manchester, 2005; Keenleyside & Panayotova, 2006). É
geralmente aceite que a cribra orbitalia resulta também da anemia por deiciência de ferro. Porém são igualmente sugeridas outras etiologias, das
quais são exemplo o escurbuto, a síilis e a presença de toxinas (Wapler et al., 2004; Blom et al., 2005; Sullivan, 2005).
8 - Os nódulos de Schmorl estão associados à degeneração dos discos intervertebrais. A formação de hérnias discais resulta na pressão sobre os
corpos vertebrais, observando-se uma subsequente depressão no corpo da vértebra, sendo esta lesão óssea o nódulo de Schmorl (Swischuk et al.,
1998; Adams et al., 2000; Williams et al., 2007; Faccia & Williams, 2008). As hérnias podem provocar um ou mais focos de nódulos (Ortner &
Putschar, 1981). É comum encontrarem-se associados a osteoitos (Buikstra & Ubelaker, 1994). Na maioria dos casos localizam-se no segmento
torácico, especialmente na segunda metade, e, em seguida, no segmento lombar (Williams et al., 2007; Faccia & Williams, 2008). É possivel
que os nódulos de Schmorl gerem dores de costas crónicas, variando a sua intensidade de acordo com a sua dimensão e profundidade, resultando
numa diminuição do bem estar dos indivíduos e, consequentemente, na sua produtividade. Porém, esta interpretação não é consensualmente aceite
(Williams et al., 2007; Faccia & Williams, 2008).
205
ta a aparente fractura na metáise distal dos rádio e
ulna direitos. A fractura foi completamente reduzida tendo, porém, subsistido uma curvatura anterior
de aproximadamente 15º no local da fractura. Deve
ser salientada a importância da realização de raio-X
para conirmação ou inirmação do diagnóstico apresentado. Neste indivíduo foi identiicada a presença
de um corpo ósseo de morfologia aproximadamente
elíptica e aparência “efervescente” com aproximadamente 30 x 25 mm de dimensão. Localizava-se
junto ao corpo das 4ª a 6ª vértebras cervicais, perto
da localização expectável do hióide e tiróide.
Deve ser sublinhado que a identiicação de casos patológicos se encontra dependente da preservação dos ossos, tal como todos os restantes parâmetros paleobiológicos e até mesmo funerários. Assim,
é possível que existissem outros casos patológicos
que devido à degradação dos ossos se tornaram inidentiicáveis. É, igualmente, possível que após a
limpeza e observação sistemática do espólio osteológico sejam identiicados mais casos patológicos.
Por im, destacamos que a análise patológica não se
esgota, manifestamente, na identiicação e enumeração de casos patológicos isolados que constituem,
nestes termos, estudos de casos. A análise patológica deve, idealmente, assumir uma abordagem populacional e, tanto quanto permitido em contextos
paleoantropológicos, (paleo)epidemiológica. É, assim, desejável que o material osteológico seja alvo
de uma observação minuciosa e sistemática que
permita o cálculo de frequências das patologias observadas tornando, desta forma, possível um retrato
patológico da população.
OCUPAÇÃO DA BAIXA IDADE MÉDIA
O horizonte cronológico compreendido entre
o século XIII e o XIV está representado, no lote em
apreço, por três lixeiras doméstica (L1, L2 e L3). O
espólio é caracterizado por cerâmicas de uso quotidiano, relacionadas, essencialmente, com contextos de cozinha; oferecem decoração que se prende,
quase exclusivamente, com preocupações utilitárias, sendo constituída por caneluras aplicadas no
colo e no bojo, à excepção do pote proveniente da
Lixeira 2, da vala de desmontagem de muro (Qs.
F-H/16-17), com decoração impressa, e dos exemplares com pintura a branco de tradição muçulmana
provenientes da Lixeira 1, do interior do reservatório de água romano (Camada 8).
Os recipientes recolhidos apresentam, maioritariamente, pastas avermelhadas ou acastanhadas;
predomina a cozedura em ambiente oxidante; as
206
pastas contêm elementos não plásticos de quartzo e
moscovite de granulometria ina a média.
A Lixeira 1 (C.8) do enchimento do reservatório de água da Época Romana (Qs. C-E/20-21 e Qs.
