Julio 2017 - ISSN: 2254-7630
IDENTIDADE MATERNA NA IMAGEM POLÍTICA FEMININA
Tayra Carolina Nascimento Aleixo¹
Professora do Departamento de Comunicação Social da Faculdade Anhanguera de Jundiaí
E-mail: aleixo.tay@hotmail.com
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Tayra Carolina Nascimento Aleixo (2017): “Identidade materna na imagem política feminina”, Revista
Caribeña de Ciencias Sociales (julio 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/caribe/2017/07/materna-imagen-politica.html
RESUMEN
El artículo busca articular los temas del amor, el sexo y la política. Teniendo en cuenta el afecto como
el poder legítimo del ser humano, las listas bibliográficas teóricos que identifican el impacto de la
perspectiva afectiva en la carrera política de la mujer contemporánea. Más específicamente, el
objetivo principal es identificar los retos de la maternidad de los concejales de la Región Metropolitana
de Campinas (teniendo en cuenta la cuestión del género en este universo doméstico), así como la
posibilidad de canalización de la identidad materna en comunicación política de ellos. La investigación
incluyó a nueve entrevistas semiestructuradas, transcrita, analizado y comparado con la referencia.
Ellos hablan de los entrevistados señalan, en términos de análisis cualitativo que la experiencia
materna aún se encuentra en el corazón de la vida de las mujeres contemporáneas y es una
estrategia sensata en la política, apoyada por el interés en la vida personal de los personajes públicos
y el potencial para la creación de empatía con el electorado antes de que el candidato.
Palabras clave: afecto, el género, la política, los procesos de comunicación, concejales.
ABSTRACT
The article aims to articulate the themes: affection, gender and politics. Considering affection as a
legitimate faculty of the human being, the theoretical referential lists bibliographical surveys that
identify the impact of the affective perspective on the political career of contemporary women. More
specifically, the main objective is to identify the challenges of motherhood for city councilors in the
Metropolitan Region of Campinas (considering the gender issue in this domestic universe), as well as
the possibility of channeling the maternal identity in their political communication. The research had
nine semi-structured interviews, later transcribed, analyzed and compared with the reference. The
interviewees' points show that the maternal experience is still at the center of contemporary feminine
life and represents a sensible strategy in politics, supported by the interest in the personal life of public
figures and the potential for empathy with the electorate towards the candidate.
Keywords: affection, gender, politics, media processes, city councils.
RESUMO
O artigo busca articular os temas: afeto, gênero e política. Considerando o afeto enquanto faculdade
legítima do ser humano, o referencial teórico elenca levantamentos bibliográficos que identificam o
impacto da perspectiva afetiva na carreira política da mulher contemporânea. Mais especificamente, o
principal objetivo é identificar os desafios da maternidade para as vereadoras da Região
Metropolitana de Campinas (considerando a questão do gênero neste universo doméstico), bem
como a possibilidade de canalização da identidade materna na comunicação política das mesmas. A
pesquisa contou com nove entrevistas semiestruturadas, posteriormente transcritas, analisadas e
confrontadas com o referencial. Falas das entrevistadas apontam, em termos de análise qualitativa,
¹Graduada em Administração de Empresas pela Universidade Mackenzie. Mestre em Comunicação
pela Cásper Líbero.
que a experiência materna ainda está no centro da vida feminina contemporânea e representa uma
estratégia sensível na política, sustentada pelo interesse na vida pessoal das figuras públicas e o
potencial de criação da empatia com o eleitorado perante a candidata.
Palavras-chave: afeto, gênero, política, processos midiáticos, vereadoras.
1. INTRODUÇÃO
À primeira vista, a relação entre afeto e gênero feita neste artigo, poder remeter ao resgate da
vinculação da mulher com o ambiente doméstico. No entanto, elencar a perspectiva afetiva para
discorrer sobre gênero não se trata de um preconceito teórico, uma vez que o afeto é uma faculdade
do ser humano e não uma qualidade de um gênero específico. Além disso, invocar tal noção também
é o mesmo que considerar o percurso histórico no que se refere à construção da imagem política da
mulher.
O ponto de partida para entender este percurso imerso no afeto localiza-se propriamente na
circunscrição da mulher dentro do ambiente doméstico e sua atribuição acerca da maternidade.
Ambos, de modo geral, podem reduzir o tempo e o aproveitamento de oportunidades profissionais e
acadêmicas das mulheres. Assim como foi observado, e a diante descrito, sobre a vivência das
vereadoras entrevistadas, assinalando tanto suas rotinas como também o juízo de valor que as
mesmas fazem acerca dos temas em questão.
Vale assinalar que no decorrer do tempo algumas mudanças contribuíram para a projeção da
mulher no espaço social. Adiamento do casamento, métodos contraceptivos, elevação dos índices de
divórcio, acesso ao ensino secundário e redução do núcleo familiar, incidem diretamente na vida
profissional da mulher (BOURDIEU, 2012) e representam algumas das mudanças que impactaram
diretamente no tempo e aproveitamento de oportunidades das mulheres no que tange a vida pública,
seja ela política, educacional, recreativa ou profissional.
Mas, mesmo com várias mudanças, a mulher ainda é subestimada e vê seu potencial sendo
diminuído. No campo político, as mulheres eleitas são prejudicadas no que diz respeito à cobertura
midiática, por exemplo. A mídia tende a exaltar aspectos pessoais e estéticos das representantes, ao
invés de noticiar suas ações políticas. Essa supressão causa impacto na construção da imagem
pública feminina, prejudicando a projeção da mulher em cargos representativos (PAIVA, 2008).
Em termos gerais, a TV brasileira é um exemplo de veículo que acarreta prejuízos à imagem
feminina, pois o corpo da mulher é amplamente utilizado como promotor de marcas de cerveja ou
programas televisivos voltados para o entretenimento (SODRÉ, 1991). Tal construção interfere no
posicionamento das mulheres em cargos de confiança e de gestão, os quais requerem uma postura
firme perante as situações.
