Psicologia & Sociedade
ISSN: 0102-7182
revistapsisoc@gmail.com
Associação Brasileira de Psicologia Social
Brasil
Kochenborger Scarparo, Helena Beatriz; de Fátima Guareschi, Neuza Maria
PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Psicologia & Sociedade, vol. 19, núm. 2, 2007, pp. 100-108
Associação Brasileira de Psicologia Social
Minas Gerais, Brasil
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=309326391024
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Scaparo, H.; Guareschi, N. “Psicologia Social Comunitária e Formação Profissional”
PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Helena Beatriz Kochenborger Scarparo
Neuza Maria de Fátima Guareschi
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil
RESUMO: O presente texto aborda questões relativas à construção da psicologia social comunitária no Brasil e as
interfaces deste processo histórico com a formação profissional. Para tanto, apóia-se em dados sobre o contexto
histórico e social brasileiro no decorrer da efetivação das práticas psicológicas em comunidades. Finalmente, o
estudo propõe reflexões quanto ao descompasso entre a formação e os fenômenos sociais contemporâneos.
PALAVRAS-CHAVE: Preparação profissional; Psicologia Social Comunitária; práticas sociais.
COMMUNITY SOCIAL PSYCHOLOGY AND PROFESSIONAL PREPARATION
ABSTRACT: The following paper approaches issues related to the Community Social Psychology’s construction in
Brazil and the interactions of this historical process with the professional preparation. For this purpose, the Brazilian
historical and social context is taken into consideration in order to reach effective psychological practices in communities. In addition, it associates Community Social Psychology’s characteristics with the professional preparation
and the Psychology’s construction. Finally, this paper considers reflections about the professional preparation and
contemporaries social phenomena.
KEYWORDS: Professional preparation; Community Social Psychology; social practices.
Demarcando Territórios: Registros
dos Diferentes Caminhos da Instituição
da Psicologia no Brasil
A profissão de psicólogo foi regulamentada no
Brasil em 1962. Pouco tempo antes do Golpe Militar
que condenou o País a um longo período ditatorial. Na
época, as práticas psicológicas se consolidaram sob a
influência de ideologias desenvolvimentistas, pautadas
pela repressão política e pelo patrulhamento ideológico,
que caracterizaram o Brasil ao longo de quase três décadas de ditadura explícita.
A decorrência imediata desses fatos nas práticas
psicológicas e, obviamente, na formação profissional foi
o predomínio de abordagens individualistas, descontextualizadas e apoiadas em modelos abstratos de seres
humanos. Tais modelos eram tomados como medidas
para a realização e avaliação das ações o que engendrou
processos de normatização e de controle das pessoas e
contribuiu para a naturalização das expressões de violência e repressão. Assim, este cenário favorecia o uso
da psicologia para a articulação de espaços de exclusão
social e de adaptação dos “desviantes”, transformando
práticas em instrumentos de controle ideológico.
Especialmente a classe média brasileira era atingida
por esse processo, pois a ideologia desenvolvimentista
causava na população brasileira “um profundo conformismo político”, além da “produção de subjetividades
consumistas” (Coimbra, 1995, p. 56). Nesta ótica era
evidente a predominância de perspectivas individualis100
tas também na produção do conhecimento e nas práticas
psicológicas. Como afirmou Campos (1992), a psicologia contribuía, em algumas ocasiões, como ferramenta
ideológica, com potencial de tornar os mecanismos
sociais vigentes obscuros, através da legitimação da desigualdade, com argumentos “pretensamente universais
e neutros” (p. 125).
O controle e a repressão dos movimentos sociais
organizados, através do regime ditatorial, protelaram a
adoção de posicionamentos críticos de grande parte dos
cidadãos quanto à realidade brasileira seja pelos processos de alienação patrocinados pela ditadura, seja pelo
medo de ser alvo das perseguições políticas.
Na esfera da psicologia, a análise de documentos e
publicações relativas a esse período histórico explicitou
expectativas predominantes em relação ao profissional
da época. O trabalho do psicólogo era definido a partir
da clínica individual, da tarefa de avaliação psicológica
e do acompanhamento de dificuldades de aprendizagem
nas escolas. Também são mencionados e dos trabalhos
de consultoria, recrutamento e seleção no contexto das
empresas. Tratava-se de um período no qual o exercício
da psicologia, em expressiva escala, se adequava às
necessidades políticas e econômicas do governo militar
ditatorial vigente (Scarparo, 2005).
Neste contexto, a liberdade só poderia ser pensada
no nível imaginário e intrapsíquico, ou seja, o desejo não
deveria transpor as fronteiras da individualidade para aterse às circunstâncias da vida macro social. Em relação a
isso, é interessante observar que as opções de leituras
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oferecidas nos cursos de psicologia referenciavam predominantemente textos que potencializassem a noção de
indivíduo como parâmetro para a compreensão do ser
humano (Dias, 2001).
