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O Mosteiro e o Burgo

2015, Cister no Douro

CITE: NP: Castro, Ana Sampaio e; Resende, Nuno - Cister no Douro. [s.l.]: DCRN/Museu de Lamego/Vale do Varosa, 2015. - O Mosteiro e o Burgo. ISBN: 978-989-98657-9-2 APA 6th: Castro, A. S. e., & Resende, N. (2015). O Mosteiro e o Burgo. In N. Resende, coord. ed. & L. Sebastian, coord. ed. (Eds.), Cister no Douro (pp. 56-63). [s.l.]: DCRN/Museu de Lamego/Vale do Varosa.

FICHAS TÉCNICAS CATÁLOGO COORDENAÇÃO EDITORIAL | Luís Sebastian Nuno Resende COORDENAÇÃO CIENTÍFICA AUTORES DOS TEXTOS | Nuno Resende |Ana Sampaio e Castro Ana Cristina Sousa Célia Taborda David Ferreira Hugo Barreira Lúcia Rosas Luís Corredoura EXPOSIÇÃO INICIATIVA Maria Leonor Botelho ORGANIZAÇÃO | Manuel Pedro Ferreira FINANCIAMENTO Miguel Rodrigues APOIO | Salvador Magalhães Mota | Cristina Dordio FOTOGRAFIA | Ana Sampaio e Castro Museu de Lamego | Vale do Varosa | DRCN / ON2, O Novo Norte | QREN | FEDER | UE Liga dos Amigos do Museu de Lamego Escola de Hotelaria e Turismo do Douro-Lamego Nuno Resende DESIGN GRÁFICO | Direção Regional de Cultura do Norte (DRCN) Luís Sebastian DIREÇÃO | Luís Sebastian (DRCN | Museu de Lamego) | Nuno Resende COMISSARIADO CIENTÍFICO PROJETO MUSEOGRÁFICO | Nuno Resende Luís Sebastian (DRCN | Museu de Lamego) Biblioteca Nacional Digital Bruno Marques. DCRN © EDIÇÃO GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS E FINANCEIROS | Paula Diocese de Lamego DESIGN EXECUÇÃO E MONTAGEM José Pessoa. Museu de Lamego. DRCN © TRATAMENTO AUDIOVISUAL Luís Corredoura TEXTOS Luís Sebastian. Museu de Lamego. DCRN © TRADUÇÃO Nuno Resende SONOPLASTIA Pedro Martins. DRCN © TEMA MUSICAL Soia Catalão. DRCN © IMAGENS |Outros Mercadus | DRCN / ON2, O Novo Norte | QREN | FEDER | UE | WGroup ISBN | 978-989-98657-9-2 IMPRESSÃO DEPÓSITO LEGAL | Pedro Martins FOTOGRAFIA Instituto Geográico do Exército Duarte (DRCN | Museu de Lamego) | 395817/15 Duarte (DRCN | Museu de Lamego) | Cristina Dordio Hugo Pereira. DRCN © | DCRN | Museu de Lamego | Vale do Varosa FINANCIAMENTO | Alexandra Falcão (DRCN | Museu de Lamego) Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa GESTÃO FINANCEIRA | Paula PRODUÇÃO APOIO À ORGANIZAÇÃO | Outros Mercadus, Lda. | Digitalframe, Lda. | Nuno Resende | Paulo Vaz (Escola de Hotelaria e Turismo do Douro-Lamego) | Luís Sebastian (DRCN | Museu de Lamego) | Luís Sebastian (DRCN | Museu de Lamego) | Museu de Lamego (Lamego, Portugal) Biblioteca Nacional de Portugal (Lisboa, Portugal) Morgan Library (New York, United States of America) Bodleian Library (Oxford, United Kingdom) Bibliothèque National de France (Paris, France) Bibliothèque de la ville de Troyes / Mediatheque Grand Troyes (Troyes, France) Österreichische Nationalbibliothek (Wien, Österreich) Bibliothèque Municipale de Toulouse (Toulouse, France) 08 SÉCULOS XVI - XXI MOSTEIRO DE SANTA MARIA DE SALZEDAS O MOSTEIRO E O BURGO ANA SAMPAIO E CASTRO NUNO RESENDE O lugar do Burgo, situado às portas da igreja e mos- estava o dito lugar de Argeriz. A reforçar a hipóte- teiro de Santa Maria de Salzedas (figura 1) constitui a se de um povoado antigo neste local temos ainda materialização urbanística das relações de indivídu- as evidências arqueológicas. De facto, na encosta os leigos ao serviço da comunidade cisterciense, ou oeste da elevação da capela de Nossa Senhora da dela dependentes, quase desde a sua fundação, no Piedade, encontram-se numerosos vestígios de frag- século XII, até à atualidade (figura 3 cat. 22). mentos de cerâmica comum medieval e cerâmica Aquando do início de construção do mosteiro, em de construção. A este exemplo junta-se o do Burgo 1168, provavelmente existiria já um pequeno aglo- próximo do mosteiro de S. João de Tarouca, situado merado populacional nas suas proximidades. Como a poucos quilómetros de Salzedas, que já existiria an- refere A. de Almeida Fernandes (FERNANDES, 1995: tes do estabelecimento monástico (SEBASTIAN et alii, 203) o território, designado por Argeriz, que se tornou 2008: 143). couto monástico tinha como povoado principal Villa É após a implantação do mosteiro que este núcleo Plana de Argeriz, situado no sopé da elevação onde se terá transferido para o local presente, designado se ergue atualmente a capela de Nossa Senhora da por Burgo (figura 2). Atualmente este pequeno aglo- Piedade. Esta capela, edificada no século XVIII sob merado, na sua maior parte desabitado, é constituí- égide monástica, deverá ter substituído uma mais an- do por um conjunto de estruturas justapostas, onde o tiga, possivelmente a igreja de S. Salvador de Argeriz espaço privado é mais representativo, originando um a qual, segundo um documento datado de 1153, o tecido denso e irregular com ruas estreitas, sinuosas e seu presbítero trocou pela de S. Silvestre de Britiande descontinuadas (figura 3). (FERNANDES, 1984: 28). De um modo geral este conjunto apresenta habi- Uma das primeiras referências documentais onde tações com dois pisos, paredes exteriores em alvena- encontramos Villa Plana de Argeriz data de 1144 ria de pedra no andar inferior, normalmente utilizado (FERNANDES, 1995: 204) e em 1150 é mesmo referida para guarda das alfaias agrícolas e/ou de gado, e a villa de Argeriz numa carta de venda de propriedades efetuada a D. Teresa Afonso (FERNANDES, 1984: 15). Fr. Baltazar dos Reis (2002: 23-24) no manuscrito Breve relação da fundação e antiguidade do Mosteiro de Santa Maria de Salzeda de início de século XVII menciona um local denominado por vinhas de Argeriz, localizado num vale, junto da igreja de S. Salvador de Argeriz, edificação então ainda existente, onde no dito sittio de Argeriz se achão oje alicesses e vestigios de edificios antigos, aonde parece que Figura 1 | Fachada a igreja de Salzedas. Foto Pedro Martins © DRCN  57 58  Figura 2. Ana Sampaio e Castro Figura 3 | Arruamento do Burgo de Salzedas. Foto Luís Sebastian  de tabique no piso superior e nas divisões internas. deve-se a fatores como o clima ou a facilidade de Esta técnica encontra-se, sobretudo, na designada acesso a materiais autóctones, evitando um custo arquitetura vernacular das regiões do Alto Douro, acrescido na construção das habitações e paralela- Trás-os-Montes e Beira Alta. Consiste na aplicação mente criando um ambiente mais estável no interior de terra argilosa, amassada com água e fibras ve- das divisões. getais (palha) como enchimento e sob elementos de Até à época moderna o lugar parece indissociável madeira que são colocados na vertical, horizontal do mosteiro. No foral outorgado, em 1504, ao Cou- ou inclinados. Embora só se encontre documentada to de Salzedas ainda se não refere qualquer povoa- entre nós a partir de século XVII, é contudo provável ção nomeada como Burgo ou Salzedas, sendo ape- que tenha uma cronologia mais recuada, uma vez nas indicados os lugares de Granja Nova, Ucanha, que na Europa terá sido utilizada desde a Idade Mé- Cimbres, Meixedo, Murganheira, Vila Pouca, Formilo dia (PINTO, 2013: 32). A popularidade