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A ESCRAVIDÃO EM CENA: UMA LEITURA DE MÃE, DE JOSÉ
DE ALENCAR, E O ESCRAVOCRATA, DE ARTUR AZEVEDO E
URBANO DUARTE
Rodrigo Cézar Dias
Submetido em 23 de maio de 2018.
Aceito para publicação em 01 de novembro de 2018.
Cadernos do IL, Porto Alegre, n.º 57, novembro. p. 9-20
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Quinta-feira, 22 de novembro de 2018.
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A ESCRAVIDÃO EM CENA: UMA LEITURA DE MÃE, DE
JOSÉ DE ALENCAR, E O ESCRAVOCRATA, DE ARTUR
AZEVEDO E URBANO DUARTE
SLAVERY ONSTAGE: A CLOSE READING OF JOSÉ DE
ALENCAR’S MÃE, AND ARTUR AZEVEDO AND
URBANO DUARTE’S O ESCRAVOCRATA
Rodrigo Cézar Dias*
RESUMO: O presente estudo propõe uma leitura das peças Mãe, de José de Alencar, e O escravocrata,
de Artur Azevedo e Urbano Duarte, tendo por objetivo central a análise da representação do escravo em
ambos os textos, considerando a condição aporética decorrente da escravidão moderna em que o ser
humano cativo é percebido legalmente e socialmente como pessoa e como mercadoria. Por meio do
cotejo das peças, pretende-se, ainda, mapear os pontos de continuidade e ruptura que podem ser
estabelecidos entre as duas obras no que diz respeito à forma dramática e ao tratamento sério dos
personagens escravizados.
PALAVRAS-CHAVE: Mãe; O escravocrata; escravidão; forma dramática.
ABSTRACT: This study proposes a close reading of José de Alencar’s Mãe, and Artur Azevedo and
Urbano Duarte’s O Escravocrata, in order to analyze the representation of slaves in both plays, taking
into account the aporetic condition in which the enslaved human being is perceived legally and socially
as both person and commodity. Through the comparison of these plays, I also intend to map out the points
of continuity and rupture that can be established between the texts concerning the dramatic form and the
serious treatment of enslaved characters.
KEYWORDS: Mãe; O Escravocrata; slavery; dramatic form.
1. Apontamentos iniciais
Ao longo de Mimesis, Erich Auerbach discorre sobre a representação da
realidade na literatura ocidental, dando centralidade ao tratamento sério dispensado ao
cotidiano e à ascensão de camadas populares enquanto objeto de representação
problemático-existencial (AUERBACH, 2011, p. 440). Esse movimento de leitura é
desenvolvido por meio de um grande panorama cronologicamente organizado que não
se pretende exaustivo. Segundo o autor,
[...] o método de me deixar dirigir por alguns motivos de forma paulatina e
despropositada e de pô-los à prova mediante uma série de textos que se me
tornaram conhecidos e vivos durante a minha atividade filológica, parece-me
fecundo e factível; pois estou convencido de que aqueles motivos
fundamentais da história da representação da realidade, se os vi corretamente,
devem poder ser encontrados em qualquer texto realista escolhido ao acaso
(AUERBACH, 2011, p. 494).
Seguindo por esta senda, o presente trabalho propõe um deslocamento do
método auerbachiano, partindo de sua leitura acerca da ascensão das camadas populares
*
Doutorando em Estudos de Literatura pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
rodrigocezardias@gmail.com.
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enquanto objeto de representação problemático-existencial na literatura ocidental para
articular uma análise da representação do escravo em duas peças teatrais produzidas na
segunda metade do Oitocentos brasileiro, quais sejam, Mãe, de José de Alencar, e O
escravocrata, de Artur Azevedo e Urbano Duarte. Com isso, pretende-se investigar
como a condição aporética decorrente da escravidão moderna em que o ser humano
cativo é percebido legalmente e socialmente como pessoa e como mercadoria é
refratada nesses textos literários. Por meio do cotejo das peças, busca-se, ainda, mapear
os pontos de continuidade e ruptura que podem ser estabelecidos entre as duas obras no
que diz respeito à forma dramática e ao tratamento sério dos personagens escravos e dos
personagens proprietários de escravos.