Nos cursos de graduação de diferentes áreas, a reforma universitária e o patrulhamento ideológico característicos da época, pautaram as diretrizes curriculares e o
cotidiano das academias. Era comum que, por medo de
represálias, alguns professores universitários de disciplinas cujo conteúdo fundamentava-se em abordagens
políticas, usassem códigos para comunicar-se com os
estudantes, pois não podiam expressar livremente suas
idéias, sob pena de serem perseguidos politicamente
(Scarparo, 2005). Por exemplo, nessa época, nas salas
de aula, “classe dominante virou minoria que está no
vértice da pirâmide social” (Porto, 1999, p. 634).
Nas aulas de Psicologia Social, por exemplo, predominavam os aportes de teorias positivistas que privilegiavam a descrição de pesquisas que utilizavam escalas,
grupos de controle e experimentais, visando adaptação
de indivíduos à sociedade. De algum modo, eram aventadas as possibilidades de prever e generalizar comportamentos, através da medição e da análise dos fenômenos psicológicos. Desse modo, exacerbavam-se as
crenças na legitimação do controle da sociedade, através das práticas psicológicas.
Nessa época existiam referenciais teóricos cuja
bibliografia era proibida no Brasil e só poderia ser lida
clandestinamente. Dentre estas estavam notícias e textos
sobre práticas emancipatórias desenvolvidas na Europa
e obras de Paulo Freire, Guattari, Laing e Cooper, por
exemplo. A literatura proibida extrapolava a perspectiva
individualista e transpunha a compreensão do ser humano associada ao modelo de família nuclear (Scarparo,
2005). Além disso, os textos continham propostas que
produziam questionamentos quanto aos limites e aos
efeitos das práticas psicológicas e pedagógicas. Desse
modo, emergiam possibilidades de reflexões críticas sobre os trabalhos efetivados e proposições de outros modos
de abordagem. Dentre esses se destacavam as práticas
participativas e a consideração dos espaços coletivos, o
que gerou propostas de trabalhos em comunidades.
O uso do conhecimento psicológico como instrumento de práticas em comunidades teve seus primeiros
registros formais na década de setenta (Freitas, 1996;
Scarparo, 2005). Tais registros referiram-se à participação de psicólogos em trabalhos associados à esfera da
educação e da saúde mental, especialmente no âmbito
da prevenção. As ações eram inspiradas na psiquiatria
comunitária, um ramo da psiquiatria social voltado para
o atendimento à saúde mental de integrantes de comunidades. Para tanto, predominavam propostas de intervenções cujo objetivo era a diminuição da prevalência
de psicopatologias e a promoção processos de adaptação das pessoas ao ambiente, tendo em vista as influências que a cultura e a sociedade exercem sobre elas
(Busnello, 1976; Cowen & Lorion, 1975). Esta abordagem foi adotada como um dos modelos de trabalho no
Brasil e orientou diferentes práticas psicológicas em comunidades das classes populares brasileiras. Um dos
exemplos desse tipo de intervenção foi o da implantação, na década de setenta, do Centro Médico Social São
José do Murialdo, em Porto Alegre (Busnello, Lewin,
Ruschel & Bradley, 1975; Scarparo, 2005).
Mesmo com as restrições dos direitos civis vigentes
na época, foram efetuados projetos de extensão das
universidades e programas na rede pública de grande
impacto. Configurou-se assim, um “consentimento” para
intervenções que favorecessem a proximidade entre
profissionais de saúde e a população. Tal consentimento
poderia ser atribuído à necessidade de acomodar em um
“nicho controlável” pessoas cujos modos de pensar divergiam da ideologia imposta pela ditadura. De qualquer
forma, algumas narrativas sobre experiências desse tipo,
denotam o estabelecimento de linhas de fuga ao controle
ditatorial. É o caso da organização de grupos clandestinos para estudar textos proibidos pela censura e da inserção de intelectuais em trabalhos comunitários como,
por exemplo, os efetivados nas Comunidades Eclesiais
de Base (Scarparo, 2005; Teixeira, 1988).
Com o desgaste da Ditadura Militar no Brasil, em
meados dos anos setenta, eram freqüentes as manifestações populares contra a repressão política. Também
proliferava no País a mobilização popular favorável à
anistia dos presos políticos. No âmbito econômico, começaram a aparecer cobranças dos países credores. A dívida externa dilapidava as reservas brasileiras. Discordâncias quanto ao início da abertura política era motivo de
crises no Governo Militar. Mesmo assim, persistiam as
políticas desenvolvimentistas pautadas na abertura ao
capital estrangeiro e à distribuição desigual das riquezas
(Brenner, 1998; Ribeiro, Alencar & Ceccon, 1997).
A participação de intelectuais em movimentos de
emancipação política era crescente. Na psicologia,
concomitantes aos processos de instituição dos Conselhos Federal e Regional da profissão, emergiam manifestações que procuravam desmistificar as teorias psicológicas, discutindo suas origens ideológicas e os valores
subjacentes às lógicas postuladas. Era um momento no
qual uma significativa parcela da categoria questionava
o papel e a responsabilidade social da psicologia, associando-os aos preocupantes aspectos sociais e políticos
da realidade brasileira de então.
