V SIMPÓSIO GÊNERO E POLÍTICAS PÚBLICAS
Universidade Estadual de Londrina
13 a 15 de junho de 2018
ISSN 2177-8248
Panorama da expansão e da efetividade dos Organismos e Conselhos Gestores
de políticas para mulheres nos municípios brasileiros
Milena Cristina Belançon1
Karen Laís Barbero Chaves2
Carla Almeida3
Resumo: Considerando os Organismos de Políticas para Mulheres (OPMs) e os Conselhos
Gestores de Políticas para Mulheres (CPMs) como instâncias que representam marcos na conquista das políticas de gênero no Brasil, analisá-las torna-se um passo estratégico para avaliação mais adequada dos ganhos e limites legados por tais políticas. Desse modo, o presente trabalho busca apresentar uma análise da radiografia da criação e expansão de tais órgãos nos
municípios brasileiros. Os objetivos são: i) apresentar uma radiografia da criação e expansão
destes órgãos pelos municípios brasileiros, buscando conhecer também o perfil destes municípios, ii) compreender em que medida a expansão de OPMs e CPMs esteve associada; iii)
identificar se a presença de OPMs e CPMs nos municípios está associada à quantidade e à
qualidade de serviços especializados oferecidos para as mulheres em cada realidade. Para tanto, o trabalho foi baseado principalmente em dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais, o MUNIC/IBGE, da edição de 2013. Os dados apontaram associação entre OPMs e
CPMs, sugerindo ainda que a presença desses órgãos beneficia o oferecimento das políticas
públicas para mulheres. Sobre a distribuição de CPMs e OPMs nos municípios, pode se identificar que estão presentes em uma pequena parcela do total brasileiro, e as maiores concentrações de ambas instâncias em metrópoles e municípios com IDHM muito alto.
Palavras-chave: Organismos de políticas para mulheres; Institucionalização; Efetividade.
1
Universidade Estadual de Maringá/NUPPOL-UEM; Mestranda em Ciências Sociais;
milenabelancon@gmail.com.
2
Universidade Estadual de Maringá/NUPPOL-UEM; Graduanda em Ciências Sociais;
karen_lais2006@hotmail.com
3
Universidade Estadual de Maringá/NUPPOL-UEM; Doutora em Ciências Sociais;
carlaalm@uol.com.br.
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Introdução
Levando-se em conta o contexto de reestabelecimento da democracia no Brasil, muito
já foi discutido pela bibliografia sobre a aproximação entre movimentos sociais e Estado.
Nesse trabalho particularmente nos propomos a analisar os efeitos de tal aproximação do
movimento feminista com o Estado, que nesse período conquistou, a duras penas, a
possibilidade de institucionalização das demandas pelos direitos das mulheres. Nossa
proposta abarca particularmente o campo que se refere à difusão de Organismos de Políticas
para Mulheres (OPMs) e Conselhos Gestores de Políticas para Mulheres (CPMs) pelos
municípios brasileiros.
Consideramos aqui OPMs aquelas instituições responsáveis pela elaboração, coordenação, articulação e execução de políticas de gênero nos municípios brasileiros. Já CPMs são
instâncias participativas que incluem representantes do Estado, da sociedade civil e dos serviços públicos com o objetivo de formular, executar e fiscalizar políticas públicas que competem à especificidade das mulheres, de maneira que permite a tomada de decisões mais justas,
além de um importante mecanismo de controle social e participação política das mulheres.
Assim, com esse trabalho buscamos conhecer melhor a difusão de CPMs e OPMs pelos municípios brasileiros, baseando-se principalmente em dados da Pesquisa de Informações
Básicas Municipais, o MUNIC/IBGE, da edição de 20134, que contempla, para o conjunto
dos municípios brasileiros, informações sobre as políticas especializadas para mulheres.
