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A necessária renovação da Guarda Costeira canadense

2019, Boletim Geocorrente 95

ISSN 2446-7014 BOLETIM GEOCORRENTE ANO 5 • Nº 95 • 06 DE JUNHO DE 2019 O Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal do Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC), vinculado à Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação (SPP) da Escola de Guerra Naval (EGN). O NAC acompanha a Conjuntura Internacional sob o olhar teórico da Geopolítica, a fim de fornecer mais uma alternativa para a demanda global de informação, tornando-a acessível e integrando a sociedade aos temas de segurança e defesa. Além disso, proporciona a difusão do conhecimento sobre crises e conflitos internacionais procurando corresponder às demandas do Estado-Maior da Armada. O Boletim tem como finalidade a publicação de artigos compactos tratando de assuntos atuais de dez macrorregiões do globo, a saber: América do Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica. Ademais, algumas edições contam com a seção “Temas Especiais”. O grupo de pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas do conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências proporciona uma análise ampla da conjuntura e dos problemas correntes internacionais. Assim, procura-se identificar os elementos agravantes, motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises em andamento, bem como seus desdobramentos. NORMAS DE PUBLICAÇÃO Para publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do NAC e submeta seu artigo contendo até 350 palavras ao processo avaliativo por pares. Os textos contidos neste Boletim são de responsabilidade única dos autores, não retratando a opinião oficial da EGN ou da Marinha do Brasil. CORRESPONDÊNCIA Escola de Guerra Naval – Superintendência de Pesquisa e PósGraduação. Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Janeiro/RJ - Brasil TEL.: (21) 2546-9394 | E-mail: geocorrentenac@gmail.com Os textos do BOLETIM GEOCORRENTE poderão ser encontrados na home page da EGN: <https://www.marinha.mil.br/egn/boletim_geocorrente> ESCOLA DE GUERRA NAVAL SUPERINTENDÊNCIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO NÚCLEO DE AVALIAÇÃO DA CONJUNTURA BOLETIM GEOCORRENTE CONSELHO EDITORIAL EDITOR RESPONSÁVEL Leonardo Faria de Mattos (egn) ÍNDICE EDITOR CIENTÍFICO Francisco eduardo aLves de aLMeida (egn) EDITORES ADJUNTOS Jansen coLi caLiL n. a. de oLiveira (egn) Jéssica gerMano de LiMa siLva (egn) noeLe de Freitas Peigo (FacaMP) Pedro aLLeMand Mancebo siLva (uFrJ) ________________________________________________________ PEQUISADORES DO NÚCLEO DE AVALIAÇÃO DA CONJUNTURA adriana escosteguy Medronho (ehess) aLessandra dantas brito (egn) ana cLáudia Ferreira da siLva (uFrJ) ana Luiza coLares carneiro (uFrJ) andré Figueiredo nunes (eceMe) ariane dinaLLi Francisco (universität osnabrück) beatriz Mendes garcia Ferreira (uFrJ) beatriz victória aLbuquerque da siLva raMos (egn) carLos henrique Ferreira da siLva Júnior (uFrJ) caroLina côrtes góis (Puc-rio) danieL santos kosinski (uFrJ) david severo Pereira França Pinto (uerJ) doMinique Marques de souza (uFrJ) eLy Pereira da siLva Júnior (uerJ) FeLiPe augusto rodoLFo Medeiros (egn) Franco naPoLeão aguiar de aLencastro guiMarães (Puc-rio) gabrieLa de assuMPção nogueira (uFrJ) gabrieLe Marina MoLina hernandez (uFF) gLayce keroLin rodrigues MaxiMiano (uFrJ) Jéssica Pires barbosa barreto (egn) João FeLiPe de aLMeida Ferraz (uFrJ) João MigueL viLLas-boas barceLLos (uFrJ) João victor Marques cardoso (unirio) José gabrieL de MeLo Pires (uFrJ) LaiLa neves Lorenzon (uFrJ) Louise Marie hureL siLva dias (London schooL oF econoMics) MarceLLe torres aLves okuno (ibMec) Marina soares corrêa (uFrJ) Matheus bruno Ferreira aLves Pereira (uFrJ) Matheus souza gaLves Mendes (egn) Pedro eMiLiano kiLson Ferreira (universidade de santiago) Pedro Mendes Martins (eceMe) Pérsio gLória de PauLa (uFF) PhiLiPe aLexandre Junqueira (uerJ) rebeca vitória aLves Leite (egn) rodrigo abreu de barceLLos ribeiro (uFrJ) shakiLa de sousa ahMad (uFrJ) steFany Lucchesi siMões (unesP) taynara rodrigues custódio (egn) thaïs abygaëLLe dedeo (université de Paris 3) thayná Fernandes aLves ribeiro (uFrJ) victor cabraL ribeiro (uFrJ) victor eduardo kaLiL gasPar FiLho (egn) vinícius de aLMeida costa (egn) vinicius guiMarães reis gonçaLves (uFrJ) vivian de Mattos Marciano (uFrJ) AMÉRICA DO SUL Segurança alimentar e hídrica no Peru: desafios estruturais ............................ 3 AMÉRICA DO NORTE & CENTRAL MINUJUSTH: a nova aposta para frear a instabilidade haitiana ....................... 4 A necessária renovação da Guarda Costeira canadense ................................. 4 Chineses miram em vulnerabilidade estadunidense no mercado de terras-raras ........................................................................................................ 5 ÁFRICA SUBSAARIANA Região do Lago Chade em contínua demanda por segurança e desenvolvimento................................................................................................ 5 EUROPA Tensão entre Espanha e Reino Unido nas águas de Gibraltar ......................... 6 ORIENTE MÉDIO & NORTE DA ÁFRICA A cúpula emergencial em Meca e a importância estratégica do Catar ............. 7 Jordânia e o projeto de conexão Mar Vermelho - Mar Morto ............................ 7 RÚSSIA & EX-URSS 2+2: novo formato de negociações sobre as Ilhas Curilas ................................ 8 LESTE ASIÁTICO O trem da Esquadra: a importância dos navios de apoio logístico chineses ... 9 SUL DA ÁSIA A reeleição de Narendra Modi e a política externa indiana ............................. 9 A corrida armamentista entre Índia e Paquistão .............................................. 10 SUDESTE ASIÁTICO & OCEANIA Marinha da Indonésia: desafios e perspectivas .............................................. 