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Esta publicação teve suporte do Projeto “Aprender e Ensinar na Universidade” (PTDC/
CED-EDG/29252/2017) financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e
Tecnologia/ Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Governo de Portugal.
ISBN: 978-84-09-27401-7
L: https://roderic.uv.es/handle/10550/80458
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: Instituto de Creativi
Innovacion s Educativ s de la
Universitat de València, 2021
Se permiten la reproducción, distribución y la comunicación pública, siempre que se
cite el título, el autor y el editor; y que no se haga con fines comerciales.
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Esta publicação teve suporte do Projeto “Aprender e Ensinar na Universidade” (PTDC/
CED-EDG/29252/2017) financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e
Tecnologia/ Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Governo de Portugal.
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: Institut de Creativi
Innovacions Educativ s de la
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la E
FACES DO ENSINAR E APRENDER NO ENSINO SUPERIOR
FORMAS DE ENSEÑAR Y APRENDER EN EDUCACIÓN SUPERIOR
1
2
Índice
INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 6
PARTE I .................................................................................................................................................... 13
EDUCAÇÃO SUPERIOR, CONTEXTOS EDUCATIVOS E PERSPECTIVAS PEDAGÓGICAS 13
1.
THINKING ABOUT UNIVERSITY TEACHING AND LEARNING: CONTRIBUTIONS
FROM EDUCATIONAL RESEARCH .................................................................................................. 14
Noel Entwistle ...........................................................................................................................................
2.
LA HORA LOGRADA. PARA UNA SOCIOLOGÍA DE LA RELACIÓN CON LA
EDUCACIÓN (UNIVERSITAS STUDIORUM) ................................................................................... 39
José Beltrán Llavador & Antonio Benedito Casanova ...............................................................................
3.
POURQUOI ALLER À L’UNIVERSITÉ? LE CHOIX DES ÉLÈVES DE TERMINALE . 63
Georgios Stamelos .....................................................................................................................................
4.
CONDITIONS ENVIRONNEMENTALES FAVORABLES A L’EDUCATION AU
DEVELOPPEMENT DURABLE ........................................................................................................... 75
Georges Elias .............................................................................................................................................
5.
SENTIR OU A OUTRA FACE DO APRENDER NO ENSINO SUPERIOR ....................... 95
Elisa Chaleta ..............................................................................................................................................
6.
PENSAR E LIDAR COM OS PENSAMENTOS ACADÉMICOS: A EXPERIÊNCIA DE
ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR ........................................................................................... 117
Fátima Leal ...............................................................................................................................................
7.
MONITORIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DE ESTUDANTES NA TRANSIÇÃO
PARA O ENSINO SUPERIOR NA UTAD .......................................................................................... 138
José Paulo Cravino, Tatiana Ferreira, Daniela Pedrosa & Isabel Alves .....................................................
8.
LE RÔLE DU MENTOR DANS LES STAGES DES FUTURS ENSEIGNANTS DES
ÉCOLES .................................................................................................................................................. 160
Maria Frounta, Charikleia Pitsou & Costas Malamas ................................................................................
9.
CONTRIBUTIONS TO REDUCE ACADEMIC FAILURE IN STEM BACHELOR
COURSES ............................................................................................................................................... 175
José Carlos Lopes, Maria do Rosário Correia, João Miguel Dias & Luis Descalço ..................................
10.
COMPARAÇÃO TEÓRICA DOS REFERENCIAIS DA QUALIDADE PARA A
EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL ................................................................................ 197
Marisa Pisco, Margarida Saraiva & Fátima Jorge ......................................................................................
11. APRENDIZAGEM COMO LIBERDADE .................................................................................... 214
Misleine Andrade F. Peel, Patrícia Damas Beites & Fátima Simões .........................................................
PARTE II ......................................................................................................................................................
SENTIDOS PEDAGÓGICOS E PRÁCTICAS EDUCATIVAS ........................................................ 234
12.
ENSINO SUPERIOR EM PAUTA: UM LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO DO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UFRN ............................................. 235
Erika dos Reis Gusmão Andrade, Anna Katyanne Arruda Silva e Souza, Telma Elita da Silva & Sheyla
Gomes Pereira de Almeida.........................................................................................................................
3
13.
FORMACIÓN
CONTINUA
INTENSIVA
A
NIVEL
DE
POSGRADOS
INTERNACIONALES EN EDUCACIÓN SUPERIOR E INCLUSIÓN EN UNA UNIVERSIDAD
PRIVADA DE PARAGUAY ................................................................................................................. 251
Javier Numan Caballero Merlo ..................................................................................................................
14.
A AUTOPERCEÇÃO DA CONSTRUÇÃO DA PROFISSIONALIDADE DOCENTE NA
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES ..................................................................................... 270
Elsa Ribeiro-Silva, Catarina Amorim & José Luis Aparicio Herguedas....................................................
15.
A PEDAGOGICAL INTERACTIVE PLATFORM FOR THE STUDY OF COMPOSITE
PLATES .................................................................................................................................................. 287
Ana Filipa Mota & Amélia Loja ................................................................................................................
16.
DESIGN THINKING E METODOLOGIAS CRIATIVAS NO ENSINO SUPERIOR.
ITINERÁRIO PEDAGÓGICO E INVESTIGATIVO COM PARTIDA NA SOCIOLOGIA DA
INFÂNCIA .............................................................................................................................................. 303
Rosalina Pisco Costa, Beatriz Roque & Vanessa Carreira .........................................................................
17.
O ENSINO EFETIVO DA EMPATIA NAS ESCOLAS MÉDICAS: UMA REVISÃO
SISTEMÁTICA DA LITERATURA .................................................................................................... 325
Carla Sousa & Paulo Vitória ......................................................................................................................
18.
FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: ELOS ENTRE A DIMENSÃO
PEDAGÓGICA E INCLUSÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR . 351
Lisiê Marlene da Silveira Melo Martins & Lúcia de Araújo Ramos Martins ............................................
19.
TEACHING THE GENERAL CASE IN ECONOMICS WHAT HAVE WE LEARNED AT
THE ECONOMIC DECISION ANALYSIS COURSE? .................................................................... 378
António Bento Caleiro ...............................................................................................................................
20.
CONFIGURAÇÕES DE RENOVAÇÃO PEDAGÓGICA-DIDÁTICA NO ENSINO
SUPERIOR: UMA PROPOSTA NO CURSO DE ARTES PLÁSTICAS E MULTIMÉDIA ......... 390
Ana Souto e Melo ......................................................................................................................................
21.
AFETOS, ERROS E APRENDIZAGENS – A TRANSDUÇÃO COMO PROCESSO DE
ENSINO DAS MATEMÁTICAS E DAS GRAMÁTICAS ................................................................. 409
Misleine Andrade Ferreira Peel, Luiz Roberto Peel Furtado de Oliveira & Antonio Cilírio da Silva
Neto ............................................................................................................................................................
22.
PRÁTICAS DE ESCRITA CRIATIVA NO ENSINO SUPERIOR: REDESCOBRINDO
CAMINHOS DA PEDAGOGIA ........................................................................................................... 429
Dulce Melão ...............................................................................................................................................
23.
A PEDAGOGIA CORPORIFICADA NA PROPOSTA DAS TERNAS: ENSINAGEM
SOBRE O CORPO SENSÍVEL E POÉTICO NAS ARTES DA CENA ........................................... 453
Renata Bittencourt Meira & Túlio Guimarães da Cunha ...........................................................................
24.
EDUCAÇÃO FINANCEIRA COMO CÓDIGO DO CAPITAL INTELECTUAL NO
ENSINO MÉDIO .................................................................................................................................... 476
Cássia do Carmo Pires Fernandes, João Coelho de Alvarenga e Melo , Ana Flávia Mayrink, Edmar
Jesus Pena de Souza, Igor de Assis Basílio Corrêa & Sibele Leandra Pena Silva .....................................
25.
SOBREVIVÊNCIA ACADÊMICA: SOCIALIZAÇÃO E EVASÃO ESTUDANTIL NO
ENSINO SUPERIOR ............................................................................................................................. 490
Adir Luiz Ferreira ......................................................................................................................................
4
5
INTRODUÇÃO
O ensino e a aprendizagem no contexto do ensino superior está a ser moldado por
fenómenos semelhantes em todo o mundo. Todos os sistemas assumem, de forma mais
ou menos explicita, o pressuposto da qualidade e todos lidam com um corpo estudantil
cada vez maior, mais exigente e mais diversificado e, pela premência resultante da
pandemia, pela procura de novas possibilidades tecnológicas embora conscientes dos
níveis desiguais de familiaridade dos estudantes neste domínio. Ao mesmo tempo
tornam-se mais exigentes os acordos com os governos em que o financiamento assume
relevância primordial e aumentam as expectativas dos estudantes e empregadores sobre
a adequação dos diplomados aos locais de trabalho, cada vez mais globais e susceptíveis
de rápida mutação.
O modelo de educação superior de Humbolt do início do século XIX, com tremenda
influência na cultura académica até aos dias actuais, já propunha que a universidade se
baseasse no ideal da integração entre investigação e ensino, num ambiente de idêntica
liberdade para professores e estudantes, que se traduzia na liberdade de criar o que
ensinar e na liberdade de se escolher o que aprender. Contudo, mesmo hoje, a realidade
no ensino superior ainda se mostra bastante restritiva para as invenções dos professores
e para a escolha dos estudantes. A limitação de liberdade de professores e
investigadores deveu-se especialmente à intensa especialização das áreas científicas,
nascida dos próprios avanços e resultados das pesquisas, que cresceram com uma
dependência incontornável de recursos externos, de governos e de empresas. Mas a
restrição de escolhas também foi aceite pelos próprios estudantes, em vista das
demandas combinadas de inovação e de padronização do mundo empresarial, com
espectativas de concorrência na sectorização de futuros empregos, o que contraindicava
conhecimentos fragmentados e formações abertas. Evidentemente que a pedagogia
universitária também se estabeleceu e se adaptou a essas limitações de ensino e
aprendizagem, o que, associado à natural tendência burocrática das instituições, acabou
concentrando muito mais poder académico e científico na investigação, em detrimento
do ensino. No mundo global contemporâneo, destaca-se a importância vital de
percebermos que a universidade se transformou em multiversidade, com a expansão dos
campos científicos e tecnológicos do ensino superior baseada na diversidade e na
inclusão, impulsionada igualmente por interesses sociais e políticos urgentes, como são
a questão ambiental, a sustentabilidade económica e os desafios da convivência
democrática e da desigualdade social.
Como as duas faces do deus Janus, da mitologia romana, representando o passado e o
futuro na mesma cabeça, a multidiversidade caminha para o futuro sem abandonar a
face do antigo. Há outras faces na figura universitária de Janus: a imagem radical que a
sociedade tem da universidade, enquanto, ao contrário, o ambiente corporativo do
ensino superior continua basicamente conservador. Apesar disso, mais do que nunca, a
educação e a pesquisa académica estão no centro da inovação científica, tecnológica e
social. Mesmo assim, como estudo subestimado e necessidade secundária, mesmo que
se reconheça sua importância, a pedagogia universitária permanece na política dos
estabelecimentos e na prática como inovação adiada. Muitos professores,
investigadores, administradores e estudantes precisam ser convencidos dessa mudança
profunda na ordem social e pedagógica cotidiana da educação superior. Como
6
geralmente acontece, quando a maioria desses públicos estiver de acordo sobre essa
necessidade, já será hora de passar para a discussão de outra coisa. Um exemplo é a
inclusão no ensino superior de grupos sociais e étnicos, tradicionalmente
marginalizados: depois de políticas de inclusão, com menor ou maior sucesso, agora é
preciso pensar e desenvolver formas para que tais estudantes se mantenham e concluam
bem as suas formações. Essa seria uma orientação crucial para as pesquisas e as
produções de uma pedagogia universitária crítica e inovadora.
A componente de investigação e produção científica assumiu nos últimos tempos o
papel principal no contexto universitário deixando na penumbra a dimensão
fundamental do ensino e da aprendizagem, em particular, a sua vertente pedagógica.
Assumimos que a reflexão em torno da pedagogia universitária continua a não ser uma
prática corrente no meio universitário apesar da Reforma de Bolonha, dos desafios
resultantes da massificação de todos os ciclos de estudo e do considerável
desenvolvimento tecnológico. A necessidade de se pensar a pedagogia universitária, em
que a aprendizagem pelo estudante assume a centralidade é, por certo, partilhada por
muitos professores universitários, independentemente da sua disciplina ou área
científica. Contudo, no campo da pesquisa sobre aprendizagem e ensino no ensino
superior, na perspectiva de estudantes e professores, há muito a ser esclarecido. Esta
obra pretende assim abrir um espaço de reflexão e partilha no âmbito da pedagogia
universitária, incluindo as contribuições críticas da psicologia, da sociologia e outras
áreas científicas numa perspectiva multidisciplinar sobre a pertinência de se caminhar
para a construção de uma maior ‘profissionalidade’ docente e de se ampliar a
compreensão do papel dos estudantes em contextos de educação superior.
Para isso, este livro reúne um conjunto de vozes plurais em diálogo entre si,
compartilhando experiências e preocupações comuns em torno do eixo comum da
paideia, uma ciência e um ofício que hoje adquirem maior relevância e novos
significados, à medida que as sociedades do conhecimento que caracterizam o século
XXI exigem e incentivam a aprendizagem contínua ao longo da vida. Nossas sociedades
avançadas educam e aprendem ao mesmo tempo, tornando-se sociedades educadoras
que não só estimulam políticas e práticas educacionais a curto prazo, mas também
antecipam cenários futuros, como mostrado no relatório Aprender a Transformar, no
qual a UNESCO está trabalhando para projetar o futuro da educação. A tarefa de educar
e ser educado torna as instituições de ensino superior actores relevantes para a reflexão
e a acção educacional. Isto foi assumido quando foi apontado que a principal missão das
universidades era ensinar, juntamente com a investigação e extensão. Este volume
enfoca essa primeira missão, oferecendo narrativas alternativas que contribuem para
renovar uma rica tradição pedagógica que encontra sua origem nos momentos
fundadores do pensamento humano.
Intituladas Faces do Ensinar e Aprender no Ensino Superior, estas páginas reúnem
vinte e cinco textos distribuídos em duas partes diferentes. A primeira parte -Educação
Superior, contextos educativos e perspectivas pedagógicas- apresenta onze capítulos
dedicados a questões teóricas, pesquisas, experiências pedagógicas e reflexões
educativas de caráter moral e normativo de grande interesse do ponto de vista
interdisciplinar. A segunda parte - intitulada Sentidos pedagógicos e práticas
educativas- organiza o restante dos catorze capítulos, que são dedicados a apresentar
7
casos específicos referentes a práticas pedagógicas muito diversas (modos de fazer) e
inovações relevantes que, sem dúvida, representam avanços significativos em termos de
ensino e aprendizagem no campo do ensino superior. Se a primeira e a segunda partes
revelam algo, é a capacidade crítica e criativa da pedagogia, que atravessa fronteiras de
conhecimento e constrói pontes entre diferentes conhecimentos e pontos de vista. Por
outro lado, o amplo repertório de reflexões e propostas nos compromete a continuar
prestando atenção e reavaliando a atividade docente diária em nossas universidades,
superando esta dicotomia e esta hierarquia artificial entre pesquisa e ensino, que
sobrestima a primeira à custa da subestimação da segunda. Pois não pode haver um bom
ensino se não for baseado em uma tarefa contínua de reflexão e pesquisa, assim como
não pode haver uma boa pesquisa se não for acompanhado de uma tarefa pedagógica
para sua transferência e aplicação.
Mais de cinquenta pesquisadores estão envolvidos neste trabalho coletivo, mais de trinta
dos quais são autores femininos, mostrando que as ciências educacionais continuam a
dar passos firmes em termos de igualdade. Como em muitos outros casos, a pandemia
global que nos afetou desde março de 2020 alterou nossas agendas e atrasou esta
publicação, embora também tenha servido para confirmar nossa resiliência e vontade de
responder aos nossos compromissos com a comunidade científica e educacional,
superando os obstáculos da "distância social". A este respeito, vale a pena notar também
que as contribuições deste livro vêm de académicos que realizam as suas atividades de
ensino e investigação em universidades em Portugal, Brasil, Paraguai, França, Grécia,
Reino Unido e Espanha. A confluência de sete países de ambos os lados do Atlântico
reflete o fato de que a produção de conhecimento é realizada de forma cada vez mais
intensa e dinâmica num contexto de colaboração internacional e através de amplas redes
científicas que compartilham interesses e objetivos comuns. São estas redes que
facilitam uma rica conversa que se baseia em diferentes idiomas (neste caso, português,
inglês, francês e espanhol) e inspira o propósito comum de melhorar os assuntos e as
sociedades através da educação. A partir daqui, convidamos os leitores a se juntarem a
nós nesta tarefa.
Este livro não teria sido possível sem a resposta positiva à chamada aberta à
participação. Por esta razão, nosso primeiro agradecimento vai para todos aqueles que
colaboraram nestas páginas com seus textos. Gostaríamos de fazer uma menção especial
de agradecimento a Fátima Leal, que também assina um dos capítulos do livro, por sua
atenta e rigorosa organização do manuscrito. E finalmente, prestamos uma merecida
homenagem em memória de nosso querido amigo e professor Moisés Sobrinho, que
desde o início incentivou e apoiou este projeto, e que infelizmente faleceu em março,
enquanto estas páginas estavam a ser compiladas. Embora o seu nome não apareça nos
textos aqui colectados, o seu ensino está muito presente aqui e continuará a estar
presente no futuro.
Elisa Chaleta, José Beltrán, Adir Ferreira
Évora, Valencia, Natal, setembro 2021
8
INTRODUCCIÓN
La enseñanza y el aprendizaje en el contexto de la educación superior están siendo
moldeados por fenómenos similares en todo el mundo. Todos los sistemas asumen, de
forma más o menos explícita, la asunción de la calidad y todos se enfrentan a un
alumnado cada vez más numeroso, más exigente y más diverso y, debido a la urgencia
derivada de la pandemia, a la búsqueda de nuevas posibilidades tecnológicas siendo
conscientes de los desiguales niveles de familiaridad de los alumnos en este campo. Al
mismo tiempo, los acuerdos con los gobiernos son cada vez más exigentes, ya que la
financiación es primordial, y aumentan las expectativas de los estudiantes y los
empleadores sobre la idoneidad de los titulados para unos puestos de trabajo cada vez
más globales y susceptibles de cambios rápidos.
El modelo de educación superior de Humbolt a principios del siglo XIX, pero con
enorme influencia en la cultura académica hasta nuestros días, ya proponía que la
universidad debía basarse en el ideal de integración entre la investigación y la
enseñanza, en un entorno de igual libertad para profesores y alumnos, lo que se traducía
en libertad para crear lo que se enseña y libertad para elegir lo que se aprende. Sin
embargo, aún hoy, la realidad de la enseñanza superior sigue siendo bastante restrictiva
para las invenciones del profesorado y la elección de los alumnos. La limitación de la
libertad de los docentes e investigadores se debió especialmente a la intensa
especialización de las áreas científicas, surgida de los propios avances y resultados de la
investigación, que creció con una inevitable dependencia de los recursos externos,
gobiernos y empresas. Pero la restricción de las opciones también fue aceptada por los
propios estudiantes, en vista de las exigencias combinadas de innovación y
estandarización del mundo empresarial, con las expectativas de competencia en la
sectorización de los futuros puestos de trabajo, que contrarrestan el conocimiento
fragmentado y la formación abierta. Evidentemente, la pedagogía universitaria también
se ajustó y adaptó a estas limitaciones de enseñanza y aprendizaje, lo que, unido a la
natural tendencia burocrática de las instituciones, acabó concentrando mucho más poder
académico y científico en el personal docente e investigador, en detrimento de la
enseñanza. En el mundo global contemporáneo, es de vital importancia darse cuenta de
que la universidad se ha transformado en una multiversidad, con la expansión de los
campos científicos y tecnológicos de la educación superior que se lleva a cabo con un
énfasis en la diversidad y la inclusión, impulsada igualmente por intereses sociales y
políticos urgentes, como la cuestión ambiental, la sostenibilidad económica y los
desafíos de la convivencia democrática y la desigualdad social.
Como las dos caras del dios Jano, de la mitología romana, que representan el pasado y
el futuro en una misma cabeza, la multiversidad camina hacia el futuro sin abandonar la
cara de lo antiguo. Hay otras caras en la figura universitaria de Jano: la imagen radical
que la sociedad tiene de la universidad, mientras que, por el contrario, el entorno
corporativo de la enseñanza superior sigue siendo básicamente conservador. Sin
embargo, más que nunca, la educación y la investigación académica están en el centro
de la innovación científica, tecnológica y social. Aun así, como estudio subestimado y
necesidad secundaria, aunque se reconozca su importancia, la pedagogía universitaria
permanece en la política del centro y en la práctica como una innovación pospuesta. Es
necesario convencer a muchos profesores, investigadores, administradores y estudiantes
9
de este profundo cambio en el orden social y pedagógico cotidiano de la enseñanza
superior. Como suele ocurrir, cuando la mayoría de estos públicos esté de acuerdo con
esta necesidad, ya será el momento de pasar a discutir otra cosa. Un ejemplo es la
inclusión en la enseñanza superior de grupos sociales y étnicos tradicionalmente
marginados: tras las políticas de inclusión, con menor o mayor éxito, ahora es necesario
pensar y desarrollar formas para que esos estudiantes mantengan y completen bien su
formación. Esta sería una orientación crucial para la investigación y producción de una
pedagogía universitaria crítica e innovadora.
En los últimos tiempos, el componente de investigación y producción científica ha
asumido el papel principal en el contexto universitario, dejando en la sombra la
dimensión fundamental de la enseñanza y el aprendizaje, especialmente su aspecto
pedagógico. Partimos de la base de que la reflexión en torno a la pedagogía universitaria
aún no es una práctica actual en el ámbito universitario a pesar de la Reforma de
Bolonia, los retos derivados de la masificación de todos los ciclos de estudio y el
considerable desarrollo tecnológico. La necesidad de pensar en una pedagogía
universitaria en la que el aprendizaje de los alumnos sea el centro de atención es sin
duda compartida por muchos profesores universitarios, independientemente de su
disciplina o área científica. Sin embargo, en el campo de la investigación sobre el
aprendizaje y la enseñanza en la educación superior, desde la perspectiva de los
estudiantes y los profesores, hay mucho que indagar. Así, este trabajo pretende abrir un
espacio de reflexión y puesta en común dentro de la pedagogía universitaria, incluyendo
aportaciones críticas desde la psicología, la sociología y otras áreas científicas en una
perspectiva multidisciplinar con el propósito de avanzar hacia la construcción de una
mayor "profesionalidad" docente y ampliar la comprensión del papel del estudiantado
en los contextos de educación superior.
Con esa finalidad, este libro reúne un conjunto de voces plurales que dialogan entre sí
compartiendo experiencias e inquietudes comunes en torno al eje común de la paideia,
una ciencia y un oficio que en la actualidad adquieren mayor relevancia y nuevos
significados, pues las sociedades de conocimiento que caracterizan el siglo XXI exigen
y fomentan un aprendizaje continuo a lo largo de la vida. Nuestras sociedades
avanzadas educan y aprenden al mismo tiempo, convirtiéndose en sociedades
educadoras que no solo estimulan políticas y prácticas educativas en el corto plazo, sino
que anticipan escenarios de futuro, como muestra el informe Aprender a transformarse,
en el que trabaja la UNESCO para diseñar los futuros de la educación. La tarea de
educar y de educarse hace de las instituciones de educación superior actores relevantes
para la reflexión y la acción educativa. Así se asumió cuando se señaló que la principal
misión de las universidades era la docencia, junto con la investigación y extensión. Este
volumen pone el foco de atención preferente a esa primera misión, ofreciendo narrativas
alternativas que contribuyen a renovar una rica tradición pedagógica que encuentra sus
orígenes en los momentos fundacionales del pensamiento humano.
Con el título Formas de enseñar y aprender en Educación Superior, estas páginas
reúnen veinticinco textos distribuidos en dos partes diferentes. En la primera de ellas –
Educación Superior, contextos educativos y perspectivas pedagógicas– se presentan
once capítulos dedicados a cuestiones teóricas, a investigaciones desarrolladas, a
experiencias pedagógicas y a reflexiones educativas de orden moral y normativo de un
10
enorme interés desde un punto de vista interdisciplinar. La segunda parte –titulada
Sentidos pedagógicos y prácticas educativas– ordena el resto de los catorce capítulos,
dedicados a presentar casos concretos referidos a prácticas (maneras de hacer)
pedagógicas muy diversas y a innovaciones relevantes que, sin duda, suponen avances
significativos en términos de enseñanza y aprendizaje en el ámbito de la educación
superior. Si algo revela tanto la primera como la segunda parte es la capacidad crítica y
creativa de la pedagogía, que cruza fronteras del conocimiento y tiende puentes entre
saberes y puntos de vista diferentes. Por otra parte, el amplio repertorio de reflexiones y
propuestas nos compromete a seguir prestando atención y revalorizando la actividad
docente cotidiana en nuestras universidades, superando esa dicotomía y esa
jerarquización artificial entre investigación y docencia, que sobreestima a la primera a
costa de subestimar a la segunda. Pues no puede haber buena docencia, buena
enseñanza, si no está fundamentada en una tarea continua de reflexión e investigación;
de la misma manera que no puede haber buena investigación si esta no va acompañada
de una tarea pedagógica para su transferencia y aplicación.
En esta obra colectiva participan más de cincuenta investigadores, de los que más de
trienta son autoras, mostrando que las ciencias de la educación siguen dando pasos
firmes en términos de igualdad. Como en muchos otros casos, la pandemia mundial que
nos ha afectado desde marzo de 2020 ha alterado nuestras agendas y ha retrasado esta
publicación, si bien también ha servido para confirmar nuestra capacidad de resiliencia
y la voluntad de dar respuesta a nuestros compromisos con la comunidad científica y
educativa, superando los obstáculos de la “distancia social”. En este sentido, cabe
destacar también que las aportaciones de este libro proceden de académicos que
desempeñan su actividad docente e investigadora en universidades de Portugal, Brasil,
Paraguay, Francia, Grecia, Reino Unido y España. La confluencia de siete países a
ambos lados del Atlántico refleja que la producción de conocimiento se lleva a cabo de
manera cada vez más intensa y dinámica en un contexto de colaboración internacional y
a través de amplias redes científicas que comparten intereses y obejtivos comunes. Estas
redes son las que facilitan una rica conversación que se nutre de idiomas diferentes (en
este caso, portugués, inglés, francés y español) e inspira el propósito común de la
mejora de los sujetos y las sociedades a través de la educación. Desde aquí, invitamos a
lectoras y lectores a sumarse a esta tarea.
Este libro no hubiera sido posible sin la respuesta positiva a la llamada abierta que
lanzamos para participar en el mismo. Por eso, nuestro primer agradecimiento se dirige
a todos cuantos han colaborado en estas páginas con sus textos. Queremos hacer una
mención especial de agradecimiento a Fátima Leal, que también firma uno de los
capítulos del libro, por su atenta y rigurosa revisión de todo el manuscrito. Y finalmente
rendimos un merecido tributo en memoria de nuestro apreciado amigo y maestro
Moisés Sobrinho, que desde el principio alentó y apoyó este proyecto, y que
lamentablemente falleció en el mes de marzo mientras se compilaban estas páginas. Si
bien su nombre no aparece en los textos que aquí se reúnen, su magisterio está bien
presente aquí y lo seguirá estando en el futuro.
Elisa Chaleta, José Beltrán, Adir Ferreira
Évora, Valencia, Natal, septiembre 2021
11
12
PARTE I
EDUCAÇÃO SUPERIOR, CONTEXTOS EDUCATIVOS E
PERSPECTIVAS PEDAGÓGICAS
1. THINKING ABOUT UNIVERSITY TEACHING AND LEARNING:
CONTRIBUTIONS FROM EDUCATIONAL RESEARCH
Noel Entwistle 1
Summary
The main purposes of research into university teaching and learning can be seen as both
academic and practical. Academic research has been exploring ways of describing and
explaining how students go about their studying and what affects the nature of the learning
that takes place. The practical value of the research is to help teachers and students to carry
out their work as effectively as possible. For teachers, research can show the influences of
teaching and the whole learning environment on the ways that students go about learning,
while for students, it can help them to understand the consequences of different approaches
to learning and studying. This paper describes a range of studies that have explored our
understanding of teaching and learning and provided concepts which provide clear and
relevant descriptions for teachers. The researchers have found interrelationships among
these concepts and sometimes provided illustrative heuristic models of those
interconnections. This research cannot, however, provide specific implications for teaching,
as these depend crucially on the nature of the discipline. But certain concepts have proved to
be ‘pedagogically fertile’, through their strong impact on how academics think about
teaching and learning. Several of the illustrative studies have been drawn from the author’s
own work, but these are supported by research carried out by other researchers in the same
field.
Key words: Student learning; Educational research; Pedagogical fertility; Contextualised
concepts; Teaching-learning environments.
Noel Entwistle is Professor Emeritus of Education at the University of Edinburgh and was previously its Bell
Professor of Education (1978-2005) (noel.entwistle@ed.ac.uk). Before that, he was a Professor of Educational
Research at Lancaster University (1971-1978). He is a Fellow of the British Psychological Society, the Scottish
Council for Educational Research, and the Society for Research into Higher Education. He has honorary
doctorates from the Universities of Gothenburg and Turku and edited the British Journal of Educational
Psychology and the international journal Higher Education. He was President of the European Association for
Research on Learning and Instruction and received an Oeuvre Award from that organisation. He also served on a
UK research funding body and on an international panel evaluating Swedish educational research. Among his
most recent publications are two books - Teaching for Understanding at University (Palgrave Macmillan, 2009)
and Student Learning and Academic Understanding (Academic Press, 2018).
14
Introduction
The early research into student learning initially used psychological concepts to investigate
how students learn, but the use of technical language often created terminological and
methodological barriers for university teachers in other disciplines. Once it was recognised
that it was possible to define concepts specifically to describe student learning in its
everyday context, the value of the findings became more evident. Research then led to
concepts and theories that eventually produced generalised descriptions of the ways in
which the whole teaching and learning environment affects how students go about their
learning. And these ideas have had an increasing influence on the teaching process to
provide experiences that encourage students to think critically about their own learning.
This paper describes how researchers have developed some of the most influential
constructs and how these have affected the ways of thinking of increasing numbers of
university teachers. The research has used inventories (scored questionnaires) and individual
interviews with students and teachers, with some of the findings being illustrated through
heuristic models that encourage teachers to explore the value and implications of the
research findings. Individual interviews with students have enabled researchers to
understand learning and teaching from the students’ own perspectives, rather than in terms
of pre-existing psychological theories, while inventory studies have established firm
evidence of the relationships that exist among the concepts describing different forms of
teaching and students’ ways of learning and studying. Examples of different research
methodologies and findings from a succession of studies will be used to track the
development of this research area and its influences on the ways of thinking and practising
developed by university teachers. Certain concepts proved to have a special quality of being
‘pedagogically fertile’, through creating a strong impact on how academics, across subject
areas, think about their teaching and their students’ learning (Entwistle, 1994).
The research focuses mainly on the general relationships among aspects of teaching and the
quality of student learning, but university teachers are more interested in the very specific
relationships existing within their discipline and their own specialism. Indeed, it has become
clear that there is an inner logic of the subject that determines the types of teaching
considered appropriate in contrasting disciplines, an important feature that researchers have
been rather slow to recognize in their research designs and methodologies.
15
Early research into student learning
Much of the research carried out in this field was heavily influenced by concepts introduced
by American educational psychologists, such as Bruner (1960) and Ausubel (1968). These
theorists broke away from the dominant tradition of Skinner (1954) and others who had
used experiments with animals to provide the basis of their conditioning theories of
learning. They developed a new cognitive psychology focusing on human learning. Bruner,
in particular, stressed the necessity to see such learning as uniquely concerned with
developing understanding.
It is an epistemological mystery why traditional education has so often emphasized extensiveness and
coverage over intensiveness and depth… Memorizing was usually perceived by [students] as one of the
high priority tasks, but rarely did [they] sense an emphasis upon ratiocination, with a view toward
redefining what had been encountered, reshaping it, reordering it. … To instil such attitudes by teaching
requires … a sense of excitement about discovery - discovery of regularities of previously unrecognized
relations and similarities between ideas, with a resulting sense of self-confidence in one's abilities…
The cultivation of a sense of interconnectedness is surely the heart of the matter. (Bruner, 1974, pp.
447, 449; italics added)
Ausubel (1978) described three distinct forms of learning to be found in education meaningful verbal learning; meaningful reception learning; and rote learning. He suggested
that reception learning was generally found in schools, along with rote learning. Meaningful
verbal learning, leading towards understanding, was largely absent but was the one most
likely to persist in the memory and so be useful later on.
It was this thinking that guided the early researchers working on student learning in
universities, including myself, although my own ideas were also influenced by educational
theorists. Bantock (1961), for example, had long argued that, if educational research was to
influence classroom practice, it would have to involve
an imaginative projection into what the phenomena concerned mean, a meaning which can only come
from inside the activity to be studied... [It depends on] a sympathetic understanding of our fellow
beings, on finding meaning in their activities, on grasping intuitively how they feel, what their plans
are, what they are driving at, ... the feel of the 'whole person alive'. (pp. 168, 170, 177).
Research into students’ own experiences of studying
The research into student learning in the late 1960s was driven by experimental
methodologies and statistical analyses, and drew on general psychological concepts such
16
as ability, personality and motivation. The perspective adopted was thus more likely to
be that of the researcher and lecturer, rather than that of the subjects of their experiments.
But this view began to change when a few researchers were ready to go against the
methodological grain and use individual interviews with students. At the time, it was a
risky choice, as main-stream psychological journals acted as guardians of the quantitative
tradition, a tendency which can still be seen in current journals to some extent.
At the forefront of the qualitative research was a study at Harvard. Perry (1970) reported
an analysis of follow-up interviews with students, conducted at the start of each year of
study. His analysis showed how students’ conceptions of knowledge changed from
dualism – knowledge based simply on the dichotomy of right and wrong answers –
towards a broader view of academic knowledge, with sense of relativism in the thinking.
He found that some students developed a commitment to this relativistic reasoning, while
others reacted to it by retreating to their previous dualistic conceptions, perhaps finding
the uncertainty implied by relativism too threatening.
A subsequent interview study, by Säljö (1979) in Gothenburg, described the range of
conceptions emerging when students were asked “What do you mean by ‘learning’?” His
analysis produced five distinguishable categories of conceptions of learning, which
ranged from simply memorising details to understanding ideas and ultimately
reconceptualising - seeing things in a fundamentally different way.
Later on, when describing these two sets of findings, I saw them as parallel descriptions
of mental development among students that could be seen as an expanding awareness
through a broader, integrative conception of both knowledge and learning. This idea was
illustrated through a heuristic model (Figure 1) designed to encourage thinking about
these two facets of student learning (Entwistle, 2007). The idea of expanding awareness
also includes the idea that each category builds on and includes the previous one, so, for
example, students seeing ‘learning’ as requiring ‘understanding’ still can use
‘memorising’ and ‘applying knowledge’ and are also capable of judging which approach
to learning is most appropriate to the specific task they face.
17
Figure 1 Categories comparing students’ conceptions of knowledge and learning
(Entwistle, 2007, p.129)
These ideas described the students’ own experiences within a university education
system, and so could be seen as contextualised concepts. Educational theories are
generally developed within a specific context, and so may have only limited applicability
outside that particular context (Kelly, 1955). For this to have a real impact of teachers’
thinking, however, such concepts also need the quality of pedagogical fertility
(Entwistle, 1994). Such concepts have to be readily understood by teachers across a
range of disciplines and also capture the imagination of those teachers, encouraging them
to explore new ways of thinking about teaching and learning in their own subject area.
One of the most influential ideas about student learning came from Marton (1975) and
his colleagues in Gothenburg, who asked students to read a general academic article and
to be ready to answer questions about the content afterwards. His analysis indicated that
students had interpreted the instructions in very different ways - some had focused on the
likely questions while they were reading, while others were concentrating on
understanding the author’s meaning for themselves. There was a surprisingly clear
distinction among the students’ descriptions of their ways of reading, which led to the
influential idea of ‘deep’ and ‘surface’ approaches to learning. The analyses showed that
the nature of the learning processes used were almost inevitable consequences of the very
different intentions which drew in either meaningful learning or reproductive learning.
18
Those forms of learning generally led to the learning outcomes to be expected – either
understanding the meaning of the article and being able to explain the ideas in it or
focusing on specific aspects of the material or reproducing fragments of knowledge with
little grasp of their meaning.
This concept was one of the first that was demonstrably pedagogically fertile, as it was
taken up by academics who came to realise the influence of their teaching on students’
approaches to learning. One striking example of this came from a research project in
Australia in which teachers from an anatomy department recognised that their students
were adopting mainly surface approaches to their learning – concentrating on being able
to remember facts. The department set about creating a curriculum that would stress the
importance of understanding the main ideas in anatomy, rather than the facts to be
learned. The result of the department’s change in curriculum was sufficiently clear to
ensure that it was developed further. The structure of the curriculum they developed will
be described, in an updated and generalised form at the end of this article, so that
concepts introduced subsequently could be included.
Marton’s concept was fertile not just in terms of its impact on university teachers, but it
also encouraged other researchers to explore his ideas and seek ways of developing them
further. In Lancaster, for example, my research group built on the ideas of differing
approaches to learning by identifying these approaches in much larger groups of students
and across a range of subject areas. This was done by designing a new inventory. The
first step involved interviewing students to find whether deep and surface approaches
applied widely and to a variety of academic tasks: which they did. The inventory also had
to take account of the influence of the assessment tasks students faced, which led to the
description of an approach to studying that indicated the extent to which students were
strategic in their ways of studying, organising their studying systematically and putting
consistent effort into their working practices. Items were written to encapsulate the
defining features of the three approaches by using the students’ own language as they
described their study activities. The outcome was an Approaches to Studying Inventory
(Entwistle & Ramsden, 1983), which provided scores on the three approaches and also
sub-scores on different aspects of them. A revised version of this inventory (RASI - Tait
et al, 1998) has been used widely in many studies (Entwistle, 2018), including some in
the University of Evora.
Figure 2 illustrates the way the items describing a deep approach to learning were found
19
to relate to each sub-scale and how the sub-scales acted together to create scores on the
deep approach itself. The numerical values indicate the differing strengths of the items
in defining each concept in the sub-scales and the inter-relationships among individual
sub-scale scores. It can be seen that all but one item related just to the scale they were
intended to define, and that item was phrased in a way that could be meaningful, in
different ways, for students having differing study profiles - ‘relating ideas’ or
‘monitoring effectiveness’.
Figure 2 Confirmatory factor analysis of the RASI deep approach items
(Analysis carried out by Professor Elisa Chaleta, University of Evora)
SMEAN(D_SM4)
,55
,52
Seeking Meaning
SMEAN(D_SM17)
,53
,52
SMEAN(D_SM30)
SMEAN(D_SM43)
,92
,60
,67
,99
Relating Ideas
,78
SMEAN(D_RI11)
,54
,80
SMEAN(D_RI21)
SMEAN(D_RI33)
SMEAN(D_RI46)
1,00
,91
,57
,50
,85
Use of Evidence
,62
,59
,81
,81
-,54
,50
,63
,94
SMEAN(D_II13)
,59
,60
Interest in Ideas
SMEAN(D_UE9)
SMEAN(D_UE23)
SMEAN(D_UE36)
SMEAN(D_UE49)
SMEAN(D_II26)
SMEAN(D_II39)
SMEAN(D_II52)
,68
Monitoring Effectiveness
SMEAN(ST_ME7)
,55
,38
,57
,52
SMEAN(ST_ME20)
SMEAN(ST_ME34)
SMEAN(ST_ME47)
Table 1, below, provides additional evidence of the same three-factor structure from a
contrasting educational system. British university students completed the ASSIST inventory,
which contains the same scales as RASI but also includes scales measuring ‘conceptions of
learning’ and ‘preferences for teaching’. It shows how all the approaches sub-scales fitted
into the expected three factors, with the additional elements fitting in with the overall
pattern of relationships. An exception, however, was ‘monitoring effectiveness’ that loaded
on both deep and strategic factors, although later analysis indicated that there were two
rather different sets of items, one indicating ‘monitoring understanding’ and the other
‘monitoring studying’. Similar research in several countries produced equivalent patterns
and indicated that the best predictor of academic performance, when using this inventory,
20
was the combined score made up of high scores on deep and strategic scales and low scores
on the surface approach (Entwistle, 2018).
Table 1 Factor structure of the ASSIST instrument
(from Tait, Entwistle & McCune, 1998; N=604))
Factor
I
II
III
Deep
Strategic
Surface
Conceptions of learning
Learning as reproducing
(.20)
Learning as transforming
(.13)
.41
Deep approach
Seeking meaning
.72
Relating ideas
.79
Use of evidence
.77
Interest in ideas
.65
Monitoring effectiveness
.45
.43
Strategic approach
Organised studying
.76
Time management
.87
Achieving
.73
Surface approach
Lack of purpose
.42
Unrelated memorising
.77
Syllabus boundness
.42
Fear of Failure
.73
Preferences for teaching
Encourages understanding
.61
Transmits information
.35
Correlations between factors
Deep
Deep
-
Surface
- 0.20
Strategic
Surface
Strategic
0.35
- 0.22
-
From the interviews mentioned earlier, it became clear that an additional aspect of
student learning needed to be explored, namely the students’ individual reactions to the
teaching and assessment they had experienced. These reactions were investigated by
developing a Course Perceptions Questionnaire (Entwistle & Ramsden, 1983), with a
21
revised version developed later by Ramsden (1991) - Course Experience Questionnaire
(CEQ).
Just as Marton’s idea of ‘approaches to learning’ could be seen as being ‘pedagogically
fertile’, so too was the recognition that students had differing perceptions of teaching. Of
course, the actual teaching does directly affect, in general terms, how groups of students
carry out their studying, but it is the individual perception of that teaching which influences
the student’s own specific approaches to learning and studying (Trigwell & Prosser, 2020).
It has also been shown that the general causal relationships between study approaches and
perceptions of teaching are bi-directional; students who adopt deep approaches are likely to
rate their experiences of teaching highly, and those experiencing teaching intended to
promote understanding are more likely to have adopted deep approaches in their studying
(Richardson, 2006).
It is useful for teachers to be aware of these relationships and their implications. Inventory
research can offer a way of checking on students’ reactions to their courses based on wellestablished concepts and may also provoke discussion about the issues raised by the
findings for a specific subject area. Study strategy inventories can also be provided for
students to complete themselves and obtain indications of their levels on the various ways of
learning and studying through on-line computer scoring.
Experiences of personal academic understanding
The research into student learning is intended to provide concepts that academics can use in
planning their teaching, and as Marton argued:
It is only when we have a fair understanding of what learners are expected to learn, what they actually
learn in those situations, and why they learn something in one situation but not in another, that
pedagogy becomes a reasonably rational set of human activities. (Marton, 2007, p. 22)
Although the importance of deep approaches has been readily accepted by many university
teachers, the ways in which students actually go about developing their understanding is
unlikely to be clear to academics. Research in Edinburgh explored the nature of students’
academic understanding, using open interviewing techniques, as in phenomenography
(Marton, 1981), designed to encourage students to explore their experiences of learning in
progressively deeper ways (Entwistle, 2018). The outcome of this study was a set of
22
categories which indicated different ways in which the nature of ‘understanding’ had been
experienced.
Feelings of satisfaction
Understanding appears in many guises. It can often be a glow, a warm feeling acquired from reading pages
and pages of notes and text - “I see what you mean” rather than “what on earth is all this about?”
Meaning and significance
When you understand something, you are able to attach meaning and thus words become more than mere
facts; they become the key to something deeper and more significant, which involves appreciation of
meaning.
Coherence, connectedness and ‘provisional wholeness’
‘Understanding’ means the interconnection of lots of disparate things; the way it all hangs together - you can
make sense of it internally. You’re making lots of connections, which then make sense - it’s logical, ‘locked
in’ to a pattern, like jigsaw pieces and you can see the whole picture. But you feel you can add more and
more.
Irreversibility
If you understand, say, why ‘optimal foraging’ works, and what the idea is behind it... You can’t not
understand it afterwards: you can’t ‘de-understand’ it!
Confidence about explaining
‘Understanding’ means to be able to discuss a topic with someone in a logical way; be able to explain and
clarify your thoughts if the other is unsure of what you mean. To be able to put forward an argument, with a
conclusion that is satisfactory to yourself, as well as to others.
Flexibility in adapting and applying
‘Understanding’ involves knowing what an issue's about, being able to reorganise it in different ways,
manipulate it, form arguments out of it if need be, … and to apply this information in a different situation
than the one it was ‘learnt’ in originally.
(Entwistle, 2018, p. 113)
This research also established five different forms or levels of understanding:
•
Absorbing facts, details, and procedures, without consideration of structure
•
Accepting and using the logical structures provided in the lecture notes
•
Developing own summary structures from notes to answer exam questions
•
Developing structures to represent own understanding and control exam answers
•
Developing structures relating own understanding to the nature of the discipline (op. cit., p.116)
The emphasis on developing structures or frameworks for understanding (Entwistle, 1995), as
students were preparing for writing essays in course work or taking exams, was often linked
with the drawing of mind-maps. A good example of this was found among interviews with
students taking a graduate education course. They were asked to write an essay of “What
makes good teaching”, using a set of readings provided (Entwistle et al., 2000). One of the
23
students explained in detail how she went about preparing to write her essay by developing a
‘mind map’ (see Figure 3), to help her find a meaningful structure. She identified a “false
dichotomy” between education seen as ‘inculcation’ – putting knowledge in, and education as
‘drawing out’ – encouraging independent thinking about ideas – ‘false’, because ‘good
teaching’ in her view depended on drawing ideas from the whole range she had identified. The
description of the process of developing her mind map, shown below Figure 2, provides a
good indication of how her understanding developed.
.
Figure 3 Mind-map developed to provide aa structure for an essay
(from Entwistle et al, 2000)
I do a rough map with just my own ideas and then I refine it… I know when I do a mind-map, I’m not always
concentrating on the map itself. I’ll write something down, and then sit back and think what I’ve written,
ideas going in and out. After the fast brain-storming map, which looked a complete mess, I did another one. I
took more time over that one, and I tried roughly to divide things up into different areas. I divided it up into
areas… It was still quite fluid, because there are so many things that cross over. It was just to create some
order in my own mind; I was thinking about it, and then thinking where I was putting the things on the map,
and sorting out ideas into where they should go, and trying to make it logical, bringing in the extracts as well,
and trying to place them. (Entwistle et al., 2000, p. 15-16)
24
Other descriptions of the processes of developing an understanding come from two separate
studies. Extracts from the transcripts provide useful insights into students’ ways of learning
and studying but could only be achieved using the form of open interviewing described
previously. In the extracts from the transcripts, the first student explains how she went about
studying neurology articles by developing a mind-maps prior to the final exams.
With these articles, it’s like making friends - reading and re-reading and going to different sources of
information. Patterns become familiar and they start to help you; helping you make sense of new things that
you haven’t met before… getting to see why this question is important while another one is not, or that this
theory is more likely than another. Then, you get a feeling for the author of each paper and for your lecturers
too, a sense of where they are coming from and why such and such is important for them. … I have to be able
to see the ideas in my visual space, ... according to how I know them, how I can picture them, and which ones
are closer to me or further away – that is what I mean by making friends with ideas and this also means getting
to ideas or data. … Then, in the end, I come to realise how everything is really related and I’m able to connect
everything together - but this cannot happen until much later and, when it comes, it is not as if I were looking
for it - it just happens! (Final-year student) (Hay, 2010, pp. 272-279).
The other student described how she had used her mind-map when taking zoology exams.
[In writing my answers], my mind-map keeps me going with the structure, in the sense that it is basically
visual - a pictorial representation of what I want the whole answer to have in it, and therefore stops me
wandering off track. … As I wrote, it was almost as though I could see [the ideas] all fitting into an overall
picture - you're developing what you know and playing it in a slightly different way to fit the question set.
Following the logic through, it pulls in pictures and facts, as it needs them. Each time I describe a particular
topic, it's likely to be different: well, you start with evolution, say, and suddenly you know where you're going
next; then you might have a choice to go in that direction, or that direction, and follow it through various
options it's offering. Hopefully, you'll make the right choice, and so this goes to this, goes to this - and you've
explained it to the level you've got to. Then, it says "OK, you can go on to talk about further criticisms in the
time you've got left". (Final-year student) (Entwistle, 2018, p.135)
These interview extracts came from two students who were able to explain their ways of
thinking exceptionally well. Their descriptions indicate how students in general might be
helped to develop their own academic ways of reasoning and understanding.
Drawing on his own phenomenographic research, Marton (2015) developed a variation theory
of learning which suggested that a thorough understanding came from being able to discern
the salience of critical features within the topic being studied, and also to recognize the
patterns of variation among them. These patterns then have to be brought together,
simultaneously, within an arena of focal awareness within the mind to reach a satisfying
academic understanding.
25
This process can be supported in teaching by pointing out such patterns within topics, but
university students also have to learn to discern for themselves the critical features of topics
and to explore the inter-play among those aspects as they build up their understanding of a
topic. They can be helped to do this by being introduced to the technique of developing their
own concept maps (more formal mind-maps) as class work, and then discussing those maps
with other students and the teacher. Teachers can also provide concept-maps of their own,
when introducing a new topic, for instance, drawing attention to critical features and their
interrelationships, and showing their own ways of thinking about the ideas (Entwistle, 2009).
Conceptions of university teaching
As we have seen, approaches to learning depend not just on the students’ past experiences and
the study skills previously developed, but also on their experiences of teaching. An early
contribution to ideas about teachers’ conceptions of teaching was made by Fox (1983), who
asked lecturers about their ideas about teaching. Four basic theories or conceptions emerged:
There is the transfer theory which treats knowledge as a commodity to be transferred from one vessel to
another. There is the shaping theory … moulding students to a predetermined pattern. Thirdly, there is
the travelling theory … where there are hills to be climbed for better viewpoints, with the teacher as …
an expert guide. Finally, there is the growing theory which focuses attention on the intellectual and
emotional development of the learner. (Fox, 1983, p. 151).
Subsequent phenomenographic interviews by Prosser and his colleagues (1994) identified two
sharply contrasting approaches to teaching, although it is recognized that academics often
adopt one or other approach with students at different levels and for specific topics.
Two qualitatively different approaches to teaching are used - a conceptual change/ student-focused approach
and an information transmission/teacher-focused approach. [In the first] the teacher provokes debate, …
[allows] time to question students’ ideas and develops a ‘conversation’ with students in teaching sessions,
including lectures. [In the other approach] the intention is the transmission of facts and skills, through the use
of well-planned teaching material, as it is assumed that the students will learn from the received material and
a good set of notes. (Trigwell & Prosser, 2020).
This distinction focuses on the cognitive dimension in teaching, but other researchers have
brought out affective dimensions. For example, Ballantyne and his colleagues (1997), asked
university teachers to explain what constituted ‘good teaching’ and found three main themes
running through their descriptions.
Recognizing the student perspective by pitching material in accessible language, combining humanistic
qualities with academic rigour; and showing relevance to students’ everyday experience and making links to
professional contexts.
26
Creating a learning ethos by teaching for learning and discussing what is involved and accepting that
learning can be difficult; and also talking to students about their emerging understanding and fostering generic
and lifelong skills.
Conveying feelings and arousing interest by showing enthusiasm for the subject; and planning teaching to
create and maintain student interest. (adapted from Ballantyne et al., 1997).
‘Good teaching’ depends on the teachers’ conceptions, but these inevitably change over time,
based on their experiences with students and on ideas drawn both from their colleagues and
the research literature. Such a progression can be seen as involving an expanding awareness
of the nature of teaching and learning, with corresponding changes in conceptions of teaching
and relationships with students (Entwistle & Walker, 2000). This progression can be
illustrated in a narrative account provided by a physics lecturer, explaining how his teaching
had developed.
My early teaching experiences were something of an act, in being the authoritative source of knowledge. The
learning outcome I sought, as a matter of traditional expectation, was students' knowledge of the curriculum
material. The approach to teaching was primarily a matter of presenting curriculum material in a factually
correct (and hopefully interesting) way, with ancillary activity designed to reinforce the intake of knowledge
and its retention. [Subsequently] I began, increasingly, to question the way I had been teaching, and to try to
focus more on encouraging students to reflect on their own learning. My lectures thus began to be less a
matter of delivering students the facts handed down from higher authority, and more a conversation designed
to stimulate their engagement. … Over time, I have developed a teaching approach which begins to satisfy,
simultaneously, a tacit demand for content, for understanding of content, and for relevance and applicability
of that content. … Within this multipli-inclusive approach, information is provided in logical order for those
who want it, but … for students who need to relate to other course content or to the world, there is [also] a
thread of conversation in making such links. (Entwistle & Walker, 2000, p. 348)
These descriptions of teaching are drawn mainly from experiences of lecturing, without
explicit recognition of other aspects of the whole teaching-learning environment, but this has
become a focus of more recent research. This approach is illustrated here through findings
from a four-year follow-up study, co-directed by Professor Dai Hounsell and me.
Designing supportive teaching-learning environments
In the Enhancing Teaching and Learning Project (ETL, 2005), researchers worked with both
university teachers and their students, using interviews and questionnaires to explore ways of
improving the educational experience of students. Two cohorts of students, in specific course
units, were drawn from four contrasting subject areas in eleven universities, with findings
from the first cohort used to suggest changes in teaching for the following cohort. Discussions
27
with course leaders were used to establish the content of the course unit and the rationale for
the teaching methods being used, while students completed questionnaires about their
approaches to studying, their experiences of teaching, and the knowledge and skills they
believed they had acquired. Groups of students also discussed with a researcher their
experiences of the teaching, explained any difficulties and suggested how the course might be
improved. The findings were discussed in detail with the course leaders of each unit, leading
to negotiations with them about possible enhancements in the teaching for the next intake of
students. The overall conclusions were reported widely through subject area associations for
Electronic Engineering, Biological Sciences, Economics and History (ETL project, 2005).
Describing teaching-learning environments
The focus of this study was on how the whole inner teaching-learning environment affected
student learning (‘Inner’ refers to those aspects of the teaching environment directly
experienced by the students). Such an environment is illustrated in Figure 4 (below) for a
department of electronic engineering, showing the various activities involved and their
function in supporting student learning. The wider environment is indicated through the
external and institutional influences shown outside the encircling ellipse. Current outlines of
teaching-learning environments might well look rather different from this, with a wider range
of provision now being available, such as on-line learning, blended learning, and other
technology-supported learning, but this type of diagram could be adapted appropriately.
28
Figure 4
A teaching-learning environment in electronic engineering
(from Entwistle, McCune & Hounsell (2003)
In considering the impact of teaching-learning environments in each of the selected course
units, the researchers developed or adapted additional concepts needed to describe the
effectiveness of teaching in relation to the experiences of students. By the end of the project,
it became clear that one of the main contributions of the project was to provide research-based
concepts which encouraged academics to explore new ways of thinking about their own
teaching, and the learning of their students, indicating that some had become pedagogically
fertile (Hounsell & Entwistle, 2005; McCune & Hounsell, 2005; Entwistle, 2018).
Threshold concepts and troublesome knowledge
Students find some concepts and theories particularly difficult to understand (Perkins, 2006),
and these are often ones that had been crucially important in developing the discipline. Meyer
and Land (2005) introduced the term threshold concepts to represent ideas and theories of this
kind, such as ‘evolution’ in biology and ‘energy’ in physics. Such concepts serve as ‘portals’
or ‘conceptual gateways’ within the structure of the discipline, and yet with meanings that
often elude students at first, due to their abstract nature.
Threshold concepts… focus [teachers’] attention on the relationship between big shifts in thinking in the
subject and transformative changes that learners have to experience in their thinking. These changes are
29
transformative in the sense that learners are not simply making connections between new learning and ideas
they have already acquired: in order to truly understand the new idea – if it is a threshold concept – they must
re-work [their] prior understanding. (Davies & Mangan, 2007: 721)
Further development in these ideas has come in many academic fields (Land et al., 2006),
thus demonstrating the pedagogical fertility of the concept. In biology, for example, Taylor
(2006) found that introducing the idea of threshold concepts and discussing it with colleagues
led to a different way of thinking about the curriculum and teaching methods in their
department. And in economics Davies & Mangan (2007) found three distinguishable types of
threshold to exist at different stages of an economics degree course. First, came the necessary
grasping of the technical meanings of basic concepts, then seeing how these become
integrated within overarching threshold theories, and finally understanding how the
interacting webs of higher-order concepts and theories mapped the whole knowledge domain.
Ways of thinking and practising in the discipline
Universities generally require staff to provide detailed sets of learning objectives for their
students, but when the teachers in this study were asked about their main aims in teaching,
learning objectives were rarely mentioned. Instead, the academics emphasised the broader
skills involved in coming to think like an expert or professional in the field. As one
economics teacher explained:
More recently I’ve come round to the view that economists have acquired a way of looking at the world,
which is indelible. And even though they may not find themselves in a position where they can use their
analytical techniques very consciously, in fact their whole way of treating questions is affected by this kind of
training. (project interview extract)
Similar comments from other members of teaching staff interviewed led to the term ‘ways of
thinking and practising’ (WTP) being used to capture “the richness, depth and breadth of
what students could learn through engagement with a given discipline or subject area in a
specific context” (McCune & Hounsell, 2005, p. 257). The idea that university education
should, first and foremost, involve engaging students in the ways of thinking and practising
that define the discipline, shifts the balance in constructing a curriculum. It takes the emphasis
away from transmitting knowledge to be learned and towards the idea of engaging students in
a shared enterprise of becoming an emerging expert within a profession.
[It] brings into central focus the ways in which individual disciplines represent (or at least debate) the nature
of knowledge in their domains, what counts as ‘evidence’ and the processes of creating, judging and
validating knowledge. … A common concern among [staff] was to wean first-year students away from a
30
relatively unproblematised view of [academic] knowledge. They sought to move students towards a more
complex, differentiated understanding of knowledge and its relationship to evidence, … associated with the
encouragement of a questioning approach and flexibility of mind. (Anderson & Hounsell, 2007, p. 469).
Congruence of aims with teaching
The construct that perhaps most strongly defines the level of effectiveness of any curriculum
is that of congruence among the teachers’ aims and the various components of the teachinglearning environment they provide for students. Biggs (1996) had introduced the idea of
constructive alignment. The idea of being ‘constructive’ came from the psychological theory
of constructivism, in which teaching is expected to focus predominantly on the development
of understanding. ‘Alignment’ is more straightforward – the idea that the main aims in each
course unit should directly reflect the ways teaching, learning, and assessment were being
carried out in practice. By the end of the ETL project, this idea had been broadened to include
six forms of what was then called congruence, to reflect a wider set of aspects that involved:
course organisation and management; curriculum aims; scope and structure; teaching-learning
activities; learning support; assessment and feedback; and students’ backgrounds and
aspirations, all of which needed to be congruent with the aims and also with each other
(Hounsell & Hounsell, 2007, p. 101). The extent of congruence within a teaching programme
proved to be one of the most valuable ways of judging its effectiveness, and yet it is probably
one of the most difficult demands to meet.
The final construct introduced within the ETL project emphasized the need to take account of
the crucial variations of teaching and learning across disciplines, indicated through the phrase
‘the inner logic of the subject and its pedagogy’ (Entwistle, 2009). This reminds researchers that
any implications they may see for their findings should take careful account of the nature of
the discipline, or group of disciplines, through discussions, and possible collaborations with,
teaching staff.
The project also looked at the relationships that existed between approaches to learning and
studying and the main aspects of the teaching-learning environment, identified through
interviews with teaching staff. Extended versions of earlier inventories were used to look at
relationships among a sample of over 4500 students from both cohorts.
31
Table 2
Correlations between ratings of attainment and experiences of teaching
(from Entwistle (2018, p.221: correlations > O.30 in bold)
Student ratings of attainment
Scale scores
Approaches to studying
Deep approach
Organised effort (Strategic approach)
Surface approach
Experiences of teaching
Course design congruent with aims
Teaching for understanding
Staff enthusiasm and support
Set work with supportive feedback
Student support
Knowledge
acquired
Academic
progress
Interest &
enjoyment_
.38
.29
- .33
.29
.33
- .39
.39
.28
- .37
.46
.48
.36
.45
.23
.29
.27
.18
.28
.07
.47
.54
.45
.39
.23
One analysis, shown in Table 2, reported the correlations of ‘approaches to learning’ and
‘experiences of teaching’ with students’ ratings of their present level of achievement
(outcome measures), based on the feedback received from their teachers. Students with high
scores on ‘deep approach’ felt they had acquired a satisfying degree of ‘knowledge’ and had
more ‘interest and enjoyment’ than students with lower scores, while those with high scores
on ‘surface approach’ had lower scores than other students on all three of the outcome
measures. ‘Organised effort’ also had positive outcomes and appeared to be the best predictor
of perceived academic progress, particularly in combination with low levels of ‘surface
approach’. The ‘Experiences of teaching’ section of the questionnaire showed the highest
correlations with learning outcomes for ‘teaching for understanding’ and ‘course design
congruent with aims’. ‘Student support’ was least influential, probably because such ‘support’
could take quite different forms, for example, simply copying from other students or,
alternatively, having useful discussions with them. Similar analyses within a single subject
area showed slightly different values and somewhat higher correlations, but the overall pattern
was consistent.
Conclusion
This account of research into university teaching and learning is admittedly limited by
drawing heavily on my own interest and research activity, but it is intended to support my
contention that research can offer academics a set of concepts and ideas that amount to a
particular way of thinking about their teaching and student learning.
32
Figure 5 Heuristic model illustrating the relationships between teaching and learning
(from Entwistle, 2003)
Peer group
attitudes to
studying
The existing knowledge,
understanding, abilities, motives
and conceptions/styles of learning
students already have
H ow students
approach learning
and studying
H ow students perceive
the teaching-learning
environment
QUALIT Y OF
LEARN IN G
ACH IEV ED
H ow course material is
selected, organised,
presented and assessed
Const ruct ive
alignment
H ow a teaching-learning
environment is designed
and implemented
What students are
expected to learn
and understand
Influences of
academic community,
validating bodies and
socio-political climate
University teachers'
ways of think ing
about teaching
Influences of
departmental and
institutional policies
and resources
To bring together some of the main ideas described earlier, Figure 5 provides a heuristic
model of how teaching and learning environments are thought to influence the quality of
student learning, backed up with evidence derived from differing research methodologies and
carried out in a variety of educational settings and different educational systems. The top half
of the model indicates some of the main differences among students in their previous
experiences, motives, and approaches to studying, which are likely to affect the quality of
learning there are likely to achieve. The lower half shows how academics’ ways of thinking
about teaching and learning, and the broader contextual influences on their thinking, are
thought to affect the approaches to studying adopted by students. This model was
subsequently developed further (Entwistle, 2009, 2018), but still cannot take account of the
most recent changes affecting universities. The pandemic has been causing major changes in
the ways that curricula are being designed, with many forms of teaching involving different
forms of presentation in blended learning. However, the great advantage of having sets of
research-based concepts is that they suggest ways of thinking about teaching and learning that
can readily be adjusted to different contexts and conditions, while still taking account of the
inner logic of the discipline.
33
In discussing the early work on approaches to learning, the research of Eizenberg and
colleagues in an anatomy department was mentioned. They identified a set of aspects that
needed to be considered, if the students’ tendencies to adopt surface approaches were to be
counteracted and encourage more use of deep approaches. Table 3 shows a revision of their
suggestions, drawing on more recent concepts, and showing the reasons why the aspects had
been chosen. These suggestions might well be worth considering when curricula are being
revised, with many of them now being adapted to take account of new ways of teaching.
Table 3 Aspects to consider in a curriculum review to encourage deep approach
(Entwistle 2009, p. 107; developed from Eizenberg 1988, p. 186).
Aspects to consider
with the purpose of
Course content and structure
Linking to faculty or departmental goals explicitly
making the aims clear to staff and students
Identifying threshold concepts and implications
ensuring time to explain such concepts thoroughly
Ensuring congruence across the curriculum
keeping teaching components in line with aims
Incorporating professional applications in syllabus
making the subject matter explicitly relevant
Selecting textbooks and learning materials
being readable and encouraging understanding
Teaching
Differentiating essential knowledge from other
allowing study time to be used efficiently
Explaining principles and concepts thoroughly
making critical features and linkages clear
Exemplifying ways of thinking and practising
showing how professionals think and act
Encouraging problem-based thinking
actively engaging students in the processes
Using post-graduates or senior students as tutors
reducing authority and distance
Assessment
Arranging progressive course work with feedback
encouraging development of understanding
Providing regular tests with diagnostic feedback
providing information on academic progress
Using concept-based questionnaires for feedback
making students aware of effective study processes
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38
2. LA HORA LOGRADA. PARA UNA SOCIOLOGÍA DE LA
RELACIÓN CON LA EDUCACIÓN (UNIVERSITAS
STUDIORUM)
THE HOUR ACCOMPLISHED. FOR A SOCIOLOGY OF THE RELATIONSHIP
WITH EDUCATION (UNIVERSITAS STUDIORUM)
José Beltrán Llavador & Antonio Benedito Casanova2
Universitat de València
Resumen
El presente texto aborda la función de las representaciones sociales en el proceso de
aprendizaje en educación superior. Se prestará especial atención a las metáforas como
herramientas auxiliares que van más allá del sentido común al servir como vehículos para la
expresión y el conocimiento de la realidad. A partir de la teoría de la resonancia, la metáfora
de “la hora lograda” se usará para identificar las situaciones significativas con aquellas que
consiguen conformar y enriquecer nuestra relación con el mundo. Finalmente, se expondrá un
experimento pedagógico con estudiantes de Magisterio en el que se muestra prácticamente el
proceso de construcción de sentido de su experiencia universitaria (sus representaciones de la
universidad). Un sentido que, apuntando a la idea de G. Vico sobre la Universidad de los
Estudios (Universitas Studiorum), ayuda a visibilizar una dimensión de la dialéctica entre
resonancia y alienación.
Palabras clave: metáforas, sociología, universidad, representaciones sociales, aprendizaje
profundo
2
José Beltrán (jose.beltran@uv.es) y Antonio Benedito (antonio.benedito@uv.es) son profesores del
Departamento de Sociología y Antropología Social de la Universidad de Valencia (España). Ambos forman parte
de la Red Internacional que investiga las dinámicas educativas actuales, en especial, las universitarias, y que
tiene como hilo conductor la indagación de las relaciones entre estructuras sociales y sistemas de pensamiento
(Domingos, Ennafaa y Chaleta, 2016).
Este trabajo forma parte del proyecto de investigación “Las representaciones sociales de los contenidos
escolares en el desarrollo de las competencias docentes” (PGC2018-094491-B-C32), financiado por el
Ministerio de Ciencia, Innovación y Universidades y cofinanciado con fondos FEDER de la UE.
39
Abstract
This text addresses the role of social representations in higher education learning
processes. Particular attention is paid to metaphors as auxiliary tools that go beyond common
sense and serve as vehicles for the expression and knowledge of reality. Based on the theory of
resonance, the metaphor of "the hour accomplished" may help to identify significant situations
as those that succeed in shaping and enriching our relationship with the world. Finally, a
pedagogical experiment will be introduced whereby teacher trainees are invited to graphically
and conceptually render the construction of meaning of their university experience (their
representations of the university). A sense that, pointing to G. Vico's idea of the University of
Studies (Universitas Studiorum), helps to make visible a dimension of the dialectic between
resonance and alienation.
Keywords: metaphors, sociology, university, social representations, common sense
Introducción
¿De qué sirve la ciencia si no hay entendimiento?
Montaigne: Del magisterio (Libro primero, capítulo XXV, Ensayos)
Durante el curso 2019-2020 tuvimos ocasión de llevar a cabo una tarea de reflexión
académica con los estudiantes de la Facultad de Magisterio de la Universidad de Valencia, en
el marco de la asignatura de Sociología de la Educación, que miraba hacia el pasado reciente,
de una década atrás, y ponía el foco de atención en la situación de grave crisis económica y
social que afecta a nuestro país desde 2010, y en sus efectos más directos sobre el sistema
educativo y sobre la Educación Superior. Durante todo el curso académico pudimos seguir y
analizar las noticias, informaciones, documentos, debates y acciones generados en torno a los
recortes y a las medidas legislativas aplicados a la esfera educativa. Nuestro análisis se sirvió
de diferentes procedimientos metodológicos (entre otros, debate y discusión de fragmentos
discursivos, de noticias de prensa, radio y televisión, de comunicaciones en redes sociales,
lectura de artículos y de capítulos de libros, a modo de etnotextos). Uno de los procedimientos
consistió en la creación, interpretación y “traducción” gráfica e icónica –esto es, en la
representación metafórica visual–, de la universidad. Un experimento pedagógico que se
explicará hacia el final de estas páginas.
40
A la crisis vivida en aquel curso ha sucedido otra de naturaleza diferente, pero también
con efectos desiguales y de escala mundial: nos referimos a la pandemia provocada por la
Covid-19. Si bien se trata de dos fenómenos distintos, lo que ambos tienen en común es su
magnitud, su alcance global y planetario, y una supuesta invisibilidad e imprevisibilidad en
ambos casos, que tras un análisis postfacto, se ha comprobado que obedecía a cadenas sociológicas, provocadas por constelaciones de factores sociales, y con consecuencias que hasta
cierto punto era posible anticipar.
La explicación que ofreceremos al final de nuestro experimento pedagógico será el
ejemplo empírico, o la aplicación a un caso concreto, del uso de expresiones referidas a la
educación superior, en el que el trabajo con las metáforas ha sido determinante.
Antes de presentar esta experiencia, esta exploración sobre la enseñanza y el
aprendizaje en la educación superior, nos centraremos en las relaciones entre sentido común y
sociología espontánea, así como en la consideración de las representaciones como
elaboraciones de conocimiento socialmente mediado.
Lo que haremos a continuación será abordar el papel de las metáforas como vehículos
de conocimiento, que partiendo del sentido común (esto es, de la experiencia de una realidad
mediada por los lugares comunes) van más allá del mismo, y sirven para desplazar nuestros
marcos de sentido, para salir del imaginario dominante, generando otros espacios alternativos.
Sentido común y sociología espontánea
Uno de los supuestos en el estudio de las representaciones sociales es el de la necesidad de
subrayar las relaciones entre texto y contexto, entre sentido común y construcción de la
realidad. Con este supuesto se quiere señalar que la reflexión sociológica, y la producción
intelectual que plasma esta reflexión, no tienen sentido si no se realiza a partir de fenómenos
sociales y en torno a estos fenómenos. La vinculación entre texto y contexto se puede
expresar también como la relación dialéctica, recíproca y continua, entre palabras y cosas,
entre lenguaje y mundo. En ese sentido, las representaciones sociales se pueden entender en
cierto modo, y adoptando la expresión de Paulo Freire (Freire et al, 1989), como una lectura
de la realidad social, esto es, como un intento de establecer puentes y conexiones por parte de
los sujetos entre el texto, el discurso, la palabra, y un mundo que es específicamente humano,
social e histórico, precisamente a través del lenguaje. Esta interpretación enlaza con una
sociología de las relaciones, practicada como una sociología de los modos en que nos
relacionamos entre nosotros y con el mundo, y teorizada, entre otros, por Bernard Charlot
41
(2007), Bernard Lahire (2016) y Hartmut Rosa (2019). La sociedad está compuesta de
relaciones y de acciones, pero también de representaciones, de formas de saber que dan
sentido a esas acciones y relaciones, y que al hacerlo crean relaciones entre los sujetos
sociales y entre éstos y el mundo. No está de más recordar, a este respecto, una de las
aportaciones sociológicas más relevantes en lo que se refiere a la naturaleza simbólica de lo
real. M. Mauss (2009), en su Ensayo sobre el don argumenta que el fenómeno social del “dar”
conforma una estructura con los fenómenos del “recibir” y el “devolver”. Ello le conducirá al
importante concepto de “hecho social total”. Lo social no es meramente lo que nos constriñe,
también es aquello que nos obliga, que nos demanda una respuesta, una interpelación. Por ello
lo social y lo mental participan de una misma realidad, no siendo más que uno. En tanto que
sociólogos no podemos determinar el sentido y la función de una institución social sin tener
en cuenta que en ella se expresan simultáneamente todo tipo de instituciones del sistema
social y sin ser capaces de determinar sus efectos en la conciencia de los sujetos sociales,
individuales o colectivos.
Esta tarea incesante de aproximación a la realidad social, de hacerla inteligible, de
presentarla o representarla, se realiza a través de una interpelación constante, planteando
continuos interrogantes cuyas respuestas tendrán que someterse a nuevos cuestionamientos.
Los sujetos trabajan, así, de manera crítica, es decir, poniendo en crisis y en tela de juicio las
creencias erróneas, las opiniones planas o las explicaciones espúreas acerca de la realidad
social. Pero esa tarea de deconstrucción, de revisión continua de las asunciones acerca de
nuestro mundo social, buena parte de las cuales forman parte del sentido común, no sería
totalmente crítica si no fuera acompañada de una labor simultánea de reconstrucción, esto es,
de reelaboración de nuestros puntos de vista.
Cotidianamente los sujetos elaboran –sin saberlo, de manera inconsciente– una
sociología espontánea a partir de su conocimiento y experiencia del mundo, de sus formas de
vida y de su modo de representar el mundo social, otorgándole identidad. Identidad que viene
dada por la “idea” (mapa, imagen, representación) que cada uno se hace de sí mismo y de su
propio mundo. De este modo, esta sociología no solo nos proporciona información, sino que
también nos ofrece una manera de mirar el mundo y nuestro lugar en él. Es frecuente que
intentemos explicar lo que nos sucede examinando los motivos que subyacen a los hechos que
nos rodean y a los discursos sobre los mismos.
La sociología científica nos insta a mirar aquellos patrones o modelos de
comportamiento de la gente y los cambios de estos patrones a través del tiempo, de las culturas
42
y de los colectivos sociales. Así, los sociólogos no preguntan acerca de los motivos
individuales para usar las tecnologías de la información, sino que interrogan acerca de las
condiciones sociales relacionadas con el uso cada vez más extenso de estas tecnologías en
determinadas capas de la población y los cambios que están generando en el acceso y
distribución del conocimiento y en su impacto en cualquier dimensión social. Precisamente
este enfoque interrelacional es lo que Wright Mills llamó imaginación sociológica en su obra
de título homónimo (1999). Por imaginación sociológica se entiende la observación de
nuestras experiencias mediadas (esto es, no directamente presentadas, sino codificadas o representadas) por el mundo social. También significa prestar atención a los patrones sociales
más amplios que no se evidencian sólo a través de la experiencia personal; por expresarlo
gráficamente, se trata de tener la visión del puzzle completo, y no de algunas de sus piezas. Se
trata de poner en relación la historia con las biografías dentro de una sociedad determinada. La
imaginación sociológica constituye, además, una herramienta crítica puesto que contribuye a
dotar de sentido tanto a las propias experiencias como a los asuntos públicos. Precisamente, el
modo de existencia, el tipo de ser resultante de la aparición del mundo humano, es el del
sentido, alrededor del cual gravita todo lo demás. Cuando hablamos de sentido lo hacemos de
un modo no meramente figurativo o retórico, sino material.
A la sociología le interesa comprender los mecanismos de constitución del sentido
común, es decir, cómo se construye y se reconstruye socialmente el sentido compartido,
participado por los sujetos. Por otra parte, y complementariamente, a la sociología le interesa
desvelar aquellos supuestos del sentido común que cristalizan en la naturalización de
determinados fenómenos sociales, es decir, en la identificación de lo normal con lo natural y
en la suplantación, por consiguiente, de la comprensión social por la explicación natural (véase
Bourdieu, 2011: 74).
La sociología tiene que reconocer los límites del sentido común cuando éste cristaliza
en una tupida red de opiniones naturalistas con la que pretendemos categorizar los fenómenos
sociales. El sentido común, instrumento con el que nos manejamos cotidianamente, resulta
funcional y fundamental para comunicarnos con nuestros semejantes, para opinar y para
recorrer el camino que va de lo conocido a lo conocido. “El sentido común es nuestro
reservorio de contexto disponible de manera espontánea”, afirman Wagner y Hayes (2011:
19). Pero hay otra dimensión del sentido común que nos confina a una suerte de inmutable
fatalismo, a un fatalismo programado, a una estrategia organizada según la cual se nos quiere
hacer creer que las cosas son como son irremediablemente (“es lo que hay”, es la expresión
43
coloquial que mejor refleja esta conformidad). Ante esa lógica dominante, es necesario poner
todo nuestro empeño si no nos conformamos con ser meros espectadores pasivos en el
escenario social.
Representación social como conocimiento socialmente mediado
En El oficio de sociólogo, Bourdieu, Chamboredon y Passeron nos advierten acerca de
la necesidad de ejercer una continua “vigilancia epistemológica” que, evitando toda tentación
de convertir criterios metodológicos en recetas de cocina científica, ejerza un movimiento de
reflexividad, por la que el sociólogo vuelve a repensar continuamente su propia actividad. Para
Bourdieu (1976: 16-17), el oficio de sociólogo forma parte de un habitus que, “en tanto que
sistema de esquemas más o menos dominados y más o menos transponibles, no es sino la
interiorización de los principios de la teoría del conocimiento sociológico.” Precisamente por
este movimiento de reflexividad (volviendo a sí mismo y a su actividad) es como el sociólogo
puede evitar los errores propios del intelectualismo, es decir, tomar su propia relación
intelectual con el objeto de análisis por la relación del agente con su acción. Así, la capacidad
del sociólogo de tener en cuenta su relación con su objeto constituye uno de los medios de
mejorar la calidad científica de su trabajo. De ahí el interés de lo que Bourdieu denomina una
“objetivación participante”, pues la objetivación (en tanto que conocimiento científico) de la
relación subjetiva del sociólogo con su objeto (su participación en el objeto que analiza) forma
parte de los requisitos para que su análisis sea científico. De manera que, desde esta sociología
reflexiva, que es crítica al mismo tiempo (por poner en crisis los supuestos del sentido común
desde la vigilancia epistemológica), se realiza una tarea de auto-socio-análisis, en la medida en
que examina su relación con el objeto, que está vinculada a su lugar en el campo intelectual y
a su propia trayectoria social. La misma ciencia social es, así, objeto de representación social,
combinando objetivación y participación.
Ejercer la vigilancia epistemológica encierra una exigencia: la exigencia de vigilar, de
prestar atención, de mirar, de re-flejar (reflexionar, pensar) y traer a presencia una realidad
que es social, esto es, la exigencia de re-presentar la realidad social. Hay un viejo aforismo
que dice: primum vivere, deinde philosophari (primero vivir, después filosofar). Primero
vivimos la realidad mediada socialmente, después pensamos e interpretamos –traducimos,
resignificamos– la realidad.
En la Gestalt se dice: no vemos, sino que vemos como; es decir, vemos con lo que
Herbert Read denominó “imágenes eidéticas”. “El arte mismo –señala– es una actividad
44
metafórica, que encuentra (más que busca) símbolos nuevos para significar nuevas áreas,
nuevas formas de la sensibilidad (Read, 1985: 160). De modo que el lenguaje y las imágenes
son también performativas, esto es, decir y ver son prácticas sociales con efectos materiales:
hacemos cosas con palabras y también con imágenes, como nos muestra, entre otras, la
narración fílmica, el arte del cine (Beltrán, 2006).
“Una vez centrada –señala L. M. Santos– la mirada ha de abrirse de manera progresiva
a los elementos que estén insinuados en lo que la mirada descubra. Lo primero que estará
insinuado será un hombre real, que es el soporte de la acción y que nosotros vamos a llamar el
actor. No pretendemos, sin embargo, que el actor y sus cualidades sean la explicación de todo
cuanto ocurre, pues tal vez haya que explicarle antes a él, pero sostenemos que siempre está
presente. No se le puede borrar del cuadro. Tal es la posición de Marx y de Max Weber, que
parten de la presencia indispensable de un sujeto. No es la postura de los estructuralistas, que
pretenden construir una sociología sin hombre. Pero quede claro que el actor aquí es el lugar
de la mirada, no el deus ex machina que todo lo explica. Después, la mirada sociológica
descubre que lo mirado está dentro de una trama, de un contexto (...) Por último, la trama se
desarrollará en un lugar, en un espacio, en lo que denominaremos con la palabra griega topos.”
(Martín Santos: 1988: 14-15). Esa misma palabra que da lugar al espacio de la utopía en su
sentido más literal: “u-topos”, “no lugares”, o lo que es lo mismo, espacios por recrear,
territorios por descubrir, ámbitos sobre los que dirigir la mirada. Mundos posibles en sentido
estricto.
Las metáforas acompañan al mundo
Por la palabra se hizo el mundo (Blumenberg, 2001: 174). Nuestro mundo está
informado por el lenguaje. Nuestra mirada está mediada por el lenguaje. “El lenguaje
acompaña al mundo”, decía Wittgenstein (WWK 22/12/1929: 50). Pero el lenguaje no es una
mera copia del mundo, sino una expresión del mundo: no es el reflejo literal de la realidad,
sino su representación simbólica, codificada. Por eso, el lenguaje se sirve de las metáforas,
que están vinculadas a la dimensión paradigmática o sistemática del lenguaje (Barthes, 1964).
Las metáforas son herramientas del lenguaje, pero éste, a su vez, es un sistema de
herramientas y de usos de las mismas (Wittgenstein, 2017). Nos enfrentamos a lo
desconocido haciendo asociaciones con aquello que conocemos, de ahí que la expresión
metafórica, relacional-asociativa sea una forma de poder que interponemos entre nosotros y la
realidad desconocida. Comparamos sucesos, conceptos o significados y los relacionamos con
45
nuestros esquemas de significado. El lenguaje no es inocente ni neutral, de manera que
conviene preguntarse bajo qué condiciones es válido o verosímil el uso de determinadas ideas
o expresiones. Así, por ejemplo, podemos preguntarnos bajo qué condiciones se pronuncia el
término “calidad” o “excelencia” en las agendas educativas hegemónicas.
La esfera educativa –cuyo origen histórico más reciente se remonta al Siglo de las
Luces (otra magnífica y potente metáfora)– proporciona un espacio especialmente fecundo
para generar metáforas con una gran potencia semántica. Con frecuencia se ha comparado a
las instituciones de enseñanza con factorías o industrias (recuérdese el conocido y triste tópico
de “la Universidad como fábrica de parados”), con prisiones (recuérdese el modelo panóptico
de Foucault en Vigilar y castigar), con laboratorios (así la escuela “laboratorio” de John
Dewey en Chicago) o con la misma vida (“la escuela de la vida” siguiendo a Comenius).
Nuestras explicaciones siempre son metafóricas: armamos y desarmamos el mundo con
metáforas. Y con ellas, nos enfrentamos a lo desconocido haciendo asociaciones con lo que
conocemos. Cuando nos referimos a procesos de innovación educativa no estamos sino
apelando a una expresión que sugiere nuevas metáforas del cambio social. Cambio que en este
caso viene marcado, a su vez, por el signo de la globalización. Aquí podríamos parafrasear la
pregunta que el cartero, en la novela de Antonio Skármeta, formula al poeta Pablo Neruda:
“¿Usted cree que el mundo es la metáfora de algo?” (Skármeta, 1999: 26).
Efectivamente, el significado que atribuimos a alguna cosa, que descubrimos o que
construimos es, más que un hecho psicológico, una cuestión lingüística. Para entender el
significado de una idea, de una frase o de una explicación, es necesario entender bajo qué
condiciones es cierta o válida. En una conversación cotidiana no es frecuente que nos
preguntemos acerca de la veracidad de lo que se dice o de lo que se escribe, entre otras cosas
porque la finalidad o la orientación de una conversación o diálogo de la vida cotidiana no es
didáctica. Ahora bien, imaginemos una aseveración que pertenece al conocimiento
instrumental (saber hacer), por ejemplo, una explicación dedicada al manejo de una
herramienta técnica en el terreno de la ofimática o de la electrotecnia. En este caso las
condiciones bajo las cuales una idea expresada es cierta se pueden determinar por una prueba
empírica. En cambio, cuando lo que se afirma pertenece al conocimiento expresivo (hacer
saber: enseñar y aprender a entender aquello que se está comunicando), las condiciones bajo
las cuales la aserción es válida se establece o bien a través del contraste con otros sujetos que
están informados, o apelando a criterios o fuentes de autoridad, o evaluando (emitiendo
juicios de valor acerca de) y cuestionando el contenido de la misma. Así, por ejemplo, puedo
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preguntarme bajo qué condiciones es cierta la defensa cada vez más extendida de la idea de
“desarrollo sostenible” por países que sistemáticamente incumplen los acuerdos
internacionales sobre contaminación, y puedo cuestionar si el uso de esta idea no está en el
fondo legitimando lo contrario de aquello a lo que apunta: el sostenimiento del desarrollo.
Otro ejemplo típico en educación es el siguiente: ¿Bajo qué condiciones declara el educador
estar aplicando una metodología crítica, activa, participativa, interdisciplinar, flexible, abierta,
etc.? Este inventario de epítetos, que es capaz de pronunciar cualquier educador familiarizado
con la retórica pedagógica, ¿sirve de la misma manera para el educador comprometido que
para el educador menos implicado? Ahora podemos preguntar, con un sentido crítico y
poniendo en crisis asunciones previas, si el uso reiterado y trivial de estos epítetos no acaba
por vaciarlos de contenido.
Mientras que las hipótesis son las herramientas del aprendizaje instrumental, las
metáforas son las herramientas del aprendizaje expresivo. Nos enfrentamos a lo desconocido
haciendo asociaciones con lo que conocemos. Comparamos sucesos, conceptos o palabras y
los relacionamos con nuestros esquemas de significado. “A los especialistas les puede bastar
una abstracción para imaginar el Big Bang. Pero los demás necesitan de una metáfora”
(AA.VV, 1997: 23). Muchas veces la comprensión viene de hacer que la metáfora correcta
haga encajar la experiencia en nuestras teorías, sistemas de creencias, o en nuestro autoconcepto. Las metáforas, pues, se basan en la correlación entre la experiencia percibida y algo
conocido. Así, cuando hablamos del teatro de la vida, subrayamos el papel que cumplimos en
éste en tanto que actores sociales. Cuando a los seis años un niño miró al cielo y afirmó que
“la luna es la sonrisa del cielo” hizo una metáfora sin saberlo, a la par que un descubrimiento.
Cuando decimos de un educador que es un “todoterreno” nos referimos a las múltiples tareas
que ha de desempeñar más allá de lo que estipula su contrato como docente. Cuando se acusa
a un docente de ser un “hueso” se está señalando la rigidez de su actitud. Cuando lamentamos
la carencia de una “cultura de la evaluación”, utilizamos el término de connotaciones agrarias
para apuntar la falta de tradición evaluativa en el sistema educativo.
Wittgenstein afirmaba que las palabras de nuestro lenguaje cotidiano son semejantes a
cajas de herramientas. Lo que hacemos cotidianamente en nuestras clases es acudir a esos
instrumentos y construir metáforas. Nuestras explicaciones siempre son metafóricas: armamos
y desarmamos el mundo con metáforas. Construimos significados con metáforas, buscamos el
sentido de las cosas con metáforas. Y aquí podemos llegar a una conclusión imprevista, por
radical y sorprendente: conocimiento y poesía se dan de la mano. No es extraño que Platón
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quisiera expulsar a los poetas de su República ideal. No es extraño que escritores y escritoras
sean perseguidos en la actualidad, o que permanezcan en el exilio: sus metáforas han sido lo
suficientemente poderosas como para poner en crisis, en tela de juicio, el mundo conocido. En
palabras de una conocida filósofa de la ciencia, que no nos resistimos a citar: “Las metáforas
y conceptos de las formas de pensar que prescinden del principio femenino han tenido su
fundamento en una concepción según la cual la naturaleza y las mujeres son pasivas, inertes y
por último prescindibles” (Shiva, 1995: 284). Los educadores también utilizan cotidianamente
metáforas para explicar y para expresar una parcela de la realidad: con el uso de las metáforas,
los educadores pueden efectuar no sólo movimientos, sino que pueden provocar cambios, en
el sentido de enseñar el camino desde lo conocido hasta lo desconocido.
El uso que aquí hacemos del término metáfora se refiere tanto a un producto –una
perspectiva o marco, una forma de ver las cosas– como a un proceso por el que aparecen
nuevas perspectivas sobre el mundo, porque “la realidad es perspectiva” (Wheelwright, 1979:
171). La perspectiva está relacionada con el sujeto obviamente, pero la perspectiva forma
parte de la realidad, ya que si un sujeto ocupa el lugar del otro la perspectiva se mantiene.
Está vinculada al lugar. Del hecho de considerar a la perspectiva como una insuficiencia o
deformación de lo real, pasamos a la consideración de que la perspectiva es objetiva, a través
de ella se nos aparece la realidad. Como referente (existente) o como sentido (posibilidad).
Las metáforas que resultan de este proceso son “metáforas generativas”. Estas
metáforas son relevantes en tanto que modos peculiares de ver algo como algo más, es decir,
de desplazar marcos o perspectivas desde un dominio de experiencia a otro. En ese sentido,
“una metáfora es un conjunto disponible de conexiones, un puente prefabricado que se puede
utilizar de modo temporal para unir dos ideas, para, de esta forma, poder descubrir los
vínculos reales que las unen” (Claxton, 1987: 227). Como en la parábola zen, la metáfora es el
dedo que señala la luna, pero no hay que confundir el dedo con la luna. Si el educador deja
que sus estudiantes tomen la analogía por la realidad, les estará induciendo a equivocarse.
Las “metáforas vivas”, utilizando la expresión de Ricoeur en su libro de título
homónimo (Ricoeur, 1980), iluminan con su claridad expresiva el camino de la comprensión:
nos ayudan, como linternas, a interpretar el mundo, a cruzarlo como quien atraviesa un espejo
y se enfrenta a nuevas situaciones con nuevas miradas, con nuevos códigos de interpretación.
Cuando Alicia, el personaje de Lewis Carroll, aparece en el otro lado del espejo, tiene que
aprender a ordenar el caos de un mundo absurdo cuyas reglas no conoce.
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De la misma manera, las metáforas constituyen la bisagra o el enlace entre la teoría y
la práctica, entre el conocimiento y la acción. Pueden llegar a ser “ficciones útiles”, cuya
misión no es demostrar las cosas, sino mostrar el mundo “como si” fuera tal como lo describe
una metáfora. Una metáfora ya es una realización: un acto, una acción, de comprensión de la
realidad. Para ilustrar esta conjunción con un ejemplo podemos acudir al término inglés “to
realize”, cuya traducción sería “darse cuenta”, mientras su homófono en español quiere decir
“hacer”. Hacer y comprender, práctica y teoría, se dan la mano y nos ponen en el camino del
aprender. En este sentido, podemos decir que las metáforas son constitutivas, y que hasta
cierto punto somos pensados por las metáforas, porque hay “metáforas que nos piensan”
(Lizcano, 2006).
La hora lograda
Actualizando y ampliando la teoría del reconocimiento de Axel Honneth, muy
recientemente, Hartmut Rosa ha desarrollado una teoría de la resonancia, en su obra
Resonancia. Una sociología de la relación con el mundo (2019)3. El autor sostiene que, frente
a la alienación que producen las sociedades contemporáneas, es necesario recuperar la idea y
la experiencia de resonancia, que para el autor significa la capacidad de conexión y relación
con el mundo al que pertenecemos. En este sentido, la alienación podria ser definida como
una modalidad específica de relación con el mundo, modalidad en la que la relación alienante
sería una ausencia de relaciones. Y la resonancia sería otra modalidad en que la relación
resonante sería la presencia de relaciones4. Desde el punto de vista educativo, y como apunta
Rosa en el capítulo dedicado al eje de resonancia de la educación, la formación apunta a “la
conformación de la relación con el mundo” (Rosa: 2019: 313). Aplicada esta teoría a nuestra
reflexión, esto es lo que vamos a encontrar en buena parte de nuestra experiencia sobre el
sentido de la Universidad. “La formación como asimilación transformadora del mundo y
como instauración de ejes de resonancia presupone que la propia voz del alumno pueda ser
expresada y escuchada.” (Ibid: 313). Como veremos, si alguna contribución social resalta
Es importante señalar que el concepto que emplea Rosa es el de “Beziehungen” y no los de “Verhältnisse”,
“Verbindungen”, “Wechselwirkungen” o “Zusammenhänge”. La sociología, como ciencia social, es el estudio
de relaciones sociales. Sin embargo, éstas pueden entenderse de múltiples formas y desde diferentes sistemas
teóricos. El uso del término alemán “Beziehung” remite al modelo weberiano de entender las relaciones. El resto
de nociones remiten a Marx, Durkheim, Simmel y Dilthey respectivamente. Ello implica hacer tres
consideraciones. Se trata de una relación de dependencia referencial y funcional, por tanto, dirigida. En ella
priman las categorías de modalidad referentes a condiciones de posibilidad, existencia o posibilidad. Estamos
ante un uso del concepto de relación que se aplica fundamentalmente a las relaciones de poder, porque son
relaciones que se aplican a sistemas de relaciones. La noción de “Beziehung” se vincula, pues, al uso de las
categorías sociológicas de subjetividad y de acción social.
4
Una sociología de nuestras relaciones (Beziehungen) con el mundo debe concluir en una crítica de las
relaciones (Verhältnisse) que marcan a la alienación para posibilitar las condiciones de la resonancia.
3
49
entre las demás, es la oportunidad de generar y recrear relaciones entre los sujetos para
intercambiar y compartir proyectos y puntos de vista comunes. Si bien el análisis de Rosa se
centra en la escuela, se puede extrapolar a la Universidad. Hartmut Rosa se hace eco de temas
populares (canciones pop) que hacen de la escuela el centro de inspiración: desde The Wall,
de Pink Floyd, la obra que elevó a manifiesto el célebre “We don´t need no education”,
pasando por la versión de “Mad World”, en la adaptación realizada por Tear for Fears, hasta
“The Logical Song”, del grupo Supertramp. Todas ellas, y buena parte de las obras del género
de formación en la literatura construyen narrativas en torno a la importancia de la enseñanza y
el aprendizaje, pero no como un hecho abstracto, sino a partir de experiencias concretas,
vividas subjetivamente y objetivadas mediante ejercicios de “biograficidad” (Alheit y
Dausien, 2007) y de “aprendizaje narrativo” (Goodson, 2007).
Hartmut Rosa toma prestada una definición de Wilhelm von Humboldt sobre la
formación en sintonía con su teoría de la resonancia, señalando que es un proceso que puede
tener éxito “solo si se produce la ligazón de nuestro yo con el mundo en una intervención que
sea lo más general, activa y libre posible”. (Rosa, 2019: 316).
¿Qué docente no ha tenido la percepción, durante el desarrollo de una clase y al final
de la misma, de que esta ha sido una clase exitosa (satisfactoria, plena, redonda) o, por el
contrario, de que ha sido una clase en la que, pese al esfuerzo invertido, no ha habido
conexión, no se ha dado una interacción, una comunicación? La primera percepción
corresponde a la hora lograda, la contraria corresponde a la hora no lograda. En la hora
lograda, se da un triángulo de resonancia por la que el docente (vértice 1) alcanza a los
alumnos y transmite entusiasmo, a la par que se deja “conmover”. El alumno (vertice 2) está
cautivado por el tema, subyugado o absorto y a la vez abierto y el material (vértice 2) aparece
para ambas partes como un campo de posibilidades y desafíos significativos. La escuela (la
universidad en nuestro caso) se convierte en un espacio de resonancia en la que el aula
“crepita” y la atención (la relación con el saber) se focaliza sin esfuerzo alguno. Los ejes de
resonancia “vibran”, por utilizar la expresión cotidiana por la que manifestamos sentir
“buenas vibraciones”. Para ello, “la primera condición para que se constituya el triángulo de
resonancia como paradigma de una lección escolar lograda es que el alumno y el docente
puedan alcanzarse mutuamente.” (Rosa, 2019: 317). Advierte Rosa que en el clima
pedagógico actual, la idea de que haya un conmoción recíproca –en términos metafóricos–
entre estudiantes y docentes es considerada como perjudicial, seguramente debido a nuestra
limitada capacidad para pensar vínculos de resonancia (Rosa, 2019: 319-320). El autor
50
concluye señalando que, a su juicio, la característica decisiva del talento no es la inteligencia
sono la capacidad de resonancia. Ahora bien, los estudios sobre desigualdad educativa, “dan
pie a una crítica general del sistema educativo, en cuanto que controla la distribución de la
disposición a la resonancia (y a la alienación) de acuerdo con el estrato social, e
institucionaliza así la escuela como un potencial espacio de resonancia para unos y una zona
de alienación para otros.” (Rosa, 2019: 322).
Elisa Chaleta (2011), en colaboración con diferentes autores (Chaleta y Entwistle,
2011; Chaleta, Grácio y Efklides, 2011), ha prestado atención al problema del aprendizaje en
Educación Superior, que analizan en diferentes dimensiones y desde una perspectiva
psicológica en diálogo con otras disciplinas. Con un modelo y una metáfora similares a los de
Rosa, Chaleta et al. (2013: 12-28), recuperan el concepto de Meyer de “orquestração da
aprendizagem” (Meyer, 1991) a partir de la coordinación entre tres componentes
fundamentales en el proceso de aprender: concepciones, abordajes y percepción sobre los
conceptos de aprendizaje. De nuevo, el término de “orquestación” evoca al de “resonancia”,
con el recurso común al símil musical. En el estudio que llevan a cabo con un grupo de
estudiantes universitarios de primer curso universitario, los autores destacan la “consonancia”
(la “resonancia” o relación estructurada, en términos de Rosa) entre las concepciones, los
abordajes y las experiencias en curso, o lo que es lo mismo, que los estudiantes presentan
formas apropiadas de “orquestar” su propio proceso de aprendizaje.
Un experimento pedagógico con metáforas
Nos atenemos a la definición que Moscovici dio de las representaciones sociales como
“la elaboración de un objeto social por parte de una comunidad con el propósito de
comportarse y comunicar” (Moscovici, 1963: 251). Pero sobre todo al enfoque que tiene sobre
las representaciones sociales. Éstas no deben ser encaradas de forma pasiva, como si fuesen
imágenes, deformadas o no de algo previo, sino de forma activa, ya que su función es informar, es decir, dar forma a lo que procede del exterior (Moscovici, 1979). En este sentido
son procedimientos transformadores de interpretación, al ser en ellas lo más relevante su
papel de transposición, esto es, su naturaleza metafórica, su capacidad de comparar, poniendo
unas cosas en lugar de otras a través de un sistema de relaciones (Nietzsche, 2000: 107). Más
adelante, completó esta definición afirmando que “podrían incluso ser entendidas como la
versión contemporánea del sentido común” (Moscovici, 1981: 181), es más, como la génesis
misma de un nuevo sentido común (Moscovici, 1979) que enlaza con el concepto de “sentido
común”, no connotado negativamente, de A. Gramsci (Gramsci, 1978, 44).
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Estas definiciones y las consideraciones anteriores enmarcan una de las dimensiones
del “experimento” pedagógico anunciado al comienzo de este texto. La reflexión sobre
representaciones sociales en relación con la educación superior se encuentra en la literatura
dentro de la psicología social y dentro de las propias ciencias de la educación (véase, por
ejemplo, recientemente: Covarrubias Papahiu, 2011 y Gutiérrez Vidrio, 2011).
Sin embargo, hay que añadir dos dimensiones más. Por una parte, actuamos en tanto
que educadores con el fin de que el estudiantado, que participa en la experiencia pedagógica,
logre un aprendizaje profundo y no estratégico o superficial (Bain, 2006). Eso significa que
pretendemos que los estudiantes aprendan sociología de la educación no de forma
memorística o productivista, sino de manera educativa y formativa (Anaya, 2007). Por otra
parte, en tanto que sociólogos de la educación tenemos en cuenta tanto las diferentes
modalidades pedagógicas como los diversos dispositivos pedagógicos usado en el espacio
académico (Bernstein, 1990). Ello implica trabajar con los conceptos pertinentes de una teoría
adecuada de la comunicación y de la transmisión y el aprendizaje culturales. Si desde el punto
de vista educativo tenemos que conseguir que los estudiantes se percaten de los modelos que
ya poseen acerca de la Universidad para que puedan ser desplazados por otros, más adecuados
a las problemáticas actuales del campo social universitario, desde el punto de vista
sociológico debemos cambiar las reglas de enmarcamiento y de control del espacio educativo
con el fin de que se puedan objetivar de forma crítica las reglas de clasificación y de poder
incorporadas en las estructuras simbólicas de los estudiantes.
Había que dar la voz al adquirente del aprendizaje para mostrar en qué sentido esa voz
no es propia y está atravesada de un sistema de relaciones e interacciones sociales. De ahí que
usáramos procedimientos teóricos propios de un enfoque sociohermenéutico, como son el
interaccionismo simbólico de raíz pragmatista y la etnometodología de base fenomenológica.
Para este enfoque la conciencia es una estructura intencional, es decir, funcional. La
conciencia no es una sustancia enfrentada al mundo. Es una relación en la que aparece el
mundo, lo real, de diferentes maneras. En este modo de pensar ya no tenemos al sujeto
contrapuesto al objeto, porque el sujeto es una relación de tipo intersubjetivo, interactivo y
social. Es más, el sujeto deja de ser algo a interpretar, puesto que él, como signo, es ya
proceso de interpretación, historia, como lo es el objeto que, además es el argumento de la
función que es el sujeto (Foucault; 2001: 599). La idea clave es que el supuesto dualismo de
la relación entre sujeto y objeto, de raíz cartesiana, es desmontado como falaz ante el primado
de las relaciones. No obstante, hay que tener en cuenta que, si por medio de las relaciones nos
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aparece lo real, la realidad no está constituida por un conjunto de relaciones como si fuera una
“cosa en sí” (Kuhn, 1979). No tiene sentido hablar de la realidad en sí. Todo es fenómeno,
aparición en un plexo de relaciones, constituido por dimensiones cognitivas, afectivas y
volitivas.
Respecto a los instrumentos técnicos empleados en la experiencia seguimos la línea de
la tesis doctoral de Moscovici (Moscovici, 1979), hemos usado el Análisis de Contenido
aplicado a las respuestas a un Cuestionario abierto que estaba estructurado en base a 6
“pattern-variables”. Tres de estas variables están vinculadas a la noción de hecho social de
Durkheim como forma de acción, de pensamiento y de ser de tipo coactivo. Las otras tres se
relacionan con el concepto de hecho social total de Mauss (2009) en el que tenemos
relaciones sociales, acciones históricas, pero también representaciones sociales que están
incorporadas a la estructura de lo real. El sistema de las representaciones sociales acerca de la
Universidad de los estudiantes de Sociología de la Educación de la Facultad de Magisterio de
la Universidad de Valencia se ponía así en relación con el medio que usa ese sistema y con el
entorno del mismo. El concepto de “medio” social lo hemos descompuesto en tres variables y
el de “entorno” en otras tres.
El experimento tuvo lugar en mayo de 2012, en unos momentos en los que el
Ministerio de Educación, en manos del gobierno conservador del PP, promulgó un Decreto
Ley de medidas urgentes para racionalizar el gasto educativo, una medida que afectaba a
todos los niveles educativos, desde educación infantil hasta educación superior, y que provocó
una reacción mayoritaria, a través de la primera huelga educativa unitaria en la historia de la
democracia de nuestro país. La iniciativa se realizó en una de las sesiones de la asignatura de
Sociología de la Educación, en la que se impartía un tema dedicado a las reformas educativas.
Se trataba de que los estudiantes de segundo curso de Magisterio llevaran a cabo una
actividad de representación –de codificación visual y textual– de lo que estaba sucediendo en
la Universidad en un contexto de intensa contestación social debido a una política de recortes
económicas y de reformas tecnocráticas de carácter neoliberal. Lo que se pedía a los
estudiantes es que elaboraran posters plasmando imágenes (dibujos) e ideas (mensajes) en
torno a una serie de ejes temáticos. El título que le dimos a esta actividad era “El muro”,
evocando por un lado la conocida obra antes mencionada del grupo musical Pink Floyd (The
Wall), y por otro lado la actividad de los grafitis en las paredes de la ciudad. De manera que
los estudiantes tenían que crear una suerte de mural en una cartulina y de manera colectiva, en
pequeños grupos de cuatro o cinco personas. La actividad combinaba elementos de
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información y de reflexión con elementos de creación e imaginación. El resultado sería una
representación social, gráfica y metafórica, de los sentidos de la Educación Superior. También
se sugirió a los estudiantes que podían servirse explícitamente de metáforas elaboradas para
expresarse, algo que ya les resultaba familiar porque habían trabajado con metáforas a partir
de la conocida viñeta del pedagogo italiano Francesco Tonucci (Frato), titulada “La máquina
de la escuela”, cuyo origen se remonta a 1970 (Tonucci, 2008: 10).
Para organizar y sistematizar estas representaciones, se les sugirió trabajar, pues, sobre
los siguientes ejes temáticos:
Cuadro 1. Ejes temáticos para la representación social sobre la Universidad
MARCO RELATIVO AL MARCO
SER
PENSAR
RELATIVO
AL MARCO RELATIVO A
LA ACCIÓN
Qué soy y quién soy, cómo Qué estoy aprendiendo y cómo Qué podemos hacer al
me autopercibo en la en ella
respecto
Universidad
CONTEXTO SOCIAL
CONTEXTO POLÍTICO
CONTEXTO
HISTÓRICO
Qué lugar ocupo en la Qué significa ser estudiante Qué está sucediendo en la
sociedad
universitario
actualidad dentro y fuera
de la Universidad
Fuente: elaboración propia
Este esquema de trabajo permitía un auto-socio-análisis que tenía en cuenta diferentes
marcos (identitarios, epistemológicos y prácticos) puestos en relación con una serie de
contextos (socio-institucional, político-cultural e histórico-crítico). El análisis, por tanto, tenía
desde el principio una orientación relacional. Cada una de las variables (de marcos y
contextos) tiene relación con las demás y generan una serie de interrogantes a los que había
que responder con palabras e imágenes. Este procedimiento combinaba al mismo tiempo la
subjetividad y la objetividad (la interiorización de lo exterior y la exteriorización de lo
interior, en términos de Bourdieu), lo emotivo y lo racional, lo formal y lo no formal, la
mirada sociológica y la imaginación sociológica. Además, el punto de partida era el del
sentido común, lo que estaba a la vista de todos y formaba parte del debate público, pero al
mismo tiempo se pretendía ir más allá de la opinión (doxa), para avanzar hacia la
construcción de conocimiento (episteme), hacia lo desconocido, que en buena medida consiste
54
en los diferentes procesos sociales configuradores del propio sentido común expresado. En
este camino se hacía hincapié en las metáforas como modelos comparativos que están a la
base de la actividad científica (Kuhn, 1979). Se trataba de un proceso que ilustraba muy bien
la ruptura epistemológica: el papel de la sociología espontánea y la necesidad de que ésta
pudiera objetivarse desde la reflexividad propia de las ciencias sociales. Para transitar de los
viejos modelos de comprensión a los nuevos y ser conscientes de que se ha aprendido algo, de
manera profunda, en el campo sociológico fue fundamental trabajar las representaciones no
como imágenes sino como herramientas (Wittgenstein, 2017).
De este modo logramos tres consecuencias metodológicas. En primer lugar, aplicar el
concepto de “resonancia” de Rosa en la dirección de una perspectiva crítica, sustituyendo la
noción restringida de intencionalidad (Badiou, 2008) entendida como extensionalidad
(referencia) por una generalizada que la entiende como intensionalidad (posibilidad,
modalidad). En segundo lugar, hacer ver que el análisis del sistema de la cultura no puede
reducirse a dos dimensiones, el poder no simbólico y el poder simbólico, sino que debe
abrirse a la cuestión del sujeto. Por último, argumentar la importancia de que un análisis
sociológico del sistema de las desigualdades educativas no puede limitarse a una discusión
sobre recursos, sobre medios, también debe incluir a las personas y a sus sistemas de fines. El
ser es tan importante como el tener (Fromm, 1991), de modo que se puede tener trabajo, pero
ser pobre y se puede no ser pobre y tener una mala calidad de vida o una vida indigna y no
buena. Tan importante como las condiciones sociales de producción son las condiciones de
vida y de existencia. En el campo de la educación, como en cualquier campo social, hay que
atender a los procesos de diferenciación, de explotación y de dominación. Sin embargo, no
podemos limitarnos al análisis de estas dimensiones de la alienación. Para combatirla
prácticamente hay que señalar al espacio educativo de los sujetos que se relaciona de
diferentes maneras con este sistema de relaciones múltiples y entrecruzadas.
Como resultado del experimento se elaboraron 30 posters en dos grupos de clase, que
se expusieron en las paredes de las dos aulas y a las que se invitó a visitar al resto de
estudiantes de Magisterio.
Siguiendo los ejes temáticos expuestos en el esquema anterior, organizados según las
variables de marco y de contexto, los elementos más destacados fueron los siguientes.
Respecto al marco identitario, en el que tenían que dar respuesta a cómo se percibían
en la universidad, la mayor parte se identificaba con un colectivo que cumplía roles típicos
55
(aquello que les pedía la sociedad: el oficio de estudiar), pero al mismo tiempo reclamaban
para sí el imperativo: “Sé tú mismo”, de manera que su identidad no quedara anulada en el
juego de poder y de distribución de clases sociales. En algunos de los posters apareció el
dibujo de unas gafas con la recomendación de Wright Mills de “mirar con los ojos abiertos”.
El marco epistemológico venía ilustrado con aforismos llenos de humor, como:
“pienso, luego estorbo” (a partir de un conocido humorista gráfico de la prensa nacional:
Forges), o con lemas como: “tenemos voz, no somos la minoría silenciosa”. Con estas
expresiones, los estudiantes manifestaban su resistencia a ser manipulados y a convertirse en
“robots alegres”, por utilizar también otra expresión de Mills.
El marco de posibilidades prácticas pretendía dar respuesta explícita a la conocida
pregunta de Lenin: qué podemos hacer. Las respuestas en este caso fueron tan elocuentes
como abundantes. He aquí algunas de ellas: descubrir la verdad, contribuir al cambio y a la
mejora, abrir los ojos, construir un mundo mejor, defender mis derechos, ser crítico con la
sociedad, ser buena persona (ser cívico y no cínico), rebelarse contra “las fuerzas superiores”,
pasar de las palabras a la acción, “¡democracia real ya!” (este es el nombre de un movimiento
social creado a partir de las llamadas “mareas” y “primaveras”: aquí se vivió una intensa
“primavera valenciana”, protagonizada por estudiantes y con una desproporcionada represión
policial), tomar conciencia de la realidad, ver el mundo con otros ojos. Este marco permitía
tender el puente de la crítica a la posibilidad, y resultó uno de las dimensiones más fértiles de
la actividad.
Por lo que se refiere a los contextos, el primero de ellos pretendía situar a los
estudiantes en una institución social y a su representación acerca del lugar que ocupaban en la
sociedad. Algunas respuestas fueron, de nuevo muy imaginativas: en algún poster se pudo ver
una sucesión de números: 1, 2, 3, 4...1.000, con lo que la interpretación coincidía con buena
parte de la percepción ciudadana de ser considerados números antes que individuos. Otra
respuesta recogía la expresión común: “el último de la fila”, en otros casos, la respuesta, en
textos y en imágenes, aludía al hecho de ser considerados “marionetas”, o una pieza más del
puzzle. En otros casos los estudiantes declaraban que se sentían comprendidos por sus
profesores, o que la Universidad “me hace sentir vivo, si me la quitan ¡me están matando!” En
alguno de los posters aparecía la palabra utopía descompuesta, recordando una de las clases
que había dedicado a descomponer la palabra u-topia y a traducirla en su literalidad como
“no-lugar”, y en la que había denunciado el significado unívoco (la trampa histórica a partir
de un salto lógico) de la palabra utopía como aquello que es “imposible”.
56
El contexto político social, por el que se pretendía la aproximación a la cuestión
acerca de qué significa ser estudiante universitario, recibió respuestas descriptivas, pero
también emotivas y expresivas: ser estudiantes universitarios significa ser el futuro, significa
esfuerzo, empleo, identidad, posibilidad, oportunidad, amistad, conocimiento. También se
respondió con los lemas de las pancartas que se llevan en las manifestaciones: “la educación
es un derecho, no un privilegio”, “una beca, ¿es una hipoteca?”. En algún caso el tono era
poético: “somos la palabra silenciada, somos un mundo por construir”.
El contexto crítico suponía un cierto diagnóstico de la situación. A la pregunta qué
está sucediendo los estudiantes respondían con vehemencia, haciéndose eco de algunos de los
síntomas que forman parte del análisis del sentido común: corrupción, malversación,
manipulación, capitalismo, consumismo, y “menos no es más.”
Conclusiones
La interrelación entre los diferentes contextos puede asociarse a la idea (y al ideal
practicable) que ya había defendido Vico5 bajo el término de Universitas Studiorum. Los
estudiantes, en el experimento descrito, hicieron gala de “las razones de lo probable”, con sus
nociones y facultades, a saber, “el sentido común, la fantasía, el ingenio y la imaginación”
(Patella, 2019: 69). El ingenio, que ha trabajado aquí “acercando palabras, cosas e ideas a
primera vista distantes y desconectadas, efectivamente es más propenso a acercar que a alejar,
a integrar que a sustituir, a unir que a dividir, indicando así el objetivo primario de una cultura
orgánica e integrada, más que un saber escindido y fraccionado” (Patella, 2019: 76).
Precisamente, Vico confía en las universidades el noble oficio “de ser lugares de
promoción de una cultura elevada y unitaria, de transmitir un saber orgánico e integrado,
apelando a los principios de la contextura, de la armonía, y de la integración, que rinden por
tanto justicia al mismo término de Universitas Studiorum (Patella, 2019: 77). Las lecciones de
Vico a favor de un programa de paideia ideal, alcanzan su mayor vigencia en la actualidad,
“contra el paradigma disociativo de la modernidad” y “en nombre de una afirmada
contextualidad de las facultades y de las actividades humanas (…), en nombre de una
convivencia sincrónica entre imaginación e intelecto, entre razón retórica y razón crítica,
afirmando con ello una dialéctica de la copresencia, de la integración y de la recíproca
cooperación.” (Patella, 2019: 85).
5
En la edición de la Autobiografía de G. Vico (González y Martínez, 1998: 122), éste argumenta en sus distintas
Oratios, que abrían el curso académico de la Universidad de los Estudios, que el fin de los estudios era unir a los
seres humanos y que el medio de los mismos era la sistematización de los diversos tipos de conocimientos.
57
Para G. Vico se trataba en la Universidad de los estudios de aprender cultivando la
humanidad y no de ejercitar la memoria en un aprendizaje superficial o que persigue meros
honores o distinciones. La formación debe permitir que los jóvenes hagan uso de la memoria,
pero también de la fantasía, el ingenio y el entendimiento. Trabajar educativamente para
formar Humanidad consiste en cultivar las facultades de la elocuencia, la erudición, la
invención y la prudencia (González y Martínez, 1998). De ahí que haya que practicar el
sistema ordenado de las ciencias. Éstas deben ser usadas como medios para formar al ser
humano en el camino de la sabiduría que debe criticar las divisiones o diferencias entre los
hombres. A este respecto, cabe recordar que el “ingenio”, fin esencial del proceso pedagógico,
es el eje central de la “Inventio”, arte de unir y de sintetizar. Al que tiene que seguir la
preparación racional practicada en la “Dispositio”, arte de separar y de analizar, y la
formación retórica implementada en la “Elocutio”, arte de expresarse y de concebir. El
ejercicio del razonamiento exige la facultad de juzgar y ésta no puede ser nada sin el
aprendizaje, que se logra con el uso de las herramientas proporcionadas en las tres partes del
“Ars Retorica”.
La combinación de todas las variables diseñadas para la experiencia proporcionó un
“cuadro” general, una suerte de mapa. La noción de mapa aquí no es gratuita. Los últimos
estudios en el terreno de la neurobiología nos dicen que nuestro cerebro trabaja con mapas,
elaborando esquemas de significado (Damasio, 2009, 2009b, 2010), una idea que podemos
asociar con la teoría de las representaciones sociales. El mapa que resultó de esta experiencia,
o el “objeto social” en términos de Moscovici, estaba poblado de imágenes y mensajes tan
sugerentes como relevantes. De toda esta constelación de impresiones, emociones, conceptos
y expresiones se desprenden algunas conclusiones interesantes: los estudiantes pudieron llevar
a cabo un ejercicio de claridad y crítica conceptual a partir de una reelaboración de su
conocimiento cotidiano (sentido común) y académico (ciencia social). Las metáforas, algunas
de las cuales hemos señalado aquí, sirvieron como herramientas útiles para la construcción de
conocimiento social: los estudiantes pensaron con metáforas al tiempo que fueron pensados
por metáforas, en el sentido de fueron las propias metáforas, en algunos casos, las que
vehicularon las representaciones sociales obtenidas. Los estudiantes realizaron un auténtico
ejercicio de toma de conciencia –como así hicieron notar– sobre su propia situación como
sujetos sociales que forman parte de un contexto social determinado, en este sentido, fueron
capaces de tender puentes, tal como sugería Paulo Freire, entre texto y contexto, entre
palabras (e imágenes) y mundo. De hecho, hicieron una lectura del mundo social, y lo
58
hicieron más inteligible (intus legere). Al mismo tiempo, este “juego” o “experimento”
pedagógico de representaciones sociales, permitió objetivar, por un lado, el poder de las
determinaciones sociales, pero, por otro lado, lo contingente de las mismas, a saber, que en el
terreno de lo social no hay nada casual, y que lo que el mundo social ha hecho, el mundo
social, armado de un saber que partiendo del sentido común va más allá de éste, puede
deshacerlo.
Con este experimento hemos conseguido que los estudiantes participantes en él hayan
hecho inteligibles los esquemas de pensamiento que usan en sus representaciones sobre la
Universidad. Entendemos que solamente de esta manera podemos promover que puedan
modificar sus modelos de pensamiento, constatando la diferencia respecto a los que ya
poseen. El aprendizaje profundo, el que trabaja por nuestra humanización, debe ponerse al
servicio de los intereses y preguntas de los estudiantes. De hecho, lo que hicimos fue cambiar
las preguntas en un tema tan supuestamente árido como el de la Reformas educativas. Pero
también tiene que lograr una modificación de nuestra propia manera de pensar. Lo cual sólo
es posible objetivando adecuadamente la forma de pensar existente, que esta mediatizada
socialmente.
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62
3. POURQUOI ALLER À L’UNIVERSITÉ? LE CHOIX DES ÉLÈVES
DE TERMINALE
Georgios Stamelos6
Université de Patras
Grèce
Résumé
La communication se base sur une recherche de terrain qui s’est déroulée auprès de 789
élèves de terminale en lycée général, dans la région de Grèce de l’Ouest en Mai 2018. La
recherche a été conduite juste avant les examens nationaux pour l’entrée à l’enseignement
supérieure. L’échantillon a été stratifié par lieu d’habitation.
L’objectif était d’abord d’analyser les motivations qui conduisent les élèves de terminale à
envisager d’entreprendre des études supérieures. Nous avons ensuite essayé de croiser les
motivations des élèves à des variables démographiques et socio-économiques qui sont censées
influencer leur choix. À signaler que le contexte est celui d’une région touchée fortement par
la crise économique que le pays a traversée.
Les résultats montrent que pour une majorité d’élèves la perspective des études universitaires
ne repose pas sur un projet élaboré. Il s’agit plutôt d’une continuité « évidente » basée sur, en
amont, la représentation sociale de l’enseignement supérieur, et en aval, la manque de
perspectives au marché du travail. Cependant, un élève sur quatre semble avoir une idée plus
élaborée. En effet, un thème récurrent dans leur propos est le « prestige » d’un travail futur.
Par ailleurs, ce prestige semble se connecter, d’une part, au choix d’un établissement tertiaire
réputé, et d’autre part, aux récompenses financières espérées dans le futur. Pour ces élèves, il
y a une influence forte tant de leurs familles d’origine que de leur genre.
Mots-clés
Université, Transition vers l’Université, Choix d’études supérieures, Motifs, Élèves de la
Terminale.
Georgios Stamelos est professeur à l’Université de Patras, en Grèce. Ses terrains d’investigation sont les
Politiques de l’Éducation qui concernent principalement l’enseignement supérieur et l’espace européen de
l’éducation, ainsi que l’Éducation des Enseignants. Il a publié plus de 200 travaux en anglais, français, espagnol
et grec. Il était membre du CA de l’Agence Nationale d’Évaluation (HQA) de 2013 à 2020. Il est directeur du
Master Inter-Universitaire « Higher Educational Policy : Theory and Praxis » (https://mahep-upatras.gr),
coordinateur du Réseau Inter-Universitaire « Higher Education Policy » (http://hepnet.upatras.gr) et éditeur de la
revue Academia (https://academia.lis.upatras.gr) repertoriée par Scopus et DOAJ.
6
63
Introduction
Cette recherche a été élaborée en 2017, en pleine crise économique. La région de Grèce de
l’Ouest était une des régions les plus touchées de la crise. Nous avons, de ce fait, voulu
explorer le point de vue des élèves de terminale (d’un âge moyen de 18 ans) dans un lycée
général sur leurs perspectives tant éducatives que professionnelles. Nous souhaitions plus
spécifiquement enquêter sur les motivations qui relevaient d’une perspective professionnelle
ainsi que sur les critères du choix d’établissement tertiaire. De plus, nous souhaitions aussi
interroger l’image de l’Université de Patras, l’établissement le plus grand et réputé de la
région.
Dans ce travail, nous avons restitué la partie de la recherche qui concerne le choix d’aller à
l’université7.
Cadre théorique
Afin de développer notre corpus théorique, nous avons travaillé sur trois notions : a) les
représentations sociales, b) les motivations, et c) la construction de l’auto-image.
Pour la notion de « représentations sociales », nous nous sommes basés sur les travaux de
Moscovici ainsi que sur des travaux qu’il a influencés (Gustavsson A. and Selander, 2011;
Höijer, 2011; Howarth, 2006; Jovchelovitch, 1999; Markovà, 2003; Moscovici, 1973, 1984,
1988, 2000; Riga, 1991). Ainsi, dans notre travail les représentations sociales sont considérées
comme un système d’idées, de valeurs, de perceptions, de pratiques, etc qui visent, en amont,
à la compréhension du monde extérieur, et en aval, à l’intégration à ce monde. Une
représentation sociale, en l’occurrence l’université, peut être transformable mais elle contient
un noyau inchangeable, souvent abstrait et/ou irrationnel (l’université est une « bonne
chose »). En conséquence, dans un monde instable et incertain, une « bonne chose »,
l’université, connue et reconnue, peut paraître comme une voie sûre et souhaitable. Pour la
nouvelle génération (les élèves) les perceptions de leur environnement (famille et amis)
semblent jouer un rôle important, accompagné par leurs expériences vécues et formulées par
les passages successifs d’un niveau à l’autre du système scolaire.
Quant aux motivations, nous avons eu recours aux travaux de Viau mais aussi d’autres
chercheurs (Barbeau, 1995; Chekour et all, 2015; Deci & Ryan, 2000; Houssaye, 1993;
Roussel, 2000; Vallerand, 1993; Viau, 1999, 2009; Wigfield, Eccles, Schiefele, & Roeser,
Dans le langage quotidien l’enseignement supérieur est synonyme de l’université. Afin de faciliter notre
population questionnée (les élèves), nous avons gardé la même terminologie. Ainsi, dans ce texte,
l’enseignement supérieur et l’université sont utilisés comme synonymes.
7
64
2006). Une motivation nous intéresse car elle est liée à des comportements. Elle est
considérée comme une force motrice ainsi qu’une interaction. En conséquence, une
motivation marque la relation d’un individu à son environnement. Une motivation est un
phénomène dynamique qui reflète les perceptions de l’individu (élève). Les perceptions
centrales sont : a) la valeur d’une activité b) la perception de chance de réussite (à cette
activité) et c) la contrôlabilité (de cette activité). Enfin, les motivations sont formées par une
série des facteurs extérieurs comme : a) les conditions générales de la vie (de l’élève), b)
l’école, c) la classe scolaire, et d) le contexte social entourant. Il est évident que les
motivations sont en relation et en interaction avec les représentations sociales.
Pour la construction de l’auto-image, nous avons, avant tout, tenu compte de cette période
particulière qu’est l’adolescence, qui caractérise nos enquêtés. C’est une période de
construction de l’individu et une période de tensions et de transformations ainsi qu’une
période d’intégration dans un contexte social. En réalité, on parle de la construction de « soi ».
Le soi : a) tient une structure hiérarchique et multidimensionnelle, b) entretient une relation
positive avec les performances scolaire, c) reçoit des influences par des motivations internes
et externes, et d) est influencé par des facteurs extérieurs comme le sexe, l’âge, le contexte
social, le contexte scolaire, la performance scolaire, etc. Le soi contient trois dimensions
l’auto-image, l’auto-perception et l’auto-estimation. Les trois dimensions sont en relation
avec l’interaction sociale et l’expérience sociale. Par conséquent, elles sont en négociation
avec les représentations sociales et avec les autres (famille, amis, école) qui influencent
l’individu (élève) (Epstein, 1991; Fountoulaki, 2010; Giannelos, 2003 ; Harter, 1999 ;
Lawrence, 2002 ; Mead, 1962; Rosenberg, 1986 ; Rogers, 1949, 1961; Simmons &
Rosenberg, 1973 ; Tsiga & Nasaina, 2012).
Les trois notions de référence (représentations sociales, motivations, et auto-image)
entretiennent une interaction dynamique entre elles.
La recherche
La recherche a été faite dans les lycées généraux de la région de l’Ouest de Grèce qui
comprend trois Départements (Achaïe, Ilia et Étolie-Acarnanie)8. Les trois Départements
forment non seulement une unité administrative mais aussi une entité économique malgré le
fait qu’ils ont des caractéristiques différentes : a) L’Achaïe est dominé par la ville de Patras. Il
8
Les élèves des Lycées Généraux représentent les 2/3 de la population totale des lycéens.
65
est le plus peuplé, centre de services (principalement publiques) et avec un port important
reliant le pays à l’Italie et avec le reste de l’Europe (via routière), b) L’Ilia est un Département
paysan avec une agriculture intense et des côtes touristiquement développées grâce à ses
plages réputées, et c) L’Étolie-Acarnanie est plus mitigée entre des centres urbains et des
parties agricoles, parfois isolées. Par conséquent, le paramètre « localité » a été central dans la
planification de la distribution des questionnaires.
Le temps de la distribution des questionnaires a été construit afin d’être le plus proche
possible aux examens nationaux pour l’accès aux institutions de l’enseignement supérieur 9.
Les élèves étaient vraiment « en transition » entre la fin des études secondaires et l’examen
pour l’accès au supérieur.
La formulation du questionnaire était conçue en cinq parties : a) des informations sociodémographiques, b) des questions sur la relation de la famille, des amis et de l’élève à
l’éducation en général et à l’enseignement supérieur plus spécifiquement, c) des motivations
formulant une perspective professionnelle, d) des critères de choix d’un établissement de
l’enseignement supérieur et e) l’image de l’Université de Patras.
