Epigenética Bases Moleculares, Efeitos Na Fisiologia e Na Pato... PDF
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EPIGENÉTICA
Bases moleculares, efeitos na fisiologia e na patologia, e implicações para a
produção animal e a vegetal
2ª edição
Embrapa
Brasília, DF
2015
Embrapa Pecuária Sudeste
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Presidente: Ana Rita de Araújo Nogueira
Secretária-executiva: Simone Cristina Méo Niciura
Membros: Ane Lysie Fiala Garcia Silvestre, Maria Cristina Campanelli Brito, Milena Ambrosio Telles, Sônia Borges de
Alencar
Coordenação editorial: Selma Lúcia Lira Beltrão, Lucilene Maria de Andrade, Nilda Maria da Cunha Sette
Supervisão editorial: Wyviane Carlos Lima Vidal
Revisão de texto: Francisco C. Martins
Revisão do e-book: Jane Baptistone de Araújo
Normalização bibliográfica: Márcia Maria Pereira de Souza
Editoração eletrônica: Alexandre Abrantes Cotta de Mello, Leandro de Sousa Fazio, Rodrigo Carvalho Alva
Capa: Júlio César da Silva Delfino
Foto da capa: Roberta Cordeiro Gaspar
1ª edição
1ª impressão (2014): 1.000 exemplares
2ª edição
E-book (2015)
Todos os direitos reservados
Para uso exclusivo de GUSTAVO RAFAEL MAZZARON BARCELOS. A reprodução não autorizada desta publicação, no
todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610).
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Embrapa Informação Tecnológica
Epigenética : bases moleculares, efeitos na fisiologia e na patologia, e implicações para a produção animal e a vegetal /
Simone Cristina Méo Niciura, Naiara Zoccal Saraiva, editoras técnicas. – 2. ed. – Brasília, DF : Embrapa, 2015.
E-book : il. color.
1. Biotecnologia. 2. Genética molecular. 3. Gameta. 4 Embrião. I. Niciura, Simone Cristina Méo. II. Saraiva, Naiara
Zoccal. III. Embrapa Pecuária Sudeste.
CDD 575.1
© Embrapa 2015
Autores
Alexandre de Lima Oliveira
Biólogo, mestre em Genética Evolutiva e Biologia Molecular, doutorando da Universidade Federal de São Carlos, São
Carlos, SP
Felipe Perecin
Médico-veterinário, doutor em Medicina Veterinária, professor da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da
Universidade de São Paulo, Pirassununga, SP
Mateus Mondin
Engenheiro-agrônomo, doutor em Genética e Melhoramento de Plantas, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz
de Queiroz da Universidade de São Paulo, Piracicaba, SP
Epigenética
Histórico e conceitos
Simone Cristina Méo Niciura
Vanessa Candiotti Buzatto
Introdução
Na última década, grande quantidade de notícias e publicações técnico-científicas tem
sido veiculada pela imprensa sobre o tema epigenética. No Brasil, nos últimos anos,
destaca-se a proibição da fabricação de mamadeiras de plástico policarbonato, em
decorrência do aumento de riscos de puberdade precoce, câncer, alterações no sistema
reprodutivo, infertilidade, aborto e obesidade associados à ingestão de bisfenol-A (BPA),
presente no policarbonato e no revestimento interno de latas de bebidas e de alimentos
(FOLHA DE SÃO PAULO, 2011; JORNAL NACIONAL, 2011).
Outras notícias destacaram os efeitos controversos da escassez de alimentos, como
o ocorrido na Suécia, no século 19, o “inverno, da fome” na Holanda, no período 1944–
1945, e a falta de alimentos na China, no final da década de 1950, sobre a longevidade, o
peso na idade adulta, o aparecimento de patologias e o desenvolvimento de esquizofrenia
nas gerações futuras (GNT.DOC, 2010; SUPERINTERESSANTE, 2011; UOL, 2011).
Algumas reportagens também evidenciaram os efeitos do Atentado de 11 de Setembro de
2001, nos Estados Unidos, sobre o desenvolvimento de estresse (níveis de cortisol) nos
descendentes; e os efeitos da nutrição e do estilo de vida, incluindo o tabagismo e a
ingestão de álcool, sobre a saúde, a obesidade, o risco de desenvolvimento de câncer e a
longevidade das pessoas e de seus descendentes (CIÊNCIA DIÁRIA, 2010; GALILEU,
2009; GNT.DOC, 2010). Por causa da epigenética, hoje em dia pode-se dizer que somos
não só o que comemos (HUNTER, 2008), mas também o que nossos pais (BAKER IDI
HEART AND DIABETES INSTITUTE, 2009) e até o que nossos avós comeram
(RESEARCH PRESS, 2012).
Definição e história da epigenética
O termo epigenética, que literalmente significa “genética acima”, foi usado pela
primeira vez por Conrad Waddington, na década de 1940, para descrever as interações de
genes com o meio ambiente e os possíveis caminhos que cada célula pode tomar durante
o desenvolvimento (TOST, 2008). Atualmente, a epigenética é definida como o estudo de
processos que produzem um fenótipo herdável, mas que não dependem estritamente da
sequência de DNA (LIEB et al., 2006), ou seja, eventos epigenéticos são aqueles que
alteram o fenótipo sem modificar o genótipo (KENDREW, 1994) e que são herdáveis.
Como se vê, não é só a sequência de DNA que determina o fenótipo, mas também as
variações epigenéticas, e ambas as modificações, genéticas e epigenéticas, atuam em
sinergia para a manifestação do fenótipo (MURRELL et al., 2005).
A genética tradicional baseia-se no pareamento de bases adenina (A), timina (T),
guanina (G) e citosina (C) na dupla-hélice do DNA e nas variações em sua sequência.
Exemplos de modificações genéticas que levam a alterações fenotípicas incluem os
polimorfismos de base única (single nucleotide polymorphisms ou SNPs), as variações no
número de cópias (copy number variation ou CNVs), os sítios de ligação de fatores de
transcrição, os promotores alternativos e o splicing alternativo. Por sua vez, a epigenética
refere-se às modificações reversíveis dos nucleotídeos por diferentes formas químicas,
sem alteração de sua sequência. Tais modificações são chamadas de epigenéticas, pois
epi significa “fora de” ou “acima de, além de” (CALLADINE et al., 2004). Assim, a
epigenética estuda as camadas adicionais de informação no topo da sequência genômica,
o que estende de forma dramática o potencial de informação do código genético (TOST,
2008).
Enquanto o genoma é estável (só alterado por mutagênese ou por erros na
replicação), herdável e único a cada indivíduo, apesar de também ser estável e herdável, a
epigenética é modificável de maneira reversível e única a cada tipo celular (OHGANE et
al., 2008). Por isso, as diferenças nos padrões de expressão gênica que resultam no
desenvolvimento de órgãos e tecidos geralmente ocorrem pelo estabelecimento de marcas
epigenéticas (REIK, 2007). Assim, como cada célula de um mesmo organismo contém a
mesma informação genética em seu DNA, é a regulação diferencial dos genes, por meio
da epigenética, no tempo (durante o desenvolvimento) e no espaço (tecido) que determina
o destino celular (morfologia e função) e o fenótipo do indivíduo (BLOMEN; BOONSTRA,
2011).