Como decorrência, a relevância social da psicologia
passou a ser alvo de problematizações, o que recrudesceu a premência de transformações epistemológicas na
101
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área, tendo em vista o conhecimento e a crítica acerca
dos condicionamentos históricos, sociais e técnicos
(Bernardes, 1998; Lane & Sawaia, 1995).
Com o avanço da abertura política e dos movimentos
sociais a ela associados, muitas práticas psicológicas se
integraram às perspectivas de emancipação social. O
movimento pelas eleições diretas, nos anos oitenta e a
mobilização popular pelo “impeachment” presidencial
no início da década de noventa, tornou mais intenso o
sentimento e a importância do pertencimento ao coletivo. O movimento constituinte e a promulgação da
“Constituição Cidadã”, em 1988, fizeram com que as
expressões inclusão, igualdade e cidadania fossem mais
freqüentes na produção de conhecimentos e nas práticas
de psicólogos. Além disso, na esfera da saúde coletiva,
foram fundamentais a Reforma Sanitária, as Conferências de Saúde e a implantação do Sistema Único de
Saúde (SUS).
A efetivação dos propósitos do SUS, por exemplo,
objetiva o afastamento do mercado como principal critério para a organização dos serviços, na medida em que
a saúde é considerada um direito constitucional. Os
princípios de universalidade, equidade e integralidade,
assim como a inevitável demanda por ações efetivas para
a humanização do atendimento, são caracterizados como
direitos de todos os cidadãos. Além disso, a perspectiva
de regionalização das práticas prioriza as especificidades
sociais, abrindo espaços de criação de estratégias
direcionadas para a história e a cultura das populações
para as quais se dirigem as estratégias de saúde.
Atrelar as práticas cotidianas a essas prerrogativas
tem significado, desde então, pensar psicologia na dimensão da universalidade, da equidade, da integralidade
e da participação da comunidade no planejamento, na
gestão e na avaliação das ações no campo da saúde e,
mais recentemente, da assistência.
Ao mesmo tempo, a perspectiva social das práticas
psicológicas tem sido pauta de reflexões diversas o que
tem ampliado a produção de pensamentos e os sentidos
sociais atribuídos para as práticas psicológicas. Neste
cenário, originam-se propostas nas quais é evidente a
criação de práticas em diferentes âmbitos do trabalho no
campo social. Isso provoca o enfrentamento contínuo de
desafios que incitam a invenção de práticas, a reflexão
teórica sobre elas e o olhar cuidadoso para os seus efeitos, tendo em vista os desdobramentos que se efetivam,
as reações provocadas e a ética que as sustenta
(Dimenstein, 2000; Freitas, 2004; Guareschi, 2004).
Entretanto, o trabalho social não tem sido a perspectiva mais freqüentes nas escolhas profissionais de psicólogos. Parece que o imaginário que fundamenta grande
parte da formação e dos projetos profissionais, se refere
à lógica do profissional autônomo, bem sucedido, res102
paldado por um amplo cadastro de “pacientes particulares”. Tais “pacientes” são consumidores contumazes das
“verdades” que a psicologia pode lhes fornecer para garantir o lugar de “pessoa normal”. Esta opção substantiva a psicologia como um instrumento de manutenção
de lógicas naturalizantes dos fenômenos de controle e
aniquilação das possibilidades de compreender e articular espaços alternativos de produção de vida.
Dentre aqueles profissionais que optam pelo trabalho no âmbito coletivo, muitos têm nas diferentes abordagens da Psicologia Comunitária suporte teórico e
metodológico para estruturar suas práticas. Assim, na
medida em que se considera a comunidade como uma
categoria de análise e intervenção relevante no campo
da psicologia, este tem sido um campo que denota diversidades tanto na esfera filosófica quanto na política,
tendo em vista os contextos de inserção e os projetos
sociais e políticos que legitimam suas práticas (Freitas,
2004). Desse modo, para compreender as articulações
contemporâneas entre psicologia e comunidade, é relevante considerar o conceito de comunidade e as construções protagonizadas pela psicologia neste espaço.
Comunidade: Cenário para Construir
Conhecimentos a Partir das Relações
O termo comunidade é polissêmico e tem-se caracterizado por fornecer amplas e diversificadas possibilidades de problematização. Diferentes campos do saber têm
refletido sobre esta categoria de análise tendo em vista
contextos históricos e políticos. Como em qualquer conceito formulado, o de comunidade se conforma às dinâmicas sociais que se processam em cada espaço-tempo.
Na perspectiva da psicologia social crítica, Bader Sawaia
(2000) examinou algumas dessas formulações. A autora
mostrou a relevância da dicotomia indivíduo-sociedade
para o estabelecimento das concepções de comunidade
no decorrer dos processos históricos de produção de conhecimentos. Constatou que na medida do avanço das
relações comunitárias se fortaleceram utopias individualistas e vice-versa.
No contexto da globalização, a comunidade pode
ser depositária da utopia de conversão do egoísmo, da
exclusão e da fluidez presentes nas relações humanas.
