UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E RECURSOS NATURAIS
FLÁVIA TORREÃO CORRÊA DA SILVA THIEMANN
Biodiversidade como tema para a educação ambiental: contextos urbanos, sentidos
atribuídos e possibilidades na perspectiva de uma educação ambiental crítica
Tese apresentada ao Centro de Ciências Biológicas
e da Saúde da Universidade Federal de São Carlos
para obtenção do título de Doutora em Ciências
Área de concentração: Ecologia e Recursos Naturais
Linha de Pesquisa: Educação Ambiental
Orientadora: Prof. Dra. Haydée Torres De Oliveira
São Carlos – SP
Março/2013
Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da
Biblioteca Comunitária/UFSCar
T433bt
Thiemann, Flávia Torreão Corrêa da Silva.
Biodiversidade como tema para a educação ambiental :
contextos urbanos, sentidos atribuídos e possibilidades na
perspectiva de uma educação ambiental crítica / Flávia
Torreão Corrêa da Silva Thiemann. -- São Carlos : UFSCar,
2013.
159 p.
Tese (Doutorado) -- Universidade Federal de São Carlos,
2013.
1. Educação ambiental. 2. Educação ambiental crítica. 3.
Polo Ecológico de São Carlos. 4. Perspectiva hermenêutica.
5. Ecologia. I. Título.
a
CDD: 372.357 (20 )
A Otavio.
Sem você nada disso teria sido possível.
A nossos filhos, Daniel e Felipe,
que trazem beleza e alegria à nossa vida.
AGRADECIMENTOS
À Haydée Torres de Oliveira, minha orientadora, pela oportunidade de
desenvolver essa tese, o apoio ao meu trabalho, a liberdade na escolha dos
caminhos, e pelas constantes indagações que me fizeram buscar no estudo as
bases filosóficas desta pesquisa em educação ambiental.
A Amadeu José Montagnini Logarezzi, Dalva Maria Bianchini Bonotto, Jandira
Liria Biscalquini Talamoni, Luiz Marcelo de Carvalho, Pedro Manoel Galetti Júnior e
Rodolfo Antônio de Figueiredo por sua disponibilidade em aceitar o convite para
compor a banca de defesa desta tese.
À Liane Biehl Printes, Patrícia Cristina Silva Leme e novamente a Pedro
Manoel Galetti Júnior, por sua participação na banca do Exame de Qualificação. Sua
contribuição foi muito importante para o desenvolvimento deste trabalho.
A todas as pessoas que participaram da pesquisa, por meio das disciplinas e
da interação mediada pelos questionários Delphi, agradeço sua disposição em
colaborar para a construção desta tese.
Às (aos) participantes do GEPEA, nosso Grupo de Estudo e Pesquisa em
Educação Ambiental, atuais e ausentes, com quem compartilhei muitas das
questões que apresento nesta pesquisa.
Às educadoras do Laboratório de Educação Ambiental, o LEA/UFSCar, pela
atmosfera de acolhimento. Entrelaçando-se com o GEPEA, esses dois grupos fazem
com que a pesquisa não seja uma empreitada solitária, mas oferecem um espaço de
convivência, carinho e crescimento. Nomeando me arrisco a deixar alguém de fora,
então fica aqui o agradecimento coletivo! E um especial para Mayla Willik Valenti,
que teve o cuidado de rever e oferecer sugestões para esse texto.
Às amigas Ariane Di Tullio e Valéria Ghisloti Iared, companheiras desde o
início, que muito me ajudaram a chegar até aqui. Do início do trabalho, na
Assessoria de Educação Ambiental da Secretaria Municipal de Educação e Cultura
de São Carlos, até a correção cuidadosa deste texto, vocês sempre me apoiaram.
À Géria Maria Montanari Franco, pela audácia de criar a Assessoria de
Educação Ambiental, onde pudemos realizar um trabalho consistente de educação
ambiental, com sua orientação e postura democrática e participativa.
Ao
pessoal
da
Pós-Graduação
em
Ecologia
e
Recursos Naturais,
professoras/es, coordenação e secretaria, onde sempre encontrei apoio quando
necessário, e à equipe da Biblioteca Comunitária da UFSCar, por sua ajuda nas
etapas de finalização da tese
Ao meu pai, José Júlio Pontes Corrêa da Silva, advogado, relações públicas,
comunicador nato, professor, mestre dedicado, pelo trabalho minucioso e atento de
correção desta tese.
De novo a meu pai, José Júlio, e minha mãe, Conceição de Maria Torreão
Corrêa da Silva, que nos criaram com muito amor, e propiciaram a nós três as
melhores oportunidades de ensino. Sou muito grata a vocês por isso. E pelo amor à
leitura, aprendido também em casa.
A meu irmão Luis Roberto Torreão, e minha irmã, Denise Torreão, que
mesmo longe moram no meu coração. Cada um a seu jeito, vocês são exemplos de
integridade no trabalho e da busca incansável de seus sonhos.
À família de meu marido Otavio, por ter me acolhido com tanto carinho em
seu seio.
Chegar ao fim destes quatro anos inevitavelmente nos leva a querer fazer um
balanço do que se passou. Não é possível dedicar-se plenamente ao trabalho,
quando além de estudante se é mãe, esposa, filha, irmã, nora, dona de casa,
motorista e gente. O trabalho tem que dividir espaço com tudo o mais na vida, mas
valeu a pena cada passo nessa caminhada. E valeu a pena ter dividido cada
momento, com muito amor, com Otavio, meu marido e companheiro, e com Daniel e
Felipe, os encantos da nossa vida.
Somos o silêncio e o som da vida.
O estudo, a lembrança e o esquecimento.
Somos o medo e o abandono.
A espera somos nós e somos a esperança.
Pois não somos mais e nem menos do que o todo
e nem somos menos e nem mais que tudo.
Somos o perene e o momento, a pedra e o vento
a energia e a paz, a vida criada e o criador.
Somos o mundo que sente, e irmãos da vida
Somos a aventura de ser vida e sentimento.
E assim em cada ave que voa há nossa alma,
e em cada ave que morre, a nossa dor.
Carlos Rodrigues Brandão
“O Jardim de Todos”
Da poesia “tudo, todos e o todo”.
RESUMO
A biodiversidade está em tudo ao nosso redor, no que vestimos, comemos,
em objetos de nosso cotidiano, passado e futuro. Faz-se presente como uma
explosão de cores e tons, de sons e aromas. É ao mesmo tempo invisível e
inescapável. Os discursos sobre a biodiversidade também são múltiplos: ela é a
base da vida na Terra, é essencial, e, no entanto, sofre ameaça constante. Nesta
tese buscamos levantar possibilidades de trabalho com o tema da biodiversidade em
um ambiente urbano, o Polo Ecológico de São Carlos e entender quais são os
sentidos atribuídos à biodiversidade por pesquisadoras/es e estudantes da área de
Ciências Biológicas e afins, e as possibilidades de trabalhar com o conceito da
biodiversidade em processos educativos conduzidos dentro dos princípios de uma
educação ambiental crítica. Realizamos uma pesquisa qualitativa, com o uso de
técnicas de pesquisa naturalista e do Método Delphi, e utilizamos o referencial da
hermenêutica filosófica na interpretação e compreensão dos dados. Na pesquisa
foram geradas nove categorias de sentido atribuído à biodiversidade: Concretude,
Simbólico, Conhecimento, Holismo, Caleidoscópio, Oculta, Ameaçada, Inclusiva e
Exclusiva,
elencados
16
conjuntos
de
conceitos
considerados
essenciais,
organizados em esferas que contemplam aspectos de conteúdos científicos, valores
e atuação, e seis sugestões de temas que podem auxiliar o processo de
aprendizagem sobre a biodiversidade: Experimentar a biodiversidade; “Abrir os
olhos” para a biodiversidade; Exercitar diálogo/debates; Perceber a importância da
biodiversidade e os limites da interferência humana; Biodiversidade no próprio
território; Superação da fragmentação do ensino. Os resultados são ideias,
sugestões, possibilidades a serem exploradas, sob a perspectiva da educação
ambiental crítica, e devem ser contextualizadas em processos que respeitam a
multiplicidade de olhares sobre a questão ambiental e buscam a compreensão e a
construção de acordos que permitam a ação em prol da diversidade de vida do
planeta.
Palavras-chave: Biodiversidade. Educação ambiental crítica. Polo Ecológico de São
Carlos. Ambiente urbano. Perspectiva hermenêutica.
ABSTRACT
Biodiversity is all around us, in what we wear, eat, into objects from our daily,
past and future lives. It is present as an explosion of colors and hues, sounds and
smells. It is both invisible and inescapable. The discourses on biodiversity are also
multiple: it is the basis of life on Earth, it is essential, and yet suffers constant threats.
In this thesis we seek to raise possibilities of working with biodiversity as a theme in
an urban environment, the São Carlos Ecological Pole, and to understand the
meanings attributed to biodiversity by researchers and students in the Life Sciences
and similar areas, and to envision possibilities for addressing the concept of
biodiversity in environmental education processes conducted within the principles of
a critical environmental education. We conducted a qualitative study, using naturalist
research techniques and the Delphi Method, and used a philosophical hermeneutics
perspective to interpret and understand the data. This research generated nine
categories
of
meaning
attributed
to
biodiversity:
Concreteness,
Symbolic,
Knowledge, Holism, Kaleidoscope, Hidden, Threatened, Inclusive and Exclusive,
listed 16 sets of concepts considered essential, organized in spheres that
contemplate aspects of scientific content, values and action, and six suggestions of
themes that can help the process of learning about biodiversity: Experiencing
biodiversity; "Opening your eyes" for biodiversity; Exercising dialogue/discussions;
Acknowledging the importance of biodiversity and the limits of human interference;
Biodiversity in our own territory; Overcoming teaching fragmentation. The results are
ideas, suggestions, possibilities to be explored from the perspective of a critical
environmental education, and must be contextualized in processes that respect the
multiplicity of views on environmental issues, and seek understanding and to build
agreements that allow for action in favor of the diversity of life on Earth.
Keywords: Biodiversity. Critical environmental education. São Carlos Ecological Pole.
Urban environment. Hermeneutics perspective.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANPEd - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
ANPPAS – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ambiente e
Sociedade
APASC – Associação para a Proteção Ambiental de São Carlos
BCo – Biblioteca Comunitária (UFSCar)
CAPES –Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CCPSE – EMBRAPA Pecuária Sudeste
CDB – Convenção da Diversidade Biológica
CDCC - Centro de Divulgação Científica e Cultural (USP)
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
CNE – Conselho Nacional de Educação
COMDEMA – Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (São Carlos)
CRHEA – Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada (USP)
EIA-RIMA – Estudo de Impacto Ambiental – Relatório de Impacto sobre o Meio
Ambiente
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
ENCEA – Estratégia Nacional de Comunicação e Educação Ambiental
EPEA – Encontro de Pesquisa em Educação Ambiental
ETA - Estação de Tratamento de Água
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz
FNDCT - Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
GEEAM – Grupo de Estudos em Educação Ambiental
GEPEA – Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Ambiental
GT – Grupo de Trabalho
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
INCOOP - Incubadora de Cooperativas Populares
MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia
MEC – Ministério da Educação
MMA – Ministério do Meio Ambiente
ONG – Organização Não Governamental
PESC – Parque Ecológico de São Carlos
PMEA – Política Municipal de Educação Ambiental
PMSC – Prefeitura Municipal de São Carlos
PT – Partido dos Trabalhadores
PROMEA-SC – Programa Municipal de Educação Ambiental – São Carlos
SAAE - Serviço Autônomo de Água e Esgoto
SLE - Significant Life Experiences
SMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
UC – Unidade de Conservação
UCLA - University of California – Los Angeles
UFSCAR - Universidade Federal de São Carlos
USP – Universidade de São Paulo
WWF – Fundo Mundial de Proteção à vida Selvagem (World Wildlife Fund)
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
Objetivo geral da pesquisa
Objetivos específicos
CAPÍTULO 1 - PARA SITUAR A PESQUISA: CAMINHOS
PERCORRIDOS, O REFERERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
E NOTAS SOBRE A PESQUISA EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL
1.1 Caminhos que levaram ao recorte da pesquisa
1.2 O projeto “São Carlos de Todos Nós”
1.3 Notas sobre o referencial e a pesquisa em educação ambiental
1.4 A orientação da hermenêutica filosófica
1.5 Educação ambiental crítica e educação para a biodiversidade
1.6 Sobre o termo biodiversidade e educação ambiental
CAPÍTULO 2 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
2.1 A educação ambiental e biodiversidade em um contexto local
2.2 O Método Delphi
2.3 Análise dos dados
CAPÍTULO 3 - O POLO ECOLÓGICO DE SÃO CARLOS E A
BIODIVERSIDADE COMO TEMA PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
CRÍTICA EM UM CONTEXTO URBANO
3.1 Principais temáticas identificadas nos resultados da
pesquisa sobre biodiversidade e educação ambiental no
Polo Ecológico
3.1.1 A importância das áreas urbanas para atividades de educação
ambiental
3.1.2 Como o tema biodiversidade é abordado durante as visitas às
unidades do Polo Ecológico
3.1.3 Sugestões sobre como abordar o tema biodiversidade nestas
visitas
3.1.4 Como o tema biodiversidade pode ser relacionado com o
envelhecimento humano
3.2 Reflexões sobre os resultados da pesquisa sobre biodiversidade
e educação ambiental no Polo Ecológico
CAPÍTULO 4 - OS SENTIDOS DA BIODIVERSIDADE E SUAS
POSSIBILIDADES EDUCATIVAS NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO
AMBIENTAL CRÍTICA
4.1 Os sentidos atribuídos à biodiversidade
4.2 Temas oferecidos pelo grupo para abordar a biodiversidade
em processos educativos na perspectiva da educação ambiental
crítica
4.3 Os conceitos/ideias que devem estar presentes na educação
ambiental com o tema biodiversidade
4.4 Reflexões sobre os resultados do estudo Delphi sobre
biodiversidade na perspectiva da educação ambiental crítica
4.5 Os objetivos da aprendizagem em educação ambiental
e as características/critérios que podem auxiliar o processo
23
27
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30
31
31
34
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70
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82
89
98
102
105
4.5.1 Os objetivos da aprendizagem sobre biodiversidade
106
4.5.2 As características que podem auxiliar a aprendizagem
em educação ambiental
4.5.3 Aprendizagem sobre biodiversidade: algumas reflexões
CAPÍTULO 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
APÊNDICE 1 - DELPHI SISBIOTA ETAPA 1
APÊNDICE 2 - DELPHI SISBIOTA ETAPA 2
ANEXO 1 – Mapa de unidades do Polo Ecológico de São Carlos
ANEXO 2 - Mapa completo do Polo Ecológico de São Carlos
ANEXO 3 - ROTEIRO DA TRILHA DO HORTO MUNICIPAL
115
120
122
128
139
146
152
153
154
APRESENTAÇÃO
A trajetória da autora
Da USU a São Carlos, passando pela Califórnia
Desde a graduação em Ciências Biológicas na Universidade Santa Úrsula, no
Rio de Janeiro, em 1986, percorri diversos caminhos dentro da Biologia. Ao
completar a graduação, com os títulos de Bacharel e Licenciada, atuei como bióloga
em equipe multidisciplinar na empresa IESA (Internacional de Engenharia S/A), uma
empresa de consultoria em engenharia. Neste cargo contribuí para a elaboração de
relatório de impacto ambiental, o EIA-RIMA, em cumprimento com a então recémpublicada Resolução CONAMA Nº 001, de 23 de janeiro de 19861, para obra de
usina hidrelétrica em Goiás.
Em 1989 ingressei no programa de Mestrado em Parasitologia na Fundação
Instituto Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, obtendo o título de Mestre em Ciências ao
defender minha dissertação em 1991.
Naquele ano, já casada, embarquei para uma temporada (que duraria sete
anos) na Califórnia, EUA, para acompanhar meu marido Otavio Henrique, que foi
estudar para a obtenção do título de PhD na UCLA. Durante este período trabalhei
como técnica de pesquisa, na University of Southern Califonia (USC) e no Childrens
Hospital Los Angeles (CHLA), na área de biologia molecular e celular, sendo no
CHLA em pesquisa básica em terapia gênica. Após cinco anos, já pensando na volta
para o Brasil, precisei reinventar minha carreira de bióloga, já que não tinha a
intenção de continuar trabalhando com pesquisa em biologia molecular. Eu sempre
tive um interesse muito grande pelas questões sociais, originado da época da
educação em colégio jesuíta, o Colégio Santo Inácio, no Rio de Janeiro. Interesseime por um curso na área de resíduos sólidos, para poder trabalhar com catadores
de recicláveis. Por razões de tempo, cursei uma especialização na extensão da
própria UCLA em manejo de resíduos perigosos, com várias disciplinas comuns à
gestão de resíduos recicláveis. Em 1998 obtive o título de Especialista em Manejo
de Resíduos Perigosos (Hazardous Waste Management) pela UCLA.
1
Esta resolução trata das diretrizes gerais referentes à Avaliação de Impacto Ambiental, um instrumento da
Política Nacional do Meio Ambiente.
23
Em julho de 1998, em plena Copa do Mundo, chegamos a São Carlos, onde
Otavio viria a tornar-se professor na Universidade de São Paulo.
Em São Carlos
Desde a nossa chegada, minha caminhada tem sido marcada por uma série
de encontros felizes, que foram ajudando a traçar esse caminho que me trouxe ao
Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais, como candidata ao
título de Doutora em Ciências. O primeiro deles foi com a Pazu, que apresentava o
USP Recicla no IFSC-USP. A partir dali com a Daniela Sudan, também do USP
Recicla, e a Heloísa Cinquetti, que na época retornara de uma temporada de
estudos nos EUA. Os encontros seguintes foram no CDCC, com a Silvia, e os
professores Dietrich Schiel (recém falecido quando escrevo esta) e Valdir Schalch,
da USP. Fiquei um ano no CDCC, em 1999, como monitora de um projeto de
educação ambiental desenvolvido na escola Arthur Natalino Deriggi, na região dos
bairros Cidade Aracy e Antenor Garcia, aonde voltaria muitas vezes ao longo dos
anos. Também nesse período conheci o GEEAM, o Grupo de Estudos em Educação
Ambiental, coordenado pela Profa. Dra. Haydée Torres de Oliveira e pelo Prof. Dr.
Amadeu Logarezzi. Este grupo, de onde me afastei para depois retornar, se tornou o
GEPEA, nosso Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Ambiental. Nesta época
conheci também a INCOOP, da UFSCar, então iniciando suas atividades, e por meio
desse contato um pouco de cooperativismo e economia solidária. Em junho de 1999
ajudei a criar, junto com a APASC, o “Fórum Comunitário do Lixo”, grupo que se
reuniu em torno da questão dos resíduos em geral, e que foi uma peça importante
para a posterior criação do Programa Municipal de Coleta Seletiva de São Carlos,
em 2002.
Em 2000 cursei a especialização “Educação Ambiental e Recursos Hídricos”,
no CRHEA/USP, coordenada pelo Dr. Carlos Eduardo Matheus. Nosso trabalho de
curso foi desenvolvido no bairro Cidade Aracy, em uma escola de ensino
fundamental, vizinha a uma imensa voçoroca, que já tinha engolido parte da área de
lazer da escola. Ali, anos mais tarde, seria instalada a entulheira para resíduos de
construção civil.
No fim do ano o Partido dos Trabalhadores ganhou as eleições municipais, e
em 2001 fui trabalhar na Prefeitura Municipal de São Carlos, com o Prof. Francelino
Grando, e foi com a equipe da Secretaria Municipal de Desenvolvimento
Sustentável, Ciência e Tecnologia que, junto com o Ministério Público e outras
24
parcerias, criamos o Programa Municipal de Coleta Seletiva de São Carlos, em
2002. Consegui assim trabalhar com os catadores, que na época tiveram que deixar
de catar material no aterro sanitário da cidade e juntaram-se à coleta seletiva que se
iniciava. Coordenei a coleta até dezembro de 2004.
Em 2001 nasceu Daniel, nosso primeiro filho, recebido com muito amor.
Em janeiro de 2005 fui convidada para trabalhar com a Secretária Municipal
de Educação e Cultura, Géria Maria Montanari Franco, bióloga, professora
aposentada da UFSCar, responsável pela criação da Trilha da Natureza da
universidade, educadora ambiental, que, ao assumir a SMEC, criou cinco
assessorias especiais, dentre elas a Assessoria de Educação Ambiental, pela qual
fiquei responsável. Durante os quatro anos de sua gestão nossa equipe trabalhou
para a criação e consolidação da educação ambiental nas escolas municipais de
São Carlos. Foram todas as conversas com as amigas e companheiras de trabalho,
em especial Ariane e Valéria, que me levaram a querer fundamentar em teoria a
educação ambiental que eu já vivia na prática.
Em 2006 nasceu Felipe, nosso segundo filho, também recebido com muito
amor, e a família ficou completa, com duas crianças, três cachorros, e várias árvores
no quintal.
No final de 2008 eu já tinha clareza de que caminho seguir: queria fazer o
doutorado em educação ambiental. E fui recebida com carinho pela minha
orientadora, Profa. Dra. Haydée Torres de Oliveira, conhecida desde o GEEAM,
parceira em diversas atividades da nossa Rede de Educação Ambiental de São
Carlos, a REA-SC, pessoa importantíssima para a área de educação ambiental em
São Carlos e no Brasil, que aceitou me orientar em mais essa caminhada, agora
rumo a um mundo de referenciais teóricos, paradigmas estabelecidos e em
mudança, métodos e outras descobertas!
25
26
INTRODUÇÃO
Nesta pesquisa procuramos levantar possibilidades para abordar o tema da
biodiversidade em um contexto de áreas urbanas, além de, por meio de um trabalho
interpretativo, conduzido dentro da perspectiva da hermenêutica filosófica, buscar
compreender como a biodiversidade pode ser tema de processos de educação
ambiental crítica. A pesquisa tem origem em um projeto educativo conduzido na
educação escolar, descrito no capítulo 1. É naquele projeto que minha atuação
como educadora ambiental se consolida e destaco aqui como a minha pesquisa cria
raízes nesta atuação e se desenvolve em direção ao tema da biodiversidade em
educação ambiental.
O projeto São Carlos de Todos Nós, conduzido em parceria pela então
Secretaria Municipal de Educação e Cultura, da Prefeitura Municipal de São Carlos,
abordou,
dentro
da
educação
patrimonial,
a
educação
ambiental,
sendo
desenvolvido junto às escolas municipais de ensino fundamental de São Carlos.
Este projeto permitiu a realização de visitas escolares a diversos lugares do
município, tais como fazendas, parques e museus. Alguns destes lugares fazem
parte do Polo Ecológico de São Carlos – Centro de Difusão em Educação Ambiental.
Uma descrição detalhada do Polo Ecológico pode ser encontrada em Iared (2010),
que desenvolveu uma pesquisa sobre a educação ambiental em suas unidades.
Brevemente, o Polo Ecológico é uma parceria entre a UFSCar, EMBRAPA Pecuária
Sudeste, e Prefeitura Municipal de São Carlos, e visa articular a educação ambiental
nas suas unidades, o Horto e a Horta municipais, o PESC, a Estação de Captação
de Água do Espraiado, a UFSCar e a fazenda da EMBRAPA. Dentre as unidades do
Polo Ecológico, na presente pesquisa trabalhamos com visitas à Horta Municipal, o
Horto Municipal “Dr. Navarro de Andrade”, a Estação de Captação de Água do
Espraiado e o Parque Ecológico de São Carlos (PESC). Duas imagens do Polo
Ecológico de São Carlos, elaboradas pela Prefeitura Municipal de São Carlos, estão
nos Anexos 1 e 2 da tese.
Além de visitas vinculadas ao São Carlos de Todos Nós, o Polo Ecológico
recebe visitas de outros grupos. Dentre estes, turmas de graduação da Universidade
Federal de São Carlos também visitam as unidades, especialmente como parte de
disciplinas de educação ambiental oferecidas na universidade e coordenadas pela
Profa. Dra. Haydée Torres de Oliveira e pelo Prof. Dr. Amadeu Logarezzi.
27
Foi ao longo do processo de guiar e acompanhar diversas visitas que a
biodiversidade ganhou para mim contornos de um tema relevante para a educação
ambiental crítica que esposávamos: a importância da preservação da vida em todas
as suas formas, as relações entre desenvolvimento e degradação, as questões de
acesso e equidade, os animais em cativeiro, as espécies ameaçadas de extinção, as
relações entre biodiversidade e alimentação, as possibilidades de, aqui mesmo, nos
arredores da cidade e ainda dentro da área urbana, se encantar e se mobilizar para
agir em prol da biodiversidade.
O tema da biodiversidade é parte importante das atividades de educação
ambiental nos diferentes espaços educadores (MATAREZZI, 2005; KUNIEDA, 2010)
do Polo Ecológico: no Horto o foco está na diversidade de plantas, nas discussões
sobre flora nativa e exótica, nas relações plantas e animais, como polinização e
dispersão de sementes, e no uso das plantas, como medicamentos ou na
construção civil, e suas consequências; na Horta, a atenção se volta para a
agricultura orgânica, a sua relação com a saúde humana e do próprio ambiente, a
importância da biodiversidade para manutenção dos cultivos orgânicos, as
diferenças entre grandes monoculturas e agricultura familiar; no Parque Ecológico a
ênfase está na conservação ex-situ da fauna sul-americana, e da própria relação
das pessoas com os animais, seu papel na perda da biodiversidade e extinção de
espécies, e o papel dos zoológicos na preservação de espécies, inclusive
ameaçadas de extinção; na Estação de Captação do SAAE, o destaque é para a
preservação da flora das Áreas de Preservação Permanente nas margens dos
cursos d´água, cujo papel é fundamental para proteger a qualidade da água; e
finalmente na EMBRAPA e na UFSCar, duas trilhas, que permitem às pessoas
visitantes observar áreas de cerrado e matas bem preservadas, com fauna e flora
típicas de nossa região.
Pela sua proximidade com a cidade, e a facilidade de acesso, o Polo
Ecológico já é utilizado como um espaço privilegiado para o desenvolvimento de
projetos de educação ambiental e para visitação por comunidade e estudantes de
São Carlos e região. Consideramos oportuno desenvolver o tema da biodiversidade,
sua importância e estratégias de conservação, em espaços tão próximos e
acessíveis, além das discussões (não menos relevantes) sobre a conservação da
biodiversidade em outras regiões. Essa relação com o espaço local, e a
possibilidade de agir sobre ele, é outro aspecto caro à educação ambiental crítica.
28
Para Greenwood (2013), a educação com foco no lugar (place-conscious education)
propicia uma ênfase local para a pesquisa e a experiência socioecológica, além de
um contexto específico no qual questões mais abrangentes podem ser abordadas.
Assim, apresentamos até aqui o delineamento dos interesses da pesquisa: se
a biodiversidade é um tema relevante para a educação ambiental, o próprio termo
passa a ter importância no contexto da pesquisa; e a pesquisa tem um foco local,
específico, nesta área delimitada pelas unidades do Polo Ecológico de São Carlos,
mas quer, ao mesmo tempo, tratar da relação de biodiversidade e educação
ambiental em outros locais e contextos.
A oportunidade para ampliação da pesquisa configurou-se a partir do ano de
2010, quando nosso grupo (o Laboratório de Educação Ambiental/ UFSCar) foi
convidado a integrar a proposta que foi concretizada no projeto de pesquisa
"Predadores de Topo de Cadeia Alimentar" (Edital MCT/CNPq/MEC/CAPES/FNDCT
- Ação Transversal/FAPs Nº 47/2010 - Sistema Nacional de Pesquisa em
Biodiversidade - SISBIOTA BRASIL). Este projeto, coordenado pelo Prof. Dr. Pedro
Manoel Galetti Júnior (Departamento de Genética e Evolução/UFSCar), congrega 14
projetos de pesquisa, com foco nos efeitos que o desaparecimento destes
predadores de topo de cadeia causa no ambiente. O Laboratório de Educação
Ambiental – LEA/UFSCar, vinculado ao Departamento de Ciências Ambientais e
coordenado pela Profa. Dra. Haydée Torres de Oliveira, é responsável pela pesquisa
em educação ambiental neste projeto, e minha participação foi a realização de
pesquisa sobre concepções de especialistas (pesquisadoras/es, técnicas/os e
educadoras/es da Rede SISBIOTA e de espaços educadores da área de
abrangência da mesma) sobre biodiversidade, educação ambiental e conceitos
afins, considerando sua polissemia e sua implicação para a educação ambiental
voltada à conservação da biodiversidade.
Objetivo geral da pesquisa
Nesta pesquisa buscamos levantar formas de abordar o tema da
biodiversidade em um contexto local, de áreas urbanas e por meio de um trabalho
interpretativo, compreender os sentidos atribuídos à biodiversidade, os conceitos,
objetivos de aprendizagem e possibilidades educativas do tema biodiversidade sob a
perspectiva da educação ambiental crítica.
29
Objetivos específicos
A presente pesquisa pretende:
a) identificar diferentes abordagens do tema biodiversidade para a educação
ambiental crítica em áreas urbanas e proximidades, tais como as unidades do Polo
Ecológico de São Carlos;
b) compreender, por meio de um procedimento interpretativo, de interação da
pesquisadora com os textos produzidos pelas pessoas que participaram da
pesquisa, os sentidos atribuídos à biodiversidade por diferentes grupos ligados à
conservação da biodiversidade e educação ambiental, tais como estudantes e
especialistas, pesquisadoras/es, técnicas/os e educadoras/es;
c) levantar sugestões de conceitos e ideias a serem utilizados na educação
ambiental com o tema biodiversidade;
d) a contextualização da biodiversidade na educação ambiental em uma perspectiva
crítica da mesma.
30
CAPÍTULO 1
PARA SITUAR A PESQUISA: CAMINHOS PERCORRIDOS, O REFERERENCIAL
TEÓRICO-METODOLÓGICO E NOTAS SOBRE A PESQUISA EM EDUCAÇÃO
AMBIENTAL
Uma vez que a presente pesquisa tem origem no projeto São Carlos de
Todos Nós, desenvolvido junto à rede municipal de ensino, cabe discorrer
brevemente sobre a educação ambiental no contexto escolar, e apresentar o projeto,
antes de apresentar a pesquisa.
1.1 Caminhos que levaram ao recorte da pesquisa
A presença da educação ambiental nas escolas brasileiras pode ser
considerada um fato consolidado, visto que, em 2004, 94% das escolas declararam
fazer educação ambiental (VEIGA et al, 2005). Este dado foi obtido a partir de
questionários do Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira – INEP, realizados entre 2001 e 2004. A educação
ambiental aparece neste levantamento como estando distribuída em três
modalidades: projetos, disciplinas especiais, e inserção da temática ambiental nas
disciplinas, sendo esta a forma mais prevalente, seguida por projetos e, bem menos
representativa, a disciplina específica, sendo que a modalidade de projetos
apresentou crescimento significativo entre 2001 e 2004 (VEIGA, 2005, p.15).
A presença inconteste da educação ambiental nas escolas brasileiras atende
a uma exigência legal, uma vez que o direito de todas as pessoas a ela está
garantido na Política Nacional de Educação Ambiental, Lei no. 9.795, de 27/04/1999,
regulamentada pelo Decreto no. 4.281, de 25/06/2002 (BRASIL, 1999, 2002). Esta
presença registrada em números não é, porém, garantia de que a educação
ambiental praticada nas escolas está de acordo com os princípios da Lei (LIPAI et
al., 2007, p.31). Mesmo em relação à forma como a educação ambiental deve ser
oferecida, se como disciplina específica ou não, ainda foi objeto de debate
(OLIVEIRA, 2007). Na recente publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação Ambiental, pelo Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2012), a
redação do Art. 8º determina que a educação ambiental deva ser uma prática
31
educativa integrada e interdisciplinar: “não devendo, como regra, ser implantada
como disciplina ou componente curricular específico”, mas a mantém como
componente essencial, e determina que as escolas encontrem formas de incorporála.
Na maioria das escolas que fazem educação ambiental, será que há uma
articulação entre os espaços formais e não-formais da educação, uma aproximação
da escola com a comunidade em que ela está inserida, um planejamento que integre
atividades curriculares e extracurriculares, como propõe Loureiro (2004, p.45)? Que
tipo de educação ambiental está sendo realizada nessas escolas? Por exemplo, em
relação a uma temática favorita para o desenvolvimento de projetos de educação
ambiental nas escolas, o lixo, a mesma pesquisa mostrou que 41,3% das escolas
que oferecem educação ambiental queimam seu lixo, prática considerada
ambientalmente incorreta.
Além desta, algumas aparentes incoerências também são mencionadas por
Loureiro e Cossío (2007, p.60), quando notam que a maioria das escolas declara
que os objetivos centrais da educação ambiental são “conscientizar para a
cidadania” e “sensibilizar para o convívio com a natureza”, o que, na opinião dos
autores, remete a um caminho unidirecional do/a professor/a para a/o estudante ou
comunidade, o que desconsidera os processos dialógicos que deveriam pautar as
relações educador-educando e os problemas envolvidos na realidade de cada grupo
social. A percepção desta realidade é que deveria definir os temas prioritários dos
projetos de educação ambiental na escola (SEGURA, 2007, p.98).
Como podemos avaliar esse grande alcance da educação ambiental em
nossas escolas? Por que a opção pela educação ambiental? Segundo Carvalho
(2006, p.21):
é interessante observar atualmente, nos diferentes setores sociais,
uma forte tendência em reconhecer o processo educativo como uma
possibilidade de provocar mudanças e alterar o atual quadro de
degradação do ambiente com o qual nos deparamos.
O mesmo autor afirma que não importa qual modelo seja “adotado para
explicar o atual estado de agressão à natureza, o processo educativo é sempre
apresentado como uma possibilidade de alteração desse quadro” (CARVALHO,
2006, p.21). Medina (1997, p.263) confirma essa afirmação ao dizer que:
32
o aprofundamento de processos educativos ambientais apresenta-se
como uma condição sine qua non para construir uma nova
racionalidade ambiental que possibilite modalidades de relações
entre a sociedade e a natureza... em um novo modelo ético, centrado
no respeito e no direito à vida em todos os aspectos.
A educação ambiental apresenta-se de formas muito variadas, e diversas
visões de mundo, de ser humano, de sociedade e de educação estão reunidas sob
esse nome. Layrargues (2002, p.193) compara a educação ambiental considerada
Convencional,
praticada
principalmente
nas
escolas,
com
a
denominada
Crítica/Emancipatória/Popular, a qual geralmente trabalha com comunidade e
trabalhadoras/es; enquanto a primeira traz uma abordagem global dos problemas
ecológicos, e aponta soluções de ordem moral e técnica, ao nível dos indivíduos, a
segunda visa uma abordagem local dos problemas ecológicos, e busca soluções de
ordem política e de cunho coletivo.
