VIEIRA. VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
ABSTRACT
The by-catch of pink shrimp (Penaeus paulensis) fisheries
on Lagoa dos Patos, RS, Brazil.
The fishery of Penaeus paulensis on Lagoa dos Patos estuary takes place on
an important nursery ground for many fish species exploited on southern Brazil.
Although caught by various fishing gears, the pink shrimp fishery in the
estuarine zone is only allowed with passive nets (e.g., "aviãozinho"), which are
the most used by artisanal fisherman. This work makes an impact assessment
of the "aviãozinho" fishery over the fish fauna that inhabits Lagoa dos Patos
estuary. Samples (53) were obtained in 33 visits on two landing points during
1993/94 and 1994/95 fishing seasons. Fish species were classified according
to its frequency in the samples and the percentual contribution in weight and
number in the catches. As unit of fishing effort it was considered the total
number of nets used in a day work of each fisherman (12 hours in average). A
first estimation of the fishing effort to the whole estuary was carried out using
2
the fishing intensity data (nets/km /day) of a known area. Total catches in
weight was composed, on average, by 66.7% of P. paulensis, 26.8% of the
blue crab Callinectes spp., and 6.6% of fishes. The discards were mainly
composed by juvenile fish of small size. Micropogonias furnieri (white croacker)
and Netuma barba (marine catfish) were the dominant species in weight and
number on discards and seem to be the most impacted species. Based on
15,866 nets estimated to the whole estuary during 1995 fishing season, a total
discard of 445.9t was calculated, suggesting a substantial impact of this fishery
on fish populations that use the estuarine environment as a nursery ground.
The results seem to be more impressive when expressed as number of
individuais caught per season. Micropogonias furnieri showed general CPUE of
2.2 ind./net which result in 4.2 millions of individual caught per season. For N.
barba, with a CPUE of 1.4 ind./net, the total catch results on 2.7 millions of
individuais per season. This work shows that the incidental catch of Lagoa dos
Patos shrimp fisheries is large and harmful to the white croacker and marine
catfish fisheries. An effective control of the fishing effort Lagoa dos Patos
shrirnp fisheries have to be done in order to avoid potential conflicts that this
by-catch generates.
KEY WORDS: by-catch, pink shrimp, fishes, Lagoa dos Patos, Brazil.
1 - INTRODUÇÃO
O estuário da Lagoa dos Patos (Fig. 1A) abriga uma ictiofauna
bastante diversa, composta por 11 O espécies, que alternam sua ocorrência
no ambiente estuarino de acordo com distintas estratégias de vida (Vieira &
Castello, no prelo). Esse estuário constitui a mais importante área de criação
e crescimento para grande parte dos peixes e crustáceos comercialmente
explorados no litoral sul do Brasil (Chao et ai. 1982, 1986). Nesta região
concentra-se a maior parte da pesca de subsistência e de pequena escala
(artesanal) do sul do Brasil (Chao et ai. 1982, 1986, Reis 1993), tendo sido
uma área de pesca importante desde o final do século passado (Reis
1993).
124
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
)>
-i
r
)>·
z
-i
ヲᅢGB|QゥセlZ、pエ@
40
•
()
:\f\..L
::u
õ"
Ilha
G)
do!
lll
50
a.
YA.
Marinheiro!
.....
::J
.....
... _...::
45'
_)>
1
'
/'
....
Bセ@
セM@
CD
OI
->..
CXl
\
_.
55'
N
(.U
I
_.
J:>.
N
32°
<D
セ@
Ri::: •odó:· gイセZᄋ@ Su-l·:·:········
セ@
'\
'\
;
;
''
;
LセBG@
02
,!.,
I
'
iセ|N[@ |セ@
;
I
I
PUセM
\
I
_.
\,
Q@
,
____ ,
• .--""•"
Área I
05'
Área li
1O'
o
セ@ "''
15'
or.
•
OCEANO
ATLÂNTICO
...
a
25'
...
ll
15'
1O'
05'
52° 55'
50'
45'
40'
35'
d
20'
....
-
r0
OJ
-:::.
o
)::.
Ci
Q
30'
:r
z)>
-o
m
(/)
()
)>
o
o
()
セ@
N
01
FIGURA 1 - a) O estuário da Lagoa dos Patos e a localização das enseadas protegidas onde se concentra a pesca do camarão-rosa; b)
Detalhe da área de estudo. Na Área I foram delimitadas 5 subáreas para a contagem do número de redes "aviãozinho". • indica os locais de
desembarque visitados.
)>
s::
)>
::u
)>•
o
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
os desembarques da pesca artesanal de peixes teleósteos na Lagoa
dos Patos e região marinha adjacente variaram entre 43600t ( 1972) e
13000t (1989), chegando a representar 36°/o do total 、・ウュ「。イセッ@
no porto
do Rio Grande. Entretanto, nos últimos 1O anos, essa pesca na apresentou
um declínio de cerca de 34°/o em relação ao decênio anterior, sendo hoje
apenas um meio alternativo de subsistência (Reis QYセL@
1993). Os baixos
rendimentos atualmente observados são atribuídos a d1versos fatores, e a
alta proporção de juvenis nas capturas e a pesca de adultos durante o
período reprodutivo desempenham papel importante (Reis 1992).
1.1 - A pescaria do camarão-rosa
A pesca do camarão-rosa (Penaeus paulensis) representa uma das
principais atividades pesqueiras do estuário da Lagoa dos Patos. Dela
participam pescadores artesanais dos municípios de Rio Grande, São José
do Norte e Pelotas, pequenos agricultores das margens do estuário, assim
como pescadores de Santa Catarina, que permanecem acampados na
região durante os meses de safra (Asmus 1989).
De 1978 a 1986, a produção de camarão pela pesca artesanal na
Lagoa dos Patos representou mais de 90°/o do total de camarão
desembarcado no Rio Grande do Sul, contribuindo expressivamente no valor
total dos desembarques (5 a 25°/o do total) e constituindo um dos principais
produtos da pauta de exportação de pescados da região (IBAMA, 1993).
Guardadas as incertezas das estatísticas de desembarques, a produção
anual do camarão-rosa na Lagoa dos Patos variou entre 443 e 8823tlano
(D'Incao 1991 ), com uma média de 1921,3t para o período 1990 a 1994
(IBAMA-CEPERG/RS).
Na captura do camarão são utilizadas várias artes de pesca. A
legislação vigente (Portaria SUDEPE n. 0 04, 14/01/86) permite a utilização
de redes fixas que fazem uso do fluxo de água e da atração luminosa como
meio de captura, embora sejam também utilizadas ilegalmente redes ·de
arrasto manual (coca), motorizado (prancha ou portas e pauzinho) e de
deriva (berimbau ou gerival).