Tal utopia atribui ao espaço das comunidades vivências
de parceria e de solidariedade e reaviva a esperança de
pertencimento a um grupo desprovido de interesses individualistas (Bauman, 2003).
Se examinarmos conceitos já considerados clássicos
de comunidade como, por exemplo, os formulados por
Nisbet (1975) e Tönnies (1947/1887), as características
de continuidade, intimidade e engajamento em crenças
comuns estão presentes e reforçam a idéia de que tais
atributos são constitutivos do espaço comunitário. A as-
Psicologia & Sociedade; 19, Edição Especial 2: 100-108, 2007
sociação dessas formulações aos modos de vida contemporâneos torna evidente o descompasso entre a lógica
predominante nas relações da “sociedade líquida”
(Bauman, 2001) e os projetos norteados pelas relações
comunitárias.
Assim como as considerações de Bauman (2003) têm
provocado reflexões e debates, a concepção de comunidade tem sido foco de interesse e de conflitos desde
modernidade. Sua lógica era, então, considerada obstáculo ao progresso e representava a persistência das tradições a serem vencidas. Ao mesmo tempo, o pensamento
conservador da época tinha na comunidade o modelo
ideal de sociedade, ameaçado pelo individualismo e pelo
racionalismo, característicos da lógica da modernidade
embrionária (Sawaia, 2000).
A desconstrução deste conceito, então, está marcada
pelos processos de industrialização e de formação do
estado-nação os quais favoreceram fenômenos de fragmentação da sociedade. Nesse contexto, a busca livre
pelo lucro promoveu a dissociação entre produtores e
fontes de subsistência, a ruptura entre laços morais e
emocionais e propiciaram os modos de vida capitalistas
com seus ritmos regulados externamente. Além disso, a
racionalidade predominante impôs rotinas e processos
de naturalização dos padrões de conduta “abstratamente
projetados e ostensivamente artificiais” (Bauman, 2003,
p. 39). A partir do atrelamento a padrões abstratos e
naturalizados dos modos de ser e viver humanos, as relações sociais são pautadas pelo privilégio de minorias e,
consequentemente, pela multiplicação incontrolável de
pessoas não reconhecidas pela sociedade que as segrega
e/ou descarta (Bauman, 2005).
Esse modo de articular relações sociais coopta o
conceito de comunidade e estabelece a construção de
guetos que perpetuam e aprofundam a divisão social de
classes. A partir de tal conformação homogeneidades e
diferenças são determinadas pela divisão de classes.
Ou seja, os espaços sociais são disponibilizados de
acordo com o lugar social ocupado pelos sujeitos, por
exemplo, condomínios fechados ou favelas. Assim, os
guetos traduzem a negação da comunidade, enquanto o
comunitarismo permanece uma demanda presente
(Bauman, 2003).
Numa sociedade na qual parceiros são adotados ou
descartados, de acordo com sua utilidade e funcionalidade, os compromissos por tempo indeterminado e os
vínculos mais duradouros poderiam interromper ou
ameaçar os modos de vida contemporâneos. Nesse caso,
que elementos teríamos para sustentar a idéia de comunidade? Que espaços poderiam ser engendrados para
enfrentar o refinamento histórico das formas de exploração e controle traduzidas no desemprego, na desestabilidade e nas incertezas?
Penso que a questão das relações comunitárias, ou
qualquer outra questão, não pode se restringir às dicotomias antagônicas que polarizam conceitos (como individualismo e coletividade), e revigoram as lógicas
naturalizantes que adotam e impõem modelos impeditivos dos processos de criação humana. Bom e mau,
certo e errado, real ou irreal traduzem universos fechados, sem possibilidades de problematizações e, consequentemente sem produção de pensamentos e modos de
existência. A questão das utopias se vincula a essa lógica
dicotômica. Existe um espaço essencialmente bom,
no qual as pessoas sempre vão fazer o que é verdadeiramente certo e terão ótimas condições de vida, constituirão relações harmônicas e terão uma convivência
afortunada e venturosa. Essas são as promessas que
estruturam religiões há milênios e compõem peças
publicitárias há muito tempo.
Desta forma, o conceito de comunidade, assim como
qualquer outro, precisa ser examinado em contexto, tendo em vista os sentidos que produz e, consequentemente,
as práticas que abriga. Posso falar na comunidade como
um não-lugar, uma utopia, mas posso usá-la como modo
de falar de um lugar no qual pessoas convivem e contatam
com a alteridade.
Considero a comunidade como mais um lugar imprevisível, no qual as pessoas vivem seu cotidiano (Campos, 1992) e se relacionam, traduzindo os modos de vida
contemporâneos, tanto na fragmentação e naturalização
da vida quanto na possibilidade de desejar, conviver e
criar. Neste espaço, podem ser articuladas práticas sociais e, quem sabe, o não-lugar delimitado pelas utopias
seja apenas um sonho, que como disse Galeano (1994),
está no horizonte, é inatingível, mas nos leva a caminhar.
