Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                
o o r o I I N o I I I r o I r I o I r o o o o o I o r S N I N rr IN N I N : r N r r r rr o ro o r r o o S or r r r r r r o B r : r rr r I N o : o I I I ro r IN r r r r rr r o o o o: or r o oor : r NI - SI or S o r r o o r r r o r r r Br o r r o ro r o o r ro o r r o S r or rr r o B rr o r o o o Nor Br o r No or B 1 S r or o r Esta publicação teve suporte do Projeto “Aprender e Ensinar na Universidade” (PTDC/ CED-EDG/29252/2017) financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia/ Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Governo de Portugal. ISBN: 978-84-09-27401-7 L: https://roderic.uv.es/handle/10550/80458 © Del texto: o or o or :S o © : Instituto de Creativi Innovacion s Educativ s de la Universitat de València, 2021 Se permiten la reproducción, distribución y la comunicación pública, siempre que se cite el título, el autor y el editor; y que no se haga con fines comerciales. Impr o digitalment la UE o o r o I I o I I I I r I N o r o o r I N I N rr o I I IN r r r o or o o o N N I N r rr o ro r o r B o o r o : or o oor : r S : S r r r r r r IN NI - SI r r rr r rr o r o o r r No r o o or B o r o Nor Br o r : r rr r o I r I o : o r I I ro ro r o r r r r r o rr r o r o r r r o Br o r o or o S o r ro r o 1 S oS r or o B r r or Esta publicação teve suporte do Projeto “Aprender e Ensinar na Universidade” (PTDC/ CED-EDG/29252/2017) financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia/ Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Governo de Portugal. ISBN: 978-84-09-27401-7 I: https://roderic.uv.es/handle/10550/80458 or or :S o © : Institut de Creativi Innovacions Educativ s de la Universitat de València, 2021 © Del text: (VSHUPHWODUHSURGXFFLyGLVWULEXFLyLFRPXQLFDFLyS~EOLFDVHPSUHTXHQRVLJXHQ cit el título, el autor y el editor; y que no se haga con fines comerciales. FRPHUFLDOV Impr digitalment la E FACES DO ENSINAR E APRENDER NO ENSINO SUPERIOR FORMAS DE ENSEÑAR Y APRENDER EN EDUCACIÓN SUPERIOR 1 2 Índice INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 6 PARTE I .................................................................................................................................................... 13 EDUCAÇÃO SUPERIOR, CONTEXTOS EDUCATIVOS E PERSPECTIVAS PEDAGÓGICAS 13 1. THINKING ABOUT UNIVERSITY TEACHING AND LEARNING: CONTRIBUTIONS FROM EDUCATIONAL RESEARCH .................................................................................................. 14 Noel Entwistle ........................................................................................................................................... 2. LA HORA LOGRADA. PARA UNA SOCIOLOGÍA DE LA RELACIÓN CON LA EDUCACIÓN (UNIVERSITAS STUDIORUM) ................................................................................... 39 José Beltrán Llavador & Antonio Benedito Casanova ............................................................................... 3. POURQUOI ALLER À L’UNIVERSITÉ? LE CHOIX DES ÉLÈVES DE TERMINALE . 63 Georgios Stamelos ..................................................................................................................................... 4. CONDITIONS ENVIRONNEMENTALES FAVORABLES A L’EDUCATION AU DEVELOPPEMENT DURABLE ........................................................................................................... 75 Georges Elias ............................................................................................................................................. 5. SENTIR OU A OUTRA FACE DO APRENDER NO ENSINO SUPERIOR ....................... 95 Elisa Chaleta .............................................................................................................................................. 6. PENSAR E LIDAR COM OS PENSAMENTOS ACADÉMICOS: A EXPERIÊNCIA DE ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR ........................................................................................... 117 Fátima Leal ............................................................................................................................................... 7. MONITORIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DE ESTUDANTES NA TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR NA UTAD .......................................................................................... 138 José Paulo Cravino, Tatiana Ferreira, Daniela Pedrosa & Isabel Alves ..................................................... 8. LE RÔLE DU MENTOR DANS LES STAGES DES FUTURS ENSEIGNANTS DES ÉCOLES .................................................................................................................................................. 160 Maria Frounta, Charikleia Pitsou & Costas Malamas ................................................................................ 9. CONTRIBUTIONS TO REDUCE ACADEMIC FAILURE IN STEM BACHELOR COURSES ............................................................................................................................................... 175 José Carlos Lopes, Maria do Rosário Correia, João Miguel Dias & Luis Descalço .................................. 10. COMPARAÇÃO TEÓRICA DOS REFERENCIAIS DA QUALIDADE PARA A EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL ................................................................................ 197 Marisa Pisco, Margarida Saraiva & Fátima Jorge ...................................................................................... 11. APRENDIZAGEM COMO LIBERDADE .................................................................................... 214 Misleine Andrade F. Peel, Patrícia Damas Beites & Fátima Simões ......................................................... PARTE II ...................................................................................................................................................... SENTIDOS PEDAGÓGICOS E PRÁCTICAS EDUCATIVAS ........................................................ 234 12. ENSINO SUPERIOR EM PAUTA: UM LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UFRN ............................................. 235 Erika dos Reis Gusmão Andrade, Anna Katyanne Arruda Silva e Souza, Telma Elita da Silva & Sheyla Gomes Pereira de Almeida......................................................................................................................... 3 13. FORMACIÓN CONTINUA INTENSIVA A NIVEL DE POSGRADOS INTERNACIONALES EN EDUCACIÓN SUPERIOR E INCLUSIÓN EN UNA UNIVERSIDAD PRIVADA DE PARAGUAY ................................................................................................................. 251 Javier Numan Caballero Merlo .................................................................................................................. 14. A AUTOPERCEÇÃO DA CONSTRUÇÃO DA PROFISSIONALIDADE DOCENTE NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES ..................................................................................... 270 Elsa Ribeiro-Silva, Catarina Amorim & José Luis Aparicio Herguedas.................................................... 15. A PEDAGOGICAL INTERACTIVE PLATFORM FOR THE STUDY OF COMPOSITE PLATES .................................................................................................................................................. 287 Ana Filipa Mota & Amélia Loja ................................................................................................................ 16. DESIGN THINKING E METODOLOGIAS CRIATIVAS NO ENSINO SUPERIOR. ITINERÁRIO PEDAGÓGICO E INVESTIGATIVO COM PARTIDA NA SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA .............................................................................................................................................. 303 Rosalina Pisco Costa, Beatriz Roque & Vanessa Carreira ......................................................................... 17. O ENSINO EFETIVO DA EMPATIA NAS ESCOLAS MÉDICAS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA .................................................................................................... 325 Carla Sousa & Paulo Vitória ...................................................................................................................... 18. FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: ELOS ENTRE A DIMENSÃO PEDAGÓGICA E INCLUSÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR . 351 Lisiê Marlene da Silveira Melo Martins & Lúcia de Araújo Ramos Martins ............................................ 19. TEACHING THE GENERAL CASE IN ECONOMICS WHAT HAVE WE LEARNED AT THE ECONOMIC DECISION ANALYSIS COURSE? .................................................................... 378 António Bento Caleiro ............................................................................................................................... 20. CONFIGURAÇÕES DE RENOVAÇÃO PEDAGÓGICA-DIDÁTICA NO ENSINO SUPERIOR: UMA PROPOSTA NO CURSO DE ARTES PLÁSTICAS E MULTIMÉDIA ......... 390 Ana Souto e Melo ...................................................................................................................................... 21. AFETOS, ERROS E APRENDIZAGENS – A TRANSDUÇÃO COMO PROCESSO DE ENSINO DAS MATEMÁTICAS E DAS GRAMÁTICAS ................................................................. 409 Misleine Andrade Ferreira Peel, Luiz Roberto Peel Furtado de Oliveira & Antonio Cilírio da Silva Neto ............................................................................................................................................................ 22. PRÁTICAS DE ESCRITA CRIATIVA NO ENSINO SUPERIOR: REDESCOBRINDO CAMINHOS DA PEDAGOGIA ........................................................................................................... 429 Dulce Melão ............................................................................................................................................... 23. A PEDAGOGIA CORPORIFICADA NA PROPOSTA DAS TERNAS: ENSINAGEM SOBRE O CORPO SENSÍVEL E POÉTICO NAS ARTES DA CENA ........................................... 453 Renata Bittencourt Meira & Túlio Guimarães da Cunha ........................................................................... 24. EDUCAÇÃO FINANCEIRA COMO CÓDIGO DO CAPITAL INTELECTUAL NO ENSINO MÉDIO .................................................................................................................................... 476 Cássia do Carmo Pires Fernandes, João Coelho de Alvarenga e Melo , Ana Flávia Mayrink, Edmar Jesus Pena de Souza, Igor de Assis Basílio Corrêa & Sibele Leandra Pena Silva ..................................... 25. SOBREVIVÊNCIA ACADÊMICA: SOCIALIZAÇÃO E EVASÃO ESTUDANTIL NO ENSINO SUPERIOR ............................................................................................................................. 490 Adir Luiz Ferreira ...................................................................................................................................... 4 5 INTRODUÇÃO O ensino e a aprendizagem no contexto do ensino superior está a ser moldado por fenómenos semelhantes em todo o mundo. Todos os sistemas assumem, de forma mais ou menos explicita, o pressuposto da qualidade e todos lidam com um corpo estudantil cada vez maior, mais exigente e mais diversificado e, pela premência resultante da pandemia, pela procura de novas possibilidades tecnológicas embora conscientes dos níveis desiguais de familiaridade dos estudantes neste domínio. Ao mesmo tempo tornam-se mais exigentes os acordos com os governos em que o financiamento assume relevância primordial e aumentam as expectativas dos estudantes e empregadores sobre a adequação dos diplomados aos locais de trabalho, cada vez mais globais e susceptíveis de rápida mutação. O modelo de educação superior de Humbolt do início do século XIX, com tremenda influência na cultura académica até aos dias actuais, já propunha que a universidade se baseasse no ideal da integração entre investigação e ensino, num ambiente de idêntica liberdade para professores e estudantes, que se traduzia na liberdade de criar o que ensinar e na liberdade de se escolher o que aprender. Contudo, mesmo hoje, a realidade no ensino superior ainda se mostra bastante restritiva para as invenções dos professores e para a escolha dos estudantes. A limitação de liberdade de professores e investigadores deveu-se especialmente à intensa especialização das áreas científicas, nascida dos próprios avanços e resultados das pesquisas, que cresceram com uma dependência incontornável de recursos externos, de governos e de empresas. Mas a restrição de escolhas também foi aceite pelos próprios estudantes, em vista das demandas combinadas de inovação e de padronização do mundo empresarial, com espectativas de concorrência na sectorização de futuros empregos, o que contraindicava conhecimentos fragmentados e formações abertas. Evidentemente que a pedagogia universitária também se estabeleceu e se adaptou a essas limitações de ensino e aprendizagem, o que, associado à natural tendência burocrática das instituições, acabou concentrando muito mais poder académico e científico na investigação, em detrimento do ensino. No mundo global contemporâneo, destaca-se a importância vital de percebermos que a universidade se transformou em multiversidade, com a expansão dos campos científicos e tecnológicos do ensino superior baseada na diversidade e na inclusão, impulsionada igualmente por interesses sociais e políticos urgentes, como são a questão ambiental, a sustentabilidade económica e os desafios da convivência democrática e da desigualdade social. Como as duas faces do deus Janus, da mitologia romana, representando o passado e o futuro na mesma cabeça, a multidiversidade caminha para o futuro sem abandonar a face do antigo. Há outras faces na figura universitária de Janus: a imagem radical que a sociedade tem da universidade, enquanto, ao contrário, o ambiente corporativo do ensino superior continua basicamente conservador. Apesar disso, mais do que nunca, a educação e a pesquisa académica estão no centro da inovação científica, tecnológica e social. Mesmo assim, como estudo subestimado e necessidade secundária, mesmo que se reconheça sua importância, a pedagogia universitária permanece na política dos estabelecimentos e na prática como inovação adiada. Muitos professores, investigadores, administradores e estudantes precisam ser convencidos dessa mudança profunda na ordem social e pedagógica cotidiana da educação superior. Como 6 geralmente acontece, quando a maioria desses públicos estiver de acordo sobre essa necessidade, já será hora de passar para a discussão de outra coisa. Um exemplo é a inclusão no ensino superior de grupos sociais e étnicos, tradicionalmente marginalizados: depois de políticas de inclusão, com menor ou maior sucesso, agora é preciso pensar e desenvolver formas para que tais estudantes se mantenham e concluam bem as suas formações. Essa seria uma orientação crucial para as pesquisas e as produções de uma pedagogia universitária crítica e inovadora. A componente de investigação e produção científica assumiu nos últimos tempos o papel principal no contexto universitário deixando na penumbra a dimensão fundamental do ensino e da aprendizagem, em particular, a sua vertente pedagógica. Assumimos que a reflexão em torno da pedagogia universitária continua a não ser uma prática corrente no meio universitário apesar da Reforma de Bolonha, dos desafios resultantes da massificação de todos os ciclos de estudo e do considerável desenvolvimento tecnológico. A necessidade de se pensar a pedagogia universitária, em que a aprendizagem pelo estudante assume a centralidade é, por certo, partilhada por muitos professores universitários, independentemente da sua disciplina ou área científica. Contudo, no campo da pesquisa sobre aprendizagem e ensino no ensino superior, na perspectiva de estudantes e professores, há muito a ser esclarecido. Esta obra pretende assim abrir um espaço de reflexão e partilha no âmbito da pedagogia universitária, incluindo as contribuições críticas da psicologia, da sociologia e outras áreas científicas numa perspectiva multidisciplinar sobre a pertinência de se caminhar para a construção de uma maior ‘profissionalidade’ docente e de se ampliar a compreensão do papel dos estudantes em contextos de educação superior. Para isso, este livro reúne um conjunto de vozes plurais em diálogo entre si, compartilhando experiências e preocupações comuns em torno do eixo comum da paideia, uma ciência e um ofício que hoje adquirem maior relevância e novos significados, à medida que as sociedades do conhecimento que caracterizam o século XXI exigem e incentivam a aprendizagem contínua ao longo da vida. Nossas sociedades avançadas educam e aprendem ao mesmo tempo, tornando-se sociedades educadoras que não só estimulam políticas e práticas educacionais a curto prazo, mas também antecipam cenários futuros, como mostrado no relatório Aprender a Transformar, no qual a UNESCO está trabalhando para projetar o futuro da educação. A tarefa de educar e ser educado torna as instituições de ensino superior actores relevantes para a reflexão e a acção educacional. Isto foi assumido quando foi apontado que a principal missão das universidades era ensinar, juntamente com a investigação e extensão. Este volume enfoca essa primeira missão, oferecendo narrativas alternativas que contribuem para renovar uma rica tradição pedagógica que encontra sua origem nos momentos fundadores do pensamento humano. Intituladas Faces do Ensinar e Aprender no Ensino Superior, estas páginas reúnem vinte e cinco textos distribuídos em duas partes diferentes. A primeira parte -Educação Superior, contextos educativos e perspectivas pedagógicas- apresenta onze capítulos dedicados a questões teóricas, pesquisas, experiências pedagógicas e reflexões educativas de caráter moral e normativo de grande interesse do ponto de vista interdisciplinar. A segunda parte - intitulada Sentidos pedagógicos e práticas educativas- organiza o restante dos catorze capítulos, que são dedicados a apresentar 7 casos específicos referentes a práticas pedagógicas muito diversas (modos de fazer) e inovações relevantes que, sem dúvida, representam avanços significativos em termos de ensino e aprendizagem no campo do ensino superior. Se a primeira e a segunda partes revelam algo, é a capacidade crítica e criativa da pedagogia, que atravessa fronteiras de conhecimento e constrói pontes entre diferentes conhecimentos e pontos de vista. Por outro lado, o amplo repertório de reflexões e propostas nos compromete a continuar prestando atenção e reavaliando a atividade docente diária em nossas universidades, superando esta dicotomia e esta hierarquia artificial entre pesquisa e ensino, que sobrestima a primeira à custa da subestimação da segunda. Pois não pode haver um bom ensino se não for baseado em uma tarefa contínua de reflexão e pesquisa, assim como não pode haver uma boa pesquisa se não for acompanhado de uma tarefa pedagógica para sua transferência e aplicação. Mais de cinquenta pesquisadores estão envolvidos neste trabalho coletivo, mais de trinta dos quais são autores femininos, mostrando que as ciências educacionais continuam a dar passos firmes em termos de igualdade. Como em muitos outros casos, a pandemia global que nos afetou desde março de 2020 alterou nossas agendas e atrasou esta publicação, embora também tenha servido para confirmar nossa resiliência e vontade de responder aos nossos compromissos com a comunidade científica e educacional, superando os obstáculos da "distância social". A este respeito, vale a pena notar também que as contribuições deste livro vêm de académicos que realizam as suas atividades de ensino e investigação em universidades em Portugal, Brasil, Paraguai, França, Grécia, Reino Unido e Espanha. A confluência de sete países de ambos os lados do Atlântico reflete o fato de que a produção de conhecimento é realizada de forma cada vez mais intensa e dinâmica num contexto de colaboração internacional e através de amplas redes científicas que compartilham interesses e objetivos comuns. São estas redes que facilitam uma rica conversa que se baseia em diferentes idiomas (neste caso, português, inglês, francês e espanhol) e inspira o propósito comum de melhorar os assuntos e as sociedades através da educação. A partir daqui, convidamos os leitores a se juntarem a nós nesta tarefa. Este livro não teria sido possível sem a resposta positiva à chamada aberta à participação. Por esta razão, nosso primeiro agradecimento vai para todos aqueles que colaboraram nestas páginas com seus textos. Gostaríamos de fazer uma menção especial de agradecimento a Fátima Leal, que também assina um dos capítulos do livro, por sua atenta e rigorosa organização do manuscrito. E finalmente, prestamos uma merecida homenagem em memória de nosso querido amigo e professor Moisés Sobrinho, que desde o início incentivou e apoiou este projeto, e que infelizmente faleceu em março, enquanto estas páginas estavam a ser compiladas. Embora o seu nome não apareça nos textos aqui colectados, o seu ensino está muito presente aqui e continuará a estar presente no futuro. Elisa Chaleta, José Beltrán, Adir Ferreira Évora, Valencia, Natal, setembro 2021 8 INTRODUCCIÓN La enseñanza y el aprendizaje en el contexto de la educación superior están siendo moldeados por fenómenos similares en todo el mundo. Todos los sistemas asumen, de forma más o menos explícita, la asunción de la calidad y todos se enfrentan a un alumnado cada vez más numeroso, más exigente y más diverso y, debido a la urgencia derivada de la pandemia, a la búsqueda de nuevas posibilidades tecnológicas siendo conscientes de los desiguales niveles de familiaridad de los alumnos en este campo. Al mismo tiempo, los acuerdos con los gobiernos son cada vez más exigentes, ya que la financiación es primordial, y aumentan las expectativas de los estudiantes y los empleadores sobre la idoneidad de los titulados para unos puestos de trabajo cada vez más globales y susceptibles de cambios rápidos. El modelo de educación superior de Humbolt a principios del siglo XIX, pero con enorme influencia en la cultura académica hasta nuestros días, ya proponía que la universidad debía basarse en el ideal de integración entre la investigación y la enseñanza, en un entorno de igual libertad para profesores y alumnos, lo que se traducía en libertad para crear lo que se enseña y libertad para elegir lo que se aprende. Sin embargo, aún hoy, la realidad de la enseñanza superior sigue siendo bastante restrictiva para las invenciones del profesorado y la elección de los alumnos. La limitación de la libertad de los docentes e investigadores se debió especialmente a la intensa especialización de las áreas científicas, surgida de los propios avances y resultados de la investigación, que creció con una inevitable dependencia de los recursos externos, gobiernos y empresas. Pero la restricción de las opciones también fue aceptada por los propios estudiantes, en vista de las exigencias combinadas de innovación y estandarización del mundo empresarial, con las expectativas de competencia en la sectorización de los futuros puestos de trabajo, que contrarrestan el conocimiento fragmentado y la formación abierta. Evidentemente, la pedagogía universitaria también se ajustó y adaptó a estas limitaciones de enseñanza y aprendizaje, lo que, unido a la natural tendencia burocrática de las instituciones, acabó concentrando mucho más poder académico y científico en el personal docente e investigador, en detrimento de la enseñanza. En el mundo global contemporáneo, es de vital importancia darse cuenta de que la universidad se ha transformado en una multiversidad, con la expansión de los campos científicos y tecnológicos de la educación superior que se lleva a cabo con un énfasis en la diversidad y la inclusión, impulsada igualmente por intereses sociales y políticos urgentes, como la cuestión ambiental, la sostenibilidad económica y los desafíos de la convivencia democrática y la desigualdad social. Como las dos caras del dios Jano, de la mitología romana, que representan el pasado y el futuro en una misma cabeza, la multiversidad camina hacia el futuro sin abandonar la cara de lo antiguo. Hay otras caras en la figura universitaria de Jano: la imagen radical que la sociedad tiene de la universidad, mientras que, por el contrario, el entorno corporativo de la enseñanza superior sigue siendo básicamente conservador. Sin embargo, más que nunca, la educación y la investigación académica están en el centro de la innovación científica, tecnológica y social. Aun así, como estudio subestimado y necesidad secundaria, aunque se reconozca su importancia, la pedagogía universitaria permanece en la política del centro y en la práctica como una innovación pospuesta. Es necesario convencer a muchos profesores, investigadores, administradores y estudiantes 9 de este profundo cambio en el orden social y pedagógico cotidiano de la enseñanza superior. Como suele ocurrir, cuando la mayoría de estos públicos esté de acuerdo con esta necesidad, ya será el momento de pasar a discutir otra cosa. Un ejemplo es la inclusión en la enseñanza superior de grupos sociales y étnicos tradicionalmente marginados: tras las políticas de inclusión, con menor o mayor éxito, ahora es necesario pensar y desarrollar formas para que esos estudiantes mantengan y completen bien su formación. Esta sería una orientación crucial para la investigación y producción de una pedagogía universitaria crítica e innovadora. En los últimos tiempos, el componente de investigación y producción científica ha asumido el papel principal en el contexto universitario, dejando en la sombra la dimensión fundamental de la enseñanza y el aprendizaje, especialmente su aspecto pedagógico. Partimos de la base de que la reflexión en torno a la pedagogía universitaria aún no es una práctica actual en el ámbito universitario a pesar de la Reforma de Bolonia, los retos derivados de la masificación de todos los ciclos de estudio y el considerable desarrollo tecnológico. La necesidad de pensar en una pedagogía universitaria en la que el aprendizaje de los alumnos sea el centro de atención es sin duda compartida por muchos profesores universitarios, independientemente de su disciplina o área científica. Sin embargo, en el campo de la investigación sobre el aprendizaje y la enseñanza en la educación superior, desde la perspectiva de los estudiantes y los profesores, hay mucho que indagar. Así, este trabajo pretende abrir un espacio de reflexión y puesta en común dentro de la pedagogía universitaria, incluyendo aportaciones críticas desde la psicología, la sociología y otras áreas científicas en una perspectiva multidisciplinar con el propósito de avanzar hacia la construcción de una mayor "profesionalidad" docente y ampliar la comprensión del papel del estudiantado en los contextos de educación superior. Con esa finalidad, este libro reúne un conjunto de voces plurales que dialogan entre sí compartiendo experiencias e inquietudes comunes en torno al eje común de la paideia, una ciencia y un oficio que en la actualidad adquieren mayor relevancia y nuevos significados, pues las sociedades de conocimiento que caracterizan el siglo XXI exigen y fomentan un aprendizaje continuo a lo largo de la vida. Nuestras sociedades avanzadas educan y aprenden al mismo tiempo, convirtiéndose en sociedades educadoras que no solo estimulan políticas y prácticas educativas en el corto plazo, sino que anticipan escenarios de futuro, como muestra el informe Aprender a transformarse, en el que trabaja la UNESCO para diseñar los futuros de la educación. La tarea de educar y de educarse hace de las instituciones de educación superior actores relevantes para la reflexión y la acción educativa. Así se asumió cuando se señaló que la principal misión de las universidades era la docencia, junto con la investigación y extensión. Este volumen pone el foco de atención preferente a esa primera misión, ofreciendo narrativas alternativas que contribuyen a renovar una rica tradición pedagógica que encuentra sus orígenes en los momentos fundacionales del pensamiento humano. Con el título Formas de enseñar y aprender en Educación Superior, estas páginas reúnen veinticinco textos distribuidos en dos partes diferentes. En la primera de ellas – Educación Superior, contextos educativos y perspectivas pedagógicas– se presentan once capítulos dedicados a cuestiones teóricas, a investigaciones desarrolladas, a experiencias pedagógicas y a reflexiones educativas de orden moral y normativo de un 10 enorme interés desde un punto de vista interdisciplinar. La segunda parte –titulada Sentidos pedagógicos y prácticas educativas– ordena el resto de los catorce capítulos, dedicados a presentar casos concretos referidos a prácticas (maneras de hacer) pedagógicas muy diversas y a innovaciones relevantes que, sin duda, suponen avances significativos en términos de enseñanza y aprendizaje en el ámbito de la educación superior. Si algo revela tanto la primera como la segunda parte es la capacidad crítica y creativa de la pedagogía, que cruza fronteras del conocimiento y tiende puentes entre saberes y puntos de vista diferentes. Por otra parte, el amplio repertorio de reflexiones y propuestas nos compromete a seguir prestando atención y revalorizando la actividad docente cotidiana en nuestras universidades, superando esa dicotomía y esa jerarquización artificial entre investigación y docencia, que sobreestima a la primera a costa de subestimar a la segunda. Pues no puede haber buena docencia, buena enseñanza, si no está fundamentada en una tarea continua de reflexión e investigación; de la misma manera que no puede haber buena investigación si esta no va acompañada de una tarea pedagógica para su transferencia y aplicación. En esta obra colectiva participan más de cincuenta investigadores, de los que más de trienta son autoras, mostrando que las ciencias de la educación siguen dando pasos firmes en términos de igualdad. Como en muchos otros casos, la pandemia mundial que nos ha afectado desde marzo de 2020 ha alterado nuestras agendas y ha retrasado esta publicación, si bien también ha servido para confirmar nuestra capacidad de resiliencia y la voluntad de dar respuesta a nuestros compromisos con la comunidad científica y educativa, superando los obstáculos de la “distancia social”. En este sentido, cabe destacar también que las aportaciones de este libro proceden de académicos que desempeñan su actividad docente e investigadora en universidades de Portugal, Brasil, Paraguay, Francia, Grecia, Reino Unido y España. La confluencia de siete países a ambos lados del Atlántico refleja que la producción de conocimiento se lleva a cabo de manera cada vez más intensa y dinámica en un contexto de colaboración internacional y a través de amplias redes científicas que comparten intereses y obejtivos comunes. Estas redes son las que facilitan una rica conversación que se nutre de idiomas diferentes (en este caso, portugués, inglés, francés y español) e inspira el propósito común de la mejora de los sujetos y las sociedades a través de la educación. Desde aquí, invitamos a lectoras y lectores a sumarse a esta tarea. Este libro no hubiera sido posible sin la respuesta positiva a la llamada abierta que lanzamos para participar en el mismo. Por eso, nuestro primer agradecimiento se dirige a todos cuantos han colaborado en estas páginas con sus textos. Queremos hacer una mención especial de agradecimiento a Fátima Leal, que también firma uno de los capítulos del libro, por su atenta y rigurosa revisión de todo el manuscrito. Y finalmente rendimos un merecido tributo en memoria de nuestro apreciado amigo y maestro Moisés Sobrinho, que desde el principio alentó y apoyó este proyecto, y que lamentablemente falleció en el mes de marzo mientras se compilaban estas páginas. Si bien su nombre no aparece en los textos que aquí se reúnen, su magisterio está bien presente aquí y lo seguirá estando en el futuro. Elisa Chaleta, José Beltrán, Adir Ferreira Évora, Valencia, Natal, septiembre 2021 11 12 PARTE I EDUCAÇÃO SUPERIOR, CONTEXTOS EDUCATIVOS E PERSPECTIVAS PEDAGÓGICAS 1. THINKING ABOUT UNIVERSITY TEACHING AND LEARNING: CONTRIBUTIONS FROM EDUCATIONAL RESEARCH Noel Entwistle 1 Summary The main purposes of research into university teaching and learning can be seen as both academic and practical. Academic research has been exploring ways of describing and explaining how students go about their studying and what affects the nature of the learning that takes place. The practical value of the research is to help teachers and students to carry out their work as effectively as possible. For teachers, research can show the influences of teaching and the whole learning environment on the ways that students go about learning, while for students, it can help them to understand the consequences of different approaches to learning and studying. This paper describes a range of studies that have explored our understanding of teaching and learning and provided concepts which provide clear and relevant descriptions for teachers. The researchers have found interrelationships among these concepts and sometimes provided illustrative heuristic models of those interconnections. This research cannot, however, provide specific implications for teaching, as these depend crucially on the nature of the discipline. But certain concepts have proved to be ‘pedagogically fertile’, through their strong impact on how academics think about teaching and learning. Several of the illustrative studies have been drawn from the author’s own work, but these are supported by research carried out by other researchers in the same field. Key words: Student learning; Educational research; Pedagogical fertility; Contextualised concepts; Teaching-learning environments. Noel Entwistle is Professor Emeritus of Education at the University of Edinburgh and was previously its Bell Professor of Education (1978-2005) (noel.entwistle@ed.ac.uk). Before that, he was a Professor of Educational Research at Lancaster University (1971-1978). He is a Fellow of the British Psychological Society, the Scottish Council for Educational Research, and the Society for Research into Higher Education. He has honorary doctorates from the Universities of Gothenburg and Turku and edited the British Journal of Educational Psychology and the international journal Higher Education. He was President of the European Association for Research on Learning and Instruction and received an Oeuvre Award from that organisation. He also served on a UK research funding body and on an international panel evaluating Swedish educational research. Among his most recent publications are two books - Teaching for Understanding at University (Palgrave Macmillan, 2009) and Student Learning and Academic Understanding (Academic Press, 2018). 14 Introduction The early research into student learning initially used psychological concepts to investigate how students learn, but the use of technical language often created terminological and methodological barriers for university teachers in other disciplines. Once it was recognised that it was possible to define concepts specifically to describe student learning in its everyday context, the value of the findings became more evident. Research then led to concepts and theories that eventually produced generalised descriptions of the ways in which the whole teaching and learning environment affects how students go about their learning. And these ideas have had an increasing influence on the teaching process to provide experiences that encourage students to think critically about their own learning. This paper describes how researchers have developed some of the most influential constructs and how these have affected the ways of thinking of increasing numbers of university teachers. The research has used inventories (scored questionnaires) and individual interviews with students and teachers, with some of the findings being illustrated through heuristic models that encourage teachers to explore the value and implications of the research findings. Individual interviews with students have enabled researchers to understand learning and teaching from the students’ own perspectives, rather than in terms of pre-existing psychological theories, while inventory studies have established firm evidence of the relationships that exist among the concepts describing different forms of teaching and students’ ways of learning and studying. Examples of different research methodologies and findings from a succession of studies will be used to track the development of this research area and its influences on the ways of thinking and practising developed by university teachers. Certain concepts proved to have a special quality of being ‘pedagogically fertile’, through creating a strong impact on how academics, across subject areas, think about their teaching and their students’ learning (Entwistle, 1994). The research focuses mainly on the general relationships among aspects of teaching and the quality of student learning, but university teachers are more interested in the very specific relationships existing within their discipline and their own specialism. Indeed, it has become clear that there is an inner logic of the subject that determines the types of teaching considered appropriate in contrasting disciplines, an important feature that researchers have been rather slow to recognize in their research designs and methodologies. 15 Early research into student learning Much of the research carried out in this field was heavily influenced by concepts introduced by American educational psychologists, such as Bruner (1960) and Ausubel (1968). These theorists broke away from the dominant tradition of Skinner (1954) and others who had used experiments with animals to provide the basis of their conditioning theories of learning. They developed a new cognitive psychology focusing on human learning. Bruner, in particular, stressed the necessity to see such learning as uniquely concerned with developing understanding. It is an epistemological mystery why traditional education has so often emphasized extensiveness and coverage over intensiveness and depth… Memorizing was usually perceived by [students] as one of the high priority tasks, but rarely did [they] sense an emphasis upon ratiocination, with a view toward redefining what had been encountered, reshaping it, reordering it. … To instil such attitudes by teaching requires … a sense of excitement about discovery - discovery of regularities of previously unrecognized relations and similarities between ideas, with a resulting sense of self-confidence in one's abilities… The cultivation of a sense of interconnectedness is surely the heart of the matter. (Bruner, 1974, pp. 447, 449; italics added) Ausubel (1978) described three distinct forms of learning to be found in education meaningful verbal learning; meaningful reception learning; and rote learning. He suggested that reception learning was generally found in schools, along with rote learning. Meaningful verbal learning, leading towards understanding, was largely absent but was the one most likely to persist in the memory and so be useful later on. It was this thinking that guided the early researchers working on student learning in universities, including myself, although my own ideas were also influenced by educational theorists. Bantock (1961), for example, had long argued that, if educational research was to influence classroom practice, it would have to involve an imaginative projection into what the phenomena concerned mean, a meaning which can only come from inside the activity to be studied... [It depends on] a sympathetic understanding of our fellow beings, on finding meaning in their activities, on grasping intuitively how they feel, what their plans are, what they are driving at, ... the feel of the 'whole person alive'. (pp. 168, 170, 177). Research into students’ own experiences of studying The research into student learning in the late 1960s was driven by experimental methodologies and statistical analyses, and drew on general psychological concepts such 16 as ability, personality and motivation. The perspective adopted was thus more likely to be that of the researcher and lecturer, rather than that of the subjects of their experiments. But this view began to change when a few researchers were ready to go against the methodological grain and use individual interviews with students. At the time, it was a risky choice, as main-stream psychological journals acted as guardians of the quantitative tradition, a tendency which can still be seen in current journals to some extent. At the forefront of the qualitative research was a study at Harvard. Perry (1970) reported an analysis of follow-up interviews with students, conducted at the start of each year of study. His analysis showed how students’ conceptions of knowledge changed from dualism – knowledge based simply on the dichotomy of right and wrong answers – towards a broader view of academic knowledge, with sense of relativism in the thinking. He found that some students developed a commitment to this relativistic reasoning, while others reacted to it by retreating to their previous dualistic conceptions, perhaps finding the uncertainty implied by relativism too threatening. A subsequent interview study, by Säljö (1979) in Gothenburg, described the range of conceptions emerging when students were asked “What do you mean by ‘learning’?” His analysis produced five distinguishable categories of conceptions of learning, which ranged from simply memorising details to understanding ideas and ultimately reconceptualising - seeing things in a fundamentally different way. Later on, when describing these two sets of findings, I saw them as parallel descriptions of mental development among students that could be seen as an expanding awareness through a broader, integrative conception of both knowledge and learning. This idea was illustrated through a heuristic model (Figure 1) designed to encourage thinking about these two facets of student learning (Entwistle, 2007). The idea of expanding awareness also includes the idea that each category builds on and includes the previous one, so, for example, students seeing ‘learning’ as requiring ‘understanding’ still can use ‘memorising’ and ‘applying knowledge’ and are also capable of judging which approach to learning is most appropriate to the specific task they face. 17 Figure 1 Categories comparing students’ conceptions of knowledge and learning (Entwistle, 2007, p.129) These ideas described the students’ own experiences within a university education system, and so could be seen as contextualised concepts. Educational theories are generally developed within a specific context, and so may have only limited applicability outside that particular context (Kelly, 1955). For this to have a real impact of teachers’ thinking, however, such concepts also need the quality of pedagogical fertility (Entwistle, 1994). Such concepts have to be readily understood by teachers across a range of disciplines and also capture the imagination of those teachers, encouraging them to explore new ways of thinking about teaching and learning in their own subject area. One of the most influential ideas about student learning came from Marton (1975) and his colleagues in Gothenburg, who asked students to read a general academic article and to be ready to answer questions about the content afterwards. His analysis indicated that students had interpreted the instructions in very different ways - some had focused on the likely questions while they were reading, while others were concentrating on understanding the author’s meaning for themselves. There was a surprisingly clear distinction among the students’ descriptions of their ways of reading, which led to the influential idea of ‘deep’ and ‘surface’ approaches to learning. The analyses showed that the nature of the learning processes used were almost inevitable consequences of the very different intentions which drew in either meaningful learning or reproductive learning. 18 Those forms of learning generally led to the learning outcomes to be expected – either understanding the meaning of the article and being able to explain the ideas in it or focusing on specific aspects of the material or reproducing fragments of knowledge with little grasp of their meaning. This concept was one of the first that was demonstrably pedagogically fertile, as it was taken up by academics who came to realise the influence of their teaching on students’ approaches to learning. One striking example of this came from a research project in Australia in which teachers from an anatomy department recognised that their students were adopting mainly surface approaches to their learning – concentrating on being able to remember facts. The department set about creating a curriculum that would stress the importance of understanding the main ideas in anatomy, rather than the facts to be learned. The result of the department’s change in curriculum was sufficiently clear to ensure that it was developed further. The structure of the curriculum they developed will be described, in an updated and generalised form at the end of this article, so that concepts introduced subsequently could be included. Marton’s concept was fertile not just in terms of its impact on university teachers, but it also encouraged other researchers to explore his ideas and seek ways of developing them further. In Lancaster, for example, my research group built on the ideas of differing approaches to learning by identifying these approaches in much larger groups of students and across a range of subject areas. This was done by designing a new inventory. The first step involved interviewing students to find whether deep and surface approaches applied widely and to a variety of academic tasks: which they did. The inventory also had to take account of the influence of the assessment tasks students faced, which led to the description of an approach to studying that indicated the extent to which students were strategic in their ways of studying, organising their studying systematically and putting consistent effort into their working practices. Items were written to encapsulate the defining features of the three approaches by using the students’ own language as they described their study activities. The outcome was an Approaches to Studying Inventory (Entwistle & Ramsden, 1983), which provided scores on the three approaches and also sub-scores on different aspects of them. A revised version of this inventory (RASI - Tait et al, 1998) has been used widely in many studies (Entwistle, 2018), including some in the University of Evora. Figure 2 illustrates the way the items describing a deep approach to learning were found 19 to relate to each sub-scale and how the sub-scales acted together to create scores on the deep approach itself. The numerical values indicate the differing strengths of the items in defining each concept in the sub-scales and the inter-relationships among individual sub-scale scores. It can be seen that all but one item related just to the scale they were intended to define, and that item was phrased in a way that could be meaningful, in different ways, for students having differing study profiles - ‘relating ideas’ or ‘monitoring effectiveness’. Figure 2 Confirmatory factor analysis of the RASI deep approach items (Analysis carried out by Professor Elisa Chaleta, University of Evora) SMEAN(D_SM4) ,55 ,52 Seeking Meaning SMEAN(D_SM17) ,53 ,52 SMEAN(D_SM30) SMEAN(D_SM43) ,92 ,60 ,67 ,99 Relating Ideas ,78 SMEAN(D_RI11) ,54 ,80 SMEAN(D_RI21) SMEAN(D_RI33) SMEAN(D_RI46) 1,00 ,91 ,57 ,50 ,85 Use of Evidence ,62 ,59 ,81 ,81 -,54 ,50 ,63 ,94 SMEAN(D_II13) ,59 ,60 Interest in Ideas SMEAN(D_UE9) SMEAN(D_UE23) SMEAN(D_UE36) SMEAN(D_UE49) SMEAN(D_II26) SMEAN(D_II39) SMEAN(D_II52) ,68 Monitoring Effectiveness SMEAN(ST_ME7) ,55 ,38 ,57 ,52 SMEAN(ST_ME20) SMEAN(ST_ME34) SMEAN(ST_ME47) Table 1, below, provides additional evidence of the same three-factor structure from a contrasting educational system. British university students completed the ASSIST inventory, which contains the same scales as RASI but also includes scales measuring ‘conceptions of learning’ and ‘preferences for teaching’. It shows how all the approaches sub-scales fitted into the expected three factors, with the additional elements fitting in with the overall pattern of relationships. An exception, however, was ‘monitoring effectiveness’ that loaded on both deep and strategic factors, although later analysis indicated that there were two rather different sets of items, one indicating ‘monitoring understanding’ and the other ‘monitoring studying’. Similar research in several countries produced equivalent patterns and indicated that the best predictor of academic performance, when using this inventory, 20 was the combined score made up of high scores on deep and strategic scales and low scores on the surface approach (Entwistle, 2018). Table 1 Factor structure of the ASSIST instrument (from Tait, Entwistle & McCune, 1998; N=604)) Factor I II III Deep Strategic Surface Conceptions of learning Learning as reproducing (.20) Learning as transforming (.13) .41 Deep approach Seeking meaning .72 Relating ideas .79 Use of evidence .77 Interest in ideas .65 Monitoring effectiveness .45 .43 Strategic approach Organised studying .76 Time management .87 Achieving .73 Surface approach Lack of purpose .42 Unrelated memorising .77 Syllabus boundness .42 Fear of Failure .73 Preferences for teaching Encourages understanding .61 Transmits information .35 Correlations between factors Deep Deep - Surface - 0.20 Strategic Surface Strategic 0.35 - 0.22 - From the interviews mentioned earlier, it became clear that an additional aspect of student learning needed to be explored, namely the students’ individual reactions to the teaching and assessment they had experienced. These reactions were investigated by developing a Course Perceptions Questionnaire (Entwistle & Ramsden, 1983), with a 21 revised version developed later by Ramsden (1991) - Course Experience Questionnaire (CEQ). Just as Marton’s idea of ‘approaches to learning’ could be seen as being ‘pedagogically fertile’, so too was the recognition that students had differing perceptions of teaching. Of course, the actual teaching does directly affect, in general terms, how groups of students carry out their studying, but it is the individual perception of that teaching which influences the student’s own specific approaches to learning and studying (Trigwell & Prosser, 2020). It has also been shown that the general causal relationships between study approaches and perceptions of teaching are bi-directional; students who adopt deep approaches are likely to rate their experiences of teaching highly, and those experiencing teaching intended to promote understanding are more likely to have adopted deep approaches in their studying (Richardson, 2006). It is useful for teachers to be aware of these relationships and their implications. Inventory research can offer a way of checking on students’ reactions to their courses based on wellestablished concepts and may also provoke discussion about the issues raised by the findings for a specific subject area. Study strategy inventories can also be provided for students to complete themselves and obtain indications of their levels on the various ways of learning and studying through on-line computer scoring. Experiences of personal academic understanding The research into student learning is intended to provide concepts that academics can use in planning their teaching, and as Marton argued: It is only when we have a fair understanding of what learners are expected to learn, what they actually learn in those situations, and why they learn something in one situation but not in another, that pedagogy becomes a reasonably rational set of human activities. (Marton, 2007, p. 22) Although the importance of deep approaches has been readily accepted by many university teachers, the ways in which students actually go about developing their understanding is unlikely to be clear to academics. Research in Edinburgh explored the nature of students’ academic understanding, using open interviewing techniques, as in phenomenography (Marton, 1981), designed to encourage students to explore their experiences of learning in progressively deeper ways (Entwistle, 2018). The outcome of this study was a set of 22 categories which indicated different ways in which the nature of ‘understanding’ had been experienced. Feelings of satisfaction Understanding appears in many guises. It can often be a glow, a warm feeling acquired from reading pages and pages of notes and text - “I see what you mean” rather than “what on earth is all this about?” Meaning and significance When you understand something, you are able to attach meaning and thus words become more than mere facts; they become the key to something deeper and more significant, which involves appreciation of meaning. Coherence, connectedness and ‘provisional wholeness’ ‘Understanding’ means the interconnection of lots of disparate things; the way it all hangs together - you can make sense of it internally. You’re making lots of connections, which then make sense - it’s logical, ‘locked in’ to a pattern, like jigsaw pieces and you can see the whole picture. But you feel you can add more and more. Irreversibility If you understand, say, why ‘optimal foraging’ works, and what the idea is behind it... You can’t not understand it afterwards: you can’t ‘de-understand’ it! Confidence about explaining ‘Understanding’ means to be able to discuss a topic with someone in a logical way; be able to explain and clarify your thoughts if the other is unsure of what you mean. To be able to put forward an argument, with a conclusion that is satisfactory to yourself, as well as to others. Flexibility in adapting and applying ‘Understanding’ involves knowing what an issue's about, being able to reorganise it in different ways, manipulate it, form arguments out of it if need be, … and to apply this information in a different situation than the one it was ‘learnt’ in originally. (Entwistle, 2018, p. 113) This research also established five different forms or levels of understanding: • Absorbing facts, details, and procedures, without consideration of structure • Accepting and using the logical structures provided in the lecture notes • Developing own summary structures from notes to answer exam questions • Developing structures to represent own understanding and control exam answers • Developing structures relating own understanding to the nature of the discipline (op. cit., p.116) The emphasis on developing structures or frameworks for understanding (Entwistle, 1995), as students were preparing for writing essays in course work or taking exams, was often linked with the drawing of mind-maps. A good example of this was found among interviews with students taking a graduate education course. They were asked to write an essay of “What makes good teaching”, using a set of readings provided (Entwistle et al., 2000). One of the 23 students explained in detail how she went about preparing to write her essay by developing a ‘mind map’ (see Figure 3), to help her find a meaningful structure. She identified a “false dichotomy” between education seen as ‘inculcation’ – putting knowledge in, and education as ‘drawing out’ – encouraging independent thinking about ideas – ‘false’, because ‘good teaching’ in her view depended on drawing ideas from the whole range she had identified. The description of the process of developing her mind map, shown below Figure 2, provides a good indication of how her understanding developed. . Figure 3 Mind-map developed to provide aa structure for an essay (from Entwistle et al, 2000) I do a rough map with just my own ideas and then I refine it… I know when I do a mind-map, I’m not always concentrating on the map itself. I’ll write something down, and then sit back and think what I’ve written, ideas going in and out. After the fast brain-storming map, which looked a complete mess, I did another one. I took more time over that one, and I tried roughly to divide things up into different areas. I divided it up into areas… It was still quite fluid, because there are so many things that cross over. It was just to create some order in my own mind; I was thinking about it, and then thinking where I was putting the things on the map, and sorting out ideas into where they should go, and trying to make it logical, bringing in the extracts as well, and trying to place them. (Entwistle et al., 2000, p. 15-16) 24 Other descriptions of the processes of developing an understanding come from two separate studies. Extracts from the transcripts provide useful insights into students’ ways of learning and studying but could only be achieved using the form of open interviewing described previously. In the extracts from the transcripts, the first student explains how she went about studying neurology articles by developing a mind-maps prior to the final exams. With these articles, it’s like making friends - reading and re-reading and going to different sources of information. Patterns become familiar and they start to help you; helping you make sense of new things that you haven’t met before… getting to see why this question is important while another one is not, or that this theory is more likely than another. Then, you get a feeling for the author of each paper and for your lecturers too, a sense of where they are coming from and why such and such is important for them. … I have to be able to see the ideas in my visual space, ... according to how I know them, how I can picture them, and which ones are closer to me or further away – that is what I mean by making friends with ideas and this also means getting to ideas or data. … Then, in the end, I come to realise how everything is really related and I’m able to connect everything together - but this cannot happen until much later and, when it comes, it is not as if I were looking for it - it just happens! (Final-year student) (Hay, 2010, pp. 272-279). The other student described how she had used her mind-map when taking zoology exams. [In writing my answers], my mind-map keeps me going with the structure, in the sense that it is basically visual - a pictorial representation of what I want the whole answer to have in it, and therefore stops me wandering off track. … As I wrote, it was almost as though I could see [the ideas] all fitting into an overall picture - you're developing what you know and playing it in a slightly different way to fit the question set. Following the logic through, it pulls in pictures and facts, as it needs them. Each time I describe a particular topic, it's likely to be different: well, you start with evolution, say, and suddenly you know where you're going next; then you might have a choice to go in that direction, or that direction, and follow it through various options it's offering. Hopefully, you'll make the right choice, and so this goes to this, goes to this - and you've explained it to the level you've got to. Then, it says "OK, you can go on to talk about further criticisms in the time you've got left". (Final-year student) (Entwistle, 2018, p.135) These interview extracts came from two students who were able to explain their ways of thinking exceptionally well. Their descriptions indicate how students in general might be helped to develop their own academic ways of reasoning and understanding. Drawing on his own phenomenographic research, Marton (2015) developed a variation theory of learning which suggested that a thorough understanding came from being able to discern the salience of critical features within the topic being studied, and also to recognize the patterns of variation among them. These patterns then have to be brought together, simultaneously, within an arena of focal awareness within the mind to reach a satisfying academic understanding. 25 This process can be supported in teaching by pointing out such patterns within topics, but university students also have to learn to discern for themselves the critical features of topics and to explore the inter-play among those aspects as they build up their understanding of a topic. They can be helped to do this by being introduced to the technique of developing their own concept maps (more formal mind-maps) as class work, and then discussing those maps with other students and the teacher. Teachers can also provide concept-maps of their own, when introducing a new topic, for instance, drawing attention to critical features and their interrelationships, and showing their own ways of thinking about the ideas (Entwistle, 2009). Conceptions of university teaching As we have seen, approaches to learning depend not just on the students’ past experiences and the study skills previously developed, but also on their experiences of teaching. An early contribution to ideas about teachers’ conceptions of teaching was made by Fox (1983), who asked lecturers about their ideas about teaching. Four basic theories or conceptions emerged: There is the transfer theory which treats knowledge as a commodity to be transferred from one vessel to another. There is the shaping theory … moulding students to a predetermined pattern. Thirdly, there is the travelling theory … where there are hills to be climbed for better viewpoints, with the teacher as … an expert guide. Finally, there is the growing theory which focuses attention on the intellectual and emotional development of the learner. (Fox, 1983, p. 151). Subsequent phenomenographic interviews by Prosser and his colleagues (1994) identified two sharply contrasting approaches to teaching, although it is recognized that academics often adopt one or other approach with students at different levels and for specific topics. Two qualitatively different approaches to teaching are used - a conceptual change/ student-focused approach and an information transmission/teacher-focused approach. [In the first] the teacher provokes debate, … [allows] time to question students’ ideas and develops a ‘conversation’ with students in teaching sessions, including lectures. [In the other approach] the intention is the transmission of facts and skills, through the use of well-planned teaching material, as it is assumed that the students will learn from the received material and a good set of notes. (Trigwell & Prosser, 2020). This distinction focuses on the cognitive dimension in teaching, but other researchers have brought out affective dimensions. For example, Ballantyne and his colleagues (1997), asked university teachers to explain what constituted ‘good teaching’ and found three main themes running through their descriptions. Recognizing the student perspective by pitching material in accessible language, combining humanistic qualities with academic rigour; and showing relevance to students’ everyday experience and making links to professional contexts. 26 Creating a learning ethos by teaching for learning and discussing what is involved and accepting that learning can be difficult; and also talking to students about their emerging understanding and fostering generic and lifelong skills. Conveying feelings and arousing interest by showing enthusiasm for the subject; and planning teaching to create and maintain student interest. (adapted from Ballantyne et al., 1997). ‘Good teaching’ depends on the teachers’ conceptions, but these inevitably change over time, based on their experiences with students and on ideas drawn both from their colleagues and the research literature. Such a progression can be seen as involving an expanding awareness of the nature of teaching and learning, with corresponding changes in conceptions of teaching and relationships with students (Entwistle & Walker, 2000). This progression can be illustrated in a narrative account provided by a physics lecturer, explaining how his teaching had developed. My early teaching experiences were something of an act, in being the authoritative source of knowledge. The learning outcome I sought, as a matter of traditional expectation, was students' knowledge of the curriculum material. The approach to teaching was primarily a matter of presenting curriculum material in a factually correct (and hopefully interesting) way, with ancillary activity designed to reinforce the intake of knowledge and its retention. [Subsequently] I began, increasingly, to question the way I had been teaching, and to try to focus more on encouraging students to reflect on their own learning. My lectures thus began to be less a matter of delivering students the facts handed down from higher authority, and more a conversation designed to stimulate their engagement. … Over time, I have developed a teaching approach which begins to satisfy, simultaneously, a tacit demand for content, for understanding of content, and for relevance and applicability of that content. … Within this multipli-inclusive approach, information is provided in logical order for those who want it, but … for students who need to relate to other course content or to the world, there is [also] a thread of conversation in making such links. (Entwistle & Walker, 2000, p. 348) These descriptions of teaching are drawn mainly from experiences of lecturing, without explicit recognition of other aspects of the whole teaching-learning environment, but this has become a focus of more recent research. This approach is illustrated here through findings from a four-year follow-up study, co-directed by Professor Dai Hounsell and me. Designing supportive teaching-learning environments In the Enhancing Teaching and Learning Project (ETL, 2005), researchers worked with both university teachers and their students, using interviews and questionnaires to explore ways of improving the educational experience of students. Two cohorts of students, in specific course units, were drawn from four contrasting subject areas in eleven universities, with findings from the first cohort used to suggest changes in teaching for the following cohort. Discussions 27 with course leaders were used to establish the content of the course unit and the rationale for the teaching methods being used, while students completed questionnaires about their approaches to studying, their experiences of teaching, and the knowledge and skills they believed they had acquired. Groups of students also discussed with a researcher their experiences of the teaching, explained any difficulties and suggested how the course might be improved. The findings were discussed in detail with the course leaders of each unit, leading to negotiations with them about possible enhancements in the teaching for the next intake of students. The overall conclusions were reported widely through subject area associations for Electronic Engineering, Biological Sciences, Economics and History (ETL project, 2005). Describing teaching-learning environments The focus of this study was on how the whole inner teaching-learning environment affected student learning (‘Inner’ refers to those aspects of the teaching environment directly experienced by the students). Such an environment is illustrated in Figure 4 (below) for a department of electronic engineering, showing the various activities involved and their function in supporting student learning. The wider environment is indicated through the external and institutional influences shown outside the encircling ellipse. Current outlines of teaching-learning environments might well look rather different from this, with a wider range of provision now being available, such as on-line learning, blended learning, and other technology-supported learning, but this type of diagram could be adapted appropriately. 28 Figure 4 A teaching-learning environment in electronic engineering (from Entwistle, McCune & Hounsell (2003) In considering the impact of teaching-learning environments in each of the selected course units, the researchers developed or adapted additional concepts needed to describe the effectiveness of teaching in relation to the experiences of students. By the end of the project, it became clear that one of the main contributions of the project was to provide research-based concepts which encouraged academics to explore new ways of thinking about their own teaching, and the learning of their students, indicating that some had become pedagogically fertile (Hounsell & Entwistle, 2005; McCune & Hounsell, 2005; Entwistle, 2018). Threshold concepts and troublesome knowledge Students find some concepts and theories particularly difficult to understand (Perkins, 2006), and these are often ones that had been crucially important in developing the discipline. Meyer and Land (2005) introduced the term threshold concepts to represent ideas and theories of this kind, such as ‘evolution’ in biology and ‘energy’ in physics. Such concepts serve as ‘portals’ or ‘conceptual gateways’ within the structure of the discipline, and yet with meanings that often elude students at first, due to their abstract nature. Threshold concepts… focus [teachers’] attention on the relationship between big shifts in thinking in the subject and transformative changes that learners have to experience in their thinking. These changes are 29 transformative in the sense that learners are not simply making connections between new learning and ideas they have already acquired: in order to truly understand the new idea – if it is a threshold concept – they must re-work [their] prior understanding. (Davies & Mangan, 2007: 721) Further development in these ideas has come in many academic fields (Land et al., 2006), thus demonstrating the pedagogical fertility of the concept. In biology, for example, Taylor (2006) found that introducing the idea of threshold concepts and discussing it with colleagues led to a different way of thinking about the curriculum and teaching methods in their department. And in economics Davies & Mangan (2007) found three distinguishable types of threshold to exist at different stages of an economics degree course. First, came the necessary grasping of the technical meanings of basic concepts, then seeing how these become integrated within overarching threshold theories, and finally understanding how the interacting webs of higher-order concepts and theories mapped the whole knowledge domain. Ways of thinking and practising in the discipline Universities generally require staff to provide detailed sets of learning objectives for their students, but when the teachers in this study were asked about their main aims in teaching, learning objectives were rarely mentioned. Instead, the academics emphasised the broader skills involved in coming to think like an expert or professional in the field. As one economics teacher explained: More recently I’ve come round to the view that economists have acquired a way of looking at the world, which is indelible. And even though they may not find themselves in a position where they can use their analytical techniques very consciously, in fact their whole way of treating questions is affected by this kind of training. (project interview extract) Similar comments from other members of teaching staff interviewed led to the term ‘ways of thinking and practising’ (WTP) being used to capture “the richness, depth and breadth of what students could learn through engagement with a given discipline or subject area in a specific context” (McCune & Hounsell, 2005, p. 257). The idea that university education should, first and foremost, involve engaging students in the ways of thinking and practising that define the discipline, shifts the balance in constructing a curriculum. It takes the emphasis away from transmitting knowledge to be learned and towards the idea of engaging students in a shared enterprise of becoming an emerging expert within a profession. [It] brings into central focus the ways in which individual disciplines represent (or at least debate) the nature of knowledge in their domains, what counts as ‘evidence’ and the processes of creating, judging and validating knowledge. … A common concern among [staff] was to wean first-year students away from a 30 relatively unproblematised view of [academic] knowledge. They sought to move students towards a more complex, differentiated understanding of knowledge and its relationship to evidence, … associated with the encouragement of a questioning approach and flexibility of mind. (Anderson & Hounsell, 2007, p. 469). Congruence of aims with teaching The construct that perhaps most strongly defines the level of effectiveness of any curriculum is that of congruence among the teachers’ aims and the various components of the teachinglearning environment they provide for students. Biggs (1996) had introduced the idea of constructive alignment. The idea of being ‘constructive’ came from the psychological theory of constructivism, in which teaching is expected to focus predominantly on the development of understanding. ‘Alignment’ is more straightforward – the idea that the main aims in each course unit should directly reflect the ways teaching, learning, and assessment were being carried out in practice. By the end of the ETL project, this idea had been broadened to include six forms of what was then called congruence, to reflect a wider set of aspects that involved: course organisation and management; curriculum aims; scope and structure; teaching-learning activities; learning support; assessment and feedback; and students’ backgrounds and aspirations, all of which needed to be congruent with the aims and also with each other (Hounsell & Hounsell, 2007, p. 101). The extent of congruence within a teaching programme proved to be one of the most valuable ways of judging its effectiveness, and yet it is probably one of the most difficult demands to meet. The final construct introduced within the ETL project emphasized the need to take account of the crucial variations of teaching and learning across disciplines, indicated through the phrase ‘the inner logic of the subject and its pedagogy’ (Entwistle, 2009). This reminds researchers that any implications they may see for their findings should take careful account of the nature of the discipline, or group of disciplines, through discussions, and possible collaborations with, teaching staff. The project also looked at the relationships that existed between approaches to learning and studying and the main aspects of the teaching-learning environment, identified through interviews with teaching staff. Extended versions of earlier inventories were used to look at relationships among a sample of over 4500 students from both cohorts. 31 Table 2 Correlations between ratings of attainment and experiences of teaching (from Entwistle (2018, p.221: correlations > O.30 in bold) Student ratings of attainment Scale scores Approaches to studying Deep approach Organised effort (Strategic approach) Surface approach Experiences of teaching Course design congruent with aims Teaching for understanding Staff enthusiasm and support Set work with supportive feedback Student support Knowledge acquired Academic progress Interest & enjoyment_ .38 .29 - .33 .29 .33 - .39 .39 .28 - .37 .46 .48 .36 .45 .23 .29 .27 .18 .28 .07 .47 .54 .45 .39 .23 One analysis, shown in Table 2, reported the correlations of ‘approaches to learning’ and ‘experiences of teaching’ with students’ ratings of their present level of achievement (outcome measures), based on the feedback received from their teachers. Students with high scores on ‘deep approach’ felt they had acquired a satisfying degree of ‘knowledge’ and had more ‘interest and enjoyment’ than students with lower scores, while those with high scores on ‘surface approach’ had lower scores than other students on all three of the outcome measures. ‘Organised effort’ also had positive outcomes and appeared to be the best predictor of perceived academic progress, particularly in combination with low levels of ‘surface approach’. The ‘Experiences of teaching’ section of the questionnaire showed the highest correlations with learning outcomes for ‘teaching for understanding’ and ‘course design congruent with aims’. ‘Student support’ was least influential, probably because such ‘support’ could take quite different forms, for example, simply copying from other students or, alternatively, having useful discussions with them. Similar analyses within a single subject area showed slightly different values and somewhat higher correlations, but the overall pattern was consistent. Conclusion This account of research into university teaching and learning is admittedly limited by drawing heavily on my own interest and research activity, but it is intended to support my contention that research can offer academics a set of concepts and ideas that amount to a particular way of thinking about their teaching and student learning. 32 Figure 5 Heuristic model illustrating the relationships between teaching and learning (from Entwistle, 2003) Peer group attitudes to studying The existing knowledge, understanding, abilities, motives and conceptions/styles of learning students already have H ow students approach learning and studying H ow students perceive the teaching-learning environment QUALIT Y OF LEARN IN G ACH IEV ED H ow course material is selected, organised, presented and assessed Const ruct ive alignment H ow a teaching-learning environment is designed and implemented What students are expected to learn and understand Influences of academic community, validating bodies and socio-political climate University teachers' ways of think ing about teaching Influences of departmental and institutional policies and resources To bring together some of the main ideas described earlier, Figure 5 provides a heuristic model of how teaching and learning environments are thought to influence the quality of student learning, backed up with evidence derived from differing research methodologies and carried out in a variety of educational settings and different educational systems. The top half of the model indicates some of the main differences among students in their previous experiences, motives, and approaches to studying, which are likely to affect the quality of learning there are likely to achieve. The lower half shows how academics’ ways of thinking about teaching and learning, and the broader contextual influences on their thinking, are thought to affect the approaches to studying adopted by students. This model was subsequently developed further (Entwistle, 2009, 2018), but still cannot take account of the most recent changes affecting universities. The pandemic has been causing major changes in the ways that curricula are being designed, with many forms of teaching involving different forms of presentation in blended learning. However, the great advantage of having sets of research-based concepts is that they suggest ways of thinking about teaching and learning that can readily be adjusted to different contexts and conditions, while still taking account of the inner logic of the discipline. 33 In discussing the early work on approaches to learning, the research of Eizenberg and colleagues in an anatomy department was mentioned. They identified a set of aspects that needed to be considered, if the students’ tendencies to adopt surface approaches were to be counteracted and encourage more use of deep approaches. Table 3 shows a revision of their suggestions, drawing on more recent concepts, and showing the reasons why the aspects had been chosen. These suggestions might well be worth considering when curricula are being revised, with many of them now being adapted to take account of new ways of teaching. Table 3 Aspects to consider in a curriculum review to encourage deep approach (Entwistle 2009, p. 107; developed from Eizenberg 1988, p. 186). Aspects to consider with the purpose of Course content and structure Linking to faculty or departmental goals explicitly making the aims clear to staff and students Identifying threshold concepts and implications ensuring time to explain such concepts thoroughly Ensuring congruence across the curriculum keeping teaching components in line with aims Incorporating professional applications in syllabus making the subject matter explicitly relevant Selecting textbooks and learning materials being readable and encouraging understanding Teaching Differentiating essential knowledge from other allowing study time to be used efficiently Explaining principles and concepts thoroughly making critical features and linkages clear Exemplifying ways of thinking and practising showing how professionals think and act Encouraging problem-based thinking actively engaging students in the processes Using post-graduates or senior students as tutors reducing authority and distance Assessment Arranging progressive course work with feedback encouraging development of understanding Providing regular tests with diagnostic feedback providing information on academic progress Using concept-based questionnaires for feedback making students aware of effective study processes References Anderson, C., & Hounsell, D. (2007). Knowledge practices: ‘doing the subject’ in undergraduate courses. The Curriculum Journal, 18, 463–478. Ausubel, D. P. (1968). Educational psychology: A cognitive view. (2nd edition with others, 1978). New York, NY: Holt, Rinehart & Winston. 34 Ballantyne, R., Bain, J., & Packer, J. (1997). Reflecting on university teaching: Academic stories. Canberra, Australia: Department of Employment, Education, Training and Youth Affairs. Bantock, G. H. (1961). Educational research: a criticism. Harvard Educational Review, 31, 264–280. Biggs, J. B. (1996). Enhancing teaching through constructive alignment. Higher Education, 32, 1–18. Bruner, J. S. (1960). The process of education. Cambridge, MA: Harvard University Press. Bruner, J. S. (1974). Beyond the information given. London: Unwin Bros. Davies, P., & Mangan, J. (2007). Threshold concepts and the integration of understanding in economics. Studies in Higher Education, 32, 711–726. Eizenberg, N. (1988). Approaches to learning anatomy: Developing a programme for preclinical medical students. In P. Ramsden (Ed.), Improving learning: New perspectives (pp. 178–198). London: Kogan Page. Entwistle, N. J. (1994). Generative concepts and pedagogical fertility: communicating research findings on student learning. EARLI News (June,1994), 9–15. Entwistle, N. J. (1995). Frameworks for understanding as experienced in essay writing and in preparing for examinations. Educational Psychologist, 30, 47–54. Entwistle, N. J. (2003) Concepts and conceptual frameworks underpinning the ETL Project. ETL Project Occasional Report 3. Viewed on 30.4.2021 at www.etl.tla.ed.ac.uk Entwistle, N. J. (2007). Conceptions of learning and the experience of understanding: Thresholds, contextual influences, and knowledge objects. In S. Vosniadou &C A. Baltas (Eds.), Reframing the conceptual change approach in learning and instruction (pp. 123-144). Amsterdam: Elsevier. Entwistle, N. J. (2009). Teaching for understanding at university. Basingstoke, Hampshire: Palgrave Macmillan. Entwistle, N. J. (2018). Student learning and academic understanding. London & Cambridge, MA: Academic Press. Entwistle, N. J., McCune, V., & Hounsell, J. (2003). Approaches to studying and perceptions of university teaching-learning environments: Concepts, inventory design and 35 preliminary findings. In E. De Corte, L. Verschaffel, N. Entwistle, & J. van Merriënboer (Eds.), Powerful learning environments: Unravelling basic components (pp. 89–108). Oxford, UK: Elsevier. Entwistle, N. J., & Ramsden, P. (1983). Understanding student learning. London: Croom Helm. (Reissued, 2015. London & New York: Routledge). Entwistle, N. J., Skinner, D., Entwistle, D., & Orr, S. (2000). Conceptions and beliefs about good teaching: an integration of contrasting research areas. Higher Education Research and Development, 19, 5–26. Entwistle. N.J., & Walker, P. (2000). Strategic alertness and expanded awareness within sophisticated conceptions of teaching. Instructional Science, 28, 335-361 Fox, D. (1983). Theories of teaching. Studies in Higher Education, 8, 151-163. ETL project (2005). Viewed on 30.4.2021 at www.etl.tla.ed.ac.uk Hay, D. B. (2010). The imaginative function in student learning: theory and case study data from third-year neuroscience. The Journal of the Hellenic Psychological Society, 17, 259–289. Hounsell, D., & Entwistle, N. J. (2005). Enhancing teaching-learning environments in undergraduate courses. Final Report to the Economic and Social Research Council on TLRP Project L139251099. Accessed on 30.4.2021 at www.etl.tla.ed.ac.uk . Hounsell, D., & Hounsell, J. (2007). Teaching-learning environments in contemporary mass higher education. In N. J. Entwistle, & P. Tomlinson (Eds.), Student learning and university teaching (pp. 91-112). British Journal of Educational Psychology Monograph, Series II, No. 4. Leicester: British Psychological Society. Kelly, G. A. (1955). The psychology of personal constructs. New York, NY: Norton. Land, R., Meyer, J. H. F., & Smith, J. (Eds.). (2008). Threshold concepts within the disciplines. Rotterdam: Sense Publishers. Marton, F. (1975). What does it take to learn? In N. J. Entwistle, & D. J. Hounsell (Eds.), How students learn (pp. 125–138). Lancaster: Institute for Research and Development in Post-Compulsory Education, University of Edinburgh. (Reprinted in Entwistle, 2018, Appendix B3). 36 Marton, F. (1981). Phenomenography—describing conceptions of the world around us. Instructional Science, 10, 177–200. Marton, F. (2007). Towards a pedagogical theory of learning. In N. J. Entwistle, & P. Tomlinson (Eds.), Student learning and university teaching (pp. 19–30). British Journal of Educational Psychology Monographs, Series II, No. 4. Leicester: British Psychological Society. Marton, F. (2015). Necessary conditions of learning. New York & London: Routledge. McCune, V., & Hounsell, D. (2005). The development of students’ ways of thinking and practising in three final-year biology classes. Higher Education, 49, 255–289. Perry, W. G. (1970). Forms of intellectual and ethical development in the college years: A scheme. New York: Holt, Rinehart & Winston. Perkins, D. N. (2006). Constructivism and troublesome knowledge. In J. H. F. Meyer, & R. Land (Eds.), Overcoming barriers to student understanding: Threshold concepts and troublesome knowledge (pp. 33–47). London: Routledge. Prosser, M., Trigwell, K., & Taylor, P. (1994). A phenomenographic study of academics’ conceptions of science learning and teaching. Learning and Instruction, 4, 217–231. Ramsden, P. (1991). A performance indicator of teaching quality in higher education: The Course Experience Questionnaire. Studies in Higher Education, 16, 129–150. Richardson, J. T. E. (2006). Investigating the relationship between variations in students’ perceptions of their academic environment and variations in study behaviour in distance education. British Journal of Educational Psychology, 76, 867–893. Säljö, R. (1979). Learning from the learner’s perspective. I – Some common-sense conceptions. Reports from the University of Göteborg, 76. (Whole report). Gothenburg: Department of Education. Skinner, B. F. (1954). The science of learning and the art of teaching. Harvard Education Review, 24, 88–97. Tait, H., Entwistle, N. J., & McCune, V. (1998). ASSIST: a re-conceptualisation of the Approaches to Studying Inventory. In C. Rust (Ed.), Improving student learning: Improving students as learners (pp. 262–271). Oxford: Oxford Brookes University, The Oxford Centre for Staff and Learning Development. 37 Taylor, C. E. (2006). Threshold concepts in biology: do they fit the definition? In J. H. F. Meyer, & R. Land (Eds.), Overcoming barriers to student understanding: Threshold concepts and troublesome knowledge (pp. 185–197). London: Routledge. Trigwell, K., & Prosser, P. (2020). Exploring university teaching and learning: Experience and context. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan. 38 2. LA HORA LOGRADA. PARA UNA SOCIOLOGÍA DE LA RELACIÓN CON LA EDUCACIÓN (UNIVERSITAS STUDIORUM) THE HOUR ACCOMPLISHED. FOR A SOCIOLOGY OF THE RELATIONSHIP WITH EDUCATION (UNIVERSITAS STUDIORUM) José Beltrán Llavador & Antonio Benedito Casanova2 Universitat de València Resumen El presente texto aborda la función de las representaciones sociales en el proceso de aprendizaje en educación superior. Se prestará especial atención a las metáforas como herramientas auxiliares que van más allá del sentido común al servir como vehículos para la expresión y el conocimiento de la realidad. A partir de la teoría de la resonancia, la metáfora de “la hora lograda” se usará para identificar las situaciones significativas con aquellas que consiguen conformar y enriquecer nuestra relación con el mundo. Finalmente, se expondrá un experimento pedagógico con estudiantes de Magisterio en el que se muestra prácticamente el proceso de construcción de sentido de su experiencia universitaria (sus representaciones de la universidad). Un sentido que, apuntando a la idea de G. Vico sobre la Universidad de los Estudios (Universitas Studiorum), ayuda a visibilizar una dimensión de la dialéctica entre resonancia y alienación. Palabras clave: metáforas, sociología, universidad, representaciones sociales, aprendizaje profundo 2 José Beltrán (jose.beltran@uv.es) y Antonio Benedito (antonio.benedito@uv.es) son profesores del Departamento de Sociología y Antropología Social de la Universidad de Valencia (España). Ambos forman parte de la Red Internacional que investiga las dinámicas educativas actuales, en especial, las universitarias, y que tiene como hilo conductor la indagación de las relaciones entre estructuras sociales y sistemas de pensamiento (Domingos, Ennafaa y Chaleta, 2016). Este trabajo forma parte del proyecto de investigación “Las representaciones sociales de los contenidos escolares en el desarrollo de las competencias docentes” (PGC2018-094491-B-C32), financiado por el Ministerio de Ciencia, Innovación y Universidades y cofinanciado con fondos FEDER de la UE. 39 Abstract This text addresses the role of social representations in higher education learning processes. Particular attention is paid to metaphors as auxiliary tools that go beyond common sense and serve as vehicles for the expression and knowledge of reality. Based on the theory of resonance, the metaphor of "the hour accomplished" may help to identify significant situations as those that succeed in shaping and enriching our relationship with the world. Finally, a pedagogical experiment will be introduced whereby teacher trainees are invited to graphically and conceptually render the construction of meaning of their university experience (their representations of the university). A sense that, pointing to G. Vico's idea of the University of Studies (Universitas Studiorum), helps to make visible a dimension of the dialectic between resonance and alienation. Keywords: metaphors, sociology, university, social representations, common sense Introducción ¿De qué sirve la ciencia si no hay entendimiento? Montaigne: Del magisterio (Libro primero, capítulo XXV, Ensayos) Durante el curso 2019-2020 tuvimos ocasión de llevar a cabo una tarea de reflexión académica con los estudiantes de la Facultad de Magisterio de la Universidad de Valencia, en el marco de la asignatura de Sociología de la Educación, que miraba hacia el pasado reciente, de una década atrás, y ponía el foco de atención en la situación de grave crisis económica y social que afecta a nuestro país desde 2010, y en sus efectos más directos sobre el sistema educativo y sobre la Educación Superior. Durante todo el curso académico pudimos seguir y analizar las noticias, informaciones, documentos, debates y acciones generados en torno a los recortes y a las medidas legislativas aplicados a la esfera educativa. Nuestro análisis se sirvió de diferentes procedimientos metodológicos (entre otros, debate y discusión de fragmentos discursivos, de noticias de prensa, radio y televisión, de comunicaciones en redes sociales, lectura de artículos y de capítulos de libros, a modo de etnotextos). Uno de los procedimientos consistió en la creación, interpretación y “traducción” gráfica e icónica –esto es, en la representación metafórica visual–, de la universidad. Un experimento pedagógico que se explicará hacia el final de estas páginas. 40 A la crisis vivida en aquel curso ha sucedido otra de naturaleza diferente, pero también con efectos desiguales y de escala mundial: nos referimos a la pandemia provocada por la Covid-19. Si bien se trata de dos fenómenos distintos, lo que ambos tienen en común es su magnitud, su alcance global y planetario, y una supuesta invisibilidad e imprevisibilidad en ambos casos, que tras un análisis postfacto, se ha comprobado que obedecía a cadenas sociológicas, provocadas por constelaciones de factores sociales, y con consecuencias que hasta cierto punto era posible anticipar. La explicación que ofreceremos al final de nuestro experimento pedagógico será el ejemplo empírico, o la aplicación a un caso concreto, del uso de expresiones referidas a la educación superior, en el que el trabajo con las metáforas ha sido determinante. Antes de presentar esta experiencia, esta exploración sobre la enseñanza y el aprendizaje en la educación superior, nos centraremos en las relaciones entre sentido común y sociología espontánea, así como en la consideración de las representaciones como elaboraciones de conocimiento socialmente mediado. Lo que haremos a continuación será abordar el papel de las metáforas como vehículos de conocimiento, que partiendo del sentido común (esto es, de la experiencia de una realidad mediada por los lugares comunes) van más allá del mismo, y sirven para desplazar nuestros marcos de sentido, para salir del imaginario dominante, generando otros espacios alternativos. Sentido común y sociología espontánea Uno de los supuestos en el estudio de las representaciones sociales es el de la necesidad de subrayar las relaciones entre texto y contexto, entre sentido común y construcción de la realidad. Con este supuesto se quiere señalar que la reflexión sociológica, y la producción intelectual que plasma esta reflexión, no tienen sentido si no se realiza a partir de fenómenos sociales y en torno a estos fenómenos. La vinculación entre texto y contexto se puede expresar también como la relación dialéctica, recíproca y continua, entre palabras y cosas, entre lenguaje y mundo. En ese sentido, las representaciones sociales se pueden entender en cierto modo, y adoptando la expresión de Paulo Freire (Freire et al, 1989), como una lectura de la realidad social, esto es, como un intento de establecer puentes y conexiones por parte de los sujetos entre el texto, el discurso, la palabra, y un mundo que es específicamente humano, social e histórico, precisamente a través del lenguaje. Esta interpretación enlaza con una sociología de las relaciones, practicada como una sociología de los modos en que nos relacionamos entre nosotros y con el mundo, y teorizada, entre otros, por Bernard Charlot 41 (2007), Bernard Lahire (2016) y Hartmut Rosa (2019). La sociedad está compuesta de relaciones y de acciones, pero también de representaciones, de formas de saber que dan sentido a esas acciones y relaciones, y que al hacerlo crean relaciones entre los sujetos sociales y entre éstos y el mundo. No está de más recordar, a este respecto, una de las aportaciones sociológicas más relevantes en lo que se refiere a la naturaleza simbólica de lo real. M. Mauss (2009), en su Ensayo sobre el don argumenta que el fenómeno social del “dar” conforma una estructura con los fenómenos del “recibir” y el “devolver”. Ello le conducirá al importante concepto de “hecho social total”. Lo social no es meramente lo que nos constriñe, también es aquello que nos obliga, que nos demanda una respuesta, una interpelación. Por ello lo social y lo mental participan de una misma realidad, no siendo más que uno. En tanto que sociólogos no podemos determinar el sentido y la función de una institución social sin tener en cuenta que en ella se expresan simultáneamente todo tipo de instituciones del sistema social y sin ser capaces de determinar sus efectos en la conciencia de los sujetos sociales, individuales o colectivos. Esta tarea incesante de aproximación a la realidad social, de hacerla inteligible, de presentarla o representarla, se realiza a través de una interpelación constante, planteando continuos interrogantes cuyas respuestas tendrán que someterse a nuevos cuestionamientos. Los sujetos trabajan, así, de manera crítica, es decir, poniendo en crisis y en tela de juicio las creencias erróneas, las opiniones planas o las explicaciones espúreas acerca de la realidad social. Pero esa tarea de deconstrucción, de revisión continua de las asunciones acerca de nuestro mundo social, buena parte de las cuales forman parte del sentido común, no sería totalmente crítica si no fuera acompañada de una labor simultánea de reconstrucción, esto es, de reelaboración de nuestros puntos de vista. Cotidianamente los sujetos elaboran –sin saberlo, de manera inconsciente– una sociología espontánea a partir de su conocimiento y experiencia del mundo, de sus formas de vida y de su modo de representar el mundo social, otorgándole identidad. Identidad que viene dada por la “idea” (mapa, imagen, representación) que cada uno se hace de sí mismo y de su propio mundo. De este modo, esta sociología no solo nos proporciona información, sino que también nos ofrece una manera de mirar el mundo y nuestro lugar en él. Es frecuente que intentemos explicar lo que nos sucede examinando los motivos que subyacen a los hechos que nos rodean y a los discursos sobre los mismos. La sociología científica nos insta a mirar aquellos patrones o modelos de comportamiento de la gente y los cambios de estos patrones a través del tiempo, de las culturas 42 y de los colectivos sociales. Así, los sociólogos no preguntan acerca de los motivos individuales para usar las tecnologías de la información, sino que interrogan acerca de las condiciones sociales relacionadas con el uso cada vez más extenso de estas tecnologías en determinadas capas de la población y los cambios que están generando en el acceso y distribución del conocimiento y en su impacto en cualquier dimensión social. Precisamente este enfoque interrelacional es lo que Wright Mills llamó imaginación sociológica en su obra de título homónimo (1999). Por imaginación sociológica se entiende la observación de nuestras experiencias mediadas (esto es, no directamente presentadas, sino codificadas o representadas) por el mundo social. También significa prestar atención a los patrones sociales más amplios que no se evidencian sólo a través de la experiencia personal; por expresarlo gráficamente, se trata de tener la visión del puzzle completo, y no de algunas de sus piezas. Se trata de poner en relación la historia con las biografías dentro de una sociedad determinada. La imaginación sociológica constituye, además, una herramienta crítica puesto que contribuye a dotar de sentido tanto a las propias experiencias como a los asuntos públicos. Precisamente, el modo de existencia, el tipo de ser resultante de la aparición del mundo humano, es el del sentido, alrededor del cual gravita todo lo demás. Cuando hablamos de sentido lo hacemos de un modo no meramente figurativo o retórico, sino material. A la sociología le interesa comprender los mecanismos de constitución del sentido común, es decir, cómo se construye y se reconstruye socialmente el sentido compartido, participado por los sujetos. Por otra parte, y complementariamente, a la sociología le interesa desvelar aquellos supuestos del sentido común que cristalizan en la naturalización de determinados fenómenos sociales, es decir, en la identificación de lo normal con lo natural y en la suplantación, por consiguiente, de la comprensión social por la explicación natural (véase Bourdieu, 2011: 74). La sociología tiene que reconocer los límites del sentido común cuando éste cristaliza en una tupida red de opiniones naturalistas con la que pretendemos categorizar los fenómenos sociales. El sentido común, instrumento con el que nos manejamos cotidianamente, resulta funcional y fundamental para comunicarnos con nuestros semejantes, para opinar y para recorrer el camino que va de lo conocido a lo conocido. “El sentido común es nuestro reservorio de contexto disponible de manera espontánea”, afirman Wagner y Hayes (2011: 19). Pero hay otra dimensión del sentido común que nos confina a una suerte de inmutable fatalismo, a un fatalismo programado, a una estrategia organizada según la cual se nos quiere hacer creer que las cosas son como son irremediablemente (“es lo que hay”, es la expresión 43 coloquial que mejor refleja esta conformidad). Ante esa lógica dominante, es necesario poner todo nuestro empeño si no nos conformamos con ser meros espectadores pasivos en el escenario social. Representación social como conocimiento socialmente mediado En El oficio de sociólogo, Bourdieu, Chamboredon y Passeron nos advierten acerca de la necesidad de ejercer una continua “vigilancia epistemológica” que, evitando toda tentación de convertir criterios metodológicos en recetas de cocina científica, ejerza un movimiento de reflexividad, por la que el sociólogo vuelve a repensar continuamente su propia actividad. Para Bourdieu (1976: 16-17), el oficio de sociólogo forma parte de un habitus que, “en tanto que sistema de esquemas más o menos dominados y más o menos transponibles, no es sino la interiorización de los principios de la teoría del conocimiento sociológico.” Precisamente por este movimiento de reflexividad (volviendo a sí mismo y a su actividad) es como el sociólogo puede evitar los errores propios del intelectualismo, es decir, tomar su propia relación intelectual con el objeto de análisis por la relación del agente con su acción. Así, la capacidad del sociólogo de tener en cuenta su relación con su objeto constituye uno de los medios de mejorar la calidad científica de su trabajo. De ahí el interés de lo que Bourdieu denomina una “objetivación participante”, pues la objetivación (en tanto que conocimiento científico) de la relación subjetiva del sociólogo con su objeto (su participación en el objeto que analiza) forma parte de los requisitos para que su análisis sea científico. De manera que, desde esta sociología reflexiva, que es crítica al mismo tiempo (por poner en crisis los supuestos del sentido común desde la vigilancia epistemológica), se realiza una tarea de auto-socio-análisis, en la medida en que examina su relación con el objeto, que está vinculada a su lugar en el campo intelectual y a su propia trayectoria social. La misma ciencia social es, así, objeto de representación social, combinando objetivación y participación. Ejercer la vigilancia epistemológica encierra una exigencia: la exigencia de vigilar, de prestar atención, de mirar, de re-flejar (reflexionar, pensar) y traer a presencia una realidad que es social, esto es, la exigencia de re-presentar la realidad social. Hay un viejo aforismo que dice: primum vivere, deinde philosophari (primero vivir, después filosofar). Primero vivimos la realidad mediada socialmente, después pensamos e interpretamos –traducimos, resignificamos– la realidad. En la Gestalt se dice: no vemos, sino que vemos como; es decir, vemos con lo que Herbert Read denominó “imágenes eidéticas”. “El arte mismo –señala– es una actividad 44 metafórica, que encuentra (más que busca) símbolos nuevos para significar nuevas áreas, nuevas formas de la sensibilidad (Read, 1985: 160). De modo que el lenguaje y las imágenes son también performativas, esto es, decir y ver son prácticas sociales con efectos materiales: hacemos cosas con palabras y también con imágenes, como nos muestra, entre otras, la narración fílmica, el arte del cine (Beltrán, 2006). “Una vez centrada –señala L. M. Santos– la mirada ha de abrirse de manera progresiva a los elementos que estén insinuados en lo que la mirada descubra. Lo primero que estará insinuado será un hombre real, que es el soporte de la acción y que nosotros vamos a llamar el actor. No pretendemos, sin embargo, que el actor y sus cualidades sean la explicación de todo cuanto ocurre, pues tal vez haya que explicarle antes a él, pero sostenemos que siempre está presente. No se le puede borrar del cuadro. Tal es la posición de Marx y de Max Weber, que parten de la presencia indispensable de un sujeto. No es la postura de los estructuralistas, que pretenden construir una sociología sin hombre. Pero quede claro que el actor aquí es el lugar de la mirada, no el deus ex machina que todo lo explica. Después, la mirada sociológica descubre que lo mirado está dentro de una trama, de un contexto (...) Por último, la trama se desarrollará en un lugar, en un espacio, en lo que denominaremos con la palabra griega topos.” (Martín Santos: 1988: 14-15). Esa misma palabra que da lugar al espacio de la utopía en su sentido más literal: “u-topos”, “no lugares”, o lo que es lo mismo, espacios por recrear, territorios por descubrir, ámbitos sobre los que dirigir la mirada. Mundos posibles en sentido estricto. Las metáforas acompañan al mundo Por la palabra se hizo el mundo (Blumenberg, 2001: 174). Nuestro mundo está informado por el lenguaje. Nuestra mirada está mediada por el lenguaje. “El lenguaje acompaña al mundo”, decía Wittgenstein (WWK 22/12/1929: 50). Pero el lenguaje no es una mera copia del mundo, sino una expresión del mundo: no es el reflejo literal de la realidad, sino su representación simbólica, codificada. Por eso, el lenguaje se sirve de las metáforas, que están vinculadas a la dimensión paradigmática o sistemática del lenguaje (Barthes, 1964). Las metáforas son herramientas del lenguaje, pero éste, a su vez, es un sistema de herramientas y de usos de las mismas (Wittgenstein, 2017). Nos enfrentamos a lo desconocido haciendo asociaciones con aquello que conocemos, de ahí que la expresión metafórica, relacional-asociativa sea una forma de poder que interponemos entre nosotros y la realidad desconocida. Comparamos sucesos, conceptos o significados y los relacionamos con 45 nuestros esquemas de significado. El lenguaje no es inocente ni neutral, de manera que conviene preguntarse bajo qué condiciones es válido o verosímil el uso de determinadas ideas o expresiones. Así, por ejemplo, podemos preguntarnos bajo qué condiciones se pronuncia el término “calidad” o “excelencia” en las agendas educativas hegemónicas. La esfera educativa –cuyo origen histórico más reciente se remonta al Siglo de las Luces (otra magnífica y potente metáfora)– proporciona un espacio especialmente fecundo para generar metáforas con una gran potencia semántica. Con frecuencia se ha comparado a las instituciones de enseñanza con factorías o industrias (recuérdese el conocido y triste tópico de “la Universidad como fábrica de parados”), con prisiones (recuérdese el modelo panóptico de Foucault en Vigilar y castigar), con laboratorios (así la escuela “laboratorio” de John Dewey en Chicago) o con la misma vida (“la escuela de la vida” siguiendo a Comenius). Nuestras explicaciones siempre son metafóricas: armamos y desarmamos el mundo con metáforas. Y con ellas, nos enfrentamos a lo desconocido haciendo asociaciones con lo que conocemos. Cuando nos referimos a procesos de innovación educativa no estamos sino apelando a una expresión que sugiere nuevas metáforas del cambio social. Cambio que en este caso viene marcado, a su vez, por el signo de la globalización. Aquí podríamos parafrasear la pregunta que el cartero, en la novela de Antonio Skármeta, formula al poeta Pablo Neruda: “¿Usted cree que el mundo es la metáfora de algo?” (Skármeta, 1999: 26). Efectivamente, el significado que atribuimos a alguna cosa, que descubrimos o que construimos es, más que un hecho psicológico, una cuestión lingüística. Para entender el significado de una idea, de una frase o de una explicación, es necesario entender bajo qué condiciones es cierta o válida. En una conversación cotidiana no es frecuente que nos preguntemos acerca de la veracidad de lo que se dice o de lo que se escribe, entre otras cosas porque la finalidad o la orientación de una conversación o diálogo de la vida cotidiana no es didáctica. Ahora bien, imaginemos una aseveración que pertenece al conocimiento instrumental (saber hacer), por ejemplo, una explicación dedicada al manejo de una herramienta técnica en el terreno de la ofimática o de la electrotecnia. En este caso las condiciones bajo las cuales una idea expresada es cierta se pueden determinar por una prueba empírica. En cambio, cuando lo que se afirma pertenece al conocimiento expresivo (hacer saber: enseñar y aprender a entender aquello que se está comunicando), las condiciones bajo las cuales la aserción es válida se establece o bien a través del contraste con otros sujetos que están informados, o apelando a criterios o fuentes de autoridad, o evaluando (emitiendo juicios de valor acerca de) y cuestionando el contenido de la misma. Así, por ejemplo, puedo 46 preguntarme bajo qué condiciones es cierta la defensa cada vez más extendida de la idea de “desarrollo sostenible” por países que sistemáticamente incumplen los acuerdos internacionales sobre contaminación, y puedo cuestionar si el uso de esta idea no está en el fondo legitimando lo contrario de aquello a lo que apunta: el sostenimiento del desarrollo. Otro ejemplo típico en educación es el siguiente: ¿Bajo qué condiciones declara el educador estar aplicando una metodología crítica, activa, participativa, interdisciplinar, flexible, abierta, etc.? Este inventario de epítetos, que es capaz de pronunciar cualquier educador familiarizado con la retórica pedagógica, ¿sirve de la misma manera para el educador comprometido que para el educador menos implicado? Ahora podemos preguntar, con un sentido crítico y poniendo en crisis asunciones previas, si el uso reiterado y trivial de estos epítetos no acaba por vaciarlos de contenido. Mientras que las hipótesis son las herramientas del aprendizaje instrumental, las metáforas son las herramientas del aprendizaje expresivo. Nos enfrentamos a lo desconocido haciendo asociaciones con lo que conocemos. Comparamos sucesos, conceptos o palabras y los relacionamos con nuestros esquemas de significado. “A los especialistas les puede bastar una abstracción para imaginar el Big Bang. Pero los demás necesitan de una metáfora” (AA.VV, 1997: 23). Muchas veces la comprensión viene de hacer que la metáfora correcta haga encajar la experiencia en nuestras teorías, sistemas de creencias, o en nuestro autoconcepto. Las metáforas, pues, se basan en la correlación entre la experiencia percibida y algo conocido. Así, cuando hablamos del teatro de la vida, subrayamos el papel que cumplimos en éste en tanto que actores sociales. Cuando a los seis años un niño miró al cielo y afirmó que “la luna es la sonrisa del cielo” hizo una metáfora sin saberlo, a la par que un descubrimiento. Cuando decimos de un educador que es un “todoterreno” nos referimos a las múltiples tareas que ha de desempeñar más allá de lo que estipula su contrato como docente. Cuando se acusa a un docente de ser un “hueso” se está señalando la rigidez de su actitud. Cuando lamentamos la carencia de una “cultura de la evaluación”, utilizamos el término de connotaciones agrarias para apuntar la falta de tradición evaluativa en el sistema educativo. Wittgenstein afirmaba que las palabras de nuestro lenguaje cotidiano son semejantes a cajas de herramientas. Lo que hacemos cotidianamente en nuestras clases es acudir a esos instrumentos y construir metáforas. Nuestras explicaciones siempre son metafóricas: armamos y desarmamos el mundo con metáforas. Construimos significados con metáforas, buscamos el sentido de las cosas con metáforas. Y aquí podemos llegar a una conclusión imprevista, por radical y sorprendente: conocimiento y poesía se dan de la mano. No es extraño que Platón 47 quisiera expulsar a los poetas de su República ideal. No es extraño que escritores y escritoras sean perseguidos en la actualidad, o que permanezcan en el exilio: sus metáforas han sido lo suficientemente poderosas como para poner en crisis, en tela de juicio, el mundo conocido. En palabras de una conocida filósofa de la ciencia, que no nos resistimos a citar: “Las metáforas y conceptos de las formas de pensar que prescinden del principio femenino han tenido su fundamento en una concepción según la cual la naturaleza y las mujeres son pasivas, inertes y por último prescindibles” (Shiva, 1995: 284). Los educadores también utilizan cotidianamente metáforas para explicar y para expresar una parcela de la realidad: con el uso de las metáforas, los educadores pueden efectuar no sólo movimientos, sino que pueden provocar cambios, en el sentido de enseñar el camino desde lo conocido hasta lo desconocido. El uso que aquí hacemos del término metáfora se refiere tanto a un producto –una perspectiva o marco, una forma de ver las cosas– como a un proceso por el que aparecen nuevas perspectivas sobre el mundo, porque “la realidad es perspectiva” (Wheelwright, 1979: 171). La perspectiva está relacionada con el sujeto obviamente, pero la perspectiva forma parte de la realidad, ya que si un sujeto ocupa el lugar del otro la perspectiva se mantiene. Está vinculada al lugar. Del hecho de considerar a la perspectiva como una insuficiencia o deformación de lo real, pasamos a la consideración de que la perspectiva es objetiva, a través de ella se nos aparece la realidad. Como referente (existente) o como sentido (posibilidad). Las metáforas que resultan de este proceso son “metáforas generativas”. Estas metáforas son relevantes en tanto que modos peculiares de ver algo como algo más, es decir, de desplazar marcos o perspectivas desde un dominio de experiencia a otro. En ese sentido, “una metáfora es un conjunto disponible de conexiones, un puente prefabricado que se puede utilizar de modo temporal para unir dos ideas, para, de esta forma, poder descubrir los vínculos reales que las unen” (Claxton, 1987: 227). Como en la parábola zen, la metáfora es el dedo que señala la luna, pero no hay que confundir el dedo con la luna. Si el educador deja que sus estudiantes tomen la analogía por la realidad, les estará induciendo a equivocarse. Las “metáforas vivas”, utilizando la expresión de Ricoeur en su libro de título homónimo (Ricoeur, 1980), iluminan con su claridad expresiva el camino de la comprensión: nos ayudan, como linternas, a interpretar el mundo, a cruzarlo como quien atraviesa un espejo y se enfrenta a nuevas situaciones con nuevas miradas, con nuevos códigos de interpretación. Cuando Alicia, el personaje de Lewis Carroll, aparece en el otro lado del espejo, tiene que aprender a ordenar el caos de un mundo absurdo cuyas reglas no conoce. 48 De la misma manera, las metáforas constituyen la bisagra o el enlace entre la teoría y la práctica, entre el conocimiento y la acción. Pueden llegar a ser “ficciones útiles”, cuya misión no es demostrar las cosas, sino mostrar el mundo “como si” fuera tal como lo describe una metáfora. Una metáfora ya es una realización: un acto, una acción, de comprensión de la realidad. Para ilustrar esta conjunción con un ejemplo podemos acudir al término inglés “to realize”, cuya traducción sería “darse cuenta”, mientras su homófono en español quiere decir “hacer”. Hacer y comprender, práctica y teoría, se dan la mano y nos ponen en el camino del aprender. En este sentido, podemos decir que las metáforas son constitutivas, y que hasta cierto punto somos pensados por las metáforas, porque hay “metáforas que nos piensan” (Lizcano, 2006). La hora lograda Actualizando y ampliando la teoría del reconocimiento de Axel Honneth, muy recientemente, Hartmut Rosa ha desarrollado una teoría de la resonancia, en su obra Resonancia. Una sociología de la relación con el mundo (2019)3. El autor sostiene que, frente a la alienación que producen las sociedades contemporáneas, es necesario recuperar la idea y la experiencia de resonancia, que para el autor significa la capacidad de conexión y relación con el mundo al que pertenecemos. En este sentido, la alienación podria ser definida como una modalidad específica de relación con el mundo, modalidad en la que la relación alienante sería una ausencia de relaciones. Y la resonancia sería otra modalidad en que la relación resonante sería la presencia de relaciones4. Desde el punto de vista educativo, y como apunta Rosa en el capítulo dedicado al eje de resonancia de la educación, la formación apunta a “la conformación de la relación con el mundo” (Rosa: 2019: 313). Aplicada esta teoría a nuestra reflexión, esto es lo que vamos a encontrar en buena parte de nuestra experiencia sobre el sentido de la Universidad. “La formación como asimilación transformadora del mundo y como instauración de ejes de resonancia presupone que la propia voz del alumno pueda ser expresada y escuchada.” (Ibid: 313). Como veremos, si alguna contribución social resalta Es importante señalar que el concepto que emplea Rosa es el de “Beziehungen” y no los de “Verhältnisse”, “Verbindungen”, “Wechselwirkungen” o “Zusammenhänge”. La sociología, como ciencia social, es el estudio de relaciones sociales. Sin embargo, éstas pueden entenderse de múltiples formas y desde diferentes sistemas teóricos. El uso del término alemán “Beziehung” remite al modelo weberiano de entender las relaciones. El resto de nociones remiten a Marx, Durkheim, Simmel y Dilthey respectivamente. Ello implica hacer tres consideraciones. Se trata de una relación de dependencia referencial y funcional, por tanto, dirigida. En ella priman las categorías de modalidad referentes a condiciones de posibilidad, existencia o posibilidad. Estamos ante un uso del concepto de relación que se aplica fundamentalmente a las relaciones de poder, porque son relaciones que se aplican a sistemas de relaciones. La noción de “Beziehung” se vincula, pues, al uso de las categorías sociológicas de subjetividad y de acción social. 4 Una sociología de nuestras relaciones (Beziehungen) con el mundo debe concluir en una crítica de las relaciones (Verhältnisse) que marcan a la alienación para posibilitar las condiciones de la resonancia. 3 49 entre las demás, es la oportunidad de generar y recrear relaciones entre los sujetos para intercambiar y compartir proyectos y puntos de vista comunes. Si bien el análisis de Rosa se centra en la escuela, se puede extrapolar a la Universidad. Hartmut Rosa se hace eco de temas populares (canciones pop) que hacen de la escuela el centro de inspiración: desde The Wall, de Pink Floyd, la obra que elevó a manifiesto el célebre “We don´t need no education”, pasando por la versión de “Mad World”, en la adaptación realizada por Tear for Fears, hasta “The Logical Song”, del grupo Supertramp. Todas ellas, y buena parte de las obras del género de formación en la literatura construyen narrativas en torno a la importancia de la enseñanza y el aprendizaje, pero no como un hecho abstracto, sino a partir de experiencias concretas, vividas subjetivamente y objetivadas mediante ejercicios de “biograficidad” (Alheit y Dausien, 2007) y de “aprendizaje narrativo” (Goodson, 2007). Hartmut Rosa toma prestada una definición de Wilhelm von Humboldt sobre la formación en sintonía con su teoría de la resonancia, señalando que es un proceso que puede tener éxito “solo si se produce la ligazón de nuestro yo con el mundo en una intervención que sea lo más general, activa y libre posible”. (Rosa, 2019: 316). ¿Qué docente no ha tenido la percepción, durante el desarrollo de una clase y al final de la misma, de que esta ha sido una clase exitosa (satisfactoria, plena, redonda) o, por el contrario, de que ha sido una clase en la que, pese al esfuerzo invertido, no ha habido conexión, no se ha dado una interacción, una comunicación? La primera percepción corresponde a la hora lograda, la contraria corresponde a la hora no lograda. En la hora lograda, se da un triángulo de resonancia por la que el docente (vértice 1) alcanza a los alumnos y transmite entusiasmo, a la par que se deja “conmover”. El alumno (vertice 2) está cautivado por el tema, subyugado o absorto y a la vez abierto y el material (vértice 2) aparece para ambas partes como un campo de posibilidades y desafíos significativos. La escuela (la universidad en nuestro caso) se convierte en un espacio de resonancia en la que el aula “crepita” y la atención (la relación con el saber) se focaliza sin esfuerzo alguno. Los ejes de resonancia “vibran”, por utilizar la expresión cotidiana por la que manifestamos sentir “buenas vibraciones”. Para ello, “la primera condición para que se constituya el triángulo de resonancia como paradigma de una lección escolar lograda es que el alumno y el docente puedan alcanzarse mutuamente.” (Rosa, 2019: 317). Advierte Rosa que en el clima pedagógico actual, la idea de que haya un conmoción recíproca –en términos metafóricos– entre estudiantes y docentes es considerada como perjudicial, seguramente debido a nuestra limitada capacidad para pensar vínculos de resonancia (Rosa, 2019: 319-320). El autor 50 concluye señalando que, a su juicio, la característica decisiva del talento no es la inteligencia sono la capacidad de resonancia. Ahora bien, los estudios sobre desigualdad educativa, “dan pie a una crítica general del sistema educativo, en cuanto que controla la distribución de la disposición a la resonancia (y a la alienación) de acuerdo con el estrato social, e institucionaliza así la escuela como un potencial espacio de resonancia para unos y una zona de alienación para otros.” (Rosa, 2019: 322). Elisa Chaleta (2011), en colaboración con diferentes autores (Chaleta y Entwistle, 2011; Chaleta, Grácio y Efklides, 2011), ha prestado atención al problema del aprendizaje en Educación Superior, que analizan en diferentes dimensiones y desde una perspectiva psicológica en diálogo con otras disciplinas. Con un modelo y una metáfora similares a los de Rosa, Chaleta et al. (2013: 12-28), recuperan el concepto de Meyer de “orquestração da aprendizagem” (Meyer, 1991) a partir de la coordinación entre tres componentes fundamentales en el proceso de aprender: concepciones, abordajes y percepción sobre los conceptos de aprendizaje. De nuevo, el término de “orquestación” evoca al de “resonancia”, con el recurso común al símil musical. En el estudio que llevan a cabo con un grupo de estudiantes universitarios de primer curso universitario, los autores destacan la “consonancia” (la “resonancia” o relación estructurada, en términos de Rosa) entre las concepciones, los abordajes y las experiencias en curso, o lo que es lo mismo, que los estudiantes presentan formas apropiadas de “orquestar” su propio proceso de aprendizaje. Un experimento pedagógico con metáforas Nos atenemos a la definición que Moscovici dio de las representaciones sociales como “la elaboración de un objeto social por parte de una comunidad con el propósito de comportarse y comunicar” (Moscovici, 1963: 251). Pero sobre todo al enfoque que tiene sobre las representaciones sociales. Éstas no deben ser encaradas de forma pasiva, como si fuesen imágenes, deformadas o no de algo previo, sino de forma activa, ya que su función es informar, es decir, dar forma a lo que procede del exterior (Moscovici, 1979). En este sentido son procedimientos transformadores de interpretación, al ser en ellas lo más relevante su papel de transposición, esto es, su naturaleza metafórica, su capacidad de comparar, poniendo unas cosas en lugar de otras a través de un sistema de relaciones (Nietzsche, 2000: 107). Más adelante, completó esta definición afirmando que “podrían incluso ser entendidas como la versión contemporánea del sentido común” (Moscovici, 1981: 181), es más, como la génesis misma de un nuevo sentido común (Moscovici, 1979) que enlaza con el concepto de “sentido común”, no connotado negativamente, de A. Gramsci (Gramsci, 1978, 44). 51 Estas definiciones y las consideraciones anteriores enmarcan una de las dimensiones del “experimento” pedagógico anunciado al comienzo de este texto. La reflexión sobre representaciones sociales en relación con la educación superior se encuentra en la literatura dentro de la psicología social y dentro de las propias ciencias de la educación (véase, por ejemplo, recientemente: Covarrubias Papahiu, 2011 y Gutiérrez Vidrio, 2011). Sin embargo, hay que añadir dos dimensiones más. Por una parte, actuamos en tanto que educadores con el fin de que el estudiantado, que participa en la experiencia pedagógica, logre un aprendizaje profundo y no estratégico o superficial (Bain, 2006). Eso significa que pretendemos que los estudiantes aprendan sociología de la educación no de forma memorística o productivista, sino de manera educativa y formativa (Anaya, 2007). Por otra parte, en tanto que sociólogos de la educación tenemos en cuenta tanto las diferentes modalidades pedagógicas como los diversos dispositivos pedagógicos usado en el espacio académico (Bernstein, 1990). Ello implica trabajar con los conceptos pertinentes de una teoría adecuada de la comunicación y de la transmisión y el aprendizaje culturales. Si desde el punto de vista educativo tenemos que conseguir que los estudiantes se percaten de los modelos que ya poseen acerca de la Universidad para que puedan ser desplazados por otros, más adecuados a las problemáticas actuales del campo social universitario, desde el punto de vista sociológico debemos cambiar las reglas de enmarcamiento y de control del espacio educativo con el fin de que se puedan objetivar de forma crítica las reglas de clasificación y de poder incorporadas en las estructuras simbólicas de los estudiantes. Había que dar la voz al adquirente del aprendizaje para mostrar en qué sentido esa voz no es propia y está atravesada de un sistema de relaciones e interacciones sociales. De ahí que usáramos procedimientos teóricos propios de un enfoque sociohermenéutico, como son el interaccionismo simbólico de raíz pragmatista y la etnometodología de base fenomenológica. Para este enfoque la conciencia es una estructura intencional, es decir, funcional. La conciencia no es una sustancia enfrentada al mundo. Es una relación en la que aparece el mundo, lo real, de diferentes maneras. En este modo de pensar ya no tenemos al sujeto contrapuesto al objeto, porque el sujeto es una relación de tipo intersubjetivo, interactivo y social. Es más, el sujeto deja de ser algo a interpretar, puesto que él, como signo, es ya proceso de interpretación, historia, como lo es el objeto que, además es el argumento de la función que es el sujeto (Foucault; 2001: 599). La idea clave es que el supuesto dualismo de la relación entre sujeto y objeto, de raíz cartesiana, es desmontado como falaz ante el primado de las relaciones. No obstante, hay que tener en cuenta que, si por medio de las relaciones nos 52 aparece lo real, la realidad no está constituida por un conjunto de relaciones como si fuera una “cosa en sí” (Kuhn, 1979). No tiene sentido hablar de la realidad en sí. Todo es fenómeno, aparición en un plexo de relaciones, constituido por dimensiones cognitivas, afectivas y volitivas. Respecto a los instrumentos técnicos empleados en la experiencia seguimos la línea de la tesis doctoral de Moscovici (Moscovici, 1979), hemos usado el Análisis de Contenido aplicado a las respuestas a un Cuestionario abierto que estaba estructurado en base a 6 “pattern-variables”. Tres de estas variables están vinculadas a la noción de hecho social de Durkheim como forma de acción, de pensamiento y de ser de tipo coactivo. Las otras tres se relacionan con el concepto de hecho social total de Mauss (2009) en el que tenemos relaciones sociales, acciones históricas, pero también representaciones sociales que están incorporadas a la estructura de lo real. El sistema de las representaciones sociales acerca de la Universidad de los estudiantes de Sociología de la Educación de la Facultad de Magisterio de la Universidad de Valencia se ponía así en relación con el medio que usa ese sistema y con el entorno del mismo. El concepto de “medio” social lo hemos descompuesto en tres variables y el de “entorno” en otras tres. El experimento tuvo lugar en mayo de 2012, en unos momentos en los que el Ministerio de Educación, en manos del gobierno conservador del PP, promulgó un Decreto Ley de medidas urgentes para racionalizar el gasto educativo, una medida que afectaba a todos los niveles educativos, desde educación infantil hasta educación superior, y que provocó una reacción mayoritaria, a través de la primera huelga educativa unitaria en la historia de la democracia de nuestro país. La iniciativa se realizó en una de las sesiones de la asignatura de Sociología de la Educación, en la que se impartía un tema dedicado a las reformas educativas. Se trataba de que los estudiantes de segundo curso de Magisterio llevaran a cabo una actividad de representación –de codificación visual y textual– de lo que estaba sucediendo en la Universidad en un contexto de intensa contestación social debido a una política de recortes económicas y de reformas tecnocráticas de carácter neoliberal. Lo que se pedía a los estudiantes es que elaboraran posters plasmando imágenes (dibujos) e ideas (mensajes) en torno a una serie de ejes temáticos. El título que le dimos a esta actividad era “El muro”, evocando por un lado la conocida obra antes mencionada del grupo musical Pink Floyd (The Wall), y por otro lado la actividad de los grafitis en las paredes de la ciudad. De manera que los estudiantes tenían que crear una suerte de mural en una cartulina y de manera colectiva, en pequeños grupos de cuatro o cinco personas. La actividad combinaba elementos de 53 información y de reflexión con elementos de creación e imaginación. El resultado sería una representación social, gráfica y metafórica, de los sentidos de la Educación Superior. También se sugirió a los estudiantes que podían servirse explícitamente de metáforas elaboradas para expresarse, algo que ya les resultaba familiar porque habían trabajado con metáforas a partir de la conocida viñeta del pedagogo italiano Francesco Tonucci (Frato), titulada “La máquina de la escuela”, cuyo origen se remonta a 1970 (Tonucci, 2008: 10). Para organizar y sistematizar estas representaciones, se les sugirió trabajar, pues, sobre los siguientes ejes temáticos: Cuadro 1. Ejes temáticos para la representación social sobre la Universidad MARCO RELATIVO AL MARCO SER PENSAR RELATIVO AL MARCO RELATIVO A LA ACCIÓN Qué soy y quién soy, cómo Qué estoy aprendiendo y cómo Qué podemos hacer al me autopercibo en la en ella respecto Universidad CONTEXTO SOCIAL CONTEXTO POLÍTICO CONTEXTO HISTÓRICO Qué lugar ocupo en la Qué significa ser estudiante Qué está sucediendo en la sociedad universitario actualidad dentro y fuera de la Universidad Fuente: elaboración propia Este esquema de trabajo permitía un auto-socio-análisis que tenía en cuenta diferentes marcos (identitarios, epistemológicos y prácticos) puestos en relación con una serie de contextos (socio-institucional, político-cultural e histórico-crítico). El análisis, por tanto, tenía desde el principio una orientación relacional. Cada una de las variables (de marcos y contextos) tiene relación con las demás y generan una serie de interrogantes a los que había que responder con palabras e imágenes. Este procedimiento combinaba al mismo tiempo la subjetividad y la objetividad (la interiorización de lo exterior y la exteriorización de lo interior, en términos de Bourdieu), lo emotivo y lo racional, lo formal y lo no formal, la mirada sociológica y la imaginación sociológica. Además, el punto de partida era el del sentido común, lo que estaba a la vista de todos y formaba parte del debate público, pero al mismo tiempo se pretendía ir más allá de la opinión (doxa), para avanzar hacia la construcción de conocimiento (episteme), hacia lo desconocido, que en buena medida consiste 54 en los diferentes procesos sociales configuradores del propio sentido común expresado. En este camino se hacía hincapié en las metáforas como modelos comparativos que están a la base de la actividad científica (Kuhn, 1979). Se trataba de un proceso que ilustraba muy bien la ruptura epistemológica: el papel de la sociología espontánea y la necesidad de que ésta pudiera objetivarse desde la reflexividad propia de las ciencias sociales. Para transitar de los viejos modelos de comprensión a los nuevos y ser conscientes de que se ha aprendido algo, de manera profunda, en el campo sociológico fue fundamental trabajar las representaciones no como imágenes sino como herramientas (Wittgenstein, 2017). De este modo logramos tres consecuencias metodológicas. En primer lugar, aplicar el concepto de “resonancia” de Rosa en la dirección de una perspectiva crítica, sustituyendo la noción restringida de intencionalidad (Badiou, 2008) entendida como extensionalidad (referencia) por una generalizada que la entiende como intensionalidad (posibilidad, modalidad). En segundo lugar, hacer ver que el análisis del sistema de la cultura no puede reducirse a dos dimensiones, el poder no simbólico y el poder simbólico, sino que debe abrirse a la cuestión del sujeto. Por último, argumentar la importancia de que un análisis sociológico del sistema de las desigualdades educativas no puede limitarse a una discusión sobre recursos, sobre medios, también debe incluir a las personas y a sus sistemas de fines. El ser es tan importante como el tener (Fromm, 1991), de modo que se puede tener trabajo, pero ser pobre y se puede no ser pobre y tener una mala calidad de vida o una vida indigna y no buena. Tan importante como las condiciones sociales de producción son las condiciones de vida y de existencia. En el campo de la educación, como en cualquier campo social, hay que atender a los procesos de diferenciación, de explotación y de dominación. Sin embargo, no podemos limitarnos al análisis de estas dimensiones de la alienación. Para combatirla prácticamente hay que señalar al espacio educativo de los sujetos que se relaciona de diferentes maneras con este sistema de relaciones múltiples y entrecruzadas. Como resultado del experimento se elaboraron 30 posters en dos grupos de clase, que se expusieron en las paredes de las dos aulas y a las que se invitó a visitar al resto de estudiantes de Magisterio. Siguiendo los ejes temáticos expuestos en el esquema anterior, organizados según las variables de marco y de contexto, los elementos más destacados fueron los siguientes. Respecto al marco identitario, en el que tenían que dar respuesta a cómo se percibían en la universidad, la mayor parte se identificaba con un colectivo que cumplía roles típicos 55 (aquello que les pedía la sociedad: el oficio de estudiar), pero al mismo tiempo reclamaban para sí el imperativo: “Sé tú mismo”, de manera que su identidad no quedara anulada en el juego de poder y de distribución de clases sociales. En algunos de los posters apareció el dibujo de unas gafas con la recomendación de Wright Mills de “mirar con los ojos abiertos”. El marco epistemológico venía ilustrado con aforismos llenos de humor, como: “pienso, luego estorbo” (a partir de un conocido humorista gráfico de la prensa nacional: Forges), o con lemas como: “tenemos voz, no somos la minoría silenciosa”. Con estas expresiones, los estudiantes manifestaban su resistencia a ser manipulados y a convertirse en “robots alegres”, por utilizar también otra expresión de Mills. El marco de posibilidades prácticas pretendía dar respuesta explícita a la conocida pregunta de Lenin: qué podemos hacer. Las respuestas en este caso fueron tan elocuentes como abundantes. He aquí algunas de ellas: descubrir la verdad, contribuir al cambio y a la mejora, abrir los ojos, construir un mundo mejor, defender mis derechos, ser crítico con la sociedad, ser buena persona (ser cívico y no cínico), rebelarse contra “las fuerzas superiores”, pasar de las palabras a la acción, “¡democracia real ya!” (este es el nombre de un movimiento social creado a partir de las llamadas “mareas” y “primaveras”: aquí se vivió una intensa “primavera valenciana”, protagonizada por estudiantes y con una desproporcionada represión policial), tomar conciencia de la realidad, ver el mundo con otros ojos. Este marco permitía tender el puente de la crítica a la posibilidad, y resultó uno de las dimensiones más fértiles de la actividad. Por lo que se refiere a los contextos, el primero de ellos pretendía situar a los estudiantes en una institución social y a su representación acerca del lugar que ocupaban en la sociedad. Algunas respuestas fueron, de nuevo muy imaginativas: en algún poster se pudo ver una sucesión de números: 1, 2, 3, 4...1.000, con lo que la interpretación coincidía con buena parte de la percepción ciudadana de ser considerados números antes que individuos. Otra respuesta recogía la expresión común: “el último de la fila”, en otros casos, la respuesta, en textos y en imágenes, aludía al hecho de ser considerados “marionetas”, o una pieza más del puzzle. En otros casos los estudiantes declaraban que se sentían comprendidos por sus profesores, o que la Universidad “me hace sentir vivo, si me la quitan ¡me están matando!” En alguno de los posters aparecía la palabra utopía descompuesta, recordando una de las clases que había dedicado a descomponer la palabra u-topia y a traducirla en su literalidad como “no-lugar”, y en la que había denunciado el significado unívoco (la trampa histórica a partir de un salto lógico) de la palabra utopía como aquello que es “imposible”. 56 El contexto político social, por el que se pretendía la aproximación a la cuestión acerca de qué significa ser estudiante universitario, recibió respuestas descriptivas, pero también emotivas y expresivas: ser estudiantes universitarios significa ser el futuro, significa esfuerzo, empleo, identidad, posibilidad, oportunidad, amistad, conocimiento. También se respondió con los lemas de las pancartas que se llevan en las manifestaciones: “la educación es un derecho, no un privilegio”, “una beca, ¿es una hipoteca?”. En algún caso el tono era poético: “somos la palabra silenciada, somos un mundo por construir”. El contexto crítico suponía un cierto diagnóstico de la situación. A la pregunta qué está sucediendo los estudiantes respondían con vehemencia, haciéndose eco de algunos de los síntomas que forman parte del análisis del sentido común: corrupción, malversación, manipulación, capitalismo, consumismo, y “menos no es más.” Conclusiones La interrelación entre los diferentes contextos puede asociarse a la idea (y al ideal practicable) que ya había defendido Vico5 bajo el término de Universitas Studiorum. Los estudiantes, en el experimento descrito, hicieron gala de “las razones de lo probable”, con sus nociones y facultades, a saber, “el sentido común, la fantasía, el ingenio y la imaginación” (Patella, 2019: 69). El ingenio, que ha trabajado aquí “acercando palabras, cosas e ideas a primera vista distantes y desconectadas, efectivamente es más propenso a acercar que a alejar, a integrar que a sustituir, a unir que a dividir, indicando así el objetivo primario de una cultura orgánica e integrada, más que un saber escindido y fraccionado” (Patella, 2019: 76). Precisamente, Vico confía en las universidades el noble oficio “de ser lugares de promoción de una cultura elevada y unitaria, de transmitir un saber orgánico e integrado, apelando a los principios de la contextura, de la armonía, y de la integración, que rinden por tanto justicia al mismo término de Universitas Studiorum (Patella, 2019: 77). Las lecciones de Vico a favor de un programa de paideia ideal, alcanzan su mayor vigencia en la actualidad, “contra el paradigma disociativo de la modernidad” y “en nombre de una afirmada contextualidad de las facultades y de las actividades humanas (…), en nombre de una convivencia sincrónica entre imaginación e intelecto, entre razón retórica y razón crítica, afirmando con ello una dialéctica de la copresencia, de la integración y de la recíproca cooperación.” (Patella, 2019: 85). 5 En la edición de la Autobiografía de G. Vico (González y Martínez, 1998: 122), éste argumenta en sus distintas Oratios, que abrían el curso académico de la Universidad de los Estudios, que el fin de los estudios era unir a los seres humanos y que el medio de los mismos era la sistematización de los diversos tipos de conocimientos. 57 Para G. Vico se trataba en la Universidad de los estudios de aprender cultivando la humanidad y no de ejercitar la memoria en un aprendizaje superficial o que persigue meros honores o distinciones. La formación debe permitir que los jóvenes hagan uso de la memoria, pero también de la fantasía, el ingenio y el entendimiento. Trabajar educativamente para formar Humanidad consiste en cultivar las facultades de la elocuencia, la erudición, la invención y la prudencia (González y Martínez, 1998). De ahí que haya que practicar el sistema ordenado de las ciencias. Éstas deben ser usadas como medios para formar al ser humano en el camino de la sabiduría que debe criticar las divisiones o diferencias entre los hombres. A este respecto, cabe recordar que el “ingenio”, fin esencial del proceso pedagógico, es el eje central de la “Inventio”, arte de unir y de sintetizar. Al que tiene que seguir la preparación racional practicada en la “Dispositio”, arte de separar y de analizar, y la formación retórica implementada en la “Elocutio”, arte de expresarse y de concebir. El ejercicio del razonamiento exige la facultad de juzgar y ésta no puede ser nada sin el aprendizaje, que se logra con el uso de las herramientas proporcionadas en las tres partes del “Ars Retorica”. La combinación de todas las variables diseñadas para la experiencia proporcionó un “cuadro” general, una suerte de mapa. La noción de mapa aquí no es gratuita. Los últimos estudios en el terreno de la neurobiología nos dicen que nuestro cerebro trabaja con mapas, elaborando esquemas de significado (Damasio, 2009, 2009b, 2010), una idea que podemos asociar con la teoría de las representaciones sociales. El mapa que resultó de esta experiencia, o el “objeto social” en términos de Moscovici, estaba poblado de imágenes y mensajes tan sugerentes como relevantes. De toda esta constelación de impresiones, emociones, conceptos y expresiones se desprenden algunas conclusiones interesantes: los estudiantes pudieron llevar a cabo un ejercicio de claridad y crítica conceptual a partir de una reelaboración de su conocimiento cotidiano (sentido común) y académico (ciencia social). Las metáforas, algunas de las cuales hemos señalado aquí, sirvieron como herramientas útiles para la construcción de conocimiento social: los estudiantes pensaron con metáforas al tiempo que fueron pensados por metáforas, en el sentido de fueron las propias metáforas, en algunos casos, las que vehicularon las representaciones sociales obtenidas. Los estudiantes realizaron un auténtico ejercicio de toma de conciencia –como así hicieron notar– sobre su propia situación como sujetos sociales que forman parte de un contexto social determinado, en este sentido, fueron capaces de tender puentes, tal como sugería Paulo Freire, entre texto y contexto, entre palabras (e imágenes) y mundo. De hecho, hicieron una lectura del mundo social, y lo 58 hicieron más inteligible (intus legere). Al mismo tiempo, este “juego” o “experimento” pedagógico de representaciones sociales, permitió objetivar, por un lado, el poder de las determinaciones sociales, pero, por otro lado, lo contingente de las mismas, a saber, que en el terreno de lo social no hay nada casual, y que lo que el mundo social ha hecho, el mundo social, armado de un saber que partiendo del sentido común va más allá de éste, puede deshacerlo. Con este experimento hemos conseguido que los estudiantes participantes en él hayan hecho inteligibles los esquemas de pensamiento que usan en sus representaciones sobre la Universidad. Entendemos que solamente de esta manera podemos promover que puedan modificar sus modelos de pensamiento, constatando la diferencia respecto a los que ya poseen. El aprendizaje profundo, el que trabaja por nuestra humanización, debe ponerse al servicio de los intereses y preguntas de los estudiantes. De hecho, lo que hicimos fue cambiar las preguntas en un tema tan supuestamente árido como el de la Reformas educativas. Pero también tiene que lograr una modificación de nuestra propia manera de pensar. Lo cual sólo es posible objetivando adecuadamente la forma de pensar existente, que esta mediatizada socialmente. Bibliografía AA.VV. (1997). La historia más bella del mundo. Barcelona, Anagrama. Alheit, Peter y Dausien, Betina (2007). En el curso de la vida. Educación, formación, biograficidad y género. Xàtiva, ediciones del CREC/Instituto Paulo Freire. Anaya, Gonzalo (2007). La passió educativa. Valencia, Universitat de València. Badiou, Alain (2008). Lógicas de los mundos. Buenos Aires, Manantial. Bain, Ken (2006). Lo que hacen los mejores profesores universitarios. Valencia, PUV. Barthes, Roland (1964). “Elementos de semiología”. En AA.VV. La semiología. Buenos Aire, Tiempo Contemporáneo. Beltrán Llavador, José. (2002). “Metáforas vivas y acciones reflexivas. El papel de los formadores en la construcción de significados”, en Beltrán Llavador, José (2002), pp. 209-258. Beltrán Llavador, José, ed. (2002). Ciudadanía y educación. Lecturas de imaginación sociológica. Alzira, Germania. Beltrán Llavador, José (2006) “Cómo hacer cosas con imágenes”. Revista de Ciencias Sociales [Universidad de la República, Uruguay], año XIX, n. 23, dic., pp. 88-99. Bernstein, Basil (1990). Poder, educación y conciencia. Barcelona, El Roure. Black, Max (1966). Modelos y metáforas. Madrid, Tecnos. 59 Blumenberg, Hans (2001). La inquietud que atraviesa el río. Ensayo sobre la metáfora. Barcelona, Península. Bourdieu, Pierre (2011). Capital cultural, escuela y espacio social. México, Siglo XXI. [Isabel Jiménez, ed.]. Castoriadis, Cornelius (1975). La institución imaginaria de la sociedad. Barcelona, Tusquets. Cerrato, Javier y Palmonari, Augusto (dir.) (2007). Representaciones sociales y psicología social. Valencia, Promolibro. Claxton, G. (1987): Vivir y aprender. Madrid, Alianza. Covarrubias Papahiu, Patricia (2011). “Representaciones sobre la enseñanza. Una indagación en estudiantes universitarios”. Sinéctica, nos 36/37, pp. 53-70. Chaleta, Elisa (2011). “Promoção do succeso académico no Ensino Superior – Projecto GPSA”. Educação. Temas e problemas. N. 9 (año 4). CIEP, Centro de Investigação em Educação e Psicologia, 67-78. Chaleta, Elisa (2013). Orquestração da Aprendizaegem no Ensino Superior (org). Ramada, Edições Pedago. Chaleta, Elisa y Entwistle, Noel (2011). “Abordagens à aprendizagem no ensino superior – Approaches and Study Skills Inventory for Students (ASSIST) no contexto português. Educação. Temas e problemas. N. 9 (año 4). CIEP, Centro de Investigação em Educação e Psicologia, 7-18. Chaleta, Elisa; Grácio, Luisa y Efllides, Anastasia (2011). “Sentimentos experienciados pelos estudantes do ensiño superior em situações de aprendizagem. Educação. Temas e problemas. N. 9 (año 4). CIEP, Centro de Investigação em Educação e Psicologia, 1932. Charlot, Bernard (2007). La relación con el saber. Elementos para una teoría. Buenos Aires Libros del Zorzal. Damasio, Antonio (2009). En busca de Spinoza. Neurobiología de la emoción y de los sentimientos. Barcelona, Crítica. Damasio, Antonio (2009b). El error de Descartes. Barcelona, Crítica. Damasio, Antonio (2010). Y el cerebro creó al hombre. Barcelona, Destino. Domingos Sobrinho, Ennafaa, Rhidà y Chaleta, Elisa (coord.) (2016). La educación superior, el estudiantado y la cultura universitaria. Alzira: Neopatria. Foucault, Michel (2001). “Nietzsche, Freud, Marx”. En Foucault, Michel. Dits et écrits I. Paris, Gallimard, pp.592-607. Freire, Paulo, Horvath, Silvia, Macedo, Donaldo y Giroux, Henry (1989). Lectura de la palabra y lectura de la realidad. Barcelona: Paidós Ibérica. Fromm, Erich (1991). Del tener al ser. Barcelona: Paidós. Gramsci, Antonio (1978). Introducción a la filosofía de la praxis. Barcelona, Península. González, Moisés y Martínez, Josep (Eds.) (1998). Autobiografía de Giambattista Vico. Madrid, SXXI. Goodson, Ivor (2007). “Curriculum, narrativa y el futuro social”. Revista Brasileira de Educação, vol. 12, n. 35, pp. 241-252. 60 Gutiérrez Vidrio, Silvia (2011). “Representaciones sociales y contrucción de ciudadanía en jóvenes universitarios”. Sinéctica, nos 36/37, pp. 85-102. Kuhn, Thomas Samuel (1979). “Metaphor in Science”. En Ortony Andrew (Ed.) Metaphor and Thought. Cambridge, Cambridge University Press, pp. 409-419. Lahire, Bernard (2016). En defensa de la sociología. Buenos Aires, Siglo XXI. Lakoff, George y Johnson, Mark (2001). Metáforas de la vida cotidiana. Madrid, Cátedra. Lizcano, Emmánuel (2006). Metáforas que nos piensan. Sobre ciencia, democracia y otras poderosas ficciones. Madrid, Traficantes de sueños. Martín Santos, Luis (1988). Diez lecciones de sociología. Madrid, FCE. Mauss, Marcel (2009). Ensayo sobre el don. Madrid, Katz editores. Meyer, J. (1991). “Study orchestration: the manifestation, interpretation and consequences of contextualised approaches to learning”. Higher Education, 22, 297-316. Mireles Vargas, Olivia (2011). Representaciones sociales: debates y atributos para el estudio de la educación. Sinéctica, nos 36/37, pp. 9-20. Moscovici, Serge (1962). “Attitudes and opinions”. Annual Review of Psychology, n, 14, pp. 231-260. Moscovici, Serge (1979). El psicoanálisis, su imagen y su público. Buenos aires, Editorial Huemul. Moscovici, Serge (1981). On social representations. En Forgas, J. P. (Ed.) Social Cognition: Perspectives on Everyday understanding. Londres, Academic Press. Nietzsche, Friedrich (2000). Escritos sobre retórica. Madrid, Trotta. Patella, Giuseppe (2019). Parva Vichiana. Ensayos sobre Giambatitsta Vico y la estética. Sevilla, Athenaica ediciones universitarias. Read, Herbert (1985). Imagen e idea. México, FCE Ricoeur, Paul (1980). La metáfora viva. Madrid, Ed. Europa. Rosa, Hartmut (2019). Resonancia. Una sociología de la relación con el mundo. Madrid, Katz. Shiva, Vandana (1995): Abrazar la vida. Mujeres, ecología, desarrollo. Madrid, horas y HORAS. Skármeta, Antonio (1999). El cartero de Neruda (Ardiente paciencia). Barcelona, Plaza & Janés. Sontag, Susan (2008). La enfermedad y sus metáforas. Madrid, Debolsillo. Tonucci, Francesco (2008). La maquinaria escolar. Madrid, Centro de Documentacóbn Crítica. Wagner, Wolfgang y Hayes, Nicky (2011). El discurso de lo cotidiano y el sentido común. La teoría de las representaciones sociales. Barcelona, Anthropos. [Fátima Flores Palacios, ed.]. Wheelwright, Philip (1979). Metáfora y realidad. Madrid, Espasa-Calpe. Wittgenstein, Ludwig (2017). Investigaciones filosóficas. Madrid, Trotta. 61 Wittgenstein, Ludwig (1929). Ludwig Wittgenstein und der Wiener Kreis (1967), ed. B. F. McGuinness, WA, t. 3 [Ludwig Wittgenstein y el Círculo de Viena]. [WWK]. Wright Mills, Charles (1999). La imaginación sociológica. Madrid, Fondo de Cultura Económica. 