As marcas epigenéticas são introduzidas nos cromossomos de maneira reversível e
replicadas, estavelmente, durante as divisões celulares (KENDREW, 1994). A regulação
gênica epigenética consiste na propagação estável do estado de atividade gênica durante
as divisões celulares de mitose (herança epigenética entre células) e, algumas vezes, de
meiose (herança epigenética entre gerações ou transgeracional) (BIRD, 2007; STAM,
2009). As modificações epigenéticas ocorrem, naturalmente, nos organismos e participam
de vários processos fisiológicos, como (YOUNG; FAIRBURN, 2000):
Considerações finais
Além do código genético, fatores epigenéticos interferem na expressão gênica e no
fenótipo dos indivíduos. Assim, a epigenética associada à genética tem aumentado a
compreensão de muitos processos fisiológicos e patológicos que ocorrem nos seres vivos.
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Capítulo 2
Modificações epigenéticas I
Conformação da cromatina e modificação do DNA
Simone Cristina Méo Niciura
Introdução
As modificações epigenéticas têm sido classificadas em quatro grandes classes
(FINGERMAN et al., 2013):
Figura 1. Estrutura dos nucleossomos (em roxo) com a fita de DNA (alaranjada) enovelada
no octâmero de histonas (duas cópias das histonas H2A, H2B, H3 e H4); e histona H1
(verde) que se liga à fita de DNA entre dois nucleossomos.
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
• H2A.X – Difere da histona H2A na cauda-C, na qual uma serina na posição 139
pode ser fosforilada, transformando-se em γ-H2A.X; variante que se localiza
em quebra de dupla fita e marca o DNA para o reparo.
• H2A.Z – Presente em promotores e em sítios de início de transcrição; associada
a regiões livres de nucleossomos.
• MacroH2A – Presente no cromossomo X inativo em mamíferos.
• CEMP-A ou CenH3 – Inserida em sequências centroméricas; componente do
cinetócoro.
• H3.3 – Participação no estabelecimento de heterocromatina em regiões
pericentroméricas.
• H3t – Participação na substituição de histona por protamina na cromatina
espermática.
Modificações do DNA
Metilação do DNA
A metilação do DNA é um tipo de modificação química do DNA – que é herdável e
pode ser estabelecida e removida sem mudar a sequência original do DNA. Ela participa:
A DNMT2, que parece ter pouca atividade in vitro de metilação do DNA, tem função de
metiltransferase específica de RNA transportador (t-RNA) (PAULSEN et al., 2008).
As DNMT1o e DMNT3B têm atividade de metilação de novo durante a embriogênese
(Figura 3B); a DNMT3A está associada à heterocromatina (BLOMEN; BOONSTRA, 2011);
e a DNMT3L está envolvida no desenvolvimento da linhagem germinativa (TOLLEFSBOL,
2004) e aumenta a atividade das DNMT3A e DNMT3B (RIVERA; ROSS, 2013).
Figura 3. Ação das metiltransferases de DNA (DNMTs) na fita de DNA (em roxo) e nas
metilações (círculos alaranjados). A) Manutenção de metilação: após a replicação do DNA
nas divisões celulares, a DNMT1 promove a metilação da fita de DNA hemimetilada; B)
Metilação de novo: a DNMT3A e a DNMT3B promovem metilação de uma dupla-fita de DNA
não metilada.
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
Silenciamento gênico
Na região promotora de genes, a metilação do DNA está relacionada ao silenciamento
gênico (ENRIGHT et al., 2003), e 88% dos promotores ativos são regulados por metilação
(TOST, 2010). O silenciamento gênico, mediado por metilação, pode ocorrer de duas
maneiras (MUTHUSAMY et al., 2010), conforme mostra a Figura 4:
Silenciamento direto – Quando a própria metilação do DNA impede a ligação de
fatores de transcrição ou afeta o estado de condensação e a estrutura da cromatina.
Silenciamento indireto – Quando a metilação do DNA promove o recrutamento de
proteínas ligadoras de metil (MBP) que formam complexos repressores. É o mecanismo
mais comumente usado para o silenciamento gênico.
A primeira caracterização das ilhas CpG foi feita por Gardiner-Garden e Frommer
(1987), que descreveram que uma ilha CpG deve conter mais de 50% de conteúdo G+C,
razão GC observada/GC esperada maior que 0,6 e tamanho mínimo de 200 bp. Após o
sequenciamento do genoma de mamíferos, foi observado que essa definição de ilhas CpG
englobava sequências que não são associadas a regiões promotoras, mas a elementos
repetitivos. Assim, Takai e Jones (2003) desenvolveram um critério mais rigoroso para
detectar ilhas CpG funcionais:
Essa definição inclui quase todas as ilhas CpG regulatórias e exclui aquelas
associadas a elementos repetitivos (PAULSEN et al., 2008). Há também um algoritmo que
foi desenvolvido para detectar ilhas CpG, o CpGcluster, o qual se baseia na distribuição da
distância física entre dinucleotídeos CpG vizinhos no cromossomo e não considera o
conteúdo G+C, o tamanho e nem a fração CpG para identificar uma ilha CpG
(HACKENBERG et al., 2006).
• As metiltransferases de DNA.
• A maquinaria de desmetilação.
• As proteínas que interagem com 5mC e DNMT.
Considerações finais
Entre os tipos de modificações epigenéticas que afetam a conformação da cromatina,
destacam-se o posicionamento dos nucleossomos formados por duas cópias de cada uma
das histonas H2A, H2B, H3 e H4, o estado de compactação, a estrutura de enovelamento
da cromatina, e a metilação do DNA. Enquanto numa determinada região do DNA a
ausência de nucleossomos torna essa sequência mais acessível aos fatores de transcrição
e mais transcricionalmente ativa, a metilação do DNA na citosina (5mC) de sítios CpG,
promovida pelas metiltransferases de DNA (DNMTs), é a principal marca de silenciamento
gênico.
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Capítulo 3
Modificações epigenéticas II
Modificações pós-traducionais de histonas
Simone Cristina Méo Niciura
Introdução
Conforme visto no Capítulo 2, as histonas são constituintes dos nucleossomos que
afetam, diretamente, a estrutura da cromatina e apresentam sítios para modificações pós-
traducionais e superfície para a interação com outras proteínas. As modificações de
histonas estão ligadas, essencialmente, a todos os processos celulares que requerem o
acesso ao DNA (ZENTER; HENIKOFF, 2013):
• Condensação.
• Transcrição.
• Replicação.
• Reparo.
H2A K: 5 e 9 – S: 1 K: 119
H2B K: 5, 12, 15 e 20 – – K: 123
K: 4, 9, 27, 36 e 79
H3 K: 9, 14, 18 e 23 S: 10 e 28 –
R: 2, 17 e 26
K: 20
H4 K: 5, 8, 12 e 16 S: 1 –
R: 3
Fonte: modificado de Whitelaw e Garrick (2005).
Geralmente, as HATs modificam mais do que uma lisina, e várias HATs fazem parte de
grandes complexos multiproteicos reguladores da transcrição. A Tabela 2 mostra as
principais HATs de humanos, seus substratos de histonas e suas funções.
Tabela 2. Modificações de acetilação em resíduos de lisina (K) das histonas H2A, H2B, H3 e H4, substratos
para as acetiltransferases de histonas (HATs) em humanos e suas funções.