10 ÁRTICO & ANTÁRTICA O novo quebra-gelo nuclear russo .................................................................. 11 TEMAS ESPECIAIS Operações de Paz Multilaterais para além da ONU......................................... 11 Artigos Selecionados & Notícias de Defesa........... 12 Calendário Geocorrente......................................... 12 Referências............................................................ 13 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 AMÉRICA DO SUL Segurança alimentar e hídrica no Peru: desafios estruturais Beatriz Mendes E m maio de 2019, o Peru presenciou uma paralisação de aproximadamente um milhão de agricultores em escala nacional. Historicamente, a agricultura peruana é um setor com poucos investimentos e com significativa escassez de projetos e políticas públicas. As demandas dos produtores se baseiam primordialmente na promoção de estímulos por parte do Ministério da Agricultura, voltados para a produção do consumo interno. Visando estabelecer reformas que atinjam mais de três milhões de trabalhadores rurais, as principais medidas dizem respeito à defesa da produção agrária nacional contra as importações subsidiadas, e a modificação de tarifas de importação de alimentos, uma vez que o país reduziu consideravelmente a produção alimentícia de produtos essenciais como arroz, leite e açúcar nos últimos anos. Além disso, os produtores peruanos reivindicam mudanças na política de segurança hídrica voltada para a agricultura, como a suspensão da autoridade administrativa da Agência Nacional da Água sobre os pequenos agricultores. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, sigla em inglês), a segurança alimentar diz respeito à capacidade de um país em produzir alimentos suficientes para nutrir a população, e está diretamente relacionada a uma certa quantidade e qualidade de água para o desenvolvimento de uma produção agrícola autossuficiente. Apesar de ser um dos países com maior disponibilidade de água do mundo, o Peru enfrenta atualmente uma crise hídrica acarretada principalmente pelo fenômeno do El Niño de 2017, tornando-se um dos países mais vulneráveis aos impactos climáticos relacionados à segurança hídrica. Isto revela que o núcleo do problema está na capacidade de gerir esse recurso por meio de investimentos em infraestrutura. Em adição às questões ambientais e agrícolas, aproximadamente 10% dos peruanos enfrentam a falta de acesso a fontes potáveis de água para suas necessidades básicas. Com isso, levando em consideração que a agenda dos pequenos e médios produtores rurais se relaciona com a contribuição de aproximadamente 70% da segurança alimentar nacional, é possível afirmar que essas questões fazem parte de um complexo panorama de segurança alimentar e hídrica que diz respeito a uma debilidade estrutural do Peru, indicando um latente quadro de instabilidade a longo prazo. Fonte: Scielo 3 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 AMÉRICA DO NORTE & CENTRAL MINUJUSTH: a nova aposta para frear a instabilidade haitiana Ana Cláudia Ferreira F oi estendida, até 15 de outubro de 2019, a Missão das Nações Unidas para o Apoio à Justiça no Haiti (MINUJUSTH, sigla em inglês), devido à instabilidade política do país. Esta se agravou em fevereiro de 2019, após a intensificação de protestos populares contra o governo e a queda da qualidade de vida. O panorama instável é marcado, principalmente, por uma alta inflação e irregularidades na Petrocaribe (Boletim 92) – acordo de cooperação energética entre Venezuela e países caribenhos. Nesse acordo, revelou-se um desvio de US$ 2 bilhões, que envolveu 15 ex-ministros haitianos e a Agritrans SA, empresa antes dirigida pelo presidente haitiano, Jovenel Moïse. As manifestações, que exigem a renúncia de Moïse desde 2018, ocasionaram a renúncia do primeiro-ministro Jack Guy Lafontant. Diferentemente de sua antecessora – a Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH, sigla em inglês), a MINUJUSTH foca no fortalecimento das instituições públicas e na fiscalização da polícia haitiana, para evitar violações aos direitos humanos. É formada, principalmente, por policiais civis das Nações Unidas e de países como a Índia. Apesar de precedida por uma longa missão de estabilização, iniciada em 2017, encontra dificuldades para conter a instabilidade local. Além da revolta civil e da extensão da MINUJUSTH, o Haiti enfrenta outras adversidades. No ápice dos protestos, o governo norte-americano retirou funcionários do país e o Canadá fechou sua embaixada na região, reabrindo apenas com o cessar dos protestos. Além disso, a economia haitiana foi afetada pela alta inflação e pela desvalorização do gourde, moeda nacional. A situação atual levanta questionamentos sobre a efetividade da MINUSTAH e da MINUJUSTH. Segundo registros das Nações Unidas, durante e a MINUSTAH, ocorreram aproximadamente 150 casos de violações aos direitos humanos por parte dos militares, a MINUJUSTH falhou em evitar 26 mortes durante os protestos de fevereiro e encontra dificuldades em auxiliar o fortalecimento das instituições haitianas. Com isso, questiona-se o uso de forças exógenas como forma mais eficaz de controlar a instabilidade em países onde o Estado não oferece condições de trabalho e educação. A necessária renovação da Guarda Costeira canadense Jéssica Barreto E m 22 de maio de 2019, o governo canadense anunciou o projeto de renovação da Guarda Costeira do país. Contando com mais de 1.900 funcionários, 44 embarcações e 9 helicópteros, a Guarda Costeira promove diversas operações, entre elas as de Busca e Salvamento. Além disso, ela é essencial para a atuação do país no Ártico, região de interesse para a soberania e segurança canadenses. Entretanto, por receber poucos investimentos, seus equipamentos obsoletos têm prejudicado sua capacidade. Essa