Considerando que em educação ambiental existem múltiplas orientações
(CARVALHO 2004), torna-se importante explicitar a linha proposta e buscar
aproximar a intenção educativa das ações sugeridas. A análise das práticas de
educação ambiental correntes mostra que essa aproximação muitas vezes é tênue.
Carvalho (2006, p.23) avalia que “alguns educadores parecem acreditar que apenas
nomear a educação ambiental como ação política (grifo do autor) garante às suas
práticas, a priori, força de transformação social”. O autor prossegue:
o fato de se reconhecer um processo como político, entretanto, não
garante per se que as intenções se concretizem. Antes de tudo, será
necessário reconhecer o significado profundo dessa constatação e
imprimir aos programas de educação ambiental características
pedagógicas que façam jus a essa perspectiva.
O autor propõe que é por meio da “articulação dialética entre teoria e prática,
constituindo a prática intencionalizada – a práxis, segundo os filósofos”, que a
educação pode cumprir sua perspectiva transformadora (CARVALHO, 2006, p.26).
Uma observação da descrição de projetos e atividades de educação
ambiental desenvolvidas nas escolas, ainda que breve, mostra que, com freqüência,
saídas da escola para observar o bairro, ou visitas a parques, viveiros de mudas ou
bosques são citadas como sendo a atividade em si, ou parte importante do
desenvolvimento do projeto (FRACALANZA, 2004). Uma questão que surge nesse
33
contexto da educação ambiental na escola é em que grau essas visitas estariam
articuladas com os conteúdos escolares, uma preocupação que esteve presente
durante nossa atuação junto ao São Carlos de Todos Nós, apresentado a seguir.
1.2 O projeto “São Carlos de Todos Nós”
A utilização do ecossistema urbano como apoio no desenvolvimento de
atividades e projetos de educação ambiental esteve no centro do projeto “São Carlos
de Todos Nós”, desenvolvido desde 2006 até o presente (dezembro de 2012), pela
Secretaria Municipal de Educação e Cultura (atualmente Secretaria Municipal de
Educação, desde 2009, com a criação da Coordenadoria de Cultura) e Fundação
Pró-Memória, nas oito escolas municipais de ensino básico do município de São
Carlos – SP.
O projeto teve três vertentes: as visitas escolares, a formação de
professoras/es e a elaboração de material didático de apoio. Esse tripé objetiva
consolidar a visita escolar como instrumento de aprendizagem. Por meio deste
projeto, todas/os as/os estudantes do ensino fundamental da rede municipal são
levados a realizar uma a duas visitas escolares durante o ano letivo a diferentes
espaços educadores. Considerando que a realização de visitas a áreas naturais,
parques, viveiros e córregos já é muito utilizada como uma atividade de educação
ambiental (MENDONÇA; NEIMAN, 2003), uma de nossas metas ao promover o
projeto foi a de que as visitas pudessem realmente frutificar e gerar projetos de
educação ambiental nas escolas e comunidade de entorno.
Quando o projeto foi criado, as escolas municipais de ensino básico (EMEBs)
do município de São Carlos já trabalhavam com visitas escolares a diferentes locais
da cidade. Geralmente estes locais eram escolhidos pelas/os próprias/os
professoras/es, em função dos estudos sendo desenvolvidos em sala de aula.
Embora esta abordagem fosse acertada, ela também gerava uma situação em que
apenas uma parcela das/os estudantes da rede tinha acesso a essas visitas. Além
disso, o corpo docente notava a falta de material didático para fundamentar seus
estudos do município.
Sendo assim, o projeto foi elaborado para oportunizar a todos os mais de sete
mil estudantes pertencentes às EMEBs ao menos uma visita externa, anualmente.
Visou também montar um material de apoio às/aos professoras/es com informações
34
sobre o município de São Carlos, e sugestões de atividades que pudessem ajudar a
fomentar noções de pertencimento, além da possibilidade de participar de ações
transformadoras de seu meio.
A estratégia central do projeto prevê que, no processo de conhecer melhor
sua cidade e seu município, desde o entorno da escola até uma fazenda histórica na
área rural, de uma fábrica antiga até a bacia hidrográfica de um córrego que corta a
região central da cidade, estudantes e professoras/es consigam ir apreendendo e
criando vínculos com os espaços que habitam e possam tornar-se participantes dos
processos de transformação e melhoria destes.
Outro tema central do projeto é a concepção da cidade como agente
educativo. Esta ideia de que a cidade pode ser um instrumento de apoio ao
processo educativo, de que ela própria, por meio das políticas públicas
implementadas, de projetos que promovem a acessibilidade, difundem o acesso à
informação, democratizam a oferta de eventos culturais e a possibilidade de conviver
em praças e locais agradáveis, também está no centro do conceito de cidade
educadora, um movimento que nasceu em Barcelona em 1989 (BELLOT, 2008).
Atualmente a Associação Internacional das Cidades Educadoras – AICE congrega
formalmente mais de 130 cidades espalhadas no mundo todo, e a cidade de São
Carlos é filiada desde o ano de 2005. A oportunidade de acesso à educação, lazer e
crescimento pessoal, oferecida pela cidade a toda a população, com a preocupação
com aspectos de justiça social e democracia, é um dos pilares das cidades
educadoras, e está em sua carta de princípios (POZO, 2008).
Os princípios do diálogo e da valorização de saberes foram importantes
balizadores na criação do projeto São Carlos de Todos Nós, elaborado por uma
equipe formada por integrantes da então Secretaria Municipal de Educação e
Cultura, e da Fundação Pró-Memória. A escolha dos locais a serem visitados foi feita
em conjunto com as/os diretoras/es das escolas envolvidas, de forma que o grupo
pôde dialogar sobre quais os conteúdos eram abordados em cada nível de ensino, e
que visitas poderiam melhor subsidiar o ensino da sala de aula.
A valorização dos saberes dos familiares fez-se presente especialmente nas
questões ligadas às hortas e à história local (IARED et al., 2009). Uma das maiores
conquistas do projeto São Carlos de Todos Nós, em nossa visão (compartilhada por
outras integrantes da equipe), foi permitir a todas as crianças, independentemente
da escola que frequentam ou do bairro em que residem, o acesso às mesmas
35
visitas. Embora isso tenha restringido a possibilidade de cada escola ou professor/a
individual escolher sua própria visita, em função da logística de organização das
visitas, sempre consideramos esta a questão sob a ótica dos direitos das/os
estudantes.
A equipe responsável pelo projeto também sempre teve o cuidado de sugerir
atividades e buscar materiais que pudessem apoiar o trabalho das pessoas
participantes, sem, contudo, dirigir esses trabalhos, que ficaram a cargo de cada
participante. Ao oferecer os conteúdos dessa forma, acreditávamos respeitar o
conselho do educador Paulo Freire, de que: “Enquanto objetos de conhecimento os
conteúdos se devem entregar à curiosidade cognoscitiva de professores e alunos.”
(FREIRE, 1992, p.112).
A formação de professoras/es
No primeiro ano de realização do projeto, em 2006, a formação de
professoras/es constituiu-se de oficinas realizadas quinzenalmente para as/os
professoras/es de 3ª e 4ª séries, etapa em que é estudado o município, a cidade e a
inserção das crianças nestes. A formação de professoras/es baseou-se em
conhecer o material usado nas aulas e melhorá-lo com informações sobre a História
da formação do município, das populações que aqui habitaram e ajudaram a
construí-lo, além de metodologias de trabalho em Educação Patrimonial. É
importante ressaltar aqui que o termo Patrimônio abrange todas as suas
manifestações, de forma material e imaterial, como o patrimônio artístico, histórico,
cultural e ambiental (ÓSIO; MASSARÃO; MARTINS, 2012).
Em 2007, o processo de formação foi realizado durante o planejamento
anual, no princípio do ano, e abrangeu o conjunto de docentes do ensino
fundamental, de 1º ano a 8ª série (atualmente 9º ano; já está em vigor desde 2006 o
ensino fundamental de nove anos no município de São Carlos). A formação versou,
para cada série de ensino, sobre temas relacionados à série e à visita selecionada.
Sendo assim, as/os professoras/es participaram de aulas sobre plantas medicinais,
espécies animais e vegetais do cerrado, uso racional da água, educação em
museus, incentivo à leitura, e bacias hidrográficas. Foram elaboradas cartilhas de
orientação para as/os professoras/es, sobre agricultura orgânica e sobre os animais
36
observados durante a visita ao zoológico da cidade2. Todo esse material, além de
trazer informações, traz também sugestões de atividades a serem desenvolvidas
com os estudantes, inclusive a criação de hortas nas escolas.
A diversidade dos locais visitados
A diversidade dos locais visitados mostra a abrangência do projeto. Em 2007,
ano em que fizemos uma pesquisa sobre o projeto (THIEMANN et. al., 2009a; DI
TULLIO, A. et al., 2009), as visitas realizadas foram as seguintes: Fazenda da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) Pecuária Sudeste, Horta
Municipal, Biblioteca Comunitária da Universidade Federal de São Carlos –
BCo/UFSCar, Horto Florestal Municipal “Dr. Navarro de Andrade”, Parque Ecológico
de São Carlos – PESC (Parque Ecológico Dr. Antônio Teixeira Vianna), Fazenda
Pinhal, Estação de Tratamento de Água do Serviço Autônomo de Água e Esgoto
(ETA-SAAE); Fazenda Santa Maria, Museu Histórico de São Carlos, Micro Bacia do
Córrego do Gregório (roteiro realizado pelo Centro de Divulgação Científica e
Cultural da Universidade de São Paulo - CDCC/USP), Museu de ciências
(CDCC/USP), Centro de Cultura Afro-Brasileira Odette dos Santos, Fábrica da
Electrolux, Viveiro CAMARÁ - viveiro de produção de mudas de árvores em Ibaté,
sede da ONG RAMUDÁ (produção de mudas, horticultura orgânica), Museu Asas de
um Sonho (TAM), e a UFSCar: Programa Universidade Aberta e Trilha da Natureza.
Como já mencionado, alguns dos locais visitados fazem parte do Projeto Polo
Ecológico – Centro de Difusão em Educação Ambiental, projeto da UFSCar, em
parceria com a EMBRAPA Pecuária Sudeste e Prefeitura Municipal de São Carlos,
que pretende articular as ações e projetos de educação ambiental abrangendo o
Horto e a Horta municipais, PESC, a Estação de Captação de Água do Espraiado do
SAAE, a UFSCar e a fazenda da EMBRAPA. Estas unidades do Polo Ecológico,
com exceção da fazenda da EMBRAPA, estão situadas dentro do perímetro urbano
do município de São Carlos. Porém, devido a suas características que se
“Guia de animais do Parque: a cidade como espaço educador – visita ao Parque Ecológico de São Carlos” e
Horticultura orgânica: a cidade como espaço educador – visita à horta municipal”, ambas publicadas pela SMEC
em 2008, em parceria com a Fundação Pró-Memória, e a cartilha das hortas com a Secretaria Municipal de
Agricultura e Abastecimento.”
2
37
assemelham a áreas rurais e de parque, são frequentemente referidas como sendo
externas à área urbana, como será visto ao longo do texto da tese.
O projeto “São Carlos de Todos Nós” foi elaborado em acordo com as linhas
de ação propostas no Programa Municipal de Educação Ambiental de São Carlos –
ProMEA-SC (regulamentado pela Resolução COMDEMA-SC no 1 de 25 de
novembro de 2008), mais especificamente a linha 7, onde se lê: “Promover a
inclusão da dimensão sócio-cultural em projetos de EA, por meio da consolidação de
roteiros histórico-culturais do município, que resgatem os registros de ocupação da
região, como fazendas” (REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DE SÃO CARLOS,
2007). Durante a gestão governamental no período de 2009 a 2012 o projeto foi
transformado em Programa da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura
Municipal de São Carlos.
O desenvolvimento de material de apoio
O material didático elaborado sobre a história do município propõe a
realização de algumas atividades que têm como finalidade levar as/os estudantes a
refletir sobre como a implantação de uma cidade transforma o meio, retifica cursos
d'água e degrada matas de beira de córregos, como os diferentes grupos étnicos se
situam na sociedade que se forma, como o meio rural é modificado pela implantação
de lavouras e das monoculturas extensivas, enfim, uma série de temas que
procuram ajudar a despertar o sentido de História, a participação do ser humano na
modificação do meio e as interações entre pessoas e o meio, natural e construído.
Assim, ao se tentar entender, por exemplo, o problema de enchentes no
centro da cidade, as/os estudantes serão capazes de correlacionar a situação atual
com as intervenções feitas no passado, as motivações que levaram a elas e buscar
soluções coerentes com o problema, e ter um olhar mais crítico sobre novas
propostas de intervenção que poderiam levar a problemas similares.
Até o final do ano de 2012, haviam sido elaboradas duas cartilhas (já citadas,
ver nota de rodapé 2) e o livro “São Carlos de Todos Nós”, publicado em dezembro
de 2012 (ÓSIO; MASSARÃO; MARTINS, 2012).
38
A avaliação do projeto
A avaliação do projeto “São Carlos de Todos Nós” conduzida ao final de 2007
serviu como um ponto de partida para a presente pesquisa. Escolhemos usar um
questionário, porque havia a intenção de envolver todas/os as/os professoras/es que
haviam participado do projeto naquele ano em sua avaliação. O questionário,
segundo Gil (1999), possibilitava esse alcance maior, inclusive quando, como nesse
caso, queríamos abranger em média trezentas pessoas, distribuídas em oito escolas
localizadas em áreas distintas da cidade, trabalhando em horários diversos. O
questionário dá às pessoas mais flexibilidade para responder, em seu próprio tempo,
as questões formuladas. Os questionários foram entregues nas escolas, e foram
respondidos ao todo 193 questionários.
Esses questionários foram objeto de uma avaliação qualitativa, feita a partir
da leitura das respostas registradas pelos/as professores/as (THIEMANN et al.,
2009a). As respostas foram lidas, em busca da descrição de atividades que
pudessem ser consideradas intervenções no meio, ou na própria escola ou na
comunidade de entorno, ou que ao menos demonstrassem que a visita gerou
aprofundamento de discussões sobre a temática ambiental em sala de aula.
A partir dessa avaliação preliminar pudemos notar que a participação dos
estudantes e professoras/es nas visitas escolares do Projeto “São Carlos de Todos
Nós” parecia ter contribuído para a realização de atividades e projetos de educação
ambiental nas escolas da rede municipal de ensino de São Carlos. Esta contribuição
ocorreu de várias formas. Em alguns casos, foi a doação de mudas de árvores ou
hortaliças que serviu como semente para o início de um plantio nas escolas. Em
outros, o próprio processo de pesquisa sobre os locais visitados, ou dos temas a
eles associados, gerou na escola reflexões interessantes sobre o papel de cada
pessoa na cidade e sua contribuição para a construção desta.
A partir da participação na criação e condução deste projeto, como já
mencionado na introdução, o tema da biodiversidade adquiriu relevância para a
atuação da pesquisadora e levou ao desenvolvimento desta pesquisa em educação
ambiental. A partir deste ponto, discutimos as escolhas do referencial para a
condução desta.
39
1.3 Notas sobre o referencial e a pesquisa em educação ambiental
Esta é uma pesquisa qualitativa, que, na visão de Denzin e Lincoln (2006,
p.17), pode ser definida da seguinte forma:
A pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o
observador no mundo. Consiste em um conjunto de práticas
materiais e interpretativas que dão visibilidade ao mundo. Essas
práticas transformam o mundo em uma série de representações,
incluindo as notas de campo, as entrevistas, as conversas, as
fotografias, as gravações e os lembretes. Nesse nível, a pesquisa
qualitativa envolve uma abordagem naturalista, interpretativa, para o
mundo, o que significa que seus pesquisadores estudam as coisas
em seus cenários naturais, tentando entender, ou interpretar, os
fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles
conferem.
A pesquisa qualitativa pode valer-se de mais de uma prática interpretativa, e
do uso e coleta de diversos materiais empíricos, como questionários, entrevistas,
textos e estudos de caso. Denzin e Lincoln (2006) falam na atividade da pesquisa
qualitativa como uma bricolagem, em que diferentes instrumentos e métodos são
utilizados, em função das perguntas da pesquisa e dos contextos em que esta se
realiza. Nem sempre as práticas são definidas antecipadamente, e todo o processo
da pesquisa exige uma postura auto-reflexiva por parte das/os pesquisadoras/es.
Segundo Denzin e Lincoln (2006, p.34) a pesquisa qualitativa é estruturada
por quatro paradigmas interpretativos principais: positivista e pós-positivista,
construtivista-interpretativo,
crítico
(marxista,
emancipatório)
e
feminista-pós-
estrutural. Os paradigmas são definidos como esquemas interpretativos, como uma
rede de premissas: axiológicas (éticas); epistemológicas (que tratam da relação
entre investigadora e objeto do conhecimento); ontológicas (da natureza do ser); e
metodológicas (como conhecemos o mundo). As suposições de cada um desses
paradigmas podem ser encontradas na literatura, como por exemplo, em Denzin e
Lincoln (2006) ou em Cohen, Manion e Morrison (2010). De nosso interesse aqui
são os paradigmas construtivista-interpretativo e o crítico, este sob a ótica do que
Kincheloe e McLaren descrevem como uma “teoria crítica reconceituada” (2006,
p.283), influenciada pelos discursos da pós-modernidade, teoria crítica esta que
imputa uma influência ainda maior sobre a visão que os indivíduos têm de si e do
mundo às forças sociais e históricas e com isso traz para o centro a interpretação,
40
por meio da hermenêutica crítica. Os paradigmas construtivista-interpretativo e
crítico (reconceituado) operam dentro de: “ontologias relativistas (múltiplas
realidades construídas), de epistemologias interpretativas (o conhecedor e o
conhecido interagem e influenciam-se mutuamente) e de métodos interpretativos,
naturalistas” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p.34). No construtivismo o mundo social é
reconstruído pela interpretação, por meio de uma metodologia hermenêutica, e a
pesquisa busca compreender as perspectivas e significados das/os participantes; os
valores da/o intérprete influenciam a interpretação, enquanto que no paradigma
crítico, as bases históricas e estruturais dos fenômenos sociais são investigadas, e a
pesquisa visa catalisar mudanças de ordem social e política (ROBOTTOM; HART,
1993).
Considerando-se a multiplicidade de formas de se conduzir a pesquisa
qualitativa, Lincoln e Guba (2006) consideram que a comensurabilidade entre
paradigmas é possível desde que sejam respeitadas as similaridades axiomáticas
entre eles. Por exemplo, “elementos da teoria crítica interpretativista/pós-moderna,
da
investigação
construtivista
e
participativa
ajustam-se
confortavelmente”
(LINCOLN; GUBA, 2006, p. 178), como a hermenêutica, em uma vertente crítica,
que é adotada dentro do paradigma crítico defendido por Kincheloe e McLaren
(2006). Já os modelos positivista e interpretativista se excluem mutuamente, uma
vez que o paradigma positivista opera partindo de uma ontologia realista (e não
relativista, como o construtivista-interpretativo) e uma epistemologia objetiva, e não
subjetivista, como no modelo interpretativo. Além disso, no construtivismo são
usados procedimentos naturalistas de pesquisa, enquanto que no positivismo/póspositivismo são privilegiadas “metodologias qualitativas experimentais, quaseexperimentais” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p.45), tais como aplicação de testes
antes e depois de uma intervenção educativa para avaliar se os objetivos foram
cumpridos (ROBOTTOM; HART, 1993, p.21).
Embora seja possível definir em linhas gerais cada paradigma, Lincoln e
Guba (2006) consideram que, desde meados da década de 90, as linhas de divisão
entre diferentes paradigmas estão começando a perder a nitidez, e que é possível
encontrar áreas de confluência entre eles, da mesma forma que ainda permanecem
as diferenças. Denzin e Lincoln (2006) traçam uma história da pesquisa qualitativa (a
partir dos Estados Unidos - EUA) e identificam sete momentos nesta história,
começando com um chamado período tradicional, do início do século XX até a
41
Segunda Guerra Mundial, até chegar ao presente, que é descrito como pósexperimental (o sexto momento) e o futuro, ainda por acontecer, que seria o sétimo
momento. Nesta concepção da história, para estes autores, o período pós-moderno
seria o quinto momento, situado na década de 90. Neste período abandona-se a
ideia de pesquisadoras/es como observadoras/es distantes, privilegiando-se a ação
e participação, e ganham força as teorias locais, em contextos específicos,
particulares, em oposição a grandes narrativas. Porém, cada um dos momentos
anteriores continua de alguma forma presente hoje, o que faz com que o campo da
pesquisa qualitativa seja multifacetado, e aberto a debates (DENZIN; LINCOLN,
2006).
Esta postura que aceita a convivência de formas muito distintas de produção
de conhecimento válido também é identificada por Sauvé como fruto da pósmodernidade.
Para
esta
autora,
a
epistemologia
da
pós-modernidade
transformadora valoriza o diálogo entre formas de conhecimento diversas, tal como
o experimental e o conhecimento tradicional, e prefere uma abordagem processual,
que se baseia em uma dialética entre teoria e prática, e contextualizada, ao invés de
fechar-se em escolhas feitas “a priori” (SAUVÉ, 1999b, p. 12, grifo da autora).
Para alguns autores, como Gallo (2008, p.37), a pós-modernidade é
entendida como um período temporal. Para este autor, expressões como pósmoderno e pós-modernidade, originárias do meio artístico/cultural, “designam,
simplesmente, uma temporalidade: viveríamos hoje um tempo posterior à
modernidade. Este caráter temporal do pós-modernismo também é discutido por
Kincheloe e McLaren (2006, p. 294) embora os mesmos admitam que “os estudiosos
não chegaram a um consenso capaz de definir se esse memorável rompimento com
a era “moderna” chega a constituir um período discreto”. Kincheloe e McLaren
situam o período entre os anos 1980 e 2000, e o descrevem como “uma era
contemporânea marcada pela deslegitimização das grandes narrativas das
civilizações ocidentais”.
Sauvé (1999b) ao discutir sobre a educação ambiental no final da década de
90, situada entre a modernidade e a pós-modernidade, descreve esta como uma
resposta à modernidade e suas crenças no progresso e tecnologia e em teorias
unificadoras e valores universais. Ainda segundo a autora, embora os ideais da
modernidade e as esperanças neles depositadas continuem válidas, os problemas
ocorridos em sua concretização – a autora cita regimes totalitários e o capitalismo
42
selvagem – levaram à diferentes respostas da sociedade, dentre elas o niilismo,
fatalista, que não vê sentido em projetar o futuro ou acreditar em valores universais,
e o chamado transformismo, “que vira a página de modo a contemplar novas formas
de pensar, ser, fazer e agir” (SAUVÉ, 1999a, p.11). Esta postura de aceitação de
múltiplas abordagens na pesquisa e no processo educativo e a crença na
possibilidade de mudança, identificadas com essa caracterização do tempo pósmoderno, se fazem presentes ao longo da tese.
Em relação à pesquisa em educação ambiental, no início da década de 90,
Robottom e Hart (1993) publicaram um artigo seminal em que defendiam uma
mudança na direção desta, na época associada fortemente à pesquisa positivista
(novamente falando de um contexto de língua inglesa, especialmente nos EUA), em
direção a pesquisas de orientação sócio-crítica. Este trabalho foi muito importante
para a abertura do campo da pesquisa em educação ambiental, que hoje (seguindo
as tendências da pesquisa em educação, comentada anteriormente) apresenta-se
como um campo em que convivem pesquisas diversas, desde as que usam
referenciais metodológicos da pesquisa positivista, com ênfase em resultados
empíricos, mensuráveis e generalizáveis, até aquelas que seguem uma perspectiva
crítica, participativa e pós-interpretativa (HART, 2013). Para o autor, se “o
conhecimento de questões sociais humanas é socialmente construído e, portanto de
alguma forma relativo às pessoas e o contexto, há bases filosóficas para diversas
abordagens metodológicas” (HART, 2013, p. 507, tradução nossa). Esta mesma
ideia já havia sido defendida por Fien (2002), para quem cada paradigma de
pesquisa pode ser utilizado de forma adequada na pesquisa em educação, cabendo
sua escolha ao tipo de questão que se pretende investigar.
Junto a essa pluralidade de temas e tendências, Dillon e Wals (2008)
encontram simultaneamente uma certa fragilidade na afirmação dos referenciais
metodológicos das pesquisas realizadas no contexto internacional, ao avaliar as
pesquisas publicadas no volume 11, número 5, ano 2005 da revista Environmental
Education Research. Estas mesmas características, do pluralismo e da fragilidade
de referenciais também é observada em pesquisas realizadas no Brasil, segundo os
trabalhos apresentados a seguir.
No Brasil, o campo da educação ambiental consolida-se a partir de sua
prática, como mostra Carvalho (2001) em sua tese sobre a formação do sujeito
ecológico. Já o campo da pesquisa em educação ambiental encontra-se
43
estreitamente vinculado à produção da pós-graduação no país, já que a maioria das
pesquisas é realizada no âmbito das universidades e em seus programas de pósgraduação, como apontam Carvalho, Tomazello e Oliveira (2009). Em relação às
bases teórico-metodológicas tanto da prática quanto da pesquisa em educação
ambiental, Carvalho (2001) e Freitas e Oliveira (2006) indicam uma lacuna na
estruturação de aspectos metodológicos de ambas. Na pesquisa, esta lacuna é
encontrada por Freitas e Oliveira (2006) ao traçar um panorama das tendências
metodológicas da pesquisa em educação ambiental apresentada no I EPEA - I
Encontro de Pesquisa em Educação Ambiental, o primeiro encontro nacional
organizado para refletir sobre a produção da pesquisa em educação ambiental no
Brasil, realizado em julho/ 2001 em Rio Claro, SP. As autoras identificaram uma
incompreensão em relação à constituição do campo da pesquisa na área, que elas
cogitam
que
pode
estar
relacionado
à
formação
predominante
das/os
pesquisadoras/es em Ciências Naturais, que ao deslocar-se para a Educação
revelam “as fragilidades na abordagem de temas situados nas fronteiras entre essas
grandes áreas” (FREITAS; OLIVEIRA, 2006, p.185). Em relação à diversidade de
abordagens, a análise das concepções de educação ambiental apresentadas no I
EPEA apontou para uma predominância de tendências críticas, mas foram
encontrados também trabalhos que referenciam outras abordagens, como Estudos
Culturais e perspectivas pós-modernas (CAVALARI; SANTANA; CARVALHO, 2006).
A análise da pesquisa em educação ambiental no Brasil, tendo como foco os
trabalhos apresentados em encontros de âmbito nacional, foi apresentada
subsequentemente por Kawasaki et al. (2009), Catalão (2009) e Avanzi, Carvalho e
Ferraro Júnior (2009), dentre outras/os. Ao avaliar os trabalhos apresentados em
quatro EPEAs (do I EPEA, em 2001, ao IV EPEA, em 2007), Kawasaki et al. (2009)
encontraram nos trabalhos teóricos uma ênfase nos fundamentos teóricometodológicos da educação ambiental, o que na visão do grupo de autoras/es
aponta na direção de um delineamento mais nítido daquilo que se constitui em
pesquisa no campo. Catalão (2009, p.143), ao investigar o cenário da pesquisa em
educação ambiental no contexto de cinco reuniões do Grupo de Trabalho em
Educação Ambiental GT 22 da ANPEd (Associação Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Educação), no período de 2003 a 2007, encontrou uma identidade
crítica na educação ambiental brasileira, que a autora atribuiu ao diálogo “entre a
complexidade inerente ao próprio processo educativo e a complexidade do campo
44
socioambiental”. Finalmente, Avanzi, Carvalho e Ferraro Júnior (2009) apresentam
uma análise de trabalhos apresentados no Grupo de Trabalho Ambiente, Sociedade
e Educação do Encontro da ANPPAS – Associação Nacional de Pesquisa e PósGraduação em Ambiente e Sociedade, nos anos de 2006 e 2008. Também neste
contexto predominou o referencial teórico-metodológico crítico/emancipatório (como
identificado na ANPEd por Catalão, 2009), embora a análise do conjunto de
trabalhos tenha apontado para um campo multifacetado, em que convivem diversas
temáticas e bases teóricas (AVANZI; CARVALHO; FERRARO JÚNIOR, 2009, p. 91),
além de uma preocupação em “tecer articulações entre áreas de conhecimento
como ecologia, política e meio ambiente”.
Frente à diversidade de opções teórico-metodológicas disponíveis para a
condução da pesquisa em educação ambiental, Dillon e Wals (2008) sugerem que
as questões de pesquisa devem guiar a escolha dos referenciais, e apontam para a
importância da explicitação dos caminhos escolhidos e da apresentação da
justificativa para a escolha. Esta é nossa intenção neste Capítulo 2 e no Capitulo 3,
que versa sobre a escolha dos procedimentos metodológicos de coleta e análise dos
dados da pesquisa, tanto a pesquisa naturalista sobre as abordagens do tema da
biodiversidade no Polo Ecológico, como a utilização do método do Delphi de Política
de Turrof (2002), que com suas raízes na dialética busca a construção de consensos
entre participantes no processo.
1.4 A orientação da hermenêutica filosófica
Acreditamos que a conservação da biodiversidade passa tanto pela produção
de conhecimentos científicos quanto pelo embate de ideias em diversas esferas:
ética, jurídica, política e econômica, entre outras.
Questões socioeconômicas e
políticas são muito importantes para a tomada de decisões nessa área, mas o
embasamento em dados científicos permanece extremamente relevante para o
processo decisório e, para Guedin e Franco (2008, p.92), requer uma consciência
hermenêutica, ou seja, “a tradução de informações científicas relevantes para a
linguagem da vida social”.
A hermenêutica é entendida como postura filosófica, de cunho interpretativo,
baseada na linguagem: “a hermenêutica situa-se na existência da linguagem, na
qual e pela qual se processam os significados” (GUEDIN; FRANCO, 2008, p.163).
45
Na perspectiva hermenêutica, considera-se que a realidade é socialmente
construída e pode ter vários sentidos, que são assumidos por meio do processo de
interpretação (ROBOTTOM; HART, 1993, p.9).
Na área da conservação da biodiversidade, em que diferentes visões e
projetos de mundo estão em convivência ou conflito, é por meio do diálogo que
vamos nos comunicar e buscar acordos compartilhados de ação. Este diálogo pode
ser realizado por meio da fala, como em interações educativas, aulas, palestras e
nos discursos proferidos, ou pode ser via recursos visuais ou pela escrita, em
materiais diversos publicados sobre o tema.
Em pesquisa realizada anteriormente (THIEMANN et al., 2009b) com
estudantes de Ciências Biológicas da UFSCar, observamos que as concepções de
biodiversidade variam desde uma descrição de biodiversidade estritamente
biológica, até a que tende para a sociobiodiversidade (DIEGUES, 2005), incluindo
ser humano e cultura; e que seu valor é tido desde como sendo intrínseco até
antropocêntrico (HAGVAR, 1994), em que a biodiversidade é vista principalmente
como fonte de recursos para o ser humano.
A compreensão dessas diferentes concepções de biodiversidade dos sujeitos
pode ser entendida sob um referencial freireano, se consideramos que as diferentes
“leituras de mundo” (FREIRE, 1992, p.106) estarão presentes em como cada sujeito
entende a biodiversidade.
Se o diálogo aparece como tema central, torna-se fundamental que, em cada
situação, sejam colocados em pauta os significados elaborados pelas pessoas que
participam do diálogo. Esta compreensão baseia-se também no referencial da
hermenêutica filosófica de Hans-Georg Gadamer (1900-2002). Mais do que
reproduzir a opinião expressa pelas/os participantes, entendemos que a tarefa de
uma abordagem hermenêutica de pesquisa é “entrar em diálogo com o texto”
(GADAMER, 2012, p.480) e, por meio das perguntas, abrir “possibilidades de
sentido” (GADAMER, 2012, p.489). A compreensão é realizada pela interpretação
das respostas oferecidas na pesquisa. A linguagem “se constitui enquanto abertura
à significação, aonde o jogo da produção de sentidos vai se dar através da
dialogicidade e da interpretação” (CARVALHO; GRUN, 2005, p.179). O sentido aqui
pode ser definido como “uma forma de criação do mundo. Quando se cria, constróise o significado, e é nessa relação significativa que se constitui o mundo como
leitura humana” (GUEDIN; FRANCO, 2008, p.160). Sendo criações, os sentidos não
46
são equivalentes a verdades, “mas sua apropriação exige a produtividade interna do
sujeito” (CARVALHO, 2001, p.26).
A escolha deste referencial hermenêutico atende à nossa necessidade de
explorar alternativas que possam ser acessadas em diferentes contextos de trabalho
com o tema da biodiversidade, sob a perspectiva da educação ambiental crítica.
Segundo Noel Gough (1999, p.414), na “concepção hermenêutica de pesquisa
educativa, o propósito do questionamento não é descartar as dificuldades, riscos e
ambiguidades da vida, mas viver e falar de dentro delas”.
Na hermenêutica filosófica de Gadamer, a compreensão não é uma tarefa
que se cumpre por meio de regras, mas é uma condição própria da pessoa humana,
e a interpretação é realizada de dentro de uma tradição à qual pertencemos, de um
contexto sócio-histórico no qual estamos imersos, sendo por meio de um encontro
dialógico que a compreensão é produzida (SCHWANDT, 2006, p. 199).
O interpretativismo, a hermenêutica fenomenológica e o construtivismo social
são três posturas epistemológicas investigadas por Schwandt (2006), que as
contrapõe à hermenêutica filosófica de Gadamer justamente em relação à alegação,
nessas outras tradições, do não-envolvimento do observador com o fenômeno
observado. Na hermenêutica filosófica não é requerido que o intérprete suspenda
suas pré-concepções historicamente herdadas, mas, ao contrário, que estas
informem a sua interpretação, por meio do que o autor chama de uma fusão de
horizontes entre o texto e o intérprete. Para Gadamer, a “fusão de horizontes que se
deu na compreensão é o genuíno desempenho e produção da linguagem”
(GADAMER, 2012, p. 492). Kincheloe e McLaren, usando o referencial da
hermenêutica crítica, alicerçado na hermenêutica filosófica de Gadamer, lembram
que este, ao afirmar em “Verdade e Método” que toda a interpretação é situada
historicamente, mostrou que “as estruturas sociais da referência influenciam as
questões dos pesquisadores, as quais, por sua vez, influenciam a natureza da
própria interpretação” (KINCHELOE; MCLAREN, 2006, p.290). Se toda a
interpretação é situada, ao mudarem as condições histórico-culturais da intérprete,
também mudará a interpretação do texto, que então não pode ser considerado
portador de uma verdade única, imutável.