62 3. POURQUOI ALLER À L’UNIVERSITÉ? LE CHOIX DES ÉLÈVES DE TERMINALE Georgios Stamelos6 Université de Patras Grèce Résumé La communication se base sur une recherche de terrain qui s’est déroulée auprès de 789 élèves de terminale en lycée général, dans la région de Grèce de l’Ouest en Mai 2018. La recherche a été conduite juste avant les examens nationaux pour l’entrée à l’enseignement supérieure. L’échantillon a été stratifié par lieu d’habitation. L’objectif était d’abord d’analyser les motivations qui conduisent les élèves de terminale à envisager d’entreprendre des études supérieures. Nous avons ensuite essayé de croiser les motivations des élèves à des variables démographiques et socio-économiques qui sont censées influencer leur choix. À signaler que le contexte est celui d’une région touchée fortement par la crise économique que le pays a traversée. Les résultats montrent que pour une majorité d’élèves la perspective des études universitaires ne repose pas sur un projet élaboré. Il s’agit plutôt d’une continuité « évidente » basée sur, en amont, la représentation sociale de l’enseignement supérieur, et en aval, la manque de perspectives au marché du travail. Cependant, un élève sur quatre semble avoir une idée plus élaborée. En effet, un thème récurrent dans leur propos est le « prestige » d’un travail futur. Par ailleurs, ce prestige semble se connecter, d’une part, au choix d’un établissement tertiaire réputé, et d’autre part, aux récompenses financières espérées dans le futur. Pour ces élèves, il y a une influence forte tant de leurs familles d’origine que de leur genre. Mots-clés Université, Transition vers l’Université, Choix d’études supérieures, Motifs, Élèves de la Terminale. Georgios Stamelos est professeur à l’Université de Patras, en Grèce. Ses terrains d’investigation sont les Politiques de l’Éducation qui concernent principalement l’enseignement supérieur et l’espace européen de l’éducation, ainsi que l’Éducation des Enseignants. Il a publié plus de 200 travaux en anglais, français, espagnol et grec. Il était membre du CA de l’Agence Nationale d’Évaluation (HQA) de 2013 à 2020. Il est directeur du Master Inter-Universitaire « Higher Educational Policy : Theory and Praxis » (https://mahep-upatras.gr), coordinateur du Réseau Inter-Universitaire « Higher Education Policy » (http://hepnet.upatras.gr) et éditeur de la revue Academia (https://academia.lis.upatras.gr) repertoriée par Scopus et DOAJ. 6 63 Introduction Cette recherche a été élaborée en 2017, en pleine crise économique. La région de Grèce de l’Ouest était une des régions les plus touchées de la crise. Nous avons, de ce fait, voulu explorer le point de vue des élèves de terminale (d’un âge moyen de 18 ans) dans un lycée général sur leurs perspectives tant éducatives que professionnelles. Nous souhaitions plus spécifiquement enquêter sur les motivations qui relevaient d’une perspective professionnelle ainsi que sur les critères du choix d’établissement tertiaire. De plus, nous souhaitions aussi interroger l’image de l’Université de Patras, l’établissement le plus grand et réputé de la région. Dans ce travail, nous avons restitué la partie de la recherche qui concerne le choix d’aller à l’université7. Cadre théorique Afin de développer notre corpus théorique, nous avons travaillé sur trois notions : a) les représentations sociales, b) les motivations, et c) la construction de l’auto-image. Pour la notion de « représentations sociales », nous nous sommes basés sur les travaux de Moscovici ainsi que sur des travaux qu’il a influencés (Gustavsson A. and Selander, 2011; Höijer, 2011; Howarth, 2006; Jovchelovitch, 1999; Markovà, 2003; Moscovici, 1973, 1984, 1988, 2000; Riga, 1991). Ainsi, dans notre travail les représentations sociales sont considérées comme un système d’idées, de valeurs, de perceptions, de pratiques, etc qui visent, en amont, à la compréhension du monde extérieur, et en aval, à l’intégration à ce monde. Une représentation sociale, en l’occurrence l’université, peut être transformable mais elle contient un noyau inchangeable, souvent abstrait et/ou irrationnel (l’université est une « bonne chose »). En conséquence, dans un monde instable et incertain, une « bonne chose », l’université, connue et reconnue, peut paraître comme une voie sûre et souhaitable. Pour la nouvelle génération (les élèves) les perceptions de leur environnement (famille et amis) semblent jouer un rôle important, accompagné par leurs expériences vécues et formulées par les passages successifs d’un niveau à l’autre du système scolaire. Quant aux motivations, nous avons eu recours aux travaux de Viau mais aussi d’autres chercheurs (Barbeau, 1995; Chekour et all, 2015; Deci & Ryan, 2000; Houssaye, 1993; Roussel, 2000; Vallerand, 1993; Viau, 1999, 2009; Wigfield, Eccles, Schiefele, & Roeser, Dans le langage quotidien l’enseignement supérieur est synonyme de l’université. Afin de faciliter notre population questionnée (les élèves), nous avons gardé la même terminologie. Ainsi, dans ce texte, l’enseignement supérieur et l’université sont utilisés comme synonymes. 7 64 2006). Une motivation nous intéresse car elle est liée à des comportements. Elle est considérée comme une force motrice ainsi qu’une interaction. En conséquence, une motivation marque la relation d’un individu à son environnement. Une motivation est un phénomène dynamique qui reflète les perceptions de l’individu (élève). Les perceptions centrales sont : a) la valeur d’une activité b) la perception de chance de réussite (à cette activité) et c) la contrôlabilité (de cette activité). Enfin, les motivations sont formées par une série des facteurs extérieurs comme : a) les conditions générales de la vie (de l’élève), b) l’école, c) la classe scolaire, et d) le contexte social entourant. Il est évident que les motivations sont en relation et en interaction avec les représentations sociales. Pour la construction de l’auto-image, nous avons, avant tout, tenu compte de cette période particulière qu’est l’adolescence, qui caractérise nos enquêtés. C’est une période de construction de l’individu et une période de tensions et de transformations ainsi qu’une période d’intégration dans un contexte social. En réalité, on parle de la construction de « soi ». Le soi : a) tient une structure hiérarchique et multidimensionnelle, b) entretient une relation positive avec les performances scolaire, c) reçoit des influences par des motivations internes et externes, et d) est influencé par des facteurs extérieurs comme le sexe, l’âge, le contexte social, le contexte scolaire, la performance scolaire, etc. Le soi contient trois dimensions l’auto-image, l’auto-perception et l’auto-estimation. Les trois dimensions sont en relation avec l’interaction sociale et l’expérience sociale. Par conséquent, elles sont en négociation avec les représentations sociales et avec les autres (famille, amis, école) qui influencent l’individu (élève) (Epstein, 1991; Fountoulaki, 2010; Giannelos, 2003 ; Harter, 1999 ; Lawrence, 2002 ; Mead, 1962; Rosenberg, 1986 ; Rogers, 1949, 1961; Simmons & Rosenberg, 1973 ; Tsiga & Nasaina, 2012). Les trois notions de référence (représentations sociales, motivations, et auto-image) entretiennent une interaction dynamique entre elles. La recherche La recherche a été faite dans les lycées généraux de la région de l’Ouest de Grèce qui comprend trois Départements (Achaïe, Ilia et Étolie-Acarnanie)8. Les trois Départements forment non seulement une unité administrative mais aussi une entité économique malgré le fait qu’ils ont des caractéristiques différentes : a) L’Achaïe est dominé par la ville de Patras. Il 8 Les élèves des Lycées Généraux représentent les 2/3 de la population totale des lycéens. 65 est le plus peuplé, centre de services (principalement publiques) et avec un port important reliant le pays à l’Italie et avec le reste de l’Europe (via routière), b) L’Ilia est un Département paysan avec une agriculture intense et des côtes touristiquement développées grâce à ses plages réputées, et c) L’Étolie-Acarnanie est plus mitigée entre des centres urbains et des parties agricoles, parfois isolées. Par conséquent, le paramètre « localité » a été central dans la planification de la distribution des questionnaires. Le temps de la distribution des questionnaires a été construit afin d’être le plus proche possible aux examens nationaux pour l’accès aux institutions de l’enseignement supérieur 9. Les élèves étaient vraiment « en transition » entre la fin des études secondaires et l’examen pour l’accès au supérieur. La formulation du questionnaire était conçue en cinq parties : a) des informations sociodémographiques, b) des questions sur la relation de la famille, des amis et de l’élève à l’éducation en général et à l’enseignement supérieur plus spécifiquement, c) des motivations formulant une perspective professionnelle, d) des critères de choix d’un établissement de l’enseignement supérieur et e) l’image de l’Université de Patras. L’échantillon a été fixé à 800 questionnaires. Ce nombre correspondait au 10% du nombre total des élèves de la Terminale qui est un pourcentage qui diminue au minimum la marge d’erreur (http://www.tools4dev.org/resources/how-to-choose-a-sample-size/). Par la suite, ce nombre a été distribué initialement par Département et, dans un second temps, par localité (capitale, villes importantes, reste du Département). Le choix des établissements scolaires a été fait par localité et au tirage au sort. Ainsi on est arrivé à la distribution suivante : Tableau 1: L’échantillon de la recherche par Département Département Échantillon désiré Échantillon réel Achaïe 376 369 Étolie-Acarnanie 272 273 Ilia 152 147 Total 800 78910 En Grèce, l’accès se fait par un examen national. Les résultats sont déterminés par trois paramètres : a) les places disponibles par Département, b) les résultats aux examens, et c) le choix de chaque élève exprimé par le rempli d’un formulaire de préférence prioritaire. 10 L’échantillon final a été d’un nombre de 794 questionnaires correctement remplis. Cinq (5) questionnaires étaient éliminés parce qu’ils n’étaient pas correctement remplis. Donc, le pourcentage des questionnaires correctement remplis était de 99,4%. 9 66 Et par localité : Tableau 2: L’échantillon par localité Échantillon Échantillon réel Localité désiré Capitale 460 430 Villes principales 125 116 Département 215 243 Total 800 789 Reste du Nous avons obtenu un échantillon réel très proche de la distribution de la population d’élèves par Département. En revanche, nous avons des sur- et sous- représentations par lieu d’habitation (localité). Il s’agit d’un résultat produit par notre décision de distribuer l’échantillon à chaque élève de terminale des écoles tirées au sort et non pas triées. Quant au choix de la recherche par questionnaire, il s’explique par notre souhait d’avoir le nombre désiré des questionnaires en un temps très limités. Bien entendu, ce choix a ses limites. En effet, cette recherche, dans l’avenir, gagnerait à être prolongée par une autre recherche qualitative afin que (les motivations ou les déterminants des choix) d’élève soit mieux approfondie. Résultats Avant d’entrer dans une analyse précise, il nous semble opportun de donner une image générale des résultats de notre recherche. Les élèves du Lycée Général sont massivement tournés vers l’enseignement supérieur. En effet, 4 sur 5 (76,1%) veulent continuer leurs études dans le supérieur. Un 10% (9,6%) ne s’intéresse pas et il y a un 15% (14,4%) qui se montre indécis. Par l’analyse de donnés, trois informations paraissent importantes : a) L’écrasante majorité des élèves ne semble pas avoir un vrai projet professionnel. Les réponses semblent être aléatoires et instantanés. La continuation des études paraît 67 « évidente/normale » comme le passage de l’école primaire au secondaire. On ne constate pas les effets de la crise dans les réponses des élèves. b) La représentation sociale de l’enseignement supérieur, en langage quotidien « l’université », reste forte mais en même temps floue (aller à l’Université est bonne chose parce que tous le disent). c) Cependant, il y a une minorité considérable, concernant un élève sur quatre (25%), qui instrumentalise concrètement cette représentation, comme nous allons voir par la suite. Nous allons nous centrer sur cette minorité afin de procéder à une analyse en profondeur. Afin de faciliter la lecture, nous proposons la figure suivante qui reflète les résultats de l’analyse statistique. 68 Figure 1 Perspectives de développement professionnel Choix de l’Établissement loin de ma maison (localité, affirmation « moi, j’irai à l’Université) Choix de l’Établissement près de la maison (localité) (localité) Attirance par le contenu du métier (filles, situation de travail des parents, affirmation « moi, j’irai à l’université)) Revenus espérés Prestige du métier (garçons) (situation de travail de la mère, « beaucoup de ma famille sont allés à l’université ») (garçons) Influences familials (garçons, localité, affirmation « moi, j’irai à l’Université) Réputation de l’établissement Je choisirais l’université qui propose les études qui m’intéressent affirmation « beaucoup de ma famille sont allés à l’université ») Tout d’abord, il faut insister sur l’importance de cette minorité d’élèves. En effet, ces élèves sont les seuls qui essaient de donner un sens concret à la représentation sociale de l’université. Ils construisent un récit rationnel. Ce récit semble être dominé par un esprit utilitariste qui met en avant les futures avantages individuels qui peuvent résulter de leur fréquentation à l’enseignement supérieur. En conséquence, nous pouvons parler d’une instrumentalisation individualiste de la représentation sociale « université ». Plus spécifiquement, la motivation décisive, qui mobilise ces élèves, est le prestige du métier. Il y a une influence de sexe statistiquement significative (plus les garçons que les filles). Par la suite, la réputation de l’établissement est un critère qui consolide la motivation initiale. Deux variables influencent ce critère : a) la situation de travail de la mère11 et b) la tradition La variable « situation de travail » désigne la stabilité d’un travail qui garantit, par la suite, le flux stable des sources financières dans la famille. En effet, dans un pays où le taux du chômage était plus de 25%, on a constaté 11 69 familiale aux études tertiaires (variable « beaucoup de membres de ma famille sont allés à l’université »). Ainsi, nous obtenons un dipôle constitutif de la pensée d’élève: « le prestige du métier » et les « études dans une institution réputée ». L’analyse statistique a montré que ce dipôle a une relation statistiquement significative avec les revenus espérés. Ainsi, on peut supposer que la raison d’être de ce dipôle est l’espoir des futures revenus espérés (désirés). Sur cette relation, le sexe joue un rôle décisif (plus les garçons que les filles). Par conséquent, le récit construit sur la représentation sociale de l’université par un élève sur quatre semble être: l’université est une « bonne chose » parce qu’elle pourrait conduire à un métier de prestige. Afin de consolider l’accès à ce métier de prestige, il faut choisir un établissement réputé. Si j’arrive à faire des études qui préparent pour un métier de prestige dans un établissement réputé, j’aurai plus de chance de gagner bien ma vie. De l’autre côté, les filles semblent avoir une autre façon de penser aux études supérieures, peut-être, plus idéaliste et en tout cas plus centrées sur l’attirance par le contenu d’un métier. À la formulation de cette motivation la situation de travail des parents ainsi que l’affirmation « moi, j’irai à l’université » (une des variables du questionnaire) jouent un rôle statistiquement significatif. Notre analyse a montré aussi que la motivation « perspectives de développement professionnel » a une relation statistiquement significative tant avec le « prestige du métier » qu’avec les attentes des « revenus espérés » (dominé par les garçons). Ainsi, nous pouvons entrevoir que le contenu du « développement professionnel » est lieu davantage avec les « revenus espérés » au sein d’un métier de prestige. En revanche la motivation « attirance par le contenu du métier » domine chez les filles. Il est d’abord à noter que les élèves qui admettent une influence de la famille sur leur choix, ne sont pas nombreux. Cependant, ceux qui y font davantage référence, sont les garçons qui affirment par ailleurs : « moi, j’irai à l’université ». Ensuite, les « influences familiales » agissent tant sur le « prestige du métier » que sur les « revenus espérés ». Enfin, le critère pragmatique « je choisirais l’université qui propose les études qui m’intéressent » tient une relation statistiquement significative avec la tradition familiale aux études universitaires (« beaucoup de membres de ma famille sont allés à l’université »). Ce critère esquisse un triangle avec les motivations « prestige du métier » et « influences familiales ». que la variable cruciale a été la stabilité des sources financières en famille et non pas l’activité professionnelle concrète. 70 Nous avons laissé pour la fin les critères « l’établissement loin de la maison » et « l’établissement près de la maison », critères fortement influencés par la localité. Il faut prendre en considération étant donné que les élèves habitants les villes centrales et les restes des Départements sont, de toute façon, obligés de se déplacer afin de faire des études supérieures. Les élèves qui habitent aux capitales (principalement Patras) ont au moins un établissement supérieur dans leurs villes. Conclusion Les résultats de la recherche montrent que les élèves du Lycée Général sont tournés vers l’enseignement supérieur. Il ne s’agit pas d’une nouveauté. Cependant, la majorité de ces élèves ne semble pas avoir une idée concrète concernant leur avenir tant professionnel que personnel. Ils n’ont pas de projet vraiment élaboré dans ces deux domaines. La transition du lycée à l’université peut être identifiée à tout autre passage dans le système de l’enseignement. Il s’agit d’une facilité, voire habitude, qui est un accord avec la représentation sociale de l’université, comme une « chose bonne ». Si l’on met ce résultat dans son contexte historique, on pourrait constater que la majorité des élèves se montre peu soucieux de la réalité socio-économique de son environnement. Il s’agit d’un paradoxe12. Ce souci apparait trois mois plus tard (en Septembre). En effet, en analysant les données statistiques concernant les nouveaux entrants par établissement et par programmes d’études, on constate que l’accès est déterminé par l’origine sociale, le sexe et la localité de provenance (Stamatopoulou, 2019). En conséquence, entre Mai et Septembre un choc, non seulement éducatif, se produit. Ainsi, en amont, les résultats des examens nationaux, et en aval, le rempli du formulaire administratif par l’élève semble jouer un rôle significatif et un « atterrissage » brutal à la réalité socio-économique du jeune de 18 ans. Il faut signaler que le problème n’est pas « accès ou pas accès » en l’enseignement supérieur étant donné que 4 sur 5 candidats réussissent dans un programme d’études. Le problème se pose, en amont, par le fait que seulement un 15% de ceux qui réussissent se présentent satisfaits de leur « réussite » (Stamelos, 2020), et en aval, par la « distribution » par établissement et par programme d’études qui révèle une forte influence de l’origine socioéconomique ainsi que de leur sexe et de leur localité de provenance. Si la majorité d’élèves ne semble pas avoir un projet concret (un projet tout court), il y a une minorité importante d’élèves (autours de 25%) qui semble instrumentaliser la représentation 12 À ce point, on fait allusion à la fameuse protection familiale, caractéristique fort des sociétés méditerranéennes. Mais, il ne s’agit pas que d’une simple allusion qui nécessite une enquête spécialisée. 71 sociale « université » en la transformant en un récit rationnel. En effet, pour cette minorité, l’université est une « bonne chose » parce qu’elle amène à des métiers de prestige. Afin d’assurer l’accès à un métier de prestige il faut étudier dans un établissement de réputation. Finalement, ceux, qui arrivent à un métier de prestige, peuvent espérer à des futurs revenus convenables. De plus, au fur et à mesure, dans ce métier de prestige, on peut espérer à un « développement professionnel » qui est aussi lié au développement des futurs revenus. Cette minorité est dominé par les garçons et par la tradition familiale aux études universitaires. En revanche, les filles semblent avoir un autre raisonnement qui est basé sur l’attirance par le contenu du métier. Nos résultats pourraient nous fournir des pistes de réflexion concernant un autre problème actuel relatif à l’enseignement supérieur : la prolongation ou l’abandon des études. En effet, on sait qu’un pourcentage autour de 35-40% d’élèves qui accèdent à l’enseignement supérieur ne finissent pas leurs études (Païzis, 2014; Stamelos, 2016). La moyenne contient fortes disparités selon les établissements et les programmes d’études, qui, à leur tour, contiennent de fortes disparités socio-économiques concernant l’origine de leurs étudiants. Par conséquent, une interrogation s’esquisse concernant la politique dominante l’enseignement supérieur du dernier demi-siècle qui portait justement sur sa démocratisation. Cette interrogation devient de plus en plus visible dans une période de crise économique qui conduit à la diminution des ressources financières pour l’enseignement supérieur. Références Barbeau, D. (1995). Analyse de déterminants et d'indicateurs de la motivation scolaire d'élèves du collégial. Actes du 15e Colloque annuel de l'Association québécoise de pédagogie collégiale. Quebec: Rivière-du-Loup. Chekour, M. C.-I. (2015). Impact des théories de la motivation sur l'apprentissage dans le contexte scolaire. EpiNet, no.172. Deci, E., & Ryan, R. (2000). The "what" and "why" of goal pursuits: human needs and the self-determination of behavior. Psychological Inquiry, 11(4): 227-268. Epstein, S. (1991). Cognitive-experiential self theory:implications for developmental psychology. Στο M. &. Gunnar, Self processes and development (σ. vol 23.). New Jersey: Lawrence Erilbaum. Fountoulaki, E. (2010). La notion académique du soi et la performance scolaire des élèves. Annales de PTDE de l'Université d'Ioannina, 22: 179-208 (en grec). 72 Giannelos, A. (2003). Explorer l'auto-perception et l'auto-image des élèves de la dernière classe du primaire et leur relation aux performance scolaires. Revue des Issues Éducatifs, 8:128-143 (en grec). Gustavsson A. and Selander, S. (2011). Transformations and changes in social knowledge: Towards the dynemics of meaning making. Στο M. D. Chaib, Education, Professionalization and Social Representations (σσ. 17-32). New York-London: Routledge Taylor & Francis Group. Höijer, B. (2011). Social reporesentation theory. A new theory for media research. Nordicom Review, 32 (2):3-16. Harter, S. (1999). The construction of the self: A developmental perspective. New York: Guilford. Houssaye, J. (1993). La motivation. Στο J. Houssaye, La Pédagogie. Une encyclopédie pour aujourd'hui (σσ. 223-233). Paris: ESF. Howarth, C. (2006). A social representation is not a quiet thing: exploring the critical potential of social representations theory. British journal of social psychology, 45(1): 65-86. Jovchelovitch, S. (1999). Theory and method of social representations. Asian Journal of Social Psychology, 2: 95-125. Lawrence, D. (2002). Enhacing self-esteem in the classroom. London: Paul Chapman Publishing Ltd. Markovà, I. (2003). Dialogicality and social representations theory. The dynamics of mind. Cambridge: Cambridge University Press. Meead, G. (1962). Mind, Self and Society. Chicago: University of Chicago Press. Moscivici, S. (1984). The myth of the lonely paradigm: a rejoinder. Social Research, 51: 939-967. Moscovici, S. (1973). Foreword. Στο C. Herzlich, Health and Illness. A social psychological analysis (σ. xiii). London: Academic Press. Moscovici, S. (1988). Notes towards a description of social representations. European Journal of Social Psychology, 18: 211-250. Moscovici, S. (2000). Social representations: Explorations in social psychology. Cambridge: Polity Press. Païzis, N. (2014). L'enseignement supérieur grec. Données de base. Athènes: KANEP/GSEE (en grec). 73 Riga, A. (1991). Des attitudes aux représentation sociales: un état de lieu bibliographique (en grec). Revue des Recherches Sociales, 80: 156-165 (en grec). Rogers, C. (1949). A coordinated research in psychotherapy: a non-objective introduction. Journal of Consulting Psychology, 13:49-51. Rogers, C. (1961). On becoming a person. Boston: Houghton Mifflin. Rosenberg, M. (1986). Conceiving the self. Florida: Robert. E. Krieger Publishing Company. Roussel, P. (2000). La motivation au travail-concept et théories. Notes du LIRHE-Université deToulouse I, no.326. Simmons, R., & Rosenberg, F. &. (1973). Disturbance on the self-image at adolescence. American Sociological Review, 38 (5): 553-568. Stamatopoulou, A. (2019). La reproduction des inégalités sociales dans l'enseignement supérieur. Les cas des facultés des sciences médicales et paramédicales. Patras: MaHep (en grec). Stamelos, G. (2016). Les étudiants qui abandons l'enseignement supérieur. Patras: HepNet (en grec). Stamelos, G. (2020). Transformant l'enseignement supérieur: La démocratisation de l'Université et ses limites. Patras: HepNet (en grec). Tsiga, E., & Nasaina, E. (2012). La contribution de l'auto-estimation dans la performance des élèves. Actes du 6e Colloque de l'Institut Grec de la Pédagogie Appliquée et de l'Éducation (en grec). Vallerand, R. e. (1993). Introduction au concept de motivation. Στο R. e. Vallerand, Introduction à la psychologie de la motivation (σσ. 3-39). Laval: Éditions du Renouveau Pédagogique. Viau, R. (1999). La motivation dans l'apprentissage du français. Saint-Laurent (Québec): Éditions du Renouveau Pédagogique. Viau, R. (2009). La motivation en contexte scolaire. Bruxelles: De Boeck. Wigfield, A., Eccles, J., Schiefele, U., & Roeser, R. e. (2006). Development of achivement motivation. Στο N. Eisenberg, W. Damon, & R. Lerner, Handbook of child psychology (6e édition) (σσ. 933-1002). Hoboken (N.J.): John Wiley et Son. 74 4. CONDITIONS ENVIRONNEMENTALES FAVORABLES A L’EDUCATION AU DEVELOPPEMENT DURABLE Apports des neurosciences cognitives sur l’influence des conditions environnementales affectives sur le bien-être de l’élève et l’amélioration de l’efficacité des apprentissages scolaires pour le développement durable Georges Elias Doctorant en sciences de l’éducation Université Saint-Joseph de Beyrouth Faculté des sciences de l’éducation georgeselias07@icloud.com Résumé L’objet de cette communication est de contribuer à mettre en relief l’influence des conditions environnementales affectives sur le bien-être des élèves et l’amélioration de l’efficacité des apprentissages scolaires afin de promouvoir l’éducation au développement durable et former les futurs acteurs économiques, sociaux et politiques. Elle identifie les conditions affectives optimales et leur influence sur l’apprentissage issues des données les plus récentes des recherches en neurosciences cognitives. Mots-clés: Développement durable; Environnement; Émotions; Bien-être. Abstract The purpose of this paper is to help highlight the influence of affective environmental conditions on the well-being of students and improve the effectiveness of school learning in order to promote education for sustainable development and future economic, social and political actors. It identifies optimal affective conditions and their influence on learning from the most recent data in cognitive neuroscience research. Keywords: Sustainable development; Environment; Emotions; Wellness Introduction Les découvertes récentes en neurosciences cognitives bousculent les pratiques pédagogiques traditionnelles et questionnent les méthodes, les situations et les environnements d’apprentissage. Le progrès fulgurant de l’imagerie cérébrale ouvre de nouveaux horizons en 75 matière de formation et de développement des compétences « life skills » des élèves face aux défis du vingt-et-unième siècle. Ces découvertes dévoilent les conditions environnementales optimales garantes d’une amélioration de l’efficacité des apprentissages scolaires pour un futur développement durable. Dans un monde qui se transforme continuellement, le système de formation et d’apprentissage traditionnel se révèle incapable d’accompagner le développement rapide de la technologie et la grande compétitivité dans le monde des entreprises et des administrations (Le Boterf, 2006). Les organisations professionnelles ont besoin de capital humain compétitif capable de résoudre des problèmes qui surviendront dans l’avenir, de trouver des solutions qu’il n’ a jamais étudiées, dans un monde de plus en plus complexe où l’innovation est l’indispensable de la compétitivité et de la part de marché (Jonnaert, 2004, 2009b, 2009a). L’économie du savoir occupe une place importante. L’école a la responsabilité de préparer les futurs acteurs sociaux, économiques et politiques. Pour cela, l’éducation au développement durable devient une nécessité. Le problème qui se pose est la contradiction existante entre le mode de pensée et d’agir indispensable au développement durable «qui impose de faire avec des situations complexes, des savoirs pas toujours stabilisés, des incertitudes, des interprétations parfois contradictoires […] et le mode d’enseignement traditionnellement fondé sur la solidité de connaissances prouvées et vérifiées et sur la simplification » (Tutiaux-Guillon & Considère, 2010, p. 193). Pour cela, l’éducation au développement durable « constitue un réel enjeu qui interroge les fondements de notre façon d’enseigner» (Julien, Chalmeau, Vergnolle-Mainar, Léna, & Calvet, 2014). L’apprentissage s’opère grâce à des structures cérébrales innées bien organisées mais dont les fonctionnalités sont influencées par les conditions environnementales de chaque personne tout au long de sa vie (Bier & Belleville, 2010; Franck, 2013; Lavoie et al., 2016; Posner, Rothbart, & Rueda, 2008; Vidal, 2012). Influence des conditions environnementales sur l’apprentissage L’influence des conditions environnementales commence depuis la vie prénatale et passe par une période où le développement cérébral est le plus sensible aux conditions 76 environnementales. Cette période est appelée période critique (Dehaene, 2018; Habib, 2018; Jouvent, 2009; Kandel, 2007; Lavoie et al., 2016). Elle s’étend de l’enfance jusqu’à l’adolescence où l’individu s’imprègne rapidement de son environnement et acquiert des comportements et des compétences permanentes. Durant cette période, des modifications rapides s’opèrent dans les structures cérébrales. Ces modifications augmentant l’excitabilité des synapses et le nombre de circuits neuronaux, une propriété de plasticité du cerveau maintenue durant toute la vie de l’individu même si elle devient plus lente à l’âge adulte (Houdé & Borst, 2014). Les apprentissages scolaires couvrent alors la plus grande partie de cette période critique responsable de stimuler la croissance cérébrale et d’influencer les comportements actuels et ultérieurs des individus (Vidal, 2012). Diverses expériences mettent en évidence que les enfants loin de leurs parents ou élevés dans des environnements pauvres dépourvus d’affection présentent à l’âge adulte de sévères atteintes de leur capacités intellectuelles et sociales (Dehaene, 2018; Habib, 2018; Kolb et al., 2019). Le développement de la taille et du volume du cerveau se termine vers l’âge de 12 ou 13 ans, mais le renouvellement et le remodelage des connexions neuronales se prolonge jusqu’à 25 ans et reste actif au moins jusqu’à l’âge de 60 ans, preuve directe de la plasticité cérébrale (Bier & Belleville, 2010; Habib, 2018; Sablonnière, 2016). Une étude en imagerie cérébrale (IRMf) menée sur 139 régions du cerveau de 579 individus révèle une différence au niveau de la densité des connexions dans certaines régions (Di Martino et al., 2014). Les connexions des aires motrices et sensitives sont pratiquement les mêmes chez tous les individus, par contre les connexions du lobe frontal et du lobe pariétal ainsi que le cortex temporal sont très variables selon les individus. Ces régions sont impliquées dans l’adaptation de chaque individu à son environnement. Cela constitue une preuve sur l’influence de l’environnement sur la modulation des circuits neuronaux en fonction de l’expérience de chacun, de son éducation, de sa capacité de prise de décision et de l’adaptation à une situation donnée (Sablonnière, 2016; Vincent & Lledo, 2012). Une autre étude en IRMf est menée sur le cerveau de 1250 paires de vrais jumeaux afin d’identifier l’influence des facteurs génétiques et environnementaux sur le développement (Blokland, Zubicaray, McMahon, & Wright, 2012). Les résultats mettent en lumière une variation du volume des lobes cérébraux dépendant à 70% des gènes et à 30% des facteurs environnementaux. Le volume de l’hippocampe impliqué dans la mémoire est assez variable entre les vrais jumeaux et dépend à 50% des gènes et 50% de l’environnement. La part de 77 l’influence de l’environnement est la plus grande au niveau du cortex orbito-frontal et le cortex cingulaire où elle arrive à 60% contre 40% pour l’influence des gènes. Ces deux régions sont impliquées dans la prise de décision et le contrôle exécutif (Kolinsky, Morais, Cohen, Dehaene-Lambertz, & Dehaene, 2014). Les modifications de circuits neuronaux dans des conditions spécifiques d’apprentissage sont influencées par des facteurs environnementaux tels que le stress. Lorsque l’individu est dans un état de stress, l’hypophyse sécrète une hormone (l’ACTH) qui stimule le cortex surrénalien à libérer des hormones nommées glucocorticoïdes (Fradin, Lefrancois, & Massioui, 2006). Ces hormones agissent sur les cellules de l’hippocampe et causent leur dégénérescence (Fix, 2012; Kolb et al., 2019; Purves et al., 2019; Vincent & Lledo, 2012). Des expériences menées chez le singe révèlent que même après de brèves périodes de stress, le nombre de cellules nerveuses de l’hippocampe diminue (Caroni et al., 2012). Cela mène à une altération de l’apprentissage et des capacités de mémorisation des informations du fait que l’hippocampe est impliqué dans les processus mnésiques (Caroni et al., 2012; Donato, Rompani, & Caroni, 2013; Fradin et al., 2006; Kim & Diamond, 2002; Ruph, 2011). Ces dommages hippocampiques causés par les états de stress sont maintenant démontrés aussi chez l’homme. Les techniques récentes d’imagerie cérébrale (IRMf) mettent en lumière une diminution du volume de l’hippocampe pour des personnes soumises à des états de stress provoqués (Liberzon & Phan, 2003). Pour ces personnes, il est aussi démontré que leurs fonctions mnésiques sont clairement affectées. Ces données neuroscientifiques suggèrent que l’optimisation de l’efficacité des apprentissages scolaires nécessite des conditions environnementales saines favorables ne plaçant pas l’élève dans des situations de stress et d’angoisse au cours de l’apprentissage (Esseily, Rat-Fischer, Somogyi, O’Regan, & Fagard, 2016). Le rôle de l’enseignant est alors de « garantir un cadre hors menace car on ne peut pas grandir sans avoir des espaces sécurisés qui préservent à la fois des débordements des autres et de ses propres débordements » (Meirieu, 2009, p. 8). L’enseignant peut établir des alliances avec les élèves autorisant le repérage de ceux qui ont besoin de lui. Il intervient au bon moment en donnant à ces élèves l’impression qu’il est de leur côté et prêt à les aider. L’activité physique (le sport) représente aussi une des conditions possibles pour diminuer les situations de stress. Elle stimule la sécrétion dans le cerveau de la sérotonine impliquée dans 78 la régulation de l’humeur (Habib, 2018). Cette hormone active la fabrication de nouveaux neurones principalement dans l’hippocampe (Voss et al., 2013). La pratique d’une activité physique d’intensité moyenne et d’une durée quotidienne de cinquante minutes environ favorise la formation de nouveaux neurones impliqués principalement dans la mémoire (Maillot & Perrot, 2012; St-Louis-Deschênes & Ellemberg, 2013; Voss et al., 2013). Les conditions environnementales favorables à l’apprentissage exigent aussi des situations donnant un état de motivation (Habib, 2018; Houdé, 2011; Ruph, 2011). Le cerveau est prédisposé à établir des associations entre objets, évènements, personnes. Les facteurs environnementaux facilitent l’élaboration d’apprentissages associatifs tenaces et rapides à s’installer, spécialement lorsque l’association se fait avec un renforcement significatif pour l’individu (Franck, 2013; Habib, 2018; Kandel, 2007). Cette association peut se faire avec un élément de renforcement positif ou négatif et influence directement la motivation (Kolb et al., 2019). L’apprentissage et l’expérience favorisent le contact avec certains stimuli de l’environnement ou au contraire réduisent le contact avec d’autres stimuli. Ainsi « toute action qui amène une situation plaisante tend à être répétée dans le futur » (Pessiglione, 2014, p. 1284). Au cours d’un apprentissage, l’organisme associe les évènements du milieu extérieur à une valeur positive ou à une valeur négative. Il apprend à éviter les stimuli environnementaux associés à une valeur négative et chercher les contacts avec les stimuli à valeur positive (Fix, 2012; Habib, 2018; Kolb et al., 2019; Purves et al., 2019). De tels comportements ne sont pas innés mais acquis au cours de l’apprentissage et de l’expérience. La qualité d’un contact avec les stimuli environnementaux est réduite lorsque l’individu ressent de la peur, de l’anxiété, du manque d’intérêt, de l’ennui, donc des stimuli neutres ou aversifs (renforcements négatifs). Par contre, la qualité d’un contact est maintenue et optimisée lorsque les stimuli environnementaux procurent à l’individu du plaisir et satisfaction (renforcements positifs ou récompense) (Jouvent, 2009; Lavoie et al., 2016). « Les circuits cérébraux de la motivation nous permettent d’anticiper la valeur des différentes options disponibles, de sélectionner une situation que nous prenons pour but, et de mettre en place un plan d’action qui nous mène vers ce but » (Pessiglione, 2014, p. 1283). Le circuit de la récompense joue un rôle essentiel dans les comportements motivés. Il comprend 79 l’hippocampe qui a un rôle essentiel dans la mémoire, l’amygdale et le cortex préfrontal (Sussan, 2009; Trouvé, 2012). L’amygdale joue un rôle essentiel dans le maintien du contact avec des stimuli de l’environnement, directement ou ultérieurement. Cependant, l’individu perçoit aussi quelque chose d’agréable quand l’amygdale est activé et cela explique la contribution de la récompense dans le maintien de certains comportements autres que ceux qui sont adaptatifs (Sussan, 2009; Trouvé, 2012). L’amygdale exerce alors une influence sur la prise de conscience des conséquences positives et négatives des évènements du milieu extérieur. Les fonctions exécutives de l’individu sont alors influencées du fait de la connexion de l’amygdale au cortex préfrontal. Les différentes expériences menées témoignent que la production d’un comportement lié à une récompense augmente rapidement la libération de la dopamine par l’amygdale dans le circuit de la récompense. L’amygdale est étroitement associée au fonctionnement du cortex préfrontal impliqué dans des fonctions mnésiques (Borradori Tolsa et al., 2014; Cohen, 2009). Le cortex préfrontal assure la sélection et la prise de décision des comportements les plus adaptés en réponse à une situation donnée. Cette sélection peut être effectuée sur la base d’informations internes ou externes environnementales. Certains stimuli environnementaux constituent des éléments de motivation qui incitent les personnes à entrer en activité (Berridge, 2004). Les recherches en neurosciences indiquent que les récompenses recherchées et obtenues engagent les mêmes circuits cérébraux. «C’est par l’intermédiaire de ces circuits que la valeur anticipée des récompenses nous incite à produire un effort, que celui-ci soit mental (comme de calculer un trajet) ou physique (comme de porter une valise)» (Pessiglione, 2014, p. 1289). Ce réseau de récompense ou système limbique contredit les principes du Behaviorisme où le déclenchement d’une réponse à un stimulus est facilitée par la récompense matérielle qui s’applique plutôt sur les circuits moteurs (Berridge, 2004; Dehaene, 2018; Schultz, 2005). Par contre, dans le système limbique « ce qui est renforcé est l’association d’un contexte avec une valeur. On sort ici du schéma behavioriste, qui excluait toute représentation mentale de grandeur abstraite telle que la valeur » (Pessiglione, 2014, p. 1288). La motivation est essentielle pour l’apprentissage. Elle assure un engagement actif de l’élève renforçant l’attention, la réflexion et l’élaboration d’hypothèse. Cet apprentissage de haut 80 niveau cognitif ne survient que si l’enseignement assure des conditions affectives favorables (Dehaene, 2018). Influence des conditions environnementales affectives sur l’apprentissage Les émotions représentent un état particulier perçu induit par une certaine situation. Elles correspondent à « une modification d’état rapide et transitoire en deux temps. Un déclenchement initial dû à la pertinence d’un évènement (réel ou imaginé) menant à une réponse dans plusieurs composantes (système nerveux périphérique, tendance à l’action, expression motrice et ressenti conscient) » (Denervaud et al., 2017, p. 20). L’expression des émotions se reflète par des modifications physiologiques telles que le rythme cardiaque, la pression sanguine et les muscles du visage intervenant dans les expressions faciales (Barrett, 2006). Le caractère des émotions peut être plaisant ou au contraire violent. Il entraîne des sentiments subjectifs et la survenue de pensées liées à l’expérience vécue en induisant le rappel de faits passés et déterminant ce qui peut être fait ultérieurement dans des situations pareilles (Kolb et al., 2019). Les émotions, induits par des stimuli internes ou externes, sont normalement une réponse inconsciente (Hinton & Fischer, 2010). Le stimulus externe reçu au niveau des récepteurs sensoriels crée un message nerveux qui est transmis directement aux structures cérébrales, principalement l’amygdale. L’amygdale est connectée aux lobes frontaux. Les émotions peuvent alors influencer les processus cognitifs d’apprentissage, l’évaluation des conditions du milieu environnant, les pensées, les décisions et les actions. Après avoir considéré pour de longues années les circuits neuronaux des émotions et de la raison comme indépendants dans le cerveau, le développement des techniques d’imagerie cérébrale révèle l’interdépendance et l’association de ces deux circuits au niveau cérébral. Ces techniques signalent aussi une relation entre l’état émotionnel et la santé physique (Davidson & Schuyler, 2017). Les études neuroscientifiques témoignent de la plasticité des circuits neuronaux des émotions. Ils sont capables de se développer et se modifier (Davidson & McEwen, 2012). Cela suggère que le contrôle émotionnel et le bien-être peuvent être acquis suite à un travail intentionnel après plusieurs entraînement par des techniques bénéfiques comme la méditation. 81 La figure 1illustre les images obtenues en IRMf de l’activité cérébrale d’individus en réaction à des photos plaisantes (Davidson & Schuyler, 2017, p. 45). Figure 1:IRMf de l'activité cérébrale en réaction à des photos plaisantes Les images mettent en évidence un niveau élevé d’activation du striatum ventral (à gauche), région cérébrale sous-tendant le bien-être psychologique. Également, une activation du cortex préfrontal dorsolatéral droit (à droite), une région cérébrale impliquée dans l’attention et la mémoire de travail. L’étude indique que le taux de cortisol associé à la réaction de l’organisme au stress diminue lors d’une activation soutenue du striatum central et de la région préfrontale dorsolatérale. Ces résultats témoignent que les émotions positives induisent un état de bien-être durable plus résistant aux circonstances externes et une plus grande résilience face à l’adversité et aux situations de stress. Cet effet est observée si les réactions sont prolongées face aux stimuli positifs en comparaison à des réactions brèves où les niveaux de bien-être sont plus bas (Lapate et al., 2014). De même, le contexte de la réaction face aux stimuli positifs détermine la durabilité de l’effet des émotions sur le bien-être et la résilience à l’adversité à long terme (Telzer, Fuligni, Lieberman, & Galván, 2014). La résilience à l’adversité correspond à un rétablissement efficace de l’état de bien-être suite à un stimuli négatif (Davidson & Schuyler, 2017). Elle représente une forme de régulation des émotions (Schuyler et al., 2014). Cette réaction corporelle est associée à un recouvrement de 82 l’activité de l’amygdale soutenant les expériences de peur et d’anxiété. La figure 2 illustre les images cérébrales obtenues en IRMf de l’activité de l’amygdale dans la régulation des émotions face à l’adversité (Schuyler et al., 2014, p. 179). Figure 2:IRMf de l'activité de l'amygdale lors de la résilience à l’adversité Les images (en a) affirment que l’activité de l’amygdale est significativement plus grande lors d’évènements négatifs par comparaison à des évènements neutres. Le premier graphe (en b) montre l’augmentation croissante de l’activité de l’amygdale (rectangle gris foncé) après la survenue d’un évènement négatif (rectangle noir), puis la phase de régulation (rectangle gris clair). Le deuxième graphe (en c) indique une activation supérieure de l’amygdale chez les patients à névrotisme élevé (en rouge) par comparaison à une moindre activation chez les patients à névrotisme faible (en bleu) qui présentent un recouvrement plus rapide de l’activité de l’amygdale. Le troisième graphe (en d) affiche une activation plus grande de l’amygdale chez les patients ayant jugé de nouveaux visages comme moins sympathiques (en jaune) par comparaison à des patients ayant jugé des visages très sympathiques (en vert) et qui manifestent aussi un rétablissement plus rapide de l’activité de l’amygdale. Ces résultats mettent en évidence que le recouvrement de l’amygdale est différent entre les individus jouant ainsi un rôle important au niveau de la résilience et du bien-être. Cette compétence de gestion des émotions étant associée à une plasticité cérébrale, elle n’est pas figée par la prédétermination génétique et peut être atteinte au cours du parcours éducatif par la mise en place d’un environnement favorable à son développement. En effet, « il est apparu que les 83 participants qui se caractérisaient par un score élevé pour le sens de la vie font preuve d’une reprise vigoureuse à la suite des évènements négatifs » (Davidson & Schuyler, 2017, p. 50). Cet effet est aussi observé chez les participants ayant une bonne estime de soi et une croissance personnelle. En somme, « des niveaux d’adversité modérés peuvent faciliter l’apprentissage de stratégies de régulation émotionnelle favorisant un meilleur rétablissement (résilience) et provoquent des changements dans l’implication préfrontale » (Davidson & Schuyler, 2017, p. 51). En somme, les émotions sont associées aux buts d’accomplissement et de réussite des élèves. Elles génèrent la motivation durant l’apprentissage sous forme de plaisir, d’intérêt, d’espoir de progresser, d’estime de soi, d’empathie, d’engagement social, d’aide à autrui et d’exploration de la nouveauté (Pekrun, Goetz, Frenzel, Barchfeld, & Perry, 2011; Silvia, 2010). Un environnement scolaire assurant ces diverses conditions affectives garantit une amélioration de l’efficacité des apprentissages (Denervaud et al., 2017). Un des apports récents les plus intéressants en neurosciences est l’importance des interactions entre les régions cérébrales associées aux émotions et celles associées aux fonctions cognitives et les influences mutuelles entre elles et sur l’ensemble du cerveau (Pichon & Vuilleumier, 2011). Plusieurs recherches mettent en évidence l’influence des sentiments plaisants provenant du milieu environnant sur le fonctionnement cérébral. La figure 3 illustre les images obtenues en IRMf lors de la réponse affective à des signaux sociaux de récompense ou de sanction (Pichon & Vuilleumier, 2011, p. 768). 84 Figure 3:IRMf de la réponse affective à des signaux sociaux Les images marquent une activation croissante de l’amygdale lorsque des visages exprimant la colère sont présentés à des sujets suite à une erreur lors de l’exécution d’une tâche cognitive. Par contre, l’activation du striatum ventral (neurones dopaminergiques) décroît en réponse à des visages souriants exprimant la joie suite à une performance cognitive correcte. Ces résultats confirment l’influence des conditions affectifs de sanction ou de récompense lors de l’exécution de tâches cognitives sur le fonctionnement des structures cérébrales (Vrtička, Andersson, Grandjean, Sander, & Vuilleumier, 2008). De plus, le cortex orbitofrontal et le gyrus frontal soutiennent la capacité de gestion des émotions et des conduites sociales en participant à l’inhibition et la modification des comportements lorsque la récompense cesse (Blair, 2004). Ces données neuroscientifiques révèlent l’importance des messages verbaux et non-verbaux et le sentiment de valorisation que l’enseignant donne aux élèves. « Le comportement qui confirme peut créer une zone de sécurité où l’apprenant n’a pas peur de prendre les risques […] le facteur le plus important pour induire la motivation des élèves fut le comportement du professeur suivi du climat créé dans la salle de classe » (Arnold, 2006, p. 412). Cela suppose le respect l’élève, l’établissement d’une relation adulte-adulte avec lui (Berne, 2005) et lui assurer la possibilité d’exprimer ses préoccupations. Le fait que les élèves vérifient « que leurs camarades partagent leurs sentiments d’insécurité, qu’ils ne sont pas les seuls à les en ressentir, peut avoir un effet positif » (Arnold, 2006, p. 413). L’organisation de la prise de 85 parole en classe est aussi importante de telle façon à ne pas forcer un élève à répondre avant que l’enseignant ne vérifie qu’il est capable. D’autres techniques de prise de parole sont efficaces telles que « think-pair-share » où l’enseignant propose une question et donne aux élèves un temps de préparation individuelle puis un temps de discussion en paires et après leur propose de prendre la parole face à l’ensemble du groupe (Kagan & Kagan, 2009). Cette technique rend la production et l’intervention de l’élève plus élaborées et diminue l’anxiété lors d’une communication à l’ensemble du groupe. Parmi les propositions efficaces capables d’améliorer la gestion des émotions et l’anxiété en classe, il est important de favoriser l’estime de soi et la confiance en soi des élèves. Il s’agit « d’une estime de soi saine qui conduit l’apprenant à avoir une vision positive et réaliste de soi et de ses capacités, en même temps qu’une attitude responsable fondée sur le fait qu’il se sait capable d’atteindre des buts importants » (Arnold, 2006, p. 415). C’est aussi un rôle crucial de l’enseignant en classe d’instaurer des conditions d’apprentissage soutenant la capacité de chaque élève à travailler, à exploiter toutes ses potentialités et à progresser en confrontant l’influence des émotions négatives. L’atteinte d’une compétence mène à un sentiment de confiance en soi. L’enseignant peut donc aider l’élève à développer une plus grande estime de soi en assurant un plus grand suivi pour atteindre un niveau de compétences de plus haut niveau durant son parcours. Une étude réalisée souligne l’intérêt d’introduire dès l’école élémentaire l’éducation aux neurosciences dans le développement de l’estime de soi chez les élèves (Lanoë, Rossi, Froment, & Lubin, 2015). La reconnaissance par les élèves du fonctionnement de leur cerveau et des mécanismes neuronaux de plasticité conduit à modifier leur perception sur l’intelligence de statique à dynamique capable d’évoluer. La gestion des émotions et le développement de l’estime de soi ne se réduit pas uniquement au rôle de l’enseignant en classe mais également à l’interaction sociale entre camarades. « L’émotion est un signal social qui peut être utilisé pour modifier l’action du partenaire, mais aussi de l’individu lui-même » (Le Gall et al., 2009, p. 28). L’enseignant a ici la responsabilité de créer un environnement de relations positives entre les élèves en classe et de développer les compétences sociales d’empathie, de communication et de relations interpersonnelles. Les techniques d’imagerie cérébrale (IRMf) mettent en lumière que l’exclusion sociale engendre une blessure affective et une réponse émotionnelle qui active les mêmes circuits 86 cérébraux que ceux activés dans le cas d’une douleur physique (Eisenberger, Lieberman, & Williams, 2003). La figure 4 illustre les images obtenues en IRMf des régions du cortex préfrontal suite à une exclusion sociale (Eisenberger et al., 2003, p. 291) Figure 4: Images en IRMf de l'activation du cortex préfrontal suite à une exclusion sociale Ces images révèlent l’activation par la douleur affective suite à une exclusion sociale de deux régions cérébrales du cortex préfrontal. Il s’agit du cortex cingulaire antérieur dont l’activité augmente suite à une douleur physique et du cortex préfrontal ventral dont l’activité augmente lorsque la douleur diminue. Ces résultats confirment que les mécanismes neurobiologiques dans le cerveau sont identiques pour une douleur physique et une douleur affective. Cela atteste de l’importance du réconfort social, de l’inclusion, de l’interaction et de la communication dans la réduction de la douleur physique et affective. Les situations qui favorisent les liens sociaux telles que l’empathie augmentent le bien-être des enfants et des adultes (Aknin, Hamlin, & Dunn, 2012; Hofmann, Wisneski, Brandt, & Skitka, 2014). L’empathie est l’« habileté à reconnaître et partager les émotions des autres » (Davidson & Schuyler, 2017, p. 51). Elle peut être améliorée par entraînement à la compassion et la reconnaissance des émotions de soi et d’autrui. L’activité cérébrale correspondante est modulée par le cortex préfrontal ventral et dorsomédian. Ces régions sont impliquées dans la régulation des émotions et le comportement dirigé vers un but. Elles augmentent la motivation à reconnaître les émotions des autres suite à l’entraînement. Cela génère une empathie plus compatissante et une orientation des ressources personnelles vers l’aide d’autrui. 87 Les compétences sociales d’empathie, de communication et de relations interpersonnelles peuvent être développées à l’école à travers une approche socioconstructiviste mise en place par les méthodes d’enseignement en groupes. Cette approche soutient la construction des processus mentaux par interaction sociale et conflictuelle entre pairs (Barlow, 1993). Les approches expérimentales menées chez l’animal comme chez l’homme mettent en lumière l’amélioration de la mémorisation à long terme sous l’effet d’expériences émotionnelles (Dolcos & Denkova, 2016; Habib, 2018; Kolb et al., 2019). Les émotions activent des systèmes cérébraux et hormonaux qui facilitent et renforcent la mise en mémoire des souvenirs explicites ou implicites (Lavoie et al., 2016). Les études en IRMf révèlent que le contenu émotionnel positif favorise significativement la durabilité des souvenirs en mémoire (Kaouane, 2010). L’amygdale joue un rôle essentiel dans la sélection des informations à maintenir en mémoire, parmi celles qui ont le plus de sens et d’importance pour l’individu. D’autres études en neurosciences cognitives mettent en évidence que les facteurs émotionnels améliorent les capacités d’attention et que l’activation de l’amygdale assure un rôle essentiel dans l’orientation de l’attention vers l’expression faciale de l’autre (Adolphs et al., 2005; Phelps, Ling, & Carrasco, 2006). Conclusion Les conditions environnementales influencent directement l’optimisation de l’efficacité des apprentissages scolaire au développement durable et à la formation des futurs acteurs. D’où l’importance que les enseignants assurent des conditions d’alliance, de suivi et d’aide aux élèves. La garantie de conditions affectives favorables à l’inclusion sociale et l’estime de soi privilégient la motivation des élèves. Celle-ci influence directement l’engagement actif, l’attention et le développement de compétences de haut niveau cognitif. Ces conditions environnementales induisent un recyclage neuronal au cours de l’apprentissage, une formation de nouvelles connexions et une déformation d’autres. De profondes modifications cérébrales sont alors retracées et consolident l’atteinte de nouvelles compétences conformes aux exigences du futur développement durable. Les multiples apports des neurosciences questionnent et réactualisent la compréhension des aspects naturels et environnementaux de 88 l’apprentissage et orientent les conditions pédagogiques optimales à instaurer au niveau des méthodes d’enseignement, des situations et de l’environnement d’apprentissage. Références bibliographiques Adolphs, R., Gosselin, F., Buchanan, T. W., Tranel, D., Schyns, P., & Damasio, A. R. (2005). A mechanism for impaired fear recognition after amygdala damage. Nature, 433(7021),68. https://doi.org/10.1038/nature03086 Aknin, L. B., Hamlin, J. K., & Dunn, E. W. (2012). Giving Leads to Happiness in Young Children. PLOS ONE, 7(6), e39211. https://doi.org/10.1371/journal.pone.003921 Arnold, J. (2006). Comment les facteurs affectifs influencent-ils l’apprentissage d’une langue étrangère ? Ela. Études de linguistique appliquée, n° 144(4), 407‑425. Barlow, M. (1993). Le travail en groupe des élèves. Paris: Armand Colin. Barrett, L. F. (2006). Are Emotions Natural Kinds? Perspectives on Psychological Science: A Journal of the Association for Psychological Science, 1(1), 28‑58. https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2006.00003.x Berne, E. (2005). Analyse transactionnelle et psychothérapie. Paris: Payot. Berridge, K. C. (2004). Motivation concepts in behavioral neuroscience. Physiology & Behavior, 81(2), 179‑209. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2004.02.0 Bier, B., & Belleville, S. (2010). Optimiser le fonctionnement cognitif au cours du vieillissement : Facteurs de réserve, stimulation cognitive et plasticité cérébrale. Neuropsicologia Latinoamericana, 2(3). Consulté à l’adresse http://neuropsicolatina.org/index.php/Neuropsicologia_Latinoamericana/article/view/52 Blair, R. J. R. (2004). The roles of orbital frontal cortex in the modulation of antisocial behavior. Brain and Cognition, 55(1), 198‑208. https://doi.org/10.1016/S02782626(03)00276-8 Blokland, G. A. M., Zubicaray, G. I. de, McMahon, K. L., & Wright, M. J. (2012). Genetic and Environmental Influences on Neuroimaging Phenotypes : A Meta-Analytical Perspective on Twin Imaging Studies. Twin Research and Human Genetics, 15(3), 351‑371. https://doi.org/10.1017/thg.2012.11 Borradori Tolsa, C., Barisnikov, K., Lejeune, F., & Hüppi, P. (2014). Développement des fonctions exécutives de l’enfant prématuré. Archives de Pédiatrie, 21(9), 1035‑1040. https://doi.org/10.1016/j.arcped.2014.06.011 89 Caroni, P., Donato, F., & Muller, D. (2012). Structural plasticity upon learning : Regulation and functions. Nature Reviews Neuroscience, 13(7), 478‑490. https://doi.org/10.1038/nrn3258 Cohen, L. (2009). Pourquoi les chimpanzés ne parlent pas : Et 30 autres questions sur le cerveau de l’homme. Paris: Odile Jacob. Davidson, R. J., & McEwen, B. S. (2012). Social influences on neuroplasticity : Stress and interventions to promote well-being. Nature Neuroscience, 15(5), 689‑695. https://doi.org/10.1038/nn.3093 Davidson, R. J., & Schuyler, B. (2017). Neuroscience du bonheur. Revue québécoise de psychologie, 38(1), 39‑64. https://doi.org/10.7202/1040069ar Dehaene, S. (2018). Apprendre ! Les talents du cerveau, le défi des machines. Paris: Odile Jacob. Denervaud, S., Franchini, M., Gentaz, E., & Sander, D. (2017). Les émotions au cœur des processus d’apprentissage. Revue suisse de pédagogie spécialisée, (4), 20‑25. Di Martino, A., Yan, C.-G., Li, Q., Denio, E., Castellanos, F. X., Alaerts, K., Milham, M. P. (2014). The autism brain imaging data exchange : Towards a large-scale evaluation of the intrinsic brain architecture in autism. Molecular Psychiatry, 19(6), 659‑667. https://doi.org/10.1038/mp.2013.78 Dolcos, F., & Denkova, E. (2016). Dissocier les effets facilitants et les effets délétères de l’émotion sur la cognition. Santé mentale au Québec, 41(1), 15‑34. https://doi.org/10.7202/1036964ar Donato, F., Rompani, S. B., & Caroni, P. (2013). Parvalbumin-expressing basket-cell network plasticity induced by experience regulates adult learning. Nature, 504(7479), 272‑276. https://doi.org/10.1038/nature12866 Eisenberger, N. I., Lieberman, M. D., & Williams, K. D. (2003). Does rejection hurt? An FMRI study of social exclusion. Science (New York, N.Y.), 302(5643), 290‑292. https://doi.org/10.1126/science.1089134 Esseily, R., Rat-Fischer, L., Somogyi, E., O’Regan, K. J., & Fagard, J. (2016). Humour production may enhance observational learning of a new tool-use action in 18-month-old infants. Cognition and Emotion, 30(4), 817‑825. https://doi.org/10.1080/02699931.2015.1036840 Fix, J. (2012). Neuroanatomie (4ème). Bruxelles: De Boeck. 90 Fradin, J., Lefrancois, C., & Massioui, F. E. (2006). Des neurosciences à la gestion du stress devant l’assiette. Médecine et Nutrition, 42(2), 75‑81. https://doi.org/10.1051/mnut/2006422075 Franck, N. (2013). Entraînez et préservez votre cerveau : Plus de vitalité cérébrale. Paris: Odile Jacob. Habib, M. (2018). La constellation des dys : Bases neurologiques de l’apprentissage et de ses troubles. Bruxelles: De Boeck Supérieur. Hinton, C., & Fischer, K. (2010). Perspective développementale et biologique de l’apprentissage. In La recherche et l’innovation dans l’enseignement Comment apprend-on ? La recherche au service de la pratique. OECD Publishing. Hofmann, W., Wisneski, D. C., Brandt, M. J., & Skitka, L. J. (2014). Morality in everyday life. Science, 345(6202), 1340‑1343. https://doi.org/10.1126/science.1251560 Houdé, O. (2011). Imagerie cérébrale, cognition et pédagogie—Imagerie et cognition (6). médecine/sciences, 27(5), 535‑539. https://doi.org/10.1051/medsci/2011275020 Houdé, O., & Borst, G. (2014). Measuring inhibitory control in children and adults : Brain imaging and mental chronometry. Frontiers in Psychology, 5. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2014.00616 Houdé, O., & Leroux, G. (2015). Psychologie du développement cognitif. Paris: Presses universitaires de France. Jouvent, R. (2009). Le cerveau magicien. Paris: Odile Jacob. Julien, M.-P., Chalmeau, R., Vergnolle-Mainar, C., Léna, J.-Y., & Calvet, A. (2014). Concevoir le futur d’un territoire dans une perspective d’éducation au développement. [VertigO] La revue électronique en sciences de l’environnement, 14(1). Consulté à l’adresse https://id.erudit.org/iderudit/1027964ar Kagan, S., & Kagan, M. (2009). Kagan Cooperative Learning. San Clemente, California: Kagan. Kandel, É. (2007). À la recherche de la mémoire : Une nouvelle théorie de l’esprit. Paris: Odile Jacob. Kaouane, N. (2010). Mémoire émotionnelle normale et pathologique : Implication des glucocorticoïdes intra-hippocampiques (Thèse, Bordeaux 1). Consulté à l’adresse http://www.theses.fr/2010BOR14203 91 Kim, J. J., & Diamond, D. M. (2002). The stressed hippocampus, synaptic plasticity and lost memories. Nature Reviews Neuroscience, 3(6), 453. https://doi.org/10.1038/nrn849 Kolb, B., Whishaw, I. Q., & Teskey, G. C. (2019). Cerveau et comportement. Bruxelles: De Boeck Supérieur. Kolinsky, R., Morais, J., Cohen, L., Dehaene-Lambertz, G., & Dehaene, S. (2014). L’influence de l’apprentissage du langage écrit sur les aires du langage. Revue de neuropsychologie, Volume 6(3), 173‑181. Lanoë, C., Rossi, S., Froment, L., & Lubin, A. (2015). Le programme pédagogique neuroéducatif « À la découverte de mon cerveau » : Quels bénéfices pour les élèves d’école élémentaire ? (134), 9. Lapate, R. C., Reekum, C. M. van, Schaefer, S. M., Greischar, L. L., Norris, C. J., Bachhuber, D. R. W., Davidson, R. J. (2014). Prolonged marital stress is associated with short-lived responses to positive stimuli. Psychophysiology, 51(6), 499‑509. https://doi.org/10.1111/psyp.12203 Lavoie, M., Champagne, J., Glaser, E., & Mendrek, A. (2016). Mémoire émotionnelle et activités électrocorticales en schizophrénie. Santé mentale au Québec, 41(1), 85‑121. https://doi.org/10.7202/1036967ar Le Boterf, G. (2006). Construire les compétences individuelles et collectives. Paris: Eyrolles. Le Gall, D., Besnard, J., Havet, V., Pinon, K., & Allain, P. (2009). Contrôle exécutif, cognition sociale, émotions et métacognition. Revue de neuropsychologie, 1(1), 24‑33. Liberzon, I., & Phan, K. L. (2003). Brain-Imaging Studies of Posttraumatic Stress Disorder. CNS Spectrums, 8(9), 641‑650. https://doi.org/10.1017/S109285290000883 Maillot, P., & Perrot, A. (2012). La théorie de l’enrichissement cognitif à travers la stimulation physique : Activité physique traditionnelle versus exergames. NPG Neurologie Psychiatrie - Gériatrie, 12(71), 217‑229. https://doi.org/10.1016/j.npg.2012.07.008 Pekrun, R., Goetz, T., Frenzel, A. C., Barchfeld, P., & Perry, R. P. (2011). Measuring emotions in students’ learning and performance : The Achievement Emotions Questionnaire (AEQ). Contemporary Educational Psychology, 36(1), 36‑48. https://doi.org/10.1016/j.cedpsych.2010.10.0 Pessiglione, M. (2014). Comment le cerveau motive le comportement : Du circuit de la récompense au système des valeurs. Bulletin de l’Académie Nationale de Médecine, 198(7), 1283‑1296. https://doi.org/10.1016/S0001-4079(19)3122 92 Phelps, E. A., Ling, S., & Carrasco, M. (2006). Emotion Facilitates Perception and Potentiates the Perceptual Benefits of Attention. Psychological Science, 17(4), 292‑299. https://doi.org/10.1111/j.1467-9280.2006.01701.x Pichon, S., & Vuilleumier, P. (2011). Neuro-imagerie et neuroscience des émotions— Imagerie et cognition (8). médecine/sciences, 27(8‑9), 763‑770. https://doi.org/10.1051/medsci/2011278019 Posner, M., Rothbart, M., & Rueda, M. (2008). Brain mechanisms and learning of high level skills. The Educated Brain: Essays in Neuroeducation. https://doi.org/10.1017/CBO978051148990 Purves, D., Augustine, G. J., Fitzpatrick, D., Hall, W., LaMantia, A.-S., & White, L. (2019). Neurosciences. Bruxelles: De Boeck Supérieur. Ruph, F. (2011). Guide de réflexion sur les stratégies d’apprentissage à l’université : Actualiser mon potentiel intellectuel pour des études de qualité. Québec: Presses de l'université du Québec. Sablonnière, B. (2016). Les Nouveaux territoires du cerveau. Paris: Odile Jacob. Schultz, W. (2005). Behavioral Theories and the Neurophysiology of Reward. Annual Review of Psychology, 57(1), 87‑115. https://doi.org/10.1146/annurev.psych.56.09 Schuyler, B. S., Kral, T. R. A., Jacquart, J., Burghy, C. A., Weng, H. Y., Perlman, D. M., Davidson, R. J. (2014). Temporal dynamics of emotional responding : Amygdala recovery predicts emotional traits. Social Cognitive and Affective Neuroscience, 9(2), 176‑181. https://doi.org/10.1093/scan/nss131 Seassau, M. (2012). La mémoire émotionnelle existe-t-elle ? : Influence d’un Indice Émotionnel Sur le Rappel Épisodique, Approche Analytique De la Normalité à la Pathologie. Latvia: Presses Académiques Francophones. Silvia, P. J. (2010). Confusion and interest : The role of knowledge emotions in aesthetic experience. Psychology of Aesthetics, Creativity, and the Arts, 4(2), 75‑80. https://doi.org/10.1037/a0017081 St-Louis-Deschênes, M., & Ellemberg, D. (2013). L’exercice physique aigu et la performance cognitive chez l’enfant et l’adolescent. Science & Sports, 28(2), 57‑64. https://doi.org/10.1016/j.scispo.2011.10.007 Sussan, R. (2009). Optimiser son cerveau. Limoges: FYP. 93 Syssau, A., & Monnier, C. (2012). L’influence de la valence émotionnelle positive des mots sur la mémoire des enfants. Psychologie Française, 57(4), 237‑250. https://doi.org/10.1016/j.psfr.2012.09.003 Telzer, E. H., Fuligni, A. J., Lieberman, M. D., & Galván, A. (2014). Neural sensitivity to eudaimonic and hedonic rewards differentially predict adolescent depressive symptoms over time. Proceedings of the National Academy of Sciences, 111(18), 6600‑6605. https://doi.org/10.1073/pnas.1323014111 Trouvé, J.-N. (2012). Subjectivité et « cerveau social ». Cahiers de PreAut, 9(1), 15‑70. Tutiaux-Guillon, N., & Considère, S. (2010). L’éducation au développement durable : Entre injonctions ministérielles et obstacles didactiques. Schweizerische Zeitschrift für Bildungswissenschaften, 32(2), 193‑211. Vidal, C. (2012). La plasticité cérébrale : Une révolution en neurobiologie. Spirale, 63(3), 17‑22. Vincent, J.-D., & Lledo, P.-M. (2012). Le cerveau sur mesure. Paris: Odile Jacob. Voss, M. W., Vivar, C., Kramer, A. F., & van Praag, H. (2013). Bridging animal and human models of exercise-induced brain plasticity. Trends in Cognitive Sciences, 17(10), 525‑544. https://doi.org/10.1016/j.tics.2013.08.001 Vrtička, P., Andersson, F., Grandjean, D., Sander, D., & Vuilleumier, P. (2008). Individual Attachment Style Modulates Human Amygdala and Striatum Activation during Social Appraisal. PLOS ONE, 3(8), e2868. https://doi.org/10.1371/journal.pone.000286 94 5. SENTIR OU A OUTRA FACE DO APRENDER NO ENSINO SUPERIOR Elisa Chaleta13 Resumo Os modelos explicativos da aprendizagem em contextos de educação superior que se desenvolveram nas últimas cinco décadas, tanto nos Estados Unidos como na Europa, foram fortemente marcados pelos modelos cognitivistas e cognitivo-construtivistas determinando evidente protagonismo da componente cognitiva nos modelos de ensino e aprendizagem. As investigações realizadas, em particular na última década, têm vindo a enfatizar que a aprendizagem na sua complexidade envolve, para além da faceta cognitiva, uma faceta afectiva porque as tarefas de aprendizagem representam situações de realização que desencadeiam emoções nos estudantes. A importância das emoções vivenciadas no contexto educacional começa a ser reconhecida por pesquisadores de diferentes campos e tenta-se agora a aproximação entre as diferentes tradições de pesquisa que permaneceram em relativo isolamento e fragmentação. As emoções académicas podem desempenhar um papel importante nos resultados de aprendizagem e no desenvolvimento de práticas educativas uma vez que uma emoção académica pode ser activada ou desactivada em função da forma como o estudante percepciona as tarefas de aprendizagem e o contexto de ensino. Introdução Após receber em 1979 o Distinguished Scientific Contribution Award pela American Psychological Association, Robert Zajonc foi convidado a realizar a tradicional conferência reservada aos cientistas homenageados em que usualmente apresentavam a investigação premiada e a sua visão sobre o desenvolvimento futuro desse campo de interesse. Zajonc, no entanto, optou por não cumprir a tradição e apresentou um texto "ricamente provocador" (Rachman, 1981, p. 279) sobre a relação entre o afecto e a cognição. Era consensual na investigação, à época, que as reações afectivas dependiam do processamento cognitivo prévio, Professora do Departamento de Psicologia e Investigadora do Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de Évora (CIEP- UÉ) Email: mec@evora.pt Este texto resulta do Projeto PTDC/CED-EDG/29252/2017 financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia de Portugal. 13 95 pelo que os diferentes modelos concordavam, de modo geral, com a prevalência da cognição sobre a emoção e que as reações afectivas só podiam ser observadas após um processamento considerável da informação (Adolphs, 2017). Esta apresentação de Zajonc traduziu-se num ataque frontal à ‘análise cognitiva’ da relação entre afecto e cognição, questionando o core dos modelos cognitivistas, partindo da premissa de que as reações afectivas podiam ocorrer antes e sem a participação do processamento cognitivo. De outro modo, enquanto os modelos cognitivistas postulavam a primazia da cognição, Zajonc defendeu a primazia do afecto, posição descrita no artigo publicado subsequentemente (1980) na American Psychologist: Preferences (affect) need no inferences (cognition). O debate resultante desta apresentação teve um enorme impacto no campo da investigação sobre as emoções determinando, nas décadas que se seguiram, uma explosão de estudos (em meados de 2009 o artigo tinha 2100 citações) sobre a relação entre afecto e cognição, ou seja, saber se as reacções afectivas podiam surgir sem o envolvimento de processos cognitivos (dando particular ênfase ao processamento afectivo automático). Não é nosso objectivo apresentar aqui os resultados dessa investigação, realizada predominantemente no campo da Psicologia Experimental, mas fazer notar o seu pouco impacto no campo da educação e da aprendizagem que edificaram os seus constructos teóricos pela prevalência da dimensão cognitiva, relegando para segundo plano a dimensão afectiva (embora algumas componentes como a motivação ou a ansiedade face ás provas de avaliação tenham tido alguma atenção por parte dos investigadores). Se focarmos o nosso olhar sobre a investigação no quadro da aprendizagem em contexto universitário, que teve o seu impulso nos anos 70 em Inglaterra, nos Estados Unidos e na Suécia, observamos que se desenha a partir do interesse dos investigadores sobre os aspectos preditores do desempenho académico dos estudantes (capacidade cognitiva, motivação e personalidade) tendo em vista, essencialmente, a selecção dos alunos para as instituições de ensino superior (Entwistle, 2015). A observação dos diferentes modelos explicativos da aprendizagem em contextos de educação superior, tanto nos Estados Unidos como na Europa, vemos a forte marca dos modelos cognitivistas (referencial do processamento de informação) e cognitivo-construtivistas (modelos centrados nos constructos de metacognição e autorregulação) onde a componente cognitiva assume evidente protagonismo (Hattie & Yates, 2014). Nos Estados Unidos investigaram-se inicialmente as características de personalidade dos estudantes, formas de pensamento desenvolvidas por estes sobre a própria aprendizagem e os requisitos para progredirem ao longo do percurso académico, originando a ideia de nível epistemológico e, 96 em Inglaterra e na Suécia, recorreu-se essencialmente a metodologias qualitativas para compreender a perspectiva dos estudantes sobre o seu processo de aprendizagem visando determinar, por um lado, o que aprendiam e, por outro, que estratégias adoptavam para resolver as tarefas académicas (Entwistle & Marton, 1989). A investigação que entretanto realizámos, seguindo a tradição europeia, mostrou que, para além da componente cognitiva envolvendo estratégias cognitivas e metacognitivas de estudo e de aprendizagem e de aspectos relacionados com a monitorização e gestão da actividade mental (Chaleta, 2003, 2011; 2017), existia associada ao discurso dos estudantes uma forte componente afectiva-emocional que envolvia emoções e sentimentos académicos que se manifestavam nas várias tarefas e situações de aprendizagem, tornando evidente que esta dimensão teria de ser considerada (Chaleta, 2013; Chaleta et al., 2013). A presença da componente afectiva na aprendizagem dos estudantes universitários começou a ser equacionada quando detectámos que respondiam recorrentemente acerca do que pensavam sobre algo, “eu sinto que…”. A primazia do afecto sobre a cognição enunciada por Zajonc e a possibilidade do processamento afectivo ocorrer sem processamento cognitivo prévio, ou mesmo de forma automática, tornou-se relevante no contexto da investigação que realizamos. Os dados entretanto obtidos apontavam para um forte entrelace entre a dimensão cognitiva e afectiva nos processos de aprendizagem e, ao mesmo tempo, constatava- se que (não apenas no ensino superior) muitos eram os alunos que não aprendiam e tinham insucesso académico apesar de não revelarem qualquer comprometimento cognitivo. De entre as variadas questões que os resultados nos vão suscitando, como que emoções e sentimentos se encontram associadas ao aprender em diferentes situações ou que emoções/sentimentos facilitam ou dificultam o processo de aprendizagem, uma delas assume particular relevância para compreender a falta de envolvimento dos alunos nas tarefas académicas em determinadas situações ou contextos (e consequente insucesso académico): podem ser desencadeadas emoções de forma automática e não consciente susceptíveis de perturbar o envolvimento dos sujeitos nas tarefas e o seu processamento cognitivo sem que ninguém se dê conta, incluindo o próprio? Por outro lado, se a componente emocional tem um importante papel na aprendizagem, importa compreender que emoções a afectam e como e, também, que possibilidades têm os estudantes de regular o que sentem em situações de aprendizagem. Para compreender o impacto das emoções no processo de aprendizagem recorremos essencialmente a dois modelos explicativos desenvolvidos nas duas ultimas décadas. Referimo-nos à investigação conduzida por Pekrun (2000, 2006, 2009, 2014, 2016, 2018) que estuda as emoções 97 académicas ou emoções de realização e ao modelo metacognitivo e afectivo da aprendizagem autorregulada (MASRL) de Efklides (2001, 2002, 2005, 2006a, 2006b, 2008, 2009, 2011, 2014). Emoções e sentimentos nas experiências de aprendizagem O conceito de ‘emoções académicas’ surge na investigação científica na década de 90 do século XX a partir da pesquisa de Pekrun sobre a motivação e a ansiedade dos alunos face aos exames académicos (Pekrun et al., 2004). Destes estudos e da integração dos resultados da investigação realizada por Perry (1991; Perry & Magnusson, 1989) sobre o controle e a motivação académica, emerge um modelo explicativo para compreender os efeitos das emoções na aprendizagem, mediados por mecanismos cognitivos e motivacionais e a sua respectiva regulação (Pekrun, 1992a, 1992b, 2000; Pekrun, Goetz, Tiz & Perry, 2002). A ansiedade relacionada com os exames continuou a atrair o interesse de muitos investigadores, mas outras emoções relacionadas com a realização académica foram negligenciadas existindo, actualmente, maior interesse no seu estudo, em particular a partir da teoria de controle-valor de Pekrun (Bernardo, Ouano & Salanga, 2009). Considera-se que os estudantes não experienciam, necessariamente, toda a gama de emoções humanas nas suas experiências de aprendizagem pelo que o leque das emoções académicas identificadas é menor do que o das emoções gerais, devendo ser consideradas como emoções complementares e não apenas um mero subconjunto das emoções gerais (Pekrun, Goetz, Tiz & Perry, 2002). As emoções académicas e as emoções gerais têm os mesmos limites conceptuais uma vez que a grande maioria das emoções académicas, identificadas na teoria de controle-valor de Pekrun (Goetz et al., 2006), se encontram na categoria dos afetos gerais (como a raiva, a ansiedade, o 98 prazer, o orgulho e a vergonha). Por outro lado, ainda existem algumas limitações em termos do conhecimento produzido no campo das emoções académicas uma vez que ainda estão por determinar os seus antecedentes e a sua ocorrência em áreas académicas específicas. A identificação dos antecedentes causais e dos mediadores cognitivos das emoções académicas permitirá construir um quadro mais completo dos problemas emocionais específicos dos alunos e, também, desenhar respostas mais eficazes ao nível da aprendizagem e do bem-estar psicológico em contexto académico (Goetz et al, 2016). A investigação tem mostrado maior facilidade na classificação das emoções académicas em contextos em que existe especificidade de domínio (por exemplo, português vs. matemática) do que em situações relacionadas com a classificação mais geral das emoções (por exemplo, prazer vs. ansiedade). Em termos gerais, a investigação sobre as emoções académicas e a forma como estudantes lidam com elas em diferentes situações permanecem escassas (Asikainen, Hailikari & Mattsson, 2018). No quadro da pesquisa educacional o estudo das emoções e dos sentimentos associados ao processo de aprendizagem foram negligenciados durante muito tempo, com excepção para a ansiedade em situação de testes ou exames que surge na literatura desde a década de 1930 e da investigação sobre os antecedentes atribuicionais das emoções relacionadas com sucesso e fracasso. Apenas no final da década de 1990 se inicia na Europa e nos Estados Unidos a investigação sobre as múltiplas dimensões das emoções, a forma como se desenvolvem e a importância funcional que revelam na aprendizagem e no desenvolvimento dos estudantes (Pekrun, 2005). Como a maioria dos estudos foram produzidos em níveis de ensino anteriores observa-se, ainda, uma grande lacuna no contexto da investigação na área das emoções e sentimentos nas experiências de aprendizagem nos contextos de educação superior. No ensino superior o foco incidiu, essencialmente, na vertente cognitiva, isto é, na aprendizagem como conhecimento de factos, no raciocínio lógico, na análise crítica, na capacidade de resolver problemas sendo estes considerados os indicadores mais decisivos do sucesso académico. Porém, essa abordagem revelou-se insuficiente uma vez que a aprendizagem do estudante não acontece num domínio puramente racional dissociado da emoção (Immordino-Yang & Damásio, 2007) e os resultados da aprendizagem dependem, também, do estado emocional do estudante e das suas relações interpessoais (Zabalza, 2004). Na universidade os estudantes experimentam diversas e diferentes emoções no contexto académico. Uns gostam de aprender novos assuntos, alguns sentem-se orgulhosos das suas realizações académicas, outros há que se sentem entediados com as suas tarefas e outros que se sentem envergonhados pelos seus fracassos (King & Gaerlan, 2014). Os alunos vivenciam 99 em ambiente académico, com frequência, diversas emoções (positivas e negativas) como excitação ao estudar, orgulho pelas suas realizações académicas, surpresa ao descobrir uma nova solução, aborrecimento/tédio durante as aulas, ansiedade, medo, preocupação e/ou nervosismo durante os exames, alegria ou vergonha face aos resultados de avaliação, entre outros (Pekrun, 2014). Neste sentido, as emoções académicas são experienciadas numa ampla e variada gama de ambientes académicos e estão directamente relacionadas com as actividades como estudar e aprender (Ainley, Corrigan & Richardson 2005; Asikainen, Hailikari & Mattsson, 2018; Goetz et al. 2007; Govaerts & Grégoire 2008), podendo ocorrer em variados ambientes de aprendizagem (presencial ou virtual), seja numa escola, numa universidade ou até mesmo num centro de formação. Segundo Ahmed et al. (2010; Tyng et al., 2017), as experiências emocionais são omnipresentes por natureza sendo importantes e críticas em espaços académicos uma vez que a emoção modula todos os aspectos da cognição. As emoções académicas podem estimular ou inibir o processo de aprendizagem dos alunos devido à influência expressiva que têm sobre a percepção, a atenção, a memória, o raciocínio e a resolução de problemas, sendo ainda relevantes na codificação e recuperação de informação e ao nível da curiosidade e da criatividade como componentes da aprendizagem (Chiang & Liu, 2014). As emoções académicas têm influência sobre a cognição, a motivação, a autorregulação, o envolvimento dos estudantes na aprendizagem e, consequentemente, na sua realização académica (Pekrun et al., 2009; Pekrun et al., 2011). Segundo Pekrun, Elliot e Maier (2006), as emoções académicas como prazer, esperança, orgulho, ansiedade, vergonha, desespero e tédio têm um significativo impacto na aprendizagem, na motivação, na memória, no desempenho e, também, na saúde física e psicológica de um modo geral. Podem ainda influenciar o bem-estar, a qualidade da aprendizagem, a realização académica e a interacção social na sala de aula (Goetz et al., 2006; Goetz et al., 2012). As emoções denominadas por Pekrun (2006) de emoções académicas ou de realização, são experiências emocionais que envolvem competências pessoais directamente relacionadas com as actividades ou resultados da aprendizagem e com os contextos académicos como a sala de aula ou a realização de provas de avaliação (Goetz, Preckel, Pekrun & Hall, 2007), podendo variar ao longo do percurso académico. Assim, as emoções podem corresponder ao prazer sentido pela obtenção de uma nota alta num exame, ao tédio experimentado numa sala de aula ou à frustração e raiva sentidas ao lidar com uma tarefa percebida como difícil (Pekrun, 2006; Pekrun et al., 2010). 100 Tanto a emoção relacionada com a actividade, como a relacionada com os resultados, podem ser agrupadas de acordo com a sua valência (positiva versus negativa; prazerosa versus desprazerosa). A investigação realizada por Pekrun, Goetz, Titz e Perry (2002) encontrou como mais referidas quatro tipos de emoções: emoções positivas activantes (satisfação, esperança e orgulho); ii) emoções negativas activantes (raiva, ansiedade e vergonha); iii) emoções positivas desactivantes (alívio) e iv) emoções negativas desactivantes (desespero e aborrecimento). Neste estudo identificaram-se ainda as três situações em que maioritariamente são activadas as emoções académicas: durante as aulas, no estudo fora das aulas e nos momentos de realização de provas académicas (Goetz, Pekrun, Hall & Haag, 2006; Goetz et al., 2007; Zeidner, 2007). As emoções de realização podem variar em intensidade e frequência e desencadeiam comportamentos de aproximação ou de evitamento das tarefas de aprendizagem, consoante facilitem ou dificultem essa mesma aprendizagem (Efklides, 2009; Goetz et al., 2007; Zeidner, 2007). Podem ser conceptualizadas como episódios momentâneos que ocorrem numa determinada situação e num determinado tempo (como por exemplo a ansiedade experimentada antes de um exame) ou como habituais e recorrentes sendo experimentadas em relação a determinadas disciplinas como por exemplo a matemática (Peixoto et al., 2015; Pekrun, Elliot & Maier, 2006). A investigação permitiu identificar dois tipos de emoções de realização: i) emoções de actividade/mestria (prazer, tédio e raiva) decorrentes da realização de actividades e ii) emoções de resultado/desempenho, (esperança, orgulho, ansiedade, desânimo e vergonha) decorrentes dos resultados obtidos. Estes dois tipos de emoções de desempenho (foco na actividade ou no resultado) podem ser agrupadas de acordo com a sua valência positiva ou negativa. Caracterizam-se como positivas, por exemplo, o prazer, a esperança e o orgulho, e como negativas, o tédio, a raiva, a ansiedade, o desânimo e a vergonha (Pekrun, 2006, 2014, 2018; Pekrun et al., 2007, Harley et al., 2019). Para além da valência (positiva ou negativa), as emoções envolvem uma componente prospectiva/antecipatória face à expectativa de sucesso ou fracasso (esperança de sucesso ou ansiedade de insucesso/falha) e emoções retrospectivas (orgulho ou vergonha) relativas ao sucesso ou fracasso obtido (Pekrun, 2006; Pekrun et al., 2010). Meinhardt e Pekrun (2003) realizaram um estudo sobre o efeito das emoções positivas e negativas nos processos cognitivos e os resultados obtidos demonstraram que os dois tipos podiam consumir recursos cognitivos, desviando e focalizando a atenção no objecto da emoção o que implicava a redução de recursos necessários à resolução de tarefas. 101 As emoções influenciam também a motivação intrínseca dos alunos (interesse e curiosidade pela aprendizagem) e a motivação extrínseca (relacionada com a obtenção de resultados positivos ou notas elevadas). As emoções positivas activantes como o prazer, a esperança e o orgulho influenciam ambos os tipos de motivação (intrínseca e extrínseca) e facilitam o uso de estratégias de aprendizagem mais flexíveis afetando positivamente o desempenho académico. Por outro lado, as emoções negativas desactivantes, como o desespero e o tédio, reduzem a motivação e o esforço no processamento de informação, conduzindo a efeitos negativos no desempenho (Pekrun et al., 2002; Harley et al., 2019). Emoções como a raiva, a ansiedade e a vergonha podem ter diferentes efeitos: tanto podem reduzir a motivação intrínseca como podem induzir uma forte motivação extrínseca aumentando o investimento e o esforço (Pekrun et al., 2011), o que implica que os seus efeitos sobre a motivação não são necessariamente negativos, podendo funcionar como emoções negativas activantes da aprendizagem. Emoções desactivantes como o alívio ou o tédio podem conduzir a um processamento de informação mais superficial ao invés de conduzir ao uso mais intensivo de estratégias de aprendizagem. As emoções de realização afectam os processos cognitivos e motivacionais, assim como o bem-estar, a felicidade e a satisfação com a vida podendo ter uma forte influência na aprendizagem e no desempenho ou rendimento escolar (Pekrun, 2006; Pekrun, Frenzel, Barchfeld & Perry, 2011). Pekrun (2014, 2016) afirma que as emoções são funcionalmente importantes nos ambientes académicos uma vez que podem ser adaptativas ou desadaptativas, conduzindo ao sucesso ou ao fracasso escolar. As emoções positivas como o prazer em aprender podem levar o aluno a alcançar metas e desafios estabelecidos e a activar o pensamento criativo para a resolução de problemas (ou mesmo como protecção da saúde mediante aumento da resiliência). Por outro lado, as emoções desadaptativas como a ansiedade excessiva, a desesperança ou o tédio podem induzir comportamentos de evitação, fuga e desistência. Linnenbrink-Garcia e Pekrun (2011) consideram relevante compreender o papel das emoções como a raiva, a frustração, tédio, a vergonha, o prazer, a esperança, a alegria e o orgulho (entre outras) em ambientes académicos, em particular, como e porque emergem, como afectam o processamento cognitivo, de que forma moldam o envolvimento dos alunos nas tarefas de aprendizagem e quais as possibilidades dos estudantes mobilizarem os recursos emocionais para facilitar esse envolvimento e a realização académica. As emoções dirigem, conduzem e guiam a cognição (Cubukcu, 2013; Fonseca, 2016) e, tendo em vista a valência emocional, emoções positivas como alegria e entusiasmo são benéficas 102 para os indivíduos e as emoções negativas como tristeza, raiva e frustração constituem-se como um provável inibidor de ações apropriadas pois costumam durar mais tempo do que as emoções positivas (Beard, Humberstone & Clayton, 2014; Frijda, 1998). Para Damásio (1996), a emoção é iniciadora do processo de aprendizagem, sendo fundamental e útil para que ela ocorra e os sentimentos, por sua vez, aprimoram a aprendizagem. Além disso, a emoção pode afectar alguns processos cognitivos como a tomada de decisão e indivíduos que possuem algum déficit na região cerebral responsável pelas emoções e pelos sentimentos, como o sistema límbico, costumam apresentar dificuldades de aprendizagem. Goleman (1997, 2001) considera que as emoções funcionam como ferramentas que servem para aprimoramento da inteligência e, dessa forma, contribuem para a aprendizagem ao proporcionar estímulos à cognição. Por outro lado, acredita que os estudantes que possuem problemas emocionais têm maior dificuldade em aprender, pois, da mesma forma que a emoção é um propulsor e mecanismo de alavanca da aprendizagem, uma disfunção emocional (ou ‘não estar bem emocionalmente’) pode ser prejudicial para a aprendizagem. A inteligência emocional constitui, assim, um aspecto relevante, pois ser emocionalmente inteligente significa conhecer as próprias emoções, a sua intensidade, as suas causas, as suas consequências e as emoções dos outros (Butz et al., 2016; Kollontai, 2015). As emoções académicas podem desempenhar um papel importante na avaliação e no desenvolvimento de práticas educativas e, consequentemente, nos resultados de aprendizagem (Goetz et al., 2016). Importa, neste contexto, perceber como os alunos se sentem antes, durante ou depois de uma determinada actividade ou tarefa académica, pois as emoções ocorrem em muitas situações para além dos exames (Zhou, 2016). Os métodos de ensino, o feedback e as tarefas de aprendizagem estão associados às emoções académicas dos alunos (Chiang & Liu, 2014; Goetz et al., 2013), o que significa que uma emoção académica pode ser activada ou desactivada em função da forma como o conteúdo é transmitido pelo professor na sala de aula (como, por exemplo, o seu nível de compreensibilidade, ritmo e o uso de recursos audiovisuais). A partir dos estudos sobre as emoções em contexto académico, Pekrun (2006, 2014) desenvolve a teoria de controlo-valor das emoções de realização que oferece um modelo integrativo das experiências emocionais para analisar os antecedentes e os efeitos das emoções de realização em ambiente académico. Numa fase inicial a teoria centrava-se num modelo de expectativa de valor da ansiedade sendo ampliada, posteriormente, para incluir os antecedentes e os efeitos das múltiplas emoções de realização tendo em conta o envolvimento académico, a autorregulação e a realização académica (Bieg, Goetz & Hubbard, 2013). Na 103 atual versão, a teoria do controlo-valor integra os pressupostos das abordagens sobre o valor das expectativas das teorias atribuicionais da emoção e das teorias sobre o papel da percepção do controlo na experiência emocional, na aprendizagem e no rendimento académico. Pekrun (2006) destaca a importância de dois grupos de avaliações cognitivas: i) a controlabilidade percebida das actividades de realização e dos seus resultados mediante a percepção de competência e as cognições causais (expectativas de que a persistência no estudo pode ser exercida e que irá conduzir ao sucesso) e ii) o valor subjectivo dessas actividades e resultados (importância percebida de sucesso). De um modo mais específico as avaliações de controlo e valor do estudante seriam parte de um processo cognitivo capaz de mediar as suas emoções ligadas às actividades de desempenho e aos seus resultados académicos (Meyer & Turner, 2002, 2006). Nestas avaliações estariam incluídas as expectativas relacionadas com os resultados de desempenho, atribuições de causalidade, autoconceito académico e competências/habilidades. Assim, o controlo (mesmo que subjectivo) diz respeito à influência da percepção de controlo sobre as acções e os resultados por parte do aluno, ou seja, à percepção que o aluno tem acerca do seu desempenho numa determinada tarefa ou disciplina considerando, neste caso, a percepção de competência, as expectativas e as atribuições de causalidade para o sucesso/fracasso (Frenzel, Pekrun & Goetz, 2007). O valor (subjectivo), por sua vez, refere-se à valência atribuída às acções e aos resultados, ou seja, à importância subjectiva que o aluno atribui a determinada disciplina/tarefa (Pekrun, 2006, 2016, 2018). De acordo com Pekrun, Elliot e Maier (2006), a teoria de controlo-valor baseia-se na premissa de que as avaliações de controlo e dos valores são centrais para o despoletar de emoções de desempenho positivas (como o prazer) e para reduzir as emoções negativas (tédio, raiva e frustração). Assim, o controlo dos resultados e o seu valor subjectivo positivo promovem emoções positivas de resultado, como a esperança e o orgulho. Por outro lado, a percepção de incontrolabilidade e a atribuição de um valor subjectivo negativo aos resultados desperta emoções de resultado negativas como ansiedade, desânimo ou vergonha. As avaliações subjectivas são fundamentais para o despertar das emoções tendo em conta que podem afectar a aprendizagem, o interesse, o envolvimento escolar, o desempenho, a realização e o desenvolvimento da personalidade, podendo ainda influenciar o clima social da sala de aula e o ensino (Pekrun, 2006; Pekrun et al., 2011). Apesar da maioria dos estudos se focalizarem essencialmente na ansiedade face aos testes (Pekrun et al., 2006) e nas emoções relacionadas com situações de sucesso e fracasso, algumas investigações têm incidido sobre a relação entre as emoções positivas (como o prazer) e as emoções negativas (como a zanga, o tédio, o 104 desânimo e vergonha) no desempenho académico (Pekrun et al., 2002; Pekrun et al., 2010). As emoções de realização são críticas no domínio da aprendizagem devido ao seu impacto no sucesso e no fracasso, mas podem ser modificadas mediante regulação emocional. Para isso é fundamental compreender como em diferentes situações de realização as emoções são reguladas e qual o papel e o impacto das emoções discretas nas estratégias de regulação adoptadas (Harley, Pekrun, Taxer & Gross, 2019). A dimensão afectiva da aprendizagem foi também explorada no modelo metacognitivo e afectivo da aprendizagem autorregulada (MASRL) de Efklides (2011), que coloca a ênfase na pessoa e não tanto sobre o comportamento ou sobre o contexto. A pessoa envolve características metacognitivas, cognitivas, motivacionais, afectivas e volitivas relativamente estáveis (traços) que se formaram em diferentes situações de aprendizagem e são estes recursos, relativamente estáveis da pessoa, que levam a decisões sobre o envolvimento numa tarefa. O nível pessoa associa a estas características componentes específicas como i) as competências da pessoa (conhecimento, habilidades), ii) a forma de orientação para a concretização de objectivos, as expectativas e as crenças, iii) o autoconceito como representação da própria competência em vários domínios, iv) as atitudes, disposições comportamentais, emoções (ansiedade, interesse, medo, orgulho, vergonha) em relação à aprendizagem v) a volição, na forma de percepção de controlo e vi) a metacognição na forma de conhecimento metacognitivo que capta a história da pessoa no percurso de aprendizagem, como o conhecimento de si mesmo e dos outros e das tarefas, metas e estratégias (Efklides, 2011). As experiências de aprendizagem representam para os alunos situações de conquista ou fracasso suscitando, para além do esforço ou investimento cognitivo, reacções afectivas despoletadas num determinado contexto. A disponibilidade cognitiva para aprender ou para investir esforço cognitivo numa tarefa é possibilitada pelas experiências afectivas que funcionam como um regulador tanto cognitivo como afectivo, facilitando ou inibindo a gestão do processo de aprendizagem pelo estudante (Efklides, 2009). Face a uma tarefa de aprendizagem o estudante pode ser confrontado com obstáculos que podem interromper o processamento cognitivo. O que define fundamentalmente estas experiências metacognitivas é o seu carácter afectivo que dá acesso tanto ao circuito regulador cognitivo do comportamento como ao afectivo. As experiências metacognitivas são, assim, manifestações da monitorização online da cognição resultantes da interacção entre a pessoa e a tarefa e compreendem sentimentos, julgamentos e conhecimento online específico sobre a tarefa (Efklides, 2001, 2006b). 105 A investigação da possibilidade de regulação através do circuito cognitivo tem-se centrado nas habilidades metacognitivas e no conhecimento metacognitivo (declarativo e processual). O desenvolvimento do processamento cognitivo (mais ou menos eficaz) numa determinada tarefa resulta da experiência metacognitiva do indivíduo. Durante um esforço cognitivo ocorrem julgamentos, vivenciam-se sentimentos e/ou emoções e recorre-se ao conhecimento específico sobre a tarefa. São exemplos de julgamentos/ estimativas a estimativa de esforço necessário para a realização da tarefa, a estimativa de tempo necessário e a estimativa da solução correta. O conhecimento online específico compreende as informações sobre a tarefa a ser executada (ideias/ pensamentos conscientes úteis para saber como lidar com a tarefa) e procedimentos utilizados no passado em tarefas semelhantes passíveis de serem aplicadas no presente. O conhecimento online específico é de natureza cognitiva e analítica, ao contrário dos sentimentos metacognitivos que compreendem, em simultâneo, um caracter cognitivo, mas também afectivo. O carácter afectivo das experiências metacognitivas pode ser explicado por circuitos de feedback (Carver, 2003; Carver & Scheier, 2011; Efklides, 2009) que avaliam o resultado do processamento cognitivo tendo em conta a discrepância face à meta estabelecida (maior distância entre a meta estabelecida e o resultado conduz a afecto negativo; maior a aproximação à meta conduz a afecto positivo ou satisfação). Numa situação de aprendizagem os estudantes podem experienciar sentimentos relacionados com as características da tarefa (sentimento de saber, sentimento de familiaridade e sentimento de dificuldade) ou relacionados com o resultado do processamento (sentimento de satisfação e sentimento de confiança). Estes sentimentos são denominados de sentimentos metacognitivos (Efklides & Violet, 2005) porque estão presentes na cognição e resultam de uma função de monitorização que informa a pessoa acerca da necessidade de tomar decisões de controlo ao invés de a conduzir à acção directa. Assim, os sentimentos metacognitivos funcionam como sinalizadores que podem ser interpretados pelo estudante permitindo-lhe tomar decisões de controlo (estratégias cognitivas e metacognitivas) ou decisões que determinem o início ou o evitamento da tarefa e, dessa forma, autorregular o seu processo de aprendizagem, tanto a curto como a longo-prazo (Efklides, 2009). O sentimento de dificuldade que induz, por norma, a interrupção do processamento cognitivo, está associado ao afecto negativo enquanto o sentimento de familiaridade, se associa ao afecto positivo (Efklides & Petkaki, 2005). O sentimento de confiança está relacionado com o resultado do processamento como o sentimento de satisfação, mas distingue-se deste, porque se baseia em informações da estimativa de solução correcta. O sentimento de dificuldade está relacionado com a fluência do processamento, ou seja, a forma como a solução/resposta foi produzida, 106 fluentemente ou com interrupções. A estimativa de solução correcta é baseada em conhecimento metacognitivo e está associada ao afecto negativo (Efklides & Petkaki, 2005) que implica pensamento crítico e analítico (Brown, 1987, 2000; Kuhl, 2011). O sentimento de confiança é afectado pela estimativa de solução correcta e pelo sentimento de dificuldade, enquanto o sentimento de satisfação está relacionado com o sentimento de confiança. Em pessoas com características de personalidade perfeccionistas, o resultado do processamento cognitivo, embora possa ser correcto, é sempre discrepante da meta estabelecida. Os sentimentos metacognitivos não são analíticos, geralmente são momentâneos, transitórios e podem passar despercebidos, mas quando são demasiado intensos o indivíduo toma consciência da sua presença, o que dá origem a processos conscientes analíticos, tendo implicações no processamento cognitivo, na necessidade de acção e de regulação do comportamento (Efklides, 2009, 2011, 2014). Assim, o aluno a fim de dar sentido aos seus sentimentos metacognitivos, recorre ao seu conhecimento metacognitivo sobre pessoas e tarefas e/ou realiza atribuições causais sobre a sua fonte, sendo esta situação particularmente evidente no sentimento de dificuldade. Quando o aluno sente dificuldade muitas vezes não consegue identificar facilmente a causa, emergindo dúvidas sobre se esta é devida a falta de compreensão sobre a tarefa, falta de conhecimento declarativo/processual prévio, etc. Nestes casos, existe uma interrupção do processamento ou falta fluência no processamento o que dá origem ao afecto desagradável/negativo traduzido em sentimento de dificuldade (Efklides, 2002; 2006b; 2008; 2009). Tomar consciência deste sentimento conduz à necessidade de aumentar o esforço tendo em vista restabelecer o processamento, razão pela qual o sentimento de dificuldade e a estimativa de esforço se correlacionam tão significativamente. Em situações mais extremas o sentimento de dificuldade pode ser tão intenso que pode levar ao abandono da tarefa. Se a tarefa for familiar e o processamento for executado sem quaisquer problemas ou interrupções a pessoa experiencia afecto positivo ou nenhum sentimento de dificuldade (Efklides & Petkaki, 2005). As experiências metacognitivas fornecem dados que activam as habilidades metacognitivas e que permitem controlar a acção e o comportamento. O sentimento de dificuldade pode ser atribuído, por exemplo, à complexidade da tarefa, à exigência ou à falta de competência pessoal para lidar com essa tarefa. Caso a atribuição causal corresponda à complexidade da tarefa, o estudante tende a procurar obter estratégias metacognitivas com o objectivo de prosseguir com o processamento. Assim, os sentimentos metacognitivos informam sobre a capacidade de a pessoa realizar com sucesso uma determinada tarefa. Metallidou e Efklides (2001) demonstraram que as experiências metacognitivas anteveem as atribuições causais 107 feitas pelos alunos após a resolução de problemas verificando que o sentimento de confiança conduziu a atribuições de capacidade/competência, enquanto o sentimento de dificuldade conduziu a atribuições relacionadas com falta de competência e com a dificuldade da tarefa. Efklides (2009, 2011) associa os sentimentos à metacognição por considerar que estes são resultantes de processos de monitorização que informam a pessoa sobre a necessidade de controlar decisões (mais do que conduzir à acção como acontece com as emoções). Os sentimentos metacognitivos possuem características específicas, nomeadamente na conexão com os loops regulatórios cognitivo e afectivo (Efklides, 2006) e a sua função é informar a pessoa sobre as características do processamento cognitivo no decurso da experiência de aprendizagem (Efklides, 2008). Os sentimentos metacognitivos, tal como os julgamentos metacognitivos, são produtos de processos inferenciais não analíticos que informam a pessoa acerca das características do processamento cognitivo, do resultado do processamento, bem como do progresso que a pessoa está a fazer relativamente aos seus próprios objectivos (Efklides, 2008). Emergem, de um modo geral, quando existem condições que não permitem análises completas da situação, tais como a pressão de tempo ou falta de acesso à informação na memória ou sob condições de incerteza (Efklides, 2006). O estudo das emoções e dos sentimentos académicos poderá agora contribuir para a compreensão do constructo de motivação em contexto académico (presença ou ausência). A motivação, neste contexto, é considerada como um estado interior que dirige e instiga o comportamento de forma persistente e enérgica (Isaac & Behar-Horenstein, 2006), como um processo no qual o comportamento dirigido para os objectivos é instigado e mantido (Pintrich & Schunk, 2002), ou ainda, como qualquer factor interno que inicia (activação), dirige (direcção) e sustenta (manutenção ou persistência) uma determinada conduta até à consecução de um determinado objectivo (Barros de Oliveira, 2010). Importa então averiguar se o estado interior, o processo ou qualquer factor interno a que se referem os autores pode resultar do despoletar de emoções ou sentimentos desencadeados nas experiências de aprendizagem e compreender, também, em contexto de realização académica, o porquê de alguns estudantes completarem as tarefas apesar das acentuadas dificuldades enquanto outros desistem face ao menor obstáculo. Para Eflkides (2005, 2006a, 2006b, 2009, 2011), os sentimentos metacognitivos assim como outras experiências metacognitivas (julgamentos e conhecimentos), influenciam e interferem com o autoconceito e a auto-estima do aluno (incluindo crenças de auto-eficácia). Com base no seu autoconceito o estudante constrói expetativas sobre a sua capacidade de lidar com as exigências de novas situações de aprendizagem, constrói a sua própria teoria de aprendizagem 108 pessoal (baseada nas suas experiências metacognitivas anteriores, nos conhecimentos formados nas várias situações de aprendizagem e sobre os resultados das mesmas) e, a partir das dificuldades enfrentadas, elabora as atribuições causais para o sucesso e o fracasso que, ao longo do tempo, vão sendo interiorizadas. Ao mesmo tempo vai construindo, também, representações sobre determinados domínios de aprendizagem (como a matemática) a partir de experiências de aprendizagem anteriores e que ficam guardadas na memória como o que sentiu, como pensou, como resolveu os problemas, se falhou ou obteve sucesso, etc. Estas vivências são principalmente afectivas e estas memórias afectivas guardadas são activadas mediante uma nova tarefa quando esta requer decisões de controlo. Por exemplo, um estudante baseado na sua experiência metacognitiva, acredita que não possui competência num determinado domínio de aprendizagem (atribuição causal de competência) e quando se depara com uma tarefa que pertence a esse domínio, mesmo antes de iniciar o processamento da tarefa, vai experienciar afecto negativo e formar baixas expetativas de sucesso. Como consequência, a tendência é eventualmente evitar a tarefa ou procurar ajuda constantemente, tornando-se socialmente dependente e pouco autónomo, sendo incapaz de mobilizar o esforço necessário a que se associa bloqueio em termos de disponibilidade cognitiva e afectiva, o que dificulta a possibilidade de se autorregular metacognitivamente (Eflkides, 2011). Sendo o bem-estar dos estudantes um dos objetivos da educação, também no ensino superior, nível em que se requer mais a autorregulação do que co-regulação (esta mais presente em níveis de ensino anteriores) é importante ter em conta o impacto das experiências metacognitivas para uma aprendizagem de sucesso uma vez que estas têm associadas aspectos fundamentais como a monitorização e o controlo (Efklides, 2008; Efklides & Misailidi, 2010) embora a precisão da monitorização dos nossos próprios estados de conhecimento não deva ser tomado como algo garantido. Ppor exemplo, o excesso de confiança em situações em que não existe consciência sobre o nível de conhecimento ou competências pode levar à diminuição do esforço necessário para completar uma tarefa com sucesso. Referências Adolphs, R. (2017). How should neuroscience study emotions? by distinguishing emotion states, concepts, and experiences. Social Cognitive and Affective Neuroscience,12. Ainley, M., Corrigan, M., & Richardson, N. (2005). Students, tasks and emotions: Identifying the contribution of emotions to students' reading of popular culture and popular science texts. Learning and Instruction, 15, 433-447. doi:10.1016/j.learninstruc.2005.07.011 109 Ahmed, W.; Werf, G.; Minnaert, A. & Kuyper, H. (2010). Students daily emotions in the classroom: Intra-individual variability and appraisal correlates. British journal of Educational Psychology, 80, 583-597. Asikainen, H.; Hailikari, T. & Mattsson, M. (2018). The interplay between academic emotions, psychological flexibility and self-regulation as predictors of academic achievement. Journal of Further and Higher Education, 42:4, 439-453, DOI:10.1080/0309877X.2017.1281889 Barros de Oliveira, J. (2010). Psicologia da Educação: Aprendizagem-Aluno. Legis, Livpsic. Barros, A. & Simão, A. M. V. (2018). Attributions to academic achievements in the transition to higher education. Current Psychology (2018) 37:216–224. DOI 10.1007/s12144-0169505-4. Bernardo, A. B. I.; Ouano, J. A. & Salanga, M. G. C. (2009). What is an Academic Emotion? Insights from Filipino Bilingual Students’ Emotion Words Associated with Learning. Psychological Studies 54, 28–37. Beard, C., Humberstone, B., & Clayton, B. (2014). Positive emotions: Passionate scholarship and student transformation. Teaching in Higher Education, 19, 630-643. doi:10.1080/13562517.2014.901950 Bieg, M.; Goetz, T. & Hubbard, K. (2013). Can I master it and does it matter? An intraindividual analysis on control–value antecedents of trait and state academic emotions. Learning and Individual Differences, 28, 102–108. Brown, A. L. (1987). Metacognition, executive control, self-regulation, and other more mysterious mechanisms. In F. E. Weinert & R. H. Kluwe (Eds.), Metacognition, motivation, and understanding (65-116). Hillsdale, New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates. Brown, R. B. (2000). Contemplating the emotional component of learning: The emotions and feelings involved when undertaking an MBA. Management Learning, 31 (3), 275-293. Butz, N. T.; Stupnisky, R. H.; Pekrun, R.; Jensen, J. L. & Harsell, D. M. (2016). The impact of emotions on student achievement in synchronous hybrid business and public administration programs: A longitudinal test of Control-Value Theory. Decision Sciences Journal of Innovative Education, 14, 4. Carver, C. S. (2003). Pleasure as a sign you can attend to something else: Placing positive feelings within a general model of affect. Cognition and Emotion, 17, 241-261. doi:10.1080/02699930302294 Carver, C. S., & Scheier, M. F. (2011). Self-regulation of action and affect. In K. D. Vohs, & R. F. Baumeister (Eds.), Handbook of self-regulation: Research, theory, and applications (2nd ed., pp. 3-21). New York, NY: Guilford. Chaleta, E. (2003). Abordagens ao estudo e estratégias de aprendizagem no ensino superior. Tese de Doutoramento (não publicada). Évora: Universidade de Évora. 110 Chaleta, E. (2011). Promoção do sucesso académico no Ensino Superior – Projecto GPSA. Educação-Temas e Problemas, 9, 67-78 (ISSN 1646- 2831). Chaleta, E. (2013). Emoções e sentimentos nas experiências de aprendizagem no Ensino Superior – IESEA (pp. 103-116). In I. Fialho & J. Verdasca (Orgs). TurmaMais e Sucesso Escolar- Trajectórias para uma nova cultura da escola. Lisboa: Edições Colibri. Chaleta, E. (2014). Experiência no curso – contributo para a qualidade do ensino superior português. Educação em Questão, 48(34), 65-85. Chaleta, E. (2017). Inventário de Emoções e Sentimentos nas Experiências de Aprendizagem – IESEA (pp. 59-69). In L. S. Almeida; M. R. Simões; & M. M. Gonçalves (Coords). Adaptação, Desenvolvimento e Sucesso Académico dos Estudantes do Ensino Superior: Instrumentos de avaliação. Psicologia e Educação, 4. Braga: ADIPSIEDUC. Chaleta, E.; Grácio, L.; Veiga Simão, A.; Ramalho, G.; Rosário, P.; Saraiva, M.; Sebastião, L.; Leal, F. & Silva, J. (2013). Orquestrar o aprender no ensino superior - Concepções, abordagens e experiência no curso (pp. 11-28). In E. Chaleta (Org). Orquestração da aprendizagem no Ensino Superior. Mangualde: Pedago. Chiang, W. & Liu, C. (2014). Escala de emoção académica em educação científica: desenvolvimento e validação. International Journal of Science Education, 36(6), 908928, DOI: 10.1080 / 09500693.2013.830233. Cubukcu, F. (2013). The significance of teachers’ academic emotions. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 70, 649-653. Damásio, A. (1996). O erro de Descartes - emoção, razão e cérebro humano. Mem Martins: Europa-América. Efklides, A. (2001). Metacognitive experiences in problem solving: Metacognition, motivation, and self-regulation. In A. Efklides, J. Kuhl, & R.M. Sorrentino (Eds.), Trends and prospects in motivation research (pp. 297–323). Dordrecht, The Netherlands: Kluwer. Efklides, A. (2002). The systemic nature of metacognitive experiences: Feelings, judgments, and their interrelations. In M. Izaute, P. Chambres, & P.-J. Marescaux (Eds.), Metacognition: Process, function, and use (pp. 19–34). Dordrecht, The Netherlands: Kluwer. Efklides, A. (2005). Motivation and affect in the regulation of behavior [Special section]. European Psychologist, 10 (3). Efklides, A. (2006a). Metacognition and affect: what can metacognitive experiences tell us about the learning process? Educational Research Review. 1, 3-14. Efklides, A. (2006b). Metacognitive experiences: the missing link in the self-regulated learning process. A rejoinder to Ainley and Patrick. Educational Psychology Revue, 18, 287-291. 111 Efklides, A. (2008). Metacognitive experiences, affect, and students’ well-being at school. Paper presented at the Symposium “Children’s Wellbeing in School Environments” in honor of the jubilee year (100th Year Aniversary) of the Finish Academy of Science and Letters (February). University of Jyväskylä, Finland. Efklides, A. (2009). The role of metacognitive experiences in the learning process. Psicothema, 21 (1), 76–82. (Retrieved from http://www.ncbi.nlm.nih.gov/ pubmed/ 19178860). Efklides, A. (2011). Interactions of metacognition with motivation and affect in self-regulated learning: The MASRL Model. Educational Psychologist, 6(1), 6–25. Efklides, A. (2014). How does metacognition contribute to the regulation of learning? An integrative approach. Psychological Topics, 23, 1-30. Retrieved from http://hrcak.srce.hr/psihologijske-teme. Efklides, A., & Petkaki, C. (2005). Effects of mood on students’ metacognitive experiences. Learning and Instruction, 15, 415–431. Efklides A., Misailidi P. (2010) Introduction: the present and the future in metacognition. In: Efklides A., Misailidi P. (eds) Trends and Prospects in Metacognition Research. Boston: Springer. Efklides, A., & Violet, S. (2005). Feelings and emotions in the learning process [Special issue]. Learning and Instruction, 15, 377-380. Entwistle, N. (2015). Handbook of educational ideas and practices (Ed). New York: Routledge. Entwistle, N. & Marton, F. (1989). Introduction. The psychology of student learning. European Journal of Psychology of Education, IV(4), 449-452. Fonseca, V. (2016). Importância das emoções na aprendizagem: uma abordagem neuropsicopedagógica. Revista Psicopedagogia, 33(102), 365-384. Frenzel, A., Pekrun, R., & Goetz, T. (2007). Girls and mathematics - a “hopeless” issue? A control-value approach to gender differences in emotions towards mathematics. European Journal of Psychology of Education, 22, 497-514. Frijda, N. H. (1998). The laws of emotion. American Psychologist, 3, 5, 349-358. Goetz, T., Pekrun, R., Hall, N. & Haag, L. (2006). Academic emotions from a socialcognitive perspective: Antecedents and domain specificity of students’ affect in the context of Latin instruction. British Journal of Educational Psychology, 76, 289–308. Goetz, T., Frenzel, A. C., Pekrun, R. & Hall, N. C. (2006). The domain specificity of academic emotional experiences. The Journal of Experimental Education. 75, 5-29. doi:10.3200/jexe.75.1.5-29 Goetz, T., Preckel, F., Pekrun, R., & Hall, N. (2007). Emotional experiences during test taking: does cognitive ability make a difference? Learning and Individual Differences, 17, 3-16. 112 Goetz, T., Frenzel, A. C., Pekrun, R., Hall, N. C., & Lüdtke, O. (2007). Between-and withindomain relations of students’ academic emotions. Journal of Educational Psychology, 99, 715-733. doi:10.1037/0022-0663.99.4.715 Goetz, T., Sticca, F., Pekrun, R., Murayama, K., & Elliot, A. J. (2016). Intraindividual relations between achievement goals and discrete achievement emotions: An experience sampling approach. Learning and Instruction, 41, 115-125. doi: 10.1177/095679761348698 Goetz, T.; Ludtke, O.; Nett, U. E.; Keller, M. M. & Lipnevich, A. A. (2013). Characteristics of teaching and students’ emotions in the classroom: Investigating differences across domains. Contemporary Educational Psychology 38, 383–394. Goetz, T.; Nett, U. E.; Martiny, S. E.; Hall, N. C.; Pekrun, R.; Dettmers, S. & Trautwein, U. (2012). Students' emotions during homework: Structures, self-concept antecedents and achievement outcomes. Learning and Individual Differences 22 (2012) 225–234. Goetz, T.; Pekrun, R.; Hall, N.; Haag, L. (2006). Academic emotions from a social-cognitive perspective: Antecedents and domain specificity of students’ affect in the context of Latin instruction. British Journal of Educational Psychology, 76, 289–308, The British Psychological Society. Goleman, D. (1997). Inteligência emocional. Portugal: Temas e Debates. Goleman, D. (2001). Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva. Harley, J., Pekrun, R., Taxer, J. & Gross, J. (2019). Emotion regulation in achievement situations: an integrated model. Educational Psychologist, 54(2), 106-126. Hattie, J. & Yates, G. (2014). Visible Learning and the Science of how we Learn. UK, Routledge. Immordino-Yang, M. H. & Damásio, A. (2007). We feel, therefore we Learn: the relevance of affective and social neuroscience to education. Mind, Brain, and Education, 1, 3-10. Isaac, C. A., & Behar-Horenstein L. S. (2006). Motivation. In S. Feinstein (ed), The Prager Encyclopaedia of Brain and Learning, 308-314. King, R. &. Gaerlan, M. (2014). High self-control predicts more positive emotions, better engagement, and higher achievement in school. European Journal of Psychology of Education 29:81–100. DOI 10.1007/s10212-013-0188-z Kollontai, P. (2015). Emotional intelligence in higher education: using a rt in a philosophical discussion on God, evil and suffering. Research in Education, 93. http://dx.doi.org/10.7227/RIE.0012. Kuhl, J. (2011). Adaptive and maladaptive pathways of self-development: mental health and interactions among personality systems. Psychologia Rozwojowa, 16(4), 9-31. DOI 10.4467/20843879PR.11.021.0194 113 Linnenbrink-Garcia, L., & Pekrun, R. (2011). Students’ emotions and academic engagement [Special issue]. Contemporary Educational Psychology, 36 (1). Meinhardt, J., & Pekrun, R. (2003). Attentional resource allocation to emotional events: An ERP study. Cognition and Emotion, 17(3), 477-500. Metallidou, P., & Efklides, A. (2001). The effects of general success-related beliefs and specific metacognitive experiences on causal attributions. In A. Efklides, J. Kuhl & R. M. Sorrentino (Eds.), Trends and prospects in motivation research (pp. 325-347). Dordrecht, The Netherlands: Kluwer. Meyer, D. K., & Turner, J. C. (2002). Discovering emotion in classroom motivation research. Educational Psychologist, 37, 107-114. Peixoto, F.; Mata, L.; Monteiro, V.; Sanches, C. & Pekrun, R. (2015). The achievement emotions questionnaire: validation for pre-adolescent students. European Journal of Developmental Psychology, 12 (4), 472-481. Pekrun, R. (1992a). The expectancy-value theory of anxiety: Overview and implications. In D. G. Forgays, T. Sosnowski & K. Wrzesniewski (Eds.), Anxiety: Recent developments in self-appraisal, psychophysiological and health research (pp. 23–41). Washington, DC: Hemisphere. Pekrun, R. (1992b). The impact of emotions on learning and achievement: Towards a theory of cognitive/motivational mediators. Applied Psychology: An International Review, 41, 359–376. Pekrun, R. (2000). A social cognitive, control-value theory of achievement emotions. In J. Heckhausen (Ed.), Motivational psychology of human development. Oxford, UK: Elsevier. Pekrun, R. (2005). Progress and open problems in educational emotion research. Learning and Instruction, 15, 497–506. Pekrun, R. (2006). The control–value theory of achievement emotions: Assumptions, corollaries, and implications for educational research and practice. Educational Psychology Review, 18, 315-34. doi:10.1007/ s10648-006-9029-9. Pekrun, R. (2009). Global and local perspectives on human affect: Implications of the control value theory of achievement emotions. In M. Wosnitza, S. A. Karabenick, A. Efklides, & P. Nenninger (Eds.), Contemporary motivation research: From global to local perspectives (pp. 97-115). Cambridge, MA: Hogrefe. Pekrun, R. (2014). Emotions and Learning. International Academy of Education. Educational Practices Series, 24. Pekrun, R. (2016). Academic emotions. In. K. R. Wentzel, & D. B. Miele (Eds.), Handbook of motivation at school (2nd ed., pp. 120-144). New York, NY: Routledge. Pekrun, R. (2018). Control-value theory: A social-cognitive approach to achievement emotions. InG.A.D.Liem, & D. M. McInerney (Eds.), Big theories revisited 2: A 114 volume of research on sociocultural influences on motivation and learning (pp. 162– 190). Charlotte, NC: Information Age. Pekrun, R., & Stephens, E. J. (2009). Goals, emotions, and emotion regulation: Perspectives of the control-value theory of achievement emotions. Human Development, 52, 357365. doi:10.1159/000242349 Pekrun, R., Frenzel, A. C., Goetz, T., & Perry, R. P. (2007). The control-value theory of achievement emotions: An integrative approach to emotions in education. In P. A. Schutz, & R. Pekrun (Eds.), Emotion in education (pp. 13–36). San Diego: Academic Press. https:// doi.org/10.1016/B978-012372545-5/50003-4. Pekrun, R., Elliot, A. J., & Maier, M. A. (2006). Achievement goals and discrete achievement emotions: A theoretical model and prospective test. Journal of Educational Psychology, 98(3), 583–597. https://doi.org/10.1037/0022-0663.98.3.583 Pekrun, R., Goetz, T., Daniels, L. M., Stupnisky, R. H., & Perry, R. P. (2010). Boredom in achievement settings: Exploring control-value antecedents and performance outcomes of a neglected emotion. Journal of Educational Psychology, 102, 531–549. Pekrun, R., Goetz, T., Frenzel, A., Barchfeld, P., Perry R. (2011). Measuring emotions in students’ learning and performance: The Achievement. Emotions Questionnaire (AEQ). Contemporary Educational Psychology, 36, 36-48. Pekrun, R., Goetz, T., Titz, W., & Perry, R. (2002). Academic emotions in students’ selfregulated learning and achievement: a program of qualitative and quantitative research. Educational Psychologist, 37 (2), 91-105. Pekrun, R., Goetz, T., Perry, R. P., Kramer, K., Hochstadt, M., & Molfenter, S. (2004). Beyond test anxiety: Development and validation of the Test Emotions Questionnaire (TEQ). Anxiety, Stress, & Coping, 17, 287-316. doi:10.1080/10615800412331303847 Perry, R. P. (1991). Perceived control in college students: implications for instruction in higher education. In Higher Education: Handbook of Theory and Research, Vol. 7, ed J. Smart (New York, NY: Agathon), 1–56. Perry, R. P., & Magnusson, J.-L. (1987). Effective teaching and students’ perceptions of control in the college classroom: Multiple lectures effects. Journal of Educational Psychology, 79, 453-460. Pintrich, P. R., & Schunk, D. H. (2002). Motivation in education theory, research, and applications (2nd ed.). Upper Saddle River, NJ Prentice Hall. Rachman, S. (1981). The primacy of affect: Some theoretical implications. Behaviour Research and Therapy, 19(4), 279–290. https://doi.org/10.1016/0005-7967(81)90048-6 Tyng, C. M.; Amin, H. U.; Saad, M. N. M.; Malik; A. S. (2017). The influences of emotion on learning and memory. Frontiers in Psychology. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01454 Zabalza, M. (2004). O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed. 115 Zeidner, M. (2007). Test anxiety in educational contexts: concepts, findings, and future directions. In P. A. Schutz, & R. Pekrun (Eds.), Emotion in Education (pp. 165-184). Boston, MA: Elsevier Academic Press. http://dx.doi.org/10.1016/B978-0123725455/50011-3 Zhou, M. (2016). University students' emotion during online search task: a multiple achievement goal perspective. The Journal of Psychology, 150:5, 576-590, DOI:10.1080/00223980.2016.1143797. 116 6. PENSAR E LIDAR COM OS PENSAMENTOS ACADÉMICOS: A EXPERIÊNCIA DE ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR Fátima Leal 14 Resumo Os processos de estudo e de aprendizagem envolvem dimensões comportamentais, afetivas, motivacionais, cognitivas, metacognitivas e regulatórias. Os pensamentos académicos referem-se aos conteúdos dos pensamentos dos estudantes que emergem durante o seu processo de estudo (Leal, 2017). Este trabalho visa: identificar pensamentos académicos dos estudantes emergentes durante o seu processo de estudo e identificar as estratégias que os estudantes utilizam para lidar com esses pensamentos. Participaram 48 estudantes, rapazes e raparigas, com idades entre os 18 e os 25. A metodologia qualitativa foi privilegiada. A recolha de dados foi obtida através de entrevistas semi-estruturadas e os dados tratados através de análise temática categorial. Os resultados reportam-se a dois grandes temas: pensamentos durante o estudo e estratégias para lidar com os pensamentos. Relativamente à identificação de pensamentos durante o processo de estudo emergiram três categorias: pensamentos centrados na tarefa, pensamentos distratores e pensamentos centrados na pessoa. No que concerne à identificação de estratégias para lidar com os pensamentos durante o processo de estudo emergiram três grandes categorias: perceção avaliativa global, respostas afetivas e mobilização de estratégias para lidar com o que pensa. Conclui-se acerca da necessidade de colocar os estudantes a refletirem sobre estes aspetos cognitivos e regulatórios. Por fim, deixam-se sugestões de intervenção prática para os vários intervenientes no contexto de ensino superior. Palavras-chave: Pensamentos académicos. Estratégias de regulação. Estudo e Aprendizagem. Estudantes. Ensino Superior. 14 Investigadora no Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de Évora, no âmbito do projeto PTDC/CED-EDG/29252/2017, projeto financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P. 117 Introdução Ao longo do tempo, inúmeros autores têm estudado a aprendizagem, evidenciando a relevância da interação entre processos cognitivos e metacognitivos (e.g., Beber, Silva & Bonfiglio, 2014; Boyle, Duffy & Dunleavy, 2003; Trigwell & Ashwin, 2006; Vermunt, 2005). Enquanto a metacognição se prende com o conhecimento e experiência acerca dos processos cognitivos (Kelly & Donaldson, 2016), a cognição envolve processos cognitivos e também pensamentos que ajudam na aquisição e na integração da informação com os conhecimentos prévios, assim como, na recuperação da informação disponível (Pintrich, 2000; Ersözlü, 2010). Os processos cognitivos são atividades cerebrais que, através da transformação, transporte, redução, coordenação, recuperação e utilização das informações, possibilitam uma representação mental do mundo. São formas de processar a informação e acontecem quando a pessoa perceciona, lembra, pensa, adquire, recupera e ou transforma informação (Brandimonte, Bruno & Collina, 2006). A componente cognitiva é responsável pelo pensamento e, no âmbito da aprendizagem, leva aos resultados de aprendizagem, ao aumento do conhecimento, da compreensão e da aquisição de competências (Oosterheert & Vermunt, 2001). O pensamento pode ser visto como o conteúdo da atividade inteletual do indivíduo. De forma sequencial um pensamento leva a outro pensamento (Ericsson & Crutcher, 1991); ou seja, o pensamento pode ser representado como uma sequência de ideias (estados cognitivos relativamente estáveis) intercaladas por períodos de atividade de processamento (Ericsson & Simon, 1998). McGuinness (1999) apresenta uma lista de processos abrangidos pelo pensamento: sequenciar e ordenar informação; selecionar, classificar e agrupar; comparar e contrastar; predizer e hipotetizar; retirar conclusões; distinguir fatos e opiniões; enviesamentos e confiabilidade; gerar ideias e brainstorming; atribuir causas e efeitos; definir e clarificar problemas; encontrar soluções; delinear objetivos; testar soluções, avaliar resultados; planear e monitorizar; tomar decisões; definir prioridades; distinguir prós e contras e refletir sobre o próprio pensamento. Vários têm sido os autores que, ao longo dos anos, têm estudado o pensamento e encontrado diversas categorias e terminologias específicas (e.g. Bruner, 1975; Guilford, 1940; 1980). Paul e Elder (2007) referem o pensamento crítico descrevendo-o como a arte de analisar e de avaliar o pensamento, pressupondo o conhecimento das suas estruturas básicas e intelectuais, de forma a melhorá-lo. Pintrich e García (1993) consideram que este pode ser uma forma cognitiva que leva os estudantes a pensar reflexiva, profunda e criticamente sobre 118 os conteúdos de estudo. Estimular o pensamento crítico dos estudantes pressupõe a promoção da sua capacidade para questionar, desafiando os quadros explicativos vigentes, reconhecendo a importância das questões e da sua compreensão, observando e detetando as problemáticas atuais e futuras, procurando soluções para os obstáculos, justificando e argumentando as suas ideias (Brockbank & McGill, 1998; Harvey & Knight, 1996; Turabik & Gün, 2016). Ericsson e Simon (1998) consideram que, na vida diária, o discurso dos sujeitos reflete apenas alguns dos aspetos dos seus pensamentos através da verbalização, sendo que, no entanto, a maior parte destes acaba por ser suprimida. Os autores distinguem o que se passa na mente dos indivíduos através do pensamento silencioso (silence thinking), a verbalização dos pensamentos (thinking aloud) e a descrição e a explicação dos seus próprios pensamentos. Para quem ouve ou transcreve, o thinking aloud revela-se incoerente e incompleto com apenas partes de informação desconetadas, por outro lado, a descrição e explicação dos pensamentos possibilita a analise e monitorização dos sujeitos ao seu próprio discurso. Isto permite que os indivíduos expliquem melhor as partes mais confusas do seu discurso, corrigindo-as quando necessário. Logicamente que a descrição e explicação do pensamento não reflete o pensamento espontâneo, contudo, revela-se uma verdadeira oportunidade para tornar o pensamento dos estudantes mais reflexivo e coerente. Beck, Robinson, Carroll e Apperly (2006) diferenciam pensamentos fatuais e contrafatuais. Os pensamentos contrafatuais são pensamentos que se prendem com a capacidade para criar alternativas aos acontecimentos fatuais e permitem reconhecer os fatores que, no passado, impossibilitaram o desempenho pretendido (e.g., se tivesse estudado mais, teria passado no exame). Estes pensamentos podem conduzir a consequências importantes para a realização das tarefas desde que sejam bem utilizados e orientados para objetivos, envolvendo intenções comportamentais e identificando ações retificativas (e.g. se o pensamento “se eu tivesse estudado mais, o exame teria corrido melhor” for seguido por outro como “para o próximo exame vou estudar mais” (Tyser, McCrea & Knüpfer, 2012). Os autores alertam que os pensamentos contrafatuais trazem vantagens quando os indivíduos procuram melhorar, mas que, pelo contrário, quando os sujeitos procuram se auto-proteger, estes pensamentos podem prejudicar servindo como justificação pelo fraco desempenho. Portanto, as consequências comportamentais destes pensamentos variam consoante a autoavaliação dos indivíduos. O desenvolvimento de competências do pensamento, particularmente no contexto do ensino formal tem sido uma preocupação constante (Rocha, 2011), contudo, são escassas as investigações que procuram conhecer os conteúdos dos pensamentos de estudantes 119 universitários durante os seus processos de estudo e de aprendizagem. Os pensamentos académicos (Leal, 2017) dizem respeito aos conteúdos dos pensamentos ligados às aprendizagens académicas dos estudantes, que emergem durante o seu processo de estudo e que vêm na sequência da resposta à questão “o que é que eu costumo pensar enquanto estou a estudar?”. São precisamente nestes pensamentos, assim como nas estratégias ativadas pelos estudantes para lidar com esses pensamentos, que este estudo se centra. Metodologia Como objetivos para esta investigação temos: 1) identificar pensamentos que emergem durante o processo de estudo dos estudantes e 2) identificar estratégias que os estudantes utilizam para lidar com o que pensam quando estão a estudar. Os dados foram recolhidos através de entrevista semi-estruturada. Para este estudo em específico, trazemos a análise das respostas às questões: “o que costumas pensar quando estás a estudar?” e “como é que lidas com o que pensas quando estás a estudar?” A amostra envolveu a participação voluntária de 48 jovens de ambos os sexos e com idades entre os 18 e os 25 anos, estudantes de licenciatura de uma instituição de ensino superior portuguesa. Após a apresentação dos objetivos do estudo, os participantes foram convidados a colaborar na investigação, assinaram o termo de consentimento informado e as entrevistas foram agendadas. Estas foram realizadas de forma individual e mediante anonimato. De forma a assegurar que todos os estudantes entrevistados tivessem tido oportunidade de estudar e aprender em contexto dentro e fora de sala de aula certificámo-nos de que, na altura de realização das entrevistas, todos os participantes, mesmo os do primeiro ano, já tinham experienciado o ensino superior durante um semestre letivo, já tinham sido submetidos a avaliação e já tinham tido conhecimento dos resultados obtidos. Para a análise e tratamento dos dados recorreu-se essencialmente a metodologia qualitativa - análise de conteúdo, respeitando as fases propostas por Bardin (2008). A análise realizada consistiu num processo de categorização baseada no critério semântico do discurso dos estudantes, considerando-se como unidades de significado, os elementos que representam uma ideia, uma situação e/ou conteúdos de informação que sejam compreensíveis por si mesmas (Schilling, 2006). Optámos por um processo de categorização com procedimentos abertos (Esteves, 2006) sendo que a lista de categorias emergiu da análise do discurso dos estudantes. 120 Respeitando normas de fiabilidade e de validade, foi constituído um painel de três investigadores que fizeram revisão da análise da codificação, resolvendo as situações de discrepância. O índice de fidelidade foi calculado através da equação total de casos de acordo dos vários codificadores a dividir pelo somatório dos casos de acordo com os casos de desacordo (Esteves, 2006). O nível de concordância final entre juízes, foi de 95%. Aplicámos estatística descritiva simples e realizámos a análise de frequências em função das unidades de sentido - segmentos de conteúdo que contêm uma ideia, episódio ou informação consideradas como unidade base (Schilling, 2006). Procedemos à contagem do número de vezes que cada elemento semântico expressivo de uma ideia distinta se encontrava presente no discurso dos sujeitos. Perante a repetição de uma unidade de sentido, esta foi considerada uma única vez. Resultados Os resultados estão dispostos de acordo com a categorização apresentada na grelha de análise temática categorial. Por uma questão de parcimónia e de espaço, neste trabalho serão apresentados apenas alguns exemplos de verbalizações mais significativas para melhor compreensão das experiências dos estudantes. Identificação de pensamentos durante o estudo Relativamente à identificação de pensamentos durante o processo de estudo (Tabela 1), emergiram três categorias que correspondem a três tipos de pensamentos: os pensamentos centrados na tarefa (académica) (N=44; 51.8%), os pensamentos distratores (N=28; 32.9%) e os pensamentos centrados na pessoa (N=13; 15.3%). 121 Tabela 1. Identificação de pensamentos: categorias, subcategorias. CATEGORIAS Pensamentos distratores SUBCATEGORIAS Gerais/divagações Decorrentes de aspetos motivacionais N 13 15 % 32.9 Pensamentos centrados na tarefa (académica) Orientados para a matéria Orientados para memorização Orientados para aplicação prática Orientados para procura de compreensão Orientados para a avaliação Orientados para resultados Pensamentos de controlo volitivo Controlo de pensamentos distratores Pensamentos decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo Pensamento de controlo/regulação ambiental Pensamentos de julgamento de realizações e inferências adaptativas 16 2 5 5 2 3 5 3 1 1 1 51.8 Pensamentos centrados na pessoa Pensamentos centrados em ganhos Pensamentos centrados no Futuro académico/ profissional 4 7 15.3 Pensamentos de cariz emocional negativo 2 Pensamentos ligados a motivações concorrenciais Dúvidas/Valor do estudo 85 100 A primeira categoria refere-se aos pensamentos distratores e inclui verbalizações dos estudantes relativas a pensamentos perturbadores do seu estudo. Emergiram duas subcategorias: os pensamentos decorrentes de aspetos motivacionais e os pensamentos gerais/divagações. Os pensamentos gerais/divagações reportam-se a verbalizações relativas a pensamentos dos estudantes que, de uma forma geral e não especificada, surgem durante o estudo e dificultam a tarefa. “É coisas aleatórias...às vezes é coisas do meu dia a dia (…)” (S.48) “penso no dia que está lá fora, penso nas coisas que eu poderia estar a fazer, na mosca a passar” (S.1) A continuidade prolongada no tempo de estudo e a antecedência relativamente à data de avaliação são vistos, pelos estudantes, como fatores de dispersão dos pensamentos. “…às vezes quando já estou há muito tempo a estudar… já começo a divagar um bocadinho” (S.40) “(…) se estiver com imenso tempo de antecedência estou a pensar noutras coisas, no que é que vou fazer … se vou sair à noite, o que é que vou vestir amanhã, ou coisas assim” (S.29) A verbalização de um estudante chama a atenção para o fato dos seus pensamentos dependerem daquilo que está a sentir naquele momento. 122 “muitas vezes isso também vai derivar…depender do que estou a sentir no momento... por exemplo se tiver com algum problema de relacionamento com a minha namorada ou com os meus familiares... isso vai afectar...eu começo a pensar nisso (…) quando estou a estudar...penso muitas vezes na minha família... e...em tudo...eu sei lá eu penso em tudo eu penso um pouco em tudo...” (S.21) A verbalização de um outro estudante explicita a ideia de que pensar sobre vários assuntos, os seus próprios sentimentos, o seu percurso, as suas dificuldades e sobre aquilo que está a estudar torna-se algo estruturante e coadjuvante do estudo pois permite-lhe criar relações entre conhecimentos e atribuir significado ao seu próprio pensamento. “Costumo pensar sobre tudo… divagar… porque penso que se divagar, consigo encontrar, consigo talvez construir uma teia de conhecimento (…) eu costumo pensar muitas vezes e rever-me nos sentimentos e fazer “introspecções” analisar os sentimentos que que vou encontrando e as dificuldades, por isso, isto do “pensar”, pelo menos para mim não é assim tão estranho (…)pelo menos para mim costuma ser bom porque apesar de me perder, depois às tantas vou procurar o sentido daquilo tudo que pensei… “porque é que eu fiz aquele trajeto?” e pensar também que “para que é que serve a qui lo q ue estou a fazer...?” porque é que estou a pensar o que estou a pensar, porque é que estou a pensar sobre aquilo que estou a trabalhar, estou a ler sobre” (S.34) Os pensamentos ligados a motivações concorrenciais prendem-se com ideias que se revelam distratoras para com a tarefa de estudo e que advêm de aspetos motivacionais e com a vontade de procurar atividades alternativas ao estudo. Este tipo de pensamento decorre frequentemente do fato dos estudantes referirem que não gostam da matéria. “a minha cabeça começa a dispersar… começo a pensar em coisas, o que é que podia estar a fazer e não estar a fazer” (S.9) “(…) se não estou a gostar, começo a pensar “ai se estivesse a estudar a outra que eu gosto tanto era tão mais fácil…eu se calhar já tinha isto despachado” (S.40) As dúvidas/valor do estudo referem-se aos pensamentos de incerteza acerca da maisvalia e da utilidade desta atividade e emergem de situações como não conseguir estabelecer relação entre as matérias com o seu futuro profissional. “se eu não conseguir fazer essa ligação entre o que estou a aprender e a minha futura vida profissional, então penso “para que é que me estão a ensinar isto? qual o objetivo?” (S. 46) Relativamente à segunda categoria, pensamentos centrados na tarefa (académica), emergiram onze subcategorias que correspondem a vários tipos de pensamentos: orientados para a matéria, orientados para memorização, orientados para aplicação prática, orientados para procura de compreensão, orientados para a avaliação, orientados para resultados, pensamentos de controlo volitivo, controlo de pensamentos distratores, pensamentos decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo, pensamento de controlo/regulação ambiental e pensamentos de julgamento de realizações e inferências adaptativas. 123 Os pensamentos orientados para a matéria são focados nos conteúdos de estudo de uma forma específica. Este foco pode acontecer por ser uma caraterística natural dos estudantes, a de não se distraírem com outros pensamentos no momento do estudo; mas, para outros estudantes, parece haver necessidade de uma ação intencional no afastamento de pensamentos concorrenciais para conseguirem atingir essa focalização na tarefa. “O que é que eu costumo pensar (…) tento abstrair-me ao máximo das coisas do dia-a-dia e tentar só mesmo dedicar-me ao estudo” (S.8) “eu tento pensar naquilo que estou a estudar … e nos conteúdos e nos conhecimentos que tenho que adquirir” (S.28) Outros estudantes especificam que se focam na matéria quando se sentem bem consigo mesmos e quando gostam, têm interesse e reconhecem importância nesses conteúdos. “Quando gosto do que estou a estudar, estou só a pensar nisso...” (S.7) “Quando estou bem, estou mesmo concentrada, estou mesmo a pensar naquilo na matéria” (S.26) Destacamos duas verbalizações de estudantes que afirmam não pensar em nada e que, por estarem focados, só “pensam” na matéria, levando-nos a refletir acerca da possível falta de consciência por parte dos estudantes sobre os conteúdos do seu próprio pensamento. “O que costumo pensar? Eu não costumo pensar em nada! Estou a estudar e foco-me na matéria e pronto!” (S.19) Os pensamentos orientados para aplicação prática referem-se a pensamentos específicos para a aplicação da matéria de estudo, relativamente a onde usá-la e a como utilizá-la. “penso “onde é que eu posso utilizar isto?” ou seja… muito a aplicação prática das matérias” (S. 46) “(…) eu gosto de pensar em casos práticos (…) um exemplo do quotidiano para perceber porque é que as coisas acontecem... (…) para ser mais fácil complementar as duas coisas a prática e a teoria” (S.25) “penso muitas vezes …se eu tiver a estudar e se eu não encontrar um exemplo para aplicar essa matéria em específico ou essa cadeira depois torna-se mais complicado pensar muito nisso em vez de estar concentrado, começo a divagar para o resto” (S.44) Os pensamentos orientados para a procura de compreensão dirigem-se para um entendimento profundo dos conteúdos. Esta procura de compreensão conduz os estudantes à pesquisa complementar e também à procura de contextos de discussão sobre as matérias. “às vezes dou por mim a …um simples facto e aquilo pode não estar… a professora só diz “é só até aqui”, mas eu posso sempre ir investigar mais qualquer coisa, dá sempre a intenção que…podemos ir mais além do que aquilo que estamos a estudar…e outras vezes dou por mim a falar aquilo que estudei com os meus …discuto pontos de vista com os meus amigos…com os meus colegas… e com os meus pais também…” (S.2) 124 Os pensamentos orientados para a avaliação surgem como pensamentos dirigidos para os momentos de avaliação e para a preparação dos mesmos. “quando estou a estudar, normalmente ou estou a pensar como é que irá ser o teste (…)” (S.38) Os pensamentos orientados para resultados prendem-se com a aspiração de obter bons resultados académicos. “(…) penso que se estou aqui...tenho que conseguir ter bons resultados... e é isso que me dá mais vontade” (S.4) Salientamos uma verbalização que transmite a ideia de que o estudante pensa não só nos resultados das provas de avaliação, mas também nas implicações destes para o seu percurso. O cariz motivacional deste pensamento leva-o a sentir-se bem e crente nos seus objetivos. “[quando estou a estudar (…)] penso … que o teste em si ou aquela disciplina em si, poderá afetar por exemplo a média ou poderá afetar o resto do meu percurso (…)o estudo para cada disciplina é ali a base de tudo… uma pessoa ao estudar bem, vai ter boas notas nos testes, vai ter boas médias, vai conseguir sempre fazer aquilo que quer… e acho que assim, uma pessoa sente-se sempre bem” (S.38) Os pensamentos de controlo volitivo prendem-se com o domínio da volição e emergiram quando o estudante não gosta do que está a estudar, quando está distraído ou tem a sensação de que o estudo não está a correr como pretende. Para realizar este controlo, os estudantes utilizam estratégias como pausas e/ou auto-instruções o que lhes permitirá voltar à tarefa do estudo. “quando eu não gosto, penso sempre “ah tenho que tentar saber para fazer” (S.32) “(…) eu distraio-me muito facilmente...sei lá, às vezes começo a pensar em coisas corriqueiras e com isso distraio-me e tenho que fazer uma disciplina a mim mesma “vá…foca-te naquilo que estavas a fazer” (S.30) “depois volto outra vez ao tema (...) muitas vezes penso assim “tenho que estudar” é isso que eu penso “tenho que estudar” (S.9) O controlo de pensamentos distratores acontece através do afastamento de ideias irrelevantes para o estudo, ou realização de pausas quando o estudante tem a perceção de que já está a estudar há algum tempo consecutivo. “Depende...se já estiver a estudar há muito tempo...normalmente dou comigo a vaguear (…) e então faço uma pausa” (S.20) Os pensamentos decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo prendem-se com uma verbalização relativa a pensamentos que se ligam a expetativas de resultado assim como a possíveis alternativas. “Lá está! depende …depende de se estou a conseguir estudar bem ou não, porque se estou a conseguir estudar bem, eu penso que vou ter uma boa nota e que só tenho que continuar a ir por esse caminho…se o estudo está a 125 correr mal, começo a pensar que não vou conseguir e começo logo a ver as outras oportunidades que tenho(…)” (S.47) Os pensamentos de controlo/regulação ambiental prendem-se com o propósito de reduzir os distratores. “(…) eu tiro o telemóvel de ao pé de mim, e penso assim “tá sempre no silêncio!” porque eu sei porque alguém me vai ligar pedir não sei o quê (…) às vezes já estou ali tão embalada e o estudo está a correr bem, se estiverem a me ligar e a mandar mensagens, pronto, aquilo quebra o raciocínio, e depois tenho que voltar atrás (…)” (S.28) Os pensamentos de auto-reflexão/de julgamento de realizações e inferências adaptativas transparecem na verbalização de um estudante numa situação de falta de tempo para estudar para a avaliação. Esta revela um pensamento reflexivo concreto, um autojulgamento sobre a realização e inferência para situações semelhantes. “hum… se tiver com pouquíssimo tempo para estudar, acontece imensas vezes, começo a pensar “o que é que eu posso fazer se chumbar isto?”, “para a próxima tenho que estudar mais” e como já estou em cima da hora e estou muito nervosa e então penso assim “para a próxima, estudas mais um bocadinho, para a próxima estudas mais” (S.29) A categoria pensamentos centrados na pessoa (de projeção no futuro) inclui verbalizações relativas aos pensamentos que ocorrem durante o estudo e que são centrados nos próprios sujeitos e orientados para o seu futuro. Salientam-se três tipos de pensamentos: pensamentos centrados em ganhos; pensamentos centrados no futuro académico/ profissional; e pensamentos de cariz emocional negativo. Os pensamentos centrados em ganhos reportam-se a verbalizações relativas aos pensamentos centralizados nos proveitos advindos do estudo. Estes ganhos são expressos através de pensamentos de que estão a fazer algo que consideram como bom para si; pensamentos de gratificação, ou seja, de estar a fazer algo que produz satisfação; pensamentos de que estão a fazer algo que lhes permitirá um trabalho e um futuro profissional; pensamentos de que estão a fazer algo que os enriquece como pessoas, algo que os torna mais conhecedores e mais interessantes por estarem a aprender. “...penso que estou a fazer algo bom para mim (…)” (S.18) “O que costumo pensar? penso que me estou a tornar uma pessoa cada vez mais interessada, mais interessante, e acho que é sempre bom, estarmos a aprender cada vez mais.” (S.39) Os pensamentos centrados no futuro académico/profissional reportam-se a verbalizações sobre pensamentos focados nos objetivos pessoais, no investimento que os estudantes fazem e nas expetativas sobre o futuro académico e profissional. Estes 126 pensamentos constituem-se fontes de auto-motivação quer para atingir as metas como para ultrapassar obstáculos (ex: ausência de gosto pelas matérias). “quando gosto…sinto que estou no curso certo… que vou gostar do que vou fazer no futuro…de que sei ou que tenho uma ideia do que quero fazer no futuro, fico mais contente não é tão desmotivante…” (S.14) “ponho-me a pensar “ok! isto não é muito interessante” “não gosto muito disto mas para conseguir fazer o que tenho de fazer, no futuro, tenho…tenho que passar por isto” (S.23) Os pensamentos de cariz emocional negativo prendem-se com situações em que os estudantes não gostam da disciplina e/ou das matérias que estão a estudar ou se sentem em circunstâncias temporais (não ter tempo) de maior pressão. A consciência acerca da sua situação leva-os a pensar sobre o seu estado de cansaço e de stress e a descentrar a sua atenção da tarefa para com o seu próprio estado emocional. “mas depois se eu não gostar ou se embirrar com alguma coisa externa, porque às vezes, (…) há prazos que nós devemos cumprir (…) e isso deixa-nos cansados, deixa-nos sob grande stress, e isso também vai influenciar a maneira como depois nós pensamos sobre aquilo... porque, se eu já estou irritada porque não tenho tempo para fazer as coisas, porque é tudo ao mesmo tempo então quando estou a olhar para as coisas em vez de estar a pensar “faz isto, tens mais do que fazer, estou a fazer mas estou a pensar “que raiva!” (S.27) Estratégias para lidar com os pensamentos durante o estudo Relativamente à identificação de estratégias para lidar com os pensamentos durante o processo de estudo (Tabela 2), emergiram três grandes categorias: perceção avaliativa global (N=24; 28.2%), respostas afetivas (N=13; 15.3%) e mobilização de estratégias estratégias para lidar com o que pensa (N=48; 56.5%). 