As HATs são coativadores transcricionais que não se ligam, diretamente, ao DNA, mas
a ativadores, como as proteínas de bromodomínios, as quais se ligam a resíduos
específicos de lisinas nas histonas (ABCAM, 2011; KOUZARIDES, 2007):
• ATAD2 (H3K14ac).
• BRD2,3,4,7 (H3ac, H4ac).
• BRDT (H4K5ac, H4K8ac, H3K18ac).
• CBP/p300 (H3ac, H4ac, H3K36ac, H4K20ac).
• GCN5 (H4K16ac).
• hBRG1 (H3K14ac).
• PB-2 (H3K14ac).
• P/CAF (H3ac, H4ac, H4K16ac).
• Polybromo/BAF180 (H3ac).
• TAF1 (H3ac, H4ac).
• TRIM24 (H3K23ac).
Tabela 3. Modificações de metilação de resíduos de lisina (K) e arginina (R) nas histonas H1, H2A, H3 e H4,
substratos para metilltransferases de proteínas (PMTs), desmetilases e proteínas regulatórias PHD e de
cromodomínios (cromo).
H2AR11 PRMT1 – – –
PRMT6
H2AR29 PRMT1 – – –
PRMT6
H3R2 PRMT4 (CARM1) JMJD6 – –
PRMT6
H3K4 KMT2A (MLL1) KDM1 (LSD1 ou BHC110) BPTF/dmNURF301 CHD1
KMT2B (MLL2) KDM2A (JHDM1a ou ING1,2,3,4,5 hMRG15
FBXL11)
KMT2C (MLL3) KIAA1718 PHF20L1
KDM2B (JHDM1B)
KMT2D (MLL4) Lid
KDM5A (JARID1A ou RBP2)
KMT2E (MLL5) PHF2,8
KDM5B (JARID1B ou PLU1)
KMT2F (SETD1A) PHO23
KDM5C (JARID1C ou
KMT2G (SETD1B) SMCX) Pygo
KMT2H (ASH1) KDM5D (JARID1D ou RAG2
KMT3E (SMYD3) SMCY) TAF3
KMT7 (SET7/9) PHF8 (JHDM1F)
PRDM0
H3R8 PRMT5 – – –
H3K9 KMT1A (SUV39H1) KDM1 (LSD1 ou BHC110) CHD4 BX1,3,5
KMT1B (SUV39H2) KDM1B (LSD2) ICBP90 (Np95) CBX2,4,6,7,8
KMT1C (G9a ou EHMT2) KDM3A (JHDM2a) JARID1C CDY1
KMT1D (EHMT1) KDM3B (JHDM2b) SMCX HP1/spSwi6
KMT1E (ESET ou KDM4A (JMJD2A ou L3MBTL1/2
SETDB1) JHDM3A)
MPP8
KMT1F (CLL8 ou KDM4B (JMJD2B)
SETDB2) PC1/PC2/PC/LHP1
KDM4C (JMJD2C ou
KMT8 (RIZ1) GASC1) SFMBT
KDM7 (JHDM1D)
PHF8 (JHDM1F)
H3R17 PRMT4 (CARM1) – – –
H3R26 PRMT4 (CARM1) – – –
H3K27 KMT1C (G9A ou EHMT2) KDM6A (UTX) – CBX2,4,6,7,8
KMT1D (EHMT1) KDM6B (JMJD3) PC1/PC2/PC/LHP1
KMT6 (EZH2) PHF8 (JHDM1F)
KMT6B (EZH1) KDM7 (JHDM1D)
WHSC1L1 (NSD3)
NO66
H3K79 KMT4 (DOT1L) – – –
H4R3 PRMT1 JMJD6 – –
PRMT5
PRMT6
H4K20 KMT5A (SETD8) PHF8 (JHDM1F) – L3MBTL1
KMT5B (SUV420H1) PHF20L1
KMT5C (SUV420H2) SFMBT
KMT3B (NSD1)
WHSC1 (NSD2)
(1)
Os sinônimos, pelos quais as metiltransferases e as desmetilases também são conhecidas, figuram entre
parênteses.
Fonte: Abcam (2011), Allis et al. (2007), Copeland et al. (2009) e Histome (2013).
As proteínas desse grupo podem desempenhar sua atividade por interações de longa
distância e em diferentes cromossomos, colaboram com os repressores para manter o
silenciamento gênico e são contrabalanceadas pelas proteínas do grupo Tritorax (TrxG),
que promovem a ativação gênica (CASA; GABELLINI, 2012; DE FELICI, 2011).
As proteínas PcG formam dois complexos multiproteicos principais: complexos
repressivos Polycomb 1 (PRC1) e 2 (PRC2). O PRC1 possui o domínio Ring1B, que é
uma ligase de ubiquitina E3, promove ubiquitinação de H2AK119 e, assim, evita a
elongação do transcrito e promove, também, a compactação da cromatina (BLOMEN;
BOONSTRA, 2011; CASA; GABELLINI, 2012). O PRC2, via subunidade catalítica EZH2,
leva à H3K27me3, marca fundamental da ligação Polycomb associada ao silenciamento
epigenético estável (ANGEL et al., 2011; DE FELICI, 2011). O PRC2 também contém a
subunidade não catalítica embryonic ectoderm development (EED) que interage com as
HDACs (DE FELICI, 2011).
As modificações ativas, associadas à ativação gênica H3K4me3 e H3K27ac, são
reguladas pelo grupo TrxG e facilitam a elongação transcricional (BLOMEN; BOONSTRA,
2011).
Fosforilação de histonas
A fosforilação (ph) de histonas ocorre em serina (S), treonina (T) e tirosina (Y)
(Figura 4) (HISTOME, 2013; NIGHTINGALE et al., 2006) e transmite uma carga negativa
para o resíduo modificado. Como o esqueleto fosfato do DNA possui carga negativa, cria
repulsão de cargas, o que potencialmente enfraquece a associação do DNA com as
histonas (ZENTER; HENIKOFF, 2013).
Figura 4. Serina (S), treonina (T) e tiros ina (Y) fosforiladas (ph).
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
PPM1D
ATM
PPP2CA
H2AS139 ATR
PPP2CB
PRKDC
PPP4C
EYA1
H2AY142 WSTF (BAZ1B) EYA2
EYA3
H2BS14 MST1 (STK4) –
H3T3 Haspin (GSG2) –
H3S6 Aurora B (AURKB) –
H3T6 PRKCB –
Aurora B (AURKB)
IKK alfa (CHUK)
MSK1 (RPS5KA5)
MSK2 (RPS6KA4)
H3S10 PTPN10 (MKP-1)
Pim1
MAP3K8
PAK2
PKU-beta (TLK1)
ZIP (DAPK3)
H3T11 PPP1 gama
PKN1 (DBK)
Aurora B (AURKB)
H3S28 MSK1 (RPS5KA5) –
MSK2 (RPS6KA4)
H3Y41 JAK2 –
H3T45 PRKCD –
H4S1 CKII –
(1)
Os sinônimos, pelos quais as quinases e as fosfatases também são conhecidas,
estão entre parênteses.
Fonte: Abcam (2011) e Histome (2013).