Não obstante, os programas jornalísticos brasileiros chegam a veicular cinco vezes mais
mulheres nas opiniões enquadradas como “populares”, além de contrastar com a opinião de homens
cientistas, técnicos, profissionais especializados nos assuntos jornalísticos. Deste modo, “o noticiário
reproduz estereótipos de gênero, ao mesmo tempo em que tem papel ativo na sua naturalização e
manutenção” (BIROLI, MIGUEL, 2009: 75).
A construção do estereótipo, portanto, se apoia na mídia e nas experiências comuns da vida
cotidiana. Ao longo do artigo, várias situações serão descritas segundo vivências de mulheres eleitas
em diversas casas legislativas. De saída, as câmaras recortadas por este estudo, constituem
ambientes predominantemente masculinos, mas os relatos extrapolam as paredes e cobrem desde a
relação das candidatas com o eleitorado, como também na rotina de casa com sua família e amigos.
Enfim, para retratar a construção e os desafios enfrentados por mulheres na política, o artigo
traz autores que já refletiram sobre o tema e debruçaram em recortes empíricos diferentes, como
Raquel Paiva (2008), Luiz Felipe Miguel e Flávia Biroli (2009 e 2013), Carole Pateman (2013), Fanny
Tabak (1982), dentre outros. Sobre os conceitos centrais elencados, há a noção de estratégias
sensíveis de Muniz Sodré (2006), diferenças entre público e privado de Elshtain (1993) e noções
gerais sobre política de Antônio Rubim (2004).
Por fim, para contribuir com uma nova teorização política, consciente dos impactos da
perspectiva afetiva para a mulher contemporânea, o presente artigo transcreve e analisa nove
entrevistas semiestruturadas junto às vereadoras em atividade no pleito 2012-2016 na Região
Metropolitana de Campinas. Na primeira triagem da pesquisa, catorze mulheres faziam parte da
[Digite aqui]
câmara de onze das dezenove cidades que formam a Região Metropolitana de Campinas. Destas,
duas suspenderam suas atividades parlamentares, diminuindo para dez o número de municípios que
apresentam mulheres em suas casas legislativas. A título de comparação, haviam doze vereadoras
dentre 296 vereadores eleitos no pleito municipal de 2012. Esta proporção demonstra a incapacidade
da política brasileira em equilibrar a representatividade de gênero, visto que 52,11% dos eleitores do
país são mulheres, segundo dados de 2014 (TSE, 2014).
O próximo tópico concentra-se nas dificuldades encontradas por essas mulheres na
construção de sua imagem política em cada cidade da RMC cuja população escolheu pelo menos
uma mulher para os representar.
2. A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM FEMININA NA POLÍTICA
Depois de 30 anos da conquista do voto, apenas 16 mulheres elegeram-se prefeitas
municipais até 1965/66. Já em 2006, - na época, a Lei das Cotas fazia dez anos - nenhum partido
cumpria a exigência de apresentar 30% de mulheres no quadro de candidatos (PAIVA, 2008). Com
relação à opinião das entrevistadas, todas apresentam certo ceticismo com relação às cotas,
denunciando a falta de cumprimento e/ou a presença de candidatas “fantasmas” para cumprir tal
obrigatoriedade, ou seja, muitas candidatas não concorrem “para valer” (palavras da vereadora
Clemilda Pereira) ou existem somente no papel.
No tocante à direção das câmaras, mesmo a representatividade feminina sendo tímida,
dentre as doze vereadoras consideradas, cinco faziam parte da mesa diretora, o que pode sugerir
maior esforço para serem aceitas ou para se projetarem no ambiente político predominantemente
masculino, no qual, “como regra, as mulheres que ingressam na arena política não tardam a perceber
o ônus que representa um enfrentamento aos estereótipos de sexo” (MIGUEL; BIROLI, 2009: 70).
Mas esta percepção nem sempre pode ser identificada na prática. Algumas vereadoras
disseram não sofrer discriminação de gênero na ocupação política em que estão, mas
contradisseram essa constatação em falas subsequentes das entrevistas. Por exemplo, a vereadora
Jacinta sempre assume o papel de secretária nas assembleias gerais realizadas na cidade de
Campinas.
Se tratando de comportamento, unanimemente, as vereadoras tiveram que adotar uma
postura mais firme no ambiente parlamentar. Segundo as vereadoras Ângela Duarte, Maria José
Hunglaub e Eliane Defáveri, o mandato exigiu que elas se afirmassem enquanto representantes
políticas, pois acreditam que a responsabilidade da baixa aceitação se deve as suas antecessoras.
Portanto, mesmo reconhecendo a necessidade de alterar o comportamento, as vereadoras atribuíamna às outras mulheres que, antes delas, ocuparam cargos no parlamento municipal das suas
respectivas cidades.
A adoção da postura “mais séria” serve para evitar brincadeiras e falta de respeito, visto como
uma conduta necessária pelas vereadoras para afastar possíveis situações desagradáveis. Tal
posicionamento também distancia a pretensa feminilidade cobrada da mulher no mundo das relações
sociais:
Ser ‘feminina’ é essencialmente evitar todas as propriedades e práticas que
podem funcionar como sinais de virilidade; e dizer que uma mulher de poder
que ela é ‘muito feminina’ não é mais do que um modo particularmente sutil
de negar-lhe qualquer direito a este atributo caracteristicamente masculino
que é o poder. (BOURDIEU, 2012:118).
O distanciamento da mulher do gênero feminino, portanto, impõe-se como uma demanda do
campo político. Ângela Duarte denuncia essa cobrança mediante sua vivência enquanto vereadora,
ao passo que a vereadora Eliane Defáveri localiza essas expectativas no vestuário exigido. Seja na
roupa ou no comportamento, as mulheres devem dosar suas escolhas.