127 Tabela 2. Estratégias para lidar com o que pensa: categorias, subcategorias. CATEGORIAS Perceção avaliativa global Respostas afetivas Mobilização de estratégias SUBCATEGORIAS Não sabe Perceção positiva Perceção negativa Emoções/sentimentos Sentimento de facilidade Sentimento de dificuldade Sentimento de dúvida Regulação cognitiva Em geral Controlo de pensamentos distratores Regulação cognitivo- Substituição de pensamentos negativos por emocional positivos Ativação de pensamentos positivos Minimizar a dificuldade Regulação Auto-reflexão metacognitiva Análise crítica Regulação Controlo volitivo motivacional Crenças de auto-eficácia Focalização nos objectivos Regulação da Pausas no estudo atividade de estudo Realização de atividades alternativas N 7 13 4 2 7 14 13 % 28.2 15.3 56.5 9 3 13 10 85 100 Na primeira categoria, perceção avaliativa global foram incluídas verbalizações relativas a uma perceção geral acerca de lidar bem ou não lidar bem com aquilo que pensa quando está a estudar. Emergiram três subcategorias: não sabe; perceção positiva e perceção negativa. A subcategoria não sabe inclui verbalizações de estudantes que referem “não saber bem” como lidam com aquilo que pensam quando estão a estudar porque nunca refletiram sobre essa questão tornando-se difícil pensar e responder, mas consideram que lidam normalmente e/ou não sabem se existirá forma concreta de lidar com esses pensamentos. “Não sei… nunca pensei muito nisso…como é que lido com o que penso… hum… não sei… como é que lido com o que penso quando estou a estudar… não sei… mas acho que lido de forma normal.” (S.29) “Como é que lido com o que penso...hum…como é que lido…às vezes lido bem, às vezes lido mal... sei lá... ai ...isto é muito difícil de responder ...eu nunca pensei neste tipo de coisas... como é que lido com o que penso?...sei lá! (…)”(S.18) A perceção positiva reporta-se às verbalizações dos estudantes que consideram que lidam bem com o que pensam quando estão a estudar uma vez que conseguem abstrair-se dos distratores mantendo-se concentrados no estudo, tornando-o produtivo. “Como lido? Normalmente… até lido bem...costumo lidar bem com o que penso” (S.31) 128 “Lido bem... e tento me abstrair de forma a concentrar-me ...não tenho assim um método específico...é estudando (…) para o estudo ser produtivo” (S.8) A verbalização de um estudante refere lidar bem com o que pensa quando o estudo está a correr bem. Destacamos outra referência que salienta o fato de ter aprendido a lidar bem com o estudo levando-nos a pressupor que tenha sido uma aprendizagem ao longo do percurso académico. “lido muito bem quando as coisas estão a correr bem (…)” (S.26) “Aprendi a lidar bem (…)” (S.11) A perceção negativa reporta-se às verbalizações de estudantes que consideram não lidar bem com o que pensam quando estão a estudar. Esta perceção pode prender-se com aspetos gerais e não especificados, ou com dificuldades ao nível da concentração e ao nível do controlo da ansiedade enquanto estudam. “Não lido muito bem porque chateio-me um bocado, porque eu quero estar concentrada naquilo, mas depois a minha mente foge para outros lados” (S.1) “Pois…às vezes… não lido muito bem… como sou um bocadinho ansiosa às vezes lido mal…fico mal e às tantas parece que exijo de mim mais do que posso dar…” (S.15) A categoria respostas afetivas refere-se às experiências afetivas que emergem como resposta à necessidade de lidar com aquilo que pensam enquanto estudam e inclui três subcategorias: sentimento de facilidade, sentimento de dificuldade e sentimento de dúvida. O sentimento de facilidade surgiu em situações em que os estudantes estão concentrados no estudo e experimentam sensações positivas percebendo que estão bem encaminhados. “(…) há alturas em que é fácil porque lá está... porque o curso está a correr bem é como se estivesse tudo certo…o caminho que estou a percorrer para o meu futuro está tudo a ser bem encaminhado” (S.18) O sentimento de dificuldade emergiu como resposta afetiva dos estudantes em situações de dificuldade nas disciplinas, de desmotivação, de pessimismo e com o colocar em causa os próprios métodos de estudo. “(…) quando estou um bocado pessimista, pronto (…) é o pensar que não vai ser fácil e que se calhar eu já devia ter começado a estudar ou…se calhar este não é o melhor método para estudar” (S.47) “(…) outras vezes é mais complicado porque …é assim…pode haver dias em que a pessoa pode não ter tanta vontade…” (S.12) O sentimento de dúvida surgiu como resposta afetiva às experiências de insegurança quando estão a estudar e prende-se com questões da matéria em si, com a fluência do processo de estudo e com o custo-valor da tarefa. 129 “é um pouco confuso porque ainda há questões que não estou de todo preparada para discutir porque acho que ainda não tenho os argumentos necessários (…) ainda há muitas questões que ainda nos fogem…à nossa compreensão (…)” (S.2) “(…) depois há alturas em que uma pessoa pensa … “será que vale mesmo a pena? Será que isto?” …eu também penso muito nessas coisas quando estou a estudar penso se está a correr bem ou se está a correr mal, depende da matéria também...se gosto se não gosto...enfim…às vezes pergunto-me se está a valer a pena ou se não está a valer a pena?” (S.18) A terceira categoria, mobilização de estratégias para lidar com os pensamentos durante o estudo, traduz-se em cinco subcategorias: regulação cognitiva, regulação cognitivoemocional, regulação metacognitiva, regulação motivacional e regulação da atividade de estudo. A utilização de estratégias de regulação cognitiva de uma forma geral e não especificada remete para a capacidade dos estudantes de concentração nas tarefas e de organização mental como forma de se abstrairem dos estímulos externos ao estudo. “Como lido...eu organizo os pensamentos (…) e concentro-me naquilo que estou a estudar...” (S.17) O controlo de pensamentos distratores refere-se à regulação de pensamentos que sejam perturbadores para o estudo e acontecem através: da anulação de pensamentos desmotivadores, da focalização na tarefa e persistência na atividade de estudo, do cumprimento e respeito pelos momentos de estudo e da consciencialização dos próprios pensamentos, mantendo-os ou afastando-os de acordo com a sua utilidade para o estudo. “Tento me isolar de pensamentos ((desincentivadores))…“ah mas para que é que estás a estudar tanto?” (S.16) “(…) tento sempre limpar essas coisas da cabeça e pensar “bem! Agora estou nisto e vou me concentrar até ao fim, depois logo se vê!” (S.43) “Como lido? Então?... eu acho que há...momentos para tudo. Agora estou a estudar...tenho que me mentalizar em estudar e depois quando acabar de estudar já penso no que quiser (…)” (S.19) “Como lido? ... Então…se eu estou a pensar numa coisa que não é matéria, tento não pensar mais naquilo (…) se estou a pensar alguma coisa que seja da matéria, mesmo que seja uma coisa extra, se calhar é uma forma de eu aprender melhor” (S.37) Destacamos que, para alguns estudantes este controlo de pensamentos passa por não afastar os pensamentos distratores mas simplesmente aceitá-los, permitindo-se pensar sobre os mesmos. Esta estratégia funciona como uma forma de regulação uma vez que, consentindo estes pensamentos, sentem que se libertam e posteriormente podem voltar a focalizar-se na tarefa. Os estudantes fazem pausas propositadas para assumir estes procedimentos mentais. 130 “se realmente me estou a distrair muito, e estou constantemente a pensar nisso, se for preciso até faço uma pausa…e penso… “não! Agora vais pensar nisso até ao fundo” como se …para esgotar um assunto, como se depois, quando voltar a estudar já não ter essa sombra aqui (…) se eu vejo que o que me distrai ou o que estou a pensar não é benéfico nem importante, tento afastar-me dessas sombras, digamos assim” (S.30) “se tiver alguma coisa que me estiver a preocupar acho que arranjo uma estratégia defensiva qualquer (…) para mim próprio, para não ter de continuar com isso no pensamento (…) às vezes faço uma pausa e deixo esse pensamento escorrer…no seu curso normal para lidar com ele e ficar decidido” (S.35) A regulação cognitivo-emocional inclui verbalizações de estudantes que referem a utilização de estratégias como a substituição de pensamentos negativos por positivos, a ativação de pensamentos positivos e a minimização da dificuldade. “Se forem menos bons ou mais desmotivadores, tento contorná-los, tipo… tento contorná-los com outros pensamentos melhores” (S.32) “Depende...normalmente o pensamento é bom porque acabo por fugir um pouco aquele stress do estudo e...ponho-me a pensar em coisas que gosto (…)” (S.20) A ativação de pensamentos positivos traduz-se em verbalizações de estudantes que referem que perante pensamentos positivos, auto-reforçam a sua motivação e continuam o seu estudo; e que perante pensamentos negativos, optam por ignorá-los, fazer pausas e por se acalmarem para que, posteriormente, já recuperados, possam voltar a se concentrar no estudo. “(…) quando estou desmotivada e sei que se calhar não consigo ou assim, aprendo a lidar… não fico contente mas fico neutra tento não ficar muito negativa com isso e não deixar que isso afecte muito o resto (…) apoio-me nas coisas que eu gosto… positivas para combater as outras negativas” (S.14) “Com as coisas boas tento me motivar cada vez mais (…) as coisas más tento pô-las um bocadinho de parte… tentando não pensar que elas são más, ou que pelo menos para mim são más, é tentar ver a parte boa delas” (S.39) “Se for assim… pensamentos positivos, do género, “isto está a correr bem”… e mais não sei quê... pronto! Continuo a estudar na boa (…) se for assim pensamentos mais negativos, muitas vezes do género “isto não está a correr nada bem”, “eu não estou a perceber nada disto” “está a ser complicado,” aí tento fazer uma pausa … tento esquecer aquilo, e depois quando as coisas estiverem assim um pouco mais calmas, recomeçar aquilo com mais facilidade e uma nova força” (S.38) A estratégia de minimizar a dificuldade refere-se ao entendimento das dificuldades como algo temporário, passageiro e natural ao processo de estudo. “(…) ultrapasso as dificuldades...por muito que elas possam me incomodar...eu penso que esse desespero é apenas uma passagem para poder continuar…ou seja penso que faz parte do processo.” (S.46) As estratégias de regulação metacognitiva como forma dos estudantes lidarem com o que pensam quando estão a estudar reportam-se à auto-reflexão e à análise crítica. 131 A auto-reflexão prende-se com a reflexão sobre os próprios pensamentos acerca dos conteúdos em estudo e com a consciência das consequências desta ação. “(…) só assim é que eu consigo fazer a gestão das coisas… pensando para mim próprio… fazendo reflexão sobre a questão…reflexão do pensamento sobre aquilo que estou a aprender…de todas as questões que isso levanta em mim…” (S.44) “(…)não há melhor crítico de mim que eu mesmo… e eu lido bem com isso (…)” (S.46) A análise crítica pode ser para consigo próprio ou para com a matéria de estudo e emergiu ligada à necessidade de compreensão da matéria em estudo. “Como é que lido?... às vezes questiono-me porque é que se chegou a esta conclusão...qual foi o raciocínio?…pronto…acabo também por fazer um pouco… uma análise crítica relativamente àquilo que estou a estudar… também para podermos compreender a matéria, não é?” (S.45) A regulação motivacional prende-se com o controlo da vontade por parte dos estudantes, como forma de lidarem com o que pensam quando estão a estudar e isto pode acontecer através do controlo volitivo, das crenças de auto-eficácia e da focalização nos objetivos. As estratégias emergentes de controlo volitivo passam por lidar com a frustração decorrente de não estar a compreender a matéria, com a desconcentração e a necessidade de focalização e de continuar a estudar. Também foram identificadas autoinstruções de repreensão e de autorreforço e também as pausas. “tenho que arranjar uma maneira de pegar num ponto para conseguir lidar com o sentimento de frustração de às vezes não estar a conseguir perceber aquilo... “o que é que eu estou a estudar?”... “porque é que eu estou a estudar?” (S.25) “(…) depois penso... “não! Tenho que voltar a me focar” e aí volto ao trabalho” (S.21) “Às vezes quando estou a divagar muito (…) dou umas pancadas na cabeça e “foca-te naquilo!” (…) puno-me quando não estou com atenção...ralho comigo mesmo...ou então “esforça-te que tu consegues!”” (S.24) A focalização nos objetivos emergiu como estratégia motivacional. Os estudantes centram-se nos seus objetivos, pensam nas suas expetativas, acreditam que para atingir os objetivos é necessário haver dedicação, e constatam que, o fato de conseguirem bons resultados através do seu esforço, leva-os a quererem continuar a se dedicar ao estudo. “penso assim - que é o que acaba por me motivar para estudar – “acredito que um dia eu vou conseguir fazer o que eu quero (…)eu acho que é ainda o que me mantém! querer continuar a estudar! (…) e também saber onde é que quero chegar!” (S.16) 132 “(…) acima de tudo é preciso é o esforço e...a dedicação...se nós tivermos esforço e dedicação, (…) nós vamos conseguir alcançar aquilo que nós pretendemos …acima de tudo, o mais importante é termos motivação para trabalharmos e não desistirmos do nosso objectivo principal” (S.4) “se estou no final e se estou a conseguir bons resultados, então ajuda-me a continuar mais esse bocadinho para atingir os objetivos” (S.13) A regulação da atividade de estudo prende-se com a ativação de estratégias que servem para o estudante gerir a tarefa e apresenta duas formas: as pausas no estudo e a realização de atividades alternativas. A estratégia de fazer pausas no estudo reporta-se a interrupções propositadas pelos estudantes. A sua referência localiza-se em momentos em que o estudante não está a ser capaz de estudar, quando encontra obstáculos e parece que não consegue ultrapassá-los, quando tem a sensação de que o estudo não está a correr fluentemente, quando os pensamentos emergentes são negativos e o estudante consciencializa sobre as dificuldades que está a sentir. Os vários exemplos demonstrados vêm na sequência de aspetos negativos, chamando a atenção para os obstáculos na fluência do raciocínio. “Se sentir que não sou capaz...lá está…páro um bocadinho [e faço outra coisa para distrair e então depois volto a fazer o que tenho que fazer]” (S.31) “às vezes parece que não... que não consigo sair dali, e leio, leio, leio e parece que por mais que leia, parece que não consigo, entender o que é que é preciso mesmo fazer, (…)depois às vezes, dá-me mais a tendência para ir me levantar e ir fazer outra coisa qualquer” (S.27) A realização de atividades alternativas refere-se à estratégia de optar por intercalar atividades diferentes de forma a poderem se distrair ou descansar do esforço inteletual exigido para a primeira tarefa e posteriormente, voltar ao estudo. Esta estratégia emergiu quando encontram obstáculos e quando não estão concentrados na tarefa de estudo. “[Quando encontro obstáculos…às vezes meto de parte o estudo], tento ultrapassar fazendo exercício físico ou vendo um filme, abstraindo-me e depois volto ao estudo, normalmente.” (S.6) “Se me começo a distrair…tento parar um bocadinho, vou até à sala, fico ali uma meia hora na conversa, vejo um bocadinho de televisão…e depois volto, e se calhar a coisa funciona” (S.40) Uma verbalização de um estudante explicita que perante momentos em que sente que não está a conseguir estudar como pretende, tem a tendência a passar algumas partes da matéria chamando-nos à atenção para o fato deste poder ser um fator que conduz a uma abordagem à aprendizagem de tipo superficial. “(…)se não estou a conseguir…dá-me a tendência a ultrapassar certas partes em vez de ir seguindo (…)” (S.13) 133 Conclusão Este trabalho permite-nos ter uma visão geral sobre três principais categorias de pensamentos académicos que emergem nos estudantes: os pensamentos distratores, pensamentos focados na tarefa e os pensamentos centrados na pessoa. A maior parte das verbalizações concentrou-se nos pensamentos centrados na tarefa de estudo sendo este um bom indicador de que os estudantes tendem a focar os seus pensamentos em aspetos relevantes para a sua aprendizagem. Em termos das estratégias ativadas para lidar com estes pensamentos, distingue-se uma percepção geral de lidar bem ou não lidar bem, respostas afetivas advindas da ativação dessas estratégias e efetivamente cinco subtipos de estratégias: a regulação cognitiva, regulação cognitivo-emocional, regulação metacognitiva, regulação motivacional e por último a regulação da atividade de estudo. Destaca-se a importância que os estudantes atribuem a gostar ou não gostar das disciplinas como algo diferenciador quer no tipo de pensamento que emerge como no tipo de estratégia que utilizam para lidar com esses pensamentos. Este tópico, merece, decerto, mais investigação para apurar melhor estes efeitos. Como limitações a este trabalho consideramos que: por ser um estudo exploratório, ao questionar os estudantes acerca das experiências de estudo de uma forma geral e não para cada disciplina em particular, podemos perder informação específica para cada domínio científico; em termos da categorização, os resultados poderão conter enviesamentos resultantes de processos seletivos e idiossincráticos da memória (Vaz, 2009); o processo de categorização é sempre passível de limitações uma vez que nem sempre é fácil distinguir construtos abstratos como os cognitivos, metacognitivos e ligados aos pensamentos dos sujeitos; o tamanho de amostra, embora adequado a este tipo de investigação, pode não ser de fato, representativo da sua população. A metodologia qualitativa faculta-nos dados em maior profundidade do que em quantidade. Assim, estes resultados podem não ser generalizáveis à população, mas poderão contribuir como base para a criação de instrumentos, nomeadamente quantitativos, que poderão esses sim, servir para abranger amostras maiores. Os resultados deste estudo poderão sustentar intervenções quer para os estudantes, como para os docentes, para as instituições de ensino superior, para os serviços de psicologia que lá trabalham e até para as famílias e para a sociedade de forma geral. Para os estudantes, a implementação de medidas práticas deve visar a consciencialização acerca das suas características, sejam elas mais ou menos positivas e/ou adequadas ao estudo e à aprendizagem; permitir a aceitação destas particularidades, a alteração das mesmas quando necessário e da forma mais adequada para cada momento e contexto de aprendizagem. Este 134 processo de auto-conhecimento representará um investimento pessoal e académico, com consequências ao nível do ganho de competências autorregulatórias bem como em termos de desempenho académico. Os docentes e os técnicos de psicologia das instituições de ensino superior poderão ter um papel coadjuvante neste processo. Os professores, ao terem maior conhecimento sobre os pensamentos académicos dos seus estudantes e a forma como lidam com os mesmos estarão mais aptos a empregar esse conhecimento na sua forma de preparar os conteúdos de estudo, de conduzir as aulas e até mesmo no seu relacionamento com os estudantes. Estes contributos também poderão se revelar úteis para os dirigentes das instituições de ensino superior, para a implementação deliberada de ações sistematizadas, para a criação de políticas internas, fomentação de uma cultura organizacional que tenha por base a exigência, o desafio, mas igualmente, o bem-estar e a satisfação dos seus estudantes. As famílias dos estudantes também poderão beneficiar destes resultados se os utilizarem para contribuir para um clima de respeito e de incentivo ao esforço e ao empenho dos estudantes para com as exigências do contexto académico e também para a promoção de um ambiente de entusiasmo e de esperança relativamente ao seu futuro profissional. Uma sociedade evoluída na sua forma de estar e de pensar, que acredita no poder do conhecimento científico e está, indubitavelmente, muito mais preparada para enfrentar os obstáculos da vida. Referências Bibliográficas Beber, B., Silva, E., & Bonfiglio, S. U. (2014). Metacognição como processo da aprendizagem. Revista Psicopedagogia, 31, 144-151. Beck, S., Robinson, E., Carroll, D., & Apperly, I. (2006). Children’s thinking about counterfactuals and future hypotheticals as possibilities. Child Development, 77(2), 413-426. Boyle, E. A., Duffy, T., & Dunleavy, K. (2003). Learning styles and academic outcome: The validity and utility of Vermunt's Inventory of Learning Styles in a British higher education setting. British Journal of Educational Psychology, 73, 267-290. doi:10.1348/00070990360626976 Brandimonte, M., Bruno. N., & Collina, S. (2006) Cognition. In P. Pawlik and G. d´Ydewalle (Eds) Psychological concepts: An international hystorical perspective. Hove, UK: Psychology press. Bruner, J. (1975). O processo da educação. Lisboa, Portugal: Edições 70. 135 Brockbank, A. & McGill, I. (1998). Facilitating reflective learning in higher education. Buckingham, UK: SRHE/Open University Press. Efklides, A. (2011). Interactions of metacognition with motivation and affect in self-regulated learning: The MASRL Model. Educational Psychologist, 46, 6-25. doi:10.1080/00461520.2011.538645 Ericsson, K. A., & Crutcher, R. J. (1991). Introspection and verbal reports on cognitive processes – two approaches to the study of thought processes: A response to Howe. New Ideas in Psychology, 9, 57–71. Ericsson, K. A., & Simon, H. A. (1998). How to study thinking in everyday life: Contrasting think-aloud protocols with descriptions and explanations of thinking. Mind, Culture, & Activity, 5(3), 178-186. Ersözlü, Z. N. (2010). Determining of the student teachers' learning and studying strategies. Procedia Social and Behavioral Sciences, 2, 5147-5151. doi:10.1016/j.sbspro.2010.03.836 Flavell, J. H. (1979). Metacognition and cognitive monitoring: A new area of cognitivedevelopmental inquiry. American Psychologist, 34, 906-911. doi:10.1037/0003066X.34.10.906 Guilford, J.P. (1980). Some changes in the structure of intellect model. Educational and Psychological Measurement, 48, 1-4. Harvey, L., & Knight, P. T. (1996). Transforming higher education. Buckingham, UK: The Society for Research into Higher Education & Open University Press. Kelly, D., & Donaldson, D. (2016). Investigating the complexities of academic success: Personality constrains the effects of metacognition. The Psychology of Education Review, 40(2) 17-24. Retrieved from https://shop.bps.org.uk/publications/publicationby-series/psychology-of-education-review.html Leal, F. (2017). Experiências do sentir, do pensar e do regular a aprendizagem no ensino superior. Tese de doutoramento. Algarve: Universidade do Algarve. McGuinness, C., (1999). From thinking skills to thinking classrooms: A review and evaluation of approaches to developing pupils' thinking. Norwich: HMSO. (DfEE Research Report No. 115) Oosterheert, I. E., & Vermunt, J. D. (2001). Individual differences in learning to teach: Relating cognition, regulation and affect. Learning and Instruction, 11, 133-156. doi:10.1016/S0959-4752(00)00019-0 Paul, R., & Elder, L. (2007). A guide for educators to critical thinking competency standards. Dillon Beach, CA; Foundation for Critical Thinking. 136 Pintrich, P. R. (2000). The role of goal orientation in self-regulated learning. In M. Boekaerts, P. R. Pintrich, & M. Zeidner (Eds.), Handbook of self-regulation (pp. 451-502). San Diego, CA: Academic Press. Pintrich, P., & García, T. (1993). Intraindividual diffrences in students’ motivation and selfregulated learning. German Journal of Educational Psichology, 7(3), 99-107. Trigwell, K., & Ashwin, P. (2006). An exploratory study of situated conceptions of learning and learning environments. Higher Education, 51, 243-258. doi:10.1007/s10734-0046387-4 Turabik, T., & Gün, F. (2016). The relationship between teachers' democratic classroom management attitudes and students' critical thinking dispositions. Journal of Education and Training Studies, 4(12), 45-57. doi:10.11114/jets.v4i12.1901 Tyser, M. P., McCrea, S. M., & Knüpfer, K. (2012). Pursuing perfection or pursuing protection? Self-evaluation motives moderate the behavioral consequences of counterfactual thoughts. European Journal of Social Psychology, 42, 372-382. doi:10.1002/ejsp.1864 Vaz, F. J. (2009). Diferenciação e regulação emocional na idade adulta: Tradução e validação de dois instrumentos de avaliação para a população portuguesa (Dissertação de mestrado. Universidade do Minho, Braga, Portugal). Recuperado de http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/9898 Vermunt. J. D. (2005). Relations between student learning patterns and personal and contextual factors and academic performance. Higher Education, 49, 205-234. doi:10.1007/s10734-004-6664-2 137 7. MONITORIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DE ESTUDANTES NA TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR NA UTAD MONITORING AND FOLLOW-UP OF STUDENTS IN THE TRANSITION TO HIGHER EDUCATION IN UTAD José Paulo Cravino15, Tatiana Ferreira16, Daniela Pedrosa17 & Isabel Alves18 Resumo O Observatório Permanente do Abandono e Promoção do Sucesso Escolar (OPAPSE) foi criado na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) em 2015, com o objetivo de acompanhar o percurso académico dos seus estudantes, em particular na transição do ensino secundário para o superior. Metodologicamente, é feito anualmente um levantamento sistemático dos pedidos de anulação de matrícula e das informações sobre os estudantes que não renovaram a sua matrícula em cada ano letivo, de forma a identificar possíveis casos de risco de abandono. O OPAPSE, quando consegue estabelecer contacto com o estudante, via telefone ou correio eletrónico, confirma se se trata efetivamente de uma situação de anulação de matrícula ou de não renovação de inscrição, sendo avaliada a possibilidade de reverter a decisão do estudante. Quando estas situações são confirmadas, é solicitado o preenchimento de um questionário online para tentar compreender a situação atual do estudante, as circunstâncias e as razões da sua decisão, e as suas intenções sobre um possível regresso ao Ensino Superior e à UTAD. Neste trabalho apresentam-se dados dos últimos três anos letivos relativos às anulações de matrícula e às não renovações de inscrição, recolhidos através dos requerimentos de anulação de matrícula e dos questionários online. Discutimos os motivos e as decisões reportados pelos estudantes. Explicamos ainda as estratégias utilizadas pelo OPAPSE no acompanhamento de casos específicos que necessitem de apoio da própria instituição e dos serviços disponíveis, nomeadamente: Serviços de Ação Social, Apoio Psicológico, Programa de Tutoria e Programa de Mentoria. 15 Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. Investigador integrado do Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores, Aveiro, Portugal. jcravino@utad.pt 16 Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. tatianaf@utad.pt 17 Universidade Aveiro e Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores, Aveiro, Portugal. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. dpedrosa@ua.pt 18 Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. ifalves@utad.pt 138 Palavras-chave: Abandono académico. Apoio aos estudantes. Ensino Superior. Prevenção do abandono. Transição para o Ensino Superior Abstract In 2015, the University of Trás-os-Montes and Alto Douro (UTAD) created the Permanent Observatory of School Dropout and Promotion of Academic Success (OPAPSE in the Portuguese acronym) aiming to monitor the academic path of its students, particularly in the transition period from secondary school to higher education. Methodologically, and in order to identify possible cases of student dropout risks, it is made a systematic survey of enrollment cancellation forms and non-renewal requests in each school year. When such a case is detected, OPAPSE contacts the student, via telephone or e-mail, to confirm whether it is in fact a situation of enrollment cancellation or non-renewal, and evaluates the possibility of reversing the student's decision. When these cases are confirmed, students are asked to fulfill an online questionnaire to try to understand their current situation, the circumstances and reasons for their decision, and their intentions about a possible return to higher education and to UTAD. In this paper we present data from the last three academic years concerning enrollment cancellations and non-renewals, obtained through cancellation forms and online questionnaires. We also discuss the reasons and decisions reported by the students. In addition, we explain the strategies used by OPAPSE that contribute to reduce student dropout risks, namely by monitoring specific cases that need support from the institution and the services available: Social Services, Psychological Support, Tutoring and Mentoring Programmes. Keywords: Academic dropout. Dropout prevention. Higher Education. Student support. Transition to Higher Education Introdução A entrada no Ensino Superior (ES) assume-se como: 139 “[u]m mundo de oportunidades, em que interagem múltiplos fatores académicos e sociais, que podem facilitar ou impedir florescimento, desenvolvimento pessoal e sucesso académico. Esta etapa escolar exige capacidade de adaptação a diferentes papéis e responsabilidades, que mobilizam recursos internos como autorregulação, autoeficácia, traços de personalidade e competências psicossociais” (Teixeira & Costa, 2018, p. 144). Para o estudante esta nova realidade pressupõe diversas adaptações, uma maior autonomia, novos ambientes sociais, bem como novos papéis e responsabilidades e uma acrescida pressão para a excelência (Respondek, Seufert, Stupnisky, & Nett, 2017). Nos últimos anos tem-se assistido a inúmeros estudos com incidência no ES e nas temáticas do insucesso e abandono académico universitário, sendo que a literatura tem evidenciado o primeiro ano como um período crucial de adaptação e integração (por exemplo: Casanova, 2018; Vieira, 2019). Sabe-se que o abandono académico é um acontecimento complexo e multidimensional (Sarra, Fontanella, & Di Zio, 2018; Tinto, 1975) que está relacionado com outros aspetos tais como a esfera pessoal, social e profissional (Ferreira et al., 2018) e depende de diferentes características de background, abordagens de aprendizagem e ensino, das diversas interrelações entre estas (Sarra et al., 2018), da interação entre o indivíduo e a instituição (por exemplo, recursos, instalações e composição de membros) e da qualidade da universidade (Tinto, 1975). Sendo um dos objetivos das instituições de ES a formação de cidadãos mais comprometidos e competentes socialmente, o abandono poderá assumir-se como um fracasso - para os estudantes, para as famílias e as próprias instituições (Casanova, 2018). Uma vez que o abandono académico pode implicar um conjunto de consequências, não só para o sujeito (através da marginalização, mobilidade descendente; Hällsten, 2017) como também para as instituições e para a sociedade (Sosu & Pheunpha, 2019), importa compreender as causas e motivações desta problemática. Ao serem identificadas estas causas, torna-se mais fácil a identificação de grupos de risco e poder-se-á agir preventivamente (Sosu & Pheunpha, 2019) através de intervenções mais intensivas e de estratégias mais eficientes para manter os estudantes no ES (Ortiz-Lozano, Rua-Vieites, Bilbao-Calabuig, & Casadesús-Fa, 2018). 140 Face a esta problemática e à crescente preocupação em compreender e acompanhar o percurso académico dos estudantes (especialmente aqueles em risco de insucesso e abandono), surge, em 2015, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), o Observatório Permanente do Abandono e Promoção do Sucesso Escolar (OPAPSE) com o objetivo de fomentar estratégias promotoras do sucesso académico, decorrente de um estudo exploratório sobre o abandono na UTAD (Ribeiro et al., 2014). O OPAPSE é um meio de combate ao insucesso e abandono académico dos estudantes da UTAD, que pretende monitorizar e intervir em casos de abandono escolar e implementar ações que permitam melhorar os indicadores de abandono e de promoção do sucesso. Especificamente, objetiva monitorizar o abandono académico, acompanhar os estudantes, mobilizar os docentes e funcionários e melhorar/adequar a oferta formativa (Ribeiro, Cabreira, Silva, & Cravino, 2017). O OPAPSE apresenta-se como a primeira instância à qual os estudantes podem recorrer, evitando que fiquem isolados na resolução dos seus problemas. O Observatório analisa individualmente as situações de risco, permitindo um encaminhamento direcionado e adequado face ao(s) problema(s) do estudante para outros serviços e apoios disponíveis. O modelo de ação do OPAPSE tem duas vertentes: a de investigação e a de intervenção, ambas assentes em três princípios essenciais: sinalizar, encaminhar e acompanhar. Descrição, problematização e apresentação de objetivos ou hipóteses Em Portugal, o ensino é marcado pela heterogeneidade de estudantes. Estes são de idades diferentes, chegam por diferentes vias de acesso ao ES (Engrácia & Baptista, 2018) e com diferentes expectativas e desempenhos (Vieira, 2019). Contudo, a diversidade de perfis está associada à existência de algumas problemáticas que têm sido identificadas como potenciais fatores de risco no que concerne o abandono académico, tais como: 1) a média e nota de ingresso obtida no ensino secundário do estudante quando se candidata (Engrácia & Baptista, 2018; Sosu & Pheunpha, 2019). Relativamente a este aspeto refira-se que as notas de entrada mais baixas são entendidas como um fator de vulnerabilidade académica e parece estar correlacionado de modo significativo com o risco de abandono (Sosu & Pheunpha, 2019); 2) a (in)preparação que os estudantes possuem ao nível do ensino secundário parece determinar o posterior (in)sucesso ao nível do ES (Engrácia & Baptista, 2018; Esteban García, 141 Bernardo Gutiérrez, & Rodríguez-Muñiz, 2016; Meggiolaro, Giraldo, & Clerici, 2017; OrtizLozano et al., 2018; Stewart, Lim, & Kim, 2015; Tinto, 1975); 3) (in)capacidade de adaptação ao ES (Casanova, 2018; Ferreira & Fernandes, 2015). Outro fator que pode condicionar a permanência do estudante no ES é a capacidade de financiamento, já que o ES pressupõe mais investimento do que a escolaridade obrigatória. Muitas vezes associado a problemas financeiros surgem dificuldades em conciliar a vida académica com as outras esferas da vida e o consequente confronto das expectativas idealizadas com a realidade (Vieira, 2019). As expectativas, quando elevadas, podem ser benéficas, traduzindo-se num maior investimento nas atividades académicas; no entanto, caso estas não sejam alcançadas, podem resultar em desilusão ou frustração, podendo conduzir a um menor investimento e participação, risco de abandono e insucesso académico (Almeida, Araújo, & Martins, 2016). Engrácia e Baptista (2018), num estudo que acompanhou o percurso académico dos estudantes matriculados em 2011/12 durante quatro anos (até 2014/15), verificaram que as taxas de sucesso variavam de acordo com o subsistema de ES em que o estudante estava matriculado, regime, opção e média de ingresso, a área de estudos, se o estudante estava ou não deslocado, género e o nível de escolaridade dos progenitores. Tinto (1975) refere o nível de escolaridade dos pais como um dos fatores que influencia a permanência no ES, aspeto que é confirmado por Engrácia e Baptista (2018), que reforçam a ideia de que a taxa de abandono dos filhos de pais com escolaridade elevada é mais baixa. Porém, Casanova, Bernardo e Almeida (2018) referem que não encontraram nenhuma associação significativa entre o género e as habilitações académicas dos progenitores com as taxas mais altas de abandono académico. Questões relacionadas com a opção de escolha do curso, ou seja, se o estudante entra na opção desejada, e questões relacionadas com a adaptação são dois fatores com influência na decisão de abandono académico, uma vez que podem estar associadas a uma menor satisfação e menores níveis de autoeficácia e motivação. Alguns autores destacam a importância das atitudes, motivações e sentimentos (Casanova, 2018; Casanova & Almeida, 2016; Meggiolaro et al., 2017). Por outro lado, Casanova, Cervero, Núñez, Almeida e Bernardo (2018) sublinham que o número de ECTS obtidos no primeiro ano de frequência do ES afeta a decisão de 142 permanecer ou abandonar o ES, uma vez que o sucesso académico durante este período pode evidenciar projetos educacionais e vocacionais melhor definidos. Um outro fator que parece influenciar o abandono académico está relacionado com a distância a que o estudante se encontra do seu agregado familiar, algo que pode originar dificuldades emocionais e consequentemente reforçar/agravar a vulnerabilidade académica (Sosu & Pheunpha, 2019). De modo geral, os motivos apresentados para a intenção de abandono prendem-se maioritariamente com aspetos vocacionais, financeiros, de aprendizagem e pessoais (Casanova, Bernardo, et al., 2018). As variáveis do tempo dedicado a estudar e os fatores relacionados com a residência (viver com os pais, amigos ou em residência de estudantes) parecem ser também fatores que contribuem para maiores níveis de persistência académica (Bernardo et al., 2017, 2016). De forma a colmatar os vários fatores que podem provocar o abandono académico, é importante que as instituições atentem na forma como os estudantes são acolhidos de modo a fornecer-lhes ferramentas com as quais possam enfrentar com sucesso as novas solicitações e mais facilmente se adaptar à nova realidade (Almeida et al., 2016; Stewart et al., 2015). Considerando as graves consequências que o abandono académico pode assumir na vida dos estudantes, têm sido criados mecanismos de acompanhamento e combate deste fenómeno (Ferreira et al., 2018). Assim, e uma vez que o desempenho académico e o envolvimento académico têm influência no abandono, importa criar mais ambientes de suporte que atuem de forma preventiva (Sarra et al., 2018), tais como programas de integração facilitadores na adaptação ao ES, compromisso com a conclusão do curso, prática de estratégias de treino e gestão do tempo (Bernardo et al., 2016). Importa que a integração social seja fomentada pelos cursos, visando a construção de uma rede de suporte diversificada e sólida (afetiva e academicamente). De igual modo, é imperioso oferecer apoios especializados aos estudantes com maiores dificuldades de adaptação (Teixeira, Dias, Wottrich, & Oliveira, 2008). Dentro desses apoios, destacam-se os programas de tutoria e mentoria. Esteban García e colegas (2016) referem que um projeto como o da tutoria aumenta a responsabilidade dos participantes para com o seu futuro e contribui para a prevenção do abandono. A tutoria e a mentoria, favorecendo a integração e adaptação dos estudantes, com especial relevo para os 143 do 1º ano (Casanova, 2018), podem assumir-se como mecanismos potenciadores da aprendizagem e criação de novas redes de suporte social, autonomia, gestão temporal e económica para os novos estudantes, especialmente para os deslocados do seio familiar. Por exemplo, o apoio oferecido pela tutoria/mentoria é também defendido por Stewart e colegas (2015), sendo que estes destacam a importância de outros serviços, tais como os de aconselhamento, sistemas de intervenção precoce e assistência de apoio financeiro na promoção da permanência no ES. Meggiolaro e colegas (2017) corroboram esta perspetiva, sugerindo uma oferta de atividades e serviços através da tutoria, coaching e aconselhamento. Assim, uma integração formal (académica) e informal (em termos relacionais) bemsucedidas parecem atuar como condições preventivas do abandono no ES (Ferreira & Fernandes, 2015; Tinto, 1975), existindo também maiores probabilidades de os estudantes continuarem o seu percurso académico quando socialmente bem-adaptados (Bernardo et al., 2016). A boa relação entre o estudante e o professor parece ainda ser um outro fator que contribui para a permanência no ES (Bernardo et al., 2016; Casanova & Almeida, 2016; Esteban García et al., 2016; Meggiolaro et al., 2017). De modo a facilitar a transição e adaptação/integração plena dos novos estudantes, Casanova (2018) defende que uma boa articulação entre o ensino secundário e o ES pode funcionar preventivamente em relação ao abandono. Esta articulação poderá realizar-se através do desenvolvimento de competências pré-transição, disponibilização da informação acerca dos cursos existentes, exploração e clarificação de escolhas vocacionais e ajustamento de expectativas, objetivando a preparação dos novos estudantes para os desafios com os quais se poderão deparar (Casanova, 2018). Para os estudantes que se encontram em risco de abandono é relevante fornecer workshops sobre as temáticas do autocuidado, gestão de tempo e hábitos de estudo (Gibbons, Rhinehart, & Hardin, 2016), e estilos de vida saudáveis e hábitos alimentares saudáveis, bem como promover a prática de exercício físico e prevenção de consumo de substâncias (Casanova, 2018). Em relação à integração, acrescente-se que Ferreira e Fernandes (2015) verificaram que os estudantes valorizam a bolsa de ação social e o relacionamento com os colegas. Estes autores observaram ainda que 80% dos estudantes afirmava desconhecer os serviços de apoio existentes na faculdade/universidade. Assim, a divulgação da existência de serviços de apoio é, pois, uma ação que as faculdades/universidades devem fomentar. 144 Em suma, importa ter presente que as instituições de ES devem prestar uma atenção acrescida aos estudantes mais fragilizados (psicológica e academicamente), prestando-lhes apoio e evitando possíveis situações que possam resultar em desânimo, insucesso e abandono académico (Casanova & Almeida, 2016). De acordo com o referido, as necessidades de acompanhamento reforçam o papel do OPAPSE na prevenção e monitorização do abandono, uma vez que este se apresenta como a primeira instância à qual o estudante poderá recorrer (diretamente ou sinalizado por outra figura). De acordo com cada situação, os estudantes poderão ser encaminhados para outros serviços da UTAD, nomeadamente para os Serviço de Psicologia, os Diretores de Curso, o Programa de Tutoria, o Programa de Mentoria e os Serviços de Ação Social da UTAD (bolsas de estudo, alojamento; fundo de apoio social), podendo ainda ter acesso a outros apoios específicos. Realça-se que o OPAPSE mantém um contacto contínuo com o estudante em risco, mesmo após um eventual encaminhamento para outros serviços da UTAD. Assim, este trabalho tem como principal objetivo compreender a problemática do abandono na UTAD, caracterizando o perfil do estudante que opta por abandonar o ES (formal ou informalmente), numa tentativa de identificação de características/grupos de risco para que, futuramente, se possa agir preventivamente e de forma mais célere. Argumentação Na UTAD, apesar de nos últimos anos se ter vindo a assistir a um decréscimo dos números de abandono no ES (a maior taxa de abandono coincidiu com a crise económica iniciada em 2011), este continua a ser uma realidade para alguns estudantes. Verifica-se que a maior concentração de pedidos de anulação de matrícula ocorre entre setembro e novembro 19. O pedido de anulação de matrícula pode ser realizado online ou presencialmente junto dos Serviços Académicos (SA) da UTAD, mediante o preenchimento de um formulário próprio para o efeito. De modo a explorar as razões que levam os estudantes a abandonar os seus estudos, e numa tentativa de reverter esta situação, o OPAPSE procede ao contacto com os estudantes, 19 De acordo com a regulamentação da UTAD um aluno que anule a sua matrícula até final de novembro tem apenas que realizar o pagamento das propinas até à data da anulação, caso contrário terá que realizar o pagamento das propinas de todo o ano letivo. 145 no menor espaço de tempo possível. Para tal, solicita aos SA da UTAD informação sobre as anulações de matrícula realizando-se o contacto imediatamente após o pedido. O estudante é contactado telefonicamente, pretendendo-se analisar os motivos do abandono e verificar a possibilidade/necessidade de se acionar algum apoio que possa reverter esta decisão. Nas situações de não renovação de matrícula, o procedimento é semelhante uma vez que estas podem evidenciar cenários de abandono académico não oficializado. Nestas situações o contacto é estabelecido através de email. Após o contacto com o estudante, e nas situações em que não é possível a reversão da intenção de abandono, é solicitada a resposta a um questionário online. Este questionário é uma adaptação do “Questionário sobre causas do abandono e decisões do estudante relativas ao abandono dos estudos no ensino superior” do Projeto GUIA “Gestão Universitária do Abandono Escolar”(Comissão Guia e Grupo de Análise, 2013), sendo constituído por 47 questões, agrupadas nas seguintes secções: a) Caracterização do perfil; b) Causas do abandono escolar; c) Procura de apoio; d) Situação atual do estudante; e) Percurso após a saída da UTAD – Abandono académico e avaliação da decisão; f) Percurso na UTAD; g) Acesso ao Ensino Superior; e h) Caraterização do contexto familiar. O questionário de autorrelato foi desenvolvido no LimeSurvey, sendo assegurados o anonimato e a confidencialidade. Para este trabalho foram analisados os dados referentes ao abandono dos últimos dois anos letivos (2017/18 e 2018/19), contemplando todos os pedidos de anulação de matrícula (formais) e as situações de não renovação de matrícula (abandono não oficializado) no 1ºCiclo de Estudos e Mestrado Integrado, utilizando como data de referência 31 de março do respetivo ano letivo. Os dados foram tratados com recurso ao Excel, realizando-se análises estatísticas descritivas. Dados do abandono 2017/18 e 2018/19 (Anulação e não renovação de matrícula) Os dados referentes ao abandono têm sofrido algumas oscilações ao longo dos anos, no entanto continua a ser uma realidade para alguns estudantes da UTAD. 146 Nº Estudantes Anulações de matrícula 2017/18 2018/19 6651 6688 1ºCiclo e MI 4987 (75%) 5032 (75%) 2º Ciclo 1383 (21%) 1349 (20%) 3º Ciclo 281 (4%) 307 (5%) Nº Total de anulações 95 (1.43%) 179 (2.68%) Anulações que correspondem a abandono: 82 (1.23%) 136 (2.03%) 1º Ciclo e MI 44 51 2º Ciclo 33 72 3º Ciclo 5 13 29 (30.5%) 51 (28.5%) 340 (6.82%) 359 (7.13%) 43 (12.6%) 37 (10.3%) 8,25% 9,81% Nº Total Nº Respostas questionário Não Renovações de matrícula Não Renovações 1º Ciclo e MI Nº Respostas questionário % Abandono Total Figura 1. Abandono com base nas anulações e não renovações de matrícula nos anos letivos 2017/18 e 2018/19. Analisando os motivos reportados pelos estudantes no pedido de anulação de matrícula junto dos SA , constata-se que estes são predominantemente os mesmos, sendo que em 2017/18 se destacam os aspetos relacionados com a não adaptação, razões do foro pessoal e profissional e, em 2018/19, os motivos mais reportados relacionam-se com a não adaptação e aspetos financeiros e económicos. Uma vez que nem todos os pedidos de anulação de matrícula correspondem a abandono académico (por vezes trata-se de mudanças de curso/instituição), na análise seguinte serão apenas contempladas as anulações que correspondentes a abandono real do Ensino Superior (Figura 1). 147 Perfil do estudante que opta por pedir a anulação da sua matrícula Analisando as respostas dos participantes, constata-se que a maioria dos estudantes que solicitou a anulação de matrícula tinha entre os 17 e os 20 anos, estava deslocado (54% - 2017/18; 75% -2018/19), e residia maioritariamente na zona Norte do país (Porto e Braga) com os seus progenitores (68% - 2017/18; 59% - 2018/19). Relativamente aos progenitores dos participantes, apenas uma pequena parte possui formação académica superior. No caso da mãe, a maioria possui o ensino secundário, no caso do pai o ensino básico foi o nível de ensino mais prevalente, e no caso dos tutores predomina o ensino secundário. No que diz respeito à situação profissional dos progenitores, na generalidade, estes encontram-se empregados e ativos a tempo inteiro. Relativamente ao ingresso, grande parte dos estudantes (61% - 2017/18; 68% 2018/19) diz não ter interrompido os seus estudos antes da entrada no ES, destacando como razões da escolha do seu ingresso: a obtenção de um grau académico e a obtenção de competências que permitem acesso a uma profissão aliciante/bem remunerada. Já para a escolha da UTAD, os participantes apontam como motivos: a sua localização geográfica, isto é, a proximidade com a sua residência, a recomendação de amigos, por ser a melhor instituição para o curso pretendido e a sua boa reputação académica. O curso frequentado foi a 1ª opção para a maioria dos participantes (50% - 2017/18; 72% - 2018/19), estando estes satisfeitos com o curso e com as relações estabelecidas na instituição, avaliando mais positivamente as relações estabelecidas com os seus pares do que as estabelecidas com os docentes. Durante a permanência na UTAD, a maioria dos estudantes afirma ter dependido financeiramente dos seus pais (71% - 2017/18; 59% - 2018/19); no entanto, 29% dos estudantes em 2017/18 e 24% em 2018/19, afirma não ter tido recursos económicos suficientes. De destacar que grande parte dos participantes refere não ter obtido qualquer tipo de ajuda (87% - 2017/18; 67% - 2018/19). Relativamente à procura de apoio, 46% dos participantes em 2017/18, e 29% em 2018/19, referiu não ter procurado qualquer tipo de apoio, apontando como razões para esta decisão: “ingresso no mercado de trabalho, sendo impossível conciliar a vida académica e a vida profissional”; “Não quis”, “Não necessitar”, , “Não era algo que pudesse ser ajudado”, “Falta de tempo, por motivos profissionais e familiares”, por estar “emigrado”; “…entre prestar apoio à minha família e trabalhar não conseguia frequentar as aulas.”; “(...) natureza pessoal…”; “(...) mudei para o Instituto/Curso que realmente queria.”; “Não sabia 148 que existia ajuda.”; “Abandonei o Mestrado por me encontrar empregado”. Por outro lado, a maioria dos estudantes que procurou apoio diz ter recorrido a familiares, sendo que apenas 12% em 2017/18 e 22% em 2018/19 diz ter procurado ajuda junto de algum serviço de apoio da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE). Analisando os motivos que conduziram ao abandono, percebemos que não existe o predomínio direto de um só motivo, sendo vários os que potenciam esta decisão do estudante. Contudo, os motivos mais apontados são semelhantes em ambos os anos, sendo a razão mais destacada o facto de o curso não ter correspondido às expectativas. São ainda realçadas as dificuldades de adaptação à vida académica, os problemas pessoais e familiares e a incompatibilidade da vida académica com a vida profissional (Figura 2). Dificuldades económicas. Problemas pessoais e familiares. Ingresso no mercado de trabalho. Dificuldades no processo de aprendizagem (Insucesso escolar). O curso não correspondeu às minhas expectativas. Dificuldades de adaptação na vida académica. Má qualidade das infraestruturas da UTAD. Má qualidade dos serviços disponíveis na UTAD. Fraca qualidade do corpo docente do curso. Problemas de saúde. Incompatibilidade da vida académica com a vida profissional. 0% 2017/18 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 2018/19 Figura 2. Motivos de abandono das anulações de matrícula em 2017/18 e 2018/19. 149 Após o abandono a situação dos estudantes difere nos dois anos letivos e varia consoante a sua faixa etária. Assim, em 2017/18 os participantes entre os 17 e 20 anos referem ter ingressado noutra IES, e em 2018/19, a maioria dos participantes desta faixa etária encontrava-se sem qualquer tipo de ocupação. Os resultados nas outras faixas etárias foram semelhantes nos dois anos letivos, estando a generalidade dos participantes entre os 21 e os 24 anos noutra IES, e a maioria dos participantes com idades superiores a 24 anos no mercado de trabalho. Analisando as notas de entrada referidas pelos participantes, podemos perceber que estas se situavam entre os 12 e os 14 e entre os 15 e os 17 valores em 2017/18. Por sua vez, em 2018/19 a maioria dos estudantes refere que a sua média se encontrava entre os 15 e os 17 valores. Perfil do estudante de não renovação de matrícula Em relação às não renovações de matrícula, e considerando as respostas dos participantes, apercebemo-nos de algumas diferenças entre os dois anos letivos. Em 2017/18 a maioria dos estudantes (35%) encontra-se entre os 30 e os 39 anos, e em 2018/19, o grupo etário com maior prevalência (32%) foi o dos estudantes entre os 25 e os 29 anos. De modo semelhante aos estudantes de anulação de matrícula, a maioria dos participantes encontrava-se deslocado da zona de residência (63% e 70% em 2017/18 e 2018/19, respetivamente), e residia com os seus progenitores (45% - 2017/18; 49% - 2018/19). Relativamente à formação académica dos progenitores, verificou-se que apenas uma pequena parte possui formação superior. No caso do pai, o ensino primário foi o mais prevalente em ambos os anos. Em 2017/18, no caso da mãe e do tutor legal, a maioria possui o ensino primário, sendo que em 2018/19 a maioria das mães e dos tutores legais possui o ensino secundário. Quanto à situação profissional destes, verificamos que a maioria se encontra ativa a tempo inteiro. No que respeita às questões de ingresso, grande parte dos estudantes (78% - 2017/18; 73% - 2018/19) diz não ter interrompido os seus estudos antes da entrada no ES, destacando como razões da escolha desta tipologia de ensino: a obtenção de competências que permitam acesso a uma profissão aliciante/bem remunerada, o prazer em estudar e em aprender, e a obtenção de um grau académico. As razões apontadas para escolher a UTAD, prendem-se 150 com a proximidade com a residência e por ser a melhor para o curso pretendido. O curso frequentado foi a primeira opção para 78% em 2017/18 e 70% dos estudantes em 2018/19. Quando questionados, os estudantes mostram-se satisfeitos com o curso e com as relações estabelecidas na instituição, tendendo a avaliar mais positivamente as relações estabelecidas com os pares do que as estabelecidas com os docentes, à semelhança dos estudantes de anulação de matrícula. Durante a permanência na UTAD, a maioria dos estudantes, (58%) em 2017/18, dependeu financeiramente de si mesmo, e em 2018/19 a maioria dependeu dos seus pais (62%). Quando questionados se possuíam recursos económicos suficientes, uma parte significativa dos participantes aponta que não (29% - 2017/18; 38% - 2018/19). De destacar que grande parte dos participantes refere não ter obtido qualquer tipo de ajuda (65% 2017/18; 70% - 2018/19). Relativamente à procura de ajuda, 55% dos participantes em 2017/18 e 54% em 2018/19 referiu não ter procurado qualquer tipo de apoio, apontando como razões: “Foi uma decisão pessoal”; “Não achei que iria necessitar de ajuda”, “Porque não tinha conhecimento de apoios extra, visto que já recebia bolsa de estudo”, “(...) o facto de ser trabalhadorestudante e entretanto a vida profissional alterou-se e não consegui conciliar”, “Prescrição, embora tivesse vontade de continuar os estudos em conciliação com o trabalho”, “Porque eu não espero que ninguém me dê nada. E queria estudar numa universidade que contribuísse de alguma forma para a minha melhor formação”; “Não era necessário”, “Vergonha”, “Orgulho”, “Não considerei pertinente”; "… não ter condições psicológicas nem apoio de ninguém para continuar a estudar e a concluir o curso que tanto gostava…”; “Por transferência para um curso noutra instituição.”; “(...) questões de saúde e monetárias, não sabia propriamente como pedir ajuda de momento”; (...) ter começado actividade que me impossibilita de frequentar e ir inclusive a exames.”; “Parei um ano, com o âmbito de renovar a matrícula para o ano”; “Porque entrei no segundo semestre do primeiro ano, onde ninguém me concedeu apontamentos e não me consegui integrar. Também abandonei a universidade porque tive de tomar conta da minha avó…”; “(...)o horário deste curso não é compatível com o meu trabalho”. Os estudantes que procuraram auxílio, recorreram a familiares, sendo que apenas 18% em 2017/18 e 14% em 2018/19 diz ter procurado ajuda junto de algum serviço de apoio da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE). 151 Nas situações descritas não existe apenas uma causa potenciadora do abandono, sendo variadas as combinações de motivos. Porém, a incompatibilidade da vida académica com a Dificuldades económicas. Problemas pessoais e familiares. Ingresso no mercado de trabalho. Dificuldades no processo de aprendizagem (Insucesso escolar). O curso não correspondeu às minhas expectativas. Dificuldades de adaptação na vida académica. Má qualidade das infraestruturas da UTAD. Má qualidade dos serviços disponíveis na UTAD. Fraca qualidade do corpo docente do curso. Problemas de saúde. Incompatibilidade da vida académica com a vida profissional. Outro. 0% 2017/18 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 45% 50% 2018/19 Figura 3. Motivos de abandono das não renovações de matrícula em 2017/18 e 2018/19. vida profissional, as dificuldades económicas, o facto de o curso não ter correspondido às expectativas e os problemas pessoais e familiares foram as razões mais referidas (Figura 3). A situação dos estudantes no pós-abandono difere consoante o grupo etário. No intervalo de idades entre os 17 e os 20 anos, a maioria dos estudantes ingressou noutra IES, e a maioria dos participantes dos restantes grupos etários encontra-se no mercado de trabalho. As notas de entradas no Ensino Superior reportadas pelos estudantes de não renovação de matrícula, em 2017/18, situaram-se entre os 12 e os 14 valores, sendo que em 2018/19, a maioria se situou entre os 15 e os 17 valores. Discussão dos resultados Reconhecendo que nem todas as situações de anulação de matrícula correspondem a abandono, algumas correspondendo a mudanças de instituição de ensino e/ou curso, nesta pesquisa focamo-nos principalmente nas anulações referentes ao abandono real do ES e nas situações de não renovação de matrícula. Assim, após a análise das respostas aos questionários, foi possível identificar algumas características comuns entre os participantes, 152 nomeadamente que a maioria dos estudantes se encontra deslocado da sua zona de residência. Estes resultados parecem contraditórios aos reportados por Engrácia e Baptista (2018), uma vez que estes autores verificaram que os estudantes deslocados tinham uma taxa de abandono ligeiramente inferior. Pudemos ainda verificar que a maioria dos estudantes que abandonou os seus estudos vive com os seus progenitores, dependendo financeiramente destes durante a sua permanência na UTAD, enquanto a maioria dos estudantes de não renovação de matrícula dependeu dos pais (2017/18) ou de si mesmo (2018/19). Relativamente à formação académica dos progenitores, verificamos que esta varia maioritariamente entre o ensino básico e o ensino secundário no caso dos pais dos estudantes de anulação de matrícula, e entre o ensino primário e o ensino secundário nas situações de não renovação de matrícula. Esta baixa escolaridade dos progenitores parece reforçar a ideia que as menores taxas de abandono se encontram associadas a estudantes cujos pais possuem níveis de escolaridade mais elevados (Engrácia & Baptista, 2018; Tinto, 1975). Contudo, salientamos que a maioria dos estudantes da UTAD é proveniente de meios familiares cujos progenitores têm escolaridade mais baixa, pelo que este poderá não ser um bom indicador, dado os estudos de Casanova e colaboradores (2018), pois estes não encontraram nenhuma associação significativa entre com o nível de escolaridade dos pais. A maioria dos estudantes afirmou não ter interrompido os estudos antes da entrada no ES, referindo ter entrado no curso de 1ª opção, parecendo assim corroborar a tese de que a opção de escolha é independente da decisão de abandono (Engrácia & Baptista, 2018). O facto dos estudantes de não renovação de matrícula serem de grupos etários mais velhos (2017/18 - entre os 30 e os 39 anos; 2018/19 - entre os 25 e os 29 anos) não contribui para alcançar a segunda meta para a Europa 2020, cujo objetivo é o aumento do número de estudantes entre os 30 e os 34 com o nível superior (Eurostat, 2020). No entanto, estas faixas etárias confirmam parcialmente o encontrado por Bernardo e colegas (2017), onde os estudantes mais velhos (e com um progresso académico menor) apresentaram maior probabilidade de desistir do ES, e por Casanova, Bernardo e Almeida (2018) que verificaram que os estudantes mais velhos, deslocados e não colocados no curso de 1ª opção, apresentavam uma taxa de intenção de abandono superior. A maioria dos estudantes apontou a obtenção de um grau académico, a obtenção de competências que permitam acesso a uma profissão aliciante/ bem remunerada e o prazer em estudar e em aprender como as principais razões para a continuação dos seus estudos. A escolha da UTAD deveu-se essencialmente à sua localização geográfica (proximidade com a residência), por recomendação de amigos, por ser a melhor para o curso pretendido e pela boa 153 reputação académica. Esta preferência pela proximidade geográfica pode evidenciar que os estudantes limitam as suas escolhas a instituições mais próximas devido a dificuldades económicas (Balsa et al., citado em Almeida et al., 2016). De realçar que, durante o seu percurso na instituição, os estudantes mostraram-se satisfeitos com o curso e com as relações estabelecidas. Uma parte considerável dos estudantes refere não possuir recursos económicos suficientes, confirmando o observado por Ferreira e Fernandes (2015), que o abandono do ensino superior se deveu, em grande medida, a aspetos económicos. Destaca-se ainda que uma grande parte dos participantes de anulação de matrícula e de não renovação de matrícula refere não ter procurado qualquer tipo de apoio, indicando diversas razões para esta escolha, desde o facto de achar não precisar, incompatibilidade entre a esfera profissional e a esfera académica, desconhecimento dos apoios disponíveis, não saber como pedir ajuda, referindo também aspetos como “Vergonha” e “Orgulho”. Por sua vez, os estudantes que procuraram apoio fizeram-no principalmente junto dos seus familiares, sendo poucos os que referiram ter procurado ajuda junto dos serviços de apoio da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE). Apesar dos motivos que levam o estudante a abandonar o ES serem múltiplos e com inúmeras interações, no caso dos estudantes de anulação de matrícula o mais destacado foi o facto de o curso não ter correspondido às expectativas, reforçando que a não concretização destas pode resultar num maior risco de insucesso e abandono (Almeida et al., 2016), ou seja, a transição e adaptação para o ES parece determinante no sucesso académico do estudante (Casanova, 2018). São ainda destacados como motivos os problemas pessoais e familiares e a incompatibilidade entre a vida académica e a vida profissional. No que diz respeito às razões de abandono dos estudantes que não renovaram a matrícula, estas são semelhantes às das anulações de matrícula e igualmente diversas, destacando-se a incompatibilidade entre a vida académica e a vida profissional, as dificuldades económicas, o facto de o curso não ter correspondido às expectativas e os problemas pessoais e familiares. Analisando a situação dos estudantes após o abandono, verificamos que no caso das anulações de matrícula esta variou nos dois anos letivos e de acordo com a faixa etária. Assim, em 2017/18 os participantes no inquérito, entre os 17 e 20 anos, referiram ter ingressado noutra IES, e em 2018/19, a maioria dos participantes desta faixa etária encontrava-se sem qualquer tipo de ocupação. Estes últimos parecem estar de acordo com o observado pelo Eurostat (2020), onde 53.8% dos estudantes que abandonaram os estudos se encontravam desempregados ou inativos. Os resultados nas outras faixas etárias foram 154 semelhantes nos dois anos letivos, estando a generalidade dos participantes entre os 21 e os 24 anos noutra IES, e a maioria dos participantes com idades superiores a 24 anos no mercado de trabalho. No que concerne aos estudantes de não renovação de matrícula, pudemos perceber que maioria dos estudantes entre os 17 e os 20 refere ter ingressado noutra IES, e a maioria dos participantes dos restantes grupos etários encontrava-se no mercado de trabalho. Quando analisadas as notas de entrada no ES reportadas pelos estudantes, verificamos que estas se encontram entre os 12 e 14 valores e os 15 e 17 valores, pelo que os estudantes que abandonaram não parecem estar numa situação de maior vulnerabilidade académica provocada por baixas notas de ingresso (Sosu & Pheunpha, 2019). A União Europeia definiu na estratégia para 2020 a diminuição da taxa de abandono para 10%, sendo que Portugal em 2018 se encontrava com uma taxa de 11.8%, um valor consideravelmente mais baixo o que o apresentado em 2008 (34.9%; Eurostat, 2020). Na UTAD o abandono em 2017/18 rondou os 8,25% e em 2018/19 rondou os 9,81% (total das anulações e não renovações de matrícula), contribuindo para que esta meta seja alcançada. No entanto, o desejável é que este fosse nulo, e que o estudante consiga concluir o seu percurso académico com sucesso. Considerações finais A entrada no ensino superior corresponde ao objetivo de muitos jovens. No entanto, esta conquista exige a adaptação a uma nova realidade e contexto de ensino. Embora para a generalidade dos estudantes esta transição ocorra sem dificuldades, para outros, aqueles que são forçados a abandonar, essa mesma fase da vida afigura-se instável e problemática. Sabe-se que o abandono não é uma decisão tomada levianamente, consistindo num processo multidimensional complexo (Casanova, 2018; Sarra et al., 2018) diferente para cada estudante. Dada a heterogeneidade dos estudantes e a multiplicidade de razões, a identificação das dificuldades e possíveis causas de abandono nem sempre é fácil (Casanova, Cervero, et al., 2018). Contudo, importa compreender quais são as causas do abandono, pois uma vez identificadas, podemos agir preventivamente, apoiando os estudantes que se encontram em situações de maior fragilidade. 155 Neste trabalho foram consideradas duas situações de abandono separadamente: as anulações de matrícula (abandono oficial) e as não renovações de matrícula (abandono não oficializado). Após a análise dos motivos inicialmente reportados pelos estudantes para a anulação da sua matrícula percebemos que a não adaptação foi o mais frequente, seguido de razões do foro pessoal e profissional. Por sua vez, analisando os questionários aplicados a estes estudantes e aos estudantes de não renovação de matrícula, os motivos mais referidos relacionaram-se com o facto de o curso não ter correspondido às expectativas, a incompatibilidade entre a vida académica e a vida profissional, os problemas pessoais e familiares e as dificuldades económicas. A UTAD reconhece o impacto que o abandono assume na vida do estudante, e reconhece ainda que algumas destas situações podem ser evitadas. É da responsabilidade das instituições o combate ao abandono e a preocupação no apoio aos estudantes nesta nova etapa das suas vidas. Neste sentido, a UTAD providencia mecanismos de acolhimento e apoio na transição para o ES, pretendendo a identificação e a intervenção precoce em situações de maior fragilidade, potenciando o sucesso académico. Como referido, destes mecanismos de apoio destacamos o OPAPSE, o apoio psicológico, e as atividades promotoras da integração e socialização, nomeadamente: a semana de integração no início do ano letivo, o programa tutoria e mentoria, o qual potencia as redes de suporte social dos estudantes, o desenvolvimento de competências pessoais, sociais e académicas, e atua preventivamente na identificação precoce de eventuais dificuldades (Almeida et al., 2016; Casanova & Almeida, 2016; Casanova, Cervero, et al., 2018; Meggiolaro et al., 2017). O apoio prestado pelo OPAPSE aos estudantes é de extrema importância, uma vez que este intervém e informa os estudantes em diversas problemáticas, nomeadamente na procura de apoio económico (interno e externo à instituição), psicológico, questões de reingresso e de prescrição. Os estudantes que chegam ao OPAPSE são acompanhados de forma próxima e informados das respostas existentes de acordo com os seus pedidos, sendo realizadas as respetivas marcações e encaminhamentos para os diferentes serviços. De realçar que mesmo após o encaminhamento, os estudantes continuam a ser acompanhados pelo OPAPSE. De sublinhar que o apoio e acompanhamento realizado pelo OPAPSE permitiu o encaminhamento de algumas situações para os serviços da UTAD, evitando que os estudantes ficassem sozinhos na resolução dos seus problemas, e promovendo o seu sucesso académico. Algo a melhorar é a divulgação do OPAPSE e restantes mecanismos de apoio aos estudantes, uma vez que os resultados mostraram que muitos ainda não os utilizam. Também pode ser útil uma abordagem pedagógica, no sentido de melhorar a perceção dos estudantes 156 relativamente à ocorrência de problemas e dificuldades, para que não seja estigmatizante recorrer aos mecanismos de apoio disponibilizados pela instituição. Para reflexão futura, e dada a importância atribuída ao desempenho académico na decisão do abandono referido por alguns autores (Bernardo et al., 2017; Casanova, Cervero, et al., 2018), será interessante perceber o impacto deste fator na decisão de abandono. Referências bibliográficas Almeida, L., Araújo, A., & Martins, C. (2016). Transição e adaptação dos alunos do 1oano: variáveis intervenientes e medidas de atuação. Em Ser Estudante no Ensino Superior: O caso dos estudantes do 1o ano (CIEd, pp. 146–164). Bernardo, A., Cervero, A., Esteban, M., Tuero, E., Casanova, J. R., & Almeida, L. S. (2017). Freshmen program withdrawal: Types and recommendations. Frontiers in Psychology, 8, 1–11. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01544 Bernardo, A., Esteban, M., Fernández, E., Cervero, A., Tuero, E., & Solano, P. (2016). Comparison of personal, social and academic variables related to university drop-out and persistence. Frontiers in Psychology, 7. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01610 Casanova, J. R. (2018). Abandono no ensino superior: modelos teóricos, evidências empíricas e medidas de intervenção. Educação: Teoria e Prática, 28(57), 5–22. https://doi.org/10.18675/1981-8106.vol28.n57.p05-22 Casanova, J. R., & Almeida, L. S. (2016). Diversidade de públicos no ensino superior: antecipando riscos na qualidade da adaptação e do sucesso académico em estudantes do 1o ano. Psicologia, Educação e Cultura, XX(1), 27–44. Casanova, J. R., Bernardo, A., & Almeida, L. S. (2018). O abandono de estudantes do ensino superior: estudo de variáveis pessoais e contextuais. Obtido de http://hdl.handle.net/1822/55716 Casanova, J. R., Cervero, A., Núñez, J. C., Almeida, L. S., & Bernardo, A. (2018). Factors that determine the persistence and dropout of university students. Psicothema, 30(4), 408–414. https://doi.org/10.7334/psicothema2018.155 Comissão Guia e Grupo de Análise (2013). Projeto Guia: “Gestão universitária do abandono escolar” - Questionário sobre as causas do abandono e decisões do estudante relativas ao abandono dos estudos no ensino superior. Disponível em: https://ridda2.utp.ac.pa/bitstream/handle/123456789/3139/CuestionarioOnlinePortugues. pdf?sequence=4&isAllowed=y Engrácia, P., & Baptista, J. (2018). Percursos no ensino superior (DGEEC). Obtido de http://www.dgeec.mec.pt/np4/62/ 157 Esteban García, M., Bernardo Gutiérrez, A. B., & Rodríguez-Muñiz, L. J. (2016). Permanencia en la universidad: la importancia de un buen comienzo. Aula Abierta, 44, 1–6. https://doi.org/10.1016/j.aula.2015.04.001 Eurostat. (2020). Europe 2020 indicators - education. Statistics Explained, pp. 1–8. Obtido de https://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php/Europe_2020_indicators__education Ferreira, F., & Fernandes, P. (2015). Fatores que influenciam o abandono no ensino superior e iniciativas para a sua prevenção. Educação, Sociedade & Culturas, 45, 177–197. Ferreira, M., Duarte, J., Cardoso, A. P., Cabral, L., Guiné, R., Campos, S., & Alves, C. (2018). Competências emocionais e prevenção do abandono nos estudantes do ensino superior politécnico. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Especial 6, 17–24. https://doi.org/10.19131/rpesm.0208 Gibbons, M. M., Rhinehart, A., & Hardin, E. (2016). How first-generation college students adjust to college. Journal of College Student Retention: Research, Theory and Practice, 0(0), 1–23. https://doi.org/10.1177/1521025116682035 Hällsten, M. (2017). Is education a risky investment? The scarring effect of university dropout in Sweden. European Sociological Review, 33(2), 169–181. https://doi.org/10.1093/esr/jcw053 Meggiolaro, S., Giraldo, A., & Clerici, R. (2017). A multilevel competing risks model for analysis of university students’ careers in Italy. Studies in Higher Education, 42(7), 1259–1274. https://doi.org/10.1080/03075079.2015.1087995 Ortiz-Lozano, J. M., Rua-Vieites, A., Bilbao-Calabuig, P., & Casadesús-Fa, M. (2018). University student retention: Best time and data to identify undergraduate students at risk of dropout. Innovations in Education and Teaching International. https://doi.org/10.1080/14703297.2018.1502090 Respondek, L., Seufert, T., Stupnisky, R., & Nett, U. E. (2017). Perceived academic control and academic emotions predict undergraduate university student success: Examining effects on dropout intention and achievement. Frontiers in Psychology, 8, 1–18. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.00243 Ribeiro, F. B., Cabreira, C. , Silva, A. P. , & Cravino, J. P. (2017). Intervir para Reduzir o Abandono: Recursos, respostas institucionais e intervenção em situações de risco na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. In Ser Estudante no Ensino Superior: As respostas institucionais à diversidade de público (pp. 177-196). Braga: Universidade do Minho. Ribeiro, F. B., Cravino, J. P., Sacramento, O., Escola, J., Justino, E., Borges, D., … Cerqueira da Silva, C. (2014). Abandono escolar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. 158 Estudo exploratório (Fernando Bessa Ribeiro Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. (Coordenação), Ed.). Vila Real: Sarra, A., Fontanella, L., & Di Zio, S. (2018). Identifying students at risk of academic failure within the educational data mining framework. Social Indicators Research, 1–20. https://doi.org/10.1007/s11205-018-1901-8 Sosu, E. M., & Pheunpha, P. (2019). Trajectory of university dropout: investigating the cumulative effect of academic vulnerability and proximity to family support. Frontiers in Education, 4, 1–10. https://doi.org/10.3389/feduc.2019.00006 Stewart, S., Lim, H., & Kim, J. (2015). Factors influencing college persistence for first-time students. Developmental Education, 38(3), 12–16. Teixeira, M. A. P., Dias, A. C. G., Wottrich, S. H., & Oliveira, A. M. (2008). Adaptação à universidade em jovens calouros. Psicologia Escolar e Educacional, 12(1), 185–202. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572008000100013 Teixeira, M., & Costa, C. (2018). Fontes de autoeficácia em estudantes do ensino superior. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 19(2), 143–155. https://doi.org/1026707/1984-7270/2019v19n2p143 Tinto, V. (1975). Dropout from higher education: A theoretical synthesis of recent research. Review of Educational Research, 45(1), 89–125. https://doi.org/10.3102/00346543045001089 Vieira, M. M. (2019). Sucesso, insucesso e desistência no ensino superior - conceitos, percursos e subjetividades. Em Luís Eduardo Nicolau (Ed.), 31 Desafios (1a, pp. 161– 166). Funchal: Imprensa Académica. 159 8. LE RÔLE DU MENTOR DANS LES STAGES DES FUTURS ENSEIGNANTS DES ÉCOLES Maria Frounta20, Charikleia Pitsou21 & Costas Malamas22 Résumé Le stage joue un rôle de plus en plus important dans la formation initiale des futurs enseignants. Dans le cas du Département des Sciences de l’Éducation et du Travail Social de l’université de Patras, il s’échelonne du 5e au 8e semestre. Il débute à l’université et se poursuit dans les écoles où les étudiants passent par une phase d’observation avant d’assumer les activités pédagogiques de la classe sous la tutelle de l’enseignant titulaire de la classe ou mentor. Dans ce contexte, le rôle du mentor est central étant donné qu’il fonctionne comme un superviseur de l’étudiant. Lors de cette communication, nous présenterons les résultats d’une recherche faite sur questionnaire auprès des étudiants qui participent au stage du 5e semestre. Sur un total de 220 étudiants du 5e semestre, 184 étudiants ont complété le questionnaire. Les résultats montrent que l’efficacité du stage et la satisfaction des étudiants sont liés à la qualité du mentor et sa capacité à établir un sentiment de confiance ainsi qu’au climat général de l’établissement. De plus, faute d’un nombre suffisant de mentors formés à cette tâche, la coopération n’est pas telle qu’espérée. Par ailleurs, les mentors semblent, parfois, jouer plus le rôle du gardien des habitudes du métier qu’œuvrer à faciliter son renouveau. Mots-clés : Université. Formation Initiale des Enseignants. Stage. Mentor. Introduction Le terme même de formation des enseignants suggère que l’enseignement est un métier et non pas une vocation. Cependant, l’enseignement ne consiste pas seulement en une liste de techniques à apprendre et à appliquer. C’est aussi une capacité à comprendre, à réfléchir et à agir pédagogiquement dans un environnement d’apprentissage. Pour cette raison, dans le curriculum de la formation initiale des enseignants des écoles, partout dans le monde, existe une période d’initiation au métier par des stages dans les écoles (Saifullah, Sherzaman, Syed PhD, Enseignante, Université de Patras – Grèce, email : mariafggm@upatras.gr PhD, Enseignante, Université de Patras – Grèce, email : xpitsou@hotmail.com 22 Conseiller des écoles, Athènes – Grèce, email : syn86-at3@sch.gr 20 21 160 Shafqat, Asima, & Sehrish, 2013; Essays, 2018). Ce stage est censé familiariser les futurs enseignants au contexte du métier et aux réalités d’une classe scolaire (Abiodun, 2017). En d’autres termes, le stage consiste en la mise en contact des étudiants avec les conditions réelles de l’acte didactique et du processus d’apprentissage des élèves. Dans ce cadre, l’étudiant est appelé à prouver sa capacité à mobiliser les savoirs théoriques acquis dans l’espace universitaire et à les mettre à l’épreuve de la réalité de la classe (Abiodun, 2017). Pour beaucoup, tant formateurs qu’étudiants, le stage est considéré comme une activité formatrice clé dans le programme d’études. Des recherches montrent que les étudiants considèrent le stage comme l’élément le plus utile du programme d’études étant donné qu’il représente la transition du statut d’étudiant au statut de maître (Essays, 2018). La place, l’organisation et le temps octroyé au stage varient par établissement et par programme d’étude. Le stage est, parfois, considéré comme un cours obligatoire, parfois, il est organisé après une période de formation formelle dans l’environnement universitaire. Dans d’autre cas, le stage commence dans l’espace universitaire avec des activités préparatoires avant qu’il soit déplacé dans une classe. Dans d’autre cas, il commence directement dans les écoles. Malgré ces différences d’organisation, une fois arrivé à l’école, l’étudiant suit l’enseignement de l’enseignant de la classe, et par la suite, il assume personnellement le fonctionnement de « sa » classe (Essays, 2018). La prise en charge d’une classe scolaire n’est pas seulement une dimension de la formation initiale de l’étudiant c’est aussi un acte formateur pour la constitution de l’identité professionnelle du futur enseignant. Une expérience négative lors du stage peut causer un blocage du développement des compétences professionnelles des futurs enseignants (Tang, Wong, & Li , 2019). Cependant, pour un déroulement approprié du stage, une préparation minutieuse est indispensable et commence par la concrétisation des objectifs. Un stage joue un rôle crucial dans l’acquisition par l’étudiant d’une confiance en soi et des compétences nécessaires à un enseignement efficace. En effet, grâce au stage, les étudiants développent des compétences clés pour un enseignement de qualité comme la planification et la mise en œuvre de l’enseignement, la gestion d’une classe scolaire, les compétences communicationnelles, la capacité d’évaluation et d’auto-évaluation mais aussi la capacité à former une personnalité qui corresponde aux attentes du métier (Abiodun, 2017). De plus, à travers le stage, les étudiants se préparent à plusieurs tâches : la gestion efficace du temps scolaire, le choix des pratiques et des activités les plus conformes aux objectifs de l’enseignement et aux capacités de leurs élèves, la motivation des élèves pour qu’ils participent activement au cours, le développement 161 des pratiques et des activités adaptées aux conditions particulières de la classe. Enfin, en suivant la façon d’enseigner, les étudiants ont la possibilité d’observer et d’évaluer les différentes stratégies d’enseignement (Kilic, 2010). L’expérience du stage est si forte qu’elle est en mesure de façonner la perception globale des futurs enseignants pour l’enseignement et l’apprentissage (Saifullah, Sherzaman, Syed Shafqat, Asima, & Sehrish, 2013). Si l’expérience s’avère positive, l’enseignement se fera avec moins de stress et le comportement dans la classe sera aisé et détendu (Abiodun, 2017). Pour le bon déroulement du stage, le « mentoring » de l’étudiant joue un rôle primordial. Le « mentoring » s’avère important au niveau psychologique, didactique et professionnel (Χατζοπούλου & Κακανά, 2013). Selon leur définition le « mentoring » est « un processus au travers duquel un enseignant expérimenté transmet les informations et les conseils nécessaires à l’enseignant débutant, en même temps qu’il le soutient psychologiquement pendant un temps déterminé » (Ανδρούτσου & Τσάφος, 2013). Dans la pratique, un mentor joue le rôle d’un hôte qui introduit et soutient l’étudiant dans une classe. Bien sûr, le but final sera l’intégration de l’étudiant dans la classe où il est censé effectuer son stage. À travers cette expérience, mentor et étudiants peuvent partager leurs efforts et générer des connaissances nouvelles sur le métier (Parker Katz & Tejero Hughes, 2008). Depuis les années 1980, le « mentoring » est reconnu comme une activité centrale de la formation initiale de futurs enseignants car il tente d’établir des interconnexions entre la théorie et la pratique de la classe. Des chercheurs soutiennent que le « mentoring » pour qu’il soit efficace, doit se faire en petits groupes (Singh & Mahomed, 2013). Le mentor n’est pas un simple observateur passif qui fait des constatations après l’enseignement d’un étudiant. Des recherches montrent que l’étudiant s’enrichit davantage si sa coopération avec son mentor est continue et systématique. Le feedback que les mentors donnent aux étudiants joue un rôle crucial pour le futur parcours de l’enseignant. Pour cette raison, les étudiants protestent quand le « mentoring » n’est pas de qualité (Genç, 2016). Des recherches soulignent aussi le rôle de l’expérience chez le mentor de sorte que les étudiants profitent d’un accompagnement de qualité (Schepens A. A., 2009; Izadinia, 2016; Zhao & Zhang, 2017). Ainsi, la question du profit de mentor s’impose. Un bon accompagnateur est celui qui a une bonne expérience d’enseignant, qui est bien formé, qui suit les évolutions de la recherche et du métier et qui dispose d’un arsenal abondant de méthodes et de pratiques d’enseignement. Dans ce cas-là, le mentor est considéré comme un référent professionnel pour l’étudiant (Richards, 2010; Singh & Mahomed, 2013). En effet, ces mentors peuvent faciliter l’intégration des étudiants dans la culture scolaire et réduire ainsi 162 la difficulté de la transition de la place d’étudiant à la place d’enseignant. (Zhao & Zhang, 2017). Izadinia, M. (2016), dans sa recherche, a signalé l’importance du soutien émotionnel et académique ainsi que de la communication et du feedback entre le mentor et l’étudiant. Il s’agit des éléments qui caractérisent une bonne relation de « mentoring ». Pour les étudiants, le soutien émotionnel et académique de leurs mentors s’avère fondamental. Sur ce point, une divergence émerge. D’une part, les mentors semblent considérer que leur rôle serait d’amener les stagiaires à décider de manière consciente et fondée s’ils veulent encore continuer à ce métier ou pas. D’autre part, les stagiaires souhaiteraient une relation basée sur l’encouragement constant et le soutien émotionnel afin de construire une confiance mutuelle. La bibliographie spécifique signale qu’une relation émotionnelle étroite entre le mentor et l’étudiant conduit à de meilleurs résultats y compris la compétence d’auto-évaluation (Zhao & Zhang, 2017). Cependant, le « mentoring » n’est pas une compétence inhérente chez l’homme. Par conséquent, un bon enseignant n’est pas nécessairement un bon mentor. Pour cette raison, des chercheurs mettent en lumière une contradiction flagrante : en amont, le rôle des enseignantsmentors est crucial, et en aval, ces enseignants-mentors ne sont que rarement formés pour assumer ce rôle (Genç, 2016). Pour conclure, le stage et le « mentoring » constituent des issues importantes dans la formation initiale des enseignants des écoles. Or, malgré le fait que le stage et le « mentoring » prennent, au fur et à mesure, une place plus importante dans les programmes d’études pour les enseignants des écoles, les recherches sur les mentors se font rares et un manque de donnés existe (Richards, 2010). Suite à une étude synthétique des recherches effectuées sur une période de 25 ans, les chercheurs ont souligné que, d’une part, le rôle de mentor est significatif, et que d’autre part, un flou généralisé existe sur les tâches concédées au mentor. En effet, il existe un manque de concrétisation de son rôle ainsi qu’une lacune sur sa formation nécessaire, son œuvre à accomplir et sa fonction lors de son travail. Finalement, les attentes et les exigences de son rôle ne sont pas claires (Cohen, Hoz, & Kaplan, 2013). Le cadre de référence du stage au Département des Sciences de l’Éducation et du Travail Social de l’Université de Patras Le stage est organisé en trois phases (ΟΔΗΓΟΣ ΣΠΟΥΔΩΝ, 2017-2018): 163 a) La première est intégrée au curriculum de la troisième année d’études (5e semestre) et elle est d’une durée de 13 semaines. Les étudiants suivent 5 ateliers d’initiation dans les locaux du département et ensuite ils suivent des cours et enseignent dans une classe pendant 8 jours (5 heures par jour). Cette phase est strictement liée aux cours de didactiques des matières scolaires. La participation au stage fait partie intégrante des cours et considérée comme un « exercice en laboratoire » (la partie « mise en pratique » de ces cours). Elle est obligatoire pour tous les étudiants et un étudiant ne peut pas passer aux niveaux suivants sans avoir l’accompli. b) La deuxième phase commence au 7e semestre (4e année d’études). Les étudiants participent aux cours d’une classe de primaire dans l’École Expérimentale de l’Université de Patras pendant une semaine23. Ils sont considérés comme des maîtres auxiliaires. c) La troisième phase se déroule au 8e semestre (dernier semestre des études). Elle a le statut d’un cours indépendant d’une durée de 13 semaines. Dans cette phase, l’étudiant assume pleinement le rôle de l’enseignant sous tutelle du maître de la classe (« mentoring »). Pour s’y adapter l’étudiant :  coopère avec les enseignants-accompagnateurs  bénéficie d’un accompagnement actif lors de son enseignement  participe à des ateliers, des réunions d’équipes ou assiste à des présentations spécifiques dans le but d’enrichir sa réflexion sur son travail. L’évaluation de la procédure de cette phase est faite par les étudiants, les accompagnateurs et les mentors24. Les étudiants et les mentors remplissent deux questionnaires différents. La note finale de l’étudiant est la synthèse de : a) sa performance didactique à l’école. Elle est définie par les mentors et les accompagnateurs, b) l’appréciation du portfolio (plans des cours/plans didactiques, auto-évaluation et les évaluations par les mentors et les accompagnateurs) et c) la participation active de l’étudiant aux ateliers. Sur la base de cet état des lieux présenté, trois questions de recherche ont été formulées : 1ere question : Quelle appréciation du stage font les étudiants par rapport à son utilité globale et par rapport à la relation mentor - étudiant? 23 L’école expérimentale de l’Université de Patras est utilisée comme un lieu d’expérimentations pédagogiques et elle accueille les étudiants de l’Université destinés devenir des enseignants du primaire et du secondaire. 24 En effet, la préparation de l’étudiant commence à l’Université. Le responsable est un enseignantchercheur. L’enseignant-chercheur coopère avec les enseignants spécialisés du Département dont le statut est différent de celui des enseignants-chercheurs. Ces enseignants spécialisés, désignés comme accompagnateurs, prennent en charge un nombre d’écoles qui correspond à 25-30 étudiants par accompagnateurs. Le rôle des enseignants spécialisés est de préparer, accompagner et faciliter la réflexivité de l’étudiant. Donc, pendant le stage, chaque étudiant est suivi par un accompagnateur (qui est membre de l’université) et le mentor (qui est l’instituteur de la classe de réception). 164 2eme question : En quoi les origines sociales des étudiants influent-elles sur les réponses données à la première question? 3eme question : Quelle est la relation entre la réponse des étudiants sur l’utilité globale du stage et la réponse sur la qualité de la relation mentor et étudiant? 3. La recherche L’Objectif de la recherche consiste en l’analyse de l’opinion des étudiants-stagiaires sur leur expérience de stage et est formulé autour de trois questions de recherche. Notre démarche a pour but de recueillir des données susceptibles de contribuer à l’amélioration du stage. 3.1. La mise en application L’outil utilisé a été un questionnaire composé de questions fermées. L’échantillon est constitué des étudiants de la 3e année d’études du Département des Sciences de l’Éducation et du Travail Social de l’Université de Patras. Par voie de conséquence, notre échantillon est un échantillon « de facilité » (Bryman, 2017). En tout, 184 étudiants, sur un total de 220 étudiants, ont rempli le questionnaire (année académique 2018-2019). Ces étudiants venaient de terminer leur stage (5e semestre). Ils avaient donc assisté au cours de leurs mentors et enseigné dans leurs classes pendant 8 jours (5 heures par jour). Cependant, il faut signaler qu’il ne s’agit que du premier niveau du stage. Les questions ont été formulées selon l’échelle de Likert (de trois ou cinq échelons). Dans la première partie du questionnaire des données démographiques, sociales et éducatives des étudiants ont été collectées. 3.2. Analyse de données Pour l’analyse de données nous avons utilisé le logiciel SPSS, version 24. Dans ce texte, nous utilisons les données sociodémographiques ainsi que deux facteurs qui concernent l’utilité du stage et la relation mentor-étudiant25. Pour la présentation des résultats, la moyenne et l’écart type ainsi que les fréquences et les pourcentages ont été utilisés. Les facteurs de la recherche sont présentés sous forme de 100*[(Xi-minimum(X))/Range(X)], afin que les valeurs statistiques se situent entre [0,100]. Pour le contrôle des facteurs du stage (valeur du stage et relation mentor-étudiant) avec des variables sociodémographiques et éducatives, nous avons utilisé le contrôle non paramétrique Kruskal Wallis, en raison du petit nombre de cas (n<30) et l’échelle Likert (à trois ou cinq La relation, dans cette recherche, est centrée principalement sur l’intervention de l’enseignant et sur l’autonomie de l’étudiant. 25 165 échelons). L’hypothèse initiale du contrôle est que les k-cas (k >2) proviennent de la même population (indépendance des variables). Pour le contrôle de régularité des deux facteurs (valeur du stage et relation mentor-étudiant) le contrôle Shapiro Wilk a été utilisé. L’hypothèse initiale est que les facteurs suivent la régularité paramétrique. Comme l’hypothèse de régularité n’était pas satisfait par le contrôle de corrélation entre les facteurs, on a utilisé le coefficient de corrélation Spearman dont la valeur est entre -1 et 1. L’hypothèse initiale du contrôle est que la corrélation linéaire n’est pas statistiquement significative. Le niveau de signification est défini à 5%. L’hypothèse initiale est acceptée pour une p-valeur ≥ 0,05 (Κολυβά-Μαχαίρα, Μπόρα-Σέντα, & Μπράτσας, 2017). 3.3. Fiabilité des données La fiabilité des données est contrôlée pour chaque facteur par le coefficient Alpha Cronbach, pour lequel les valeurs acceptées sont celles de plus de 0,7 (Nunnaly & Bernstein, 1994). Le tableau 1 montre que les valeurs sont toujours plus de 0,7. Tableau 1: Analyse de fiabilité Facteur Valeur du stage Relation mentor-étudiant Questions 6 3 Cronbach’s Alpha 0,806 0,719 Résultats I. Données démographiques, socioéconomiques et éducatives L’échantillon est composé par 80,22% (Ν=146) de femmes et 19,78% (Ν=36) d’hommes. L’écrasante majorité des participants, 91,11% (Ν=164), a un âge entre 19-22 ans, 2,2% (N=4) entre 23-25 ans et 6,67% (N=12) plus de 26 ans. Quant à la préférence des participants par rapport au programme d’études26, pour les 65,34% (Ν=115) ce département a été le premier vœu, pour les 24,43% (N=43) le second et pour les 10,23% (N=18) le troisième. En ce qui concerne la situation sociale des parents : a) 74,32% (Ν=136) des pères ont un travail stable, 13,66% (N=25) sont retraités, 7,65% n’ont pas de travail stable et 1,64% (N=3) sont au chômage, 26 En Grèce, un bachelier doit passer un examen national et par la suite remplir un formulaire administratif avec ses vœux classés par ordre de préférence. A terme, le Département de réussite est déterminé par : a) le nombre d’entrée par Département fixé par le Ministère, b) la performance à l’examen national, c) la liste des voeux du candidat. 166 b) 49,46% (N=91) des mères ont un travail stable, 23,91% sont femmes au foyer, 10,33% sont retraitées, 8,7% n’ont pas de travail stable, 6,52% sont au chômage et 1.09% (N=2) « autre ». Enfin, les participants ont déclaré que l’expérience du stage concernait la cinquième année (5e) de l’école primaire 21,86% (N=40), la 4e année 19,13% (N=35), la 6e année 18,03% (N=33), la 3e année 16,94% (N=31), la 2e année 15.30% (N=28) et la 1er année 8,74% (N=16)27. II. 1ere Question de recherche Quelle appréciation du stage font les étudiants par rapport à son utilité globale et par rapport à la relation mentor-étudiant?  La valeur du stage Les réponses ont été données sur une échelle en cinq échelons. Avec le tableau 2, nous constatons que le stage a été considéré comme très important pour les étudiants (moyenne = 4,66/5). Grâce au stage, ils ont mieux appréhendé le fonctionnement de l’école (moyenne= 4,44). De plus, les participants au stage considèrent qu’ils ont amélioré leurs capacités didactiques (moyenne= 4,14), qu’ils ont davantage développé leurs connaissances et compétences initialement acquises à l’université lors des cours (moyenne= 3,98) et qu’ils ont développé des compétences réflexives (moyenne= 3,94). Les réponses des participants sont plus mitigées quant au développement des capacités de planification et de mise en œuvre de l’ensemble de la matière scolaire (moyenne=3,57). L’écart type se situe entre 0,68 et 0,96. Tableau 2 : Valeur du stage       Questions Le stage a été important pour moi J’ai mieux compris le fonctionnement de l’école J’ai amélioré ma capacité didactique J’ai développé davantage mes connaissances et compétences J’ai développé des compétences réflexives J’ai amélioré ma compétence de planification et de mise en œuvre de cours dans l’ensemble des matières scolaires Moyenne 4,66 4,44 4,14 3,98 3,94 3,57 Écart Type 0,68 0,74 0,76 0,81 0,71 0,96  La relation entre mentor et étudiant La question visait, en principe, à comprendre le degré d’interventionnisme du mentor et le sentiment d’autonomie chez l’étudiant. Les réponses étaient données sur cinq échelons. Par les réponses (tableau 3), les étudiants semblent être contents de leur autonomie 27 En Grèce, l’école élémentaire comporte six classes. 167 (moyenne=4,24). Le mentor semble intervenir modérément lors de la préparation du matériel à utiliser et lors des activités à programmer (moyenne=1,66) et aussi lors du déroulement de l’enseignement dans la classe (moyenne=1,69). L’écart type est entre 0,88 et 1,05. Par conséquent, il semble que l’interventionnisme variait selon le mentor mais en tout état de causes restait modéré. Tableau 3: Relation entre mentor et étudiant Questions  Je me sentais libre d’organiser mon enseignement  Le mentor intervenait lors de mon enseignement  Le mentor intervenait lors de la préparation du matériel et de la programmation des activités que je voulais développer Moyenne 4,24 1,69 1,66 Écart Type 0,88 0,99 1,05 Après la réduction des valeurs à une échelle 0-100, nous constatons que les étudiants considèrent positivement la valeur du stage (moyenne=78,02, +/- 13,96). Les étudiants pensent aussi que les mentors n’intervenaient pas trop et que leur autonomie n’était pas atteinte (moyenne=17,71, +/-19,53). III. 2eme Question de recherche En quoi l’origine sociale des étudiants influencent-elles les réponses données à la première question? En ce qui concerne la deuxième question, l’influence des variables sociales semble limitée. Deux variables paraissent jouer un rôle significatif sur le facteur relation, mentor-étudiant : a) la situation professionnelle de la mère et b) la classe du primaire où l’étudiant a fait son stage.  La situation professionnelle de la mère Le Tableau 4 présente les résultats des contrôles Kruskal Wallis des deux facteurs avec la variable « situation professionnelle de la mère ». L’analyse statistique a montré qu’il y a une différence significative des rangs moyens (means ranks) avec le facteur « relation mentorétudiant » (H(5)=12,320, p=0,031). De plus, du tableau 5, il résulte que, concernant le facteur « relation mentor-étudiant », les étudiants avec des mères des catégories « retraitées » ou « autre » ont un rang moyen (mean rank) plus élevé comparée aux autres catégories. 168 Tableau 4: Contrôles Kruskal Wallis entre le facteur relation mentor-étudiant et la situation professionnelle de la mère Η 2,456 12,320 Facteur du stage Valeur du stage Relation mentor-étudiant df 5 5 P 0,783 0,031 Tableau 5: Différences statistiquement significatives des rangs moyens entre le facteur mentor-étudiant et la variable situation professionnelle de la mère Facteur du stage Intervention du mentor, autonomie d’étudiant Catégories Travail stable N 91 R.M. 95,99 Travail instable 16 102,59 Chômage 12 54,46 Retraitée 19 107,45 Femme au foyer Autre 44 2 83,17 144,25 P 0,031  Le niveau de la classe de participation lors du stage Le tableau 6 présente les résultats des contrôles Kruskal Wallis sur les facteurs du stage concernant le niveau de la classe où l’étudiant effectue son stage. Il y a des différences significatives des rangs moyens (means ranks) entre la relation du mentor-étudiant et le niveau de la classe du stage (H(5)=12,608, p=0,027). De plus, du tableau 7, il ressort que le facteur concernant la relation mentor-étudiant donne une relation significative au niveau de la classe. En effet, les étudiants qui ont suivi les niveaux les plus élevés (5e et 6e) montrent du rang moyen (mean rank) plus élevé (5e (107,48) ή 6e (106,53). Tableau 6: Contrôles Kruskal Wallis des facteurs du stage à la variable « niveau de la classe » Facteurs du stage Valeur du stage Relation entre mentor-étudiant (Intervention du mentor/autonomie de l’étudiant) Η 10,794 12,608 df 5 5 p 0,056 0,027 169 Tableau 7: Différences statistiquement significatives des rangs moyens (means ranks) des facteurs en fonction de la variable niveau de la classe Facteur du stage Relation mentor-étudiant (Intervention du mentor/Autonomie de l’étudiant) Catégories (classes scolaires) Α΄ N 16 R.M 94,72 P Β΄ 28 78,84 C΄ 31 72,69 D΄ 35 87,00 Ε΄ F΄ 40 33 107,48 106,53 0,027 IV. 3e question de recherche Quelle relation entre la réponse des étudiants concernant l’utilité globale du stage et la réponse sur la qualité de la relation entre mentor et étudiant? Le tableau 8 présente les résultats du contrôle de régularité du test Shapiro Wilk pour les facteurs dont la régularité n’a pas été satisfaite (p<0,001). Le tableau 9 présente les résultats des corrélations Spearman des facteurs entre eux. Il semble que le facteur « valeur du stage » révèle une relation négativement significative avec la relation mentor-étudiant (intervention du mentor/autonomie de l’étudiant) (r=-0,234, p<0,01). Tableau 8: Résultats du contrôle de régularité des facteurs entre eux avec l’usage du test Shapiro Wilk Facteur P Valeur du stage <0,001 Relation mentor-étudiant (Intervention du mentor/Autonomie de l’étudiant) <0,001 Tableau 9: Corrélations Spearman des facteurs entre eux Corrélation Spearman Valeur du stage Intervention du mentor/autonomie de l’étudiant -0,234** **Corrélations statistiquement significatives à 1%. Discussion des résultats 184 étudiants de la 3e année d’études ont participé à la recherche. Dans une majorité écrasante, il s’agit de femmes entre 19-22 ans. Les pères ont, en majorité, un travail stable (ou sont retraités) (donc, ils disposent un financement stable et régulier). Les mères, elles, ont, soit un travail stable (ou sont retraitées) soit sont femmes au foyer, c’est le cas dans leur majorité. Nous avons décidé de demander « la situation de professionnelle » des parents car le pays (La Grèce) sort d’une crise économique majeure et présente encore un taux de chômage élevé. 170 Ainsi, nous constatons que la majorité des étudiants viennent de familles qui ne sont pas violemment touchées par la crise, même si les salaires ont nettement diminués. Pour l’écrasante majorité des étudiants, le Département des Sciences de l’Éducation et du Travail Social de l’Université de Patras, a fait partie des trois premiers choix exprimés par les candidats au concours d’entrée à l’université. Cependant, ceux qui déclarent que ces études étaient vraiment « les études rêvées » sont beaucoup moins nombreux. En effet, nous observons qu’entre les « études rêvées » et les choix exprimés sur la plateforme de l’Éducation Nationale, et le facteur réussite ou non aux examens nationaux, des enjeux sociaux interviennent et façonnent un choix biaisé des études. Concernant notre première question de recherche, nous avons examiné les facteurs « valeur du stage » (selon les étudiants participants) et « relation mentor-étudiant » (en se focalisant sur l’interventionnisme du mentor et le sentiment d’autonomie de l’étudiant). Les étudiants semblent convaincus de l’utilité du stage. Selon leur opinion, grâce au stage, ils ont mieux compris le fonctionnement de l’école et de la classe scolaire. Ils croient encore qu’ils ont amélioré leurs capacités d’enseignement, ils ont approfondi leurs connaissances et ils ont accru une capacité réflexive. De plus, les étudiants ne se sentaient pas, en général, trop contrôlés par les mentors. Cependant cette image globale doit être mitigée car l’écart type de réponses était important et en conséquence nous pouvons supposer que quelques mentors étaient plus dirigistes que d’autres. À noter aussi que le mentor intervenait, modérément, dans la préparation du cours par l’étudiant. Cette intervention précoce pourrait peut-être expliquer le niveau modéré de l’intervention lors de l’enseignement. Quant à la seconde question, l’analyse des variables sociodémographiques et éducatives n’ont pas donné beaucoup de corrélations statistiquement significatives. Comme exceptions, nous avons cité les variables « situation professionnelle de la mère » et « niveau de classe ». Quant à la première variable, les résultats ne sont pas facilement lisibles. En conséquence, une recherche qualitative focalisée sur le rôle des mères (d’une population d’étudiant dans un Département très féminisée) s’avère opportune dans l’avenir. Par contre, les résultats concernant le niveau de classe signalent une considération implicite. En effet, les enseignantsmentors semblent considérer les deux dernières classes de l’école élémentaire comme plus difficiles que les autres. Ainsi, ils ont tendance à intervenir plus souvent lors du stage des étudiants. Concernant la troisième question, il semble que les étudiants les plus satisfaits du stage sont ceux qui ont le moins senti l’intervention du mentor. Ainsi, deux réflexions surgissent. Premièrement, le rôle du mentor est crucial. Or, l’élément central de son rôle n’est pas, pour 171 les étudiants, son intervention sur le travail de l’étudiant. Ainsi, dans les cas où le mentor intervenait davantage, cela produisait un mécontentement chez l’étudiant qui se sentait privé de son autonomie. Conclusion Pour conclure, l’expérience du stage a été décrite comme positive par une grande partie des étudiants. Le stage a été appréhendé comme moyen de connexion de la théorie à la pratique dans l’espace professionnel. Cependant, malgré l’enthousiasme des étudiants, un point critique émerge qui concerne le rôle précis du mentor. Quel est le terrain de son action et quelles en sont les limites? Quel est le point crucial après lequel son aide nécessaire se transforme en une intervention peu désirée par l’étudiant? Ces questions semblent être en accord avec la bibliographie spécialisée qui signale les problèmes de concrétisation des tâches et du rôle des mentors. À signaler aussi, le manque de corrélation de deux facteurs examinés avec les variables sociodémographiques. Cependant, une recherche qui se focalisera sur le rôle des mères (d’une population d’étudiant féminisée), avec comme notion analytique l’« autonomie », parait intéressante. Enfin, il semble que le niveau de la classe où est effectué le stage, influence le rôle du mentor. En effet, l’analyse a montré que les mentors des deux dernières classes de l’école élémentaire ont fait preuve d’un interventionnisme plus important. Ainsi, nous pouvons suggérer que les enseignants considèrent ces classes comme étant plus exigeantes que les autres. En revanche, les étudiants qui ont fait leur stage dans les premières classes semblent avoir profité d’une autonomie plus élargie. Il s’agit d’une analyse qui démontre l’importance du mentor. De plus, l’expérience et la formation du mentor semble décisive. Il fait aussi signaler les limitations de cette recherche, étant donné que ses résultats concernent un échantillon de facilité et donc la généralisation des résultats n’est pas conseillée. Par contre, elle peut s’avérer utile pour une réflexion globale sur l’utilité du stage et sur le rôle du mentor. Références Abiodun, A. (2017). Pre-service teachers perception on teaching practice exercise organized by their institution. A Project written in the Science and Technology Education (STED) Faculty of Education in Olabisi Onabanjo University Ago Iwoye Ogun. Retrieved july 2018, from https://www.academia.edu/31654843/PRESERVICE_TEACHERS_PERCEPTION_ON_TEAC 172 HING_PRACTICE_EXERCISE_ORGANIZED_BY_THEIR_INSTITUTION_OLABISI_ON ABANJO_UNIVERSITY Ανδρούτσου, Α., Τσάφος, Β. (2013). Εκπαιδεύοντας εκπαιδευτικούς ως μέντορες μελλοντικών εκπαιδευτικών σε ένα διερευνητικό αναστοχαστικό πλαίσιο. Στο Ανδρούτσου, Α., Αυγητίδου, Σ. (επιμέλεια). Η πρακτική άσκηση στην αρχική εκπαίδευση των εκπαιδευτικών: Ερευνητικές προσεγγίσεις σελ. 360-395. Δίκτυο Πρακτικών Ασκήσεων τμήματος εκπαίδευσης και αγωγής στην προσχολική ηλικία. Αθήνα: ΕΚΠΑ Bryman, A. (2017). Μέθοδοι κοινωνικής έρευνας. Μετ. Π. Σακελλαρίου, Επιμ. Α. Αϊδίνης. Αθήνα: Gutenberg Cohen, E., Hoz, R., & Kaplan, H. (2013). The practicum in preservice teacher education: a review of empirical studies. Teaching Education, Vol. 24(4), pp. 345-380. Doi:http://dx.doi.org/10.1080/10476210.2012.711815 Essays, U. (2018). The Concept of Teaching Practicum. Retrieved from. Retrieved April 2019, from UK Essays: https://www.ukessays.com/essays/education/the-concept-ofteaching-practicum-education-essay.php?vref=1 Genç, Z. (2016). More practice for pre-service teachers and more theory for in-service teachers of English language. Procedia - Social and Behavioral Sciences, Vol. 232, pp. 677–683. Retrieved April 2019, from https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2016.10.092 Izadinia, M. (2016). Student teachers’ and mentor teachers’ perceptions and expectations of a mentoring relationship: Do they match or clash? Professional Development in Education, Vol. 42(3), pp. 387–402. Doi:10.1080/19415257.2014.994136 Kilic, A. (2010). Learner-centered micro teaching in teacher education. International Journal of Instruction January, V. 3(1), pp. 77-100. Retrieved from www.e-iji.net Κολυβά-Μαχαίρα, Φ., Μπόρα-Σέντα, Ε., & Μπράτσας, Χ. (2017). Στατιστική: Θεωρία Εφαρμογές - Παραδείγματα στην R. (3η ed.). Θεσσαλονίκη: Ζήτη. Nunnaly, J., & Bernstein, I. (1994). Psycometric Theory. (3rd ed.). New York: McGraw-Hill. ΟΔΗΓΟΣ ΣΠΟΥΔΩΝ. (2017-2018). Παιδαγωγικό Τμήμα Δημοτικής Εκπαίδευσης. Σχολή Ανθρωπιστικών και Κοινωνικών Επιστημών. Πανεπιστήμιο Πατρών Parker Katz, M., & Tejero Hughes, M. (2008, April). Preparing Special Education Mentors Using Classroom Artifacts as a Vehicle for Learning About Teaching. Teacher Education and Special Education, Vol. 31(4), pp. 268-282. Retrieved April 2019, from https://doi.org/10.1177/0888406408330646 Richards, J. C. (2010). Mentoring Preservice Teachers in a Community of Practice Summer Literacy Camp: Master’s Students’ Challenges, Achievements, and Professional 173 Development. The Qualitative Report, Vol. 15(2), pp. 318-339. Retrieved November 2018, from http://www.nova.edu/ssss/QR/QR15-1/richards.pdf Saifullah, S., Sherzaman, Syed Shafqat, A. S., Asima, I., & Sehrish, Z. (2013). Effect of Reformed Teaching Practicum on Professional Development of B.Ed (Hons) Prospective Teachers. Bulletin of Education and Research., Vol. 35(2), pp. 125-138. Schepens, A. A. (2009). Student teachers’ professional identity formation: Between being born as a teacher and becoming one. Educ. Stud., Vol. 35, pp. 361–378. Doi:10.1080/03055690802648317 Singh, P., & Mahomed, C. (2013). The Value οf Mentoring τo Develop Student Teachers’ Work-Integrated Learning Skills. International Business & Economics Research Journal, Vol. 12(11), pp. 1373-1387. Doi:10.19030/iber.v12i11.8175 Tang, S. Y., Wong, A. K., & Li, D. D. (2019). Re-conceptualising professional competence development of student teachers in initial teacher education. Research Papers in Education. Doi:10.1080/02671522.2019.1633563 Zhao, H., & Zhang, X. (2017). The Influence of Field Teaching Practice on Pre-service Teachers’ Professional Identity: A Mixed Methods Study. Front. Psychol., Vol. 8, p. 1264. Doi:10.3389/fpsyg.2017.01264 Χατζοπούλου, Κ. & Κακανά, Δ.Μ. (2013). Υποστηρίζοντας το στοχασμό των υποψήφιων εκπαιδευτικών στο πλαίσιο της Πρακτικής Άσκησης. Συγκριτικά αποτελέσματα μέσω πειραματικής έρευνας. Στο Αλ. Ανδρούσου & Σ. Αυγητίδου (επιμ.) Η πρακτική άσκηση στην αρχική εκπαίδευση των εκπαιδευτικών: Ερευνητικές προσεγγίσεις σελ.125-156. Δίκτυο Πρακτικών Ασκήσεων, Αθήνα: ΤΕΑΠΗ-ΕΚΠΑ. 174 9. CONTRIBUTIONS TO REDUCE ACADEMIC FAILURE IN STEM BACHELOR COURSES José Carlos Lopes28, Maria do Rosário Correia29, João Miguel Dias30 & Luis Descalço31 Abstract According to Portuguese official data, less than half of the students enrolled in a bachelor program manage to complete it after four years. In the STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics) courses at the University of Aveiro, a probable major factor in this situation is the worryingly high failure rates in the first couple of years of the curricula, namely in the Physics modules. In order to contribute to increasing the success rates in those modules, we have carried out a case study of a 1st year/1st semester module (Elements of Physics), which has about 600 students from STEM courses and an average failure rate of around 30%. The module teachers and course directors involved were inquired on how to reduce failure and on their receptivity to some proposals for curricular reforms and pedagogical innovation. As a result of this case study, we present here a set of four interconnected pedagogical strategies that aim to foster the improvement in learning by students with more difficulties as well as by the best students. The Physics Department has recently created an office (GQIP) dedicated to pedagogical quality and innovation, whose mission is to promote that set of measures and evaluate its efficacy, in addition to doing research in higher education in Physics. We also mention a research project that GQIP will carry out next academic year to study the effectiveness of a model of active learning in large classes, using both quantitative and qualitative methods. Keywords: Pedagogical quality and innovation. Active learning. Attitudes and skills. Criteria-based assessment. Higher education research. 1. Introduction 28 GQIP (Office for Pedagogical Quality and Innovation), Department of Physics, and CIDMA (Center for Research & Development in Mathematics and Applications), University of Aveiro, Portugal. jcl@ua.pt 29 GQIP (Office for Pedagogical Quality and Innovation), Department of Physics & i3N-Aveiro, University of Aveiro, Portugal. mrcorreia@ua.pt 30 Head of the Department of Physics, University of Aveiro, Portugal. joao.dias@ua.pt 31 CIDMA (Center for Research & Development in Mathematics and Applications), Department of Mathematics, University of Aveiro, Portugal. luisd@ua.pt 175 In order to respond to economic needs, Portugal intends to reach the target of having 40% of citizens aged 30-34 years with tertiary level of education (Council of European Union, 2009). This expansion of access to higher education increases the risk of academic failure and dropout rate compared to international reference values (Williams, 2017). The present situation is already worrisome: according to a recent report (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, 2018), four years after entering a public university bachelor degree, only 47% of students had obtained their diploma and 26% had left the higher education system (public and private). The shortage of qualified professionals is particularly acute in the area of STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics), not only in Portugal (Horta, 2013), but in most developed countries (UK Commission for Employment and Skills, 2015), and for decades that efforts have been made to improve the situation (Catterall, 2017). STEM curricula in general have, in the 1st and 2nd years, at least one module of the scientific area of Physics. This paper addresses the situation in STEM courses at the University of Aveiro (UA) in terms of academic failure in Physics modules, as of 2017/18. In the case of UA, such modules are under the responsibility of the Department of Physics (DPhys). In the last few years more than half of those modules had failure rates around 30%, and in some cases higher than 40% (Lopes, 2018). Among those modules, there is the case of the study reported in section 2: Elements of Physics, a 1st year/1st semester module taught to ten Science and Engineering courses, with typically about six hundred students enrolled, of which one third are repeat students. The problem of high student failure rates is a concern not only of DPhys; some departments affected, namely the Department of Mathematics (DMath), have taken initiatives leading to pedagogical changes to improve academic achievement (MATEAS, 2016). The causes of this failure are surely multiple; one of them, certainly, is the average grades of the students admitted, which are very low in some courses. But a most important point is that in Portugal higher education public institutions do not select their students and so teachers have to teach students that are not always those they would fancy to have. Therefore, it is necessary to innovate, and improve the quality of the teaching serviced. This need is increasingly emergent in the current days, where all universities are challenged to improve the tools and methodologies of distance learning. This brings additional challenges in terms of students’ motivation, attitudes and skills. 176 2. Case study background and presentation In this section we characterize the problem of academic failure in modules taught by DPhys of UA to STEM courses managed by other departments, referring to its likely causes. Next, we lay out the pedagogical guidelines which may help deal with that problem and constitute the foundational hypotheses of the case study subsequently introduced. 2.1 Description of the problem A statistical characterization of academic failure in 1st and 2nd year modules taught by DPhys that are part of STEM courses that belong to other STEM departments showed a pattern that has been occurring for at least the last five years. In a nutshell, that pattern is the following: in six of such modules, which globally have more than two thousand students enrolled, six hundred are repeats – that’s about 30% average, but in some cases it can be over 40%. It should not be controversial that the reasons for academic failure have to do with: (a) External factors (criteria for admission to higher education) In fact, it has been reported that, for the aforementioned 1st year/1st semester STEM module of Elements of Physics, there is an unsurprising correlation between the failure rate per course and the course admission grades (Lopes, 2018), shown in Figure 1. (b) Institutional factors (curricular organization, teacher selection) Some of the large modules such as Elements of Physics, Calculus or Informatics, with hundreds of students from many different backgrounds and with many different interests and competences, all taught and assessed in the same traditional way, are reminiscent of a former idea that such agglomeration would bring efficiency gains. (c) Teaching factors (module’s syllabus, pedagogical methods, assessment methods) Some faculty think that higher education has been working this way for decades, and it turned out well for them, so they see little reason to change anything but student selection. (d) Student engagement. 177 Faculty can do nothing about (a), can only influence (b), and (c) is their obvious responsibility. And they certainly have a definite bearing on (d) considering that, to be engaged, students need to think they belong in higher education, that they can learn and find meaningful the subject-matters (Felten, 2018). So if freshmen find themselves in a large class together with hundreds of students, studying things they can’t relate with the course they have applied to, or that they find too challenging, they probably feel disengaged, inclined to giving up and even dropping out. But faculty must teach the students assigned to them and must do what is within their reach to get the best results, that is to say: low failure rates and competent graduates. 2.2 Hypotheses presentation Based on the authors’ accumulated experience of several decades of teaching in higher education, we conjecture that this situation of academic failure in STEM courses is mainly related with the following:  not being made clear to students the point of they having to study certain subject matters; Figure 4 – Admission grades (last admitted and average) and percentage of repeats (over all enrolled) in 2017/18 for 8 of the 10 courses of Elements of Physics. (Two courses are omitted: one had very few students and the other had been restructured.) E1-E6: Building Rehabilitation, Environmental, Civil, Chemical, Informatics and Mechanical Engineering; S1-S2: Marine Sciences and Mathematics. Solid lines represent tendencies. 178  teaching is centered on the teacher performance and not student-centered, so students’ passivity in classes is not only allowed but even unwittingly cultivated;  absence of systematic, formal education regarding adequate working skills and attitudes;  the assessment method consists in mere score-adding, so that a student can pass (even with good grades) with serious knowledge deficiencies, repeating the same mistakes over and over without being specifically taught and encouraged to correct them. Consequently, we assume that the strategy that should be adopted to tackle the problem has four dimensions: curricular integration; active learning methods; education for development of attitudes and skills; and criteria-based assessment. These interconnected dimensions are explained next. Curricular integration Curricular integration implies giving meaning to the existence of a module in the curriculum, making clear what is the purpose of the module, so that students understand why it matters for their course that they learn such subject matters. This can be achieved by using didactic elements specific to the course (e.g., the aspects of radioactivity that are levant for medical imaging or not the same as for fossil dating) and by linking the contents of the module to others in the same curriculum that require that same contents (e.g., electromagnetic concepts are a prerequisite for materials engineering). On the other hand, the ability to transfer knowledge and skills from one module to another and to integrate (assimilate) them is also essential. Now, in the current curricular model, students are typically exposed to different topics of a given area of knowledge (e.g., electromagnetism) in different modules in different curricular semesters. And, typically, professors of later modules expect students to be able to recall what they have learned in the basic modules to make associations and applications. It is unrealistic to expect this from a mere juxtaposition of modules. It is necessary that students work on integrating knowledge and skills continuously. Thus, it is necessary that the teachers involved in the modules of the same area coordinate with each other, even if they belong to different departments, so that it becomes clear to students, as early as possible, the affinities of learning outcomes and competences. 179 Active learning In addition to the sense of purpose, the sense of playfulness is important (Wagner, 2017), understood here not only as recreational enjoyment (such as that which comes from watching a game or attending a concert), but also the enjoyment that comes from performance and achievement (playing a game or music). This sense of playfulness is not unrelated to the good work of a teacher or scientist. Learning with a sense of purpose and playfulness makes it easier for students to develop interest, dedication and persistence in the study of a subject matter they find harder, as Physics is considered by many. And so, students must be engaged in active learning, a modality in which teaching is centered on students. Instead of passively listening to “the sage on stage” (King, 1993), students are involved in tasks (reading, writing, discussing, solving problems) that imply higher thinking functions (analysis, synthesis, evaluation). Active learning operates more fully across the three learning domains (knowledge, skills and attitudes), promoting critical thinking as well as the ability to work as a team. This is achieved not only by changing what is taught and how it is taught. The role of the teacher must also be different: instead of a “sage on the stage”, more like a “guide on the side” (King, 1993). Experts in science education have been developing and assaying teaching methods that try to address student’s difficulties along the learning process (e.g., (Dori & Belcher, 2005; Heller, Keith, & Anderson, 1992; Mazur, 1996; Miller, Lukoff, King, & Mazur, 2018; Sokoloff & Thornton, 1997). A meta-analysis (Freeman et al., 2014; Wieman, 2014) showed that, compared to the traditional model, active learning modalities in the STEM areas are advantageous: exam performance is better (effect size of 0.5) and the probability of failure is 1.5 times smaller (22% versus 34%). Applying these probabilities to the module Elements of Physics, this could mean less fifty repeat students. Attitudes and skills In general, teachers are mostly concerned with covering the syllabus, that is, they are more concerned with their putative job of lecturing on certain topics in preference to achieving students’ real learning of those topics. And, in general, they overestimate knowledge to the detriment of skills and attitudes. Nowadays, in the 4th Industrial Revolution, the internet makes knowledge largely available for free, and perhaps more and more so, therefore neither a teacher nor a school are as necessary as they used to be. In contrast, the skills needed for the 180 labor market are the same as for education and citizenship, namely: learning critically (which is more important than memorizing correct responses); ability to collaborate, communicate and listen; solve problems in a creative way (Wagner, 2017). And work attitudes as well, which are indispensable both while as students and in future professional life: perseverance, tenacity, self-discipline, etc. It is not enough to encourage student to develop certain attitudes. These must be formally cultivated. As with any subject matter, relevant attitudes and skills must be defined, situations for their learning or development must be created, and assessment criteria established. And should have a significant weight on the final grade. Criteria-based assessment Competences are much more than a set of formal statements required for the module handbook. In a criteria-based assessment system (CBA) they are absolutely instrumental for both teachers and students (Sadler, 2005). The CBA system defines levels of competence, specifying which criteria must be met for each. Namely, it establishes the minimum learning outcomes that are indispensable to earn a pass grade  as is usual in the case of essay assignments, project reports or dissertations. But there are several pedagogical advantages in planning any module, irrespective of its character, considering this methodology since it leads to a more effective structuring of the work of both the teacher and the students (Lopes, Silva, Faustino, & Pimentel, 2009): it is much clearer what students should learn, what learning situations (lecture class, laboratory class, study visit, etc.) should be created for learning to take place, and how learning will be assessed and graded. For each competency, it must be specified, and made known to students, what the teacher understands as essential. Students can orient their autonomous study by starting to reach that core of competence. If, through formative assessment, students can know whether they have already reached that core, or if they can know what it lacks to reach it, they can more easily gain interest and motivation to study. CBA maximizes the formative value that every assessment should have. The demonstrated success of this methodology in the biomedical sciences course (Lopes et al., 2009) encourages its application to STEM modules. 181 It has become increasingly imperative to resort extensively to modern technological means not only for didactic purposes but also to carry out student assessment. Therefore, sooner rather than later it will be unavoidable to use (albeit partially) a computer system for summative assessment. Starting with one for formative assessment will be a good preparation for the near future. A good example is SIACUA (UA Interactive Computer Learning System), developed at DMath of UA. SIACUA can be used to support autonomous study and assessment (Descalço, Carvalho, & Oliveira, 2018), particularly in flipped learning (Descalço & Carvalho, 2019). For each module the system presents a clean interface with an index of the module topics. For each topic there are four different elements with different purposes. The first three provide access to learning objects, including small videos, in order to: (i) recall previous concepts, (ii) introduce the topic and (iii) provide references for complete study. The fourth element consists of a clickable progress bar giving access to parameterized multiple-choice questions with detailed solutions about the topic. The several progress bars in the module inform students about their overall progress in the module based on their answers to questions. These progress bars are computed using a Bayesian user module, from a set of four parameters for each question: (i) difficulty level; (ii) slip (probability of wrong answer with knowledge about associated concepts); (ii) guess (probability of guessing without knowing) and (iv) discrimination. A consistent positive feedback has been obtained from the student surveys, according to which the most valued resource were multiple choice questions with detailed solutions, immediately followed by small videos. 2.3 Case study presentation The case To carry out the case study we chose a 1st year/1st semester module, Elements of Physics, that has over six hundred students from ten STEM courses. Figure 2 summarizes the situation for six of the worst-performing courses, corresponding to about 350 enrolled and 40% repeats in the module; these numbers are typical of what has been happening in the last years. In addition to this fact, this module was chosen because it is the students’ first contact with university physics and academic failure at a such early stage, whatever the causes, has large and lasting detrimental consequences in terms of student motivation. 182 The study This qualitative study was informed by the hypotheses in section 2.2. It aims to evaluate the acceptability of the strategy outlined therein, as no pedagogical reform can be successful against, or despite, the opinion of the teachers involved (Bumbacher, Salehi, Wierzchula, & Blikstein, 2015). The study we performed consisted in querying course directors and module teachers about academic failure in the module, its causes and how it might be dealt with. In addition, we also wanted to probe their receptivity to a set of ideas, expounded in section 2.2, for curriculum reform and pedagogical innovation to improve teaching and learning in that module – and purportedly in other modules. The query was done through individual interviews based on sets of previously prepared questions. The participants were the ten course directors and sixteen module teachers (among which module coordinators). The former were all experienced faculty: six associate professors (two of which with habilitation) and four assistant professors. The latter, all but three (PhD students) were also experienced faculty: five associate professors (two of which with Figure 2 – Number of enrolled students and percentage of repeats for Elements of Physics in 2017/18, per course. E1-E4: Informatics, Chemical, Environmental and Civil Engineering. S1-S2: Marine Sciences and Mathematics. 183 habilitation) and eight assistant professors. We began by interviewing the course directors first. A presentation of research motivations and purposes was made viva voce, in brief (about half hour) meetings, by the end of 2017. They were given a set of three questions to ponder: (1) what competences and learning outcomes are expected from Elements of Physics; (2) what were their students’ overall reactions to Elements of Physics; (3) what changes (regarding learning outcomes or teaching methods or other) could improve the integration of the module in the curriculum. They were requested to answer either in writing or verbally in a second meeting. After collecting the course directors’ reflections and taking them into account, another set of questions was elaborated to guide the next step, in January 2018: individual interviews of about one hour with the module teachers of that semester, as well as former module coordinators. Each meeting was audio-recorded, and its summary transcript was edited and validated by the interviewee. Although the dialogue could flow with some freedom, a script was followed with the following topics: (1) if the module were specific to the course, or group of courses, to which the teacher was assigned, how would s/he design the module; (2) if it would be preferable that each course, or group of courses, to have a specific module, with specific leaning outcomes, teaching and assessment methods; (3) how the student assessment method should be; (4) how did s/he envisage the use of computer platforms for assessment; (5) how active learning could be developed, particularly in theoretical classes; (6) what attitudes should we encourage students to cultivate and how; (7) would it be of interest to form a group of teachers dedicated to studying the pedagogical problems related to modules such as Elements of Physics (whose students are from courses that are not under the responsibility of DPhys), proposing changes and testing new teaching and assessment methods. 184 3. Results Here we wrap up the feedback received from the course directors and summarize the interviews with module teachers. 3.1 Course directors’ feedback All but one course directors responded and preferred the written form, the documents being up to four-page long. This we took as a good indicator of how they were aware of and sensible to the problems they were inquired about. Competences and learning outcomes There was a general agreement about general competences, namely having a critical mind, the ability to learn autonomously, and the ability to write experimental reports. However, each director pointed out the learning outcomes that had little relevance for their course and/or suggested topics and approaches most pertinent from their point of view. Unsurprisingly, the common denominator was not large. Students’ reactions At UA, student representatives of each curricular year gather at the end of the semester with the course director to whom they convey their peers’ opinions, but it is not known to what extent these represent majority views. The points most relevant for the purpose of this paper that were mentioned by course directors are: students did not understand the usefulness of module in the context of their course (e.g., Informatics Engineering and Mathematics); the diversity of teaching approaches was not mirrored in the assessment; some had widespread difficulty in understanding the subject matters (e.g., Mathematics), while for others the topics were interesting and not difficult, but the way of teaching did not help students to succeed; it was mentioned students didn’t understand marking criteria and that there was discrepancy of criteria among teachers. Changes to improve curricular integration All but one course directors suggested changes to learning outcomes. Some proposals (Informatics Engineering and Mathematics) imply a completely different module, while others imply substantial changes that are not compatible among them. In one case (Industrial Engineering and Management) it was stated that the learning outcomes are most divergent from what is taught in the same courses at other Portuguese universities. 185 While only a few directors have suggested mere changes in the approach (e.g., the use of didactic examples from the science or engineering branch), almost all of them mentioned the need to adjust (or bring closer) the module’s learning outcomes to the specificities of each course. 3.2 Summary of module teachers’ interviews The interviews with the teachers revealed several majority perspectives regarding the current status: inadequacy of the current model of organization (i.e., general modules with several hundred students from a diversity of courses), inefficiency of methodologies (based on too traditional teaching/learning methods), little appreciation of attitudes and skills (which are considered secondary outcomes), and the perception of the need to change the assessment system, as detailed next. Design of modules Almost all of the sixteen interviewees agreed that reorganizing the module by grouping together students from similar courses, to mitigate the course heterogeneity, allowed for a closer relationship with the students, but more than half reported that the idea fell short of its potential if the teaching of each group would have little autonomy (which is unavoidable if assessment is not differentiated). All teachers were favorable to the creation of new modules dedicated to a small number of courses with affinities. They emphasized the need to adjust the learning outcomes and methods of teaching and assessment on a case-by-case basis, without mentioning disadvantages. However, they had no concrete and definite suggestions about the best way to do it (how many new modules would be necessary, how the courses should be grouped). Assessment issues Regarding assessment methods, most teachers considered that there are too many tests  not only in this module, but also in the other four modules of the semester. Notwithstanding, one teacher advocated frequent assessment moments with short quizzes. Several teachers mentioned that most students are preparing for a test just a few days before, meanwhile neglecting the classes as they cannot manage the effort. About one third of the teachers considered that mid-semester and final exams are too difficult, by which they mean 186 that students were not able to achieve the learning outcomes according to teachers’ expectations. On the use of computer platforms for assessment, opinions were quite diverse: yes for formative purposes, but not for summative purposes perhaps; yes, but only partially, because some learning outcomes cannot be assessed this way; if only for formative purposes, it is not worth it because students are not interested if it has no weight in the final grade; in the laboratory classes the individual assessment should be done that way. Active learning One teacher believed that active learning methods may not work with these students, are time consuming and require too few students per teacher to be feasible. One colleague suggested abolishing lecture classes and considered that only problem-solving and laboratory classes should be maintained. The remaining teachers did not offer concrete suggestions. Attitudes and skills Almost all teachers suggested at least one soft skill or attitude students should develop, but that one was rarely repeated by others: formality, discipline (punctuality, not leaving halfway without giving excuse); interactive attitude with the teacher; cooperative attitude among peers in the laboratory; ability to search for information; self-criticism; critical mind; rigor; curiosity. Two teachers referred to the need to counter students' passivity and lack of initiative. Two other teachers stressed the importance of making students realize that certain attitudes at the university are also important in the job market. In general, there were no suggestions on how to get students to develop those skills and attitudes, but a teacher suggested an elective module. Group of teachers dedicated to pedagogy As to the creation of a group of DPhys teachers dedicated to issues of quality and innovation in Physics higher education, with the exception of one interviewee who believed that such a group would duplicate what is already being done at the UA, all the others were favorable. About one third of the teachers suggested at least one function that such a group should have: to propose changes to make the assessment more adequate and effective; develop computational tools (e.g., interactive simulations); it should characterize students through demographic parameters (academic background, preference order in the university 187 application, economic situation, etc.); study teaching experiences and good practices that have proved successful and investigate which might be adapted to our reality; provide support and training to other teachers. About half of the teachers warned that the tasks of such a group are very time consuming, which would be incompatible with other functions (research and management). Two teachers underlined that it would be necessary that the activity of such a group to be extended over time. Some mentioned requirements regarding the members of this group: they must be few (2-3), they must deal with students, they must have good training in e-learning platforms. Three teachers mentioned that there are limits to innovation, that big revolutions should not be made, and that the experiences should be allowed to mature. Two teachers expressed interest and availability to join this group. 4. Discussion of results We now analyze the results and present its aftereffects, both the measures that have already been implemented and other actions planed for the near future. 4.1 Analysis From the summaries in section 3, we can acknowledge the following main points:  The need for adjustment of learning outcomes or even a profound syllabus change.  The need for new modules.  Assessment methods are an issue for both teachers and students (even though the arguments are different).  There were no clear ideas about changes in learning outcomes nor about alternative teaching methods.  Teachers named a variety of attitudes and skills students should have, but opinions were scattered about which ones.  Teachers were not assertive in the opinions expressed concerning the implementation of the assessment using e-learning platforms. Actions aiming to improve pedagogical quality and innovation along the tenets of section 2.2 were apparently considered feasible but unsurprisingly not without some resistance. By examining the DPhys faculty (internal factors) and the UA overall (external factors), it is possible to pinpoint some of the factors underlying the resistance to the changes seemingly 188 urgent to make, but also some others that can encourage and support innovative pedagogical proposals. For instance, the resistance can be due to faculty aging. According to the Higher Education Teacher Profile in 2018/19, 59 % of the PhD teachers in public universities were 50 years or older (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, 2020). Furthermore, the conviction many teachers have that the pedagogical models they follow  which resulted from their own education as students and are usually content-oriented conceptions of teaching (Eley, 2006; Kember, 2009)  remain suitable for the new generations, is a huge hurdle. Nevertheless, it is possible to notice that at DPhys there are structural conditions, interpersonal relationships and mobilization among the teaching staff to implement actions to promote pedagogical quality. Also, external factors can undermine pedagogical reforms, namely the fact teaching work has a relatively small weight in faculty promotion. However, the undergoing process of curricular restructuring at university level in Portugal makes a propitious climate for change. The most relevant internal and external factors that can influence the implementation of the pedagogical changes we advocate in section 2.2 are set out in Table 1 as a SWOT (Strength-Weaknesses-Opportunities-Threats) analysis. Table 1 - SWOT analysis regarding the implementations of changes set out in section 2.2. Internal Factors Strengths Sensibility of DPhys councils for pedagogical issues Weaknesses Opportunities Threats Dependency on faculty motivation, willingness Recent rectory team implemented pedagogical and didactic training programs for teachers Dependency on: Curricular reforms in progress - approval by rectory councils Lack of time due to work overload (diversity of scientific, teaching and Proposals of section 2.2 are management tasks) overall consensual View that pedagogical Teachers’ willingness to get problems surmount faculty involved in pedagogical intervention capacity innovation Faculty aging Friendly interpersonal relationships among DPhys faculty Human and other resources associated with computational engineering External Factors - cooperation of other departments - actions on rectory management boards (schedules, classroom assigning) - approval by national accreditation agency Pedagogical activities and competencies have modest weight in academic promotion in comparison to research 189 4.2 Outputs In this section, and as a result of the case study presented in this article, we give account of the initiatives that are already in place: the creation of the office dedicated to teaching innovation and quality, and the creation of new modules substituting for Elements of Physics. Also, a new pedagogical research project is briefly presented. What has been implemented GQIP When we realize that: (i) DPhys provides teaching service to a dozen departments and three polytechnical schools, in addition to the students of the DPhys courses, in which a few thousand students are enrolled; (ii) for that service to have the best possible quality, there must be a monitoring of the teaching-learning process at a finer scale than that of the current Quality Assurance System in the UA; (iii) the numbers of academic failure in some modules serviced by DPhys to other departments warrants a deep and thorough research. (iv) the application of the strategies described in section 2.2 to any module implies creating or recreating pedagogical and didactic methods, testing them and developing those that are effective for each case; (v) in other words, it is not possible to buy a “ready-to-teach”  R&D is necessary in this area, it is compelling to conclude that all this requires a team of specialized, dedicated teachers. It was therefore considered helpful to create an Office for Pedagogical Innovation and Quality (GQIP, 2020), whose members are professors or researchers, working under the dependency of the DPhys Head. Its mission is to increase the teaching quality (not just by decreasing failure rates but also by improving levels of competence), namely of the teaching serviced to other departments, and to promote and support innovation, that is, more effective pedagogical methods. In addition, it aims to develop research in the area of higher education in Physics teaching, namely on fine-level quality assessment of the modules, and on the effectiveness of new methodologies. 190 Figure 3 - Creation of new modules to increase curricular integration according to affinity criteria. Industrial Engineering & Management and Mechanical Engineering shall not have a module similar to Elements of Physics. (*) Not yet official. GQIP is similar to a pedagogical research and development unit, with the following functions: to monitor the quality of teaching/learning; to investigate solutions (teaching/learning and assessment methods) for the pedagogical problems encountered; to gather human resources (partnerships, temporary collaborations) to develop solutions (namely through e-learning platforms); to test (with the collaboration of other teachers) solutions in pilot experiments; to collaborate in the implementation of the solutions that are adopted (analysis of the needs and tasks involved, pedagogical support); to monitor the effectiveness of solutions. Creation of new modules A generalized curricular restructuring is occurring at UA and other universities in the country. Taking this opportunity, STEM courses have been gathered by affinity in groups of three or so, and each group has Physics modules tailored to its shared interests. Therefore, the Elements of Physics module will be replaced by new modules as shown in Figure 3. For Informatics Engineering, a task force of teachers from DPhys and the Department of Electronics, Telecommunications & Informatics designed a new module, Modelling of Physical Systems to substitute for Elements of Physics. As to the Mathematics course, a new module, Elements of Mathematical Physics, was tailored by DPhys and DMath. It is articulated with other modules in the curriculum, with partially shared learning outcomes. 191 Marine Sciences, Geosciences, and MOG (Meteorology, Oceanography & Geophysics) will share a new module of Elements of Physics of the Earth, in which all didactic examples and applications are related with phenomena in the atmosphere, the hydrosphere or the lithosphere. The three courses of Civil, Environmental and Chemical Engineering will share a new module of Fundamentals of Physics, whose learning outcomes maximize the overlap of interests among the three specialties. Planned near-future actions Starting next academic year, we are carrying out a research project on a new comprehensive pedagogical methodology that combines active learning in large classes, flipped learning, peer teaching, peer and criteria-based assessment. The details of this project shall be published presently, but one salient feature of the methodology is the splitting of a large class into small teams, each of which coordinated by student-tutors that act as intermediaries between team peers and the teacher. To study its effectiveness a mixed methods approach is warranted, so a research team comprised of teachers and experts in statistics and qualitative research was constituted. 5. Conclusion In this qualitative study, we evaluated faculty’s acceptability regarding the implementation of a set of pedagogical innovation actions based on four entangled dimensions, detailed in this work: (1) curricular integration; (2) active learning methods; (3) education for development of attitudes and skills; and (4) criteria-based assessment. As a result, and relation to dimension 1, a single introductory module, which is the first contact with Higher Education Physics shared by hundreds of students from ten STEM courses, shall be replaced by four new modules. Each module includes up to three of those courses, gathered by affinity, and is tailored to its shared interests. As there are no “ready-to-teach” methodologies, it is essential to identify problems that could guide research in the development and evaluation of the most appropriate methodologies. For this a Pedagogical Quality and Innovation office (GQIP) was created, constituted by teachers 192 of DPhys of UA, aiming to support the enhancement of quality of teaching and learning in Physics’ modules, especially in those that are serviced to other departments. The implementation of innovative actions based on the foregoing dimensions is dependent on strengths and weaknesses of the DPhys faculty and is susceptible to favorable circumstances and external threats. Among the factors internal to DPhys, a consensus on actions, and the existence of human and material resources capable of supporting the increased didactic use of computer means are favorable. Weak points are: the dependence on motivation and willingness of faculty to devise and carry out the initiatives; the widespread view that problems transcend our ability to intervene; the current workload of teachers, which reduces their availability to make changes; the aging of the teaching staff; the smaller weight of pedagogical quality, in comparison to research’s, for the purposes of career promotion. Among the external factors, we highlight the opportunity for undergoing curriculum review processes. In contrast, the success of innovation strongly relies on the cooperation of the departments involved and of the UA boards and services. 