Nesta pesquisa, é por meio do diálogo com as respostas das/os participantes
da pesquisa que podemos encontrar caminhos a trilhar na educação ambiental que
busca a compreensão e a conservação da biodiversidade.
47
1.5 Educação ambiental crítica e educação para a biodiversidade
Consideramos muito importante que em qualquer ação ou projeto/programa
de educação ambiental sejam explicitados os princípios em que se baseiam. Porque
a visão de educação ambiental presente vai determinar que tipo de proposta será
apresentada como resposta às necessidades identificadas. Carvalho (2006, p.22)
lembra que, se a educação ambiental for pensada como um meio de “ajustar
comportamentos individuais a padrões socialmente desejáveis”, as propostas serão
muito diferentes daquelas feitas por educadoras/es que entendem a educação como
“um motor de transformações mais radicais na sociedade”.
Esta pesquisa foi desenvolvida dentro do referencial da educação ambiental
crítica. Para Robottom e Hart (1993, p.24) a pesquisa em uma vertente sócio-crítica
deve buscar “desvelar e explicitar os valores e interesses ocultos de indivíduos e
grupos que adotam posições em relação aos temas”. Concordamos com Kincheloe e
McLaren (2006, p.293) para quem o trabalho de uma pesquisa crítica deve ser visto
como “um primeiro passo em direção a formas de ação política que possam reparar
as injustiças encontradas no campo” e que pesquisadoras/es desta vertente “com
frequência declaram seu partidarismo na luta por um mundo melhor”. Em nosso
caso, isto está refletido na busca por tratar do tema da biodiversidade não apenas
dentro da esfera da ciência, mas trazê-lo para o mundo. Na pesquisa crítica, ainda
segundo Kincheloe e McLaren (2006, p.292), são válidas certas suposições, tais
como as de que:
todo o pensamento é fundamentalmente mediado pelas relações de
poder estabelecidas social e historicamente; de que os fatos nunca
podem ser isolados do domínio de valores ou removidos de alguma
forma de inscrição ideológica; de que a relação entre conceito e
objeto e significante e significado nunca é estável ou fixa, sendo
geralmente mediada pelas relações sociais da produção e do
consumo capitalistas; de que a linguagem é central para a formação
da subjetividade (percepção consciente e inconsciente).
Entendemos ainda que esta pesquisa insere-se na vertente crítica da
educação ambiental porque, além de colocar em relevo as próprias relações ser
humano, sociedade e natureza, por meio do diálogo sobre os sentidos atribuídos à
biodiversidade e maneiras de tratar do tema que buscam considerar aspectos
48
políticos envolvidos em sua conservação, a pesquisa tem também como objetivos a
busca de diálogo entre os conhecimentos de dimensão mais estritamente biológica,
como é o conceito de biodiversidade em sua origem, e as múltiplas abordagens a
que o conceito se rende em possibilidades educativas: as inter-relações, disputas,
encantamento estético, valor intrínseco (CARVALHO, 2008).
A educação ambiental crítica alicerça a pesquisa e a nossa atuação em
educação ambiental em coletivos locais - Rede de Educação Ambiental de São
Carlos, Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação Ambiental (GEPEA/UFSCar), e o
Laboratório de Educação Ambiental (LEA/UFSCar) - e está fundamentada em
alguns documentos de base. O principal deles é o Tratado para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global, ou Tratado de Educação Ambiental3 (RIO
DE JANEIRO, 1992) documento fruto do encontro da sociedade civil na Rio 92 (a
Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento CNUMAD). Neste Tratado estão relacionados dezesseis “Princípios da Educação
para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global”, dentre os quais
destacamos as afirmações de que a educação ambiental é um ato político (Princípio
4) e de que deve tratar as questões globais críticas, como a degradação da flora e
fauna, em uma perspectiva sistêmica (Princípio 7). Especialmente em relação à
questão da biodiversidade em seu Princípio 16, que propõe que:
a educação ambiental deve ajudar a desenvolver uma consciência
ética sobre todas as formas de vida com as quais compartilhamos
este planeta, respeitar seus ciclos vitais e impor limites à exploração
dessas formas de vida pelos seres humanos.
Este mesmo enfoque ético, de respeito e valorização da diversidade, é
defendido por Oliveira (2012, p.181), que considera que processos educativos
coerentes com uma vertente crítica da educação ambiental devem assumir um
compromisso com a transformação de condições socioambientais, buscando, entre
outros objetivos, a “valorização da diversidade seja biológica, sociocultural ou de
saberes”.
3
O Tratado foi fruto da Jornada Internacional de Educação Ambiental, evento paralelo à Rio 92 (Conferência
das Nações Unidas e Meio Ambiente, Rio de Janeiro, 1992). A Segunda Jornada do Tratado ocorreu no período
de 2008-2012, culminando em encontros realizados durante a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável (CNUDS).
49
Outro documento de referência para este trabalho é o ProNEA, o Programa
Nacional de Educação Ambiental, com texto pós-consulta pública (BRASIL, 2005); e
o ProMEA-SC4 (REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DE SÃO CARLOS, 2007),
documento inspirado no ProNEA e construído de forma coletiva pela Câmara
Técnica de Educação Ambiental do COMDEMA-SC, o Conselho Municipal de Meio
Ambiente de São Carlos. Os princípios e diretrizes destes documentos guiam nossa
atuação em educação ambiental, e foram importantes elementos balizadores da
pesquisa.
A elaboração destes últimos documentos e, por consequência, os princípios e
diretrizes neles explicitados são um reflexo da educação ambiental brasileira. Esta
se forma vinculada a movimentos sociais e privilegia uma vertente mais crítica,
tendo nascido dentro de movimentos contraculturais da década de 60 e se
consolidado na década de 80, período de mudanças sociais e políticas no Brasil
(CARVALHO, 2002). No país a educação ambiental nasce ligada a movimentos
sociais e de educação popular, tem em Paulo Freire um de seus referenciais e se
faz presente em projetos em comunidades e relacionados a questões sociais
(OLIVEIRA, 2008). Vem de Paulo Freire o trabalho com os temas geradores, que
devem necessariamente ser compreendidos nas relações entre as pessoas e a sua
realidade, seu mundo (FREIRE, 2005), e alicerçam a educação no contexto local e
no grupo que dela participa, como é caro à educação ambiental crítica.
A orientação crítica da educação ambiental brasileira, embora não exclusiva
do país (e reconhecendo ainda que não é a única dentro dele), a diferencia da
educação ambiental em diversos outros países, onde esta aparece mais ligada ao
movimento conservacionista, como é o caso da Austrália e dos EUA (CARVALHO,
2002). Nos Estados Unidos o movimento ambientalista começa vinculado à
preservação de áreas naturais, tendo como algumas de suas primeiras referências,
ao longo de um século: Henry David Thoreau, que publicou “Walden; or, Life in the
Woods” em 1854; John Muir, um dos fundadores do Sierra Club, em 1892; e Aldo
Leopold, autor de uma das obras clássicas do movimento, “A Sand County Almanac:
And Sketches Here and There” (publicado originalmente em 1949). O movimento
preservacionista está fortemente presente nos Estados Unidos até hoje, onde
4
A Lei 14.795 de 28 de Novembro de 2008, que instituiu a Política Municipal de Educação Ambiental de São
Carlos, dita em seu Art. 3º que esta política “se desenvolverá através da implementação do Programa Municipal
de Educação Ambiental” de São Carlos.
50
instituições como o Sierra Club e a National Audubon Society, ambas de escopo
nacional, trabalham para a preservação de espécies e manutenção de áreas
protegidas. A relevância deste movimento pode ser sentida no modo como o modelo
de parques nacionais criado nos EUA foi exportado para outros países, inclusive
para o Brasil (DIEGUES, 1996).
Em sua tese de doutorado, Carvalho (2001) traça o processo de constituição
do/a educador/a ambiental brasileiro, que se forma ao mesmo tempo em que o
próprio campo da educação ambiental vai se criando, a partir de uma confluência
entre as vidas pessoais e os acontecimentos históricos, como as conferências
internacionais que acontecem nas décadas de 70 a 905. É neste processo que o viés
de conservação e preservação da natureza dá lugar a uma perspectiva mais crítica à
mesma, como também identificado por Loureiro (2006), ao traçar a trajetória da
educação ambiental no Brasil a partir da década de 80.
Este movimento também é relatado por Sauvé, que fala sobre como, na
década de 70, a educação ambiental se transforma da educação conservacionista
das décadas de 50 e 60, passando a ver o meio ambiente como um problema, ao se
dar conta da magnitude dos problemas ambientais (SAUVÉ, 1999b). Mesmo assim
permaneceu forte a tendência a uma educação com foco em experiências pessoais
do meio ambiente como natureza. Para a autora, é nas décadas de 80 e 90 que se
consolida a contribuição da teoria crítica (revisitada à luz de um pensamento pósmoderno construtivo, que acredita na possibilidade de transformação e mudança) à
educação ambiental. Segundo Sauvé (1999a, p.46), esta contribuição foi a de
iluminar as inter-relações entre aspectos ambientais, sociais e educacionais, “na
perspectiva de transformações pessoais e sociais em direção a relacionamentos
ambientais ótimos”. A educação ambiental passa a enfatizar o envolvimento
comunitário, as ações locais, o diálogo entre saberes, aspectos sociais e culturais
(SAUVÉ, 1999b, p.14). A complexidade da educação ambiental se beneficia da
“multiplicidade e diversidade de visões, discursos e práticas” (SAUVÉ, 1999b, p.15),
desde que as escolhas pedagógicas sejam adequadas e contextualizadas. Para a
5
A história da educação ambiental no Brasil e no mundo está marcada por uma séria de conferências
internacionais, como a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, Estocolmo, 1972; o I
Seminário Internacional de Educação Ambiental, em Belgrado, 1975; a Conferência Intergovernamental em
Tbilisi, 1977; a Jornada Internacional de Educação Ambiental, Rio de Janeiro, em 1992; e a Conferência Meio
Ambiente e Sociedade: Educação e Consciência Pública para a Sustentabilidade, Thessalonik, 1997. As
principais discussões e resultados desses encontros podem ser encontradas na literatura, como por exemplo, em
Loureiro, 2006 ou Carvalho, I.C.M., 2001, entre vários outros.
51
autora, a educação ambiental não está restrita nem a uma abordagem naturalista,
como no movimento conservacionista, nem pode ter como foco apenas a solução de
problemas ambientais, mas é um componente essencial da educação, e envolve
“nada menos do que a reconstrução de sistemas de relacionamentos entre pessoas,
sociedade e meio ambiente” (SAUVÉ, 1999b, p.11).
Na educação ambiental voltada para a conservação da biodiversidade
encontramos trabalhos com alguns enfoques distintos. Com base em uma
cartografia proposta por Sauvé (2005) para a educação ambiental, podemos
encontrar a educação para a conservação da biodiversidade principalmente dentro
da chamada ”corrente naturalista”, que tem o foco nas experiências na natureza; e
na “corrente conservacionista/recursista”, que prega a conservação para o consumo
humano - plantas medicinais, por exemplo - da natureza vista como recurso
(SAUVÉ, 2005, p.18). Também encontramos trabalhos que focam de maneira mais
holística o tema, envolvendo comunidades na conservação, e buscando lidar com
questões socioeconômicas e socioculturais envolvidas nesta, como o de Bizerril,
Soares e Santos (2011), com a conservação do lobo-guará (Chrysocyon brachyurus)
no Parque Nacional da Serra da Canastra, MG. Outros exemplos recentes sobre a
educação ambiental em áreas protegidas no Brasil são: o trabalho desenvolvido com
os povos do Parque Indígena do Xingu, que envolve a gestão territorial, manejo de
recursos naturais e a análise do conceito de biodiversidade a partir dos referenciais
culturais de professores indígenas, relatado por Athayde et al. (2008), e a pesquisa e
trabalho educativo, com o referencial da hermenêutica, desenvolvida por Carvalho,
Grun e Avanzi (2009) em áreas protegidas no Vale do Ribeira, SP, além dos que
mencionamos a seguir.
A incorporação da relação com as comunidades locais na educação
ambiental voltada à conservação da biodiversidade é um aspecto importante para
diversas/os autores. O trabalho desenvolvido pela ONG IPÊ6 no Pontal do
Paranapanema,
voltado
à
proteção
do
mico-leão-preto
(Leontopithecus
chrysopygus) é um exemplo disto. Desde a década de 80, com o trabalho iniciado
como um projeto de pesquisa, em uma área marcada por conflitos ligados à posse
da terra, a equipe compreendeu a necessidade de promover um trabalho de
educação ambiental, com foco em questões ambientais e sociais, com a
6
IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, ONG com sede em Nazaré Paulista, SP.
52
comunidade local (PÁDUA; SOUZA, 2007). Em um trabalho abrangente, a equipe
envolveu escolas, proprietários rurais e comunidade em projetos de recuperação de
áreas degradadas, criação de corredores ecológicos e projetos de geração de renda
com bases sustentáveis. O modelo de trabalho do IPÊ foi objeto de diversas
pesquisas, dentre elas a dissertação de mestrado de Souza (2005), que investigou
as contribuições da proposta educativa da ONG para a área da educação ambiental
relacionada à conservação da biodiversidade.
A atenção à necessidade de geração de renda para as comunidades também
esteve presente no trabalho de Erdmann (2006), com a preservação do celacanto
(Latimeria menadoensis) na Indonésia. Ao se deparar com uma nova espécie, ainda
sem dados que pudessem comprovar suas afirmações, o autor assumiu que a
população do peixe seria pequena e ameaçada, e mobilizou imprensa, escolas e
comunidade em uma campanha proativa de conservação. O autor atribui o sucesso
da campanha de conservação ao uso da estratégia da espécie-bandeira para gerar
interesse na causa e ao trabalho educativo com a comunidade local.
A importância do envolvimento da comunidade na conservação também foi
verificada por Engels e Jacobson (2007), ao avaliar o trabalho da Associação Mico
Leão Dourado em Poço das Antas. O trabalho de educação ambiental tem como
foco o mico-leão-dourado (Leontopithecus rosalia), uma espécie carismática, o que
as autoras acreditam que ajuda a atrair as pessoas para o tema da conservação.
O trabalho educativo com a comunidade, mais do que importante, é
considerado essencial para a conservação de predadores de topo de cadeia, como
no caso da harpia (Harpia harpyja). Perda de habitat e caça foram elementos
causadores do declínio da espécie nas Américas, do México à Argentina. Desde
1989, o Fundo Peregrino trabalha na região do Panamá na proteção desta espécie,
e criou em 2002 um programa de educação ambiental, utilizando a harpia como
espécie-bandeira (CURTI; VALDEZ, 2009). Dois pontos interessantes do programa
foram o enfoque na troca de conhecimentos científicos e culturais entre as/os
biólogas/os e membros das comunidades indígenas da região e a ênfase em
considerar o contexto local e incorporar a comunidade nas ações voltadas à
conservação.
A contextualização local como base do trabalho de educação ambiental para
a conservação da biodiversidade, que é coerente com sua orientação crítica, pode
ser observada também no trabalho educativo desenvolvido com a comunidade de
53
entorno da Reserva Ecológica Cayambe-Coca, no Equador. O urso andino
(Tremarctos ornatus) encontra-se ameaçado de extinção, em parte devido à morte
dos animais causada por fazendeiros, que os consideram uma ameaça às criações.
O programa educativo envolveu membros da comunidade na pesquisa com os ursos
além de encontros educativos em escolas e inserções na mídia (ESPINOSA;
JACOBSON, 2012).
No caso da onça (Panthera onca), Marchini e MacDonald (2012) identificam a
caça como a principal ameaça sofrida por esta espécie de predador de topo de
cadeia e defendem que fatores psicológicos e sociais envolvidos com a caça devem
ser abordados, de modo a tornar a prática inaceitável no meio social e também ao
nível de comportamento pessoal.
Essas pesquisas, dentre várias outras, apontam para a relevância da
educação
ambiental
como
parceira
em
programas
de
conservação
da
biodiversidade. É interessante observar que as pesquisas indicam que, mais do que
um instrumento, a educação deve ser componente essencial da conservação e
profundamente enraizada no contexto local. Para Sauvé, a “educação ambiental
não pode ser considerada um instrumento a serviço de um programa políticoeconômico universal e exógeno respondendo a uma visão de mundo prédeterminada” (SAUVÉ, 2009, p. 326), mas deve estar alicerçada em um contexto e
um projeto de mundo cujo sentido ela ajuda a construir. Gonzalez-Gaudiano (2005,
p.220) acredita que a educação ambiental “não deveria ter objectivos 7 próprios, mas
deveria ser parte constitutiva das práticas educativas em geral”. Entendemos com
isso que a educação ambiental aproxima-se de uma filosofia, de uma maneira de
entender a educação, e por isso não se restringe a um ou outro objetivo, podendo
ser um caminho para trabalhar com diversos temas. O autor defende que “a
educação para a biodiversidade deve conter o mesmo que uma boa educação
ambiental, embora tendo como objectivo pedagógico a biodiversidade”. O autor
sugere que esta seja chamada educação ambiental para a biodiversidade, e a
contrapõe à educação para a conservação, que ele considera que abrange
propostas conservacionistas que não são necessariamente desenhadas sob a ótica
da educação ambiental. Nossa tendência é concordar com o autor, mesmo porque a
7
Publicado em Lisboa, Portugal, por isso a grafia “objectivos”.
54
expressão educação ambiental para a biodiversidade remete a uma visão mais
coerente com as propostas que surgem ao decorrer desta pesquisa.
1.6 Sobre o termo biodiversidade e educação ambiental
O termo biodiversidade foi introduzido pelo Dr. Walter G. Rosen, no contexto
do Fórum Nacional em BioDiversidade (The National Forum on BioDiversity),
ocorrido em Washington, D.C., Estados Unidos, em 1986, promovido pela Academia
Nacional de Ciências e Instituto Smithsonian (WILSON, 1988, p.vi). O termo foi
usado para representar a vasta gama de tópicos e perspectivas abordados durante a
realização do Fórum. Em suas considerações sobre o estado da diversidade
biológica na época, Edward O. Wilson usou valores quantitativos - o número de
espécies descritas - como referência para estimar a biodiversidade. Considerou
também a enorme quantidade de informação genética presente em um único
organismo, embora ciente de que ambos (espécies e genes) constituem apenas
uma parte da diversidade biológica existente, já que cada espécie inclui inúmeros
indivíduos, que por sua vez diferem entre si na composição genética (WILSON,
1988, p.7). Já em sua origem, portanto, a biodiversidade aparece com caráter
múltiplo (pode ser número de espécies, de genes, por exemplo) e incalculável. Até
hoje as estimativas variam enormemente e só há consenso em torno da ideia de que
não é conhecida mais do que uma fração do número total de espécies existentes em
qualquer momento, e nosso conhecimento incompleto da biodiversidade não nos
permite sequer precisar as taxas de extinção de espécies (EHRLICH; PRINGLE,
2008).
A internacionalização do tema da biodiversidade pode ser traçada à
realização da Rio 92. É curioso lembrar que Brown, em capítulo publicado no
mesmo livro que apresentou as discussões do Fórum Nacional em BioDiversidade
de 1986 (BROWN, 1988, p. 447), já havia previsto que uma conferência das Nações
Unidas sobre o tema teria o potencial de gerar interesse público sobre o assunto.
Na Rio 92, como ficou conhecida a Conferência das Nações Unidas para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro em
55
1992, foi assinada a Convenção da Diversidade Biológica (CDB)8, na qual a
biodiversidade está assim definida:
Diversidade biológica significa a variabilidade de organismos vivos de
todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas
terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos
ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro
de espécies, entre espécies e de ecossistemas (BRASIL, 2000, p.9).
Ao longo destes 20 anos, a CDB9 agregou 193 países membros, já foi
assinada por 168 países10 e a biodiversidade tornou-se um termo de uso corrente. A
posição do Brasil como país megadiverso, dentre as nações mais ricas em
biodiversidade na Terra (MITTERMEIER et al., 2005), a importância da proteção da
biodiversidade, as riquezas associadas a ela, tudo isso está presente hoje na mídia
(TRIGUEIRO, 2005), além de em inúmeros artigos científicos. Oliveira e Marandino
(2011) também observam que o tema biodiversidade aparece não só no meio
científico e nem mesmo apenas na biologia, mas da mesma forma que outros temas
da área, como células-tronco, é discutido fora da academia, tendo sido apropriado
pela sociedade.
O uso deste termo biodiversidade que se alarga para além da esfera em que
foi utilizado originalmente faz pensar em como ele é entendido pelas pessoas.
Considerando, como Gadamer, que a “constituição da nossa experiência de mundo
estruturada na linguagem está em condições de abarcar as mais diversas relações
de vida” (GADAMER, 2012, p.579), é nesta (a linguagem) que vamos encontrar o
meio em que as diferentes ideias sobre biodiversidade se manifestarão.
Este autor descreve um termo como uma palavra “cujo significado está
determinado univocamente”, e que se refere a um determinado conceito
(GADAMER, 2012, p.536). Para o autor, “um termo é sempre algo artificial”, porque,
como no caso do termo biodiversidade, pode ser uma palavra formada
artificialmente, que então “é fixada em um determinado sentido conceitual” (idem,
p.536). Nem sempre há uma correspondência direta entre o conceito e o que ele
representa: o conceito de biodiversidade é um conceito abstrato, criado pela
8
Decreto Legislativo no. 2, de 5 de junho de 1992. Aprova o texto da Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na
cidade do Rio de Janeiro, no período de 5 a 14 de junho de 1992.
9
A CDB foi ratificada pelo Brasil por meio do Decreto No 2.519, de 16 de Março de 1998.
10
Fonte: Convention on Biological Diversity.
56
linguagem, que é essencialmente cultural, e o funcionamento do ecossistema, em
seu sentido biológico, não é guiado pela cultura (STABLES, 2001).
O que é um conceito? Um conceito pode ser considerado como “a relação
entre a palavra (ou símbolo) e uma ideia” (COHEN; MANION; MORRISON, 2010, p.
14). Para os autores conceitos são uma forma de dar um sentido e de organizar a
realidade, e a própria forma como percebemos o mundo depende de nosso
repertório de conceitos. Em consequência pessoas com conjuntos de conceitos
distintos podem perceber a mesma realidade objetiva de forma diferente.
Ao tratar da educação para a biodiversidade, González-Gaudiano (2005,
p.213) preocupa-se em definir conceitos, que para ele “são ferramentas mediante as
quais organizamos o nosso pensamento e tudo aquilo que é derivado dele”. Ainda
segundo o autor, “com os conceitos construímos a realidade que pensamos, como a
representamos, como a delimitamos”. Estas definições também são válidas para os
conceitos científicos. Gadamer (2012, p.537) chama a atenção para o fato de que,
ao interpretar textos científicos, precisamos considerar que existe uma “coexistência
do uso terminológico e do uso corrente de uma palavra”. Como já dissemos acima,
para o autor o termo é uma palavra com significado único, porque se refere a um
conceito definido.
Porém, em relação ao termo biodiversidade, nem sempre se pode falar em
univocidade de seu significado. Alguns autores, ao contrário, falam sobre a natureza
“mal-definida” de conceitos emergentes como biodiversidade ou sustentabilidade,
afirmando que “não há uma perspectiva ou definição única de biodiversidade ou
sustentabilidade que as descreve precisamente em todas as situações e contextos”
(DREYFUS; WALS; VAN WEELIE, 1999, pg.37). Não são os atributos ou dimensões
da biodiversidade que não são bem definidos, mas “as abordagens é que são
distintas, gerando seleções diferentes de atributos relativamente bem definidos”
(DREYFUS; WALS; VAN WEELIE, 1999, pg.40), dependendo do contexto ou
situação. Isto permite que a aprendizagem sobre a biodiversidade seja
contextualizada, e que a pluralidade de significados seja considerada e respeitada,
assim como as incertezas e disputas sempre presentes na questão ambiental.
A pluralidade de concepções sobre biodiversidade também é discutida por
Santos (2005, p.61), que considera que a biodiversidade é um conceito polêmico, e
o “discurso sobre a biodiversidade é, de fato, um conjunto de discursos em que se
cruzam diferentes conhecimentos, culturas e estratégias políticas”. As posições
57
apresentadas sobre a biodiversidade podem estar centradas: em seu caráter de
recurso, o que gera propostas de sua gestão, as quais podem ter um caráter global,
dominado por instituições internacionais baseadas em países da América do Norte e
Europa, ou caráter nacional, quando países do Terceiro Mundo buscam negociar as
estratégias de conservação da biodiversidade em seus territórios; em uma
concepção democrática, que identifica em práticas do Norte as origens da crise e
ameaças à biodiversidade; e uma perspectiva local, que vincula a conservação da
biodiversidade a práticas e contextos locais, com raízes na cultura associada ao
país/ região em questão (SANTOS, 2005, p.61). Para Brandão e Oliveira (2002, p.3),
a biodiversidade tende a “se tornar uma dessas praças do conhecimento até onde
se chega vindo de muitas ruas e de onde se pode partir em direção a rumos
diversos”.
A diversidade de contextos em que a questão da biodiversidade pode ser
abordada, longe de ser uma fraqueza, a torna relevante como tema para a educação
ambiental, como Dreyfus; Wals; Van Weelie (1999, p.37) argumentam:
biodiversidade aproxima grupos distintos da sociedade buscando
uma linguagem comum para discutir questões de conservação da
natureza em relação ao tema da sustentabilidade. O simples fato
destes grupos, de áreas diversas, se concentrarem em um conceito
comum - mesmo que o que o conceito significa para cada grupo varie
- permite que, o que chamaremos uma disputa sócio-científica
apareça. Esta disputa sócio-científica oferece uma excelente
oportunidade para aprendizagem sobre um tópico altamente
relevante, controverso, emocionalmente carregado e passível de
debate no cruzamento entre ciência, tecnologia e sociedade.
(tradução nossa)
Os mesmos autores seguem argumentando que, como conceito para a
educação ambiental, em relação à biodiversidade “uma distinção pode ser feita entre
sua definição política ou simbólica, e as definições científicas”:
o símbolo da biodiversidade refere-se ao problema ambiental da
redução da variedade da vida e a demanda normativa de que nós
deveríamos fazer algo a respeito. ... como um conceito simbólico
biodiversidade não tem referências empíricas. Para saber
exatamente o que é perdido e o que deveria ser feito para parar a
perda da “biodiversidade”, conceitos científicos ou conceitos
referentes à variedade da vida com referências empíricas são
essenciais. Tais conceitos se referem a entidades... que podem ser
58
identificadas e, realmente, medidas de alguma forma. (tradução
nossa)
Estes autores levantam uma questão que consideramos relevante para a
educação ambiental crítica: como podemos “lidar com este continuum de
significados que existe entre significados e usos políticos da biodiversidade de um
lado e usos e significados científicos do outro?” (DREYFUS; WALS; VAN WEELIE,
1999, pg.38). Se vamos trabalhar neste cruzamento entre conceitos abstratos e
conhecimentos empíricos, obtidos na concretude das pesquisas que embasam o
conceito biológico/científico da biodiversidade, é importante ter em mente do que
estamos falando quando dizemos que vamos trabalhar com o termo biodiversidade
em educação ambiental.
59
CAPÍTULO 2
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Neste capítulo serão descritas as etapas da pesquisa, com as formas de
coleta e análise de dados, as considerações éticas e a descrição dos grupos que
participaram do processo. Nesta pesquisa abordamos a questão da biodiversidade
como tema para a educação ambiental por dois caminhos: o primeiro tem como
objeto o contexto específico do Polo Ecológico de São Carlos, e é uma pesquisa
naturalista, que busca investigar uma situação específica, com foco em um grupo, e
na sua percepção dos eventos em questão (COHEN; MANION; MORRISON, 2010).
Em nosso caso, o estudo busca compreender junto a grupos de estudantes de
disciplinas oferecidas na Universidade Federal de São Carlos de que formas o tema
da biodiversidade é e pode ser usado em atividades/interações educativas dentro do
contexto do Polo Ecológico de São Carlos.
O segundo caminho escolhido foi o “Policy Delphi”, ou Delphi de Política
(TURROF, 2002). Este é uma das formas do Método Delphi (LINSTONE; TURROF,
2002, p.3), que é considerado pelos autores uma “conversação estruturada”.
Embora este método, em sua origem, tenha tido como objetivo a obtenção de
consenso de especialistas sobre um tema, os próprios autores dizem que há
diversas maneiras de se utilizar o método. Nossa pesquisa utilizou o Delphi de
Política, descrito por Turrof (2002), que tem como objetivo a geração de alternativas,
e não consenso. Este foi considerado um instrumento adequado à coleta e
estruturação da pesquisa e coerente com o referencial hermenêutico, uma vez que
suas raízes filosóficas e metodológicas estão na dialética. A raiz filosófica deste
Delphi pode ser traçada à seguinte reflexão sobre seu sistema de questionamento:
já que cada conjunto de proposições é um reflexo de um plano ou
teoria mais geral sobre a natureza do mundo como um sistema
inteiro, ou seja, uma visão de mundo (grifos no original), existe
alguma visão de mundo alternativa radicalmente diferente que
permitiria a consideração séria de um conjunto de proposições
completamente oposto? Por que essa visão oposta não é verdadeira
ou mais desejável? Além disso, o conflito entre o plano e contraplano permitem emergir um terceiro plano ou visão de mundo que
seja uma síntese criativa (grifo no original), do plano e contra-plano
originais? (MITROFF; TURROF, 2002, p.19, tradução nossa).
60
Na presente pesquisa, isso vai ao encontro das premissas de diálogo também
da hermenêutica filosófica. Uma vantagem do uso deste método é que ele prescinde
de encontros presenciais, o que foi fundamental em nossa pesquisa, por permitir a
conversa entre as/os participantes, que vivem e atuam em regiões diversas do País,
desde a Bacia Amazônica na região Norte até a do Rio Paraguai, em Santa
Catarina, no sul do Brasil. As/os participantes devem ser selecionados segundo o
critério de estarem de alguma forma envolvidas/os no assunto em questão. A
intermediação entre as/os participantes é feita por meio da pesquisadora,
responsável pela aplicação, análise e elaboração dos questionários.
A análise dos dados seguiu as orientações de análises qualitativas, que visam
“fazer sentido dos dados em termos das definições da situação de participantes (da
pesquisa), observando padrões, temas, categorias e regularidades” (COHEN;
MANION; MORRISON, 2010, p.461). Dentre os objetivos da análise qualitativa
oferecidos por esses autores estão aqueles de descrição, interpretação e geração
de temas, que se aplicam à presente pesquisa. A pesquisa qualitativa é
essencialmente interpretativa, e essas interpretações devem ser construídas. A
partir dos textos obtidos de forma direta na pesquisa – as reflexões das/os
estudantes das disciplinas e os questionários do método Delphi – deve ser
construído o “texto da pesquisa” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p.37), que é criado a
partir de anotações e interpretações sobre os dados coletados. Neste texto a
pesquisadora registra suas próprias interpretações, e é ele que servirá de base para
a construção do texto final, que será apresentado ao público, a presente tese.
Em relação à hermenêutica filosófica, esta não determina um procedimento
específico para o processo da interpretação. Segundo Kincheloe e McLaren (2006,
p.288) a produção dos textos “não segue nenhum plano detalhado ou fórmula
mecânica. Assim como ocorre com qualquer forma de arte, a análise hermenêutica
pode ser apreendida somente no sentido deweyano11 – executando-a”.
2.1 A educação ambiental e biodiversidade em um contexto local
Nesta etapa da pesquisa a coleta de dados consistiu em material escrito, a
saber, reflexões feitas por estudantes das disciplinas em relação às visitas
realizadas em unidades do Polo Ecológico. Os dados foram coletados junto a um
61
total de quatro turmas de disciplinas de educação ambiental oferecidas em cursos
de graduação da Universidade Federal de São Carlos:
- duas turmas da disciplina “Educação Ambiental para a Conservação da
Biodiversidade”, oferecidas em 2009 e 2010. Docente responsável: Haydée Torres
de Oliveira. A pesquisadora acompanhou a turma em 2009, como observadora, e foi
monitora da turma em 2010, por meio da disciplina PESCD (Estágio Supervisionado
de Capacitação Docente em Ecologia e Recursos Naturais);
- uma turma da ACIEPE “Atividade Curricular de Integração Ensino, Pesquisa e
Extensão
-
Educação
ambiental:
ambientalizando
e
politizando
a
ação
socioeducativa”. Coordenador/a - Docente responsável: Haydée Torres de Oliveira
e Amadeu Logarezzi, ano 2011;
- uma turma de “Educação Ambiental e Gerontologia”. Docente responsável: Haydée
Torres de Oliveira, ano 2011;
A pesquisadora foi responsável por guiar e acompanhar as visitas das turmas
às seguintes unidades do Polo Ecológico de São Carlos: Horto Municipal, Horta
Municipal, PESC, e Estação de Captação do Espraiado. A visita ao Horto Municipal
foi conduzida tendo por base um roteiro preparado pela equipe da unidade, e que
pode ser consultado no Anexo 2.
Após as visitas, pedimos às/aos estudantes que respondessem um
questionário com as seguintes perguntas (as perguntas entre parênteses
correspondem a redações alternativas da questão, que não alteram o conteúdo,
exceto na questão 3, como descrito a seguir), que deveriam ser respondidas em
relação às unidades do Polo Ecológico visitadas pelas turmas:
1-) Você considera que essas áreas urbanas são importantes para atividades de EA/
Por quê?
2-) Considerando os seus conhecimentos sobre biodiversidade, como o tema é
tratado em cada uma das unidades? (Considerando os seus conhecimentos sobre
biodiversidade, é possível perceber como o tema é tratado em cada um dos espaços
educadores visitados? Por quê?/ Pensando em tudo que já vimos sobre
biodiversidade, como ela é trabalhada em cada uma das unidades?).
11
Referente a John Dewey, filósofo e pedagogo, que viveu nos Estados Unidos na virada do século XX.
62
3-) Por favor anote aqui ideias sobre como o tema biodiversidade poderia ser
tratado/abordado durante as visitas. (Por favor, anote aqui ideias sobre como o tema
biodiversidade poderia ser tratado/abordado durante as visitas e como pode ser
relacionado com o tema do envelhecimento humano - Esta questão foi perguntada
apenas à turma de “Educação Ambiental e Gerontologia” – 2011).