H-I/19) forneceu 42 fragmentos cerâmicos (Quadro
8) com atribuição morfo-funcional, dos quais 6 revelam tradição muçulmana.
As panelas são o grupo melhor representado;
ostentam marcas de utilização ao fogo, identiicando-se bem a sua funcionalidade. O único exemplar
de panela exumado inteiro, neste contexto de lixeira (Fig. 51: 3) apresenta duas asas opostas de secção losângica e caneluras no bordo e no colo com
paralelo em exemplar procedente da Rua da Judiaria (Almada) com cronologia dos séculos XII-XIII
(Barros & Henriques, 2003, p. 139). As panelas de
bordo em aba têm paralelos em contextos do século
XIV estudados na área urbana de Setúbal (Duarte,
Soares & Tavares da Silva, 2014, p. 349) e na Rua
dos Correeiros, em Lisboa, de meados do século
XIII a meados do século XIV (Gaspar & Amaro,
1997, p. 342).
Salientamos, também, a presença de fragmento de panela (Fig. 51: 4) de inluência muçulmana
com paralelos no período Almóada do Castelo de
Palmela (Fernandes, 2005, p. 166, Fig. 215:1), e de
meados do século XII–XIII em Lisboa (AA.VV.,
2005, p. 232, Fig. 11:20).
Também de tradição muçulmana são os fragmentos de recipientes fechados com decoração pintada a branco (Fig. 51:17 a 19).
A par da cerâmica de cozinha, recolhemos
uma taça que nos remete para uma cronologia do
século XIV, com paralelos em exemplares exumados na Área Urbana de Setúbal.
Os púcaros/copos, bem representados neste
contexto, ainda que bastante fragmentados, não
permitindo a reconstituição de um peril completo,
possuem porção de bordo ligeiramente extrovertido, colo alto com asas opostas que arrancam do
colo e bojo baixo assente em pé em bolacha. São
exemplares muito divulgados nos inais do século
XII e 1ª metade do século XIII em contextos de
Lisboa (AA.VV., 2005, p. 231, Fig. 10:3 e 4). No
núcleo arqueológico da Rua dos Correeiros (Lisboa) foram exumados exemplares com cronologia
de meados do século XIII a meados do século XIV
(Gaspar & Amaro, 1997, p. 340).
Os jarros de bordo ligeiramente extrovertido,
com caneluras até à zona do colo, ou de bordo extrovertido sem caneluras têm paralelos no castelo
de Palmela com cronologia dos séculos XIII-XIV
(Fernandes, 2005, p. 169, Fig. 223).
A actividade lúdica está representada por uma
Quadro 8 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Cerâmica comum proveniente das lixeiras medievais
(século XIII-XIV).
malha de jogo de contorno subcircular (peças estas
com larga diacronia) e por fragmento de provável
tambor, possuindo bordo com espessamento e inlexão interna que formaria a parte superior do mesmo. Exemplares similares foram identiicados no
Castelo Velho de Alcoutim nos níveis de abandono
dos inais do reino de taifas/início da ocupação almorávida/almóada da região (Catarino, 1997/98, p.
1097, Est. XI, nº8; p. 1146, Est. LX, nº 5). Peças
semelhantes às identiicadas no Castelo Velho de
Alcoutim foram também registadas nas produções
de Saragoça com cronologia dos séculos XI-XII e
em Paterna, no século XIII (Catarino, 1997/98, p.
381-382).
As Lixeiras 2 e 3, identiicadas repectivamente
nos Qs. F-H/16-17 e Qs. D10-11, eram constituídas
por sedimento de matriz arenosa cinzento-escura
que preenchia negativos de desmontagem de muros ali existentes em momento anterior. O espólio
exumado, à semelhança do que provém da Lixeira 1, do interior do reservatório romano, apresenta
cerâmica comum com características de ambientes
domésticos, apesar de oferecer menor quantidade
de formas com atribuição morfo-funcional (Quadro
8). A forma melhor representada é a panela, com
evidentes sinais de utilização ao fogo, cuja morfologia, quando completa, varia entre o globular e o
troncocónico a cilíndrico com bordos em aba e os
lábios rectos ou inclinados para o interior, preparados para receber o testo. Uma das panelas apresenta
a particularidade de ter o bordo com impressões digitais e a extremidade inferior do corpo demarcada
por série de caneluras paralelas (Fig. 52:1). Uma
outra possui caneluras no colo, imediatamente acima da inserção superior da asa, realizadas de forma
pouco cuidada (Fig. 52:2).