193 Acknowledgments This work was in part supported by Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), through CIDMA Centro de Investigação e Desenvolvimento em Matemática e Aplicações, within project UID / MAT / 04106/2013. M. R Correia thanks the support from the project i3N, UIDB/50025/2020 & UIDP/50025/2020, financed by national funds through the FCT/MEC" References Bumbacher, E., Salehi, S., Wierzchula, M., & Blikstein, P. (2015). Learning Environments and Inquiry Behaviors in Science Inquiry Learning: How Their Interplay Affects the Development of Conceptual Understanding in Physics. International Educational Data Mining Society. Catterall, L. G. (2017). A Brief History of STEM and STEAM from an Inadvertent Insider. The STEAM Journal, 3(1), Article 5. doi:10.5642/steam.20170301.05 Council of European Union. (2009). Council conclusions of 12 May 2009 on a strategic framework for European cooperation in education and training ('ET 2020'). Official Journal of the European Union (C 119/02). Retrieved from https://eurlex.europa.eu/legal-content/EN/ALL/?uri=CELEX:52009XG0528(01) Descalço, L., & Carvalho, P. (2019, 1st - 3th July). On the importance of assessment on flipped learning. Paper presented at the EDULEARN19 Conference, Palma, Spain. Descalço, L., Carvalho, P., & Oliveira, P. (2018, 2th - 4th July). Motivating Study Before Classes on Flipped Learning. Paper presented at the EDULEARN18 Conference, Palma, Spain. Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência. (2018). Percursos no ensino superior: situação após quatro anos dos alunos inscritos em licenciaturas de três anos. Retrieved from https://www.dgeec.mec.pt/np4/903.html Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência. (2020). Perfil do Docente do Ensino Superior - 2018/19. Retrieved from https://www.dgeec.mec.pt/np4/461/ Dori, Y. J., & Belcher, J. (2005). Learning electromagnetism with visualizations and active learning. In Visualization in science education (pp. 187-216): Springer. Eley, M. G. (2006). Teachers’ Conceptions of Teaching, and the Making of Specific Decisions in Planning to Teach. Higher Education, 51(2), 191-214. doi:10.1007/s10734-004-6382-9 Felten, P. (2018). The heart of engaged learning: What students do and think. Retrieved from https://www.centerforengagedlearning.org/the-heart-of-engaged-learning-whatstudents-do-and-think/ 194 Freeman, S., Eddy, S. L., McDonough, M., Smith, M. K., Okoroafor, N., Jordt, H., & Wenderoth, M. P. (2014). Active learning increases student performance in science, engineering, and mathematics. Proceedings of the National Academy of Sciences, 111(23), 8410. doi:10.1073/pnas.1319030111 GQIP. (2020). Gabinete para a Qualidade e Inovação Pedagógicas. Retrieved from http://gqip.web.ua.pt/ Heller, P., Keith, R., & Anderson, S. (1992). Teaching problem solving through cooperative grouping. Part 1: Group versus individual problem solving. American journal of physics, 60(7), 627-636. Horta, H. (2013). STEM education in Portugal: Education, policies and labor market. Australian Council of Learned Academies. Retrieved from https://acola.org/stemcountry-comparisons-saf02/ Kember, D. (2009). Promoting student-centred forms of learning across an entire university. Higher education, 58(1), 1-13. King, A. (1993). From Sage on the Stage to Guide on the Side. College Teaching, 41(1), 3035. doi:10.1080/87567555.1993.9926781 Lopes, J. C. (2018). Memorando sobre Elementos de Física. Relatório para o Diretor do Departamento de Física da Universidade de Aveiro. [Unpublished report]. Lopes, J. C., Silva, M. J., Faustino, M. A. F., & Pimentel, F. L. (2009). ABP e ABC na LCB da UA. In I. Huet, N. Costa, J. Tavares, & A. V. Baptista (Eds.), Docência no Ensino Superior: Partilha de Boas Práticas (pp. 159). Aveiro, Portugal: Editora da Universidade de Aveiro. MATEAS. (2016). Matemática: Ensino e Avaliação no (ensino) Superior. Retrieved from www.ua.pt/dmat/page/20716 Mazur, E. (1996). Peer Instruction: A User’s Manual: Pearson. Miller, K., Lukoff, B., King, G., & Mazur, E. (2018). Use of a Social Annotation Platform for Pre-Class Reading Assignments in a Flipped Introductory Physics Class. Frontiers in Education, 3, 8. Sadler, D. R. (2005). Interpretations of criteria‐based assessment and grading in higher education. Assessment & Evaluation in Higher Education, 30(2), 175-194. doi:10.1080/0260293042000264262 Sokoloff, D. R., & Thornton, R. K. (1997). Using interactive lecture demonstrations to create an active learning environment. The Physics Teacher, 35(6), 340-347. 195 UK Commission for Employment and Skills. (2015). High level STEM skills requirements in the UK labour market. Retrieved from www.gov.uk/government/publications/highlevel-stem-skills-requirements-in-the-uk-labour-market Wagner, T. (2017) Reinventar a educação para enfrentar o futuro/Interviewer: S. Wozniak. Vodafone Future., Retrieved from: www.youtube.com/watch?v=LCPnPvOJ6o8. Wieman, C. E. (2014). Large-scale comparison of science teaching methods sends clear message. Proceedings of the National Academy of Sciences, 111(23), 8319. doi:10.1073/pnas.1407304111 Williams, J. (2017). Addressing the Completion Challenge in Portuguese Higher Education. Retrieved from Harvard Kennedy School, M-RCBG Associate Working Paper Series: https://www.hks.harvard.edu/centers/mrcbg/publications/awp/awp81 196 10. COMPARAÇÃO TEÓRICA DOS REFERENCIAIS DA QUALIDADE PARA A EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL* Marisa Pisco32, Margarida Saraiva33 & Fátima Jorge34 Resumo O Quadro de Referência Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e a Formação Profissionais (Quadro EQAVET) surge da necessidade de assegurar a melhoria da qualidade na Educação e Formação Profissional (EFP) dentro do espaço europeu. Considera-se que devem ser instituídos métodos de garantia de qualidade, que permitam uma convergência europeia na educação e formação profissional. O presente trabalho pretende estabelecer uma comparação teórica de Referenciais da Qualidade para a EFP, tendo por base a análise do Quadro EQAVET, do Modelo EFQM, da CAF- Educação 2013, da ISO 9001:2015, da ISO 21001:2018 e da Certificação de Entidades Formadoras, em Portugal. Através de uma análise documental, pode concluir-se que um dos elementos comuns é o facto destes referenciais se preocuparem com as mesmas questões e de se basearem no ciclo de PDCA (Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua. No entanto, foram desenvolvidos a partir de paradigmas diferentes e, consequentemente, são substancialmente diferentes. Palavras-chave: Educação e Formação Profissional. Referenciais da Qualidade. EQAVET. Garantia da qualidade. PDCA. * Funding: This work was funded by Fundação para a Ciência e a Tecnologia, grant UIDB/00315/2020. 32 Marisa Pisco, Agrupamento de Escolas Gabriel Pereira (Évora-Portugal), marisapisco@gmail.com. É mestre em Gestão, especialidade em Recursos Humanos na Universidade de Évora, formadora e técnica especializada, licenciada em Sociologia. As principais áreas de interesse e investigação são Qualidade Formação, Gestão de Recursos Humanos. 33 Margarida Saraiva, Universidade de Évora & BRU-UNIDE/ISCTE-IUL (Portugal), msaraiva@uevora.pt. É doutorada em Gestão pelo ISCTE-IUL, desde 2004. Atualmente é professora auxiliar do Departamento de Gestão da Escola de Ciências Socias da Universidade de Évora. É investigadora do Business Research Unit (UNIDE-IUL) da Business School do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL) – Portugal. É membro fundador da Rede de Investigadores da Qualidade (RIQUAL) e é co-editora da Revista Científica TMQ – Techniques, Methodologies and Quality (ISSN: 2183-0940). Tem como interesses de investigação as áreas da Qualidade e da Gestão. 34 Fátima Jorge, Universidade de Évora & CICP (Portugal), mfj@uevora.pt. É doutorada em Gestão pela Universidade de Évora, desde o ano de 2003. É professora auxiliar no Departamento de Gestão da Universidade de Évora e investigadora no Centro de Investigação em Ciência Política. Os seus principais interesses de investigação inserem-se nas áreas do Comportamento Organizacional, da Gestão dos Recursos Humanos e da Ética e da Responsabilidade Social. 197 1. Introdução A adoção de um quadro, modelo ou standard de referência pode colocar um dilema aos operadores de Educação e Formação Profissional (EFP), quer em Portugal, quer a nível internacional, dado que o objetivo é garantir que as referências são adequadas às características da organização (Comissão Europeia, 2010; Communiqué of the European Ministers for Vocational Education and Training, 2015). Os operadores de EFP, em Portugal, podem optar por utilizar e adaptar um conjunto de modelos de referência. Esta situação pode ser feita de várias formas, uma das quais é alinhar os modelos de referência da qualidade (Galvão, 2016; OCDE, 2018; Pisco e Saraiva, 2019). De acordo com o Cedefop (2015), a noção de cultura de qualidade corresponde à definição de gestão da qualidade, à qual se acrescentou o fator humano. A cultura de qualidade depende, fundamentalmente, do compromisso e do empenho dos profissionais de uma instituição na procura da qualidade. Na educação e formação profissional podem considerar-se três abordagens possíveis: a) uma centrada no mundo do trabalho; b) outra centrada nas necessidades dos estudantes; e c) uma centrada na eficácia e na eficiência dos processos organizacionais, embora na maior parte das instituições funcionem em interação e de forma equilibrada (Cedefop, 2015; Pisco, 2019). Segundo o Conselho da União Europeia (2014), os mecanismos de garantia de qualidade podem desempenhar um papel importante, ajudando tanto os estabelecimentos de ensino e formação, como os decisores políticos a vencer esses desafios e assegurando que a qualidade dos sistemas de ensino e de formação, e de cada uma das instituições, é adequada ao fim a que se destina. A garantia de qualidade, que faz parte de uma série de medidas a adotar pelos Governos e pelas instituições, aumenta a transparência e reforça a confiança na pertinência e na qualidade dos conhecimentos, capacidades, competências e qualificações, o que, por sua vez, parte da confiança na qualidade das instituições e dos prestadores de serviços de educação e formação. Assim, com este trabalho pretende-se, através de uma análise documental, estabelecer uma comparação teórica de referenciais da qualidade para a Educação e Formação Profissional (EFP), tendo por base a análise do Quadro EQAVET, do Modelo EFQM, da CAF- Educação 2013, da ISO 9001:2015, da ISO 21001:2018 e da Certificação de Entidades Formadoras, em Portugal. Este trabalho é baseado na literatura disponível sobre esses referenciais da qualidade em estudo, resultantes, sobretudo, de um trabalho de recolha e análise de documentos publicados, 198 que procuram tratar, de uma forma sistemática e acessível, informação relevante sobre a temática. Salienta-se que esta seleção de informações não é exaustiva e recaiu, com maior incidência, em documentos publicados (essencialmente relatórios) da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu. Assim, com este estudo pode-se concluir que um dos elementos comuns é o facto destes referenciais se preocuparem com as mesmas questões e de se basearem no ciclo de PDCA (Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua. No entanto, foram desenvolvidos a partir de paradigmas diferentes e, consequentemente, são substancialmente diferentes, permitindo e garantindo melhorias contínuas, sistemáticas e sustentáveis para o sistema educacional. Este estudo começa com um enquadramento teórico, onde se inclui uma apresentação genérica dos referenciais da qualidade para a Educação e Formação Profissional, seguindo-se uma comparação desses referenciais, onde se aborda o tipo, a natureza, princípios e abordagens e destinatários, bem como o âmbito de aplicação e a finalidade, as características e objetivos, e as metodologias e indicadores de medida. Por fim, apresentam-se as considerações finais, abordando as limitações. 2. Referenciais da Qualidade para a Educação e Formação Profissional Quadro Referência Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e Formação Profissionais (EQAVET) Este referencial, criado pela Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu de 18 de junho de 2009, tem como propósito melhorar a educação e formação profissional (EFP) no espaço europeu, disponibilizando aos operadores, ferramentas comuns para a gestão da qualidade, a empregar no âmbito da legislação e das práticas de cada Estado-Membro (Conselho Europeu, 2009). A garantia da qualidade é, para a Comissão Europeia, fundamental para encontrar respostas dado os desafios a que a Europa assiste, em especial no que respeita às baixas qualificações e/ou mão-de-obra pouco qualificada. Assim, esta garantia pode contribuir para ultrapassar a não correspondência entre as competências existentes, e as necessárias, e melhorar a empregabilidade dos jovens, para que, finalmente, se possa alcançar um entendimento comum do EFP, que facilite o reconhecimento mútuo das aprendizagens obtidas em vários países e, 199 deste modo, permita uma maior mobilidade e respostas mais eficazes aos desafios económicos e sociais (Comissão Europeia, 2014). O Quadro EQAVET compreende um ciclo de garantia e de melhoria da qualidade, que prevê as fases de planeamento, de implementação, de avaliação/apreciação e de revisão de EFP, apoiado em critérios de qualidade, indicativos e indicadores comuns. Os processos de supervisão, que incluem mecanismos de avaliação interna e externa, têm de ser definidos de modo adequado pelos Estados-Membros, com o propósito de identificar as capacidades dos sistemas, dos processos e procedimentos e as áreas que deviam ser melhoradas. Neste quadro de referência deverá prever a utilização de ferramentas de aferição no intuito de obter dados fiáveis sobre a sua eficácia (Conselho Europeu, 2009). Com efeito, o ciclo da Qualidade do EQAVET tem por base o ciclo PDCA35 (Plan-DoCheck-Act) e o ciclo MERI36 (Motivar, Estimar, Refletir, Informar), acompanhados por um conjunto de 10 indicadores, que podem ser utilizados como um Toolkit (caixa de ferramentas) pelos operadores de EFP (Almeida, 2016; Cedefop, 2015). Modelo de Excelência da European Foundation for Quality Management (EFQM) Este referencial, no sentido de promover e reconhecer o sucesso sustentado e proporcionar orientações aos que procuram alcançá-lo, é materializado através de um conjunto de três componentes integrados: 1) Conceitos Fundamentais de Excelência enquanto os oito princípios subjacentes, que se constituem como alicerce essencial para qualquer organização alcançar a excelência sustentada; 2) Modelo de Excelência da EFQM, patenteado num diagrama, uma ferramenta não prescritiva baseada em nove critérios: cinco referentes aos “Meios” e quatro para os “Resultados”; 3) a lógica do RADAR37 (Resultados, Abordagem, Desdobramento, Avaliação e Revisão), que envolve uma avaliação dinâmica, enquanto ferramenta de gestão, que fornece os elementos que dão apoio a uma organização, uma vez “Um dos fatores‑chave na qualidade de produção reside em processos claros e repetíveis. Nesta abordagem, surge o ciclo que consiste em Plan (identificar e analisar o problema), Do (desenvolver e testar uma potencial solução), Check (testar a solução implementada e analisar como esta pode ser melhorada), Act (implementar as melhorias)” (Almeida, 2016, p. 143) 35 “O ciclo MERI refere‑se a uma abordagem de garantia da qualidade que corresponde a Motivar as pessoas e mobilizar os recursos; Estimar o empenho dos colaboradores e dos stakeholders; Refletir sobre e discutir as perceções de qualidade com os colaboradores e os stakeholders; Informar e inspirar para as melhorias adequadas. Define‑se como um método de quatro passos centrado nas soft­‑skills necessárias para implementar um sistema de gestão interno da qualidade” (Almeida, 2016, p. 143) 36 “No caso de aplicação do modelo de excelência num processo de auto-avaliação, os elementos da lógica RADAR (Resultados, Abordagem, Desdobramento, Avaliação e Revisão), devem ser considerados para cada parte de critério de Meios, enquanto o elemento Resultados deve ser considerado para cada parte de critério de Resultados” (EFQM, 2004, p. 6) 37 200 que aponta os desafios que esta terá de ultrapassar se pretender concretizar a sua ambição de alcançar a excelência sustentada (Dias & Melão, 2009; EFQM, 2004). A Estrutura Comum de Avaliação (CAF) - CAF Educação 2013 A CAF foi inicialmente concebida para ser utilizada em todos os domínios do setor público na União Europeia, analogamente, foi considerada uma ferramenta útil para ser aplicada no setor da Educação em geral. A CAF - Educação destina-se a todas as instituições de ensino e formação, independentemente do seu nível, uma vez que é aplicável desde o ensino préescolar ao ensino superior, incluindo a aprendizagem ao longo da vida (DGAEP, 2013). Este referencial é um modelo de Gestão pela Qualidade Total, para o setor público, enquanto instrumento europeu de gestão da qualidade comum a todo o setor. Inspirada no Modelo de Excelência da Fundação Europeia para a gestão da qualidade (EFQM), baseia-se na premissa de que os resultados de excelência no desempenho organizacional, cidadãos/clientes, pessoas e sociedade são atingidos, através da liderança que conduz a estratégia e planeamento, as pessoas, as parcerias, os recursos e os processos. Este modelo analisa a organização simultaneamente por diferentes ângulos, promovendo uma análise holística do desempenho da organização (DGAEP, 2013). Enquanto ferramenta da Gestão pela Qualidade Total, a CAF subscreve os conceitos fundamentais da excelência, inicialmente definidos pela EFQM, transpondo-os para o setor público/contexto CAF e procurando melhorar o desempenho das organizações públicas com base nestes conceitos. Estes princípios fazem a diferença entre as organizações públicas burocráticas tradicionais e a organização orientada no sentido da Qualidade Total (DGAEP, 2013). Norma ISO 9001:2015 Pertencente à série de normas ISO 9000, é um referencial para a implementação de sistemas de gestão da qualidade, orientando organizações, de modo a estas alcançarem níveis satisfatórios de qualidade. A sua adoção deverá ser uma decisão estratégica por parte das organizações, que procurem melhorar o seu desempenho e demonstrar a conformidade com requisitos especificados do sistema de gestão da qualidade (APCER, 2015; Gotzamani, & Tsiotras, 2002). É através de uma abordagem por processos, que este normativo envolve a definição e a gestão sistemáticas dos processos e das suas interações, de forma a obter os resultados pretendidos, de acordo com a política da qualidade e a orientação estratégica da 201 organização. Os processos e o sistema podem ser geridos como um todo utilizando o ciclo PDCA, com um foco global no pensamento baseado em risco, que vise tirar vantagem das oportunidades e prevenir resultados indesejados (Fonseca, 2015). Atualmente, com sete princípios, a versão de 2015 é constituída por menos um princípio do que a versão de 2008, onde a “abordagem por processos” e a “abordagem da gestão como um sistema” eram considerados dois princípios distintos (NP EN ISO 9001:2015). A junção destes dois princípios no princípio “Abordagem por processos” e alteração do princípio “Relações mutuamente benéficas com fornecedores” para “Gestão de relacionamentos” surge com o objetivo da ISO, em simplificar o referencial normativo e o manter abrangente, ao direcionar a gestão de relacionamentos a todas as partes interessadas. Norma ISO 21001:2018 Também este normativo se apresenta como um complemento de práticas direcionadas ao setor educativo/formativo, podendo (ou não) ser articulada com outros referenciais. A ISO 21001:2018, especifica os requisitos para sistemas de gestão de organizações educacionais, quando estas precisam demonstrar a sua capacidade no desenvolvimento de competências por meio do ensino, aprendizagem ou pesquisa e visam aumentar a satisfação dos alunos, beneficiários e pessoal, através da aplicação eficaz do seu sistema de gestão e melhoria do sistema e garantia de conformidade com os requisitos dos alunos e outros beneficiários. Este normativo tem uma abordagem genérica com o objetivo de ser aplicada a qualquer organização, que utilize um curriculum para o apoio ao desenvolvimento de competências, independentemente do tamanho, tipo ou métodos utilizados. Com a vantagem de poder ser aplicada a departamentos de formação, dentro de empresas industriais e conjugada com outros referenciais normativos ou de certificação (ISO 21001:2018). Certificação DGERT A certificação de entidades formadoras, em Portugal, está consagrada na Resolução do Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de novembro que aprova a Reforma da Formação Profissional e no Decreto-Lei nº 396/2007, de 31 de dezembro que estabelece o Sistema Nacional de Qualificações. A Portaria nº 851/2010, de 6 de setembro, alterada e republicada pela Portaria nº 208/2013, 26 de junho, regula o sistema de certificação inserida na política de qualidade dos serviços das entidades formadoras, gerido pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT). 202 Os sistemas de certificação de entidades formadoras têm como objetivo promover a qualidade e a credibilização da atividade das entidades formadoras, que operam no âmbito do Sistema Nacional de Qualificações, bem como contribuir para que o financiamento das atividades formativas tendo em conta a qualidade da formação ministrada e os seus resultados (Parlamento Europeu e Conselho, 2008, 2009). A melhoria da capacidade, qualidade e fiabilidade do serviço de formação prestado pelas entidades formadoras constitui o objetivo central da certificação. Esta deve significar um fator distintivo no mercado e a garantia de um claro compromisso com uma oferta de maior qualidade para os clientes finais da formação (DGERT, 2019). A certificação de uma entidade formadora significa o reconhecimento total da sua competência, para o desenvolvimento das diferentes fases do ciclo formativo. Isso acontece em determinadas áreas de educação e formação, nas quais a entidade formadora atua e para as quais lhe é concedida a certificação, o que significa que demonstrou através dos requisitos exigidos, capacidade para o desenvolvimento de formação especializada em certas áreas temáticas (DGERT, 2019). Estes são os principais referenciais da qualidade, pelo que, com este trabalho pretende-se apresentar uma análise comparativa das mesmas, com base em diferentes indicadores. 3. Comparação dos Referenciais da Qualidade Em Portugal, os diferentes operadores de Educação e Formação Profissional, podem ver os seus sistemas de garantia da qualidade certificados consoante a sua natureza e âmbito de intervenção. Para a comparação dos referencias de qualidade presentes nos operadores de EFP, optou-se pela utilização de dez indicadores apresentados no Comparative overview of the EQAVET Framework, the EFQM Excellence Model and the ISO 9001 Standard, (EQAVET, s/d), e referidos em Pisco (2019) e em Pisco & Saraiva (2019). O Quadro 1 apresenta o tipo, a natureza, os princípios e abordagens e os destinatários de cada referencial da qualidade em análise. 203 Quadro 1 - Tipo, natureza, princípios e abordagens e destinatários Certificação DGERT ISO 21001:2018 ISO 9001:2015 CAF – Educação EFQM EQAVET Tipo Natureza Princípios e abordagens Destinatários Framework/ Quadro de referências Abordagem sistémica e específica; Não prescritivo. Holística; integradora. Gestão da Qualidade Total (TQM) baseada em nove princípios comuns europeus. Modelo Abordagem sistémica e genérica. Não prescritivo. Holística; integradora. Gestão da Qualidade Total (TQM) sustentada em oito conceitos de excelência. Modelo/ Ferramenta/ Mecanismo Abordagem sistémica e específica. Não prescritivo. Holística; integradora. Gestão da Qualidade Total (TQM) fundamentada na premissa de que os resultados de excelência, oito conceitos de excelência do EFQM, com nove critérios de análise organizacional. Todas as organizações, independentemente do setor de intervenção, tamanho, estrutura ou maturidade. Todas as instituições de ensino e formação, independentemente do seu nível, sendo aplicável desde o ensino pré-escolar ao ensino superior, incluindo a aprendizagem ao longo da vida. Standart Abordagem sistémica e genérica. Prescritiva. Holística; integradora. Sistema de Gestão da Qualidade (QMS)apoiado em sete princípios fundamentais. Todas as organizações, independentemente do tipo, tamanho e produto fornecidos. Standart Sistema/ Mecanismo Abordagem sistémica e especifica. Prescritiva. Holística; integradora. Sistema de Gestão da Qualidade (QMS) em Organizações Educacionais, alicerçado em onze princípios específicos. Abordagem sistémica e específica. Prescritiva. Holística; integradora. Sistema de Certificação/Acreditação de Entidades Formadoras sustentado em três grupos de requisitos, incluídos num referencial de qualidade. Todos os operadores de Educação e Formação Profissional (EFP). Organizações educacionais (OE) que visem o desenvolvimento de competências por meio de ensino, aprendizagem ou pesquisa, independentemente do tipo, tamanho ou método de ensino/ investigação. Qualquer entidade pública ou privada que esteja regularmente constituída e registada, em Portugal e, que seja detentora da estrutura formativa exigida nos requisitos de certificação. Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019) Da leitura e análise do Quadro 1, relativa à comparação destes quatro indicadores, pode observar-se que existem grandes semelhanças nas abordagens da Gestão pela Qualidade Total (Total Quality Management - TQM) e também nos Sistemas de Gestão da Qualidade (Quality Management System - QMS), sustentadas em diferentes princípios e conceitos, associados aos diferentes referenciais, tal como referido em Saraiva & Pires (2018). No que respeita ao tipo de referencial, pode observar-se, que o EQAVET se destaca por ser um Quadro de Referenciais a nível Europeu, enquanto os restantes se apresentam como 204 Modelos ou Padrões (Standart) para empresas e organizações, que desejam garantir que seus produtos e serviços atendam consistentemente aos requisitos do cliente, e que a qualidade seja constantemente aprimorada, numa perspetiva de melhoria contínua indo de encontro ao estudo de Pisco (2019). Por fim, o modelo de excelência EQFM e a ISO 9001:2015 são de natureza genérica, passiveis de qualquer entidade poder certificar os seus sistemas de qualidade, já os outros referenciais (EQAVET, CAF-Educação, ISO 21001:2018 e Certificação DGERT) são direcionados para a Educação e Formação Profissional, sendo a Certificação da DGERT a mais específica para a Formação Profissional, no contexto português. O Quadro 2 apresenta mais dois indicadores, designadamente o âmbito de aplicação e a finalidade destes 6 referenciais da qualidade. EQAVET O quadro EQAVET é entendido como uma referência para ajudar os Estados-Membros a promover e monitorizar a melhoria contínua dos sistemas de EFP, com base em referências europeias comuns. Concentra-se na modernização e melhoria dos sistemas e operadores de EFP, para que possam ajudar a aumentar a empregabilidade e a inclusão social e melhorar o acesso à aprendizagem ao longo da vida para todos, incluindo as pessoas desfavorecidas. O Modelo pode ser usado como uma estrutura abrangente para determinar como diferentes ferramentas e técnicas de gestão comumente usadas se encaixam e se complementam. Concentra-se nos níveis de excelência e desempenho sustentáveis de uma organização que atenda ou supere as expetativas dos stakeholders. A CAF pretende introduzir uma cultura de excelência e os Princípios de Gestão da Qualidade, adaptada ao setor da educação aplica-se a todas as instituições de ensino e formação europeias. Apresenta-se como uma ferramenta fácil de utilizar para ajudar as organizações do setor público a melhorar o desempenho, através da utilização de técnicas de gestão da qualidade. 9001:2015 ISO 21001:2018 ISO Educação Finalidade CAF – Âmbito de aplicação EFQM Quadro 2- Âmbito de aplicação e finalidade A norma determina os requisitos para um SGQ em que uma organização: a) precisa demonstrar a sua capacidade de fornecer produtos que atendam aos requisitos do cliente; b) visa aumentar a satisfação do cliente com melhoria contínua e garantia de conformidade. Designa como requisitos para um SGQ em que: a) precisa demonstrar a sua capacidade no desenvolvimento de competências por meio de ensino, aprendizagem ou pesquisa; b) visa aumentar a satisfação dos alunos, beneficiários e pessoal através da aplicação eficaz do seu SGQ e melhoria do sistema e garantia de conformidade com os requisitos dos alunos e outros beneficiários. Concentra-se na eficácia do sistema de gestão da qualidade para atender aos requisitos do cliente. Centra-se na eficácia dos sistemas de gestão da qualidade das organizações educacionais, bem como o impacto destes sobre os alunos e outras partes interessadas (stakeholders). 205 DGERT Certificação A certificação das entidades pode assumir duas vertentes: a) a certificação inserida na política da qualidade dos serviços de entidades formadoras, de acesso facultativo; b) a certificação obrigatória para acesso e exercício da atividade de formação profissional, regulada por legislação setorial. Centraliza-se na promoção da credibilização das entidades formadoras que operam no âmbito do Sistema Nacional de Qualificações e na confirmação que o financiamento das atividades formativas tenha em conta a qualidade da formação ministrada e os seus resultados. Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019) Da leitura e análise do Quadro 2, no qual se efetua a comparação destes dois indicadores, pode concluir-se a existência de orientações europeias, no caso do EQAVET, para a implementação e desenvolvimento de melhoria contínua dos sistemas de Educação e Formação Profissional a nível Europeu, enquanto os restantes referenciais estão focados numa perspectiva de implementação e desenvolvimento de melhoria contínua das organizações a nível individual. Pode observar-se ainda as diferenças entre as finalidades, nas quais as necessidades e satisfação das partes interessadas dos operadores de EFP (EQAVET), necessidades do cliente, expectativas e oportunidades (Modelo) ou satisfação e requisitos do cliente (Standard) dos restantes referenciais, tal como apresentado em Pisco & Saraiva (2019). O Quadro 3 apresenta as características específicas e os principais objetivos de cada referencial da qualidade. Quadro 3 – Características e objetivos EQAVET A recomendação estabelece que o quadro deve apoiar a implementação de: a) Quadro Europeu de Qualificações, em particular a qualidade da certificação dos resultados da aprendizagem, b) o Sistema Europeu de Créditos do Ensino e Formação Profissionais c) os princípios europeus comuns para a identificação, certificação e validação da aprendizagem não formal e informal. EFQM Características Específicas O modelo afirma que ele pode ser usado em conjunto com qualquer número de ferramentas e técnicas de gestão. EFQM Excellence Award e premiações nacionais feitas para organizações de melhor desempenho. Principais objetivos Contribuir para: a) o uso de boas práticas; b) modernização dos sistemas de Educação e Formação; c) melhoria da qualidade do EFP e aumento da transparência e consistência na evolução da política de EFP; d) construção de confiança mútua, mobilidade de trabalhadores e alunos; c) promoção de um espaço europeu de aprendizagem ao longo da vida sem fronteiras. Capacitar as organizações para: a) avaliar se estão no caminho para a excelência; b) ajudá-los a entender seus pontos fortes e potenciais em relação à sua Visão e Missão; c) agregar iniciativas existentes e planificadas e remover a duplicação; d) fornecer uma estrutura básica para o sistema de gestão da organização; e) melhoria contínua e inovação; f) benchmarking - “O EFQM partilha o que funciona”. 206 CAF – Educação ISO 21001:2018 A norma declara que é possível que uma organização adapte o seu (s) sistema (s) de gestão da qualidade existente (s) para estabelecer um SGQ que esteja em conformidade com os requisitos desta Norma. Avaliação de terceiros (muitas vezes referida como certificação ou registo). A ISO possui vários prémios que ajudam a promover diferentes aspetos da padronização internacional. A norma tem subjacentes princípios comuns aos restantes sistemas de gestão, adaptados ao contexto das organizações educacionais, uma vez que existe a necessidade crítica e contínua das organizações educacionais avaliarem até que ponto atendem os requisitos de alunos bem como de outras partes interessadas relevantes, e melhorar sua capacidade de continuar a fazê-lo. Certificação DGERT ISO 9001:2015 A CAF aposta no princípio de que os resultados de excelência no desempenho organizacional, cidadãos/clientes, pessoas e sociedade são atingidos através da liderança que conduz a estratégia e planeamento, as pessoas, as parcerias, os recursos e os processos. A certificação implica a existência de características ou condições mínimas de estruturação da atividade formativa de uma entidade formadora relativas à capacidade instalada em termos de recursos, às práticas inerentes aos processos de desenvolvimento da formação e aos resultados alcançados. Uma análise de resultados e orientação para melhoria contínua. Tem como objetivos principais: a) introduzir uma cultura de excelência e os Princípios de Gestão da Qualidade; b) melhorar os processos existentes; c) orientar o processo de gestão da instituição de ensino e formação para o aluno/formando; d) melhorar o desempenho/resultados; e) promover o reconhecimento da instituição de ensino e formação. Permite: a) a compreensão e a satisfação consistente dos requisitos; b) a consideração dos processos em termos de valor acrescentado; c) a obtenção de um desempenho eficaz dos processos; d) a melhoria dos processos baseada na avaliação de dados e de informação. Contribuir para: a) o alinhamento dos objetivos e atividades com a estratégia, missão e visão; b) educação de qualidade inclusiva e equitativa para todos; c) uma aprendizagem mais personalizada a todos os alunos; d) processos consistentes e ferramentas de avaliação para aumentar a eficácia e eficiência; d) aumentar a credibilidade da organização; e) promover uma cultura para melhoria organizacional; f) harmonização de padrões nacionais dentro de uma estrutura internacional; g) ampla participação das partes interessadas; h) estimular da excelência e da inovação. Visa contribuir para o aumento da qualidade da formação: a) prevendo um conjunto de recursos essenciais a uma atuação com qualidade em cada fase do ciclo formativo e para as áreas de formação em causa; b) garantindo a planificação da atividade formativa numa base sólida de necessidades identificadas; c) estimulando a orientação para resultados e para práticas de melhoria contínua das entidades formadoras; d) incentivando práticas e condutas mais profissionais por parte das entidades formadoras. Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019) Da análise do Quadro 3, conclui-se que independentemente das suas características específicas e os seus principais objetivos serem inevitavelmente diferentes, todos os referenciais perpetuam a qualidade e melhoria contínua da qualidade, mesmo que em diferentes níveis e sob diferentes pontos de vista, quer seja por um reconhecimento exterior 207 (credibilidade), quer seja pela promoção da melhoria contínua interna, tal como referenciado em Pisco & Saraiva (2019). Por fim, o Quadro 4 apresenta a metodologia e os indicadores de medida para cada referencial em análise. Quadro 4 – Metodologia e Indicadores de Medida Indicadores de Medida Referência a um conjunto de dez indicadores de qualidade enquanto proposta para servir de “caixa de ferramentas” e não ser considerado somente como um conjunto de benchmarks. CAF – Educação Não existem indicadores incluídos, mas o modelo afirma explicitamente que organizações excelentes usam um conjunto de medidas de perceção e respetivos indicadores de desempenho. É usado um esquema de pontuação para organizações que solicitam a excelência EFQM. Uma metodologia de autoavaliação para a qualidade através do qual uma organização procede ao diagnóstico do seu desempenho numa perspetiva de Melhoria Contínua (metodologia PDCA), através da identificação de pontos fortes e áreas de melhoria. Existência de critérios de análise, utilizados numa autoavaliação utilizando a metodologia PDCA, registada em painéis de pontuação. ISO 9001:2015 EFQM EQAVET Metodologia Garantia de qualidade e melhoria contínua. (Metodologia PDCA) apoiada por critérios de qualidade, descritores indicativos, no sistema níveis de provisão e um conjunto de referência de indicadores de qualidade selecionados (Ciclo de Qualidade EQAVET e Ciclo MERI). Utilização da ferramenta RADAR (Resultados, Abordagem, Desdobramento, Avaliação e Revisão) baseada na metodologia PDCA. O método de avaliação usado para pontuar organizações que se candidatam ao Prémio de Excelência EFQM- EQA. Um SGQ baseado em processos: a) entender e atender aos requisitos; b) considerar processos em termos de valor agregado; c)obtenção de resultados de desempenho e eficácia de processos; d) melhoria contínua de processos baseados em objetivos de medição. Os processos têm ligação com a metodologia PDCA. Não existe a inclusão de indicadores, mas a medição é explicitamente exigida pelo Padrão, bem como a recolha e análise de dados. 208 ISO 21001:2018 Certificação DGERT Metodologia baseada em processos: a) planeamento: ações para prevenir riscos, objetivos organizacionais, mudança, conceção e desenvolvimento dos produtos e serviços; b) processos educativos: bem-estar e ambiente; c)conhecimento organizacional; d)avaliação de desempenho individual e desenvolvimento contínuo; e) política de comunicação; f) conceção e desenvolvimento dos produtos e serviços; g) controlo de serviços externos; h) rastreabilidade e preservação; i) monitorização: critérios, desempenho organizacional, eficácia do sistema de gestão e do planeamento, revisão crítica do desempenho. Os processos têm vinculação com a metodologia PDCA. O referencial de qualidade composto por um conjunto de requisitos que determinam a qualidade das práticas adotadas pela organização na oferta dos seus produtos e na prestação dos seus serviços. Os requisitos foram definidos numa lógica do ciclo de melhoria contínua. Pretende imprimir uma dinâmica de qualidade à atividade, mas não uniformizar atuações ou limitar a criatividade e a originalidade. A existência de um ciclo da formação que traduz uma interligação clara entre a identificação de necessidades de competências, o processo formativo em si e os resultados atingidos no final do mesmo, apoiado na metodologia PDCA. Nenhum indicador está incluído, mas a medição e análise de dados está presente. São apresentados exemplos de processos, medidas e ferramentas de avaliação. Referência a requisitos, a indicadores, fontes de verificação e critérios de apreciação dos mesmos como fundamentais para o sistema de certificação e manutenção da certificação. A conformidade das práticas através da apresentação de evidências objetivas das mesmas. Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019) Da análise do Quadro 4, destaca-se a predominância do ciclo PDCA, em todos os referenciais, sendo utilizada a ferramenta RADAR no EFQM e o Ciclo da Qualidade no EQAVET, a salientar que no EQAVET também surge a menção ao ciclo MERI, tal como referido em Almeida (2016) e Cedefop (2015). No que se concerne aos indicadores de medida existe um conjunto de referência de indicadores de qualidade selecionados (EQAVET), no EQMF e CAF – Educação existem medidas de percepção e indicadores de desempenho relacionados (Modelo) e de medição, bem como fontes de verificação e análise de dados (Standart) na ISO 9001:2015, ISO 21001:2018 e Certificação DGERT, tal como evidenciado em Pisco & Saraiva (2019). 4. Considerações Finais Neste trabalho foram analisados diferentes referenciais da qualidade, do qual se pode concluir que um dos elementos comuns é o facto destes referenciais se preocuparem com algumas das mesmas questões, nomeadamente sobre a eficiência e eficácia da organização e, se basearem 209 no ciclo de PDCA (Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua. No entanto, foram desenvolvidos a partir de origens diferentes e, consequentemente, são substancialmente diferentes quer na sua abordagem quer nos seus principais objetivos. Após as pesquisas realizadas, confirma-se a existência de uma indiscutível vontade para convergir e articular, nas normas ISO e modelo CAF, os descritores e indicadores do Quadro EQAVET. Na norma ISO 21001:2018, o anexo F, apresenta elementos compatíveis, entre descritores e indicadores EQAVET, e os requisitos desta norma. É estabelecida uma matriz de correspondência entre ambos, sendo possível a verificar o cumprimento dos critérios de qualidade do Quadro EQAVET, através da implementação de um sistema de gestão com base na norma ISO 21001:2018. A CAF, além da sua vertente CAF- Educação, apresenta um Modelo Integrado CAF Educação, Referencial da Avaliação Externa e EQAVET, que permite articular a CAF com o Referencial da Avaliação Externa e/ou com o EQAVET, através da utilização de metodologia e de modelos de relatórios de monitorização de descritores indicativos e indicadores de qualidade do Quadro EQAVET. É de ressalvar que o presente trabalho pretende ser uma contribuição no que concerne à apresentação sintética e sistemática de um conjunto de referenciais no âmbito da EFP. Não se pretendeu uma análise exaustiva, procurando refletir especificamente sobre os principais referenciais da qualidade para a educação e formação profissional e efetuar uma comparação teórica. Contudo, esta análise aqui desenvolvida pode ser considerada como o início de um longo caminho para toda a comunidade escolar, como o princípio da procura da qualidade rumo à excelência. Referências Almeida, A. (2016). Avaliação do Ensino Profissional: O Quadro Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e Formação Profissionais. Educação, Sociedade & Culturas, (47), 137-155. APCER (2015) Guia do utilizador ISO 9001-2015. Porto: APCER. Cedefop (2015). Handbook for VET providers: Supporting internal quality management and quality culture. Publications Office of the European Union. Luxembourg. Comissão Europeia (2010). Comunicado de Bruges sobre o Reforço da Cooperação Europeia no Ensino e Formação Profissionais para o Período de 2011-2020. Disponível em: http://ec.europa.eu/education/policy/vocational-policy/doc/brugescom_pt.pdf (acedido em 10-04-2020). 210 Comissão Europeia (2014). Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a execução da recomendação do parlamento europeu e do conselho, de 18 de junho de 2009, sobre a criação de um quadro de referência europeu de garantia da qualidade para o ensino e a formação profissionais. Bruxelas. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX:52014DC0030 (acedido em 10-01-2021) Communiqué of the European Ministers for Vocational Education and Training (2015), the European Social Partners and the European Commission, meeting in Bruges on 7 December 2010 to review the strategic approach and priorities of the Copenhagen process for 2011-2020, Disponível em http://www.refernet.pt/wpcontent/uploads/2015/12/5-Comunicado-deBruges_EN.pdf (acedido em 10-04-2019). Conselho da União Europeia (2014). Conclusões do Conselho, de 20 de maio de 2014, sobre a garantia da qualidade como forma de apoiar o ensino e a formação. Bruxelas. Conselho Europeu (2009). Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho de 18 de junho de 2009 sobre a criação de um Quadro de Referência de Garantia da Qualidade para o Ensino e a Formação Profissionais. Bruxelas. Dias, N., & Melão, N. (2009). Avaliação e qualidade: dois conceitos indissociáveis na gestão escolar. Tékhne-Revista de Estudos Politécnicos, (12), 193-214. Direção-Geral da Administração e do Emprego Público – DGAEP (2013), Estrutura Comum de Avaliação (CAF) Adaptada ao setor da educação. Disponível em http://www.caf.dgaep.gov.pt/ (acedido em 21-09-2018). Direção-Geral da Administração e do Emprego Público – DGAEP (2019), Modelo Integrado: CAF Educação, Referencial da Avaliação Externa & EQAVET. Disponível em https://www.caf.dgaep.gov.pt/media//caf_educacao/CAF_Edu_Mod_Integrado_2_edica o.pdf (acedido em 15-02-2019). EFQM (2004) Commited to Excellence – Brochura Informativa. Amadora: Associação Portuguesa para a Qualidade. EQAVET (s/d), Comparative overview of the EQAVET Framework, EFQM Excellence Model and ISO 9001 Standard. Disponível em https://www.eqavet.eu/Aligning-withEQAVET/Aligning-a-QA-approach/Bruges-communique-(1) (acedido em 15-05-2018). Fonseca, L. (2015). From Quality Gurus and TQM to ISO 9001:2015: a review of several quality paths. International Journal for Quality Research, 9 (1), pp.167–180. Galvão, M. (2016). Garantia da qualidade nas modalidades de dupla certificação. Um guião para os operadores de educação e formação profissional. Lisboa: ANQEP. 211 Gotzamani, K., Tsiotras, G., (2002), The true motives behind ISO 9000 certification, International Journal of Quality and Reliability Management, Vol. 19, No. 2, pp 151-169. ISO 21001:2018. Educational organizations - Management systems for educational organizations - Requirements with guidance for use NP EN ISO 9001:2015. Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos OECD (2018), Skills Strategy Implementation Guidance for Portugal: Strengthening the Adult-Learning System, OECD Skills Studies, OECD Publishing, Paris, http://dx.doi.org/10.1787/9789264298705-en Parlamento Europeu e Conselho (2008). Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho de, 23 de Abril de 2008, relativa à instituição do Quadro Europeu de Qualificações para a aprendizagem ao longo da vida. Disponível em: http://eurlex.europa.eu/legalcontent/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32008H0506(01)&from=PT (acedido em14-04-2018). Parlamento Europeu e Conselho (2009). Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Junho de 2009, sobre a criação de um Quadro de Referência Europeu de Garantia da Qualidade para o Ensino e a Formação Profissionais. Disponível em: http://eurlex.europa.eu/legalcontent/PT/ALL/?uri=CELEX:32009H0708%2801%29 (acedido em 14-04-2018). Pisco, M. & Saraiva, M. (2019). Referenciais de Qualidade para a Educação e Formação Profissional - Comparação Teórica. In Livro de Atas do X Encontro de Investigadores da Qualidade– Qualidade, Investigação e Desenvolvimento, António Ramos Pires, Margarida Saraiva, Álvaro Rosa, Rodrigo Teixeira Lourenço e Helena Gonçalves (Org.), RIQUAL - Rede de Investigadores da Qualidade, Instituto Politécnico de Setúbal, Setúbal (Portugal), 7 de junho de 2019, pp. 105-116. ISSN: 2183-1408. Pisco, M. (2019). Motivações na implementação de um sistema de garantia de qualidade alinhado com o Quadro EQAVET. Estudos de caso em Operadores de Educação e Formação Profissional. Tese de Mestrado em Gestão, Especialidade em Recursos Humanos. Escola de Ciências Sociais, Universidade de Évora, Évora. Saraiva, M. & Pires, A. R. (2018). Controlo, Garantia e Gestão da Qualidade em Instituições Portuguesas de Ensino Superior. In 8ª CONFERÊNCIA FORGES: O papel da Garantia da Qualidade na Gestão do Ensino Superior: desafios, desenvolvimentos e tendências, FORGES – Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa, pp. 201-218. 212 Legislação: Decreto-Lei n.º 396/2007, Diário da República n.º 251/2007, Série I de 2007-12-31, Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, pp. 9165-9173. Disponível em https://data.dre.pt/eli/dec-lei/396/2007/12/31/p/dre/pt/html (acedido em 10-01-2021). Portaria nº 208/2013, Diário da República n.º 121/2013, Série I de 2013-06-26, Ministérios da Economia e do Emprego e da Educação e Ciência, pp. 3666-3680. Disponível em https://data.dre.pt/eli/port/208/2013/06/26/p/dre/pt/html (acedido em 10-01-2021). Portaria nº 851/2010, Diário da República n.º 173/2010, Série I de 2010-09-06, Ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social e da Educação, pp. 3936-3944. Disponível em https://data.dre.pt/eli/port/851/2010/09/06/p/dre/pt/html (acedido em 10-01-2021). Resolução do Conselho de Ministros n.º 173/2007, Diário da República n.º 214/2007, Série I de 2007-11-07, Presidência do Conselho de Ministros, pp. 8135-8151. Disponível em https://data.dre.pt/eli/resolconsmin/173/2007/11/07/p/dre/pt/html (acedido em 10-012021). 213 11. APRENDIZAGEM COMO LIBERDADE Misleine Andrade F. Peel38, Patrícia Damas Beites39 & Fátima Simões40 Resumo Existe uma tentativa de apanhar a aprendizagem, de prendê-la, de encapsulá-la; muitos educadores, filósofos, psicólogos, sociólogos, dentre outros, ao longo do tempo, têm se dedicado a essa ação de capturar a aprendizagem e moldá-la de uma forma que seja única e universal; nesse trabalho, ao contrário, entendemos que a aprendizagem acontece nas liberdades, nos encontros, nos agenciamentos, na decifração de signos e nas singularidades dos sujeitos. Demonstraremos que o ensino e a aprendizagem não podem e nem devem estar presos em estruturas curriculares rígidas, tanto o professor quanto o aluno não podem ser limitados e privados de suas liberdades substantivas. A filosofia deleuziana nos dá uma deiscência para novos encontros, uma vez que entendemos que a construção do pensamento não é linear, nem encadeada, nem arbórea; mas rizomática, livre, com agenciamentos múltiplos, com linhas de convergências, com redes, com ritornelos e com linhas de fugas, sabendo que o caminho do saber subjetivo é constituído através de todo um percurso cartográfico, em que cada encontro é necessário para que a formação integral do sujeito abra caminhos para onde este desejar. Nosso suporte teórico consiste nas observações de Amartya Sen, Gilles Deleuze, Paulo Freire e Henrique Iafelice; essa pesquisa se trata de um pequeno contributo para uma reflexividade do conhecimento junto ao campo teórico da área da educação, no que tange ao ensino e a aprendizagem, sendo de base bibliográfica. Palavras-chave: Aprendizagem. Afetos. Liberdade. Ensino. Encontros. Doutoranda do Programa de Educação da UBI – Universidade da Beira Interior; Mestre em Demandas Populares e Dinâmicas Regionais, pela UFT – Universidade Federal do Tocantins; Especialista em Educação Matemática, pela UFT; Licenciada em Ciências – Matemática, pela UFT. E-mail: misleine.peel@ubi.pt 39 Professora Auxiliar, Centro de Matemática e Aplicações (CMA-UBI) e Departamento de Matemática. Universidade da Beira Interior. E-mail: pbeites@ubi.pt 40 Professora Associada com Agregação. Unidade de Investigação LabCom.IFP e Departamento de Psicologia e Educação. Universidade da Beira Interior. E-mail: fsimoes@ubi.pt 38 214 LEARNING AS FREEDOM Abstract There is an attempt to capture learning, to arrest it, to encapsulate it; many educators, philosophers, psychologists, sociologists, among others, over time, have dedicated themselves to this action of capturing learning and shaping it in a way that is unique and universal; in this work, on the contrary, we understand that learning happens in the freedoms, in the encounters, in the assemblages, in the deciphering of signs and in the subjects' singularities. We will demonstrate that teaching and learning cannot and should not be bound by rigid curricular structures, both the teacher and the student cannot be limited and deprived of their substantive freedoms. The Deleuzian philosophy gives us a dehiscence for new encounters, since we understand that the construction of thought is not linear, nor linked, nor arboreal; but rhizomatic, free, with multiple assemblages, with lines of convergence, with networks, with choruses and leak lines, knowing that the path of subjective knowledge is constituted through a whole cartographic path, in which each encounter is necessary so that the integral formation of the individual opens paths wherever he wishes. Our theoretical support consists of the observations of Amartya Sen, Gilles Deleuze, Paulo Freire and Henrique Iafelice; this research is a small contribution to a reflexivity of knowledge within the theoretical field of education, with regard to teaching and learning, being of bibliographic basis. Keywords: Learning. Affections. Freedom. Teaching. Encounters. Introdução A aprendizagem faz parte do que somos, ela é inerente à nossa racionalidade, à nossa capacidade de construir, crescer, perceber, explorar, questionar, relacionar e criar; é parte da singularidade humana, sendo que algumas questões sobre a aprendizagem têm instigado muitos pesquisadores ao redor do mundo, e por muito tempo, tais como: Qual a melhor forma de adquirir, construir ou experimentar o conhecimento?; Como se aprende?; Quais capacidades natas ou adquiridas são necessárias para que os indivíduos aprendam?; O que é mais importante para que a aprendizagem ocorra: a genética ou o meio?; Existe uma metodologia ou didática universal para se ensinar? Os retornos a essas e a outras questões foram e continuam a ser propostos por estudiosos de diferentes áreas que nem sempre entram em consenso; sabemos que teorias vêm sendo escritas e refutadas no percurso histórico da educação. Não consideramos que temos as respostas para todas essas questões, mas 215 apostamos na liberdade encontrada no conhecimento da singularidade dos seres como um caminho para que isso ocorra de forma que aumente a potência de agir dos sujeitos. Na educação tradicional, pensava-se que existia uma relação binária entre o ensino e a aprendizagem, em que se é ensinado e se aprende ao mesmo tempo, como se isso fosse automático e sem levar em consideração a subjetividade dos sujeitos envolvidos no processo pedagógico, nem os afetos que interferem diretamente e indiretamente nas aquisições cognitivas dos aprendizes. Consideramos o ensino tradicional como aquele no qual o professor é o centro da aprendizagem, através de um ensino baseado na transmissão de conhecimento, com aulas essencialmente discursivas e expositivas, e com alunos passivos, meros receptores de informações; nos dias de hoje encontramos em nossa prática educacional muitos professores que parecem ainda pensar dessa forma, que até se preocupam em como ensinam, procurando conhecer novas tendências metodológicas para o seu ato pedagógico, mas se esquecendo do mais importante, de seus educandos, de ouvir o que seus alunos dizem, de tentar entender as suas singularidades, de compreender verdadeiramente as suas experiência e as suas vivências, de compreender como seus discentes são afetados durante os encontros escolares, seja com os pares, seja com o objeto de estudo, seja consigo ou com os outros que estão direta ou indiretamente envolvidos no processo educacional. A escola na revolução industrial começou a ser popularizada como meio de capacitação profissional, agindo como um instrumento que acolhia as necessidades do mercado industrial. A escola se constituiu, assim, como conservadora e como reprodutora das desigualdades vigentes, atendendo a lógica capitalista. Paulo Freire (1987) também chama a atenção para o fato de a escola se constituir como um instrumento para a domesticação do homem, para a manutenção da opressão. A educação é um forte componente para a formação integral dos sujeitos; no Brasil, ela é garantida constitucionalmente, de forma gratuita e obrigatória. Apesar disso podemos perceber imensas desigualdades entre os desempenhos acadêmicos em nível nacional e internacional, existindo por todo lado privações das liberdades substantivas, definidas por Sen (2010). De fato, boa parte dos jovens e adultos brasileiros, mesmo tendo concluído a educação básica (que corresponde a 12 anos escolares), não conseguem se expressar socialmente e politicamente; não alcançando, por isso, uma melhoria de vida. A educação escolar é um direito social, sua realização deve ser vista com responsabilidade, uma vez que “todos” nós passamos por ela. Com efeito, vivemos numa sociedade marcada e regida pela ciência, pela tecnologia e pela cultura. Entendemos que existe uma 216 vulnerabilidade escolar, como conceituada por Peel (2018), sendo um problema complexo que está enraizado historicamente no cenário educacional brasileiro; esta vulnerabilidade é complexa e afeta os indivíduos de diversas formas. Temos processos de ensino e experimentações de aprendizagem marcados por estruturas curriculares rígidas e ineficazes, que são mostrados através de vários dados nacionais e internacionais. O Brasil tem, ainda, um grande fardo de privação da liberdade: como a tentativa de escravização dos indígenas e a escravização dos africanos, que durou mais de três séculos; e sua “libertação”, apesar de ter um pouco mais de 130 anos, ainda traz sequelas de sua constituição, até hoje demostradas nas fortes desigualdades econômicas e sociais que existem no país, que, além deste histórico marcante ainda em nossa sociedade atual, apresenta marcas de um consumo dependente da matriz colonizadora – uma “nova” dependência, um “novo” tipo de opressão. Hoje muitos especialistas em educação e em aprendizagem defendem um ensino em que a autonomia dos sujeitos seja valorizada; com os estudantes, ainda que em boa parte dos casos apenas teoricamente, sendo percebidos como sujeitos com capacidades intelectuais para pensar, para criar, para desenvolver, para aprender e para aprender a aprender. Nós, compactuando com esse pensamento, neste artigo, propusemo-nos a trazer uma reflexão sobre aprendizagem usando, para isso, um embasamento teórico-filosófico que pensa o saber constituído através dos encontros – os agenciamentos; experimentações da decifração dos signos e da conjunção dos afetos. O saber da mesma raiz de sabor deveria ser prazeroso, deveria trazer alegria e não tristeza. A forma como enxergamos todo o processo educacional, muitas vezes, como um “mal necessário” é prejudicial, pois a dor dos afetos tristes não é valiosa nas experimentações do saber e do conhecimento: “somos educados a desconfiar de nossas diferenças, a acreditar na tristeza como meio de se chegar a alegria” (Iafelice, 2015, p. 15). Para tanto fizemos uma revisão bibliográfica de alguns trabalhos de Gilles Deleuze, Paulo Freire, Amartya Sen e de outros, buscando contribuir para a área do conhecimento da educação, promovendo uma reflexão sobre a “aprendizagem como liberdade” para o aumento da potência. O problema da aprendizagem Como já falamos existe uma preocupação em se perceber claramente como se dá a aprendizagem nos indivíduos, entendemos que este é um tema complexo que envolve muitas variáveis. O fracasso escolar no Brasil é algo palpável, começaremos pelos dados divulgados 217 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), quanto às taxas de escolarização no Brasil, apresentados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) ; apesar de ter havido um bom crescimento (10 pontos percentuais), na última década, da população de 25 a 34 anos com nível superior, este índice ainda é baixo se compararmos com a média de países da OCDE e, ainda, é a menor proporção entre os países da América Latina (INEP, 2019). Ainda temos, segundo dados divulgados em 2018, 17% da população brasileira entre 25 e 64 anos que concluíram um curso de ensino superior, sendo que apenas 0,8% de pessoas dessa faixa etária têm um título de mestre e apenas 0,2% desses indivíduos têm doutorado. Na educação básica, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), temos um alto número de adolescentes entre 15 e 17 anos que abandonaram a escola, o que soma 1,2 milhões, ou 11,8%, e ainda que 49% da população de 25 a 64 anos não têm o ensino médio completo; temos, também, em 2018, uma taxa de analfabetismo de 6,8%, que corresponde a um pouco mais de 11 milhões de pessoas (IBGE, 2019). Esses números são bem alarmantes e o IBGE ainda afirma que as desigualdades econômicas, regionais, de gênero, de cor e de raças ainda persistem; a situação se agrava se fomos considerar o que Charlot (2010) diz, o que faz bastante sentido: precisamos considerar ainda os alunos que completam a educação básica, mas não têm condições de agir autonomamente e criticamente, sendo facilmente manipulados pelas mídias, redes sociais, fake news etc. Para Charlot (2010): Fracasso escolar pode ser o fato de um aluno não passar de ano. Geralmente é assim que se entende. Mas fracasso escolar, muitas vezes, é o fato de o aluno não saber nada e passar de ano. Se deveria falar também do fracasso escolar dos bons alunos que passam, que tiram boas notas, mas não têm uma formação que permita refletir sobre a vida e sobre o mundo. Esse é um problema a se refletir. (p. 214) Dessa forma percebemos que muitos estudantes fracassam em seu percurso escolar, e nós concordamos com Charlot (2010) em relação a que o fracasso escolar, apesar de ser comumente associado ao baixo rendimento escolar, às reprovações e até mesmo à evasão escolar, o que de fato é também uma evidência clara disto, deve ser entendido como fruto de uma educação que é destituída de aprendizagem, o que não contribui significativamente para a autonomia dos sujeitos, e sendo um terrível desperdício de potencial humano. Assim, a reflexão que Charlot (2010) promove é válida pois evidencia que o problema é bem maior do que a maioria das pessoas cogita, já que existem alunos que, apesar de apresentarem 218 um bom rendimento escolar em relação ao desempenho acadêmico, não conseguem assumir posturas críticas e maduras em relação à compreensão dos fatos sociais, o que significa que não possuem uma formação que os atenda em suas necessidades políticas, sociais e econômicas. Sem aprendizagem, os alunos serão lançados para uma vida de pobreza e de exclusão, o que ameaça o seu desenvolvimento, comprometendo o futuro da sociedade, o que é reiterado por Sen (2010): sem o acesso a liberdades substantivas não há desenvolvimento. Acreditamos que a vulnerabilidade escolar, em suas multiplicidades, tem demonstrado os seus efeitos em todas as esferas da vida social, uma vez que vemos afetos tristes sendo usados para a dominação e para a conservação do poder, impedindo que os sujeitos sejam ativos na construção humana holística individual e social, possuindo apenas afetos passivos. Uma criança a quem é negada a oportunidade do aprendizado escolar básico não só é destituída na juventude, mas desfavorecida por toda a vida (como alguém incapaz de certos atos básicos que dependem de leitura, escrita e aritmética). (Sen, 2010, p. 361) As privações de liberdades produzem desigualdades que não se restringem às questões econômicas, mas chegam à educação, à saúde, à cultura, à segurança, ao lazer, à arte, dentre outros aspectos sociais; Peel (2018), em sua dissertação de mestrado, entende a vulnerabilidade escolar como uma decorrência da privação das liberdades substantivas. Amartya Sen, em obra de 2010, defende que para que haja desenvolvimento as liberdades substantivas e instrumentais devem ser acessadas por todos, e ainda que a liberdade individual é fundamentalmente um produto social; para o autor, existem três tipos de liberdade, as substantivas, as instrumentais e a humana geral, que precisam substituir, ou remover, as principais fontes de privação das liberdades: O desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência excessiva de Estados repressivos. (Sen, 2010, p. 16-17) Escolhemos iluminar suscintamente alguns importantes aspectos que influenciam diretamente na aprendizagem, no sistema, nos professores e nos estudantes; e, por fim, falaremos dos afetos na aprendizagem e da aprendizagem como liberdade, como constituem passos cartográficos para uma aprendizagem efetiva. 219 O sistema Podemos pensar pontualmente no sistema educativo, entendendo-o como a escola, com suas políticas internas; ou mais genericamente, como o conjunto de políticas públicas que regem a educação, que se faz disfuncional, pois alunos transitam entre as séries sem um aproveitamento adequado das disciplinas anteriores: os alunos vão sendo aprovados com bases insuficientes. Não estamos apoiando as reprovações, uma outra questão complexa, o que queremos dizer é que não adianta uma aprovação inconsequente com falsos resultados, pois esse é um dos aspectos em que o sistema vai se mostrando como reprodutor das desigualdades. Há, de fato, uma desigualdade evidente que parece ser naturalizada no processo escolar, infelizmente a escola não tem conseguido atender os jovens em suas necessidades profissionais e sociais, tendo um enviesamento de seu papel na formação integral dos sujeitos e uma conservação de uma seleção social. Cabe à escola proporcionar condições para a formação integral dos sujeitos, por meio de um ensino democrático e libertador para todos, sem discriminação: Além disso, e tendo por base o compromisso da escola de propiciar uma formação integral, balizada pelos direitos humanos e princípios democráticos, é preciso considerar a necessidade de desnaturalizar qualquer forma de violência nas sociedades contemporâneas, incluindo a violência simbólica de grupos sociais que impõem normas, valores e conhecimentos tidos como universais e que não estabelecem diálogo entre as diferentes culturas presentes na comunidade e na escola. (BNCC, 2017, p. 59) O Brasil possui enormes desigualdades sociais que resultam diretamente nos níveis de proficiência dos alunos, o que se encontra evidenciado nos resultados das avaliações externas nacionais e internacionais, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), que, dentre outros assuntos problemáticos, evidenciam que quanto mais pobres menor o rendimento escolar; esses dados revelam a discrepância dos resultados entre as escolas públicas e particulares. Já em relação ao ensino superior, há no Brasil o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENAD), cujo resultado apresenta dados igualmente insuficientes, principalmente no ensino privado – há, no entanto, uma troca: enquanto que, no ensino básico e médio, há um melhor desempenho de alunos oriundos de escolas particulares; no ensino superior, a escola pública se destaca como fonte dos melhores resultados. 220 Outrossim, sabemos que a aprendizagem não pode ser medida somente pelo desempenho dos alunos nas avaliações sistemáticas externas nacionais e internacionais, como se isso fosse um método totalmente confiável para avaliar, mesmo porque eles não evidenciam os problemas complexos da educação, como as condições precárias materiais e imateriais do trabalho didático e pedagógico, a fragmentação do conhecimento nas grades curriculares, a falta de segurança pública dentro e fora da escola, bem como a falta da participação familiar e da sociedade no processo educacional dos sujeitos. Ainda assim, os resultados de avaliações nacionais e internacionais são usados para a construção de políticas públicas, que geralmente não conseguem atender às particularidades regionais, econômicas e sociais de onde as instituições se encontram. Ainda temos alguns autores que defendem que os resultados dessas ações servem mais para um barulho midiático do que para ações efetivas de mudança no paradigma educacional; como Machado (2010), que chega a propor o que segue: Chegamos a um ponto tal que seria desejável a união de todos os envolvidos com o ensino público, da escola básica às universidades, para a proposição de uma ação concreta, com as características de um verdadeiro mutirão, tendo em vista uma inflexão nas mornas variações dos indicadores educacionais. Durante algum tempo, dois ou três anos, deveríamos parar de avaliar por avaliar, apenas para reiterar um fracasso de que já temos consciência, canalizando toda nossa energia para produzir uma transformação efetiva no estado de coisas. Após tal ação/mutirão, poderíamos, enfim, esperar a divulgação dos novos indicadores com uma expectativa positiva, com a sensação do dever cumprido. (s.p.) Muitos autores, como Iafelice (2015) e Paulo Freire (1967, 1987), deduzem que esse problema no âmbito escolar se dá por uma dominação ideológica da lógica do mercado, regido pelo sistema capitalista, e denunciam que muitas vezes a escola entra na engrenagem da exclusão, evidenciando que as desigualdades escolares existem quando somos escravos de um pensamento dominador de exploração e de opressão. A escola tem um papel que vai muito além da transmissão do saber científico, não podemos pensar a educação como isenta das questões sociais, políticas e econômicas de seu contexto; os sujeitos que dela participam devem ser construtores da cultura, possuindo condições para exercer e para lutar pela liberdade de ação em qualquer esfera que se encontrem. Vejamos, então, o que La Taille (2009) nos diz sobre como pensa a escola: 221 Cabe à instituição escola tomar parte na formação existencial de seus alunos? Ou cabe a ela apenas a transmissão dos conhecimentos necessários ao ingresso no mundo do trabalho? Opto pela primeira alternativa. Em primeiro lugar porque me parece inconcebível que instituições nas quais as crianças e jovens passam anos e anos possam não se preocupar com dimensões de vida que vão além da aprendizagem de determinadas disciplinas. E, em segundo lugar, porque os próprios conhecimentos transmitidos na escola são portadores de sentido que transcendem a especificidade de cada matéria. A escola é uma verdadeira usina de sentidos, sentidos de vida (ética) e de convivência (moral), e não há outra instituição social de que se possa dizer o mesmo. (p. 80-81) Dessa forma, a formação existencial é a mais importante; porém ela não deixa de estar ligada a um desempenho eficiente nas questões gramaticais, matemáticas, científicas, filosóficas e artísticas – o que é deveras importante, principalmente se esse desempenho for a tradução de uma formação holística e transdisciplinar. Os professores No Brasil há uma grande desvalorização do trabalho docente, que não é considerado como uma profissão de prestígio, apresentando uma formação inicial que falha e que não prepara os professores para a realidade das escolas brasileiras; muitos, dos que acabam nessa profissão, não o fizeram por escolha, mas por falta de escolha, já que é mais fácil o ingresso nesse tipo de carreira. A carreira docente tem, também, um piso salarial insuficiente e péssimas condições de trabalho, com muito histórico de violência no ambiente escolar, com salas lotadas, com carga horária exaustiva, com falta de materiais básicos e com estrutura física inadequada, dentre outros aspectos negativos. Os desafios são, assim, imensos; e o professor é mais uma das vítimas de um sistema injusto e triste: A questão é a seguinte: o que pode um corpo? De que afetos você é capaz? Experimente, mas é preciso muita prudência para experimentar. Vivemos em um mundo desagradável, onde não apenas as pessoas, mas os poderes estabelecidos têm interesse em nos comunicar afetos tristes. A tristeza, os afetos tristes são todos aqueles que diminuem nossa potência de agir. Os poderes estabelecidos têm necessidade de nossas tristezas para fazer de nós escravos. O tirano, o padre, os tomadores de almas, têm necessidade de nos persuadir que a vida é dura e pesada. (Deleuze & Parnet, 1998, p. 50) Percebemos que muitos docentes acabam repetindo a mesma forma com a qual foram ensinados, reproduzindo de forma inconsciente e até mesmo consciente, em seus percursos escolares, as maneiras dos professores que tiveram na infância; o que foi percebido por Paulo 222 Freire (1987), que apontou a sombra do opressor presente nos fazeres pedagógicos dos mestres, que defendem suas pautas, com suas subjetividades construídas coletivamente e afetadas por afetos tristes que decompuseram as suas potências de agir. Assim, o professor se torna reprodutor da tirania que lhe foi imposta – o “oprimido virando opressor” submisso ao sistema, sem sequer conseguir criticar sua vivência, suas ações, seu modo de existir, sua forma de afetar e de ser afetado. As paixões tristes, conceituadas por Spinoza (2017), vão sendo usadas como instrumentos de controle e de poder, por meio de suas repetições contínuas e insistentes; o professor muitas vezes se coloca em um lugar de fala superior, como o dono do saber, e, do seu pedestal, ele olha para o aluno como um ser inferior, usando o “conhecimento”, ou melhor, a ideia que ele tem sobre sua porção do conhecimento, como um instrumento de poder, que lhe concede a força do tirano, tratando seus alunos como escravos que recebem recompensas, quando fazem algo correto, e castigo, geralmente moral, quando fazem algo considerado errado. Surge então um questionamento: o que podem fazer os professores com essa reprodução de afetos e de situações tristes? Pouco, muito pouco – somente criarem afetos passivos e sem alegria: Sem perceber, esses professores criam em seus educandos afectos passivos, estimulam a reação inculcando a ideia de que ação deve ser fruto não da liberdade, mas da escravidão. O mais interessante é que esses mesmos professores, em outras circunstâncias, criticam os seus alunos por se preocuparem somente com as notas, com os resultados e não com o processo, com a pesquisa, com o próprio aprender. Infelizmente, eles não se reconhecem como responsáveis pela produção de afectos passivos em seus alunos. Uma educação fundamentada na tristeza não pode produzir como resultado a alegria e, consequentemente, a liberdade de criação. Fazer com que um aluno se aproxime de seu objeto de estudo necessita criação por parte do professor. (Iafelice, 2015 p. 88) Ora, há ações docentes contrárias a isso: acreditamos no poder dos afetos ativos, e que não devemos nos conformar com uma existência medíocre, uma submissão a ações tiranas destrutivas. Devemos fazer parte da resistência libertadora que vê em suas ações pedagógicas uma possibilidade de contribuir positivamente para a formação holística dos sujeitos, permitindo encontros profícuos que fortaleçam a potência de agir dos sujeitos. Os estudantes e suas subjetividades Acreditamos que os sujeitos possuem capacidades de aprendizagem ilimitadas, mas, devido à forma como são submetidos a privações de liberdade desde a infância, com estruturas curriculares rígidas e com a criação de dependência em relação a um sistema esvaziado de 223 significado positivo, os aprendizes são, de fato, afetados negativamente, com limitações em seu desenvolvimento ao longo da vida. Sua subjetividade acaba sendo construída de forma mecânica, como um conjunto de repetições daquilo que entendem ser apreciado por todos, sem originalidade. Dito isso, entendemos como positiva a subjetividade constituída de forma plural, polifônica e contínua; a subjetividade será, então, vivenciada de forma múltipla se for experimentada através de agenciamentos coletivos de enunciação: o nosso eu, apesar da exclusividade, é um rizoma que se liga aos outros seres, aos acontecimentos através de encontros. E isso estabelece uma riqueza coletiva e sucessiva, definida com as seguintes palavras por Guattari: “a única finalidade aceitável das atividades humanas é a produção de uma subjetividade que enriqueça de modo contínuo sua relação com o mundo” (Guattari, 2006, p. 33). Deleuze afirma, concordando com o que diz Guattari, que existe um interesse em uma produção mecânica da subjetividade: a ideia de que todos devem ser nivelados por baixo, escravos de um sistema que quer se conservar no poder, como um coquetel de uma subjetividade coletiva normativa contemporânea, substantiva a uma lei moral, numa busca de uma homogeneização universalizante e reducionista de uma subjetividade plural. Iafelice (2015), baseado em Baruch Spinoza, um filósofo holandês, também concorda com isso, dizendo que a lei moral é baseada na tristeza, por meio da injunção de vontades e de desejos passivos: Toda lei moral não nos revela nenhuma forma de conhecimento, não nos encaminha para uma compreensão das causas. Mais ainda, impede que conheçamos essas causas, direcionando-nos à obediência irrefletida, causadora de toda forma de superstição. A lei da natureza e a lei moral estão de tal modo imbricadas pela nossa ignorância que em muitos casos já não sabemos distinguir uma da outra, tamanha é nossa disposição moral para a aceitação e obediência. (Iafelice, 2015, p. 86) Na sociedade de consumo, a subjetividade é então constituída pelo nosso esforço de atingir aquilo que imaginamos ser aceitável e produtor da alegria que é vendida pelo mercado; assim, afastamo-nos da descoberta das causas reais que nos provocam alegria, para buscar aquilo que é “vendido” como alegria: A “subjetividade” dos consumidores é feita de opções de compra – opções assumidas pelo sujeito e seus potenciais compradores; sua descrição adquire a forma de uma lista de compras. O que se supõe ser a 224 materialização da verdade interior do self é uma idealização dos traços materiais – “objetificados” – das escolhas do consumidor. (Bauman, 2008, p. 24) Entendemos que todos somos sujeitos com direitos, e que, em nossas relações, interações e encontros cotidianos, devemos experimentar a construção de nossas subjetividades enquanto seres livres socialmente. E nossas experimentações devem ser vivenciadas integralmente, possibilitando que imaginemos, desejemos, observemos, pensemos, criemos, questionemos, investiguemos, construindo sentidos sobre e com as coisas, produzindo culturas, afetando-nos e sendo afetados. O estudante muitas vezes se cansa de lutar contra as diversas formas de submissão e de ordens previamente estabelecidas por formas de ensino verticais, em um sistema arborescente de ensino, com uma cadeia hierárquica do conhecimento; conformando-se com o que está estabelecido, muitas vezes sem ter consciência disso. Muitos ainda provêm de ambientes familiares que não têm condições de dar suporte emocional, cultural, econômico, o que gera como consequência um número elevado de evasão escolar, o que já foi dito anteriormente. Os afetos tristes, então se proliferam, diminuindo a nossa potência de agir, de se relacionar, de estabelecer novos encontros; eles mutilam a vida e só desaparecem com uma nova consciência, sob uma nova visão, habitando um novo território, com novos ritmos, novos costumes, novos encontros, novos desejos. Um corpo é afetado de muitas maneiras, sendo que o desejo da liberdade deve ser maior do que o desejo da escravidão. É necessária, então, uma outra imagem do pensamento, que favoreça outras formas de se pensar o conhecimento, menos hierarquizadas, menos estriadas, que não coloque o conhecimento dentro de compartimentos hierarquizados e estanques. A metáfora do rizoma subverte todo o sistema de arborescência. (Iafelice, 2015, p. 94) É preciso haver presencialidade, ou seja, o exercício do pensamento e do conhecimento sobre si, uma análise sobre a sua prática, uma análise sobre as suas relações e sobre o ganho de potência; identificando, dessa maneira, a real motivação para a experimentação de afetos alegres, tanto passivos como ativos. O amor, então, permitirá construções de afetos ativos, aumentando a potência de agir e de existir, libertando o discente de sua afetividade triste e derrotada. 225 Os afetos na aprendizagem Os afetos nem sempre foram vistos como algo de valor, as teorias clássicas do conhecimento mostram o caminho difícil que a ciência teve que percorrer para ganhar seu lugar ao sol, muitas vezes sobrevalorizando a racionalidade e a objetividade. Já ouvimos várias vezes que a razão deve sobrepor à emoção; a frase célebre de Descartes, “penso, logo existo”, deixa evidente que o pensamento vigente era que o mais importante era mesmo a razão, o pensamento que dava significado à existência. Um dos que se opôs a esse tipo de ideia foi Spinoza, defensor da imanência, que rejeitou a ideia de que a emoção deveria ser dominada pela razão, com o consequente desprestígio dos afetos. O conhecimento não é contrário aos afetos, para Spinoza (2017), “um afeto é uma idéia pela qual a mente afirma a força de existir” (p.166). Segundo Bauman (2008), na contemporaneidade, as relações sociais são baseadas no consumo, e o próprio sujeito se torna um produto. Na sociedade de consumo em que prevalece um consumir excessivo, com buscas de soluções rápidas para tudo e por um preço módico, novos psicotrópicos são criados e vendidos a todo momento, numa tentativa de cura, de diminuição da tristeza, de controle dos afetos. Esse caráter consumista procura uma solução mágica para o prazer, não almeja encontrar a causa das doenças e dos problemas, mas promover uma fuga para uma realidade externa: “A alegria está toda nas compras, enquanto a aquisição em si, com a perspectiva de ficar sobrecarregado com seus efeitos diretos e colaterais possivelmente incômodos e inconvenientes, apresenta uma alta probabilidade de frustração” (Bauman, 2008, p.28). Contrariamente a isso, Deleuze, um dos grandes nomes da filosofia do acontecimento, apesar de não ter escrito uma obra totalmente dedicada à educação e à aprendizagem, leva-nos a refletir sobre a aprendizagem na e da imanência, como algo singular, pertencente à subjetividade dos indivíduos: cada um aprende de uma forma – de uma maneira própria. Deleuze considera Spinoza o príncipe dos filósofos; para os dois, o fato de imaginarmos nossa impotência já nos entristece, ou seja, produz potências tristes que diminuem nossa força de agir. Para eles, nossa percepção é aumentada na proporção que os nossos corpos adquiram mais formas e mais maneiras; donde depreendemos que, no processo de ensino, quanto mais múltiplos em relação às formas e mais modos de existência e de significação existirem, maiores serão as possibilidades de experimentação de uma potência positiva. Devemos buscar as ideias adequadas, que são ideias claras e distintas, que objetivam os afetos ativos, que se deixe de ser afetado passivamente e externamente para passar a ser afetado ativamente, por meio de ações da mente, como um desenvolvimento de potência positiva. 226 Para isso é necessária uma elaboração interna, um fortalecimento da subjetividade real com esforço para estimular a potência de agir e de existir do corpo, buscando a alegria: “a alegria é a passagem do homem de uma perfeição menor para uma maior; a tristeza é a passagem do homem de uma perfeição maior para uma menor” (Spinoza, 2017, p. 141). As ideias inadequadas, confusas e opacas fazem o corpo padecer, trazendo afetos tristes que diminuem a potência de agir e existir; num sentido contrário, a alegria, a admiração e o amor devem nos mover. Deleuze (2004) afirma que: Se não se admira alguma coisa, se não se ama alguma coisa, não há razão alguma para se escrever sobre ela. Espinosa ou Nietzsche são filósofos cuja potência crítica e destruidora é inigualável, mas essa potência brota sempre de uma afirmação, de uma alegria, de um culto da afirmação e da alegria, de uma exigência da vida contra aqueles que a mutilam e a mortificam. Para mim, é a própria filosofia. (p. 155) É necessária, pois, uma desterritorialização da forma como pensamos e como temos agido na educação; precisamos reterritorializar a visão sobre o saber; precisamos, em verdade, criar uma situação na qual o sujeito seja o centro de todo o processo de aprendizagem, com uma visão libertadora e crítica de si, entendendo suas limitações e especialmente o que ele pode (o que pode o corpo?). Somente essa reterritorialização permitirá que possa ser vislumbrado um novo horizonte, com novos hábitos, com novos ritmos, com um novo constructo, expandindo nossa potência de agir no âmbito social político e econômico. Precisamos conhecer e reconhecer a nós mesmo como sujeitos ativos, críticos, construtores de culturas livres e libertadoras. Existem processos escolares que conservam e perpetuam modelos equivocados, onde há pesos políticos desiguais, com igual desequilíbrio de forças; precisamos, então, de ações políticas libertárias, como as defendidas por Paulo Freire (1987), que favoreçam o empoderamento dos sujeitos, aumentando a sua potência de agir. No processo de ensino e de aprendizagem devemos considerar os sujeitos como seres dotados de emoção e de razão, compreendendo que fatores afetivos interferem diretamente no sucesso do processo. Os afetos são importantes para a formação holística dos sujeitos, podendo tornálos mais fortes e ativos em suas existências. Nossa potência positiva deve ser experimentada com alegria consciente, para isso trouxemos uma citação de Deleuze e Parnet (1998): Daí a força da questão de Espinosa: o que pode um corpo? De que afetos é ele capaz? Os afetos são devires: ora eles nos enfraquecem, quando diminuem nossa potência de agir e decompõem nossas relações (tristeza), ora nos 227 tornam mais fortes, quando aumentam nossa potência e nos fazem entrar em um indivíduo mais vasto ou superior (alegria). (p. 49) Dessa forma, na filosofia do acontecimento de Deleuze, os afetos ativos criam signos igualmente ativos em sua capacidade de potencializar o surgimento e o desenvolvimento das aprendizagens; aumentando a potência de agir, ou vontade de potência, pela criação de conjuntos de sensações positivas e profícuas. A Liberdade na aprendizagem As liberdades substantivas constituem um conceito trabalhado pelo economista indiano Amartya Sen (2010), em sua obra Desenvolvimento como Liberdade, que inspirou e muito a nossa atuação profissional e o nosso trabalho. Os sujeitos precisam de experimentações autênticas, o que ocorre, para o pensador indiano, por meio do acesso às liberdades substantivas enquanto liberdades instrumentais, entendendo que a posse dessas liberdades é algo prioritário e fundamental para qualquer tipo de aprendizagem. É necessário que os sujeitos sejam livres, pois não existe desenvolvimento sem liberdade; e a liberdade se expressa na participação ativa dos sujeitos na sociedade, sendo revelada na manifestação consciente e crítica na vida social em todas suas esferas. Devemos contribuir para o exercício da liberdade, favorecendo a formação de uma consciência crítica, que alargue a capacidade de analisar o mundo complexo. Paulo Freire (1967, 1987), educador brasileiro que se preocupou com a promoção de uma educação livre e libertária, defendeu uma educação para a liberdade e pelo diálogo, pelo ouvir e pela valorização da voz do outro, especialmente dos marginalizados; ele lutou por uma educação democrática, consciente, crítica e política, mas não partidária; contrária a vigente, que para ele consistia em uma educação que domesticava e massificava o povo. A ideia de Freire era a de que um povo livre, consciente e crítico luta pela liberdade e por sua conservação, através do empoderamento, do conhecimento e do reconhecimento de seu lugar no mundo, de seu lugar de fala, de sua potência de agir e existir. Freire, como Deleuze, defende uma horizontalidade no aprender, propondo que fosse criado um método ativo, dialogal, crítico e criticizador, que servisse para modificar os conteúdos programáticos da educação, com o uso de técnicas novas e simples como a da redução da codificação (Freire, 1967). 228 Apesar de haver algum tempo que Freire escreveu suas obras, elas ainda são valiosas e preciosas, pois ainda observamos, como já falamos, uma passividade dos alunos ao invés de uma participação ativa e crítica, autônoma, construtores de sua aprendizagem; aulas discursivas e expositivas em vez de aulas dialógicas; presença de programas conteudistas quando deveriam ser programas com unidades de aprendizagem com relações práticas e relevantes para a transformação do mundo. Percebemos uma relação entre o pensamento de Freire (1987) e Sen (2010); apesar de não pertencerem a um mesmo contexto político e social, e nem apresentarem uma perspectiva comum, é evidente que para os dois a liberdade é essencial. Sen (2010) conceitua o desenvolvimento como um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam, assim a liberdade é central para o processo de desenvolvimento e, para ele, o verdadeiro desenvolvimento é demonstrado por meio de uma melhoria da vida nos seus mais diversos aspectos: O que as pessoas conseguem positivamente realizar é influenciado por oportunidades econômicas, liberdades políticas, poderes sociais e por condições habilitadoras como boa saúde, educação básica e incentivo e aperfeiçoamento de iniciativas. (Sen, 2010, p. 18) O processo de liberdade, para Sen (2010), traz uma responsabilidade social: quem é livre deve lutar pela liberdade do outro, das garras do tirano. A liberdade individual deve estar associada a uma liberdade coletiva, como se existisse uma relação de interdependência entre elas. Devemos contribuir de forma crítica para a libertação dos sujeitos com o empoderamento efetivo e participativo. Propomo-nos, então, a questionar, a refletir e a discutir a aprendizagem como liberdade, encontrando em Deleuze um defensor dessa possibilidade, da necessidade de um aprendizado plural e múltiplo, conforme as subjetividades do aluno: Nunca se sabe de antemão como alguém vai aprender – que amores tornam alguém bom em latim, por meio de que encontros se é filósofo, em que dicionários se aprende a pensar. Os limites das faculdades se encaixam uns nos outros sob a forma partida daquilo que traz e transmite a diferença. Não há método para encontrar tesouros nem para aprender, mas um violento adestramento, uma cultura ou paideia que percorre inteiramente todo o indivíduo. (Deleuze, 2000, p. 237). 229 Não podemos definir a forma como cada criança aprende, pois cada um tem sua própria singularidade, elaborando a sua própria aprendizagem; no entanto, cremos que novos territórios e novas aprendizagens ocorrem nas multiplicidades, nos agenciamentos, nos encontros preciosos, nos devires, nas linhas de fuga e nos caminhos cartográficos. Precisamos de liberdade para aprender e de liberdade para ensinar, a liberdade atua em nossa potência positiva de agir e existir. Não é fácil ser um homem livre: fugir da peste, organizar encontros, aumentar a potência de agir, afetar-se de alegria, multiplicar os afetos que exprimam ou envolvam um máximo de afirmação. Conclusão Acreditamos no trabalho realizado pela e na multiplicidade, confiando que as ações empoderam, de fato, os sujeitos – para que enfrentem a ‘vulnerabilidade escolar’, a opressão e a tirania através de uma aprendizagem efetiva, que aumente a sua potência para agir. Os sujeitos necessitam de acesso às liberdades substantivas e aos exercícios da cidadania plena para que haja desenvolvimento efetivo. Cabe ao professor sempre estar atento às necessidades educacionais dos alunos; e, para que isso aconteça, deve buscar sempre um papel ativo no processo de ensino: criticando sua própria ação; esquadrinhando as causas e as consequências da ‘aprendizagem’ e da liberdade; mostrando ao aluno que ele também deve exercer um papel ativo na construção do conhecimento; sendo agente de sua própria história, ativo, crítico; e, finalmente, sendo um cidadão que deve ser livre para um viver pleno e responsável . Precisamos de uma formação holística, de um ensino com pesquisa, criatividade, inovação e emancipação, de relações horizontais, de troca de experiências, de libertação da sombra do opressor. Deleuze afirma que a aprendizagem acontece pelos encontros com os signos, sendo os encontros, como já salientado, a base do pensamento. Não podemos, de fato, prever a ideia, “mas podemos preparar a ocasião que, eventualmente, poderá vê-la surgir” (Deleuze, 2000, p. 21). Gallo (2012) também concorda com o filósofo francês em relação à emissão randômica de signos como dado crucial para a aprendizagem: Ensinar consiste em emitir signos, sem que tenhamos controle em relação ao que será feito com eles, por aqueles que os encontrarem. Isso não significa que não devamos emitir signos, mas sim que precisamos 230 nos desapegar deles, precisamos abdicar de nossa vontade de controlar o aprendizado de cada um de nossos alunos, apesar de todas as boas intenções que possamos ter com isso. Precisamos ter a coragem de ensinar como quem lança sementes ao vento, com a esperança dos encontros que possam produzir, das diferenças que possam fazer vingar, nos encantando com as múltiplas criações que podem ser produzidas a partir delas, não desejando que todos façam da mesma maneira, sejam da mesma maneira. (p. 9) Spinoza, segundo Iafelice (2015), mostra que os afetos tristes são usados eficazmente como instrumentos de controle e de poder, dissimulando e enganando os homens, para que pensem e lutem por sua escravidão como se fosse sua salvação. Portanto, o nosso poder de resiliência tem que ser acionado, para que os nossos encontros com os signos aumentem os nossos afetos de alegria; afetando, assim, positivamente nossa potência de agir. Carecemos de uma visão holística sobre os sujeitos, sobre o processo de ensino, sobre as experimentações da aprendizagem e sobre as variáveis que incidem nesse processo; acreditamos que assim poderemos diminuir a vulnerabilidade educacional existente no Brasil, promovendo uma educação libertadora: “A educação, que deveria ser uma forma de resistência contra toda tirania do capitalismo, tornou-se o próprio braço desse sistema que incorpora tudo que passa pela sua frente” (Iafelice, 2015 p. 67). Acreditamos ter alcançado nosso objetivo de promover uma reflexão sobre a aprendizagem como liberdade. Trouxemos aqui Amartya Sen, que pensa a liberdade como essencial para uma melhoria de vida; assim como Paulo Freire (1987), que, sendo totalmente contrário a uma “educação bancária”, também revolucionou a pedagogia vigente, defendendo a liberdade para um empoderamento libertador consciente, crítico e político; Deleuze (2002, 2017) e Iafelice (2015), que, inspirados por Spinoza, pensam em uma aprendizagem pelo afeto, pelo encontro, rizomático e alagmático, na interpretação do mundo com um rompimento da tirania pela alegria e consequentemente com o aumento da potência de agir e existir. Não podemos continuar a nos submeter a poderes alienantes, nem a estruturas curriculares rígidas sem sentido, nem a hierarquias opressoras; entendemos que ainda há muito a se pensar, refletir e criticar, mas não devemos temer a liberdade, pois ela é a ponte para a verdadeira revolução da subjetividade e da sociedade. Referências Bauman, Z. (2008). Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 231 BNCC. Base Nacional Comum Curricular (2017). Base Nacional Comum Curricular: a educação é a base. Ensino Fundamental. Ministério da Educação. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site. pdf. Acesso em 17 mar. 2020. INEP (2019). Panorama da Educação: destaques do Education at a Glance 2019. Brasília INEP. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/informacao-da-publicacao//asset_publisher/6JYIsGMAMkW1/document/id/6853568 Acesso em 21 abr. 20. Charlot, B. (2010). Entrevista com Bernard Charlot. Entrevista concedida a jornalista Daniela Arbex, e publicada pela. Educ. foco, Juiz de Fora, v. 14, n. 2, p. 213-220, set 2009/fev 2010. Disponível em: http://www.ufjf.br/revistaedufoco/files/2011/10/11entrevista.pdf Acesso em 30 mar. 2020. Deleuze, G. (2000). Diferença e Repetição. Lisboa: Relógio D’Água. Deleuze, G. (2017). Espinosa e o problema da expressão. São Paulo: 34. Deleuze, G. (2002). Espinosa filosofia prática. São Paulo: Escuta. Deleuze, G. (2004). A ilha deserta e outros textos. São Paulo: Iluminuras. Deleuze, G. & Parnet, C. (1998). Diálogos. São Paulo: Escuta. Freire, P. (1967). Educação como prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra. Freire, p. (1987). Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra. Gallo, S. (2012). As múltiplas dimensões do aprender. In: Anais do Congresso de Educação Básica: aprendizagem e currículo. Florianópolis. Disponível em: http://www.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/13_02_2012_10.54.50.a0ac3b8a14067 6ef8ae0dbf32e662762.pdf Acesso em 20 abr. 2020. Guattari, F. (2006). Caosmose: Um novo paradigma estético. São Paulo: 34. Iafelice, H. (2015). Deleuze devorador de Spinoza: Teoria dos afectos e educação. São Paulo: Fapesp. IBGE (2019). PNAD contínua 2018 educação avança no país, mas desigualdades raciais e por regiões persistem. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-denoticias/releases/24857-pnad-continua-2018-educacao-avanca-no-pais-masdesigualdades-raciais-e-por-regiao-persistem Acesso em 18 abr. 2020. 232 La Taille, Y. de (2009). Formação ética: do tédio ao respeito de si. Porto Alegre: Artmed. Machado, N. J. (2010). Ações de menos, avaliação demais. Disponível em: https://www.nilsonjosemachado.net/publicacoes/artigos-e-entrevistas/ Acesso em 23 fev. 2020. Peel, M. A. F. (2018). Vulnerabilidade escolar e aprendizagem da matemática: Agenciamentos e liberdades substanciais. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Demandas Populares e Dinâmicas Regionais. Universidade Federal do Tocantins, Araguaína, Brasil. Sen, A. (2010). Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras. Spinoza, B. de. (2017). Ética. Belo Horizonte: Autêntica. 233 PARTE II SENTIDOS PEDAGÓGICOS E PRÁCTICAS EDUCATIVAS 234 12.ENSINO SUPERIOR EM PAUTA: UM LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UFRN Erika dos Reis Gusmão Andrade41, Anna Katyanne Arruda Silva e Souza, Telma Elita da Silva & Sheyla Gomes Pereira de Almeida Resumo Este trabalho trata de levantamento bibliográfico das teses e dissertações publicadas pelo Programa de Pós-Graduação em Educação no Repositório Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no período de 1998 a 2019. Objetiva analisar os trabalhos publicados sobre a temática da Educação Superior, fornecendo assim, um panorama do que vem sendo pesquisado sobre este tema, contribuições e lacunas. A busca sistemática das publicações resultou em 851 trabalhos, sendo triados 105. A análise foi pautada na avaliação dos objetivos, aporte teórico-metodológico, estratégias de análise dos dados, dados primários e secundários e resultados. A maioria dos estudos aborda formação docente para o Ensino Superior, questões relacionadas à inclusão e à acessibilidade, demandas específicas dos cursos de graduação, de acordo com a área, relacionadas aos docentes, discentes e/ou ao processo de ensino-aprendizagem, currículo, evasão/permanência, há também aqueles que versam sobre expansão e reestruturação do ensino e seus desafios, inserção no mercado de trabalho pelos egressos, avaliação e internacionalização da Educação Superior, educação à distância, e adaptação/transformação/socialização dos estudantes no nível superior. As publicações apresentam predominantemente como metodologia para recolha de dados revisão de literatura 41 Erika dos Reis Gusmão Andrade: Professora Titular do Departamento de Fundamentos e Políticas Educacionais do Centro de Educação e Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – PPGEd/UFRN. – E-mail: ergandrade@gmail.com Anna Katyanne Arruda Silva e Souza: Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – PPGEd/UFRN. Doutoranda pelo PPGEd/UFRN. Técnica em Assuntos Educacionais da Escola de Saúde da UFRN – E-mail: annakaty@gmail.com Telma Elita da Silva: Mestra em Gestão de Processos Institucionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Doutoranda pelo PPGEd/UFRN. Técnica em Assuntos Educacionais atuando no Núcleo de Apoio ao Discente – NADIS/CCSA/UFRN – E-mail: ntelita_12@hotmail.com Sheyla Gomes Pereira de Almeida: Mestre em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFRN. Professora da Escola de Saúde da UFRN – E-mail: gomesvale93@gmail.com 235 e entrevista, prevalecendo análise de conteúdo para análise dos dados. A produção sobre Ensino Superior é ampla e diversificada neste programa, versando sobre questões gerais e específicas, sendo necessário avançar na pluralidade teórico-metodológica, a fim de fomentar a pesquisa e a prática crítico-reflexiva sobre o fazer, o como e o por quê fazer, de acordo com as especificidades de cada área do conhecimento neste nível de ensino. Palavras-chave: Ensino Superior. Formação. Pós-Graduação. Educação. Introdução O Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGEd/UFRN) tem como área de concentração a Educação e está estruturado em curso de pós-graduação lato sensu (Especialização) e cursos de pós-graduação stricto sensu (Mestrado e Doutorado). Com 40 anos de funcionamento, tem como finalidade formar profissionais de alto nível acadêmico e científico para atuarem na educação básica e superior, e fomentar estudos, pesquisas e a produção do conhecimento na área da educação, visando contribuir para o desenvolvimento cultural, educacional e socioeconômico local, regional, nacional e internacional (UFRN, 2020). Ao longo dos seus 41 anos, o Programa formou 1.382 (mil trezentos e oitenta e dois) pesquisadores em educação, sendo 808 (oitocentos e oito) mestres e 574 (quinhentos e setenta e quatro) doutores, titulados em uma única área de concentração (Educação), constituindo-se, assim, no maior Programa de Pós-Graduação da UFRN, cujo eixo formativo privilegiado exige dos mestrandos, doutorandos e dos professores pesquisadores dedicação, disponibilidade e envolvimento integral nas atividades acadêmicas (UFRN, 2020). A proposta curricular do PPGEd está pautada na organização e funcionamento das Linhas de Pesquisa, cujas atividades acadêmicas são desenvolvidas em função dos projetos de pesquisa dos docentes do Programa e dos objetos de estudo de mestrandos e doutorandos. O PPGEd possui 07 linhas de pesquisa, sendo elas: Educação e inclusão em contextos educacionais; Educação, construção das ciências e práticas educativas; Educação, comunicação, linguagens e movimento; Educação, representações e formação docente; Educação, estudos sociohistóricos e filosóficos; Educação, política e práxis educativas; e Educação, currículo e práticas pedagógicas nas quais se organizam as atividades acadêmicas, em função dos projetos dos docentes que definem a relação de pertinência com os projetos dos discentes (UFRN, 2020). 236 O Programa é reconhecido nacionalmente pela qualidade do trabalho realizado, alcançando conceito 5 nas três últimas avaliações da CAPES/MEC. Possui 57 docentes vinculados e, atualmente, o corpo discente conta com 137 doutorandos e 114 mestrandos, em sua maioria professores da rede pública de ensino e egressos do curso de pedagogia da UFRN. Diante do exposto, este trabalho surgiu no contexto das pesquisas realizadas pelos discentes e docentes da linha de pesquisa Educação, Currículo e Práticas Pedagógicas do PPGEd/UFRN, especificamente da realização de uma busca sistemática no Repositório Institucional da UFRN, no intuito de traçar um panorama dos trabalhos publicados sobre a temática da Educação Superior nas teses e dissertações do referido programa, no período de 1998 a 2019, fornecendo assim, uma visão crítica e reflexiva do que vem sendo pesquisado sobre este tema, suas contribuições e lacunas. Trata-se de uma pesquisa exploratória e documental realizada a partir de 105 teses e dissertações publicadas pelo PPGEd/UFRN que abordam, no âmbito da pedagogia universitária, questões relacionadas à formação docente para o Ensino Superior, à inclusão e à acessibilidade dos discentes, demandas específicas dos cursos de graduação, de acordo com a área, relacionadas aos docentes, discentes e/ou ao processo de ensino-aprendizagem, problemáticas relativas ao currículo, à evasão e permanência dos estudantes diante das dificuldades inerentes ao ensino superior, bem como questões relacionadas à expansão e reestruturação do ensino e seus desafios, inserção no mercado de trabalho pelos egressos, avaliação e internacionalização da Educação Superior, educação à distância, e adaptação/transformação/socialização dos estudantes no nível superior. A escolha por este caminho decorre da possibilidade de uma visão geral do conhecimento produzido acerca do ensino superior através da pluralidade teóricometodológica dos estudos publicados pelo referido Programa de Pós-Graduação em Educação ao longo de 21 anos, bem como por contemplar a necessidade de ampliação de estudos nesta área. Portanto, a pesquisa aqui apresentada objetiva analisar os trabalhos publicados sobre a temática da Educação Superior pelo PPGEd/UFRN. Após o tratamento inicial dos dados, os textos foram submetidos à técnica de análise de conteúdo, buscando o levantamento das características das produções e a discussão das temáticas abordadas. Para análise dos dados recorreu-se aos resumos e textos completos dos trabalhos selecionados. Os estudos foram lidos atentamente para que se encontrassem convergências, divergências, contribuições e lacunas de acordo com o arcabouço teórico-metodológico das teses e dissertações do PPGEd. A busca sistemática das publicações no repositório do 237 PPGEd/UFRN resultou em 851 trabalhos, dos quais 105 foram triados por critérios préestabelecidos de inclusão e exclusão. A análise dos trabalhos foi pautada na avaliação dos objetivos, aporte teórico-metodológico, estratégias de análise dos dados, dados primários e secundários/ sujeitos da pesquisa e em alguns resultados descritos nas teses e publicações, os quais foram organizados em uma planilha contendo estas variáveis. A análise dos registros sintetizados na planilha permitiu identificar os estudos centrados nas temáticas:  A expansão e a reestruturação dos cursos e das instituições;  Políticas e ações para a inclusão dos estudantes público-alvo da educação especial;  As lacunas e dificuldades dos estudantes ingressantes no ensino superior;  Características e dificuldades da formação específica dos estudantes nos diferentes cursos de graduação;  A constituição da identidade e do ser docente universitário;  Acesso, permanência e evasão dos estudantes no ensino superior;  Egressos do ensino superior;  O currículo no ensino superior;  A socialização acadêmica e a construção da identidade do discente no ensino superior;  O ensino superior e a educação à distância;  O ensino superior e a internacionalização;  A formação docente no e para o ensino superior. Os temas estudados pelos pesquisadores do PPGED/UFRN demonstram a existência de um movimento no ensino superior brasileiro que rompe com a ideia primeira, de um ensino elitista. A qual se propagou por muito tempo em decorrência de sua origem demandada por atender a formação de profissionais liberais, para ocupar postos de trabalho em um mercado de trabalho restrito a uma nobreza, fruto da chegada da família real portuguesa ao país (MARTINS, 2002). Apesar dos estudos sinalizarem para essa ruptura, o movimento em prol do ensino superior sempre foi permeado por tensões e disputas entre grupos que defendem a preservação desse status primeiro e os que lutam pela sua democratização (ALMEIDA, 2012; CHAUÍ, 2001). 238 E dentre essas tensões pode se inferir que o ensino superior brasileiro, assim como, a própria constituição de sua sociedade é permeada por contrastes. Ao mesmo tempo em que se aponta para um problema de aprendizagem na educação básica, que repercute em ingressantes com dificuldades de acompanhar o ensino superior, se vislumbra por uma internacionalização que coloca o país em condições de disputa global pelo conhecimento. Todas essas questões perpassam pela formação e sua relação com o currículo e estão implicadas em políticas locais e internacionais. Como bem disse as professoras Selma Pimenta e Léa Anastasiou: A Educação é um processo de humanização. Ou seja, é processo pelo qual se possibilita que os seus humanos se insiram na sociedade humana, historicamente construída e em construção. Sociedade que é rica em avanços civilizatórios e, em decorrência, apresenta imensos problemas de desigualdade social, econômica e cultural PIMENTA e ANASTASIOU, 2014, p. 97). Como produto social, a educação se constrói em contextos díspares. O que reflete o pensar social amplo, traduzido nas produções acadêmicas do Programa de Pós-graduação em Educação, aqui discutidas. Apresentação e Discussão dos resultados A produção sobre Ensino Superior no PPGEd, no período de 1998 a 2019, é vasta e diversificada. Dentre as 105 publicações triadas durante esta revisão bibliográfica, 53 são teses e 52 são dissertações, cujos títulos e objetivos encontram-se descritos a seguir na Tabela 1. Os objetivos das publicações são variados, abrangem tanto questões gerais relacionadas à Pedagogia Universitária e aos agentes nela implicados, quanto questões específicas de diferentes áreas do conhecimento desse nível de ensino. As publicações possuem predominantemente uma abordagem qualitativa e como metodologia para recolha de dados a revisão de literatura e a entrevista, prevalecendo a análise de conteúdo como principal estratégia para análise dos dados, independentemente dos objetos de estudo sobre os quais se debruçam: o processo de expansão dos Institutos Federais de Educação e das Universidades, centrados em um contexto político vivenciado pelo Ensino 239 Superior nos anos de 2003 a 2016, durante o governo dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Vana Rousseff; a relação entre as políticas educacionais das instituições e do país, assim como, dos programas e projetos do Ministério da Educação com a formação continuada dos docentes e suas necessidades formativas diante do contexto do Ensino Superior; o acesso, a evasão, a permanência e o êxito dos educandos e a inclusão dos estudantes público-alvo da Educação Especial; as dificuldades e lacunas pedagógicas dos estudantes; a constituição da identidade e do ser docente universitário; o perfil educacional e socioeconômico dos estudantes ingressantes e também dos egressos desse nível de ensino; o currículo nas diferentes áreas; a socialização acadêmica e a construção da identidade do discente no Ensino Superior; a Educação à Distância e o Ensino Superior; a Internacionalização no Ensino Superior; a Universidade e sua inserção na sociedade; a formação docente no e para o ensino superior; o estresse no exercício docente universitário; as características e dificuldades da formação específica dos estudantes nos diferentes cursos de graduação. Tabela 1: Dissertações e teses publicadas pelo PPGEd/UFRN, no período de 1998 a 2019, triadas para realização do estudo. Título Um estudo da expansão da educação superior no IFPB: desafios institucionais e alcance social (Tese) Inclusão do estudante com deficiência no Ensino Superior e a formação continuada do docente universitário (Tese) Estudo do desempenho de candidatos à UFRN na prova de redação do Enem no período de 2013 a 2016 (Dissertação) A orientação da ação para leitura crítica a partir de uma experiência formativa: uma contribuição para o ensino de química (Tese) De Bacharel a Professor: o ser docente no ensino universitário (Dissertação) Estudantes cotistas com deficiência na universidade: perfil educacional e socioeconômico (Dissertação) Egressos universitários com deficiência e inserção no mercado de trabalho competitivo (Dissertação) Formação colaborativa de docentes em educação profissional e tecnológica inclusiva para o ensino de alunos com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) (Dissertação) Currículo e cultura: análise dos referenciais de Educação Física dos estados do Nordeste do Objetivo Analisar o processo de expansão da Educação Superior no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB), situando-o no contexto da política educacional brasileira para esse nível de ensino, no período de 2008 a 2015, investigando os desafios enfrentados pela instituição para viabilizar esse processo de expansão e a sua contribuição social. Analisar a relação entre as políticas educacionais institucionais da UFRN e a formação continuada de docentes universitários, no tocante à dimensão pedagógica e a interface com a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior. Caracterizar as dificuldades encontradas pelos estudantes ao produzirem um texto argumentativo a partir da pontuação obtida na redação do Enem, dos resultados encontrados por pesquisadores, relativos aos aspectos avaliados na matriz de competências utilizada para corrigi-la, e de teóricos que discutem problemas relativos à produção textual na escola. Investigar a influência de uma experiência formativa na orientação da ação para se ler criticamente no contexto do Ensino de Química. Analisar como foi constituído o ser docente dos professores bacharéis do ensino superior. Foi produzido a partir de um grupo de investigação formado por docentes bacharéis do quadro efetivo da UFRN, com jornadas de trabalho de 20h semanais e que exercem sua profissão de formação, concomitantemente, fora da universidade. Conhecer o perfil educacional e socioeconômico dos estudantes cotistas com deficiência ingressantes na UFRN através do processo seletivo Sisu 2018. Delinear o perfil dos egressos universitários com deficiência, diplomados no período 2011-2017. Avaliar as contribuições de um programa de consultoria colaborativa para capacitação de docentes do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) sobre o processo de ensino para educandos com TEA. Compreender o conhecimento de cultura e currículo nos referenciais de educação física, e os processos de regulação do corpo. 240 Brasil (Tese) Evasão no ensino superior: a socialização acadêmica interrompida no mundo universitário da UFRN (Dissertação) Reconfigurações do campo universitário no Brasil e suas repercussões em uma instituição periférica (Tese) Jovens estudantes em processo de transformação na travessia pelo ensino superior (Tese) A Universidade flexível: reestruturação e expansão no Bacharelado em Tecnologia da Informação na UFRN (Tese) Política de permanência e fomento à formação docente: o Pibid nos cursos de licenciaturas na UFRN (Dissertação) Avaliação e regulação da educação superior: intenções e tensões na proposta de criação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (INSAES) (Tese) Estratégias de sobrevivência no ensino superior na educação a distância: os estudantes de pedagogia (UFRN) (Dissertação) Grande mídia e a construção de uma legitimidade discursiva sobre a universidade brasileira durante a greve de 2015 (Tese) O curso de Pedagogia a distância da UFRN (2012-2016) na perspectiva dos egressos, professores e tutores (Dissertação) Representações sociais de professores da educação profissional em saúde sobre o ser professor (Dissertação) Expansão da formação docente inicial: os cursos de licenciatura presenciais no Brasil (2003-2014) (Dissertação) O ensino de literatura no curso de pedagogia: um lugar necessário entre o institucional, o acadêmico e o formativo (Tese) Aproximações e distanciamentos entre necessidades formativas de futuros professores de ciências bolsistas e não bolsistas do PIBID (Dissertação) Reinventar a universidade: um ensaio sobre o Grupo de Estudos da Complexidade (GRECOM/UFRN) (Tese) Quando desistir não é uma opção: socialização e estratégias de permanência de estudantes populares da UFRN (Dissertação) Representações sociais de psicólogo: imagens em movimento na formação profissional (Tese) Discentes com dislexia na Universidade: um estudo de caso (Dissertação) Estudantes surdos no ensino superior: reflexões sobre a inclusão no curso de letras libras/ língua portuguesa da UFRN (Dissertação) Analisar o processo de socialização acadêmica nos cursos das Ciências Exatas e sua relação no percurso acadêmico dos estudantes. Analisar as principais reconfigurações ocorridas no campo universitário nas últimas décadas e apreender as repercussões destas reconfigurações na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM/UECE) – instituição estadual de ensino superior, pertencente à Universidade Estadual do Ceará. Analisar a relação entre ser jovem (condição juvenil) e ser graduando (condição estudantil) a partir das vivências de jovens estudantes do IFRN-Campus Ipanguaçu. Analisar os processos de reestruturação e expansão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), intensificados pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), e sua materialização no Bacharelado em Tecnologia da Informação (BTI), especificamente, na ampliação da oferta e na flexibilidade acadêmico-curricular desse curso de graduação interdisciplinar no Instituto Metrópole Digital (IMD). Analisar como configura-se a política de permanência e de formação de professores adotadas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, tendo como referência o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - Pibid nos cursos de licenciatura da UFRN. Analisar a construção da proposta de criação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (INSAES), investigando as intenções e as tensões nos debates ocorridos na Câmara dos Deputados acerca da avaliação, regulação, supervisão e acreditação da educação superior no Brasil. Colaborar na área da Educação a Distância, especificamente com a investigação das estratégias de sobrevivência social que os estudantes do curso de pedagogia à distância, no polo Natal, na UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte desenvolveram durante o período de sua formação. Analisar a produção discursiva da grande mídia sobre a universidade pública brasileira, a partir das notícias veiculadas durante a greve de docentes e servidores dessas instituições, no ano de 2015, com a finalidade de desvelar as estratégias de veiculação de pontos de vista sobre a universidade e o movimento paredista. Analisar as perspectivas avaliativas dos formadores e egressos do curso de Pedagogia a distância da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, período de 2012 a 2016. Analisar as representações sociais de professores da Educação Profissional em Saúde sobre o ser professor tendo por base a perspectiva moscoviciana. Analisar o processo de expansão da formação docente inicial em cursos de licenciatura presenciais no Brasil, no período de 2003 a 2014, considerando a organização acadêmica e categorias administrativas. Investiga o ensino de literatura nos cursos de licenciatura em Pedagogia das universidades federais do Brasil. Analisar quais as aproximações e distanciamentos entre as necessidades formativas de futuros professores de Ciências que foram bolsistas e não bolsistas do PIBID. Expor fragmentos da história de uma experiência de reforma do pensamento construída, ao longo de 25 anos, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Compreender a condição de permanência do estudante de origem popular na Universidade a partir do seu processo de socialização. Analisar as representações sociais sobre o psicólogo para os estudantes de Psicologia da Universidade Federal de Alagoas/Unidade Educacional de Palmeira dos Índios. Analisar as características educacionais de discentes da UFRN com dislexia, por meio da caracterização do perfil educacional, da investigação do cotidiano e da avaliação do desempenho em leitura e escrita dos cinco participantes. Além disso, intentou revisar a literatura a respeito da temática em questão. Conhecer e analisar a opinião de alunos Surdos sobre o curso de Licenciatura em Letras-Libras/Língua Portuguesa como Segunda Língua (LLLP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em relação à formação acadêmica. 241 A internacionalização do ensino superior e a formação inicial de professores: um estudo do Programa Licenciaturas Internacionais na UFRN (2010 - 2013) (Dissertação) A base orientadora da ação em modelagem científica de licenciandos em química: um conhecimento disciplinar profissional para o ensino (Dissertação) Imagens em claro/escuro: o cenário do estágio não obrigatório na formação inicial de graduandas dos Cursos de Pedagogia (Dissertação) Práticas e formação docente na UFRN com vistas à inclusão de estudantes cegos (Dissertação) A expansão da educação superior a distância no Tocantins no âmbito da parceria entre a EADCON e a UNITINS (Tese) Perfil dos servidores com deficiência da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Dissertação) Os sentidos formativos dos estudantes de licenciatura: socialização, aprendizagens e identidade docente (Tese) Repensando a socialização na educação infantil: o entendimento e as práticas na formação docente do curso de pedagogia (Dissertação) Representação social sobre o ensino de matemática de licenciandos vinculados ao PIBID: dinâmica de formação (Tese) As representações sociais de licenciandos sobre a educação à distância: o caso da UFRN (Dissertação) Representações sociais de licenciandos do curso de Pedagogia da UFRN acerca da prática educativa (Dissertação) Necessidades formativas e aprendizagens docentes em uma licenciatura em ciências biológicas a distância da UFRN (Dissertação) A expansão do ensino superior à distância no IFPB: um estudo da implantação do Curso de Administração Pública no âmbito do Programa Nacional de Administração Pública – PNAP (Tese) Formação de professores alfabetizadores em cursos de pedagogia: sentidos de professores formadores (Tese) Internacionalização da educação superior: um estudo da mobilidade estudantil em cursos de graduação da UFRN no âmbito do programa Ciência sem Fronteiras (2012-2014) (Dissertação) Desenvolvimento profissional de futuros professores: travessias que se entrecruzam em contextos formativos (Tese) Licenciaturas interdisciplinares em ciências naturais na UFMA: análise crítica de um modelo de formação docente no contexto de reestruturação da universidade brasileira (Tese) Mediação como estratégia no atendimento educacional especializado a aluno com deficiência intelectual: contribuições da Analisar o Programa Licenciaturas Internacionais (PLI) e a sua implementação na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), evidenciando suas repercussões para a formação inicial de professores. Identificar e caracterizar o conhecimento profissional disciplinar que integra a Base Orientadora da Ação de modelagem científica em Ciências de 58 licenciandos em Química da UFRN, no sentido de determinar se os anos de formação fazem diferença na apropriação desse conhecimento disciplinar. Investigar de que maneira o estágio não obrigatório contribui no percurso formativo inicial docente de graduandas dos cursos de Pedagogia, que atuam na etapa da Educação Infantil. Investigar se a formação continuada e a ação docente, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, tem possibilitado a inclusão de alunos cegos nos cursos de graduação dos quais fazem parte. Analisar a expansão da educação superior na modalidade de Educação a Distância (EaD) no estado do Tocantins por meio da parceria entre a Educação Continuada Ltda (EDUCON) e a Fundação Universidade do Tocantins (UNITINS) no período compreendido entre 2000 e 2009. Traçar o perfil dos servidores com deficiência da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com vistas a contribuir para a elaboração de uma política institucional de inclusão. Analisa os sentidos formativos atribuídos por estudantes concluintes dos cursos de licenciatura (Letras, Biologia, Matemática e Pedagogia) ligados à construção de sua identidade profissional docente, no decorrer do processo de socialização e aprendizagem no meio universitário. Contribuir na formação dos professores que poderão trabalhar com crianças, analisando as concepções e as práticas educativas relacionas às formas de socialização escolar da infância Identificar as representações sociais dos licenciandos, bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID, sobre o ensino de Matemática e enfatizar os benefícios do contato com os alunos da rede pública para sua formação. Analisar as representações sociais de licenciandos de cursos a distância, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sobre a educação à distância. Analisar as representações sociais de licenciandos do Curso de Pedagogia da UFRN acerca da prática educativa. Analisar aprendizagens docentes e necessidades formativas que emergem da Licenciatura em Ciências Biológicas a distância na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Analisar a política de expansão do ensino superior na modalidade a distância no IFPB, tendo como referência a implementação do Bacharelado de Administração Pública/PNAP e suas repercussões na cultura organizacional e no trabalho docente do IFPB Campus João Pessoa. Analisar a formação de professores alfabetizadores em Cursos de Pedagogia, a partir de sentidos atribuídos a esse processo por professores-formadores que atuam com disciplinas específicas de alfabetização nesses cursos. Analisar a implementação do Programa Ciência sem Fronteiras na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, procurando evidenciar, na visão de gestores e coordenadores de cursos, as contribuições do processo de mobilidade acadêmica proporcionadas pelo Programa Ciência sem Fronteiras em cursos de graduação da mesma instituição. Compreender como o contexto formativo contribui para o desenvolvimento profissional de futuros professores em iniciação à prática docente.. Investigar e analisar criticamente os pressupostos e fundamentos que apoiaram a implementação do curso de Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Naturais, em sua versão original, no âmbito da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Situar a mediação como uma estratégia necessária no Atendimento Educacional Especializado - AEE a um aluno, com deficiência intelectual, matriculado em uma escola de aplicação - o Colégio Universitário da Universidade Federal do Maranhão - 242 abordagem histórico cultural (Tese) COLUN/UFMA. Representação social de estagiários (as) do curso de pedagogia acerca da docência (Dissertação) Identificar a representação social de estagiários (as) que cursam disciplinas de Estágio Supervisionado no curso de Pedagogia da UERN, acerca da docência. Propomos ainda, perceber como o curso e, em específico, as disciplinas de Estágio Supervisionado contribuem para construção dessa representação. Compreender os sentidos atribuídos pelos 'docentes formadores ao processo de gestão docurrículo, tendo como foco a sua ação no ESO do curso de Pedagogia da UFMA. Trajetórias construídas em caminhos (não) planejados: os sentidos formativos da escrita no estágio supervisionado obrigatório do curso de Pedagogia da UFMA (Tese) Processo identitário e saberes docentes: um estudo a partir da prática de ensino no estágio do curso de pedagogia da UFRN (Dissertação) Núcleos de acessibilidade e o atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais nas universidades federais do nordeste brasileiro (Dissertação) As dimensões pedagógica, didática, tecnológica e científica na formação e no desenvolvimento profissional dos professores no Brasil e em Portugal (Tese) Um estudo sobre a compreensão das definições matemáticas no curso de licenciatura em matemática (Tese) Livros das Ciências da Educação, bibliotecas e a engenhosidade da bibliotecária Zila da Costa Mamede (Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 1959-1980) (Dissertação) Representações sociais da identidade docente na formação inicial de professores de sociologia da UFRN (Dissertação) Programa de apoio a planos de reestruturação e expansão das Universidades Públicas Federais (REUNI): repercussões na UFRN (Dissertação) A representação social de disciplinas didáticopedagógicas no contexto da formação inicial docente: um entremear de saberes (Tese) O estágio supervisionado como contexto de formação docente específica para educação infantil: o que dizem os formandos sobre suas aprendizagens? (Tese) Cantos, encantos e desencantos na educação a distância: uma análise da concepção e da implementação do curso de administração pública da UFRN (Tese) A formação do enfermeiro na reflexividade (Tese) Ingressar na ufrn: trajetórias escolares e universitárias de estudantes egressos da educação básica da rede pública (Tese) Mecanismos sócio-genéticos da representação social de trabalho docente por grupos de licenciandos de física e de química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Tese) Dimensões didática, afetiva e formativa de docência que tecem as representações sociais entre licenciandos da UFPI (Tese) A Tessitura de sentidos: representação social de licenciados do curso de letras da UFRN sobre o Compreender o processo identitário dos licenciandos de Pedagogia da UFRN e identificar os saberes construídos na prática de ensino desenvolvida durante o estágio supervisionado do referido curso. Analisar o trabalho desenvolvido pelos núcleos de acessibilidade implementados nas universidades federais do nordeste brasileiro para atendimento aos estudantes com NEE. Estudar, em uma perspectiva comparativa, os cursos de formação inicial de professores do Brasil e de Portugal, tendo em vista o desenvolvimento profissional e a importância das dimensões pedagógica, didática, tecnológica e científica. Tem como objetivo geral o desenvolvimento de atividades construtivistas, informadas pela História da Matemática (Fossa), para promover a compreensão relacional (Skemp) das definições matemáticas. Refletir acerca das inter-relações entre o livro universitário das Ciências da Educação e as políticas institucionais, estabelecidas pelo Ministério da Educação e Cultura e aquela instituição universitária. Compreender como os saberes apreendidos durante a formação inicial de professores influenciam o processo de construção identitária, investigou-se as representações sociais que estes sujeitos constroem acerca da identidade docente, buscando depreender como esses representam as professoras e professores de Sociologia. Analisar a implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) e o seu papel na reconfiguração da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ressaltando suas repercussões na gestão e organização da universidade. Analisar a representação social que os licenciandos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte IFRN têm de disciplinas didáticopedagógicas. Analisar que saberes específicos à atuação docente na Educação Infantil são construídos, segundo graduandos-estagiários, no Estágio Supervisionado do curso de Pedagogia. Analisar a concepção e a implementação do curso de administração pública a distância da UFRN no contexto da expansão do ensino superior, no período de 2010 a 2013, tomando como referência a concepção teórico-metodológica, a estrutura e a gestão do curso. Propõe a compreensão da formação do enfermeiro na reflexividade e a superação dos limites do modelo de formação biomédica, a partir do pensamento de John Dewey, inserido no panorama do profissional reflexivo apresentado por Donald Schön dialogando com a perspectiva da ação transformadora de Paulo Freire. Analisar os processos de transição entre a Educação Básica e o Ensino Superior do ponto de vista de estudantes que conquistaram uma vaga na universidade pública. Compreender as Representações Sociais de Trabalho Docente por grupos de licenciandos de Física e Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Analisar a representação social de docência para os estudantes dos primeiros anos dos cursos de Licenciatura em Pedagogia, Letras e Biologia. Conhecer e analisar as representações sociais de licenciandos do Curso de Letras da UFRN sobre o ensinar. 243 ensinar (Dissertação) Inclusão de estudantes com deficiência nas instituíções de ensino superior da cidade do Natal/RN: análise das condições oferecidas no processo seletivo vestibular (Dissertação) Um estudo sobre o estágio supervisionado na formação inicial de professores de matemática na Bahia (Tese) Tendências de sucesso no percurso acadêmico do alunado na UFRN (Dissertação) O memorial autobiográfico: uma tradição acadêmica do ensino superior no Brasil (Tese) Trajetórias de estudantes da rede pública que ingressam, permanecem e obtém êxito numa universidade pública (Dissertação) Processo identitário profissional: as experiências formativas de licenciandos do curso de Física – UFPI (Tese) Praxiologia e representação social sobre formação de professores nas licenciaturas da UFPI (Tese) Um estudante cego no curso de licenciatura em música da UFRN: questões de acessibilidade curricular e física (Dissertação) As múltiplas faces da evasão na educação superior a distância: a experiência do curso de tecnologia em gestão ambiental do IFRN em dois pólos de apoio presencial (Tese) Ser bacharel e professor: sentidos e relações entre o bacharelado e a docência universitária (Tese) O desenvolvimento da docência nas engenharias: um estudo na universidade federal de campina grande (UFCG) (Dissertação) O professor e sua formação linguística: uma interlocução teoria-prática (Tese) A representação social de educação tecnológica de docentes da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica: CEFETs do Rio Grande do Norte (Tese) Alfabetizar letrando: investigação-ação fundada nas necessidades de formação docente (Tese) A formação do pedagogo-professor no curso de pedagogia: limites e possibilidades na visão de professores formados no campus avançado de Patu da UERN (dissertação) As contribuições do proformação/pedagogia/UERN para a melhoria da prática pedagógica de professores (dissertação) Acesso e permanência na universidade federal do rio grande do Norte sob o ponto de vista do Investigar em que medida as IES da cidade do Natal-RN estão seguindo as recomendações contidas na legislação brasileira, especificamente a do Aviso Circular Nº 277/96-MEC/GM, no que tange às condições oferecidas aos estudantes com deficiência para o processo seletivo vestibular. Investigar necessidades de formação docente de professores principiantes da Educação Infantil/Pré-escola. Identificar e caracterizar os fatores que revelam tendências de sucesso no desempenho acadêmico dos estudantes da UFRN. Descrever o percurso histórico do memorial como uma tradição acadêmica do ensino superior no Brasil. Investigar a trajetória de estudantes da rede pública que ingressaram em uma universidade pública. Compreender o processo de identificação dos discentes com a profissão docente, com base nos sentidos dados às suas experiências formativas. Analisar o conteúdo e a organização da representação social sobre o objeto formação de professores, construída pelos professores de licenciatura da Universidade Federal do Piauí (Ufpi), entendendo tal representação articulada aos habitus docentes desses formadores de professores, o que remete a considerações sobre a posição que ocupam na estrutura do campo acadêmico nacional e do subcampo da formação de professores. Discutir e analisar o processo de inclusão escolar de uma pessoa cega no curso de Licenciatura em Música, na Escola de Música na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, bem como, refletir sobre a importância da constituição de sistemas de apoio para assegurar o processo inclusivo universitário de pessoas com deficiência visual. Identificar os fatores que influenciaram na evasão dos alunos do curso superior de Tecnologia em Gestão Ambiental oferecido através da EaD pelo IFRN. Compreender os sentidos atribuídos pelos professores bacharéis a docência e a sua ação na universidade, buscando indicativos sobre as relações estabelecidas por eles, entre a sua formação profissional e o ser professor. Conhecer a percepção da prática de ensino dos docentes-engenheiros dos cursos de Engenharia Civil, Elétrica e de Materiais da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) Analisar as interrelações entre os saberes dos professores, referentes à linguagem (verbal), mobilizados no processo ensino aprendizagem da produção de textos escritos pelos educandos, inscritos nos anos iniciais do ensino fundamental. Pesquisar a representação social de educação tecnológica dos docentes da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (RFEPT). Investigar necessidades de formação de professores do Ensino Fundamental da escola pública acerca de conhecimentos subjacentes ao desenvolvimento de uma prática pedagógica de alfabetização na perspectiva do letramento e (re)construir, com os professores participantes da pesquisa, conhecimentos relativos ao processo de alfabetizar letrando , a partir de suas necessidades de formação. Identificar as maiores necessidades formativas de professores licenciados em Pedagogia, que atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental; Elencar as contribuições e limitações do Curso de Pedagogia do CAJIM/UERN na formação de professores, apontadas pelos egressos do curso; levantar sugestões para o aprimoramento da formação de professores no Curso de Pedagogia do CAJIM/UERN. Investigar como os professores, então alunos do Proformação/Pedagogia avaliam os saberes privilegiados por esta formação universitária em serviço bem como a relação entre esses e as práticas pedagógicas vividas em sala de aula enquanto professores, visando definir de que forma os saberes construídos e reconstruídos durante o curso contribuem para a melhoria de práticas pedagógicas dos mesmos. Analisar, pelo fio condutor de ações e práticas pedagógicas, sob os pontos de vista de estudantes com deficiência e docentes, as condições de acesso e permanência, 244 docente e do estudante com deficiência NatalRN (Dissertação) O fazer docente: representações sociais de alunos de curso de pedagogia da UFRN (Dissertação) SINAES: as diferentes faces da avaliação na UFRN (Dissertação) As ciências da educação e a prática: sentidos atribuídos por estudantes do curso de Pedagogia (Tese) Avaliação da aprendizagem no curso a distância de licenciatura em ciências biológicas da Universidade Estadual de Pernambuco (Dissertação) O processo de invenção de si: um estudo sobre a construção identitária de pedagogas em formação (tese) Como vão se formando os professores em física e química: embates entre o ser, o ter e o fazer na formação de licenciandos da UFRN sob a perspectiva da teoria das representações sociais (Dissertação) A relação teoria-prática do curso de formação de professores do campo na UFPA (tese) Concepções de alunos do Curso de Pedagogia da UFRN acerca da natureza da ciência: subsídios à formação de professores (Dissertação) A formação do professor alfabetizador em cursos de Pedagogia: contribuições e lacunas teóricopráticas (Tese) Representações sociais de professor partilhadas por licenciados a partir de imagens de professor (Tese) Olhares sobre a formação do professor de matemática. Imagem da profissão e escrita de si (Tese) Dificuldades na aprendizagem dos conteúdos de Biologia: evidências a partir das Provas de Múltipla Escolha do Vestibular da UFRN (20012008) (Tese) Ofício, Estresse e Resiliência: desafios do Professor Universitário (Tese) O uso de modelos no ensino de química: uma investigação acerca dos saberes construídos durante a formação inicial de professores de Química da UFRN (Tese) Representações sociais de discentes sobre universidade: um estudo psicossocial entre ingressantes do vestibular e da seleção ProUni (Dissertação) Como se chega ou como nos tornamos docentes no Ensino Superior (Tese) Campo educacional e representação social da formação docente: o olhar dos agentes (Dissertação) A Formação docente no fazer e refazer da prática pedagógica (Tese) oferecidos pela UFRN. Estudar os elementos de constituição identitária dos licenciandos do Curso de Pedagogia da UFRN, na intenção de caracterizar as representações sociais manifestadas por esses alunos sobre o trabalho do professor, identificando os elementos que definem tais representações (o conhecimento do conteúdo destas) e compreendendo a forma dinâmica da organização desses elementos. Analisar a configuração que a política nacional de avaliação para o ensino superior vem assumindo na UFRN. Investigar os sentidos atribuídos por estudantes estagiários à relação entre as Ciências da Educação e a prática pedagógica. Analisar a prática avaliativa e os instrumentos de avaliação disponíveis no ambiente virtual de aprendizagem (AVA), utilizados pelos professores formadores na avaliação da aprendizagem dos conteúdos oferecidos pelo curso em referência. Compreender o processo de construção identitária de pedagogos e pedagogas em formação inicial. Acessar e compreender as Representações Sociais (RS).(MOSCOVICI, 2003) sobre Física e Química para os grupos de licenciandos destes cursos, como também suas Representações Sociais sobre o Ensinar . Investigar quais são os elementos facilitadores da articulação teoria-prática nos procedimentos metodológicos do curso, embasados em Paulo Freire Investigar as concepções de alunos do Curso de Pedagogia da UFRN acerca da natureza da ciência. Investigar, sob a perspectiva de professores alfabetizadores licenciados em cursos de Pedagogia, as contribuições e as lacunas teórico-práticas desses cursos, na formação do pedagogo alfabetizador. Conhecer e analisar as representações sociais (RS) de professor, partilhadas por licenciandos, a partir de imagens desse profissional (fotografias de professores em diversos níveis escolares e redes de ensino). Descrever e analisar o processo de formação do professor de Matemática aluno da licenciatura em Matemática no Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy IFESP , em Natal-RN. Identificar os conteúdos explorados nas questões das provas de múltipla escolha do vestibular da UFRN para os quais os candidatos demonstraram dificuldade de aprendizagem; analisar se a contextualização da questão e a presença de elementos não-textuais influenciaram no aumento da dificuldade da questão e identificar os erros mais freqüentemente cometidos pelos candidatos nessas provas. Investigar os elementos que contribuem para desencadear o estresse no exercício da docência universitária e conhecer as estratégias adotadas pelos professores para enfrentar as situações estressantes, a fim de promover o desenvolvimento da resiliência e um exercício saudável do ofício. Identificar as contribuições e entraves, durante a formação inicial de professores de Química, na UFRN, em relação à construção de saberes que subsidiem os licenciandos na elaboração de atividades de ensino que envolvam a utilização de modelos. Identificar as representações sociais de universidade entre os sujeitos investigados Estuda a existência do ensino vivencial, no âmbito do Ensino Superior, pautado na vivência e no campo (auto) formativo como um suporte teórico-metodológico presente nas salas de aulas, Pontuar as principais discussões que permeiam a formação docente, pautadas na visão de autores da atualidade. Analisou ações formativas desenvolvidas pelo Grupo de Estudos de Prática Educativas em Movimento (GEPEM) - UFRN, 245 A política de formação inicial de professores e a implementação do componente curricular Prática Profissional na Licenciatura de Geografia do CEFET-RN (Dissertação) A fábrica de professores e a padronização do conhecimento (Tese) O Probásica e a formação de professores no Pólo de Parnamirim: política de formação profissional no Rio Grande do Norte? (Dissertação) O percurso formativo do Programa de PósGraduação em Educação da UFRN: a trajetória dos egressos mestres e doutores no período 1981 a 2005 (Dissertação) A Inclusão da pessoa com deficiência visual na UFRN: a percepção dos acadêmicos (Dissertação) O dia mais feliz da minha vida: a entrada na universidade segundo os alunos recém-ingressos no curso de Pedagogia da UFRN (2004.1) (dissertação) Universidade e educação ambiental (tese) Historiando a política de formação professores em serviço da UFRN (tese) de Analisar a implementação da política de formação inicial de professores, tomando como campo empírico o CEFET RN, e como referência o curso de Licenciatura em Geografia, mais especificamente o componente curricular prática profissional. Discute a tensão ambígua entre os conhecimentos que o professor adquire na sua formação e as práticas docentes concretas a partir dessas experiências Identificar e analisar a contribuição desta política de formação inicial para a formação profissional de professores. Procura tornar público e revelar, interna e externamente o alcance que o PPGEd tem assumido como importante centro de formação de pesquisadores em educação. Analisar como vem se processando a inclusão das pessoas com deficiência visual na UFRN, Compreender o momento de entrada na universidade a partir das falas de doze estudantes recém-ingressos no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Objetivou, ainda, analisar a relação entre a escola de origem e a entrada na universidade e a relação entre a universidade e o novo aluno universitário. Apontar elementos que demonstrem os conflitos, estrangulamentos, distanciamento e avanços na inter-relação entre a universidade e a questão ambiental. Revelar, numa abordagem sócio-histórica, a forma como a legislação educacional brasileira sobre a formação de professores para as séries iniciais educação básica expressa a política do Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, como o PROBÁSICA significa uma resposta da UFRN a esta política. Fonte: Elaborado pelas autoras. As teses e dissertações elencadas acima utilizam tanto dados primários como secundários no que se refere à fase de recolha. Ao utilizarem dados primários, os principais sujeitos das pesquisas são docentes universitários e dos Institutos Federais, professores da rede pública estadual e municipal, gestores, discentes dos cursos de licenciatura, bacharelado e graduação tecnológica e, também, egressos do ensino superior. Quanto aos dados secundários, destacam-se fontes bibliográficas e documentais, inclusive documentos específicos elaborados por aqueles que integram os lócus da pesquisa, como projetos pedagógicos, regimentos, entre outros. As publicações com objeto de estudo – a expansão e a reestruturação dos cursos e das instituições – trazem como principais resultados e discussões: a relação entre essa expansão e o período político específico do país, através do qual foi possível ampliar não apenas quantitativamente os cursos ofertados e o número de estudantes atendidos, mas também se configurou como uma oportunidade de acesso dos estudantes da capital e do interior do país; a preocupação com a inclusão desses estudantes e também daqueles públicoalvo da Educação especial; a demanda por formação pedagógica dos professores para atender às necessidades específicas dos educandos, as mudanças na concepção de gestão, organizada com base em metas, indicadores de desempenho e avaliação vinculada ao repasse de recursos, 246 o alcance e a dimensão social dessa expansão e reestruturação ao proporcionar acesso, desenvolvimento geográfico e qualificação para o mundo do trabalho. Já as publicações com objeto de estudo – as políticas e ações para a inclusão dos estudantes público-alvo da Educação Especial – trazem como principais resultados e discussões: a distribuição intra-institucional das responsabilidades junto ao processo de inclusão dos estudantes com deficiência; a formação continuada do docente e a preocupação institucional em apresentar nas políticas fatores para a promoção da inclusão e acessibilidade; a reestruturação e reformulação das políticas e das ações afirmativas; o papel dos núcleos de acessibilidade nas instituições de ensino como um avanço para a efetivação das políticas de inclusão destes alunos no ensino superior, com vistas à garantia da democratização do ensino a partir do direito de todos à educação. Por sua vez, as publicações com objeto de estudo – as lacunas e dificuldades dos estudantes ingressantes no ensino superior – trazem como principais resultados e discussões: dificuldades específicas dos estudantes, por exemplo, na elaboração e produção de textos argumentativos, dificuldades de leitura de textos; a necessidade de capacitação e aperfeiçoamento dos professores para lidarem com essas dificuldades. As demandas educacionais mais requisitadas, além do acompanhamento técnico educacional, estiveram na adaptação de materiais e na solicitação de auxílios financeiros. Como fatores facilitadores para a permanência, encontraram-se as ações para inclusão; a colaboração de amigos, professores e demais servidores; a oferta de auxílios e recursos pedagógicos e financeiros. Como aspectos limitadores, destacaram-se o desconhecimento por parte do discente dos auxílios/recursos e normativas disponibilizadas pela instituição para a permanência; falhas no fluxo de troca de informações sobre ações para inclusão e o desafio desses estudantes em permanecerem nos cursos. As publicações com objeto de estudo – características e dificuldades da formação específica dos estudantes nos diferentes cursos de graduação – trazem como principais resultados e discussões: a importância da experiência formativa e das consequências sobre o ensino e aprendizagem nas diferentes áreas no Ensino Superior. As publicações com objeto de estudo – a constituição da identidade e do ser docente universitário – trazem como principais resultados e discussões: necessidade de aprofundamento da formação pedagógica dos docentes; a importância do saber da experiência; o ser professor atrelado ao tornar-se professor em sua prática cotidiana; o desafio do ser docente relacionado à luta por seus direitos; a busca por educação permanente e por reconhecimento social. 247 As publicações com objeto de estudo – acesso, permanência e evasão dos estudantes no Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: a necessidade de uma formação que de fato prepare o discente para se inserir no mercado de trabalho, com as competências e habilidades exigidas pela profissão; e as implicações da relação entre os cursos escolhidos, os estudantes, os professores, as instituições de ensino e o que elas oferecem aos discentes para o sucesso ou fracasso acadêmico. As publicações com objeto de estudo – egressos do Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: constituição e maior articulação e efetividade das políticas institucionais de acompanhamento de egressos. As publicações com objeto de estudo – o currículo no Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: a regulação das dinâmicas em torno da organização curricular pela construção cultural do currículo e pela própria prática pedagógica; a reestruturação do currículo levando-se em conta maior equilíbrio entre as dimensões pedagógica, didática, tecnológica e científica, de modo a favorecer a formação e também o desenvolvimento profissional docente. As publicações com objeto de estudo – a socialização acadêmica e a construção da identidade do discente no Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: a não implicação das particularidades de cada graduação para o maior ou menor grau de socialização do estudante; a socialização e a solidariedade como necessidade para a sobrevivência acadêmica; e a solidão como possível fator de exclusão. As publicações com objeto de estudo – o Ensino Superior e a Educação à Distância – trazem como principais resultados e discussões: a escolha pelo curso e a modalidade como possibilitadores de uma flexibilidade de tempo para realização do curso, como alternativa a modalidade presencial tradicional; a exigência para que os estudantes se articulem em virtude da necessidade de adaptação a um modelo de ensino-aprendizagem amparado em aportes tecnológicos, digitais e novos meios de informação e comunicação aos quais não estavam familiarizados; o papel de mediação dos tutores na superação dos desafios. As publicações com objeto de estudo – o Ensino Superior e a Internacionalização – trazem como principais resultados e discussões: a importância da internacionalização no âmbito das instituições de ensino superior, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento do ensino, à troca de conhecimentos e o contato com uma cultura diferente. As publicações com objeto de estudo – a Formação docente no e para o Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: as lacunas da formação inicial, a 248 necessidade de formação pedagógica para os docentes do ensino superior, a formação continuada. Considerações finais A análise das teses e dissertações produzidas no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no período de 1998 a 2019, nos possibilitou um olhar para o ensino superior vinculado à constituição de sociedade. O que remete a uma produção acadêmica de interesses diversificados, mas ao mesmo tempo atravessada pela temática da formação. Uma formação que apresenta deficiências na efetivação do processo de ensino-aprendizagem na Educação Básica, de forma a permitir aos seus egressos uma continuidade no percurso acadêmico no ensino superior, concomitantemente em que relata lacunas na formação docente no e para o ensino superior. Ao mesmo tempo em que se constitui uma educação para o desenvolvimento, reconhecendo a importância da internacionalização nas trocas de saberes e investe na inclusão de estudantes para uma educação inclusiva como uma ideia de futuro. Como contribuições para a discussão sobre a temática do Ensino Superior, as publicações do PPGEd trazem à tona uma problematização crítico-reflexiva sobre a carência pedagógica na dos professores que atuam nesse nível de ensino, assim como salientam a diversidade de questões inerentes à pedagogia universitária, cada uma com especificidades que demandam significativa atenção, a fim de que sejam assegurados a qualidade acadêmica, a continuidade do aumento do ingresso e da permanência dos estudantes, a redução da evasão, a melhoria da gestão democrática nas instituições de ensino de nível superior e a qualidade de vida e de trabalho dos professores. Um destaque relevante das teses e dissertações publicadas deve-se à atenção dedicada à problemática da Educação Especial no Ensino Superior, não apenas quantitativamente, mas qualitativamente, boa parte das publicações estão voltadas para essa discussão e apresentam considerações significativas para a superação das dificuldades vivenciadas por esses estudantes. Por sua vez, como lacunas nas teses e publicações analisadas observa-se uma escassez e/ou insuficiência de publicações no programa que discutam a avaliação no ensino superior. 