Psicologia Comunitária: Construção Coletiva de
Práticas Psicológicas
A Psicologia Comunitária dedica-se a estudar,
compreender e intervir no cenário de questões psicossociais que caracterizam uma comunidade. Salienta-se por
sua praticidade e pela diversidade das opções teóricas e
intencionalidades que estruturam seus fazeres. Irma
Serrano-Garcia e Collazzo (1992) desenvolveram um
estudo comparativo no qual procuraram explicitar as
diferenças evidentes entre as práticas de Psicologia
Comunitária nos EUA e na América Latina. Para tanto,
examinaram experiências realizadas em comunidades,
tendo em vista os marcos conceituais que caracterizavam os fazeres em comunidades em cada um desses
territórios. Dentre os resultados deste estudo está a delimitação de modos de desenvolver Psicologia Comunitária. As práticas estadunidenses revelaram a adoção
de intervenções estruturadas na psiquiatria clínica
comunitária, na psicologia condutista, na perspectiva
ecológico-contextual e na psicologia organizacional,
103
Scaparo, H.; Guareschi, N. “Psicologia Social Comunitária e Formação Profissional”
entre outras. Já na América Latina, a análise dos dados
ressaltou maior diversidade de marcos conceituais que
revelaram a busca de apoio na dialética marxista, em
estudos transculturais, na preocupação com o desenvolvimento social e econômico, com a tecnologia, com a
ação e mudança social e com a interdependência entre
fatores estruturais, psicológicos e condutuais.
Dentre os marcos conceituais ressaltados pelos autores para descrever o trabalho Social Comunitário predominante na América Latina, está a Psicologia Social
Comunitária. Essa, por seu caráter histórico-crítico e
generalista, tem sido um campo de trabalho no qual a
interlocução com os movimentos sociais e com outros
saberes pode inspirar práticas atentas à complexidade
do cotidiano.
A adoção da comunidade como lócus do interesse da
psicologia foi considerada tardia. A Psicologia Comunitária como disciplina só foi assim denominada em 1965
(Montero, 1994a) e o conceito de comunidade como categoria de análise das ciências psicológicas somente foi
utilizado a partir dos anos setenta (Sawaia, 2000). Até
então, o estudo das comunidades era mais afeito, principalmente, aos campos da sociologia e da antropologia.
As interlocuções entre psicologia e comunidade se
intensificaram na medida em que as práticas psicológicas dialogaram com outras áreas, com o saber popular e
com os contextos sócio-políticos nos quais se estabeleciam. A experiência de vivenciar um conflito da dimensão da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, marcou
os modos de pensar, viver e agir da humanidade. No
âmbito da Psicologia Social aconteceram mudanças que
modificaram de tal forma essa esfera do saber que Hitler
foi jocosamente mencionado como importante intercessor
nos processos de construção da Psicologia Social Moderna (Farr, 2002). Dentre os aspectos que contribuíram
para tais transformações está a necessidade de repensar
os processos sociais e as relações entre teorias, práticas,
processos de investigação, produção de conhecimentos
e as éticas que os justificam.
Esse movimento dialógico inaugurou perspectivas
psicológicas. Assim, aspectos familiares, ambientais e
culturais passaram a compor mais enfaticamente as
teorias, ampliaram as concepções de saúde mental e, conseqüentemente, as possibilidades de integração entre
psicologia e comunidade. Por exemplo, no final da década de cinqüenta integrantes do “Institute of Community
Studies” divulgaram a pesquisa “Family and Kinship in
East London”. Esse estudo demonstrou que, na época,
havia expectativa de diluir a uniformidade, a estabilidade e a insipidez dos tempos pós-guerra. Existiam, na
época, publicações, nas quais os atrativos emocionais
dos estudos comunitários eram ressaltados, estimulando
as pesquisas, reflexões e, até mesmo, obras literárias
104
dedicadas à dicotomia antagônica entre comunidade e
individualidade (Bender,1978).
As dicotomias e antagonismos também se evidenciavam em movimentos sociais da época que denunciavam contradições, desigualdades e inconsistências entre
direitos humanos e os modos de relação que vigoravam
na sociedade. É o caso da militância anti-racista e dos
movimentos feminista e estudantil, por exemplo. Ao
mesmo tempo, políticas sociais articulavam bem-estar e
avaliação dos serviços em saúde nos Estados Unidos da
América e na Europa (Vianna, 1991). Além disso, os
movimentos da antipsiquiatria e institucionalista questionavam os conceitos e as práticas de saúde mental e a
psiquiatria de setor deixava de ser uma proposta para
tornar-se uma ação efetiva que muito influenciou na
ampliação e diversificação da psicologia como prática.
Como já vimos anteriormente na América Latina, as
ditaduras decretavam a morte civil em grande parte dos
países do continente. A experiência de viver nesse contexto de repressão e sofrimento provocou, por parte de
alguns intelectuais, questionamentos quanto à responsabilidade social da Psicologia. Referindo esse período,
Lane (1996, p. 68) afirmou: “Diante desse quadro o
nosso cotidiano não nos permitia ficar em torres de marfim pesquisando neutramente”. Emergiram, então, iniciativas de aproximação entre psicologia e comunidades
de classes populares, numa tentativa de deselitizar as
práticas psicológicas e marcar sua relevância social
(Scarparo, 2005).