L’échantillon a été fixé à 800 questionnaires. Ce nombre correspondait au 10% du nombre
total des élèves de la Terminale qui est un pourcentage qui diminue au minimum la marge
d’erreur (http://www.tools4dev.org/resources/how-to-choose-a-sample-size/). Par la suite, ce
nombre a été distribué initialement par Département et, dans un second temps, par localité
(capitale, villes importantes, reste du Département). Le choix des établissements scolaires a
été fait par localité et au tirage au sort. Ainsi on est arrivé à la distribution suivante :
Tableau 1: L’échantillon de la recherche par
Département
Département
Échantillon
désiré
Échantillon réel
Achaïe
376
369
Étolie-Acarnanie
272
273
Ilia
152
147
Total
800
78910
En Grèce, l’accès se fait par un examen national. Les résultats sont déterminés par trois paramètres : a) les
places disponibles par Département, b) les résultats aux examens, et c) le choix de chaque élève exprimé par le
rempli d’un formulaire de préférence prioritaire.
10
L’échantillon final a été d’un nombre de 794 questionnaires correctement remplis. Cinq (5) questionnaires
étaient éliminés parce qu’ils n’étaient pas correctement remplis. Donc, le pourcentage des questionnaires
correctement remplis était de 99,4%.
9
66
Et par localité :
Tableau 2: L’échantillon par localité
Échantillon
Échantillon réel
Localité
désiré
Capitale
460
430
Villes principales
125
116
Département
215
243
Total
800
789
Reste du
Nous avons obtenu un échantillon réel très proche de la distribution de la population d’élèves
par Département. En revanche, nous avons des sur- et sous- représentations par lieu
d’habitation (localité). Il s’agit d’un résultat produit par notre décision de distribuer
l’échantillon à chaque élève de terminale des écoles tirées au sort et non pas triées.
Quant au choix de la recherche par questionnaire, il s’explique par notre souhait d’avoir le
nombre désiré des questionnaires en un temps très limités. Bien entendu, ce choix a ses
limites. En effet, cette recherche, dans l’avenir, gagnerait à être prolongée par une autre
recherche qualitative afin que (les motivations ou les déterminants des choix) d’élève soit
mieux approfondie.
Résultats
Avant d’entrer dans une analyse précise, il nous semble opportun de donner une image
générale des résultats de notre recherche.
Les élèves du Lycée Général sont massivement tournés vers l’enseignement supérieur. En
effet, 4 sur 5 (76,1%) veulent continuer leurs études dans le supérieur. Un 10% (9,6%) ne
s’intéresse pas et il y a un 15% (14,4%) qui se montre indécis.
Par l’analyse de donnés, trois informations paraissent importantes :
a) L’écrasante majorité des élèves ne semble pas avoir un vrai projet professionnel. Les
réponses semblent être aléatoires et instantanés. La continuation des études paraît
67
« évidente/normale » comme le passage de l’école primaire au secondaire. On ne
constate pas les effets de la crise dans les réponses des élèves.
b) La représentation sociale de l’enseignement supérieur, en langage quotidien «
l’université », reste forte mais en même temps floue (aller à l’Université est bonne
chose parce que tous le disent).
c) Cependant, il y a une minorité considérable, concernant un élève sur quatre (25%), qui
instrumentalise concrètement cette représentation, comme nous allons voir par la suite.
Nous allons nous centrer sur cette minorité afin de procéder à une analyse en profondeur.
Afin de faciliter la lecture, nous proposons la figure suivante qui reflète les résultats de
l’analyse statistique.
68
Figure 1
Perspectives de
développement professionnel
Choix
de
l’Établissement loin
de
ma
maison
(localité, affirmation « moi, j’irai à
l’Université)
Choix
de
l’Établissement près de
la maison (localité)
(localité)
Attirance par le
contenu du métier
(filles, situation de travail des
parents, affirmation « moi,
j’irai à l’université))
Revenus
espérés
Prestige du métier
(garçons)
(situation de travail de la
mère, « beaucoup de ma
famille sont allés à
l’université »)
(garçons)
Influences familials
(garçons, localité,
affirmation « moi, j’irai à
l’Université)
Réputation
de
l’établissement
Je choisirais l’université qui
propose les études qui
m’intéressent affirmation «
beaucoup de ma famille sont allés à
l’université »)
Tout d’abord, il faut insister sur l’importance de cette minorité d’élèves. En effet, ces élèves
sont les seuls qui essaient de donner un sens concret à la représentation sociale de l’université.
Ils construisent un récit rationnel. Ce récit semble être dominé par un esprit utilitariste qui met
en avant les futures avantages individuels qui peuvent résulter de leur fréquentation à
l’enseignement supérieur. En conséquence, nous pouvons parler d’une instrumentalisation
individualiste de la représentation sociale « université ».
Plus spécifiquement, la motivation décisive, qui mobilise ces élèves, est le prestige du métier.
Il y a une influence de sexe statistiquement significative (plus les garçons que les filles). Par
la suite, la réputation de l’établissement est un critère qui consolide la motivation initiale.
Deux variables influencent ce critère : a) la situation de travail de la mère11 et b) la tradition
La variable « situation de travail » désigne la stabilité d’un travail qui garantit, par la suite, le flux stable des
sources financières dans la famille. En effet, dans un pays où le taux du chômage était plus de 25%, on a constaté
11
69
familiale aux études tertiaires (variable « beaucoup de membres de ma famille sont allés à
l’université »).
Ainsi, nous obtenons un dipôle constitutif de la pensée d’élève: « le prestige du métier » et les
« études dans une institution réputée ». L’analyse statistique a montré que ce dipôle a une
relation statistiquement significative avec les revenus espérés. Ainsi, on peut supposer que la
raison d’être de ce dipôle est l’espoir des futures revenus espérés (désirés). Sur cette relation,
le sexe joue un rôle décisif (plus les garçons que les filles).
Par conséquent, le récit construit sur la représentation sociale de l’université par un élève sur
quatre semble être: l’université est une « bonne chose » parce qu’elle pourrait conduire à un
métier de prestige. Afin de consolider l’accès à ce métier de prestige, il faut choisir un
établissement réputé. Si j’arrive à faire des études qui préparent pour un métier de prestige
dans un établissement réputé, j’aurai plus de chance de gagner bien ma vie.
De l’autre côté, les filles semblent avoir une autre façon de penser aux études supérieures,
peut-être, plus idéaliste et en tout cas plus centrées sur l’attirance par le contenu d’un métier.
À la formulation de cette motivation la situation de travail des parents ainsi que l’affirmation
« moi, j’irai à l’université » (une des variables du questionnaire) jouent un rôle statistiquement
significatif.
Notre analyse a montré aussi que la motivation « perspectives de développement
professionnel » a une relation statistiquement significative tant avec le « prestige du métier »
qu’avec les attentes des « revenus espérés » (dominé par les garçons). Ainsi, nous pouvons
entrevoir que le contenu du « développement professionnel » est lieu davantage avec les
« revenus espérés » au sein d’un métier de prestige. En revanche la motivation « attirance par
le contenu du métier » domine chez les filles.
Il est d’abord à noter que les élèves qui admettent une influence de la famille sur leur choix,
ne sont pas nombreux. Cependant, ceux qui y font davantage référence, sont les garçons qui
affirment par ailleurs : « moi, j’irai à l’université ». Ensuite, les « influences familiales »
agissent tant sur le « prestige du métier » que sur les « revenus espérés ». Enfin, le critère
pragmatique « je choisirais l’université qui propose les études qui m’intéressent » tient une
relation statistiquement significative avec la tradition familiale aux études universitaires
(« beaucoup de membres de ma famille sont allés à l’université »). Ce critère esquisse un
triangle avec les motivations « prestige du métier » et « influences familiales ».
que la variable cruciale a été la stabilité des sources financières en famille et non pas l’activité professionnelle
concrète.
70
Nous avons laissé pour la fin les critères « l’établissement loin de la maison » et
« l’établissement près de la maison », critères fortement influencés par la localité. Il faut
prendre en considération étant donné que les élèves habitants les villes centrales et les restes
des Départements sont, de toute façon, obligés de se déplacer afin de faire des études
supérieures. Les élèves qui habitent aux capitales (principalement Patras) ont au moins un
établissement supérieur dans leurs villes.
Conclusion
Les résultats de la recherche montrent que les élèves du Lycée Général sont tournés vers
l’enseignement supérieur. Il ne s’agit pas d’une nouveauté. Cependant, la majorité de ces
élèves ne semble pas avoir une idée concrète concernant leur avenir tant professionnel que
personnel. Ils n’ont pas de projet vraiment élaboré dans ces deux domaines. La transition du
lycée à l’université peut être identifiée à tout autre passage dans le système de l’enseignement.
Il s’agit d’une facilité, voire habitude, qui est un accord avec la représentation sociale de
l’université, comme une « chose bonne ».
Si l’on met ce résultat dans son contexte historique, on pourrait constater que la majorité des
élèves se montre peu soucieux de la réalité socio-économique de son environnement. Il s’agit
d’un paradoxe12. Ce souci apparait trois mois plus tard (en Septembre). En effet, en analysant
les données statistiques concernant les nouveaux entrants par établissement et par
programmes d’études, on constate que l’accès est déterminé par l’origine sociale, le sexe et la
localité de provenance (Stamatopoulou, 2019). En conséquence, entre Mai et Septembre un
choc, non seulement éducatif, se produit. Ainsi, en amont, les résultats des examens
nationaux, et en aval, le rempli du formulaire administratif par l’élève semble jouer un rôle
significatif et un « atterrissage » brutal à la réalité socio-économique du jeune de 18 ans.
Il faut signaler que le problème n’est pas « accès ou pas accès » en l’enseignement supérieur
étant donné que 4 sur 5 candidats réussissent dans un programme d’études. Le problème se
pose, en amont, par le fait que seulement un 15% de ceux qui réussissent se présentent
satisfaits de leur « réussite » (Stamelos, 2020), et en aval, par la « distribution » par
établissement et par programme d’études qui révèle une forte influence de l’origine socioéconomique ainsi que de leur sexe et de leur localité de provenance.
Si la majorité d’élèves ne semble pas avoir un projet concret (un projet tout court), il y a une
minorité importante d’élèves (autours de 25%) qui semble instrumentaliser la représentation
12
À ce point, on fait allusion à la fameuse protection familiale, caractéristique fort des sociétés
méditerranéennes. Mais, il ne s’agit pas que d’une simple allusion qui nécessite une enquête spécialisée.
71
sociale « université » en la transformant en un récit rationnel. En effet, pour cette minorité,
l’université est une « bonne chose » parce qu’elle amène à des métiers de prestige. Afin
d’assurer l’accès à un métier de prestige il faut étudier dans un établissement de réputation.
Finalement, ceux, qui arrivent à un métier de prestige, peuvent espérer à des futurs revenus
convenables. De plus, au fur et à mesure, dans ce métier de prestige, on peut espérer à un
« développement professionnel » qui est aussi lié au développement des futurs revenus. Cette
minorité est dominé par les garçons et par la tradition familiale aux études universitaires. En
revanche, les filles semblent avoir un autre raisonnement qui est basé sur l’attirance par le
contenu du métier.
Nos résultats pourraient nous fournir des pistes de réflexion concernant un autre problème
actuel relatif à l’enseignement supérieur : la prolongation ou l’abandon des études. En effet,
on sait qu’un pourcentage autour de 35-40% d’élèves qui accèdent à l’enseignement supérieur
ne finissent pas leurs études (Païzis, 2014; Stamelos, 2016). La moyenne contient fortes
disparités selon les établissements et les programmes d’études, qui, à leur tour, contiennent de
fortes disparités socio-économiques concernant l’origine de leurs étudiants.
Par
conséquent,
une
interrogation
s’esquisse
concernant
la
politique
dominante
l’enseignement supérieur du dernier demi-siècle qui portait justement sur sa démocratisation.
Cette interrogation devient de plus en plus visible dans une période de crise économique qui
conduit à la diminution des ressources financières pour l’enseignement supérieur.
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74
4. CONDITIONS ENVIRONNEMENTALES FAVORABLES A
L’EDUCATION AU DEVELOPPEMENT DURABLE
Apports des neurosciences cognitives sur l’influence des conditions
environnementales affectives sur le bien-être de l’élève et l’amélioration de
l’efficacité des apprentissages scolaires pour le développement durable
Georges Elias
Doctorant en sciences de l’éducation
Université Saint-Joseph de Beyrouth
Faculté des sciences de l’éducation
georgeselias07@icloud.com
Résumé
L’objet de cette communication est de contribuer à mettre en relief l’influence des conditions
environnementales affectives sur le bien-être des élèves et l’amélioration de l’efficacité des
apprentissages scolaires afin de promouvoir l’éducation au développement durable et former
les futurs acteurs économiques, sociaux et politiques. Elle identifie les conditions affectives
optimales et leur influence sur l’apprentissage issues des données les plus récentes des
recherches en neurosciences cognitives.
Mots-clés: Développement durable; Environnement; Émotions; Bien-être.
Abstract
The purpose of this paper is to help highlight the influence of affective environmental
conditions on the well-being of students and improve the effectiveness of school learning in
order to promote education for sustainable development and future economic, social and
political actors. It identifies optimal affective conditions and their influence on learning from
the most recent data in cognitive neuroscience research.
Keywords: Sustainable development; Environment; Emotions; Wellness
Introduction
Les découvertes récentes en neurosciences cognitives bousculent les pratiques pédagogiques
traditionnelles et questionnent les méthodes, les situations et les environnements
d’apprentissage. Le progrès fulgurant de l’imagerie cérébrale ouvre de nouveaux horizons en
75
matière de formation et de développement des compétences « life skills » des élèves face aux
défis du vingt-et-unième siècle. Ces découvertes dévoilent les conditions environnementales
optimales garantes d’une amélioration de l’efficacité des apprentissages scolaires pour un
futur développement durable.
Dans un monde qui se transforme continuellement, le système de formation et d’apprentissage
traditionnel se révèle incapable d’accompagner le développement rapide de la technologie et
la grande compétitivité dans le monde des entreprises et des administrations (Le Boterf,
2006). Les organisations professionnelles ont besoin de capital humain compétitif capable de
résoudre des problèmes qui surviendront dans l’avenir, de trouver des solutions qu’il n’ a
jamais étudiées, dans un monde de plus en plus complexe où l’innovation est l’indispensable
de la compétitivité et de la part de marché (Jonnaert, 2004, 2009b, 2009a).
L’économie du savoir occupe une place importante. L’école a la responsabilité de préparer les
futurs acteurs sociaux, économiques et politiques. Pour cela, l’éducation au développement
durable devient une nécessité.
Le problème qui se pose est la contradiction existante entre le mode de pensée et d’agir
indispensable au développement durable «qui impose de faire avec des situations complexes,
des savoirs pas toujours stabilisés, des incertitudes, des interprétations parfois contradictoires
[…] et le mode d’enseignement traditionnellement fondé sur la solidité de connaissances
prouvées et vérifiées et sur la simplification » (Tutiaux-Guillon & Considère, 2010, p. 193).
Pour cela, l’éducation au développement durable « constitue un réel enjeu qui interroge les
fondements de notre façon d’enseigner» (Julien, Chalmeau, Vergnolle-Mainar, Léna, &
Calvet, 2014).
L’apprentissage s’opère grâce à des structures cérébrales innées bien organisées mais dont les
fonctionnalités sont influencées par les conditions environnementales de chaque personne tout
au long de sa vie (Bier & Belleville, 2010; Franck, 2013; Lavoie et al., 2016; Posner,
Rothbart, & Rueda, 2008; Vidal, 2012).
Influence des conditions environnementales sur l’apprentissage
L’influence des conditions environnementales commence depuis la vie prénatale et passe par
une période où le développement cérébral est le plus sensible aux conditions
76
environnementales. Cette période est appelée période critique (Dehaene, 2018; Habib, 2018;
Jouvent, 2009; Kandel, 2007; Lavoie et al., 2016). Elle s’étend de l’enfance jusqu’à
l’adolescence où l’individu s’imprègne rapidement de son environnement et acquiert des
comportements et des compétences permanentes. Durant cette période, des modifications
rapides s’opèrent dans les structures cérébrales. Ces modifications augmentant l’excitabilité
des synapses et le nombre de circuits neuronaux, une propriété de plasticité du cerveau
maintenue durant toute la vie de l’individu même si elle devient plus lente à l’âge adulte
(Houdé & Borst, 2014). Les apprentissages scolaires couvrent alors la plus grande partie de
cette période critique responsable de stimuler la croissance cérébrale et d’influencer les
comportements actuels et ultérieurs des individus (Vidal, 2012). Diverses expériences mettent
en évidence que les enfants loin de leurs parents ou élevés dans des environnements pauvres
dépourvus d’affection présentent à l’âge adulte de sévères atteintes de leur capacités
intellectuelles et sociales (Dehaene, 2018; Habib, 2018; Kolb et al., 2019).
Le développement de la taille et du volume du cerveau se termine vers l’âge de 12 ou 13 ans,
mais le renouvellement et le remodelage des connexions neuronales se prolonge jusqu’à 25
ans et reste actif au moins jusqu’à l’âge de 60 ans, preuve directe de la plasticité cérébrale
(Bier & Belleville, 2010; Habib, 2018; Sablonnière, 2016).
Une étude en imagerie cérébrale (IRMf) menée sur 139 régions du cerveau de 579 individus
révèle une différence au niveau de la densité des connexions dans certaines régions (Di
Martino et al., 2014). Les connexions des aires motrices et sensitives sont pratiquement les
mêmes chez tous les individus, par contre les connexions du lobe frontal et du lobe pariétal
ainsi que le cortex temporal sont très variables selon les individus. Ces régions sont
impliquées dans l’adaptation de chaque individu à son environnement. Cela constitue une
preuve sur l’influence de l’environnement sur la modulation des circuits neuronaux en
fonction de l’expérience de chacun, de son éducation, de sa capacité de prise de décision et de
l’adaptation à une situation donnée (Sablonnière, 2016; Vincent & Lledo, 2012). Une autre
étude en IRMf est menée sur le cerveau de 1250 paires de vrais jumeaux afin d’identifier
l’influence des facteurs génétiques et environnementaux sur le développement (Blokland,
Zubicaray, McMahon, & Wright, 2012). Les résultats mettent en lumière une variation du
volume des lobes cérébraux dépendant à 70% des gènes et à 30% des facteurs
environnementaux. Le volume de l’hippocampe impliqué dans la mémoire est assez variable
entre les vrais jumeaux et dépend à 50% des gènes et 50% de l’environnement. La part de
77
l’influence de l’environnement est la plus grande au niveau du cortex orbito-frontal et le
cortex cingulaire où elle arrive à 60% contre 40% pour l’influence des gènes. Ces deux
régions sont impliquées dans la prise de décision et le contrôle exécutif (Kolinsky, Morais,
Cohen, Dehaene-Lambertz, & Dehaene, 2014).
Les modifications de circuits neuronaux dans des conditions spécifiques d’apprentissage sont
influencées par des facteurs environnementaux tels que le stress.
Lorsque l’individu est dans un état de stress, l’hypophyse sécrète une hormone (l’ACTH) qui
stimule le cortex surrénalien à libérer des hormones nommées glucocorticoïdes (Fradin,
Lefrancois, & Massioui, 2006). Ces hormones agissent sur les cellules de l’hippocampe et
causent leur dégénérescence (Fix, 2012; Kolb et al., 2019; Purves et al., 2019; Vincent &
Lledo, 2012). Des expériences menées chez le singe révèlent que même après de brèves
périodes de stress, le nombre de cellules nerveuses de l’hippocampe diminue (Caroni et al.,
2012). Cela mène à une altération de l’apprentissage et des capacités de mémorisation des
informations du fait que l’hippocampe est impliqué dans les processus mnésiques (Caroni et
al., 2012; Donato, Rompani, & Caroni, 2013; Fradin et al., 2006; Kim & Diamond, 2002;
Ruph, 2011). Ces dommages hippocampiques causés par les états de stress sont maintenant
démontrés aussi chez l’homme. Les techniques récentes d’imagerie cérébrale (IRMf) mettent
en lumière une diminution du volume de l’hippocampe pour des personnes soumises à des
états de stress provoqués (Liberzon & Phan, 2003). Pour ces personnes, il est aussi démontré
que leurs fonctions mnésiques sont clairement affectées.
Ces données neuroscientifiques suggèrent que l’optimisation de l’efficacité des apprentissages
scolaires nécessite des conditions environnementales saines favorables ne plaçant pas l’élève
dans des situations de stress et d’angoisse au cours de l’apprentissage (Esseily, Rat-Fischer,
Somogyi, O’Regan, & Fagard, 2016). Le rôle de l’enseignant est alors de « garantir un cadre
hors menace car on ne peut pas grandir sans avoir des espaces sécurisés qui préservent à la
fois des débordements des autres et de ses propres débordements » (Meirieu, 2009, p. 8).
L’enseignant peut établir des alliances avec les élèves autorisant le repérage de ceux qui ont
besoin de lui. Il intervient au bon moment en donnant à ces élèves l’impression qu’il est de
leur côté et prêt à les aider.
L’activité physique (le sport) représente aussi une des conditions possibles pour diminuer les
situations de stress. Elle stimule la sécrétion dans le cerveau de la sérotonine impliquée dans
78
la régulation de l’humeur (Habib, 2018). Cette hormone active la fabrication de nouveaux
neurones principalement dans l’hippocampe (Voss et al., 2013). La pratique d’une activité
physique d’intensité moyenne et d’une durée quotidienne de cinquante minutes environ
favorise la formation de nouveaux neurones impliqués principalement dans la mémoire
(Maillot & Perrot, 2012; St-Louis-Deschênes & Ellemberg, 2013; Voss et al., 2013).
Les conditions environnementales favorables à l’apprentissage exigent aussi des situations
donnant un état de motivation (Habib, 2018; Houdé, 2011; Ruph, 2011).
Le cerveau est prédisposé à établir des associations entre objets, évènements, personnes. Les
facteurs environnementaux facilitent l’élaboration d’apprentissages associatifs tenaces et
rapides à s’installer, spécialement lorsque l’association se fait avec un renforcement
significatif pour l’individu (Franck, 2013; Habib, 2018; Kandel, 2007). Cette association peut
se faire avec un élément de renforcement positif ou négatif et influence directement la
motivation (Kolb et al., 2019).
L’apprentissage et l’expérience favorisent le contact avec certains stimuli de l’environnement
ou au contraire réduisent le contact avec d’autres stimuli. Ainsi « toute action qui amène une
situation plaisante tend à être répétée dans le futur » (Pessiglione, 2014, p. 1284). Au cours
d’un apprentissage, l’organisme associe les évènements du milieu extérieur à une valeur
positive ou à une valeur négative. Il apprend à éviter les stimuli environnementaux associés à
une valeur négative et chercher les contacts avec les stimuli à valeur positive (Fix, 2012;
Habib, 2018; Kolb et al., 2019; Purves et al., 2019). De tels comportements ne sont pas innés
mais acquis au cours de l’apprentissage et de l’expérience. La qualité d’un contact avec les
stimuli environnementaux est réduite lorsque l’individu ressent de la peur, de l’anxiété, du
manque d’intérêt, de l’ennui, donc des stimuli neutres ou aversifs (renforcements négatifs).
Par contre, la qualité d’un contact est maintenue et optimisée lorsque les stimuli
environnementaux procurent à l’individu du plaisir et satisfaction (renforcements positifs ou
récompense) (Jouvent, 2009; Lavoie et al., 2016).
« Les circuits cérébraux de la motivation nous permettent d’anticiper la valeur des différentes
options disponibles, de sélectionner une situation que nous prenons pour but, et de mettre en
place un plan d’action qui nous mène vers ce but » (Pessiglione, 2014, p. 1283). Le circuit de
la récompense joue un rôle essentiel dans les comportements motivés. Il comprend
79
l’hippocampe qui a un rôle essentiel dans la mémoire, l’amygdale et le cortex préfrontal
(Sussan, 2009; Trouvé, 2012).
L’amygdale joue un rôle essentiel dans le maintien du contact avec des stimuli de
l’environnement, directement ou ultérieurement. Cependant, l’individu perçoit aussi quelque
chose d’agréable quand l’amygdale est activé et cela explique la contribution de la
récompense dans le maintien de certains comportements autres que ceux qui sont adaptatifs
(Sussan, 2009; Trouvé, 2012). L’amygdale exerce alors une influence sur la prise de
conscience des conséquences positives et négatives des évènements du milieu extérieur. Les
fonctions exécutives de l’individu sont alors influencées du fait de la connexion de
l’amygdale au cortex préfrontal. Les différentes expériences menées témoignent que la
production d’un comportement lié à une récompense augmente rapidement la libération de la
dopamine par l’amygdale dans le circuit de la récompense.
L’amygdale est étroitement associée au fonctionnement du cortex préfrontal impliqué dans
des fonctions mnésiques (Borradori Tolsa et al., 2014; Cohen, 2009). Le cortex préfrontal
assure la sélection et la prise de décision des comportements les plus adaptés en réponse à une
situation donnée. Cette sélection peut être effectuée sur la base d’informations internes ou
externes environnementales. Certains stimuli environnementaux constituent des éléments de
motivation qui incitent les personnes à entrer en activité (Berridge, 2004). Les recherches en
neurosciences indiquent que les récompenses recherchées et obtenues engagent les mêmes
circuits cérébraux. «C’est par l’intermédiaire de ces circuits que la valeur anticipée des
récompenses nous incite à produire un effort, que celui-ci soit mental (comme de calculer un
trajet) ou physique (comme de porter une valise)» (Pessiglione, 2014, p. 1289).
Ce réseau de récompense ou système limbique contredit les principes du Behaviorisme où le
déclenchement d’une réponse à un stimulus est facilitée par la récompense matérielle qui
s’applique plutôt sur les circuits moteurs (Berridge, 2004; Dehaene, 2018; Schultz, 2005).
Par contre, dans le système limbique « ce qui est renforcé est l’association d’un contexte avec
une valeur. On sort ici du schéma behavioriste, qui excluait toute représentation mentale de
grandeur abstraite telle que la valeur » (Pessiglione, 2014, p. 1288).
La motivation est essentielle pour l’apprentissage. Elle assure un engagement actif de l’élève
renforçant l’attention, la réflexion et l’élaboration d’hypothèse. Cet apprentissage de haut
80
niveau cognitif ne survient que si l’enseignement assure des conditions affectives favorables
(Dehaene, 2018).
Influence des conditions environnementales affectives sur l’apprentissage
Les émotions représentent un état particulier perçu induit par une certaine situation. Elles
correspondent à « une modification d’état rapide et transitoire en deux temps. Un
déclenchement initial dû à la pertinence d’un évènement (réel ou imaginé) menant à une
réponse dans plusieurs composantes (système nerveux périphérique, tendance à l’action,
expression motrice et ressenti conscient) » (Denervaud et al., 2017, p. 20). L’expression des
émotions se reflète par des modifications physiologiques telles que le rythme cardiaque, la
pression sanguine et les muscles du visage intervenant dans les expressions faciales (Barrett,
2006). Le caractère des émotions peut être plaisant ou au contraire violent. Il entraîne des
sentiments subjectifs et la survenue de pensées liées à l’expérience vécue en induisant le
rappel de faits passés et déterminant ce qui peut être fait ultérieurement dans des situations
pareilles (Kolb et al., 2019).
Les émotions, induits par des stimuli internes ou externes, sont normalement une réponse
inconsciente (Hinton & Fischer, 2010). Le stimulus externe reçu au niveau des récepteurs
sensoriels crée un message nerveux qui est transmis directement aux structures cérébrales,
principalement l’amygdale. L’amygdale est connectée aux lobes frontaux. Les émotions
peuvent alors influencer les processus cognitifs d’apprentissage, l’évaluation des conditions
du milieu environnant, les pensées, les décisions et les actions.
Après avoir considéré pour de longues années les circuits neuronaux des émotions et de la
raison comme indépendants dans le cerveau, le développement des techniques d’imagerie
cérébrale révèle l’interdépendance et l’association de ces deux circuits au niveau cérébral. Ces
techniques signalent aussi une relation entre l’état émotionnel et la santé physique (Davidson
& Schuyler, 2017).
Les études neuroscientifiques témoignent de la plasticité des circuits neuronaux des émotions.
Ils sont capables de se développer et se modifier (Davidson & McEwen, 2012). Cela suggère
que le contrôle émotionnel et le bien-être peuvent être acquis suite à un travail intentionnel
après plusieurs entraînement par des techniques bénéfiques comme la méditation.
81
La figure 1illustre les images obtenues en IRMf de l’activité cérébrale d’individus en réaction
à des photos plaisantes (Davidson & Schuyler, 2017, p. 45).
Figure 1:IRMf de l'activité cérébrale en réaction à des photos plaisantes
Les images mettent en évidence un niveau élevé d’activation du striatum ventral (à gauche),
région cérébrale sous-tendant le bien-être psychologique. Également, une activation du cortex
préfrontal dorsolatéral droit (à droite), une région cérébrale impliquée dans l’attention et la
mémoire de travail. L’étude indique que le taux de cortisol associé à la réaction de
l’organisme au stress diminue lors d’une activation soutenue du striatum central et de la
région préfrontale dorsolatérale. Ces résultats témoignent que les émotions positives induisent
un état de bien-être durable plus résistant aux circonstances externes et une plus grande
résilience face à l’adversité et aux situations de stress. Cet effet est observée si les réactions
sont prolongées face aux stimuli positifs en comparaison à des réactions brèves où les niveaux
de bien-être sont plus bas (Lapate et al., 2014). De même, le contexte de la réaction face aux
stimuli positifs détermine la durabilité de l’effet des émotions sur le bien-être et la résilience à
l’adversité à long terme (Telzer, Fuligni, Lieberman, & Galván, 2014).
La résilience à l’adversité correspond à un rétablissement efficace de l’état de bien-être suite à
un stimuli négatif (Davidson & Schuyler, 2017). Elle représente une forme de régulation des
émotions (Schuyler et al., 2014). Cette réaction corporelle est associée à un recouvrement de
82
l’activité de l’amygdale soutenant les expériences de peur et d’anxiété. La figure 2 illustre les
images cérébrales obtenues en IRMf de l’activité de l’amygdale dans la régulation des
émotions face à l’adversité (Schuyler et al., 2014, p. 179).
Figure 2:IRMf de l'activité de l'amygdale lors de la résilience à l’adversité
Les images (en a) affirment que l’activité de l’amygdale est significativement plus grande lors
d’évènements négatifs par comparaison à des évènements neutres. Le premier graphe (en b)
montre l’augmentation croissante de l’activité de l’amygdale (rectangle gris foncé) après la
survenue d’un évènement négatif (rectangle noir), puis la phase de régulation (rectangle gris
clair). Le deuxième graphe (en c) indique une activation supérieure de l’amygdale chez les
patients à névrotisme élevé (en rouge) par comparaison à une moindre activation chez les
patients à névrotisme faible (en bleu) qui présentent un recouvrement plus rapide de l’activité
de l’amygdale. Le troisième graphe (en d) affiche une activation plus grande de l’amygdale
chez les patients ayant jugé de nouveaux visages comme moins sympathiques (en jaune) par
comparaison à des patients ayant jugé des visages très sympathiques (en vert) et qui
manifestent aussi un rétablissement plus rapide de l’activité de l’amygdale. Ces résultats
mettent en évidence que le recouvrement de l’amygdale est différent entre les individus jouant
ainsi un rôle important au niveau de la résilience et du bien-être. Cette compétence de gestion
des émotions étant associée à une plasticité cérébrale, elle n’est pas figée par la
prédétermination génétique et peut être atteinte au cours du parcours éducatif par la mise en
place d’un environnement favorable à son développement. En effet, « il est apparu que les
83
participants qui se caractérisaient par un score élevé pour le sens de la vie font preuve d’une
reprise vigoureuse à la suite des évènements négatifs » (Davidson & Schuyler, 2017, p. 50).
Cet effet est aussi observé chez les participants ayant une bonne estime de soi et une
croissance personnelle. En somme, « des niveaux d’adversité modérés peuvent faciliter
l’apprentissage de stratégies de régulation émotionnelle favorisant un meilleur rétablissement
(résilience) et provoquent des changements dans l’implication préfrontale » (Davidson &
Schuyler, 2017, p. 51).
En somme, les émotions sont associées aux buts d’accomplissement et de réussite des élèves.
Elles génèrent la motivation durant l’apprentissage sous forme de plaisir, d’intérêt, d’espoir
de progresser, d’estime de soi, d’empathie, d’engagement social, d’aide à autrui et
d’exploration de la nouveauté (Pekrun, Goetz, Frenzel, Barchfeld, & Perry, 2011; Silvia,
2010). Un environnement scolaire assurant ces diverses conditions affectives garantit une
amélioration de l’efficacité des apprentissages (Denervaud et al., 2017).
Un des apports récents les plus intéressants en neurosciences est l’importance des interactions
entre les régions cérébrales associées aux émotions et celles associées aux fonctions
cognitives et les influences mutuelles entre elles et sur l’ensemble du cerveau (Pichon &
Vuilleumier, 2011).
Plusieurs recherches mettent en évidence l’influence des sentiments plaisants provenant du
milieu environnant sur le fonctionnement cérébral. La figure 3 illustre les images obtenues en
IRMf lors de la réponse affective à des signaux sociaux de récompense ou de sanction (Pichon
& Vuilleumier, 2011, p. 768).
84
Figure 3:IRMf de la réponse affective à des signaux sociaux
Les images marquent une activation croissante de l’amygdale lorsque des visages exprimant
la colère sont présentés à des sujets suite à une erreur lors de l’exécution d’une tâche
cognitive. Par contre, l’activation du striatum ventral (neurones dopaminergiques) décroît en
réponse à des visages souriants exprimant la joie suite à une performance cognitive correcte.
Ces résultats confirment l’influence des conditions affectifs de sanction ou de récompense
lors de l’exécution de tâches cognitives sur le fonctionnement des structures cérébrales
(Vrtička, Andersson, Grandjean, Sander, & Vuilleumier, 2008). De plus, le cortex orbitofrontal et le gyrus frontal soutiennent la capacité de gestion des émotions et des conduites
sociales en participant à l’inhibition et la modification des comportements lorsque la
récompense cesse (Blair, 2004).
Ces données neuroscientifiques révèlent l’importance des messages verbaux et non-verbaux et
le sentiment de valorisation que l’enseignant donne aux élèves. « Le comportement qui
confirme peut créer une zone de sécurité où l’apprenant n’a pas peur de prendre les risques
[…] le facteur le plus important pour induire la motivation des élèves fut le comportement du
professeur suivi du climat créé dans la salle de classe » (Arnold, 2006, p. 412). Cela suppose
le respect l’élève, l’établissement d’une relation adulte-adulte avec lui (Berne, 2005) et lui
assurer la possibilité d’exprimer ses préoccupations. Le fait que les élèves vérifient « que
leurs camarades partagent leurs sentiments d’insécurité, qu’ils ne sont pas les seuls à les en
ressentir, peut avoir un effet positif » (Arnold, 2006, p. 413). L’organisation de la prise de
85
parole en classe est aussi importante de telle façon à ne pas forcer un élève à répondre avant
que l’enseignant ne vérifie qu’il est capable. D’autres techniques de prise de parole sont
efficaces telles que « think-pair-share » où l’enseignant propose une question et donne aux
élèves un temps de préparation individuelle puis un temps de discussion en paires et après leur
propose de prendre la parole face à l’ensemble du groupe (Kagan & Kagan, 2009). Cette
technique rend la production et l’intervention de l’élève plus élaborées et diminue l’anxiété
lors d’une communication à l’ensemble du groupe.
Parmi les propositions efficaces capables d’améliorer la gestion des émotions et l’anxiété en
classe, il est important de favoriser l’estime de soi et la confiance en soi des élèves. Il s’agit
« d’une estime de soi saine qui conduit l’apprenant à avoir une vision positive et réaliste de
soi et de ses capacités, en même temps qu’une attitude responsable fondée sur le fait qu’il se
sait capable d’atteindre des buts importants » (Arnold, 2006, p. 415). C’est aussi un rôle
crucial de l’enseignant en classe d’instaurer des conditions d’apprentissage soutenant la
capacité de chaque élève à travailler, à exploiter toutes ses potentialités et à progresser en
confrontant l’influence des émotions négatives. L’atteinte d’une compétence mène à un
sentiment de confiance en soi. L’enseignant peut donc aider l’élève à développer une plus
grande estime de soi en assurant un plus grand suivi pour atteindre un niveau de compétences
de plus haut niveau durant son parcours. Une étude réalisée souligne l’intérêt d’introduire dès
l’école élémentaire l’éducation aux neurosciences dans le développement de l’estime de soi
chez les élèves (Lanoë, Rossi, Froment, & Lubin, 2015). La reconnaissance par les élèves du
fonctionnement de leur cerveau et des mécanismes neuronaux de plasticité conduit à modifier
leur perception sur l’intelligence de statique à dynamique capable d’évoluer.
La gestion des émotions et le développement de l’estime de soi ne se réduit pas uniquement
au rôle de l’enseignant en classe mais également à l’interaction sociale entre camarades.
« L’émotion est un signal social qui peut être utilisé pour modifier l’action du partenaire, mais
aussi de l’individu lui-même » (Le Gall et al., 2009, p. 28). L’enseignant a ici la responsabilité
de créer un environnement de relations positives entre les élèves en classe et de développer les
compétences sociales d’empathie, de communication et de relations interpersonnelles.
Les techniques d’imagerie cérébrale (IRMf) mettent en lumière que l’exclusion sociale
engendre une blessure affective et une réponse émotionnelle qui active les mêmes circuits
86
cérébraux que ceux activés dans le cas d’une douleur physique (Eisenberger, Lieberman, &
Williams, 2003).
La figure 4 illustre les images obtenues en IRMf des régions du cortex préfrontal suite à une
exclusion sociale (Eisenberger et al., 2003, p. 291)
Figure 4: Images en IRMf de l'activation du cortex préfrontal suite à une exclusion sociale
Ces images révèlent l’activation par la douleur affective suite à une exclusion sociale de deux
régions cérébrales du cortex préfrontal. Il s’agit du cortex cingulaire antérieur dont l’activité
augmente suite à une douleur physique et du cortex préfrontal ventral dont l’activité augmente
lorsque la douleur diminue.
Ces résultats confirment que les mécanismes neurobiologiques dans le cerveau sont identiques
pour une douleur physique et une douleur affective. Cela atteste de l’importance du réconfort
social, de l’inclusion, de l’interaction et de la communication dans la réduction de la douleur
physique et affective. Les situations qui favorisent les liens sociaux telles que l’empathie
augmentent le bien-être des enfants et des adultes (Aknin, Hamlin, & Dunn, 2012; Hofmann,
Wisneski, Brandt, & Skitka, 2014).
L’empathie est l’« habileté à reconnaître et partager les émotions des autres » (Davidson &
Schuyler, 2017, p. 51). Elle peut être améliorée par entraînement à la compassion et la
reconnaissance des émotions de soi et d’autrui. L’activité cérébrale correspondante est
modulée par le cortex préfrontal ventral et dorsomédian. Ces régions sont impliquées dans la
régulation des émotions et le comportement dirigé vers un but. Elles augmentent la motivation
à reconnaître les émotions des autres suite à l’entraînement. Cela génère une empathie plus
compatissante et une orientation des ressources personnelles vers l’aide d’autrui.
87
Les compétences sociales d’empathie, de communication et de relations interpersonnelles
peuvent être développées à l’école à travers une approche socioconstructiviste mise en place
par les méthodes d’enseignement en groupes. Cette approche soutient la construction des
processus mentaux par interaction sociale et conflictuelle entre pairs (Barlow, 1993).
Les approches expérimentales menées chez l’animal comme chez l’homme mettent en
lumière l’amélioration de la mémorisation à long terme sous l’effet d’expériences
émotionnelles (Dolcos & Denkova, 2016; Habib, 2018; Kolb et al., 2019). Les émotions
activent des systèmes cérébraux et hormonaux qui facilitent et renforcent la mise en mémoire
des souvenirs explicites ou implicites (Lavoie et al., 2016).
Les études en IRMf révèlent que le contenu émotionnel positif favorise significativement la
durabilité des souvenirs en mémoire (Kaouane, 2010). L’amygdale joue un rôle essentiel dans
la sélection des informations à maintenir en mémoire, parmi celles qui ont le plus de sens et
d’importance pour l’individu.
D’autres études en neurosciences cognitives mettent en évidence que les facteurs émotionnels
améliorent les capacités d’attention et que l’activation de l’amygdale assure un rôle essentiel
dans l’orientation de l’attention vers l’expression faciale de l’autre (Adolphs et al., 2005;
Phelps, Ling, & Carrasco, 2006).
Conclusion
Les conditions environnementales influencent directement l’optimisation de l’efficacité des
apprentissages scolaire au développement durable et à la formation des futurs acteurs. D’où
l’importance que les enseignants assurent des conditions d’alliance, de suivi et d’aide aux
élèves. La garantie de conditions affectives favorables à l’inclusion sociale et l’estime de soi
privilégient la motivation des élèves. Celle-ci influence directement l’engagement actif,
l’attention et le développement de compétences de haut niveau cognitif. Ces conditions
environnementales induisent un recyclage neuronal au cours de l’apprentissage, une formation
de nouvelles connexions et une déformation d’autres. De profondes modifications cérébrales
sont alors retracées et consolident l’atteinte de nouvelles compétences conformes aux
exigences du futur développement durable. Les multiples apports des neurosciences
questionnent et réactualisent la compréhension des aspects naturels et environnementaux de
88
l’apprentissage et orientent les conditions pédagogiques optimales à instaurer au niveau des
méthodes d’enseignement, des situations et de l’environnement d’apprentissage.
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94
5. SENTIR OU A OUTRA FACE DO APRENDER NO ENSINO
SUPERIOR
Elisa Chaleta13
Resumo
Os modelos explicativos da aprendizagem em contextos de educação superior que se
desenvolveram nas últimas cinco décadas, tanto nos Estados Unidos como na Europa, foram
fortemente marcados pelos modelos cognitivistas e cognitivo-construtivistas determinando
evidente protagonismo da componente cognitiva nos modelos de ensino e aprendizagem. As
investigações realizadas, em particular na última década, têm vindo a enfatizar que a
aprendizagem na sua complexidade envolve, para além da faceta cognitiva, uma faceta
afectiva porque as tarefas de aprendizagem representam situações de realização que
desencadeiam emoções nos estudantes. A importância das emoções vivenciadas no contexto
educacional começa a ser reconhecida por pesquisadores de diferentes campos e tenta-se
agora a aproximação entre as diferentes tradições de pesquisa que permaneceram em relativo
isolamento e fragmentação. As emoções académicas podem desempenhar um papel
importante nos resultados de aprendizagem e no desenvolvimento de práticas educativas uma
vez que uma emoção académica pode ser activada ou desactivada em função da forma como o
estudante percepciona as tarefas de aprendizagem e o contexto de ensino.
Introdução
Após receber em 1979 o Distinguished Scientific Contribution Award pela American
Psychological Association, Robert Zajonc foi convidado a realizar a tradicional conferência
reservada aos cientistas homenageados em que usualmente apresentavam a investigação
premiada e a sua visão sobre o desenvolvimento futuro desse campo de interesse. Zajonc, no
entanto, optou por não cumprir a tradição e apresentou um texto "ricamente provocador"
(Rachman, 1981, p. 279) sobre a relação entre o afecto e a cognição. Era consensual na
investigação, à época, que as reações afectivas dependiam do processamento cognitivo prévio,
Professora do Departamento de Psicologia e Investigadora do Centro de Investigação em Educação e
Psicologia da Universidade de Évora (CIEP- UÉ)
Email: mec@evora.pt
Este texto resulta do Projeto PTDC/CED-EDG/29252/2017 financiado pela FCT – Fundação para a
Ciência e Tecnologia de Portugal.
13
95
pelo que os diferentes modelos concordavam, de modo geral, com a prevalência da cognição
sobre a emoção e que as reações afectivas só podiam ser observadas após um processamento
considerável da informação (Adolphs, 2017). Esta apresentação de Zajonc traduziu-se num
ataque frontal à ‘análise cognitiva’ da relação entre afecto e cognição, questionando o core
dos modelos cognitivistas, partindo da premissa de que as reações afectivas podiam ocorrer
antes e sem a participação do processamento cognitivo. De outro modo, enquanto os modelos
cognitivistas postulavam a primazia da cognição, Zajonc defendeu a primazia do afecto,
posição descrita no artigo publicado subsequentemente (1980) na American Psychologist:
Preferences (affect) need no inferences (cognition).
O debate resultante desta apresentação teve um enorme impacto no campo da investigação
sobre as emoções determinando, nas décadas que se seguiram, uma explosão de estudos (em
meados de 2009 o artigo tinha 2100 citações) sobre a relação entre afecto e cognição, ou seja,
saber se as reacções afectivas podiam surgir sem o envolvimento de processos cognitivos
(dando particular ênfase ao processamento afectivo automático). Não é nosso objectivo
apresentar aqui os resultados dessa investigação, realizada predominantemente no campo da
Psicologia Experimental, mas fazer notar o seu pouco impacto no campo da educação e da
aprendizagem que edificaram os seus constructos teóricos pela prevalência da dimensão
cognitiva, relegando para segundo plano a dimensão afectiva (embora algumas componentes
como a motivação ou a ansiedade face ás provas de avaliação tenham tido alguma atenção por
parte dos investigadores).
Se focarmos o nosso olhar sobre a investigação no quadro da aprendizagem em contexto
universitário, que teve o seu impulso nos anos 70 em Inglaterra, nos Estados Unidos e na
Suécia, observamos que se desenha a partir do interesse dos investigadores sobre os aspectos
preditores do desempenho académico dos estudantes (capacidade cognitiva, motivação e
personalidade) tendo em vista, essencialmente, a selecção dos alunos para as instituições de
ensino superior (Entwistle, 2015).
A observação dos diferentes modelos explicativos da aprendizagem em contextos de educação
superior, tanto nos Estados Unidos como na Europa, vemos a forte marca dos modelos
cognitivistas (referencial do processamento de informação) e cognitivo-construtivistas
(modelos centrados nos constructos de metacognição e autorregulação) onde a componente
cognitiva assume evidente protagonismo (Hattie & Yates, 2014). Nos Estados Unidos
investigaram-se inicialmente as características de personalidade dos estudantes, formas de
pensamento desenvolvidas por estes sobre a própria aprendizagem e os requisitos para
progredirem ao longo do percurso académico, originando a ideia de nível epistemológico e,
96
em Inglaterra e na Suécia, recorreu-se essencialmente a metodologias qualitativas para
compreender a perspectiva dos estudantes sobre o seu processo de aprendizagem visando
determinar, por um lado, o que aprendiam e, por outro, que estratégias adoptavam para
resolver as tarefas académicas (Entwistle & Marton, 1989).
A investigação que entretanto realizámos, seguindo a tradição europeia, mostrou que, para
além da componente cognitiva envolvendo estratégias cognitivas e metacognitivas de estudo e
de aprendizagem e de aspectos relacionados com a monitorização e gestão da actividade
mental (Chaleta, 2003, 2011; 2017), existia associada ao discurso dos estudantes uma forte
componente afectiva-emocional que envolvia emoções e sentimentos académicos que se
manifestavam nas várias tarefas e situações de aprendizagem, tornando evidente que esta
dimensão teria de ser considerada (Chaleta, 2013; Chaleta et al., 2013). A presença da
componente afectiva na aprendizagem dos estudantes universitários começou a ser
equacionada quando detectámos que respondiam recorrentemente acerca do que pensavam
sobre algo, “eu sinto que…”.
A primazia do afecto sobre a cognição enunciada por Zajonc e a possibilidade do
processamento afectivo ocorrer sem processamento cognitivo prévio, ou mesmo de forma
automática, tornou-se relevante no contexto da investigação que realizamos. Os dados
entretanto obtidos apontavam para um forte entrelace entre a dimensão cognitiva e afectiva
nos processos de aprendizagem e, ao mesmo tempo, constatava- se que (não apenas no ensino
superior) muitos eram os alunos que não aprendiam e tinham insucesso académico apesar de
não revelarem qualquer comprometimento cognitivo. De entre as variadas questões que os
resultados nos vão suscitando, como que emoções e sentimentos se encontram associadas ao
aprender em diferentes situações ou que emoções/sentimentos facilitam ou dificultam o
processo de aprendizagem, uma delas assume particular relevância para compreender a falta
de envolvimento dos alunos nas tarefas académicas em determinadas situações ou contextos
(e consequente insucesso académico): podem ser desencadeadas emoções de forma
automática e não consciente susceptíveis de perturbar o envolvimento dos sujeitos nas tarefas
e o seu processamento cognitivo sem que ninguém se dê conta, incluindo o próprio?
Por outro lado, se a componente emocional tem um importante papel na aprendizagem,
importa compreender que emoções a afectam e como e, também, que possibilidades têm os
estudantes de regular o que sentem em situações de aprendizagem. Para compreender o
impacto das emoções no processo de aprendizagem recorremos essencialmente a dois
modelos explicativos desenvolvidos nas duas ultimas décadas. Referimo-nos à investigação
conduzida por Pekrun (2000, 2006, 2009, 2014, 2016, 2018) que estuda as emoções
97
académicas ou emoções de realização e ao modelo metacognitivo e afectivo da aprendizagem
autorregulada (MASRL) de Efklides (2001, 2002, 2005, 2006a, 2006b, 2008, 2009, 2011,
2014).
Emoções e sentimentos nas experiências de aprendizagem
O conceito de ‘emoções académicas’ surge na investigação científica na década de 90 do
século XX a partir da pesquisa de Pekrun sobre a motivação e a ansiedade dos alunos face aos
exames académicos (Pekrun et al., 2004). Destes estudos e da integração dos resultados da
investigação realizada por Perry (1991; Perry & Magnusson, 1989) sobre o controle e a
motivação académica, emerge um modelo explicativo para compreender os efeitos das
emoções na aprendizagem, mediados por mecanismos cognitivos e motivacionais e a sua
respectiva regulação (Pekrun, 1992a, 1992b, 2000; Pekrun, Goetz, Tiz & Perry, 2002).
A ansiedade relacionada com os exames continuou a atrair o interesse de muitos
investigadores, mas outras emoções relacionadas com a realização académica foram
negligenciadas existindo, actualmente, maior interesse no seu estudo, em particular a partir da
teoria de controle-valor de Pekrun (Bernardo, Ouano & Salanga, 2009). Considera-se que os
estudantes não experienciam, necessariamente, toda a gama de emoções humanas nas suas
experiências de aprendizagem pelo que o leque das emoções académicas identificadas é
menor do que o das emoções gerais, devendo ser consideradas como emoções
complementares e não apenas um mero subconjunto das emoções gerais (Pekrun, Goetz, Tiz
& Perry, 2002).
As emoções académicas e as emoções gerais têm os mesmos limites conceptuais uma vez que
a grande maioria das emoções académicas, identificadas na teoria de controle-valor de Pekrun
(Goetz et al., 2006), se encontram na categoria dos afetos gerais (como a raiva, a ansiedade, o
98
prazer, o orgulho e a vergonha). Por outro lado, ainda existem algumas limitações em termos
do conhecimento produzido no campo das emoções académicas uma vez que ainda estão por
determinar os seus antecedentes e a sua ocorrência em áreas académicas específicas. A
identificação dos antecedentes causais e dos mediadores cognitivos das emoções académicas
permitirá construir um quadro mais completo dos problemas emocionais específicos dos
alunos e, também, desenhar respostas mais eficazes ao nível da aprendizagem e do bem-estar
psicológico em contexto académico (Goetz et al, 2016). A investigação tem mostrado maior
facilidade na classificação das emoções académicas em contextos em que existe
especificidade de domínio (por exemplo, português vs. matemática) do que em situações
relacionadas com a classificação mais geral das emoções (por exemplo, prazer vs. ansiedade).
Em termos gerais, a investigação sobre as emoções académicas e a forma como estudantes
lidam com elas em diferentes situações permanecem escassas (Asikainen, Hailikari &
Mattsson, 2018).
No quadro da pesquisa educacional o estudo das emoções e dos sentimentos associados ao
processo de aprendizagem foram negligenciados durante muito tempo, com excepção para a
ansiedade em situação de testes ou exames que surge na literatura desde a década de 1930 e
da investigação sobre os antecedentes atribuicionais das emoções relacionadas com sucesso e
fracasso. Apenas no final da década de 1990 se inicia na Europa e nos Estados Unidos a
investigação sobre as múltiplas dimensões das emoções, a forma como se desenvolvem e a
importância funcional que revelam na aprendizagem e no desenvolvimento dos estudantes
(Pekrun, 2005). Como a maioria dos estudos foram produzidos em níveis de ensino anteriores
observa-se, ainda, uma grande lacuna no contexto da investigação na área das emoções e
sentimentos nas experiências de aprendizagem nos contextos de educação superior.
No ensino superior o foco incidiu, essencialmente, na vertente cognitiva, isto é, na
aprendizagem como conhecimento de factos, no raciocínio lógico, na análise crítica, na
capacidade de resolver problemas sendo estes considerados os indicadores mais decisivos do
sucesso académico. Porém, essa abordagem revelou-se insuficiente uma vez que a
aprendizagem do estudante não acontece num domínio puramente racional dissociado da
emoção (Immordino-Yang & Damásio, 2007) e os resultados da aprendizagem dependem,
também, do estado emocional do estudante e das suas relações interpessoais (Zabalza, 2004).
Na universidade os estudantes experimentam diversas e diferentes emoções no contexto
académico. Uns gostam de aprender novos assuntos, alguns sentem-se orgulhosos das suas
realizações académicas, outros há que se sentem entediados com as suas tarefas e outros que
se sentem envergonhados pelos seus fracassos (King & Gaerlan, 2014). Os alunos vivenciam
99
em ambiente académico, com frequência, diversas emoções (positivas e negativas) como
excitação ao estudar, orgulho pelas suas realizações académicas, surpresa ao descobrir uma
nova solução, aborrecimento/tédio durante as aulas, ansiedade, medo, preocupação e/ou
nervosismo durante os exames, alegria ou vergonha face aos resultados de avaliação, entre
outros (Pekrun, 2014). Neste sentido, as emoções académicas são experienciadas numa ampla
e variada gama de ambientes académicos e estão directamente relacionadas com as
actividades como estudar e aprender (Ainley, Corrigan & Richardson 2005; Asikainen,
Hailikari & Mattsson, 2018; Goetz et al. 2007; Govaerts & Grégoire 2008), podendo ocorrer
em variados ambientes de aprendizagem (presencial ou virtual), seja numa escola, numa
universidade ou até mesmo num centro de formação.
Segundo Ahmed et al. (2010; Tyng et al., 2017), as experiências emocionais são
omnipresentes por natureza sendo importantes e críticas em espaços académicos uma vez que
a emoção modula todos os aspectos da cognição. As emoções académicas podem estimular ou
inibir o processo de aprendizagem dos alunos devido à influência expressiva que têm sobre a
percepção, a atenção, a memória, o raciocínio e a resolução de problemas, sendo ainda
relevantes na codificação e recuperação de informação e ao nível da curiosidade e da
criatividade como componentes da aprendizagem (Chiang & Liu, 2014).
As emoções académicas têm influência sobre a cognição, a motivação, a autorregulação, o
envolvimento dos estudantes na aprendizagem e, consequentemente, na sua realização
académica (Pekrun et al., 2009; Pekrun et al., 2011). Segundo Pekrun, Elliot e Maier (2006),
as emoções académicas como prazer, esperança, orgulho, ansiedade, vergonha, desespero e
tédio têm um significativo impacto na aprendizagem, na motivação, na memória, no
desempenho e, também, na saúde física e psicológica de um modo geral. Podem ainda
influenciar o bem-estar, a qualidade da aprendizagem, a realização académica e a interacção
social na sala de aula (Goetz et al., 2006; Goetz et al., 2012).
As emoções denominadas por Pekrun (2006) de emoções académicas ou de realização, são
experiências emocionais que envolvem competências pessoais directamente relacionadas com
as actividades ou resultados da aprendizagem e com os contextos académicos como a sala de
aula ou a realização de provas de avaliação (Goetz, Preckel, Pekrun & Hall, 2007), podendo
variar ao longo do percurso académico. Assim, as emoções podem corresponder ao prazer
sentido pela obtenção de uma nota alta num exame, ao tédio experimentado numa sala de aula
ou à frustração e raiva sentidas ao lidar com uma tarefa percebida como difícil (Pekrun, 2006;
Pekrun et al., 2010).
100
Tanto a emoção relacionada com a actividade, como a relacionada com os resultados, podem
ser agrupadas de acordo com a sua valência (positiva versus negativa; prazerosa versus
desprazerosa). A investigação realizada por Pekrun, Goetz, Titz e Perry (2002) encontrou
como mais referidas quatro tipos de emoções: emoções positivas activantes (satisfação,
esperança e orgulho); ii) emoções negativas activantes (raiva, ansiedade e vergonha); iii)
emoções positivas desactivantes (alívio) e iv) emoções negativas desactivantes (desespero e
aborrecimento).
Neste
estudo
identificaram-se
ainda
as
três
situações
em
que
maioritariamente são activadas as emoções académicas: durante as aulas, no estudo fora das
aulas e nos momentos de realização de provas académicas (Goetz, Pekrun, Hall & Haag,
2006; Goetz et al., 2007; Zeidner, 2007).
As emoções de realização podem variar em intensidade e frequência e desencadeiam
comportamentos de aproximação ou de evitamento das tarefas de aprendizagem, consoante
facilitem ou dificultem essa mesma aprendizagem (Efklides, 2009; Goetz et al., 2007;
Zeidner, 2007). Podem ser conceptualizadas como episódios momentâneos que ocorrem numa
determinada situação e num determinado tempo (como por exemplo a ansiedade
experimentada antes de um exame) ou como habituais e recorrentes sendo experimentadas em
relação a determinadas disciplinas como por exemplo a matemática (Peixoto et al., 2015;
Pekrun, Elliot & Maier, 2006).
A investigação permitiu identificar dois tipos de emoções de realização: i) emoções de
actividade/mestria (prazer, tédio e raiva) decorrentes da realização de actividades e ii)
emoções de resultado/desempenho, (esperança, orgulho, ansiedade, desânimo e vergonha)
decorrentes dos resultados obtidos. Estes dois tipos de emoções de desempenho (foco na
actividade ou no resultado) podem ser agrupadas de acordo com a sua valência positiva ou
negativa. Caracterizam-se como positivas, por exemplo, o prazer, a esperança e o orgulho, e
como negativas, o tédio, a raiva, a ansiedade, o desânimo e a vergonha (Pekrun, 2006, 2014,
2018; Pekrun et al., 2007, Harley et al., 2019). Para além da valência (positiva ou negativa),
as emoções envolvem uma componente prospectiva/antecipatória face à expectativa de
sucesso ou fracasso (esperança de sucesso ou ansiedade de insucesso/falha) e emoções
retrospectivas (orgulho ou vergonha) relativas ao sucesso ou fracasso obtido (Pekrun, 2006;
Pekrun et al., 2010). Meinhardt e Pekrun (2003) realizaram um estudo sobre o efeito das
emoções positivas e negativas nos processos cognitivos e os resultados obtidos demonstraram
que os dois tipos podiam consumir recursos cognitivos, desviando e focalizando a atenção no
objecto da emoção o que implicava a redução de recursos necessários à resolução de tarefas.
101
As emoções influenciam também a motivação intrínseca dos alunos (interesse e curiosidade
pela aprendizagem) e a motivação extrínseca (relacionada com a obtenção de resultados
positivos ou notas elevadas). As emoções positivas activantes como o prazer, a esperança e o
orgulho influenciam ambos os tipos de motivação (intrínseca e extrínseca) e facilitam o uso
de estratégias de aprendizagem mais flexíveis afetando positivamente o desempenho
académico. Por outro lado, as emoções negativas desactivantes, como o desespero e o tédio,
reduzem a motivação e o esforço no processamento de informação, conduzindo a efeitos
negativos no desempenho (Pekrun et al., 2002; Harley et al., 2019). Emoções como a raiva, a
ansiedade e a vergonha podem ter diferentes efeitos: tanto podem reduzir a motivação
intrínseca como podem induzir uma forte motivação extrínseca aumentando o investimento e
o esforço (Pekrun et al., 2011), o que implica que os seus efeitos sobre a motivação não são
necessariamente negativos, podendo funcionar como emoções negativas activantes da
aprendizagem. Emoções desactivantes como o alívio ou o tédio podem conduzir a um
processamento de informação mais superficial ao invés de conduzir ao uso mais intensivo de
estratégias de aprendizagem.
As emoções de realização afectam os processos cognitivos e motivacionais, assim como o
bem-estar, a felicidade e a satisfação com a vida podendo ter uma forte influência na
aprendizagem e no desempenho ou rendimento escolar (Pekrun, 2006; Pekrun, Frenzel,
Barchfeld & Perry, 2011). Pekrun (2014, 2016) afirma que as emoções são funcionalmente
importantes nos ambientes académicos uma vez que podem ser adaptativas ou desadaptativas,
conduzindo ao sucesso ou ao fracasso escolar. As emoções positivas como o prazer em
aprender podem levar o aluno a alcançar metas e desafios estabelecidos e a activar o
pensamento criativo para a resolução de problemas (ou mesmo como protecção da saúde
mediante aumento da resiliência). Por outro lado, as emoções desadaptativas como a
ansiedade excessiva, a desesperança ou o tédio podem induzir comportamentos de evitação,
fuga e desistência.
Linnenbrink-Garcia e Pekrun (2011) consideram relevante compreender o papel das emoções
como a raiva, a frustração, tédio, a vergonha, o prazer, a esperança, a alegria e o orgulho
(entre outras) em ambientes académicos, em particular, como e porque emergem, como
afectam o processamento cognitivo, de que forma moldam o envolvimento dos alunos nas
tarefas de aprendizagem e quais as possibilidades dos estudantes mobilizarem os recursos
emocionais para facilitar esse envolvimento e a realização académica.
As emoções dirigem, conduzem e guiam a cognição (Cubukcu, 2013; Fonseca, 2016) e, tendo
em vista a valência emocional, emoções positivas como alegria e entusiasmo são benéficas
102
para os indivíduos e as emoções negativas como tristeza, raiva e frustração constituem-se
como um provável inibidor de ações apropriadas pois costumam durar mais tempo do que as
emoções positivas (Beard, Humberstone & Clayton, 2014; Frijda, 1998). Para Damásio
(1996), a emoção é iniciadora do processo de aprendizagem, sendo fundamental e útil para
que ela ocorra e os sentimentos, por sua vez, aprimoram a aprendizagem. Além disso, a
emoção pode afectar alguns processos cognitivos como a tomada de decisão e indivíduos que
possuem algum déficit na região cerebral responsável pelas emoções e pelos sentimentos,
como o sistema límbico, costumam apresentar dificuldades de aprendizagem.
Goleman (1997, 2001) considera que as emoções funcionam como ferramentas que servem
para aprimoramento da inteligência e, dessa forma, contribuem para a aprendizagem ao
proporcionar estímulos à cognição. Por outro lado, acredita que os estudantes que possuem
problemas emocionais têm maior dificuldade em aprender, pois, da mesma forma que a
emoção é um propulsor e mecanismo de alavanca da aprendizagem, uma disfunção emocional
(ou ‘não estar bem emocionalmente’) pode ser prejudicial para a aprendizagem. A inteligência
emocional constitui, assim, um aspecto relevante, pois ser emocionalmente inteligente
significa conhecer as próprias emoções, a sua intensidade, as suas causas, as suas
consequências e as emoções dos outros (Butz et al., 2016; Kollontai, 2015).
As emoções académicas podem desempenhar um papel importante na avaliação e no
desenvolvimento de práticas educativas e, consequentemente, nos resultados de aprendizagem
(Goetz et al., 2016). Importa, neste contexto, perceber como os alunos se sentem antes,
durante ou depois de uma determinada actividade ou tarefa académica, pois as emoções
ocorrem em muitas situações para além dos exames (Zhou, 2016). Os métodos de ensino, o
feedback e as tarefas de aprendizagem estão associados às emoções académicas dos alunos
(Chiang & Liu, 2014; Goetz et al., 2013), o que significa que uma emoção académica pode
ser activada ou desactivada em função da forma como o conteúdo é transmitido pelo professor
na sala de aula (como, por exemplo, o seu nível de compreensibilidade, ritmo e o uso de
recursos audiovisuais).
A partir dos estudos sobre as emoções em contexto académico, Pekrun (2006, 2014)
desenvolve a teoria de controlo-valor das emoções de realização que oferece um modelo
integrativo das experiências emocionais para analisar os antecedentes e os efeitos das
emoções de realização em ambiente académico. Numa fase inicial a teoria centrava-se num
modelo de expectativa de valor da ansiedade sendo ampliada, posteriormente, para incluir os
antecedentes e os efeitos das múltiplas emoções de realização tendo em conta o envolvimento
académico, a autorregulação e a realização académica (Bieg, Goetz & Hubbard, 2013). Na
103
atual versão, a teoria do controlo-valor integra os pressupostos das abordagens sobre o valor
das expectativas das teorias atribuicionais da emoção e das teorias sobre o papel da percepção
do controlo na experiência emocional, na aprendizagem e no rendimento académico. Pekrun
(2006) destaca a importância de dois grupos de avaliações cognitivas: i) a controlabilidade
percebida das actividades de realização e dos seus resultados mediante a percepção de
competência e as cognições causais (expectativas de que a persistência no estudo pode ser
exercida e que irá conduzir ao sucesso) e ii) o valor subjectivo dessas actividades e resultados
(importância percebida de sucesso).
De um modo mais específico as avaliações de controlo e valor do estudante seriam parte de
um processo cognitivo capaz de mediar as suas emoções ligadas às actividades de
desempenho e aos seus resultados académicos (Meyer & Turner, 2002, 2006). Nestas
avaliações estariam incluídas as expectativas relacionadas com os resultados de desempenho,
atribuições de causalidade, autoconceito académico e competências/habilidades. Assim, o
controlo (mesmo que subjectivo) diz respeito à influência da percepção de controlo sobre as
acções e os resultados por parte do aluno, ou seja, à percepção que o aluno tem acerca do seu
desempenho numa determinada tarefa ou disciplina considerando, neste caso, a percepção de
competência, as expectativas e as atribuições de causalidade para o sucesso/fracasso (Frenzel,
Pekrun & Goetz, 2007). O valor (subjectivo), por sua vez, refere-se à valência atribuída às
acções e aos resultados, ou seja, à importância subjectiva que o aluno atribui a determinada
disciplina/tarefa (Pekrun, 2006, 2016, 2018).
De acordo com Pekrun, Elliot e Maier (2006), a teoria de controlo-valor baseia-se na premissa
de que as avaliações de controlo e dos valores são centrais para o despoletar de emoções de
desempenho positivas (como o prazer) e para reduzir as emoções negativas (tédio, raiva e
frustração). Assim, o controlo dos resultados e o seu valor subjectivo positivo promovem
emoções positivas de resultado, como a esperança e o orgulho. Por outro lado, a percepção de
incontrolabilidade e a atribuição de um valor subjectivo negativo aos resultados desperta
emoções de resultado negativas como ansiedade, desânimo ou vergonha. As avaliações
subjectivas são fundamentais para o despertar das emoções tendo em conta que podem afectar
a aprendizagem, o interesse, o envolvimento escolar, o desempenho, a realização e o
desenvolvimento da personalidade, podendo ainda influenciar o clima social da sala de aula e
o ensino (Pekrun, 2006; Pekrun et al., 2011). Apesar da maioria dos estudos se focalizarem
essencialmente na ansiedade face aos testes (Pekrun et al., 2006) e nas emoções relacionadas
com situações de sucesso e fracasso, algumas investigações têm incidido sobre a relação entre
as emoções positivas (como o prazer) e as emoções negativas (como a zanga, o tédio, o
104
desânimo e vergonha) no desempenho académico (Pekrun et al., 2002; Pekrun et al., 2010).
As emoções de realização são críticas no domínio da aprendizagem devido ao seu impacto no
sucesso e no fracasso, mas podem ser modificadas mediante regulação emocional. Para isso é
fundamental compreender como em diferentes situações de realização as emoções são
reguladas e qual o papel e o impacto das emoções discretas nas estratégias de regulação
adoptadas (Harley, Pekrun, Taxer & Gross, 2019).
A dimensão afectiva da aprendizagem foi também explorada no modelo metacognitivo e
afectivo da aprendizagem autorregulada (MASRL) de Efklides (2011), que coloca a ênfase na
pessoa e não tanto sobre o comportamento ou sobre o contexto. A pessoa envolve
características metacognitivas, cognitivas, motivacionais, afectivas e volitivas relativamente
estáveis (traços) que se formaram em diferentes situações de aprendizagem e são estes
recursos, relativamente estáveis da pessoa, que levam a decisões sobre o envolvimento numa
tarefa. O nível pessoa associa a estas características componentes específicas como i) as
competências da pessoa (conhecimento, habilidades), ii) a forma de orientação para a
concretização de objectivos, as expectativas e as crenças, iii) o autoconceito como
representação da própria competência em vários domínios, iv) as atitudes, disposições
comportamentais, emoções (ansiedade, interesse, medo, orgulho, vergonha) em relação à
aprendizagem v) a volição, na forma de percepção de controlo e vi) a metacognição na forma
de conhecimento metacognitivo que capta a história da pessoa no percurso de aprendizagem,
como o conhecimento de si mesmo e dos outros e das tarefas, metas e estratégias (Efklides,
2011).
As experiências de aprendizagem representam para os alunos situações de conquista ou
fracasso suscitando, para além do esforço ou investimento cognitivo, reacções afectivas
despoletadas num determinado contexto. A disponibilidade cognitiva para aprender ou para
investir esforço cognitivo numa tarefa é possibilitada pelas experiências afectivas que
funcionam como um regulador tanto cognitivo como afectivo, facilitando ou inibindo a gestão
do processo de aprendizagem pelo estudante (Efklides, 2009). Face a uma tarefa de
aprendizagem o estudante pode ser confrontado com obstáculos que podem interromper o
processamento cognitivo. O que define fundamentalmente estas experiências metacognitivas é
o seu carácter afectivo que dá acesso tanto ao circuito regulador cognitivo do comportamento
como ao afectivo. As experiências metacognitivas são, assim, manifestações da monitorização
online da cognição resultantes da interacção entre a pessoa e a tarefa e compreendem
sentimentos, julgamentos e conhecimento online específico sobre a tarefa (Efklides, 2001,
2006b).
105
A investigação da possibilidade de regulação através do circuito cognitivo tem-se centrado
nas habilidades metacognitivas e no conhecimento metacognitivo (declarativo e processual).
O desenvolvimento do processamento cognitivo (mais ou menos eficaz) numa determinada
tarefa resulta da experiência metacognitiva do indivíduo. Durante um esforço cognitivo
ocorrem julgamentos, vivenciam-se sentimentos e/ou emoções e recorre-se ao conhecimento
específico sobre a tarefa. São exemplos de julgamentos/ estimativas a estimativa de esforço
necessário para a realização da tarefa, a estimativa de tempo necessário e a estimativa da
solução correta. O conhecimento online específico compreende as informações sobre a tarefa
a ser executada (ideias/ pensamentos conscientes úteis para saber como lidar com a tarefa) e
procedimentos utilizados no passado em tarefas semelhantes passíveis de serem aplicadas no
presente. O conhecimento online específico é de natureza cognitiva e analítica, ao contrário
dos sentimentos metacognitivos que compreendem, em simultâneo, um caracter cognitivo,
mas também afectivo. O carácter afectivo das experiências metacognitivas pode ser explicado
por circuitos de feedback (Carver, 2003; Carver & Scheier, 2011; Efklides, 2009) que avaliam
o resultado do processamento cognitivo tendo em conta a discrepância face à meta
estabelecida (maior distância entre a meta estabelecida e o resultado conduz a afecto negativo;
maior a aproximação à meta conduz a afecto positivo ou satisfação).
Numa situação de aprendizagem os estudantes podem experienciar sentimentos relacionados
com as características da tarefa (sentimento de saber, sentimento de familiaridade e
sentimento de dificuldade) ou relacionados com o resultado do processamento (sentimento de
satisfação e sentimento de confiança). Estes sentimentos são denominados de sentimentos
metacognitivos (Efklides & Violet, 2005) porque estão presentes na cognição e resultam de
uma função de monitorização que informa a pessoa acerca da necessidade de tomar decisões
de controlo ao invés de a conduzir à acção directa. Assim, os sentimentos metacognitivos
funcionam como sinalizadores que podem ser interpretados pelo estudante permitindo-lhe
tomar decisões de controlo (estratégias cognitivas e metacognitivas) ou decisões que
determinem o início ou o evitamento da tarefa e, dessa forma, autorregular o seu processo de
aprendizagem, tanto a curto como a longo-prazo (Efklides, 2009). O sentimento de
dificuldade que induz, por norma, a interrupção do processamento cognitivo, está associado
ao afecto negativo enquanto o sentimento de familiaridade, se associa ao afecto positivo
(Efklides & Petkaki, 2005). O sentimento de confiança está relacionado com o resultado do
processamento como o sentimento de satisfação, mas distingue-se deste, porque se baseia em
informações da estimativa de solução correcta. O sentimento de dificuldade está relacionado
com a fluência do processamento, ou seja, a forma como a solução/resposta foi produzida,
106
fluentemente ou com interrupções. A estimativa de solução correcta é baseada em
conhecimento metacognitivo e está associada ao afecto negativo (Efklides & Petkaki, 2005)
que implica pensamento crítico e analítico (Brown, 1987, 2000; Kuhl, 2011). O sentimento de
confiança é afectado pela estimativa de solução correcta e pelo sentimento de dificuldade,
enquanto o sentimento de satisfação está relacionado com o sentimento de confiança. Em
pessoas com características de personalidade perfeccionistas, o resultado do processamento
cognitivo, embora possa ser correcto, é sempre discrepante da meta estabelecida.
Os sentimentos metacognitivos não são analíticos, geralmente são momentâneos, transitórios
e podem passar despercebidos, mas quando são demasiado intensos o indivíduo toma
consciência da sua presença, o que dá origem a processos conscientes analíticos, tendo
implicações no processamento cognitivo, na necessidade de acção e de regulação do
comportamento (Efklides, 2009, 2011, 2014). Assim, o aluno a fim de dar sentido aos seus
sentimentos metacognitivos, recorre ao seu conhecimento metacognitivo sobre pessoas e
tarefas e/ou realiza atribuições causais sobre a sua fonte, sendo esta situação particularmente
evidente no sentimento de dificuldade. Quando o aluno sente dificuldade muitas vezes não
consegue identificar facilmente a causa, emergindo dúvidas sobre se esta é devida a falta de
compreensão sobre a tarefa, falta de conhecimento declarativo/processual prévio, etc. Nestes
casos, existe uma interrupção do processamento ou falta fluência no processamento o que dá
origem ao afecto desagradável/negativo traduzido em sentimento de dificuldade (Efklides,
2002; 2006b; 2008; 2009). Tomar consciência deste sentimento conduz à necessidade de
aumentar o esforço tendo em vista restabelecer o processamento, razão pela qual o sentimento
de dificuldade e a estimativa de esforço se correlacionam tão significativamente. Em situações
mais extremas o sentimento de dificuldade pode ser tão intenso que pode levar ao abandono
da tarefa. Se a tarefa for familiar e o processamento for executado sem quaisquer problemas
ou interrupções a pessoa experiencia afecto positivo ou nenhum sentimento de dificuldade
(Efklides & Petkaki, 2005).
As experiências metacognitivas fornecem dados que activam as habilidades metacognitivas e
que permitem controlar a acção e o comportamento. O sentimento de dificuldade pode ser
atribuído, por exemplo, à complexidade da tarefa, à exigência ou à falta de competência
pessoal para lidar com essa tarefa. Caso a atribuição causal corresponda à complexidade da
tarefa, o estudante tende a procurar obter estratégias metacognitivas com o objectivo de
prosseguir com o processamento. Assim, os sentimentos metacognitivos informam sobre a
capacidade de a pessoa realizar com sucesso uma determinada tarefa. Metallidou e Efklides
(2001) demonstraram que as experiências metacognitivas anteveem as atribuições causais
107
feitas pelos alunos após a resolução de problemas verificando que o sentimento de confiança
conduziu a atribuições de capacidade/competência, enquanto o sentimento de dificuldade
conduziu a atribuições relacionadas com falta de competência e com a dificuldade da tarefa.
Efklides (2009, 2011) associa os sentimentos à metacognição por considerar que estes são
resultantes de processos de monitorização que informam a pessoa sobre a necessidade de
controlar decisões (mais do que conduzir à acção como acontece com as emoções). Os
sentimentos metacognitivos possuem características específicas, nomeadamente na conexão
com os loops regulatórios cognitivo e afectivo (Efklides, 2006) e a sua função é informar a
pessoa sobre as características do processamento cognitivo no decurso da experiência de
aprendizagem (Efklides, 2008). Os sentimentos metacognitivos, tal como os julgamentos
metacognitivos, são produtos de processos inferenciais não analíticos que informam a pessoa
acerca das características do processamento cognitivo, do resultado do processamento, bem
como do progresso que a pessoa está a fazer relativamente aos seus próprios objectivos
(Efklides, 2008). Emergem, de um modo geral, quando existem condições que não permitem
análises completas da situação, tais como a pressão de tempo ou falta de acesso à informação
na memória ou sob condições de incerteza (Efklides, 2006).
O estudo das emoções e dos sentimentos académicos poderá agora contribuir para a
compreensão do constructo de motivação em contexto académico (presença ou ausência). A
motivação, neste contexto, é considerada como um estado interior que dirige e instiga o
comportamento de forma persistente e enérgica (Isaac & Behar-Horenstein, 2006), como um
processo no qual o comportamento dirigido para os objectivos é instigado e mantido (Pintrich
& Schunk, 2002), ou ainda, como qualquer factor interno que inicia (activação), dirige
(direcção) e sustenta (manutenção ou persistência) uma determinada conduta até à consecução
de um determinado objectivo (Barros de Oliveira, 2010). Importa então averiguar se o estado
interior, o processo ou qualquer factor interno a que se referem os autores pode resultar do
despoletar de emoções ou sentimentos desencadeados nas experiências de aprendizagem e
compreender, também, em contexto de realização académica, o porquê de alguns estudantes
completarem as tarefas apesar das acentuadas dificuldades enquanto outros desistem face ao
menor obstáculo.
Para Eflkides (2005, 2006a, 2006b, 2009, 2011), os sentimentos metacognitivos assim como
outras experiências metacognitivas (julgamentos e conhecimentos), influenciam e interferem
com o autoconceito e a auto-estima do aluno (incluindo crenças de auto-eficácia). Com base
no seu autoconceito o estudante constrói expetativas sobre a sua capacidade de lidar com as
exigências de novas situações de aprendizagem, constrói a sua própria teoria de aprendizagem
108
pessoal (baseada nas suas experiências metacognitivas anteriores, nos conhecimentos
formados nas várias situações de aprendizagem e sobre os resultados das mesmas) e, a partir
das dificuldades enfrentadas, elabora as atribuições causais para o sucesso e o fracasso que, ao
longo do tempo, vão sendo interiorizadas. Ao mesmo tempo vai construindo, também,
representações sobre determinados domínios de aprendizagem (como a matemática) a partir
de experiências de aprendizagem anteriores e que ficam guardadas na memória como o que
sentiu, como pensou, como resolveu os problemas, se falhou ou obteve sucesso, etc. Estas
vivências são principalmente afectivas e estas memórias afectivas guardadas são activadas
mediante uma nova tarefa quando esta requer decisões de controlo. Por exemplo, um
estudante baseado na sua experiência metacognitiva, acredita que não possui competência
num determinado domínio de aprendizagem (atribuição causal de competência) e quando se
depara com uma tarefa que pertence a esse domínio, mesmo antes de iniciar o processamento
da tarefa, vai experienciar afecto negativo e formar baixas expetativas de sucesso. Como
consequência, a tendência é eventualmente evitar a tarefa ou procurar ajuda constantemente,
tornando-se socialmente dependente e pouco autónomo, sendo incapaz de mobilizar o esforço
necessário a que se associa bloqueio em termos de disponibilidade cognitiva e afectiva, o que
dificulta a possibilidade de se autorregular metacognitivamente (Eflkides, 2011).
Sendo o bem-estar dos estudantes um dos objetivos da educação, também no ensino superior,
nível em que se requer mais a autorregulação do que co-regulação (esta mais presente em
níveis de ensino anteriores) é importante ter em conta o impacto das experiências
metacognitivas para uma aprendizagem de sucesso uma vez que estas têm associadas aspectos
fundamentais como a monitorização e o controlo (Efklides, 2008; Efklides & Misailidi, 2010)
embora a precisão da monitorização dos nossos próprios estados de conhecimento não deva
ser tomado como algo garantido. Ppor exemplo, o excesso de confiança em situações em que
não existe consciência sobre o nível de conhecimento ou competências pode levar à
diminuição do esforço necessário para completar uma tarefa com sucesso.
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116
6. PENSAR E LIDAR COM OS PENSAMENTOS ACADÉMICOS: A
EXPERIÊNCIA DE ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR
Fátima Leal 14
Resumo
Os processos de estudo e de aprendizagem envolvem dimensões comportamentais,
afetivas, motivacionais, cognitivas, metacognitivas e regulatórias. Os pensamentos
académicos referem-se aos conteúdos dos pensamentos dos estudantes que emergem durante
o seu processo de estudo (Leal, 2017). Este trabalho visa: identificar pensamentos académicos
dos estudantes emergentes durante o seu processo de estudo e identificar as estratégias que os
estudantes utilizam para lidar com esses pensamentos. Participaram 48 estudantes, rapazes e
raparigas, com idades entre os 18 e os 25. A metodologia qualitativa foi privilegiada. A
recolha de dados foi obtida através de entrevistas semi-estruturadas e os dados tratados
através de análise temática categorial. Os resultados reportam-se a dois grandes temas:
pensamentos durante o estudo e estratégias para lidar com os pensamentos. Relativamente à
identificação de pensamentos durante o processo de estudo emergiram três categorias:
pensamentos centrados na tarefa, pensamentos distratores e pensamentos centrados na pessoa.
No que concerne à identificação de estratégias para lidar com os pensamentos durante o
processo de estudo emergiram três grandes categorias: perceção avaliativa global, respostas
afetivas e mobilização de estratégias para lidar com o que pensa. Conclui-se acerca da
necessidade de colocar os estudantes a refletirem sobre estes aspetos cognitivos e regulatórios.
Por fim, deixam-se sugestões de intervenção prática para os vários intervenientes no contexto
de ensino superior.
Palavras-chave: Pensamentos académicos. Estratégias de regulação. Estudo e Aprendizagem.
Estudantes. Ensino Superior.
14
Investigadora no Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de Évora, no âmbito do
projeto PTDC/CED-EDG/29252/2017, projeto financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para
a Ciência e a Tecnologia, I.P.
117
Introdução
Ao longo do tempo, inúmeros autores têm estudado a aprendizagem, evidenciando a
relevância da interação entre processos cognitivos e metacognitivos (e.g., Beber, Silva &
Bonfiglio, 2014; Boyle, Duffy & Dunleavy, 2003; Trigwell & Ashwin, 2006; Vermunt,
2005). Enquanto a metacognição se prende com o conhecimento e experiência acerca dos
processos cognitivos (Kelly & Donaldson, 2016), a cognição envolve processos cognitivos e
também pensamentos que ajudam na aquisição e na integração da informação com os
conhecimentos prévios, assim como, na recuperação da informação disponível (Pintrich,
2000; Ersözlü, 2010). Os processos cognitivos são atividades cerebrais que, através da
transformação, transporte, redução, coordenação, recuperação e utilização das informações,
possibilitam uma representação mental do mundo. São formas de processar a informação e
acontecem quando a pessoa perceciona, lembra, pensa, adquire, recupera e ou transforma
informação (Brandimonte, Bruno & Collina, 2006). A componente cognitiva é responsável
pelo pensamento e, no âmbito da aprendizagem, leva aos resultados de aprendizagem, ao
aumento do conhecimento, da compreensão e da aquisição de competências (Oosterheert &
Vermunt, 2001).
O pensamento pode ser visto como o conteúdo da atividade inteletual do indivíduo. De
forma sequencial um pensamento leva a outro pensamento (Ericsson & Crutcher, 1991); ou
seja, o pensamento pode ser representado como uma sequência de ideias (estados cognitivos
relativamente estáveis) intercaladas por períodos de atividade de processamento (Ericsson &
Simon, 1998). McGuinness (1999) apresenta uma lista de processos abrangidos pelo
pensamento: sequenciar e ordenar informação; selecionar, classificar e agrupar; comparar e
contrastar; predizer e hipotetizar; retirar conclusões; distinguir fatos e opiniões;
enviesamentos e confiabilidade; gerar ideias e brainstorming; atribuir causas e efeitos; definir
e clarificar problemas; encontrar soluções; delinear objetivos; testar soluções, avaliar
resultados; planear e monitorizar; tomar decisões; definir prioridades; distinguir prós e contras
e refletir sobre o próprio pensamento.
Vários têm sido os autores que, ao longo dos anos, têm estudado o pensamento e
encontrado diversas categorias e terminologias específicas (e.g. Bruner, 1975; Guilford, 1940;
1980). Paul e Elder (2007) referem o pensamento crítico descrevendo-o como a arte de
analisar e de avaliar o pensamento, pressupondo o conhecimento das suas estruturas básicas e
intelectuais, de forma a melhorá-lo. Pintrich e García (1993) consideram que este pode ser
uma forma cognitiva que leva os estudantes a pensar reflexiva, profunda e criticamente sobre
118
os conteúdos de estudo. Estimular o pensamento crítico dos estudantes pressupõe a promoção
da sua capacidade para questionar, desafiando os quadros explicativos vigentes, reconhecendo
a importância das questões e da sua compreensão, observando e detetando as problemáticas
atuais e futuras, procurando soluções para os obstáculos, justificando e argumentando as suas
ideias (Brockbank & McGill, 1998; Harvey & Knight, 1996; Turabik & Gün, 2016).
Ericsson e Simon (1998) consideram que, na vida diária, o discurso dos sujeitos reflete
apenas alguns dos aspetos dos seus pensamentos através da verbalização, sendo que, no
entanto, a maior parte destes acaba por ser suprimida. Os autores distinguem o que se passa na
mente dos indivíduos através do pensamento silencioso (silence thinking), a verbalização dos
pensamentos (thinking aloud) e a descrição e a explicação dos seus próprios pensamentos.
Para quem ouve ou transcreve, o thinking aloud revela-se incoerente e incompleto com apenas
partes de informação desconetadas, por outro lado, a descrição e explicação dos pensamentos
possibilita a analise e monitorização dos sujeitos ao seu próprio discurso. Isto permite que os
indivíduos expliquem melhor as partes mais confusas do seu discurso, corrigindo-as quando
necessário. Logicamente que a descrição e explicação do pensamento não reflete o
pensamento espontâneo, contudo, revela-se uma verdadeira oportunidade para tornar o
pensamento dos estudantes mais reflexivo e coerente.
Beck, Robinson, Carroll e Apperly (2006) diferenciam pensamentos fatuais e
contrafatuais. Os pensamentos contrafatuais são pensamentos que se prendem com a
capacidade para criar alternativas aos acontecimentos fatuais e permitem reconhecer os
fatores que, no passado, impossibilitaram o desempenho pretendido (e.g., se tivesse estudado
mais, teria passado no exame).
Estes pensamentos podem conduzir a consequências
importantes para a realização das tarefas desde que sejam bem utilizados e orientados para
objetivos, envolvendo intenções comportamentais e identificando ações retificativas (e.g. se o
pensamento “se eu tivesse estudado mais, o exame teria corrido melhor” for seguido por outro
como “para o próximo exame vou estudar mais” (Tyser, McCrea & Knüpfer, 2012). Os
autores alertam que os pensamentos contrafatuais trazem vantagens quando os indivíduos
procuram melhorar, mas que, pelo contrário, quando os sujeitos procuram se auto-proteger,
estes pensamentos podem prejudicar servindo como justificação pelo fraco desempenho.
Portanto, as consequências comportamentais destes pensamentos variam consoante a autoavaliação dos indivíduos.
O desenvolvimento de competências do pensamento, particularmente no contexto do
ensino formal tem sido uma preocupação constante (Rocha, 2011), contudo, são escassas as
investigações que procuram conhecer os conteúdos dos pensamentos de estudantes
119
universitários durante os seus processos de estudo e de aprendizagem. Os pensamentos
académicos (Leal, 2017) dizem respeito aos conteúdos dos pensamentos ligados às
aprendizagens académicas dos estudantes, que emergem durante o seu processo de estudo e
que vêm na sequência da resposta à questão “o que é que eu costumo pensar enquanto estou a
estudar?”. São precisamente nestes pensamentos, assim como nas estratégias ativadas pelos
estudantes para lidar com esses pensamentos, que este estudo se centra.
Metodologia
Como objetivos para esta investigação temos: 1) identificar pensamentos que emergem
durante o processo de estudo dos estudantes e 2) identificar estratégias que os estudantes
utilizam para lidar com o que pensam quando estão a estudar. Os dados foram recolhidos
através de entrevista semi-estruturada. Para este estudo em específico, trazemos a análise das
respostas às questões: “o que costumas pensar quando estás a estudar?” e “como é que lidas
com o que pensas quando estás a estudar?”
A amostra envolveu a participação voluntária de 48 jovens de ambos os sexos e com
idades entre os 18 e os 25 anos, estudantes de licenciatura de uma instituição de ensino
superior portuguesa. Após a apresentação dos objetivos do estudo, os participantes foram
convidados a colaborar na investigação, assinaram o termo de consentimento informado e as
entrevistas foram agendadas. Estas foram realizadas de forma individual e mediante
anonimato. De forma a assegurar que todos os estudantes entrevistados tivessem tido
oportunidade de estudar e aprender em contexto dentro e fora de sala de aula certificámo-nos
de que, na altura de realização das entrevistas, todos os participantes, mesmo os do primeiro
ano, já tinham experienciado o ensino superior durante um semestre letivo, já tinham sido
submetidos a avaliação e já tinham tido conhecimento dos resultados obtidos.
Para a análise e tratamento dos dados recorreu-se essencialmente a metodologia
qualitativa - análise de conteúdo, respeitando as fases propostas por Bardin (2008).
A análise realizada consistiu num processo de categorização baseada no critério
semântico do discurso dos estudantes, considerando-se como unidades de significado, os
elementos que representam uma ideia, uma situação e/ou conteúdos de informação que sejam
compreensíveis por si mesmas (Schilling, 2006). Optámos por um processo de categorização
com procedimentos abertos (Esteves, 2006) sendo que a lista de categorias emergiu da análise
do discurso dos estudantes.
120
Respeitando normas de fiabilidade e de validade, foi constituído um painel de três
investigadores que fizeram revisão da análise da codificação, resolvendo as situações de
discrepância. O índice de fidelidade foi calculado através da equação total de casos de acordo
dos vários codificadores a dividir pelo somatório dos casos de acordo com os casos de
desacordo (Esteves, 2006). O nível de concordância final entre juízes, foi de 95%. Aplicámos
estatística descritiva simples e realizámos a análise de frequências em função das unidades de
sentido - segmentos de conteúdo que contêm uma ideia, episódio ou informação consideradas
como unidade base (Schilling, 2006). Procedemos à contagem do número de vezes que cada
elemento semântico expressivo de uma ideia distinta se encontrava presente no discurso dos
sujeitos. Perante a repetição de uma unidade de sentido, esta foi considerada uma única vez.
Resultados
Os resultados estão dispostos de acordo com a categorização apresentada na grelha de
análise temática categorial. Por uma questão de parcimónia e de espaço, neste trabalho serão
apresentados apenas alguns exemplos de verbalizações mais significativas para melhor
compreensão das experiências dos estudantes.
Identificação de pensamentos durante o estudo
Relativamente à identificação de pensamentos durante o processo de estudo (Tabela
1), emergiram três categorias que correspondem a três tipos de pensamentos: os pensamentos
centrados na tarefa (académica) (N=44; 51.8%), os pensamentos distratores (N=28; 32.9%) e
os pensamentos centrados na pessoa (N=13; 15.3%).
121
Tabela 1. Identificação de pensamentos: categorias, subcategorias.
CATEGORIAS
Pensamentos
distratores
SUBCATEGORIAS
Gerais/divagações
Decorrentes de aspetos motivacionais
N
13
15
%
32.9
Pensamentos
centrados na
tarefa
(académica)
Orientados para a matéria
Orientados para memorização
Orientados para aplicação prática
Orientados para procura de compreensão
Orientados para a avaliação
Orientados para resultados
Pensamentos de controlo volitivo
Controlo de pensamentos distratores
Pensamentos decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo
Pensamento de controlo/regulação ambiental
Pensamentos de julgamento de realizações e inferências adaptativas
16
2
5
5
2
3
5
3
1
1
1
51.8
Pensamentos
centrados na
pessoa
Pensamentos centrados em ganhos
Pensamentos centrados no Futuro académico/ profissional
4
7
15.3
Pensamentos de cariz emocional negativo
2
Pensamentos ligados a
motivações concorrenciais
Dúvidas/Valor do estudo
85
100
A primeira categoria refere-se aos pensamentos distratores e inclui verbalizações dos
estudantes relativas a pensamentos perturbadores do seu estudo. Emergiram duas
subcategorias: os pensamentos decorrentes de aspetos motivacionais e os pensamentos
gerais/divagações.
Os pensamentos
gerais/divagações
reportam-se a verbalizações
relativas a
pensamentos dos estudantes que, de uma forma geral e não especificada, surgem durante o
estudo e dificultam a tarefa.
“É coisas aleatórias...às vezes é coisas do meu dia a dia (…)” (S.48)
“penso no dia que está lá fora, penso nas coisas que eu poderia estar a fazer, na mosca a passar” (S.1)
A continuidade prolongada no tempo de estudo e a antecedência relativamente à data
de avaliação são vistos, pelos estudantes, como fatores de dispersão dos pensamentos.
“…às vezes quando já estou há muito tempo a estudar… já começo a divagar um bocadinho” (S.40)
“(…) se estiver com imenso tempo de antecedência estou a pensar noutras coisas, no que é que vou fazer … se
vou sair à noite, o que é que vou vestir amanhã, ou coisas assim” (S.29)
A verbalização de um estudante chama a atenção para o fato dos seus pensamentos
dependerem daquilo que está a sentir naquele momento.
122
“muitas vezes isso também vai derivar…depender do que estou a sentir no momento... por exemplo se tiver com
algum problema de relacionamento com a minha namorada ou com os meus familiares... isso vai afectar...eu
começo a pensar nisso (…) quando estou a estudar...penso muitas vezes na minha família... e...em tudo...eu sei lá
eu penso em tudo eu penso um pouco em tudo...” (S.21)
A verbalização de um outro estudante explicita a ideia de que pensar sobre vários
assuntos, os seus próprios sentimentos, o seu percurso, as suas dificuldades e sobre aquilo que
está a estudar torna-se algo estruturante e coadjuvante do estudo pois permite-lhe criar
relações entre conhecimentos e atribuir significado ao seu próprio pensamento.
“Costumo pensar sobre tudo… divagar… porque penso que se divagar, consigo encontrar, consigo talvez
construir uma teia de conhecimento (…) eu costumo pensar muitas vezes e rever-me nos sentimentos e fazer
“introspecções” analisar os sentimentos que que vou encontrando e as dificuldades, por isso, isto do “pensar”,
pelo menos para mim não é assim tão estranho (…)pelo menos para mim costuma ser bom porque apesar de me
perder, depois às tantas vou procurar o sentido daquilo tudo que pensei… “porque é que eu fiz aquele trajeto?”
e pensar também que “para que é que serve a qui lo q ue estou a fazer...?” porque é que estou a pensar o que
estou a pensar, porque é que estou a pensar sobre aquilo que estou a trabalhar, estou a ler sobre” (S.34)
Os pensamentos ligados a motivações concorrenciais prendem-se com ideias que se
revelam distratoras para com a tarefa de estudo e que advêm de aspetos motivacionais e com a
vontade de procurar atividades alternativas ao estudo. Este tipo de pensamento decorre
frequentemente do fato dos estudantes referirem que não gostam da matéria.
“a minha cabeça começa a dispersar… começo a pensar em coisas, o que é que podia estar a fazer e não estar a
fazer” (S.9)
“(…) se não estou a gostar, começo a pensar “ai se estivesse a estudar a outra que eu gosto tanto era tão mais
fácil…eu se calhar já tinha isto despachado” (S.40)
As dúvidas/valor do estudo referem-se aos pensamentos de incerteza acerca da maisvalia e da utilidade desta atividade e emergem de situações como não conseguir estabelecer
relação entre as matérias com o seu futuro profissional.
“se eu não conseguir fazer essa ligação entre o que estou a aprender e a minha futura vida profissional, então
penso “para que é que me estão a ensinar isto? qual o objetivo?” (S. 46)
Relativamente à segunda categoria, pensamentos centrados na tarefa (académica),
emergiram onze subcategorias que correspondem a vários tipos de pensamentos: orientados
para a matéria, orientados para memorização, orientados para aplicação prática, orientados
para procura de compreensão, orientados para a avaliação, orientados para resultados,
pensamentos de controlo volitivo, controlo de pensamentos distratores, pensamentos
decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo, pensamento de controlo/regulação
ambiental e pensamentos de julgamento de realizações e inferências adaptativas.
123
Os pensamentos orientados para a matéria são focados nos conteúdos de estudo de
uma forma específica. Este foco pode acontecer por ser uma caraterística natural dos
estudantes, a de não se distraírem com outros pensamentos no momento do estudo; mas, para
outros estudantes, parece haver necessidade de uma ação intencional no afastamento de
pensamentos concorrenciais para conseguirem atingir essa focalização na tarefa.
“O que é que eu costumo pensar (…) tento abstrair-me ao máximo das coisas do dia-a-dia e tentar só mesmo
dedicar-me ao estudo” (S.8)
“eu tento pensar naquilo que estou a estudar … e nos conteúdos e nos conhecimentos que tenho que adquirir”
(S.28)
Outros estudantes especificam que se focam na matéria quando se sentem bem
consigo mesmos e quando gostam, têm interesse e reconhecem importância nesses conteúdos.
“Quando gosto do que estou a estudar, estou só a pensar nisso...” (S.7)
“Quando estou bem, estou mesmo concentrada, estou mesmo a pensar naquilo na matéria” (S.26)
Destacamos duas verbalizações de estudantes que afirmam não pensar em nada e que,
por estarem focados, só “pensam” na matéria, levando-nos a refletir acerca da possível falta
de consciência por parte dos estudantes sobre os conteúdos do seu próprio pensamento.
“O que costumo pensar? Eu não costumo pensar em nada! Estou a estudar e foco-me na matéria e pronto!”
(S.19)
Os pensamentos orientados para aplicação prática referem-se a pensamentos
específicos para a aplicação da matéria de estudo, relativamente a onde usá-la e a como
utilizá-la.
“penso “onde é que eu posso utilizar isto?” ou seja… muito a aplicação prática das matérias” (S. 46)
“(…) eu gosto de pensar em casos práticos (…) um exemplo do quotidiano para perceber porque é que as coisas
acontecem... (…) para ser mais fácil complementar as duas coisas a prática e a teoria” (S.25)
“penso muitas vezes …se eu tiver a estudar e se eu não encontrar um exemplo para aplicar essa matéria em
específico ou essa cadeira depois torna-se mais complicado pensar muito nisso em vez de estar concentrado,
começo a divagar para o resto” (S.44)
Os pensamentos orientados para a procura de compreensão dirigem-se para um
entendimento profundo dos conteúdos. Esta procura de compreensão conduz os estudantes à
pesquisa complementar e também à procura de contextos de discussão sobre as matérias.
“às vezes dou por mim a …um simples facto e aquilo pode não estar… a professora só diz “é só até aqui”, mas
eu posso sempre ir investigar mais qualquer coisa, dá sempre a intenção que…podemos ir mais além do que
aquilo que estamos a estudar…e outras vezes dou por mim a falar aquilo que estudei com os meus …discuto
pontos de vista com os meus amigos…com os meus colegas… e com os meus pais também…” (S.2)
124
Os pensamentos orientados para a avaliação surgem como pensamentos dirigidos para
os momentos de avaliação e para a preparação dos mesmos.
“quando estou a estudar, normalmente ou estou a pensar como é que irá ser o teste (…)” (S.38)
Os pensamentos orientados para resultados prendem-se com a aspiração de obter bons
resultados académicos.
“(…) penso que se estou aqui...tenho que conseguir ter bons resultados... e é isso que me dá mais vontade” (S.4)
Salientamos uma verbalização que transmite a ideia de que o estudante pensa não só
nos resultados das provas de avaliação, mas também nas implicações destes para o seu
percurso. O cariz motivacional deste pensamento leva-o a sentir-se bem e crente nos seus
objetivos.
“[quando estou a estudar (…)] penso … que o teste em si ou aquela disciplina em si, poderá afetar por exemplo
a média ou poderá afetar o resto do meu percurso (…)o estudo para cada disciplina é ali a base de tudo… uma
pessoa ao estudar bem, vai ter boas notas nos testes, vai ter boas médias, vai conseguir sempre fazer aquilo que
quer… e acho que assim, uma pessoa sente-se sempre bem” (S.38)
Os pensamentos de controlo volitivo prendem-se com o domínio da volição e
emergiram quando o estudante não gosta do que está a estudar, quando está distraído ou tem a
sensação de que o estudo não está a correr como pretende. Para realizar este controlo, os
estudantes utilizam estratégias como pausas e/ou auto-instruções o que lhes permitirá voltar à
tarefa do estudo.
“quando eu não gosto, penso sempre “ah tenho que tentar saber para fazer” (S.32)
“(…) eu distraio-me muito facilmente...sei lá, às vezes começo a pensar em coisas corriqueiras e com isso
distraio-me e tenho que fazer uma disciplina a mim mesma “vá…foca-te naquilo que estavas a fazer” (S.30)
“depois volto outra vez ao tema (...) muitas vezes penso assim “tenho que estudar” é isso que eu penso “tenho
que estudar” (S.9)
O controlo de pensamentos distratores acontece através do afastamento de ideias
irrelevantes para o estudo, ou realização de pausas quando o estudante tem a perceção de que
já está a estudar há algum tempo consecutivo.
“Depende...se já estiver a estudar há muito tempo...normalmente dou comigo a vaguear (…) e então faço uma
pausa” (S.20)
Os pensamentos decorrentes da avaliação ou monitorização do estudo prendem-se com
uma verbalização relativa a pensamentos que se ligam a expetativas de resultado assim como
a possíveis alternativas.
“Lá está! depende …depende de se estou a conseguir estudar bem ou não, porque se estou a conseguir estudar
bem, eu penso que vou ter uma boa nota e que só tenho que continuar a ir por esse caminho…se o estudo está a
125
correr mal, começo a pensar que não vou conseguir e começo logo a ver as outras oportunidades que
tenho(…)” (S.47)
Os pensamentos de controlo/regulação ambiental prendem-se com o propósito de
reduzir os distratores.
“(…) eu tiro o telemóvel de ao pé de mim, e penso assim “tá sempre no silêncio!” porque eu sei porque alguém
me vai ligar pedir não sei o quê (…) às vezes já estou ali tão embalada e o estudo está a correr bem, se
estiverem a me ligar e a mandar mensagens, pronto, aquilo quebra o raciocínio, e depois tenho que voltar atrás
(…)” (S.28)
Os pensamentos de auto-reflexão/de julgamento de realizações e inferências
adaptativas transparecem na verbalização de um estudante numa situação de falta de tempo
para estudar para a avaliação. Esta revela um pensamento reflexivo concreto, um autojulgamento sobre a realização e inferência para situações semelhantes.
“hum… se tiver com pouquíssimo tempo para estudar, acontece imensas vezes, começo a pensar “o que é que
eu posso fazer se chumbar isto?”, “para a próxima tenho que estudar mais” e como já estou em cima da hora e
estou muito nervosa e então penso assim “para a próxima, estudas mais um bocadinho, para a próxima estudas
mais” (S.29)
A categoria pensamentos centrados na pessoa (de projeção no futuro) inclui
verbalizações relativas aos pensamentos que ocorrem durante o estudo e que são centrados
nos próprios sujeitos e orientados para o seu futuro. Salientam-se três tipos de pensamentos:
pensamentos centrados em ganhos; pensamentos centrados no futuro académico/ profissional;
e pensamentos de cariz emocional negativo.
Os pensamentos centrados em ganhos reportam-se a verbalizações relativas aos
pensamentos centralizados nos proveitos advindos do estudo. Estes ganhos são expressos
através de pensamentos de que estão a fazer algo que consideram como bom para si;
pensamentos de gratificação, ou seja, de estar a fazer algo que produz satisfação; pensamentos
de que estão a fazer algo que lhes permitirá um trabalho e um futuro profissional;
pensamentos de que estão a fazer algo que os enriquece como pessoas, algo que os torna mais
conhecedores e mais interessantes por estarem a aprender.
“...penso que estou a fazer algo bom para mim (…)” (S.18)
“O que costumo pensar? penso que me estou a tornar uma pessoa cada vez mais interessada, mais interessante,
e acho que é sempre bom, estarmos a aprender cada vez mais.” (S.39)
Os pensamentos centrados no futuro académico/profissional reportam-se a
verbalizações sobre pensamentos focados nos objetivos pessoais, no investimento que os
estudantes fazem e nas expetativas sobre o futuro académico e profissional. Estes
126
pensamentos constituem-se fontes de auto-motivação quer para atingir as metas como para
ultrapassar obstáculos (ex: ausência de gosto pelas matérias).
“quando gosto…sinto que estou no curso certo… que vou gostar do que vou fazer no futuro…de que sei ou que
tenho uma ideia do que quero fazer no futuro, fico mais contente não é tão desmotivante…” (S.14)
“ponho-me a pensar “ok! isto não é muito interessante” “não gosto muito disto mas para conseguir fazer o que
tenho de fazer, no futuro, tenho…tenho que passar por isto” (S.23)
Os pensamentos de cariz emocional negativo prendem-se com situações em que os
estudantes não gostam da disciplina e/ou das matérias que estão a estudar ou se sentem em
circunstâncias temporais (não ter tempo) de maior pressão. A consciência acerca da sua
situação leva-os a pensar sobre o seu estado de cansaço e de stress e a descentrar a sua
atenção da tarefa para com o seu próprio estado emocional.
“mas depois se eu não gostar ou se embirrar com alguma coisa externa, porque às vezes, (…) há prazos que nós
devemos cumprir (…) e isso deixa-nos cansados, deixa-nos sob grande stress, e isso também vai influenciar a
maneira como depois nós pensamos sobre aquilo... porque, se eu já estou irritada porque não tenho tempo para
fazer as coisas, porque é tudo ao mesmo tempo então quando estou a olhar para as coisas em vez de estar a
pensar “faz isto, tens mais do que fazer, estou a fazer mas estou a pensar “que raiva!” (S.27)
Estratégias para lidar com os pensamentos durante o estudo
Relativamente à identificação de estratégias para lidar com os pensamentos durante o
processo de estudo (Tabela 2), emergiram três grandes categorias: perceção avaliativa global
(N=24; 28.2%), respostas afetivas (N=13; 15.3%) e mobilização de estratégias
estratégias para lidar com o que pensa (N=48; 56.5%).
127
Tabela 2. Estratégias para lidar com o que pensa: categorias, subcategorias.
CATEGORIAS
Perceção
avaliativa
global
Respostas
afetivas
Mobilização de
estratégias
SUBCATEGORIAS
Não sabe
Perceção positiva
Perceção negativa
Emoções/sentimentos Sentimento de facilidade
Sentimento de dificuldade
Sentimento de dúvida
Regulação cognitiva
Em geral
Controlo de pensamentos distratores
Regulação cognitivo- Substituição de pensamentos negativos por
emocional
positivos
Ativação de pensamentos positivos
Minimizar a dificuldade
Regulação
Auto-reflexão
metacognitiva
Análise crítica
Regulação
Controlo volitivo
motivacional
Crenças de auto-eficácia
Focalização nos objectivos
Regulação da
Pausas no estudo
atividade de estudo
Realização de atividades alternativas
N
7
13
4
2
7
14
13
%
28.2
15.3
56.5
9
3
13
10
85
100
Na primeira categoria, perceção avaliativa global foram incluídas verbalizações
relativas a uma perceção geral acerca de lidar bem ou não lidar bem com aquilo que pensa
quando está a estudar. Emergiram três subcategorias: não sabe; perceção positiva e perceção
negativa.
A subcategoria não sabe inclui verbalizações de estudantes que referem “não saber
bem” como lidam com aquilo que pensam quando estão a estudar porque nunca refletiram
sobre essa questão tornando-se difícil pensar e responder, mas consideram que lidam
normalmente e/ou não sabem se existirá forma concreta de lidar com esses pensamentos.
“Não sei… nunca pensei muito nisso…como é que lido com o que penso… hum… não sei… como é que lido com
o que penso quando estou a estudar… não sei… mas acho que lido de forma normal.” (S.29)
“Como é que lido com o que penso...hum…como é que lido…às vezes lido bem, às vezes lido mal... sei lá... ai
...isto é muito difícil de responder ...eu nunca pensei neste tipo de coisas... como é que lido com o que
penso?...sei lá! (…)”(S.18)
A perceção positiva reporta-se às verbalizações dos estudantes que consideram que
lidam bem com o que pensam quando estão a estudar uma vez que conseguem abstrair-se dos
distratores mantendo-se concentrados no estudo, tornando-o produtivo.
“Como lido? Normalmente… até lido bem...costumo lidar bem com o que penso” (S.31)
128
“Lido bem... e tento me abstrair de forma a concentrar-me ...não tenho assim um método específico...é
estudando (…) para o estudo ser produtivo” (S.8)
A verbalização de um estudante refere lidar bem com o que pensa quando o estudo
está a correr bem. Destacamos outra referência que salienta o fato de ter aprendido a lidar bem
com o estudo levando-nos a pressupor que tenha sido uma aprendizagem ao longo do
percurso académico.
“lido muito bem quando as coisas estão a correr bem (…)” (S.26)
“Aprendi a lidar bem (…)” (S.11)
A perceção negativa reporta-se às verbalizações de estudantes que consideram não
lidar bem com o que pensam quando estão a estudar. Esta perceção pode prender-se com
aspetos gerais e não especificados, ou com dificuldades ao nível da concentração e ao nível do
controlo da ansiedade enquanto estudam.
“Não lido muito bem porque chateio-me um bocado, porque eu quero estar concentrada naquilo, mas depois a
minha mente foge para outros lados” (S.1)
“Pois…às vezes… não lido muito bem… como sou um bocadinho ansiosa às vezes lido mal…fico mal e às tantas
parece que exijo de mim mais do que posso dar…” (S.15)
A categoria respostas afetivas refere-se às experiências afetivas que emergem como
resposta à necessidade de lidar com aquilo que pensam enquanto estudam e inclui três
subcategorias: sentimento de facilidade, sentimento de dificuldade e sentimento de dúvida.
O sentimento de facilidade surgiu em situações em que os estudantes estão
concentrados no estudo e experimentam sensações positivas percebendo que estão bem
encaminhados.
“(…) há alturas em que é fácil porque lá está... porque o curso está a correr bem é como se estivesse tudo
certo…o caminho que estou a percorrer para o meu futuro está tudo a ser bem encaminhado” (S.18)
O sentimento de dificuldade emergiu como resposta afetiva dos estudantes em
situações de dificuldade nas disciplinas, de desmotivação, de pessimismo e com o colocar em
causa os próprios métodos de estudo.
“(…) quando estou um bocado pessimista, pronto (…) é o pensar que não vai ser fácil e que se calhar eu já
devia ter começado a estudar ou…se calhar este não é o melhor método para estudar” (S.47)
“(…) outras vezes é mais complicado porque …é assim…pode haver dias em que a pessoa pode não ter tanta
vontade…” (S.12)
O sentimento de dúvida surgiu como resposta afetiva às experiências de insegurança
quando estão a estudar e prende-se com questões da matéria em si, com a fluência do processo
de estudo e com o custo-valor da tarefa.
129
“é um pouco confuso porque ainda há questões que não estou de todo preparada para discutir porque acho que
ainda não tenho os argumentos necessários (…) ainda há muitas questões que ainda nos fogem…à nossa
compreensão (…)” (S.2)
“(…) depois há alturas em que uma pessoa pensa … “será que vale mesmo a pena? Será que isto?” …eu
também penso muito nessas coisas quando estou a estudar penso se está a correr bem ou se está a correr mal,
depende da matéria também...se gosto se não gosto...enfim…às vezes pergunto-me se está a valer a pena ou se
não está a valer a pena?” (S.18)
A terceira categoria, mobilização de estratégias para lidar com os pensamentos durante
o estudo, traduz-se em cinco subcategorias: regulação cognitiva, regulação cognitivoemocional, regulação metacognitiva, regulação motivacional e regulação da atividade de
estudo.
A utilização de estratégias de regulação cognitiva de uma forma geral e não
especificada remete para a capacidade dos estudantes de concentração nas tarefas e de
organização mental como forma de se abstrairem dos estímulos externos ao estudo.
“Como lido...eu organizo os pensamentos (…) e concentro-me naquilo que estou a estudar...” (S.17)
O controlo de pensamentos distratores refere-se à regulação de pensamentos que sejam
perturbadores para o estudo e acontecem através: da anulação de pensamentos
desmotivadores, da focalização na tarefa e persistência na atividade de estudo, do
cumprimento e respeito pelos momentos de estudo e da consciencialização dos próprios
pensamentos, mantendo-os ou afastando-os de acordo com a sua utilidade para o estudo.
“Tento me isolar de pensamentos ((desincentivadores))…“ah mas para que é que estás a estudar tanto?” (S.16)
“(…) tento sempre limpar essas coisas da cabeça e pensar “bem! Agora estou nisto e vou me concentrar até ao
fim, depois logo se vê!” (S.43)
“Como lido? Então?... eu acho que há...momentos para tudo. Agora estou a estudar...tenho que me mentalizar
em estudar e depois quando acabar de estudar já penso no que quiser (…)” (S.19)
“Como lido? ... Então…se eu estou a pensar numa coisa que não é matéria, tento não pensar mais naquilo (…)
se estou a pensar alguma coisa que seja da matéria, mesmo que seja uma coisa extra, se calhar é uma forma de
eu aprender melhor” (S.37)
Destacamos que, para alguns estudantes este controlo de pensamentos passa por não
afastar os pensamentos distratores mas simplesmente aceitá-los, permitindo-se pensar sobre os
mesmos. Esta estratégia funciona como uma forma de regulação uma vez que, consentindo
estes pensamentos, sentem que se libertam e posteriormente podem voltar a focalizar-se na
tarefa. Os estudantes fazem pausas propositadas para assumir estes procedimentos mentais.
130
“se realmente me estou a distrair muito, e estou constantemente a pensar nisso, se for preciso até faço uma
pausa…e penso… “não! Agora vais pensar nisso até ao fundo” como se …para esgotar um assunto, como se
depois, quando voltar a estudar já não ter essa sombra aqui (…) se eu vejo que o que me distrai ou o que estou
a pensar não é benéfico nem importante, tento afastar-me dessas sombras, digamos assim” (S.30)
“se tiver alguma coisa que me estiver a preocupar acho que arranjo uma estratégia defensiva qualquer (…)
para mim próprio, para não ter de continuar com isso no pensamento (…) às vezes faço uma pausa e deixo esse
pensamento escorrer…no seu curso normal para lidar com ele e ficar decidido” (S.35)
A regulação cognitivo-emocional inclui verbalizações de estudantes que referem a
utilização de estratégias como a substituição de pensamentos negativos por positivos, a
ativação de pensamentos positivos e a minimização da dificuldade.
“Se forem menos bons ou mais desmotivadores, tento contorná-los, tipo… tento contorná-los com outros
pensamentos melhores” (S.32)
“Depende...normalmente o pensamento é bom porque acabo por fugir um pouco aquele stress do estudo
e...ponho-me a pensar em coisas que gosto (…)” (S.20)
A ativação de pensamentos positivos traduz-se em verbalizações de estudantes que
referem que perante pensamentos positivos, auto-reforçam a sua motivação e continuam o seu
estudo; e que perante pensamentos negativos, optam por ignorá-los, fazer pausas e por se
acalmarem para que, posteriormente, já recuperados, possam voltar a se concentrar no estudo.
“(…) quando estou desmotivada e sei que se calhar não consigo ou assim, aprendo a lidar… não fico contente
mas fico neutra tento não ficar muito negativa com isso e não deixar que isso afecte muito o resto (…) apoio-me
nas coisas que eu gosto… positivas para combater as outras negativas” (S.14)
“Com as coisas boas tento me motivar cada vez mais (…) as coisas más tento pô-las um bocadinho de parte…
tentando não pensar que elas são más, ou que pelo menos para mim são más, é tentar ver a parte boa delas”
(S.39)
“Se for assim… pensamentos positivos, do género, “isto está a correr bem”… e mais não sei quê... pronto!
Continuo a estudar na boa (…) se for assim pensamentos mais negativos, muitas vezes do género “isto não está
a correr nada bem”, “eu não estou a perceber nada disto” “está a ser complicado,” aí tento fazer uma pausa …
tento esquecer aquilo, e depois quando as coisas estiverem assim um pouco mais calmas, recomeçar aquilo com
mais facilidade e uma nova força” (S.38)
A estratégia de minimizar a dificuldade refere-se ao entendimento das dificuldades
como algo temporário, passageiro e natural ao processo de estudo.
“(…) ultrapasso as dificuldades...por muito que elas possam me incomodar...eu penso que esse desespero é
apenas uma passagem para poder continuar…ou seja penso que faz parte do processo.” (S.46)
As estratégias de regulação metacognitiva como forma dos estudantes lidarem com o
que pensam quando estão a estudar reportam-se à auto-reflexão e à análise crítica.
131
A auto-reflexão prende-se com a reflexão sobre os próprios pensamentos acerca dos
conteúdos em estudo e com a consciência das consequências desta ação.
“(…) só assim é que eu consigo fazer a gestão das coisas… pensando para mim próprio… fazendo reflexão
sobre a questão…reflexão do pensamento sobre aquilo que estou a aprender…de todas as questões que isso
levanta em mim…” (S.44)
“(…)não há melhor crítico de mim que eu mesmo… e eu lido bem com isso (…)” (S.46)
A análise crítica pode ser para consigo próprio ou para com a matéria de estudo e
emergiu ligada à necessidade de compreensão da matéria em estudo.
“Como é que lido?... às vezes questiono-me porque é que se chegou a esta conclusão...qual foi o
raciocínio?…pronto…acabo também por fazer um pouco… uma análise crítica relativamente àquilo que estou a
estudar… também para podermos compreender a matéria, não é?” (S.45)
A regulação motivacional prende-se com o controlo da vontade por parte dos
estudantes, como forma de lidarem com o que pensam quando estão a estudar e isto pode
acontecer através do controlo volitivo, das crenças de auto-eficácia e da focalização nos
objetivos.
As estratégias emergentes de controlo volitivo passam por lidar com a frustração
decorrente de não estar a compreender a matéria, com a desconcentração e a necessidade de
focalização e de continuar a estudar. Também foram identificadas autoinstruções de
repreensão e de autorreforço e também as pausas.
“tenho que arranjar uma maneira de pegar num ponto para conseguir lidar com o sentimento de frustração de
às vezes não estar a conseguir perceber aquilo... “o que é que eu estou a estudar?”... “porque é que eu estou a
estudar?” (S.25)
“(…) depois penso... “não! Tenho que voltar a me focar” e aí volto ao trabalho” (S.21)
“Às vezes quando estou a divagar muito (…) dou umas pancadas na cabeça e “foca-te naquilo!” (…) puno-me
quando não estou com atenção...ralho comigo mesmo...ou então “esforça-te que tu consegues!”” (S.24)
A focalização nos objetivos emergiu como estratégia motivacional. Os estudantes
centram-se nos seus objetivos, pensam nas suas expetativas, acreditam que para atingir os
objetivos é necessário haver dedicação, e constatam que, o fato de conseguirem bons
resultados através do seu esforço, leva-os a quererem continuar a se dedicar ao estudo.
“penso assim - que é o que acaba por me motivar para estudar – “acredito que um dia eu vou conseguir fazer o
que eu quero (…)eu acho que é ainda o que me mantém! querer continuar a estudar! (…) e também saber onde é
que quero chegar!” (S.16)
132
“(…) acima de tudo é preciso é o esforço e...a dedicação...se nós tivermos esforço e dedicação, (…) nós vamos
conseguir alcançar aquilo que nós pretendemos …acima de tudo, o mais importante é termos motivação para
trabalharmos e não desistirmos do nosso objectivo principal” (S.4)
“se estou no final e se estou a conseguir bons resultados, então ajuda-me a continuar mais esse bocadinho para
atingir os objetivos” (S.13)
A regulação da atividade de estudo prende-se com a ativação de estratégias que
servem para o estudante gerir a tarefa e apresenta duas formas: as pausas no estudo e a
realização de atividades alternativas.
A estratégia de fazer pausas no estudo reporta-se a interrupções propositadas pelos
estudantes. A sua referência localiza-se em momentos em que o estudante não está a ser capaz
de estudar, quando encontra obstáculos e parece que não consegue ultrapassá-los, quando tem
a sensação de que o estudo não está a correr fluentemente, quando os pensamentos
emergentes são negativos e o estudante consciencializa sobre as dificuldades que está a sentir.
Os vários exemplos demonstrados vêm na sequência de aspetos negativos, chamando a
atenção para os obstáculos na fluência do raciocínio.
“Se sentir que não sou capaz...lá está…páro um bocadinho [e faço outra coisa para distrair e então depois volto
a fazer o que tenho que fazer]” (S.31)
“às vezes parece que não... que não consigo sair dali, e leio, leio, leio e parece que por mais que leia, parece
que não consigo, entender o que é que é preciso mesmo fazer, (…)depois às vezes, dá-me mais a tendência para
ir me levantar e ir fazer outra coisa qualquer” (S.27)
A realização de atividades alternativas refere-se à estratégia de optar por intercalar
atividades diferentes de forma a poderem se distrair ou descansar do esforço inteletual exigido
para a primeira tarefa e posteriormente, voltar ao estudo. Esta estratégia emergiu quando
encontram obstáculos e quando não estão concentrados na tarefa de estudo.
“[Quando encontro obstáculos…às vezes meto de parte o estudo], tento ultrapassar fazendo exercício físico ou
vendo um filme, abstraindo-me e depois volto ao estudo, normalmente.” (S.6)
“Se me começo a distrair…tento parar um bocadinho, vou até à sala, fico ali uma meia hora na conversa, vejo
um bocadinho de televisão…e depois volto, e se calhar a coisa funciona” (S.40)
Uma verbalização de um estudante explicita que perante momentos em que sente que
não está a conseguir estudar como pretende, tem a tendência a passar algumas partes da
matéria chamando-nos à atenção para o fato deste poder ser um fator que conduz a uma
abordagem à aprendizagem de tipo superficial.
“(…)se não estou a conseguir…dá-me a tendência a ultrapassar certas partes em vez de ir seguindo (…)” (S.13)
133
Conclusão
Este trabalho permite-nos ter uma visão geral sobre três principais categorias de
pensamentos académicos que emergem nos estudantes: os pensamentos distratores,
pensamentos focados na tarefa e os pensamentos centrados na pessoa. A maior parte das
verbalizações concentrou-se nos pensamentos centrados na tarefa de estudo sendo este um
bom indicador de que os estudantes tendem a focar os seus pensamentos em aspetos
relevantes para a sua aprendizagem. Em termos das estratégias ativadas para lidar com estes
pensamentos, distingue-se uma percepção geral de lidar bem ou não lidar bem, respostas
afetivas advindas da ativação dessas estratégias e efetivamente cinco subtipos de estratégias: a
regulação cognitiva, regulação cognitivo-emocional, regulação metacognitiva, regulação
motivacional e por último a regulação da atividade de estudo. Destaca-se a importância que os
estudantes atribuem a gostar ou não gostar das disciplinas como algo diferenciador quer no
tipo de pensamento que emerge como no tipo de estratégia que utilizam para lidar com esses
pensamentos. Este tópico, merece, decerto, mais investigação para apurar melhor estes
efeitos.
Como limitações a este trabalho consideramos que: por ser um estudo exploratório, ao
questionar os estudantes acerca das experiências de estudo de uma forma geral e não para
cada disciplina em particular, podemos perder informação específica para cada domínio
científico; em termos da categorização, os resultados poderão conter enviesamentos
resultantes de processos seletivos e idiossincráticos da memória (Vaz, 2009); o processo de
categorização é sempre passível de limitações uma vez que nem sempre é fácil distinguir
construtos abstratos como os cognitivos, metacognitivos e ligados aos pensamentos dos
sujeitos; o tamanho de amostra, embora adequado a este tipo de investigação, pode não ser de
fato, representativo da sua população. A metodologia qualitativa faculta-nos dados em maior
profundidade do que em quantidade. Assim, estes resultados podem não ser generalizáveis à
população, mas poderão contribuir como base para a criação de instrumentos, nomeadamente
quantitativos, que poderão esses sim, servir para abranger amostras maiores.
Os resultados deste estudo poderão sustentar intervenções quer para os estudantes,
como para os docentes, para as instituições de ensino superior, para os serviços de psicologia
que lá trabalham e até para as famílias e para a sociedade de forma geral. Para os estudantes, a
implementação de medidas práticas deve visar a consciencialização acerca das suas
características, sejam elas mais ou menos positivas e/ou adequadas ao estudo e à
aprendizagem; permitir a aceitação destas particularidades, a alteração das mesmas quando
necessário e da forma mais adequada para cada momento e contexto de aprendizagem. Este
134
processo de auto-conhecimento representará um investimento pessoal e académico, com
consequências ao nível do ganho de competências autorregulatórias bem como em termos de
desempenho académico. Os docentes e os técnicos de psicologia das instituições de ensino
superior poderão ter um papel coadjuvante neste processo. Os professores, ao terem maior
conhecimento sobre os pensamentos académicos dos seus estudantes e a forma como lidam
com os mesmos estarão mais aptos a empregar esse conhecimento na sua forma de preparar os
conteúdos de estudo, de conduzir as aulas e até mesmo no seu relacionamento com os
estudantes. Estes contributos também poderão se revelar úteis para os dirigentes das
instituições de ensino superior, para a implementação deliberada de ações sistematizadas, para
a criação de políticas internas, fomentação de uma cultura organizacional que tenha por base a
exigência, o desafio, mas igualmente, o bem-estar e a satisfação dos seus estudantes. As
famílias dos estudantes também poderão beneficiar destes resultados se os utilizarem para
contribuir para um clima de respeito e de incentivo ao esforço e ao empenho dos estudantes
para com as exigências do contexto académico e também para a promoção de um ambiente de
entusiasmo e de esperança relativamente ao seu futuro profissional. Uma sociedade evoluída
na sua forma de estar e de pensar, que acredita no poder do conhecimento científico e está,
indubitavelmente, muito mais preparada para enfrentar os obstáculos da vida.