2. A representação do escravizado no teatro
No ano de 1875, a estreia da peça O jesuíta, de José de Alencar, suscita uma
polêmica literária travada entre o autor e Joaquim Nabuco nas páginas do jornal O
Globo, vindo a ser reunida em volume por Afrânio Coutinho em 1965 sob o título A
polêmica Alencar-Nabuco. A refrega tem por estopim a crítica de Nabuco ao caráter
datado da obra, produzida em 1861 e não alterada para a representação em 1875, o que,
segundo ele, seria um dos motivos por trás da pouca acolhida da peça pelo público
fluminense. Alencar, por sua vez, transfere a “responsabilidade” pelo fracasso da peça
para o público, que, em seu julgamento, não valorizava o teatro nacional. A partir dessa
discussão inicial, Nabuco submete a produção romanesca e dramática de Alencar a um
severo exame no folhetim do Globo, sob o título “Aos domingos: estudos sobre o Sr. J.
de Alencar”, sendo que as réplicas do romancista começariam a ser veiculadas no
mesmo espaço do jornal, sob o título “Às quintas”.
Para os fins desta leitura, é oportuno destacar uma das críticas realizadas por
Nabuco à peça O demônio familiar, centrada na representação do escravo e de sua fala
em cena:
Essa linguagem de telegrama não é falada entre nós; mas se o fosse, ainda
não teria o direito de passar da boca dos clown, pintados de preto, dos nossos
circos para a dos atores. O negro, nascido no país e criado na família do
senhor, como esse Pedro, que teve a mesma educação dos filhos da casa, não
suprime assim o artigo e não fala uma língua que nos parece bárbara.
Falasse-a porém, ela não devia ser repetida em cena. Já é bastante ouvir nas
ruas a linguagem confusa, incorreta dos escravos; há certas máculas sociais
que não se devem trazer ao teatro, como o nosso principal elemento cômico,
para fazer rir. O homem do século XIX não pode deixar de sentir um
profundo pesar, vendo que o teatro de um grande país, cuja civilização é
proclamada pelo próprio dramaturgo escravagista (o seu teatro só abala a
escravidão em nosso espírito, não no dele), acha-se limitado por uma linha
negra, e nacionalizado pela escravidão. Se isso ofende o estrangeiro, como
não humilha o brasileiro! (COUTINHO, 1965, p. 106, grifos meus).
Temos, pois, nas palavras do jovem autor, que viria a se destacar por conta de
sua militância abolicionista, uma reprovação enfática não só da representação
supostamente inverossímil da fala do escravo, mas também, em boa medida, da própria
representação de indivíduos escravizados no palco. Alencar, por sua vez, posiciona-se a
favor da representação da escravidão no palco como um meio por ele utilizado para
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defender a causa da emancipação espontânea1, patenteando com “o prestígio da cena os
perigos e horrores dessa chaga social” (COUTINHO, 1965, p. 120).
Para pensarmos essa questão, podemos mobilizar a leitura desenvolvida por
Jacques Rancière em seu artigo intitulado “O efeito de realidade e a política da ficção”.
O autor parte da análise empreendida por Roland Barthes em “O efeito de realidade”,
texto que
começa focando um detalhe retirado do conto de Flaubert “Um coração
simples”. Ao descrever a sala da casa onde sua personagem vive, o escritor
diz que “um velho piano sustentava, sob um barômetro, um monte piramidal
de caixas e caixotes”. Obviamente esse barômetro não tem utilidade alguma e
o monte piramidal não nos deixa ver nada determinado. Como afirma
Barthes, eles “elevam o custo da informação da narrativa” (RANCIÈRE,
2010, p. 75).
Ao contrário da interpretação de Barthes, que considera o detalhe inútil como o “real
que prova sua realidade por sua própria inutilidade e carência de sentido” (RANCIÈRE,
2010, p. 76), Rancière defende a hipótese de que o
ocioso barômetro expressa uma poética da vida ainda desconhecida,
manifestando a capacidade de qualquer um (por exemplo, da velha
empregada de Flaubert [Felicité, protagonista de “Um coração simples]) de
transformar a rotina do dia-a-dia na profundeza da paixão, seja por um
amante, um senhor, uma criança, seja por um papagaio. O efeito de realidade
é um efeito de igualdade (RANCIÈRE, 2010, p. 79, grifo meu).
Assim, a representação desse índice do cotidiano apontaria para uma “democracia
literária”, materializada por uma redistribuição do sensível que possibilitaria um
tratamento sério de indivíduos das camadas populares, outrora relegados apenas ao
estilo baixo, o que vai ao encontro da leitura do realismo moderno empreendida por
Erich Auerbach.
Desse modo, penso que a representação da escravidão, tanto no teatro de
Alencar como no de Artur Azevedo e Urbano Duarte, apresenta potencialidades
expressivas interessantes apesar de suas fraturas – e, em certa medida, em decorrência
delas. Na tentativa de evidenciar esses elementos, parto para a discussão a respeito de
cada uma das obras, buscando subsídios para cotejá-las e situá-las na dimensão do
debate público que as atravessava.