Para tanto dividimos este trabalho em três partes, além desta introdução. Como
desenvolvimento, na próxima sessão tratamos brevemente do histórico de institucionalização
das pautas feministas, a partir de revisão bibliográfica sobre o tema. Posteriormente,
apresentamos os dados obtidos, e, por fim, apontamos alguns achados e perspectivas nas
considerações finais.
4
Segundo o IBGE, a última edição do MUNIC foi feita em 2015, porém, esta não traz dados sobre a gestão da
política de gênero, portanto, o último MUNIC que contém essas variáveis no banco de dados é o de 2013.
Ressaltamos ainda que mesmo tendo se passado 5 anos, o volume de dados analisados (todos os municípios
brasileiros) se faz relevante para tal análise. Além disso, gostaríamos de pontuar a necessidade de atualização
dos dados por parte dos órgãos competentes.
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Redemocratização e institucionalização de demandas do movimento feminista
O movimento feminista no Brasil possui um histórico muito rico, e sempre foi guiado
pelas particularidades de nosso contexto histórico5. Para fins do objeto que nos propusemos
cumprir e por falta de espaço neste trabalho, tratamos aqui de dois momentos históricos fundamentais que nos ajudarão a entender a perspectiva proposta, ainda que reconheçamos que
toda a história do movimento é importante e nenhum aspecto deve ser descartado. Esses momentos são o período de ditadura militar e a redemocratização vivida com o fim da ditadura.
A importância de se rever o clima político do regime militar, no início dos anos 1970,
se dá pelo destaque da presença das mulheres na luta anti-ditadura, que foi o berço de novas
formas de atuação política, onde Pinto (2003, p. 43) enfatiza “as condições específicas em que
nasce o feminismo brasileiro e os efeitos que estas terão no seu desenvolvimento”.
O período ditatorial é sempre elencado como marco para o movimento feminista. Segundo Márcia Tavares et al. (2011), nesse contexto a ação direta foi a primeira estratégia do
movimento feminista, na medida em que diferentes grupos de ativistas procuraram atender
mulheres atingidas pelas mais variadas formas de violência, criando coletivos com essa finalidade. Além de defender suas pautas próprias, muitas mulheres participavam em organizações
clandestinas de esquerda e em grupos guerrilheiros de combate à ditadura militar.
Essas atuações serviram como instrumento de emancipação, segundo Lúcia Avelar
(2015), e foram delas que decorreram eventos como, fóruns, convenções, conferências, movimentos populares e, posteriormente, também a criação de departamentos femininos dentro dos
partidos e dos movimentos sociais.
Portanto, essa foi uma “escola” para o que Céli Pinto (2003) chama de terceira onda
do movimento feminista brasileiro, sendo um momento marcado pela forte participação das
mulheres brasileiras em todo o processo de redemocratização e na construção daquilo que a
autora identifica como uma espécie de “feminismo difuso” e com maior ênfase sobre processos de institucionalização e discussão das diferenças entre os gêneros.
Essa nova relação entre Estado e sociedade, que foi se desdobrando dos processos de
abertura política, contou com diversos novos repertórios de atuação dos movimentos, havendo
até mesmo a ocupação de cargos comissionados nos governos por ativistas. Essa estratégia foi
5
Conferir em Céli Pinto, 2003.
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usada também por feministas, que ocuparam estes espaços buscando operar as políticas “por
dentro”, sendo chamadas de feministas institucionais (BELANÇON, 2018).
Além das estratégias dos movimentos, houve também a investida por parte do Estado
– ainda que em atendimento às demandas dos movimentos – a partir da criação de canais
abertos no sistema político com intuito de aproximar a sociedade da elaboração das políticas
públicas, o que foi pauta dos movimentos na luta pela redemocratização. Essas instâncias são
representadas pelos Orçamentos Participativos, Conselhos Gestores, conferências temáticas,
comissões, secretarias, etc.