249 Referências Almeida, Wilson Mesquita de. ACESSO À UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA: posições em disputa. In Revista do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE. v. 2, n. 18, 2012. Disponível em <https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/article/view/235247/28268>. Acesso em 29/04/2020. CHAUÍ, Marilena de Souza, Modernização versus democracia. In Escritos sobre a universidade. São Paulo: Editora UNESP, 2001. (p. 73-113). Martins, Antonio Carlos Pereira. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. Acta Cir. Bras. v.17 supl.3 São Paulo 2002. Disponível em <https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-86502002000900001> Acesso em 29/04/2020. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Programa de Pós-Graduação em Educação. Repositório Institucional. Disponível em: < http://repositorio.ufrn.br:8080/jspui/handle/123456789/11945/simplesearch?query=educa%C3%A7%C3%A3o+superior&sort_by=dc.date.issued_dt&order=desc &rpp=100&etal=0&start=0>. Acesso em 17 02 2020. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Centro de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Regimento interno. 2020. 250 13.FORMACIÓN CONTINUA INTENSIVA A NIVEL DE POSGRADOS INTERNACIONALES EN EDUCACIÓN SUPERIOR E INCLUSIÓN EN UNA UNIVERSIDAD PRIVADA DE PARAGUAY Javier Numan Caballero Merlo42 Resumen El objetivo es mostrar la inclusión de alumnos brasileños en los posgrados internacionales en educación ofertados por una universidad privada paraguaya. Considerando desde la gobernanza institucional la dimensión social de los estudiantes para la oferta de la modalidad de enseñanza-aprendizaje intensiva (concentración de horas-aula presenciales en módulos semanales) e innovadora (aplicación del e-learning y de pautas didáctico-pedagógicas activas, participativas y colaborativas) posibilitando su formación continua de manera internacional. Esto, desde el paradigma pragmático (mixto) y el método de investigación evaluativa, no experimental, según los datos descriptivos secundarios proporcionados por la universidad y de los resultantes del cuestionario aplicado dentro del marco de la participación de la Universidad Autónoma de Asunción (UAA) en el proyecto TO-INN From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions (https://www.toinn.org/). Los resultados indican que los posgrados internacionales se realizan en mayor medida por estudiantes brasileños; la inclusión mayoritaria femenina en la matricula; la mayoría de los/as estudiantes trabaja para costearse sus estudios y tiene dependientes a su cargo; la inclusión permite acceder a un capital educativo-cultural superior respecto a sus padres; la participación mayoritaria en actividades asociadas al uso de tecnologías de la información, esenciales para desarrollar la modalidad intensiva de formación continua. La conclusión principal es que la estrategia didáctico-pedagógica intensiva de posgraduación en educación permite la inclusión educativa de alumnos/as brasileños, así como su movilidad individual meritocrática. 42 Posdoctorado en el Instituto de Investigación en Educación de la Universidad de Barcelona (UB). Agencia de Financiación: Programa Nacional de Becas de Postgrado en el Exterior “Don Carlos Antonio López” (BECAL; https://www.becal.gov.py/). Docente-Investigador por la Escuela de Posgrado (EP) de la Universidad del Este (UNE). Doctor en Ciencias Humanas y Sociales (UNaM-Argentina), Licenciado en Sociología (UDELARUruguay), Magíster en Sociología (UFRGS-Brasil). Pos Graduado en Derechos Humanos y Ciudadanía (IDHCosta Rica); y, en Didáctica Universitaria (UFRGS-Brasil) y (UCA-Paraguay). Investigador Categorizado (PRONII-CONACYT). Miembro de Consejos de Redacción de Revistas Nacionales e Internacionales en ciencias sociales y autor de diversos libros, artículos y ensayos. Líneas de investigación: Docencia e Investigación en Historia Sociológica de la Sociología en Paraguay; Inclusión, equidad y cohesión social en educación superior. Contacto: javiernuman18@hotmail.com. 251 Palabras clave: Dimensión social. Posgraduación. Modalidad Intensiva. Inclusión. INTENSIVE CONTINUOUS TRAINING AT THE INTERNATIONAL POSTGRADUATE LEVEL IN HIGHER EDUCATION AND INCLUSION IN A PRIVATE UNIVERSITY IN PARAGUAY Abstract The objective is to show the inclusion of Brazilian students in the international postgraduate courses in education offered by a Paraguayan private university. Considering from the institutional governance the social dimension of the students for the offer of the intensive teaching-learning modality (concentration of classroom hours-face-to-face in weekly modules) and innovative (application of e-learning and active, participatory didacticpedagogical guidelines and collaborative) enabling their continuous training in an international manner. This, from the pragmatic paradigm (mixed) and the non-experimental evaluative research method, according to the secondary descriptive data provided by the university and the results of the questionnaire applied within the framework of the participation of the Autonomous University of Asunción (UAA) in the TO-INN From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions Project (https://www.toinn.org/). The results indicate that the international postgraduate studies are carried out to a greater extent by Brazilian students; the majority inclusion is female in the enrollment; most of the students work to pay for their studies and have assistants in their post; the inclusion allows access to a higher educational-cultural capital in comparison to their parents; the majority participation in activities associated with the use of information technologies, essential to develop the intensive modality of continuous training. The main conclusion is that the intensive postgraduate educational pedagogical strategy in education allows the educational inclusion of Brazilian students, as well as their meritocratic individual mobility. Keywords: Social dimension. Postgraduation. Intensive mode. Inclusion. 252 I. Introducción: el problema Vale hacer explícito desde el inicio que no es el objetivo del artículo adentrarse en el sistema de educación superior en el Brasil, y las consecuencias de su política educativa respecto del acceso dentro del marco de la formación continua de sus egresados, a niveles sucesivos de pos graduación en el área de educación. Se toma como situación de origen que contingentes de graduados en diversas áreas e instituciones de educación superior de ese país, busquen acceder a cursos internacionales intensivos en los países limítrofes, entre ellos, Paraguay. Para poder desarrollar su formación continua con diversos fines: ganar más dinero al mejorar su categorización al poseer un título de posgrado, para mejorar su jubilación futura, actualizar sus conocimientos, certificaciones para garantizar su permanencia laboral que sus instituciones exigen sin habilitar las condiciones y medios al efecto. Las dificultades y/o limitaciones de diversos tipos: para encarar exámenes de ingreso competitivos, los pocos cupos de acceso respecto a la demanda, los altos costos de la preparación al efecto, las condiciones de sus trayectorias académicas, las matrículas y cuotas de las universidades privadas de elite, la carga horaria de su actividad principal que no da margen a estudiar paralelamente con niveles de exigencia, etc.; ha producido que se genere una extraña oferta internacional regional en el MERCOSUR que se alimenta de esta demanda de posgrados por los graduados brasileños, a los que no pueden acceder en su país de residencia, donde además, desempeñan sus actividades laborales. El acceso internacional a la formación continua a nivel de posgrados, a través de la modalidad intensiva, genera un tipo particular de inclusión, que garantiza un acceso universal, más económico y menos exigente que en su país de procedencia, con carreras sin embargo acreditadas (www.uaa.edu.py/postgradoUAA). Estas se desarrollan en un periodo de 1 a 2 años de cursado, contemplando dos o tres semanas presenciales en los meses de enero y julio, con una carga horaria por módulo variable; pudiendo tener dos materias por día, o una semanal, de lunes a viernes, dependiendo del curso, su plan de estudios y malla curricular. Así, accesible en el sitio web institucional, pueden leerse los requisitos para inscribirse en este tipo de posgrados, sean de maestría, doctorado o posdoctorado con la modalidad descripta (www.uaa.edu.py/postgradoUAA). Para Maestría Internacional en Ciencias de la Educación (Tratamiento MERCOSUR): 253  Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por escribanía Paraguaya.  Fotocopia del título de GRADO, legalizado por el MEC y autenticado por escribanía.  Certificado de estudio Original, legalizado por el MEC y autenticado por escribanía. Doctorado Internacional en Ciencias de la Educación (Tratamiento MERCOSUR):  Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por escribanía Paraguaya.  Copia del documento de Identidad autenticado por escribanía Paraguaya.  La fotocopia del título de Máster Stricto Sensu y el Certificado de estudio Original, que acredite como mínimo 700hs. que deben reunir las siguientes exigencias: • Apostillado por convenio de la Haya (trámite en el país de origen). • La copia del título debe estar autenticado por escribanía Paraguaya. • Traer título original para trámites. Posdoctorado Internacional en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una Sociedad Inclusiva (Tratamiento MERCOSUR):  Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por escribanía Paraguaya.  Copia del documento de identidad autenticado por escribanía Paraguaya.  La fotocopia del título de Doctor y el certificado de estudio Original, que acredite como mínimo 1.200hs. que deben reunir las siguientes exigencias: • Apostillado por convenio de la Haya (trámite en el país de origen). • La copia del título debe estar autenticado por escribanía Paraguaya. • Traer título original para trámites. Así, los datos sobre la dimensión social de los participantes de estos cursos de pos-graduación intensiva se transforman en una fuente muy rica de validación de este tipo de estrategias pedagógicas que viabilizan el acceso masivo a estudiantes que de otra manera no lo podrían hacer, al menos en su país de origen. Al tiempo de posibilitar mejorar su capital educativocultural respecto a su familia de origen. La inclusión y la meritocracia se evidencian con los datos proporcionados por la encuesta (https://www.toinn.org/), al tiempo que se abren puertas para fortalecer estos programas modulares intensivos internacionales de formación continua. Poniendo asimismo su calidad 254 en debate, y la resignificación de los conceptos mismos de inclusión y meritocracia con las limitaciones de estas buenas prácticas, igualmente parciales, y en cuestión. Por todo lo dicho hasta aquí es que tanto la Ponencia aceptada para su presentación en la IV Conferencia Internacional de Aprendizaje y Enseñanza en la Educación Superior (Évora, Portugal 2020), y el presente artículo, se inscriben dentro de la temática de la Inclusión Educativa y Bienestar. El instrumento del cuestionario del Proyecto TO-INN como herramienta para la UAA TO-INN, “From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions”, ha sido un proyecto desarrollado por un consorcio de universidades europeas y latinoamericanas y el grupo de investigación FODIP de la Facultad de Educación de la Universidad de Barcelona. Veintidós instituciones de educación superior (ES) y un centro de formación de siete países de América Latina (Colombia, Argentina, Honduras, México, Ecuador, Bolivia y Paraguay) y cinco países de la UE (España, Italia, Holanda, Portugal y Francia). En el marco del programa Erasmus + Key Action 2- Capacity building in the field of Higher Education de la Unión Europea (2016-2019). (TO-INN, 2018a). Que se propuso impulsar el desarrollo a través de la educación, la formación docente, y la inclusión (2014-2020), fomentando la movilidad internacional y la cooperación educativa entre países. (TO-INN, 2018b). La Encuesta TO INN a estudiantes es uno de los productos de su ejecución, comprometido con la articulación de la dimensión social con la pertinencia social y curricular, y la innovación. Por su parte, la (UAA) es una de las universidades locales privadas en Paraguay que forma parte del proyecto, y en la que se aplicó dicho cuestionario. La (UAA) tuvo su origen en la Escuela Superior de Administración de Empresas (ESAE) en el año 1978. Constituyéndose como asociación civil sin fines de lucro, con la misión de producir y difundir el conocimiento. Reconocida como institución de educación superior (IES) a través del Decreto del Poder Ejecutivo N° 11.615, con fecha 14 de noviembre de 1991, que autoriza el funcionamiento de la UAA. (Caballero, et al., 2018). La misma ofrece bajo esta modalidad intensiva internacional los cursos de Maestría en Ciencias de la Educación, de dos años de duración (www.uaa.edu.py/carreras/maestria-cienicas-educacion), de Doctorado en Ciencias de la Educación (www.uaa.edu.py/carreras/doctorado-ciencias-educacion) también de dos años de duración, y, de Posdoctorado en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una 255 Sociedad Inclusiva, de un año de duración (www.uaa.edu.py/carreras/postdoctoradoliderazgo-educativa-sociedad-inclusiva). Objetivos y metodología El objetivo general ha sido analizar la dimensión social de los estudiantes de posgrados internacionales modalidad intensiva en educación de la (UAA) como estrategia para su inclusión meritocrática. Los objetivos específicos son: a) Describir dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión de una mayoría de alumnos de brasileños en cursos de post grado en educación abiertos al efecto; b) Exponer los datos de ciertas dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión de género, de estudiantes trabajadores y/o con dependientes a su cargo; c) Analizar los datos respecto si opera un proceso de apropiación progresiva de capital educativo-cultural de manera meritocrática, respecto al de partida u origen familiar; d) Mostar el uso frecuente a internet, aparatos y aplicativos que son necesarios para desarrollar las pedagogías activas que permiten el e-learning para desarrollar la modalidad intensiva modular de formación continua; e) Asociar la modalidad intensiva modular de formación continua internacional como una estrategia que posibilita la inclusión meritocrática. Esto, según datos secundarios proporcionados por la institución respecto a sus programas intensivos internacionales desarrollados como modalidad y tiempos para alumnos provenientes de la República Federativa del Brasil. Y, por los datos descriptivos del informe del cuestionario aplicado dentro del marco de la participación en el proyecto TO-INN (https://www.toinn.org/; Caballero, 2019a). Según cuatro ítems generales con sub-ítems respecto a variables escalares, categóricas y abiertas del cuestionario que más abajo se detallan. Estos son, sintéticamente cuatro: (1) Datos sociodemográficos (Básicos y 256 Parentales): sexo, personas dependientes y situación familiar (estudio y trabajo de los padres); (2) Datos universitarios: el país de procedencia de los estudiantes, el curso al que están adscritos, la vía de acceso, etc.; (3). Vida y participación académica y social: escolarización previa, cambio de población, tiempo de desplazamiento, residencia, calidad de la residencia, tipología de estudiante; motivo si trabaja, dificultad del trabajo, ingresos; entre otros; y, (4) Ámbito motivacional y expectativas de futuro: motivos para el estudio, intereses personales y ocio. La metodología propuesta se enmarcó dentro de la orientación del paradigma pragmático (mixto) y el método de investigación evaluativa, no experimental. El estudio de la dimensión social a través del instrumento del cuestionario proporciona un abanico amplio de datos sobre los/las estudiantes de formación continua en educación, vinculantes con el problema y los objetivos aquí abordados. Lo cual es fundamental al momento de la toma de decisiones institucionales y como insumo a las políticas universitarias o gobernanza, tal como la oferta de posgrados internacionales de modalidad intensiva y modular. Dimensión social del alumnado de posgrados internacionales y la modalidad intensiva La UAA tiene la particularidad institucional de no dictar cursos de formación de maestros para la escuela, de profesores para la educación media o de Licenciados en Ciencias de la Educación. Sin embargo, su oferta institucional se dirige a la formación continua de posgrado en educación, constituyendo una particularidad. De esta manera, a nivel nacional ofrece como posgrado profesionalizante la Especialización en Didáctica (www.uaa.edu.py/postgradoUAA#masteres); mientras, como internacionales, la Maestría en Ciencias de la Educación (www.uaa.edu.py/carreras/maestria-cienicas-educacion), el Doctorado en Ciencias de la Educación (www.uaa.edu.py/carreras/doctorado-cienciaseducacion) y el Posdoctorado en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una Sociedad Inclusiva (www.uaa.edu.py/carreras/postdoctorado-liderazgo-educativa-sociedadinclusiva ). Si bien a los mismos también se les permite acceder no sólo a los alumnos brasileños, aunque se hayan desarrollado para captar el volumen de su demanda, sino también a alumnos nacionales (Universidad Nacional de Asunción, UNA; UAA) y extranjeros con Tratamiento Mercosur y Sin Tratamiento Mercosur, con Requisitos de Admisión para los Programas de Postgrado diversos, aunque de tipo documental administrativo, sin pruebas de ingreso o cursos de nivelación (https://www.uaa.edu.py/postgradoUAA#masteres). 257 Constituyendo la demanda del alumnado brasileño por cursos de posgrado internacionales intensivos y modulares en ciencias de la educación un target específico que tuvo y es considerado de manera sistemática por la gobernanza institucional que orienta a la UAA, garantizando en su oferta la pertinencia social, curricular y sus programas de formación (planes de estudios, mallas curriculares, modalidades). (Caballero, 2018). Esto no es casual, sino que forma parte de una política intencional de la institución de participación sostenida desde el año 2010 en Proyectos de Cooperación en Redes Internacionales en educación. Dando continuidad a las dimensiones y ejes desarrollados conjuntamente desde el Proyecto ALFA III, RIAIPE 3: El Programa Marco Interuniversitario para una Política de la Equidad y la Cohesión Social en la Educación Superior (2010-2013). Y, más recientemente (2016-2019), desde el Proyecto TO-INN, “From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions”. A fin de diagnosticar, evaluar y proponer alternativas a los problemas de desigualdad social y educativa en Paraguay y América Latina desde la Educación Superior, fomentando la formación docente, su inclusión, la movilidad internacional y la cooperación educativa entre países. Con esta capacidad instalada, y en desarrollo, la política institucional como gobernanza es la que permite articular lo académico con lo social, posibilitando el engranaje entre la pertinencia social, curricular, y la innovación didáctico-pedagógica. Es a través de las Conferencias Mundiales sobre la Educación Superior de los años 1995, 1998, 2009 que la UNESCO introduce conceptualmente la categoría de pertinencia. Esta, en principio, se definía funcionalmente como la adecuación entre las necesidades formativas de la sociedad y los que las instituciones de educación superior ofrecen. De esta manera, su evaluación dependería de un mayor o menor ensamble entre las demandas sociales y la oferta curricular (TO-INN, 2018b). Lo que estos proyectos, red de socios, y la UAA en particular comparten, es que tal adecuación y evaluación deben regirse por ciertos principios norteadores como valores transversales tales como la igualdad entre géneros, la equidad y la justicia social (Montané, 2018; TO-INN, 2018b). Haciendo que el sentido de su concepto dentro del marco del proyecto haga referencia a la institución, a los programas universitarios y a todos los proyectos de vinculación social. Se asume un concepto y práctica de pertinencia curricular de los programas que ofrecen las diversas instituciones donde el currículo incluye los intereses y demandas de los diversos contextos sociales, culturales y productivos en los que se inserta (pertinencia social), así como a las necesidades de aprendizaje, de desarrollo 258 personal e intelectual de los/as estudiantes universitarios/as (pertinencia curricular) (TO-INN, 2018b). Que se efectiviza considerando el perfil de los docentes para su mejor formación según su existencia y experiencias vitales, así como la realidad de sus contextos socio-educativos expresado en la pertinencia curricular, y la innovación facilitadora y multiplicadora. (Caballero, 2018; Montané, 2018; TO-INN, 2018b). Esto es, la conexión necesaria entre los aspectos de la dimensión social del alumnado, su realidad social, con su formación, y su función social y profesional futura. La innovación desde una estrategia didáctico-pedagógica intensiva, con el recurso del e-learning, el manejo de la plataforma Moodle, y de las pedagogías activas, permiten la inclusión de este particular perfil de estudiantes brasileños, junto con la una política institucional de ‘open access’. Así, se reconoce un concepto amplio acerca de la dimensión social que explicita el reconocimiento de la necesidad de conocer el perfil de los estudiantes según sus características y condiciones sociales de existencia. Estos, como indicadores objetivos para diseñar las políticas con un conocimiento real de su forma de vida y antecedentes en todas las formas de capital, persiguiendo como meta implementar prácticas innovadoras que permitan desarrollar de manera concreta una educación superior más equitativa e inclusiva. Al efecto, el instrumento aplicado del cuestionario y los datos que orientan el diseño y constante validación de estos programas internacionales intensivos. Datos con los cuales se propone y desarrolla una formación que contempla la historia de vida estructural y la experiencia, que enmarcan la definición de los procesos de enseñanza-aprendizaje y de innovación, de manera inclusiva. La dimensión social se torna en un eje clave para la inclusión, posibilitando el acceso, la permanencia y el éxito académico de los estudiantes, para el caso, de los brasileños que necesitan una modalidad innovadora, intensiva, con pedagogías activas que permitan su egreso con defensa de tesis y título, calificándose y posicionándose con un capital educativo cultural superior al de origen alcanzado meritocráticamente. Esto, en un contexto contradictorio de democratización en el acceso a las universidades que sin embargo continúa conviviendo con las desigualdades y diferencias del mismo. La dimensión social promueve así la cohesión social, la reducción gradual meritocrática de las desigualdades y mejora de la calidad del nivel de conocimiento, habilidades y competencias. 259 Presentación de resultados De acuerdo al problema construido, así como los objetivos generales y específicos, se tiene que: a) Describir dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión de una mayoría de alumnos extranjeros en cursos de post grado en educación abiertos al efecto. Considerando los datos secundarios proporcionados por la Dirección de Posgrado de la (UAA), respecto a sus programas de Posgrado Internacionales en Educación para alumnos extranjeros, fundamentalmente de brasileños, por ello lo de (Tratamiento MERCOSUR) antes expuestos en los requisitos de ingreso, pero de open access a una diversa minoría distribuida entre colombianos, angoleños, mexicanos y hasta de paraguayos, se tiene que para el período 2018-2019 la cantidad de participantes se ha distribuido de la siguiente manera: Maestría en Ciencias de la Educación, con 234 de alumnos/as; Doctorado en Ciencias de la Educación, con 82 cursantes, y en el Postdoctorado en Gestión en Innovación Educativa, con 9 participantes. Dando un subtotal de 325 estudiantes de posgrado en el bienio de referencia, los cuales constituyen buena parte del universo encuestado. Asimismo, teniendo en cuenta los programas de Posgrado Nacionales en Educación para el mismo bienio, donde la cantidad de participantes de la Especialización en Didáctica Universitaria ha sido de 112 alumnos/as. La suma de ambos subtotales supone 437 estudiantes, de cuyo universo forman parte los 359 participantes efectivamente encuestados. En el ítem general Datos universitarios, sub ítem Estudios en curso, el resumen del perfil académico coincide con el ya definido en contexto del problema que nos interroga, el que la universidad desarrolle cursos de educación sólo en posgrados y mayoritariamente de carácter internacional, modalidad intensiva, pensada para captar a los/as candidatos/as brasileños que buscan formación continua en el área (Caballero, 2019a; Caballero, et al., 2018; Caballero y Báez, 2019). Así puede comprenderse situadamente que a la pregunta acerca de «Qué estudios está cursando actualmente», las respuestas válidas mayoritarias se hallan distribuido de la siguiente forma: Máster, Maestría o Magister en el campo de la Educación, en un número de 180 y un porcentaje de 50,1 %; para Posgrado y cursos/capacitaciones de especializaciones en educación, en 69 casos (y un porcentaje de 18,2 %); y, Doctorado relacionado con la Educación, en 54 respuestas (y un porcentaje de 15 %). Acumulando un 84,2 % sobre 100 % del porcentaje válido, y 303 respuestas sobre un total de 359. Confluyendo los datos secundarios con los primarios respecto a la procedencia y para qué cursos se matriculan. 260 Lo que acompaña también las respuestas a la pregunta acerca de si «Estos estudios son los primeros que cursa en el ámbito de la Educación», con 225 casos que responden que no (con un porcentaje de 62,7 %). Ratificando el interés central por la formación continua en posgrados en educación. Asimismo, en el sub ítem que consulta ¿Cuál es la duración en años de su programa formativo?, 311 responde que en cursos de hasta 2 años (un porcentaje acumulado de 86,6 %). Una vez más cerrando con la duración promedio de cursos de posgrados en los que se han matriculado, mayormente de Maestrías. Los otros 48 casos (con un porcentaje de 13,4 % acumulado), coinciden con los tiempos del Programa Doctoral y Posdoctoral tal como ya visto con los datos secundarios. Por otro lado, en otro sub ítem se pregunta Mediante qué proceso accedió a los estudios universitarios que está cursando, se dan una serie de respuestas que coinciden con la procedencia mayoritaria de alumnos brasileños dados los criterios de admisión a los posgrados internacionales diseñados de manera intensiva y modular a tal efecto. Así, se puede comprender contextualizadamente que la mayoritaria haya respondido que accedió a los mismos presentando en 118 casos una Solicitud de incorporación (un porcentaje de 32,9 %); en 61 casos que No hubo vía de selección (un porcentaje de 16 %); y, con 42 casos Presentando el curriculum vitae (un porcentaje de 11,7 %). Sumando 221 casos (un porcentaje de 62 %) que no tuvieron más requisitos que cumplir que aquellos que se han presentado más arriba como parte de este tipo particular de acceso en cursos de posgrado internacionales. En la dimensión Vida y participación académica y social, respecto al ítem Situación Residencial, la mayor parte de los y las participantes en la encuesta manifestaron con 254 respuestas que tienen fijada su residencia en un hotel (un porcentaje de 71 %). Lo cual corrobora de manera indirecta la alta participación de alumnos extranjeros, fundamentalmente brasileños. De esta forma, tanto los datos secundarios proporcionados por la universidad –datos sobre los posgrados y número de matriculados; documentos digitales sobre los criterios de admisión a dichos cursos-, como los primarios proporcionados por el cuestionario, confirman el acceso de una población mayoritariamente extranjera de estudiantes brasileños. b) Exponer los datos de ciertas dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión según sexo, y de estudiantes trabajadores o con dependientes a su cargo. 261 En los Datos sociodemográficos, para la variable sexo, se tiene que 235 respuestas corresponden a mujeres (un porcentaje de 65,5 %) y 124 a hombres (un porcentaje de 34,5 %). Lo que muestra el acceso e inclusión de la mujer como una categoría central entre otras que hacen a las categorías de la diversidad que se propone desde la gobernanza institucional y del Proyecto TO INN empoderar. Por tanto, se hace relevante que esto se refleje en la matriculación según sexo. Frente a la pregunta si Tiene personas dependientes a su cargo, 212 han respondido que sí (un porcentajes del 59,1 %), mientras que 147 no (un porcentaje del 40,9 %). Esta variable es relevante dentro de los/las que si los tienen, pues pude incidir en recursos tales como el tiempo y los económicos necesarios para acceder como para llevar adelante su formación continua. Lo que hace que dicha relación de dependencia dificulte su dedicación exclusiva a su formación, incidiendo en la calidad de la misma, así como tal vez en su permanencia en el sistema. Desde la dimensión Vida y participación académica y social, se puede percibir esta vez la inclusión de los/las estudiantes que trabajan al examinarse las respuestas según la Situación laboral, particularmente a través de la pregunta acerca de Cuál de las siguientes situaciones encajaría mejor con lo que está haciendo actualmente. Esto, porque en 152 casos han respondido que realizan una actividad remunerada en un ámbito relacionado con sus estudios (un porcentaje de 55 %) sobre los 276 que trabajan; excluyéndose de esta base las 73 en 349 válidas que responden: No realizó ninguna actividad remunerada. A los que también se deben sumar aquellos estudiantes, con 124 respuestas (un porcentaje de 45 %), que desarrollan alguna actividad remunerada pero en un ámbito no relacionado con sus estudios. Dando un total de 276 alumnos trabajadores que de esta forma costean sus propias posibilidades de continuar con su formación continua. Hay que destacar asimismo que, dentro de los/as que realizan una actividad remunerada en un ámbito relacionado con sus estudios, 87 de estos casos (un porcentaje de 32 %), lo hacen con una duración superior a 30 horas semanales. Asimismo, todos/as aquellas personas que sí realizan una actividad remunerada, con diversos niveles de dedicación, manifiestan que ésta interfiere en su formación continua, con una media de 2,8, en una escala de 1 a 5 puntos. Además, analizando el sub ítem Financiación de los Estudios, y las respuestas frente a la cuestión «Cuál de las siguientes fuentes de ingreso contribuye en mayor medida a financiar sus estudios», la forma más frecuente proviene del trabajo en 300 de los casos (un porcentaje 262 de 87,5 %). Claramente, la mayoría de los alumnos de que vienen a Paraguay a desarrollar sus cursos internacionales de formación continua, hacen un gran esfuerzo en los meses de enero y julio, para costear los mismos, con dependientes a su cargo y teniendo que trabajar, en muchos casos con largas jornadas laborales. c) Analizar los datos respecto si opera un proceso de apropiación progresiva de capital educativo-cultural de manera meritocrática, respecto al de partida u origen familiar. Se presentan algunos datos respecto al origen familiar de los estudiantes recogidos bajo el ítem general Datos sociodemográficos, considerando el sub ítem de los Datos Parentales, a través del perfil formativo (nivel de estudios más elevado) y profesional (ocupación actual) de sus madres y padres; lo cual se compara con la situación actual de los educandos, y así seguir el rastro de su trayectoria académica. Pudiendo deducir si han mejorado su capital cultural, y a través de su estudio, de manera meritocrática. Así, frente a la consulta sobre ¿Cuál es el nivel de estudios más elevado alcanzado por su madre? 154 respuestas (un porcentaje del 42,9 %) señalan que Sin Estudios y Estudios primarios o educación básica. Más otras 118 respuestas (un porcentaje de 32,9 %), respecto a educación técnica y media, repartidas entre Formación técnica o profesional no universitaria, Estudios secundarios no obligatorios (Bachillerato, ciclo o grado) y Estudios secundarios de enseñanza media. Acumulando así, un sub total de 272 respuestas (un porcentaje del 75,8 %) que hacen referencia a formación no universitaria de sus madres. El resto, que corresponde sólo a 78 de las respuestas (un porcentaje de 21,7 %) hacen referencias a los Estudios de doctorado; Estudios de posgrado –Máster, Magister, Maestría u Otros–; o Estudios de grado, pregrado, licenciatura, diplomatura o ingeniería. Todo lo anterior constituye un importante indicador respecto a que los/as estudiantes han superado meritocráticamente a través del estudio, y de su trabajo, el capital educativo-cultural de sus madres. Respecto a los padres, 163 respuestas (un porcentaje de 45,4 %) señalan que Sin Estudios y Estudios primarios o educación básica. Más otras 115 respuestas (un porcentaje de 32,1 %), respecto a educación técnica y media, repartidas entre Formación técnica o profesional no universitaria, Estudios secundarios no obligatorios (Bachillerato, ciclo o grado) y Estudios secundarios de enseñanza media. Acumulando así, un sub total de 278 respuestas (un porcentaje del 77,5 %) que hacen referencia a formación no universitaria de sus padres. El resto, que corresponde sólo a 60 de las respuestas (un porcentaje de 16,7 %), menor que para las madres, hacen referencias a los Estudios de doctorado; Estudios de posgrado –Máster, 263 Magister, Maestría u Otros–; o Estudios de grado, pregrado, licenciatura, diplomatura o ingeniería. Así como respecto a las madres, lo anterior constituye otro importante indicador respecto a que los/as estudiantes han superado meritocráticamente a través del estudio, y de su trabajo, el capital educativo-cultural de sus padres, aunque de forma más significativa. Dentro del sub ítem de los Datos Parentales, también es importante para nuestro objetivo los resultados respecto a la variable Ocupación de los progenitores; pues, constituyen marcas de referencias objetivas para comparar con la de los estudiantes que se dedican a actividades educativas en todos los casos. Así, puede pueden verse que tan sólo 37 casos apuntan (un porcentaje del 10,3 %) a que sus madres trabajen en algunas de las categorías que incluyen el ejercicio profesional, estas son como Empresarios/as con asalariados/as, altos/as funcionarios/as, altos/as ejecutivos/as y profesionales por cuenta propia; Profesionales y técnicos/as por cuenta ajena (empleados/as) y cuadros medios. El resto de las respuestas con 289 casos (un porcentaje de 80,6 %) se distribuyen entre los demás indicadores: Comerciantes y pequeños/as empresarios/as no agrarios/as (sin empleados/as); Agricultores/as (empresarios/as sin asalariados/as y miembros de cooperativas); Personal administrativo, comercial y de servicios; Jubilados/as y pensionistas; Parados/as (que han trabajado antes y en busca de su primer empleo); Trabajo doméstico no remunerado; Trabajo doméstico remunerado; y, Situaciones no clasificables. Lo que muestra que, en la mayoría de los casos, los/as pos-graduandos han superado la herencia educativacultural, y las actividades económicas de la ocupaciones de origen de sus madres, así como de sus padres. Mientas, para el caso de los padres Así, puede pueden verse que 52 casos apuntan (un porcentaje del 14,5 %) a que sus padres, un poco más que sus madres, trabajen en algunas de las categorías que incluyen el ejercicio profesional: Empresarios/as con asalariados/as, altos/as funcionarios/as, altos/as ejecutivos/as y profesionales por cuenta propia; Profesionales y técnicos/as por cuenta ajena (empleados/as) y cuadros medios. El resto de las respuestas con 244 casos (un porcentaje de 68 %) se distribuyen entre los demás indicadores: Comerciantes y pequeños/as empresarios/as no agrarios/as (sin empleados/as); Agricultores/as (empresarios/as sin asalariados/as y miembros de cooperativas); Personal administrativo, comercial y de servicios; Jubilados/as y pensionistas; 264 Parados/as (que han trabajado antes y en busca de su primer empleo); Trabajo doméstico no remunerado; Trabajo doméstico remunerado; y, Situaciones no clasificables. Lo que muestra que, en la mayoría de los casos, al igual que con respecto a sus madres, los/as pos graduandos han superado la herencia educativa-cultural, y las actividades económicas de la ocupaciones de origen de sus padres y de ambos progenitores. d) Mostar el uso frecuente de internet, aparatos y aplicativos que son necesarios para desarrollar las pedagogías activas que permiten el e-learning para desarrollar la modalidad intensiva modular de formación continua. En el último de los ítems generales abordado en el cuestionario hace referencia al Ámbito Motivacional, dentro del cual se examina el conocimiento de la actividad socio-cultural que tienen los estudiantes. Para ello, dentro del sub ítem Intereses Personales y Ocio, se consulta al respecto de Participar en foros, chats, blogs y redes en Internet. Este tópico es importante a nuestros objetivos pues es una de las capacidades necesarias y a desarrollar como competencia transversal en los cursos internacionales de formación continua modular intensiva. Dado que esta modalidad exige trabajos en grupos, on line, presentación de avances con el uso de las herramientas tecnológicas, dada la carga horaria intensiva que justamente define esta estrategia didáctica-pedagógica de formación. Fundamento asimismo de la educación a distancia o semi presencial con el uso del e-learning a través de plataforma Moodle que es la que implementa la universidad, como buena práctica que a la vez de innovar incluye. Ante ello es de destacar que sólo 98 en 343 respuestas válidas (un porcentaje del 28.6 %) casos responden que No lo hago nunca, mientras la mayoría expresa que con diversas frecuencia Participar en foros, chats, blogs y redes en Internet, con 245 respuestas (un porcentaje de 71.4 %). Lo que se condice con que todos los estudiantes cuenten con celular, o computadoras portátiles, herramientas necesarias para esta modalidad de formación; y si no poseen estas últimas, la institución les otorga computadoras portátiles durante sus actividades en las semanas de lunes a viernes en turnos mañana y/o tarde dependiendo del módulo que se trate, mientras estén dentro de la universidad, incluyendo sus aulas o en su Biblioteca. La democratización de la inclusión se muestra tanto en el acceso a los posgrados como a los recursos que requiere la innovación de la práctica didáctico-pedagógica de la modalidad intensiva, para el caso, internacional. 265 e) Asociar la modalidad intensiva modular de formación continua internacional como una forma de inclusión meritocrática. Para este objetivo, se articula la modalidad intensiva modular de posgrados internacionales previamente documentada por la UAA, con lo descrito en los sub apartados (a), (b) y (c) fruto de la administración del cuestionario. Para no repetirnos, logró mostrarse respecto al sub apartado (a) que: los datos secundarios proporcionados por la universidad –datos sobre el área de los posgrados, sus niveles, y número de matriculados; las referencias en documentos digitales en su sitio web institucional, respecto a los criterios de admisión a dichos cursos, están diseñados (pertinencia curricular y modalidad) a medida para la demanda de los estudiantes provenientes de Brasil que vienen a cursarlos en su época de vacaciones en enero y julio, de cada año; así como los datos primarios proporcionados por el cuestionario respecto a una búsqueda de formación continua en el área de educación, combinando las variables estudios, acceso y situación residencial, que confirman el acceso de una población mayoritariamente extranjera brasileña de estudiantes. Respecto al sub apartado (b) se pudo probar la inclusión según sexo, con una mayoría femenina en la matriculación de cursos de formación continua internacionales en educación ofertados por la UAA; una de las variables importantes al hablar de la diversidad de género, en términos tanto de acceso como de inclusión, haciendo que la condición por sexo no sea restrictiva. Asimismo de estudiantes que en su mayoría según su situación laboral trabajan, trabajar constituye la fuente principal para la financiación de sus estudios, y que tienen además dependientes a su cargo. Y que por tanto, aun con estas limitaciones, y las que se detallan en (c), sin embargo de manera individual continúan con su formación académica. Por su parte, en referencia al sub apartado (c) Datos Sociodemográficos, considerando el sub ítem de los Datos Parentales, a través del perfil formativo (nivel de estudios más elevado), profesional (ocupación actual) se puede apreciar que tanto por los niveles de estudio de los progenitores como por la ocupación de los mismos, los estudiantes que desarrollan sus cursos de posgrados provienen en forma mayoritaria de hogares humildes, superando las condiciones socio-económicas y educativas-culturales de origen. Permitiendo una movilidad individual parcial en base al acceso e inclusión en procesos meritocráticos educativos-culturales. 266 Concluyendo Las desigualdades y diferencias sociales, reconocidas o no, individuales o estructurales, históricas o coyunturales, nos desafían a su consideración o no respecto al acceso también a la formación continua en el ámbito de los posgrados, sean especializaciones, maestrías o doctorados en el área de educación superior. La posibilidad del acceso a la formación continua, dentro de la diversidad con una mayoría femenina, de estudiantes que trabajan para costear sus estudios, y meritocráticamente, superando el nivel educativo de sus progenitores, garantiza la inclusión a muchos/as educadores/as que no pueden hacerlo en su país de residencia. Al tiempo que hace que la modalidad intensiva internacional se trasforme probadamente en una estrategia didácticopedagógica pertinente de acceso, diversidad y justicia social. Tal vez no sea la única, ni necesariamente la mejor, pero, emerge como una buena práctica institucional, con años de prueba, que ha permitido continuar de manera concreta el acceso a miles de estudiantes de posgrado brasileños a continuar con su formación acreditada en el área de educación para diversos fines a su retorno a sus estados de origen en su país. El énfasis en la aplicación de las pedagogías activas, y el e-learning, se han transformado en herramientas y estrategias adecuadas en el marco de una política educativa que garantiza un derecho humano fundamental, cual es, poder continuar con la formación docente más allá de los límites y restricciones en su país de origen. Sean estas, por condición de su capital educativo-cultural (requisitos de historial o trayectoria académica; exámenes de ingreso; cupos), u económico (costos; dependientes, etc.). Conocer datos centrales respecto la dimensión social del alumnado de cursos internacionales modalidad intensiva problematiza la condición social de origen de los mismos, así como su inclusión cuantitativa y su proceso meritocrático, considerando la educación y ocupación alcanzada por sus progenitores. Sin embargo, emerge la alerta pedagógica, como contracara, que el acceso sin examen de ingreso, y la condición socio-académica diversa entre el alumnado dentro de cada una de las secciones que cursan no pueden poner en riesgo la calidad la formación continua a la que ahora, más democráticamente, se accede. 267 Ese control de calidad, más allá de evaluaciones, acreditaciones, rituales y titulaciones, debe cuidar que el acceso no prime sobre la calidad y formación que, como criterio, a modo de espiral, vuelva a vincular el negocio de las universidades-empresas privadas que lucran también con los déficits formativos y restricciones al acceso a una educación crítica y de calidad. A la explotación económica de la miseria de las restricciones al acceso a la formación continua a vastos sectores de la población de graduados universitarios en Brasil, debe acompañarle una política educativa institucional que no se vanaglorie exclusivamente de este tipo de inclusión, del mero acceso cuantitativo de los/las profesores/as en formación. Al final, queda en abierto, de qué tipo de inclusión queremos y la que se realiza, y a qué estamos llamando de trayectoria académica meritocrática. Referencias bibliográficas Almada, C., Caballero, J., Duarte, B., y Gaona, K. (2019). Utilización de la Plataforma MOODLE como apoyo al proceso enseñanza – aprendizaje. Universidad Autónoma de Asunción (UAA), Universidad del Cono Sur de las Américas (UCSA) EN: Buenas Prácticas en Educación Superior. Monografies & Aproximacions (9). Caballero Merlo, J. N. (2018). La experiencia de innovación en formación docente en Educación Superior: el caso de la participación de la Universidad Autónoma de Asunción (UAA) en la Red TO-INN Programa Erasmus (2016-2019). RIICS: Revista Internacional de Investigaciones en Ciencias Sociales (UAA), 14(2), 169-184. Disponible en: http://revistacientifica.uaa.edu.py/index.php/riics; http://scielo.iics.una.py/cgi-bin/wxi Caballero Merlo, J. N. (2019). La dimensión social del alumnado que cursa formación continua en educación superior en Paraguay: el caso de estudiantes de posgrado en la Universidad Autónoma de Asunción (UAA). Revista de Sociología de la EducaciónRASE, 12 (2), 176-190. http://dx.doi.org/10.7203/RASE.12.2.14653. Caballero Merlo, J. N. (2019a). Dimensión Social. Universidad Autónoma de Asunción (Paraguay). En: Montané, A. & Calduch, I. Dimensión social. Datos sociodemográficos, datos universitarios, ámbito motivacional, vida y participación académica y social de los estudiantes de Educación. Monografies & Aproximacions, nº 13. Institut de Creativitat i Innovacions Educatives de la Universitat de València. Caballero, J., y Báez, B. (2019). Universidad Autónoma de Asunción (UAA). Paraguay. En: Caracterización y análisis de los modelos de formación permanente en universidades de Bolivia, Paraguay y Ecuador. Monografies & AproximacionEs(10). 268 Caballero, J., Gaona, K. F., y Martin, G. M. (2018). Educación superior y formación del profesorado. Universidad Autónoma de Asunción. Disponible en https://www.toinn.org/wp-content/uploads/2018/06/proyecto-to-inn-educacionsuperior-y-formacion-del-profesorado.pdf Montané, L. A. (Coordinadora). (2018). Educación superior y formación del profesorado: Gobernanza y política, dimensión social, pertinencia curricular e innovación docente. Disponible en: https://www.toinn.org/wp-content/uploads/2018/06/proyecto-to-inneducacion-superior-y-formacion-del-profesorado.pdf Montané, L. A. & Antúnez, A. (Editores). (2019). Política y Gobernanza en las Instituciones de Educación Superior de Formación Docente. Monografies & Aproximacions, nº 15. Institut de Creativitat i Innovacions Educatives de la Universitat de València. Montané, L. A. & José Luis Medina Moya, J. L. (Editores). (2019). La pertinencia curricular y social en las instituciones de educación superior. Monografies & Aproximacions, nº 16. Institut de Creativitat i Innovacions Educatives de la Universitat de València. UAA. (2019). Universidad Autónoma de Asunción. Disponible en: www.uaa.edu.py UNESCO (2009). Conferencia Mundial sobre la Educación Superior- 2009: La nueva dinámica de la educación superior y la investigación para el cambio social y el desarrollo. Disponible en: http://www.unesco.org/education/WCHE2009/comunicado_es.pdf TO-INN. From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions. (2018a). Tarea 3. Dimensión: Identificación de las mejores prácticas de Innovación docente y publicación en la plataforma TO INN. Análisis y difusión de metodologías de enseñanza innovadoras para la formación inicial del profesorado. Universitat de Barcelona, Facultat d’Educació, Passeig de Vall d’Hebron 171, 08035 Barcelona. Documento interno PDF. TO INN. (2018b). From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions. Disponible en: https://www.toinn.org/ Universidad Autónoma de Asunción (UAA). (2020). Requisitos de Admisión para los Programas de Postgrado. Disponible en: https://www.uaa.edu.py/postgradoUAA Universidad Autónoma de Asunción (UAA). (2020). Maestría en Ciencias de la Educación. Disponible en: www.uaa.edu.py/carreras/maestria-cienicas-educacion Universidad Autónoma de Asunción (UAA). (2020). Postdoctorado en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una Sociedad Inclusiva. Disponible en: https://www.uaa.edu.py/carreras/postdoctorado-liderazgo-educativa-sociedad-inclusiva Universidad Autónoma de Asunción (UAA). (2020). Doctorado en Ciencias de la Educación. Disponible en: www.uaa.edu.py/carreras/doctorado-ciencias-educacion 269 14.A AUTOPERCEÇÃO DA CONSTRUÇÃO DA PROFISSIONALIDADE DOCENTE NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES Elsa Ribeiro-Silva434445PhD, Catarina Amorim46, M.Ed & José Luis Aparicio Herguedas47, PhD Resumo A formação inicial desempenha um papel significativo na construção da identidade profissional docente, permitindo a reflexão e a análise crítica de diversas representações sociais historicamente construídas acerca da profissão (Guimarães, 2004), com relevância para o estágio profissional que, promovendo a presença do estagiário no cotidiano da escola, abre espaço para a realidade e para o trabalho do professor na sociedade (Lima e Pimenta, 2005/6). Estudámos a perceção dos estagiários sobre o respetivo nível de desempenho docente numa fase intermédia do Estágio Pedagógico no sentido de, enquanto formadores, podermos incrementar o potencial formativo deste exercício de autoavaliação. Analisámos, por critério semântico (Bardin, 2011) e com categorias previamente estabelecidas, o conteúdo de 46 relatórios de autoavaliação intermédia, de estagiários de Educação Física, optando-se pelo ATLAS.ti 8.4 na análise qualitativa dos dados. Os resultados revelam que, na maioria dos indivíduos, a autoavaliação não foi produto de uma reflexão aprofundada sobre o seu agir, resultando em discursos reduzidos, sem conteúdo e essencialmente de autoelogio, tendo sido poucas as aprendizagens ainda por desenvolver assumidas pelos indivíduos. Entendendo-se a autoavaliação como decisiva na construção da profissionalidade docente, estes resultados revelam a necessidade de uma maior atenção àquela forma de avaliação na formação inicial de professores. Palavras-chave: Autoavaliação. Formação inicial. Profissionalidade Docente. Estagiários. Educação Física. 43 1 Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física, Universidade de Coimbra Centro de Investigação do Desporto e da Atividade Física 45 3 Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX 46 1 Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física, Universidade de Coimbra 47 4 Universidade de Valladolid 44 2 270 Introdução A avaliação faz parte do nosso dia-a-dia, a maior parte das vezes sem que tenhamos consciência disso, estendendo-se a inúmeros domínios da nossa intervenção. No âmbito educativo, a forma como os alunos veem a avaliação e a importância que lhe atribuem, tem implicações no modo como se posicionam nas suas aprendizagens, sendo normalmente entendida como o fim de um processo, onde o esforço é dirigido para a obtenção dos melhores resultados e não das melhores aprendizagens (Vieira et al, 2013). Assim sendo, a avaliação pode ser realizada com diferentes objetivos, sendo que, quando tratamos da formação inicial de professores, aquela só faz sentido enquanto instrumento de aprendizagem e como um dos meios mais importantes de autorregulação das aprendizagens, devendo, como defende LópezPastor (2009), ser dirigida para a melhoria da ação do (futuro) professor. Através da autorregulação será possível ao aluno desenvolver uma aprendizagem autónoma e proativa onde, a partir da mobilização das suas características pessoais e das suas emoções, motivações e cognições, será capaz de desenvolver estratégias assertivas que, por sua vez, maximizarão a própria aprendizagem (Zimmermann, Flavier e Méard, 2012). A avaliação formativa, tendo como principal propósito a melhoria das aprendizagens (Fernandes, 2008; Pérez-Pueyo, Julián e Pastor, 2009), deverá implicar a participação dos alunos no seu processo, nomeadamente pela autoavaliação, entendida esta como um processo de reconhecimento da importância de descobrir os valores implícitos que dirigem e condicionam todas as nossas ações no mundo, autorregulando-se a partir de critérios éticos emergentes e reconhecendo as próprias limitações, convidando à reflexão sobre si mesmo e sobre a responsabilidade que temos no nosso desempenho diário (Moreno, Trigueros e Rivera, 2013). Assim sendo, para que esta alcance a plenitude do seu valor deverá ser ensinada e exercitada. De acordo com Black e William (2003), apesar da autoavaliação já se manifestar em cada indivíduo de forma espontânea, a aprendizagem não deve descurar o seu aperfeiçoamento através de um processo que requer tempo, prática e intencionalidade. A este propósito, Moreno et al (2013) concluíram, num estudo sobre as emoções vividas e experimentadas por estudantes do ensino superior no processo de autoavaliação, que a complexidade autoavaliativa foi ali efetivamente vivida e experimentada em resultado da liberdade dada aos estudantes para tomarem decisões de forma autónoma, tendo assumido que este processo não foi isento de erros, mas que estes foram uma das fontes mais importantes da aprendizagem, permitindo aos alunos gerarem as suas perguntas e autodirigirem o próprio processo de aprendizagem. 271 Dentro da formação inicial de professores, o Estágio Pedagógico é, comummente, considerado um momento significativo na construção da profissionalidade docente dos futuros professores (Beauchamp e Thomas, 2009; Flores, 2020; Geng, Midford e Buckworth, 2016), a qual, embora multidimensional, polissémica e dinâmica, em muito depende da capacidade de ação e de reflexão do próprio formando (Frick, Carl e Beets, 2010). É partindo deste pressuposto que consideramos fundamental focar-nos na autoavaliação do estagiário e na sua capacidade em o fazer, entendida como parte integrante do seu processo formativo, já que apela à autorreflexão e ao posicionamento crítico relativamente à qualidade do trabalho produzido, ao conjunto de competências desenvolvidas e por desenvolver e à atitude ética mantida durante aquele desenvolvimento, mobilizando os resultados para a melhoria do seu processo formativo. A autoavaliação como processo de auto perceção de si enquanto pessoa (das suas crenças, valores, emoções, reações e caraterísticas) (Brown e Harris, 2013) e desse mesmo eu no desempenho da profissão, contribui de forma decisiva para a construção da identidade profissional do novo professor (Bourke, 2018), conscientes de que aquela é dinâmica e se irá construindo e reconstruindo ao longo da carreira profissional docente. A formação inicial é, como nos diz Flores (2020), um espaço onde os novos docentes constroem, desconstroem e reconstroem a sua perspetiva de ser professor, processo que consideramos manter-se para lá da profissionalização, assumindo outras caraterísticas, ou mesmo maturidade, ultrapassados os maiores “confrontos” dos estagiários entre o ser professor, que construiu enquanto aluno, e o professor que quer ser, percebido ao longo da formação inicial. Para Moreno et al (2013) as aprendizagens provenientes do processo de autoavaliação, ultrapassam o espaço e o tempo da aula para se converterem em aprendizagens para a vida, para o contexto de desempenho pessoal e profissional, dado que o processo de autoavaliação permite mobilizar os processos metacognitivos, possibilitando desta forma a construção das aprendizagens. Assim sendo, a autoavaliação implica um conjunto de tomadas de decisão do próprio e a sua responsabilização por elas, assumindo as consequências positivas e negativas que dali resultaram, impondo-se para tal que lhe seja dado espaço no processo de formação dos indivíduos, encarando-a como qualquer outro conteúdo de ensino-aprendizagem (Brown e Harris, 2013; Panadero e Alonso-Tapia, 2013; Yan, 2019). Foi com esta convicção que desenvolvemos esta experiência pedagógica, na qual propusemos aos estagiários em Educação Física da Universidade de Coimbra, do presente ano letivo (2019/2020) a autoavaliação do respetivo desempenho da função docente, focada 272 essencialmente na Área das Atividades de Ensino-Aprendizagem, na qual são avaliados em quatro grandes dimensões: Planeamento; Realização (Intervenção Pedagógica) e Avaliação do ensino e, ainda, Atitude Ético-Profissional. Atendendo à extensão dos relatórios daqui resultantes e consequente quantidade de dados, neste trabalho apenas nos focaremos na dimensão Realização/Intervenção Pedagógica. A opção por apenas esta Área justifica-se, não só, por ser a mais valorada de todas as outras que compõem o Estágio Pedagógico, mas também porque era aquela em que todos os estagiários tinham a mesma quantidade e natureza de trabalhos desenvolvidos quando lhes propusemos a realização da autoavaliação. Escolhemos o momento intermédio do Estágio com dois propósitos, o primeiro para coincidir com a avaliação intercalar da unidade curricular realizada pelos respetivos orientadores, permitindo, fora deste trabalho, a discussão dos resultados entre estagiários e orientadores, e o outro, para nos permitir continuar o processo de ensino-aprendizagem das competências autoavaliativas ao longo da segunda metade do ano letivo, apoiados nos resultados aqui obtidos. Esta experiência de autoavaliação foi orientada por um guião construído pelos docentes com base no referencial de avaliação da unidade curricular, estruturado nas quatro grandes dimensões atrás referidas, considerando, tal como Lamb, Lane e Aldous (2012), que a utilização deste tipo de documentos auxilia o estagiário no amadurecimento da compreensão conceitual da sua prática reflexiva. Foi solicitado aos estagiários que através de um exercício de reflexão aprofundada e crítica identificassem as competências que consideravam já terem desenvolvido e as ainda por desenvolver, concretizando e justificando as suas afirmações. Em virtude de este ser o primeiro momento de exercitação da autoavaliação por parte destes alunos e conscientes de que estávamos a amputar uma parte significativa das aprendizagens que esta forma de avaliação pode aportar, optámos por orientá-la apenas para a autoavaliação das competências e ainda não para a participação na construção do referencial de autoavaliação. Contudo, o referencial que serviu de base à construção do guião foi discutido, nos seus parâmetros, critérios e descritores, dentro de cada núcleo de estágio durante a primeira semana de trabalho nas escolas e posteriormente numa reunião plenária de estagiários, onde, por sua proposta, foram realizados alguns ajustamentos. Objetivos Este estudo integra um projeto de investigação de maior escala que tem o propósito de compreender de que forma é construída a identidade profissional docente durante o Estágio 273 Pedagógico de Educação Física, sendo que aqui nos focamos essencialmente na autoavaliação, considerando-a como uma experiência de formação. Assim sendo, o estudo tem por objetivo averiguar como os alunos estagiários entenderam a autoavaliação que realizaram na fase intermédia do Estágio Pedagógico, no sentido de, com base nestes resultados, podermos incrementar os seus conhecimentos sobre aquela forma de avaliação, fundamental na construção da sua profissionalidade docente. Metodologia Para desenvolvermos este estudo usámos uma metodologia qualitativa sob o paradigma construtivista (Creswell e Creswell, 2018). Recolhemos relatórios resultantes do exercício de autoavaliação dos estagiários, onde analisamos o seu conteúdo (Bardin, 2011) com categorias pré-definidas e coincidentes com as do guião de avaliação. Amostra Contámos com 46 relatórios de autoavaliação respeitantes ao mesmo número de estagiários, 28 do género masculino e 18 do género feminino, da Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física inscritos na unidade curricular de Estágio Pedagógico do Mestrado de Ensino de Educação Física nos Ensinos Básicos e Secundário, da Universidade de Coimbra, no ano letivo 2019/2020. Os autores dos relatórios apresentavam uma média de idades de 26 anos (DP 3,7 anos) e estavam colocados em escolas da zona centro do país, maioritariamente no distrito de Coimbra, mas também de Aveiro e da Marinha Grande. A participação foi voluntária, mas não anónima de forma a possibilitar, para além deste estudo, a análise e discussão dos resultados em conjunto com os respetivos orientadores. Todos os participantes assinaram um termo de consentimento informado, livre e esclarecido antes de iniciarem a autoavaliação. Instrumentos e procedimentos De acordo com o que afirmámos anteriormente, os dados obtidos reportam ao momento intermédio do Estágio Pedagógico, coincidente com a avaliação qualitativa formativa formal realizada pelos professores orientadores no final do primeiro semestre. Neste relatório os estagiários deveriam refletir, identificar e descrever as aprendizagens desenvolvidas e as por desenvolver até ao momento, nas várias áreas do Estágio Pedagógico. Como já justificámos, este estudo foca-se essencialmente nos discursos relativos à Intervenção Pedagógica, a qual se encontrava categorizada no guião da 274 autoavaliação em quatro grandes categorias e nove subcategorias, que constam no Quadro 1. Cada uma destas subcategorias estava acompanhada de um pequeno conjunto de descritores, os mesmos que já tinham sido discutidos entre todos os participantes no início do ano letivo, e cuja função era a de tornar inequívoca cada uma daquelas subcategorias, orientando os formandos numa reflexão que se pretendia crítica, objetiva e concreta. Quadro 1 - Identificação das categorias e subcategorias Categorias Subcategorias Informação inicial Instrução Condução da aula Feedback Conclusão da aula Gestão Clima/Disciplina Decisões de ajustamento Tempo Organização/Transição Controlo Comunicação Decisões de ajustamento Os dados foram coletados através de um relatório de autoavaliação, submetido na plataforma digital da Universidade de Coimbra, à qual todos os alunos tinham acesso. Cada relatório de autoavaliação foi analisado documentalmente, como documentos primários, utilizando o software ATLAS.ti (versão 8), realizando-se um trabalho de análise detalhada em cada um deles. A estratégia de codificação, seguindo Miles, Huberman e Saldaña (2014), foi realizada, num primeiro ciclo de codificação, através da aplicação de códigos descritivos (subcategorias iniciais), tomando decisões sobre a seleção das unidades de análise e atendendo ao conteúdo das unidades escolhidas a partir de uma perspetiva semântica (Bardin, 2011). Seguidamente, num segundo ciclo de codificação, os códigos inicialmente aplicados foram revistos, atendendo ao seu significado com base nas evidências de partida. Desta forma, constitui-se uma constante relação circular entre os códigos aplicados durante os dois ciclos de codificação, refinando-se conceitos e identificando-se as suas características, dimensões, propriedades e relações (Corbin e Strauss, 2015) vinculadas às categorias iniciais, para inferir, posteriormente, construtos interpretativos de maior nível (Taylor e Bodgan, 2000). 275 Para abordar os aspetos de credibilidade da investigação, em relação às dificuldades interpretativas do objeto de estudo, seguindo Creswell e Creswell (2018), foi realizado um debate constante entre os investigadores, alcançando acordos com base na discussão sobre a interpretação dos discursos dos alunos e a sua respetiva codificação e categorização. O feedback constante dos investigadores para chegar a um acordo sobre a interpretação dos códigos e categorias apoiou a credibilidade, a viabilidade e a transferência do estudo (Watling, Neal, VanDyke e Kornbluh, 2015). Atingiu-se a saturação dos dados, no momento em que as comparações entre os dados deixaram de evidenciar novos relacionamentos e propriedades entre eles. Desta forma, a riqueza representativa dos dados foi considerada esgotada num processo analítico circular (Flick, 2007). Apresentação e discussão dos resultados Apesar de ter sido solicitado aos estagiários uma reflexão crítica e aprofundada sobre o seu desempenho e a justificação de cada uma das suas afirmações, percebemos que muitos se limitaram a mobilizar os descritores de cada subcategoria, que o próprio documento guia continha, resultando em discursos de curta extensão, de fraca reflexividade e pouco conteúdo, como se pode constatar pelo número relativamente reduzido de unidades de análise resultantes do tratamento de um total de 46 autoavaliações (Tabela 1). Tabela 1 - Frequências absolutas das subcategorias Aprendizagens realizadas Aprendizagens a desenvolver Clima/Disciplina - Controlo 75 Clima/Disciplina - Controlo 29 Decisões de ajustamento 53 Decisões de ajustamento 28 Instrução - Condução da aula 52 Instrução - Feedback 22 Gestão - Organização/transição 45 Instrução - Condução da aula 15 Gestão - Tempo 40 Gestão - Organização/transição 14 Instrução - Feedback 37 Gestão - Tempo 13 Instrução - Informação inicial 33 Instrução - Conclusão da aula 13 Clima/Disciplina - Comunicação 19 Clima/Disciplina - Comunicação 8 Instrução - Conclusão da aula 15 Instrução - Informação inicial 8 Total 369 Total 150 276 A preocupação na auto valoração (e, em muitos casos, na sobre valoração), levou a que os indivíduos se limitassem a copiar os descritores orientadores daquele processo avaliativo, previamente constantes na grelha de autoavaliação, confirmando a sua aprendizagem e adjetivando a própria prestação. Quanto à Tabela 1, onde, como já afirmámos, o número de unidades de análise se apresenta muito reduzido, podemos observar que as categorias surgem sequenciadas de forma idêntica nas aprendizagens realizadas e nas aprendizagens a desenvolver, sendo evidente em relação a estas últimas uma significativa redução do número de unidades de análise, permitindo-nos aferir que os estagiários, apesar de não o terem concretizado, consideram que lhes falta aprender muito menos (150 entradas) do que já aprenderam até ao momento (369 entradas). Iremos apresentar os resultados analisando concomitantemente as aprendizagens realizadas e as aprendizagens a desenvolver, começando pelas categorias com maior número de frequência absoluta. Aprendizagens realizadas versus aprendizagens a desenvolver De acordo com a análise dos poucos discursos que concretizaram algumas ideias e seguindo a ordem decrescente de representatividade das categorias, pudemos perceber que as aprendizagens mais desenvolvidas até ao momento intermédio do Estágio Pedagógico referem-se à dimensão disciplina e, dentro desta, especificamente ao controlo da turma e à atitude dos estagiários face aos comportamentos de indisciplina, associando estas aprendizagens ao bom clima relacional que conseguiram estabelecer entre aluno-professor e aluno-aluno. Por outro lado, revelam que usaram estratégias de gestão em favor da disciplina, nomeadamente a opção por pausas de curta duração entre os exercícios práticos e a intervenção sistemática na ação dos alunos, como formas de evitarem comportamentos fora da tarefa e de desvio. Vários estagiários avançam que a atitude mais importante de combate à indisciplina é a atitude preventiva do professor e que foi esta a sua opção. “… consigo perceber perfeitamente quando um aluno merece ir “sentar e pensar no assunto” assim como sei quando intervir de forma calma e serena para chegar ao problema de forma adulta. De uma forma geral, consigo ter sempre uma aula com um clima positivo e saudável, sabendo controlar os alunos mais mal comportados que, de alguma forma, influenciam os restantes.” (Estagiário PC, 24) anos) 277 No entanto, quando analisamos as aprendizagens por conseguir, verificamos que são também vários os que afirmam que por vezes têm de adotar posturas mais rígidas e assertivas para conseguirem controlar a turma e evitar comportamentos de indisciplina, reconhecendo que em algumas situações ainda têm dificuldade em marcar a sua autoridade, expressando a necessidade de a imporem (ainda) mais e de punir de forma mais frequente e veemente, os comportamentos de desvio. “Em certos momentos da aula, necessito adotar uma postura mais rígida não permitindo situações de comportamento fora da tarefa (conversas paralelas) que afetam negativamente a aula (dimensão disciplina).” (Estagiária AC, 25 anos) Há, pois, aqui uma contradição entre o afirmado nas aprendizagens conseguidas e o que afirmam nas aprendizagens por conseguir, dado que as estratégias punitivas, que aqui propõem como solução para o controlo disciplinar, não se coadunam com a intervenção preventiva que anteriormente afirmaram ter sido a sua opção. Outra das competências que os estagiários consideraram já ter desenvolvido foi a de conseguirem motivar os alunos para o empenhamento motor durante as aulas, através do reforço positivo do seu comportamento, contribuindo isto, de acordo com as suas afirmações, para a otimização do processo de ensino-aprendizagem. Também a capacidade de criarem e implementarem rotinas e hábitos de trabalho foi por eles considerado como muito positivo para a manutenção de bom clima. “Sou capaz de motivar os alunos para os exercícios da aula o que mantém o seu empenho durante toda a aula e otimiza o processo de aprendizagem.” (Estagiário LM, 25 anos) “Consigo ter um bom controlo da turma e desenvolver uma boa relação entre todos os intervenientes (professor-alunos e aluno-aluno), o que ajuda na criação de um bom clima de aprendizagem.” (Estagiária AC, 24 anos) Por outro lado, nas aprendizagens por conseguir afirmam que pretendem desenvolver e melhorar aprendizagens que lhes permitam encontrar um ponto de equilíbrio entre o controlo disciplinar da turma, o bom ambiente da aula e da relação professor-aluno e a sua capacidade de ensinar. Daqui podemos perceber que, para além de não revelarem o que pretendem fazer para alcançar aquele equilíbrio, também ainda não conseguiram libertar-se da preocupação com o controlo disciplinar dos seus alunos. 278 "Como ainda existem alguns alunos que precisam de ser chamados à atenção na instrução e nos momentos de prática, penso que tenho que arranjar outras estratégias para que melhorem a atenção e os comportamentos.” (Estagiária MS, 25 anos) Por aqui constatamos que o seu foco recai, quase exclusivamente, nas dimensões de intervenção pedagógica de clima e disciplina, ou seja, em manter um relacionamento pedagógico positivo com os alunos, na tentativa de através deste conseguirem ter o controlo disciplinar da turma, ficando o compromisso com as aprendizagens dos seus alunos praticamente de fora desta preocupação. Passando para as decisões de ajustamento, os estagiários afirmam ter adquirido a capacidade de ajustar os objetivos da aula de acordo com as dificuldades observadas nos alunos, as especificidades da turma e o contexto. Afirmam que, perante situações imprevistas, revelam a capacidade de se adaptar integrando esse ajustamento no plano de aula previsto, sem perder de vista os objetivos propostos. Alguns estagiários reforçam ainda esta ideia afirmando que as suas decisões de ajustamento têm sempre o objetivo de beneficiar a aprendizagens dos seus alunos. “Sei perfeitamente quando necessito de ajustar as tarefas à especificidade da aula, dos alunos e, principalmente, ao contexto.” (Estagiária MA, 24 anos) “As U.D. são aplicadas e ajustadas através de decisões de ensino pedagógicas e didaticamente corretas, em função da especificidade da escola e dos alunos, e das condições reais do ensino.” (Estagiário BF, 26 anos) No entanto, os poucos que concretizaram algumas daquelas decisões referiram exclusivamente decisões no âmbito da gestão (espaços, tempo, alunos ou materiais) e quase sempre em resultado de alterações climatéricas que os obrigou a passar de um espaço exterior para um interior de menor dimensão. “Aprendi a criar um plano B para utilizar em casa de necessidade, isto é, quando existirem fatores externos à aula que não me permitam aplicar o plano A, nomeadamente quando chove. Sou capaz de reajustar o plano de aula, no entanto é um fator que posso e devo continuar a desenvolver.” (Estagiária CR, 24 anos) 279 “A necessidade de realizar decisões de ajustamento, relativamente às condições climatéricas, ou disposições de materiais deixadas por outros professores, foi algo que sempre ultrapassei com naturalidade.” (Estagiária MS, 24 anos) Tal como nas aprendizagens realizadas, também nas aprendizagens por desenvolver as decisões de ajustamento ocupam um lugar privilegiado. Apesar de antes afirmarem já terem desenvolvido competências que lhes permitiam ajustar os objetivos da aula de acordo com as dificuldades observadas nos alunos, as especificidades da turma e o contexto, reconhecem, no entanto, dificuldade em ajustar, com qualidade, as situações de ensino quando percebem que aquelas não estão a ter o efeito pretendido. Reportam também que pretendem melhorar a sua capacidade de antecipação de determinados imprevistos (como o número de alunos presentes na aula ou as condições climatéricas) tomando as melhores decisões respetivamente à adequação de determinada tarefa para o espaço de aula disponível e as dificuldades e necessidades dos alunos. Revelam, ainda, que pretendem vir a fazê-lo de forma mais rápida e autónoma contando com a ajuda do professor cooperante naquelas tomadas de decisão, na convicção de que estas melhorarão com a experiência de lecionação, a qual lhes permitirá, num futuro próximo, tomar decisões de ajustamento mais rápidas, adequadas e criativas, mesmo face a situações imprevistas e complexas. “O professor orientador tem ajudado em algumas decisões de ajustamento, tais como por vezes não ter espaço para dar aulas ou ter de alterar alguma coisa à última da hora. Penso que com a experiência de lecionação, posteriormente conseguirei melhorar esta capacidade de ser criativo, ajustando melhorar as decisões de ajustamento.” (Estagiário JS, 25 anos) Em suma, alguns estagiários estão conscientes da necessidade de melhorar a capacidade em ajustar o seu ensino face a imprevistos e ambicionam desenvolver estratégias que os auxilie a serem “excecionalmente” reflexivos e críticos a fim de tomarem decisões oportunas em função dos alunos, mas o único recurso que preveem utilizar é a ajuda do respetivo orientador. Nenhum estagiário refletiu sobre a possibilidade de realizar uma pesquisa bibliográfica, uma ação de formação, um evento científico ou outra qualquer forma de autoformação. Passando para a condução da aula, os futuros professores afirmam apresentarem os conteúdos de forma ajustada ao nível dos alunos, usando uma instrução clara e objetiva, acompanhada da subsequente demonstração, a qual era normalmente realizada pelos alunos 280 melhor executantes, considerando esta uma forma de os integrar no próprio processo de aprendizagem. “Organizo corretamente a atividade no espaço da aula de modo a permitir um posicionamento e circulação que me garantam a perceção global e o controlo eficaz das diversas situações, detetando e prevendo as situações de risco.” (Estagiário DB, 25 anos) “Durante a instrução das tarefas, realizo, ou peço a um aluno para realizar a demonstração das tarefas, de forma a fazer com que a instrução chegue ao aluno de forma mais clara.” (Estagiária CR, 26 anos) Também afirmam que, nas suas aulas, adotam um posicionamento e uma circulação corretos, conseguindo com isto controlar eficazmente a turma e prevenir situações de indisciplina, o que já vimos não estar a acontecer, pelo menos de forma plena, já que os próprios revelaram que por vezes têm de adotar posturas mais rígidas e assertivas para conseguirem aquele controlo e evitar aqueles mesmos comportamentos. “Na condução da aula, círculo corretamente pelo espaço de forma o observar todos os alunos e a facilitar a transmissão de feedbacks e controlo disciplinar.” (Estagiário MS, 24 anos) Por último quanto à dimensão instrução, as suas referências ficam-se apenas pelo feedback afirmando que este já faz parte da sua prática pedagógica corrente, emitindo-os com frequência e qualidade. “Tenho uma boa capacidade de dirigir feedback frequentemente e pertinente, direcionado tanto individualmente como coletivamente.” (Estagiário JS, 25 anos) “Utilizo sistematicamente o feedback dos tipos positivos, descritos, prescritivos, interrogativos e de reforço na minha intervenção pedagógica de forma compreensível com eficácia e pertinência.” (Estagiária AP, 24 anos) Simultaneamente também afirmam que necessitam de aumentar a qualidade daquele, melhorando a sua especificidade e ajustamento à matéria abordada e, principalmente, conseguirem encerrar os seus ciclos. “Fornecer feedback mais detalhado, ou seja, ir mais ao pormenor e ao essencial de cada conteúdo que está a ser abordado.” (Estagiária AC, 25 anos) 281 “Melhorar a parte do conhecimento das matérias de forma profunda porque, por vezes, sinto dificuldade em fornecer feedback em algumas disciplinas por não conhecer, de forma aprofundada, a matéria em causa.” (Estagiária MA, 24 anos) Em suma, estes resultados revelam uma capacidade de análise crítica e reflexiva muito incipiente, principalmente em relação às competências ainda por desenvolver, tendo sido raros os que assumiram e expressaram de forma clara as dificuldades que ainda sentem, assim como o trajeto já percorrido na sua aprendizagem e as decisões ou estratégias em perspetiva para a aquisição daquelas competências. Esta atitude dos estagiários pode também significar que têm uma opinião muito alta sobre os seus valores, o que vem ao encontro dos resultados de Szczepański (2012) que concluiu que a autoperceção e a autopromoção são fatores que desempenham um papel muito forte no que diz respeito à autoconsciência. Como já afirmámos, a maioria limitou-se a mobilizar os descritores que tinham sido incluídos no documento guia, apenas para sua orientação no processo autoavaliativo, colocando-os na coluna das competências já desenvolvidas ou por desenvolver, de acordo com o entendimento que tinham das suas aquisições em cada uma das categorias e subcategorias. Tal fez com que houvesse uma transformação de um documento aberto de análise qualitativa do desempenho numa checklist onde que se limitaram a assinalar o que já tinham aprendido e o que ainda estava por aprender, sendo ainda que, na sua opinião, poucas são as competências que lhes restam desenvolver. Estes resultados são apoiados por Vieira et al (2013) quando afirmam que os alunos associam a avaliação ao fim de um processo, esforçando-se por obter os melhores resultados em detrimento das melhores aprendizagens. Ficou evidente que uma parte significativa dos indivíduos tentou (de forma consciente ou não) usar este processo de autoavaliação para influenciar a imagem dos seus orientadores e, consequentemente, a respetiva classificação final do Estágio Pedagógico, estando ainda longe de a entenderem como uma das formas de participação dos alunos no seu processo de aprendizagem (Aparício, 2019). Conclusão Revisitando o objetivo principal deste estudo, que partiu da convicção de que a autoavaliação das aprendizagens não é inata, implicando o seu ensino teórico (Brown e Harris, 2013; Panadero e Alonso-Tapia, 2013), mas fundamentalmente experiencial, na formação inicial de professores, concluímos que muito há ainda a trabalhar com estes 282 estagiários quanto àquela forma de avaliação, de modo a conseguirmos atingir outros patamares de autonomia que aqui ainda não foram tentados. A sua tendência para o autoelogio e para a mera mobilização de informação préexistente, são amplamente reveladores, como Moreno et al (2013) nos dão conta, da complexidade do processo autoavaliativo e de que estes estagiários ainda não conseguem fazer uso da liberdade para tomarem decisões de forma autónoma, não percebendo a autoavaliação como uma das fontes mais importantes da aprendizagem. É fundamental fomentar nos estagiários a capacidade de reflexão crítica focada no questionamento das suas rotinas e práticas. Esta capacidade de reflexão define uma prudência ética docente, assim como se torna um ponto fundamental da profissionalidade (Batista, 2019). Segundo Harford e MacRuairc (2008) as abordagens que incorporem a autorreflexão, ainda que estruturada e prescritiva, podem contribuir para que os estagiários desenvolvam a compreensão da natureza da prática reflexiva. Oportunidades de autorreflexão podem (e a nosso ver, devem) ser proporcionadas desde o primeiro momento do Estágio Pedagógico, pelos professores cooperantes e professores orientadores de forma a facilitar o diálogo. Antes de terminarmos, importa relembrar que as aprendizagens conseguidas e por conseguir reveladas pelos indivíduos na fase intermédia do Estágio Pedagógico, surgem estudadas e justificadas em trabalhos de inúmeros autores (com Daryl Siedentop (1991) e Maurice Piéron (1986) como expoentes máximos no âmbito da Educação Física e Desporto), não estando, portanto, o foco deste estudo no nível qualitativo da intervenção pedagógica dos indivíduos, mas exclusivamente na sua competência de autoavaliação em relação ao já conseguido, mas principalmente, ao que ainda lhes falta dominar e às formas como o preveem fazer. Assim, e indo ao encontro de Black e William (2003) quando afirmam que a aprendizagem da autoavaliação não deve descurar o seu aperfeiçoamento através de um processo que requer tempo, prática e intencionalidade, consideramos estes resultados fundamentais na orientação do processo de ensino na formação inicial de professores. Referências bibliográficas Aparício, J.L. (2019). Las Formación de Competencias Transversales Docentes en la Formación Inicial del Profesorado de Educación Física (Tese de Doutoramento). Universidad de Valladolid, Valladolid. p. 180 Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. Lisboa. Edições 70 283 Batista, I. (2019). Ética, conhecimento profissional e formação docente. In Fraga, N. (Ed.), O Professor do Século XXI em Perspetiva Comparada: Transformações e Desafios para a construção de sociedades sustentáveis. Atas da II Conferência Internacional de Educação Comparada Sociedade Portuguesa de Ciências de Educação Secção de Educação Comparada. ISBN 978-989-54390-2-7 Beauchamp, C., e Thomas, L. (2009). Understanding teacher identity: an overview of issues in the literature and implications for teacher education. Cambridge Journal of Education, 39(2), 175–189. doi: 10.1080/03057640902902252 Black, P. e Wiliam, D. (2003). ‘In Praise of Educational Research’: formative assessment. British Educational Research Journal, 29(5), 623-637 Bourke, R. (2018). Self-assessment to incite learning in higher education: developing ontological awareness. Assessment and Evaluation in Higher Education, 43(5), 827– 839. doi: 10.1080/02602938.2017.1411881 Brown, G. T. L., e Harris, L. R. (2013). Student self-assessment. In J. H. McMillan (Ed.), The SAGE handbook of research on classroom assessment (pp. 367–393). Thousand Oaks, CA: Sage. ISBN: 978-1-4129-9587-0 Corbin, J., e Strauss, A. (2015). Basics of Qualitative Research: Techniques and Procedures for Developing Grounded Theory (4th edition). Sage Publications. ISBN: 978-1-41299746-1 Creswell, J., e Creswell, J. D. (2018). Research Design: Qualitative, Quantitative, and Mixed Methods Approaches. 5th Ed. Los Angeles: Sage Publications. ISBN: 978-1-50638670-6. pp. 45-51 Fernandes, D. (2008). Para uma teoria da avaliação no domínio das aprendizagens. Estudos em Avaliação Educacional, 19(41), 347-372 Flick, U. (2007). Managing quality in qualitative research. London: Sage. ISBN: 9780761949824 Flores, M. A. (2020). Feeling like a student but thinking like a teacher: a study of the development of professional identity in initial teacher education. Journal of Education for Teaching, 46(2), 145-158. doi: 10.1080/02607476.2020.1724659 Frick, L., Carl, A., e Beets, P. (2010). Reflection as learning about the self in context: Mentoring as catalyst for reflective development in pre-service teachers. South African Journal of Education, 30(3), 421–437. doi: 0.15700/saje.v30n3a363 Geng, G., Midford, R., e Buckworth, J. (2016). Comparing stress levels of graduate and undergraduate pre-service teachers following their teaching practicums. Australian Journal of Teacher Education, 41(9), 100–116. doi: 10.14221/ajte.2016v41n9.6 284 Guimarães, V. (2004). Formação de Professores: Saberes, Identidade e Profissão. Campinas: Papirus Harford, J. e MacRuairc, G. (2008). Engaging student teachers in meaningful reflective practice. Teaching and Teacher Education 24: 1884–1892 Lamb, P., Lane, K., e Aldous, D. (2012). Enhancing the spaces of reflection. European Physical Education Review, 19(1), 21–38. doi: 10.1177/1356336X12457293 Lima, M. S., e Pimenta, S. (2005/6). Estágio e Docência. Revista Poíesis, 3(3/4), 5-24 López-Pastor, V. (2009). Evaluación Formativa y Compartida en Educación Superior: propuestas, técnicas, instrumentos y experiencias. Madrid: Narcea, pp.19-20 Miles, M., Huberman, M., e Saldaña, J. (2014). Qualitative Data Analysis: A Methods Sourcebook. (3rd Edition). London: SAGE Publications. ISBN: 978-1-4522-5787-7 Moreno, A., Trigueros, C., e Rivera, E. (2013). Autoevaluación y Emociones en la Formación Inicial de Profesores de Educación Física. Estudios pedagógicos, 39(1), 165-177. doi: 10.4067/S0718-07052013000100010 Panadero, E., e Alonso-Tapia, J. (2013). Self-assessment: Theoretical and Practical Connotations. When it Happens, How is it Acquired and what to do to Develop it in our Students. Electronic Journal of Research in Education Psychology, 11(2), 551–576. doi: 10.14204/ejrep.30.12200 Pérez-Pueyo, Á., Julián, J. e Pastor, V. (2009). Evaluación Formativa y Compartida en el Espacio Europeo de Educación Superior (EEES). En López-Pastor, V. (Eds.), Evaluación Formativa y Compartida en Educación Superior. Madrid: Narcea, pp. 19-45 Piéron, M. (1986). Enseignement des activités physiques et sportives. Observation et recherche. Université de Liège, Liège Siedentop, D. (1991). Developing Teaching Skills in Physical Education. (3ª ed.). Palo Alto: Mayfield Publishing Company Szczepański, S. (2012). The Physical Education Teacher in Self and Peer Assessment. Journal of Physical Education & Health, 2(3), 13–29 Taylor, S., e Bodgan, R. (2000). Introducción a los métodos cualitativos de investigación. Barcelona: Pardos Vieira, F., Silva, J. L., Vilaça, T., Parente, C., Vieira, F., Almeida, M. J., Pereira, I., Solé, G., Varela, P., Gomes, A. e Silva, A. (2013). O papel da investigação na prática pedagógica dos mestrados em ensino. In B. Silva et al (Eds.), Atas do XII Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: University of Minho. pp. 2641-2655 285 Watling, J., Neal, Z., VanDyke, E., e Kornbluh, M. (2015). Expediting the Analysis of Qualitative Data in Evaluation: A Procedure for the Rapid Identification of Themes from Audio Recordings (RITA). American Journal of Evaluation, 36(1), 118-132 Yan, Z. (2019). Self-assessment in the process of self-regulated learning and its relationship with academic achievement. Assessment and Evaluation in Higher Education, 45(2), 224–238. doi: 10.1080/02602938.2019.1629390 Zimmermann, P., Flavier, É. e Méard, J. (2012). L’identité professionnelle des enseignants en formation initiale. Spiral-E. Revue de recherches en éducation, 49, 35-50. doi: 10.3406/spira.2012.1724 286 15.A PEDAGOGICAL INTERACTIVE PLATFORM FOR THE STUDY OF COMPOSITE PLATES Ana Filipa Mota48,49,50 & Amélia Loja51,52 Abstract In recent years, undergraduate and master's courses in engineering were object of an increased interest from students. In this area of knowledge, more specifically regarding the materials under development, composites stand out from the rest as they allow the properties of various materials to be combined in a single material, making them suitable for applications with specific requirements. In this sense, it is important at the design stage to carry out performance analysis of structures built from these materials. This being a requirement of the current job market, it is essential to prepare students of higher education courses for these challenges. Pedagogical platforms are a very useful tool in the learning process, allowing students to interactively explore different aspects of a given subject, as well as to assess their influence on the topic under study. Taking advantage of information and communication technologies and how they may allow contributing to a new dynamic to the classes, captivating the students, this work presents a pedagogical platform as a complement to the process teacher-student knowledge transmission. To this purpose, the various interfaces of the developed and implemented platform are exposed, illustrating their versatility and didactic character. Keywords: Engineering education. Pedagogical and interactive platform. Structural analysis. Composite plates. Finite element method Introduction Teaching can be classified as traditional, technology-based and technology-enhanced (Carbone, 2018), being the first one characterized by the face-to-face interaction between both intervenient, the teacher and the student, whereas technology-based teaching only involves the use of technology. The technology-enhanced teaching arises from the combination between 48 CIMOSM, ISEL, Centro de Investigação em Modelação e Optimização de Sistemas Multifuncionais, 1959007 Lisboa, Portugal 49 Universidade de Évora, 7000-671 Évora, Portugal 50 anafilipa.s.mota@gmail.com (Mechatronics Engineering PhD Student) 51 IDMEC, IST -Instituto Superior Técnico, Universidade de Lisboa, 1049-001 Lisboa, Portugal 52 amelialoja@uevora.pt (Invited Associate Professor) 287 the traditional and the technology-based ones and enhances the teaching-learning process. This method is a future trend in education, allowing a personalized learning process using adaptive didactic software without having to leave the classroom in the presence of a teacher. In fact, this tool has the function of complementing the teacher's activity, enabling to teach different reasoning levels' students by keeping everyone engaged and updated (Montandon et al., 2018). One of the main concerns of teachers is the quality of the teaching-learning process. It is believed that one of the reasons is related to traditional teaching methods, which may not be sufficient for a true understanding of classes’ concepts as teaching-learning methods have an inherent subjective perception component, thus varying from individual to individual (Deliktas, 2011). The low students’ performance in some subjects, which is often responsible for their dropout, can be fought by the integration of technological tools in teaching, being necessary for this purpose an educational change which involves an adaptation of the teachers and students roles to this integration (Gómez-Zermeño & Franco-Gutiérrez, 2018). Currently, information and communication technologies are constantly present in people's lives, including in their modes of communication and learning. Allowing for a faster dissemination of information, the inclusion of these technologies in the school environment must respond to the interests not only of the students, but of the entire school community. In this context, the learning platforms are very useful tools in the learning process. (Souza & Bianchini, 2019). In a survey with respect to the essential features in virtual didactic tools, the students highlighted interactivity, ease of use, motivation, and educational usefulness, placing the Interactive Virtual Platforms (IVP) at the top of interactivity. The interactivity was considered, by all interviewed, as a characteristic that promotes a better understanding of the contents allowing for a more amusing learning experience. Particularly regarding its usefulness in the study of materials science and engineering, students underlined the importance of IVPs contain as much information as possible about their contents. Keeping master classes and problem-solving classes using the blackboard on the top of the most important teaching approaches, most students consider visual resources as a helpful tool to complement the teacher's explanation in class. However, modernity plays an important role in attracting students’ interest, as they consider platforms as more attractive the more modern the technologies applied to them. In conclusion, the study refers the importance of the combined use of different virtual tools in the classroom, as they complement each other, mentioning also 288 Augmented Reality as the future trend for designing didactic virtual tools (Vergara, Lorenzo, & Rubio, 2017). Advances in the field of materials science have revolutionized several fields of engineering, giving relevance to teaching this field of science, since the knowledge acquired by students subsequently influences, in an industrial context, the quality of the design and development of components. Materials science is a basic course for a great part of engineering fields, encompassing different types of materials and relationships between their structures and properties at various scales. Thus, the structure, processing, properties, and performance of materials are fundamental elements in this science’ teaching. In our daily life we are faced with a wide variety of materials, such as metals, plastics, ceramics, and composites in general, which are under continuous evolution. Therefore, in order to contribute to technological development and innovation, students must be prepared to choose the appropriate materials for a given project, acquiring knowledge and skills through teaching as this choice must be based on the relationship between several factors, namely functionality, properties and structure (Ozturk, Deveci, Gunister & Simmons, 2017). Understanding fundamental concepts and basic principles has been a common difficulty in engineering and science students. Since the computer is often present as a resource of study, it is possible to use technology-based techniques and strategies to promote greater efficiency in the teaching-learning process. Using interactive and attractive means such as animations and simulations, key concepts' teaching that shows to be more challenging with regard to learning by the student can be amazingly improved (Deliktas, 2011). Dobrzañski and Honysz (Dobrzañski & Honysz, 2008) consider that computer-based tools represent relevant elements in the information society, since they can be used as scientific aids. In this sense, they developed a Virtual Materials Science Laboratory, an open source tool with scientific, didactic, and simulating competences (Dobrzañski, L.A; Honysz, 2008). In the context of mechanical engineering' teaching, Pons-Lelardeux et al. (Pons-Lelardeux, Galaup, Segonds, & Lagarrigue, 2015) showed that the students' machining tools skills improved through tools such as didactic games, emphasizing the importance of anticipating the transformations that new technologies appear in educational organizations. In fact, didactic platforms are a motivational element for the student, allowing them to explore a certain topic through different approaches, instead of feeling restricted by the content imposed by a specific curriculum planning (Silva & Loja, 2013). Allowing to incorporate, experiment and simulate problems of greater complexity and configured according to the user 289 specifications, the integration of symbolic resources in simulation platforms makes the learning process more flexible (Costa, Bernardo, & Loja, 2016). The integration of interactive resources in the introduction of engineering concepts has shown a growing trajectory over the last few years, with the results of student evaluations demonstrating that learning through the inclusion of these resources leads to better results. However, for a better effectiveness of the teaching-learning process it is important that the classic triangle of the education system - teacher, blackboard and chalk - is not replaced but complemented by technological resources (Deliktas, 2011). Being clear the important role of new technologies in the classroom, it is important to ensure their combination with pedagogical approaches and its suitability to the curricular requirements through the inclusion of contents that lead to the necessary acquire knowledge and skills. Also important is the assessment of how the introduction of new technologies in the teaching-learning process influences the role of the teacher and his interactivity with the students, as well as students’ performance (Montandon et al., 2018). Structural components such as plates, shells and beams, are elements that once interconnected among each other constitute structural systems, so the study of their behavior in different operating conditions is highly important, namely for engineers of the most diverse areas. This knowledge is fundamental for good and conforming designs. Hence, as common structural elements, the development and implementation of computational and simulation tools devoted to their analysis, may positively stimulate their understanding and the exploration of their behaviour for higher education students (Costa & Loja, 2016). There is a wide range of commercial software on the market for structural analysis based on the finite element method. The presented platform allows the study of composite plates with different material constituents, including advanced composite materials, such as functionally graded materials, also allowing the consideration of different porosity distributions. These characteristics, among others exposed next, combined with the pedagogical purpose, constitute a differentiation factor of this platform when compared to other existing commercial tools often used by students of Mechatronics, Aerospatiale and Aeronautics, Mechanics, Structural and Civil Engineering courses, to name the more immediate ones. Developed to play an auxiliary role in the teaching-learning process, this platform, dedicated to the study of composite plates of different compositions, has the potential to become a useful guided tool for students from different areas of engineering, both at the bachelor's and master's levels. 290 Being a recently developed platform, the next step will be to improve the platform including new composite materials constitutions, such as laminated ones, expanding functionally graded materials to different material and porosities distributions, and load and constraints conditions. Regarding its pedagogical character, it is intended to include more contents’ information to promote a better understanding of the concepts inherent to each topic covered. Once some of these objectives have been achieved, the platform will then be evaluated with students in order not only to obtain their feedback about different factors, but also to use this same feedback in order to make it more useful for students. Description The present work presents a computational platform, with a pedagogical concern, developed to the study of static behavior of composite plates through the finite element method (FEM), considering to this purpose different loads and constraints among other characteristics. This platform aims giving the user the opportunity to explore different material compositions, including, if desirable, the consideration of porosities distributions, viewing the respective materials properties distributions in a graphical mode. Furthermore, along the platform the user can explore some aspects regarding stages of the finite element method, being able to choose different types of finite elements and mesh discretizations. Concerning to shear deformation theories, the platform currently contains two theories available, a first order one and a higher order one. For loading and boundary conditions, several different situations are available. In the different separators and sub-separators the user will find some tips and information about the topics underlying them. Therefore, the platform allows the user to analyze the effects that different material constitutions, load conditions and constraints, and other parameterizations related to the finite element method have on the considered plates’ behaviour. Both equivalent single layer (ESL) and layerwise (LW) approaches are available, but due to the fact that the screens are similar, this work only presents the application of the first approach to the study of a composite plate. A more detailed description of the developed platform is presented next, covering in more detail the characteristics of the separators associated to the available graphical interfaces for exploring the different parameters involved in composite plates' studies. To this purpose, a case study involving a composite plate made of functionally graded materials reinforced with carbon nanotubes (CNTs) and considering the presence of a theoretical porosity' distribution, 291 is presented. In this static behaviour study, the plate is considered simply supported and under a uniformly distributed load. Considering the context of this article, the theoretical and mathematical formulations underlying the topics covered in the platform will not be presented. However, these are described in previous works by the authors (A. F. Mota & Loja, 2019; Ana F. Mota, Loja, Barbosa, & Rodrigues, 2020). Plate geometry separator: The study starts with the plate geometry configuration, which is defined in the separator shown in Figure 1. In this one, the user assigned a value to each geometric parameter – length, width, and thickness – and the respective aspect ratio is automatically presented, being this geometric parameter limited to values between 0 and 100. The color scale in the aspect ratio display pretends to give users information about the plate’s thickness classification, corresponding lower, medium, and higher ratios to thick, moderately thick, and thin plates, respectively. This separator contains an illustration of a typical plate’s geometry, in order to visually facilitate the association with the values assigned to each attribute. Figure 1. Plate geometry separator Materials properties separator: 292 Once the plate’ geometry is defined, one proceeds to the characterization of the plate regarding its material constitution. To this purpose, the separator illustrated in Figure 2 allows the user to specify the constituent materials' properties to be considered - Young's modulus, Poisson's ratio and density. The developed platform allows, in this domain, the consideration of a gradual and continuous evolution of material properties through the thickness, as the image referring to a biphasic FGM suggests, or, alternatively, the presence of a single phase by applying to both phases the same materials properties. Figure 2. Materials properties separator Additionally, the platform has the possibility to consider CNTs inclusions in phase B of the plate's material constitution. In this case, the “With CNTs” button must be activated, allowing the CNT panel to appear. In this panel, the user must fill the spaces with the appropriate information, material and geometric, about the CNTs to be considered as reinforcement Young's modulus, density, mass fraction, length, external diameter, and thickness. Porosities separator: Being able to constitute an advantageous or adverse consequence in the materials constitution, depending on the structural application for which they are intended, porosities frequently appear as a natural consequence of the manufacturing processes (A. F. Mota & Loja, 2019). 293 Thus, and since porosities promote a material’ resistance decrease, they should be considered in mechanical behaviour studies of structural components such as composite plates. In this regard, the developed platform contains a separator, presented in Figure 3, totally dedicated to this topic, in which the user is free to choose whether or not to include the contribution of the existence of porosities in the study to be carried out. When the user chooses to include the influence of porosities in the study, with the activation of the "Include Porosities Influence" button, the panel "Porosities Distribution Types" is displayed, allowing the user to choose between one of two different distributions illustrated - even or uneven - whose influence on material properties appears in the form of the respective mathematical expression. At the same time, the field to assign the porosity volume fraction value to be considered also appears in the separator, and the respective value introduced is then shown in a colored scale to illustrate the porosities level. To help the user, there are tips to guide him/her in the plate's material configuration concerning porosities distributions. Figure 3. Porosities separator: porosities distribution configuration Materials distribution separator: After plate’s configuration in terms of its geometry and material constitution, carried out on the three separators already presented, the separator in which the material distribution is 294 defined comes next, where an illustration of the material evolution in a biphasic FGM and the mathematical expression that rules the phase A volume fraction evolution through the thickness, are presented. By introducing the power law value to be assigned, the "Power-Law Index" display will give information about the influence of this parameter in the material distribution through a colored scale that pretends to enlighten the fact that higher power law indexes lead to a predominant presence of phase B. In this stage of the process, the effective material properties will be estimated, appearing in this separator relevant information about the evolution of the constituent material phases' volume fractions and of the plate’s Young's modulus through the plate thickness. This information is provided in a graphical form, representing these evolutions in order to the normalized thickness coordinate, z/h. Figure 4 illustrates the “Materials Distribution” separator with all its contents. Figure 4. Materials distribution separator FEM (Finite Element Method) separator: Continuing on the process of a composite plate’ static analysis, the "FEM" separator arises introducing the finite element method. This separator contains two sub-separators: one dedicated to the discretization of the plate in finite elements and, for this reason, called 295 "Mesh", and another, "Shear Deformation Theory", which, like its name denote, addresses different shear deformation theories. Presented in Figure 5, the “Mesh” sub-separator contains a panel dedicated to the element type, where the user can choose to discretize the plate into linear (Q4) or quadratic (Q9) quadrilateral finite elements, both belonging to the Lagrange family and illustrated in the panel. Then, the discretization to be applied to the plate is defined in the "Mesh Discretization" field, where different discretizations are available, namely from 44 to higher h-refinements (varying number of elements). After this, a 2D diagram of the plate will be presented according to the selection made, as well as the total number of elements and nodes to which it leads. In this way, the user can explore the influence of the element type and mesh discretization on the total number of elements and nodes, which in turn influence the analysis’ computational cost. This can be thought in terms of the total number of degrees of freedom of the discretized domain and/or the computational time required for the analysis. Figure 5. FEM separator: element type and mesh configuration In the sub-separator dedicated to the shear deformation theories, presented in Figure 6, the user can choose between a first order shear deformation theory (FSDT) or a higher order shear deformation theory (HSDT). The formulations of the respective displacement fields are 296 exposed, and the user will have access to more detailed information in this regard by clicking on the question mark button near each of the available theories. Figure 6. FEM separator: shear deformation theory Just like the separators presented before, the sub-separators included in the "FEM" separator also contain tips for user support. Loads and constraints separator: At this stage of the process, the plate under study is already configured in terms of geometry and constituent materials, its discretized model was also defined by a finite element mesh and the shear deformation theory to be considered has been chosen. Therefore, one needs now to characterize the load and constraint conditions to which the plate will be subjected. This configuration occurs in the "Loads and Constraints" separator presented in Figure 7. 297 Figure 7. Loads and constraints configuration This separator consists of two main sections, one related to the constraints and other dedicated to the load type and magnitude. Concerning to the constraints, there are four situations available, so the user can choose to consider the plate simply supported (SSSS) or fixed (CCCC) at all its edges, or clamped in one edge and free at the others (CFFF), or simply supported in two opposite edges and free at the remaining edges (SSFF). To assist the user, this section contains an image of the Cartesian reference considered and, when the type of constraint is selected, an illustrative scheme of the chosen situation is presented in order to familiarize the user with the symbology used in this context. Currently, the platform offers three different loading conditions: uniformly distributed transverse load, axially distributed load (similar to the load situation of a tensile test), and load condition corresponding to a three-point bending test. Each load condition can be visualized in the schemes included to this purpose, allowing the user to better interpret and understand each one. The pre-processing stage of FEM ends with this separator settings. From this point on the static analysis will be performed (analysis stage) and the processing of the obtained primary variables results can be processed (post-processing stage) for results’ presentation purposes. 298 Results separator: After all the necessary settings defined, in the “Results” separator, illustrated in Figure 8, the user will start the simulation process by clicking on the "Solve" button. By doing this the FEM analysis stage is performed. Regarding displacements (primary variables obtained directly from the Analysis stage), the results appear in the form of a 3D graph accompanied by the respective contour lines, showing the maximum transverse displacement value and its location on the plate. This separator contains a summary section, presenting some relevant information about the configurations applied to the study, namely about the geometry, finite element type, shear deformation theory, mesh discretization and total number of degrees of freedom, porosities distribution if considered, as well as the load conditions and constraints imposed. In case of choosing FSDT as shear deformation theory, the shear correction factor plays an important role in the study, so this separator also includes information about its value. The neutral surface, which generically distinguishes two sections of the plate, under compression or traction, doesn't always coincide with the geometrical medium surface when considering FGMs. For this reason, the neutral surface' shift value is also presented, accompanied by an image alluding to this fact, which aims to promote the comprehension of this concept and the distinction between neutral and mid-plane surfaces. 299 Figure 8. Study summary and results If the user intends to analyze the results on the plate's response regarding displacements in more detail, the option "Explore in independent figures" must be selected. In this case, two graphs will appear in independent figures, one with nodal displacements (Figure 9-a) and a second where this nodal displacements appear overlapped with the finite element mesh (Figure 9-b), allowing the user to explore the results in a more detailed way. (a) (b) Figure 9. Results separator: (a) independent figure with nodal displacements; (b) independent figure with nodal displacements and finite element mesh Conclusions  The platform here presented, constitutes an interactive and pedagogical tool to initiate and accompany the student in the study of the static behavior of composite materials, namely functionally graded materials, and allowing the consideration of reinforcement with carbon nanotubes and/or different porosity distributions. In addition to exposing the main aspects underlying the finite element method and the shear deformation theories, the platform also allows to simulate different load and constraints conditions.  The platform presented contributes to the introduction and understanding of the concepts inherent to the plate's modeling and simulation by the finite element method, by giving the possibility of exploring the influence of different configurations in the results. 300  All separators include user support tips and information on the topics covered in each of them, facilitating the platform use and promoting a better comprehension and exploration of the concepts.  The results are presented not only in a graphical form, illustrating the nodal displacements, but also numerically, which allows the user to have access to different and important information for the understanding of the influence of different parameterizations.  Since composite materials are a strong and very current trend and being plates a structural element widely studied in different engineering fields, the versatility of the developed platform, combined with the wide range of concepts it encompasses, demonstrates its potential as a complement to teaching-learning process.  Since it is a recently developed platform, its performance and impact assessment close to students has not yet been verified. This assessment is intended to be all-embracing, including students from different levels of Engineering education.  In the future, focus to the extension of the platform will be given, expanding its applicability to other types of analyses, to a greater diversity of composite materials, allowing the consideration of different distribution laws, in respect to FGMs, and new porosity distributions. Also, it is intended to increase the variety of load and constraints conditions available. References Carbone, D. J. (2018). Assessing Learning across Pedagogical Modalities and Learning Retrieval Conditions for College Learners in Introductory Psychology. Community College Journal of Research and Practice, 42(5), 340–349. https://doi.org/10.1080/10668926.2017.1310066 Costa, D. M. S., Bernardo, G. M. S., & Loja, M. A. R. (2016). A Symbolic Simulator Platform for the Static Analysis of Thin Plates. IJOE - International Journal of Online Engineering, 12(4), 10–13. Costa, D. M. S., & Loja, M. A. R. (2016). Mechanics of homogeneous and non-homogeneous thin plates: A symbolic simulation platform. Exp.at 2015 - 3rd Experiment International Conference: Online Experimentation, 286–290. https://doi.org/10.1109/EXPAT.2015.7463281 Deliktas, B. (2011). Computer technology for enhancing teaching and learning modules of engineering mechanics. Computer Applications in Engineering Education, 19(3), 421–432. 301 https://doi.org/10.1002/cae.20321 Dobrzañski, L.A; Honysz, R. (2008). Materials science virtual laboratory innovatory didactic tool in the teaching of material engineering performed by traditional and e-learning methods. Acta Mechanica et Automatica, 2(4), 5–10. Dobrzañski, L. A., & Honysz, R. (2008). The significance of multimedia didactic aids in the informative society. Archives of Materials Science and Engineering, 32(2), 117–120. Gómez-Zermeño, M., & Franco-Gutiérrez, H. (2018). The use of educational platforms as teaching resource in mathematics. Journal of Technology and Science Education, 8(1), 63–71. https://doi.org/10.3926/jotse.337 Montandon, L., Playfoot, J., Ghergulescu, I., Bratu, M., Bogusevschi, D., Rybarova, R., & Mawas, N. E. (2018). Multi-dimensional Approach for the Pedagogical Assessment in STEM Technology Enhanced Learning. In EdMedia: World Conference on Educational Media and Technology (pp. 378–383). Amsterdam. Mota, A. F., & Loja, M. A. R. (2019). Mechanical behavior of porous functionally graded nanocomposite materials. C - Journal of Carbon Research, 5(34), 1–21. https://doi.org/10.3390/c5020034 Mota, Ana F., Loja, M. A. R., Barbosa, J. I., & Rodrigues, J. A. (2020). Porous Functionally Graded Plates : An Assessment of the Influence of Shear Correction Factor on Static Behavior, 1–25. https://doi.org/10.3390/mca25020025 Ozturk, F., Deveci, T., Gunister, E., & Simmons, R. J. (2017). Innovative instructional strategies for teaching materials science in engineering. Materials Science and Engineering: Concepts, Methodologies, Tools, and Applications, 1–3, 1–19. https://doi.org/10.4018/978-15225-1798-6.ch001 Pons-Lelardeux, C., Galaup, M., Segonds, F., & Lagarrigue, P. (2015). Didactic study of a learning game to teach mechanical engineering. Procedia Engineering, 132, 242–250. https://doi.org/10.1016/j.proeng.2015.12.476 Silva, T. A. N., & Loja, M. A. R. (2013). An educational platform in structural mechanics. International Journal of Online Engineering, 9, 10–12. Souza, C. J. de, & Bianchini, L. G. B. (2019). Aprendizagem Por Meio De Plataformas: Concepção Dos Professores Sobre O Uso De Aplicativos Pedagógicos. Cadernos de Educação Tecnologia e Sociedade, 12(1), 63. https://doi.org/10.14571/brajets.v12.n1.63-71 Vergara, D., Lorenzo, M., & Rubio, M. (2017). Virtual Environments in Materials Science and Engineering: The Students’ Opinion. Materials Science and Engineering: Concepts, Methodologies, Tools, and Applications, 1–3, 1465–1483. https://doi.org/10.4018/978-15225-1798-6.ch059 302 16.DESIGN THINKING E METODOLOGIAS CRIATIVAS NO ENSINO SUPERIOR. ITINERÁRIO PEDAGÓGICO E INVESTIGATIVO COM PARTIDA NA SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA Rosalina Pisco Costa53, Beatriz Roque54 & Vanessa Carreira55 Resumo Este texto apresenta uma experiência pedagógica apoiada em Design Thinking e metodologias criativas, desenvolvida no ano letivo 2019/20, no contexto da unidade curricular “Sociologia da Infância”, disciplina optativa do curso de Sociologia na Universidade de Évora, Portugal. A disciplina foi estruturada em aulas teóricas e práticas, acompanhamento tutorial e soluções a distância. Os estudantes foram desafiados a desenvolver um exercício que permitisse expandir e aprofundar os conhecimentos de natureza teórico-conceptual discutidos nas aulas teóricas. As metodologias ativas foram específica e propositadamente desenhadas para desenvolver a capacidade de pensar criticamente os problemas apresentados, estimulando o debate e a imaginação sociológica. Inspirada pelo modelo Evolution & Design Thinking 6² da Mindshake (Tschimmel, 2018), foram organizadas aulas práticas e exploradas de forma particular as metodologias “mural de inspiração” (inspiration board), “declaração de intenções” (intent statement) e “agregação livre de ideias” (insight clustering). Este texto apresenta e detalha a implementação desse projeto pedagógico particular, atribuindo * Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto «UIDB/04647/2020» do CICS.NOVA – Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa / This work is financed by national funds through FCT - Foundation for Science and Technology, I.P., within the scope of the project «UIDB / 04647/2020» of CICS.NOVA - Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa. 53 Rosalina Pisco Costa é socióloga, professora auxiliar no Departamento de Sociologia, Escola de Ciências Sociais da Universidade de Évora e investigadora integrada no CICS.NOVA.UÉvora, Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais, Pólo de Évora. As suas áreas de investigação e publicação principais são a Sociologia da Família, Infância, Consumo, Vida Quotidiana e Metodologias Qualitativas, Sensoriais e Criativas de Investigação Social. 54 Beatriz Roque é estudante finalista do curso de licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora (201720). Em 2019/20 frequentou e concluiu com sucesso a unidade curricular optativa “Sociologia da Infância” [SOC2425L]. As áreas temáticas objeto do seu interesse são sobretudo Sexualidade e Género, Arte, Cultura e Comunicação, Sociologia da Saúde, Pobreza, Exclusão Social e Políticas Públicas e Famílias e Curso de Vida. 55 Vanessa Carreira é estudante finalista do curso de licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora (201720). Em 2019/20 frequentou e concluiu com sucesso a unidade curricular optativa “Sociologia da Infância” [SOC2425L]. As suas áreas de interesse principal são Famílias e Curso de vida, Sociologia da Saúde, Sociologia da Religião, Sexualidade e Género e Classes, Desigualdades e Políticas Públicas. 303 protagonismo e tornando mais visível a experiência dos principais atores envolvidos: professora e estudantes. No final, espera-se contribuir para discutir o lugar do Design Thinking e das metodologias criativas para motivar e envolver de maneira mais eficaz estudantes e professores na relação pedagógica e atividade de investigação em contexto universitário e, em última instância, pensar também os seus limites e desafios. Palavras-chave: Design thinking. Métodos criativos. Crianças. Escuro. Sociologia. 304 Introdução São muitas e diversas as vozes que um pouco por todo o mundo e nos mais diversos contextos têm chamado a atenção para a necessidade e urgência de repensar os curricula e as metodologias de ensino-aprendizagem no contexto de ensino superior56 (UNESCO, 2016). As alterações introduzidas em consequência de uma maior utilização das tecnologias de informação e comunicação e de uma generalizada viragem para o digital (Twenge, 2017) são porventura a face mais visível da mudança em curso. Não obstante, estudos recentes vêm também chamar a atenção para outras fontes de complexidade, nomeadamente as características que distinguem gerações entre si. Apesar do relativismo que se impõe na leitura e interpretação dessas teses, importa reconhecer o que parece ser uma tendência de mudança: as novas gerações de jovens parecem pensar de forma diferente e, consequentemente, aprendem de modo distinto (Törőcsik, Szűcs, & Kehl, 2014). Paralelamente, e como num jogo de espelhos, aquando do recrutamento, as entidades empregadoras parecem valorizar, cada vez mais, competências transversais, como a capacidade de pensar criativa e criticamente, tomar iniciativa e trabalhar de modo colaborativo (Zemke, Raines & Filipczak, 2013). Com este enquadramento de fundo e inspirada pela frequência de uma formação intensiva em Design Thinking Applied In Education, orientada por Katja Tschimmel57, decidi ensaiar estes princípios na minha prática docente. Em setembro de 2019, chamada a lecionar a unidade curricular “Sociologia da Infância”, uma unidade curricular optativa oferecida ao curso de licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora, julguei ser este o terreno fértil para tal ensaio. Por um lado, porque sabia de experiência anterior que um dos principais desafios desta UC é o de romper com o senso comum e ultrapassar a barreira epistemológica que condiciona a forma como os sujeitos que observam – estudantes, adultos-jovens – percecionam e conceptualizam os sujeitos observados – crianças. Por outro, porque a condição de disciplina optativa deixa usualmente à docência uma maior plasticidade na 56 À data em que ultimamos a revisão deste texto (junho de 2020), a pandemia gerada pelo vírus SARS-CoV2 trouxe a constatação (forçada) dos inúmeros (novos) desafios que se impõem neste domínio. Parcialmente já enfrentados no presente ano letivo, estes desafios confrontaram de forma direta e diversa as autoras do texto, inclusive nas dinâmicas geradas para a redação em coautoria a distância. Não obstante, o texto deixará de fora estas considerações, não porque as autoras não as reconheçam como especialmente importantes; antes porque se impõe respeitar o resumo oportunamente submetido e aceite em tempo “pré-COVID” para a Conferência Learning and Teaching in Higher Education “Students and Teachers”. 57 Esta formação foi promovida pelo IDeIA - Centro Transdisciplinar para a Investigação, Desenvolvimento e Inovação Aplicada da Universidade de Évora e decorreu no Colégio dos Leões, antiga Fábrica dos Leões, em Évora, entre os dias 11 e 13 de setembro de 2019. 305 orientação científico-pedagógica e, consequentemente, uma maior liberdade para imaginar criativamente soluções de ensino-aprendizagem que possam lidar com aqueloutro desafio. Com o objetivo último de fomentar o interesse e o envolvimento dos estudantes na disciplina e melhorar as aprendizagens alcançadas, no ano letivo 2019/20 foi implementada uma experiência de ensino-aprendizagem apoiada em Design Thinking na UC “Sociologia da Infância”. Esta unidade curricular tem como objetivo principal fornecer os instrumentos teóricos, conceptuais e metodológicos necessários à compreensão crítica, sociologicamente ancorada, da diversidade, relatividade e complexidade em torno da temática da criança e da infância na sociedade contemporânea. A disciplina foi estruturada em aulas teóricas e práticas, acompanhamento tutorial e soluções a distância. Os estudantes foram chamados a desenvolver um exercício que permitisse expandir e aprofundar os conhecimentos de natureza teórico-conceptual discutidos nas aulas teóricas. Metodologias ativas e criativas foram específica e propositadamente desenhadas para desenvolver a capacidade de pensar criticamente os problemas apresentados, estimulando o debate e a imaginação sociológica. Inspirada pelo modelo Evolution & Design Thinking 6² da Mindshake (Tschimmel, 2018), foram organizadas aulas práticas e exploradas de forma particular as metodologias “mural de inspiração” (inspiration board), “declaração de intenções” (intent statement) e “agregação livre de ideias” (insight clustering). Este texto apresenta e detalha a implementação desse projeto pedagógico particular, dando a voz e tornando mais visível a experiência dos principais atores envolvidos: professora e estudantes. Especificamente, contextualiza a metodologia proposta e ilustra o itinerário de pesquisa adotado por um grupo de estudantes empenhadas em investigar significados e representações em torno do escuro da noite na perspetiva das crianças (Roque & Carreira, 2020). O exercício empírico descrito serve, assim, de mote para discutir o lugar do Design Thinking e das metodologias criativas para motivar e envolver de maneira mais eficaz estudantes e professores na relação pedagógica em contexto universitário e, em última instância, pensar também os seus limites e desafios. 306 Pensar a transferibilidade do Design Thinking para a educação: possibilidades e potencialidades Design Thinking58 refere-se a um método e processo para investigar problemas abertos, mal definidos ou complexos, procurando novas perspetivas e soluções (Tschimmel et al., 2015). As fundações teórico-metodológicas do Design Thinking são amplas e diversificadas (Simon, 1969; Lawson, 1986; Rowe, 1987; Cross, Dorst, & Roozenburg, 1992; Eastman, Mccracken, & Newstetter, 2001). Para os propósitos deste texto socorremo-nos dos trabalhos de Katja Tschimmel, que em contexto português tem contribuído para dar mais visibilidade a esta metodologia, insistindo em particular na sua transferibilidade para diversos domínios, designadamente o da educação e formação. O Design Thinking aplica-se ao desenvolvimento criativo de processos, estratégias e programas e é transversal à recolha de informação, análise de conhecimento, aprofundamento de empatia, experimentação de novas perspetivas e ideias, visualização e prototipagem de novos conceitos, sempre com foco em resultados. Katja Tschimmel defende que o Design Thinking é uma atitude (mindset), um modelo para estruturar e focar um processo de design que pode ser usado na educação da mesma maneira que tem sido aplicado em processos de design de produtos e sistemas de serviço. Como refere: Design Thinking derives from the designers’ way of thinking, from their mindset and approach to work. It is a method that anyone can use. Design Thinking is founded on the ability to combine empathy for the context of a problem, creativity in generating ideas, insights and solutions, and rationality to analyse and match solutions to the context. Designers are at the same time analytical and empathic, rational and emotional, methodical and intuitive. (Tschimmel et al., 2016, p. 13) O argumento principal de transferibilidade para o domínio da educação radica no facto de o Design Thinking ser centrado no ser humano, é multidisciplinar e colaborativo, otimista e experimental (Tschimmel et al., 2015, p. 6). É um processo centrado no ser humano porque implica a compreensão das necessidades e motivações humanas. A empatia torna-se, assim, fundamental para repensar com êxito o sistema educacional e as metodologias de aprendizagem. É multidisciplinar e colaborativo porque na busca pela resolução de problemas e inovação envolve pessoas diferentes com conhecimentos específicos e papéis determinados no desenvolvimento de um projeto e na procura das melhores soluções. É otimista porque Tschimmel distingue entre design thinking (minúsculas) e Design Thinking (maiúsculas) para referir “1. “design thinking” as an academic construction of the professional designer’s practice and theoretical reflections, linking theory and practice from a design perspective and 2. “Design Thinking” as an organisational resource for innovation in business.” (Tschimmel, 2018, p. 4). 58 307 acredita na capacidade de todas as pessoas para, em conjunto, poderem criar novas soluções para resolver um problema, e que isto é relativamente independente do tamanho das equipas, tempo e disponibilidade orçamental. Por fim, experimental porque o Design Thinking se baseia na crença de que os erros constituem um input importante no processo iterativo de aprendizagem e melhoria. Deste ponto de vista, testes iniciais são realizados com o objetivo de forçar o surgimento de erros numa fase precoce do processo, procurando dessa forma encontrar melhores soluções sem gastar muito dinheiro. Trata-se, em suma, de “um processo de “«aprender fazendo»”, onde novas ideias são baseadas num processo de aprendizagem contínua com base no feedback adquirido.” (Tschimmel et al., 2015, p. 72). A transferibilidade defendida por Katja Tschimmel para o domínio da educação operacionaliza-se através da adaptação e aplicação do modelo Mindshake Design Thinking Model Evolution 6² (Tschimmel, 2018), desenvolvido pela autora entre 2012 e 2015, ano em que a última versão foi registada no Creative Commons sa-by (MINDSHAKE, 2020). Este modelo pode ser usado para orientar um processo de Design Thinking aplicado a várias áreas, inclui métodos de pesquisa quantitativos e qualitativos, apoia-se em dados primários e secundários, e está conectado com o pensamento visual e ferramentas diversas de criação de sentido. O modelo é designado de Evolution 6², o que a autora explica em três momentos. Primeiro, “Evolução”, porque o processo criativo é um processo em evolução permanente, iterativo e interativo, tanto ao nível de pessoas, como de situações (Fig. 1). 308 Fonte: Mindshake’s Innovation & Design Thinking Model Evolution 6² TEMPLATES. Figura 1 – Mindshake Design Thinking Model Evolution 6². A Figura 1 mostra o design gráfico escolhido para o modelo. Nele pode observar-se que cada E-fase está relacionada com as outras fases em ciclos iterativos. “E6”, porque o modelo é dividido em seis fases principais, todas elas a iniciar pela letra E, tanto na língua inglesa como na portuguesa: “Emergence” (Emergência), “Empathy” (Empatia), “Experimentation” (Experimentação), “Elaboration” (Elaboração), “Exposition” (Exposição) e “Extension” (Extensão) . Finalmente, “E6²” porque em cada fase do processo ocorrem momentos de “Exploration” (divergência) e “Evaluation” (convergência), elevando assim, metaforicamente, a potência do modelo ao quadrado. A fase de “Emergência” consiste na identificação de uma oportunidade e visa responder à questão “Qual é o desafio” ou “Como encontro um desafio ou uma oportunidade para inovar?” De facto, o processo E.6² começa com observação e pesquisa. Isso significa estar aberto para novos estímulos e ideias que podem levar à identificação de um novo desafio. O mesmo acontece olhando para as mudanças que ocorrem na cultura, negócios, tecnologia e 309 política, ou estudando tendências, de modo a identificar oportunidades de inovação. Esta fase compreende várias técnicas como a pesquisa nos media, a observação de tendências, a elaboração de mapas mentais de oportunidades de um mural de inspiração, a construção de uma matriz de tendências e a estabilização de uma declaração de intenções. A fase de “Empatia” pretende aprofundar o conhecimento em torno do contexto e responder à questão “Quem é o destinatário?”. Nesta fase do processo são mobilizadas ferramentas específicas que permitem recolher informação sobre os potenciais destinatários e compreender o contexto mais amplo. Para o efeito são utilizadas as técnicas de observação, entrevistas e construção de mapas diversificados, nomeadamente os das partes interessadas, mapas pessoais, mapas de viagem e outros mapas, considerados inspiradores. A fase de “Experimentação” desenvolve-se em torno da questão “Quais são as melhores ideias?” e destina-se, precisamente, a gerar e experimentar ideias, recorrendo para o efeito a técnicas várias de brainstorming (e.g. brainwriting/sketching, confrontações semânticas, analogias, cluster de ideias, matriz de avaliações e termómetro de ideias). Segue-se a fase de “Elaboração”, consistindo esta em trabalhar a ideia e transformá-la num conceito. Impõe-se, neste caso, responder à questão “Qual é o melhor conceito?” e procura-se, através da resposta obtida, desenvolver e materializar as ideias em conceitos que funcionem como soluções semânticas, aptas a serem testadas e melhoradas. Para este efeito percorre-se a área de trabalho e usam-se técnicas específicas como encenação, prototipagem rápida, testes de conceito, planta de serviço e visualização de um modelo de negócios. Na fase de “Exposição” procura-se responder à questão “Como é que eu comunico um novo conceito ou solução? O sucesso desta fase implica que os eventuais clientes possam entender “o que poderia ser” de maneira imediata e intuitiva. Por esta razão, nesta fase do processo aplicam-se técnicas narrativas e de visualização, contribuindo assim para criar uma apresentação atrativa e emocional (e.g. equacionando o recurso a formas diversas de storytelling, storyboarding e outras). A última fase do processo diz respeito à “Extensão”. Nesta fase a questão que se impõe é “Como posso implementar novas soluções e como posso melhorar e crescer?”. É então o momento de recorrer a técnicas estratégicas como o mapa de implementação ou matriz de peritos. 310 A elaboração e publicação de um toolkit associado a este modelo (Tschimmel et al., 2016; Tschimmel, 2018) compreende uma descrição detalhada e exemplificativa de todas as fases enunciadas, assim como de um conjunto de técnicas específicas de operacionalização (6 em cada fase). Esta componente torna o modelo bastante atrativo e passível de utilização em múltiplos contextos, como no desenvolvimento de projetos, workshops, sessões de coaching, projetos de investigação, aulas de metodologia, entre outros59. No domínio particular da sociologia, campo disciplinar em que as autoras se situam, os últimos anos têm assistido à generalização de um conjunto importante de metodologias consideradas inovadoras ou criativas em investigação social (Denzin & Lincoln, 2011; Kara, 2015; Mason, 2002; Mason & Dale, 2011). Estas metodologias cobrem um leque diversificado de técnicas e abordagens e são tributárias da experiência de pesquisa em equipas multi e interdisciplinares e da necessidade de responder à complexidade crescente das questões de investigação em ciências sociais (Kara, 2015). Por metodologias criativas entende-se um conjunto vasto de metodologias não necessariamente novas na história da investigação social. A adjetivação insiste no carácter processual das metodologias, e alude, sobremaneira, à criação de algo a partir de elementos que já existem, dispondo-os ou articulando-os em combinações diferentes tendo em vista a resolução de questões ou problemas específicos (Kara, 2015). Analisando-as mais de perto fica claro que muitas dessas metodologias se aproximam dos princípios e pressupostos do Design Thinking, embora nem sempre com relação direta a esta abordagem (Mäkelä et al., 2014). A secção que se segue explora de forma detalhada um ensaio de aplicação de algumas das técnicas do Design Thinking à metodologia criativa de investigação social e procura, no final, refletir criticamente sobre o seu alcance, potencialidades e limites. Discutir e investigar criativamente a criança e a infância: um itinerário pedagógico A unidade curricular “Sociologia da Infância” [SOC2425L] é uma disciplina optativa do curso de Sociologia na Universidade de Évora. A oferta desta unidade curricular tem como objetivo principal fornecer os instrumentos teóricos, conceptuais e metodológicos necessários à compreensão crítica, sociologicamente ancorada, da diversidade, relatividade e complexidade em torno da temática da criança e da infância na sociedade contemporânea. Especificamente, no final do semestre os estudantes devem ser capazes de: (i) caracterizar a criança como categoria social e a infância como estrutura geracional construída socio59 Os modelos contidos no toolkit podem ser descarregados a partir do Pinterest, em http://pin.it/ffhmFLI. 311 historicamente; (ii) apresentar criticamente o percurso teórico de emergência e consolidação da Sociologia da Infância; (iii) desenvolver os pressupostos epistemológicos, metodológicos e éticos subjacentes à investigação sociológica com crianças; (iv) discutir criticamente os principais eixos que enformam as culturas da infância; (v) analisar criticamente o lugar da criança como ator social no quadro dos vários constrangimentos e possibilidades estruturais; (vi) refletir de modo fundamentado sobre os principais temas que animam o debate sociológico neste domínio. A lecionação da unidade curricular pressupõe que sejam impulsionadas metodologias de estímulo ao desenvolvimento académico dos estudantes, assentes num trabalho de reflexão, questionamento crítico e análise contínua, devidamente orientados e enquadrados em sessões letivas e de orientação tutorial, tanto individual como de grupo. A proposta pedagógica para esta disciplina privilegia uma combinação entre métodos expositivos e ativos. O método expositivo materializa-se em sessões destinadas à apresentação das linhas de orientação teórica, analítica e metodológica da disciplina e de sistematização e problematização dos conteúdos programáticos, com recurso a meios audiovisuais e indicação de bibliografia geral e específica. As metodologias ativas compreendem sessões organizadas em torno da discussão coletiva de textos ou outros materiais de trabalho (e.g. visionamento de filmes, documentários, participação em conferências no âmbito dos temas tratados na disciplina, entre outros); leitura, apresentação e discussão crítica de textos selecionados em torno de autores, perspetivas e casos de aplicação empírica; e desenvolvimento, apresentação e discussão de exercícios desenvolvidos pelos estudantes de forma individual e/ou em pequeno grupo. De modo transversal, procurou-se também aplicar o método interrogativo, de estímulo à participação ativa dos estudantes no funcionamento da unidade curricular, com o objetivo de fomentar e desenvolver atitudes de problematização, raciocínio analítico, crítico e reflexivo sobre os temas tratados. No ano letivo 2019/20 foi proposto aos estudantes o desenvolvimento de um exercício empírico de leitura sociológica crítica e fundamentada de um tema/debate em torno da criança e da infância na contemporaneidade, selecionado livremente de entre os seguintes: as representações das crianças sobre o mundo que as rodeia: o trabalho, a segurança, o ambiente, os professores, os pais, os irmãos, a escola, a morte, a relação entre pares, …; os espaços que as crianças ocupam/vivem/habitam: a casa (divisões específicas – o quarto, a sala, a cozinha, …), a escola, os recreios, o ATL, o parque infantil & espaços menos evidentes ou expectáveis: o hospital, a prisão, a igreja, os funerais, a cidade, …; os tempos das crianças: 312 estudar, brincar, ver televisão, jogar, estar no computador, …; os ofícios das crianças, socialização, fruição e competição: trabalhar, ajudar os pais, ser aluno, desportista, artista, …; publicidade, imaginários e consumos: TV, imprensa, youtubers e influencers; Disneyficação e Mcdonaldização; indústrias da/para a infância; as culturas da infância: rotinas (dia-a-dia), rituais (aniversário, Natal, férias e outros dias ou momentos “especiais”, …), cultura de pares (infâncias digitais, culturas juvenis, …); e, as “outras” infâncias (diferentes, esquecidas, negligenciadas, invisíveis, …). Os objetivos específicos então traçados compreendiam: (i) sensibilizar os estudantes para a diversidade e complexidade da perspetiva sociológica sobre a infância; (ii) desenvolver competências ao nível dos pressupostos epistemológicos, metodológicos e éticos subjacentes à investigação sociológica com crianças; (iii) operacionalizar teorias e conceitos trabalhados no âmbito dos conteúdos programáticos da UC na análise de material empírico e situações concretas. Inspirada pelo Mindshake Design Thinking Model Evolution 6², a operacionalização do exercício incentivou à exploração de três técnicas específicas: o “mural de inspiração”, a “declaração de intenções” e a “agregação livre de ideias”, acompanhando, respetivamente, as fases de exploração, recolha e análise de dados e interpretação de resultados. A secção que se segue ilustra a aplicação dos princípios do Design Thinking, e destas técnicas em particular, ao desenvolvimento de um itinerário de pesquisa comprometido com o desejo de pensar, discutir e investigar criativamente a criança e a infância a partir dos significados e representações sobre o “escuro” (Roque & Carreira, 2020). Um itinerário de pesquisa: desenhar e discutir o escuro na perspetiva das crianças Partida: o mural de inspiração e uma lua autocolante que brilha no escuro Tal como os exercícios de Design Thinking são desenvolvidos com um fim em aberto, assim também partimos para este exercício sem conhecer o ponto de chegada. Na bagagem levávamos apenas as sugestões iniciais de um conjunto suficientemente amplo de temas e debates em torno da criança e da infância na contemporaneidade. O ponto de partida seria dado através da composição de um “mural de inspiração” (inspiration board). Nos últimos anos esta atividade ganhou algum protagonismo por via da generalização da rede social e aplicação Pinterest60, através da qual se carregam e guardam imagens e outros conteúdos 60 Pinterest é uma rede social de compartilhamento de fotografias criada no EUA em 2010 por Paul Sciarra, Evan Sharp e Ben Silbermann (Wikipedia, 2020). A rede social está disponível em https://www.pinterest.com e é 313 multimédia considerados significativos para um determinado tema ou icónicos em determinados domínios. No contexto do Design Thinking o desafio é análogo: “An inspiration board is a fun, risk-free and stress-free way to collect interesting images related to your project without much analysing. It is also an effective way to let go of critical and logical thoughts and to (re)discover parts of a larger picture that realistically illustrate the world of education and pedagogy.” (Tschimmel et al., 2016, p. 31). Numa das sessões iniciais da UC, foi pedido aos estudantes que recolhessem, como num “pinboard”, um conjunto de elementos que permitissem equacionar imaginativamente possibilidades de estudo para o exercício empírico. De modo explícito foi-lhes solicitado que considerassem a criação de um mural de inspiração como se de um jogo se tratasse, sem regras ou determinismos a condicionar a seleção e organização das imagens ou artefactos. No contexto do exercício que aqui analisamos (Roque & Carreira, 2020), o grupo de trabalho reuniu um total de nove elementos inspiradores, entre eles, uma lua autocolante que brilha no escuro, um brinquedo em forma de peão, um jogo de cartas, um poema relativo à infância e pincéis. Cada um destes elementos foi apresentado oralmente perante a turma e essa narrativa foi posteriormente expandida através de intervenções espontâneas por parte de outras pessoas presentes na sala. O grupo tomou nota dos contributos e, após reflexão aprofundada, optou por utilizar como principal objeto inspirador a lua autocolante que brilha no escuro. Apesar de o efeito empiricamente observável desta ferramenta ter sido a seleção de vários elementos inspiradores, o principal resultado não se esgota nesses elementos tomados individualmente; antes na composição que resulta da justaposição e eventualmente confronto entre as diversas imagens e objetos. Efetivamente, é na narrativa articulada sobre os diversos elementos que o processo criativo se consubstancia e de onde se alimenta. Essa narrativa é única e espontânea. As ideias sucedem-se de forma livre e, quer pela apresentação de quem recolheu os elementos, quer pela intervenção e interpelação das pessoas presentes, encadeiamse de forma e em sequências imprevisíveis. No final, espera-se que se consiga alcançar um resultado coeso, capaz de motivar e inspirar os dinamizadores do projeto. Este exercício revelou-se importante para vincular os estudantes aos objetivos da disciplina, motivando-os a levar para o espaço da sala de aula alguns dos seus interesses e preocupações de uma forma lúdica e livre. Deste modo, trabalhou-se a ideia de que os estudantes não são usada para carregar, guardar, classificar e gerenciar imagens, conhecidas como "pins", e outros conteúdos multimédia como vídeos, por exemplo, colocando-os em coleções temáticas, conhecidas como "pinboards". 314 apenas destinatários, mas também agentes ativos do processo de ensino-aprendizagem. Paralelamente, o exercício foi decisivo para clarificar os caminhos que a investigação viria a tomar, nomeadamente, no que respeita à definição do tema e objetivos a alcançar, à revisão de literatura, à metodologia que se pretende adotar, à forma como é realizada a análise de dados e respetiva interpretação de resultados e extração de conclusões. No caso particular do exercício em apreço, o mural de inspiração foi determinante para a consolidação de uma conceção holística sobre o tema em estudo. Se é certo que a Sociologia serviu de enquadramento principal – através, nomeadamente, da compreensão do lugar do medo na sociedade contemporânea (Bauman, 2006) –, outros domínios do saber contribuíram de forma não menos importante para a produção de conhecimento, nomeadamente, e a título de exemplo, a psicologia, filosofia, estética ou semiótica (Carvalho, 2013; Guimarães, 2013; Schreuder, s/d). Largada: a declaração de intenções e os porquês no trabalho de campo No quadro mais amplo do Mindshake Design Thinking Model Evolution 6², uma “declaração de intenções” (intent statement) é uma ferramenta de pensamento convergente, elaborada no final da fase de Emergência. É usada para ajudar a encontrar a resposta para a pergunta "Por que queremos inovar?", esclarecendo a inovação proposta e guiando as fases subsequentes. Como refere Tschimmel, “Most of the time the decision to develop new content is based on a hunch, and feeling the necessity for change and improvement. […] Sometimes however it is not easy to describe those early ideas in words and your concepts have to ‘mature’. The elaboration of an Intent Statement helps you to clarify your determination for innovative content development.” (Tschimmel et al., 2016, p. 77). A declaração de intenções concilia, pois, intuição e assertividade, já que daqui deve resultar uma enunciação clara do propósito e desenvolvimento a seguir. O convite para trabalhar os objetivos de investigação através desta formulação alternativa trouxe vantagens acrescidas ao processo investigativo. Visando uma resposta clara e concisa, os estudantes foram convidados a elaborar a sua intenção adaptando a estrutura “Qual é a sua [minha] intenção?” (Tschimmel, 2018, p. 25). Para o grupo de trabalho decidido a estudar o escuro, a declaração de intenções foi “subscrita” e consensualizada em torno de: (i) desmistificar o que pode existir no espaço onde as crianças dormem, seja num quarto só seu, ou partilhado, e como se preparam para o dormir, ou seja, se 315 existem e quais são os rituais associados, regras e processos específicos; (ii) caracterizar o espaço de transição dia/noite em termos de objetos, atores e ligação com subespaços envolventes. A revisão de literatura permitiu situar o tópico em estudo na área disciplinar da sociologia e obrigou a retornar muitas vezes à declaração de intenções antes subscrita. Na verdade, “The Intent Statement is not a closed document, but a starting point, thus open for changes.” (Tschimmel, 2018, p. 26). Por forma a concretizar esta declaração de intenções foram recrutadas seis crianças do 2.º e do 4.º ano, com 7 e 9 anos de idade, respetivamente, de uma escola de 1.