desta técnica e Valdevez (CASTRO, 2014: 36). Porém, no Numera- mento de 1527 aparece referido o mosteiro da Cer- século XVII, colhemos algumas expressões da vivência zeda, com 14 moradores o que poderia incluir a co- humana à sombra do Mosteiro. E a própria autonomi- munidade monástica e eventuais leigos (COLLAÇO, zação do lugar, revelada na alteração das designa- 1931: 130). Efetivamente se aos 14 moradores corres- ções Burgo e Mosteiro, empregadas sistematicamen- 1 te até 1696 e depois substituídas definitivamente no podemos calcular o número de habitantes do Burgo formulário da documentação paroquial por Salzedas através de uma indicação cronologicamente próxi- (ADL, Paroquiais, Mistos 1690-1723, fls. 2-2 v.º). ponder um número entre os 60,2 e os 67,2 indivíduos ma. Trata-se da referência do visitador cisterciense Titulava-se então a paróquia como do Bom Jesus D. Edme de Selieu que, tendo passado em Salzedas de Salzedas ou do Santíssimo Nome de Jesus de Sal- em Janeiro de 1533, indicou para o mosteiro 23 pro- zedas, sendo regida por um cura apresentado pelo fessos e 3 noviços (BRONSEVAL, 1970). Subtraindo os abade do mosteiro. Os livros paroquiais revelam-nos ocupantes do mosteiro aos 60-67 indivíduos atrás re- a inconstância dos ciclos curas nomeados, que se su- censeados talvez possamos contabilizar pouco mais cedem em pequenos intervalos – alguns de menos de três dezenas de indivíduos a habitar o Burgo no de um ano. início do século XVI. A cartografia antiga também não indica, quer Infelizmente sabemos muito pouco sobre os ho- gráfica, quer toponimicamente nem o Burgo, nem mens e as mulheres que ali viviam que formariam Salzedas. Na região, apenas a carta de Fernando uma mescla de lavradores, oficiais mecânicos e, Álvaro Secco (SECO, 1559-1561) assinala São Pedro porventura, alguns comerciantes e serviçais com das Águias e as de d’Abeville (D’ABEVILLE, 1654), F. vínculos ao mosteiro. É provável que a edificação de Wit (WIT, 1670) e de Jaillot (JAILLOT, 1711) sinalizam do novo complexo monástico no século XIII enredas- o topónimo Tarouca. Na cartografia de setecentos se na sua órbita vários oficiais e obreiros, foreiros e surge a Ucanha, indicada na Província da Beira por outros colonos atraídos pela pujante atividade cons- Carpinetti (CARPINETTI, 1769 - 1779). Mas em nenhu- trutiva e humanizadora que implicava acalentar a ma outra carta, até ao século XIX, surge o Mosteiro formação de comunidades laboriosas, não apenas ou o Burgo de Salzedas. para a construção, mas para o arroteamento e cul- É, contudo, um memorialista das luzes, o Padre Luís tivo de terra bravia. Seriam talvez alguns destes ho- Cardoso que, através do seu Dicionário Geográfico mens que no dia 6 de Janeiro de 1533 assistiram à de 1751 nos traz as primeiras notícias monográficas sagração do novo abade de Salzedas, na presença sobre o Burgo. Segundo a sua descrição era lugar da do visitador D. Edme que, não obstante ter conside- Provincia da Beira, Bispado, e Comarca de Lamego, rado o lugar solitário e desabitado, se espantou com Concelho, e Termo da Villa de Ucanha, sendo Dona- a multidão assistente (BRONSEVAL, 1970: 517-519). tarios delle os Religiosos do Mosteiro de Santa Maria Dos registos paroquiais de Salzedas, iniciados no de Salzedas (CARDOSO, 1751: 307). Tinha 75 vizinhos 59 e a paróquia, com um altar, estava dentro do lugar, dos registos de casamentos, baptismos e óbitos no com o orago Bom Jesus2. O cura era, como já refe- lugar de Salzedas, entre 1690 e 1799, obtivemos