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137
7. MONITORIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DE ESTUDANTES
NA TRANSIÇÃO PARA O ENSINO SUPERIOR NA UTAD
MONITORING AND FOLLOW-UP OF STUDENTS IN THE
TRANSITION TO HIGHER EDUCATION IN UTAD
José Paulo Cravino15, Tatiana Ferreira16, Daniela Pedrosa17 & Isabel Alves18
Resumo
O Observatório Permanente do Abandono e Promoção do Sucesso Escolar (OPAPSE) foi
criado na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) em 2015, com o objetivo de
acompanhar o percurso académico dos seus estudantes, em particular na transição do ensino
secundário para o superior. Metodologicamente, é feito anualmente um levantamento
sistemático dos pedidos de anulação de matrícula e das informações sobre os estudantes que
não renovaram a sua matrícula em cada ano letivo, de forma a identificar possíveis casos de
risco de abandono. O OPAPSE, quando consegue estabelecer contacto com o estudante, via
telefone ou correio eletrónico, confirma se se trata efetivamente de uma situação de anulação
de matrícula ou de não renovação de inscrição, sendo avaliada a possibilidade de reverter a
decisão do estudante. Quando estas situações são confirmadas, é solicitado o preenchimento
de um questionário online para tentar compreender a situação atual do estudante, as
circunstâncias e as razões da sua decisão, e as suas intenções sobre um possível regresso ao
Ensino Superior e à UTAD.
Neste trabalho apresentam-se dados dos últimos três anos letivos relativos às anulações de
matrícula e às não renovações de inscrição, recolhidos através dos requerimentos de anulação
de matrícula e dos questionários online. Discutimos os motivos e as decisões reportados pelos
estudantes. Explicamos ainda as estratégias utilizadas pelo OPAPSE no acompanhamento de
casos específicos que necessitem de apoio da própria instituição e dos serviços disponíveis,
nomeadamente: Serviços de Ação Social, Apoio Psicológico, Programa de Tutoria e
Programa de Mentoria.
15
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. Investigador integrado do Centro de
Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores, Aveiro, Portugal. jcravino@utad.pt
16
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. tatianaf@utad.pt
17
Universidade Aveiro e Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores, Aveiro,
Portugal. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. dpedrosa@ua.pt
18
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal. ifalves@utad.pt
138
Palavras-chave: Abandono académico. Apoio aos estudantes. Ensino Superior. Prevenção do
abandono. Transição para o Ensino Superior
Abstract
In 2015, the University of Trás-os-Montes and Alto Douro (UTAD) created the Permanent
Observatory of School Dropout and Promotion of Academic Success (OPAPSE in the
Portuguese acronym) aiming to monitor the academic path of its students, particularly in the
transition period from secondary school to higher education. Methodologically, and in order
to identify possible cases of student dropout risks, it is made a systematic survey of
enrollment cancellation forms and non-renewal requests in each school year. When such a
case is detected, OPAPSE contacts the student, via telephone or e-mail, to confirm whether it
is in fact a situation of enrollment cancellation or non-renewal, and evaluates the possibility of
reversing the student's decision. When these cases are confirmed, students are asked to fulfill
an online questionnaire to try to understand their current situation, the circumstances and
reasons for their decision, and their intentions about a possible return to higher education and
to UTAD.
In this paper we present data from the last three academic years concerning enrollment
cancellations and non-renewals, obtained through cancellation forms and online
questionnaires. We also discuss the reasons and decisions reported by the students. In
addition, we explain the strategies used by OPAPSE that contribute to reduce student dropout
risks, namely by monitoring specific cases that need support from the institution and the
services available: Social Services, Psychological Support, Tutoring and Mentoring
Programmes.
Keywords: Academic dropout. Dropout prevention. Higher Education. Student support.
Transition to Higher Education
Introdução
A entrada no Ensino Superior (ES) assume-se como:
139
“[u]m mundo de oportunidades, em que interagem múltiplos fatores académicos e
sociais, que podem facilitar ou impedir florescimento, desenvolvimento pessoal e
sucesso académico. Esta etapa escolar exige capacidade de adaptação a diferentes
papéis e responsabilidades, que mobilizam recursos internos como autorregulação,
autoeficácia, traços de personalidade e competências psicossociais” (Teixeira & Costa,
2018, p. 144).
Para o estudante esta nova realidade pressupõe diversas adaptações, uma maior
autonomia, novos ambientes sociais, bem como novos papéis e responsabilidades e uma
acrescida pressão para a excelência (Respondek, Seufert, Stupnisky, & Nett, 2017).
Nos últimos anos tem-se assistido a inúmeros estudos com incidência no ES e nas
temáticas do insucesso e abandono académico universitário, sendo que a literatura tem
evidenciado o primeiro ano como um período crucial de adaptação e integração (por exemplo:
Casanova, 2018; Vieira, 2019).
Sabe-se que o abandono académico é um acontecimento complexo e multidimensional
(Sarra, Fontanella, & Di Zio, 2018; Tinto, 1975) que está relacionado com outros aspetos tais
como a esfera pessoal, social e profissional (Ferreira et al., 2018) e depende de diferentes
características de background, abordagens de aprendizagem e ensino, das diversas interrelações entre estas (Sarra et al., 2018), da interação entre o indivíduo e a instituição (por
exemplo, recursos, instalações e composição de membros) e da qualidade da universidade
(Tinto, 1975).
Sendo um dos objetivos das instituições de ES a formação de cidadãos mais
comprometidos e competentes socialmente, o abandono poderá assumir-se como um fracasso
- para os estudantes, para as famílias e as próprias instituições (Casanova, 2018). Uma vez
que o abandono académico pode implicar um conjunto de consequências, não só para o
sujeito (através da marginalização, mobilidade descendente; Hällsten, 2017) como também
para as instituições e para a sociedade (Sosu & Pheunpha, 2019), importa compreender as
causas e motivações desta problemática. Ao serem identificadas estas causas, torna-se mais
fácil a identificação de grupos de risco e poder-se-á agir preventivamente (Sosu & Pheunpha,
2019) através de intervenções mais intensivas e de estratégias mais eficientes para manter os
estudantes no ES (Ortiz-Lozano, Rua-Vieites, Bilbao-Calabuig, & Casadesús-Fa, 2018).
140
Face a esta problemática e à crescente preocupação em compreender e acompanhar o
percurso académico dos estudantes (especialmente aqueles em risco de insucesso e
abandono), surge, em 2015, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), o
Observatório Permanente do Abandono e Promoção do Sucesso Escolar (OPAPSE) com o
objetivo de fomentar estratégias promotoras do sucesso académico, decorrente de um estudo
exploratório sobre o abandono na UTAD (Ribeiro et al., 2014).
O OPAPSE é um meio de combate ao insucesso e abandono académico dos estudantes
da UTAD, que pretende monitorizar e intervir em casos de abandono escolar e implementar
ações que permitam melhorar os indicadores de abandono e de promoção do sucesso.
Especificamente, objetiva monitorizar o abandono académico, acompanhar os estudantes,
mobilizar os docentes e funcionários e melhorar/adequar a oferta formativa (Ribeiro,
Cabreira, Silva, & Cravino, 2017).
O OPAPSE apresenta-se como a primeira instância à qual os estudantes podem
recorrer, evitando que fiquem isolados na resolução dos seus problemas. O Observatório
analisa individualmente as situações de risco, permitindo um encaminhamento direcionado e
adequado face ao(s) problema(s) do estudante para outros serviços e apoios disponíveis.
O modelo de ação do OPAPSE tem duas vertentes: a de investigação e a de
intervenção, ambas assentes em três princípios essenciais: sinalizar, encaminhar e
acompanhar.
Descrição, problematização e apresentação de objetivos ou hipóteses
Em Portugal, o ensino é marcado pela heterogeneidade de estudantes. Estes são de
idades diferentes, chegam por diferentes vias de acesso ao ES (Engrácia & Baptista, 2018) e
com diferentes expectativas e desempenhos (Vieira, 2019). Contudo, a diversidade de perfis
está associada à existência de algumas problemáticas que têm sido identificadas como
potenciais fatores de risco no que concerne o abandono académico, tais como: 1) a média e
nota de ingresso obtida no ensino secundário do estudante quando se candidata (Engrácia &
Baptista, 2018; Sosu & Pheunpha, 2019). Relativamente a este aspeto refira-se que as notas
de entrada mais baixas são entendidas como um fator de vulnerabilidade académica e parece
estar correlacionado de modo significativo com o risco de abandono (Sosu & Pheunpha,
2019); 2) a (in)preparação que os estudantes possuem ao nível do ensino secundário parece
determinar o posterior (in)sucesso ao nível do ES (Engrácia & Baptista, 2018; Esteban García,
141
Bernardo Gutiérrez, & Rodríguez-Muñiz, 2016; Meggiolaro, Giraldo, & Clerici, 2017; OrtizLozano et al., 2018; Stewart, Lim, & Kim, 2015; Tinto, 1975); 3) (in)capacidade de adaptação
ao ES (Casanova, 2018; Ferreira & Fernandes, 2015).
Outro fator que pode condicionar a permanência do estudante no ES é a capacidade de
financiamento, já que o ES pressupõe mais investimento do que a escolaridade obrigatória.
Muitas vezes associado a problemas financeiros surgem dificuldades em conciliar a vida
académica com as outras esferas da vida e o consequente confronto das expectativas
idealizadas com a realidade (Vieira, 2019). As expectativas, quando elevadas, podem ser
benéficas, traduzindo-se num maior investimento nas atividades académicas; no entanto, caso
estas não sejam alcançadas, podem resultar em desilusão ou frustração, podendo conduzir a
um menor investimento e participação, risco de abandono e insucesso académico (Almeida,
Araújo, & Martins, 2016).
Engrácia e Baptista (2018), num estudo que acompanhou o percurso académico dos
estudantes matriculados em 2011/12 durante quatro anos (até 2014/15), verificaram que as
taxas de sucesso variavam de acordo com o subsistema de ES em que o estudante estava
matriculado, regime, opção e média de ingresso, a área de estudos, se o estudante estava ou
não deslocado, género e o nível de escolaridade dos progenitores. Tinto (1975) refere o nível
de escolaridade dos pais como um dos fatores que influencia a permanência no ES, aspeto que
é confirmado por Engrácia e Baptista (2018), que reforçam a ideia de que a taxa de abandono
dos filhos de pais com escolaridade elevada é mais baixa. Porém, Casanova, Bernardo e
Almeida (2018) referem que não encontraram nenhuma associação significativa entre o
género e as habilitações académicas dos progenitores com as taxas mais altas de abandono
académico.
Questões relacionadas com a opção de escolha do curso, ou seja, se o estudante entra
na opção desejada, e questões relacionadas com a adaptação são dois fatores com influência
na decisão de abandono académico, uma vez que podem estar associadas a uma menor
satisfação e menores níveis de autoeficácia e motivação. Alguns autores destacam a
importância das atitudes, motivações e sentimentos (Casanova, 2018; Casanova & Almeida,
2016; Meggiolaro et al., 2017).
Por outro lado, Casanova, Cervero, Núñez, Almeida e Bernardo (2018) sublinham que
o número de ECTS obtidos no primeiro ano de frequência do ES afeta a decisão de
142
permanecer ou abandonar o ES, uma vez que o sucesso académico durante este período pode
evidenciar projetos educacionais e vocacionais melhor definidos.
Um outro fator que parece influenciar o abandono académico está relacionado com a
distância a que o estudante se encontra do seu agregado familiar, algo que pode originar
dificuldades emocionais e consequentemente reforçar/agravar a vulnerabilidade académica
(Sosu & Pheunpha, 2019).
De modo geral, os motivos apresentados para a intenção de abandono prendem-se
maioritariamente com aspetos vocacionais, financeiros, de aprendizagem e pessoais
(Casanova, Bernardo, et al., 2018). As variáveis do tempo dedicado a estudar e os fatores
relacionados com a residência (viver com os pais, amigos ou em residência de estudantes)
parecem ser também fatores que contribuem para maiores níveis de persistência académica
(Bernardo et al., 2017, 2016).
De forma a colmatar os vários fatores que podem provocar o abandono académico, é
importante que as instituições atentem na forma como os estudantes são acolhidos de modo a
fornecer-lhes ferramentas com as quais possam enfrentar com sucesso as novas solicitações e
mais facilmente se adaptar à nova realidade (Almeida et al., 2016; Stewart et al., 2015).
Considerando as graves consequências que o abandono académico pode assumir na
vida dos estudantes, têm sido criados mecanismos de acompanhamento e combate deste
fenómeno (Ferreira et al., 2018). Assim, e uma vez que o desempenho académico e o
envolvimento académico têm influência no abandono, importa criar mais ambientes de
suporte que atuem de forma preventiva (Sarra et al., 2018), tais como programas de integração
facilitadores na adaptação ao ES, compromisso com a conclusão do curso, prática de
estratégias de treino e gestão do tempo (Bernardo et al., 2016). Importa que a integração
social seja fomentada pelos cursos, visando a construção de uma rede de suporte diversificada
e sólida (afetiva e academicamente). De igual modo, é imperioso oferecer apoios
especializados aos estudantes com maiores dificuldades de adaptação (Teixeira, Dias,
Wottrich, & Oliveira, 2008).
Dentro desses apoios, destacam-se os programas de tutoria e mentoria. Esteban García
e colegas (2016) referem que um projeto como o da tutoria aumenta a responsabilidade dos
participantes para com o seu futuro e contribui para a prevenção do abandono. A tutoria e a
mentoria, favorecendo a integração e adaptação dos estudantes, com especial relevo para os
143
do 1º ano (Casanova, 2018), podem assumir-se como mecanismos potenciadores da
aprendizagem e criação de novas redes de suporte social, autonomia, gestão temporal e
económica para os novos estudantes, especialmente para os deslocados do seio familiar. Por
exemplo, o apoio oferecido pela tutoria/mentoria é também defendido por Stewart e colegas
(2015), sendo que estes destacam a importância de outros serviços, tais como os de
aconselhamento, sistemas de intervenção precoce e assistência de apoio financeiro na
promoção da permanência no ES. Meggiolaro e colegas (2017) corroboram esta perspetiva,
sugerindo uma oferta de atividades e serviços através da tutoria, coaching e aconselhamento.
Assim, uma integração formal (académica) e informal (em termos relacionais) bemsucedidas parecem atuar como condições preventivas do abandono no ES (Ferreira &
Fernandes, 2015; Tinto, 1975), existindo também maiores probabilidades de os estudantes
continuarem o seu percurso académico quando socialmente bem-adaptados (Bernardo et al.,
2016). A boa relação entre o estudante e o professor parece ainda ser um outro fator que
contribui para a permanência no ES (Bernardo et al., 2016; Casanova & Almeida, 2016;
Esteban García et al., 2016; Meggiolaro et al., 2017).
De modo a facilitar a transição e adaptação/integração plena dos novos estudantes,
Casanova (2018) defende que uma boa articulação entre o ensino secundário e o ES pode
funcionar preventivamente em relação ao abandono. Esta articulação poderá realizar-se
através do desenvolvimento de competências pré-transição, disponibilização da informação
acerca dos cursos existentes, exploração e clarificação de escolhas vocacionais e ajustamento
de expectativas, objetivando a preparação dos novos estudantes para os desafios com os quais
se poderão deparar (Casanova, 2018).
Para os estudantes que se encontram em risco de abandono é relevante fornecer
workshops sobre as temáticas do autocuidado, gestão de tempo e hábitos de estudo (Gibbons,
Rhinehart, & Hardin, 2016), e estilos de vida saudáveis e hábitos alimentares saudáveis, bem
como promover a prática de exercício físico e prevenção de consumo de substâncias
(Casanova, 2018). Em relação à integração, acrescente-se que Ferreira e Fernandes (2015)
verificaram que os estudantes valorizam a bolsa de ação social e o relacionamento com os
colegas. Estes autores observaram ainda que 80% dos estudantes afirmava desconhecer os
serviços de apoio existentes na faculdade/universidade. Assim, a divulgação da existência de
serviços de apoio é, pois, uma ação que as faculdades/universidades devem fomentar.
144
Em suma, importa ter presente que as instituições de ES devem prestar uma atenção
acrescida aos estudantes mais fragilizados (psicológica e academicamente), prestando-lhes
apoio e evitando possíveis situações que possam resultar em desânimo, insucesso e abandono
académico (Casanova & Almeida, 2016).
De acordo com o referido, as necessidades de acompanhamento reforçam o papel do
OPAPSE na prevenção e monitorização do abandono, uma vez que este se apresenta como a
primeira instância à qual o estudante poderá recorrer (diretamente ou sinalizado por outra
figura). De acordo com cada situação, os estudantes poderão ser encaminhados para outros
serviços da UTAD, nomeadamente para os Serviço de Psicologia, os Diretores de Curso, o
Programa de Tutoria, o Programa de Mentoria e os Serviços de Ação Social da UTAD (bolsas
de estudo, alojamento; fundo de apoio social), podendo ainda ter acesso a outros apoios
específicos. Realça-se que o OPAPSE mantém um contacto contínuo com o estudante em
risco, mesmo após um eventual encaminhamento para outros serviços da UTAD.
Assim, este trabalho tem como principal objetivo compreender a problemática do
abandono na UTAD, caracterizando o perfil do estudante que opta por abandonar o ES
(formal ou informalmente), numa tentativa de identificação de características/grupos de risco
para que, futuramente, se possa agir preventivamente e de forma mais célere.
Argumentação
Na UTAD, apesar de nos últimos anos se ter vindo a assistir a um decréscimo dos
números de abandono no ES (a maior taxa de abandono coincidiu com a crise económica
iniciada em 2011), este continua a ser uma realidade para alguns estudantes. Verifica-se que a
maior concentração de pedidos de anulação de matrícula ocorre entre setembro e novembro 19.
O pedido de anulação de matrícula pode ser realizado online ou presencialmente junto dos
Serviços Académicos (SA) da UTAD, mediante o preenchimento de um formulário próprio
para o efeito.
De modo a explorar as razões que levam os estudantes a abandonar os seus estudos, e
numa tentativa de reverter esta situação, o OPAPSE procede ao contacto com os estudantes,
19
De acordo com a regulamentação da UTAD um aluno que anule a sua matrícula até final de novembro tem
apenas que realizar o pagamento das propinas até à data da anulação, caso contrário terá que realizar o
pagamento das propinas de todo o ano letivo.
145
no menor espaço de tempo possível. Para tal, solicita aos SA da UTAD informação sobre as
anulações de matrícula realizando-se o contacto imediatamente após o pedido. O estudante é
contactado telefonicamente, pretendendo-se analisar os motivos do abandono e verificar a
possibilidade/necessidade de se acionar algum apoio que possa reverter esta decisão. Nas
situações de não renovação de matrícula, o procedimento é semelhante uma vez que estas
podem evidenciar cenários de abandono académico não oficializado. Nestas situações o
contacto é estabelecido através de email.
Após o contacto com o estudante, e nas situações em que não é possível a reversão da
intenção de abandono, é solicitada a resposta a um questionário online. Este questionário é
uma adaptação do “Questionário sobre causas do abandono e decisões do estudante relativas
ao abandono dos estudos no ensino superior” do Projeto GUIA “Gestão Universitária do
Abandono Escolar”(Comissão Guia e Grupo de Análise, 2013), sendo constituído por 47
questões, agrupadas nas seguintes secções: a) Caracterização do perfil; b) Causas do
abandono escolar; c) Procura de apoio; d) Situação atual do estudante; e) Percurso após a
saída da UTAD – Abandono académico e avaliação da decisão; f) Percurso na UTAD; g)
Acesso ao Ensino Superior; e h) Caraterização do contexto familiar. O questionário de
autorrelato foi desenvolvido no LimeSurvey, sendo assegurados o anonimato e a
confidencialidade.
Para este trabalho foram analisados os dados referentes ao abandono dos últimos dois
anos letivos (2017/18 e 2018/19), contemplando todos os pedidos de anulação de matrícula
(formais) e as situações de não renovação de matrícula (abandono não oficializado) no
1ºCiclo de Estudos e Mestrado Integrado, utilizando como data de referência 31 de março do
respetivo ano letivo. Os dados foram tratados com recurso ao Excel, realizando-se análises
estatísticas descritivas.
Dados do abandono 2017/18 e 2018/19 (Anulação e não renovação de matrícula)
Os dados referentes ao abandono têm sofrido algumas oscilações ao longo dos anos,
no entanto continua a ser uma realidade para alguns estudantes da UTAD.
146
Nº Estudantes
Anulações de matrícula
2017/18
2018/19
6651
6688
1ºCiclo e MI
4987 (75%)
5032 (75%)
2º Ciclo
1383 (21%)
1349 (20%)
3º Ciclo
281 (4%)
307 (5%)
Nº Total de anulações
95 (1.43%)
179 (2.68%)
Anulações que correspondem
a abandono:
82 (1.23%)
136 (2.03%)
1º Ciclo e MI
44
51
2º Ciclo
33
72
3º Ciclo
5
13
29 (30.5%)
51 (28.5%)
340 (6.82%)
359 (7.13%)
43 (12.6%)
37 (10.3%)
8,25%
9,81%
Nº Total
Nº Respostas questionário
Não Renovações de
matrícula
Não Renovações 1º Ciclo e
MI
Nº Respostas questionário
% Abandono Total
Figura 1. Abandono com base nas anulações e não renovações de matrícula nos anos letivos 2017/18 e 2018/19.
Analisando os motivos reportados pelos estudantes no pedido de anulação de
matrícula junto dos SA , constata-se que estes são predominantemente os mesmos, sendo que
em 2017/18 se destacam os aspetos relacionados com a não adaptação, razões do foro pessoal
e profissional e, em 2018/19, os motivos mais reportados relacionam-se com a não adaptação
e aspetos financeiros e económicos.
Uma vez que nem todos os pedidos de anulação de matrícula correspondem a
abandono académico (por vezes trata-se de mudanças de curso/instituição), na análise
seguinte serão apenas contempladas as anulações que correspondentes a abandono real do
Ensino Superior (Figura 1).
147
Perfil do estudante que opta por pedir a anulação da sua matrícula
Analisando as respostas dos participantes, constata-se que a maioria dos estudantes
que solicitou a anulação de matrícula tinha entre os 17 e os 20 anos, estava deslocado (54%
- 2017/18; 75% -2018/19), e residia maioritariamente na zona Norte do país (Porto e Braga)
com os seus progenitores (68% - 2017/18; 59% - 2018/19).
Relativamente aos progenitores dos participantes, apenas uma pequena parte possui
formação académica superior. No caso da mãe, a maioria possui o ensino secundário, no caso
do pai o ensino básico foi o nível de ensino mais prevalente, e no caso dos tutores predomina
o ensino secundário. No que diz respeito à situação profissional dos progenitores, na
generalidade, estes encontram-se empregados e ativos a tempo inteiro.
Relativamente ao ingresso, grande parte dos estudantes (61% - 2017/18; 68% 2018/19) diz não ter interrompido os seus estudos antes da entrada no ES, destacando como
razões da escolha do seu ingresso: a obtenção de um grau académico e a obtenção de
competências que permitem acesso a uma profissão aliciante/bem remunerada. Já para a
escolha da UTAD, os participantes apontam como motivos: a sua localização geográfica, isto
é, a proximidade com a sua residência, a recomendação de amigos, por ser a melhor
instituição para o curso pretendido e a sua boa reputação académica.
O curso frequentado foi a 1ª opção para a maioria dos participantes (50% - 2017/18;
72% - 2018/19), estando estes satisfeitos com o curso e com as relações estabelecidas na
instituição, avaliando mais positivamente as relações estabelecidas com os seus pares do que
as estabelecidas com os docentes.
Durante a permanência na UTAD, a maioria dos estudantes afirma ter dependido
financeiramente dos seus pais (71% - 2017/18; 59% - 2018/19); no entanto, 29% dos
estudantes em 2017/18 e 24% em 2018/19, afirma não ter tido recursos económicos
suficientes. De destacar que grande parte dos participantes refere não ter obtido qualquer tipo
de ajuda (87% - 2017/18; 67% - 2018/19).
Relativamente à procura de apoio, 46% dos participantes em 2017/18, e 29% em
2018/19, referiu não ter procurado qualquer tipo de apoio, apontando como razões para esta
decisão: “ingresso no mercado de trabalho, sendo impossível conciliar a vida académica e a
vida profissional”; “Não quis”, “Não necessitar”, , “Não era algo que pudesse ser ajudado”,
“Falta de tempo, por motivos profissionais e familiares”, por estar “emigrado”; “…entre
prestar apoio à minha família e trabalhar não conseguia frequentar as aulas.”; “(...)
natureza pessoal…”; “(...) mudei para o Instituto/Curso que realmente queria.”; “Não sabia
148
que existia ajuda.”; “Abandonei o Mestrado por me encontrar empregado”. Por outro lado, a
maioria dos estudantes que procurou apoio diz ter recorrido a familiares, sendo que apenas
12% em 2017/18 e 22% em 2018/19 diz ter procurado ajuda junto de algum serviço de apoio
da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE).
Analisando os motivos que conduziram ao abandono, percebemos que não existe o
predomínio direto de um só motivo, sendo vários os que potenciam esta decisão do estudante.
Contudo, os motivos mais apontados são semelhantes em ambos os anos, sendo a razão mais
destacada o facto de o curso não ter correspondido às expectativas. São ainda realçadas as
dificuldades de adaptação à vida académica, os problemas pessoais e familiares e a
incompatibilidade da vida académica com a vida profissional (Figura 2).
Dificuldades económicas.
Problemas pessoais e familiares.
Ingresso no mercado de trabalho.
Dificuldades no processo de aprendizagem (Insucesso escolar).
O curso não correspondeu às minhas expectativas.
Dificuldades de adaptação na vida académica.
Má qualidade das infraestruturas da UTAD.
Má qualidade dos serviços disponíveis na UTAD.
Fraca qualidade do corpo docente do curso.
Problemas de saúde.
Incompatibilidade da vida académica com a vida profissional.
0%
2017/18
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
2018/19
Figura 2. Motivos de abandono das anulações de matrícula em 2017/18 e 2018/19.
149
Após o abandono a situação dos estudantes difere nos dois anos letivos e varia
consoante a sua faixa etária. Assim, em 2017/18 os participantes entre os 17 e 20 anos
referem ter ingressado noutra IES, e em 2018/19, a maioria dos participantes desta faixa etária
encontrava-se sem qualquer tipo de ocupação. Os resultados nas outras faixas etárias foram
semelhantes nos dois anos letivos, estando a generalidade dos participantes entre os 21 e os 24
anos noutra IES, e a maioria dos participantes com idades superiores a 24 anos no mercado de
trabalho.
Analisando as notas de entrada referidas pelos participantes, podemos perceber que
estas se situavam entre os 12 e os 14 e entre os 15 e os 17 valores em 2017/18. Por sua vez,
em 2018/19 a maioria dos estudantes refere que a sua média se encontrava entre os 15 e os 17
valores.
Perfil do estudante de não renovação de matrícula
Em relação às não renovações de matrícula, e considerando as respostas dos
participantes, apercebemo-nos de algumas diferenças entre os dois anos letivos. Em 2017/18 a
maioria dos estudantes (35%) encontra-se entre os 30 e os 39 anos, e em 2018/19, o grupo
etário com maior prevalência (32%) foi o dos estudantes entre os 25 e os 29 anos. De modo
semelhante aos estudantes de anulação de matrícula, a maioria dos participantes encontrava-se
deslocado da zona de residência (63% e 70% em 2017/18 e 2018/19, respetivamente), e
residia com os seus progenitores (45% - 2017/18; 49% - 2018/19).
Relativamente à formação académica dos progenitores, verificou-se que apenas uma
pequena parte possui formação superior. No caso do pai, o ensino primário foi o mais
prevalente em ambos os anos. Em 2017/18, no caso da mãe e do tutor legal, a maioria possui
o ensino primário, sendo que em 2018/19 a maioria das mães e dos tutores legais possui o
ensino secundário. Quanto à situação profissional destes, verificamos que a maioria se
encontra ativa a tempo inteiro.
No que respeita às questões de ingresso, grande parte dos estudantes (78% - 2017/18;
73% - 2018/19) diz não ter interrompido os seus estudos antes da entrada no ES, destacando
como razões da escolha desta tipologia de ensino: a obtenção de competências que permitam
acesso a uma profissão aliciante/bem remunerada, o prazer em estudar e em aprender, e a
obtenção de um grau académico. As razões apontadas para escolher a UTAD, prendem-se
150
com a proximidade com a residência e por ser a melhor para o curso pretendido. O curso
frequentado foi a primeira opção para 78% em 2017/18 e 70% dos estudantes em 2018/19.
Quando questionados, os estudantes mostram-se satisfeitos com o curso e com as
relações estabelecidas na instituição, tendendo a avaliar mais positivamente as relações
estabelecidas com os pares do que as estabelecidas com os docentes, à semelhança dos
estudantes de anulação de matrícula.
Durante a permanência na UTAD, a maioria dos estudantes, (58%) em 2017/18,
dependeu financeiramente de si mesmo, e em 2018/19 a maioria dependeu dos seus pais
(62%). Quando questionados se possuíam recursos económicos suficientes, uma parte
significativa dos participantes aponta que não (29% - 2017/18; 38% - 2018/19). De destacar
que grande parte dos participantes refere não ter obtido qualquer tipo de ajuda (65% 2017/18; 70% - 2018/19).
Relativamente à procura de ajuda, 55% dos participantes em 2017/18 e 54% em
2018/19 referiu não ter procurado qualquer tipo de apoio, apontando como razões: “Foi uma
decisão pessoal”; “Não achei que iria necessitar de ajuda”, “Porque não tinha conhecimento
de apoios extra, visto que já recebia bolsa de estudo”, “(...) o facto de ser trabalhadorestudante e entretanto a vida profissional alterou-se e não consegui conciliar”, “Prescrição,
embora tivesse vontade de continuar os estudos em conciliação com o trabalho”, “Porque eu
não espero que ninguém me dê nada. E queria estudar numa universidade que contribuísse
de alguma forma para a minha melhor formação”; “Não era necessário”, “Vergonha”,
“Orgulho”, “Não considerei pertinente”; "… não ter condições psicológicas nem apoio de
ninguém para continuar a estudar e a concluir o curso que tanto gostava…”; “Por
transferência para um curso noutra instituição.”; “(...) questões de saúde e monetárias, não
sabia propriamente como pedir ajuda de momento”; (...) ter começado actividade que me
impossibilita de frequentar e ir inclusive a exames.”; “Parei um ano, com o âmbito de
renovar a matrícula para o ano”; “Porque entrei no segundo semestre do primeiro ano, onde
ninguém me concedeu apontamentos e não me consegui integrar. Também abandonei a
universidade porque tive de tomar conta da minha avó…”; “(...)o horário deste curso não é
compatível com o meu trabalho”. Os estudantes que procuraram auxílio, recorreram a
familiares, sendo que apenas 18% em 2017/18 e 14% em 2018/19 diz ter procurado ajuda
junto de algum serviço de apoio da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE).
151
Nas situações descritas não existe apenas uma causa potenciadora do abandono, sendo
variadas as combinações de motivos. Porém, a incompatibilidade da vida académica com a
Dificuldades económicas.
Problemas pessoais e familiares.
Ingresso no mercado de trabalho.
Dificuldades no processo de aprendizagem (Insucesso escolar).
O curso não correspondeu às minhas expectativas.
Dificuldades de adaptação na vida académica.
Má qualidade das infraestruturas da UTAD.
Má qualidade dos serviços disponíveis na UTAD.
Fraca qualidade do corpo docente do curso.
Problemas de saúde.
Incompatibilidade da vida académica com a vida profissional.
Outro.
0%
2017/18
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
2018/19
Figura 3. Motivos de abandono das não renovações de matrícula em 2017/18 e 2018/19.
vida profissional, as dificuldades económicas, o facto de o curso não ter correspondido às
expectativas e os problemas pessoais e familiares foram as razões mais referidas (Figura 3).
A situação dos estudantes no pós-abandono difere consoante o grupo etário. No
intervalo de idades entre os 17 e os 20 anos, a maioria dos estudantes ingressou noutra IES, e
a maioria dos participantes dos restantes grupos etários encontra-se no mercado de trabalho.
As notas de entradas no Ensino Superior reportadas pelos estudantes de não renovação
de matrícula, em 2017/18, situaram-se entre os 12 e os 14 valores, sendo que em 2018/19, a
maioria se situou entre os 15 e os 17 valores.
Discussão dos resultados
Reconhecendo que nem todas as situações de anulação de matrícula correspondem a
abandono, algumas correspondendo a mudanças de instituição de ensino e/ou curso, nesta
pesquisa focamo-nos principalmente nas anulações referentes ao abandono real do ES e nas
situações de não renovação de matrícula. Assim, após a análise das respostas aos
questionários, foi possível identificar algumas características comuns entre os participantes,
152
nomeadamente que a maioria dos estudantes se encontra deslocado da sua zona de residência.
Estes resultados parecem contraditórios aos reportados por Engrácia e Baptista (2018), uma
vez que estes autores verificaram que os estudantes deslocados tinham uma taxa de abandono
ligeiramente inferior. Pudemos ainda verificar que a maioria dos estudantes que abandonou os
seus estudos vive com os seus progenitores, dependendo financeiramente destes durante a sua
permanência na UTAD, enquanto a maioria dos estudantes de não renovação de matrícula
dependeu dos pais (2017/18) ou de si mesmo (2018/19).
Relativamente à formação académica dos progenitores, verificamos que esta varia
maioritariamente entre o ensino básico e o ensino secundário no caso dos pais dos estudantes
de anulação de matrícula, e entre o ensino primário e o ensino secundário nas situações de não
renovação de matrícula. Esta baixa escolaridade dos progenitores parece reforçar a ideia que
as menores taxas de abandono se encontram associadas a estudantes cujos pais possuem
níveis de escolaridade mais elevados (Engrácia & Baptista, 2018; Tinto, 1975). Contudo,
salientamos que a maioria dos estudantes da UTAD é proveniente de meios familiares cujos
progenitores têm escolaridade mais baixa, pelo que este poderá não ser um bom indicador,
dado os estudos de Casanova e colaboradores (2018), pois estes não encontraram nenhuma
associação significativa entre com o nível de escolaridade dos pais.
A maioria dos estudantes afirmou não ter interrompido os estudos antes da entrada no
ES, referindo ter entrado no curso de 1ª opção, parecendo assim corroborar a tese de que a
opção de escolha é independente da decisão de abandono (Engrácia & Baptista, 2018).
O facto dos estudantes de não renovação de matrícula serem de grupos etários mais
velhos (2017/18 - entre os 30 e os 39 anos; 2018/19 - entre os 25 e os 29 anos) não contribui
para alcançar a segunda meta para a Europa 2020, cujo objetivo é o aumento do número de
estudantes entre os 30 e os 34 com o nível superior (Eurostat, 2020). No entanto, estas faixas
etárias confirmam parcialmente o encontrado por Bernardo e colegas (2017), onde os
estudantes mais velhos (e com um progresso académico menor) apresentaram maior
probabilidade de desistir do ES, e por Casanova, Bernardo e Almeida (2018) que verificaram
que os estudantes mais velhos, deslocados e não colocados no curso de 1ª opção,
apresentavam uma taxa de intenção de abandono superior.
A maioria dos estudantes apontou a obtenção de um grau académico, a obtenção de
competências que permitam acesso a uma profissão aliciante/ bem remunerada e o prazer em
estudar e em aprender como as principais razões para a continuação dos seus estudos. A
escolha da UTAD deveu-se essencialmente à sua localização geográfica (proximidade com a
residência), por recomendação de amigos, por ser a melhor para o curso pretendido e pela boa
153
reputação académica. Esta preferência pela proximidade geográfica pode evidenciar que os
estudantes limitam as suas escolhas a instituições mais próximas devido a dificuldades
económicas (Balsa et al., citado em Almeida et al., 2016). De realçar que, durante o seu
percurso na instituição, os estudantes mostraram-se satisfeitos com o curso e com as relações
estabelecidas.
Uma parte considerável dos estudantes refere não possuir recursos económicos
suficientes, confirmando o observado por Ferreira e Fernandes (2015), que o abandono do
ensino superior se deveu, em grande medida, a aspetos económicos. Destaca-se ainda que
uma grande parte dos participantes de anulação de matrícula e de não renovação de matrícula
refere não ter procurado qualquer tipo de apoio, indicando diversas razões para esta escolha,
desde o facto de achar não precisar, incompatibilidade entre a esfera profissional e a esfera
académica, desconhecimento dos apoios disponíveis, não saber como pedir ajuda, referindo
também aspetos como “Vergonha” e “Orgulho”. Por sua vez, os estudantes que procuraram
apoio fizeram-no principalmente junto dos seus familiares, sendo poucos os que referiram ter
procurado ajuda junto dos serviços de apoio da UTAD (SA, SAS, Psicologia e OPAPSE).
Apesar dos motivos que levam o estudante a abandonar o ES serem múltiplos e com
inúmeras interações, no caso dos estudantes de anulação de matrícula o mais destacado foi o
facto de o curso não ter correspondido às expectativas, reforçando que a não concretização
destas pode resultar num maior risco de insucesso e abandono (Almeida et al., 2016), ou seja,
a transição e adaptação para o ES parece determinante no sucesso académico do estudante
(Casanova, 2018). São ainda destacados como motivos os problemas pessoais e familiares e a
incompatibilidade entre a vida académica e a vida profissional. No que diz respeito às razões
de abandono dos estudantes que não renovaram a matrícula, estas são semelhantes às das
anulações de matrícula e igualmente diversas, destacando-se a incompatibilidade entre a vida
académica e a vida profissional, as dificuldades económicas, o facto de o curso não ter
correspondido às expectativas e os problemas pessoais e familiares.
Analisando a situação dos estudantes após o abandono, verificamos que no caso das
anulações de matrícula esta variou nos dois anos letivos e de acordo com a faixa etária.
Assim, em 2017/18 os participantes no inquérito, entre os 17 e 20 anos, referiram ter
ingressado noutra IES, e em 2018/19, a maioria dos participantes desta faixa etária
encontrava-se sem qualquer tipo de ocupação. Estes últimos parecem estar de acordo com o
observado pelo Eurostat (2020), onde 53.8% dos estudantes que abandonaram os estudos se
encontravam desempregados ou inativos. Os resultados nas outras faixas etárias foram
154
semelhantes nos dois anos letivos, estando a generalidade dos participantes entre os 21 e os 24
anos noutra IES, e a maioria dos participantes com idades superiores a 24 anos no mercado de
trabalho. No que concerne aos estudantes de não renovação de matrícula, pudemos perceber
que maioria dos estudantes entre os 17 e os 20 refere ter ingressado noutra IES, e a maioria
dos participantes dos restantes grupos etários encontrava-se no mercado de trabalho.
Quando analisadas as notas de entrada no ES reportadas pelos estudantes, verificamos
que estas se encontram entre os 12 e 14 valores e os 15 e 17 valores, pelo que os estudantes
que abandonaram não parecem estar numa situação de maior vulnerabilidade académica
provocada por baixas notas de ingresso (Sosu & Pheunpha, 2019).
A União Europeia definiu na estratégia para 2020 a diminuição da taxa de abandono
para 10%, sendo que Portugal em 2018 se encontrava com uma taxa de 11.8%, um valor
consideravelmente mais baixo o que o apresentado em 2008 (34.9%; Eurostat, 2020). Na
UTAD o abandono em 2017/18 rondou os 8,25% e em 2018/19 rondou os 9,81% (total das
anulações e não renovações de matrícula), contribuindo para que esta meta seja alcançada. No
entanto, o desejável é que este fosse nulo, e que o estudante consiga concluir o seu percurso
académico com sucesso.
Considerações finais
A entrada no ensino superior corresponde ao objetivo de muitos jovens. No entanto,
esta conquista exige a adaptação a uma nova realidade e contexto de ensino. Embora para a
generalidade dos estudantes esta transição ocorra sem dificuldades, para outros, aqueles que
são forçados a abandonar, essa mesma fase da vida afigura-se instável e problemática.
Sabe-se que o abandono não é uma decisão tomada levianamente, consistindo num
processo multidimensional complexo (Casanova, 2018; Sarra et al., 2018) diferente para cada
estudante. Dada a heterogeneidade dos estudantes e a multiplicidade de razões, a identificação
das dificuldades e possíveis causas de abandono nem sempre é fácil (Casanova, Cervero, et
al., 2018).
Contudo, importa compreender quais são as causas do abandono, pois uma vez
identificadas, podemos agir preventivamente, apoiando os estudantes que se encontram em
situações de maior fragilidade.
155
Neste trabalho foram consideradas duas situações de abandono separadamente: as
anulações de matrícula (abandono oficial) e as não renovações de matrícula (abandono
não oficializado). Após a análise dos motivos inicialmente reportados pelos estudantes para a
anulação da sua matrícula percebemos que a não adaptação foi o mais frequente, seguido de
razões do foro pessoal e profissional. Por sua vez, analisando os questionários aplicados a
estes estudantes e aos estudantes de não renovação de matrícula, os motivos mais referidos
relacionaram-se com o facto de o curso não ter correspondido às expectativas, a
incompatibilidade entre a vida académica e a vida profissional, os problemas pessoais e
familiares e as dificuldades económicas.
A UTAD reconhece o impacto que o abandono assume na vida do estudante, e
reconhece ainda que algumas destas situações podem ser evitadas. É da responsabilidade das
instituições o combate ao abandono e a preocupação no apoio aos estudantes nesta nova etapa
das suas vidas. Neste sentido, a UTAD providencia mecanismos de acolhimento e apoio na
transição para o ES, pretendendo a identificação e a intervenção precoce em situações de
maior fragilidade, potenciando o sucesso académico. Como referido, destes mecanismos de
apoio destacamos o OPAPSE, o apoio psicológico, e as atividades promotoras da integração e
socialização, nomeadamente: a semana de integração no início do ano letivo, o programa
tutoria e mentoria, o qual potencia as redes de suporte social dos estudantes, o
desenvolvimento de competências pessoais, sociais e académicas, e atua preventivamente na
identificação precoce de eventuais dificuldades (Almeida et al., 2016; Casanova & Almeida,
2016; Casanova, Cervero, et al., 2018; Meggiolaro et al., 2017).
O apoio prestado pelo OPAPSE aos estudantes é de extrema importância, uma vez que
este intervém e informa os estudantes em diversas problemáticas, nomeadamente na procura
de apoio económico (interno e externo à instituição), psicológico, questões de reingresso e de
prescrição. Os estudantes que chegam ao OPAPSE são acompanhados de forma próxima e
informados das respostas existentes de acordo com os seus pedidos, sendo realizadas as
respetivas marcações e encaminhamentos para os diferentes serviços. De realçar que mesmo
após o encaminhamento, os estudantes continuam a ser acompanhados pelo OPAPSE. De
sublinhar que o apoio e acompanhamento realizado pelo OPAPSE permitiu o
encaminhamento de algumas situações para os serviços da UTAD, evitando que os estudantes
ficassem sozinhos na resolução dos seus problemas, e promovendo o seu sucesso académico.
Algo a melhorar é a divulgação do OPAPSE e restantes mecanismos de apoio aos
estudantes, uma vez que os resultados mostraram que muitos ainda não os utilizam. Também
pode ser útil uma abordagem pedagógica, no sentido de melhorar a perceção dos estudantes
156
relativamente à ocorrência de problemas e dificuldades, para que não seja estigmatizante
recorrer aos mecanismos de apoio disponibilizados pela instituição.
Para reflexão futura, e dada a importância atribuída ao desempenho académico na
decisão do abandono referido por alguns autores (Bernardo et al., 2017; Casanova, Cervero, et
al., 2018), será interessante perceber o impacto deste fator na decisão de abandono.
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159
8. LE RÔLE DU MENTOR DANS LES STAGES DES FUTURS
ENSEIGNANTS DES ÉCOLES
Maria Frounta20, Charikleia Pitsou21 & Costas Malamas22
Résumé
Le stage joue un rôle de plus en plus important dans la formation initiale des futurs
enseignants. Dans le cas du Département des Sciences de l’Éducation et du Travail Social de
l’université de Patras, il s’échelonne du 5e au 8e semestre. Il débute à l’université et se
poursuit dans les écoles où les étudiants passent par une phase d’observation avant d’assumer
les activités pédagogiques de la classe sous la tutelle de l’enseignant titulaire de la classe ou
mentor. Dans ce contexte, le rôle du mentor est central étant donné qu’il fonctionne comme
un superviseur de l’étudiant. Lors de cette communication, nous présenterons les résultats
d’une recherche faite sur questionnaire auprès des étudiants qui participent au stage du 5e
semestre. Sur un total de 220 étudiants du 5e semestre, 184 étudiants ont complété le
questionnaire. Les résultats montrent que l’efficacité du stage et la satisfaction des étudiants
sont liés à la qualité du mentor et sa capacité à établir un sentiment de confiance ainsi qu’au
climat général de l’établissement. De plus, faute d’un nombre suffisant de mentors formés à
cette tâche, la coopération n’est pas telle qu’espérée. Par ailleurs, les mentors semblent,
parfois, jouer plus le rôle du gardien des habitudes du métier qu’œuvrer à faciliter son
renouveau.
Mots-clés : Université. Formation Initiale des Enseignants. Stage. Mentor.
Introduction
Le terme même de formation des enseignants suggère que l’enseignement est un métier et non
pas une vocation. Cependant, l’enseignement ne consiste pas seulement en une liste de
techniques à apprendre et à appliquer. C’est aussi une capacité à comprendre, à réfléchir et à
agir pédagogiquement dans un environnement d’apprentissage. Pour cette raison, dans le
curriculum de la formation initiale des enseignants des écoles, partout dans le monde, existe
une période d’initiation au métier par des stages dans les écoles (Saifullah, Sherzaman, Syed
PhD, Enseignante, Université de Patras – Grèce, email : mariafggm@upatras.gr
PhD, Enseignante, Université de Patras – Grèce, email : xpitsou@hotmail.com
22
Conseiller des écoles, Athènes – Grèce, email : syn86-at3@sch.gr
20
21
160
Shafqat, Asima, & Sehrish, 2013; Essays, 2018). Ce stage est censé familiariser les futurs
enseignants au contexte du métier et aux réalités d’une classe scolaire (Abiodun, 2017). En
d’autres termes, le stage consiste en la mise en contact des étudiants avec les conditions
réelles de l’acte didactique et du processus d’apprentissage des élèves. Dans ce cadre,
l’étudiant est appelé à prouver sa capacité à mobiliser les savoirs théoriques acquis dans
l’espace universitaire et à les mettre à l’épreuve de la réalité de la classe (Abiodun, 2017).
Pour beaucoup, tant formateurs qu’étudiants, le stage est considéré comme une activité
formatrice clé dans le programme d’études. Des recherches montrent que les étudiants
considèrent le stage comme l’élément le plus utile du programme d’études étant donné qu’il
représente la transition du statut d’étudiant au statut de maître (Essays, 2018).
La place, l’organisation et le temps octroyé au stage varient par établissement et par
programme d’étude. Le stage est, parfois, considéré comme un cours obligatoire, parfois, il
est organisé après une période de formation formelle dans l’environnement universitaire.
Dans d’autre cas, le stage commence dans l’espace universitaire avec des activités
préparatoires avant qu’il soit déplacé dans une classe. Dans d’autre cas, il commence
directement dans les écoles. Malgré ces différences d’organisation, une fois arrivé à l’école,
l’étudiant suit l’enseignement de l’enseignant de la classe, et par la suite, il assume
personnellement le fonctionnement de « sa » classe (Essays, 2018).
La prise en charge d’une classe scolaire n’est pas seulement une dimension de la formation
initiale de l’étudiant c’est aussi un acte formateur pour la constitution de l’identité
professionnelle du futur enseignant. Une expérience négative lors du stage peut causer un
blocage du développement des compétences professionnelles des futurs enseignants (Tang,
Wong, & Li , 2019).
Cependant, pour un déroulement approprié du stage, une préparation minutieuse est
indispensable et commence par la concrétisation des objectifs. Un stage joue un rôle crucial
dans l’acquisition par l’étudiant d’une confiance en soi et des compétences nécessaires à un
enseignement efficace. En effet, grâce au stage, les étudiants développent des compétences
clés pour un enseignement de qualité comme la planification et la mise en œuvre de
l’enseignement, la gestion d’une classe scolaire, les compétences communicationnelles, la
capacité d’évaluation et d’auto-évaluation mais aussi la capacité à former une personnalité qui
corresponde aux attentes du métier (Abiodun, 2017). De plus, à travers le stage, les étudiants
se préparent à plusieurs tâches : la gestion efficace du temps scolaire, le choix des pratiques et
des activités les plus conformes aux objectifs de l’enseignement et aux capacités de leurs
élèves, la motivation des élèves pour qu’ils participent activement au cours, le développement
161
des pratiques et des activités adaptées aux conditions particulières de la classe. Enfin, en
suivant la façon d’enseigner, les étudiants ont la possibilité d’observer et d’évaluer les
différentes stratégies d’enseignement (Kilic, 2010). L’expérience du stage est si forte qu’elle
est en mesure de façonner la perception globale des futurs enseignants pour l’enseignement et
l’apprentissage (Saifullah, Sherzaman, Syed Shafqat, Asima, & Sehrish, 2013). Si
l’expérience s’avère positive, l’enseignement se fera avec moins de stress et le comportement
dans la classe sera aisé et détendu (Abiodun, 2017).
Pour le bon déroulement du stage, le « mentoring » de l’étudiant joue un rôle primordial. Le
« mentoring » s’avère important au niveau psychologique, didactique et professionnel
(Χατζοπούλου & Κακανά, 2013). Selon leur définition le « mentoring » est « un processus
au travers duquel un enseignant expérimenté transmet les informations et les conseils
nécessaires à l’enseignant débutant, en même temps qu’il le soutient psychologiquement
pendant un temps déterminé » (Ανδρούτσου & Τσάφος, 2013). Dans la pratique, un mentor
joue le rôle d’un hôte qui introduit et soutient l’étudiant dans une classe. Bien sûr, le but final
sera l’intégration de l’étudiant dans la classe où il est censé effectuer son stage. À travers cette
expérience, mentor et étudiants peuvent partager leurs efforts et générer des connaissances
nouvelles sur le métier (Parker Katz & Tejero Hughes, 2008).
Depuis les années 1980, le « mentoring » est reconnu comme une activité centrale de la
formation initiale de futurs enseignants car il tente d’établir des interconnexions entre la
théorie et la pratique de la classe. Des chercheurs soutiennent que le « mentoring » pour qu’il
soit efficace, doit se faire en petits groupes (Singh & Mahomed, 2013). Le mentor n’est pas
un simple observateur passif qui fait des constatations après l’enseignement d’un étudiant.
Des recherches montrent que l’étudiant s’enrichit davantage si sa coopération avec son
mentor est continue et systématique. Le feedback que les mentors donnent aux étudiants joue
un rôle crucial pour le futur parcours de l’enseignant. Pour cette raison, les étudiants
protestent quand le « mentoring » n’est pas de qualité (Genç, 2016).
Des recherches soulignent aussi le rôle de l’expérience chez le mentor de sorte que les
étudiants profitent d’un accompagnement de qualité (Schepens A. A., 2009; Izadinia, 2016;
Zhao & Zhang, 2017). Ainsi, la question du profit de mentor s’impose. Un bon
accompagnateur est celui qui a une bonne expérience d’enseignant, qui est bien formé, qui
suit les évolutions de la recherche et du métier et qui dispose d’un arsenal abondant de
méthodes et de pratiques d’enseignement. Dans ce cas-là, le mentor est considéré comme un
référent professionnel pour l’étudiant (Richards, 2010; Singh & Mahomed, 2013). En effet,
ces mentors peuvent faciliter l’intégration des étudiants dans la culture scolaire et réduire ainsi
162
la difficulté de la transition de la place d’étudiant à la place d’enseignant. (Zhao & Zhang,
2017).
Izadinia, M. (2016), dans sa recherche, a signalé l’importance du soutien émotionnel et
académique ainsi que de la communication et du feedback entre le mentor et l’étudiant. Il
s’agit des éléments qui caractérisent une bonne relation de « mentoring ». Pour les étudiants,
le soutien émotionnel et académique de leurs mentors s’avère fondamental. Sur ce point, une
divergence émerge. D’une part, les mentors semblent considérer que leur rôle serait d’amener
les stagiaires à décider de manière consciente et fondée s’ils veulent encore continuer à ce
métier ou pas. D’autre part, les stagiaires souhaiteraient une relation basée sur
l’encouragement constant et le soutien émotionnel afin de construire une confiance mutuelle.
La bibliographie spécifique signale qu’une relation émotionnelle étroite entre le mentor et
l’étudiant conduit à de meilleurs résultats y compris la compétence d’auto-évaluation (Zhao &
Zhang, 2017).
Cependant, le « mentoring » n’est pas une compétence inhérente chez l’homme. Par
conséquent, un bon enseignant n’est pas nécessairement un bon mentor. Pour cette raison, des
chercheurs mettent en lumière une contradiction flagrante : en amont, le rôle des enseignantsmentors est crucial, et en aval, ces enseignants-mentors ne sont que rarement formés pour
assumer ce rôle (Genç, 2016).
Pour conclure, le stage et le « mentoring » constituent des issues importantes dans la
formation initiale des enseignants des écoles. Or, malgré le fait que le stage et le
« mentoring » prennent, au fur et à mesure, une place plus importante dans les programmes
d’études pour les enseignants des écoles, les recherches sur les mentors se font rares et un
manque de donnés existe (Richards, 2010). Suite à une étude synthétique des recherches
effectuées sur une période de 25 ans, les chercheurs ont souligné que, d’une part, le rôle de
mentor est significatif, et que d’autre part, un flou généralisé existe sur les tâches concédées
au mentor. En effet, il existe un manque de concrétisation de son rôle ainsi qu’une lacune sur
sa formation nécessaire, son œuvre à accomplir et sa fonction lors de son travail. Finalement,
les attentes et les exigences de son rôle ne sont pas claires (Cohen, Hoz, & Kaplan, 2013).
Le cadre de référence du stage au Département des Sciences de l’Éducation et du
Travail Social de l’Université de Patras
Le stage est organisé en trois phases (ΟΔΗΓΟΣ ΣΠΟΥΔΩΝ, 2017-2018):
163
a) La première est intégrée au curriculum de la troisième année d’études (5e semestre) et elle
est d’une durée de 13 semaines. Les étudiants suivent 5 ateliers d’initiation dans les locaux du
département et ensuite ils suivent des cours et enseignent dans une classe pendant 8 jours (5
heures par jour). Cette phase est strictement liée aux cours de didactiques des matières
scolaires. La participation au stage fait partie intégrante des cours et considérée comme un
« exercice en laboratoire » (la partie « mise en pratique » de ces cours). Elle est obligatoire
pour tous les étudiants et un étudiant ne peut pas passer aux niveaux suivants sans avoir
l’accompli.
b) La deuxième phase commence au 7e semestre (4e année d’études). Les étudiants
participent aux cours d’une classe de primaire dans l’École Expérimentale de l’Université de
Patras pendant une semaine23. Ils sont considérés comme des maîtres auxiliaires.
c) La troisième phase se déroule au 8e semestre (dernier semestre des études). Elle a le statut
d’un cours indépendant d’une durée de 13 semaines. Dans cette phase, l’étudiant assume
pleinement le rôle de l’enseignant sous tutelle du maître de la classe (« mentoring »). Pour s’y
adapter l’étudiant :
coopère avec les enseignants-accompagnateurs
bénéficie d’un accompagnement actif lors de son enseignement
participe à des ateliers, des réunions d’équipes ou assiste à des présentations spécifiques
dans le but d’enrichir sa réflexion sur son travail.
L’évaluation de la procédure de cette phase est faite par les étudiants, les accompagnateurs et
les mentors24. Les étudiants et les mentors remplissent deux questionnaires différents.
La note finale de l’étudiant est la synthèse de : a) sa performance didactique à l’école. Elle est
définie par les mentors et les accompagnateurs, b) l’appréciation du portfolio (plans des
cours/plans didactiques, auto-évaluation et les évaluations par les mentors et les
accompagnateurs) et c) la participation active de l’étudiant aux ateliers.
Sur la base de cet état des lieux présenté, trois questions de recherche ont été formulées :
1ere question : Quelle appréciation du stage font les étudiants par rapport à son utilité globale
et par rapport à la relation mentor - étudiant?
23
L’école expérimentale de l’Université de Patras est utilisée comme un lieu d’expérimentations pédagogiques
et elle accueille les étudiants de l’Université destinés devenir des enseignants du primaire et du secondaire.
24
En effet, la préparation de l’étudiant commence à l’Université. Le responsable est un enseignantchercheur. L’enseignant-chercheur coopère avec les enseignants spécialisés du Département dont le statut est
différent de celui des enseignants-chercheurs. Ces enseignants spécialisés, désignés comme accompagnateurs,
prennent en charge un nombre d’écoles qui correspond à 25-30 étudiants par accompagnateurs. Le rôle des
enseignants spécialisés est de préparer, accompagner et faciliter la réflexivité de l’étudiant. Donc, pendant le
stage, chaque étudiant est suivi par un accompagnateur (qui est membre de l’université) et le mentor (qui est
l’instituteur de la classe de réception).
164
2eme question : En quoi les origines sociales des étudiants influent-elles sur les réponses
données à la première question?
3eme question : Quelle est la relation entre la réponse des étudiants sur l’utilité globale du stage
et la réponse sur la qualité de la relation mentor et étudiant?
3. La recherche
L’Objectif de la recherche consiste en l’analyse de l’opinion des étudiants-stagiaires sur leur
expérience de stage et est formulé autour de trois questions de recherche. Notre démarche a
pour but de recueillir des données susceptibles de contribuer à l’amélioration du stage.
3.1. La mise en application
L’outil utilisé a été un questionnaire composé de questions fermées. L’échantillon est
constitué des étudiants de la 3e année d’études du Département des Sciences de l’Éducation et
du Travail Social de l’Université de Patras. Par voie de conséquence, notre échantillon est un
échantillon « de facilité » (Bryman, 2017).
En tout, 184 étudiants, sur un total de 220 étudiants, ont rempli le questionnaire (année
académique 2018-2019). Ces étudiants venaient de terminer leur stage (5e semestre). Ils
avaient donc assisté au cours de leurs mentors et enseigné dans leurs classes pendant 8 jours
(5 heures par jour). Cependant, il faut signaler qu’il ne s’agit que du premier niveau du stage.
Les questions ont été formulées selon l’échelle de Likert (de trois ou cinq échelons). Dans la
première partie du questionnaire des données démographiques, sociales et éducatives des
étudiants ont été collectées.
3.2. Analyse de données
Pour l’analyse de données nous avons utilisé le logiciel SPSS, version 24. Dans ce texte, nous
utilisons les données sociodémographiques ainsi que deux facteurs qui concernent l’utilité du
stage et la relation mentor-étudiant25.
Pour la présentation des résultats, la moyenne et l’écart type ainsi que les fréquences et les
pourcentages ont été utilisés. Les facteurs de la recherche sont présentés sous forme de
100*[(Xi-minimum(X))/Range(X)], afin que les valeurs statistiques se situent entre [0,100].
Pour le contrôle des facteurs du stage (valeur du stage et relation mentor-étudiant) avec des
variables sociodémographiques et éducatives, nous avons utilisé le contrôle non paramétrique
Kruskal Wallis, en raison du petit nombre de cas (n<30) et l’échelle Likert (à trois ou cinq
La relation, dans cette recherche, est centrée principalement sur l’intervention de l’enseignant et sur
l’autonomie de l’étudiant.
25
165
échelons). L’hypothèse initiale du contrôle est que les k-cas (k >2) proviennent de la même
population (indépendance des variables).
Pour le contrôle de régularité des deux facteurs (valeur du stage et relation mentor-étudiant) le
contrôle Shapiro Wilk a été utilisé. L’hypothèse initiale est que les facteurs suivent la
régularité paramétrique. Comme l’hypothèse de régularité n’était pas satisfait par le contrôle
de corrélation entre les facteurs, on a utilisé le coefficient de corrélation Spearman dont la
valeur est entre -1 et 1. L’hypothèse initiale du contrôle est que la corrélation linéaire n’est
pas statistiquement significative. Le niveau de signification est défini à 5%. L’hypothèse
initiale est acceptée pour une p-valeur ≥ 0,05 (Κολυβά-Μαχαίρα, Μπόρα-Σέντα, &
Μπράτσας, 2017).
3.3. Fiabilité des données
La fiabilité des données est contrôlée pour chaque facteur par le coefficient Alpha Cronbach,
pour lequel les valeurs acceptées sont celles de plus de 0,7 (Nunnaly & Bernstein, 1994). Le
tableau 1 montre que les valeurs sont toujours plus de 0,7.
Tableau 1: Analyse de fiabilité
Facteur
Valeur du stage
Relation mentor-étudiant
Questions
6
3
Cronbach’s Alpha
0,806
0,719
Résultats
I. Données démographiques, socioéconomiques et éducatives
L’échantillon est composé par 80,22% (Ν=146) de femmes et 19,78% (Ν=36) d’hommes.
L’écrasante majorité des participants, 91,11% (Ν=164), a un âge entre 19-22 ans, 2,2% (N=4)
entre 23-25 ans et 6,67% (N=12) plus de 26 ans. Quant à la préférence des participants par
rapport au programme d’études26, pour les 65,34% (Ν=115) ce département a été le premier
vœu, pour les 24,43% (N=43) le second et pour les 10,23% (N=18) le troisième. En ce qui
concerne la situation sociale des parents :
a) 74,32% (Ν=136) des pères ont un travail stable, 13,66% (N=25) sont retraités, 7,65% n’ont
pas de travail stable et 1,64% (N=3) sont au chômage,
26
En Grèce, un bachelier doit passer un examen national et par la suite remplir un formulaire administratif avec
ses vœux classés par ordre de préférence. A terme, le Département de réussite est déterminé par : a) le
nombre d’entrée par Département fixé par le Ministère, b) la performance à l’examen national, c) la liste des
voeux du candidat.
166
b) 49,46% (N=91) des mères ont un travail stable, 23,91% sont femmes au foyer, 10,33% sont
retraitées, 8,7% n’ont pas de travail stable, 6,52% sont au chômage et 1.09% (N=2) « autre ».
Enfin, les participants ont déclaré que l’expérience du stage concernait la cinquième année
(5e) de l’école primaire 21,86% (N=40), la 4e année 19,13% (N=35), la 6e année 18,03%
(N=33), la 3e année 16,94% (N=31), la 2e année 15.30% (N=28) et la 1er année 8,74%
(N=16)27.
II. 1ere Question de recherche
Quelle appréciation du stage font les étudiants par rapport à son utilité globale et par rapport à
la relation mentor-étudiant?
La valeur du stage
Les réponses ont été données sur une échelle en cinq échelons. Avec le tableau 2, nous
constatons que le stage a été considéré comme très important pour les étudiants (moyenne =
4,66/5). Grâce au stage, ils ont mieux appréhendé le fonctionnement de l’école (moyenne=
4,44). De plus, les participants au stage considèrent qu’ils ont amélioré leurs capacités
didactiques (moyenne= 4,14), qu’ils ont davantage développé leurs connaissances et
compétences initialement acquises à l’université lors des cours (moyenne= 3,98) et qu’ils ont
développé des compétences réflexives (moyenne= 3,94). Les réponses des participants sont
plus mitigées quant au développement des capacités de planification et de mise en œuvre de
l’ensemble de la matière scolaire (moyenne=3,57). L’écart type se situe entre 0,68 et 0,96.
Tableau 2 : Valeur du stage
Questions
Le stage a été important pour moi
J’ai mieux compris le fonctionnement de l’école
J’ai amélioré ma capacité didactique
J’ai développé davantage mes connaissances et compétences
J’ai développé des compétences réflexives
J’ai amélioré ma compétence de planification et de mise en œuvre de
cours dans l’ensemble des matières scolaires
Moyenne
4,66
4,44
4,14
3,98
3,94
3,57
Écart Type
0,68
0,74
0,76
0,81
0,71
0,96
La relation entre mentor et étudiant
La question visait, en principe, à comprendre le degré d’interventionnisme du mentor et le
sentiment d’autonomie chez l’étudiant. Les réponses étaient données sur cinq échelons. Par
les réponses (tableau 3), les étudiants semblent être contents de leur autonomie
27
En Grèce, l’école élémentaire comporte six classes.
167
(moyenne=4,24). Le mentor semble intervenir modérément lors de la préparation du matériel
à utiliser et lors des activités à programmer (moyenne=1,66) et aussi lors du déroulement de
l’enseignement dans la classe (moyenne=1,69). L’écart type est entre 0,88 et 1,05. Par
conséquent, il semble que l’interventionnisme variait selon le mentor mais en tout état de
causes restait modéré.
Tableau 3: Relation entre mentor et étudiant
Questions
Je me sentais libre d’organiser mon enseignement
Le mentor intervenait lors de mon enseignement
Le mentor intervenait lors de la préparation du matériel et de la
programmation des activités que je voulais développer
Moyenne
4,24
1,69
1,66
Écart Type
0,88
0,99
1,05
Après la réduction des valeurs à une échelle 0-100, nous constatons que les étudiants
considèrent positivement la valeur du stage (moyenne=78,02, +/- 13,96). Les étudiants
pensent aussi que les mentors n’intervenaient pas trop et que leur autonomie n’était pas
atteinte (moyenne=17,71, +/-19,53).
III. 2eme Question de recherche
En quoi l’origine sociale des étudiants influencent-elles les réponses données à la première
question?
En ce qui concerne la deuxième question, l’influence des variables sociales semble limitée.
Deux variables paraissent jouer un rôle significatif sur le facteur relation, mentor-étudiant : a)
la situation professionnelle de la mère et b) la classe du primaire où l’étudiant a fait son stage.
La situation professionnelle de la mère
Le Tableau 4 présente les résultats des contrôles Kruskal Wallis des deux facteurs avec la
variable « situation professionnelle de la mère ». L’analyse statistique a montré qu’il y a une
différence significative des rangs moyens (means ranks) avec le facteur « relation mentorétudiant » (H(5)=12,320, p=0,031). De plus, du tableau 5, il résulte que, concernant le facteur
« relation mentor-étudiant », les étudiants avec des mères des catégories « retraitées » ou
« autre » ont un rang moyen (mean rank) plus élevé comparée aux autres catégories.
168
Tableau 4: Contrôles Kruskal Wallis entre le facteur relation mentor-étudiant et la situation professionnelle de
la mère
Η
2,456
12,320
Facteur du stage
Valeur du stage
Relation mentor-étudiant
df
5
5
P
0,783
0,031
Tableau 5: Différences statistiquement significatives des rangs moyens entre le facteur mentor-étudiant et la
variable situation professionnelle de la mère
Facteur du stage
Intervention du mentor, autonomie
d’étudiant
Catégories
Travail stable
N
91
R.M.
95,99
Travail instable
16
102,59
Chômage
12
54,46
Retraitée
19
107,45
Femme au foyer
Autre
44
2
83,17
144,25
P
0,031
Le niveau de la classe de participation lors du stage
Le tableau 6 présente les résultats des contrôles Kruskal Wallis sur les facteurs du stage
concernant le niveau de la classe où l’étudiant effectue son stage. Il y a des différences
significatives des rangs moyens (means ranks) entre la relation du mentor-étudiant et le
niveau de la classe du stage (H(5)=12,608, p=0,027). De plus, du tableau 7, il ressort que le
facteur concernant la relation mentor-étudiant donne une relation significative au niveau de la
classe. En effet, les étudiants qui ont suivi les niveaux les plus élevés (5e et 6e) montrent du
rang moyen (mean rank) plus élevé (5e (107,48) ή 6e (106,53).
Tableau 6: Contrôles Kruskal Wallis des facteurs du stage à la variable « niveau de la classe »
Facteurs du stage
Valeur du stage
Relation entre mentor-étudiant (Intervention du mentor/autonomie
de l’étudiant)
Η
10,794
12,608
df
5
5
p
0,056
0,027
169
Tableau 7: Différences statistiquement significatives des rangs moyens (means ranks) des facteurs en fonction
de la variable niveau de la classe
Facteur du stage
Relation mentor-étudiant
(Intervention du
mentor/Autonomie de
l’étudiant)
Catégories (classes
scolaires)
Α΄
N
16
R.M
94,72
P
Β΄
28
78,84
C΄
31
72,69
D΄
35
87,00
Ε΄
F΄
40
33
107,48
106,53
0,027
IV. 3e question de recherche
Quelle relation entre la réponse des étudiants concernant l’utilité globale du stage et la
réponse sur la qualité de la relation entre mentor et étudiant?
Le tableau 8 présente les résultats du contrôle de régularité du test Shapiro Wilk pour les
facteurs dont la régularité n’a pas été satisfaite (p<0,001). Le tableau 9 présente les résultats
des corrélations Spearman des facteurs entre eux. Il semble que le facteur « valeur du stage »
révèle une relation négativement significative avec la relation mentor-étudiant (intervention
du mentor/autonomie de l’étudiant) (r=-0,234, p<0,01).
Tableau 8: Résultats du contrôle de régularité des facteurs entre eux avec l’usage du test Shapiro Wilk
Facteur
P
Valeur du stage
<0,001
Relation mentor-étudiant (Intervention du mentor/Autonomie de l’étudiant)
<0,001
Tableau 9: Corrélations Spearman des facteurs entre eux
Corrélation Spearman
Valeur du stage
Intervention du mentor/autonomie de l’étudiant
-0,234**
**Corrélations statistiquement significatives à 1%.
Discussion des résultats
184 étudiants de la 3e année d’études ont participé à la recherche. Dans une majorité
écrasante, il s’agit de femmes entre 19-22 ans. Les pères ont, en majorité, un travail stable (ou
sont retraités) (donc, ils disposent un financement stable et régulier). Les mères, elles, ont, soit
un travail stable (ou sont retraitées) soit sont femmes au foyer, c’est le cas dans leur majorité.
Nous avons décidé de demander « la situation de professionnelle » des parents car le pays (La
Grèce) sort d’une crise économique majeure et présente encore un taux de chômage élevé.
170
Ainsi, nous constatons que la majorité des étudiants viennent de familles qui ne sont pas
violemment touchées par la crise, même si les salaires ont nettement diminués. Pour
l’écrasante majorité des étudiants, le Département des Sciences de l’Éducation et du Travail
Social de l’Université de Patras, a fait partie des trois premiers choix exprimés par les
candidats au concours d’entrée à l’université. Cependant, ceux qui déclarent que ces études
étaient vraiment « les études rêvées » sont beaucoup moins nombreux. En effet, nous
observons qu’entre les « études rêvées » et les choix exprimés sur la plateforme de
l’Éducation Nationale, et le facteur réussite ou non aux examens nationaux, des enjeux
sociaux interviennent et façonnent un choix biaisé des études.
Concernant notre première question de recherche, nous avons examiné les facteurs « valeur
du stage » (selon les étudiants participants) et « relation mentor-étudiant » (en se focalisant
sur l’interventionnisme du mentor et le sentiment d’autonomie de l’étudiant). Les étudiants
semblent convaincus de l’utilité du stage. Selon leur opinion, grâce au stage, ils ont mieux
compris le fonctionnement de l’école et de la classe scolaire. Ils croient encore qu’ils ont
amélioré leurs capacités d’enseignement, ils ont approfondi leurs connaissances et ils ont
accru une capacité réflexive. De plus, les étudiants ne se sentaient pas, en général, trop
contrôlés par les mentors. Cependant cette image globale doit être mitigée car l’écart type de
réponses était important et en conséquence nous pouvons supposer que quelques mentors
étaient plus dirigistes que d’autres. À noter aussi que le mentor intervenait, modérément, dans
la préparation du cours par l’étudiant. Cette intervention précoce pourrait peut-être expliquer
le niveau modéré de l’intervention lors de l’enseignement.
Quant à la seconde question, l’analyse des variables sociodémographiques et éducatives n’ont
pas donné beaucoup de corrélations statistiquement significatives. Comme exceptions, nous
avons cité les variables « situation professionnelle de la mère » et « niveau de classe ». Quant
à la première variable, les résultats ne sont pas facilement lisibles. En conséquence, une
recherche qualitative focalisée sur le rôle des mères (d’une population d’étudiant dans un
Département très féminisée) s’avère opportune dans l’avenir. Par contre, les résultats
concernant le niveau de classe signalent une considération implicite. En effet, les enseignantsmentors semblent considérer les deux dernières classes de l’école élémentaire comme plus
difficiles que les autres. Ainsi, ils ont tendance à intervenir plus souvent lors du stage des
étudiants.
Concernant la troisième question, il semble que les étudiants les plus satisfaits du stage sont
ceux qui ont le moins senti l’intervention du mentor. Ainsi, deux réflexions surgissent.
Premièrement, le rôle du mentor est crucial. Or, l’élément central de son rôle n’est pas, pour
171
les étudiants, son intervention sur le travail de l’étudiant. Ainsi, dans les cas où le mentor
intervenait davantage, cela produisait un mécontentement chez l’étudiant qui se sentait privé
de son autonomie.
Conclusion
Pour conclure, l’expérience du stage a été décrite comme positive par une grande partie des
étudiants. Le stage a été appréhendé comme moyen de connexion de la théorie à la pratique
dans l’espace professionnel. Cependant, malgré l’enthousiasme des étudiants, un point
critique émerge qui concerne le rôle précis du mentor. Quel est le terrain de son action et
quelles en sont les limites? Quel est le point crucial après lequel son aide nécessaire se
transforme en une intervention peu désirée par l’étudiant? Ces questions semblent être en
accord avec la bibliographie spécialisée qui signale les problèmes de concrétisation des tâches
et du rôle des mentors. À signaler aussi, le manque de corrélation de deux facteurs examinés
avec les variables sociodémographiques. Cependant, une recherche qui se focalisera sur le
rôle des mères (d’une population d’étudiant féminisée), avec comme notion analytique
l’« autonomie », parait intéressante. Enfin, il semble que le niveau de la classe où est effectué
le stage, influence le rôle du mentor. En effet, l’analyse a montré que les mentors des deux
dernières classes de l’école élémentaire ont fait preuve d’un interventionnisme plus important.
Ainsi, nous pouvons suggérer que les enseignants considèrent ces classes comme étant plus
exigeantes que les autres. En revanche, les étudiants qui ont fait leur stage dans les premières
classes semblent avoir profité d’une autonomie plus élargie. Il s’agit d’une analyse qui
démontre l’importance du mentor. De plus, l’expérience et la formation du mentor semble
décisive.
Il fait aussi signaler les limitations de cette recherche, étant donné que ses résultats concernent
un échantillon de facilité et donc la généralisation des résultats n’est pas conseillée. Par
contre, elle peut s’avérer utile pour une réflexion globale sur l’utilité du stage et sur le rôle du
mentor.
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στην αρχική εκπαίδευση των εκπαιδευτικών: Ερευνητικές προσεγγίσεις σελ.125-156.
Δίκτυο Πρακτικών Ασκήσεων, Αθήνα: ΤΕΑΠΗ-ΕΚΠΑ.
174
9. CONTRIBUTIONS TO REDUCE ACADEMIC FAILURE IN STEM
BACHELOR COURSES
José Carlos Lopes28, Maria do Rosário Correia29, João Miguel Dias30 & Luis Descalço31
Abstract
According to Portuguese official data, less than half of the students enrolled in a bachelor
program manage to complete it after four years. In the STEM (Science, Technology,
Engineering and Mathematics) courses at the University of Aveiro, a probable major factor in
this situation is the worryingly high failure rates in the first couple of years of the curricula,
namely in the Physics modules.
In order to contribute to increasing the success rates in those modules, we have carried out a
case study of a 1st year/1st semester module (Elements of Physics), which has about 600
students from STEM courses and an average failure rate of around 30%. The module teachers
and course directors involved were inquired on how to reduce failure and on their receptivity
to some proposals for curricular reforms and pedagogical innovation. As a result of this case
study, we present here a set of four interconnected pedagogical strategies that aim to foster the
improvement in learning by students with more difficulties as well as by the best students.
The Physics Department has recently created an office (GQIP) dedicated to pedagogical
quality and innovation, whose mission is to promote that set of measures and evaluate its
efficacy, in addition to doing research in higher education in Physics. We also mention a
research project that GQIP will carry out next academic year to study the effectiveness of a
model of active learning in large classes, using both quantitative and qualitative methods.
Keywords: Pedagogical quality and innovation. Active learning. Attitudes and skills.
Criteria-based assessment. Higher education research.
1. Introduction
28
GQIP (Office for Pedagogical Quality and Innovation), Department of Physics, and CIDMA (Center for
Research & Development in Mathematics and Applications), University of Aveiro, Portugal. jcl@ua.pt
29
GQIP (Office for Pedagogical Quality and Innovation), Department of Physics & i3N-Aveiro, University of
Aveiro, Portugal. mrcorreia@ua.pt
30
Head of the Department of Physics, University of Aveiro, Portugal. joao.dias@ua.pt
31
CIDMA (Center for Research & Development in Mathematics and Applications), Department of Mathematics,
University of Aveiro, Portugal. luisd@ua.pt
175
In order to respond to economic needs, Portugal intends to reach the target of having 40% of
citizens aged 30-34 years with tertiary level of education (Council of European Union, 2009).
This expansion of access to higher education increases the risk of academic failure and
dropout rate compared to international reference values (Williams, 2017). The present
situation is already worrisome: according to a recent report (Direção-Geral de Estatísticas da
Educação e Ciência, 2018), four years after entering a public university bachelor degree, only
47% of students had obtained their diploma and 26% had left the higher education system
(public and private).
The shortage of qualified professionals is particularly acute in the area of STEM (Science,
Technology, Engineering and Mathematics), not only in Portugal (Horta, 2013), but in most
developed countries (UK Commission for Employment and Skills, 2015), and for decades that
efforts have been made to improve the situation (Catterall, 2017). STEM curricula in general
have, in the 1st and 2nd years, at least one module of the scientific area of Physics. This paper
addresses the situation in STEM courses at the University of Aveiro (UA) in terms of
academic failure in Physics modules, as of 2017/18.
In the case of UA, such modules are under the responsibility of the Department of Physics
(DPhys). In the last few years more than half of those modules had failure rates around 30%,
and in some cases higher than 40% (Lopes, 2018). Among those modules, there is the case of
the study reported in section 2: Elements of Physics, a 1st year/1st semester module taught to
ten Science and Engineering courses, with typically about six hundred students enrolled, of
which one third are repeat students.
The problem of high student failure rates is a concern not only of DPhys; some departments
affected, namely the Department of Mathematics (DMath), have taken initiatives leading to
pedagogical changes to improve academic achievement (MATEAS, 2016).
The causes of this failure are surely multiple; one of them, certainly, is the average grades of
the students admitted, which are very low in some courses. But a most important point is that
in Portugal higher education public institutions do not select their students and so teachers
have to teach students that are not always those they would fancy to have. Therefore, it is
necessary to innovate, and improve the quality of the teaching serviced. This need is
increasingly emergent in the current days, where all universities are challenged to improve the
tools and methodologies of distance learning. This brings additional challenges in terms of
students’ motivation, attitudes and skills.
176
2. Case study background and presentation
In this section we characterize the problem of academic failure in modules taught by DPhys of
UA to STEM courses managed by other departments, referring to its likely causes. Next, we
lay out the pedagogical guidelines which may help deal with that problem and constitute the
foundational hypotheses of the case study subsequently introduced.
2.1 Description of the problem
A statistical characterization of academic failure in 1st and 2nd year modules taught by DPhys
that are part of STEM courses that belong to other STEM departments showed a pattern that
has been occurring for at least the last five years. In a nutshell, that pattern is the following: in
six of such modules, which globally have more than two thousand students enrolled, six
hundred are repeats – that’s about 30% average, but in some cases it can be over 40%.
It should not be controversial that the reasons for academic failure have to do with:
(a) External factors (criteria for admission to higher education)
In fact, it has been reported that, for the aforementioned 1st year/1st semester STEM
module of Elements of Physics, there is an unsurprising correlation between the failure
rate per course and the course admission grades (Lopes, 2018), shown in Figure 1.
(b) Institutional factors (curricular organization, teacher selection)
Some of the large modules such as Elements of Physics, Calculus or Informatics, with
hundreds of students from many different backgrounds and with many different interests
and competences, all taught and assessed in the same traditional way, are reminiscent of a
former idea that such agglomeration would bring efficiency gains.
(c) Teaching factors (module’s syllabus, pedagogical methods, assessment methods)
Some faculty think that higher education has been working this way for decades, and it
turned out well for them, so they see little reason to change anything but student
selection.
(d) Student engagement.
177
Faculty can do nothing about (a), can only influence (b), and (c) is their obvious
responsibility. And they certainly have a definite bearing on (d) considering that, to be
engaged, students need to think they belong in higher education, that they can learn and find
meaningful the subject-matters (Felten, 2018). So if freshmen find themselves in a large class
together with hundreds of students, studying things they can’t relate with the course they have
applied to, or that they find too challenging, they probably feel disengaged, inclined to giving
up and even dropping out.
But faculty must teach the students assigned to them and must do what is within their reach to
get the best results, that is to say: low failure rates and competent graduates.
2.2 Hypotheses presentation
Based on the authors’ accumulated experience of several decades of teaching in higher
education, we conjecture that this situation of academic failure in STEM courses is mainly
related with the following:
not being made clear to students the point of they having to study certain subject
matters;
Figure 4 – Admission grades (last admitted and average) and percentage of repeats (over all enrolled) in
2017/18 for 8 of the 10 courses of Elements of Physics. (Two courses are omitted: one had very few students
and the other had been restructured.) E1-E6: Building Rehabilitation, Environmental, Civil, Chemical,
Informatics and Mechanical Engineering; S1-S2: Marine Sciences and Mathematics. Solid lines represent
tendencies.
178
teaching is centered on the teacher performance and not student-centered, so students’
passivity in classes is not only allowed but even unwittingly cultivated;
absence of systematic, formal education regarding adequate working skills and
attitudes;
the assessment method consists in mere score-adding, so that a student can pass (even
with good grades) with serious knowledge deficiencies, repeating the same mistakes
over and over without being specifically taught and encouraged to correct them.
Consequently, we assume that the strategy that should be adopted to tackle the problem has
four dimensions: curricular integration; active learning methods; education for development
of attitudes and skills; and criteria-based assessment. These interconnected dimensions are
explained next.
Curricular integration
Curricular integration implies giving meaning to the existence of a module in the curriculum,
making clear what is the purpose of the module, so that students understand why it matters for
their course that they learn such subject matters.
This can be achieved by using didactic elements specific to the course (e.g., the aspects of
radioactivity that are levant for medical imaging or not the same as for fossil dating) and by
linking the contents of the module to others in the same curriculum that require that same
contents (e.g., electromagnetic concepts are a prerequisite for materials engineering).
On the other hand, the ability to transfer knowledge and skills from one module to another
and to integrate (assimilate) them is also essential. Now, in the current curricular model,
students are typically exposed to different topics of a given area of knowledge (e.g.,
electromagnetism) in different modules in different curricular semesters. And, typically,
professors of later modules expect students to be able to recall what they have learned in the
basic modules to make associations and applications. It is unrealistic to expect this from a
mere juxtaposition of modules. It is necessary that students work on integrating knowledge
and skills continuously. Thus, it is necessary that the teachers involved in the modules of the
same area coordinate with each other, even if they belong to different departments, so that it
becomes clear to students, as early as possible, the affinities of learning outcomes and
competences.
179
Active learning
In addition to the sense of purpose, the sense of playfulness is important (Wagner, 2017),
understood here not only as recreational enjoyment (such as that which comes from watching
a game or attending a concert), but also the enjoyment that comes from performance and
achievement (playing a game or music). This sense of playfulness is not unrelated to the good
work of a teacher or scientist.
Learning with a sense of purpose and playfulness makes it easier for students to develop
interest, dedication and persistence in the study of a subject matter they find harder, as
Physics is considered by many. And so, students must be engaged in active learning, a
modality in which teaching is centered on students. Instead of passively listening to “the sage
on stage” (King, 1993), students are involved in tasks (reading, writing, discussing, solving
problems) that imply higher thinking functions (analysis, synthesis, evaluation).
Active learning operates more fully across the three learning domains (knowledge, skills and
attitudes), promoting critical thinking as well as the ability to work as a team. This is achieved
not only by changing what is taught and how it is taught. The role of the teacher must also be
different: instead of a “sage on the stage”, more like a “guide on the side” (King, 1993).
Experts in science education have been developing and assaying teaching methods that try to
address student’s difficulties along the learning process (e.g., (Dori & Belcher, 2005; Heller,
Keith, & Anderson, 1992; Mazur, 1996; Miller, Lukoff, King, & Mazur, 2018; Sokoloff &
Thornton, 1997). A meta-analysis (Freeman et al., 2014; Wieman, 2014) showed that,
compared to the traditional model, active learning modalities in the STEM areas are
advantageous: exam performance is better (effect size of 0.5) and the probability of failure is
1.5 times smaller (22% versus 34%). Applying these probabilities to the module Elements of
Physics, this could mean less fifty repeat students.
Attitudes and skills
In general, teachers are mostly concerned with covering the syllabus, that is, they are more
concerned with their putative job of lecturing on certain topics in preference to achieving
students’ real learning of those topics. And, in general, they overestimate knowledge to the
detriment of skills and attitudes. Nowadays, in the 4th Industrial Revolution, the internet
makes knowledge largely available for free, and perhaps more and more so, therefore neither
a teacher nor a school are as necessary as they used to be. In contrast, the skills needed for the
180
labor market are the same as for education and citizenship, namely: learning critically (which
is more important than memorizing correct responses); ability to collaborate, communicate
and listen; solve problems in a creative way (Wagner, 2017). And work attitudes as well,
which are indispensable both while as students and in future professional life: perseverance,
tenacity, self-discipline, etc.
It is not enough to encourage student to develop certain attitudes. These must be formally
cultivated. As with any subject matter, relevant attitudes and skills must be defined, situations
for their learning or development must be created, and assessment criteria established. And
should have a significant weight on the final grade.
Criteria-based assessment
Competences are much more than a set of formal statements required for the module
handbook. In a criteria-based assessment system (CBA) they are absolutely instrumental for
both teachers and students (Sadler, 2005).
The CBA system defines levels of competence, specifying which criteria must be met for
each. Namely, it establishes the minimum learning outcomes that are indispensable to earn a
pass grade as is usual in the case of essay assignments, project reports or dissertations. But
there are several pedagogical advantages in planning any module, irrespective of its character,
considering this methodology since it leads to a more effective structuring of the work of both
the teacher and the students (Lopes, Silva, Faustino, & Pimentel, 2009): it is much clearer
what students should learn, what learning situations (lecture class, laboratory class, study
visit, etc.) should be created for learning to take place, and how learning will be assessed and
graded.
For each competency, it must be specified, and made known to students, what the teacher
understands as essential. Students can orient their autonomous study by starting to reach that
core of competence. If, through formative assessment, students can know whether they have
already reached that core, or if they can know what it lacks to reach it, they can more easily
gain interest and motivation to study.
CBA maximizes the formative value that every assessment should have. The demonstrated
success of this methodology in the biomedical sciences course (Lopes et al., 2009) encourages
its application to STEM modules.
181
It has become increasingly imperative to resort extensively to modern technological means
not only for didactic purposes but also to carry out student assessment. Therefore, sooner
rather than later it will be unavoidable to use (albeit partially) a computer system for
summative assessment. Starting with one for formative assessment will be a good preparation
for the near future. A good example is SIACUA (UA Interactive Computer Learning System),
developed at DMath of UA.
SIACUA can be used to support autonomous study and assessment (Descalço, Carvalho, &
Oliveira, 2018), particularly in flipped learning (Descalço & Carvalho, 2019). For each
module the system presents a clean interface with an index of the module topics. For each
topic there are four different elements with different purposes. The first three provide access
to learning objects, including small videos, in order to: (i) recall previous concepts, (ii)
introduce the topic and (iii) provide references for complete study. The fourth element
consists of a clickable progress bar giving access to parameterized multiple-choice questions
with detailed solutions about the topic. The several progress bars in the module inform
students about their overall progress in the module based on their answers to questions. These
progress bars are computed using a Bayesian user module, from a set of four parameters for
each question: (i) difficulty level; (ii) slip (probability of wrong answer with knowledge about
associated concepts); (ii) guess (probability of guessing without knowing) and (iv)
discrimination. A consistent positive feedback has been obtained from the student surveys,
according to which the most valued resource were multiple choice questions with detailed
solutions, immediately followed by small videos.
2.3 Case study presentation
The case
To carry out the case study we chose a 1st year/1st semester module, Elements of Physics, that
has over six hundred students from ten STEM courses. Figure 2 summarizes the situation for
six of the worst-performing courses, corresponding to about 350 enrolled and 40% repeats in
the module; these numbers are typical of what has been happening in the last years. In
addition to this fact, this module was chosen because it is the students’ first contact with
university physics and academic failure at a such early stage, whatever the causes, has large
and lasting detrimental consequences in terms of student motivation.
182
The study
This qualitative study was informed by the hypotheses in section 2.2. It aims to evaluate the
acceptability of the strategy outlined therein, as no pedagogical reform can be successful
against, or despite, the opinion of the teachers involved (Bumbacher, Salehi, Wierzchula, &
Blikstein, 2015).
The study we performed consisted in querying course directors and module teachers about
academic failure in the module, its causes and how it might be dealt with. In addition, we also
wanted to probe their receptivity to a set of ideas, expounded in section 2.2, for curriculum
reform and pedagogical innovation to improve teaching and learning in that module – and
purportedly in other modules.
The query was done through individual interviews based on sets of previously prepared
questions. The participants were the ten course directors and sixteen module teachers (among
which module coordinators). The former were all experienced faculty: six associate professors
(two of which with habilitation) and four assistant professors. The latter, all but three (PhD
students) were also experienced faculty: five associate professors (two of which with
Figure 2 – Number of enrolled students and percentage of repeats for Elements of Physics in 2017/18, per
course. E1-E4: Informatics, Chemical, Environmental and Civil Engineering. S1-S2: Marine Sciences and
Mathematics.
183
habilitation) and eight assistant professors.
We began by interviewing the course directors first. A presentation of research motivations
and purposes was made viva voce, in brief (about half hour) meetings, by the end of 2017.
They were given a set of three questions to ponder:
(1) what competences and learning outcomes are expected from Elements of Physics;
(2) what were their students’ overall reactions to Elements of Physics;
(3) what changes (regarding learning outcomes or teaching methods or other) could improve
the integration of the module in the curriculum.
They were requested to answer either in writing or verbally in a second meeting.
After collecting the course directors’ reflections and taking them into account, another set of
questions was elaborated to guide the next step, in January 2018: individual interviews of
about one hour with the module teachers of that semester, as well as former module
coordinators. Each meeting was audio-recorded, and its summary transcript was edited and
validated by the interviewee.
Although the dialogue could flow with some freedom, a script was followed with the
following topics:
(1) if the module were specific to the course, or group of courses, to which the teacher was
assigned, how would s/he design the module;
(2) if it would be preferable that each course, or group of courses, to have a specific module,
with specific leaning outcomes, teaching and assessment methods;
(3) how the student assessment method should be;
(4) how did s/he envisage the use of computer platforms for assessment;
(5) how active learning could be developed, particularly in theoretical classes;
(6) what attitudes should we encourage students to cultivate and how;
(7) would it be of interest to form a group of teachers dedicated to studying the pedagogical
problems related to modules such as Elements of Physics (whose students are from
courses that are not under the responsibility of DPhys), proposing changes and testing new
teaching and assessment methods.
184
3. Results
Here we wrap up the feedback received from the course directors and summarize the
interviews with module teachers.
3.1 Course directors’ feedback
All but one course directors responded and preferred the written form, the documents being
up to four-page long. This we took as a good indicator of how they were aware of and
sensible to the problems they were inquired about.
Competences and learning outcomes
There was a general agreement about general competences, namely having a critical mind, the
ability to learn autonomously, and the ability to write experimental reports.
However, each director pointed out the learning outcomes that had little relevance for their
course and/or suggested topics and approaches most pertinent from their point of view.
Unsurprisingly, the common denominator was not large.
Students’ reactions
At UA, student representatives of each curricular year gather at the end of the semester with
the course director to whom they convey their peers’ opinions, but it is not known to what
extent these represent majority views. The points most relevant for the purpose of this paper
that were mentioned by course directors are: students did not understand the usefulness of
module in the context of their course (e.g., Informatics Engineering and Mathematics); the
diversity of teaching approaches was not mirrored in the assessment; some had widespread
difficulty in understanding the subject matters (e.g., Mathematics), while for others the topics
were interesting and not difficult, but the way of teaching did not help students to succeed; it
was mentioned students didn’t understand marking criteria and that there was discrepancy of
criteria among teachers.
Changes to improve curricular integration
All but one course directors suggested changes to learning outcomes. Some proposals
(Informatics Engineering and Mathematics) imply a completely different module, while
others imply substantial changes that are not compatible among them. In one case (Industrial
Engineering and Management) it was stated that the learning outcomes are most divergent
from what is taught in the same courses at other Portuguese universities.
185
While only a few directors have suggested mere changes in the approach (e.g., the use of
didactic examples from the science or engineering branch), almost all of them mentioned the
need to adjust (or bring closer) the module’s learning outcomes to the specificities of each
course.
3.2 Summary of module teachers’ interviews
The interviews with the teachers revealed several majority perspectives regarding the current
status: inadequacy of the current model of organization (i.e., general modules with several
hundred students from a diversity of courses), inefficiency of methodologies (based on too
traditional teaching/learning methods), little appreciation of attitudes and skills (which are
considered secondary outcomes), and the perception of the need to change the assessment
system, as detailed next.
Design of modules
Almost all of the sixteen interviewees agreed that reorganizing the module by grouping
together students from similar courses, to mitigate the course heterogeneity, allowed for a
closer relationship with the students, but more than half reported that the idea fell short of its
potential if the teaching of each group would have little autonomy (which is unavoidable if
assessment is not differentiated).
All teachers were favorable to the creation of new modules dedicated to a small number of
courses with affinities. They emphasized the need to adjust the learning outcomes and
methods of teaching and assessment on a case-by-case basis, without mentioning
disadvantages. However, they had no concrete and definite suggestions about the best way to
do it (how many new modules would be necessary, how the courses should be grouped).
Assessment issues
Regarding assessment methods, most teachers considered that there are too many tests not
only in this module, but also in the other four modules of the semester. Notwithstanding, one
teacher advocated frequent assessment moments with short quizzes.
Several teachers mentioned that most students are preparing for a test just a few days before,
meanwhile neglecting the classes as they cannot manage the effort. About one third of the
teachers considered that mid-semester and final exams are too difficult, by which they mean
186
that students were not able to achieve the learning outcomes according to teachers’
expectations.
On the use of computer platforms for assessment, opinions were quite diverse: yes for
formative purposes, but not for summative purposes perhaps; yes, but only partially, because
some learning outcomes cannot be assessed this way; if only for formative purposes, it is not
worth it because students are not interested if it has no weight in the final grade; in the
laboratory classes the individual assessment should be done that way.
Active learning
One teacher believed that active learning methods may not work with these students, are time
consuming and require too few students per teacher to be feasible. One colleague suggested
abolishing lecture classes and considered that only problem-solving and laboratory classes
should be maintained. The remaining teachers did not offer concrete suggestions.
Attitudes and skills
Almost all teachers suggested at least one soft skill or attitude students should develop, but
that one was rarely repeated by others: formality, discipline (punctuality, not leaving halfway
without giving excuse); interactive attitude with the teacher; cooperative attitude among peers
in the laboratory; ability to search for information; self-criticism; critical mind; rigor;
curiosity. Two teachers referred to the need to counter students' passivity and lack of
initiative. Two other teachers stressed the importance of making students realize that certain
attitudes at the university are also important in the job market.
In general, there were no suggestions on how to get students to develop those skills and
attitudes, but a teacher suggested an elective module.
Group of teachers dedicated to pedagogy
As to the creation of a group of DPhys teachers dedicated to issues of quality and innovation
in Physics higher education, with the exception of one interviewee who believed that such a
group would duplicate what is already being done at the UA, all the others were favorable.
About one third of the teachers suggested at least one function that such a group should have:
to propose changes to make the assessment more adequate and effective; develop
computational tools (e.g., interactive simulations); it should characterize students through
demographic parameters (academic background, preference order in the university
187
application, economic situation, etc.); study teaching experiences and good practices that have
proved successful and investigate which might be adapted to our reality; provide support and
training to other teachers.
About half of the teachers warned that the tasks of such a group are very time consuming,
which would be incompatible with other functions (research and management). Two teachers
underlined that it would be necessary that the activity of such a group to be extended over
time. Some mentioned requirements regarding the members of this group: they must be few
(2-3), they must deal with students, they must have good training in e-learning platforms.
Three teachers mentioned that there are limits to innovation, that big revolutions should not
be made, and that the experiences should be allowed to mature. Two teachers expressed
interest and availability to join this group.
4. Discussion of results
We now analyze the results and present its aftereffects, both the measures that have already
been implemented and other actions planed for the near future.
4.1 Analysis
From the summaries in section 3, we can acknowledge the following main points:
The need for adjustment of learning outcomes or even a profound syllabus change.
The need for new modules.
Assessment methods are an issue for both teachers and students (even though the
arguments are different).
There were no clear ideas about changes in learning outcomes nor about alternative
teaching methods.
Teachers named a variety of attitudes and skills students should have, but opinions
were scattered about which ones.
Teachers were not assertive in the opinions expressed concerning the implementation
of the assessment using e-learning platforms.
Actions aiming to improve pedagogical quality and innovation along the tenets of section 2.2
were apparently considered feasible but unsurprisingly not without some resistance.
By examining the DPhys faculty (internal factors) and the UA overall (external factors), it is
possible to pinpoint some of the factors underlying the resistance to the changes seemingly
188
urgent to make, but also some others that can encourage and support innovative pedagogical
proposals.
For instance, the resistance can be due to faculty aging. According to the Higher Education
Teacher Profile in 2018/19, 59 % of the PhD teachers in public universities were 50 years or
older (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, 2020). Furthermore, the
conviction many teachers have that the pedagogical models they follow which resulted from
their own education as students and are usually content-oriented conceptions of teaching
(Eley, 2006; Kember, 2009) remain suitable for the new generations, is a huge hurdle.
Nevertheless, it is possible to notice that at DPhys there are structural conditions,
interpersonal relationships and mobilization among the teaching staff to implement actions to
promote pedagogical quality. Also, external factors can undermine pedagogical reforms,
namely the fact teaching work has a relatively small weight in faculty promotion. However,
the undergoing process of curricular restructuring at university level in Portugal makes a
propitious climate for change. The most relevant internal and external factors that can
influence the implementation of the pedagogical changes we advocate in section 2.2 are set
out in Table 1 as a SWOT (Strength-Weaknesses-Opportunities-Threats) analysis.
Table 1 - SWOT analysis regarding the implementations of changes set out in section 2.2.
Internal Factors
Strengths
Sensibility of DPhys
councils for pedagogical
issues
Weaknesses
Opportunities
Threats
Dependency on faculty
motivation, willingness
Recent rectory team
implemented pedagogical
and didactic training
programs for teachers
Dependency on:
Curricular reforms in
progress
- approval by rectory
councils
Lack of time due to work
overload (diversity of
scientific, teaching and
Proposals of section 2.2 are management tasks)
overall consensual
View that pedagogical
Teachers’ willingness to get problems surmount faculty
involved in pedagogical
intervention capacity
innovation
Faculty aging
Friendly interpersonal
relationships among DPhys
faculty
Human and other resources
associated with
computational engineering
External Factors
- cooperation of other
departments
- actions on rectory
management boards
(schedules, classroom
assigning)
- approval by national
accreditation agency
Pedagogical activities and
competencies have modest
weight in academic
promotion in comparison
to research
189
4.2 Outputs
In this section, and as a result of the case study presented in this article, we give account of
the initiatives that are already in place: the creation of the office dedicated to teaching
innovation and quality, and the creation of new modules substituting for Elements of Physics.
Also, a new pedagogical research project is briefly presented.
What has been implemented
GQIP
When we realize that:
(i) DPhys provides teaching service to a dozen departments and three polytechnical
schools, in addition to the students of the DPhys courses, in which a few thousand
students are enrolled;
(ii) for that service to have the best possible quality, there must be a monitoring of the
teaching-learning process at a finer scale than that of the current Quality Assurance
System in the UA;
(iii) the numbers of academic failure in some modules serviced by DPhys to other
departments warrants a deep and thorough research.
(iv) the application of the strategies described in section 2.2 to any module implies
creating or recreating pedagogical and didactic methods, testing them and developing
those that are effective for each case;
(v) in other words, it is not possible to buy a “ready-to-teach” R&D is necessary in this
area,
it is compelling to conclude that all this requires a team of specialized, dedicated teachers. It
was therefore considered helpful to create an Office for Pedagogical Innovation and Quality
(GQIP, 2020), whose members are professors or researchers, working under the dependency
of the DPhys Head. Its mission is to increase the teaching quality (not just by decreasing
failure rates but also by improving levels of competence), namely of the teaching serviced to
other departments, and to promote and support innovation, that is, more effective pedagogical
methods. In addition, it aims to develop research in the area of higher education in Physics
teaching, namely on fine-level quality assessment of the modules, and on the effectiveness of
new methodologies.
190
Figure 3 - Creation of new modules to increase curricular integration according to affinity criteria.
Industrial Engineering & Management and Mechanical Engineering shall not have a module similar to
Elements of Physics. (*) Not yet official.
GQIP is similar to a pedagogical research and development unit, with the following functions:
to monitor the quality of teaching/learning; to investigate solutions (teaching/learning and
assessment methods) for the pedagogical problems encountered; to gather human resources
(partnerships, temporary collaborations) to develop solutions (namely through e-learning
platforms); to test (with the collaboration of other teachers) solutions in pilot experiments; to
collaborate in the implementation of the solutions that are adopted (analysis of the needs and
tasks involved, pedagogical support); to monitor the effectiveness of solutions.
Creation of new modules
A generalized curricular restructuring is occurring at UA and other universities in the country.
Taking this opportunity, STEM courses have been gathered by affinity in groups of three or
so, and each group has Physics modules tailored to its shared interests. Therefore, the
Elements of Physics module will be replaced by new modules as shown in Figure 3.
For Informatics Engineering, a task force of teachers from DPhys and the Department of
Electronics, Telecommunications & Informatics designed a new module, Modelling of
Physical Systems to substitute for Elements of Physics.
As to the Mathematics course, a new module, Elements of Mathematical Physics, was tailored
by DPhys and DMath. It is articulated with other modules in the curriculum, with partially
shared learning outcomes.
191
Marine Sciences, Geosciences, and MOG (Meteorology, Oceanography & Geophysics) will
share a new module of Elements of Physics of the Earth, in which all didactic examples and
applications are related with phenomena in the atmosphere, the hydrosphere or the
lithosphere.
The three courses of Civil, Environmental and Chemical Engineering will share a new module
of Fundamentals of Physics, whose learning outcomes maximize the overlap of interests
among the three specialties.
Planned near-future actions
Starting next academic year, we are carrying out a research project on a new comprehensive
pedagogical methodology that combines active learning in large classes, flipped learning, peer
teaching, peer and criteria-based assessment. The details of this project shall be published
presently, but one salient feature of the methodology is the splitting of a large class into small
teams, each of which coordinated by student-tutors that act as intermediaries between team
peers and the teacher. To study its effectiveness a mixed methods approach is warranted, so a
research team comprised of teachers and experts in statistics and qualitative research was
constituted.
5. Conclusion
In this qualitative study, we evaluated faculty’s acceptability regarding the implementation of
a set of pedagogical innovation actions based on four entangled dimensions, detailed in this
work: (1) curricular integration; (2) active learning methods; (3) education for development of
attitudes and skills; and (4) criteria-based assessment.
As a result, and relation to dimension 1, a single introductory module, which is the first
contact with Higher Education Physics shared by hundreds of students from ten STEM
courses, shall be replaced by four new modules. Each module includes up to three of those
courses, gathered by affinity, and is tailored to its shared interests.
As there are no “ready-to-teach” methodologies, it is essential to identify problems that could
guide research in the development and evaluation of the most appropriate methodologies. For
this a Pedagogical Quality and Innovation office (GQIP) was created, constituted by teachers
192
of DPhys of UA, aiming to support the enhancement of quality of teaching and learning in
Physics’ modules, especially in those that are serviced to other departments.
The implementation of innovative actions based on the foregoing dimensions is dependent on
strengths and weaknesses of the DPhys faculty and is susceptible to favorable circumstances
and external threats. Among the factors internal to DPhys, a consensus on actions, and the
existence of human and material resources capable of supporting the increased didactic use of
computer means are favorable. Weak points are: the dependence on motivation and
willingness of faculty to devise and carry out the initiatives; the widespread view that
problems transcend our ability to intervene; the current workload of teachers, which reduces
their availability to make changes; the aging of the teaching staff; the smaller weight of
pedagogical quality, in comparison to research’s, for the purposes of career promotion.
Among the external factors, we highlight the opportunity for undergoing curriculum review
processes. In contrast, the success of innovation strongly relies on the cooperation of the
departments involved and of the UA boards and services.
193
Acknowledgments
This work was in part supported by Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), through CIDMA Centro de Investigação e Desenvolvimento em Matemática e Aplicações, within project UID / MAT /
04106/2013. M. R Correia thanks the support from the project i3N, UIDB/50025/2020 &
UIDP/50025/2020, financed by national funds through the FCT/MEC"
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196
10. COMPARAÇÃO TEÓRICA DOS REFERENCIAIS DA
QUALIDADE PARA A EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO
PROFISSIONAL*
Marisa Pisco32, Margarida Saraiva33 & Fátima Jorge34
Resumo
O Quadro de Referência Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e a Formação
Profissionais (Quadro EQAVET) surge da necessidade de assegurar a melhoria da qualidade
na Educação e Formação Profissional (EFP) dentro do espaço europeu. Considera-se que
devem ser instituídos métodos de garantia de qualidade, que permitam uma convergência
europeia na educação e formação profissional.
O presente trabalho pretende estabelecer uma comparação teórica de Referenciais da
Qualidade para a EFP, tendo por base a análise do Quadro EQAVET, do Modelo EFQM, da
CAF- Educação 2013, da ISO 9001:2015, da ISO 21001:2018 e da Certificação de Entidades
Formadoras, em Portugal. Através de uma análise documental, pode concluir-se que um dos
elementos comuns é o facto destes referenciais se preocuparem com as mesmas questões e de
se basearem no ciclo de PDCA (Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua.
No entanto, foram desenvolvidos a partir de paradigmas diferentes e, consequentemente, são
substancialmente diferentes.
Palavras-chave: Educação e Formação Profissional. Referenciais da Qualidade. EQAVET.
Garantia da qualidade. PDCA.
* Funding: This work was funded by Fundação para a Ciência e a Tecnologia, grant UIDB/00315/2020.
32
Marisa Pisco, Agrupamento de Escolas Gabriel Pereira (Évora-Portugal), marisapisco@gmail.com. É mestre
em Gestão, especialidade em Recursos Humanos na Universidade de Évora, formadora e técnica
especializada, licenciada em Sociologia. As principais áreas de interesse e investigação são Qualidade
Formação, Gestão de Recursos Humanos.
33
Margarida Saraiva, Universidade de Évora & BRU-UNIDE/ISCTE-IUL (Portugal), msaraiva@uevora.pt. É
doutorada em Gestão pelo ISCTE-IUL, desde 2004. Atualmente é professora auxiliar do Departamento de
Gestão da Escola de Ciências Socias da Universidade de Évora. É investigadora do Business Research Unit
(UNIDE-IUL) da Business School do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL) – Portugal. É membro
fundador da Rede de Investigadores da Qualidade (RIQUAL) e é co-editora da Revista Científica TMQ –
Techniques, Methodologies and Quality (ISSN: 2183-0940). Tem como interesses de investigação as áreas
da Qualidade e da Gestão.
34
Fátima Jorge, Universidade de Évora & CICP (Portugal), mfj@uevora.pt. É doutorada em Gestão pela
Universidade de Évora, desde o ano de 2003. É professora auxiliar no Departamento de Gestão da
Universidade de Évora e investigadora no Centro de Investigação em Ciência Política. Os seus principais
interesses de investigação inserem-se nas áreas do Comportamento Organizacional, da Gestão dos Recursos
Humanos e da Ética e da Responsabilidade Social.
197
1.
Introdução
A adoção de um quadro, modelo ou standard de referência pode colocar um dilema aos
operadores de Educação e Formação Profissional (EFP), quer em Portugal, quer a nível
internacional, dado que o objetivo é garantir que as referências são adequadas às
características da organização (Comissão Europeia, 2010; Communiqué of the European
Ministers for Vocational Education and Training, 2015).
Os operadores de EFP, em Portugal, podem optar por utilizar e adaptar um conjunto de
modelos de referência. Esta situação pode ser feita de várias formas, uma das quais é alinhar
os modelos de referência da qualidade (Galvão, 2016; OCDE, 2018; Pisco e Saraiva, 2019).
De acordo com o Cedefop (2015), a noção de cultura de qualidade corresponde à definição de
gestão da qualidade, à qual se acrescentou o fator humano. A cultura de qualidade depende,
fundamentalmente, do compromisso e do empenho dos profissionais de uma instituição na
procura da qualidade. Na educação e formação profissional podem considerar-se três
abordagens possíveis: a) uma centrada no mundo do trabalho; b) outra centrada nas
necessidades dos estudantes; e c) uma centrada na eficácia e na eficiência dos processos
organizacionais, embora na maior parte das instituições funcionem em interação e de forma
equilibrada (Cedefop, 2015; Pisco, 2019).
Segundo o Conselho da União Europeia (2014), os mecanismos de garantia de qualidade
podem desempenhar um papel importante, ajudando tanto os estabelecimentos de ensino e
formação, como os decisores políticos a vencer esses desafios e assegurando que a qualidade
dos sistemas de ensino e de formação, e de cada uma das instituições, é adequada ao fim a que
se destina. A garantia de qualidade, que faz parte de uma série de medidas a adotar pelos
Governos e pelas instituições, aumenta a transparência e reforça a confiança na pertinência e
na qualidade dos conhecimentos, capacidades, competências e qualificações, o que, por sua
vez, parte da confiança na qualidade das instituições e dos prestadores de serviços de
educação e formação.
Assim, com este trabalho pretende-se, através de uma análise documental, estabelecer uma
comparação teórica de referenciais da qualidade para a Educação e Formação Profissional
(EFP), tendo por base a análise do Quadro EQAVET, do Modelo EFQM, da CAF- Educação
2013, da ISO 9001:2015, da ISO 21001:2018 e da Certificação de Entidades Formadoras, em
Portugal.
Este trabalho é baseado na literatura disponível sobre esses referenciais da qualidade em
estudo, resultantes, sobretudo, de um trabalho de recolha e análise de documentos publicados,
198
que procuram tratar, de uma forma sistemática e acessível, informação relevante sobre a
temática. Salienta-se que esta seleção de informações não é exaustiva e recaiu, com maior
incidência, em documentos publicados (essencialmente relatórios) da Comissão Europeia e do
Parlamento Europeu.
Assim, com este estudo pode-se concluir que um dos elementos comuns é o facto destes
referenciais se preocuparem com as mesmas questões e de se basearem no ciclo de PDCA
(Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua. No entanto, foram desenvolvidos
a partir de paradigmas diferentes e, consequentemente, são substancialmente diferentes,
permitindo e garantindo melhorias contínuas, sistemáticas e sustentáveis para o sistema
educacional.
Este estudo começa com um enquadramento teórico, onde se inclui uma apresentação
genérica dos referenciais da qualidade para a Educação e Formação Profissional, seguindo-se
uma comparação desses referenciais, onde se aborda o tipo, a natureza, princípios e
abordagens e destinatários, bem como o âmbito de aplicação e a finalidade, as características
e objetivos, e as metodologias e indicadores de medida. Por fim, apresentam-se as
considerações finais, abordando as limitações.
2. Referenciais da Qualidade para a Educação e Formação Profissional
Quadro Referência Europeu de Garantia da Qualidade para a Educação e Formação
Profissionais (EQAVET)
Este referencial, criado pela Recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu
de 18 de junho de 2009, tem como propósito melhorar a educação e formação profissional
(EFP) no espaço europeu, disponibilizando aos operadores, ferramentas comuns para a gestão
da qualidade, a empregar no âmbito da legislação e das práticas de cada Estado-Membro
(Conselho Europeu, 2009).
A garantia da qualidade é, para a Comissão Europeia, fundamental para encontrar respostas
dado os desafios a que a Europa assiste, em especial no que respeita às baixas qualificações
e/ou mão-de-obra pouco qualificada. Assim, esta garantia pode contribuir para ultrapassar a
não correspondência entre as competências existentes, e as necessárias, e melhorar a
empregabilidade dos jovens, para que, finalmente, se possa alcançar um entendimento comum
do EFP, que facilite o reconhecimento mútuo das aprendizagens obtidas em vários países e,
199
deste modo, permita uma maior mobilidade e respostas mais eficazes aos desafios económicos
e sociais (Comissão Europeia, 2014).
O Quadro EQAVET compreende um ciclo de garantia e de melhoria da qualidade, que prevê
as fases de planeamento, de implementação, de avaliação/apreciação e de revisão de EFP,
apoiado em critérios de qualidade, indicativos e indicadores comuns. Os processos de
supervisão, que incluem mecanismos de avaliação interna e externa, têm de ser definidos de
modo adequado pelos Estados-Membros, com o propósito de identificar as capacidades dos
sistemas, dos processos e procedimentos e as áreas que deviam ser melhoradas. Neste quadro
de referência deverá prever a utilização de ferramentas de aferição no intuito de obter dados
fiáveis sobre a sua eficácia (Conselho Europeu, 2009).
Com efeito, o ciclo da Qualidade do EQAVET tem por base o ciclo PDCA35 (Plan-DoCheck-Act) e o ciclo MERI36 (Motivar, Estimar, Refletir, Informar), acompanhados por um
conjunto de 10 indicadores, que podem ser utilizados como um Toolkit (caixa de ferramentas)
pelos operadores de EFP (Almeida, 2016; Cedefop, 2015).
Modelo de Excelência da European Foundation for Quality Management (EFQM)
Este referencial, no sentido de promover e reconhecer o sucesso sustentado e proporcionar
orientações aos que procuram alcançá-lo, é materializado através de um conjunto de três
componentes integrados: 1) Conceitos Fundamentais de Excelência enquanto os oito
princípios subjacentes, que se constituem como alicerce essencial para qualquer organização
alcançar a excelência sustentada; 2) Modelo de Excelência da EFQM, patenteado num
diagrama, uma ferramenta não prescritiva baseada em nove critérios: cinco referentes aos
“Meios” e quatro para os “Resultados”; 3) a lógica do RADAR37 (Resultados, Abordagem,
Desdobramento, Avaliação e Revisão), que envolve uma avaliação dinâmica, enquanto
ferramenta de gestão, que fornece os elementos que dão apoio a uma organização, uma vez
“Um dos fatores‑chave na qualidade de produção reside em processos claros e repetíveis. Nesta abordagem,
surge o ciclo que consiste em Plan (identificar e analisar o problema), Do (desenvolver e testar uma potencial
solução), Check (testar a solução implementada e analisar como esta pode ser melhorada), Act (implementar as
melhorias)” (Almeida, 2016, p. 143)
35
“O ciclo MERI refere‑se a uma abordagem de garantia da qualidade que corresponde a Motivar as pessoas e
mobilizar os recursos; Estimar o empenho dos colaboradores e dos stakeholders; Refletir sobre e discutir as
perceções de qualidade com os colaboradores e os stakeholders; Informar e inspirar para as melhorias adequadas.
Define‑se como um método de quatro passos centrado nas soft‑skills necessárias para implementar um sistema
de gestão interno da qualidade” (Almeida, 2016, p. 143)
36
“No caso de aplicação do modelo de excelência num processo de auto-avaliação, os elementos da lógica
RADAR (Resultados, Abordagem, Desdobramento, Avaliação e Revisão), devem ser considerados para cada
parte de critério de Meios, enquanto o elemento Resultados deve ser considerado para cada parte de critério de
Resultados” (EFQM, 2004, p. 6)
37
200
que aponta os desafios que esta terá de ultrapassar se pretender concretizar a sua ambição de
alcançar a excelência sustentada (Dias & Melão, 2009; EFQM, 2004).
A Estrutura Comum de Avaliação (CAF) - CAF Educação 2013
A CAF foi inicialmente concebida para ser utilizada em todos os domínios do setor público na
União Europeia, analogamente, foi considerada uma ferramenta útil para ser aplicada no setor
da Educação em geral. A CAF - Educação destina-se a todas as instituições de ensino e
formação, independentemente do seu nível, uma vez que é aplicável desde o ensino préescolar ao ensino superior, incluindo a aprendizagem ao longo da vida (DGAEP, 2013).
Este referencial é um modelo de Gestão pela Qualidade Total, para o setor público, enquanto
instrumento europeu de gestão da qualidade comum a todo o setor. Inspirada no Modelo de
Excelência da Fundação Europeia para a gestão da qualidade (EFQM), baseia-se na premissa
de que os resultados de excelência no desempenho organizacional, cidadãos/clientes, pessoas
e sociedade são atingidos, através da liderança que conduz a estratégia e planeamento, as
pessoas, as parcerias, os recursos e os processos. Este modelo analisa a organização
simultaneamente por diferentes ângulos, promovendo uma análise holística do desempenho da
organização (DGAEP, 2013).
Enquanto ferramenta da Gestão pela Qualidade Total, a CAF subscreve os conceitos
fundamentais da excelência, inicialmente definidos pela EFQM, transpondo-os para o setor
público/contexto CAF e procurando melhorar o desempenho das organizações públicas com
base nestes conceitos. Estes princípios fazem a diferença entre as organizações públicas
burocráticas tradicionais e a organização orientada no sentido da Qualidade Total (DGAEP,
2013).
Norma ISO 9001:2015
Pertencente à série de normas ISO 9000, é um referencial para a implementação de sistemas
de gestão da qualidade, orientando organizações, de modo a estas alcançarem níveis
satisfatórios de qualidade. A sua adoção deverá ser uma decisão estratégica por parte das
organizações, que procurem melhorar o seu desempenho e demonstrar a conformidade com
requisitos especificados do sistema de gestão da qualidade (APCER, 2015; Gotzamani,
& Tsiotras, 2002). É através de uma abordagem por processos, que este normativo envolve a
definição e a gestão sistemáticas dos processos e das suas interações, de forma a obter os
resultados pretendidos, de acordo com a política da qualidade e a orientação estratégica da
201
organização. Os processos e o sistema podem ser geridos como um todo utilizando o ciclo
PDCA, com um foco global no pensamento baseado em risco, que vise tirar vantagem das
oportunidades e prevenir resultados indesejados (Fonseca, 2015).
Atualmente, com sete princípios, a versão de 2015 é constituída por menos um princípio do
que a versão de 2008, onde a “abordagem por processos” e a “abordagem da gestão como um
sistema” eram considerados dois princípios distintos (NP EN ISO 9001:2015). A junção
destes dois princípios no princípio “Abordagem por processos” e alteração do princípio
“Relações mutuamente benéficas com fornecedores” para “Gestão de relacionamentos” surge
com o objetivo da ISO, em simplificar o referencial normativo e o manter abrangente, ao
direcionar a gestão de relacionamentos a todas as partes interessadas.
Norma ISO 21001:2018
Também este normativo se apresenta como um complemento de práticas direcionadas ao setor
educativo/formativo, podendo (ou não) ser articulada com outros referenciais. A ISO
21001:2018, especifica os requisitos para sistemas de gestão de organizações educacionais,
quando estas precisam demonstrar a sua capacidade no desenvolvimento de competências por
meio do ensino, aprendizagem ou pesquisa e visam aumentar a satisfação dos alunos,
beneficiários e pessoal, através da aplicação eficaz do seu sistema de gestão e melhoria do
sistema e garantia de conformidade com os requisitos dos alunos e outros beneficiários.
Este normativo tem uma abordagem genérica com o objetivo de ser aplicada a qualquer
organização, que utilize um curriculum para o apoio ao desenvolvimento de competências,
independentemente do tamanho, tipo ou métodos utilizados. Com a vantagem de poder ser
aplicada a departamentos de formação, dentro de empresas industriais e conjugada com outros
referenciais normativos ou de certificação (ISO 21001:2018).
Certificação DGERT
A certificação de entidades formadoras, em Portugal, está consagrada na Resolução do
Conselho de Ministros nº 173/2007, de 7 de novembro que aprova a Reforma da Formação
Profissional e no Decreto-Lei nº 396/2007, de 31 de dezembro que estabelece o Sistema
Nacional de Qualificações.
A Portaria nº 851/2010, de 6 de setembro, alterada e republicada pela Portaria nº 208/2013, 26
de junho, regula o sistema de certificação inserida na política de qualidade dos serviços das
entidades formadoras, gerido pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho
(DGERT).
202
Os sistemas de certificação de entidades formadoras têm como objetivo promover a qualidade
e a credibilização da atividade das entidades formadoras, que operam no âmbito do Sistema
Nacional de Qualificações, bem como contribuir para que o financiamento das atividades
formativas tendo em conta a qualidade da formação ministrada e os seus resultados
(Parlamento Europeu e Conselho, 2008, 2009).
A melhoria da capacidade, qualidade e fiabilidade do serviço de formação prestado pelas
entidades formadoras constitui o objetivo central da certificação. Esta deve significar um fator
distintivo no mercado e a garantia de um claro compromisso com uma oferta de maior
qualidade para os clientes finais da formação (DGERT, 2019).
A certificação de uma entidade formadora significa o reconhecimento total da sua
competência, para o desenvolvimento das diferentes fases do ciclo formativo. Isso acontece
em determinadas áreas de educação e formação, nas quais a entidade formadora atua e para as
quais lhe é concedida a certificação, o que significa que demonstrou através dos requisitos
exigidos, capacidade para o desenvolvimento de formação especializada em certas áreas
temáticas (DGERT, 2019).
Estes são os principais referenciais da qualidade, pelo que, com este trabalho pretende-se
apresentar uma análise comparativa das mesmas, com base em diferentes indicadores.
3. Comparação dos Referenciais da Qualidade
Em Portugal, os diferentes operadores de Educação e Formação Profissional, podem ver os
seus sistemas de garantia da qualidade certificados consoante a sua natureza e âmbito de
intervenção. Para a comparação dos referencias de qualidade presentes nos operadores de
EFP, optou-se pela utilização de dez indicadores apresentados no Comparative overview of
the EQAVET Framework, the EFQM Excellence Model and the ISO 9001 Standard,
(EQAVET, s/d), e referidos em Pisco (2019) e em Pisco & Saraiva (2019).
O Quadro 1 apresenta o tipo, a natureza, os princípios e abordagens e os destinatários de cada
referencial da qualidade em análise.
203
Quadro 1 - Tipo, natureza, princípios e abordagens e destinatários
Certificação
DGERT
ISO 21001:2018
ISO
9001:2015
CAF – Educação
EFQM
EQAVET
Tipo
Natureza
Princípios e
abordagens
Destinatários
Framework/
Quadro de
referências
Abordagem sistémica e
específica; Não
prescritivo.
Holística; integradora.
Gestão da Qualidade Total
(TQM) baseada em nove
princípios comuns
europeus.
Modelo
Abordagem sistémica e
genérica.
Não prescritivo.
Holística; integradora.
Gestão da Qualidade Total
(TQM) sustentada em oito
conceitos de excelência.
Modelo/
Ferramenta/
Mecanismo
Abordagem sistémica e
específica.
Não prescritivo.
Holística; integradora.
Gestão da Qualidade Total
(TQM) fundamentada na
premissa de que os
resultados de excelência,
oito conceitos de
excelência do EFQM, com
nove critérios de análise
organizacional.
Todas as organizações,
independentemente do
setor de intervenção,
tamanho, estrutura ou
maturidade.
Todas as instituições de
ensino e formação,
independentemente do seu
nível, sendo aplicável
desde o ensino pré-escolar
ao ensino superior,
incluindo a aprendizagem
ao longo da vida.
Standart
Abordagem sistémica e
genérica.
Prescritiva.
Holística; integradora.
Sistema de Gestão da
Qualidade (QMS)apoiado
em sete princípios
fundamentais.
Todas as organizações,
independentemente do
tipo, tamanho e produto
fornecidos.
Standart
Sistema/
Mecanismo
Abordagem sistémica e
especifica.
Prescritiva.
Holística; integradora.
Sistema de Gestão da
Qualidade (QMS) em
Organizações
Educacionais, alicerçado
em onze princípios
específicos.
Abordagem sistémica e
específica.
Prescritiva.
Holística; integradora.
Sistema de
Certificação/Acreditação
de Entidades Formadoras
sustentado em três grupos
de requisitos, incluídos
num referencial de
qualidade.
Todos os operadores de
Educação e Formação
Profissional (EFP).
Organizações educacionais
(OE) que visem o
desenvolvimento de
competências por meio de
ensino, aprendizagem ou
pesquisa,
independentemente do
tipo, tamanho ou método
de ensino/ investigação.
Qualquer entidade pública
ou privada que esteja
regularmente constituída e
registada, em Portugal e,
que seja detentora da
estrutura formativa exigida
nos requisitos de
certificação.
Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019)
Da leitura e análise do Quadro 1, relativa à comparação destes quatro indicadores, pode
observar-se que existem grandes semelhanças nas abordagens da Gestão pela Qualidade Total
(Total Quality Management - TQM) e também nos Sistemas de Gestão da Qualidade (Quality
Management System - QMS), sustentadas em diferentes princípios e conceitos, associados aos
diferentes referenciais, tal como referido em Saraiva & Pires (2018).
No que respeita ao tipo de referencial, pode observar-se, que o EQAVET se destaca por ser
um Quadro de Referenciais a nível Europeu, enquanto os restantes se apresentam como
204
Modelos ou Padrões (Standart) para empresas e organizações, que desejam garantir que seus
produtos e serviços atendam consistentemente aos requisitos do cliente, e que a qualidade seja
constantemente aprimorada, numa perspetiva de melhoria contínua indo de encontro ao
estudo de Pisco (2019).
Por fim, o modelo de excelência EQFM e a ISO 9001:2015 são de natureza genérica,
passiveis de qualquer entidade poder certificar os seus sistemas de qualidade, já os outros
referenciais (EQAVET, CAF-Educação, ISO 21001:2018 e Certificação DGERT) são
direcionados para a Educação e Formação Profissional, sendo a Certificação da DGERT a
mais específica para a Formação Profissional, no contexto português.
O Quadro 2 apresenta mais dois indicadores, designadamente o âmbito de aplicação e a
finalidade destes 6 referenciais da qualidade.
EQAVET
O quadro EQAVET é entendido como uma
referência para ajudar os Estados-Membros a
promover e monitorizar a melhoria contínua
dos sistemas de EFP, com base em referências
europeias comuns.
Concentra-se na modernização e melhoria dos
sistemas e operadores de EFP, para que possam
ajudar a aumentar a empregabilidade e a inclusão
social e melhorar o acesso à aprendizagem ao
longo da vida para todos, incluindo as pessoas
desfavorecidas.
O Modelo pode ser usado como uma estrutura
abrangente para determinar como diferentes
ferramentas e técnicas de gestão comumente
usadas se encaixam e se complementam.
Concentra-se nos níveis de excelência e
desempenho sustentáveis de uma organização que
atenda ou supere as expetativas dos stakeholders.