3. Os olhos cansados de Joana: o proprietário-filho e sua escrava-mãe
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A emancipação espontânea se balizava pela perspectiva de que o Estado não deveria intervir nas
relações de propriedade envolvendo escravagistas e escravizados, incumbindo aos próprios senhores de
escravos a responsabilidade moral de alforriar as pessoas que eles mantinham em cativeiro. Conforme
Alencar, em discurso proferido em 1871, “a causa da emancipação espontânea há muito que está vencida
no coração do povo brasileiro; diariamente se reproduzem os exemplos de manumissões. É admirável o
aspecto que representa o nosso País; todas as classes porfiam na prática desses atos. A estatística, em
1860, dá-nos uma prova da rapidez com que marcha essa revolução social. Só na cidade do Rio de
Janeiro, houve 14.000 alforrias. Este algarismo é eloquente; ele significa que em talvez 20 anos a
escravidão estaria, por si mesma, extinta” (ALENCAR, 1977, p. 242 apud SIMÕES, 2011, p. 192).
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Sendo representado pela primeira vez em 1860, o drama em quatro atos Mãe, de
José de Alencar, tem sua ação localizada no Rio de Janeiro de 1855, possuindo como
cenário um prédio que tem por moradores, no primeiro andar, o funcionário público
Gomes e sua filha Elisa e, no andar superior, o estudante de medicina Jorge.
Alinhavando os dois núcleos figura Joana, escrava – e mãe – do estudante, que ajudava
nos afazeres domésticos na residência de Gomes desde que o último escravo do
funcionário público fora penhorado, estimulando o embrião de namoro entre Elisa e
Jorge. Temos, portanto, dois proprietários de escravos despossuídos: um funcionário
público endividado por conta da doença que o acometeu após a morte da esposa e um
estudante cuja renda provém de aulas de piano e de francês, de algumas traduções e,
principalmente, da exploração da força de trabalho de Joana, que costura e lava “para
fora”.
Até então, Joana conseguira ocultar o fato de que era mãe de Jorge, sendo que a
única pessoa que tinha conhecimento disso era o Dr. Lima, médico que supostamente
teria pago pelos estudos e demais despesas relacionadas à criação do jovem – que o tem
como “segundo pai” –, quando, em verdade, fora Joana que arcara com esses gastos. No
recorte temporal em que se passa o drama, Lima retorna da Europa, encontrando Joana
ainda escravizada, o que lhe causa surpresa e alguma inquietação. Entretanto, o médico
chega a tempo de testemunhar o proprietário-filho alforriar a escrava-mãe, visto que
Jorge saldara a hipoteca que havia contraído sobre ela e estava financeiramente livre
para saldar sua consciência.
Desse modo, coexiste em Jorge tanto a afeição de filho para com Joana, que não
permite que ele a veja como escrava, quanto a relação de senhor de escravo que se
utiliza de ao menos duas possibilidades de exploração financeira de sua propriedade,
considerando a hipoteca e, além disso, o trabalho da escrava, que o sustentara até então
a custo de sua visão fatigada. Quando Lima pergunta a Jorge por seus rendimentos, o
estudante responde que obtém, por meio das lições de francês e de piano, cerca de cem
mil réis por mês, o que na visão do médico é pouco.
JORGE – Faço também algumas traduções que me deixam às vezes um
extraordinário. Joana por seu lado ganha...
JOANA – Quase nada, nhonhô! Já estou velha. Não coso mais de noite.
JORGE – Nem eu quero. Foi de passares as noites sobre costura que ias
perdendo a vista.
DR. LIMA – Faz bem em tratá-la com amizade, Jorge. É uma boa...
JOANA – Sou uma escrava como as outras.
JORGE – É uma amiga como poucas se encontram (ALENCAR, 1940?, p.
78).
No andar inferior do prédio, por sua vez, há um recrudescimento da situação
financeira precária de Gomes. Devendo para o senhorio e para Peixoto, um agiota, o
funcionário público é acusado por este de ter falsificado uma letra, tendo até o final do
dia para reaver o valor. Não conseguindo lidar com a acusação, considera o suicídio por
envenenamento como uma saída mais honrosa do que enfrentar as galés. Gomes quase
recorre a Jorge, mas é obstado pela vergonha; Elisa, por sua vez, expõe a situação para o
namorado, entregando a ele o frasco de veneno com que o pai lhe acenara o suicídio.
Jorge busca reunir recursos, pedindo um empréstimo a Lima, que só conseguiria
a quantia no dia seguinte, visto que a alfândega já estava fechada. Joana, então, rasga
sua carta de alforria e propõe que o estudante a hipoteque, argumentando que Lima
poderia resgatar o valor no outro dia, saldando a dívida. Após breve resistência, Jorge
aceita renovar a hipoteca contraída com Peixoto, o mesmo credor/acusador de Gomes;
desta vez, entretanto, o negociante impõe que a operação realizada seja um penhor. Ao
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observar o documento que iria registrar a transação, Jorge percebe, ainda, que se tratava
de um contrato de venda a retro, dispondo o prazo de um mês para que ele pagasse a
dívida e recuperasse sua escrava – o que consiste em uma terceira via de exploração de
Joana enquanto propriedade.