Estes avanços na participação ajudaram ainda a trilhar o caminho para a fundação da
Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SPM). A SPM foi instituída em 2003, no
primeiro mandato do Presidente Lula (PT), e adquiriu caráter de ministério em 2009, o que
demonstra a importância das oportunidades políticas por parte do Estado para o sucesso da
institucionalização dos movimentos. A bibliografia já tratou exaustivamente da diferença que
um governo mais alinhado com a esquerda faz na absorção das demandas dos movimentos
sociais pelo Estado (BELANÇON, 2018; BOHN, 2010; RANGEL, 2013).
A criação da SPM acarretou em grandes avanços para as políticas públicas de mulheres, principalmente por abrir canais nas demais instâncias governamentais, e também por representar a vontade política em consolidar a institucionalização das políticas de gênero, significando, portanto, um marco no que diz respeito às políticas públicas para mulheres. Essas
tendências de institucionalização são caracterizadas por Marlise Matos (2010) como uma
“quarta onda” do feminismo no país.
Influenciada pela criação da SPM, ocorre a I Conferência Nacional de Políticas para as
Mulheres (CNPM), em 2004, que traz em seu relatório, segundo Céli Pinto (2007), demandas
não só por políticas públicas em favor das mulheres, mas como tais políticas devem ser
criadas, discutidas e implementadas. O relatório da CNPM é marcado pela reivindicação das
mulheres como agentes políticos tanto de suas próprias demandas, quanto pela participação
política em todos os conselhos e esferas da política nacional. Nos anos seguintes, as conferências continuaram constituindo-se como importante polo mobilizador de discussões e propositor de políticas para as mulheres.
No que diz respeito ao enfrentamento à violência contra as mulheres, a institucionalização da SPM representou uma ação importante no processo de fortalecimento das ações e estratégias de gestão e monitoramento das políticas públicas (MARTINS, CERQUEIRA e MA-
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TOS, 2015, p. 9). Foi também a partir de sua criação que as demandas passaram a ser vistas
em rede, buscando operar em parceria com as instâncias de atendimento às mulheres em situação de violência, CPMs, CNPM e Planos Nacionais de Políticas para Mulheres (PNPM).
A preocupação com a capilaridade das políticas para mulheres já estava presente desde
o I PNPM, onde foi enfatizada a necessidade de estados e municípios criarem instituições de
defesa dos direitos das mulheres, através de seu princípio de transversalidade vertical 6 (BRASIL, 2004). Tal difusão vertical dos OPMs é fundamental, uma vez que é nos municípios que
as cidadãs e os cidadãos veem a política acontecer de fato e são por ela atendidas. Nesse sentido, os Organismos de Política para as Mulheres
têm a função de fomentar e coordenar a elaboração de políticas públicas e
acompanhar a sua implantação nos respectivos locais onde funcionam e, ainda ser um
polo responsável pela efetividade e defesa dos interesses das mulheres nos níveis
estadual/local (FÓRUM NACIONAL DE ORGANISMOS GOVERNAMENTAIS
DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES, 2014, p. 16).
Portanto, os OPMs e CPMs atuam como mecanismos de manutenção, elaboração, implementação e execução dos direitos e das políticas públicas voltadas para as mulheres. Segundo Grunevald (2009), a SPM seria não só um órgão de representação, como também de
implementação de políticas para as mulheres, em que tem o CNDM como instância vinculada
e ligada as decisões públicas, tendo grande poder representativo e de intervenção em políticas
públicas brasileiras.
Radiografia da criação e expansão de OPMs e CPMs
Um dos objetivos deste trabalho foi verificar a associação entre a presença de OPMs e
CPMs, acreditando que essa “rede” logra benefícios para a elaboração de políticas públicas
para mulheres. Para tanto, realizamos um teste estatístico que mede, além da associação entre
duas variáveis, a força e direção em que ela ocorre7. Nesse teste, os resultados variam de -1 a
1, e os valores (negativo ou positivo) indicam a direção da associação. Portanto, quanto mais
próximo de 1, mais forte é a associação entre as duas variáveis. Constatamos que no caso
6
A transversalidade vertical visa a ampliação da rede de parcerias nos âmbitos estadual e municipal.