Neste sentido, existiria um preconceito de gênero “velado”, segundo palavras das vereadoras
Clemilda Pereira e Ângela Duarte, cujas imposições são sutilmente impostas ou sugeridas. Isto pode
ter sua raiz na concepção de que a política seria “mundo dos homens e por eles dominado”
(PATEMAN, 2013: 72). Neste cenário, a mulher pertenceria ao âmbito doméstico tendo, por
naturalidade ou costume, competência para assumir as tarefas que tangem esta colocação.
Em uma sessão na câmara de Cosmópolis, a vereadora Eliane Defáveri (Cosmópolis) foi
recebida com o seguinte comentário: “A vereadora mais bonita da câmara chegou”. E sendo a única
mulher vereadora, ela rebateu dizendo que não gostaria de ser lembrada como a vereadora mais
bonita, mas sim como o membro mais competente daquela câmara.
[Digite aqui]
De acordo com Raquel Paiva (2008), as mulheres políticas sofrem com essa vinculação de
aspectos pessoais em notícias ou ataques da oposição. No primeiro caso, ofuscando seus feitos
dentro da política, e no segundo, como tentativa de afetar negativamente sua imagem frente ao
eleitorado. A autora traz o exemplo da deputada Manuela D’Ávila que, enquanto mulher exercendo
cargo político, teve que rejeitar o rótulo de “musa da política” em diversas ocasiões, para diversos
veículos de comunicação. Outro caso: deputada que só usava jeans e camiseta branca. Mas são
tantos outros exemplos de aspectos físicos suprimindo a visibilidade das ações políticas das
mulheres que sua enumeração esgotaria o espaço do artigo.
Entretanto, antes de culpar a mídia, a lógica mercadológica pode inverter a responsabilização
por este cenário. Ou seja, o próprio eleitorado repara e compara a imagem das mulheres políticas de
diferentes estados, em termos de vestuário, cabelo, estilo (OLIVEIRA, 2010), justificando o
noticiamento de tais aspectos. A mídia, portanto, apenas veicula aquilo que sua audiência assume
como preferência.
De outra maneira, existem pessoas que, além de atribuir a vaidade como elemento
característico e central da feminilidade exigida, insistem em limitar a mulher ao âmbito doméstico,
conforme identificou Vanilda de Oliveira (2010) em pesquisa. Pensamentos retrógrados chegam a
indicar o fracasso da família e enfraquecimento da mesma como consequências da saída da mãe
para atuar fora de casa (OLIVEIRA, 2010). Aqui, o estereótipo, de maneira direta, boicota a
emancipação da mulher nos espaços sociais públicos.
Por outro lado, a saída da mãe para trabalhar fora de casa representa a diminuição da
influência masculina sobre a mulher e, neste momento, o acesso à esfera pública e o distanciamento
dos afazeres domésticos (BOURDIEU, 2012). Mas, essa saída nem sempre é movida pela vontade
da mulher, muitas vezes ela é movida pela necessidade de subsistência da família, conforme apontou
Rita Bergamasco sobre parte das munícipes de Jaguariúna.
Cruzando maternidade com profissão, sobre a reinserção da mãe jovem no mercado de
trabalho, um estudo analisou a descontinuidade da trajetória educacional e profissional de meninas
de 15 a 18 anos assistidas pelo Centro de Orientação ao Adolescente de Campinas. Segundo as
autoras responsáveis, a maternidade não necessariamente exclui estes projetos (educação e
profissionalização propriamente ditos), mas demanda adaptações e, principalmente, a necessidade
do apoio familiar e social (OGIDO e SCHOR, 2012). Se, no caso da mãe, os pais possuírem o
estereótipo retratado no parágrafo acima, existirão ainda mais barreiras para esta adolescente ou
mulher.
Trazendo para o campo político, os partidos poderiam ser mais solidários com relação as
mulheres mães. A possibilidade de oferecerem uma pessoa para cuidar dos filhos das candidatas,
por exemplo, é vista como uma atitude simples que desafogaria o tempo delas, uma vez que a
responsabilidade dos filhos ainda pende para o sexo feminino (PAIVA, 2008). A vereadora Jacinta
Heijden conta que o pleito no qual não se elegeu (segundo ela por uma questão de legenda, visto que
foi a sexta mais votada) acabou sendo benéfico para ela, pois seus filhos ainda eram pequenos.
Neste sentido, alguns casos colocam a mulher, considerada ainda como maior responsável
pela casa e pelo cuidado com os filhos, em jornada tripla na hora de fazer campanha política
(OLIVEIRA, 2010). A vereadora Ângela Duarte (Paulínia) conta sua história e oferece um exemplo
bem próximo deste turno triplo: para chegar na sua atual posição, ela trabalhou em várias funções,
inclusive como catadora de algodão, empregada doméstica e babá, enfrentando demandas da casa e
dos filhos, uma de seis anos e outro de onze anos, quando encontrava-se divorciada e, na época,
ainda cuidava de um partido novo na cidade. Hoje, a vereadora é formada em Direito e exerce cargo
político, mas levou certo tempo para que conseguisse alcançar seus objetivos, em especial, a
formação no ensino superior como advogada.
Sob outra perspectiva, a maternidade não deve ser imediatamente interpretada como
prejudicial a carreira profissional e educacional da mulher. Segundo Guedes (2009), para intervir
negativamente neste fluxo formacional, a gravidez deve anteceder o nível universitário. Ou seja, nem
sempre os filhos denotarão barreiras de crescimento para mulheres formadas no nível superior,
diferentemente do que ocorre com as adolescentes compreendidas no estudo citado acima. Há,
evidentemente, interferências psicológicas e sociodemográficas neste quadro, variando de pessoa
para pessoa.
Mas, o presente estudo contraria a argumentação de Guedes (2009), apontando experiências
de mulheres políticas que tiveram seus filhos depois de formadas no ensino superior e com tempo de
experiência profissional registrada. Como no caso das vereadoras Jacinta e Maria José, esta prefere
fazer a arrumação geral da casa e a refeição do almoço, mesmo tendo auxílio de uma empregada
doméstica (paradoxalmente, outra mulher).