Após recusar a proposta veementemente, Jorge assina de imediato o documento
tão logo Elisa entra em cena, resgatando a letra falsificada. Após a saída da jovem, que
vai avisar o pai da solução alcançada – ainda que não tenha conhecimento do negócio
do qual provém o dinheiro –, Joana parte com Peixoto. No dia seguinte, ela retorna para
a casa de Jorge, aproveitando um descuido do usurário; logo após, chega Lima com o
dinheiro que prometera emprestar. A fim de saldar a dívida, Jorge busca Peixoto, sem
sucesso, retornando para casa e recebendo, em seguida, uma visita de Gomes e de Elisa
que tem por objetivo o acerto do noivado.
Enquanto o estudante sai de cena com o futuro sogro para mostrar os aposentos a
ele destinados em sua casa, Peixoto bate à porta, procurando por sua escrava.
Acreditando que Joana estava forra, Lima não consegue entender a situação, até que o
usurário lhe mostra o documento que formalizara a negociação. Com Joana ao fundo da
cena e Jorge e Gomes retornando ao proscênio, Lima não contém mais o segredo que
guardara.
DR. LIMA – Desgraçado!...
JORGE – Doutor!...
DR. LIMA – Tu vendeste tua mãe! (Joana foge).
JORGE – Minha mãe!... Ah!
DR. LIMA – Tua mãe, sim!... Digo-o alto! porque te sei bastante nobre para
não renegares aquela que te deu o ser (ALENCAR, 1940?, p. 201).
Após pagar a dívida, Jorge procura por Joana, enquanto Gomes rejeita a hipótese
de casamento por conta da ascendência do noivo. Por fim, a mãe recém-descoberta
ingere o veneno adquirido por Gomes e recebido por Jorge das mãos de Elisa. No
desfecho, Peixoto é preso por falsificação e Joana morre nos braços do filho, o que
comove também a Gomes, que abençoa o casamento dos jovens namorados.
Em “A importação do romance e suas contradições em Alencar”, Roberto
Schwarz retoma a discussão entre Alencar e Nabuco, apontando que
Nabuco põe o dedo em fraquezas reais, mas para escondê-las; Alencar pelo
contrário incide nelas tenazmente, guiado pelo senso da realidade, que o leva
a sentir, precisamente aí, o assunto novo e o elemento brasileiro. Ao
circunscrevê-las sem as resolver, não faz grande literatura, mas fixa e varia
elementos dela – um exemplo a mais de como é tortuoso o andamento da
criação literária (SCHWARZ, 2000, p. 40).
A tese de Schwarz que percorre o ensaio acerca da importação da forma romanesca por
Alencar pode ser sintetizada na ideia de que o defeito de composição decorrente da
adoção acrítica do modelo europeu torna-se acerto da imitação, sendo incorporado no
plano do conteúdo. Assim, entra em jogo uma combinação esdrúxula, mas real, que
conjuga clientelismo e ideologia liberal – e, pensando mais especificamente em Mãe,
podemos acrescentar a combinação de escravismo e capitalismo.
Na peça, somos apresentados a duas configurações de escravocrata, que,
conforme a leitura da obra, podem ser vistas como o “bom senhor” e o “mau senhor”. O
primeiro caso é representado por Jorge, que sequer consegue verbalizar a condição de
escrava de Joana, tendo-a como uma “segunda mãe” (ainda que escravizada), como
podemos observar na cena em que o estudante a entrega às mãos de Peixoto:
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JORGE – Tenho apenas uma súplica a fazer-lhe.
PEIXOTO – Que diremos?
JORGE – Durante o tempo que esta... que Joana vai estar em sua casa.
PEIXOTO – Que é minha escrava, quer o senhor dizer.
JORGE – Peço-lhe que a trate com doçura. Está habituada a viver comigo,
mais como uma companheira do que...
PEIXOTO – Escusa pedir-me isto. Sou bom senhor. O caso é saberem levarme. Anda, mulata! Vamos (ALENCAR, 1940?, p. 159-160).
As reticências de Jorge são completadas por Peixoto, o negociante pérfido que
não faz mais do que seguir à risca a ideologia escravagista que mercantiliza o indivíduo
escravizado – e, por sua vez, pode ser vista como uma expressão radicalizada da
racionalidade “desumana”, de tipo mecânico, das esferas econômica e política, que,
segundo Schwarz, subordina ao mesmo título “objetos e força de trabalho”
(SCHWARZ, 2000, p. 55).