o se- rimos, da apresentação do Dom Abade. Para além guinte gráfico: da invocação patronal, cultuava-se dentro da igreja matriz S. Caetano e S. Sebastião. Na paróquia existiam ainda três irmandades, a do Rosario, das Almas, e do Bom Jesus e cura dela estendia a sua jurisdição pelos lugares de Meixedo, Cortegada, Murganheira, e Vila Pouca, em cujas aldeias erguiam-se as «Ermi- 60 das de S. Salvador, S. Barbara, S. Marinha, S. Antonio, S. André, S. Luzia, e Espirito Santo. Acrescentava ainda o memorialista que os frutos, que em mais abundancia recolhem os moradores desta Freguesia, são, trigo, milho painço, centeyo, azeite, vinho, e castanha em abundancia; tambem cria muita caça, de coelhos, lebres e predizes» (CARDOSO, 1751, II: 307). Sem dados estatísticos regulares disponíveis até ao  Fonte: Livros de Registos Paroquiais de Salzedas (Arquivo Diocesano de Lamego). século XIX, apenas podemos comparar a indicação do Numeramento de D. João III que indicava os 14 O pequeno Burgo do século XVI converteu-se, pois, moradores da Cerzeda com os 75 vizinhos referidos ao longo dos séculos XVII e XVIII num lugar com no- no Dicionário Geográfico de 1751. Naturalmente tável vitalidade demográfica. Ao nível de nascimen- notamos um incremento da população, que acom- tos, o lugar de Salzedas manteve-se abaixo do regis- panha a tendência nacional e até internacional. to anual de 100 indivíduos para, a partir do primeiro Contudo como se terá processado este movimento quartel do século XVIII, evidenciar um considerável demográfico localmente? Sob a jurisdição espiritual aumento quer em número de casamentos, quer de e temporal do mosteiro, como se reflectiria esta rela- nascituros/batizados. E a progressão continua expo- ção na demografia? nencialmente até finais do século XVIII, em particular Valioso documento do tipo qualitativo, os registos a partir da década de 1770. paroquiais são, também, fontes de teor estatístico A que se deveu tal crescimento? Só um estudo que permitem uma análise da demografia local, mais aturado sobre a exploração da terra e dos seus cujo movimento pode ajudar-nos a compreender a recursos e a sua administração pela principal entida- relação dos seus habitantes com o mosteiro sob cuja de dominial local – o mosteiro – poderá explicar com sombra habitavam. A partir de uma contabilização rigor este aumento demográfico. Mas um aspeto, o da proximidade a uma estrutura arquitetónica de ção começou pela capela-mor. grandes dimensões, explica, em parte, a fixação hu- O documento contabilístico de 1750 explica a ra- mana no local. A necessidade de assegurar o traba- zão da obra: por ameaçar ruína a igreja necessitou de lho braçal, a deslocação de matéria-prima e a sua intervenções que começaram pelos fundamentos da transformação – processo destinado a abastecer os cabeceira – a qual e pela aspereza do terreno onde habitantes do mosteiro e a sustentar a maleabilidade se situava exigiu um gasto considerável. Para o proje- arquitetónica do complexo, poderá ter contribuído to foram chamados a Salzedas Gaspar Ferreira, para para o incremento demográfico, sobretudo ao longo fazer o risco da mesma capela e António de Andra- do século XVIII. de, para o desenho da tribuna e coro. A descrição São conhecidos dois períodos de grande atividade construtiva em Salzedas: um no início da época do decurso da obra é reveladora da complexidade e grandeza (a expressão é do redator) do projeto: moderna que corresponde aos abadessados de D. […] Em quebrar pedraria