A CAF pretende introduzir uma cultura de
excelência e os Princípios de Gestão da
Qualidade, adaptada ao setor da educação
aplica-se a todas as instituições de ensino e
formação europeias.
Apresenta-se como uma ferramenta fácil de
utilizar para ajudar as organizações do setor
público a melhorar o desempenho, através da
utilização de técnicas de gestão da qualidade.
9001:2015
ISO 21001:2018
ISO
Educação
Finalidade
CAF –
Âmbito de aplicação
EFQM
Quadro 2- Âmbito de aplicação e finalidade
A norma determina os requisitos para um SGQ
em que uma organização: a) precisa
demonstrar a sua capacidade de fornecer
produtos que atendam aos requisitos do
cliente; b) visa aumentar a satisfação do
cliente com melhoria contínua e garantia de
conformidade.
Designa como requisitos para um SGQ em
que: a) precisa demonstrar a sua capacidade no
desenvolvimento de competências por meio de
ensino, aprendizagem ou pesquisa; b) visa
aumentar a satisfação dos alunos, beneficiários
e pessoal através da aplicação eficaz do seu
SGQ e melhoria do sistema e garantia de
conformidade com os requisitos dos alunos e
outros beneficiários.
Concentra-se na eficácia do sistema de gestão da
qualidade para atender aos requisitos do cliente.
Centra-se na eficácia dos sistemas de gestão da
qualidade das organizações educacionais, bem
como o impacto destes sobre os alunos e outras
partes interessadas (stakeholders).
205
DGERT
Certificação
A certificação das entidades pode assumir
duas vertentes: a) a certificação inserida na
política da qualidade dos serviços de entidades
formadoras, de acesso facultativo; b) a
certificação obrigatória para acesso e exercício
da atividade de formação profissional,
regulada por legislação setorial.
Centraliza-se na promoção da credibilização das
entidades formadoras que operam no âmbito do
Sistema Nacional de Qualificações e na
confirmação que o financiamento das atividades
formativas tenha em conta a qualidade da
formação ministrada e os seus resultados.
Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019)
Da leitura e análise do Quadro 2, no qual se efetua a comparação destes dois indicadores,
pode concluir-se a existência de orientações europeias, no caso do EQAVET, para a
implementação e desenvolvimento de melhoria contínua dos sistemas de Educação e
Formação Profissional a nível Europeu, enquanto os restantes referenciais estão focados numa
perspectiva de implementação e desenvolvimento de melhoria contínua das organizações a
nível individual. Pode observar-se ainda as diferenças entre as finalidades, nas quais as
necessidades e satisfação das partes interessadas dos operadores de EFP (EQAVET),
necessidades do cliente, expectativas e oportunidades (Modelo) ou satisfação e requisitos do
cliente (Standard) dos restantes referenciais, tal como apresentado em Pisco & Saraiva (2019).
O Quadro 3 apresenta as características específicas e os principais objetivos de cada
referencial da qualidade.
Quadro 3 – Características e objetivos
EQAVET
A recomendação estabelece que o quadro deve
apoiar a implementação de: a) Quadro Europeu de
Qualificações, em particular a qualidade da
certificação dos resultados da aprendizagem, b) o
Sistema Europeu de Créditos do Ensino e
Formação Profissionais c) os princípios europeus
comuns para a identificação, certificação e
validação da aprendizagem não formal e informal.
EFQM
Características Específicas
O modelo afirma que ele pode ser usado em
conjunto com qualquer número de ferramentas e
técnicas de gestão.
EFQM Excellence Award e premiações nacionais
feitas para organizações de melhor desempenho.
Principais objetivos
Contribuir para:
a) o uso de boas práticas;
b) modernização dos sistemas de Educação e
Formação;
c) melhoria da qualidade do EFP e aumento da
transparência e consistência na evolução da
política de EFP;
d) construção de confiança mútua, mobilidade de
trabalhadores e alunos;
c) promoção de um espaço europeu de
aprendizagem ao longo da vida sem fronteiras.
Capacitar as organizações para:
a) avaliar se estão no caminho para a excelência;
b) ajudá-los a entender seus pontos fortes e
potenciais em relação à sua Visão e Missão;
c) agregar iniciativas existentes e planificadas e
remover a duplicação;
d) fornecer uma estrutura básica para o sistema de
gestão da organização;
e) melhoria contínua e inovação;
f) benchmarking - “O EFQM partilha o que
funciona”.
206
CAF – Educação
ISO 21001:2018
A norma declara que é possível que uma
organização adapte o seu (s) sistema (s) de gestão
da qualidade existente (s) para estabelecer um
SGQ que esteja em conformidade com os
requisitos desta Norma.
Avaliação de terceiros (muitas vezes referida
como certificação ou registo).
A ISO possui vários prémios que ajudam a
promover diferentes aspetos da padronização
internacional.
A norma tem subjacentes princípios comuns aos
restantes sistemas de gestão, adaptados ao
contexto das organizações educacionais, uma vez
que existe a necessidade crítica e contínua das
organizações educacionais avaliarem até que
ponto atendem os requisitos de alunos bem como
de outras partes interessadas relevantes, e
melhorar sua capacidade de continuar a fazê-lo.
Certificação DGERT
ISO 9001:2015
A CAF aposta no princípio de que os resultados
de excelência no desempenho organizacional,
cidadãos/clientes, pessoas e sociedade são
atingidos através da liderança que conduz a
estratégia e planeamento, as pessoas, as parcerias,
os recursos e os processos.
A certificação implica a existência de
características ou condições mínimas de
estruturação da atividade formativa de uma
entidade formadora relativas à capacidade
instalada em termos de recursos, às práticas
inerentes aos processos de desenvolvimento da
formação e aos resultados alcançados. Uma
análise de resultados e orientação para melhoria
contínua.
Tem como objetivos principais:
a) introduzir uma cultura de excelência e os
Princípios de Gestão da Qualidade; b) melhorar os
processos existentes;
c) orientar o processo de gestão da instituição de
ensino e formação para o aluno/formando;
d) melhorar o desempenho/resultados;
e) promover o reconhecimento da instituição de
ensino e formação.
Permite:
a) a compreensão e a satisfação consistente dos
requisitos;
b) a consideração dos processos em termos de
valor acrescentado;
c) a obtenção de um desempenho eficaz dos
processos;
d) a melhoria dos processos baseada na avaliação
de dados e de informação.
Contribuir para:
a) o alinhamento dos objetivos e atividades com a
estratégia, missão e visão;
b) educação de qualidade inclusiva e equitativa
para todos;
c) uma aprendizagem mais personalizada a todos
os alunos;
d) processos consistentes e ferramentas de
avaliação para aumentar a eficácia e eficiência;
d) aumentar a credibilidade da organização;
e) promover uma cultura para melhoria
organizacional;
f) harmonização de padrões nacionais dentro de
uma estrutura internacional;
g) ampla participação das partes interessadas;
h) estimular da excelência e da inovação.
Visa contribuir para o aumento da qualidade da
formação:
a) prevendo um conjunto de recursos essenciais a
uma atuação com qualidade em cada fase do ciclo
formativo e para as áreas de formação em causa;
b) garantindo a planificação da atividade
formativa numa base sólida de necessidades
identificadas;
c) estimulando a orientação para resultados e para
práticas de melhoria contínua das entidades
formadoras;
d) incentivando práticas e condutas mais
profissionais por parte das entidades formadoras.
Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019)
Da análise do Quadro 3, conclui-se que independentemente das suas características
específicas e os seus principais objetivos serem inevitavelmente diferentes, todos os
referenciais perpetuam a qualidade e melhoria contínua da qualidade, mesmo que em
diferentes níveis e sob diferentes pontos de vista, quer seja por um reconhecimento exterior
207
(credibilidade), quer seja pela promoção da melhoria contínua interna, tal como referenciado
em Pisco & Saraiva (2019).
Por fim, o Quadro 4 apresenta a metodologia e os indicadores de medida para cada referencial
em análise.
Quadro 4 – Metodologia e Indicadores de Medida
Indicadores de Medida
Referência a um conjunto de dez indicadores de
qualidade enquanto proposta para servir de “caixa
de ferramentas” e não ser considerado somente
como um conjunto de benchmarks.
CAF – Educação
Não existem indicadores incluídos, mas o modelo
afirma explicitamente que organizações excelentes
usam um conjunto de medidas de perceção e
respetivos indicadores de desempenho. É usado
um esquema de pontuação para organizações que
solicitam a excelência EFQM.
Uma metodologia de autoavaliação para a
qualidade através do qual uma organização
procede ao diagnóstico do seu desempenho numa
perspetiva de Melhoria Contínua (metodologia
PDCA), através da identificação de pontos fortes e
áreas de melhoria.
Existência de critérios de análise, utilizados numa
autoavaliação utilizando a metodologia PDCA,
registada em painéis de pontuação.
ISO 9001:2015
EFQM
EQAVET
Metodologia
Garantia de qualidade e melhoria contínua.
(Metodologia PDCA) apoiada por critérios de
qualidade, descritores indicativos, no sistema
níveis de provisão e um conjunto de referência de
indicadores de qualidade selecionados (Ciclo de
Qualidade EQAVET e Ciclo MERI).
Utilização da ferramenta RADAR (Resultados,
Abordagem, Desdobramento, Avaliação e
Revisão) baseada na metodologia PDCA.
O método de avaliação usado para pontuar
organizações que se candidatam ao Prémio de
Excelência EFQM- EQA.
Um SGQ baseado em processos:
a) entender e atender aos requisitos;
b) considerar processos em termos de valor
agregado;
c)obtenção de resultados de desempenho e eficácia
de processos;
d) melhoria contínua de processos baseados em
objetivos de medição.
Os processos têm ligação com a metodologia
PDCA.
Não existe a inclusão de indicadores, mas a
medição é explicitamente exigida pelo Padrão,
bem como a recolha e análise de dados.
208
ISO 21001:2018
Certificação DGERT
Metodologia baseada em processos: a)
planeamento: ações para prevenir riscos, objetivos
organizacionais, mudança, conceção e
desenvolvimento dos produtos e serviços;
b) processos educativos: bem-estar e ambiente;
c)conhecimento organizacional;
d)avaliação de desempenho individual e
desenvolvimento contínuo;
e) política de comunicação;
f) conceção e desenvolvimento dos produtos e
serviços;
g) controlo de serviços externos;
h) rastreabilidade e preservação;
i) monitorização: critérios, desempenho
organizacional, eficácia do sistema de gestão e do
planeamento, revisão crítica do desempenho.
Os processos têm vinculação com a metodologia
PDCA.
O referencial de qualidade composto por um
conjunto de requisitos que determinam a qualidade
das práticas adotadas pela organização na oferta
dos seus produtos e na prestação dos seus serviços.
Os requisitos foram definidos numa lógica do
ciclo de melhoria contínua. Pretende imprimir uma
dinâmica de qualidade à atividade, mas não
uniformizar atuações ou limitar a criatividade e a
originalidade.
A existência de um ciclo da formação que traduz
uma interligação clara entre a identificação de
necessidades de competências, o processo
formativo em si e os resultados atingidos no final
do mesmo, apoiado na metodologia PDCA.
Nenhum indicador está incluído, mas a medição e
análise de dados está presente. São apresentados
exemplos de processos, medidas e ferramentas de
avaliação.
Referência a requisitos, a indicadores, fontes de
verificação e critérios de apreciação dos mesmos
como fundamentais para o sistema de certificação
e manutenção da certificação. A conformidade das
práticas através da apresentação de evidências
objetivas das mesmas.
Fonte: Elaboração própria tendo por base (EQAVET, s/d), Pisco (2019) e Pisco & Saraiva (2019)
Da análise do Quadro 4, destaca-se a predominância do ciclo PDCA, em todos os referenciais,
sendo utilizada a ferramenta RADAR no EFQM e o Ciclo da Qualidade no EQAVET, a
salientar que no EQAVET também surge a menção ao ciclo MERI, tal como referido em
Almeida (2016) e Cedefop (2015).
No que se concerne aos indicadores de medida existe um conjunto de referência de
indicadores de qualidade selecionados (EQAVET), no EQMF e CAF – Educação existem
medidas de percepção e indicadores de desempenho relacionados (Modelo) e de medição,
bem como fontes de verificação e análise de dados (Standart) na ISO 9001:2015, ISO
21001:2018 e Certificação DGERT, tal como evidenciado em Pisco & Saraiva (2019).
4. Considerações Finais
Neste trabalho foram analisados diferentes referenciais da qualidade, do qual se pode concluir
que um dos elementos comuns é o facto destes referenciais se preocuparem com algumas das
mesmas questões, nomeadamente sobre a eficiência e eficácia da organização e, se basearem
209
no ciclo de PDCA (Plan-Do-Check-Act) para alcançar uma melhoria contínua. No entanto,
foram desenvolvidos a partir de origens diferentes e, consequentemente, são substancialmente
diferentes quer na sua abordagem quer nos seus principais objetivos.
Após as pesquisas realizadas, confirma-se a existência de uma indiscutível vontade para
convergir e articular, nas normas ISO e modelo CAF, os descritores e indicadores do Quadro
EQAVET. Na norma ISO 21001:2018, o anexo F, apresenta elementos compatíveis, entre
descritores e indicadores EQAVET, e os requisitos desta norma. É estabelecida uma matriz de
correspondência entre ambos, sendo possível a verificar o cumprimento dos critérios de
qualidade do Quadro EQAVET, através da implementação de um sistema de gestão com base
na norma ISO 21001:2018. A CAF, além da sua vertente CAF- Educação, apresenta um
Modelo Integrado CAF Educação, Referencial da Avaliação Externa e EQAVET, que permite
articular a CAF com o Referencial da Avaliação Externa e/ou com o EQAVET, através da
utilização de metodologia e de modelos de relatórios de monitorização de descritores
indicativos e indicadores de qualidade do Quadro EQAVET.
É de ressalvar que o presente trabalho pretende ser uma contribuição no que concerne à
apresentação sintética e sistemática de um conjunto de referenciais no âmbito da EFP. Não se
pretendeu uma análise exaustiva, procurando refletir especificamente sobre os principais
referenciais da qualidade para a educação e formação profissional e efetuar uma comparação
teórica. Contudo, esta análise aqui desenvolvida pode ser considerada como o início de um
longo caminho para toda a comunidade escolar, como o princípio da procura da qualidade
rumo à excelência.
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212
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Portaria nº 208/2013, Diário da República n.º 121/2013, Série I de 2013-06-26, Ministérios da
Economia e do Emprego e da Educação e Ciência, pp. 3666-3680. Disponível em
https://data.dre.pt/eli/port/208/2013/06/26/p/dre/pt/html (acedido em 10-01-2021).
Portaria nº 851/2010, Diário da República n.º 173/2010, Série I de 2010-09-06, Ministérios do
Trabalho e da Solidariedade Social e da Educação, pp. 3936-3944. Disponível em
https://data.dre.pt/eli/port/851/2010/09/06/p/dre/pt/html (acedido em 10-01-2021).
Resolução do Conselho de Ministros n.º 173/2007, Diário da República n.º 214/2007, Série I
de 2007-11-07, Presidência do Conselho de Ministros, pp. 8135-8151. Disponível em
https://data.dre.pt/eli/resolconsmin/173/2007/11/07/p/dre/pt/html (acedido em 10-012021).
213
11. APRENDIZAGEM COMO LIBERDADE
Misleine Andrade F. Peel38, Patrícia Damas Beites39 & Fátima Simões40
Resumo
Existe uma tentativa de apanhar a aprendizagem, de prendê-la, de encapsulá-la; muitos
educadores, filósofos, psicólogos, sociólogos, dentre outros, ao longo do tempo, têm se
dedicado a essa ação de capturar a aprendizagem e moldá-la de uma forma que seja única e
universal; nesse trabalho, ao contrário, entendemos que a aprendizagem acontece nas
liberdades, nos encontros, nos agenciamentos, na decifração de signos e nas singularidades
dos sujeitos. Demonstraremos que o ensino e a aprendizagem não podem e nem devem estar
presos em estruturas curriculares rígidas, tanto o professor quanto o aluno não podem ser
limitados e privados de suas liberdades substantivas. A filosofia deleuziana nos dá uma
deiscência para novos encontros, uma vez que entendemos que a construção do pensamento
não é linear, nem encadeada, nem arbórea; mas rizomática, livre, com agenciamentos
múltiplos, com linhas de convergências, com redes, com ritornelos e com linhas de fugas,
sabendo que o caminho do saber subjetivo é constituído através de todo um percurso
cartográfico, em que cada encontro é necessário para que a formação integral do sujeito abra
caminhos para onde este desejar. Nosso suporte teórico consiste nas observações de Amartya
Sen, Gilles Deleuze, Paulo Freire e Henrique Iafelice; essa pesquisa se trata de um pequeno
contributo para uma reflexividade do conhecimento junto ao campo teórico da área da
educação, no que tange ao ensino e a aprendizagem, sendo de base bibliográfica.
Palavras-chave: Aprendizagem. Afetos. Liberdade. Ensino. Encontros.
Doutoranda do Programa de Educação da UBI – Universidade da Beira Interior; Mestre em Demandas
Populares e Dinâmicas Regionais, pela UFT – Universidade Federal do Tocantins; Especialista em Educação
Matemática, pela UFT; Licenciada em Ciências – Matemática, pela UFT. E-mail: misleine.peel@ubi.pt
39
Professora Auxiliar, Centro de Matemática e Aplicações (CMA-UBI) e Departamento de Matemática.
Universidade da Beira Interior. E-mail: pbeites@ubi.pt
40
Professora Associada com Agregação. Unidade de Investigação LabCom.IFP e Departamento de Psicologia e
Educação. Universidade da Beira Interior. E-mail: fsimoes@ubi.pt
38
214
LEARNING AS FREEDOM
Abstract
There is an attempt to capture learning, to arrest it, to encapsulate it; many educators,
philosophers, psychologists, sociologists, among others, over time, have dedicated themselves
to this action of capturing learning and shaping it in a way that is unique and universal; in this
work, on the contrary, we understand that learning happens in the freedoms, in the encounters,
in the assemblages, in the deciphering of signs and in the subjects' singularities. We will
demonstrate that teaching and learning cannot and should not be bound by rigid curricular
structures, both the teacher and the student cannot be limited and deprived of their substantive
freedoms. The Deleuzian philosophy gives us a dehiscence for new encounters, since we
understand that the construction of thought is not linear, nor linked, nor arboreal; but
rhizomatic, free, with multiple assemblages, with lines of convergence, with networks, with
choruses and leak lines, knowing that the path of subjective knowledge is constituted through
a whole cartographic path, in which each encounter is necessary so that the integral formation
of the individual opens paths wherever he wishes. Our theoretical support consists of the
observations of Amartya Sen, Gilles Deleuze, Paulo Freire and Henrique Iafelice; this
research is a small contribution to a reflexivity of knowledge within the theoretical field of
education, with regard to teaching and learning, being of bibliographic basis.
Keywords: Learning. Affections. Freedom. Teaching. Encounters.
Introdução
A aprendizagem faz parte do que somos, ela é inerente à nossa racionalidade, à nossa
capacidade de construir, crescer, perceber, explorar, questionar, relacionar e criar; é parte da
singularidade humana, sendo que algumas questões sobre a aprendizagem têm instigado
muitos pesquisadores ao redor do mundo, e por muito tempo, tais como: Qual a melhor forma
de adquirir, construir ou experimentar o conhecimento?; Como se aprende?; Quais
capacidades natas ou adquiridas são necessárias para que os indivíduos aprendam?; O que é
mais importante para que a aprendizagem ocorra: a genética ou o meio?; Existe uma
metodologia ou didática universal para se ensinar? Os retornos a essas e a outras questões
foram e continuam a ser propostos por estudiosos de diferentes áreas que nem sempre entram
em consenso; sabemos que teorias vêm sendo escritas e refutadas no percurso histórico da
educação. Não consideramos que temos as respostas para todas essas questões, mas
215
apostamos na liberdade encontrada no conhecimento da singularidade dos seres como um
caminho para que isso ocorra de forma que aumente a potência de agir dos sujeitos.
Na educação tradicional, pensava-se que existia uma relação binária entre o ensino e a
aprendizagem, em que se é ensinado e se aprende ao mesmo tempo, como se isso fosse
automático e sem levar em consideração a subjetividade dos sujeitos envolvidos no processo
pedagógico, nem os afetos que interferem diretamente e indiretamente nas aquisições
cognitivas dos aprendizes.
Consideramos o ensino tradicional como aquele no qual o professor é o centro da
aprendizagem, através de um ensino baseado na transmissão de conhecimento, com aulas
essencialmente discursivas e expositivas, e com alunos passivos, meros receptores de
informações; nos dias de hoje encontramos em nossa prática educacional muitos professores
que parecem ainda pensar dessa forma, que até se preocupam em como ensinam, procurando
conhecer novas tendências metodológicas para o seu ato pedagógico, mas se esquecendo do
mais importante, de seus educandos, de ouvir o que seus alunos dizem, de tentar entender as
suas singularidades, de compreender verdadeiramente as suas experiência e as suas vivências,
de compreender como seus discentes são afetados durante os encontros escolares, seja com os
pares, seja com o objeto de estudo, seja consigo ou com os outros que estão direta ou
indiretamente envolvidos no processo educacional.
A escola na revolução industrial começou a ser popularizada como meio de capacitação
profissional, agindo como um instrumento que acolhia as necessidades do mercado industrial.
A escola se constituiu, assim, como conservadora e como reprodutora das desigualdades
vigentes, atendendo a lógica capitalista. Paulo Freire (1987) também chama a atenção para o
fato de a escola se constituir como um instrumento para a domesticação do homem, para a
manutenção da opressão.
A educação é um forte componente para a formação integral dos sujeitos; no Brasil, ela é
garantida constitucionalmente, de forma gratuita e obrigatória. Apesar disso podemos
perceber imensas desigualdades entre os desempenhos acadêmicos em nível nacional e
internacional, existindo por todo lado privações das liberdades substantivas, definidas por Sen
(2010). De fato, boa parte dos jovens e adultos brasileiros, mesmo tendo concluído a educação
básica (que corresponde a 12 anos escolares), não conseguem se expressar socialmente e
politicamente; não alcançando, por isso, uma melhoria de vida.
A educação escolar é um direito social, sua realização deve ser vista com responsabilidade,
uma vez que “todos” nós passamos por ela. Com efeito, vivemos numa sociedade marcada e
regida pela ciência, pela tecnologia e pela cultura. Entendemos que existe uma
216
vulnerabilidade escolar, como conceituada por Peel (2018), sendo um problema complexo que
está enraizado historicamente no cenário educacional brasileiro; esta vulnerabilidade é
complexa e afeta os indivíduos de diversas formas. Temos processos de ensino e
experimentações de aprendizagem marcados por estruturas curriculares rígidas e ineficazes,
que são mostrados através de vários dados nacionais e internacionais.
O Brasil tem, ainda, um grande fardo de privação da liberdade: como a tentativa de
escravização dos indígenas e a escravização dos africanos, que durou mais de três séculos; e
sua “libertação”, apesar de ter um pouco mais de 130 anos, ainda traz sequelas de sua
constituição, até hoje demostradas nas fortes desigualdades econômicas e sociais que existem
no país, que, além deste histórico marcante ainda em nossa sociedade atual, apresenta marcas
de um consumo dependente da matriz colonizadora – uma “nova” dependência, um “novo”
tipo de opressão.
Hoje muitos especialistas em educação e em aprendizagem defendem um ensino em que a
autonomia dos sujeitos seja valorizada; com os estudantes, ainda que em boa parte dos casos
apenas teoricamente, sendo percebidos como sujeitos com capacidades intelectuais para
pensar, para criar, para desenvolver, para aprender e para aprender a aprender.
Nós, compactuando com esse pensamento, neste artigo, propusemo-nos a trazer uma reflexão
sobre aprendizagem usando, para isso, um embasamento teórico-filosófico que pensa o saber
constituído através dos encontros – os agenciamentos; experimentações da decifração dos
signos e da conjunção dos afetos.
O saber da mesma raiz de sabor deveria ser prazeroso, deveria trazer alegria e não tristeza. A
forma como enxergamos todo o processo educacional, muitas vezes, como um “mal
necessário” é prejudicial, pois a dor dos afetos tristes não é valiosa nas experimentações do
saber e do conhecimento: “somos educados a desconfiar de nossas diferenças, a acreditar na
tristeza como meio de se chegar a alegria” (Iafelice, 2015, p. 15).
Para tanto fizemos uma revisão bibliográfica de alguns trabalhos de Gilles Deleuze, Paulo
Freire, Amartya Sen e de outros, buscando contribuir para a área do conhecimento da
educação, promovendo uma reflexão sobre a “aprendizagem como liberdade” para o aumento
da potência.
O problema da aprendizagem
Como já falamos existe uma preocupação em se perceber claramente como se dá a
aprendizagem nos indivíduos, entendemos que este é um tema complexo que envolve muitas
variáveis. O fracasso escolar no Brasil é algo palpável, começaremos pelos dados divulgados
217
pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), quanto às taxas
de escolarização no Brasil, apresentados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) ; apesar de ter havido um bom crescimento (10 pontos
percentuais), na última década, da população de 25 a 34 anos com nível superior, este índice
ainda é baixo se compararmos com a média de países da OCDE e, ainda, é a menor proporção
entre os países da América Latina (INEP, 2019).
Ainda temos, segundo dados divulgados em 2018, 17% da população brasileira entre 25 e 64
anos que concluíram um curso de ensino superior, sendo que apenas 0,8% de pessoas dessa
faixa etária têm um título de mestre e apenas 0,2% desses indivíduos têm doutorado.
Na educação básica, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
temos um alto número de adolescentes entre 15 e 17 anos que abandonaram a escola, o que
soma 1,2 milhões, ou 11,8%, e ainda que 49% da população de 25 a 64 anos não têm o ensino
médio completo; temos, também, em 2018, uma taxa de analfabetismo de 6,8%, que
corresponde a um pouco mais de 11 milhões de pessoas (IBGE, 2019).
Esses números são bem alarmantes e o IBGE ainda afirma que as desigualdades econômicas,
regionais, de gênero, de cor e de raças ainda persistem; a situação se agrava se fomos
considerar o que Charlot (2010) diz, o que faz bastante sentido: precisamos considerar ainda
os alunos que completam a educação básica, mas não têm condições de agir autonomamente e
criticamente, sendo facilmente manipulados pelas mídias, redes sociais, fake news etc. Para
Charlot (2010):
Fracasso escolar pode ser o fato de um aluno não passar de ano. Geralmente é assim que se entende. Mas
fracasso escolar, muitas vezes, é o fato de o aluno não saber nada e passar de ano. Se deveria falar também do
fracasso escolar dos bons alunos que passam, que tiram boas notas, mas não têm uma formação que permita
refletir sobre a vida e sobre o mundo. Esse é um problema a se refletir. (p. 214)
Dessa forma percebemos que muitos estudantes fracassam em seu percurso escolar, e nós
concordamos com Charlot (2010) em relação a que o fracasso escolar, apesar de ser
comumente associado ao baixo rendimento escolar, às reprovações e até mesmo à evasão
escolar, o que de fato é também uma evidência clara disto, deve ser entendido como fruto de
uma educação que é destituída de aprendizagem, o que não contribui significativamente para
a autonomia dos sujeitos, e sendo um terrível desperdício de potencial humano.
Assim, a reflexão que Charlot (2010) promove é válida pois evidencia que o problema é bem
maior do que a maioria das pessoas cogita, já que existem alunos que, apesar de apresentarem
218
um bom rendimento escolar em relação ao desempenho acadêmico, não conseguem assumir
posturas críticas e maduras em relação à compreensão dos fatos sociais, o que significa que
não possuem uma formação que os atenda em suas necessidades políticas, sociais e
econômicas.
Sem aprendizagem, os alunos serão lançados para uma vida de pobreza e de exclusão, o que
ameaça o seu desenvolvimento, comprometendo o futuro da sociedade, o que é reiterado por
Sen (2010): sem o acesso a liberdades substantivas não há desenvolvimento. Acreditamos que
a vulnerabilidade escolar, em suas multiplicidades, tem demonstrado os seus efeitos em todas
as esferas da vida social, uma vez que vemos afetos tristes sendo usados para a dominação e
para a conservação do poder, impedindo que os sujeitos sejam ativos na construção humana
holística individual e social, possuindo apenas afetos passivos.
Uma criança a quem é negada a oportunidade do aprendizado escolar básico não só é destituída na juventude,
mas desfavorecida por toda a vida (como alguém incapaz de certos atos básicos que dependem de leitura, escrita
e aritmética). (Sen, 2010, p. 361)
As privações de liberdades produzem desigualdades que não se restringem às questões
econômicas, mas chegam à educação, à saúde, à cultura, à segurança, ao lazer, à arte, dentre
outros aspectos sociais; Peel (2018), em sua dissertação de mestrado, entende a
vulnerabilidade escolar como uma decorrência da privação das liberdades substantivas.
Amartya Sen, em obra de 2010, defende que para que haja desenvolvimento as liberdades
substantivas e instrumentais devem ser acessadas por todos, e ainda que a liberdade individual
é fundamentalmente um produto social; para o autor, existem três tipos de liberdade, as
substantivas, as instrumentais e a humana geral, que precisam substituir, ou remover, as
principais fontes de privação das liberdades:
O desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação de liberdade: pobreza e tirania,
carência de oportunidades econômicas e destituição sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância
ou interferência excessiva de Estados repressivos. (Sen, 2010, p. 16-17)
Escolhemos iluminar suscintamente alguns importantes aspectos que influenciam diretamente
na aprendizagem, no sistema, nos professores e nos estudantes; e, por fim, falaremos dos
afetos na aprendizagem e da aprendizagem como liberdade, como constituem passos
cartográficos para uma aprendizagem efetiva.
219
O sistema
Podemos pensar pontualmente no sistema educativo, entendendo-o como a escola, com suas
políticas internas; ou mais genericamente, como o conjunto de políticas públicas que regem a
educação, que se faz disfuncional, pois alunos transitam entre as séries sem um
aproveitamento adequado das disciplinas anteriores: os alunos vão sendo aprovados com
bases insuficientes. Não estamos apoiando as reprovações, uma outra questão complexa, o
que queremos dizer é que não adianta uma aprovação inconsequente com falsos resultados,
pois esse é um dos aspectos em que o sistema vai se mostrando como reprodutor das
desigualdades.
Há, de fato, uma desigualdade evidente que parece ser naturalizada no processo escolar,
infelizmente a escola não tem conseguido atender os jovens em suas necessidades
profissionais e sociais, tendo um enviesamento de seu papel na formação integral dos sujeitos
e uma conservação de uma seleção social. Cabe à escola proporcionar condições para a
formação integral dos sujeitos, por meio de um ensino democrático e libertador para todos,
sem discriminação:
Além disso, e tendo por base o compromisso da escola de propiciar uma formação integral, balizada pelos
direitos humanos e princípios democráticos, é preciso considerar a necessidade de desnaturalizar qualquer forma
de violência nas sociedades contemporâneas, incluindo a violência simbólica de grupos sociais que impõem
normas, valores e conhecimentos tidos como universais e que não estabelecem diálogo entre as diferentes
culturas presentes na comunidade e na escola. (BNCC, 2017, p. 59)
O Brasil possui enormes desigualdades sociais que resultam diretamente nos níveis de
proficiência dos alunos, o que se encontra evidenciado nos resultados das avaliações externas
nacionais e internacionais, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Programa
Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), que, dentre outros assuntos problemáticos,
evidenciam que quanto mais pobres menor o rendimento escolar; esses dados revelam a
discrepância dos resultados entre as escolas públicas e particulares.
Já em relação ao ensino superior, há no Brasil o Exame Nacional de Desempenho dos
Estudantes (ENAD), cujo resultado apresenta dados igualmente insuficientes, principalmente
no ensino privado – há, no entanto, uma troca: enquanto que, no ensino básico e médio, há um
melhor desempenho de alunos oriundos de escolas particulares; no ensino superior, a escola
pública se destaca como fonte dos melhores resultados.
220
Outrossim, sabemos que a aprendizagem não pode ser medida somente pelo desempenho dos
alunos nas avaliações sistemáticas externas nacionais e internacionais, como se isso fosse um
método totalmente confiável para avaliar, mesmo porque eles não evidenciam os problemas
complexos da educação, como as condições precárias materiais e imateriais do trabalho
didático e pedagógico, a fragmentação do conhecimento nas grades curriculares, a falta de
segurança pública dentro e fora da escola, bem como a falta da participação familiar e da
sociedade no processo educacional dos sujeitos.
Ainda assim, os resultados de avaliações nacionais e internacionais são usados para a
construção de políticas públicas, que geralmente não conseguem atender às particularidades
regionais, econômicas e sociais de onde as instituições se encontram. Ainda temos alguns
autores que defendem que os resultados dessas ações servem mais para um barulho midiático
do que para ações efetivas de mudança no paradigma educacional; como Machado (2010),
que chega a propor o que segue:
Chegamos a um ponto tal que seria desejável a união de todos os envolvidos com o ensino público, da escola
básica às universidades, para a proposição de uma ação concreta, com as características de um verdadeiro
mutirão, tendo em vista uma inflexão nas mornas variações dos indicadores educacionais. Durante algum tempo,
dois ou três anos, deveríamos parar de avaliar por avaliar, apenas para reiterar um fracasso de que já temos
consciência, canalizando toda nossa energia para produzir uma transformação efetiva no estado de coisas. Após
tal ação/mutirão, poderíamos, enfim, esperar a divulgação dos novos indicadores com uma expectativa positiva,
com a sensação do dever cumprido. (s.p.)
Muitos autores, como Iafelice (2015) e Paulo Freire (1967, 1987),
deduzem que esse
problema no âmbito escolar se dá por uma dominação ideológica da lógica do mercado,
regido pelo sistema capitalista, e denunciam que muitas vezes a escola entra na engrenagem
da exclusão, evidenciando que as desigualdades escolares existem quando somos escravos de
um pensamento dominador de exploração e de opressão.
A escola tem um papel que vai muito além da transmissão do saber científico, não podemos
pensar a educação como isenta das questões sociais, políticas e econômicas de seu contexto;
os sujeitos que dela participam devem ser construtores da cultura, possuindo condições para
exercer e para lutar pela liberdade de ação em qualquer esfera que se encontrem. Vejamos,
então, o que La Taille (2009) nos diz sobre como pensa a escola:
221
Cabe à instituição escola tomar parte na formação existencial de seus alunos? Ou cabe a ela apenas a transmissão
dos conhecimentos necessários ao ingresso no mundo do trabalho? Opto pela primeira alternativa. Em primeiro
lugar porque me parece inconcebível que instituições nas quais as crianças e jovens passam anos e anos possam
não se preocupar com dimensões de vida que vão além da aprendizagem de determinadas disciplinas. E, em
segundo lugar, porque os próprios conhecimentos transmitidos na escola são portadores de sentido que
transcendem a especificidade de cada matéria. A escola é uma verdadeira usina de sentidos, sentidos de vida
(ética) e de convivência (moral), e não há outra instituição social de que se possa dizer o mesmo. (p. 80-81)
Dessa forma, a formação existencial é a mais importante; porém ela não deixa de estar
ligada a um desempenho eficiente nas questões gramaticais, matemáticas, científicas,
filosóficas e artísticas – o que é deveras importante, principalmente se esse desempenho for a
tradução de uma formação holística e transdisciplinar.
Os professores
No Brasil há uma grande desvalorização do trabalho docente, que não é considerado como
uma profissão de prestígio, apresentando uma formação inicial que falha e que não prepara os
professores para a realidade das escolas brasileiras; muitos, dos que acabam nessa profissão,
não o fizeram por escolha, mas por falta de escolha, já que é mais fácil o ingresso nesse tipo
de carreira.
A carreira docente tem, também, um piso salarial insuficiente e péssimas condições de
trabalho, com muito histórico de violência no ambiente escolar, com salas lotadas, com carga
horária exaustiva, com falta de materiais básicos e com estrutura física inadequada, dentre
outros aspectos negativos. Os desafios são, assim, imensos; e o professor é mais uma das
vítimas de um sistema injusto e triste:
A questão é a seguinte: o que pode um corpo? De que afetos você é capaz? Experimente, mas é preciso muita
prudência para experimentar. Vivemos em um mundo desagradável, onde não apenas as pessoas, mas os poderes
estabelecidos têm interesse em nos comunicar afetos tristes. A tristeza, os afetos tristes são todos aqueles que
diminuem nossa potência de agir. Os poderes estabelecidos têm necessidade de nossas tristezas para fazer de nós
escravos. O tirano, o padre, os tomadores de almas, têm necessidade de nos persuadir que a vida é dura e pesada.
(Deleuze & Parnet, 1998, p. 50)
Percebemos que muitos docentes acabam repetindo a mesma forma com a qual foram
ensinados, reproduzindo de forma inconsciente e até mesmo consciente, em seus percursos
escolares, as maneiras dos professores que tiveram na infância; o que foi percebido por Paulo
222
Freire (1987), que apontou a sombra do opressor presente nos fazeres pedagógicos dos
mestres, que defendem suas pautas, com suas subjetividades construídas coletivamente e
afetadas por afetos tristes que decompuseram as suas potências de agir. Assim, o professor se
torna reprodutor da tirania que lhe foi imposta – o “oprimido virando opressor” submisso ao
sistema, sem sequer conseguir criticar sua vivência, suas ações, seu modo de existir, sua
forma de afetar e de ser afetado.
As paixões tristes, conceituadas por Spinoza (2017), vão sendo usadas como instrumentos de
controle e de poder, por meio de suas repetições contínuas e insistentes; o professor muitas
vezes se coloca em um lugar de fala superior, como o dono do saber, e, do seu pedestal, ele
olha para o aluno como um ser inferior, usando o “conhecimento”, ou melhor, a ideia que ele
tem sobre sua porção do conhecimento, como um instrumento de poder, que lhe concede a
força do tirano, tratando seus alunos como escravos que recebem recompensas, quando fazem
algo correto, e castigo, geralmente moral, quando fazem algo considerado errado.
Surge então um questionamento: o que podem fazer os professores com essa reprodução de
afetos e de situações tristes? Pouco, muito pouco – somente criarem afetos passivos e sem
alegria:
Sem perceber, esses professores criam em seus educandos afectos passivos, estimulam a reação inculcando a
ideia de que ação deve ser fruto não da liberdade, mas da escravidão. O mais interessante é que esses mesmos
professores, em outras circunstâncias, criticam os seus alunos por se preocuparem somente com as notas, com os
resultados e não com o processo, com a pesquisa, com o próprio aprender. Infelizmente, eles não se reconhecem
como responsáveis pela produção de afectos passivos em seus alunos. Uma educação fundamentada na tristeza
não pode produzir como resultado a alegria e, consequentemente, a liberdade de criação. Fazer com que um
aluno se aproxime de seu objeto de estudo necessita criação por parte do professor. (Iafelice, 2015 p. 88)
Ora, há ações docentes contrárias a isso: acreditamos no poder dos afetos ativos, e que não
devemos nos conformar com uma existência medíocre, uma submissão a ações tiranas
destrutivas. Devemos fazer parte da resistência libertadora que vê em suas ações pedagógicas
uma possibilidade de contribuir positivamente para a formação holística dos sujeitos,
permitindo encontros profícuos que fortaleçam a potência de agir dos sujeitos.
Os estudantes e suas subjetividades
Acreditamos que os sujeitos possuem capacidades de aprendizagem ilimitadas, mas, devido à
forma como são submetidos a privações de liberdade desde a infância, com estruturas
curriculares rígidas e com a criação de dependência em relação a um sistema esvaziado de
223
significado positivo, os aprendizes são, de fato, afetados negativamente, com limitações em
seu desenvolvimento ao longo da vida. Sua subjetividade acaba sendo construída de forma
mecânica, como um conjunto de repetições daquilo que entendem ser apreciado por todos,
sem originalidade.
Dito isso, entendemos como positiva a subjetividade constituída de forma plural, polifônica e
contínua; a subjetividade será, então, vivenciada de forma múltipla se for experimentada
através de agenciamentos coletivos de enunciação: o nosso eu, apesar da exclusividade, é um
rizoma que se liga aos outros seres, aos acontecimentos através de encontros. E isso
estabelece uma riqueza coletiva e sucessiva, definida com as seguintes palavras por Guattari:
“a única finalidade aceitável das atividades humanas é a produção de uma subjetividade que
enriqueça de modo contínuo sua relação com o mundo” (Guattari, 2006, p. 33).
Deleuze afirma, concordando com o que diz Guattari, que existe um interesse em uma
produção mecânica da subjetividade: a ideia de que todos devem ser nivelados por baixo,
escravos de um sistema que quer se conservar no poder, como um coquetel de uma
subjetividade coletiva normativa contemporânea, substantiva a uma lei moral, numa busca de
uma homogeneização universalizante e reducionista de uma subjetividade plural.
Iafelice (2015), baseado em Baruch Spinoza, um filósofo holandês, também concorda com
isso, dizendo que a lei moral é baseada na tristeza, por meio da injunção de vontades e de
desejos passivos:
Toda lei moral não nos revela nenhuma forma de conhecimento, não nos encaminha para uma compreensão das
causas. Mais ainda, impede que conheçamos essas causas, direcionando-nos à obediência irrefletida, causadora
de toda forma de superstição. A lei da natureza e a lei moral estão de tal modo imbricadas pela nossa ignorância
que em muitos casos já não sabemos distinguir uma da outra, tamanha é nossa disposição moral para a aceitação
e obediência. (Iafelice, 2015, p. 86)
Na sociedade de consumo, a subjetividade é então constituída pelo nosso esforço de atingir
aquilo que imaginamos ser aceitável e produtor da alegria que é vendida pelo mercado; assim,
afastamo-nos da descoberta das causas reais que nos provocam alegria, para buscar aquilo que
é “vendido” como alegria:
A “subjetividade” dos consumidores é feita de opções de compra – opções assumidas pelo sujeito e seus
potenciais compradores; sua descrição adquire a forma de uma lista de compras. O que se supõe ser a
224
materialização da verdade interior do self é uma idealização dos traços materiais – “objetificados” – das escolhas
do consumidor. (Bauman, 2008, p. 24)
Entendemos que todos somos sujeitos com direitos, e que, em nossas relações, interações e
encontros cotidianos, devemos experimentar a construção de nossas subjetividades enquanto
seres livres socialmente. E nossas experimentações devem ser vivenciadas integralmente,
possibilitando que imaginemos, desejemos, observemos, pensemos, criemos, questionemos,
investiguemos, construindo sentidos sobre e com as coisas, produzindo culturas, afetando-nos
e sendo afetados.
O estudante muitas vezes se cansa de lutar contra as diversas formas de submissão e de ordens
previamente estabelecidas por formas de ensino verticais, em um sistema arborescente de
ensino, com uma cadeia hierárquica do conhecimento; conformando-se com o que está
estabelecido, muitas vezes sem ter consciência disso. Muitos ainda provêm de ambientes
familiares que não têm condições de dar suporte emocional, cultural, econômico, o que gera
como consequência um número elevado de evasão escolar, o que já foi dito anteriormente.
Os afetos tristes, então se proliferam, diminuindo a nossa potência de agir, de se relacionar, de
estabelecer novos encontros; eles mutilam a vida e só desaparecem com uma nova
consciência, sob uma nova visão, habitando um novo território, com novos ritmos, novos
costumes, novos encontros, novos desejos. Um corpo é afetado de muitas maneiras, sendo que
o desejo da liberdade deve ser maior do que o desejo da escravidão.
É necessária, então, uma outra imagem do pensamento, que favoreça outras formas de se pensar o conhecimento,
menos hierarquizadas, menos estriadas, que não coloque o conhecimento dentro de compartimentos
hierarquizados e estanques. A metáfora do rizoma subverte todo o sistema de arborescência. (Iafelice, 2015, p.
94)
É preciso haver presencialidade, ou seja, o exercício do pensamento e do conhecimento sobre
si, uma análise sobre a sua prática, uma análise sobre as suas relações e sobre o ganho de
potência; identificando, dessa maneira, a real motivação para a experimentação de afetos
alegres, tanto passivos como ativos. O amor, então, permitirá construções de afetos ativos,
aumentando a potência de agir e de existir, libertando o discente de sua afetividade triste e
derrotada.
225
Os afetos na aprendizagem
Os afetos nem sempre foram vistos como algo de valor, as teorias clássicas do conhecimento
mostram o caminho difícil que a ciência teve que percorrer para ganhar seu lugar ao sol,
muitas vezes sobrevalorizando a racionalidade e a objetividade. Já ouvimos várias vezes que a
razão deve sobrepor à emoção; a frase célebre de Descartes, “penso, logo existo”, deixa
evidente que o pensamento vigente era que o mais importante era mesmo a razão, o
pensamento que dava significado à existência. Um dos que se opôs a esse tipo de ideia foi
Spinoza, defensor da imanência, que rejeitou a ideia de que a emoção deveria ser dominada
pela razão, com o consequente desprestígio dos afetos. O conhecimento não é contrário aos
afetos, para Spinoza (2017), “um afeto é uma idéia pela qual a mente afirma a força de
existir” (p.166).
Segundo Bauman (2008), na contemporaneidade, as relações sociais são baseadas no
consumo, e o próprio sujeito se torna um produto. Na sociedade de consumo em que
prevalece um consumir excessivo, com buscas de soluções rápidas para tudo e por um preço
módico, novos psicotrópicos são criados e vendidos a todo momento, numa tentativa de cura,
de diminuição da tristeza, de controle dos afetos. Esse caráter consumista procura uma
solução mágica para o prazer, não almeja encontrar a causa das doenças e dos problemas, mas
promover uma fuga para uma realidade externa: “A alegria está toda nas compras, enquanto a
aquisição em si, com a perspectiva de ficar sobrecarregado com seus efeitos diretos e
colaterais possivelmente incômodos e inconvenientes, apresenta uma alta probabilidade de
frustração” (Bauman, 2008, p.28).
Contrariamente a isso, Deleuze, um dos grandes nomes da filosofia do acontecimento, apesar
de não ter escrito uma obra totalmente dedicada à educação e à aprendizagem, leva-nos a
refletir sobre a aprendizagem na e da imanência, como algo singular, pertencente à
subjetividade dos indivíduos: cada um aprende de uma forma – de uma maneira própria.
Deleuze considera Spinoza o príncipe dos filósofos; para os dois, o fato de imaginarmos nossa
impotência já nos entristece, ou seja, produz potências tristes que diminuem nossa força de
agir. Para eles, nossa percepção é aumentada na proporção que os nossos corpos adquiram
mais formas e mais maneiras; donde depreendemos que, no processo de ensino, quanto mais
múltiplos em relação às formas e mais modos de existência e de significação existirem,
maiores serão as possibilidades de experimentação de uma potência positiva.
Devemos buscar as ideias adequadas, que são ideias claras e distintas, que objetivam os afetos
ativos, que se deixe de ser afetado passivamente e externamente para passar a ser afetado
ativamente, por meio de ações da mente, como um desenvolvimento de potência positiva.
226
Para isso é necessária uma elaboração interna, um fortalecimento da subjetividade real com
esforço para estimular a potência de agir e de existir do corpo, buscando a alegria: “a alegria é
a passagem do homem de uma perfeição menor para uma maior; a tristeza é a passagem do
homem de uma perfeição maior para uma menor” (Spinoza, 2017, p. 141).
As ideias inadequadas, confusas e opacas fazem o corpo padecer, trazendo afetos tristes que
diminuem a potência de agir e existir; num sentido contrário, a alegria, a admiração e o amor
devem nos mover. Deleuze (2004) afirma que:
Se não se admira alguma coisa, se não se ama alguma coisa, não há razão alguma para se escrever sobre ela.
Espinosa ou Nietzsche são filósofos cuja potência crítica e destruidora é inigualável, mas essa potência brota
sempre de uma afirmação, de uma alegria, de um culto da afirmação e da alegria, de uma exigência da vida
contra aqueles que a mutilam e a mortificam. Para mim, é a própria filosofia. (p. 155)
É necessária, pois, uma desterritorialização da forma como pensamos e como temos agido na
educação; precisamos reterritorializar a visão sobre o saber; precisamos, em verdade, criar
uma situação na qual o sujeito seja o centro de todo o processo de aprendizagem, com uma
visão libertadora e crítica de si, entendendo suas limitações e especialmente o que ele pode (o
que pode o corpo?). Somente essa reterritorialização permitirá que possa ser vislumbrado um
novo horizonte, com novos hábitos, com novos ritmos, com um novo constructo, expandindo
nossa potência de agir no âmbito social político e econômico. Precisamos conhecer e
reconhecer a nós mesmo como sujeitos ativos, críticos, construtores de culturas livres e
libertadoras.
Existem processos escolares que conservam e perpetuam modelos equivocados, onde há pesos
políticos desiguais, com igual desequilíbrio de forças; precisamos, então, de ações políticas
libertárias, como as defendidas por Paulo Freire (1987), que favoreçam o empoderamento dos
sujeitos, aumentando a sua potência de agir.
No processo de ensino e de aprendizagem devemos considerar os sujeitos como seres dotados
de emoção e de razão, compreendendo que fatores afetivos interferem diretamente no sucesso
do processo. Os afetos são importantes para a formação holística dos sujeitos, podendo tornálos mais fortes e ativos em suas existências. Nossa potência positiva deve ser experimentada
com alegria consciente, para isso trouxemos uma citação de Deleuze e Parnet (1998):
Daí a força da questão de Espinosa: o que pode um corpo? De que afetos é ele capaz? Os afetos são devires: ora
eles nos enfraquecem, quando diminuem nossa potência de agir e decompõem nossas relações (tristeza), ora nos
227
tornam mais fortes, quando aumentam nossa potência e nos fazem entrar em um indivíduo mais vasto ou
superior (alegria). (p. 49)
Dessa forma, na filosofia do acontecimento de Deleuze, os afetos ativos criam signos
igualmente ativos em sua capacidade de potencializar o surgimento e o desenvolvimento das
aprendizagens; aumentando a potência de agir, ou vontade de potência, pela criação de
conjuntos de sensações positivas e profícuas.
A Liberdade na aprendizagem
As liberdades substantivas constituem um conceito trabalhado pelo economista indiano
Amartya Sen (2010), em sua obra Desenvolvimento como Liberdade, que inspirou e muito a
nossa atuação profissional e o nosso trabalho. Os sujeitos precisam de experimentações
autênticas, o que ocorre, para o pensador indiano, por meio do acesso às liberdades
substantivas enquanto liberdades instrumentais, entendendo que a posse dessas liberdades é
algo prioritário e fundamental para qualquer tipo de aprendizagem.
É necessário que os sujeitos sejam livres, pois não existe desenvolvimento sem liberdade; e a
liberdade se expressa na participação ativa dos sujeitos na sociedade, sendo revelada na
manifestação consciente e crítica na vida social em todas suas esferas. Devemos contribuir
para o exercício da liberdade, favorecendo a formação de uma consciência crítica, que alargue
a capacidade de analisar o mundo complexo.
Paulo Freire (1967, 1987), educador brasileiro que se preocupou com a promoção de uma
educação livre e libertária, defendeu uma educação para a liberdade e pelo diálogo, pelo ouvir
e pela valorização da voz do outro, especialmente dos marginalizados; ele lutou por uma
educação democrática, consciente, crítica e política, mas não partidária; contrária a vigente,
que para ele consistia em uma educação que domesticava e massificava o povo.
A ideia de Freire era a de que um povo livre, consciente e crítico luta pela liberdade e por sua
conservação, através do empoderamento, do conhecimento e do reconhecimento de seu lugar
no mundo, de seu lugar de fala, de sua potência de agir e existir. Freire, como Deleuze,
defende uma horizontalidade no aprender, propondo que fosse criado um método ativo,
dialogal, crítico e criticizador, que servisse para modificar os conteúdos programáticos da
educação, com o uso de técnicas novas e simples como a da redução da codificação (Freire,
1967).
228
Apesar de haver algum tempo que Freire escreveu suas obras, elas ainda são valiosas e
preciosas, pois ainda observamos, como já falamos, uma passividade dos alunos ao invés de
uma participação ativa e crítica, autônoma, construtores de sua aprendizagem; aulas
discursivas e expositivas em vez de aulas dialógicas; presença de programas conteudistas
quando deveriam ser programas com unidades de aprendizagem com relações práticas e
relevantes para a transformação do mundo.
Percebemos uma relação entre o pensamento de Freire (1987) e Sen (2010); apesar de não
pertencerem a um mesmo contexto político e social, e nem apresentarem uma perspectiva
comum, é evidente que para os dois a liberdade é essencial. Sen (2010) conceitua o
desenvolvimento como um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas
desfrutam, assim a liberdade é central para o processo de desenvolvimento e, para ele, o
verdadeiro desenvolvimento é demonstrado por meio de uma melhoria da vida nos seus mais
diversos aspectos:
O que as pessoas conseguem positivamente realizar é influenciado por oportunidades econômicas, liberdades
políticas, poderes sociais e por condições habilitadoras como boa saúde, educação básica e incentivo e
aperfeiçoamento de iniciativas. (Sen, 2010, p. 18)
O processo de liberdade, para Sen (2010), traz uma responsabilidade social: quem é livre deve
lutar pela liberdade do outro, das garras do tirano. A liberdade individual deve estar associada
a uma liberdade coletiva, como se existisse uma relação de interdependência entre elas.
Devemos contribuir de forma crítica para a libertação dos sujeitos com o empoderamento
efetivo e participativo.
Propomo-nos, então, a questionar, a refletir e a discutir a aprendizagem como
liberdade, encontrando em Deleuze um defensor dessa possibilidade, da necessidade de um
aprendizado plural e múltiplo, conforme as subjetividades do aluno:
Nunca se sabe de antemão como alguém vai aprender – que amores tornam alguém bom em latim, por meio de
que encontros se é filósofo, em que dicionários se aprende a pensar. Os limites das faculdades se encaixam uns
nos outros sob a forma partida daquilo que traz e transmite a diferença. Não há método para encontrar tesouros
nem para aprender, mas um violento adestramento, uma cultura ou paideia que percorre inteiramente todo o
indivíduo. (Deleuze, 2000, p. 237).
229
Não podemos definir a forma como cada criança aprende, pois cada um tem sua própria
singularidade, elaborando a sua própria aprendizagem; no entanto, cremos que novos
territórios e novas aprendizagens ocorrem nas multiplicidades, nos agenciamentos, nos
encontros preciosos, nos devires, nas linhas de fuga e nos caminhos cartográficos.
Precisamos de liberdade para aprender e de liberdade para ensinar, a liberdade atua em nossa
potência positiva de agir e existir. Não é fácil ser um homem livre: fugir da peste, organizar
encontros, aumentar a potência de agir, afetar-se de alegria, multiplicar os afetos que
exprimam ou envolvam um máximo de afirmação.
Conclusão
Acreditamos no trabalho realizado pela e na multiplicidade, confiando que as ações
empoderam, de fato, os sujeitos – para que enfrentem a ‘vulnerabilidade escolar’, a opressão e
a tirania através de uma aprendizagem efetiva, que aumente a sua potência para agir. Os
sujeitos necessitam de acesso às liberdades substantivas e aos exercícios da cidadania plena
para que haja desenvolvimento efetivo.
Cabe ao professor sempre estar atento às necessidades educacionais dos alunos; e, para que
isso aconteça, deve buscar sempre um papel ativo no processo de ensino: criticando sua
própria ação; esquadrinhando as causas e as consequências da ‘aprendizagem’ e da liberdade;
mostrando ao aluno que ele também deve exercer um papel ativo na construção do
conhecimento; sendo agente de sua própria história, ativo, crítico; e, finalmente, sendo um
cidadão que deve ser livre para um viver pleno e responsável .
Precisamos de uma formação holística, de um ensino com pesquisa, criatividade, inovação e
emancipação, de relações horizontais, de troca de experiências, de libertação da sombra do
opressor. Deleuze afirma que a aprendizagem acontece pelos encontros com os signos, sendo
os encontros, como já salientado, a base do pensamento. Não podemos, de fato, prever a ideia,
“mas podemos preparar a ocasião que, eventualmente, poderá vê-la surgir” (Deleuze, 2000, p.
21). Gallo (2012) também concorda com o filósofo francês em relação à emissão randômica
de signos como dado crucial para a aprendizagem:
Ensinar consiste em emitir signos, sem que tenhamos controle em relação ao que será feito com eles, por
aqueles que os encontrarem. Isso não significa que não devamos emitir signos, mas sim que precisamos
230
nos desapegar deles, precisamos abdicar de nossa vontade de controlar o aprendizado de cada um de
nossos alunos, apesar de todas as boas intenções que possamos ter com isso. Precisamos ter a coragem de
ensinar como quem lança sementes ao vento, com a esperança dos encontros que possam produzir, das
diferenças que possam fazer vingar, nos encantando com as múltiplas criações que podem ser produzidas
a partir delas, não desejando que todos façam da mesma maneira, sejam da mesma maneira. (p. 9)
Spinoza, segundo Iafelice (2015), mostra que os afetos tristes são usados eficazmente como
instrumentos de controle e de poder, dissimulando e enganando os homens, para que pensem
e lutem por sua escravidão como se fosse sua salvação. Portanto, o nosso poder de resiliência
tem que ser acionado, para que os nossos encontros com os signos aumentem os nossos afetos
de alegria; afetando, assim, positivamente nossa potência de agir.
Carecemos de uma visão holística sobre os sujeitos, sobre o processo de ensino, sobre as
experimentações da aprendizagem e sobre as variáveis que incidem nesse processo;
acreditamos que assim poderemos diminuir a vulnerabilidade educacional existente no Brasil,
promovendo uma educação libertadora: “A educação, que deveria ser uma forma de
resistência contra toda tirania do capitalismo, tornou-se o próprio braço desse sistema que
incorpora tudo que passa pela sua frente” (Iafelice, 2015 p. 67).
Acreditamos ter alcançado nosso objetivo de promover uma reflexão sobre a aprendizagem
como liberdade. Trouxemos aqui Amartya Sen, que pensa a liberdade como essencial para
uma melhoria de vida; assim como Paulo Freire (1987), que, sendo totalmente contrário a
uma “educação bancária”, também revolucionou a pedagogia vigente, defendendo a liberdade
para um empoderamento libertador consciente, crítico e político; Deleuze (2002, 2017) e
Iafelice (2015), que, inspirados por Spinoza, pensam em uma aprendizagem pelo afeto, pelo
encontro, rizomático e alagmático, na interpretação do mundo com um rompimento da tirania
pela alegria e consequentemente com o aumento da potência de agir e existir.
Não podemos continuar a nos submeter a poderes alienantes, nem a estruturas curriculares
rígidas sem sentido, nem a hierarquias opressoras; entendemos que ainda há muito a se
pensar, refletir e criticar, mas não devemos temer a liberdade, pois ela é a ponte para a
verdadeira revolução da subjetividade e da sociedade.
Referências
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231
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233
PARTE II
SENTIDOS PEDAGÓGICOS E PRÁCTICAS EDUCATIVAS
234
12.ENSINO SUPERIOR EM PAUTA: UM LEVANTAMENTO
BIBLIOGRÁFICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO DA UFRN
Erika dos Reis Gusmão Andrade41, Anna Katyanne Arruda Silva e Souza, Telma Elita da
Silva & Sheyla Gomes Pereira de Almeida
Resumo
Este trabalho trata de levantamento bibliográfico das teses e dissertações publicadas pelo
Programa de Pós-Graduação em Educação no Repositório Institucional da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, no período de 1998 a 2019. Objetiva analisar os trabalhos
publicados sobre a temática da Educação Superior, fornecendo assim, um panorama do que
vem sendo pesquisado sobre este tema, contribuições e lacunas. A busca sistemática das
publicações resultou em 851 trabalhos, sendo triados 105. A análise foi pautada na avaliação
dos objetivos, aporte teórico-metodológico, estratégias de análise dos dados, dados primários
e secundários e resultados. A maioria dos estudos aborda formação docente para o Ensino
Superior, questões relacionadas à inclusão e à acessibilidade, demandas específicas dos cursos
de graduação, de acordo com a área, relacionadas aos docentes, discentes e/ou ao processo de
ensino-aprendizagem, currículo, evasão/permanência, há também aqueles que versam sobre
expansão e reestruturação do ensino e seus desafios, inserção no mercado de trabalho pelos
egressos, avaliação e internacionalização da Educação Superior, educação à distância, e
adaptação/transformação/socialização dos estudantes no nível superior. As publicações
apresentam predominantemente como metodologia para recolha de dados revisão de literatura
41
Erika dos Reis Gusmão Andrade: Professora Titular do Departamento de Fundamentos e Políticas
Educacionais do Centro de Educação e Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – PPGEd/UFRN. – E-mail: ergandrade@gmail.com
Anna Katyanne Arruda Silva e Souza: Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – PPGEd/UFRN. Doutoranda pelo PPGEd/UFRN. Técnica em
Assuntos Educacionais da Escola de Saúde da UFRN – E-mail: annakaty@gmail.com
Telma Elita da Silva: Mestra em Gestão de Processos Institucionais pela Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. Doutoranda pelo PPGEd/UFRN. Técnica em Assuntos Educacionais atuando no Núcleo de Apoio ao
Discente – NADIS/CCSA/UFRN – E-mail: ntelita_12@hotmail.com
Sheyla Gomes Pereira de Almeida: Mestre em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem
da UFRN. Professora da Escola de Saúde da UFRN – E-mail: gomesvale93@gmail.com
235
e entrevista, prevalecendo análise de conteúdo para análise dos dados. A produção sobre
Ensino Superior é ampla e diversificada neste programa, versando sobre questões gerais e
específicas, sendo necessário avançar na pluralidade teórico-metodológica, a fim de fomentar
a pesquisa e a prática crítico-reflexiva sobre o fazer, o como e o por quê fazer, de acordo com
as especificidades de cada área do conhecimento neste nível de ensino.
Palavras-chave: Ensino Superior. Formação. Pós-Graduação. Educação.
Introdução
O Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte (PPGEd/UFRN) tem como área de concentração a Educação e está estruturado em
curso de pós-graduação lato sensu (Especialização) e cursos de pós-graduação stricto sensu
(Mestrado e Doutorado). Com 40 anos de funcionamento, tem como finalidade formar
profissionais de alto nível acadêmico e científico para atuarem na educação básica e superior,
e fomentar estudos, pesquisas e a produção do conhecimento na área da educação, visando
contribuir para o desenvolvimento cultural, educacional e socioeconômico local, regional,
nacional e internacional (UFRN, 2020).
Ao longo dos seus 41 anos, o Programa formou 1.382 (mil trezentos e oitenta e dois)
pesquisadores em educação, sendo 808 (oitocentos e oito) mestres e 574 (quinhentos e setenta
e quatro) doutores, titulados em uma única área de concentração (Educação), constituindo-se,
assim, no maior Programa de Pós-Graduação da UFRN, cujo eixo formativo privilegiado
exige
dos
mestrandos,
doutorandos
e
dos
professores
pesquisadores
dedicação,
disponibilidade e envolvimento integral nas atividades acadêmicas (UFRN, 2020).
A proposta curricular do PPGEd está pautada na organização e funcionamento das
Linhas de Pesquisa, cujas atividades acadêmicas são desenvolvidas em função dos projetos de
pesquisa dos docentes do Programa e dos objetos de estudo de mestrandos e doutorandos. O
PPGEd possui 07 linhas de pesquisa, sendo elas: Educação e inclusão em contextos
educacionais; Educação, construção das ciências e práticas educativas; Educação,
comunicação, linguagens e movimento; Educação, representações e formação docente;
Educação, estudos sociohistóricos e filosóficos; Educação, política e práxis educativas; e
Educação, currículo e práticas pedagógicas nas quais se organizam as atividades acadêmicas,
em função dos projetos dos docentes que definem a relação de pertinência com os projetos
dos discentes (UFRN, 2020).
236
O Programa é reconhecido nacionalmente pela qualidade do trabalho realizado,
alcançando conceito 5 nas três últimas avaliações da CAPES/MEC. Possui 57 docentes
vinculados e, atualmente, o corpo discente conta com 137 doutorandos e 114 mestrandos, em
sua maioria professores da rede pública de ensino e egressos do curso de pedagogia da UFRN.
Diante do exposto, este trabalho surgiu no contexto das pesquisas realizadas pelos discentes e
docentes da linha de pesquisa Educação, Currículo e Práticas Pedagógicas do PPGEd/UFRN,
especificamente da realização de uma busca sistemática no Repositório Institucional da
UFRN, no intuito de traçar um panorama dos trabalhos publicados sobre a temática da
Educação Superior nas teses e dissertações do referido programa, no período de 1998 a 2019,
fornecendo assim, uma visão crítica e reflexiva do que vem sendo pesquisado sobre este tema,
suas contribuições e lacunas.
Trata-se de uma pesquisa exploratória e documental realizada a partir de 105 teses e
dissertações publicadas pelo PPGEd/UFRN que abordam, no âmbito da pedagogia
universitária, questões relacionadas à formação docente para o Ensino Superior, à inclusão e à
acessibilidade dos discentes, demandas específicas dos cursos de graduação, de acordo com a
área, relacionadas aos docentes, discentes e/ou ao processo de ensino-aprendizagem,
problemáticas relativas ao currículo, à evasão e permanência dos estudantes diante das
dificuldades inerentes ao ensino superior, bem como questões relacionadas à expansão e
reestruturação do ensino e seus desafios, inserção no mercado de trabalho pelos egressos,
avaliação e internacionalização da Educação Superior, educação à distância, e
adaptação/transformação/socialização dos estudantes no nível superior.
A escolha por este caminho decorre da possibilidade de uma visão geral do
conhecimento produzido acerca do ensino superior através da pluralidade teóricometodológica dos estudos publicados pelo referido Programa de Pós-Graduação em Educação
ao longo de 21 anos, bem como por contemplar a necessidade de ampliação de estudos nesta
área.
Portanto, a pesquisa aqui apresentada objetiva analisar os trabalhos publicados sobre a
temática da Educação Superior pelo PPGEd/UFRN. Após o tratamento inicial dos dados, os
textos foram submetidos à técnica de análise de conteúdo, buscando o levantamento das
características das produções e a discussão das temáticas abordadas.
Para análise dos dados recorreu-se aos resumos e textos completos dos trabalhos
selecionados. Os estudos foram lidos atentamente para que se encontrassem convergências,
divergências, contribuições e lacunas de acordo com o arcabouço teórico-metodológico das
teses e dissertações do PPGEd. A busca sistemática das publicações no repositório do
237
PPGEd/UFRN resultou em 851 trabalhos, dos quais 105 foram triados por critérios préestabelecidos de inclusão e exclusão. A análise dos trabalhos foi pautada na avaliação dos
objetivos, aporte teórico-metodológico, estratégias de análise dos dados, dados primários e
secundários/ sujeitos da pesquisa e em alguns resultados descritos nas teses e publicações, os
quais foram organizados em uma planilha contendo estas variáveis.
A análise dos registros sintetizados na planilha permitiu identificar os estudos
centrados nas temáticas:
A expansão e a reestruturação dos cursos e das instituições;
Políticas e ações para a inclusão dos estudantes público-alvo da educação especial;
As lacunas e dificuldades dos estudantes ingressantes no ensino superior;
Características e dificuldades da formação específica dos estudantes nos diferentes
cursos de graduação;
A constituição da identidade e do ser docente universitário;
Acesso, permanência e evasão dos estudantes no ensino superior;
Egressos do ensino superior;
O currículo no ensino superior;
A socialização acadêmica e a construção da identidade do discente no ensino superior;
O ensino superior e a educação à distância;
O ensino superior e a internacionalização;
A formação docente no e para o ensino superior.
Os temas estudados pelos pesquisadores do PPGED/UFRN demonstram a existência
de um movimento no ensino superior brasileiro que rompe com a ideia primeira, de um ensino
elitista. A qual se propagou por muito tempo em decorrência de sua origem demandada por
atender a formação de profissionais liberais, para ocupar postos de trabalho em um mercado
de trabalho restrito a uma nobreza, fruto da chegada da família real portuguesa ao país
(MARTINS, 2002).
Apesar dos estudos sinalizarem para essa ruptura, o movimento em prol do ensino
superior sempre foi permeado por tensões e disputas entre grupos que defendem a preservação
desse status primeiro e os que lutam pela sua democratização (ALMEIDA, 2012; CHAUÍ,
2001).
238
E dentre essas tensões pode se inferir que o ensino superior brasileiro, assim como, a
própria constituição de sua sociedade é permeada por contrastes. Ao mesmo tempo em que se
aponta para um problema de aprendizagem na educação básica, que repercute em ingressantes
com dificuldades de acompanhar o ensino superior, se vislumbra por uma internacionalização
que coloca o país em condições de disputa global pelo conhecimento. Todas essas questões
perpassam pela formação e sua relação com o currículo e estão implicadas em políticas locais
e internacionais.
Como bem disse as professoras Selma Pimenta e Léa Anastasiou:
A Educação é um processo de humanização. Ou seja, é processo pelo
qual se possibilita que os seus humanos se insiram na sociedade
humana, historicamente construída e em construção. Sociedade que é
rica em avanços civilizatórios e, em decorrência, apresenta imensos
problemas de desigualdade social, econômica e cultural PIMENTA e
ANASTASIOU, 2014, p. 97).
Como produto social, a educação se constrói em contextos díspares. O que reflete o
pensar social amplo, traduzido nas produções acadêmicas do Programa de Pós-graduação em
Educação, aqui discutidas.
Apresentação e Discussão dos resultados
A produção sobre Ensino Superior no PPGEd, no período de 1998 a 2019, é vasta e
diversificada. Dentre as 105 publicações triadas durante esta revisão bibliográfica, 53 são
teses e 52 são dissertações, cujos títulos e objetivos encontram-se descritos a seguir na Tabela
1. Os objetivos das publicações são variados, abrangem tanto questões gerais relacionadas à
Pedagogia Universitária e aos agentes nela implicados, quanto questões específicas de
diferentes áreas do conhecimento desse nível de ensino.
As publicações possuem predominantemente uma abordagem qualitativa e como
metodologia para recolha de dados a revisão de literatura e a entrevista, prevalecendo a
análise de conteúdo como principal estratégia para análise dos dados, independentemente dos
objetos de estudo sobre os quais se debruçam: o processo de expansão dos Institutos Federais
de Educação e das Universidades, centrados em um contexto político vivenciado pelo Ensino
239
Superior nos anos de 2003 a 2016, durante o governo dos presidentes Luiz Inácio Lula da
Silva e Dilma Vana Rousseff; a relação entre as políticas educacionais das instituições e do
país, assim como, dos programas e projetos do Ministério da Educação com a formação
continuada dos docentes e suas necessidades formativas diante do contexto do Ensino
Superior; o acesso, a evasão, a permanência e o êxito dos educandos e a inclusão dos
estudantes público-alvo da Educação Especial; as dificuldades e lacunas pedagógicas dos
estudantes; a constituição da identidade e do ser docente universitário; o perfil educacional e
socioeconômico dos estudantes ingressantes e também dos egressos desse nível de ensino; o
currículo nas diferentes áreas; a socialização acadêmica e a construção da identidade do
discente no Ensino Superior; a Educação à Distância e o Ensino Superior; a
Internacionalização no Ensino Superior; a Universidade e sua inserção na sociedade; a
formação docente no e para o ensino superior; o estresse no exercício docente universitário; as
características e dificuldades da formação específica dos estudantes nos diferentes cursos de
graduação.
Tabela 1: Dissertações e teses publicadas pelo PPGEd/UFRN, no período de 1998 a 2019, triadas
para realização do estudo.
Título
Um estudo da expansão da educação superior no
IFPB: desafios institucionais e alcance social
(Tese)
Inclusão do estudante com deficiência no Ensino
Superior e a formação continuada do docente
universitário (Tese)
Estudo do desempenho de candidatos à UFRN na
prova de redação do Enem no período de 2013 a
2016 (Dissertação)
A orientação da ação para leitura crítica a partir
de uma experiência formativa: uma contribuição
para o ensino de química (Tese)
De Bacharel a Professor: o ser docente no ensino
universitário (Dissertação)
Estudantes cotistas com deficiência na
universidade:
perfil
educacional
e
socioeconômico (Dissertação)
Egressos universitários com deficiência e
inserção no mercado de trabalho competitivo
(Dissertação)
Formação colaborativa de docentes em educação
profissional e tecnológica inclusiva para o ensino
de alunos com Transtorno do Espectro do
Autismo (TEA) (Dissertação)
Currículo e cultura: análise dos referenciais de
Educação Física dos estados do Nordeste do
Objetivo
Analisar o processo de expansão da Educação Superior no Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB), situando-o no contexto da
política educacional brasileira para esse nível de ensino, no período de 2008 a 2015,
investigando os desafios enfrentados pela instituição para viabilizar esse processo de
expansão e a sua contribuição social.
Analisar a relação entre as políticas educacionais institucionais da UFRN e a
formação continuada de docentes universitários, no tocante à dimensão pedagógica e
a interface com a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior.
Caracterizar as dificuldades encontradas pelos estudantes ao produzirem um texto
argumentativo a partir da pontuação obtida na redação do Enem, dos resultados
encontrados por pesquisadores, relativos aos aspectos avaliados na matriz de
competências utilizada para corrigi-la, e de teóricos que discutem problemas
relativos à produção textual na escola.
Investigar a influência de uma experiência formativa na orientação da ação para se
ler criticamente no contexto do Ensino de Química.
Analisar como foi constituído o ser docente dos professores bacharéis do ensino
superior. Foi produzido a partir de um grupo de investigação formado por docentes
bacharéis do quadro efetivo da UFRN, com jornadas de trabalho de 20h semanais e
que exercem sua profissão de formação, concomitantemente, fora da universidade.
Conhecer o perfil educacional e socioeconômico dos estudantes cotistas com
deficiência ingressantes na UFRN através do processo seletivo Sisu 2018.
Delinear o perfil dos egressos universitários com deficiência, diplomados no período
2011-2017.
Avaliar as contribuições de um programa de consultoria colaborativa para
capacitação de docentes do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) sobre o
processo de ensino para educandos com TEA.
Compreender o conhecimento de cultura e currículo nos referenciais de educação
física, e os processos de regulação do corpo.
240
Brasil (Tese)
Evasão no ensino superior: a socialização
acadêmica interrompida no mundo universitário
da UFRN (Dissertação)
Reconfigurações do campo universitário no
Brasil e suas repercussões em uma instituição
periférica (Tese)
Jovens estudantes em processo de transformação
na travessia pelo ensino superior (Tese)
A Universidade flexível: reestruturação e
expansão no Bacharelado em Tecnologia da
Informação na UFRN (Tese)
Política de permanência e fomento à formação
docente: o Pibid nos cursos de licenciaturas na
UFRN (Dissertação)
Avaliação e regulação da educação superior:
intenções e tensões na proposta de criação do
Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da
Educação Superior (INSAES) (Tese)
Estratégias de sobrevivência no ensino superior
na educação a distância: os estudantes de
pedagogia (UFRN) (Dissertação)
Grande mídia e a construção de uma
legitimidade discursiva sobre a universidade
brasileira durante a greve de 2015 (Tese)
O curso de Pedagogia a distância da UFRN
(2012-2016) na perspectiva dos egressos,
professores e tutores (Dissertação)
Representações sociais de professores da
educação profissional em saúde sobre o ser
professor (Dissertação)
Expansão da formação docente inicial: os cursos
de licenciatura presenciais no Brasil (2003-2014)
(Dissertação)
O ensino de literatura no curso de pedagogia: um
lugar necessário entre o institucional, o
acadêmico e o formativo (Tese)
Aproximações
e
distanciamentos
entre
necessidades formativas de futuros professores
de ciências bolsistas e não bolsistas do PIBID
(Dissertação)
Reinventar a universidade: um ensaio sobre o
Grupo
de
Estudos
da
Complexidade
(GRECOM/UFRN) (Tese)
Quando desistir não é uma opção: socialização e
estratégias de permanência de estudantes
populares da UFRN (Dissertação)
Representações sociais de psicólogo: imagens
em movimento na formação profissional (Tese)
Discentes com dislexia na Universidade: um
estudo de caso (Dissertação)
Estudantes surdos no ensino superior: reflexões
sobre a inclusão no curso de letras libras/ língua
portuguesa da UFRN (Dissertação)
Analisar o processo de socialização acadêmica nos cursos das Ciências Exatas e sua
relação no percurso acadêmico dos estudantes.
Analisar as principais reconfigurações ocorridas no campo universitário nas últimas
décadas e apreender as repercussões destas reconfigurações na Faculdade de
Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM/UECE) – instituição estadual de ensino
superior, pertencente à Universidade Estadual do Ceará.
Analisar a relação entre ser jovem (condição juvenil) e ser graduando (condição
estudantil) a partir das vivências de jovens estudantes do IFRN-Campus Ipanguaçu.
Analisar os processos de reestruturação e expansão da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN), intensificados pelo Programa de Apoio a Planos de
Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), e sua
materialização no Bacharelado em Tecnologia da Informação (BTI),
especificamente, na ampliação da oferta e na flexibilidade acadêmico-curricular
desse curso de graduação interdisciplinar no Instituto Metrópole Digital (IMD).
Analisar como configura-se a política de permanência e de formação de professores
adotadas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, tendo como referência
o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - Pibid nos cursos de
licenciatura da UFRN.
Analisar a construção da proposta de criação do Instituto Nacional de Supervisão e
Avaliação da Educação Superior (INSAES), investigando as intenções e as tensões
nos debates ocorridos na Câmara dos Deputados acerca da avaliação, regulação,
supervisão e acreditação da educação superior no Brasil.
Colaborar na área da Educação a Distância, especificamente com a investigação das
estratégias de sobrevivência social que os estudantes do curso de pedagogia à
distância, no polo Natal, na UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte
desenvolveram durante o período de sua formação.
Analisar a produção discursiva da grande mídia sobre a universidade pública
brasileira, a partir das notícias veiculadas durante a greve de docentes e servidores
dessas instituições, no ano de 2015, com a finalidade de desvelar as estratégias de
veiculação de pontos de vista sobre a universidade e o movimento paredista.
Analisar as perspectivas avaliativas dos formadores e egressos do curso de
Pedagogia a distância da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, período de
2012 a 2016.
Analisar as representações sociais de professores da Educação Profissional em Saúde
sobre o ser professor tendo por base a perspectiva moscoviciana.
Analisar o processo de expansão da formação docente inicial em cursos de
licenciatura presenciais no Brasil, no período de 2003 a 2014, considerando a
organização acadêmica e categorias administrativas.
Investiga o ensino de literatura nos cursos de licenciatura em Pedagogia das
universidades federais do Brasil.
Analisar quais as aproximações e distanciamentos entre as necessidades formativas
de futuros professores de Ciências que foram bolsistas e não bolsistas do PIBID.
Expor fragmentos da história de uma experiência de reforma do pensamento
construída, ao longo de 25 anos, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN)
Compreender a condição de permanência do estudante de origem popular na
Universidade a partir do seu processo de socialização.
Analisar as representações sociais sobre o psicólogo para os estudantes de Psicologia
da Universidade Federal de Alagoas/Unidade Educacional de Palmeira dos Índios.
Analisar as características educacionais de discentes da UFRN com dislexia, por
meio da caracterização do perfil educacional, da investigação do cotidiano e da
avaliação do desempenho em leitura e escrita dos cinco participantes. Além disso,
intentou revisar a literatura a respeito da temática em questão.
Conhecer e analisar a opinião de alunos Surdos sobre o curso de Licenciatura em
Letras-Libras/Língua Portuguesa como Segunda Língua (LLLP) da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em relação à formação acadêmica.
241
A internacionalização do ensino superior e a
formação inicial de professores: um estudo do
Programa Licenciaturas Internacionais na UFRN
(2010 - 2013) (Dissertação)
A base orientadora da ação em modelagem
científica de licenciandos em química: um
conhecimento disciplinar profissional para o
ensino (Dissertação)
Imagens em claro/escuro: o cenário do estágio
não obrigatório na formação inicial de
graduandas dos Cursos de Pedagogia
(Dissertação)
Práticas e formação docente na UFRN com
vistas à inclusão de estudantes cegos
(Dissertação)
A expansão da educação superior a distância no
Tocantins no âmbito da parceria entre a
EADCON e a UNITINS (Tese)
Perfil dos servidores com deficiência da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(Dissertação)
Os sentidos formativos dos estudantes de
licenciatura: socialização, aprendizagens e
identidade docente (Tese)
Repensando a socialização na educação infantil:
o entendimento e as práticas na formação
docente do curso de pedagogia (Dissertação)
Representação social sobre o ensino de
matemática de licenciandos vinculados ao
PIBID: dinâmica de formação (Tese)
As representações sociais de licenciandos sobre a
educação à distância: o caso da UFRN
(Dissertação)
Representações sociais de licenciandos do curso
de Pedagogia da UFRN acerca da prática
educativa (Dissertação)
Necessidades formativas e aprendizagens
docentes em uma licenciatura em ciências
biológicas a distância da UFRN (Dissertação)
A expansão do ensino superior à distância no
IFPB: um estudo da implantação do Curso de
Administração Pública no âmbito do Programa
Nacional de Administração Pública – PNAP
(Tese)
Formação de professores alfabetizadores em
cursos de pedagogia: sentidos de professores
formadores (Tese)
Internacionalização da educação superior: um
estudo da mobilidade estudantil em cursos de
graduação da UFRN no âmbito do programa
Ciência
sem
Fronteiras
(2012-2014)
(Dissertação)
Desenvolvimento profissional de futuros
professores: travessias que se entrecruzam em
contextos formativos (Tese)
Licenciaturas interdisciplinares em ciências
naturais na UFMA: análise crítica de um modelo
de formação docente no contexto de
reestruturação da universidade brasileira (Tese)
Mediação como estratégia no atendimento
educacional especializado a aluno com
deficiência
intelectual:
contribuições
da
Analisar o Programa Licenciaturas Internacionais (PLI) e a sua implementação na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), evidenciando suas
repercussões para a formação inicial de professores.
Identificar e caracterizar o conhecimento profissional disciplinar que integra a Base
Orientadora da Ação de modelagem científica em Ciências de 58 licenciandos em
Química da UFRN, no sentido de determinar se os anos de formação fazem diferença
na apropriação desse conhecimento disciplinar.
Investigar de que maneira o estágio não obrigatório contribui no percurso formativo
inicial docente de graduandas dos cursos de Pedagogia, que atuam na etapa da
Educação Infantil.
Investigar se a formação continuada e a ação docente, na Universidade Federal do
Rio Grande do Norte - UFRN, tem possibilitado a inclusão de alunos cegos nos
cursos de graduação dos quais fazem parte.
Analisar a expansão da educação superior na modalidade de Educação a Distância
(EaD) no estado do Tocantins por meio da parceria entre a Educação Continuada
Ltda (EDUCON) e a Fundação Universidade do Tocantins (UNITINS) no período
compreendido entre 2000 e 2009.
Traçar o perfil dos servidores com deficiência da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, com vistas a contribuir para a elaboração de uma política
institucional de inclusão.
Analisa os sentidos formativos atribuídos por estudantes concluintes dos cursos de
licenciatura (Letras, Biologia, Matemática e Pedagogia) ligados à construção de sua
identidade profissional docente, no decorrer do processo de socialização e
aprendizagem no meio universitário.
Contribuir na formação dos professores que poderão trabalhar com crianças,
analisando as concepções e as práticas educativas relacionas às formas de
socialização escolar da infância
Identificar as representações sociais dos licenciandos, bolsistas do Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID, sobre o ensino de
Matemática e enfatizar os benefícios do contato com os alunos da rede pública para
sua formação.
Analisar as representações sociais de licenciandos de cursos a distância, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sobre a educação à distância.
Analisar as representações sociais de licenciandos do Curso de Pedagogia da UFRN
acerca da prática educativa.
Analisar aprendizagens docentes e necessidades formativas que emergem da
Licenciatura em Ciências Biológicas a distância na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
Analisar a política de expansão do ensino superior na modalidade a distância no
IFPB, tendo como referência a implementação do Bacharelado de Administração
Pública/PNAP e suas repercussões na cultura organizacional e no trabalho docente
do IFPB Campus João Pessoa.
Analisar a formação de professores alfabetizadores em Cursos de Pedagogia, a partir
de sentidos atribuídos a esse processo por professores-formadores que atuam com
disciplinas específicas de alfabetização nesses cursos.
Analisar a implementação do Programa Ciência sem Fronteiras na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, procurando evidenciar, na visão de gestores e
coordenadores de cursos, as contribuições do processo de mobilidade acadêmica
proporcionadas pelo Programa Ciência sem Fronteiras em cursos de graduação da
mesma instituição.
Compreender como o contexto formativo contribui para o desenvolvimento
profissional de futuros professores em iniciação à prática docente..
Investigar e analisar criticamente os pressupostos e fundamentos que apoiaram a
implementação do curso de Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Naturais, em
sua versão original, no âmbito da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
Situar a mediação como uma estratégia necessária no Atendimento Educacional
Especializado - AEE a um aluno, com deficiência intelectual, matriculado em uma
escola de aplicação - o Colégio Universitário da Universidade Federal do Maranhão -
242
abordagem histórico cultural (Tese)
COLUN/UFMA.
Representação social de estagiários (as) do curso
de pedagogia acerca da docência (Dissertação)
Identificar a representação social de estagiários (as) que cursam disciplinas de
Estágio Supervisionado no curso de Pedagogia da UERN, acerca da docência.
Propomos ainda, perceber como o curso e, em específico, as disciplinas de Estágio
Supervisionado contribuem para construção dessa representação.
Compreender os sentidos atribuídos pelos 'docentes formadores ao processo de
gestão docurrículo, tendo como foco a sua ação no ESO do curso de Pedagogia da
UFMA.
Trajetórias construídas em caminhos (não)
planejados: os sentidos formativos da escrita no
estágio supervisionado obrigatório do curso de
Pedagogia da UFMA (Tese)
Processo identitário e saberes docentes: um
estudo a partir da prática de ensino no estágio do
curso de pedagogia da UFRN (Dissertação)
Núcleos de acessibilidade e o atendimento a
alunos com necessidades educacionais especiais
nas universidades federais do nordeste brasileiro
(Dissertação)
As dimensões pedagógica, didática, tecnológica
e científica na formação e no desenvolvimento
profissional dos professores no Brasil e em
Portugal (Tese)
Um estudo sobre a compreensão das definições
matemáticas no curso de licenciatura em
matemática (Tese)
Livros das Ciências da Educação, bibliotecas e a
engenhosidade da bibliotecária Zila da Costa
Mamede (Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, 1959-1980) (Dissertação)
Representações sociais da identidade docente na
formação inicial de professores de sociologia da
UFRN (Dissertação)
Programa de apoio a planos de reestruturação e
expansão das Universidades Públicas Federais
(REUNI): repercussões na UFRN (Dissertação)
A representação social de disciplinas didáticopedagógicas no contexto da formação inicial
docente: um entremear de saberes (Tese)
O estágio supervisionado como contexto de
formação docente específica para educação
infantil: o que dizem os formandos sobre suas
aprendizagens? (Tese)
Cantos, encantos e desencantos na educação a
distância: uma análise da concepção e da
implementação do curso de administração
pública da UFRN (Tese)
A formação do enfermeiro na reflexividade
(Tese)
Ingressar na ufrn: trajetórias escolares e
universitárias de estudantes egressos da educação
básica da rede pública (Tese)
Mecanismos sócio-genéticos da representação
social de trabalho docente por grupos de
licenciandos de física e de química da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(Tese)
Dimensões didática, afetiva e formativa de
docência que tecem as representações sociais
entre licenciandos da UFPI (Tese)
A Tessitura de sentidos: representação social de
licenciados do curso de letras da UFRN sobre o
Compreender o processo identitário dos licenciandos de Pedagogia da UFRN e
identificar os saberes construídos na prática de ensino desenvolvida durante o estágio
supervisionado do referido curso.
Analisar o trabalho desenvolvido pelos núcleos de acessibilidade implementados nas
universidades federais do nordeste brasileiro para atendimento aos estudantes com
NEE.
Estudar, em uma perspectiva comparativa, os cursos de formação inicial de
professores do Brasil e de Portugal, tendo em vista o desenvolvimento profissional e
a importância das dimensões pedagógica, didática, tecnológica e científica.
Tem como objetivo geral o desenvolvimento de atividades construtivistas,
informadas pela História da Matemática (Fossa), para promover a compreensão
relacional (Skemp) das definições matemáticas.
Refletir acerca das inter-relações entre o livro universitário das Ciências da Educação
e as políticas institucionais, estabelecidas pelo Ministério da Educação e Cultura e
aquela instituição universitária.
Compreender como os saberes apreendidos durante a formação inicial de professores
influenciam o processo de construção identitária, investigou-se as representações
sociais que estes sujeitos constroem acerca da identidade docente, buscando
depreender como esses representam as professoras e professores de Sociologia.
Analisar a implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais (REUNI) e o seu papel na reconfiguração da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ressaltando suas repercussões na
gestão e organização da universidade.
Analisar a representação social que os licenciandos do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte IFRN têm de disciplinas didáticopedagógicas.
Analisar que saberes específicos à atuação docente na Educação Infantil são
construídos, segundo graduandos-estagiários, no Estágio Supervisionado do curso de
Pedagogia.
Analisar a concepção e a implementação do curso de administração pública a
distância da UFRN no contexto da expansão do ensino superior, no período de 2010
a 2013, tomando como referência a concepção teórico-metodológica, a estrutura e a
gestão do curso.
Propõe a compreensão da formação do enfermeiro na reflexividade e a superação dos
limites do modelo de formação biomédica, a partir do pensamento de John Dewey,
inserido no panorama do profissional reflexivo apresentado por Donald Schön
dialogando com a perspectiva da ação transformadora de Paulo Freire.
Analisar os processos de transição entre a Educação Básica e o Ensino Superior do
ponto de vista de estudantes que conquistaram uma vaga na universidade pública.
Compreender as Representações Sociais de Trabalho Docente por grupos de
licenciandos de Física e Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Analisar a representação social de docência para os estudantes dos primeiros anos
dos cursos de Licenciatura em Pedagogia, Letras e Biologia.
Conhecer e analisar as representações sociais de licenciandos do Curso de Letras da
UFRN sobre o ensinar.
243
ensinar (Dissertação)
Inclusão de estudantes com deficiência nas
instituíções de ensino superior da cidade do
Natal/RN: análise das condições oferecidas no
processo seletivo vestibular (Dissertação)
Um estudo sobre o estágio supervisionado na
formação inicial de professores de matemática na
Bahia (Tese)
Tendências de sucesso no percurso acadêmico do
alunado na UFRN (Dissertação)
O memorial autobiográfico: uma tradição
acadêmica do ensino superior no Brasil (Tese)
Trajetórias de estudantes da rede pública que
ingressam, permanecem e obtém êxito numa
universidade pública (Dissertação)
Processo identitário profissional: as experiências
formativas de licenciandos do curso de Física –
UFPI (Tese)
Praxiologia e representação social sobre
formação de professores nas licenciaturas da
UFPI (Tese)
Um estudante cego no curso de licenciatura em
música da UFRN: questões de acessibilidade
curricular e física (Dissertação)
As múltiplas faces da evasão na educação
superior a distância: a experiência do curso de
tecnologia em gestão ambiental do IFRN em dois
pólos de apoio presencial (Tese)
Ser bacharel e professor: sentidos e relações
entre o bacharelado e a docência universitária
(Tese)
O desenvolvimento da docência nas engenharias:
um estudo na universidade federal de campina
grande (UFCG) (Dissertação)
O professor e sua formação linguística: uma
interlocução teoria-prática (Tese)
A representação social de educação tecnológica
de docentes da Rede Federal de Educação
Profissional e Tecnológica: CEFETs do Rio
Grande do Norte (Tese)
Alfabetizar letrando: investigação-ação fundada
nas necessidades de formação docente (Tese)
A formação do pedagogo-professor no curso de
pedagogia: limites e possibilidades na visão de
professores formados no campus avançado de
Patu da UERN (dissertação)
As
contribuições
do
proformação/pedagogia/UERN para a melhoria
da
prática
pedagógica
de
professores
(dissertação)
Acesso e permanência na universidade federal do
rio grande do Norte sob o ponto de vista do
Investigar em que medida as IES da cidade do Natal-RN estão seguindo as
recomendações contidas na legislação brasileira, especificamente a do Aviso
Circular Nº 277/96-MEC/GM, no que tange às condições oferecidas aos estudantes
com deficiência para o processo seletivo vestibular.
Investigar necessidades de formação docente de professores principiantes da
Educação Infantil/Pré-escola.
Identificar e caracterizar os fatores que revelam tendências de sucesso no
desempenho acadêmico dos estudantes da UFRN.
Descrever o percurso histórico do memorial como uma tradição acadêmica do ensino
superior no Brasil.
Investigar a trajetória de estudantes da rede pública que ingressaram em uma
universidade pública.
Compreender o processo de identificação dos discentes com a profissão docente,
com base nos sentidos dados às suas experiências formativas.
Analisar o conteúdo e a organização da representação social sobre o objeto formação
de professores, construída pelos professores de licenciatura da Universidade Federal
do Piauí (Ufpi), entendendo tal representação articulada aos habitus docentes desses
formadores de professores, o que remete a considerações sobre a posição que
ocupam na estrutura do campo acadêmico nacional e do subcampo da formação de
professores.
Discutir e analisar o processo de inclusão escolar de uma pessoa cega no curso de
Licenciatura em Música, na Escola de Música na Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, bem como, refletir sobre a importância da constituição de sistemas
de apoio para assegurar o processo inclusivo universitário de pessoas com
deficiência visual.
Identificar os fatores que influenciaram na evasão dos alunos do curso superior de
Tecnologia em Gestão Ambiental oferecido através da EaD pelo IFRN.
Compreender os sentidos atribuídos pelos professores bacharéis a docência e a sua
ação na universidade, buscando indicativos sobre as relações estabelecidas por eles,
entre a sua formação profissional e o ser professor.
Conhecer a percepção da prática de ensino dos docentes-engenheiros dos cursos de
Engenharia Civil, Elétrica e de Materiais da Universidade Federal de Campina
Grande (UFCG)
Analisar as interrelações entre os saberes dos professores, referentes à linguagem
(verbal), mobilizados no processo ensino aprendizagem da produção de textos
escritos pelos educandos, inscritos nos anos iniciais do ensino fundamental.
Pesquisar a representação social de educação tecnológica dos docentes da Rede
Federal de Educação Profissional e Tecnológica (RFEPT).
Investigar necessidades de formação de professores do Ensino Fundamental da
escola pública acerca de conhecimentos subjacentes ao desenvolvimento de uma
prática pedagógica de alfabetização na perspectiva do letramento e (re)construir, com
os professores participantes da pesquisa, conhecimentos relativos ao processo de
alfabetizar letrando , a partir de suas necessidades de formação.
Identificar as maiores necessidades formativas de professores licenciados em
Pedagogia, que atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental; Elencar as
contribuições e limitações do Curso de Pedagogia do CAJIM/UERN na formação de
professores, apontadas pelos egressos do curso; levantar sugestões para o
aprimoramento da formação de professores no Curso de Pedagogia do
CAJIM/UERN.
Investigar como os professores, então alunos do Proformação/Pedagogia avaliam os
saberes privilegiados por esta formação universitária em serviço bem como a relação
entre esses e as práticas pedagógicas vividas em sala de aula enquanto professores,
visando definir de que forma os saberes construídos e reconstruídos durante o curso
contribuem para a melhoria de práticas pedagógicas dos mesmos.
Analisar, pelo fio condutor de ações e práticas pedagógicas, sob os pontos de vista de
estudantes com deficiência e docentes, as condições de acesso e permanência,
244
docente e do estudante com deficiência NatalRN (Dissertação)
O fazer docente: representações sociais de alunos
de curso de pedagogia da UFRN (Dissertação)
SINAES: as diferentes faces da avaliação na
UFRN
(Dissertação)
As ciências da educação e a prática: sentidos
atribuídos por estudantes do curso de Pedagogia
(Tese)
Avaliação da aprendizagem no curso a distância
de licenciatura em ciências biológicas da
Universidade
Estadual
de
Pernambuco
(Dissertação)
O processo de invenção de si: um estudo sobre a
construção identitária de pedagogas em formação
(tese)
Como vão se formando os professores em física
e química: embates entre o ser, o ter e o fazer na
formação de licenciandos da UFRN sob a
perspectiva da teoria das representações sociais
(Dissertação)
A relação teoria-prática do curso de formação de
professores do campo na UFPA (tese)
Concepções de alunos do Curso de Pedagogia da
UFRN acerca da natureza da ciência: subsídios à
formação de professores (Dissertação)
A formação do professor alfabetizador em cursos
de Pedagogia: contribuições e lacunas teóricopráticas (Tese)
Representações sociais de professor partilhadas
por licenciados a partir de imagens de professor
(Tese)
Olhares sobre a formação do professor de
matemática. Imagem da profissão e escrita de si
(Tese)
Dificuldades na aprendizagem dos conteúdos de
Biologia: evidências a partir das Provas de
Múltipla Escolha do Vestibular da UFRN (20012008) (Tese)
Ofício, Estresse e Resiliência: desafios do
Professor Universitário (Tese)
O uso de modelos no ensino de química: uma
investigação acerca dos saberes construídos
durante a formação inicial de professores de
Química da UFRN (Tese)
Representações sociais de discentes sobre
universidade: um estudo psicossocial entre
ingressantes do vestibular e da seleção ProUni
(Dissertação)
Como se chega ou como nos tornamos docentes
no Ensino Superior (Tese)
Campo educacional e representação social da
formação docente: o olhar dos agentes
(Dissertação)
A Formação docente no fazer e refazer da prática
pedagógica (Tese)
oferecidos pela UFRN.
Estudar os elementos de constituição identitária dos licenciandos do Curso de
Pedagogia da UFRN, na intenção de caracterizar as representações sociais
manifestadas por esses alunos sobre o trabalho do professor, identificando os
elementos que definem tais representações (o conhecimento do conteúdo destas) e
compreendendo a forma dinâmica da organização desses elementos.
Analisar a configuração que a política nacional de avaliação para o ensino superior
vem assumindo na UFRN.
Investigar os sentidos atribuídos por estudantes estagiários à relação entre as
Ciências da Educação e a prática pedagógica.
Analisar a prática avaliativa e os instrumentos de avaliação disponíveis no ambiente
virtual de aprendizagem (AVA), utilizados pelos professores formadores na
avaliação da aprendizagem dos conteúdos oferecidos pelo curso em referência.
Compreender o processo de construção identitária de pedagogos e pedagogas em
formação inicial.
Acessar e compreender as Representações Sociais (RS).(MOSCOVICI, 2003) sobre
Física e Química para os grupos de licenciandos destes cursos, como também suas
Representações Sociais sobre o Ensinar .
Investigar quais são os elementos facilitadores da articulação teoria-prática nos
procedimentos metodológicos do curso, embasados em Paulo Freire
Investigar as concepções de alunos do Curso de Pedagogia da UFRN acerca da
natureza da ciência.
Investigar, sob a perspectiva de professores alfabetizadores licenciados em cursos de
Pedagogia, as contribuições e as lacunas teórico-práticas desses cursos, na formação
do pedagogo alfabetizador.
Conhecer e analisar as representações sociais (RS) de professor, partilhadas por
licenciandos, a partir de imagens desse profissional (fotografias de professores em
diversos níveis escolares e redes de ensino).
Descrever e analisar o processo de formação do professor de Matemática aluno da
licenciatura em Matemática no Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy
IFESP , em Natal-RN.
Identificar os conteúdos explorados nas questões das provas de múltipla escolha do
vestibular da UFRN para os quais os candidatos demonstraram dificuldade de
aprendizagem; analisar se a contextualização da questão e a presença de elementos
não-textuais influenciaram no aumento da dificuldade da questão e identificar os
erros mais freqüentemente cometidos pelos candidatos nessas provas.
Investigar os elementos que contribuem para desencadear o estresse no exercício da
docência universitária e conhecer as estratégias adotadas pelos professores para
enfrentar as situações estressantes, a fim de promover o desenvolvimento da
resiliência e um exercício saudável do ofício.
Identificar as contribuições e entraves, durante a formação inicial de professores de
Química, na UFRN, em relação à construção de saberes que subsidiem os
licenciandos na elaboração de atividades de ensino que envolvam a utilização de
modelos.
Identificar as representações sociais de universidade entre os sujeitos investigados
Estuda a existência do ensino vivencial, no âmbito do Ensino Superior, pautado na
vivência e no campo (auto) formativo como um suporte teórico-metodológico
presente nas salas de aulas,
Pontuar as principais discussões que permeiam a formação docente, pautadas na
visão de autores da atualidade.
Analisou ações formativas desenvolvidas pelo Grupo de Estudos de Prática
Educativas em Movimento (GEPEM) - UFRN,
245
A política de formação inicial de professores e a
implementação do componente curricular Prática
Profissional na Licenciatura de Geografia do
CEFET-RN (Dissertação)
A fábrica de professores e a padronização do
conhecimento (Tese)
O Probásica e a formação de professores no Pólo
de Parnamirim: política de formação profissional
no Rio Grande do Norte? (Dissertação)
O percurso formativo do Programa de PósGraduação em Educação da UFRN: a trajetória
dos egressos mestres e doutores no período 1981
a 2005 (Dissertação)
A Inclusão da pessoa com deficiência visual na
UFRN:
a
percepção
dos
acadêmicos
(Dissertação)
O dia mais feliz da minha vida: a entrada na
universidade segundo os alunos recém-ingressos
no curso de Pedagogia da UFRN (2004.1)
(dissertação)
Universidade e educação ambiental (tese)
Historiando a política de formação
professores em serviço da UFRN (tese)
de
Analisar a implementação da política de formação inicial de professores, tomando
como campo empírico o CEFET RN, e como referência o curso de Licenciatura em
Geografia, mais especificamente o componente curricular prática profissional.
Discute a tensão ambígua entre os conhecimentos que o professor adquire na sua
formação e as práticas docentes concretas a partir dessas experiências
Identificar e analisar a contribuição desta política de formação inicial para a
formação profissional de professores.
Procura tornar público e revelar, interna e externamente o alcance que o PPGEd tem
assumido como importante centro de formação de pesquisadores em educação.
Analisar como vem se processando a inclusão das pessoas com deficiência visual na
UFRN,
Compreender o momento de entrada na universidade a partir das falas de doze
estudantes recém-ingressos no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Objetivou, ainda, analisar a relação entre a escola de origem e a
entrada na universidade e a relação entre a universidade e o novo aluno
universitário.
Apontar elementos que demonstrem os conflitos, estrangulamentos, distanciamento e
avanços na inter-relação entre a universidade e a questão ambiental.
Revelar, numa abordagem sócio-histórica, a forma como a legislação educacional
brasileira sobre a formação de professores para as séries iniciais educação básica
expressa a política do Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, como o PROBÁSICA
significa uma resposta da UFRN a esta política.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
As teses e dissertações elencadas acima utilizam tanto dados primários como
secundários no que se refere à fase de recolha. Ao utilizarem dados primários, os principais
sujeitos das pesquisas são docentes universitários e dos Institutos Federais, professores da
rede pública estadual e municipal, gestores, discentes dos cursos de licenciatura, bacharelado
e graduação tecnológica e, também, egressos do ensino superior. Quanto aos dados
secundários, destacam-se fontes bibliográficas e documentais, inclusive documentos
específicos elaborados por aqueles que integram os lócus da pesquisa, como projetos
pedagógicos, regimentos, entre outros.
As publicações com objeto de estudo – a expansão e a reestruturação dos cursos e
das instituições – trazem como principais resultados e discussões: a relação entre essa
expansão e o período político específico do país, através do qual foi possível ampliar não
apenas quantitativamente os cursos ofertados e o número de estudantes atendidos, mas
também se configurou como uma oportunidade de acesso dos estudantes da capital e do
interior do país; a preocupação com a inclusão desses estudantes e também daqueles públicoalvo da Educação especial; a demanda por formação pedagógica dos professores para atender
às necessidades específicas dos educandos, as mudanças na concepção de gestão, organizada
com base em metas, indicadores de desempenho e avaliação vinculada ao repasse de recursos,
246
o alcance e a dimensão social dessa expansão e reestruturação ao proporcionar acesso,
desenvolvimento geográfico e qualificação para o mundo do trabalho.
Já as publicações com objeto de estudo – as políticas e ações para a inclusão dos
estudantes público-alvo da Educação Especial – trazem como principais resultados e
discussões: a distribuição intra-institucional das responsabilidades junto ao processo de
inclusão dos estudantes com deficiência; a formação continuada do docente e a preocupação
institucional em apresentar nas políticas fatores para a promoção da inclusão e acessibilidade;
a reestruturação e reformulação das políticas e das ações afirmativas; o papel dos núcleos de
acessibilidade nas instituições de ensino como um avanço para a efetivação das políticas de
inclusão destes alunos no ensino superior, com vistas à garantia da democratização do ensino
a partir do direito de todos à educação.
Por sua vez, as publicações com objeto de estudo – as lacunas e dificuldades dos
estudantes ingressantes no ensino superior – trazem como principais resultados e
discussões: dificuldades específicas dos estudantes, por exemplo, na elaboração e produção de
textos argumentativos, dificuldades de leitura de textos; a necessidade de capacitação e
aperfeiçoamento dos professores para lidarem com essas dificuldades. As demandas
educacionais mais requisitadas, além do acompanhamento técnico educacional, estiveram na
adaptação de materiais e na solicitação de auxílios financeiros. Como fatores facilitadores
para a permanência, encontraram-se as ações para inclusão; a colaboração de amigos,
professores e demais servidores; a oferta de auxílios e recursos pedagógicos e financeiros.
Como aspectos limitadores, destacaram-se o desconhecimento por parte do discente dos
auxílios/recursos e normativas disponibilizadas pela instituição para a permanência; falhas no
fluxo de troca de informações sobre ações para inclusão e o desafio desses estudantes em
permanecerem nos cursos.
As publicações com objeto de estudo – características e dificuldades da formação
específica dos estudantes nos diferentes cursos de graduação – trazem como principais
resultados e discussões: a importância da experiência formativa e das consequências sobre o
ensino e aprendizagem nas diferentes áreas no Ensino Superior.
As publicações com objeto de estudo – a constituição da identidade e do ser docente
universitário – trazem como principais resultados e discussões: necessidade de
aprofundamento da formação pedagógica dos docentes; a importância do saber da
experiência; o ser professor atrelado ao tornar-se professor em sua prática cotidiana; o desafio
do ser docente relacionado à luta por seus direitos; a busca por educação permanente e por
reconhecimento social.
247
As publicações com objeto de estudo – acesso, permanência e evasão dos estudantes
no Ensino Superior – trazem como principais resultados e discussões: a necessidade de uma
formação que de fato prepare o discente para se inserir no mercado de trabalho, com as
competências e habilidades exigidas pela profissão; e as implicações da relação entre os
cursos escolhidos, os estudantes, os professores, as instituições de ensino e o que elas
oferecem aos discentes para o sucesso ou fracasso acadêmico.
As publicações com objeto de estudo – egressos do Ensino Superior – trazem como
principais resultados e discussões: constituição e maior articulação e efetividade das políticas
institucionais de acompanhamento de egressos.
As publicações com objeto de estudo – o currículo no Ensino Superior – trazem
como principais resultados e discussões: a regulação das dinâmicas em torno da organização
curricular pela construção cultural do currículo e pela própria prática pedagógica; a
reestruturação do currículo levando-se em conta maior equilíbrio entre as dimensões
pedagógica, didática, tecnológica e científica, de modo a favorecer a formação e também o
desenvolvimento profissional docente.
As publicações com objeto de estudo – a socialização acadêmica e a construção da
identidade do discente no Ensino Superior – trazem como principais resultados e
discussões: a não implicação das particularidades de cada graduação para o maior ou menor
grau de socialização do estudante; a socialização e a solidariedade como necessidade para a
sobrevivência acadêmica; e a solidão como possível fator de exclusão.
As publicações com objeto de estudo – o Ensino Superior e a Educação à Distância
– trazem como principais resultados e discussões: a escolha pelo curso e a modalidade como
possibilitadores de uma flexibilidade de tempo para realização do curso, como alternativa a
modalidade presencial tradicional; a exigência para que os estudantes se articulem em virtude
da necessidade de adaptação a um modelo de ensino-aprendizagem amparado em aportes
tecnológicos, digitais e novos meios de informação e comunicação aos quais não estavam
familiarizados; o papel de mediação dos tutores na superação dos desafios.
As publicações com objeto de estudo – o Ensino Superior e a Internacionalização –
trazem como principais resultados e discussões: a importância da internacionalização no
âmbito das instituições de ensino superior, principalmente no que diz respeito ao
desenvolvimento do ensino, à troca de conhecimentos e o contato com uma cultura diferente.
As publicações com objeto de estudo – a Formação docente no e para o Ensino
Superior – trazem como principais resultados e discussões: as lacunas da formação inicial, a
248
necessidade de formação pedagógica para os docentes do ensino superior, a formação
continuada.
Considerações finais
A análise das teses e dissertações produzidas no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no período de 1998 a 2019, nos
possibilitou um olhar para o ensino superior vinculado à constituição de sociedade. O que
remete a uma produção acadêmica de interesses diversificados, mas ao mesmo tempo
atravessada pela temática da formação. Uma formação que apresenta deficiências na
efetivação do processo de ensino-aprendizagem na Educação Básica, de forma a permitir aos
seus
egressos
uma
continuidade
no
percurso
acadêmico
no
ensino
superior,
concomitantemente em que relata lacunas na formação docente no e para o ensino superior.
Ao mesmo tempo em que se constitui uma educação para o desenvolvimento, reconhecendo a
importância da internacionalização nas trocas de saberes e investe na inclusão de estudantes
para uma educação inclusiva como uma ideia de futuro.
Como contribuições para a discussão sobre a temática do Ensino Superior, as
publicações do PPGEd trazem à tona uma problematização crítico-reflexiva sobre a carência
pedagógica na dos professores que atuam nesse nível de ensino, assim como salientam a
diversidade de questões inerentes à pedagogia universitária, cada uma com especificidades
que demandam significativa atenção, a fim de que sejam assegurados a qualidade acadêmica,
a continuidade do aumento do ingresso e da permanência dos estudantes, a redução da evasão,
a melhoria da gestão democrática nas instituições de ensino de nível superior e a qualidade de
vida e de trabalho dos professores.
Um destaque relevante das teses e dissertações publicadas deve-se à atenção
dedicada à problemática da Educação Especial no Ensino Superior, não apenas
quantitativamente, mas qualitativamente, boa parte das publicações estão voltadas para essa
discussão e apresentam considerações significativas para a superação das dificuldades
vivenciadas por esses estudantes. Por sua vez, como lacunas nas teses e publicações
analisadas observa-se uma escassez e/ou insuficiência de publicações no programa que
discutam a avaliação no ensino superior.
249
Referências
Almeida, Wilson Mesquita de. ACESSO À UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA:
posições em disputa. In Revista do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE. v.
2,
n.
18,
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Disponível
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Acesso
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29/04/2020.
CHAUÍ, Marilena de Souza, Modernização versus democracia. In Escritos sobre a
universidade. São Paulo: Editora UNESP, 2001. (p. 73-113).
Martins, Antonio Carlos Pereira. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais.
Acta
Cir.
Bras. v.17 supl.3 São
Paulo 2002.
Disponível
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<https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-86502002000900001>
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Programa de Pós-Graduação
em
Educação.
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Institucional.
Disponível
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<
http://repositorio.ufrn.br:8080/jspui/handle/123456789/11945/simplesearch?query=educa%C3%A7%C3%A3o+superior&sort_by=dc.date.issued_dt&order=desc
&rpp=100&etal=0&start=0>. Acesso em 17 02 2020.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Centro de Educação.
Programa de Pós-Graduação em Educação. Regimento interno. 2020.
250
13.FORMACIÓN CONTINUA INTENSIVA A NIVEL DE
POSGRADOS INTERNACIONALES EN EDUCACIÓN SUPERIOR
E INCLUSIÓN EN UNA UNIVERSIDAD PRIVADA DE
PARAGUAY
Javier Numan Caballero Merlo42
Resumen
El objetivo es mostrar la inclusión de alumnos brasileños en los posgrados internacionales en
educación ofertados por una universidad privada paraguaya. Considerando desde la
gobernanza institucional la dimensión social de los estudiantes para la oferta de la modalidad
de enseñanza-aprendizaje intensiva (concentración de horas-aula presenciales en módulos
semanales) e innovadora (aplicación del e-learning y de pautas didáctico-pedagógicas activas,
participativas y colaborativas) posibilitando su formación continua de manera internacional.
Esto, desde el paradigma pragmático (mixto) y el método de investigación evaluativa, no
experimental, según los datos descriptivos secundarios proporcionados por la universidad y de
los resultantes del cuestionario aplicado dentro del marco de la participación de la
Universidad Autónoma de Asunción (UAA) en el proyecto TO-INN From Tradition to
Innovation in Teacher Training Institutions (https://www.toinn.org/). Los resultados indican
que los posgrados internacionales se realizan en mayor medida por estudiantes brasileños; la
inclusión mayoritaria femenina en la matricula; la mayoría de los/as estudiantes trabaja para
costearse sus estudios y tiene dependientes a su cargo; la inclusión permite acceder a un
capital educativo-cultural superior respecto a sus padres; la participación mayoritaria en
actividades asociadas al uso de tecnologías de la información, esenciales para desarrollar la
modalidad intensiva de formación continua. La conclusión principal es que la estrategia
didáctico-pedagógica intensiva de posgraduación en educación permite la inclusión educativa
de alumnos/as brasileños, así como su movilidad individual meritocrática.
42
Posdoctorado en el Instituto de Investigación en Educación de la Universidad de Barcelona (UB). Agencia de
Financiación: Programa Nacional de Becas de Postgrado en el Exterior “Don Carlos Antonio López” (BECAL;
https://www.becal.gov.py/). Docente-Investigador por la Escuela de Posgrado (EP) de la Universidad del Este
(UNE). Doctor en Ciencias Humanas y Sociales (UNaM-Argentina), Licenciado en Sociología (UDELARUruguay), Magíster en Sociología (UFRGS-Brasil). Pos Graduado en Derechos Humanos y Ciudadanía (IDHCosta Rica); y, en Didáctica Universitaria (UFRGS-Brasil) y (UCA-Paraguay). Investigador Categorizado
(PRONII-CONACYT). Miembro de Consejos de Redacción de Revistas Nacionales e Internacionales en
ciencias sociales y autor de diversos libros, artículos y ensayos. Líneas de investigación: Docencia e
Investigación en Historia Sociológica de la Sociología en Paraguay; Inclusión, equidad y cohesión social en
educación superior. Contacto: javiernuman18@hotmail.com.
251
Palabras clave: Dimensión social. Posgraduación. Modalidad Intensiva. Inclusión.
INTENSIVE CONTINUOUS TRAINING AT THE INTERNATIONAL
POSTGRADUATE LEVEL IN HIGHER EDUCATION AND INCLUSION
IN A PRIVATE UNIVERSITY IN PARAGUAY
Abstract
The objective is to show the inclusion of Brazilian students in the international postgraduate
courses in education offered by a Paraguayan private university. Considering from the
institutional governance the social dimension of the students for the offer of the intensive
teaching-learning modality (concentration of classroom hours-face-to-face in weekly
modules) and innovative (application of e-learning and active, participatory didacticpedagogical guidelines and collaborative) enabling their continuous training in an
international manner.
This, from the pragmatic paradigm (mixed) and the non-experimental evaluative research
method, according to the secondary descriptive data provided by the university and the results
of the questionnaire applied within the framework of the participation of the Autonomous
University of Asunción (UAA) in the TO-INN From Tradition to Innovation in Teacher
Training Institutions Project (https://www.toinn.org/).
The results indicate that the international postgraduate studies are carried out to a greater
extent by Brazilian students; the majority inclusion is female in the enrollment; most of the
students work to pay for their studies and have assistants in their post; the inclusion allows
access to a higher educational-cultural capital in comparison to their parents; the majority
participation in activities associated with the use of information technologies, essential to
develop the intensive modality of continuous training.
The main conclusion is that the intensive postgraduate educational pedagogical strategy in
education allows the educational inclusion of Brazilian students, as well as their meritocratic
individual mobility.
Keywords: Social dimension. Postgraduation. Intensive mode. Inclusion.
252
I.
Introducción: el problema
Vale hacer explícito desde el inicio que no es el objetivo del artículo adentrarse en el sistema
de educación superior en el Brasil, y las consecuencias de su política educativa respecto del
acceso dentro del marco de la formación continua de sus egresados, a niveles sucesivos de pos
graduación en el área de educación. Se toma como situación de origen que contingentes de
graduados en diversas áreas e instituciones de educación superior de ese país, busquen
acceder a cursos internacionales intensivos en los países limítrofes, entre ellos, Paraguay. Para
poder desarrollar su formación continua con diversos fines: ganar más dinero al mejorar su
categorización al poseer un título de posgrado, para mejorar su jubilación futura, actualizar
sus conocimientos, certificaciones para garantizar su permanencia laboral que sus
instituciones exigen sin habilitar las condiciones y medios al efecto. Las dificultades y/o
limitaciones de diversos tipos: para encarar exámenes de ingreso competitivos, los pocos
cupos de acceso respecto a la demanda, los altos costos de la preparación al efecto, las
condiciones de sus trayectorias académicas, las matrículas y cuotas de las universidades
privadas de elite, la carga horaria de su actividad principal que no da margen a estudiar
paralelamente con niveles de exigencia, etc.; ha producido que se genere una extraña oferta
internacional regional en el MERCOSUR que se alimenta de esta demanda de posgrados por
los graduados brasileños, a los que no pueden acceder en su país de residencia, donde además,
desempeñan sus actividades laborales.
El acceso internacional a la formación continua a nivel de posgrados, a través de la modalidad
intensiva, genera un tipo particular de inclusión, que garantiza un acceso universal, más
económico y menos exigente que en su país de procedencia, con carreras sin embargo
acreditadas (www.uaa.edu.py/postgradoUAA). Estas se desarrollan en un periodo de 1 a 2
años de cursado, contemplando dos o tres semanas presenciales en los meses de enero y julio,
con una carga horaria por módulo variable; pudiendo tener dos materias por día, o una
semanal, de lunes a viernes, dependiendo del curso, su plan de estudios y malla curricular.
Así, accesible en el sitio web institucional, pueden leerse los requisitos para inscribirse en este
tipo de posgrados, sean de maestría, doctorado o posdoctorado con la modalidad descripta
(www.uaa.edu.py/postgradoUAA).
Para Maestría Internacional en Ciencias de la Educación (Tratamiento MERCOSUR):
253
Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por
escribanía Paraguaya.
Fotocopia del título de GRADO, legalizado por el MEC y autenticado por escribanía.
Certificado de estudio Original, legalizado por el MEC y autenticado por escribanía.
Doctorado Internacional en Ciencias de la Educación (Tratamiento MERCOSUR):
Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por
escribanía Paraguaya.
Copia del documento de Identidad autenticado por escribanía Paraguaya.
La fotocopia del título de Máster Stricto Sensu y el Certificado de estudio Original,
que acredite como mínimo 700hs. que deben reunir las siguientes exigencias:
•
Apostillado por convenio de la Haya (trámite en el país de origen).
•
La copia del título debe estar autenticado por escribanía Paraguaya.
•
Traer título original para trámites.
Posdoctorado Internacional en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una
Sociedad Inclusiva (Tratamiento MERCOSUR):
Copia de la Visa de Residencia Temporal o Visa Permanente, autenticado por
escribanía Paraguaya.
Copia del documento de identidad autenticado por escribanía Paraguaya.
La fotocopia del título de Doctor y el certificado de estudio Original, que acredite
como mínimo 1.200hs. que deben reunir las siguientes exigencias:
•
Apostillado por convenio de la Haya (trámite en el país de origen).
•
La copia del título debe estar autenticado por escribanía Paraguaya.
•
Traer título original para trámites.
Así, los datos sobre la dimensión social de los participantes de estos cursos de pos-graduación
intensiva se transforman en una fuente muy rica de validación de este tipo de estrategias
pedagógicas que viabilizan el acceso masivo a estudiantes que de otra manera no lo podrían
hacer, al menos en su país de origen. Al tiempo de posibilitar mejorar su capital educativocultural respecto a su familia de origen.
La inclusión y la meritocracia se evidencian con los datos proporcionados por la encuesta
(https://www.toinn.org/), al tiempo que se abren puertas para fortalecer estos programas
modulares intensivos internacionales de formación continua. Poniendo asimismo su calidad
254
en debate, y la resignificación de los conceptos mismos de inclusión y meritocracia con las
limitaciones de estas buenas prácticas, igualmente parciales, y en cuestión.
Por todo lo dicho hasta aquí es que tanto la Ponencia aceptada para su presentación en la IV
Conferencia Internacional de Aprendizaje y Enseñanza en la Educación Superior (Évora,
Portugal 2020), y el presente artículo, se inscriben dentro de la temática de la Inclusión
Educativa y Bienestar.
El instrumento del cuestionario del Proyecto TO-INN como herramienta para la UAA
TO-INN, “From Tradition to Innovation in Teacher Training Institutions”, ha sido un
proyecto desarrollado por un consorcio de universidades europeas y latinoamericanas y el
grupo de investigación FODIP de la Facultad de Educación de la Universidad de Barcelona.
Veintidós instituciones de educación superior (ES) y un centro de formación de siete países de
América Latina (Colombia, Argentina, Honduras, México, Ecuador, Bolivia y Paraguay) y
cinco países de la UE (España, Italia, Holanda, Portugal y Francia). En el marco del programa
Erasmus + Key Action 2- Capacity building in the field of Higher Education de la Unión
Europea (2016-2019). (TO-INN, 2018a). Que se propuso impulsar el desarrollo a través de la
educación, la formación docente, y la inclusión (2014-2020), fomentando la movilidad
internacional y la cooperación educativa entre países. (TO-INN, 2018b). La Encuesta TO INN
a estudiantes es uno de los productos de su ejecución, comprometido con la articulación de la
dimensión social con la pertinencia social y curricular, y la innovación.
Por su parte, la (UAA) es una de las universidades locales privadas en Paraguay que forma
parte del proyecto, y en la que se aplicó dicho cuestionario. La (UAA) tuvo su origen en la
Escuela Superior de Administración de Empresas (ESAE) en el año 1978. Constituyéndose
como asociación civil sin fines de lucro, con la misión de producir y difundir el conocimiento.
Reconocida como institución de educación superior (IES) a través del Decreto del Poder
Ejecutivo N° 11.615, con fecha 14 de noviembre de 1991, que autoriza el funcionamiento de
la UAA. (Caballero, et al., 2018). La misma ofrece bajo esta modalidad intensiva
internacional los cursos de Maestría en Ciencias de la Educación, de dos años de duración
(www.uaa.edu.py/carreras/maestria-cienicas-educacion), de Doctorado en Ciencias de la
Educación (www.uaa.edu.py/carreras/doctorado-ciencias-educacion) también de dos años de
duración, y, de Posdoctorado en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una
255
Sociedad Inclusiva, de un año de duración (www.uaa.edu.py/carreras/postdoctoradoliderazgo-educativa-sociedad-inclusiva).
Objetivos y metodología
El objetivo general ha sido analizar la dimensión social de los estudiantes de posgrados
internacionales modalidad intensiva en educación de la (UAA) como estrategia para su
inclusión meritocrática.
Los objetivos específicos son:
a) Describir dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión de una
mayoría de alumnos de brasileños en cursos de post grado en educación
abiertos al efecto;
b) Exponer los datos de ciertas dimensiones, ítems o variables que confirmen la
inclusión de género, de estudiantes trabajadores y/o con dependientes a su
cargo;
c) Analizar los datos respecto si opera un proceso de apropiación progresiva de
capital educativo-cultural de manera meritocrática, respecto al de partida u
origen familiar;
d) Mostar el uso frecuente a internet, aparatos y aplicativos que son necesarios
para desarrollar las pedagogías activas que permiten el e-learning para
desarrollar la modalidad intensiva modular de formación continua;
e) Asociar la modalidad intensiva modular de formación continua internacional
como una estrategia que posibilita la inclusión meritocrática.
Esto, según datos secundarios proporcionados por la institución respecto a sus programas
intensivos internacionales desarrollados como modalidad y tiempos para alumnos
provenientes de la República Federativa del Brasil. Y, por los datos descriptivos del informe
del cuestionario aplicado dentro del marco de la participación en el proyecto TO-INN
(https://www.toinn.org/; Caballero, 2019a). Según cuatro ítems generales con sub-ítems
respecto a variables escalares, categóricas y abiertas del cuestionario que más abajo se
detallan. Estos son, sintéticamente cuatro: (1) Datos sociodemográficos (Básicos y
256
Parentales): sexo, personas dependientes y situación familiar (estudio y trabajo de los padres);
(2) Datos universitarios: el país de procedencia de los estudiantes, el curso al que están
adscritos, la vía de acceso, etc.; (3). Vida y participación académica y social: escolarización
previa, cambio de población, tiempo de desplazamiento, residencia, calidad de la residencia,
tipología de estudiante; motivo si trabaja, dificultad del trabajo, ingresos; entre otros; y, (4)
Ámbito motivacional y expectativas de futuro: motivos para el estudio, intereses personales y
ocio.
La metodología propuesta se enmarcó dentro de la orientación del paradigma pragmático
(mixto) y el método de investigación evaluativa, no experimental. El estudio de la dimensión
social a través del instrumento del cuestionario proporciona un abanico amplio de datos sobre
los/las estudiantes de formación continua en educación, vinculantes con el problema y los
objetivos aquí abordados. Lo cual es fundamental al momento de la toma de decisiones
institucionales y como insumo a las políticas universitarias o gobernanza, tal como la oferta
de posgrados internacionales de modalidad intensiva y modular.
Dimensión social del alumnado de posgrados internacionales y la modalidad intensiva
La UAA tiene la particularidad institucional de no dictar cursos de formación de maestros
para la escuela, de profesores para la educación media o de Licenciados en Ciencias de la
Educación. Sin embargo, su oferta institucional se dirige a la formación continua de posgrado
en educación, constituyendo una particularidad. De esta manera, a nivel nacional ofrece como
posgrado
profesionalizante
la
Especialización
en
Didáctica
(www.uaa.edu.py/postgradoUAA#masteres); mientras, como internacionales, la Maestría en
Ciencias
de
la
Educación
(www.uaa.edu.py/carreras/maestria-cienicas-educacion),
el
Doctorado en Ciencias de la Educación (www.uaa.edu.py/carreras/doctorado-cienciaseducacion) y el Posdoctorado en Liderazgo para la Gestión e Innovación Educativa en una
Sociedad Inclusiva (www.uaa.edu.py/carreras/postdoctorado-liderazgo-educativa-sociedadinclusiva ). Si bien a los mismos también se les permite acceder no sólo a los alumnos
brasileños, aunque se hayan desarrollado para captar el volumen de su demanda, sino
también a alumnos nacionales (Universidad Nacional de Asunción, UNA; UAA) y extranjeros
con Tratamiento Mercosur y Sin Tratamiento Mercosur, con Requisitos de Admisión para los
Programas de Postgrado diversos, aunque de tipo documental administrativo, sin pruebas de
ingreso o cursos de nivelación (https://www.uaa.edu.py/postgradoUAA#masteres).
