UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO – UFES
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS – CCHN
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA– DGEO
JOSIMAR NUNES PEREIRA DE FREITAS
MORTALIDADE DIFERENCIAL POR CAUSAS EXTERNAS SEGUNDO
RAÇA/COR NAS MICRORREGIÕES DO ESPÍRITO SANTO
VITÓRIA
2017
JOSIMAR NUNES PEREIRA DE FREITAS
MORTALIDADE DIFERENCIAL POR CAUSAS EXTERNAS SEGUNDO
RAÇA/COR NAS MICRORREGIÕES DO ESPÍRITO SANTO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao
Departamento
de
Geografia
da
Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito parcial para obtenção do Grau de
Bacharel em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Ednelson Mariano Dota
VITÓRIA
2017
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por me dar força e permitir mais esta
conquista.
Á todos os meus familiares, em especial, minha mãe, Adriana Nunes
Pereira e à minha avó Maria das Graças Nunes Pereira, pela dedicação e amor
incondicional;
Ao professor doutor Ednelson Mariano Dota pela dedicação e
compromisso destinados a construção do presente estudo;
A toda equipe do Laboratório de Estatística da Universidade Federal do
Espírito Santo (Lestat-Ufes), pelo apoio durante a realização dos testes
estatísticos;
Em especial, deixo minhas gratulações à Juliana Pereira Rodrigues,
peça mais que essencial na realização de todas as tarefas que cumpri nesta
pesquisa e ao amigo Alexandre Severino Pereira pelo apoio destinado a mim
durante todo processo de tabulação dos dados.
Às equipes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e
do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) pela gentileza e disponibilidade em
fornecer todos os dados que foram solicitados, tendo estes sido de suma
importância para a o embasamento das discussões aqui registradas.
A todos (as) os professores (as) que contribuíram de forma direta e
indireta com meu aprendizado. Aos ex-colegas de trabalho da Pró-Reitoria de
Assuntos Estudantis e Cidadania da Universidade Federal do Espírito Santo
(Proaeci-Ufes).
Ao amigo Stênio Santos Sales, pelos conselhos e por me proporcionar
todo apoio ainda quando estava no Ensino Médio. Sou grato principalmente por
ter me estimulado a ingressar na universidade, fato que naquele momento me
parecia quase impossível.
A todos do Grupo de Estudos IdentidadES, pela contribuição ímpar em
meu processo de constituição enquanto pesquisador
e aos Movimentos
Estudantis e Negros, pela formação humanizada que me proporcionaram.
RESUMO
Trata-se a presente pesquisa de um estudo do tipo empírico, de caráter
exploratório, que teve por objetivação principal identificar diferenciais
socioterritoriais na mortalidade, segundo causas externas, por faixa etária e
raça/cor, no contexto das microrregiões de planejamento do estado do Espírito
Santo, entre os anos de 2000 e 2010. Tal proposição desdobrou-se nos
seguintes objetivos específicos: a) examinar níveis de mortalidade entre 10 e
49 anos, por raça/cor nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo; b)
averiguar a existência de padrões espaciais e se existe correlação da mesma
com contextos socioeconômicos e/ou sociorraciais; c) discutir acerca dos perfis
de mortalidade evidenciado pelas microrregiões do Espírito Santo no que se
refere às variáveis raça/cor. Teve-se entre as principais hipóteses, que as
mortes por causas externas, devido à relação direta com contextos sociais,
incidiriam com maior ênfase entre pretos e pardos já a partir dos 10 anos,
enquanto brancos enfrentariam as maiores probabilidades de óbitos após os 50
anos. As informações sobre óbitos foram acessadas no sítio virtual do
SIM/DATASUS, a partir Classificação Internacional de Doenças – CID 10, e
foram analisadas tendo como base de escala para as análises espaciais as
microrregiões de planejamento do Espírito Santo. Os dados indicaram
significância estatística para interações entre as variáveis ‗Microrregião X
Raça/cor‘ e ‗Idade X Raça/cor‘, sendo possível afirmar que a, correlação entre
a variabilidade espacial e etária, assumem no contexto analisado, importante
papel no risco de morte dos grupos étnico-raciais. Identificou-se também que,
na medida em que se aumenta a escala de análise, há uma tendência do
processo de enegrecimento do maior risco de óbito, que em nível estadual,
apresenta-se entre pardos, e se intensifica entre pretos nas microrregiões, com
destaque para os indicadores sociais mais vulneráveis. Entre as conclusões,
aponta-se que as desigualdades sociorraciais, verificadas em outras esferas
(educação, cultura, mercado de trabalho, por exemplo) também puderam ser
visualizadas nas tendências, com forte orientação espacial.
Palavras-Chave:
Mortalidade
Diferencial,
Desigualdades
Sociorraciais,
Desigualdades Territoriais, Território, Grupos étnico-raciais, racismo
ABSTRACT
The present research is an empirical, exploratory study whose main objective
was to identify socio-territorial differences in mortality, according to external
causes, by age group and race / color, in the context of the micro-regions of
Espírito Santo state planning Santo, between the years 2000 and 2010. This
proposal has been developed in the following specific objectives: a) to examine
mortality levels between 10 and 49 years, by race / color in the planning microregions of Espírito Santo; b) to verify the existence of spatial patterns and if
there is a correlation of the same with socioeconomic and / or socioral contexts;
c) discuss about the mortality profiles evidenced by the micro-regions of Espírito
Santo with regard to race / color variables. Among the main hypotheses was
that deaths due to external causes, due to their direct relationship with social
contexts, would have a greater emphasis on blacks and browns as early as 10
years, whereas whites would face the highest probability of death after 50 years
. Information on deaths was accessed on the SIM / DATASUS virtual site,
based on International Classification of Diseases - ICD 10, and were analyzed
based on scale for the spatial analyzes of the planning micro-regions of Espírito
Santo. The data indicated statistical significance for interactions between the
variables 'Microregion X Race / color' and 'Age X Race / color', and it is possible
to affirm that the correlation between spatial and age variability, assume in the
analyzed context, an important role in the risk of death of ethnic-racial groups. It
was also identified that, as the scale of analysis increases, there is a tendency
of the blackening process of the higher risk of death, which at the state level, is
among browns, and it intensifies among blacks in the microregions, with the
most vulnerable social indicators. Among the conclusions, it was pointed out
that the socio-racial inequalities observed in other spheres (education, culture,
labor market, for example) could also be visualized in trends with a strong
spatial orientation.
Keywords: Differential Mortality, Societal Inequalities, Territorial Inequalities,
Territory, Ethnic-racial groups, racism
LISTA DE MAPAS
Mapa 1 - Distribuição das populações tradicionais. Espírito Santo, 2010.........56
Mapa 2 - Proporção de migrantes interestaduais segundo Unidade Federal
entre 2005-2010.................................................................................................58
Mapa 3 - Distribuição das atividades econômicas no Espírito Santo................62
Mapa 4 - Índice de GINI no estado do Espírito Santo, segundo município, no
ano de 2000.......................................................................................................70
Mapa 5 - Incidência de pobreza no estado do Espírito Santo, segundo
município, no ano de 2000.................................................................................70
Mapa 6 - Microrregiões planejamento do estado do Espírito Santo..................72
Mapa 7 - Taxa de extrema pobreza da população do Espírito Santo inscrita no
CadÚnico por Microrregião, 2016......................................................................78
Mapa 8 - Hiato de extrema pobreza da população do Espírito Santo inscrita no
CadÚnico por Microrregião, 2016......................................................................78
Mapa 9 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da população
branca nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 2000................85
Mapa 10 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da
população branca nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2010...................................................................................................................85
Mapa 11 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da
população parda nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2000...................................................................................................................86
Mapa 12 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da
população parda nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2010...................................................................................................................86
Mapa 13 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da
população preta nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2000...................................................................................................................87
Mapa 14 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da
população preta nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2010...................................................................................................................87
LISTA DE TABELAS
Tabela
1
Proporção
de
não
brancos
na
população..........................................................................................................53
Tabela 2 - Participação percentual dos municípios a leste e oeste da Br 101 no
PIB capixaba, por atividade econômica – 2008.................................................63
Tabela 3 - População por raça/cor nas Microrregiões do Espírito Santo em
2000 e 2010.......................................................................................................73
Tabela 4 - Renda média domiciliar per capita por Microrregião das pessoas
cadastradas no CadÚnico, 2016........................................................................77
Tabela 5 - Índice de Desenvolvimento da Família, Espírito Santo e
Microrregiões, 2016...........................................................................................80
Tabela 6 - Óbitos por causas externas, segundo raça/cor no Espírito Santo,
2000 e 2010.......................................................................................................82
Tabela 7 - Teste Kruskal-Wallis para as taxas específicas de mortalidade
segundo as variáveis ‗Ano‘, ‗Idade‘, ‗Raça/cor‘ e ‗Microrregião‘, 2000 e
2010........................................................................................................83
Tabela 8 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões
de planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010, 10 a 49
anos...................................................................................................................91
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Percentual de óbitos por causas externas ignorados no estado e
nas microrregiões do estado do Espírito Santo em 2000 e em
2010...................................................................................................................19
Gráfico 2 - Distribuição das pessoas de 10 anos ou mais de idade com
rendimento entre os 10% com menores rendimentos e o 1% com maiores
rendimentos, por cor ou raça Brasil - 2004/2014...............................................45
Gráfico 3 - Evolução da esperança de vida ao nascimento - Brasil e Espírito
Santo
-1940
a
2010...................................................................................................................64
Gráfico 4 - Evolução da população do Espírito Santo – 18722010...................................................................................................................65
Gráfico 5 - Evolução percentual da população urbana no Espírito Santo - 19602010...................................................................................................................66
Gráfico 6 - Evolução da Taxa Geométrica de Crescimento Anual do ES e BR –
1940-2010..........................................................................................................67
Gráfico 7 - Evolução da população das microrregiões do ES – 1960-2010......74
Gráfico 8 – Evolução da Taxa Média Geométrica de Crescimento Anual 19702010...................................................................................................................75
Gráfico 9 - Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais inscrita no
CadÚnico...........................................................................................................79
Gráfico 10 - Taxa Específica de Mortalidade do Espírito Santo, segundo
raça/cor nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2000..................................................................................................................89
Gráfico 11 - Taxa Específica de Mortalidade do Espírito Santo, segundo
raça/cor nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo,
2010..................................................................................................................89
Gráfico 12 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas
microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 10 a 19 anos, 2010............93
Gráfico 13 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas
microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 20 a 29 anos, 2010............94
Gráfico 14 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas
microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 30 a 39 anos, 2010............94
Gráfico 15 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas
microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 40 a 49 anos, 2010............95
LISTA DE SIGLAS
CADÚNICO- Cadastro Único
CID – Classificação Internacional de Doenças
IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDF – Índice de Desenvolvimento da Família
IDH- Índice de Desenvolvimento Humano
IJSN- Instituto Jones dos Santos Neves
IPEA- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
RAIS- Relatório Relação Anual de Informações Sociais
RMGV – Região Metropolitana da Grande Vitória
SIM- Sistema de Informações de Mortalidade
TBM- Taxa Bruta de Mortalidade
TEM – Taxa Específica de Mortalidade
UNFPA- Fundo de População das Nações Unidas
PIB – Produto Interno Bruto
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 11
Materiais e métodos ................................................................................................................ 15
1. OS ASPECTOS GEOGRÁFICOS E A QUESTÃO RACIAL DA
MORTALIDADE DIFERENCIAL ...................................................................... 24
1.1 Os estudos populacionais e a Geografia ........................................................................... 24
1.2 Mortalidade na Geografia .................................................................................................. 28
1.3 Desigualdades subjacentes a mortalidade ........................................................................ 33
1.3.1 A situação sociorracial da população negra no contexto brasileiro ............................ 39
1.3.1.1 Desigualdades subjacentes à mortalidade por raça/cor no Brasil ........................... 46
2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA .................................................................. 51
2.1 O processo de territorialização dos grupos étnico-raciais no estado do Espírito Santo ... 51
2.2 Aspectos econômicos ........................................................................................................ 59
2.3 Aspectos sociodemográficos ............................................................................................. 64
2.4 As microrregiões administrativas do Espírito Santo .......................................................... 71
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................. 82
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 96
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 100
11
INTRODUÇÃO
O prolongamento da vida dos diversos grupos populacionais é
apontado como uma das principais conquistas possibilitadas pelos sucessivos
avanços no conhecimento científico pelos quais o planeta vem vivenciando
(PRATA, 1992; CASTIGLIONI, 1994). Com efeito, ao passo em que o
conhecimento sobre as causas e conseqüências de diversas enfermidades
foram sendo conquistados, hábitos cotidianos foram sendo aos poucos
modificados, bem como melhorias por parte dos poderes públicos foram
implementadas, tendo como impacto, de modo geral, no ganho de tempo e
qualidade de vida.
Hábitos como a higienização das mãos, por exemplo, evitam diversas
doenças, dentre várias outras, foram adotadas e reproduzidas nas sociedades
tendo como resultado a própria redução na quantidade dos eventos de óbito e
o aumento no tempo de vida média das pessoas (PRATA, 1992). Com isso,
sociedades antigas que viviam em média de 20 a 30 anos, tendo uma taxa de
mortalidade infantil de 300 falecimentos de crianças para cada 1000 nascidas
vivas, em séculos anteriores, passaram já a partir do início do século XX a viver
em média 65 anos (CASTIGLIONI, 1994).
A ocorrência de tais mudanças possibilitou várias localidades do
mundo vivenciarem os processos de Transição Demográfica 1·, que é
condicionado, dentre outros fatores pela Transição Epidemiológica2. No Brasil,
tais processos iniciam-se – de modo tardio- no século XX, em que este iniciou
de modo significativo esses fenômenos populacionais. Neste enredo, insere-se
um momento de profundas mudanças no campo econômico, com fortes
impactos em diversas questões sociais, socioambientais, dentre outras
(BRITO, 2006; MARTINE; MACGRANAHAN, 2010; LACERDA et al., 2010).
O Brasil, que inicialmente possuía uma economia extremamente
1
―[...] redução dos níveis de mortalidade e de natalidade, tendo como conseqüências
principais, inicialmente, o crescimento demográfico e, a medida que o processo evolui, as
mudanças na representação dos grupos etários, em especial, a redução do segmento das
crianças e o aumento da representação idosa.‖ (CASTIGLIONI, 2011,p.1)
2
―[...] caracteriza-se pela evolução progressiva de um perfil de alta mortalidade por doenças
infecciosas para um outro onde predominam os óbitos por doenças cardiovasculares,
neoplasias, causas externas e outras doenças consideradas crônico-degenerativas. (PRATA,
1992, p.168)
12
dependente da agricultura, adotou uma série de políticas visando inserir o país
entre as nações mais desenvolvidas economicamente. Para os gestores da
época, esse salto passaria necessariamente pelo desenvolvimento do setor
industrial (LACERDA et al., 2010) destinando suas principais políticas estatais
a alcançar tal objetivo. Em decorrência destas movimentações no campo
econômico, houve concomitantemente diversos impactos nos contextos
socioeconômicos das diversas regiões do país. No âmbito demográfico, o
Brasil saiu em poucos anos, de uma população essencialmente rural para
atingir, já no início da segunda metade do século XX, uma população
majoritariamente urbana (MARTINE; MACGRANAHAN, 2010).
Todo este processo de mudança foi marcado por avanços na
diversificação da economia brasileira (com o início da industrialização), pela
intensificação de conflitos sociais nos centros urbanos, bem como o
agravamento de questões ambientais, uma vez que, devido à falta de
planejamento, este grande fluxo populacional, em sua maioria de baixa renda,
passou a ocupar regiões menos favorecidas das cidades (MARTINE;
MACGRANAHAN, 2010). Todavia, os autores salientam que este também foi
um momento em que cidades brasileiras passaram por avanços na atenção à
saúde e no acesso a informações e técnicas de prevenção de doenças que
resultaram conjuntamente em importantes alterações na própria dinâmica
demográfica, aumentando, segundo os mesmos, as taxas de crescimento
vegetativo. Neste bojo, incluem-se mudanças significativas nos padrões de
causas de mortes, reduzindo-se óbitos por causas facilmente evitáveis
(doenças infecto-contagiosas, por exemplo) e elevando proporcionalmente as
mortes por doenças cardiovasculares e causas externas (PRATA, 1992).
Esta urbanização acelerada da população mundial, em especial, dos
continentes americanos, teve impactos, dentre outros aspectos, no próprio
fenômeno da mortalidade e em suas características, tendo entre suas
principais consequências, o crescimento das mortes ocorridas pelos contextos
sociais (situações de estresse, violência, por exemplo), que são as Causas
Externas (IBGE, 2015). O Brasil, que vivenciou intensas perdas de pessoas
das áreas rurais em função para os espaços urbanos, já a partir da década de
1980 passou a figurar entre os principais países onde mais são registrados
13
óbitos por causas externas, chegando a liderar alguns indicadores como
mortes em acidentes de trânsito, assassinatos, dentre outros (YUNES, 2001).
E, o Espírito Santo, vem liderando tais tendências, principalmente no que se
refere ao assassinato de populares mais pobres e de mortes por acidente no
trânsito (ZANOTELLI et al., 2011; RIBEIRO JÚNIOR, 2012; CASTIGLIONI;
FAÉ, 2014).
O grupo das causas externas, aliás, insere-se na contemporaneidade
entre
os
grandes
desafios
a
serem
superados
pelos
países
em
desenvolvimento, em especial, pela forte tendência apresentada nas últimas
décadas de ceifar a vida da população nos grupos mais jovens da estrutura
etária (CASTIGLIONI, 2011; YUNES, 2001). Os crimes contra a vida, por
exemplo, que se concentra de modo significativo nas áreas urbanas (LIRA,
2017), assim como mortes por acidentes de trânsito (CASTIGLIONI; FAÈ,
2014) apresenta-se como uma importante temática a ser investigada em seus
diversos espaços geográficos, de modo que possa contribuir para a
compreensão dos comportamentos territoriais do fenômeno e subsidiar a
produção e implementação de políticas públicas que visem reduzir o risco de
óbito e proporcionar qualidade de vida aos diferentes grupos sociais e raciais.
Deste modo, justifica-se a presente pesquisa no reconhecimento da
importância
de
se
investigar
e
descrever
espacialmente
fenômenos
demográficos, entendendo estes como fundamentais na compreensão das
próprias condições de vida dos diversos grupos populacionais. A mortalidade é
diferencial e possui importantes demarcações sociais (DAMIANI, 2002) que
tem demandado cada vez mais estudos com vista principalmente a identificar
tendências, necessidades e prioridades, possibilitando assim a formulação de
políticas públicas específicas por parte dos estados que possibilitem atender as
demandas específicas dos diferentes contextos geográficos e/ou grupos
populacionais. Neste contexto, acredita-se que as análises com foco também
em diferenciais territoriais podem fornecer relevantes contribuições para o
debate.
Assim sendo, o presente estudo tem por objetivo identificar diferenciais
socioterritoriais na mortalidade, segundo causas externas, por faixa etária e
14
raça/cor, no contexto das microrregiões do estado do Espírito Santo, entre os
anos 2000 e 2010. Tal objetivo desdobra-se nos seguintes objetivos
específicos: a) examinar níveis de mortalidade entre 10 e 49 anos, por raça/cor
nas microrregiões administrativas do Espírito Santo; b) averiguar a existência
de padrões espaciais e se existe correlação da mesma com contextos
socioeconômicos e/ou sociorraciais; c) discutir acerca dos perfis de mortalidade
evidenciado pelas microrregiões do Espírito Santo no que se refere às variáveis
raça/cor.
Tem-se entre as hipóteses que: 1) as mortes violentas, devido à direta
relação com contextos sociais e desigualdades sociorraciais podem estar
manifestando maior incidência entre a população preta e parda, destacando-se
nos territórios com maiores níveis de vulnerabilidade social, para pretos; 2) Há
uma correlação entre a concentração espacial de pessoas nos centros urbanos
e os elevados risco de morte; 3) A população entre 10 e 49 anos, por vivenciar
mais intensamente os conflitos sociais cotidianos, pode estar refletindo através
das causas externas, maiores riscos de serem vitimados por uma causa
externa que os demais grupos. 4) Haverão significativos diferenciais nos
grupos etários, e raciais com destaque entre população adulta (já a partir dos
10 anos) mais jovem para pretos e pardos, ao passo que, em razão dos
ganhos, nos grupos iniciais, a população branca apenas enfrentará maiores
riscos entre as idades mais avançadas, após os 50 anos.
Deste modo, a presente investigação empírica de caráter exploratório
dividiu-se em três capítulos. No primeiro, foi traçada uma discussão sobre os
estudos da desigualdade nos índices de mortalidade por raça/cor através da
ciência geográfica. Este teve o intuito de situar a Geografia, no eixo de
pesquisas sobre questões raciais nos registros de óbitos, de modo, a contribuir
na compreensão da situação sociorracial, com um olhar sob a espacialidade
das variações entre localidades e grupos.
O segundo capítulo estruturou-se a partir da necessidade de traçar um
panorama da área de estudo em questão, visando situar o leitor acerca do
contexto espacial estudado. Neste momento, foi realizada a apresentação da
área e questões diversas que auxiliam na compreensão da conjuntura local
observada. No terceiro capítulo, foram apresentados e discutidos os resultados.
15
Materiais e métodos
O período compreendido entre 2000 e 2010 foi assim definido, pois se
insere num contexto de significativas mudanças econômicas do estado do
Espírito Santo, principalmente com a intensificação dos fluxos migratórios em
função dos crescentes investimentos resultantes direta e indiretamente da
exploração de commodities3 (DOTA; COELHO; CAMARGO, 2017) e também
da implementação de uma série de políticas públicas por parte do governo do
estado, como a intensificação da guerra às drogas4 (RIBEIRO JÚNIOR, 2012),
além do fato de possibilitar o uso de informações oriundas dos próprios censos
demográficos do IBGE, como o total populacional e análises de indicadores
sociais.
No que se refere à escala espacial de análise das informações do
indicador ‗mortalidade‘, optou-se por agregar os dados segundo as dez
microrregiões de planejamento do estado do Espírito Santo, convencionadas
pela lei estadual 9.768 sancionada em 28 de dezembro de 2011 5. Isso, pois, a
exemplo do que relatou Faria (2016), tal recorte espacial possibilitaria aglutinar
dados de municípios pequenos, ao passo que respeitaria as similaridades
existentes entre as unidades municipais. Uma vez que, normalmente, no
momento da própria definição de tais microrregiões, são considerados um
conjunto de fatores correlacionados - aspectos naturais, econômicos, sociais,
históricos, políticos - possibilite obter certo nível de homogeneidade entre os
municípios (LIRA; CAVATTI,acesso em 16 dez.2016). Vale ressaltar que,
conforme assevera Lira e Cavatti (acesso em 16 dez. 2016), a divisão do
território em regiões vem sendo uma estratégia dos planejadores sociais para
idealização, estruturação e implementação de ações governamentais. Deste
modo, optou-se pelas microrregiões de planejamento definidas pela lei estadual
ao invés da definida pelo IBGE, devido ao fato de que os estudos do Instituto
3
São matérias-prima voltadas em sua maioria para exportação. Atualmente o estado destacase pela produção e exportação dos seguintes commodities: minério de ferro, aço, celulose, e
mais recentemente, petróleo e gás.
4
Dados discutidos por Ribeiro Júnior (2012) indicam que as principais vítimas das políticas de
repressão às drogas implementadas pelo estado do Espírito Santo são jovens negros.
5
No período em que o estudo foi publicado, foi considerada a regionalização conforme Lei
Estadual 5.120 de 30/11/95 alterada pelas leis: Lei 5.469 de 22/09/1997, Lei 5.849 de 17/05/99
e Lei 7.721 de 14/01/04. Nesta ocasião, a área era denominada Metropolitana, Polo Linhares e
Litoral Norte. No presente estudo foram consideradas as microrregiões criadas pela Lei
Estadual 9.768 sancionada em 28/12/2011.
16
Jones dos Santos Neves (IJSN)6, se dedicam a analisar as informações do
Espírito Santo em seus diversos aspectos, quais sejam, econômico, social,
cultural, etc. O que corroboraria para a obtenção de estudos e análises das
informações socioeconômicas e raciais em nível estadual com maior riqueza de
detalhes, se comparado aos relatórios nacionais.
As informações dos óbitos e da população residente nos municípios do
Espírito Santo por raça/cor e faixa etária no período analisado foram obtidas
em fontes secundárias, através do sítio do Departamento de Informática do
Sistema Único de Saúde (DATASUS)7, do Ministério da Saúde, na seção
Dados Demográficos e Socioeconômicos e Sistema de Informações de
Mortalidade (SIM/DATASUS). Optou-se por utilizar tais fontes devido à
abrangência social e espacial dos dados da pesquisa, que possibilita atingir
todas as áreas estudadas.
A mortalidade é aqui estudada a partir da Classificação Internacional
das Doenças – CID 10, especificamente com o grupo das Causas Externas. O
grupo das Causas Externas foi assim definido devido ao fato deste grupo
aglutinar um conjunto de tipos de mortes extremamente sensíveis aos
contextos socioeconômicos e sociorraciais. De acordo com o DATASUS, este
grupo engloba óbitos por acidentes de trânsito, homicídios, agressões, quedas,
afogamentos, envenenamentos, suicídios, queimaduras, lesões, dentre outros,
ocasionadas por determinações ambientais.
Apesar de imprescindíveis no conhecimento da dimensão, composição e
comportamento
deste
nos
diferentes
grupos
populacionais,
análises
estatísticas do indicador mortalidade ainda têm evidenciado dificuldades para
ser realizado no Brasil (CASTIGLIONI, 1994; PEREZ; TURRA, 2008). Para
Perez e Turra (2008), a produção de tais estudos em países em
desenvolvimento como o Brasil ainda é escassa devido à dificuldade de
obtenção de dados confiáveis para geração de estimativas robustas. De acordo
ainda com os estudiosos isso estaria associado à existência de desigualdades
6
―[...] finalidade produzir conhecimento e subsidiar políticas públicas através da elaboração e
implementação de estudos, pesquisas, planos, projetos e organização de bases de dados
estatísticos e georreferenciados, nas esferas estadual, regional e municipal, voltados ao
desenvolvimento socioeconômico do Espírito Santo.