Entre as artes permitidas, as redes do tipo "aviãozinho" são as mais
difundidas. O "aviãozinho" é uma rede cilíndrica com a parte posterior do
corpo em forma de funil, onde a panagem é sustentada por aros de ferro. A
rede é fixa por estacas (calões) em águas rasas como sacos, baixios e
bancos ao longo do estuário. A pesca é efetuada no período noturno
(aproximadamente 12 horas), através da atração luminosa proporcionada
por lampiões a gás, presos no fundo do saco da rede. O "aviãozinho"
permanece na água durante toda a safra, sendo comumente içado para fora
d'água durante o dia, para evitar o acúmulo de detritos nas malhas bem
I
126
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
como para efetuar reparos ou mesmo para que não seja roubado.
De acordo com a Portaria IBAMA no 09-N/93, o "aviãozinho" deve
possuir no saco uma malhagem mínima de 24mm entre nós opostos e um
comprimento de tralha não superior a 15m, sendo permitido o uso de uma
"andai na" (conjunto de no máximo 1O redes) a cada pescador licenciado. A
temporada de pesca é, em princípio, aberta e fechada anualmente pelo
1BAMA com base no acompanhamento do crescimento do camarão-rosa,
permanecendo proibida geralmente no período de 01 de outubro a 31 de
janeiro do ano subseqüente. Entretanto, muitas das regulamentações
impostas não são seguidas pelos pescadores, que concentram sua atividade
entre dezembro e maio.
1.2 -A ictiofauna acompanhante
No mundo inteiro, a ictiofauna acompanhante da pesca do camarão
forma um conhecido e discutido recurso subutilizado e freqüentemente
descartado pelo seu pequeno tamanho ou por não haver mercado para sua
comercialização (Andrew & Pepperell 1992). Os descartes nas pescarias
direcionadas ao camarão são responsáveis por mais de um terço das 27
milhões de toneladas anualmente descartadas nas pescarias mundiais
(Aiverson et ai. 1994 ).
No estuário da Lagoa dos Patos, a pesca do camarão desenvolve-se
sobre os juvenis do camarão-rosa (Penaeus paulensis) que se concentram
nos "sacos" ou enseadas rasas ao longo do estuário (D'Incao 1991 ). Esses
ambientes oferecem locais adequados ao desenvolvimento e crescimento de
juvenis tanto de camarões como de peixes - muitos destes de importância
comercial, como a corvina (Micropogonias furnien) e o bagre-marinho
(Netuma barba) (Vieira & Castello, no prelo).
Não existem, até o momento, estudos direcíonados para avaliar a
magnitude da rejeição da pesca do camarão-rosa realizada no estuário da
Lagoa dos Patos. Nesse sentido, este trabalho tem como objetivos:
(i) analisar a composição da ictiofauna acompanhante da pesca do camarãorosa com a rede "aviãozinho", e (ii) avaliar o impacto potencial dessa
pescaria sobre a comunidade de peixes do estuário da Lagoa dos Patos.
2 - METODOLOGIA
2.1 -Área de coleta
A área de coleta (Fig. 1) compreendeu a porção sul do Saco do
Arraial, abrangendo o estreito formado entre a Ilha dos Marinheiros e a
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
127
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
(Área 11), enseada
cidade do Rio Grande (Área I) e o Saco da m。ョァオ・ゥセ@
rasa mais próxima à boca do estuário, que é caractenzada por uma f?rma
fechada e por uma estreita ligação com o corpo lagunar. Ambas as areas
constituem locais de pesca importantes, concentrando pescadores dos
municípios do Rio Grande, São José do Norte e também do estado de Santa
Catarina. O Saco da Mangueira, em função de suas características
particulares de posição e circulação, ao contrário do Saco do Arraial, não
pode ser considerado como um representante típico das enseadas e sacos
do estuário da Lagoa dos Patos.
Foram efetuadas visitas semanais ao ponto de desembarque na
Área 1durante a safra de 1993/94 e 1994/95 e na Área 11 na safra 1994/95. A
tabela 1 relaciona o número total de visitas e o número de pescadores que
tiveram suas capturas analisadas em cada uma das áreas. Durante as
visitas foram registrados, para cada pescador entrevistado, o esforço de
pesca (número total de redes utilizadas), a captura total em peso de
camarão (fundamentalmente P. pau/ensis), siri (Callinectes spp.) e peixes.
TABELA 1 -Área, período amostrado, número de visitas aos pontos de desembarque, número
total de pescadores entrevistados, número de amostras e número máximo, mínimo e médio de
redes utilizadas para cada amostra.
Are a
Período
Visitas
Pescadores
Amostras
10
16
7
4
5
15
30
10-18 (14,6)
li
24/02 a 22/04/94
26/01 a 04/04/95
17/02 a 29/03/95
Redes min-máx
(média)
12-18 (15, 7)
4
08
16-18 (16,8)
33
5
53
10-18 (15,2)
Total
Para caracterizar a estrutura da ictiofauna acompanhante, a captura
total de peixes foi analisada em laboratório, registrando-se, por espécie, o
número total capturado, peso(g) e composição de comprimento total (CT)
em mm. Para efeito de padronização, as capturas foram expressas em
CPUE (captura por unidade de esforço), calculadas a partir da razão entre a
captura total por espécie (em número e em peso) e o esforço de pesca
empregado (número de redes). A análise das variações temporais e espaciais
dos CPUE de peixes (número e peso) e do CPUE de camarão e siri (em
peso) nas capturas foi feita mediante o emprego de análise de variância
para nível de significância de 95°/o (Zar 1984 ). Os valores de CPUE (número
e peso) receberam transformações do tipo logarítmica e raiz quadrada para
atingir homogeneidade de variância (teste de Cochrans C- SPSS/PC).
A caracterização da ictiofauna acompanhante da pesca do camarãorosa com rede de "aviãozinho" foi feita mediante o índice de importância
relativa (IIR) e pela análise da riqueza de espécies (S). Para cada área e
128
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
safra amestrada as espécies de peixes foram classificadas de acordo com
sua importância nas capturas, através da aplicação do
IIR
=F0°/ox(P /o+No/o),
0
onde FO é a freqüência de ocorrência, expressa em percentagem, da espécie
em todas as amostras, e P e N a percentagem em peso e número de
indivíduos nas capturas. Para a análise da riqueza de espécies (S) utilizou-se
a técnica da rarefação (Sanders 1968, Vieira 1996). Essa técnica permite a
comparação do número de espécies entre amostras com diferentes números
de indivíduos capturados (N). A estimativa do número esperado de espécies
(E[S]) em cada uma das situações é obtida supondo-se que em cada caso
fossem tomadas amostras de igual tamanho. Essa amostra de referência é
calculada subtraindo-se, da abundância da menor amostra, o número de
indivíduos da espécie dominante (Ludwig & Reynolds 1988, Vieira 1996).