[Digite aqui]
Segundo Carole Pateman (2013), o cuidado dos filhos e da casa deveria ser compartilhado
voluntariamente pelos maridos, indicando que, enquanto as mulheres se identificarem com este
“trabalho ‘privado’, seu status público será sempre prejudicado” (PATEMAN, 2013: 75). A
reorganização das tarefas domésticas deveria também partir dos homens, reposicionando-os como
coparticipante dessa rotina em casa.
Neste contexto, a necessidade de igualar os direitos pressupõe uma mudança nas relações
de gênero (OGIDO e SCHOR, 2012) nas mais diversas ocasiões e para as mais diversas situações
nas quais se encontram as mulheres que possuem filhos e pretendem percorrer uma trajetória
política.
Em suma, parece que a sociedade não reconhece essa demanda contemporânea, lidando
com o assunto como se fosse um tabu ou pano de fundo para humorização da situação. Assim como
alguns autores da ciência política, e até mesmo da literatura feminista, a sociedade não canaliza
recursos para se debruçar em medidas efetivas para sanar esse déficit social. Em vez disso, continua
apontando desafios históricos que continuam acarretando prejuízos para as mulheres de hoje em dia,
sem apontar soluções.
3. A INTERPRETAÇÃO DA EXPERIÊNCIA MATERNAL
Nos EUA, 47% das mulheres entre 15 e 44 anos não possuem filhos. A mídia vem chamando
essas mulheres, que não contemplam a maternidade, de Geração NoMo (‘Not Mothers’). Na posição
de pioneira, a associação britânica Gateway Women vem argumentando contra a crença de que uma
mulher deve passar pela experiência materna pelo menos uma vez na vida, além de oferecer
assistências psicológica e troca de informações sobre a vida de mulheres sem filhos (LAGUARDIA,
2014).
Assistência psicológica é necessária à mesma medida em que a sociedade cobra e espera
que as mulheres tenham filhos, assumindo tal papel social. Perguntas a respeito da maternidade são
comumente endereçadas às mulheres com êxito profissional. Esta prática sugere o conhecimento da
sociedade sobre os empecilhos de tempo e ausência de conciliação de oportunidades para mães,
mas não reconhece esta condição quando se trata da figura pública de uma mulher.
Mulheres famosas, por exemplo, são convidadas para argumentar sobre a ausência de filhos
em suas vidas, e sempre o fazem justificando sua decisão e assinalando a adoração por crianças
(LAGUARDIA, 2014). Portanto, mesmo sem assumir o papel de mãe, as mulheres devem guardar um
carinho incondicional por crianças, estabelecendo assim uma expectativa social atrelada diretamente
à questão do gênero.
Na Região Metropolitana de Campinas não é diferente. A experiência materna é acolhida
pelas vereadoras entrevistadas como algo atrelado à missão de vida da mulher. Mesmo para aquelas
que (ainda) não são mães, a maternidade é interpretada como uma bênção. Para ilustrar, segundo a
vereadora Eliane Deváferi, apesar de não ter filhos ela considera que esta experiência é vital na vida
de uma mulher. A vereadora Marta Leão atribuiu a qualidade “sagrada” à maternidade. Tanto para a
vereadora Clemilda Pereira, quanto para a vereadora Rita Bergamasco, seus enteados e filhos
adotivos, respectivamente, significam grande parte da realização pessoal delas.
Retomando o recorte político que reveste a pesquisa de campo, em termos de identidade e
sua maleabilidade contemporânea (SIBILA, 2008), os personagens políticos podem adotar
estratégias sensíveis para angariar empatia do eleitorado. O apelo sensível, portanto, seria legítimo
dessas típicas estratégias da política contemporânea (SODRÉ, 2006). De outro modo, o afeto pode
ser utilizado para beneficiar a imagem pública de uma pessoa mediante canalização de elementos
identitários aclamados pela população. Seria o caso da identidade materna para figuras públicas
femininas.
Nas entrevistas, algumas experiências relatadas mostram que a identidade de mãe pode
acarretar benefícios para a mulher na política, uma vez que o eleitorado pode criar maiores
identificações e simpatia com aquela representante que (talvez) enfrente os mesmos desafios
enquanto mãe e maior responsável pelo lar.
Ângela Duarte cita exemplo de uma ex-colega de câmara, na qual incluiu em sua campanha
fotos oficiais amamentando o filho recém-nascido. Ou seja, a partir dessa exposição do papel de
mãe, a mulher pode alinhar uma estratégia voltada para as eleitoras que possuem filhos ou eleitoras
grávidas.
A vereadora Leonora Périco (Americana) também vivenciou sua candidatura e o nascimento
de um filho ao mesmo tempo. A vereadora relembra do marido levando o recém-nascido na câmara
em seu período de trabalho para que ela pudesse amamentá-lo. E, neste ponto, não há como
[Digite aqui]
recorrer às condições físicas do sexo feminino. A necessidade do tato na experiência amamentativa,
segundo Montagu (1988), influencia diretamente no desenvolvimento da criança.
Relatos das vereadoras Jacinta Heijden e Maria José Hunglaub assinalam que o apoio dos
seus respectivos maridos foi decisivo para seu ingresso e permanência na câmara. Por outro lado,
salvo detalhes da vida conjugal das entrevistadas, as vereadoras divorciadas apontaram a falta de
apoio dos maridos, quando ainda eram casadas, como empecilho para seu crescimento e projeção
políticos.
As experiências conjugais positivas podem trazer indícios na mudança do comportamento
masculino com relação a divisão sexista de tarefas, contribuindo para a desconstrução da prevalência
do apego materno sobre o paterno. Ou seja, a maior identificação com a mãe pode ser relacionada
com o tato na fase infantil, mais especificamente, com a privação da relação pai-filho que poderia
remeter o distanciamento precoce da figura paterna em detrimento da materna (MONTAGU, 1988).
