ALFABETIZAO E LINGUAGEM: REFLETINDO SOBRE ORALIDADE, LEITURA E

ESCRITA.
Francisca Samara Teixeira*
Magna Amaro
Vilma Viana
No possvel refazer este pas, democratiz-lo, humaniz-lo, torn-lo srio, com adolescentes
brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, invibializando o amor. Se a
educao sozinha no transformar a sociedade, sem ela to pouco a sociedade muda.
Paulo Freire
Resumo
O cenrio educacional brasileiro sempre foi um caso a se refletir em especial se o que esta na teoria
to presente em nossas universidades tambm se encontra na prtica. O objetivo do presente
trabalho refletir sobre o processo de alfabetizao enfocando os aspectos da oralidade, da leitura e
da escrita, baseando-se em uma observao realizada em uma escola da rede pblica da cidade de
Fortaleza. Buscamos apresentar concepes tericas articulando-as com o trabalho realizado pela
educadora de uma turma do 1 ano, refletindo sobre a importncia e o papel que a famlia e a
sociedade desempenham no processo de construo e desenvolvimento de uma aprendizagem
significativa para a vida e para a sociedade.
Palavras-chave: oralidade, leitura e escrita.
Introduo
Nos ltimos tempos atribui-se, no que se refere ao insucesso escolar no Brasil, as dificuldades
sociais e econmicas da populao. Causa que vem se alastrando h dcadas, sendo uma questo
eminentemente poltica. Mas no por motivos como estes que ns, como futuros educadores,
deixaremos de dar a nossa contribuio para reverter essa situao.
Nesta perspectiva iremos abordar o processo de alfabetizao atravs de um estudo realizado na
EMEIF Frei Tito de Alencar Lima, localizada na Praia do futuro, em Fortaleza, com a professora
Lindalva Fernandes, mostrando como ocorre o processo de alfabetizao e letramento enfocando a
oralidade, a leitura e a escrita, como a educadora trabalha e sua contribuio para a diminuio do
insucesso escolar.
Refletiremos se a educadora possibilita aos seus educandos a oportunidade de escreverem seus
textos livremente, poderem contar suas histrias de vida e os v-los respeitados e valorizados, alm
de trocarem experincias, se reconhecendo, dessa forma, como agentes de seus textos.
*Estudantes do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Cear.
Consideramos que pensar em educao, letramento e linguagem relevante, mas, acima de tudo,
devemos pensar no ser humano, na aquisio de desenvolvimento da oralidade e da escrita pelo
aluno. Isso pensar no outro, na interao, na troca de experincias, no prazer da comunicao, nas
maravilhas que a leitura e a escrita podem proporcionar ao educando.
Dando a oportunidade para que no seja somente um leitor de textos, mas tambm um leitor crtico
dos mesmos e de sua realidade, para que possa transform-la tornando-se assim, um sujeito ativo
em sua aprendizagem e um cidado responsvel para consigo e com a sociedade.
Oralidade, leitura e escrita como formas de aprendizagem
A oralidade, a leitura e a escrita esto presentes em nosso cotidiano de forma articulada. Uma
contribui para o desenvolvimento da outra. Diante disso uma das principais tarefas da escola seria
fazer com que todos os educandos tenham o conhecimento e domnio das mltiplas funes da

linguagem, onde esta possui diferentes manifestaes e tem por objetivo a ao da comunicao
entre as pessoas.
De acordo com DIAS (2001, p. 25) nossa tarefa, como educadores, seria abordar os mais variados
tipos de textos em sala de aula, analisando as semelhanas e diferenas, a estrutura textual de cada
um, o vocabulrio utilizado, buscando incentivar a leitura, a interpretao e a produo pelos
prprios alunos dos mais variados portadores de textos existentes e utilizados em nossa sociedade.
A professora que observamos aderiu ao PAIC (Programa Alfabetizao na Idade Certa). Seu
trabalho baseia-se em uma avaliao diagnstica, onde registra em qual nvel de leitura e escrita as
crianas se encontram, para que, a partir das dificuldades apresentadas, possa planejar suas
intervenes.
Para estabelecer uma boa relao entre as crianas a professora promove atividades que contribuem
para que haja uma boa adaptao das crianas ao ambiente escolar. Procura sempre planejar uma
semana bem acolhedora e divertida trazendo, por exemplo, brincadeiras que gerem interao e
convvio em grupo.