para a Capela Mor, fac- Brás de Cimbres e D. Damião Rodrigues e outro, já tura della, e forro com muro arroda, materaes perten- em pelo século XVIII de que é testemunho a estrutura centes a ella, como madeira para andaimes, pregos, actual da igreja. Embora nos centremos no espaço varios ferros, Grades para as frestas, arame e feitio eclesial, a atividade construtiva e reconstrutiva man- das [...] Cal, tijolo para as abobedas, e factura dellas, teve-se ao longo do século XVII, nomeadamente na telha e Conducção aguço de picos, ferragem de edificação da ala sul e segundo claustro (CASTRO, Carros e para madeira para elles, Carpinteiros e as 2014: 34). Muitas destas intervenções, à falta de do- muitas juntas de boys que se comprarão para condu- cumentação são atestadas por cartelas datadas e zirem a pedraria, e mais materiaes para a ditta obra breves referências esparsas pela documentação polvora e, chumbo, vidros que vierão do Porto para (COSTA, 1984: 540). as vidraças das frestas; e mas Couzas […] (TT, Mosteiro No entanto a obra que definiu, cremos, uma rutura de Alcobaça, 3.ª Inc., mç. 4, doc. 184, fl. 3) com o edifício medieval foi a que marcou o abades- Esta obra, quase fundacional, em nada reflete, sado trienal de frei Pedro Castelo Branco (1747-1750) portanto, o trabalho de Carlos Guimach que durante – a quem José Leite de Vasconcelos indica como fi- algum tempo foi indicado pela historiografia da arte lho de Salzedas (VASCONCELOS, 1933: 399). Na folha como o obreiro da nova igreja de Salzedas. De resto, contabilística referente ao seu primeiro período de a sua presença em Portugal a partir de, pelo menos, governo assinalam-se várias intervenções dispersas, o ano de 1690 (GOMES, 1996) não coincide nem com quer pela cerca, quer fora dela (em moinhos, muros, a cronologia de edificação da estrutura de Salzedas etc.ª), quer nos dormitórios e celas (TT, Mosteiro de Al- (iniciada por volta de 1747), nem com a linguagem cobaça, 3.ª Inc., mç. 4, doc. 184). É, contudo, a igreja arquitetónica do frontispício cuja construção deverá que mereceu a atenção do abade, cuja reedifica- ter ultrapassado os limites do século XVIII. 61 62  Já quanto à presença em Salzedas do arquiteto contabilística. A partir da década de 1730 registam- Gaspar Ferreira esta é corroborada pela vasta obra se várias alusões a mortes relacionadas com obras que deixou nas regiões da Beira Alta e do Mondego no convento: em 1734 Jerónimo, solteiro, carpintei- tendo trabalhado como mestre entalhador e arquite- ro da Província de Entre Douro e Minho faleceo de to em projetos para Coimbra (Biblioteca, 1718), Viseu um desastre no real mosteiro de Salzedas (ADL, Pa- (1720 e 1733), Mangualde (1721), Santa Comba Dão roquiais, Salzedas, Óbitos 1710-1739, cx. 3, l.º 1, fl. 80); (1737), Arouca (Mosteiro, 1744 e 1746) e Montemor- em 1750, José, solteiro, cahio das obras do convento, o-Velho (Hospital, 1752-1754) estes últimos trabalhos (ADL, Paroquiais, Salzedas, Óbitos 1739-177, cx. 3, l.º registados contratualmente (ALVES, 2001, I: 335-341; 2, fl. 27); em 1755 Manuel de Araújo, cayo nas obras FERREIRA-ALVES, 2008: 123), a que agora se acrescen- deste Mosteiro de Salzedas, de que logo falleceo ta a referência ao risco da capela maior de Salzedas, (ADL, Paroquiais, Salzedas, Óbitos 1739-177, cx. 3, l.