Ubiquitinação de histonas
A monoubiquitinação (ub) de histonas ocorre em lisina (K) (NIGHTINGALE et al.,
2006), geralmente em H2A e em H2B. A ubiquitinação em corpos gênicos já foi associada
à elongação da transcrição, enquanto em promotores provoca a repressão da arquitetura
da cromatina (ZENTER; HENIKOFF, 2013). A H2BK123ub em S. cerevisiae está associada
ao crescimento mitótico e meiótico; a H2BK123ub, à ativação da transcrição; e a
H2AK119ub, ao silenciamento gênico. As reações de ubiquitinação são promovidas pelas
ligases de ubiquitina e as de desubiquitinação, pelas desubiquitinases (Tabela 5).
Tabela 5. Modificações de ubiquitinação em resíduos de lisina (K) das histonas H2A, H2B e H4, substratos
para as ligases de ubiquitina e desubiquitinases de histonas.
Bmi
H2AK119 RING1 MYSM1
RING2
H2AK121 RING2 –
RNF20 (BRE1A)
RNF40 (BRE1B)
H2BK120 –
RBX1
UBCH6
H4K91 DTX3L (BBAP) –
(1)
Os sinônimos, pelos quais as ligases também são conhecidas, estão entre parênteses.
Fonte: Abcam (2011) e Histome (2013).
SUMoilação de histonas
A mono-SUMOilação (sumo) de histonas ocorre em lisina (NIGHTINGALE et al., 2006)
nas histonas H2A, H2B e H4 e foi uma modificação descoberta recentemente em
leveduras. SUMO, do inglês small ubiquitin-related modifier, é similar à ubiquitinação e
promove silenciamento quando associado à histona H4. A proteína ligadora de metil MBD1
também é modulada por um sistema de SUMOilação (FOURNIER et al., 2012).
ADP-ribosilação de histonas
A mono- e poli-ADP ribosilação de histonas ocorre em glutamina e lisina das quatro
histonas centrais e trata-se de uma marca transitória que também transmite carga negativa
aos resíduos modificados e está associada ao afrouxamento da cromatina (NIGHTINGALE
et al., 2006; ZENTER; HENIKOFF, 2013).
A ADP-ribosilação, pela enzima PARP1 (ARTD1), promove a adição de cadeias
poli(ADP-ribose) a proteínas, como as histonas centrais (H2AK13, H2BK30, H3K27, H3K37
e H4K16), à histona H1 e a várias proteínas não histônicas, incluindo fatores de transcrição
(MESSNER et al., 2010; TOLLEFSBOL, 2004).
Ativação
Marca de histona Repressão Pausa
Alta Intermediária Baixa
H2A.Z X X X
H2BK5me1 X
H2BK5ac X X
H2BK12ac X X
H2BK20ac X X
H2BK120ac X X
H3K4me1 X X X
H3K4me2 X X X X
H3K4me3 X X X X
H3K3ac X X
H3K9me1 X X X
H3K9me2 X
H3K9me3 X
H3K9ac X X
H3K14ac
H3K18ac X X
H3K27me1 X
H3K27me2 X
H3K27me3 X X
H3K27ac X X
H3K36me3 X
H3K36ac X X
H3K79me1 X
H3K79me2 X
H3K79me3 X
H4K5ac X X
H4K8ac X X
H4K16ac X
H4K20me1 X
H4K91ac X X
As configurações específicas de cromatina podem ser determinadas pela sequência
de DNA, pelos padrões de metilação do DNA, pelos fatores de transcrição, além de outras
proteínas regulatórias, e pela atividade transcricional. As características de sequência,
como ilhas CpG, promotores e elementos repetitivos, tendem a assumir padrões
característicos de modificação e estados de cromatina, que facilitam o reconhecimento
pelos fatores de transcrição e pela maquinaria regulatória (ZHOU et al., 2011). Assim como
o padrão de expressão gênica, a função de diferentes regiões do genoma está associada
a padrões de modificações de histonas (estados da cromatina) (BONN et al., 2012; DE
FELICI, 2011; ZHOU et al., 2011).
Como definição para para compreender os estados de cromatina, os enhancers ou
acentuadores são elementos de DNA que recrutam fatores de transcrição, RNA polimerase
II e reguladores de cromatina de modo a influenciar, positivamente, a transcrição de
promotores gênicos localizados a jusante (ZHOU et al., 2011). Quando os enhancers são
reconhecidos na fita de DNA, formam-se dobras que aproximam genes distantes à região
de transcrição (SANYAL et al., 2012). Os insulators ou isoladores bloqueiam, fisicamente,
o enhancer de modo que o estímulo não alcance o gene próximo a ele (SANYAL et al.,
2012).
Por dependerem de processos regulatórios locais, os estados de cromatina variam no
contexto celular (ZHOU et al., 2011). Ernst et al. (2011) mapearam 9 marcas de cromatina
(CTCF, H3K4me1, H3K4me2, H3K4me3, H3K9ac, H3K27me3, H3K27ac, H3K36me3 e
H4K20me1) em 9 tipos celulares e verificaram 15 estados de cromatina, que incluíram:
• Promotor ativo.
• Promotor fraco.
• Promotor inativo/pausado.
• Enhancer forte.
• Enhancer fraco/pausado.
• Insulator.
• Transição transcricional.
• Elongação transcricional.
• Transcrição fraca.
• Repressão por Polycomb.
• Heterocromatina.
• Elemento repetitivo/CNV.
Pelo The ENCODE Project Consortium (2012), 7 estados de cromatina foram preditos
em 2 tipos celulares:
Na revisão feita por Zhou et al. (2011), sobre a associação entre elementos
genômicos e modificações epigenéticas, foram descritas as seguintes marcas dos estados
de cromatina:
Promotor inativo – H3K27me3, H3K9me3 e metilação de DNA.
Promotor pausado – H3K4me3, H3K27me3 e H2A.Z.
Promotor ativo – H3K4me2, H3K4me3, acetilação de histonas e H2A.Z.
Corpos gênicos inativos – H3K9me2 e H3K9me3.
Corpos gênicos ativos – H3K36me3, H3K79me2 e abundância de nucleossomos.
Enhancers inativos – H3K9me2, H3K9me3 e metilação de DNA.
Considerações finais
As modificações pós-traducionais das histonas também afetam a acessibilidade da
cromatina e a expressão gênica. As modificações de histonas mais comuns são a
acetilação, marca ativa de transcrição, e a metilação, que pode promover ativação ou
silenciamento gênico, dependendo do resíduo de aminoácido modificado.
Há ação conjunta de diferentes tipos de modificações epigenéticas, e determinados
padrões de combinações epigenéticas levam a funções subsequentes específicas,
denominadas de estados de cromatina.
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Capítulo 4
Introdução
Nos últimos anos, os estudos na área de regulação epigenética vêm adicionando uma
nova dimensão ao entendimento dos processos de regulação da expressão gênica.
Epigenética é a regulação herdável da expressão gênica, durante a mitose e a meiose,
sem alteração na sequência do DNA (LEVENSON; SWEATT, 2005). A expressão é
controlada através da modificação física do DNA ou RNA, seja direta ou indiretamente
(proteínas, grupos metil), por fatores que se associam ao DNA/RNA.