Como estimador da intensidade da pesca com "aviãozinho" na região,
foram consideradas as contagens do número total de redes atuantes na
Área I. As contagens foram feitas em dois dias (20/03 e 04/04/1995), durante
os quais a região foi percorrida de barco, seguindo a delir1_1itação de cinco
subáreas (Fig. 18). Em cada subárea, as redes avistadas foram contadas
por pelo menos duas pessoas, visando garantir uma maior exatidão das
estimativas. É esperado que a contagem do número de redes atuantes
esteja subestimada, particularmente em subáreas onde é grande o número
de estacas avistadas sem redes. Portanto, para efeito de cálculo da
2
intensidade de pesca (número médio de redes por km ), foram
desconsideradas as contagens realizadas em subáreas onde o número de
estacas sem rede foi muito elevado.
A estimativa da intensidade de pesca na Área I foi calculada com base
2
no número médio de redes por km . As áreas potenciais de pesca no
estuário da Lagoa dos Patos foram calculadas considerando a profundidade
de 2m como limite para a implantação da arte, e a estimativa da intensidade
de pesca para todo o estuário extrapolada a partir da Área I. Como forma de
testar essa aproximação, o número estimado de redes foi comparado com a
estatística oficial do IBAMA e com a bibliografia.
3- RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em função dos resultados obtidos, e segundo as definições propostas
por Alverson et ai. ( 1994 ), podemos dividir as capturas da pesca com
"aviãozinho" em três componentes: (i) espécie-alvo, representada pelo
camarão-rosa (Penaeus paulensis); (ii) captura acessória, representada
fundamentalmente pelos siris do gênero Callinectes; (iii) rejeito ou descarte,
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
129
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
constituído fundamentalmente de peixes de pequeno porte. A subcaptura ·
(em inglês by-catch) foi considerada como a soma da captura acessória e· o
descarte.
3.1 - Composição das capturas
A composição das capturas manteve uma estrutura semelhante entre·
os anos e áreas analisadas (Fig. 2).
a)
Camarão
54,6%
Camarão
67,4%
Camarão
75,6%
gdp[セZ@
セp・ゥクウ@
Peixes
73%
Siri
39,8%
I
o
,
Siri
25,3%
,
b) Camarão 66,7%
セMp←ゥク・ウ@
Siri
20,3%
,
Areall
Safra 94/95
Areal
Safra 94/95
Area I
Safra 93/94
セTLQE@
--------- --- --- --6,6%
------- -------------- ---
M. fumieri 44,8%
N. barba 18,5%
Outras 46 spp. 36,7%
,
Média
Areas I e 11
Safra 93 a 95
FIGURA 2 - Composição percentual das capturas de Penaeus paulensis (camarão),
Callinectes spp. (siri) e peixes por combinações de safra e área de coleta (a) e média para o
período de estudo (b). Os tamanhos dos gráficos na figura "a" são proporcionais aos CPUE.
A contribuição percentual em peso da espécie-alvo nas capturas
(média= 66,7°/o) foi sempre superior à dos demais componentes. Os valores
observados variam entre 54,6 e 75,6°/o. A contribuição da captura acessória
constitui o segundo grupo mais abundante (média= 26,8°/o), com
percentagens entre 20,3 e 39,8°/o. Os descartes representaram o grupo
menos abundante. A contribuição média do descarte foi de 6,6o/o, com
percentagens entre 4,1 e 7,3°/o. Esses valores, embora não testados
estatisticamente, são semelhantes àqueles encontrados para a pesca com
"aviãozinho'' no estuário do rio Tramandaí, RS (Silva 1984).
130
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA
CAMARÃO
. DO
'
•,.
: . .
',
3.2 - A arte de pesca
A permissão do IBAMA para o uso de artes passivas como o
"aviãozinho" baseia-se na elevada eficiência dessas artes de pesca,. que
capturam uma maior proporção de camarão, comparada com o by-catch.
Penaeus paulensis constitui, em média, 66,7°/o em peso das capturas
obtidas com o "aviãozinho" na área estudada (Fig. 2). De fato, esses
valores, quando comparados aos descartes mundiais das pescarias de
arrasto de fundo, sugerem um baixo impacto com "aviãozinho" sobre a fauna
acompanhante.
Alverson et ar (1994) e Andrew & Pepperell (1992) estimam que, em
nível mundial, o by-catch nas pescarias de arrasto dirigidas ao camarão
varia entre 83 e 90% das capturas. Ruffino & Castello (1992) calculam
valores semelhantes para a pesca de arrasto dirigida ao camarão Artemesia
longinaris na região oceânica adjacente ao estuário da Lagoa dos Patos.
3.3 -A espécie-alvo
O CPUE em peso de camarão (Tab. 2) foi significativamente menor na
safra de 1993/94 na Área I (1 055,2g/redes) do que na mesma área para a
safra de 1994/95 (2975,9g/redes) e na Área 11 para a safra de 1994/95
(2599,8g/redes). Esse fato, associado à variação anual da produção de
camarão-rosa no estuário da Lagoa dos Patos, sugere que existem
N、ゥヲ・セョ。ウ@
na abundância de P. pau/ensis entre safras, mas que essas
diferenças não são necessariamente significativas entre distintas áreas
dentro de uma mesma safra.
TABELA 2 - CPUE médio em peso (g/rede) e erro-padrão em parênteses de Penaeus
pau/ensis, Cal/inectes spp. e peixes; CPUE médio em número de peixes (n°/rede) e erropadrão em parênteses e proporção em peso de peixes em relação ao camarão capturado e
erro-padrão em parênteses; n núm&ro de amostras-.
=
Área
(safra)
n
I (1993/94)
15
I (1994/95)
30
11 (1994/95)
08
Média
53
%das capturas em peso
CPUE em peso
(g/rede)
CPUE
(n°/rede)
Proporção
(%)
P. paulensis
Callinectes
Peixes
Peixes
Peixes
1.055,2
(4,37)
2.975,9
(2,73)
2.599,8
(5,28)
2.375,5
(2,34)
768,1
(4,51)
1.114,4
(2,51)
698,8
(4,53)
953,6
(2,26)
107,9
(0,86)
322,3
(0,92)
140,4
(0,99)
234,2
(0,61)
8,3
(2, 12)
8,3
(0,91)
4,3
(0,59)
7,7
(0,80)
13,86
(2,93)
13,52
(2, 11)
7,11
(2, 18)
12,65
(1 ,51)
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
131
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
Após 0 recrutamento no interior do estuário, a_s pós-larvas distri?uem」ッョセ・エイ。@
nos sacos (D lncao
se por uma ampla área, com ュ。ゥセイ・ウ@
1991 ). Não existem, até então, mfor_maçoes ウセヲQ」・ョエ@
para 、セエN・」。イ@
diferenças nas abundâncias entre os diferentes 」ョセ、ッオイウ@
do セウオ。ョッ@
da
Lagoa dos Patos. No entanto, variações interanua1s na produt1v1dade do
camarão ocorrem, sabidamente, segundo mudanças nos processos
ambientais envolvidos no controle do recrutamento das pós-larvas e
crescimento dos juvenis no ambiente estuarino. Fatores como o índice de
pluviosidade e a intensidade e direção dos ventos estão entre as variáveis
normalmente associadas à variação anual da produção do camarão-rosa na
Lagoa dos Patos (Calazans 1978, Castello & Mal ler 1978, D'lncao 1991 ).