De forma periférica, temos ainda o caso de Lima, que é referido em uma
conversa entre Joana e Vicente, um escravo liberto que pertencera ao médico e durante
a ação do drama exercia a função de oficial de justiça. Ao lembrarem do passado em
que ambos viviam sob a tutela de Lima junto a Jorge, o tom é saudoso, quase
nostálgico:
VICENTE – É mesmo, tia Joana. Bom tempo! Sr. doutor [Lima] só fazia
ralhar. Tirante disso, era bom amo.
JOANA – Tem tido notícias dele?
VICENTE – Depois que foi viajar, nunca mais soube por onde anda.
JOANA – E a comadre Rosa que ele vendeu a um homem da rua da
Alfândega?
VICENTE – Essa morreu... O André está cocheiro na praça.
JOANA – Cada um para sua banda (ALENCAR, 1940?, p. 62).
O mesmo Lima, que insiste na libertação de Joana por Jorge, vendeu Rosa,
comadre para Joana e propriedade para ele. Assim, a possibilidade de ver o escravo
como humano para o médico parece ser condicionada por algum vínculo específico.
Retomando Rancière, agora por meio de A partilha do sensível, podemos pensar em
quais são as possíveis condições para que Lima – e, em certa medida, Jorge –
discriminem quais são os escravos comercializáveis e quais são os escravos que devem
ser libertados. Segundo o autor, partilha do sensível é
o sistema de evidências sensíveis que revela, ao mesmo tempo, a existência
de um comum e dos recortes que nele definem lugares e partes respectivas.
Uma partilha do sensível fixa portanto, ao mesmo tempo, um comum
partilhado e partes exclusivas. Essa repartição das partes e dos lugares se
funda numa partilha de espaços, tempos e tipos de atividade que determina
propriamente a maneira como um comum se presta à participação e como uns
e outros tomam parte nessa partilha (RANCIÈRE, 2009, p. 15, grifos do
autor).
Joana é vista por Lima como alguém que deveria participar desse comum,
julgando que a relação de maternidade sobrepujaria a relação de propriedade que a une a
Jorge; este, ao descobrir em sua escrava sua mãe, posiciona-se da mesma maneira.
Joana, contudo, em sua visão de excluída do comum, percebe que a possibilidade de sua
entrada nesse espaço consistiria na exclusão de seu filho do mesmo espaço, o que é
parcialmente comprovado por Gomes, que inicialmente recusa a proposta de casamento
por conta da ascendência de Jorge. A resolução dos problemas só virá com o suicídio de
Joana, que “purga” simbolicamente o estigma de seu filho ao negar a si mesma,
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lembrando-se que ela morre sob a condição legal de escrava, visto que sua carta de
alforria fora rasgada.
4. Os escravocratas
Conforme pródomo assinado por Artur Azevedo e Urbano Duarte, o drama em
três atos O escravocrata, escrito em 1882 “e submetido à aprovação do Conservatório
Dramático Brasileiro sob o título A família Salazar, não mereceu o indispensável
placet” (AZEVEDO, 1985, p. 179). Assim, a obra foi publicada em 1884, tendo por
ambição declarada pelos autores o esforço em concorrer “com o pequenino impulso das
nossas penas para o desmoronamento da fortaleza negra da escravidão” (AZEVEDO,
1985, p. 180).
Se na peça de Alencar Joana é lastro para empréstimo e, por fim, propriedade
vendida a retro, temos n’O escravocrata um início que leva ao extremo a
institucionalização do comércio escravagista, apresentando como cenário do primeiro
dos três atos uma casa de alugar escravos. Na cena inicial, Salazar, o escravocrata,
instrui seu caixeiro a respeito da entrega de “quarenta e quatro cabeças”, incluindo
Lourenço, um de seus escravos particulares, de quem ele pretendia se livrar. Em
seguida, conversa com seu sócio, Sebastião, acerca dos negócios, em um diálogo que
exerce função expositiva, ilustrando a crueldade dos comerciantes de escravos e
sinalizando o impacto da campanha abolicionista:
SALAZAR – Negro não tem licença para estar doente. Enquanto respira, há
de poder com a enxada, quer queira, quer não.
SEBASTIÃO – De acordo, mas hoje anda aí em moda tratá-los bem... com
humanidade... não sei que mais...
SALAZAR – Tolices! Humanidade para negro! Para moléstia de negro há
um remédio supremo, infalível e único: o bacalhau. Dêem-me um negro
moribundo e um bacalhau, que eu lhes mostrarei se o não ponho lépido e
lampeiro com meia dúzia de lambadas!
