Amar se aprende amando
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Sobre este e-book
"O mundo é grande e cabe / nesta janela sobre o mar. / O mar é grande e cabe / na cama e no colchão de amar. / O amor é grande e cabe / no breve espaço de beijar." Com versos assim, que conciliam sofisticação e simplicidade, esta coletânea exalta o mais nobre "sentimento do mundo".
Publicado originalmente em 1985, apenas dois anos antes da morte de Drummond, Amar se aprende amando nos revela as diferentes facetas do amor. Para falar delas, o poeta sempre encontra um viés inusitado (como nos saborosos neologismos "sempreamar" e "pluriamar"), que evidencia sua aversão à retórica e evita a pieguice que ronda a poesia quando se fala das "coisas do coração". Seus versos fazem aquilo que para muitos é impossível: traduzem sentimentos indescritíveis em palavras.
Se o amor romântico, aquele precedido pela paixão arrebatadora, tem destaque em poemas impactantes como "Amor" e "Lira do amor romântico", Drummond também mostra que "O amor antigo tem raízes fundas, / feitas de sofrimento e de beleza". Na segunda seção do livro, abre o leque para compor poemas magistrais sobre o amor fraterno, com destaque para o comovente "Companheiro", feito para os 80 anos do amigo Pedro Nava. Na última parte, o poeta incorpora o cronista em versos tirados da realidade brasileira, que, àquela altura, caminhava para uma transição democrática depois dos amargos "anos de chumbo".
Em Amar se aprende amando, o leitor convive com um Drummond atento à realidade, lírico e genial.
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Amar se aprende amando - Carlos Drummond de Andrade
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
A566a
35. ed.
Andrade, Carlos Drummond de, 1902-1987
Amar se aprende amando [recurso eletrônico] / Carlos Drummond de Andrade. – 35. ed. – Rio de Janeiro: Record, 2024.
recurso digital
Formato: epub
Requisitos do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: world wide web
ISBN 978-85-01-92155-0 (recurso eletrônico)
1. Poesia brasileira. 2. Livros eletrônicos. I. Título.
24-88226
CDD: 869.1
CDU: 82-1(81)
Gabriela Faray Ferreira Lopes – Bibliotecária – CRB-7/6643
Carlos Drummond de Andrade © Graña Drummond
www.carlosdrummond.com.br
Texto revisado segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, armazenamento ou transmissão de partes deste livro, através de quaisquer meios, sem prévia autorização por escrito.
Direitos exclusivos desta edição reservados pela
EDITORA RECORD LTDA.
Rua Argentina, 171 – Rio de Janeiro, RJ – 20921-380 – Tel.: (21) 2585-2000.
Produzido no Brasil
Cópia não autorizada é crime. Respeite o direito autora. ABDR Associação brasileira de direitos reprográficos. Editora filiada.ISBN 978-85-01-92155-0
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SUMÁRIO
carta de guia (?) de amantes
Reconhecimento do amor
Além da terra, além do céu
O tempo passa? Não passa
O mundo é grande
Amor
Seis manequins
Úni dúni têni
Lira do amor romântico
O amor antigo
Epitalâmio
O amor determina
A lamentável história dos namorados
o convívio ideal
O combate da luz
Fazer 70 anos
O correio de amigos é doçura
O que Alécio vê
Esboço de figura
A kiss, un baiser, un bacio
Versos para Ana Cecília do Recife
Sequestro de Guilhermino César
Eu quisera ver o mundo
A festa de Ziraldo
Companheiro
Diante das fotos de Evandro Teixeira
Centenário
Em memória de Alphonsus de Guimaraens
O destino de Edgard Mata
Volto à casa de Helena
Primeiro morto
Reunião em dezembro
Presença de Mira
Odylo, na manhã
Tintim para Luís Martins
O escritor
Alceu, radiante espelho
alegrias e penas por aí
Relatório de maio
Miniversos
Ai dos macacos
Festival em verso
A semana foi assim
As notícias
Lira pedestre
Assanhamento
Em março, esta semana
A bolsa, o bolso
A queda
Praia palma paz
Pré-inverno
Microlira
Nova Rua São José
Textos mínimos
Notícias de janeiro
Carnaval chegando
Esparsos de 1976
Conversa de amigos
Foi-se a Copa?