º ciclo do ensino básico, localizada no centro histórico da cidade de Évora, para um estudo de casos múltiplos. A seleção das crianças fez-se através de sorteio, garantindo-se assim que todas as crianças tinham a mesma probabilidade de integrarem o estudo. O recurso ao sorteio foi intencional e visou aproximar o processo de investigação de uma atividade relativamente familiar às crianças: o jogo. Como referem Pinto & Sarmento: “(…) o jogo infantil, entendido no sentido de representações de papéis (ou brincar ao faz de conta), constitui um passo essencial no processo de construção da autoconsciência da infância (Pinto & Sarmento, 1997, p. 42)”. Proporcionando a todas as crianças o momento de um jogo, este serviu dois propósitos. Por um lado, aproximou as investigadoras das crianças, ultrapassando uma barreira que é não apenas etária, mas também e principalmente epistemológica. Por outro, o recurso ao jogo, incluindo a clarificação e aceitação das regras inerentes ao mesmo, fez com que as crianças que não integraram a amostra não se sentissem ressentidas ou excluídas, encarando esse facto como uma consequência “natural” das regras do jogo previamente aceites. Uma caixa de ferramentas “à medida” (toolkit) foi desenhada para dar corpo ao trabalho de campo. Desta caixa de ferramentas constam três elementos principais: a “Declaração de Consentimento Informado” - anexada no “Pedido de Autorização” -, o “Guião do Desenho” e o “Guião da Entrevista”. Estas ferramentas revelar-se-iam fundamentais no processo de recolha de dados, uma vez que asseguram não só a validade do estudo, como a confiança e acompanhamento por parte dos entrevistados e, particularmente, dos encarregados de educação. A declaração de intenções revelar-se-ia igualmente determinante no compromisso ético assumido pelas investigadoras. Em concreto, o pedido de autorização foi o documento utilizado para explicar os objetivos e apresentar o detalhe da operacionalização do estudo, além de solicitar a respetiva autorização aos responsáveis pelas crianças. Tratando-se de um 316 estudo cuja população-alvo são crianças, foi necessário adequar a linguagem no momento em que foi solicitada a sua participação, tornando-a mais simples e objetiva para um público não académico. Em todos os momentos houve total adesão ao “Código Deontológico” da Associação Portuguesa de Sociologia e, particularmente, aquando da solicitação de consentimento. Como estabelece o código: “nos processos de recolha de informação, os sociólogos devem ter o cuidado de explicitar junto dos informantes a sua identidade profissional, tal como a natureza, objetivos, procedimentos e enquadramentos institucional dos trabalhos que realizam” (APS, 1992, p. 9). O desenho infantil e a entrevista-conversa constituíram as técnicas-chave para a recolha de dados. Ambas foram orientadas segundo guiões antecipadamente definidos e propositadamente elaborados para o efeito. Optou-se por solicitar primeiro o desenho, para de algum modo conquistar a confiança das crianças, deixando-as mais confortáveis com as investigadoras, seguindo-se depois a realização das entrevistas-conversa. A realização do desenho e das entrevistas teve lugar a 21 de novembro de 2019, entre as 9h e as 17h. No primeiro caso, foi entregue à criança uma folha de papel em posição oblíqua e canetas de colorir para que pudesse desenhar que atores, objetos e rituais associam ao escuro. A literatura sugere que a realização de entrevistas com crianças possa ter lugar em locais familiares ou conhecidos, de modo que estas se sintam o mais confortáveis e seguras possível (Saramago, 2001). No estudo que aqui acompanhamos, a escola disponibilizou uma sala para o efeito. O fato de essa sala em particular ser desconhecida por todas as crianças entrevistadas fez com que a sua reação fosse surpreendente. No final, ficaram muito entusiasmadas porque conhecerem um espaço novo que sempre esteve presente, embora vedado o seu acesso. Quanto à entrevista, como refere Saramago, “cabe ao entrevistador tornar, ou não, a entrevista num momento interessante para a criança” (Saramago, 2001, p. 15). Neste caso em particular, foi entendimento do grupo que o recurso à entrevista permitiria albergar maior liberdade e flexibilidade por parte das investigadoras aquando da recolha de dados, mas também da parte das crianças, sendo objetivo colocá-las numa situação o mais possível descontraída e confortável. No decorrer da entrevista foi fundamental não interromper os seus pensamentos; procurar clarificar todas as questões colocadas sempre que foram mostradas dúvidas, como por exemplo, quando questionadas sobre o que é a religião; e evitar expressar quaisquer atitudes que colocassem a criança num estado de ansiedade ou desconforto. De modo transversal, procurou-se que em todos os momentos as crianças compreendessem que para 317 aquela entrevista em particular não existiam respostas certas ou erradas, que todas eram igualmente importantes e que a sua opinião, qualquer que fosse, seria respeitada pelas investigadoras. Em todo o processo de recolha de dados as investigadoras procuraram criar as condições para respeitar de modo integral o direito da criança a exprimir livremente a sua opinião, conforme plasmado no Artigo n.º 12, 1) da Convenção dos Direitos da Criança: Os Estados Partes garantem à criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem, sendo devidamente tomadas em consideração as opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade. (UNICEF, 2019, p. 10) A recolha de dados através de entrevista foi registada através da funcionalidade de gravação disponível no smartphone das entrevistadoras. Esta opção pode também ser perspetivada enquanto prática criativa, já que o recurso a um objeto quotidiano e até certo ponto familiar é visto como facilitador da interação em contexto de investigação social (Costa, 2019). Atendendo às características etárias dos entrevistados, o recurso ao smartphone evita também que a criança tenha a tentação de brincar com o objeto que está próximo de si, pois não o reconhece como um brinquedo novo que lhe desperte particular curiosidade. Chegada: dos desenhos às palavras, monstros e luzes de presença Em investigação qualitativa, os investigadores procuram uma compreensão holística e profunda dos temas em análise (Denzin & Lincoln, 2011). Sempre próxima dos dados, a análise e interpretação de resultados é até certo ponto indissociável da fase de recolha. No contexto do exercício que nos serve de mote, os estudantes foram desafiados a importar do modelo de Design Thinking a fase de “agregação livre de ideias” (insight clustering) para estimular a fase de análise e interpretação qualitativa. “The tool Insight Clustering is connected to Brainwriting. It helps to move from a divergent phase to a convergent phase by categorizing ideas and, at the same time, checking if the idea generation has been flexible (which means with ideas in several directions and thematic areas).” (Tschimmel, 2016, p. 85). No caso particular, os estudantes foram também interpelados a escutar e olhar os dados a partir de uma perspetiva mais reflexiva, centrando a sua atenção simultaneamente nas dimensões textual e visual. A Figura 2 reúne o conjunto de seis desenhos elaborados pelas crianças em estudo. 318 Fonte: Desenhos elaborados pelas crianças entrevistadas (2019). Figura 2 – O escuro na perspetiva das crianças. No conjunto, concluímos que a recolha de dados junto das crianças do 2.º ano (com 7 anos de idade) exigiram uma maior disponibilidade, quer de tempo, quer de envolvimento da parte das entrevistadoras comparativamente às crianças do 4.º ano (de 9 anos de idade). Estas crianças buscavam estabelecer uma relação mais próxima com as investigadoras, estavam mais dispostas a falar sobre os seus medos e inseguranças e interpelavam as entrevistadoras a um diálogo mais extenso, profundo e organizado nas ideias. As entrevistadoras procuraram retribuir, sabendo que para conseguir a sua confiança é preciso interagir e escutá-las com atenção. Esta proximidade foi particularmente heurística para compreender a especificidade do olhar das crianças e de como a interação verbal se revela, afinal, complementar à expressão visual através do desenho. Por exemplo, questões de caracterização aparentemente “simples” e “óbvias” na perspetiva das entrevistadoras, como a religião ou o local de nascimento, resultaram frequentemente em questionamentos ao invés de afirmações, ou a respostas à primeira vista “confusas”, “erradas” ou “não-lineares”, como a imprecisão geográfica ou a referência ao hospital. Já a observação do momento de elaboração do desenho permitiu à equipa de investigação tomar consciência da fronteira ténue entre o mundo da realidade e fantasia, que na criança é um só. Como refere Sarmento, nas culturas infantis, “o processo de imaginação do real é fundacional do modo de inteligibilidade” (Sarmento, 2003, p. 16). Esta observação permitiu 319 também constatar que a opção pelo desenho em conjunto com outras crianças deixou-as confortáveis e inicialmente focadas numa atividade concreta. Porém, rapidamente essa atividade se viu transformada pela copresença entre pares, sendo que o trabalho individual passou a ser feito por observação e comparação com os demais e o objetivo da atividade tornou-se rapidamente objeto de imaginação e brincadeira. A observação deste momento foi ainda particularmente sensibilizadora para, de antemão, tomar contacto com muitas das significações dos desenhos e representações do escuro por parte das crianças. O exercício de escuta atenta aos dados através da entrevista-conversa permitiu maior profundidade na observação da realização dos desenhos e sua interpretação. Conclui-se que para as crianças entrevistadas, apesar de ser frequentemente associado a sentimentos negativos como o medo e a figuras assustadoras – das quais se destacam “bruxas”, “fantasmas”, “vampiros”, “zombies”, “monstros”, “palhaços malévolos e assassinos”, “abóboras”, “buracos negros”, “caveiras” ou “espíritos” –, o escuro é muitas vezes também associado a um espaço “giro”, “divertido”, de “descoberta”, “curiosidade” e “imaginação”. O escuro pode mesmo transformar-se num universo mágico para determinadas crianças, enquanto outras sentem insegurança em dizer que o escuro lhes provoca medo. À idade que revelavam no momento das entrevistas, as crianças são habitualmente deixadas sozinhas para dormir pelos seus pais, avós ou irmãos. A análise dos dados recolhidos permite, no entanto, perceber que as crianças não estão ou não se sentem realmente sozinhas. A transição dia/noite revela a presença de outros seres e entes, humanos e não humanos. Desde logo, brinquedos “favoritos” e “divertidos” como “um cão cor-de-laranja”, “um panda de peluche” ou “uma boneca que faz rir” e objetos peculiares que tomam vida nessas brincadeiras, como “um cobertor”, “uma almofada”, “uma lanterna”, o “comando da televisão”, uma “luz de presença m forma de planeta”, “uma camisola” ou “estrelas e luas que brilham no escuro”. Apesar de a literatura advertir para a diminuição da importância da televisão no quotidiano das crianças (Livingstone & Haddon, 2009; Thompson, Berriman, & Bragg, 2018), entre a amostra estudada a televisão continua a desempenhar um papel importante na transição entre o dia e a noite. Para crianças que em regra ainda não dispõem de telemóvel, a televisão é a tecnologia que se destaca: se por um lado as entretêm, acalmando-as, afastando os seus medos ou ajudando-as a adormecer; por outro, o entretenimento que daí advém fomenta ainda mais a 320 sua imaginação, apresentando-lhe múltiplas cores, formas, personagens, sons e diversos outros estímulos ao nível dos sentidos. Por fim, este exercício permitiu também identificar outros atores igualmente importantes no momento em que as crianças transitam do dia para a noite. Se as investigadoras estavam particularmente despertas para o papel desempenhado pelos pais ou avós, os dados vieram revelar os irmãos como elementos particularmente importantes na amostra estudada. De forma até certo ponto surpreendente dadas as especificidades do contexto português, e contrariando o modelo mais ou menos hegemónico do filho único (Cordeiro, 2015), todas as crianças entrevistadas têm irmãos, variando em número de 1 a 5. Nestas circunstâncias, por mais pessoas que existam na casa, é na fratria, especificamente entre os irmãos mais velhos, que as crianças entrevistadas parecem encontrar os principais aliados nos diferentes modos como lidam com o escuro: ora na busca de protetores que os tranquilizem quando têm medo, pesadelos, ou quando se sentem sozinhas; ora na procura de parceiros de aventura que fazem do escuro o espaço da brincadeira e diversão. Conclusão No relatório Design Thinking Applied to Education and Training, K. Tschimmel e os seus colaboradores (2015) referem que nas entrevistas que conduziram, constataram que de um modo geral nem os professores nem os formadores associavam Design Thinking a um método de inovação ou aprendizagem na educação. Embora o considerassem interessante, circunscreviam essa metodologia ao domínio do design gráfico ou design de produto. Nesse mesmo relatório é referido que após uma breve introdução ao conceito de Design Thinking e à apresentação do potencial para o campo da educação, todos manifestaram interesse nesta metodologia, mostrando-se curiosos em saber mais. Constatação semelhante encontrámos entre nós. Na altura em que iniciámos este exercício estávamos em estádios diferentes de conhecimento no que respeita ao potencial do Design Thinking para a educação. Enquanto socióloga e docente com especialização e experiência em metodologias de investigação, há muito que buscara informação complementar sobre as metodologias criativas de investigação social. Enquanto estudantes de licenciatura e aprendizes de sociólogas, tínhamos tido contacto, 321 embora superficial, com tais metodologias, nomeadamente no contexto da frequência de uma unidade curricular especificamente dedicada à análise qualitativa61. Ao concluir este itinerário, sentimo-nos mais próximas e identificadas com os princípios do Design Thinking aplicados aos contextos de ensino-aprendizagem relacionados com a metodologia de investigação em ciências sociais. Como docente, destaco a mobilização de um conjunto de ferramentas que permitem trabalhar de forma mais plástica e intuitiva os tópicos clássicos que integram o processo investigativo em ciências sociais, tornando-os mais atrativos para os estudantes. Como discentes, sublinhamos como o recurso a uma terminologia diferente cria um ambiente favorável à aprendizagem, positivo e entusiasta, que refresca a metodologia frequentemente mais “árida” da investigação social, e onde os estudantes se sentem livres e confortáveis para integrar de forma coesa processo e resultado. No conjunto, destacamos a importância do Design Thinking para, no domínio da investigação social, em geral, e da Sociologia, em particular, nos conduzir de constatações a novas interrogações. Referências bibliográficas Associação Portuguesa de Sociologia. (1992). Código Deontológico. Lisboa: APS. Bauman, Z. (2006). Liquid Fear. Oxford: Policy Press. Carvalho, N. M. (2013). Calada Noite Preta: ambivalências noturnas e o medo do outro. Revista Estética e Semiótica, 99-112. Cordeiro, M. (2015). Crianças e famílias num Portugal em mudança. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos. Costa, R. (2019). iPhone, iResearch. Exploring the Use of Smart Phones in the Teaching and Learning of Visual Qualitative Methodologies. Journal of Visual Literacy, 38(1-2), 153-162. doi:https://doi.org/10.1080/1051144X.2019.1567073 Cross, N., Dorst, K., & Roozenburg, N. (Eds.) (1992). Research in Design Thinking. Delft: Delft University Press. Denzin, N., & Lincoln, Y. (2011). The sage handbook of qualitative research (4.ª ed.). Thousand Oaks, CA: Sage. 61 Laboratório de Análise Qualitativa [SOC2413L], unidade curricular obrigatória do plano de estudos da licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora. 322 Eastman, C., Mccracken, M., & Newstetter, W. (Eds.) (2001). Design Knowing and Learning: Cognition in Design Education. Oxford: Elsevier Science Ltd. Guimarães, A. C. (2013). Identificação de hábitos de sono, compreensão do sono e rotinas de sono em crianças de idade escolar. Lisboa: Universidade de Lisboa. Kara, H. (2015). Creative research methods in the social sciences: a practical guide. Bristol: Policy Press. Lawson, B. (1986). How designers think. London: The Architectural Press. Livingstone, S., & L. Haddon (Eds.) (2009). Kids Online: Opportunities and Risks for Children. Bristol, UK: Policy Press. Mäkelä, M., Nimkulrat, N., & Heikkinen, T. (2014). Editorial/Drawing as a Research Tool: Making and understanding in art and design practice. Studies in Material Thinking, 11, 3-12. Fonte: http://www.materialthinking.org/papers/147 Mason, J. (2002). Qualitative researching (2ª ed.). London: Sage. Mason, J., & Dale, A. (2011). Understanding social research: thinking creatively about method. London: Sage. MINDSHAKE. (2020). web page. Acesso em 28 de junho de 2020, disponível em MINDSHAKE: https://www.mindshake.pt/ Pinto, M., & Sarmento, M. J. (1997). As crianças - Contextos e Identidades. Braga: Centro de Estudos da Criança - Universidade do Minho. Roque, B., & Carreira, V. (2020). Escuro: o que existe no espaço e no imaginário da criança. Transição entre o dia e a noite. Exercício final desenvolvido no âmbito da UC Sociologia da Infância. Évora: Universidade de Évora. (texto policopiado). Rowe, P. (1987). Design thinking MIT Press Cambridge. Saramago, S. S. (2001). Metodologias de Pesquisa Empírica com Crianças. Problemas e Práticas, 9-29. Sarmento, M. (2003). As culturas da infância nas encruzilhadas da segunda modernidade. Em M. Sarmento, & A. Cerisara (Orgs.), Crianças e miúdos, perspetivas sociopedagógicas da infância e educação (pp. 9-34). Porto: ASA. 323 Schreuder, D. (s/d). A filosofia da noite estrelada. Lume Arquitetura, 64-67. Simon, H. A. (1969). The Sciences of the Artificial. Cambridge, Mass: M.I.T. Press. Thompson, R., L. Berriman, & S. Bragg. (2018). Researching Everyday Childhoods: Time, Technology and Documentation in a Digital Age. London: Bloomsbury. Törócsik, M., Szúcs, K., & Kehl, D. (2014). How Generations Think: Research on Generation Z. (A. U. Sapientiae, Ed.) Communicatio, 1, 23-45. Fonte: http://www.acta.sapientia.ro/acta-comm/comm1.htm Tschimmel, K. (2018). Toolkit Evolution 62. An E-handbook for practical Design Thinking for Innovation. Porto: MINDSHAKE. Tschimmel, K., Loyens, D., Soares, J., Oraviita, T., Jacinto, A., Barroca, A., Marinova, B., Santos, J., Carenzo, M., Manzini, S. (2016). D-Think Toolkit. Design Thinking Applied to Education and Training. Erasmus+, KA2 Strategic Partnership. Matosinhos: Ed. ESAD. Tschimmel, K., Santos, J., Loyens, D., Jacinto, A., Monteiro, R., & Valença, M. (2015). Research Report D-Think: Design Thinking Applied to Education and Training. Erasmus+, KA2 Strategic Partnership. Matosinhos: ESAD. Twenge, J. (2017). iGen. New York: Atria Books. UNESCO. (2016). Repensar a Educação. Rumo a um bem comum mundial? Brasília: Edições UNESCO. UNICEF. (06 de 01 de 2019). Fonte: Site da UNICEF Portugal: https://www.unicef.pt/media/2766/unicef_convenc-a-o_dos_direitos_da_crianca.pdf WIKIPEDIA. (2020). Acesso em 28 de junho de 2020, disponível em Pinterest: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pinterest Zemke, R., Raines, C., & Filipczak, B. (2013). Generations at work: Managing the clash of Boomers, Gen Xers, and Gen Yers in workplace. New York: AMACOM. 324 17.O ENSINO EFETIVO DA EMPATIA NAS ESCOLAS MÉDICAS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA Carla Sousa 62& Paulo Vitória6364 Resumo Em contexto clínico a empatia pode definir-se como a capacidade de entender as experiências, preocupações e perspetivas do paciente em relação à sua condição com o objetivo de estabelecer uma melhor relação terapêutica. O objetivo deste estudo é investigar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas e os métodos pedagógicos usados nesse ensino. Foi realizada pesquisa nas bases de dados PubMED e Scielo. Dos artigos que resultaram desta pesquisa, selecionámos 25 que cumpriam os seguintes critérios de inclusão: avaliar a implementação de métodos pedagógicos para ensinar a empatia aos estudantes de medicina, publicados a partir do ano de 2000 e escritos em inglês, espanhol ou português. De acordo com os artigos revistos a importância da empatia na prática da medicina é elevada e a relevância do seu ensino efetivo nas escolas médicas é reconhecida. Os métodos propostos para o ensino são diversificados, incluindo, por exemplo, a exposição de teorias e de técnicas ou a utilização de métodos mais ativos como o role-play, realizados em diferentes anos do curso e com a efetividade avaliada maioritariamente através da escala de empatia de Jefferson, mostrando resultados significativos no aumento da empatia, mas não na sua manutenção. Concluímos que a empatia é reconhecida como uma competência essencial na prática clínica, que deve ser ensinada nas escolas médicas e que existem diversos métodos para realizar esse ensino com diferentes graus de efetividade. Palavras-chave: Empathy. Communication skills. Undergraduate medical education. Training programs. Medical school. 62 Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal; a33467@fcsaude.ubi.pt 63 Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal; a33467@fcsaude.ubi.pt 64 Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-IUL), Lisboa, Portugal; pvitoria@fsaude.ubi.pt 325 1. Introdução A empatia é uma competência clínica essencial e um pilar do profissionalismo na relação médico-utente.(Haider, Riaz, & Gill, 2020; Hojat, et al., 2020) O estabelecimento de relações empáticas aumenta a efetividade das intervenções clínicas, associa-se a uma maior satisfação dos utentes e dos profissionais e melhora os resultados das instituições de saúde, uma vez que fortalece os vínculos, promove uma melhor adesão terapêutica e diminui as queixas e os processos jurídicos contra os profissionais, reduzindo por sua vez os custos para as instituições (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Kim, Kaplowitz, & Johnston, 2004). Existem várias definições de empatia. De acordo com Hojat, que sintetizou diferentes perspetivas, pode ser entendida como um atributo predominantemente cognitivo (mais que emocional), envolvendo a compreensão (mais que o sentir) das experiências, preocupações e perspetivas do utente, em combinação com a capacidade para comunicar essa mesma compreensão (Kataoka, et al., 2019; Loureiro, Gonçalves-Pereira, Trancas, Caldas-deAlmeida, & Castro-Caldas, 2011). Nas últimas décadas tem-se observado uma evolução científica e tecnológica muito acentuada, que tem contribuído para avanços notáveis na área da medicina, mas que paralelamente pode contribuir, se não houver o devido cuidado por partes dos profissionais, para uma diminuição da interação médico-utente, alicerçando-se esta fundamentalmente em terapêuticas de alta tecnologia e meios complementares de diagnóstico (Loureiro, et al., 2011). Estudos apontam ainda outras barreiras à comunicação empática como a falta de tempo devido à sobrecarga de trabalho, objetivos irrealistas que levam à automatização das atividades, falta de momentos de reflexão e de cuidado por parte dos profissionais em terem esta atitude empática, o foco na carreira académica, ente outras (Haider, et al., 2020). Partindo da ideia de que os profissionais apresentam dificuldades nesta prática clínica da empatia, e que, paralelamente, vários estudos têm documentado o declínio de competências, como a empatia, nos estudantes de medicina durante o seu percurso formativo, surge como oportunidade de ensino uma intervenção efetiva e eficaz nos estudantes, com momentos de aprendizagem específicos direcionados a esta temática e ao desenvolvimento destas competências de comunicação (Batista, & Lessa, 2019; Haider, et al., 2020; Hojat, et al., 2020; Son, Shimizu, Ishikawa, Aomatsu, & Leppink, 2018). 326 Assim e para que este ensino tenha resultados positivos e os estudantes desenvolvam as competências necessárias para uma comunicação empática, é necessário investigar quais as estratégias e os métodos pedagógicos efetivos e desenvolver instrumentos de avaliação adequados para medir este progresso (Haider, et al, 2020; Batista, et al, 2019). O objetivo deste estudo é investigar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas, os métodos pedagógicos utilizados, e respetiva avaliação. 2. Métodos O presente estudo consiste numa revisão sistemática qualitativa de literatura com ponto de partida em dois objetivos de investigação previamente definidos:  Averiguar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas,  Identificar os métodos pedagógicos que têm sido aplicados nesse ensino. Relativamente ao objetivo da identificação dos métodos pedagógicos, foram salientadas várias características consideradas relevantes para a replicação dos métodos, e que, portanto, serão apresentadas como subsecções deste objetivo nos resultados. Foi realizada uma pesquisa de literatura nas bases de dados Pubmed e Scielo, restrita ao período de 2000 até ao presente, e escrita em português, inglês e espanhol. As palavras-chave utilizadas foram: empathy, communication skills, undergraduate education, training programs e medical school, sendo utilizadas em diferentes combinações, e em inglês e português de acordo com a base de dados. Além da restrição de data de realização e idioma foram utilizados como critérios para inclusão no estudo os seguintes: avaliação da implementação de métodos pedagógicos no ensino da empatia a estudantes de medicina, com discriminação desses mesmos métodos e adotando a perspetiva de aplicação da empatia em situações clínicas concretas, com avaliação dos resultados. Da pesquisa efetuada resultaram 512 artigos, 510 das bases de dados e 2 de outras fontes, nomeadamente da bibliografia de outros artigos, sendo avaliados os títulos e resumos relativamente à sua relevância para a nossa pesquisa e à qualidade do desenho de estudo. Após esta primeira fase excluímos 456 por não se adequarem às temáticas propostas e aos critérios definidos para esta revisão de literatura. Dos 56 selecionados 54 estavam disponíveis 327 para leitura na integra, sendo excluídos após esta leitura 29 por não se enquadrarem em todos os critérios previamente definidos, resultando deste processo um total de 25 estudos (Figura 1). Está representada na figura 2 a grelha que orientou a recolha de informação dos vários artigos. Ao longo da revisão serão também apresentadas tabelas com a síntese das características dos estudos incluídos, nomeadamente o tipo de estudo, objetivo, intervenção e principais resultados. Figura 5 - Processo de seleção dos artigos revistos Figura 6 - Grelha orientadora para a recolha da informação dos artigos incluídos 328 Necessidade de Tipo de Ano da Organização Quem ensino da empatia método intervenção dos estudantes ensina nas escolas pedagógico Efetividade Avaliação médicas 3. Resultados 3.1. A necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas São vários os estudos existentes que averiguam a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas, quer do ponto de vista dos próprios estudantes quando ainda estão no ensino pré-graduado, quer do ponto de vista dos profissionais de saúde que já estão em meio clínico (Batista, & Lessa, 2019; Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Haider, et al., 2020). Esta necessidade de ensino coloca-se em maior evidência tendo em conta que vários estudos indicam que ocorre um declínio dos níveis de empatia ao longo do percurso formativo por variadas razões, como é sintetizado nas tabelas 1 e 2 (Chen, Lew, Hershman, & Orlander, 2007; Hojat, et al., 2009; Triffaux, Tisseron, & Nasello, 2019). Triffaux et al. avaliaram, num estudo transversal, a empatia durante o percurso académico, tendo-se verificado um declínio progressivo das competências de empatia ao longo dos anos. Neste estudo foi também apontada como hipótese para o declínio da empatia a possibilidade de haver uma dessensibilização dos estudantes com o consequente distanciamento emocional, usado como estratégia de defesa contra efeitos adversos do processo formativo como, por exemplo, o burnout (Triffaux, et al., 2019). Existem estudos que apontam inclusivamente um ano do curso, em específico, no qual houve o declínio da empatia. Nomeadamente, segundo Hojat et al., que realizaram um estudo longitudinal com estudantes de medicina desde o primeiro ano até completarem o curso, onde a empatia foi medida no final de cada ano, esta manteve-se constante durante os dois primeiros anos, mas diminuiu no final do terceiro ano, sem diferenças entre homens e mulheres. A origem deste declínio tem sido apontada como sendo multifatorial, incluindo um elevado volume de matéria para aprender, pressão de tempo, ausência de role-models e ainda o apoio cada vez maior nas tecnologias para a relação médico-utente (Hojat, et al., 2009). Relativamente à opinião dos vários intervenientes acerca do declínio e da necessidade do ensino da empatia, um estudo reuniu a perspetiva de três grupos distintos: estudantes de 329 medicina no último ano, internos da formação específica no último ano e tutores clínicos, com pelo menos 5 anos de experiência clínica e de ensino. Tendo como ponto de partida a empatia na prática clínica, foram discutidas, em cada grupo, as razões que têm levado ao declínio da empatia, os desafios que existem e as recomendações para melhorar esta prática e ensino. Como principais razões para a diminuição da empatia foram apontadas, por parte dos profissionais, a sobrecarga horária e os objetivos irrealistas. O declínio nos estudantes e internos foi também atribuído a diferenças de cultura e educação (Haider, et al., 2020). Os tutores clínicos salientaram ainda que são necessários momentos de ensino dedicados, em específico, à empatia, e não simplesmente esta ser integrada nas várias atividades clínicas. De acordo com o estudo é recomendado integrar o tema da empatia no curriculum pré-graduado e pós-graduado (Haider, et al., 2020). Batista & Lessa analisaram a aprendizagem da empatia em internos de medicina do último ano da especialização no Brasil e tentaram identificar formas de aprimorar essa aprendizagem. Os resultados salientam que os estudantes não reconhecem momentos de ensino relevantes durante a formação no que diz respeito à empatia e, quando existem, são mais direcionados à teoria e não à prática. Foi destacado ainda que a metodologia usada é pouco estimulante (teoria desconectada da prática) e que os docentes carecem de capacitação para ensinar estes temas. Assim, e de um modo geral, foi detetada a necessidade de uma maior responsabilização por parte das faculdades para um ensino estruturado e bem articulado da empatia (Batista, & Lessa, 2019). 330 Tabela 1. Síntese dos estudos relativos ao declínio da empatia durante o percurso formativo Título do Estudo. Autores (ano) Tipo de Estudo Objetivo do Estudo Principais Resultados Decline of empathy among medical students: Dehumanization or useful coping process? Estudo transversal realizado na Bélgica, com 1602 estudantes de medicina e da área comercial (usados como grupo de controlo). Aplicação da escala Basic Empathy Scale (BES). Reproduzir os dados do declínio da empatia nos estudantes de medicina numa população Belga. Foi verificado, através da BES, um declínio significativo da empatia nos estudantes de medicina ao longo do curso. Estudo longitudinal realizado nos Estados Unidos da América (EUA), com 456 estudantes de medicina. Aplicação da escala JSPE-S (início do 1º ano e no fim de cada um dos anos na escola médica). Investigar a evolução da empatia ao longo do curso de medicina. O nível de empatia foi constante nos primeiros dois anos do curso, tendo diminuído no final do 3º ano, de igual modo em mulheres e homens. Estudo transversal realizado nos EUA, com 658 estudantes de medicina de todos os anos do curso. Aplicação da escala JSPE-S. Medir e avaliar a empatia nos vários anos do curso. Os estudantes do primeiro ano do curso foram os que apresentaram valores mais altos de empatia enquanto que os do 4º ano apresentaram os valores mais baixos. (Triffaux, et al., 2018) The Devil is in the Third Year: A Longitudinal Study of Erosion of Empathy in Medical School (Hojat, et al., 2009) A Cross-sectional Measurement of Medical Student Empathy (Chen, et al., 2007) 331 Tabela 2. Síntese dos artigos que salientam a importância do ensino da empatia Título do Estudo. Autores (ano) Tipo de estudo Objetivos do estudo Principais resultados Empathy in clinical practice: a qualitative study of early medical practitioners and educators. Estudo transversal realizado no Paquistão com 109 participantes (alunos prégraduados, internos e professores médicos). Foram constituídos grupos de discussão para debater as razões do declínio da empatia, desafios e recomendações para promover a sua prática clínica. Identificar as razões do declínio da empatia na prática clínica e identificar estratégias para a promover. Todos os participantes no estudo concordaram que existe um declínio da empatia na prática clínica. Os principais desafios incluem o aumento da carga horária e restrições no tempo com cada utente. Com base nestes resultados foi salientada a importância do ensino de uma prática clínica empática. Estudo transversal realizado no Brasil com 15 alunos no final da formação médica específica. Foram colocadas 3 questões acerca do conceito da empatia na relação médico-utente, o processo de ensinoaprendizagem da empatia na formação médica e sugestões para a melhoria desse mesmo ensino. Analisar a aprendizagem da empatia nos estudantes do último ano da formação médica específica. Os estudantes não reconhecem momentos de ensino da empatia relevantes durante a formação. O ensino que existe é, maioritariamente, teórico. A metodologia utilizada é pouco estimulante e os docentes carecem de capacitação. (Haider, et al., 2020) Aprendizagem da Empatia na Relação Médico-Paciente: um Olhar Qualitativo entre Estudantes do Internato de Escolas Médicas do Nordeste do Brasil. (Batista, & Lessa, 2019) 332 3.2. Métodos pedagógicos para o ensino da empatia nas escolas médicas A tabela 3 sintetiza as características dos vários métodos pedagógicos incluídos nesta revisão. Os métodos pedagógicos teórico-práticos foram os mais vezes descritos na literatura analisada, nomeadamente, nos estudos de Kataoka, et al., 2019, de Vaure, et al., 2017 e de Daryazadeh, Adibi, Yamani, & Molllabashi, 2020. Nestes estudos foram utilizados diferentes métodos, nomeadamente um workshop com uma palestra teórica inicial, seguido de role-play e debriefing, (Kataoka, et al., 2019) sessões teórico-práticas de medicina narrativa (ler, refletir e discutir) (Daryazadeh, et al., 2020) e a estratégia dos Grupos Ballint, onde os estudantes foram convidados a reagir a uma situação clínica real e particularmente tocante ou problemática em grupo, tendo depois destas sessões participado em prática simulada de consultas (Vaure, et al., 2017). Uma estratégia muito usada foi o role-play, com recurso a pacientes padronizados para o treino de competências de entrevista clínica (Lim, Moriarty, & Huthwaite, 2011; Schweller, Ribeiro, Passeri, Wanderley, & Carvalho-Filho, 2018; Son, et al., 2018). No estudo de Son et al. os estudantes tiveram sessões de treino de entrevista clínica antes da avaliação estruturada de competências. Foi também avaliado se o número de sessões de treino (uma, duas ou três sessões), tinha influência no nível de empatia e desempenho final, o que não se verificou neste estudo (Son, et al., 2018). Tendo em conta um nível de interação mais complexo, existem intervenções que recorrem a atores para o papel de utente, tornando assim mais real a experiência do aluno (Schweller, et al., 2018; Vaure, et al., 2017). Ainda neste contexto está também descrita uma intervenção que incluiu, além da parte teórica e do role-play, uma sessão de uma hora com um professor de teatro, que teve como objetivo fazer uma breve introdução acerca de competências e métodos característicos da representação e que se focaram em melhorar a capacidade dos alunos se conectarem com os seus pacientes, terem atenção ao que estão a dizer, observarem a linguagem corporal e melhorarem o seu relacionamento interpessoal (Lim, et al., 2011). O recurso a pacientes virtuais (pacientes criados no computador) também foi descrito da seguinte forma: utilização de um paciente virtual com uma história clínica detalhada 333 para realizar uma consulta, sendo que no final era dado um feedback em relação à empatia. Após este treino os alunos tinham de realizar uma nova consulta, mas desta vez com um paciente simulado, verificando-se que o feedback era um ponto-chave para o maior sucesso dos alunos nas consultas reais (Foster, et al., 2016). A aplicação das artes e a visualização de filmes também são métodos implementados para o ensino da empatia (Ahmadzadeh, Esfahani, Ahmadzad, Shalbafan, & Shariat, 2019; Potash, Chen, Lam, & Chau, 2014). Ahmadzadeh et al. realizaram um estudo para avaliar se ver um filme poderia aumentar a empatia. Para tal, organizaram a amostra de estudantes em quatro grupos distintos, um grupo que só tinha uma discussão teórica seguida de visualização de 2 role-play, o segundo grupo visualizava o filme “The Doctor”, o terceiro grupo via o filme seguido da discussão teórica e o quarto grupo não tinha qualquer intervenção. Os grupos que viram o filme apresentaram um aumento na empatia (Ahmadzadeh, et al., 2019). Quanto ao estudo de Potash et al., os alunos do terceiro ano de medicina foram distribuídos aleatoriamente por dois workshops, um de artes e um de resolução de problemas. No de artes foram convidados a recordar o caso de um paciente a sofrer ou com dor. Com base nesta experiência foram convidados a escrever cores, cheiros, sons, objetos e sentimentos em papéis com o objetivo de criarem um poema, juntando outras palavras, se necessário, e ilustrando-o de seguida. Realizaram ainda um ensaio de reflexão acerca de como aquela experiência afetou a maneira como entendiam os utentes e a eles próprios. Quanto ao workshop de resolução de problemas, os alunos assistiram e participaram em role-play, resolveram os casos clínicos e discutiram as suas observações com o grande grupo. No final, escreveram sobre um caso clínico. Apesar de não terem existido diferenças quantitativas relevantes, os alunos reconheceram os benefícios do workshop de artes, nomeadamente o desenvolvimento da capacidade de se compreenderem a eles mesmos, aos utentes, à dor, ao sofrimento, e ao papel do médico (Potash, et al., 2014). 3.2.1. Ano do curso de medicina para as intervenções Uma vez que o curso de medicina é constituído por 6 anos de formação, maioritariamente divididos em anos teóricos e anos clínicos, importa averiguar qual o ano ou anos onde é mais eficaz a sua aplicação. 334 De acordo com dados encontrados, é referido que as atitudes humanísticas como a empatia sofrem um declínio ao longo do curso desde os anos pré-clínicos aos anos clínicos, especialmente no terceiro ano, sendo, portanto, este um ano crucial no processo formativo (Ruiz-Moral, Torres, Monge, Leonardo, & Caballero, 2017). Ainda assim, além do estudo já referido, o ensino da empatia no 3º ano foi incluído em apenas mais dois estudos (Kataoka, et al., 2019; Potash, et al., 2014). Relativamente aos restantes estudos houve uma divisão na intervenção entre os anos clínicos e pré-clínicos, com especial relevância para o 1º ano (Harlak, Gemalmaz, Gurel, Dereboy, & Ertekin, 2008; Kataoka, et al., 2019; Shapiro, Morrison, & Boker, 2004) e para o 4º ano (Airagnes, et al., 2014; Kataoka, et al., 2019; Schweller, et al., 2018; Son, et al., 2018; Vaure, et al., 2017) do curso, anos escolhidos mais vezes para o ensino. De salientar que, à exceção da escolha do 3º ano, em mais nenhum dos estudos foi especificado um motivo para a escolha do ano. 3.2.2. Duração das intervenções A duração das intervenções pode-se revelar importante para o sucesso dos próprios métodos pedagógicos. Em sumula, os resultados encontrados a este propósito são muitos díspares e variam desde poucas horas a vários meses, com sessões únicas ou múltiplas, e nestas o intervalo entre sessões também varia entre os estudos. Assim, foram encontradas intervenções que incluíram apenas um único workshop teórico-prático de 3 ou 4 horas (Kataoka, et al., 2019; Potash, et al., 2014) intervenções compostas por sessões múltiplas semanais (Airagnes, et al., 2014; Schweller, et al., 2018; Vaure, et al., 2017) e bimensais (Shapiro, et al., 2004) e ainda intervenções ao longo de um semestre completo, mas sem periodicidade das atividades (Kataoka, et al., 2019). Novamente não foi referido, em nenhum estudo, um motivo para a escolha do número específico de horas de aulas ou treino prático, nem para a escolha do intervalo de tempo entre sessões, no caso das intervenções com várias sessões. 335 3.2.3. Organização dos estudantes em grupos Uma característica importante no sucesso do ensino, além das questões já referidas é o número de alunos envolvidos em cada intervenção. Na maioria dos estudos encontrados, contudo, é referido que os alunos trabalharam em pequenos grupos, não especificando o número de alunos por grupo (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Harlak, et al., 2008; Kataoka, et al., 2019; Ruiz-Moral, et al., 2017; Son, et al., 2018). Um número específico de alunos por grupo foi referido no método dos grupos de Ballint com uma média de 10 alunos (Airagnes, et al., 2014; Vaure, et al., 2017). Foram ainda encontradas intervenções feitas com grupos maiores, nomeadamente com uma média de 20/25 alunos por grupo (Ahmadzadeh, et al., 2019; Potash, et al., 2014). Ainda assim, num dos estudos, apesar dos grupos serem maiores, não existe interatividade professor-aluno (Ahmadzadeh, et al., 2019) e no outro estudo o grupo é dividido numa última fase da intervenção para haver discussão e interatividade (Potash, et al., 2014). 3.2.4. Quem ensina a empatia? Nos estudos encontrados não é dada especial relevância a competências específicas por parte de quem faz o ensino e a aplicação dos métodos pedagógicos, um fator que seria de particular relevância para a reprodutibilidade do ensino e dos métodos nas várias instituições de ensino. Ainda assim, foram encontradas várias referências a estes tutores/professores. Quanto à classe profissional, na maioria dos estudos encontrados quem faz este ensino são médicos das diferentes especialidades, sem uma formação específica para esta temática. No entanto, existem estudos onde referem profissionais com uma formação mais específica, como psicólogos clínicos (Harlak, et al., 2008). Relativamente à capacitação dos profissionais para este ensino, de acordo com os resultados de um estudo realizado no Brasil, os alunos internos de medicina no último ano referem que existe uma fraca capacitação dos docentes envolvidos no ensino da empatia, da relação médico-utente e no estabelecimento de uma boa relação aluno336 professor. Tal pode dever-se, em muito, ao facto da maioria do corpo docente dos cursos de medicina ser composto por médicos de diferentes especialidades que, na sua maioria, não possuem formação específica para exercer a atividade docente (Batista, & Lessa, 2019). Diez-Goñi & Rodriguez-Diez salientam a importância de saber como comunicar a empatia aos estudantes e dos profissionais que acompanham os alunos nos vários estágios serem também eles formados, nomeadamente através de workshops e simulações (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017). Integrando de certa forma as perspetivas dos dois últimos estudos referidos, de acordo com Costa & Azevedo, num conjunto de entrevistas que foram realizadas a docentes médicos de um hospital no Brasil, estes mesmos profissionais apontam que a transmissibilidade da empatia na formação de novos médicos seria mais vista como um “exemplo” e não algo a ser de facto ensinado e aprendido. No entanto este tipo de aprendizagem seria muito dependente do profissional e, portanto, não seria homogénea. Tal como já referido anteriormente, também neste estudo é reforçada a importância de formação do pessoal docente (Costa, & Azevedo, 2010). Apesar de não terem sido encontradas descrições das características chave que um profissional deve ter para ensinar a empatia, de acordo com Hirsch, o grande desafio para estes profissionais é apresentar a informação num formato que o torne relevante e apelativo para os estudantes, de modo a envolve-los ativamente para que sintam que é algo que lhes vai ser muito útil na prática clínica (Hirsch, 2007). 3.2.5. Efetividade dos métodos pedagógicos avaliados A efetividade dos métodos pedagógicos foi avaliada, na maioria dos casos, através de escalas de medição dos níveis de empatia, nomeadamente a Jefferson Scale of Physician Empathy, student’s version (JSPE-S) e a Interpersonal Reactivity Index (IRI), aplicadas antes, imediatamente a seguir e em alguns casos algum tempo após a intervenção. Outro método utilizado para a avaliação do sucesso das intervenções foi de caráter qualitativo, com questões direcionadas à temática, antes e após a intervenção (Schweller, et al., 2018). Na grande maioria dos estudos houve um aumento dos níveis de empatia após a intervenção, independentemente do tipo de método aplicado, havendo alguns em que a 337 melhoria só se verificou de forma qualitativa.(Airagnes, et al., 2014; Potash, et al., 2014; Schweller, et al., 2018) Houve ainda estudos que além de reportarem um aumento da empatia no geral, descreveram que componentes da escala JSPE-S se alteraram mais, e em que sentido.(Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Kataoka, et al., 2019) Por exemplo, foi reportado de acordo com um estudo que houve um aumento dos componentes “adoção de perspetiva” e “cuidar com compaixão” e uma diminuição no componente “colocar-se na pele do doente” (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017). São poucos os estudos que avaliam efetivamente a duração da mudança demonstrada após a intervenção (Ahmadzadeh, et al., 2019; Kataoka, et al., 2019). Ainda assim, nos dois estudos onde foi encontrada esta avaliação longitudinal, constatou-se que a mudança positiva produzida pela intervenção não se manteve. Num primeiro caso, (Kataoka, et al., 2019) onde os estudantes foram avaliados ao longo dos seis anos do curso de medicina, tendo a intervenção sido feita no 3º ou 4º ano, verificouse que no 5º e no 6º ano os níveis de empatia baixaram novamente. Já no segundo estudo, (Ahmadzadeh, et al., 2019) onde foram aplicadas intervenções diferentes consoante o grupo de estudo, constatou-se que nos grupos onde tinha havido melhoria da empatia houve um declínio da mesma um mês após as intervenções. 3.2.6. Avaliação dos métodos pedagógicos pelos intervenientes De acordo com Harlak et al., recolher o feedback dos estudantes em relação ao método e aos tutores pode ser extremamente útil para investigações subsequentes (Harlak, et al., 2008). Corroborando esta ideia, de facto, é de extrema importância a avaliação de um método e dos participantes na sua aplicação, de modo a perceber a sua reprodutibilidade, utilidade e aplicabilidade. No entanto, nos estudos incluídos nesta revisão, raramente isso se verificou. Quanto à intervenção propriamente dita foi referida a avaliação por parte dos estudantes em dois casos, sendo que estes consideraram, na sua maioria, que a atividade tinha sido benéfica e útil para o seu futuro pessoal e profissional (Potash, et al., 2014; Schweller, et al., 2018). Relativamente à avaliação dos tutores pelos estudantes, apesar de não ser reportada nos métodos revistos, houve um estudo em que os alunos avaliaram o ensino da empatia no 338 geral, assim como os intervenientes neste ensino, relatando haver falta de capacitação dos tutores para este ensino (Batista, & Lessa, 2019). Não foi referida qualquer outra avaliação por parte dos intervenientes nos artigos revistos. 339 Tabela 3. Síntese das intervenções dos métodos pedagógicos Título do Estudo, Autores (ano) Tipo de estudo Intervenção Principais resultados Empatia na relação medico-doente: Evolução em Alunos do Primeiro Ano de Medicina e Contribuição para a Validação da Escala Jefferson em Portugal Estudo longitudinal (6 meses) realizado em Portugal com 81 estudantes do 1º ano de medicina. Avaliação através da Escala JSPE-S (antes e após a intervenção). Frequência do Módulo de Psicologia Médica (1 semestre de duração) cujo programa aborda a empatia em medicina mediante ensino de conteúdos e treino elementar de competências. Aumento da empatia e dos componentes “adoção de perspetiva” e “cuidar com compaixão”. Diminuição no componente “colocar-se na pele do doente”. Estudo longitudinal (6 anos) realizado no Japão com 69 estudantes do 1º ano de medicina. Avaliação através da Escala JSPE-S (1º ano, pré-workshop, pós-workshop, 5º e 6º ano). Workshop de 4 horas, sobre competências de comunicação, para aumentar a empatia no 3º ou 4º ano do curso. Verificou-se um aumento da empatia e dos componentes “adoção de perspetiva” e “cuidar com compaixão” após o workshop. Este resultado não se manteve nos dois anos seguintes do curso. (Loureiro, et al., 2011) Can communication skills training improve empathy? A six-year longitudinal study of medical students in Japan. (Kataoka, et al., 2019) Communication skills training and the conceptual structure of empathy among medical students Programa com 4 secções: 1. Palestra sobre comunicação e entrevista médica (55 minutos); 2. Orientação para a próxima sessão (10 minutos); 3. Role-play de entrevista médica com pacientes simulados (160 minutos); 4. Feedback, discussão e síntese (15 minutos). Várias sessões de treino de entrevistas médicas (1, 2 ou 3) com pacientes simulados. (Son, et al., 2018) Estudo transversal realizado no Japão com 268 estudantes do 4º ano de medicina. Avaliação através da Escala JSPE-S (após a intervenção e retrospetivamente em relação ao pré-intervenção), questões relativas à vontade de expressar um comportamento empático e questões abertas. O número de sessões de treino não teve qualquer influência nos fatores analisados. A vontade de expressar um comportamento empático está mais relacionada com o componente “adoção de perspetiva” do que com o “cuidar com compaixão”. Nas questões abertas foi notada a dificuldade em sentir compaixão. Promoting Empathy among medical Estudo longitudinal realizado em Reflexão em grupos Ballint de 12/13 estudantes, com Não houve diferença significativa nas 340 students: a two-site controlled study randomized França com 299 estudantes do 4º ano de medicina, divididos no grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação através da Escala JSPE-S (antes e após a intervenção) e CARE (após a intervenção pelos pacientes simulados). sessões semanais de 1 hora e meia ao longo de 3 meses. Uma semana após a última sessão, todos os estudantes participaram em duas sessões de simulação de entrevista médica com atores. pontuações da CARE entre os dois grupos. A pontuação na JSPE-S aumentou no grupo experimental após a intervenção e foi bastante mais alta comparativamente ao grupo de controlo. Impact of narrative medicine program on improving reflective capacity and empathy of medical students in Iran Estudo longitudinal realizado no Irão com 135 internos de medicina, divididos em grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação através da Escala Jefferson Scale of Physician Empathy (antes e após a intervenção). Programa de medicina narrativa: ler, refletir e discutir em pequenos grupos. 7 sessões teórico-práticas de 2 horas cada. Aumento da empatia no grupo experimental ao contrário do grupo de controlo. Estudo transversal realizado no Brasil com 551 estudantes do 4º e do 6º ano de medicina. Avaliação qualitativa. Simulação de consultas médicas em grupos de 7/9 estudantes, com uma sessão semanal, num total de 4 sessões. Os casos clínicos foram fictícios mas baseados em casos reais. Os profissionais envolvidos neste treino foram os mesmos que estavam a orientar o estágio destes estudantes. Depois da simulação da consulta houve sempre um debriefing para os estudantes poderem falar sobre toda a experiência. Tendo em conta a avaliação qualitativa, os estudantes sentiram-se confortáveis durante a atividade devido à “abertura para o diálogo”, “proximidade com professores e colegas” e um “ambiente livre de julgamentos”. A grande maioria dos estudantes considerou este treino útil para a sua vida profissional e pessoal. Estudo longitudinal realizado na Nova Zelândia com 149 estudantes do 5º ano de medicina, divididos em grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação pela escala JSPE-S (antes e após a No grupo experimental além da habitual sessão com uma parte teórica e role-play houve uma hora adicional com um professor de teatro, que teve como objetivo fazer uma breve introdução acerca de competências e métodos característicos da representação e que se focaram em melhorar a capacidade dos alunos se conectarem com os No grupo experimental foi reportado um aumento muito significativo dos níveis de empatia após a intervenção, facto que não se verificou no grupo de controlo. (Vaure, et al., 2017) (Daryazadeh, et al., 2020) Simulated medical consultations with standardized patients: In-depth debriefing based on dealing with emotions (Schweller, et al., 2018) ‘‘Being-in-role’’: A teaching innovation to enhance empathic communication skills in medical students 341 (Lim, et al., 2011) intervenção). seus pacientes, terem atenção ao que estão a dizer, observarem a linguagem corporal e melhorarem o seu relacionamento interpessoal. Does watching a movie improve empathy? A cluster randomized controlled trial Estudo longitudinal realizado no Teerão com 133 estudantes de medicina a realizar estágio clínico, divididos em 4 grupos. Avaliação pela escala JSPE-S (antes e após a intervenção). Grupo 1: Workshop de 3 horas sobre competências de comunicação (discussão teórica seguida de visualização de 2 role-play sobre interação médico-utente). (Ahmadzadeh, et al., 2019) Grupo 2: Visualização do filme “The Doctor”. Grupo 3: Visualização do filme “The Doctor”, seguido do workshop de 3 horas no dia seguinte. Todos os grupos em que houve intervenção apresentaram um aumento na pontuação da JSPE-S (mais pronunciado nos grupos 2 e 3, que assistiram ao filme). Um mês após a intervenção as pontuações da JSPE-S baixaram novamente nos 3 grupos em que houve intervenção. Grupo 4: Grupo de controlo sem qualquer intervenção. Art-making in a family medicine clerkship: how does it affect medical student empathy? (Potash, et al., 2014) Estudo longitudinal realizado em Hong-Kong com 161 estudantes do 3º ano de medicina, divididos em grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação pela escala JSPE-S (antes e após a intervenção). Grupo experimental: Workshop de artes de 3 horas em grupos de cerca de 25 alunos, onde estes foram convidados a recordar o caso de um paciente a sofrer ou com dor. Depois escreveram cores, cheiros, sons, objetos e sentimentos em pedaços de papéis cujo objetivo era juntarem e adicionarem outras palavras, se necessário, de modo a criarem um poema, ilustrando-o de seguida. Após esta tarefa completa discutiram em pequenos grupos. Por fim, todos os estudantes escreveram um ensaio de reflexão acerca de como aquela experiência afetou a maneira como entendem os utentes e a eles próprios. Não existiram diferenças quantitativas relevantes entre os dois grupos. No entanto, os alunos reconheceram os benefícios do workshop de artes, nomeadamente, a capacidade de se compreenderem a eles mesmos, aos utentes, à dor, ao sofrimento e ao papel do médico. Grupo de controlo: Workshop de resolução de problemas, onde os alunos assistiram e participaram em role-play, resolveram os casos clínicos e discutiram as suas observações com o grande grupo. No final, escreveram sobre um caso clínico. Teaching Empathy to First Year Estudo longitudinal realizado na 8 sessões de 1 hora, duas vezes por mês em pequenos Houve um aumento da empatia após a 342 Medical Students: Evaluation of an Elective Literature and Medicine Course (Shapiro, et al., 2004) Appropriate training based on Balint groups can improve the empathic abilities of medical students: A preliminary study (Airagnes, et al., 2014) Medical Humanities Coursework Is Associated with Greater Measured Empathy in Medical Students (Graham, et al., 2016) Communication Skills Training: Effects on Attitudes toward Communication Skills and Empathic Tendency Califórnia com 16 estudantes do 1º ano de medicina, divididos em grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação através das escalas Balanced Emotional Empathy Scale (BEES) e Empathy Construct Rating Scale (antes e após a intervenção). grupos. Leitura e discussão de poesia, sketches e histórias curtas envolvendo os seguintes tópicos: relação médicoutente, exame físico, escuta dos utentes, dor, mudança de estilo de vida, entre outros. O grupo de controlo começou a intervenção 6 meses após o grupo experimental, período durante o qual esteve exposto ao método habitual do curriculum. intervenção nos dois grupos, sendo este aumento apenas significativo na escala BEES. Estudo longitudinal com 163 estudantes do 4º ano de medicina, divididos em grupo experimental e de controlo. Avaliação pela escala IRI e 8 questões de reação a um caso clínico (antes da intervenção e quatro meses após a mesma). 10 sessões semanais de 2 horas de reflexão em grupos de Ballint (8/10 alunos) com casos clínicos reais trazidos pelos estudantes voluntariamente para serem discutidos. Antes e após a intervenção além da escala quantitativa também foi avaliada a reação emocional a dois casos clínicos previamente selecionados. A avaliação feita 4 meses após a intervenção mostrou em ambos os grupos um aumento do componente “fantasia” da IRI e uma diminuição do componente “preocupação empática”. Quanto às reações emocionais aos casos clínicos, no grupo experimental houve uma melhoria da abordagem empática em relação ao primeiro caso clínico, facto que não se verificou no grupo de controlo. Estudo longitudinal realizado nos EUA com 88 estudantes de medicina, divididos em grupo experimental e grupo de controlo. Avaliação pela escala JSPE-S (antes e após a intervenção). Curso de Humanidades médicas com 10 horas de contacto presencial. Os tópicos incluíram estudos sociais e culturais, a história da medicina ocidental e exercícios de interpretação de artes visuais e literatura. Os estudantes tinham leituras obrigatórias para discussão nas aulas e adicionalmente filmes eram vistos e discutidos nas sessões. O grupo experimental teve níveis de empatia superiores comparando com o grupo de controlo, onde a grande maioria dos estudantes manteve ou diminuiu os níveis de empatia. Estudo longitudinal realizado na Turquia com 59 estudantes do 1º ano de medicina. Avaliação pela escala Communication Skills Attitudes Scale e Empathic Treino de competências de comunicação básico integrado no curriculum do 1º ano do curso. Constituído por 30 horas, incluindo tópicos básicos da comunicação (conceitos, perceção social e do “eu”, emoções e escuta). Os métodos basearam-se em apresentações interativas, Antes da intervenção os estudantes foram agrupados num grupo com altos níveis de empatia e outro com baixos níveis de empatia. O que se verificou após a intervenção foi que não houve alterações Não houve diferença entre os dois grupos após a intervenção, o que sugere que a exposição do grupo de controlo ao curriculum habitual antes da intervenção não teve qualquer benefício. 343 (Harlak, et al., 2008) Tendency Scale (antes e após a intervenção). exercícios, role-play, trabalho de pares e discussões de grupo. no primeiro grupo enquanto que a empatia aumentou consideravelmente no segundo grupo. Teaching medical students to express empathy by exploring patient emotions and experiences in standardized medical encounters Estudo longitudinal realizado em Espanha com 115 estudantes do 3º ano de medicina. Avaliação por uma escala de 2 tarefas e 4 competências (após as 3 entrevistas). O curso envolveu várias atividades, como sessões demonstrativas e de trabalho em pequenos grupos, workshops com pacientes simulados, role-play com feedback e finalmente tiveram entrevistas gravadas com pacientes simulados, podendo ser até 3 entrevistas (apenas os estudantes que não alcançaram um determinado nível na avaliação fizeram a terceira entrevista). Os estudantes melhoraram bastante desde a primeira à terceira entrevista em todas as competências da comunicação, além de conseguirem aplicar mais expressões empáticas. (Ruiz-Moral, et al., 2017) 344 4. Discussão Os cursos de medicina devem orientar a formação com o propósito de desenvolver competências e promover a capacitação de futuros profissionais com sentido crítico, aptos a entender a importância do trabalho em equipa e capazes de estabelecer uma boa relação com os utentes.(Batista, & Lessa, 2019) Um dos pilares fundamentais desta relação é a empatia, pelo que esta tem de estar presente na prática clínica e, para estar presente nos médicos, precisa de ser ensinada aos alunos de medicina.(Haider, et al., 2020) Assim este ensino precisa de ser pensado da melhor forma, uma vez que para tornar a aprendizagem efetiva e com impacto nos alunos, é necessário que estes deem sentido aos conteúdos lecionados e que entendam a sua aplicabilidade no futuro profissional e mesmo pessoal.(Batista, & Lessa, 2019) A partir da integração destas ideias-chave, surgiu a questão principal desta investigação: averiguar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas, assim como quais os métodos pedagógicos mais aplicados. De acordo com os resultados apresentados é inegável a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas, quer pelo facto de esta ser nuclear na relação médico-utente, muito importante na prática clínica, mas também porque se observa uma tendência para esta competência decrescer durante o percurso formativo das escolas de medicina, nomeadamente a partir do 3º ano do curso, altura em que os alunos passarão a ter mais contacto com os utentes.(Hojat, et al., 2009; Ruiz-Moral, et al., 2017) Razões apontadas para este declínio e que são transversais a vários estudos, passam pela sobrecarga de matéria apresentada aos estudantes, ausência de role-models, utilização das tecnologias e ainda a dessensibilização dos próprios estudantes e a ideia, muitas vezes promovida na educação médica, de manter um certo distanciamento emocional. Por outro lado, também os profissionais de saúde que os alunos encontram nos estágios clínicos influenciam ativamente a maior ou menor empatia apresentada por estes. Portanto, e tal como foi descrito anteriormente, o facto destes profissionais estarem sobrecarregados a nível de horário, os objetivos irrealistas que muitas vezes têm e a própria falta de formação para esta competência e para a ensinarem fazem com que a empatia não seja devidamente treinada em meio clínico real, o que seria de extrema importância.(Haider, et al., 2020) 345 Em relação aos métodos pedagógicos, partindo do facto de que a grande maioria dos estudos encontrados apresentou métodos com efetividade demonstrada e comprovada através de escalas validadas, podemos afirmar que a empatia pode ser ensinada. Pelo contrário, e apesar desta efetividade imediata do ensino, houve estudos que verificaram que estes resultados se perdem ao longo do tempo.(Ahmadzadeh, et al., 2019, Kataoka, et al., 2019) Importa perceber o porquê de tal acontecer e podem ser levantadas várias hipóteses para o justificar como, por exemplo, a relação entre a duração da intervenção, a periodicidade das sessões e a manutenção da aprendizagem. Ou, por outro lado, a relação com o ano do curso em que é aplicado o ensino ou, simplesmente, a adequação do método pedagógico. Estas hipóteses não podem ser exploradas com base nos estudos encontrados, e será importante considerá-las em estudos futuros. Assumindo que a empatia pode ser ensinada, é possível avançar para as características do seu ensino aos estudantes de medicina. Com base na informação recolhida e nos tópicos principais referidos, podemos salientar que os métodos pedagógicos mais frequentes foram os teórico-práticos, foi dada primazia à intervenção nos anos clínicos do curso de medicina, a maior parte das vezes quem esteve encarregue das intervenções foram médicos das diferentes especialidades e os alunos foram maioritariamente organizados em pequenos grupos. O tipo, a duração e a periodicidade das sessões foi muito variável de estudo para estudo. Outro ponto-chave na implementação de métodos pedagógicos é uma avaliação criteriosa de todo o processo e de todos os intervenientes. Só assim uma intervenção pode ser considerada completamente efetiva e pode melhorar e ir de encontro àquilo que são as reais necessidades de uma população. No entanto, de um modo geral, esta avaliação não foi apresentada nos artigos encontrados. Reconhecemos que existem várias limitações nos resultados nesta revisão sistemática, nomeadamente a heterogeneidade dos estudos ao nível do tamanho da amostra, ausência de grupos de controlo em vários estudos, diferentes escalas utilizadas para a medição da empatia, validade questionável destas escalas e descrição pouco detalhada da intervenção realizada. Seria interessante e relevante em investigações futuras formar grupos semelhantes de alunos e estudar vários métodos pedagógicos, considerando todos os fatores que podem influenciar o sucesso da intervenção, assim como com a devida avaliação tanto da efetividade, como do processo, incluindo os intervenientes, os momentos, os métodos e os conteúdos das intervenções. 346 5. Conclusão “Não sei o que nos espera, mas sei o que me preocupa: é que a medicina, empolgada pela ciência, seduzida pela tecnologia e atordoada pela burocracia, apague a sua face humana e ignore a individualidade única de cada pessoa que sofre, pois embora se inventem cada vez mais modos de tratar, não se descobriu ainda a forma de aliviar o sofrimento sem empatia ou compaixão.” (Antunes, 2012, p.10) De facto, ser empático é crucial na prática médica e é uma competência que não pode ser adquirida automaticamente pelo médico… é necessário ensino e é necessária prática e treino. Com esta revisão conseguimos expor, por um lado, a importância desta competência e, por outro, a necessidade do seu ensino nas escolas médicas. Foram detalhados vários métodos pedagógicos colocados em prática em várias instituições de ensino, assim como o seu grau de efetividade. No entanto, são necessários mais estudos que comparem diretamente diferentes métodos, com diferentes tipos de intervenção e com diferentes populações-alvo, para assim se definir com base na evidência quais os métodos pedagógicos mais eficazes, como e quando os aplicar. 6. Referências Bibliográficas Ahmadzadeh, A., Esfahani, M.N., Ahmadzad-Asl, M., Shalbafan, M., & Shariat, S.V. (2019) Does watching a movie improve empathy? A cluster randomized controlled trial. Can Med Educ J, 10(4),e4-e12. doi: 10.36834/cmej.56979 Airagnes, G., Consoli, S.M., De Morlhon, O., Galliot, A.M., Lemogne, C., & Jaury, P. (2014) Appropriate training based on Balint groups can improve the empathic abilities of medical students: A preliminary study. J Psychosom Res, 76(5):426-9. doi: 10.1016/j.jpsychores.2014.03.005 Antunes, J.L. (2012). A Nova Medicina. (pp 10). Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos. Batista, N.A., & Lessa, S.S. (2019) Aprendizagem da Empatia na Relação Médico-Paciente: um Olhar Qualitativo entre Estudantes do Internato de Escolas Médicas do Nordeste do Brasil. Revista Brasileira de Educação Médica, 43(1),349-356. Doi: 10.1590/19815271v43suplemento1-20190118 Chen, D., Lew, R., Hershman, W., & Orlander, J. (2007) A Cross-sectional Measurement of Medical Student Empathy. J Gen Intern Med, 22(10),1434-8. doi: 10.1007/s11606-0070298-x 347 Costa, F.D., & Azevedo, R.C.S. (2010) Empatia, Relação Médico-paciente e Formação em Medicina: um Olhar Qualitativo. Rev Bras Educ Med, 34(2):261-269. doi: 10.1590/S0100-55022010000200010 Daryazadeh, S., Adibi, P., Yamani, N., & Mollabashi, R. (2020) Impact of narrative medicine program on improving reflective capacity and empathy of medical studentsin Iran. J Educ Eval Health Prof, 17,3. doi: 10.3352/jeehp.2020.17.3 Díez-Goñi, N., & Rodríguez-Díez, M.C. (2017). Why tecahing empathy is importante for the medical degree. Rev Clin Esp, 217(6),332-335. doi:10.1016/j.rce.2017.01.005 Foster, A., Chaudhary, N., Kim, T., Waller, J.L., Wong, J., Borish, M., … Buckley, P.F. (2016) Using Virtual Patients to Teach Empathy: A Randomized Controlled Study to Enhance Medical Students’ Empathic Communication. Simul Healthc, 11(3),181-9. doi: 10.1097/SIH.0000000000000142 Graham, J., Benson, L.M., Swanson, J., Potyk, D., Daratha, K., & Roberts, K. (2016) Medical Humanities Coursework Is Associated with Greater Measured Empathy in Medical Students. Am J Med, 129(12),1334-1337. doi: 10.1016/j.amjmed.2016.08.005 Haider, S.I., Riaz, Q., & Gill, R.C. (2020). Empathy in clinical practice: a qualitative study of early medical practitioners and educators. JPMA, 70(1),116-122. doi:10.5455/JPMA.14408 Harlak, H., Gemalmaz, A., Gurel, F.S., Dereboy, C., & Ertekin, K. (2008) Communication skills training: Effects on attitudes toward communication skills and empathic tendency. Educ Health, 21(2),62. Retrieved from http://www.educationforhealth.net/article.asp?issn=13576283;year=2008;volume=21;issue=2;spage=62;epage=62;aulast=Harlak Hirsch, E.M. (2007) The role of empathy in medicine: a medical student’s perspective. Virtual Mentor, 9(6), 423-7. doi: 10.1001/virtualmentor.2007.9.6.medu1-0706 Hojat, M., Shannon, S., DeSantis, J., Speicher, M., Bragan, L., & Calabrese, L. (2020). Does Empathy Decline in the Clinical Phase of Medical Education? A Nationwide, MultiInstitutional, Cross-Sectional Study of Students at DO-Granting Medical Schools. Academic Medicine, Volume Publish Ahead of Print. doi:10.1097/ACM.0000000000003175 Hojat, M., Vergare, M.J., Maxwell, K., Brainard, G., Herrine, S.K., Isenberg, G.A., … Gonnella, J.S. (2009) The Devil is in the Third Year: A Longitudinal Study of Erosion of Empathy in Medical School. Academic Medicine, 84(9),1182-1191. doi: 10.1097/ACM.0b013e3181b17e55 348 Kim, S.S., Kaplowitz, S., & Johnston, M.V. (2004) The effects of physician empathy on patient satisfaction and compliance. Evaluation & The Health Professions, 27(3),237251. doi: 10.1177/0163278704267037 Kataoka, H., Iwase, T., Ogawa, H., Mahmood, S., Sato, M., DeSantis, J., … Gonnella, J.S. (2019) Can communication skills training improve empathy? A six-year longitudinal study of medical students in Japan. Med Teach, 41(2),195-200. doi:10.1080/0142159X.2018.1460657 Lim, B.T., Moriarty, H., & Huthwaite, M. (2011) “Being-in-role”: A teaching innovation to enhance empathic communication skills in medical students. Med Teach, 33(12),e663-9. doi: 10.3109/0142159X.2011.611193 Loureiro, J., Gonçalves-Pereira, M., Trancas, B., Caldas-de-Almeida, J.M., & Castro-Caldas, A. (2011). Empatia na relação médico-doente Evolução em Alunos do Primeiro Ano de Medicina e Contribuição para a Validação da Escala Jefferson em Portugal. Acta Med Port, 24(S2),431-442. Retrieved from http:// https://www.actamedicaportuguesa.com/revista/index.php/amp/article/view/1451/1039 Potash, J.S., Chen, J.Y., Lam, C.L., & Chau, V.T. (2014) Art-making in a family medicine clerkship: how does it affect medical student empathy?. BMC Med Educ, 14,247. doi: 10.1186/s12909-014-0247-4 Ruiz-Moral, R., Torres, P.L., Monge, D., Leonardo, C.G., & Caballero, F. (2017) Teaching medical students to express empathy by exploring patient emotions and experiences in standardized medical encounters. Patient Educ Couns, 100(9),1694-1700. doi: 10.1016/j.pec.2017.04.018 Schweller, M., Ribeiro, D.L., Passeri, S.R., Wanderley, J.S., & Carvalho-Filho, M.A. (2018) Simulated medical consultations with standardized patients: In-depth debriefing based on dealing with emotions. Rev Bras Educ Med, 42(1),84-93. doi: 10.1590/198152712018v42n1rb20160089 Shapiro, J., Morrison, E., & Boker, J. (2004) Teaching Empathy to First Year Medical Students: Evaluation of an Elective Literature and Medicine Course. Educ Health, 17(1),73-84. doi: 10.1080/13576280310001656196 Son, D., Shimizu, I., Ishikawa, H., Aomatsu, M., & Leppink, J. (2018). Communication skills training and the conceptual structure of empathy among medical students. Perspect Med Educ, 7(4),264-271. doi: 10.1007/s40037-018-0431-z Triffaux, J.M., Tisseron, S., & Nasello, J.A. (2019). Decline of empathy among medical students: Dehumanization or useful coping process? Encephale, 45(1),3-8. doi: 10.1016/j.encep.2018.05.003 349 Vaure, C.B., Lemogne, C., Bunge, L., Catu-Pinault, A., Hoertel, N., Ghasarossian, C., … Jaury, P. (2017) Promoting Empathy among medical students: a two-site randomized controlled study. J Psychosom, 103,102-107. doi: 10.1016/j.jpsychores.2017.10.008 350 18.FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: ELOS ENTRE A DIMENSÃO PEDAGÓGICA E INCLUSÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR Lisiê Marlene da Silveira Melo Martins65 & Lúcia de Araújo Ramos Martins66 Resumo Esta pesquisa buscou analisar a relação entre a formação continuada de docentes universitários, no tocante à dimensão pedagógica e a interface com a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior. A discussão foi alicerçada nos fundamentos teóricos e legais que versam sobre a inclusão educacional da pessoa com deficiência no Ensino Superior, aspectos inerentes à pedagogia universitária e à formação do docente. No tocante aos aspectos teórico-metodológicos, seguiu abordagem qualitativa, adotando um perfil de estudo exploratório e de caráter descritivo das evidências do campo empírico a partir das concepções dos estudantes com deficiência, docentes universitários e gestores institucionais. Para a construção de dados foram adotadas a análise documental, entrevista semiestruturada, observação do campo empírico e triangulação dos dados. Como técnica de análise dos dados norteamo-nos pela Análise de Conteúdo (Bardin, 2009). Foram evidenciados como resultados problemas educacionais que ainda permanecem em práticas de preconceito, estigma e exclusão. Assim como foram identificadas a importância da atuação docente frente a prática educacional inclusiva, apresentando atitudes docentes que podem se constituir como barreiras, erguendo-se como “muros”, através de práticas pedagógicas equivocadas, ou que podem se constituir como “pontes”, através da realização de boas práticas educacionais que refletem compromisso com a docência, empatia e sensibilidade. Espera-se que este estudo possa contribuir para a área no que tange a redirecionamento pedagógico e formação continuada, oportunizando a reflexão sobre os princípios éticos de respeito a diversidade e a inclusão de Doutora em Educação (UFRN); Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE/CAPES) com estágio de investigação científica no Centro de Ciéncias Sociales y Magistery (Universitat de Valéncia - Espanha). Professora Adjunta da Universidade Federal da Paraíba (UFPB); Estudos e experiências profissionais na área da Educação Especial com ênfase nas seguintes temáticas: Educação Especial em uma perspectiva Inclusiva; Acesso e Permanência no Ensino Superior; Formação Docente; Pedagogia Universitária. 66 Doutora em Educação (UFRN); Professora Titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); Estudos e experiências profissionais na área da Educação Especial, atuando principalmente nos seguintes temas: história da Educação Especial; educação inclusiva, inclusão escolar de educandos com deficiência; educação de pessoas com deficiência intelectual; formação docente numa perspectiva inclusiva; Atendimento Educacional Especializado. 65 351 todos os estudantes no Ensino Superior. Resumen Esta investigación buscó analizar la relación entre la educación continua de los docentes universitarios, con respecto a la dimensión pedagógica y la interfaz con la inclusión de estudiantes con discapacidad en la Educación Superior. La discusión se basó en los fundamentos teóricos y legales que se ocupan de la inclusión educativa de las personas con discapacidad en la Educación Superior, aspectos inherentes a la pedagogía universitaria y la formación del profesorado. En cuanto a los aspectos teóricos y metodológicos, siguió un enfoque cualitativo, adoptando un perfil de estudio exploratorio y descriptivo de la evidencia del campo empírico a partir de las concepciones de estudiantes con discapacidad, profesores universitarios y gerentes institucionales. Para la construcción de datos, se adoptaron análisis de documentos, entrevistas semiestructuradas, observación del campo empírico y triangulación de datos. Como técnica para el análisis de datos, guiamonos por el Análisis de contenido (BARDIN, 2009). Los problemas educativos se evidenciaron como resultados que aún permanecen en las prácticas de prejuicio, estigma y exclusión. Así como se identificó la importancia del desempeño docente frente a la práctica educativa inclusiva, presentando actitudes de enseñanza que puedan constituirse como barreras, elevandose como "muros", a través de prácticas pedagógicas erróneas, o que también pueden constituirse como "puentes", a través de la realización de buenas prácticas educativas que reflejen el compromiso con la enseñanza, la empatía y la sensibilidad. Se espera que este estudio pueda contribuir al área con respecto a la redirección pedagógica y la educación continua, proporcionando oportunidades para reflexión sobre los principios éticos del respeto a la diversidad y la inclusión de todos los estudiantes en la Educación Superior. Palavras-chave: Inclusão no Ensino Superior. Pessoa com deficiência. Formação Continuada. Docência Universitária. Introdução Nas últimas décadas, a universidade tem vislumbrado novos horizontes, abrindo espaço para aprendizagem e conquista da cidadania por grupos de representação ainda 352 minoritária na sociedade contemporânea. Dentre estes situamos os alunos com deficiência, que estão ingressando – embora de maneira ainda lenta - no contexto do Ensino Superior. O censo da Educação Superior, realizado em 2014 (Inep, 2014) mostra que naquele ano, o Brasil possuía 7,839 milhões de estudantes matriculados no ensino superior, e destes, 34.144 eram estudantes com deficiência, sendo 14.158 estudantes de IES públicas e 19.986 estudantes de IES privadas. Em 2016, o número de estudantes com deficiência subiu para 35.891. A sinopse estatística e os microdados do Censo da Educação Superior apresentadas pelo INEP relativas ao ano de 2017 (Brasil, 2018) apresenta 8.652.441 como total de matrículas na Educação Superior. Destes, são representados 38.272 estudantes com deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades/ superdotação67. O processo de inclusão deste grupo de estudantes em âmbito universitário se apresenta a partir da elaboração e implementação de políticas nacionais e internacionais, que visam promover o direito de todos à educação nos diferentes níveis de ensino, tais como: a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ratificada no Brasil como Emenda Constitucional, em 1995 (Brasil, 1995); Conferência Mundial de Educação para Todos (Tailândia, 1990); a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais (Espanha, 1994); a Lei 9.394/96 das Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996); a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Onu, 2006); Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008); Decreto Nº 7.611/ 2011, que dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado (Brasil, 2011); Plano Nacional da Educação (PNE) 2014-2024 (Brasil, 2014); Lei nº 13.146/2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Brasil, 2015); Lei 13.409/2016 que dispõe sobre a reserva de vagas para pessoas com deficiência nos cursos técnicos, de nível médio e superior, das instituições federais de ensino (Brasil, 2016). Diante das mudanças sociais e políticas ocorridas no seio do Ensino Superior, ao longo das décadas de 1990 e 2000, a inclusão de alunos com deficiência se configurou como parte dos desafios às políticas e ações institucionais das universidades. (Pletsch; Melo, 2017; Melo 2015; 2016; Cabral, 2018) Das discussões sobre a promoção do acesso e permanência dos estudantes com deficiência nas universidades brasileiras, surge a necessidade de preparar os docentes do ensino superior para lidar com a diversidade que poderão encontrar em sala de aula, A delimitação do público – alvo da Educação Especial é de considerada pela Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008) 67 353 principalmente quando esta diversidade está representada por alunos com deficiência. Este estudo surgiu neste contexto investigativo, e teve como objetivo analisar a relação entre a formação continuada de docentes universitários, no tocante à dimensão pedagógica e a interface com a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior. As contribuições surgem dos resultados obtidos nesta investigação, apontam para problemas educacionais existentes entre a dimensão pedagógica e a formação do docente universitário diante do estudante com deficiência. Argumentação Formação docente à luz da perspectiva educacional inclusiva A não preparação prévia do professor universitário para lidar com o processo de inclusão de pessoas com deficiência é evidenciado em pesquisas nacionais e internacionais. (Oliveto; Manzini, 1999; Vitaliano, 2002; Vitaliano, 2007; Santos, 2002; Beyer, 2003; 2006; Hummel, 2007; Eidelwein, 2005; Jesus, 2006; Martins, 2016). Estudos específicos sobre a formação continuada do docente no contexto do Ensino Superior em uma perspectiva inclusiva, respaldam a necessidade efetiva de formação docente, no tocante à dimensão pedagógica e especificamente na área da Educação Inclusiva (Thoma, 2006; Santos; Fumes, 2009; Reis, Eufrásio; Bazon 2010; Hayashi, Machado; Yamaniha, Ausec 2012; Carballo, 2016; Carballo, Moriña, 2018; Silvia, Simirotti, Sammar, 2012). A ausência de formação pedagógica se configura como barreira na ação docente para lidar com a diversidade inerente à presença de estudantes com deficiência (Moriña-Diez, López Gavira, Melero, Cortés Veja, Romo, 2013, Carballo, 2018). E ainda destacam a importância da formação continuada para a prática docente, evidenciando a ação formativa em uma perspectiva inclusiva, como aspecto positivo junto aos estudantes com NEE. (Carballo, 2018; Oliveira, Magalhães, Mendonça, 2016). Destacamos ainda que estudos que apresentam as vozes de estudantes com deficiência em relatos sobre suas experiências acadêmicas, destacam a atuação pedagógica dos docentes universitários como uma das maiores barreiras existentes na universidade (Vega, MoriñaDíez, 2015; Moriña, Perera, 2018). No entanto, os estudos consideraram que a partir da ação formativa que aborda a perspectiva educacional inclusiva são identificadas melhoras nos processos de ensino (Redruello; Rodríguez; Quesada; Viloria, 2014; Carballo, Morgado 2019; Moriña 2019). 354 Diante das evidências, consideramos que as universidades deveriam desenvolver, em seus cursos de graduação e de pós-graduação e em programas de formação continuada, preparação para os professores e profissionais da educação atuar frente à diversidade e inclusão de pessoas com deficiência. É necessário fazer parte da pauta da gestão da universidade a preocupação com a formação do professor, contemplando e incentivando a formação continuada em uma perspectiva inclusiva como parte inerente à qualidade do ensino. Esta contínua preparação e envolvimento com a docência pode proporcionar o sentimento de pertença ao processo educativo ao professor e ao estudante com deficiência. Nesse sentido, nos ensina Freire (1996 p. 38-39) que “[...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”. No processo formativo, a perspectiva da educação inclusiva deve estar presente nos diferentes espaços de formação. De acordo com Mayán (2014), a atenção à diversidade devese destacar como questão norteadora das práticas e formação docentes. Nas situações formativas se fazem necessárias a criação de culturas inclusivas nos ambientes educacionais, a aproximação, análise e reflexão sobre a eliminação de barreiras de aprendizagem e o desenvolvimento de estratégias de cooperação que incrementem o acesso ao currículo, desenvolvimento de habilidades e aquisição do conhecimento. Com relação a isso, consideramos necessária a preocupação com a atuação do professor universitário na área do ensino e da formação continuada, tendo em vista que, diante da diversidade e inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior, são levantadas novas possibilidades de ressignificação da prática docente. Essa, ao invés dos limites, deve visar às possibilidades e, no lugar da construção das barreiras, atuar para transpô-las. Neste sentido, ao refletir sobre as propostas de formação continuada em uma perspectiva inclusiva, concordamos com Michels (2005), quando orienta que os programas de formação precisam propor a temática da inclusão em uma perspectiva do respeito à diversidade, da sensibilização para o humano e da inclusão plena. Desprendendo-se das características físicas e biológicas da deficiência em si e descontruindo, assim, a chamada “marca da deficiência” nos processos formativos, que na prática, compartimentalizam e reduzem a formação em uma perspectiva inclusiva apenas ao “conhecer as deficiências”. Diante destas reflexões, consideramos que as perspectivas de diversidade humana e inclusão de todos precisam permear as práticas educacionais e formativas no contexto universitário, redirecionando os processos de ensino-aprendizagem, adaptações curriculares e 355 estratégias de avaliação. As quais possam desenvolver habilidades que conduzam o aluno a patamares superiores de representação mental dos conteúdos ministrados, como a reflexão contínua, a capacidade de análise e síntese e a generalização de fatos e ideias, a compreensão dos fenômenos naturais, sociais, políticos e econômicos, condições precípuas para melhor compreensão e inserção no mundo, das ações e relações que se materializam nas práticas sociais. (Silva, 2013, p. 69) O currículo e suas possibilidades de adaptações também se constituem como alternativas às práticas inclusivas de estudantes com deficiência na universidade, pois torna possível uma prática pedagógica que valoriza o potencial do estudante, considerando sempre as suas demandas e especificidades. Neste sentido, Magalhães (2013, p. 50) orienta que as adaptações propostas ao currículo “[...] pressupõem a preocupação entre professores e estudantes, em uma contínua construção de alternativas que diversificam e ampliam as possibilidades de aprendizagem”. Com base nas reflexões desta autora, as adaptações curriculares podem ser compreendidas como um processo de ajustes e tomada de decisões para que alcancem as especificidades e demandas dos estudantes no tocante aos diferentes modos de aprendizagem. Diante das amplas possibilidades de adaptações está à necessidade do diálogo contínuo entre o professor e o estudante com deficiência, em uma escuta sensível à condição do outro e à disponibilização em tornar a aprendizagem acessível. De acordo com Magalhães (2013), as adaptações curriculares são consideradas não significativas quando demandam uma pequena alteração na programação da aula. Isto ocorre quando há uma necessidade de adaptações na organização espacial, didática, objetivos, conteúdos, técnicas e instrumentos de avaliação, de modo possam atender as especificidades dos estudantes com deficiência, e assim, possibilitar o alcance da aprendizagem, não só para o estudante com deficiência, mas para todos. Já as adaptações curriculares consideradas adaptações significativas, de acordo com Magalhães (2013, p.52), são aquelas modificações mais acentuadas, “[...] mais drásticas no desenho curricular da aula, havendo a eliminação de conteúdos lineares, adequando os objetivos da área e os respectivos critérios de avaliação”. Há a eliminação de alguns objetivos básicos ou a introdução de objetivos específicos alternativos, não previstos aos demais estudantes. É importante ressaltar que as adaptações curriculares devem ser pensadas para a promoção de aquisição de novos conhecimentos, de modo a complementarem ou 356 suplementarem os processos de aprendizagem. É equivocado pensar em adaptação curricular sob um viés de facilitador dos conteúdos, que não considere todas as etapas de desenvolvimento e aprendizagem esperadas para um estudante em nível universitário. Esta visão de adaptação curricular na promoção da facilidade não se adequa à perspectiva real de inclusão, pois esta é imbuída de atitudes compensatórias e minimalistas das potencialidades de estudantes com deficiência. Outro desafio à prática pedagógica universitária diante da inclusão de estudantes com deficiência são as estratégias e modelos de avaliação. Nesta perspectiva, a avaliação da aprendizagem precisa exercer um papel formativo, com o foco na formação integral dos estudantes durante o processo de ensino-aprendizagem e na ressignificação da ação docente, fazendo uso de critérios e procedimentos mais flexíveis, com vistas a obter resultados qualitativos da aprendizagem. Sobre esta temática, Silva (2013) nos conduz a refletir que a avaliação da aprendizagem não é a reprodução de informações a identificação de acertos e de erros expressos em um sistema de notação e em uma visão linear e dicotômica de aprovar ou reprovar, mas o que o aluno acrescentou aos conhecimentos prévios e a forma como fez isso é que devem ser dignos de nota. (Silva, 2013, p. 78) Portanto, a ação avaliativa do processo de aprendizagem de estudantes com deficiência não deve ser direcionada pelas possíveis limitações por essa provocada no sujeito e/ou por visões equivocadas de incapacidade, admitidas por parte de muitos professores. Deve ser, sim, uma ação direcionada às potencialidades de cada um, voltada à compreensão de como ocorreu a aprendizagem e se a aquisição deste novo conhecimento alcançou os objetivos traçados no início do processo. Quando falamos de estudantes com deficiência, os elementos norteadores referem-se à acessibilidade, adaptação de material e modos de flexibilização dos modelos de avaliação, sem haver prejuízo dos objetivos dos componentes curriculares, dos conteúdos e da formação do estudante. Podemos exemplificar este processo desde a simples ampliação no tamanho de letras e fontes para tornar exequível uma atividade avaliativa a estudantes com baixa visão à flexibilização do tempo de realização de uma tarefa ou, até mesmo, na utilização de instrumentos de tecnologia assistiva para a comunicação entre professor e estudante, de modo que haja a compreensão e retorno de repostas sob um olhar pedagógico voltado ao processo e não ao produto. 357 Para além dos processos de adaptações dos currículos e das práticas docentes a partir da demanda específicas das pessoas com deficiência, se apresentam os princípios do Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA). O campo acadêmico dos Disability Studies in Education (DSE) ou Estudos sobre Deficiência na Educação (EDE), apresentam a como mais uma possibilidade no processo de desenvolvimento de ambientes educacionais organizados para o enfrentamento e a eliminação de barreiras na escolarização de todas as pessoas, dentre elas aquelas com deficiência. Os princípios e as três diretrizes principais do DUA, sendo eles: as múltiplas formas de acesso à informação e conhecimento, isto é, o “o quê” da aprendizagem; as várias maneiras de abordar tarefas estratégicas, isto é, o “como” da aprendizagem; e as várias maneiras de tornar-se e permanecer engajado no aprendizado, isto é, o “porquê” da aprendizagem (KEMPFER; BOCK; GESSER; NUERNBERG, 2018). O campo dos “Disability Studies in Education” (DSE) é relativamente recente e tem se preocupado com a potencialização de espaços educacionais mais acolhedores à variação funcional humana e, com isso, tem proporcionado entendimentos e reflexões sobre a aprendizagem de estudantes com deficiência. Pesquisadores como Baglieri et al. (2011), Barnes (2009), Collins (2013), Valle e Connor (2014) compreendem que é por meio da transformação do ambiente pedagógico, prioritariamente na eliminação de barreiras e na implementação de práticas colaborativas, que todos os estudantes podem ter acesso ao conhecimento com participação, uma vez que, dessa forma, é possível considerar a singularidade presente nos diferentes modos de aprender. Os pesquisadores do DSE, fundamentados pelo modelo social de deficiência, combatem a prática de adaptação curricular. O que se propõe é um currículo adequado às variações das habilidades dos estudantes da sala de aula qualificando o ensino para todos e, dessa maneira, apresentam o DUA em diferentes pesquisas (Baglieri et al., 2011; Liasidou, 2014; Valle; Connor, 2014). Pessoas com os mesmos diagnósticos de deficiência (nominado como lesão) podem ter necessidades distintas em sua escolarização, quer seja na metodologia, nas estratégias ou nos recursos a serem utilizados. Para os estudiosos do DSE, ações que possibilitam o acesso e a participação efetiva de pessoas com diferentes condições não podem ser propostas apenas sob a égide de legislações, mas, sim, por compreender que são necessárias mudanças na adoção de estratégias metodológicas para que elas estejam adequadas às necessidades, às potencialidades, enfim, às características de cada pessoa. Dessa maneira, acredita-se que as diretrizes e princípios do DUA, que estão 358 evidenciados nos estudos de distintos pesquisadores, a exemplo de Rao e Bryant (2014), Rose et al. (2006), Edyburn (2010), Cha e Ahn (2014), entre outros, apresentam perspectivas que possibilitam minimizar as barreiras no percurso acadêmico de estudantes com e sem deficiência, não hierarquizando ou privilegiando um único modo de aprender e, com isso, criando ambientes de aprendizagem flexíveis para estudantes e docentes. O DUA amplia o entendimento para os processos pelos quais os estudantes acessam o conhecimento, não somente vislumbrando recursos que eliminem barreiras, mas pensando e projetando cursos e currículos adequados, e, dessa maneira, não cabe falar de adaptação curricular. Essa é uma de suas premissas: barreiras para aprendizagem ocorrem na intersecção com o currículo (Rappoltschlichtmann et al., 2013). O DUA tem se evidenciado como um grande aliado para desenhar instruções de cursos, materiais e conteúdos, a fim de beneficiar as pessoas de todos os estilos de aprendizagem, sem adaptação ou substituição de equipamento (Zhong, 2012). Complementarmente a essa ideia, é preciso reforçar que o DUA não remove desafios acadêmicos, ele remove barreiras ao seu acesso (Nielsen, 2013). A perspectiva do DUA está presente em normativas internacionais, tais como: a Lei de Oportunidades do Ensino Superior de 2008 (HEOA) publicada em 14 de agosto de 2008, nos Estados Unidos68. Define que o DUA deve ser uma estrutura válida cientificamente para orientar a prática educacional (Black; Weinberg; Brodwin, 2015). Na Lei Educacional para Indivíduos com Deficiência (IDEIA) de 2004, a lei federal americana oferece um forte apoio para inclusão de estudantes com deficiência nas escolas públicas dos Estados Unidos. Nela determina-se que o Desenho Universal deverá ser utilizado como uma intervenção para ajudar os estudantes com deficiência na sua participação no currículo geral da educação da maneira mais plena possível (Hinshaw; Gumus, 2013; Larocco; Wilken, 2013; King-Sears et al., 2015; Webb; Hoover, 2015). A legislação do Governo de Manitoba, província do Canadá, adota o DUA afirmando a necessidade de as comunidades escolares, incluindo professores, desenvolverem planos para a diversidade total da sua população estudantil (Katz, 2015). A incorporação do DUA nas políticas da educação de modo mais amplo, contrapõe-se ao modelo da inclusão a partir de legislações específicas. Nela se estabelece uma proposta de uma escola acolhedora das diferentes expressões do humano, nas quais se distingue daquela que emite rótulos para a inclusão a partir de diagnósticos. Realidades que incorporaram o DUA mostram-se mais satisfatórias na participação, no 68 Public Law 110–315. AUG. 14, 2008 - HEOA: https://www.govinfo.gov/content/pkg/PLAW110publ315/pdf/PLAW-110publ315.pdf 359 envolvimento e no acesso à aprendizagem de estudantes. Coyne et al. (2012) sugere que, de acordo com o objetivo de diminuir potenciais barreiras à aprendizagem e aumentar as oportunidades de aprender, os planejamentos a partir do DUA trazem melhores resultados de aprendizagem para todos os indivíduos. Neste contexto, as políticas para minorias diferem de uma política para todos, distanciando-se de uma perspectiva universal. Fovet et al. (2014); Kumar e Wideman, (2014) pontuam que a partir da aplicabilidade do DUA, os estudantes podem se sentir mais no controle de seu próprio processo de aprendizagem e com possibilidade para fazer escolhas pessoais que melhor apoiassem a sua própria aprendizagem, além da identificação antecipada de barreiras e de proposições de facilitadores minimizarem a necessidade dos chamados “serviços de apoio para inclusão” ou serviços de acessibilidade educacional. Percursos teórico-metodológicos Esta pesquisa seguiu uma abordagem qualitativa, por valorizarmos as relações entre os sujeitos envolvidos e o entorno, suas relações e as implicações no processo educativo, pois na mesma abordagem, de acordo com Oliveira (2007), descrevemos e interpretamos o fenômeno dentro de uma visão complexa, holística e sistêmica, sabendo que, ao adotarmos essa postura investigativa, não preconizamos a verdade absoluta das coisas. Diante do caráter exploratório, da temática abordada no estudo sobre as políticas de formação continuada dos docentes no Ensino Superior e as relações entre a permanência dos estudantes com deficiência neste nível de Ensino, esta pesquisa apresenta características de uma pesquisa exploratória, pois de acordo com Gil (2008) este tipo de pesquisas é realizada, especialmente, quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular hipóteses precisas e operacionalizáveis. Além disso, a pesquisa exploratória tem como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. Diante da necessidade de descrição da realidade, compreendemos que esta pesquisa se constitui como uma pesquisa exploratório-descritiva, pois apresenta uma junção dos perfis metodológicos definidos anteriormente, visando proporcionar maior familiaridade com o problema investigativo para torná-lo explícito de maneira empírica. Deste modo, a pesquisa exploratório-descritivo também descreve e expõe características de determinada população ou de determinado fenômeno, podendo estabelecer correlações entre variáveis e definir sua 360 natureza (Silva; Menezes, 2001; Vergara,1998). Para direcionar os procedimentos metodológicos, adotamos a pesquisa de campo para conduzir a investigação, uma vez que ela “[...] caracteriza-se pelas investigações em que, além da pesquisa bibliográfica e/ou documental, se realiza coleta de dados junto a pessoas, com o recurso de diferentes tipos de pesquisa.” (Fonseca, 2002, p 37). O campo empírico da pesquisa foi a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), campus Natal/RN/ Brasil. Destaca-se esta escolha devido ao pertencimento territorial e institucional que temos a este espaço, e o desejo de, como membro de um corpo acadêmico e servidor, contribuir com problemáticas existentes, “ethos” imensamente complexo e em movimento que se constitui na Universidade, sendo a pertinência desta pesquisa anteriormente justificada em sua relevância acadêmica, social e pessoal. Participaram deste estudo 9 discentes com deficiência, 10 docentes e 5 gestores, totalizando assim, 24 participantes da pesquisa. Este artigo configura-se um recorte do estudo que resultou na elaboração da tese doutoral intitulada: Inclusão do estudante com deficiência no ensino superior e a formação continuada do docente universitário (Martins, 2019) Para o desenvolvimento deste estudo, foram cumpridos os trâmites e protocolos institucionais para a autorização da realização da pesquisa. Após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRN69, de fato iniciamos nossas buscas em nosso contexto de pesquisa. A fim de dar prosseguimento ao estudo, foi realizada a etapa de levantamento de estudos e políticas institucionais que versam sobre a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior, a observação do contexto empírico, até identificarmos a necessidade de entrevistar os participes que dialogam com a área, tais como estudantes com deficiência, docentes de cursos diversos e gestores da universidade. A entrevista semiestruturada foi escolhida como instrumento de coleta de dados, por acreditarmos que esta, de acordo com Triviños (1987, p.138), “[...] é um dos instrumentos mais decisivos para estudar os processos e produtos nos quais está interessado o investigador qualitativo”. E que nos permite diante do mosaico social expresso no contexto empírico perceber nuances, cores, encaixes e desencaixes revelados no ato de ouvir, perguntar e dialogar, com leveza e ao mesmo com cientificidade. Apesar de valorizar esse grande mosaico 69 Este estudo foi submetido em 08/11/2017 e aprovado em 29/11/18 (CAAE n°79717717.1.0000.5292) pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL/UFRN), em consonância com a Resolução CNS Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, por se tratar de uma pesquisa com seres humanos. 361 subjetivo das entrevistas, Bourdieu (2001; 2003; 2004) manteve os olhos na possibilidade da ciência como portadora do universal, da razão objetiva como método de descoberta. Análise de dados: o mosaico entre a inclusão e formação docente Seguimos o processo de análise pautadas na proposta de Análise de Conteúdo, na perspectiva de Bardin (2009). Deste modo, foi pela busca em dar outros significados aos dados obtidos nas entrevistas que fomos construindo um mosaico entre a Inclusão e Formação Docente na UFRN, considerando a percepção de estudantes com deficiência, professores e gestores participantes da pesquisa. A riqueza de detalhes existentes em um mosaico, constituído por diferentes peças, com tamanhos, cores e formatos diferenciados possibilita a percepção complexa da feitura da arte. Esta pode permitir diversas interpretações, assim como a junção delas pode esclarecer ao admirador uma análise do belo, do movimento e até do inacabado. Foi esta impressão que tivemos ao observarmos os dados emanados do campo empírico e as revelações analíticas advindas da categorização dos dados. Conforme as prerrogativas para a estruturação da análise proposta por Bardin (2009), as Unidades de Registros originaram as categorias e subcategorias de análise que descreveram indicações dos dados documentais e as concepções de estudantes, docentes e gestores sobre o processo educacional inclusivo no Ensino Superior e os seus entrelaçamentos com as políticas de formação continuada do docente universitário. Com vistas a preservar a identidade dos participantes da pesquisa, eles foram identificados na análise dos dados com as letras iniciais de cada grupo ao qual pertencem, isto é, estudantes (E), docentes (D) e gestores (G), enumerados conforme ordem da realização as entrevistas. Assim, temos as seguintes nomenclaturas codificadas para cada participante indicando o modo de referência utilizados em recortes de falas das entrevistas apresentadas na análise. Discussão de resultados Conceber o ingresso do estudante com deficiência no Ensino Superior brasileiro era, aproximadamente há duas décadas no Brasil, uma realidade praticamente impossível para grande parte da sociedade. Fato que historicamente surge como discussão política, pedagógica 362 e investigativa muito recente sobre o processo de inclusão destes estudantes com deficiência no Ensino Superior. A presença dos estudantes com deficiência nas IES perpassa pela reorganização estrutural e de práticas educativas historicamente alicerçadas em ações homogeneizadoras e seletivas no contexto universitário. Deste modo, emanaram de nossos diálogos nas entrevistas com docentes, estudantes e gestores as implicações, elementos contidos, na dimensão pedagógica, especificamente na atividade docente que marcam tais ações homogeneizantes e seletivas. O primeiro deles é o preconceito, barreira percebida pelos 24 entrevistados, sendo expressas de diferentes formas nas articulações orais, não especificamente partindo de si próprios para com os estudantes com deficiência, mas identificando situações estigmatizantes e geradoras de preconceito, que representam barreiras às possibilidades de ingresso e do reconhecimento de competências reais pertinentes ao estudante com deficiência para alcançar o nível superior de ensino. Vejamos nas falas dos docentes, elencadas para análise: Eu sei que existe uma forma de entrar na universidade, pelo ENEM e SiSU, mas o deficiente devia ter um processo de avaliação psicológica dos graus de habilidades, se ele gosta de música, se ele gosta de história, porque, de repente, fazendo uma junção da deficiência dele com as habilidades que ele têm seria mais fácil. (D2, 2017) Não defendo a exclusão, mas uma inclusão com interferências70 de você, a partir do momento que você tem o laudo daquele aluno, você tem condições de avaliar se ele dá mais certo para Humanas, para Cálculos, se ele daria mais certo com Música... porque, se a política é da inclusão, é de uma inclusão que ele se sinta mais humano, que aumente a autoestima dele, que ele se sinta mais motivado [...] Porque, vamos ser sinceros, dificilmente (pausa) vamos imaginar esse meu aluno aqui. Quando ele terminar o curso aqui ele tem que fazer um exame (cita órgão que legitima a profissão), que dificilmente ele vai passar. Então, uma vez que ele não passe isso nunca vai deixá-lo habilitado para atuar na área como perito, como profissional. (D3, 2017) Os fragmentos acima estão permeados de preconcepções a respeito da condição de deficiência, dos estereótipos de incapacidade socialmente e historicamente perpetuados sobre a pessoa com deficiência. Os (as) docentes D2, D8, D3 e D6 sugerem uma inclusão “até certo 70 Em alguns recortes das falas destacamos alguns trechos em sublinhado para enfatizar determinados conteúdos. 363 ponto”, ou como nominou D3, uma “inclusão com interferências”, nas quais sejam tomadas decisões de recondução de curso, pressupondo a incapacidade de os estudantes acompanharem determinados cursos de graduação, após legítimo ingresso. É interessante ressaltar o modo com o qual D6 refere-se à distinção entre pessoas com deficiência e pessoas não destras, apontando sua concepção que ser canhoto seria “apenas uma variação”. É como se para D6 a deficiência não partisse das diversas variações existentes na composição da humanidade. Diniz (2007) observa que a concepção de deficiência como uma variação do normal da espécie humana foi uma criação discursiva do século XVIII, e desde então ser deficiente é experimentar um corpo fora da norma. Para a autora, deficiência é um conceito complexo que reconhece o corpo com lesão, mas que também denuncia a estrutura social que oprime a pessoa com deficiência. Assim como outras formas de opressão pelo corpo, como o sexismo ou o racismo, os estudos sobre deficiência descortinaram uma das ideologias mais opressoras de nossa vida social: a que humilha e segrega o corpo ‘deficiente’. É necessário esclarecer que na atualidade, se discute o conceito de deficiência a partir de dois modelos que respaldam e justificam o modo de compreender a condição de deficiência. O primeiro é denominado modelo médico, o qual destaca a patologia antes do reconhecimento das especificidades do sujeito, colocando em notoriedade a deficiência da pessoa, restando a ela o papel passivo de paciente. De acordo com estudos de Rioux (1994), Amirallian (1999) e Amaral (1998), este modelo considera que a condição de deficiência da pessoa pode ser momentânea no processo de busca da “cura”, visando se aproximar ao padrão de normalidade dos aspectos físicos e sensoriais de cada indivíduo. O segundo, o modelo social da condição de deficiência, conduz ao entendimento de que a pessoa tem autonomia para tomada de decisões, participação ativa na sociedade e pleno exercício da cidadania. Esta perspectiva leva à compreensão de que a “falha” não está na pessoa ou na sua condição, mas que se encontra em uma dimensão social, que leva à exclusão (Amaral, 1998; Diniz, 2007; Costa 2014). Assim, a condição de deficiência pode ser pontuada a partir das especificidades de cada pessoa, ambiente e recursos dos quais possuem para mediar à eliminação das barreiras. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008) recomenda a eliminação de qualquer dispositivo que associasse deficiência com incapacidade, considerando, no art. 2°, que pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua 364 participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Brasil, 2008) As concepções apresentadas pelos docentes D2, D3 e D8 reforçam a perspectiva do modelo médico e reforçam a ideia de preconceito. Dado que nos apresenta que ainda existem pessoas, independentemente do nível de esclarecimento cultural, que conservam estereótipos que distanciam a pessoa com deficiência de uma sociedade inclusiva. Acreditamos que estes posicionamentos são respostas aos contextos excludentes nos quais historicamente circundaram as pessoas com deficiência, originando o preconceito, advindo de um estigma social que marca a pessoa com deficiência, e a posiciona em descrédito social, e a desvia do padrão social estabelecido. (Magalhães, 2011) Outra pauta alicerçada no preconceito e na negativa do reconhecimento às possibilidades de inclusão efetiva dos estudantes com deficiência é apresentada na fala de alguns docentes ao expressarem concepções sobre a possível interferência da presença do estudante com deficiência no rendimento e qualidade dos cursos nos quais ingressam. Sob a premissa de que, seus cursos possuem padrões altos de rendimento acadêmico e alto grau de dificuldade para cumprimento das disciplinas e posterior exercício das profissões oriundas da formação universitária, parte dos docentes reafirmam padrões de normalidade e reforçam perspectivas preconceituosas, que carregam a marca da limitação e da incapacidade pelo simples fato da existência da deficiência. Vejamos os seguintes recortes dos diálogos nas falas dos docentes D2 e D6. Tem também a qualidade do ensino do curso, né? Que é muito boa, mas esse aluno não aproveita muita coisa, porque não acompanha. Prejudica ele e prejudica o curso. (D2, 2017) Para um curso de (nome do curso) que se você parar para pensar foi tudo historicamente um curso de elite, isso é muito difícil. É uma mudança muito grande. Eu estou falando assim, bem... Não tem nenhuma... Não estou tendo nenhum orgulho em dizer isso não. É muito difícil para a gente, porque a gente tinha alunos que eram os melhores. A gente não tinha dificuldade com os alunos. Os nossos alunos eram os melhores. Hoje essa realidade mudou na universidade como um todo. Hoje a gente já está tendo que se adequar aos alunos com todos os tipos de problemas, inclusive a questão da deficiência. Isso é muito preocupante, não podemos deixar a qualidade cair. Mas, por outro lado, não podemos deixar de receber estes alunos que tem esse tipo de deficiência, e aí como é que a gente vai? (D6, 2017) 365 Os dados analisados, revelam que a sociedade e as instituições de educação superior continuam a contribuir para a perpetuação da discriminação e do preconceito construídos sobre as pessoas com deficiência. A esse respeito, concordamos com Candau e Moreira (2003, p. 163) quando afirmam que Estamos imersos em uma cultura da discriminação, na qual a demarcação entre “nós” e os “outros” é uma prática social permanente que se manifesta pelo não reconhecimento dos que consideramos não somente diferentes, mas, em muitos casos, ‘inferiores. O desrespeito e a invisibilidade dos estudantes com deficiência são parte do preconceito que deve sempre ser desconstruído. Estas posturas preconceituosas com relação à pessoa com deficiência podem perder espaço a partir de ações educativas que visem ressignificar a prática pedagógica. Não há dúvidas que o contexto educativo pode ser um dos mecanismos de transformação e instrumento para tornar a sociedade menos excludente. Diante disso, torna-se ainda mais necessário que se discuta a respeito da perspectiva educacional inclusiva na Universidade, no sentido de destacar a humanidade e individualidade de cada pessoa, antes de destacar, nelas, marcas que as diferenciam do que se prega como normalidade. Considerar a condição de deficiência como uma limitação, que por si mesma não impossibilita e não incapacita, precisa ser a tônica de nossos discursos inclusivos, principalmente no campo da Educação Superior. Além dos aspectos sociais, consideramos que as marcas do preconceito causam impactos na dimensão pedagógica. As falas de D8, G1 e D9 evidenciam tal perspectiva, ao expressarem a preocupação com a resistência de professores para saírem de suas próprias zonas de conforto, e necessariamente, refletirem sobre suas ações didáticas diante da presença de um estudante com deficiência em sala de aula. Há um preconceito, e eu aprendi isso não faz muito tempo, então eu certamente também tinha esse preconceito, que não era possível o aluno ter acesso ao ensino, porque a gente vivia em caixinhas hermeticamente fechadas com modelos de avaliação, modelos de aula e isso requer um pouco mais de habilidade e disposição do professor, porque isso vai requerer dele mais trabalho, um esforço a mais. Ele sai um pouquinho da sua zona de conforto e ele vai precisar pensar sobre quais são as possibilidades de... eu não gosto de usar essa palavra “facilitar”, mas de possibilitar o aprendizado do aluno. (D8, 2017) Alguns colegas reconhecem o seu preconceito e tentam mudar, outros não. Outros 366 reconhecem e acham que é isso mesmo: que não é para todo mundo, que a formação daquele espaço não é para “qualquer um” e isso vale tanto para o deficiente, quanto para o menino que veio da escola pública. (G1, 2017) A gente tem que oferecer a condição, tudo bem, mas de fato algumas coisas não vão ser possíveis serem feitas. Aí como você vai colocar na balança se aquilo é importante, fundamental ou não para o aluno seguir adiante? E que tipo de frustação isso pode causar para esse aluno se ele não conseguir, entendeu? Por exemplo, um caso de deficiência física, ao treinar intubação, não tem como você intubar com uma mão só, entendeu? Então assim, o que acontecia, a gente teria que terminar ajudando no procedimento, você pode auxiliar, mas a pessoa não consegue fazer sozinha [...] A pessoa tem que sair daqui com a formação completa, é profissional e não meio profissional. (D9, 2017) Os fragmentos dos relatos, nos revelam a existência do preconceito, como barreira existente na dimensão pedagógica pelo simples fato da existência da condição de deficiência, por apresentarem perspectivas de que, diante das vivências dos próprios participantes da pesquisa para alguns docentes, a Universidade ainda não se constituir lugar de fala, de escuta e de aprendizagem da pessoa com deficiência. Concordamos com Glat (2011) quando afirma que os educadores trazem em suas concepções frente aos estudantes com deficiência o estigma da incapacidade, e agregamos a este pensamento o viés formativo laboral que permeia a universidade na atualidade, o qual respalda ainda mais uma visão mercadológica de incapacidade e ineficiência por parte da pessoa com deficiência. Em consonância com marcos legais já citados no arcabouço desse trabalho, que legitimam, como um direito inquestionável, a presença da pessoa com deficiência no contexto do Ensino Superior torna-se indiscutível a necessidade de um redirecionamento pedagógico que possa oportunizar a reflexão dos princípios éticos de respeito a diversidade e a inclusão de todos os estudantes. E deste modo, coadunarmo-nos com Pires e Pires (2013) quando afirma que a inclusão consiste no respeito e promoção da ética dos direitos relativos ao ser humano, cultivando os valores da convivência acadêmica e da cidadania, por meio de um processo de inclusão de todos, considerando suas diferenças e especificidades. Neste sentido, ao considerar o ingresso de estudantes com deficiência na UFRN os cinco gestores entrevistados direcionaram suas falas para a necessidade de mudanças nas práticas da Universidade de ordem estrutural, política e pedagógica. Destacamos as falas dos 367 (as) os (as) gestores (as) G1 e G2 ao realizarem os seguintes comentários Certamente, implica num projeto de mudança de projeto pedagógico da universidade toda, implica em várias coisas, mas, por exemplo, implica nas metodologias de avaliação, nos projetos pedagógicos dos cursos, com certeza isso vai ter impacto na medida em que você vai ter mais alunos com deficiência. (G2, 2017) Na hora que eu estou numa sala de aula, na hora que eu estou desenvolvendo uma metodologia, eu posso chegar na sala de aula e ter um aluno com algum tipo de deficiência, então você já tem que pensar nisso. Então eu acho que o grande desafio hoje é trabalhar também pra que as pessoas, principalmente os professores, tenham esse entendimento, essa compreensão e essa necessidade, comece a ter esse olhar para as pessoas de forma mais integral. (G1, 2017) A presença do estudante com deficiência na UFRN tem oportunizado a elaboração não apenas de políticas ou o desenvolvimento de ações para a promoção de acessibilidade, mas tem provocado reflexões institucionais sobre “a necessidade de uma mudança no modo de pensar e nas concepções sobre a deficiência, sobre a diversidade em geral, e no modo de pensar sobre o ensino ou sobre a aprendizagem” (Carballo, p. 39, 2018). Este movimento de reflexão, que se refere a dimensão pedagógica e vem ecoar o silêncio científico, político e formativo do docente com vistas ao aprimoramento da atuação docente universitária à luz da perspectiva inclusiva. Em nossas entrevistas junto aos estudantes com deficiência foram relatados aspectos inerentes à dimensão pedagógica que geraram sofrimento, exposição da condição de deficiência, má compreensão dos seus direitos expressos nas políticas institucionais, que se apresentaram como muros a serem ultrapassados. Oito estudantes, dos nove entrevistados, relataram equívocos ocorridos nas práticas docentes. Já os docentes e gestores não apresentaram nenhum fato que julgassem se caracterizar como uma barreira pedagógica. Das situações vivenciadas, elencamos os seguintes trechos das entrevistas com os estudantes: Devido à baixa visão, tenho que escrever com letras grandes, então eu extrapolei mais umas duas linhas na prova e ele [professor] foi e cortou a resposta, deixou como incompleta. Não reconheceu aquilo que extrapolou. Eu falei: Mas professor, eu tenho problema, deficiência. E ele respondeu: Ah, então procure se superar! (E1, 2017) Às vezes fico invisível na sala. O professor usa os slides e nem se preocupa em descrever o que todos estão vendo, menos eu. E os filmes? Num vou nem comentar. Quando tem acessibilidade em sala você flui melhor, você consegue alcançar o 368 objetivo da disciplina. Me refiro ao professor mesmo. Porque é ele o responsável por essa acessibilidade na hora de ensinar e aprender. (E6, 2017) As situações relatadas pelos estudantes, nos remetem à reflexão realizada por Moriña et al (2013), referente a postura do professor em sala de aula diante do estudante com deficiência. O estudo apresenta aspectos nos quais os docentes podem se apresentar como barreira ao processo de ensino e aprendizagem, ao demonstrarem resistência, preconceito, inflexibilidade e indiferença à presença do estudante com deficiência, levantando muros ao processo de inclusão no Ensino Superior. No entanto, identifica no professor universitário a possibilidade de em vez de erguer muros, construir pontes rumo à aprendizagem, à participação efetiva e à promoção de acessibilidade pedagógica. Corroborando com esse estudo ao investigar o contexto do ensino superior, Carballo (2018, p.44) afirma que “em relação ao processo de ensino e aprendizagem, o professor tem um papel fundamental. O docente, pode se constituir como a principal barreira na experiência educativa universitária do alunado com deficiência, mas também pode se constituir como uma grande ajuda”. Quanto a esse último aspecto, experiências de boas práticas educacionais foram trazidas em nossos diálogos por cinco estudantes e três docentes durante as entrevistas. As consideramos como significativas pontes que conduziram os estudantes às situações de ensino e aprendizagens inclusivas, assim expressadas: “superamos a barreira juntos; durante a disciplina houve muito diálogo; tive que ter paciência com ela; eu sabia que era possível.” Das vivências compartilhadas nas entrevistas elencamos as falas seguintes como exemplos de boas práticas: Eu fiz uma prova sobre tática, havia um retroprojetor, eu colocava uma lâmina que tinha o desenho da quadra e tinham os supostos jogadores que se distribuíam. Aí todos os alunos, igualmente na sala, tinham que ir até lá na frente e fazer para a turma uma preleção. Dizer como que eles iam escalar os jogadores dentro da quadra. Note que há um conteúdo objetivo sobre isso, por exemplo, o sistema 2-2, o sistema 3-1, que eles foram ao longo das aulas experimentando isso e o E. que era o estudante fazia também isso. "Ah, mas como que ele se locomovia na quadra?" Bom, ele sem a cadeira não conseguiria se locomover, mas o que impedia de alguém empurrar a cadeira enquanto ele estivesse na quadra? O que impediria ele de tocar na bola com os pés? Ele fazia isso com dificuldade? Fazia. Isso impedia dele fazer? Não. Então não exigia que ele tivesse uma meta de desempenho de acertar o passe, de fazer tantos gols, mas ele se deslocava dentro da quadra. Ele experimentava a 369 sensação de se deslocar dentro da quadra. [...] Nas atividades teóricas era pra colocar os soldadinhos, os jogadores, dentro do retroprojetor. Quando eu dizia: mostre para mim o sistema 2-2. Ele colocava. Se ele tivesse alguma dificuldade motora de colocar ele apontava e o auxiliar, colega de turma, ajudava ele a colocar. E ele dizia: é isso? É, é isso. Aí eu dizia: mostre uma movimentação de rodízio. Como é que estes jogadores iriam rodar dentro da quadra. Aí ele sinalizava com toda a dificuldade motora dele, mas ele conseguia. Mesmo com as suas dificuldades motoras ele conseguiu cognitivamente mostrar perfeitamente o quê que era a situação. (D5, 2017) Me permita aprender com você. Porque só convivendo é que a gente sabe. As diferenças (pausa) a gente não está preparado para viver com elas mesmo. (D3, 2017) Você vai aprender a aprender sendo cega e eu vou aprender a ensinar uma pessoa cega, porque eu nunca fiz isso [...] E foi realmente um aprendizado. Nós enfrentamos os desafios juntas, algumas coisas deram certo, outras coisas não deram certo e a gente teve que refazer. Quando a gente diz não no início, a gente inibi qualquer possibilidade de invenção que a gente possa ter para dar essa possibilidade ao sujeito. (D1, 2017) A prática pedagógica, nestes contextos, é compreendida com uma ação na qual se abre um canal de mediação entre professor e estudante, permitindo-os, como nos conduz Freire (1996) e Morin (2004) a pensar, mutuamente aprender a ser, a conhecer e a conviver sob uma perspectivadas diferenças humanas, considerando as especificidades de cada um, assim como os modos e diferentes ritmos de aprendizagens. Envolver o estudante no processo educativo significa considerar e valorizar nele as potencialidades percebidas, além de contribuir para o seu empoderamento enquanto estudante universitário e cidadão, contribuindo para o crescimento pessoal e coletivo de uma educação libertadora e conscientizadora, Freire (1996), na qual a pessoa com deficiência pode se reconhecer questionando a normalidade, a legitimidade do tratamento inferiorizado e a cultura que o incapacita (DANTAS, 2015). Na perspectiva educacional inclusiva, a dimensão pedagógica precisa estar alicerçada em uma prática docente motivada a buscar a equidade de condições para todos os estudantes, pautada na “[...] aprendizagem cooperativa, componente do ensino, que está relacionada à criação de uma atmosfera de aprendizagem em sala de aula em que os estudantes com seus 370 vários interesses e habilidades podem atingir o seu potencial.” (Karagiannis; Stainback, S; Stainback, W, 1999, p.22). A aproximação e a escuta do outro é exercício essencial à dimensão pedagógica, considerando as peculiaridades de cada estudante em seus processos de aprendizagem, distanciando-se de práticas pedagógicas pautadas no modelo racionalista de educação baseado na objetividade e padronização dos papéis de estudantes e professores. Nos diálogos resultantes das entrevistas realizadas, estudantes, docentes e gestores ressaltaram como pontos importantes à dimensão pedagógica diante do estudante com deficiência aspectos como: compromisso com a docência, empatia e sensibilidade. A gente já tem um conceito, se eu sou dedicação exclusiva, aquela coisa toda. Há um, na verdade, a importância de todos participarem, mas há um compromisso maior que eu tenho que dar de retorno ao meu aluno, ele precisa aprender e eu preciso oferecer as melhores estratégias. Penso que todos os professores deveriam pensar e agir assim. (D7, 2017) Trabalhar com deficiente não é qualquer coisa. não é qualquer jeito. Não é chegou na sala, copiou no quadro, copiou no caderno e acabou-se, não. Tem que ter primeiro do que tudo amor, carinho e dedicação. Se não tiver isso, pode morrer de fazer curso, ser até doutor no que ele quiser, mas não vai conseguir nunca trabalhar com aqueles ali. Porque ele tem que ser sensível, perceber que do outro lado também estão pessoas. (E1, 2017) Tentar senti-lo e se colocar no lugar dele, mas a empatia pode favorecer, ou não se ocorrer a falta dela. A gente está falando da pessoa humana, a gente não está falando da pessoa com necessidade específica. (D1. 2017) Estas afirmações nos remetem à reflexão de que o processo educacional inclusivo é composto pela sensibilidade pedagógica, a qual é comprometida com o exercício constante do professor em colocar-se no lugar do estudante quando elabora o plano de aula ou de plano de disciplina demonstrando assim basear suas ações nos princípios de igualdade, justiça e imparcialidade, citados por Schaffner e Buswell (1999). Consideramos que estes pontos não se dirigem apenas à ordem estrita do pedagógico, mas, sim, do humano. Pela individualidade e singularidade que todo ser humano apresenta, independente da condição que possui, “[...] o educador necessita estar sensibilizado para ver, ouvir e tocar o ser aprendente” (OLIVEIRA, 2010 p. 136), buscando desenvolver estratégias 371 que o façam desconstruir as barreiras alicerçadas em comportamentos egoístas, as quais não permitem que se coloquem no lugar do outro em um exercício de ressignificação de si mesmo e, consequentemente, da prática docente. Para Tardif, (2000, p. 16), “o objeto do trabalho do docente são seres humanos e, por conseguinte, os saberes dos professores carregam as marcas do ser humano”, sendo a aquisição da sensibilidade relativa às diferenças entre os estudantes constitui uma das principais características do trabalho docente. No entanto, não há como desassociar da dimensão pedagógica, preceitos discutidos por Freire (1996), na obra Pedagogia da Autonomia. Nela, vemos que no ato pedagógico também estão implicados o emprego de técnicas, as ações didáticas conscientes e o conhecimento científico necessário para alcançar o objetivo transformador da Educação. Freire (1996) ressalta o vínculo entre as faces que permeiam a didática desde a presença da rigorosidade metódica, pesquisa, competência, autoridade, criticidade, estética e ética; assim como as demais faces da didática que perpassam pela: generosidade, respeito à autonomia do ser educando, alegria e esperança, curiosidade, dentre tantos outros. E a partir dos vínculos estabelecidos entre as diferentes faces da didática compreender que a Educação é uma forma de intervenção no mundo, na qual o professor é importante articulador e mediador na educação de todos os estudantes, pois em suas ações didáticas residem a essência da formação, mediação e transformação, em movimento dialógico e reflexivo do exercício da docência. (FREIRE, 1996). Claramente, o Ensino Superior apresenta lacunas formativas e políticas no que se refere à dimensão pedagógica do docente universitário. E quando colocamos estas questões à luz da perspectiva educacional inclusiva, as lacunas tornam-se ainda mais evidentes. Esta realidade, foi confirmada em nosso campo de investigação, nesta categoria de análise a qual trouxe a tona temáticas como preconceito, estigma e exclusão; necessidade de redirecionamento pedagógico docente a partir de reflexões institucionais; atitudes docentes que podem se constituir como barreiras, erguendo-se como “muros”, através de práticas docentes equivocadas, ou que podem se constituir como “pontes”, através da realização de boas práticas educacionais que refletem compromisso com a docência, empatia e sensibilidade. Além disso, foram levantados pontos a respeito do compromisso formador e transformador no exercício docente, ao assumir aspectos da didática que permeiam a dimensão pedagógica desde a rigorosidade metódica ao despertar da curiosidade e da alegria no ser aprendente. Os saberes pedagógicos podem colaborar com o exercício da docência, em uma íntima 372 vinculação entre teoria e prática, pois a docência é um campo complexo de ações, que exige uma formação contínua e rigorosa reflexão sobre a prática mediada pela teoria. Consideramos que esta preocupação com a dimensão pedagógica da docência universitária, em uma perspectiva formativa, está diretamente ligada à qualidade do ensino. Sobre isso, Zabalza (2011) afirma que a qualificação da Educação Superior requer investimentos na preparação docente para o trabalho, pois isto remete à reflexão sobre o processo de formação para a docência universitária, considerando seus aspectos teóricos e práticos, buscando a compreensão de como nos tornamos docentes e de que repertório de saberes se faz necessário lançar mão para uma docência preparada a lidar com a diversidade e especificidades humanas dos estudantes e dos diferentes contextos de aprendizagem. Considerações finais Independentemente de qual perspectiva possa direcionar a inclusão plena e efetiva das pessoas com deficiência em todos os contextos de aprendizagem, é premente que docentes e estudantes a percorrerem caminhos pedagógicos mais atentos ao humano e às especificidades de cada sala de aula e de cada estudante, como agentes ativos para desenvolvimento do saber e da criticidade. Não podemos excluir o engajamento institucional em possibilitar a legitimidade da formação docente através de programas e políticas que provoquem uma mudança cultural na universidade frente os estudantes com deficiência. A inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior vem propor novos olhares sobre o pensar e agir do professor no ato de planejar, ensinar, aprender e avaliar o ensino universitário. E, dessa forma, compreender que “[...] ser professor obriga a opções constantes que cruzam a nossa maneira de ser com a nossa maneira de ensinar, e que desvendam na maneira de ensinar a nossa maneira de ser.” (Nóvoa, 1992, p.10). Sob a perspectiva da inclusão de estudantes com deficiência na universidade, a docência universitária precisa ser moldada, conforme apontam Pires e Pires (2013), pelo compromisso ético do professor, respeitando a integridade do estudante, cuidando do seu bem-estar acadêmico por meio de uma aprendizagem atenta e cuidadosa, da compreensão e da aceitação do outro, indo além de uma compreensão objetiva do conhecimento acadêmico, mas alcançando uma compreensão subjetiva de cada estudante em suas especificidades, considerando as suas vivências, sentimentos, objetivos e dificuldades. Neste sentido, a prática pedagógica, de acordo com Freire (1996) e Morin (2004), deve 373 ser vista como uma ação permeada de reflexão e criticidade, onde se abre um canal de mediação entre professor e estudante, permitindo-os mutuamente aprender a ser, a conhecer e a conviver sob uma perspectiva do humano, considerando as especificidades de cada um, assim como os modos e diferentes ritmos de aprendizagens. Para Nóvoa (1995), a diversidade e as novas configurações sociais e culturais que permeiam o papel da universidade conduzem os professores a reencontrar novos valores, que permitam atribuir um sentido à ação docente, precisando edificar novas normas de funcionamento e regulações profissionais. Logo, a ação docente é permeada de novos saberes e práticas educacionais, necessitando romper com um modelo socialmente construído de ensino superior, o qual foi direcionado historicamente para ações educacionais universitárias a um grupo de elite, de destacado sucesso social, com raça e credo únicos. Diante das novas configurações sociais, a Universidade precisa se refazer em novos saberes e novos modos de ação formativa do professor, ampliando o olhar da sociedade para as especificidades e necessidades de cada sujeito. Assim, envolvido neste processo, o docente universitário deve compreender o seu lugar na articulação entre os princípios éticos, políticos e filosóficos que envolvam a ação educativa norteada pela perspectiva de diversidade humana. Referências AINSCOW, M. Tornar a educação inclusiva: como essa tarefa deve ser conceituada? In ____ Tornar a Educação Inclusiva. Brasília: UNESCO, 2009. AMARAL, Lígia Assunção. Sobre crocodilos e avestruzes: falando de diferenças físicas, preconceitos e sua superação. In ___ Diferenças e Preconceitos na Escola: Alternativas teóricas e Práticas. Groppa, J. A. (org.). São Paulo: Summus, 1998. AMIRALIAN, M.L.T. Compreendendo o cego: uma visão psicanalítica da cegueira por meio de desenhos-estórias. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999. BRASIL. Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais. Brasília: Corde, 1994. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em: 10 de dezembro de 2011. _____. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Brasília: MEC/SEESP, 2001. Disponível em: <http: //portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/rsolucao2.pdf>. Acesso em: 08 de dezembro de 2011. 374 _____. Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Portaria nº 948, de 09 de outubro de 2007. Ministério da Educação. Brasília: 2008. Disponível em:< http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica.pdf>. Acesso em 14 de dezembro de 2011. _____. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Brasília: Imprensa Oficial. Disponível em: http:<//portal.mec.gov.br/seesp/index.php?option=content > Acesso em: de 15 de dezembro de 2011. _____. Lei nº. 7.853 de 1989. Ministério da Educação. CORDE. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei7853.pdf>. Acesso em: 15 de dezembro de 2011. _____. Lei nº. 8.069. Estatuto da Criança e do Adolescente. 1990. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei8069_02.pdf>. Acesso em: 14 de dezembro de 2011. _____. Decreto nº. 914 de 1993. Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Ministério da Educação. Brasília: 1993. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec914.pdf>. Acesso em: 15 de dezembro de 2011. _____. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9.394/96. Brasília, 1996. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/txt/lei9394_ldbn1.txt>. Acesso em: 15 de dezembro de 2011. _____. Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF/SEESP, 1998. Disponível em:<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro.pdf> Acesso em: 10 de dezembro de 2011. _____. Plano Nacional de Educação. Ministério da Educação. Brasília, 2001. Disponível em:<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/pne.pdf>. Acesso em: 10 de dezembro de 2011. _____. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Resolução CNE/CEB nº. 2/2001. Brasília, 2001. 375 Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/resolucaocne.pdf>. Acesso em: 10 de dezembro de 2011. ______. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. – Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007. _____.Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm _______. Declaração Universal dos Direitos Humanos, ratificada no Brasil como Emenda Constitucional. 1995. BIANCHETTI, L. Aspectos Históricos da Educação Especial. Revista Brasileira de Educação Especial. UFSCar/UNIMEP. São Carlos, v.2, n.3, p.07-19, 1995. BOOTH, T., AINSCOW, M. (et Al). Index for Inclusion. Developing Learning Participation in School. Londres, UK: Centre for Studies on Inclusive Education (CSIE). 2002. CARVALHO. L.; ALMEIDA. P. Direitos humanos e pessoas com deficiência: da exclusão à inclusão, da proteção à promoção. Revista Internacional de Direito e Cidadania, n. 12, p. 77-86, fev. 2012. CARVALHO, R. E. Escola inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico. Porto Alegre: Editora Mediação, 2008. ESPANHA. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. UNESCO, 1994. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários à prática educativa. 31 Ed. São Paulo, SP. Paz e Terra (Coleção Leitura). 2005. _____. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996. MAZZOTTA, M. J. Silveira. Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas. 5ª Ed. São Paulo. Cortez, 2005. MENDES, E. G. A radicalização do debate sobre inclusão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v.11, n.33, p.387-405, 2006. MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Trad. Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. 11.ed. São Paulo: Cortez; Brasília: UNESCO, 2006. 376 ONU. Declaração Universal http://www.onubrasil. dos Direitos Humanos. 1948. Disponível em: org.br/documentos_direitoshumanos.php>. Acesso em 19/10/2014. TAILÂNDIA. Declaração Mundial sobre Educação para Todos. 1990. Disponível em: <http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/Declaracao_Jomtien.pdf>N Acesso em: 15 de dezembro de 2011. 377 19.TEACHING THE GENERAL CASE IN ECONOMICS WHAT HAVE WE LEARNED AT THE ECONOMIC DECISION ANALYSIS COURSE? António Bento Caleiro71 Abstract Allegedly, in order to achieve the objectives outlined in the Bologna Declaration, it would be desirable that, especially in higher education 1st cycle degrees, there should be courses with the widest possible approach, in order to cover the different perspectives addressed in the science associated with that degree. This happens in the 1st cycle (as well as in the 2nd cycle) degree in Economics, at the University of Évora, with the Economic Decision Analysis course. In this course, the general case is presented, with the different branches of Economics seen as particular cases. The appraisal of this teaching-learning experience is the object of this study. Keywords: Teaching. Learning. General Case. Economic Decision Analysis. 71 Assistant professor at the Universidade de Évora: Departamento de Economia, Portugal. caleiro@uevora.pt 378 1. Introduction According to the principles outlined in the Bologna Declaration, it was intended, as much as possible, that students should attend three levels of higher education, in particular the first two, as training for most students. This ended up translating into a redesignation of those levels, of a sequential nature to emphasize continuity, i.e. 1st, 2nd, and 3rd cycles. That continuity in higher education learning resulted in the call for the 1st cycle degrees to be, as much as possible, of ‘broadband’ type, even covering courses that did not fit, strictly, within the scope of the science in question being studied in that cycle. In this sense, it should also be desirable the existence of courses in which the general case is presented, so that students understand how the different courses associated with the different parts or approaches usually considered in the science under study are integrated/complemented, as particular cases of that general one. That is what happens in Economics, where, as is known, there are several branches: microeconomics, macroeconomics, monetary economics, international economics, etc., these being treated in the various courses that, most commonly, constitute any 1st cycle (as well as some master and even doctorate programmes) of Economics. This is also the case in the University of Évora, but there is also a course that intends to present the general case, with those various branches of Economics being seen as particular cases. This is the Economic Decision Analysis course, whose main goal is precisely to provide an integrated approach to the process of taking economic decisions by the economic agents in the most relevant situations, i.e. certainty, risk and uncertainty, eventually under a static or a dynamic context. The Economic Decision Analysis case, in terms of the challenges that arise in the teaching-learning process, is what we intend to analyze here. That being said, the rest of this paper is structured as follows: Section 2 offers the description, argumentation and discussion of the case associated with the course under analysis; Section 3 concludes; the Annexes present some important information to better characterize the course, namely the syllabus and the bibliography. 2. Description, Argumentation and Discussion 379 Starting with a short historical digression, Economic Decision Analysis was taught, for the first time, in the academic year 2003/04, as an optional course of the 1st cycle/degree in Economics (at the University of Évora), following the reformulation of curricular plan of that degree. Despite its optional nature, it has been taught in almost every academic year, always under our responsibility. In fact, its non-functioning has occurred only when taking sabbatical leave. As a course of the Master’s in Economics (at the University of Évora), it was taught, for the first time, in the academic year of 2006/07, having become mandatory in this master’s degree, in the academic year of 2015/16. From this year on, it was also taught as an optional course for the Master in Monetary and Financial Economics (at the University of Évora). As an optional curricular unit of the PhD in Economics, it was taught in the academic years of 2010/11 and 2011/12. It is, therefore, a course that, due to its characteristics, is appropriate to be taught in the 3 cycles of higher education studies. In fact, these characteristics were immediately evident – at least for us – in the Economic Planning course, which gave rise to the Economic Decision Analysis course, created by our initiative. In fact, the Economic Planning course has, to the best of our knowledge, always been part of the curriculum plans of the 1st cycles/degrees in Economics (at the University of Évora). This course, which was annual in nature and later became semiannual, was always mandatory in those curricular plans. In the first part of Economic Planning, an analysis of economic decisions was presented. For instance, our first contact with Game Theory, took place, as a student, in this course, in the (far-off) academic year of 1984/85. The manual used at that time was the well-known – at least for us – Johansen (1977). About this reference in particular and, in general, about the importance of its author, it is worth mentioning part of the note in Econometrica, Vol. 61, No. 6 (November, 1983), pp. 1854-55, that states: “It is probably fair to say that Leif Johansen’s overall perspective on economics was that economic theory should be seen as a tool for economic planning. This perspective is clearly visible in his two-volume work Lectures on Macroeconomic Planning (NorthHolland, 1977-78). The treatment is broad and sometimes reaches beyond the conventional borderlines between economics and other disciplines. At the same time, 380 there is hardly any aspect of economic theory which is not discussed from the planning perspective, and Johansen always manage to draw some interesting implications from even the apparently most esoteric parts of the theoretical literature.” The above-mentioned comment clearly shows that the approach to Economic Planning, based on the work of Leif Johansen, was comprehensive in nature and, by its characteristics, flexible enough to remain current, in other words up-to-date. Even so, after the extinction of that curricular unit – which was the first one to be taught when we entered the Department of Economics at the Universidade de Évora, in the distant year of 1988/89 – paradoxically because it was considered out of date, we did everything so that it would be (back) considered in the curricular plan of the 1st cycle/degree in Economics. This is how the Economic Decision Analysis course (which we chose in the context of our ‘aggregation’ in Economics, in 2011) emerged. From Johansen (1977) we still retain in memory (and still use) a picture like Figure 1. Figure 10: The basic scheme of decision analysis In fact, Figure 1 perfectly reflects the scope, flexibility and adaptability of the approach suggested by Johansen (1977), which at first appears to be (almost) abstract – or esoteric, in the words of that comment. In the figure, X represents the set of possible decisions, x being one of them, and Z represents the set of possible states assumed by the non-controllable (by the decisionmaker agent(s)) factors, and z one of them. To each pair (x,z) corresponds a (unique) 381 state for the objective variables, y = f(x,z), – forming the set Y – to which, by nature, the decision-making agent(s) assume preferences, W(y). Thus, the optimal decision, say, x*, will be the one that, being possible, i.e. x* belonging to X, together with a (predicted / known / assumed) state z^, gives rise to the best y, i.e. the one that, belonging to the set Yz, when evaluated on the scale of preferences it reaches the highest possible value. The determination of optimal decisions, according to the approach outlined above, in the most diverse situations is, therefore, what we intend to study in the Economic Decision Analysis course, which, is fair and relevant to be said, corresponds to the first part of the extinct Economic Planning course. Thus, in what concerns the general objectives and skills to be acquired, the Economic Decision Analysis course has the essential objective of providing the study of the decision-making process by economic agents under the situations, considered more relevant, which they usually face. Thus, according to the absence or not of random elements (in the decision-making process), and their type of randomness, the certainty, risk and uncertainty situations are analyzed. These situations are studied under a static context at the 1st cycle/degree and also under a dynamic context at the 2nd cycle/degree. The abstraction and flexibility that characterize the perspective with which the problem of determining the (optimal) economic decisions is studied makes the course, essentially, a means of acquiring modes of reasoning and not a menu of ‘recipes’. Thus, while at the theoretical level, the necessary instruments are provided to choose the optimal decisions in each situation, at the practical level, the understanding of these instruments is tested through the use of different applications (of macroeconomic, microeconomic, econometric nature, etc.) that, in this way, can be considered particular cases of the theoretical approach followed in the course. Thus it is possible to consider that, within the scope of professional skills that students are expected to acquire in order to integrate into the job market, the course aims to provide the ability to analyze economic activity in its various dimensions, as well as develop the ability to understand the decision-making processes. decision-making, as well as contact with the definition and execution of applied research work, in various fields of Economics. In terms of general skills, the course provides adaptability, 382 innovation, reasoning or independent thinking, decision-making skills, as well as team work. In terms of specific skills, the course contributes, through the consolidation of the capacities to face the multiple aspects of the decision-making processes, to the solid formation in the foundations of economic science in its aspects of (applied) macroeconomics and microeconomics, as well as for mastering the various tools of economic, qualitative and, above all, quantitative analysis. In what concerns the consistency of the syllabus with the objectives of the course, naturally, such an approach, and its intrinsic objectives, is reflected in the structure of the syllabus (which can be found in the annex). In fact, the decision theory associated with each case – but only the strictly necessary – is always considered first, and secondly, the economic applications, which are particular cases. To attest the wide scope of the analysis, it can be said that, for example, in the 1st cycle, there are cases of macroeconomics, microeconomics, public economics, econometrics, economic policy, operations research, economic psychology, international economics, fiscal policy, financial economics, and economic planning (this one, symbolically). Obviously, the achievement of the objectives that are intended to be achieved with this course depends, in part, on the previous knowledge, of the various areas of Economics, that the students already possess when attending the course. Therefore, when creating the course for the 1st cycle/degree, we proposed that it should be placed in the last semester of that degree. In fact, it ended up being in the penultimate semester which, under normal conditions, still does not raise any major problems. To be more specific, in what concerns the course framework, Economic Decision Analysis is part of group II of optional courses in Economics. Taking into account the current curricular plan of the degree, it must be attended in the 5th, i.e. the penultimate academic semester. Thus, it is supposed to be attended after students have attended mandatory core curricular units, namely:  Principles of Microeconomics;  Mathematics Applied to Economics and Management I;  Principles of Macroeconomics;  Mathematics Applied to Economics and Management II;  Microeconomics I;  Macroeconomics I; 383  Probability and Statistics;  Microeconomics II;  Macroeconomics II;  Econometrics I; which allows the acquisition of (minimum) knowledge required by the course. Given that, in fact, it is possible for students to attend the Economic Decision Analysis course without having already been approved in all those courses, in these cases, there are admittedly some difficulties. In what concerns the teaching methodologies, the teaching-learning process is based on the presentation of the decision theory needed for the understanding of the several economic applications. While, at theoretical level, the necessary instruments to take optimal decisions are supplied, the understanding of them is tested by the use of several applications (from macroeconomics, microeconomics, econometrics, economic policy, operations research, etc.). Given the characteristics of the course, the entire matter, in each lecture, is presented on the board, as a way of ensuring, as much as possible, that there are no doubts about the various steps that the subject involves. While the information collected by the students in the lectures is of crucial importance in the acquisition of knowledge, obviously it can / should be complemented by reading the recommend bibliography. In what concerns the course support bibliography, given the comprehensive nature of the course, the list of supporting bibliographic references could be extremely long. In fact, even if it were intended to suggest works that covered, stricto sensu, each particular case or economic application that is to be presented throughout the course, it would still be a list, certainly, composed of several dozen titles. On the other hand, the innovative nature of the approach makes it difficult to suggest a (single) economic decision analysis manual. Thus, taking into account that difficulty and the need to avoid the dispersion of suggested bibliographic references, with the consequent overload of effort (in a course that, by itself, already requires a lot of extra-class effort), a support text, corresponding to the development of the syllabus, authored by us, is made available and being strongly recommended to be studied, in a regular way. This support text, as well as all the other 384 elements of support for the course, are placed in the moodle area of Economic Decision Analysis; see http://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/4427. The regular study of subjects is, in fact, very advisable in Economic Decision Analysis, not least because only this allows to raise doubts that, sometimes, students do not realize they have. From this point of view, it turns out that it is advisable, in terms of evaluation, to choose the continuous evaluation regime, whenever possible. In what concerns the assessment, according to the Academic Regulations of the University of Évora, students can choose the continuous evaluation regime or the evaluation system by final exam. In the 1st cycle/degree course, the continuous assessment regime consists of three written (closed-books) tests: A first test covering the matter corresponding to the Case of a Single Decision-Making Agent in chapter 1. Decision Analysis in Certain Situation, lasting 60 minutes, and weighting of 25%; a second test covering the matter corresponding to the Case of Two Decision Maker Agents of Chapter 1. Decision Analysis under Certainty, lasting 90 minutes and weighting 35 % of the final grade; a third test covering the matter of chapters 2. Analysis of Decision under Risk and 3. Decision Analysis under Uncertainty, lasting 90 minutes, with a 40% weighting in the final grade. The modality of assessment by exam is based on a single assessment written (closed-books) test covering all the three chapters. In the 2nd cycle/degree course, the continuous assessment modality is based on the accomplishment of one written (open-books) test, whose weight is 60% on the final grade, and an assignment based upon the demonstration of the analytical results of a scientific article, whose weight is 40% on the final grade. The modality of assessment by exam is based on a single written (open-books) test covering all the matters under study throughout the course. As a balance of results, we can say that, after being overcome the (understandable) barriers created by the language, purposefully generic (abstract or esoteric), used in Economic Decision Analysis, the (also understandable) difficulties that this course entails, usually end up being also overcome. Acknowledging that Economic Decision Analysis is a difficult course, it is also the course where, in certain cases, our best classifications are given, precisely to those students to whom we were able to transmit the sensitivity for and utility of this type of (general) approach. 