[...]‖. Disponível em
<
http://www.ijsn.es.gov.br/institucional/quem-somos > acesso 01 jan. 2017.
7
Mais informações sobre o DATASUS, acessar <http://datasus.saude.gov.br>.
17
regionais e de precários sistemas de registro ou até mesmo negligência por
parte dos profissionais responsáveis (como é o caso da região nordeste do
Brasil, por exemplo), que resultam na persistência de elevados registros com
informações faltantes, como é o caso da causa de morte e/ou categoria racial
da vítima – cor da vítima.
O eixo de discussão das desigualdades raciais no âmbito da saúde
ainda tem sido pouco investigado no Brasil (CHOR; LIMA, 2005). Para
Waiselfisz (2012) esta constatação estaria associada ao fato de, apesar da
obrigatoriedade de emissão de uma certidão de óbito para todas as mortes
registradas no país ser datada de meados de 1970 e a disponibilização destas
informações para o público ter ocorrido a partir de 1979, a variável raça/cor
apenas passou a fazer parte do Sistema de Informações de Mortalidade8 de
1995 para 1996. Como conseqüência, verifica-se que as informações sobre a
cor das vítimas de óbitos apenas estão disponíveis no sistema a partir de 1997
(ZANOTELLI et al, 2011).
Os dados do SIM/DATASUS são contados:
―[...] a partir do registro da morte em certidão de óbito à vista de um
atestado médico ou, na falta de médico na localidade, por duas
pessoas qualificadas que tenham presenciado ou verificado a morte
[...]‖ (ZANOTELLI et al, 2011, p.35).
Deste modo, após a constatação do falecimento, tais profissionais
preenchem a Declaração de Óbito (documento basilar para a obtenção junto
aos cartórios, da certidão de óbito) com as informações da vítima e das
circunstâncias do falecimento. Zanotelli et al (2011) chama a atenção para a
necessidade do cuidado com as inferências realizadas a partir exclusivamente
das informações do SIM/DATASUS. Segundo os pesquisadores é relevante
atentar-se para o fato da possibilidade de, por exemplo, de vítimas residentes
em um município serem encaminhadas para hospitais de referências de outras
cidades e no registro constar como se o individuo fosse de origem do local
onde a morte aconteceu. Regiões onde há uma maior concentração de
hospitais referência acabam por concentrar mortes ocorridas em ambientes
hospitalares, que caso analisadas com base no local de ocorrência, não
8
Sistema de Informações de Mortalidade <http://sim.saude.gov.br>; Ver também
<http://www.saude.sc.gov.br/inf_saude/sim_informacoes/sistemas_informacoes_mortalidade/in
dex.htm>
18
refletiria necessariamente o aspecto socioterritorial do paciente. No Espírito
Santo, por exemplo, Vitória, Vila Velha e Serra possuem importantes unidades
hospitalares que recebem pacientes de diversas cidades do interior. Por este
motivo, visando amenizar tais questões, neste estudo, os dados foram
observados com base nos locais de residência das vítimas.
Outro ponto identificado ao longo da construção desta pesquisa que
mereceu atenção foi à existência de diferenças na captação da categoria racial
dos indivíduos. Enquanto a informação relativa ao quantitativo populacional no
território segundo raça/cor é mensurada a partir da autodeclaração dos
habitantes (o indivíduo indica sua pertença raça/cor), a categorização raça/cor
dos óbitos ocorre segundo percepção do profissional habilitado pela autoridade
pública (a pertença racial é definida por terceiros – heteroclassificação). Em
decorrência disso, pode-se encontrar registros com divergências entre o
quantitativo de óbito de determinada categoria específica e a população
existente deste grupo num determinado território (ausência de óbitos atribuídos
à categoria ao longo de vários períodos). Deste modo, as análises e inferências
estatísticas aqui realizadas ativeram-se exclusivamente aos registros já
disponíveis
no
SIM/DATASUS,
resguardando-se
as
ressalvas
acima
mencionadas.
Ainda no que diz respeito à categorização racial, vale destacar que
houve melhora nas informações do SIM/DATASUS. Observando-se os
registros dos anos de 2000 e 2010 do estado do Espírito Santo (gráfico 1),
verifica-se uma redução de 19,7 pontos percentuais (2000: 31,4%; 2010:
11,7%) nos óbitos com categoria racial ignorada. Tendência acompanhada
pelas microrregiões de planejamento, com destaque para nordeste, centrooeste, rio doce e noroeste, situadas na faixa norte do estado. Tais registros
foram desconsiderados no ato da realização dos cálculos e análises das taxas.
19
Gráfico 1 – Percentual de óbitos por causas externas ignorados no estado e nas
microrregiões do estado do Espírito Santo em 2000 e em 2010
31,4
ESPÍRITO SANTO
11,7
37,4
Metropolitana
15,5
25
Central Serrana
14,3
16,3
Sudoeste Serrana
8,1
Litoral Sul
8,1
15,7
17,3
Central Sul
10,7
12,8
11,6
Caparaó
30,6
Rio Doce
7
17,6
Centro-Oeste
3,6
48
Nordeste
6,7
14,1
Noroeste
3,5
0
10
20
2000 (%)
30
40
50
2010 (%)
Fonte: SIM/DATASUS. Organizado pelo autor
De início, tinha-se entre as hipóteses que: a) as mortes violentas,
devido à relação direta com contextos sociais e desigualdades sociorraciais
incidiriam mais entre pretos e pardos, que de acordo com a bibliografia
consultada, ocupam os espaços com as piores condições materiais de
existência na sociedade brasileira; b) haveria uma correlação entre a
concentração de pessoas, os grandes centros urbanos e as elevadas taxas
específicas de mortalidade, destacando-se os maiores riscos entre pretos e
pardos; c) haveria uma maior incidência entre a população preta já a partir dos
10 anos, mesmo nas microrregiões onde brancos representam maioria
percentual da população, e entre brancos após os 50 anos.
Na busca de atingir os objetivos e averiguar tais hipóteses, foram
consultados relatórios e mapas produzidos pelo IJSN. Os mapas do instituto
auxiliaram na compreensão de alguns indicadores e sua distribuição espacial
no estado. Os demais órgãos de pesquisas nacionais, tais como Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, Instituto de Pesquisas Econômicas e
Aplicadas contribuíram para a aferição em nível nacional e estadual de
indicadores sociais e raciais. Tais entidades têm produzido inúmeros estudos
que coadunam na compreensão da situação dos grupos étnico-raciais no que
se refere a aspectos econômicos e sociais, sendo utilizados inclusive, por
20
inúmeros autores consultados ao longo do desenvolvimento do presente
estudo.
Os dados obtidos no sitio do DATASUS foram tabulados e tratados no
Software Excel - versões 2007 e 2010 e analisados no software RStudio. As
comparações entre os diferentes grupos étnico-raciais e/ou etários foram
realizadas a partir dos cálculos das taxas. Isso, pois, a partir destas é possível
comparar diferentes grupos, uma vez que os resultados são verificados a partir
do estabelecimento de um quantitativo base de pessoas vivas, em função do
número de óbitos, possibilitando assim, verificar a intensidade com que os
diferentes grupos populacionais têm sido vitimados.
Para tanto foram calculadas: a) Taxa Bruta de Mortalidade (TBM), que
se refere ao risco que tem uma pessoa de morrer, a partir do cálculo entre a
relação do total de óbitos e a população total de um determinado grupo
populacional ao longo de 12 meses. Tal taxa é expressa pela razão entre
óbitos e população multiplicados por mil habitantes;
i) Taxa Bruta de Mortalidade:
TBM =
Óbitos Totais
∗ 1000
Popula Totaiso
ii) Taxa Bruta de Mortalidade segundo raça/cor:
TBM =
Óbitos totais do grupo racial
∗ 1000
Popula totais do grupo racial M
b) A Taxa Específica de Mortalidade (TEM) esta relacionada ao risco de morte
em cada idade ou em cada grupo etário. A partir desta é possível acompanhar
como os diferentes indivíduos e/ou grupos etários foram expostos ao risco de
morte ao longo do período analisado. A TBM é uma média ponderada das
TEM‘s. (CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998). No presente estudo
foram calculadas as TEM segundo grupo racial da seguinte maneira:
TEM =
Óbitos do grupo etária racial
∗ 10000
Popula do grupo etária racial
O uso das Taxas Brutas de Mortalidade precisa ser feito com algumas
ressalvas. Isso, pois, por ser uma média ponderada de todos os grupos etários,
que possuem diversificados níveis de risco de morte, está é facilmente
influenciada pela composição etária – principalmente pela presença de idosos
21
e crianças (BEAJEAU-GARNIER, 1980; CASTIGLIONI, 1994; CARVALHO;
SAWYER; RODRIGUES, 1998). Populações com elevados números de idosos
e crianças podem refletir realidades totalmente diferente. Um país desenvolvido
e/ou em desenvolvimento, que possua boas condições socioeconômicas e
sanitárias tem, dentre outras características, o fato de a população viver cada
vez mais. Este fato, por sua vez, faz com que o número de idosos – que tem
maiores riscos de morte- seja elevado, acarretando em elevadas taxas brutas,
enquanto países e/ou regiões com condições precárias, em que as taxas de
natalidade sejam altas – indivíduos com menores riscos de morte – evidenciem
taxas baixas (CASTIGLIONI, 1994). Resguardando-se os devidos cuidados (a
estrutura etária), esta pode contribuir para a compreensão geral da situação de
uma determinada localidade. Por este motivo Carvalho, Sawyer e Rodrigues
(1998) destacam que, de modo geral, as pesquisas que analisam comparações
de óbitos entre grupos populacionais utilizam as Taxas Específicas de
Mortalidade9, que auferem e possibilitam a inspeção do efeito dos diferenciais
especificamente em cada um dos conjuntos, segundo recorte etário.
Após o calculo das taxas10 no Excel, no intuito de verificar se houve
variação significativa nas taxas e possíveis interações estatisticamente
significantes, foi aplicado, no software RStudio o teste Kruskal-Wallis11. Esta
testagem não paramétrica é utilizada para defrontar três ou mais populações,
no intuito de comparar as taxas de mortalidade entre essas variáveis,
verificando qual seria significante. Com isso, procedeu-se o manuseio das
taxas no software Excel, e utilizou-se técnicas da estatística descritiva12, com
vista verificar a distribuição das mortes segundo faixa etária, microrregiões e
9
Ao longo das discussões foram calculadas médias aritméticas das taxas específicas de
mortalidade referente ao ano de 2000 e 2010. Neste caso, a média da TEM, refere-se a média
aritmética estabelecida entre os anos de 2000 e 2010.
10
Durante as tabulações, verificou-se que alguns grupos étnico-raciais não possuíam óbitos
atribuídos a categoria em determinado grupo etário. Por este motivo, o resultado do cálculo da
taxa foi zero. No intuito de melhorar a visualização dos dados, tais zeros não foram inseridos
na tabela, ficando assim os espaços vazios.
11
O teste Kurskal-Wallis, realizado no software RStudio, foi feito pelo discente Alan Torres
(graduando em de Estatística da Ufes), que compõe a equipe do Laboratório de Estatística da
Universidade Federal do Espírito Santo-Lestat-Ufes, sob orientação do Prof° Dr. Ivan Robert
Enriquez Guzman.
12
Foram calculadas médias e medianas. Denomina-se: a) média: o resultado da soma de
todas as informações de um conjunto de dados dividida pelo número de informações que foram
somadas; b) mediana: número que ocupa a posição central de uma lista. Destaca-se que a
única
média
utilizada
nos
cálculos
foi
a
média
aritmética.
Disponível
<http://brasilescola.uol.com.br/matematica/moda-media-mediana.htm> Acesso: 16 out. 2017.
22
grupos étnico-raciais.
As taxas calculadas para as microrregiões foram também distribuídas
espacialmente em mapas produzidos com o auxílio do sistema de informações
geográficas ArcMap 10.1 da empresa ESRI (Environmental Systems Research
Institute). Para tanto, foram utilizadas as bases cartográficas13 fornecidas pelo
Instituto Jones dos Santos Neves.
No que se refere aos grupos étnico-raciais, faz-se relevante entender
que: Raça e Etnia possuem importantes diferenças que as demarcam (SISS;
PACE, 2013). Para os autores, enquanto o conceito de etnia remete a uma
filiação ancestral, raça está diretamente correlacionado a um conjunto de
características fenotípicas. Nesta perspectiva, etnicamente, pessoas com
diferentes tonalidades de pigmentação da pele e traços físicos podem se definir
como
pertencente
a
uma
determinada
ancestralidade
que
não
necessariamente reflete o tom de pele que o mesmo possui. Isso possibilita
que pessoas com tom de pele branco possam se autodeclarar negras, por
afinidade e/ou compreensão que ao longo do processo de miscigenação pode
ter havido um cruzamento interracial entre seus ancestrais. Já raça14 tem sido
definida por critérios observáveis, tais como, tonalidade da pele, altura e tipo de
cabelo, por exemplo.
O IBGE utiliza em seus registros empíricos o critério de autodeclaração
(a partir de uma heteroclassificação) para definir a variável ―raça/cor‖, tendo as
seguintes opções15: branca; preta, amarela, parda, indígena. O entrevistado
responde ao agente da pesquisa no ato da realização das entrevistas qual
grupo raça/cor ele pertence. Raça, conforme se observa em Siss e Pace
(2013), será entendido como conjunto de características físicas, que como
adota o IBGE, será observado a partir da autoatribuição.
Para a realização dos cálculos e análises deste trabalho foram
considerados inicialmente todos os grupos étnico-raciais. Todavia, durante o
13
Shapefiles disponíveis em < http://www.ijsn.es.gov.br/mapas/ > Acesso: 07 abr. 2017.
Destaca-se que o termo raça na presente pesquisa não é discutido sob o ponto de vista do
determinismo biológico, mas sim como sendo fruto de uma construção histórica e social
(SCHWARCZ, 2001).
15
Os conceitos utilizados nas coletas do IBGE estão disponíveis em <
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/indicadoresminimos/conceit
os.shtm > acesso em: 01 ago. 2016
14
23
processo de análise dos dados notou-se que as informações de duas, quais
sejam, Amarela e Indígena, variam muito, uma vez que a quantidade de
indivíduos categorizados neste grupo é muito menor/não registradas 16,
dificultando assim a fidedignidade da análise. Portanto, ao longo da tabulação
estes foram aglutinados na categoria racial outras. Deste modo, definiu-se com
grupos étnico-raciais neste estudo: branca, preta, parda e outras. Ressalta-se
ainda que, para fins desta pesquisa, a exemplo do estudo do IJSN (2017), o
termo negro(a), quando utilizado,estará se referindo a pretos e pardos.Tal fato
é possível, conforme pontua Kilsztajnet al. (2005), devido a existência de
estudos empíricos que tem revelado que ambas compartilham, de modo geral,
padrões de vida, renda média, escolaridade dentre outras variáveis
semelhantes entre si e diferentes entre as demais.
Devido ao fato dos jovens e adultos17 estarem mais propensos à
vivenciarem as tensões sociais, e serem mais ativos socialmente, estes
acabam ficando também mais expostos ao risco de morte (DRUMOND JR;
BARROS, 1999). Notou-se na bibliografia consultada, que tais ocorrências tem
se revelado ainda mais intensas nos adultos, principalmente entre os 20 e os
49 anos. Isso, conforme se observa em Castiglioni (1994; 2011) da-se tanto
devido a fatores psicológicos (inexperiência, consumo de drogas lícitas e
ilícitas, imprudência no trânsito) quanto sociais (residir em regiões onde
ocorrem inúmeros conflitos, disputa pela posse de terras) (ZANOTELLI et al,
2011). Por este motivo, optou-se por centrar as análises das taxas específicas
de mortalidade dos grupos etários entre 10 e 49 anos, segundo grupos étnicoraciais e as microrregiões.
16
Amarela e Indígena não superou média de 0,1% nos registros de óbitos disponibilizados pelo
SIM/DATASUS períodos analisados. Juntas, de 2000-2010, totalizaram de 35 óbitos.
17
A Organização Mundial da Saúde entende como jovens os sujeitos com idades entre 10 e 24
anos. No entanto, considerando que se optou por trabalhar com intervalos etários de 10 anos,
o termo Jovem, quando utilizado, estará se referindo a faixa etária dos 10 aos 19 anos. Adulto
refere-se aos grupos etários entre 20 e 69 anos e Idoso acima dos 70 anos.
24
1.
OS
ASPECTOS
GEOGRÁFICOS
E
A
QUESTÃO
RACIAL
DA
MORTALIDADE DIFERENCIAL
Este capítulo tem por objetivo discorrer sobre as variações no risco de
morte, em função de diferentes variáreis. Vislumbrou-se ainda nesta discussão
teórica, compreender como (se) o estudo da mortalidade tem contribuído para
a discussão sobre os níveis de mortalidade em seus diversos aspectos
(classes sociais, faixa etária, raça/cor, regiões etc.), com ênfase à possível
existência de questões raciais e/ou espaciais nos diferenciais identificados.
Ressalta-se que o eixo de pesquisas sobre desigualdades raciais no
Brasil tem apontado disparidades entre os grupos étnico-raciais que compõe o
povo brasileiro em diversos campos (HASENBALG, 1979; SANTOS, 2016). E o
presente capítulo tem a pretensão de verificar em produções científicas se
essas diferenças tem ocorrido também no que refere à duração da vida, bem
como a intensidade dos riscos de morte em diferentes regiões geográficas.
Faz-se assim necessário discorrer acerca do olhar que a Geografia tem sobre
os estudos populacionais, em específico, sobre as análises da mortalidade e
seus diferenciais também por raça/cor, de modo a auxiliar na compreensão da
situação sociorracial da população negra no contexto brasileiro, em seus
diferentes aspectos.
1.1 Os estudos populacionais e a Geografia
A ciência geográfica tem muito a contribuir com os estudos
populacionais, por meio de uma abordagem crítica e contextualizada
(MORMUL, 2013). Segundo Beaujeur-Garnier (1980) o profissional geógrafo
tem por atribuição não só descrever os fatos no contexto de seu ambiente, mas
também estudar os motivos, características e possíveis reflexos socioespaciais
de tais eventos. Deste modo o geógrafo, ―[...] quando estuda a população,
analisa fenômenos essencialmente biológicos e fenômenos com causas sócioeconômicas e culturais. [...]‖ (CAMPOS, 2009, p. 59). Assim, tal profissional,
amparando-se em saberes oriundos de diferentes campos de conhecimento
(Sociologia, Antropologia, Economia, por exemplo) analisa, na perspectiva
geográfica, temáticas como a mortalidade, a natalidade e a migração
(BEAUJEU-GARNIER, 1980; GEORGE, 1978; FREITAS, 2014), com vista à
25
inter-relacionar e analisar os diferentes contextos.
Beaujeu-Garnier (1980, p.5) destaca que:
As sociedades humanas existem e modificam-se, mas são também
ativas em imprimir sua marca, com maior ou menor força, em seu
próprio ambiente: casas, desflorestamentos, campos cultivados,
fábricas, estradas. [...]
Nota-se assim, nas palavras de Beajeu-Garnier (1980) e nas
contribuições de George (1978), que a superfície terrestre reflete em seus
diversos contextos as relações sociais, históricas, culturais e econômicas dos
diferentes lugares. Bourdieu (2013) propõe a análise deste fenômeno a partir
do conceito de espaço físico reificado18. De acordo com o autor, o espaço
social19e o espaço físico20 reproduzem a relação dialógica existente entre o
ambiente físico e as relações sociais. Assim, tem-se como resultado a
reificação das estruturas físicas em função de demandas socialmente criadas
(o contrário também ocorre), que se refere às marcas evidenciadas pelo
contexto das relações sociais no território de vivência. Cita-se, por exemplo, o
caso do espaço urbano, em que, devido a relações sociais assimétricas entre
os diferentes estratos sociais, produz a estruturação e fortalecimento de áreas
com determinados padrões espaciais (áreas nobres, dotadas de benfeitorias e
as áreas menos favorecidas, onde serviços básicos são total ou quase
inexistentes) (LIRA, 2015). Neste sentido, o lugar e o local ocupados no espaço
físico apropriado podem fornecer formidáveis indicadores da posição que o
indivíduo ocupa na hierarquia social (BOURDIEU, 2013; DRUMOND JR;
BARROS, 1999), não sendo, portanto, a localização aleatória, produto somente
de decisão em nível individual.
A melhoria da qualidade nos registros de dados sobre diferentes
aspectos da população tem impactado positivamente na produção de estudos
empíricos. De acordo com Freitas (2014), principalmente na segunda metade
do século XX, variados fatores corroboraram para que isso ocorresse, dentre
18
Espaço físico modificado pelas relações sociais. Também denominado espaço físico
apropriado (BOURDIEU, 2013).
19
―[...] espaço abstrato construído pelo conjunto dos subespaços ou dos campos (campo
econômico, campo intelectual, etc.) [...]‖ (BOURDIEU, 2013, p.136).
20
―[...] só pode ser pensado como tal por meio de uma abstração (geografia física); ou seja,
ignorando-se decididamente tudo o que ele deve ao fato de ser um espaço habitado e
apropriado [...]‖ (BOURDIEU, 2013, p.136).
26
eles, o próprio avanço tecnológico. Neste cenário, a Geografia passa a partir
dos novos debates iniciados na década de 1950 a também considerar a
relevância de se discorrer acerca dos fenômenos que envolvem fatores
demográficos, questões sociais, físicas, tudo isso de modo holístico e dialógico.
No que se refere especificamente aos estudos geográficos históricos
relacionados à população, Beaujeu-Garnier (1980) demarca existir três
aspectos que merecem ser observados: distribuição dos povos pelo globo; a
evolução das sociedades humanas e o grau de êxito por elas atingido sendo
que, para a autora, o mais elementar é a distribuição da população. Tal fato
revela o olhar que a geografia destina às análises relacionadas às pesquisas
no campo das investigações em população, que é a variabilidade espacial dos
dados. Com o avanço dos debates sobre qual seria de fato o olhar especifico
da geografia, cada vez mais se destacou a relevância de se realizar análises
críticas dos registros, não se limitando a descrevê-lo espacialmente.
Damiani (2002), neste sentido, ressalta que não se podem limitar os
estudos populacionais em geografia a simplesmente realizar averiguações e
descrições espaciais, mas sim, observar a espacialidade, problematizando
sobre possíveis fatores (sociais, culturais, raciais, econômicos, ambientais, por
exemplo), que podem estar operando e influenciando em determinado
comportamento do dado.
As investigações realizadas em geografia da população se centram nos
nascimentos, nos movimentos populacionais e nas mortes ocorridas. Em tais
análises, são verificados os seguintes fatores demográficos: tamanho da
população; distribuição por sexo, idade, estado conjugal; distribuição segundo
região geográfica de residência anterior, atual, e de nascimento; natalidade;
fecundidade; mortalidade. Cada um, ao seu modo, exerce significativa
influência nas dinâmicas populacionais e também refletem os variados
contextos territoriais (BEAUJEU-GARNIER, 1980; CARVALHO; SAWYER;
RODRIGUES, 1998; ZELINSKY, 1969).
Nas palavras de George (1978, p.7), a depender da realidade
geográfica, econômica e social de cada país, por exemplo, cada nascimento
assume um significado particular, ou seja, está estatisticamente atrelado a uma
27
realidade estrutural que pode estar indicando para uma maior ou menor
possibilidade de sobrevivência e/ou longevidade, de modo que, as diferentes
desigualdades também se expressariam e poderiam ser observadas em função
da origem do dado nascimento, bem como o local onde vive. Para o autor,
A mais inelutável das razões da desigualdade entre os homens é hoje
a sua origem geográfica, isto é, o lugar onde nascem. Ao lado de
diferenciações naturais, que implicam para o pequeno esquimó um
universo sem nada de comum com o do pequeno indonésio, a
disparidade na repartição da riqueza entre os homens, as posições
violentas entre países onde a renda aumenta e naqueles onde as
necessidades crescem rapidamente, fazem da geografia da
população um dos problemas de mais dramática abordagem da
realidade humana hodierna. (GEORGE, 1978, p.7-8)
Freitas (2014) e Damiani (2002) listam a mortalidade entre as temáticas
relevantes a serem analisadas pela ciência geográfica, ao lado das questões
de natalidade e migração. Pensando do ponto de vista da evolução
populacional, têm-se na natalidade e na migração dois fatores demográficos
que atuam diretamente na inserção de indivíduos de uma determinada
população num determinado tempo e espaço. As mortes, por sua vez, são
irreversíveis, sendo o indivíduo excluído definitivamente da população
(CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998).
George (1978) destaca a redução geral da mortalidade ocorrida no mundo
como fato demográfico mais característico da primeira metade do século XX.
Segundo o autor,
[...] Surge como resultado da debelação das epidemias, da
erradicação das endemias destruidoras, como o paludismo, de
numerosas regiões do globo onde antes faziam estragos e da
redução considerável da mortalidade infantil (mortalidade no primeiro
ano de vida). (GEORGE, 1978, p.50)
De acordo com Damiani (2002) basicamente três fatores centrais
teriam influenciado nesta redução: maior controle das doenças infectocontagiosas; melhoria do saneamento e do nível de vida; melhoria nas
condições de trabalho, com o avanço das legislações trabalhistas. Todavia, ao
verificar tais constatações, a autora ressalta ainda, que seja preciso relativizar
estas supostas conquistas atingidas pela população mundial. Isso, pois, nem
todos os estratos da hierarquia social foram contemplados de maneira
igualitária. Compreende-se assim que tal fato credibiliza e reforça o quão
relevantes podem ser as análises espaciais de tal fenômeno.
28
Conforme pontua Castiglioni (1994):
O conhecimento das características dos fenômenos demográficos
que condicionam a dimensão, composição e dinâmica da população é
de grande relevância para a definição das necessidades e prioridades
que devem nortear o planejamento socioeconômico dos estados.
(CASTIGLIONI, 1994, p.2)
Neste contexto de definição de necessidades e prioridades, a
compreensão dos possíveis aspectos territoriais envolvidos nas dinâmicas dos
comportamentos apresentados pelos indicadores da população, nos quais a
ciência geográfica focaliza em seus estudos, podem assumir relevância ímpar,
uma vez que permite também problematizar sobre um mesmo fenômeno,
também em função de diferentes localidades e conjunturas no tempo e no
espaço. Sendo possível através dos resultados, criar estratégias de
intervenções que se adéquem aos contextos específicos.