Na Argentina, Enrique Pichon-Riviere e José Bleger
enfatizaram a efetivação de trabalhos sociais como
ponto de partida para mudanças epistemológicas e práticas nos enfoques de Psicologia Social (Bleger, 1992).
Apoiados em idéias marxistas e na psicanálise, amplamente difundida na Argentina, esses intelectuais empenharam-se em refletir teoricamente fenômenos grupais.
Tal esforço possibilitou o entendimento dos processos
de grupos, instituições e comunidades, através da problematização das suas especificidades (Pichon-Rivière,
2000). José Bleger tentou consolidar saberes sobre a subjetividade no âmbito da teoria marxista (Rodrigues, 2004)
e associou o conceito de psicohigiene (Bleger, 1992) ao
trabalho comunitário. Para tanto, referiu a necessidade
de considerar o cotidiano das populações e questionou
as práticas de patologização dos fenômenos humanos.
Na área da Sociologia, a indignação com a precariedade da vida das populações oprimidas e o desejo de
mudar essa condição também caracterizou propostas de
inserção junto às classes populares (Montero, 1994b). O
colombiano Orlando Fals Borda (1979), por exemplo,
associou a categoria consciência à construção de uma
Sociologia militante, na qual a busca de transformação
social só poderia ocorrer na conjugação de saberes,
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fazeres e contextos. Do mesmo modo, Paulo Freire abriu
espaços sociais para a Educação Popular, uma proposta
político-pedagógica emancipatória que anseia por esforços coletivos de humanização (Freire, 2004). O contato com pensamentos que bradavam pela instauração
de críticas quanto às circunstancias políticas e sociais
vividas criou, no âmbito da psicologia, movimentos de
crítica ao determinismo, a exclusão de modelos únicos
de fazer científico e o abandono do sentido da psicologia
como um objeto dado.
No final dos anos 70, foi criado, na Venezuela, o
Centro a Serviço da Ação Popular. Apoiados na pesquisa-ação, seus integrantes envolveram-se em trabalhos
educacionais e de organização comunitária, além de
estruturar unidades de produção. A multiplicação de
práticas desse tipo facilitou sua adoção pelas universidades. Através do trabalho de estudantes, projetos comunitários aconteceram em Porto Rico, na Venezuela,
no Brasil e no México entre outros países (Freitas, 1998;
Lane, 1996).
A ampliação de trabalhos comunitários implicou a
necessidade de intercâmbio da comunidade científica.
Havia dificuldade de comunicação entre os pesquisadores e parcos recursos para a divulgação dos trabalhos.
Em função disso, foi criada a Associação Venezuelana
de Psicologia Social – AVEPSO – em 1980 (Bernardes,
1998). No Brasil, durante a 32ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC),
foi criada a Associação Brasileira de Psicologia Social –
a ABRAPSO (Freitas, 1996). Essa pretendia favorecer
a articulação de uma Psicologia Social Crítica (Lane &
Sawaia, 1995, p. 7) com possibilidades transformadoras.
Nos anos seguintes recrudesceram cursos de graduação e pós-graduação na área. As universidades abriram espaços para trabalhos comunitários articulando
produção de conhecimentos e trabalho social. É o caso
do estudo realizado por Montero (1994c) que descreve
seu trabalho junto à população das imediações de Caracas. Ao divulgar o trabalho a autora apontou para a
necessidade de discutir as bases epistemológicas e as
ideologias subjacentes às práticas comunitárias. Esse tem
sido um desafio continuado na medida em que habitamos tempos e espaços em movimento.
Contemporaneamente, a relação psicologia-comunidade se edita tendo em vista outras perspectivas. As
transmutações ocasionadas pelo acirramento do processo de globalização articularam maneiras diversas de
significar o mundo e de viver coletivamente. A lógica
instrumental se estabelece nas tensas relações humanas
a partir da economia e da política. A convivência caracteriza-se pela premência de espaços e de tempos, pela
racionalização exacerbada, por processos de desterritorialização e pela predominância de impessoalização
nas relações (Bauman, 2001). Nessa perspectiva, é pertinente refletir sobre a Psicologia Social Comunitária considerando a contribuição dessa perspectiva de estudo e
trabalho para a formação profissional.
Formação e Compromissos Sociais
As práticas psicológicas, dentre essas aquelas
dedicadas à formação de psicólogos, consubstanciamse em processos de interconexão entre acontecimentos,
pensamentos e reações que estabelecem ritmos diferentes para o conhecimento e, consequentemente, mudanças epistemológicas. A partir de tais mudanças incluemse no campo da ciência psicológica objetos inusitados.
Alguns negligenciados ao longo dos tempos, outros, que
traduzem os objetivos, fins e intenções de uma época.