257
Constituyendo la demanda del alumnado brasileño por cursos de posgrado internacionales
intensivos y modulares en ciencias de la educación un target específico que tuvo y es
considerado de manera sistemática por la gobernanza institucional que orienta a la UAA,
garantizando en su oferta la pertinencia social, curricular y sus programas de formación
(planes de estudios, mallas curriculares, modalidades). (Caballero, 2018).
Esto no es casual, sino que forma parte de una política intencional de la institución de
participación sostenida desde el año 2010 en Proyectos de Cooperación en Redes
Internacionales en educación. Dando continuidad a las dimensiones y ejes desarrollados
conjuntamente desde el Proyecto ALFA III, RIAIPE 3: El Programa Marco Interuniversitario
para una Política de la Equidad y la Cohesión Social en la Educación Superior (2010-2013).
Y, más recientemente (2016-2019), desde el Proyecto TO-INN, “From Tradition to
Innovation in Teacher Training Institutions”. A fin de diagnosticar, evaluar y proponer
alternativas a los problemas de desigualdad social y educativa en Paraguay y América Latina
desde la Educación Superior, fomentando la formación docente, su inclusión, la movilidad
internacional y la cooperación educativa entre países. Con esta capacidad instalada, y en
desarrollo, la política institucional como gobernanza es la que permite articular lo académico
con lo social, posibilitando el engranaje entre la pertinencia social, curricular, y la innovación
didáctico-pedagógica.
Es a través de las Conferencias Mundiales sobre la Educación Superior de los años 1995,
1998, 2009 que la UNESCO introduce conceptualmente la categoría de pertinencia. Esta, en
principio, se definía funcionalmente como la adecuación entre las necesidades formativas de
la sociedad y los que las instituciones de educación superior ofrecen. De esta manera, su
evaluación dependería de un mayor o menor ensamble entre las demandas sociales y la oferta
curricular (TO-INN, 2018b). Lo que estos proyectos, red de socios, y la UAA en particular
comparten, es que tal adecuación y evaluación deben regirse por ciertos principios
norteadores como valores transversales tales como la igualdad entre géneros, la equidad y la
justicia social (Montané, 2018; TO-INN, 2018b). Haciendo que el sentido de su concepto
dentro del marco del proyecto haga referencia a la institución, a los programas universitarios y
a todos los proyectos de vinculación social. Se asume un concepto y práctica de pertinencia
curricular de los programas que ofrecen las diversas instituciones donde el currículo incluye
los intereses y demandas de los diversos contextos sociales, culturales y productivos en los
que se inserta (pertinencia social), así como a las necesidades de aprendizaje, de desarrollo
258
personal e intelectual de los/as estudiantes universitarios/as (pertinencia curricular) (TO-INN,
2018b).
Que se efectiviza considerando el perfil de los docentes para su mejor formación según su
existencia y experiencias vitales, así como la realidad de sus contextos socio-educativos
expresado en la pertinencia curricular, y la innovación facilitadora y multiplicadora.
(Caballero, 2018; Montané, 2018; TO-INN, 2018b). Esto es, la conexión necesaria entre los
aspectos de la dimensión social del alumnado, su realidad social, con su formación, y su
función social y profesional futura. La innovación desde una estrategia didáctico-pedagógica
intensiva, con el recurso del e-learning, el manejo de la plataforma Moodle, y de las
pedagogías activas, permiten la inclusión de este particular perfil de estudiantes brasileños,
junto con la una política institucional de ‘open access’.
Así, se reconoce un concepto amplio acerca de la dimensión social que explicita el
reconocimiento de la necesidad de conocer el perfil de los estudiantes según sus
características y condiciones sociales de existencia. Estos, como indicadores objetivos para
diseñar las políticas con un conocimiento real de su forma de vida y antecedentes en todas las
formas de capital, persiguiendo como meta implementar prácticas innovadoras que permitan
desarrollar de manera concreta una educación superior más equitativa e inclusiva. Al efecto,
el instrumento aplicado del cuestionario y los datos que orientan el diseño y constante
validación de estos programas internacionales intensivos. Datos con los cuales se propone y
desarrolla una formación que contempla la historia de vida estructural y la experiencia, que
enmarcan la definición de los procesos de enseñanza-aprendizaje y de innovación, de manera
inclusiva.
La dimensión social se torna en un eje clave para la inclusión, posibilitando el acceso, la
permanencia y el éxito académico de los estudiantes, para el caso, de los brasileños que
necesitan una modalidad innovadora, intensiva, con pedagogías activas que permitan su
egreso con defensa de tesis y título, calificándose y posicionándose con un capital educativo
cultural superior al de origen alcanzado meritocráticamente. Esto, en un contexto
contradictorio de democratización en el acceso a las universidades que sin embargo continúa
conviviendo con las desigualdades y diferencias del mismo. La dimensión social promueve
así la cohesión social, la reducción gradual meritocrática de las desigualdades y mejora de la
calidad del nivel de conocimiento, habilidades y competencias.
259
Presentación de resultados
De acuerdo al problema construido, así como los objetivos generales y específicos, se tiene
que:
a) Describir dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión de una mayoría de
alumnos extranjeros en cursos de post grado en educación abiertos al efecto.
Considerando los datos secundarios proporcionados por la Dirección de Posgrado de la
(UAA), respecto a sus programas de Posgrado Internacionales en Educación para alumnos
extranjeros, fundamentalmente de brasileños, por ello lo de (Tratamiento MERCOSUR) antes
expuestos en los requisitos de ingreso, pero de open access a una diversa minoría distribuida
entre colombianos, angoleños, mexicanos y hasta de paraguayos, se tiene que para el período
2018-2019 la cantidad de participantes se ha distribuido de la siguiente manera: Maestría en
Ciencias de la Educación, con 234 de alumnos/as; Doctorado en Ciencias de la Educación,
con 82 cursantes, y en el Postdoctorado en Gestión en Innovación Educativa, con 9
participantes. Dando un subtotal de 325 estudiantes de posgrado en el bienio de referencia, los
cuales constituyen buena parte del universo encuestado. Asimismo, teniendo en cuenta los
programas de Posgrado Nacionales en Educación para el mismo bienio, donde la cantidad de
participantes de la Especialización en Didáctica Universitaria ha sido de 112 alumnos/as. La
suma de ambos subtotales supone 437 estudiantes, de cuyo universo forman parte los 359
participantes efectivamente encuestados.
En el ítem general Datos universitarios, sub ítem Estudios en curso, el resumen del perfil
académico coincide con el ya definido en contexto del problema que nos interroga, el que la
universidad desarrolle cursos de educación sólo en posgrados y mayoritariamente de carácter
internacional, modalidad intensiva, pensada para captar a los/as candidatos/as brasileños que
buscan formación continua en el área (Caballero, 2019a; Caballero, et al., 2018; Caballero y
Báez, 2019). Así puede comprenderse situadamente que a la pregunta acerca de «Qué estudios
está cursando actualmente», las respuestas válidas mayoritarias se hallan distribuido de la
siguiente forma: Máster, Maestría o Magister en el campo de la Educación, en un número de
180 y un porcentaje de 50,1 %; para Posgrado y cursos/capacitaciones de especializaciones en
educación, en 69 casos (y un porcentaje de 18,2 %); y, Doctorado relacionado con la
Educación, en 54 respuestas (y un porcentaje de 15 %). Acumulando un 84,2 % sobre 100 %
del porcentaje válido, y 303 respuestas sobre un total de 359. Confluyendo los datos
secundarios con los primarios respecto a la procedencia y para qué cursos se matriculan.
260
Lo que acompaña también las respuestas a la pregunta acerca de si «Estos estudios son los
primeros que cursa en el ámbito de la Educación», con 225 casos que responden que no (con
un porcentaje de 62,7 %). Ratificando el interés central por la formación continua en
posgrados en educación. Asimismo, en el sub ítem que consulta ¿Cuál es la duración en años
de su programa formativo?, 311 responde que en cursos de hasta 2 años (un porcentaje
acumulado de 86,6 %). Una vez más cerrando con la duración promedio de cursos de
posgrados en los que se han matriculado, mayormente de Maestrías. Los otros 48 casos (con
un porcentaje de 13,4 % acumulado), coinciden con los tiempos del Programa Doctoral y
Posdoctoral tal como ya visto con los datos secundarios.
Por otro lado, en otro sub ítem se pregunta Mediante qué proceso accedió a los estudios
universitarios que está cursando, se dan una serie de respuestas que coinciden con la
procedencia mayoritaria de alumnos brasileños dados los criterios de admisión a los
posgrados internacionales diseñados de manera intensiva y modular a tal efecto. Así, se puede
comprender contextualizadamente que la mayoritaria haya respondido que accedió a los
mismos presentando en 118 casos una Solicitud de incorporación (un porcentaje de 32,9 %);
en 61 casos que No hubo vía de selección (un porcentaje de 16 %); y, con 42 casos
Presentando el curriculum vitae (un porcentaje de 11,7 %). Sumando 221 casos (un
porcentaje de 62 %) que no tuvieron más requisitos que cumplir que aquellos que se han
presentado más arriba como parte de este tipo particular de acceso en cursos de posgrado
internacionales.
En la dimensión Vida y participación académica y social, respecto al ítem Situación
Residencial, la mayor parte de los y las participantes en la encuesta manifestaron con 254
respuestas que tienen fijada su residencia en un hotel (un porcentaje de 71 %). Lo cual
corrobora de manera indirecta la alta participación de alumnos extranjeros, fundamentalmente
brasileños.
De esta forma, tanto los datos secundarios proporcionados por la universidad –datos sobre los
posgrados y número de matriculados; documentos digitales sobre los criterios de admisión a
dichos cursos-, como los primarios proporcionados por el cuestionario, confirman el acceso
de una población mayoritariamente extranjera de estudiantes brasileños.
b) Exponer los datos de ciertas dimensiones, ítems o variables que confirmen la inclusión
según sexo, y de estudiantes trabajadores o con dependientes a su cargo.
261
En los Datos sociodemográficos, para la variable sexo, se tiene que 235 respuestas
corresponden a mujeres (un porcentaje de 65,5 %) y 124 a hombres (un porcentaje de 34,5
%). Lo que muestra el acceso e inclusión de la mujer como una categoría central entre otras
que hacen a las categorías de la diversidad que se propone desde la gobernanza institucional y
del Proyecto TO INN empoderar. Por tanto, se hace relevante que esto se refleje en la
matriculación según sexo.
Frente a la pregunta si Tiene personas dependientes a su cargo, 212 han respondido que sí (un
porcentajes del 59,1 %), mientras que 147 no (un porcentaje del 40,9 %). Esta variable es
relevante dentro de los/las que si los tienen, pues pude incidir en recursos tales como el
tiempo y los económicos necesarios para acceder como para llevar adelante su formación
continua. Lo que hace que dicha relación de dependencia dificulte su dedicación exclusiva a
su formación, incidiendo en la calidad de la misma, así como tal vez en su permanencia en el
sistema.
Desde la dimensión Vida y participación académica y social, se puede percibir esta vez la
inclusión de los/las estudiantes que trabajan al examinarse las respuestas según la Situación
laboral, particularmente a través de la pregunta acerca de Cuál de las siguientes situaciones
encajaría mejor con lo que está haciendo actualmente. Esto, porque en 152 casos han
respondido que realizan una actividad remunerada en un ámbito relacionado con sus estudios
(un porcentaje de 55 %) sobre los 276 que trabajan; excluyéndose de esta base las 73 en 349
válidas que responden: No realizó ninguna actividad remunerada. A los que también se deben
sumar aquellos estudiantes, con 124 respuestas (un porcentaje de 45 %), que desarrollan
alguna actividad remunerada pero en un ámbito no relacionado con sus estudios. Dando un
total de 276 alumnos trabajadores que de esta forma costean sus propias posibilidades de
continuar con su formación continua. Hay que destacar asimismo que, dentro de los/as que
realizan una actividad remunerada en un ámbito relacionado con sus estudios, 87 de estos
casos (un porcentaje de 32 %), lo hacen con una duración superior a 30 horas semanales.
Asimismo, todos/as aquellas personas que sí realizan una actividad remunerada, con diversos
niveles de dedicación, manifiestan que ésta interfiere en su formación continua, con una
media de 2,8, en una escala de 1 a 5 puntos.
Además, analizando el sub ítem Financiación de los Estudios, y las respuestas frente a la
cuestión «Cuál de las siguientes fuentes de ingreso contribuye en mayor medida a financiar
sus estudios», la forma más frecuente proviene del trabajo en 300 de los casos (un porcentaje
262
de 87,5 %). Claramente, la mayoría de los alumnos de que vienen a Paraguay a desarrollar sus
cursos internacionales de formación continua, hacen un gran esfuerzo en los meses de enero y
julio, para costear los mismos, con dependientes a su cargo y teniendo que trabajar, en
muchos casos con largas jornadas laborales.
c) Analizar los datos respecto si opera un proceso de apropiación progresiva de capital
educativo-cultural de manera meritocrática, respecto al de partida u origen familiar.
Se presentan algunos datos respecto al origen familiar de los estudiantes recogidos bajo el
ítem general Datos sociodemográficos, considerando el sub ítem de los Datos Parentales, a
través del perfil formativo (nivel de estudios más elevado) y profesional (ocupación actual) de
sus madres y padres; lo cual se compara con la situación actual de los educandos, y así seguir
el rastro de su trayectoria académica. Pudiendo deducir si han mejorado su capital cultural, y a
través de su estudio, de manera meritocrática.
Así, frente a la consulta sobre ¿Cuál es el nivel de estudios más elevado alcanzado por su
madre? 154 respuestas (un porcentaje del 42,9 %) señalan que Sin Estudios y Estudios
primarios o educación básica. Más otras 118 respuestas (un porcentaje de 32,9 %), respecto a
educación técnica y media, repartidas entre Formación técnica o profesional no universitaria,
Estudios secundarios no obligatorios (Bachillerato, ciclo o grado) y Estudios secundarios de
enseñanza media. Acumulando así, un sub total de 272 respuestas (un porcentaje del 75,8 %)
que hacen referencia a formación no universitaria de sus madres. El resto, que corresponde
sólo a 78 de las respuestas (un porcentaje de 21,7 %) hacen referencias a los Estudios de
doctorado; Estudios de posgrado –Máster, Magister, Maestría u Otros–; o Estudios de grado,
pregrado, licenciatura, diplomatura o ingeniería. Todo lo anterior constituye un importante
indicador respecto a que los/as estudiantes han superado meritocráticamente a través del
estudio, y de su trabajo, el capital educativo-cultural de sus madres.
Respecto a los padres, 163 respuestas (un porcentaje de 45,4 %) señalan que Sin Estudios y
Estudios primarios o educación básica. Más otras 115 respuestas (un porcentaje de 32,1 %),
respecto a educación técnica y media, repartidas entre Formación técnica o profesional no
universitaria, Estudios secundarios no obligatorios (Bachillerato, ciclo o grado) y Estudios
secundarios de enseñanza media. Acumulando así, un sub total de 278 respuestas (un
porcentaje del 77,5 %) que hacen referencia a formación no universitaria de sus padres. El
resto, que corresponde sólo a 60 de las respuestas (un porcentaje de 16,7 %), menor que para
las madres, hacen referencias a los Estudios de doctorado; Estudios de posgrado –Máster,
263
Magister, Maestría u Otros–; o Estudios de grado, pregrado, licenciatura, diplomatura o
ingeniería. Así como respecto a las madres, lo anterior constituye otro importante indicador
respecto a que los/as estudiantes han superado meritocráticamente a través del estudio, y de su
trabajo, el capital educativo-cultural de sus padres, aunque de forma más significativa.
Dentro del sub ítem de los Datos Parentales, también es importante para nuestro objetivo los
resultados respecto a la variable Ocupación de los progenitores; pues, constituyen marcas de
referencias objetivas para comparar con la de los estudiantes que se dedican a actividades
educativas en todos los casos.
Así, puede pueden verse que tan sólo 37 casos apuntan (un porcentaje del 10,3 %) a que sus
madres trabajen en algunas de las categorías que incluyen el ejercicio profesional, estas son
como Empresarios/as con asalariados/as, altos/as funcionarios/as, altos/as ejecutivos/as y
profesionales por cuenta propia; Profesionales y técnicos/as por cuenta ajena (empleados/as)
y cuadros medios.
El resto de las respuestas con 289 casos (un porcentaje de 80,6 %) se distribuyen entre los
demás indicadores: Comerciantes y pequeños/as empresarios/as no agrarios/as (sin
empleados/as); Agricultores/as (empresarios/as sin asalariados/as y miembros de
cooperativas); Personal administrativo, comercial y de servicios; Jubilados/as y pensionistas;
Parados/as (que han trabajado antes y en busca de su primer empleo); Trabajo doméstico no
remunerado; Trabajo doméstico remunerado; y, Situaciones no clasificables. Lo que muestra
que, en la mayoría de los casos, los/as pos-graduandos han superado la herencia educativacultural, y las actividades económicas de la ocupaciones de origen de sus madres, así como de
sus padres.
Mientas, para el caso de los padres Así, puede pueden verse que 52 casos apuntan (un
porcentaje del 14,5 %) a que sus padres, un poco más que sus madres, trabajen en algunas de
las categorías que incluyen el ejercicio profesional: Empresarios/as con asalariados/as,
altos/as funcionarios/as, altos/as ejecutivos/as y profesionales por cuenta propia; Profesionales
y técnicos/as por cuenta ajena (empleados/as) y cuadros medios.
El resto de las respuestas con 244 casos (un porcentaje de 68 %) se distribuyen entre los
demás indicadores: Comerciantes y pequeños/as empresarios/as no agrarios/as (sin
empleados/as);
Agricultores/as
(empresarios/as
sin
asalariados/as
y
miembros
de
cooperativas); Personal administrativo, comercial y de servicios; Jubilados/as y pensionistas;
264
Parados/as (que han trabajado antes y en busca de su primer empleo); Trabajo doméstico no
remunerado; Trabajo doméstico remunerado; y, Situaciones no clasificables. Lo que muestra
que, en la mayoría de los casos, al igual que con respecto a sus madres, los/as pos graduandos
han superado la herencia educativa-cultural, y las actividades económicas de la ocupaciones
de origen de sus padres y de ambos progenitores.
d) Mostar el uso frecuente de internet, aparatos y aplicativos que son necesarios para
desarrollar las pedagogías activas que permiten el e-learning para desarrollar la
modalidad intensiva modular de formación continua.
En el último de los ítems generales abordado en el cuestionario hace referencia al Ámbito
Motivacional, dentro del cual se examina el conocimiento de la actividad socio-cultural que
tienen los estudiantes. Para ello, dentro del sub ítem Intereses Personales y Ocio, se consulta
al respecto de Participar en foros, chats, blogs y redes en Internet. Este tópico es importante a
nuestros objetivos pues es una de las capacidades necesarias y a desarrollar como
competencia transversal en los cursos internacionales de formación continua modular
intensiva. Dado que esta modalidad exige trabajos en grupos, on line, presentación de avances
con el uso de las herramientas tecnológicas, dada la carga horaria intensiva que justamente
define esta estrategia didáctica-pedagógica de formación. Fundamento asimismo de la
educación a distancia o semi presencial con el uso del e-learning a través de plataforma
Moodle que es la que implementa la universidad, como buena práctica que a la vez de innovar
incluye.
Ante ello es de destacar que sólo 98 en 343 respuestas válidas (un porcentaje del 28.6 %)
casos responden que No lo hago nunca, mientras la mayoría expresa que con diversas
frecuencia Participar en foros, chats, blogs y redes en Internet, con 245 respuestas (un
porcentaje de 71.4 %). Lo que se condice con que todos los estudiantes cuenten con celular, o
computadoras portátiles, herramientas necesarias para esta modalidad de formación; y si no
poseen estas últimas, la institución les otorga computadoras portátiles durante sus actividades
en las semanas de lunes a viernes en turnos mañana y/o tarde dependiendo del módulo que se
trate, mientras estén dentro de la universidad, incluyendo sus aulas o en su Biblioteca. La
democratización de la inclusión se muestra tanto en el acceso a los posgrados como a los
recursos que requiere la innovación de la práctica didáctico-pedagógica de la modalidad
intensiva, para el caso, internacional.
265
e) Asociar la modalidad intensiva modular de formación continua internacional como
una forma de inclusión meritocrática.
Para este objetivo, se articula la modalidad intensiva modular de posgrados internacionales
previamente documentada por la UAA, con lo descrito en los sub apartados (a), (b) y (c) fruto
de la administración del cuestionario.
Para no repetirnos, logró mostrarse respecto al sub apartado (a) que: los datos secundarios
proporcionados por la universidad –datos sobre el área de los posgrados, sus niveles, y
número de matriculados; las referencias en documentos digitales en su sitio web institucional,
respecto a los criterios de admisión a dichos cursos, están diseñados (pertinencia curricular y
modalidad) a medida para la demanda de los estudiantes provenientes de Brasil que vienen a
cursarlos en su época de vacaciones en enero y julio, de cada año; así como los datos
primarios proporcionados por el cuestionario respecto a una búsqueda de formación continua
en el área de educación, combinando las variables estudios, acceso y situación residencial,
que confirman el acceso de una población mayoritariamente extranjera brasileña de
estudiantes. Respecto al sub apartado (b) se pudo probar la inclusión según sexo, con una
mayoría femenina en la matriculación de cursos de formación continua internacionales en
educación ofertados por la UAA; una de las variables importantes al hablar de la diversidad
de género, en términos tanto de acceso como de inclusión, haciendo que la condición por sexo
no sea restrictiva. Asimismo de estudiantes que en su mayoría según su situación laboral
trabajan, trabajar constituye la fuente principal para la financiación de sus estudios, y que
tienen además dependientes a su cargo. Y que por tanto, aun con estas limitaciones, y las que
se detallan en (c), sin embargo de manera individual continúan con su formación académica.
Por su parte, en referencia al sub apartado (c) Datos Sociodemográficos, considerando el sub
ítem de los Datos Parentales, a través del perfil formativo (nivel de estudios más elevado),
profesional (ocupación actual) se puede apreciar que tanto por los niveles de estudio de los
progenitores como por la ocupación de los mismos, los estudiantes que desarrollan sus cursos
de posgrados provienen en forma mayoritaria de hogares humildes, superando las condiciones
socio-económicas y educativas-culturales de origen. Permitiendo una movilidad individual
parcial en base al acceso e inclusión en procesos meritocráticos educativos-culturales.
266
Concluyendo
Las desigualdades y diferencias sociales, reconocidas o no, individuales o estructurales,
históricas o coyunturales, nos desafían a su consideración o no respecto al acceso también a
la formación continua en el ámbito de los posgrados, sean especializaciones, maestrías o
doctorados en el área de educación superior.
La posibilidad del acceso a la formación continua, dentro de la diversidad con una mayoría
femenina, de estudiantes que trabajan para costear sus estudios, y meritocráticamente,
superando el nivel educativo de sus progenitores, garantiza la inclusión a muchos/as
educadores/as que no pueden hacerlo en su país de residencia. Al tiempo que hace que la
modalidad intensiva internacional se trasforme probadamente en una estrategia didácticopedagógica pertinente de acceso, diversidad y justicia social.
Tal vez no sea la única, ni necesariamente la mejor, pero, emerge como una buena práctica
institucional, con años de prueba, que ha permitido continuar de manera concreta el acceso a
miles de estudiantes de posgrado brasileños a continuar con su formación acreditada en el
área de educación para diversos fines a su retorno a sus estados de origen en su país.
El énfasis en la aplicación de las pedagogías activas, y el e-learning, se han transformado en
herramientas y estrategias adecuadas en el marco de una política educativa que garantiza un
derecho humano fundamental, cual es, poder continuar con la formación docente más allá de
los límites y restricciones en su país de origen. Sean estas, por condición de su capital
educativo-cultural (requisitos de historial o trayectoria académica; exámenes de ingreso;
cupos), u económico (costos; dependientes, etc.).
Conocer datos centrales respecto la dimensión social del alumnado de cursos internacionales
modalidad intensiva problematiza la condición social de origen de los mismos, así como su
inclusión cuantitativa y su proceso meritocrático, considerando la educación y ocupación
alcanzada por sus progenitores.
Sin embargo, emerge la alerta pedagógica, como contracara, que el acceso sin examen de
ingreso, y la condición socio-académica diversa entre el alumnado dentro de cada una de las
secciones que cursan no pueden poner en riesgo la calidad la formación continua a la que
ahora, más democráticamente, se accede.
267
Ese control de calidad, más allá de evaluaciones, acreditaciones, rituales y titulaciones, debe
cuidar que el acceso no prime sobre la calidad y formación que, como criterio, a modo de
espiral, vuelva a vincular el negocio de las universidades-empresas privadas que lucran
también con los déficits formativos y restricciones al acceso a una educación crítica y de
calidad.
A la explotación económica de la miseria de las restricciones al acceso a la formación
continua a vastos sectores de la población de graduados universitarios en Brasil, debe
acompañarle una política educativa institucional que no se vanaglorie exclusivamente de este
tipo de inclusión, del mero acceso cuantitativo de los/las profesores/as en formación.
Al final, queda en abierto, de qué tipo de inclusión queremos y la que se realiza, y a qué
estamos llamando de trayectoria académica meritocrática.
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269
14.A AUTOPERCEÇÃO DA CONSTRUÇÃO DA
PROFISSIONALIDADE DOCENTE NA FORMAÇÃO INICIAL DE
PROFESSORES
Elsa Ribeiro-Silva434445PhD, Catarina Amorim46, M.Ed & José Luis Aparicio Herguedas47,
PhD
Resumo
A formação inicial desempenha um papel significativo na construção da identidade
profissional docente, permitindo a reflexão e a análise crítica de diversas representações
sociais historicamente construídas acerca da profissão (Guimarães, 2004), com relevância
para o estágio profissional que, promovendo a presença do estagiário no cotidiano da escola,
abre espaço para a realidade e para o trabalho do professor na sociedade (Lima e Pimenta,
2005/6).
Estudámos a perceção dos estagiários sobre o respetivo nível de desempenho docente
numa fase intermédia do Estágio Pedagógico no sentido de, enquanto formadores, podermos
incrementar o potencial formativo deste exercício de autoavaliação. Analisámos, por critério
semântico (Bardin, 2011) e com categorias previamente estabelecidas, o conteúdo de 46
relatórios de autoavaliação intermédia, de estagiários de Educação Física, optando-se pelo
ATLAS.ti 8.4 na análise qualitativa dos dados.
Os resultados revelam que, na maioria dos indivíduos, a autoavaliação não foi produto
de uma reflexão aprofundada sobre o seu agir, resultando em discursos reduzidos, sem
conteúdo e essencialmente de autoelogio, tendo sido poucas as aprendizagens ainda por
desenvolver assumidas pelos indivíduos. Entendendo-se a autoavaliação como decisiva na
construção da profissionalidade docente, estes resultados revelam a necessidade de uma maior
atenção àquela forma de avaliação na formação inicial de professores.
Palavras-chave: Autoavaliação. Formação inicial. Profissionalidade Docente. Estagiários.
Educação Física.
43 1
Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física, Universidade de Coimbra
Centro de Investigação do Desporto e da Atividade Física
45 3
Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX
46 1
Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física, Universidade de Coimbra
47 4
Universidade de Valladolid
44 2
270
Introdução
A avaliação faz parte do nosso dia-a-dia, a maior parte das vezes sem que tenhamos
consciência disso, estendendo-se a inúmeros domínios da nossa intervenção. No âmbito
educativo, a forma como os alunos veem a avaliação e a importância que lhe atribuem, tem
implicações no modo como se posicionam nas suas aprendizagens, sendo normalmente
entendida como o fim de um processo, onde o esforço é dirigido para a obtenção dos melhores
resultados e não das melhores aprendizagens (Vieira et al, 2013). Assim sendo, a avaliação
pode ser realizada com diferentes objetivos, sendo que, quando tratamos da formação inicial
de professores, aquela só faz sentido enquanto instrumento de aprendizagem e como um dos
meios mais importantes de autorregulação das aprendizagens, devendo, como defende LópezPastor (2009), ser dirigida para a melhoria da ação do (futuro) professor.
Através da autorregulação será possível ao aluno desenvolver uma aprendizagem
autónoma e proativa onde, a partir da mobilização das suas características pessoais e das suas
emoções, motivações e cognições, será capaz de desenvolver estratégias assertivas que, por
sua vez, maximizarão a própria aprendizagem (Zimmermann, Flavier e Méard, 2012).
A avaliação formativa, tendo como principal propósito a melhoria das aprendizagens
(Fernandes, 2008; Pérez-Pueyo, Julián e Pastor, 2009), deverá implicar a participação dos
alunos no seu processo, nomeadamente pela autoavaliação, entendida esta como um processo
de reconhecimento da importância de descobrir os valores implícitos que dirigem e
condicionam todas as nossas ações no mundo, autorregulando-se a partir de critérios éticos
emergentes e reconhecendo as próprias limitações, convidando à reflexão sobre si mesmo e
sobre a responsabilidade que temos no nosso desempenho diário (Moreno, Trigueros e Rivera,
2013).
Assim sendo, para que esta alcance a plenitude do seu valor deverá ser ensinada e
exercitada. De acordo com Black e William (2003), apesar da autoavaliação já se manifestar
em cada indivíduo de forma espontânea, a aprendizagem não deve descurar o seu
aperfeiçoamento através de um processo que requer tempo, prática e intencionalidade.
A este propósito, Moreno et al (2013) concluíram, num estudo sobre as emoções
vividas e experimentadas por estudantes do ensino superior no processo de autoavaliação, que
a complexidade autoavaliativa foi ali efetivamente vivida e experimentada em resultado da
liberdade dada aos estudantes para tomarem decisões de forma autónoma, tendo assumido que
este processo não foi isento de erros, mas que estes foram uma das fontes mais importantes da
aprendizagem, permitindo aos alunos gerarem as suas perguntas e autodirigirem o próprio
processo de aprendizagem.
271
Dentro da formação inicial de professores, o Estágio Pedagógico é, comummente,
considerado um momento significativo na construção da profissionalidade docente dos
futuros professores (Beauchamp e Thomas, 2009; Flores, 2020; Geng, Midford e Buckworth,
2016), a qual, embora multidimensional, polissémica e dinâmica, em muito depende da
capacidade de ação e de reflexão do próprio formando (Frick, Carl e Beets, 2010).
É partindo deste pressuposto que consideramos fundamental focar-nos na
autoavaliação do estagiário e na sua capacidade em o fazer, entendida como parte integrante
do seu processo formativo, já que apela à autorreflexão e ao posicionamento crítico
relativamente à qualidade do trabalho produzido, ao conjunto de competências desenvolvidas
e por desenvolver e à atitude ética mantida durante aquele desenvolvimento, mobilizando os
resultados para a melhoria do seu processo formativo.
A autoavaliação como processo de auto perceção de si enquanto pessoa (das suas
crenças, valores, emoções, reações e caraterísticas) (Brown e Harris, 2013) e desse mesmo eu
no desempenho da profissão, contribui de forma decisiva para a construção da identidade
profissional do novo professor (Bourke, 2018), conscientes de que aquela é dinâmica e se irá
construindo e reconstruindo ao longo da carreira profissional docente. A formação inicial é,
como nos diz Flores (2020), um espaço onde os novos docentes constroem, desconstroem e
reconstroem a sua perspetiva de ser professor, processo que consideramos manter-se para lá
da profissionalização, assumindo outras caraterísticas, ou mesmo maturidade, ultrapassados
os maiores “confrontos” dos estagiários entre o ser professor, que construiu enquanto aluno, e
o professor que quer ser, percebido ao longo da formação inicial.
Para Moreno et al (2013) as aprendizagens provenientes do processo de autoavaliação,
ultrapassam o espaço e o tempo da aula para se converterem em aprendizagens para a vida,
para o contexto de desempenho pessoal e profissional, dado que o processo de autoavaliação
permite mobilizar os processos metacognitivos, possibilitando desta forma a construção das
aprendizagens.
Assim sendo, a autoavaliação implica um conjunto de tomadas de decisão do próprio e a sua
responsabilização por elas, assumindo as consequências positivas e negativas que dali
resultaram, impondo-se para tal que lhe seja dado espaço no processo de formação dos
indivíduos, encarando-a como qualquer outro conteúdo de ensino-aprendizagem (Brown e
Harris, 2013; Panadero e Alonso-Tapia, 2013; Yan, 2019).
Foi com esta convicção que desenvolvemos esta experiência pedagógica, na qual
propusemos aos estagiários em Educação Física da Universidade de Coimbra, do presente ano
letivo (2019/2020) a autoavaliação do respetivo desempenho da função docente, focada
272
essencialmente na Área das Atividades de Ensino-Aprendizagem, na qual são avaliados em
quatro grandes dimensões: Planeamento; Realização (Intervenção Pedagógica) e Avaliação do
ensino e, ainda, Atitude Ético-Profissional. Atendendo à extensão dos relatórios daqui
resultantes e consequente quantidade de dados, neste trabalho apenas nos focaremos na
dimensão Realização/Intervenção Pedagógica.
A opção por apenas esta Área justifica-se, não só, por ser a mais valorada de todas as
outras que compõem o Estágio Pedagógico, mas também porque era aquela em que todos os
estagiários tinham a mesma quantidade e natureza de trabalhos desenvolvidos quando lhes
propusemos a realização da autoavaliação. Escolhemos o momento intermédio do Estágio
com dois propósitos, o primeiro para coincidir com a avaliação intercalar da unidade
curricular realizada pelos respetivos orientadores, permitindo, fora deste trabalho, a discussão
dos resultados entre estagiários e orientadores, e o outro, para nos permitir continuar o
processo de ensino-aprendizagem das competências autoavaliativas ao longo da segunda
metade do ano letivo, apoiados nos resultados aqui obtidos.
Esta experiência de autoavaliação foi orientada por um guião construído pelos
docentes com base no referencial de avaliação da unidade curricular, estruturado nas quatro
grandes dimensões atrás referidas, considerando, tal como Lamb, Lane e Aldous (2012), que a
utilização deste tipo de documentos auxilia o estagiário no amadurecimento da compreensão
conceitual da sua prática reflexiva. Foi solicitado aos estagiários que através de um exercício
de reflexão aprofundada e crítica identificassem as competências que consideravam já terem
desenvolvido e as ainda por desenvolver, concretizando e justificando as suas afirmações.
Em virtude de este ser o primeiro momento de exercitação da autoavaliação por parte
destes alunos e conscientes de que estávamos a amputar uma parte significativa das
aprendizagens que esta forma de avaliação pode aportar, optámos por orientá-la apenas para a
autoavaliação das competências e ainda não para a participação na construção do referencial
de autoavaliação. Contudo, o referencial que serviu de base à construção do guião foi
discutido, nos seus parâmetros, critérios e descritores, dentro de cada núcleo de estágio
durante a primeira semana de trabalho nas escolas e posteriormente numa reunião plenária de
estagiários, onde, por sua proposta, foram realizados alguns ajustamentos.
Objetivos
Este estudo integra um projeto de investigação de maior escala que tem o propósito de
compreender de que forma é construída a identidade profissional docente durante o Estágio
273
Pedagógico de Educação Física, sendo que aqui nos focamos essencialmente na
autoavaliação, considerando-a como uma experiência de formação.
Assim sendo, o estudo tem por objetivo averiguar como os alunos estagiários
entenderam a autoavaliação que realizaram na fase intermédia do Estágio Pedagógico, no
sentido de, com base nestes resultados, podermos incrementar os seus conhecimentos sobre
aquela forma de avaliação, fundamental na construção da sua profissionalidade docente.
Metodologia
Para desenvolvermos este estudo usámos uma metodologia qualitativa sob o
paradigma construtivista (Creswell e Creswell, 2018). Recolhemos relatórios resultantes do
exercício de autoavaliação dos estagiários, onde analisamos o seu conteúdo (Bardin, 2011)
com categorias pré-definidas e coincidentes com as do guião de avaliação.
Amostra
Contámos com 46 relatórios de autoavaliação respeitantes ao mesmo número de
estagiários, 28 do género masculino e 18 do género feminino, da Faculdade de Ciências do
Desporto e Educação Física inscritos na unidade curricular de Estágio Pedagógico do
Mestrado de Ensino de Educação Física nos Ensinos Básicos e Secundário, da Universidade
de Coimbra, no ano letivo 2019/2020.
Os autores dos relatórios apresentavam uma média de idades de 26 anos (DP 3,7 anos)
e estavam colocados em escolas da zona centro do país, maioritariamente no distrito de
Coimbra, mas também de Aveiro e da Marinha Grande. A participação foi voluntária, mas
não anónima de forma a possibilitar, para além deste estudo, a análise e discussão dos
resultados em conjunto com os respetivos orientadores. Todos os participantes assinaram um
termo de consentimento informado, livre e esclarecido antes de iniciarem a autoavaliação.
Instrumentos e procedimentos
De acordo com o que afirmámos anteriormente, os dados obtidos reportam ao
momento intermédio do Estágio Pedagógico, coincidente com a avaliação qualitativa
formativa formal realizada pelos professores orientadores no final do primeiro semestre.
Neste relatório os estagiários deveriam refletir, identificar e descrever as
aprendizagens desenvolvidas e as por desenvolver até ao momento, nas várias áreas do
Estágio Pedagógico. Como já justificámos, este estudo foca-se essencialmente nos discursos
relativos à Intervenção Pedagógica, a qual se encontrava categorizada no guião da
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autoavaliação em quatro grandes categorias e nove subcategorias, que constam no Quadro 1.
Cada uma destas subcategorias estava acompanhada de um pequeno conjunto de descritores,
os mesmos que já tinham sido discutidos entre todos os participantes no início do ano letivo, e
cuja função era a de tornar inequívoca cada uma daquelas subcategorias, orientando os
formandos numa reflexão que se pretendia crítica, objetiva e concreta.
Quadro 1 - Identificação das categorias e subcategorias
Categorias
Subcategorias
Informação inicial
Instrução
Condução da aula
Feedback
Conclusão da aula
Gestão
Clima/Disciplina
Decisões de ajustamento
Tempo
Organização/Transição
Controlo
Comunicação
Decisões de ajustamento
Os dados foram coletados através de um relatório de autoavaliação, submetido na
plataforma digital da Universidade de Coimbra, à qual todos os alunos tinham acesso. Cada
relatório de autoavaliação foi analisado documentalmente, como documentos primários,
utilizando o software ATLAS.ti (versão 8), realizando-se um trabalho de análise detalhada em
cada um deles. A estratégia de codificação, seguindo Miles, Huberman e Saldaña (2014), foi
realizada, num primeiro ciclo de codificação, através da aplicação de códigos descritivos
(subcategorias iniciais), tomando decisões sobre a seleção das unidades de análise e
atendendo ao conteúdo das unidades escolhidas a partir de uma perspetiva semântica (Bardin,
2011).
Seguidamente, num segundo ciclo de codificação, os códigos inicialmente aplicados
foram revistos, atendendo ao seu significado com base nas evidências de partida. Desta forma,
constitui-se uma constante relação circular entre os códigos aplicados durante os dois ciclos
de codificação, refinando-se conceitos e identificando-se as suas características, dimensões,
propriedades e relações (Corbin e Strauss, 2015) vinculadas às categorias iniciais, para inferir,
posteriormente, construtos interpretativos de maior nível (Taylor e Bodgan, 2000).
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Para abordar os aspetos de credibilidade da investigação, em relação às dificuldades
interpretativas do objeto de estudo, seguindo Creswell e Creswell (2018), foi realizado um
debate constante entre os investigadores, alcançando acordos com base na discussão sobre a
interpretação dos discursos dos alunos e a sua respetiva codificação e categorização.
O feedback constante dos investigadores para chegar a um acordo sobre a
interpretação dos códigos e categorias apoiou a credibilidade, a viabilidade e a transferência
do estudo (Watling, Neal, VanDyke e Kornbluh, 2015). Atingiu-se a saturação dos dados, no
momento em que as comparações entre os dados deixaram de evidenciar novos
relacionamentos e propriedades entre eles. Desta forma, a riqueza representativa dos dados foi
considerada esgotada num processo analítico circular (Flick, 2007).
Apresentação e discussão dos resultados
Apesar de ter sido solicitado aos estagiários uma reflexão crítica e aprofundada sobre
o seu desempenho e a justificação de cada uma das suas afirmações, percebemos que muitos
se limitaram a mobilizar os descritores de cada subcategoria, que o próprio documento guia
continha, resultando em discursos de curta extensão, de fraca reflexividade e pouco conteúdo,
como se pode constatar pelo número relativamente reduzido de unidades de análise
resultantes do tratamento de um total de 46 autoavaliações (Tabela 1).
Tabela 1 - Frequências absolutas das subcategorias
Aprendizagens realizadas
Aprendizagens a desenvolver
Clima/Disciplina - Controlo
75
Clima/Disciplina - Controlo
29
Decisões de ajustamento
53
Decisões de ajustamento
28
Instrução - Condução da aula
52
Instrução - Feedback
22
Gestão - Organização/transição
45
Instrução - Condução da aula
15
Gestão - Tempo
40
Gestão - Organização/transição
14
Instrução - Feedback
37
Gestão - Tempo
13
Instrução - Informação inicial
33
Instrução - Conclusão da aula
13
Clima/Disciplina - Comunicação
19
Clima/Disciplina - Comunicação
8
Instrução - Conclusão da aula
15
Instrução - Informação inicial
8
Total
369
Total
150
276
A preocupação na auto valoração (e, em muitos casos, na sobre valoração), levou a
que os indivíduos se limitassem a copiar os descritores orientadores daquele processo
avaliativo, previamente constantes na grelha de autoavaliação, confirmando a sua
aprendizagem e adjetivando a própria prestação.
Quanto à Tabela 1, onde, como já afirmámos, o número de unidades de análise se
apresenta muito reduzido, podemos observar que as categorias surgem sequenciadas de forma
idêntica nas aprendizagens realizadas e nas aprendizagens a desenvolver, sendo evidente em
relação a estas últimas uma significativa redução do número de unidades de análise,
permitindo-nos aferir que os estagiários, apesar de não o terem concretizado, consideram que
lhes falta aprender muito menos (150 entradas) do que já aprenderam até ao momento (369
entradas).
Iremos apresentar os resultados analisando concomitantemente as aprendizagens
realizadas e as aprendizagens a desenvolver, começando pelas categorias com maior número
de frequência absoluta.
Aprendizagens realizadas versus aprendizagens a desenvolver
De acordo com a análise dos poucos discursos que concretizaram algumas ideias e
seguindo a ordem decrescente de representatividade das categorias, pudemos perceber que as
aprendizagens mais desenvolvidas até ao momento intermédio do Estágio Pedagógico
referem-se à dimensão disciplina e, dentro desta, especificamente ao controlo da turma e à
atitude dos estagiários face aos comportamentos de indisciplina, associando estas
aprendizagens ao bom clima relacional que conseguiram estabelecer entre aluno-professor e
aluno-aluno. Por outro lado, revelam que usaram estratégias de gestão em favor da disciplina,
nomeadamente a opção por pausas de curta duração entre os exercícios práticos e a
intervenção sistemática na ação dos alunos, como formas de evitarem comportamentos fora da
tarefa e de desvio. Vários estagiários avançam que a atitude mais importante de combate à
indisciplina é a atitude preventiva do professor e que foi esta a sua opção.
“… consigo perceber perfeitamente quando um aluno merece ir “sentar e pensar no assunto” assim como
sei quando intervir de forma calma e serena para chegar ao problema de forma adulta. De uma forma
geral, consigo ter sempre uma aula com um clima positivo e saudável, sabendo controlar os alunos mais
mal comportados que, de alguma forma, influenciam os restantes.” (Estagiário PC, 24) anos)
277
No entanto, quando analisamos as aprendizagens por conseguir, verificamos que são
também vários os que afirmam que por vezes têm de adotar posturas mais rígidas e assertivas
para conseguirem controlar a turma e evitar comportamentos de indisciplina, reconhecendo
que em algumas situações ainda têm dificuldade em marcar a sua autoridade, expressando a
necessidade de a imporem (ainda) mais e de punir de forma mais frequente e veemente, os
comportamentos de desvio.
“Em certos momentos da aula, necessito adotar uma postura mais rígida não permitindo situações de
comportamento fora da tarefa (conversas paralelas) que afetam negativamente a aula (dimensão
disciplina).” (Estagiária AC, 25 anos)
Há, pois, aqui uma contradição entre o afirmado nas aprendizagens conseguidas e o
que afirmam nas aprendizagens por conseguir, dado que as estratégias punitivas, que aqui
propõem como solução para o controlo disciplinar, não se coadunam com a intervenção
preventiva que anteriormente afirmaram ter sido a sua opção.
Outra das competências que os estagiários consideraram já ter desenvolvido foi a de
conseguirem motivar os alunos para o empenhamento motor durante as aulas, através do
reforço positivo do seu comportamento, contribuindo isto, de acordo com as suas afirmações,
para a otimização do processo de ensino-aprendizagem. Também a capacidade de criarem e
implementarem rotinas e hábitos de trabalho foi por eles considerado como muito positivo
para a manutenção de bom clima.
“Sou capaz de motivar os alunos para os exercícios da aula o que mantém o seu empenho durante toda a
aula e otimiza o processo de aprendizagem.” (Estagiário LM, 25 anos)
“Consigo ter um bom controlo da turma e desenvolver uma boa relação entre todos os intervenientes
(professor-alunos e aluno-aluno), o que ajuda na criação de um bom clima de aprendizagem.” (Estagiária
AC, 24 anos)
Por outro lado, nas aprendizagens por conseguir afirmam que pretendem desenvolver e
melhorar aprendizagens que lhes permitam encontrar um ponto de equilíbrio entre o controlo
disciplinar da turma, o bom ambiente da aula e da relação professor-aluno e a sua capacidade
de ensinar. Daqui podemos perceber que, para além de não revelarem o que pretendem fazer
para alcançar aquele equilíbrio, também ainda não conseguiram libertar-se da preocupação
com o controlo disciplinar dos seus alunos.
278
"Como ainda existem alguns alunos que precisam de ser chamados à atenção na instrução e nos
momentos de prática, penso que tenho que arranjar outras estratégias para que melhorem a atenção e os
comportamentos.” (Estagiária MS, 25 anos)
Por aqui constatamos que o seu foco recai, quase exclusivamente, nas dimensões de
intervenção pedagógica de clima e disciplina, ou seja, em manter um relacionamento
pedagógico positivo com os alunos, na tentativa de através deste conseguirem ter o controlo
disciplinar da turma, ficando o compromisso com as aprendizagens dos seus alunos
praticamente de fora desta preocupação.
Passando para as decisões de ajustamento, os estagiários afirmam ter adquirido a
capacidade de ajustar os objetivos da aula de acordo com as dificuldades observadas nos
alunos, as especificidades da turma e o contexto. Afirmam que, perante situações imprevistas,
revelam a capacidade de se adaptar integrando esse ajustamento no plano de aula previsto,
sem perder de vista os objetivos propostos. Alguns estagiários reforçam ainda esta ideia
afirmando que as suas decisões de ajustamento têm sempre o objetivo de beneficiar a
aprendizagens dos seus alunos.
“Sei perfeitamente quando necessito de ajustar as tarefas à especificidade da aula, dos alunos e,
principalmente, ao contexto.” (Estagiária MA, 24 anos)
“As U.D. são aplicadas e ajustadas através de decisões de ensino pedagógicas e didaticamente corretas,
em função da especificidade da escola e dos alunos, e das condições reais do ensino.” (Estagiário BF, 26
anos)
No entanto, os poucos que concretizaram algumas daquelas decisões referiram
exclusivamente decisões no âmbito da gestão (espaços, tempo, alunos ou materiais) e quase
sempre em resultado de alterações climatéricas que os obrigou a passar de um espaço exterior
para um interior de menor dimensão.
“Aprendi a criar um plano B para utilizar em casa de necessidade, isto é, quando existirem fatores
externos à aula que não me permitam aplicar o plano A, nomeadamente quando chove. Sou capaz de
reajustar o plano de aula, no entanto é um fator que posso e devo continuar a desenvolver.” (Estagiária
CR, 24 anos)
279
“A necessidade de realizar decisões de ajustamento, relativamente às condições climatéricas, ou
disposições de materiais deixadas por outros professores, foi algo que sempre ultrapassei com
naturalidade.” (Estagiária MS, 24 anos)
Tal como nas aprendizagens realizadas, também nas aprendizagens por desenvolver as
decisões de ajustamento ocupam um lugar privilegiado. Apesar de antes afirmarem já terem
desenvolvido competências que lhes permitiam ajustar os objetivos da aula de acordo com as
dificuldades observadas nos alunos, as especificidades da turma e o contexto, reconhecem, no
entanto, dificuldade em ajustar, com qualidade, as situações de ensino quando percebem que
aquelas não estão a ter o efeito pretendido.
Reportam também que pretendem melhorar a sua capacidade de antecipação de
determinados imprevistos (como o número de alunos presentes na aula ou as condições
climatéricas) tomando as melhores decisões respetivamente à adequação de determinada
tarefa para o espaço de aula disponível e as dificuldades e necessidades dos alunos.
Revelam, ainda, que pretendem vir a fazê-lo de forma mais rápida e autónoma
contando com a ajuda do professor cooperante naquelas tomadas de decisão, na convicção de
que estas melhorarão com a experiência de lecionação, a qual lhes permitirá, num futuro
próximo, tomar decisões de ajustamento mais rápidas, adequadas e criativas, mesmo face a
situações imprevistas e complexas.
“O professor orientador tem ajudado em algumas decisões de ajustamento, tais como por vezes não ter
espaço para dar aulas ou ter de alterar alguma coisa à última da hora. Penso que com a experiência de
lecionação, posteriormente conseguirei melhorar esta capacidade de ser criativo, ajustando melhorar as
decisões de ajustamento.” (Estagiário JS, 25 anos)
Em suma, alguns estagiários estão conscientes da necessidade de melhorar a
capacidade em ajustar o seu ensino face a imprevistos e ambicionam desenvolver estratégias
que os auxilie a serem “excecionalmente” reflexivos e críticos a fim de tomarem decisões
oportunas em função dos alunos, mas o único recurso que preveem utilizar é a ajuda do
respetivo orientador. Nenhum estagiário refletiu sobre a possibilidade de realizar uma
pesquisa bibliográfica, uma ação de formação, um evento científico ou outra qualquer forma
de autoformação.
Passando para a condução da aula, os futuros professores afirmam apresentarem os
conteúdos de forma ajustada ao nível dos alunos, usando uma instrução clara e objetiva,
acompanhada da subsequente demonstração, a qual era normalmente realizada pelos alunos
280
melhor executantes, considerando esta uma forma de os integrar no próprio processo de
aprendizagem.
“Organizo corretamente a atividade no espaço da aula de modo a permitir um posicionamento e
circulação que me garantam a perceção global e o controlo eficaz das diversas situações, detetando e
prevendo as situações de risco.” (Estagiário DB, 25 anos)
“Durante a instrução das tarefas, realizo, ou peço a um aluno para realizar a demonstração das tarefas, de
forma a fazer com que a instrução chegue ao aluno de forma mais clara.” (Estagiária CR, 26 anos)
Também afirmam que, nas suas aulas, adotam um posicionamento e uma circulação
corretos, conseguindo com isto controlar eficazmente a turma e prevenir situações de
indisciplina, o que já vimos não estar a acontecer, pelo menos de forma plena, já que os
próprios revelaram que por vezes têm de adotar posturas mais rígidas e assertivas para
conseguirem aquele controlo e evitar aqueles mesmos comportamentos.
“Na condução da aula, círculo corretamente pelo espaço de forma o observar todos os alunos e a facilitar
a transmissão de feedbacks e controlo disciplinar.” (Estagiário MS, 24 anos)
Por último quanto à dimensão instrução, as suas referências ficam-se apenas pelo
feedback afirmando que este já faz parte da sua prática pedagógica corrente, emitindo-os com
frequência e qualidade.
“Tenho uma boa capacidade de dirigir feedback frequentemente e pertinente, direcionado tanto
individualmente como coletivamente.” (Estagiário JS, 25 anos)
“Utilizo sistematicamente o feedback dos tipos positivos, descritos, prescritivos, interrogativos e de
reforço na minha intervenção pedagógica de forma compreensível com eficácia e pertinência.” (Estagiária
AP, 24 anos)
Simultaneamente também afirmam que necessitam de aumentar a qualidade daquele,
melhorando a sua especificidade e ajustamento à matéria abordada e, principalmente,
conseguirem encerrar os seus ciclos.
“Fornecer feedback mais detalhado, ou seja, ir mais ao pormenor e ao essencial de cada conteúdo que está
a ser abordado.” (Estagiária AC, 25 anos)
281
“Melhorar a parte do conhecimento das matérias de forma profunda porque, por vezes, sinto dificuldade
em fornecer feedback em algumas disciplinas por não conhecer, de forma aprofundada, a matéria em
causa.” (Estagiária MA, 24 anos)
Em suma, estes resultados revelam uma capacidade de análise crítica e reflexiva muito
incipiente, principalmente em relação às competências ainda por desenvolver, tendo sido raros
os que assumiram e expressaram de forma clara as dificuldades que ainda sentem, assim como
o trajeto já percorrido na sua aprendizagem e as decisões ou estratégias em perspetiva para a
aquisição daquelas competências. Esta atitude dos estagiários pode também significar que têm
uma opinião muito alta sobre os seus valores, o que vem ao encontro dos resultados de
Szczepański (2012) que concluiu que a autoperceção e a autopromoção são fatores que
desempenham um papel muito forte no que diz respeito à autoconsciência.
Como já afirmámos, a maioria limitou-se a mobilizar os descritores que tinham sido
incluídos no documento guia, apenas para sua orientação no processo autoavaliativo,
colocando-os na coluna das competências já desenvolvidas ou por desenvolver, de acordo
com o entendimento que tinham das suas aquisições em cada uma das categorias e
subcategorias.
Tal fez com que houvesse uma transformação de um documento aberto de análise
qualitativa do desempenho numa checklist onde que se limitaram a assinalar o que já tinham
aprendido e o que ainda estava por aprender, sendo ainda que, na sua opinião, poucas são as
competências que lhes restam desenvolver.
Estes resultados são apoiados por Vieira et al (2013) quando afirmam que os alunos
associam a avaliação ao fim de um processo, esforçando-se por obter os melhores resultados
em detrimento das melhores aprendizagens. Ficou evidente que uma parte significativa dos
indivíduos tentou (de forma consciente ou não) usar este processo de autoavaliação para
influenciar a imagem dos seus orientadores e, consequentemente, a respetiva classificação
final do Estágio Pedagógico, estando ainda longe de a entenderem como uma das formas de
participação dos alunos no seu processo de aprendizagem (Aparício, 2019).
Conclusão
Revisitando o objetivo principal deste estudo, que partiu da convicção de que a
autoavaliação das aprendizagens não é inata, implicando o seu ensino teórico (Brown e
Harris, 2013; Panadero e Alonso-Tapia, 2013), mas fundamentalmente experiencial, na
formação inicial de professores, concluímos que muito há ainda a trabalhar com estes
282
estagiários quanto àquela forma de avaliação, de modo a conseguirmos atingir outros
patamares de autonomia que aqui ainda não foram tentados.
A sua tendência para o autoelogio e para a mera mobilização de informação préexistente, são amplamente reveladores, como Moreno et al (2013) nos dão conta, da
complexidade do processo autoavaliativo e de que estes estagiários ainda não conseguem
fazer uso da liberdade para tomarem decisões de forma autónoma, não percebendo a
autoavaliação como uma das fontes mais importantes da aprendizagem.
É fundamental fomentar nos estagiários a capacidade de reflexão crítica focada no
questionamento das suas rotinas e práticas. Esta capacidade de reflexão define uma prudência
ética docente, assim como se torna um ponto fundamental da profissionalidade (Batista,
2019). Segundo Harford e MacRuairc (2008) as abordagens que incorporem a autorreflexão,
ainda que estruturada e prescritiva, podem contribuir para que os estagiários desenvolvam a
compreensão da natureza da prática reflexiva. Oportunidades de autorreflexão podem (e a
nosso ver, devem) ser proporcionadas desde o primeiro momento do Estágio Pedagógico,
pelos professores cooperantes e professores orientadores de forma a facilitar o diálogo.
Antes de terminarmos, importa relembrar que as aprendizagens conseguidas e por
conseguir reveladas pelos indivíduos na fase intermédia do Estágio Pedagógico, surgem
estudadas e justificadas em trabalhos de inúmeros autores (com Daryl Siedentop (1991) e
Maurice Piéron (1986) como expoentes máximos no âmbito da Educação Física e Desporto),
não estando, portanto, o foco deste estudo no nível qualitativo da intervenção pedagógica dos
indivíduos, mas exclusivamente na sua competência de autoavaliação em relação ao já
conseguido, mas principalmente, ao que ainda lhes falta dominar e às formas como o preveem
fazer.
Assim, e indo ao encontro de Black e William (2003) quando afirmam que a
aprendizagem da autoavaliação não deve descurar o seu aperfeiçoamento através de um
processo que requer tempo, prática e intencionalidade, consideramos estes resultados
fundamentais na orientação do processo de ensino na formação inicial de professores.
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286
15.A PEDAGOGICAL INTERACTIVE PLATFORM FOR THE
STUDY OF COMPOSITE PLATES
Ana Filipa Mota48,49,50 & Amélia Loja51,52
Abstract
In recent years, undergraduate and master's courses in engineering were object of an increased
interest from students. In this area of knowledge, more specifically regarding the materials
under development, composites stand out from the rest as they allow the properties of various
materials to be combined in a single material, making them suitable for applications with
specific requirements. In this sense, it is important at the design stage to carry out
performance analysis of structures built from these materials. This being a requirement of the
current job market, it is essential to prepare students of higher education courses for these
challenges. Pedagogical platforms are a very useful tool in the learning process, allowing
students to interactively explore different aspects of a given subject, as well as to assess their
influence on the topic under study. Taking advantage of information and communication
technologies and how they may allow contributing to a new dynamic to the classes,
captivating the students, this work presents a pedagogical platform as a complement to the
process teacher-student knowledge transmission. To this purpose, the various interfaces of the
developed and implemented platform are exposed, illustrating their versatility and didactic
character.
Keywords: Engineering education. Pedagogical and interactive platform. Structural analysis.
Composite plates. Finite element method
Introduction
Teaching can be classified as traditional, technology-based and technology-enhanced
(Carbone, 2018), being the first one characterized by the face-to-face interaction between both
intervenient, the teacher and the student, whereas technology-based teaching only involves the
use of technology. The technology-enhanced teaching arises from the combination between
48
CIMOSM, ISEL, Centro de Investigação em Modelação e Optimização de Sistemas Multifuncionais, 1959007 Lisboa, Portugal
49
Universidade de Évora, 7000-671 Évora, Portugal
50
anafilipa.s.mota@gmail.com (Mechatronics Engineering PhD Student)
51
IDMEC, IST -Instituto Superior Técnico, Universidade de Lisboa, 1049-001 Lisboa, Portugal
52
amelialoja@uevora.pt (Invited Associate Professor)
287
the traditional and the technology-based ones and enhances the teaching-learning process.
This method is a future trend in education, allowing a personalized learning process using
adaptive didactic software without having to leave the classroom in the presence of a teacher.
In fact, this tool has the function of complementing the teacher's activity, enabling to teach
different reasoning levels' students by keeping everyone engaged and updated (Montandon et
al., 2018).
One of the main concerns of teachers is the quality of the teaching-learning process. It is
believed that one of the reasons is related to traditional teaching methods, which may not be
sufficient for a true understanding of classes’ concepts as teaching-learning methods have an
inherent subjective perception component, thus varying from individual to individual
(Deliktas, 2011). The low students’ performance in some subjects, which is often responsible
for their dropout, can be fought by the integration of technological tools in teaching, being
necessary for this purpose an educational change which involves an adaptation of the teachers
and students roles to this integration (Gómez-Zermeño & Franco-Gutiérrez, 2018).
Currently, information and communication technologies are constantly present in people's
lives, including in their modes of communication and learning. Allowing for a faster
dissemination of information, the inclusion of these technologies in the school environment
must respond to the interests not only of the students, but of the entire school community. In
this context, the learning platforms are very useful tools in the learning process. (Souza &
Bianchini, 2019).
In a survey with respect to the essential features in virtual didactic tools, the students
highlighted interactivity, ease of use, motivation, and educational usefulness, placing the
Interactive Virtual Platforms (IVP) at the top of interactivity. The interactivity was
considered, by all interviewed, as a characteristic that promotes a better understanding of the
contents allowing for a more amusing learning experience. Particularly regarding its
usefulness in the study of materials science and engineering, students underlined the
importance of IVPs contain as much information as possible about their contents. Keeping
master classes and problem-solving classes using the blackboard on the top of the most
important teaching approaches, most students consider visual resources as a helpful tool to
complement the teacher's explanation in class. However, modernity plays an important role in
attracting students’ interest, as they consider platforms as more attractive the more modern the
technologies applied to them. In conclusion, the study refers the importance of the combined
use of different virtual tools in the classroom, as they complement each other, mentioning also
288
Augmented Reality as the future trend for designing didactic virtual tools (Vergara, Lorenzo,
& Rubio, 2017).
Advances in the field of materials science have revolutionized several fields of engineering,
giving relevance to teaching this field of science, since the knowledge acquired by students
subsequently influences, in an industrial context, the quality of the design and development of
components. Materials science is a basic course for a great part of engineering fields,
encompassing different types of materials and relationships between their structures and
properties at various scales. Thus, the structure, processing, properties, and performance of
materials are fundamental elements in this science’ teaching. In our daily life we are faced
with a wide variety of materials, such as metals, plastics, ceramics, and composites in general,
which are under continuous evolution. Therefore, in order to contribute to technological
development and innovation, students must be prepared to choose the appropriate materials
for a given project, acquiring knowledge and skills through teaching as this choice must be
based on the relationship between several factors, namely functionality, properties and
structure (Ozturk, Deveci, Gunister & Simmons, 2017).
Understanding fundamental concepts and basic principles has been a common difficulty in
engineering and science students. Since the computer is often present as a resource of study, it
is possible to use technology-based techniques and strategies to promote greater efficiency in
the teaching-learning process. Using interactive and attractive means such as animations and
simulations, key concepts' teaching that shows to be more challenging with regard to learning
by the student can be amazingly improved (Deliktas, 2011).
Dobrzañski and Honysz (Dobrzañski & Honysz, 2008) consider that computer-based tools
represent relevant elements in the information society, since they can be used as scientific
aids. In this sense, they developed a Virtual Materials Science Laboratory, an open source tool
with scientific, didactic, and simulating competences (Dobrzañski, L.A; Honysz, 2008). In the
context of mechanical engineering' teaching, Pons-Lelardeux et al. (Pons-Lelardeux, Galaup,
Segonds, & Lagarrigue, 2015) showed that the students' machining tools skills improved
through tools such as didactic games, emphasizing the importance of anticipating the
transformations that new technologies appear in educational organizations.
In fact, didactic platforms are a motivational element for the student, allowing them to explore
a certain topic through different approaches, instead of feeling restricted by the content
imposed by a specific curriculum planning (Silva & Loja, 2013). Allowing to incorporate,
experiment and simulate problems of greater complexity and configured according to the user
289
specifications, the integration of symbolic resources in simulation platforms makes the
learning process more flexible (Costa, Bernardo, & Loja, 2016).
The integration of interactive resources in the introduction of engineering concepts has shown
a growing trajectory over the last few years, with the results of student evaluations
demonstrating that learning through the inclusion of these resources leads to better results.
However, for a better effectiveness of the teaching-learning process it is important that the
classic triangle of the education system - teacher, blackboard and chalk - is not replaced but
complemented by technological resources (Deliktas, 2011).
Being clear the important role of new technologies in the classroom, it is important to ensure
their combination with pedagogical approaches and its suitability to the curricular
requirements through the inclusion of contents that lead to the necessary acquire knowledge
and skills. Also important is the assessment of how the introduction of new technologies in
the teaching-learning process influences the role of the teacher and his interactivity with the
students, as well as students’ performance (Montandon et al., 2018).
Structural components such as plates, shells and beams, are elements that once interconnected
among each other constitute structural systems, so the study of their behavior in different
operating conditions is highly important, namely for engineers of the most diverse areas. This
knowledge is fundamental for good and conforming designs. Hence, as common structural
elements, the development and implementation of computational and simulation tools devoted
to their analysis, may positively stimulate their understanding and the exploration of their
behaviour for higher education students (Costa & Loja, 2016).
There is a wide range of commercial software on the market for structural analysis based on
the finite element method. The presented platform allows the study of composite plates with
different material constituents, including advanced composite materials, such as functionally
graded materials, also allowing the consideration of different porosity distributions. These
characteristics, among others exposed next, combined with the pedagogical purpose,
constitute a differentiation factor of this platform when compared to other existing
commercial tools often used by students of Mechatronics, Aerospatiale and Aeronautics,
Mechanics, Structural and Civil Engineering courses, to name the more immediate ones.
Developed to play an auxiliary role in the teaching-learning process, this platform, dedicated
to the study of composite plates of different compositions, has the potential to become a
useful guided tool for students from different areas of engineering, both at the bachelor's and
master's levels.
290
Being a recently developed platform, the next step will be to improve the platform including
new composite materials constitutions, such as laminated ones, expanding functionally graded
materials to different material and porosities distributions, and load and constraints
conditions. Regarding its pedagogical character, it is intended to include more contents’
information to promote a better understanding of the concepts inherent to each topic covered.
Once some of these objectives have been achieved, the platform will then be evaluated with
students in order not only to obtain their feedback about different factors, but also to use this
same feedback in order to make it more useful for students.
Description
The present work presents a computational platform, with a pedagogical concern, developed
to the study of static behavior of composite plates through the finite element method (FEM),
considering to this purpose different loads and constraints among other characteristics.
This platform aims giving the user the opportunity to explore different material compositions,
including, if desirable, the consideration of porosities distributions, viewing the respective
materials properties distributions in a graphical mode. Furthermore, along the platform the
user can explore some aspects regarding stages of the finite element method, being able to
choose different types of finite elements and mesh discretizations. Concerning to shear
deformation theories, the platform currently contains two theories available, a first order one
and a higher order one. For loading and boundary conditions, several different situations are
available. In the different separators and sub-separators the user will find some tips and
information about the topics underlying them. Therefore, the platform allows the user to
analyze the effects that different material constitutions, load conditions and constraints, and
other parameterizations related to the finite element method have on the considered plates’
behaviour.
Both equivalent single layer (ESL) and layerwise (LW) approaches are available, but due to
the fact that the screens are similar, this work only presents the application of the first
approach to the study of a composite plate.
A more detailed description of the developed platform is presented next, covering in more
detail the characteristics of the separators associated to the available graphical interfaces for
exploring the different parameters involved in composite plates' studies. To this purpose, a
case study involving a composite plate made of functionally graded materials reinforced with
carbon nanotubes (CNTs) and considering the presence of a theoretical porosity' distribution,
291
is presented. In this static behaviour study, the plate is considered simply supported and under
a uniformly distributed load.
Considering the context of this article, the theoretical and mathematical formulations
underlying the topics covered in the platform will not be presented. However, these are
described in previous works by the authors (A. F. Mota & Loja, 2019; Ana F. Mota, Loja,
Barbosa, & Rodrigues, 2020).
Plate geometry separator:
The study starts with the plate geometry configuration, which is defined in the separator
shown in Figure 1. In this one, the user assigned a value to each geometric parameter – length,
width, and thickness – and the respective aspect ratio is automatically presented, being this
geometric parameter limited to values between 0 and 100. The color scale in the aspect ratio
display pretends to give users information about the plate’s thickness classification,
corresponding lower, medium, and higher ratios to thick, moderately thick, and thin plates,
respectively. This separator contains an illustration of a typical plate’s geometry, in order to
visually facilitate the association with the values assigned to each attribute.
Figure 1. Plate geometry separator
Materials properties separator:
292
Once the plate’ geometry is defined, one proceeds to the characterization of the plate
regarding its material constitution. To this purpose, the separator illustrated in Figure 2 allows
the user to specify the constituent materials' properties to be considered - Young's modulus,
Poisson's ratio and density. The developed platform allows, in this domain, the consideration
of a gradual and continuous evolution of material properties through the thickness, as the
image referring to a biphasic FGM suggests, or, alternatively, the presence of a single phase
by applying to both phases the same materials properties.
Figure 2. Materials properties separator
Additionally, the platform has the possibility to consider CNTs inclusions in phase B of the
plate's material constitution. In this case, the “With CNTs” button must be activated, allowing
the CNT panel to appear. In this panel, the user must fill the spaces with the appropriate
information, material and geometric, about the CNTs to be considered as reinforcement Young's modulus, density, mass fraction, length, external diameter, and thickness.
Porosities separator:
Being able to constitute an advantageous or adverse consequence in the materials constitution,
depending on the structural application for which they are intended, porosities frequently
appear as a natural consequence of the manufacturing processes (A. F. Mota & Loja, 2019).
293
Thus, and since porosities promote a material’ resistance decrease, they should be considered
in mechanical behaviour studies of structural components such as composite plates. In this
regard, the developed platform contains a separator, presented in Figure 3, totally dedicated to
this topic, in which the user is free to choose whether or not to include the contribution of the
existence of porosities in the study to be carried out. When the user chooses to include the
influence of porosities in the study, with the activation of the "Include Porosities Influence"
button, the panel "Porosities Distribution Types" is displayed, allowing the user to choose
between one of two different distributions illustrated - even or uneven - whose influence on
material properties appears in the form of the respective mathematical expression. At the
same time, the field to assign the porosity volume fraction value to be considered also appears
in the separator, and the respective value introduced is then shown in a colored scale to
illustrate the porosities level. To help the user, there are tips to guide him/her in the plate's
material configuration concerning porosities distributions.
Figure 3. Porosities separator: porosities distribution configuration
Materials distribution separator:
After plate’s configuration in terms of its geometry and material constitution, carried out on
the three separators already presented, the separator in which the material distribution is
294
defined comes next, where an illustration of the material evolution in a biphasic FGM and the
mathematical expression that rules the phase A volume fraction evolution through the
thickness, are presented. By introducing the power law value to be assigned, the "Power-Law
Index" display will give information about the influence of this parameter in the material
distribution through a colored scale that pretends to enlighten the fact that higher power law
indexes lead to a predominant presence of phase B. In this stage of the process, the effective
material properties will be estimated, appearing in this separator relevant information about
the evolution of the constituent material phases' volume fractions and of the plate’s Young's
modulus through the plate thickness. This information is provided in a graphical form,
representing these evolutions in order to the normalized thickness coordinate, z/h. Figure 4
illustrates the “Materials Distribution” separator with all its contents.
Figure 4. Materials distribution separator
FEM (Finite Element Method) separator:
Continuing on the process of a composite plate’ static analysis, the "FEM" separator arises
introducing the finite element method. This separator contains two sub-separators: one
dedicated to the discretization of the plate in finite elements and, for this reason, called
295
"Mesh", and another, "Shear Deformation Theory", which, like its name denote, addresses
different shear deformation theories.
Presented in Figure 5, the “Mesh” sub-separator contains a panel dedicated to the element
type, where the user can choose to discretize the plate into linear (Q4) or quadratic (Q9)
quadrilateral finite elements, both belonging to the Lagrange family and illustrated in the
panel. Then, the discretization to be applied to the plate is defined in the "Mesh
Discretization" field, where different discretizations are available, namely from 44 to higher
h-refinements (varying number of elements). After this, a 2D diagram of the plate will be
presented according to the selection made, as well as the total number of elements and nodes
to which it leads. In this way, the user can explore the influence of the element type and mesh
discretization on the total number of elements and nodes, which in turn influence the analysis’
computational cost. This can be thought in terms of the total number of degrees of freedom of
the discretized domain and/or the computational time required for the analysis.
Figure 5. FEM separator: element type and mesh configuration
In the sub-separator dedicated to the shear deformation theories, presented in Figure 6, the
user can choose between a first order shear deformation theory (FSDT) or a higher order shear
deformation theory (HSDT). The formulations of the respective displacement fields are
296
exposed, and the user will have access to more detailed information in this regard by clicking
on the question mark button near each of the available theories.
Figure 6. FEM separator: shear deformation theory
Just like the separators presented before, the sub-separators included in the "FEM" separator
also contain tips for user support.
Loads and constraints separator:
At this stage of the process, the plate under study is already configured in terms of geometry
and constituent materials, its discretized model was also defined by a finite element mesh and
the shear deformation theory to be considered has been chosen. Therefore, one needs now to
characterize the load and constraint conditions to which the plate will be subjected. This
configuration occurs in the "Loads and Constraints" separator presented in Figure 7.
297
Figure 7. Loads and constraints configuration
This separator consists of two main sections, one related to the constraints and other dedicated
to the load type and magnitude. Concerning to the constraints, there are four situations
available, so the user can choose to consider the plate simply supported (SSSS) or fixed
(CCCC) at all its edges, or clamped in one edge and free at the others (CFFF), or simply
supported in two opposite edges and free at the remaining edges (SSFF). To assist the user,
this section contains an image of the Cartesian reference considered and, when the type of
constraint is selected, an illustrative scheme of the chosen situation is presented in order to
familiarize the user with the symbology used in this context.
Currently, the platform offers three different loading conditions: uniformly distributed
transverse load, axially distributed load (similar to the load situation of a tensile test), and
load condition corresponding to a three-point bending test. Each load condition can be
visualized in the schemes included to this purpose, allowing the user to better interpret and
understand each one.
The pre-processing stage of FEM ends with this separator settings. From this point on the
static analysis will be performed (analysis stage) and the processing of the obtained primary
variables results can be processed (post-processing stage) for results’ presentation purposes.
298
Results separator:
After all the necessary settings defined, in the “Results” separator, illustrated in Figure 8, the
user will start the simulation process by clicking on the "Solve" button. By doing this the
FEM analysis stage is performed. Regarding displacements (primary variables obtained
directly from the Analysis stage), the results appear in the form of a 3D graph accompanied
by the respective contour lines, showing the maximum transverse displacement value and its
location on the plate. This separator contains a summary section, presenting some relevant
information about the configurations applied to the study, namely about the geometry, finite
element type, shear deformation theory, mesh discretization and total number of degrees of
freedom, porosities distribution if considered, as well as the load conditions and constraints
imposed. In case of choosing FSDT as shear deformation theory, the shear correction factor
plays an important role in the study, so this separator also includes information about its
value. The neutral surface, which generically distinguishes two sections of the plate, under
compression or traction, doesn't always coincide with the geometrical medium surface when
considering FGMs. For this reason, the neutral surface' shift value is also presented,
accompanied by an image alluding to this fact, which aims to promote the comprehension of
this concept and the distinction between neutral and mid-plane surfaces.
299
Figure 8. Study summary and results
If the user intends to analyze the results on the plate's response regarding displacements in
more detail, the option "Explore in independent figures" must be selected. In this case, two
graphs will appear in independent figures, one with nodal displacements (Figure 9-a) and a
second where this nodal displacements appear overlapped with the finite element mesh
(Figure 9-b), allowing the user to explore the results in a more detailed way.
(a)
(b)
Figure 9. Results separator: (a) independent figure with nodal displacements; (b) independent
figure with nodal displacements and finite element mesh
Conclusions
The platform here presented, constitutes an interactive and pedagogical tool to initiate and
accompany the student in the study of the static behavior of composite materials, namely
functionally graded materials, and allowing the consideration of reinforcement with carbon
nanotubes and/or different porosity distributions. In addition to exposing the main aspects
underlying the finite element method and the shear deformation theories, the platform also
allows to simulate different load and constraints conditions.
The platform presented contributes to the introduction and understanding of the concepts
inherent to the plate's modeling and simulation by the finite element method, by giving the
possibility of exploring the influence of different configurations in the results.
300
All separators include user support tips and information on the topics covered in each of
them, facilitating the platform use and promoting a better comprehension and exploration
of the concepts.
The results are presented not only in a graphical form, illustrating the nodal displacements,
but also numerically, which allows the user to have access to different and important
information for the understanding of the influence of different parameterizations.
Since composite materials are a strong and very current trend and being plates a structural
element widely studied in different engineering fields, the versatility of the developed
platform, combined with the wide range of concepts it encompasses, demonstrates its
potential as a complement to teaching-learning process.
Since it is a recently developed platform, its performance and impact assessment close to
students has not yet been verified. This assessment is intended to be all-embracing,
including students from different levels of Engineering education.
In the future, focus to the extension of the platform will be given, expanding its
applicability to other types of analyses, to a greater diversity of composite materials,
allowing the consideration of different distribution laws, in respect to FGMs, and new
porosity distributions. Also, it is intended to increase the variety of load and constraints
conditions available.
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302
16.DESIGN THINKING E METODOLOGIAS CRIATIVAS NO
ENSINO SUPERIOR. ITINERÁRIO PEDAGÓGICO E
INVESTIGATIVO COM PARTIDA NA SOCIOLOGIA DA
INFÂNCIA
Rosalina Pisco Costa53, Beatriz Roque54 & Vanessa Carreira55
Resumo
Este texto apresenta uma experiência pedagógica apoiada em Design Thinking e metodologias
criativas, desenvolvida no ano letivo 2019/20, no contexto da unidade curricular “Sociologia
da Infância”, disciplina optativa do curso de Sociologia na Universidade de Évora, Portugal.
A disciplina foi estruturada em aulas teóricas e práticas, acompanhamento tutorial e soluções
a distância. Os estudantes foram desafiados a desenvolver um exercício que permitisse
expandir e aprofundar os conhecimentos de natureza teórico-conceptual discutidos nas aulas
teóricas. As metodologias ativas foram específica e propositadamente desenhadas para
desenvolver a capacidade de pensar criticamente os problemas apresentados, estimulando o
debate e a imaginação sociológica. Inspirada pelo modelo Evolution & Design Thinking 6² da
Mindshake (Tschimmel, 2018), foram organizadas aulas práticas e exploradas de forma
particular as metodologias “mural de inspiração” (inspiration board), “declaração de
intenções” (intent statement) e “agregação livre de ideias” (insight clustering). Este texto
apresenta e detalha a implementação desse projeto pedagógico particular, atribuindo
* Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P.,
no âmbito do projeto «UIDB/04647/2020» do CICS.NOVA – Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da
Universidade Nova de Lisboa / This work is financed by national funds through FCT - Foundation for Science
and Technology, I.P., within the scope of the project «UIDB / 04647/2020» of CICS.NOVA - Centro
Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa.
53
Rosalina Pisco Costa é socióloga, professora auxiliar no Departamento de Sociologia, Escola de Ciências
Sociais da Universidade de Évora e investigadora integrada no CICS.NOVA.UÉvora, Centro Interdisciplinar de
Ciências Sociais, Pólo de Évora. As suas áreas de investigação e publicação principais são a Sociologia da
Família, Infância, Consumo, Vida Quotidiana e Metodologias Qualitativas, Sensoriais e Criativas de
Investigação Social.
54
Beatriz Roque é estudante finalista do curso de licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora (201720). Em 2019/20 frequentou e concluiu com sucesso a unidade curricular optativa “Sociologia da Infância”
[SOC2425L]. As áreas temáticas objeto do seu interesse são sobretudo Sexualidade e Género, Arte, Cultura e
Comunicação, Sociologia da Saúde, Pobreza, Exclusão Social e Políticas Públicas e Famílias e Curso de Vida.
55
Vanessa Carreira é estudante finalista do curso de licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora (201720). Em 2019/20 frequentou e concluiu com sucesso a unidade curricular optativa “Sociologia da Infância”
[SOC2425L]. As suas áreas de interesse principal são Famílias e Curso de vida, Sociologia da Saúde, Sociologia
da Religião, Sexualidade e Género e Classes, Desigualdades e Políticas Públicas.
303
protagonismo e tornando mais visível a experiência dos principais atores envolvidos:
professora e estudantes. No final, espera-se contribuir para discutir o lugar do Design
Thinking e das metodologias criativas para motivar e envolver de maneira mais eficaz
estudantes e professores na relação pedagógica e atividade de investigação em contexto
universitário e, em última instância, pensar também os seus limites e desafios.
Palavras-chave: Design thinking. Métodos criativos. Crianças. Escuro. Sociologia.
304
Introdução
São muitas e diversas as vozes que um pouco por todo o mundo e nos mais diversos contextos
têm chamado a atenção para a necessidade e urgência de repensar os curricula e as
metodologias de ensino-aprendizagem no contexto de ensino superior56 (UNESCO, 2016). As
alterações introduzidas em consequência de uma maior utilização das tecnologias de
informação e comunicação e de uma generalizada viragem para o digital (Twenge, 2017) são
porventura a face mais visível da mudança em curso. Não obstante, estudos recentes vêm
também chamar a atenção para outras fontes de complexidade, nomeadamente as
características que distinguem gerações entre si. Apesar do relativismo que se impõe na
leitura e interpretação dessas teses, importa reconhecer o que parece ser uma tendência de
mudança: as novas gerações de jovens parecem pensar de forma diferente e,
consequentemente, aprendem de modo distinto (Törőcsik, Szűcs, & Kehl, 2014).
Paralelamente, e como num jogo de espelhos, aquando do recrutamento, as entidades
empregadoras parecem valorizar, cada vez mais, competências transversais, como a
capacidade de pensar criativa e criticamente, tomar iniciativa e trabalhar de modo
colaborativo (Zemke, Raines & Filipczak, 2013).
Com este enquadramento de fundo e inspirada pela frequência de uma formação intensiva em
Design Thinking Applied In Education, orientada por Katja Tschimmel57, decidi ensaiar estes
princípios na minha prática docente. Em setembro de 2019, chamada a lecionar a unidade
curricular “Sociologia da Infância”, uma unidade curricular optativa oferecida ao curso de
licenciatura em Sociologia na Universidade de Évora, julguei ser este o terreno fértil para tal
ensaio. Por um lado, porque sabia de experiência anterior que um dos principais desafios
desta UC é o de romper com o senso comum e ultrapassar a barreira epistemológica que
condiciona a forma como os sujeitos que observam – estudantes, adultos-jovens –
percecionam e conceptualizam os sujeitos observados – crianças. Por outro, porque a
condição de disciplina optativa deixa usualmente à docência uma maior plasticidade na
56
À data em que ultimamos a revisão deste texto (junho de 2020), a pandemia gerada pelo vírus SARS-CoV2
trouxe a constatação (forçada) dos inúmeros (novos) desafios que se impõem neste domínio. Parcialmente já
enfrentados no presente ano letivo, estes desafios confrontaram de forma direta e diversa as autoras do texto,
inclusive nas dinâmicas geradas para a redação em coautoria a distância. Não obstante, o texto deixará de fora
estas considerações, não porque as autoras não as reconheçam como especialmente importantes; antes porque se
impõe respeitar o resumo oportunamente submetido e aceite em tempo “pré-COVID” para a Conferência
Learning and Teaching in Higher Education “Students and Teachers”.
57
Esta formação foi promovida pelo IDeIA - Centro Transdisciplinar para a Investigação, Desenvolvimento e
Inovação Aplicada da Universidade de Évora e decorreu no Colégio dos Leões, antiga Fábrica dos Leões, em
Évora, entre os dias 11 e 13 de setembro de 2019.
305
orientação científico-pedagógica e, consequentemente, uma maior liberdade para imaginar
criativamente soluções de ensino-aprendizagem que possam lidar com aqueloutro desafio.
Com o objetivo último de fomentar o interesse e o envolvimento dos estudantes na disciplina
e melhorar as aprendizagens alcançadas, no ano letivo 2019/20 foi implementada uma
experiência de ensino-aprendizagem apoiada em Design Thinking na UC “Sociologia da
Infância”. Esta unidade curricular tem como objetivo principal fornecer os instrumentos
teóricos, conceptuais e metodológicos necessários à compreensão crítica, sociologicamente
ancorada, da diversidade, relatividade e complexidade em torno da temática da criança e da
infância na sociedade contemporânea. A disciplina foi estruturada em aulas teóricas e
práticas, acompanhamento tutorial e soluções a distância. Os estudantes foram chamados a
desenvolver um exercício que permitisse expandir e aprofundar os conhecimentos de natureza
teórico-conceptual discutidos nas aulas teóricas. Metodologias ativas e criativas foram
específica e propositadamente desenhadas para desenvolver a capacidade de pensar
criticamente os problemas apresentados, estimulando o debate e a imaginação sociológica.
Inspirada pelo modelo Evolution & Design Thinking 6² da Mindshake (Tschimmel, 2018),
foram organizadas aulas práticas e exploradas de forma particular as metodologias “mural de
inspiração” (inspiration board), “declaração de intenções” (intent statement) e “agregação
livre de ideias” (insight clustering).
Este texto apresenta e detalha a implementação desse projeto pedagógico particular, dando a
voz e tornando mais visível a experiência dos principais atores envolvidos: professora e
estudantes. Especificamente, contextualiza a metodologia proposta e ilustra o itinerário de
pesquisa adotado por um grupo de estudantes empenhadas em investigar significados e
representações em torno do escuro da noite na perspetiva das crianças (Roque & Carreira,
2020). O exercício empírico descrito serve, assim, de mote para discutir o lugar do Design
Thinking e das metodologias criativas para motivar e envolver de maneira mais eficaz
estudantes e professores na relação pedagógica em contexto universitário e, em última
instância, pensar também os seus limites e desafios.
306
Pensar a transferibilidade do Design Thinking para a educação: possibilidades e
potencialidades
Design Thinking58 refere-se a um método e processo para investigar problemas abertos, mal
definidos ou complexos, procurando novas perspetivas e soluções (Tschimmel et al., 2015).
As fundações teórico-metodológicas do Design Thinking são amplas e diversificadas (Simon,
1969; Lawson, 1986; Rowe, 1987; Cross, Dorst, & Roozenburg, 1992; Eastman, Mccracken,
& Newstetter, 2001). Para os propósitos deste texto socorremo-nos dos trabalhos de Katja
Tschimmel, que em contexto português tem contribuído para dar mais visibilidade a esta
metodologia, insistindo em particular na sua transferibilidade para diversos domínios,
designadamente o da educação e formação.
O Design Thinking aplica-se ao desenvolvimento criativo de processos, estratégias e
programas e é transversal à recolha de informação, análise de conhecimento, aprofundamento
de empatia, experimentação de novas perspetivas e ideias, visualização e prototipagem de
novos conceitos, sempre com foco em resultados. Katja Tschimmel defende que o Design
Thinking é uma atitude (mindset), um modelo para estruturar e focar um processo de design
que pode ser usado na educação da mesma maneira que tem sido aplicado em processos de
design de produtos e sistemas de serviço. Como refere:
Design Thinking derives from the designers’ way of thinking, from their mindset and approach to work.
It is a method that anyone can use. Design Thinking is founded on the ability to combine empathy for
the context of a problem, creativity in generating ideas, insights and solutions, and rationality to analyse
and match solutions to the context. Designers are at the same time analytical and empathic, rational and
emotional, methodical and intuitive. (Tschimmel et al., 2016, p. 13)
O argumento principal de transferibilidade para o domínio da educação radica no facto de o
Design Thinking ser centrado no ser humano, é multidisciplinar e colaborativo, otimista e
experimental (Tschimmel et al., 2015, p. 6). É um processo centrado no ser humano porque
implica a compreensão das necessidades e motivações humanas. A empatia torna-se, assim,
fundamental para repensar com êxito o sistema educacional e as metodologias de
aprendizagem. É multidisciplinar e colaborativo porque na busca pela resolução de problemas
e inovação envolve pessoas diferentes com conhecimentos específicos e papéis determinados
no desenvolvimento de um projeto e na procura das melhores soluções. É otimista porque
Tschimmel distingue entre design thinking (minúsculas) e Design Thinking (maiúsculas) para referir “1.
“design thinking” as an academic construction of the professional designer’s practice and theoretical reflections,
linking theory and practice from a design perspective and 2. “Design Thinking” as an organisational resource for
innovation in business.” (Tschimmel, 2018, p. 4).
58
307
acredita na capacidade de todas as pessoas para, em conjunto, poderem criar novas soluções
para resolver um problema, e que isto é relativamente independente do tamanho das equipas,
tempo e disponibilidade orçamental. Por fim, experimental porque o Design Thinking se
baseia na crença de que os erros constituem um input importante no processo iterativo de
aprendizagem e melhoria. Deste ponto de vista, testes iniciais são realizados com o objetivo
de forçar o surgimento de erros numa fase precoce do processo, procurando dessa forma
encontrar melhores soluções sem gastar muito dinheiro. Trata-se, em suma, de “um processo
de “«aprender fazendo»”, onde novas ideias são baseadas num processo de aprendizagem
contínua com base no feedback adquirido.” (Tschimmel et al., 2015, p. 72).
A transferibilidade defendida por Katja Tschimmel para o domínio da educação
operacionaliza-se através da adaptação e aplicação do modelo Mindshake Design Thinking
Model Evolution 6² (Tschimmel, 2018), desenvolvido pela autora entre 2012 e 2015, ano em
que a última versão foi registada no Creative Commons sa-by (MINDSHAKE, 2020). Este
modelo pode ser usado para orientar um processo de Design Thinking aplicado a várias áreas,
inclui métodos de pesquisa quantitativos e qualitativos, apoia-se em dados primários e
secundários, e está conectado com o pensamento visual e ferramentas diversas de criação de
sentido. O modelo é designado de Evolution 6², o que a autora explica em três momentos.
Primeiro, “Evolução”, porque o processo criativo é um processo em evolução permanente,
iterativo e interativo, tanto ao nível de pessoas, como de situações (Fig. 1).
308
Fonte: Mindshake’s Innovation & Design Thinking Model Evolution 6² TEMPLATES.
Figura 1 – Mindshake Design Thinking Model Evolution 6².
A Figura 1 mostra o design gráfico escolhido para o modelo. Nele pode observar-se que cada
E-fase está relacionada com as outras fases em ciclos iterativos. “E6”, porque o modelo é
dividido em seis fases principais, todas elas a iniciar pela letra E, tanto na língua inglesa como
na portuguesa: “Emergence” (Emergência), “Empathy” (Empatia), “Experimentation”
(Experimentação), “Elaboration” (Elaboração), “Exposition” (Exposição) e “Extension”
(Extensão) . Finalmente, “E6²” porque em cada fase do processo ocorrem momentos de
“Exploration”
(divergência)
e
“Evaluation”
(convergência),
elevando
assim,
metaforicamente, a potência do modelo ao quadrado.
A fase de “Emergência” consiste na identificação de uma oportunidade e visa responder à
questão “Qual é o desafio” ou “Como encontro um desafio ou uma oportunidade para
inovar?” De facto, o processo E.6² começa com observação e pesquisa. Isso significa estar
aberto para novos estímulos e ideias que podem levar à identificação de um novo desafio. O
mesmo acontece olhando para as mudanças que ocorrem na cultura, negócios, tecnologia e
309
política, ou estudando tendências, de modo a identificar oportunidades de inovação. Esta fase
compreende várias técnicas como a pesquisa nos media, a observação de tendências, a
elaboração de mapas mentais de oportunidades de um mural de inspiração, a construção de
uma matriz de tendências e a estabilização de uma declaração de intenções.
A fase de “Empatia” pretende aprofundar o conhecimento em torno do contexto e responder à
questão “Quem é o destinatário?”. Nesta fase do processo são mobilizadas ferramentas
específicas que permitem recolher informação sobre os potenciais destinatários e
compreender o contexto mais amplo. Para o efeito são utilizadas as técnicas de observação,
entrevistas e construção de mapas diversificados, nomeadamente os das partes interessadas,
mapas pessoais, mapas de viagem e outros mapas, considerados inspiradores.
A fase de “Experimentação” desenvolve-se em torno da questão “Quais são as melhores
ideias?” e destina-se, precisamente, a gerar e experimentar ideias, recorrendo para o efeito a
técnicas várias de brainstorming (e.g. brainwriting/sketching, confrontações semânticas,
analogias, cluster de ideias, matriz de avaliações e termómetro de ideias).
Segue-se a fase de “Elaboração”, consistindo esta em trabalhar a ideia e transformá-la num
conceito. Impõe-se, neste caso, responder à questão “Qual é o melhor conceito?” e procura-se,
através da resposta obtida, desenvolver e materializar as ideias em conceitos que funcionem
como soluções semânticas, aptas a serem testadas e melhoradas. Para este efeito percorre-se a
área de trabalho e usam-se técnicas específicas como encenação, prototipagem rápida, testes
de conceito, planta de serviço e visualização de um modelo de negócios.
Na fase de “Exposição” procura-se responder à questão “Como é que eu comunico um novo
conceito ou solução? O sucesso desta fase implica que os eventuais clientes possam entender
“o que poderia ser” de maneira imediata e intuitiva. Por esta razão, nesta fase do processo
aplicam-se técnicas narrativas e de visualização, contribuindo assim para criar uma
apresentação atrativa e emocional (e.g. equacionando o recurso a formas diversas de
storytelling, storyboarding e outras).
A última fase do processo diz respeito à “Extensão”. Nesta fase a questão que se impõe é
“Como posso implementar novas soluções e como posso melhorar e crescer?”. É então o
momento de recorrer a técnicas estratégicas como o mapa de implementação ou matriz de
peritos.
310
A elaboração e publicação de um toolkit associado a este modelo (Tschimmel et al., 2016;
Tschimmel, 2018) compreende uma descrição detalhada e exemplificativa de todas as fases
enunciadas, assim como de um conjunto de técnicas específicas de operacionalização (6 em
cada fase). Esta componente torna o modelo bastante atrativo e passível de utilização em
múltiplos contextos, como no desenvolvimento de projetos, workshops, sessões de coaching,
projetos de investigação, aulas de metodologia, entre outros59.
No domínio particular da sociologia, campo disciplinar em que as autoras se situam, os
últimos anos têm assistido à generalização de um conjunto importante de metodologias
consideradas inovadoras ou criativas em investigação social (Denzin & Lincoln, 2011; Kara,
2015; Mason, 2002; Mason & Dale, 2011). Estas metodologias cobrem um leque
diversificado de técnicas e abordagens e são tributárias da experiência de pesquisa em equipas
multi e interdisciplinares e da necessidade de responder à complexidade crescente das
questões de investigação em ciências sociais (Kara, 2015). Por metodologias criativas
entende-se um conjunto vasto de metodologias não necessariamente novas na história da
investigação social. A adjetivação insiste no carácter processual das metodologias, e alude,
sobremaneira, à criação de algo a partir de elementos que já existem, dispondo-os ou
articulando-os em combinações diferentes tendo em vista a resolução de questões ou
problemas específicos (Kara, 2015). Analisando-as mais de perto fica claro que muitas dessas
metodologias se aproximam dos princípios e pressupostos do Design Thinking, embora nem
sempre com relação direta a esta abordagem (Mäkelä et al., 2014). A secção que se segue
explora de forma detalhada um ensaio de aplicação de algumas das técnicas do Design
Thinking à metodologia criativa de investigação social e procura, no final, refletir criticamente
sobre o seu alcance, potencialidades e limites.
Discutir e investigar criativamente a criança e a infância: um itinerário pedagógico
A unidade curricular “Sociologia da Infância” [SOC2425L] é uma disciplina optativa do
curso de Sociologia na Universidade de Évora. A oferta desta unidade curricular tem como
objetivo principal fornecer os instrumentos teóricos, conceptuais e metodológicos necessários
à compreensão crítica, sociologicamente ancorada, da diversidade, relatividade e
complexidade em torno da temática da criança e da infância na sociedade contemporânea.
Especificamente, no final do semestre os estudantes devem ser capazes de: (i) caracterizar a
criança como categoria social e a infância como estrutura geracional construída socio59
Os modelos contidos no toolkit podem ser descarregados a partir do Pinterest, em http://pin.it/ffhmFLI.
311
historicamente; (ii) apresentar criticamente o percurso teórico de emergência e consolidação
da Sociologia da Infância; (iii) desenvolver os pressupostos epistemológicos, metodológicos e
éticos subjacentes à investigação sociológica com crianças; (iv) discutir criticamente os
principais eixos que enformam as culturas da infância; (v) analisar criticamente o lugar da
criança como ator social no quadro dos vários constrangimentos e possibilidades estruturais;
(vi) refletir de modo fundamentado sobre os principais temas que animam o debate
sociológico neste domínio.
A lecionação da unidade curricular pressupõe que sejam impulsionadas metodologias de
estímulo ao desenvolvimento académico dos estudantes, assentes num trabalho de reflexão,
questionamento crítico e análise contínua, devidamente orientados e enquadrados em sessões
letivas e de orientação tutorial, tanto individual como de grupo. A proposta pedagógica para
esta disciplina privilegia uma combinação entre métodos expositivos e ativos. O método
expositivo materializa-se em sessões destinadas à apresentação das linhas de orientação
teórica, analítica e metodológica da disciplina e de sistematização e problematização dos
conteúdos programáticos, com recurso a meios audiovisuais e indicação de bibliografia geral
e específica. As metodologias ativas compreendem sessões organizadas em torno da discussão
coletiva de textos ou outros materiais de trabalho (e.g. visionamento de filmes,
documentários, participação em conferências no âmbito dos temas tratados na disciplina, entre
outros); leitura, apresentação e discussão crítica de textos selecionados em torno de autores,
perspetivas e casos de aplicação empírica; e desenvolvimento, apresentação e discussão de
exercícios desenvolvidos pelos estudantes de forma individual e/ou em pequeno grupo. De
modo transversal, procurou-se também aplicar o método interrogativo, de estímulo à
participação ativa dos estudantes no funcionamento da unidade curricular, com o objetivo de
fomentar e desenvolver atitudes de problematização, raciocínio analítico, crítico e reflexivo
sobre os temas tratados.
No ano letivo 2019/20 foi proposto aos estudantes o desenvolvimento de um exercício
empírico de leitura sociológica crítica e fundamentada de um tema/debate em torno da criança
e da infância na contemporaneidade, selecionado livremente de entre os seguintes: as
representações das crianças sobre o mundo que as rodeia: o trabalho, a segurança, o ambiente,
os professores, os pais, os irmãos, a escola, a morte, a relação entre pares, …; os espaços que
as crianças ocupam/vivem/habitam: a casa (divisões específicas – o quarto, a sala, a cozinha,
…), a escola, os recreios, o ATL, o parque infantil & espaços menos evidentes ou
expectáveis: o hospital, a prisão, a igreja, os funerais, a cidade, …; os tempos das crianças:
312
estudar, brincar, ver televisão, jogar, estar no computador, …; os ofícios das crianças,
socialização, fruição e competição: trabalhar, ajudar os pais, ser aluno, desportista, artista, …;
publicidade, imaginários e consumos: TV, imprensa, youtubers e influencers; Disneyficação e
Mcdonaldização; indústrias da/para a infância; as culturas da infância: rotinas (dia-a-dia),
rituais (aniversário, Natal, férias e outros dias ou momentos “especiais”, …), cultura de pares
(infâncias digitais, culturas juvenis, …); e, as “outras” infâncias (diferentes, esquecidas,
negligenciadas, invisíveis, …).
Os objetivos específicos então traçados compreendiam: (i) sensibilizar os estudantes para a
diversidade e complexidade da perspetiva sociológica sobre a infância; (ii) desenvolver
competências ao nível dos pressupostos epistemológicos, metodológicos e éticos subjacentes
à investigação sociológica com crianças; (iii) operacionalizar teorias e conceitos trabalhados
no âmbito dos conteúdos programáticos da UC na análise de material empírico e situações
concretas.
Inspirada pelo Mindshake Design Thinking Model Evolution 6², a operacionalização do
exercício incentivou à exploração de três técnicas específicas: o “mural de inspiração”, a
“declaração de intenções” e a “agregação livre de ideias”, acompanhando, respetivamente, as
fases de exploração, recolha e análise de dados e interpretação de resultados. A secção que se
segue ilustra a aplicação dos princípios do Design Thinking, e destas técnicas em particular,
ao desenvolvimento de um itinerário de pesquisa comprometido com o desejo de pensar,
discutir e investigar criativamente a criança e a infância a partir dos significados e
representações sobre o “escuro” (Roque & Carreira, 2020).
Um itinerário de pesquisa: desenhar e discutir o escuro na perspetiva das crianças
Partida: o mural de inspiração e uma lua autocolante que brilha no escuro
Tal como os exercícios de Design Thinking são desenvolvidos com um fim em aberto, assim
também partimos para este exercício sem conhecer o ponto de chegada. Na bagagem
levávamos apenas as sugestões iniciais de um conjunto suficientemente amplo de temas e
debates em torno da criança e da infância na contemporaneidade. O ponto de partida seria
dado através da composição de um “mural de inspiração” (inspiration board). Nos últimos
anos esta atividade ganhou algum protagonismo por via da generalização da rede social e
aplicação Pinterest60, através da qual se carregam e guardam imagens e outros conteúdos
60
Pinterest é uma rede social de compartilhamento de fotografias criada no EUA em 2010 por Paul Sciarra,
Evan Sharp e Ben Silbermann (Wikipedia, 2020). A rede social está disponível em https://www.pinterest.com e é
313
multimédia considerados significativos para um determinado tema ou icónicos em
determinados domínios. No contexto do Design Thinking o desafio é análogo: “An inspiration
board is a fun, risk-free and stress-free way to collect interesting images related to your
project without much analysing. It is also an effective way to let go of critical and logical
thoughts and to (re)discover parts of a larger picture that realistically illustrate the world of
education and pedagogy.” (Tschimmel et al., 2016, p. 31).
Numa das sessões iniciais da UC, foi pedido aos estudantes que recolhessem, como num
“pinboard”, um conjunto de elementos que permitissem equacionar imaginativamente
possibilidades de estudo para o exercício empírico. De modo explícito foi-lhes solicitado que
considerassem a criação de um mural de inspiração como se de um jogo se tratasse, sem
regras ou determinismos a condicionar a seleção e organização das imagens ou artefactos.
No contexto do exercício que aqui analisamos (Roque & Carreira, 2020), o grupo de trabalho
reuniu um total de nove elementos inspiradores, entre eles, uma lua autocolante que brilha no
escuro, um brinquedo em forma de peão, um jogo de cartas, um poema relativo à infância e
pincéis. Cada um destes elementos foi apresentado oralmente perante a turma e essa narrativa
foi posteriormente expandida através de intervenções espontâneas por parte de outras pessoas
presentes na sala. O grupo tomou nota dos contributos e, após reflexão aprofundada, optou
por utilizar como principal objeto inspirador a lua autocolante que brilha no escuro.
Apesar de o efeito empiricamente observável desta ferramenta ter sido a seleção de vários
elementos inspiradores, o principal resultado não se esgota nesses elementos tomados
individualmente; antes na composição que resulta da justaposição e eventualmente confronto
entre as diversas imagens e objetos. Efetivamente, é na narrativa articulada sobre os diversos
elementos que o processo criativo se consubstancia e de onde se alimenta. Essa narrativa é
única e espontânea. As ideias sucedem-se de forma livre e, quer pela apresentação de quem
recolheu os elementos, quer pela intervenção e interpelação das pessoas presentes, encadeiamse de forma e em sequências imprevisíveis. No final, espera-se que se consiga alcançar um
resultado coeso, capaz de motivar e inspirar os dinamizadores do projeto.
Este exercício revelou-se importante para vincular os estudantes aos objetivos da disciplina,
motivando-os a levar para o espaço da sala de aula alguns dos seus interesses e preocupações
de uma forma lúdica e livre. Deste modo, trabalhou-se a ideia de que os estudantes não são
usada para carregar, guardar, classificar e gerenciar imagens, conhecidas como "pins", e outros conteúdos
multimédia como vídeos, por exemplo, colocando-os em coleções temáticas, conhecidas como "pinboards".
314
apenas destinatários, mas também agentes ativos do processo de ensino-aprendizagem.
Paralelamente, o exercício foi decisivo para clarificar os caminhos que a investigação viria a
tomar, nomeadamente, no que respeita à definição do tema e objetivos a alcançar, à revisão de
literatura, à metodologia que se pretende adotar, à forma como é realizada a análise de dados
e respetiva interpretação de resultados e extração de conclusões. No caso particular do
exercício em apreço, o mural de inspiração foi determinante para a consolidação de uma
conceção holística sobre o tema em estudo. Se é certo que a Sociologia serviu de
enquadramento principal – através, nomeadamente, da compreensão do lugar do medo na
sociedade contemporânea (Bauman, 2006) –, outros domínios do saber contribuíram de forma
não menos importante para a produção de conhecimento, nomeadamente, e a título de
exemplo, a psicologia, filosofia, estética ou semiótica (Carvalho, 2013; Guimarães, 2013;
Schreuder, s/d).
Largada: a declaração de intenções e os porquês no trabalho de campo
No quadro mais amplo do Mindshake Design Thinking Model Evolution 6², uma “declaração
de intenções” (intent statement) é uma ferramenta de pensamento convergente, elaborada no
final da fase de Emergência. É usada para ajudar a encontrar a resposta para a pergunta "Por
que queremos inovar?", esclarecendo a inovação proposta e guiando as fases subsequentes.
Como refere Tschimmel, “Most of the time the decision to develop new content is based on a
hunch, and feeling the necessity for change and improvement. […] Sometimes however it is
not easy to describe those early ideas in words and your concepts have to ‘mature’. The
elaboration of an Intent Statement helps you to clarify your determination for innovative
content development.” (Tschimmel et al., 2016, p. 77). A declaração de intenções concilia,
pois, intuição e assertividade, já que daqui deve resultar uma enunciação clara do propósito e
desenvolvimento a seguir.
O convite para trabalhar os objetivos de investigação através desta formulação alternativa
trouxe vantagens acrescidas ao processo investigativo. Visando uma resposta clara e concisa,
os estudantes foram convidados a elaborar a sua intenção adaptando a estrutura “Qual é a sua
[minha] intenção?” (Tschimmel, 2018, p. 25).
Para o grupo de trabalho decidido a estudar o escuro, a declaração de intenções foi “subscrita”
e consensualizada em torno de: (i) desmistificar o que pode existir no espaço onde as crianças
dormem, seja num quarto só seu, ou partilhado, e como se preparam para o dormir, ou seja, se
315
existem e quais são os rituais associados, regras e processos específicos; (ii) caracterizar o
espaço de transição dia/noite em termos de objetos, atores e ligação com subespaços
envolventes. A revisão de literatura permitiu situar o tópico em estudo na área disciplinar da
sociologia e obrigou a retornar muitas vezes à declaração de intenções antes subscrita. Na
verdade, “The Intent Statement is not a closed document, but a starting point, thus open for
changes.” (Tschimmel, 2018, p. 26).
Por forma a concretizar esta declaração de intenções foram recrutadas seis crianças do 2.º e do
4.º ano, com 7 e 9 anos de idade, respetivamente, de uma escola de 1.º ciclo do ensino básico,
localizada no centro histórico da cidade de Évora, para um estudo de casos múltiplos. A
seleção das crianças fez-se através de sorteio, garantindo-se assim que todas as crianças
tinham a mesma probabilidade de integrarem o estudo. O recurso ao sorteio foi intencional e
visou aproximar o processo de investigação de uma atividade relativamente familiar às
crianças: o jogo. Como referem Pinto & Sarmento: “(…) o jogo infantil, entendido no sentido
de representações de papéis (ou brincar ao faz de conta), constitui um passo essencial no
processo de construção da autoconsciência da infância (Pinto & Sarmento, 1997, p. 42)”.
Proporcionando a todas as crianças o momento de um jogo, este serviu dois propósitos. Por
um lado, aproximou as investigadoras das crianças, ultrapassando uma barreira que é não
apenas etária, mas também e principalmente epistemológica. Por outro, o recurso ao jogo,
incluindo a clarificação e aceitação das regras inerentes ao mesmo, fez com que as crianças
que não integraram a amostra não se sentissem ressentidas ou excluídas, encarando esse facto
como uma consequência “natural” das regras do jogo previamente aceites.
Uma caixa de ferramentas “à medida” (toolkit) foi desenhada para dar corpo ao trabalho de
campo. Desta caixa de ferramentas constam três elementos principais: a “Declaração de
Consentimento Informado” - anexada no “Pedido de Autorização” -, o “Guião do Desenho” e
o “Guião da Entrevista”. Estas ferramentas revelar-se-iam fundamentais no processo de
recolha de dados, uma vez que asseguram não só a validade do estudo, como a confiança e
acompanhamento por parte dos entrevistados e, particularmente, dos encarregados de
educação.
A declaração de intenções revelar-se-ia igualmente determinante no compromisso ético
assumido pelas investigadoras. Em concreto, o pedido de autorização foi o documento
utilizado para explicar os objetivos e apresentar o detalhe da operacionalização do estudo,
além de solicitar a respetiva autorização aos responsáveis pelas crianças. Tratando-se de um
316
estudo cuja população-alvo são crianças, foi necessário adequar a linguagem no momento em
que foi solicitada a sua participação, tornando-a mais simples e objetiva para um público não
académico. Em todos os momentos houve total adesão ao “Código Deontológico” da
Associação Portuguesa de Sociologia e, particularmente, aquando da solicitação de
consentimento. Como estabelece o código: “nos processos de recolha de informação, os
sociólogos devem ter o cuidado de explicitar junto dos informantes a sua identidade
profissional, tal como a natureza, objetivos, procedimentos e enquadramentos institucional
dos trabalhos que realizam” (APS, 1992, p. 9).
O desenho infantil e a entrevista-conversa constituíram as técnicas-chave para a recolha de
dados.
Ambas
foram
orientadas
segundo
guiões
antecipadamente
definidos
e
propositadamente elaborados para o efeito. Optou-se por solicitar primeiro o desenho, para de
algum modo conquistar a confiança das crianças, deixando-as mais confortáveis com as
investigadoras, seguindo-se depois a realização das entrevistas-conversa.
A realização do desenho e das entrevistas teve lugar a 21 de novembro de 2019, entre as 9h e
as 17h. No primeiro caso, foi entregue à criança uma folha de papel em posição oblíqua e
canetas de colorir para que pudesse desenhar que atores, objetos e rituais associam ao escuro.
A literatura sugere que a realização de entrevistas com crianças possa ter lugar em locais
familiares ou conhecidos, de modo que estas se sintam o mais confortáveis e seguras possível
(Saramago, 2001). No estudo que aqui acompanhamos, a escola disponibilizou uma sala para
o efeito. O fato de essa sala em particular ser desconhecida por todas as crianças entrevistadas
fez com que a sua reação fosse surpreendente. No final, ficaram muito entusiasmadas porque
conhecerem um espaço novo que sempre esteve presente, embora vedado o seu acesso.
Quanto à entrevista, como refere Saramago, “cabe ao entrevistador tornar, ou não, a entrevista
num momento interessante para a criança” (Saramago, 2001, p. 15). Neste caso em particular,
foi entendimento do grupo que o recurso à entrevista permitiria albergar maior liberdade e
flexibilidade por parte das investigadoras aquando da recolha de dados, mas também da parte
das crianças, sendo objetivo colocá-las numa situação o mais possível descontraída e
confortável. No decorrer da entrevista foi fundamental não interromper os seus pensamentos;
procurar clarificar todas as questões colocadas sempre que foram mostradas dúvidas, como
por exemplo, quando questionadas sobre o que é a religião; e evitar expressar quaisquer
atitudes que colocassem a criança num estado de ansiedade ou desconforto. De modo
transversal, procurou-se que em todos os momentos as crianças compreendessem que para
317
aquela entrevista em particular não existiam respostas certas ou erradas, que todas eram
igualmente importantes e que a sua opinião, qualquer que fosse, seria respeitada pelas
investigadoras. Em todo o processo de recolha de dados as investigadoras procuraram criar as
condições para respeitar de modo integral o direito da criança a exprimir livremente a sua
opinião, conforme plasmado no Artigo n.º 12, 1) da Convenção dos Direitos da Criança:
Os Estados Partes garantem à criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente
a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem, sendo devidamente tomadas em consideração as
opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade. (UNICEF, 2019, p. 10)
A recolha de dados através de entrevista foi registada através da funcionalidade de gravação
disponível no smartphone das entrevistadoras. Esta opção pode também ser perspetivada
enquanto prática criativa, já que o recurso a um objeto quotidiano e até certo ponto familiar é
visto como facilitador da interação em contexto de investigação social (Costa, 2019).
Atendendo às características etárias dos entrevistados, o recurso ao smartphone evita também
que a criança tenha a tentação de brincar com o objeto que está próximo de si, pois não o
reconhece como um brinquedo novo que lhe desperte particular curiosidade.
Chegada: dos desenhos às palavras, monstros e luzes de presença
Em investigação qualitativa, os investigadores procuram uma compreensão holística e
profunda dos temas em análise (Denzin & Lincoln, 2011). Sempre próxima dos dados, a
análise e interpretação de resultados é até certo ponto indissociável da fase de recolha. No
contexto do exercício que nos serve de mote, os estudantes foram desafiados a importar do
modelo de Design Thinking a fase de “agregação livre de ideias” (insight clustering) para
estimular a fase de análise e interpretação qualitativa. “The tool Insight Clustering is
connected to Brainwriting. It helps to move from a divergent phase to a convergent phase by
categorizing ideas and, at the same time, checking if the idea generation has been flexible
(which means with ideas in several directions and thematic areas).” (Tschimmel, 2016, p. 85).
No caso particular, os estudantes foram também interpelados a escutar e olhar os dados a
partir de uma perspetiva mais reflexiva, centrando a sua atenção simultaneamente nas
dimensões textual e visual. A Figura 2 reúne o conjunto de seis desenhos elaborados pelas
crianças em estudo.
318
Fonte: Desenhos elaborados pelas crianças entrevistadas (2019).
Figura 2 – O escuro na perspetiva das crianças.
No conjunto, concluímos que a recolha de dados junto das crianças do 2.º ano (com 7 anos de
idade) exigiram uma maior disponibilidade, quer de tempo, quer de envolvimento da parte das
entrevistadoras comparativamente às crianças do 4.º ano (de 9 anos de idade). Estas crianças
buscavam estabelecer uma relação mais próxima com as investigadoras, estavam mais
dispostas a falar sobre os seus medos e inseguranças e interpelavam as entrevistadoras a um
diálogo mais extenso, profundo e organizado nas ideias. As entrevistadoras procuraram
retribuir, sabendo que para conseguir a sua confiança é preciso interagir e escutá-las com
atenção. Esta proximidade foi particularmente heurística para compreender a especificidade
do olhar das crianças e de como a interação verbal se revela, afinal, complementar à expressão
visual através do desenho. Por exemplo, questões de caracterização aparentemente “simples”
e “óbvias” na perspetiva das entrevistadoras, como a religião ou o local de nascimento,
resultaram frequentemente em questionamentos ao invés de afirmações, ou a respostas à
primeira vista “confusas”, “erradas” ou “não-lineares”, como a imprecisão geográfica ou a
referência ao hospital.
Já a observação do momento de elaboração do desenho permitiu à equipa de investigação
tomar consciência da fronteira ténue entre o mundo da realidade e fantasia, que na criança é
um só. Como refere Sarmento, nas culturas infantis, “o processo de imaginação do real é
fundacional do modo de inteligibilidade” (Sarmento, 2003, p. 16). Esta observação permitiu
319
também constatar que a opção pelo desenho em conjunto com outras crianças deixou-as
confortáveis e inicialmente focadas numa atividade concreta. Porém, rapidamente essa
atividade se viu transformada pela copresença entre pares, sendo que o trabalho individual
passou a ser feito por observação e comparação com os demais e o objetivo da atividade
tornou-se rapidamente objeto de imaginação e brincadeira. A observação deste momento foi
ainda particularmente sensibilizadora para, de antemão, tomar contacto com muitas das
significações dos desenhos e representações do escuro por parte das crianças.
O exercício de escuta atenta aos dados através da entrevista-conversa permitiu maior
profundidade na observação da realização dos desenhos e sua interpretação. Conclui-se que
para as crianças entrevistadas, apesar de ser frequentemente associado a sentimentos
negativos como o medo e a figuras assustadoras – das quais se destacam “bruxas”,
“fantasmas”, “vampiros”, “zombies”, “monstros”, “palhaços malévolos e assassinos”,
“abóboras”, “buracos negros”, “caveiras” ou “espíritos” –, o escuro é muitas vezes também
associado a um espaço “giro”, “divertido”, de “descoberta”, “curiosidade” e “imaginação”. O
escuro pode mesmo transformar-se num universo mágico para determinadas crianças,
enquanto outras sentem insegurança em dizer que o escuro lhes provoca medo.
À idade que revelavam no momento das entrevistas, as crianças são habitualmente deixadas
sozinhas para dormir pelos seus pais, avós ou irmãos. A análise dos dados recolhidos permite,
no entanto, perceber que as crianças não estão ou não se sentem realmente sozinhas. A
transição dia/noite revela a presença de outros seres e entes, humanos e não humanos. Desde
logo, brinquedos “favoritos” e “divertidos” como “um cão cor-de-laranja”, “um panda de
peluche” ou “uma boneca que faz rir” e objetos peculiares que tomam vida nessas
brincadeiras, como “um cobertor”, “uma almofada”, “uma lanterna”, o “comando da
televisão”, uma “luz de presença m forma de planeta”, “uma camisola” ou “estrelas e luas que
brilham no escuro”.
Apesar de a literatura advertir para a diminuição da importância da televisão no quotidiano
das crianças (Livingstone & Haddon, 2009; Thompson, Berriman, & Bragg, 2018), entre a
amostra estudada a televisão continua a desempenhar um papel importante na transição entre
o dia e a noite. Para crianças que em regra ainda não dispõem de telemóvel, a televisão é a
tecnologia que se destaca: se por um lado as entretêm, acalmando-as, afastando os seus medos
ou ajudando-as a adormecer; por outro, o entretenimento que daí advém fomenta ainda mais a
320
sua imaginação, apresentando-lhe múltiplas cores, formas, personagens, sons e diversos
outros estímulos ao nível dos sentidos.
Por fim, este exercício permitiu também identificar outros atores igualmente importantes no
momento em que as crianças transitam do dia para a noite. Se as investigadoras estavam
particularmente despertas para o papel desempenhado pelos pais ou avós, os dados vieram
revelar os irmãos como elementos particularmente importantes na amostra estudada. De
forma até certo ponto surpreendente dadas as especificidades do contexto português, e
contrariando o modelo mais ou menos hegemónico do filho único (Cordeiro, 2015), todas as
crianças entrevistadas têm irmãos, variando em número de 1 a 5. Nestas circunstâncias, por
mais pessoas que existam na casa, é na fratria, especificamente entre os irmãos mais velhos,
que as crianças entrevistadas parecem encontrar os principais aliados nos diferentes modos
como lidam com o escuro: ora na busca de protetores que os tranquilizem quando têm medo,
pesadelos, ou quando se sentem sozinhas; ora na procura de parceiros de aventura que fazem
do escuro o espaço da brincadeira e diversão.
Conclusão
No relatório Design Thinking Applied to Education and Training, K. Tschimmel e os seus
colaboradores (2015) referem que nas entrevistas que conduziram, constataram que de um
modo geral nem os professores nem os formadores associavam Design Thinking a um método
de inovação ou aprendizagem na educação. Embora o considerassem interessante,
circunscreviam essa metodologia ao domínio do design gráfico ou design de produto. Nesse
mesmo relatório é referido que após uma breve introdução ao conceito de Design Thinking e à
apresentação do potencial para o campo da educação, todos manifestaram interesse nesta
metodologia, mostrando-se curiosos em saber mais. Constatação semelhante encontrámos
entre nós.
Na altura em que iniciámos este exercício estávamos em estádios diferentes de conhecimento
no que respeita ao potencial do Design Thinking para a educação. Enquanto socióloga e
docente com especialização e experiência em metodologias de investigação, há muito que
buscara informação complementar sobre as metodologias criativas de investigação social.
Enquanto estudantes de licenciatura e aprendizes de sociólogas, tínhamos tido contacto,
321
embora superficial, com tais metodologias, nomeadamente no contexto da frequência de uma
unidade curricular especificamente dedicada à análise qualitativa61.
Ao concluir este itinerário, sentimo-nos mais próximas e identificadas com os princípios do
Design Thinking aplicados aos contextos de ensino-aprendizagem relacionados com a
metodologia de investigação em ciências sociais. Como docente, destaco a mobilização de um
conjunto de ferramentas que permitem trabalhar de forma mais plástica e intuitiva os tópicos
clássicos que integram o processo investigativo em ciências sociais, tornando-os mais
atrativos para os estudantes. Como discentes, sublinhamos como o recurso a uma
terminologia diferente cria um ambiente favorável à aprendizagem, positivo e entusiasta, que
refresca a metodologia frequentemente mais “árida” da investigação social, e onde os
estudantes se sentem livres e confortáveis para integrar de forma coesa processo e resultado.
No conjunto, destacamos a importância do Design Thinking para, no domínio da investigação
social, em geral, e da Sociologia, em particular, nos conduzir de constatações a novas
interrogações.
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324
17.O ENSINO EFETIVO DA EMPATIA NAS ESCOLAS MÉDICAS:
UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA
Carla Sousa 62& Paulo Vitória6364
Resumo
Em contexto clínico a empatia pode definir-se como a capacidade de entender as experiências,
preocupações e perspetivas do paciente em relação à sua condição com o objetivo de
estabelecer uma melhor relação terapêutica. O objetivo deste estudo é investigar a necessidade
do ensino da empatia nas escolas médicas e os métodos pedagógicos usados nesse ensino. Foi
realizada pesquisa nas bases de dados PubMED e Scielo. Dos artigos que resultaram desta
pesquisa, selecionámos 25 que cumpriam os seguintes critérios de inclusão: avaliar a
implementação de métodos pedagógicos para ensinar a empatia aos estudantes de medicina,
publicados a partir do ano de 2000 e escritos em inglês, espanhol ou português. De acordo
com os artigos revistos a importância da empatia na prática da medicina é elevada e a
relevância do seu ensino efetivo nas escolas médicas é reconhecida. Os métodos propostos
para o ensino são diversificados, incluindo, por exemplo, a exposição de teorias e de técnicas
ou a utilização de métodos mais ativos como o role-play, realizados em diferentes anos do
curso e com a efetividade avaliada maioritariamente através da escala de empatia de
Jefferson, mostrando resultados significativos no aumento da empatia, mas não na sua
manutenção. Concluímos que a empatia é reconhecida como uma competência essencial na
prática clínica, que deve ser ensinada nas escolas médicas e que existem diversos métodos
para realizar esse ensino com diferentes graus de efetividade.
Palavras-chave: Empathy. Communication skills. Undergraduate medical education.
Training programs. Medical school.
62
Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal; a33467@fcsaude.ubi.pt
63
Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior, Covilhã, Portugal; a33467@fcsaude.ubi.pt
64
Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-IUL), Lisboa, Portugal; pvitoria@fsaude.ubi.pt
325
1. Introdução
A empatia é uma competência clínica essencial e um pilar do profissionalismo na relação
médico-utente.(Haider, Riaz, & Gill, 2020; Hojat, et al., 2020) O estabelecimento de relações
empáticas aumenta a efetividade das intervenções clínicas, associa-se a uma maior satisfação
dos utentes e dos profissionais e melhora os resultados das instituições de saúde, uma vez que
fortalece os vínculos, promove uma melhor adesão terapêutica e diminui as queixas e os
processos jurídicos contra os profissionais, reduzindo por sua vez os custos para as
instituições (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Kim, Kaplowitz, & Johnston, 2004).
Existem várias definições de empatia. De acordo com Hojat, que sintetizou diferentes
perspetivas, pode ser entendida como um atributo predominantemente cognitivo (mais que
emocional), envolvendo a compreensão (mais que o sentir) das experiências, preocupações e
perspetivas do utente, em combinação com a capacidade para comunicar essa mesma
compreensão (Kataoka, et al., 2019; Loureiro, Gonçalves-Pereira, Trancas, Caldas-deAlmeida, & Castro-Caldas, 2011).
Nas últimas décadas tem-se observado uma evolução científica e tecnológica muito
acentuada, que tem contribuído para avanços notáveis na área da medicina, mas que
paralelamente pode contribuir, se não houver o devido cuidado por partes dos profissionais,
para uma diminuição da interação médico-utente, alicerçando-se esta fundamentalmente em
terapêuticas de alta tecnologia e meios complementares de diagnóstico (Loureiro, et al.,
2011).
Estudos apontam ainda outras barreiras à comunicação empática como a falta de tempo
devido à sobrecarga de trabalho, objetivos irrealistas que levam à automatização das
atividades, falta de momentos de reflexão e de cuidado por parte dos profissionais em terem
esta atitude empática, o foco na carreira académica, ente outras (Haider, et al., 2020).
Partindo da ideia de que os profissionais apresentam dificuldades nesta prática clínica da
empatia, e que, paralelamente, vários estudos têm documentado o declínio de competências,
como a empatia, nos estudantes de medicina durante o seu percurso formativo, surge como
oportunidade de ensino uma intervenção efetiva e eficaz nos estudantes, com momentos de
aprendizagem específicos direcionados a esta temática e ao desenvolvimento destas
competências de comunicação (Batista, & Lessa, 2019; Haider, et al., 2020; Hojat, et al.,
2020; Son, Shimizu, Ishikawa, Aomatsu, & Leppink, 2018).
326
Assim e para que este ensino tenha resultados positivos e os estudantes desenvolvam as
competências necessárias para uma comunicação empática, é necessário investigar quais as
estratégias e os métodos pedagógicos efetivos e desenvolver instrumentos de avaliação
adequados para medir este progresso (Haider, et al, 2020; Batista, et al, 2019).
O objetivo deste estudo é investigar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas,
os métodos pedagógicos utilizados, e respetiva avaliação.
2. Métodos
O presente estudo consiste numa revisão sistemática qualitativa de literatura com ponto de
partida em dois objetivos de investigação previamente definidos:
Averiguar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas,
Identificar os métodos pedagógicos que têm sido aplicados nesse ensino.
Relativamente ao objetivo da identificação dos métodos pedagógicos, foram salientadas várias
características consideradas relevantes para a replicação dos métodos, e que, portanto, serão
apresentadas como subsecções deste objetivo nos resultados.
Foi realizada uma pesquisa de literatura nas bases de dados Pubmed e Scielo, restrita ao
período de 2000 até ao presente, e escrita em português, inglês e espanhol.
As palavras-chave utilizadas foram: empathy, communication skills, undergraduate
education, training programs e medical school, sendo utilizadas em diferentes combinações, e
em inglês e português de acordo com a base de dados.
Além da restrição de data de realização e idioma foram utilizados como critérios para inclusão
no estudo os seguintes: avaliação da implementação de métodos pedagógicos no ensino da
empatia a estudantes de medicina, com discriminação desses mesmos métodos e adotando a
perspetiva de aplicação da empatia em situações clínicas concretas, com avaliação dos
resultados.
Da pesquisa efetuada resultaram 512 artigos, 510 das bases de dados e 2 de outras fontes,
nomeadamente da bibliografia de outros artigos, sendo avaliados os títulos e resumos
relativamente à sua relevância para a nossa pesquisa e à qualidade do desenho de estudo.
Após esta primeira fase excluímos 456 por não se adequarem às temáticas propostas e aos
critérios definidos para esta revisão de literatura. Dos 56 selecionados 54 estavam disponíveis
327
para leitura na integra, sendo excluídos após esta leitura 29 por não se enquadrarem em todos
os critérios previamente definidos, resultando deste processo um total de 25 estudos (Figura
1).
Está representada na figura 2 a grelha que orientou a recolha de informação dos vários artigos.