1.2 Mortalidade na Geografia
Na Geografia, a mortalidade, assim como os demais fatores
demográficos, é observada e problematizada a partir da realidade do contexto
analisado em função de questões conjunturais e culturais (GEORGE, 1978;
BEAUJEU-GARNIER, 1980; DAMIANI, 2002). Conforme Mormul (2013), a
análise mais ampla do social possibilita uma melhor compreensão de seus
resultados, ao passo que demarca a efetiva participação, em diferentes
escalas, de fatores locais e regionais, no comportamento de determinado dado.
Segundo a mesma,
Não se trata de realizar uma leitura linear da história, mas entender
as forças políticas, econômicas e culturais que influenciaram o modo
como as pessoas se organizam e vivem socialmente. (MORMUL,
2013, p.40)
Estudos que analisam índices de mortalidade em diferentes localidades
têm evidenciado a existência de padrões e variações espaciais nos tipos e nos
motivos pelos quais ocorrem os óbitos (PRATA, 1992; SILVA; PAIM; COSTA,
1999; SANTOS; NORONHA, 2001; PAES-SOUSA, 2002; ANDRADE; DINIZ,
2013), corroborando com processos, como o de reificação do espaço físico e
social (BOURDIEU, 2013). Beaujeu-Garnier (1980), ao abordar sobre esta
temática, demonstra que as diferentes regiões do planeta apresentam
29
especificidades culturais21, climáticas e socioeconômicas, por exemplo, que
acabam por refletir em padrões diferenciados de índices e motivos pelos quais
as pessoas têm vindo a óbito.
Ao analisar as mortes ocorridas entre 1930 e meados de 1970 no
Brasil, Prata (1992) encontrou significativas variações nas causas de
mortalidade em função da região analisada. Dentre outras conclusões, o autor
explicita a ocorrência de diferentes padrões e processos na Transição
Epidemiológica22 Brasileira, com fortes influências do contexto geopolítico e
histórico. Segundo o autor, ao longo dos anos ocorreram diferentes avanços no
que se refere aos padrões de mortes, por exemplo, as regiões Sul e Sudeste,
que são historicamente favorecidas por políticas públicas, foram percebidas
melhorias no combate a morbidades com forte cunho social como as doenças
infecciosas, por exemplo, enquanto as regiões Norte e Nordeste ainda
mantiveram estes índices elevados.
Apesar da evolução do perfil de mortalidade estar obedecendo ao
esperado na teoria da transição epidemiológica em todas as regiões
brasileiras, a desigualdade processual desta evolução pode ser
observada [...] (PRATA, 1992, p.172).
Para Castiglioni (1994) a extensão ou não da vida média de uma
população está diretamente relacionada tanto com a velocidade com que seus
componentes são eliminados às várias idades (os óbitos), quanto à localização
espacial. Segundo a estudiosa, o ritmo da diminuição passa por forte influência
das características dos espaços geográficos e suas nuances sócio-econômicacultural. De tal modo que, é possível, de acordo ainda com a mesma,
estabelecer conexões entre, por exemplo, avanços em saúde de uma
determinada região e o envelhecimento dos habitantes, em que:
[...] os ganhos em saúde se distribuem espacialmente de forma
desigual refletindo as disparidades de desenvolvimento existentes
entre as regiões do mundo. Cerca de 64% dos países já
21
Ao discutir sobre diferenciais por sexo na mortalidade, Castiglioni (1994) ressalta o peso da
bagagem das práticas e costumes locais na mortalidade. Apesar de mundialmente a
mortalidade masculina ser maior que a feminina, ―em certas sociedades onde a mulher é
submetida à forte discriminação, o fator biológico é sobrepujado pelo cultural e a
sobremortalidade masculina se reduz a menos de 2 anos ou há uma inversão. [..]
(CASTIGLIONI, 1994, p.8)
22
[...] essa transição refere-se ao período entre o declínio das mortes por doenças infecciosas
e parasitárias agudas e o aumento das mortes em função de doenças crônico-degenerativas,
acompanhadas de um deslocamento (shift) do padrão de mortalidade por idades, das idades
mais jovens para as mais avançadas. [...] (ALBUQUERQUE; SILVA, 2015, p.51-52)
30
ultrapassaram a marca média de 65 anos de expectativa de vida. Em
muitas regiões pobres, no entanto, a revolução tecnológica ocorrida
neste século [século XX] ainda não resultou em melhoria do padrão
de vida das populações. A duração da vida na África é em média 20
anos menor que a da Europa e, em muitos países da África
Subsaariana morrem mais de 100 crianças em 1.000 nascidas vivas.
A maioria dos óbitos destas populações são ainda causados por
doenças infecciosas e parasitárias. (CASTIGLIONI, 1994, p.1)
A melhoria nas condições de vida no território modifica também os
motivos pelos quais ocorrem os óbitos, estando estes, estreitamente
correlacionados (CASTIGLIONI, 1994), sendo possível, encontrar pistas de que
a organização territorial e as relações sociais estabelecidas, no qual a
geografia se dedica a compreender em seus estudos, inserem-se como
relevantes fatores a serem considerados nas análises demográficas. Sendo
possível a partir de Castiglioni (1994), destacar que a intensidade e a na
natureza do óbito interligam-se também à composição dos grupos de causas
de morte de um aglomerado populacional.
Dados do Relatório "Tendências sobre a mortalidade materna: 1990 a
2010", produzido pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA)
indicou que o Brasil, tem diminuído o número óbitos maternos23. O indicador de
morte materna do país estimada para 2010 foi menor que os demais países da
América Latina e o Caribe, aferida em 80 por 100 mil nascidos vivos. Quando
analisados em escala global, a diminuição do país (51%) superou a média
mundial (47%) e latino-americana (41%). Contudo, ainda não atingiu a meta do
Objetivo de Desenvolvimento do Milênio 524, que é a marca de 75% (UNFPA,
2012).
Entre os anos de 1990 e 2010, verificou-se relevantes melhorias nas
condições de vida em vários países. No entanto, informações do relatório da
UNFPA (2012) apontam diversas disparidades nos óbitos das diferentes
regiões do globo. Índia (20%) e Nigéria (14%) concentraram um terço de todas
as mortes registradas no mundo no ano de 2010 (Índia: 56 mil; Nigéria: 40 mil).
Analisando-se os 40 países com as mais elevadas taxas de mortalidade
materna, verificou-se que 90% (36) eram de países localizados na África
23
Mortes correlacionadas a consequências de parto ou pós-parto, por exemplo.
Meta 5: ―Reduzir em três quartos, até 2015, a taxa de mortalidade materna. Deter o
crescimento da mortalidade por câncer de mama e de colo de útero.‖Disponível em
<http://www.objetivosdomilenio.org.br/gestantes/> acesso em: 09 mai. 2017.
24
31
Subsaariana (UNFPA, 2012). A maioria destes casos relacionados as
condições de saúde, nutrição e conflitos sociais.
É possível notar também em George (1978) a existência de tendências
espaciais, em que, localidades com melhores indicadores de condições de
vida, possuem baixos índices de mortalidade infantil:
[...] morrem quatro a cinco vezes mais crianças de pouca idade na
Argélia, na África tropical e na República Árabe Unida do que na
Europa Ocidental, de acordo com as estatísticas oficiais [...]
(GEORGE, 1978, p.50-51)
Quando observadas as relações sociais historicamente estabelecidas
nestas nações, verificam-se processos de territorializações diferenciados. De
um lado, observa-se que territórios que foram colônias, tendo suas riquezas e
seus povos explorados, e de outro, as metrópoles colonizadoras. Tal narrativa
revela um aspecto essencialmente geográfico, sendo este, a variabilidade
espacial de um fenômeno em função de um processo histórico de disputa por
território (ZELINSKY, 1969).
Os óbitos relacionados a causas violentas, as causas externas25, tem
assumido cada vez mais destaque na sociedade, estando associados a fatores
como iniquidade social, densidade populacional, acesso a armas letais, por
exemplo, (YUNES, 2001). O autor, ao discutir sobre a temática, alerta que
mundialmente esse fenômeno tem crescido substancialmente. O continente
americano, por exemplo, em comparação a outras áreas do planeta, desde
meados dos anos de 1980, vem se destacando pelas altas taxas. Tendência
esta também visualizada no Brasil (ALBUQUERQUE; SILVA, 2015).
Registros relatados por Yunes (2001) e Lira (2017) dão conta de que
no final do
século passado
as mortes violentas ocuparam espaço
preponderante entre os demais grupos de causas, com destaque para os
países situados nas Américas, pontuando ainda que as mesmas têm se
elevado cada vez mais nos últimos anos:
[...] Na Colômbia e em El Salvador, por exemplo, cerca de 25% da
mortalidade geral são por causas externas. Esta proporção já está ao
redor de 15% para países como o Brasil, Equador, México e
Nicarágua, enquanto que para o Canadá e os Estados Unidos da
América e Uruguai é somente de 8%, aproximadamente. Mesmo para
25
Abarcam mortes ocasionadas por fatores externos ao corpo humano, abrangendo os óbitos
provocados por acidentes diversos, suicídios, homicídios (CASTIGLIONI, 1994; 2011;).
32
os países onde as causas externas não têm tanto peso, observa-se
que sua importância relativa aumentou entre as décadas de 80 e 90.
(YUNES, 2001, p.147)
Para Albuquerque e Silva (2015, p.51) este crescimento da violência
estaria relacionado ao fato do país, assim como diversas outras nações, ter
vivenciado um rápido processo de urbanização e metropolização sem ―a devida
contrapartida de políticas voltadas, particularmente, para a segurança e o bemestar dos indivíduos que vivem nas cidades‖.
Andrade e Diniz (2013) encontraram diferenciados processos de
organização
territorial da
violência nas
macrorregiões brasileiras.
Os
pesquisadores fizeram uma averiguação geográfica dos homicídios no Brasil
no contexto das macrorregiões, entre os anos de 1980 e 2010. Os autores
destacaram que, entre 2000 e 2010, as macrorregiões brasileiras vivenciaram
significativas desigualdades territoriais nas ocorrências dos homicídios, sendo
influenciados por questões econômicas e/ou em virtude da alteração das
formas de uso e funções do espaço. Três das cinco regiões apresentaram
aumentos no percentual de mortes por homicídio, sendo elas respectivamente:
Norte (100,9%), Nordeste (76,4%), Sul (53,6%). Já o Sudeste neste mesmo
período, diminuiu (48,1%) a mortalidade por homicídio, enquanto o CentroOeste manteve praticamente estável os índices. Andrade e Diniz (2013)
concluem assim, que o período analisado revelou um processo de
redistribuição espacial dos homicídios, tendo nítidos padrões de concentrações
espaciais em determinadas localidades, principalmente na última década
observada.Vale destacar que, se o fenômeno é social, e as relações sociais
exprimem forte influência do contexto relacional (BOURDIEU, 2013), entender
os diferenciais dos óbitos a partir de diferentes relações e contextos torna
essencial na compreensão de motivos de possíveis tendências regionais, uma
vez que, conforme pontua Damiani (2002), a depender do país, elevadas taxas
de mortalidade geral podem assumir significados diferentes. Inserindo-se a
geografia como potencial área de conhecimento a contribuir com esses
debates.
Como se pôde observar, o indicador mortalidade tem reificado
espacialmente, as relações sócio-historico-ambientais das regiões verificadas,
revelando significativas variações espaciais em seus comportamentos. E,
33
conforme pontua Castiglioni (1994), o estudo de tais variações são de
relevância ímpar para sua compreensão no tempo e no espaço, sendo possível
através desta, projetar ações, respeitando-se as especificidades conjunturais
de cada território.
1.3 Desigualdades subjacentes a mortalidade
A redução da mortalidade geral nos índices de mortalidade se iniciou
na Europa Ocidental, em meados do século XIII (BEAUJEU-GARNIER, 1980)
se expandindo posteriormente para os demais países. De acordo com Prata
(1992), tal evento ocorreu em razão de alguns fatores:
[...] as Revoluções Agrícola e Industrial, a urbanização e a melhoria
das condições de vida durante os últimos séculos foram responsáveis
por um importante declínio da mortalidade e pela modificação do
perfil epidemiológico da população, numa época de pouco
conhecimento médico e de implementação limitada de medidas
terapêuticas eficazes. (PRATA, 1992, p.168)
O processo de formação dos grandes centros urbanos industriais, ao
longo da primeira fase do desenvolvimento industrial e urbano fez com que a
mortalidade se elevasse em algumas cidades, principalmente no Reino Unido e
na Alemanha. Beaujeu-Garnier (1980, p.92) informa que: ―[...] o índice médio
de mortalidade caíra 30 de por mil no começo do século XIX para 18 por mil
por volta de 1900 [...]‖.
Analisando o perfil epidemiológico - os grupos de
causas-, os autores indicam que este refletiu e influenciou significativamente
neste processo.
As pessoas, que inicialmente morriam por doenças
infecciosas, desnutrição, com o avanço da medicina (imunização e tratamento),
a melhoria das condições de moradia (graças à melhoria nos serviços de
saneamento), bem como a adequada manipulação de alimentos fizeram com
que cada vez mais diminuíssem os índices de mortes por motivos considerados
fúteis (PRATA, 1992). O autor destaca ainda, que tais atitudes foram
responsáveis pela redução de três quartos da taxa de mortalidade ocorrida no
século XX. Apesar disso, de modo geral, os diversos países vem vivenciando
significativas mudanças em seus perfis. Todavia, conforme alerta Damiani
(2002), quando analisadas região a região, grupo a grupo, é possível notar que
todo este avanço tem ocorrido de maneira desigual sob a ótica social e
territorial, tendo forte influência da posição em que o indivíduo ocupa na
hierarquia social.
34
A literatura tem demonstrado a existência de desigualdades nos
índices
de
mortalidade
por:
grupos
etários,
questões
biológicas,
socioeconômicas, territoriais, socioespaciais, culturais, raciais, por exemplo,
(ZELINSKY, 1969; GEORGE, 1978; BEAUJEU-GARNIER, 1980; PRATA,
1992; SILVA; PAIM; COSTA, 1999; PAIM et al., 1999; SANTOS; NORONHA,
2001; DAMIANI, 2002; PAES-SOUZA, 2002; BATISTA; ESCUDER; PEREIRA,
2004; CHOR; LIMA, 2005; FIORIO et al., 2011; ANDRADE; DINIZ, 2013;
FARIA, 2016). Inserindo-se a temática da mortalidade e suas nuances como
relevante campo temático a ser explorado pelas ciências sociais e da saúde.
A fragilidade à vida é desigual e varia em função dos diferentes grupos
da população (GEORGE, 1978). Neste sentido, Castiglioni (1994) informa ser
possível dividir os fatores que atuam sobre o fenômeno da mortalidade,
distinguindo-os entre aqueles que ocorrem em nível individual e os que
decorrem
de
questões
contextuais,
alertando
que
ambos
atuam
concomitantemente26. Em nível individual, têm-se aqueles que se relacionam
diretamente a características físicas, genéticas e/ou comportamentais do
sujeito num determinado grupo social, estando subdivididos em: Variáveis
fisiológicas (fatores biológicos e genéticos); Variáveis comportamentais
(alcoolismo,
tabagismo,
consumo
de
drogas
etc.);
Variáveis
mentais
(alimentação, medicina curativa, higiene, atitudes diante de doenças, etc.).
Para a autora, tais características individuais,
[...] denotam qualidade de vida e determinam a posição social do
indivíduo. Trata-se da ocupação, do sexo, da renda, da instrução, da
situação de domicílio, da etnia. Os grupos sociais formados segundo
diferentes categorias destas variáveis são submetidos à riscos de
morte diferenciais. (CASTIGLIONI, 1994, p.3)
Em nível coletivo, Castiglioni (1994, p.4) categoriza a influencia
socioeconômica, cultural e ambiental ―[...] sobre o comportamento da
população com relação à mortalidade‖. Destacando-se que:
[...] Os fatores que compõem este grupo são responsáveis pelas
diferenças dos níveis e da composição da mortalidade entre regiões,
26
No Brasil, é importante destacar que a questão raça/cor está fortemente associada a ambos
aspectos (individual e contextual).
35
classes sociais, etnias, como também pelas variações do fenômeno
no decorrer do tempo. (CASTIGLIONI, 1994, p.4)
Acredita-se assim que esta variação contextual em função de fatores
sociais, socioeconômicos, demográficos (PRATA, 1992) possibilitaria a
realização de inferências sociais e territoriais, a partir da observação da própria
dinâmica dos índices de mortalidade. De acordo com Drumond Jr e Barros
(1999):
[...] as análises da mortalidade, referenciadas no espaço e
relacionadas a dados sociais, dão contribuições importantes para o
conhecimento das determinações dos perfis e taxas encontrados. [...]
(DRUMOND JR; BARROS, 1999, p.37)
Para Santos e Noronha (2001) há relação direta entre os diferentes
lugares, o perfil dos sujeitos vitimados, os grupos de doenças causadoras e os
padrões espaciais apresentados – variações espaciais estas influenciadas por
situações históricas, ambientais e sociais. Todavia, há que se ressaltar,
conforme pontua Beajeau-Garnier (1980) e Carvalho, Sawyer e Rodrigues
(1998), os índices de mortalidade27: a) apenas são passíveis de serem
correlacionadas populações que possuem estruturas etárias similares; b) os
índices de mortalidade são fortemente influenciados pelo número de pessoas
idosas e pelo número de crianças, sendo a primeira a que mais influencia nos
índices de mortalidade geral; c) historicamente, regiões menos desenvolvidas
socioeconomicamente apresentam elevados índices de mortalidade no primeiro
ano do nascimento. Tais pesquisadores demarcam a necessidade de sempre
que analisados os índices de mortalidade sejam correlacionados outros
indicadores que possibilitem o maior nível de detalhamento possível que
corrobore com a proposta e escala de análise optada pelo pesquisador. Pois
conforme pontua Damiani (2002):
Mesmo prescindindo de variações sociais, nos países onde
prevalecem camadas mais jovens da população, esses índices têm
significado bastante diferente. Uma maior população jovem significa
uma inflexão para baixo das taxas de mortalidade, frente a países
onde a população mais velha prevalece. (DAMIANI, 2002, p.30)
27
As considerações a e b referem-se especificamente aos resultados obtidos pelo cálculo da
Taxa Bruta de Mortalidade (TBM). Esta que, por ser uma medida ponderada, pode ser
fortemente influenciada pela presença de idosos ou de crianças, com maior possibilidade de
influencia dos idosos, devido às maiores riscos de virem a óbitos resultantes da
degeneração/envelhecimento natural do organismo. Uma região com um elevado número de
idosos, por exemplo, mesmo com boas condições de vida, pode apresentar elevadas TBM‘s,
simplesmente pelo maior risco do grupo etário, se comparado aos demais.
36
Assim, reservados os devidos cuidados nas inferências, tais índices
têm colaborado significativamente para o debate sobre avanços qualitativos
nas condições de vida de determinadas populações, bem como evidenciado a
persistência de mazelas em diferentes grupos analisados.
Prata (1992) ao retratar o processo de transição nas causas de mortes
no Brasil, deixa explicito o forte cunho social que o contexto brasileiro tem
revelado, a exemplo de outros países, em seus tipos e causas de óbitos.
Neste, observa-se pistas do que Damiani (2002, p.33) tinha como objetivo
explicitar ao afirmar que ―[...] a mortalidade é diferencial e atinge especialmente
os pobres‖. Em 1985, enquanto as regiões Sul e Sudeste estavam quase
completando
a
Transição
Epidemiológica,
Norte
e
Nordeste
ainda
encontravam-se na etapa inicial, sendo que nestes locais, milhares de pessoas
morriam por doenças infecciosas.
Em recente estudo realizado, Faria (2016) discutiu as variações
espaciais e as desigualdades territoriais em função dos indicadores de
mortalidade infantil do Brasil. O autor investigou todos os óbitos infantis
ocorridos no ano de 2012 e 2013 no país, que estão registrados nos sistemas
oficiais de registros de mortalidade. Os resultados indicaram ―[...] persistentes e
enormes disparidades territoriais na distribuição [...]‖ (FARIA, 2016, p.607) dos
coeficientes de mortalidade infantil, com mínimos e máximos variando entre
8,1‰ e 34‰. Para o estudioso, é possível apontar que as localidades do país
onde residem os mais pobres – com destaque para áreas do nordeste e norte e que possuem péssimas condições sanitárias, tem registrado maior incidência
de mortalidade infantil.
O IBGE (2015), ao verificar as mortes das crianças com até um ano de
idade para mil nascidas vidas (Taxa de Mortalidade Infantil) ocorridas em 2014,
concluiu que apesar de apresentar avanços na redução, o Brasil ainda tem
vivenciado importantes desigualdades regionais. O instituto apontou que:
[...] desigualdades regionais podiam ainda ser observadas neste
indicador: Regiões Norte (18,6), Nordeste (18,4) e Centro-Oeste
(15,2) com valores acima ao da média nacional, enquanto, Sudeste
(11,1) e Sul (10,1) apresentavam valores inferiores. Os valores
extremos, em 2014, na estimativa da taxa de mortalidade infantil
foram observados no Amapá (23,7 mortes por mil nascidos vivos) e
no Espírito Santo (9,6) (IBGE, 2015, p.20)
37
O país, de modo geral, tem diminuído as taxas de mortalidade e
elevado a expectativa de vida da população (IBGE, 2015). No entanto,quando
analisados alguns grupos de causas, verifica-se que mesmo com indicativos de
tendência de redução, ainda persistem desafios aos planejadores sociais em
razão da forte atuação destes, principalmente na faixa etária adulta da
população. Os óbitos por causas externas (violentas), por exemplo, ainda tem
influenciado de modo incisivo a elevação do número de mortes no Brasil, em
especial entre a população jovem e adulta (15 aos 59 anos) (CASTIGLIONI,
2011; IBGE, 2015) e tem explicitado relevantes diferenciais.
Paim et al. (1999) ao investigarem a distribuição dos indicadores de
mortalidade por causas externas no município de Salvador, referente ao ano de
1991, constataram que o principal tipo de morte violenta era os homicídios, e
que estes atingiam especificamente a população jovem de áreas mais pobres.
Enquanto áreas mais nobres do município apresentaram 38,7 mortes por
100.000 habitantes, às menos favorecidas socioeconomicamente tiveram
coeficientes superiores a 100 óbitos. Este estudo também revelou que os
grupos etários mais sensíveis a este tipo de violência em Salvador, já naquele
período, eram os jovens de 15 a 19 anos e os idosos acima de 65. Silva, Paim
e Costa (1999) identificaram, neste mesmo ano, que havia certa relação
estatística entre a posição do indivíduo e do grupo de indivíduos na
determinação das condições materiais de existência.
Silva, Paim e Costa (1999) e Paim et al. (1999) revelaram relevantes
informações sobre a realidade do município de Salvador na última década do
século XX. De acordo com Paim et al. (1999), o município apresentava, em
1991, índices de mortalidade por causa violenta acima dos evidenciados em
regiões que tem sofrido com ‗guerras civis‘. Os autores ressaltam a
necessidade de implementação de políticas públicas e ações programáticas
que também tenham como orientação o espaço social dos sujeitos.
Fato semelhante foi identificado por Paes-Sousa (2002). Nesta
investigação, o autor revelou que o número de homicídios decrescia na medida
em que aumentava a escolaridade do chefe do núcleo familiar, revelando fortes
relações com aspectos sociais e socioeconômicos dos centros urbanos.
Regiões com maiores índices de escolaridade e condições de vida
38
apresentaram um padrão avançado nas causas dos óbitos (doenças
cardiovasculares e neoplasias, por exemplo), as regiões com índices menores
revelavam causas com forte cunho social (homicídios e doenças infecciosas).
Ao investigarem a mortalidade de adultos no município de São Paulo,
entre os anos de 1990 e 1992, Drumond Jr e Barros (1999) apontaram que os
valores de índices de mortalidade mais elevados foram encontrados nas
regiões com as piores condições de vida. Para tais investigadores, estes
resultados revelam a existência de prejuízos dos grupos sociais residentes nas
áreas menos atendidas pelas políticas públicas, no caso específico, as áreas
onde residem os populares com piores indicadores de renda. Enquanto a
população adulta, com melhores condições socioambientais, de São Paulo
morre principalmente por doenças, os estratos mais pobres morrem por
homicídios (DRUMOND JR e BARROS, 1999), revelando significativa
correlação entre os padrões cotidianos de vida e a fragilidade às determinadas
mortes com conotação social.
Castiglioni (2011), numa pesquisa que objetivou analisar a composição
da mortalidade por grupos de causas no Espírito Santo no ano de 2010
segundo sexo e idade, explicitou dentre outras conclusões, que o estado,
apesar de registrar importantes melhoras nas condições de vida, tem
apresentado elevação nas mortes por causas violentas especialmente entre
jovens do sexo masculino, apontando para uma maior sobrevida das mulheres.
Dados do IBGE (2015) corroboram com tais conclusões e informam que as
mulheres do estado apresentaram no ano de 2014 a maior expectativa de
sobrevida após os 60 anos – 25,6 anos – dentre todas as demais unidades
federativas (IBGE, 2015). Contudo, os jovens negros do sexo masculino têm
sido alvos de modo muito intenso na população capixaba, sendo estes
vitimados de modo mais incisivo pelos homicídios, em sua maioria, moradores
de comunidades mais pobres (ZANOTELLI et al, 2011; WAISELFISZ, 2012;
WEISELFISZ, 2015).
Outro eixo de estudos da mortalidade que tem se fortalecido no Brasil,
a exemplo do que já ocorria em países como Estados Unidos e Inglaterra são
análises de tais informações utilizando-se as variáveis raça/cor (CHOR; LIMA,
2005).
39
Pesquisas analisadas por Drumond Jr e Barros (1999) apontam que os
Estados Unidos apresentavam em 1989, coeficientes de mortalidade que
indicavam que negros lideravam 13 das 15 causas de mortes no país. Ao
ajustar os resultados para averiguar os efeitos do nível educacional e
ocupacional, inferiram que a classe social do grupo étnico estava diretamente
relacionada às diferenças de mortalidade encontradas.