385 3. Conclusion What have we learned at the Economic Decision Analysis course? The information collected over these years of teaching allows us to say – as we, indeed, do in the first lecture – that, in fact, it is (most probably) the most difficult course of the 1st cycle/degree in Economics (at the University of Évora) but it is also (probably) the more important course given that we will be considering the general case, whereas the other courses consider the particular cases in Economics. Although the importance of the course being not that one, in fact it corresponds to an approach that we believe is important to be used, especially in the 1st cycle/degree of higher education studies. Plainly, the abstraction and flexibility that characterize the course make it a means of acquiring modes of reasoning, which is of obvious importance, mainly at those first degrees of academic formation. In particular, that flexibility is evidently considered by giving more attention to the economic applications, emphasizing being (mere) particular cases of the decision theory corresponding to the situations of interest. As expected, our teaching methodology reflects this objective, which, taking into account the results that we have been obtaining, may be considered as sufficiently successful, also from the point of view of what students learn at this Economic Decision Analysis course. As for the limitations of this work, in fact, it remains to be seen what the students’ real opinion is about this course. Being sure that the students comment on the courses, immediately after their attendance, we believe that an even more reliable analysis could be obtained through an inquiry (sufficiently after the attendance of the course) of the students. That remains to be done in further studies. References Johansen, L. (1977). Lectures of Macroeconomic Planning – Parts 1 & 2. Amsterdam: North-Holland. 386 Annex I Syllabus of the Economic Decision Analysis course (for the 1st cycle in Economics) 1. DECISION ANALYSIS UNDER CERTAINTY 1.1. The Case of a Single Decision-Making Agent 1.1.1. Decision Theory: The Basic Scheme 1.1.2. Economic Applications / Particular Cases 1.1.2.1. A case of macroeconomics: the IS-LM model 1.1.2.2. A case of microeconomics: the duopoly model 1.1.2.3. A case of public economics: the Laffer curve 1.1.2.4. A case of econometrics: the least squares estimators 1.1.2.5. A case of economic policy: the fixed targets criterion 1.1.2.6. A case of operations research: the investment projects analysis 1.2. The Case of Two Decision-Makers 1.2.1. Decision Theory: Teams Theory and Game Theory 1.2.2. Economic Applications / Particular Cases 1.2.2.1. A case of economic psychology: the difficulties of cooperation 1.2.2.2. A case of economic policy: the credibility of economic policies 1.2.2.3. A case of international economics: the international coordination of economic policies 2. DECISION ANALYSIS UNDER RISK 2.1. Decision Theory: The non-controllable variables and the multipliers of decision variables 2.2. Economic Applications / Particular Cases 2.2.1. A case of economic policy: the models of partisan cycles 2.2.2. A case of fiscal policy: the uncertainty in public spending multipliers 2.2.3. A case of financial economics: the portfolio analysis 3. DECISION ANALYSIS UNDER UNCERTAINTY 3.1. Decision Theory: The decision criteria and the decision trees 3.2. Economic Applications / Particular Cases 3.2.1. A case of economic planning: the decision rules and the flexibility of plans Annex II Syllabus of the Economic Decision Analysis course (for the Master in Economics) 1. DECISION ANALYSIS UNDER A STATIC CONTEXT 1.1 The Certainty Situation 1.1.1. Decision Theory 1.1.2. Economic Applications / Particular cases 1.2. The Risk Situation 1.2.1. Decision Theory 1.2.2. Economic Applications / Particular cases 1.3. The Uncertainty Situation 1.3.1. Decision Theory 387 1.3.2. Economic Applications / Particular cases 2. DECISION ANALYSIS UNDER A DYNAMIC CONTEXT 2.1. The Discrete Time Situation 2.1.1. Decision Theory 2.1.2. Economic Applications / Particular cases 2.2. The Continuous Time Situation 2.2.1. Decision Theory 2.2.2. Economic Applications / Particular cases Annex III (Complementary) bibliography Bather, J. (2000). Decision theory: an introduction to dynamic programming and sequential decisions. Chichester: John Wiley & Sons. Baumol, W. (1977). Economic Theory and Operations Analysis – 4th edition. New Jersey: Prentice-Hall. Biswas, T. (1997). Decision-making Under Uncertainty. Houndmills, Basingstoke, Hampshire: Macmillan Press. Cavaco Silva, A. (1982). Finanças Públicas e Política Macroeconómica. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa. Chiang, A. (1982). Mathematics for Economists. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil. Chiang, A. (1992). Elements of Dynamic Optimization. New York: McGraw-Hill. Clemen, R.T. (1996). Making Hard Decisions: An Introduction to Decision Analysis – 2nd edition. Belmont: Duxbury Press, Wadsworth Publishing Company. Delias, P.; Rochhia, S., eds. (2016). Tools and Techniques for Economic Decision Analysis. Hershey: IGI Global. Fabrycky, W.J.; Thuesen, G.J.; Verma, D. (1998). Economic Decision Analysis. New Jersey: Prentice Hall. Forsund, F.R. (ed.) (1987). Collected Works of Leif Johansen – Vols. I & II. Amesterdam: North-Holland. Gapinski, J.H. (1982). Macroeconomic Theory: Statics, Dynamics & Policy. New York: McGraw-Hill. Hammond, J.S.; Keeney, R.L.; Raiffa, H. (1999). Smart choices: a practical guide to making better decisions. Boston: Harvard Business School Press. Johansen, L. (1977). Lectures of Macroeconomic Planning – Parts 1 & 2. Amsterdam: North-Holland. Lapin, L.L. (1994). Quantitative methods for business decisions: with cases – 6th edition. Belmont: Duxbury Press. Mills, G. (1984). Optimisation in Economic Analysis. London: George Allen & Unwin. Murteira, B. (1988). Estatística: Inferência e Decisão. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda. Murteira, B. (1990). Probabilidades e Estatística – Vol. I – 2nd edition. Lisboa: McGraw-Hill de Portugal. 388 Passet, R. (1972). Introduction aux mathematiques de l'analyse economique structurale et problems de decision. Paris: Éditions Cujas. Pinto, J.C.C.; Curto, J.J.D. (2014). Estatística para Economia e Gestão: Instrumentos de Apoio à Tomada de Decisão – 3rd edition. Lisboa: Sílabo. Roberts, M.C.; Nelson, P.A.; Gale, J.R. (2011). Economic Decision Analysis – 4th edition. London: Pearson Learning Solutions. Schärlig, A. (1990). Décider sur Plusieurs Critères: Panorama de l'aide a la décision multicritère. Lausanne: Presses Polytechniques et Universitaires Romandes. Silva Ribeiro, C.; Reis, L.; Reis, S.S. (1990). Álgebra Linear: Exercícios e Aplicações. Lisboa: McGraw-Hill de Portugal. Skinner, D.C. (2001). Introduction to decision analysis: a practitioner’s guide to improving decision quality – 2nd edition. Gainsville: Probabilistic. Zey, M., ed. (1992). Decision Making: Alternatives to Rational Choice Models. Newbury Park: Sage Publications. 389 20.CONFIGURAÇÕES DE RENOVAÇÃO PEDAGÓGICADIDÁTICA NO ENSINO SUPERIOR: UMA PROPOSTA NO CURSO DE ARTES PLÁSTICAS E MULTIMÉDIA Ana Souto e Melo72 Resumo A mudança de paradigma educacional no Ensino Superior é decorrente da necessidade de reestruturação deste nível de ensino preconizada pelo Processo de Bolonha, pressupondo uma efetiva reconceptualização do processo de ensino e aprendizagem que é tida, por alguns autores, como sendo um dos maiores desafios trazidos por Bolonha na atualidade, uma vez que questiona e põe em causa o paradigma educacional há muito instituído nos vários níveis de ensino, implicando os seus intervenientes, alunos e professores. A descrita necessidade faz-nos emergir num mar de reflexões na procura de formas de ensinar, mas sobretudo de aprender, que tenham como pano de fundo o perfil de saída dos diversos cursos de formação e os respetivos objetivos, que atendam de forma persistente ao desenvolvimento dos diversos tipos de competências atualmente requeridas e que dinamizem a aprendizagem do aluno de forma autónoma e interveniente em todo o processo. Cremos que o trabalho de projeto e as ideias preconizadas pela Educação pela Arte mostram-se estratégias de ensino e aprendizagem fundamentais no novo contexto de formação. Na presente comunicação, pretendemos relatar as atividades desenvolvidas e a aplicação destas estratégias de aprendizagem, em contexto real de ensino, no primeiro ano do curso de licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, na unidade curricular de Desenho I, no âmbito da dinamização de um Projeto do qual fez parte também uma instituição da comunidade local. Pretendemos com esta comunicação, refletir e divulgar as potencialidades desta metodologia de aprendizagem no âmbito do projeto realizado e os resultados práticos obtidos. Palavras –Chave: Ensino Superior. Renovação pedagógico-didática. Ensino das Artes. 72 CI&DEI, Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Educação, Professora Adjunta do Departamento de Comunicação e Arte, anamelo@esev.ipv.pt, Phd em Educação – Ensino Superior, Mestrado em Supervisão Pedagógica e Formação de Professores, Licenciatura em Ensino da Educação Visual e Tecnológica, no Ensino Básico, docente do ensino superior desde 2001 na área das Artes e do seu ensino. 390 1. Introdução A renovação pedagógico-didática preconizada no Processo de Bolonha (PB), na Declaração de Berlim (2003), a par da alteração estrutural da Área Europeia de Ensino Superior (AEES), propõe a implementação de metodologias e estratégias de ensino, aprendizagem e avaliação que tenham como pano de fundo o perfil de saída dos cursos de formação e que atendessem de forma persistente ao desenvolvimento dos diversos tipos de competências. Estas, tanto as específicas como as genéricas, que se encontram descritas no Decreto-Lei nº107/2008, estimulam a aprendizagem do aluno de forma autónoma, responsável e verdadeiramente interveniente em todo o processo. Cremos que é mediante a concretização desta vertente de mudança pedagógica que se consolida a desejada alteração do paradigma educacional, que, por sua vez, dá uma resposta coerente aos objetivos primeiros do PB, a saber: consolidação, flexibilização, uniformização e compatibilização dos sistemas de ensino superior (ES). No exercício da docência no ensino das artes, temos vindo a percorrer vários caminhos motivados pela vontade de descobrir novos sentidos e experienciar novas estratégias de aprendizagem, uma vez, que e segundo Bachmann (2018), “as estratégias de ensino existem para otimizar a aprendizagem do aluno” (p.11). Tendo como objetivo fundamental a aquisição de aptidões exigentes que deem resposta à constante transformabilidade do mercado de trabalho, damos um enfoque ao desenvolvimento nos alunos de competências ao nível da resolução de problemas, do seu autoconhecimento e da dinâmica das relações interpessoais. Acreditamos que os pressupostos da Metodologia Projetual e da Educação pela Arte podem, por razões mais à frente expostas, dar uma resposta a esta necessidade. Num primeiro momento, neste trabalho, enunciamos algumas linhas orientadoras subjacentes à renovação pedagógico-didática trazida por Bolonha, bem como à Metodologia Projetual e à Educação pela Arte; num segundo momento, pretendemos relatar as atividades desenvolvidas tendo em conta a proposta pedagógica em contexto real de ensino, no âmbito do Projeto Artístico Desenhar Viseu, implementado na unidade curricular (UC) de Desenho I, do primeiro ano do curso de Licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, na Escola Superior de Educação de Viseu (ESEV); num terceiro momento, pretendemos refletir sobre os eventuais contributos da metodologia aplicada no referido Projeto na concretização dos pressupostos de Bolonha. 391 2. Estratégias de Ensino e Aprendizagem à luz de Bolonha No delinear da estratégia de renovação educacional, ao nível europeu, estão subjacentes pressupostos de crescimento cultural, económico e social, que solicitam um olhar mais atento sobre a formação profissional dos cidadãos, recuperando ideais de capital humano na interdependência da formação ao aumento da capacidade de produção. As exigências de uma sociedade em constante transformação passam pela preparação dos cidadãos na adaptação a vários contextos vivenciais e profissionais, conjugada com as necessidades da “busca de novos rumos do futuro” (Simão et al., 2002, p. 385). A desejada transformação educacional, que teve o seu início no século XX com a promissora Escola Nova, nos níveis de ensino mais baixos, chegou ao ES com a força ideológica e institucional da AEES, tendo-se disseminado nos vários países constituintes de forma categórica. A desejada transformação educacional, que teve o seu início no século XX com a promissora Escola Nova, nos níveis de ensino mais baixos, chegou ao ES com a força ideológica e institucional da AEES, tendo-se disseminado nos vários países constituintes de forma categórica. Esta resposta, porém, no nosso entender, tem tido mais sucesso ao nível estrutural dos cursos de formação, permitindo a compatibilização e consequente favorecimento no que se refere à mobilidade entre os vários estadosmembros do que ao nível da interiorização de novas formas de aprender e de ensinar, através das quais toda a almejada transformação está dependente. Embora, no momento atual, já se sinta alguma inquietação e seja cada vez mais comum haver formação na área pedagógica-didática do ES, muita desta formação está ainda limitada a um âmbito mais teórico do que prático. A mobilização do conhecimento para a resolução de problemas práticos de ensino e aprendizagem deve ser uma aptidão não só para os docentes, mas também para os alunos. Aqui se forma o sentido de competência, contrário à ideia de objetivo de ensino, ultrapassada com Bolonha (Souto-e-Melo, 2018). A competência remete-nos para a ideia de saber em uso (Roldão, 2003), pressupondo que o aluno para a adquirir encontre oportunidades de desenvolvimento de atividades que lhe permitam exercitar e aplicar esse saber em situações práticas. Essas oportunidades culminarão no alcance dos objetivos do curso e caberá ao professor completar esse ciclo, criando os desafios e 392 implementando estratégias para que esse alcance se estabeleça com eficácia. Trata-se, pois, da abolição de um modo de aprendizagem baseado na aquisição passiva de conhecimentos e a integração do alcance do conhecimento de forma dinâmica, contextual e comprometida, fazendo a desejada ligação entre aquilo que somos enquanto pessoas, o que trazemos das nossas vidas e experiências, com a construção efetiva de um conhecimento ligado à inovação científica e vida profissional. Ressalvase, neste contexto, ainda a ideia de Henry Bachmann (2018), de que o ensino e aprendizagem de competências infere com a sociedade e com o que o mundo moderno espera por parte dos profissionais, nomeadamente a preparação para atuar ativamente, potenciando o progresso da sociedade moderna. Neste sentido, a palavra aprender toma um significado de tal maneira abrangente e até interdisciplinar que conflui num sentido dinâmico: só estratégias de ensino e aprendizagem igualmente práticas favorecem o papel ativo do aluno na construção do seu conhecimento. Segundo Bachmann (2018), aprender significa tomar “tempo para praticar” (p. 14), pressupondo que esse tempo implica a pesquisa, estudo e seleção de conteúdos, adequados para a resolução de determinados problemas e respetiva resolução. Esta exigente tarefa docente implica que o foco seja o aluno e que as decisões de ensino tomadas sejam em prol desse aluno e do seu crescimento académico e, para que isso seja uma realidade, o professor deve adotar o papel de orientador e mentor de um processo de construção de aprendizagem único e duradouro, porque encontra na sua unicidade valores de motivação e de encanto que só a “aprendizagem significativa” (Kagan, 1992) pode favorecer. Ou seja, na atualidade não basta que o professor seja academicamente muito competente, uma vez que isso não garante per si que tenha sucesso na sua atividade docente (Bachmann, 2018). Esta questão faz-nos refletir sobre o papel atual do ES, dos alunos e dos professores no alcance de competências, e sobre a falta de formação ao nível da pedagogia da maioria dos docentes deste nível de ensino, dificuldade que pode comprometer o insucesso de qualquer inovação educacional. Quando se discute que procedimentos metodológicos e didáticos implementar em sala de aula mediante a harmonização de estratégias de ensino e aprendizagem com as competências requeridas, surgem várias preocupações (Luckesi, 1994): Será que nós professores, ao estabelecermos o nosso plano de ensino, ou quando vamos decidir o que fazer na aula, nos perguntamos se as técnicas de ensino que utilizaremos têm articulação coerente com nossa proposta pedagógica? Ou será que escolhemos os procedimentos de ensino [pela] sua modernidade, ou [pela] sua facilidade, ou pelo [facto de diminuir a] quantidade de 393 trabalho ao professor? Ou, pior ainda, será que escolhemos os procedimentos de ensino sem nenhum critério específico? (p. 155) Efetivamente, a seleção das estratégias de ensino e aprendizagem deve ser ponderada e fundamentada por parte do professor. Um tipo de ensino que é planeado apenas a partir de conteúdos (domínios de saber), a partir dos quais se enunciam os objetivos e respetivas atividades de aprendizagem, pode incorrer no distanciamento entre as estratégias de ensino e as competências a adquirir. Ao invés, no âmbito da renovação pedagógico-didática que aqui se discute, reúnem-se condições funcionais para que seja possível que o ensino seja planeado com os alunos. Partindo das competências que se pretende alcançar, encontram-se os conteúdos que melhor as operacionalizam e as estratégias que as impulsionam na sua efetiva concretização de saber individual. O papel ativo do aluno na construção do conhecimento, a dinâmica que cria mediante as diferentes aprendizagens que consegue articular e mobilizar para a resolução de determinado problema, são aspetos preponderantes para a aquisição das competências atualmente requeridas pelo mercado de trabalho. Através do Projeto Tuning, verificou-se que são cada vez mais as instituições de ES dos países aderentes ao PB a aplicar questionários a alunos, ex-alunos e aos seus empregadores no sentido de orientar a oferta da formação para as necessidades do mercado de trabalho (González &Wagenaar, 2008). As necessidades do mercado são, pois, identificadas e os planos de estudo são orientados para as competências essenciais, que irão, de alguma forma, auxiliar na procura de emprego. No âmbito do referido Projeto, emergiram dois grupos de competências: a) as específicas referentes ao tipo de conhecimento de determinada área de saber; b) genéricas ou transferíveis, dirigidas à área do saber ser e estar, mais ligadas à cidadania e de saber estar em sociedade, que, por sua vez, foram divididas em três tipos: instrumentais que dizem respeito a habilidades cognitivas, metodológicas, tecnológicas e linguísticas; interpessoais respeitantes às capacidades individuais de interação pessoal, social e de cooperação; e as competências sistémicas, que se referem a uma abordagem holística do conhecimento, exigindo o seu inter-relacionamento com uma perceção mais global dos processos de gestão do mesmo saber (González & Wagenaar, 2008). Em Portugal, através da publicação do Decreto-Lei nº74/2006, os cinco grupos de 394 competências mostram-se como pontos de referência para a reorganização do ES português e para a concretização dos objetivos consignados pelo PB. Nesta perspetiva, ficará claro de que não serão apenas as competências específicas de determinado domínio do conhecimento que interessarão desenvolver. No contexto atual, será necessário impulsionar o alcance de competências de alto nível (Higher Order Skills) relacionadas com o saber ser, estar e devir, esta última que acrescenta às outras a projeção do aluno no alcance do seu próprio conhecimento (Lebrun, 2008). Ou seja, faz-se a apologia de maior equilíbrio entre os dois tipos de competências, mostrando-se como fundamental para o desenvolvimento de uma atividade profissional que dê resposta ao elevado nível de exigência e competitividade. 2.1 O papel da Metodologia Projetual e da Educação pela Arte no âmbito das metodologias ativas No âmbito das necessidades anteriormente explanadas, e que Bolonha trouxe a discussão, são recuperadas as “pedagogias ativas” (Altet, 1994, p. 12). O papel ativo do aluno na construção da sua aprendizagem, um dos pilares fundamentais da alteração de paradigma educacional trazido por Bolonha, não é completamente novo no sistema de ensino, uma vez que, em meados do século XX, ressurgiram os postulados da Escola Nova (de finais do século XIX) e a tentativa da sua implementação em níveis de ensino mais baixos. Contudo, o ensaio de recusa do modelo tradicional de escola manteve ao longo dos tempos várias fontes de resistência e, até hoje, na escola contemporânea, não é consensual e praticável em todos os contextos educativos, aspeto que se agrava no que diz respeito ao ES, uma vez que a escassa formação pedagógico-didática dos docentes em exercício prejudica esta vertente mais inovadora de ensino e aprendizagem. Segundo Simão, Santos e Costa (2004), o processo pedagógico do ES percorreu durante largos anos caminhos rígidos, baseados numa lógica curricular com metodologias de ensino, de aprendizagem e de avaliação assentes na assimilação de conteúdos pré-definidos. Agora, com o PB, essas teorias reaparecem de forma integrada nas práticas de ensino e aprendizagem e poderão ser implementadas consoante as competências formativas que se pretende desenvolver, respeitando as expectativas e o percurso individual de cada aluno. 395 Na vertente atual de formação do ES, um aluno que tenha consciência de que não sabe tudo, estará pronto para aprender integrando os ideais que envolvem o aprender a aprender que pressupõe um “processo contínuo de procura e de refinamento […] sendo este um dos aspetos mais inovadores no âmbito da pedagogia do ES e que promete dar cartas no que se refere à desejada mudança de paradigma educacional” (Souto-e-Melo, 2013, p. 49). A par do aprender a aprender, surge uma outra área de estudo, a metacognição, também impulsionada por Bolonha, que se refere à autorregulação do conhecimento por parte do aluno que, segundo Vygotsky (Cole et al., 1991), confere a reconstrução e a transformação ativa do sujeito no âmbito de processos interativos de conhecimento. A propósito, cabe-nos referir também a aprendizagem por descoberta (Sprinthall & Sprinthall, 1993), defendida por Dewey, Piaget, Vygotsky, Bruner e Ausubel, entre outros autores, não só na formação do indivíduo como ao longo da sua vida. Este tipo de aprendizagem responde às necessidades atuais de formação ao nível da dinamização de competências crítico-reflexivas, do desenvolvimento do raciocínio e da criatividade para resolução de problemas, da participação ativa na produção do conhecimento, através de uma ação exploradora e atendendo às especificidades dos alunos. No domínio das relações interpessoais, recorde-se a aprendizagem cooperativa, desenvolvida por Spencer Kagan (1992), na década de oitenta, e reconhecida por Bolonha com grande potencial. A aprendizagem significativa, entendida por alguns autores (como Dewey, Piaget, Vygotsky, Bruner e Ausubel) como aquela que impulsiona o sujeito para a descoberta do conhecimento, através da atividade resolutiva (Sprinthall & Sprinthall, 1993) associa-se à aprendizagem experiencial. John Dewey defendeu que o papel da escola não se deverá cingir à aquisição de saberes, devendo incluir a exploração do potencial do aluno e prepará-lo para a utilização desses saberes na sua vida ativa. Neste sentido, Dewey só entende o conhecimento teórico mediante a sua exequibilidade ou, por outras palavras, a sua integração experiencial, concretizada no célebre princípio pedagógico learning by doing, que implica o envolvimento sistémico do aluno no alcance do conhecimento. Rogers (1985) refere que a aprendizagem experiencial implica o envolvimento do aluno numa aplicação prática, fazendo aumentar o seu interesse bem como os níveis de motivação e suscitando a criatividade na resolução de problemas. Algumas das linhas orientadoras deste modelo enquadram-se nos pressupostos do PB, visto que a apologia 396 do saber útil pressupõe o aluno na construção da sua aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento de competências crítico-reflexivas e criativas na resolução de problemas. A Pedagogia de Projeto foi desenvolvida no âmbito da Escola Nova e teve como principal impulsionador John Dewey (1998). Este modelo possibilita uma visão integradora do novo conhecimento nos saberes já existentes, permitindo o desenvolvimento do raciocínio lógico para dar resposta adequada a determinada necessidade. O conhecimento e, pois, entendido como “dinâmico, mutável, multidimensional, situacional e construído” (Guedes et al., 2007, p. 33). Embora a Metodologia Projetual tenha sido utilizada no âmbito do design e em outras áreas artísticas, entendemos que poderá ser uma mais-valia no âmbito da renovação pedagógico-didática, nomeadamente pelas suas valências ao nível do desenvolvimento de competências de alto nível, desde o incentivo à implementação do aprender a aprender, mas também enquanto garantia de um trabalho com maior precisão, maior rentabilização de tempo e de recursos (Munari, 1988), maior organização, coordenação e convergência de saberes e aproximação do contexto de ensino ao contexto real e profissional. A implementação de uma formação que vá além da simples transmissão de saberes, objetivando-se na formação total e integral do indivíduo a todos os níveis, está presente no âmbito dos pressupostos do PB, nomeadamente na definição de competências genéricas que devem ocupar um lugar equilibrado nos programas de ensino a par das específicas. A importância da formação do indivíduo como ser total emergiu da tese desenvolvida por Herbert Read (2010), intitulada Education Through Art, publicada em 1943. No âmbito da Declaração de Salamanca (2001), apela-se a um ES que deva ser capaz de formar cidadãos com capacidade criativa, com aptidão para resolver sistematicamente problemas e aplicar metodicamente os conhecimentos aprendidos em situações reais. Ora, a criatividade é uma das competências genéricas que o PB traz para debate, contribuindo, de forma eficaz, para o desenvolvimento de competências no âmbito do aprender a aprender. Neste sentido, é-lhe atribuída uma real importância, por exemplo, ao nível da capacidade para a resolução de problemas, já que, num clima de instabilidade decorrente da permanente mudança, possibilita soluções eficazes para os mesmos. A criatividade é assim entendida como uma capacidade, uma aptidão, que deve conduzir à criação (Sousa, 2003). 397 Tendo consciência de que os pressupostos da Educação pela Arte, divulgados por Read, se dirigem fundamentalmente à educação da criança, entendemos que se poderão estender à formação de jovens e adultos, enquadrando-se com pertinência no âmbito do ES e nos desígnios do PB, nomeadamente no que diz respeito à perspetivação de uma proposta pedagógica-didática de renovação, visto que, como referiu Alberto Sousa (2003): A Educação pela Arte é essencialmente um movimento de renovações, no sentido de se abandonar princípios pedagógicos rígidos e pré-concebidos, para compreender [o indivíduo] nas suas emoções, nos seus desejos, nos seus interesses e na sua procura da felicidade, do modo cientificamente mais correto e eficaz. (p. 82) Segundo Lucília Valente (1999), uma formação que se objetive na formação integral da pessoa dá resposta a dois aspetos fundamentais para sua existência: a expressão de si e a comunicação com os outros. O equilíbrio entre o que se pensa e a manifestação clara (expressão) desse pensar facilita o alcance de competências de alto nível. 3. Contexto de Implementação Metodológica do projeto Desenhar Viseu No âmbito da lecionação da UC de Desenho I, do primeiro ano do curso de licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, da Escola Superior de Educação de Viseu (ESEV), durante três anos, integrámos uma parceria com uma instituição agregada à Câmara Municipal de Viseu, de nome Viseu Novo – SRU (Sociedade de Reabilitação Urbana), dinamizando o projeto artístico Desenhar Viseu, que envolveu cerca de setenta alunos e um professor. O curso de Licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia da ESEV é constituído por duas áreas distintas, as Artes e as Tecnologias da informação e Comunicação que, numa dimensão mais alargada, se podem integrar e conjugar potenciando a aquisição de competências profissionais na criação da imagem e/ou identidade visual de empresas/instituições na área das artes gráficas e da multimédia; coordenação e criação de conteúdos/produtos multimédia; e assessoria na área da comunicação (Escola Superior de Educação de Viseu, 2020 junho 29). A UC de Desenho I é de natureza teórico-prática e faz parte do elenco de UC da área das Artes Plásticas, pretendendo explorar competências ao nível do desenho 398 inicial (fundamentalmente de representação), situando-se no início do curso e precedendo as UC de Desenho II, III e IV, que lhe darão continuidade. Na UC de Desenho I, pretende-se, num primeiro momento, desenvolver competências ao nível do desenho de representação de objetos, na aplicação técnica de meios, materiais e adequação dos suportes; numa segunda fase, pretende-se fundamentalmente que os alunos desenvolvam competências ao nível da representação do espaço/meio envolvente (paisagístico e arquitetónico) com a aplicação de efeitos de perspetiva, sendo que se espera que os conhecimentos anteriormente explorados sejam aplicados também neste segundo momento, tendo um seguimento lógico de continuidade e o natural aumento do grau de dificuldade das competências a adquirir. Por sua vez, no âmbito do Projeto Desenhar Viseu pretendia-se a realização do registo gráfico de edifícios recuperados ou em estado de recuperação que se encontrassem na área de intervenção da SRU, na zona histórica de Viseu, que envolvia o estudo visual e gráfico de fachadas, elementos arquitetónicos e zonas pedonais para divulgação e conhecimento. O Projeto Desenhar Viseu integra várias áreas do conhecimento artístico: a arte, o desenho, a fotografia, a preservação da história e da cultura, o património, a arquitetura antiga e contemporânea, apelando também, de forma inequívoca, ao trabalho em equipa, ao sentido de organização e de responsabilidade, que se conjugam num projeto de sentido comum, competências fundamentais no exercício de qualquer profissão. Vimos, neste projeto, por um lado, um desafio pedagógico distinto do que temos implementado; por outro lado, o impulso para a reflexão necessária sobre estratégias de ensino que potenciem a efetiva participação do aluno na construção da aprendizagem contribuindo, desta forma, para a realização do trabalho e a concretização do projeto com o sucesso desejado. O desafio era o de implementar metodologias de ensino e aprendizagem que garantissem o necessário envolvimento dos alunos no projeto e a sua adequada participação. O projeto Desenhar Viseu seguiu as linhas consignadas pela Metodologia Projetual e pela Educação pela Arte, que explicaremos a seguir. Após um contacto institucional por parte da SRU, e depois de concluirmos todas as formalidades que implicaram a realização desta parceria, definiu-se a situação/problema deste Projeto. Num primeiro momento, foi apresentado à turma o convite de parceria, estabelecendo um diálogo sobre em que medida as duas partes envolvidas poderiam colaborar no âmbito da UC de Desenho I. Mediante uma análise às 399 competências para o desenvolvimento desta UC (Programa de Desenho I), foi possível estabelecer desde logo uma relação coerente entre o que era proposto trabalhar no Programa de ensino com o que tínhamos de trabalhar neste projeto. Esta análise mostrou-se profícua, uma vez que, por um lado, incluiu o aluno na decisão de participarmos, ou não no Projeto; por outro lado, permitiu que o aluno, ao analisar as competências pré-definidas para a UC, entendesse as potencialidades do mesmo Projeto no alcance das mesmas, tornando-se esse facto, por si só, um motor de motivação. Ainda nesta fase, no primeiro ano, foi feita uma visita de estudo aos escritórios e ateliers da SRU, conhecendo in loco o trabalho desenvolvido pela mesma associação, proporcionando-se o diálogo necessário entre os envolvidos, nomeadamente com alguns dos responsáveis; nos outros dois anos, convidámos os responsáveis a virem a uma aula de Desenho para apresentar o trabalho realizado pela SRU. Tendo como objetivo o estabelecimento de uma ponte entre as ideias que fossem surgindo na definição do projeto e os pressupostos da parceria, foram criadas linhas de pesquisa que elucidassem os alunos sobre o que iríamos fazer. Estabeleceu-se, de seguida, um debate com a apresentação de linhas orientadoras gerais, um cronograma de atividades, a definição de aspetos a considerar na avaliação do trabalho e processo de execução do mesmo. Estas linhas, de alguma forma, balizariam alguma dúvida decorrente da criatividade e das múltiplas ideias que foram sendo mostradas e discutidas para a resolução do problema inicialmente proposto. A estratégia de ensino implementada foi a tempestade de ideias, defendida por vários autores (Anastasiou & Alves, 2006; Bordenave & Pereira, 1985; Dalberio & Dalberio, 2010; Vieira & Vieira, 2005). Após a necessária discussão e argumentação de qual proposta seria mais viável, acordámos que cada aluno trabalharia uma composição visual que integrasse vários elementos arquitetónicos, fachadas, portas, calçadas, que fizessem parte da área de intervenção da SRU nas técnicas e materiais de pintura e desenho que entendessem ficar melhor na sua composição. Contudo, será de ressalvar que o interesse foi sempre que os alunos sentissem o Projeto como sendo deles e que se sentissem ouvidos, nomeadamente através das decisões a tomar e dos caminhos técnicos e artísticos que preferissem seguir, indo ao encontro dos seus interesses individuais de desenvolvimento artístico. Numa segunda fase, procedeu-se ao percorrer de todo um caminho de descoberta, procura e pesquisa de informação que entendíamos como sendo pertinente 400 para concluir o trabalho com sucesso. Primeiramente, os alunos entenderam ser importante realizarmos a prospeção do espaço in loco, que fizemos através do trabalho de campo com roteiro elaborado previamente, para reconhecimento local da área de intervenção da SRU, indo à procura dos edifícios intervencionados e que se encontravam em intervenção, reconhecendo também o espaço e património de Viseu. Fizemos várias recolhas de campo através de registo fotográfico e gráfico de pormenores, edifícios, calçadas, elementos arquitetónicos. Esta estratégia de aprendizagem cria condições para o contacto com a realidade, propicia a aquisição de conhecimentos de forma direta através da experiência vivida; e promove o desenvolvimento da capacidade de observação e de análise crítica da realidade observada (Anastasiou & Alves, 2006; Dalberio & Dalberio, 2010; Petrucci & Batiston, 2006; Vieira & Vieira, 2005). Nesta fase de investigação, cada aluno realizou também uma pesquisa sobre artistas de referência na área do desenho de espaços arquitetónicos, de bibliografia, sobre formas/tipos de desenho e meios que poderiam utilizar. Após esta recolha, os alunos organizaram a informação tendo em conta ideias que, entretanto, estavam a surgir e fizeram a respetiva apresentação/partilha com os colegas. Tendo em conta as ideias que estavam a ser construídas, também através do debate e troca de ideias e material recolhido, em aula definimos em conjunto que conteúdos do Programa (ou outros) teríamos de trabalhar e exercitar para realizar o trabalho. Os alunos foram participando, referindo e chegando de forma natural aos domínios que entendiam que deveriam explorar e exercitar antes de iniciar os trabalhos, nomeadamente: a perspetiva linear e aspetos particulares de desenho no espaço; técnicas de representação mais rigorosa e mais gestual; meios, materiais e possibilidade de conjugação de técnicas; noções de composição visual (retomando conteúdos que estavam no momento a ser lecionados na UC de Estudos de Composição sobre equilíbrio e harmonia visual), conjugando-se com as ideias que entretando foram tomando forma e organizando à medida que eram expostas as necessidades do estudo de cada um dos alunos. Num terceiro momento, foram realizados os primeiros esboços de pormenores e elementos a inserir na composição visual, criando de certa forma uma base conceptual de forma e assunto a explorar, bem como da exploração de algumas técnicas de desenho e de utilização de materiais, de preferência que não tivessem utilizado anteriormente e que de alguma forma suscitassem curiosidade técnica e concordância com o objeto/conceito criado. 401 À medida que as primeiras ideias gráficas foram sendo representadas, íamos fazendo um ponto da situação que consistia na apresentação das explorações, hipóteses estudadas, excluídas ou implementadas, com a contribuição crítica de todos os colegas e docente. Esta partilha de ideias e de apresentação de diferentes perspetivas, tornou-se num caminho sempre enriquecedor para todos, uma vez que, através das mesmas, se foram estabelecendo contactos de confiança, de compromisso global e de atitude de entreajuda no alcance dos objetivos individuais e de grupo, num percurso de aprendizagem singular, com a colaboração dos colegas e docente. Ainda na terceira fase, correspondente à fase de Projeto, conjugaram-se esforços no sentido de se desenvolverem esboços mais definidos em termos de ideias finais em que a composição passou a tomar forma, combinando materiais, técnicas, definição de formatos, tipos de suportes e o esboço geral. De seguida, os alunos tendo em conta as ideias definidas no Projeto colocaram em prática os conhecimentos adquiridos em todo o processo de aprendizagem estruturada e alicerçada nos domínios do saber que faziam sentido no âmbito deste projeto, tendo em conta a experienciação, a pesquisa, a descoberta e o diálogo que se foi estabelecendo na troca de ideias e conhecimentos entre todos. É certo que ainda nesta parte e por que as fases da metodologia projetual não são estanques e se podem articular e entruzar umas nas outras, houve ainda alteração de planos delineados no projeto, ajustes materiais e de pormenor que culminaram nos projetos em que cada um dos alunos se identificava e essa harmonia foi de cabal importância também para manter a natural e necessária motivação para o trabalho. O Projeto Desenhar Viseu prosseguiu nos mesmos moldes pedagógicodidáticos durante três anos, sendo que no final de cada ano era um ciclo que se fechava com novas aprendizagens concretizadas e muitas outras por materializar que foram sendo alcançadas ano após ano, numa incessante vontade de fazer melhor e estabelecendo-se uma constante dinâmica reflexiva, fundamental para a melhoria de qualquer atividade profissional. Na Avaliação, numa primeira parte, analisamos em contexto de turma as conquistas realizadas, por realizar e respetivos impedimentos, perspetivando o que poderia ser melhorado num novo projeto ou atividade, focando-nos nos resultados obtidos, mas sobretudo no processo de prossecução de todo o trabalho. Numa segunda fase, verificou-se o impacto no público dos trabalhos realizados. Foram realizadas três exposições dos trabalhos, uma delas na ESEV e duas em lugares públicos de Viseu. Não temos dados rigorosos sobre de que forma o público interagiu com os 402 trabalhos expostos, mas algum do feedback direto que tivemos também por parte da SRU foi de muito agrado com os trabalhos realizados, alguns dos quais foram expostos nas instalações da mesma instituição. Ressalvamos que as estratégias de ensino individualizado e de ensino com pesquisa foram uma constante ao longo de todo o processo de aprendizagem. Por um lado, o ensino individualizado assegurou o ajustamento do processo de ensino e aprendizagem às reais necessidades e características individuais do aluno e deu sentido individual do processo/crescimento artístico que cada um quis construir tendo em conta os seus interesses de formação. Esta estratégia facilita a mediação e autorregulação da aprendizagem, pode auxiliar o aluno no encontro das estratégias mais apropriadas para si próprio e a estruturar, a dinamizar e a avaliar a aprendizagem e a adequação dos esforços implementados (Baudrit, 2009; Petrucci & Batiston, 2006). Por outro lado, cremos que o ensino com pesquisa se ajustou de forma positiva às necessidades de constante questionamento crítico para que a renovação, reconstrução e conceção do conhecimento se estabeleça, envolvendo três etapas fundamentais: o questionamento (associado à ideia de liberdade de expressão), a argumentação e a comunicação, permitindo o apuramento do sentido crítico, reflexivo e de autonomia (Anastasiou & Alves, 2006; Lampert, 2008). 4. Discussão/Conclusões A partir da análise de alguns estudos (Gimeno Sacristán, 2007; Romanowski & Wachowitcz, 2003), podemos constatar de que na perspetiva de alunos, as experiências de aprendizagem mais relevantes e que acrescentam mais significado para os mesmos são as que mantêm uma maior articulação com a realidade. Ou seja, todo o tipo de experiências e vivências que permitam relacionar o currículo académico com situações e particularidades dos sujeitos e do mundo em que vivem, perspetivando-se uma efetiva transposição da teoria para a prática, são valorizadas pelos alunos. Esta questão é perfeitamente compreensível, uma vez que o contexto real dá um sentido de verdade ao que estamos a aprender, nomeadamente ao nível da resolução de problemas. Essa pró atividade, emancipação e comprometimento com a aprendizagem faz com que o aluno continuamente mantenha uma motivação intrínseca para o aprender a aprender. 403 Mediante as necessidades atuais de formação, em que os objetivos dão lugar às competências, os professores podem planear o ensino com os alunos. A partir das competências podem-se encontrar conteúdos, atividades e estratégias que as operacionalizem e objetivos que as impulsionem e a Metodologia Projetual e a Educação pela Arte têm um lugar de destaque neste processo conjunto. Cremos que, através do desenvolvimento de estratégias e atividades de aprendizagem adequadas, podem ser os próprios alunos a chegar aos saberes conteudinais imprescindíveis para a concretização de determinado projeto ou resolução de determinado problema e, desta forma, a aprendizagem ser mais significativa. Estabelecendo a relação entre os pressupostos da Pedagogia de Projeto, que aqui se orientou através das fases enunciadas na Metodologia Projetual, as atividades realizadas no Projeto Desenhar Viseu foram ao encontro das necessidades de formação e crescimento global dos alunos. A resolução de problemas e o conhecimento prévio das fases de ação que orientam a sua resolução, trazidas pela Metodologia Projetual, permitiram desenvolver o saber ativo e a construção do conhecimento, a mobilidade intelectual, o sentido crítico, a criatividade, a inovação, a autonomia, a motivação, a garantia de um trabalho com maior precisão, a rentabilização de recursos, de tempo, a organização, a coordenação, e a convergência de saberes. Sendo estas capacidades fundamentais no âmbito da aprendizagem que se pretende no âmbito do ES como foi descrito na Declaração de Salamanca (2001) no âmbito do PB. No que concerne à Educação pela Arte e aos princípios que a enformam e que trazemos para esta reflexão, o desenvolvimento de competências de alto nível relacionadas com o saber ser, estar e devir estiveram alicerçadas no projeto que aqui descrevemos, pelo constante apelo ao sentido crítico e reflexivo que o mesmo exigiu. A constante partilha de saberes, informações e o confronto de ideias permitiu desenvolver a autorregulação dos alunos que, por sua vez, por um lado, despoletou a expressão de cada um redimensionando o seu autoconhecimento; por outro lado, desencadeou a capacidade de comunicação com os outros, construindo e reconstruindo a relação interpessoal. Ora, segundo Alberto Sousa (2003), A Educação Artística tem por base o autoconhecimento, a dinâmica das relações interpessoais e o desenvolvimento equilibrado do indivíduo, constituindo, desta forma, um impulso para a motivação, para o desenvolvimento ativo da aprendizagem e para o sucesso da mesma. Por essa razão defendemos e consolidamos a ideia de que a Educação pela Arte favorece os novos pressupostos de Bolonha, não apenas para curso de índole artística. 404 Cremos que o Projeto Desenhar Viseu possui várias potencialidades tanto ao nível científico, como ao nível pedagógico, sendo a este nível que nos interessou refletir neste artigo. Este projeto pretendeu estabelecer a conjugação entre arte, património, formas de manifestação e representação artística; aproximou a formação com a prática do futuro profissional; incentivou a participação ativa e interveniente do aluno na sua aprendizagem; apelou ao trabalho em equipa, ao sentido de organização e de responsabilidade conjunta; tornou-se um desafio pedagógico pela necessidade de implementar estratégias de ensino e aprendizagem que contribuíssem de forma eficaz para a realização do trabalho com o sucesso desejado e que envolvessem os alunos num objetivo de sentido comum; e trouxe para a turma um problema emergente de uma situação real, interpeladora e relevante no âmbito do perfil de competências do curso. Quando o professor propõe determinada atividade, estão associados a ela determinados objetivos de aprendizagem, que pressupõem uma determinada atuação do aluno no alcance da mesma. A execução de uma atividade de aprendizagem, mais do que enfatizar a competitividade entre colegas e a obtenção de determinada classificação numérica, deve dinamizar a compreensão de conteúdos e a aquisição de determinadas capacidades e habilidades (Brophy, 1987), as competências. O aumento do grau de participação na definição de estratégias de aprendizagem e a responsabilidade do estudante nessa decisão aumenta a sua perceção de controlo e com ela a sua implicação e interesse nas atividades de aprendizagem (Ariza & Ferra, 2009). Esta exigente tarefa docente implica, em primeira instância, que o foco seja o aluno e que as decisões tomadas sejam em prol desse aluno, do seu crescimento académico e dos seus interesses individuais de formação; em segunda instância, que o professor tenha formação pedagógico-didática que facilite essa tarefa de mediação da aprendizagem. Embora, seja este o caminho favorecido por Bolonha, temos encontrado barreiras institucionais, financeiras e de mentalidade que criam uma narrativa de descontrolo e de inconformismo com a incoerência que o PB nos trouxe, uma vez que a estrutura documental e legal nem sempre corresponde ao que se efetiva na prática e há passos fundamentais por dar em todo este processo, nomeadamente ao nível na mudança de paradigma educacional em que os professores devem ser os protagonistas. Como afirma Machado (1995), “os professores são os elementos mais determinantes de qualquer sistema escolar; [...] não é possível haver sucesso na implementação de qualquer reforma ou inovação sem o querer, sem o seu saber e sem o seu poder” (p.134). 405 Neste caminho também nosso de experienciação e de descoberta, cremos que fará sentido partilhar os processos de reconhecimento do tempo e do espaço de ensino onde nos encontramos na atualidade, por que é nessa partilha que nos reencontramos e confluímos no desenvolvimento das nossas práticas pedagógicas. 5. Referências Bibliográficas Altet, M. (1997). As pedagogias da aprendizagem. Lisboa: Instituto Piaget (Trabalho original em francês, publicado em 1997). Anastasiou, L. G. C., & Alves, L. P. (2006). Estratégias de ensinagem. Em L. G. C. Anastasiou & L. P. Alves (Orgs.), Processos de ensinagem na universidade. Pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: UNIVILLE (6ª ed., Pp. 67-100). Ariza, M. R., & Ferra, M. P. (2009). Cómo motivar a aprender en la universidade: una estratégia fundamental contra el fracasso académico en los nuevos modelos educativos. Revista Iberoamericana, 51 (pp. 87-105). Bachmann, H. (2018). Competence-oriented teaching and learnig in Higher Education – Essentials. Suíça: Hep Verlayag. Baudrit, A. (2009). A tutoria: Riqueza de um método pedagógico. Porto: Porto Editora (Trabalho original em francês, publicado em 2007). Bordenave, J. D., & Pereira, A. M. (1985). Estratégias de ensino-aprendizagem (7ªed.). Petrópolis: Vozes. Brophy, J. E. (1987). Synthesis of research on strategies for motivating students to learn. Educational Leadership (Vol.45) (pp. 40-48). Cole, M., John-Steiner, L., Scribner, S., & Souberman, E. (Orgs.) (1991). A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Vygotsky L. S (4ªed.). S. Paulo: Martins Fontes. http://chafic.com.br/chafic/moodle/file.php/1/Biblioteca_Virtual/Temas_educacionai s/Lev._Vygotsky_-_A_formacao_social_da_mente.pdf Dalberio, M. C., & Dalberio, O. (2010). A formação docente: A mediação didáctica para um ensino de melhor qualidade. Revista Iberoamericana de Educação, 51 (5) (pp. 1-11). Declaração de Berlim: Convenção dos ministros europeus de educação reunidos em Berlim a 19 de setembro de 2003. Declaração de Salamanca: Convenção dos ministros europeus de educação reunidos em Salamanca a 29 e 30 de março de 2001. Decreto-Lei nº74/2006, de 24 de março (Regulamentação das alterações introduzidas pela LBSE relativas ao novo modelo de organização do ensino superior). Decreto-Lei nº107/2008, de 25 de junho (Relatório anual acerca do progresso da concretização do processo de bolonha). 406 Dewey, J. (1998). How we think: A restatement of the relation of reflective thinking to the educative process. Boston: Houghton Mifflin (Trabalho original em inglês, publicado em 1933). Escola Superior de Educação de Viseu (2020, junho 29). 1º Ciclo (Licenciatura) Artes Plásticas e Multimédia. http://www.esev.ipv.pt/Cursos/apresentacao.aspx?value=2 Gimeno Sacristán, J. (2007). A educação que ainda é possível: Ensaios sobre uma cultura para a educação. Porto Alegre: Artmed. González, J., & Wagenaar, R. (Eds.) (2008). Tuning project. Universities contribution to the bologna process. An introduction. http://www.unideusto.org/tuningeu/images/stories/Publications/ENGLISH_BROCH URE_FOR_WEBSITE.pdf Guedes, M. G., Lourenço, J. M., Filipe, A. I., Almeida, L., & Moreira, M. A. (2007). Bolonha. Ensino e aprendizagem por projecto. Lisboa: Centro Atlântico. Lampert, E. (2008). O ensino com pesquisa: Realidade, desafios e perspectivas na universidade brasileira. Linhas Críticas (Vol.14) nº26. http://www.redalyc.org/redalyc/pdf/1935/193517442008.pdf Lebrun, M. (2008). Teorias e métodos pedagógicos para ensinar e aprender. Lisboa: Instituto Piaget (Trabalho original em francês, publicado em 2002). Luckesi, C. C. (1994). Filosofia da educação. São Paulo: Cortez. Machado, F. A. (1995). Do Perfil dos Tempos ao Perfil da Escola: Portugal na Viragem do Milénio. Porto: Edições Asa. Munari, B. (1988). Das coisas nascem coisas. Lisboa: Edições 70 (Trabalho original em inglês, publicado em 1981). Petrucci, V. B. C., & Bastion, R. R. (2006). Estratégias de ensino e avaliação de aprendizagem em contabilidade. Em I. R. Peleias (Org.), Didáctica do ensino da contabilidade. São Paulo: Saraiva. Simão, J. V., Santos, S. M., & Costa, A. A. (2002). Ensino superior: Uma visão para a próxima década. Lisboa: Gradiva. Simão, J. V., Santos, S. M., & Costa, A. A. (2004). Bolonha: Agenda para a excelência. http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Governos_Constitucionais/GC16/Ministerios/ MCIES/Comunicacao/Publicacoes/20041011_MCIES_Pub_Bolonha.htm Souto-e-Melo, A. L. (2013). O impacto do processo de bolonha na formação de professores de educação visual e tecnológica. [Tese de Doutoramento. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade da Beira Interior]. Souto-e-Melo, A. L. (2018). Bologna process and the rethinking of the role of higher education: Teaching strategies focused on students’ skills achievement". Em C. P. Albuquerque, A. G. Ferreira, A. L. Oliveira, M. P. Paixão, R. P. Paixão & A. M. Seixas (Coords.), Higher Education: After Bologna - Challenges and Perspectives (pp. 15-49). Universidade de Coimbra. Sprinthall, N. A., & Sprinthall, R. C. (1993). Psicologia educacional. Lisboa: McGrawHill (Trabalho original em inglês, publicado em 1990). Kagan, M. S. (1992). Cooperative learning: Resources for teachers. Thousand Oaks, Califórnia: University of Califórnia. 407 Read, H. (2010). A educação pela arte (3ªed.). Lisboa: Edições 70 (Trabalho original em inglês, publicado em 1943). Rogers, C. R. (1985). Liberdade de aprender na nossa década. Porto Alegre: Merrill. Roldão, M. C. (2003). Gestão do currículo e avaliação de competências. Lisboa: Editorial Presença. Romanowski, J. P., & Wachowicz, L. A. (2003). Inovações metodológicas na educação superior e a transformação da prática pedagógica. Revista Diálogo Educacional (Vol.4) nº10 (pp. 1-12). http://www2.pucpr.br/reol/index.php/DIALOGO?dd1=792&dd99=view# Sousa, A. B. (2003). Educação pela arte e artes na educação. Bases psicopedagógicas, vol. 1. Lisboa: Instituto Piaget. Valente, L. (1999). Formação e transformação - Perspectivas de uma educação para o ser através das expressões artísticas. Em J. Tavares, A. Pereira, A. Pedro & H. A. Sá (Eds.), Investigar e formar em educação- Actas do IV Congresso da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação (Vol. I) (pp. 477-491). Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Vieira, R. M., & Vieira, C. (2005). Estratégias de ensino/aprendizagem. Lisboa: Instituto Piaget. 408 21. AFETOS, ERROS E APRENDIZAGENS – A TRANSDUÇÃO COMO PROCESSO DE ENSINO DAS MATEMÁTICAS E DAS GRAMÁTICAS Misleine Andrade Ferreira Peel73, Luiz Roberto Peel Furtado de Oliveira74 & Antonio Cilírio da Silva Neto75 Resumo A ausência de encontros, com toda a gama de afetos negativos, resultantes da falta de agenciamentos, e a constância de individuações equivocadas, também com toda a gama de afetos negativos, resultantes dessas pós-singularizações ‘errantes’, são responsáveis por grande parte das claudicações apresentadas pelos aprendizes nos processos de escolarização e de formação acadêmica. Neste texto, relacionaremos afetos com erros, e aprendizagens com transduções, tendo como norte teórico principal as obras de Charles Sanders Peirce, Gilbert Simondon e Gilles Deleuze; e tendo, como grupo beneficiário, alunos do Ensino Superior da região norte do Brasil. Trabalharemos com os modos de produção subjetivos implicados com a processualidade dos acontecimentos, fundamentando-nos em toda a riqueza da filosofia do acontecimento de Deleuze. Tratase de uma abordagem interdisciplinar, que se pretende trans, dos fenômenos da aprendizagem. A investigação é basicamente bibliográfica com procedimentos cartográficos, por meio dos quais a objetividade do trabalho foi sendo construída pelo traçar e destraçar de linhas duras, flexíveis e de fuga, o que permitiu e ajudou a constituí-lo como fusão de multiplicidades, com considerações sobre o fato comunicativo social (responsável pela importância da alteridade, tanto nos encontros, quanto nas criações). Uma das apostas de Deleuze está, certamente, centrada nos Doutoranda do Programa de Educação da Universidade da Beira Interior – UBI; Mestre em Demandas Populares e Dinâmicas Regionais, pela Universidade Federal do Tocantins – UFT; Especialista em Educação Matemática, pela UFT; Licenciada em Ciências – Matemática, pela UFT. E-mail: misleine.peel@ubi.pt 74 Professor Adjunto do Curso de Letras e do Programa de Mestrado e Doutorado em Ensino de Língua e Literatura na Universidade Federal do Tocantins. Pós-doutor em Língua Portuguesa pela Universidade da Beira Interior – UBI. Doutor e Mestre em Letras Clássicas pela Universidade de São Paulo – USP; Bacharel em Letras Clássicas pela USP; Bacharel e Licenciado em Língua Portuguesa pela USP. E-mail: luizpeel@mail.uft.edu.br 75 Professor Adjunto do Curso de Licenciatura em Letras/Pedagogia na Universidade Estadual do Maranhão – UEMA; Doutor e Mestre em Letras: ensino de língua e literatura pela Universidade Federal do Tocantins - UFT. E-mail: acilirio@bol.com.br 73 409 encontros, nas criações, nos afetos positivos e nos saberes outros, todos menores – todos plenos de uma menoridade que os afasta do poder e do discurso dominante. Palavras-chave: Filosofia do Acontecimento. Transdução. Alagmática. Afetos. Agenciamentos. AFFECTIONS, ERRORS AND LEARNING – TRANSDUCTION AS A PROCESS FOR TEACHING MATHEMATICS AND GRAMMARS Abstract The absence of encounters, with the whole range of negative affections, resulting from the lack of agency, and the constancy of mistaken individuations, also with the whole range of negative affections, resulting from these 'errant' post-singularizations, are responsible for most of the lameness presented by apprentices in the process of schooling and academic training. In this text, we will relate affections with errors, and learning with transductions, having as main theoretical guide the works of Charles Sanders Peirce, Gilbert Simondon and Gilles Deleuze; and having as targeted beneficiaries undergraduate students from the North of Brazil. We will work with the subjective modes of production involved with the procedurality of events, basing ourselves on the richness of Deleuze's event philosophy. It is an interdisciplinary approach, which is intended to be trans, of the learning phenomena. The investigation is basically bibliographic with cartographic procedures, through which the objectivity of the work was being constructed by drawing and unraveling hard, flexible and escape lines, which allowed and helped to constitute it as a fusion of multiplicities, with considerations on the social communicative fact (responsible for the importance of otherness, both in meetings and in creations). One of Deleuze's bets is certainly centered on encounters, creations, positive affections and other knowledge, all minor - all filled with a minority that distances them from power and dominant discourse. Keywords: Philosophy of Event. Transduction. Alagmatic. Affections. Agencies. 1. Introdução Os erros escolares resultam quase sempre ou da ausência de afetos e de encontros ou da presença e da constância de individuações equivocadas, situadas fora da 410 normatividade usual da disciplina ou da matéria trabalhada em classe; em nosso caso, os erros ou desvios da norma padrão da língua portuguesa, ou das normas da linguagem matemática, são recorrentes e colocam os professores em uma situação complexa e cheia de aporias, tanto no ensino fundamental, quanto no ensino médio, e ainda no ensino superior – uma vez que os conhecimentos linguístico-gramaticais e os conhecimentos matemáticos são necessários em qualquer fase do ensino. Muitas vezes os erros são vistos consorte concepções negativas, ou nem se quer são levados em consideração para a construção de novas relações; deveriam, no entanto, ser percebidos como oportunidades de desterritorialização, para uma posterior reterritorialização profícua e para a criação de afetos e de sensações de alegria – o que transformaria todo o processo de ensino e de aprendizagem em momentos de crescimento da vontade de agir. De fato, muitos estudantes carregam seus erros por toda a caminhada escolar, pois, se nenhum novo agenciamento for feito a partir deles, nenhum novo afeto será constituído; sabendo que geralmente os resultados finais são mais valorizados do que os processos, sendo que, nessa valorização de resultados, os procedimentos resultantes de agenciamentos não são percebidos com fenômenos fundamentais para a construção do aprendizado. Neste artigo queremos relacionar erros, afetos, aprendizagens e transduções, tendo como norte principal Charles Sanders Peirce, Gilbert Simondon e Gilles Deleuze, procurando apresentar a possibilidade de trabalho lúdico na sala de aula por meio da transdução alagmática. Pretendemos, dessa forma, trabalhar com os modos de produção subjetivos associados à processualidade dos acontecimentos, já que a filosofia do acontecimento, fonte de nossas argumentações, apresenta tanto os fenômenos corporais do enunciado, quanto os incorporais e inexprimíveis – aqueles que são utilizados de modo transdutivo e alagmático no aprendizado familiar da linguagens verbais e matemáticas (transdução implica, certamente, trocas e mudanças de energia; e não, essências ou substâncias, donde a sua percepção é delicada e séria), como fenômenos importantíssimos para que a aprendizagem realmente ocorra. 2. Peirce, Simondon e Deleuze: afetos, incorporais e erros As palavras e as frases (e os parágrafos, e os capítulos, e os livros – as repetição da conjunção aditiva são propositais, pois, na filosofia do acontecimento de Deleuze, o 411 somar é mais importante do que o dividir), já que nosso escopo principal é o encontro com os textos, têm algo de incorporal, o que foi percebido pelos estoicos e trabalhado com maestria por Deleuze. Esse incorporal é o inexprimível, algo que se localiza entre a palavra e a coisa, verdadeira passagem, apropriado acontecimento de uma significação e igualmente correto espaço de ligação entre sujeitos e objetos, entre mães e filhos (um espaço sem coerção – o espaço do acontecimento – verdadeiro espaço de passagens profícuas entre os seres e entre seres e coisas). E é nesse espaço que acontecem os afetos, os acertos, os erros (ou desvios, ou ainda variações) e os fenômenos inexprimíveis, não se tratando de um espaço de e para representações analógicas ou simbólicas, mas do lugar de encontros ou de agenciamentos, de experimentações ou de jogos, e de devires ou de festas. Heidegger chamou o ponto de partida desses lugares de simpatia ou afinação, ou também atmosfera (Stimmung); Ricoeur, de memória ou símbolo; Deleuze, de agenciamentos ou encontros. Preferimos, nesse texto, o último, já que é nos encontros com afetos que nascem os signos, os quais, por sua vez, têm a função de fazer pensar, ou seja, pensar é uma atividade disparada involuntariamente pela força do signo (Nascimento, 2012). Pensar, de fato, não se constitui apenas como representação cognitiva de algo, posto que existam vários tipos de pensamentos, resultantes de variadas formas de imagens; pensar é seguir signos; pensar é fazer com que signos sejam seguidos; pensar é conduzir. E é por isso que dedução, indução, abdução e transdução têm em comum a raiz latina duc- (‘conduzir’). Pensar é, então, conduzir e ser conduzido por signos. Os vários tipos de signos são responsáveis por vários tipos de imagens, que, por seu turno, são responsáveis por igualmente vários tipos de devires: há o devir perceptivo, resultado da imagem-percepção (zeroidade76); existe o devir afetivo, resultado da imagem-afecção (primeiridade77); ocorre, também, o devir pulsional, resultado da imagem-pulsão (entre a primeira e a secundidade); acontece, ainda, o devir acional, resultado da imagem-ação (secundidade); sucede, além disso, o devir reflexivo, resultado da imagem-reflexão (entre a secunda e a terceiridade); existindo, até, o devir 76 Zeroidade é um conceito introduzido por Gilles Deleuze às matrizes de criação do pensamento e da linguagem de Charles Sanders Peirce, constituindo-se como o não lugar da criação, ou seja, o lugar dos movimentos infinitos de todas as partículas que possamos pensar, dizer ou significar. 77 Primeiridade, Secundidade e Terceiridade são as matrizes do pensamento e da linguagem da semiótica americana de Charles Sanders Peirce, sendo que a Primeiridade é o lugar de contemplação da pura qualidade; a Secundidade, o lugar da ação; e a Terceiridade, o lugar da convenção, da lei, do pensamento simbólico, da representação e da argumentação verbal e/ou multissemiótica. 412 relacional, resultado da imagem-relação (terceiridade). Não parando por aí, já que podem ocorrer outros devires (háptico, por exemplo) (Oliveira, Duarte e Peel, 2019). Percebamos que esses processos começam com dois devires: o perceptivo e o afetivo – passagens primeiras, nas quais os processos de aprendizagens têm o seu início, tanto os positivos, resultantes de individuações esperadas pelos docentes, ou estimuladores, quanto os negativos, resultantes de individuações, ou de alienações, equivocadas em relação ao esperado pelos docentes. Cada um desses devires, com sua imagem equivalente, acaba sendo responsável pela criação de um determinado tipo de afeto. O devir perceptivo, fruto da imagempercepção, é o responsável pelo afeto em relação à percepção, pela percepção da percepção, pelas imagens sem ponto de referência, posto que nasça da zeroidade, lugar do caos e fonte de toda a criação, constituindo-se como a passagem inicial para a abertura da mente (verdadeiro conjunto de senhas, que abre realmente o ‘cérebro, permitindo variações na arquitetura neural). A imagem-percepção se constitui como a primeira imagem criadora de movimentos, ou de acontecimentos, sendo que o bebê, em seus processos de individuações, deixando de ser pré-singular e amorfo, inicia o seu processo de participante ativo dos acontecimentos quando começa a perceber a sua percepção – a perceber que percebe. O papel da imagem-percepção na constituição da imagemmovimento, a conjunção das imagens percepção, afecção e ação, é o de se apresentar como o primeiro aspecto material da subjetividade – a subtração. Assim, subtraindo pela percepção, a subjetividade se instaura, sendo seguida posteriormente por uma ação – pela imagem-ação. Ora, o leitor atento pode estar se perguntando: “E a afecção?”; “E a imagem-afecção?”; “Onde se localiza?”. Deleuze (2009) mesmo responde: A afecção é aquilo que ocupa o intervalo, aquilo que o ocupa sem o encher ou o tapar. Ele surge no centro da indeterminação, isto é, no sujeito, entre uma percepção sob certos aspectos perturbante e uma ação hesitante. Ela é uma coincidência do sujeito e do objeto, ou a maneira como o sujeito se percepciona a si mesmo, ou antes, faz a experiência de si ou se sente “de dentro” (terceiro aspecto material da subjetividade). Ela refere o movimento a uma “qualidade” como estado vivido (adjetivo). (p. 106) 413 A imagem-afecção é, então, a pura potência, a coincidência do sujeito e do objeto, sendo adjetiva por excelência – adjetiva e inexprimível, posto ser afeto. E o afeto, sendo a potência do devir é fenômeno imprescindível para a aprendizagem. No entanto, antes de navegarmos por outras imagens, é preciso mostrar o papel da imagem-afecção em sua relação com a imagem-percepção, o que Drigo (2016) faz por meio da aproximação entre Deleuze e Peirce: Deleuze distingue a coisa e a coisa percebida. A coisa, que “é a imagem tal como ela é em si”, corresponderia ao percepto, no processo perceptivo visto à luz das ideias peircianas; a coisa percebida, ou imagem-percepção, corresponderia ao par percipuum/juízo perceptivo. Na perspectiva peirciana, o produto da percepção, na sequência da imagem-percepção, a imagem-ação, teria como ponto de partida o juízo perceptivo. Ao propor o terceiro componente da imagem-movimento, a imagem-afeção, Deleuze, em certa medida, mostra que aspectos qualitativos também compõem a imagem-movimento. A imagem-afeção resgata aspectos não percepcionados, quando da subtração, ou na constituição da imagem-percepção. (p. 5) A imagem-afecção tem lugar na primeiridade; daí, a sua importância, resgatando “aspectos não percepcionados” – aqueles aspectos que não foram subtraídos. Ora, a subtração se tornará, então, negativa, se não for acompanhada do afeto; podendo se tornar, caso não haja também afeto, uma postura apenas representativa, deixando de lado, certamente, outros aspectos da coisa percebida, em função de escolhas subjetivas separadas da fenomenologia perceptiva. A passagem da percepção para a ação, como envolve a imagem-afecção e o seu fenômeno incorporal, dá-se de modo insensível; sendo que a imagem-movimento, a conjunção da percepção, da afecção e da ação, ocorre sempre na secundidade (Drigo 2016). Pensando, agora, na relação entre consciência e percepção, há, para Peirce (CP 1.377 e CP 1.378), três níveis de consciência: consciência de qualidade (primeiridade – consciência passiva, sem recognição ou análise), consciência dual (secundidade – consciência de uma interrupção no campo da consciência) e consciência sintética (terceiridade – a consciência no tempo, com sentido de similaridade, de conexão real e de aprendizagem). De acordo com as palavras do filósofo americano, os três níveis são assim descritos em relação às concepções de qualidade, de relação e de mediação: 414 A concepção de qualidade, a qual é absolutamente simples nela mesma e, contudo, observada nestas relações ela parece ser completa de variedade, surgiria em qualquer momento quando sentimento ou consciência singular se torna proeminente. A concepção de relação vem da consciência dual ou sentido de ação e reação. A concepção de mediação emerge da consciência plural ou sentido de aprendizagem. (Peirce, CP 1.378) Assim, da vivência de qualidades, por meio do surgimento da consciência singular, início do processo de individuação do bebê, há o posterior surgimento da consciência dual, com os sentidos de ação e reação; finalmente, quando os signos se tornam mediações, emerge a consciência plural e a aprendizagem cognitiva profícua. Em outras palavras, da imagem-percepção, passando pela imagem-afecção e pela imagem-ação, a aprendizagem ocorre quando a consciência plural alcança a individuação da imagem-relação; havendo, ainda, a imagem-pulsão e a imagemreflexão como pontes entre os níveis segundo e terceiro78. Percepções, então, são acompanhadas de afetos e de pulsões, para estimularem ações, que, por sua vez, acompanhadas de reflexos, resultarão em aprendizagens relacionais; dessa forma, as imagens se sucedem com os agenciamentos, os quais, por sua vez, são importantíssimos para que haja festas de aprendizagens mais complexas. Ora, aprender a ouvir e a falar, a ler e a escrever, são deveras atividades complexas, que necessitam de toda uma condução inventiva e fecunda para que ajudem a criar indivíduos sérios e criativos. No Brasil, em relação ao ensino superior, há problemas sérios no tocante à leitura e à resolução de problemas matemáticos simples e primordiais – o que se iniciou na educação familiar, passou pela educação escolar e colegial e chegou à universidade, sem ter sido cuidado, com a premência necessária, em nenhum desses processos. Agora, considerando o outro tópico do subtítulo deste segmento do texto – o erro; ele pode aparecer no processo ou como individuação equivocada ou como resultante de falta de atenção ou, ainda, como variação da norma (no caso do ensino e da aprendizagem da língua portuguesa ou da linguagem matemática). E, caso se torne 78 Os acréscimos de Deleuze à teoria de Peirce são precisos, já que estabelecem uma sequência profícua para a compreensão tanto da percepção quanto da aprendizagem das imagens. Dessa forma, imagempercepção, imagem-afecção, imagem-pulsão, imagem-ação, imagem-reflexão e imagem-relação se constituem como processos de aquisição e de desenvolvimento não só da percepção, mas também do pensar. 415 uma individuação concreta, pode generalizar-se em equívocos constantes. Convém, para que não caiamos em aporias redundantemente insolúveis, refletir sobre normatividades e saberes menores, visto que é importante, se quisermos caminhar para a transdução alagmática, compreender as variações como possibilidades normativas igualmente sérias e profícuas. Deleuze fala do saber menor como o saber das minorias, não minorias quantitativas, mas qualitativas em relação ao poder. As culturas menores, com suas variações sincrônicas, precisam ser contempladas nas salas de aulas como verdades, enquanto somatórias de relações humanas. Não é verdadeira somente a norma padrão da língua portuguesa, ou apenas uma forma de aplicação dos cálculos matemáticos; também serão verdadeiros, ao menos em sua persistência na mente dos alunos, as variações linguísticas e os cálculos não euclidianos e aorísticos, resultados de erros cristalizados, que pertencem à inclusão do terceiro, como nos processos quânticos. Apesar de muitos avanços em relação às concepções de aprendizagem e de ensino, na prática escolar brasileira, ainda se faz presente o uso de uma metodologia tradicional de ensino baseada na transmissão de conhecimentos historicamente estabelecidos, não oportunizando aos estudantes a passagem pela experimentação, pela exploração, pela verbalização das ideias, pelo questionamento, pela argumentação, pela abdução, pela transdução e pela validação; sendo assim, as transduções alagmáticas não acontecem, ainda, de forma efetiva. Ora, a transdução alagmática, enquanto processo de troca e de mistura, não cabe apenas nas normatividades culturais, sejam linguísticas, matemáticas ou de outra natureza qualquer; as variações devem ser respeitadas, posto se tratarem de transformações de energia, de acontecimento e de incorporais. Ora ainda, a transdução, se alagmática, enquanto processo que opera e contempla as diferenças, prescinde das variações, aceitando o terceiro – o diferente; ou conforme Oliveira, Duarte e Peel (2019): O processo de aquisição de conhecimento deve ocorrer de modo transdutivo associado à alagmática. Para que as operações alagmáticas aconteçam, é preciso que o ser préindividuado percorra o caminho de percepção/solução de problemas de modo abdutivo, indutivo, dedutivo e transdutivo. Esses processos resultarão em constantes individuações; constituintes, por sua vez, de outro ponto muito importante para Simondon, talvez o que justifique a alagmática. [...] A noção de alagmática vai além da materialidade formada, ou seja, do conceito de essência. 416 Para Simondon, o problema em todas essas teorias é que elas consideram a noção de forma com antecedente à própria operação que a torna real. A alagmática é o conceito que busca reparar essa lacuna, ao descartar a ideia de molde e de modelagem. (p. 99 e 100) A alagmática, para Simondon, é o nome dado ao processo que opera a individuação, sendo mesmo o acontecimento que dá forma a uma nova fase do ser, já que a individuação é a teoria da constituição e da formação do indivíduo. Dessa forma, na operação com os signos, por meio da aquisição das imagens descritas até aqui, responsáveis pelos processos de individuação alagmática, os seres constroem os seus acontecimentos; ou seja, pela percepção de problemas, passamos por processos de individuação quando conseguimos resolvê-los ou, ao menos, compreendêlos no jogo das experimentações resultantes de agenciamentos afetivos. A alagmática pode ser ainda descrita como a amplificação transdisciplinar das individuações. Ainda segundo Oliveira, Duarte e Peel (2019): Os processos alagmáticos atualizam constantemente o ser, levando-o de uma etapa présingular a outra individuada [....]. É por meio da resolução de problemas que esses processos se concretizam. Para Simondon (2005, p. 455), o indivíduo é um ser autoproblemático, “não encontra dificuldades, ele é dificuldade em si mesmo; ele se reencontra sobre seu próprio caminho”. Esse caráter autoproblemático surge daquilo que Simondon chama de “dualismo ambivalente”, “sob qualquer ponto de vista, o indivíduo é feito da relação de dois aspectos: substancialidade ontogenética e e filogenética; eventualidade; interioridade interioridade profunda e exterioridade; e racionalidade hiperconsciente” (2005, p. 455). ( p. 102) Em outras palavras, a alagmática é a teoria geral das trocas e das mudanças de estado. Daí, a criança, ao aprender afetivamente as primeiras palavras e frases, na realidade faz coincidir numa mesma expressão a frase monorremática e as incorporalidades dos sentidos; usando-as, tanto palavras quanto frases, como conjunção alagmática de percepções, afetos, pulsões, ações, reflexões e relações, num sentido transdutivo que busca sempre a resolução de problemas. Ainda segundo os três autores citados acima, a criança adquire conhecimento linguístico por meio de trocas realizadas entre ela e seu meio físico e social: 417 Para isso, vários processos de individuação ocorrem; em um desses processos, ela deixa aos poucos o estado em que balbucia e passa a se comunicar. Quando vai à escola, a criança passa novamente por mudanças de fase que ocorrem por meio de trocas com seu meio social/físico. Essas trocas lhe proporcionam novas individuações e a mudança de estado implica conhecimento de estruturas; no caso específico da aprendizagem da língua, a atualização do ser ocorre por meio das novas estruturas linguísticas que são adquiridas. (p. 102) Quando algo é verdadeiramente aprendido, o conhecimento adquirido se mescla com o ser, transformando-o, conforme nos deixou o filósofo francês Michel Serres (2015): “quando aprendo matemática, eu mudo também a pessoa; quando aprendo história, meu corpo, minha personalidade muda” (p. 244). E, assim, de mudança em mudança, de troca em troca de energias, os problemas irão sendo resolvidos. 3. Erros, normatividades e a aprendizagem-cartografia Retornemos à normatividade, aos saberes menores e aos erros como pontes entre afetos e aprendizagens; para tanto, afirmamos que as linguagens (verbal e a matemática) se constituem como objetos técnicos elementares a quaisquer criações científicas e/ou técnicas. Um pequeno texto de Almeida (2016) nos ajuda a compreender essa proposição: Em O Indivíduo e sua Gênese Físico-Biológica (1966), a questão prévia da individuação é a existência de um sistema metaestável definido por uma disparação entre duas ordens de grandeza, duas escalas de realidades díspares, onde não há comunicação interativa; ao contrário, existe dissimetria, energia potencial e diferença de potencial. Neste texto, Deleuze afirma que o metaestável é definido como ser préindividual, provido de singularidades. Singular sem ser individual, eis o estado do ser pré-individual (DELEUZE, 2006, p.118). A disparidade (a categoria do problemático) é, portanto, o primeiro momento do ser, singular e prévio à individualidade. Trata-se da distinção entre singularidade e individualidade, que terá, por sua vez, inúmeros desdobramentos no pensamento de Deleuze. (p. 33). Mesmo com a normatividade que as torna viáveis, as linguagens verbais e matemáticas precisam da disparidade inicial do infante, da sua categoria do problemático, do primeiro momento do ser e do estar aqui e aí. E, a partir dessas disparidades, dessas reais e virtuais diferenças entre duas ordens de grandeza, entre duas escalas de realidades díspares, é que surgirão as individuações. 418 E, se a categoria do problemático é vivenciada e definida como momento ‘préindividual’ do ser, a individuação é a organização de uma solução, ou seja, constitui-se como resolução para um sistema problemático – verdadeira ressonância interna, modo de comunicação entre realidades diferentes. Assim refletindo, concluímos que as variações da norma padrão, seja na língua portuguesa, seja em outra forma de conhecimento ou técnica normativa, devem ser compreendidas como pertencentes à categoria do problemático, já que necessitam da individuação para a organização de soluções. Deleuze deixou claro que a ressonância tem enorme importância nos processos relacionados à afetividade, abrindo-se a um coletivo ‘trans-individual’: Simondon não quer ater-se a uma determinação biológica da individuação propriamente, mas precisar níveis cada vez mais complexos: assim, há uma individuação propriamente psíquica, que surge, precisamente, quando as funções vitais já não bastam para resolver os problemas postos ao vivente, e quando uma nova carga de realidade pré-individual é mobilizada numa nova problemática, em um novo processo de solução. E o psiquismo, por sua vez, abre-se a um coletivo trans-individual. (Deleuze, 2006, p.120). Essa abertura ‘trans-individual’ do psiquismo ocorre por meio de agenciamentos e de encontros afetuosos, cheios de ressonâncias, resoluções e comunicações entre realidades diferentes e que se querem trans. Ora, objetos técnicos e culturas estiveram sempre ligados: a língua é um sistema vivo de construção cultural, formado por jogos de linguagem; já a gramática é um sistema técnico de ensino e de aprendizagem, formado por outros jogos de linguagem, os quais, desta vez, são constituídos como objetos técnicos cuja experimentação é rizomática e importantíssima; enquanto que a matemática é um sistema formado também por jogos de linguagens específicos e de igual importância. Objetos técnicos e culturas se misturam, dessa forma, alagmaticamente, redefinindo-se em vários momentos. A aprendizagem ocorre, então, na imanência do encontro de objetos técnicos com culturas menores e maiores, a partir de agenciamentos e sempre por meio de signos e de afetos (com palavras, com desenhos, com danças, com corpos... etc.). Para Deleuze (1988), não dá para saber com certeza como todas as pessoas aprendem, já que a aprendizagem está relacionada com a singularidade de cada um – 419 com o modo com que cada um é afetado pelos signos, pelos afetos – não há, na realidade, métodos genéricos para o aprender; não há, então como planejar genericamente o aprendizado (o aprender acontece singularmente). A aprendizagem, segundo o filósofo, é feita na relação do signo enquanto afeto, com a resposta enquanto encontro com o outro. Experimentando a aprendizagem-cartografia, a aprendizagem a partir de trajetos de afetos, de perceptos, de conceitos e de funções ou relações, o indivíduo terá encontros com signos, ou seja, com afetos, com perceptos, com conceitos e com funções – dado o seu caráter alagmático, o que favorecerá respostas e aprendizagens. Em Deleuze, a noção de aprendizagem supera as concepções tradicionais: para o filósofo, a aprendizagem não se trata de uma passagem de um estado de não saber para um estado de saber; mas, sim, de processos percorridos pelo indivíduo em inúmeros estágios de sua vida – é um ato de adaptação e de criação, um agenciamento complexo que concerne às condições de possibilidade do próprio pensamento que são a formação da ideia e a formulação do problema (o aprender vai além do saber, anuindo na vida inteira do indivíduo de forma contínua, apaixonada e imprevisível – o aprender vem do fora, de onde estão as ideias). A aprendizagem, portanto, deve ser realizada de modo a forçar o desaparecimento do sujeito e a revelação de uma verdade experimentada naquilo que o ultrapassa, que está fora do seu ser, fazendo criar possibilidades de pensamento. Aí está um processo constituído por elementos que tornam possível o seu acontecimento: os signos, a invenção de problemas e a criação de conceitos em contextos de experimentação. Nesse processo, são os contextos de experimentação que o acaso, o encontro e aquilo que força a pensar precedem o aprender. Nessa perspectiva, a aprendizagem é o caminhar da razão para a sensibilidade, da sensibilidade ao signo, da re-cognição à decifração, da existência à essência. A aprendizagem é efeito do ato de pensar e o que força a pensar é o signo; o ato de pensar não é, portanto, decorrente de uma simples possibilidade natural, sendo, ao contrário, a única criação verdadeira. O signo é o objeto de um encontro e a contingência dos encontros garantem a aprendizagem. Numa reflexão mais ampliada da compreensão da aprendizagem humana – campo múltiplo e complexo –, as visões literárias e filosóficas que se encontram no filósofo Gilles Deleuze (2006) e em suas leituras da obra de Marcel Proust, por exemplo, expõem as novas noções sobre a aprendizagem agora sob a ótica da Filosofia 420 e da Literatura, o que dá oportunidade de compreensões de zonas obscuras e, especialmente, amplia-se o olhar do pesquisador no trabalho com a aprendizagem. Como refletiu Schérer (2005), “Gilles Deleuze disse, sobre Michel Foucault, que ele era um “vidente”. Esta qualidade aplica-se, eminentemente, a ele próprio. Ele vê e nos faz ver o que até então não era percebido”. A aprendizagem nunca se encerra na singular aquisição de um saber; aprendizagem é um processo a ser incessantemente recomeçado onde o que importa é o ato inicial, a partida, o movimento para vias do fazer. Para que a aprendizagem se efetue, esse impulso inicial e permanente do pensamento deve consistir em liberar todo pensamento daquilo que o entrava, que o limita, que o impede de experimentar o movimento. Aprender não é reproduzir, mas inaugurar; inventar o ainda não existente, e não se contentar em repetir um saber: “fala-se – percorro outra vez o mesmo texto –, do fundo daquilo que não se sabe, de seu próprio sentido, de seu próprio desenvolvimento, de um conjunto de singularidades soltas”; pois é preciso desfazer os “aparelhos de saber”, as organizações preexistentes, incluída a do corpo, para devir, entrar em “devires” que comandam e balizam toda criação. (Schérer, 2005, p.1188). Aprender é desembaraçar-se das divisões, dos poderes, das regras artificiais, das instituições, das representações, das ideias prontas, de tudo que bloqueia os processos favoráveis ao necessário movimento do pensar; é desembaraçar-se do que imobiliza ou sedentariza; é reativar-se em constante movimento de des(re)territorialização; é experimentar um incessante surgimento de formulações novas, de invenções, de criações na continuidade de uma trajetória. 4. A aprendizagem-cartografia propriamente dita Desejamos, com o nosso trabalho, que muitos educadores e professores percebam a aprendizagem-cartografia como dispositivo capaz de provocar agenciamentos, experimentações e devires: agenciando momentos singulares e criativos com seus alunos, experimentando com eles mapas de intensidade que distribuam e redistribuam afetos e constelações de perceptos, e vivenciando o devir-aprendizagem ou o devir-cartografia como errância profícua ou nomadismo positivo. O errar, considerado enquanto trajeto, cheio de flanares e passeios lúdicos, constitui-se como vontade de agir. E o erro percebido dessa forma deve ser vivenciado 421 como ideia adequada, deixando a sua visão de ideia inadequada para trás; o erro, para Nietzsche, não deve ser colocado como antítese da verdade; mas, como seu complemento de alegria, de grande alegria (grosse Freude). A noção de erro, na aprendizagem-cartografia, é verbal; referindo-se ao acontecimento, à experimentação cartográfica – ao “errar” enquanto caminhar ou flanar lúdico. Daí, errando ou cartografando pelas experimentações alagmáticas e transdisciplinares, a criança poderá caminhar para as matemáticas ou gramáticas ou ciências com afetos positivos – verdadeiros dispositivos que sempre provocarão outros dispositivos e aprendizagens; e o erro deixará de ser um erro para transformar-se num erro (eu erro – eu caminho – eu cartografo). Almejamos, igualmente, que professores e alunos mergulhem, nadem e flutuem na língua e na matemática, por meio de agenciamentos e de experimentações com as palavras, experimentando-as como excesso prazeroso de suas vivências pedagógicas; aspiramos, ainda, a que os períodos passados com os alunos sejam vivenciados como banquetes facilitadores da conjugação de vontades da potência – de socialidades profícuas. A mesa é, de fato e de fenômeno, o lugar da caosmose79, da comunhão de corpos sem órgãos, expressando por seus ritos trágicos e cômicos a harmonia e a comunicação Envolta por toda uma complexidade interessante, a expressão ‘caosmose’ que dá título a um livro de Félix Guattari (2012), traz a composição de caos, osmose e cosmo. A associação dessas palavras, numa fusão desejada e sabiamente composta pelo filósofo, propõe uma reflexão acerca da condição caótica e de osmose que caracteriza o cosmo, o universo – o que podemos recortar também como o território de uma pesquisa, de uma análise, de uma aprendizagem, de uma produção que carece ser compreendida em seu estado mais complexo. 79 Pensar caosmose na postura do pesquisador é uma perspectiva que possibilita vislumbrar o quanto é preciso levar em conta as dimensões visíveis e invisíveis – na terminologia esquizoanalítica, os universos corporais e incorporais – existentes num campo de pesquisa. A palavra caosmose é emblemática para caracterizar a ciência contemporânea, os universos de pesquisa, a (des)(re)territorialização cada vez mais intensa dos dias atuais. Trata-se de um novo paradigma estético, que diz respeito à subjetividade enquanto produzida por instâncias individuais, coletivas e institucionais, constituídas a partir de diversos elementos: componentes semiológicos significantes (manifestados por meio da família, da educação, do meio ambiente, da religião, da arte, do esporte); componentes constituídos pela indústria dos mídia; componentes semiológicos assignificantes (produções paralelas ou independentes que escapam das produções axiomáticas). Dessa forma, para o pensador francês, subjetividade é “o conjunto das condições que torna possível que instâncias individuais e/ou coletivas estejam em posição de emergir como território existencial autorreferencial, em adjacência ou em relação de delimitação com uma alteridade ela mesma subjetiva” (p. 19). 422 cósmicas; assim, as experiências pedagógicas devem ser como banquetes que permitam e que desenvolvam a arte da conjugação e da troca simbólica; de acordo com Maffesoli (2005, p.97), “o encontro à mesa é uma propedêutica dessa troca simbólica, pois se baseia na aparência” – constituindo-se, portanto, como modelo invencível do fato social. Mas, acrescentando outros signos aos símbolos, a vivência da aprendizagemcartografia é um banquete ainda maior e melhor, pois permite que sejam experimentados na mesma experiência e com forças diferentes o movimento e o esquecimento, o que, ao lado da experimentação de perceptos e de afetos, trará música, dança e alegria enquanto linhas flexíveis e de fuga na direção de devires trágicos e cômicos, e, por isso, igualmente alegres e frutíferos. Se conseguirem partilhar do banquete pedagógico possibilitado pela abordagem transdutiva e alagmática da aprendizagem-cartografia, de sua partilha do sensível, de sua comunhão com o caos e com o cosmos, professores e alunos terão encontros singulares em seus mergulhos nas linguagens e nos signos, experenciando a arte e alcançando, como dito acima, devires intensos e efervescentes. As aprendizagens, se cartográficas, precisam deixar a monumentalidade de lado, tornando-se hodológicas, ordenando caminhos oriundos de um fora e sendo, de fato, elas próprias trajetos e viagens. A aprendizagem-cartografia segue os trajetos dados por um fora e opera com linhas fluidas que atravessam os corpos orgânicos. Essas linhas fluidas são os trajetos e os caminhos que o aprendiz, o professor e o aprendiz-professor e o professor-aprendiz traçam para passear e para flanar em uma pluralidade de trajetos legíveis e coexistentes somente num mapa, metamorfoseando e retendo sentidos inseparáveis de devires. A aprendizagem-cartografia é, ainda, coletiva, porque é relacional; é também política, por envolver interações entre forças; é ética, por participar de valorações para existir; e é estética, por dar forma a todo esse conjunto de modo expressivo. Deleuze e Guattari (2011), salientando a importância da arte em qualquer tipo de experiência cartográfica, termina o capítulo no qual as crianças dizem, da seguinte forma: “Trajetos e devires, a arte os torna presentes uns nos outros; ela torna sensível sua presença mútua e se define assim, invocando Dioniso como o deus dos lugares de A subjetividade, então, é tanto individual quanto coletiva. E, de modo caosmótico, tentando reconciliar o caos e a complexidade, cada indivíduo e cada grupo social veiculam seus próprios sistemas de modelização da subjetividade, sempre a partir de cartografias cognitivas, míticas, rituais, sintomatológicas, e com o desejo, enquanto excesso, de se posicionar em relação aos seus afetos e às suas angústias, para gerar e gerir suas inibições e suas pulsões. 423 passagem e das coisas de esquecimento” (p. 90) – viva, pois, o esquecimento! mote maior das crises picnolépticas da criação artístico-cartográfica. Chegando à picnolepsia, chegamos a Paul Virilio (2014, p. 97): “o esquecimento é indispensável à projetividade da imaginação e à propagação do pensamento”. Daí, o esquecimento, enquanto falta, precisará do desejo, enquanto excesso, para juntos possibilitarem a criação artística; falta e excesso juntos compõem um dos paradoxos da aprendizagem-cartografia – o paradoxo que a mantém como vontade da potência trágica. E essa vontade de potência reflete o trágico por suas multiplicidades, por suas alegrias plurais e por seus eternos retornos; de fato e de fenômeno, não há retorno do negativo – só do positivamente trágico; sendo o eterno retorno, para Nietzsche e para Deleuze, a reprodução do devir-ativo (do além-do-homem, do filho de Ariadne com Dioniso). E a reprodução do devir-ativo nada mais é do que a criação da diferença pela repetição – a criação da diferença enquanto afirmação pura. Apenas a diferença é feliz, ensinou-nos Nietzsche; e o excesso da aprendizagemcartografia é a alegria e, por que não, a felicidade. Não nos esqueçamos nunca de que para Deleuze e Guattari, desejo é excesso, contrariamente a Lacan, que o considerou como falta. E, dessa forma, sendo excesso, o desejo pede o errar, o flanar e o aprender. 5. Aprendizagens-cartografia e alegrias O conceito de alegria é muito importante para a aprendizagem, para qualquer maneira com que ela se apresente, mas principalmente para a aprendizagem-cartografia, o que foi, em relação à vida e à filosofia, sempre salientado por Nietzsche (2009), Deleuze e Guattari (2011), dentre outros. Etimologicamente, a palavra ‘alegria’ vem do vocábulo latino alecer, alecris – que significa vigoroso, animado, sendo que os perceptos provocados pela arte realmente vigoram e animam as singularidades. Em Nietzsche (2009), há duas alegrias (kleine Freude e grosse Freude): a primeira se refere à alegria ou à felicidade metafísica; a segunda, à alegria ou à felicidade artística – à alegria trágica. Convém ler o que diz o filósofo sobre a alegria trágica e compreender e perceber tudo o que comporta a grande alegria: Se pensamos nos germens iniciais do senso artístico e nos perguntamos que diferentes espécies de alegria são produzidas [...] encontramos primeiramente a alegria de entender o que um outro quer dizer [...] – Em seguida, ante a mais rudimentar obra de arte nos 424 lembramos do que foi agradável na experiência e temos alegria [...] – Também a lembrança do que foi desagradável, na medida em que foi superado ou em que nos faz parecer interessante para o ouvinte [...] pode proporcionar grande alegria [grosse Freude] [...] – De uma espécie mais refinada é a alegria que surge à visão do que é regular e simétrico, em linhas, pontos, ritmos; pois devido a uma certa similaridade é despertado o sentimento elo que é ordenado e regular na vida, ao qual devemos, enfim e exclusivamente, todo o nosso bem-estar, ou seja, no culto do simétrico adoramos inconscientemente a regra e o equilíbrio como fonte de felicidade até então havida; tal alegria é uma espécie de oração de graças. Apenas após atingirmos uma certa saturação dessa última alegria nasce o sentimento [o conjunto de sensações chamado percepto], ainda mais refinado, de que também pode haver fruição na infração do que é simétrico e regrado; quando há o estímulo, por exemplo, de buscar razão na aparente não-razão, pelo que, como uma espécie de enigma estético, ele se revela um gênero mais elevado da alegria artística [Kunstfreude] primeiramente mencionada. (p. 18). E, ainda pensando nas alegrias pequenas e grandes do filósofo alemão e nas atribuições maior e menor de Deleuze, deve-se vivenciar e experimentar um paradoxo: o maior de Deleuze é o pequeno de Nietzsche, e o menor de Deleuze é o grande de Nietzsche; de fato a arte menor do filósofo francês é a alegria maior do alemão (somente os agenciamentos que produzem cultura menor é que oferecerão a alegria enorme). A alegria, para a aprendizagem-cartografia e para Spinoza, é a passagem de uma perfeição menor para uma perfeição maior. Não sendo a própria perfeição, o que atrapalharia a sua experimentação, a alegria carece de agenciamentos para alcançar o devir – o seu vir a ser. Assim, agenciamentos e experimentações alegres caminharão sempre ao devir enquanto dispositivo, igualmente alegre e igualmente profícuo. 6. A aprendizagem-cartografia e os perceptos Os perceptos não são percepções, nem dependem do estado ou da situação daqueles que os experimentam (Deleuze, 2011); constituem-se, para o filósofo, como conjunto de sensações, que valem por si mesmas, excedendo qualquer ser ou coisa vivido: “a obra de arte é um ser de sensação, e nada mais: ela existe em si” (p. 194); e o contíguo de efeitos e impressões produzidas pelas obras de arte é o que constitui o percepto. 425 Pela arte, então, os perceptos são arrancados das percepções dos objetos e dos estados de um sujeito percipiente (idem, p. 197); e, relacionados com os afetos, são criados pelos artistas como metamorfoses de mundo. Questões e resposta de Deleuze e Guattari (2010) nos ajudam a compreender o seu conceito de percepto: Que estranhos devires desencadeiam a música através de suas “paisagens melódicas” e seus “personagens rítmicos”, como diz Messiaen, compondo, num mesmo ser de sensação, o molecular e o cósmico, as estrelas, os átomos e os pássaros? Que terror invade a cabeça de Van Gogh, tomada num devir girassol? Sempre é preciso o estilo – a sintaxe de um escritor, os modos e ritmos de um músico, os traços e as cores de um pintor – para se elevar das percepções vividas ao percepto, das afecções vividas ao afecto. (p. 200-201) A aprendizagem-cartografia precisa, destarte, da arte para se constituir como construção de afetos; para que suas experimentações provoquem o surgimento desse conjunto de sensações chamado ‘percepto’. Precisa, ainda, das gramáticas, das matemáticas, das ciências e das filosofias; e tudo isso por meio de experimentações transdutivas e alagmáticas. Sendo, assim, as aprendizagens transdutivas e alagmáticas por perceptos serão responsáveis pela criação de metamorfoses, que se repetem sempre em função das singularidades do educando; mas a repetição acontecerá de maneiras diferentes – o fundo pode ser semelhante, mas os signos emitidos pelos aprendizes sempre são e serão diferentes, até sua repetição é e será sempre diferente. De fato, as repetições são os procedimentos experimentados pelo corpo em nossa singularidade, ocorrendo sempre por meio de encontros fortuitos entre corpos. Para Deleuze, os agenciamentos não ocorrem entre corpos totalizados e sim entre pontos extraordinários dos corpos, e essa notabilidade dos encontros é que permite que os perceptos sejam gerados. Os aprendizes, assim, criarão signos e perceptos para seduzir, para encantar e para cativar. 7. Considerações finais Deleuze (2000) afirmou que não podemos saber com certeza como o ensino será eficaz ou como as crianças aprendem, porque a aprendizagem está relacionada com a singularidade de cada um, ao modo como determinado signo consegue afetar e fazer 426 pensar: “Nunca se sabe como uma pessoa aprende; mas, de qualquer forma que aprenda, é sempre por intermédio de signos, perdendo tempo, e não pela assimilação de conteúdos objetivos” (p. 21). A aposta de Deleuze está centrada nos encontros, na criatividade, nos afetos e nos saberes menores. É preciso, pois, aceitarmos o erro, a cultura menor, a arte, o afeto, as diferenças. É conveniente aceitarmos as alteridades, tanto menores quanto maiores, para que possamos respeitar as diferenças. O erro deve ser, então, um dispositivo para a aprendizagem – errar é aprender, ou melhor, errar será aprender quando vivenciarmos juntos, professores e alunos, o aprender cartografando, o aprender-cartografia; o que nos levará a viagens belíssimas e fantásticas por trajetos vivos, alegres e terapêuticos. Precisamos, pois, da criação de novos povos, de novos professores e de novos alunos, que queiram e que possam vivenciar a vida. E é esta a experimentação que percebemos na aprendizagem-cartografia: a criação de um povo novo, que agencie e que experimente o respeito, a criatividade, a tolerância, a vontade de agir e de dar, a afetividade, a recepção e a criação de perceptos, a conjunção exclusiva, a disjunção inclusiva e outros rizomas igualmente ricos na busca e na procura de devires. Referências Almeida, B. V. de. (2016). A individuação e a máquina: leitura deleuzeana de Simondon”. In Revista Dispositiva, vol. 5, nº 2. Deleuze, G. (2006). A Ilha Deserta: e outros textos. São Paulo: Iluminuras. Deleuze, G. (2009). A Imagem-Movimento. Cinema 1. 2ª ed. Lisboa: Assírio e Alvim. Deleuze, G. (1988). Diferença e Repetição. Rio de Janeiro: Graal. Deleuze, G. (2000). Diferença e Repetição. Lisboa: Relógio D’Água. Deleuze, G & Guattari, F. (2011). Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. Vol.1. 2 ed. São Paulo: 34. Deleuze, G. & Guattari, F. (2010). O Anti-Édipo. São Paulo: 34. Drigo, M. O. (2016). Imagem cinematográfica e pensamento: a imagem-percepção na confluência de teorias de Deleuze e Peirce. In Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação | E-compós, Brasília, v.19, n.2, maio/ago. 2016. 427 Guattari, F. (2012). Caosmose: um novo paradigma estético. São Paulo: 34. Maffesoli, M. (2005) O mistério da conjunção: ensaios sobre comunicação, corpo e socialidade. Porto Alegre: Sulinas. Nascimento, R. D. (2012). Teoria dos signos no pensamento de Gilles Deleuze. Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas. Nietzsche, F. (2009). Genealogia da Moral. São Paulo: Companhia das Letras. Oliveira, L. R. P. F. de; Duarte, L. de J. A. & Peel, M. A. F. (2019). A experimentação das palavras – da imagem-percepção à imagem-relação. João Pessoa: Ideia. Peirce, C. S. (1998). Antologia Filosófica. Portugal/Imprensa Nacional: Casa da Moeda. Peirce, C. S. Collected papers of Charles Sanders Peirce. Ed. by: C. Hartshorne & P. Weiss (v. 1-6); A. Burks (v. 7-8). Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931-58. Schérer, R. (2005). Aprender com Deleuze. In Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 93, p. 1183-1194, Set./Dez. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v26n93/27272.pdf Serres, M. (2015). Educação e contemporaneidade sem Michel Serres. In Pro-Posições, Campinas, v. 26, nº 1, p. 239-257, jan./abr. 2015. Simondon, G. (2005). L’individuation à la lumière des notions de forme et d’information. Grenoble: Millon. Virilio, P. (2015). Estética da desaparição. Rio de Janeiro: Contraponto. 428 22.PRÁTICAS DE ESCRITA CRIATIVA NO ENSINO SUPERIOR: REDESCOBRINDO CAMINHOS DA PEDAGOGIA Dulce Melão80 Resumo A centralidade do estudante no âmbito do processo de ensino e de aprendizagem é, desde há muito, reconhecida como fundamental no âmbito do desenvolvimento de práticas pedagógicas que tenham a autonomia no seu cerne. Tal centralidade continua a instituir-se enquanto desafio, mormente face à diversidade de contextos em que participamos, bem como à necessidade de respeitar a sua singularidade. Conhecer as representações dos estudantes sobre os conteúdos programáticos das unidades curriculares que frequentam reveste-se, pois, de crescente relevância no âmbito de uma pedagogia para a autonomia enquanto arena de reconstrução de conhecimento partilhado. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é refletir sobre a relevância do conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância das dimensões que pode assumir em contexto académico para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem. Optou-se por uma metodologia de cariz qualitativo, tendo como referencial metodológico o estudo de caso múltiplo. Participaram 54 estudantes do 3.º ano da licenciatura em Comunicação Social de uma instituição de ensino superior portuguesa, inscritos na unidade curricular de Escrita Criativa. Os instrumentos de recolha de dados foram três reflexões realizadas pelos estudantes no início, a meio e no final da unidade curricular. A investigação realizada possibilitou inferir que o processo de ensino e aprendizagem pode adquirir uma dimensão transformadora quando é conferida centralidade às representações dos estudantes. Estes valorizaram o seu papel na reconstrução de processos de ensino e aprendizagem, redescobrindo, ao longo do percurso, o caráter multifacetado da escrita criativa. 80 Dulce Melão é Professora adjunta na Escola Superior de Educação de Viseu (Instituto Politécnico de Viseu - IPV), integrando o Departamento de Ciências da Linguagem. É doutorada em Educação e membro integrado do CI&DEI (Centro de Estudos em Educação e Inovação – IPV). ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-1608-1074 429 Palavras-chave: Ensino superior. Pedagogia. Escrita criativa. Estudantes. Representações. Creative writing practices in higher education: rediscovering paths of pedagogy The centrality of the role played by students in the teaching and learning process has long been recognised as fundamental in the development of pedagogical practices that have autonomy at their core. Such centrality continues to be a challenge, especially given the diversity of contexts in which we participate, as well as the need to respect their uniqueness. Knowing students' conceptions about the syllabus contents of the curricular units they attend is therefore of growing relevance in the context of a pedagogy for autonomy as an arena of reconstruction of shared knowledge. In this sense, the aim of this study is to reflect on the relevance of the knowledge of students' conceptions on creative writing and the importance of the dimensions it can assume in an academic context for the improvement of the teaching and learning process. A qualitative methodology was chosen, within a multiple case study framework. Participants were 54 students enrolled in a first degree in Media Studies (third year) of a Portuguese higher education institution, taking a Creative Writing course. Data collection tools were three reflections made by the students at the beginning, middle and end of the course. The research made it possible to infer that the teaching and learning process can acquire a transforming dimension when students' conceptions are given centrality. They valued their role in the reconstruction of teaching and learning processes, rediscovering, along the way, the multifaceted character of creative writing. Keywords: Higher education. Pedagogy. Creative writing. Students. Conceptions. Introdução Reconhece-se, hoje, a complexidade de que se nutre o exercício do ensino, numa renovada teia de desafios que (nos) implica, ativamente, (n)o repensar das nossas práticas. Como sublinha Vieira (2011, p. 20), “(…) a pedagogia é também um encontro com o inesperado, exigindo ações criativas, transitórias e inacabadas.” 430 Na reflexão que consagra à relevância da reconfiguração do saber profissional docente repensado através da centralidade com o compromisso das finalidades da profissão, Roldão (2017) sublinha a importância da “(…) capacidade de reconceptualizar o modo como nos fazemos professores” (Roldão, 2017, p. 1148). Neste repensar permanente, a indagação assume um caráter central, contínuo, assente no diálogo com os estudantes e na investigação dos modos como reconstruimos o conhecimento partilhado. À luz do exposto, o objetivo deste estudo é refletir sobre a relevância do conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância das dimensões que pode assumir em contexto académico para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem. Num itinerário pautado pela riqueza dos inacabamentos próprios das demandas do desvendar de tal processo, focamo-nos nas vozes dos estudantes, reconhecendo o seu caráter central na partilha de metamorfoses consolidadas num processo crítico promotor de autonomia. Este estudo está organizado em três secções: i) enquadramento teórico; ii) metodologia; iii) apresentação dos resultados e discussão. As considerações finais instituem-se como parcelas do caminho percorrido, no aguardar perene de muitos outros trilhos – ensejos velando descobertas de pousios de partilhas aguardadas. 1. Enquadramento teórico Conhecer as representações dos estudantes sobre os conteúdos programáticos das unidades curriculares que frequentam e lhes servem de base de sustentação, reveste-se, hoje, de crescente relevância, no âmbito de uma pedagogia para a autonomia enquanto arena de reconstrução de conhecimento partilhado. Tal não é, porém, tarefa isenta de desafios, face à rede de plurissignificações que as envolvem, em contextos diversificados. Apresenta-se, em seguida, uma breve revisão da literatura incidindo na relevância de tais representações, em traços mais amplos, contemplando a leitura e a escrita, bem como focando, em particular, as representações sobre a escrita criativa, circunscrevendo-nos ao ensino superior. A teoria das representações sociais, cunhada por Moscovici (1961; 1976) serve-nos de fio condutor para a compreensão das repercussões da sua relevância na vida em sociedade e, consequentemente, nas práticas de leitura e de escrita em que participamos. Como frisa Moscovici (1976, p. 26), “Une représentation parle autant qu’elle montre, communique autant qu’elle exprime (…) elle produit et détermine des comportements, (…) la représentation sociale est une modalité 431 de connaissance particulière ayant pour fonction l’élaboration des comportements et la communication entre individus.” Estudos norteados pelo objetivo de identificar e caracterizar as representações sobre a leitura de estudantes do ensino superior, a frequentar um primeiro ciclo de estudos em Educação Básica, em instituições do ensino superior português, têm possibilitado compreender a complexidade inerente a tal caracterização, ao apontarem para perfis de leitores multifacetados, “em construção” (por exemplo, Yubero, Larrañaga, & Pires, 2014). Em alguns estudos é estabelecida uma forte conexão entre as representações sobre a leitura evidenciadas pelos estudantes e o modo como poderão vir a repercutir-se no seu futuro público (por exemplo, Melão, 2016; 2017). Larrañaga e Yubero (2005) corroboram semelhante linha de pensamento, frisando que “La representación social que tengamos de la lectura puede ser fuente de motivación o desmotivación lectora y nos acompañará en nuestras relaciones cotidianas, orientando nuestra relación con la lectura” (Larrañaga & Yubero, 2005, p. 44). Por seu lado, Mateos e Solé (2012), no ensaio em que refletem sobre conceções e crenças de estudantes de licenciatura relativamente à escrita académica, sublinham, também, que “Students’ participation in social practices shaped according to certain conceptions of writing will contribute to how they learn to write and to a personal way of conceiving of writing, representing it to themselves and seeing themselves as writers” (Mateo & Solé, 2012, p. 53). Talvez a relevância que hoje assume a escrita académica justifique a maior atenção concedida às representações dos estudantes sobre a mesma, a nível nacional e internacional – atenção crescente reconhecida na literatura de especialidade (por exemplo, Assis, Bailly & Corrêa, 2017). Investigação incidindo sobre a sua caracterização, tem revelado a sua forte ligação intrínseca com as práticas de leitura e/ou de escrita permeando os percursos que os estudantes trilham no dia a dia, repercutindo-se em contexto académico. Oliveira e Araújo (2017), no estudo que consagraram às representações sociais da escrita de 33 estudantes universitários oriundos de cursos de Letras vinculados a três instituições brasileiras de ensino superior (no estado da Paraíba), concluíram, também em linha com o aduzido anteriormente, que tais representações “(…) interferem no modo de agir desses sujeitos e que, uma vez apropriadas, permitem-lhes se inserir nas diversas práticas letradas recorrentes no curso” (Oliveira & Araújo, 2017, p. 286). A abordagem de natureza qualitativa, no âmbito da qual foram utilizados um inquérito por questionário e três “sessões 432 reflexivas,” possibilitou concluir que os estudantes relacionavam a escrita académica com as orientações facultadas pelo professor relativamente à sua produção e com o processo de estruturação inerente às exigências académicas. Em contexto distinto, a investigação realizada por Sousa e Pereira (2018), numa instituição pública de ensino superior politécnico, teve como objetivo refletir sobre o ensino da escrita no ensino superior e analisar as representações dos estudantes (85, distribuídos por três turmas) sobre processos de escrita e de aprendizagem, tendo no seu cerne os conteúdos da unidade curricular de Desenvolvimento e aprendizagem (integrando o 5.º semestre do plano de estudos da licenciatura em Educação Básica). Os dados foram recolhidos através de um inquérito por questionário (online) sobre escrita, de tarefas de leitura e escrita realizadas em contexto de sala de aula e da realização de dois focus group, no final do semestre. Os estudantes declararam possuir alguma confiança nas suas competências de escrita, planificando e revendo os seus textos. Reconheceram, também, a necessidade de maior instrução, acompanhamento e feedback por parte dos docentes, no que à produção textual diz respeito. O entrelaçamento do processo de escrita com as práticas de leitura realizadas emergiu, também, como relevante, tendo os estudantes referido que “(…) ler para escrever exige mais trabalho de busca do que é essencial A escrita ajuda a esclarecer e a verificar a compreensão do que se leu (…) este trabalho exige maior rigor na leitura e mais releituras” (Sousa & Pereira, 2018, p. 8). As autoras do estudo entenderam ser relevante analisar as representações dos estudantes sobre a escrita, no intuito de se promover a reflexão sobre as “possibilidades de transformação das práticas” (Sousa & Pereira, 2018, p. 6). As representações sobre a escrita criativa no ensino superior têm, por seu turno, sido alvo de parca atenção. No estudo realizado por Light (2002), norteado pelo objetivo de investigar tais representações, participaram 40 estudantes oriundos de três instituições de ensino superior na Grã-Bretanha. Um dos critérios de seleção estabelecidos – perfil diversificado dos participantes – repercutiu-se quer na mescla de cursos considerados, quer no seu nível de ensino (licenciatura ou pós-graduação). O segundo critério – a similitude – garantiu a inclusão de cursos contemplando práticas de escritas concentradas no mesmo género – ficção. No que respeita à metodologia adotada, a opção recaiu no inquérito por entrevista semiestruturada aos estudantes. A análise dos resultados, após um processo de categorização, revelou: i) a associação da escrita criativa às vivências pessoais dos estudantes, nelas se plasmando; ii) a conexão entre a 433 escrita criativa e a liberdade que estaria inerente ao seu processo, comparativamente à escrita com outras finalidades; iii) o reconhecimento da singularidade da escrita criativa, mobilizando a sua compreensão, de modo renovado; iv) a compreensão do processo de textualização no âmbito da escrita criativa. Do exposto, é possível inferir a importância da escuta e do conhecimento das representações da escrita dos estudantes do ensino superior, podendo potenciar movimentos de mudança no que concerne ao processo de ensino e de aprendizagem. O estudo apresentado a seguir procura lançar luz, em particular, sobre a relevância do conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa que pouca atenção tem recebido por parte dos investigadores, merecendo, pois, uma demanda cuidadosa das suas múltiplas facetas entretecidas em processos de ensino e de aprendizagem. 2. Metodologia Participaram neste estudo 54 estudantes do 3.º ano da licenciatura em Comunicação Social de uma instituição de ensino superior portuguesa, inscritos na unidade curricular de Escrita Criativa, no ano letivo 2017-2018. Esta unidade curricular privilegia percursos favorecedores de reflexão sobre o conceito de criatividade, nos crescentes desdobramentos exigidos pelos desafios da sociedade atual. É concedida atenção à tessitura textual enquanto tela de acolhimento de diferentes tipologias que lhe conferem nuances singulares, exigindo reflexão. Destaca-se, ainda, a escrita criativa na comunicação social, com particular enfoque nos géneros jornalísticos e na sua atual versatilidade. As aulas revestem-se de natureza teórica e prática, aliando a abordagem teórica de conteúdos programáticos com a aplicação dos mesmos em situações práticas, mobilizadas através de diferentes modalidades de trabalho (por exemplo, a pares, em grupo), possibilitando um feedback recorrente e sustentado sobre as práticas de escrita realizadas. Os estudantes estavam distribuídos por duas turmas: a turma A (16 estudantes do sexo feminino e 10 do sexo masculino, perfazendo um total de 26, doravante referidos como E1-26) e a turma B (18 estudantes do sexo feminino e 10 de sexo masculino, perfazendo um total de 28, doravante referidos como E27-54). 434 O objetivo principal que norteou este estudo foi refletir sobre a relevância do conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância das dimensões que poderia assumir em contexto académico para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem. Face ao objetivo traçado, foram colocadas as seguintes questões de investigação: - Q1 – Que representações evidenciam estudantes de Comunicação Social, a frequentar um 1.º ciclo de estudos de Bolonha, sobre a escrita criativa? - Q2 – De que modo o conhecimento de tais representações pode contribuir para a melhoria do processo de ensino e de aprendizagem em contexto académico? Entendeu-se que seria adequada uma abordagem de natureza qualitativa, tendo como referencial metodológico o estudo de caso múltiplo. Os instrumentos de recolha de dados foram três reflexões realizadas pelos estudantes no início (R1), a meio (R2) e no final da unidade curricular (R3). Na primeira reflexão (R1) foi solicitado aos estudantes que indicassem quatro palavras que associavam ao conceito de escrita criativa (ordenadas de acordo com a importância que lhe atribuíam, da mais importante para a menos importante). Adicionalmente, os estudantes foram convidados a refletir sobre a relação que tinham com a escrita, de modo a que pudéssemos compreender as dimensões em que a encaravam. A segunda reflexão (R2) foi realizada a meio da unidade curricular, tendo os estudantes refletido sobre as suas principais dificuldades no que respeitava ao processo de escrita. A realização desta reflexão foi norteada pelo objetivo de poder proceder a reajustamentos potenciadores de transformação. Na terceira reflexão (R3), de modo a compreendermos se se teriam registado eventuais mudanças nas representações dos estudantes sobre a escrita criativa, solicitamos-lhes, de novo, que indicassem quatro palavras que associavam ao conceito de escrita criativa. Privilegiamos a técnica de análise de conteúdo, na esteira de Bardin (2004), tendo realizado várias leituras que favoreceram um processo reiterativo impulsionador do descortinar dos sentidos implícitos nas vozes dos estudantes, ecoando nas suas reflexões. Posteriormente, procedemos ao estabelecimento de categorias que agregassem as dimensões que emergiam do processo realizado. 3. Apresentação dos resultados e discussão 435 3.1.Representações iniciais dos estudantes sobre a escrita criativa No Quadro 1 apresentamos análise das respostas dos estudantes (TA) relativamente às suas representações iniciais sobre a escrita criativa: Palavras indicadas 1ª posição 2ª posição 3ª posição 4ª posição Freq. % Freq. % Freq. % Freq. % Criatividade 10 38% 6 23% 5 19% 1 4% Imaginação 6 23% 6 23% 1 4% 6 23% Inspiração 4 15% 4 15% 3 12% 4 15% Liberdade 3 12% 4 15% 8 31% 3 12% Originalidade 2 8% 2 8% 2 8% 2 8% Motivação 1 4% 2 8% 0 0% 1 4% Invenção 0 0% 1 4% 1 4% 1 4% Persistência 0 0% 1 4% 0 0% 0 0% Sonho 0 0% 0 0% 1 4% 1 4% Conhecimento 0 0% 0 0% 1 4% 0 0% Textos 0 0% 0 0% 1 4% 1 4% Dedicação 0 0% 0 0% 1 4% 1 4% Singularidade 0 0% 0 0% 1 4% 1 4% Magia 0 0% 0 0% 1 4% 1 4% Reflexão 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Diferença 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Talento 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% TOTAL 26 100% 26 100% 26 100% 26 100% Quadro 1 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau decrescente de importância (TA, R1) A análise do Quadro 1 possibilita-nos depreender que a palavra que os estudantes mais associaram ao conceito de escrita criativa foi “Criatividade” (10 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 38% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 23%), seguindo-se “Imaginação” (6 ocorrências, em primeira e em segunda posição, correspondendo a 23%), “Inspiração” (4 ocorrências, em primeira e em segunda posição, correspondendo a 15%) e “Liberdade” (3 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 12% e 4 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 15%). A associação do conceito de “Escrita criativa” a “Criatividade” é, porventura, a mais favorecida pelo senso comum, no âmbito do qual esta palavra ganha, muitas vezes, 436 contornos polissémicos de grande abrangência, reconhecida na literatura de especialidade (Goldberg, 2018; Morais, 2011). Privilegiar a “Imaginação” em estreita associação com a “Escrita Criativa” pode estar relacionado com a realização de práticas de leitura e de escrita no âmbito das quais os estudantes a tenham valorizado, estimando o seu desabrochar. Uma vez que, em distintas circunstâncias, criatividade e imaginação caminham a par, o destaque conferido a ambas assume importância, pelas repercussões que pode ter na produção textual dos estudantes. “Inspiração” e “Escrita criativa” surgem muitas vezes associadas, no dia a dia, remetendo para a representação da extraordinária relevância da primeira para levar a bom porto a segunda, aspeto contrariado pela investigação que vinca tratar-se de um mito (Runco, 2017; Sawyer, 2012). O facto de os estudantes a sublinharem pode implicar a desvalorização da complexidade inerente à natureza processual da escrita, no âmbito da qual não pode estar ausente o esforço e o rigor nela implicados. A associação da palavra “Liberdade” ao conceito de “Escrita criativa” remete para a sua representação como processo desassombrado instigador de ousadias que acolhem diferentes itinerários de reencontros da imaginação, perpetuando-a sem limites (com subtileza ou renovada intensidade). Na miríade de sentidos que pode conglomerar, aponta para uma infinidade de percursos impressos nos seus desdobramentos, sem quaisquer restrições – aspeto que os estudantes teriam valorizado. A desvalorização das palavras “Persistência” e “Dedicação” pode estar relacionada com a representação do senso comum de que a escrita criativa, diferentemente da escrita académica ou com outras finalidades, não reclama semelhante esforço. No entanto, como frisa Morais (2011), se momentos de descoberta súbita podem ocorrer, importa igualmente ter em consideração “(…) um lento percurso de trabalho, de conhecimento, de persistência, de reavaliações, e de manutenção teimosa num sentido de objetivo.” As palavras “Sonho” e “Magia” envolvem-se, porventura, de modo docemente lento, no gosto pela escrita, associando-lhe nuances de encanto possivelmente plasmado em práticas de escrita realizadas pelos estudantes ao longo da vida, incutindo-lhes particular alento. Inferimos, ainda, que os estudantes concederam pouca atenção às palavras “Reflexão,” “Diferença” e “Talento” (1 ocorrência, em quarta posição, correspondendo a 4%), apresentando um caráter periférico nas suas representações sobre a escrita criativa. 437 No Quadro 2 apresentamos análise das respostas dos estudantes (TB), reportando-se às suas representações iniciais sobre a escrita criativa: 1ª posição Palavras indicadas 2ª posição 3ª posição 4ª posição Freq. % Freq. % Freq. % Freq. % Criatividade 9 32% 3 11% 6 21% 4 14% Imaginação 6 21% 8 29% 4 14% 3 11% Originalidade 4 14% 6 21% 8 29% 9 32% Reflexão 2 7% 4 14% 3 11% 5 18% Invenção 1 4% 0 0% 2 7% 2 7% Liberdade 1 4% 0 0% 1 4% 0 0% Insólito 1 4% 0 0% 0 0% 0 0% Complexidade 1 4% 0 0% 1 4% 0 0% Incentivo 1 4% 0 0% 1 4% 0 0% Literatura 1 4% 0 0% 1 4% 0 0% Perspetiva 1 4% 0 0% 0 0% 0 0% Empenho 0 0% 0 0% 1 4% 2 7% Inovação 0 0% 0 0% 0 0% 2 7% Conhecimento 0 0% 2 7% 0 0% 1 4% Isolamento 0 0% 2 7% 0 0% 0 0% Intuição 0 0% 1 4% 0 0% 0 0% Descoberta 0 0% 1 4% 0 0% 0 0% Criação 0 0% 1 4% 0 0% 0 0% TOTAL 28 100% 28 100% 28 100% 28 100% Quadro 2 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau decrescente de importância (TB, R1) Da análise do Quadro 2 destaca-se a relevância atribuída à palavra “Criatividade” (9 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 32% e 3 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 11%), seguindo-se “Imaginação” (6 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 21% e 8 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 29%), “Originalidade” (4 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 14% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 21%) e “Reflexão” (2 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 7% e 4 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 14%). 438 Foi possível inferirmos que os estudantes da TA e da TB atribuíram semelhante relevância às palavras “Criatividade” e “Imaginação,” surgindo estas, em ambos os casos, em primeiro e em segundo lugar respetivamente. A relação da palavra “Originalidade” com o conceito de “Escrita criativa” remete para a sua representação como prática que abriga singularidades, podendo implicar empenhamento renovado na tessitura textual, plasmando-a de um caráter único e belo. A sua valorização por parte dos estudantes aponta para a sua possível dedicação a tal labor. Como sublinham Runco e Jaeger (2012, p. 92), “Originality is undoubtedly required. It is often labeled novelty, but whatever the label, if something is not unusual, novel, or unique, it is commonplace, mundane, or conventional. It is not original, and therefore not creative.” A associação da palavra “Reflexão” ao conceito de “Escrita criativa” aponta para a complexidade que lhe está inerente, envolvendo um conjunto de etapas que contemplam, muitas vezes, um processo de brainstorming, evoluindo para o conhecimento aprofundado daquilo que se cria – demoras implicando reiterados reajustamentos nas práticas de escrita, entretecendo-as de unicidades. O destaque que os estudantes lhe concederam remete possivelmente para a compreensão de tais aspetos multifacetados que a literatura de especialidade reconhece como relevantes (Moran, 2010; Sternberg, 2012). A palavra “Literatura” (1 ocorrência, em primeira posição, correspondendo a 4% e 1 ocorrência, em terceira posição, correspondendo a 4%) foi pouco valorizada pelos estudantes, estando, possivelmente associada à relação que estabeleceram entre as práticas de escrita criativa e a produção de textos literários, representação mais favorecida pelo senso comum (embora tais práticas possam revestir de natureza não ficcional, em distintos contextos, na sociedade atual). O menor relevo concedido às palavras “Empenho” (1 ocorrência, em terceira posição, correspondendo a 4% e 2 ocorrências, em quarta posição, correspondendo a 7%) e “Complexidade” (1 ocorrência em primeira e em terceira posição, correspondendo a 4%) poderá indiciar que os estudantes entendem a escrita criativa enquanto processo que não as implica. 439 No respeita às palavras “Invenção,” “Insólito” e “Inovação,” embora registando ocorrências distintas, poderão estar relacionadas com a singularidade que os estudantes teriam atribuído à escrita criativa, apontando para o seu caráter transformador. As palavras “Intuição,” “Descoberta” e “Criação” (1 ocorrência, em segunda posição, correspondendo a 4%) foram as mais depreciadas pelos estudantes, afastando-se do núcleo central das suas representações sobre a escrita criativa. 3.2. Relação que os estudantes estabelecem com a escrita De modo a compreendermos melhor as representações dos estudantes, estes foram convidados a refletir sobre a relação que estabeleciam com escrita. A análise dos resultados (TA) é apresentada no Quadro 3: Categorias Subcategorias Estruturação do Escrita académica pensamento Complexidade da redação Desenvolvimento Escrita criativa da imaginação Prazer Motivação Escrita pessoal intrínseca Expressão de sentimentos Desenvolvimento Escrita de notícias profissional Fascínio pela informação Total Freq. % 3 10% 3 10% 5 17% 3 10% 7 24% 4 14% 2 7% 2 29 Total % 6 20% 8 27% 11 38% 4 14% 29 100% 7% Quadro 3 – Relação que os estudantes estabelecem com a escrita (Turma A, R1) Da análise do Quadro 3 inferimos que os estudantes concederam mais destaque à “Escrita pessoal” (11 ocorrências, correspondendo a 38%), seguindo-se a “Escrita criativa” (8 ocorrências, correspondendo a 27%) e, posteriormente, a “Escrita académica” (6 ocorrências, correspondendo a 20%), bem como a “Escrita de notícias” (4 ocorrências, correspondendo a 14%). 440 No que diz respeito à “Escrita pessoal” foi possível depreendermos que alguns estudantes teriam uma relação muito positiva com a escrita, plasmada nos enunciados que associamos às subcategorias “Motivação intrínseca” e “Expressão de sentimentos.” No primeiro caso, os estudantes referiram ter um gosto particular pela escrita, como ilustram os seguintes enunciados: “Pessoalmente, gosto muito de escrever as minhas coisas. Gosto de escrever textos, em qualquer ocasião do dia, ou seja, é basicamente uma escrita mais pessoal” (E4) / “Desde muito cedo que tenho um gosto especial pela escrita. Acompanhou-me sempre, não me vejo sem escrever. É algo pessoal que faz parte de mim” (E22). A escrita foi também relacionada com a “Expressão de sentimentos,” sendo frisado, por exemplo: “A escrita permite-me exprimir os meus sentimentos, entendo que a nossa relação é boa por isso, gosto de o fazer” (E5) / “A minha relação com a escrita baseia-se, sobretudo, na expressão dos meus sentimentos sobre tudo o que me rodeia” (E19). Relativamente à “Escrita criativa,” destacaram-se o “Desenvolvimento da imaginação” e o “Prazer.” No âmbito da primeira subcategoria referida, os estudantes estabeleceram uma relação estreita entre as práticas de escrita criativa e diferentes modos de a imaginação lhe estar implícita. Um estudante declarou, por exemplo, o seguinte: “A relação que eu estabeleço com a escrita criativa está muito dependente da imaginação. Se a conseguirmos desenvolver bastante o nosso texto será bem-sucedido e os leitores gostarão dele” (E13). No que respeita ao “Prazer,” um estudante sublinhou, por exemplo: “Pessoalmente, embora estejamos a começar, relaciono a escrita criativa com prazer, ao contrário da escrita por obrigação. Acho que nos permite voar mais longe, não é como os outros tipos de escrita” (E17). No âmbito da “Escrita académica,” as subcategorias “Estruturação do pensamento” e “Complexidade da redação” receberam semelhante atenção por parte dos estudantes. A primeira subcategoria contemplou os enunciados que apontavam para a centralidade da “estruturação do pensamento” nas práticas de escrita, sendo referido, por exemplo “Começo a escrever um ensaio académico e tenho de estruturar o pensamento, sinto que é o mais importante para a clareza da escrita. Caso contrário não se compreende o que queremos dizer” (E11). A “Complexidade da redação” foi associada pelos estudantes à relação que mantinham com a escrita de trabalhos académicos, aspeto ilustrado no enunciado seguinte: “A minha relação com a escrita é basicamente a académica. Redigir 441 esses textos é complexo, não me sinto preparada embora já esteja no terceiro ano do curso” (E1). A “Escrita de notícias” desdobrou-se em “Desenvolvimento profissional” e “Fascínio pela informação.” No primeiro caso, os estudantes desvelaram uma relação com a escrita sustentada pelo seu futuro labor, referindo, por exemplo, explicitamente: “A minha relação com a escrita passa pelo meu desenvolvimento profissional, nesta altura. É assim que a encaro” (E2). No segundo caso, vincaram o seu profundo fascínio pela informação, declarando, por exemplo, “Sempre quis seguir jornalismo de imprensa. A informação fascina-me, a sua capacidade de fazer chegar às pessoas o que nós escrevemos” (E12). No Quadro 4 apresentamos a análise dos resultados relativos à TB, no que concerne à relação dos estudantes com a escrita: Categorias Subcategorias Freq. % 6 14% 4 10% 8 19% Liberdade 5 12% Evasão 9 21% 4 10% 4 10% Complexidade da Escrita académica planificação Desafios da redação Desenvolvimento da Escrita criativa Escrita pessoal originalidade Expressão de sentimentos Desenvolvimento Escrita de notícias profissional Desenvolvimento pessoal Total 2 5% 42 100% Total % 10 24% 13 31% 13 31% 6 15% 42 100% Quadro 4 – Relação que os estudantes estabelecem com a escrita (Turma B, R1) A análise do Quadro 4 permite-nos compreender que a “Escrita criativa” e a “Escrita pessoal” assumiram relevância idêntica para os estudantes (13 ocorrências, correspondendo a 31%), destacando-se das outras duas categorias. A “Escrita criativa” surgiu associada ao “Desenvolvimento da originalidade” e à “Liberdade,” tendo os estudantes declarado que a sua relação com a escrita estaria estreitamente ligada, no primeiro caso, à criação de algo novo, como ilustram os 442 enunciados que transcrevemos: “A prática da escrita criativa, para mim, é sinónimo de originalidade, podermos escrever algo que outros não escreveram, ser diferentes” (E33) / “Poder ser original na escrita, como quisermos, é manter com ela uma relação especial, sermos únicos, o que me agrada particularmente” (E40). No segundo caso, um estudante referiu, por exemplo, o seguinte: “Vejo a escrita criativa como expressão de liberdade, e isso é notável, o facto de não existirem regras pré-estabelecidas nem entraves” (E29), aspeto igualmente valorizado nos enunciados que associamos a esta subcategoria. A “Expressão de sentimentos” e a “Evasão” emergiram no âmbito da “Escrita pessoal,” destacando-se a primeira. Os estudantes afirmaram que a sua relação com a escrita estaria entretecida em distintos modos de se alhearem da realidade, trilhando outros percursos prazerosos, aspeto que emerge, por exemplo, no seguinte enunciado: “Consigo afirmar que de entre muitas palavras que já desenhei, existem umas quantas que me fazem sentir noutro mundo, faz parte das coisas que me relaxam” (E42). A relação de alguns estudantes com a escrita surgiu, também, entrelaçada em sentimentos desvelados nos itinerários de “Escrita pessoal,” percorridos por alguns estudantes. Um deles referiu, por exemplo, que “Escrever é sentir o que me vai na alma, é um misto de sentimentos e emoções” (E52). A “Escrita académica” desdobrou-se em “Complexidade da planificação” e “Desafios da redação,” tendo os estudantes mencionado, no que respeita à primeira subcategoria, que a sua relação com a escrita seria muito influenciada pela etapa da planificação, aspeto plasmado no enunciado seguinte: “(…) tenho que planificar o texto que vou escrever; é algo que me custa imenso, começar por onde, ver o que é mais importante referir. Não parece, mas para mim é complexo” (E49). Outros estudantes vincaram ainda os desafios implícitos na especificidade da escrita académica. O enunciado que transcrevemos a seguir ilustra-os: “A redação do texto é um desafio. Pensar no tema é mais rápido e no que pretendo dizer também, mas a redação já não é assim. Até hoje a minha relação com a escrita tem sido marcada por este desafio” (E41) No âmbito da “Escrita de notícias” os estudantes valorizaram, sobretudo, o “Desenvolvimento profissional.” Um estudante declarou, por exemplo, “A minha relação com a escrita dá-se, sobretudo, através das notícias que redijo, o que se traduz no meu desenvolvimento profissional e me parece importante no curso que frequento” (E39). O “Desenvolvimento pessoal” desvelou uma relação intrínseca com a escrita, numa matriz associada à cidadania global: “A escrita de notícias é o que faço mais e 443 contribui muito para o meu desenvolvimento pessoal; consigo compreender melhor o meu posicionamento e o dos outros no mundo” (E47). As representações iniciais dos estudantes sobre o conceito de “Escrita criativa,” revelando-se um caráter multifacetado, possibilitaram-nos inferir que no seu núcleo central assumiam destaque palavras “Criatividade” e “Imaginação.” O cruzamento de tais representações com as que evidenciaram relativamente à sua relação com a escrita, mormente a escrita criativa, aponta para o seu entrelaçamento, quer na TA, quer na TB. No primeiro caso, pela importância atribuída à subcategoria “Desenvolvimento da imaginação” e, no segundo, pela valorização das subcategorias “Desenvolvimento da originalidade” e “Liberdade.” Os aspetos desvelados no âmbito da “Escrita académica,” “Escrita pessoal” e “Escrita de notícias” possibilitaram-nos compreender outros modos de os estudantes se relacionarem com a escrita, apontando itinerários a seguir na unidade curricular, de modo a promover a sua centralidade no âmbito do processo de ensino e de aprendizagem. 3.3. Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita Na segunda reflexão, realizada a meio da unidade curricular, convidamos os estudantes a mencionar as suas principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita. A análise dos resultados (TA) é apresentada no Quadro 5: Categorias Freq. % Total Planificação do texto 12 36% 36% Articulação da temática a desenvolver no 9 27% 27% Coerência textual 4 12% 12% Criação de textos atrativos 4 12% 12% Escassez de tempo 2 6% 6% Cunho pessoal/Originalidade 2 6% 6% Total 33 100% 100% texto Quadro 5 – Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita (Turma A, R2) A “Planificação do texto” (12 ocorrências, correspondendo a 36%) e a “Articulação da temática a desenvolver no texto” (9 ocorrências, correspondendo a 27%) foram as dificuldades mais sublinhadas pelos estudantes. Os enunciados que associamos à primeira categoria possibilitaram-nos compreender que os estudantes: i) não teriam o hábito de planificar o texto, passando, de imediato, à sua redação, por entenderem ser 444 uma tarefa árdua; ii) realizariam planificações de caráter extenso, o que lhes dificultaria a posterior redação do texto. Relativamente à segunda categoria, depreendemos que os estudantes, independentemente da tipologia textual em causa, teriam dificuldades em articular a temática a desenvolver no texto, como ilustram os enunciados seguintes: “A minha principal dificuldade reside em articular o tema a desenvolver, isto quer se trate de um texto narrativo, ou de texto poético. O fio condutor demora a aparecer” (E14) / “Tenho dificuldades em ir encaixando as coisas conforme vou escrevendo para que haja ali uma articulação da temática que pretendo abordar” (E25). A “Coerência textual” e a “Criação de textos atrativos” receberam idêntica atenção (4 ocorrências, correspondendo a 12%). Relativamente à primeira categoria, os estudantes declararam ter dificuldades: i) em escrever textos que se revelassem coerentes, no seu todo; ii) na manutenção da coerência dos textos, à medida que os iam escrevendo, mormente por falta da sua planificação. Nos enunciados associados à categoria “Criação de textos atrativos” ficou plasmada a dificuldade inerente à criação de um texto com características germinadoras de atenção por parte dos leitores, desvelando a preocupação dos estudantes face ao público-alvo dos seus textos – indício de generosidades em crescimento. A “Escassez de tempo” e o “Cunho pessoal/originalidade” (2 ocorrências, correspondendo a 6%) foram as dificuldades menos valorizadas pelos estudantes. No primeiro caso, reportaram-se à dificuldade que teriam em escrever textos no âmbito dos limites temporais impostos, o que lhes causaria alguma frustração; no segundo caso, declararam ser um desafio escrever textos onde ficasse evidenciado o seu cunho pessoal/originalidade, aspeto que entenderam como muito relevante nas práticas de escritas realizadas, até então, na UC. No Quadro 6 apresentamos a análise dos resultados relativos às principais dificuldades dos estudantes em relação à natureza processual da escrita (TB): Categorias Freq. % Total Redação do texto 9 29% 29% Gestão do tempo 7 23% 23% Implementação de processos criativos 5 16% 16% Falta de imaginação 5 16% 16% Reduzida capacidade de improvisação 3 10% 10% Escassez de vocabulário 2 6% 6% 445 Total 31 100% 100% Quadro 6 – Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita (Turma B, R2) Da análise do Quadro 6 inferimos que a “Redação do texto” (9 ocorrências, correspondendo a 29%) e a “Gestão do tempo” (7 ocorrências, correspondendo a 23%) se destacaram, seguindo-se, com idêntica valorização, a “Implementação de processos criativos” e a “Falta de imaginação” (5 ocorrências, correspondendo a 16%). No âmbito da “Redação do texto,” inferimos que as dificuldades dos estudantes se prenderiam, sobretudo, com: i) a explicitação de conteúdo; ii) a articulação linguística. Relativamente à primeira, um estudante declarou, por exemplo: “A principal dificuldade que registo prende-se com a redação do texto; não me faltam ideias, mas é difícil clarificar o que pretendo dizer” (E28). No âmbito da articulação linguística, os estudantes afirmaram que o sucesso na escrita seria influenciado pelas suas dificuldades de interligação das frases no texto, aspeto plasmado no enunciado seguinte: “A minha principal dificuldade está em ligar as frases do texto enquanto vou redigindo; vai-me escapando sempre alguma coisa porque quando releio muitas vezes não faz sentido. A redação do texto é complicada” (E30). Relativamente à “Gestão do tempo” os estudantes afirmaram que esta estaria associada a dificuldades de concentração, o que se repercutiria em alguma dispersão, impedindo a realização da escrita do texto em tempo útil, como transparece no enunciado seguinte: “Creio que a gestão de tempo é a minha maior dificuldade; vou perdendo concentração, o tempo passa, já não escrevo o que queria e como queria” (E48). A “Implementação de processos criativos” e a “Falta de imaginação” foram valorizadas de forma idêntica pelos estudantes (5 ocorrências, correspondendo a 16%). A primeira categoria apontada possibilitou descortinar as dificuldades resultantes da sua preocupação com a redação de textos pautados pela criatividade, como ilustra o enunciado seguinte: “Agora que já escrevo com maior fluência, a minha maior dificuldade é conseguir aplicar processos criativos nos textos, para que estes sejam distintos de outros; tentar, assim, que sejam mais criativos” (E33). Alguns estudantes afirmaram, por seu lado, que a “Falta de imaginação” seria a sua principal dificuldade, o que não lhes permitiria escrever de acordo com os objetivos que teriam traçado, no que respeita às práticas de escrita criativa. O enunciado que transcrevemos a seguir ecoa tal 446 dificuldade: “Sem dúvida que a dificuldade maior é faltar-me imaginação, acho que tenho de a desenvolver mais. Ela é fundamental para escrever de forma criativa e também para outros tipos de escrita” (E40). A “Reduzida capacidade de improvisação” instituiu-se como dificuldade para alguns estudantes, tendo declarado que seria um obstáculo à prossecução da escrita de textos, limitando a sua prolixidade. Um estudante referiu, por exemplo, o seguinte: “Se conseguisse improvisar mais, parece-me que poderia produzir mais e melhores textos; é uma capacidade que espero melhorar, mas por enquanto é ainda difícil para mim fazer isso.” (E54). A “Escassez de vocabulário,” menos valorizada pelos estudantes, revelou-se, em seu entender, um obstáculo à prossecução da escrita com maior celeridade, bem como um impedimento a que os textos progredissem de acordo com a diversidade vocabular desejável, de acordo com os objetivos traçados no âmbito da sua prossecução. A análise dos resultados relativos às principais dificuldades manifestadas pelos estudantes em relação à natureza processual da escrita possibilitou-nos repensar o processo de ensino e de aprendizagem a meio UC, dando relevo às suas vozes. Foram realizados alguns reajustamentos, de modo incrementar o trabalho a pares e a promover o feedback em relação ao trabalho realizado. Tal feedback foi facultado pela docente, mas igualmente alicerçado através do trabalho a pares, possibilitando maior partilha do trabalho realizado e conferindo maior protagonismo aos estudantes. 3.4.Representações finais dos estudantes sobre a escrita criativa No final da unidade curricular, solicitamos aos estudantes que nos indicassem, de novo, quais as quatro palavras que associavam ao conceito de escrita criativa. A análise das suas respostas (TA) é apresentada no Quadro 7: Palavras indicadas 1ª posição 2ª posição 3ª posição 4ª posição Freq. % Freq. % Freq. % Freq. % Criatividade 8 31% 6 23% 7 27% 6 23% Originalidade 6 23% 4 15% 4 15% 4 15% Imaginação 4 15% 4 15% 3 12% 4 15% Conhecimento 2 8% 3 12% 3 12% 5 19% Liberdade 1 4% 2 8% 2 8% 3 12% Reflexão 1 4% 2 8% 1 4% 0 0% 447 Concentração 1 4% 2 8% 1 4% 0 0% Singularidade 1 4% 1 4% 1 4% 0 0% Reescrita 1 4% 1 4% 1 4% 0 0% Complexidade 1 4% 0 0% 1 4% 0 0% Empenhamento 0 0% 1 4% 1 4% 0 0% Habilidade 0 0% 0 0% 1 4% 0 0% Motivação 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Técnica 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Confiança 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Vontade 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% TOTAL 26 100% 26 100% 26 100% 26 100% Quadro 7 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau decrescente de importância (TA, R3) Da análise do Quadro 7 depreendemos que as palavras que os estudantes mais associaram à escrita criativa foram “Criatividade” (8 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 31% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 23%), “Originalidade” (6 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 23% e 4, em segunda posição, correspondendo a 15%), “Imaginação” (4 ocorrências, em primeira e em segunda posição, correspondendo a 15%) e “Conhecimento” (2 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 8% e 3 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 12%). O cruzamento da análise dos resultados relativos às representações iniciais e finais dos estudantes sobre a escrita criativa permitiu-nos inferir que, no final da unidade curricular, estes: i) continuavam a dar maior relevância à “Criatividade;” ii) passaram a associar mais importância à “Originalidade” e ao “Conhecimento;” iii) concediam menos destaque à “Imaginação,” embora mantivesse importância. Algumas palavras, ausentes das suas representações iniciais, tais como “Reescrita” e “Habilidade” apontam para o repensar da natureza processual da escrita, o que teria resultado do trabalho realizado ao longo da unidade curricular. A ausência da palavra “Inspiração,” anteriormente uma das mais destacadas pelos estudantes, possibilita-nos inferir que através das suas práticas de escrita teriam igualmente compreendido o seu caráter multifacetado, nelas intervindo outros aspetos de maior relevo. 448 O Quadro 8 reúne a análise dos resultados relativos às representações finais dos estudantes sobre a escrita criativa (TB): Palavras indicadas 1ª posição 2ª posição 3ª posição 4ª posição Freq. % Freq. % Freq. % Freq. % Criatividade 9 32% 6 21% 4 14% 4 14% Originalidade 7 25% 4 14% 6 21% 4 14% Diferença 5 18% 3 11% 2 7% 4 14% Imaginação 3 11% 6 21% 5 18% 3 11% Trabalho 2 7% 2 7% 3 11% 4 14% Objetivo 1 4% 1 4% 2 7% 1 4% Reflexão 1 4% 1 4% 1 4% 1 4% Paixão 0 0% 1 4% 0 0% 0 0% Planificação 0 0% 1 4% 1 4% 1 4% Conhecimento 0 0% 1 4% 1 4% 0 0% Invenção 0 0% 1 4% 1 4% 1 4% Confiança 0 0% 1 4% 1 4% 1 4% Singularidade 0 0% 0 0% 1 4% 0 0% Emoção 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Diversidade 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Inspiração 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% Talento 0 0% 0 0% 0 0% 1 4% TOTAL 28 100% 28 100% 28 100% 28 100% Quadro 8 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau decrescente de importância (TB, R3) Depreendemos que, à semelhança no sucedido na TA, as palavras que os estudantes mais associaram ao conceito de escrita criativa foram “Criatividade” (9 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 32% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 21%) e “Originalidade” (7 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 25% e 4 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 14%). Neste caso, seguiram-se as palavras “Diferença” (5 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 18% e 3, em segunda posição, correspondendo a 11%) e “Imaginação” (3 ocorrências, em primeira posição, correspondendo 11% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 21%) que passou de segunda escolha inicial a quarta escolha. A valorização da palavra “Trabalho” (2 ocorrências, em primeira e em segunda posição, correspondendo a 7%, 3 ocorrências, em terceira posição, correspondendo a 11% e 4 449 ocorrências, em quarta posição, correspondendo a 14%), antes ausente, permite-nos inferir que os estudantes a associavam, no final da unidade curricular, ao conceito de escrita criativa, possivelmente por terem compreendido a complexidade inerente às práticas de escrita desenvolvidas. O surgimento da palavra “Planificação” (1 ocorrência em segunda, em terceira e em quarta posição, correspondendo a 4%) parece-nos importante por remeter para o seu equacionamento no âmbito de futuras práticas de escrita a realizar pelos estudantes, valorizando-as. Embora menos frisadas pelos estudantes, as palavras “Paixão” e “Emoção” merecem destaque por apontarem para a possível criação de uma rede de afetos relativa à escrita, podendo alimentar futuras práticas que se repercutam, positivamente, nos estudantes, contribuindo para o seu desenvolvimento pessoal e profissional. Os aspetos mencionados permitem-nos compreender que se reveste de muita importância continuar a refletir sobre o modo como repensamos os processos de ensino e de aprendizagem, tendo em conta as representações dos estudantes sobre os conteúdos programáticos a abordar, de modo a favorecer o desabrochar de partilhas que potenciem reencontros mais proveitosos e felizes com a escrita criativa. Considerações finais A investigação realizada possibilitou-nos inferir que o processo de ensino e aprendizagem pode adquirir uma dimensão transformadora quando é conferida centralidade às representações dos estudantes. O conhecimento do seu caráter multidimensional revelou-se importante por possibilitar expor facetas da escrita criativa que os estudantes valorizavam, bem como diferentes modos de as encarar. Para tal conhecimento contribuiu, em primeiro lugar, a escuta das suas representações iniciais sobre a escrita criativa, porto de abrigo de movimentos de hospitalidade envolvidos em processos de escrita – aí se destacando a importância da criatividade e da imaginação. A compreensão das principais dificuldades que os estudantes declararam ter (expressas através da segunda reflexão) possibilitou a realização de reajustamentos que promoveram o incremento do trabalho a pares bem como a promoção do feedback em relação ao trabalho realizado, levando ao entendimento da natureza processual da escrita – nela se plasmando a(s) criatividade(s) germinada(s) ao longo do percurso seguido. 