Essas são posturas que podem esgotar a formação de preconceitos logo na fase infantil das
futuras gerações. Segundo a vereadora Clemilda Pereira, a compra de presentes para crianças já
remete diferentes interpretações de ambos os sexos, sendo que para os meninos são dados heróis,
helicópteros, carros de controle remoto, enquanto que para as meninas, princesas que remetem a
fragilidade, bonecas que remetem a maternidade, pias (que saem água) que remetem ao ambiente
doméstico.
Outro apontamento feito por Clemilda vai de encontro ao ambiente familiar, no qual a
designação da lavagem da louça do filho para a filha já contribui para manter preconceitos de gênero.
Sob entendimento de Pierre Bourdieu (2012), o âmbito familiar seria o maior reprodutor da dominação
masculina, com suas linguagens e divisões de trabalho nas quais, desde muito cedo, fazem essa
distinção precoce entre os sexos.
Enfim, a maternidade pode contribuir para a construção da imagem pública feminina na
política em termos de identidade para capitalizar afeto e transformá-lo em votos a partir do
atendimento de demandas sociais do município. Por outro lado, a sociedade deveria apresentar maior
apoio social e instrumental para promover o acesso da mulher aos espaços de poder.
4. MULHER COMO AGENTE POLÍTICA ATIVA
Promovendo a perspectiva da estratégia sensível descrita no tópico anterior, os atendimentos
feitos nos gabinetes das entrevistadas dirigem-se, predominantemente, para as mulheres do
município. Deste modo, as possíveis criações empáticas da candidata que elenca a identidade
materna para conversar com o público feminino, ganha legitimidade.
Com base na sua vivência parlamentar, a vereadora Ângela Duarte assinala que as mulheres
exercem maior atividade política do que os homens. São elas que buscam respostas, pois a
responsabilidade da casa e dos filhos, incluindo a administração do orçamento da família é hoje da
mulher.
Este relato contraria a argumentação voltada para necessidade da mulher em tomar
consciência de seu potencial político em diversas instâncias de participação, desde reuniões
escolares e de condomínio, até exercer um cargo de liderança política, colocando como igual ao
homem em termos de eleitorado, contribuinte, militante (TABAK, 1982).
Segundo indicadores do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a proporção
de famílias chefiadas por mulheres no Brasil subiu de 22,9% (1995) para 38,8% em 2013 (IPEA,
2015). Muitas dessas mulheres são mães trabalhadoras que segundo Fanny Tabak (1982) são
desassistidas pela sociedade.
Em outras palavras, a mulher já possui tal consciência e reivindica direitos juntos aos
representantes. Ou seja, no tocante à política feita no dia-a-dia, a maioria das vereadoras apontaram
as mulheres como principais agentes políticas. Seja por necessidade de procurar auxílio juntos aos
representantes, como também para se projetar e posicionar como contribuinte, a mulher já percebeu
as regras do jogo e está mudando sua atitude ao longo da trajetória. Mas, talvez o problema seja a
velocidade com a qual essa atuação vem se concretizando.
Para ilustrar este cenário, as vereadoras levantaram uma série de exemplos, exclusivos da
esfera privada (moradia, saúde, educação etc.), presenciados com suas munícipes: reclamações com
relação ao atendimento em unidades de pronto atendimento de saúde, proximidade de
empreendimentos imobiliários com escolas e mercados, o preço do arroz e do feijão, reivindicação de
emprego para o marido, qualidade da quadra nas escolas, falta dos professores nas escolas, dentre
outros exemplos dados pelas próprias vereadoras.
As reuniões de cunho político da cidade de Hortolândia contam com mulheres em sua
maioria. A fala de Clemilda Pereira a respeito dessa participação ainda relata a presença de filhos
[Digite aqui]
pequenos na companhia delas. Porém, esse quórum representou uma exceção no recorte em
questão.
Ou seja, em contrapartida, assim como relatou Eliane Defáveri, em Cosmópolis as mulheres
não participam das esferas públicas de discussão política. Ou seja, as sessões da câmara e reuniões
de partido, mesmo quando a pauta é voltada para as mulheres, sempre contam com poucas
munícipes. Isso ocorre em todas as demais cidades, conforme relatos captados nas entrevistas.
Enfim, apesar de se mostrarem ativas nas reivindicações, as mulheres não participam de
reuniões partidárias e também, nas palavras da vereadora Clemilda, não “dão a cara a tapa” na hora
de se candidatar ao pleito. Clemilda sugere que as mulheres estão, muitas vezes, à frente de
questões políticas, mas na hora de sair como representantes, recuam. Por isso, seu mandato é
voltado para conscientização política da mulher. O próximo item problematiza essa situação,
colocando a difícil conciliação de tarefas como barreira para maior participação feminina na política.
5. INTRODUÇÃO DE “DEMANDAS EXTERNAS”?
A partir do recorte de um estudo apresentado por João Freire Filho e Tatiane Leal (2015), as
revistas Época e Veja atribuíram a atual infelicidade das mulheres ao feminismo. Isso por que o
feminismo teria acumulado responsabilidades demais para este gênero, impossibilitando o alcance da
felicidade.
Diferente da mulher feliz dos anos 50, hoje além de ser responsável pelo lar e filhos, a mulher
ainda teria que ser profissionalmente bem-sucedida e fisicamente bonita, respeitando os padrões de
beleza e de sucesso impostos pela sociedade. Ou seja, apesar da inserção de demandas externas, o
casamento e a maternidade ainda permanecem com pretensa centralidade na felicidade da mulher
contemporânea (FILHO e LEAL, 2015).
Em outras palavras, a domesticidade e a maternidade ainda fazem parte da caminhada em
busca da felicidade das mulheres, mas, atualmente, o mundo do trabalho passaria a ampliar esse rol
de domínios da vida social da mulher contemporânea, afetando sua capacidade de ser feliz (FILHO e
LEAL, 2015).
