Inteligencia Artificial No Direito
Inteligencia Artificial No Direito
Inteligencia Artificial No Direito
1.Introdução
Esse novo direito, que passou a exigir muito mais inovação jurídica, ficou horizontal,
transversal, e passou a englobar todas as disciplinas: civil, criminal, contratual,
tributário, propriedade intelectual, constitucional, trabalhista, entre outras. É um cenário
onde a prova é eletrônica e a testemunha é a máquina. É o novo pensar jurídico que
exige do profissional conhecimento técnico, prático e especializado.
Nos anos 1980, a grande quebra de paradigma foi trazida pela indústria de software e
toda a discussão sobre direitos autorais e limites éticos relacionados às práticas das
empresas da recém-surgida Economia Digital.
Nos anos 1990, a atuação mais comum envolvia elaborar contratos de tecnologia,
abrangendo a política de privacidade e segurança da informação, com contratos de
hospedagem de site, de armazenagem de dados, desenvolvimento de software. Aos
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Direito digital: da inteligência artificial às legaltechs
Após os anos 2000, após o bug do milênio, o desafio passou a ser a segurança diante
dos novos riscos digitais e as ameaças trazidas pelo uso mais maciço das tecnologias
digitais, tanto para a sociedade como para os ambientes corporativos.
Dentro da Sociedade Global Digital, o Direito evoluiu para lidar com os novos desafios na
implementação das melhores práticas nacionais e internacionais acerca da proteção dos
negócios, das relações e dos ativos intangíveis.
Nesse sentido, é inevitável mencionar a indústria 4.0, que possibilita a coleta dos dados
na internet por dispositivos inteligentes. Assim, o avanço da Internet das Coisas (IoT)
força o desenvolvimento da legislação que busca uma configuração jurídica que consiga
englobar as novas necessidades do mercado.
Entre essas tendências que vêm ganhando espaço no mercado e que mais prometem
causar disrupções nos modelos existentes está a Inteligência Artificial. De acordo com a
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consultoria Gartner, até 40% dos novos aplicativos empresariais implementados pelos
prestadores de serviços nos próximos quatro anos incluirão tecnologias de IA.
Recentemente, o tema ganhou repercussão devido à circulação de notícias afirmando
que o Facebook desligou robôs criados para interagir com seres humanos em
negociações após descobrir que os sistemas de inteligência artificial abandonaram o
inglês e adotaram uma linguagem própria.
Os CDOs (Chief Data Officer) dessa indústria estão lidando com uma quantidade muito
grande de dados sob a forma de transações financeiras, e que devem ser analisadas por
fraude ou por comportamentos de clientes a partir de informações sobre o tipo de
conselho financeiro que seria mais benéfico. E com as novas regulamentações, estão
tendo que pensar muito mais sobre privacy risks e instituir a pessoa responsável pela
privacidade e a proteção de dados da empresa (tem sido chamado de DPO – data
privacy officer ou CPO – chief privacy officer).
Ou seja, é uma tendência que vai mudar a estrutura organizacional das empresas e
desconstruir a relação milenar que temos com o trabalho, com o uso de Machine
Learning e da personalização dos serviços.
Por outro lado, o mercado de tecnologia também está voltado para o setor jurídico.
Diversas empresas buscam utilizar a IA em prol da acessibilidade a consultoria jurídica e
ao sistema jurídico. A ideia é utilizar a possibilidade de diminuir os honorários
advocatícios com a redução no tempo dedicado a administração de banco de dados e de
pesquisas jurisprudenciais, por exemplo, e aumentar o tempo disponível do advogado
em si com o cliente com honorários mais acessíveis.
No entanto, quais serão os impactos causados com a entrada da IA no nosso dia a dia?
Seja nas cidades inteligentes, no setor automotivo ou no setor bancário. E no setor
jurídico? Apesar de o Direito ser considerado um setor mais tradicional e conservador, a
revolução tecnológica também força a sua modernização, sendo o Direito Digital uma
vertente que possibilita a criação de soluções para adaptar-se à realidade atual dos
novos business models.
Como todo o resto, a tecnologia avança mais rápido que o Direito. E agora temos que
correr para trazer soluções que garantam a segurança jurídica das relações sociais de
homens e de máquinas. Uma sugestão dada pelo Parlamento Europeu é a criação de um
código de conduta para os engenheiros e uma agência europeia de robótica, visando a
criar uma cultura de responsabilidade devido aos futuros desafios e oportunidades que
serão apresentados.
Sendo assim, a Comissão propõe que seja feito monitoramento do número e da natureza
dos trabalhos perdidos e criados por robotização e automação, e o impacto do fenômeno
na renda perdida por sistemas de segurança social, avaliando novas formas dos
trabalhadores se envolverem com seus empregos e como as plataformas digitais de
trabalho podem conectar melhores indivíduos, equipes e projetos.
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Esse ponto mencionado acima, é crucial e envolve diversos temas jurídicos que serão
atingidos com a entrada da IA no nosso dia a dia.
Cabe ressaltar que os sistemas ciberfísicos (Cyber-physical system – CPS) são assuntos
constantes na pauta do Parlamento Europeu para entender as consequências e os
impactos que serão causados no nosso cotidiano. Em 16 de fevereiro de 2017, o
Parlamento Europeu aprovou o relatório para uma iniciativa legislativa com o intuito de
analisar os impactos causados pelos veículos autônomos, drones, robôs médicos e robôs
de assistência a idosos, crianças e pessoas com deficiência. O objetivo dessa iniciativa é
recomendar à Comissão Europeia uma futura legislação observando o potencial
econômico e garantindo a segurança.