renovação para a Guarda Costeira já era prevista no National Shipbuilding Strategy (NSS), lançado pelo governo Harper em 2010. Dessa forma, o plano prevê a aquisição de 18 novas embarcações, sendo 16 navios multi-propósito, que serão construídos pelo estaleiro Seaspan (Vancouver), e dois Artic Offshore Ship Patrol (AOPS), que serão construídos pelo Irving (Halifax). Os AOPS serão adaptados para realizar missões de apoio para as embarcações quebragelo. Estima-se que todo esse investimento será de US$ 15.7 bilhões. Além disso, o governo também prevê, aproximadamente US$ 2 bilhões para extensão da vida útil das atuais embarcações, até que as novas sejam entregues. Essa notícia coincide com a entrega oficial do novo quebra-gelo CCGS Captain Molly Kool, que fará sua primeira viagem oficial para o Ártico, em junho deste ano. A embarcação faz parte de um contrato assinado em agosto de 2018 com a Davie Shipyard, ao custo de aproximadamente US$ 827 milhões, para a compra e reforma de três quebra-gelos noruegueses. Apesar da aquisição permitir uma melhora na capacidade da Força, que não tinha um novo quebra-gelo há 25 anos, ela traz questionamentos sobre o andamento da construção do CCGS John G. Diefenbaker, que é o único quebra-gelo previsto na NSS, esperado inicialmente para 2017, mas adiado para 2022. O governo canadense está, ainda, avaliando a necessidade de uma nova classe de pequenas embarcações, denominadas Mid-shore Multi-mission ship, para complementar o trabalho especialmente em águas rasas. Assim, pretende-se acrescentar um terceiro estaleiro como parceiro dentro do NSS, que já conta com o Irving e o Seaspan. Apesar de o Davie Shipyard ser o mais cotado, haverá um processo competitivo para selecionar esse novo estaleiro. 4 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 Chineses miram em vulnerabilidade estadunidense no mercado de terras-raras Victor Gaspar Filho A pós a decisão do governo estadunidense de elevar tarifas impostas sobre produtos chineses de 10% a 25%, a mídia chinesa divulgou a possibilidade do banimento de exportações chinesas de minério de terrasraras para os Estados Unidos. Os elementos, essenciais para a indústria de tecnologia civil e militar, foram poupados das novas alíquotas dada a sua essencialidade. A medida seria também uma retaliação à determinação da administração de Donald Trump em cortar o fornecimento de componentes necessários à fabricação dos produtos da companhia chinesa Huawei, a qual despende cerca de US$ 11 bilhões em bens produzidos nos Estados Unidos. A China é líder mundial em produção de terras-raras, configurando cerca de 80% das importações norteamericanas. Mountain Pass, a última mina responsável pela extração desses elementos nos Estados Unidos foi fechada em 2015, devido à competição chinesa e ao baixo retorno financeiro diante das restrições ambientais necessárias para produção em território americano. Esta mina retomou sua produção em baixa escala em janeiro de 2019, mas precisaria de um ano para que sua produção fosse capaz de substituir as importações chinesas. É importante notar que a recente reativação de Mountain Pass é responsável por 10% das exportações mundiais desses minérios brutos, mas seu processamento ainda é feito na China. Uma disputa territorial entre a China e o Japão acerca das Ilhas Senkaku no ano de 2010 resultou no corte das exportações chinesas de terras-raras para o Japão, resultando num precedente a ser observado. Nesta ocasião, exportações chinesas continuaram a ocorrer em forma de contrabando, e o Japão encontrou formas de reduzir a dependência, substituindo seu fornecimento e o próprio material por matérias primas alternativas. No curto prazo, os Estados Unidos possuem estoque suficiente para suprir a demanda por esses minerais em funções mais essenciais, como a indústria de defesa. Foi anunciada também a proposta de uma joint venture entre empresas estadunidenses e australianas para produção de terras-raras nos Estados Unidos. A China, como um dos maiores consumidores internacionais de terras-raras, pode hesitar em restringir as exportações, dada a possibilidade do impacto no preço do produto do qual também será dependente de importações, numa projeção de consumo a partir de 2025. ÁFRICA SUBSAARIANA Região do Lago Chade em contínua demanda por segurança e desenvolvimento João Victor Marques Cardoso N o início de maio de 2019, a presidente da 73ª Assembleia Geral das Nações Unidas, Maria Espinoza, visitou a Nigéria para estreitar os laços entre as partes. Dentre os principais temas tratados com o presidente Muhammadu Buhari, destaca-se a preocupação com a bacia do Lago Chade que, em 40 anos, encolheu de 24 para apenas 02 mil km² (cerca de 90% da cobertura). Como resultado do encontro, foi assinado um acordo de cooperação de US$ 4,5 milhões, por cinco anos, a fim de contribuir para o esforço regional de recuperar o lago. Localizado numa região dividida entre Nigéria, Níger, Camarões e Chade, o lago tem sofrido com as mudanças climáticas e com a expansão do deserto do Saara, ameaçando a sobrevivência de 20 milhões de pessoas. Associada aos impactos ambientais, a realidade socioeconômica da região é extremamente delicada, provocando movimentos migratórios devido à pobreza e à insegurança, sobretudo no nordeste da Nigéria, epicentro do grupo extremista Boko Haram. Decisivo para a vitória de Buhari em 2015, que prometeu o seu extermínio, o Boko Haram foi considerado oficialmente derrotado no ano seguinte. Fonte: Big Think (adaptado) 5 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 Entretanto, a insuficiência das operações militares, bem como a continuidade da grave situação socioeconômica, mantiveram o ciclo de insegurança e pobreza. Tal realidade se materializa, por exemplo, conforme uma das facções que se desvincularam do Boko Haram, o Estado Islâmico na Província da África