No Brasil, pesquisas que abordam sobre esta temática têm apontado
que há diferenças sociais segundo raça/cor e que estas têm impactado na
materialização de determinados padrões raciais e espaciais nos índices e perfis
de mortalidade (BATISTA; ESCUDER; PEREIRA, 2004; CHOR; LIMA, 2005;
FIORIO et al., 2011; WAISELFISZ, 2012). No entanto, conforme destaca Chor
e Lima (2005) e Waiselfisz (2012), a produção de investigações com este viés
ainda são recentes.
As análises dos índices e taxas de mortalidade sob a ótica também dos
grupos étnico-raciais no Brasil tem apontado, ano após ano, tanto para a
existência de desigualdades nos tipos de óbitos quanto para a prevalência e
crescente aumento da vulnerabilidade, especialmente da população negra,
para mortes com forte influência de conflitos sociais (WEISELFISZ, 2012;
WEISELFISZ, 2015; CARDOSO; SANTOS; COIMBRA JR, 2005; ARAUJO et
al., 2009). Deste modo, antes de explicitar tais literaturas, faz-se relevante,
compreender e analisar sobre a histórica e atual situação da população negra
no Brasil.
1.3.1 A situação sociorracial da população negra no contexto brasileiro
Nos últimos anos tem sido cada vez mais defendida a tese de que o
pertencimento racial, no contexto brasileiro, tem historicamente determinado o
acondicionamento de determinada parcela da população à situação de
desigualdades
socioeconômicas,
culturais
e
territoriais
(RIBEIRO,
RODRIGUES; CORREA, 2009; CAMPOS, 2012). Tal fato ocorreria devido ao
próprio processo de formação e constituição do território nacional brasileiro, no
qual as relações raciais histórico-cotidianas estabelecidas refletem ainda na
atualidade, mesmo que simbolicamente, concepções racialistas introjetadas no
imaginário social do povo brasileiro que tem culminado na reprodução de
40
práticas racistas e de problemas sociais de determinados grupos (SANTOS
2016).
Campos (2012) revela indícios do que teria intensificado a exclusão
social do negro no Brasil no pós abolição. De acordo com o autor, o processo
de inserção dos negros à cidadania passava pela legitimação territorial. Isso,
pois, a maioria dos benefícios políticos era em função dos bens que o indivíduo
possuía. Todavia, o autor relata que foram adotadas uma série de políticas
governamentais, impulsionadas pelos interesses ideológicos da elite branca
brasileira, que impediram o negro de ter legalmente acesso à posse de terras
na zona rural. Em consequência disso, afirma ainda o autor, muitos foram
forçados a ir para os centros urbanos. No entanto, nas cidades, tal processo foi
agravado. Agora, além de não possuírem propriedades nem direito de
participação política de modo igualitário, foram alocados nos postos de trabalho
mais precários, recebendo as piores remunerações, restando a estes apenas
ocupar os territórios menos favorecidos dos centros urbanos ao passo que
também vivenciavam cotidianas violações de direitos por parte da força policial
(CAMPOS, 2012). Todo este processo enraizado visando à construção de uma
sociedade brasileira branca, baseada nos padrões europeus, que envolvia
suprimir política, econômica e culturalmente a população ―recém-liberta‖:
[...] A busca de tal nação homogênea tinha como pressuposto a
construção de um país onde os padrões da cultura européia fossem
levados às últimas consequências. E o negro, bem da verdade, não
fazia parte desse projeto. (CAMPOS, 2012, p.45)
Ribeiro, Rodrigues e Correa (2009) ao investigarem desigualdades nas
relações sociais, segundo grupos étnico-raciais e associá-las a diferentes
regiões urbanas, afirmam ter encontrado indícios empíricos que permitem
correlacionar a discussão entre as desigualdades raciais e a hierarquia social
dos espaços metropolitanos, em que o bem-estar urbano evidenciou
desvantagem maior sobre pretos do que sobre os brancos. (RIBEIRO,
RODRIGUES E CORREA, 2009).
Neste sentido, Santos (2016), ao analisar as contribuições de Carlos
Hasenbalg e Nelson Valle Silva, afirma que:
Para Hasenbalg e Silva existem barreiras de ordem racial à
mobilidade social dos negros e que a discriminação não evidencia
estar enfraquecendo, mas ajudando a perpetuar a desigualdade
41
racial, que, por sua vez, apresenta grande estabilidade nas relações
raciais. [...] (SANTOS, 2016, p.218)
A reprodução do preconceito e da discriminação racial tem sido
evidenciada, tendo como consequências à ausência da população negra28 nas
variadas esferas de poder (SANTOS, 2016). Tal grupo tem sido representado
principalmente nas posições e ocasiões de desvantagem em relação à
população branca como: ser maioria entre a população mais pobre; ocupar as
áreas com menor qualidade de vida; ser as principais vítimas das mortes
violentas; ocupar as mais precárias condições de trabalho (HENRIQUES, 2001;
RIBEIRO, RODRIGUES E CORREA, 2009; CAMPOS, 2012; DURANS, 2014;
IPEA, 2014; BRASIL, 2014).
Faz-se assim, necessário uma breve explicitação dos dados oficiais
registrados sobre este estrato da população brasileira, haja vista que, a
imersão social de um grupo contribui nas explicações acerca das condições de
vida e de bem-estar do qual o mesmo desfruta (DAMIANI, 2002; SANTOS;
NORONHA, 2001; SANTOS, 2016). A literatura tem apontado para a existência
de profundas diferenças entre a população branca e a negra, nos diferentes
aspectos socioeconômicos, territoriais e culturais.
Os estudos que analisam desigualdades entre grupos étnico-raciais29
no Brasil foram iniciados em meados dos anos de 1950, tendo suas origens e
motivações, nos relatórios da UNESCO30. Tais documentos começaram a ser
produzidos com o intuito de refutar empiricamente as idéias racistas,
reforçadas no período do nazismo. Neste processo, o Brasil teria papel
importante, posto que naquele período ainda era difundido o mito da
democracia racial31 brasileira. Todavia, Santos (2016) narra que, conforme
destaca Hasenbalg, teve-se já nos resultados destas pesquisas, uma forte
associação entre cor ou raça e o status socioeconômico, que pôde também ser
verificada em pesquisas posteriores, principalmente em meados de 1970. Tal
fato, ainda se pode verificar em relatórios produzidos recentemente
28
População autodeclarada preta e parda.
Raça categorial social e não biológica.
30
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
31
Idéia de que todas as raças/etnias convivem em plena harmonia no Brasil, gozando
igualmente das mesmas oportunidades e desafios no cotidiano das relações sociorraciais.
(SANTOS, 2016)
29
42
(HENRIQUE, 2001; BRASIL, 2014; IPEA, 2014; IJSN, 2017b)
Henriques (2001) assevera que:
A intensa desigualdade racial brasileira, associada a formas
usualmente sutis de discriminação racial, impede o desenvolvimento
das potencialidades e o progresso social da população negra. O
entendimento dos contornos econômicos e sociais da desigualdade
entre brasileiros brancos e brasileiros afro-descendentes apresentase como elemento central para se construir uma sociedade
democrática, socialmente justa e economicamente eficiente.
(HENRIQUES, 2001, p.2)
O estudo de Henriques (2001), que objetivou analisar a amplitude e a
evolução das possíveis desigualdades entre brancos e negros na última
década do século XX, identifica que a população pobre representava 63%. A
partir da análise de vários indicadores socioeconômicos, identificou em suas
inspeções que a pigmentação da pele estava demonstrando associação direta
com condições de vida. Os dados analisados apontaram que 61,2% da
população negra, na década de 1990, eram pobres. Com isso, segundo o
autor, é possível concluir que: ―[...] nascer de cor parda ou de cor preta
aumenta de forma significativa a probabilidade de um brasileiro ser pobre.‖
(HENRIQUES, 2001, p. 11).
Durans (2014), ao analisar relatórios oficiais, destaca que:
Segundo o IPEA (2008) existem 16,2 milhões de brasileiros (8,5%)
que sobrevivem com menos de 70,00/mês. Desses 8,5%, 70,8% são
negros. 63% da população que vive abaixo da linha de pobreza é
negra e o mesmo ocorre com a condição racial dos 70% que vivem
abaixo da linha de indigência. A pesquisa do IBGE de 2010 mostra
que a média salarial dos brancos é de R$ 1.538,00, dos pardos R$
845,00, dos negros [pretos] R$ 834,00 e dos indígenas é de R$
735,00. (DURANS, 2014, p.393)
Ribeiro, Rodrigues e Correa (2009) sinalizam que a existência de
mecanismos velados de discriminação racial no mercado de trabalho tem
contribuído no fato de a população preta e parda ocupar as piores condições
de trabalho, tendo como consequência, o acondicionamento desta população
nas regiões menos favorecidas, com piores condições de vida. Haja vista,
segundo os autores, que tal fato impacta diretamente no acesso à renda, que
por sua vez, condiciona a possibilidade de aquisição de determinados padrões
de imóveis nas diferentes regiões da cidade. Os resultados da investigação dos
autores apontam que os grandes centros urbanos brasileiros revelaram forte
tendência de, a depender do estrato do grupo social, ocupar posições
43
territorialmente inferiores as com as piores condições de vida, corroborando
assim, com o processo de reificação do espaço social (BOURDIEU, 2013). No
que se refere especificamente ao atraso escolar, os autores apontam ter
encontrado efeitos significativos do território, local de residência dos populares,
na condição de maior tendência a ter atraso escolar:
[...] para as duas categorias de cor. Sendo que o mais alto deles foi
de Maringá com um risco de atraso escolar de 2,22 vezes para
crianças pretas em relação a brancas. Considerando as crianças
pardas, o maior risco [de atraso] foi encontrado em Florianópolis
onde, conforme dito anteriormente, o risco de evasão escolar para
crianças pardas é maior do que para crianças pretas. (RIBEIRO,
RODRIGUES; CORREA, 2009, p.52)
Entre os anos de 2004 e 2014, apesar de elevar a proporção de
pessoas que concluíram o ensino médio, verifica-se que o atraso escolar tem
ocorrido principalmente entre jovens negros, que mesmo elevando as taxas, o
pico alcançando em 2014 foi abaixo dos jovens brancos em 2004 (Brancos:
57,9% em 2004 para 71,7% em 2014; Pretos ou pardos: 33,4% em 2004 para
52,6% em 2014) (IBGE, 2015). No Espírito Santo, 80% dos jovens fora da
escola são pretos e pardos (IJSN, 2017a).
De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), no
ano de 2012, o máximo de remuneração atingida pelos negros foi 62,9%
inferior à dos brancos, como foi o caso de rendimentos provenientes de um
emprego fixo. O Instituto destaca que há redução da desigualdade entre raças,
com sensível aumento da renda. No entanto, negros ainda enfrentam
desvantagem tanto no que se refere à ocupação, quanto à remuneração,
refletindo, para segundo o IPEA (2014, p.26), ―os efeitos do racismo32 e da
discriminação nas condições de inserção.‖.
O Relatório Relação Anual de Informações Sociais de 201433 elaborado
pela Secretária de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho e
Emprego (BRASIL, 2014), revela resultados que merecem atenção por parte
dos órgãos e especialistas que debatem a promoção de políticas públicas.
32
Também conhecido como preconceito racial, o racismo ―[...] pode ser entendido como uma
forma de pensar os negros tendo como princípio ideias apriorísticas que lhes atribuem
qualidades negativas. [...]‖ (MACIEL, 2016, p.168). Tais idéias ancoram-se em teorias que
afirmam existir diferenças de superioridade ou inferioridade entre raças humanas.
33
Trata-se de é ―[...] um registro administrativo e constitui uma das principais fontes de
informações sobre o mercado de trabalho formal brasileiro, que permite o acompanhamento e
a caracterização do emprego formal.‖ (BRASIL, 2014, p.3)
44
Apesar de sinalizar uma pequena diminuição das diferenças na remuneração
média dos brancos em relação aos negros (2013:70,13%; 2014: 69,58%), o
estudo apontou que quanto maior o nível de escolaridade, maiores têm sido as
disparidades entre as remunerações (82,8134 – ensino superior incompleto;
67,58 – ensino superior completo). Nota-se assim que quanto mais elevada à
concentração de melanina, mesmo quando graduados, menor é o salário
médio (branco: R$ 5.589,25; pardo: R$ 4.044,09; preto: R$ 3.777,39;),
representando superioridade 47% a mais dos brancos em relação aos
rendimentos que os negros auferem. Os dados revelaram ainda que:
Os rendimentos médios dos vínculos empregatícios declarados como
Branco registraram ganho real de 2,21%, superior aos trabalhadores
Pardos (1,21%) e Negros/Pretos (1,41%). Os rendimentos médios
dos trabalhadores classificados como Negro/Preto representam
69,58% em 2014, ante 70,13% em 2013, daqueles auferidos pelos
Brancos. Já os rendimentos dos Pardos correspondem a 70,69% dos
recebidos pelos Brancos. (BRASIL, 2014, p.20)
À população preta e parda restam, conforme se observa nos dados do
IBGE (2015), ocupar empregos informais, que em sua maioria possuem
péssimas condições de trabalho e baixa remuneração.
O percentual de trabalhadores ocupados em trabalhos informais tem
se reduzido nos últimos anos; no entanto, a lacuna da taxa entre
brancos e pretos e pardos praticamente não se alterou na década.
Em 2004, o percentual de brancos em trabalhos informais era 47,0%,
enquanto entre os pretos ou pardos o percentual era 62,7%. Em
2014, esses percentuais reduziram em 11,7 e 14,3 pontos
percentuais, respectivamente; mas revela que parcela expressiva da
população preta ou parda ainda está em trabalhos informais (48,4%)
(IBGE, 2015, p.71)
Este processo de desigualdade sociorracial tem condicionado,
conforme se pode observar nos resultados mencionados, num processo de
manutenção da estratificação social, também com forte determinação dos
aspectos raciais. Conforme se nota no IBGE (2015), mais de 70% entre 10%
mais pobres da população brasileira eram pretos ou pardos (Gráfico 2).
34
A cada 100 reais recebidos pelos brancos, os negros receberam em média 82,81 reais.
45
Gráfico 2 - Distribuição das pessoas de 10 anos ou mais de idade com rendimento entre
os 10% com menores rendimentos e o 1% com maiores rendimentos, por cor ou raça
Brasil - 2004/2014
Fonte: IBGE,2015,p.90
Revelando assim, que a questão racial tem operado aos moldes do que
ressalta Santos (2016) no processo de manutenção, ano pós ano, dos
privilégios concretos e simbólicos. Uma das conseqüências diretas de tais
desigualdades são as disparidades territoriais, que podem ser verificadas no
fato da população negra ocupar essencialmente os espaços mais vulneráveis,
como se observa no estudo de Zanotelli et al (2011). As disparidades
socioeconômicas com forte orientação racial existente no Brasil (IPEA, 2014),
acabam por condicionar tais grupos a ocuparem em sua maioria, regiões
menos favorecidas das cidades, as comunidades populares, onde o poder
público ainda tem atuado pouco no fornecimento de bens e serviços como
educação, saúde, saneamento básico. Indicando que no processo de reificação
do espaço físico e social brasileiro, pretos e pardos tem ocupado os espaços
mais precários.
Numa sociedade onde a lógica do acesso aos bens e serviços
relacionados às condições de vida (moradia, saúde, segurança, cuidados com
a saúde, por exemplo) é fortemente mediada pelo poder de consumo dos
indivíduos, a presença dos diferentes grupos étnico-raciais, por exemplo, nos
principais postos de trabalho com melhores remunerações coloca-se como de
extrema relevância. Tal fato coaduna com a tese de Santos (2016), que
reafirma a necessidade e pertinência de se repensar no âmbito das relações
econômicas e sociais, as questões sociorraciais.
46
1.3.1.1 Desigualdades subjacentes à mortalidade por raça/cor no Brasil
As desigualdades evidenciadas nos índices de mortalidade do Brasil
têm desvelado, aos moldes do que pontua Damiani (2002) forte incidência
entre a população mais pobre (DRUMOND JR; BARROS, 1999; PAESSOUSA,
2002;
SOARES,
2004).
Quando
observados
por
grupos,
especificamente por raça/cor, nota-se que a população negra (pretos e pardos)
tem sido as principais vítimas nos diferentes cenários analisados. Os estudos
têm apontado como causa de tais diferenciais o histórico de formação do
próprio país, marcado por relações sociais e raciais assimétricas35 entre
brancos e negros (CHOR; LIMA, 2005; ARAUJO et al., 2009).
Batista, Escuder e Pereira (2004) averiguaram, no Estado de São
Paulo, se raça/cor condiciona padrões característicos de óbito. O estudo
apontou que enquanto brancos foram vitimados principalmente em razão de
neoplasias e doenças do aparelho circulatório, pretos e pardos morreram por
causas externas e doenças infecciosas. Foi encontrada associação entre
causas de óbito e raça/cor, concluindo que o tipo de morte em São Paulo tem
cor:
[...] há uma morte branca que tem como causa as doenças, as quais,
embora de diferentes tipos, não são mais que doenças. Há uma
morte negra que não tem causa em doenças: são as causas
externas, complicações de gravidez e parto, os transtornos mentais e
as causas mal definidas. (BATISTA; ESCUDER; PEREIRA, 2004,
p.630, grifo nosso)
O estudo de Chor e Lima (2005), ao discutir sobre aspectos
epidemiológicos evidenciados nas desigualdades raciais em saúde no Brasil,
apontou que entre 1996 e 2001 jovens pardos e pretos, entre 15 e 29 anos,
tiveram valores duas vezes maiores de taxas de mortalidade por agressões,
que os brancos, sendo estas (Pardos: 136; Pretos: 111; Brancos: 72 por 100
mil habitantes). De acordo ainda com as autoras, mulheres pretas (115 óbitos
por 100 mil) entre 40 e 69 anos de idade apresentaram índice duas vezes
maior por doenças cerebrovasculares (Ex: Acidente Vascular Cerebral - AVC)
que as brancas (58 por 100 mil) e pardas (54 por 100 mil).
Dados divulgados pela equipe de comunicação do sétimo Congresso
35
O racismo e a escravidão foram desigualdades historicamente produzidas e socialmente
mantidas.
47
Brasileiro de Pesquisadores(as) Negros(as) (SANTANA, 2012) indicam que de
1990 para 2011 os registros do Ministério da Saúde evidenciaram uma redução
de 51,4%nas mortes maternas no pós parto (140 em 1990 para 68 óbitos por
mil nascidos vivos em 2011). No entanto, quando analisadas segundos as
categorias raciais, Santana (2012) ressalta que a chance de uma mulher negra
morrer em 2011 por causas relacionadas à gravidez, parto e pós-parto era 1,8
vezes maior em comparação as mulheres brancas, revelando situação ainda
pior para as mulheres indígenas. A publicação afirma ainda que de 1999 a
2004, as mortes por HIV/AIDS vitimaram com maior incidência, homens e
mulheres negras. Enquanto os homens negros tiveram 4,9%, os homens
brancos somaram 0,2%. Já as mulheres negras alcançaram crescimento anual
de 6,4%, representando quase o dobro da ascensão entre as brancas, que
totalizaram 3,8%.
Analisando a mortalidade por causa básica, sexo e raça/cor, no
município de Vitória-ES entre 2003 e 2006, Fiorio et al. (2011) verificaram em
seus resultados que o maior risco relativo de óbito entre negros foram:
transtornos mentais e comportamentais, causas mal definidas36 e causas
externas. Segundo os mesmos, indivíduos pretos e pardos morreram mais
cedo que a população branca na maioria das causas investigadas. Os
pesquisadores indicam em suas conclusões que tal fato pode estar ocorrendo
devido a acesso desigual aos serviços e bens de saúde, estando, nas palavras
dos mesmos, atreladas a lugares diferenciados na sociedade ocupados pelos
grupos raça/cor.
Wieselfisz (2012) ao analisar homicídios que ocorreram no Brasil na
primeira década do século XXI, aponta que:
[...] a vitimização negra na população total, que em 2002 era 65,4 –
morriam assassinados, proporcionalmente, 65,4% mais negros que
brancos, no ano de 2010 pulou para 132,3% – proporcionalmente,
morrem vítimas de homicídio 132,3% mais negros que brancos.
(WEISELFISZ, 2012, p. 38)
No Espírito Santo, em 2000, a população preta e parda representava
36
―Os óbitos por causas mal definidas correspondem ao Capítulo XVIII da CID-10: "Sintomas,
Sinais e Achados Anormais de Exames Clínicos e de Laboratório Não Classificados em Outra
Parte" (códigos R00-R99).‖ Disponível em <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2000/fqc08.htm>
Acesso: 08 out. 2017.
48
50,2% e a branca 48,8%. Apesar disso, ao averiguar o percentual de
homicídios por raça, Zanotelli et al. (2011), observaram-se que os grupos
pardos e pretos eram quatro vezes mais vitimados por estes crimes que os
brancos (pretos e pardos: 76,7%; brancos: 18,7%). Tais percentuais mostramse mais acentuados nos municípios de Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica e
Linhares. Na evolução observada entre os anos de 1997 e 2005,
[...] a população negra e parda sempre representa mais de 50% dos
homicídios dos maiores e mais populosos municípios do Espírito
Santo. Na maior parte dos municípios, mesmo no sul, onde a maioria
da população é branca, houve um volume elevado de homicídios de
negros e pardos, superior a 50% do total. [...] (ZANOTELLI et al.,
2011, p.126)
Weiselfisz (2015) revela que, entre 2003 e 2014, enquanto o número
de homicídios no Brasil reduziu 26,1% entre a população branca, a população
negra vivenciou um aumento de 46,9%. O destaque no ano de 2014 foi o
encontrado no estado de Alagoas:
[...] em Alagoas, em 2014, foram assassinados60 brancos e 1.702
negros! Taxas de 6,4 HAF brancos para 71,7 negros [pretos e
pardos].Vitimização negra neste estado: 1.028,2% (morrem
assassinados,proporcionalmente, acima de 11 negros por cada
branco). (WEISELFISZ, 2015, p.60, grifo nosso)
Entre 1998 e 2003, Araujo et al. (2009) já apontavam cenário similar no
município de Salvador, ao afirmar que a população tem sido potencial vitima de
mortes por causas externas, destacando que entre os homicídios, tal fato tem
sido ainda mais alarmante.
[...] a população negra deste município é somente três vezes maior
que a de brancos, por outro lado o número de anos de vida perdidos
pelos primeiros foi mais que 30 vezes superior. Além disso,
comparados aos brancos, a população de pretos – 11,4% menor –,
perdeu mais que o dobro (2,6 vezes) do número de anos potenciais
de vida. (ARAUJO et al., 2009, p.410)
O estudo de Campos (2012) auxilia na compreensão da dinâmica
presente em regiões socioeconomicamente mais vulneráveis. O autor discutiu
sobre as estratégias de sobrevivência dos grupos segregados espacial e
economicamente na Cidade do Rio de Janeiro para inserção na sociedade.
Seu estudo demonstrou, ao analisar os antigos quilombos periféricos e as
favelas atuais, que tais regiões tem sido socioeconomicamente abandonadas
pelo poder público no que se refere às melhorias nas condições de vida, e que
o Estado tem historicamente coadunado com ações que apenas reforçam a
49
estigmatização de tais territórios, sobretudo a discriminação étnica, uma vez
que, conforme pontua o autor, tais regiões são majoritariamente ocupadas por
afrodescententes37. Tendo entre as conseqüências a chamada ‗guerra às
drogas‘(conflitos ocorridos em razão da legislação, que, proíbe o comércio de
algumas substâncias - maconha, cocaína, por exemplo) que tem resultado em
elevados índices de mortalidade em tais regiões, em sua maioria, negros
(WEISELFISZ, 2012). Tal fato ajuda a pensar fenômenos como identificado por
Paes-Sousa (2002) no município de Belo Horizonte, em que as áreas mais
pobres do município vivenciavam já em 1994, comportamento ascendente nos
índices de homicídios contra a população, em especial os mais jovens, como
também verificada no Espírito Santo (RIBEIRO JÚNIOR, 2012).
Apesar da abordagem das desigualdades sociais na mortalidade
apresentarem-se como de significativa importância para se pensar políticas
públicas específicas para os diferentes estratos sociais, raciais e/ou espaciais,
Weiselfisz (2012) e Chor e Lima (2005) destacam que, no Brasil, as pesquisas
ainda são recentes e pouco realizadas. Se por um lado, como afirma Weiselfisz
(2012), esta baixa produção estaria relacionada ao fato dos registros e
informação especifica serem recentes, sendo publicamente disponibilizados a
partir de 1995/1996, tem-se de outro, para Chor e Lima (2005), a influência
ainda presente no imaginário nacional, da existência de uma ‗democracia
racial‘ que pode ter sido influenciada no baixo interesse pela investigação
acadêmica.
De acordo com Weiselfisz (2012) a informação raça/cor foi inserida nos
registros a partir de 1995/1996, após intensos debates do Movimento Negro,
que defendia, dentre outros aspectos, a importância de se apurar oficialmente
quem estava morrendo, no que se refere à raça/cor. Tais discussões tecidas
pelo Movimento Negro se fortaleceram principalmente na segunda metade do
século XX.
Mesmo assim, é possível notar na literatura consultada que
37
Para o autor, a afrodescendencia diz respeito às escolhas de indivíduos singulares ou
coletivos de associarem-se em torno das questões étnico-raciais. Não estando somente
associado aos pretos, possibilitando incluir na perspectiva indivíduos que se auto-associei à
categoria. ―A constituição da identidade afrodescentente requer, sobretudo, o reconhecimento
da diferença como fator fundamental para que possam avançar as relações sociais no interior
da sociedade.‖ (CAMPOS, 2012, p.29)
50
determinados
padrões
de
mortes
tem
atingido
grupos
étnico-raciais
específicos, estando ainda diretamente relacionada com condições sociais
vivenciadas cotidianamente por estes grupos. A população negra (pretos e
pardos), como se pôde notar, tem ocupado as piores condições de vida e
morrido por causas com forte influência socioeconômica e sociorracial.