Regulando o DNA e/ou o RNA, sem alterar a sequência deste, células geneticamente
idênticas (como as células dentro de um mesmo organismo) são capazes de ser
fenotipicamente distintas, dependendo de sua localização (por exemplo, células da pele
são distintas de células da medula óssea dentro de um mesmo organismo, apesar de
apresentarem o mesmo código genético) (LEVENSON; SWEATT, 2005). Além disso, o
controle epigenético é reversível, podendo ser em curto prazo (expressão de um gene
durante um período específico do desenvolvimento) ou em longo prazo (imprinting
presente no genoma materno ou paterno).
A programação epigenética dos gametas e embriões iniciais é condição vital para o
desenvolvimento de um novo organismo. Essa programação envolve a integração dos três
processos epigenéticos:
• Metilação do DNA.
• Remodelamento das histonas.
• Ação de RNA não codificadores.
Esses eventos epigenéticos regulam a expressão gênica pelo controle da transcrição
e/ou tradução.
• Long ncRNAs.
• Small ncRNAs, incluindo-se Piwi-interacting RNAs (piRNAs).
• Small interfering RNAs (siRNAs).
• MicroRNAs (miRNAs).
Tipos de ncRNAs
Os ncRNAs são um grupo emergente de moléculas que regulam justamente a
deposição das marcas epigenômicas (MATTICK et al., 2009). Até o momento, todos os
ncRNAs estudados agem por um mecanismo comum: associação com proteínas ligantes
do RNA que, por sua vez, fazem parte de um complexo modificador da cromatina. RNAs
não codificadores parecem direcionar esses complexos, ubiquitamente expressos de uma
maneira sequência-específica, às regiões da cromatina que serão modificadas. O melhor
exemplo de modificação na cromatina direcionada por RNA são o processo de interferência
por RNA, a inativação do cromossomo X e o imprinting (MORRIS, 2009), mas existem
fortes evidências indicando que moléculas de RNA participam em todos os aspectos de
regulação da estrutura da cromatina (MATTICK et al., 2009).
RNAs não codificadores são conhecidos há muito tempo, e apenas as classes que têm
função no controle da transcrição e/ou tradução gênica é que foram descobertas mais
recentemente. Entre os ncRNAs previamente conhecidos temos (WRIGHT; BRUFORD,
2011):
RNA de transferência ou transportador (tRNA) – Com aproximadamente 80
nucleotídeos, participa da tradução do mRNA para proteínas exercendo o papel de
transporte dos aminoácidos até os ribossomos, no momento da formação e do
alongamento da cadeia de peptídeos.
RNA ribossômico (rRNA) – O mais abundante dos RNAs exerce seu papel dentro
dos ribossomos, facilitando a interação entre o tRNA e o mRNA, durante o processo de
tradução.
RNA spliceosomal ou small nuclear RNA (snRNA) – Juntamente com uma série de
ribonucleoproteínas, formam os spliceossomos, responsáveis pelo processamento de pré-
mRNA (remoção de íntrons) em mRNA maduro.
Small nucleolar RNA (snoRNA) – São responsáveis por modificações pós-
transcricionais nos rRNAs, tRNAs e snRNAs.
A seguir, serão apresentados os ncRNAs que exercem papel regulatório na expressão
de genes, por meio do controle da transcrição e/ou tradução. Esses ncRNAs são
classificados em dois grupos, baseados, principalmente, no tamanho molecular:
miRNA
Os microRNAs passam por uma série de processos antes de atingir a maturidade na
forma de um complexo miRNA ativo (Figura 1). Esses ncRNAs iniciam sua jornada como
transcritos longos da RNAP II, os pri-miRNA, muitas vezes contendo milhares de
nucleotídeos e formando hairpins ou stem-loops. Esses hairpins são, então, reconhecidos
pelo complexo Drosha–DGCR8, também conhecido como complexo microprocessador.
Drosha é uma endonuclease similar à RNase III, que contém um sítio de ligação ou binding
domain para RNA dupla fita ou dsRNA (dsRBD), do inglês double-stranded RNA-binding
domain, e dois sítios RNase III (COOK; CONTI, 2006; KIM et al., 2009). Já a DGCR8
(DiGeorge syndrome critical region gene 8) é uma proteína ligante de RNA de
aproximadamente 120 kDa que reconhece a junção ssRNA-dsRNA (RNA fita simples – RNA
fita dupla) do substrato (DENLI et al., 2004; GREGORY et al., 2004; HAN et al., 2004,
2006; LANDTHALER et al., 2004). A DGCR8 direciona a enzima Drosha para a clivagem
na posição de 11 nucleotídeos a partir da junção do ssRNA.
Figura 1. Biogênese de RNAs não codificadores. RNAs não codificadores (ncRNAs) são transcritos pela RNA
polimerase II (Poll II). Os ncRNAs longos (lncRNA) agem via insulação do alvo (DNA) impedindo a transcrição
(A). Os microRNAs (miRNA) formam uma série de alças hairpin durante a transcrição, que são processadas
pelo complexo Drosha-DGCR8 para dar origem aos pré-miRNAs (B). Pré-miRNAs são exportados do núcleo
pela ação da Exportina 5/Ran-GTP (C). Uma vez no citoplasma, a Dicer cliva o pré-miRNA em miRNAs
maduros de 22 nt, que são associados à proteína Argonaute 2 (Ago2) (D). Essas proteínas formam o complexo
RISC (RNA-induced silencing complex). O processamento dos small-interfering RNAs (siRNA) começa com a
formação de um longo ssRNA contendo um hairpin em sua sequência (E). Esse longo hairpin é processado
pela enzima Dicer e inserido em Ago2, de maneira similar ao miRNA (F). Uma vez em Ago2, o miRNA ou
siRNA podem reconhecer a região 3’-UTR do mRNA alvo (G) e promover degradação (H) ou inibição da
tradução do mRNA alvo (I). Precursores de Piwi-interacting RNAs (piRNAs) (J) são processados pelas
proteínas Piwi (MIWI e MILI). A atividade de nuclease de MILI produz uma ponta 5’ que é reconhecida por MIWI2.
MIWI2 então produz uma ponta 5’ que é reconhecida por MILI (K). Esse processo circular (ciclo ping-pong)
permite a produção contínua de piRNAs. MIWI2 é transportada de volta ao núcleo (L).
Ilustração: Daniel Robert Arnold.
siRNA
Precursores de siRNA endógenos são produzidos de três maneiras (CHUNG et al.,
2008; CZECH et al., 2008; GHILDIYAL et al., 2008; KAWAMURA et al., 2008; TAM et al.,
2008; WATANABE et al., 2008):
piRNA
Os precursores de fita simples dos piwi-interacting RNAs (piRNAs) são transcritos de
regiões intergênicas como regiões repetitivas, transposons ou clusters de piRNAs. Ao
contrário dos miRNAs e dos siRNAs, piRNAs são produzidos sem a ação de Dicer.
Entretanto, piRNAs associam-se com proteínas da subfamília Piwi que apresentam
atividade de nuclease e estão envolvidas na biogênese de piRNAs. Esse processo envolve
mecanismos primários e secundários. Ele ocorre no citoplasma, mas não se sabe como os
precursores chegam até lá.
Até o momento, fatores de processamento primário e colocação de piRNAs nas
proteínas PIWI (MIWI e MILI) são desconhecidos; já no processamento secundário, MILI
introduz a clivagem ao precursor, definindo assim a ponta 5’, que é então reconhecida e
aceita pela proteína MIWI2 (ARAVIN et al., 2008). Por sua vez, MIWI2 cliva o precursor da
fita de sentido contrário, criando o sítio de ligação para MILI. A nuclease que cria a parte
3’ ainda é desconhecida. Esse processo circular, conhecido como ciclo pingue-pongue,
pode ocorrer continuamente, aumentando assim a população de piRNAs (BRENNECKE
et al., 2007; GUNAWARDANE et al., 2007).