Ocidental, que amplia seu poder bélico e sua influência sobre a comunidade, mediante a realização de serviços que deveriam ser prestados pelo Estado: segurança, fornecimento de crédito, assistência de saúde e governança jurídica. Apesar de contatos internacionais, como o ocorrido em setembro de 2018, em Berlim, no qual 70 países e organizações internacionais anunciaram US$ 2,17 bilhões em apoio humanitário e em prol da paz, a região do Lago Chade vive um impasse. O desenvolvimento econômico torna-se inviável com a insegurança. Tampouco há segurança sem a realização de projetos voltados ao desenvolvimento. A região envolve, ao mesmo tempo, as principais discussões globais na atualidade — mudanças climáticas, migração, pobreza e terrorismo —, devendo se manter como um tema delicado e com demandas urgentes durante o segundo mandato de Buhari. EUROPA Tensão entre Espanha e Reino Unido nas águas de Gibraltar Glayce Kerolin N sem ter descumprido nenhuma regra, enquanto que a Espanha reivindica o território do Rochedo de Gibraltar e ignora os limites que o Reino Unido estabelece para as alegadas "águas internacionais". Entretanto, ainda que a Espanha considere esse episódio uma afronta, o Reino Unido deixou claro que continuará realizando operações desse porte na região. Logo, caso essas ações se tornem frequentes no presente corredor marítimo, o acirramento entre os dois governos em relação à Gibraltar se intensificará, tornando o relacionamento entre as duas Marinhas ainda mais embaraçoso. o último dia 25 de maio, uma embarcação da Marinha britânica realizou exercícios militares próximo a um navio-patrulha espanhol nas águas que banham as costas de Gibraltar. Foi um episódio confuso em torno de um território controlado por Londres, desde 1704, mas reivindicado por Madri, cuja situação foi questionada depois que a ONU sugeriu ao Reino Unido que restaurasse a soberania do Arquipélago de Chagos, outro território ultramarino da coroa inglesa, mas no Oceano Índico (Boletim 94). O Ministério da Defesa do Reino Unido alega que o HMS Sabre — embarcação da classe Scimitar — estava conduzindo uma rotina de exercícios de tiro fora das águas territoriais britânicas de Gibraltar, ou seja, para além das 12 milhas náuticas da costa (cerca de 24 quilômetros). Segundo a Marinha espanhola, a tripulação do navio de ação marítima Audaz interveio por se sentir coagido com a presente operação. Convém frisar que o Audaz, quinto navio da classe Meteoro, que foi comissionado em 2018, é um navio de 2.500 toneladas de deslocamento, possui uma tripulação de 50 militares e capacidade para transportar até 30 fuzileiros navais, além de poder operar um helicóptero. Está armado com um canhão de 76 mm, metralhadoras de 25 mm e de 12,7 mm. Por outro lado, o HMS Sabre é uma lancha patrulha de 24 toneladas com uma tripulação de 5 militares, possuindo duas metralhadoras de 7,62 mm. Um ponto importante é que os dois países fazem parte da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), desde 1982, realizando exercícios conjuntos frequentemente. O governo britânico alegou que sua Marinha exerceu os seus direitos em águas internacionais, Fonte: Earth Week 6 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 ORIENTE MÉDIO & NORTE DA ÁFRICA A cúpula emergencial em Meca e a importância estratégica do Catar Ana Luiza Colares N a última quinta-feira (30/05/2019), iniciou-se, em Meca, cidade histórica na Arábia Saudita, uma cúpula emergencial convocada pelo anfitrião com a participação de diversos países árabes, dentre esses, seis países que fazem parte do Conselho de Cooperação do Golfo, incluindo Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Kuwait, Omã e Catar. A cúpula teve duração de três dias e demonstrou uma movimentação dos estados árabes perante a atual situação regional de tensões na Península Arábica e no Golfo Pérsico, palco de ataques nas últimas semanas, cuja autoria está sendo imputada ao Irã por autoridades locais. A cúpula teve o objetivo claro de conter a suposta ameaça iraniana e os líderes presentes afirmaram que irão manter esforços para evitar possíveis conflitos e manter a estabilidade na região. A presença que mais chamou atenção nas reuniões foi a de Abdullah al-Thani, primeiro-ministro do Catar. Circundado pelas águas do Golfo Pérsico, o país começou a sofrer sanções lideradas pela Arábia Saudita em 2017, com quem faz fronteira. Os dois países também passam por tensões, intensificadas a partir do início da chamada Primavera Árabe (2011), devido à oposição de opiniões quanto às revoluções. Além disso, as autoridades do Catar, traduzindo sua política externa mais diversificada, possuem boas relações com o Irã, inimigo regional da Arábia Saudita. A participação do Catar foi marcada pelo pronunciamento do primeiro-ministro, afirmando que está disposto a unir forças com os demais líderes visando à paz regional. Além de unir as forças locais, a importância da aproximação com o Catar deve-se à sua localização estratégica e à sua posição de terceira maior reserva mundial de gás. O país é o segundo maior exportador de gás mundial, que representa 48% de suas exportações, totalizando U$S 25,5 bilhões. Em um cenário mundial de crescente movimentação dos países em busca de acesso ao gás, combustível mais limpo que outros como o carvão, o Catar torna-se um ator importante, tendo como principais compradores a Coreia do Sul, Japão, Índia e China. Com os atuais acontecimentos, analisa-se uma demonstração da força do bloco regional de modo a conter as tensões crescentes na região a evitar ataques dentro de seus territórios, e a se fortalecer econômica e politicamente. Jordânia e o projeto de conexão Mar Vermelho - Mar Morto André Nunes O projeto de conexão do Mar Vermelho ao Mar Morto foi concebido por meio de um estudo de viabilidade assinado, em 2005, pela Jordânia, Israel e Autoridade