3.4 - O esforço de pesca
Não existem, até o momento, estimativas da intensidade da pesca
com "aviãozinho" para o estuário da Lagoa dos Patos. D'lncao (1991)
caracterizou os sacos da Mangueira, Arraial, Mendanha, Silveira e Rincão
(Fig. 1) como as principais áreas de concentração da pesca do camarãorosa. Na tabela 3 é apresentada uma estimativa da extensão das áreas
(km 2 ) propícias à utilização do "aviãozinho" em cada um desses ambientes.
As áreas foram calculadas considerando a profundidade de 2m como limite
para a implantação da arte. Estima-se que a área potencial de pesca com
2
"aviãozinho" na Lagoa dos Patos seja de 244, i 7km .
TABELA 3 - Relação das principais áreas de concentração da pesca com o "aviãozinho" no
estuário da Lagoa dos Patos e estimativa das área propícias (menos de 2m) à utilização da
arte de pesca (baseado em D'lncao 1991 ).
Saco
Mangueira
Arraial
Mendanha
Silveira
Rincão
Total
26,79
115,99
42,44
16,46
42,49
244,17
A partir dos censos realizados em 1995, obtém-se um número médio
de redes "aviãozinho" atuantes na Área I igual a 1837 (Tab. 4). No entanto,
na estimativa do esforço de pesca efetivo do uso da rede de "aviãozinho"
para a captura do camarão-rosa na Lagoa dos Patos, devem ser observados
aspectos relacionados à dinâmica do pescador.
A pesca c_9m "aviãozinho" é basicamente noturna. As redes ficam
içadas durante operíodo de sol, para evitar o acúmulo de sujeira nas malhas
e mesmo para garantir uma vida útil mais longa à panagem. É nesse período
que a contagem das redes é possível. Contudo, freqüentemente o pescador
não vive próximo ao local de pesca e, para evitar o furto de suas redes
、オイ。ョエセ@
o セゥ。@
(fato relativamente comum ao longo das enseadas que
marge1am nucleos urbanos), ou para efetuar reparos, retira seus petrechos
132
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
da água, voltando a instalá-los ao anoitecer para a pesca. Assim, é
esperado que a contagem do número de redes atuantes esteja subestimada,
particularmente nas subáreas 1 e 5, onde foi grande o número de estacas
avistadas sem redes. Portanto, para efeito de cálculo da intensidade de
2
pesca (número médio de redes por km ) para a Área I, foram
desconsideradas as contagens realizadas nas subáreas 1 e 5. Dessa forma,
estima-se que a intensidade de pesca na Área I, em vez de 44,57 redes/km 2 ,
2
tenha sido de 64,98 redes/km (Tab. 4). Usando esse valor como um
estimador da intensidade geral da pesca e multiplicando-o pela área
2
potencial de pesca (244, 17km ; Tab. 3), obtém-se uma estimativa de cerca
de 15.866 redes/dia atuantes em todo o estuário. Esses dados foram
comparados com o regtstro oficial de "andainas" (IBAMA) e a bibliografia.
TABELA 4 - Número de redes "aviãozinho" contadas na Área I e a estimativa da intensidade
2
de pesca (número de redes por km ) na região de estudo. Média 2 a 4 representa o número
médio de redes por km 2 , calculado desconsiderando os valores obtidos nas subáreas 1 e 5.
Data
Subáreas
1
2
3
4
5
Total
20/03/95
152
632
186
766
34
1770
04/04/95
77
398
58
1367
4
1904
Média
114,5
515,0
122,0
1066,5
19,0
1837,0
)
4,85
7,52
2,16
15,24
4,39
34,16
2
23,61
68,48
56,48
69,98
4,32
44,57
Área (km
2
Redes/km
Média 2 a 4
64,98
O número oficial de registros de "andainas" para a safra 1994/95 foi
de 682 (IBAMA- Posto de Controle e Fiscalização de Rio Grande); porém,
segundo Dias (com. pess.), estima-se que o número real possa ser 1OOo/o
maior (- 1364 andainas), devido à invasão de pescadores clandestinos
(pessoas não-credenciadas pelo órgão competente) e pescadores
provenientes do estado de Santa Catarina. Considerando que o número
oficial de redes por andai na é 1O, obtém-se um número aproximado de
13640 redes/dia. Esse valor está próximo ao valor estimado acima (15866
redes/dia).
Esses resultados são corroborados pela estimativa do número de
"parelhas de pesca" atuantes na pescaria do camarão-rosa no ano de 1988
(Asmus 1989). As parelhas são consideradas unidades de pesca
constituídas por uma embarcação motorizada, um ou dois botes utilizados
na despesca e um conjunto de pelo menos dez redes, denominado
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
133
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
"andai na" Segundo Asmus (op. cit. ), estima-se que durante o ano de 1988
·
·t
t·
Lagoa dos Patos cerca de 1281 parelhas de pesca.
h
h
estanam a uan es na
·d
os como 1o o número de redes por parei a, c egaPortanto se cons1 erarm
.
'
1
• ·
para 0 esforço de pesca de 1281 O redes/dia. A
se a um va or mm1mo
diferença encontrada entre o nosso valor estimado (15866) e _os ,dados d_o
1BAMA ( 13640) ou os de Asmu 3 ( op. cit._) ( 1281 O) pode ser atnbUida a_ do1s
fatores: 1) o número sabidamente subestimado de 1O イ・、セ@
por ー。イ・ャィセ@
e セI@
um provável aumento do esforço de pesca nos últimos se1s anos, ten?enc1a
normalmente observada em pescarias sobre recursos de propnedade
comum baseadas em um sistema de livre acesso (McGoodwin 1990).
Portanto, consideraremos a estimativa de 15866 redes/dia um valor
confiável para a intensidade de pesca com "aviãozinho" na Lagoa dos Patos.