4) Contribuições/Sugestões/Críticas/ Observações. (Você tem alguma sugestão/
observação/ crítica no sentido de melhorar as atividades de educação ambiental nas
unidades? E entre as unidades?)
As respostas foram recolhidas e fizeram parte da avaliação realizada pela/o
docentes responsáveis pelas disciplinas. A coleta de dados para a presente
pesquisa foi realizada de forma independente desta avaliação e não teve nenhuma
influência sobre a mesma. Ao todo foram coletados e analisados 73 questionários.
Quadro 1_Descrição das turmas de estudantes da UFSCar que responderam aos
questionários sobre a educação ambiental e biodiversidade no Polo Ecológico de São
Carlos.
GRUPO
No.
de
questionários
respondidos
(total 73)
Estudantes da disciplina Educação Ambiental para a
19
Conservação da Biodiversidade; inclui estudantes de Ciências
Biológicas, cursos de Bacharelado e Licenciatura, turma de 2009
Estudantes da disciplina Educação Ambiental para a
10
Conservação da Biodiversidade; inclui estudantes de Ciências
Biológicas, Bacharelado, turma de 2010
Estudantes da disciplina Educação Ambiental e Gerontologia,
28
turma de 2011
Estudantes da ACIEPE “Atividade Curricular de Integração
16
Ensino, Pesquisa e Extensão - Educação ambiental:
ambientalizando e politizando a ação socioeducativa”, turma de
2011.
Fonte: Elaborado pela autora.
2.2 O Método Delphi
O Método Delphi (LINSTONE; TURROF, 2002), aqui utilizado na forma do
Delphi de Política (TURROF, 2002), é um processo que permite a inclusão de
respostas individuais na formatação de uma resposta grupal/coletiva, isto é, a
contribuição individual para o delineamento grupal de temas significativos é mantida.
63
Esta técnica, semelhante à do Grupo Nominal, em que o trabalho é presencial
(COHEN; MANION; MORRISON, 2010. p.309), é útil para coletar dados de
indivíduos e colocá-los em alguma ordem compartilhada pelo grupo, como por
exemplo, prioridades, similaridades e diferenças, generalidades e especificidades,
permitindo que discordâncias individuais sejam registradas e colocadas dentro da
resposta grupal, e a identificação de questões significativas.
O Método Delphi (LINSTONE; TURROF, 2002) é desenvolvido em três etapas
básicas: a pesquisadora pede às/aos participantes para responder, por escrito, a
uma série de questões ou afirmativas; as respostas são analisadas e agrupadas por
temas; esta análise é devolvida às/aos participantes para comentários, e discussões
adicionais. Nesta segunda etapa as/os participantes recebem uma resposta grupal,
que pode refletir semelhanças ou registrar diferenças, e devem interagir com a
resposta grupal – desta forma cada pessoa tem a oportunidade de concordar com a
resposta grupal ou indicar uma discordância com esta.
Ao levar o grupo a refletir sobre a resposta coletiva, estimula-se cada
participante a concordar ou discordar da resposta grupal, o que nos permite
identificar áreas de consenso e discordância. Já que as respostas são colocadas de
forma anônima, mantém a privacidade dos participantes, e dá voz igual a todas/os.
Três grupos distintos foram convidados a participar desta pesquisa. Como
citado anteriormente, para atender às premissas do Método Delphi, o critério de
seleção foi a experiência prévia em biodiversidade e/ou educação ambiental, seja
esta experiência no nível da graduação, pós-graduação ou profissional.
Os Grupos A e B foram formados por pesquisadoras/es vinculadas/os ao
projeto
de
pesquisa
"Predadores de Topo
de
Cadeia
Alimentar"
(Edital
MCT/CNPq/MEC/CAPES/FNDCT - Ação Transversal/FAPs Nº 47/2010 - Sistema
Nacional de Pesquisa em Biodiversidade - SISBIOTA BRASIL). Este projeto agrega
14 subprojetos com foco em predadores de topo de cadeia e os efeitos destes (e de
sua ausência) na conservação da biodiversidade, sendo um dos subprojetos de
pesquisa em educação ambiental, do qual a autora faz parte. Os grupos de pesquisa
estão distribuídos em vários estados brasileiros, e atuam em diferentes biomas, o
que confere diversidade às perspectivas apresentadas. Os questionários foram
enviados às/aos 14 coordenadoras/es dos subprojetos, que puderam convidar
colaboradoras/es de sua pesquisa a participar, e a todas/os as/os integrantes do
subprojeto de pesquisa em educação ambiental (subprojeto 14).
64
O Grupo A foi formado por pesquisadoras/es vinculadas/os ao projeto de
pesquisa "Predadores de Topo de Cadeia Alimentar", excluídas/os integrantes do
subprojeto 14, de pesquisa em educação ambiental. O Grupo B foi composto por
integrantes do subprojeto 14, em sua maioria estudantes de pós-graduação, com
experiência em educação ambiental. O Grupo C foi composto por estudantes e/ou
recém-formadas em Ciências Biológicas da Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar), em cursos de Bacharelado ou Licenciatura, que cursaram a disciplina
“Educação Ambiental para a Conservação da Biodiversidade”, oferecida nos anos de
2009 e 2010 e participaram em visitas guiadas a unidades do Polo Ecológico de São
Carlos, SP. A pesquisadora e sua orientadora foram monitora/observadora
participante e professora responsável pela disciplina, e os convites foram enviados
às/aos 29 estudantes que concluíram a disciplina.
O Quadro 2 apresenta o número de participantes em cada etapa do Delphi,
distribuídas/os por grupos.
Quadro 2_Descrição das/os participantes da pesquisa DELPHI SISBIOTA ETAPA 1 e
DELPHI SISBIOTA ETAPA 2.
ETAPA 1 – no. ETAPA 2 – no.
Participantes (total Participantes (total
33 participantes)
24 participantes)
APesquisadoras/es,
professoras/es
14
8
universitárias/os, pós-doutorandas, e uma
estudante de pós-graduação, com atuação
de 1 a 25 anos no cargo.
B- Integrantes do subprojeto 14 (educação
9
11
ambiental), sendo uma doutora, seis
estudantes de pós-graduação e dois de
graduação.
C - Estudantes da disciplina Educação
10
5
Ambiental para a Conservação da
Biodiversidade;
inclui
estudantes
de
Ciências Biológicas, duas pós-graduandas e
duas profissionais da área.
GRUPO
Fonte: Elaborado pela autora.
Na primeira etapa do Delphi, as/os participantes receberam um questionário,
composto por questões fechadas e abertas (DELPHI SISBIOTA ETAPA 1 APÊNDICE 1). O questionário foi adaptado do trabalho de Van Weelie e Wals (1999,
p.85).
65
Após a coleta do primeiro questionário (DELPHI SISBIOTA ETAPA 1), as
respostas foram analisadas, e foi elaborado o segundo questionário (DELPHI
SISBIOTA ETAPA 2 – APÊNDICE 2), cujo objetivo principal foi permitir ao grupo
posicionar-se em relação aos resultados das partes I a IV do primeiro questionário.
O segundo questionário foi enviado para todas as pessoas que haviam sido
convidadas para participar do DELPHI SISBIOTA ETAPA 1, mesmo não tendo
respondido a este. No grupo B o número de participantes da ETAPA 2 é superior ao
número da ETAPA 1. Esta possibilidade de participação em apenas uma etapa é
prevista no próprio método.
As partes V e VI do primeiro questionário (DELPHI SISBIOTA ETAPA 1),
referentes aos objetivos e características da aprendizagem em educação ambiental,
não fizeram parte do questionário DELPHI SISBIOTA ETAPA 2, sendo analisadas e
apresentadas em separado na tese.
Em relação às considerações éticas para condução de pesquisa educacional,
foram
observados
cuidados
relacionados
ao
consentimento
informado
de
participação, considerado um conceito fundamental dos procedimentos éticos
(COHEN; MANION; MORRISON, 2010). Respeitando estes procedimentos, a
participação na pesquisa foi voluntária, efetuando-se por meio de preenchimento de
um questionário, enviado e recebido por via eletrônica. O envio do questionário
preenchido pelas/os convidadas/os foi entendido como aceite de participação na
pesquisa.
O convite enviado explicitava o caráter voluntário da pesquisa:
“Este convite deve-se à sua participação, como pesquisador/a no âmbito do
projeto “Predadores de topo de cadeia – SISBIOTA”. (ou alternativamente: como
estudante,
na
disciplina
“Educação
Ambiental
para
a
Conservação
da
Biodiversidade”). O objetivo geral da pesquisa é conhecer quais os significados do
termo biodiversidade para diferentes grupos ligados à área de Ciências Biológicas e
Educação; discutir como os sentidos atribuídos à biodiversidade estão relacionados
a questões de educação ambiental e conservação da biodiversidade.
Sua participação nesta pesquisa não é obrigatória. No entanto, irá enriquecer
a qualidade da pesquisa, com sua contribuição para seu desenvolvimento. O
desenvolvimento desta pesquisa pode vir a oferecer algum tipo de desconforto ou
constrangimento decorrente das perguntas elaboradas e em alguma etapa de
processos formativos / interativos, bem como na posterior divulgação dos dados
66
coletados. Considerando essa possibilidade e sendo sua participação voluntária,
deixamos claro que, para minimização de um eventual desconforto, você pode
decidir não mais participar da pesquisa a qualquer momento, por simples
manifestação, sem sofrer qualquer prejuízo ou retaliação devido à sua desistência.
No decorrer da coleta de dados e informações, sua identidade será
preservada. Será mantida a confidencialidade das informações coletadas, bem como
a sua privacidade.
A pesquisa não trará nenhum gasto ou ganho remunerado às/aos
participantes, mas ela apresenta o benefício da compreensão do conceito de
biodiversidade, e de sua relevância e influência em processos de educação
ambiental.
O desenvolvimento dessa pesquisa estará a cargo da pesquisadora
responsável, bióloga, especialista em educação ambiental e mestre em ciências pela
Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), aluna de doutorado do Programa de PósGraduação em Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Federal de São
Carlos.”
Ao final da mensagem estavam listados o telefone e o endereço da
pesquisadora, para tirar dúvidas sobre o projeto e a participação a qualquer
momento.
2.3 Análise dos dados
A análise de dados qualitativos pode ser feita de diversas formas. Nosso
propósito foi focar de maneira progressiva nos dados, começando com a visão
ampla dos dados coletados, e a partir disto, em um processo contínuo de agrupar,
rever e refletir sobre eles deixar emergirem os aspectos mais salientes destes, que
passaram então a orientar as análises (COHEN; MANION; MORRISON, 2010, pg.
462).
As respostas oferecidas pelas/os estudantes e demais participantes foram
lidas repetidas vezes, buscando sempre no texto a resposta às nossas questões de
pesquisa. Trechos dos textos foram assinalados e, quando estes expressavam
ideias semelhantes, agrupados de forma a compor os resultados.
Ao longo de toda a análise, a orientação da hermenêutica filosófica, de que
“para compreender é preciso que as perguntas ultrapassem o que foi dito”
67
(GADAMER, 2012, p.482) serviu para conduzir o processo de interpretar e
compreender as respostas.
Em um processo sistemático, a leitura levou à geração de “unidades naturais
de significado” (COHEN; MANION; MORRISON, 2010, p. 470) que foram então
agregadas em categorias. Estas categorias serviram como indicadores para a
construção de uma teoria alicerçada nos dados. O termo “teoria alicerçada”, ou
grounded theory, foi cunhado na década de 60 por Glasser e Strauss, em seu livro
The Discovery of grounded theory (publicado em 1967) para representar
construções teóricas derivadas de análise qualitativa de dados, como é apresentado
em Corbin e Strauss (2008). Na presente pesquisa estes “agregados” de ideias
serviram para indicar quais os pontos mais relevantes ressaltados pelas/os
participantes, e no caso do Delphi foram as construções que levaram à criação das
categorias de sentido, e das relações de conceitos e temas que foram então
submetidas à consideração pelos grupos na Etapa 2 da pesquisa.
68
CAPÍTULO 3
O POLO ECOLÓGICO DE SÃO CARLOS E A BIODIVERSIDADE COMO TEMA
PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA EM UM CONTEXTO URBANO.
Neste capítulo são apresentados e discutidos os resultados do estudo
realizado sobre a educação ambiental, com o tema biodiversidade, em um contexto
específico: o olhar aqui se volta para essas questões, da educação ambiental, das
áreas urbanas e arredores, do tema da biodiversidade próxima, acessível à
população, e não como algo distante, do imaginário.
Relembramos que as unidades do Polo Ecológico visitadas pelos grupos de
estudantes foram: o Horto Municipal, a Horta Municipal, o PESC (Parque Ecológico
de São Carlos) e a Estação de Captação de Água do Espraiado. É interessante
notar que todas essas unidades ficam dentro da área urbana do município, mas são
comumente tratadas como sendo fora desta, talvez por apresentarem características
de área rural – até a criação recente de um condomínio na região, não havia muitas
residências no local, apenas algumas chácaras, fazendas, e as moradias estudantis
dentro da universidade, oferecendo um aspecto de área não urbanizada. Isto pode
ser observado nos mapas do Polo (ANEXO 1 e ANEXO 2). É possível encontrar nas
respostas várias referências às unidades como estando fora da área urbana.
Esta relação é importante quando consideramos que, segundo o IBGE (de
acordo com dados disponíveis na página da Prefeitura Municipal de São Carlos,
acessados em dezembro/2012) em 2010 a maior parte da população do município
(96%) residia na área urbana, que corresponde a apenas 6% do território. Se a
educação ambiental requer o deslocamento de dentro da cidade/área urbana para
ser realizada, as questões de acesso também vão assumir relevância na discussão,
como é possível observar nas respostas. Este acesso pode ser compreendido de
duas formas: como possibilidade de entrada nos locais, facilitada pelo fato de ser
gratuita, e como proximidade, que vai afetar as condições de deslocamento,
influenciadas também por possibilidades econômicas. Ainda há as considerações de
acesso como facilidade de deslocamento dentro das unidades, relevantes para
pessoas com limitações motoras, como pode ser o caso de pessoas idosas, como é
citado por estudantes da turma de educação ambiental do curso de Gerontologia.
Em relação à biodiversidade, as respostas apontam para uma divisão que
está presente tanto na estrutura e função das unidades visitadas como na forma
69
como as visitas são conduzidas. Os focos são em fauna (PESC), flora (Horto),
alimentação/plantio orgânico (Horta), e água (Espraiado). Esses assuntos, embora
sejam predominantemente abordados em uma ou outra unidade, estão presentes
também nas demais, assim como a questão da água, como é possível observar nas
respostas oferecidas. As unidades do Polo estão localizadas em uma área de
nascentes e vários pequenos cursos d´água cruzam a região.
Os resultados apresentados não são transcrições literais das respostas, mas
já são construções feitas pela pesquisadora, de forma que respostas semelhantes
foram agrupadas de modo a refletir as principais ideias presentes. A identificação de
trechos selecionados como exemplo segue o seguinte código: EACB para as duas
turmas da disciplina “Educação Ambiental para a Conservação da Biodiversidade”,
oferecidas em 2009 e 2010, seguido do número atribuído ao questionário de cada
estudante (1 a 29); AC para a turma da ACIEPE de educação ambiental, seguida do
número atribuído (1 a 16), e GER para a turma do curso de Gerontologia, seguido do
número atribuído ao questionário (1 a 28). Estes códigos de identificação são
usados no corpo do texto quando há transcrição literal de trechos de texto das
respostas dos questionários, colocados entre aspas. Sendo assim, AC3 refere-se à
resposta da participante 3, do Grupo AC (da ACIEPE). As respostas foram
analisadas em conjunto, e não foi feita separação das respostas por turma
participante. A identificação das respostas por turma serve apenas como referência
para a leitura.
3.1 Principais temáticas identificadas nos resultados da pesquisa sobre
biodiversidade e educação ambiental no Polo Ecológico
Ao oferecerem reflexões sobre a importância das unidades do Polo para o
desenvolvimento de atividades de educação ambiental, algumas questões são
ressaltadas pelas/os estudantes e apresentadas a seguir.
3.1.1 A importância das áreas urbanas para atividades de educação ambiental
Foi possível perceber alguns pontos principais em relação às unidades do
Polo Ecológico:
70
a) Há uma relação forte entre a presença nos locais e as possibilidades
educativas e de formação de vínculo com a natureza: em diversas respostas é
relatada a importância de se estar fisicamente no local, o que permite experimentar
sensações como o frescor, a limpeza do ar, os sons, a beleza do local, e ajuda a
motivar para lidar com as questões ambientais. Estar nesses ambientes importa
“porque o contato, a sensibilização através dessas áreas promoverá o conhecimento
sobre algumas das problemáticas ambientais locais” (EACB26), e isso pode no
futuro promover o engajamento da comunidade. Essas áreas proporcionam “um
maior contato das pessoas com a natureza, podendo despertar o amor, o interesse e
a partir daí o respeito por ela” (EACB6);
b) A natureza aparece como algo que não está na cidade: a cidade não tem
natureza, e por isso é importante ter essas áreas próximas. Este contraponto entre a
cidade e natureza aparece em várias respostas. As unidades são vistas como
“espaço de apresentação da biodiversidade à cidade” (GER25) e são importantes
porque “a população urbana não tem contato com a natureza” (GER 11). A mesma
noção é apresentada pela resposta de EACB3, de que as unidades visitadas
“proporcionam às pessoas o contato direto com a natureza, o qual elas não têm na
vida cotidiana”;
c) O contato com a natureza parece essencial para motivar ações em prol do
meio ambiente: as áreas visitadas tornam “as atividades de educação ambiental
mais reais” (GER2), podem ampliar a “visão e consciência para preservação e uso
sustentável de recursos” (GER3), “demonstram que a natureza pode e deve ser
preservada”(GER5). Esta reflexão pode ser estendida para a própria educação
ambiental. Há uma forte indicação nas respostas de que a educação ambiental não
pode prescindir destes locais para ser realizada. O contato com a natureza é
apontado como sendo essencial: “não havendo áreas rurais, não haveria como
analisar e exemplificar as questões da educação ambiental” (GER8). A relação entre
área rural e urbana “é o contexto ideal para se trabalhar atividades de educação
ambiental” (EACB 16);
d) A proximidade dos locais visitados também é considerada um ponto chave:
já que as áreas estão próximas à cidade, criam a “possibilidade da população
71
conhecer mais sobre plantas e animais” (GER16), “facilitando e incentivando a
população
a
fazer
visitas”
(GER19),
levando
a
um
“maior
interesse
e
conscientização da importância dos cuidados com a área ambiental” (GER19). A
localização do Polo permite “trazer a comunidade para perto da natureza sem ter
que percorrer grandes distâncias” (GER15);
e) A questão do acesso: as áreas são de extrema importância para a população
“que talvez nunca tenha tido contato com a natureza possa conhecer e aprender a
respeitar o meio ambiente, e ver como nós precisamos estar em equilíbrio com a
natureza para poder sobreviver” (GER21). Aqui também é ressaltado o fato de que
nenhuma dessas unidades cobra taxa de entrada, o que novamente facilita o
acesso.
3.1.2 Como o tema biodiversidade é abordado durante as visitas às unidades
do Polo Ecológico
Nós pedimos às/aos participantes para que observassem e comentassem
sobre como a biodiversidade é apresentada nas visitas às unidades do Polo. Como
já discutimos na apresentação do projeto São Carlos de Todos Nós no capítulo 1 a
biodiversidade é um tema central do trabalho educativo nas unidades visitadas.
Sendo assim, as respostas refletem o que foi percebido pelas/os estudantes em
relação a este trabalho.
De modo geral, são destacados aspectos visuais e de comportamento dos
animais (do PESC), os conteúdos educativos na visita ao horto, referentes às
“interações entre plantas e animais; os diferentes tipos de folha, semente, caule; as
texturas; os cheiros; as sensações” (EACB 2), e a importância da manutenção da
mata ciliar ao longo dos córregos e da diversidade de plantas e animais para o
cultivo orgânico na horta. A questão sensorial foi citada em várias respostas,
reforçando a importância da presença, do contato com o ambiente para o trabalho
educativo: nestas unidades é possível “tocar, sentir, inspirar as diversas sensações
possíveis em cada parte do passeio” (EACB 29); “o contato direto com a natureza
proporciona aos indivíduos oportunidades de reflexão e descobrimento sobre a
beleza e os mistérios da natureza” (EACB 3).
A forma como as visitas são guiadas é refletida nas respostas, que falam da
importância da mediação para o aproveitamento das visitas. As respostas citam que
72
“com a visita guiada é possível aprender sobre várias espécies, sua origem” (EACB
6), e que “em todas as atividades a transmissão informal e direcionada de saberes
pode estar presente” (EACB 3). Além do que pode ser percebido com o auxílio desta
mediação da visita guiada, foi ressaltada a importância da preparação prévia dos
grupos para a visita. No caso foi citada a distribuição das cartilhas do PESC para as
escolas que vão realizar as visitas, quando do agendamento da mesma.
Algumas outras observações dizem respeito à ênfase na questão da
diversidade – de seres vivos: “cores, tamanhos, formas” e temas: “reflorestamento,
aquecimento global, conscientização para uso controlado” (GER 23) que são
abordados; das relações entre os seres vivos, e destes com o ambiente –
“adaptação das espécies vegetais; disseminação de sementes” (AC 1); e nas
questões éticas e estéticas, além do aspecto político, uma vez que, na época da
realização de parte das visitas, havia indefinição quanto ao comprometimento das
áreas, em particular do horto, devido à projetada duplicação da estrada municipal
que passa ao lado da unidade. Até o final de 2012 a duplicação não aconteceu, e
permanece a incerteza quanto à execução do projeto.
3.1.3 Sugestões sobre como abordar o tema biodiversidade nestas visitas
Foi pedido às/aos estudantes que, à luz do que foi observado, fossem feitas
sugestões para melhorar/aprimorar o trabalho educativo com o tema biodiversidade
nas unidades visitadas.
As seguintes sugestões foram apresentadas:
a) Como as ênfases são distintas em cada unidade, foi ressaltada a importância das
visitas serem realizadas no horto, horta e PESC, para dar uma ideia mais completa
do tema da biodiversidade12 (EACB 3, EACB 15); a necessidade de integração entre
as unidades no desenvolvimento do trabalho educativo foi citada em várias
respostas;
b) Já que os locais apresentam espécies nativas e exóticas, deve-se trabalhar com
esse tema nas unidades, com ênfase na biodiversidade brasileira (EACB 7);
12
Embora parte das turmas tenha visitado também a estação de captação de água para consumo do Espraiado, foi
considerado que não há ênfase na temática da biodiversidade nesta unidade e, portanto, não há referência a este
espaço educador nestas respostas.
73
c) As visitas são guiadas de modo convencional, com a pessoa que guia oferecendo
informações sobre o local – foram sugeridas outras atividades, como vivências na
natureza (AC 1); de percepção sensorial: “andar descalço, sentir variação de
temperatura do solo, sentir sabores das frutas” (EACB 8).
3.1.4 Como o tema biodiversidade pode ser relacionado com o envelhecimento
humano
Apenas para a turma do curso de Gerontologia, pedimos às estudantes que
refletissem sobre as possibilidades de relacionar a biodiversidade com as questões
do envelhecimento humano. Diversas respostas referiram-se à própria visita como
uma oportunidade de socialização e da prática de atividade física, consideradas
importantes para as pessoas idosas, mas não relacionadas ao tema da
biodiversidade. Em relação especificamente à biodiversidade e envelhecimento,
foram oferecidas as seguintes sugestões de trabalho educativo:
a) Memórias: as sugestões versaram sobre atividades que podem ajudar a treinar e
aguçar a memória, e aquelas que têm como foco a passagem do tempo e as
mudanças ocorridas, como a diminuição da biodiversidade: “associação de plantas e
árvores com o passado dos idosos – podem despertar acontecimentos passados,
sensações, sentidos” (GER 7); “treinar memória com nomes de espécies” (GER 3);
“lembranças do passado, flores que eram vistas com mais frequência” (GER 19);
“pedir aos idosos para relatar como era a biodiversidade na época deles, o contato
com animais e árvores” (GER 22); trabalhar com a biodiversidade “relacionado à
história de cada um e história de cada espécie”;
b) Os efeitos da passagem do tempo: as sugestões aqui trataram sobre a
associação do envelhecimento humano com o “envelhecimento dos ecossistemas e
espaços em si” (GER 23); a reflexão sobre o “crescer e envelhecer das árvores”
(GER 16); “árvores jovens e velhas, ciclo das estações, sons, decomposição”
(GER23); o relacionamento das “idades da fauna e flora brasileira com a idade
humana” (GER 4); a “preservação para gerações futuras” (GER 1);
c) Os sentidos: foram feitas menções à questão da diminuição dos sentidos com a
idade, e da importância de trabalhar para aguçar os sentidos da visão, do tato, da
audição, olfato e paladar, como por exemplo, por meio das “texturas das folhas e
cascas de árvores (GER 3) e das frutas da época (GER 5);
74
d) A importância da biodiversidade: aqui foi citada a relação entre plantas
medicinais e os processos de envelhecimento (GER 8), e as “mudanças de
interpretação dos idosos sobre a importância do meio ambiente com o passar dos
anos” (GER 10); as relações entre o “conhecimento dos idosos sobre biodiversidade
com o conhecimento científico” (GER 11).
3.2 Reflexões sobre os resultados da pesquisa sobre biodiversidade e
educação ambiental no Polo Ecológico
A integração entre as atividades educativas desenvolvidas nas unidades do
Polo é o objetivo principal do convênio firmado entre a Prefeitura Municipal de São
Carlos, a Universidade Federal de São Carlos, e a EMBRAPA (assinado em junho
de 2011). Possibilidades da educação ambiental no Polo já foram exploradas na
dissertação de mestrado de Iared (2010), que pesquisou as concepções das
professoras que participaram de visitas guiadas às unidades, e de profissionais que
trabalham nos espaços. Estas visitas foram realizadas no âmbito do projeto São
Carlos de Todos Nós, cuja estrutura previa que, se uma criança participasse de
todas as visitas, do 1º ao 9º ano, esta teria uma visão bem completa da situação
ambiental, histórica e cultural do município, e teria visitado todas as unidades do
Polo Ecológico. A importância da integração entre as atividades educativas nas
diferentes unidades foi ressaltada em nossa pesquisa, e atribuída ao fato de que
cada um dos locais visitados tem uma especificidade própria, e um enfoque mais
direcionado para um ou outro tema. Também foi observada a questão das espécies
nativas e exóticas, e a importância da ênfase na biodiversidade brasileira. O PESC
destaca-se por promover justamente um trabalho reconhecido de cuidado e
reprodução em cativeiro de exemplares da fauna brasileira. Porém, no horto
municipal, devido à sua própria história, há uma grande variedade de plantas,
inclusive diversas exóticas. Desde 2001 o horto passou a privilegiar a reprodução de
espécies nativas, com vistas principalmente ao plantio urbano. Sendo assim,
paulatinamente árvores nativas vêm sendo introduzidas, mas na própria unidade
permanece grande número de exóticas. A preocupação com a reorientação do
trabalho do horto, no período 2001-2012 pode ser atestada em sua alameda de
acesso, em que mudas de peroba rosa foram plantadas nos intervalos dos grandes
75
pinheiros que ladeiam a estrada, de forma a que cresçam e eventualmente tomem o
espaço destes.
A clivagem entre cidade/área rural, e área urbana/não urbana é recorrente na
maioria das respostas. A área rural (ou não urbana) é apontada como sendo o local
ideal para experiências sensoriais agradáveis de contato com a natureza. Esta
noção de que a natureza é mais saudável/agradável do que a cidade remonta,
segundo Carvalho (2001, p.74), ao período entre os séculos XVIII e meados do
século XIX, quando há a emergência tanto de uma associação da cidade à
insalubridade, devido às consequências da poluição fruto da Revolução Industrial,
quanto de uma nova relação com a natureza, impulsionada pelo romantismo
europeu:
a experiência urbana, marcada pelas inóspitas condições ambientais,
impulsionou o surgimento de um sentimento estético e moral de
valorização da natureza selvagem, não transformada pelos humanos.
Este fenômeno vai repercutir tanto na emergência das chamadas
novas sensibilidades para com a natureza, a partir do século XVIII na
Inglaterra, quanto das idéias de valorização do mundo natural
selvagem (Wilderness) nos EUA, principalmente no século XIX.
A nostalgia por uma natureza virgem, intocada, surge “na contraposição à
violência social e ambiental do mundo urbano” (CARVALHO, 2001, p.75), e leva à
valorização da natureza pela sociedade.
Esta contraposição entre natureza, entendida aqui como uma área natural,
não construída, e a área urbana está presente na maioria das reflexões sobre as
unidades do Polo Ecológico. Seguindo essa orientação que vem da própria
pesquisa, mantivemos aqui o uso das palavras como nos é apresentado pelas
respostas: natureza como local em que há um predomínio de plantas e animais em
oposição a uma concentração de prédios construídos, que caracteriza uma área
urbana. Sendo assim, respeitamos a inclusão das unidades do Polo Ecológico na
área natural/rural, muito embora elas estejam dentro da mancha urbanizada do
município e sejam, na realidade, áreas urbanas.
A importância de experiências na natureza para a formação de um vínculo
com o ambiente natural é citada por diversas/os autoras/es como sendo a origem de
um envolvimento com a educação ambiental e o movimento ambientalista. Isabel
Carvalho, em sua tese sobre a formação de um sujeito ecológico (CARVALHO,
76
2001), encontra nas narrativas colhidas a associação entre memórias de
experiências na natureza, vividas na infância e na vida adulta, e a criação de um
vínculo afetivo com esta, vínculo este que está relacionado ao envolvimento futuro
com a questão ambiental.
Muito já foi discutido na literatura sobre a importância das vivências na
natureza para a criação de vínculo. Na década de 90 houve uma série de artigos
publicados na revista Environmental Education Research (Environmental Education
Research, v.4, n.4, 1998) sobre pesquisas a respeito das chamadas experiências de
vida significativas (Significant Life Experiences - SLE). Embora o tema tenha sido
cercado de controvérsias, suscitando inclusive um número posterior da mesma
revista com artigos que colocavam em dúvida as próprias pesquisas (Environmental
Education Research, v.5, n.4, Nov 1999), o tema – das experiências vividas junto à
natureza e sua importância na formação da relação com a natureza – permanece
presente no campo da educação ambiental. Por exemplo, em 2009, Cachelin,
Paisley e Blanchard (2009) realizaram uma pesquisa sobre a importância da
experiência na natureza, em áreas alagadas no Utah, EUA, usando o referencial da
SLE, e afirmam que o ganho cognitivo e envolvimento emocional das crianças que
participaram das visitas a campo era maior do que daquelas que não puderam
realizar a saída, mas aprenderam sobre esse ecossistema em sala de aula.
A mesma relação é apontada por Lindemann-Matthies (2002) ao avaliar
programas educativos relacionados à biodiversidade. A autora encontra na literatura
exemplos que relatam que a aprendizagem melhora significativamente quando as
aulas são ministradas em ambientes naturais, em oposição a aulas teóricas em sala
de aula. Em sua própria pesquisa, a autora trabalha com foco na observação da
natureza no caminho da escola, e no dia a dia das crianças. A própria observação,
associada ao ensino com base em taxonomia, aumenta o conhecimento das
crianças sobre plantas e animais e ajuda a expandir o número de espécies
conhecidas e nomeadas por elas, aumentando sua percepção da biodiversidade
presente em sua própria vizinhança.
Richard Louv (2008) vai mais longe do que reconhecer a importância das
experiências na natureza, ao identificar uma “desordem de déficit da natureza”
(nature-deficit disorder) nos tempos atuais. O autor pesquisou, junto a escolas e
comunidades, as relações que as crianças têm atualmente com a natureza e
descobriu que, comparado às suas (e de sua geração) próprias experiências, não há
77
mais o contato íntimo com áreas naturais que marcou sua infância. O autor atribui
isso a diversos fatores, entre eles as questões de segurança, que levam as famílias
a temer a ida das crianças às áreas naturais, e a incutir esse temor nas crianças, e
ao crescimento do entretenimento vinculado a jogos e equipamentos eletrônicos. O
crescente processo de urbanização e a conversão de áreas naturais em subúrbios
moveram para cada vez mais distante o que antes era a natureza no próprio quintal
das crianças. Mas embora ele encare isso como a realidade, essa mudança não
vem sem consequências. E é aí que o autor fala sobre esse déficit e indaga como
será o envolvimento dessas crianças com as questões ambientais no futuro, uma
vez que não tiveram a oportunidade de criar um vínculo duradouro com a natureza
na infância. O autor defende também que o contato direto com a natureza é
importante para a própria saúde mental e resiliência espiritual, não apenas de
crianças, mas também de adultos. Isso é citado nas respostas da turma de
Gerontologia em relação às visitas. As estudantes destacaram questões de
socialização, mas também de sensações de bem-estar associadas à presença
nestes locais. Um tema que apareceu nas respostas foi a aceitação do processo de
envelhecimento como algo natural, compartilhado por todos os seres vivos, e a
possibilidade de, nesses locais, observar e traçar paralelos entre o envelhecimento
de seres humanos e de plantas e animais.
Ao tratar da questão da relação entre educação ambiental e as cidades,
McClaren (2009) pondera se a educação ambiental foi concebida, ou percebida,
como um estudo/atividade a ser desenvolvida em lugares onde a influência humana
não se fazia evidente e qual o sentido dessa concepção frente à realidade de que
estudantes e professoras/es envolvidos com a educação ambiental habitam as
cidades. O autor cita a ausência do estudo das cidades no currículo de educação
ambiental de seu país, o Canadá, e preocupa-se com o foco na valorização da
associação do ambiente urbano como uma fonte de problemas ambientais,
enquanto os ambientes naturais seriam mais bonitos e saudáveis. O autor não nega
a importância de experiências em ambientes mais preservados, como é
amplamente citado na literatura (por exemplo, por Richard Louv, 2008), mas
contesta firmemente a tendência em considerar o discurso implícito de separação
entre ser humano e natureza presente na separação cidade/natureza, já que as
cidades são produto da criação humana (McCLAREN, 2009, p. 303). O autor
discorre sobre a influência do local na formação da identidade e da importância da
78
educação ambiental considerar lugares e condições de vida de estudantes, inclusive
elementos construídos, o que favoreceria o engajamento das pessoas com projetos
de ação em suas próprias comunidades.