Mas, tal narrativa adotada pelas revistas analisadas é, além de simplista, extremamente
sexista. Primeiro por pressupor a generalização da infelicidade feminina, segundo por não reconhecer
o retardamento da sociedade contemporânea de atender às demandas de gênero que libertam as
mulheres da falta de escolha e autonomia sobre sua própria vida. Além disso, citando os próprios
autores do estudo:
[...] a revista não problematiza a divisão igualitária das atividades
domésticas, classificando a atitude do marido como uma “ajuda”, não como
uma obrigação. Esse discurso transmite a ideia de que a responsabilidade
pelo trabalho doméstico seria ainda feminina, cabendo também à mulher a
tarefa de convencer o marido a auxiliá-la, se quiser ser feliz (FILHO e LEAL,
2015: 16 e 17).
Estendendo para a política, a incapacidade de propor soluções para mover a sociedade em
direção à igualdade de oportunidades para ambos os sexos, tem sua raiz na própria temática da
teoria política. Ou seja, frente a todas as barreiras enfrentadas por mulheres que tentam projetar sua
carreira no terreno político, a teoria deveria superar seus ancestrais e assumir as inadequações que
permeiam o meio (MIGUEL e BIROLI, 2013), admitindo novas práticas de governo sob a ótica de
fenômenos contemporâneos. Seria necessário, portanto:
[...] criar um modo de pensamento político que ajude as mulheres a
redescrever a realidade social a partir de um ponto de vista que permita a
reflexão crítica e a sustente. Precisamos conceituar alternativas plausíveis.
Precisamos evitar impulsos potentes rumo à repetição das compulsões do
passado, incluindo a sentimentalização e a opressão de mulheres sob algum
pretexto novo (ELSHTAIN, 2013: 125).
Não bastaria, entretanto, proposições sem projeção na prática, como no caso das cotas. Além
disso, a rivalidade existente no universo feminino deveria ser superada e, com isso, abrir espaço para
a promoção de representantes femininas. Esta rivalidade foi mencionada nas entrevistas,
corroborando com as investigações de Vanilda de Oliveira (2010) em Goiânia. A autora constatou que
a inveja é indício da rivalidade entre as mulheres, e este aspecto configuraria a “desunião das
mulheres que estão no poder público”, percebida pelos próprios eleitores (OLIVEIRA, 2010: 77).
Esta característica acarreta perdas de potencialidades políticas e acessão de benefícios
mútuos, para citar a opinião da vereadora Ângela Duarte. Em Hortolândia, na primeira vez que a
[Digite aqui]
vereadora Clemilda Pereira foi eleita, apenas uma mulher do Conselho Municipal da Mulher apoiou
sua candidatura. As demais, todas apoiaram homens.
Para a vereadora Rita Bergamasco, o voto não deveria ser pautado por raça, credo, cor ou
sexo do candidato, mas sim pela índole do sujeito. Entretanto, a expansão da visibilidade pelos meios
de comunicação promove a política prioritariamente estética, prevalecendo o cuidado com a imagem
frente a qualquer possível direcionamento ético-social (SODRÉ, 1991).
Portanto, o sexo de um candidato, assim como a religião do mesmo, é considerado no
processo decisório eleitoral. Mediante isso, as imbricações entre afeto e política são pertinentes pois,
saber o que as pessoas pensam, bem como o que afeta suas escolhas políticas, é essencial para a
democracia (GONZÁLEZ-BAILÓN, BANCHS e KALTENBRUNNER, 2012).
Neste sentido, a transmissão da mensagem com carga emocional é mais eficaz, pois a
emoção é considerada o vetor mais importante acerca da ação humana (FRIDJA, KUIPERS &
TERSCHURE, 1989; SODRÉ, 2015). Consequentemente, existe uma estreita relação entre emoção e
comportamento (FUNG, NAMKOONG e SCHUEFELE, 2012), especialmente na arena de disputa
eleitoral pautada pela visibilidade. E, neste momento, “a mídia então faz a política”, pois a política, em
sua face espetacular, se despolitiza para atender aos padrões de produção da mídia (RUBIM, 2004).
Mediante esta linha de argumentação, a adoção da identidade materna na comunicação
política feminina pode ser benéfica. A criação de identificações com o eleitorado viabiliza um canal de
comunicação com base afetiva, mas também com reais possibilidades de engrenar um método de
atendimento às demandas sociais das mães.
6. VINCULAÇÃO DO ÂMBITO PRIVADO NA CARREIRA POLÍTICA FEMININA
O tópico anterior termina sugerindo a adoção da identidade materna para promover
campanhas eleitorais femininas. Entretanto, apesar desta estratégia reverter a domesticidade
(presente na construção histórica da figura feminina) em benefício para a imagem pública da mulher,
pode também contribuir para permanência de preconceitos de gênero.
À título de esclarecimento, as mulheres costumam ser maioria apenas nas esferas da
educação, saúde e serviços sociais (65,6%) nos cargos diretivos, além no setor de alojamento e
alimentação (44%), segundo dados do Relatório Anual Socioeconômico da Mulher, de 2014.
Ou seja, mesmo inseridas no campo político existem cisões nas atividades que configuram
diferentes tipos de atuação para cada sexo. Essa separação sugere a sobrevivência da dominação
masculina na política, pois, segundo Flávia Biroli e Luís Felipe Miguel (2013), os assuntos que
contam com homens em sua representação são mais prestigiados na grande mídia e rotulados como
“mais difíceis”.
Assuntos como educação, saúde e serviços sociais, quando inseridos no campo político,
podem ser entendidos como naturalmente pertencentes ao âmbito público, justamente por estarem
abrigados numa arena comum, promotora de assuntos comuns da sociedade. Entretanto, este artigo
empresta o entendimento de Flávia Biroli e Luís Felipe Miguel (2013) que localizam a noção de
âmbito privado sob a perspectiva macroeconômica, ou seja, para diferenciar assuntos como
educação, saúde, saneamento, dos assuntos de políticas públicas, estes são considerados próprios
do âmbito privado, diferente do que ocorre com temas sobre economia, relações internacionais.