º 2, executado por volta de 1750. fl. 49). É de resto pertinente assinalar a proveniência Os livros de registo paroquial são consentâneos minhota destes e de outros oficiais que muito embora com o frenesim atrás descrito pelo redator da folha não tenham falecido nas obras do mosteiro viviam Figura 4 | Sacristia da igreja de Salzedas: paramenteiro e pinturas de Bento Coelho da Silveira (1677-1685). Foto Pedro Martins © DRCN em Salzedas nesta época, como Manuel Gomes, ofi- Leal à época em que a obra foi suspensa acrescenta cial de pedreiro natural de São Mamede de Ferreira, às suas palavras uma importância que não podemos arcebispado de Braga, falecido naquele lugar em ignorar. Segundo ele, quando Junot invadiu Portugal 20-9-1754 (ADL, Paroquiais, Salzedas, Óbitos 1739-177, em 1807, a obra da fachada de Salzedas parou, e cx. 3, l.º 2, fl. 43). É, pois, natural que esta migração de nunca mais, até hoje, se concluiu (LEAL, 1878: 373). oficiais cuja mão-de-obra servia o estaleiro da nova É provável que o conturbado clima político e eco- igreja monástica influísse no crescimento da comuni- nómico contribuísse para o abandono do projecto dade de Salzedas dando expressão à vitalidade de- arquitectónico. No entanto, as razões inerentes à pa- mográfica a partir da década de 1730. ragem das obras ou de, pelo menos, ao seu abranda- Mão anónima assinalou, num códice pertencente ao espólio de Leite de Vasconcelos, a paragem das mento em finais do século XVIII, são-nos ocultas pela documentação disponível e para já reconhecida. obras durante o abadessado de Gregório Pereira Não obstante, no início do século XIX constituía Sal- (1796-1797), mas não o explica. Segundo o redator zedas um núcleo urbano onde se registava a preva- do dito códice, o abade Gregório Pereira, de Lisboa, lência de mão-de-obra especializada nos ofícios da continuou com o frontispício e o deixou no estado cantaria, como testemunham as várias referências a em que actualmente se acha e se não fora a sus- pedreiros dali naturais a trabalharem em igrejas da pensão que ouve de obras a deixaria completa por região (ALVES, 2008: 48, 71). que se conhecia nelle hu grande desejo de o mandar acabar […]3. Embora reconhecido pela ausência de referências Em finais do século XIX Salzedas tinha 251 moradores, sendo o lugar mais populoso do termo da Ucanha (SERRÃO, 1970: 40). à origem das suas fontes, a proximidade de Pinho  Figura 5 | Claustro novo de Salzedas e vista sobre o remate inacabado do frontispício da igreja. Foto Pedro Martins © DRCN 1. Para cálculo do número de habitantes por fogo adoptámos a proposta de J. José Alves Dias que afina a média anteriormente desenvolvida de 4/5 indivíduos para os valores coeficientes de 4,3 e 4,8 pessoas p/ fogo (DIAS, 1996, I: 39). 2. A esta igreja refere-se frei Baltasar dos Reis, nestes termos: Junto desta Igreja [a monástica] á porta principal della mandou esta Sñora [Dona Maria de Sousa] fazer hua Cappella para a gente secular poder ouvir missa, porquanto era Custume usado, não entrar pessoa algua Leiga nas Igrejas dos Mosteiros desta Religião como ainda oje se uza em alguns Mosteiros de outros Reinos, a qual Igreja oje serve de Capella E freguesia de alguns Lugares que tem aobrigação de virem a ella ouvir Missa. Tem esta igreja, da porta principal da Igr.ª do Mosteiro ata porta della sette varas E de largo tem quatorze (REIS, 2002: 22). A igreja paroquial teria, assim, sido mandada edificar em vida de D. Maria de Sousa (século XIV), assinalando a existência de um pequeno núcleo de habitantes que justificasse tal fundação. 3. Museu Nacional de Arqueologia, Espólio de José Leite de Vasconcelos, Códice sobre a fundação do Mosteiro de Salzedas, fl. 25 v.º. 63