Ao longo da revisão serão também apresentadas tabelas com a síntese das características dos
estudos incluídos, nomeadamente o tipo de estudo, objetivo, intervenção e principais
resultados.
Figura 5 - Processo de seleção dos artigos revistos
Figura 6 - Grelha orientadora para a recolha da informação dos artigos incluídos
328
Necessidade de
Tipo de
Ano da
Organização
Quem
ensino da empatia
método
intervenção
dos estudantes
ensina
nas escolas
pedagógico
Efetividade Avaliação
médicas
3. Resultados
3.1. A necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas
São vários os estudos existentes que averiguam a necessidade do ensino da empatia nas
escolas médicas, quer do ponto de vista dos próprios estudantes quando ainda estão no ensino
pré-graduado, quer do ponto de vista dos profissionais de saúde que já estão em meio clínico
(Batista, & Lessa, 2019; Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Haider, et al., 2020).
Esta necessidade de ensino coloca-se em maior evidência tendo em conta que vários estudos
indicam que ocorre um declínio dos níveis de empatia ao longo do percurso formativo por
variadas razões, como é sintetizado nas tabelas 1 e 2 (Chen, Lew, Hershman, & Orlander,
2007; Hojat, et al., 2009; Triffaux, Tisseron, & Nasello, 2019).
Triffaux et al. avaliaram, num estudo transversal, a empatia durante o percurso académico,
tendo-se verificado um declínio progressivo das competências de empatia ao longo dos anos.
Neste estudo foi também apontada como hipótese para o declínio da empatia a possibilidade
de haver uma dessensibilização dos estudantes com o consequente distanciamento emocional,
usado como estratégia de defesa contra efeitos adversos do processo formativo como, por
exemplo, o burnout (Triffaux, et al., 2019).
Existem estudos que apontam inclusivamente um ano do curso, em específico, no qual houve
o declínio da empatia. Nomeadamente, segundo Hojat et al., que realizaram um estudo
longitudinal com estudantes de medicina desde o primeiro ano até completarem o curso, onde
a empatia foi medida no final de cada ano, esta manteve-se constante durante os dois
primeiros anos, mas diminuiu no final do terceiro ano, sem diferenças entre homens e
mulheres. A origem deste declínio tem sido apontada como sendo multifatorial, incluindo um
elevado volume de matéria para aprender, pressão de tempo, ausência de role-models e ainda
o apoio cada vez maior nas tecnologias para a relação médico-utente (Hojat, et al., 2009).
Relativamente à opinião dos vários intervenientes acerca do declínio e da necessidade do
ensino da empatia, um estudo reuniu a perspetiva de três grupos distintos: estudantes de
329
medicina no último ano, internos da formação específica no último ano e tutores clínicos, com
pelo menos 5 anos de experiência clínica e de ensino. Tendo como ponto de partida a empatia
na prática clínica, foram discutidas, em cada grupo, as razões que têm levado ao declínio da
empatia, os desafios que existem e as recomendações para melhorar esta prática e ensino.
Como principais razões para a diminuição da empatia foram apontadas, por parte dos
profissionais, a sobrecarga horária e os objetivos irrealistas. O declínio nos estudantes e
internos foi também atribuído a diferenças de cultura e educação (Haider, et al., 2020).
Os tutores clínicos salientaram ainda que são necessários momentos de ensino dedicados, em
específico, à empatia, e não simplesmente esta ser integrada nas várias atividades clínicas. De
acordo com o estudo é recomendado integrar o tema da empatia no curriculum pré-graduado e
pós-graduado (Haider, et al., 2020).
Batista & Lessa analisaram a aprendizagem da empatia em internos de medicina do último
ano da especialização no Brasil e tentaram identificar formas de aprimorar essa aprendizagem.
Os resultados salientam que os estudantes não reconhecem momentos de ensino relevantes
durante a formação no que diz respeito à empatia e, quando existem, são mais direcionados à
teoria e não à prática. Foi destacado ainda que a metodologia usada é pouco estimulante
(teoria desconectada da prática) e que os docentes carecem de capacitação para ensinar estes
temas. Assim, e de um modo geral, foi detetada a necessidade de uma maior
responsabilização por parte das faculdades para um ensino estruturado e bem articulado da
empatia
(Batista,
&
Lessa,
2019).
330
Tabela 1. Síntese dos estudos relativos ao declínio da empatia durante o percurso formativo
Título do Estudo. Autores (ano)
Tipo de Estudo
Objetivo do Estudo
Principais Resultados
Decline of empathy among medical students:
Dehumanization or useful coping process?
Estudo transversal realizado na Bélgica, com
1602 estudantes de medicina e da área
comercial (usados como grupo de controlo).
Aplicação da escala Basic Empathy Scale
(BES).
Reproduzir os dados do declínio da empatia
nos estudantes de medicina numa população
Belga.
Foi verificado, através da BES, um declínio
significativo da empatia nos estudantes de
medicina ao longo do curso.
Estudo longitudinal realizado nos Estados
Unidos da América (EUA), com 456
estudantes de medicina. Aplicação da escala
JSPE-S (início do 1º ano e no fim de cada
um dos anos na escola médica).
Investigar a evolução da empatia ao longo do
curso de medicina.
O nível de empatia foi constante nos
primeiros dois anos do curso, tendo
diminuído no final do 3º ano, de igual modo
em mulheres e homens.
Estudo transversal realizado nos EUA, com
658 estudantes de medicina de todos os anos
do curso. Aplicação da escala JSPE-S.
Medir e avaliar a empatia nos vários anos do
curso.
Os estudantes do primeiro ano do curso
foram os que apresentaram valores mais
altos de empatia enquanto que os do 4º ano
apresentaram os valores mais baixos.
(Triffaux, et al., 2018)
The Devil is in the Third Year: A
Longitudinal Study of Erosion of Empathy
in Medical School
(Hojat, et al., 2009)
A Cross-sectional Measurement of Medical
Student Empathy
(Chen, et al., 2007)
331
Tabela 2. Síntese dos artigos que salientam a importância do ensino da empatia
Título do Estudo. Autores (ano)
Tipo de estudo
Objetivos do estudo
Principais resultados
Empathy in clinical practice: a qualitative
study of early medical practitioners and
educators.
Estudo transversal realizado no Paquistão
com 109 participantes (alunos prégraduados, internos e professores médicos).
Foram constituídos grupos de discussão
para debater as razões do declínio da
empatia, desafios e recomendações para
promover a sua prática clínica.
Identificar as razões do declínio da empatia
na prática clínica e identificar estratégias para
a promover.
Todos os participantes no estudo
concordaram que existe um declínio
da empatia na prática clínica. Os
principais desafios incluem o
aumento da carga horária e restrições
no tempo com cada utente. Com base
nestes resultados foi salientada a
importância do ensino de uma prática
clínica empática.
Estudo transversal realizado no Brasil com
15 alunos no final da formação médica
específica. Foram colocadas 3 questões
acerca do conceito da empatia na relação
médico-utente, o processo de ensinoaprendizagem da empatia na formação
médica e sugestões para a melhoria desse
mesmo ensino.
Analisar a aprendizagem da empatia nos
estudantes do último ano da formação médica
específica.
Os estudantes não reconhecem
momentos de ensino da empatia
relevantes durante a formação. O
ensino que existe é, maioritariamente,
teórico. A metodologia utilizada é
pouco estimulante e os docentes
carecem de capacitação.
(Haider, et al., 2020)
Aprendizagem da Empatia na Relação
Médico-Paciente: um Olhar Qualitativo
entre Estudantes do Internato de Escolas
Médicas do Nordeste do Brasil.
(Batista, & Lessa, 2019)
332
3.2. Métodos pedagógicos para o ensino da empatia nas escolas médicas
A tabela 3 sintetiza as características dos vários métodos pedagógicos incluídos nesta
revisão.
Os métodos pedagógicos teórico-práticos foram os mais vezes descritos na literatura
analisada, nomeadamente, nos estudos de Kataoka, et al., 2019, de Vaure, et al., 2017 e
de Daryazadeh, Adibi, Yamani, & Molllabashi, 2020.
Nestes estudos foram utilizados diferentes métodos, nomeadamente um workshop com
uma palestra teórica inicial, seguido de role-play e debriefing, (Kataoka, et al., 2019)
sessões teórico-práticas de medicina narrativa (ler, refletir e discutir) (Daryazadeh, et
al., 2020) e a estratégia dos Grupos Ballint, onde os estudantes foram convidados a
reagir a uma situação clínica real e particularmente tocante ou problemática em grupo,
tendo depois destas sessões participado em prática simulada de consultas (Vaure, et al.,
2017).
Uma estratégia muito usada foi o role-play, com recurso a pacientes padronizados para
o treino de competências de entrevista clínica (Lim, Moriarty, & Huthwaite, 2011;
Schweller, Ribeiro, Passeri, Wanderley, & Carvalho-Filho, 2018; Son, et al., 2018).
No estudo de Son et al. os estudantes tiveram sessões de treino de entrevista clínica
antes da avaliação estruturada de competências. Foi também avaliado se o número de
sessões de treino (uma, duas ou três sessões), tinha influência no nível de empatia e
desempenho final, o que não se verificou neste estudo (Son, et al., 2018). Tendo em
conta um nível de interação mais complexo, existem intervenções que recorrem a atores
para o papel de utente, tornando assim mais real a experiência do aluno (Schweller, et
al., 2018; Vaure, et al., 2017). Ainda neste contexto está também descrita uma
intervenção que incluiu, além da parte teórica e do role-play, uma sessão de uma hora
com um professor de teatro, que teve como objetivo fazer uma breve introdução acerca
de competências e métodos característicos da representação e que se focaram em
melhorar a capacidade dos alunos se conectarem com os seus pacientes, terem atenção
ao que estão a dizer, observarem a linguagem corporal e melhorarem o seu
relacionamento interpessoal (Lim, et al., 2011).
O recurso a pacientes virtuais (pacientes criados no computador) também foi descrito da
seguinte forma: utilização de um paciente virtual com uma história clínica detalhada
333
para realizar uma consulta, sendo que no final era dado um feedback em relação à
empatia. Após este treino os alunos tinham de realizar uma nova consulta, mas desta vez
com um paciente simulado, verificando-se que o feedback era um ponto-chave para o
maior sucesso dos alunos nas consultas reais (Foster, et al., 2016).
A aplicação das artes e a visualização de filmes também são métodos implementados
para o ensino da empatia (Ahmadzadeh, Esfahani, Ahmadzad, Shalbafan, & Shariat,
2019; Potash, Chen, Lam, & Chau, 2014).
Ahmadzadeh et al. realizaram um estudo para avaliar se ver um filme poderia aumentar
a empatia. Para tal, organizaram a amostra de estudantes em quatro grupos distintos, um
grupo que só tinha uma discussão teórica seguida de visualização de 2 role-play, o
segundo grupo visualizava o filme “The Doctor”, o terceiro grupo via o filme seguido
da discussão teórica e o quarto grupo não tinha qualquer intervenção. Os grupos que
viram o filme apresentaram um aumento na empatia (Ahmadzadeh, et al., 2019).
Quanto ao estudo de Potash et al., os alunos do terceiro ano de medicina foram
distribuídos aleatoriamente por dois workshops, um de artes e um de resolução de
problemas. No de artes foram convidados a recordar o caso de um paciente a sofrer ou
com dor. Com base nesta experiência foram convidados a escrever cores, cheiros, sons,
objetos e sentimentos em papéis com o objetivo de criarem um poema, juntando outras
palavras, se necessário, e ilustrando-o de seguida. Realizaram ainda um ensaio de
reflexão acerca de como aquela experiência afetou a maneira como entendiam os
utentes e a eles próprios. Quanto ao workshop de resolução de problemas, os alunos
assistiram e participaram em role-play, resolveram os casos clínicos e discutiram as
suas observações com o grande grupo. No final, escreveram sobre um caso clínico.
Apesar de não terem existido diferenças quantitativas relevantes, os alunos
reconheceram os benefícios do workshop de artes, nomeadamente o desenvolvimento da
capacidade de se compreenderem a eles mesmos, aos utentes, à dor, ao sofrimento, e ao
papel do médico (Potash, et al., 2014).
3.2.1. Ano do curso de medicina para as intervenções
Uma vez que o curso de medicina é constituído por 6 anos de formação,
maioritariamente divididos em anos teóricos e anos clínicos, importa averiguar qual o
ano ou anos onde é mais eficaz a sua aplicação.
334
De acordo com dados encontrados, é referido que as atitudes humanísticas como a
empatia sofrem um declínio ao longo do curso desde os anos pré-clínicos aos anos
clínicos, especialmente no terceiro ano, sendo, portanto, este um ano crucial no processo
formativo (Ruiz-Moral, Torres, Monge, Leonardo, & Caballero, 2017). Ainda assim,
além do estudo já referido, o ensino da empatia no 3º ano foi incluído em apenas mais
dois estudos (Kataoka, et al., 2019; Potash, et al., 2014).
Relativamente aos restantes estudos houve uma divisão na intervenção entre os anos
clínicos e pré-clínicos, com especial relevância para o 1º ano (Harlak, Gemalmaz,
Gurel, Dereboy, & Ertekin, 2008; Kataoka, et al., 2019; Shapiro, Morrison, & Boker,
2004) e para o 4º ano (Airagnes, et al., 2014; Kataoka, et al., 2019; Schweller, et al.,
2018; Son, et al., 2018; Vaure, et al., 2017) do curso, anos escolhidos mais vezes para o
ensino.
De salientar que, à exceção da escolha do 3º ano, em mais nenhum dos estudos foi
especificado um motivo para a escolha do ano.
3.2.2. Duração das intervenções
A duração das intervenções pode-se revelar importante para o sucesso dos próprios
métodos pedagógicos.
Em sumula, os resultados encontrados a este propósito são muitos díspares e variam
desde poucas horas a vários meses, com sessões únicas ou múltiplas, e nestas o
intervalo entre sessões também varia entre os estudos.
Assim, foram encontradas intervenções que incluíram apenas um único workshop
teórico-prático de 3 ou 4 horas (Kataoka, et al., 2019; Potash, et al., 2014) intervenções
compostas por sessões múltiplas semanais (Airagnes, et al., 2014; Schweller, et al.,
2018; Vaure, et al., 2017) e bimensais (Shapiro, et al., 2004) e ainda intervenções ao
longo de um semestre completo, mas sem periodicidade das atividades (Kataoka, et al.,
2019).
Novamente não foi referido, em nenhum estudo, um motivo para a escolha do número
específico de horas de aulas ou treino prático, nem para a escolha do intervalo de tempo
entre sessões, no caso das intervenções com várias sessões.
335
3.2.3. Organização dos estudantes em grupos
Uma característica importante no sucesso do ensino, além das questões já referidas é o
número de alunos envolvidos em cada intervenção.
Na maioria dos estudos encontrados, contudo, é referido que os alunos trabalharam em
pequenos grupos, não especificando o número de alunos por grupo (Diez-Goni, &
Rodriguez-Diez, 2017; Harlak, et al., 2008; Kataoka, et al., 2019; Ruiz-Moral, et al.,
2017; Son, et al., 2018). Um número específico de alunos por grupo foi referido no
método dos grupos de Ballint com uma média de 10 alunos (Airagnes, et al., 2014;
Vaure, et al., 2017).
Foram ainda encontradas intervenções feitas com grupos maiores, nomeadamente com
uma média de 20/25 alunos por grupo (Ahmadzadeh, et al., 2019; Potash, et al., 2014).
Ainda assim, num dos estudos, apesar dos grupos serem maiores, não existe
interatividade professor-aluno (Ahmadzadeh, et al., 2019) e no outro estudo o grupo é
dividido numa última fase da intervenção para haver discussão e interatividade (Potash,
et al., 2014).
3.2.4. Quem ensina a empatia?
Nos estudos encontrados não é dada especial relevância a competências específicas por
parte de quem faz o ensino e a aplicação dos métodos pedagógicos, um fator que seria
de particular relevância para a reprodutibilidade do ensino e dos métodos nas várias
instituições de ensino. Ainda assim, foram encontradas várias referências a estes
tutores/professores.
Quanto à classe profissional, na maioria dos estudos encontrados quem faz este ensino
são médicos das diferentes especialidades, sem uma formação específica para esta
temática. No entanto, existem estudos onde referem profissionais com uma formação
mais específica, como psicólogos clínicos (Harlak, et al., 2008).
Relativamente à capacitação dos profissionais para este ensino, de acordo com os
resultados de um estudo realizado no Brasil, os alunos internos de medicina no último
ano referem que existe uma fraca capacitação dos docentes envolvidos no ensino da
empatia, da relação médico-utente e no estabelecimento de uma boa relação aluno336
professor. Tal pode dever-se, em muito, ao facto da maioria do corpo docente dos
cursos de medicina ser composto por médicos de diferentes especialidades que, na sua
maioria, não possuem formação específica para exercer a atividade docente (Batista, &
Lessa, 2019).
Diez-Goñi & Rodriguez-Diez salientam a importância de saber como comunicar a
empatia aos estudantes e dos profissionais que acompanham os alunos nos vários
estágios serem também eles formados, nomeadamente através de workshops e
simulações (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017).
Integrando de certa forma as perspetivas dos dois últimos estudos referidos, de acordo
com Costa & Azevedo, num conjunto de entrevistas que foram realizadas a docentes
médicos de um hospital no Brasil, estes mesmos profissionais apontam que a
transmissibilidade da empatia na formação de novos médicos seria mais vista como um
“exemplo” e não algo a ser de facto ensinado e aprendido. No entanto este tipo de
aprendizagem seria muito dependente do profissional e, portanto, não seria homogénea.
Tal como já referido anteriormente, também neste estudo é reforçada a importância de
formação do pessoal docente (Costa, & Azevedo, 2010).
Apesar de não terem sido encontradas descrições das características chave que um
profissional deve ter para ensinar a empatia, de acordo com Hirsch, o grande desafio
para estes profissionais é apresentar a informação num formato que o torne relevante e
apelativo para os estudantes, de modo a envolve-los ativamente para que sintam que é
algo que lhes vai ser muito útil na prática clínica (Hirsch, 2007).
3.2.5. Efetividade dos métodos pedagógicos avaliados
A efetividade dos métodos pedagógicos foi avaliada, na maioria dos casos, através de
escalas de medição dos níveis de empatia, nomeadamente a Jefferson Scale of Physician
Empathy, student’s version (JSPE-S) e a Interpersonal Reactivity Index (IRI), aplicadas
antes, imediatamente a seguir e em alguns casos algum tempo após a intervenção. Outro
método utilizado para a avaliação do sucesso das intervenções foi de caráter qualitativo,
com questões direcionadas à temática, antes e após a intervenção (Schweller, et al.,
2018).
Na grande maioria dos estudos houve um aumento dos níveis de empatia após a
intervenção, independentemente do tipo de método aplicado, havendo alguns em que a
337
melhoria só se verificou de forma qualitativa.(Airagnes, et al., 2014; Potash, et al.,
2014; Schweller, et al., 2018) Houve ainda estudos que além de reportarem um aumento
da empatia no geral, descreveram que componentes da escala JSPE-S se alteraram mais,
e em que sentido.(Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017; Kataoka, et al., 2019) Por
exemplo, foi reportado de acordo com um estudo que houve um aumento dos
componentes “adoção de perspetiva” e “cuidar com compaixão” e uma diminuição no
componente “colocar-se na pele do doente” (Diez-Goni, & Rodriguez-Diez, 2017).
São poucos os estudos que avaliam efetivamente a duração da mudança demonstrada
após a intervenção (Ahmadzadeh, et al., 2019; Kataoka, et al., 2019).
Ainda assim, nos dois estudos onde foi encontrada esta avaliação longitudinal,
constatou-se que a mudança positiva produzida pela intervenção não se manteve. Num
primeiro caso, (Kataoka, et al., 2019) onde os estudantes foram avaliados ao longo dos
seis anos do curso de medicina, tendo a intervenção sido feita no 3º ou 4º ano, verificouse que no 5º e no 6º ano os níveis de empatia baixaram novamente. Já no segundo
estudo, (Ahmadzadeh, et al., 2019) onde foram aplicadas intervenções diferentes
consoante o grupo de estudo, constatou-se que nos grupos onde tinha havido melhoria
da empatia houve um declínio da mesma um mês após as intervenções.
3.2.6. Avaliação dos métodos pedagógicos pelos intervenientes
De acordo com Harlak et al., recolher o feedback dos estudantes em relação ao método e
aos tutores pode ser extremamente útil para investigações subsequentes (Harlak, et al.,
2008).
Corroborando esta ideia, de facto, é de extrema importância a avaliação de um método e
dos participantes na sua aplicação, de modo a perceber a sua reprodutibilidade, utilidade
e aplicabilidade. No entanto, nos estudos incluídos nesta revisão, raramente isso se
verificou.
Quanto à intervenção propriamente dita foi referida a avaliação por parte dos estudantes
em dois casos, sendo que estes consideraram, na sua maioria, que a atividade tinha sido
benéfica e útil para o seu futuro pessoal e profissional (Potash, et al., 2014; Schweller,
et al., 2018).
Relativamente à avaliação dos tutores pelos estudantes, apesar de não ser reportada nos
métodos revistos, houve um estudo em que os alunos avaliaram o ensino da empatia no
338
geral, assim como os intervenientes neste ensino, relatando haver falta de capacitação
dos tutores para este ensino (Batista, & Lessa, 2019).
Não foi referida qualquer outra avaliação por parte dos intervenientes nos artigos
revistos.
339
Tabela 3. Síntese das intervenções dos métodos pedagógicos
Título do Estudo, Autores (ano)
Tipo de estudo
Intervenção
Principais resultados
Empatia na relação medico-doente:
Evolução em Alunos do Primeiro
Ano de Medicina e Contribuição para
a Validação da Escala Jefferson em
Portugal
Estudo longitudinal (6 meses)
realizado em Portugal com 81
estudantes do 1º ano de medicina.
Avaliação através da Escala
JSPE-S (antes e após a
intervenção).
Frequência do Módulo de Psicologia Médica (1 semestre de
duração) cujo programa aborda a empatia em medicina
mediante ensino de conteúdos e treino elementar de
competências.
Aumento da empatia e dos componentes
“adoção de perspetiva” e “cuidar com
compaixão”. Diminuição no componente
“colocar-se na pele do doente”.
Estudo longitudinal (6 anos)
realizado no Japão com 69
estudantes do 1º ano de medicina.
Avaliação através da Escala
JSPE-S (1º ano, pré-workshop,
pós-workshop, 5º e 6º ano).
Workshop de 4 horas, sobre competências de comunicação,
para aumentar a empatia no 3º ou 4º ano do curso.
Verificou-se um aumento da empatia e
dos componentes “adoção de perspetiva”
e “cuidar com compaixão” após o
workshop. Este resultado não se manteve
nos dois anos seguintes do curso.
(Loureiro, et al., 2011)
Can communication skills training
improve empathy? A six-year
longitudinal study of medical students
in Japan.
(Kataoka, et al., 2019)
Communication skills training and
the conceptual structure of empathy
among medical students
Programa com 4 secções: 1. Palestra sobre comunicação e
entrevista médica (55 minutos); 2. Orientação para a
próxima sessão (10 minutos); 3. Role-play de entrevista
médica com pacientes simulados (160 minutos); 4.
Feedback, discussão e síntese (15 minutos).
Várias sessões de treino de entrevistas médicas (1, 2 ou 3)
com pacientes simulados.
(Son, et al., 2018)
Estudo transversal realizado no
Japão com 268 estudantes do 4º
ano de medicina. Avaliação
através da Escala JSPE-S (após a
intervenção e retrospetivamente
em relação ao pré-intervenção),
questões relativas à vontade de
expressar um comportamento
empático e questões abertas.
O número de sessões de treino não teve
qualquer
influência
nos
fatores
analisados. A vontade de expressar um
comportamento empático está mais
relacionada com o componente “adoção
de perspetiva” do que com o “cuidar com
compaixão”. Nas questões abertas foi
notada a dificuldade em sentir
compaixão.
Promoting Empathy among medical
Estudo longitudinal realizado em
Reflexão em grupos Ballint de 12/13 estudantes, com
Não houve diferença significativa nas
340
students: a two-site
controlled study
randomized
França com 299 estudantes do 4º
ano de medicina, divididos no
grupo experimental e grupo de
controlo. Avaliação através da
Escala JSPE-S (antes e após a
intervenção) e CARE (após a
intervenção
pelos
pacientes
simulados).
sessões semanais de 1 hora e meia ao longo de 3 meses.
Uma semana após a última sessão, todos os estudantes
participaram em duas sessões de simulação de entrevista
médica com atores.
pontuações da CARE entre os dois
grupos. A pontuação na JSPE-S
aumentou no grupo experimental após a
intervenção e foi bastante mais alta
comparativamente ao grupo de controlo.
Impact of narrative medicine program
on improving reflective capacity and
empathy of medical students in Iran
Estudo longitudinal realizado no
Irão com 135 internos de
medicina, divididos em grupo
experimental e grupo de controlo.
Avaliação através da Escala
Jefferson Scale of Physician
Empathy (antes e após a
intervenção).
Programa de medicina narrativa: ler, refletir e discutir em
pequenos grupos. 7 sessões teórico-práticas de 2 horas
cada.
Aumento da empatia no grupo
experimental ao contrário do grupo de
controlo.
Estudo transversal realizado no
Brasil com 551 estudantes do 4º e
do 6º ano de medicina. Avaliação
qualitativa.
Simulação de consultas médicas em grupos de 7/9
estudantes, com uma sessão semanal, num total de 4
sessões. Os casos clínicos foram fictícios mas baseados em
casos reais. Os profissionais envolvidos neste treino foram
os mesmos que estavam a orientar o estágio destes
estudantes. Depois da simulação da consulta houve sempre
um debriefing para os estudantes poderem falar sobre toda
a experiência.
Tendo em conta a avaliação qualitativa,
os estudantes sentiram-se confortáveis
durante a atividade devido à “abertura
para o diálogo”, “proximidade com
professores e colegas” e um “ambiente
livre de julgamentos”. A grande maioria
dos estudantes considerou este treino útil
para a sua vida profissional e pessoal.
Estudo longitudinal realizado na
Nova
Zelândia
com
149
estudantes do 5º ano de medicina,
divididos em grupo experimental
e grupo de controlo. Avaliação
pela escala JSPE-S (antes e após a
No grupo experimental além da habitual sessão com uma
parte teórica e role-play houve uma hora adicional com um
professor de teatro, que teve como objetivo fazer uma breve
introdução acerca de competências e métodos
característicos da representação e que se focaram em
melhorar a capacidade dos alunos se conectarem com os
No grupo experimental foi reportado um
aumento muito significativo dos níveis de
empatia após a intervenção, facto que não
se verificou no grupo de controlo.
(Vaure, et al., 2017)
(Daryazadeh, et al., 2020)
Simulated medical consultations with
standardized
patients:
In-depth
debriefing based on dealing with
emotions
(Schweller, et al., 2018)
‘‘Being-in-role’’:
A
teaching
innovation to enhance empathic
communication skills in medical
students
341
(Lim, et al., 2011)
intervenção).
seus pacientes, terem atenção ao que estão a dizer,
observarem a linguagem corporal e melhorarem o seu
relacionamento interpessoal.
Does watching a movie improve
empathy? A cluster randomized
controlled trial
Estudo longitudinal realizado no
Teerão com 133 estudantes de
medicina a realizar estágio
clínico, divididos em 4 grupos.
Avaliação pela escala JSPE-S
(antes e após a intervenção).
Grupo 1: Workshop de 3 horas sobre competências de
comunicação (discussão teórica seguida de visualização de
2 role-play sobre interação médico-utente).
(Ahmadzadeh, et al., 2019)
Grupo 2: Visualização do filme “The Doctor”.
Grupo 3: Visualização do filme “The Doctor”, seguido do
workshop de 3 horas no dia seguinte.
Todos os grupos em que houve
intervenção apresentaram um aumento na
pontuação da JSPE-S (mais pronunciado
nos grupos 2 e 3, que assistiram ao filme).
Um mês após a intervenção as pontuações
da JSPE-S baixaram novamente nos 3
grupos em que houve intervenção.
Grupo 4: Grupo de controlo sem qualquer intervenção.
Art-making in a family medicine
clerkship: how does it affect medical
student empathy?
(Potash, et al., 2014)
Estudo longitudinal realizado em
Hong-Kong com 161 estudantes
do 3º ano de medicina, divididos
em grupo experimental e grupo de
controlo. Avaliação pela escala
JSPE-S (antes e após a
intervenção).
Grupo experimental: Workshop de artes de 3 horas em
grupos de cerca de 25 alunos, onde estes foram convidados
a recordar o caso de um paciente a sofrer ou com dor.
Depois escreveram cores, cheiros, sons, objetos e
sentimentos em pedaços de papéis cujo objetivo era
juntarem e adicionarem outras palavras, se necessário, de
modo a criarem um poema, ilustrando-o de seguida. Após
esta tarefa completa discutiram em pequenos grupos. Por
fim, todos os estudantes escreveram um ensaio de reflexão
acerca de como aquela experiência afetou a maneira como
entendem os utentes e a eles próprios.
Não existiram diferenças quantitativas
relevantes entre os dois grupos. No
entanto, os alunos reconheceram os
benefícios do workshop de artes,
nomeadamente, a capacidade de se
compreenderem a eles mesmos, aos
utentes, à dor, ao sofrimento e ao papel
do médico.
Grupo de controlo: Workshop de resolução de problemas,
onde os alunos assistiram e participaram em role-play,
resolveram os casos clínicos e discutiram as suas
observações com o grande grupo. No final, escreveram
sobre um caso clínico.
Teaching Empathy to First Year
Estudo longitudinal realizado na
8 sessões de 1 hora, duas vezes por mês em pequenos
Houve um aumento da empatia após a
342
Medical Students: Evaluation of an
Elective Literature and Medicine
Course
(Shapiro, et al., 2004)
Appropriate training based on Balint
groups can improve the empathic
abilities of medical students: A
preliminary study
(Airagnes, et al., 2014)
Medical Humanities Coursework Is
Associated with Greater Measured
Empathy in Medical Students
(Graham, et al., 2016)
Communication Skills Training:
Effects
on
Attitudes
toward
Communication Skills and Empathic
Tendency
Califórnia com 16 estudantes do
1º ano de medicina, divididos em
grupo experimental e grupo de
controlo. Avaliação através das
escalas Balanced Emotional
Empathy Scale (BEES) e
Empathy Construct Rating Scale
(antes e após a intervenção).
grupos. Leitura e discussão de poesia, sketches e histórias
curtas envolvendo os seguintes tópicos: relação médicoutente, exame físico, escuta dos utentes, dor, mudança de
estilo de vida, entre outros. O grupo de controlo começou a
intervenção 6 meses após o grupo experimental, período
durante o qual esteve exposto ao método habitual do
curriculum.
intervenção nos dois grupos, sendo este
aumento apenas significativo na escala
BEES.
Estudo longitudinal com 163
estudantes do 4º ano de medicina,
divididos em grupo experimental
e de controlo. Avaliação pela
escala IRI e 8 questões de reação
a um caso clínico (antes da
intervenção e quatro meses após a
mesma).
10 sessões semanais de 2 horas de reflexão em grupos de
Ballint (8/10 alunos) com casos clínicos reais trazidos pelos
estudantes voluntariamente para serem discutidos. Antes e
após a intervenção além da escala quantitativa também foi
avaliada a reação emocional a dois casos clínicos
previamente selecionados.
A avaliação feita 4 meses após a
intervenção mostrou em ambos os grupos
um aumento do componente “fantasia” da
IRI e uma diminuição do componente
“preocupação empática”. Quanto às
reações emocionais aos casos clínicos, no
grupo experimental houve uma melhoria
da abordagem empática em relação ao
primeiro caso clínico, facto que não se
verificou no grupo de controlo.
Estudo longitudinal realizado nos
EUA com 88 estudantes de
medicina, divididos em grupo
experimental e grupo de controlo.
Avaliação pela escala JSPE-S
(antes e após a intervenção).
Curso de Humanidades médicas com 10 horas de contacto
presencial. Os tópicos incluíram estudos sociais e culturais,
a história da medicina ocidental e exercícios de
interpretação de artes visuais e literatura. Os estudantes
tinham leituras obrigatórias para discussão nas aulas e
adicionalmente filmes eram vistos e discutidos nas sessões.
O grupo experimental teve níveis de
empatia superiores comparando com o
grupo de controlo, onde a grande maioria
dos estudantes manteve ou diminuiu os
níveis de empatia.
Estudo longitudinal realizado na
Turquia com 59 estudantes do 1º
ano de medicina. Avaliação pela
escala Communication Skills
Attitudes Scale e Empathic
Treino de competências de comunicação básico integrado
no curriculum do 1º ano do curso. Constituído por 30
horas, incluindo tópicos básicos da comunicação
(conceitos, perceção social e do “eu”, emoções e escuta).
Os métodos basearam-se em apresentações interativas,
Antes da intervenção os estudantes foram
agrupados num grupo com altos níveis de
empatia e outro com baixos níveis de
empatia. O que se verificou após a
intervenção foi que não houve alterações
Não houve diferença entre os dois grupos
após a intervenção, o que sugere que a
exposição do grupo de controlo ao
curriculum habitual antes da intervenção
não teve qualquer benefício.
343
(Harlak, et al., 2008)
Tendency Scale (antes e após a
intervenção).
exercícios, role-play, trabalho de pares e discussões de
grupo.
no primeiro grupo enquanto que a
empatia aumentou consideravelmente no
segundo grupo.
Teaching medical students to express
empathy by exploring patient
emotions
and
experiences
in
standardized medical encounters
Estudo longitudinal realizado em
Espanha com 115 estudantes do
3º ano de medicina. Avaliação por
uma escala de 2 tarefas e 4
competências
(após
as
3
entrevistas).
O curso envolveu várias atividades, como sessões
demonstrativas e de trabalho em pequenos grupos,
workshops com pacientes simulados, role-play com
feedback e finalmente tiveram entrevistas gravadas com
pacientes simulados, podendo ser até 3 entrevistas (apenas
os estudantes que não alcançaram um determinado nível na
avaliação fizeram a terceira entrevista).
Os estudantes melhoraram bastante desde
a primeira à terceira entrevista em todas
as competências da comunicação, além de
conseguirem aplicar mais expressões
empáticas.
(Ruiz-Moral, et al., 2017)
344
4. Discussão
Os cursos de medicina devem orientar a formação com o propósito de desenvolver
competências e promover a capacitação de futuros profissionais com sentido crítico, aptos a
entender a importância do trabalho em equipa e capazes de estabelecer uma boa relação com
os utentes.(Batista, & Lessa, 2019) Um dos pilares fundamentais desta relação é a empatia,
pelo que esta tem de estar presente na prática clínica e, para estar presente nos médicos,
precisa de ser ensinada aos alunos de medicina.(Haider, et al., 2020)
Assim este ensino precisa de ser pensado da melhor forma, uma vez que para tornar a
aprendizagem efetiva e com impacto nos alunos, é necessário que estes deem sentido aos
conteúdos lecionados e que entendam a sua aplicabilidade no futuro profissional e mesmo
pessoal.(Batista, & Lessa, 2019)
A partir da integração destas ideias-chave, surgiu a questão principal desta investigação:
averiguar a necessidade do ensino da empatia nas escolas médicas, assim como quais os
métodos pedagógicos mais aplicados.
De acordo com os resultados apresentados é inegável a necessidade do ensino da empatia nas
escolas médicas, quer pelo facto de esta ser nuclear na relação médico-utente, muito
importante na prática clínica, mas também porque se observa uma tendência para esta
competência decrescer durante o percurso formativo das escolas de medicina, nomeadamente
a partir do 3º ano do curso, altura em que os alunos passarão a ter mais contacto com os
utentes.(Hojat, et al., 2009; Ruiz-Moral, et al., 2017)
Razões apontadas para este declínio e que são transversais a vários estudos, passam pela
sobrecarga de matéria apresentada aos estudantes, ausência de role-models, utilização das
tecnologias e ainda a dessensibilização dos próprios estudantes e a ideia, muitas vezes
promovida na educação médica, de manter um certo distanciamento emocional.
Por outro lado, também os profissionais de saúde que os alunos encontram nos estágios
clínicos influenciam ativamente a maior ou menor empatia apresentada por estes. Portanto, e
tal como foi descrito anteriormente, o facto destes profissionais estarem sobrecarregados a
nível de horário, os objetivos irrealistas que muitas vezes têm e a própria falta de formação
para esta competência e para a ensinarem fazem com que a empatia não seja devidamente
treinada em meio clínico real, o que seria de extrema importância.(Haider, et al., 2020)
345
Em relação aos métodos pedagógicos, partindo do facto de que a grande maioria dos estudos
encontrados apresentou métodos com efetividade demonstrada e comprovada através de
escalas validadas, podemos afirmar que a empatia pode ser ensinada. Pelo contrário, e apesar
desta efetividade imediata do ensino, houve estudos que verificaram que estes resultados se
perdem ao longo do tempo.(Ahmadzadeh, et al., 2019, Kataoka, et al., 2019) Importa perceber
o porquê de tal acontecer e podem ser levantadas várias hipóteses para o justificar como, por
exemplo, a relação entre a duração da intervenção, a periodicidade das sessões e a
manutenção da aprendizagem. Ou, por outro lado, a relação com o ano do curso em que é
aplicado o ensino ou, simplesmente, a adequação do método pedagógico. Estas hipóteses não
podem ser exploradas com base nos estudos encontrados, e será importante considerá-las em
estudos futuros.
Assumindo que a empatia pode ser ensinada, é possível avançar para as características do seu
ensino aos estudantes de medicina. Com base na informação recolhida e nos tópicos
principais referidos, podemos salientar que os métodos pedagógicos mais frequentes foram os
teórico-práticos, foi dada primazia à intervenção nos anos clínicos do curso de medicina, a
maior parte das vezes quem esteve encarregue das intervenções foram médicos das diferentes
especialidades e os alunos foram maioritariamente organizados em pequenos grupos. O tipo, a
duração e a periodicidade das sessões foi muito variável de estudo para estudo.
Outro ponto-chave na implementação de métodos pedagógicos é uma avaliação criteriosa de
todo o processo e de todos os intervenientes. Só assim uma intervenção pode ser considerada
completamente efetiva e pode melhorar e ir de encontro àquilo que são as reais necessidades
de uma população. No entanto, de um modo geral, esta avaliação não foi apresentada nos
artigos encontrados.
Reconhecemos que existem várias limitações nos resultados nesta revisão sistemática,
nomeadamente a heterogeneidade dos estudos ao nível do tamanho da amostra, ausência de
grupos de controlo em vários estudos, diferentes escalas utilizadas para a medição da empatia,
validade questionável destas escalas e descrição pouco detalhada da intervenção realizada.
Seria interessante e relevante em investigações futuras formar grupos semelhantes de alunos e
estudar vários métodos pedagógicos, considerando todos os fatores que podem influenciar o
sucesso da intervenção, assim como com a devida avaliação tanto da efetividade, como do
processo, incluindo os intervenientes, os momentos, os métodos e os conteúdos das
intervenções.
346
5. Conclusão
“Não sei o que nos espera, mas sei o que me preocupa: é que a medicina, empolgada pela ciência, seduzida pela
tecnologia e atordoada pela burocracia, apague a sua face humana e ignore a individualidade única de cada
pessoa que sofre, pois embora se inventem cada vez mais modos de tratar, não se descobriu ainda a forma de
aliviar o sofrimento sem empatia ou compaixão.” (Antunes, 2012, p.10)
De facto, ser empático é crucial na prática médica e é uma competência que não pode ser
adquirida automaticamente pelo médico… é necessário ensino e é necessária prática e treino.
Com esta revisão conseguimos expor, por um lado, a importância desta competência e, por
outro, a necessidade do seu ensino nas escolas médicas. Foram detalhados vários métodos
pedagógicos colocados em prática em várias instituições de ensino, assim como o seu grau de
efetividade.
No entanto, são necessários mais estudos que comparem diretamente diferentes métodos, com
diferentes tipos de intervenção e com diferentes populações-alvo, para assim se definir com
base na evidência quais os métodos pedagógicos mais eficazes, como e quando os aplicar.
6. Referências Bibliográficas
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350
18.FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: ELOS ENTRE A
DIMENSÃO PEDAGÓGICA E INCLUSÃO DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR
Lisiê Marlene da Silveira Melo Martins65 & Lúcia de Araújo Ramos Martins66
Resumo
Esta pesquisa buscou analisar a relação entre a formação continuada de docentes
universitários, no tocante à dimensão pedagógica e a interface com a inclusão de estudantes
com deficiência no Ensino Superior. A discussão foi alicerçada nos fundamentos teóricos e
legais que versam sobre a inclusão educacional da pessoa com deficiência no Ensino Superior,
aspectos inerentes à pedagogia universitária e à formação do docente. No tocante aos aspectos
teórico-metodológicos, seguiu abordagem qualitativa, adotando um perfil de estudo
exploratório e de caráter descritivo das evidências do campo empírico a partir das concepções
dos estudantes com deficiência, docentes universitários e gestores institucionais. Para a
construção de dados foram adotadas a análise documental, entrevista semiestruturada,
observação do campo empírico e triangulação dos dados. Como técnica de análise dos dados
norteamo-nos pela Análise de Conteúdo (Bardin, 2009). Foram evidenciados como resultados
problemas educacionais que ainda permanecem em práticas de preconceito, estigma e
exclusão. Assim como foram identificadas a importância da atuação docente frente a prática
educacional inclusiva, apresentando atitudes docentes que podem se constituir como barreiras,
erguendo-se como “muros”, através de práticas pedagógicas equivocadas, ou que podem se
constituir como “pontes”, através da realização de boas práticas educacionais que refletem
compromisso com a docência, empatia e sensibilidade. Espera-se que este estudo possa
contribuir para a área no que tange a redirecionamento pedagógico e formação continuada,
oportunizando a reflexão sobre os princípios éticos de respeito a diversidade e a inclusão de
Doutora em Educação (UFRN); Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE/CAPES) com estágio de
investigação científica no Centro de Ciéncias Sociales y Magistery (Universitat de Valéncia - Espanha).
Professora Adjunta da Universidade Federal da Paraíba (UFPB); Estudos e experiências profissionais na área da
Educação Especial com ênfase nas seguintes temáticas: Educação Especial em uma perspectiva Inclusiva;
Acesso e Permanência no Ensino Superior; Formação Docente; Pedagogia Universitária.
66
Doutora em Educação (UFRN); Professora Titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN);
Estudos e experiências profissionais na área da Educação Especial, atuando principalmente nos seguintes temas:
história da Educação Especial; educação inclusiva, inclusão escolar de educandos com deficiência; educação de
pessoas com deficiência intelectual; formação docente numa perspectiva inclusiva; Atendimento Educacional
Especializado.
65
351
todos os estudantes no Ensino Superior.
Resumen
Esta investigación buscó analizar la relación entre la educación continua de los docentes
universitarios, con respecto a la dimensión pedagógica y la interfaz con la inclusión de
estudiantes con discapacidad en la Educación Superior. La discusión se basó en los
fundamentos teóricos y legales que se ocupan de la inclusión educativa de las personas con
discapacidad en la Educación Superior, aspectos inherentes a la pedagogía universitaria y la
formación del profesorado. En cuanto a los aspectos teóricos y metodológicos, siguió un
enfoque cualitativo, adoptando un perfil de estudio exploratorio y descriptivo de la evidencia
del campo empírico a partir de las concepciones de estudiantes con discapacidad, profesores
universitarios y gerentes institucionales. Para la construcción de datos, se adoptaron análisis
de documentos, entrevistas semiestructuradas, observación del campo empírico y
triangulación de datos. Como técnica para el análisis de datos, guiamonos por el Análisis de
contenido (BARDIN, 2009). Los problemas educativos se evidenciaron como resultados que
aún permanecen en las prácticas de prejuicio, estigma y exclusión. Así como se identificó la
importancia del desempeño docente frente a la práctica educativa inclusiva, presentando
actitudes de enseñanza que puedan constituirse como barreras, elevandose como "muros", a
través de prácticas pedagógicas erróneas, o que también pueden constituirse como "puentes",
a través de la realización de buenas prácticas educativas que reflejen el compromiso con la
enseñanza, la empatía y la sensibilidad. Se espera que este estudio pueda contribuir al área
con respecto a la redirección pedagógica y la educación continua, proporcionando
oportunidades para reflexión sobre los principios éticos del respeto a la diversidad y la
inclusión de todos los estudiantes en la Educación Superior.
Palavras-chave: Inclusão no Ensino Superior. Pessoa com deficiência. Formação
Continuada. Docência Universitária.
Introdução
Nas últimas décadas, a universidade tem vislumbrado novos horizontes, abrindo
espaço para aprendizagem e conquista da cidadania por grupos de representação ainda
352
minoritária na sociedade contemporânea. Dentre estes situamos os alunos com deficiência,
que estão ingressando – embora de maneira ainda lenta - no contexto do Ensino Superior.
O censo da Educação Superior, realizado em 2014 (Inep, 2014) mostra que naquele
ano, o Brasil possuía 7,839 milhões de estudantes matriculados no ensino superior, e destes,
34.144 eram estudantes com deficiência, sendo 14.158 estudantes de IES públicas e 19.986
estudantes de IES privadas. Em 2016, o número de estudantes com deficiência subiu para
35.891.
A sinopse estatística e os microdados do Censo da Educação Superior apresentadas
pelo INEP relativas ao ano de 2017 (Brasil, 2018) apresenta 8.652.441 como total de
matrículas na Educação Superior. Destes, são representados 38.272 estudantes com
deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades/ superdotação67.
O processo de inclusão deste grupo de estudantes em âmbito universitário se apresenta
a partir da elaboração e implementação de políticas nacionais e internacionais, que visam
promover o direito de todos à educação nos diferentes níveis de ensino, tais como: a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, ratificada no Brasil como Emenda
Constitucional, em 1995 (Brasil, 1995); Conferência Mundial de Educação para Todos
(Tailândia, 1990); a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais (Espanha,
1994); a Lei 9.394/96 das Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996); a Convenção sobre
os Direitos das Pessoas com Deficiência (Onu, 2006); Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008); Decreto Nº 7.611/ 2011, que dispõe
sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado (Brasil, 2011); Plano
Nacional da Educação (PNE) 2014-2024 (Brasil, 2014); Lei nº 13.146/2015, que institui a Lei
Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Brasil, 2015); Lei 13.409/2016 que dispõe
sobre a reserva de vagas para pessoas com deficiência nos cursos técnicos, de nível médio e
superior, das instituições federais de ensino (Brasil, 2016).
Diante das mudanças sociais e políticas ocorridas no seio do Ensino Superior, ao longo
das décadas de 1990 e 2000, a inclusão de alunos com deficiência se configurou como parte
dos desafios às políticas e ações institucionais das universidades. (Pletsch; Melo, 2017; Melo
2015; 2016; Cabral, 2018)
Das discussões sobre a promoção do acesso e permanência dos estudantes com
deficiência nas universidades brasileiras, surge a necessidade de preparar os docentes do
ensino superior para lidar com a diversidade que poderão encontrar em sala de aula,
A delimitação do público – alvo da Educação Especial é de considerada pela Política Nacional da
Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008)
67
353
principalmente quando esta diversidade está representada por alunos com deficiência.
Este estudo surgiu neste contexto investigativo, e teve como objetivo analisar a relação
entre a formação continuada de docentes universitários, no tocante à dimensão pedagógica e a
interface com a inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior. As contribuições
surgem dos resultados obtidos nesta investigação, apontam para problemas educacionais
existentes entre a dimensão pedagógica e a formação do docente universitário diante do
estudante com deficiência.
Argumentação
Formação docente à luz da perspectiva educacional inclusiva
A não preparação prévia do professor universitário para lidar com o processo de
inclusão de pessoas com deficiência é evidenciado em pesquisas nacionais e internacionais.
(Oliveto; Manzini, 1999; Vitaliano, 2002; Vitaliano, 2007; Santos, 2002; Beyer, 2003; 2006;
Hummel, 2007; Eidelwein, 2005; Jesus, 2006; Martins, 2016).
Estudos específicos sobre a formação continuada do docente no contexto do Ensino
Superior em uma perspectiva inclusiva, respaldam a necessidade efetiva de formação docente,
no tocante à dimensão pedagógica e especificamente na área da Educação Inclusiva (Thoma,
2006; Santos; Fumes, 2009; Reis, Eufrásio; Bazon 2010; Hayashi, Machado; Yamaniha,
Ausec 2012; Carballo, 2016; Carballo, Moriña, 2018; Silvia, Simirotti, Sammar, 2012).
A ausência de formação pedagógica se configura como barreira na ação docente para
lidar com a diversidade inerente à presença de estudantes com deficiência (Moriña-Diez,
López Gavira, Melero, Cortés Veja, Romo, 2013, Carballo, 2018). E ainda destacam a
importância da formação continuada para a prática docente, evidenciando a ação formativa
em uma perspectiva inclusiva, como aspecto positivo junto aos estudantes com NEE.
(Carballo, 2018; Oliveira, Magalhães, Mendonça, 2016).
Destacamos ainda que estudos que apresentam as vozes de estudantes com deficiência
em relatos sobre suas experiências acadêmicas, destacam a atuação pedagógica dos docentes
universitários como uma das maiores barreiras existentes na universidade (Vega, MoriñaDíez, 2015; Moriña, Perera, 2018). No entanto, os estudos consideraram que a partir da ação
formativa que aborda a perspectiva educacional inclusiva são identificadas melhoras nos
processos de ensino (Redruello; Rodríguez; Quesada; Viloria, 2014; Carballo, Morgado 2019;
Moriña 2019).
354
Diante das evidências, consideramos que as universidades deveriam desenvolver, em
seus cursos de graduação e de pós-graduação e em programas de formação continuada,
preparação para os professores e profissionais da educação atuar frente à diversidade e
inclusão de pessoas com deficiência. É necessário fazer parte da pauta da gestão da
universidade a preocupação com a formação do professor, contemplando e incentivando a
formação continuada em uma perspectiva inclusiva como parte inerente à qualidade do
ensino.
Esta contínua preparação e envolvimento com a docência pode proporcionar o
sentimento de pertença ao processo educativo ao professor e ao estudante com deficiência.
Nesse sentido, nos ensina Freire (1996 p. 38-39) que “[...] na formação permanente dos
professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”.
No processo formativo, a perspectiva da educação inclusiva deve estar presente nos
diferentes espaços de formação. De acordo com Mayán (2014), a atenção à diversidade devese destacar como questão norteadora das práticas e formação docentes. Nas situações
formativas se fazem necessárias a criação de culturas inclusivas nos ambientes educacionais, a
aproximação, análise e reflexão sobre a eliminação de barreiras de aprendizagem e o
desenvolvimento de estratégias de cooperação que incrementem o acesso ao currículo,
desenvolvimento de habilidades e aquisição do conhecimento.
Com relação a isso, consideramos necessária a preocupação com a atuação do
professor universitário na área do ensino e da formação continuada, tendo em vista que, diante
da diversidade e inclusão de estudantes com deficiência no Ensino Superior, são levantadas
novas possibilidades de ressignificação da prática docente. Essa, ao invés dos limites, deve
visar às possibilidades e, no lugar da construção das barreiras, atuar para transpô-las.
Neste sentido, ao refletir sobre as propostas de formação continuada em uma
perspectiva inclusiva, concordamos com Michels (2005), quando orienta que os programas de
formação precisam propor a temática da inclusão em uma perspectiva do respeito à
diversidade, da sensibilização para o humano e da inclusão plena. Desprendendo-se das
características físicas e biológicas da deficiência em si e descontruindo, assim, a chamada
“marca da deficiência” nos processos formativos, que na prática, compartimentalizam e
reduzem a formação em uma perspectiva inclusiva apenas ao “conhecer as deficiências”.
Diante destas reflexões, consideramos que as perspectivas de diversidade humana e
inclusão de todos precisam permear as práticas educacionais e formativas no contexto
universitário, redirecionando os processos de ensino-aprendizagem, adaptações curriculares e
355
estratégias de avaliação. As quais possam desenvolver habilidades que
conduzam o aluno a patamares superiores de representação mental dos conteúdos
ministrados, como a reflexão contínua, a capacidade de análise e síntese e a
generalização de fatos e ideias, a compreensão dos fenômenos naturais, sociais,
políticos e econômicos, condições precípuas para melhor compreensão e inserção no
mundo, das ações e relações que se materializam nas práticas sociais. (Silva, 2013,
p. 69)
O currículo e suas possibilidades de adaptações também se constituem como
alternativas às práticas inclusivas de estudantes com deficiência na universidade, pois torna
possível uma prática pedagógica que valoriza o potencial do estudante, considerando sempre
as suas demandas e especificidades. Neste sentido, Magalhães (2013, p. 50) orienta que as
adaptações propostas ao currículo “[...] pressupõem a preocupação entre professores e
estudantes, em uma contínua construção de alternativas que diversificam e ampliam as
possibilidades de aprendizagem”.
Com base nas reflexões desta autora, as adaptações curriculares podem ser
compreendidas como um processo de ajustes e tomada de decisões para que alcancem as
especificidades e demandas dos estudantes no tocante aos diferentes modos de aprendizagem.
Diante das amplas possibilidades de adaptações está à necessidade do diálogo contínuo entre
o professor e o estudante com deficiência, em uma escuta sensível à condição do outro e à
disponibilização em tornar a aprendizagem acessível.
De acordo com Magalhães (2013), as adaptações curriculares são consideradas não
significativas quando demandam uma pequena alteração na programação da aula. Isto ocorre
quando há uma necessidade de adaptações na organização espacial, didática, objetivos,
conteúdos, técnicas e instrumentos de avaliação, de modo possam atender as especificidades
dos estudantes com deficiência, e assim, possibilitar o alcance da aprendizagem, não só para o
estudante com deficiência, mas para todos.
Já as adaptações curriculares consideradas adaptações significativas, de acordo com
Magalhães (2013, p.52), são aquelas modificações mais acentuadas, “[...] mais drásticas no
desenho curricular da aula, havendo a eliminação de conteúdos lineares, adequando os
objetivos da área e os respectivos critérios de avaliação”. Há a eliminação de alguns objetivos
básicos ou a introdução de objetivos específicos alternativos, não previstos aos demais
estudantes.
É importante ressaltar que as adaptações curriculares devem ser pensadas para a
promoção de aquisição de novos conhecimentos, de modo a complementarem ou
356
suplementarem os processos de aprendizagem. É equivocado pensar em adaptação curricular
sob um viés de facilitador dos conteúdos, que não considere todas as etapas de
desenvolvimento e aprendizagem esperadas para um estudante em nível universitário. Esta
visão de adaptação curricular na promoção da facilidade não se adequa à perspectiva real de
inclusão, pois esta é imbuída de atitudes compensatórias e minimalistas das potencialidades
de estudantes com deficiência.
Outro desafio à prática pedagógica universitária diante da inclusão de estudantes com
deficiência são as estratégias e modelos de avaliação. Nesta perspectiva, a avaliação da
aprendizagem precisa exercer um papel formativo, com o foco na formação integral dos
estudantes durante o processo de ensino-aprendizagem e na ressignificação da ação docente,
fazendo uso de critérios e procedimentos mais flexíveis, com vistas a obter resultados
qualitativos da aprendizagem. Sobre esta temática, Silva (2013) nos conduz a refletir que a
avaliação da aprendizagem
não é a reprodução de informações a identificação de acertos e de erros
expressos em um sistema de notação e em uma visão linear e dicotômica de
aprovar ou reprovar, mas o que o aluno acrescentou aos conhecimentos
prévios e a forma como fez isso é que devem ser dignos de nota. (Silva, 2013,
p. 78)
Portanto, a ação avaliativa do processo de aprendizagem de estudantes com deficiência
não deve ser direcionada pelas possíveis limitações por essa provocada no sujeito e/ou por
visões equivocadas de incapacidade, admitidas por parte de muitos professores. Deve ser, sim,
uma ação direcionada às potencialidades de cada um, voltada à compreensão de como ocorreu
a aprendizagem e se a aquisição deste novo conhecimento alcançou os objetivos traçados no
início do processo.
Quando falamos de estudantes com deficiência, os elementos norteadores referem-se à
acessibilidade, adaptação de material e modos de flexibilização dos modelos de avaliação,
sem haver prejuízo dos objetivos dos componentes curriculares, dos conteúdos e da formação
do estudante. Podemos exemplificar este processo desde a simples ampliação no tamanho de
letras e fontes para tornar exequível uma atividade avaliativa a estudantes com baixa visão à
flexibilização do tempo de realização de uma tarefa ou, até mesmo, na utilização de
instrumentos de tecnologia assistiva para a comunicação entre professor e estudante, de modo
que haja a compreensão e retorno de repostas sob um olhar pedagógico voltado ao processo e
não ao produto.
357
Para além dos processos de adaptações dos currículos e das práticas docentes a partir
da demanda específicas das pessoas com deficiência, se apresentam os princípios do Desenho
Universal para a Aprendizagem (DUA). O campo acadêmico dos Disability Studies in
Education (DSE) ou Estudos sobre Deficiência na Educação (EDE), apresentam a como mais
uma possibilidade no processo de desenvolvimento de ambientes educacionais organizados
para o enfrentamento e a eliminação de barreiras na escolarização de todas as pessoas, dentre
elas aquelas com deficiência.
Os princípios e as três diretrizes principais do DUA, sendo eles: as múltiplas formas
de acesso à informação e conhecimento, isto é, o “o quê” da aprendizagem; as várias maneiras
de abordar tarefas estratégicas, isto é, o “como” da aprendizagem; e as várias maneiras de
tornar-se e permanecer engajado no aprendizado, isto é, o “porquê” da aprendizagem
(KEMPFER; BOCK; GESSER; NUERNBERG, 2018).
O campo dos “Disability Studies in Education” (DSE) é relativamente recente e tem se
preocupado com a potencialização de espaços educacionais mais acolhedores à variação
funcional humana e, com isso, tem proporcionado entendimentos e reflexões sobre a
aprendizagem de estudantes com deficiência. Pesquisadores como Baglieri et al. (2011),
Barnes (2009), Collins (2013), Valle e Connor (2014) compreendem que é por meio da
transformação do ambiente pedagógico, prioritariamente na eliminação de barreiras e na
implementação de práticas colaborativas, que todos os estudantes podem ter acesso ao
conhecimento com participação, uma vez que, dessa forma, é possível considerar a
singularidade presente nos diferentes modos de aprender.
Os pesquisadores do DSE, fundamentados pelo modelo social de deficiência,
combatem a prática de adaptação curricular. O que se propõe é um currículo adequado às
variações das habilidades dos estudantes da sala de aula qualificando o ensino para todos e,
dessa maneira, apresentam o DUA em diferentes pesquisas (Baglieri et al., 2011; Liasidou,
2014; Valle; Connor, 2014).
Pessoas com os mesmos diagnósticos de deficiência (nominado como lesão) podem ter
necessidades distintas em sua escolarização, quer seja na metodologia, nas estratégias ou nos
recursos a serem utilizados. Para os estudiosos do DSE, ações que possibilitam o acesso e a
participação efetiva de pessoas com diferentes condições não podem ser propostas apenas sob
a égide de legislações, mas, sim, por compreender que são necessárias mudanças na adoção de
estratégias metodológicas para que elas estejam adequadas às necessidades, às
potencialidades, enfim, às características de cada pessoa.
Dessa maneira, acredita-se que as diretrizes e princípios do DUA, que estão
358
evidenciados nos estudos de distintos pesquisadores, a exemplo de Rao e Bryant (2014), Rose
et al. (2006), Edyburn (2010), Cha e Ahn (2014), entre outros, apresentam perspectivas que
possibilitam minimizar as barreiras no percurso acadêmico de estudantes com e sem
deficiência, não hierarquizando ou privilegiando um único modo de aprender e, com isso,
criando ambientes de aprendizagem flexíveis para estudantes e docentes.
O DUA amplia o entendimento para os processos pelos quais os estudantes acessam o
conhecimento, não somente vislumbrando recursos que eliminem barreiras, mas pensando e
projetando cursos e currículos adequados, e, dessa maneira, não cabe falar de adaptação
curricular. Essa é uma de suas premissas: barreiras para aprendizagem ocorrem na intersecção
com o currículo (Rappoltschlichtmann et al., 2013).
O DUA tem se evidenciado como um grande aliado para desenhar instruções de
cursos, materiais e conteúdos, a fim de beneficiar as pessoas de todos os estilos de
aprendizagem,
sem
adaptação
ou
substituição
de
equipamento
(Zhong,
2012).
Complementarmente a essa ideia, é preciso reforçar que o DUA não remove desafios
acadêmicos, ele remove barreiras ao seu acesso (Nielsen, 2013).
A perspectiva do DUA está presente em normativas internacionais, tais como: a Lei de
Oportunidades do Ensino Superior de 2008 (HEOA) publicada em 14 de agosto de 2008, nos
Estados Unidos68. Define que o DUA deve ser uma estrutura válida cientificamente para
orientar a prática educacional (Black; Weinberg; Brodwin, 2015). Na Lei Educacional para
Indivíduos com Deficiência (IDEIA) de 2004, a lei federal americana oferece um forte apoio
para inclusão de estudantes com deficiência nas escolas públicas dos Estados Unidos. Nela
determina-se que o Desenho Universal deverá ser utilizado como uma intervenção para ajudar
os estudantes com deficiência na sua participação no currículo geral da educação da maneira
mais plena possível (Hinshaw; Gumus, 2013; Larocco; Wilken, 2013; King-Sears et al., 2015;
Webb; Hoover, 2015). A legislação do Governo de Manitoba, província do Canadá, adota o
DUA afirmando a necessidade de as comunidades escolares, incluindo professores,
desenvolverem planos para a diversidade total da sua população estudantil (Katz, 2015).
A incorporação do DUA nas políticas da educação de modo mais amplo, contrapõe-se
ao modelo da inclusão a partir de legislações específicas. Nela se estabelece uma proposta de
uma escola acolhedora das diferentes expressões do humano, nas quais se distingue daquela
que emite rótulos para a inclusão a partir de diagnósticos.
Realidades que incorporaram o DUA mostram-se mais satisfatórias na participação, no
68
Public Law 110–315. AUG. 14, 2008 - HEOA: https://www.govinfo.gov/content/pkg/PLAW110publ315/pdf/PLAW-110publ315.pdf
359
envolvimento e no acesso à aprendizagem de estudantes. Coyne et al. (2012) sugere que, de
acordo com o objetivo de diminuir potenciais barreiras à aprendizagem e aumentar as
oportunidades de aprender, os planejamentos a partir do DUA trazem melhores resultados de
aprendizagem para todos os indivíduos. Neste contexto, as políticas para minorias diferem de
uma política para todos, distanciando-se de uma perspectiva universal.
Fovet et al. (2014); Kumar e Wideman, (2014) pontuam que a partir da aplicabilidade
do DUA, os estudantes podem se sentir mais no controle de seu próprio processo de
aprendizagem e com possibilidade para fazer escolhas pessoais que melhor apoiassem a sua
própria aprendizagem, além da identificação antecipada de barreiras e de proposições de
facilitadores minimizarem a necessidade dos chamados “serviços de apoio para inclusão” ou
serviços de acessibilidade educacional.
Percursos teórico-metodológicos
Esta pesquisa seguiu uma abordagem qualitativa, por valorizarmos as relações entre os
sujeitos envolvidos e o entorno, suas relações e as implicações no processo educativo, pois na
mesma abordagem, de acordo com Oliveira (2007), descrevemos e interpretamos o fenômeno
dentro de uma visão complexa, holística e sistêmica, sabendo que, ao adotarmos essa postura
investigativa, não preconizamos a verdade absoluta das coisas.
Diante do caráter exploratório, da temática abordada no estudo sobre as políticas de
formação continuada dos docentes no Ensino Superior e as relações entre a permanência dos
estudantes com deficiência neste nível de Ensino, esta pesquisa apresenta características de
uma pesquisa exploratória, pois de acordo com Gil (2008) este tipo de pesquisas é realizada,
especialmente, quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele
formular hipóteses precisas e operacionalizáveis. Além disso, a pesquisa exploratória tem
como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em
vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos
posteriores.
Diante da necessidade de descrição da realidade, compreendemos que esta pesquisa se
constitui como uma pesquisa exploratório-descritiva, pois apresenta uma junção dos perfis
metodológicos definidos anteriormente, visando proporcionar maior familiaridade com o
problema investigativo para torná-lo explícito de maneira empírica. Deste modo, a pesquisa
exploratório-descritivo também descreve e expõe características de determinada população ou
de determinado fenômeno, podendo estabelecer correlações entre variáveis e definir sua
360
natureza (Silva; Menezes, 2001; Vergara,1998).
Para direcionar os procedimentos metodológicos, adotamos a pesquisa de campo para
conduzir a investigação, uma vez que ela “[...] caracteriza-se pelas investigações em que,
além da pesquisa bibliográfica e/ou documental, se realiza coleta de dados junto a pessoas,
com o recurso de diferentes tipos de pesquisa.” (Fonseca, 2002, p 37).
O campo empírico da pesquisa foi a Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN), campus Natal/RN/ Brasil. Destaca-se esta escolha devido ao pertencimento
territorial e institucional que temos a este espaço, e o desejo de, como membro de um corpo
acadêmico e servidor, contribuir com problemáticas existentes, “ethos” imensamente
complexo e em movimento que se constitui na Universidade, sendo a pertinência desta
pesquisa anteriormente justificada em sua relevância acadêmica, social e pessoal.
Participaram deste estudo 9 discentes com deficiência, 10 docentes e 5 gestores, totalizando
assim, 24 participantes da pesquisa.
Este artigo configura-se um recorte do estudo que resultou na elaboração da tese
doutoral intitulada: Inclusão do estudante com deficiência no ensino superior e a formação
continuada do docente universitário (Martins, 2019)
Para o desenvolvimento deste estudo, foram cumpridos os trâmites e protocolos
institucionais para a autorização da realização da pesquisa. Após aprovação do projeto de
pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRN69, de fato iniciamos nossas buscas em
nosso contexto de pesquisa.
A fim de dar prosseguimento ao estudo, foi realizada a etapa de levantamento de
estudos e políticas institucionais que versam sobre a inclusão de estudantes com deficiência
no Ensino Superior, a observação do contexto empírico, até identificarmos a necessidade de
entrevistar os participes que dialogam com a área, tais como estudantes com deficiência,
docentes de cursos diversos e gestores da universidade.
A entrevista semiestruturada foi escolhida como instrumento de coleta de dados, por
acreditarmos que esta, de acordo com Triviños (1987, p.138), “[...] é um dos instrumentos
mais decisivos para estudar os processos e produtos nos quais está interessado o investigador
qualitativo”. E que nos permite diante do mosaico social expresso no contexto empírico
perceber nuances, cores, encaixes e desencaixes revelados no ato de ouvir, perguntar e
dialogar, com leveza e ao mesmo com cientificidade. Apesar de valorizar esse grande mosaico
69
Este estudo foi submetido em 08/11/2017 e aprovado em 29/11/18 (CAAE n°79717717.1.0000.5292) pelo
Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL/UFRN), em consonância com a
Resolução CNS Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, por se tratar de uma pesquisa com seres humanos.
361
subjetivo das entrevistas, Bourdieu (2001; 2003; 2004) manteve os olhos na possibilidade da
ciência como portadora do universal, da razão objetiva como método de descoberta.
Análise de dados: o mosaico entre a inclusão e formação docente
Seguimos o processo de análise pautadas na proposta de Análise de Conteúdo, na
perspectiva de Bardin (2009). Deste modo, foi pela busca em dar outros significados aos
dados obtidos nas entrevistas que fomos construindo um mosaico entre a Inclusão e Formação
Docente na UFRN, considerando a percepção de estudantes com deficiência, professores e
gestores participantes da pesquisa.
A riqueza de detalhes existentes em um mosaico, constituído por diferentes peças, com
tamanhos, cores e formatos diferenciados possibilita a percepção complexa da feitura da arte.
Esta pode permitir diversas interpretações, assim como a junção delas pode esclarecer ao
admirador uma análise do belo, do movimento e até do inacabado.
Foi esta impressão que tivemos ao observarmos os dados emanados do campo
empírico e as revelações analíticas advindas da categorização dos dados. Conforme as
prerrogativas para a estruturação da análise proposta por Bardin (2009), as Unidades de
Registros originaram as categorias e subcategorias de análise que descreveram indicações dos
dados documentais e as concepções de estudantes, docentes e gestores sobre o processo
educacional inclusivo no Ensino Superior e os seus entrelaçamentos com as políticas de
formação continuada do docente universitário.
Com vistas a preservar a identidade dos participantes da pesquisa, eles foram
identificados na análise dos dados com as letras iniciais de cada grupo ao qual pertencem, isto
é, estudantes (E), docentes (D) e gestores (G), enumerados conforme ordem da realização as
entrevistas. Assim, temos as seguintes nomenclaturas codificadas para cada participante
indicando o modo de referência utilizados em recortes de falas das entrevistas apresentadas na
análise.
Discussão de resultados
Conceber o ingresso do estudante com deficiência no Ensino Superior brasileiro era,
aproximadamente há duas décadas no Brasil, uma realidade praticamente impossível para
grande parte da sociedade. Fato que historicamente surge como discussão política, pedagógica
362
e investigativa muito recente sobre o processo de inclusão destes estudantes com deficiência
no Ensino Superior.
A presença dos estudantes com deficiência nas IES perpassa pela reorganização
estrutural e de práticas educativas historicamente alicerçadas em ações homogeneizadoras e
seletivas no contexto universitário. Deste modo, emanaram de nossos diálogos nas entrevistas
com docentes, estudantes e gestores as implicações, elementos contidos, na dimensão
pedagógica, especificamente na atividade docente que marcam tais ações homogeneizantes e
seletivas.
O primeiro deles é o preconceito, barreira percebida pelos 24 entrevistados, sendo
expressas de diferentes formas nas articulações orais, não especificamente partindo de si
próprios para com os estudantes com deficiência, mas identificando situações estigmatizantes
e geradoras de preconceito, que representam barreiras às possibilidades de ingresso e do
reconhecimento de competências reais pertinentes ao estudante com deficiência para alcançar
o nível superior de ensino. Vejamos nas falas dos docentes, elencadas para análise:
Eu sei que existe uma forma de entrar na universidade, pelo ENEM e SiSU, mas o
deficiente devia ter um processo de avaliação psicológica dos graus de habilidades,
se ele gosta de música, se ele gosta de história, porque, de repente, fazendo uma
junção da deficiência dele com as habilidades que ele têm seria mais fácil. (D2,
2017)
Não defendo a exclusão, mas uma inclusão com interferências70 de você, a partir do
momento que você tem o laudo daquele aluno, você tem condições de avaliar se ele
dá mais certo para Humanas, para Cálculos, se ele daria mais certo com Música...
porque, se a política é da inclusão, é de uma inclusão que ele se sinta mais humano,
que aumente a autoestima dele, que ele se sinta mais motivado [...] Porque, vamos
ser sinceros, dificilmente (pausa) vamos imaginar esse meu aluno aqui. Quando ele
terminar o curso aqui ele tem que fazer um exame (cita órgão que legitima a
profissão), que dificilmente ele vai passar. Então, uma vez que ele não passe isso
nunca vai deixá-lo habilitado para atuar na área como perito, como profissional.
(D3, 2017)
Os fragmentos acima estão permeados de preconcepções a respeito da condição de
deficiência, dos estereótipos de incapacidade socialmente e historicamente perpetuados sobre
a pessoa com deficiência. Os (as) docentes D2, D8, D3 e D6 sugerem uma inclusão “até certo
70
Em alguns recortes das falas destacamos alguns trechos em sublinhado para enfatizar determinados
conteúdos.
363
ponto”, ou como nominou D3, uma “inclusão com interferências”, nas quais sejam tomadas
decisões de recondução de curso, pressupondo a incapacidade de os estudantes
acompanharem determinados cursos de graduação, após legítimo ingresso.
É interessante ressaltar o modo com o qual D6 refere-se à distinção entre pessoas com
deficiência e pessoas não destras, apontando sua concepção que ser canhoto seria “apenas
uma variação”. É como se para D6 a deficiência não partisse das diversas variações existentes
na composição da humanidade. Diniz (2007) observa que a concepção de deficiência como
uma variação do normal da espécie humana foi uma criação discursiva do século XVIII, e
desde então ser deficiente é experimentar um corpo fora da norma.
Para a autora, deficiência é um conceito complexo que reconhece o corpo com lesão,
mas que também denuncia a estrutura social que oprime a pessoa com deficiência. Assim
como outras formas de opressão pelo corpo, como o sexismo ou o racismo, os estudos sobre
deficiência descortinaram uma das ideologias mais opressoras de nossa vida social: a que
humilha e segrega o corpo ‘deficiente’.
É necessário esclarecer que na atualidade, se discute o conceito de deficiência a partir
de dois modelos que respaldam e justificam o modo de compreender a condição de
deficiência. O primeiro é denominado modelo médico, o qual destaca a patologia antes do
reconhecimento das especificidades do sujeito, colocando em notoriedade a deficiência da
pessoa, restando a ela o papel passivo de paciente. De acordo com estudos de Rioux (1994),
Amirallian (1999) e Amaral (1998), este modelo considera que a condição de deficiência da
pessoa pode ser momentânea no processo de busca da “cura”, visando se aproximar ao padrão
de normalidade dos aspectos físicos e sensoriais de cada indivíduo.
O segundo, o modelo social da condição de deficiência, conduz ao entendimento de
que a pessoa tem autonomia para tomada de decisões, participação ativa na sociedade e pleno
exercício da cidadania. Esta perspectiva leva à compreensão de que a “falha” não está na
pessoa ou na sua condição, mas que se encontra em uma dimensão social, que leva à exclusão
(Amaral, 1998; Diniz, 2007; Costa 2014).
Assim, a condição de deficiência pode ser pontuada a partir das especificidades de
cada pessoa, ambiente e recursos dos quais possuem para mediar à eliminação das barreiras. A
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008) recomenda a eliminação de
qualquer dispositivo que associasse deficiência com incapacidade, considerando, no art. 2°,
que pessoa com deficiência é
aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
364
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas. (Brasil, 2008)
As concepções apresentadas pelos docentes D2, D3 e D8 reforçam a perspectiva do
modelo médico e reforçam a ideia de preconceito. Dado que nos apresenta que ainda existem
pessoas, independentemente do nível de esclarecimento cultural, que conservam estereótipos
que distanciam a pessoa com deficiência de uma sociedade inclusiva. Acreditamos que estes
posicionamentos são respostas aos contextos excludentes nos quais historicamente
circundaram as pessoas com deficiência, originando o preconceito, advindo de um estigma
social que marca a pessoa com deficiência, e a posiciona em descrédito social, e a desvia do
padrão social estabelecido. (Magalhães, 2011)
Outra pauta alicerçada no preconceito e na negativa do reconhecimento às
possibilidades de inclusão efetiva dos estudantes com deficiência é apresentada na fala de
alguns docentes ao expressarem concepções sobre a possível interferência da presença do
estudante com deficiência no rendimento e qualidade dos cursos nos quais ingressam. Sob a
premissa de que, seus cursos possuem padrões altos de rendimento acadêmico e alto grau de
dificuldade para cumprimento das disciplinas e posterior exercício das profissões oriundas da
formação universitária, parte dos docentes reafirmam padrões de normalidade e reforçam
perspectivas preconceituosas, que carregam a marca da limitação e da incapacidade pelo
simples fato da existência da deficiência. Vejamos os seguintes recortes dos diálogos nas falas
dos docentes D2 e D6.
Tem também a qualidade do ensino do curso, né? Que é muito boa, mas esse aluno
não aproveita muita coisa, porque não acompanha. Prejudica ele e prejudica o curso.
(D2, 2017)
Para um curso de (nome do curso) que se você parar para pensar foi tudo
historicamente um curso de elite, isso é muito difícil. É uma mudança muito grande.
Eu estou falando assim, bem... Não tem nenhuma... Não estou tendo nenhum
orgulho em dizer isso não. É muito difícil para a gente, porque a gente tinha alunos
que eram os melhores. A gente não tinha dificuldade com os alunos. Os nossos
alunos eram os melhores. Hoje essa realidade mudou na universidade como um
todo. Hoje a gente já está tendo que se adequar aos alunos com todos os tipos de
problemas, inclusive a questão da deficiência. Isso é muito preocupante, não
podemos deixar a qualidade cair. Mas, por outro lado, não podemos deixar de
receber estes alunos que tem esse tipo de deficiência, e aí como é que a gente vai?
(D6, 2017)
365
Os dados analisados, revelam que a sociedade e as instituições de educação superior
continuam a contribuir para a perpetuação da discriminação e do preconceito construídos
sobre as pessoas com deficiência. A esse respeito, concordamos com Candau e Moreira (2003,
p. 163) quando afirmam que
Estamos imersos em uma cultura da discriminação, na qual a demarcação entre
“nós” e os “outros” é uma prática social permanente que se manifesta pelo não
reconhecimento dos que consideramos não somente diferentes, mas, em muitos
casos, ‘inferiores.
O desrespeito e a invisibilidade dos estudantes com deficiência são parte do
preconceito que deve sempre ser desconstruído. Estas posturas preconceituosas com relação à
pessoa com deficiência podem perder espaço a partir de ações educativas que visem
ressignificar a prática pedagógica. Não há dúvidas que o contexto educativo pode ser um dos
mecanismos de transformação e instrumento para tornar a sociedade menos excludente.
Diante disso, torna-se ainda mais necessário que se discuta a respeito da perspectiva
educacional inclusiva na Universidade, no sentido de destacar a humanidade e individualidade
de cada pessoa, antes de destacar, nelas, marcas que as diferenciam do que se prega como
normalidade. Considerar a condição de deficiência como uma limitação, que por si mesma
não impossibilita e não incapacita, precisa ser a tônica de nossos discursos inclusivos,
principalmente no campo da Educação Superior.
Além dos aspectos sociais, consideramos que as marcas do preconceito causam
impactos na dimensão pedagógica. As falas de D8, G1 e D9 evidenciam tal perspectiva, ao
expressarem a preocupação com a resistência de professores para saírem de suas próprias
zonas de conforto, e necessariamente, refletirem sobre suas ações didáticas diante da presença
de um estudante com deficiência em sala de aula.
Há um preconceito, e eu aprendi isso não faz muito tempo, então eu certamente
também tinha esse preconceito, que não era possível o aluno ter acesso ao ensino,
porque a gente vivia em caixinhas hermeticamente fechadas com modelos de
avaliação, modelos de aula e isso requer um pouco mais de habilidade e disposição
do professor, porque isso vai requerer dele mais trabalho, um esforço a mais. Ele sai
um pouquinho da sua zona de conforto e ele vai precisar pensar sobre quais são as
possibilidades de... eu não gosto de usar essa palavra “facilitar”, mas de possibilitar
o aprendizado do aluno. (D8, 2017)
Alguns colegas reconhecem o seu preconceito e tentam mudar, outros não. Outros
366
reconhecem e acham que é isso mesmo: que não é para todo mundo, que a formação
daquele espaço não é para “qualquer um” e isso vale tanto para o deficiente, quanto
para o menino que veio da escola pública. (G1, 2017)
A gente tem que oferecer a condição, tudo bem, mas de fato algumas coisas não vão
ser possíveis serem feitas. Aí como você vai colocar na balança se aquilo é
importante, fundamental ou não para o aluno seguir adiante? E que tipo de frustação
isso pode causar para esse aluno se ele não conseguir, entendeu? Por exemplo, um
caso de deficiência física, ao treinar intubação, não tem como você intubar com uma
mão só, entendeu? Então assim, o que acontecia, a gente teria que terminar ajudando
no procedimento, você pode auxiliar, mas a pessoa não consegue fazer sozinha [...]
A pessoa tem que sair daqui com a formação completa, é profissional e não meio
profissional. (D9, 2017)
Os fragmentos dos relatos, nos revelam a existência do preconceito, como barreira
existente na dimensão pedagógica pelo simples fato da existência da condição de deficiência,
por apresentarem perspectivas de que, diante das vivências dos próprios participantes da
pesquisa para alguns docentes, a Universidade ainda não se constituir lugar de fala, de escuta
e de aprendizagem da pessoa com deficiência.
Concordamos com Glat (2011) quando afirma que os educadores trazem em suas
concepções frente aos estudantes com deficiência o estigma da incapacidade, e agregamos a
este pensamento o viés formativo laboral que permeia a universidade na atualidade, o qual
respalda ainda mais uma visão mercadológica de incapacidade e ineficiência por parte da
pessoa com deficiência.
Em consonância com marcos legais já citados no arcabouço desse trabalho, que
legitimam, como um direito inquestionável, a presença da pessoa com deficiência no contexto
do Ensino Superior torna-se indiscutível a necessidade de um redirecionamento pedagógico
que possa oportunizar a reflexão dos princípios éticos de respeito a diversidade e a inclusão de
todos os estudantes. E deste modo, coadunarmo-nos com Pires e Pires (2013) quando afirma
que a inclusão consiste no respeito e promoção da ética dos direitos relativos ao ser humano,
cultivando os valores da convivência acadêmica e da cidadania, por meio de um processo de
inclusão de todos, considerando suas diferenças e especificidades.
Neste sentido, ao considerar o ingresso de estudantes com deficiência na UFRN os
cinco gestores entrevistados direcionaram suas falas para a necessidade de mudanças nas
práticas da Universidade de ordem estrutural, política e pedagógica. Destacamos as falas dos
367
(as) os (as) gestores (as) G1 e G2 ao realizarem os seguintes comentários
Certamente, implica num projeto de mudança de projeto pedagógico da universidade
toda, implica em várias coisas, mas, por exemplo, implica nas metodologias de
avaliação, nos projetos pedagógicos dos cursos, com certeza isso vai ter impacto na
medida em que você vai ter mais alunos com deficiência. (G2, 2017)
Na hora que eu estou numa sala de aula, na hora que eu estou desenvolvendo uma
metodologia, eu posso chegar na sala de aula e ter um aluno com algum tipo de
deficiência, então você já tem que pensar nisso. Então eu acho que o grande desafio
hoje é trabalhar também pra que as pessoas, principalmente os professores, tenham
esse entendimento, essa compreensão e essa necessidade, comece a ter esse olhar
para as pessoas de forma mais integral. (G1, 2017)
A presença do estudante com deficiência na UFRN tem oportunizado a elaboração
não apenas de políticas ou o desenvolvimento de ações para a promoção de acessibilidade,
mas tem provocado reflexões institucionais sobre “a necessidade de uma mudança no modo
de pensar e nas concepções sobre a deficiência, sobre a diversidade em geral, e no modo de
pensar sobre o ensino ou sobre a aprendizagem” (Carballo, p. 39, 2018). Este movimento de
reflexão, que se refere a dimensão pedagógica e vem ecoar o silêncio científico, político e
formativo do docente com vistas ao aprimoramento da atuação docente universitária à luz da
perspectiva inclusiva.
Em nossas entrevistas junto aos estudantes com deficiência foram relatados aspectos
inerentes à dimensão pedagógica que geraram sofrimento, exposição da condição de
deficiência, má compreensão dos seus direitos expressos nas políticas institucionais, que se
apresentaram como muros a serem ultrapassados. Oito estudantes, dos nove entrevistados,
relataram equívocos ocorridos nas práticas docentes. Já os docentes e gestores não
apresentaram nenhum fato que julgassem se caracterizar como uma barreira pedagógica. Das
situações vivenciadas, elencamos os seguintes trechos das entrevistas com os estudantes:
Devido à baixa visão, tenho que escrever com letras grandes, então eu extrapolei
mais umas duas linhas na prova e ele [professor] foi e cortou a resposta, deixou
como incompleta. Não reconheceu aquilo que extrapolou. Eu falei: Mas professor,
eu tenho problema, deficiência. E ele respondeu: Ah, então procure se superar! (E1,
2017)
Às vezes fico invisível na sala. O professor usa os slides e nem se preocupa em
descrever o que todos estão vendo, menos eu. E os filmes? Num vou nem comentar.
Quando tem acessibilidade em sala você flui melhor, você consegue alcançar o
368
objetivo da disciplina. Me refiro ao professor mesmo. Porque é ele o responsável por
essa acessibilidade na hora de ensinar e aprender. (E6, 2017)
As situações relatadas pelos estudantes, nos remetem à reflexão realizada por Moriña
et al (2013), referente a postura do professor em sala de aula diante do estudante com
deficiência. O estudo apresenta aspectos nos quais os docentes podem se apresentar como
barreira ao processo de ensino e aprendizagem, ao demonstrarem resistência, preconceito,
inflexibilidade e indiferença à presença do estudante com deficiência, levantando muros ao
processo de inclusão no Ensino Superior. No entanto, identifica no professor universitário a
possibilidade de em vez de erguer muros, construir pontes rumo à aprendizagem, à
participação efetiva e à promoção de acessibilidade pedagógica.
Corroborando com esse estudo ao investigar o contexto do ensino superior, Carballo
(2018, p.44) afirma que “em relação ao processo de ensino e aprendizagem, o professor tem
um papel fundamental. O docente, pode se constituir como a principal barreira na experiência
educativa universitária do alunado com deficiência, mas também pode se constituir como uma
grande ajuda”.
Quanto a esse último aspecto, experiências de boas práticas educacionais foram
trazidas em nossos diálogos por cinco estudantes e três docentes durante as entrevistas. As
consideramos como significativas pontes que conduziram os estudantes às situações de ensino
e aprendizagens inclusivas, assim expressadas: “superamos a barreira juntos; durante a
disciplina houve muito diálogo; tive que ter paciência com ela; eu sabia que era possível.”
Das vivências compartilhadas nas entrevistas elencamos as falas seguintes como exemplos de
boas práticas:
Eu fiz uma prova sobre tática, havia um retroprojetor, eu colocava uma lâmina que
tinha o desenho da quadra e tinham os supostos jogadores que se distribuíam. Aí
todos os alunos, igualmente na sala, tinham que ir até lá na frente e fazer para a
turma uma preleção. Dizer como que eles iam escalar os jogadores dentro da quadra.
Note que há um conteúdo objetivo sobre isso, por exemplo, o sistema 2-2, o sistema
3-1, que eles foram ao longo das aulas experimentando isso e o E. que era o
estudante fazia também isso. "Ah, mas como que ele se locomovia na quadra?"
Bom, ele sem a cadeira não conseguiria se locomover, mas o que impedia de alguém
empurrar a cadeira enquanto ele estivesse na quadra? O que impediria ele de tocar
na bola com os pés? Ele fazia isso com dificuldade? Fazia. Isso impedia dele fazer?
Não. Então não exigia que ele tivesse uma meta de desempenho de acertar o passe,
de fazer tantos gols, mas ele se deslocava dentro da quadra. Ele experimentava a
369
sensação de se deslocar dentro da quadra. [...] Nas atividades teóricas era pra colocar
os soldadinhos, os jogadores, dentro do retroprojetor. Quando eu dizia: mostre para
mim o sistema 2-2. Ele colocava. Se ele tivesse alguma dificuldade motora de
colocar ele apontava e o auxiliar, colega de turma, ajudava ele a colocar. E ele dizia:
é isso? É, é isso. Aí eu dizia: mostre uma movimentação de rodízio. Como é que
estes jogadores iriam rodar dentro da quadra. Aí ele sinalizava com toda a
dificuldade motora dele, mas ele conseguia. Mesmo com as suas dificuldades
motoras ele conseguiu cognitivamente mostrar perfeitamente o quê que era a
situação. (D5, 2017)
Me permita aprender com você. Porque só convivendo é que a gente sabe. As
diferenças (pausa) a gente não está preparado para viver com elas mesmo. (D3,
2017)
Você vai aprender a aprender sendo cega e eu vou aprender a ensinar uma pessoa
cega, porque eu nunca fiz isso [...] E foi realmente um aprendizado. Nós
enfrentamos os desafios juntas, algumas coisas deram certo, outras coisas não deram
certo e a gente teve que refazer. Quando a gente diz não no início, a gente inibi
qualquer possibilidade de invenção que a gente possa ter para dar essa possibilidade
ao sujeito. (D1, 2017)
A prática pedagógica, nestes contextos, é compreendida com uma ação na qual se
abre um canal de mediação entre professor e estudante, permitindo-os, como nos conduz
Freire (1996) e Morin (2004) a pensar, mutuamente aprender a ser, a conhecer e a conviver
sob uma perspectivadas diferenças humanas, considerando as especificidades de cada um,
assim como os modos e diferentes ritmos de aprendizagens.
Envolver o estudante no processo educativo significa considerar e valorizar nele as
potencialidades percebidas, além de contribuir para o seu empoderamento enquanto
estudante universitário e cidadão, contribuindo para o crescimento pessoal e coletivo de uma
educação libertadora e conscientizadora, Freire (1996), na qual a pessoa com deficiência
pode se reconhecer questionando a normalidade, a legitimidade do tratamento inferiorizado
e a cultura que o incapacita (DANTAS, 2015).
Na perspectiva educacional inclusiva, a dimensão pedagógica precisa estar alicerçada
em uma prática docente motivada a buscar a equidade de condições para todos os estudantes,
pautada na “[...] aprendizagem cooperativa, componente do ensino, que está relacionada à
criação de uma atmosfera de aprendizagem em sala de aula em que os estudantes com seus
370
vários interesses e habilidades podem atingir o seu potencial.” (Karagiannis; Stainback, S;
Stainback, W, 1999, p.22).
A aproximação e a escuta do outro é exercício essencial à dimensão pedagógica,
considerando as peculiaridades de cada estudante em seus processos de aprendizagem,
distanciando-se de práticas pedagógicas pautadas no modelo racionalista de educação baseado
na objetividade e padronização dos papéis de estudantes e professores.
Nos diálogos resultantes das entrevistas realizadas, estudantes, docentes e gestores
ressaltaram como pontos importantes à dimensão pedagógica diante do estudante com
deficiência aspectos como: compromisso com a docência, empatia e sensibilidade.
A gente já tem um conceito, se eu sou dedicação exclusiva, aquela coisa toda. Há
um, na verdade, a importância de todos participarem, mas há um compromisso
maior que eu tenho que dar de retorno ao meu aluno, ele precisa aprender e eu
preciso oferecer as melhores estratégias. Penso que todos os professores deveriam
pensar e agir assim. (D7, 2017)
Trabalhar com deficiente não é qualquer coisa. não é qualquer jeito. Não é chegou
na sala, copiou no quadro, copiou no caderno e acabou-se, não. Tem que ter
primeiro do que tudo amor, carinho e dedicação. Se não tiver isso, pode morrer de
fazer curso, ser até doutor no que ele quiser, mas não vai conseguir nunca trabalhar
com aqueles ali. Porque ele tem que ser sensível, perceber que do outro lado também
estão pessoas. (E1, 2017)
Tentar senti-lo e se colocar no lugar dele, mas a empatia pode favorecer, ou não se
ocorrer a falta dela. A gente está falando da pessoa humana, a gente não está falando
da pessoa com necessidade específica. (D1. 2017)
Estas afirmações nos remetem à reflexão de que o processo educacional inclusivo é
composto pela sensibilidade pedagógica, a qual é comprometida com o exercício constante do
professor em colocar-se no lugar do estudante quando elabora o plano de aula ou de plano de
disciplina demonstrando assim basear suas ações nos princípios de igualdade, justiça e
imparcialidade, citados por Schaffner e Buswell (1999).
Consideramos que estes pontos não se dirigem apenas à ordem estrita do pedagógico,
mas, sim, do humano. Pela individualidade e singularidade que todo ser humano apresenta,
independente da condição que possui, “[...] o educador necessita estar sensibilizado para ver,
ouvir e tocar o ser aprendente” (OLIVEIRA, 2010 p. 136), buscando desenvolver estratégias
371
que o façam desconstruir as barreiras alicerçadas em comportamentos egoístas, as quais não
permitem que se coloquem no lugar do outro em um exercício de ressignificação de si mesmo
e, consequentemente, da prática docente. Para Tardif, (2000, p. 16), “o objeto do trabalho do
docente são seres humanos e, por conseguinte, os saberes dos professores carregam as marcas
do ser humano”, sendo a aquisição da sensibilidade relativa às diferenças entre os estudantes
constitui uma das principais características do trabalho docente.
No entanto, não há como desassociar da dimensão pedagógica, preceitos discutidos
por Freire (1996), na obra Pedagogia da Autonomia. Nela, vemos que no ato pedagógico
também estão implicados o emprego de técnicas, as ações didáticas conscientes e o
conhecimento científico necessário para alcançar o objetivo transformador da Educação.
Freire (1996) ressalta o vínculo entre as faces que permeiam a didática desde a
presença da rigorosidade metódica, pesquisa, competência, autoridade, criticidade, estética e
ética; assim como as demais faces da didática que perpassam pela: generosidade, respeito à
autonomia do ser educando, alegria e esperança, curiosidade, dentre tantos outros. E a partir
dos vínculos estabelecidos entre as diferentes faces da didática compreender que a Educação é
uma forma de intervenção no mundo, na qual o professor é importante articulador e mediador
na educação de todos os estudantes, pois em suas ações didáticas residem a essência da
formação, mediação e transformação, em movimento dialógico e reflexivo do exercício da
docência. (FREIRE, 1996).
Claramente, o Ensino Superior apresenta lacunas formativas e políticas no que se
refere à dimensão pedagógica do docente universitário. E quando colocamos estas questões
à luz da perspectiva educacional inclusiva, as lacunas tornam-se ainda mais evidentes. Esta
realidade, foi confirmada em nosso campo de investigação, nesta categoria de análise a qual
trouxe a tona temáticas como preconceito, estigma e exclusão; necessidade de
redirecionamento pedagógico docente a partir de reflexões institucionais; atitudes docentes
que podem se constituir como barreiras, erguendo-se como “muros”, através de práticas
docentes equivocadas, ou que podem se constituir como “pontes”, através da realização de
boas práticas educacionais que refletem compromisso com a docência, empatia e
sensibilidade.
Além disso, foram levantados pontos a respeito do compromisso formador e
transformador no exercício docente, ao assumir aspectos da didática que permeiam a
dimensão pedagógica desde a rigorosidade metódica ao despertar da curiosidade e da alegria
no ser aprendente.
Os saberes pedagógicos podem colaborar com o exercício da docência, em uma íntima
372
vinculação entre teoria e prática, pois a docência é um campo complexo de ações, que exige
uma formação contínua e rigorosa reflexão sobre a prática mediada pela teoria.
Consideramos que esta preocupação com a dimensão pedagógica da docência
universitária, em uma perspectiva formativa, está diretamente ligada à qualidade do ensino.
Sobre isso, Zabalza (2011) afirma que a qualificação da Educação Superior requer
investimentos na preparação docente para o trabalho, pois isto remete à reflexão sobre o
processo de formação para a docência universitária, considerando seus aspectos teóricos e
práticos, buscando a compreensão de como nos tornamos docentes e de que repertório de
saberes se faz necessário lançar mão para uma docência preparada a lidar com a diversidade e
especificidades humanas dos estudantes e dos diferentes contextos de aprendizagem.
Considerações finais
Independentemente de qual perspectiva possa direcionar a inclusão plena e efetiva das
pessoas com deficiência em todos os contextos de aprendizagem, é premente que docentes e
estudantes a percorrerem caminhos pedagógicos mais atentos ao humano e às especificidades
de cada sala de aula e de cada estudante, como agentes ativos para desenvolvimento do saber
e da criticidade. Não podemos excluir o engajamento institucional em possibilitar a
legitimidade da formação docente através de programas e políticas que provoquem uma
mudança cultural na universidade frente os estudantes com deficiência.
A inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior vem propor novos olhares
sobre o pensar e agir do professor no ato de planejar, ensinar, aprender e avaliar o ensino
universitário. E, dessa forma, compreender que “[...] ser professor obriga a opções constantes
que cruzam a nossa maneira de ser com a nossa maneira de ensinar, e que desvendam na
maneira de ensinar a nossa maneira de ser.” (Nóvoa, 1992, p.10).
Sob a perspectiva da inclusão de estudantes com deficiência na universidade, a
docência universitária precisa ser moldada, conforme apontam Pires e Pires (2013), pelo
compromisso ético do professor, respeitando a integridade do estudante, cuidando do seu
bem-estar acadêmico por meio de uma aprendizagem atenta e cuidadosa, da compreensão e da
aceitação do outro, indo além de uma compreensão objetiva do conhecimento acadêmico, mas
alcançando uma compreensão subjetiva de cada estudante em suas especificidades,
considerando as suas vivências, sentimentos, objetivos e dificuldades.
Neste sentido, a prática pedagógica, de acordo com Freire (1996) e Morin (2004), deve
373
ser vista como uma ação permeada de reflexão e criticidade, onde se abre um canal de
mediação entre professor e estudante, permitindo-os mutuamente aprender a ser, a conhecer e
a conviver sob uma perspectiva do humano, considerando as especificidades de cada um,
assim como os modos e diferentes ritmos de aprendizagens.
Para Nóvoa (1995), a diversidade e as novas configurações sociais e culturais que
permeiam o papel da universidade conduzem os professores a reencontrar novos valores, que
permitam atribuir um sentido à ação docente, precisando edificar novas normas de
funcionamento e regulações profissionais. Logo, a ação docente é permeada de novos saberes
e práticas educacionais, necessitando romper com um modelo socialmente construído de
ensino superior, o qual foi direcionado historicamente para ações educacionais universitárias a
um grupo de elite, de destacado sucesso social, com raça e credo únicos.
Diante das novas configurações sociais, a Universidade precisa se refazer em novos
saberes e novos modos de ação formativa do professor, ampliando o olhar da sociedade para
as especificidades e necessidades de cada sujeito. Assim, envolvido neste processo, o docente
universitário deve compreender o seu lugar na articulação entre os princípios éticos, políticos
e filosóficos que envolvam a ação educativa norteada pela perspectiva de diversidade humana.
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377
19.TEACHING THE GENERAL CASE IN ECONOMICS WHAT
HAVE WE LEARNED AT THE ECONOMIC DECISION
ANALYSIS COURSE?
António Bento Caleiro71
Abstract
Allegedly, in order to achieve the objectives outlined in the Bologna Declaration, it would be
desirable that, especially in higher education 1st cycle degrees, there should be courses with
the widest possible approach, in order to cover the different perspectives addressed in the
science associated with that degree. This happens in the 1st cycle (as well as in the 2nd cycle)
degree in Economics, at the University of Évora, with the Economic Decision Analysis
course. In this course, the general case is presented, with the different branches of Economics
seen as particular cases. The appraisal of this teaching-learning experience is the object of this
study.
Keywords: Teaching. Learning. General Case. Economic Decision Analysis.
71
Assistant professor at the Universidade de Évora: Departamento de Economia, Portugal. caleiro@uevora.pt
378
1. Introduction
According to the principles outlined in the Bologna Declaration, it was intended, as
much as possible, that students should attend three levels of higher education, in
particular the first two, as training for most students. This ended up translating into a redesignation of those levels, of a sequential nature to emphasize continuity, i.e. 1st, 2nd,
and 3rd cycles.
That continuity in higher education learning resulted in the call for the 1st cycle degrees
to be, as much as possible, of ‘broadband’ type, even covering courses that did not fit,
strictly, within the scope of the science in question being studied in that cycle. In this
sense, it should also be desirable the existence of courses in which the general case is
presented, so that students understand how the different courses associated with the
different parts or approaches usually considered in the science under study are
integrated/complemented, as particular cases of that general one.
That is what happens in Economics, where, as is known, there are several branches:
microeconomics, macroeconomics, monetary economics, international economics, etc.,
these being treated in the various courses that, most commonly, constitute any 1st cycle
(as well as some master and even doctorate programmes) of Economics. This is also the
case in the University of Évora, but there is also a course that intends to present the
general case, with those various branches of Economics being seen as particular cases.
This is the Economic Decision Analysis course, whose main goal is precisely to provide
an integrated approach to the process of taking economic decisions by the economic
agents in the most relevant situations, i.e. certainty, risk and uncertainty, eventually
under a static or a dynamic context.
The Economic Decision Analysis case, in terms of the challenges that arise in the
teaching-learning process, is what we intend to analyze here.
That being said, the rest of this paper is structured as follows: Section 2 offers the
description, argumentation and discussion of the case associated with the course under
analysis; Section 3 concludes; the Annexes present some important information to better
characterize the course, namely the syllabus and the bibliography.
2. Description, Argumentation and Discussion
379
Starting with a short historical digression, Economic Decision Analysis was taught, for
the first time, in the academic year 2003/04, as an optional course of the 1st
cycle/degree in Economics (at the University of Évora), following the reformulation of
curricular plan of that degree. Despite its optional nature, it has been taught in almost
every academic year, always under our responsibility. In fact, its non-functioning has
occurred only when taking sabbatical leave.
As a course of the Master’s in Economics (at the University of Évora), it was taught, for
the first time, in the academic year of 2006/07, having become mandatory in this
master’s degree, in the academic year of 2015/16. From this year on, it was also taught
as an optional course for the Master in Monetary and Financial Economics (at the
University of Évora).
As an optional curricular unit of the PhD in Economics, it was taught in the academic
years of 2010/11 and 2011/12.
It is, therefore, a course that, due to its characteristics, is appropriate to be taught in the
3 cycles of higher education studies. In fact, these characteristics were immediately
evident – at least for us – in the Economic Planning course, which gave rise to the
Economic Decision Analysis course, created by our initiative.
In fact, the Economic Planning course has, to the best of our knowledge, always been
part of the curriculum plans of the 1st cycles/degrees in Economics (at the University of
Évora). This course, which was annual in nature and later became semiannual, was
always mandatory in those curricular plans. In the first part of Economic Planning, an
analysis of economic decisions was presented. For instance, our first contact with Game
Theory, took place, as a student, in this course, in the (far-off) academic year of
1984/85. The manual used at that time was the well-known – at least for us – Johansen
(1977). About this reference in particular and, in general, about the importance of its
author, it is worth mentioning part of the note in Econometrica, Vol. 61, No. 6
(November, 1983), pp. 1854-55, that states:
“It is probably fair to say that Leif Johansen’s overall perspective on economics was
that economic theory should be seen as a tool for economic planning. This perspective
is clearly visible in his two-volume work Lectures on Macroeconomic Planning (NorthHolland, 1977-78). The treatment is broad and sometimes reaches beyond the
conventional borderlines between economics and other disciplines. At the same time,
380
there is hardly any aspect of economic theory which is not discussed from the planning
perspective, and Johansen always manage to draw some interesting implications from
even the apparently most esoteric parts of the theoretical literature.”
The above-mentioned comment clearly shows that the approach to Economic Planning,
based on the work of Leif Johansen, was comprehensive in nature and, by its
characteristics, flexible enough to remain current, in other words up-to-date. Even so,
after the extinction of that curricular unit – which was the first one to be taught when we
entered the Department of Economics at the Universidade de Évora, in the distant year
of 1988/89 – paradoxically because it was considered out of date, we did everything so
that it would be (back) considered in the curricular plan of the 1st cycle/degree in
Economics. This is how the Economic Decision Analysis course (which we chose in the
context of our ‘aggregation’ in Economics, in 2011) emerged.
From Johansen (1977) we still retain in memory (and still use) a picture like Figure 1.
Figure 10: The basic scheme of decision analysis
In fact, Figure 1 perfectly reflects the scope, flexibility and adaptability of the approach
suggested by Johansen (1977), which at first appears to be (almost) abstract – or
esoteric, in the words of that comment.
In the figure, X represents the set of possible decisions, x being one of them, and Z
represents the set of possible states assumed by the non-controllable (by the decisionmaker agent(s)) factors, and z one of them. To each pair (x,z) corresponds a (unique)
381
state for the objective variables, y = f(x,z), – forming the set Y – to which, by nature, the
decision-making agent(s) assume preferences, W(y).
Thus, the optimal decision, say, x*, will be the one that, being possible, i.e. x*
belonging to X, together with a (predicted / known / assumed) state z^, gives rise to the
best y, i.e. the one that, belonging to the set Yz, when evaluated on the scale of
preferences it reaches the highest possible value.
The determination of optimal decisions, according to the approach outlined above, in
the most diverse situations is, therefore, what we intend to study in the Economic
Decision Analysis course, which, is fair and relevant to be said, corresponds to the first
part of the extinct Economic Planning course.
Thus, in what concerns the general objectives and skills to be acquired, the Economic
Decision Analysis course has the essential objective of providing the study of the
decision-making process by economic agents under the situations, considered more
relevant, which they usually face. Thus, according to the absence or not of random
elements (in the decision-making process), and their type of randomness, the certainty,
risk and uncertainty situations are analyzed. These situations are studied under a static
context at the 1st cycle/degree and also under a dynamic context at the 2nd
cycle/degree.
The abstraction and flexibility that characterize the perspective with which the problem
of determining the (optimal) economic decisions is studied makes the course,
essentially, a means of acquiring modes of reasoning and not a menu of ‘recipes’. Thus,
while at the theoretical level, the necessary instruments are provided to choose the
optimal decisions in each situation, at the practical level, the understanding of these
instruments is tested through the use of different applications (of macroeconomic,
microeconomic, econometric nature, etc.) that, in this way, can be considered particular
cases of the theoretical approach followed in the course.
Thus it is possible to consider that, within the scope of professional skills that students
are expected to acquire in order to integrate into the job market, the course aims to
provide the ability to analyze economic activity in its various dimensions, as well as
develop the ability to understand the decision-making processes. decision-making, as
well as contact with the definition and execution of applied research work, in various
fields of Economics. In terms of general skills, the course provides adaptability,
382
innovation, reasoning or independent thinking, decision-making skills, as well as team
work. In terms of specific skills, the course contributes, through the consolidation of the
capacities to face the multiple aspects of the decision-making processes, to the solid
formation in the foundations of economic science in its aspects of (applied)
macroeconomics and microeconomics, as well as for mastering the various tools of
economic, qualitative and, above all, quantitative analysis.
In what concerns the consistency of the syllabus with the objectives of the course,
naturally, such an approach, and its intrinsic objectives, is reflected in the structure of
the syllabus (which can be found in the annex). In fact, the decision theory associated
with each case – but only the strictly necessary – is always considered first, and
secondly, the economic applications, which are particular cases. To attest the wide
scope of the analysis, it can be said that, for example, in the 1st cycle, there are cases of
macroeconomics, microeconomics, public economics, econometrics, economic policy,
operations research, economic psychology, international economics, fiscal policy,
financial economics, and economic planning (this one, symbolically).
Obviously, the achievement of the objectives that are intended to be achieved with this
course depends, in part, on the previous knowledge, of the various areas of Economics,
that the students already possess when attending the course. Therefore, when creating
the course for the 1st cycle/degree, we proposed that it should be placed in the last
semester of that degree. In fact, it ended up being in the penultimate semester which,
under normal conditions, still does not raise any major problems.
To be more specific, in what concerns the course framework, Economic Decision
Analysis is part of group II of optional courses in Economics. Taking into account the
current curricular plan of the degree, it must be attended in the 5th, i.e. the penultimate
academic semester. Thus, it is supposed to be attended after students have attended
mandatory core curricular units, namely:
Principles of Microeconomics;
Mathematics Applied to Economics and Management I;
Principles of Macroeconomics;
Mathematics Applied to Economics and Management II;
Microeconomics I;
Macroeconomics I;
383
Probability and Statistics;
Microeconomics II;
Macroeconomics II;
Econometrics I;
which allows the acquisition of (minimum) knowledge required by the course. Given
that, in fact, it is possible for students to attend the Economic Decision Analysis course
without having already been approved in all those courses, in these cases, there are
admittedly some difficulties.
In what concerns the teaching methodologies, the teaching-learning process is based
on the presentation of the decision theory needed for the understanding of the several
economic applications. While, at theoretical level, the necessary instruments to take
optimal decisions are supplied, the understanding of them is tested by the use of several
applications (from macroeconomics, microeconomics, econometrics, economic policy,
operations research, etc.).
Given the characteristics of the course, the entire matter, in each lecture, is presented on
the board, as a way of ensuring, as much as possible, that there are no doubts about the
various steps that the subject involves.
While the information collected by the students in the lectures is of crucial importance
in the acquisition of knowledge, obviously it can / should be complemented by reading
the recommend bibliography. In what concerns the course support bibliography,
given the comprehensive nature of the course, the list of supporting bibliographic
references could be extremely long. In fact, even if it were intended to suggest works
that covered, stricto sensu, each particular case or economic application that is to be
presented throughout the course, it would still be a list, certainly, composed of several
dozen titles. On the other hand, the innovative nature of the approach makes it difficult
to suggest a (single) economic decision analysis manual.
Thus, taking into account that difficulty and the need to avoid the dispersion of
suggested bibliographic references, with the consequent overload of effort (in a course
that, by itself, already requires a lot of extra-class effort), a support text, corresponding
to the development of the syllabus, authored by us, is made available and being strongly
recommended to be studied, in a regular way. This support text, as well as all the other
384
elements of support for the course, are placed in the moodle area of Economic Decision
Analysis; see http://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/4427.
The regular study of subjects is, in fact, very advisable in Economic Decision Analysis,
not least because only this allows to raise doubts that, sometimes, students do not
realize they have. From this point of view, it turns out that it is advisable, in terms of
evaluation, to choose the continuous evaluation regime, whenever possible.
In what concerns the assessment, according to the Academic Regulations of the
University of Évora, students can choose the continuous evaluation regime or the
evaluation system by final exam.
In the 1st cycle/degree course, the continuous assessment regime consists of three
written (closed-books) tests: A first test covering the matter corresponding to the Case
of a Single Decision-Making Agent in chapter 1. Decision Analysis in Certain Situation,
lasting 60 minutes, and weighting of 25%; a second test covering the matter
corresponding to the Case of Two Decision Maker Agents of Chapter 1. Decision
Analysis under Certainty, lasting 90 minutes and weighting 35 % of the final grade; a
third test covering the matter of chapters 2. Analysis of Decision under Risk and 3.
Decision Analysis under Uncertainty, lasting 90 minutes, with a 40% weighting in the
final grade. The modality of assessment by exam is based on a single assessment written
(closed-books) test covering all the three chapters.
In the 2nd cycle/degree course, the continuous assessment modality is based on the
accomplishment of one written (open-books) test, whose weight is 60% on the final
grade, and an assignment based upon the demonstration of the analytical results of a
scientific article, whose weight is 40% on the final grade. The modality of assessment
by exam is based on a single written (open-books) test covering all the matters under
study throughout the course.
As a balance of results, we can say that, after being overcome the (understandable)
barriers created by the language, purposefully generic (abstract or esoteric), used in
Economic Decision Analysis, the (also understandable) difficulties that this course
entails, usually end up being also overcome. Acknowledging that Economic Decision
Analysis is a difficult course, it is also the course where, in certain cases, our best
classifications are given, precisely to those students to whom we were able to transmit
the sensitivity for and utility of this type of (general) approach.
385
3. Conclusion
What have we learned at the Economic Decision Analysis course? The information
collected over these years of teaching allows us to say – as we, indeed, do in the first
lecture – that, in fact, it is (most probably) the most difficult course of the 1st
cycle/degree in Economics (at the University of Évora) but it is also (probably) the more
important course given that we will be considering the general case, whereas the other
courses consider the particular cases in Economics.
Although the importance of the course being not that one, in fact it corresponds to an
approach that we believe is important to be used, especially in the 1st cycle/degree of
higher education studies. Plainly, the abstraction and flexibility that characterize the
course make it a means of acquiring modes of reasoning, which is of obvious
importance, mainly at those first degrees of academic formation.
In particular, that flexibility is evidently considered by giving more attention to the
economic applications, emphasizing being (mere) particular cases of the decision theory
corresponding to the situations of interest. As expected, our teaching methodology
reflects this objective, which, taking into account the results that we have been
obtaining, may be considered as sufficiently successful, also from the point of view of
what students learn at this Economic Decision Analysis course.
As for the limitations of this work, in fact, it remains to be seen what the students’ real
opinion is about this course. Being sure that the students comment on the courses,
immediately after their attendance, we believe that an even more reliable analysis could
be obtained through an inquiry (sufficiently after the attendance of the course) of the
students. That remains to be done in further studies.
References
Johansen, L. (1977). Lectures of Macroeconomic Planning – Parts 1 & 2. Amsterdam:
North-Holland.
386
Annex I
Syllabus of the Economic Decision Analysis course (for the 1st cycle in Economics)
1. DECISION ANALYSIS UNDER CERTAINTY
1.1. The Case of a Single Decision-Making Agent
1.1.1. Decision Theory: The Basic Scheme
1.1.2. Economic Applications / Particular Cases
1.1.2.1. A case of macroeconomics: the IS-LM model
1.1.2.2. A case of microeconomics: the duopoly model
1.1.2.3. A case of public economics: the Laffer curve
1.1.2.4. A case of econometrics: the least squares estimators
1.1.2.5. A case of economic policy: the fixed targets criterion
1.1.2.6. A case of operations research: the investment projects analysis
1.2. The Case of Two Decision-Makers
1.2.1. Decision Theory: Teams Theory and Game Theory
1.2.2. Economic Applications / Particular Cases
1.2.2.1. A case of economic psychology: the difficulties of cooperation
1.2.2.2. A case of economic policy: the credibility of economic policies
1.2.2.3. A case of international economics: the international coordination of economic
policies
2. DECISION ANALYSIS UNDER RISK
2.1. Decision Theory: The non-controllable variables and the multipliers of decision
variables
2.2. Economic Applications / Particular Cases
2.2.1. A case of economic policy: the models of partisan cycles
2.2.2. A case of fiscal policy: the uncertainty in public spending multipliers
2.2.3. A case of financial economics: the portfolio analysis
3. DECISION ANALYSIS UNDER UNCERTAINTY
3.1. Decision Theory: The decision criteria and the decision trees
3.2. Economic Applications / Particular Cases
3.2.1. A case of economic planning: the decision rules and the flexibility of plans
Annex II
Syllabus of the Economic Decision Analysis course (for the Master in Economics)
1. DECISION ANALYSIS UNDER A STATIC CONTEXT
1.1 The Certainty Situation
1.1.1. Decision Theory
1.1.2. Economic Applications / Particular cases
1.2. The Risk Situation
1.2.1. Decision Theory
1.2.2. Economic Applications / Particular cases
1.3. The Uncertainty Situation
1.3.1. Decision Theory
387
1.3.2. Economic Applications / Particular cases
2. DECISION ANALYSIS UNDER A DYNAMIC CONTEXT
2.1. The Discrete Time Situation
2.1.1. Decision Theory
2.1.2. Economic Applications / Particular cases
2.2. The Continuous Time Situation
2.2.1. Decision Theory
2.2.2. Economic Applications / Particular cases
Annex III
(Complementary) bibliography
Bather, J. (2000). Decision theory: an introduction to dynamic programming and
sequential decisions. Chichester: John Wiley & Sons.
Baumol, W. (1977). Economic Theory and Operations Analysis – 4th edition. New
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Hampshire: Macmillan Press.
Cavaco Silva, A. (1982). Finanças Públicas e Política Macroeconómica. Lisboa:
Universidade Nova de Lisboa.
Chiang, A. (1982). Mathematics for Economists. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil.
Chiang, A. (1992). Elements of Dynamic Optimization. New York: McGraw-Hill.
Clemen, R.T. (1996). Making Hard Decisions: An Introduction to Decision Analysis –
2nd edition. Belmont: Duxbury Press, Wadsworth Publishing Company.
Delias, P.; Rochhia, S., eds. (2016). Tools and Techniques for Economic Decision
Analysis. Hershey: IGI Global.
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Jersey: Prentice Hall.
Forsund, F.R. (ed.) (1987). Collected Works of Leif Johansen – Vols. I & II.
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Casa da Moeda.
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McGraw-Hill de Portugal.
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et problems de decision. Paris: Éditions Cujas.
Pinto, J.C.C.; Curto, J.J.D. (2014). Estatística para Economia e Gestão: Instrumentos
de Apoio à Tomada de Decisão – 3rd edition. Lisboa: Sílabo.
Roberts, M.C.; Nelson, P.A.; Gale, J.R. (2011). Economic Decision Analysis – 4th
edition. London: Pearson Learning Solutions.
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multicritère. Lausanne: Presses Polytechniques et Universitaires Romandes.
Silva Ribeiro, C.; Reis, L.; Reis, S.S. (1990). Álgebra Linear: Exercícios e Aplicações.
Lisboa: McGraw-Hill de Portugal.
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improving decision quality – 2nd edition. Gainsville: Probabilistic.
Zey, M., ed. (1992). Decision Making: Alternatives to Rational Choice Models.
Newbury Park: Sage Publications.
389
20.CONFIGURAÇÕES DE RENOVAÇÃO PEDAGÓGICADIDÁTICA NO ENSINO SUPERIOR: UMA PROPOSTA NO
CURSO DE ARTES PLÁSTICAS E MULTIMÉDIA
Ana Souto e Melo72
Resumo
A mudança de paradigma educacional no Ensino Superior é decorrente da
necessidade de reestruturação deste nível de ensino preconizada pelo Processo de
Bolonha, pressupondo uma efetiva reconceptualização do processo de ensino e
aprendizagem que é tida, por alguns autores, como sendo um dos maiores desafios
trazidos por Bolonha na atualidade, uma vez que questiona e põe em causa o paradigma
educacional há muito instituído nos vários níveis de ensino, implicando os seus
intervenientes, alunos e professores. A descrita necessidade faz-nos emergir num mar de
reflexões na procura de formas de ensinar, mas sobretudo de aprender, que tenham
como pano de fundo o perfil de saída dos diversos cursos de formação e os respetivos
objetivos, que atendam de forma persistente ao desenvolvimento dos diversos tipos de
competências atualmente requeridas e que dinamizem a aprendizagem do aluno de
forma autónoma e interveniente em todo o processo. Cremos que o trabalho de projeto e
as ideias preconizadas pela Educação pela Arte mostram-se estratégias de ensino e
aprendizagem fundamentais no novo contexto de formação.
Na presente comunicação, pretendemos relatar as atividades desenvolvidas e a
aplicação destas estratégias de aprendizagem, em contexto real de ensino, no primeiro
ano do curso de licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, na unidade curricular de
Desenho I, no âmbito da dinamização de um Projeto do qual fez parte também uma
instituição da comunidade local. Pretendemos com esta comunicação, refletir e divulgar
as potencialidades desta metodologia de aprendizagem no âmbito do projeto realizado e
os resultados práticos obtidos.
Palavras –Chave: Ensino Superior. Renovação pedagógico-didática. Ensino das Artes.
72
CI&DEI, Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Educação, Professora Adjunta do
Departamento de Comunicação e Arte, anamelo@esev.ipv.pt, Phd em Educação – Ensino Superior,
Mestrado em Supervisão Pedagógica e Formação de Professores, Licenciatura em Ensino da Educação
Visual e Tecnológica, no Ensino Básico, docente do ensino superior desde 2001 na área das Artes e do
seu ensino.
390
1. Introdução
A renovação pedagógico-didática preconizada no Processo de Bolonha (PB),
na Declaração de Berlim (2003), a par da alteração estrutural da Área Europeia de
Ensino Superior (AEES), propõe a implementação de metodologias e estratégias de
ensino, aprendizagem e avaliação que tenham como pano de fundo o perfil de saída dos
cursos de formação e que atendessem de forma persistente ao desenvolvimento dos
diversos tipos de competências. Estas, tanto as específicas como as genéricas, que se
encontram descritas no Decreto-Lei nº107/2008, estimulam a aprendizagem do aluno de
forma autónoma, responsável e verdadeiramente interveniente em todo o processo.
Cremos que é mediante a concretização desta vertente de mudança pedagógica que se
consolida a desejada alteração do paradigma educacional, que, por sua vez, dá uma
resposta coerente aos objetivos primeiros do PB, a saber: consolidação, flexibilização,
uniformização e compatibilização dos sistemas de ensino superior (ES).
No exercício da docência no ensino das artes, temos vindo a percorrer vários
caminhos motivados pela vontade de descobrir novos sentidos e experienciar novas
estratégias de aprendizagem, uma vez, que e segundo Bachmann (2018), “as estratégias
de ensino existem para otimizar a aprendizagem do aluno” (p.11). Tendo como objetivo
fundamental a aquisição de aptidões exigentes que deem resposta à constante
transformabilidade do mercado de trabalho, damos um enfoque ao desenvolvimento nos
alunos de competências ao nível da resolução de problemas, do seu autoconhecimento e
da dinâmica das relações interpessoais. Acreditamos que os pressupostos da
Metodologia Projetual e da Educação pela Arte podem, por razões mais à frente
expostas, dar uma resposta a esta necessidade.
Num primeiro momento, neste trabalho, enunciamos algumas linhas
orientadoras subjacentes à renovação pedagógico-didática trazida por Bolonha, bem
como à Metodologia Projetual e à Educação pela Arte; num segundo momento,
pretendemos relatar as atividades desenvolvidas tendo em conta a proposta pedagógica
em contexto real de ensino, no âmbito do Projeto Artístico Desenhar Viseu,
implementado na unidade curricular (UC) de Desenho I, do primeiro ano do curso de
Licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, na Escola Superior de Educação de Viseu
(ESEV); num terceiro momento, pretendemos refletir sobre os eventuais contributos da
metodologia aplicada no referido Projeto na concretização dos pressupostos de Bolonha.
391
2. Estratégias de Ensino e Aprendizagem à luz de Bolonha
No delinear da estratégia de renovação educacional, ao nível europeu, estão
subjacentes pressupostos de crescimento cultural, económico e social, que solicitam um
olhar mais atento sobre a formação profissional dos cidadãos, recuperando ideais de
capital humano na interdependência da formação ao aumento da capacidade de
produção. As exigências de uma sociedade em constante transformação passam pela
preparação dos cidadãos na adaptação a vários contextos vivenciais e profissionais,
conjugada com as necessidades da “busca de novos rumos do futuro” (Simão et al.,
2002, p. 385).
A desejada transformação educacional, que teve o seu início no século XX com
a promissora Escola Nova, nos níveis de ensino mais baixos, chegou ao ES com a força
ideológica e institucional da AEES, tendo-se disseminado nos vários países
constituintes de forma categórica.
A desejada transformação educacional, que teve o seu início no século XX com
a promissora Escola Nova, nos níveis de ensino mais baixos, chegou ao ES com a força
ideológica e institucional da AEES, tendo-se disseminado nos vários países
constituintes de forma categórica. Esta resposta, porém, no nosso entender, tem tido
mais sucesso ao nível estrutural dos cursos de formação, permitindo a compatibilização
e consequente favorecimento no que se refere à mobilidade entre os vários estadosmembros do que ao nível da interiorização de novas formas de aprender e de ensinar,
através das quais toda a almejada transformação está dependente. Embora, no momento
atual, já se sinta alguma inquietação e seja cada vez mais comum haver formação na
área pedagógica-didática do ES, muita desta formação está ainda limitada a um âmbito
mais teórico do que prático.
A mobilização do conhecimento para a resolução de problemas práticos de
ensino e aprendizagem deve ser uma aptidão não só para os docentes, mas também para
os alunos. Aqui se forma o sentido de competência, contrário à ideia de objetivo de
ensino, ultrapassada com Bolonha (Souto-e-Melo, 2018). A competência remete-nos
para a ideia de saber em uso (Roldão, 2003), pressupondo que o aluno para a adquirir
encontre oportunidades de desenvolvimento de atividades que lhe permitam exercitar e
aplicar esse saber em situações práticas. Essas oportunidades culminarão no alcance dos
objetivos do curso e caberá ao professor completar esse ciclo, criando os desafios e
392
implementando estratégias para que esse alcance se estabeleça com eficácia. Trata-se,
pois, da abolição de um modo de aprendizagem baseado na aquisição passiva de
conhecimentos e a integração do alcance do conhecimento de forma dinâmica,
contextual e comprometida, fazendo a desejada ligação entre aquilo que somos
enquanto pessoas, o que trazemos das nossas vidas e experiências, com a construção
efetiva de um conhecimento ligado à inovação científica e vida profissional. Ressalvase, neste contexto, ainda a ideia de Henry Bachmann (2018), de que o ensino e
aprendizagem de competências infere com a sociedade e com o que o mundo moderno
espera por parte dos profissionais, nomeadamente a preparação para atuar ativamente,
potenciando o progresso da sociedade moderna.
Neste sentido, a palavra aprender toma um significado de tal maneira abrangente
e até interdisciplinar que conflui num sentido dinâmico: só estratégias de ensino e
aprendizagem igualmente práticas favorecem o papel ativo do aluno na construção do
seu conhecimento. Segundo Bachmann (2018), aprender significa tomar “tempo para
praticar” (p. 14), pressupondo que esse tempo implica a pesquisa, estudo e seleção de
conteúdos, adequados para a resolução de determinados problemas e respetiva
resolução. Esta exigente tarefa docente implica que o foco seja o aluno e que as decisões
de ensino tomadas sejam em prol desse aluno e do seu crescimento académico e, para
que isso seja uma realidade, o professor deve adotar o papel de orientador e mentor de
um processo de construção de aprendizagem único e duradouro, porque encontra na sua
unicidade valores de motivação e de encanto que só a “aprendizagem significativa”
(Kagan, 1992) pode favorecer. Ou seja, na atualidade não basta que o professor seja
academicamente muito competente, uma vez que isso não garante per si que tenha
sucesso na sua atividade docente (Bachmann, 2018). Esta questão faz-nos refletir sobre
o papel atual do ES, dos alunos e dos professores no alcance de competências, e sobre a
falta de formação ao nível da pedagogia da maioria dos docentes deste nível de ensino,
dificuldade que pode comprometer o insucesso de qualquer inovação educacional.
Quando se discute que procedimentos metodológicos e didáticos implementar
em sala de aula mediante a harmonização de estratégias de ensino e aprendizagem com
as competências requeridas, surgem várias preocupações (Luckesi, 1994):
Será que nós professores, ao estabelecermos o nosso plano de ensino, ou quando vamos decidir
o que fazer na aula, nos perguntamos se as técnicas de ensino que utilizaremos têm articulação
coerente com nossa proposta pedagógica? Ou será que escolhemos os procedimentos de ensino
[pela] sua modernidade, ou [pela] sua facilidade, ou pelo [facto de diminuir a] quantidade de
393
trabalho ao professor? Ou, pior ainda, será que escolhemos os procedimentos de ensino sem
nenhum critério específico? (p. 155)
Efetivamente, a seleção das estratégias de ensino e aprendizagem deve ser
ponderada e fundamentada por parte do professor. Um tipo de ensino que é planeado
apenas a partir de conteúdos (domínios de saber), a partir dos quais se enunciam os
objetivos e respetivas atividades de aprendizagem, pode incorrer no distanciamento
entre as estratégias de ensino e as competências a adquirir. Ao invés, no âmbito da
renovação pedagógico-didática que aqui se discute, reúnem-se condições funcionais
para que seja possível que o ensino seja planeado com os alunos. Partindo das
competências que se pretende alcançar, encontram-se os conteúdos que melhor as
operacionalizam e as estratégias que as impulsionam na sua efetiva concretização de
saber individual.
O papel ativo do aluno na construção do conhecimento, a dinâmica que cria
mediante as diferentes aprendizagens que consegue articular e mobilizar para a
resolução de determinado problema, são aspetos preponderantes para a aquisição das
competências atualmente requeridas pelo mercado de trabalho.