Assim, ao abordar questões relativas à formação profissional é importante que levemos em conta o momento
histórico vivido no exame dos projetos sociais que justificam e estruturam as propostas curriculares e seus
desdobramentos. A psicologia, como profissão tem sido
caracterizada pela prevalência de modelos característicos da sociedade ocidental moderna e, em muitas
ocasiões, posiciona-se com distanciamento dos contextos históricos e culturais nos quais se processam os fenômenos de interesse para a área. Como decorrência, são
muitas as contradições entre os modelos e estratégias
profissionais disponíveis e as propostas ou demandas
advindas das diferentes circunstâncias de vida.
Um dos exemplos de tais contradições é a discrepância entre a necessidade de trabalho no âmbito das políticas sociais e o despreparo dos profissionais para enfrentar os desafios relativos a esse campo de trabalho. Esse
enfrentamento implica em assumir o compromisso de
compreender a magnitude das questões abordadas ao
planejar, gerir e avaliar ações. Para tanto, é urgente que a
formação favoreça o conhecimento e a crítica dos pressupostos das políticas sociais e da amplitude do espaço
público. Caso contrário podem se multiplicar práticas
elitistas e inacessíveis às pessoas para as quais se supõe
igualdade de direitos.
Pensamos que o processo de formação precisa legitimar a necessidade de revisão e questionamento das
práticas cotidianas no sentido de articular estratégias de
ensino e processos emancipatórios. Desse modo é imprescindível problematizar e discutir a própria psicologia no que se refere aos sentidos que tem produzido, aos
papéis dos quais apropria e ás idéias que veicula, articulando uma gama de instâncias simbólicas implicadas nos
processo de subjetivação contemporânea.
A perspectiva de trabalho resultante só é possível,
portanto, se imbricada na aprendizagem continuada, o
que exige que o profissional envolvido na tarefa se arti105
Scaparo, H.; Guareschi, N. “Psicologia Social Comunitária e Formação Profissional”
cule em diferentes direções, sendo receptivo a outros
saberes, aos imprevistos e às eventuais mudanças de percurso.
Essas condições supõem sujeitos criadores e propositivos. Por decorrência se trata de pessoas e grupos
dispostos a tomar para si a responsabilidade de gerar
acontecimentos. Neste contexto não há possibilidade de
obediência cega a padrões uniformes e rituais preestabelecidos.
Para tanto é urgente que a aprendizagem, base da
formação profissional se estruture na prática, na vivencia
de experiências e no exercício da efetivação de projetos
que articulem e transformem as perspectivas do mundo
acadêmico e da população numa autêntica produção de
saberes compartilhada.
Nos princípios e compromissos estipulados pelo Ministério de Educação e Cultura, nas diretrizes curriculares
para o ensino superior, as expectativas para a formação
do psicólogo se referem à habilidade em lidar com a diversidade em contexto. Tais diretrizes se dirigem para
práticas sociais e para a formação de profissionais
generalistas, com perspectivas interdisciplinares e que
respondam criativamente às demandas da população a
qual se dedica, considerando suas especificidades. Ou
seja, ao modelo profissional sugerido está associado à
habilidade de compreensão integral e contextualizada dos
fenômenos psicológicos.
Se considerarmos questões relativas à formação
profissional no Brasil, veremos que psicólogos pretensamente “formados”, no mais das vezes, estão presos a
modelos descontextualizados de inserção no trabalho.
Persistem projetos profissionais em que o trabalho é significado como atendimento no âmbito privado, em
espaços convencionais como gabinetes ou consultórios.
Este modelo estrutura seu projeto profissional e social a
partir da lógica do consumo, o que sugere o atendimento
ao cliente privado e não ao integrante de uma rede pública de atenção básica.
Observamos frequentemente práticas formadoras
associadas a um processo de idealização do fazer profissional que se estrutura em perspectivas extemporâneas e
fragmentadas. É preciso, então, compreender a formação como um processo generalista de educação permanente que supõe um sujeito criador que redesenhe ciência e profissão na praxis. Cabe ressaltar que essa não é
uma tarefa pequena ou simples. Para tanto, é necessário
abandonar os territórios de conforto conquistados com a
adoção de modelos convencionais de produção de conhecimento e atuação profissional. Por exemplo, a perspectiva unidisciplinar, centrada na psicologia, para compreender os fenômenos que se precipitam no cotidiano
da comunidade é restritiva e reduz a complexidade das
relações coletivas e das próprias possibilidades das di106
ferentes áreas do conhecimento em promover espaços
de diálogo e reflexão. Assim, um dos primeiros desafios
é a transformação de práticas unidisciplinares em busca
de construção de relações interdisciplinares.
A busca de uma identidade se transforma num processo tecido continuamente, na medida dos acontecimentos, das leituras, dos diálogos, da passagem do tempo
vivido... O profissional constitui-se e reconhece-se na
relação com o inusitado e na criação da psicologia.