Com o crescente processo de urbanização, é importante trazer para as áreas
urbanas ideias como a de corredores ecológicos, que podem conectar parques
urbanos e aproximar a população da natureza, e o uso de vegetação nativa na
jardinagem, que pode tanto reduzir o uso de insumos quanto ajudar a trazer de volta
para a cidade espécies nativas, como pássaros (LOUV, 2008). O autor cita uma
série de cidades na Europa que incorporaram essa aproximação com a natureza em
processos de reurbanização, favorecendo plantio de jardins comunitários e a
regeneração de lotes abandonados com plantas nativas. O Polo Ecológico de São
Carlos contém, em sua área, um corredor ecológico que liga áreas de mata nativa
da EMBRAPA com áreas da UFSCar. Já o horto, como mencionado anteriormente,
realiza o trabalho de reprodução de espécies nativas para plantio na área urbana e
em chácaras do município.
A questão do acesso equitativo à natureza, que estava entre as
preocupações originais na formulação do São Carlos de Todos Nós (FRANCO;
THIEMANN; MASSARÃO, 2007), afeta até mesmo populações urbanas em países
ricos. Wals (2010, p. 148) fala sobre a dificuldade de crianças de áreas urbanas na
Escandinávia a áreas naturais, tanto pela distância dessas áreas, quanto pela falta
de transporte e de um currículo sobrecarregado, que não deixa tempo para as
saídas. Se considerarmos importante a vivência experimental em ambientes
naturais, a própria questão do currículo escolar deverá entrar em discussão
eventualmente, como já aconteceu nas escolas municipais de São Carlos em
relação ao São Carlos de Todos Nós e, de forma geral, em escolas de todo o país.
A garantia do direito à educação ambiental nas escolas brasileiras remonta à
Constituição Federal de 1988, tendo sido confirmada na Política Nacional do Meio
Ambiente de 1981 (BRASIL, 1981) e na Política Nacional de Educação Ambiental
(BRASIL, 1999, 2002). Porém foi apenas em 2012 que o Conselho Nacional de
Educação estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Ambiental (BRASIL, 2012). As diretrizes definem, em seu Capítulo II, que:
Art. 7º Em conformidade com a Lei nº 9.795, de 1999, reafirma-se
que a
79
Educação Ambiental é componente integrante, essencial e
permanente da Educação Nacional, devendo estar presente, de
forma articulada, nos níveis e modalidades da Educação Básica e da
Educação Superior, para isso devendo as instituições de ensino
promovê-la integradamente nos seus projetos institucionais e
pedagógicos.
Art. 8º A Educação Ambiental, respeitando a autonomia da dinâmica
escolar e acadêmica, deve ser desenvolvida como uma prática
educativa integrada e interdisciplinar, contínua e permanente em
todas as fases, etapas, níveis e modalidades, não devendo, como
regra, ser implantada como disciplina ou componente curricular
específico.
No Art.17º as diretrizes estabelecem que o planejamento curricular e a gestão
da instituição de ensino devem promover projetos e atividades, inclusive artísticas e
lúdicas, que
valorizem o sentido de pertencimento dos seres humanos à natureza,
a diversidade dos seres vivos, as diferentes culturas locais, a
tradição oral, entre outras, inclusive desenvolvidas em espaços nos
quais os estudantes se identifiquem como integrantes da natureza,
estimulando a percepção do meio ambiente como fundamental para
o exercício da cidadania.
Embora tenha sido mantida nas diretrizes a orientação contrária à
obrigatoriedade da criação de disciplina específica, o que já tinha sido determinado
na PNEA em 1999, é inegável a diretriz da promoção de atividades desenvolvidas
em espaços como os do Polo Ecológico: espaços nos quais os estudantes se
identifiquem como integrantes da natureza. Esta pesquisa aponta que tais espaços,
para permitirem essa identificação, devem ter características consideradas
“naturais”, como parques e áreas verdes.
Com base nos resultados da pesquisa, e à luz de outros estudos já realizados
sobre o tema, não temos dúvida sobre a importância da manutenção de visitas a
áreas como o Polo Ecológico de São Carlos ou similares, tanto por turmas de
estudantes como por membros da comunidade, considerando que a experiência
presencial nestes ambientes, embora não seja obrigatoriamente uma atividade de
educação ambiental, concorre para a realização de alguns de seus objetivos, como
a criação de vínculo afetivo com o espaço, o ganho de conhecimento sobre os
sistemas naturais, as inter-relações entre seres vivos e a possibilidade de fomentar
discussões sobre aspectos relevantes, como a expansão da cidade sobre a zona
rural e questões relacionadas à produção de alimentos, dentre outras.
80
CAPÍTULO 4
OS SENTIDOS DA BIODIVERSIDADE E SUAS POSSIBILIDADES EDUCATIVAS
NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA
Neste capítulo apresentamos e discutimos os resultados da pesquisa
realizada por meio do Método Delphi. Ao elaborar esta etapa da pesquisa, o que se
apresentou como questão foi: como construir, a partir de um grupo composto
majoritariamente por pesquisadoras/es envolvidas/os na área de conservação da
biodiversidade e efeitos de predadores de topo de cadeia em seus ambientes, um
conjunto de orientações para o trabalho com biodiversidade sob a perspectiva da
educação ambiental? E ainda: para que este trabalho fosse realizado sob a égide de
uma educação ambiental crítica, que traz olhares comprometidos com questões
sociais, políticas, éticas, estéticas e de envolvimento e participação, como ir além
das questões científicas que embasam os demais projetos dos grupos do projeto de
pesquisa "Predadores de Topo de Cadeia Alimentar"?
Com o objetivo de ampliar o leque de possibilidades que poderiam resultar da
pesquisa, fizemos algumas escolhas metodológicas: a opção pelo Método Delphi,
que tem como base a busca da opinião de um grupo a respeito de um tema em
questão e a inclusão de outros dois grupos na pesquisa, um deles (ao qual
pertencemos) de pesquisa em educação ambiental, e o outro de estudantes da área
de Ciências Biológicas. A opção por continuar a transitar pela área de Ciências
Biológicas e afins (um dos participantes, por exemplo, é da Engenharia Ambiental) é
justificada porque o Método Delphi deriva sua confiabilidade do fato de que as
pessoas que participam têm uma opinião fundamentada sobre o tema em questão.
Isso não quer dizer que tenham que ser especialistas com graduação universitária
na área, mas é necessário que já tenham tido a oportunidade de refletir sobre o
assunto. Por isso consideramos importante selecionar as pessoas com base em sua
atuação profissional, formação ou contato, como estudante, com os temas (como foi
o caso das estudantes da disciplina de “Educação Ambiental para a Conservação da
Biodiversidade”).
A elaboração do questionário inicial baseou-se em questionário utilizado em
estudo sobre o tema (biodiversidade e educação ambiental) conduzido por Van
Weelie e Wals na Holanda em 1999. Para a elaboração do questionário original, que
foi traduzido, adaptado e utilizado na pesquisa, os autores consultaram uma série de
81
profissionais de diversas áreas, incluindo artes, ciências e filosofia. Isto fez com que
o questionário trouxesse uma série de reflexões e perspectivas variadas sobre o
conceito da biodiversidade. O trabalho foi conduzido em uma perspectiva crítica da
educação ambiental e produziu uma série de passos para a condução da educação
ambiental com o tema da biodiversidade (VAN WEELIE; WALS, 1999; VAN
WEELIE; WALS, 2002). Na pesquisa original os autores observaram diversas
maneiras de se perceber a biodiversidade e como mesmo entre pesquisadoras/es
da área não há consenso quanto à sua definição. Sendo assim, consideramos que o
ponto inicial da análise dos dados seria compreender qual o sentido que as pessoas
estavam atribuindo à biodiversidade quando falavam sobre o tema.
A própria opção de não fazer a pergunta de forma direta é uma escolha
metodológica. As afirmativas oferecidas no questionário possibilitaram uma reflexão
sobre o tema e foi nas justificativas/motivações oferecidas para as escolhas que as
formas como as pessoas percebem/apreendem a biodiversidade afloraram, e deram
origem, por uma via interpretativa, à criação das categorias de sentidos atribuídos à
biodiversidade.
4.1 Os sentidos atribuídos à biodiversidade
No questionário DELPHI SISBIOTA ETAPA 1 (APÊNDICE 1) pediu-se às/aos
participantes para concordarem ou discordarem de uma série de afirmativas,
utilizando uma escala LIKERT (COHEN; MANION; MORRISON, 2010, p. 326), com
a possibilidade de apresentar a motivação para suas escolhas. As afirmativas
tratavam do conceito de biodiversidade e sua relação com a educação ambiental, e
estão listadas no Quadro 3.
Quadro 3_Afirmativas sobre biodiversidade e educação ambiental (adaptado de VAN
WEELIE; WALS, 1999).
AFIRMATIVAS – “concordo plenamente” a “discordo plenamente”
1 Biodiversidade é, essencialmente, uma nova forma de se referir a tudo que tem a
ver com a relação entre pessoas e natureza.
2 O poder da biodiversidade não está necessariamente em seu significado biológico
ou científico, mas muito mais em seu significado político, ao renovar a atenção para
a conservação da natureza (em nível global).
3 Educadoras e educadores ambientais precisam concordar com uma definição e
significado único de biodiversidade, para que ela (biodiversidade) tenha qualquer
potencial educativo.
82
4 O valor da biodiversidade para a educação ambiental está no fato de que o termo
“biodiversidade” tem uma variedade de significados distintos.
5 É muito útil discutir se é possível afirmar que algumas espécies são mais valiosas
do que outras.
6 Em educação, é importante lidar com os diferentes significados da biodiversidade,
seja como conceito simbólico, ou como conceito baseado em dados empíricos.
7 O ensino da biodiversidade seria incompleto se diversidade cultural não estiver
incluída.
8 A natureza pode ser melhor entendida quando distinguimos entre categorias como:
genes, espécies e ecossistemas.
9 A natureza pode ser melhor avaliada quando distinguimos entre categorias como:
genes, espécies e ecossistemas.
Fonte: Elaborado pela autora.
Conforme descrito anteriormente, a análise das respostas foi conduzida por
meio da interpretação do texto, entendida aqui como uma “conversação
hermenêutica” (GADAMER, 2012, p.502). Nesta conversação, a/o intérprete
participa do sentido do texto e traz para a interpretação seus próprios pensamentos,
o que permite que aflorem, por meio desta compreensão via interpretação, sentidos
que agora são compartilhados entre autor/a e intérprete (GADAMER, 2012, p.503).
Portanto não são relacionadas aqui as respostas conforme escritas, mas já o
resultado dessa conversação. Estes resultados foram compartilhados com o grupo
na forma da segunda etapa do Delphi, para permitir a cada participante conhecer os
resultados e posicionar-se com relação a estes. Sendo assim, os sentidos atribuídos
e temas puderam ser considerados e comentados pelo grupo.
Em nossa pesquisa usamos categorias emergentes, e não pré-definidas, para
a análise de dados, as quais foram criadas a partir da leitura criteriosa e cuidadosa
dos dados obtidos. No processo de análise as respostas foram codificadas, como
etapa instrumental, para permitir o retorno e confirmação da seleção das ideias e
criação das categorias. Esta codificação é apresentada no corpo do texto quando há
transcrição literal de trechos de texto dos questionários, colocados entre aspas.
Neste caso, está identificado o grupo a que pertence a/o autora/autor do texto
(Grupo A, B ou C), seguidos do número de identificação dos questionários em cada
grupo, que variam de 1 a 14, conforme o número de participantes. Sendo assim, C3
refere-se à resposta da participante 3 do Grupo C. Como o nosso interesse estava
na construção coletiva do produto do trabalho, e não foram encontradas
divergências que justificassem outra abordagem, não há separação das respostas
83
por grupo participante. A identificação do grupo serve aqui apenas como referência
para a leitura.
Os sentidos da biodiversidade
As seguintes categorias de sentido foram criadas a partir da pesquisa:
Concretude, Simbólico, Conhecimento, Holismo, Caleidoscópio, Oculta, Ameaçada,
Inclusiva e Exclusiva.
Em primeiro lugar, buscamos esta resposta nas motivações oferecidas às
escolhas feitas no questionário DELPHI SISBIOTA ETAPA 1, quando foi pedido
às/aos participantes para concordarem ou discordarem de uma série de afirmativas
que tratavam do conceito de biodiversidade, e sua relação com a educação
ambiental (Quadro 3).
Uma categoria de sentido que apareceu com muita força é o que
denominamos a Concretude da biodiversidade. Isto quer dizer que a biodiversidade,
apesar de ser um “conceito humano” (B1), é percebida como uma realidade
concreta, palpável, de existência “independente dos seres humanos” (B1), que
“sempre esteve ali” (C1). Esta biodiversidade pode ser auferida, medida, existe em
uma área definida – é o “número de formas diferentes de vida em uma determinada
área” (A4). Ao refletir sobre as afirmativas na Quadro 3, ficou claro que para as/os
participantes é importante que o próprio conceito de biodiversidade adotado seja
explicitado nas interações educativas e que seja respeitada a parte essencial de seu
significado, mesmo que o processo de definição contemple uma multiplicidade de
significações e perspectivas das/os participantes. Essa referência a uma “parte
essencial” (A13) reflete a concretude do sentido e remete às definições conceituais
mais usadas de biodiversidade, como por exemplo, “riqueza e abundância de
espécies em uma localidade” (C5).
Outra categoria de sentido que emerge foi nomeada Simbólico. Aqui a
biodiversidade
assume
seu
papel
de
simbolizar
o
relacionamento
ser
humano/natureza. Este “significado simbólico para a sociedade” (C2) é “revelado
pelos tempos de crise ambiental” (C2). O próprio conceito foi “popularizado e
comercializado” (C5), como aconteceu com os de meio ambiente e desenvolvimento
sustentável. A biodiversidade adquire também o sentido Conhecimento. Em relação
ao poder do conceito de biodiversidade, fica claro que o poder político que a
84
biodiversidade tem ou pode ter advém da ciência e do conhecimento científico –
“quanto mais se esclarece o tema, mais força ganha seu valor biológico” (A8). O
“significado político da biodiversidade é embasado pelo significado biológico ou
científico” (C6), apontando que o sentido da biodiversidade aqui é de embasamento,
com dados científicos, da esfera política. É por meio do conhecimento que se
entende o valor da biodiversidade, e ela pode ter poder político.
Na argumentação que levou à criação do sentido Conhecimento há uma
atribuição de valor da biodiversidade, afirmando-se tanto que “a biodiversidade
possui valor intrínseco” (A13), como a importância da “valoração econômica com
relação aos bens e serviços prestados pela biodiversidade” (B5). Mas o sentido da
biodiversidade para os grupos pesquisados de forma geral prescinde da atribuição
de valor a espécies específicas, o que levou à criação da quarta categoria, o
Holismo. Os argumentos sugerem que o valor da biodiversidade está no todo, e não
nas partes – deve-se “trabalhar com uma visão ecossistêmica, na qual todas as
espécies são importantes” (C4). As exceções à restrição quanto à discussão de
valor de espécies específicas são feitas em relação a quando “esse processo
oferece subsídios para sua conservação” (C5), quando a atribuição de valor pode
“ajudar a definir prioridades” (A10) de conservação e quando a discussão está
centrada no próprio processo de atribuição de valor – podemos “inserir o ser
humano na discussão: somos mais valiosos?” (B3).
Em seguida, buscamos compreender os sentidos da biodiversidade
depreendidos na leitura das motivações para a escolha ou sugestão dos temas que
poderiam servir como estímulo para aprender e motivar-se a agir para a
conservação da biodiversidade. Estes temas (apresentados e/ou sugeridos estão
discutidos a seguir).
Da apresentação da motivação para os temas escolhidos, destacaram-se três
categorias de sentido para a biodiversidade: ela é percebida ora como um
Caleidoscópio, ora como Oculta, ora como algo que necessita proteção, com o
sentido de Ameaçada.
O sentido Caleidoscópio é depreendido do componente de diversidade da
biodiversidade:
diversidade
de
culturas,
formas,
sabores,
receitas,
sons,
combinações. Aflora por exemplo da sugestão de temas como a “Biodiversidade e
seus valores através do mundo” (C2) e “Brasil, seus biomas e sua população” (A1),
e do uso de um brinquedo de peças que podem se encaixar em “infinitas
85
combinações” (A1). A escolha do objeto caleidoscópio para nomear esta categoria
foi feita porque, com o caleidoscópio, pequenas formas coloridas podem ser
combinadas, e cada combinação dá origem a uma imagem nova, que pode ser
radicalmente diferente das anteriores.
O sentido de ocultamento (categoria Oculta) surge da necessidade observada
de desvelamento. A biodiversidade aparece como algo que, apesar de estar ao
redor, não é visto, e por isso é preciso direcionar o olhar para ela, como nos temas
“Clicando a biodiversidade” (A10), que sugere o uso da fotografia para mostrar
“descobertas das riquezas naturais e culturais” (A10) ou “Seres vivos (e culturas)
brasileiros” (B3), que sugere o foco na biodiversidade local, menos representada na
mídia.
Por último, o sentido da biodiversidade como alvo de ameaças (categoria
Ameaçada), que merece e precisa de proteção. Este sentido aparece relacionado
aos temas “Unidades de Conservação13 e conflitos” (escolhido por 3 participantes),
“Conservação da biodiversidade e expansão da fronteira agropecuária” (escolhido
por 3 participantes) e “(Re)Conectando a biodiversidade” (proposto por A7). A
motivação para escolher trabalhar com esses temas parece denotar uma
preocupação com as ameaças sofridas pela biodiversidade.
Em relação ao ser humano, é possível perceber duas posições: o ser humano
como parte da biodiversidade ou como expectador externo. Se entendermos “o ser
humano como parte da biodiversidade” (B4), temos a inclusão da diversidade
cultural, pois “considerando o homem e seu meio ambiente, devemos considerar a
cultura” (C9) no sentido atribuído à biodiversidade. Porém, quando os seres
humanos são percebidos como externos à natureza, sua relação com a
biodiversidade é vista como interferência. Os próprios parâmetros da biodiversidade
podem ser afetados pelo ser humano – “o parâmetro responde à relação entre as
pessoas e a natureza” (C4), o que indica que o ser humano é externo a ela. O
sentido da biodiversidade inclui a cultura? Quando o ser humano é considerado
parte da biodiversidade, a diversidade cultural é incluída porque faz parte da
diversidade humana. Mas para quem considera que o ser humano não é parte
intrínseca da biodiversidade – se ela é só “diversidade de formas biológicas, outras
diversidades não representam a biodiversidade” (A11), a diversidade cultural não
As Unidades de Conservação (UCs) são regidas pelo SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
da Natureza, Lei no. 9.985 de 18 de Julho de 2000.
13
86
precisa ser incluída. Disto compreendemos duas categorias de sentido, específicas
para esta relação: Inclusiva e Exclusiva.
O Quadro 4 apresenta as categorias emergentes e exemplos dos indicadores
descritivos que levaram à criação das categorias. Neste Quadro 4 as categorias já
estão ordenadas de forma a refletir a relevância atribuída aos sentidos criados
pelas/os participantes, após a realização do DELPHI SISBIOTA ETAPA 2.
Quadro 4_Categorias emergentes e indicadores descritivos que levaram à criação das
categorias de sentido para a biodiversidade.
Categorias
emergentes
Indicadores descritivos
Holismo
“visão ecossistêmica...todas as espécies são importantes” (C4);
“a partir do momento que se entende o que é biodiversidade,
não faz mais sentido achar que há espécies mais valiosas”
(C7).
Ameaçada
“conservação de várias espécies vulneráveis”
“fragmentação de habitats e perda de espécies” (C1).
Oculta
“ampliar a percepção” (A10); conhecer mais a biodiversidade
local” (B3).
Inclusiva
“entende o ser humano como parte da biodiversidade” (B4); “a
diversidade cultural é intrínseca à diversidade dos seres
humanos” (A13).
Concretude
“existe biodiversidade independente dos seres humanos”(B1);
“fato que sempre esteve ali”(C1); “número de formas diferentes
de vida...” (A4).
Conhecimento
“quanto mais se esclarece o tema, mais força ganha seu valor
biológico”
(A8);
“significado
ecológico
concreto
de
dependência...auxilia no seu significado político” (B2).
Caleidoscópio
“formar infinitas combinações” (A1); “diversidade na nossa
alimentação” (B1).
Simbólico
“significado simbólico...de relacionamento com a natureza”(C2);
“conceitos..popularizados e comercializados” (C5).
Exclusiva
“parâmetro responde à relação entre as pessoas e a natureza”
(C4); “diversidade de formas biológicas” (A11); “as relações
ecológicas, os processos, ocorrem independente da presença
humana” (B1);
(A4);
Fonte: Elaborado pela autora.
87
O processo de interpretação das respostas e criação das categorias, que
foram depois referendadas pelos grupos participantes, mostra alguns pontos que
valem ser ressaltados. As categorias não são excludentes entre si. Os mesmos
trechos poderiam ser utilizados para justificar a criação de mais de uma delas. Este
processo de classificação de texto em categorias originais ou já existentes não
significa que estas sejam monolíticas, ou estáveis, como já demonstraram, por
exemplo, Sauvé (2005), em seu trabalho com as cartografias da educação
ambiental, e Iared et al. (2011), ao analisarem livros didáticos, atividades de
educação ambiental em Unidades de Conservação e discursos de professoras de
ensino fundamental. No entanto, as categorias são uma forma de organizar e
apresentar os dados, e de colocar em relevo os aspectos que foram considerados
mais importantes nas respostas.
A categoria Caleidoscópio foi questionada por um dos participantes da
pesquisa por parecer não representar a ideia pretendida. Uma alternativa talvez
possa ser mudar a denominação para Mosaico, ou Tear, mantendo a ideia de que, a
partir da combinação de blocos, fragmentos, fios, é possível montar mais de um
produto diferente, como os genes podem ser combinados de forma a resultar em
seres tão distintos e diversos como os que habitam o planeta.
A categoria Holismo, criada como as demais em função da pesquisa,
encontra ressonância na literatura. Sua descrição a torna muito semelhante ao que
Oksanen (1997, p.544) denomina “holismo ecocêntrico” no qual a ênfase está no
todo: espécies, ecossistemas, a biosfera e os processos que mantêm a vida. O
conceito de holismo está presente ainda nas discussões sobre a ética e a educação
ambiental. Grün (2005) discorre sobre o prestígio e aceitação que o enfoque
holístico encontra atualmente na área, e alerta para que não se substitua sem
critério a visão antropocentrista por uma visão holística que, se não respeitar a
distinção entre Natureza e Cultura, no afã de integrar seres humanos à Natureza,
terminaria por tirar desta sua alteridade. O autor propõe a hermenêutica filosófica
como um caminho que pode ajudar a resolver esse impasse, ao respeitar as
relações entre a parte e o todo e desta forma preservar a distinção entre Cultura e
Natureza (GRÜN, 2005, p. 49). Nas respostas à pesquisa, nos parece que o enfoque
holístico de Grün corresponderia melhor ao que denominamos categoria Inclusiva, e
a categoria Holismo criada aproxima-se mais da descrita por Oksanen (1997).
88
A categoria Exclusiva, que reflete a separação ser humano-natureza, foi a que
teve menos ressonância com o grupo (apenas 5 dentre 24 pessoas a consideraram
relevante para a sua visão do que deve ser o trabalho de educação ambiental com
biodiversidade), provavelmente em contraposição à visão holística, que foi
referendada por 19 de 24 participantes do DELPHI SISBIOTA ETAPA 2, o que
parece corroborar a visão de Grün sobre a prevalência do enfoque holístico em
educação ambiental, como citado anteriormente.
4.2 Temas oferecidos pelo grupo para abordar a biodiversidade em processos
educativos na perspectiva da educação ambiental crítica
No questionário inicial (DELPHI SISBIOTA ETAPA 1) foram apresentados
cinco temas que poderiam servir como estímulo para aprender e motivar-se a agir
para a conservação da biodiversidade, os quais foram selecionados pelas/os
participantes (indicadas/os entre parênteses14):
1. Biodiversidade no seu prato (A9, B1, B7);
2. Biodiversidade em Trilhas da Natureza (A12, C7);
3. Natureza como vizinha: biodiversidade em áreas urbanas e proximidades (B9, C5,
C9);
4. Conservação da Biodiversidade e expansão da fronteira agropecuária (C4, C6,
C8);
5. Unidades de Conservação e conflitos (A4, B4, C1).
Além de selecionar temas dentre os sugeridos, as/os participantes
acrescentaram outros dezesseis temas originais como alternativas para trabalhar
com o conceito de biodiversidade, somando ao todo 21 temas:
6. Brasil, seus biomas e sua população (A1);
7. LEGO15 (A1);
8. Biodiversidade: e eu com isso?(A5);
9. Funcionamento da Terra e a biodiversidade (A6);
10. (Re)Conectando a biodiversidade (A7);
11. Biomas e biodiversidade (A8);
14
As letras e números entre parênteses identificam a/o participante, conforme descrito anteriormente em 5.1.
LEGO é a marca de um brinquedo de blocos de montar, baseada na Dinamarca, nos quais o encaixe perfeito
das peças e uma grande variedade de cores e formatos permitem a criação de diversas estruturas distintas.
15
89
12. Clicando a biodiversidade (A10);
13. Aves aquáticas e áreas alagadiças – uma aliança estratégica (A13);
14. Biodiversidade arte e cultura popular (B2);
15. Seres vivos (e culturas) brasileiros (B3);
16. Sentindo e contemplando a biodiversidade (B5);
17. Biodiversidade como funcionamento do sistema (B6);
18. Importância da preservação das florestas (B8);
19. Biodiversidade e seus valores através do mundo (C2);
20. Conhecimento dos animais e plantas (C3);
21. Biodiversidade no Limite (C10).
As/os participantes A2 e A11 não denominaram suas sugestões, mas
ofereceram propostas que estão incluídas na pesquisa. A3 não respondeu a
questão.
Todos estes temas (originais ou sugeridos) foram usados na construção do
Quadro 5, que apresenta seis possibilidades e sugestões de atividades educativas,
criadas a partir dos temas, para trabalhar com biodiversidade em processos
educativos guiados por uma perspectiva crítica de educação ambiental. Novamente
essas possibilidades são fruto de um esforço de interpretação da pesquisadora em
diálogo com as motivações apresentadas pelas/os participantes. É importante
ressaltar ainda que, como em relação às categorias, também as possibilidades
relacionadas poderiam abrigar outros temas e são apenas uma das propostas
possíveis de organização dos resultados.
Quadro 5_Possibilidades de abordagem do tema da biodiversidade em processos
educativos.
Possibilidades
emergentes
de
trabalho
1.Experimentar a biodiversidade
2.“Abrir os olhos”
biodiversidade
90
para
Sugestões de atividades educativas
propostas
Sentido de experiência, como na sugestão
de usar peças idênticas (LEGO) para
montar combinações e produtos finais
diversos; relações entre biodiversidade e
alimentação; trilhas da natureza.
a
Uso da fotografia; aves aquáticas e áreas
alagadiças; canções; teatro, histórias;
confecções; ênfase na biodiversidade
brasileira; folclore, festas tradicionais.
3.Exercitar diálogo/debates
Discutir conflitos em UCs; exercício crítico;
desvelamento das “engrenagens”; outros
fazeres, como a agroecologia; expansão
agropecuária e biodiversidade.
4.Perceber a importância da
biodiversidade e os limites da
interferência humana
Observar a presença de elementos da
biodiversidade no cotidiano; pensamento
sistêmico; preservação das florestas;
conhecer a diversidade.
5.Biodiversidade
território
Trilhas urbanas; processos históricos de
ocupação do território.
no
próprio
6.Superação da fragmentação do
ensino
Visão holística da natureza.
Fonte: Elaborado pela autora.
A composição das possibilidades de trabalho mostra que as diversas
sugestões de atividades trazem abordagens criativas para o tema, onde são
privilegiados conteúdos científicos, como os processos envolvidos na origem da
biodiversidade (sua origem na combinação infinita de “blocos”, como genes, aqui
exemplificados pelo brinquedo LEGO), mas onde o ensino sobre biodiversidade
envolve um exercício crítico que busca debater e entender os processos que estão
ameaçando sua conservação, como na questão dos conflitos em Unidades de
Conservação onde valores sensoriais e não apenas cognitivos são considerados,
como em atividades que envolvem manifestações artísticas.
Como as categorias de sentido apresentadas na seção 5.1 foram criadas em
parte com base nas motivações apresentadas para a escolha/elaboração dos temas,
indicamos aqui as categorias relacionadas, sempre que for pertinente.
As possibilidades agrupadas como Experimentar a biodiversidade refletem
aquelas em que é possível ter uma experiência sensorial em relação à
biodiversidade e estão relacionadas ainda à categoria de sentido Caleidoscópio. Em
relação ao brinquedo LEGO, a ideia é ter uma experiência pessoal de como a
biodiversidade é formada, a partir de inúmeras combinações de um número limitado
de peças iguais (A1). Aqui estão também as sugestões de trabalho com a
alimentação, em que a proposta é observar a origem dos alimentos, tanto em sua
diversidade quanto em termos da presença de produtos da biodiversidade brasileira
na alimentação cotidiana (ou ausência destes) e aspectos relacionados a formas
alternativas de sua produção (sugeridos por A9, C2, B7, B1). Por fim foi incluída a
91
atividade “Biodiversidade em Trilhas da Natureza”, que permite experimentar as
sensações propiciadas pelo contato direto e a aprendizagem sobre biodiversidade
no ambiente (A12, C7).
Em “Abrir os olhos” para a biodiversidade estão as sugestões
relacionadas à categoria de sentido Oculta, uma vez que trazem uma série de ideias
para que se perceba a biodiversidade, seja por meio de fotografia, de canções e
outras manifestações culturais, do folclore, do próprio uso da biodiversidade
brasileira na confecção de artesanato, com enfoque para a cultura e biodiversidade
brasileiras. Esta ênfase é justificada em contraposição à presença dominante, na
mídia e nas publicações (principalmente voltadas ao público infantil) de forma geral,
de animais que não são de nossa fauna (B2, B3, C2, A10, C3). Neste grupo foram
incluídas as sugestões relacionadas à observação de aves, não só visuais, mas por
meio de suas vocalizações, e as aves que utilizam áreas alagadiças, um grupo que
inclui aves residentes e migratórias (A13, B5).
Agrupadas em Exercitar diálogo/debates estão as propostas que também
deram origem à categoria Ameaçada, criada a partir das motivações apresentadas
por várias/os participantes (A7, A4, B4, C1, C4, C6, C8). Aqui a ideia é dialogar
sobre as questões relacionadas à criação de áreas protegidas e Unidades de
Conservação, a sua importância e os problemas que costumam surgir quando há
populações residentes no interior ou entorno dessas áreas, e a expansão da
fronteira agropecuária, que pode ser um motor de perda de biodiversidade. Estão
incluídos os debates sobre a produção agrícola, com as monoculturas, o uso de
agrotóxicos, plantios transgênicos e as alternativas da agroecologia e dos cultivos
orgânicos, além da polêmica em torno da revisão do Código Florestal, ocorrida ao
longo de 2012, que culminou com uma nova legislação mais leniente em questões
de preservação ambiental. (foram promulgadas as leis: Lei No. 12.651, de 25 de
maio de 2012 e Lei No. 12.727, de 17 de Outubro de 2012, que alteram e revogam
outras leis e decretos, dentre estes a Lei No. 4.771, de 15 de Setembro de 1965, a
lei do Código Florestal).
Em
relação
às
sugestões
para
se
Perceber
a
importância
da
biodiversidade e os limites da interferência humana, como naquelas dadas
anteriormente para se desvelar a biodiversidade que parece oculta, a intenção é a
observação da biodiversidade no dia-a-dia, reconhecendo sua importância para a
vida humana, mostrando que quase tudo que usamos como roupas, alimentos e
92
produtos têm sua origem na biodiversidade (A5), “discutir a importância da
biodiversidade para a preservação das florestas” (B8), introduzir o pensamento
sistêmico (B6), que se aproxima da categoria Holismo, e finalmente que existe um
limite para a interferência humana (C10). Outra categoria que se aproxima deste
tema é Conhecimento, em relação à atribuição de valor à biodiversidade pelo
reconhecimento de sua importância para o ser humano.
O reconhecimento da Biodiversidade no próprio território, o tema seguinte,
pode ser feito por meio de trilhas dentro da própria cidade e proximidades, como em
áreas verdes e praças, aproveitando para discutir o próprio processo de ocupação
urbana e sua história (B9, C9), ou por meio do enfoque nos biomas e na
biodiversidade local, inclusive colocando em pauta a discussão de valores
econômicos, sociais e culturais (A8, C5). Este tema pode ainda ser associado à
categoria de sentido Oculta, por ter também um caráter de desvelamento da
biodiversidade no ambiente urbano e território.
O tema da Superação da fragmentação do ensino é proposto em função de
uma ausência de uma visão holística, percebida por A11, que explore ao mesmo
tempo as funções e a importância de cada componente da natureza e suas interrelações, o que poderia auxiliar inclusive a debater questões como consumo,
exploração, respeito, com uma ênfase no valor intrínseco de cada ser vivo e seu
direito à existência. Este tema está ainda relacionado à categoria Holismo. Incluída
neste tema está a sugestão do estudo da Terra e biodiversidade, oferecido por A6,
que propõe um enfoque nas relações entre os fenômenos físicos e processos de
organismos vivos.
A relação entre os temas propostos para abordar o ensino da biodiversidade
sob a perspectiva da educação ambiental e as categorias de sentidos atribuídos à
biodiversidade estão sistematizadas no Quadro 6.
Quadro 6_A relação entre os temas propostos e as categorias de sentido.
Possibilidades de trabalho emergentes
Categorias de sentido
1.Experimentar a biodiversidade
Caleidoscópio
2.“Abrir os olhos” para a biodiversidade
Oculta
93
3.Exercitar diálogo/debates
Ameaçada
4.Perceber a importância da biodiversidade e os
limites da interferência humana
Holismo;
Conhecimento
5.Biodiversidade no próprio território
Oculta
6.Superação da fragmentação do ensino
Holismo
Fonte: Elaborado pela autora.
Considerações sobre os temas propostos
Alguns dos temas propostos tratam da questão da biodiversidade e do espaço
local, já discutidos no Capítulo 4, em relação à educação ambiental e biodiversidade
no Polo Ecológico de São Carlos e no programa São Carlos de Todos Nós, e é
interessante notar que as questões relacionadas à importância das experiências na
natureza, e da biodiversidade em um contexto local, foram enfatizadas também nos
temas sugeridos neste estudo Delphi. Isso mostra a relevância do trabalho de
educação ambiental nestes âmbitos, da vivência e do contexto local.