Trabalha a oralidade, a leitura e a escrita de forma articulada. Fixa cartazes nas paredes para que as
crianas acompanhem o que for sendo vivenciado. Ler palavras para que elas repitam e depois
escrevam, seja coletivamente ou individualmente. Confecciona para os alunos fichas com seus
respectivos nomes, em letra cursiva e em letra basto, para proporcionar o contato deles com as
letras de seus nomes e da de seus colegas. Com estas fichas so realizadas atividades como:
identificar a ficha que contem o nome do colega, contar o numero de letras destacando a letra inicial
e a final.
Estimula a conscincia fonolgica cantando msicas que as crianas conhecem trocando as palavras
por sons de slabas. Por exemplo: na msica Atirei o pau no gato... cantam PA, PA, PA... (de
acordo com a melodia); depois com outras slabas, sucessivamente.
A oralidade trabalhada, em especial, atravs da construo de histrias, leituras dramatizadas,
leituras compartilhadas, teatrinho de fantoches, onde, em seguida, as crianas so convidadas a
recontarem e a escreverem as histrias de seus jeitos. Outra atividade consiste em pedir para as
crianas elaborem uma lista de personagens com os quais se identificam na histria.
Observamos que uma atividade onde todos se envolvem, alguns querem recontar, outros, desenhar
e escrever.
Uma conseqncia visvel desta atividade que todos os dias acontecem emprstimos de livros
paradidticos que so levados para casa por interesse das crianas. Esta atividade acaba estimulando
at mesmo os pais a se envolverem na aprendizagem dos filhos aproximando-os afetivamente.
Para a professora, quando os pais se envolvem no desenvolvimento das crianas perceptvel. Ela
procura conversar com os mesmos diariamente e principalmente nas reunies em sala de aula.
Procura sempre pedir para que os pais leiam com as crianas diariamente, sejam rtulos de
embalagens e propagandas, sejam anncios e os livros que as crianas levam para casa.
No se trata, simplesmente, de se ensinar a criana a falar, mas de desenvolver sua oralidade e
saber lidar com ela nas mais diversas situaes. (DIAS, 2001, p.36)
A docente trabalha a leitura de forma prazerosa, ldica e formadora de leitores. Em um trabalho
conjunto com a escola, incentiva a leitura atravs do emprstimo de livros pela biblioteca e minibiblioteca nas salas de aula da educao infantil e primeiro ano. Existe uma atividade denominada
Ciranda de Leitura, onde os livros so divididos por gneros, cada sala fica com o que achar ideal se
trabalhar. Durante a semana todo processo de leitura e produo textual feito juntamente com a
professora.
A escola da grande importncia a literatura infantil, pois, para a mesma, o prazer de ler tem que ser
cultuado desde a infncia.

Atravs da literatura as crianas imaginam, conhecem, crescem, formando senso crtico,

incentivando a possibilidade de termos futuros leitores e grandes escritores.
A professora acredita na contribuio da leitura para a alfabetizao e o letramento, pois, segundo
ela, quando se incentiva a criana a ler, na contao, por exemplo, ela j quer recontar a histria,
quer escrever mesmo sendo pr-silbica. A partir da vai tendo vontade e o prazer de aprender, de
escrever, de falar aos colegas.
Tudo isso no deve ser cultivado s na escola, mas tambm pela famlia e todos os segmentos
poltico-governamentais. Deve-se ter em mente que so de fundamental importncia para o
desenvolvimento de um pas que clama por uma educao de qualidade.
Observamos que a entrevistada procura contemplar as etapas e os nveis de compreenso leitora.
Percebe-se que a criana j chega escola com o conhecimento sobre os objetos e suas funes,
procurando fazer relaes entre a palavra falada com a imagem do objeto.
A linguagem das crianas vai se tornando cada vez mais prxima da dos adultos, atravs da
imitao e comparao. Trabalha para que as crianas alcancem de forma significativa os outros
nveis da compreenso leitora, que consistem na compreenso do material utilizado no meio social e
finalmente escrever, saber como se representa a fala no papel.
Vimos que o PAIC, em relao escrita, trabalha fundamentando-se no estudo da psicognese da
lngua escrita, desenvolvido por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. Nesta teoria destaca-se que as
crianas formulam uma srie de idias prprias sobre a escrita alfabtica enquanto esto aprendendo
a ler e a escrever. Reinventam e atribuem aos smbolos da escrita significados bastante distintos dos
que lhes transmitem os adultos que as alfabetizam.
Estas hipteses especificas foram classificadas por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky em quatro
nveis:
No nvel pr-silbico as crianas apresentam hipteses bastante elementares sobre a escrita.