Neste sentido, as vivências domésticas e gestão dos afetos nas relações familiares, faria a
mulher engendrar uma ética diferente, fundada na preocupação com o outro (ELSHTAIN, 1982),
mesmo na posição de dirigente ou representante política. Para os eleitores, os elogios às mulheres
geralmente são feitos nesta direção, sustentadas pela crença de que elas são “mais humanas” e
“mais sensíveis” por terem o dom natural de gerar vidas. Já àqueles direcionados aos homens,
costumam reconhecê-los como “mais fortes” (OLIVEIRA, 2010).
Existe aqui a necessidade de problematizar essas divisões, submetidas talvez à falta de
oportunidades concedidos para ambos os sexos, e que são passíveis de identificação tanto no nível
municipal (entrevistas captadas por este estudo) quanto no nível estadual e federal (estudo de Flávia
Biroli e Luís Felipe Miguel, 2013).
Somente a ampliação de oportunidades não diminuirá, por si só, a lacuna de atuação de
homens e mulheres. Existe a necessidade das pessoas em reconhecer o papel que cada um tem na
vida do próximo, em especial, daquelas pessoas ainda mais próximas de você: mãe, filha, irmã,
esposa.
A construção do estereótipo poderá ser desmantelada sob condicionantes comportamentais.
Por exemplo, ao ouvir uma piada sexista, ao invés de rir da humorização ácida que apela à uma
minoria, haverá o silêncio. Este esgotamento da discriminação, acumulada ao longo dos anos, poderá
significar novos horizontes para a convivência social e pessoal das famílias ou casais.
[Digite aqui]
Até aqui, o artigo discutiu a identidade materna como estratégia sensível identificada nas
práticas políticas de candidatas da Região Metropolitana de Campinas. Também observou a (super)
valorização acerca da maternidade tanto para a sociedade, como também para a vereadoras,
legitimando essa aplicação afetiva no campo político.
Foi costurado um fio condutor no qual a maternidade perpassa desde a construção da
imagem das vereadoras até a vivência política das munícipes, localizando demandas latentes ao
sexo feminino. Não obstante, foi levantada também a maneira como o tema maternidade pode
influenciar na agenda política das mulheres, bem como na sua atuação, demonstrando ser de
relevância irrefutável para pessoas que queiram discutir o nível de representatividade feminino nas
instâncias políticas do Brasil.
No item a seguir, o artigo resgata algumas lacunas identificadas no presente estudo, bem
como o objetivo central do mesmo. Vale considerar as lacunas já descritas ao longo do texto, cuja
importância extrapola pretensas justificações que se possa dar aqui.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As divisões arbitrárias do mundo social não deveriam limitar ou constranger ações políticas
de mulheres. Enquanto estereótipos forem elencados para pautar relações sociais, as mulheres
deverão, constantemente, se afirmar como competentes.
Pontuando, a busca por equiparação salarial não se enquadra, pois trata-se de cargo público,
estes não fazem diferenciação entre sexo (pelo menos não na folha de pagamento). Mas, não deixa
de assinalar a necessidade de reposicionar a luta feminista no que tange poder e reconhecimento
perante a sociedade.
Para Bourdieu (2002), existem inclinações e preconceitos, que mesmo não manifestados
explicitamente, constroem imagens desfavoráveis acerca da mulher enquanto representante política.
Portanto, interferir no ciclo de lideranças predominantemente masculinas no poder dependerá não
somente de ações afirmativas voltadas para os partidos políticos, como também de alterar o
julgamento negativo acerca da capacidade das mulheres em representar a população e assumir
posições elevadas na hierarquia política do país.
Essas inclinações pertencem, sob entendimento de Sodré (2015), ao campo afetivo. Portanto,
levantar um ponto essencialmente entendido como o dom supremo da mulher - a maternidade - ao
discutir sua vereança (FARIA, 1998), é algo que contempla tanto as possibilidades e o andamento
político feminino, quanto o afeto do eleitorado e pares dentro do campo político.
Com isso, o presente artigo buscou iniciar a proposição de uma nova teorização acerca da
figura política feminina, considerando a perspectiva afetiva como elemento central para o
entendimento das demandas sociais das potenciais representantes políticas, bem como o impacto na
construção da sua imagem.
Para tanto, confrontou o levantamento bibliográfico com a experiência das vereadoras eleitas
no pleito de 2012, e em atual atividade, nos dez municípios da RMC (Campinas e mais dezoito
cidades) que apresentam mulheres em suas casas legislativas. Essa pesquisa possibilitou a
identificação de elementos comuns na vivência dessas mulheres.
Assinala-se, no entanto, a necessidade de novas investigações empíricas para colaborar com
a estruturação de teorias que busquem solucionar as lacunas de atuação da mulher na política. Ao
confrontar diferentes dados de diferentes locais, haverá possibilidades reais de propor mudanças
mais efetivas na vida política feminina.
Buscar encontrar novos elementos e a frequência dos mesmos poderá guiar a sociedade em
prol de um reposicionamento da imagem feminina e, consequentemente, a recolocação das mesmas
em diversas esferas da sociedade.
Deve haver ações partindo da comunidade, da família, dos grupos sociais, dos partidos, etc.
Cada campo social deve colaborar com ações para, cada vez mais, as pessoas vivam livres de
discriminação de qualquer espécie.
Reafirmando, postura firme é o principal subterfúgio dessas mulheres na construção da sua
imagem enquanto representantes políticas. Apesar de algumas entrevistadas assinalarem nunca
terem vivido situações preconceituosas dentro das câmaras, suas falas corroboram para o
reconhecimento de desafios acerca do ambiente político predominantemente masculino, pressupondo
que "o Parlamento e o mundo da política em geral – o Poder Executivo, o Judiciário, os partidos
políticos e os sindicatos – são espaços hostis para as mulheres” (BORBA, 1998: 156).