Visando a construção da capilaridade necessária para o atendimento às referidas demandas.
7
Trata-se do teste de independência de Yule, que tem por objetivo testar a independência de associação
entre duas variáveis dicotômicas, verificando também a intensidade em que esta relação acontece .
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desta pesquisa, a existência de órgão gestor é acompanhada pela existência do conselho, com
um valor bastante alto (0,74).
Entretanto, aferimos também que a difusão dessas instâncias é bastante restrita, tendose em vista o total de municípios brasileiros, os CPMs estão presentes em apenas 18% e os
OPMs em 28%.
Afim de verificar a influência do contexto histórico e político para a criação destes
órgãos, iniciamos a análise com o gráfico 1, que contém a distribuição dos CPMs por ano de
criação.
Gráfico 1 – Distribuição dos CPMs de acordo com ano de criação
Elaboração Própria
Fonte: Munic/IBGE 2013
Entre as variáveis do MUNIC não consta o ano de criação dos OPMs, por isso neste
momento nos bastamos à análise dos CPMs.
A partir da observação do gráfico 1, podemos identificar alguns picos da expansão
dessas instâncias. Iniciando-se por 2007, ano que marca a criação de 75 CPMs, outro pico se
dá em 2009, com 112 CPMs e ainda, 2011, com 102 CPMs.
Afim de apontas algumas hipóteses para os picos de criação dos CPMs demarcamos
alguns momentos no processo de redemocratização e no período posterior que são importantes da luta por políticas de gênero. Como forma de esquematizar e facilitar a visualização, elaboramos o quadro 1, abaixo descrito.
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Quadro 1 – Série histórica da institucionalização das políticas para mulheres
Ano
Ação
1983
Criação do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo
1985
Criação do Conselho Nacional de Defesa da Mulher
2003
Criação da SPM
2004
1ª Conferência de Políticas para Mulheres (CNPM)
2005 a 2007
Vigência do I PNPM
2006
Criação da Lei nº 11340 (Lei Maria da Penha)
2007
2ª CNPM
2008 a 2011
Vigência do II PNPM
2009
SPM passa a ser Ministério
2011
3ª CNPM
2013 a 2015
Vigência do III PNPM
2016
4ª CNPM
Fonte: Elaboração Própria
Pensando a princípio no pico mais alto, localizado em 2009 levantamos algumas
hipóteses. Primeiramente, esse foi o ano em que a SPM adquiriu caráter ministerial, ou seja,
vinculou-se diretamente ao gabinete da presidência, passando a operar em alto nível
hierárquico (Gonzalez, 2018) e desse modo tendo mais autonomia e recursos para gerir suas
políticas.
Ainda, tendo em vista que esse pico se encontra na vigência do II PNPM, de acordo
com o relatório final de implementação do I PNPM (BRASIL, 2009), este foi pactuado junto
a 21 governos estaduais e cerca de 300 prefeituras, por meio da assinatura de termos de
adesão. Portanto, podemos considerar que este primeiro plano, como toda política pública, foi
absorvido gradativamente, em efeito cascata, iniciando-se principalmente nos estados, e
compreendendo poucas prefeituras, já que essas 300 que assinaram o termo durante o período
representam uma mínima parcela se levarmos em consideração o total de prefeituras em nosso
país.
Outra hipótese testada por Costa (2015) diz respeito a influência da SPM na
capilaridade de instâncias de políticas para mulheres, onde uma das explicações possíveis para
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essa influência se dá pelos convênios firmados com os entes federativos, que beneficiaram os
municípios que aderiram à política.