450 O processo de ensino-aprendizagem foi, pois, alvo de várias metamorfoses ao longo do itinerário pelo qual enveredamos, tendo em atenção a participação ativa dos estudantes no mesmo, sustentada pelas reflexões levadas a cabo ao longo da unidade curricular. Os estudantes valorizaram o seu papel na reconstrução de tal processo, redescobrindo, ao longo do percurso trilhado, maneiras de se reverem na escrita criativa enquanto possibilidade de desenvolvimento pessoal, nomeadamente pela via do incremento da imaginação e da originalidade – reequacionando e reconhecendo a capacidade de serem mais versáteis na sua futura profissão. Referências bibliográficas Assis, J. A., Bailly, S., & Corrêa, M. L. G. (2017). Ainda em torno da escrita no ensino superior: demandas para o ensino e a pesquisa. Scripta, 21 (43), 9-22. DOI: 10.5752/P.2358-3428.2017v21n43p9 Bardin, L. (2004). Análise de conteúdo, 3.ª edição. Lisboa: Edições 70. Goldberg, E. (2018). Creativity: the human brain in the age of innovation. Oxford: Oxford University Press. Larrañaga E. & Yubero, S. (2005). El hábito lector como actitud. El origen de la categoria de “falsos lectores”. OCNOS, 1, 43-60. Disponível em http://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=1973232 Light, G. (2002). From the personal to the public: Conceptions of creative writing in higher education. Higher Education 43, 257–276. DOI: 10.1023/A:1013728500652 Mateos, M. & Solé, I. (2012). Undergraduate students’ conceptions and beliefs about academic writing. In M. Castelló e C, Donahue (Eds.) University writing: selves and texts in academic societies (pp. 53-67). Leiden: Brill. Melão, D. (2016). A formação do leitor no ensino superior: trajetórias de motivação para a leitura. Revista Desenredo, 12 (2), 453-472. DOI: 10.5335/rdes.v12i2.6373 Melão, D. (2017). Educação literária e representações da leitura: itinerários de formação de professores. Revista de estudios e investigación en psicología y educación. Vol. Extr., 6, 55-60. DOI: 10.17979/reipe.2017.0.06.2223 Moran, S. (2010). The roles of creativity in society. In J. C. Kaufman & R. J. Sternberg (Eds.), Cambridge handbook of creativity (pp. 74-90). New York: Cambridge University Press. Moscovici, S. (1961). La psychanalyse, son image et son publique. Paris: PUF. Moscovici, S. (1976). La psychanalyse, son image et son publique (2ème éd.). Paris: PUF. 451 Oliveira, H. A. G. & Araújo, D. L. (2017). Representações sociais de escrita em curso de formação docente: objeto de ensino e objeto de inserção nas práticas letradas acadêmicas. Scripta, 21(43), 277-298. DOI: 10.5752/P.23583428.2017v21n43p277 Roldão, M. C. (2017). Conhecimento, didática e compromisso: o triângulo virtuoso de uma profissionalidade em risco. Cadernos de Pesquisa, 47 (166), 1134-1149. Runco, M. A. (2017). Creativity. Theories and themes: research, development and practice. London: Academic Press. Runco, M. A. & Jaeger, G. J. (2012). The standard definition of creativity. Creativity Research Journal, 24 (1), 92-96. DOI: 10.1080/10400419.2012.650092 Sawyer, K. (2012). Explaining creativity: the science of human innovation. Oxford: Oxford University Press. Sousa, O. C., & Costa-Pereira, T. A. (2018). Literacy practices in higher education: students' perceptions about writing in the disciplines/Praticas de literacia no ensino superior: as perceções dos alunos sobre escrita nas disciplinas. Acta Scientiarum. Language and Culture, 40 (2), 1-12. Sternberg, R. J. (2012). The assessment of creativity: an investment-based approach. Creativity Research Journal, 24 (1), 3-12. DOI: 10.1080/10400419.2012.652925 Vieira, F. (2011). A experiência educativa como espaço de (trans)formação profissional. LINGVARUM ARENA 2, 9-25. Yubero, S., Larrañaga, E. & Pires, N. (2014). Estudo sobre os hábitos de leitura dos estudantes portugueses do ensino superior. Castelo Branco: Edições IPCB. 452 23.A PEDAGOGIA CORPORIFICADA NA PROPOSTA DAS TERNAS: ENSINAGEM SOBRE O CORPO SENSÍVEL E POÉTICO NAS ARTES DA CENA Renata Bittencourt Meira81 & Túlio Guimarães da Cunha Resumo O crescimento dos cursos de graduação e da pesquisa em Teatro, no Brasil, deu visibilidade ao trabalho de corpo dentre as práticas de ator. Na perspectiva da educação, o conhecimento corporal envolve práticas transformadoras de si. Tratamos aqui da abordagem somática que tem conquistado espaço na pesquisa acadêmica e na formação universitária no campo das Artes da Cena. A pessoa humana é um processo em rede, complexo e interconectado nas dimensões corporal, cognitiva, psicológica, social. O corpo enquanto materialidade é, dentre as dimensões interconectadas, “[...] a mais apta para catalisar a globalidade das transformações” (Fortin, 1999, p. 44). A abordagem somática aciona um conjunto de conhecimentos teórico-práticos em que corpo, mente e cultura são parte da inteireza humana (Shusterman, 2011). Esta perspectiva somática direciona este estudo de treinamento e formação de atores e professores de teatro que parte do corpo sensível para o corpo expressivo e para a poética. Na formação em teatro as "disciplinas de corpo" são oferecidas por professores com formação especializada (Potter, 2015). As atividades práticas e o trabalho intelectual desenvolvidos nas aulas deixa subjacentes conhecimentos e habilidades do trabalho docente (Tuisku, 2015). O aprofundamento nestes conhecimentos exige tempo e recursos financeiros, sendo, assim, elitizante. A pesquisa denominada "Ternas: uma pedagogia corporal para as artes" enfrenta este problema. A metodologia da prática como pesquisa considera que a tarefa de ensinar leva à reflexão e à organização do conhecimento prático (Januzelli, 2003). Esta comunicação compartilha as experiências docentes e os resultados parciais da pesquisa. Palavras Chave: Teatro. Educação Somática. Treinamento para Atores. Formação de Professores. Movimento. Professora Associada do Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia, onde ministra desde 2002, nos cursos de Graduação em Teatro (bacharelado e licenciatura); Bacharelado em Dança; Mestrado em Artes Cênicas e Mestrado Profissional em Artes (PROFARTES). Bacharel em Dança, Mestre em Artes e Doutora em Educação pela Universidade Federal de Campinas. A pesquisa atual inclui educação somática, movimento consciente, processo criativo e cultura popular. 81 http://www.iarte.ufu.br/equipe/renata-bittencourt-meira 453 Introdução Este artigo apresenta uma pesquisa docente em andamento, desenvolvida junto ao Curso de Teatro da Universidade de Évora em Programa Pós Doutoral. A primeira parte do texto discorre sobre o percurso de organização do ensino formal de Teatro no Brasil que culminou com a criação dos cursos universitários. São considerados os contextos artísticos e políticos. A segunda parte indica a metodologia da prática como pesquisa utilizada na pesquisa que se debruça sobre a prática docente, desenvolvida em um período de dezoito anos na Universidade Federal de Uberlândia (Meira, 2019), como fonte de criação e elaboração de material didático para a preparação corporal do ator que pretende contribuir com as práticas docentes de professores de teatro. O terceiro item descreve a opção da pesquisa por uma abordagem corporal somática e integradora, seguido, no item quatro, dos objetivos propostos. Os níveis de consciência corporal, as referências aos estudos das neurociências e a questão filosófica da natureza humana constituem a problematização e os pressupostos teóricos de suporte para a pesquisa. O sétimo item descreve os procedimentos que se abrigam na experiência docente enquanto prática como pesquisa. Os resultados parciais da pesquisa apontam seis conceitos corporificados como caminhos para o desenvolvimento da percepção e indicam três questões pedagógicas que orientam a ação do professor em sala de aula, no planejamento e no modo de estimular uma experiência integradora para os estudantes. As considerações finais traçam uma pequena reflexão sobre a pedagogia corporificada na proposta das Ternas. 1. A formação dos cursos universitários de Teatro no Brasil Contexto Artístico O ensino do Teatro nos cursos de formação superior, no Brasil, remontam ao movimento de modernização da cultura brasileira dos anos 1920-1930 (Brito, 2011). Até este período o entendimento sobre o aprendizado em Teatro era espontaneísta, ou seja, o artista é considerado artista por ter talento e se desenvolve tecnicamente na experiência prática do palco, não há um processo determinado de ensino e aprendizagem. Procópio Ferreira (1898 - 1979) e Dercy Gonçalves (1909 - 2008), defendiam esta ideia (Brito, 2011, p. 66). Na década de 1930, a complexidade crescente da Arte Moderna Brasileira passa a exigir do artista um conhecimento cultivado intelectualmente, além da prática artística. Esta característica conceitual da arte moderna 454 leva à reflexão sobre a formação do profissional da Arte. O embate entre os intelectuais e os talentos da arte brasileira estabelece uma reflexão crítica no período em que são criados dois cursos que serão embriões dos cursos de Teatro nas universidades. Em 1939 o Curso Prático de Teatro (CPT) é constituído no Rio de Janeiro e em 1948 é criada a Escola de Arte Dramática (EAD) em São Paulo. Destacamos a relação destas escolas com a dinâmica artística de seu tempo, no caso, com o movimento modernista que renovou a arte brasileira com elementos poéticos da cultura nacional, com críticas e características sociais do Brasil, tendo por base a vanguarda da arte moderna européia. Esta nova poética crítica, de ruptura das tradições e contextualizada na arte universal, influenciou o ensino do Teatro no Brasil. Contexto Político A Constituição Brasileira de 1934, contém um capítulo que trata exclusivamente da educação no país. Dentre as propostas está prevista a instituição de uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para definir e regular a educação nacional. Entre 1937 e 1946 o país viveu um período de censura, repressão e populismo. O capítulo sobre a educação foi retirado em uma nova Constituição que recebeu o apelido de “Polaca” por ter sido inspirada no regime semi fascista polonês. Após 1946, a discussão sobre a LDB foi retomada com uma forte polarização de ideias que disputaram, durante dezesseis anos, seu fundamento filosófico. A primeira LDB foi criada em 1961, seguida por uma versão em 1971, que vigorou até 1996. Recentemente a LDB tem sofrido reformas em pontos específicos que evidenciam as disputas ideológicas recentes no país. A questionável reforma do ensino médio (Ferretti, 2018) foi decretada em 2017 como Medida Provisória, depois de provocar um movimento estudantil secundarista de resistência que ficou conhecido como Movimento de Ocupação das Escolas. Também em 2017 foi aprovada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que foi alvo de críticas tanto pela ausência de especialistas na elaboração da versão final, quanto pelo atendimento a interesses de grandes grupos econômicos (de Andrade, 2017). Em 2019 foram promulgadas duas leis que atendem a interesses de grupos religiosos (Lei n°13.868 e Lei n° 13.796), entre outras reformas pontuais que têm redesenhado os rumos das políticas nacionais brasileiras. Estas alterações recentes têm diminuído sensivelmente a formação humanista, estética e ética dos jovens brasileiros, uma vez que torna facultativo o ensino de artes e sociologia no 455 ensino médio, além de permitir que pessoas com conhecimento técnico profissional, e sem formação pedagógica, assumam o lugar dos professores nas escolas formais. Em meio à discussão da LDB, que se deu entre 1940 e 1960, na década de 1950, são criadas quatro escolas82. Temos, então, neste primeiro período, cursos de teatro em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, cidades onde são criados os primeiros cursos universitários na década de 1960. Esses cursos, com a contribuição de outras iniciativas importantes, porém efêmeras que surgiram nas décadas de 1940, 50 e 60 (Brito, 2011, pp. 66 a 74), formaram a base dos cursos de teatro em nível superior no Brasil. As disciplinas que estes cursos técnicos de nível médio ofereciam para a formação de atores, destacadas por Brito (2011, pp. 71 a 86), incluíam ginástica, dança, dicção, esgrima (CPT no Rio de Janeiro); dicção, impostação vocal, mímica, ginástica rítmica e esgrima (EAD em São Paulo); dança rítmica (ETUB na Bahia) e expressão corporal, dicção, e esgrima aplicada ao teatro (CAD no Rio Grande do Sul). Esta organização disciplinar indica uma concepção de trabalho corporal paralela e complementar à formação em interpretação. Os acontecimentos que dão início aos cursos superiores em Teatro no Brasil são acompanhados de debates com ideias contraditórias. As oposições entre teoria e prática e entre espontaneísmo e racionalismo dividem as opiniões da classe teatral. Maria Clara Machado, fundadora de O Tablado83, é um exemplo da resistência contra a formação em Teatro no ensino superior, por considerar que na universidade, o caráter predominantemente teórico não permitiria a formação de um profissional de Teatro. Para ela, o trabalho prático de Teatro é o conhecimento principal do profissional desta arte, desde o mais elementar como é o modo de andar em cena, além disso, os conhecimentos oferecidos pela universidade poderiam ser aprendidos em conferências e bibliotecas (Brito, 2011, p. 68). Compreendo que Maria Clara Machado (1921 - 2001) afirmava, com isso, a importância das atividades práticas para a formação profissional, O Tablado (1951); Fundação Brasileira de Teatro _ FBT (1955); Escola de Teatro da Universidade da Bahia _ ETUB (1956) e Curso de Artes Dramática da URGS _ CAD (1958). 82 O Tablado de início “se resumia a uma simples sala com um palco rudimentar (ainda assim, palco!), usada para apresentações teatrais amadoras e divertimentos sortidos. (...) Em que pese o “amadorismo” pretendido inicialmente, décadas de invejável e apaixonado profissionalismo fariam do Tablado parte importante da história da cultura brasileira, seja como celeiro de talentos, seja como templo do teatro infantil. O Tablado é hoje, sobretudo, uma escola de teatro, com cerca de 700 alunos e mais de 20 professores, atuante na formação de cidadãos de todo o Brasil”. http://otablado.com.br/texto/1/historia acessado em 22 de abril de 2020, ás 19h40, horário de Lisboa. 83 456 dentre as quais a prática corporal, e também apresentava sua perspectiva na qual o conhecimento universitário é de caráter teórico. O conhecimento prático é hoje reconhecido como um campo de ensino e pesquisa nas universidades brasileiras, este reconhecimento frutificou em metodologias de ensino e da prática enquanto pesquisa, além de abordagens teórico-práticas que se interessam pela experiência humana como é o caso da perspectiva somática dos estudos do corpo. Chego a afirmar que a legitimação do conhecimento prático no ensino superior está latente na história da criação dos cursos superiores para formação de atores e atrizes no Brasil. Este debate culminou em 1965 por meio da regularização da formação na área de teatro com a promulgação a LEI n° 4.641 e que considerou que atores, contra-regras, sonoplastas e cenotécnicos deveriam ser formados em cursos técnicos de nível médio; enquanto diretores, cenógrafos e professores de Arte Dramática deveriam ter curso superior. Nesta década de 1960 são criados, então, os quatro primeiros cursos superiores84 de Teatro no Brasil como desdobramento de Escolas Técnicas de Teatro. Na década seguinte outra lei é promulgada fortalecendo ainda mais a criação de cursos superiores de Teatro, segundo Brito (2011), Em 1971 a FAFIEG85 sedia o I Simpósio Nacional de Ensino Teatral que reivindica ao MEC a criação do curso de ator em nível superior e a inclusão do ensino de Teatro nos cursos primário e médio. Neste mesmo ano, 1971, foi aprovada a LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação que torna obrigatória a inclusão de Educação Artística, bem como a Educação Física, Educação Moral e Cívica e Programas de Saúde, nos 1° e 2° graus (Brito, 2011, p. 73). Em 1974 é aprovada a lei que regulamenta o bacharelado em Teatro com quatro habilitações: Interpretação, Direção Teatral, Teoria do Teatro e Cenografia. No mesmo ano foram criados os cursos de Interpretação na Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO) e na Universidade de São Paulo (USP). Posso afirmar que a visão espontaneísta foi, com isto, suplantada, uma vez que o conhecimento em Arte passa a ser considerado como desenvolvimento intelectual e sua inclusão no currículo escolar nacional integra a arte na educação universal. Com o ensino de Artes obrigatório no Universidade Federal da Bahia - UFBa (1963); Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro UNIRIO (1964); Universidade de São Paulo - USP (1967) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS (1967). 84 Federação das Escolas Federais Isoladas Do Estado da Guanabara -FAFIEG -, uma Fundação de Direito Público voltada para o desenvolvimento da educação superior e da pesquisa. 85 457 ensino fundamental, houve um investimento das universidades na criação de cursos para formação de professores, as chamadas licenciaturas. Nessa trajetória da criação de cursos de Teatro no ensino superior percebe-se que as disciplinas de trabalho corporal dos cursos que originaram as primeiras graduações ofereciam treinamentos trazidos da dança, da ginástica, de lutas e de tradições teatrais, como a mímica. Esta questão está no centro dos questionamentos da pesquisa apresentada neste artigo. No início da década de 2000 a perspectiva política do Brasil apontava uma grande mudança, neste contexto foi realizada uma discussão abrangente que envolveu os gestores públicos, os professores universitários e artistas. Os docentes pesquisadores das universidades brasileiras, organizados na Associação Brasileira de Pesquisa e Pós Graduação em Artes Cênicas, ABRACE, criada em 1998, participaram ativamente deste debate inclusive indicando um representante da área teatral para o Ministério da Educação. O I Congresso, (...) em setembro de 1999, revelou o crescimento da área de Artes Cênicas no ambiente universitário brasileiro, desde a implantação dos primeiros cursos livres nos anos 40 e 50, dos cursos de graduação nos anos 60 e do lento processo de criação dos cursos de pós-graduação a partir dos anos 70 (ABRACE, 2020). O debate resultou na publicação das diretrizes curriculares nacionais para os cursos superiores de Teatro no Brasil86 em 2004. "Nestas diretrizes curriculares os saberes corporais estão indicados como competências e habilidades de “domínio técnico e expressivo do corpo visando a interpretação teatral”, são também abordados na apresentação do perfil desejado do profissional formado em Teatro como linguagem a ser construída. Art. 3º O curso de graduação em Teatro deve ensejar, como perfil desejado do formando, capacitação para a apropriação do pensamento reflexivo e da sensibilidade artística, compreendendo sólida formação técnica, artística, ética e cultural, com aptidão para construir novas formas de expressão e de linguagem corporal e de propostas estéticas, inclusive como No âmbito do ensino superior, existem no Brasil, 54 instituições que oferecem cursos de Teatro, nas diversas modalidades de graduação e pós-graduação, totalizando uma oferta de 107 cursos/habilitações (Brito, 2011, p. 158). 86 458 elemento de valorização humana e da auto-estima, visando a integrar o indivíduo na sociedade e tornando-o participativo de suas múltiplas manifestações culturais (Resolução CNE/CES n.º 4). O trabalho corporal é considerado como Conteúdo Específico dentro do qual é indicado, entre outros, os estudos de diferentes formas de expressão corporal. No tratamento dado aos estágios supervisionados o trabalho corporal é ampliado para além de linguagem e expressão, uma vez que a inclusão do “domínio dos princípios cinesiológicos” é indicada. § 1º O estágio de que trata este artigo poderá ser realizado na própria Instituição de ensino superior, mediante laboratórios que congreguem as diversas ordens correspondentes às diferentes técnicas de produção coreográficas das Artes Cênicas, do Espetáculo Teatral, da Dramaturgia, da Encenação e Interpretação Teatral, do domínio dos princípios cinesiológicos, revelando performance, expressão e linguagem corporal, com a atuação em espaços cênicos e com a execução de outras atividades inerentes à área do Teatro (Resolução CNE/CES n.º 4). Por fim, as diretrizes indicam, que o egresso do curso deve ter “capacidade de auto aprendizado contínuo, exercitando procedimentos de investigação, análise e crítica dos diversos elementos e processos estéticos da arte teatral” (Resolução CNE/CES n.º 4). Sem desconsiderar as falhas, obstáculos e a complexidade da implantação dos cursos de nível universitário de Teatro, Antônio Machado destaca como ponto positivo o desenvolvimento dos estudos teatrais no ensino superior. Em que pesem todas as deficiências e percalços, a implantação dos cursos de nível universitário possibilitou aos estudos teatrais no Brasil um notável salto qualitativo. O aprofundamento do conteúdo das disciplinas, a disseminação das pesquisas acadêmicas, a conseqüente ampliação da bibliografia em língua nacional, o aprimoramento da qualificação docente (com muitos mestrados e doutoramentos nos melhores centros internacionais), a institucionalização acadêmica de áreas do saber antes relegadas a segundo plano (como cenografia e teoria do teatro) foram algumas das conquistas mais evidentes (Mercado, 1998, p. 69 apud Brito, 2011, p. 155). Percebe-se, portanto, uma mudança qualitativa na abordagem dos estudos do corpo desde a concepção dos cursos técnicos de teatro até o crescimento do número de cursos de graduação e a implantação e amadurecimento da pesquisa acadêmica em Teatro, no Brasil, que deu visibilidade ao trabalho de corpo dentre as práticas de ator. O assunto foi 459 tema central do VIII Congresso da ABRACE, realizado entre 31 de outubro e 4 de novembro de 2014, em Belo Horizonte, no Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais. O tema “Arte, corpo e pesquisa na cena: experiência expandida”, propôs a apresentação de pesquisas, conferências, mesas redondas e debates para “pensar sobre o corpo como acontecimento nas artes da cena e na pesquisa: abrigo poético de convívio e sociabilidade”. Mais de 800 pesquisadores, pós-graduandos e graduandos estiveram presentes, sendo 693 trabalhos apresentados pelos sócios (ABRACE, 2020). 2. Metodologia da prática como pesquisa Ao discutir a relação entre a reflexão teórica e a pesquisa prática desenvolvidas nas universidades brasileiras, Paulino (2008) aponta que as pesquisas que investigam os textos e as encenações enquanto obra artística no campo da semiologia, sociologia, antropologia, história e filosofia deixam lacunas para a compreensão e o avanço do conhecimento teatral, especificamente o conhecimento dos processos de criação e realização destas obras, ponto fundamental para o fazer teatral. Os pesquisadores das artes da cena têm investido na reflexão sobre metodologias, especialmente considerando a necessidade de aprofundar o conhecimento dos processos de criação e de formação no campo do teatro. O avanço das pesquisas para preencher essas lacunas se dá por meio do desenvolvimento de investigações do teatro como prática dentro das universidades. Esta metodologia que investiga a prática do fazer teatral tem também sido utilizada para investigar a prática docente. Januzelli (2003, p. 42 e 43) afirma que a metodologia da prática como pesquisa considera que a tarefa de ensinar leva à reflexão e à organização do conhecimento prático. A pesquisa em desenvolvimento apresentada neste artigo é intimamente associada com a docência e trata dos conteúdos e procedimentos desenvolvidos nas aulas de corpo, como são informalmente chamadas pelos professores as disciplinas Consciência Corporal, Expressão Corporal e Corpovoz. Estas disciplinas do Curso de Teatro da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) têm por objetivo criar a base para o “domínio técnico e expressivo do corpo visando a interpretação teatral”; dar subsídios para o desenvolvimento de “aptidão para construir novas formas de expressão e de linguagem corporal e de propostas estéticas, inclusive como elemento de valorização humana e da auto-estima”; estudar diferentes formas de expressão corporal; desenvolver conhecimento teórico e prático capacitando o estudante a desenvolver laboratórios nos 460 quais é aperfeiçoado o “domínio dos princípios cinesiológicos, revelando performance, expressão e linguagem corporal” (Resolução CNE/CES n.º 4). A elaboração das aulas destas disciplinas, bem como as ementas, conteúdos, procedimentos e modos de avaliação, foi realizada conjuntamente às atividades de gestão87, no período de 2003 a 2016, com destaque para a Coordenação do Curso (2003 a 2005) durante o processo de reconhecimento do curso junto ao Ministério da Educação. Este contexto, no qual a prática docente se desenvolveu, permitiu um olhar para o curso como um todo, ao mesmo tempo em que as especificidades das aulas eram propostas. No mesmo fluxo de trabalho, a participação na Associação Brasileira de Pesquisa e Pós Graduação em Artes Cênicas, desde 2000, permitiu o diálogo com outros professores pesquisadores responsáveis pelo ensino-aprendizagem de movimento e expressão corporal em diferentes universidades do Brasil e uma na Argentina. As trocas de ideias e informações se fizeram transversalmente às atividades oficiais dos congressos bianuais, entre um grupo de professores que se autodenominou “Los Corporales”, pela presença do Prof. Dr. Martin Rosso da Universidade de Buenos Aires, Argentina. As conversas giravam em torno das fichas de disciplinas, onde são definidos objetivos, conteúdos, procedimentos, avaliação e bibliografia. Falávamos de métodos, referências e práticas durante os intervalos entre as atividades formais dos congressos. O que encontramos em comum foi a formação de cada um e a prática artística e pedagógica como norteadoras das propostas docentes. A presente pesquisa se debruça sobre as escolhas e a sistematização do fazer docente com base na trajetória institucional, na formação em dança, na experiência do conhecimento somático desenvolvida na prática artística, na vida pessoal e na experiência docente. Este caminho formativo continuado direcionou as abordagens propostas nas disciplinas, criadas e ministradas no bojo do Curso de Teatro da UFU. As disciplinas de Consciência Corporal, Expressão Corporal e Corpovoz que formam a estrutura básica para a organização de uma pedagogia corporal e que têm como proposta metodológica o desenvolvimento de um processo de transformação que parte da Coordenação da comissão de elaboração do Projeto Pedagógico implementado em 2005; presidência do colegiado de curso que promoveu o reconhecimento do curso de teatro junto ao Ministério da Educação em 2004; participação como integrante das comissões das reformulações do Projeto Pedagógico do curso de teatro nas versões implementadas em 2006, 2010 e 2017; coordenação da comissão que elaborou o Projeto de Criação do Curso de Dança em 2008 e 2009; Diretora da Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais da UFU em 2010; presidente da comissão que elaborou o Regimento do Instituto de Artes; Direção do Instituto de Artes no período de 2011 a 2016. 87 461 observação do próprio corpo por meio da experiência. “Ternas: uma pedagogia corporal para as artes” é o título da pesquisa em andamento. 3. Soma, uma perspectiva integral e integradora do corpo Escolhemos uma abordagem de trabalho corporal para direcionar a proposta docente. Consideramos um fator importante para essa escolha oferecer ao estudante orientações para adentrar no campo da experiência. A experiência permite o desenvolvimento do conhecimento do próprio corpo de modo a descobrir novas formas de expressão e de linguagem corporal. Na perspectiva da educação, esse conhecimento corporal envolve práticas transformadoras de si que têm potência de serem criadora de propostas estéticas próprias numa perspectiva de valorização humana e de cultivo da auto-estima. Tratamos aqui da abordagem somática que aciona um conjunto de conhecimentos teórico-práticos em que corpo, mente e cultura são parte da inteireza humana. De acordo com Shusterman, Precisamos pensar cuidadosamente através do corpo de modo a nos cultivarmos e a edificar os nossos estudantes, porque a verdadeira humanidade não é um dado genético, mas uma realização educacional na qual o corpo, a mente e a cultura devem estar completamente integrados (Shusterman, 2011, p. 7). A pessoa humana é um processo em rede, complexo e interconectado nas dimensões corporal, cognitiva, psicológica, social. O corpo enquanto materialidade é, dentre as dimensões interconectadas, “[...] a mais apta para catalisar a globalidade das transformações” (FORTIN, 1999, p. 44). Por estar interconectadas, as transformações acontecem também em rede, na complexidade somática. Esta materialidade de si, diz respeito à percepção do próprio corpo. Percepção tanto das sensações de tato, pressão, luz, temperatura, tônus, quanto do discernimento das emoções como estados físicos e do reconhecimento dos padrões mentais dos pensamentos, da memória, da imaginação. Para esta concepção de materialidade do corpo estudamos os escritos de António Damásio que norteiam o entendimento da materialidade das sensações, da memória, do pensamento e das emoções; e a relação desta percepção de si com os movimentos. Um desafio da pesquisa das Ternas que investiga o trabalho corporal para formação de atores e atrizes é avançar no entendimento desta materialidade na direção do 462 aprimoramento da noção da forma do corpo. Melhorar a percepção da localização do corpo no espaço, das posições das partes do corpo, da qualidade do tônus das ações, e gerar no praticante a noção da forma do próprio corpo. Esta noção diz respeito também à habilidade mimética. A terceira perspectiva é a mais própria das artes da cena e a mais distante da dinâmica específica das práticas de educação somática. Um dos objetivos das Ternas é levar a materialidade somática a alcançar o corpo cênico, o corpo performativo, com o propósito de relacionar a percepção de si e da forma com a percepção da comunicação e com a relação com o público. 4. Objetivos A pesquisa tem como objetivo organizar os conhecimentos desta pedagogia incorporada, acumulados na prática docente, em materiais didáticos que fiquem disponíveis para atores, atrizes, professores e professoras de Teatro. A finalidade desses materiais que estão em elaboração é dar suporte ao professor formado nos cursos universitários para trabalhar com seus alunos na perspectiva somática. A Educação Somática é um campo de conhecimento altamente especializado, estruturado em formações que implica em investimento pessoal de um valor monetário incompatível com o salário de professor. Outra intenção da pesquisa é contribuir para a formação continuada de atores e atrizes. Os materiais estão sendo elaborados para orientar o treinamento corporal para teatro a fim de contribuir com o ofício de ator no sentido de cooperar no aumento da autonomia. Concordamos com Tuisku quando ele analisa as pedagogias corporificadas que são baseadas na consciência corporal. Nessa perspectiva a atuação passa a ser atividades que o ator tem condições de regular. O aumento da agência do ator, por sua vez, significa, ao mesmo tempo, efeito diminuído da opinião subjetiva do professor / diretor. Isso é crucial em relação à ética do treinamento A noção de reflexividade e a ênfase na auto-agência foram trazidas à tona na discussão internacional do atual treinamento de atores (Tuisku, 2017, p. 31). 5.Distração e Níveis de Consciência O conhecimento do corpo é oculto em processos orgânicos de percepção. Temos aparatos sensoriais que nos informam regularmente sobre posições, movimentos, fluxos 463 e tônus corporais. São muitas informações, mais do que a consciência permite se atentar. Então, apenas parte das informações são conscientes, a maior parte delas fica encoberta. Damásio chama este ocultamento de “distração”. Às vezes usamos nossa mente não para descobrir fatos, mas para encobri-los. Usamos parte da mente como uma tela para impedir outra parte de perceber o que se passa em outro lugar. Esse encobrimento é necessário e intencional - não tencionamos confundir o tempo todo - mas, de propósito ou não, para todos os efeitos há uma tela que oculta (DAMÁSIO, 2000, p. 49). As Ternas utilizam estratégias para lidar com a distração nas aulas de Teatro. São modos de manter a atenção somática e, acreditamos com isso, melhorar a concentração e o envolvimento na cena e desenvolver a presença cênica. Shusterman (2012, p. 98 a 101) contribui para este trabalho ao nos apresentar quatro níveis de consciência. O mais genérico relacionado com os “modos primitivos de apreensão dos quais não estou de modo algum conscientemente apercebido, mas que Merleau-Ponty parece atribuir à a nossa intencionalidade corporal mais básica” (Meira, 2019, p. 171). O segundo que pode ser aproximado com o estado de vigília cotidiana que Shusterman descreve como “percepção consciente sem apercebimento explícito” e Merleau Ponty chama de “consciência primária” (Shusterman, 2011, p. 99). Shusterman explica o terceiro nível da consciência afirmando que “nesse nível, que Merleau-Ponty considera o nível das representações mentais, já se pode falar de percepção somática explicitamente consciente ou observação somaestética” (Shusterman, 2012, p. 100). Nas atividades das Ternas este terceiro nível é experimentado como a consciência da cena, chamado por Shusterman de observação somaestética. Este estado leva o praticante a estar conectado com suas próprias sensações e ao mesmo tempo com os companheiros de cena e os outros elementos expressivos como sonoridades, visualidades e objetos. Já o quarto nível é o estado adequado para os estudos somáticos propriamente ditos. Nele o praticante está focado na percepção sutil do próprio corpo e está consciente desta concentração. 6. A natureza humana A noção de humanidade é invocada para designar excelência moral e racionalidade que não são encontradas em outras espécies de seres vivos. Entretanto, esta mesma noção de humanidade é convocada a desculpar e descrever os defeitos de ações e sentimentos. 464 Para além das vulnerabilidades, os hábitos corporais, incluindo hábitos de sentir que têm raízes corporais também, inscrevem em si as normas sociais e os valores éticos. O poder dessas normas e valores são, então, mantidos sem a necessidade de leis ou de reflexão (Shusterman, 2011, p. 114). Qualquer desafio com sucesso da opressão deve então envolver o diagnóstico somático dos hábitos do corpo e dos sentimentos que expressam essa dominação para que estes, juntamente com as condições sociais opressivas que os geraram, possam ser ultrapassados (Shusterman, 2011, p. 114 e 115). A filosofia ocidental constitui uma base para o sentimento de desvalorização do corpo. Reúne argumentos com os quais entende o corpo como um ponto fraco do ser, considerando a percepção como uma condição enganadora na relação com a realidade. Qualifica o corpo como instrumento que deve ser desenvolvido para melhor servir a mente e o espírito, deixando o conhecimento somático num plano inferior à abstração e à ciência. Esta desqualificação do corpo, juntamente com as ambivalências que o corpo anuncia por meio da existência em si, são razões que levaram a educação humanista a negligenciar o conhecimento somático. Em contrapartida, a abordagem somática determina um ponto de vista centrado no corpo, no corpo de quem sente e pensa, no corpo vivido, o corpo do “eu”. Esta perspectiva somática indica uma característica da pedagogia corporificada que é proponente de processos de experiência em que cada estudante é o centro de seu ponto de vista. Como observa Larossa (2002), a experiência não pode ser ensinada. O professor desenvolve uma ação pedagógica corporificada como um facilitador de processos de experiência. 7. As experiências docentes - sistematização de conteúdos e procedimentos Em 2017, foram ministradas sete disciplinas88, entre graduação em Teatro, graduação em Dança e pós graduação, que formaram a base para a sistematização dos modos e Práticas Teatrais II (oitavo período do Bacharelado em Teatro, na disciplina a docente realizou a direção corporal e a pesquisa de movimentos dos atores no processo de montagem do espetáculos Terapia Lagartixa); Expressão Corporal I (segundo período do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro, disciplina ministrada para duas turmas nos turnos integral e noturno); Educação Somática II (terceiro período do Bacharelado em Dança); Tópicos Especiais em Estudos do Corpo (disciplina optativa do Curso de Mestrado Acadêmico em Artes Cênicas, com a participação de um mestrando do Programa de Pós Graduação em Educação e uma mestranda do Programa de Pós Graduação em Artes Visuais); 88 465 conteúdos que formam a proposta pedagógica das Ternas. As disciplinas foram anotadas aula a aula, foi feita uma análise de conteúdo que apontou oito tópicos nos quais se distribuem os temas e as práticas que se tornaram as diretrizes da pesquisa, são eles, Enraizamento, Alinhamento, Abraço, Espaços Internos, Sonoridades, Rosto, Pele e Apoios e Projeções. Foram ministradas concomitantemente disciplinas na Graduação em Teatro, bacharelado e licenciatura, primeiro, segundo, sexto e oitavo períodos; na Graduação em Dança, terceiro período; na Pós Graduação em Artes Cênicas. Foram disciplinas que trabalharam a introdução aos estudos do corpo em Teatro e a relação entre a percepção do corpo e a cena em três aspectos: encenação, performance individual e texto performativo.. A organização das oito Ternas contém os temas e as práticas desenvolvidas no conjunto das disciplinas, considerando, assim, os diferentes estágios do conhecimento na formação do artista da cena e propostas distintas de criação performativas e cênicas. Com esta abordagem espera-se que o conhecimento construído na investigação das Ternas seja amplo e possa ser usados em diferentes propostas pedagógicas e atividades práticas, tanto na formação do atuante quanto na atividade do professor de teatro. O conhecimento somático mobilizado nas aulas tem suas referências em Eutonia de Gerda Alexander; Método Feldenkrais, com ênfase na estrutura óssea; Técnica Klauss Vianna, com ênfase nas direções ósseas no espaço; Método Ivaldo Bertazzo, com destaque às influências da coordenação motora de Beziér e o trabalho com a resistência muscular; e a Sensopercepção de Patrícia Stokoe. Dialoga com Rudolf Laban, especialmente com as noções de espaço, tempo, força e fluência. Esse conhecimento é ainda enriquecido por leituras sobre as biografias e estudos dos chamados pioneiros da Educação Somática, especialmente Mabel Todd, Frederick Matthias Alexander e Ida Rolf. A proposta das Ternas, organizada em oito temas diretrizes foi, durante três semestres, a base do planejamento e da realização de disciplinas e atividades de pesquisa com grupos de estudantes, professores e integrantes da comunidade. Foi mantida, também, a diversidade de aplicação das atividades e temas tanto na formação de estudantes de bacharelado e licenciatura em teatro, quanto para processos de criação em artes cênicas. Neste período, primeiro e segundo semestres de 2018 e primeiro semestre de 2019, Interpretação / Atuação IV (quinto período do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro); Consciência Corporal (Primeiro semestre do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro). 466 foram oferecidas89 quatro disciplinas na graduação, sendo duas introdutórias e duas relativas a um processo de criação a partir da recriação da história de um livro. Simultaneamente dois processos com grupos de pesquisa foram desenvolvidos tendo as Ternas como foco de trabalho. As atividades desenvolvidas no estágio pós doutoral, na Universidade de Évora, utilizou as Ternas para planejamento e realização de duas disciplinas, a saber, Teatro Físico e Atelier de Dramaturgia Portuguesa. Esta última disciplina, desenvolvida no contexto da pandemia do Covid19, foi a primeira experiência de utilização do material pedagógico sem encontros presenciais. A orientação da pesquisa de movimento para criação de personagens e treinamento para atuação foi toda realizada por meio de cinco Estudos Dirigidos. 8. Resultados parciais da pesquisa A realização das disciplinas e experimentos de pesquisa seguindo a sistematização das Ternas desde 2017 permitiu a observação e a reflexão da prática com o objetivo de determinar as noções teóricas e as atividades definidoras da pedagogia das Ternas. Desde então, as aulas e atividades de pesquisa realizadas têm seguido esta sistematização com objetivo de encontrar, definir e/ou criar elementos pedagógicos que possam servir de base de trabalho para outros professores. Os resultados parciais apontam um conjunto de elementos pedagógicos e formam um léxico de base para o diálogo intersubjetivo que permite a reflexão sobre as orientações para o processo experimental dos estudantes. Conceitos Corporificados Os conceitos corporificados são caminhos para desenvolver a percepção. Referem-se a procedimentos de análise sensorial que auxiliam na aprendizagem da percepção do corpo e também a elementos de interioridade, experiências que se passam no âmbito da consciência do sujeito, que possibilitam o diálogo intersubjetivo entre o grupo. Há um conjunto de materiais coletados por meio de textos escritos pelos estudantes que Corpovoz I e II (primeiro e segundo semestre da Graduação em Teatro); Práticas Teatrais I e Estágio Supervisionado em Interpretação/Atuação em Espaços Escolares (sétimo semestre da Licenciatura em Teatro). 89 467 participaram das aulas que deverão ser analisados para estudar o modo de compreensão dos conceitos corporificados pelos estudantes. A definição de “foco”, “atenção somática” e “inventário” como conceitos corporificados foi experimentada na disciplina Teatro Físico ministrada na Universidade de Évora em 2019, um contexto distinto de onde foram criadas as Ternas. Foi, portanto, uma oportunidade de reorganizar o modo de apresentar, praticar e refletir sobre estas práticas e seus conceitos. Apresento a seguir a definição que foi compartilhada com os estudantes, mantendo o texto utilizado no material didático e foram a base dos debates e da prática. Foco Sentimos o estado corporal e o ambiente que habitamos por meio de um complexo sistema neurológico que transporta uma enorme quantidade de informações do ambiente externo e interno do corpo criando comunicação e ações materializadas em movimentos, dinâmicas metabólicas e padrões mentais ou imagens (Damásio, 2000). Percebemos um conjunto destes estímulos em “janelas de tempo” por onde tomamos consciência destes eventos somáticos. Os outros tantos estímulos ficam em estado de “distração”, que não percebemos. A atenção dedicada a esta “janela” chamamos em Ternas de “Foco”. O exercício consiste em escolher onde está o foco, “brincando” com a noção de “distração adaptativa” descrita por António Damásio (2000, p. 46).~ Atenção Somática A consciência corporal, na filosofia de Shusterman, é o estado de atenção do corpo e existe em quatro níveis. Os dois primeiros são cotidianos, é com esta consciência que desviamos de uma pessoa na rua, abaixamos ao passar embaixo de uma árvore sem nos darmos conta, sem pensar ou prever estas ações. As Ternas propõe práticas para desenvolver o terceiro nível de consciência, quando reconhecemos explicitamente o espaço que o corpo ocupa, a tensão muscular em ação, a dinâmica da respiração, a posição das articulações. Exploramos também nas Ternas a “atenção introspectiva aos sentimentos corporais”, por meio dos focos de atenção, exercitando o quarto nível de consciência corporal quando nos concentramos profundamente na percepção somática. Estes dois últimos níveis constituem práticas em estado de Atenção Somática. 468 Inventário A percepção do estado do corpo é um exercício; vamos usar uma estratégia da Eutonia (Alexander, 1989) chamada “inventário” para checar sistematicamente como sentimos o próprio corpo. Espera-se que com os exercícios a percepção fique cada vez mais clara e possa ser detalhada tanto no sentir quanto no falar sobre ela. O exercício consiste em comparar a sensação do corpo antes e depois das práticas. Os “inventários” são procedimentos da Eutonia que objetivam uma “tomada de consciência corporal aprofundada”, além de ser um instrumento para aguçar a percepção. (BRIEGHELMULLER, 1999, p. 31). Com a prática o Inventário passa a ser também uma prática de trabalho corporal. A prática constante de prestar atenção no corpo durante a atividade cria caminhos pelos quais o praticante equilibra sua tensão muscular, organiza sua postura e dá espaço nas articulações. Nesta perspectiva, o Inventário é uma prática ativa. “Os inventários têm como efeito uma regeneração profunda no organismo e uma melhora funcional” (BRIEGHEL- MULLER, 1999, p. 31 apud FRANCO, Erika Karnauchovas, 2008, p. 49). Como já foi dito, a pessoa humana é um processo em rede, complexo e interconectado nas dimensões corporal, cognitiva, psicológica, social. Na pedagogia das Ternas esta interconexão é trabalhada por meio da observação de interioridades que são dinamizadas junto com os movimentos. Além da interdependência do processo motor e sensitivo, ou seja, além de observar as sensações e os movimentos, nas atividades das Ternas são propostas observações da memória, da imaginação, da emoção e do pensamento. Nesta diretriz pedagógica fica evidente a perspectiva fenomenológica, em outras palavras, o movimento é trabalhado tanto na sua exterioridade quanto nas interioridades. O que acontece no campo subjetivo é observado, verbalizado e compartilhado em palavras oralizadas e escritas. Além de servir como temas para observação de si e para estabelecer um diálogo intersubjetivo, as noções de sensação, memória, imaginação, emoção e pensamento ajudam a organizar o pensamento sobre o corpo. As referências teóricas a elas relacionadas, as experiências somáticas e a vocalização da percepção destas noções enquanto acontecimento somático compõem o conhecimento incorporado. Conjuntamente aos conceitos norteadores da análise sensorial que contribuem com o entendimento corporificado das sensações, outras quatro noções constituem o conjunto 469 de Conceitos Corporificados, são parte da experiência do movimento, complementar às sensações e parte das percepções somáticas. Memória Enquanto o trabalho de atuação e interpretação teatral muitas vezes convoca a memória ou mesmo a memória emotiva para criar sua expressividade, as Ternas convidam os estudantes a abrir uma escuta somática à memória a partir do movimento realizado a partir da sensibilização do corpo e da percepção do ambiente. Na pesquisa de mapeamento das atividades cerebrais, Damásio esclarece que os sinais percebidos pelo corpo são levados a uma região específica no cérebro responsável pela formação das imagens referentes àquele sinal, por exemplo, “(...) para os sinais vindos da articulação do cotovelo, a recepção acontecerá nos córtices somatossensoriais iniciais, nas regiões parietal e insular, (...) (Damásio, 1996, p. 126)”. (...) as imagens mentais são construções momentâneas, tentativas de réplica, de padrões que já foram experienciados, nas quais a probabilidade de se obter uma réplica exata é baixa, mas a de ocorrer uma reprodução substancial pode ser alta ou baixa, dependendo das circunstâncias em que as imagens foram assimiladas e estão sendo lembradas. (Damásio, 1996, p. 128). A experiência do movimento marca um caminho neural que é percorrido novamente quando acionamos a memória. Esta noção contribui para a compreensão da importância da realização atenta das atividades, bem como da eficácia da repetição para a aprendizagem do movimento. Emoção A musculatura tônico-gravitacional é responsável pela postura e pela coordenação motora. A interconexão da emoção com o fundo tônico do indivíduo indica que o trabalho postural mobiliza as emoções. Para ficar em pé é necessária uma força muscular que resiste ao desequilíbrio, a musculatura gravitacional. Segundo Godard, “são esses músculos que registram as mudanças em nossos estados afetivo e emocional” (Godard, 2002, p. 14). Esta mobilização pode ser consciente ou inconsciente, ou como define Damásio, esta mobilização pode ficar no campo da distração ou pode vir a ter 470 uma representação mental, que é uma forma de entendimento deste processo emocional. O praticante de Ternas é estimulado a ficar atento à percepção das emoções. Imaginação O estímulo à imaginação, num primeiro momento, é bem diferente das propostas do teatro de criar um campo imaginário em que as personagens, as performances ou outro tipo de atuação são construídas. A pedagogia das ternas propõe a observação do emergir deste campo imaginário a partir do processo sensório-motor. A centralidade é da ação, da percepção e da materialidade do corpo. O corpo é convidado ao movimento e deste movimento emerge um campo imaginário. Nos dados coletados da pesquisa, nos textos e falas dos estudantes, existem indícios de que a experiência do movimento nas aulas de Ternas evocou ambientes ou situações que nunca foram vividas. Questões Pedagógicas Além dos conceitos corporificados, os resultados da pesquisa apontam para questões de cunho pedagógico. São questões de naturezas distintas que orientam a ação do professor em sala de aula, no planejamento e no modo de estimular uma experiência abrangente para os estudantes. Estado Somático do professor Ao falar de sua atuação em dar aulas de Feldenkrais, Shusterman (2011, p. 29) destaca que é preciso se colocar em estado somático a fim de melhor perceber e se comunicar com o cliente. Na pedagogia das Ternas a experiência somática do professor é também um fator importante para observar os estudantes e para estar presente e atuante na aula, percebendo como o grupo está a compreender e realizar a prática proposta. Este estado somático permite que o professor faça alterações em seu planejamento a fim de melhor integrar as práticas aos praticantes, e também facilita um estado criativo em que os movimentos do docente, por exemplo nas improvisações, e seu estado de concentração possam ser inspiradores, sem necessariamente ser um modelo. Esta prática em conexão podem ser explicativas ou poéticas. 471 Transferência de aprendizagem Sylvie Fortin observou em cursos universitários de dança nos EUA, Austrália e Canadá que existe uma dificuldade dos bailarinos de estabelecer uma transferência de aprendizagem entre as aulas de educação somática e as aulas de dança. O conhecimento somático desenvolvido em aulas específicas de métodos de Educação somática como Feldenkrais, por exemplo, nem sempre são incorporados nas aulas de dança de maneira espontânea ou automática. Na pedagogia das Ternas a questão da transferência de aprendizagem é mobilizadora da proposta de desenvolver numa mesma aula os aspectos somáticos, expressivos e cênicos. Fortin relata que conheceu dançarinos que treinavam sem nenhum respeito pelo seu corpo e que, uma ou duas vezes por semana, seguiam um curso de Educação Somática para voltar a uma certa neutralidade. Uma situação similar foi verificada numa investigação sobre a integração da bioenergética como treinamento para Teatro. Experimentada em diferentes momentos das atividades de uma atriz, como treinamento cotidiano, aquecimento para entrar em cena e como exercício de concentração, a prática da bioenergética foi considerada uma prática de “higiene somática”, nas palavras da autora, pois servia para ela como uma “limpeza”, como um caminho de reorganizar seu corpo e de reequilibrar as energias do corpo em atividades paralelas ao exercício da profissão de atriz (Machado, 2002). As escolhas pedagógicas da Educação Somática precisam ser recriadas para os objetivos e dinâmicas do trabalho em Teatro. Da sala de aula para o cotidiano O contato com as necessidades e características do estudante inicia um conjunto de ações que saem da sala de aula para o cotidiano. O processo de transformação de si efetiva quando passa a fazer parte da vida do estudante. São vários os relatos de estudantes que mudam o modo de utilizar o corpo em caminhadas, ao andar de ônibus, de autocarro, ao andar de bicicleta. Há uma alteração na percepção do próprio corpo e no modo como é feito o movimento. Esta integração é estimulada com propostas práticas como perceber a pele ao tomar banho; observar a organização das costas ou do tórax das pessoas que andam na rua; repetir em casa os exercícios de manipulação do próprio corpo. São procedimentos que objetivam a autonomia do estudante e que estimulam o protagonismo na apropriação do próprio corpo. 472 9. Considerações finais: uma pequena reflexão sobre a pedagogia corporificada Mais do que pensar o corpo, as Ternas procuram apresentar um caminho para uma mudança profunda de pensamento-corpo, de pensamento corporificado, de interconexão no campo da representação mental, buscando qualificar a experiência e evitar o plano de distração. A análise da prática docente por meio da organização das ternas, do planejamento minucioso das aulas e da escuta dos estudantes com anotação de suas falas e elaboração de textos, revela uma pedagogia bricoler em que conhecimentos desenvolvidos a partir de diferentes referências são combinados e recriados constituindo um modo próprio de colocá-los em ação. Durante os experimentos, foram acrescidas novas referências, especialmente do teatro, que foram integradas aos conhecimentos somáticos organizados em Ternas. Assim se delineia a orientação para os professores de partir da base do trabalho apoiada no conhecimento já sedimentado e avançar por meio das Ternas enquanto rota de trabalho que indica o caminho somático e a integração de novos conhecimentos trazidos por meio de estudos sobre teatro. O desafio da pedagogia das Ternas é combinar diferentes dinâmicas de práticas que permitam incluir no estudo do movimento a exploração sensorial atenta com trabalhos em lentidão e os exercícios de exaustão, os jogos, a contracenação, entre outras dinâmicas. A hipótese para enfrentar este desafio é o trabalho de alternância da atenção somática entre os níveis três e quatro de consciência. O que provavelmente irá resultar em novos conceitos corporificados e questões pedagógicas. 10. Referências bibliográficas ABRACE (2020). Portal da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós Graduação em Artes Cênicas. Disponível em http://portalabrace.org/4/index.php/abrace2/historico ALEIXO, F.M., MARQUES, M.P.S.C., MEIRA, R.B., SANTOS, R.G. (2010) Projeto Político Pedagógico Curso de Dança - Modalidade Bacharelado (vol. 1). Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia. Retrieved from http://www.iarte.ufu.br/sites/iarte.ufu.br/files/media/publicacoes/anexos_projeto_politic o_pedagogico_danca_ufu.pdf 473 de ANDRADE, M. C. P., das NEVES, R. M. C., & PICCININI, C. L. (2017). Base nacional comum curricular: disputas ideológicas na educação nacional. In: Anais do Colóquio Internacional Marx e o Marxismo 2017 _ de O Capital à Revolução de Outubro (1867 - 1917), ago. 2017, Niterói. Disponível em: http://www.niepmarx.blog.br/MManteriores/MM2017/anais2017/MC37/mc373.pdf BRIEGHEL- MULLER, Gunna and Winkler Anne-Marie (1999). Pedagogia e terapia em eutonia: guia de regulação psicotônica. Summus Editorial. BRITO, Marcos Falco de. (2011). A (in) desejada transgressão uma história social do Ensino Superior de Teatro no Brasil. Dissertação de Mestrado em Educação, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo. Retrieved from http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-04082011152252/en.php DAMÁSIO, António. O Mistério da consciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. FERRETTI, Celso João. (2018). A reforma do Ensino Médio e sua questionável concepção de qualidade da educação. Estudos Avançados, 32(93), 25-42. https://doi.org/10.5935/0103-4014.20180028. FORTIN, Sylvie. Educação Somática: novo ingrediente da formação prática em dança. Cadernos do GIPE-CIT, Salvador, n. 1, p. 40-55, nov. 1999. Guia Acadêmico do Curso de Teatro (2016). Portal do Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia. Retrieved from http://www.iarte.ufu.br/sites/iarte.ufu.br/files/conteudo/page/teatro_guia_academico_uf u_2016-1.pdf GODARD, Hubert (2002). Gesto e Percepção. Trad. Silvia Soter. In: PEREIRA, Roberto; SOTER, Silvia (Org.). Lições de Dança 3. Rio de Janeiro: UniverCidade Editora. JANUZELLI, Antonio (2003). A Aprendizagem do Ator. São Paulo: Editora Ática. LAROSSA, Jorge (2002). Notas sobre experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.19, p.20-28, jan./abr., 2002. LEI n° 4.641, DE 27 DE MAIO DE 1965. Lei castelo branco. Dispõe sôbre os cursos de teatro e regulamenta as categorias profissionais correspondentes. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4641.htm LEI Nº 13.796, DE 3 DE JANEIRO DE 2019 _ Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para fixar, 474 em virtude de escusa de consciência, prestações alternativas à aplicação de provas e à frequência a aulas realizadas em dia de guarda religiosa. LEI Nº 13.868, DE 3 DE SETEMBRO DE 2019 _ Altera as Leis nos 4.024, de 20 de dezembro de 1961, e 9.394, de 20 de dezembro de 1996, para incluir disposições relativas às universidades comunitárias. MACHADO, Ana Cândida Pereira. (2002) A bioenergética e o trabalho corporal do ator. 2002. 35 f. Trabalho de Conclusão de Curso. (Graduação em Artes Cênicas) - Universidade Federal de Uberlândia. Orientadora: Renata Bittencourt Meira. MEIRA, Renata Bittencourt. (2019) Preparação corporal e somaestética na Universidade Federal de Uberlândia 2000-2018. Repertório, Salvador, ano 22, n. 32, p. 159-182. DOI: https://doi.org/10.9771/r.v1i32.26554 . Parecer CNE/CES n.º 146, de 3 de abril de 2002 _ Aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Administração, Ciências Contábeis, Ciências Econômicas, Dança, Design, Direito, Hotelaria, Música, Secretariado Executivo, Teatro e Turismo. Parecer CNE/CES n.º 195, de 5 de agosto de 2003 _ Aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Música, Dança, Teatro e Design. Resolução CNE/CES n.º 4, de 8 de março de 2004 _ Aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Teatro e dá outras providências. PAULINO, Rogério Lopes da Silva (2008). As artes cênicas na academia: entre reflexão teórica e pesquisa prática. Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano VI - Número 10. Disponível em https://www.google.com/url?q=http://www.revista.art.br/site-numero10/trabalhos/47.htm&sa=D&ust=1593508957024000&usg=AFQjCNGZ1vM9NK SAHEtSLSh8r0iM8eCOcA . SHUSTERMAN, Richard (2011) . Pensar Através do Corpo, Educar para as Humanidades: Um Apelo para a Soma-Estética. Revista Philia&Filia: O MalEstar na Cultura e na Sociedade. Porto Alegre, Philia&Filia, Porto Alegre, Nov 25; vol. 02, n° 2, jul./dez. 2011. pp. 5-33. TUISKU, Hannu (2017). Developing embodied pedagogies of acting for youth theatre education: psychophysical actor training as a source for new openings. Doctoral Dissertation. Acta scenica 47. Helsinki: University of the Arts Helsinki, Theatre Academy, Performing Arts Research Centre, 2017. 475 24.EDUCAÇÃO FINANCEIRA COMO CÓDIGO DO CAPITAL INTELECTUAL NO ENSINO MÉDIO Cássia do Carmo Pires Fernandes90, João Coelho de Alvarenga e Melo 91, Ana Flávia Mayrink92, Edmar Jesus Pena de Souza93, Igor de Assis Basílio Corrêa94 & Sibele Leandra Pena Silva95 Resumo Em um contexto socioeconômico marcado nos últimos anos pelo aumento da oferta de crédito e pela diversificação de condições de pagamento, evidencia-se por um lado a movimentação da economia com o acesso das classes menos favorecidas a produtos e serviços e por outro lado o endividamento e a inadimplência do consumidor. Diante da relevância dessa problemática, a educação financeira integra a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) a ser implementada em todas as escolas do país. Coincidindo com a BNCC, o presente trabalho é resultado de um Projeto de Ensino sobre educação financeira desenvolvido em 2019 no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG), Campus Ponte Nova. Os objetivos consistiram em apresentar aos discentes conhecimentos básicos sobre educação financeira, bem como delinear um perfil socioeconômico dos cursistas e avaliar os efeitos das oficinas do Projeto. A metodologia envolveu estudos semanais para fundamentação teórica dos quatro bolsistas que ministraram oficinas mensais para um grupo de 40 discentes inscritos e a produção de conteúdo para rede social. Para conhecer o público-alvo e seu contexto familiar, foi realizada uma avaliação diagnóstica na qual identificou-se que os conhecimentos em educação financeira representavam uma fragilidade dos núcleos familiares dos cursistas. Na avaliação final do projeto, Doutora em Educação, Docente no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG) Campus Ponte Nova. Orientadora do Projeto de Ensino Educação Financeira. cassia.pires@ifmg.edu.br. 90 91 Discente do Curso Técnico Integrado em Informática do IFMG Ponte Nova. Bolsista do Projeto Educação Financeira. joao.cjmelo@gmail.com 92 Técnica em Administração pelo IFMG Ponte Nova. anaflaviamayrink21@gmail.com 93 Técnico em Administração pelo IFMG Ponte Nova. edmarsouza966@yahoo.com 94 Discente do Curso Técnico Integrado em Informática do IFMG Ponte Nova. igor.assis.ifmg@gmail.com 95 Doutoranda em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Viçosa/MG. Docente no IFMG Campus Ponte Nova. Coorientadora do Projeto Educação Financeira. sibele.penna@ifmg.edu.br Nosso agradecimento a Pró-Reitoria de Ensino do IFMG pelas bolsas concedidas aos discentes que atuaram no Projeto de Ensino Educação Financeira e ao Campus Ponte Nova pelo apoio institucional. 476 outro formulário foi enviado, sendo destacadas pelos respondentes suas aprendizagens e aspectos positivos da organização das oficinas e da atuação dos formadores/bolsistas. Por fim, projetos como este promovem o conhecimento em educação financeira como um “código do capital intelectual” para os jovens do ensino médio, estimulando novos comportamentos de organização financeira e sua multiplicação nas famílias e comunidades. Palavras-chave: Educação Financeira. Ensino Médio. Oficinas. Ensino por pares. Capital intelectual. 1. Aspectos introdutórios No Brasil, a educação financeira como política pública tem seu histórico tardio, marcado por disputas e descontinuidades. Em 2004, o Projeto de Lei nº 3.401 (autoria do Deputado Federal Lobbe Neto) dispunha sobre a criação de uma disciplina específica e posteriormente (PL nº 171/2009) a integração do tema Educação Financeira no currículo da disciplina de Matemática. Contudo, as propostas foram rejeitadas e arquivadas por tal competência ser responsabilidade dos entes federativos em regime de colaboração (Art. 9º, inciso IV, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/1996). Já em 2010, foi instituída a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) “com a finalidade de promover a educação financeira e previdenciária e contribuir para o fortalecimento da cidadania, a eficiência e solidez do sistema financeiro nacional e a tomada de decisões conscientes por parte dos consumidores” (Art.1º, Decreto Federal n. 7.397/2010). Para fomentar as ações da ENEF também foi instituído o Comitê Nacional de Educação Financeira-CONEF, que, a despeito do seu papel, foi revogado recentemente pelo Decreto Nº 10.087, de 5 de novembro de 2019. Representando a sociedade civil/mercado financeiro no extinto CONEF, quatro organizações criaram a Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF –Brasil96) e ainda continuam promovendo programas de capacitação de professores, produção de material didático, games, vídeos, entre outras iniciativas e tecnologias sociais incluindo outros públicos - não cabe aqui uma análise dos conteúdos produzidos pela AEF. ANBIMA – Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais; B3 – Brasil, Bolsa, Balcão; CNSeg – Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização; e FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos 96 477 De modo específico, o currículo escolar previa a abordagem facultativa da educação financeira como tema transversal “Trabalho e Consumo” nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (PCN’s) (BRASIL, 1997). Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular - BNCC em dezembro de 201897, a educação financeira assume caráter obrigatório entre 15 Temas Contemporâneos Transversais, a ser desenvolvida em todas as escolas do país de forma integradora (Brasil, 2017). A necessidade de incluir a temática nas escolas se deve a constantes crises econômicas no país, a ausência de uma cultura de consumo consciente, de planejamento financeiro, de saber poupar e investir que, consequentemente, leva ao endividamento, inadimplência e comprometimento da saúde financeira individual, familiar e do sistema. Uma pesquisa da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (2018) revela que a educação financeira nas salas de aula pode gerar impacto significativo na organização financeira das famílias, apontando que 70% dos estudantes que participam de estudos sobre a temática ajudam os pais a comprar de forma consciente. Para fins de conceituação, segundo a OCDE (2005, p.13), educação financeira é o processo mediante o qual os indivíduos e as sociedades melhoram a sua compreensão em relação aos conceitos e produtos financeiros, de maneira que, com informação, formação e orientação, possam desenvolver os valores e as competências necessários para se tornarem mais conscientes das oportunidades e riscos neles envolvidos e, então, poderem fazer escolhas bem informadas, saber onde procurar ajuda e adotar outras ações que melhorem o seu bem-estar. Assim, podem contribuir de modo mais consistente para a formação de indivíduos e sociedades responsáveis, comprometidos com o futuro. Levando em consideração que parte significativa da população brasileira não teve acesso à educação financeira durante a sua formação acadêmica e que a BNCC está em fase de implementação, o presente trabalho resulta do Projeto de Ensino “Educação financeira: consumidores, investidores e empreendedores conscientes e inovadores” desenvolvido no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG) Campus Avançado Ponte Nova durante o ano de 2019. Os objetivos consistiram em apresentar aos discentes do Campus os conhecimentos básicos sobre educação financeira, estimular o raciocínio lógico e reflexivo para lidar com questões 97 http://basenacionalcomum.mec.gov.br/historico 478 econômicas ao longo de suas vidas, delinear o perfil e noções prévias dos cursistas e avaliar os efeitos do projeto. 2. Metodologia O princípio da indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão na formação acadêmica e nas ações docentes e institucionais balizou a metodologia empregada no desenvolvimento do Projeto de Ensino, sendo esse delineado em diálogo com ações de extensão para a comunidade e com as etapas de pesquisa científica, visando assim promover reflexões no processo de apropriação e produção do conhecimento sobre educação financeira. Feita a seleção dos bolsistas, que ocorreu por afinidade temática, aconteceram reuniões de orientação para: levantamento bibliográfico e de outras fontes; definições e estudo de temas; planejamento das oficinas com ementas, objetivos e estratégias didáticas; idealização da marca (identidade visual e slogan); criação de perfil do Projeto em rede social; e elaboração de questionário para uma avaliação diagnóstica e outra final via formulário Google Docs. A opção foi por disponibilizar quarenta vagas para os alunos dos cursos técnicos integrados em Administração e em Informática, pensando no comprometimento com a qualidade do processo. Com o preenchimento de todas, foi flexibilizado o atendimento a mais três alunos, contudo, no decorrer do ano letivo e com outros projetos concomitantes, cerca de 40% dos inscritos não conseguiu comparecer a todas as oficinas. O primeiro questionário foi aplicado em maio de 2019, sendo na primeira parte solicitado um breve perfil do estudante e do nível de escolaridade dos pais, e, na segunda parte, questões relacionadas aos conhecimentos prévios e ao perfil de consumo familiar. O questionário final foi disponibilizado em dezembro de 2019 repetindo algumas questões sobre os conhecimentos em educação financeira com o objetivo de identificar as mudanças/aprendizagens, e outras questões para avaliar o projeto. As análises dos dados se deram por procedimentos estatísticos básicos. 479 3. Resultados e discussões 3.1. Perfil dos cursistas Na apresentação do questionário online com o título “Conversando sobre Educação Financeira”, foram esclarecidos aos respondentes os objetivos, que a participação seria voluntária e anônima e que os dados coletados seriam utilizados para fins exclusivos do Projeto. No total de 43 inscritos, 58% responderam ao levantamento. O perfil majoritário aponta idades entre dezesseis e dezessete anos (84%), sendo 72% do sexo feminino e 28% do sexo masculino. Importante destacar o maior interesse de meninas pelo Projeto, visto que apesar de ser a maioria da população, as mulheres ainda são minoria no mundo dos investimentos (Tuchlinski, 2019), e por questões históricoculturais elas assumem papel secundário nos núcleos familiares e ainda se encontram em situação de desigualdade salarial no mercado de trabalho em relação aos homens. Portanto, a educação financeira para meninas tem potencial para contribuir com decisões mais conscientes na vida adulta, promovendo a independência e o protagonismo financeiro. De modo mais específico, em entrevista para O Estado de São Paulo (2019), a educadora financeira Luciana Ikedo aponta que Quando abordamos o tema violência, encontramos ao lado da física e da psicológica a violência financeira. Muitas vezes as mulheres abrem mão da gestão dos próprios recursos financeiros por uma questão cultural, por falta de interesse, falta de tempo ou porque naturalmente os homens assumem esse papel diante de rotinas femininas tão extenuantes. Sobre a formação escolar das mães ou outra figura materna responsável, os cursistas disseram que 24% possuem ensino fundamental incompleto, somando esse percentual às que não concluíram o ensino médio tem-se 48% que não completaram a educação básica. Já 24% concluíram o ensino superior e 8% cursos de pós-graduação lato sensu. Em relação aos pais ou outra figura paterna responsável, os respondentes indicaram que 24% possuem ensino fundamental incompleto, somando esse percentual aos que não concluíram o ensino médio (4%) tem-se 28%. Comparando com as mães 480 (20%), o dobro de pais (40%) finalizou o ensino médio, apesar disso, no ensino superior elas tiveram ligeira vantagem (4%). Observa-se que uma boa parte do núcleo familiar possui grau de escolaridade médio, cerca de 60% do total de pais e mães dos cursistas e 44% nível superior, o que pode facilitar a disseminação de conteúdos sobre investimentos e mercado financeiro. 3.2. Conhecimentos iniciais/avaliação diagnóstica Entre os inscritos, mais da metade nunca havia participado de debates acerca de educação financeira e 72% afirmou possuir “pouco conhecimento” na área. Além disso, 100% dos entrevistados considerava “muito relevante” adquirir conhecimentos a respeito da educação financeira nas escolas, corroborando a pertinência do projeto. Nenhum dos cursistas declarou estar muito habituado com a educação financeira e 56% apontou sentir-se “pouco ou nada familiarizado” com o tema. Conforme uma pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito – SPC em 2015, 70% dos brasileiros afirmaram ter dificuldades para controlar as finanças pessoais. Dentre os motivos para tal, encontram-se a falta de tempo e disciplina, a preguiça e a carência de conhecimentos sobre como começar a administrar os ganhos e gastos. Ademais, somente 40% das pessoas declararam sentirem-se seguras controlando o seu próprio dinheiro. 3.3. As oficinas: estratégia de formação por pares Considerando a natureza prática/construtiva inerente a uma “oficina” e tendo em vista que os encontros de formação ocorriam no final da tarde após uma rotina cansativa de oito aulas, foram planejadas estratégias metodológicas ativas e atrativas ao público-alvo. O fato dos quatro bolsistas serem colegas de turma dos cursistas facilitou a aproximação do universo de interesses e da linguagem, delineando um processo de educativo por pares com potencial emancipatório. Para organizar as produções de material didático de cada oficina, sistematizouse, a partir do viés pedagógico da proposta, um banco de conteúdos que será disponibilizado como uma solução educacional a ser sugerida a outras escolas. 481 A primeira oficina foi inspirada no best-seller “Pai Rico, Pai Pobre” e teve o objetivo de garantir um maior engajamento dos alunos, para que se sentissem motivados a se dedicarem ao aprendizado do tema educação financeira. Imagem 1: Oficina 1 Fonte: Rede Social do Projeto. A segunda oficina denominada “Desvendando o Mercado Financeiro – Parte 1” teve o propósito de debater conceitos introdutórios e desconstruir ideias que não condizem com a realidade do mercado financeiro. A ementa abordou os seguintes tópicos: Introdução a Renda Variável e suas vertentes, Fundos de Investimento x Ações, Risco x Segurança, Investimento Prático. Em “Desvendando o mercado financeiro – Parte 2” (Oficina 3) o objetivo foi dar sequencia aos conhecimentos introdutórios do mercado financeiro para que os alunos busquem aprofundar e planejar o futuro considerando os conceitos de investimentos apreendidos. A metodologia foi exposição dialogada e utilização de ferramentas de simulação. Como atividade à distância, foi solicitada a tarefa de pesquisar sobre a forma de investimento que mais interessou e destacar alguns pontos práticos sobre a modalidade escolhida, devendo ser enviada para o e-mail do Projeto até uma data estabelecida (edufinanceiraifmg@gmail.com). "Administrando seu capital intelectual" foi tema da quarta oficina que aplicou os conhecimentos das oficinas anteriores com simulações de investimentos e análise prática dos mesmos, tendo participação ativa dos cursistas. Ferramentas de administração pessoal, tributações de investimentos, análise de mercado e simulações, foram os temas abordados. Assim como em todas as oficinas, ao final eram realizadas avaliações informais buscando um retorno dos cursistas quanto à metodologia e aos conteúdos explorados. Os feedbacks eram positivos e desde o primeiro encontro foi 482 apresentada por um grupo a demanda para temas relacionados a investimentos em ações e por outro grupo a demanda por aspectos sobre consumo e orçamento. A quinta oficina, “Guia do Orçamento familiar”, se fundamentou em um estudo de caso fictício elaborado pela equipe do projeto. Os cursistas se organizaram em grupo e receberam o mesmo caso de uma família com pai, mãe, dois filhos em idade escolar e informações sobre a renda e as despesas. O objetivo era organizar financeiramente a vida da família e tirá-los de uma situação de devedores para poupadores e/ou investidores. Os grupos apresentaram soluções diferentes adotando alternativas possíveis no cenário apresentado. Cabe destacar que a mesma oficina foi ofertada durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) do Campus e contou com a participação de estudantes dos cursos técnicos subsequentes e de pais de alunos. Tal oportunidade permitiu que pai e filho, por exemplo, aprendessem juntos sobre ferramentas de organização familiar relacionando sua realidade com o caso fictício. Imagem 2 - Oficina 5 Guia do Orçamento familiar Imagem 3 - Oficina SNCT Guia do Orçamento Fonte: Rede social do Projeto O Projeto contou também com a colaboração de uma bancária do Sindicato dos Bancários local que ministrou a oficina “Iniciação financeira na prática”. Foram apresentados aspectos gerais sobre produtos e serviços dos bancos, além de orientações sobre como abrir uma conta corrente de maneira simples. A segunda etapa da oficina consistiu na atividade prática realizada numa agência bancária com o objetivo de simular operações básicas, como o depósito. A maioria dos cursistas vivenciou a experiência pela primeira vez. 483 Imagem 4 – Oficina 6 Iniciação financeira na prática Fonte: https://www2.ifmg.edu.br/pontenova/noticias/projeto-de-educacao-financeira-receberepresentante-do-sindicato-dos-bancarios 3.4. @edufinanceiraif: O Código do Capital Intelectual Durante o processo de planejamento das ações, a equipe do Projeto decidiu criar um canal de comunicação que recorresse a estratégias de marketing de conteúdo e de relacionamento via a rede social Instagram. A primeira etapa foi pensar em um slogan curto e de fácil memorização que transmitisse aos cursistas qual seria o verdadeiro objetivo do projeto. Então, partindo da premissa de superar a lógica de formar cidadãos aptos a lidar com as diversas situações que envolvam o uso de dinheiro, foi ampliado o foco para que os alunos aprendessem que não devem investir apenas em dinheiro, mas em conhecimento. Logo, surgiu a expressão “Invista no seu ativo mais importante, o conhecimento”. Devido ao limite de vagas das oficinas, a incompatibilidade de horários de vários estudantes e ao interesse de pessoas externas ao Campus, como forma de ampliar o acesso aos temas abordados, o perfil do Projeto no Instagram (@edufinanceiraif) funcionou como uma extensão com postagens semanais, produção e publicação de vídeos, interações por enquetes e disponibilização do link de uma planilha financeira da Oficina 5. Essa última, segundo alguns relatos de pais de alunos, se tornou instrumento de controle de gastos da família. Os conteúdos para as publicações foram produzidos a partir de pesquisas sobre assuntos recorrentes do mundo financeiro e notícias do projeto, sendo criados roteiros para os vídeos e designers criativos. 484 Imagem 5: Perfil @edufinanceiraif Fonte: Instagram 3.5. Socializando o tema por meio do projeto O ensino-aprendizagem por pares e a gestão do projeto com a participação ativa dos bolsistas permitiram alguns destaques, como: a menção honrosa pela apresentação de banner no Simpósio de Iniciação Científica, sendo uma integrante do projeto entrevistada para o vídeo institucional do IFMG; a apresentação oral de dois trabalhos no Simpósio de Integração Acadêmica da Universidade Federal de Viçosa, com reconhecimento da banca avaliadora; a apresentação de banner e oferta de duas oficinas na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia do Campus. Como parte de uma exposição dos projetos de pesquisa, extensão e ensino do IFMG foi apresentado uma fase deste estudo em 30 de maio de 2019 (#30M) durante o ato em defesa da educação pública na Praça central da cidade de Ponte Nova, contribuindo para aproximá-lo da população local. Destaca-se que houve grande interesse de representantes de outras escolas públicas pelo projeto, evidenciando a dimensão e o seu potencial de extensão. 485 Imagem 6: Ato em Defesa da Educação Fonte: https://www2.ifmg.edu.br/pontenova/noticias/mostra-do-ifmg-ponte-nova 3.6. Avaliação final: os efeitos do Projeto nas opiniões dos cursistas Na avaliação diagnóstica e na avaliação final apresentou-se no questionário online, entre outras questões, uma mesma indagação: “Sobre seus conhecimentos em educação financeira, responda:” (opções na legenda) Gráfico 1 – Conhecimentos iniciais Gráfico 2 – Conhecimentos ao final do projeto Fonte: Dados do projeto A mudança na proporção das cores azul e vermelha do primeiro para o segundo gráfico ilustra os efeitos dos estudos dos temas, alterando de 4% (Gráfico 1) para 88,9% (Gráfico 2) os que declararam ter “conhecimentos suficientes”. A respeito das atividades do Projeto, considerando a escala de 1 a 5, sendo 1 o valor mínimo e 5 o valor máximo, os estudantes apresentaram notadamente uma percepção positiva: 486 Gráfico 3 - Avaliação do Projeto Fonte: Dados do projeto As atividades e tarefas à distância é uma dimensão que precisa ser revista para uma segunda fase, o que pode ser compreendido pelos intervalos distantes entre as oficinas e por não haver mecanismos de atribuição de notas, sem obrigatoriedade. Questionados a respeito de “Como você considera que o Projeto de Educação Financeira colaborou com sua formação?”, as respostas, não excludentes, revelaram que “As oficinas me ensinaram novas maneiras de organização financeira” (88,9%), “O conteúdo das oficinas me ajudou a ser um consumidor mais consciente e um potencial investidor no mercado financeiro” (66,7%), “Com o conteúdo das oficinas consegui auxiliar na gestão/organização do orçamento da família” (22,2%) e “Com a ajuda das oficinas consegui traçar um planejamento para minha vida financeira” (55,6%). A partir de tais dados é factível avaliar como bem sucedida essa primeira experiência, atingindo o objetivo de promover a educação financeira na formação escolar extrapolando o que prevê a BNCC e a lógica de criação de disciplina (PL n. 3.401/2004) ou a restrição como componente curricular no ensino de matemática. Considerações finais Em um contexto socioeconômico marcado nos últimos anos pelo aumento da oferta de crédito e pela diversificação de condições de pagamento, evidencia-se por um lado a movimentação da economia com o acesso das classes menos favorecidas a produtos e serviços e por outro lado o endividamento e a inadimplência do consumidor. Tal cenário demonstra a falta de conhecimentos para o consumo consciente e para uma relação saudável com o dinheiro. Historicamente os mais pobres possuem menor acesso ao conhecimento de como alcançar determinados bens e gerar riquezas, perpetuando um círculo vicioso. Como poupar e investir diante da uberização das relações de trabalho, do desemprego e da inflação? Somos campeões em desigualdade social, segundo pesquisa recente da FGV (2019). Existe um abismo entre os poucos que ganham muito e os muitos que ganham muito pouco. Para uma família sair da situação de pobreza e alcançar uma renda média do país sem investimento publico em educação e saúde demoraria cerca de 500 anos, segundo a OCDE (2018). Portanto, programas da AEF e política curricular nacional (BNCC) para formação em educação financeira não bastam aos jovens brasileiros, pois 487 não existe empoderamento real pelo capital intelectual se não houver uma reestruturação do sistema econômico e fortalecimento da educação pública que ofereça condições menos desiguais. Considerando que essa mudança macro não ocorra nesta primeira metade de século, em âmbito micro se insiste, como parte da missão do IFMG, em formar cidadãos conscientes, críticos, criativos e protagonistas para construir uma sociedade mais justa e solidária com projetos como este que promovem o conhecimento em educação financeira para os jovens do ensino médio, estimulando novos comportamentos de organização financeira e sua multiplicação nas famílias e comunidades, delineando um processo de educativo por pares com potencial emancipatório. Referências bibliográficas AEF-BRASIL. (2015). Associação de Educação Financeira do Brasil. Disponível em: <http://www.aefbrasil.org.br/>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2019. BRASIL. (1996) Lei n.9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. BRASIL. Decreto n. 7.397, de 22 de dezembro de 2010. Institui a Estratégia Nacional de Educação Financeira-ENEF, dispõe sobre a sua gestão e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7397.htm>. Acesso em: 20 janeiro 2020. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. (1997). Parâmetros curriculares nacionais: matemática / Secretaria de Educação Fundamental. 142p. BRASIL. Ministério da Educação. (2017) Base Nacional Comum Curricular. Disponível em <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/download-da-bncc/> Acesso em 20 Mar. 2019. OCDE. (2005) Recommendationon Principles and Good Practices for Financial Education and Awareness. Disponível education/35108560.pdf>. em: <http://www.oecd.org/daf/fin/financial- Acesso em: 19 abril 2019. Lobbe Neto, A.A. Projeto de Lei n. 3.401, de 27 de abril de 2004. Cria a disciplina "Educação Financeira" nos currículos de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental e do ensino médio. Diário 488 da Câmara dos Deputados, Brasília, DF, 12 maio 2004. Lobbe Neto, A.A. Projeto de Lei n. 171, de 10 de setembro de 2009. Altera a redação do art. 26 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. (cria a disciplina "Educação Financeira" nos currículos de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental e do ensino médio). Diário do Senado Federal, Brasília, DF, 20 set. 2009. Tuchlinski, Camila. ( 2019, setembro 24). Educação financeira para meninas promove maior liberdade de escolha na vida adulta. O Estado de S. Paulo. Disponível em https://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,educacao-financeira-parameninaspromove-maior-liberdade-de-escolha-na-vida-adulta,70003021664 Acesso em: 25 de janeiro 2020. 489 25. SOBREVIVÊNCIA ACADÊMICA: SOCIALIZAÇÃO E EVASÃO ESTUDANTIL NO ENSINO SUPERIOR Adir Luiz Ferreira98 Universidade Federal do Rio Grande do Norte Um claro perfil de caráter vem surgindo na sociedade moderna, aquela pessoa que se revela incapaz de gerir formas complexas e exigentes de envolvimento social, e portanto se retira. Perde a vontade de cooperar. Essa pessoa se transforma em um “eu que não coopera”. (Richard Sennett) Introdução Para entender a evasão estudantil no Ensino Superior, poderíamos começar pela etimologia do verbo evadir, sendo a evasão o resultado, em algumas línguas. No latim, evadere tem o sentido próprio de sair ou escapar, de algo ou de algum lugar, com o sentido figurado de ter fim, passar, transpor, atravessar, um período ou local. No português, evadir-se tem o sentido de evitar ou escapar. No espanhol, se evadir também significa evitar com habilidade, de um dano ou perigo. No francês, s’évader é escapar de algum lugar, mas também de uma realidade. No inglês, to evade tem igualmente o sentido de evitar algo desagradável ou indesejado. Para a pessoa do estudante, a evasão pode compreender alguns desses sentidos, que estão associados a outras condições desfavoráveis cotidianas de estudo e convivência, como a socialização insuficiente, o insucesso acadêmico e a insatisfação com a vida universitária, com o consequente isolamento social que geralmente antecede à evasão. O êxito dos estudantes no ensino superior está longe de ser um processo linear que possa ser caracterizado pela racionalidade do desempenho, ou seja, por um percurso progressivo e sem falhas graves na sua formação acadêmica, desde o ingresso até a conclusão no curso. É claro que, nesse caminho, haveria diferentes obstáculos pessoais e institucionais, em suas formas agudas ou crônicas, como o sentimento de ter sido injustiçado em algumas avaliações, as dificuldades para conciliar estudos e vida social ou o estresse causado pela rigidez dos currículos. Contudo, um dos fatores mais subestimados para o sucesso acadêmico e para a satisfação pessoal é, justamente, o 98 Professor titular na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) 490 cotidiano da socialização vivida pelo estudante, na comunidade de pares e nas relações comuns e extraordinárias com a instituição. Do êxito ou do fracasso desse processo de socialização acadêmica depende a permanência produtiva dos estudantes no Ensino Superior, com melhores chances de chegar a bons resultados nos seus projetos de estudos e de formação profissional. Mesmo que o bom convívio com colegas não seja sinônimo de sucesso acadêmico, por causa dos efeitos desestimulantes do isolamento social, quando os estudantes se afastam do apoio caloroso do grupo de colegas eles esmorecem mais facilmente e pensam em desistir dos estudos. Assim, devido às durezas emocionais e acadêmicas do esforço solitário de aprendizagem no ensino superior, as alternativas individuais também podem ser aquelas que levam à decisão do abandono. Como conhecimento quase trivial, considera-se que, como em qualquer experiência de convivência social prolongada, a aprendizagem das formas da socialização seja um grande desafio para os estudantes novatos. Inclusive, aspectos como o choque do estranhamento e a importância do apoio social do grupo desde o início dessa ressocialização acadêmica, em especial com abordagens pedagógicas e psicológicas, já motivaram vários estudos no Brasil e em outros países (BOYER; CORIDIAN; ERLICH, 2001; FERREIRA; MOUTINHO, 2007; PRIEST; SAUCIER; EISELEIN, 2016; TEIXEIRA et al., 2008). Entretanto, a adaptação ao meio ambiente acadêmico não é um problema apenas para os iniciantes no ensino superior, mas sim, um processo de socialização permanente, do começo ao fim da carreira do estudante. Ainda que o fenômeno da evasão pertença ao cotidiano das instituições, ele ainda é visto como um desvio marginal no percurso dos estudantes, para a maioria dos gestores universitários. Predomina a expectativa do percurso curricular completo com um fluxo ideal do início ao fim dos estudos. Porém, diante da grande quantidade de estudantes fora dessa planejada sequência, esse desvio “inesperado” é minimizado, mas internamente é considerado como um sério problema que perturba a administração. A representação desses estudantes “desviantes”, contradizendo as expectativas otimistas dos dirigentes, remete à imagem de produtos falhos na linha de produção fabril das universidades. São os “desnivelados”, “irregulares” ou “atrasados”: formas de estigmas sociais para pessoas perdidas e desorientadas em suas trajetórias acadêmicas. As gestões dos estabelecimentos continuam fazendo análises de fluxo e de produtividade, mas sem 491 saírem da perspectiva enganosa da polarização entre a permanência da maioria e a evasão de poucos. Após ingressar no ensino superior, o sucesso acadêmico depende do investimento em capacidades inéditas de adaptação relativas às condições organizacionais das instituições de ensino, como das redes de apoio social que devem ser identificadas e construídas pelo esforço dos próprios estudantes. (FERREIRA, 2014) Não obstante a importância crucial da socialização acadêmica que deriva da própria experiência dos estudantes, as instituições continuam fazendo análises de fluxo e produtividade na perspectiva da polarização entre a permanência e a evasão. Para explicar esse resultado negativo, quando o estudante não conclui o ciclo de formação previsto, os argumentos se concentram no aspecto administrativo contábil na visão simplificada de desempenho curricular insuficiente, atribuído a fatores acadêmicos tradicionais como o não atendimento às exigências do curso e à incapacidade pessoal do estudante. Nesse contexto, a permanência e a evasão são situações sempre relativas e ambivalentes, com constantes atualizações e momentos críticos coexistindo nas mentes e nas vivências dos universitários, alternando-se como decisões seguras, angustiadas, incertas, duradouras, provisórias, ou uma mescla desses sentimentos. Em relação a esses posicionamentos, as questões sociológicas relacionadas às possibilidades reconstrutivas e conflitivas dessa socialização integradora e cooperativa têm grande relevância para se buscar uma melhor eficácia educacional e social da universidade. Socialização e sobrevivência acadêmica no mundo social do estudante A permanência ou não no percurso universitário são fenômenos construídos como objetos intencionais da consciência relacionada aos conteúdos das experiências no mundo, mais especificamente, no mundo acadêmico, compartilhado com a comunidade dos atores envolvidos (colegas, professores, técnicos). Na linha de base sociológica, Alfred Schutz viu na teoria weberiana um vínculo que conectava a fenomenologia à Sociologia. Todavia, a conduta humana se configura como ação racional, isto é, inteligível em seus meios e fins para uma compreensão externa, apenas quando e, na medida em que, a pessoa que age atribui significado e direção significativa à sua ação. Dessa forma, uma abordagem que se pretenda tanto fenomenológica quanto 492 compreensiva do mundo social deve relacionar essas duas dimensões das condutas humanas: as perspectivas conscientes sobre as experiências com a racionalidade que possa ser atribuída às ações significativas pessoais e coletivas, isto é, na direção de propósitos compreensíveis para si e para os outros. Esse seria o quadro geral que proponho para uma análise do extenso e diversificado mundo social acadêmico no convívio cotidiano. Recorrendo a essas considerações fenomenológicas de Schutz para o estudo do mundo acadêmico, percebendo-o como campo de expressão da vivência pessoal junto com as vivências de outros, teríamos uma perspectiva expandida da vida do estudante, como convívio intencional de consciências, simultaneamente subjetivas e coletivas. Nessa dimensão ampliada de considerar a vivência com o outro, fica auto evidente que “não apenas vivencio o próximo, mas também vivo com ele, envelheço com ele, posso ter em perspectiva seu curso de duração como o faço em relação ao meu”. (SCHUTZ, 2018, p. 219, grifo do autor) Essa poderia ser uma definição sociológica da vida em comum da experiência do estudante, como uma comunhão de consciências, em um campo específico de tempoespaço: a convivência em um percurso formativo no ensino superior. Mesmo a ideia do envelhecimento, como consciência do amadurecimento compartilhado, é uma parte essencial nas reflexões reconstrutivas sobre a experiência da vida universitária. E isso não é apenas real para o aqui-agora do sujeito estudante que relata a sua experiência, mas é reminiscência psíquica inesgotável do estudante que habita o eu do pesquisador, em especial para a compreensão analítica de experiências alheias em confronto com aquelas de si próprio. Então, em uma tentativa de elucidar e relacionar a análise estrutural do mundo social, de acordo com Schutz (2018), com as perspectivas de apreensão dos estudantes sobre as próprias experiências no mundo social acadêmico, podemos considerar que elas são vivenciadas cotidianamente em distintos graus de intimidade. E é nessa vida em comum que se percebem as consciências como estando integradas ao mesmo mundo circundante social, a região social da relação convivial direta entre pares estudantes. Em outro espectro do mundo acadêmico geral, podemos reconhecer outro campo de experiência possível: a de um mundo social indiretamente compartilhado, que é a região social dos outros significativos na comunidade acadêmica global. Essa distinção corresponde à diversidade de consciências sobre o mundo social, bastando dar o 493 exemplo muito comum das perspectivas conflitivas em sala de aula entre professores e estudantes; a imagem do outro assume para os sujeitos as denominações de consociados, quando se trata do seu mundo circundante, e de contemporâneos, quando se refere ao mundo indiretamente compartilhado. Como regiões sociais diferenciadas no meio ambiente universitário comum, os cursos típicos de vivência apresentam-se simultaneamente, porém de forma paralela e ambivalente, como percursos curriculares, na perspectiva das instituições, e como percursos de convivência, na experiência da vida dos estudantes. Como efeito dessa ambivalência, a vida acadêmica, em geral, apresenta-se como um fluxo latente de tensão entre significados, comportamentos e vivências entre ambos, com muitas experiências rotineiras de normalidade e mesmo de tédio persistente. Com a mesma fluidez tensa, entre eventos possíveis de resultados produtivos ou insatisfatórios, quando momentos potenciais se transformam em ameaça manifesta, ocorrem na experiência do ensino superior muitas situações de conflito aberto e de incerteza sobre a continuidade nos estudos. Nesse clima de convivência desigual no mesmo meio ambiente social, onde logo se destaca a proeminência das estruturas impositivas das instituições sobre os interesses próprios dos estudantes, eclode, na consciência desses, que eles devem investir em estratégias de sobrevivência, se quiserem ter alguma chance de êxito em seus projetos de estudo e formação. Em decorrência dessa percepção, reforça-se também o reconhecimento da grande importância do convívio com o outro estudante, o consociado do mesmo mundo circundante social. Mesmo que as motivações para a experiência convivial sejam geralmente de natureza mais ampla do que os objetivos imediatos de estudo, a vivência simultânea de significados socioafetivos e de formação profissional podem ser ambos reforçados nas dores e prazeres da vida cotidiana. Em estudos feitos sobre a relação com o aprender no ambiente universitário francês, Saeed Paivandi (2014, 2015) identificou uma tipologia na perspectiva dos estudantes, que foi organizada em quatro categorias: a perspectiva “compreensiva”, que atenderia ao perfil esperado de aprendizagem diante das exigências acadêmicas; a perspectiva minimalista, que, significaria, obviamente a dedicação mínima para atingir os resultados; a perspectiva de desempenho, representando a categoria de estudantes que ficariam em uma situação intermediária entre as duas situações anteriores; e, a 494 perspectiva de desengajamento, que seria a dos estudantes em via de marginalização e eventual exclusão do meio universitário. Além dessa dimensão da aprendizagem universitária, poderíamos pensar no contexto mais extenso da socialização acadêmica e comunitária, entre pares e com os outros atores da comunidade: professores e funcionários. Nos extremos do arco do percurso de identificação com a universidade, de um lado, encontra-se a situação dos estudantes que vivenciam uma permanência acadêmica socialmente intensa, produtiva em novos conhecimentos e engajados no seu projeto de formação; por outro lado, haveria aqueles estudantes com uma permanência acadêmica reduzida, com desinteresse crescente pela aprendizagem, desvinculados de projetos de formação, que se sentem excluídos dos estudos e da convivência comunitária. Noutro sentido, uma vida cotidiana que seja socialmente sustentável no meio acadêmico também inclui rituais de civilidade que, muitas vezes, são associados a modos tradicionais ligados a títulos e comportamentos anacrônicos, como o costume da turma se levantar à entrada do professor na sala. Todavia, as práticas de respeito mútuo não se sustentam se forem baseadas em conceitos vagos e abstratos, nem tampouco se forem apenas preceitos morais inscritos em regimentos. Para serem efetivos, os rituais de civilidade, nos seus significados de integração social de grupos e pessoas com características e interesses distintos, eles devem estar definidos como sinais conscientes da disposição mútua para trocas cooperativas, em que, mesmo na suposição de relações desiguais, ambas as partes podem, potencialmente, beneficiar-se. Mas há, igualmente, um componente afetivo da cooperação que é muito comum na convivência entre estudantes, que oscila entre a contenção por causa dos deveres escolares e os efeitos destrutivos quando se privilegia desejos egoístas, em detrimento do grupo. Por exemplo, rituais como “obrigado” e “por favor” podem parecer apenas formas educadas de linguagem, mas visam igualmente a demonstração de respeito mútuo. Mas, além disso, a cooperação também se estende a situações muito menos estruturadas, como nos parecem muitas das conversas triviais que experimentamos ou observamos em outras pessoas. A cooperação informal, em encontros de amigos e rodas de conversa, são experiências de prazer que vêm juntas com o convívio social amigável, sem que as pessoas pensem que estão cooperando nesses momentos, mas que facilitam, sim, a cooperação formal, presente e futura. 495 Nesses momentos de relaxamento e distensão dos estudantes, nos intervalos das inúmeras atividades curriculares, ou em locais de encontro fora dos auditórios e das salas de aula, se compartilham vários assuntos, como fofocas sobre colegas e professores, dicas práticas para as tarefas acadêmicas, comentários políticos. É quando as observações críticas são assimiladas com menor resistência, podendo mesmo provocar reflexões reconstrutivas. Distante desses momentos de confraternização que possam ser vistos como atos de cooperação informal, o estudante isolado, possivelmente muito estressado, é o oposto evidente do estudante relaxado, mas que também pode, ocasionalmente, colaborar nas atividades formais. Na condição de isolamento no mundo acadêmico, vê-se uma antecipação do desgaste da confiança na lógica competitiva inerente à concorrência do mundo empresarial. Todavia, esse efeito social parece mais amenizado no cotidiano da vida escolar, porque a confiança é constantemente testada e ajustada. Bons colegas são colaboradores experimentados que não hesitam em colocar na “geladeira” colegas relapsos, chegando mesmo a romper laços de amizade quando ocorrem falhas graves ou clara deslealdade na colaboração acadêmica. Porém, nessa perspectiva de colaboração entre colegas sob forte pressão de desempenho, o trabalho em equipe pode se transformar em formas de opressão praticadas por grupos demasiadamente coesos e competitivos. Na mesma dinâmica da coexistência da cooperação com a competição, existem situações de colaboração fraca e de comparação odiosa que podem ser vistas na vida acadêmica nos conhecidos trabalhos de grupo, propostos pelos professores e rapidamente aceitos pelos estudantes. Mesmo quando não é essa a orientação didática dos professores, a realização das tarefas não acontece como o planejado pelos educadores individualistas. Em uma pesquisa que orientei que tinha como campo de investigação um curso da área de ciências exatas, para as quais a matemática dos cálculos é a disciplina rainha, soube do relato de um coordenador de curso que afirmou que não admitia o trabalho de grupos porque a boa aprendizagem matemática só pode vir de estudos solitários. Entretanto, o relato oposto dos estudantes do mesmo curso é que eles só aprendiam direito os cálculos quando estudavam em grupo, mesmo que fosse fora da sala de aula, onde mantinham as aparências da aprendizagem solitária. Na estrutura das organizações é conhecido o “efeito silo”, por analogia aos imensos silos para estocagem de grãos que parecem não ter ligação entre si. Mas isso pode resultar em 496 baixa produtividade, pois “os empregados tendem a guardar para si informações vitais que consideram pessoalmente vantajosas, e o fato de que nos silos as pessoas resistem ao feedback dos outros”. (SENNETT, 2015b, p. 205) Em resposta a esse isolamento, a alternativa gerencial é a de que a cooperação em equipe seja o modo mais eficaz para tratar de problemas, mantendo-se em funcionamento por períodos de vários meses, tempo suficiente para executar um projeto bem definido, mas duração insuficiente para os participantes ficarem apegados demais, o que poderia levar à acomodação e à resistência ao aumento nas metas. Contra essa tendência gregária e potencialmente versátil dos trabalhadores, as empresas apostam na volatilidade da cooperação em grupo. Apesar das vantagens práticas dessa versatilidade do trabalho de equipe, a tendência é de que, com base nesse comportamento, estabeleçase uma cooperação fraca entre os membros do grupo. Essa é a realidade do trabalho corporativo no capitalismo contemporâneo, com as suas estratégias de negócios em constante mudança ao sabor dos ventos da economia global, implicando, muitas vezes, demissões massivas mesmo de equipes cooperativas muito eficazes. Para a realização das tarefas acadêmicas, com objetivos claros e prazos definidos semelhantes às empresas, a cooperação também é vista como o método mais eficaz. Porém, diferentemente da lógica corporativa, a continuidade do convívio na vida do estudante universitário é, geralmente, de longa duração, o que favorece o surgimento de vínculos afetivos além do tempo reduzido dos compromissos passageiros. Como professor, já observei que muitos grupos cooperativos não são flutuantes, formando-se no início do curso e mantendo-se unidos até os últimos semestres. Contudo, esse claro exemplo de coesão social de grupo de estudos e convívio, com a qual se forjam mesmo amizades calorosas, algumas vezes mostram suas falhas quando a confiança entre os seus membros é corroída pela comparação odiosa. Assim como acontece no mundo do trabalho corporativo, a sensação da desigualdade comparada de resultados, real ou imaginária, desgasta as relações pela própria natureza do processo educacional do ensino superior, que visa à capacitação de competências, que se constrói como uma referência personalizada e autorreferencial. Como carga psicológica e representacional deletérias para o convívio com o outro, a “comparação odiosa baseada na competência tem um efeito particularmente corrosivo na confiança: é difícil confiar em alguém que consideramos incompetente”. (SENNETT, 2015b, p. 208) Mas, a comparação odiosa também pode surgir da 497 competição e da inveja social, já que também posso desconfiar de quem considero mais competente, a sensação de ameaça real pode ser igual, ou até maior, do que diante de alguém incompetente. Na situação acadêmica, por exemplo, um professor competente pode ser percebido como tão ameaçador, pela suposta superioridade intelectual, quanto o mestre incompetente, de quem se espera uma afirmação autoritária compensatória. Essas formas de comparação odiosa também podem ser aplicadas às relações com os colegas, sejam elas estritamente acadêmicas ou no convívio social. Porém, quando se trata de interação com os pares estudantes, há uma evidente diferença na relação de poder. Outra possibilidade na vivência das interações sociais, que apenas é funcional no convívio ser for exercida com muita sutileza, é se adotar um comportamento cooperativo, mas com cinismo, isto é, mantendo-se uma descrença não declarada diante do valor social da cooperação. O efeito negativo de se apresentar como um colaborador cínico é que essa atitude seja identificada pelo grupo como uma forma de solidariedade fingida. Isso também é uma fonte de desconfiança social, porque revela a predominância de interesses pessoais maliciosamente ocultos para os parceiros relativamente altruístas. Logo, a confiança no outro, desde que seja sincera, participante e experimentada, é a melhor base social para a cooperação autêntica. Como consequência da ansiedade e da incerteza em permanecer na formação universitária, há o cenário de alguma forma de resistência ou desinteresse pela convivência com os pares. Seria esse o estereótipo do estudante solitário que evita o contato com o outro, mesmo nos momentos de dificuldade, configurando a situação do isolamento acadêmico. Esse isolamento também configura a personalidade do eu que não coopera, nas palavras de Sennett “um campo intermediário entre a psique e a sociedade” (SENNETT, 2015b, p. 219), com esse caráter pessoal dificultando muito as possibilidades de apoio social para um percurso bem-sucedido. Outros traços entre a personalidade e o caráter do eu que não coopera seriam a ansiedade na vida social, a solidão e o narcisismo. Em sala de aula ou fora dela, identificaríamos frequentemente nesse tipo de estudante, para quem a agitada vida universitária os leva “a se mostrarem distantes e impassíveis por fora, apesar de fervilhando de estímulos por dentro”. (SENNETT, 2015b, p. 221) 498 Do relato de uma estudante, a partir da sua vivência no cotidiano acadêmico da sala de aula, quando comenta sobre o “sumiço” de uma colega, que seria precedido de uma condição típica do eu que não coopera: Ela não gostava de fazer trabalhos em grupo e isso afetou o rendimento dela e isso fazia com que os outros alunos não tentassem se aproximar. Quando alguém tentava, ela afastava. E esse semestre ela, simplesmente, sumiu. (MEDEIROS, 2018, p. 74) Na continuidade desse gradual isolamento acadêmico haveria, como consequência lógica, a definição do eu que se retira, associando essa maneira de desligamento e indiferença social à aparição de sinais premonitórios de abandono pessoal do convívio acadêmico e de desfiliação institucional. Essa seria a maneira de preparar uma evasão (a saída definitiva), desde uma autoavaliação social e emocional em relação ao meio ambiente universitário. Um exemplo desse percurso de retirada é o relato de um estudante evadido, explicando como essa transição aconteceu na sua vida: Eu não tinha grupo de estudos, teve um momento que eu não sabia mais em que período eu estava, sentia que estava deslocado dentro da UFRN, não tinha muito grupo de amizades, então isto também dificultou um pouco. (FONSECA, 2020, p. 77) Assim, entre a colaboração forte, a colaboração fraca, a comparação odiosa, a solidariedade fingida, do eu que não colabora e até o limite do eu que se retira, dá o fluxo das experiências do estudante, com as quais se buscaria a sobrevivência acadêmica. A configuração dessa condição que conjuga as dimensões pessoais e coletivas do estudante no contexto do ensino superior é um fruto conceitual a partir da investigação sobre as vivências significativas dos estudantes, sendo assim, é muito mais uma compreensão fenomenológica da educação do que uma dimensão pedagógica estruturada e prevista pelas ações institucionais. A ideia de que a sobrevivência acadêmica também está associada à socialização, podendo ser relacionada à imagem de um relativo darwinismo social, com a continuidade seletiva do mais adaptado às adversidades do meio ambiente universitário, pode parecer demasiado excludente diante da visão democrática atribuída às instituições do ensino superior público. Deve-se considerar, entretanto, que a própria concepção contemporânea de democracia, seja na sua matriz liberal ou socialista, legitima a desigualdade de resultados mesmo com distintas referências sociais para a igualdade de oportunidades. Ou seja, a seletividade baseada nas capacidades dos indivíduos, conceito muito distinto daquele de privilégio imanente de grupos ou classes sociais, estaria nos fundamentos mesmo da democracia moderna. Até mesmo o significado liberal e 499 antiaristocrático da meritocracia representaria o reconhecimento do mérito pelo desempenho, mas aberto à concorrência igualitária, e não o benefício prévio e desigual do mérito pela origem social. Aliás, esse tipo de racionalidade democrática permanece como defesa ideológica das classes médias do estilo norte-americano do self-made man e das elites burocráticas, técnicas e científicas da administração pública e das grandes empresas. Com essa reflexão, poderíamos ver a evasão no ensino superior como marca frustrante e paradoxal do abandono de um percurso escolar bem-sucedido, pelo menos até ali. Pois, o sonho se desfez justamente quando se chegou ao Eldorado universitário, a etapa educacional que representaria a realização do objetivo maior da escolaridade iniciada ainda na infância. É pensando nessa época da infância que, nos eventuais resgates em nossas memórias escolares, lembramo-nos da inevitável pergunta com a qual os adultos, especialmente pais e professores, desafiavam-nos: o que você quer ser quando crescer? Na maioria das vezes, as respostas que dávamos a essa pergunta se referia a alguma profissão que incluía, explicitamente, a posse de um diploma universitário. Sabemos que boa parte das realizações no mundo dos adultos estão na concretização dos sonhos de infância, ainda mais reforçados ou latentes na adolescência, servindo assim como bases pessoais de perspectivas e inspiração de projetos para o resto de nossas vidas. Ao contrário, muitas frustrações na vida adulta são explicadas pela interrupção, voluntária ou não, de caminhos escolares promissores. Em outro sentido, mesmo antes do ingresso no Ensino Superior há outros campos de investigação associados às formas de privilégio que favorecem o acesso à educação universitária, como é o caso dos fatores prévios e de origem, envolvendo as condições socioeconômicas e escolares dos estudantes, como a melhor preparação nos estabelecimentos de ensino médio e as características de favorecimento do capital social e cultural das famílias. Entretanto, mesmo com a discussão crítica bastante fundamentada sobre as condições desiguais de acesso, em claro detrimento dos filhos das classes populares, considera-se equivocadamente que, superada a grande barreira de ingresso, abre-se um caminho sem dificuldades para a conquista do diploma universitário, incluindo a ascensão social compensatória. Todavia, na experiência cotidiana das suas vidas acadêmicas, os estudantes descobrem que a passagem da condição de novatos para veteranos será extremamente custosa e desafiadora, antes que eles atinjam o status privilegiado de concluintes. Até 500 chegarem à finalização, a visão de um caminho perigoso e incerto é algo muito mais coerente do que a enganosa noção de uma permanência linear e sem sobressaltos no desenvolvimento dos estudos e da formação profissional, desde o ingresso até a conclusão dos cursos superiores. Na concepção fenomenológica de Alfred Schutz, o mundo da vida cotidiana intersubjetiva, o mundo da atitude natural, é movido e orientado por interesses práticos, que acabam formando um estoque de conhecimentos dessa experiência social, resultando do seu uso social uma “sedimentação dos significados”. No mundo da vida acadêmica há evidentemente um significado para os estudantes de um resultado prático final, a conclusão do curso; todavia, a percepção de outros significados vivenciados na experiência universitária pode ser mais relevante pessoalmente do que o de atingir a marca institucional da conclusão do curso. Nesse quadro de possibilidades no campo perceptivo cotidiano dos estudantes, as estratégias para a sobrevivência acadêmica, constantemente sob o risco da “morte curricular”, formam o estoque de conhecimentos decisivos que podem evitar, compreender ou justificar tanto a permanência como a evasão. A experiência da socialização de baixo para cima e da socialização de cima para baixo Como é bem conhecido na carreira dos professores nas instituições públicas federais de ensino superior, à tradicional tríade acadêmica de ensino-pesquisa-extensão se junta os quase inevitáveis períodos em cargos administrativos. Essa outra carreira acadêmica vai desde coordenações de curso até cargos superiores na administração universitária, o que para muitos são tempos frustrantes de exaustivas tarefas compartilhadas, ou são assumidos como tempos ambiciosos de dedicação exclusiva aos objetivos da gestão. Encaro esses períodos como situações passageiras de exercício da cidadania acadêmica, guiado mais pelo sentimento de dever, outra maneira de nomear a sensação de sacrifício pessoal, do que pelo gosto político de transitar na alternância entre governado e governante. Contudo, aqueles cargos que envolvem uma relação direta com os estudantes, ou de mediação entre os professores e os estudantes, podem nos trazer ricos aprendizados sobre desafios desconhecidos na vida comum dos universitários. E isso é especialmente 501 verdadeiro para quem, como eu, interessa-se pelas dimensões sociológicas da educação, com uma imensa curiosidade pelos meandros das experiências cotidianas dos estudantes, muitas delas subestimadas, incompreendidas ou até invisíveis aos olhos dos professores e da administração universitária. Da minha última experiência como chefe de Departamento, afortunadamente restrita a dois anos, tempo razoável antes de se tornar um fardo pesado demais, guardo duas situações que marcaram a minha sensibilidade às condições de vida dos estudantes. Em um desses casos, tratava-se de uma estudante de pedagogia, com bom desempenho em semestres anteriores, mas que à época se encontrava muito próxima do abandono, já tendo percorrido mais da metade do curso. Seu quadro psicológico de desistência e de retirada parecia bem avançado. As inúmeras faltas nos componentes curriculares e o consequente baixo desempenho já comprometiam o seu semestre letivo. Era uma jovem viúva, tendo seu marido morrido em um trágico acidente de trânsito no ano anterior, abalroado por um ônibus quando voltava de bicicleta do trabalho. Mãe de dois filhos pequenos, de origem popular e desempregada, apesar do choque psicológico e das dificuldades econômicas, tentou se manter no curso para não perder a perspectiva de um diploma superior, o que lhe daria a possibilidade de um melhor emprego. Todavia, o desgaste psíquico e o peso dos obstáculos materiais e acadêmicos acabaram por deixar nela uma sensação de derrota escolar e impotência cognitiva. Foi esse o relato trazido por um pequeno grupo de colegas mais próximos da deprimida estudante, que também eram seus parceiros de encontros e de estudos de longa data. Por causa dos laços de amizade, surgida pelo convívio acadêmico, deram-se o apelido de “grupo da rosquinha”, representando o pequeno círculo que formavam. Nesse momento, a solidariedade estudantil moveu o grupo a agir, porque a própria estudante achava que não tinha mais esperança de salvação, tendo comentado com amigos até mesmo planos de suicídio. E se não fosse a iniciativa do restante do grupo em procurar a ajuda da chefia do Departamento, a administração e os professores não teriam conhecimento do grau extremo de dificuldades da estudante. Provavelmente devido ao preconceito e estereótipo relacionado ao estado de depressão, mesmo com os sinais de estresse emocional e isolamento, com muitas e frequentes ausências, os problemas pessoais da estudante passaram desapercebidos para a maioria dos professores e dos colegas do curso. Tentando evitar o constrangimento de uma exposição contraproducente, adotamos uma abordagem discreta, mas atenciosa. 502 Após a exposição do caso para a chefia, as medidas tomadas, como conversar com os professores para serem benevolentes com atividades de recuperação, e o encaminhamento aos serviços de assistência social da universidade, permitiram que a estudante finalizasse o semestre com aprovação na maioria das atividades e, dessa forma, desse continuidade ao curso. Outra situação, levada ao conhecimento da chefia pela via hierárquica da direção do Centro de Educação, foi a de outra estudante que sofria de uma séria e incurável doença degenerativa, esclerose lateral amiotrófica (ELA), que progressivamente incapacitava a jovem de permanecer no curso de pedagogia. No primeiro ano, ela, ainda que com muito esforço, tinha sido assídua nas atividades acadêmicas, contando com o auxílio de muletas canadenses e o apoio de colegas da turma, criando-se assim um notável clima de integração social. Contudo, no ano seguinte, a sua situação se agravou muito, levando-a praticamente à imobilidade. Em consequência disso, a sua frequência às aulas diminuiu drasticamente, refletindo-se, logicamente, em um desempenho insuficiente nas atividades. Os colegas da turma e os professores já sabiam da condição dramática da estudante, estabelecendo rapidamente, como efeito dessa ampla visibilidade social, uma compreensão colaborativa por parte da comunidade acadêmica. Além de tudo, ela provinha de uma família com poucos recursos econômicos. Mas, os seus colegas não contavam apenas com o apoio institucional, tendo eles próprios colocado em prática uma rede própria de assistência acadêmica informal à estudante. Inclusive, o cuidado com a acessibilidade, a apresentação de atestados médicos e as justificativas para apresentação de trabalhos caseiros já vinham sendo mantidas pela turma. Juntamente com essa admirável mobilização cooperativa, outras instâncias da universidade, como a Secretaria de Inclusão e Acessibilidade, conhecida por seu abrangente e muito eficaz programa de ações para a permanência e terminalidade, estiveram sempre envolvidas, criando-se nesse processo um grupo de trabalho dedicado especialmente ao acompanhamento do caso. Sem esse extenso leque de apoio social e acadêmico, o percurso universitário dessa estudante estaria destinado ao fracasso e ao inevitável abandono. O que chamou a atenção, em ambas as situações, é que a sensibilização e a mobilização de medidas para ajudar colegas em sérias dificuldades se relacionava com um de movimento advindo de uma solidariedade provocada pela experiência cotidiana da socialização estudantil. No caso da primeira estudante, o circuito social partiu de um 503 pequeno grupo e se estendeu, discretamente, para poucos professores, estabelecendo-se apenas os contatos necessários para preservar a sua permanência produtiva no curso. Todavia, sem a decisiva atuação dos colegas do seu círculo íntimo a situação teria caminhado, provavelmente, para um final infeliz. Já no caso da segunda estudante diagnosticada com ELA, desde o início, havia o investimento dos serviços acadêmico e técnico da universidade, criados e orientados para esse tipo de acompanhamento. É claro que a participação dos colegas contribui muito para que a estudante, mesmo com sérias limitações motoras, perseverasse nos estudos, com o caloroso incentivo e as mensagens de esperança que recebeu. O espírito solidário da comunidade de estudantes desempenhou com mérito o seu papel de inclusão social. Mas esse empenho dos colegas também foi reforçado com as ações diretas de apoio pedagógico e material que dispunham as instâncias institucionais para a permanência da estudante. Em uma situação, a forma de socialização acadêmica, mesmo restrita a um pequeno grupo de colegas, representou a diferença entre a evasão com invisibilidade social e a permanência com resultados acadêmicos e afetivos positivos. Nesse caso, a informalidade das relações entre professores e estudantes, assim como a flexibilidade de procedimentos curriculares, adaptados às condições particulares, permitiram soluções criativas e negociadas na base, entre os meios de socialização e as regras da administração, tratado como um problema no nível micro. Em outra situação, o atendimento da estudante com necessidades educacionais especiais pela administração universitária, como ação inscrita em um plano de educação inclusiva, prescindia da participação dos colegas de turma e dos amigos estudantes. Ainda que a socialização estudantil tenha, na prática, exercido seu papel integrador e se veja nisso um exemplo de compaixão social e cidadania universitária, a permanência desses estudantes depende, formalmente, de um currículo diferenciado aprovado pela administração do ensino superior. Como parte da política da instituição, esse era um problema de nível macro, que comprometia a imagem pública da universidade, diante da comunidade interna, das diretrizes ministeriais e da própria legitimidade social de um estabelecimento público de ensino superior. Porém, havia uma semelhança no problema humano na situação daquelas estudantes, mesmo com características pessoais distintas: ambas se encontravam na trilha do fracasso escolar, se nada fosse feito. Contudo, as soluções empreendidas tiveram por referência duas lógicas distintas: a socialização acadêmica de baixo para 504 cima, com seu modo informal e flexível de alcance local; e a socialização institucional de cima para baixo, com seu procedimento formal e abrangente de alcance global. Essas lógicas não são estruturalmente opostas entre si, podendo, ao contrário, serem complementares para um bom funcionamento das instituições educacionais, mas elas têm uma diferença crucial na efetividade das mudanças esperadas para uma vida cotidiana mais satisfatória. Os fenômenos relacionados à socialização acadêmica local podem passar desapercebidos ou serem mal interpretados pela administração, tomados como condutas “fora da norma” ou excepcionais, perdendo-se o potencial aprendizado dessa experiência para processos de decisão mais realistas e eficazes. Enquanto as ações da socialização institucional global, diante da complexidade e dos critérios técnicos das ações, podem evitar a participação de eventuais grupos cooperativos na base social, com o risco de se desmobilizar o engajamento organizacional dos atores da comunidade escolar, como estudantes, professores e servidores administrativos. A identificação, pelos colegas e amigos, dos sinais da morte acadêmica de uma estudante próxima, com profundos efeitos sobre todos os aspectos de suas respectivas vidas, seria também um prognóstico da retirada de um parceiro de convivência cotidiana. Logo, essa saída do convívio é ressentida dolorosamente como a perda de um estimado consociado no mundo circundante (na definição da fenomenologia social de Alfred Schutz), para quem o mundo acadêmico global não fez o suficiente para mantêlo. Para a administração, esse desligamento do vínculo universitário é assimilado como uma defecção não desejada, mas é atribuída à decisão do próprio estudante, classificando-se essa situação nas formas regimentais de abandono do curso, com a denominação podendo variar como estudante desistente, desligado ou evadido. Mas, esses diferentes rótulos contábeis, como se esperaria da lógica quantitativa das estatísticas, ocultam os detalhes e a complexidade da vida cotidiana dos estudantes, dentro e fora da universidade. De fato, as dimensões pessoais e coletivas da existência dos estudantes só podem ser compreendidas no contexto do convívio comum. Em uma imagem ecológica, esse seria o nicho social dos estudantes, o campo da vivência compartilhada e dos modos de se desenvolverem as relações sociais necessárias para a sobrevivência, no interior do meio ambiente mais amplo da universidade. Considerar-se o meio ambiente do ensino superior como um ecossistema social complexo, onde o nicho dos estudantes coexiste com outros diferentes nichos (dos professores, dos pesquisadores, dos administradores), 505 seria mais importante do que ver os estudantes como meros ocupantes de um habitat acadêmico específico, o espaço físico e institucional dos cursos. Dessa coexistência de nichos, resultam estratégias de sobrevivência diversificadas, diante dos sentidos e significados próprios atribuídos pelos diferentes seres sociais que configuram o ecossistema acadêmico universitário. Por isso, a permanência ou a evasão de estudantes é percebida de formas bem distintas pelos colegas estudantes e pelos professores, mesmo aqueles mais próximos. Para os estudantes que compartilham do mesmo nicho, a ameaça de saída de um dos seus consociados pode ser ressentida como perda dolorosa e enfraquecimento social, enquanto para os professores e a administração é uma defecção vista com relativa indiferença, porque não tem repercussão nas relações sociais do seu nicho específico. Evasão no ensino superior: um fenômeno com vários significados Nos seminários conjuntos com estudantes e pesquisadores já discutimos muito sobre o uso do termo evasão, que considero o mais representativo no sentido sociológico do fenômeno, com posições razoáveis favoráveis e contrárias a essa noção. Alguns sugeriram o termo abandono, ao invés de evasão, justificando que essa definição seria mais coerente com a atitude de desistência e de conformismo dos próprios estudantes. Argumentei, em resposta, que evasão poderia ter um significado ativo e inconformista, mesmo que seja também sinônimo de fuga, mas que requer a mobilização do sujeito para desenvolver um fluxo de escolhas, ações e consequências, até resultar no seu desengajamento do percurso universitário. Ou seja, o processo de evasão implica um intenso ativismo do estudante, que mesmo com um propósito negativo tem um sentido estratégico de mobilização social e mental, exigindo muito mais do que uma simples decisão, de aparência burocrática, sem desdobramentos psicológicos e práticos até a efetivação de desligamento do seu vínculo acadêmico. No regulamento da Universidade onde trabalho, em relação ao fenômeno da saída física e administrativa dos estudantes dos seus respectivos programas de estudos, não há o uso do termo evasão, mas sim o de abandono. Em outro sentido, na lógica contábil das matrículas no sistema da universidade o tratamento adotado, para o que se caracteriza como evasão, é o de cancelamento de programa. Já o retorno de estudante desligado por reprovação, abandono ou outras razões, é denominado de reativação do cadastro. Essa é a consequência simbólica e prática de se tratar os estudantes como 506 números, seres abstratos de um planeta burocrático, o da universidade de resultados e estatísticas, não a universidade de atores reflexivos para a transformação social e o florescimento de pessoas. Diferentemente dessa noção contábil, o termo abandono traz um significado moral e psicológico de desistência definitiva e de resignação duradoura, caracterizando uma falha de caráter e um comportamento depressivo e autodestrutivo. Na mente dos estudantes, como se pode depreender dos relatos expostos, a evasão raramente tem essa conotação de abandono, sendo assumida mais como uma saída provisória, um recuo necessário e justificável, do que como derrota final. Via de regra, os estudantes desejam retornar, no mesmo curso ou em outros, quando melhores condições se apresentarem. E isso não significa que, nas suas avaliações, os estudantes, evadidos ou em riscos de sêlo, não sejam realistas sobre os limites do próprio desempenho. Porém, identificam também os fatores fora do seu controle acadêmico e pessoal, como as exigências exorbitantes de professores, as dificuldades extremas de alguns conteúdos, os problemas familiares e de saúde, os custos de manutenção além das suas condições materiais etc. Reconhecem que alguns desses fatores são difíceis de serem superados, enquanto outros são vistos como barreiras momentâneas. Na mente de muitos daqueles que deixaram o ensino superior, por decisão própria ou tendo sido forçados pelas circunstâncias, a condição provisória de retirada não é ressentida como desistência, parecendo-se mais com uma condição ambivalente de estudantes universitários “em hibernação”. Seria muito ingênuo e irrealista imaginar que, nas atuais instituições de ensino superior, o espírito dos estudantes e o próprio ideal da academia, não seja corroído pela estreiteza formativa dos currículos, das imposições burocráticas da administração, assim como pelo conhecido narcisismo e autoritarismo dos professores e gestores. Criadas para desenvolver o melhor do conhecimento científico e tecnológico, moldando o caráter de excelência da cidadania dos universitários, hoje as instituições de ensino superior estão no topo da lucratividade do mercado educacional. O aumento das capacidades tecnológicas na indústria e a revolução nas comunicações e nos transportes para o comércio mundial, tornaram frenéticas a competição de marcas e a renovação constante de produto de consumo, diante dos riscos de obsolescência e da extinção econômica. E essa lógica empresarial de resultados de curto prazo, de transformações tecnológicas e de angustiante concorrência corporativa, também induziu a condutas 507 antiéticas e perversas no mundo acadêmico. Com a pressão pela rapidez de resultados e com a precariedade dos empregos, aumentaram os casos de plágio das produções intelectuais, privilegiam-se os financiamentos para pesquisas industriais aplicadas, diminuem-se os recursos para as formações artísticas e de humanidades, investem-se em campanhas publicitárias de produtos educacionais sem qualidade certificada. Com essa expansão mercadológica complacente com a baixa qualidade educacional, incluindo o financiamento público de instituições de ensino superior medíocres, paralelamente ao desemprego estrutural das economias contemporâneas, ampliou-se igualmente a sensação de inutilidade, pessoal e social dos diplomas e formações profissionais. Nesse cenário, infelizmente muito difundido no ambiente educacional brasileiro, em consonância como a imagem da educação como mercadoria da economia globalizada, é compreensível que o ensino superior seja visto como um espaço onde, devido à hipervalorização da meritocracia competitiva, deixou-se de dar destaque ao papel da educação para uma cidadania democrática e para a importância social de uma ciência crítica e criativa. No clima de ansiedade acadêmica e incerteza no futuro profissional que decorre desse cenário, muitos jovens se sentem frustrados e preferem fugir, se já estiverem dentro, ou se manterem distantes, se ainda não ingressaram. Mesmo assim, muitos ainda continuam sendo empurrados pelas pressões familiares e sociais para buscarem diplomas, ainda que eles pouco contribuam para aliviar a angústia causada pelo medo do desemprego futuro. Mas esse é o quadro desalentador no mundo do trabalho contemporâneo, com o desemprego estrutural, a acelerada automação das indústrias e serviços, com a consequente precariedade dos empregos nas economias flexíveis das sociedades que vivem tempos líquidos, de medos e incertezas que desfazem antigas utopias. (BAUMAN, 2007) Mas há um efeito perverso para aqueles que não trabalham nem estudam, ou para quem, mesmo com diplomas universitários, sobrevive com subempregos e na incerteza de ocupações precárias: o consolo de que, pelo menos, deixaram de ser prisioneiros oprimidos pelas organizações escolares que esmagam projetos e talentos, seja como carreiras vazias de significado nas empresas ou percursos acadêmicos medíocres, desinteressante e inúteis, em variadas combinações. Também há o significado da educação superior como prisões douradas, como espaços de preparação ilusória para profissões com baixa expectativa de ocupação, como é o caso de políticas populistas de ampliação do acesso ao ensino superior, destinadas sobretudo aos estudantes de classes populares, porém guiadas, de fato, pela 508 manipulação eleitoral das legítimas demandas de democratização aos diplomas universitários. No caso brasileiro das últimas duas décadas, esse acesso ao ensino superior foi apoiado por vultosos subsídios públicos aos investimentos privados no mercado da educação superior, amplamente dominado por formações de baixa qualidade e curta duração, a lado da relativa manutenção do prestígio e excelência acadêmica dos estabelecimentos públicos. (FERREIRA, 2019) A superficialidade das formações, a precariedade das perspectivas profissionais e a manipulação política da educação convivem danosamente para disseminar, ao menos no horizonte de informação e do conhecimento de senso comum, o sentido de inutilidade cultural e mesmo de irracionalidade econômica de projetos de capacitação de longo prazo. Nesse contexto social, cultural e educacional, o perfil esperado dos indivíduos, cidadãos e estudantes é orientado pela adaptação rápida às mudanças na economia e no mundo do trabalho, aceitando incontrolável e rápida obsolescência de qualquer qualificação e a consequente instabilidade e potencial desconfiança de estudos de longa duração. Nessa ótica, um tipo de espírito de evasão, o da fuga para um futuro desconhecido com mudanças inevitáveis, não apenas é supervalorizado, mas também é fortemente estimulado. O frenesi social, pelas mudanças esperadas, mas desconhecidas, vivido como ansiedade coletiva estressante, converteu-se na expectativa que move o crescente consumo de objetos e os sonhos compartilhados por todas as classes sociais. A mudança pela mudança, sem discussão política sobre o significado social de mudanças com potencial de melhoria das condições de vida, tornou-se a evasão da sociedade de si mesma. Atualmente, o autoengano com a positividade criativa das mudanças, por tornarem desnecessários e contraproducentes os esforços críticos, apresenta-se hoje como a confortável tendência ao abandono de refletir e agir sobre as suas contradições, seus conflitos e sobre as potencialidades positivas do exercício da liberdade e das realizações humanas em todos os campos, tecnológicos, educacionais, ambientais, democráticos, econômicos etc. Todavia, no polo oposto, o termo evasão também tem um inevitável significado libertário. Desde a intenção até a sua concretização evolutiva, a evasão pode ser encontrada na própria condição de surgimento da espécie humana, na sua capacidade criativa de fugir dos limites do seu lugar de origem e descobrir novos territórios para a expansão da vida. O ser humano sempre se mobilizou com o fascínio pela aventura da evasão, sendo essa a motivação para as viagens mais perigosas, com a possibilidade de 509 fugir de si mesmo, como indivíduos e grupos insatisfeitos ou perseguidos, abrindo-se a novas experiências, pessoais, coletivas e libertadoras. Talvez seja exatamente por esse sentimento de descoberta e libertação que os evadidos, os fugitivos, quase sempre retornam às origens de onde foram arrancados, reconhecidos como sobreviventes heroicos. Porém, muitas vezes, os fugitivos também voltam aos lugares das suas fugas, geralmente atribuindo-lhes significados positivos muito distintos daqueles que justificaram suas escapadas de supostos locais de tormento e frustração, como é o caso de lares pobres de infância e rincões do interior pouco promissores. Até mesmo lugares de detestáveis e desumanas prisões, quando são convertidos posteriormente em educativos museus de memória e alerta dos horrores da barbárie, transformam-se em rotas de peregrinação de ex-prisioneiros. É lógico que muitas visões históricas e biográficas retrospectivas nos permitem afirmar que existem contextos e experiências de onde as fugas se justificariam plenamente. Mas, de todos os lugares que fugimos, provavelmente seja a escola aquele que nos provoque mais arrependimentos e dolorosas lembranças da equivocada escapatória. Assim, quando posteriormente novas oportunidades se apresentam, o retorno à escola é vivido como caminho de reconciliação, pessoal e social, com os sonhos da educação perdida. E essa retomada do destino interrompido é assumido como uma verdadeira prova de superação, especialmente quando a evasão, no passado, é compreendida como erro de avaliação sobre a importância da escola para a vida, ou como eventual incapacidade de desempenho acadêmico em determinado momento, ou como resultado da falta de condições pessoais, geralmente por razões familiares e econômicas, para se sustentar diante das exigências materiais do ambiente escolar. Contudo, a evasão que significou, igualmente, a ruptura de um processo de socialização escolar, relacionado no ensino superior com as aptidões próprias para a sobrevivência acadêmica, repercute também sobre os modos de avaliação e de administração da instituição educacional. Na lógica administrativa dos estabelecimentos de ensino, não importando nesse aspecto que eles sejam públicos ou privados, estabelece-se uma diferença produtiva fundamental entre a eficácia, que é o conjunto de ações para se aperfeiçoar as formas de agir para atingir o resultado previsto, e a eficiência, que é o ideal ou a otimização dos meios e procedimentos para a administração racional sem desperdício de recursos e materiais. (JESUINO, 2016) A evasão, dessa forma, é considerada pela administração universitária quase 510 exclusivamente sob a perspectiva da eficiência, devido aos parâmetros economicistas e gerenciais das políticas educacionais. Todavia, a gestão das instituições de ensino superior desconsidera e se fundamenta pouco no sentido da eficácia, definida pelo aperfeiçoamento constante das formas e das estratégias para os melhores resultados de aprendizagem e formação profissional. Sob esse ângulo administrativo, a carreira do estudante na universidade é geralmente vista apenas no seu encaminhamento curricular de formação científica e profissional. A evasão não é uma atitude impulsiva e irracional do estudante ou, no limite, patológica, como uma espécie de suicídio escolar. A evasão é o resultado de um processo de decisão que, mesmo com elementos equivocados de avaliação do problema ou motivações inconscientes do sujeito, pode ser vivida como uma fuga planejada ou um recuo estratégico. Um fator representacional que permite uma visão positiva para a evasão universitária é que, diferente do analfabetismo e da educação básica incompleta, a interrupção no ensino superior não constitui um estigma social, uma marca de inferioridade intelectual. Nessa ótica, o sujeito do ex-universitário não é visto como um incapacitado escolar, mas sim como um estudante que mantém uma competência acadêmica para retornar ao ensino superior, quando melhores condições se lhe apresentarem. Todavia, nessa racionalidade alternativa da retomada do sujeito estudante, o remédio de outra oportunidade dentro dos mesmos padrões escolares pode ser mais um veneno do que uma solução. Afinal, a evasão pode não ter sido uma decisão de morte, mas sim uma decisão de recuperar o controle de sua vida, como estratégia de sobrevivência fora do ambiente formal de estudos. Passando da dimensão pessoal para a dimensão organizacional, a administração universitária tem grande dificuldade em reconhecer as razões internas, ligadas ao funcionamento do ensino e das estruturas de apoio institucional, que levaram o estudante a se mobilizar para um processo de evasão, ao invés de reinvestir na permanência no seu projeto de educação superior. Na verdade, os próprios mecanismos de avaliação pela instituição, compreendendo em especial a avaliação do desempenho de professores e funcionários, sofrem muitas resistências da comunidade interna de educadores e gestores, como expressão da resiliência do tradicional espírito corporativo dos atores profissionais da universidade. No discurso corrente da comunidade interna, o comentário comum diante do fenômeno da evasão, visto na sua dimensão personalizada 511 e moral, é que essa forma de saída do ensino superior corresponde a alguma fraqueza de caráter do próprio estudante, atribuindo a isso a desistência e o abandono dos estudos. Ao contrário, as críticas relacionadas às insuficiências e disfuncionalidades pedagógicas e formativas internas são minimizadas ou são vistas como independentes dos motivos da evasão. O elenco de problemas didáticos — os meios de ensino, pedagógicos, os objetivos do ensino e de gestão do ensino — são muito abrangentes. Como exemplos temos a insistência em planos curriculares desvinculados dos interesses dos estudantes e do mundo do trabalho, modos tradicionais e autoritários de avaliação utilizados pelos professores, a falta de alternativas de ensino adaptadas às condições de aprendizagem de estudantes trabalhadores, a ausência ou ineficácia de modalidades de acompanhamento educacional e formas de apoio socioeconômico, entre outras situações. Estudos focados na análise das condições de ensino já constataram esse conhecido problema, ainda que se reduza a explicação à dimensão do mundo do ensino que provoca a retenção e a evasão, destacando que a “matriz curricular engessada, metodologia didática obsoleta e instrumentos de avaliação inapropriados dificultam os processos de ensino-aprendizagem e (...) o percurso formativo e aproveitamento dos estudantes nas disciplinas”. (FARIAS FILHO et al., 2018, p. 129) Contudo, diante dessas situações a administração oferece formas alternativas para a recuperação e o atendimento a esses estudantes desgarrados do rebanho, como componentes individualizados, aproveitamento e equivalência de atividades. Mas, os regimentos também estipulam limites e critérios para o desligamento dos estudantes considerados como irrecuperáveis, por exigirem demasiado esforço e dispensa injustificável de condições curriculares mínimas diante das exigências para um diploma de ensino superior. Logo, mesmo de forma fragmentada e episódica, quando não insuficiente para cobrir o déficit educacional desses estudantes em risco de abandono, as instituições de ensino superior reconhecem que, antes que a evasão se confirme, são possíveis vários mecanismos para se recuperar o interesse e o desempenho acadêmico. (OLIVEIRA; VANZELA; SALVADOR, 2019) Em outras palavras, ao invés da atenção sobre o evento post facto, provavelmente se poderia identificar os sinais precoces de evasão entre aqueles que, em aparência, comportam-se como estudantes em continuidade normal com sua formação. Assim, os motivos atribuídos à evasão dos estudantes se concentram em questões morais e subjetivas, enquanto as razões institucionais são relacionadas a situações 512 objetivas e administrativas, marcadas pela impessoalidade, pelos argumentos de defesa corporativa ou por fatores externos além do controle do estabelecimento, como a dependência de verbas governamentais. Considerações finais Entre algumas das considerações sobre a relação entre permanência, socialização no ensino superior e evasão dos estudantes, especialmente no contexto das universidades públicas, poderíamos concluir que um significado excessivamente negativo atribuído ao fenômeno da evasão, desviaria o olhar de uma perspectiva compreensiva sobre o aprendizado organizacional. A partir dessa compreensão, poderíamos: a) incluir o reconhecimento do mundo social acadêmico dos estudantes, com outras perspectivas sobre as motivações pessoais e sociais dos estudantes, rompendo com abordagens contábeis ou exclusivamente curriculares; b) criar formas de acompanhamento e de diálogo, para a construção de quadros institucionais de apoio e de alternativas compartilhadas de atuação; c) colocar em prática políticas institucionais mais adaptativas, especialmente aquelas que ampliassem as capacidades das estruturas dos cursos para apoiar os percursos de formação dos estudantes, sejam eles diferenciados, inclusivos, alternativos ou oscilantes No final das contas, a vida cotidiana do estudante no meio ambiente do ensino superior é complexa e multidimensional. Mais do que um resultado padronizado ao final de um caminho curricular, educacional e cognitivo, o reconhecimento de novas capacidades propiciadas pela formação universitária está associado às bagagens motivacionais próprias de cada estudante. A sensação de que a educação universitária mudou realmente as suas vidas, trazendo novas e mais ricas expectativas de desenvolvimento pessoal e social, está associada às atribuições acadêmicas positivas desenvolvidas pelo convívio acadêmico orientado pelas experiências de interação social, pelas estratégias de estudo e aprendizagem e pelos projetos de formação profissional. É o conjunto desses aspectos implícitos, ocultos, naturalizados e especialmente orientadores das práticas cotidianas, que compõem e caracterizam a socialização acadêmica. Em resumo, no mundo universitário, paralelamente à formação curricular, acompanhada e certificada pelos mecanismos burocráticos da instituição, há uma intensa e transformadora socialização acadêmica que é obra dos próprios estudantes. 513 A evasão no ensino superior geralmente é relacionada e explicada pelas deficiências dos estudantes, isto é, a falta de capacidades ou o domínio insuficiente para se atingir os níveis de desempenho esperados na educação universitária. Todavia, a evasão é bem menos compreendida e justificada pelas falhas ou inadequações das próprias estruturas educacionais das instituições de ensino superior. Em consequência disso, quando se privilegia o déficit da condição dos estudantes, ao invés das situações propiciadas pela própria instituição, há uma transferência do horizonte de mudanças possíveis para fora do âmbito universitário, da organização educacional para a pessoa do estudante, na sua dimensão psicológica e social. Em outro sentido, a permanência dos estudantes no seu percurso de formação, ainda que esteja logicamente dependente do seu contínuo desempenho pessoal, é relacionada às condições objetivas da instituição; mas, ao contrário, a saída do estudante do sistema, nas suas diferentes formas, é quase sempre atribuída às condições do sujeito estudante, desde causas subjetivas, como desinteresse e frustrações, até causas mais concretas, como mudança de emprego ou moradia. Como relatam muitos estudantes, o desejo da evasão pode estar sempre latente, pulsando de acordo com as variações de experiências pessoais e coletivas, dos momentos afetivos, na avaliação positiva dos avanços cognitivos, na esteira do sentimento de injustiça e subestimação do desempenho acadêmico, na descoberta de novas perspectivas de estudos e formação, ou na frustração advinda da incerteza de processos de amadurecimento. Assim como a morte, de forma consciente ou não, está sempre no horizonte da nossa existência, na vida acadêmica a perspectiva da evasão convive cotidianamente com o exercício da permanência. E os males e as glórias dessa permanência encontram seu calor humano, de realização e frustrações, no convívio com o outro. Nesse sentido, os sinais e os prenúncios da evasão acadêmica, como a indiferença e o isolamento, estão inevitavelmente presentes e subjacentes à formação universitária, como sombras cotidianas da permanência no mundo acadêmico. Entretanto, estabilizando simultaneamente tanto a sua situação social quanto a sua condição emocional, é a socialização integrando o eu do estudante com o seu mundo social circundante, o nicho estudantil, que permite ao estudante reconhecer a sua permanência na comunidade acadêmica como projeto de formação pessoal e profissional. 514 Referências BAUMAN, Z. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. BOYER, R.; CORIDIAN, C.; ERLICH, V. L’entrée dans la vie étudiante. Socialisation et apprentissages. Revue Française de Pédagogie, Lyon, n. 136, p. 97-105, 2001. FARIAS FILHO, J. R. F. et al. Diretrizes institucionais para apoio psicopedagógico ao discente de graduação: a experiência de construção do centro de suporte acadêmico na Universidade Federal Fluminense (UFF). In: OLIVEIRA, L. C.; AMORIM, C. C. (org.) Gestão do Ensino de Graduação: acesso, permanência e êxito – Práticas estratégicas no acompanhamento da formação discente. 1. ed. Paraíba: Ed. UFPB, 2018. p. 125-136. FERREIRA, A. L. Socialização na universidade: quando apenas estudar não é o suficiente. Educação em Questão, Natal, v. 48, n. 34, p. 116-140, jan./abr. 2014. FERREIRA, A. L. Higher Education in Brazil: mergers as a reality to private groups in parallel with the stagnation of public universities. In: CREMONINI, L.; PAIVANDI, S.; JOSHI, K. M. Mergers in Higher Education: practices and polices. New Delhi: Studera Press, 2019. p. 203-223. FERREIRA, M.; MOUTINHO, F. «Começam as aulas, […] caio de paraquedas numa coisa completamente diferente…»: aprender a lidar com a estranheza, tornando-se estudante da licenciatura em Ciências da Educação. Educação, Sociedade & Culturas, Porto, n. 24, p. 67-106, 2007. FONSECA, F. L. M. Evasão no ensino superior: a socialização acadêmica interrompida no mundo universitário da UFRN. Natal: Faculdade Metropolitana Norte Riograndense, 2020. JESUINO, J. C. Introducción. In: DOMINGOS, M.; ENNAFAA, R.; CHALETA, E. (ed.) La Educación Superior, el estudiantado y la cultura universitaria. València: Editorial Neopàtria, 2016. p. 15-36. MEDEIROS, N. C. A socialização extraclasse e extrauniversidade como estratégia de sobrevivência acadêmica de estudantes do ensino superior na UFRN. 2018. 118 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Educação, Programa de Pósgraduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2018. OLIVEIRA, L. C.; VANZELA, A. P. F. C.; SALVADOR, L. D. S. (org.) Enfrentamento à retenção e evasão: Universidade no rumo certo. Diamantina: UFVJM, 2019. PAIVANDI, S. A relação com o aprender na universidade e o meio ambiente de estudos. Educação em Questão, Natal, v. 48, n. 34, p. 39-64, jan./abr. 2014. PAIVANDI, S. Apprendre à l’Université. Louvain-la-Neuve: De Boeck Supérieur, 2015. 515 PRIEST, K. L.; SAUCIER, D. A.; EISELEIN, G. Exploring students’ experiences in first-year learning communities from a situated learning perspective. International Journal of Teaching and Learning in Higher Education, [s. l.], v. 28, n. 3, p. 361-371, 2016. SCHUTZ, A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes, 2018. SENNETT, R. A cultura do novo capitalismo. Rio de Janeiro: Record, 2015a. SENNETT, R. Juntos. Rio de Janeiro: Record, 2015b. TEIXEIRA, M. A. P. et al. Adaptação à universidade em jovens calouros. Psicologia Escolar e Educacional, [s. l.], v. 12, n. 1, p. 185-202, 2008. 516