Nos Estados Unidos, o empresário de tecnologia Elon Musk chamou bastante atenção no
mês passado quando afirmou que os governadores norte-americanos precisam
regulamentar a inteligência artificial “antes que seja tarde demais”. O empresário faz
parte de um grupo com mais de 100 líderes de companhias especializadas no assunto,
que enviou uma carta à Organização das Nações Unidas (ONU) pedindo que a entidade
proíba o desenvolvimento de robôs de guerra.
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Esse documento, o “Asilomar AI Principles”, traz 23 princípios e representa um guia
parcial para ajudar a garantir que a IA seja desenvolvida de forma benéfica para todos.
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Ética e Valores.
6) Segurança: Os sistemas AI devem ser seguros e seguros ao longo de sua vida útil, e
de forma verificável, quando aplicável e viável.
16) Controle humano: Os seres humanos devem escolher como e quando delegar
decisões aos sistemas de AI, para atingir objetivos humanos escolhidos.
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18) AI Arms Race: Uma corrida armamentista em armas autônomas letais deve ser
evitada.
19) Capacidade Cuidado: Não havendo consenso, devemos evitar fortes pressupostos
em relação aos limites superiores das capacidades de AI futuras.
21) Riscos: Os riscos colocados pelos sistemas de AI, especialmente riscos catastróficos
ou existenciais, devem estar sujeitos a planejamento e mitigação dos esforços
proporcional ao impacto esperado.
Assim, o conceito da IA está cada vez mais acessível e, com a diminuição do custo
computacional, várias corporações podem se beneficiar com a melhoria de seus
processos, ampliando suas logísticas e gerando diferencial competitivo, inclusive no
ambiente jurídico.
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Outro exemplo é um advogado robô que conseguiu reverter 160 mil multas de trânsito
em Nova York e em Londres desde 2015. O DoNotPay é um chatbot, um robô em forma
de aplicativo de chat que usa inteligência artificial funcional para interagir com humanos.
Ele “conversa” com os motoristas a respeito dos tíquetes de infrações de trânsito e, a
partir dessas informações, ele fornece orientações sobre se a sinalização procede ou não
e o que se deve fazer.
Mas o que teve mais destaque na área foi o ROSS, o primeiro advogado de inteligência
artificial do mundo, lançado no início do ano e construído sobre o computador cognitivo
Watson (IBM), desenvolvido para ler e compreender a linguagem natural, postular
hipóteses quando questionado, pesquisar e gerar respostas (com referências e citações)
para fundamentar suas conclusões. O robô compreende o significado das leis e das
decisões pesquisadas, classifica as informações de interesse e indica soluções jurídicas,
apresentando perspectivas de resultados práticos, a fim de eliminar a ineficiência dos
trabalhos jurídicos e, assim, reduzir custos. A solução inclusive já chegou ao Brasil, com
o propósito de auxiliar o advogado na coleta e organização de dados, formatação de
petições, acompanhamento de carteiras e rotina de processos.
No entanto, há questões legais e éticas que precisam ser consideradas. Uma das
principais habilidades dos advogados é identificar os interesses não aparentes, pensar
nas melhores técnicas de negociação e investir em meios alternativos para solução de
conflitos, como é o caso da mediação e da conciliação. Nesse sentido, a utilização do
Poder Judiciário acontecerá em último caso, quando todas as outras vias alternativas já
foram esgotadas sem o devido sucesso.
como funciona a criptografia e a coleta de biometria. Nisso tudo, o que mais impacta é
conhecer sobre provas eletrônicas e perícia digital.
O profissional do direito precisa saber ter a melhor técnica jurídica para perguntar para a
máquina o que aconteceu, e isso deveria ser ensinado nas graduações de Direito, para
que os estudantes tivessem a oportunidade de no laboratório usar softwares que fazem
a coleta de prova eletrônica, tendo uma compreensão maior sobre esse tipo de
procedimento.
O advogado, para atuar na área de Direito Digital, tem que ser curioso, gostar de
tecnologia, e principalmente, estudar e continuar se atualizando em um contexto
internacional. A todo momento, surgem novas informações e novas tecnologias, e essas
mudanças exigem dedicação e um contínuo aperfeiçoamento. Por exemplo, o bitcoin e o
blockchain ganham espaço no mercado, e é preciso aprender e entender do que se trata
para poder fazer um contrato, um parecer ou uma petição que envolva essas inovações.
O que está por vir? Um grande debate sobre digitalização humanizada. Por certo, além
da pauta da privacidade e proteção de dados e da cibersegurança, como fazer a
transição para uma sociedade muito mais robotizada, e que isso contribua para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas.
A transformação digital deve ocorrer, mas com valorização do ser humano. Claramente,
é impossível ser contra a evolução, mas caberá a nós, hoje, sedimentar os valores que
irão sustentar as próximas gerações de pessoas e empresas.
CORTELLA, Mário Sérgio. Nos labirintos da moral. 3. ed. São Paulo: Papirus, 2006.
CORTELLA, Mário Sérgio. Qual é a tua obra? São Paulo: Vozes, 2007.
SAVATER, Fernando. Ética para meu filho. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
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