É preciso enfatizar ainda, que as políticas demoram a ser implementadas, e por isso, é
possível que o boom dessas instâncias tenha se dado apenas durante o II PNPM, onde pôde
ser melhor capilarizado e assimilado pelas prefeituras para torna-se realmente uma política.
Ainda segundo o relatório final de implementação do I PNPM (BRASIL, 2009), foi
ressaltado que a II CNPM – realizada em agosto de 2007 – trouxe alguns dados novos para a
questão da verticalização do PNPM. A primeira e mais importante foi o detalhamento das demandas em prioridades e ações que ampliaram o número de eixos estratégicos do I para o II
Plano. Ademais, foi possível avaliar que a simples assinatura de termos de adesão ao Plano
Nacional por parte de prefeitos/as e governadores/as não foi capaz de transformar o PNPM
em uma realidade para as mulheres. Em vários casos, a adesão ao Plano resumiu-se à assinatura do termo, não havendo quaisquer outros desdobramentos de relevância. Assim, para o II
Plano Nacional a estratégia adotada pelo governo federal para regionalizar o Plano foi o estímulo à construção dos planos estaduais e municipais, de forma a adequar as grandes linhas e
objetivos do PNPM às realidades locais.
Uma dessas estratégias, foi a criação do Fórum Nacional de Organismos Governamentais de Políticas para Mulheres, que buscou discutir importantes pautas de ação política, dentre as quais as dificuldades de implementação do Plano na realidade local. Promovendo iniciativas como, os Encontros Nacionais e Regionais do Fórum; as web conferências com a participação das gestoras de OPM estaduais e municipais; a criação de um banco de dados com informações sobre os OPM; a troca de informações e experiências, e também a criação de documentos oficiais que orientavam sobre a criação de um OPM.
Mas além disso, como afirmado no relatório,
Sabe-se que as pactuações e articulações com estados e municípios são decisivamente
influenciadas por fatores políticos. Assim, cada rearranjo político-institucional nas
esferas subnacionais demanda uma nova investida, um novo processo de
convencimento e sensibilização dos atores locais para a implementação das ações do
Plano em suas cidades ou estados. (BRASIL, 2009, p. 97)
Ou seja, os fatores políticos, sociais, e espaciais de cada município contam muito para
a explicação da difusão. E por esse motivo buscamos conhecer com um pouco mais de detalhes os municípios que absorveram os OPMs e CPMs.
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Uma das variáveis utilizadas para analisar esses municípios que concentram CPMs e
OPMs foi o porte. Do qual obtivemos a tabela 1, abaixo.
Tabela 1 – Distribuição de CPMs e OPMs por municípios de acordo com seu
porte8
Porte
CPM (%)
OPM (%)
Total de Municípios
Metrópole
82
100
17
Grande
79
74
282
Médio
50
52
339
Pequeno 2
26
36
1080
Pequeno 1
7
19
3847
Total
18
28
5565
Elaboração Própria.
Fonte: MUNIC/IBGE 2013.
De acordo com a tabela 1, podemos notar que tanto CPMs quanto OPMs se concentram majoritariamente nas metrópoles, e diminuem a cada grau do porte que descemos, saindo
de uma marca de 100% de OPMs nas metrópoles, por exemplo, e chegando a 19% nos municípios classificados como “Pequeno 1”.
Outra medida que levamos em conta na análise foi o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), onde obtivemos a tabela 2.
Tabela 2 – Distribuição de CPMs e OPMs por municípios de acordo com IDHM9
IDHM
CPM (%)
OPM (%)
Muito Alto
66
77
Total de
Municípios
44
Alto
24
28
1889
Médio
Baixo
Muito Baixo
Total
16
10
9
18
26
28
38
28
2233
1367
32
5565
Elaboração Própria.
Fonte: MUNIC/IBGE 2013.