Enquanto brancos morrem por ‗morte morrida‘ (não são mais que doenças),
Batista, Escudes e Pereira (2004, p.635) pontuam que ―[...] a morte negra não é
um fim da vida, é uma vida desfeita [...]‖, interrompida cada vez mais cedo pela
violência (WEISELFISZ, 2012). Já os brancos, conforme aponta o estudo de
Fiorio et al. (2011), apresentam maiores probabilidades de viver mais e em
melhores condições.
Segundo a bibliografia, os estudos apresentados neste capítulo
evidenciaram a existência de desigualdades na mortalidade segundo algumas
variáveis como: sexo, raça, faixa etária, cultural e regional. A morte com forte
marca social no Brasil tem vitimado em especial, pessoas pobres, que residem
em regiões menos favorecidas economicamente, sendo em sua maioria pretas
e pardas. Tal fato sugere que o país tem reificado de modo significativo os
processos sociais-históricos, com importantes orientações espaciais e fortes
influencia das relações sociorraciais historicamente estabelecidas de modo
assimétrica.
Neste
cenário,
visualiza-se
na
ciência
geográfica
potenciais
possibilidades de contribuição nos debates sobre as variações existentes no
indicador mortalidade, destacando-se a contribuição a partir das distribuições
espaciais deste, que possibilitam entender e planejar ações
a partir do
conhecimento da desigualdade social dos diferentes espaços geográficos. A
seguir será realizada a apresentação da área estudada, dos materiais e
métodos adotados.
51
2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA
O Espírito Santo38 está localizado na região Sudeste do Brasil, tendo
os seguintes limites fronteiriços: ao norte com o estado da Bahia, ao sul com o
estado do Rio de Janeiro, a oeste com o estado de Minas Gerais e a leste com
o oceano Atlântico. O estado atingiu em 2016, segundo a estimativa do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, a marca de 3.973.697 habitantes,
distribuídos numa área total de 46.089.390 km². Tal área é atualmente dividida
em 78 municípios, tendo como capital o município de Vitória. A população do
estado distribui-se de modo desigual ao longo do território capixaba, e
concentra-se na faixa litorânea do estado, com destaque para a região
metropolitana.
[...] Sua região central demonstra uma grande concentração da
população (190 hab/km²), que por sua vez, está altamente
intensificada na região metropolitana (724 hab/km²), chegando a
expressiva marca de 3.328 hab/km² na capital. Com quadro
diferenciado, temos ao norte um vazio demográfico ( 36 hab/km²),
indicando a presença de grandes latifúndios na região. O sul possui
uma densidade demográfica de 63 hab/km².(ESPIRITO SANTO,
2012, p.14)
Em 2010 o estado do Espírito Santo possuía 3,5 milhões de habitantes.
Destes, 48,62% eram autodeclarados pardos, 42,15% brancos, 8,35% pretos,
0,62% amarelos e 0,26% indígena (FERRARI, 2011). Analisando a disposição
espacial de tais grupos ao longo dos municípios capixabas, verifica-se que este
tem sido reflexos do processo histórico de ocupação das terras capixabas
relatado por Saletto (2014), tendo forte influencia dos fluxos migratórios
ocorridos ao longo dos séculos anteriores (CASTIGLIONI, 2009). Faz-se assim,
relevante rememorar tal processo, no intuito de contextualizar e situar
geograficamente a territorialização de tais povos.
2.1 O processo de territorialização dos grupos étnico-raciais no estado do
Espírito Santo
Até a chegada dos colonizadores em 1535, o estado era ocupado
unicamente por povos indígenas. Nos dois primeiros séculos de história do
estado (XVI e XVII), os índios eram segundo Saletto (2014), a maioria da
população. Com o destaque do açúcar no cenário econômico nacional e
38
Ver mais sobre em <https://es.gov.br/es-em-dados> acesso em: 01 mar 2017.
52
internacional, o Espírito Santo passa por um processo de ascensão,
principalmente a região denominada na época como ‗baixo Itapemirim‘ –
atualmente denominado Cachoeiro de Itapemirim.Tal fato atraiu migrantes dos
estados vizinhos, Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro.
A
demanda
por
mão
de
obra
para
os
engenhos
aumenta
significativamente. Os povos africanos escravizados, que não eram destinados
inicialmente ao estado, devido a fatores como preço, por exemplo, passam a
partir do século dezessete, a serem trazidos e encaminhados aos engenhos na
região sul e norte do Espírito Santo39.A injeção em massa de mão de obra
escravizada africana foi massificada até meados de 1850. A partir do início do
século dezenove, a Inglaterra começou a pressionar os demais países a proibir
o tráfico de negros e uso de mão de obra escrava. Mesmo com o tráfico
‗proibido‘ no país, o ES foi um dos principais estados que receberam
massivamente escravos (1830-1850):
Nem mesmo a extinção do tráfico impediu que novamente o número
de cativos quase dobrasse até 1872, graças à expansão cafeeira e à
importação de escravos de outras províncias. O Espírito Santo era a
segunda província com a maior proporção de escravos na
população— 1 para 2,6 livres —, ultrapassada apenas pelo Rio de
Janeiro, com 1,6, enquanto a média nacional era de 5,5 habitantes
livres por escravo. Eles se concentravam principalmente no sul, a
região mais próspera, das grandes fazendas de café, onde
constituíam 40% da população (em Cachoeiro de Itapemirim, 50%). O
sul reunia quase metade dos cativos da província (45%).
[...](SALETTO, 2014, p.41)
A abolição da escravatura do Brasil, ocorrida em 1888, começou uma
série de debates entre a elite branca dominante do país sobre como seria
substituída a mão de obra e ocupados os locais de trabalho. Influenciados
fortemente pelas teorias racistas que atrelavam à população negra a
delinqüência, a má qualidade e falta de conhecimento no manejo das lavouras
de café, inicia-se um processo de importação em massa do que o estado
denominava como sendo ‗mão de obra especializada‘ que seria capaz de
assumir os postos de trabalho e conduzir, por exemplo, os cafezais, garantindo
39
Saletto (2014a) ressalta que a chegada da mão de obra escrava no ES apenas chega de
modo intenso a partir deste momento, pois eram muito caros e o estado tentou escravizar os
indígenas. Todavia, devido ao vasto conhecimento do território (FERREIRA, 2010), estes se
tornaram economicamente menos viáveis que a mão de obra oriunda dos povos africanos.
Aliás, estes foram trazidos inicialmente no país para trabalhar nos engenhos de Pernambuco e
Bahia e posteriormente foram destinados a outras regiões, como o Espírito Santo.
53
assim o futuro do país (CAMPOS, 2012; BENTO, 2012; SANTOS, 2016). Nas
entrelinhas destes debates, segundo Santos (2016), havia o medo de que os
‗recém libertos‘ promovessem uma revolução no país e ascendessem ao
poder, conforme havia ocorrido no Haiti em meados do fim do século XVII e
início do século dezoito. Uma vez que os povos pretos e pardos – ditos ‗de cor‘eram maioria no país.
[...] a mestiçagem e as alforrias e fugas haviam dado origem a uma
população negra e mestiça livre mais numerosa que a branca;
segundo o recenseamento de 1872, 46% dos livres eram pretos e
pardos contra 45% brancos [...] (SALETTO, 2014, p.41)
A política de branqueamento objetivou estimular a migração em massa
de europeus para o Brasil (BENTO, 2012). No Espírito Santo, provocou
significativas mudanças na composição dos grupos étnico-raciais – fruto da
intensificação da migração ocorrida principalmente a partir dos anos de 1870 e
1890. Saletto (2014) aponta que o censo de 1940 (tabela 1) revelou o impacto
da entrada em massa de migrantes, principalmente italianos, que representou
68,4% das pessoas que migraram para o Espirito Santo no período. 14% do
total de recém chegados ao estado eram oriundos da região nordeste
brasileira- especialmente Bahia, e das demais unidades federativas vizinhas Minas Gerais e Rio de Janeiro - que vieram em busca de áreas desocupadas.
Tabela 1 – Proporção de não brancos na população
LOCALIDADE
1872
1890
1940
1950
1960*
Brasil
61,9
56
35,8
37,5
DF, SP, SUL
48,7
38,2
16,3
15,8
Espírito Santo
67,6
57,9
38,4
41,3
39,1
Rio de Janeiro
61,3
57
39,9
39,8
Minas Gerais
53,3
59,4
38,6
41,4
* Em 1960 a cor só foi registrada em alguns estados. Fonte: Saletto (2014) apud Hasenbalg
(1979)
Enquanto aos europeus era proporcionado o acesso a terra40, à
população negra recém liberta, foi criada inúmeras estratégias burocráticas
com o intuído de dificultar o acesso à posse de propriedades. Todo este
conjunto de ações resulta da ideologia de branqueamento da população
brasileira, pensamento defendido pela elite branca brasileira, que objetivava
tornar o país ‗branco‘ – ou o mais branco possível - para assegurar o ‗futuro‘ da
40
No Espírito Santo, o estímulo a vinda dos migrantes contou com a facilitação ao acesso a
propriedade: ―[...] O governo gerou medidas que possibilitou os imigrantes [europeus] a
aquisição de pequenas e médias propriedades enquanto a cultura cafeeira agia como o
elemento propulsor da expansão do povoamento.‖ (CASTIGLIONI, 2009, p.94, grifo nosso).
54
nação, uma vez que as demais raças seriam inferiores a esta. Tal processo se
daria a partir da ‗importação‘ em massa de trabalhadores europeus –brancos –
para o Brasil. Nas entrelinhas, o que se pôde observar na literatura, é um
projeto de poder, baseado em teorizações racistas do século XVIII, que visava
à manutenção dos privilégios do grupo racial ‗branco‘ sobre os demais
(BENTO, 2012; SANTOS, 2016). O governo demarcava terras ocupadas pelos
quilombolas como devolutas e exigia documentos registrados em cartório que
atestassem a posse das terras (FERREIRA, 2010). Como impacto direto, podese observar o condicionamento da população negra a condições subalternas,
situação de vulnerabilidade e marginalidade social em seus diversos aspectos:
culturais, econômicos, sociais, sócio-espaciais (HASENBALG, 1979; CAMPOS,
2012).
No Espírito Santo, a população de migrantes alemã e italiana (branca)
se instalou ao longo de todo o século XIX e início do século XX nas áreas dos
cafezais, localizadas na região serrana, que abarcam municípios onde se
localizam as microrregiões: Central Serrana, Sudoeste Serrana, Litoral Sul,
Central Sul, Caparaó. Regiões estas que também foi o destino41 escolhido por
fazendeiros mineiros e fluminense fruto da expansão da zona cafeeira do vale
do Paraíba (SALETTO, 2014). A autora destaca ainda que devido ao
isolamento cultural, característico das comunidades alemãs, o processo de
miscigenação ocorreu de modo mais conservador (em 1940 correspondia
apenas 4% da população do estado). Saletto (2014) salienta que a
miscigenação entre migrantes brancos e não brancos ocorreu principalmente
com a população italiana.
Segundo censo de 1980:
Analisando a distribuição do grupo não branco no Espírito Santo,
vemos que se verificou uma concentração na região de Vitória,
refletindo o processo de urbanização, que foi intenso no período 6080, e o desenvolvimento acentuado da região. A Grande Vitória, que
em 1960 possuía 14% da população do Estado, passara a concentrar
35% dela, distribuídos da seguinte maneira: 48,5% brancos, 6,8%
pretos e 44,5% pardos. Os não brancos representavam, portanto,
mais da metade do total. A região reunia 1/3 dos pretos do Estado e
quase a metade dos pardos (44,5%). A região sul, que
tradicionalmente tivera a maior concentração de pretos, conservava
41
No Sul do estado houve a presença dos fazendeiros, enquanto as pequenas propriedades localizaram-se
nas montanhas.
55
23% deles, mas, ao contrário do que ocorria na maior parte do
Estado, sua população parda era pequena, correspondendo a 9% do
total estadual. Na região de São Mateus, sempre mencionada pela
concentração de negros, os não brancos correspondiam a 66,7% da
população, mas, como essa população é pequena, eles
representavam apenas 6% dos pretos e pardos do Estado.
(SALETTO, 2014, p.45)
Analisando a distribuição espacial das Comunidades Tradicionais 42no
ano de 2010 (Mapa 1), verifica-se que estas se distribuem obedecendo tais
cursos migratórios da colonização ou sua descendência (ESPÌRITO SANTO,
2012). Há presença marcante das comunidades européias (italianos, suíços,
pomeranos, alemães, holandeses e poloneses) ao longo da região serrana,
enquanto as quilombolas situam-se no extremo norte e extremo sul do Espírito
Santo. Destaca-se o fato os indígenas concentrarem-se no município de
Aracruz e a presença de uma comunidade quilombola no município de Santa
Leopoldina.
42
De acordo com o Ministério dos Direitos Humanos comunidades tradicionais são "grupos
culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de
organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua
reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos,
inovações e práticas gerados e transmitidos por tradição". Disponível em
<http://www.seppir.gov.br/comunidades-tradicionais/o-que-sao-comunidades-tradicionais>
Acesso em 10 mai. 2017.
56
Mapa 1 - Distribuição das populações tradicionais. Espírito Santo, 2010
Fonte: Espírito Santo, 2012, p.19
Como se pôde verificar, o processo de distribuição, territorialização e
composição racial da população capixaba foi e ainda continua sendo marcado
intensamente pela atuação dos fluxos migratórios. Como resultado, o que se
observa hoje de modo geral, é a formação de aglomerados onde situam-se de
modo mais expressivo determinadas comunidades pertencentes a grupos
étnico-raciais específicos.
No entanto, vale pontuar que a migração
interestadual tem contribuído significativamente para a composição racial/cor
57
da população capixaba ainda nos dias atuais, conforme pode ser visualizado
no mapa 2. Mesmo estando fora da maioria dos destinos dos migrantes ao
longo dos grandes fluxos migratórios vivenciados na história do país, a interrelação do ES com os estados vizinhos tem refletido na espacialização da
população no que se refere à raça/cor. Dados do censo demográfico de 2010
apontaram que a Região Metropolitana de Vitória e a porção litorânea ao norte
recebem em sua maioria migrantes oriundos principalmente da Bahia,
enquanto a faixa continental oeste - próxima ao estado de Minas Geraisrecebe os mineiros e o extremo sul do ES, os cariocas e mineiros (DOTA;
COELHO; CAMARGO, 2017).
O Atlas da Migração do Espírito Santo (DOTA; COELHO; CAMARGO,
2017) demonstra que ao longo dos dez primeiros anos do século XXI, a
população capixaba tem sido fortemente incrementada por migrantes oriundos
principalmente dos estados vizinhos. Os baianos encontram-se distribuídos
praticamente por todo o ES, estando presente especialmente nos municípios
da faixa litorânea, exceto no extremo sul, região onde há predominância de
pessoas do Rio de Janeiro – os cariocas se concentram basicamente no
extremo sul do estado. Os mineiros, por sua vez, ocupam toda a faixa
continental – norte a sul - próxima a divisa entre os dois estados (figura 3).
O processo de territorialização do estado do Espírito Santo, conforme
se observou, ocorreu de modo diferenciado para cada um dos grupos étnicoraciais. Enquanto os povos brancos chegaram ao estado contanto inclusive
com o estímulo estatal (CASTIGLIONI, 2009), a população negra, por exemplo,
foi arrancada de seus territórios e a população nativa foi escravizada e
praticamente dizimada (FERREIRA, 2010). A partir dos registros narrados por
Saletto (2014) e Castiglioni (2009), nota-se o quanto o histórico de constituição
do povo espírito-santense foi marcado pela demarcação de privilégios
econômicos, sociais e culturais aos brancos e violência contra os povos não
brancos.
58
Mapa 2 - Proporção de migrantes interestaduais segundo Unidade Federal entre 20052010
Fonte: Dota, Coelho e Camargo, 2017, p.38
59
2.2 Aspectos econômicos
O histórico econômico do estado do Espírito Santo foi marcado,
principalmente na segunda metade do século vinte, por significativas mudanças
estruturais (MENDES; VILLASCHI; FELIPE, 2012). Devido a diversas questões
políticas e históricas, tal unidade federativa iniciou seu processo de
industrialização tardiamente, saindo de uma economia que até meados dos
anos de 1950 era essencialmente agrícola, para um padrão urbano-industrial,
caracterizado pela instalação de ―grandes‖ projetos industriais (CASTIGLIONI,
2009).
Este movimento de reestruturação econômica foi motivado pela crise
do café no mercado nacional e internacional (CASTIGLIONI, 2009; LIRA;
OLIVEIRA JUNIOR; MONTEIRO, 2014).Tal crise fez com que a elite política
espírito-santense iniciasse discussões com o intuito de buscar alternativas para
reestruturar as bases às quais a economia estava sustentada (LOUREIRO,
2005). Como resultados destes debates, foram iniciados projetos estatais com
o intuito de atrair indústrias para o Espírito Santo. Conforme se observa na
narrativa de Caliman (2012), o incentivo tributário foi uma das alternativas já
em meados da segunda metade da década de 1950.
O governador Carlos Fernando Monteiro Lindenberg, por exemplo, no
seu primeiro mandato, instituiu incentivo tributário específico para
novas indústrias que se instalassem no Espírito Santo. Já no seu
segundo mandato, no final da década de cinquenta, Dr. Carlos
Fernando Monteiro Lindenberg, como era chamado, introduziu o
mecanismo de planejamento governamental como forma de preparar
o Espírito Santo para a passagem para a era industrial. Foi ele que
institucionalizou o planejamento na gestão de governo.(CALIMAN,
2012, p.47)
Os primeiros resultados já puderam ser vistos nas décadas
seguintes.Obteve-se a vinda de empresas ligadas principalmente ao setor de
mineração. A chegada e instalação de grandes empresas, como a Aracruz
Celulose S.A., ocorrido a partir da década de 1970, a abertura de usinas de
pelotização da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) da Companhia
Siderúrgica de Tubarão (CST) na Região Metropolitana de Vitória (RMGV)
foram alguns dos principais acontecimentos ocorridos neste período inicial.
Ambas situadas na microrregião metropolitana seguindo o sentido norte –
microrregião rio doce - e posteriormente ao sul – no município de Anchieta
60
(microrregião litoral sul), áreas ocupadas, em muitos casos, por comunidades
indígenas e quilombolas.
Ferreira (2010) observa que essa territorialização das indústrias teve
como impactos diretos, a expulsão dos quilombolas e dos indígenas das terras,
retirando destas a posse de extensas áreas utilizadas para produção de
alimentos a partir da lógica do uso comum do solo. Entre as conseqüências,
para além de modificar as atividades realizadas na região, que inicialmente
eram voltadas a subsistência dos povos que ali se encontravam localizados,
verificou-se na região norte do estado o aumento da concentração de terras por
parte principalmente do capital privado, contribuindo diretamente, de acordo
com a autora, para a piora nas condições de vida das pessoas que ali residiam.
Para Mattos e Rosa (2012) este movimento de mudança da estrutura
econômica, que fora alicerçado no estímulo estatal, teria contribuído, por outro
lado, para que o Espírito Santo tivesse sua característica agrícola rapidamente
alterada. Passando de uma economia agrícola para a era industrial. Este
movimento de atração de grandes empresas teria assumido papel relevante no
―desenvolvimento‖ estadual sob o ponto de vista econômico, aproximando seus
indicadores com os apresentados pelo Brasil (CASTIGLIONI, 2009). Outro
efeito destacado por Castiglioni (2009) foi à concentração de tais investimentos
na região da capital.
Em meados da década de 1980, em especial, já foi possível visualizar
os impactos na economia. A taxa média de crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB) evidenciou que em razão das sucessivas crises econômicas
(LACERDA et al, 2010), o Brasil e o estado obtiveram entre 1960 e o final da
década de 1970 significativas reduções no crescimento43. No entanto, o ES
apresentou percentuais de crescimento acima da taxa do país ao longo de todo
o período visualizado apresentado (CAÇADOR; GRASSI, 2009).
Esta elevação do PIB alicerçou-se no avanço do agronegócio e das
novas atividades econômicas adotadas pelo estado. Especialmente a partir da
43
Verifica-se em Lacerda et. al (2010) que em meados de 1960 e final da década de 1990, o
país passava –de modo mais intenso- por inúmeras crises políticas, econômicas e sociais, que
ajudaria compreender essas bruscas oscilações no Produto Interno Bruto do país e do estado.
No entanto, nota-se que ainda assim, os resultados econômicos do estado se destacam em
relação ao país.
61
década de 1990, com a crescente valorização das commodities no mercado
nacional e internacional, as indústrias de transformação intensificaram ainda
mais sua expansão. Caçador e Grassi (2009) explicitam a relevância das
commodities na economia do estado. Em dez anos (1996 a 2006), o setor de
extração de minerais metálicos assumiu a liderança entre os dez principais
seguimentos da indústria capixaba. A extração de gás natural e petróleo (Norte
e Sul do ES) têm impulsionado cada vez mais o estado em nível nacional e
internacional. As descobertas – de novas jazidas em mar e no continente realizada principalmente pela Petrobras fizeram com que o estado saísse da
quinta (em 2002) para a segunda maior província petrolífera do país,
ressaltando assim a crescente relevância econômica do estado em relação às
demais unidades federativas do país (FILHO et al, 2013).
Destaca-se ainda a relevante participação do estado no que se refere à
produção de produtos pétreos beneficiados que acontece no extremo sul –
microrregião central sul - e extremo noroeste do Espírito Santo (exploração e
beneficiamento de rochas ornamentais) onde se encontra o maior parque
industrial para processamento de rochas ornamentais do país (FILHO et al,
2013). Filho et al. (2013) pontua ainda que já no início dos anos 2000, a
economia capixaba apresentava
uma configuração mais diversificada,
destacando-se na agricultura, na pecuária e na mineração.
[...] têm destaque a agricultura, a pecuária e a mineração. Na
produção agrícola, destacam-se a cana-de-açúcar, a laranja, o cocoda-bahía e o café. Na atividade pecuária o rebanho ultrapassa 1,8
milhão de cabeças de gado e na avicultura, aproximadamente 9,2
milhões de aves. Na mineração há reservas importantes de granito
para fins ornamentais, além da extração de gás natural e petróleo. O
parque industrial do estado do Espírito Santo abriga indústrias
químicas, metalúrgicas, alimentícias, de papel e celulose.(FILHO et
al, 2013, p.23).
Todavia, Mendes, Villaschi e Felipe (2012) demarcam que a
distribuição da estrutura econômica do estado do Espírito Santo possui forte
concentração44 espacial e setorial45 de atividades econômicas e renda.
44
O estado também se destaca em relação a concentração racial da renda. A capital Vitória
figura entre as capitais brasileiras com significativo distanciamento na renda da população
branca e da negra. Disponível em <http://www.vermelho.org.br/noticia/274511-10>. Acesso: 10
out 2017.
45
Apesar do crescimento e surgimento de novas atividades na economia capixaba
(principalmente nos anos de 1990), as atividades ainda permaneceram centradas em
commodities (CAÇADOR; GRASSI, 2009).
62
Segundo tais pesquisadores, seria
possível observar a
infraestrutura
econômica do ES, dividindo-a em duas partes: A localizada a leste da Br 101,
majoritariamente caracterizada pelas atividades industriais e à oeste pelas
atividades agrícolas e afins (Mapa 3).
Mapa 3- Distribuição das atividades econômicas no Espírito Santo
Fonte:
Mendes,
Villaschi
e
Felipe
(2012).
Disponível
em<https://economiacapixaba.files.wordpress.com/2012/08/apls-e-br.jpg> acesso: 20 abr.
2017.
Dados de 2008, por exemplo,apontam que 80% das riquezas foram
produzidas no litoral capixaba (tabela 2). Quando observados tal fato em
função dos municípios do extremo oeste – zona fronteiriça com Minas Gerais -,
tal discrepância mostra-se ainda mais intensa. Informaçõesrelativas ao ano de
2009
revelam
participação
de
3,55%
no
litorâneos(MENDES; VILLASCHI; FELIPE, 2012).
PIB,
contra
51,79%
dos
63
Tabela 2– Participação percentual dos municípios a leste e oeste da Br 101 no PIB
capixaba, por atividade econômica - 2008
Comércio e Serviços
Indústria,
Agropecuária
Adm.
Constr.
Localidade
Demais
(%)
Pública
Total
Siup. (%)
atividades. (%)
(%)
Total ES
100
100
100
100
100
Leste BR 101
28,5
Oeste BR 101
71,5
Fonte: Mendes,Villaschi e Felipe ,2012
91
64,4
83,9
80
9
35,6
16,1
19,8
O interior, por sua vez, representado pelos municípios localizados na
faixa central e do extremo oeste do ES, dinamizou os arranjos produtivos 46 e
vivenciou o crescimento de micro, pequenas e médias empresas ligadas aos
seguimentos: vestuário, móveis, alimentos, mármore e granito e alguns efeitos
multiplicadores, singularmente na área de serviços (MENDES; VILLASCHI;
FELIPE, 2012), bem como vivenciou o agravamento da concentração de terras,
principalmente na porção norte, estimulado pela monocultura do eucalipto
(ZANOTELLI et al., 2011) e a intensificação de conflitos sociais, em especial
contra as comunidades quilombolas (FERREIRA, 2010).
Faz-se assim, possível a assertiva de que no processo de
reestruturação da economia capixaba foi marcante o processo de concentração
espacial das grandes empresas na faixa litorânea do estado, em especial nas
localidades onde se encontravam concentradas e instaladas populações
indígenas e quilombolas. Neste movimento de modernização econômica, a
população preta, parda e indígena, em especial, foi profundamente impactada,
tendo suas disparidades socioeconômicas (em relação ao branco) ainda mais
agravadas47. Uma vez que, conforme se pôde observar na discussão de
Ferreira (2010) e Zanotelli et al (2011), em tais avanços econômicos, os povos
tradicionais que ocupam de modo expressivo o litoral capixaba, foram os mais
impactados e marginalizados socioeconomicamente.
De outro lado, a comunidade territorializada na região serrana do
estado (em sua maioria oriunda de países da Europa), apesar de forçadas a
46
Colatina, Linhares, Cachoeiro e Nova Venécia se destacaram. Mendes, Villaschi e Felipe
(2012) pontuam que estas mudanças impulsionaram até municípios dos estados vizinhos.