Além das panelas, surge o cântaro de duas
asas, forma esta comum nos contextos dos séculos
XIII-XIV, cujas asas arrancam da parte superior do
colo sobreelevando-se junto ao bordo. Encontramos paralelos para esta forma em exemplares recolhidos na Área Urbana de Setúbal (Soares, 2002, p.
251), em Lisboa (Gaspar & Amaro, 1997, p. 343344, Est.7:1 e 2) e no castelo de Palmela (Fernandes, 2005, p. 174, Fig. 233).
Os potes, apenas identiicados na Lixeira
2 (Qs. F-H/16-17), estão representados por dois
exemplares: um com porção de bordo decorado por
caneluras; o outro, com bordo extrovertido e decoração impressa no colo e no bojo (Fig. 52:4-5).
207
Fig. 51 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira 1, da Baixa Idade Média (C. 8 do interior do tanque romano). Cerâmica
comum: 1 – alguidar; 2 – taça; 3 a 9 – panelas; 10 – púcaro/copo; 11 e 12 – jarros; 13 – tambor(?); 14 a 16 – testos; 17 a 19 –
fragmentos com decoração pintada a branco. Desenhos de Susana Duarte.
208
Fig. 52 - Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira 2, do período medieval (vala de desmontagem de muro,
Qs.F-H/16-17). Cerâmica comum: 1 a 3 – panelas; 4 e 5 – potes. Desenhos de Susana Duarte.
209
Musa. Museus, Arqueologia e Outros Patrimónios.
As sequências estratigráicas
dos loci A e C registaram uma ampla diacronia e as mais antigas fases da ocupação humana:
O povoado sidérico
As Cs. 11-14, de carácter coluvionar, resultantes da remobilização de camadas antrópicas da Idade
do Ferro da área mais elevada da
colina, depositaram-se em depressão criada pelo intenso abarrancamento das vertentes da colina de
arenito mal consolidado de Santa
Maria. Os materiais aí recolhidos
são maioritariamente dos séculos
VII-VI a. C. (Figs. 6 e 7), estando
presentes o prato de bordo em aba
com engobe vermelho, cerâmica
cinzenta (a mais abundante) orientalizante e/ou de tradição orientalizante, ânforas fenícias, cerâmica
manual. Uma taça de cerâmica comum ao torno parece corresponder
a uma imitação da Forma IXA da
cerâmica de tipo Kuass, sendo, e a
conirmar-se esta classiicação, um
elemento sidérico tardio, datável
de um período compreendido entre o inal do século IV e o século
II/I a.C. (Sousa, 2009) revelador da
permanência na cidade portuária da
foz do Sado de especímens de carácter cultural meridional.
Cidade romana
Fig. 53 – Rua Francisco Augusto Flamengo. Lixeira 3, do período medieval
(vala de desmontagem de muro, Qs.D10-11). Cerâmica comum: 1 a 4 – panelas; 5 – cântaro; 6 – testo. Desenhos de Susana Duarte.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo deve ser lido tendo em
consideração o trabalho publicado sobre a 1ª campanha arqueológica no mesmo lote, no vol. 3, da
210
Durante a Época Romana, a
partir do terceiro quartel do século I d.C., a área correspondente ao
Locus C, é ocupada por um vazadouro público, provavelmente até
ao último quartel do século II (Cs.