8 Classificação de porte de município segundo o IBGE, onde: Municípios de Pequeno Porte 1: até 20.000
habitantes. / Pequeno Porte 2: de 20.001 até 50.000 habitantes. / Médio Porte: de 50.001 até 100.000 habitantes. /
Grande Porte: de 100.001 até 900.000 habitantes. / Metrópole: mais de 900.000 habitantes.
9
Classificação de IDHM segundo o IBGE, onde: IDHM Muito Baixo: 0 a 0,499: / Baixo: 0,5 a 0,599 / Médio:
0,6 a 0,699. / Alto: 0,7 a 0,799. / Muito Alto: 0,8 a 1.
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Sobre a distribuição dos municípios pelo IDHM, podemos notar, de acordo com a tabela 2, que a presença significativa de CPMs e OPMs se concentra naqueles municípios com
IDH muito alto, onde 77% desses têm OPM e 66% têm CPM.
Porém, há um diferencial se tratando da distribuição de OPMs, que ao contrário do
porte não diminui a cada estágio de classificação, pois podemos observar que em segundo lugar na distribuição percentual de OPMs estão os municípios de IDH muito baixo. A nossa hipótese para esse dado é que os municípios de IDH muito baixo viram na adesão ao OPM uma
janela de oportunidades para angariar recursos orçamentários.
Segundo Costa (2015, p. 19) a SPM auxiliaria financeiramente o município na capacitação dos funcionários do órgão e na compra de equipamentos, por exemplo. Além dos demais convênios possíveis entre a secretaria e o município.
O mesmo não ocorre com os CPMs, que seguem o padrão do porte de município,
como demonstra a tabela 2, quanto menor o IDHM, menos conselhos. Isso porquê, em geral,
carecem de verbas, recursos humanos e infraestrutura para seu funcionamento e instalação.
Além disso, a mobilização de organizações e movimentos de mulheres compreende papel extremamente importante para a instalação de CPMs, já que para participar como representante
da sociedade civil é necessário participar de alguma organização civil.
Como último objetivo, buscamos ainda identificar se a presença de CPMs e OPMs nos
municípios esteve associada à quantidade e qualidade dos serviços oferecidos para as mulheres. Para isso criamos um índice composto por variáveis que fazem parte do MUNIC.
O índice de serviços é composto por três medidas. A primeira mensura os serviços especializados para mulher em situação de violência ofertados pelo município em cumprimento
à Lei Maria da Penha. Para a construção dessa medida foram agrupados nove categorias que
descrevem os tipos de serviços, conforme quadro 2, abaixo.
Quadro 2 - Serviços Especializados de gestão municipal para mulheres em situação de
violência no município de acordo com a Lei Maria da Penha
Atendimento psicológico individual
Atendimento psicológico em grupo
Atividades culturais e educativas profissionalizantes
Atendimento jurídico
Atendimento social acompanhado por assistente social que insira a mulher em programas sociais
do governo, como Bolsa-Família e/ou Benefícios de Prestação Continuada
Encaminhamento para programas de emprego e geração de renda
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Atividades de conscientização sobe os direitos da mulher junto à comunidade
Acompanhamento nos casos da Lei Maria da Penha
Outras Atividades
Fonte: MUNIC/IBGE (2013).
Já segunda medida que compõe o índice de serviços é formada pela existência de Casa
Abrigos para o atendimento à mulheres em situação de violência ou risco de morte e os serviços ofertados por estas instituições, reunindo 12 itens, conforme quadro abaixo.
Quadro 3 - Casas-Abrigo para atendimento a mulheres em situação de violência e risco
de morte de acordo com a Lei Maria da Penha
Endereço é sigiloso
Atendimento psicológico individual
Atendimento psicológico em grupo
Atividades culturais e educativas
Atividades profissionalizantes
Atendimento social acompanhado por assistente social que insira a mulher em programas sociais
do governo, como Bolsa-Família e/ou Benefícios de Prestação Continuada
Atendimento jurídico, no caso de advogado próprio ou de Defensoria Pública
Atendimento médico, hospitalar ou de outra especialidade da área de saúde, ou encaminhamento
para serviço de saúde da rede pública
Acompanhamento pedagógico das crianças
Encaminhamento para programas de emprego e geração de renda
Garantia de inserção/permanência das crianças na escola
Creche
Atendimento nos casos da Lei Maria da Penha
Outras atividades
Fonte: MUNIC/IBGE (2013)
Por fim, o último componente do índice de serviços é a existência de serviços de saúde
especializados para o atendimento dos casos de violência contra a mulher.