47
Dezenas de famílias tiveram suas condições materiais de existência expropriadas por parte
das grandes empresas que se instalaram (FERREIRA, 2010). O estímulo da Aracruz Celulose
(atual FIBRIA) a produção de eucalipto alterou a dinâmica de produção em várias regiões do
estado, contribuindo também no processo de intensificação da saída das pessoas de tais
localidades, uma vez que esta atividade não gera muitos empregos (ZANOTELLI et al, 2011).
64
alterar parte das atividades econômicas desenvolvidas, estas por possuírem
posse de suas terras facilitadas pelo próprio estado, puderam gozar de
privilégios concretos, sendo menos vulneráveis aos avanços do capital
internacional. Neste bojo, vale enfatizar que, conforme indicaram as literaturas,
todos estes fatos foram mediado diretamente por ações governamentais e
focalizaram-se
espacialmente
nas
regiões
onde
encontravam-se
territorializadas com se identifica em Ferreira (2010) os quilombolas e os
indígenas. Em conseqüência, verificou-se uma série de arrebatamentos na
dinâmica sociodemográfica do estado.
2.3 Aspectos sociodemográficos
Todo este processo de oscilação na dinâmica econômica e política do
país resultaram numa série de impactos nas questões socioeconômicas,
culturais, espaciais, no Espírito Santo (SILVA; DADALTO, 2014). Aliado a tal
fator
econômico,
teve-se
o
momento
da
transição
demográfica
e
epidemiológica pela qual o país e o estado estavam inseridos, saindo de um
cenário de elevadas taxas de fecundidades e mortalidade, para a redução
significativa, juntamente com a melhoria nas condições sanitárias, tendo como
conseqüência direta a elevação na expectativa de vida da população capixaba,
como pode ser visualizado no gráfico 3 (CASTIGLIONI, 2009). Nota-se na
figura uma elevação total de 20,08 anos, de 1940 para 1980, na esperança de
vida dos capixabas – destaca-se a década de 1970-80, que contribuiu com
9,35 anos do total.
Gráfico 3- Evolução da esperança de vida ao nascimento -Brasil e Espírito Santo -1940 a
2010
Fonte: Castiglioni, 2009, p.96
65
Para Castiglioni (2009), a melhoria geral nas condições de vida aliada à
ampliação dos métodos contraceptivos e ao ―perfil cultural48 dos migrantes‖ que
povoaram o estado ajudaria a compreender todo este processo. No entanto, há
que se ressaltar que, conforme se observa no trabalho desta mesma autora,
esses recém chegados ao estado foram recepcionados de modo e contexto
totalmente diferentes que os que outrora já estavam territorializados
(principalmente os negros e indígenas – os não brancos). Diferentemente dos
migrantes europeus, que contaram com estímulo estatal, aos não-brancos não
foram facilitados o acesso à propriedade no Brasil na pós-abolição (CAMPOS,
2012), por exemplo, que poderia contribuir para a diminuição das disparidades
econômicas e sociais. O gráfico 4 apresenta a evolução em termos absolutos
da população do Espírito Santo entre os anos de 1872 e 2010. Nesta é
possível observar que a década de 1950 demarca o início da expansão da
população do estado. Entre os anos de 1950 e 1970, a população do estado
praticamente dobrou, saindo de 861.562 para 1.599.333 habitantes. Castiglioni
(2009) destaca que tal ascensão populacional foi alicerçada na migração,
desde meados do final do século XIX, intensificado especialmente no inicio da
segunda metade do século XX.
Gráfico 4 -Evolução da população do Espírito Santo – 1872-2010
Fonte: BRASIL et al. (acesso em 01 mar. 2017)
48
O ‗perfil cultural‘ relatado pela autora diz respeito aos ―bons hábitos‖ e ―costumes‖ dos
migrantes europeus. Data máxima vênia, mas tal entendimento não traduz o modo diferenciado
como os diferentes grupos étnico-raciais foram tratados. O tratamento dado aos indígenas e
aos negros não foi o mesmo que os migrantes europeus. Além do mais, tal apontamento
desconsidera a própria riqueza cultural presente nas tradições das etnias dos indígenas e da
população negra.
66
Este período foi também marcado pela alteração dos locais onde se
localizavam tais habitantes. O Espírito Santo saiu de uma população rural –
final da década de 1940 e início da década de 1950 – para uma
essencialmente urbanizada (CASTIGLIONI, 2009). O gráfico 5 retrata a
evolução percentual da população urbana no estado (População urbana: 31,6%
em 1960 para 63,9 em 1980) (MENDES; VILLASCHI; FELIPE, 2012).
Gráfico 5- Evolução percentual da população urbana no Espírito Santo - 1960-2010
Fonte: Adaptado de Mendes,Villaschi e Felipe (2012)
No ano 1980, os municípios capixabas passaram por significativas
mudanças na composição de suas populações e em seus indicadores
demográficos (LOUREIRO, 2005; LIRA; OLIVEIRA JUNIOR; MONTEIRO,
2014; DOTA; COELHO; CAMARGO, 2017). O crescimento da população
motivado no final do século XIX e início do século XX pela migração
internacional (CASTIGLIONI, 2009), passa por profundas modificações na
segunda metade do século motivado, além da condição demográfica da
população, em grande parte pela chegada em massa de migrantes,
principalmente de estados vizinhos (Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro)
(DOTA; COELHO; CAMARGO, 2017).
Dota, Coelho e Camargo (2017) destacam que fatores foram se
somando nas décadas seguintes à 1980 e contribuindo para obtenção de
seguidos saldos migratórios positivos: a) Acesso ao mar que viabilizou o
fortalecimento das relações econômicas do Espírito Santo com Minas Gerais,
através de investimentos relacionados aos setores ligados a mineração e
escoamento da produção, que resultaram na criação de empregos e atração de
migrantes; b) A valorização dos commodities no mercado internacional; c) O
crescimento do setor de petróleo e gás, que trouxe investimentos para o
67
Espírito Santo. Fatores estes que tem atuado, segundo os autores, como
atrativo para os migrantes em busca de oportunidades, principalmente dos
estados da Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro nas últimas décadas.
O gráfico 6 retrata a evolução da taxa média de crescimento anual do
Espírito Santo e do Brasil entre os anos de 1940 e 2010, apesar de apresentar
tendência de queda, o estado ainda tem mantido taxas de crescimento acima
da brasileira – especialmente a partir da década de 1980. De 2000 para 2010,
a taxa do Espírito Santo reduziu 35,9% (2000: 1,98%; 2010: 1,27%).
Comparando-se as taxas do estado e do país no ano de 2010, o ES teve taxa
8,5% maior que a do Brasil (BRA: 1,17%; ES: 1,27%).
Segundo Ferrari (2011), o censo demográfico de 2010 apontou um
crescimento no processo de urbanização de 13,4% na concentração de
pessoas por quilometro quadrado no Espírito Santo – densidade demográfica –
em relação a 2000. O estado que em 2000 possuía 67,2 hab./km², atingiu a
marca de 76,3 hab./km².De acordo com a autora, o estado teve a maior taxa de
crescimento populacional entre os estados da região Sudeste (13,6%) do país,
e acima da média nacional, que foi 12,5% para o mesmo período.
Gráfico 6 - Evolução da Taxa Geométrica de Crescimento Anual do ES e BR – 1940-2010
Fonte: BRASIL et al. (acesso em 01 mar. 2017)
A transição econômica teve conseqüência direta na própria dinâmica
demográfica do estado. Este processo de transformação da economia do
estado do Espírito Santo refletiu em questões socioeconômicas, culturais,
68
espaciais, como a intensificação da segregação socioespacial na RMGV, por
exemplo, (SILVA; DADALTO, 2014). Essa concentração das pessoas na faixa
litorânea do estado, com destaque para a microrregião metropolitana, teria
relação direta com a atuação dos grandes projetos industriais no interior, que
teria atuado na reconfiguração das atividades econômicas e como um dos
motivadores à expulsão dos habitantes da zona rural para os grandes centros
urbanos. Neste sentido, pontua Zanotelli et al (2011):
[...] com a ampliação do famoso ‗fomento‘ da grande empresa
produtora de celulose para exportação, a Aracruz Celulose [atual
FIBRIA], os pequenos proprietários rurais disseminaram o eucalipto
por várias áreas do estado com os estímulos que a empresa dá
(fornecimento de mudas e garantia de compra) , além do que
diversos proprietários rurais tem visto no eucalipto uma fonte de
renda garantida, pois há, igualmente uma demanda da indústria
moveleira e da construção civil. Isso associado a outros processos
econômicos tem provocado a evolução do preço da terra em diversos
lugares (ZANOTELLI et al, 2011,p.139)
Vale pontuar, conforme Zanotelli et al (2011) afirma que o cultivo de
eucalipto não emprega mão-de-obra intensiva e estimula a valorização da
propriedade, corroborando com intensificação de conflitos no campo, tendo
entre suas conseqüências, a saída dos camponeses sentido às grandes
cidades e a concentração de terras. De acordo com o censo de 2010 do IBGE,
83,4% da população capixaba residia em áreas urbanas e 16,6 na zona rural.
Em 2015, de um total de 2.05 milhões pessoas economicamente ativas, 1.74
milhões (84,9%) residiam em área urbana e 309.000 (15,1%) na zona rural49.
Entre os impactos sociais de todo este processo de alteração
econômica e expulsão dos moradores do campo capixaba, pode-se citar a
concentração de terras ocorrida no interior do estado especialmente na área
onde se localiza a microrregião Noroeste, Nordeste e parte da Rio Doce. A
respeito da concentração afirma Zanotelli et al (2011):
[...] em 1995 podíamos identificar um crescimento importante no
número de grandes propriedades: 202 empresas e/ou famílias
detinham 15,3% das terras agricultáveis do Espírito Santo (539 mil
hectares), boa parte dessas terras estavam destinadas à
eucaliptocultura (173 mil hectares em 1995 e possivelmente mais
hoje) [...] (ZANOTELLI et al, 2011, p.139)
No mapa 4 é possível verificar os locais onde a concentração de renda
era mais intensa no Espírito Santo em 2000. As áreas escuras do mapa
49
Dados disponíveis em < https://es.gov.br/es-em-dados> Acesso em: 01 abr. 2017
69
retratam espacialmente as localidades em que a renda estava mais
concentrada em uma pequena parcela da população. Destacam-se os
municípios do norte do estado, componentes das microrregiões noroeste,
nordeste, centro-oeste e rio doce. Regiões estas onde há maior representação
percentual da população preta e parda, em que estas são cerca de 65 a 70%
da população e que também evidenciaram uma maior concentração espacial
nos registros de incidência de pobreza (mapa 5).Na faixa serrana do estado,
em que se situam as comunidades tradicionais européias, a concentração de
renda mostrou-se menos intensa. Possivelmente associada à atividade de
pequenos agricultores, de terras obtidas durante a chegada em massa da
migração, conforme é possível identificar em relatos no trabalho de Castiglioni
(2009).
Entre as consequências, o período de 2000 a 2010, registrou
discrepâncias nas condições de vida da população capixaba. Em 2005, o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)50 do estado era de 0, 802, sendo
este o sétimo maior do Brasil e o terceiro maior da região sudeste (FILHO et
al., 2013). Contudo, averigua-se nos dados apresentados por Filho et al (2013)
persistentes desigualdades regionais no estado. O maior IDH foi o do município
de Vitória (0,856) – situado na região metropolitana- e o pior do município de
Água Doce do Norte (0,659) – no extremo noroeste do estado. Neste mesmo
sentido, a figura 9 indica que o ano de 2000 a incidência de pobreza estava
majoritariamente localizada na divisa do Espírito Santo com a Bahia.
50
A escala varia de zero a um, onde quanto mais próximo de um, melhor seria a qualidade de
vida da população.
70
51
Mapas 4 e 5– Índice de GINI (E) e Incidência de pobreza no estado do Espírito Santo,
segundo município, no ano de 2000 (D)*
Fonte/Figura9: IJSN, 2003. Disponível em < http://www.ijsn.es.gov.br/mapas > acesso: 26 abr.
2017; Fonte/Figura 10: IJSN, 2009. Disponível em < http://www.ijsn.es.gov.br/mapas > acesso:
26 abr. 2017.Nota: *(E) = figura da esquerda; (D) = figura da direita
O índice de GINI “[...] é um instrumento para medir o grau de concentração de renda em
determinado grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais
ricos. Numericamente, varia de zero a um (alguns apresentam de zero a cem). O valor zero
representa a situação de igualdade, ou seja, todos têm a mesma renda.
[...]‖
(IPEA)
Disponível
em
<
http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2048:catid=28&Itemid=23>
Acesso 10 out 2017.
51
71
2.4 As microrregiões administrativas do Espírito Santo
Dentre outras subdivisões, o estado do Espírito Santo possui desde a
aprovação da lei estadual 9.768 – sancionada em 28 de dezembro de 2011- as
seguintes microrregiões de planejamento (mapa 6): Metropolitana, Central
Serrana, Sudoeste Serrana, Litoral Sul, Central Sul, Caparaó, Rio Doce, Centro
Oeste, Nordeste e Noroeste. Estas que, segundo o próprio texto da lei, tem
entre as funções, auxiliar o processo de organização das ações do setor
público, foram escolhidas como unidade de análise dos dados de mortalidade.
Por este motivo, faz-se relevante estabelecer uma aproximação das mesmas e
de suas características gerais.
72
Mapa 6 - Microrregiões planejamento do estado do Espírito Santo
Fonte: IJSN, 2012. Disponível em <http://www.ijsn.es.gov.br/mapas > acesso: 11 nov. 2016.
73
Analisando-se as dez microrregiões de planejamento do estado (tabela
3), nota-se que há uma maior concentração de brancos nas microrregiões
situadas a oeste e sul da Região Metropolitana da Grande Vitória (Central
Serrana, Sudoeste Serrana, Litoral Sul, Central Sul, Caparaó), atingindo em
alguns casos, percentuais superiores a 60% (Central Serrana 69,4%; Sudoeste
Serrana 61,1%). Os pardos, por sua vez, neste ano, representavam mais de
50% da população em quatro microrregiões situadas na porção ao norte do
Estado (Nordeste 59,7%, Noroeste 58,4%, Rio Doce 54,9% e Metropolitana
51,4%). Observa-se ainda que a população de autodeclarados pretos e outras
são respectivamente inferiores a 13% e 1% em todas as microrregiões em
ambos os censos (2000 e 2010). Há uma menor representação percentual, no
que refere aos grupos étnico-raciais: brancos na microrregião Nordeste (2000:
33,9% e 2010: 27,4%), pretos (2000: 3,5% e 2010: 3,5%)e pardos (2000:
23,8% e 2010: 26,8%) na microrregião Central Serrana.
Tabela 3- População por raça/cor nas Microrregiões do Espírito Santo em 2000 e 2010
% Branca
% Preta
% Parda
% Outras
Microrregiões
2000
2010
2000
2010
2000
2010
2000
2010
Metropolitana
45,1
38,4
6,8
9,2
47,6
51,4
0,6
1,0
Central Serrana
72,5
69,4
3,5
3,5
23,8
26,8
0,2
0,5
Sudoeste Serrana
67,1
61,1
4,1
4,8
28,6
33,4
0,2
0,8
Litoral Sul
61,0
53,2
3,6
5,2
35,0
41,1
0,3
0,6
Central Sul
58,4
50,3
9,3
9,6
32,1
39,6
0,2
0,6
Caparaó
60,2
54,1
7,4
8,3
32,3
37,1
0,2
0,6
Rio Doce
42,4
36,9
5,1
7,5
51,1
54,9
1,3
2,0
Centro Oeste
54,8
46,4
4,7
5,5
40,3
47,8
0,2
0,4
Nordeste
33,9
27,4
9,0
12,1
56,6
59,7
0,5
1,0
Noroeste
40,4
35,4
5,3
5,7
54,0
58,4
0,3
0,5
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010). Organizado pelo autor.
Um dos indicadores demográficos que auxilia na compreensão de
determinadas questões econômicas, sociais, socioeconômicas, dentre outras,
de um território são as trocas populacionais e a intensidade com que estas
ocorrem (CASTIGLIONI, 2009; DOTA; COELHO; CAMARGO, 2017). A
depender
das
oportunidades
–
e/ou
promessas-
(emprego,
moradia,
educacional, etc.), algumas localidades podem atrair maiores ou menores
contingentes
de
migrantes.
Averiguando
os
fluxos
migratórios
das
microrregiões (gráfico 6) é possível notar que Metropolitana (RMGV), Central
Sul (Centro Sul) e Rio Doce têm recebido os maiores contingentes de pessoas,
74
resultando, como se observa em Espírito Santo (2012), na elevação na
expansão da mancha urbana. Já os municípios das microrregiões situadas na
zona fronteiriça com o estado de Minas Gerais são em sua maioria rural e
estão em processo de perda de população, tendo como destino, em muitos
casos, a faixa litorânea do estado (ESPIRITO SANTO, 2012). Como reflexo de
tal movimento populacional, o censo de 2010 apontou que seis dos dez
municípios com maiores densidades demográficas situavam-se na região
Metropolitana, enquanto os menores foram dos municípios da microrregião
Noroeste e Nordeste (FERRARI, 2011).
A evolução do crescimento médio anual da população entre 1960 e
2010 (gráfico 7 e 8) apontou relevantes oscilações ao longo dos anos,
destacando-se a Metropolitana, Rio Doce e Nordeste. A microrregião
Metropolitana se sobressai ao longo dos 40 anos, tendo as maiores taxas
médias, mesmo apresentando redução em 2010 em relação a 1970. A Rio
Doce tem taxas elevadas em 1980, todavia, reduz até meados de 1990,
adquirindo, com a valorização das commodities e atividades ligadas ao petróleo
que contribuíram para crescimento econômico da região, tendência de
ascensão a partir dos anos de 2000, atingindo em 2010, taxa superior à
Metropolitana – que acumula maior crescimento ao longo do período. O
Nordeste capixaba vivencia momentos de crescimentos (1970 e 1990)
seguidos de decrescimentos (1980 e 2000), finalizando a primeira década dos
anos dois mil com destaque em relação às demais – exceto em relação a Rio
Doce e a Metropolitana.
Gráfico 7 - Evolução da população das microrregiões do ES – 1960-2010
Fonte: BRASIL et al. (acesso em 01 mar. 2017)
75
As taxas de crescimento populacional de 2000 para 2010 da zona
abrangida pelas microrregiões Metropolitana, Rio Doce e Nordeste foram
superiores as do Espírito Santo (ES: 1,27%; Rio Doce: 2,08%; Metropolitana
(1,61%) (LIRA; CAVATTI, acesso em 16 dez. 2016)52. As contribuições dos
autores revelam ainda que as microrregiões situadas no litoral do ES
apresentaram as principais elevações populacionais.
Gráfico 8– Evolução da Taxa Média Geométrica de Crescimento Anual 1970-2010
Fonte: BRASIL et al. (acesso em 01 março 2017)
À
luz
dos
indicadores
sociais,
verifica-se
que
apesar
do
desenvolvimento econômico pelo qual o estado tem passado, ainda persistem
significativas
desigualdades
regionais,
tendo
intensa
concentração
de
indicadores sociais que apontam desigualdades sociais e sociorraciais que
merecem atenção por parte dos planejadores sociais. Dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílio de informações extraídas do CadÚnico 53
sobre o Espírito Santo (IJSN, 2016; IJSN, 2017b) revelaram que algumas
microrregiões ainda enfrentam grandes desafios na melhoria de serviços
públicos básicos diretamente ligados as condições mínimas responsáveis pelo
bem-estar de um grupo populacional, tais como a coleta de lixo e
abastecimento adequado de água.
52
No período em que o estudo foi publicado, foi considerada a regionalização conforme Lei
Estadual 5.120 de 30/11/95 alterada pelas leis: Lei 5.469 de 22/09/1997, Lei 5.849 de 17/05/99
e Lei 7.721 de 14/01/04. Nesta ocasião, a área era denominada Metropolitana, Polo Linhares e
Litoral Norte. No presente estudo foram consideradas as microrregiões criadas pela Lei
Estadual 9.768 sancionada em 28/12/2011.
53
“O Cadastro Único é um conjunto de informações sobre as famílias brasileiras em situação
de pobreza e extrema pobreza. Essas informações são utilizadas pelo Governo Federal, pelos
Estados e pelos municípios para implementação de políticas públicas capazes de promover a
melhoria da vida dessas famílias.[...]‖ (CAIXA ECONOMICA FEDERAL, 2017) Disponível em
<http://www.caixa.gov.br/cadastros/cadastro-unico/Paginas/default.aspx > Acesso: 16 out. 2017
76
Ao analisar dados das famílias do Espírito Santo cadastradas no
CadÚnico, contempladas pelo programa Bolsa Família54, importante fonte de
informações socioeconômicas da população, devido sua abrangência espacial,
o IJSN (2017b) identificou que quatro das dez microrregiões possuem renda
média domiciliar abaixo da estadual (tabela 4), sendo a Metropolitana e
Nordeste, que também apresentaram as maiores taxas de extrema pobreza 55.
Estas também foram áreas (mais escuras do mapa) que apontaram maior hiato
de pobreza, ou seja, são localidades identificadas como áreas onde em termos
monetários, tem sido mais difícil deixar a extrema pobreza (IJSN, 2017b)
(mapas 7 e 8).
Outras informações que também corroboram para a compreensão das
condições de vida é o nível de alfabetização de uma população (PEREZ;
TURRA, 2008), por associar-se também a ocupação de cargos mais
valorizados, que influencia também nos rendimentos, bem como o nível de
informações sobre cuidados com a saúde, dentre outros. As mais elevadas
taxas de analfabetismo entre as beneficiárias inscritas no cadastro único foram
identificadas nas microrregiões: Nordeste, Noroeste e Rio Doce. Considerando
apenas os cadastrados no CadÚnico, a taxa do Espírito Santo ficou 2,2 pontos
percentuais acima da meta objetivada para o ano de 2015 e a microrregião
Nordeste 3,1 pontos percentuais acima da estadual.
54
―O Bolsa Família é um programa federal destinado às famílias em situação de pobreza e
extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 154 mensais, que associa à transferência do
benefício financeiro do acesso aos direitos sociais básicos - saúde, alimentação, educação e
assistência social‖ (DATASUS). No Espírito Santo, as famílias atendidas pelo programa são,
em sua maioria negras. O IJSN (2017b) assevera que as beneficiárias distribuem-se
racialmente nos seguintes grupos: 63,0% pardas, 27,2% brancas, 8,5% pretas, 0,93%
amarelos e 0,24% de indígenas. Disponível em <http://bolsafamilia.datasus.gov.br/w3c/bfa.asp
> Acesso em: 01 jun. 2017.
55
A renda média estabelecida como parâmetro para se verificar as taxas de extrema pobreza
no período fora: R$ 126,34 para as famílias residentes em áreas urbanas e R$ 107,83 para as
residentes nas áreas rurais. (IJSN, 2017b).
77
Tabela 4- Renda média domiciliar per capita por Microrregião das pessoas cadastradas
no CadÚnico, 2016
Fonte: IJSN, 2017b, p.12
78
Mapas 7 e 8 - Taxa de extrema pobreza da população (E) e Hiato de extrema pobreza da
população (D) do Espírito Santo inscrita no CadÚnico por Microrregião, 2016
Fonte: IJSN, 2017b. Nota: (E)=figura à esquerda; (D)=figura à direita.
79
Dados do IJSN (2017a) revelam que os bairros com elevados índices
de assassinatos detêm também um cenário que tem preocupado cada vez
mais os pesquisadores de temáticas sociais, que é o elevado número de jovens
fora da escola. O analfabetismo ainda mostra-se como grande desafio as
famílias em situação de vulnerabilidade social56 (gráfico 9). Seis entre as dez
microrregiões possuem taxa de analfabetismo acima da apresentada pelo
estado, com destaque para a Nordeste, a Noroeste e a Rio Doce (IJSN,
2017b).
Gráfico 9 - Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais inscrita no CadÚnico
Fonte: IJSN, 2017b, p.39
No que se refere a coleta de lixo que, ao lado do abastecimento de
água e saneamento básico, assumem papel de extrema relevância na
promoção do bem-estar mínimo de uma população, as informações do relatório
do IJSN (2017b) revelaram que 13,2% das famílias não possui acesso a coleta
de lixo, e,a microrregião Noroeste lidera este indicador, com o percentual de
34,8% dos cadastrados, seguida da Central Serrana (29,6%), Sudoeste
Serrana (27,7%), e Caparaó (25,1%). Entre as que possuem o maior
percentual
56
de
residências
com
lixo
coletado
estão
respectivamente:
―Vulnerabilidade social refere-se ao conjunto de fatores socioeconômicos e demográficos
capazes de reduzir o nível de bem-estar de uma determinada população, em consequência de
sua exposição a determinados tipos de risco, não se limitando, portanto, à concepção de
pobreza, mas inclui também a composição familiar, as condições e o acesso a serviços de
saúde, a qualidade e o acesso ao sistema educacional, a oportunidade de acesso ao mercado
de trabalho, etc.‖ (SECRETARIA DE ESTADO DE DIREITOS HUMANOS DO ESPÌRITO
SANTO). Disponível em < https://sedh.es.gov.br/ocupacao-social-perguntas-frequentes >
Acesso em 30 mai 2017.
80
Metropolitana (97,6%), Litoral Sul (91,9%) e Rio Doce (88,7%).
O Índice de Desenvolvimento Familiar (IDF), que mensura o contexto
vivido por cada família a partir de diferentes dimensões, aponta que duas entre
as três microrregiões entre os piores índices de desenvolvimento do grupo
familiar localizam-se no norte do Espírito Santo, tendo entre os grandes
desafios a serem superados, o acesso ao trabalho e a boas condições de
moradia (Tabela 5).
Tabela 5 - Índice de Desenvolvimento da Família, Espírito Santo e Microrregiões, 2016
Fonte: IJSN, 2017b, p.39
Sendo, portanto, possível afirmar, a partir das informações levantadas
no presente capítulo que o estado do Espírito Santo encontra-se de modo
geral, em processo de pleno desenvolvimento econômico social. No entanto,
ao analisar as dinâmicas socioeconômicas, demográficas, sociorraciais e suas
variações espaciais, identificou-se a existência de importantes desigualdades
regionais na distribuição da população, da renda, das atividades econômicas,
por exemplo.