SEBASTIÃO – Perfeitamente de acordo. Mas, quer queiramos, quer não,
temos de contemporizar com essas ideias... Os tais senhores abolicionistas...
SALAZAR (Erguendo-se e descendo ao proscênio.) – Psiu! Não me fales
nessa gente, pelo amor de Deus! Só o nome dessa cáfila de bandidos que
ultimamente me têm feito perder mais de oitenta contos, irrita-me de um
modo incrível! (AZEVEDO, 1985, p. 184).
Ainda nesta cena, quando questionado por Sebastião acerca de Lourenço,
Salazar confirma que ele será enviado à sua fazenda por ser muito “emproado”, ainda
que Gabriela, sua esposa, o proteja, alegando que ele seria cria da casa. Ao longo da
peça, descobrimos que a real causa dessa proteção é o fato de ter havido uma relação
sexual, talvez amorosa, entre ambos, cujo fruto foi Gustavo, que fora criado como filho
legítimo por Salazar sem que este duvidasse de sua paternidade.
Gustavo, por sua vez, apresenta de início um alinhamento à posição de Salazar,
opondo-se aos abolicionistas que atacam seu suposto pai por meio de publicações na
imprensa. Entretanto, quando presencia Salazar prestes a chicotear Lourenço por este
não abaixar a vista, intervém:
GUSTAVO – Peço por ele, meu pai! Lourenço é um escravo dócil e
obediente (A Lourenço, com brandura.). Abaixa a vista, Lourenço (Lourenço
obedece.). Pede humildemente perdão a meu pai de lhe não haveres
obedecido incontinenti.
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LOURENÇO – Peço humildemente perdão a meu senhor... (AZEVEDO,
1985, p. 188-189).
O seu comportamento parece oscilar, portanto, entre o de Salazar, em sua
aversão aos negros, e o de Gabriela, em sua afeição por Lourenço, podendo ser
exemplificado pela seguinte fala que dirige a Salazar: “[...] para esta raça amaldiçoada
só há três princípios: o eito, o bacalhau e a força! Mas não posso deixar de abrir uma
exceção para o Lourenço...” (AZEVEDO, 1985, p. 189).
Como traço importante de sua personalidade temos, ainda, sua propensão para o
jogo, sendo que uma de suas preocupações centrais no drama é arranjar quatrocentos
mil réis para saldar suas dívidas, quantia que não lhe é concedida por Salazar, que
ironicamente o incita a ganhar o dinheiro com o “suor de seu rosto”. Será Lourenço,
com suas economias (cento e vinte mil, seiscentos e vinte réis), que ajudará Gustavo em
um primeiro momento, ao perceber que o filho está endividado por conta do jogo.
Ao final do primeiro ato, Gabriela e Carolina, filha do casal Salazar, conseguem
convencer o escravocrata a manter Lourenço junto à família, submetendo-se à condição
única de não intervirem quando o patriarca julgasse que o escravo merecesse sofrer
castigos físicos. Com isso, Lourenço pôde testemunhar, já na casa dos Salazar, no
segundo ato, a acusação feita por um credor de que Gustavo teria falsificado uma letra,
assinando-a por Salazar, no valor de quinhentos mil réis. Lourenço toma o documento
das mãos do credor e o rasga, prometendo que o pagaria dentro de pouco tempo,
enquanto Gabriela traz joias para cobrir a dívida; o credor, em uma comoção
inverossímil, aceita que o pagamento seja feito quando possível.
Em mais uma tentativa de obter dinheiro para apostar no jogo e resgatar a letra
falsificada, Gustavo decide roubar diretamente do gabinete de Salazar. Sendo impedido
por Lourenço, que lhe toma o dinheiro, desfere uma bofetada contra o rosto de seu
escravo-pai, que acaba por lhe revelar o segredo que guardava há vinte e dois anos:
LOURENÇO (Em tom singular.) – Esta bofetada será um direito perante os
homens, mas perante Deus é um sacrilégio. Eu...
GABRIELA (Correndo para Lourenço.) – Lourenço, não o digas!
LOURENÇO (Desvencilhando-se.) – Eu sou teu pai! (Tomando Gabriela
pelo braço.) Negue! Negue, se é capaz! (Gabriela dá um grito e cai
desfalecida. Longa pausa. Gustavo fulminado recua paulatinamente, fitando
Lourenço com o olhar desvairado. Entra Salazar, que estaca no fundo ao ver
a cena.) (AZEVEDO, 1985, p. 202-203).