3.5- A captura total
Considerando a Área I como um estimador representativo do estuário
da Lagoa dos Patos, o CPUE médio de camarão-rosa variando entre 1,05 e
2,98kg/rede (Tab. 2, Área 1), e um esforço diário estimado para todo o
estuário de 15866 redes, ter-se-ia uma produção média diária de camarãorosa entre 16,7 e 47,2t, a qual, multiplicada por 120 dias de safra, resultaria
em uma produção de cerca de 2009,0 a 5665,9tlano. Esses valores estão
próximos à produção média anual de camarão-rosa na Lagoa dos Patos,
que foi estimada pelo IBAMA em 2790 toneladas (média de 40 anos),
sugerindo, mais uma vez, que a densidade de redes observada na Área I
representa adequadamente a intensidade da pesca do camarão pelo
"aviãozinho" na região estuarina. No entanto, devemos considerar que nas
estatísticas de pesca do camarão-rosa podem estar incluídas capturas
oriundas de outras artes de pesca, e que uma boa parte das capturas é
vendida diretamente para caminhões frigoríficos que transportam o camarão
para outras cidades do estado ou outros estados.
3.6- A captura acessória
Do total de siris capturados, a maioria é comercializada no próprio
local de desembarque do camarão-rosa. Uma pequena parcela, composta
por indivíduos pequenos, é rejeitada viva. Por definição, a parcela
」セ・イゥ。ャコ@
deve ser referida como captura acessória, enquanto a fração
reJeitada sena o descarte. Não foram feitas estimativas do total de siri
rejeitado, porém essa quantidade foi inexpressiva, tendo sido desprezada
em nossa análise. O CPUE médio em peso do siri (953,63g/rede) não
apresentou diferenças significativas entre combinações de safra e área
(Tab. 2).
134
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
3. 7 - A rejeição
A rejeição na pesca de "aviãozinho" é constituída fundamentalmente
por peixes. As espécies capturadas não são comercializadas devido ao
pequeno tamanho. Ocasionalmente, os indivíduos maiores são utilizados
para o consumo dos próprios pescadores ou doados. A porção retida para o
consumo foi identificada em nível de espécie, contada,. medida e pesada,
tendo sido incorporada à categoria "rejeito".
No total foram registradas 48 espécies de peixes, representantes de
24 'famílias, sendo as espécies de peixes coletadas pela pesca com
"aviãozinho" as mesmas descritas por Vieira & Castello (no prelo) para as
zonas rasas (2 a 4m) do estuário da Lagoa dos Patos.
a)
i
セFo@
&&I
80
70
60
ÁREA I - SAFRA 93/94
N-977
b)
S• 26
ÁREA 11 - SAFRA 94/96
N• 678
18
s-
MICFUR
40
::1 30
&&I
セ@
z
セ@
10
o
10
20
30
40
セ@
g &O
セ@
80
70
80
F0•100'llo
ACUMULADA
c)
セ@
Gセ@
&&I
ÁREA I - SAFRA 94/95
N• 3577
s- 40
80
70
60
&O
NETBAR
40
::1 30
&&120
セ@ 10
z
セ@
d)
o
10
w 20
o.30
i
r
40
&O
60
70
80
F0•100%
NCIA DE
ACUMULADA
FIGURA 3 - Relação das espécies de peixes dominantes nas capturas com "aviãozinho" na
Área I - Safra 1993/94 (a), Área I - Safra 1994/95 (b) e na Área 11 - Safra 1994/95 (c). As
espécies foram classificadas de acordo com sua importância nas capturas pela aplicação do
IIR (vide Material e métodos). N é o número total de indivíduos analisados e S o total de
espécies capturadas. d) Resultado gráfico da técnica de rarefação (número esperado de
espécies). A riqueza de espécies é comparada a um nível amostrai hipotético de 268
indivíduos (N). Código das espécies: Brevoortia pectinata (BREPEC); Genidens genidens
(GENGEN); Lycengraulis grossidens (L YCGRO); Micropogonias fumieri (MICFUR); Netuma
barba (NETBAR).
ATLÂNTICA, Rio Grande, 1_8: 123-142, 1996.
135
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
As diferenças no número de espécies coletadas (S) entre ャセ」。ゥウ@
e
como alteraçoes na
anos de amostragem não podem ser ゥョエ・イーセ、。ウN@
·
d espécies porque existe uma relaçao d1reta entre o esforço
nqueza e
,
. . ,
t d
,
amostrai (número de amostras), número de md1v1_duos co 1e a os e numero
de espécies (Vieira & Musick 1994, Vieira 1996) (F1g. 3 d).
Para a Área 1, safra 1993/94, em 15 amostras foram coleta dos 977
indivíduos de 25 espécies; na mesma área, safra 1994f95, em 30 amostras,
foram coletados 3.577 indivíduos de 40 espécies e na Area 11, safra 1994/95,
em 8 amostras foram coletados 576 indivíduos de 18 espécies. A técnica de
rarefação, no entanto, permite reconhecer que, na Área I, セ。⦅ウ@
safras 1993/94
e 1994/95 os valores esperados de número de espec1es (E[S] = 17,0,
desvio padrão= 1,75; E[S] = 16,6, desvio padrão= 2,05, respectivamente)
foram maiores que na Área 11, safra 1994/95, (E[S] = 14,4, desvio
padrão= 1,43) (Fig. 3d).
Observa-se, pela aplicação do índice de importância relativa (Figs. 3a,
b e c), que na Área I Micropogonias furnieri (corvina), Netuma barba (bagremarinho) e Genidens genidens (bagre-estuarino), este último exclusivamente
para o ano de 1995, são as espécies dominantes tanto em número como em
peso. Na Área 11, apenas M. furnieri pode ser considerada dominante. As
diferenças no número de espécies e dominância entre áreas sugerem que
existem variações espaciais na composição da fauna de peixes impactada
pela pesca com B。カゥ ̄ッコョィセN@
No entanto, M. furnieri, na Área I e 11, e N. barba,
na Área I, são, aparentemente, as espécies mais impactadas (Fig. 3).
Na figura 4a, b e d são observados os CPUE médios em número por
classe de tamanho do total das espécies capturadas nas áreas I e 11 e a
contribuição do CPUE médio de M. furnieri e N. barba nas capturas para
cada uma das referidas áreas. A corvina ocorreu desde os 1Omm até os
31 Omm CT, apresentando, em ambas as áreas, uma estrutura polimodal.
Destacam-se dois ou mais grupos modais associados a distintas classes
anuais. O primeiro grupo compreende indivíduos menores de 11 Omm CT
possivelmente associados aos jovens do ano, descendentes das desovas de
primavera, que recrutam ao ambiente estuarino entre dezembro e maio
(Castello 1986, Reis 1992, Vieira 1991 ). Distinguem-se ainda grupos modais
com comprimentos superiores a 140mm CT, possivelmente, constituídos por
classes etárias com mais de 1 ano. Nesses grupos incluem-se indivíduos
com comprimento total próximo ao de primeira maturação sexual para
machos ( 181 mm) e fême?s (205mm) (Castello 1986).