A população negra (pretos e pardos) é a principal atendida pelo
programa nacional que visa mitigar as desigualdades socioeconômicas, tendo
como principal público os grupos populacionais em situação de pobreza, sendo
assim possível inferir, que este é o provável grupo que, de modo geral, na
sociedade capixaba, ocupa as condições socioeconômicas menos favoráveis.
Este se encontra, como se observou nos dados expostos neste capítulo,
territorializado
majoritariamente
nos
espaços
com
os
indicadores
socioeconômicos mais sensíveis (IDH, Índice de GINI, Taxas de extrema
81
pobreza, dentre outros). Em diálogo com as contribuições de Bourdieu (2013),
entende-se que o processo dialógico entre a reificação do espaço social e do
espaço físico, coloca-se como mais provável, no que se refere à reprodução e
intensificação de tais indicadores, a ocorrência para os sujeitos desta categoria
racial.
A literatura apontou para a ocorrência no Espírito Santo, de um
desenvolvimento econômico fortemente concentrado no litoral que tem
resultado ao longo de sua história recente em intensos conflitos sociais, com
fortes arrebatamentos também nas questões raciais. O avanço dos interesses
do agronegócio no estado, principalmente após meados de 1950, que contou
com ampla conivência estatal, focalizou-se nos espaços geográficos onde
estavam territorializadas as comunidades tradicionais, com destaque para o
norte do estado, onde se situam em maior quantitativo – de quilombolas e
indígenas.
82
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
As literaturas têm revelado que o estado do Espírito Santo esta
acompanhando as tendências nacionais e internacionais no que se refere à
melhoria das condições sanitárias, com redução das mortes por doenças
infecciosas, por exemplo, e elevação das mortes decorrentes da degeneração
do organismo (CASTIGLIONI, 2011; ESPIRITO SANTO, 2012; IBGE, 2015).
Todavia, quando observadas às perdas de vida em função de causas externas,
que são os falecimentos em razão, dentre outros fatos, do crescimento das
tensões sociais no trânsito, no cotidiano (homicídios e acidentes de transito,
etc.), o estado ainda apresenta grandes desafios a serem enfrentados pelas
políticas públicas. No ano de 2010, por exemplo, Castiglioni (2011) revela que
esta era a segunda maior causa de morte no estado, tendo incidido
principalmente nos jovens, conforme tendência do país e dos continentes
americanos verificada em Yunes (2001), Zanotelli et al. (2011), IBGE (2015),
Albuquerque e Silva (2015) e Lira (2017).
De acordo com os dados do SIM/DATASUS computados, ocorreram
37.921 mortes por causas externas ao longo da década de 2000 no Espírito
Santo,
estando
estas
concentradas
espacialmente
nas
microrregiões
localizadas no litoral capixaba (Litoral Sul, Metropolitana, Nordeste e Rio Doce,
representando 73,9% das mortes), com destaque para a região Metropolitana,
localidade onde se aglutinaram 55,7% das ocorrências. É também na
microrregião Metropolitana que está condensada em média 48% da população
entre 0 a 59 anos. Em termos totais, de 2000 para 2010 o número de
falecimentos por causas externas registrados pelo SIM/DATASUS distribuiu-se
da seguinte forma:
Tabela 6- Óbitos por causas externas, segundo raça/cor no Espírito Santo, 2000 e 2010
%
%
%
%
%
Total
Preta
Parda
Outras
Ignorado
Ano Branca
27,2
6
35,3
0,1
31,4
2933
2000
797
175
1035
4
922
27,4 223 5,7 2155 55,1
0,1
11,7 3914
2010
1074
4
458
6847
Total 1871
398
3190
8
1380
Fonte: SIM/DATASUS. Organizado pelo autor
O teste estatístico Kruskal-Wallis57, realizado com as taxas específicas
de mortalidade indicou elevação estatisticamente significativa no risco de morte
57
Este teste, não paramétrico, é utilizado para defrontar três ou mais populações, no intuito de
comparar as taxas de mortalidade entre essas variáveis, verificando qual seria significante.
83
no Espírito Santo do ano de 2000 para o ano de 2010, e que há uma interação
entre as variáveis ‗raça e microrregiões‘ e ‗idade e raça‘ (tabela 7). O valor-p
menor que 0.05 indica qual variável se mostrou significante. Neste caso,
observa-se que as variáveis ‗Ano‘ e ‗Idade‘ apresentaram significância,
inferindo que há diferença na taxa de mortalidade entre os anos de 2000 e
2010, assim como há diferença entre as faixas etárias.
As interações entre ‗Microrregião‘ e ‗Raça/cor‘, e ‗Idade‘ com a
‗Raça/cor‘ também se mostraram significantes. Pode-se assim, afirmar que a
variabilidade espacial e etária assume, no contexto analisado papel importante
no
risco
de
morte
dos
grupos
étnico-raciais.
Quando
analisada
individualmente58 as taxas étnico-raciais, sem associá-las com as demais
variáveis, não foi possível afirmar que haveria diferenças significativas nas
variações do risco de morte de uma categoria raça/cor específica, desvelando
que os diferenciais na probabilidade de morte mostraram-se associados à
idade do indivíduo, lugar de moradia e ao sexo.
Tabela 7 - Teste Kruskal-Wallis para as taxas específicas de mortalidade segundo as
variáveis „Ano‟, „Idade‟, „Raça/cor‟ e „Microrregião‟, 2000 e 2010
Variável
Estatística Valor-p*
Ano
14.447
<0.001
Idade
153.26
<0.001
Raça/cor
20.701
0.3552
Microrregião
93.042
Microrregião x Raça/cor
52.933
0.4097
0.0043
<0.001
Idade x Raça/cor
178.89
Fonte: Dados organizados pelo autor com apoio da equipe do Lestat-Ufes.
A distribuição espacial das taxas de mortalidade auferidas para os três
grupos étnico-raciais considerados nos cálculos indicou, de modo geral, para
uma concentração territorial significativa das taxas entre a raça branca na faixa
serrana do estado (mapas 9 e 10), parda na faixa litorânea norte a partir da
microrregião Metropolitana (mapas 11 e 12) e preta nas microrregiões
localizadas nos dois extremos do estado – norte e sul, acompanhando assim,
em certo modo, as áreas onde compõe percentualmente o maior número de
58
Abstrair a variável raça/cor isoladamente da situação espacial (lugar), do contexto social e de
fase de vida (faixa etária) constitui uma hipótese do software estatístico que apenas se efetiva
num campo hipotético, pois não há como analisar uma variável de modo isolado sem se
considerar o espaço (local/lugar) ao qual ele esta inserido, pois a vida apenas se concretiza
num espaço, com relações sociais.
84
indivíduos de cada um dos grupos étnico-raciais (mapas 13 e 14).
Num primeiro momento, se isoladas as comparações raciais, verificase tendências para taxas entre os próprios grupos nas microrregiões onde
estes são maioria na população. No entanto, enquanto a alta taxa de
mortalidade branca restringe-se quase que exclusivamente ao interior (mapas 9
e 10), pardos e pretos destacam-se nas demais áreas, principalmente nas
localidades com maior adensamento populacional em áreas urbanas – Central
Sul, Metropolitana, Rio Doce (mapas 11, 12, 13 e 14). Este aglomerado
espacial de altas taxas ao longo da faixa litorânea, mais especificamente ao
norte do estado, a partir da Metropolitana, aparentemente tem acompanhado o
processo histórico de desenvolvimento econômico das localidades, que de um
lado, atraíram muitos habitantes – principalmente do interior do estado e das
unidades federativas vizinhas (Bahia e de Minas Gerais) - e intensificaram os
conflitos sociais (crescimento da violência urbana, intensificação da disputa
pela posse de terras no interior, por exemplo) (ZANOTELLI et al., 2011;
FERREIRA, 2010; MENDES; VILLASCHI; FELIPE, 2012).
Os mapas a seguir apresentam as taxas dos anos de 2000 e 2010,
calculadas segundo grupo racial e microrregiões. Neste caso, são apenas
dispostas espacialmente as taxas de mortalidade dos grupos étnico-raciais
segundo as microrregiões de planejamento. Em 2000, a Caparaó, a Litoral Sul
e a Metropolitana foram os locais onde os riscos mostraram-se mais intensos
que nas demais porções do estado. O ano de 2010 por sua vez, demarca
territorialmente o avanço do risco de morte ao longo de quase toda área
estadual para a população parda. Houve assim, desconsiderando os grupos
etários, maiores perigos de morte para pardos.
Neste cenário, verificadas as taxas máximas aferidas, nota-se que
comparados os anos 2000 e 2010, brancos elevaram 21,5% (2000: 9,56; 2010:
11,62 óbitos por dez mil habitantes) (mapas 9 e 10), pretos reduziram 11,9%
(2000: 14; 2010: 12,33 óbitos por dez mil habitantes) (mapas 13 e 14) e pardos
aumentaram 53,9% (2000: 10,51; 2010: 16,17 óbitos por dez mil habitantes) a
probabilidade de vir a ser vitimado (mapas 11 e 12). Sendo possível inferir que
a variabilidade espacial da intensidade das taxas, quando isoladas as faixas
etárias, demonstra-se riscos mais significantes para pardos.
85
Mapas 9 e 10– Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da população
branca nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010) e SIM/DATASUS. Dados organizados pelo
autor com apoio da Equipe do Lestat-Ufes. *Óbitos por mil habitantes.
86
Mapas 11 e 12 - Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da população
parda nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010) e SIM/DATASUS. Dados organizados pelo
autor com apoio da Equipe do Lestat-Ufes. *Óbitos por mil habitantes.
87
Mapas 13 e 14- Distribuição espacial da Taxa Específica de Mortalidade da população
preta nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010) e SIM/DATASUS. Dados organizados pelo
autor com apoio da Equipe do Lestat-Ufes. *Óbitos por mil habitantes.
Os centros urbanos, devido à maior concentração de população,
tendem a representar áreas onde os conflitos e as tensões sociais são mais
intensos, bem como a exposição a situações de estresse cotidiano, dentre
outras, talvez conforme verifica-se em Lira (2017) devido a própria estrutura
centralizadora de pessoas, renda, mas também de mazelas sociais fruto das
88
próprias desigualdades presentes nos estratos sociais. Nestas áreas, as taxas
de mortalidade foram mais elevadas entre pardos.
Os
investimentos
recebidos
pela
faixa
litorânea
do
estado,
principalmente a partir da microrregião Metropolitana, inicialmente com os
grandes projetos industriais e posteriormente com a descoberta do petróleo
corroboraram para intensificação dos fluxos migratórios intra e interestadual,
tornando estas áreas de forte atração de migrantes, e por conseqüência, de
expansão da malha urbana (DOTA; COELHO; CAMARGO, 2017). Os impactos
diretos tem se refletido no próprio crescimento dos crimes contra a vida,
aumento da frota e de vítimas de acidentes, dentre outros (SILVA; DADALTO,
2014; CASTIGLIONI; FAÉ, 2014). Em 2007, a taxa de homicídio da
microrregião metropolitana foi 1,5 vezes maior que a do estado e 2,4 em
relação aos demais municípios do estado (MENDES; VILLASCHI; FELIPE ,
2012).
Inserindo-se a variável idade, torna-se possível melhorar o nível de
detalhamento dos riscos que, por conseguinte, corrobora para acompanhar ao
longo de cada um dos grupos etários a exposição dos agrupamentos
populacionais à possibilidade de perda da vida. As taxas de mortalidade
segundo raça/cor auferidas para o Espírito Santo apresentaram significativa
variação nos grupos etários, com elevado risco de morte entre os 10 aos 49
anos, mostrando mais incidência nos grupos etários jovens das raças preta e
parda (gráficos 10 e 11). Entre os anos 2000 e 2010, os dados revelaram que
pretos e bancos vivenciaram tendências opostas, principalmente entre os 10 e
os 19 anos. Para Ribeiro Junior (2012) o assassinato de jovens no estado, que
em sua maioria é residente de comunidades mais carentes, relaciona-se a
política de ‗guerra as drogas‘, que tem, entre os principais impactos, a
vitimização de jovens de tais áreas.
Nota-se ainda que em 2010, comparado ao ano de 2000, houve, após
os 50 anos, um distanciamento entre as taxas de mortalidade da raça branca
em relação aos demais grupos. Se a extensão da vida média de uma
população encontra-se diretamente associada à velocidade com que seus
elementos são eliminados (CASTIGLIONI, 1994), pode-se verificar nos dados,
que a perda da vida nos grupos mais jovens, ocorrido principalmente no caso
89
estudado, na raça preta e na raça parda, insere-se como um dos possíveis
fatores influenciadores de tal comportamento entre as idades mais elevadas.
Numa comparação entre pretos e brancos, se observadas as faixas (10
a 19 anos e 70 anos ou mais) verifica-se que enquanto na população mais
jovem a chance de um preto vir a ser vitimado é 2,7 a de um branco, entre a
população mais idosa a situação se inverte, estando o branco com
probabilidade de morte 1,7 vezes a de pretos. Entre a raça parda o maior risco
verificado no estado foi para a faixa dos 20 aos 29 anos. Isso, pois, em razão
de uma série de elementos que se somam ao longo da vivencia cotidiana (tais
como condições de vida de modo geral e a própria exposição à violência a
situações de estresse) que possam, dentre outros fatores, estar resultando em
suicídios, acidentes de transito e ou qualquer outro tipo ou causa de morte
presente no grupo das causas externas. Tal tendência coloca a população
branca na condição de maior propensão, em nível estadual, de alcançar as
idades mais elevadas se comparadas aos demais grupos étnico-raciais.
Gráfico 10 e 11 - Taxa Específica de Mortalidade do Espírito Santo, segundo raça/cor
nas microrregiões de planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010
25,0
2000
15,0
5,0
-5,0
0 a 09 anos 10 a 19
anos
20 a 29
anos
Branca
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
30 a 39
anos
40 a 49
anos
Preta
50 a 59
anos
60 a 69
anos
70 anos ou
mais
60 a 69
anos
70 anos ou
mais
Parda
2010
0 a 09 anos 10 a 19
anos
20 a 29
anos
Branca
30 a 39
anos
40 a 49
anos
Preta
50 a 59
anos
Parda
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010) e SIM/DATASUS. Organizado pelo autor.
Os estudos sobre o contexto capixaba revelam que o aspecto social, o
racismo, as relações sociorraciais e a imersão socioeconômica dos diferentes
grupos étnico-raciais têm contribuído e resultado numa sobreposição de mortes
90
violentas entre a população jovem não branca (ZANOTELLI et al, 2011;
WEISELFISZ, 2012). Estas que em sua maioria ocupam as regiões menos
dotadas de equipamentos públicos que proporcionam qualidade de vida e
oportunidades
em
seus
diversos
aspectos,
quais
sejam,
culturais,
educacionais, sanitárias, de moradia e segurança, por exemplo – em nível
estadual, verifica-se nas microrregiões situadas no extremo norte.
Ao comparar dois grupos etários de raças diferentes, nota-se que a
exemplo do exposto nos dados em nível estadual, os fatores territorial e racial,
parecem estar associados ao risco e a faixa etária, com maior incidência deste
também nas microrregiões (tabela 8). Enquanto após os vinte anos o risco
divide-se entre pretos e pardos, nota-se que entre os 10 e 19 anos, pretos são
as principais vítimas, em especial nas microrregiões localizadas no interior do
estado- divisa com o estado de Minas Gerais. Nos grandes centros urbanos,
como Rio Doce, Central Sul, Litoral Sul e Metropolitana (áreas com grandes
cidades, como Cachoeiro de Itapemirim, Linhares, Vitória, Serra, por exemplo),
as taxas mais elevadas foram verificadas em 2010 entre a população parda.
Apesar de não concentrar a principal estrutura econômica do estado,
as áreas rurais, que tiveram processo de ocupação das terras estimulado pelo
próprio estado (CASTIGLIONI, 2009) e como principal beneficiário as
comunidades européias59, foram contempladas com propriedades, facilitando
assim, sua sobrevivência nas localidades. A estes grupos, a própria seguridade
jurídica pela posse da propriedade em certo modo, atua como fator estimulador
a permanecer ocupando tais territórios, mesmo com a forte atração feita pelo
crescimento industrial nas outras áreas do estado. Ao contrário de muitas
propriedades da região do Rio Doce e Nordeste, por exemplo, onde as
comunidades quilombolas e indígenas tem sido expulsas pela atuação das
grandes empresas, restando a estas, migrarem para os centros urbanos e
ocupar as áreas menos favorecidas nas cidades – como tem ocorrido os
quilombolas.
59
Há que se ressaltar, no entanto, que com a crise do café, algumas famílias brancas que residiam na
região norte do estado também perderam tudo.
91
Tabela 8 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões de
planejamento do Espírito Santo, 2000 e 2010, 10 a 49 anos.
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2000 e 2010) e SIM/DATASUS. Organizado pelo autor.
Quando avaliado a probabilidade de perda da vida em função de um
assassinato, suicídio ou acidente de trânsito, nas variadas microrregiões do
estado, entre os 10 e 49 anos, a população preta e parda é a principal vitimada,
mesmo nos territórios onde representam percentualmente número inferior em
relação à branca. Em 2010, por exemplo, a microrregião Central Serrana, onde
havia em média a menor concentração de autodeclarados pretos (3,5%) e
pardos (25,3%), o risco de morte para pretos na faixa etária dos 30 aos 39
anos foi 1,7 vezes o de brancos (branca: 12,3; preta: 20,9; parda: 11,2 óbitos
para cada dez mil habitantes) (tabela 8). Vale destacar que nesta área do
estado, em média 70% da população é autodeclarada branca.
Nos grupos etários que compõe os extremos da população (crianças e
pessoas com idades mais avançadas), em que as rotinas cotidianas são menos
ativas (DRUMOND JR; BARROS, 1999) estando, portanto, menos expostos as
tensões sociais – se comparado aos grupos etários de 10 a 49 anos -,
verificou-se uma maior dispersão entre os grupos étnico-raciais do risco de
morte. O fator racial parece atuar de modo menos incisivo.
É possível estabelecer uma correlação entre o lugar onde o indivíduo
92
vive e as condições materiais de acesso a oportunidade, condições de saúde,
exposição à violência, onde aqueles que residem nos espaços geográficos
mais privilegiados de benfeitorias acabam por serem expostos ao longo de
suas vidas a menores riscos de perder a vida (SILVA; PAIM; COSTA, 1999;
BATISTA; ESCUDER; PEREIRA, 2004; CHOR; LIMA, 2005; ZANOTELLI ET
AL, 2011; BOURDIEU, 2013; ALBUQUERQUE; SILVA, 2015; IJSN, 2016).
Para Bordieu (2013) processos como este revelaria o fenômeno de reificação
do espaço social, em que as relações que se estabelecem entre o lugar e o
social, privilegiariam determinadas localidades geográficas em função de
outras.
Verificadas sob o ponto de vista dos indicadores sociais, o norte, onde
se evidencia as informações de maior vulnerabilidade social e socioeconômica,
sanitária e de acesso a saúde, mostrou-se como a área do estado com maiores
índices de violência60 onde a população preta é a principal vitimada.
Comparando-se as taxas da população jovem (10 a 19 anos) microrregião
Noroeste, por exemplo, nota-se que no ano de 2010 a taxa específica da
população preta foi 2,7 vezes superior a parda e 2,8 a branca (branca: 3; preto:
8,3; pardo: 3,1 óbitos para cada dez mil habitantes).
Além da demarcação social (DAMIANI, 2002) e territorial (FARIA,
2016), a mortalidade, no caso estudado, as oriunda de causas externas, das
microrregiões analisadas, manifestou significativa orientação espacial do risco,
ao passo que, quanto maior a concentração populacional, mais elevados eram
as taxas para pardos, enquanto o sentido inverso se mostrou mais relevante
entre pretos, tendo estes os mais altos risco de vir a serem vitimados. O que os
inserem como potenciais vítimas principalmente nas microrregiões do interior
capixaba. O risco entre brancos manteve-se pequeno – se comparado a pretos
e pardos- nos principais grupos etários, manifestando-se mais relevantes nas
idades mais avançadas (TEM mais elevada para o ano de 2010 dos 10 aos 49
anos: Branca: 13,7; Preta: 45,1; Parda: 33,5 óbitos para cada dez mil
habitantes).
Os gráficos a seguir apresentam o comportamento das taxas
60
Importante destacar que a violência é produzida socialmente. Não se trata de algo inato do
lugar. São as relações sociais que produzem as áreas violentas (ZANOTELLI, et al, 2011).
93
específicas de mortalidade em função das microrregiões e da faixa etária no
ano de 2010 (Gráficos 12, 13, 14 e 15). Para se compreender o quão maior foi
à probabilidade de óbito para a população autodeclarada preta no período
analisado em relação às categorias raciais, torna-se importante lembrar que o
total de autodeclarados pretos nas dez microrregiões não ultrapassa os 12,1%
em ambos os anos, enquanto pardos e brancos superam os 30% na maioria
das microrregiões de planejamento do estado. Mesmo assim, foi possível
verificar que o risco de morte evidenciado pelas taxas mostra-se mais
incidente, principalmente nos grupos etários de maior exposição cotidiana a
situações violentas.
Nota-se que entre os 10 e 19 anos (gráfico 12), pretos são as principais
vítimas, em especial nas microrregiões localizadas no interior do estado- divisa
com o estado de Minas Gerais. Nas microrregiões Litoral Sul e Centro Oeste
foram identificados os mais elevados diferenciais do grupo etário, sendo que o
risco para pretos foi 5,5 o de pardos e 7,3 o de brancos. Nos grandes centros
urbanos, como Rio Doce, Central Sul e Metropolitana (áreas com grandes
cidades, como Cachoeiro de Itapemirim, Linhares, Vitória, Serra, por exemplo),
as taxas mais elevadas foram verificadas em 2010 entre a população parda.
Gráfico 12 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões de
planejamento do Espírito Santo, 10 a 19 anos, 2010
45,0
40,0
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
24,2
20,5
2,8
5,2
Branca
1,2
Preta
4,5
Parda
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2010) e SIM/DATASUS. Organizado pelo autor. Óbitos por
dez mil. Organizado pelo autor.
Entre os 20 e os 29 anos (gráfico 13), as taxas mantiveram-se
elevadas entre pretos. Contudo, neste recorte etário, ganha destaque o
crescimento das taxas de mortalidade entre a população parda, que em alguns
94
casos, sobrepõe ao risco de pretos. Na microrregião Metropolitana, possuidora
da maior concentração de população do estado, o alto risco foi visualizado
entre a população parda.
Gráfico 13 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões de
planejamento do Espírito Santo, 20 a 29 anos, 2010
45,0
40,0
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
Branca
Preta
Parda
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2010) e SIM/DATASUS. Organizado pelo autor. Óbitos por
dez mil. Organizado pelo autor.
Percebe-se que entre pretos e pardos os diferenciais são ainda mais
elevados dos 30 aos 39 anos. Ressalta-se para o fato de que na microrregião
Sudoeste Serrana não foi computada nenhum óbito de pretos (gráfico 14).
Gráfico 14- Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões de
planejamento do Espírito Santo, 30 a 39 anos, 2010
45,0
35,0
25,0
15,0
5,0
-5,0
Branca
Preta
Parda
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2010) e SIM/DATASUS. Óbitos por dez mil. Organizado
pelo autor.
Após os 40 anos o crescimento mais significativo foi evidenciado pelo
grupo racial branco, que em algumas microrregiões supera as taxas de pretos
(gráfico 15). No entanto, mantiveram-se as maiores probabilidades entre pretos
e pardos.
95
Gráfico 15 - Taxa Específica de Mortalidade, segundo raça/cor nas microrregiões de
planejamento do Espírito Santo, 40 a 49 anos, 2010
45,0
40,0
35,0
30,0
25,0
20,0
15,0
10,0
5,0
0,0
Branca
Preta
Parda
Fonte: IBGE Censos Demográficos (2010) e SIM/DATASUS. Óbitos por dez mil. Organizado
pelo autor.
Os dados tenderam, na medida em que se aumenta a escala de
análise, passar por um processo de enegrecimento do maior risco de óbito,
que, em nível estadual, apresentaram-se entre pardos, e, na medida em que
são inseridas as variabilidades espaciais microrregionais, vai se agravando
entre pretos, principalmente nas áreas com maior vulnerabilidade, sugerindo
assim, uma distribuição espacial da mortalidade nas microrregiões do Espírito
Santo que tem apresentando fortes desigualdades tanto raciais quando
microrregionais, variando de modo significativo também entre os grupos
etários.
96
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os últimos séculos demarcaram mudanças significativas nas condições
de vida da população mundial. De modo geral, muitos foram os avanços que
precisam ser considerados, tais como, a melhoria nas condições sanitárias, nos
métodos contraceptivos, dentre outros. E em consequência de tais fatos,
verificou-se também, um conjunto de impactos nos indicadores demográficos,
destacando-se os ganhos na expectativa de vida. O Espírito Santo, por
exemplo, saiu de um cenário de esperança de vida em 1940 similar ao que os
países europeus possuíam séculos atrás, para em menos de trinta anos passar
a figurar entre os estados brasileiros com melhores e maiores esperanças de
vida.
Ao longo da realização da presente pesquisa, encontrou-se evidências
de que tais ganhos, pelos quais o estado do Espírito Santo tem passado ainda
não se traduziram em benefícios para todos os grupos populacionais de modo
equânime (sexo, idade, raça, por exemplo). Sob a ótica racial, os resultados da
pesquisa dão indícios de que a população preta e parda ocupa posição de
riscos sociais mais elevados devido ao racismo vivenciado em diversas
esferas.
Castiglioni (2011) discorria que o ano de 2010 havia sido um ano de
intensa elevação do grupo das causas externas. Como se verificou nas
informações obtidas na presente pesquisa, ao que parece, esta incidência tem
demarcado nas microrregiões investigadas, forte concentração espacial na
distribuição das taxas específicas de mortalidade, tendo de modo bem
demarcado os grupos étnico-raciais vitimados.