O terceiro ato se passa na fazenda dos Salazar, com Gustavo recuperando-se de
“fortíssima comoção cerebral” (conforme o diagnóstico de Eugênio, médico da família e
pretendente abolicionista de Carolina) e com Gabriela internada no Hospício de Pedro
II. Lourenço, responsabilizado pelo furto malogrado de Gustavo, conseguira fugir,
sendo recapturado por um empregado de Salazar. A título de desfecho do drama,
Lourenço se enforca, evitando que Gustavo seja ferido por Salazar, o que suscita uma
revolta dos escravos da fazenda, que se armam de foices e machados contra o
escravocrata. A sublevação é interrompida, todavia, pelo pedido de misericórdia de
Carolina, o que faz com que os escravos larguem suas armas e saiam “resmungando”
sem que saibamos se a revolta seria abortada ou se resultaria em fuga. Gustavo, por fim,
é encontrado morto junto ao cadáver do pai.
5. A escravidão no palco: continuidade e ruptura
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Para realizarmos um cotejo que não peque por anacronia, não podemos deixar de
levar em consideração a distância temporal que separa O escravocrata, escrito em 1882
e publicado em 1884, de Mãe, escrito em 1855 e estreado em 1860. Nesse intervalo, o
movimento abolicionista ganhou corpo e representatividade na esfera pública brasileira,
utilizando-se de diversos canais de comunicação, como jornais, opúsculos e meetings, e
contando com a criação de diversos clubes e associações.
Enquanto Alencar se manifestava publicamente como partidário da emancipação
espontânea, Azevedo e Duarte eram abolicionistas declarados, sendo que o primeiro
deles chegou a realizar uma leitura do primeiro ato de O escravocrata em reunião da
Abolicionista Cearense, leitura que, conforme comentário publicado na seção editorial
da Gazeta de Noticias, fora “interrompida constantemente pela hilariedade”
(ABOLICIONISTA..., 1884, p. 2).
Ao contrário de Mãe, que possui raros momentos de distensão, O escravocrata
apresenta uma mescla de estilos acentuada, reservando a alguns personagens funções de
alívio cômico, principalmente no que se refere às figuras de Josefa, irmã de Salazar, e
do ex-abolicionista Serafim, empregado do escravocrata. A primeira é caracterizada
como uma senhora provinciana e tagarela, constantemente ignorada por todos, que
odeia pessoas negras. O segundo, por sua vez, é representado como um oportunista que,
ao ver que o abolicionismo não estava sendo “lucrativo”, oferece seus trabalhos para o
escravocrata; ao final do drama, com a sublevação dos escravos, abandona o serviço,
considerado demasiado perigoso, resolvendo voltar a ser “abolicionista”.
Além desse abolicionista de ocasião, temos a figura de Eugênio, que marca seu
posicionamento por meio de seu discurso, mas evita entrar em choque com o pai de sua
pretendente, fato que Josefa não deixa passar em branco por meio de uma indireta
endereçada a ele, a quem diz ser um dos “sujeitinhos que são abolicionistas, mas que
andam à coca de meninas que têm escravos” (AZEVEDO, 1985, p. 196). O
personagem, estabelecido na oscilação entre o amor pela namorada e o engajamento
pela causa, justifica sua hesitação a Gabriela e Carolina posicionando-se da seguinte
forma:
[...] Se bem que não apresente como paladino, faço modestamente tudo
quanto posso pela causa da emancipação dos escravos (Pausa.). Estou
perfeitamente convicto de que a escravidão é a maior das iniquidades sociais,
absolutamente incompatível com os princípios em que se esteiam as
sociedades modernas. É ela, é só ela a causa real do nosso atraso material,
moral e intelectual, visto como, sendo a base única da nossa constituição
econômica, exerce a sua funesta influência sobre todos os outros ramos da
atividade social que se derivam logicamente da cultura do solo. Mesmo no
Rio de Janeiro, esta grande capital cosmopolita, feita de elementos
heterogêneos, já hoje possuidora de importantes melhoramentos, o elemento
servil é a pedra angular da riqueza. O estrangeiro que o visita, maravilhado
pelos esplendores da nossa incomparável natureza, mal suspeita das amargas
decepções que o esperam. Nos ricos palácios como nas vivendas burguesas,
nos estabelecimentos de instrução como nos de caridades, nas ruas e praças
públicas, nos jardins e parques, nos pitorescos e decantados arrabaldes, no
cimo dos montes, onde tudo respira vida e liberdade, no íntimo do lar
doméstico, por toda a parte, em suma, depara-se-lhe o sinistro aspecto do
escravo, exalando um gemido de dor, que é ao mesmo tempo uma
imprecação e um protesto. E junto do negro o azorrague, o tronco e a força,
trípode lúgubre em que se baseia a prosperidade do meu país! Oh! não! Cada
dia que continua este estado de coisas, é uma cusparada que se lança à face
da civilização e da humanidade! Sei que me acoimarão de idealista, alegando
que não se governam nações com sentimentalismos e retóricas. Pois bem, há
um fato incontroverso e palpável, que vem corroborar as minhas utopias. É
sabido que os imigrantes estrangeiros não procuram o Brasil ou não se
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conservam nele, por não quererem emparceirar-se com os escravos. A
escravidão é uma barreira insuperável à torrente imigratória. Portanto penso
que só há uma solução para o problema da transformação do trabalho: a
espada de Alexandre! (AZEVEDO, 1985, p. 199).