Nas capturas da Area I, N. barba (Fig. 4a) apresentou dois grupos
modais predominantes. O primeiro grupo apresenta um comprimento modal
de 80mm CT, correspondendo a indivíduos jovens do ano originados das
desovas de primavera (Araujo 1983). A segunda moda, entre 11 O e
140mm CT, guarda relação com o tamanho esperado para os juvenis da
136
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
espécie no segundo ano de vida (Reis 1982, Araujo 1983, Vieira 1991 ).
c)
a)
MÉDIA GERAL
1
12
10
cp 8
u 6
E
-
NETBAR
CJ
Mla'UR
-4
2
oセyh@
10 30 60 70 80 110 130160 170 180 210230250
CLASSE DE CT (10 mm)
E
12
10
AAEAI
14
-
NETBAR
0
Mla'UR
12
10
-GERAL
8
6
cp
u
E
2
2
so
eo 110 130150 110 1eo 210230260
CLASSE DE CT ( 10 mm)
50 10
-
NETBAR
0
Mla'UR
-GERAL
6
4
10
MÉDIA GERAL
8
4
o
DE OOORRÊNOA ACUMULADA
d)
b)
14
cp
u
freoᅵセncia@
o
eo 110 130150110 180 210230260
CLASSE DE CT (10 mm)
10 30 60 10
FIGURA 4- a, b e c) Composição do CPUE (número médio de indivíduos por rede) por classe
de tamanho (1 Omm CT) das capturas para as áreas analisadas. A distribuição de
comprimentos da Área I (a) foi obtida agrupando-se os CPUE por classe de tamanho para as
·duas safras analisadas. A distribuição de comprimentos geral (d) foi obtida agrupando os
CPUE por classe de tamanho para as duas área e as duas safras analisadas. c) Relação das
espécies de peixes dominantes capturadas com "aviãozinho" para todo o período de estudo.
As espécies foram classificadas de acordo com sua importância nas capturas pela aplicação
do IIR -(vide Material e métodos). Código das espécies: Brevoortia pectinata (BREPEC);
Genidens genidens (GENGEN); Lycengraulis grossidens (L YCGRO); Micropogonias furnieri
(MICFUR); Netuma barba (NETBAR).
A baixa participação de N. barba nas capturas da Área 11 (Fig. 4b) pode
estar relacionada, particularmente, à estratégia reprodutiva da espécie e ao
seu padrão de migração no ambiente estuarino. Os adultos de N. barba
deslocam-se para o alto estuário no final da primavera para desovar. Os
machos permanecem, a partir desse período, incubando os embriões em sua
cavidade orofaringeal até que atinjam cerca de 50mm CT, aproximadamente
três meses depois (Reis 1982, Vieira & Castello, no prelo). Os indivíduos
nascidos no verão iniciam, no princípio do outono, um deslocamento para o
baixo estuário (Araujo 1983), sendo então observado o aparecimento do
primeiro grupo modal (associado aos jovens do ano) nas capturas da Área I
nos meses de março e abril. Dessa forma, as baixas capturas de N. barba
na Área 11 podem ser atribuídas a dois fatores: primeiro, assumindo que a
ATLÂNTICA, Rio Grande, l8: 123-142, 1996.
137
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
.
.
d.
0 ao baixo estuário é feita gradativajオカ・ョャセ@
em is セZ。ァイ・@
na Área 11 ocorreria posteriormente
movimentação セッウ@
mente, o 。ーイ・」ャュセョエッ@
de Juvenrtanto após a safra do camarão; segundo, a
1
ao observado na Area e, po
. セ@ ão com 0 corpo lagunar fazem do Saco
e a ー・アオZセョウ@
estuarinas com menor hidrodinâmica
forma ヲ・」ィセ、。@
da Mangueira uma das
h
de ser colonizada pelos pequenos bagres.
li
e portanto com menores c ances
. (A'
,
,
bl,.
de
peixes
do
Saco
da
Mangueira
rea
.
·
A estrutura da assem e1a
·
da a· conformação part1cular desse ambiente e,
Figs 3b e 4b) esta, re 1ac1ona
.
fi
te
a
estrutura
geral
observada
nas
dema1s
provavelmente, nao re e
•
N
N
enseadas rasas do estuário da Lagoa dos Patos.
3.8 -A estimativa de rejeição
Na tabela 2 observa-se que o CPUE em peso de peixes capturados.. é
baixo (média= 234,2g/rede), se comparado com as 」。ーエオイセウ@
de, c_amarao
(média= 2375,5g/rede). Essa relação イ・ウLオャセ。@
numa_ proporçao media ・ョセイ@
peixes e camarão de 9,86°/o. O número med1o 、セ@ pe1xes capturados tambem
é reduzido (média= 7,7 indivíduos/rede). Considerando apenas os valores
obtidos para a Área I, observou-se uma variação anual do CPUE em peso
de peixes. A safra 1993/94 apresentou valores significativamente menores
que a safra 1994/95. Esses resultados podem estar positivamente
relacionados com as variações da abundância do camarão (Tab. 2), embora
nossos dados não permitam tais comparações.
3.9 - O impacto potencial da pescaria sobre M. furnieri e N. barba
Das espécies de peixes capturadas pelo "aviãozinho", a corvina
(M. furnien) e o bagre-marinho (N. barba) compõem cerca de 50o/o dos
desembarques da pesca artesanal do sul do Brasil (Chao et ai. 1986), com
desembarques anuais médios de 7534t e 3541 t, respectivamente (Reis
1992). A presença e a importância de M. furnieri e N. barba no descarte
constitui, portanto, o efeito mais pronunciado da pesca do camarão-rosa no
estuário da Lagoa dos Patos (Figs. 2, 3 e 4 ), com impactos potenciais sobre
o recrutamento dessas populações e sobre os rendimentos das pescarias
artesanais estuarinas.
Guardadas as devidas incertezas presentes nos estimadores da
ゥョエ・ウ、セ⦅@
de ー・セ」。⦅@
do camarão-rosa no estuário da Lagoa dos Patos e da
」ッューセQ。@
アオ。セエQカ@
das capturas, avaliou-se o impacto potencial dessa
pesca na sobre a _1ct1ofauna estuarina a partir do esforço de pesca estimado e
da captura de pe1xes por unidade de esforço.
Com um CPUE em セ・ウッ@
médio de 234,2g de peixe/rede (Tab. 2) e
cerca de 15.866 redes estimadas para todo 0 estuário, calcula-se que o
138
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
BY-CATCH NA PESCA DO CAMARÃO
rejeito diário de peixes tenha sido de 3, 7tldia. Da mesma forma, se o nível
do esforço observado é mantido constante no decorrer da safra
(aproximadamente 120 dias), sugere-se que o rejeito total de peixes seja de
445,9tlano. Considerando que a corvina e o bagre-marinho, no mesmo
período, representaram respectivamente 44,8 e 18,5°/o do total em peso do
descarte (Fig. 2b), essa extrapolação levaria a uma captura de cerca de
199,8tlano de corvina e 82,5tlano de bagre-marinho.