Através do Projeto Tuning, verificou-se que são cada vez mais as instituições de
ES dos países aderentes ao PB a aplicar questionários a alunos, ex-alunos e aos seus
empregadores no sentido de orientar a oferta da formação para as necessidades do
mercado de trabalho (González &Wagenaar, 2008). As necessidades do mercado são,
pois, identificadas e os planos de estudo são orientados para as competências essenciais,
que irão, de alguma forma, auxiliar na procura de emprego.
No âmbito do referido Projeto, emergiram dois grupos de competências: a) as
específicas referentes ao tipo de conhecimento de determinada área de saber; b)
genéricas ou transferíveis, dirigidas à área do saber ser e estar, mais ligadas à cidadania
e de saber estar em sociedade, que, por sua vez, foram divididas em três tipos:
instrumentais que dizem respeito a habilidades cognitivas, metodológicas, tecnológicas
e linguísticas; interpessoais respeitantes às capacidades individuais de interação pessoal,
social e de cooperação; e as competências sistémicas, que se referem a uma abordagem
holística do conhecimento, exigindo o seu inter-relacionamento com uma perceção mais
global dos processos de gestão do mesmo saber (González & Wagenaar, 2008). Em
Portugal, através da publicação do Decreto-Lei nº74/2006, os cinco grupos de
394
competências mostram-se como pontos de referência para a reorganização do ES
português e para a concretização dos objetivos consignados pelo PB.
Nesta perspetiva, ficará claro de que não serão apenas as competências
específicas de determinado domínio do conhecimento que interessarão desenvolver. No
contexto atual, será necessário impulsionar o alcance de competências de alto nível
(Higher Order Skills) relacionadas com o saber ser, estar e devir, esta última que
acrescenta às outras a projeção do aluno no alcance do seu próprio conhecimento
(Lebrun, 2008). Ou seja, faz-se a apologia de maior equilíbrio entre os dois tipos de
competências, mostrando-se como fundamental para o desenvolvimento de uma
atividade profissional que dê resposta ao elevado nível de exigência e competitividade.
2.1 O papel da Metodologia Projetual e da Educação pela Arte no âmbito
das metodologias ativas
No âmbito das necessidades anteriormente explanadas, e que Bolonha trouxe a
discussão, são recuperadas as “pedagogias ativas” (Altet, 1994, p. 12). O papel ativo do
aluno na construção da sua aprendizagem, um dos pilares fundamentais da alteração de
paradigma educacional trazido por Bolonha, não é completamente novo no sistema de
ensino, uma vez que, em meados do século XX, ressurgiram os postulados da Escola
Nova (de finais do século XIX) e a tentativa da sua implementação em níveis de ensino
mais baixos. Contudo, o ensaio de recusa do modelo tradicional de escola manteve ao
longo dos tempos várias fontes de resistência e, até hoje, na escola contemporânea, não
é consensual e praticável em todos os contextos educativos, aspeto que se agrava no que
diz respeito ao ES, uma vez que a escassa formação pedagógico-didática dos docentes
em exercício prejudica esta vertente mais inovadora de ensino e aprendizagem.
Segundo Simão, Santos e Costa (2004), o processo pedagógico do ES percorreu
durante largos anos caminhos rígidos, baseados numa lógica curricular com
metodologias de ensino, de aprendizagem e de avaliação assentes na assimilação de
conteúdos pré-definidos. Agora, com o PB, essas teorias reaparecem de forma integrada
nas práticas de ensino e aprendizagem e poderão ser implementadas consoante as
competências formativas que se pretende desenvolver, respeitando as expectativas e o
percurso individual de cada aluno.
395
Na vertente atual de formação do ES, um aluno que tenha consciência de que
não sabe tudo, estará pronto para aprender integrando os ideais que envolvem o
aprender a aprender que pressupõe um “processo contínuo de procura e de refinamento
[…] sendo este um dos aspetos mais inovadores no âmbito da pedagogia do ES e que
promete dar cartas no que se refere à desejada mudança de paradigma educacional”
(Souto-e-Melo, 2013, p. 49). A par do aprender a aprender, surge uma outra área de
estudo, a metacognição, também impulsionada por Bolonha, que se refere à
autorregulação do conhecimento por parte do aluno que, segundo Vygotsky (Cole et al.,
1991), confere a reconstrução e a transformação ativa do sujeito no âmbito de processos
interativos de conhecimento.
A propósito, cabe-nos referir também a aprendizagem por descoberta (Sprinthall
& Sprinthall, 1993), defendida por Dewey, Piaget, Vygotsky, Bruner e Ausubel, entre
outros autores, não só na formação do indivíduo como ao longo da sua vida. Este tipo
de aprendizagem responde às necessidades atuais de formação ao nível da dinamização
de competências crítico-reflexivas, do desenvolvimento do raciocínio e da criatividade
para resolução de problemas, da participação ativa na produção do conhecimento,
através de uma ação exploradora e atendendo às especificidades dos alunos.
No domínio das relações interpessoais, recorde-se a aprendizagem cooperativa,
desenvolvida por Spencer Kagan (1992), na década de oitenta, e reconhecida por
Bolonha com grande potencial.
A aprendizagem significativa, entendida por alguns autores (como Dewey,
Piaget, Vygotsky, Bruner e Ausubel) como aquela que impulsiona o sujeito para a
descoberta do conhecimento, através da atividade resolutiva (Sprinthall & Sprinthall,
1993) associa-se à aprendizagem experiencial. John Dewey defendeu que o papel da
escola não se deverá cingir à aquisição de saberes, devendo incluir a exploração do
potencial do aluno e prepará-lo para a utilização desses saberes na sua vida ativa. Neste
sentido, Dewey só entende o conhecimento teórico mediante a sua exequibilidade ou,
por outras palavras, a sua integração experiencial, concretizada no célebre princípio
pedagógico learning by doing, que implica o envolvimento sistémico do aluno no
alcance do conhecimento.
Rogers (1985) refere que a aprendizagem experiencial implica o envolvimento
do aluno numa aplicação prática, fazendo aumentar o seu interesse bem como os níveis
de motivação e suscitando a criatividade na resolução de problemas. Algumas das linhas
orientadoras deste modelo enquadram-se nos pressupostos do PB, visto que a apologia
396
do saber útil pressupõe o aluno na construção da sua aprendizagem, tendo em vista o
desenvolvimento de competências crítico-reflexivas e criativas na resolução de
problemas.
A Pedagogia de Projeto foi desenvolvida no âmbito da Escola Nova e teve
como principal impulsionador John Dewey (1998). Este modelo possibilita uma visão
integradora do novo conhecimento nos saberes já existentes, permitindo o
desenvolvimento do raciocínio lógico para dar resposta adequada a determinada
necessidade. O conhecimento e, pois, entendido como “dinâmico, mutável,
multidimensional, situacional e construído” (Guedes et al., 2007, p. 33).
Embora a Metodologia Projetual tenha sido utilizada no âmbito do design e em
outras áreas artísticas, entendemos que poderá ser uma mais-valia no âmbito da
renovação pedagógico-didática, nomeadamente pelas suas valências ao nível do
desenvolvimento de competências de alto nível, desde o incentivo à implementação do
aprender a aprender, mas também enquanto garantia de um trabalho com maior
precisão, maior rentabilização de tempo e de recursos (Munari, 1988), maior
organização, coordenação e convergência de saberes e aproximação do contexto de
ensino ao contexto real e profissional.
A implementação de uma formação que vá além da simples transmissão de
saberes, objetivando-se na formação total e integral do indivíduo a todos os níveis, está
presente no âmbito dos pressupostos do PB, nomeadamente na definição de
competências genéricas que devem ocupar um lugar equilibrado nos programas de
ensino a par das específicas. A importância da formação do indivíduo como ser total
emergiu da tese desenvolvida por Herbert Read (2010), intitulada Education Through
Art, publicada em 1943.
No âmbito da Declaração de Salamanca (2001), apela-se a um ES que deva ser
capaz de formar cidadãos com capacidade criativa, com aptidão para resolver
sistematicamente problemas e aplicar metodicamente os conhecimentos aprendidos em
situações reais. Ora, a criatividade é uma das competências genéricas que o PB traz para
debate, contribuindo, de forma eficaz, para o desenvolvimento de competências no
âmbito do aprender a aprender. Neste sentido, é-lhe atribuída uma real importância, por
exemplo, ao nível da capacidade para a resolução de problemas, já que, num clima de
instabilidade decorrente da permanente mudança, possibilita soluções eficazes para os
mesmos. A criatividade é assim entendida como uma capacidade, uma aptidão, que
deve conduzir à criação (Sousa, 2003).
397
Tendo consciência de que os pressupostos da Educação pela Arte, divulgados
por Read, se dirigem fundamentalmente à educação da criança, entendemos que se
poderão estender à formação de jovens e adultos, enquadrando-se com pertinência no
âmbito do ES e nos desígnios do PB, nomeadamente no que diz respeito à perspetivação
de uma proposta pedagógica-didática de renovação, visto que, como referiu Alberto
Sousa (2003):
A Educação pela Arte é essencialmente um movimento de renovações, no sentido de se
abandonar princípios pedagógicos rígidos e pré-concebidos, para compreender [o
indivíduo] nas suas emoções, nos seus desejos, nos seus interesses e na sua procura da
felicidade, do modo cientificamente mais correto e eficaz. (p. 82)
Segundo Lucília Valente (1999), uma formação que se objetive na formação
integral da pessoa dá resposta a dois aspetos fundamentais para sua existência: a
expressão de si e a comunicação com os outros. O equilíbrio entre o que se pensa e a
manifestação clara (expressão) desse pensar facilita o alcance de competências de alto
nível.
3. Contexto de Implementação Metodológica do projeto Desenhar Viseu
No âmbito da lecionação da UC de Desenho I, do primeiro ano do curso de
licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia, da Escola Superior de Educação de Viseu
(ESEV), durante três anos, integrámos uma parceria com uma instituição agregada à
Câmara Municipal de Viseu, de nome Viseu Novo – SRU (Sociedade de Reabilitação
Urbana), dinamizando o projeto artístico Desenhar Viseu, que envolveu cerca de setenta
alunos e um professor. O curso de Licenciatura em Artes Plásticas e Multimédia da
ESEV é constituído por duas áreas distintas, as Artes e as Tecnologias da informação e
Comunicação que, numa dimensão mais alargada, se podem integrar e conjugar
potenciando a aquisição de competências profissionais na criação da imagem e/ou
identidade visual de empresas/instituições na área das artes gráficas e da multimédia;
coordenação e criação de conteúdos/produtos multimédia; e assessoria na área da
comunicação (Escola Superior de Educação de Viseu, 2020 junho 29).
A UC de Desenho I é de natureza teórico-prática e faz parte do elenco de UC
da área das Artes Plásticas, pretendendo explorar competências ao nível do desenho
398
inicial (fundamentalmente de representação), situando-se no início do curso e
precedendo as UC de Desenho II, III e IV, que lhe darão continuidade. Na UC de
Desenho I, pretende-se, num primeiro momento, desenvolver competências ao nível do
desenho de representação de objetos, na aplicação técnica de meios, materiais e
adequação dos suportes; numa segunda fase, pretende-se fundamentalmente que os
alunos desenvolvam competências ao nível da representação do espaço/meio envolvente
(paisagístico e arquitetónico) com a aplicação de efeitos de perspetiva, sendo que se
espera que os conhecimentos anteriormente explorados sejam aplicados também neste
segundo momento, tendo um seguimento lógico de continuidade e o natural aumento do
grau de dificuldade das competências a adquirir.
Por sua vez, no âmbito do Projeto Desenhar Viseu pretendia-se a realização do
registo gráfico de edifícios recuperados ou em estado de recuperação que se
encontrassem na área de intervenção da SRU, na zona histórica de Viseu, que envolvia
o estudo visual e gráfico de fachadas, elementos arquitetónicos e zonas pedonais para
divulgação e conhecimento. O Projeto Desenhar Viseu integra várias áreas do
conhecimento artístico: a arte, o desenho, a fotografia, a preservação da história e da
cultura, o património, a arquitetura antiga e contemporânea, apelando também, de forma
inequívoca, ao trabalho em equipa, ao sentido de organização e de responsabilidade, que
se conjugam num projeto de sentido comum, competências fundamentais no exercício
de qualquer profissão.
Vimos, neste projeto, por um lado, um desafio pedagógico distinto do que
temos implementado; por outro lado, o impulso para a reflexão necessária sobre
estratégias de ensino que potenciem a efetiva participação do aluno na construção da
aprendizagem contribuindo, desta forma, para a realização do trabalho e a concretização
do projeto com o sucesso desejado. O desafio era o de implementar metodologias de
ensino e aprendizagem que garantissem o necessário envolvimento dos alunos no
projeto e a sua adequada participação.
O projeto Desenhar Viseu seguiu as linhas consignadas pela Metodologia
Projetual e pela Educação pela Arte, que explicaremos a seguir.
Após um contacto institucional por parte da SRU, e depois de concluirmos
todas as formalidades que implicaram a realização desta parceria, definiu-se a
situação/problema deste Projeto. Num primeiro momento, foi apresentado à turma o
convite de parceria, estabelecendo um diálogo sobre em que medida as duas partes
envolvidas poderiam colaborar no âmbito da UC de Desenho I. Mediante uma análise às
399
competências para o desenvolvimento desta UC (Programa de Desenho I), foi possível
estabelecer desde logo uma relação coerente entre o que era proposto trabalhar no
Programa de ensino com o que tínhamos de trabalhar neste projeto. Esta análise
mostrou-se profícua, uma vez que, por um lado, incluiu o aluno na decisão de
participarmos, ou não no Projeto; por outro lado, permitiu que o aluno, ao analisar as
competências pré-definidas para a UC, entendesse as potencialidades do mesmo Projeto
no alcance das mesmas, tornando-se esse facto, por si só, um motor de motivação.
Ainda nesta fase, no primeiro ano, foi feita uma visita de estudo aos escritórios
e ateliers da SRU, conhecendo in loco o trabalho desenvolvido pela mesma associação,
proporcionando-se o diálogo necessário entre os envolvidos, nomeadamente com alguns
dos responsáveis; nos outros dois anos, convidámos os responsáveis a virem a uma aula
de Desenho para apresentar o trabalho realizado pela SRU.
Tendo como objetivo o estabelecimento de uma ponte entre as ideias que
fossem surgindo na definição do projeto e os pressupostos da parceria, foram criadas
linhas de pesquisa que elucidassem os alunos sobre o que iríamos fazer. Estabeleceu-se,
de seguida, um debate com a apresentação de linhas orientadoras gerais, um cronograma
de atividades, a definição de aspetos a considerar na avaliação do trabalho e processo
de execução do mesmo. Estas linhas, de alguma forma, balizariam alguma dúvida
decorrente da criatividade e das múltiplas ideias que foram sendo mostradas e discutidas
para a resolução do problema inicialmente proposto. A estratégia de ensino
implementada foi a tempestade de ideias, defendida por vários autores (Anastasiou &
Alves, 2006; Bordenave & Pereira, 1985; Dalberio & Dalberio, 2010; Vieira & Vieira,
2005).
Após a necessária discussão e argumentação de qual proposta seria mais viável,
acordámos que cada aluno trabalharia uma composição visual que integrasse vários
elementos arquitetónicos, fachadas, portas, calçadas, que fizessem parte da área de
intervenção da SRU nas técnicas e materiais de pintura e desenho que entendessem ficar
melhor na sua composição. Contudo, será de ressalvar que o interesse foi sempre que os
alunos sentissem o Projeto como sendo deles e que se sentissem ouvidos,
nomeadamente através das decisões a tomar e dos caminhos técnicos e artísticos que
preferissem seguir, indo ao encontro dos seus interesses individuais de desenvolvimento
artístico.
Numa segunda fase, procedeu-se ao percorrer de todo um caminho de
descoberta, procura e pesquisa de informação que entendíamos como sendo pertinente
400
para concluir o trabalho com sucesso. Primeiramente, os alunos entenderam ser
importante realizarmos a prospeção do espaço in loco, que fizemos através do trabalho
de campo com roteiro elaborado previamente, para reconhecimento local da área de
intervenção da SRU, indo à procura dos edifícios intervencionados e que se
encontravam em intervenção, reconhecendo também o espaço e património de Viseu.
Fizemos várias recolhas de campo através de registo fotográfico e gráfico de
pormenores, edifícios, calçadas, elementos arquitetónicos. Esta estratégia de
aprendizagem cria condições para o contacto com a realidade, propicia a aquisição de
conhecimentos de forma direta através da experiência vivida; e promove o
desenvolvimento da capacidade de observação e de análise crítica da realidade
observada (Anastasiou & Alves, 2006; Dalberio & Dalberio, 2010; Petrucci & Batiston,
2006; Vieira & Vieira, 2005).
Nesta fase de investigação, cada aluno realizou também uma pesquisa sobre
artistas de referência na área do desenho de espaços arquitetónicos, de bibliografia,
sobre formas/tipos de desenho e meios que poderiam utilizar. Após esta recolha, os
alunos organizaram a informação tendo em conta ideias que, entretanto, estavam a
surgir e fizeram a respetiva apresentação/partilha com os colegas. Tendo em conta as
ideias que estavam a ser construídas, também através do debate e troca de ideias e
material recolhido, em aula definimos em conjunto que conteúdos do Programa (ou
outros) teríamos de trabalhar e exercitar para realizar o trabalho. Os alunos foram
participando, referindo e chegando de forma natural aos domínios que entendiam que
deveriam explorar e exercitar antes de iniciar os trabalhos, nomeadamente: a perspetiva
linear e aspetos particulares de desenho no espaço; técnicas de representação mais
rigorosa e mais gestual; meios, materiais e possibilidade de conjugação de técnicas;
noções de composição visual (retomando conteúdos que estavam no momento a ser
lecionados na UC de Estudos de Composição sobre equilíbrio e harmonia visual),
conjugando-se com as ideias que entretando foram tomando forma e organizando à
medida que eram expostas as necessidades do estudo de cada um dos alunos.
Num terceiro momento, foram realizados os primeiros esboços de pormenores e
elementos a inserir na composição visual, criando de certa forma uma base conceptual
de forma e assunto a explorar, bem como da exploração de algumas técnicas de desenho
e de utilização de materiais, de preferência que não tivessem utilizado anteriormente e
que de alguma forma suscitassem curiosidade técnica e concordância com o
objeto/conceito criado.
401
À medida que as primeiras ideias gráficas foram sendo representadas, íamos
fazendo um ponto da situação que consistia na apresentação das explorações, hipóteses
estudadas, excluídas ou implementadas, com a contribuição crítica de todos os colegas e
docente. Esta partilha de ideias e de apresentação de diferentes perspetivas, tornou-se
num caminho sempre enriquecedor para todos, uma vez que, através das mesmas, se
foram estabelecendo contactos de confiança, de compromisso global e de atitude de
entreajuda no alcance dos objetivos individuais e de grupo, num percurso de
aprendizagem singular, com a colaboração dos colegas e docente.
Ainda na terceira fase, correspondente à fase de Projeto, conjugaram-se esforços
no sentido de se desenvolverem esboços mais definidos em termos de ideias finais em
que a composição passou a tomar forma, combinando materiais, técnicas, definição de
formatos, tipos de suportes e o esboço geral.
De seguida, os alunos tendo em conta as ideias definidas no Projeto colocaram
em prática os conhecimentos adquiridos em todo o processo de aprendizagem
estruturada e alicerçada nos domínios do saber que faziam sentido no âmbito deste
projeto, tendo em conta a experienciação, a pesquisa, a descoberta e o diálogo que se foi
estabelecendo na troca de ideias e conhecimentos entre todos. É certo que ainda nesta
parte e por que as fases da metodologia projetual não são estanques e se podem articular
e entruzar umas nas outras, houve ainda alteração de planos delineados no projeto,
ajustes materiais e de pormenor que culminaram nos projetos em que cada um dos
alunos se identificava e essa harmonia foi de cabal importância também para manter a
natural e necessária motivação para o trabalho.
O Projeto Desenhar Viseu prosseguiu nos mesmos moldes pedagógicodidáticos durante três anos, sendo que no final de cada ano era um ciclo que se fechava
com novas aprendizagens concretizadas e muitas outras por materializar que foram
sendo alcançadas ano após ano, numa incessante vontade de fazer melhor e
estabelecendo-se uma constante dinâmica reflexiva, fundamental para a melhoria de
qualquer atividade profissional. Na Avaliação, numa primeira parte, analisamos em
contexto de turma as conquistas realizadas, por realizar e respetivos impedimentos,
perspetivando o que poderia ser melhorado num novo projeto ou atividade, focando-nos
nos resultados obtidos, mas sobretudo no processo de prossecução de todo o trabalho.
Numa segunda fase, verificou-se o impacto no público dos trabalhos realizados. Foram
realizadas três exposições dos trabalhos, uma delas na ESEV e duas em lugares públicos
de Viseu. Não temos dados rigorosos sobre de que forma o público interagiu com os
402
trabalhos expostos, mas algum do feedback direto que tivemos também por parte da
SRU foi de muito agrado com os trabalhos realizados, alguns dos quais foram expostos
nas instalações da mesma instituição.
Ressalvamos que as estratégias de ensino individualizado e de ensino com
pesquisa foram uma constante ao longo de todo o processo de aprendizagem. Por um
lado, o ensino individualizado assegurou o ajustamento do processo de ensino e
aprendizagem às reais necessidades e características individuais do aluno e deu sentido
individual do processo/crescimento artístico que cada um quis construir tendo em conta
os seus interesses de formação. Esta estratégia facilita a mediação e autorregulação da
aprendizagem, pode auxiliar o aluno no encontro das estratégias mais apropriadas para
si próprio e a estruturar, a dinamizar e a avaliar a aprendizagem e a adequação dos
esforços implementados (Baudrit, 2009; Petrucci & Batiston, 2006). Por outro lado,
cremos que o ensino com pesquisa se ajustou de forma positiva às necessidades de
constante questionamento crítico para que a renovação, reconstrução e conceção do
conhecimento se estabeleça, envolvendo três etapas fundamentais: o questionamento
(associado à ideia de liberdade de expressão), a argumentação e a comunicação,
permitindo o apuramento do sentido crítico, reflexivo e de autonomia (Anastasiou &
Alves, 2006; Lampert, 2008).
4. Discussão/Conclusões
A partir da análise de alguns estudos (Gimeno Sacristán, 2007; Romanowski &
Wachowitcz, 2003), podemos constatar de que na perspetiva de alunos, as experiências
de aprendizagem mais relevantes e que acrescentam mais significado para os mesmos
são as que mantêm uma maior articulação com a realidade. Ou seja, todo o tipo de
experiências e vivências que permitam relacionar o currículo académico com situações
e particularidades dos sujeitos e do mundo em que vivem, perspetivando-se uma efetiva
transposição da teoria para a prática, são valorizadas pelos alunos. Esta questão é
perfeitamente compreensível, uma vez que o contexto real dá um sentido de verdade ao
que estamos a aprender, nomeadamente ao nível da resolução de problemas. Essa pró
atividade, emancipação e comprometimento com a aprendizagem faz com que o aluno
continuamente mantenha uma motivação intrínseca para o aprender a aprender.
403
Mediante as necessidades atuais de formação, em que os objetivos dão lugar às
competências, os professores podem planear o ensino com os alunos. A partir das
competências podem-se encontrar conteúdos, atividades e estratégias que as
operacionalizem e objetivos que as impulsionem e a Metodologia Projetual e a
Educação pela Arte têm um lugar de destaque neste processo conjunto. Cremos que,
através do desenvolvimento de estratégias e atividades de aprendizagem adequadas,
podem ser os próprios alunos a chegar aos saberes conteudinais imprescindíveis para a
concretização de determinado projeto ou resolução de determinado problema e, desta
forma, a aprendizagem ser mais significativa.
Estabelecendo a relação entre os pressupostos da Pedagogia de Projeto, que aqui
se orientou através das fases enunciadas na Metodologia Projetual, as atividades
realizadas no Projeto Desenhar Viseu foram ao encontro das necessidades de formação
e crescimento global dos alunos. A resolução de problemas e o conhecimento prévio das
fases de ação que orientam a sua resolução, trazidas pela Metodologia Projetual,
permitiram desenvolver o saber ativo e a construção do conhecimento, a mobilidade
intelectual, o sentido crítico, a criatividade, a inovação, a autonomia, a motivação, a
garantia de um trabalho com maior precisão, a rentabilização de recursos, de tempo, a
organização, a coordenação, e a convergência de saberes. Sendo estas capacidades
fundamentais no âmbito da aprendizagem que se pretende no âmbito do ES como foi
descrito na Declaração de Salamanca (2001) no âmbito do PB.
No que concerne à Educação pela Arte e aos princípios que a enformam e que
trazemos para esta reflexão, o desenvolvimento de competências de alto nível
relacionadas com o saber ser, estar e devir estiveram alicerçadas no projeto que aqui
descrevemos, pelo constante apelo ao sentido crítico e reflexivo que o mesmo exigiu. A
constante partilha de saberes, informações e o confronto de ideias permitiu desenvolver
a autorregulação dos alunos que, por sua vez, por um lado, despoletou a expressão de
cada um redimensionando o seu autoconhecimento; por outro lado, desencadeou a
capacidade de comunicação com os outros, construindo e reconstruindo a relação
interpessoal. Ora, segundo Alberto Sousa (2003), A Educação Artística tem por base o
autoconhecimento, a dinâmica das relações interpessoais e o desenvolvimento
equilibrado do indivíduo, constituindo, desta forma, um impulso para a motivação, para
o desenvolvimento ativo da aprendizagem e para o sucesso da mesma. Por essa razão
defendemos e consolidamos a ideia de que a Educação pela Arte favorece os novos
pressupostos de Bolonha, não apenas para curso de índole artística.
404
Cremos que o Projeto Desenhar Viseu possui várias potencialidades tanto ao
nível científico, como ao nível pedagógico, sendo a este nível que nos interessou refletir
neste artigo. Este projeto pretendeu estabelecer a conjugação entre arte, património,
formas de manifestação e representação artística; aproximou a formação com a prática
do futuro profissional; incentivou a participação ativa e interveniente do aluno na sua
aprendizagem; apelou ao trabalho em equipa, ao sentido de organização e de
responsabilidade conjunta; tornou-se um desafio pedagógico pela necessidade de
implementar estratégias de ensino e aprendizagem que contribuíssem de forma eficaz
para a realização do trabalho com o sucesso desejado e que envolvessem os alunos num
objetivo de sentido comum; e trouxe para a turma um problema emergente de uma
situação real, interpeladora e relevante no âmbito do perfil de competências do curso.
Quando o professor propõe determinada atividade, estão associados a ela
determinados objetivos de aprendizagem, que pressupõem uma determinada atuação do
aluno no alcance da mesma. A execução de uma atividade de aprendizagem, mais do
que enfatizar a competitividade entre colegas e a obtenção de determinada classificação
numérica, deve dinamizar a compreensão de conteúdos e a aquisição de determinadas
capacidades e habilidades (Brophy, 1987), as competências. O aumento do grau de
participação na definição de estratégias de aprendizagem e a responsabilidade do
estudante nessa decisão aumenta a sua perceção de controlo e com ela a sua implicação
e interesse nas atividades de aprendizagem (Ariza & Ferra, 2009). Esta exigente tarefa
docente implica, em primeira instância, que o foco seja o aluno e que as decisões
tomadas sejam em prol desse aluno, do seu crescimento académico e dos seus interesses
individuais de formação; em segunda instância, que o professor tenha formação
pedagógico-didática que facilite essa tarefa de mediação da aprendizagem. Embora, seja
este o caminho favorecido por Bolonha, temos encontrado barreiras institucionais,
financeiras e de mentalidade que criam uma narrativa de descontrolo e de
inconformismo com a incoerência que o PB nos trouxe, uma vez que a estrutura
documental e legal nem sempre corresponde ao que se efetiva na prática e há passos
fundamentais por dar em todo este processo, nomeadamente ao nível na mudança de
paradigma educacional em que os professores devem ser os protagonistas. Como afirma
Machado (1995), “os professores são os elementos mais determinantes de qualquer
sistema escolar; [...] não é possível haver sucesso na implementação de qualquer
reforma ou inovação sem o querer, sem o seu saber e sem o seu poder” (p.134).
405
Neste caminho também nosso de experienciação e de descoberta, cremos que
fará sentido partilhar os processos de reconhecimento do tempo e do espaço de ensino
onde nos encontramos na atualidade, por que é nessa partilha que nos reencontramos e
confluímos no desenvolvimento das nossas práticas pedagógicas.
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408
21. AFETOS, ERROS E APRENDIZAGENS – A TRANSDUÇÃO
COMO PROCESSO DE ENSINO DAS MATEMÁTICAS E
DAS GRAMÁTICAS
Misleine Andrade Ferreira Peel73, Luiz Roberto Peel Furtado de Oliveira74 & Antonio
Cilírio da Silva Neto75
Resumo
A ausência de encontros, com toda a gama de afetos negativos, resultantes da falta de
agenciamentos, e a constância de individuações equivocadas, também com toda a gama
de afetos negativos, resultantes dessas pós-singularizações ‘errantes’, são responsáveis
por grande parte das claudicações apresentadas pelos aprendizes nos processos de
escolarização e de formação acadêmica. Neste texto, relacionaremos afetos com erros, e
aprendizagens com transduções, tendo como norte teórico principal as obras de Charles
Sanders Peirce, Gilbert Simondon e Gilles Deleuze; e tendo, como grupo beneficiário,
alunos do Ensino Superior da região norte do Brasil. Trabalharemos com os modos de
produção subjetivos implicados com a processualidade dos acontecimentos,
fundamentando-nos em toda a riqueza da filosofia do acontecimento de Deleuze. Tratase de uma abordagem interdisciplinar, que se pretende trans, dos fenômenos da
aprendizagem. A investigação é basicamente bibliográfica com procedimentos
cartográficos, por meio dos quais a objetividade do trabalho foi sendo construída pelo
traçar e destraçar de linhas duras, flexíveis e de fuga, o que permitiu e ajudou a
constituí-lo como fusão de multiplicidades, com considerações sobre o fato
comunicativo social (responsável pela importância da alteridade, tanto nos encontros,
quanto nas criações). Uma das apostas de Deleuze está, certamente, centrada nos
Doutoranda do Programa de Educação da Universidade da Beira Interior – UBI; Mestre em Demandas
Populares e Dinâmicas Regionais, pela Universidade Federal do Tocantins – UFT; Especialista em
Educação Matemática, pela UFT; Licenciada em Ciências – Matemática, pela UFT. E-mail:
misleine.peel@ubi.pt
74
Professor Adjunto do Curso de Letras e do Programa de Mestrado e Doutorado em Ensino de Língua e
Literatura na Universidade Federal do Tocantins. Pós-doutor em Língua Portuguesa pela Universidade da
Beira Interior – UBI. Doutor e Mestre em Letras Clássicas pela Universidade de São Paulo – USP;
Bacharel em Letras Clássicas pela USP; Bacharel e Licenciado em Língua Portuguesa pela USP. E-mail:
luizpeel@mail.uft.edu.br
75
Professor Adjunto do Curso de Licenciatura em Letras/Pedagogia na Universidade Estadual do
Maranhão – UEMA; Doutor e Mestre em Letras: ensino de língua e literatura pela Universidade Federal
do Tocantins - UFT. E-mail: acilirio@bol.com.br
73
409
encontros, nas criações, nos afetos positivos e nos saberes outros, todos menores – todos
plenos de uma menoridade que os afasta do poder e do discurso dominante.
Palavras-chave: Filosofia do Acontecimento. Transdução. Alagmática. Afetos.
Agenciamentos.
AFFECTIONS, ERRORS AND LEARNING – TRANSDUCTION AS A
PROCESS FOR TEACHING MATHEMATICS AND GRAMMARS
Abstract
The absence of encounters, with the whole range of negative affections, resulting from
the lack of agency, and the constancy of mistaken individuations, also with the whole
range of negative affections, resulting from these 'errant' post-singularizations, are
responsible for most of the lameness presented by apprentices in the process of
schooling and academic training. In this text, we will relate affections with errors, and
learning with transductions, having as main theoretical guide the works of Charles
Sanders Peirce, Gilbert Simondon and Gilles Deleuze; and having as targeted
beneficiaries undergraduate students from the North of Brazil. We will work with the
subjective modes of production involved with the procedurality of events, basing
ourselves on the richness of Deleuze's event philosophy. It is an interdisciplinary
approach, which is intended to be trans, of the learning phenomena. The investigation
is basically bibliographic with cartographic procedures, through which the objectivity of
the work was being constructed by drawing and unraveling hard, flexible and escape
lines, which allowed and helped to constitute it as a fusion of multiplicities, with
considerations on the social communicative fact (responsible for the importance of
otherness, both in meetings and in creations). One of Deleuze's bets is certainly centered
on encounters, creations, positive affections and other knowledge, all minor - all filled
with a minority that distances them from power and dominant discourse.
Keywords: Philosophy of Event. Transduction. Alagmatic. Affections. Agencies.
1. Introdução
Os erros escolares resultam quase sempre ou da ausência de afetos e de
encontros ou da presença e da constância de individuações equivocadas, situadas fora da
410
normatividade usual da disciplina ou da matéria trabalhada em classe; em nosso caso, os
erros ou desvios da norma padrão da língua portuguesa, ou das normas da linguagem
matemática, são recorrentes e colocam os professores em uma situação complexa e
cheia de aporias, tanto no ensino fundamental, quanto no ensino médio, e ainda no
ensino superior – uma vez que os conhecimentos linguístico-gramaticais e os
conhecimentos matemáticos são necessários em qualquer fase do ensino.
Muitas vezes os erros são vistos consorte concepções negativas, ou nem se quer
são levados em consideração para a construção de novas relações; deveriam, no entanto,
ser percebidos como oportunidades de desterritorialização, para uma posterior
reterritorialização profícua e para a criação de afetos e de sensações de alegria – o que
transformaria todo o processo de ensino e de aprendizagem em momentos de
crescimento da vontade de agir.
De fato, muitos estudantes carregam seus erros por toda a caminhada escolar,
pois, se nenhum novo agenciamento for feito a partir deles, nenhum novo afeto será
constituído; sabendo que geralmente os resultados finais são mais valorizados do que os
processos, sendo que, nessa valorização de resultados, os procedimentos resultantes de
agenciamentos não são percebidos com fenômenos fundamentais para a construção do
aprendizado.
Neste artigo queremos relacionar erros, afetos, aprendizagens e transduções,
tendo como norte principal Charles Sanders Peirce, Gilbert Simondon e Gilles Deleuze,
procurando apresentar a possibilidade de trabalho lúdico na sala de aula por meio da
transdução alagmática.
Pretendemos, dessa forma, trabalhar com os modos de produção subjetivos
associados à processualidade dos acontecimentos, já que a filosofia do acontecimento,
fonte de nossas argumentações, apresenta tanto os fenômenos corporais do enunciado,
quanto os incorporais e inexprimíveis – aqueles que são utilizados de modo transdutivo
e alagmático no aprendizado familiar da linguagens verbais e matemáticas (transdução
implica, certamente, trocas e mudanças de energia; e não, essências ou substâncias,
donde a sua percepção é delicada e séria), como fenômenos importantíssimos para que a
aprendizagem realmente ocorra.
2. Peirce, Simondon e Deleuze: afetos, incorporais e erros
As palavras e as frases (e os parágrafos, e os capítulos, e os livros – as repetição
da conjunção aditiva são propositais, pois, na filosofia do acontecimento de Deleuze, o
411
somar é mais importante do que o dividir), já que nosso escopo principal é o encontro
com os textos, têm algo de incorporal, o que foi percebido pelos estoicos e trabalhado
com maestria por Deleuze. Esse incorporal é o inexprimível, algo que se localiza entre a
palavra e a coisa, verdadeira passagem, apropriado acontecimento de uma significação e
igualmente correto espaço de ligação entre sujeitos e objetos, entre mães e filhos (um
espaço sem coerção – o espaço do acontecimento – verdadeiro espaço de passagens
profícuas entre os seres e entre seres e coisas).
E é nesse espaço que acontecem os afetos, os acertos, os erros (ou desvios, ou
ainda variações) e os fenômenos inexprimíveis, não se tratando de um espaço de e para
representações analógicas ou simbólicas, mas do lugar de encontros ou de
agenciamentos, de experimentações ou de jogos, e de devires ou de festas.
Heidegger chamou o ponto de partida desses lugares de simpatia ou afinação, ou
também atmosfera (Stimmung); Ricoeur, de memória ou símbolo; Deleuze, de
agenciamentos ou encontros. Preferimos, nesse texto, o último, já que é nos encontros
com afetos que nascem os signos, os quais, por sua vez, têm a função de fazer pensar,
ou seja, pensar é uma atividade disparada involuntariamente pela força do signo
(Nascimento, 2012). Pensar, de fato, não se constitui apenas como representação
cognitiva de algo, posto que existam vários tipos de pensamentos, resultantes de
variadas formas de imagens; pensar é seguir signos; pensar é fazer com que signos
sejam seguidos; pensar é conduzir. E é por isso que dedução, indução, abdução e
transdução têm em comum a raiz latina duc- (‘conduzir’). Pensar é, então, conduzir e
ser conduzido por signos.
Os vários tipos de signos são responsáveis por vários tipos de imagens, que, por
seu turno, são responsáveis por igualmente vários tipos de devires: há o devir
perceptivo, resultado da imagem-percepção (zeroidade76); existe o devir afetivo,
resultado da imagem-afecção (primeiridade77); ocorre, também, o devir pulsional,
resultado da imagem-pulsão (entre a primeira e a secundidade); acontece, ainda, o devir
acional, resultado da imagem-ação (secundidade); sucede, além disso, o devir reflexivo,
resultado da imagem-reflexão (entre a secunda e a terceiridade); existindo, até, o devir
76
Zeroidade é um conceito introduzido por Gilles Deleuze às matrizes de criação do pensamento e da
linguagem de Charles Sanders Peirce, constituindo-se como o não lugar da criação, ou seja, o lugar dos
movimentos infinitos de todas as partículas que possamos pensar, dizer ou significar.
77
Primeiridade, Secundidade e Terceiridade são as matrizes do pensamento e da linguagem da semiótica
americana de Charles Sanders Peirce, sendo que a Primeiridade é o lugar de contemplação da pura
qualidade; a Secundidade, o lugar da ação; e a Terceiridade, o lugar da convenção, da lei, do pensamento
simbólico, da representação e da argumentação verbal e/ou multissemiótica.
412
relacional, resultado da imagem-relação (terceiridade). Não parando por aí, já que
podem ocorrer outros devires (háptico, por exemplo) (Oliveira, Duarte e Peel, 2019).
Percebamos que esses processos começam com dois devires: o perceptivo e o
afetivo – passagens primeiras, nas quais os processos de aprendizagens têm o seu início,
tanto os positivos, resultantes de individuações esperadas pelos docentes, ou
estimuladores, quanto os negativos, resultantes de individuações, ou de alienações,
equivocadas em relação ao esperado pelos docentes.
Cada um desses devires, com sua imagem equivalente, acaba sendo responsável
pela criação de um determinado tipo de afeto. O devir perceptivo, fruto da imagempercepção, é o responsável pelo afeto em relação à percepção, pela percepção da
percepção, pelas imagens sem ponto de referência, posto que nasça da zeroidade, lugar
do caos e fonte de toda a criação, constituindo-se como a passagem inicial para a
abertura da mente (verdadeiro conjunto de senhas, que abre realmente o ‘cérebro,
permitindo variações na arquitetura neural).
A imagem-percepção se constitui como a primeira imagem criadora de
movimentos, ou de acontecimentos, sendo que o bebê, em seus processos de
individuações, deixando de ser pré-singular e amorfo, inicia o seu processo de
participante ativo dos acontecimentos quando começa a perceber a sua percepção – a
perceber que percebe. O papel da imagem-percepção na constituição da imagemmovimento, a conjunção das imagens percepção, afecção e ação, é o de se apresentar
como o primeiro aspecto material da subjetividade – a subtração.
Assim, subtraindo pela percepção, a subjetividade se instaura, sendo seguida
posteriormente por uma ação – pela imagem-ação. Ora, o leitor atento pode estar se
perguntando: “E a afecção?”; “E a imagem-afecção?”; “Onde se localiza?”. Deleuze
(2009) mesmo responde:
A afecção é aquilo que ocupa o intervalo, aquilo que o ocupa sem o encher ou o tapar.
Ele surge no centro da indeterminação, isto é, no sujeito, entre uma percepção sob
certos aspectos perturbante e uma ação hesitante. Ela é uma coincidência do sujeito e do
objeto, ou a maneira como o sujeito se percepciona a si mesmo, ou antes, faz a
experiência de si ou se sente “de dentro” (terceiro aspecto material da subjetividade).
Ela refere o movimento a uma “qualidade” como estado vivido (adjetivo). (p. 106)
413
A imagem-afecção é, então, a pura potência, a coincidência do sujeito e do
objeto, sendo adjetiva por excelência – adjetiva e inexprimível, posto ser afeto. E o
afeto, sendo a potência do devir é fenômeno imprescindível para a aprendizagem.
No entanto, antes de navegarmos por outras imagens, é preciso mostrar o papel
da imagem-afecção em sua relação com a imagem-percepção, o que Drigo (2016) faz
por meio da aproximação entre Deleuze e Peirce:
Deleuze distingue a coisa e a coisa percebida. A coisa, que “é a imagem tal como ela é
em si”, corresponderia ao percepto, no processo perceptivo visto à luz das ideias
peircianas; a coisa percebida, ou imagem-percepção, corresponderia ao par
percipuum/juízo perceptivo. Na perspectiva peirciana, o produto da percepção, na
sequência da imagem-percepção, a imagem-ação, teria como ponto de partida o juízo
perceptivo. Ao propor o terceiro componente da imagem-movimento, a imagem-afeção,
Deleuze, em certa medida, mostra que aspectos qualitativos também compõem a
imagem-movimento. A imagem-afeção resgata aspectos não percepcionados, quando da
subtração, ou na constituição da imagem-percepção. (p. 5)
A imagem-afecção tem lugar na primeiridade; daí, a sua importância, resgatando
“aspectos não percepcionados” – aqueles aspectos que não foram subtraídos. Ora, a
subtração se tornará, então, negativa, se não for acompanhada do afeto; podendo se
tornar, caso não haja também afeto, uma postura apenas representativa, deixando de
lado, certamente, outros aspectos da coisa percebida, em função de escolhas subjetivas
separadas da fenomenologia perceptiva.
A passagem da percepção para a ação, como envolve a imagem-afecção e o seu
fenômeno incorporal, dá-se de modo insensível; sendo que a imagem-movimento, a
conjunção da percepção, da afecção e da ação, ocorre sempre na secundidade (Drigo
2016).
Pensando, agora, na relação entre consciência e percepção, há, para Peirce (CP
1.377 e CP 1.378), três níveis de consciência: consciência de qualidade (primeiridade –
consciência passiva, sem recognição ou análise), consciência dual (secundidade –
consciência de uma interrupção no campo da consciência) e consciência sintética
(terceiridade – a consciência no tempo, com sentido de similaridade, de conexão real e
de aprendizagem).
De acordo com as palavras do filósofo americano, os três níveis são assim
descritos em relação às concepções de qualidade, de relação e de mediação:
414
A concepção de qualidade, a qual é absolutamente simples nela mesma e, contudo,
observada nestas relações ela parece ser completa de variedade, surgiria em qualquer
momento quando sentimento ou consciência singular se torna proeminente. A
concepção de relação vem da consciência dual ou sentido de ação e reação. A
concepção de mediação emerge da consciência plural ou sentido de aprendizagem.
(Peirce, CP 1.378)
Assim, da vivência de qualidades, por meio do surgimento da consciência
singular, início do processo de individuação do bebê, há o posterior surgimento da
consciência dual, com os sentidos de ação e reação; finalmente, quando os signos se
tornam mediações, emerge a consciência plural e a aprendizagem cognitiva profícua.
Em outras palavras, da imagem-percepção, passando pela imagem-afecção e
pela imagem-ação, a aprendizagem ocorre quando a consciência plural alcança a
individuação da imagem-relação; havendo, ainda, a imagem-pulsão e a imagemreflexão como pontes entre os níveis segundo e terceiro78.
Percepções, então, são acompanhadas de afetos e de pulsões, para estimularem
ações, que, por sua vez, acompanhadas de reflexos, resultarão em aprendizagens
relacionais; dessa forma, as imagens se sucedem com os agenciamentos, os quais, por
sua vez, são importantíssimos para que haja festas de aprendizagens mais complexas.
Ora, aprender a ouvir e a falar, a ler e a escrever, são deveras atividades complexas, que
necessitam de toda uma condução inventiva e fecunda para que ajudem a criar
indivíduos sérios e criativos.
No Brasil, em relação ao ensino superior, há problemas sérios no tocante à
leitura e à resolução de problemas matemáticos simples e primordiais – o que se iniciou
na educação familiar, passou pela educação escolar e colegial e chegou à universidade,
sem ter sido cuidado, com a premência necessária, em nenhum desses processos.
Agora, considerando o outro tópico do subtítulo deste segmento do texto – o
erro; ele pode aparecer no processo ou como individuação equivocada ou como
resultante de falta de atenção ou, ainda, como variação da norma (no caso do ensino e
da aprendizagem da língua portuguesa ou da linguagem matemática). E, caso se torne
78
Os acréscimos de Deleuze à teoria de Peirce são precisos, já que estabelecem uma sequência profícua
para a compreensão tanto da percepção quanto da aprendizagem das imagens. Dessa forma, imagempercepção, imagem-afecção, imagem-pulsão, imagem-ação, imagem-reflexão e imagem-relação se
constituem como processos de aquisição e de desenvolvimento não só da percepção, mas também do
pensar.
415
uma individuação concreta, pode generalizar-se em equívocos constantes. Convém, para
que não caiamos em aporias redundantemente insolúveis, refletir sobre normatividades
e saberes menores, visto que é importante, se quisermos caminhar para a transdução
alagmática, compreender as variações como possibilidades normativas igualmente
sérias e profícuas.
Deleuze fala do saber menor como o saber das minorias, não minorias
quantitativas, mas qualitativas em relação ao poder. As culturas menores, com suas
variações sincrônicas, precisam ser contempladas nas salas de aulas como verdades,
enquanto somatórias de relações humanas. Não é verdadeira somente a norma padrão da
língua portuguesa, ou apenas uma forma de aplicação dos cálculos matemáticos;
também serão verdadeiros, ao menos em sua persistência na mente dos alunos, as
variações linguísticas e os cálculos não euclidianos e aorísticos, resultados de erros
cristalizados, que pertencem à inclusão do terceiro, como nos processos quânticos.
Apesar de muitos avanços em relação às concepções de aprendizagem e de
ensino, na prática escolar brasileira, ainda se faz presente o uso de uma metodologia
tradicional de ensino baseada na transmissão de conhecimentos historicamente
estabelecidos, não oportunizando aos estudantes a passagem pela experimentação, pela
exploração, pela verbalização das ideias, pelo questionamento, pela argumentação, pela
abdução, pela transdução e pela validação; sendo assim, as transduções alagmáticas não
acontecem, ainda, de forma efetiva.
Ora, a transdução alagmática, enquanto processo de troca e de mistura, não cabe
apenas nas normatividades culturais, sejam linguísticas, matemáticas ou de outra
natureza qualquer; as variações devem ser respeitadas, posto se tratarem de
transformações de energia, de acontecimento e de incorporais.
Ora ainda, a transdução, se alagmática, enquanto processo que opera e
contempla as diferenças, prescinde das variações, aceitando o terceiro – o diferente; ou
conforme Oliveira, Duarte e Peel (2019):
O processo de aquisição de conhecimento deve ocorrer de modo transdutivo associado à
alagmática. Para que as operações alagmáticas aconteçam, é preciso que o ser préindividuado percorra o caminho de percepção/solução de problemas de modo abdutivo,
indutivo, dedutivo e transdutivo. Esses processos resultarão em constantes
individuações; constituintes, por sua vez, de outro ponto muito importante para
Simondon, talvez o que justifique a alagmática. [...] A noção de alagmática vai além da
materialidade formada, ou seja, do conceito de essência.
416
Para Simondon, o problema em todas essas teorias é que elas consideram a noção de
forma com antecedente à própria operação que a torna real. A alagmática é o conceito
que busca reparar essa lacuna, ao descartar a ideia de molde e de modelagem. (p. 99 e
100)
A alagmática, para Simondon, é o nome dado ao processo que opera a
individuação, sendo mesmo o acontecimento que dá forma a uma nova fase do ser, já
que a individuação é a teoria da constituição e da formação do indivíduo.
Dessa forma, na operação com os signos, por meio da aquisição das imagens
descritas até aqui, responsáveis pelos processos de individuação alagmática, os seres
constroem os seus acontecimentos; ou seja, pela percepção de problemas, passamos por
processos de individuação quando conseguimos resolvê-los ou, ao menos, compreendêlos no jogo das experimentações resultantes de agenciamentos afetivos.
A alagmática pode ser ainda descrita como a amplificação transdisciplinar das
individuações. Ainda segundo Oliveira, Duarte e Peel (2019):
Os processos alagmáticos atualizam constantemente o ser, levando-o de uma etapa présingular a outra individuada [....]. É por meio da resolução de problemas que esses
processos se concretizam. Para Simondon (2005, p. 455), o indivíduo é um ser
autoproblemático, “não encontra dificuldades, ele é dificuldade em si mesmo; ele se
reencontra sobre seu próprio caminho”. Esse caráter autoproblemático surge daquilo
que
Simondon
chama
de
“dualismo ambivalente”, “sob qualquer ponto de vista, o indivíduo é feito da relação de
dois
aspectos:
substancialidade
ontogenética
e
e
filogenética;
eventualidade;
interioridade
interioridade
profunda
e
exterioridade;
e
racionalidade
hiperconsciente” (2005, p. 455). ( p. 102)
Em outras palavras, a alagmática é a teoria geral das trocas e das mudanças de
estado. Daí, a criança, ao aprender afetivamente as primeiras palavras e frases, na
realidade faz coincidir numa mesma expressão a frase monorremática e as
incorporalidades dos sentidos; usando-as, tanto palavras quanto frases, como conjunção
alagmática de percepções, afetos, pulsões, ações, reflexões e relações, num sentido
transdutivo que busca sempre a resolução de problemas.
Ainda segundo os três autores citados acima, a criança adquire conhecimento
linguístico por meio de trocas realizadas entre ela e seu meio físico e social:
417
Para isso, vários processos de individuação ocorrem; em um desses processos, ela deixa
aos poucos o estado em que balbucia e passa a se comunicar. Quando vai à escola, a
criança passa novamente por mudanças de fase que ocorrem por meio de trocas com seu
meio social/físico. Essas trocas lhe proporcionam novas individuações e a mudança de
estado implica conhecimento de estruturas; no caso específico da aprendizagem da
língua, a atualização do ser ocorre por meio das novas estruturas linguísticas que são
adquiridas. (p. 102)
Quando algo é verdadeiramente aprendido, o conhecimento adquirido se mescla
com o ser, transformando-o, conforme nos deixou o filósofo francês Michel Serres
(2015): “quando aprendo matemática, eu mudo também a pessoa; quando aprendo
história, meu corpo, minha personalidade muda” (p. 244). E, assim, de mudança em
mudança, de troca em troca de energias, os problemas irão sendo resolvidos.
3. Erros, normatividades e a aprendizagem-cartografia
Retornemos à normatividade, aos saberes menores e aos erros como pontes entre
afetos e aprendizagens; para tanto, afirmamos que as linguagens (verbal e a matemática)
se constituem como objetos técnicos elementares a quaisquer criações científicas e/ou
técnicas. Um pequeno texto de Almeida (2016) nos ajuda a compreender essa
proposição:
Em O Indivíduo e sua Gênese Físico-Biológica (1966), a questão prévia da
individuação é a existência de um sistema metaestável definido por uma disparação
entre duas ordens de grandeza, duas escalas de realidades díspares, onde não há
comunicação interativa; ao contrário, existe dissimetria, energia potencial e diferença de
potencial. Neste texto, Deleuze afirma que o metaestável é definido como ser préindividual, provido de singularidades. Singular sem ser individual, eis o estado do ser
pré-individual (DELEUZE, 2006, p.118). A disparidade (a categoria do problemático) é,
portanto, o primeiro momento do ser, singular e prévio à individualidade. Trata-se da
distinção entre singularidade e individualidade, que terá, por sua vez, inúmeros
desdobramentos no pensamento de Deleuze. (p. 33).
Mesmo com a normatividade que as torna viáveis, as linguagens verbais e
matemáticas precisam da disparidade inicial do infante, da sua categoria do
problemático, do primeiro momento do ser e do estar aqui e aí. E, a partir dessas
disparidades, dessas reais e virtuais diferenças entre duas ordens de grandeza, entre duas
escalas de realidades díspares, é que surgirão as individuações.
418
E, se a categoria do problemático é vivenciada e definida como momento ‘préindividual’ do ser, a individuação é a organização de uma solução, ou seja, constitui-se
como resolução para um sistema problemático – verdadeira ressonância interna, modo
de comunicação entre realidades diferentes.
Assim refletindo, concluímos que as variações da norma padrão, seja na língua
portuguesa, seja em outra forma de conhecimento ou técnica normativa, devem ser
compreendidas como pertencentes à categoria do problemático, já que necessitam da
individuação para a organização de soluções.
Deleuze deixou claro que a ressonância tem enorme importância nos processos
relacionados à afetividade, abrindo-se a um coletivo ‘trans-individual’:
Simondon não quer ater-se a uma determinação biológica da individuação
propriamente, mas precisar níveis cada vez mais complexos: assim, há uma
individuação propriamente psíquica, que surge, precisamente, quando as funções vitais
já não bastam para resolver os problemas postos ao vivente, e quando uma nova carga
de realidade pré-individual é mobilizada numa nova problemática, em um novo
processo de solução. E o psiquismo, por sua vez, abre-se a um coletivo trans-individual.
(Deleuze, 2006, p.120).
Essa abertura ‘trans-individual’ do psiquismo ocorre por meio de agenciamentos
e de encontros afetuosos, cheios de ressonâncias, resoluções e comunicações entre
realidades diferentes e que se querem trans.
Ora, objetos técnicos e culturas estiveram sempre ligados: a língua é um sistema
vivo de construção cultural, formado por jogos de linguagem; já a gramática é um
sistema técnico de ensino e de aprendizagem, formado por outros jogos de linguagem,
os quais, desta vez, são constituídos como objetos técnicos cuja experimentação é
rizomática e importantíssima; enquanto que a matemática é um sistema formado
também por jogos de linguagens específicos e de igual importância. Objetos técnicos e
culturas se misturam, dessa forma, alagmaticamente, redefinindo-se em vários
momentos.
A aprendizagem ocorre, então, na imanência do encontro de objetos técnicos
com culturas menores e maiores, a partir de agenciamentos e sempre por meio de signos
e de afetos (com palavras, com desenhos, com danças, com corpos... etc.).
Para Deleuze (1988), não dá para saber com certeza como todas as pessoas
aprendem, já que a aprendizagem está relacionada com a singularidade de cada um –
419
com o modo com que cada um é afetado pelos signos, pelos afetos – não há, na
realidade, métodos genéricos para o aprender; não há, então como planejar
genericamente o aprendizado (o aprender acontece singularmente). A aprendizagem,
segundo o filósofo, é feita na relação do signo enquanto afeto, com a resposta enquanto
encontro com o outro.
Experimentando a aprendizagem-cartografia, a aprendizagem a partir de trajetos
de afetos, de perceptos, de conceitos e de funções ou relações, o indivíduo terá
encontros com signos, ou seja, com afetos, com perceptos, com conceitos e com funções
– dado o seu caráter alagmático, o que favorecerá respostas e aprendizagens.
Em Deleuze, a noção de aprendizagem supera as concepções tradicionais: para o
filósofo, a aprendizagem não se trata de uma passagem de um estado de não saber para
um estado de saber; mas, sim, de processos percorridos pelo indivíduo em inúmeros
estágios de sua vida – é um ato de adaptação e de criação, um agenciamento complexo
que concerne às condições de possibilidade do próprio pensamento que são a formação
da ideia e a formulação do problema (o aprender vai além do saber, anuindo na vida
inteira do indivíduo de forma contínua, apaixonada e imprevisível – o aprender vem do
fora, de onde estão as ideias).
A aprendizagem, portanto, deve ser realizada de modo a forçar o
desaparecimento do sujeito e a revelação de uma verdade experimentada naquilo que o
ultrapassa, que está fora do seu ser, fazendo criar possibilidades de pensamento. Aí está
um processo constituído por elementos que tornam possível o seu acontecimento: os
signos, a invenção de problemas e a criação de conceitos em contextos de
experimentação.
Nesse processo, são os contextos de experimentação que o acaso, o encontro e
aquilo que força a pensar precedem o aprender. Nessa perspectiva, a aprendizagem é o
caminhar da razão para a sensibilidade, da sensibilidade ao signo, da re-cognição à
decifração, da existência à essência. A aprendizagem é efeito do ato de pensar e o que
força a pensar é o signo; o ato de pensar não é, portanto, decorrente de uma simples
possibilidade natural, sendo, ao contrário, a única criação verdadeira. O signo é o objeto
de um encontro e a contingência dos encontros garantem a aprendizagem.
Numa reflexão mais ampliada da compreensão da aprendizagem humana –
campo múltiplo e complexo –, as visões literárias e filosóficas que se encontram no
filósofo Gilles Deleuze (2006) e em suas leituras da obra de Marcel Proust, por
exemplo, expõem as novas noções sobre a aprendizagem agora sob a ótica da Filosofia
420
e da Literatura, o que dá oportunidade de compreensões de zonas obscuras e,
especialmente, amplia-se o olhar do pesquisador no trabalho com a aprendizagem.
Como refletiu Schérer (2005), “Gilles Deleuze disse, sobre Michel Foucault, que ele era
um “vidente”. Esta qualidade aplica-se, eminentemente, a ele próprio. Ele vê e nos faz
ver o que até então não era percebido”.
A aprendizagem nunca se encerra na singular aquisição de um saber;
aprendizagem é um processo a ser incessantemente recomeçado onde o que importa é o
ato inicial, a partida, o movimento para vias do fazer. Para que a aprendizagem se
efetue, esse impulso inicial e permanente do pensamento deve consistir em liberar todo
pensamento daquilo que o entrava, que o limita, que o impede de experimentar o
movimento.
Aprender não é reproduzir, mas inaugurar; inventar o ainda não existente, e não se
contentar em repetir um saber: “fala-se – percorro outra vez o mesmo texto –, do fundo
daquilo que não se sabe, de seu próprio sentido, de seu próprio desenvolvimento, de um
conjunto de singularidades soltas”; pois é preciso desfazer os “aparelhos de saber”, as
organizações preexistentes, incluída a do corpo, para devir, entrar em “devires” que
comandam e balizam toda criação. (Schérer, 2005, p.1188).
Aprender é desembaraçar-se das divisões, dos poderes, das regras artificiais, das
instituições, das representações, das ideias prontas, de tudo que bloqueia os processos
favoráveis ao necessário movimento do pensar; é desembaraçar-se do que imobiliza ou
sedentariza; é reativar-se em constante movimento de des(re)territorialização; é
experimentar um incessante surgimento de formulações novas, de invenções, de
criações na continuidade de uma trajetória.
4. A aprendizagem-cartografia propriamente dita
Desejamos, com o nosso trabalho, que muitos educadores e professores
percebam
a
aprendizagem-cartografia
como
dispositivo
capaz
de
provocar
agenciamentos, experimentações e devires: agenciando momentos singulares e criativos
com seus alunos, experimentando com eles mapas de intensidade que distribuam e
redistribuam afetos e constelações de perceptos, e vivenciando o devir-aprendizagem ou
o devir-cartografia como errância profícua ou nomadismo positivo.
O errar, considerado enquanto trajeto, cheio de flanares e passeios lúdicos,
constitui-se como vontade de agir. E o erro percebido dessa forma deve ser vivenciado
421
como ideia adequada, deixando a sua visão de ideia inadequada para trás; o erro, para
Nietzsche, não deve ser colocado como antítese da verdade; mas, como seu
complemento de alegria, de grande alegria (grosse Freude).
A noção de erro, na aprendizagem-cartografia, é verbal; referindo-se ao
acontecimento, à experimentação cartográfica – ao “errar” enquanto caminhar ou flanar
lúdico. Daí, errando ou cartografando pelas experimentações alagmáticas e
transdisciplinares, a criança poderá caminhar para as matemáticas ou gramáticas ou
ciências com afetos positivos – verdadeiros dispositivos que sempre provocarão outros
dispositivos e aprendizagens; e o erro deixará de ser um erro para transformar-se num
erro (eu erro – eu caminho – eu cartografo).
Almejamos, igualmente, que professores e alunos mergulhem, nadem e flutuem
na língua e na matemática, por meio de agenciamentos e de experimentações com as
palavras, experimentando-as como excesso prazeroso de suas vivências pedagógicas;
aspiramos, ainda, a que os períodos passados com os alunos sejam vivenciados como
banquetes facilitadores da conjugação de vontades da potência – de socialidades
profícuas.
A mesa é, de fato e de fenômeno, o lugar da caosmose79, da comunhão de corpos
sem órgãos, expressando por seus ritos trágicos e cômicos a harmonia e a comunicação
Envolta por toda uma complexidade interessante, a expressão ‘caosmose’ que dá título a um livro de
Félix Guattari (2012), traz a composição de caos, osmose e cosmo. A associação dessas palavras, numa
fusão desejada e sabiamente composta pelo filósofo, propõe uma reflexão acerca da condição caótica e de
osmose que caracteriza o cosmo, o universo – o que podemos recortar também como o território de uma
pesquisa, de uma análise, de uma aprendizagem, de uma produção que carece ser compreendida em seu
estado mais complexo.
79
Pensar caosmose na postura do pesquisador é uma perspectiva que possibilita vislumbrar o quanto é
preciso levar em conta as dimensões visíveis e invisíveis – na terminologia esquizoanalítica, os universos
corporais e incorporais – existentes num campo de pesquisa. A palavra caosmose é emblemática para
caracterizar a ciência contemporânea, os universos de pesquisa, a (des)(re)territorialização cada vez mais
intensa dos dias atuais.
Trata-se de um novo paradigma estético, que diz respeito à subjetividade enquanto produzida por
instâncias individuais, coletivas e institucionais, constituídas a partir de diversos elementos: componentes
semiológicos significantes (manifestados por meio da família, da educação, do meio ambiente, da
religião, da arte, do esporte); componentes constituídos pela indústria dos mídia; componentes
semiológicos assignificantes (produções paralelas ou independentes que escapam das produções
axiomáticas).
Dessa forma, para o pensador francês, subjetividade é “o conjunto das condições que torna possível que
instâncias individuais e/ou coletivas estejam em posição de emergir como território existencial
autorreferencial, em adjacência ou em relação de delimitação com uma alteridade ela mesma subjetiva”
(p. 19).
422
cósmicas; assim, as experiências pedagógicas devem ser como banquetes que permitam
e que desenvolvam a arte da conjugação e da troca simbólica; de acordo com Maffesoli
(2005, p.97), “o encontro à mesa é uma propedêutica dessa troca simbólica, pois se
baseia na aparência” – constituindo-se, portanto, como modelo invencível do fato social.
Mas, acrescentando outros signos aos símbolos, a vivência da aprendizagemcartografia é um banquete ainda maior e melhor, pois permite que sejam
experimentados na mesma experiência e com forças diferentes o movimento e o
esquecimento, o que, ao lado da experimentação de perceptos e de afetos, trará música,
dança e alegria enquanto linhas flexíveis e de fuga na direção de devires trágicos e
cômicos, e, por isso, igualmente alegres e frutíferos.
Se conseguirem partilhar do banquete pedagógico possibilitado pela abordagem
transdutiva e alagmática da aprendizagem-cartografia, de sua partilha do sensível, de
sua comunhão com o caos e com o cosmos, professores e alunos terão encontros
singulares em seus mergulhos nas linguagens e nos signos, experenciando a arte e
alcançando, como dito acima, devires intensos e efervescentes.
As aprendizagens, se cartográficas, precisam deixar a monumentalidade de lado,
tornando-se hodológicas, ordenando caminhos oriundos de um fora e sendo, de fato,
elas próprias trajetos e viagens. A aprendizagem-cartografia segue os trajetos dados por
um fora e opera com linhas fluidas que atravessam os corpos orgânicos.
Essas linhas fluidas são os trajetos e os caminhos que o aprendiz, o professor e o
aprendiz-professor e o professor-aprendiz traçam para passear e para flanar em uma
pluralidade de trajetos legíveis e coexistentes somente num mapa, metamorfoseando e
retendo sentidos inseparáveis de devires.
A aprendizagem-cartografia é, ainda, coletiva, porque é relacional; é também
política, por envolver interações entre forças; é ética, por participar de valorações para
existir; e é estética, por dar forma a todo esse conjunto de modo expressivo.
Deleuze e Guattari (2011), salientando a importância da arte em qualquer tipo de
experiência cartográfica, termina o capítulo no qual as crianças dizem, da seguinte
forma: “Trajetos e devires, a arte os torna presentes uns nos outros; ela torna sensível
sua presença mútua e se define assim, invocando Dioniso como o deus dos lugares de
A subjetividade, então, é tanto individual quanto coletiva. E, de modo caosmótico, tentando reconciliar o
caos e a complexidade, cada indivíduo e cada grupo social veiculam seus próprios sistemas de
modelização da subjetividade, sempre a partir de cartografias cognitivas, míticas, rituais,
sintomatológicas, e com o desejo, enquanto excesso, de se posicionar em relação aos seus afetos e às suas
angústias, para gerar e gerir suas inibições e suas pulsões.
423
passagem e das coisas de esquecimento” (p. 90) – viva, pois, o esquecimento! mote
maior das crises picnolépticas da criação artístico-cartográfica.
Chegando à picnolepsia, chegamos a Paul Virilio (2014, p. 97): “o esquecimento
é indispensável à projetividade da imaginação e à propagação do pensamento”. Daí, o
esquecimento, enquanto falta, precisará do desejo, enquanto excesso, para juntos
possibilitarem a criação artística; falta e excesso juntos compõem um dos paradoxos da
aprendizagem-cartografia – o paradoxo que a mantém como vontade da potência
trágica.
E essa vontade de potência reflete o trágico por suas multiplicidades, por suas
alegrias plurais e por seus eternos retornos; de fato e de fenômeno, não há retorno do
negativo – só do positivamente trágico; sendo o eterno retorno, para Nietzsche e para
Deleuze, a reprodução do devir-ativo (do além-do-homem, do filho de Ariadne com
Dioniso). E a reprodução do devir-ativo nada mais é do que a criação da diferença pela
repetição – a criação da diferença enquanto afirmação pura.
Apenas a diferença é feliz, ensinou-nos Nietzsche; e o excesso da aprendizagemcartografia é a alegria e, por que não, a felicidade. Não nos esqueçamos nunca de que
para Deleuze e Guattari, desejo é excesso, contrariamente a Lacan, que o considerou
como falta. E, dessa forma, sendo excesso, o desejo pede o errar, o flanar e o aprender.
5. Aprendizagens-cartografia e alegrias
O conceito de alegria é muito importante para a aprendizagem, para qualquer
maneira com que ela se apresente, mas principalmente para a aprendizagem-cartografia,
o que foi, em relação à vida e à filosofia, sempre salientado por Nietzsche (2009),
Deleuze e Guattari (2011), dentre outros. Etimologicamente, a palavra ‘alegria’ vem do
vocábulo latino alecer, alecris – que significa vigoroso, animado, sendo que os
perceptos provocados pela arte realmente vigoram e animam as singularidades.
Em Nietzsche (2009), há duas alegrias (kleine Freude e grosse Freude): a
primeira se refere à alegria ou à felicidade metafísica; a segunda, à alegria ou à
felicidade artística – à alegria trágica. Convém ler o que diz o filósofo sobre a alegria
trágica e compreender e perceber tudo o que comporta a grande alegria:
Se pensamos nos germens iniciais do senso artístico e nos perguntamos que diferentes
espécies de alegria são produzidas [...] encontramos primeiramente a alegria de entender
o que um outro quer dizer [...] – Em seguida, ante a mais rudimentar obra de arte nos
424
lembramos do que foi agradável na experiência e temos alegria [...] – Também a
lembrança do que foi desagradável, na medida em que foi superado ou em que nos faz
parecer interessante para o ouvinte [...] pode proporcionar grande alegria [grosse
Freude] [...] – De uma espécie mais refinada é a alegria que surge à visão do que é
regular e simétrico, em linhas, pontos, ritmos; pois devido a uma certa similaridade é
despertado o sentimento elo que é ordenado e regular na vida, ao qual devemos, enfim e
exclusivamente, todo o nosso bem-estar, ou seja, no culto do simétrico adoramos
inconscientemente a regra e o equilíbrio como fonte de felicidade até então havida; tal
alegria é uma espécie de oração de graças. Apenas após atingirmos uma certa saturação
dessa última alegria nasce o sentimento [o conjunto de sensações chamado percepto],
ainda mais refinado, de que também pode haver fruição na infração do que é simétrico e
regrado; quando há o estímulo, por exemplo, de buscar razão na aparente não-razão,
pelo que, como uma espécie de enigma estético, ele se revela um gênero mais elevado
da alegria artística [Kunstfreude] primeiramente mencionada. (p. 18).
E, ainda pensando nas alegrias pequenas e grandes do filósofo alemão e nas
atribuições maior e menor de Deleuze, deve-se vivenciar e experimentar um paradoxo:
o maior de Deleuze é o pequeno de Nietzsche, e o menor de Deleuze é o grande de
Nietzsche; de fato a arte menor do filósofo francês é a alegria maior do alemão
(somente os agenciamentos que produzem cultura menor é que oferecerão a alegria
enorme).
A alegria, para a aprendizagem-cartografia e para Spinoza, é a passagem de uma
perfeição menor para uma perfeição maior. Não sendo a própria perfeição, o que
atrapalharia a sua experimentação, a alegria carece de agenciamentos para alcançar o
devir – o seu vir a ser. Assim, agenciamentos e experimentações alegres caminharão
sempre ao devir enquanto dispositivo, igualmente alegre e igualmente profícuo.
6. A aprendizagem-cartografia e os perceptos
Os perceptos não são percepções, nem dependem do estado ou da situação
daqueles que os experimentam (Deleuze, 2011); constituem-se, para o filósofo, como
conjunto de sensações, que valem por si mesmas, excedendo qualquer ser ou coisa
vivido: “a obra de arte é um ser de sensação, e nada mais: ela existe em si” (p. 194); e o
contíguo de efeitos e impressões produzidas pelas obras de arte é o que constitui o
percepto.
425
Pela arte, então, os perceptos são arrancados das percepções dos objetos e dos
estados de um sujeito percipiente (idem, p. 197); e, relacionados com os afetos, são
criados pelos artistas como metamorfoses de mundo.
Questões e resposta de Deleuze e Guattari (2010) nos ajudam a compreender o
seu conceito de percepto:
Que estranhos devires desencadeiam a música através de suas “paisagens melódicas” e
seus “personagens rítmicos”, como diz Messiaen, compondo, num mesmo ser de
sensação, o molecular e o cósmico, as estrelas, os átomos e os pássaros? Que terror
invade a cabeça de Van Gogh, tomada num devir girassol? Sempre é preciso o estilo – a
sintaxe de um escritor, os modos e ritmos de um músico, os traços e as cores de um
pintor – para se elevar das percepções vividas ao percepto, das afecções vividas ao
afecto. (p. 200-201)
A aprendizagem-cartografia precisa, destarte, da arte para se constituir como
construção de afetos; para que suas experimentações provoquem o surgimento desse
conjunto de sensações chamado ‘percepto’. Precisa, ainda, das gramáticas, das
matemáticas, das ciências e das filosofias; e tudo isso por meio de experimentações
transdutivas e alagmáticas.
Sendo, assim, as aprendizagens transdutivas e alagmáticas por perceptos serão
responsáveis pela criação de metamorfoses, que se repetem sempre em função das
singularidades do educando; mas a repetição acontecerá de maneiras diferentes – o
fundo pode ser semelhante, mas os signos emitidos pelos aprendizes sempre são e serão
diferentes, até sua repetição é e será sempre diferente. De fato, as repetições são os
procedimentos experimentados pelo corpo em nossa singularidade, ocorrendo sempre
por meio de encontros fortuitos entre corpos.
Para Deleuze, os agenciamentos não ocorrem entre corpos totalizados e sim
entre pontos extraordinários dos corpos, e essa notabilidade dos encontros é que permite
que os perceptos sejam gerados. Os aprendizes, assim, criarão signos e perceptos para
seduzir, para encantar e para cativar.
7. Considerações finais
Deleuze (2000) afirmou que não podemos saber com certeza como o ensino será
eficaz ou como as crianças aprendem, porque a aprendizagem está relacionada com a
singularidade de cada um, ao modo como determinado signo consegue afetar e fazer
426
pensar: “Nunca se sabe como uma pessoa aprende; mas, de qualquer forma que aprenda,
é sempre por intermédio de signos, perdendo tempo, e não pela assimilação de
conteúdos objetivos” (p. 21).
A aposta de Deleuze está centrada nos encontros, na criatividade, nos afetos e
nos saberes menores. É preciso, pois, aceitarmos o erro, a cultura menor, a arte, o afeto,
as diferenças. É conveniente aceitarmos as alteridades, tanto menores quanto maiores,
para que possamos respeitar as diferenças.
O erro deve ser, então, um dispositivo para a aprendizagem – errar é aprender,
ou melhor, errar será aprender quando vivenciarmos juntos, professores e alunos, o
aprender cartografando, o aprender-cartografia; o que nos levará a viagens belíssimas e
fantásticas por trajetos vivos, alegres e terapêuticos.
Precisamos, pois, da criação de novos povos, de novos professores e de novos
alunos, que queiram e que possam vivenciar a vida. E é esta a experimentação que
percebemos na aprendizagem-cartografia: a criação de um povo novo, que agencie e
que experimente o respeito, a criatividade, a tolerância, a vontade de agir e de dar, a
afetividade, a recepção e a criação de perceptos, a conjunção exclusiva, a disjunção
inclusiva e outros rizomas igualmente ricos na busca e na procura de devires.
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428
22.PRÁTICAS DE ESCRITA CRIATIVA NO ENSINO
SUPERIOR: REDESCOBRINDO CAMINHOS DA
PEDAGOGIA
Dulce Melão80
Resumo
A centralidade do estudante no âmbito do processo de ensino e de aprendizagem é,
desde há muito, reconhecida como fundamental no âmbito do desenvolvimento de
práticas pedagógicas que tenham a autonomia no seu cerne. Tal centralidade continua a
instituir-se enquanto desafio, mormente face à diversidade de contextos em que
participamos, bem como à necessidade de respeitar a sua singularidade. Conhecer as
representações dos estudantes sobre os conteúdos programáticos das unidades
curriculares que frequentam reveste-se, pois, de crescente relevância no âmbito de uma
pedagogia para a autonomia enquanto arena de reconstrução de conhecimento
partilhado. Nesse sentido, o objetivo deste estudo é refletir sobre a relevância do
conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância
das dimensões que pode assumir em contexto académico para a melhoria do processo de
ensino e aprendizagem.
Optou-se por uma metodologia de cariz qualitativo, tendo como referencial
metodológico o estudo de caso múltiplo. Participaram 54 estudantes do 3.º ano da
licenciatura em Comunicação Social de uma instituição de ensino superior portuguesa,
inscritos na unidade curricular de Escrita Criativa. Os instrumentos de recolha de dados
foram três reflexões realizadas pelos estudantes no início, a meio e no final da unidade
curricular.
A investigação realizada possibilitou inferir que o processo de ensino e aprendizagem
pode adquirir uma dimensão transformadora quando é conferida centralidade às
representações dos estudantes. Estes valorizaram o seu papel na reconstrução de
processos de ensino e aprendizagem, redescobrindo, ao longo do percurso, o caráter
multifacetado da escrita criativa.
80
Dulce Melão é Professora adjunta na Escola Superior de Educação de Viseu (Instituto Politécnico de
Viseu - IPV), integrando o Departamento de Ciências da Linguagem. É doutorada em Educação e
membro integrado do CI&DEI (Centro de Estudos em Educação e Inovação – IPV). ORCID ID:
https://orcid.org/0000-0002-1608-1074
429
Palavras-chave: Ensino superior. Pedagogia. Escrita criativa. Estudantes.
Representações.
Creative writing practices in higher education: rediscovering paths of
pedagogy
The centrality of the role played by students in the teaching and learning process has
long been recognised as fundamental in the development of pedagogical practices that
have autonomy at their core. Such centrality continues to be a challenge, especially
given the diversity of contexts in which we participate, as well as the need to respect
their uniqueness. Knowing students' conceptions about the syllabus contents of the
curricular units they attend is therefore of growing relevance in the context of a
pedagogy for autonomy as an arena of reconstruction of shared knowledge. In this
sense, the aim of this study is to reflect on the relevance of the knowledge of students'
conceptions on creative writing and the importance of the dimensions it can assume in
an academic context for the improvement of the teaching and learning process.
A qualitative methodology was chosen, within a multiple case study framework.
Participants were 54 students enrolled in a first degree in Media Studies (third year) of a
Portuguese higher education institution, taking a Creative Writing course. Data
collection tools were three reflections made by the students at the beginning, middle and
end of the course.
The research made it possible to infer that the teaching and learning process can acquire
a transforming dimension when students' conceptions are given centrality. They valued
their role in the reconstruction of teaching and learning processes, rediscovering, along
the way, the multifaceted character of creative writing.
Keywords: Higher education. Pedagogy. Creative writing. Students. Conceptions.
Introdução
Reconhece-se, hoje, a complexidade de que se nutre o exercício do ensino, numa
renovada teia de desafios que (nos) implica, ativamente, (n)o repensar das nossas
práticas. Como sublinha Vieira (2011, p. 20), “(…) a pedagogia é também um encontro
com o inesperado, exigindo ações criativas, transitórias e inacabadas.”
430
Na reflexão que consagra à relevância da reconfiguração do saber profissional docente
repensado através da centralidade com o compromisso das finalidades da profissão,
Roldão (2017) sublinha a importância da “(…) capacidade de reconceptualizar o modo
como nos fazemos professores” (Roldão, 2017, p. 1148). Neste repensar permanente, a
indagação assume um caráter central, contínuo, assente no diálogo com os estudantes e
na investigação dos modos como reconstruimos o conhecimento partilhado.
À luz do exposto, o objetivo deste estudo é refletir sobre a relevância do conhecimento
das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância das dimensões
que pode assumir em contexto académico para a melhoria do processo de ensino e
aprendizagem. Num itinerário pautado pela riqueza dos inacabamentos próprios das
demandas do desvendar de tal processo, focamo-nos nas vozes dos estudantes,
reconhecendo o seu caráter central na partilha de metamorfoses consolidadas num
processo crítico promotor de autonomia.
Este estudo está organizado em três secções: i) enquadramento teórico; ii) metodologia;
iii) apresentação dos resultados e discussão. As considerações finais instituem-se como
parcelas do caminho percorrido, no aguardar perene de muitos outros trilhos – ensejos
velando descobertas de pousios de partilhas aguardadas.
1. Enquadramento teórico
Conhecer as representações dos estudantes sobre os conteúdos programáticos das
unidades curriculares que frequentam e lhes servem de base de sustentação, reveste-se,
hoje, de crescente relevância, no âmbito de uma pedagogia para a autonomia enquanto
arena de reconstrução de conhecimento partilhado. Tal não é, porém, tarefa isenta de
desafios, face à rede de plurissignificações que as envolvem, em contextos
diversificados. Apresenta-se, em seguida, uma breve revisão da literatura incidindo na
relevância de tais representações, em traços mais amplos, contemplando a leitura e a
escrita, bem como focando, em particular, as representações sobre a escrita criativa,
circunscrevendo-nos ao ensino superior. A teoria das representações sociais, cunhada
por Moscovici (1961; 1976) serve-nos de fio condutor para a compreensão das
repercussões da sua relevância na vida em sociedade e, consequentemente, nas práticas
de leitura e de escrita em que participamos. Como frisa Moscovici (1976, p. 26), “Une
représentation parle autant qu’elle montre, communique autant qu’elle exprime (…) elle
produit et détermine des comportements, (…) la représentation sociale est une modalité
431
de connaissance particulière ayant pour fonction l’élaboration des comportements et la
communication entre individus.”
Estudos norteados pelo objetivo de identificar e caracterizar as representações sobre a
leitura de estudantes do ensino superior, a frequentar um primeiro ciclo de estudos em
Educação Básica, em instituições do ensino superior português, têm possibilitado
compreender a complexidade inerente a tal caracterização, ao apontarem para perfis de
leitores multifacetados, “em construção” (por exemplo, Yubero, Larrañaga, & Pires,
2014). Em alguns estudos é estabelecida uma forte conexão entre as representações
sobre a leitura evidenciadas pelos estudantes e o modo como poderão vir a repercutir-se
no seu futuro público (por exemplo, Melão, 2016; 2017). Larrañaga e Yubero (2005)
corroboram semelhante linha de pensamento, frisando que “La representación social
que tengamos de la lectura puede ser fuente de motivación o desmotivación lectora y
nos acompañará en nuestras relaciones cotidianas, orientando nuestra relación con la
lectura” (Larrañaga & Yubero, 2005, p. 44).
Por seu lado, Mateos e Solé (2012), no ensaio em que refletem sobre conceções e
crenças de estudantes de licenciatura relativamente à escrita académica, sublinham,
também, que “Students’ participation in social practices shaped according to certain
conceptions of writing will contribute to how they learn to write and to a personal way
of conceiving of writing, representing it to themselves and seeing themselves as writers”
(Mateo & Solé, 2012, p. 53). Talvez a relevância que hoje assume a escrita académica
justifique a maior atenção concedida às representações dos estudantes sobre a mesma, a
nível nacional e internacional – atenção crescente reconhecida na literatura de
especialidade (por exemplo, Assis, Bailly & Corrêa, 2017). Investigação incidindo
sobre a sua caracterização, tem revelado a sua forte ligação intrínseca com as práticas de
leitura e/ou de escrita permeando os percursos que os estudantes trilham no dia a dia,
repercutindo-se em contexto académico. Oliveira e Araújo (2017), no estudo que
consagraram às representações sociais da escrita de 33 estudantes universitários
oriundos de cursos de Letras vinculados a três instituições brasileiras de ensino superior
(no estado da Paraíba), concluíram, também em linha com o aduzido anteriormente, que
tais representações “(…) interferem no modo de agir desses sujeitos e que, uma vez
apropriadas, permitem-lhes se inserir nas diversas práticas letradas recorrentes no
curso” (Oliveira & Araújo, 2017, p. 286). A abordagem de natureza qualitativa, no
âmbito da qual foram utilizados um inquérito por questionário e três “sessões
432
reflexivas,” possibilitou concluir que os estudantes relacionavam a escrita académica
com as orientações facultadas pelo professor relativamente à sua produção e com o
processo de estruturação inerente às exigências académicas.
Em contexto distinto, a investigação realizada por Sousa e Pereira (2018), numa
instituição pública de ensino superior politécnico, teve como objetivo refletir sobre o
ensino da escrita no ensino superior e analisar as representações dos estudantes (85,
distribuídos por três turmas) sobre processos de escrita e de aprendizagem, tendo no seu
cerne os conteúdos da unidade curricular de Desenvolvimento e aprendizagem
(integrando o 5.º semestre do plano de estudos da licenciatura em Educação Básica). Os
dados foram recolhidos através de um inquérito por questionário (online) sobre escrita,
de tarefas de leitura e escrita realizadas em contexto de sala de aula e da realização de
dois focus group, no final do semestre. Os estudantes declararam possuir alguma
confiança nas suas competências de escrita, planificando e revendo os seus textos.
Reconheceram, também, a necessidade de maior instrução, acompanhamento e feedback
por parte dos docentes, no que à produção textual diz respeito. O entrelaçamento do
processo de escrita com as práticas de leitura realizadas emergiu, também, como
relevante, tendo os estudantes referido que “(…) ler para escrever exige mais trabalho
de busca do que é essencial A escrita ajuda a esclarecer e a verificar a compreensão do
que se leu (…) este trabalho exige maior rigor na leitura e mais releituras” (Sousa &
Pereira, 2018, p. 8). As autoras do estudo entenderam ser relevante analisar as
representações dos estudantes sobre a escrita, no intuito de se promover a reflexão sobre
as “possibilidades de transformação das práticas” (Sousa & Pereira, 2018, p. 6).
As representações sobre a escrita criativa no ensino superior têm, por seu turno, sido
alvo de parca atenção. No estudo realizado por Light (2002), norteado pelo objetivo de
investigar tais representações, participaram 40 estudantes oriundos de três instituições
de ensino superior na Grã-Bretanha. Um dos critérios de seleção estabelecidos – perfil
diversificado dos participantes – repercutiu-se quer na mescla de cursos considerados,
quer no seu nível de ensino (licenciatura ou pós-graduação). O segundo critério – a
similitude – garantiu a inclusão de cursos contemplando práticas de escritas
concentradas no mesmo género – ficção. No que respeita à metodologia adotada, a
opção recaiu no inquérito por entrevista semiestruturada aos estudantes. A análise dos
resultados, após um processo de categorização, revelou: i) a associação da escrita
criativa às vivências pessoais dos estudantes, nelas se plasmando; ii) a conexão entre a
433
escrita criativa e a liberdade que estaria inerente ao seu processo, comparativamente à
escrita com outras finalidades; iii) o reconhecimento da singularidade da escrita criativa,
mobilizando a sua compreensão, de modo renovado; iv) a compreensão do processo de
textualização no âmbito da escrita criativa.
Do exposto, é possível inferir a importância da escuta e do conhecimento das
representações da escrita dos estudantes do ensino superior, podendo potenciar
movimentos de mudança no que concerne ao processo de ensino e de aprendizagem. O
estudo apresentado a seguir procura lançar luz, em particular, sobre a relevância do
conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa que pouca
atenção tem recebido por parte dos investigadores, merecendo, pois, uma demanda
cuidadosa das suas múltiplas facetas entretecidas em processos de ensino e de
aprendizagem.
2. Metodologia
Participaram neste estudo 54 estudantes do 3.º ano da licenciatura em Comunicação
Social de uma instituição de ensino superior portuguesa, inscritos na unidade curricular
de Escrita Criativa, no ano letivo 2017-2018. Esta unidade curricular privilegia
percursos favorecedores de reflexão sobre o conceito de criatividade, nos crescentes
desdobramentos exigidos pelos desafios da sociedade atual. É concedida atenção à
tessitura textual enquanto tela de acolhimento de diferentes tipologias que lhe conferem
nuances singulares, exigindo reflexão. Destaca-se, ainda, a escrita criativa na
comunicação social, com particular enfoque nos géneros jornalísticos e na sua atual
versatilidade.
As aulas revestem-se de natureza teórica e prática, aliando a abordagem teórica de
conteúdos programáticos com a aplicação dos mesmos em situações práticas,
mobilizadas através de diferentes modalidades de trabalho (por exemplo, a pares, em
grupo), possibilitando um feedback recorrente e sustentado sobre as práticas de escrita
realizadas.
Os estudantes estavam distribuídos por duas turmas: a turma A (16 estudantes do sexo
feminino e 10 do sexo masculino, perfazendo um total de 26, doravante referidos como
E1-26) e a turma B (18 estudantes do sexo feminino e 10 de sexo masculino, perfazendo
um total de 28, doravante referidos como E27-54).
434
O objetivo principal que norteou este estudo foi refletir sobre a relevância do
conhecimento das representações dos estudantes sobre a escrita criativa e a importância
das dimensões que poderia assumir em contexto académico para a melhoria do processo
de ensino e aprendizagem. Face ao objetivo traçado, foram colocadas as seguintes
questões de investigação:
- Q1 – Que representações evidenciam estudantes de Comunicação Social, a frequentar
um 1.º ciclo de estudos de Bolonha, sobre a escrita criativa?
- Q2 – De que modo o conhecimento de tais representações pode contribuir para a
melhoria do processo de ensino e de aprendizagem em contexto académico?
Entendeu-se que seria adequada uma abordagem de natureza qualitativa, tendo como
referencial metodológico o estudo de caso múltiplo. Os instrumentos de recolha de
dados foram três reflexões realizadas pelos estudantes no início (R1), a meio (R2) e no
final da unidade curricular (R3).
Na primeira reflexão (R1) foi solicitado aos estudantes que indicassem quatro palavras
que associavam ao conceito de escrita criativa (ordenadas de acordo com a importância
que lhe atribuíam, da mais importante para a menos importante). Adicionalmente, os
estudantes foram convidados a refletir sobre a relação que tinham com a escrita, de
modo a que pudéssemos compreender as dimensões em que a encaravam.
A segunda reflexão (R2) foi realizada a meio da unidade curricular, tendo os estudantes
refletido sobre as suas principais dificuldades no que respeitava ao processo de escrita.
A realização desta reflexão foi norteada pelo objetivo de poder proceder a
reajustamentos potenciadores de transformação.
Na terceira reflexão (R3), de modo a compreendermos se se teriam registado eventuais
mudanças nas representações dos estudantes sobre a escrita criativa, solicitamos-lhes, de
novo, que indicassem quatro palavras que associavam ao conceito de escrita criativa.
Privilegiamos a técnica de análise de conteúdo, na esteira de Bardin (2004), tendo
realizado várias leituras que favoreceram um processo reiterativo impulsionador do
descortinar dos sentidos implícitos nas vozes dos estudantes, ecoando nas suas
reflexões. Posteriormente, procedemos ao estabelecimento de categorias que
agregassem as dimensões que emergiam do processo realizado.
3. Apresentação dos resultados e discussão
435
3.1.Representações iniciais dos estudantes sobre a escrita criativa
No Quadro 1 apresentamos análise das respostas dos estudantes (TA) relativamente às
suas representações iniciais sobre a escrita criativa:
Palavras
indicadas
1ª posição
2ª posição
3ª posição
4ª posição
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Criatividade
10
38%
6
23%
5
19%
1
4%
Imaginação
6
23%
6
23%
1
4%
6
23%
Inspiração
4
15%
4
15%
3
12%
4
15%
Liberdade
3
12%
4
15%
8
31%
3
12%
Originalidade
2
8%
2
8%
2
8%
2
8%
Motivação
1
4%
2
8%
0
0%
1
4%
Invenção
0
0%
1
4%
1
4%
1
4%
Persistência
0
0%
1
4%
0
0%
0
0%
Sonho
0
0%
0
0%
1
4%
1
4%
Conhecimento
0
0%
0
0%
1
4%
0
0%
Textos
0
0%
0
0%
1
4%
1
4%
Dedicação
0
0%
0
0%
1
4%
1
4%
Singularidade
0
0%
0
0%
1
4%
1
4%
Magia
0
0%
0
0%
1
4%
1
4%
Reflexão
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Diferença
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Talento
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
TOTAL
26
100%
26
100%
26
100%
26
100%
Quadro 1 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau
decrescente de importância (TA, R1)
A análise do Quadro 1 possibilita-nos depreender que a palavra que os estudantes mais
associaram ao conceito de escrita criativa foi “Criatividade” (10 ocorrências, em
primeira posição, correspondendo a 38% e 6 ocorrências, em segunda posição,
correspondendo a 23%), seguindo-se “Imaginação” (6 ocorrências, em primeira e em
segunda posição, correspondendo a 23%), “Inspiração” (4 ocorrências, em primeira e
em segunda posição, correspondendo a 15%) e “Liberdade” (3 ocorrências, em primeira
posição, correspondendo a 12% e 4 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a
15%).
A associação do conceito de “Escrita criativa” a “Criatividade” é, porventura, a mais
favorecida pelo senso comum, no âmbito do qual esta palavra ganha, muitas vezes,
436
contornos polissémicos de grande abrangência, reconhecida na literatura de
especialidade (Goldberg, 2018; Morais, 2011). Privilegiar a “Imaginação” em estreita
associação com a “Escrita Criativa” pode estar relacionado com a realização de práticas
de leitura e de escrita no âmbito das quais os estudantes a tenham valorizado, estimando
o seu desabrochar. Uma vez que, em distintas circunstâncias, criatividade e imaginação
caminham a par, o destaque conferido a ambas assume importância, pelas repercussões
que pode ter na produção textual dos estudantes.
“Inspiração” e “Escrita criativa” surgem muitas vezes associadas, no dia a dia,
remetendo para a representação da extraordinária relevância da primeira para levar a
bom porto a segunda, aspeto contrariado pela investigação que vinca tratar-se de um
mito (Runco, 2017; Sawyer, 2012). O facto de os estudantes a sublinharem pode
implicar a desvalorização da complexidade inerente à natureza processual da escrita, no
âmbito da qual não pode estar ausente o esforço e o rigor nela implicados.
A associação da palavra “Liberdade” ao conceito de “Escrita criativa” remete para a sua
representação como processo desassombrado instigador de ousadias que acolhem
diferentes itinerários de reencontros da imaginação, perpetuando-a sem limites (com
subtileza ou renovada intensidade). Na miríade de sentidos que pode conglomerar,
aponta para uma infinidade de percursos impressos nos seus desdobramentos, sem
quaisquer restrições – aspeto que os estudantes teriam valorizado.
A desvalorização das palavras “Persistência” e “Dedicação” pode estar relacionada com
a representação do senso comum de que a escrita criativa, diferentemente da escrita
académica ou com outras finalidades, não reclama semelhante esforço. No entanto,
como frisa Morais (2011), se momentos de descoberta súbita podem ocorrer, importa
igualmente ter em consideração “(…) um lento percurso de trabalho, de conhecimento,
de persistência, de reavaliações, e de manutenção teimosa num sentido de objetivo.”
As palavras “Sonho” e “Magia” envolvem-se, porventura, de modo docemente lento, no
gosto pela escrita, associando-lhe nuances de encanto possivelmente plasmado em
práticas de escrita realizadas pelos estudantes ao longo da vida, incutindo-lhes particular
alento.
Inferimos, ainda, que os estudantes concederam pouca atenção às palavras “Reflexão,”
“Diferença” e “Talento” (1 ocorrência, em quarta posição, correspondendo a 4%),
apresentando um caráter periférico nas suas representações sobre a escrita criativa.
437
No Quadro 2 apresentamos análise das respostas dos estudantes (TB), reportando-se às
suas representações iniciais sobre a escrita criativa:
1ª posição
Palavras
indicadas
2ª posição
3ª posição
4ª posição
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Criatividade
9
32%
3
11%
6
21%
4
14%
Imaginação
6
21%
8
29%
4
14%
3
11%
Originalidade
4
14%
6
21%
8
29%
9
32%
Reflexão
2
7%
4
14%
3
11%
5
18%
Invenção
1
4%
0
0%
2
7%
2
7%
Liberdade
1
4%
0
0%
1
4%
0
0%
Insólito
1
4%
0
0%
0
0%
0
0%
Complexidade
1
4%
0
0%
1
4%
0
0%
Incentivo
1
4%
0
0%
1
4%
0
0%
Literatura
1
4%
0
0%
1
4%
0
0%
Perspetiva
1
4%
0
0%
0
0%
0
0%
Empenho
0
0%
0
0%
1
4%
2
7%
Inovação
0
0%
0
0%
0
0%
2
7%
Conhecimento
0
0%
2
7%
0
0%
1
4%
Isolamento
0
0%
2
7%
0
0%
0
0%
Intuição
0
0%
1
4%
0
0%
0
0%
Descoberta
0
0%
1
4%
0
0%
0
0%
Criação
0
0%
1
4%
0
0%
0
0%
TOTAL
28
100%
28
100%
28
100%
28
100%
Quadro 2 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau
decrescente de importância (TB, R1)
Da análise do Quadro 2 destaca-se a relevância atribuída à palavra “Criatividade” (9
ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 32% e 3 ocorrências, em segunda
posição, correspondendo a 11%), seguindo-se “Imaginação” (6 ocorrências, em primeira
posição, correspondendo a 21% e 8 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a
29%), “Originalidade” (4 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 14% e 6
ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 21%) e “Reflexão” (2 ocorrências,
em primeira posição, correspondendo a 7% e 4 ocorrências, em segunda posição,
correspondendo a 14%).
438
Foi possível inferirmos que os estudantes da TA e da TB atribuíram semelhante
relevância às palavras “Criatividade” e “Imaginação,” surgindo estas, em ambos os
casos, em primeiro e em segundo lugar respetivamente.
A relação da palavra “Originalidade” com o conceito de “Escrita criativa” remete para a
sua representação como prática que abriga singularidades, podendo implicar
empenhamento renovado na tessitura textual, plasmando-a de um caráter único e belo.
A sua valorização por parte dos estudantes aponta para a sua possível dedicação a tal
labor. Como sublinham Runco e Jaeger (2012, p. 92), “Originality is undoubtedly
required. It is often labeled novelty, but whatever the label, if something is not unusual,
novel, or unique, it is commonplace, mundane, or conventional. It is not original, and
therefore not creative.”
A associação da palavra “Reflexão” ao conceito de “Escrita criativa” aponta para a
complexidade que lhe está inerente, envolvendo um conjunto de etapas que
contemplam, muitas vezes, um processo de brainstorming, evoluindo para o
conhecimento aprofundado daquilo que se cria – demoras implicando reiterados
reajustamentos nas práticas de escrita, entretecendo-as de unicidades. O destaque que os
estudantes lhe concederam remete possivelmente para a compreensão de tais aspetos
multifacetados que a literatura de especialidade reconhece como relevantes (Moran,
2010; Sternberg, 2012).
A palavra “Literatura” (1 ocorrência, em primeira posição, correspondendo a 4% e 1
ocorrência, em terceira posição, correspondendo a 4%) foi pouco valorizada pelos
estudantes, estando, possivelmente associada à relação que estabeleceram entre as
práticas de escrita criativa e a produção de textos literários, representação mais
favorecida pelo senso comum (embora tais práticas possam revestir de natureza não
ficcional, em distintos contextos, na sociedade atual).
O menor relevo concedido às palavras “Empenho” (1 ocorrência, em terceira posição,
correspondendo a 4% e 2 ocorrências, em quarta posição, correspondendo a 7%) e
“Complexidade” (1 ocorrência em primeira e em terceira posição, correspondendo a
4%) poderá indiciar que os estudantes entendem a escrita criativa enquanto processo
que não as implica.
439
No respeita às palavras “Invenção,” “Insólito” e “Inovação,” embora registando
ocorrências distintas, poderão estar relacionadas com a singularidade que os estudantes
teriam atribuído à escrita criativa, apontando para o seu caráter transformador.
As palavras “Intuição,” “Descoberta” e “Criação” (1 ocorrência, em segunda posição,
correspondendo a 4%) foram as mais depreciadas pelos estudantes, afastando-se do
núcleo central das suas representações sobre a escrita criativa.
3.2. Relação que os estudantes estabelecem com a escrita
De modo a compreendermos melhor as representações dos estudantes, estes foram
convidados a refletir sobre a relação que estabeleciam com escrita. A análise dos
resultados (TA) é apresentada no Quadro 3:
Categorias
Subcategorias
Estruturação do
Escrita académica
pensamento
Complexidade da
redação
Desenvolvimento
Escrita criativa
da imaginação
Prazer
Motivação
Escrita pessoal
intrínseca
Expressão de
sentimentos
Desenvolvimento
Escrita de notícias
profissional
Fascínio pela
informação
Total
Freq.
%
3
10%
3
10%
5
17%
3
10%
7
24%
4
14%
2
7%
2
29
Total
%
6
20%
8
27%
11
38%
4
14%
29
100%
7%
Quadro 3 – Relação que os estudantes estabelecem com a escrita (Turma A, R1)
Da análise do Quadro 3 inferimos que os estudantes concederam mais destaque à
“Escrita pessoal” (11 ocorrências, correspondendo a 38%), seguindo-se a “Escrita
criativa” (8 ocorrências, correspondendo a 27%) e, posteriormente, a “Escrita
académica” (6 ocorrências, correspondendo a 20%), bem como a “Escrita de notícias”
(4 ocorrências, correspondendo a 14%).
440
No que diz respeito à “Escrita pessoal” foi possível depreendermos que alguns
estudantes teriam uma relação muito positiva com a escrita, plasmada nos enunciados
que associamos às subcategorias “Motivação intrínseca” e “Expressão de sentimentos.”
No primeiro caso, os estudantes referiram ter um gosto particular pela escrita, como
ilustram os seguintes enunciados: “Pessoalmente, gosto muito de escrever as minhas
coisas. Gosto de escrever textos, em qualquer ocasião do dia, ou seja, é basicamente
uma escrita mais pessoal” (E4) / “Desde muito cedo que tenho um gosto especial pela
escrita. Acompanhou-me sempre, não me vejo sem escrever. É algo pessoal que faz
parte de mim” (E22). A escrita foi também relacionada com a “Expressão de
sentimentos,” sendo frisado, por exemplo: “A escrita permite-me exprimir os meus
sentimentos, entendo que a nossa relação é boa por isso, gosto de o fazer” (E5) / “A
minha relação com a escrita baseia-se, sobretudo, na expressão dos meus sentimentos
sobre tudo o que me rodeia” (E19).
Relativamente à “Escrita criativa,” destacaram-se o “Desenvolvimento da imaginação”
e o “Prazer.” No âmbito da primeira subcategoria referida, os estudantes estabeleceram
uma relação estreita entre as práticas de escrita criativa e diferentes modos de a
imaginação lhe estar implícita. Um estudante declarou, por exemplo, o seguinte: “A
relação que eu estabeleço com a escrita criativa está muito dependente da imaginação.
Se a conseguirmos desenvolver bastante o nosso texto será bem-sucedido e os leitores
gostarão dele” (E13). No que respeita ao “Prazer,” um estudante sublinhou, por
exemplo: “Pessoalmente, embora estejamos a começar, relaciono a escrita criativa com
prazer, ao contrário da escrita por obrigação. Acho que nos permite voar mais longe,
não é como os outros tipos de escrita” (E17).
No âmbito da “Escrita académica,” as subcategorias “Estruturação do pensamento” e
“Complexidade da redação” receberam semelhante atenção por parte dos estudantes. A
primeira subcategoria contemplou os enunciados que apontavam para a centralidade da
“estruturação do pensamento” nas práticas de escrita, sendo referido, por exemplo
“Começo a escrever um ensaio académico e tenho de estruturar o pensamento, sinto que
é o mais importante para a clareza da escrita. Caso contrário não se compreende o que
queremos dizer” (E11). A “Complexidade da redação” foi associada pelos estudantes à
relação que mantinham com a escrita de trabalhos académicos, aspeto ilustrado no
enunciado seguinte: “A minha relação com a escrita é basicamente a académica. Redigir
441
esses textos é complexo, não me sinto preparada embora já esteja no terceiro ano do
curso” (E1).
A “Escrita de notícias” desdobrou-se em “Desenvolvimento profissional” e “Fascínio
pela informação.” No primeiro caso, os estudantes desvelaram uma relação com a
escrita sustentada pelo seu futuro labor, referindo, por exemplo, explicitamente: “A
minha relação com a escrita passa pelo meu desenvolvimento profissional, nesta altura.
É assim que a encaro” (E2). No segundo caso, vincaram o seu profundo fascínio pela
informação, declarando, por exemplo, “Sempre quis seguir jornalismo de imprensa. A
informação fascina-me, a sua capacidade de fazer chegar às pessoas o que nós
escrevemos” (E12).
No Quadro 4 apresentamos a análise dos resultados relativos à TB, no que concerne à
relação dos estudantes com a escrita:
Categorias
Subcategorias
Freq.
%
6
14%
4
10%
8
19%
Liberdade
5
12%
Evasão
9
21%
4
10%
4
10%
Complexidade da
Escrita académica
planificação
Desafios da redação
Desenvolvimento da
Escrita criativa
Escrita pessoal
originalidade
Expressão de
sentimentos
Desenvolvimento
Escrita de notícias
profissional
Desenvolvimento
pessoal
Total
2
5%
42
100%
Total
%
10
24%
13
31%
13
31%
6
15%
42
100%
Quadro 4 – Relação que os estudantes estabelecem com a escrita (Turma B, R1)
A análise do Quadro 4 permite-nos compreender que a “Escrita criativa” e a “Escrita
pessoal” assumiram relevância idêntica para os estudantes (13 ocorrências,
correspondendo a 31%), destacando-se das outras duas categorias.
A “Escrita criativa” surgiu associada ao “Desenvolvimento da originalidade” e à
“Liberdade,” tendo os estudantes declarado que a sua relação com a escrita estaria
estreitamente ligada, no primeiro caso, à criação de algo novo, como ilustram os
442
enunciados que transcrevemos: “A prática da escrita criativa, para mim, é sinónimo de
originalidade, podermos escrever algo que outros não escreveram, ser diferentes” (E33)
/ “Poder ser original na escrita, como quisermos, é manter com ela uma relação especial,
sermos únicos, o que me agrada particularmente” (E40). No segundo caso, um estudante
referiu, por exemplo, o seguinte: “Vejo a escrita criativa como expressão de liberdade, e
isso é notável, o facto de não existirem regras pré-estabelecidas nem entraves” (E29),
aspeto igualmente valorizado nos enunciados que associamos a esta subcategoria.
A “Expressão de sentimentos” e a “Evasão” emergiram no âmbito da “Escrita pessoal,”
destacando-se a primeira. Os estudantes afirmaram que a sua relação com a escrita
estaria entretecida em distintos modos de se alhearem da realidade, trilhando outros
percursos prazerosos, aspeto que emerge, por exemplo, no seguinte enunciado:
“Consigo afirmar que de entre muitas palavras que já desenhei, existem umas quantas
que me fazem sentir noutro mundo, faz parte das coisas que me relaxam” (E42). A
relação de alguns estudantes com a escrita surgiu, também, entrelaçada em sentimentos
desvelados nos itinerários de “Escrita pessoal,” percorridos por alguns estudantes. Um
deles referiu, por exemplo, que “Escrever é sentir o que me vai na alma, é um misto de
sentimentos e emoções” (E52).
A “Escrita académica” desdobrou-se em “Complexidade da planificação” e “Desafios
da redação,” tendo os estudantes mencionado, no que respeita à primeira subcategoria,
que a sua relação com a escrita seria muito influenciada pela etapa da planificação,
aspeto plasmado no enunciado seguinte: “(…) tenho que planificar o texto que vou
escrever; é algo que me custa imenso, começar por onde, ver o que é mais importante
referir. Não parece, mas para mim é complexo” (E49). Outros estudantes vincaram
ainda os desafios implícitos na especificidade da escrita académica. O enunciado que
transcrevemos a seguir ilustra-os: “A redação do texto é um desafio. Pensar no tema é
mais rápido e no que pretendo dizer também, mas a redação já não é assim. Até hoje a
minha relação com a escrita tem sido marcada por este desafio” (E41)
No âmbito da “Escrita de notícias” os estudantes valorizaram, sobretudo, o
“Desenvolvimento profissional.” Um estudante declarou, por exemplo, “A minha
relação com a escrita dá-se, sobretudo, através das notícias que redijo, o que se traduz
no meu desenvolvimento profissional e me parece importante no curso que frequento”
(E39). O “Desenvolvimento pessoal” desvelou uma relação intrínseca com a escrita,
numa matriz associada à cidadania global: “A escrita de notícias é o que faço mais e
443
contribui muito para o meu desenvolvimento pessoal; consigo compreender melhor o
meu posicionamento e o dos outros no mundo” (E47).
As representações iniciais dos estudantes sobre o conceito de “Escrita criativa,”
revelando-se um caráter multifacetado, possibilitaram-nos inferir que no seu núcleo
central assumiam destaque palavras “Criatividade” e “Imaginação.” O cruzamento de
tais representações com as que evidenciaram relativamente à sua relação com a escrita,
mormente a escrita criativa, aponta para o seu entrelaçamento, quer na TA, quer na TB.
No primeiro caso, pela importância atribuída à subcategoria “Desenvolvimento da
imaginação” e, no segundo, pela valorização das subcategorias “Desenvolvimento da
originalidade” e “Liberdade.” Os aspetos desvelados no âmbito da “Escrita académica,”
“Escrita pessoal” e “Escrita de notícias” possibilitaram-nos compreender outros modos
de os estudantes se relacionarem com a escrita, apontando itinerários a seguir na
unidade curricular, de modo a promover a sua centralidade no âmbito do processo de
ensino e de aprendizagem.
3.3. Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita
Na segunda reflexão, realizada a meio da unidade curricular, convidamos os estudantes
a mencionar as suas principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita.
A análise dos resultados (TA) é apresentada no Quadro 5:
Categorias
Freq.
%
Total
Planificação do texto
12
36%
36%
Articulação da temática a desenvolver no
9
27%
27%
Coerência textual
4
12%
12%
Criação de textos atrativos
4
12%
12%
Escassez de tempo
2
6%
6%
Cunho pessoal/Originalidade
2
6%
6%
Total
33
100%
100%
texto
Quadro 5 – Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita (Turma A, R2)
A “Planificação do texto” (12 ocorrências, correspondendo a 36%) e a “Articulação da
temática a desenvolver no texto” (9 ocorrências, correspondendo a 27%) foram as
dificuldades mais sublinhadas pelos estudantes. Os enunciados que associamos à
primeira categoria possibilitaram-nos compreender que os estudantes: i) não teriam o
hábito de planificar o texto, passando, de imediato, à sua redação, por entenderem ser
444
uma tarefa árdua; ii) realizariam planificações de caráter extenso, o que lhes dificultaria
a posterior redação do texto. Relativamente à segunda categoria, depreendemos que os
estudantes, independentemente da tipologia textual em causa, teriam dificuldades em
articular a temática a desenvolver no texto, como ilustram os enunciados seguintes: “A
minha principal dificuldade reside em articular o tema a desenvolver, isto quer se trate
de um texto narrativo, ou de texto poético. O fio condutor demora a aparecer” (E14) /
“Tenho dificuldades em ir encaixando as coisas conforme vou escrevendo para que haja
ali uma articulação da temática que pretendo abordar” (E25).
A “Coerência textual” e a “Criação de textos atrativos” receberam idêntica atenção (4
ocorrências, correspondendo a 12%). Relativamente à primeira categoria, os estudantes
declararam ter dificuldades: i) em escrever textos que se revelassem coerentes, no seu
todo; ii) na manutenção da coerência dos textos, à medida que os iam escrevendo,
mormente por falta da sua planificação. Nos enunciados associados à categoria “Criação
de textos atrativos” ficou plasmada a dificuldade inerente à criação de um texto com
características germinadoras de atenção por parte dos leitores, desvelando a
preocupação dos estudantes face ao público-alvo dos seus textos – indício de
generosidades em crescimento.
A “Escassez de tempo” e o “Cunho pessoal/originalidade” (2 ocorrências,
correspondendo a 6%) foram as dificuldades menos valorizadas pelos estudantes. No
primeiro caso, reportaram-se à dificuldade que teriam em escrever textos no âmbito dos
limites temporais impostos, o que lhes causaria alguma frustração; no segundo caso,
declararam ser um desafio escrever textos onde ficasse evidenciado o seu cunho
pessoal/originalidade, aspeto que entenderam como muito relevante nas práticas de
escritas realizadas, até então, na UC.
No Quadro 6 apresentamos a análise dos resultados relativos às principais dificuldades
dos estudantes em relação à natureza processual da escrita (TB):
Categorias
Freq.
%
Total
Redação do texto
9
29%
29%
Gestão do tempo
7
23%
23%
Implementação de processos criativos
5
16%
16%
Falta de imaginação
5
16%
16%
Reduzida capacidade de improvisação
3
10%
10%
Escassez de vocabulário
2
6%
6%
445
Total
31
100%
100%
Quadro 6 – Principais dificuldades em relação à natureza processual da escrita (Turma B, R2)
Da análise do Quadro 6 inferimos que a “Redação do texto” (9 ocorrências,
correspondendo a 29%) e a “Gestão do tempo” (7 ocorrências, correspondendo a 23%)
se destacaram, seguindo-se, com idêntica valorização, a “Implementação de processos
criativos” e a “Falta de imaginação” (5 ocorrências, correspondendo a 16%).
No âmbito da “Redação do texto,” inferimos que as dificuldades dos estudantes se
prenderiam, sobretudo, com: i) a explicitação de conteúdo; ii) a articulação linguística.
Relativamente à primeira, um estudante declarou, por exemplo: “A principal dificuldade
que registo prende-se com a redação do texto; não me faltam ideias, mas é difícil
clarificar o que pretendo dizer” (E28). No âmbito da articulação linguística, os
estudantes afirmaram que o sucesso na escrita seria influenciado pelas suas dificuldades
de interligação das frases no texto, aspeto plasmado no enunciado seguinte: “A minha
principal dificuldade está em ligar as frases do texto enquanto vou redigindo; vai-me
escapando sempre alguma coisa porque quando releio muitas vezes não faz sentido. A
redação do texto é complicada” (E30).
Relativamente à “Gestão do tempo” os estudantes afirmaram que esta estaria associada
a dificuldades de concentração, o que se repercutiria em alguma dispersão, impedindo a
realização da escrita do texto em tempo útil, como transparece no enunciado seguinte:
“Creio que a gestão de tempo é a minha maior dificuldade; vou perdendo concentração,
o tempo passa, já não escrevo o que queria e como queria” (E48).
A “Implementação de processos criativos” e a “Falta de imaginação” foram valorizadas
de forma idêntica pelos estudantes (5 ocorrências, correspondendo a 16%). A primeira
categoria apontada possibilitou descortinar as dificuldades resultantes da sua
preocupação com a redação de textos pautados pela criatividade, como ilustra o
enunciado seguinte: “Agora que já escrevo com maior fluência, a minha maior
dificuldade é conseguir aplicar processos criativos nos textos, para que estes sejam
distintos de outros; tentar, assim, que sejam mais criativos” (E33). Alguns estudantes
afirmaram, por seu lado, que a “Falta de imaginação” seria a sua principal dificuldade, o
que não lhes permitiria escrever de acordo com os objetivos que teriam traçado, no que
respeita às práticas de escrita criativa. O enunciado que transcrevemos a seguir ecoa tal
446
dificuldade: “Sem dúvida que a dificuldade maior é faltar-me imaginação, acho que
tenho de a desenvolver mais. Ela é fundamental para escrever de forma criativa e
também para outros tipos de escrita” (E40).
A “Reduzida capacidade de improvisação” instituiu-se como dificuldade para alguns
estudantes, tendo declarado que seria um obstáculo à prossecução da escrita de textos,
limitando a sua prolixidade. Um estudante referiu, por exemplo, o seguinte: “Se
conseguisse improvisar mais, parece-me que poderia produzir mais e melhores textos; é
uma capacidade que espero melhorar, mas por enquanto é ainda difícil para mim fazer
isso.” (E54).
A “Escassez de vocabulário,” menos valorizada pelos estudantes, revelou-se, em seu
entender, um obstáculo à prossecução da escrita com maior celeridade, bem como um
impedimento a que os textos progredissem de acordo com a diversidade vocabular
desejável, de acordo com os objetivos traçados no âmbito da sua prossecução.
A análise dos resultados relativos às principais dificuldades manifestadas pelos
estudantes em relação à natureza processual da escrita possibilitou-nos repensar o
processo de ensino e de aprendizagem a meio UC, dando relevo às suas vozes. Foram
realizados alguns reajustamentos, de modo incrementar o trabalho a pares e a promover
o feedback em relação ao trabalho realizado. Tal feedback foi facultado pela docente,
mas igualmente alicerçado através do trabalho a pares, possibilitando maior partilha do
trabalho realizado e conferindo maior protagonismo aos estudantes.
3.4.Representações finais dos estudantes sobre a escrita criativa
No final da unidade curricular, solicitamos aos estudantes que nos indicassem, de novo,
quais as quatro palavras que associavam ao conceito de escrita criativa. A análise das
suas respostas (TA) é apresentada no Quadro 7:
Palavras
indicadas
1ª posição
2ª posição
3ª posição
4ª posição
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Criatividade
8
31%
6
23%
7
27%
6
23%
Originalidade
6
23%
4
15%
4
15%
4
15%
Imaginação
4
15%
4
15%
3
12%
4
15%
Conhecimento
2
8%
3
12%
3
12%
5
19%
Liberdade
1
4%
2
8%
2
8%
3
12%
Reflexão
1
4%
2
8%
1
4%
0
0%
447
Concentração
1
4%
2
8%
1
4%
0
0%
Singularidade
1
4%
1
4%
1
4%
0
0%
Reescrita
1
4%
1
4%
1
4%
0
0%
Complexidade
1
4%
0
0%
1
4%
0
0%
Empenhamento
0
0%
1
4%
1
4%
0
0%
Habilidade
0
0%
0
0%
1
4%
0
0%
Motivação
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Técnica
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Confiança
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Vontade
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
TOTAL
26
100%
26
100%
26
100%
26
100%
Quadro 7 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau
decrescente de importância (TA, R3)
Da análise do Quadro 7 depreendemos que as palavras que os estudantes mais
associaram à escrita criativa foram “Criatividade” (8 ocorrências, em primeira posição,
correspondendo a 31% e 6 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 23%),
“Originalidade” (6 ocorrências, em primeira posição, correspondendo a 23% e 4, em
segunda posição, correspondendo a 15%), “Imaginação” (4 ocorrências, em primeira e
em segunda posição, correspondendo a 15%) e “Conhecimento” (2 ocorrências, em
primeira posição, correspondendo a 8% e 3 ocorrências, em segunda posição,
correspondendo a 12%).
O cruzamento da análise dos resultados relativos às representações iniciais e finais dos
estudantes sobre a escrita criativa permitiu-nos inferir que, no final da unidade
curricular, estes: i) continuavam a dar maior relevância à “Criatividade;” ii) passaram a
associar mais importância à “Originalidade” e ao “Conhecimento;” iii) concediam
menos destaque à “Imaginação,” embora mantivesse importância. Algumas palavras,
ausentes das suas representações iniciais, tais como “Reescrita” e “Habilidade” apontam
para o repensar da natureza processual da escrita, o que teria resultado do trabalho
realizado ao longo da unidade curricular. A ausência da palavra “Inspiração,”
anteriormente uma das mais destacadas pelos estudantes, possibilita-nos inferir que
através das suas práticas de escrita teriam igualmente compreendido o seu caráter
multifacetado, nelas intervindo outros aspetos de maior relevo.
448
O Quadro 8 reúne a análise dos resultados relativos às representações finais dos
estudantes sobre a escrita criativa (TB):
Palavras
indicadas
1ª posição
2ª posição
3ª posição
4ª posição
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Freq.
%
Criatividade
9
32%
6
21%
4
14%
4
14%
Originalidade
7
25%
4
14%
6
21%
4
14%
Diferença
5
18%
3
11%
2
7%
4
14%
Imaginação
3
11%
6
21%
5
18%
3
11%
Trabalho
2
7%
2
7%
3
11%
4
14%
Objetivo
1
4%
1
4%
2
7%
1
4%
Reflexão
1
4%
1
4%
1
4%
1
4%
Paixão
0
0%
1
4%
0
0%
0
0%
Planificação
0
0%
1
4%
1
4%
1
4%
Conhecimento
0
0%
1
4%
1
4%
0
0%
Invenção
0
0%
1
4%
1
4%
1
4%
Confiança
0
0%
1
4%
1
4%
1
4%
Singularidade
0
0%
0
0%
1
4%
0
0%
Emoção
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Diversidade
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Inspiração
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
Talento
0
0%
0
0%
0
0%
1
4%
TOTAL
28
100%
28
100%
28
100%
28
100%
Quadro 8 – Palavras relacionadas com o conceito de escrita criativa ordenadas segundo o grau
decrescente de importância (TB, R3)
Depreendemos que, à semelhança no sucedido na TA, as palavras que os estudantes
mais associaram ao conceito de escrita criativa foram “Criatividade” (9 ocorrências, em
primeira posição, correspondendo a 32% e 6 ocorrências, em segunda posição,
correspondendo a 21%) e “Originalidade” (7 ocorrências, em primeira posição,
correspondendo a 25% e 4 ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 14%).
Neste caso, seguiram-se as palavras “Diferença” (5 ocorrências, em primeira posição,
correspondendo a 18% e 3, em segunda posição, correspondendo a 11%) e
“Imaginação” (3 ocorrências, em primeira posição, correspondendo 11% e 6
ocorrências, em segunda posição, correspondendo a 21%) que passou de segunda
escolha inicial a quarta escolha.
A valorização da palavra “Trabalho” (2 ocorrências, em primeira e em segunda posição,
correspondendo a 7%, 3 ocorrências, em terceira posição, correspondendo a 11% e 4
449
ocorrências, em quarta posição, correspondendo a 14%), antes ausente, permite-nos
inferir que os estudantes a associavam, no final da unidade curricular, ao conceito de
escrita criativa, possivelmente por terem compreendido a complexidade inerente às
práticas de escrita desenvolvidas.
O surgimento da palavra “Planificação” (1 ocorrência em segunda, em terceira e em
quarta posição, correspondendo a 4%) parece-nos importante por remeter para o seu
equacionamento no âmbito de futuras práticas de escrita a realizar pelos estudantes,
valorizando-as.
Embora menos frisadas pelos estudantes, as palavras “Paixão” e “Emoção” merecem
destaque por apontarem para a possível criação de uma rede de afetos relativa à escrita,
podendo alimentar futuras práticas que se repercutam, positivamente, nos estudantes,
contribuindo para o seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Os aspetos mencionados permitem-nos compreender que se reveste de muita
importância continuar a refletir sobre o modo como repensamos os processos de ensino
e de aprendizagem, tendo em conta as representações dos estudantes sobre os conteúdos
programáticos a abordar, de modo a favorecer o desabrochar de partilhas que potenciem
reencontros mais proveitosos e felizes com a escrita criativa.
Considerações finais
A investigação realizada possibilitou-nos inferir que o processo de ensino e
aprendizagem pode adquirir uma dimensão transformadora quando é conferida
centralidade às representações dos estudantes. O conhecimento do seu caráter
multidimensional revelou-se importante por possibilitar expor facetas da escrita criativa
que os estudantes valorizavam, bem como diferentes modos de as encarar. Para tal
conhecimento contribuiu, em primeiro lugar, a escuta das suas representações iniciais
sobre a escrita criativa, porto de abrigo de movimentos de hospitalidade envolvidos em
processos de escrita – aí se destacando a importância da criatividade e da imaginação.
A compreensão das principais dificuldades que os estudantes declararam ter (expressas
através da segunda reflexão) possibilitou a realização de reajustamentos que
promoveram o incremento do trabalho a pares bem como a promoção do feedback em
relação ao trabalho realizado, levando ao entendimento da natureza processual da escrita
– nela se plasmando a(s) criatividade(s) germinada(s) ao longo do percurso seguido.
450
O processo de ensino-aprendizagem foi, pois, alvo de várias metamorfoses ao longo do
itinerário pelo qual enveredamos, tendo em atenção a participação ativa dos estudantes
no mesmo, sustentada pelas reflexões levadas a cabo ao longo da unidade curricular. Os
estudantes valorizaram o seu papel na reconstrução de tal processo, redescobrindo, ao
longo do percurso trilhado, maneiras de se reverem na escrita criativa enquanto
possibilidade de desenvolvimento pessoal, nomeadamente pela via do incremento da
imaginação e da originalidade – reequacionando e reconhecendo a capacidade de serem
mais versáteis na sua futura profissão.
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452
23.A PEDAGOGIA CORPORIFICADA NA PROPOSTA DAS
TERNAS: ENSINAGEM SOBRE O CORPO SENSÍVEL E
POÉTICO NAS ARTES DA CENA
Renata Bittencourt Meira81 & Túlio Guimarães da Cunha
Resumo
O crescimento dos cursos de graduação e da pesquisa em Teatro, no Brasil, deu
visibilidade ao trabalho de corpo dentre as práticas de ator. Na perspectiva da educação,
o conhecimento corporal envolve práticas transformadoras de si. Tratamos aqui da
abordagem somática que tem conquistado espaço na pesquisa acadêmica e na formação
universitária no campo das Artes da Cena. A pessoa humana é um processo em rede,
complexo e interconectado nas dimensões corporal, cognitiva, psicológica, social. O
corpo enquanto materialidade é, dentre as dimensões interconectadas, “[...] a mais apta
para catalisar a globalidade das transformações” (Fortin, 1999, p. 44). A abordagem
somática aciona um conjunto de conhecimentos teórico-práticos em que corpo, mente e
cultura são parte da inteireza humana (Shusterman, 2011). Esta perspectiva somática
direciona este estudo de treinamento e formação de atores e professores de teatro que
parte do corpo sensível para o corpo expressivo e para a poética. Na formação em teatro
as "disciplinas de corpo" são oferecidas por professores com formação especializada
(Potter, 2015). As atividades práticas e o trabalho intelectual desenvolvidos nas aulas
deixa subjacentes conhecimentos e habilidades do trabalho docente (Tuisku, 2015). O
aprofundamento nestes conhecimentos exige tempo e recursos financeiros, sendo,
assim, elitizante. A pesquisa denominada "Ternas: uma pedagogia corporal para as
artes" enfrenta este problema. A metodologia da prática como pesquisa considera que a
tarefa de ensinar leva à reflexão e à organização do conhecimento prático (Januzelli,
2003). Esta comunicação compartilha as experiências docentes e os resultados parciais
da pesquisa.
Palavras Chave: Teatro. Educação Somática. Treinamento para Atores. Formação de
Professores. Movimento.
Professora Associada do Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia, onde ministra desde
2002, nos cursos de Graduação em Teatro (bacharelado e licenciatura); Bacharelado em Dança; Mestrado
em Artes Cênicas e Mestrado Profissional em Artes (PROFARTES). Bacharel em Dança, Mestre em
Artes e Doutora em Educação pela Universidade Federal de Campinas. A pesquisa atual inclui educação
somática, movimento consciente, processo criativo e cultura popular.
81
http://www.iarte.ufu.br/equipe/renata-bittencourt-meira
453
Introdução
Este artigo apresenta uma pesquisa docente em andamento, desenvolvida junto ao Curso
de Teatro da Universidade de Évora em Programa Pós Doutoral. A primeira parte do
texto discorre sobre o percurso de organização do ensino formal de Teatro no Brasil que
culminou com a criação dos cursos universitários. São considerados os contextos
artísticos e políticos. A segunda parte indica a metodologia da prática como pesquisa
utilizada na pesquisa que se debruça sobre a prática docente, desenvolvida em um
período de dezoito anos na Universidade Federal de Uberlândia (Meira, 2019), como
fonte de criação e elaboração de material didático para a preparação corporal do ator
que pretende contribuir com as práticas docentes de professores de teatro. O terceiro
item descreve a opção da pesquisa por uma abordagem corporal somática e integradora,
seguido, no item quatro, dos objetivos propostos. Os níveis de consciência corporal, as
referências aos estudos das neurociências e a questão filosófica da natureza humana
constituem a problematização e os pressupostos teóricos de suporte para a pesquisa. O
sétimo item descreve os procedimentos que se abrigam na experiência docente enquanto
prática como pesquisa. Os resultados parciais da pesquisa apontam seis conceitos
corporificados como caminhos para o desenvolvimento da percepção e indicam três
questões pedagógicas que orientam a ação do professor em sala de aula, no
planejamento e no modo de estimular uma experiência integradora para os estudantes.
As considerações finais traçam uma pequena reflexão sobre a pedagogia corporificada
na proposta das Ternas.
1. A formação dos cursos universitários de Teatro no Brasil
Contexto Artístico
O ensino do Teatro nos cursos de formação superior, no Brasil, remontam ao
movimento de modernização da cultura brasileira dos anos 1920-1930 (Brito, 2011).