O caráter sensorial do trabalho com biodiversidade, e a diversidade de
abordagens que privilegiem aspectos da cultura, flora e fauna brasileiras estiveram
presentes em ambas as partes da pesquisa. Esta ênfase na biodiversidade brasileira
na educação é defendida por John (2006), que vincula a apropriação cultural da
nossa biodiversidade a uma exposição maior da população aos elementos que são
parte dela. Ao contrário de privilegiar animais de outros continentes, é fundamental
que sejam divulgadas as nossas espécies nativas e as tradições culturais e
populações tradicionais com conhecimentos sobre essas espécies. A mesma autora
propõe ainda que outros sentidos, além da visão, sejam apurados na percepção da
biodiversidade, como já foi sugerido por estudantes da Gerontologia em relação ao
trabalho com idosos no Polo Ecológico de São Carlos. Aspectos culturais foram o
foco das estratégias do trabalho educativo junto à comunidade de entorno do Parque
Nacional da Serra da Canastra, voltado à conservação do lobo-guará, que teve
como ponto forte o desenvolvimento de atividades culturais, como a produção
coletiva de um livro sobre a região e a produção e exibição de vídeos e filmes sobre
a região e o lobo-guará (BIZERRIL; SOARES; SANTOS, 2011).
94
Os conflitos relacionados à conservação da biodiversidade em áreas
protegidas e em seu entorno e a importância da educação ambiental para o tema já
foram afirmadas em diversos trabalhos, como aqueles citados no capítulo 2 da tese.
Em pesquisa realizada no Vale do Ribeira, Carvalho, Grün e Avanzi (2009)
encontram uma região em que há várias áreas protegidas sob a forma de Unidades
de Conservação, e testemunham o descontentamento de moradores com as
medidas de conservação adotadas. O meio ambiente, em sua visão, torna-se uma
restrição, contrapondo-se à vida das/os moradoras/es do local e coagindo suas
práticas. O trabalho educativo segue a via do diálogo, da escuta das comunidades
locais, que respeita sua história, não impondo seu próprio conceito de meio
ambiente, mas buscando compreender os sentidos atribuídos ao espaço pela
comunidade. Ainda em relação às áreas protegidas, os princípios do diálogo e da
transdisciplinaridade, que visa promover a “convergência de conhecimentos e
saberes diversos para a elaboração conjunta e integrada de ações”, são parte do
conjunto de iniciativas da Estratégia Nacional de Comunicação e Educação
Ambiental – ENCEA – do SNUC (BRASIL, 2011, p.5), que tem como um de seus
objetivos a promoção da educação ambiental em Unidades de Conservação
brasileiras. O modelo de áreas protegidas, com a criação de parques nacionais em
que não há moradores permanentes, foi criado nos Estados Unidos e apropriado por
outros países, como o Brasil, mesmo sofrendo críticas por sua visão de separação
ser humano/natureza e por desconsiderar a convivência de populações em áreas
naturais como se encontra no País (DIEGUES, 1996). A educação ambiental neste
âmbito (orientada pela ENCEA) precisa lidar com a complexidade da situação criada
pela legislação, que estabeleceu (por meio do SNUC) áreas de proteção integral em
regiões com populações residentes.
As áreas protegidas, na forma de matas ciliares e reservas de mata nativa,
são ponto focal na discussão sobre conservação de biodiversidade e expansão da
fronteira agrícola. A monocultura e a consequente perda de biodiversidade podem
ser discutidas em contraponto a alternativas como a agroecologia, que prioriza a
diversidade no plantio e o cultivo orgânico, que não utiliza os fertilizantes e
defensores químicos vastamente aplicados nas monoculturas, com consequências
nefastas para o ambiente e a saúde humana. Segundo Foley et al. (2011), 38% da
superfície terrestre é ocupada pela agropecuária. Os impactos ambientais
decorrentes da agropecuária incluem a conversão de áreas naturais em plantações
95
e pastagens e a intensificação do uso de áreas existentes, o que aumenta o uso e
consequente contaminação do solo e da água por produtos químicos. São
propostos um conjunto de medidas que visam aumentar a produção, distribuição e
acesso aos produtos, enquanto ao mesmo tempo reduzindo emissão de gases de
efeito estufa, uso e poluição da água, e perda de biodiversidade, já que uma das
medidas prevê que não haja expansão territorial de áreas cultivadas. A valorização
da biodiversidade em sistemas agrícolas, baseada em um resgate do conhecimento
tradicional e na cultura local, tem demonstrado resultados positivos, como é
apresentado por Almeida, Jantara e Petersen (2008) na Paraíba e na região Sul do
Brasil.
No Brasil, 2012 foi o ano em que foi votada a lei que substituiu o Código
Florestal de 1965 (Lei No. 4771/65), considerado um modelo de legislação no que
se refere à proteção de áreas verdes, como topos de morros, encostas, matas
ciliares e matas nativas em áreas rurais. Moreira (2011) apresenta os principais
aspectos da lei e as propostas de sua alteração. A nova legislação
16
remove uma
série de restrições que protegiam as áreas de mata, abrindo espaço para sua
conversão em área agrícola, com consequências danosas à biodiversidade. As
alterações do Código Florestal são um dos tópicos sugeridos para discussão/debate
na pesquisa.
O respeito à natureza e aos seus limites, tema proposto por uma das
participantes (Biodiversidade no Limite - C10), é situado por Carvalho (2001, p.61)
na esfera da ética ambiental:
esta crença alimenta a utopia de uma relação simétrica entre os
interesses das sociedades e os processos da natureza. Na
perspectiva de uma ética ambiental, o respeito aos processos vitais e
aos limites da capacidade de regeneração e suporte da natureza
deveriam ser balizadores das decisões sociais, e reorientadores dos
estilos de vida e hábitos coletivos e individuais.
A necessidade de reorientação dos padrões de relação com o ambiente
natural, ancorada por valores éticos, é reconhecida ainda por Carvalho et al. (1996).
As/os autores citam o trabalho de Aldo Leopold, que na década de 30 já reivindicava
que a relação ser humano/natureza fosse regida por um sistema ético.
16
Lei No. 12.651, de 25 de maio de 2012 e Lei No. 12.727, de 17 de Outubro de 2012.
96
A biodiversidade presente no próprio território foi discutida no capítulo 4, que
tratou da educação ambiental e biodiversidade no programa São Carlos de Todos
Nós e no Polo Ecológico de São Carlos. Trilhas interpretativas da natureza são
muito utilizadas em educação ambiental. Di Tullio (2005) fez da própria elaboração
da trilha, construída de forma participativa, uma estratégia de educação ambiental.
No São Carlos de Todos Nós, além das visitas às unidades do Polo Ecológico já
relatadas, as visitas incluíam uma caminhada pela área central da cidade, onde
algumas praças bem arborizadas chamam a atenção. A arborização urbana, as
microbacias hidrográficas e os processos históricos de ocupação do município, que
podem ser relembrados por meio das memórias das/os habitantes, podem ser
atividades de educação ambiental desenvolvidas neste tema. A questão da memória
associada à biodiversidade foi inclusive uma das estratégias propostas para o
trabalho com pessoas idosas no capítulo 4. A conservação da biodiversidade em
áreas urbanas é o foco do artigo de Dearborn e Kark (2009, p.434), que citam sete
motivações principais para a conservação, dentre elas a criação de corredores
ecológicos, a responsabilidade ética para com os demais seres vivos, a melhoria do
bem estar das populações humanas e a conexão das pessoas com a natureza e
promoção da educação ambiental. Estes autores identificam nas áreas urbanas a
oportunidade de trabalhar com educação ambiental com um público que não tem
condições (ou motivação) para se locomover para áreas não-urbanas, aonde a
educação ambiental baseada em vivências na natureza é tradicionalmente realizada.
Este tema reforça mais uma vez a importância do Polo Ecológico de São Carlos
como um espaço educador, onde podem ser concretizadas algumas das atividades
e reflexões sobre biodiversidade e educação ambiental apresentadas na pesquisa.
Em relação à preocupação com a fragmentação do ensino, um dos temas
sugerido, Oliveira (2012, p.181) defende que “a abordagem transdisciplinar busca a
superação dos problemas resultantes da fragmentação do conhecimento (grifo da
autora), inserida num movimento de crítica à ciência moderna”. Uma possibilidade
apontada pela autora é o trabalho com projetos, uma metodologia que permite a
elaboração e reflexão sobre que projetos de futuro queremos começar a construir no
presente (OLIVEIRA, 2012, p.181). Gonzalez-Gaudiano (2005, p.220) relaciona às
pedagogias críticas essa intenção de desestruturação das disciplinas convencionais,
e a produção de conhecimentos interdisciplinares, que estão melhor posicionados
para lidar com a complexidade do mundo real.
97
4.3 Os conceitos/ideias que devem estar presentes na educação ambiental
com o tema biodiversidade
Na primeira etapa do questionário (DELPHI SISBIOTA ETAPA 1) cada
participante selecionou até cinco conceitos e ideias que considerava mais
importantes para a educação ambiental para a conservação da biodiversidade.
As/os participantes relacionaram 152 respostas, com conceitos/ideias
que
consideraram essenciais. A análise dos conceitos levou à sua agregação em torno
de algumas ideias centrais. Com isso foi gerada uma relação de 16 conceitos, ou
conjuntos de conceitos, que refletem as respostas das/os participantes. Estes
conjuntos não se constituem na única possibilidade de agrupamento dos originais,
visto que há grande confluência nos conceitos/ideias sugeridos. O Quadro 7
relaciona os conceitos finais e alguns exemplos dos conceitos originais usados para
montar a relação final.
Quadro 7_Conceitos/ideias considerados essenciais pelas/os participantes da pesquisa em
um programa de educação ambiental com foco na biodiversidade.
Conceitos finais
Exemplos de conceitos originais
Interações
Cadeia alimentar; interações
ecológicas; mutualismos.
O que é e como surge a
biodiversidade; especiação; evolução.
Origem da biodiversidade
98
Manutenção e conservação da
biodiversidade
Unidades de Conservação; áreas
protegidas.
Importância da biodiversidade
Patrimônio genético; serviços
ecossistêmicos; bens e serviços que a
biodiversidade presta aos seres
humanos.
Interdependência
Reciprocidade e interdependência;
cada espécie tem uma função
importante para o funcionamento do
sistema.
Danos/Ameaças à
biodiversidade/Perda da
biodiversidade
Ameaças e declínios populacionais;
extinção; fragmentação.
Cultura e sociedade/Diversidade
cultural
Diversidade cultural humana; culturas
tradicionais.
Ética/Valores
Ética ambiental; antropocentrismo e
biocentrismo; biofilia; valores éticos.
Ação/Envolvimento/Política/Participa
ção
Gestão participativa; formação crítica;
políticas públicas; participação e ações
coletivas.
População; nicho ecológico;
Ecossistema;
Riqueza de espécies; variabilidade
genética; definições de biodiversidade.
Conceitos da Ecologia
Medição da
biodiversidade/conceituação da
biodiversidade
Experiência/Valor
estético/Arte/Percepção
Atividades de contemplação/ sentidos
de percepção como ferramenta de
sensibilização; experiência estética/
inspiração para a arte e o trabalho com
o sensível.
Valoração da biodiversidade
Valoração da biodiversidade sob o
ponto de vista antropocêntrico; Valores
existenciais em contraponto a valores
de uso.
Diversidade
Diversidade funcional em
ecossistemas; impacto das
monoculturas, monopensamentos.
Sustentabilidade
Educação para o uso sustentável;
sustentabilidade.
Bacias hidrográficas; ocupação urbana,
espaços educadores.
Território
Fonte: Elaborado pela autora.
Ao analisar os 152 conceitos/ideias originais e o conjunto de 16
conceitos/ideias apresentados no Quadro 7, encontramos um repertório variado de
conceitos, que mostrou uma preocupação, como grupo, de que fossem observados
aspectos políticos, de valor e de conhecimento científico no trabalho educativo.
Esses três aspectos são considerados fundamentais em trabalhos com a temática
ambiental por Carvalho et al. (1996) e Carvalho (2006) e, com base nessa
orientação, reagrupamos os 16 conceitos/ideias em três novos conjuntos,
organizados de forma a atender a este tripé de conhecimento (Esfera de conteúdos
científicos), envolvimento político (Esfera de atuação) e valores (Esfera de valores).
O novo quadro foi devolvido às/aos participantes no questionário DELPHI
SISBIOTA ETAPA 2 (APÊNDICE 2) e foi pedido que cada um/a identificasse qual
destas esferas estaria em primeiro, segundo e terceiro lugares em importância no
processo educativo, em relação ao contexto escolhido no início do questionário,
quando foi pedido que fossem considerados um animal, bioma e público,
99
preferencialmente relacionado ao próprio projeto de pesquisa da/o participante, ao
responder o questionário.
Em relação à atribuição de uma ordem de importância, ou uma sequência de
trabalho em relação às três esferas sugeridas, cabe salientar que essa é apenas
uma questão de organização do processo educativo. A proposta era de que, ao
responder o questionário da Etapa 2, as pessoas tivessem em mente com que
animal, bioma e público estariam desenvolvendo seu trabalho educativo, e
pudessem então selecionar uma das esferas como ponto de partida, sem deixar de
abordar todos os aspectos ao longo do desenvolvimento do processo. Desta forma,
no Quadro 8 as esferas estão ordenadas de forma a espelhar a sequência de
trabalho, conforme resultado do DELPHI SISBIOTA ETAPA 2.
Quadro 8_Conceitos/ideias considerados essenciais em um programa de educação
ambiental para a conservação da biodiversidade, na sequência atribuída pelas/os
participantes do DELPHI SISBIOTA ETAPA 2.
Esfera de valores
Esfera de
conteúdos
científicos
Esfera de
atuação
100
Conceitos
Cultura e sociedade/Diversidade cultural: Diversidade cultural
humana; culturas tradicionais.
Ética/Valores: Ética ambiental; antropocentrismo e biocentrismo;
biofilia; valores éticos.
Experiência/Valor estético/Arte/Percepção: Atividades de
contemplação/ sentidos de percepção como ferramenta de
sensibilização; experiência estética/ inspiração para a arte e o
trabalho com o sensível.
Valoração da biodiversidade: Valoração da biodiversidade sob o
ponto de vista antropocêntrico; Valores existenciais em
contraponto a valores de uso.
Importância da biodiversidade: Patrimônio genético; serviços
ecossistêmicos; bens e serviços que a biodiversidade presta
aos seres humanos.
Interações:
Cadeia
alimentar;
interações
ecológicas;
mutualismos.
Interdependência: Reciprocidade e interdependência; cada
espécie tem uma função importante para o funcionamento do
sistema.
Origem da biodiversidade: O que é e como surge a
biodiversidade; especiação; evolução.
Conceitos básicos: População; nicho ecológico; Ecossistema;
Medição da biodiversidade/conceituação da biodiversidade:
Riqueza de espécies; variabilidade genética; definições de
biodiversidade.
Manutenção e conservação da biodiversidade: Unidades de
Conservação; áreas protegidas.
Danos/Ameaças à biodiversidade/Perda da biodiversidade:
Ameaças e declínios populacionais; extinção; fragmentação.
Ação/Envolvimento/Política/Participação: Gestão participativa;
formação crítica; políticas públicas; participação e ações
coletivas.
Fonte: Elaborado pela autora.
A organização dos conceitos nas diferentes esferas a nosso ver auxilia o
processo educativo. Ao mesmo tempo em que cada aula ou interação educativa
pode ter como assunto apenas um ou outro componente, essa organização ajuda a
preparação do tema como um todo. Um modelo semelhante é usado em aulas de
Geografia em escolas na Inglaterra. Walshe (2008), em artigo sobre concepções de
estudantes sobre sustentabilidade, usa os pontos cardeais para marcar os diferentes
aspectos relacionados ao tema, baseado nas questões da geografia: N (North/Norte)
para Natural (ambiente natural); S (South/Sul) para Social (questões que envolvem
pessoas e relacionamentos); E (East/Leste) para Economia (questões econômicas,
comércio) e W (West/Oeste) para Who (Quem – para tratar sobre quem retém o
poder decisório). Em sua pesquisa, o autor encontra uma ênfase maior das/os
estudantes em aspectos ambientais, sociais e econômicos da questão da
sustentabilidade, deixando de fora as questões políticas, o que ele atribui à ausência
da menção a aspectos políticos nas diretrizes do currículo de geografia do país
(WALSHE, p.552). Este resultado aponta para a importância da inclusão deste
enfoque (dos aspectos políticos) nas interações educativas sobre a biodiversidade.
O autor sugere ainda em suas conclusões que deve ser encorajada a
formação de relações entre a sustentabilidade e a vida das/os estudantes, o que
pode ser importante também para o tema da biodiversidade e está em acordo com o
tema educativo proposto (sobre a importância da biodiversidade) e com os
conteúdos relacionados no Quadro 8 dentro da esfera de valores. Nesta esfera
estão agregados conteúdos que refletem uma atribuição de valor intrínseco à
natureza e ao mesmo tempo valores de uso da biodiversidade, como os serviços
ambientais. A atribuição de valor à biodiversidade foi discutida nas reflexões que
levaram à criação da categoria Conhecimento (subseção 5.1), com a mesma
dicotomia entre valor intrínseco e valores mensuráveis. A atribuição de qualquer
valor além do intrínseco é contestada por Ehrenfeld (1988), que considera que
esforços de conservação da biodiversidade só terão sucesso quando as pessoas
entenderem que sua destruição é algo simplesmente errado. O autor centra sua
101
discussão em fatos como o desconhecimento de grande parte da biodiversidade
existente, e suas funções e atribuições nos ecossistemas, e na futilidade de se achar
que seria possível encontrar argumentos econômicos para a preservação da maioria
das espécies, e defende assim uma postura ética em relação à conservação.
Dentro da esfera de conteúdos científicos, a abordagem destes pode ser feita
de forma a romper com a fragmentação observada por A11, ao propor atividades
que foram contempladas no tema da Superação da fragmentação do ensino (ver
subseção 5.2). Carvalho e colaboradoras/es (1996) apontam para a importância de
não se apresentar os elementos da natureza de forma isolada, mas ter o cuidado de
reforçar aspectos de interação e transformação da natureza, por meio, por exemplo,
de abordagens ecológicas e evolutivas, que são de extrema relevância em estudos
com o tema biodiversidade. Esta orientação para uma visão mais sistêmica do tema
da biodiversidade nos levou a agregar uma série de conteúdos específicos,
sugeridos na pesquisa, em um grupo nomeado Conceitos básicos. Sob essa
denominação geral, é possível tratar de conceitos específicos relevantes para o ser
vivo ou ambiente em que o trabalho educativo é realizado. Esta mesma visão está
presente em Motokane, Kawasaki e Oliveira (2010, p.54), que defendem que a
seleção de conteúdos para o ensino da biodiversidade deve tratar de aspectos
básicos, que por sua vez podem subsidiar o levantamento de dados, pelas/os
próprias/os estudantes, dados estes que possam ajudar a compreender as
dimensões culturais, econômicas e sociais, além das ambientais, que estão
envolvidas na questão. Esta visão – da dimensão sociocultural da biodiversidade está presente ainda nas recomendações de Brandão e Oliveira (2002, p.4), para
quem a educação ambiental não é sinônimo de divulgação científica, mas deve
buscar “criar meios de aprendizagem adequada do conhecimento em si mesmo
(como valor de ciência), em suas interações (como valor de ética) e em suas
práticas de socialização da natureza (em sua dimensão de ação tecnológica)”.
4.4 Reflexões sobre os resultados do estudo Delphi sobre biodiversidade na
perspectiva da educação ambiental crítica
A opção metodológica pelo uso do Delphi de Política (TURROF, 2002) na
pesquisa reflete uma convicção expressa por outras/os pesquisadoras/es, como por
exemplo Gough, S. (1999) e compartilhada aqui, de que em áreas complexas como
102
a de pesquisa social (e biodiversidade e educação ambiental) uma abordagem que
tolera opiniões múltiplas não pode ser considerada uma postura relativista, mas uma
que acredita firmemente que não há uma solução única para tratar de um tema tão
abrangente.
Segundo Sauvé (1999b, p.12), favorecer uma postura epistemológica
relativista que também considera o contexto, que valoriza o diálogo tanto entre as
diferentes formas de conhecimento (sejam elas de origem científica ou saberes
tradicionais) quanto o diálogo entre atores envolvidos, leva a decisões apropriadas
ao contexto único em questão. Isso significa também que os termos utilizados (como
por exemplo, biodiversidade) devem ser clarificados nos contextos em que
aparecem, ao invés de se buscar um significado único para eles (STABLES, 2001).
A busca dos sentidos atribuídos à biodiversidade em um contexto de pesquisa
que envolveu um grupo de certa forma homogêneo – em quase sua totalidade com
graduação em Ciências Biológicas ou afins – mostrou que mesmo nessa aparente
homogeneidade foi possível desvelar nove categorias emergentes de sentidos
atribuídos à biodiversidade. Este resultado corroborou uma das premissas que
consideramos essenciais para o trabalho com a educação ambiental crítica: a
importância fundamental do diálogo nas interações educativas. Se mesmo em um
grupo com formação similar – a maioria cursa ou cursou a área de Ciências
Biológicas em nível universitário – um termo como a biodiversidade pode adquirir
múltiplos sentidos, como fazer um trabalho educativo sem abrir o diálogo entre as
pessoas que participam do mesmo? A heterogeneidade de concepções de
biodiversidade em profissionais da mesma área foi observada também por Oliveira e
Marandino (2011), em pesquisa sobre o tema junto a professores de Ciências
Biológicas em nível universitário.
O campo da educação ambiental e da conservação da biodiversidade é
marcado por disputas e interesses contrários. A criação de áreas protegidas, em
geral com base em seus aspectos ecológicos e critérios econômicos, nem sempre
atinge os objetivos da conservação da biodiversidade e pode causar conflitos com
as populações humanas na região, como estudado por Ferreira (2004) no Vale do
Ribeira, SP e Simões (2010) no Núcleo Picinguaba do Parque Estadual da Serra do
Mar, SP. O Núcleo Picinguaba, belíssima área de mata Atlântica encravada entre o
mar e a serra, abriga quatro núcleos populacionais consolidados, a Vila de
Picinguaba, o Cambury, o Sertão da Fazenda e o Sertão de Ubatumirim. Neste
103
espaço convivem veranistas, turistas, pescadores, quilombolas e descendentes de
populações que ocupam a área desde a colonização, como os grupos indígenas
(SIMÕES, 2010). O trabalho de pesquisa estudou os acordos negociados entre os
diferentes grupos de residentes na área do parque para tratar de sua permanência
no local. O trabalho de educação ambiental conduzido no Núcleo foi objeto de
estudo de Valenti (2010), que em sua dissertação de mestrado encontrou uma
vertente crítica na condução das visitas monitoradas no local, relacionada
justamente à presença das populações na área do parque, o que contraria a
legislação pertinente (o SNUC, anteriormente citado). As pesquisas realizadas por
Ferreira (2004) no contexto do Vale do Ribeira (mas que também se aplicam a
outras situações semelhantes, como Picinguaba) questionam a necessidade de
esvaziamento das áreas protegidas para a preservação da biodiversidade e trazem
para a discussão outras indagações, como os interesses econômicos que são
acobertados em nome da conservação da biodiversidade em países megadiversos
como o Brasil.
Como apontam Carvalho, Grün e Avanzi (2009, p.111), em trabalho no
mesmo Vale do Ribeira, SP, os sentidos do ambiental dos grupos envolvidos em
processos educativos devem ser pontos de início e chegada do trabalho conduzido
na perspectiva compreensiva da hermenêutica. De interesse ao se discutir as
relações entre as populações em áreas protegidas e a biodiversidade é a questão
dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade, abordados por Santilli
(2005) e que abrangem técnicas de manejo dos recursos naturais, conhecimentos
sobre os ecossistemas, inclusive sistemas próprios de categorização de fauna e
flora e propriedades farmacêuticas, agrícolas e alimentícias das espécies.
Estes conhecimentos tornam-se fundamentais para as discussões em torno
da perda (e conservação) da biodiversidade, que devem levar em conta questões
como a distribuição equitativa e uso sustentável previstos na Convenção da
Diversidade Biológica (como sugerido por, entre outras/os, Van Weelie e Wals,
2002). Os autores consideram que o estabelecimento de valores da biodiversidade é
um aspecto importante da discussão, e que cada pessoa deve basear a sua
atribuição de valor em uma argumentação fundamentada de sua posição, a qual
deve refletir ainda os valores pessoais.
Tratando-se do tema da biodiversidade, originário do campo da Biologia,
poderíamos esperar que, como observado por Carvalho (2001, p.56) no caso das
104
trilhas interpretativas, na escolha dos temas e dos conceitos para abordar a
biodiversidade sob a ótica da educação ambiental fosse dado “um grande peso aos
conhecimentos oriundos da biologia sobre o funcionamento dos ecossistemas, a
composição dos diversos elementos da natureza e suas interações”. Porém em
nossa pesquisa encontramos um repertório de temas e conceitos variado, que
mostrou uma preocupação, como grupo, de que fossem observados aspectos
políticos, de valor e de conhecimento no trabalho educativo. Esta preocupação,
compartilhada por nós, também é expressa por outras/os autoras/es, como Carvalho
(2006). A educação ambiental, mesmo se apropriando de um tema vinculado
primariamente à área de ciências, não pode fechar-se na esfera deste âmbito de
conhecimento, sem reconhecer as implicações de valor e de engajamento inerentes
a ela.
4.5
Os
objetivos
da
aprendizagem
em
educação
ambiental
e
as
características/critérios que podem auxiliar o processo
No final do questionário DELPHI SISBIOTA ETAPA 1, as partes V e VI
referiam-se respectivamente aos objetivos da educação para a biodiversidade17 e
características que auxiliam a aprendizagem em educação ambiental18. Porém, ao
elaborar a segunda etapa do questionário, as respostas a essas questões não foram
incorporadas em separado no questionário DELPHI SISBIOTA ETAPA 2, e portanto
não foram ressubmetidas ao grupo. Sendo assim, a partir daqui elas não são
tratadas como parte do estudo com o Método Delphi. Estas análises seguiram o
mesmo referencial metodológico da pesquisa qualitativa das demais, em que os
textos foram lidos em busca de indícios que pudessem iluminar as principais ideias
17
Parte V – Objetivos de aprendizagem:
A seguir você encontrará uma lista de nove objetivos possíveis da educação para a biodiversidade.
Assinale na quadro um objetivo que você considera essencial, ou, se não encontrar nenhum, crie o
seu próprio. Se possível, por favor, novamente, justifique sua escolha. Se considerar necessário,
complemente sua justificativa com objetivos de aprendizagem mais específicos, que se encaixam no
objetivo escolhido.
18
Parte VI – Aprendizagem e ensino:
A seguir você encontrará 11 características/critérios que auxiliam a aprendizagem em educação
ambiental. Assinale o que você considera mais relevante para educação sobre biodiversidade, ou, se
não encontrar nenhum adequado, crie seu próprio. Novamente, se considerar pertinente, justifique
sua escolha.
105
contidas nas respostas, que foram então agrupadas de modo a ser apresentadas
nesta etapa dos resultados da pesquisa.
4.5.1 Os objetivos da aprendizagem sobre biodiversidade
A aprendizagem em educação ambiental com o tema da biodiversidade,
mesmo respeitando a sua contextualização, se quer contribuir para uma
transformação das condições ambientais atuais, que estão levando à perda da
biodiversidade, deve buscar contemplar alguns objetivos gerais, aqui definidos
conforme Van Weelie e Wals, 1999. Os objetivos abrangem desde aspectos de
mudanças pessoais, como o foco na aquisição de conhecimentos e mudança de
comportamento, associados a uma visão mais tradicional da educação ambiental,
até a formação de uma postura crítica, que pode ajudar a posicionar-se frente ao
tema da biodiversidade e poder dialogar sobre suas posições em relação à questão
de sua conservação. Todos os objetivos de aprendizagem em educação ambiental
apresentados no Quadro 9 são considerados válidos e pertinentes ao tema da
biodiversidade e a convivência entre correntes diversas de educação ambiental é
uma característica do campo que já foi apontada por outras/os autoras/es, como por
exemplo, Sauvé (2005). Estes objetivos também são coerentes com aqueles
definidos como objetivos da educação ambiental na Conferência Intergovernamental
de Tbilisi, realizada em 1977 – que o meio ambiente deve ser considerado complexo
e multidimensional, que a educação deve ser contextualizada e deve reconhecer a
“interdependência das dimensões econômicas, políticas e ambientais”, conforme
citado por Oliveira (2008, p.9). O Quadro 9 mostra os objetivos apresentados no
questionário e o número de vezes que cada objetivo foi selecionado pelas/os
participantes. Nesta etapa da pesquisa foi interessante notar uma diferença entre os
objetivos escolhidos pelos grupos A, B e C (ver Quadro 2 para descrição destes
grupos) sendo portanto os resultados apresentados em separado para cada grupo.
106
Quadro 9_Objetivos de aprendizagem em educação ambiental: os objetivos sugeridos e a
sua seleção pelas/os participantes da pesquisa.
No. de vezes que o objetivo foi
selecionado nas respostas
GRUPO A GRUPO B GRUPO C
5
2
1
2
4
2
3
2
6
4
1
2
1
1
1
1
-
-
-
-
Objetivo de aprendizagem sugerido
aquisição de conhecimento
clarificação e desenvolvimento de valores
tornar-se crítico
tomada de consciência
mudança de comportamento
competências/habilidades
envolvimento emocional
outro:
“promover
o
diálogo
sobre
biodiversidade”(B3);
“desenvolver
valores
relacionados à solidariedade, o respeito ao
outro e o amor a todos os seres vivos e ao
nosso meio”(A13).
desenvolvimento moral
formar uma opinião
Fonte: Elaborado pela autora.
A leitura das motivações para a escolha dos objetivos de aprendizagem
selecionados e comentados pelas/os participantes, indicou que foram privilegiados
alguns pontos-chave: uma ênfase na aquisição de conhecimento, com a ressalva de
que isso não é suficiente, se não for acompanhada da clarificação e
desenvolvimento de valores, o que levaria à mudança de comportamento; que a
porta de entrada para atingir todos os objetivos listados (ver Quadro 9) poderia ser
tanto o desenvolvimento de competências/habilidades, como o de valores, ou a
tomada de consciência; que tornar-se crítico é muito importante.
Os resultados estão apresentados por grupo porque foi possível, nesta etapa
da
pesquisa,
notar diferenças entre
estes.
No
grupo
A,
composto
por
pesquisadoras/es da área de biodiversidade, foi possível notar uma preferência
marcada por aquisição de conhecimento, tomada de consciência e mudança de
comportamento, enquanto que no grupo B, cuja maioria de integrantes desenvolve
atividades e pesquisa em educação ambiental, estes objetivos não foram
selecionados por nenhum/a participante. O objetivo tomada de consciência também
não foi selecionado pelas estudantes que compõem o grupo C, que participaram
conosco de uma disciplina sobre educação ambiental e conservação da
biodiversidade. Podemos conjecturar se isto pode refletir uma discussão muito
presente na educação ambiental, sobre a conscientização. Como já mencionamos
107
no capítulo 1, ao tratar da educação ambiental em contextos escolares, é comum o
ato de conscientizar a outra pessoa ser apontado como um dos objetivos centrais da
educação ambiental (LOUREIRO; COSSÍO, 2007, p.60). Porém, para estes autores,
isto remeteria a um caminho unidirecional, privilegiando o/a professor/a ao invés
da/do aluno/a, desconsiderando que processos dialógicos deveriam guiar as
relações
entre
educadoras/es
e
educandas/os.
A
conscientização,
como
apresentada por Freire (2005, p.118) é o “aprofundamento da tomada de
consciência”. Podemos intuir que o processo de conscientizar já citado, e não a
conscientização no sentido proposto por Freire foi o entendimento das/os
participantes dos grupos B e C sobre o objetivo tomada de consciência, e por isso
ele não foi selecionado. Mas o processo de tomada de consciência sobre as
questões envolvidas com a conservação da biodiversidade permanece um objetivo
válido da educação ambiental, desde que este seja um processo interno de
conscientização, em que cada pessoa, a partir de sua reflexão e interações com as
demais, avalia as questões e cria sua própria opinião sobre estas, e se prepara para
a ação. Em relação à aquisição de conhecimento e mudança de comportamento,
também não selecionados pelo grupo B, estes objetivos podem ter sido preteridos
em função da escolha de outros, como o de valores, considerados mais relevantes,
já que a orientação da pesquisa pedia a seleção de apenas um objetivo dentre os
apresentados (embora algumas pessoas tenham selecionado mais de um objetivo).
A partir da seleção de um (ou mais, em alguns casos) objetivo de
aprendizagem, pedimos a cada participante que sugerisse três objetivos de
aprendizagem concretos. Para facilitar este exercício, foi apresentado no
questionário o exemplo a seguir, mostrando como três objetivos de aprendizagem
concretos poderiam ser elaborados para se atender ao objetivo principal de
clarificação e desenvolvimento de valores:
1) o educando compreende o valor de cada espécie e a importância
delas no ecossistema;
2) o educando compreende que as formas de vida e a relação com
os recursos naturais são múltiplas e também quais são os interesses
econômicos, políticos e sociais da natureza;
3) o educando compreende que existem formas mais sustentáveis de
se relacionar com o meio e apreende novos valores.
108
As respostas oferecidas mais uma vez refletiam as esferas do tripé de:
conhecimento (esfera de conteúdos científicos), envolvimento político (esfera de
atuação) e valores (esfera de valores), apresentadas no Quadro 8, e remetem
novamente às esferas do trabalho em educação ambiental discutidas desde a
década de 90 (CARVALHO et al., 1996) e que se encontram também, por exemplo,
nas orientações do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global de 1992, sem as quais concordamos que não se pode
abranger um tema complexo como a biodiversidade na perspectiva da educação
ambiental crítica.
Como exemplo, a participante B1, após escolher o objetivo “envolvimento
emocional”, ofereceu os seguintes objetivos concretos de aprendizagem: “o
educando percebe que todas as formas de vida merecem ser respeitadas; o
educando desenvolve valores estéticos e éticos em relação à natureza; educando
tem experiências estéticas na natureza”. Estes objetivos concretos, a meu ver,
podem ser considerados dentro da esfera de valores e ao mesmo tempo privilegiam
a questão da experiência na natureza, que como já vimos foi apontada
anteriormente (por exemplo, no contexto do Polo Ecológico) como sendo importante
para a construção de uma relação de respeito (e portanto mais ética) com a mesma.