Nessa longa fala ecoam diversos argumentos correntes do ideário abolicionista
hegemônico, dirigido para os problemas macroeconômicos decorrentes do regime
escravocrata e coroado pelo incentivo à imigração estrangeira – em outras palavras,
europeia –, não se detendo no problema da ressocialização e inserção dos ex-escravos
no mercado de trabalho.
No artigo “O bom escravo e As vítimas-algozes”, Brito Broca formula a hipótese
de que a propaganda abolicionista foi formalizada na literatura romântica brasileira por
duas vias distintas, sendo que uma delas apresentava
o escravo como uma criatura cheia de virtudes, superando os males da
instituição; noutra mostrando-o como um ser infeliz e miserável, levado ao
vício ou ao crime por culpa exclusiva do cativeiro. No primeiro caso temos
uma imagem idealizada e romântica do negro, que o torna até superior ao
branco. No segundo, uma imagem realista: o escravo dificilmente poderia ser
bom na condição nefanda a que o relegava o cativeiro (BROCA, 1979, p.
271-273 apud FARIA, 2013, p. 95).
Partindo dessa premissa, podemos ler tanto Joana quanto Lourenço como
indivíduos virtuosos, que, apesar da escravidão, mantêm sua dignidade e sua
integridade. Joana abdica de sua liberdade, Lourenço abdica de suas economias e ambos
rasgam papeis importantes em cena: a própria alforria, no caso da mãe-escrava de Jorge,
e a letra falsificada pelo filho, no caso do pai-escravo de Gustavo, que se
responsabilizaria por sua dívida.
Para além disso, podemos derivar duas outras categorias da hipótese de Broca
por meio de uma inversão, encontrando o “bom senhor” e o “mau senhor”, categorias
separadas por uma distinção tênue. Assim, temos Jorge e Lima, em Mãe, e Gabriela e
Carolina, em O escravocrata, como senhores piedosos – e, em boa medida, idealizados
– que protegem não os escravos, mas escravos em particular, aos quais se vinculam por
laços de afeição – o que não redunda na supressão do laço de propriedade. No âmbito
dos maus senhores, temos tanto as figuras dos “burgueses escravocratas”, como o
usurário Peixoto e o escravocrata Salazar (orbitado por funcionários, pelo sócio
Sebastião e pela irmã Josefa), quanto a figura de Gustavo, que esboça, em um trajeto
brusco, alguma redenção, atribuindo ao meio vicioso a causa para seus desvios morais.
Sendo assim, as duas peças tensionam a questão da escravidão de diferentes
formas e plasmam contradições sociais amplamente debatidas na segunda metade do
século XIX. Mãe apresenta a escravidão como problema a ser resolvido pelos “bons”
senhores de escravos em uma perspectiva reformista e paulatina que não tem por intuito
ofender as relações de propriedade. Esse posicionamento encontraria eco, por exemplo,
na Lei do Ventre Livre, promulgada em 1871 pelo gabinete conservador de Rio Branco,
que, ainda que tenha abalado a estrutura do regime escravocrata, lhe dava ainda algum
fôlego. Em O escravocrata, por sua vez, temos a escravidão representada com toda a
sua torpeza, levando os personagens escravocratas às raias da caricatura. Contudo, o
anticlímax final se constitui como saída um tanto conformista, sugerindo uma
sublevação que ainda não se completa. Ainda assim, a revolta dos escravos não deixa de
prenunciar a intensificação do apoio a fugas e de ações de desobediência civil que,
conforme Angela Alonso (2014), teria como estopim o recrudescimento da repressão
aos movimentos abolicionistas realizada pelo gabinete Cotegipe em 1885.
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REFERÊNCIAS
ABOLICIONISTA... Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, ano 10, n. 147, p. 2, 26 mai.
1884. Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/103730_02/7009>. Acesso em:
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ALONSO, Angela. O abolicionismo como movimento social. Novos Estudos CEBRAP,
São Paulo, n. 100, nov. 2014, p. 115-137. Disponível em:
<http://novosestudos.uol.com.br/wpcontent/uploads/2017/03/07_abolicionismo.pdf.zip>. Acesso em: 15 ago. 2017.
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de Artur Azevedo II. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Artes Cênicas, 1985.
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