Palestina com o Banco Mundial. Em linhas gerais, o objetivo do empreendimento é abastecer as necessidades hídricas dos três países e contribuir para a restauração do Mar Morto, fonte de receitas de turismo que, ao longo das últimas décadas, tem começado a desaparecer lentamente. O Mar Morto, ponto mais baixo da terra, é naturalmente alimentado por águas fluviais oriundas do Rio Jordão e, também, por águas pluviais. No entanto, desde a década de 1960, Israel tem desviado parte da água do rio para abastecer a demanda hídrica interna, enquanto a Jordânia tem feito algo semelhante em seu território com o rio Yarmouk, que deságua no Jordão. De acordo com a Estratégia Nacional de Água 20162025, documento publicado pelo Ministério de Água e Irrigação da Jordânia, o país figura entre os que enfrentam maior escassez hídrica no mundo. As condições climáticas, a geografia e o ambiente geopolítico contribuem para o agravamento dos desafios. Apesar das adversidades, o documento informa que a Jordânia consegue atender a maior parte das demandas da população local e reutilizar cerca de 91% de seus recursos hídricos para a agricultura. Apesar de a construção do projeto ainda não ter sido iniciada, a conexão do Mar Vermelho ao Mar Morto contribuiria de três formas para a Jordânia: em primeiro lugar, a água do Golfo de Aqaba seria transportada por Fonte: Haaretz 7 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 tubulações e despejada no Mar Morto, onde seriam movidas turbinas para geração de eletricidade; em segundo lugar, parte da água será dessalinizada pela planta de Aqaba, inaugurada em março de 2017, e distribuída para cidades jordanianas, palestinas e israelenses; por fim, o sal retirado no processo de purificação da água seria enviado para o Mar Morto, conforme a necessidade de equilíbrio de salinidade do local. O governo da Jordânia entende a importância do empreendimento, tanto para a criação de alternativa de água potável por meio da dessalinização, quanto para a composição da matriz energética nacional. O incerto, no entanto, seria a recuperação do Mar Morto, principalmente por conta da possibilidade de consequências ambientais irreversíveis ao misturar grandes volumes de águas com diferentes níveis de salinidade. RÚSSIA & Ex-URSS 2+2: novo formato de negociações sobre as Ilhas Curilas José Gabriel Melo N o último dia 30 de maio, a agência de notícias russa TASS divulgou que o recém empossado Comandante da Marinha russa, Almirante Nikolai Yemenov, visitará o Japão no segundo semestre deste ano, em uma demonstração de interesse em estreitar laços militares, no que será a primeira visita do gênero em 18 anos. A notícia veio durante a reunião no formato 2+2 dos ministros da Defesa e das Relações Exteriores, Sergei Shoigu e Sergei Lavrov, respectivamente, com seus pares japoneses para tratar das disputas territoriais sobre as Ilhas Curilas, ao sul da Península de Kamtchatka. As disputas em torno do arquipélago remontam ao século XIX, tendo sido incorporado ao território soviético como espólio do Japão após o fim da Segunda Guerra Mundial. Devido à ausência da União Soviética no Tratado de São Francisco (1951), as negociações prosseguiram bilateralmente, com o primeiro passo em busca de uma solução pacífica sendo dado, em 1956, pela assinatura da Declaração Conjunta SoviéticoJaponesa, que determinava o fim do estado de guerra e o reestabelecimento das relações diplomáticas entre as nações. Todavia, o alinhamento japonês aos Estados Unidos, nos anos 1960, se tornou um empecilho para as negociações, que parecem ter ganhado prioridade apenas na última década, com um aumento considerável na frequência dos encontros, dando indícios que estão dispostos a encontrar uma solução definitiva. Ambos têm preocupações maiores no que diz respeito a segurança nacional, e não vêem as ilhas, que vivem basicamente da pesca, como um foco iminente de tensões. Para Moscou, a resolução das disputas pode inclusive funcionar como um catalisador para a cooperação econômica, na busca por reaver o comércio com o Japão, que encolheu cerca de 50% nos últimos cinco anos. Essa foi a primeira vez que as partes adotaram esse formato, visando aumentar o engajamento na resolução do conflito. Porém, as conversas permaneceram incipientes, selando um encontro entre o presidente Vladimir Putin e o primeiro-ministro Shinzo Abe no final de junho, por ocasião da reunião do G-20, no Japão. Vale ressaltar que a soberania sobre as ilhas em disputa garante suas ZEE e respectivas riquezas. Nesse contexto, a visita de Yemenov servirá para pavimentar o caminho da cooperação com Tóquio. Fonte: Stratfor 8 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 LESTE ASIÁTICO O trem da Esquadra: a importância dos navios de apoio logístico chineses Vinicius Almeida C orvetas, fragatas, contratorpedeiros, cruzadores, navios-aeródromo e submarinos são tipos de belonaves que imediatamente vêm à mente quando se pensa numa Marinha de Guerra, expressando, talvez, o significado de poder marítimo. Mas não somente de belonaves vive uma esquadra. Como Mahan e tantos outros teóricos(as) do poder marítimo argumentam, a efetividade de uma Esquadra depende de uma cadeia de apoio logístico. Mísseis, torpedos, projéteis, combustíveis, víveres, equipamentos e sobressalentes são essenciais para a combatividade, mas precisam ser transportados e entregues aos seus respectivos meios de forma eficiente. Nisto consiste a importância dos navios de apoio logístico, cuja missão consiste em fornecer recursos aos meios da Esquadra nas suas missões. Geralmente são incorporados a um comando naval à parte e específico, como nos Estados Unidos, onde o Military Sealift Command (Comando de Transporte Militar, em português) exerce essa tal função. Em marinhas oceânicas, estes navios são importantes para manter as esquadras aprestadas em águas distantes, atuando