29/11/2018
Alessandro Octaviani: Obrigado, Darcy - 17/02/2017 - Opinião - Folha de S.Paulo
Alessandro Octaviani
Obrigado, Darcy
17/02/2017 02h00
Neste 17 de fevereiro completam-se 20 anos da morte de Darcy Ribeiro. Se as principais
nações do mundo honram seus heróis com memoriais, filmes, nomes de ruas e festas
cívicas, o mínimo que podemos fazer para ele é, como Emicida já nos ensinou, dizer de
peito aberto: "Obrigado, Darcy!".
Darcy Ribeiro cresceu no interior de Minas Gerais e estudou na Escola de Sociologia e
Política em São Paulo. Foi "etnologar" índios no Xingu e cometeu o pecado de perceber
que eles não eram somente fósseis do passado mas um presente e -se tivéssemos
sabedoria- um futuro civilizacional.
Mergulhou na reforma da educação brasileira, engajou-se na alteração estrutural do país
por meio da ação política, foi exilado, escreveu uma obra teórica de impressionante fôlego
sobre desenvolvimento mundial e o papel do Brasil (a "teoria de nós mesmos que só nós
poderemos fazer", encarnada nos diversos volumes dos "Estudos de Antropologia da
Civilização").
Tornou-se escritor de romances de alta qualidade e um agitador cultural de primeira
grandeza. Amou os brasileiros brancos, índios, negros, misturados de todos os jeitos e
para todos os gostos.
Circulou com marechal Rondon, Anísio Teixeira, Victor Nunes Leal, Juscelino Kubitschek,
João Goulart, Leonel Brizola, San Tiago Dantas, Celso Furtado, Glauber Rocha, Salvador
Allende, Pablo Neruda, Fidel Castro, Che Guevara, Chico Buarque, Caetano Veloso, entre
inúmeros outros.
Foi homenageado por algumas das principais universidades do mundo, tema de teses e
documentários. Deu origem a uma fundação. Inspirou várias iniciativas nos mais diversos
campos, impactando positivamente a vida de milhares de brasileiros.
A ação e o pensamento de Darcy alertaram-nos para nossas tarefas como nação a fim de
construir, nessa primeira metade do século 21, uma verdadeira civilização nos trópicos: a
defesa da mestiçagem; a altivez na determinação de objetivos próprios para a cultura, a
economia e a política (e não acreditarmos que os modelos culturais, econômicos e
políticos de que precisamos estão em uma prateleira, à venda, em alguma empresa ou
universidade do hemisfério Norte); a democratização do poder político, do poder
econômico, do conhecimento e dos grandes meios de comunicação de massa.
Se fosse possível reduzir tal complexidade e riqueza a duas palavras, diria que Darcy foi
amor e serviço. Amor ao Brasil, à ideia do país generoso com os brasileiros, autônomo
perante o imperialismo e o sistema financeiro e responsável com seus recursos naturais e
humanos.
Amor é atenção; Darcy nos deu ininterruptamente atenção. Serviu ao outro,
incansavelmente: produziu teoria para a emancipação; trabalhou para construir escolas
decentes onde nossas crianças seriam educadas e alimentadas; lutou para garantir
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29/11/2018
Alessandro Octaviani: Obrigado, Darcy - 17/02/2017 - Opinião - Folha de S.Paulo
liberdades democráticas; sorriu para os compatriotas e os fez sorrir; ensinou a abrir uma
fresta entre a realidade e a utopia que alimenta a luta diária.
No Brasil de hoje, Darcy não é só saudade: é necessidade. Podemos ser todos Darcy.
Obrigado, Darcy!
ALESSANDRO OCTAVIANI, professor de direito econômico da Faculdade de Direito da
USP, é autor do livro "Estudos, Pareceres e Votos de Direito Econômico", entre outros
PARTICIPAÇÃO
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