Gameta masculino
Deleção das proteínas PIWI, mais especificamente MILI, MIWI e MIWI-2 (mammalian
Piwi homologs), acarreta parada meiótica em diferentes estádios do ciclo meiótico,
ativação de retrotransposons e até mesmo esterilidade, sugerindo uma função importante
dos piRNAs durante o processo de espermatogênese (ARAVIN et al., 2007; CARMELL
et al., 2007; CASTEL; MARTIENSSEN, 2013; COOK; BLELLOCH, 2013; DENG; LIN,
2002; KURAMOCHI-MIYAGAWA et al., 2004, 2008; LIN, 2007).
Já a perda de Dicer em células germinativas primordiais masculinas leva a inúmeros
defeitos na espermatogênese, na proliferação de células, bem como na própria morfologia
e na motilidade (COOK; BLELLOCH, 2013; HAYASHI et al., 2008; MAATOUK et al., 2008).
Já a deleção de Drosha, que participa apenas da biogênese de miRNAs em
espermatócitos, leva à perda de tipos celulares como espermátides e até mesmo
esterilidade (azoospermia) (WU et al., 2012), indicando que miRNAs apresentam função
importante no desenvolvimento do gameta masculino.
Embriões
Os ncRNAs curtos são fundamentais no desenvolvimento embrionário e fetal. Deleção
da riboendonuclease Dicer é letal em camundongos, com morte embrionária aos 7,5 dias
de gestação (BERNSTEIN et al., 2003). Estudos recentes indicam que, de fato, os miRNAs
têm funções regulatórias vitais durante o desenvolvimento embrionário. Mineno et al.
(2006) demonstraram a presença de 390 miRNAs em embriões e em fetos murinos de 9,5
a 11,5 dias da gestação, bem como expressão temporal diferenciada.
Além disso, a proteína Ago2, envolvida na formação do complexo RISC de ação dos
miRNAs, é fundamental no desenvolvimento no momento de ativação do genoma
embrionário. Nesse período, são destruídos os produtos remanescentes derivados da
transcrição de genes maternos ou oocitários. Isso sugere que o processo epigenético –
mediado pela interferência de miRNAs – deve participar de maneira importante nessa
destruição (LYKKE-ANDERSEN et al., 2008).
Durante o estádio de mórula, miRNAs parecem estar envolvidos em adesão celular,
enquanto no estágio de blastocisto, eles devem ter importância na diferenciação celular,
podendo estar associados com a manutenção da pluripotência (YANG et al., 2008). De
fato, estima-se que existam em torno de 110 mil transcritos totais de miRNAs em células-
tronco embrionárias de murinos (CALABRESE et al., 2007).
Conforme mencionado anteriormente, miRNAs podem se ligar, imperfeitamente, a
seus genes-alvo, o que dificulta a identificação destes. Entretanto, muitos genes já tiveram
seu papel identificado como sendo importantes na regulação de genes específicos da
massa celular interna (MCI), tanto em células-tronco embrionárias de camundongos quanto
em células de humanos. Por exemplo, miR-134 e miR470 controlam SOX2 e OCT4,
respectivamente, e miR-296 e miR470 regulam a expressão de NANOG (TAY et al., 2008).
Em células-tronco embrionárias de humanos, miR-145 também reprime a expressão de
OCT4, SOX2 e KLF4 (XU et al., 2009). Todos esses miRNAs regulam, negativamente,
fatores de pluripotência, indicando que podem estar envolvidos na indução da formação de
células trofoblásticas, bem como na diferenciação de células da MCI em outros tipos
celulares.
Um gene alvo do miR-290, específico de células-tronco embrionárias, já foi
identificado. Essa família de miRNAs reprime o gene RBL2, que por sua vez age
reprimindo a expressão da metiltransferase de DNA DNMT3, responsável pela metilação
de novo em células embrionárias e germinativas. Assim, a perda dessa família de miRNAs
eleva a expressão de RBL2, que por sua vez reduz DNMT3, levando à hipometilação em
células-tronco (BENETTI et al., 2008; SINKKONEN et al., 2008). Até o momento, apesar
de um pequeno grupo de miRNAs ter sido identificado em células trofoblásticas, nenhum
alvo foi identificado nesses miRNAs. A identificação de mais miRNAs, bem como alvos para
eles, contribuirá para que se entenda o papel desse processo epigenético na segregação
das células totipotentes embrionárias em massa celular interna e trofoblasto.
Recentemente, foram publicados alguns estudos sobre miRNAs em bovinos. Abd El
Naby et al. (2013) relataram diminuição dramática em seis miRNAs, altamente expressos
em oócitos, durante o desenvolvimento embrionário. Além disso, esses miRNAs seguem
um padrão similar de degradação dos demais transcritos maternos, sugerindo que eles
sejam parte ativa do processo de degradação dos transcritos maternos que ocorre durante
a ativação do genoma embrionário. Em estudos envolvendo embriões produzidos por
transferência nuclear em bovinos, Castro et al. (2010) mostraram que, em embriões que
sobreviveram ao 17º dia da gestação, 14 de 56 miRNA avaliados estavam alterados
quando comparados com embriões produzidos por fertilização in vitro.
Placenta
MicroRNAs já foram descritos associados aos mais diversos eventos reprodutivos,
incluindo processos de modulação uterina como a implantação (CHAKRABARTY et al.,
2007; PAN; CHEGINI, 2008). Um estudo muito interessante, conduzido em 2007,
demonstrou um perfil específico de tecido para a expressão de miRNAs, incluindo um perfil
placentário (LIANG et al., 2007), com um número importante de genes trofoblástico-
específicos (DONKER et al., 2012; MORALES-PRIETO et al., 2012).
Outros estudos também identificaram que a placenta apresenta inúmeros miRNAs
agrupados em três clusters em humanos, nos seguintes locos (LIANG et al., 2007; MIURA
et al., 2010; MORALES-PRIETO et al., 2012; MORALES-PRIETO; MARKERT, 2011),
apresentando expressão temporal e diferenciada em pacientes com parto prematuro
(MAYOR-LYNN et al., 2011):
• Cromossomo 14 (14q32).
• Cromossomo 19 (19q13.41).
• Cluster denominado miR-371-3.
Por sua vez, ausência de Dicer1 em células mesenquimais do oviduto também causa
defeito no transporte de embriões (GONZALEZ; BEHRINGER, 2009), possivelmente por
falhas na formação da camada muscular lisa nessas estruturas.
Esse modelo transgênico condicional também apresenta defeitos na junção tubo-
uterina. Além disso, também foram encontradas anormalidades no útero dessas fêmeas
mutantes para Dicer, como redução no número de glândulas endometriais, importantes
para secreção de hormônios fundamentais no estabelecimento e na manutenção da
gestação, bem como para o transporte de nutrientes (GONZALEZ; BEHRINGER, 2009;
LUENSE et al., 2009).