como plataformas modulares, reduzindo a dependência de portos estrangeiros. Para manter uma Marinha oceânica, o apoio logístico é essencial para a capacidade da esquadra de atender aos interesses chineses em espaços cada vez mais distantes. Isso motiva o investimento chinês em navios deste tipo. Em um comando específico da PLA Navy, até 2016, ao menos 8 navios de apoio logístico foram comissionados em tempo recorde – nas esquadras dos mares do Leste e do Norte, prioritariamente. A melhor expressão dessa capacidade é a classe Qiandaohu, versão 903A, deslocando 23.000 toneladas. Pode transportar 2 hovercrafts e desembarcar um batalhão de infantaria em até 20 minutos. Similares às contrapartes estadunidenses (classe Montford Point), os navios de apoio logístico chineses são cada vez mais adaptados para o futuro que Pequim planeja à PLA Navy: resguardar seus interesses nos mares do Leste e do Sul da China; e nos espaços adjacentes, como o Índico. Nesse sentido, a cadeia logística militar chinesa tem os navios de apoio como sua espinha dorsal, já demonstrando prontidão para apoiar o poder naval chinês aonde for preciso. SUL DA ÁSIA A reeleição de Narendra Modi e a política externa indiana João Miguel Villas-Boas N arendra Modi (BJP) foi reeleito primeiro-ministro indiano com ampla maioria dos votos. Sua vitória sinaliza algumas questões relevantes. A primeira delas é o fortalecimento do movimento hindutva, ou o nacionalismo hindu, o que levanta algumas preocupações acerca da estrutura institucional secular da maior democracia global. No campo da política externa, ao que tudo indica, não haverá mudanças substanciais, ou seja, Paquistão, China, Estados Unidos e a diplomacia energética devem permanecer no topo da agenda. As relações com o Paquistão devem se pautar pelo discurso indiano de combate ao terrorismo e da afirmação da superioridade militar do país. Devido às inconstâncias da política externa de Donald Trump, Modi preferiu rever as relações com a China. No encontro em Wuhan, em abril de 2018 – que deverá se repetir no próximo outono – Xi Jinping e Modi concordaram em recompor as relações. Todavia, os problemas de fronteira permanecem ativos e as relações econômicas são amplamente favoráveis à China, que em 2018 teve um superávit de U$66 bilhões. Outro tradicional problema para a Índia é furar e conter o “bloqueio” geoeconômico chinês do “colar de pérolas”, que vem sendo fortalecido com o projeto da Nova Rota da Seda. No que diz respeito às relações com os Estados Unidos, há espaço para consolidação e mesmo crescimento da agenda. A Índia é considerada um importante parceiro de defesa estadunidense e importou mais armamentos dos EUA que da Rússia, principal fornecedor até 2017. Há, entretanto, uma questão sensível a ser resolvida no curto prazo: as sanções estadunidenses ao Irã (petróleo) e à Rússia (armamentos, especialmente a bateria antiaérea S-400) e como elas afetam pontos sensíveis do crescimento do poder indiano. Ao que tudo indica, a inserção internacional indiana terá de lidar com velhos problemas e deverá manter a mesma estratégia dos últimos anos: transformar o crescimento econômico em poder. O grande desafio indiano para os próximos cinco anos será continuar seu processo de acumulação de poder econômico e militar e ser reconhecida como uma potência em ascensão. Até o momento, Modi conseguiu capitalizar os esforços de política exterior para sua reeleição. Resta saber se conseguirá manter o ritmo. 9 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 A corrida armamentista entre Índia e Paquistão Marina Corrêa A competição técnica entre Índia e Paquistão mostrouse ativa em 2019, principalmente no último mês de maio, devido a lançamentos efetuados por ambos países. Ao demonstrarem as evoluções de suas capacidades tecnológicas, também fomentam uma corrida armamentista. Começando com o lançamento do quarto submarino indiano da classe Scorpene, o INS Vela, na cidade de Mumbai, realizado por meio de um contrato cooperativo entre a estatal Mazagon Dock Shipbuilders Limited (MDL) e a construtora francesa Naval Group. Durante a quarta semana do mês de maio, a Força Aérea Indiana (IAF, sigla em inglês), anunciou que havia realizado um teste bem-sucedido do míssil de cruzeiro supersônico BrahMos, em Car Nicobar, uma das ilhas pertencentes ao arquipélago Nicobar, no leste do Oceano Índico. Este míssil é capaz de realizar ataques de longa distância contra alvos no mar, tendo alta precisão. Foi construído por meio de uma joint venture entre a desenvolvedora russa NPO Mashinotroyenia, e a Organização de Pesquisa e Desenvolvimento de Defesa (DDRO, sigla em inglês) da Índia. No dia 22 de maio deste ano, ocorreu no estaleiro de Carashi, a cerimônia de lançamento do navio de patrulha marítima, destinado à Guarda Costeira do Paquistão (PMSA, sigla em inglês). O navio está preparado para realizar missões de segurança marítima, busca e salvamento nas ZEE paquistanesas em colaboração com a China Shipbuilding & Trading Company e com o estaleiro Huang Pu. Já no dia seguinte, o Paquistão conduziu o lançamento do míssil superfície-superfície balístico Shaheen-II, que possui capacidade de transportar ogivas convencionais e nucleares em um alcance de até 1.500 km. Segundo Asif Ghafoor, porta-voz das Forças Armadas paquistanesas, o teste serviu para reforçar a postura de dissuasão nuclear e atender às necessidades estratégicas do país. Por fim, vale lembrar que o lançamento ocorreu logo após o ministro das Relações Exteriores, Shah Mahmood Qureshi, ter reiterado uma oferta à Índia para retomar as negociações de paz. Esse último movimento paquistanês mostra o desejo de que a diplomacia prevaleça, mas sem abrir mão do poder militar. SUDESTE ASIÁTICO & OCEANIA Marinha da Indonésia: desafios e perspectivas Thayná Fernandes E m abril deste ano foram realizadas eleições