7-9). Esta lixeira é particularmente
rica em terra sigillata, com numerosas marcas de
oleiro (Quadro 3), que nos dão conta da diversidade
de consumos próprios de meio urbano (Quadro 2). A
t. sigillata itálica é rara neste sítio e na generalidade da área urbana de Setúbal; a t. sigillata sudgálica
domina largamente o conjunto de cerâmicas inas de
mesa, sendo as formas mais frequentes a Drag. 18, a
Drag. 27, a Drag. 24/25 e a Drag. 15/17. A t. sigillata
hispânica é francamente menos abundante, sendo a
forma Drag. 15/17 a melhor representada. Mas são as
ânforas provenientes desta lixeira que melhor documentam a diversiicada actividade portuária da Setúbal romana (Quadro 5), onde chegava vinho do Egeu
(classe 9 de Peacock/ Williams), da Península Itálica
(ânfora Dressel 2-4), do sul da Gália (Gaulesa 4) e do
sul de Espanha (Haltern 70), tal como azeite do vale
do Guadalquivir (Oberaden 83). Como seria expectável, dominavam as ânforas produzida no Baixo Sado,
da forma Dressel 14, nas variantes B e C, enquanto
contentores de salgas de peixe, como se comprovou
factualmente em dois exemplares que continham ainda restos esqueléticos de sardinha miúda.
Após a selagem do vazadouro, foi construído
no local, talvez nos inícios do século III, um grande
reservatório de água com uma capacidade superior
a 250m3, supostamente para abastecimento público,
e que revela o crescimento demográico da cidade
romana durante o início do Baixo Império. O enchimento do depósito por resíduos sólidos inicia-se em
meados do século IV (C. 14), altura em que podia
ainda funcionar, mas em que a sua manutenção não
seria tão cuidada como em momentos anteriores. A
C. 10, claramente de lixeira, foi atribuída à passagem do século IV para o século V, de acordo com
a presença de sigillata africana D, na forma Hayes
91A/B e em exemplares com decoração estampada
(Quadro 2) e ânforas Almagro 51c, Almagro 51 a-b
e Sado 1 (Quadro 5) e marca o inal da ocupação
da Época Romana do lote da Rua Francisco Augusto Flamengo. Após o colapso do Império Romano
do Ocidente, durante a Alta Idade Média assiste-se
à rápida desurbanização de Setúbal. Porém, o porto
parece continuar a desenvolver alguma actividade
comercial pelo menos até ao século VI d.C. (Tavares
da Silva & Coelho-Soares, 2014).
Necrópole islâmica
Na presente campanha de escavações arqueológicas, foram identiicadas e levantadas 15 inumações singulares em posição primária. A necrópole
estende-se para além dos limites intervencionados.
Os indivíduos apresentam características funerárias tipicamente islâmicas e congruentes com aquelas
identiicadas nos indivíduos exumados na primeira
campanha. Tais características consistem em deposição
em decúbito lateral direito; orientação SO-NE; face
virada para nascente; mãos junto à região pélvica; ausência de espólio funerário; ausência de reutilização
funerária das estruturas. Na primeira campanha de escavações foi possível datar radiocarbonicamente o inumado na sepultura 1, obtendo-se (calibração a 2 sigma)
o intervalo de 980 a 1150 DC (Beta-256936:1000±40
BP), datação que conirma o ritual islâmico.
Os indivíduos não adultos detêm 46%. O elevado número de indivíduos de sexo indeterminado
(n=9) está correlacionado com a boa representação
de indivíduos não adultos e, também, com o mau estado de preservação dos ossos de alguns dos indivíduos. Este factor condiciona decisivamente a análise
da distribuição sexual na necrópole. Não obstante,
foi veriicada uma maior frequência de mulheres
(n=3) e possíveis mulheres (n=2) que de homens
(n=0) e possíveis homens (n=1). Em termos paleopatológicos registou-se a presença de:
- Patologia oral sob a forma de desgaste acentuado, cáries, tártaro, perda ante-mortem de dentição, periodontite e uma possível lesão periapical;
- Indicadores de stress isiológico, cribra orbitalia;
- Patologia degenerativa articular (osteoartrose
e nódulos de Schmorl) e não articular (diversas entesopatias no esqueleto axial);
- Patologia traumática sob a forma de fractura
do rádio e ulna direitos, com redução completa, do
indivíduo da sepultura 12.
Baixa Idade Média (séculos XIII-XIV)
É provável que a necrópole islâmica tenha sido
desactivada após a conquista cristã.
A área do nosso lote, embora no interior da cerca medieval, manteve-se expectante em termos urbanísticos até à Idade Moderna. Nos séculos XIII-XIV
depositaram-se no local várias lixeiras domésticas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AA. VV. (1990) – Conspectus Formarum Terrae Sigillatae
Italice Modo Confectae. Bonn: Rudolf Habelt GMBH.