Em machos murinos, a deleção da Dicer1 em células de Sértoli resulta em severos
defeitos na espermatogênese e eventual degeneração testicular após o nascimento,
seguida por enorme alteração na expressão gênica no tecido testicular (PAPAIOANNOU
et al., 2009, 2011), que por sua vez pode ter causado alteração na sinalização hormonal,
controlada pelas células de Sértoli, e de fundamental importância na espermatogênese.
Considerações finais
Conforme abordado neste capítulo, a descoberta de transcritos não codificadores
(curtos e longos) adicionou um novo nível de complexidade aos processos de controle da
transcrição e da tradução do RNA mensageiro. Isso também faz entender a importância
das vastas sequências genômicas não codificadoras de proteínas, previamente vistas
como não funcionais. A expressão temporal e específica de tecido posiciona os ncRNAs
como figuras importantes no entendimento dos padrões de expressão gênica, função e
fenótipo tão diferenciados entre tipos celulares de órgãos distintos, descrevendo assim
importante papel desses RNAs no controle epigenético do desenvolvimento, da
manutenção e da função dos organismos.
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Capítulo 5
Introdução
O objetivo do estudo da epigenética é a identificação dos locais e da natureza das
modificações que ocorrem ao longo do genoma (FAZZARI; GREALLY, 2004). Assim,
dependendo da modificação, dos equipamentos disponíveis e do interesse do estudo,
diferentes técnicas podem ser utilizadas para detectar e avaliar modificações epigenéticas.
Entre as técnicas disponíveis, as mais utilizadas para avaliação das modificações de
histonas são: imunofluorescência indireta (IF) e imunoprecipitação de cromatina (ChIP);
para metilação de DNA: digestão com endonuclease de restrição sensível à metilação,
tratamento do DNA com bissulfito de sódio e imunoprecipitação de cromatina metilada
(MeDIP); para conformação de cromatina e do posicionamento de nucleossomos: digestão
com endonuclease micrococal, análise de hipersensibilidade à DNaseI e captura de
conformação de cromossomo (3C) e suas variações.
Duas abordagens podem ser utilizadas para preparar a cromatina para a ChIP:
digestão do DNA com a nuclease micrococal (MNase) para obter a cromatina nativa
(nChIP) ou exposição das células ao formaldeído ou à luz UV e posterior fragmentação por
sonicação, que consiste na quebra do DNA por aplicação de ultrassom, para uso de
cromatina crosslinked (xChIP) (YAN et al., 2004). A xChIP permite avaliar proteínas que se
ligam ao DNA com baixa afinidade, como a maioria das proteínas não-histônicas, enquanto
a nChIP é utilizada no estudo de proteínas que se ligam ao DNA com alta afinidade, sendo
mais adequada para a análise de modificações de histonas centrais como acetilação e
metilação (TOLLEFSBOL, 2004).
Na xChIP, o formaldeído promove a ligação cruzada entre proteína-DNA por meio da
interação entre os grupos amino e imino de lisina, arginina e histidina e as bases do DNA.
A estrutura da cromatina é preservada, e a ligação pode ser revertida em condições
brandas. Após a fixação com formaldeído, a cromatina é fragmentada e solubilizada por
sonicação e, então, precipitada com os anticorpos seletivos. Em seguida, o crosslink é
revertido, e o DNA imunoprecipitado é avaliado (YAN et al., 2004).
Na nChIP, a cromatina liberada do núcleo por digestão com MNase, que cliva
preferencialmente o DNA de ligação entre os nucleossomos, é selecionada quanto à
presença de mono e dinucleossomos, o que permite que uma modificação em determinado
gene ou loco seja mapeada com maior resolução que na xChIP.
Para os estudos de acetilação de histonas, é necessária a adição de butirato de sódio
nos tampões para inibir as enzimas desacetilases de histonas (THORNE et al., 2004).
Outra vantagem do uso da nChIP é que os epítopos reconhecidos pelos anticorpos
permanecem intactos durante a preparação da cromatina, o que assegura maiores níveis
de precipitação que a xChIP (UMLAUF et al., 2004).
Após a ChIP, o DNA precipitado e extraído pode ser avaliado por diferentes técnicas
(HARING et al., 2007; KIM; PARK, 2011; LIEB et al., 2006; TOLLEFSBOL, 2004), como:
qPCR (ChIP-qPCR) – Permite a quantificação rápida e acurada da proteína ligada a
uma região específica do DNA (UMLAUF et al., 2004). Além da reação em cadeia da
polimerase quantitativa (qPCR), é possível avaliar o DNA precipitado por PCR duplex
(coamplificação do gene-alvo e de um gene controle), que permite determinar níveis
relativos de uma modificação específica de histona ao longo dos domínios cromossômicos
(UMLAUF et al., 2004).
Para avaliar a metilação, três tipos de comparações podem ser feitas: entre amostras
tratadas com uma ou mais enzimas e uma amostra controle – sem tratamento; entre uma
amostra tratada com uma enzima sensível à metilação comparada com uma amostra
controle tratada com um isoquisômero não sensível à metilação; ou entre duas amostras
testes, como por exemplo, dois tecidos diferentes, ambos tratados com a mesma enzima
(ZILBERMAN; HENIFOFF, 2007).
O uso de endonuclease de restrição sensível à metilação fornece informações a
respeito da ocorrência relativa e da abundância de 5mC no genoma (LIU et al., 2004).
Entretanto, como a sequência de reconhecimento para as enzimas de restrição ocorre de
maneira pouco frequente, menos de 5% das citosinas metiladas podem ser avaliadas numa
dada sequência do DNA (TOLLEFSBOL, 2004). Além disso, a técnica requer grandes
quantidades de DNA e não permite detectar hemimetilação (LIU et al., 2004).
Após a digestão com enzima de restrição sensível metilação, a avaliação do DNA
digerido pode ser feita por meio de diversas técnicas (JACINTO et al., 2008; HUA et al.,
2011; MELNIKOV et al., 2005):
PCR sensível à metilação – O DNA submetido à digestão com enzima de restrição
sensível à metilação (cliva sítio não metilado) é amplificado por PCR, utilizando-se primers
flanqueadores ao sítio de restrição, e comparado, após eletroforese, ao produto de PCR
do DNA não digerido (Figura 2). A diminuição da intensidade ou o desaparecimento da
banda no produto de PCR do DNA digerido indicam redução ou perda de metilação num
determinado fragmento do DNA (XUE et al., 2002).
Figura 2. PCR sensível à metilação: após PCR de DNA não digerido (-) ou digerido com endonuclease de
restrição sensível à metilação (+), eletroforese permite identificar fragmentos: 1) metilados (banda em - e +), 2)
desmetilados (banda em -) ou 3) hipometilados (banda normal em - e banda mais fraca em +).
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
Figura 4. Amplificação de sítios intermetilados (AIMS). Primeira digestão com endonuclease de restrição
sensível à metilação, que reconhece sítios específicos (S), mas não cliva sítios metilados (mS), e deixa
extremidades cegas; segunda digestão com isoquisômeros de endonuclease de restrição não sensível à
metilação que deixa extremidades coesivas para a ligação de adaptadores; amplificação por PCR e
eletroforese para identificação do nível de metilação.
Fonte: modificado de Samuelsson et al. (2010).