As propostas de trabalho social comunitário têm como
pressupostos as práticas interdisciplinares, reflexões
teóricas sobre as experiências cotidianas, socialização
de saberes, participação e exame crítico das implicações
políticas de cada prática (Campos, 1992). Nessa dimensão a formação precisa priorizar a construção de espaços para a constituição de vínculos, de valorização de
projetos coletivos nos quais os conhecimentos sejam
instrumentos emancipatórios e, ao mesmo tempo, objetos de análise e produção de pensamento. A efetivação
desses movimentos problematiza a manutenção de
hegemonias, duvida de códigos tidos como verdades
inquestionáveis, reformula idéias e ressignifica práticas.
Curiosamente, se nos dedicarmos ao exame das trajetórias de construção da Psicologia Social Comunitária na
América Latina, encontraremos relatos de ações contrahegemônicas, questionadoras e criativas no que tange à
produção de pensamentos e à proposição de práticas.
Formar-se ou Assumir a Condição
de Autor?
Ao associar aspectos da história da psicologia no
Brasil, com perspectivas da psicologia comunitária e as
práticas relativas à formação de psicólogos não poderíamos deixar de considerar a vivencia cotidiana com o
impermanente que nos impõem os modos de vida pósmodernos (Bauman, 2001). Conhecimento, formação e
comunidade são apenas alguns dos conceitos que tem
sofrido propostas radicais de transformação na esteira
de mudanças paradigmáticas em todos os níveis de compreensão humana. Ou seja, as promessas de verdade e
ordem do projeto da modernidade dão lugar ao cultivo
inexorável de incertezas e indeterminações (Bauman,
2003).
As dúvidas e perplexidades se mostram contundentes no que toca aos espaços e às formas de convivência
social. No que se refere ao âmbito educacional é óbvia a
falência da concepção epistemilógica baseada na
praticidade positivista que valoriza a idéia de profissão
instrumental, suficientemente potente para solucionar
problemas a partir da aplicação de rigor científicos e
métodos eficientes. Curiosamente esta concepção é predominante nos cursos de formação acadêmica, apesar
Psicologia & Sociedade; 19, Edição Especial 2: 100-108, 2007
da constatação de que ela não atende às exigências cotidianas para o profissional nos contextos de inserção nos
quais poderia atuar (Gomes & Casagrande, 2002).
O descompasso entre demandas sociais e formação
denota fragmentações que se traduzem em dissociações
entre fazer e saber, rupturas entre laços morais e emocionais e propiciaram um contingente cada vez maior de
pessoas tituladas na academia e não reconhecidas pela
sociedade que as segrega e/ou descarta perpetuando e
aprofundando as mazelas sociais contemporâneas.
O entendimento das questões relativas à formação
profissional deve partir da problemática da própria construção do conhecimento psicológico, tendo em vista os
sentidos que produz e, consequentemente, as práticas que
abriga. Ou seja, a formação não pode prescindir do conhecimento de diferentes paradigmas e da contínua tentativa de apreensão dos múltiplos reflexos e possíveis efeitos que caracterizam as práticas associadas a cada um.
Desse modo, os processos educacionais, a exemplo
da história de construção das práticas sociais em comunidades, precisam se apoiar na discussão contínua da ética
dos projetos sociais que os sustentam. Como decorrência, o sujeito abandona a condição de alguém a “ser formado” e assume autoria da construção da sua prática
profissional, revisando conceitos e marcas identitárias.
Tal autoria se processará pela ocupação do lugar de origem do fazer profissional e ser por ele responsável. Assim, adquire e ressignifica saberes, propõe interlocuções
na diversidade e articula contínuamente imaginação,
consciência histórica e ética.
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Helena Beatriz Kochenborger Scarparo é psicóloga,
mestre em Educação e doutora em Psicologia pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC-RS). Atualmente é conselheira titular do Conselho
Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul e
professora da PUC-RS. Endereço para correspondência:
PUC-RS, Faculdade de Psicologia, Departamento de
Psicologia Escolar. Avenida Ipiranga, 6681, Partenon,
Porto Alegre, RS, 90619-900. Telefone: (51) 33203500;
Ramal: 3550; Fax: (51) 32003614.
scarparo@pucrs.br
Neuza Maria de Fátima Guareschi é psicóloga,
especialista em Psicologia do Trabalho e Organizacional
e mestre em Psicologia Social e da Personalidade pela
PUC-RS. Doutora em Educação pela University of
Wisconsin - Madison. Atualmente é Professor com
dedicação exclusiva da Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul, Conselheira da Associação
Brasileira de Psicologia Social, Coordenadora do Comitê
de Avaliação da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio Grande do Sul, Conselheira do Conselho
Regional de Psicologia e Tesoureira da Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia.
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Endereço para correspondência: PUC-RS, Faculdade de
Psicologia, Departamento de Psicologia Escolar. Avenida
Ipiranga, 6681, Partenon, Porto Alegre, RS,
90619-900.Telefone: (51) 33203500; Ramal: 3633;
Fax: (51) 33203633.
nmguares@pucrs.br
Psicologia Social Comunitária e Formação
Profissional
Helena Scarparo e Neuza Guareschi
Recebido: 16/10/2006
Aceite final: 18/07/2007
1ª revisão: 24/06/2007