Ao analisar os objetivos de aprendizagem resultantes de sua pesquisa, Van
Weelie e Wals (2002, p. 1150) encontraram quatro argumentos para esta
aprendizagem: os argumentos emocional, ecológico, ético e político. Englobados
nestes estão a sensibilização e as experiências na natureza, o entendimento do
funcionamento interligado dos sistemas ecológicos, as questões de valores éticos e
o desenvolvimento de habilidades e competências para lidar com temas
controvertidos e a capacidade de tomar decisões nesta arena.
Os autores identificaram ainda três perspectivas principais que guiam a
educação sobre biodiversidade: “natureza e o eu”, “conhecimentos ecológicos”, e “as
políticas da natureza”19 (VAN WEELIE; WALS, 2002, p.1149). Mais uma vez essas
perspectivas podem ser conectadas às esferas de conhecimento, de valores e de
atuação, já mencionadas. Além disto, a perspectiva da “natureza e o eu” contempla
as atividades de vivência na natureza, cuja importância foi percebida em nossa
pesquisa, tanto na relação com o Polo Ecológico de São Carlos (capítulo 4), quanto
“the nature and self”, “the ecological literacy”, “the politics of nature perspective” no original (WEELIE;
WALS, 2002, p. 1149).
19
109
nos temas sugeridos na subseção 4.2, especialmente o de “Experimentar a
biodiversidade”. A perspectiva de “conhecimentos ecológicos”, com foco nas
relações dos demais seres vivos dentro dos ecossistemas e de seres humanos com
estes, pode ser abordada a partir de temas como “Perceber a importância da
biodiversidade e os limites da interferência humana” e da “Superação da
fragmentação do ensino”. Por fim, a perspectiva “as políticas da natureza” está
relacionada principalmente ao tema de “Exercitar diálogo/debates”.
Com base nas reflexões contidas naquele trabalho (VAN WEELIE; WALS,
2002), retornamos às seis possibilidades e sugestões de atividades educativas para
trabalhar com biodiversidade, apresentadas no Quadro 5, e direcionamos as
seguintes questões aos dados: como os objetivos de aprendizagem concretos
oferecidos pelas/os participantes se relacionam às esferas que se somam para dar
forma a um trabalho abrangente de educação ambiental sob uma perspectiva
crítica? Neste mesmo movimento, acrescentamos o aspecto de afetividade à esfera
de valores, pois estava presente em algumas das respostas. Os resultados desta
análise estão apresentados no Quadro 10, construída com a cópia das respostas
originais. A relação entre objetivos de aprendizagem/objetivos de aprendizagem
concretos foi mantida conforme respostas dos questionários e a relação destes com
as esferas de valores, conteúdos científicos e atuação foram determinadas na
presente análise dos dados. A identificação de cada participante está entre
parênteses ao fim da sentença.
110
Quadro 10_Os entrelaçamentos entre os objetivos de aprendizagem concretos propostos e esferas de valores/afetiva, conteúdos científicos e
atuação.
Objetivo de aprendizagem
Objetivos de aprendizagem concretos
Esfera de valores/ Aspectos
afetivos (emocionais)
Esfera de conteúdos
científicos
Esfera de atuação
Aquisição de conhecimento
Compreende que é
responsável pelo seu
comportamento e entende
consequências (A11);
compreende a importância da
natureza, julga o que é ou
não importante / percebe que
ele é importante para a
natureza (C3); mudança de
comportamento, torna-se ser
de opinião (C10).
Torna-se capaz de
propagar o conhecimento
(A11); desenvolve
competências para
modificar realidade –
forma sustentável (C10).
Mudança de comportamento
Compreende que há formas
mais sustentáveis, aprende
novos valores (A2);
compreende que manutenção
da biodiversidade é questão
de sobrevivência humana/
que deve modificar modos de
vida, adquirir senso crítico em
relação a pessoas e
instituições e uso do meio
ambiente (A6); compreende a
amplitude do termo
biodiversidade, e como se
insere nele/ desenvolve
consciência sobre
importância da preservação
(C7).
Compreende o valor de cada
espécie e sua importância no
ecossistema (A2); existência
de distintas espécies,
processos de especiação e
evolução biológica/ relações
entre espécies (inclusive
humana) e equilíbrio ou
desequilíbrio entre elas/(A8);
compreende importância e
função de cada componente
da natureza (A11).
Estrutura e funcionamento
dos ecossistemas e da
biosfera, e efeitos das ações
humanas que geram
alterações na natureza (A7).
Aprende formas de atuar
em prol da preservação
(C7).
111
Competências/habilidades
Clarificação e
desenvolvimento de valores;
Tomada de consciência
112
Se percebe capaz de
apreender porque se sente
valorizado (B4); sente que
suas habilidades são úteis
(B4); se sente ativo no
processo educacional (B4);
desenvolve habilidade de
perceber o meio natural e
componentes (B5).
Direito à vida, direito à
existência de populações,
espécies e ecossistemas
(B2); compreender que
existem diferentes estéticas
(B2); Compreende o valor de
cada espécie (C4); formas
mais sustentáveis (C4);
constrói valores, é orientado
nas atitudes (C5); com seus
valores desenvolve habilidade
crítica, argumentativa, toma
próprias decisões, capaz de
dialogar e aprender novos
hábitos (C5); forma cidadão
crítico com valores éticos,
gera mudança de
comportamento, identificar
importância dos seres vivos,
questiona consumo
desenfreado e esgotamento
de recursos(C9).
Percebe poder da educação
para mudança de
comportamento e atitude na
relação homemXambiente
(A5); compreensão possibilita
mudança de conceitos e
atitudes (A9)/ estímulo para
vencer inércia – mudança de
Compreende a importância de
cada elemento (ou espécie)
(B5).
Desenvolve a
competência para tomar
atitudes, mudar sua
postura (B5).
Compreende a
interdependência entre
qualidade ambiental e
biodiversidade (A8); Dialoga
com os conceitos (C5);
cidadão sensibilizado é capaz
de adquirir conhecimento
(C9).
Compreender impactos de
escolhas de consumo e
possibilidades de
mudança (B2);
compreende, escolhe e
exercita formas mais
sustentáveis de relação
com o meio/ aprende
novos valores e expõe e
defende seus argumentos
(C2); Compreende que as
relações com os recursos
naturais são múltiplas, e
os interesses econômicos,
políticos e sociais da
natureza (C4).
Conceitos de ecologia (A1);
compreende inter-relações
entre elos do ecossistema e
sua importância para manter
equilíbrio dinâmico e estável
(A5); compreende a
interdependência entre
qualidade ambiental e
Compreende que as
relações com os recursos
naturais são múltiplas, e
os interesses econômicos,
políticos e sociais da
natureza / Ideologias da
ecologia humana, noções
de economia e política
Envolvimento emocional
Tornar-se crítico
atitude com ações simples,
círculo virtuosos favorece
mudança de hábitos (A9).
biodiversidade (A8);
conhecimento das interrelações, interdependências e
valores de cada espécie
favorece compreensão e
análise crítica dos processos
usuais (A9).
Respeito a todas formas de
vida (B1); desenvolve valores
éticos e estéticos/ experiência
estética na natureza(B1);
pensamento holístico (B6);
clarificação e
desenvolvimento de valores
(C1).
Desenvolve a capacidade de
avaliar de forma crítica a
importância e benefícios da
manutenção da
biodiversidade (A12);
compreende o valor de cada
espécie (B7); formas mais
sustentáveis (B7);
desenvolve uma visão
pessoal sobre a problemática
da biodiversidade (B9);
compreende informações e
sintetiza (C6); aprende que a
mídia geralmente oferta o
supérfluo / não joga lixo na
rua por entender
consequências – enchentes,
morte, sujeira e estética da
cidade (C8).
Percebe a importância das
interações entre os
elementos, e suas funções
como elemento do sistema
(B6); aquisição de
conhecimentos (C1).
Compreende a
interdependência entre
qualidade ambiental e
biodiversidade (A8);
compreende que cada
espécie tem uma função
determinada no ecossistema
(A12); compreende o conceito
de biodiversidade em seus
aspectos biológico e social, e
importância (B9); recebe os
dados e conceitos de
biodiversidade de forma
crítica (C6).
(A1, A2); tomada de
consciência da origem e
motivações das
perturbações antrópicas,
a perda de biodiversidade
relacionadas com o
modelo de sociedade
atual (A5).
Compreende que as
relações com os recursos
naturais são múltiplas, e
os interesses econômicos,
políticos e sociais da
natureza (B7, B9);
compreende e realiza as
ações (C6); entende que
fazer política é atividade
de todos cidadãos, e há
espaços coletivos para
atuação política local e
global (C8).
113
Promover o diálogo sobre
biodiversidade (objetivo
sugerido por participante B3)
Diferentes ideias sobre
biodiversidade (B3).
Desenvolver valores
relacionados à solidariedade,
o respeito ao outro e o amor a
todos os seres vivos e ao
nosso meio (objetivo sugerido
por participante A13)
Compreende que existem
formas mais sustentáveis de
se relacionar com o meio e
apreende novos valores a
respeito desse
relacionamento, e que todas
as espécies e ecossistemas
são igualmente importantes
para garantir convívio
harmonioso e feliz (A13).
Esfera de valores/ Aspectos
afetivos (emocionais)
Objetivo de aprendizagem
Fonte: Elaborado pela autora.
114
Participam da discussão e
apresentam seus pontos
de vista; escutar e
respeitar o argumento
das/os outras/os (B3).
Compreende que todas as
formas de vida no planeta
descendem de uma única
forma de vida primitiva, todos
seres vivos estão
relacionados intimamente, e
devemos preservar o
equilíbrio da natureza (A13).
Esfera de conteúdos
científicos
Esfera de atuação
A construção deste quadro mostrou mais uma vez o quanto os diferentes
aspectos da questão da biodiversidade estão entrelaçados, dificultando
inclusive a separação em esferas, que de maneira alguma são estanques. As
questões relativas à biodiversidade não podem ser compreendidas em toda a
sua complexidade se o olhar se direciona apenas a um ou outro aspecto, sem
que se mantenha sempre a consciência de que este é apenas uma parte do
todo. Os objetivos de aprendizagem concretos, mesmo quando se referiam a
um objetivo como, por exemplo, a aquisição de conhecimento, que poderia ser
entendida como tendo o foco em conteúdos da esfera científica, apresentaram
ao mesmo tempo aspectos valorativos e de ação. O mesmo pode ser dito para
todos os objetivos, à exceção de Promover o diálogo sobre biodiversidade e
Desenvolver valores relacionados à solidariedade, o respeito ao outro e o amor
a todos os seres vivos e ao nosso meio, que se concentraram nas esferas de
valores e ação, ou valores e conteúdos científicos, respectivamente.
Quanto ao objetivo Tomada de consciência, discutido no início desta
subseção, é interessante notar que entre os objetivos concretos oferecidos ele
não aparece como uma imposição, mas como um processo pessoal, que pode
levar à compreensão do caráter múltiplo do tema da conservação da
biodiversidade. O mesmo ocorre em relação ao Tornar-se crítico, que privilegia
desde processos internos até a tomada de atitudes. De modo geral, os
objetivos concretos sugeridos desenvolvem de forma criativa aqueles objetivos
de aprendizagem em educação ambiental apresentados no Quadro 9.
4.5.2 As características que podem auxiliar a aprendizagem em educação
ambiental
Por fim foram avaliadas quais as características ou critérios que
poderiam auxiliar os processos de aprendizagem sobre a biodiversidade como
tema da educação ambiental. Novamente foi apresentado um quadro com
alternativas que poderiam ser selecionadas, ou novas opções poderiam ser
apresentadas. O Quadro 11 mostra essas características e o número de vezes
em que cada uma foi selecionada pelas/os participantes. O quadro é
115
apresentado com os resultados consolidados entre os grupos A, B e C, e as
divergências de respostas entre os grupos são discutidas na sequência.
Quadro 11_Características/critérios que auxiliam a aprendizagem em educação
ambiental.
No. de vezes que estas
características/critérios
foram selecionadas
nas respostas
12
11
Características/critérios sugeridos
aproveita conhecimentos e experiências anteriores do
educando
é
baseado
em
problemas,
para
promover
questionamentos e investigação adicional
08
reconhecível no cotidiano
07
orientado
para
a
ação,
para
desenvolver
responsabilidade, cuidado e competência para ação
06
permite experiências em primeira mão, e mão na massa
06
aprofundamento teórico para descobrir princípios e ideias
subjacentes
cria dissonância cognitiva para promover modos
alternativos de pensar e fazer
05
04
orientado a descobertas para fomentar novas experiências
de aprendizado
03
útil no cotidiano
02
cria conflitos sociais para envolver estudantes em debates
(e disputas sócio-científicas)
02
observação acurada para envolver todos os sentidos
_
outro
Fonte: Elaborado pela autora.
O aproveitamento de conhecimentos e experiências anteriores das/os
educandas/os, o foco em problemas, que permite abordar vários aspectos da
questão, a familiaridade com o tema (reconhecível no cotidiano) e a ênfase na
ação foram as características que mais apareceram, seguidas de perto da
questão das vivências/experiências (mão-na-massa) e do aprofundamento
teórico.
Brody (2005, p.603) acredita que a “educação ambiental como a
educação em geral tem em seu cerne a noção de que aprendizagens
116
significativas acontecem em situações específicas que incorporam um conjunto
abrangente de princípios de aprendizagem” (tradução nossa), tais como estes
relacionados aqui.
A base em experiências do grupo participante é parte fundamental em
um processo que se quer dialógico, e que busca construir o conhecimento de
forma coletiva e, para tal, necessita primeiro conhecer o que cada participante
já sabe e, a partir daí, traçar a caminhada. Estas características remetem ao
trabalho de Paulo Freire com os temas geradores. O autor defende que: “será a
partir da situação presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de
aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da
educação ou da ação política” (FREIRE, 2005, p. 100). Segundo Tozoni-Reis
(2006), os temas ambientais locais, presentes entre os objetivos da educação
ambiental desde a Conferência de Tbilisi em 1977, devem ser encarados como
temas geradores e estes podem ser uma estratégia metodológica para a
educação ambiental crítica.
O foco em problemas é uma prática conhecida no trabalho em educação
ambiental, como por exemplo, por meio da pesquisa-ação e envolvimento da
comunidade na solução de problemas ambientais locais (STAPP; WALS;
STANKORB, 1996) e por meio da pedagogia de projetos, como aponta Oliveira
(2012). O fato de a biodiversidade ser um tema atual faz com que o foco em
questões-problema relacionadas à sua conservação, por exemplo, possam
motivar a aprendizagem em educação ambiental. A abordagem da educação
ambiental por meio do trabalho educativo com conflitos socioambientais reais é
proposta por Manzochi e Carvalho (2008) como uma possibilidade para a
formação de professoras/es, por sua possibilidade de engajamento com
esferas de ação política e de formação de valores morais.
Quanto à familiaridade com o tema (ser reconhecível no cotidiano), esta
característica não foi selecionada por nenhuma pessoa do grupo B, do qual,
entre 9 participantes no grupo, 4 escolheram a característica é baseado em
problemas, e 5 se dividiram entre outras 5 sugestões. Isto pode refletir o fato de
que foi pedido escolher apenas uma opção no quadro, e esta não foi
considerada prioritária. Mas sua relevância pode ser atestada, por exemplo, no
117
guia de apoio à formação em educação ambiental: Programa Parâmetros em
ação, meio ambiente na escola – de 5ª a 8ª série: guia do formador (BRASIL,
2001, p.193), no qual o módulo de ensino sobre a biodiversidade sugere que a
abordagem sobre o tema comece por uma reflexão sobre as relações da vida
cotidiana com a biodiversidade, as relações com ambientes, culturas e modos
de vida e traz um questionamento interessante, sobre a relação entre a
diversidade de culturas e sociedades humanas e a manutenção e valorização
da biodiversidade. Este assunto é lembrado ainda na fala de Javier Pérez de
Cuéllar 20 (1997), citado por Brasil (2001, p. 219) ao dizer que:
muitas plantas medicinais são conhecidas apenas por pessoas
imersas em culturas tradicionais, com linguagens que lhes dão
nomes específicos. O desaparecimento dessas linguagens e cultura
acarreta a perda do conhecimento de tais plantas e suas
propriedades de cura.
Já a ênfase na ação é destacada por Oliveira (2012, p. 181), para quem
processos
educativos
de
educação
ambiental
devem
contemplar
o
“desenvolvimento de ações e projetos numa perspectiva prospectiva, de sonhar
um mundo desejável”. Como citado por uma participante na pesquisa, a
orientação voltada para a ação pode ajudar porque vai além das reflexões e
exposições de conceitos sobre o tema, ao focar em como agir frente às
questões.
A importância das vivências e experiências na natureza já foi discutida
mais extensivamente ao analisarmos a educação ambiental no Polo Ecológico
de São Carlos. Embora haja algumas controvérsias, este é um recurso que
as/os participantes consideraram um diferencial para a aprendizagem. As
controvérsias dizem respeito à dificuldade de se estimar qual a real
contribuição que esse tipo de experiência teve no fato de uma pessoa ter se
interessado pela questão ambiental. Payne (1999) em artigo sobre o significado
da “experiência” em pesquisa com o referencial da SLE – Significant Life
Experience, diz que não é possível prever quais serão os resultados de
CUÉLLAR, J.P. Nossa diversidade criadora – Relatório da Comissão Mundial de Cultura e
Desenvolvimento. Campinas, UNESCO/Papirus, 1997, 237p.
20
118
determinadas experiências na natureza, uma vez que há múltiplas respostas
pessoais, que vão depender de personalidade e de condições sociais, culturais
e ambientais. Para o autor mesmo experiências negativas podem ser
importantes, se levarem a uma mobilização em prol da defesa de uma área
degradada, ou contra um projeto ainda a ser implantado. Gough, S. (1999,
p.353) questiona se a pesquisa na área (de SLE) explora que tipos de
experiências podem levar alguém a ser um/a ativista ambiental, ou se na
verdade as pesquisas mostram “que tipo de experiências passadas são mais
provavelmente relembradas como significativas por aquelas/es que, de uma
maneira ou outra, se tornaram ativistas ambientais?”. A nós parece que esta é
uma discussão que remete à questão da normatividade, como abordada por
Carvalho, Farias e Pereira (2011), ou se a educação deve ser pensada em
termos da produção de resultados previsíveis, a que retornaremos mais
adiante. No momento importa que, ao menos em um nível de percepção, as
experiências na natureza são consideradas importantes para algumas pessoas.
Por fim, o foco no aprofundamento teórico para descobrir princípios e
ideias subjacentes que podem auxiliar a aprendizagem em educação ambiental
remete a questões muito relevantes e, na opinião de Brody (2005), entre
outras/os, pouco discutidas em educação ambiental: como as pessoas
aprendem, e mais especificamente, como elas aprendem na natureza? Um dos
resultados de sua pesquisa é que as experiências de visitantes a um parque
(no caso o Parque Nacional do Yellowstone, EUA) levaram ao desenvolvimento
de valores. Este é um aspecto caro à educação ambiental para a
biodiversidade, já que sua conservação depende de negociações em arenas de
conflito, em que diferentes valores atribuídos a ela estão em jogo (VAN
WEELIE; WALS, 2002, p.1154). Para Ehrlich e Wilson (1991, p.253), há três
razões para se importar com a perda da biodiversidade: os benefícios
econômicos trazidos pela biodiversidade, os serviços essenciais que os
ecossistemas naturais prestam e, em primeiro lugar, as questões éticas e
estéticas, ou seja, de alguma forma, todas elas questões valorativas.
119
4.5.3 Aprendizagem sobre biodiversidade: algumas reflexões
Nesta seção investigamos duas questões: para que precisamos
aprender sobre biodiversidade (os objetivos da aprendizagem) e como essa
aprendizagem pode ser facilitada (as características da aprendizagem).
Em sua pesquisa, Van Weelie e Wals (2002) concluem que a
aprendizagem sobre biodiversidade oferece a oportunidade de um trabalho de
educação ambiental em que é possível: aproveitar conhecimentos prévios
das/os participantes na construção do conhecimento; ser crítica, ao investigar
interesses, valores, e visões de mundo que informam a questão; ser
emancipatória, ao detectar e se possível alterar relações de poder que
impedem mudanças; e finalmente transformadora, pelo potencial de mudar o
mundo, mesmo que sejam mudanças pequenas ou pessoais. Enfim, em
resposta a “para que”, é para transformar o mundo; e “como”, por meio de uma
educação crítica e emancipatória.
Os autores apresentam uma série de passos (“stepping stones”) que
podem ajudar a contextualizar a
educação ambiental com
o tema
biodiversidade.
Quadro 12_Passos para contextualizar biodiversidade.
Determinar
perspectiva(s)
Selecionar temas e
contextos específicos
Analisar os significados
da biodiversidade
Definir
objetivos de
aprendizagem concretos
Contextualizar
conceito
biodiversidade
Valoração
120
Determinar perspectivas pedagógicas e traduzi-las em
objetivos de aprendizagem para o recurso educativo a
ser desenvolvido.
Selecionar temas e contextos que são adequados para
as
formas
de
aprendizagem
pretendidas
e
complementares aos objetivos de aprendizagem gerais
no contexto educativo presente.
Analisar os significados da biodiversidade tal como é
usada em contextos reais (ex. política, mídia, ciência)
relevantes para o recurso educativo a ser desenvolvido.
Formular objetivos de aprendizagem específicos que são
compatíveis com os objetivos de aprendizagem gerais e
os temas selecionados.
o Definir significados específicos de biodiversidade que
de são úteis nos contextos de aprendizagem escolhidos e
consistentes com a definição escolhida para a
biodiversidade (neste contexto).
da Proponha
atividades
para
cada
contexto
de
biodiversidade
aprendizagem, prestando atenção aos interesses e
valores dos vários atores na disputa sócio-científica
sobre biodiversidade.
Fonte: quadro traduzido de Van Weelie e Wals (2002).
Na presente pesquisa, a análise dos dados aponta que se deve
aprender sobre a biodiversidade para que se entenda sua importância para a
manutenção da vida, para tornar-se uma pessoa crítica, e que isso se dá por
meio da aquisição de conhecimento, clarificação e desenvolvimento de valores,
que levam à tomada de consciência e à mudança de comportamento. Para
facilitar essa aprendizagem, se deve construir o processo educativo sobre os
conhecimentos e experiências que as/os educandas/os já têm e basear a
aprendizagem em problemas concretos, questões reconhecíveis no cotidiano e
que possam ser experimentadas pelas pessoas envolvidas no processo. Além
da prática, foi considerado igualmente relevante o aprofundamento teórico nas
questões.
Os passos sugeridos no Quadro 12 podem servir como indicações para
a condução dos processos educativos, sendo coerentes com os resultados da
presente pesquisa.
121
CAPÍTULO 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final da pesquisa, algumas questões ainda merecem ser discutidas,
tais como se a educação ambiental com o tema biodiversidade deve ser
normativa. A educação ambiental crítica é uma “educação imersa na vida, na
história e nas questões urgentes de nosso tempo” e tem “uma especificidade:
compreender as relações sociedade-natureza e intervir sobre os problemas e
conflitos ambientais” (CARVALHO, 2004, p. 18). Esta especificidade na
questão dos problemas ambientais leva a que a educação possa ser encarada
como um instrumento de gestão ambiental, o que por sua vez faz com que o
conhecimento seja visto como uma mercadoria de consumo, e não como um
processo a ser construído (GONZALES-GAUDIANO, 2005, p.118).
Em alguns momentos da pesquisa foi possível identificar uma tendência
à prescrição de comportamentos corretos, ou mais adequados, em relação à
biodiversidade. Estas prescrições aparecem inclusive quando a recomendação
é pela formação de uma pessoa crítica, que deveria ser capaz de tomar suas
próprias decisões, mas de quem se espera que estas favoreçam a
conservação da biodiversidade e do meio ambiente em geral.
Esta tendência prescritiva aparece expressa por Carvalho, Farias e
Pereira (2011, p.38), que questionam se a educação ambiental deveria ser uma
forma de “modelar um novo padrão de comportamentos ecologicamente
corretos”, ao mesmo tempo em que entendem que:
a caução para esta força prescritiva ou normatizadora da EA
encontra um fundamento de difícil refutação, que é o
agravamento dos problemas ambientais e sua crescente
visibilidade pública, o que corrobora o argumento de que se os
processos ecológicos degradam em uma escala planetária, é o
próprio futuro de humanos e não humanos que está em jogo.
O enfrentamento de questões como a perda da biodiversidade,
mudanças climáticas e desigualdades entre as regiões geopolíticas, entre
outras, podem se beneficiar de normatividade, da criação de conjuntos de leis e
122
normas, inclusive acordos internacionais, que busquem minimizar os
problemas. É importante esclarecer que falamos de duas coisas diferentes:
uma delas é o processo educativo, a outra são medidas de conservação. A
educação (inclusive a educação ambiental) não deve servir como um
instrumento para normatizar comportamentos, mesmo que estes tenham sido
considerados desejáveis por especialistas no assunto (WALS, 2010; JICKLING,
2007). Ao mesmo tempo estes autores concordam que a tendência à
normatização advém da preocupação com a degradação do ambiente e a
urgência na busca de mudanças nos padrões não sustentáveis que levaram a
essa situação, como também acreditam Carvalho, Farias e Pereira (2011). Mas
se a educação tem o papel de formar pessoas críticas, capazes de elaborar
suas próprias opiniões, como predizer qual será seu comportamento? Segundo
Fien, Scott e Tilbury (2001, p. 393), “nenhuma intervenção ética – educacional
ou outra – pode garantir resultados”. A/os autora/es referem-se aos resultados
positivos encontrados na avaliação de programas educativos da WWF21, objeto
do artigo: o envolvimento da população local, a mudança das práticas
escolares de professoras/es envolvidas/os, a reforma no trabalho das escolas,
entre outros. Todos esses objetivos foram resultado da integração entre
programas educativos e de conservação, e a associação entre estes parece
favorecer os resultados, mais do que medidas isoladas de conservação, mas é
importante frisar que este é um estudo de avaliação, e não preditivo. Wals
(2010, p.150) refere-se a uma tensão entre a ênfase na “auto-determinação” e
na convicção de educadoras/es de que é errado “persuadir, influenciar ou
mesmo educar as pessoas para modos de pensar e agir pré-determinados e
determinados por especialistas” e uma preocupação profunda com o estado do
planeta. A redução da educação ambiental a um caráter puramente
instrumental pode comprometer a própria natureza desta (CAVALARI;
SANTANA; CARVALHO, 2006).
A justificativa para um caráter de normatização de comportamentos pela
educação ambiental viria de uma legitimidade adquirida por ser esta a
21
World Wildlife Fund, organização internacional que atua em projetos ligados à conservação da
natureza.
123
“portadora da boa nova ecológica” (CARVALHO; FARIAS; PEREIRA, 2011,
p.43, grifado no original). Para este grupo, a educação ambiental
capitaliza um poder de convocação, situando-se, em
continuidade com os movimentos ecológicos, como porta voz
dos “descontentes com a civilização”, e é desde esta nova
ordem ecológica que, nos parece, vem sua legitimidade para o
exercício normativo e prescritivo dos comportamentos, pois
opera em nome de ética e estética do bem viver ecológico
(CARVALHO; FARIAS; PEREIRA, 2011, p.44).
Bonotto (2008) traz para a discussão o que denomina de valores
ambientalmente desejáveis. A autora traça um paralelo destes com os valores
universalmente desejáveis da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os
alicerça no Tratado de EA (o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global, de 1992). Para a autora, as questões
ambientais envolvem a todas as pessoas e seres vivos do planeta e por isso
não podem ser reféns de decisões pessoais, que terão consequências para
muito além do âmbito pessoal. Bonotto defende que os valores presentes nos
princípios da educação ambiental desde a Conferência de Tbilisi em 1977, e
reafirmados no Tratado de EA de 1992 (ambos já citados), devem ser
promovidos junto à sociedade.
O Programa Municipal de Educação Ambiental de São Carlos, ProMEASC, que é um dos documentos balizadores de nossa atuação em educação
ambiental, fala na construção de sociedades sustentáveis, quer “possibilitar o
desenvolvimento de mudanças de valores, habilidades e atitudes que
ultrapassem a visão utilitarista e evoluam para uma reconstrução do sentido de
vinculação entre seres humanos e natureza” e busca o estabelecimento de
“critérios de inserção dos limites ambientais na economia” e “o respeito à
diversidade cultural e biológica” (REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DE SÃO
CARLOS, 2007). Mas a consecução destes objetivos não é sugerida por meio
de vias impositivas, mas por meio da promoção de valores que podem
estimular a escolha de caminhos alternativos e de uma “postura de diálogo
entre saberes” (princípios do ProMEA-SC).
124
O que é defendido aqui não é uma postura permissiva, que aceita
qualquer alternativa sem se posicionar quanto ao que se considera certo, mas
sim uma que, sem ser impositiva, assume um compromisso ético de pautar-se
por uma atitude democrática e enraizada no diálogo.
Que repercussão tem esta postura para a presente pesquisa? A
convicção de que o diálogo deve ser a base das interações educativas,
particularmente as que tem a biodiversidade como tema para a educação
ambiental. Todos os temas sugeridos para o trabalho com biodiversidade em
educação ambiental apontam na direção deste diálogo como caminho a ser
trilhado.
Para desenvolver este ponto, vamos nos valer aqui das reflexões de
Gadamer (2012) sobre o diálogo. Para o autor, a arte do diálogo se concretiza
como perguntas e respostas, sendo que a pergunta é a mais importante das
duas. Aceitar perguntar significa aceitar que não se sabe algo, e se quer saber.
Se desde o início concordamos que há múltiplos conhecimentos válidos a
respeito da biodiversidade, é plausível admitir que não sabemos tudo sobre o
assunto e por isso podemos perguntar. “Perguntar quer dizer colocar no aberto”
(GADAMER, 2012, p.474) e esta abertura significa que não há uma resposta
fixa para a pergunta. O diálogo, com sua estrutura de pergunta e resposta,
requer que as pessoas ao conversar acompanhem uma a fala da outra. “Levar
adiante uma conversa significa voltar-se na direção do tema que orienta os
interlocutores. Requer não abafar o outro com argumentos, mas ponderar
realmente a importância objetiva de sua opinião” (GADAMER, 2012, p.479).
Na presente pesquisa o diálogo foi concretizado entre a pesquisadora, e
o texto escrito, de autoria das pessoas que participaram da pesquisa. A outra
pessoa, interlocutora do diálogo, fez-se presente por meio do texto escrito. Esta
foi uma escolha metodológica, condicionada pela opção em tratar da mesma
forma as participações de pessoas que estavam perto e longe, de participantes
de nosso próprio laboratório de pesquisa e de pessoas que residem em outras
regiões do país. Também a escolha do método Delphi buscou atender a essa
premissa de que a pesquisadora não contaria com encontros presenciais em
que o grupo pudesse interagir pessoalmente. Uma vez que o produto do Delphi
125
são respostas por escrito, o referencial da hermenêutica, com sua origem na
interpretação de textos, foi considerado o mais apropriado.
Os resultados desta pesquisa, da importância de situar a educação
ambiental com o tema biodiversidade em um contexto local; das diferentes
percepções da biodiversidade – os sentidos atribuídos a ela; dos temas e
conceitos que cada participante apresentou como possibilidades para as
interações educativas; e ainda os objetivos e características da educação
ambiental com este tema, rendem-se a esta proposta do exercício do diálogo.
É por meio deste, em situações concretas, que este trabalho pode alcançar seu
potencial de contribuir para trazer à luz o tema da biodiversidade em uma
perspectiva da educação ambiental crítica.
Quais são as contribuições da presente pesquisa para o tema da
educação ambiental crítica e a conservação da biodiversidade? A pesquisa
aponta para as seguintes conclusões:
1. Quanto aos sentidos atribuídos à biodiversidade: a biodiversidade é
percebida de formas diferentes pelas pessoas e por isso é objeto de disputa,
pois valores diferentes são ligados a ela. Torna-se essencial dialogar sobre
esses valores e em que concepções/visões de mundo eles estão alicerçados. A
postura hermenêutica pode auxiliar nesse processo, já que ajuda a desvelar as
estruturas subliminares. Uma vez que estes sentidos foram fruto da interação
entre a pesquisadora e os textos produzidos pelas pessoas que participaram
da pesquisa, por meio da interpretação do texto escrito das respostas, ao
mudarem as pessoas novos sentidos podem ser percebidos, fazendo com que
este possa ser um exercício conduzido dentro dos processos educativos.
2. Quanto aos temas para se trabalhar com a biodiversidade: os temas são
bem diversos e podem ser utilizados em diferentes interações educativas,
sejam elas no âmbito da escola ou no trabalho com comunidades, sempre
pautados pelo diálogo. Um dos desdobramentos da presente pesquisa deverá
ser a reelaboração do roteiro atualmente utilizado para a condução de visitas
guiadas à trilha do Horto (ANEXO 3) a partir deste olhar dos temas sugeridos.
3. A conservação da biodiversidade: as ameaças à conservação da
biodiversidade são múltiplas e o fato do grupo participante estar ligado a
126
projetos de pesquisa e conservação em diferentes biomas ajuda a colocar em
isso em relevo. A expansão da fronteira agropecuária e o crescente processo
de urbanização aparecem como duas das principais ameaças e há temas
propostos que podem ajudar a abordar essas questões. Na escolha dos
conceitos/ideias a prevalência de conceitos da esfera de valores mostra a
importância destes nas medidas de proteção à biodiversidade;
4. Em relação à questão ambiental, embora obviamente esta não possa
prescindir de dados científicos, também não se move apenas em função
destes. A esfera econômica parece ser sempre a decisiva e a educação
ambiental precisa vir a ser componente estrutural das decisões, e não ser
encarada como um instrumento. As decisões são tomadas em clima de
incerteza.
5. Em relação aos referenciais escolhidos para a pesquisa, o Delphi foi
considerado um elemento valioso por permitir a realização do trabalho mesmo
com a restrição quanto a encontros presencias. Esta opção, somada ao uso de
questões por escrito na pesquisa realizada no contexto do Polo Ecológico,
permitiu a inclusão de um grande número de participantes na pesquisa. Ambas
foram escolhas conscientes da pesquisadora, ao mesmo tempo em que foram
opções metodológicas que restringiram a comunicação direta com as pessoas
que participaram da pesquisa. O aprofundamento desta comunicação,
realizada até agora por meio das etapas sequencias do Delphi, poderá ser
objeto de novas investigações.
Na presente pesquisa, optamos por apresentar os resultados como um
conjunto de alternativas, e não de regras, o que respeita nossa compreensão
de que a aprendizagem sobre a biodiversidade na ótica da educação ambiental
crítica deve estar vinculada ao contexto das/dos participantes, o que vai ao
encontro das premissas de diálogo dos procedimentos metodológicos
escolhidos (o Delphi de Política e a hermenêutica filosófica). Ficam, portanto,
aqui ideias, sugestões, possibilidades a serem exploradas.