Esses valores (geral= 445,9; corvina = 199,8; bagre-marinho =
82,5tlano) quando comparados à média anual dos desembarques das
pescarias artesanais da região, ilusoriamente, mostram-se pouco
expressivos, representando, em geral, 3,4%, dos desembarques médios
anuais da pesca estuarina (13188,55t) entre os anos de 1974 e 1982
(Castello 1985). E, respectivamente, 2,7 e· 2,3o/o dos desembarques médios
anuais das pescarias estuarinas e costeiras de corvina (7534t) e bagremarinho (3541 t) entre os anos de 1960 e 1990 (Reis 1992). Esses
resultados, adicionados à baixa proporção nas capturas entre peixes e
camarões (Tab. 2) levariam erroneamente a concluir que o descarte da
pesca com "aviãozinho" resultaria num impacto aparentemente reduzido na
conservação das espécies de peixes no estuário da Lagoa dos Patos.
Devemos lembrar que a grande maioria das corvinas e bagres-marinhos
rejeitados na pesca com "aviãozinho" são juvenis de pequeno tamanho
(Fig. 4d), e a comparação em peso entre estes e os indivíduos capturados
pela pesca artesanal de peixes é desprovida de proporção. Entretanto, o
impacto da pesca com "aviãozinho" torna-se muito mais expressivo quando
as capturas são expressas em número de indivíduos. Micropogonias furnieri
teve um CPUE geral de 2,2 ind./rede, que, ponderado por 15866 redes e
120 dias de safra, resulta em 4,2 milhões de indivíduos capturados por safra.
Para N. barba, com um CPUE de 1,4 ind./rede, o valor é de 2,7 milhões de
indivíduos por safra. Esses valores, quando levado em consideração o
tamanho dos indivíduos capturados (Fig. 4d), sugerem um nível de impacto
significativo dessa atividade sobre essas populações.
Ao avaliar o impacto do descarte da pesca do camarão-rosa sobre a
ictiofauna estuarina, deve-se ponderar o caráter estuarino-dependente de
espécies como a corvina, que tem seu recrutamento concentrado durante os
meses de verão (Vieira & Castello, no prelo) e, portanto, no período de
máxima intensidade de pesca. Mesmo em níveis menos elevados de
mortalidade por pesca, o impacto pode ser ainda mais pronunciado para
uma espécie anádroma k-estrategista (Guderson 1980, Guderson & Dygert
1988, Alverson et ai. 1994) como o bagre-marinho N. barba, cujo
crescimento lento, maturação tardia e baixa fecundidade (Reis 1982)
caracterizam a maior vulnerabilidade dessa população ao efeito de uma
sobrepesca de recrutamento.
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
139
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
4 - CONCLUSÕES
A pesca do camarão-rosa na Lagoa dos Patos hádmuito エ・、ュセッNカ@
sendo realizada de maneira desordenada, comprometen o a ーセッ@
u セカQ@
a e
biológica e econômica desse イ・」セウッ@
セdGiョ」。ッ@
QYXセIN@
A legtslaçao que
por. ウ・イセ@
regulamenta a pescaria proíbe a uttllzaçao de redes de 。セイウエッL@
supostamente mais predatórias, ao capturar ァイ。ョセウ@
アセ。ョエャ、・ウ@
de jセカ・ュウ@
de espécies de peixes e promover a desestabtltzaçao das comumdades
bentônicas. Porém, não existem, até o presente momento, estudos
específicos sobre o impacto dessas ou de outras artes de pesca no estuário
da Lagoa dos Patos.
.
A permissão pelo 1BAMA do uso de artes ー。セウエカL@
como o
"aviãozinho", baseia-se na baixa proporção em peso de petxes no by-catch
e, portanto, num impacto aparentemente reduzido dessa atividade na
conservação das espécies estuarinas (Silva 1984). De fato, os resultados
apresentados neste trabalho, comparados com dados mundiais sobre redes
de arrasto, caracterizam o "aviãozinho" como uma arte de pesca eficiente e
razoavelmente adequada à pesca estuarina e! nesse sentido, fundamentam
a medida regulatória. No entanto, em termos de número e tamanho de
indivíduos capturados, os resultados apontam para uma perspectiva menos
amena e certamente mais devastadora.
Deve-se questionar os atuais níveis de esforço com que a pesca do
camarão-rosa vem sendo realizada no estuário da Lagoa dos Patos. Com
uma intensidade de pesca da magnitude verificada, é de se esperar um
impacto considerável da pesca com o "aviãozinho", especialmente sobre os
estoques de M. furnieri e N. barba, com reflexos potenciais sobre o
rendimento das pescarias artesanais baseadas nessas espécies.
A correta avaliação do impacto da mortalidade adicional provocada
pela pesca estuarina exigirá uma avaliação mais abrangente das capturas
com "aviãozinho", assim como das demais artes de pesca empregadas na
região, permitidas ou não. Essa análise deve ser acompanhada de um
estudo mais detalhado da estrutura e da dinâmica dessas populações e dos
rendimentos de suas pescarias.
Segundo Andrew & Pepperell ( 1992) e Alverson et ai. ( 1994 ), a
solução para o problema da rejeição exigirá um esforço considerável no
sentido de serem examinadas estratégias de manejo alternativas e soluções
tecnológicas que levem a uma redução das capturas de espécies
secundárias e permitam o escape ou sobrevivência dos juvenis de pequeno
tamanho. Esses autores citam várias estratégias normalmente adotadas
para a redução d.a rejeição. Além daquelas já empregadas pelo IBAMA,
como o estabelecimento de períodos e áreas de defeso e o uso de artes
passivas, seria fundamental intensificar um programa de controle de esforço
140
ATLÂNTICA, Rio Grande, 1.8: 123-142, 1996.
BY-CA TCH NA PESCA DO CAMARÃO
de pesca. Por outro lado, deve ser apoiada a institucionalização de
programas de incentivo aos pescadores, de modo que procurem soluções
próprias para o problema. A busca de novas tecnologias que aumentem a
eficiência das artes e minimizem o descarte, o desenvolvimento de técnicas
de aquacultura em ambientes naturais e a elaboração de sistemas de quotas
para a rejeição seriam soluções alternativas. A implementação de tais
medidas necessita, contudo, ser precedida de uma avaliação mais ampla de
seus efeitos no contexto atual em que se encontra o sistema estuarino e em
particular a ictiofauna do estuário da Lagoa dos Patos.
AGRADECIMENTOS
Os autores desejam expressar os seus agradecimentos a M. B. Almeida, A. M. Garcia,
W. M. Marques e a dois revisores anônimos pelas críticas e sugestões ao manuscrito; ao
CNPq pelo auxílio financeiro, e em especial aos pescadores artesanais que contribuíram para
este trabalho.
LITERATURA CITADA
1. ALVERSON, D.L., M.H. FREEBERG, S.A. MURAWSKI & J.G. POPE. 1994. A global
assessment of fisheries bycatch and discards. FAO Fish. Tech. Paper. 339, 233 p.