A.A.V.V. (2005) – Cerâmicas medievais de Lisboa – continuidades e rupturas. Muçulmanos e Cristãos entre o Tejo e
o Douro (Sécs. VIII a XIII). Coord. Mário Barroca e Isabel
C. Fernandes. Câmara Municipal de Palmela e Faculdade
de Letras da Universidade do Porto, p. 221-236.
ADAMS, M.; FREEMAN, B.; MORRISON, H.; NELSON, I. & DOLAN, P. (2000) – Mechanical initiation of
intervertebral disc degeneration. Spine, 25, p. 1625-1636.
ARRUDA, A.M. (1999-2000) – Los Fenícios em Por211
tugal. Fenícios y mundo indígena em el centro y sur de
Portugal (siglos VIII-VI a.C.). Barcelona: Universidade
Pompeo Fabra.
AUFDERHEIDE, A. C. & RODRÍGUEZ-MARTÍN, C.
(1998) – The Cambridge Encyclopedia of Human Paleopathology. Cambridge: Cambridge University Press.
BARNES, E. (1994) – Developmental Defects of the Axial
Skeleton in Paleopathology, Colorado, University Press of
Colorado.
BARROS, L. & HENRIQUES, F. (2003) – Rua da Judiaria:
Um Celeiro nos arrabaldes da vila. Actas das 3ªs Jornadas
de Cerâmica Medieval e Pós-Medieval. Métodos e resultados para o seu estudo. Câmara Municipal de Tondela,
p. 135-144.
BELCHIOR, C. (1969) – Lucernas romanas de Conimbriga. Museu Monográico de Conimbriga.
BELLO, S. & ANDREWS, P. (2006) - The intrinsic pattern
of preservation of human skeletons and its inluence on the
interpretation of funerary remains. In R. GOWLAND & C.
KNÜSEL (eds.), Social Archaeology of Funerary Remains.
Oxford: Oxbow Books, p. 1-13.
BLOM, D.; BUIKSTRA, J. E.; KENG, L.; TOMCZAK,
P.; SHOREMAN, E. & STEVENS-TUTTLE, D. (2005)
– Anemia and childhood mortality: latitudinal patterning
along the coast of pre-columbian Peru. American Journal
of Physical Anthropology, 127, p. 152-169.
BODDINGTON, A.; GARLAND, A. N. & JANAWAY,
R. C. (1987) – Flesh, bones dust and society. In A. BODDINGTON; A. N. GARLAND & R. C. JANAWAY
(eds.). Death, decay and reconstruction, approaches to archaeology and forensic science. Manchester: Manchester
University Press, p. 3-9.
BOURGEOIS, A. & MAYET, F. (1991) – Fouilles de Belo
(Les Sigillées). Madrid: Collection de La Casa de Velázquez.
BRUZEK, J. (2002) – A method for visual determination of
sex, using the human hip bone. American Journal of Physical Anthropology, 117, p. 157-168.
BUIKSTRA, J. E. & UBELAKER, D. H. (1994) – Standards For Data Colection From Human Skeletal Remains.
Arkansas: Arkansas Archaeological Survey.
BUSTAMANTE ÁLVAREZ, M. (2013) – La terra sigillata
hispânica de Augusta Emerita. Estudio tipocronológico a
partir de los vertederos del subúrbio norte. Mérida: Instituto de Arqueología de Mérida.
CAMPILLO, D. (2001) – Introducción a la paleopatologia. Barcelona: Bellaterra arqueología.
212
CARDOSO, J.L.; TAVARES DA SILVA, C.; MARTINS,
F. & ANDRÉ, M.C. (2010-2011) – O casal agrícola da Idade do Ferro de Leião (Oeiras). Estudos Arqueológicos de
Oeiras, 18, p. 75-102.
CATARINO, H. (1997/98) – O Algarve Oriental durante a
ocupação islâmica – Povoamento rural e recintos fortiicados. In Al-‘ulyã. Revista do Arquivo Histórico Municipal
de Loulé, nº 6, 3 vols.
CLARKE, J.R. (2003) – Roman sex. New York: Harry N.
Abrams, Inc.