Estas três medidas foram somadas e depois padronizadas em uma escala que varia de
0 a 1. Portanto, o índice de serviços varia de 0 a 1, onde 1 indica o cumprimento total dos serviços acima elencados.
Cruzamos as informações do índice distribuindo entre municípios “sem CPM e sem
OPM”, “apenas com OPM”, “apenas com CPM”, e “com CPM e OPM”, resultando nas descrições da tabela 3.
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Tabela 3 - Média índice de Serviços e Presença de OPM e CPM
Presença de OPM e Conselho
Média
Sem conselho ou órgão gestor
0,03
Órgão Gestor
0,10
Conselho
0,09
Conselho e Órgão Gestor
0,25
Elaboração Própria
Fonte: MUNIC (IBGE, 2013)
A tabela 3 aponta, portanto, a diferença que a presença dessas instâncias faz na vida da
cidadã propriamente. É importante pontuar que, conforme descrito acima, nosso índice foi
bastante exigente, e por isso as médias se mostraram baixas. Ainda assim, notamos uma grande diferença dos municípios que possuem CPM e OPM, que chegam a uma média de 0,25 no
índice. Estes resultados apontam também a importância dessa “rede”, uma vez que a existência de CPM e OPM no município já faz bastante diferença, mas quando juntos a diferença é
ainda mais notável.
Considerações finais
De acordo com os dados apresentados, podemos notar a importância dessa “rede” de
instâncias governamentais, onde atestamos que a presença de CPMs e OPMs esteve associada. E ainda, sugere-se que essa associação é benéfica no que diz respeito a um maior
oferecimento de serviços para as mulheres nos municípios que possuem ambas instâncias.
Ainda concluímos que o número de municípios que possuem CPMs e OPMs é bastante restrito, sendo apenas 28% e 18% respectivamente, e ainda, que a presença ou não desses
organismos estão, dentre outros fatores, vinculados ao tamanho e ao desenvolvimento dos
municípios.
Outra observação importante é de como a busca por benefícios orçamentários parece
fazer diferença na adesão de municípios com IDH muito abaixo aos OPMs, indicando a importância de que o órgão federal possua orçamento próprio para capilarizar estes órgãos.
Esse trabalho é mais um dos tantos que atesta a importância da SPM para a criação e
execução de políticas de gênero, não só institucionalmente mas também simbolicamente. Se-
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cretaria esta que foi dissolvida de seu caráter ministerial em 2016, operando atualmente como
um pasta vinculada ao Ministério de Direitos Humanos.
Gonzalez (2018, p. 4), levando em conta a influência do contexto político, disputas
internas e demais fatores no funcionamento dessas instâncias, sugere analisá-las a partir de
uma “perspectiva relacional e conjuntural, não como parte de uma maquinaria burocráticoestatal homogênea e fixa, mas antes em seu caráter dinâmico e complexo, como arenas de/em
disputas”. Desse modo, a autora analisa os diferentes níveis hierárquicos que essas instâncias
de políticas para mulheres podem ocupar, atestando que no Brasil já passamos pelo mais alto
nível e atualmente nos encontramos no mais baixo. Portanto, em nossa realidade o futuro
dessas instâncias se mostra bastante incerto, assim como as políticas de gênero de modo geral.
Referências
AVELAR, L. Mulher, Gênero e Política. In: _____; CINTRA, A. O. (Orgs.). Sistema político
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