2. ANDREW, N.L. & J.G. PEPPERELL. 1992. The by-catch of shrimp trawl fisheries.
Oceanogr. Mar. Biol. Annu. Rev., 30: 527-565.
3. ARAUJO, F.G. 1983. Distribuição, abundância, movimentos sazonais e hábitos
alimentares de bagres marinhos (Siluriformes, Ariidae) no estuário da Lagoa dos Patos
(RS) Brasil. Tese de Mestrado. Fundação Universidade do Rio Grande, 89 p.
4. ASMUS, H.E. 1989. Estrutuía e dinâmica do Sistema Lagoa dos Patos. Secretaria da
Comissão lnterministerial para Recursos do Mar. Comunicado Técnico.
5. CALAZANS, D.K. 1978. Penetração das pós-larvas do camarão-rosa (Penaeus paulensis)
no estuário da Lagoa dos Patos, RS, Brasil. In: Resumos V Simpósio LatinoAmericano
sobre Oceanografia Biológica, 125-126.
6. CASTELLO, J.P. 1985. La ecología de los consumidores del estuario de la Lagoa dos
Patos, Brasil .. In: A. YANEZ-ARANCIBIA (ed.). Fish Community Ecology in Estuaries
and Coastal Lagoons: Towards an Ecosystem lntegration, UNAM, México, Chap. 17:
338-406
7. CASTELLO, J.P. 1986. Distribución, crecimiento y maduración sexual de la corvina juvenil
(Micropogonias fumien) en el estuario de la Lagoa dos Patos, Brasil. Physys, Secc. A,
44: 21-36.
8. CASTELLO, J.P. & MOLLER, O. 1978. On the relationship between rainfall and shrimp
production in the estuary of the Patos Lagoon (Rio Grande do Sul, Brazil). Atlântica, Rio
Grande, 3: 67-74.
9. CHAO, L.N., L.E. PEREIRA, J.P. VIEIRA, M.A. BEMVENUTI & L.P.R. CUNHA. 1982.
Relação preliminar dos peixes estuarinos e marinhos da Lagoa dos Patos e região
costeira adjacente, Rio Grande do Sul, Brasil. Atlântica, Rio Grande, 5: 67-75.
10. CHAO, L.N., J.P. VIEIRA & L.R.R. BARBIERI. 1986. Lagoa dos Patos as a nursery ground
for shore fishes off southern Brazil. In: YANEZ-ARANCIBIA, A & D. PAUL Y (eds.).
IOC/FAO Workshop on Recruitment in Tropical Coastal Demersal Communities. IOC
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.
141
VIEIRA, VASCONCELLOS, SILVA & FISCHER
0
Workshop Report n. 44, Suppl.
11. D'INCAO, F. 1985. Camarões de alto valor comercial do Rio Grande do Sul. Cadernos de
0
Pesca. Porto Alegre, n. 5, 1O p.
12. D'INCAO, F. 1991. Pesca e biologia de Penaeus paulensis no estuário da Lagoa dos
Patos, RS. Atlântica, Rio Grande, 13: 159-169.
13. GUDERSON, D.R. 1980. Using r-K selection theory· to predict natural mortality. ·Can J.
Fish. Aquat. Sei., 37: 2266-2271.
14. GUDERSON, D.R. & P.H. DYGERT. 1988. Reproductive effort as a predictor of natural
mortality rate. J. Cons. lnt. Expiar. Mer, 44: 200-209.
15. IBAMA, 1993. Camarões do Sudeste e Sul: relatório da IX reunião do Grupo Permanente
de Estudos (GPE) de camarões. CEPSUL, ltajaí, SC Coleção Meio Ambiente, Série
0
Estudos: Pesca, n. 5, 68 p.
16. LUDWIG, J.A. & J.F. REYNOLDS. 1988. Statistical Ecology. John Wiley & Sons, 337 p.
17. MCGOODWIN, J.R. 1990. Crisis in the World's Fisheries. People, Problems and Policies.
Stanford University Press, 234 p.
18. REIS, E.G. 1982. Idade, crescimento e reprodução de Netuma barba (Siluriformes, Ariidae)
no estuário da Lagoa dos Patos (RS). Tese de Mestrado, Universidade do Rio Grande,
113 p.
19. REIS, E.G. 1992. An assessment of the exploitation of the white croacker Micropogonias
fumieri (Pisces, Sciaenidae) by the artisanal and industrial fisheries in coastal waters of
southern Brazil. Ph.D. Thesis. University of East Anglia, Norwich, U.K. 219 p.
20. REIS, E.G. 1993. Classificação das atividades pesqueiras na costa do Rio Grande do Sul e
qualidade das estatísticas de desembarque. Atlântica, Rio Grande, 15:107-114.
21. RUFFINO M.L. & J.P. CASTELLO. 1992. Alterações na ictiofauna acompanhante da pesca
do camarão-barba-ruça (Artemesia longinaris) nas imediações da barra de Rio Grande,
Rio Grande do Sul - Brasil. Nerítica 7: 43 -55.
22. SANDERS, H.L. 1968. Marine benthic diversity: a comparative study. Amer. Natur., 102:
243-282.
.
23. SILVA, C.P. 1984. Rejeição do pescado na pesca de camarão-rosa com "aviãozinho" em
Tramandaí-RS. Rei. lnt. Dep. de Pesca. Porto Alegre, RS. 2(2): 1-17.
24. VIEIRA, J.P. 1991. Ecoiogy of estuarine fish assemblages in Patos Lagoon, Brazil (32° S),
and York River, USA (3r N), with review of zoogeography of fishes in Western Atlantic
and tropical estuaries. Ph.D. Thesis Virgínia lnstitute of Marine Science, USA. 170 p.
25. VIEIRA, J.P. 1996. Técnicas alternativas para o estudo de diversidade de espécies: peixes
de água doce como um estudo de caso. Anais do VIl Seminário Regional de Ecologia
.
Universidade de São Carlos, SP- Brasii T'no prelo).
26. VIEIRA, J.P. & J.A. MUSICK, 1994. Fish fauna! composition in warm-temperate and
tropical estuaries of Western Atlantic. Atlântica, Rio Grande, 16: 31-53.
27. VIEIRA, J.P. & J.P. CASTELLO (no prelo). Environment and biota of the Patos Lagoon
estuary: fish fauna. In: SEELIGER, U; C. ODEBRECHT & J. P. CASTELLO (eds.).
Ecology of Subtropical Convergence Regions. The coast and sea in the warmtemperate southwestern Atlantic. Springer-Verlag.
28. ZAR, J.H. 1984. Biostatistical Analysis. New Jersey. Prentice Hall, 697 p.
142
ATLÂNTICA, Rio Grande, 18: 123-142, 1996.