Possuem dificuldades em diferenciar letras e nmeros. A escrita vista como um meio de se nomear
as coisas. Tendem a acreditar que se escreve guardando as caractersticas do objeto a ser escrito.
No silbico a quantidade de letras a serem grafadas corresponde a quantidade de segmentos
silbicos pronunciados. Podem se preocupar apenas com o aspecto quantitativo, marcando uma letra
qualquer para representar cada slaba da palavra. Quando comeam a utilizar, na escrita da slaba
das palavras, letras que possuem uma correspondncia com os sons representados temos a fase
silbica quantitativa.
A fase silbico-alfabtica caracteriza-se pelas hipteses muito prximas da escrita alfabtica. Aqui
as crianas j conseguem fazer uma relao entre grafemas e fonemas na maioria das palavras que
escrevem.
Finalmente, no nvel alfabtico, o aluno comea a compreender o como a escrita nota a pauta
sonora, ou seja, ela j capaz de fazer a relao entre grafemas e fonemas, embora ainda possua
problemas de transcrio da fala e cometa erros ortogrficos.
Nesta abordagem consideramos fundamental que os professores construam um mtodo de
alfabetizao que no planejamento das atividades esteja atento para a heterogeneidade do grupo,
oferecendo atividades diferenciadas para alunos que apresentam hipteses de escritas diferentes,
considerando que as respostas dos alunos nas atividades em sala so distintas, e nesse caso, o
confronto entre as diferentes respostas interessante.
Em nossa observao podemos destacar algumas atividades que nos chamaram ateno. A
professora busca escrever a agenda perguntando as crianas com que letra elas acham que se
escreve determinada palavra; tambm trabalha com ditados de palavras (as crianas escrevem do
jeito que sabem), visando assim, sabem se elas identificam as letras do alfabeto e se sabem graflas.

Os alunos tambm so solicitados a escreverem os nomes dos colegas da sala e o deles prprios
para que assim se possa avaliar se conseguem fazer esta atividade sozinhos, assim, a escrita
realizada pelas crianas servir para identificar em qual nvel psicogentico (relatado anteriormente)
elas se encontram.
O professor dever, em fim, estabelecer um trabalho que possibilite aos alunos desenvolverem suas
habilidades e se tornarem leitores e escritores autnomos. Dando importncia linguagem pela
necessidade humana de comunicar-se, decodificar o mundo, a sua realidade, para conhec-lo e
transform-lo resignificando-os.
A linguagem tem como objetivo principal a comunicao sendo socialmente construda e
transmitida culturalmente. Portanto, o sentido da palavra instaura-se no contexto, aparece no
dilogo e altera-se historicamente produzindo formas lingsticas e atos sociais. A transmisso
racional de experincia e pensamento a outros requer um sistema mediador, cujo prottipo a fala
humana, oriunda da necessidade de intercambio durante o trabalho. (VYGOTSKY, 1998. p. 07)
Alfabetizao: novos olhares e novas perspectivas.
O trabalho com a linguagem se constitui em um dos eixos bsicos no processo de alfabetizao,
dado a sua importncia para a formao do sujeito, para a interao com outras pessoas, na
orientao das aes das crianas, na construo de muitos conhecimentos e no desenvolvimento
psicomotor e afetivo.
Compreendemos que o domnio da linguagem surge do seu uso em variadas circunstncias, nas
quais as crianas podem perceber a funo social que ela exerce e por meio destas aquisies
desenvolverem diferentes capacidades. Desse modo, a aprendizagem da linguagem oral e escrita
um elemento essencial para que ampliem suas possibilidades de insero e participao em prticas
sociais diversas.
As palavras s tem sentido em enunciados e textos que significam e so significados por situaes.
Neste contexto, a linguagem no apenas o vocabulrio, lista de palavras e sentenas, por meio
do dilogo que a comunicao acontece. So os sujeitos em interaes singulares que atribuem
sentidos nicos as falas. Assim sendo, a alfabetizao no deve ser entendida como um
desenvolvimento de capacidades relacionadas percepo, memorizao e treino de habilidades
sensrio-motoras e sim como um processo no qual as crianas precisam resolver problemas de
natureza lgica at chegarem a compreender de que forma a escrita em portugus representa a
linguagem e assim poderem ler e escrever com autonomia.