presidenciais na Indonésia, cujo resultado saiu no dia 22 de maio. O candidato da situação, Joko “Jokowi” Widodo, foi reeleito, cenário tido como bom para o país, apesar dos protestos liderados pelo opositor derrotado, Prabowo Subianto. Quando candidato em 2014, um dos principais assuntos abordados por Jokowi durante a campanha foi a importância da consolidação da Indústria de Defesa Nacional. Poucos meses após eleito, o presidente classificou a Indonésia como “eixo marítimo mundial” (Boletim 20), declarando a importância de manter e modernizar os projetos de Defesa Naval, especialmente pela característica arquipelágica do Estado. Cinco anos depois, para um novo mandato, é preciso avaliar o que se conseguiu realizar nesta área. O conceito de eixo marítimo mundial possui duas bases: econômica e estratégica. A primeira estabelece a renovação e a ampliação da esquadra do país, considerando como principal desafio o patrulhamento do seu vasto litoral. A segunda abrange a melhoria da integração das ilhas que compõem o território, via linhas de comunicação marítimas, visando diminuir disparidades de desenvolvimento entre elas. Até meados de 2017, pouco foi realizado pelo programa, além da abertura a empresas (principalmente chinesas) para a modernização de portos e melhorias na indústria pesqueira. Entretanto, no final desse mesmo ano, alguns avanços se produziram: em novembro, as primeiras embarcações do Programa de Navios Patrulha foram entregues, com mais nove sendo comissionadas entre julho de 2018 e setembro de 2019. Em abril passado, o governo indonésio fechou um contrato de US$ 1 bilhão com a empresa sul coreana DSME para o desenvolvimento de mais três submarinos diesel-elétricos 209/1400, que complementarão a esquadra junto aos submarinos classe Nagapasa, contratados em 2011. Ainda que lentamente, avanços no desenvolvimento da Marinha da Indonésia estão ocorrendo. A atual administração objetiva estabelecer a independência da indústria de defesa até 2029; contudo, o investimento até o momento é de menos de 1% do PIB. Widodo pretende mudar este quadro, destinando 1,5% desta receita ao setor. Os desafios são a necessidade de mão de obra local, o investimento em projetos de P&D e a busca pela diversificação de parceiros para além de Pequim. Afinal, as contendas pelo Mar do Sul da China podem inviabilizar os investimentos. 10 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 ÁRTICO & ANTÁRTICA O novo quebra-gelo nuclear russo Laila Lorenzon de petróleo, representando 22% do óleo e gás ainda não explorado no mundo, o que tem impulsionado posturas assertivas de certos países para marcar sua presença no Norte. Além disso, com o crescente degelo das regiões polares, e agora com o lançamento de um quebra-gelo com potência nunca vista, é cada vez mais viável o uso da Rota Marítima do Norte como alternativa às rotas comerciais existentes. A Rússia vem investindo pesadamente em infraestrutura e equipamentos para se posicionar à frente nessa corrida pela região e ser a potência dominante capaz de gerir e executar o tão sonhado trajeto, significativamente mais rápido que os usuais, já que a propulsão nuclear permite uma maior autonomia dos meios, necessitando de menos paradas para abastecimento. A introdução de uma tecnologia cara e arriscada demonstra a grande importância atribuída a esse futuro polo de disputa de poder. É necessário estar atento aos desdobramentos futuros da corrida pelos quebra-gelos, bem como do aumento da relevância da Rota do Norte para o comércio internacional. N o dia 25 de maio de 2019, a Rússia lançou um potente quebra-gelo nuclear, que foi batizado de Ural e é apenas o primeiro de três navios que deverão estar operacionais até o ano de 2022. O navio saiu do estaleiro de São Petersburgo e, até então, é o mais poderoso quebragelo do mundo, que tem capacidade para cortar blocos de gelo de até três metros de espessura e com capacidade para uma tripulação de 75 pessoas. Além disso, o quebragelo também foi projetado com a capacidade de operar em ambiente marítimo e em estuários fluviais. De acordo com o presidente da estatal Rosatom, Alexey Likhachev, o novo navio será a força central do projeto estratégico russo de abrir a Rota Marítima do Norte, para que seja utilizada durante o ano todo, até mesmo no inverno. O presidente Vladimir Putin estabeleceu metas ainda mais ambiciosas de, até 2035, ter uma frota operando com treze quebra-gelos, dos quais nove serão movidos por energia nuclear. Há anos, sabe-se que a região do Ártico reserva aproximadamente 412 bilhões de barris equivalentes TEMAS ESPECIAIS Operações de Paz Multilaterais para além da ONU Ariane Francisco N o último Dia Internacional do Peacekeeper (29 de maio de 2019), o Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI) lançou informações atualizadas sobre Operações de Paz Multilaterais, que incluem as operações das Nações Unidas, de organizações regionais e aquelas criadas por coalizões ad hoc de Estados, sancionadas e autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU. De acordo com a publicação, o número de operações em desenvolvimento, em 2018, foi o menor desde 2013, totalizando apenas 60 iniciativas. Em termos de pessoal, a diminuição foi de menos de 1%, acompanhando, porém, a tendência dos últimos três anos. Em termos geográficos, 24 estão na África, 18 na Europa, 10 no Oriente Médio, 05 nas Américas e 05 na região da Ásia e Oceania. De forma geral, a diminuição das missões diretamente desenvolvidas pelas Nações Unidas pode ser considerada uma tendência que vem sendo ensaiada há alguns anos, com a publicação de dois relatórios elaborados pela própria Organização. O relatório do Painel Independente de Alto Nível sobre Operações de Paz (HIPPO Report) de 2015 teve como principal tema o deslocamento da primazia das operações para seu componente político; em 2017, o General brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz submeteu ao Secretário Geral o Improving Security of United Nations Peacekeepers (Relatório Cruz), com recomendações para a diminuição de fatalidades entre peacekeepers em missões da ONU, entre elas, a melhora no treinamento e pre-deployment das tropas. Não sem críticas, os relatórios têm sido o ponto de partida para as reformas que a organização tenta desenvolver, com relativo sucesso: o ano de 2018 teve o menor número de fatalidades em campo desde 2012. Por outro lado, apesar de a ONU ainda ter, em termos absolutos, o maior número de missões e efetivo presente, vemos o fortalecimento da OTAN nesse tipo de iniciativas e aumento de seu escopo. Esta organização criou, em 2018, uma missão de treinamento das forças do Iraque, além de vir apoiando mais efetivamente as operações da União Africana, que já conta com a maior operação de paz desde 2015, a Missão da União Africana para a Somália (AMISOM), com uma média de 21 mil peacekeepers presentes ao longo do ano. A tendência de redução das Operações de Paz da ONU não significa, portanto, a diminuição da importância desse tipo de operação, mas sim, a maior cooperação e importância de mecanismos regionais para criação e manutenção da paz. 11 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 ARTIGOS SELECIONADOS E NOTÍCIAS DE DEFESA • CSIS, Daniel F. Runde Beyond Technology: The Fourth Industrial Revolution in the Developing World • CARNEGIE EUROPE, Peter Kellner Brexit After May • DEFENSE NEWS, Mike Yeo Testing the waters: China’s maritime militia challenges foreign forces at sea • DEFENSE NEWS, Joe Gould Key US lawmakers want to give Ukraine anti-ship and anti-aircraft missiles to counter Russia • PROJECT SYNDICATE, Ian Buruma Deng Xiaoping’s Victory • GEOPOLÍTICAL FUTURES, George Friedman Europe Redefined • EL PAÍS, Bernardo De Miguel EE UU da un ultimátum a Europa para que rectifique su plan de defensa • MILITARY NEWS, Lolita C. Baldor Acting US defense chief: Major military drills with South Korea still on hold CARNEGIE, Chung Min Lee, Kathryn Botto Reconceptualizing U.S.-ROK Cooperation in Korean Unification: A Stabilization Framework • FIFTH DOMAIN, Mark Pomerleau NATO to integrate offensive cyber capabilities of individual members • CALENDÁRIO GEOCORRENTE JUNHO 06 Encontro entre Jair Bolsonaro e Mauricio Macri, em Buenos Aires 07 Renúncia de Theresa May do cargo de primeira-ministra do Reino Unido 07-09 Encontro entre Xi Jinping e Vladimir Putin, em São Petesburgo 13-14 Cúpula da Organização para a Cooperação de Xangai 20-23 34ª Cúpula da ASEAN, na Tailândia 28-29 Cúpula do G20, no Japão 12 BOLETIM GEOCORRENTE • ISSN 2446-7014 • N. 95 • Junho | 2019 REFERÊNCIAS • Segurança alimentar e hídrica no Peru: desafios estruturais Paro agrario: ¿Por qué protestan los agricultores y cuál es la posición del Gobierno? Rádio Programas Del Perú, 12 maio 2019. Acesso em: 18 maio 2019. 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Nations Unies, 12 abr. 2019. Acesso em: 17 maio 2019. • O trem da Esquadra: a importância dos navios de apoio logístico chineses THOMPSON, L. Aging sealift fleet is achilles heel of pentagon war plans. Forbes, 25 abr. 2019. Acesso em: 16 maio 2019. BROOKER, S. China set to expand it military sealift capability. Value Walk, 21 jun. 2015. Acesso em: 17 maio 2019. • A necessária renovação da Guarda Costeira canadense BENJAMIN, Graeme. Canadian Coast Guard’s first new icebreaker welcomed to fleet. Global News, 30 maio 2019. Acesso em: 31 maio 2019. CDR. Canada Announces CCG Fleet Renewal including two new AOPS. Canadian Defence Review, 22 maio 2019. Acesso em: 30 maio 2019. • A reeleição de Narendra Modi e a política externa indiana CHELLANEY, Brahma. Modi’s win will cement India’s multiple-aligned foreign policy. Russia Today, 24 maio 2019. Acesso em 01 jun. 2019. UPADHYAYA, Nidhi. Narendra Modi Wins Big. What’s Next for India? Atlantic Council, 23 maio 2019. Acesso em 01 jun. 2019. • Chineses miram em vulnerabilidade estadunidense no mercado de terras-raras JOHNSON, K; GROLL, E. China Raises Threat of Rare-Earths Cutoff to U.S. Foreign Policy. 21 maio 2019. Acesso em: 31 maio 2019. BRADSHER, K. China’s Supply of Minerals for iPhones and Missiles Could Be a Risky Trade Weapon. New York Times. 23 maio 2019. Acesso em: 31 maio 2019. • A corrida armamentista entre Índia e Paquistão GADY, Franz-Stefan. India Launches 4th Kalvari-Class Attack Submarine. The Diplomat, 06 maio 2019. Acesso em: 30 maio 2019. GADY, Franz-Stefan. India Test Fires BrahMos Supersonic Cruise Missile in Eastern Indian Ocean. The diplomat, 27 maio 2019. Acesso em: 30 maio 2019. • Região do Lago Chade em contínua demanda por segurança e desenvolvimento UN Signs 5-Year, $ 4.5 Million Agreement to Recharge-Lake Chad. Africa Independent Television. Acesso em: 18 maio 2019. Facing the Challenge of the Islamic State in West Africa Province. 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Acesso em: 28 abr. 2019. • Operações de Paz Multilaterais para além da ONU SMIT, Timo. Global and regional trends in multilateral peace operations, 2009–18. Stockholm International Peace Research Institute, 29 maio 2019. Acesso em: 01 jun. 2019. NATO. Operations and missions: past and present. NATO website, 25 abr. 2019. Acesso em: 01 jun. 2019. • A cúpula emergencial em Meca e a importância estratégica do Catar ROBERTSON, Nic. Saudi Arabia united the Arab world against Iran. That means conflict could be one step closer. CNN, 31 maio 2019. Acesso em: 01 maio 2019. The Observatory of Econonomic Complexity. Acesso em: 01 maio 2019. • Jordânia e o projeto de conexão Mar Vermelho - Mar Morto DONNELLY, Kristina. The Red Sea–Dead Sea Project Update. In: THE WORLD’S Water. Volume 8. Washington, D.C.: Island Press, 2014. Acesso em: 31 maio 2019. HASHEMITE KINGDOM OF JORDAN. Ministry of Water and 13