Até este período o entendimento sobre o aprendizado em Teatro era espontaneísta, ou
seja, o artista é considerado artista por ter talento e se desenvolve tecnicamente na
experiência prática do palco, não há um processo determinado de ensino e
aprendizagem. Procópio Ferreira (1898 - 1979) e Dercy Gonçalves (1909 - 2008),
defendiam esta ideia (Brito, 2011, p. 66). Na década de 1930, a complexidade crescente
da Arte Moderna Brasileira passa a exigir do artista um conhecimento cultivado
intelectualmente, além da prática artística. Esta característica conceitual da arte moderna
454
leva à reflexão sobre a formação do profissional da Arte. O embate entre os intelectuais
e os talentos da arte brasileira estabelece uma reflexão crítica no período em que são
criados dois cursos que serão embriões dos cursos de Teatro nas universidades. Em
1939 o Curso Prático de Teatro (CPT) é constituído no Rio de Janeiro e em 1948 é
criada a Escola de Arte Dramática (EAD) em São Paulo.
Destacamos a relação destas escolas com a dinâmica artística de seu tempo, no caso,
com o movimento modernista que renovou a arte brasileira com elementos poéticos da
cultura nacional, com críticas e características sociais do Brasil, tendo por base a
vanguarda da arte moderna européia. Esta nova poética crítica, de ruptura das tradições
e contextualizada na arte universal, influenciou o ensino do Teatro no Brasil.
Contexto Político
A Constituição Brasileira de 1934, contém um capítulo que trata exclusivamente da
educação no país. Dentre as propostas está prevista a instituição de uma Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para definir e regular a educação nacional. Entre
1937 e 1946 o país viveu um período de censura, repressão e populismo. O capítulo
sobre a educação foi retirado em uma nova Constituição que recebeu o apelido de
“Polaca” por ter sido inspirada no regime semi fascista polonês. Após 1946, a discussão
sobre a LDB foi retomada com uma forte polarização de ideias que disputaram, durante
dezesseis anos, seu fundamento filosófico.
A primeira LDB foi criada em 1961, seguida por uma versão em 1971, que vigorou até
1996. Recentemente a LDB tem sofrido reformas em pontos específicos que evidenciam
as disputas ideológicas recentes no país. A questionável reforma do ensino médio
(Ferretti, 2018) foi decretada em 2017 como Medida Provisória, depois de provocar um
movimento estudantil secundarista de resistência que ficou conhecido como Movimento
de Ocupação das Escolas. Também em 2017 foi aprovada a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) que foi alvo de críticas tanto pela ausência de especialistas na
elaboração da versão final, quanto pelo atendimento a interesses de grandes grupos
econômicos (de Andrade, 2017). Em 2019 foram promulgadas duas leis que atendem a
interesses de grupos religiosos (Lei n°13.868 e Lei n° 13.796), entre outras reformas
pontuais que têm redesenhado os rumos das políticas nacionais brasileiras. Estas
alterações recentes têm diminuído sensivelmente a formação humanista, estética e ética
dos jovens brasileiros, uma vez que torna facultativo o ensino de artes e sociologia no
455
ensino médio, além de permitir que pessoas com conhecimento técnico profissional, e
sem formação pedagógica, assumam o lugar dos professores nas escolas formais.
Em meio à discussão da LDB, que se deu entre 1940 e 1960, na década de 1950, são
criadas quatro escolas82. Temos, então, neste primeiro período, cursos de teatro em São
Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, cidades onde são criados os primeiros
cursos universitários na década de 1960. Esses cursos, com a contribuição de outras
iniciativas importantes, porém efêmeras que surgiram nas décadas de 1940, 50 e 60
(Brito, 2011, pp. 66 a 74), formaram a base dos cursos de teatro em nível superior no
Brasil.
As disciplinas que estes cursos técnicos de nível médio ofereciam para a formação de
atores, destacadas por Brito (2011, pp. 71 a 86), incluíam ginástica, dança, dicção,
esgrima (CPT no Rio de Janeiro); dicção, impostação vocal, mímica, ginástica rítmica e
esgrima (EAD em São Paulo); dança rítmica (ETUB na Bahia) e expressão corporal,
dicção, e esgrima aplicada ao teatro (CAD no Rio Grande do Sul). Esta organização
disciplinar indica uma concepção de trabalho corporal paralela e complementar à
formação em interpretação.
Os acontecimentos que dão início aos cursos superiores em Teatro no Brasil são
acompanhados de debates com ideias contraditórias. As oposições entre teoria e prática
e entre espontaneísmo e racionalismo dividem as opiniões da classe teatral. Maria Clara
Machado, fundadora de O Tablado83, é um exemplo da resistência contra a formação em
Teatro no ensino superior, por considerar que na universidade, o caráter
predominantemente teórico não permitiria a formação de um profissional de Teatro.
Para ela, o trabalho prático de Teatro é o conhecimento principal do profissional desta
arte, desde o mais elementar como é o modo de andar em cena, além disso, os
conhecimentos oferecidos pela universidade poderiam ser aprendidos em conferências e
bibliotecas (Brito, 2011, p. 68). Compreendo que Maria Clara Machado (1921 - 2001)
afirmava, com isso, a importância das atividades práticas para a formação profissional,
O Tablado (1951); Fundação Brasileira de Teatro _ FBT (1955); Escola de Teatro da Universidade da
Bahia _ ETUB (1956) e Curso de Artes Dramática da URGS _ CAD (1958).
82
O Tablado de início “se resumia a uma simples sala com um palco rudimentar (ainda assim, palco!),
usada para apresentações teatrais amadoras e divertimentos sortidos. (...) Em que pese o “amadorismo”
pretendido inicialmente, décadas de invejável e apaixonado profissionalismo fariam do Tablado parte
importante da história da cultura brasileira, seja como celeiro de talentos, seja como templo do teatro
infantil. O Tablado é hoje, sobretudo, uma escola de teatro, com cerca de 700 alunos e mais de 20
professores, atuante na formação de cidadãos de todo o Brasil”. http://otablado.com.br/texto/1/historia
acessado em 22 de abril de 2020, ás 19h40, horário de Lisboa.
83
456
dentre as quais a prática corporal, e também apresentava sua perspectiva na qual o
conhecimento universitário é de caráter teórico. O conhecimento prático é hoje
reconhecido como um campo de ensino e pesquisa nas universidades brasileiras, este
reconhecimento frutificou em metodologias de ensino e da prática enquanto pesquisa,
além de abordagens teórico-práticas que se interessam pela experiência humana como é
o caso da perspectiva somática dos estudos do corpo. Chego a afirmar que a legitimação
do conhecimento prático no ensino superior está latente na história da criação dos
cursos superiores para formação de atores e atrizes no Brasil.
Este debate culminou em 1965 por meio da regularização da formação na área de teatro
com a promulgação a LEI n° 4.641 e que considerou que atores, contra-regras,
sonoplastas e cenotécnicos deveriam ser formados em cursos técnicos de nível médio;
enquanto diretores, cenógrafos e professores de Arte Dramática deveriam ter curso
superior. Nesta década de 1960 são criados, então, os quatro primeiros cursos
superiores84 de Teatro no Brasil como desdobramento de Escolas Técnicas de Teatro.
Na década seguinte outra lei é promulgada fortalecendo ainda mais a criação de cursos
superiores de Teatro, segundo Brito (2011),
Em 1971 a FAFIEG85 sedia o I Simpósio Nacional de Ensino Teatral que reivindica ao MEC a
criação do curso de ator em nível superior e a inclusão do ensino de Teatro nos cursos primário e
médio. Neste mesmo ano, 1971, foi aprovada a LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação
que torna obrigatória a inclusão de Educação Artística, bem como a Educação Física, Educação
Moral e Cívica e Programas de Saúde, nos 1° e 2° graus (Brito, 2011, p. 73).
Em 1974 é aprovada a lei que regulamenta o bacharelado em Teatro com quatro
habilitações: Interpretação, Direção Teatral, Teoria do Teatro e Cenografia. No mesmo
ano foram criados os cursos de Interpretação na Universidade do Rio de Janeiro
(UNIRIO) e na Universidade de São Paulo (USP). Posso afirmar que a visão
espontaneísta foi, com isto, suplantada, uma vez que o conhecimento em Arte passa a
ser considerado como desenvolvimento intelectual e sua inclusão no currículo escolar
nacional integra a arte na educação universal. Com o ensino de Artes obrigatório no
Universidade Federal da Bahia - UFBa (1963); Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro UNIRIO (1964); Universidade de São Paulo - USP (1967) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS (1967).
84
Federação das Escolas Federais Isoladas Do Estado da Guanabara -FAFIEG -, uma Fundação de
Direito Público voltada para o desenvolvimento da educação superior e da pesquisa.
85
457
ensino fundamental, houve um investimento das universidades na criação de cursos para
formação de professores, as chamadas licenciaturas.
Nessa trajetória da criação de cursos de Teatro no ensino superior percebe-se que as
disciplinas de trabalho corporal dos cursos que originaram as primeiras graduações
ofereciam treinamentos trazidos da dança, da ginástica, de lutas e de tradições teatrais,
como a mímica. Esta questão está no centro dos questionamentos da pesquisa
apresentada neste artigo.
No início da década de 2000 a perspectiva política do Brasil apontava uma grande
mudança, neste contexto foi realizada uma discussão abrangente que envolveu os
gestores públicos, os professores universitários e artistas. Os docentes pesquisadores das
universidades brasileiras, organizados na Associação Brasileira de Pesquisa e Pós
Graduação em Artes Cênicas, ABRACE, criada em 1998, participaram ativamente deste
debate inclusive indicando um representante da área teatral para o Ministério da
Educação. O I Congresso,
(...) em setembro de 1999, revelou o crescimento da área de Artes Cênicas no ambiente
universitário brasileiro, desde a implantação dos primeiros cursos livres nos anos 40 e 50, dos
cursos de graduação nos anos 60 e do lento processo de criação dos cursos de pós-graduação a
partir dos anos 70 (ABRACE, 2020).
O debate resultou na publicação das diretrizes curriculares nacionais para os cursos
superiores de Teatro no Brasil86 em 2004. "Nestas diretrizes curriculares os saberes
corporais estão indicados como competências e habilidades de “domínio técnico e
expressivo do corpo visando a interpretação teatral”, são também abordados na
apresentação do perfil desejado do profissional formado em Teatro como linguagem a
ser construída.
Art. 3º O curso de graduação em Teatro deve ensejar, como perfil desejado do formando,
capacitação para a apropriação do pensamento reflexivo e da sensibilidade artística,
compreendendo sólida formação técnica, artística, ética e cultural, com aptidão para construir
novas formas de expressão e de linguagem corporal e de propostas estéticas, inclusive como
No âmbito do ensino superior, existem no Brasil, 54 instituições que oferecem cursos de Teatro,
nas diversas modalidades de graduação e pós-graduação, totalizando uma oferta de 107
cursos/habilitações (Brito, 2011, p. 158).
86
458
elemento de valorização humana e da auto-estima, visando a integrar o indivíduo na sociedade e
tornando-o participativo de suas múltiplas manifestações culturais (Resolução CNE/CES n.º 4).
O trabalho corporal é considerado como Conteúdo Específico dentro do qual é indicado,
entre outros, os estudos de diferentes formas de expressão corporal. No tratamento dado
aos estágios supervisionados o trabalho corporal é ampliado para além de linguagem e
expressão, uma vez que a inclusão do “domínio dos princípios cinesiológicos” é
indicada.
§ 1º O estágio de que trata este artigo poderá ser realizado na própria Instituição de ensino
superior, mediante laboratórios que congreguem as diversas ordens correspondentes às diferentes
técnicas de produção coreográficas das Artes Cênicas, do Espetáculo Teatral, da Dramaturgia, da
Encenação e Interpretação Teatral, do domínio dos princípios cinesiológicos, revelando
performance, expressão e linguagem corporal, com a atuação em espaços cênicos e com a
execução de outras atividades inerentes à área do Teatro (Resolução CNE/CES n.º 4).
Por fim, as diretrizes indicam, que o egresso do curso deve ter “capacidade de auto
aprendizado contínuo, exercitando procedimentos de investigação, análise e crítica dos
diversos elementos e processos estéticos da arte teatral” (Resolução CNE/CES n.º 4).
Sem desconsiderar as falhas, obstáculos e a complexidade da implantação dos cursos de
nível universitário de Teatro, Antônio Machado destaca como ponto positivo o
desenvolvimento dos estudos teatrais no ensino superior.
Em que
pesem todas as deficiências e
percalços, a
implantação dos cursos de
nível
universitário possibilitou aos estudos teatrais no Brasil um notável salto qualitativo. O
aprofundamento do conteúdo das disciplinas, a disseminação das pesquisas acadêmicas, a
conseqüente
ampliação
da
bibliografia
em
língua
nacional,
o aprimoramento da
qualificação docente (com muitos mestrados e doutoramentos nos melhores
centros
internacionais), a institucionalização acadêmica de áreas do saber antes relegadas a segundo
plano (como cenografia e teoria do teatro) foram algumas das conquistas mais evidentes
(Mercado, 1998, p. 69 apud Brito, 2011, p. 155).
Percebe-se, portanto, uma mudança qualitativa na abordagem dos estudos do corpo
desde a concepção dos cursos técnicos de teatro até o crescimento do número de cursos
de graduação e a implantação e amadurecimento da pesquisa acadêmica em Teatro, no
Brasil, que deu visibilidade ao trabalho de corpo dentre as práticas de ator. O assunto foi
459
tema central do VIII Congresso da ABRACE, realizado entre 31 de outubro e 4 de
novembro de 2014, em Belo Horizonte, no Campus Pampulha da Universidade Federal
de Minas Gerais. O tema “Arte, corpo e pesquisa na cena: experiência expandida”,
propôs a apresentação de pesquisas, conferências, mesas redondas e debates para
“pensar sobre o corpo como acontecimento nas artes da cena e na pesquisa: abrigo
poético de convívio e sociabilidade”. Mais de 800 pesquisadores, pós-graduandos e
graduandos estiveram presentes, sendo 693 trabalhos apresentados pelos sócios
(ABRACE, 2020).
2. Metodologia da prática como pesquisa
Ao discutir a relação entre a reflexão teórica e a pesquisa prática desenvolvidas nas
universidades brasileiras, Paulino (2008) aponta que as pesquisas que investigam os
textos e as encenações enquanto obra artística no campo da semiologia, sociologia,
antropologia, história e filosofia deixam lacunas para a compreensão e o avanço do
conhecimento teatral, especificamente o conhecimento dos processos de criação e
realização destas obras, ponto fundamental para o fazer teatral. Os pesquisadores das
artes da cena têm investido na reflexão sobre metodologias, especialmente considerando
a necessidade de aprofundar o conhecimento dos processos de criação e de formação no
campo do teatro. O avanço das pesquisas para preencher essas lacunas se dá por meio
do desenvolvimento de investigações do teatro como prática dentro das universidades.
Esta metodologia que investiga a prática do fazer teatral tem também sido utilizada para
investigar a prática docente. Januzelli (2003, p. 42 e 43) afirma que a metodologia da
prática como pesquisa considera que a tarefa de ensinar leva à reflexão e à organização
do conhecimento prático.
A pesquisa em desenvolvimento apresentada neste artigo é intimamente associada com
a docência e trata dos conteúdos e procedimentos desenvolvidos nas aulas de corpo,
como são informalmente chamadas pelos professores as disciplinas Consciência
Corporal, Expressão Corporal e Corpovoz. Estas disciplinas do Curso de Teatro da
Universidade Federal de Uberlândia (UFU) têm por objetivo criar a base para o
“domínio técnico e expressivo do corpo visando a interpretação teatral”; dar subsídios
para o desenvolvimento de “aptidão para construir novas formas de expressão e de
linguagem corporal e de propostas estéticas, inclusive como elemento de valorização
humana e da auto-estima”; estudar diferentes formas de expressão corporal; desenvolver
conhecimento teórico e prático capacitando o estudante a desenvolver laboratórios nos
460
quais é aperfeiçoado o “domínio dos princípios cinesiológicos, revelando performance,
expressão e linguagem corporal” (Resolução CNE/CES n.º 4).
A elaboração das aulas destas disciplinas, bem como as ementas, conteúdos,
procedimentos e modos de avaliação, foi realizada conjuntamente às atividades de
gestão87, no período de 2003 a 2016, com destaque para a Coordenação do Curso (2003
a 2005) durante o processo de reconhecimento do curso junto ao Ministério da
Educação. Este contexto, no qual a prática docente se desenvolveu, permitiu um olhar
para o curso como um todo, ao mesmo tempo em que as especificidades das aulas eram
propostas.
No mesmo fluxo de trabalho, a participação na Associação Brasileira de Pesquisa e Pós
Graduação em Artes Cênicas, desde 2000, permitiu o diálogo com outros professores
pesquisadores responsáveis pelo ensino-aprendizagem de movimento e expressão
corporal em diferentes universidades do Brasil e uma na Argentina. As trocas de ideias
e informações se fizeram transversalmente às atividades oficiais dos congressos
bianuais, entre um grupo de professores que se autodenominou “Los Corporales”, pela
presença do Prof. Dr. Martin Rosso da Universidade de Buenos Aires, Argentina. As
conversas giravam em torno das fichas de disciplinas, onde são definidos objetivos,
conteúdos, procedimentos, avaliação e bibliografia. Falávamos de métodos, referências
e práticas durante os intervalos entre as atividades formais dos congressos. O que
encontramos em comum foi a formação de cada um e a prática artística e pedagógica
como norteadoras das propostas docentes.
A presente pesquisa se debruça sobre as escolhas e a sistematização do fazer docente
com
base na trajetória institucional, na formação em dança, na experiência do
conhecimento somático desenvolvida na prática artística, na vida pessoal e na
experiência docente. Este caminho formativo continuado direcionou as abordagens
propostas nas disciplinas, criadas e ministradas no bojo do Curso de Teatro da UFU. As
disciplinas de Consciência Corporal, Expressão Corporal e Corpovoz que formam a
estrutura básica para a organização de uma pedagogia corporal e que têm como proposta
metodológica o desenvolvimento de um processo de transformação que parte da
Coordenação da comissão de elaboração do Projeto Pedagógico implementado em 2005; presidência do
colegiado de curso que promoveu o reconhecimento do curso de teatro junto ao Ministério da Educação
em 2004; participação como integrante das comissões das reformulações do Projeto Pedagógico do curso
de teatro nas versões implementadas em 2006, 2010 e 2017; coordenação da comissão que elaborou o
Projeto de Criação do Curso de Dança em 2008 e 2009; Diretora da Faculdade de Artes, Filosofia e
Ciências Sociais da UFU em 2010; presidente da comissão que elaborou o Regimento do Instituto de
Artes; Direção do Instituto de Artes no período de 2011 a 2016.
87
461
observação do próprio corpo por meio da experiência. “Ternas: uma pedagogia corporal
para as artes” é o título da pesquisa em andamento.
3. Soma, uma perspectiva integral e integradora do corpo
Escolhemos uma abordagem de trabalho corporal para direcionar a proposta docente.
Consideramos um fator importante para essa escolha oferecer ao estudante orientações
para adentrar no campo da experiência. A experiência permite o desenvolvimento do
conhecimento do próprio corpo de modo a descobrir novas formas de expressão e de
linguagem corporal. Na perspectiva da educação, esse conhecimento corporal envolve
práticas transformadoras de si que têm potência de serem criadora de propostas estéticas
próprias numa perspectiva de valorização humana e de cultivo da auto-estima. Tratamos
aqui da abordagem somática que aciona um conjunto de conhecimentos teórico-práticos
em que corpo, mente e cultura são parte da inteireza humana. De acordo com
Shusterman,
Precisamos pensar cuidadosamente através do corpo de modo a nos cultivarmos e a edificar os
nossos estudantes, porque a verdadeira humanidade não é um dado genético, mas uma realização
educacional na qual o corpo, a mente e a cultura devem estar completamente integrados
(Shusterman, 2011, p. 7).
A pessoa humana é um processo em rede, complexo e interconectado nas dimensões
corporal, cognitiva, psicológica, social. O corpo enquanto materialidade é, dentre as
dimensões interconectadas, “[...] a mais apta para catalisar a globalidade das
transformações” (FORTIN, 1999, p. 44). Por estar interconectadas, as transformações
acontecem também em rede, na complexidade somática. Esta materialidade de si, diz
respeito à percepção do próprio corpo. Percepção tanto das sensações de tato, pressão,
luz, temperatura, tônus, quanto do discernimento das emoções como estados físicos e do
reconhecimento dos padrões mentais dos pensamentos, da memória, da imaginação.
Para esta concepção de materialidade do corpo estudamos os escritos de António
Damásio que norteiam o entendimento da materialidade das sensações, da memória, do
pensamento e das emoções; e a relação desta percepção de si com os movimentos.
Um desafio da pesquisa das Ternas que investiga o trabalho corporal para formação de
atores e atrizes é avançar no entendimento desta materialidade na direção do
462
aprimoramento da noção da forma do corpo. Melhorar a percepção da localização do
corpo no espaço, das posições das partes do corpo, da qualidade do tônus das ações, e
gerar no praticante a noção da forma do próprio corpo. Esta noção diz respeito também
à habilidade mimética. A terceira perspectiva é a mais própria das artes da cena e a mais
distante da dinâmica específica das práticas de educação somática. Um dos objetivos
das Ternas é levar a materialidade somática a alcançar o corpo cênico, o corpo
performativo, com o propósito de relacionar a percepção de si e da forma com a
percepção da comunicação e com a relação com o público.
4. Objetivos
A pesquisa tem como objetivo organizar os conhecimentos desta pedagogia
incorporada, acumulados na prática docente, em materiais didáticos que fiquem
disponíveis para atores, atrizes, professores e professoras de Teatro. A finalidade desses
materiais que estão em elaboração é dar suporte ao professor formado nos cursos
universitários para trabalhar com seus alunos na perspectiva somática. A Educação
Somática é um campo de conhecimento altamente especializado, estruturado em
formações que implica em investimento pessoal de um valor monetário incompatível
com o salário de professor.
Outra intenção da pesquisa é contribuir para a formação continuada de atores e atrizes.
Os materiais estão sendo elaborados para orientar o treinamento corporal para teatro a
fim de contribuir com o ofício de ator no sentido de cooperar no aumento da autonomia.
Concordamos com Tuisku quando ele analisa as pedagogias corporificadas que são
baseadas na consciência corporal.
Nessa perspectiva a atuação passa a ser atividades que o ator tem condições de regular. O
aumento da agência do ator, por sua vez, significa, ao mesmo tempo, efeito diminuído da opinião
subjetiva do professor / diretor. Isso é crucial em relação à ética do treinamento A noção de
reflexividade e a ênfase na auto-agência foram trazidas à tona na discussão internacional do atual
treinamento de atores (Tuisku, 2017, p. 31).
5.Distração e Níveis de Consciência
O conhecimento do corpo é oculto em processos orgânicos de percepção. Temos
aparatos sensoriais que nos informam regularmente sobre posições, movimentos, fluxos
463
e tônus corporais. São muitas informações, mais do que a consciência permite se
atentar. Então, apenas parte das informações são conscientes, a maior parte delas fica
encoberta. Damásio chama este ocultamento de “distração”.
Às vezes usamos nossa mente não para descobrir fatos, mas para encobri-los. Usamos parte da
mente como uma tela para impedir outra parte de perceber o que se passa em outro lugar. Esse
encobrimento é necessário e intencional - não tencionamos confundir o tempo todo - mas, de
propósito ou não, para todos os efeitos há uma tela que oculta (DAMÁSIO, 2000, p. 49).
As Ternas utilizam estratégias para lidar com a distração nas aulas de Teatro. São
modos de manter a atenção somática e, acreditamos com isso, melhorar a concentração
e o envolvimento na cena e desenvolver a presença cênica. Shusterman (2012, p. 98 a
101) contribui para este trabalho ao nos apresentar quatro níveis de consciência. O mais
genérico relacionado com os “modos primitivos de apreensão dos quais não estou de
modo algum conscientemente apercebido, mas que Merleau-Ponty parece atribuir à a
nossa intencionalidade corporal mais básica” (Meira, 2019, p. 171). O segundo que
pode ser aproximado com o estado de vigília cotidiana que Shusterman descreve como
“percepção consciente sem apercebimento explícito” e Merleau Ponty chama de
“consciência primária” (Shusterman, 2011, p. 99). Shusterman explica o terceiro nível
da consciência afirmando que “nesse nível, que Merleau-Ponty considera o nível das
representações mentais, já se pode falar de percepção somática explicitamente
consciente ou observação somaestética” (Shusterman, 2012, p. 100). Nas atividades das
Ternas este terceiro nível é experimentado como a consciência da cena, chamado por
Shusterman de observação somaestética. Este estado leva o praticante a estar conectado
com suas próprias sensações e ao mesmo tempo com os companheiros de cena e os
outros elementos expressivos como sonoridades, visualidades e objetos. Já o quarto
nível é o estado adequado para os estudos somáticos propriamente ditos. Nele o
praticante está focado na percepção sutil do próprio corpo e está consciente desta
concentração.
6. A natureza humana
A noção de humanidade é invocada para designar excelência moral e racionalidade que
não são encontradas em outras espécies de seres vivos. Entretanto, esta mesma noção de
humanidade é convocada a desculpar e descrever os defeitos de ações e sentimentos.
464
Para além das vulnerabilidades, os hábitos corporais, incluindo hábitos de sentir que
têm raízes corporais também, inscrevem em si as normas sociais e os valores éticos. O
poder dessas normas e valores são, então, mantidos sem a necessidade de leis ou de
reflexão (Shusterman, 2011, p. 114).
Qualquer desafio com sucesso da opressão deve então envolver o diagnóstico somático dos
hábitos do corpo e dos sentimentos que expressam essa dominação para que estes, juntamente
com as condições sociais opressivas que os geraram, possam ser ultrapassados (Shusterman,
2011, p. 114 e 115).
A filosofia ocidental constitui uma base para o sentimento de desvalorização do corpo.
Reúne argumentos com os quais entende o corpo como um ponto fraco do ser,
considerando a percepção como uma condição enganadora na relação com a realidade.
Qualifica o corpo como instrumento que deve ser desenvolvido para melhor servir a
mente e o espírito, deixando o conhecimento somático num plano inferior à abstração e
à ciência. Esta desqualificação do corpo, juntamente com as ambivalências que o corpo
anuncia por meio da existência em si, são razões que levaram a educação humanista a
negligenciar o conhecimento somático. Em contrapartida, a abordagem somática
determina um ponto de vista centrado no corpo, no corpo de quem sente e pensa, no
corpo vivido, o corpo do “eu”. Esta perspectiva somática indica uma característica da
pedagogia corporificada que é proponente de processos de experiência em que cada
estudante é o centro de seu ponto de vista. Como observa Larossa (2002), a experiência
não pode ser ensinada. O professor desenvolve uma ação pedagógica corporificada
como um facilitador de processos de experiência.
7. As experiências docentes - sistematização de conteúdos e procedimentos
Em 2017, foram ministradas sete disciplinas88, entre graduação em Teatro, graduação
em Dança e pós graduação, que formaram a base para a sistematização dos modos e
Práticas Teatrais II (oitavo período do Bacharelado em Teatro, na disciplina a docente realizou a
direção corporal e a pesquisa de movimentos dos atores no processo de montagem do espetáculos Terapia
Lagartixa); Expressão Corporal I (segundo período do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro,
disciplina ministrada para duas turmas nos turnos integral e noturno); Educação Somática II (terceiro
período do Bacharelado em Dança); Tópicos Especiais em Estudos do Corpo (disciplina optativa do
Curso de Mestrado Acadêmico em Artes Cênicas, com a participação de um mestrando do Programa de
Pós Graduação em Educação e uma mestranda do Programa de Pós Graduação em Artes Visuais);
88
465
conteúdos que formam a proposta pedagógica das Ternas. As disciplinas foram
anotadas aula a aula, foi feita uma análise de conteúdo que apontou oito tópicos nos
quais se distribuem os temas e as práticas que se tornaram as diretrizes da pesquisa, são
eles, Enraizamento, Alinhamento, Abraço, Espaços Internos, Sonoridades, Rosto, Pele e
Apoios e Projeções.
Foram ministradas concomitantemente disciplinas na Graduação em Teatro,
bacharelado e licenciatura, primeiro, segundo, sexto e oitavo períodos; na Graduação
em Dança, terceiro período; na Pós Graduação em Artes Cênicas. Foram disciplinas que
trabalharam a introdução aos estudos do corpo em Teatro e a relação entre a percepção
do corpo e a cena em três aspectos: encenação, performance individual e texto
performativo.. A organização das oito Ternas contém os temas e as práticas
desenvolvidas no conjunto das disciplinas, considerando, assim, os diferentes estágios
do conhecimento na formação do artista da cena e propostas distintas de criação
performativas e cênicas. Com esta abordagem espera-se que o conhecimento construído
na investigação das Ternas seja amplo e possa ser usados em diferentes propostas
pedagógicas e atividades práticas, tanto na formação do atuante quanto na atividade do
professor de teatro.
O conhecimento somático mobilizado nas aulas tem suas referências em Eutonia de
Gerda Alexander; Método Feldenkrais, com ênfase na estrutura óssea; Técnica Klauss
Vianna, com ênfase nas direções ósseas no espaço; Método Ivaldo Bertazzo, com
destaque às influências da coordenação motora de Beziér e o trabalho com a resistência
muscular; e a Sensopercepção de Patrícia Stokoe. Dialoga com Rudolf Laban,
especialmente com as noções de espaço, tempo, força e fluência. Esse conhecimento é
ainda enriquecido por leituras sobre as biografias e estudos dos chamados pioneiros da
Educação Somática, especialmente Mabel Todd, Frederick Matthias Alexander e Ida
Rolf.
A proposta das Ternas, organizada em oito temas diretrizes foi, durante três semestres, a
base do planejamento e da realização de disciplinas e atividades de pesquisa com grupos
de estudantes, professores e integrantes da comunidade. Foi mantida, também, a
diversidade de aplicação das atividades e temas tanto na formação de estudantes de
bacharelado e licenciatura em teatro, quanto para processos de criação em artes cênicas.
Neste período, primeiro e segundo semestres de 2018 e primeiro semestre de 2019,
Interpretação / Atuação IV (quinto período do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro); Consciência
Corporal (Primeiro semestre do Bacharelado e da Licenciatura em Teatro).
466
foram oferecidas89 quatro disciplinas na graduação, sendo duas introdutórias e duas
relativas a um processo de criação a partir da recriação da história de um livro.
Simultaneamente dois processos com grupos de pesquisa foram desenvolvidos tendo as
Ternas como foco de trabalho.
As atividades desenvolvidas no estágio pós doutoral, na Universidade de Évora, utilizou
as Ternas para planejamento e realização de duas disciplinas, a saber, Teatro Físico e
Atelier de Dramaturgia Portuguesa. Esta última disciplina, desenvolvida no contexto da
pandemia do Covid19, foi a primeira experiência de utilização do material pedagógico
sem encontros presenciais. A orientação da pesquisa de movimento para criação de
personagens e treinamento para atuação foi toda realizada por meio de cinco Estudos
Dirigidos.
8. Resultados parciais da pesquisa
A realização das disciplinas e experimentos de pesquisa seguindo a sistematização das
Ternas desde 2017 permitiu a observação e a reflexão da prática com o objetivo de
determinar as noções teóricas e as atividades definidoras da pedagogia das Ternas.
Desde então, as aulas e atividades de pesquisa realizadas têm seguido esta
sistematização com objetivo de encontrar, definir e/ou criar elementos pedagógicos que
possam servir de base de trabalho para outros professores. Os resultados parciais
apontam um conjunto de elementos pedagógicos e formam um léxico de base para o
diálogo intersubjetivo que permite a reflexão sobre as orientações para o processo
experimental dos estudantes.
Conceitos Corporificados
Os conceitos corporificados são caminhos para desenvolver a percepção. Referem-se a
procedimentos de análise sensorial que auxiliam na aprendizagem da percepção do
corpo e também a elementos de interioridade, experiências que se passam no âmbito da
consciência do sujeito, que possibilitam o diálogo intersubjetivo entre o grupo. Há um
conjunto de materiais coletados por meio de textos escritos pelos estudantes que
Corpovoz I e II (primeiro e segundo semestre da Graduação em Teatro); Práticas Teatrais I e Estágio
Supervisionado em Interpretação/Atuação em Espaços Escolares (sétimo semestre da Licenciatura em
Teatro).
89
467
participaram das aulas que deverão ser analisados para estudar o modo de compreensão
dos conceitos corporificados pelos estudantes. A definição de “foco”, “atenção
somática” e “inventário” como conceitos corporificados foi experimentada na disciplina
Teatro Físico ministrada na Universidade de Évora em 2019, um contexto distinto de
onde foram criadas as Ternas. Foi, portanto, uma oportunidade de reorganizar o modo
de apresentar, praticar e refletir sobre estas práticas e seus conceitos. Apresento a seguir
a definição que foi compartilhada com os estudantes, mantendo o texto utilizado no
material didático e foram a base dos debates e da prática.
Foco
Sentimos o estado corporal e o ambiente que habitamos por meio de um complexo
sistema neurológico que transporta uma enorme quantidade de informações do ambiente
externo e interno do corpo criando comunicação e ações materializadas em
movimentos, dinâmicas metabólicas e padrões mentais ou imagens (Damásio, 2000).
Percebemos um conjunto destes estímulos em “janelas de tempo” por onde tomamos
consciência destes eventos somáticos. Os outros tantos estímulos ficam em estado de
“distração”, que não percebemos. A atenção dedicada a esta “janela” chamamos em
Ternas de “Foco”. O exercício consiste em escolher onde está o foco, “brincando” com
a noção de “distração adaptativa” descrita por António Damásio (2000, p. 46).~
Atenção Somática
A consciência corporal, na filosofia de Shusterman, é o estado de atenção do corpo e
existe em quatro níveis. Os dois primeiros são cotidianos, é com esta consciência que
desviamos de uma pessoa na rua, abaixamos ao passar embaixo de uma árvore sem nos
darmos conta, sem pensar ou prever estas ações. As Ternas propõe práticas para
desenvolver o terceiro nível de consciência, quando reconhecemos explicitamente o
espaço que o corpo ocupa, a tensão muscular em ação, a dinâmica da respiração, a
posição das articulações. Exploramos também nas Ternas a “atenção introspectiva aos
sentimentos corporais”, por meio dos focos de atenção, exercitando o quarto nível de
consciência corporal quando nos concentramos profundamente na percepção somática.
Estes dois últimos níveis constituem práticas em estado de Atenção Somática.
468
Inventário
A percepção do estado do corpo é um exercício; vamos usar uma estratégia da Eutonia
(Alexander, 1989) chamada “inventário” para checar sistematicamente como sentimos o
próprio corpo. Espera-se que com os exercícios a percepção fique cada vez mais clara e
possa ser detalhada tanto no sentir quanto no falar sobre ela. O exercício consiste em
comparar a sensação do corpo antes e depois das práticas. Os “inventários” são
procedimentos da Eutonia que objetivam uma “tomada de consciência corporal
aprofundada”, além de ser um instrumento para aguçar a percepção. (BRIEGHELMULLER, 1999, p. 31).
Com a prática o Inventário passa a ser também uma prática de trabalho corporal. A
prática constante de prestar atenção no corpo durante a atividade cria caminhos pelos
quais o praticante equilibra sua tensão muscular, organiza sua postura e dá espaço nas
articulações. Nesta perspectiva, o Inventário é uma prática ativa. “Os inventários têm
como efeito uma regeneração profunda no organismo e uma melhora funcional”
(BRIEGHEL- MULLER, 1999, p. 31 apud FRANCO, Erika Karnauchovas, 2008, p.
49).
Como já foi dito, a pessoa humana é um processo em rede, complexo e interconectado
nas dimensões corporal, cognitiva, psicológica, social. Na pedagogia das Ternas esta
interconexão é trabalhada por meio da observação de interioridades que são
dinamizadas junto com os movimentos. Além da interdependência do processo motor e
sensitivo, ou seja, além de observar as sensações e os movimentos, nas atividades das
Ternas são propostas observações da memória, da imaginação, da emoção e do
pensamento. Nesta diretriz pedagógica fica evidente a perspectiva fenomenológica, em
outras palavras, o movimento é trabalhado tanto na sua exterioridade quanto nas
interioridades. O que acontece no campo subjetivo é observado, verbalizado e
compartilhado em palavras oralizadas e escritas. Além de servir como temas para
observação de si e para estabelecer um diálogo intersubjetivo, as noções de sensação,
memória, imaginação, emoção e pensamento ajudam a organizar o pensamento sobre o
corpo. As referências teóricas a elas relacionadas, as experiências somáticas e a
vocalização da percepção destas noções enquanto acontecimento somático compõem o
conhecimento incorporado.
Conjuntamente aos conceitos norteadores da análise sensorial que contribuem com o
entendimento corporificado das sensações, outras quatro noções constituem o conjunto
469
de Conceitos Corporificados, são parte da experiência do movimento, complementar às
sensações e parte das percepções somáticas.
Memória
Enquanto o trabalho de atuação e interpretação teatral muitas vezes convoca a memória
ou mesmo a memória emotiva para criar sua expressividade, as Ternas convidam os
estudantes a abrir uma escuta somática à memória a partir do movimento realizado a
partir da sensibilização do corpo e da percepção do ambiente. Na pesquisa de
mapeamento das atividades cerebrais, Damásio esclarece que os sinais percebidos pelo
corpo são levados a uma região específica no cérebro responsável pela formação das
imagens referentes àquele sinal, por exemplo, “(...) para os sinais vindos da articulação
do cotovelo, a recepção acontecerá nos córtices somatossensoriais iniciais, nas regiões
parietal e insular, (...) (Damásio, 1996, p. 126)”.
(...) as imagens mentais são construções momentâneas, tentativas de réplica, de padrões que já
foram experienciados, nas quais a probabilidade de se obter uma réplica exata é baixa, mas a de
ocorrer uma reprodução substancial pode ser alta ou baixa, dependendo das circunstâncias em
que as imagens foram assimiladas e estão sendo lembradas. (Damásio, 1996, p. 128).
A experiência do movimento marca um caminho neural que é percorrido novamente
quando acionamos a memória. Esta noção contribui para a compreensão da importância
da realização atenta das atividades, bem como da eficácia da repetição para a
aprendizagem do movimento.
Emoção
A musculatura tônico-gravitacional é responsável pela postura e pela coordenação
motora. A interconexão da emoção com o fundo tônico do indivíduo indica que o
trabalho postural mobiliza as emoções. Para ficar em pé é necessária uma força
muscular que resiste ao desequilíbrio, a musculatura gravitacional. Segundo Godard,
“são esses músculos que registram as mudanças em nossos estados afetivo e emocional”
(Godard, 2002, p. 14). Esta mobilização pode ser consciente ou inconsciente, ou como
define Damásio, esta mobilização pode ficar no campo da distração ou pode vir a ter
470
uma representação mental, que é uma forma de entendimento deste processo emocional.
O praticante de Ternas é estimulado a ficar atento à percepção das emoções.
Imaginação
O estímulo à imaginação, num primeiro momento, é bem diferente das propostas do
teatro de criar um campo imaginário em que as personagens, as performances ou outro
tipo de atuação são construídas. A pedagogia das ternas propõe a observação do emergir
deste campo imaginário a partir do processo sensório-motor. A centralidade é da ação,
da percepção e da materialidade do corpo. O corpo é convidado ao movimento e deste
movimento emerge um campo imaginário. Nos dados coletados da pesquisa, nos textos
e falas dos estudantes, existem indícios de que a experiência do movimento nas aulas
de Ternas evocou ambientes ou situações que nunca foram vividas.
Questões Pedagógicas
Além dos conceitos corporificados, os resultados da pesquisa apontam para questões de
cunho pedagógico. São questões de naturezas distintas que orientam a ação do professor
em sala de aula, no planejamento e no modo de estimular uma experiência abrangente
para os estudantes.
Estado Somático do professor
Ao falar de sua atuação em dar aulas de Feldenkrais, Shusterman (2011, p. 29) destaca
que é preciso se colocar em estado somático a fim de melhor perceber e se comunicar
com o cliente. Na pedagogia das Ternas a experiência somática do professor é também
um fator importante para observar os estudantes e para estar presente e atuante na aula,
percebendo como o grupo está a compreender e realizar a prática proposta. Este estado
somático permite que o professor faça alterações em seu planejamento a fim de melhor
integrar as práticas aos praticantes, e também facilita um estado criativo em que os
movimentos do docente, por exemplo nas improvisações, e seu estado de concentração
possam ser inspiradores, sem necessariamente ser um modelo. Esta prática em conexão
podem ser explicativas ou poéticas.
471
Transferência de aprendizagem
Sylvie Fortin observou em cursos universitários de dança nos EUA, Austrália e Canadá
que existe uma dificuldade dos bailarinos de estabelecer uma transferência de
aprendizagem entre as aulas de educação somática e as aulas de dança. O conhecimento
somático desenvolvido em aulas específicas de métodos de Educação somática como
Feldenkrais, por exemplo, nem sempre são incorporados nas aulas de dança de maneira
espontânea ou automática. Na pedagogia das Ternas a questão da transferência de
aprendizagem é mobilizadora da proposta de desenvolver numa mesma aula os aspectos
somáticos, expressivos e cênicos. Fortin relata que conheceu dançarinos que treinavam
sem nenhum respeito pelo seu corpo e que, uma ou duas vezes por semana, seguiam um
curso de Educação Somática para voltar a uma certa neutralidade. Uma situação similar
foi verificada numa investigação sobre a integração da bioenergética como treinamento
para Teatro. Experimentada em diferentes momentos das atividades de uma atriz, como
treinamento cotidiano, aquecimento para entrar em cena e como exercício de
concentração, a prática da bioenergética foi considerada uma prática de “higiene
somática”, nas palavras da autora, pois servia para ela como uma “limpeza”, como um
caminho de reorganizar seu corpo e de reequilibrar as energias do corpo em atividades
paralelas ao exercício da profissão de atriz (Machado, 2002). As escolhas pedagógicas
da Educação Somática precisam ser recriadas para os objetivos e dinâmicas do trabalho
em Teatro.
Da sala de aula para o cotidiano
O contato com as necessidades e características do estudante inicia um conjunto de
ações que saem da sala de aula para o cotidiano. O processo de transformação de si
efetiva quando passa a fazer parte da vida do estudante. São vários os relatos de
estudantes que mudam o modo de utilizar o corpo em caminhadas, ao andar de ônibus,
de autocarro, ao andar de bicicleta. Há uma alteração na percepção do próprio corpo e
no modo como é feito o movimento. Esta integração é estimulada com propostas
práticas como perceber a pele ao tomar banho; observar a organização das costas ou do
tórax das pessoas que andam na rua; repetir em casa os exercícios de manipulação do
próprio corpo. São procedimentos que objetivam a autonomia do estudante e que
estimulam o protagonismo na apropriação do próprio corpo.
472
9. Considerações finais: uma pequena reflexão sobre a pedagogia corporificada
Mais do que pensar o corpo, as Ternas procuram apresentar um caminho para uma
mudança profunda de pensamento-corpo, de pensamento corporificado, de interconexão
no campo da representação mental, buscando qualificar a experiência e evitar o plano de
distração.
A análise da prática docente por meio da organização das ternas, do planejamento
minucioso das aulas e da escuta dos estudantes com anotação de suas falas e elaboração
de textos, revela uma pedagogia bricoler em que conhecimentos desenvolvidos a partir
de diferentes referências são combinados e recriados constituindo um modo próprio de
colocá-los em ação. Durante os experimentos, foram acrescidas novas referências,
especialmente do teatro, que foram integradas aos conhecimentos somáticos
organizados em Ternas.
Assim se delineia a orientação para os professores de partir da base do trabalho apoiada
no conhecimento já sedimentado e avançar por meio das Ternas enquanto rota de
trabalho que indica o caminho somático e a integração de novos conhecimentos trazidos
por meio de estudos sobre teatro. O desafio da pedagogia das Ternas é combinar
diferentes dinâmicas de práticas que permitam incluir no estudo do movimento a
exploração sensorial atenta com trabalhos em lentidão e os exercícios de exaustão, os
jogos, a contracenação, entre outras dinâmicas. A hipótese para enfrentar este desafio é
o trabalho de alternância da atenção somática entre os níveis três e quatro de
consciência. O que provavelmente irá resultar em novos conceitos corporificados e
questões pedagógicas.
10. Referências bibliográficas
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Cênicas.
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474
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475
24.EDUCAÇÃO FINANCEIRA COMO CÓDIGO DO CAPITAL
INTELECTUAL NO ENSINO MÉDIO
Cássia do Carmo Pires Fernandes90, João Coelho de Alvarenga e Melo 91, Ana Flávia
Mayrink92, Edmar Jesus Pena de Souza93, Igor de Assis Basílio Corrêa94 & Sibele
Leandra Pena Silva95
Resumo
Em um contexto socioeconômico marcado nos últimos anos pelo aumento da oferta de
crédito e pela diversificação de condições de pagamento, evidencia-se por um lado a
movimentação da economia com o acesso das classes menos favorecidas a produtos e
serviços e por outro lado o endividamento e a inadimplência do consumidor. Diante da
relevância dessa problemática, a educação financeira integra a nova Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) a ser implementada em todas as escolas do país.
Coincidindo com a BNCC, o presente trabalho é resultado de um Projeto de Ensino
sobre educação financeira desenvolvido em 2019 no Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG), Campus Ponte Nova. Os objetivos
consistiram em apresentar aos discentes conhecimentos básicos sobre educação
financeira, bem como delinear um perfil socioeconômico dos cursistas e avaliar os
efeitos das oficinas do Projeto. A metodologia envolveu estudos semanais para
fundamentação teórica dos quatro bolsistas que ministraram oficinas mensais para um
grupo de 40 discentes inscritos e a produção de conteúdo para rede social. Para
conhecer o público-alvo e seu contexto familiar, foi realizada uma avaliação diagnóstica
na qual identificou-se que os conhecimentos em educação financeira representavam
uma fragilidade dos núcleos familiares dos cursistas. Na avaliação final do projeto,
Doutora em Educação, Docente no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas
Gerais (IFMG) Campus Ponte Nova. Orientadora do Projeto de Ensino Educação Financeira.
cassia.pires@ifmg.edu.br.
90
91
Discente do Curso Técnico Integrado em Informática do IFMG Ponte Nova. Bolsista do Projeto
Educação Financeira. joao.cjmelo@gmail.com
92
Técnica em Administração pelo IFMG Ponte Nova. anaflaviamayrink21@gmail.com
93
Técnico em Administração pelo IFMG Ponte Nova. edmarsouza966@yahoo.com
94
Discente do Curso Técnico Integrado em Informática do IFMG Ponte Nova.
igor.assis.ifmg@gmail.com
95
Doutoranda em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Viçosa/MG. Docente no IFMG
Campus Ponte Nova. Coorientadora do Projeto Educação Financeira. sibele.penna@ifmg.edu.br
Nosso agradecimento a Pró-Reitoria de Ensino do IFMG pelas bolsas concedidas aos discentes que
atuaram no Projeto de Ensino Educação Financeira e ao Campus Ponte Nova pelo apoio institucional.
476
outro formulário foi enviado, sendo destacadas pelos respondentes suas aprendizagens e
aspectos positivos da organização das oficinas e da atuação dos formadores/bolsistas.
Por fim, projetos como este promovem o conhecimento em educação financeira como
um “código do capital intelectual” para os jovens do ensino médio, estimulando novos
comportamentos de organização financeira e sua multiplicação nas famílias e
comunidades.
Palavras-chave: Educação Financeira. Ensino Médio. Oficinas. Ensino por pares.
Capital intelectual.
1. Aspectos introdutórios
No Brasil, a educação financeira como política pública tem seu histórico tardio,
marcado por disputas e descontinuidades. Em 2004, o Projeto de Lei nº 3.401 (autoria
do Deputado Federal Lobbe Neto) dispunha sobre a criação de uma disciplina específica
e posteriormente (PL nº 171/2009) a integração do tema Educação Financeira no
currículo da disciplina de Matemática. Contudo, as propostas foram rejeitadas e
arquivadas por tal competência ser responsabilidade dos entes federativos em regime de
colaboração (Art. 9º, inciso IV, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9394/1996). Já em 2010, foi instituída a Estratégia Nacional de Educação Financeira
(ENEF) “com a finalidade de promover a educação financeira e previdenciária e
contribuir para o fortalecimento da cidadania, a eficiência e solidez do sistema
financeiro nacional e a tomada de decisões conscientes por parte dos consumidores”
(Art.1º, Decreto Federal n. 7.397/2010). Para fomentar as ações da ENEF também foi
instituído o Comitê Nacional de Educação Financeira-CONEF, que, a despeito do seu
papel, foi revogado recentemente pelo Decreto Nº 10.087, de 5 de novembro de 2019.
Representando a sociedade civil/mercado financeiro no extinto CONEF, quatro
organizações criaram a Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF –Brasil96) e
ainda continuam promovendo programas de capacitação de professores, produção de
material didático, games, vídeos, entre outras iniciativas e tecnologias sociais incluindo
outros públicos - não cabe aqui uma análise dos conteúdos produzidos pela AEF.
ANBIMA – Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais; B3 – Brasil,
Bolsa, Balcão; CNSeg – Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e
Vida, Saúde Suplementar e Capitalização; e FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos
96
477
De modo específico, o currículo escolar previa a abordagem facultativa da
educação financeira como tema transversal “Trabalho e Consumo” nos Parâmetros
Curriculares Nacionais de Matemática (PCN’s) (BRASIL, 1997). Com a homologação
da Base Nacional Comum Curricular - BNCC em dezembro de 201897, a educação
financeira assume caráter obrigatório entre 15 Temas Contemporâneos Transversais, a
ser desenvolvida em todas as escolas do país de forma integradora (Brasil, 2017).
A necessidade de incluir a temática nas escolas se deve a constantes crises
econômicas no país, a ausência de uma cultura de consumo consciente, de planejamento
financeiro, de saber poupar e investir que, consequentemente, leva ao endividamento,
inadimplência e comprometimento da saúde financeira individual, familiar e do sistema.
Uma pesquisa da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (2018) revela que a
educação financeira nas salas de aula pode gerar impacto significativo na organização
financeira das famílias, apontando que 70% dos estudantes que participam de estudos
sobre a temática ajudam os pais a comprar de forma consciente.
Para fins de conceituação, segundo a OCDE (2005, p.13), educação financeira
é
o processo mediante o qual os indivíduos e as sociedades melhoram a sua compreensão em
relação aos conceitos e produtos financeiros, de maneira que, com informação, formação e
orientação, possam desenvolver os valores e as competências necessários para se tornarem mais
conscientes das oportunidades e riscos neles envolvidos e, então, poderem fazer escolhas bem
informadas, saber onde procurar ajuda e adotar outras ações que melhorem o seu bem-estar.
Assim, podem contribuir de modo mais consistente para a formação de indivíduos e sociedades
responsáveis, comprometidos com o futuro.
Levando em consideração que parte significativa da população brasileira não
teve acesso à educação financeira durante a sua formação acadêmica e que a BNCC está
em fase de implementação, o presente trabalho resulta do Projeto de Ensino “Educação
financeira: consumidores, investidores e empreendedores conscientes e inovadores”
desenvolvido no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais
(IFMG) Campus Avançado Ponte Nova durante o ano de 2019. Os objetivos
consistiram em apresentar aos discentes do Campus os conhecimentos básicos sobre
educação financeira, estimular o raciocínio lógico e reflexivo para lidar com questões
97
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/historico
478
econômicas ao longo de suas vidas, delinear o perfil e noções prévias dos cursistas e
avaliar os efeitos do projeto.
2. Metodologia
O princípio da indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão na formação
acadêmica e nas ações docentes e institucionais balizou a metodologia empregada no
desenvolvimento do Projeto de Ensino, sendo esse delineado em diálogo com ações de
extensão para a comunidade e com as etapas de pesquisa científica, visando assim
promover reflexões no processo de apropriação e produção do conhecimento sobre
educação financeira.
Feita a seleção dos bolsistas, que ocorreu por afinidade temática, aconteceram
reuniões de orientação para: levantamento bibliográfico e de outras fontes; definições e
estudo de temas; planejamento das oficinas com ementas, objetivos e estratégias
didáticas; idealização da marca (identidade visual e slogan); criação de perfil do Projeto
em rede social; e elaboração de questionário para uma avaliação diagnóstica e outra
final via formulário Google Docs.
A opção foi por disponibilizar quarenta vagas para os alunos dos cursos
técnicos
integrados
em
Administração
e
em
Informática,
pensando
no
comprometimento com a qualidade do processo. Com o preenchimento de todas, foi
flexibilizado o atendimento a mais três alunos, contudo, no decorrer do ano letivo e com
outros projetos concomitantes, cerca de 40% dos inscritos não conseguiu comparecer a
todas as oficinas.
O primeiro questionário foi aplicado em maio de 2019, sendo na primeira parte
solicitado um breve perfil do estudante e do nível de escolaridade dos pais, e, na
segunda parte, questões relacionadas aos conhecimentos prévios e ao perfil de consumo
familiar. O questionário final foi disponibilizado em dezembro de 2019 repetindo
algumas questões sobre os conhecimentos em educação financeira com o objetivo de
identificar as mudanças/aprendizagens, e outras questões para avaliar o projeto. As
análises dos dados se deram por procedimentos estatísticos básicos.
479
3. Resultados e discussões
3.1. Perfil dos cursistas
Na apresentação do questionário online com o título “Conversando sobre
Educação Financeira”, foram esclarecidos aos respondentes os objetivos, que a
participação seria voluntária e anônima e que os dados coletados seriam utilizados para
fins exclusivos do Projeto.
No total de 43 inscritos, 58% responderam ao levantamento. O perfil
majoritário aponta idades entre dezesseis e dezessete anos (84%), sendo 72% do sexo
feminino e 28% do sexo masculino. Importante destacar o maior interesse de meninas
pelo Projeto, visto que apesar de ser a maioria da população, as mulheres ainda são
minoria no mundo dos investimentos (Tuchlinski, 2019), e por questões históricoculturais elas assumem papel secundário nos núcleos familiares e ainda se encontram
em situação de desigualdade salarial no mercado de trabalho em relação aos homens.
Portanto, a educação financeira para meninas tem potencial para contribuir com
decisões mais conscientes na vida adulta, promovendo a independência e o
protagonismo financeiro. De modo mais específico, em entrevista para O Estado de São
Paulo (2019), a educadora financeira Luciana Ikedo aponta que
Quando abordamos o tema violência, encontramos ao lado da física e da psicológica a violência
financeira. Muitas vezes as mulheres abrem mão da gestão dos próprios recursos financeiros por
uma questão cultural, por falta de interesse, falta de tempo ou porque naturalmente os homens
assumem esse papel diante de rotinas femininas tão extenuantes.
Sobre a formação escolar das mães ou outra figura materna responsável, os
cursistas disseram que 24% possuem ensino fundamental incompleto, somando esse
percentual às que não concluíram o ensino médio tem-se 48% que não completaram a
educação básica. Já 24% concluíram o ensino superior e 8% cursos de pós-graduação
lato sensu.
Em relação aos pais ou outra figura paterna responsável, os respondentes
indicaram que 24% possuem ensino fundamental incompleto, somando esse percentual
aos que não concluíram o ensino médio (4%) tem-se 28%. Comparando com as mães
480
(20%), o dobro de pais (40%) finalizou o ensino médio, apesar disso, no ensino superior
elas tiveram ligeira vantagem (4%).
Observa-se que uma boa parte do núcleo familiar possui grau de escolaridade
médio, cerca de 60% do total de pais e mães dos cursistas e 44% nível superior, o que
pode facilitar a disseminação de conteúdos sobre investimentos e mercado financeiro.
3.2. Conhecimentos iniciais/avaliação diagnóstica
Entre os inscritos, mais da metade nunca havia participado de debates acerca
de educação financeira e 72% afirmou possuir “pouco conhecimento” na área. Além
disso, 100% dos entrevistados considerava “muito relevante” adquirir conhecimentos a
respeito da educação financeira nas escolas, corroborando a pertinência do projeto.
Nenhum dos cursistas declarou estar muito habituado com a educação financeira e 56%
apontou sentir-se “pouco ou nada familiarizado” com o tema.
Conforme uma pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito – SPC
em 2015, 70% dos brasileiros afirmaram ter dificuldades para controlar as finanças
pessoais. Dentre os motivos para tal, encontram-se a falta de tempo e disciplina, a
preguiça e a carência de conhecimentos sobre como começar a administrar os ganhos e
gastos. Ademais, somente 40% das pessoas declararam sentirem-se seguras controlando
o seu próprio dinheiro.
3.3. As oficinas: estratégia de formação por pares
Considerando a natureza prática/construtiva inerente a uma “oficina” e tendo
em vista que os encontros de formação ocorriam no final da tarde após uma rotina
cansativa de oito aulas, foram planejadas estratégias metodológicas ativas e atrativas ao
público-alvo. O fato dos quatro bolsistas serem colegas de turma dos cursistas facilitou
a aproximação do universo de interesses e da linguagem, delineando um processo de
educativo por pares com potencial emancipatório.
Para organizar as produções de material didático de cada oficina, sistematizouse, a partir do viés pedagógico da proposta, um banco de conteúdos que será
disponibilizado como uma solução educacional a ser sugerida a outras escolas.
481
A primeira oficina foi inspirada no best-seller “Pai Rico, Pai Pobre” e teve o
objetivo de garantir um maior engajamento dos alunos, para que se sentissem motivados
a se dedicarem ao aprendizado do tema educação financeira.
Imagem 1: Oficina 1
Fonte: Rede Social do Projeto.
A segunda oficina denominada “Desvendando o Mercado Financeiro – Parte 1”
teve o propósito de debater conceitos introdutórios e desconstruir ideias que não
condizem com a realidade do mercado financeiro. A ementa abordou os seguintes
tópicos: Introdução a Renda Variável e suas vertentes, Fundos de Investimento x Ações,
Risco x Segurança, Investimento Prático.
Em “Desvendando o mercado financeiro – Parte 2” (Oficina 3) o objetivo foi dar
sequencia aos conhecimentos introdutórios do mercado financeiro para que os alunos
busquem aprofundar e planejar o futuro considerando os conceitos de investimentos
apreendidos. A metodologia foi exposição dialogada e utilização de ferramentas de
simulação. Como atividade à distância, foi solicitada a tarefa de pesquisar sobre a forma
de investimento que mais interessou e destacar alguns pontos práticos sobre a
modalidade escolhida, devendo ser enviada para o e-mail do Projeto até uma data
estabelecida (edufinanceiraifmg@gmail.com).
"Administrando seu capital intelectual" foi tema da quarta oficina que aplicou os
conhecimentos das oficinas anteriores com simulações de investimentos e análise
prática dos mesmos, tendo participação ativa dos cursistas. Ferramentas de
administração pessoal, tributações de investimentos, análise de mercado e simulações,
foram os temas abordados. Assim como em todas as oficinas, ao final eram realizadas
avaliações informais buscando um retorno dos cursistas quanto à metodologia e aos
conteúdos explorados. Os feedbacks eram positivos e desde o primeiro encontro foi
482
apresentada por um grupo a demanda para temas relacionados a investimentos em ações
e por outro grupo a demanda por aspectos sobre consumo e orçamento.
A quinta oficina, “Guia do Orçamento familiar”, se fundamentou em um estudo
de caso fictício elaborado pela equipe do projeto. Os cursistas se organizaram em grupo
e receberam o mesmo caso de uma família com pai, mãe, dois filhos em idade escolar e
informações sobre a renda e as despesas. O objetivo era organizar financeiramente a
vida da família e tirá-los de uma situação de devedores para poupadores e/ou
investidores. Os grupos apresentaram soluções diferentes adotando alternativas
possíveis no cenário apresentado. Cabe destacar que a mesma oficina foi ofertada
durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) do Campus e contou com
a participação de estudantes dos cursos técnicos subsequentes e de pais de alunos. Tal
oportunidade permitiu que pai e filho, por exemplo, aprendessem juntos sobre
ferramentas de organização familiar relacionando sua realidade com o caso fictício.
Imagem 2 - Oficina 5 Guia do Orçamento familiar
Imagem 3 - Oficina SNCT Guia do Orçamento
Fonte: Rede social do Projeto
O Projeto contou também com a colaboração de uma bancária do Sindicato dos
Bancários local que ministrou a oficina “Iniciação financeira na prática”. Foram
apresentados aspectos gerais sobre produtos e serviços dos bancos, além de orientações
sobre como abrir uma conta corrente de maneira simples. A segunda etapa da oficina
consistiu na atividade prática realizada numa agência bancária com o objetivo de
simular operações básicas, como o depósito. A maioria dos cursistas vivenciou a
experiência pela primeira vez.
483
Imagem 4 – Oficina 6 Iniciação financeira na prática
Fonte: https://www2.ifmg.edu.br/pontenova/noticias/projeto-de-educacao-financeira-receberepresentante-do-sindicato-dos-bancarios
3.4. @edufinanceiraif: O Código do Capital Intelectual
Durante o processo de planejamento das ações, a equipe do Projeto decidiu criar
um canal de comunicação que recorresse a estratégias de marketing de conteúdo e de
relacionamento via a rede social Instagram. A primeira etapa foi pensar em um slogan
curto e de fácil memorização que transmitisse aos cursistas qual seria o verdadeiro
objetivo do projeto. Então, partindo da premissa de superar a lógica de formar cidadãos
aptos a lidar com as diversas situações que envolvam o uso de dinheiro, foi ampliado o
foco para que os alunos aprendessem que não devem investir apenas em dinheiro, mas
em conhecimento. Logo, surgiu a expressão “Invista no seu ativo mais importante, o
conhecimento”.
Devido ao limite de vagas das oficinas, a incompatibilidade de horários de
vários estudantes e ao interesse de pessoas externas ao Campus, como forma de ampliar
o acesso aos temas abordados, o perfil do Projeto no Instagram (@edufinanceiraif)
funcionou como uma extensão com postagens semanais, produção e publicação de
vídeos, interações por enquetes e disponibilização do link de uma planilha financeira da
Oficina 5. Essa última, segundo alguns relatos de pais de alunos, se tornou instrumento
de controle de gastos da família.
Os conteúdos para as publicações foram produzidos a partir de pesquisas sobre
assuntos recorrentes do mundo financeiro e notícias do projeto, sendo criados roteiros
para os vídeos e designers criativos.
484
Imagem 5: Perfil @edufinanceiraif
Fonte: Instagram
3.5. Socializando o tema por meio do projeto
O ensino-aprendizagem por pares e a gestão do projeto com a participação
ativa dos bolsistas permitiram alguns destaques, como: a menção honrosa pela
apresentação de banner no Simpósio de Iniciação Científica, sendo uma integrante do
projeto entrevistada para o vídeo institucional do IFMG; a apresentação oral de dois
trabalhos no Simpósio de Integração Acadêmica da Universidade Federal de Viçosa,
com reconhecimento da banca avaliadora; a apresentação de banner e oferta de duas
oficinas na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia do Campus.
Como parte de uma exposição dos projetos de pesquisa, extensão e ensino do
IFMG foi apresentado uma fase deste estudo em 30 de maio de 2019 (#30M) durante o
ato em defesa da educação pública na Praça central da cidade de Ponte Nova,
contribuindo para aproximá-lo da população local. Destaca-se que houve grande
interesse de representantes de outras escolas públicas pelo projeto, evidenciando a
dimensão e o seu potencial de extensão.
485
Imagem 6: Ato em Defesa da Educação
Fonte: https://www2.ifmg.edu.br/pontenova/noticias/mostra-do-ifmg-ponte-nova
3.6. Avaliação final: os efeitos do Projeto nas opiniões dos cursistas
Na avaliação diagnóstica e na avaliação final apresentou-se no questionário
online, entre outras questões, uma mesma indagação: “Sobre seus conhecimentos em
educação financeira, responda:” (opções na legenda)
Gráfico 1 – Conhecimentos iniciais
Gráfico 2 – Conhecimentos ao final do projeto
Fonte: Dados do projeto
A mudança na proporção das cores azul e vermelha do primeiro para o segundo
gráfico ilustra os efeitos dos estudos dos temas, alterando de 4% (Gráfico 1) para
88,9% (Gráfico 2) os que declararam ter “conhecimentos suficientes”.
A respeito das atividades do Projeto, considerando a escala de 1 a 5, sendo 1 o
valor mínimo e 5 o valor máximo, os estudantes apresentaram notadamente uma
percepção positiva:
486
Gráfico 3 - Avaliação do Projeto
Fonte: Dados do projeto
As atividades e tarefas à distância é uma dimensão que precisa ser revista para
uma segunda fase, o que pode ser compreendido pelos intervalos distantes entre as
oficinas e por não haver mecanismos de atribuição de notas, sem obrigatoriedade.
Questionados a respeito de “Como você considera que o Projeto de Educação
Financeira colaborou com sua formação?”, as respostas, não excludentes, revelaram que
“As oficinas me ensinaram novas maneiras de organização financeira” (88,9%), “O
conteúdo das oficinas me ajudou a ser um consumidor mais consciente e um potencial
investidor no mercado financeiro” (66,7%), “Com o conteúdo das oficinas consegui
auxiliar na gestão/organização do orçamento da família” (22,2%) e “Com a ajuda das
oficinas consegui traçar um planejamento para minha vida financeira” (55,6%).
A partir de tais dados é factível avaliar como bem sucedida essa primeira
experiência, atingindo o objetivo de promover a educação financeira na formação
escolar extrapolando o que prevê a BNCC e a lógica de criação de disciplina (PL n.
3.401/2004) ou a restrição como componente curricular no ensino de matemática.
Considerações finais
Em um contexto socioeconômico marcado nos últimos anos pelo aumento da
oferta de crédito e pela diversificação de condições de pagamento, evidencia-se por um
lado a movimentação da economia com o acesso das classes menos favorecidas a
produtos e serviços e por outro lado o endividamento e a inadimplência do consumidor.
Tal cenário demonstra a falta de conhecimentos para o consumo consciente e para uma
relação saudável com o dinheiro. Historicamente os mais pobres possuem menor acesso
ao conhecimento de como alcançar determinados bens e gerar riquezas, perpetuando um
círculo vicioso. Como poupar e investir diante da uberização das relações de trabalho,
do desemprego e da inflação?
Somos campeões em desigualdade social, segundo pesquisa recente da FGV
(2019). Existe um abismo entre os poucos que ganham muito e os muitos que ganham
muito pouco. Para uma família sair da situação de pobreza e alcançar uma renda média
do país sem investimento publico em educação e saúde demoraria cerca de 500 anos,
segundo a OCDE (2018). Portanto, programas da AEF e política curricular nacional
(BNCC) para formação em educação financeira não bastam aos jovens brasileiros, pois
487
não existe empoderamento real pelo capital intelectual se não houver uma
reestruturação do sistema econômico e fortalecimento da educação pública que ofereça
condições menos desiguais.
Considerando que essa mudança macro não ocorra nesta primeira metade de
século, em âmbito micro se insiste, como parte da missão do IFMG, em formar
cidadãos conscientes, críticos, criativos e protagonistas para construir uma sociedade
mais justa e solidária com projetos como este que promovem o conhecimento em
educação financeira para os jovens do ensino médio, estimulando novos
comportamentos de organização financeira e sua multiplicação nas famílias e
comunidades, delineando um processo de educativo por pares com potencial
emancipatório.
Referências bibliográficas
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<http://www.aefbrasil.org.br/>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2019.
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Diário
488
da Câmara dos Deputados, Brasília, DF, 12 maio 2004.
Lobbe Neto, A.A. Projeto de Lei n. 171, de 10 de setembro de 2009. Altera a redação do art. 26
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currículos
de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental e do ensino médio). Diário do Senado Federal,
Brasília, DF, 20 set. 2009.
Tuchlinski, Camila. ( 2019, setembro 24). Educação financeira para meninas promove maior
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https://emais.estadao.com.br/noticias/comportamento,educacao-financeira-parameninaspromove-maior-liberdade-de-escolha-na-vida-adulta,70003021664 Acesso em:
25 de janeiro
2020.
489
25. SOBREVIVÊNCIA ACADÊMICA: SOCIALIZAÇÃO E
EVASÃO ESTUDANTIL NO ENSINO SUPERIOR
Adir Luiz Ferreira98
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Um claro perfil de caráter vem surgindo na sociedade moderna,
aquela pessoa que se revela incapaz de gerir formas complexas
e exigentes de envolvimento social, e portanto se retira. Perde a
vontade de cooperar. Essa pessoa se transforma em um “eu que
não coopera”. (Richard Sennett)
Introdução
Para entender a evasão estudantil no Ensino Superior, poderíamos começar pela
etimologia do verbo evadir, sendo a evasão o resultado, em algumas línguas. No latim,
evadere tem o sentido próprio de sair ou escapar, de algo ou de algum lugar, com o
sentido figurado de ter fim, passar, transpor, atravessar, um período ou local. No
português, evadir-se tem o sentido de evitar ou escapar. No espanhol, se evadir também
significa evitar com habilidade, de um dano ou perigo. No francês, s’évader é escapar
de algum lugar, mas também de uma realidade. No inglês, to evade tem igualmente o
sentido de evitar algo desagradável ou indesejado. Para a pessoa do estudante, a evasão
pode compreender alguns desses sentidos, que estão associados a outras condições
desfavoráveis cotidianas de estudo e convivência, como a socialização insuficiente, o
insucesso acadêmico e a insatisfação com a vida universitária, com o consequente
isolamento social que geralmente antecede à evasão.
O êxito dos estudantes no ensino superior está longe de ser um processo linear
que possa ser caracterizado pela racionalidade do desempenho, ou seja, por um percurso
progressivo e sem falhas graves na sua formação acadêmica, desde o ingresso até a
conclusão no curso. É claro que, nesse caminho, haveria diferentes obstáculos pessoais
e institucionais, em suas formas agudas ou crônicas, como o sentimento de ter sido
injustiçado em algumas avaliações, as dificuldades para conciliar estudos e vida social
ou o estresse causado pela rigidez dos currículos. Contudo, um dos fatores mais
subestimados para o sucesso acadêmico e para a satisfação pessoal é, justamente, o
98
Professor titular na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
490
cotidiano da socialização vivida pelo estudante, na comunidade de pares e nas relações
comuns e extraordinárias com a instituição. Do êxito ou do fracasso desse processo de
socialização acadêmica depende a permanência produtiva dos estudantes no Ensino
Superior, com melhores chances de chegar a bons resultados nos seus projetos de
estudos e de formação profissional.
Mesmo que o bom convívio com colegas não seja sinônimo de sucesso
acadêmico, por causa dos efeitos desestimulantes do isolamento social, quando os
estudantes se afastam do apoio caloroso do grupo de colegas eles esmorecem mais
facilmente e pensam em desistir dos estudos. Assim, devido às durezas emocionais e
acadêmicas do esforço solitário de aprendizagem no ensino superior, as alternativas
individuais também podem ser aquelas que levam à decisão do abandono. Como
conhecimento quase trivial, considera-se que, como em qualquer experiência de
convivência social prolongada, a aprendizagem das formas da socialização seja um
grande desafio para os estudantes novatos. Inclusive, aspectos como o choque do
estranhamento e a importância do apoio social do grupo desde o início dessa
ressocialização acadêmica, em especial com abordagens pedagógicas e psicológicas, já
motivaram vários estudos no Brasil e em outros países (BOYER; CORIDIAN;
ERLICH, 2001; FERREIRA; MOUTINHO, 2007; PRIEST; SAUCIER; EISELEIN,
2016; TEIXEIRA et al., 2008). Entretanto, a adaptação ao meio ambiente acadêmico
não é um problema apenas para os iniciantes no ensino superior, mas sim, um processo
de socialização permanente, do começo ao fim da carreira do estudante.
Ainda que o fenômeno da evasão pertença ao cotidiano das instituições, ele
ainda é visto como um desvio marginal no percurso dos estudantes, para a maioria dos
gestores universitários. Predomina a expectativa do percurso curricular completo com
um fluxo ideal do início ao fim dos estudos. Porém, diante da grande quantidade de
estudantes fora dessa planejada sequência, esse desvio “inesperado” é minimizado, mas
internamente é considerado como um sério problema que perturba a administração. A
representação desses estudantes “desviantes”, contradizendo as expectativas otimistas
dos dirigentes, remete à imagem de produtos falhos na linha de produção fabril das
universidades. São os “desnivelados”, “irregulares” ou “atrasados”: formas de estigmas
sociais para pessoas perdidas e desorientadas em suas trajetórias acadêmicas. As gestões
dos estabelecimentos continuam fazendo análises de fluxo e de produtividade, mas sem
491
saírem da perspectiva enganosa da polarização entre a permanência da maioria e a
evasão de poucos.
Após ingressar no ensino superior, o sucesso acadêmico depende do
investimento em capacidades inéditas de adaptação relativas às condições
organizacionais das instituições de ensino, como das redes de apoio social que devem
ser identificadas e construídas pelo esforço dos próprios estudantes. (FERREIRA, 2014)
Não obstante a importância crucial da socialização acadêmica que deriva da própria
experiência dos estudantes, as instituições continuam fazendo análises de fluxo e
produtividade na perspectiva da polarização entre a permanência e a evasão. Para
explicar esse resultado negativo, quando o estudante não conclui o ciclo de formação
previsto, os argumentos se concentram no aspecto administrativo contábil na visão
simplificada de desempenho curricular insuficiente, atribuído a fatores acadêmicos
tradicionais como o não atendimento às exigências do curso e à incapacidade pessoal do
estudante.
Nesse contexto, a permanência e a evasão são situações sempre relativas e
ambivalentes, com constantes atualizações e momentos críticos coexistindo nas mentes
e nas vivências dos universitários, alternando-se como decisões seguras, angustiadas,
incertas, duradouras, provisórias, ou uma mescla desses sentimentos. Em relação a esses
posicionamentos, as questões sociológicas relacionadas às possibilidades reconstrutivas
e conflitivas dessa socialização integradora e cooperativa têm grande relevância para se
buscar uma melhor eficácia educacional e social da universidade.
Socialização e sobrevivência acadêmica no mundo social do estudante
A permanência ou não no percurso universitário são fenômenos construídos
como objetos intencionais da consciência relacionada aos conteúdos das experiências no
mundo, mais especificamente, no mundo acadêmico, compartilhado com a comunidade
dos atores envolvidos (colegas, professores, técnicos). Na linha de base sociológica,
Alfred Schutz viu na teoria weberiana um vínculo que conectava a fenomenologia à
Sociologia. Todavia, a conduta humana se configura como ação racional, isto é,
inteligível em seus meios e fins para uma compreensão externa, apenas quando e, na
medida em que, a pessoa que age atribui significado e direção significativa à sua ação.
Dessa forma, uma abordagem que se pretenda tanto fenomenológica quanto
492
compreensiva do mundo social deve relacionar essas duas dimensões das condutas
humanas: as perspectivas conscientes sobre as experiências com a racionalidade que
possa ser atribuída às ações significativas pessoais e coletivas, isto é, na direção de
propósitos compreensíveis para si e para os outros. Esse seria o quadro geral que
proponho para uma análise do extenso e diversificado mundo social acadêmico no
convívio cotidiano.
Recorrendo a essas considerações fenomenológicas de Schutz para o estudo do
mundo acadêmico, percebendo-o como campo de expressão da vivência pessoal junto
com as vivências de outros, teríamos uma perspectiva expandida da vida do estudante,
como convívio intencional de consciências, simultaneamente subjetivas e coletivas.
Nessa dimensão ampliada de considerar a vivência com o outro, fica auto evidente que
“não apenas vivencio o próximo, mas também vivo com ele, envelheço com ele, posso
ter em perspectiva seu curso de duração como o faço em relação ao meu”. (SCHUTZ,
2018, p. 219, grifo do autor)
Essa poderia ser uma definição sociológica da vida em comum da experiência do
estudante, como uma comunhão de consciências, em um campo específico de tempoespaço: a convivência em um percurso formativo no ensino superior. Mesmo a ideia do
envelhecimento, como consciência do amadurecimento compartilhado, é uma parte
essencial nas reflexões reconstrutivas sobre a experiência da vida universitária. E isso
não é apenas real para o aqui-agora do sujeito estudante que relata a sua experiência,
mas é reminiscência psíquica inesgotável do estudante que habita o eu do pesquisador,
em especial para a compreensão analítica de experiências alheias em confronto com
aquelas de si próprio.
Então, em uma tentativa de elucidar e relacionar a análise estrutural do mundo
social, de acordo com Schutz (2018), com as perspectivas de apreensão dos estudantes
sobre as próprias experiências no mundo social acadêmico, podemos considerar que elas
são vivenciadas cotidianamente em distintos graus de intimidade. E é nessa vida em
comum que se percebem as consciências como estando integradas ao mesmo mundo
circundante social, a região social da relação convivial direta entre pares estudantes. Em
outro espectro do mundo acadêmico geral, podemos reconhecer outro campo de
experiência possível: a de um mundo social indiretamente compartilhado, que é a
região social dos outros significativos na comunidade acadêmica global. Essa distinção
corresponde à diversidade de consciências sobre o mundo social, bastando dar o
493
exemplo muito comum das perspectivas conflitivas em sala de aula entre professores e
estudantes; a imagem do outro assume para os sujeitos as denominações de
consociados, quando se trata do seu mundo circundante, e de contemporâneos, quando
se refere ao mundo indiretamente compartilhado.
Como regiões sociais diferenciadas no meio ambiente universitário comum, os
cursos típicos de vivência apresentam-se simultaneamente, porém de forma paralela e
ambivalente, como percursos curriculares, na perspectiva das instituições, e como
percursos de convivência, na experiência da vida dos estudantes. Como efeito dessa
ambivalência, a vida acadêmica, em geral, apresenta-se como um fluxo latente de tensão
entre significados, comportamentos e vivências entre ambos, com muitas experiências
rotineiras de normalidade e mesmo de tédio persistente. Com a mesma fluidez tensa,
entre eventos possíveis de resultados produtivos ou insatisfatórios, quando momentos
potenciais se transformam em ameaça manifesta, ocorrem na experiência do ensino
superior muitas situações de conflito aberto e de incerteza sobre a continuidade nos
estudos.
Nesse clima de convivência desigual no mesmo meio ambiente social, onde logo
se destaca a proeminência das estruturas impositivas das instituições sobre os interesses
próprios dos estudantes, eclode, na consciência desses, que eles devem investir em
estratégias de sobrevivência, se quiserem ter alguma chance de êxito em seus projetos
de estudo e formação. Em decorrência dessa percepção, reforça-se também o
reconhecimento da grande importância do convívio com o outro estudante, o consociado
do mesmo mundo circundante social. Mesmo que as motivações para a experiência
convivial sejam geralmente de natureza mais ampla do que os objetivos imediatos de
estudo, a vivência simultânea de significados socioafetivos e de formação profissional
podem ser ambos reforçados nas dores e prazeres da vida cotidiana.
Em estudos feitos sobre a relação com o aprender no ambiente universitário
francês, Saeed Paivandi (2014, 2015) identificou uma tipologia na perspectiva dos
estudantes, que foi organizada em quatro categorias: a perspectiva “compreensiva”, que
atenderia ao perfil esperado de aprendizagem diante das exigências acadêmicas; a
perspectiva minimalista, que, significaria, obviamente a dedicação mínima para atingir
os resultados; a perspectiva de desempenho, representando a categoria de estudantes que
ficariam em uma situação intermediária entre as duas situações anteriores; e, a
494
perspectiva de desengajamento, que seria a dos estudantes em via de marginalização e
eventual exclusão do meio universitário.
Além dessa dimensão da aprendizagem universitária, poderíamos pensar no
contexto mais extenso da socialização acadêmica e comunitária, entre pares e com os
outros atores da comunidade: professores e funcionários. Nos extremos do arco do
percurso de identificação com a universidade, de um lado, encontra-se a situação dos
estudantes que vivenciam uma permanência acadêmica socialmente intensa, produtiva
em novos conhecimentos e engajados no seu projeto de formação; por outro lado,
haveria aqueles estudantes com uma permanência acadêmica reduzida, com desinteresse
crescente pela aprendizagem, desvinculados de projetos de formação, que se sentem
excluídos dos estudos e da convivência comunitária.
Noutro sentido, uma vida cotidiana que seja socialmente sustentável no meio
acadêmico também inclui rituais de civilidade que, muitas vezes, são associados a
modos tradicionais ligados a títulos e comportamentos anacrônicos, como o costume da
turma se levantar à entrada do professor na sala. Todavia, as práticas de respeito mútuo
não se sustentam se forem baseadas em conceitos vagos e abstratos, nem tampouco se
forem apenas preceitos morais inscritos em regimentos. Para serem efetivos, os rituais
de civilidade, nos seus significados de integração social de grupos e pessoas com
características e interesses distintos, eles devem estar definidos como sinais conscientes
da disposição mútua para trocas cooperativas, em que, mesmo na suposição de relações
desiguais, ambas as partes podem, potencialmente, beneficiar-se.
Mas há, igualmente, um componente afetivo da cooperação que é muito comum
na convivência entre estudantes, que oscila entre a contenção por causa dos deveres
escolares e os efeitos destrutivos quando se privilegia desejos egoístas, em detrimento
do grupo. Por exemplo, rituais como “obrigado” e “por favor” podem parecer apenas
formas educadas de linguagem, mas visam igualmente a demonstração de respeito
mútuo. Mas, além disso, a cooperação também se estende a situações muito menos
estruturadas, como nos parecem muitas das conversas triviais que experimentamos ou
observamos em outras pessoas. A cooperação informal, em encontros de amigos e rodas
de conversa, são experiências de prazer que vêm juntas com o convívio social amigável,
sem que as pessoas pensem que estão cooperando nesses momentos, mas que facilitam,
sim, a cooperação formal, presente e futura.
495
Nesses momentos de relaxamento e distensão dos estudantes, nos intervalos das
inúmeras atividades curriculares, ou em locais de encontro fora dos auditórios e das
salas de aula, se compartilham vários assuntos, como fofocas sobre colegas e
professores, dicas práticas para as tarefas acadêmicas, comentários políticos. É quando
as observações críticas são assimiladas com menor resistência, podendo mesmo
provocar reflexões reconstrutivas. Distante desses momentos de confraternização que
possam ser vistos como atos de cooperação informal, o estudante isolado, possivelmente
muito estressado, é o oposto evidente do estudante relaxado, mas que também pode,
ocasionalmente, colaborar nas atividades formais.
Na condição de isolamento no mundo acadêmico, vê-se uma antecipação do
desgaste da confiança na lógica competitiva inerente à concorrência do mundo
empresarial. Todavia, esse efeito social parece mais amenizado no cotidiano da vida
escolar, porque a confiança é constantemente testada e ajustada. Bons colegas são
colaboradores experimentados que não hesitam em colocar na “geladeira” colegas
relapsos, chegando mesmo a romper laços de amizade quando ocorrem falhas graves ou
clara deslealdade na colaboração acadêmica. Porém, nessa perspectiva de colaboração
entre colegas sob forte pressão de desempenho, o trabalho em equipe pode se
transformar em formas de opressão praticadas por grupos demasiadamente coesos e
competitivos.
Na mesma dinâmica da coexistência da cooperação com a competição, existem
situações de colaboração fraca e de comparação odiosa que podem ser vistas na vida
acadêmica nos conhecidos trabalhos de grupo, propostos pelos professores e
rapidamente aceitos pelos estudantes. Mesmo quando não é essa a orientação didática
dos professores, a realização das tarefas não acontece como o planejado pelos
educadores individualistas. Em uma pesquisa que orientei que tinha como campo de
investigação um curso da área de ciências exatas, para as quais a matemática dos
cálculos é a disciplina rainha, soube do relato de um coordenador de curso que afirmou
que não admitia o trabalho de grupos porque a boa aprendizagem matemática só pode
vir de estudos solitários. Entretanto, o relato oposto dos estudantes do mesmo curso é
que eles só aprendiam direito os cálculos quando estudavam em grupo, mesmo que
fosse fora da sala de aula, onde mantinham as aparências da aprendizagem solitária. Na
estrutura das organizações é conhecido o “efeito silo”, por analogia aos imensos silos
para estocagem de grãos que parecem não ter ligação entre si. Mas isso pode resultar em
496
baixa produtividade, pois “os empregados tendem a guardar para si informações vitais
que consideram pessoalmente vantajosas, e o fato de que nos silos as pessoas resistem
ao feedback dos outros”. (SENNETT, 2015b, p. 205)
Em resposta a esse isolamento, a alternativa gerencial é a de que a cooperação
em equipe seja o modo mais eficaz para tratar de problemas, mantendo-se em
funcionamento por períodos de vários meses, tempo suficiente para executar um projeto
bem definido, mas duração insuficiente para os participantes ficarem apegados demais,
o que poderia levar à acomodação e à resistência ao aumento nas metas. Contra essa
tendência gregária e potencialmente versátil dos trabalhadores, as empresas apostam na
volatilidade da cooperação em grupo. Apesar das vantagens práticas dessa versatilidade
do trabalho de equipe, a tendência é de que, com base nesse comportamento, estabeleçase uma cooperação fraca entre os membros do grupo. Essa é a realidade do trabalho
corporativo no capitalismo contemporâneo, com as suas estratégias de negócios em
constante mudança ao sabor dos ventos da economia global, implicando, muitas vezes,
demissões massivas mesmo de equipes cooperativas muito eficazes.
Para a realização das tarefas acadêmicas, com objetivos claros e prazos definidos
semelhantes às empresas, a cooperação também é vista como o método mais eficaz.
Porém, diferentemente da lógica corporativa, a continuidade do convívio na vida do
estudante universitário é, geralmente, de longa duração, o que favorece o surgimento de
vínculos afetivos além do tempo reduzido dos compromissos passageiros. Como
professor, já observei que muitos grupos cooperativos não são flutuantes, formando-se
no início do curso e mantendo-se unidos até os últimos semestres. Contudo, esse claro
exemplo de coesão social de grupo de estudos e convívio, com a qual se forjam mesmo
amizades calorosas, algumas vezes mostram suas falhas quando a confiança entre os
seus membros é corroída pela comparação odiosa.
Assim como acontece no mundo do trabalho corporativo, a sensação da
desigualdade comparada de resultados, real ou imaginária, desgasta as relações pela
própria natureza do processo educacional do ensino superior, que visa à capacitação de
competências, que se constrói como uma referência personalizada e autorreferencial.
Como carga psicológica e representacional deletérias para o convívio com o outro, a
“comparação odiosa baseada na competência tem um efeito particularmente corrosivo
na confiança: é difícil confiar em alguém que consideramos incompetente”.
(SENNETT, 2015b, p. 208) Mas, a comparação odiosa também pode surgir da
497
competição e da inveja social, já que também posso desconfiar de quem considero mais
competente, a sensação de ameaça real pode ser igual, ou até maior, do que diante de
alguém incompetente. Na situação acadêmica, por exemplo, um professor competente
pode ser percebido como tão ameaçador, pela suposta superioridade intelectual, quanto
o mestre incompetente, de quem se espera uma afirmação autoritária compensatória.
Essas formas de comparação odiosa também podem ser aplicadas às relações com os
colegas, sejam elas estritamente acadêmicas ou no convívio social. Porém, quando se
trata de interação com os pares estudantes, há uma evidente diferença na relação de
poder.
Outra possibilidade na vivência das interações sociais, que apenas é funcional no
convívio ser for exercida com muita sutileza, é se adotar um comportamento
cooperativo, mas com cinismo, isto é, mantendo-se uma descrença não declarada diante
do valor social da cooperação. O efeito negativo de se apresentar como um colaborador
cínico é que essa atitude seja identificada pelo grupo como uma forma de solidariedade
fingida. Isso também é uma fonte de desconfiança social, porque revela a
predominância de interesses pessoais maliciosamente ocultos para os parceiros
relativamente altruístas. Logo, a confiança no outro, desde que seja sincera, participante
e experimentada, é a melhor base social para a cooperação autêntica.
Como consequência da ansiedade e da incerteza em permanecer na formação
universitária, há o cenário de alguma forma de resistência ou desinteresse pela
convivência com os pares. Seria esse o estereótipo do estudante solitário que evita o
contato com o outro, mesmo nos momentos de dificuldade, configurando a situação do
isolamento acadêmico. Esse isolamento também configura a personalidade do eu que
não coopera, nas palavras de Sennett “um campo intermediário entre a psique e a
sociedade” (SENNETT, 2015b, p. 219), com esse caráter pessoal dificultando muito as
possibilidades de apoio social para um percurso bem-sucedido. Outros traços entre a
personalidade e o caráter do eu que não coopera seriam a ansiedade na vida social, a
solidão e o narcisismo. Em sala de aula ou fora dela, identificaríamos frequentemente
nesse tipo de estudante, para quem a agitada vida universitária os leva “a se mostrarem
distantes e impassíveis por fora, apesar de fervilhando de estímulos por dentro”.
(SENNETT, 2015b, p. 221)
498
Do relato de uma estudante, a partir da sua vivência no cotidiano acadêmico da
sala de aula, quando comenta sobre o “sumiço” de uma colega, que seria precedido de
uma condição típica do eu que não coopera:
Ela não gostava de fazer trabalhos em grupo e isso afetou o
rendimento dela e isso fazia com que os outros alunos não tentassem
se aproximar. Quando alguém tentava, ela afastava. E esse semestre
ela, simplesmente, sumiu. (MEDEIROS, 2018, p. 74)
Na continuidade desse gradual
isolamento acadêmico haveria, como
consequência lógica, a definição do eu que se retira, associando essa maneira de
desligamento e indiferença social à aparição de sinais premonitórios de abandono
pessoal do convívio acadêmico e de desfiliação institucional. Essa seria a maneira de
preparar uma evasão (a saída definitiva), desde uma autoavaliação social e emocional
em relação ao meio ambiente universitário. Um exemplo desse percurso de retirada é o
relato de um estudante evadido, explicando como essa transição aconteceu na sua vida:
Eu não tinha grupo de estudos, teve um momento que eu não sabia
mais em que período eu estava, sentia que estava deslocado dentro da
UFRN, não tinha muito grupo de amizades, então isto também
dificultou um pouco. (FONSECA, 2020, p. 77)
Assim, entre a colaboração forte, a colaboração fraca, a comparação odiosa, a
solidariedade fingida, do eu que não colabora e até o limite do eu que se retira, dá o
fluxo das experiências do estudante, com as quais se buscaria a sobrevivência
acadêmica. A configuração dessa condição que conjuga as dimensões pessoais e
coletivas do estudante no contexto do ensino superior é um fruto conceitual a partir da
investigação sobre as vivências significativas dos estudantes, sendo assim, é muito mais
uma compreensão fenomenológica da educação do que uma dimensão pedagógica
estruturada e prevista pelas ações institucionais.
A ideia de que a sobrevivência acadêmica também está associada à socialização,
podendo ser relacionada à imagem de um relativo darwinismo social, com a
continuidade seletiva do mais adaptado às adversidades do meio ambiente universitário,
pode parecer demasiado excludente diante da visão democrática atribuída às instituições
do ensino superior público. Deve-se considerar, entretanto, que a própria concepção
contemporânea de democracia, seja na sua matriz liberal ou socialista, legitima a
desigualdade de resultados mesmo com distintas referências sociais para a igualdade de
oportunidades. Ou seja, a seletividade baseada nas capacidades dos indivíduos, conceito
muito distinto daquele de privilégio imanente de grupos ou classes sociais, estaria nos
fundamentos mesmo da democracia moderna. Até mesmo o significado liberal e
499
antiaristocrático da meritocracia representaria o reconhecimento do mérito pelo
desempenho, mas aberto à concorrência igualitária, e não o benefício prévio e desigual
do mérito pela origem social. Aliás, esse tipo de racionalidade democrática permanece
como defesa ideológica das classes médias do estilo norte-americano do self-made man
e das elites burocráticas, técnicas e científicas da administração pública e das grandes
empresas.
Com essa reflexão, poderíamos ver a evasão no ensino superior como marca
frustrante e paradoxal do abandono de um percurso escolar bem-sucedido, pelo menos
até ali. Pois, o sonho se desfez justamente quando se chegou ao Eldorado universitário,
a etapa educacional que representaria a realização do objetivo maior da escolaridade
iniciada ainda na infância. É pensando nessa época da infância que, nos eventuais
resgates em nossas memórias escolares, lembramo-nos da inevitável pergunta com a
qual os adultos, especialmente pais e professores, desafiavam-nos: o que você quer ser
quando crescer? Na maioria das vezes, as respostas que dávamos a essa pergunta se
referia a alguma profissão que incluía, explicitamente, a posse de um diploma
universitário. Sabemos que boa parte das realizações no mundo dos adultos estão na
concretização dos sonhos de infância, ainda mais reforçados ou latentes na
adolescência, servindo assim como bases pessoais de perspectivas e inspiração de
projetos para o resto de nossas vidas. Ao contrário, muitas frustrações na vida adulta são
explicadas pela interrupção, voluntária ou não, de caminhos escolares promissores.
Em outro sentido, mesmo antes do ingresso no Ensino Superior há outros
campos de investigação associados às formas de privilégio que favorecem o acesso à
educação universitária, como é o caso dos fatores prévios e de origem, envolvendo as
condições socioeconômicas e escolares dos estudantes, como a melhor preparação nos
estabelecimentos de ensino médio e as características de favorecimento do capital social
e cultural das famílias. Entretanto, mesmo com a discussão crítica bastante
fundamentada sobre as condições desiguais de acesso, em claro detrimento dos filhos
das classes populares, considera-se equivocadamente que, superada a grande barreira de
ingresso, abre-se um caminho sem dificuldades para a conquista do diploma
universitário, incluindo a ascensão social compensatória.
Todavia, na experiência cotidiana das suas vidas acadêmicas, os estudantes
descobrem que a passagem da condição de novatos para veteranos será extremamente
custosa e desafiadora, antes que eles atinjam o status privilegiado de concluintes. Até
500
chegarem à finalização, a visão de um caminho perigoso e incerto é algo muito mais
coerente do que a enganosa noção de uma permanência linear e sem sobressaltos no
desenvolvimento dos estudos e da formação profissional, desde o ingresso até a
conclusão dos cursos superiores.
Na concepção fenomenológica de Alfred Schutz, o mundo da vida cotidiana
intersubjetiva, o mundo da atitude natural, é movido e orientado por interesses práticos,
que acabam formando um estoque de conhecimentos dessa experiência social,
resultando do seu uso social uma “sedimentação dos significados”. No mundo da vida
acadêmica há evidentemente um significado para os estudantes de um resultado prático
final, a conclusão do curso; todavia, a percepção de outros significados vivenciados na
experiência universitária pode ser mais relevante pessoalmente do que o de atingir a
marca institucional da conclusão do curso.
Nesse quadro de possibilidades no campo perceptivo cotidiano dos estudantes,
as estratégias para a sobrevivência acadêmica, constantemente sob o risco da “morte
curricular”, formam o estoque de conhecimentos decisivos que podem evitar,
compreender ou justificar tanto a permanência como a evasão.
A experiência da socialização de baixo para cima e da socialização de cima para
baixo
Como é bem conhecido na carreira dos professores nas instituições públicas
federais de ensino superior, à tradicional tríade acadêmica de ensino-pesquisa-extensão
se junta os quase inevitáveis períodos em cargos administrativos. Essa outra carreira
acadêmica vai desde coordenações de curso até cargos superiores na administração
universitária, o que para muitos são tempos frustrantes de exaustivas tarefas
compartilhadas, ou são assumidos como tempos ambiciosos de dedicação exclusiva aos
objetivos da gestão. Encaro esses períodos como situações passageiras de exercício da
cidadania acadêmica, guiado mais pelo sentimento de dever, outra maneira de nomear a
sensação de sacrifício pessoal, do que pelo gosto político de transitar na alternância
entre governado e governante.
Contudo, aqueles cargos que envolvem uma relação direta com os estudantes, ou
de mediação entre os professores e os estudantes, podem nos trazer ricos aprendizados
sobre desafios desconhecidos na vida comum dos universitários. E isso é especialmente
501
verdadeiro para quem, como eu, interessa-se pelas dimensões sociológicas da educação,
com uma imensa curiosidade pelos meandros das experiências cotidianas dos
estudantes, muitas delas subestimadas, incompreendidas ou até invisíveis aos olhos dos
professores e da administração universitária. Da minha última experiência como chefe
de Departamento, afortunadamente restrita a dois anos, tempo razoável antes de se
tornar um fardo pesado demais, guardo duas situações que marcaram a minha
sensibilidade às condições de vida dos estudantes.
Em um desses casos, tratava-se de uma estudante de pedagogia, com bom
desempenho em semestres anteriores, mas que à época se encontrava muito próxima do
abandono, já tendo percorrido mais da metade do curso. Seu quadro psicológico de
desistência e de retirada parecia bem avançado. As inúmeras faltas nos componentes
curriculares e o consequente baixo desempenho já comprometiam o seu semestre letivo.
Era uma jovem viúva, tendo seu marido morrido em um trágico acidente de trânsito no
ano anterior, abalroado por um ônibus quando voltava de bicicleta do trabalho. Mãe de
dois filhos pequenos, de origem popular e desempregada, apesar do choque psicológico
e das dificuldades econômicas, tentou se manter no curso para não perder a perspectiva
de um diploma superior, o que lhe daria a possibilidade de um melhor emprego.
Todavia, o desgaste psíquico e o peso dos obstáculos materiais e acadêmicos acabaram
por deixar nela uma sensação de derrota escolar e impotência cognitiva.
Foi esse o relato trazido por um pequeno grupo de colegas mais próximos da
deprimida estudante, que também eram seus parceiros de encontros e de estudos de
longa data. Por causa dos laços de amizade, surgida pelo convívio acadêmico, deram-se
o apelido de “grupo da rosquinha”, representando o pequeno círculo que formavam.
Nesse momento, a solidariedade estudantil moveu o grupo a agir, porque a própria
estudante achava que não tinha mais esperança de salvação, tendo comentado com
amigos até mesmo planos de suicídio. E se não fosse a iniciativa do restante do grupo
em procurar a ajuda da chefia do Departamento, a administração e os professores não
teriam conhecimento do grau extremo de dificuldades da estudante.
Provavelmente devido ao preconceito e estereótipo relacionado ao estado de
depressão, mesmo com os sinais de estresse emocional e isolamento, com muitas e
frequentes ausências, os problemas pessoais da estudante passaram desapercebidos para
a maioria dos professores e dos colegas do curso. Tentando evitar o constrangimento de
uma exposição contraproducente, adotamos uma abordagem discreta, mas atenciosa.
502
Após a exposição do caso para a chefia, as medidas tomadas, como conversar com os
professores para serem benevolentes com atividades de recuperação, e o
encaminhamento aos serviços de assistência social da universidade, permitiram que a
estudante finalizasse o semestre com aprovação na maioria das atividades e, dessa
forma, desse continuidade ao curso.
Outra situação, levada ao conhecimento da chefia pela via hierárquica da direção
do Centro de Educação, foi a de outra estudante que sofria de uma séria e incurável
doença degenerativa, esclerose lateral amiotrófica (ELA), que progressivamente
incapacitava a jovem de permanecer no curso de pedagogia. No primeiro ano, ela, ainda
que com muito esforço, tinha sido assídua nas atividades acadêmicas, contando com o
auxílio de muletas canadenses e o apoio de colegas da turma, criando-se assim um
notável clima de integração social. Contudo, no ano seguinte, a sua situação se agravou
muito, levando-a praticamente à imobilidade. Em consequência disso, a sua frequência
às aulas diminuiu drasticamente, refletindo-se, logicamente, em um desempenho
insuficiente nas atividades. Os colegas da turma e os professores já sabiam da condição
dramática da estudante, estabelecendo rapidamente, como efeito dessa ampla
visibilidade social, uma compreensão colaborativa por parte da comunidade acadêmica.
Além de tudo, ela provinha de uma família com poucos recursos econômicos.
Mas, os seus colegas não contavam apenas com o apoio institucional, tendo eles
próprios colocado em prática uma rede própria de assistência acadêmica informal à
estudante. Inclusive, o cuidado com a acessibilidade, a apresentação de atestados
médicos e as justificativas para apresentação de trabalhos caseiros já vinham sendo
mantidas pela turma. Juntamente com essa admirável mobilização cooperativa, outras
instâncias da universidade, como a Secretaria de Inclusão e Acessibilidade, conhecida
por seu abrangente e muito eficaz programa de ações para a permanência e
terminalidade, estiveram sempre envolvidas, criando-se nesse processo um grupo de
trabalho dedicado especialmente ao acompanhamento do caso. Sem esse extenso leque
de apoio social e acadêmico, o percurso universitário dessa estudante estaria destinado
ao fracasso e ao inevitável abandono.
O que chamou a atenção, em ambas as situações, é que a sensibilização e a
mobilização de medidas para ajudar colegas em sérias dificuldades se relacionava com
um de movimento advindo de uma solidariedade provocada pela experiência cotidiana
da socialização estudantil. No caso da primeira estudante, o circuito social partiu de um
503
pequeno grupo e se estendeu, discretamente, para poucos professores, estabelecendo-se
apenas os contatos necessários para preservar a sua permanência produtiva no curso.
Todavia, sem a decisiva atuação dos colegas do seu círculo íntimo a situação teria
caminhado, provavelmente, para um final infeliz. Já no caso da segunda estudante
diagnosticada com ELA, desde o início, havia o investimento dos serviços acadêmico e
técnico da universidade, criados e orientados para esse tipo de acompanhamento. É
claro que a participação dos colegas contribui muito para que a estudante, mesmo com
sérias limitações motoras, perseverasse nos estudos, com o caloroso incentivo e as
mensagens de esperança que recebeu. O espírito solidário da comunidade de estudantes
desempenhou com mérito o seu papel de inclusão social. Mas esse empenho dos colegas
também foi reforçado com as ações diretas de apoio pedagógico e material que
dispunham as instâncias institucionais para a permanência da estudante.
Em uma situação, a forma de socialização acadêmica, mesmo restrita a um
pequeno grupo de colegas, representou a diferença entre a evasão com invisibilidade
social e a permanência com resultados acadêmicos e afetivos positivos. Nesse caso, a
informalidade das relações entre professores e estudantes, assim como a flexibilidade de
procedimentos curriculares, adaptados às condições particulares, permitiram soluções
criativas e negociadas na base, entre os meios de socialização e as regras da
administração, tratado como um problema no nível micro. Em outra situação, o
atendimento da estudante com necessidades educacionais especiais pela administração
universitária, como ação inscrita em um plano de educação inclusiva, prescindia da
participação dos colegas de turma e dos amigos estudantes. Ainda que a socialização
estudantil tenha, na prática, exercido seu papel integrador e se veja nisso um exemplo de
compaixão social e cidadania universitária, a permanência desses estudantes depende,
formalmente, de um currículo diferenciado aprovado pela administração do ensino
superior. Como parte da política da instituição, esse era um problema de nível macro,
que comprometia a imagem pública da universidade, diante da comunidade interna, das
diretrizes ministeriais e da própria legitimidade social de um estabelecimento público de
ensino superior.
Porém, havia uma semelhança no problema humano na situação daquelas
estudantes, mesmo com características pessoais distintas: ambas se encontravam na
trilha do fracasso escolar, se nada fosse feito. Contudo, as soluções empreendidas
tiveram por referência duas lógicas distintas: a socialização acadêmica de baixo para
504
cima, com seu modo informal e flexível de alcance local; e a socialização institucional
de cima para baixo, com seu procedimento formal e abrangente de alcance global. Essas
lógicas não são estruturalmente opostas entre si, podendo, ao contrário, serem
complementares para um bom funcionamento das instituições educacionais, mas elas
têm uma diferença crucial na efetividade das mudanças esperadas para uma vida
cotidiana mais satisfatória. Os fenômenos relacionados à socialização acadêmica local
podem passar desapercebidos ou serem mal interpretados pela administração, tomados
como condutas “fora da norma” ou excepcionais, perdendo-se o potencial aprendizado
dessa experiência para processos de decisão mais realistas e eficazes. Enquanto as ações
da socialização institucional global, diante da complexidade e dos critérios técnicos das
ações, podem evitar a participação de eventuais grupos cooperativos na base social, com
o risco de se desmobilizar o engajamento organizacional dos atores da comunidade
escolar, como estudantes, professores e servidores administrativos.
A identificação, pelos colegas e amigos, dos sinais da morte acadêmica de uma
estudante próxima, com profundos efeitos sobre todos os aspectos de suas respectivas
vidas, seria também um prognóstico da retirada de um parceiro de convivência
cotidiana. Logo, essa saída do convívio é ressentida dolorosamente como a perda de um
estimado consociado no mundo circundante (na definição da fenomenologia social de
Alfred Schutz), para quem o mundo acadêmico global não fez o suficiente para mantêlo. Para a administração, esse desligamento do vínculo universitário é assimilado como
uma defecção não desejada, mas é atribuída à decisão do próprio estudante,
classificando-se essa situação nas formas regimentais de abandono do curso, com a
denominação podendo variar como estudante desistente, desligado ou evadido. Mas,
esses diferentes rótulos contábeis, como se esperaria da lógica quantitativa das
estatísticas, ocultam os detalhes e a complexidade da vida cotidiana dos estudantes,
dentro e fora da universidade.
De fato, as dimensões pessoais e coletivas da existência dos estudantes só podem
ser compreendidas no contexto do convívio comum. Em uma imagem ecológica, esse
seria o nicho social dos estudantes, o campo da vivência compartilhada e dos modos de
se desenvolverem as relações sociais necessárias para a sobrevivência, no interior do
meio ambiente mais amplo da universidade. Considerar-se o meio ambiente do ensino
superior como um ecossistema social complexo, onde o nicho dos estudantes coexiste
com outros diferentes nichos (dos professores, dos pesquisadores, dos administradores),
505
seria mais importante do que ver os estudantes como meros ocupantes de um habitat
acadêmico específico, o espaço físico e institucional dos cursos. Dessa coexistência de
nichos, resultam estratégias de sobrevivência diversificadas, diante dos sentidos e
significados próprios atribuídos pelos diferentes seres sociais que configuram o
ecossistema acadêmico universitário. Por isso, a permanência ou a evasão de estudantes
é percebida de formas bem distintas pelos colegas estudantes e pelos professores,
mesmo aqueles mais próximos. Para os estudantes que compartilham do mesmo nicho,
a ameaça de saída de um dos seus consociados pode ser ressentida como perda dolorosa
e enfraquecimento social, enquanto para os professores e a administração é uma
defecção vista com relativa indiferença, porque não tem repercussão nas relações sociais
do seu nicho específico.
Evasão no ensino superior: um fenômeno com vários significados
Nos seminários conjuntos com estudantes e pesquisadores já discutimos muito
sobre o uso do termo evasão, que considero o mais representativo no sentido
sociológico do fenômeno, com posições razoáveis favoráveis e contrárias a essa noção.
Alguns sugeriram o termo abandono, ao invés de evasão, justificando que essa definição
seria mais coerente com a atitude de desistência e de conformismo dos próprios
estudantes. Argumentei, em resposta, que evasão poderia ter um significado ativo e
inconformista, mesmo que seja também sinônimo de fuga, mas que requer a
mobilização do sujeito para desenvolver um fluxo de escolhas, ações e consequências,
até resultar no seu desengajamento do percurso universitário. Ou seja, o processo de
evasão implica um intenso ativismo do estudante, que mesmo com um propósito
negativo tem um sentido estratégico de mobilização social e mental, exigindo muito
mais do que uma simples decisão, de aparência burocrática, sem desdobramentos
psicológicos e práticos até a efetivação de desligamento do seu vínculo acadêmico.
No regulamento da Universidade onde trabalho, em relação ao fenômeno da
saída física e administrativa dos estudantes dos seus respectivos programas de estudos,
não há o uso do termo evasão, mas sim o de abandono. Em outro sentido, na lógica
contábil das matrículas no sistema da universidade o tratamento adotado, para o que se
caracteriza como evasão, é o de cancelamento de programa. Já o retorno de estudante
desligado por reprovação, abandono ou outras razões, é denominado de reativação do
cadastro. Essa é a consequência simbólica e prática de se tratar os estudantes como
506
números, seres abstratos de um planeta burocrático, o da universidade de resultados e
estatísticas, não a universidade de atores reflexivos para a transformação social e o
florescimento de pessoas.
Diferentemente dessa noção contábil, o termo abandono traz um significado
moral e psicológico de desistência definitiva e de resignação duradoura, caracterizando
uma falha de caráter e um comportamento depressivo e autodestrutivo. Na mente dos
estudantes, como se pode depreender dos relatos expostos, a evasão raramente tem essa
conotação de abandono, sendo assumida mais como uma saída provisória, um recuo
necessário e justificável, do que como derrota final. Via de regra, os estudantes desejam
retornar, no mesmo curso ou em outros, quando melhores condições se apresentarem. E
isso não significa que, nas suas avaliações, os estudantes, evadidos ou em riscos de sêlo, não sejam realistas sobre os limites do próprio desempenho. Porém, identificam
também os fatores fora do seu controle acadêmico e pessoal, como as exigências
exorbitantes de professores, as dificuldades extremas de alguns conteúdos, os problemas
familiares e de saúde, os custos de manutenção além das suas condições materiais etc.
Reconhecem que alguns desses fatores são difíceis de serem superados, enquanto outros
são vistos como barreiras momentâneas. Na mente de muitos daqueles que deixaram o
ensino superior, por decisão própria ou tendo sido forçados pelas circunstâncias, a
condição provisória de retirada não é ressentida como desistência, parecendo-se mais
com uma condição ambivalente de estudantes universitários “em hibernação”.
Seria muito ingênuo e irrealista imaginar que, nas atuais instituições de ensino
superior, o espírito dos estudantes e o próprio ideal da academia, não seja corroído pela
estreiteza formativa dos currículos, das imposições burocráticas da administração, assim
como pelo conhecido narcisismo e autoritarismo dos professores e gestores. Criadas
para desenvolver o melhor do conhecimento científico e tecnológico, moldando o
caráter de excelência da cidadania dos universitários, hoje as instituições de ensino
superior estão no topo da lucratividade do mercado educacional. O aumento das
capacidades tecnológicas na indústria e a revolução nas comunicações e nos transportes
para o comércio mundial, tornaram frenéticas a competição de marcas e a renovação
constante de produto de consumo, diante dos riscos de obsolescência e da extinção
econômica.
E essa lógica empresarial de resultados de curto prazo, de transformações
tecnológicas e de angustiante concorrência corporativa, também induziu a condutas
507
antiéticas e perversas no mundo acadêmico. Com a pressão pela rapidez de resultados e
com a precariedade dos empregos, aumentaram os casos de plágio das produções
intelectuais, privilegiam-se os financiamentos para pesquisas industriais aplicadas,
diminuem-se os recursos para as formações artísticas e de humanidades, investem-se em
campanhas publicitárias de produtos educacionais sem qualidade certificada. Com essa
expansão mercadológica complacente com a baixa qualidade educacional, incluindo o
financiamento público de instituições de ensino superior medíocres, paralelamente ao
desemprego estrutural das economias contemporâneas, ampliou-se igualmente a
sensação de inutilidade, pessoal e social dos diplomas e formações profissionais.
Nesse cenário, infelizmente muito difundido no ambiente educacional brasileiro,
em consonância como a imagem da educação como mercadoria da economia
globalizada, é compreensível que o ensino superior seja visto como um espaço onde,
devido à hipervalorização da meritocracia competitiva, deixou-se de dar destaque ao
papel da educação para uma cidadania democrática e para a importância social de uma
ciência crítica e criativa. No clima de ansiedade acadêmica e incerteza no futuro
profissional que decorre desse cenário, muitos jovens se sentem frustrados e preferem
fugir, se já estiverem dentro, ou se manterem distantes, se ainda não ingressaram.
Mesmo assim, muitos ainda continuam sendo empurrados pelas pressões familiares e
sociais para buscarem diplomas, ainda que eles pouco contribuam para aliviar a angústia
causada pelo medo do desemprego futuro. Mas esse é o quadro desalentador no mundo
do trabalho contemporâneo, com o desemprego estrutural, a acelerada automação das
indústrias e serviços, com a consequente precariedade dos empregos nas economias
flexíveis das sociedades que vivem tempos líquidos, de medos e incertezas que
desfazem antigas utopias. (BAUMAN, 2007) Mas há um efeito perverso para aqueles
que não trabalham nem estudam, ou para quem, mesmo com diplomas universitários,
sobrevive com subempregos e na incerteza de ocupações precárias: o consolo de que,
pelo menos, deixaram de ser prisioneiros oprimidos pelas organizações escolares que
esmagam projetos e talentos, seja como carreiras vazias de significado nas empresas ou
percursos acadêmicos medíocres, desinteressante e inúteis, em variadas combinações.
Também há o significado da educação superior como prisões douradas, como
espaços de preparação ilusória para profissões com baixa expectativa de ocupação,
como é o caso de políticas populistas de ampliação do acesso ao ensino superior,
destinadas sobretudo aos estudantes de classes populares, porém guiadas, de fato, pela
508
manipulação eleitoral das legítimas demandas de democratização aos diplomas
universitários. No caso brasileiro das últimas duas décadas, esse acesso ao ensino
superior foi apoiado por vultosos subsídios públicos aos investimentos privados no
mercado da educação superior, amplamente dominado por formações de baixa
qualidade e curta duração, a lado da relativa manutenção do prestígio e excelência
acadêmica dos estabelecimentos públicos. (FERREIRA, 2019) A superficialidade das
formações, a precariedade das perspectivas profissionais e a manipulação política da
educação convivem danosamente para disseminar, ao menos no horizonte de
informação e do conhecimento de senso comum, o sentido de inutilidade cultural e
mesmo de irracionalidade econômica de projetos de capacitação de longo prazo.
Nesse contexto social, cultural e educacional, o perfil esperado dos indivíduos,
cidadãos e estudantes é orientado pela adaptação rápida às mudanças na economia e no
mundo do trabalho, aceitando incontrolável e rápida obsolescência de qualquer
qualificação e a consequente instabilidade e potencial desconfiança de estudos de longa
duração. Nessa ótica, um tipo de espírito de evasão, o da fuga para um futuro
desconhecido com mudanças inevitáveis, não apenas é supervalorizado, mas também é
fortemente estimulado. O frenesi social, pelas mudanças esperadas, mas desconhecidas,
vivido como ansiedade coletiva estressante, converteu-se na expectativa que move o
crescente consumo de objetos e os sonhos compartilhados por todas as classes sociais.
A mudança pela mudança, sem discussão política sobre o significado social de
mudanças com potencial de melhoria das condições de vida, tornou-se a evasão da
sociedade de si mesma. Atualmente, o autoengano com a positividade criativa das
mudanças, por tornarem desnecessários e contraproducentes os esforços críticos,
apresenta-se hoje como a confortável tendência ao abandono de refletir e agir sobre as
suas contradições, seus conflitos e sobre as potencialidades positivas do exercício da
liberdade e das realizações humanas em todos os campos, tecnológicos, educacionais,
ambientais, democráticos, econômicos etc.
Todavia, no polo oposto, o termo evasão também tem um inevitável significado
libertário. Desde a intenção até a sua concretização evolutiva, a evasão pode ser
encontrada na própria condição de surgimento da espécie humana, na sua capacidade
criativa de fugir dos limites do seu lugar de origem e descobrir novos territórios para a
expansão da vida. O ser humano sempre se mobilizou com o fascínio pela aventura da
evasão, sendo essa a motivação para as viagens mais perigosas, com a possibilidade de
509
fugir de si mesmo, como indivíduos e grupos insatisfeitos ou perseguidos, abrindo-se a
novas experiências, pessoais, coletivas e libertadoras. Talvez seja exatamente por esse
sentimento de descoberta e libertação que os evadidos, os fugitivos, quase sempre
retornam às origens de onde foram arrancados, reconhecidos como sobreviventes
heroicos. Porém, muitas vezes, os fugitivos também voltam aos lugares das suas fugas,
geralmente atribuindo-lhes significados positivos muito distintos daqueles que
justificaram suas escapadas de supostos locais de tormento e frustração, como é o caso
de lares pobres de infância e rincões do interior pouco promissores. Até mesmo lugares
de detestáveis e desumanas prisões, quando são convertidos posteriormente em
educativos museus de memória e alerta dos horrores da barbárie, transformam-se em
rotas de peregrinação de ex-prisioneiros.
É lógico que muitas visões históricas e biográficas retrospectivas nos permitem
afirmar que existem contextos e experiências de onde as fugas se justificariam
plenamente. Mas, de todos os lugares que fugimos, provavelmente seja a escola aquele
que nos provoque mais arrependimentos e dolorosas lembranças da equivocada
escapatória. Assim, quando posteriormente novas oportunidades se apresentam, o
retorno à escola é vivido como caminho de reconciliação, pessoal e social, com os
sonhos da educação perdida. E essa retomada do destino interrompido é assumido como
uma verdadeira prova de superação, especialmente quando a evasão, no passado, é
compreendida como erro de avaliação sobre a importância da escola para a vida, ou
como eventual incapacidade de desempenho acadêmico em determinado momento, ou
como resultado da falta de condições pessoais, geralmente por razões familiares e
econômicas, para se sustentar diante das exigências materiais do ambiente escolar.
Contudo, a evasão que significou, igualmente, a ruptura de um processo de
socialização escolar, relacionado no ensino superior com as aptidões próprias para a
sobrevivência acadêmica, repercute também sobre os modos de avaliação e de
administração da instituição educacional. Na lógica administrativa dos estabelecimentos
de ensino, não importando nesse aspecto que eles sejam públicos ou privados,
estabelece-se uma diferença produtiva fundamental entre a eficácia, que é o conjunto de
ações para se aperfeiçoar as formas de agir para atingir o resultado previsto, e a
eficiência, que é o ideal ou a otimização dos meios e procedimentos para a
administração racional sem desperdício de recursos e materiais. (JESUINO, 2016) A
evasão, dessa forma, é considerada pela administração universitária quase
510
exclusivamente sob a perspectiva da eficiência, devido aos parâmetros economicistas e
gerenciais das políticas educacionais. Todavia, a gestão das instituições de ensino
superior desconsidera e se fundamenta pouco no sentido da eficácia, definida pelo
aperfeiçoamento constante das formas e das estratégias para os melhores resultados de
aprendizagem e formação profissional. Sob esse ângulo administrativo, a carreira do
estudante na universidade é geralmente vista apenas no seu encaminhamento curricular
de formação científica e profissional.
A evasão não é uma atitude impulsiva e irracional do estudante ou, no limite,
patológica, como uma espécie de suicídio escolar. A evasão é o resultado de um
processo de decisão que, mesmo com elementos equivocados de avaliação do problema
ou motivações inconscientes do sujeito, pode ser vivida como uma fuga planejada ou
um recuo estratégico. Um fator representacional que permite uma visão positiva para a
evasão universitária é que, diferente do analfabetismo e da educação básica incompleta,
a interrupção no ensino superior não constitui um estigma social, uma marca de
inferioridade intelectual. Nessa ótica, o sujeito do ex-universitário não é visto como um
incapacitado escolar, mas sim como um estudante que mantém uma competência
acadêmica para retornar ao ensino superior, quando melhores condições se lhe
apresentarem. Todavia, nessa racionalidade alternativa da retomada do sujeito
estudante, o remédio de outra oportunidade dentro dos mesmos padrões escolares pode
ser mais um veneno do que uma solução. Afinal, a evasão pode não ter sido uma
decisão de morte, mas sim uma decisão de recuperar o controle de sua vida, como
estratégia de sobrevivência fora do ambiente formal de estudos.
Passando da dimensão pessoal para a dimensão organizacional, a administração
universitária tem grande dificuldade em reconhecer as razões internas, ligadas ao
funcionamento do ensino e das estruturas de apoio institucional, que levaram o
estudante a se mobilizar para um processo de evasão, ao invés de reinvestir na
permanência no seu projeto de educação superior. Na verdade, os próprios mecanismos
de avaliação pela instituição, compreendendo em especial a avaliação do desempenho
de professores e funcionários, sofrem muitas resistências da comunidade interna de
educadores e gestores, como expressão da resiliência do tradicional espírito corporativo
dos atores profissionais da universidade. No discurso corrente da comunidade interna, o
comentário comum diante do fenômeno da evasão, visto na sua dimensão personalizada
511
e moral, é que essa forma de saída do ensino superior corresponde a alguma fraqueza de
caráter do próprio estudante, atribuindo a isso a desistência e o abandono dos estudos.
Ao contrário, as críticas relacionadas às insuficiências e disfuncionalidades
pedagógicas e formativas internas são minimizadas ou são vistas como independentes
dos motivos da evasão. O elenco de problemas didáticos — os meios de ensino,
pedagógicos, os objetivos do ensino e de gestão do ensino — são muito abrangentes.
Como exemplos temos a insistência em planos curriculares desvinculados dos interesses
dos estudantes e do mundo do trabalho, modos tradicionais e autoritários de avaliação
utilizados pelos professores, a falta de alternativas de ensino adaptadas às condições de
aprendizagem de estudantes trabalhadores, a ausência ou ineficácia de modalidades de
acompanhamento educacional e formas de apoio socioeconômico, entre outras
situações. Estudos focados na análise das condições de ensino já constataram esse
conhecido problema, ainda que se reduza a explicação à dimensão do mundo do ensino
que provoca a retenção e a evasão, destacando que a “matriz curricular engessada,
metodologia didática obsoleta e instrumentos de avaliação inapropriados dificultam os
processos de ensino-aprendizagem e (...) o percurso formativo e aproveitamento dos
estudantes nas disciplinas”. (FARIAS FILHO et al., 2018, p. 129)
Contudo, diante dessas situações a administração oferece formas alternativas
para a recuperação e o atendimento a esses estudantes desgarrados do rebanho, como
componentes individualizados, aproveitamento e equivalência de atividades. Mas, os
regimentos também estipulam limites e critérios para o desligamento dos estudantes
considerados como irrecuperáveis, por exigirem demasiado esforço e dispensa
injustificável de condições curriculares mínimas diante das exigências para um diploma
de ensino superior. Logo, mesmo de forma fragmentada e episódica, quando não
insuficiente para cobrir o déficit educacional desses estudantes em risco de abandono, as
instituições de ensino superior reconhecem que, antes que a evasão se confirme, são
possíveis vários mecanismos para se recuperar o interesse e o desempenho acadêmico.
(OLIVEIRA; VANZELA; SALVADOR, 2019)
Em outras palavras, ao invés da atenção sobre o evento post facto,
provavelmente se poderia identificar os sinais precoces de evasão entre aqueles que, em
aparência, comportam-se como estudantes em continuidade normal com sua formação.
Assim, os motivos atribuídos à evasão dos estudantes se concentram em questões
morais e subjetivas, enquanto as razões institucionais são relacionadas a situações
512
objetivas e administrativas, marcadas pela impessoalidade, pelos argumentos de defesa
corporativa ou por fatores externos além do controle do estabelecimento, como a
dependência de verbas governamentais.
Considerações finais
Entre algumas das considerações sobre a relação entre permanência, socialização
no ensino superior e evasão dos estudantes, especialmente no contexto das
universidades públicas, poderíamos concluir que um significado excessivamente
negativo atribuído ao fenômeno da evasão, desviaria o olhar de uma perspectiva
compreensiva sobre o aprendizado organizacional.
A partir dessa compreensão, poderíamos: a) incluir o reconhecimento do mundo
social acadêmico dos estudantes, com outras perspectivas sobre as motivações pessoais
e sociais dos estudantes, rompendo com abordagens contábeis ou exclusivamente
curriculares; b) criar formas de acompanhamento e de diálogo, para a construção de
quadros institucionais de apoio e de alternativas compartilhadas de atuação; c) colocar
em prática políticas institucionais mais adaptativas, especialmente aquelas que
ampliassem as capacidades das estruturas dos cursos para apoiar os percursos de
formação dos estudantes, sejam eles diferenciados, inclusivos, alternativos ou oscilantes
No final das contas, a vida cotidiana do estudante no meio ambiente do ensino
superior é complexa e multidimensional. Mais do que um resultado padronizado ao final
de um caminho curricular, educacional e cognitivo, o reconhecimento de novas
capacidades propiciadas pela formação universitária está associado às bagagens
motivacionais próprias de cada estudante. A sensação de que a educação universitária
mudou realmente as suas vidas, trazendo novas e mais ricas expectativas de
desenvolvimento pessoal e social, está associada às atribuições acadêmicas positivas
desenvolvidas pelo convívio acadêmico orientado pelas experiências de interação social,
pelas estratégias de estudo e aprendizagem e pelos projetos de formação profissional. É
o conjunto desses aspectos implícitos, ocultos, naturalizados e especialmente
orientadores das práticas cotidianas, que compõem e caracterizam a socialização
acadêmica. Em resumo, no mundo universitário, paralelamente à formação curricular,
acompanhada e certificada pelos mecanismos burocráticos da instituição, há uma
intensa e transformadora socialização acadêmica que é obra dos próprios estudantes.
513
A evasão no ensino superior geralmente é relacionada e explicada pelas
deficiências dos estudantes, isto é, a falta de capacidades ou o domínio insuficiente para
se atingir os níveis de desempenho esperados na educação universitária. Todavia, a
evasão é bem menos compreendida e justificada pelas falhas ou inadequações das
próprias estruturas educacionais das instituições de ensino superior. Em consequência
disso, quando se privilegia o déficit da condição dos estudantes, ao invés das situações
propiciadas pela própria instituição, há uma transferência do horizonte de mudanças
possíveis para fora do âmbito universitário, da organização educacional para a pessoa
do estudante, na sua dimensão psicológica e social. Em outro sentido, a permanência
dos estudantes no seu percurso de formação, ainda que esteja logicamente dependente
do seu contínuo desempenho pessoal, é relacionada às condições objetivas da
instituição; mas, ao contrário, a saída do estudante do sistema, nas suas diferentes
formas, é quase sempre atribuída às condições do sujeito estudante, desde causas
subjetivas, como desinteresse e frustrações, até causas mais concretas, como mudança
de emprego ou moradia.
Como relatam muitos estudantes, o desejo da evasão pode estar sempre latente,
pulsando de acordo com as variações de experiências pessoais e coletivas, dos
momentos afetivos, na avaliação positiva dos avanços cognitivos, na esteira do
sentimento de injustiça e subestimação do desempenho acadêmico, na descoberta de
novas perspectivas de estudos e formação, ou na frustração advinda da incerteza de
processos de amadurecimento. Assim como a morte, de forma consciente ou não, está
sempre no horizonte da nossa existência, na vida acadêmica a perspectiva da evasão
convive cotidianamente com o exercício da permanência. E os males e as glórias dessa
permanência encontram seu calor humano, de realização e frustrações, no convívio com
o outro. Nesse sentido, os sinais e os prenúncios da evasão acadêmica, como a
indiferença e o isolamento, estão inevitavelmente presentes e subjacentes à formação
universitária, como sombras cotidianas da permanência no mundo acadêmico.
Entretanto, estabilizando simultaneamente tanto a sua situação social quanto a sua
condição emocional, é a socialização integrando o eu do estudante com o seu mundo
social circundante, o nicho estudantil, que permite ao estudante reconhecer a sua
permanência na comunidade acadêmica como projeto de formação pessoal e
profissional.
514
Referências
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