As microrregiões onde se concentram as principais e mais altas taxas
de mortalidade são as mesmas onde a literatura tem indicado como os piores
lugares, sob o ponto de vista socioeconômico e ambiental, para se viver no
estado. São também nestes lugares onde os relatórios oficiais dos órgãos
governamentais têm apontado existir as mais elevadas taxas de assassinatos,
o que coloca esta como provável e principal tipo de causas para os
falecimentos dos municípios destas microrregiões categorizados como Causas
Externas nos registros do SIM/DATASUS. Estes achados corroboram e
97
reforçam espacialmente as tendências apontadas por Zanotelli et Al. (2011) e
Waiselfisz (2012; 2015) e Ribeiro Junior (2012), de que nesta unidade
federativa há um processo de vitimização dos grupos etários mais jovem,
territorialmente localizados nas áreas com os indicadores socioeconômicos
mais vulneráveis61, em sua maioria pretas e pardas.
Há que se ressaltar, no entanto, que microrregiões como a
Metropolitana e Rio Doce apesar de concentrar as principais atividades
econômicas também apresentou taxas significativamente altas, indicando a
existência de intensos conflitos sociais que merecem atenção por parte dos
pesquisadores. Afinal, nestes espaços, conforme se verificou em Zannotelli et
al (2011), tem-se também a concentração de renda, que contribui para o
acirramento entre classes sociais. Bem como concentra a maior densidade de
automóveis e acidentes de trânsito do estado, que contribui no grupo das
causas externas.
Devido ao fato deste ser um estudo exploratório, em que se tinha como
principal objetivação visualizar os diferenciais e os níveis de mortalidade por
raça/cor das microrregiões de planejamento no estado, não foi possível afirmar
exatamente quais tipos dentro do grupo das causas externas são os
responsáveis pela maior vitimização da população negra no estado no período
analisado. Todavia, os dados possibilitam inferir que os ambientes urbanos
apresentaram-se para os anos investigados, mais propensos a vitimarem a
população autodeclarada parda, enquanto os menos populosos e rurais, os
pretos.
Há que se destacar o risco que a população preta e parda (negra) tem
sido exposta, com maior ênfase nos autodeclarados pretos. Mesmo
representando, em média, menos que 13% dos autodeclarados em todas as
microrregiões, os níveis mais elevados de propensão à morte foram registrados
entre os pretos.
No que se refere ao processo de desenvolvimento da presente
pesquisa, faz-se necessário destacar algumas dificuldades e fragilidades
encontradas nos dados. De modo geral, notou-se significativa melhora nas
61
Indicadores detalhados na narrativa tecida ao longo do capítulo dois.
98
informações disponibilizadas, sendo possíveis de serem verificadas nos
próprios percentuais de óbitos com categoria racial ignoradas. Todavia, a
categorização racial ainda se coloca como um importante quesito a ser
melhorada, principalmente no que diz respeito à metodologia de coleta da
informação.
A
ambiguidade
entre
a
autodeclaração
(em
vida)
e
a
heteroclassificação do profissional designado pelo órgão competente (categoria
racial da vítima) dificulta a produção de estudos que poderiam fornecer para os
diversos campos de debates científicos, importantes dados e discussões com
vista a auxiliar na elaboração de políticas públicas específicas para os grupos
étnico-raciais com potenciais riscos de mortalidade.
Cita-se, por exemplo, o caso da população indígena e amarela que
sequer apareceram nas estatísticas produzidas por esta pesquisa, resultando
numa série de questões que permanecem em aberto, pois sequer podem-se
inferir com exatidão quais, afinal, foram às tendências específicas investigadas
neste trabalho no que se refere à mortalidade dos mesmos. Estes, ao que tudo
indica, encontram-se ainda mais invisíveis para o poder público.
Castiglioni (1994, p.1) assevera que ―a duração média de um grupo
populacional varia em função da velocidade com que seus elementos são
eliminados às várias idades [...]‖. Como se observou ao longo do
desenvolvimento deste trabalho, nas unidades espaciais analisadas, os grupos
étnico-raciais têm sido substancialmente atingidos de modo diferenciado. E
algumas consequências de tendências como estas podem ser visualizadas em
termos estaduais no relatório do IJSN (2016), onde se verifica que apesar dos
ganhos em termos gerais, o estado tem revelado diferencial nos acréscimos de
idosos dos grupos étnico-raciais, destacando-se os brancos em relação aos
demais. Inserindo-se assim, o grupo racial branco com maior propensão a
obter ganhos na expectativa de vida ao nascer.
A constatação de que a pertença racial tem favorecido e em muitos
casos condicionado grande parte da população às condições de desigualdades
em várias áreas (educação, mercado de trabalho, moradia, representatividade
em espaços de disputa de poder, etc.) vem sendo cada vez mais fortalecida
pelos estudos empíricos. Os lugares desiguais ocupados pelos distintos grupos
étnico-raciais (FIORIO et. al. 2011), tanto no que se refere aos territórios,
99
quanto às relações sociorracialmente estabelecidas no cotidiano, parecem
como indicam os dados, estar resultando também num prolongamento desigual
da vida entre brancos, pretos e pardos no Espírito Santo.
Considerando
a
ocorrência
de
tais
tendências,
salienta-se
a
necessidade de estudo que focalizem especificamente nessas microrregiões
com taxas mais elevadas. De modo a detalhar os tipos de mortes que
compõem o grupo das causas externas, e compreender quais as causas
específicas e que dinâmicas socioterritoriais têm contribuído para o
comportamento de tais ocorrências. Há ainda a necessidade de se desenvolver
métodos de análises de tais dados oficiais que contribuam para averiguar e
discutir ao longo destas, o impacto da vivência do racismo e se há relação com
os constantes agravamentos de tais informações.
Os resultados obtidos no presente estudo assinalam para a
necessidade de se pensar políticas públicas com vista na redução da violência,
principalmente entre a população jovem e adulta, destacando a primordialidade
de se implementar medidas capazes de mitigar tanto espacial quanto
racialmente o crescimento da mortalidade especialmente entre a população
mais jovem.
100
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, F. R. P. C; SILVA, L. G. C.Tendências dos níveis e padrões
de mortalidade e seus diferenciais regionais no período 2000-2030: Brasil,
Grandes Regiões e Unidades da Federação. IN: ERVATTI, L. R.; BORGES, G.
M.; JARDIM, A. P. (org.). Mudança demográfica no Brasil no início do
século XXI: subsídios para as projeções da população. Rio de Janeiro:
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2015, p.49-86
ANDRADE, L. T. de; DINIZ, A. M. A. A reorganização espacial dos
homicídios no Brasil e a tese da interiorização. Rio de Janeiro: REBEP, v.
30,
Sup.,
p.171-191.
2013.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/pdf/rbepop/v30s0/11.pdf>Acesso em: 15 jun. 2016.
ARAUJO, E. M. et al.Diferenciais de raça/cor da pele em anos potenciais de
vida perdidos por causas externas.Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.43, n.3,
p.405-412,
mai/jun.
2009.
Disponível
em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003489102009000300003>Acesso em: 15 jun. 2016.
BATISTA, L. E.; ESCUDER, M. M. L.; PEREIRA, J. C. R. A cor da
morte:causas de óbito segundo características de raça no Estado de São
Paulo, 1999 a 2001.Rev. Saúde Pública,São Paulo, vol.38, n.5, Out.. 2004.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003489102004000500003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 jul. 2016.
BEAUJEU-GARNIER, Jacqueline. Geografia de população. 2. ed. rev. e atual.
São Paulo: Ed. Nacional, 1980. xiv, 440 p.
BENTO, M. A. S. Branqueamento e branquitude no Brasil. In: CARONE. I.;
Bento, M. A. S. Psicologia social do racismo : estudos sobre branquitude e
branqueamento no Brasil. 5ª. ed.Petrópolis,RJ: Vozes, 2012, p. 25-57.
BOURDIEU, P. Espaço físico, espaço social e espaço físico apropriado.
Estudos Avançados, São Paulo, vol.27, n.79. 2013. Disponível em
<http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142013000300010 > Acesso em: 14 out.
2016
BRASIL et al. [s.d.]. Oficina temática dinâmica demográfica e
socioeconômica<
http://www.ijsn.es.gov.br/component/attachments/download/4476>Acesso em:
01 março 2017. 54 slides. Apresentação em Power point.
BRASIL. Ministério do Trabalho. Características do emprego formal: relação
anual de informações sociais – 2014. Brasília, 2014. Disponível em:
<http://portalfat.mte.gov.br/wpcontent/uploads/2016/03/Caracter%C3%ADsticas-do-Emprego-Formalsegundo-a-Rela%C3%A7%C3%A3o-Anual-de-Informa%C3%A7%C3%B5esSociais-2014-31082014.pdf>. Acesso em: 13 nov. 2016.
101
BRITO, F. O deslocamento da população brasileira para as metrópoles.
Estudos Avançados, São Paulo, v. 20, n. 57. Maio/ Ago. de 2006. Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010340142006000200017&script=sci_arttext>. Acesso em: 28 nov. 2015.
CAÇADOR, S. B.; GRASSI, R. A. A Evolução Recente da Economia do
Espírito Santo: Um Estado Desenvolvido e Periférico. 2009.
http://www.anpec.org.br/encontro2009/inscricao.on/arquivos/000acbb55edea8d55d858feb624d6b49f0d.pdf > Acesso em: 27 fev. 2017.
CALIMAN, O. Formação econômica do Espírito Santo: de fragmentos
doperíodo colonial à busca de um projeto de desenvolvimento. RIGS, Vol. 1, n.
2.
Mai/Ago.
2012.
Disponível
em
<
https://portalseer.ufba.br/index.php/rigs/article/view/10061/7196 > Acesso 12
dez 2016.
CAMPOS, Andrelino. Do quilombo à favela: a produção do „espaço
criminalizado‟ no Rio de Janeiro. 5. Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2012. 208 p.
CAMPOS, R. R de. Aspectos demográficos na obra de Josué de Castro.
RevistaMercator,
Fortaleza,Vol.8,
n.17.
2009.
Disponível
em
<http://www.mercator.ufc.br/index.php/mercator/article/viewFile/274/248
>
acesso em: 18 out. 2016
CARDOSO, A. M. A.; SANTOS, R. V.; COIMBRA JR, C.E. A.Mortalidade
infantil segundo raça/corno Brasil: o que dizem os sistemasnacionais de
informação?Cad. Saúde Pública,Rio de Janeiro, v.21, n.5, p.1602-1608,
set/out. 2005. <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X2005000500035> Acesso em: 15 jun. 2016.
CARVALHO, J. A. M. de; SAWYER, D. O.; RODRIGUES, R. de N. Introdução
a alguns conceitos básicos e medidas em demografia - São Paulo: ABEP,
1998.
Disponível
em:
<http://www.ernestoamaral.com/docs/indsoc122/biblio/Carvalho1998.pdf > Acesso em: 3 abr. 2016.
CASTIGLIONI, A. H. Mortalidade diferencial no Espírito Santo. Vitória: UFES,
1994 (Relatório de Pesquisa – Bolsa de produtividade em pesquisa CNPQ)
CASTIGLIONI, A. H. Mudanças na estrutura demográfica do Espírito Santo
ocorridas durante a segunda metade do século XX. Geografares, Vitória, n.7,
p.93-109. 2009.
CASTIGLIONI, A. H.. Mortalidade diferencial por causa segundo o sexo e a
idade no Espírito Santo: síntese das relações. In: V Simpósio Nacional de
Geografia da Saúde - II Fórum Internacional de Geografia da Saúde, 2011,
Recife. ANAIS - V Simpósio Nacional de Geografia da Saúde - II Fórum
Internacional de Geografia da Saúde - Espaço, Ambiente e Território nas
práticas da saúde, 2011. p. 1-11.
102
CASTIGLIONI, A. H; FAÉ, M. I. Inter-relações entre a frota de veículos, a
ocorrência de acidentes de trânsito e o adensamento populacional no Espírito
Santo. Ateliê Geográfico, Goiânia, v.8, n.7, p.103-127, abr/2014.
CHOR, D.; LIMA, C. R. A. Aspectos epidemiológicos das desigualdades raciais
em saúde no Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro,vol.21 n.5, Set./Out.
2005.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X2005000500033 > Acesso em: 12 jul. 2016
DAMIANI, Amélia Luísa. População e Geografia. 7. Ed.São Paulo: Contexto,
2002.107 p.
DOTA, E. M.; COELHO, A. L. N.; CAMARGO, D. M.; Atlas da migração no
Espírito Santo. 1. ed. - Vitória: UFES, Proex, 2017. Disponível em <
http://www.geo.ufes.br/sites/geografia.ufes.br/files/field/anexo/atlas3.pdf
>
Acesso: 04 abr. 2017.
DRUMOND JR., M.; BARROS, M. B. A. Desigualdades socioespaciais na
mortalidade do adulto no município de São Paulo. Rev. bras. Epidemiol,São
Paulo,
vol.2
n.1-2,
Abr./Ago.
1999.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415790X1999000100004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 jul. 2016.
DURANS, C. A. Questão social e relações étnico-racias no Brasil. Revista de
Políticas Públicas, São Luís, Número Especial, p. 391-399, julho. 2014.
<http://www.revistapoliticaspublicas.ufma.br/site/download.php?id_publicacao=
903 > acesso em: 12 ago. 2016
ESPÍRITO SANTO. Secretaria de Estado da Saúde. Plano estadual de saúde
2012-2015. Vitória: [s.n], 2012.
FARIA,R. Geografia da mortalidade infantil do Brasil: variações espaciais e
desigualdades territoriais. Geousp – Espaço Tempo (online), v.20,n.3,, p.602618, 2016.
FERRARI, T. K. Distribuição populacional no espírito santo: resultados do
censo demográfico 2010. IJSN, Vitória, n.27, ano IV, mai. 2011. Disponível
<http://www.ijsn.es.gov.br/ConteudoDigital/20121022_958_201127_.pdf
>
Acesso em: 16 dez. 2016.
FERREIRA, S. R. B. ―Donos do lugar‖: a geo-grafia negra
camponesadoSapêdo Norte – ES. Geografares, Vitória, n.8, p.1-23. 2010
e
FILHO et al. Aspectos fisiográficos e socioeconômicos. IN: _____. Atlas de
rochas ornamentais do estado do espírito santo. p.19-24. Disponível em
<http://www.cprm.gov.br/publique/media/atlas_rochas_ES.pdf> Acesso em: 25
abr. 2017
103
FIORIO et al. Mortalidade por raça/cor: evidências de desigualdades sociais em
Vitória (ES), Brasil. RevBrasEpidemiol, São Paulo, vol.14, n.3, Set.. 2011.
Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415790X2011000300016 > Acesso em: 12 jul. 2016
FREITAS, P. P. de. Geografia da população: novas abordagens e
possibilidades de estudo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEÓGRAFOS,
7.
2014,
Vitória.
Anais
eletrônicos...
Disponível
em:
<http://www.cbg2014.agb.org.br/resources/anais/1/1403926483_ARQUIVO_GE
OGRAFIADAPOPULACAO_artigo_PatriciaPonte.pdf >. Acesso em: 01 set.
2016
FUNDO DE POPULAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.UNFPA.Mortes maternas
caem pela metade em 20 anos, mas é necessário acelerar o
progresso.2012.Disponível
em
<http://www.unfpa.org.br/novo/index.php/noticias/2012/160-mortes-maternascaem-pela-metade-em-20-anos-mas-e-necessario-acelerar-o-progresso>
Acesso em 09 mai. 2017
GEORGE, M.; MCGRANAHAN, G. A transição urbana brasileira: trajetória,
dificuldades e lições aprendidas. In: BAENINGER, R (Org.). População e
Cidades: subsídios para o planejamento e para as políticas sociais.
Brasília: UNFPA, 2010.p.11-24.
GEORGE, Pierre. Geografia da população. 5. ed. - Rio de Janeiro: Difel,
1978. 118 p.
HASENBALG, Carlos Alfredo. Discriminacao e desigualdades raciais no Brasil.
Rio de Janeiro: Graal, 1979.
HENRIQUES, R. Desigualdade racial no Brasil: evolução das condições de
vida na década de 90. Brasília: IPEA, 2001. Disponível em:
<http://www.do.ufgd.edu.br/mariojunior/arquivos/desigualdade_racial_brasil.pdf
> Acesso em: 3 abr. 2016.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE. Síntese
de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população
brasileira: 2015.n. 35. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. 137 p.
INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA. IPEA. Situação social
da população negra por estado. Brasília: IPEA, 2014. 115p.
INSTITUTO JONES DOS SANTOS NEVES. IJSN. Perfil da pobreza no
Espírito Santo: famílias inscritas no CadÚnico 2016. Vitória: IJSN, 2017b.
87p.
INSTITUTO JONES DOS SANTOS NEVES. IJSN. Relatório: jovens fora da
escola. Vitória: IJSN, 2017a. 102p.
INSTITUTO JONES DOS SANTOS NEVES. IJSN. Síntese dos Indicadores
104
Sociais do Espírito Santo PNAD 2015. Vitória: IJSN, 2016. 104p.
KILSZTAJN, S. et. al. Vítimas da cor: homicídios na região metropolitana de
São Paulo, Brasil, 2000. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.21, n.5, p.
1408-1415,set/out,
2005.
Disponível
em
<
http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n5/13.pdf > Acesso em: 15 jun. 2016.
LACERDA et al.. Economia brasileira. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
LIRA, Eder. Transformação de um espaço: o caso do bairro Morada da
Barra, Vila Velha (ES) - Brasil. 2015. 213 f. Dissertação (Mestrado em
Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia do Centro de Ciências
Humanas e Naturais, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2015.
LIRA, P.; CAVATTI, C [s/d]. O estado do Espírito Santo no Censo 2010.
Disponível
em
<
http://observatoriodasmetropoles.net/download/Censo_ES_e_RMGV.pdf
>
Acesso: 16 dez. 2016.
LIRA, P.; CAVATTI, C.. O estado do Espírito Santo no Censo 2010 [s.d.].
Disponível
em:
<http://www.observatoriodasmetropoles.net/download/Censo_ES_e_RMGV.pd
>. Acesso em: 16 dezembro 2016.
LIRA, Pablo Silva. Geografia do Crime e Arquitetura do Medo: uma análise
dialética da criminalidade violenta e das instâncias urbanas. 2. Ed. Rio de
Janeiro: Letra Capital, 2017. 184 p.
LIRA, Pablo Silva; OLIVEIRA JUNIOR, Adilson Pereira de; MONTEIRO, Laturra
Laranja (Ed.). Vitória: transformações na ordem urbana. 1. Ed. Rio de
Janeiro: Letra Capital, 2014.393 p. (Série estudos comparativos)
LOUREIRO, K. A modernização econômica do Espírito Santo e a ação dos
agentes locais. In: SIMPOSIO NACIONAL DE HISTORIA, 23, 2005, Londrina.
Anais do XXIII Simpósio Nacional de História – História: guerra e paz.
Londrina: ANPUH, 2005. CD-ROM.
MACIEL, C. Discriminação racial. IN: OLIVEIRA, Osvaldo Martins (Org.).
Negros no Espírito Santo. Vitória: Arquivo Público do Estado do Espírito
Santo, 2016. p.167-183 (Coleção Canaã, Volume 22)
MARTINE, G.; MCGRANAHAN, G. A transição urbana brasileira: trajetória,
dificuldades e lições aprendidas. In: BENINGER, R. (Org.). População e
Cidades: subsídeos para o planejamento e para as políticas sociais.
Campinas: Núcleo de Estudos de População-Nepo/Unicamp; Brasília: UNFPA,
2010
MATTOS, R; ROSA, T. Segregação sócio espacial e ambiental em São Pedro
(Vitória-ES/Brazil). IN: VII CONGRESSO PORTUGUES DE SOCIOLOGIA –
SOCIEDADE CRISE E RECONFIGURAÇÕES, 7. 2012, Porto. Anais
105
eletrônicos...
Disponível
em:
<http://www.aps.pt/vii_congresso/papers/finais/PAP0414_ed.pdf >. Acesso em
31 mar. 2017
MENDES, A. S.; VILLASCHI, A.; FELIPE, E. S. Elementos caracterizadores
da concentração econômica no Espírito Santo. 2012. Disponível em
<https://economiacapixaba.wordpress.com/2012/08/02/elementoscaracterizadores-da-concentracao-economica-no-espirito-santo/>Acesso
em:
20 abr. 2017.
MORMUL, N. M. Geografia Humana e Geografia da População: pontos de
tensionamento e aprofundamento na ciência geográfica. Caderno de
Geografia, Belo Horizonte, vol. 23, n. 40, p. 33-47, ago-dez. 2013. Disponível
em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=333228746003> acesso em: 25
ago. 2016
PAES-SOUSA, R. Diferenciais intra-urbanos de mortalidade em Belo Horizonte,
Minas Gerais, Brasil, 1994: revisitando o debate sobre transições demográfica
e epidemiológica.Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro,vol.18, n.5, p.1411-1421,
set/out.
2002.
Disponível
em
<http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X2002000500034 > Acesso em: Acesso em: 12 jul. 2016
PAIM et al. Distribuição espacial da violência: mortalidade por causas externas
em Salvador (Bahia), Brasil. Rev Panam Salud Publica/Pan Am J Public
Health,
v.6,
n.5,
p.
321-331.
1999.
Disponível
em
<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/2897/1/0956.pdf > Acesso em 16 jun.
2016.
PEREZ, E. R.; TURRA, C. M. Desigualdade social na mortalidade no Brasil:
diferenciais por escolaridade entre mulheres adultas. In: ENCONTRO DA,
ABEP, 16. 2008, Caxambu. Anais eletrônicos... Disponível em <
http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2008/docspdf/abep2008_1705.pdf >
Acesso 15 jun. 2016
PRATA, P. R. A transição epidemiológica no Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio
de
Janeiro,
v.8
n.2,
abr./jun.
1992.
Disponível
em< http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X1992000200008> acesso em: 17 jun.
2016
RIBEIRO JUNIOR, H. Encarceramento em massa e criminalização da
pobreza no Espírito Santo: as políticas penitenciarias e de segurança
pública do governo de Paulo Hartung 2003-2010. Vitória: Cousa, 2012. 96 p.
RIBEIRO, L. C. Q.; RODRIGUES, J.; CORRÊA, F. S. Status, cor e
desigualdades socioespaciais nos grandes espaços urbanos brasileiros.
Rio de Janeiro: Letra Capital, 2009.106 p.
SALETTO, N. Sobre a composição étnica da população capixaba IN:
LAZZARO, Agostino (Org.). Imigrantes Espírito Santo: base de dados da
106
imigração estrangeira no Espírito Santo nos séculos XIX e XX. Vitória:
Arquivo Público do Estado do Espírito Santo, 2014. p.34-49.
SANTANA, M. Pesquisadores Debatem Saúde da População Negra em
Florianópolis.2012.
Disponível
em:<http://www.unfpa.org.br/novo/index.php/noticias/2012/192-pesquisadoresdebatem-saude-da-populacao-negra-em-florianopolis> acesso em: 09 mai.
2017
SANTOS, S. M.; NORONHA, C.P.Padrões espaciais de mortalidade e
diferenciaissócio-econômicos na cidade do Rio de Janeiro. Cad. Saúde
Pública, Rio de Janeiro, v.17, n.5, p.1099-1110, set/out. 2001. Disponível em:
<http://www.scielosp.org/pdf/csp/v17n5/6319.pdf> Acesso em: 16 jun. 2016
SANTOS, S. P. As relações raciais no Brasil. In:______. Os „intrusos‟ e os
„outros‟ quebrando o aquário e mudando os horizontes: relações de raça
e classe nas ações afirmativas da UFES. Curitiba: CRV, 2016, cap.5, p.175218.
SCHWARCZ, L. M. Racismo no Brasil. São Paulo: Publifolha, 2001. p.104
SILVA, L. M. V. da; PAIM, J. S.; COSTA, M. C. N. Desigualdades na
mortalidade, espaço e estratossociais. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.33,
n.2,
p.187-197.
1999.
Disponível
em:
<http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v33n2/0060.pdf> Acesso em: 16 jun. 2016.
SILVA, M. G.; DADALTO, M. C. Os efeitos da industrialização e das migrações
no espírito santo: o caso da Serra. Anais eletrônicos...Semana de Ciências
Sociais-UFES,
Vitória,
2014.
Disponível
em
<http://periodicos.ufes.br/SCSUFES/article/view/8908> acesso 01 jun 2016.
SISS, A.; PACE, A. F. O papel da educação na construção das identidades
étnicas como fator primordial para o exercício pleno da cidadania.In:
BARRETO, M. A. S. C.; RODRIGUES, A.; SISS, A. (Org.). Africanidades:
produções identitárias e políticas culturais. Vitória: EDUFES, 2013. p. 21-41
SOARES, M. J. B.; Relação entre desigualdades sócio-espaciais e a violência
urbana: o Caso das Regiões Metropolitanas da Baixada Santista e de
Campinas. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 14.
2004,
Caxambú,
Anais
eletrônicos...
Disponível
em:
<http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_752.pdf>
Acesso em:01 set. 2016
SOUZA, M. L.. Um ―olhar afrodescendente‖ sobre as cidades brasileiras. In:
CAMPOS, A. Do quilombo à favela: a produção do “espaço criminalizado”
no Rio de janeiro. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012, p.13-17.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO. Biblioteca Central.
Normalização de referências: NBR 6023:2002. 2. Ed. Vitória: EDUFES, 2015
107
WEISELFISZ, J. J. Mapa da Violência 2012: A Cor dos Homicídios no
Brasil. Rio de Janeiro: CEBELA, FLACSO, 2012. Disponível em <
http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/mapa2012_cor.pdf > Acesso em:
5nov. 2016
WEISELFISZ, J. J. Mapa da violência 2016: homicídio por armas de fogo.
Brasília:
FLACSO,
2015.
Disponível
em
<http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2016/Mapa2016_armas_web.pdf
>
Acesso em: 5 nov. 2016
YUNES, J. Epidemiologia da violência. In: OLIVEIRA, M. C. (Org.). Demografia
da exclusão social: temas e abordagens. Campinas: Editora da Unicamp,
2001. p.145-164.
ZANOTELLI, C. L. et al. Atlas da criminalidade no Espírito Santo.São Paulo:
Annablume : FAPES, 2011. 218 p.
ZELINSKY, W. Determinantes culturais da quantidade e distribuição da
população. In______: Introdução a Geografia da População. Rio de Janeiro:
Zahar, 1969, p.67-86