Cabe ao processo de alfabetizao ajudar o discente a se constituir como pessoa, passando assim, a
conhecer-se. Um importante caminho a ser seguido a explorao dos vrios tipos de textos de
forma prazerosa, pondo em evidncia a prtica de despertar o interesse e a ateno dos discentes,
desenvolvendo a imaginao, a expresso das idias e o prazer pela leitura e escrita. Oportunizando
situaes nas quais as crianas possam interagir em seu processo de construo do conhecimento,
possibilitando o seu desenvolvimento e aprendizado de forma significativa, direcionando um
saudvel dilogo entre a criana e o livro.
A grandiosidade do processo de alfabetizar no pode ser somente compreendida como uma forma
de ensinar, mas de aprender e evoluir, permitindo assim, uma leitura de interpretaes do mundo e a
compreenso daquilo que se l. Nesse sentido a alfabetizao tem um importante papel, o de
conduzir as crianas aquisio da oralidade, da leitura e da escrita com fruio, isto , que se sinta
o prazer ao estar em sala de aula.
Alfabetizar a arte da criatividade que representa o mundo atravs da palavra, fundindo os sonhos e
a realidade da vida prtica, transformando-a em um processo de continuo aprendizado no convvio
escolar, formando leitores que tenham um envolvimento integral com aquilo que lem, para que a
cada leitura adquiram mais profundidade e intimidade com o mundo, fazendo perguntas e buscando
respostas para produzir um continuo aprendizado, desenvolvendo a reflexo e um esprito critico.

Ningum ignora tudo. Ningum sabe tudo. Todos nos sabemos alguma coisa. Por isso aprendemos
sempre. Paulo Freire
Como educadores devemos proporcionar aos discentes o prazer e gosto pela leitura, valorizando
suas experincias de vida atravs de atividades nas quais eles sejam participantes ativos na
construo do seu processo de aprendizagem. Passando a reconhecerem-se como sujeitos do
conhecimento e poderem expressar suas opinies sobre os temas abordados em sala.
Nesta nova concepo devemos estabelecer uma relao dialgica, onde educador e educando
vivenciem experincias de trocas de conhecimento, para que possa haver um levantamento daquilo
que os educandos j trazem do mundo e dessa forma elaborar estratgias de aprendizagem para se
ampliar os conhecimentos.
Consideraes Finais
Embasadas nestas reflexes consideramos relevante que o sucesso do processo de alfabetizao se
d atravs do posicionamento do professor em sensibilizar o aluno a encontrar o caminho e o prazer
pela descoberta de falar, de ler e escrever, utilizando-as para desenvolver a capacidade de pensar e
crescer, proporcionando atividades significativas como: trabalhos em grupos, debates, contao de
histrias, dramatizao, considerando o nvel de desenvolvimento cognitivo do aluno.
Sendo assim um sujeito atuante, que sente liberdade, prazer e gosto em ser alfabetizado, sentindo-se
valorizado ao participar desse processo.
Segundo Paulo Freire A educao sozinha no transforma a sociedade, sem ela pouco a
sociedade muda. Percebemos que a sociedade moderna nos bombardeia com uma srie de
informaes, na maioria das vezes sem significados, fazendo com que essa violncia simblica nos
torne individualistas, consumistas e meros reprodutores do sistema, ou seja, alienados,
impossibilitando nossa reflexo sobre as relaes e problemas sociais, sobre a nossa prxis
pedaggica.
Devemos ento quebrar os grilhes que nos aprisionam a uma prtica mecanicista de ensino, onde
os alunos ainda so vistos como meros armazenadores de determinados conhecimentos.
Devemos sair do discurso e buscar uma prxis para formarmos no apenas leitores de textos, mas
leitores de mundo e agentes transformadores da realidade.
Devemos trabalhar a oralidade, a leitura e a escrita como base para alfabetizar, proporcionando ao
educando a oportunidade se apaixonar. Sim! E porque no se apaixonar pelas letras? Pois a
finalidade da educao formar apaixonados pela vida, pelo conhecimento, pelo outro, para tornar
o ambiente em que vivemos mais humano e significativo, comprometido consigo e com a
sociedade.
Referncias Bibliogrficas
COUTINHO, Marlia de Lucena. Psicognese da lngua escrita: o que ? Como intervir em cada
uma das hipteses? Uma conversa entre professores. In: MORAIS, Artur Gomes de;
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de; LEAL, Telma Ferraz (orgs.). Alfabetizao:
apropriao do sistema de escrita alfabtica. Belo Horizonte: Autntica, 2005.
DIAS, Ana Iorio. Ensino da linguagem no Currculo. Fortaleza: Brasil Tropical, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
VYGOTSKY, L. S. A formao social da mente: o desenvolvimento dos processos psicolgicos
superiores. So Paulo: Martins Fontes, 1991.