127
REFERÊNCIAS
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(Doutorado) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, SP, 2010.
SOUZA, M.G. Contribuições de um programa educativo de uma organização não
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STABLES, A. Language and meaning in environmental education: an overview.
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STAPP, W.B.; WALS, A.E.J.; STANKORB, S.L. Environmental Education for
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Iowa: KENDALL/HUNT Publishing Company, 1996. 141p.
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In: ENCONTRO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL- V EPEA. 5, 2009a,
São Carlos. Anais...São Carlos, UFSCar;USP;UNESP p. 541 a 548
THIEMANN,F.T. et al. Um retrato da experiência prévia de estudantes de biologia
sobre educação ambiental e conservação da biodiversidade. In: EA 2009 - Educação
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TURROF, M. The Policy Delphi. In LINSTONE, H.A.; TURROF, M. The Delphi MethodTechniques and Applications. Ed. Murray Turoff and Harold A. Linstone, 2002. p.80-96.
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WALS, A. E. J. Between knowing what is right and knowing that is it wrong to tell
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WALS, A. E. J. Environmental education and biodiversity. Wageningen: National
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Disponível em: <http://www.nap.edu/catalog/989.html>. Acesso em: 08 set. 2011.
138
APÊNDICE 1 - DELPHI SISBIOTA ETAPA 1
QUESTIONÁRIO DELPHI SISBIOTA
Projeto “Predadores de Topo de Cadeia”
dezembro 2011
Primeira etapa dos questionários
Parte I – Dados pessoais
Todas as suas respostas serão utilizadas de forma anônima na pesquisa e em
qualquer documento e relato originado dela. Porém, os dados pessoais serão
importantes para auxiliar a análise dos dados da pesquisa. Os questionários
individuais serão numerados. Pedimos que sejam preenchidos os seguintes dados:
Nome:
Instituição:
Cargo:
Número de anos neste cargo:
Gênero: (Masculino/Feminino)
Esta parte do questionário será separada antes da leitura das respostas.
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
Parte II – Afirmações
A seguir você vai encontrar uma série de afirmativas, que podem ser controversas.
Por favor, indique a que ponto/grau você concorda ou discorda da afirmativa.
Para cada afirmativa, sempre que considerar necessário, você pode
defender/esclarecer sua escolha no espaço designado (pode também exceder o
espaço designado, sempre que necessário).
_____________________________________________________________________
Afirmativa 1: Biodiversidade é, essencialmente, uma nova forma de se referir a tudo
que tem a ver com a relação entre pessoas e natureza.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 2: O poder da biodiversidade não está necessariamente em seu significado
biológico ou científico, mas muito mais em seu significado político, ao renovar a
atenção para a conservação da natureza (em nível global).
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
139
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 3: Educadoras e educadores ambientais precisam concordar com uma
definição e significado único de biodiversidade, para que ela (biodiversidade) tenha
qualquer potencial educativo.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 4: O valor da biodiversidade para a educação ambiental está no fato de que
o termo “biodiversidade” tem uma variedade de significados distintos.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 5: É muito útil discutir se é possível afirmar que algumas espécies são mais
valiosas do que outras.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 6: Em educação, é importante lidar com os diferentes significados da
biodiversidade, seja como conceito simbólico, ou como conceito baseado em dados
empíricos.
Concordo plenamente (_)
140
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 7: O ensino da biodiversidade seria incompleto se diversidade cultural não
estive incluída.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 8: A natureza pode ser melhor entendida quando distinguimos entre
categorias como: genes, espécies e ecossistemas.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Afirmativa 9: A natureza pode ser melhor avaliada quando distinguimos entre
categorias como: genes, espécies e ecossistemas.
Concordo plenamente (_)
Concordo (_)
Concordo parcialmente (_)
Discordo (_)
Discordo completamente (_)
Motivação (opcional):
_____________________________________________________________________
Parte III – Conceitos
As duas questões seguintes (A e B) solicitam conceitos ou ideias que você considera
que estão relacionadas à ou associadas com biodiversidade.
141
Questão A: Quais conceitos ou ideias usadas em seu trabalho você associa ou
conecta com a biodiversidade? Listar no máximo 10 conceitos/ideias.
Conceitos/ideias:
1)
2)
3)
4)
5)
6)
7)
8)
9)
10)
Questão B: Escreva a seguir uma lista dos cinco conceitos e ideias que você
considera mais importantes para educação sobre biodiversidade. Na lista devem estar
os conceitos ou ideias que você gostaria de incluir indiscutivelmente em um programa
de educação ambiental com foco na biodiversidade.
Você pode repetir conceitos e ideias listados na Questão A.
Sempre que considerar pertinente, por favor, indique porque você considera um
conceito ou ideia particularmente importante (na própria linha ou no espaço ao final).
1)
2)
3)
4)
5)
Argumentação (opcional):
_____________________________________________________________________
Parte IV – Temas
A seguir você encontrará cinco exemplos de temas que poderiam servir como estímulo
para aprender sobre biodiversidade. Com essa inspiração, sugira um tema que você
acha que seria adequado para trabalhar com biodiversidade, ou selecione um dos
exemplos fornecidos. Você pode basear sua escolha em sua própria experiência e
conhecimento. Na sequência, se possível, dê sugestões para traduzir os temas
propostos em atividades educativas.
Exemplos fornecidos:
1. Biodiversidade no seu prato.
2. Biodiversidade em Trilhas da Natureza.
3. Natureza como vizinha: biodiversidade em áreas urbanas e proximidades.
4. Conservação da Biodiversidade e expansão da fronteira agropecuária.
5. Unidades de Conservação e conflitos.
142
Seu tema:
Motivação:
Sugestão de atividades educativas relacionadas:
_____________________________________________________________________
Parte V – Objetivos de aprendizagem
A seguir você encontrará uma lista de nove objetivos possíveis da educação para a
biodiversidade. Assinale na quadro um objetivo que você considera essencial, ou, se
não encontrar nenhum, crie o seu próprio. Se possível, por favor, novamente, justifique
sua escolha. Se considerar necessário, complemente sua justificativa com objetivos de
aprendizagem mais específicos, que se encaixam no objetivo escolhido.
aquisição de conhecimento
mudança de comportamento
competências/habilidades
clarificação e desenvolvimento de
valores
tomada de consciência
envolvimento emocional
desenvolvimento moral
tornar-se crítico
formar uma opinião
outro:
Justificativa:
_____________________________________________________________________
Considere o exemplo a seguir, fornecido anteriormente em resposta a este
questionário, como exemplo de objetivos de aprendizagem concretos relacionados ao
objetivo principal (clarificação e desenvolvimento de valores) escolhido:
Relacione a seguir três objetivos de aprendizagem concretos que se encaixam no
objetivo principal escolhido por você:
1) o educando compreende o valor de cada espécie e a importância delas no
ecossistema
143
2) o educando compreende que as formas de vida e a relação com os recursos
naturais são múltiplas e também quais são os interesses econômicos, políticos e
sociais da natureza.
3) o educando compreende que existem formas mais sustentáveis de se relacionar
com o meio e apreende novos valores.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Se possível, relacione a seguir três objetivos de aprendizagem concretos que se
encaixam no objetivo principal escolhido por você na quadro anterior:
1)
2)
3)
_____________________________________________________________________
Parte VI – Aprendizagem e ensino
A seguir você encontrará 11 características/critérios que auxiliam a aprendizagem em
educação ambiental. Assinale o que você considera mais relevante para educação
sobre biodiversidade, ou, se não encontrar nenhum adequado, crie seu próprio.
Novamente, se considerar pertinente, justifique sua escolha.
Características/critérios que auxiliam a aprendizagem em educação ambiental:
reconhecível no cotidiano
útil no cotidiano
permite experiências em primeira mão, e mão na massa
aproveita conhecimentos e experiências anteriores do educando
cria dissonância cognitiva para promover modos alternativos de pensar
e fazer
é baseado em problemas, para promover questionamentos e
investigação adicional
aprofundamento teórico para descobrir princípios e idéias subjacentes
orientado a descobertas para fomentar novas experiências de
aprendizado
cria conflitos sociais para envolver estudantes em debates (e disputas
sócio-científicas)
observação acurada para envolver todos os sentidos
orientado para a ação, para desenvolver responsabilidade, cuidado e
competência para ação
- outro:
Motivação (opcional):
144
Parte VII – Conclusão
Use este espaço se quiser acrescentar algum comentário.
Quanto tempo você gastou respondendo este questionário?
(_) menos do que 60 min
(_) de 60 a 90 min
(_) de 90 a 120 min
(_) mais do que 120 min
Muito obrigada por responder ao questionário. Sua participação vai ajudar-nos a definir
diretrizes para o trabalho com biodiversidade, sob o enfoque da educação ambiental,
no projeto SISBIOTA – Predadores de Topo de Cadeia.
.
Este questionário foi adaptado do questionário utilizado em:
WALS, A. E. J. Environmental education and biodiversity. ICK-report no. 36.
Wagningen: National Reference Centre for Nature Management, 1999. 120p.
Texto alternativo, constou no questionário enviado às participantes do Grupo C, que
não estavam vinculadas ao SISBIOTA:
Muito obrigada por responder ao questionário. Sua participação vai ajudar-nos a definir
diretrizes para o trabalho com biodiversidade, sob o enfoque da educação ambiental,
no projeto de doutorado: BIODIVERSIDADE E EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
EXPLORANDO DIFERENTES AMBIENTES NO ECOSSISTEMA URBANO PARA A
PRÁTICA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ESCOLAS E COMUNIDADES - Os
sentidos da biodiversidade e as interfaces com a educação ambiental.
145
APÊNDICE 2 - DELPHI SISBIOTA ETAPA 2
QUESTIONÁRIO DELPHI SISBIOTA – ETAPA 2
Projeto “Predadores de Topo de Cadeia Alimentar”
Setembro 2012
Com o objetivo de dar continuidade à nossa pesquisa sobre os sentidos da
biodiversidade e as interfaces com a educação ambiental, convidamos vocês a
contribuir com a ETAPA 2 do QUESTIONÁRIO DELPHI SISBIOTA. Você pode
contribuir com esta segunda etapa tendo ou não respondido o questionário inicial.
As contribuições da pesquisa, até o presente, baseadas na primeira etapa do
questionário DELPHI SISBIOTA mostraram que:
1) Há diversas formas de se perceber a biodiversidade (os sentidos atribuídos).
Sendo assim, atividades educativas que tenham a biodiversidade como tema, devem
ocupar-se com o diálogo sobre essas percepções;
2) Conceitos relacionados à ciência, ao envolvimento afetivo e político são
relacionados como sendo importantes para o ensino da biodiversidade. Assim, mesmo
que o enfoque das interações educativas privilegie uma ou outra esfera, devemos
manter esse tripé como referência;
3) Os temas sugeridos para as atividades educativas podem auxiliar o planejamento
destas sob a perspectiva da educação ambiental crítica.
QUESTIONÁRIO DELPHI SISBIOTA – ETAPA 2
Parte I – Dados pessoais.
Todas as suas respostas serão utilizadas de forma anônima na pesquisa e em
qualquer documento e relato originado dela. Porém, os dados pessoais serão
importantes para auxiliar a análise dos dados da pesquisa. Os questionários
individuais serão numerados. Pedimos que sejam preenchidos os seguintes dados:
Nome:
Instituição:
Cargo:
Número de anos neste cargo:
Gênero: (Masculino/Feminino)
Esta parte do questionário será separada antes da leitura das respostas. Se você já
preencheu esta parte no QUESTIONÁRIO DELPHI SISBIOTA ETAPA 1, basta colocar
seu nome.
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
Parte II – O contexto do questionário.
Com o objetivo de ajudar a construir um conjunto de sugestões para o trabalho
educativo, pedimos que, ao responder o questionário, você considere sempre o seu
146
próprio projeto de pesquisa/área de atuação dentro do projeto "Predadores de Topo de
Cadeia Alimentar" (Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade - SISBIOTA
BRASIL). Caso não participe do projeto, pode responder considerando como tema
geral a biodiversidade e a educação ambiental.
AO RESPONDER AO QUESTIONÁRIO, CONSIDERO O SEGUINTE:
- ANIMAL:
- BIOMA:
- PÚBLICO DO PROCESSO EDUCATIVO:
Parte III – Os sentidos atribuídos à biodiversidade.
Os sentidos atribuídos à biodiversidade pelos grupos que participaram desta pesquisa
foram buscados nas motivações oferecidas às escolhas feitas na Parte II –
Afirmações da primeira etapa do questionário DELPHI SISBIOTA. Na Parte II –
Afirmações foi pedido às/aos participantes para concordarem ou discordarem de uma
série de afirmativas que tratavam do conceito de biodiversidade, e sua relação com a
educação ambiental. Também utilizamos nesta análise as respostas à Parte IV –
Temas do questionário, na qual foram apresentados temas que poderiam servir como
estímulo para aprender e motivar-se a agir para a conservação da biodiversidade. É
importante ressaltar dois aspectos: que os termos escolhidos para designar as
categorias são fruto do processo hermenêutico de compreensão do sentido de
biodiversidade que estaria implícito no texto, e que pode haver cruzamento entre
categorias, não sendo cada uma excludente da outra. Foi possível desvelar nove
categorias emergentes de sentidos atribuídos à biodiversidade.
Pedimos que você indique que categorias você considera coerentes/relevantes para a
sua visão do que deve ser o trabalho educativo no contexto escolhido por você na
Parte II deste questionário (Parte II – O contexto do questionário).
Quadro 1: Categorias emergentes e indicadores descritivos que levaram à
criação das categorias. Assinalar na coluna da direita todas as categorias que
considerar relevantes.
1
Categorias
emergentes
Indicadores descritivos
CONCRETUDE
a biodiversidade é percebida como uma
realidade concreta, palpável, de
existência independente do ser
humano. Esta biodiversidade pode ser
auferida, medida, existe em uma área
determinada, independentemente das
relações com as pessoas.
“existe biodiversidade independente
dos seres humanos”; “fato que sempre
esteve ali”; “número de formas
diferentes de vida...”.
Exemplos:
Relev
ante
147
2
SIMBÓLICO
Exemplos:
3
CONHECIMENTO
Exemplos:
4
HOLISMO
Exemplos:
5
CALEIDOSCÓPIO
Exemplos:
6
OCULTA
Exemplos:
7
AMEAÇADA
Exemplos:
148
a biodiversidade assume seu papel de
simbolizar o relacionamento ser
humano/natureza. Isto decorre da
popularização do uso do termo.
“significado simbólico...de
relacionamento com a natureza”;
“conceitos...”popularizados e
comercializados”.
Em relação ao poder do conceito de
biodiversidade, fica claro que o poder
político que a biodiversidade tem ou
pode ter advém da ciência e do
conhecimento científico. O sentido da
biodiversidade aqui é de embasamento,
com dados científicos, da esfera
política.
“quanto mais se esclarece o tema, mais
força ganha seu valor biológico”;
“significado ecológico concreto de
dependência...auxilia no seu significado
político”.
O sentido da biodiversidade para os
grupos pesquisados de forma geral
prescinde da atribuição de valor a
espécies específicas. Os argumentos
sugerem que o valor da biodiversidade
está no todo, e não nas partes.
“visão ecossistêmica...todas as
espécies são importantes”; “a partir do
momento que se entende o que é
biodiversidade, não faz mais sentido
achar que há espécies mais valiosas”.
Depreendido do componente de
diversidade da biodiversidade:
diversidade de culturas, formas,
sabores, receitas, sons, combinações
“formar infinitas combinações”;
“diversidade na nossa alimentação”.
Surge da necessidade observada de
desvelamento. A biodiversidade
aparece como algo que, apesar de
estar ao redor, não é visto, e por isso é
preciso direcionar o olhar para ela.
“ampliar a percepção”; conhecer mais a
biodiversidade local”.
Biodiversidade como alvo de ameaças,
que merece e precisa de proteção.
“conservação de várias espécies
vulneráveis”; “fragmentação de habitats
e perda de espécies”.
8
INCLUSIVA
Exemplos:
9
EXCLUSIVA
Exemplos:
Se o ser humano é parte da
biodiversidade, temos a inclusão da
diversidade cultural e dos
relacionamentos com os seres
humanos no sentido atribuído à
biodiversidade. diversidade cultural é
incluída porque faz parte da diversidade
humana.
“entende o ser humano como parte da
biodiversidade”; “a diversidade cultural
é intrínseca à diversidade dos seres
humanos”.
Quando os seres humanos são
percebidos como externos à natureza,
sua relação com a biodiversidade é
vista como interferência. Os próprios
parâmetros da biodiversidade podem
ser afetados pelo ser humano. Se o ser
humano não é parte intrínseca da
biodiversidade, a diversidade cultural
não precisa ser incluída.
“parâmetro responde à relação entre as
pessoas e a natureza”; “diversidade de
formas biológicas”.
Parte IV – Os conceitos/ideias para a educação ambiental para a conservação da
biodiversidade.
Na primeira etapa do questionário DELPHI SISBIOTA (Parte III – Conceitos; Questão
B) cada participante selecionou até cinco conceitos e ideias que considerava mais
importantes para educação ambiental para a conservação da biodiversidade. Foram
relacionados ao todo 152 conceitos/ideias. Nas respostas encontramos um repertório
de conceitos variado, que mostrou uma preocupação, como grupo, de que fossem
observados aspectos políticos, de valor e de conhecimento científico no trabalho
educativo.
Apresentamos na Quadro 2 três conjuntos de conceitos/ideias, organizados de forma a
atender a este tripé de conhecimento (Esfera de conteúdos científicos), envolvimento
político (Esfera de atuação) e valores (Esfera de valores), oferecido nas respostas, e
pedimos que você identifique (utilizando a coluna à direita) qual destas esferas você
considera que está em primeiro, segundo e terceiro lugar em importância no processo
educativo no contexto escolhido por você na Parte II deste questionário (Parte II – O
contexto do questionário).
149
Quadro 2: Conceitos/ideias considerados essenciais em um programa de
educação ambiental para a conservação da biodiversidade.
Conceitos
Ordem
(1º, 2º,
3º lugar)
Esfera de
Interações: Cadeia alimentar; interações ecológicas;
conteúdos
mutualismos.
científicos
Interdependência: Reciprocidade e interdependência; cada
espécie tem uma função importante para o funcionamento
do sistema.
Origem da biodiversidade: O que é e como surge a
biodiversidade; especiação; evolução.
Esfera de
atuação
Conceitos básicos: População; nicho ecológico;
Ecossistema;
Medição da biodiversidade/conceituação da biodiversidade:
Riqueza de espécies; variabilidade genética; definições de
biodiversidade.
Manutenção e conservação da biodiversidade: Unidades de
Conservação; áreas protegidas.
Esfera de
valores
Danos/Ameaças à biodiversidade/Perda da biodiversidade:
Ameaças e declínios populacionais; extinção;
fragmentação.
Ação/Envolvimento/Política/Participação: Gestão
participativa; formação crítica; políticas públicas;
participação e ações coletivas.
Cultura e sociedade/Diversidade cultural: Diversidade
cultural humana; culturas tradicionais.
Ética/Valores: Ética ambiental; antropocentrismo e
biocentrismo; biofilia; valores éticos.
Experiência/Valor estético/Arte/Percepção: Atividades de
contemplação/ sentidos de percepção como ferramenta de
sensibilização; experiência estética/ inspiração para a arte e
o trabalho com o sensível.
Valoração da biodiversidade: Valoração da biodiversidade
sob o ponto de vista antropocêntrico; Valores existenciais
em contraponto a valores de uso.
Importância da biodiversidade: Patrimônio genético;
serviços ecossistêmicos; bens e serviços que a
biodiversidade presta aos seres humanos.
150
Parte V – Sugestões para a educação ambiental para a conservação da
biodiversidade.
Na primeira etapa do questionário DELPHI SISBIOTA (Parte IV – Temas) cada
participante selecionou ou criou um tema que considerou que seria adequado para
trabalhar com biodiversidade, sob a perspectiva da educação ambiental. Foram
criados 17 temas, além dos cinco originais. Estes temas apontaram para seis
possibilidades de trabalho que contemplam as principais possibilidades de trabalho
oferecidas.
A Quadro 3 apresenta estas possibilidades e as atividades educativas que foram
propostas.
Quadro 3: Possibilidades de abordagem do tema da biodiversidade em
processos educativos.
Possibilidades de trabalho
emergentes
Sugestões de atividades educativas
propostas
Experimentar a biodiversidade
Sentido de experiência, como na sugestão
de usar peças idênticas (LEGO) para
montar combinações e produtos finais
diversos; relações entre biodiversidade e
alimentação; trilhas da natureza.
“Abrir os olhos” para a
biodiversidade
Uso da fotografia; aves aquáticas e áreas
alagadiças; canções; teatro, histórias;
confecções; ênfase na biodiversidade
brasileira; folclore, festas tradicionais.
Exercitar diálogo/debates
Discutir conflitos em UCs; exercício crítico;
desvelamento das “engrenagens”; outros
fazeres, como a agroecologia; expansão
agropecuária e biodiversidade.
Perceber a importância da
biodiversidade e os limites da
interferência humana
Observar a presença de elementos da
biodiversidade no cotidiano; pensamento
sistêmico; preservação das florestas;
conhecer a diversidade.
Biodiversidade no próprio território
Trilhas urbanas; processos históricos de
ocupação do território.
Superação da fragmentação do
ensino
Visão holística da natureza.
Considerando novamente o que foi pedido no início deste questionário (Parte II
– O contexto do questionário), solicitamos agora que você selecione uma (ou mais)
possibilidade(s) de trabalho e comentasse porque esta seria interessante para a sua
própria atuação.
151
152
ANEXO 1 – Mapa de unidades do Polo Ecológico de São Carlos – SP
– Figura cedida pela Prefeitura Municipal de São Carlos
153
ANEXO 2 – Mapa completo do Polo Ecológico de São Carlos – SP Figura cedida pela Prefeitura Municipal de São Carlos
Anexo 3 - ROTEIRO DA TRILHA DO HORTO MUNICIPAL – Elaborado pela
equipe do Horto Municipal – Prefeitura Municipal de São Carlos.
HORTO MUNICIPAL NAVARRO DE ANDRADE
ROTEIRO DA TRILHA ECOLÓGICA
Caro Professor e Cara Professora,
É com satisfação que apresentamos este livreto: A CIDADE COMO ESPAÇO
EDUCADOR: VISITA AO HORTO MUNICIPAL.
Conhecer o Horto Municipal é parte do Projeto “São Carlos de Todos Nós”,
desenvolvido desde 2006 pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura e Fundação PróMemória de São Carlos.
Este projeto visa levar o aluno a conhecer, apreciar e valorizar o patrimônio
material e imaterial de São Carlos, reconhecendo-o como fonte para a compreensão
do processo de formação e desenvolvimento da cidade, e a despertar o sentimento de
identidade e pertencimento dos diferentes grupos culturais e étnicos que habitam a
cidade de São Carlos, de forma que todos possam sentir-se parte integrante da
construção da história da cidade.
Por meio do projeto São Carlos de Todos Nós todos os alunos do ensino
fundamental da rede municipal, da série inicial à 8ª série, aos sítios patrimoniais do
município de São Carlos. Esses abarcam lugares tão distintos como a Fazenda Pinhal
e o Horto Municipal, até fábricas e universidades da nossa região. Este projeto permite
que todos os nossos estudantes, independente da escola que freqüentam, tenham as
mesmas oportunidades de conhecer e se envolver com o cuidado de nosso município.
PARA QUE NOSSA VISITA SEJA PROVEITOSA, E PARA QUE NÃO
DEIXEMOS A NOSSA MARCA NO LOCAL, É PRECISO CUMPRIR ALGUNS
ACORDOS:
1. VAMOS CAMINHAR APENAS NA TRILHA DEMARCADA;
2. VAMOS OBSERVAR ATENTAMENTE O AMBIENTE, SEM ARRANCAR NEM DANIFICAR
RAMOS DE PLANTAS, ANIMAIS, SEMENTES, PEDRAS, ETC;
3. É IMPORTANTE QUE A GENTE NÃO JOGUE LIXO NA TRILHA.
154
APRESENTAÇÃO:
A área do Horto Municipal Navarro de Andrade é de 4 hectares - 40.000 m2 ,
equivalente a 04 campos de futebol. O horto produz anualmente uma média de
100 mil árvores, que são doadas para arborização urbana e na zona rural. As
árvores são elos essenciais na grande teia da vida. As árvores da mata ciliar
protegem os cursos d´água e nascentes, contribuindo também para a preservação
dos recursos hídricos, tão importantes para a vida na Terra.
Nós poderemos observar aqui na trilha a interação das árvores com outros
seres vivos, como animais, musgos, fungos, outras plantas e líquens: existe uma
relação de interdependência entre todos os seres vivos. As plantas são, por
exemplo, fonte de alimento e de proteção para outros seres vivos. As plantas
também dependem dos outros seres vivos que realizam a decomposição de
matéria orgânica para produção de húmus, que fazem a dispersão das sementes,
que possibilitam o cruzamento para reprodução, etc.
Vocês podem sentir como há diferença ente o clima da cidade e o do horto. Em
dias quentes, podemos sentir que o clima no Horto é muito mais úmido e ameno.
As árvores conservam a umidade do ambiente e a degradação das matas está
diretamente relacionada com o aquecimento global.
Podemos conversar também sobre tudo que é construído e que consumimos a
partir de matéria prima da natureza: o lápis (grafite é um mineral e a madeira vem
da árvore), móveis de madeira, tecido (algodão, seda, etc...). É importante termos
consciência de que o consumo não deve ser excessivo. Também vamos observar
que, apesar de não falarem, as árvores também se comunicam por meio da cor
das flores, frutas e folhas, pelo cheiro, etc. Os animais sabem se uma fruta está
madura pela cor e pelo cheiro.
A produção de mudas: a produção de mudas em tubetes e depois a área para
onde elas são transplantadas para saquinhos para se desenvolver até o tamanho
para plantio são visitadas: os “berçários das árvores”.
Sobre as placas de identificação das árvores: o nome científico dos seres vivos
é formado por duas palavras. A primeira designa o gênero a que pertence, a
segunda, a espécie. Um único gênero pode ter muitas espécies, indicando o grau
de parentesco que possuem entre si. O nome vulgar é o nome pelo qual a planta é
conhecida. Esse nome pode variar bastante, inclusive de região para região.
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Árvores Exóticas e Nativas.
Espécies nativas – são encontradas naturalmente no território
brasileiro, podendo ocorrer ou não em países vizinhos em estado
nativo (jerivá, palmito Jussara, macaúva, etc)
Espécies exóticas – são as introduzidas de outros países e cultivadas
no território brasileiro, mas que não são encontradas em estado nativo
no país (palmeira real, imperial, areca, etc).
Altura de até 20 metros com diâmetro máximo de 50 cm. Ocorre e do sul
a Goiás e Mato Grosso. Seus frutos são avidamente procurados pela
fauna, como tucanos, maritacas, macaco, etc.
1) Vários exemplares de Pinus intercalado com peroba, na beira da rua de terra, à
esquerda do início da trilha:
o
Pinus- planta exótica- madeira utilizada para fabricação de lápis
o
Peroba- madeira de boa qualidade. Óleo de peroba utilizado para hidratar e dar
brilho em móveis de madeira.
2) Área de falsas murtas:
Planta exótica, muito utilizada para plantio urbano em cidades. É uma árvore de
pequeno porte, que tem uma floração de pequenas flores brancas, com aroma
semelhante ao jasmim.
3) Forração do chão na área das falsas murtas:
Nessa área é fácil ver a cobertura de folhas caídas no chão, também chamada de
serrapilheira. Essa cobertura é formada por folhas e frutos caídos, e pequenos animais
mortos, além fungos e bactérias. Esta cobertura protege o solo, e é decomposta e os
elementos são incorporados ao solo, como um adubo.
4) Àrvores de Natal:
O Horto distribuía árvores de Natal e essas árvores não foram distribuídas, e se
enraizaram e cresceram no local.
5) Lofantera:
Está é uma espécie da Amazônia, de um bioma diferente do nosso, que é o cerrado.
6)Cedro rosa:
o
Se você olhar bem para o alto, vai ver lá em cima a copa da árvore. Esta
árvore mede quase 30 metros, e demorou 40 anos para crescer tanto. Ela pode
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chegar a 40 metros de altura, e pode viver até 200 anos. O tempo de vida das
árvores é diferente do nosso. Algumas árvores vivem até 3.000 anos! Quantas
gerações de seres humanos as árvores já viram passar?
o
O cedro rosa é uma árvore muito procurada pela qualidade de sua madeira
largamente empregada na construção civil, esculturas e obras de talha, móveis
e marcenaria. Por isso está em extinção! O desaparecimento de uma espécie
pode afetar várias outras, porque a natureza (incluindo a espécie humana) é
repleta de relações entre os seres.
o
O cedro floresce durante os meses de agosto-setembro e seus frutos
amadurecem de maio a agosto. Produz grande quantidade de sementes
viáveis, e é fácil de produzir mudas.
o
A dispersão das sementes no caso do cedro rosa é a dispersão eólica (pelo
vento). Sua semente é alada. A árvore é imóvel, a dispersão foi uma estratégia
evolutiva para que as plantas se espalhassem e conquistassem o ambiente
terrestre. “Já pensou se pega fogo naquele local e tivessem somente sementes
ao redor daquela árvore? Tais espécies de árvores desapareceriam...”
7) Embaúba
o
O tronco é reto e oco, ocupados por formigas, que recebem abrigo e
alimentação e, em troca, defendem sua protetora dos inimigos naturais, ou
seja, qualquer praga ou inseto, que tente destruir suas folhas ou flores "mutualismo".
o
De tão ásperas, suas folhas são usadas como lixa para polir madeira. A casca
fornece fibras resistentes. O tronco é utilizado na fabricação de caixotes e
palitos de fósforos, na construção de jangadas e flutuadores. O broto tem
muitos usos medicinais.
o
A embaúba floresce e frutifica no verão. As sementes fazem as delícias dos
pássaros e principalmente da preguiça, que se alimenta da sua inflorescência,
chegando a dar seu nome à arvore: "árvore-da-preguiça".
8) Copaíba
o
Os índios já conheciam as propriedades medicinais de sua seiva: cicatrizante,
antiséptico, expectorante. Eles passam a seiva no ferimento.
o
Como extrair a seiva da Copaíba de forma sustentável, sem destruir a árvore?
Não é necessário cortar a árvore inteira. Os índios retiravam a seiva dos ramos
que caiam.
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o
Se é feito um talho na casca, é como um corte em nosso braço: em ambos
entram no microrganismos que podem causar danos sérios até a morte!
o
Ao lado da copaíba, tem um pé de café...
9) Palmeiras
o
São plantas monocotiledôneas da família das palmáceas, representadas por
cerca de 3.500 espécies reunidas em mais de 240 gêneros. Muitas palmeiras
são de grande importância econômica pelos diferentes produtos que delas
podem ser obtidos (entre eles o palmito).
o
Estão entre as plantas mais antigas do globo e seus vestígios remontam a
mais de 120 milhões de anos.
o
A palmeira imperial foi trazida da América Central por D. João VI e plantada no
Jardim Botânico do Rio de Janeiro. D. Pedro II (seu neto) a dispersou.
o
Como exemplo da interdependência das espécies vegetais e animais,
podemos pensar na dispersão do Jerivá, que é feita por aves (arara, tucano,
periquita, maritaca - as aves engolem o caroço e as sementes saem nas
fezes).
o
O palmito é extraído da região na base da saída das folhas.
o
Nomes populares: Jerivá, côco-babão, baba-de-boi (em cada lugar há um
“apelido”, da esquerda para direita – conforme vai subindo no mapa do Brasil a
palmeira vai recebendo um nome, sendo que baba de boi é como ela é
conhecida no nordeste).
10) Ipê roxo e Jibóia
o
Epífitas- plantas que crescem sobre outras plantas na busca pela luz solar e ou
suporte, como as bromélias, orquídeas, filodendros, jibóia. Nesse caso, ipê
serve como suporte para a jibóia. A jibóia não suga a seiva bruta nem a
elaborada do ipê, só se apóia nele para subir.
o
Atentar para a quantidade de folhas secas que existem no chão. Geralmente
achamos que aquilo é sujeira, varremos e jogamos fora. Mas na mata, elas são
extremamente necessárias porque viram adubo para as plantas. No adubo
existem nutrientes que as plantas absorvem para fabricação de seu alimento
através da fotossíntese.
11) Algumas plantas que vemos na trilha são usadas como ornamentais, em
paisagismo, como as helicônias, Rabo de peixe (palmeira), as íris.
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12) Araucária (Aspectos históricos)
o
Árvore símbolo de São Carlos, pois esta era uma espécie bastante abundante
na região. Primeiro nome de São Carlos – São Carlos do Pinhal; título do
fundador de São Carlos – Conde do Pinhal; Fazenda Pinhal; Dia da Araucária
– 25 de abril, instituído por lei municipal.
o
Planta dióica (precisa de macho e fêmea para reproduzir). A dispersão é feita
pela gralha azul, que enterra suas sementes para comer no futuro e depois
esquece, a semente germina e nasce uma nova árvore.
o
A araucária não tem fruto, a pinha é uma flor, e o pinhão é uma semente.
13) Cereja do Rio Grande
o
Neste ponto podemos ver as diferenças de cenários entre: Florestas (mata
semi-decídua, Atlântica, Amazônica), Cerrado e Alagado.
14) Jatobá
o
Esta árvore é tida como uma das espécies que mais fixam carbono da
atmosfera.
o
Uso da farinha da fruta para fins culinários (bolos, biscoitos, etc).
o
A dispersão da espécie é feita por roedores (cotia, paca, esquilo, anta) que
levam suas sementes para comer longe da árvore, onde germinam.
o
Macaco- prego se alimenta de jatobá.
15) Urucúm
o
Planta utilizada pelos indígenas para proteger a pele dos raios solares. Hoje
também utilizada na indústria de cosmético, como bronzeadores e também
pela indústria alimentícia na forma de corante para alimentos (Colorau).
o
Sementes: antidiarréia, antifebril, asma, faringite, gripe.
o
Raízes: diurética, digestiva.
16) Ninféia e crótons –
o
plantas ornamentais
o
Ninféia: considerada sagrada pelos egípcios, muito utilizado por ser bela e de
fácil cuidado e se espalhar com facilidade. Multiplica-se por tubérculos e
sementes.
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