DARWENT, C. M. & LYMAN, R. L. (2002) – DetectDetecting the postburial fragmentation of carpals, tarsals, and
phalanges. In W. D. HAGLUND & M. H. SORG (eds.).
Advances in Forensic Taphonomy - Method, Theory, and
Archaeological Perspectives. Florida: CRC Press LLC,
p. 355 - 377.
DENEAUVE, J. (1969) – Lampes de Carthage. Paris: Centre National de la Recherche Scientiique.
DUARTE, S.; SOARES, J. & TAVARES DA SILVA, C.
(2014) – Intervenção arqueológica na Rua Álvaro CasCastelões nºs 38 e 40 (Setúbal) e sismo de 1755. II Encontro de
Arqueologia da Arrábida. Homenagem a A. I. Marques da
Costa (Setúbal Arqueológica, 15). Setúbal: Museu de Arqueologia e Etnograia do Distrito de Setúbal, p. 341-372.
FACCIA, K. & WILLIAMS, R. (2008) – Schmorl’s nodes:
clinical signiicance and implications for the bioarchaeological record. International Journal of Osteoarcheology,
18, p. 28-44.
FERNANDES, I. C. (2005) – Palmela no período da “reconquista”. Muçulmanos e Cristãos entre o Tejo e o Douro (Sécs. VIII a XIII). Coord. Mário Barroca e Isabel C.
Fernandes. Câmara Municipal de Palmela e Faculdade de
Letras da Universidade do Porto, p. 311-325.
GASPAR, A. & AMARO, C. (1997) – Cerâmicas dos séculos XIII-XV da cidade de Lisboa. Actes du Ve Congrès de la
Céramique Médiéval en Méditerranée. Aix-en-Provence,
p. 337-345.
GENIN, M. (2007) – La Graufesenque (Millau, Avereyron).
Volume II – sigillés lisses et autres productions. Éditions de
la Fédération Aquitania.
GODINHO, R. (2008) – Vestígios de um Império Passado:
a necrópole do Colégio de Santo Antão-o-Novo e a Lisboa
dos séc. XVI - XVIII. Tese de mestrado, Departamento de
Antropologia, Universidade de Coimbra.
GODINHO, R. M. & BRAZUNA, S. (2009) – Culture and
taphonomy at the Islamic necropolis of Xancra II. Beja:
Apontamentos de Arqueologia e Património, 4, p. 65-69.
GUY, H.; MASSET, C. & BAUD, C.-A. (1997) – Infant
taphonomy. International Journal of Osteoarcheology, 7,
p. 221 - 227.
ORTNER, D. & PUTSCHAR, W. G. (1981) – Identiication of Pathological Conditions In Human Skeletal Remains. Washington D.C.: Smithonian Institution Press.
HAYES, J. W. (1972) – Late Roman pottery. London.
PEACOCK, D.P.S &; WILLIAMS, D. F. (1986) – Amphorae and the Roman Economy. An Introductory Guide. London and New York: Longman.
HAYES, J. W. (1980) – Late Roman pottery, supplement.
London.
JANAWAY, R. C. (1996) – The decay of buried remains
and their associated materials. In J. R. HUNTER; C. ROBERTS & A. MARTIN (eds.). Studies In Crime: An Introduction to Forensic Archaeology. London: BT Batsford,
p. 59-85.
KASTENBAUM, R. (2003) – Macmillan Encyclopedia of
Death and Dying. New York: Macmillan Reference USA.
KEENLEYSIDE, A. & PANAYOTOVA, K. (2006) –
Cribra orbitalia and porotic hyperostosis in a greek colonial population (5th to 3rd centuries B.C.) from the
Black Sea. International Journal of Osteoarcheology,
16, p. 373-384.
LE BARS, D. (2008) - Étude archaeo-anthropologique de
la nécropole musulmane de Rossio do Carmo, Mértola: bilan des fouilles anciennes (1981-1990). Arqueologia Medieval, 9, p. 233-259.
MACIAS, S. (2005) – Mértola - O último porto do Mediterrâneo, 1. Mértola: Campo Arqueológico de Mértola.
MACLAUGHLIN, S. M. (1990) – Epiphyseal Fusion at
The Sternal End of The Clavicle In a Modern Portuguese
Skeletal Sample. Antropologia Portuguesa, 8, p. 59 - 68.