Conversa com o lixeiro
Rio em flor de janeiro
Ver e ouvir, sem brincar
Brinquedos para homens
A excitante fila do feijão
A amiga voltou
Liquidação de inverno
Tempo de ipê
Aqui havia uma praça
Salário
O poema da Bahia que não foi escrito
Sonetos heredianos
Posfácio, por Bruno Gambarotto
Cronologia: Na época do lançamento (1982-1987)
Bibliografia de Carlos Drummond de Andrade
Bibliografia sobre Carlos Drummond de Andrade (seleta)
Índice de primeiros versos
"O amor que move o sol,
como as estrelas."
O verso de Dante
é uma verdade resplandecente,
e curvo-me ante a sua magnitude.
Ouso insinuar,
sem pretensão a contribuir
para que se desvende o mistério amoroso:
Amar se aprende amando.
Sem omitir o real cotidiano,
também matéria de poesia.
CARTA DE GUIA (?) DE AMANTES
RECONHECIMENTO DO AMOR
Amiga, como são desnorteantes
os caminhos da amizade.
Apareceste para ser o ombro suave
onde se reclina a inquietação do forte
(ou que forte se pensava ingenuamente).
Trazias nos olhos pensativos
a bruma da renúncia:
não querias a vida plena,
tinhas o prévio desencanto das uniões para toda a vida,
não pedias nada,
não reclamavas teu quinhão de luz.
E deslizavas em ritmo gratuito de ciranda.
Descansei em ti meu feixe de desencontros
e de encontros funestos.
Queria talvez – sem o perceber, juro –
sadicamente massacrar-te
sob o ferro de culpas e vacilações e angústias que doíam
desde a hora do nascimento,
senão desde o instante da concepção em certo mês perdido na História,
ou mais longe, desde aquele momento intemporal
em que os seres são apenas hipóteses não formuladas
no caos universal.
Como nos enganamos fugindo ao amor!
Como o desconhecemos, talvez com receio de enfrentar
sua espada coruscante, seu formidável
poder de penetrar o sangue e nele imprimir
uma orquídea de fogo e lágrimas.
Entretanto, ele chegou de manso e me envolveu
em doçura e celestes amavios.
Não queimava, não siderava; sorria.
Mal entendi, tonto que fui, esse sorriso.
Feri-me pelas próprias mãos, não pelo amor
que trazias para mim e que teus dedos confirmavam
ao se juntarem aos meus, na infantil procura do Outro,
o Outro que eu me supunha, o Outro que te imaginava,
quando – por esperteza do amor – senti que éramos um só.
Amiga, amada, amada amiga, assim o amor
dissolve o mesquinho desejo de existir em face do mundo
com olhar pervagante e larga ciência das coisas.
Já não defrontamos o mundo: nele nos diluímos,
e a pura essência em que nos transmutamos dispensa
alegorias, circunstâncias, referências temporais,
imaginações oníricas,
o voo do Pássaro Azul, a aurora boreal,
as chaves de ouro dos sonetos e dos castelos medievos,
todas as imposturas da razão e da experiência,
para existir em si e por si,
à revelia de corpos amantes,
pois já nem somos nós, somos o número perfeito:
UM.
Levou tempo, eu sei, para que o Eu renunciasse
à vacuidade de persistir, fixo e solar,
e se confessasse jubilosamente vencido,
até respirar o júbilo maior da integração.
Agora, amada minha para sempre,
nem olhar temos de ver nem ouvidos de captar
a melodia, a paisagem, a transparência da vida,
perdidos que estamos na concha ultramarina de amar.
ALÉM DA TERRA, ALÉM DO CÉU
Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.
O TEMPO PASSA? NÃO PASSA
O tempo passa? Não passa
no abismo do coração.
Lá dentro, perdura a graça
do amor, florindo em canção.
O tempo nos aproxima
cada vez mais, nos reduz
a um só verso e uma rima
de mãos e olhos, na luz.
Não há tempo consumido
nem tempo a economizar.
O tempo é todo vestido
de amor e tempo de amar.
O meu tempo e o teu, amada,
transcendem qualquer medida.
Além do amor, não há nada,
amar é o sumo da vida.
São mitos de calendário
tanto o ontem como o agora,
e o teu aniversário
é um nascer toda hora.
E nosso amor, que brotou
do tempo, não tem idade,
pois só quem ama escutou
o apelo da eternidade.