Foram contempladas também, circunstâncias da grande mídia que promovem a permanência
e manutenção das várias formas de discriminação contra a mulher. Essas características impactam
diretamente na formação e projeção da mulher no poder público. E isto deve ser seriamente discutido
[Digite aqui]
em direção ao estabelecimento de possibilidades iguais aos candidatos de ambos os sexos e de
todos os gêneros.
Por outro lado, as mulheres devem desenvolver uma nova postura para lidar com outras
mulheres. Talvez trocar a lente da rivalidade por lentes de possíveis alianças. Reconstruir uma
relação menos hostil com mulheres desconhecidas e arriscar novas aventuras no que tange o âmbito
público. Desbravar novos horizontes a partir do reconhecimento de si próprias como seres capazes e
competentes.
Para reverter este desequilibrado quadro, a auto formação poderia ser posta também como
uma das soluções para a consciência social acerca da questão de gênero. Pois, a auto formação tem
relação direta com a educação e pode combater formas de repreensão mediadas por estereótipos.
Educar-se abriria caminhos para o novo. Novas formas de pensar desconfiam dos costumes
traduzidos nas linguagens correntes da sociedade. É justamente o exercício de pensar, e a
consciência despertada no processo de educação, que afirmam a base não absoluta do ser humano
(SODRÉ, 2013).
8. REFERÊNCIAS
Biroli, F.; Miguel, L. F. (2009): “Mídia e representação política feminina: hipóteses de pesquisa”. En
revista Opinião Pública nº 1, Junho 2009, p.55-81.
Borba, A. (1998): “Legislando para mulheres”. En A. Borba; N. Faria; T. Godinho (Coord.), Mulher e
política: gênero e feminismo no Partido dos Trabalhadores. Editora Fundação Perseu Abramo. São
Paulo. pp. 153-172.
Bourdieu, P. (2012): “A dominação masculina”. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro.
Presidência da República (2015): “Relatório Anual Socioeconômico da Mulher”. Secretaria de
Políticas para as Mulheres. Brasília. 181p.
Laguardia, I. (2014): Geração NoMo: A rebelião das mulheres que não contemplam a maternidade.
Disponible
en:
<http://brasil.elpais.com/brasil/2014/08/23/sociedad/1408813287_310188.html>
Consultado en 20/04/2015 a 08:20.
Elshtain, J. B. (1982): “Public man, private woman: women in social and political thought”. En The
Academy of Political Science N. 1. Nova York. 18 p.
Faria, N. (1998): “Sexualidade e gênero: uma abordagem feminista”. Sempreviva Organização
Feminista. São Paulo.
Filho, J. F.; Leal, T. (2015): ““Mas por que, afinal, as mulheres não sorriem?”: jornalismo e as razões
da (in) felicidade feminina”. En Revista Ciberlegenda N. 33, Outubro 2015. pp. 8-20.
Fridja, N. H.; Kuipers, P.; Ter Schure, E. (1989): “Relations among emotion, appraisal, and emotional
action readiness”. En Journal of Personality and Social Psychology vol. 57 (2), Agosto 1989, pp. 212228.
Fung, T. K. F; Namkoong, K.; Scheufele, A. D. (2012): “The politics of emotion: news media attention,
emotional responses, and participations during the 2004 U. S. presidential election”. En Mass
Communication and Society N. 15, pp. 25-45.
González-Bailón, S.; Banchs, R. E.; Kaltenbrunner, A. (2012): “Emotions, public opinion, and U.S.
Presidential Approval Rates: a 5-year analysis of online political discussions”. En Human
Communication Research N. 38, pp. 121-143.
Guedes, M. C. (2009): “Na medida do (im)possível: família e trabalho entre as mulheres de nível
universitário”. Tese (Doutorado em Demografia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Estadual de Campinas. Campinas. 132 p.
Miguel, L. F.; Biroli, F. (2013): “Introdução teoria política feminista, hoje”. Em L. F. Miguel; F. Biroli,
Teoria crítica feminista: textos centrais, Editora Horizonte. Vinhedo. pp. 7-54.
Montagu, A. (1988): “Tocar: o significado humano da pele”. Summus. São Paulo.
Ogido, R.; Schor, N. (2012): “A jovem mãe e o mercado de trabalho”. En Saúde e Sociedade. N. 4,
São Paulo, Dezembro 2012, pp. 1044-1055.
Oliveira, V.; Chaves, S. M.; Signates, L. (2010): “Política no feminino?: a imagem da mulher candidata
nas eleições municipais de Goiânia“. Grafset. Goiânia.
[Digite aqui]
Paiva, R. (2008): “Política: palavra feminina”. Mauad X. Rio de Janeiro.
Pateman, C. (2013): “Críticas feministas à dicotomia público/privado”. Em L. F. Miguel; F. Biroli,
Teoria crítica feminista: textos centrais. Editora Horizonte. Vinhedo. pp. 55-80.
Rubim, A. A. C. (2004): “Espetacularização e midiatização da política”. En A. A. C. Rubim (Coord.),
Comunicação e política: conceitos e abordagens. Edufba. Salvador. pp. 181-222.
Sibila, P. (2008): “O show do eu: a intimidade como espetáculo”. Nova Fronteira. Rio de Janeiro.
Sodré, M. (2015): “A comunicação eletrônica é epistemóloga”. En Revista Parágrafo N. 3, Junho
2015, pp. 121-128.
Sodré, M. (2006): “As estratégias sensíveis: afeto, mídia e política”. Vozes. Petrópolis.
Sodré, M. (1991): “O Brasil simulado e o real: ensaio sobre o quotidiano nacional”. Rio Fundo. Rio de
Janeiro.
Tabak, F. (1982): “Mulher e política”. Paz e Terra. Rio de Janeiro.
TSE
(2015):
“Estatísticas
das
eleições
de
2012”.
Disponible
en:
<http://www.tse.jus.br/eleicoes/estatisticas/estatisticas-eleicoes-2012>. Consultado en 20/10/2015 a
17:48.
[Digite aqui]