MAYET, F. (1984) – Les Céramiques Sigillées Hispaniques. Paris: Diffusion E. De Boccard.
MAYET, F. & TAVARES DA SILVA, C. (1998) – L’atelier d’anphores de Pinheiro (Portugal). Paris: Diffusion
E. De Boccard.
MAYET, F. & TAVARES DA SILVA, C. (2000) – Le site
phénicien d’Abul (Portugal). Comptoir et santuaire. Paris:
Diffusion E. De Boccard.
MAYET, F. & TAVARES DA SILVA, C. (2002) – L’atelier d’anphores d’Abul (Portugal).Paris: Diffusion E. De
Boccard.
MICOZZI, M. S. (1991) – Postmortem Change In Human
and Animal Remains - A systematic approach. Illinois:
Charles C. Thomas Publisher.
NAWROCKI, S. P. (1995) – Taphonomic processes in
historic cemeteries. In A. lL. GRAUER (eds.). Bodies of
Evidence, reconstructing History through skeletal analysis.
New York: Wiley-Liss, p. 49-66.
PEARSON, M. P. (2005) – The Archaeology of Death and
Burial, second edition. Gloucestershire: Sutton Publishing.
PINTO, I. Vaz (2003) – A cerâmica comum das villae romanas de São Cucufate (Beja). Lisboa: Universidade Lusíada.
POLAK, M. (2000) – South Gaulish terra sigillata with
potters’stamps from vecthten. (Rei Creatariae Romanae
F’avtorum Acta, Supplementum 9), Nijimegen.
PONTE, S. da (2006) – Corpus signorum das fíbulas protohistóricas e romanas de Portugal. Casal de Cambra: Caleidoscópio Edição e Artes Gráicas, SA.
QUARESMA, J. C. (2003) – Terra sigillata sudgálica num
centro de consumo: Chãos Salgados, Santiago do Cacém
(Mirobriga?). (Trabalhos de Arqueologia; 30). Lisboa: Instituto Português de arqueologia (IPA).
QUARESMA, J. C. (2012) – Economia antiga a partir de
um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Miróbriga?).
Lisboa: Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa
(UNIARQ).
RAMÓN TORRES, J. (1995) – Las ánforas fenício-púnicas del Mediterráneo central e ocidental. Barcelona: Universitat de Barcelona.
ROBERTS, C. & MANCHESTER, K. (2005) – The Archaeology of Disease. Gloucestershire: Sutton Publishing Ltd.
ROGERS, J. (2000) – The
he paleopathology of joint disease. In M. COX & S. MAYS (eds.). Human Osteology
In Archaeology and Forensic Science. London: Greenwich
Medical Media Ltd., p. 163-182.
ROKSANDIC, M. (2002) – Position of skeletal remains as
a key to understanding mortuary behavior. In W. D. HAGLUND & M. H. SORG (eds.). Advances in Forensic Taphonomy - Method, Theory, and Archaeological Perspectives. Florida: CRC Press LLC, p. 99 - 117.
SÁEZ ROMERO, A.M. (2005) – Aproximación a la tipologia de la cerâmica común púnico-gadirita de los ss. III-II.
Spal, 14, p.145-177.
SCHEUER, L. & BLACK, S. (2000) – Developmental Juvenile Osteology. Somerset: Academic Press Limited.
213
SMITH, B. H. (1991) - Standards of human tooth formation and dental age assessment. In M. A. KELLY & C. S.
LARSEN (eds.). Advances in Dental Anthropology. New
York: Wiley-Liss, Inc., p. 143-168.
TORRES, C. & MACIAS, S. (1995) – Rituais funerários
paleocristãos e islâmicos nas necrópoles de Mértola. In J.
MATTOSO (eds.). O Reino dos Mortos na Idade Média
Peninsular. Lisboa: Edições João Sá da Costa, p. 11-44.
SOARES, J. (2002) – MAEDS. Trabalhos arqueológicos:
novas estratigraias para a história de Setúbal. Al-madan, 2ª
Série, nº 11, p .250-251.
UBELAKER, D. (1989) – Human Skeletal Remains - excavation, analysis, interpretation, Second edition. Washington: Smithonian Institute.
SOARES J. & TAVARES DA SILVA, C. (1986) – Ocupação pré-romana de Setúbal. Escavações arqueológicas na
Travessa dos Apóstolos. Actas do I Encontro Nacional de
Arqueologia Urbana. Lisboa: Instituto Português do Património Cultural.
VALLEJO SÁNCHEZ, J. I. (2005) – Las cerâmicas grises
orientalizantes de la Península Ibérica: uma nueva lectura
de la tradición alfarera indígena. El Periodo Orientalizante.
Actas del III Simposio Internacional de Arqueología de
Mérida, vol. II, p. 1149-1172.
SOUSA, E. de (2009) – A cerâmica de tipo kuass no Algarve: os casos de Castro Marim e Faro. Lisboa: Centro de
Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ).
VIEGAS, C. (2003) – A terra sigillata da Alcáçova de Santarém – Cerâmica, economia e comércio (Trabalhos de Arqueologia, 26). Lisboa: Instituto Português de Arqueologia.
STOJANOWSKI, C.; SEIDEMANN, R. & DORAN, G.
(2002) - Differential skeletal preservation at Windover
Pond: causes and consequences. American Journal of
Physical Anthropology, 119, p. 15-26.
VIEGAS, C. (2011) – A ocupação romana do Algarve.
Estudo do povoamento e economia do Algarve central e
oriental no período romano. Série Estudos e Memórias 3.
Lisboa: Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa
(UNIARQ).
SULLIVAN, A. (2005) – Prevalence and etiology of acquired anemia in medieval York, England. American Journal of Physical Anthropology, 128, p. 252-272.
SWISCHUK, L.; JOHN, S. & ALLBERY, S. (1998) – Disk
degenerative disease in childhood: Scheurmann’s disease,
Schmorl’s nodes, and the limbus vertebra: MRI idings in
12 patients. Pediatric Radiology, 28, p. 334-338.
TAVARES DA SILVA, C. (1996) – Produção de ânforas na
área urbana de Setúbal. In Ocupação romana dos estuários
do Tejo e do Sado. Actas das 1as Jornadas sobre Romanização dos Estuários do Tejo e do Sado. Lisboa: Publicações
Dom Quixote, p. 43-54.
TAVARES DA SILVA, C. & COELHO-SOARES, A.
(2014) - Preexistências de Setúbal. A ocupação da Época
Romana da Travessa de João Galo, nos 4-4B. Setúbal Arqueológica, 15, p. 305-338.
TAVARES DA SILVA, C.; SOARES, J.; BEIRÃO, C. de
Mello; FERRER DIAS, L. & COELHO-SOARES, A.
(1980-81) –- Escavações arqueológicas no Castelo de Alcácer do Sal (campanha de 1979). Setúbal Arqueológica,
6-7, p. 149-218.
TAVARES DA SILVA, C.; SOARES, J.; COELHO-SOARES, A.; DUARTE, S. & GODINHO, R. M. (2010) – Preexistências de Setúbal. Intervenção arqueológica na Rua
Francisco Augusto Flamengo, nºs. 10-12. Musa, Museus,
Arqueologia e Outros Patrimónios, 3, p. 165-178.
214
WAPLER, U.; CRUBEZY, E. & SCHULTZ, M. (2004)
– Is cribra orbitalia synonymous with anemia? Analysis
and interpretation of cranial pathology in Sudan. American
Journal of Physical Anthropology, p. 333-339.
WASTERLAIN, R. S. (2000) – Morfo - análise das proporções entre os membros, dimorismo sexual e estatura
de uma amostra da colecção de esqueletos identiicados do
museu antropológico da Universidade de Coimbra. Tese
de mestrado, Departamento de Antropologia, Universidade
de Coimbra.
WEISS, E. & JURMAIN, R. (2007) –– Osteoarthritis
Osteoarthritis rerevisited: a contemporary review of aetiology. International
Journal of Osteoarcheology, 17, p. 437-450.
WILLIAMS, F.; MANEK, N.; SAMBROOK, P.; SPECTOR, T. & MACGREGOR, A. (2007) – Schmorl’s nodes,
common, highly heritable and related to lumbar disc disease. Arthritis & Rheumatism, 57, p. 855-860.