Conformação de cromatina
O teste de hipersensibilidade à DNaseI permite gerar mapas da acessibilidade da
cromatina ao detectar as modificações na estrutura associada com a ativação
transcricional: estrutura permissiva e DNA exposto e, consequentemente, maior
sensibilidade à digestão pela DNaseI (ZHOU et al., 2011). Os sítios de hipersensibilidade à
DNaseI geralmente estão localizados nos sítios de reconhecimento de fatores de
transcrição, que incluem promotores, enhancers, elementos de controle de locos,
silenciadores transcricionais, origens de replicação, elementos de recombinação e sítios
estruturais, geralmente localizados dentro de 1 kb na extremidade 5’ do sítio de início de
transcrição (LU; RICHARDSON, 2004).
A estratégia desse teste baseia-se no breve tratamento da cromatina com pequenas
quantidades de DNaseI de maneira a clivar os sítios expostos hipersensíveis. Para o
mapeamento dos sítios de clivagem, o DNA é isolado e analisado por Southern blotting
(LU; RICHARDSON, 2004), PCR multiplex (avaliação de até 50 locos simultaneamente,
com múltiplos primers) com amplificação dependente de ligação de sonda (MLPA, do
inglês ligation-dependent probe amplification); (OHNESORG et al., 2009), microarranjo –
DNaseI-chip – (FOLLOWS et al., 2006) ou sequenciamento DNaseI-seq (BAEK et al.,
2012).
O isolamento de elementos regulatórios assistido por formaldeído (FAIRE, do inglês
formaldehyde-assisted isolation of regulatory elements) explora a solubilidade da
cromatina aberta e livre de nucleossomos na fase aquosa durante a extração com solvente
orgânico (ZHOU et al., 2011). Essa técnica consiste no crosslink da cromatina com
formaldeído, fracionamento por sonicação, extração com fenol-clorofórmio e avaliação do
DNA recuperado da fase aquosa, em comparação ao DNA não crosslinked, por
microarranjo – FAIRE-chip (GIRESI et al., 2007) ou sequenciamento – FAIRE-seq
(GAULTON et al., 2010).
A técnica de FAIRE resulta em enriquecimento de DNA coincidente com a localização
de sítios hipersensíveis à DNaseI, sítios de início de transcrição e promotores ativos
(GIRESI et al., 2007).
Uma técnica que se assemelha à técnica de FAIRE, mas inclui uma etapa de seleção
de tamanho e produz resultados diferentes, foi denominada de Sono-seq, quando avaliada
por sequenciamento. Essa metodologia baseia-se na maior eficiência de sonicação em
abrir a cromatina crosslinked de regiões de maior acessibilidade no genoma e tem como
objetivo mapear a localização da cromatina de alta acessibilidade nas regiões promotoras
(AUERBACH et al., 2009; SAJAN et al., 2012; ZHOU et al., 2011).
A técnica 5C foi usada para estudar interações entre sítios de início de transcrição e
elementos distais no genoma (SANYAL et al., 2012).
• Tipo celular.
• Meio de cultura.
• Confluência da cultura celular.
• Tempo de incubação.
• Concentração.
Assim, a padronização rigorosa dos experimentos faz-se necessária (LIU; XU, 2004).
Entre outras substâncias químicas, capazes de promover alterações epigenéticas,
destaca-se a 5-aza-2-desoxicitidina (5-aza-Dc), que promove desmetilação do DNA. Como
um análogo de nucleosídeo, a 5-aza-Dc é incorporada no DNA em replicação e liga-se de
maneira covalente às metiltransferases de DNA (DNMTs), o que ocasiona a desmetilação
passiva durante a replicação do DNA e a divisão celular (HAGEMANN et al., 2011).
Considerações finais
São várias as técnicas moleculares que podem ser utilizadas para detectar e a avaliar
as modificações epigenéticas. Para a avaliar a metilação do DNA, o tratamento com
bissulfito de sódio é a técnica mais adotada, enquanto para as modificações de histonas,
costuma-se empregar a imunoprecipitação de cromatina. Assim, a escolha da técnica
molecular ideal deve ser baseada:
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Capítulo 6
Impressão genômica
Simone Cristina Méo Niciura
Felipe Perecin
Introdução
O embrião mamífero diploide (2n) é formado pela fusão dos gametas haploides (1n)
masculino (espermatozoide) e feminino (oócito) (Figura 1). Uma vez que cada um dos
genitores fornece a seus descendentes um gameta, ou seja, um conjunto haploide de
cromossomos, parece óbvio supor que a contribuição genética transmitida aos filhos por
ambos os pais deveria ser idêntica (WATSON et al., 1992). Entretanto, isso não é
observado em alguns genes.
Figura 1. Indivíduos adultos diploides (2n) produzem gametas haploides (n): oócito na
fêmea e espermatozoide no macho, que se unem, reconstituem o conteúdo cromossômico
2n e formam o zigoto, que, por mitose, desenvolve-se num novo indivíduo.
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
Definição
O genomic imprinting é o evento no qual a expressão de um gene depende de sua
origem parental, materna ou paterna (ALBERTS et al., 1994; JAENISCH, 1997; WATSON
et al., 1992). Em outras palavras, o genomic imprinting é o evento epigenético que
determina a expressão monoalélica de um gene. Enquanto a maioria dos genes
autossômicos é expressa por ambos os cromossomos parentais, a expressão gênica
imprinted é restrita a um dos alelos parentais. Assim, a atividade de um gene imprinted em
cada indivíduo depende do sexo do progenitor do qual o alelo foi herdado (WATSON et al.,
1992), de modo que alguns genes são expressos apenas pelo alelo herdado da mãe e
outros só pelo alelo herdado do pai (KENDREW, 1994).
O imprinting surgiu em mamíferos há aproximadamente 180 a 210 milhões de anos,
próximo do momento em que os humanos compartilhavam um ancestral comum com os
marsupiais e os monotrematas (HORE et al., 2007). Assim, o imprinting ocorre em genes
autossômicos de mamíferos eutérios (que possuem placenta verdadeira) e leva a desvios
da herança mendeliana (RUVINSKY, 1999). Em marsupiais (metatérios), o número de
genes imprinted descritos (seis genes até o momento) é bem menor que em mamíferos
eutérios, enquanto ainda não foram relatados imprints em monotrematas (prototérios) e
em aves (DAS et al., 2012). Fenômeno epigenético semelhante ao genomic imprinting já
foi descrito em plantas angiospérmicas e em insetos (LIZE et al., 2007; SPIELMAN et al.,
2001; TODER et al., 1996).
Os genes imprinted possuem algumas características em comum:
• São dispostos em grupos ou clusters (o que indica que podem sofrer interação).
• Apresentam assincronia na replicação do DNA, sequências repetitivas e poucos
e pequenos íntrons.
Poucos são os genes imprinted isolados no genoma, a maioria (80%) deles localiza-se
em clusters de até 4 megabases (Mb) de tamanho (BARLOW, 2011). Esses clusters – que
se estendem por centenas a milhares de quilobases no genoma – englobam genes
imprinted paternos ou maternos codificadores de proteínas, pelo menos um RNA não
codificador e, em alguns casos, outros genes não imprinted (ARNAUD, 2010;
STROGANTSEV; FERGUSON-SMITH, 2012).
Em bovinos, em comparação aos genes de expressão bialélica, os genes imprinted
possuem (KHATIB et al., 2007):
• Maior conteúdo G + C.
• Maior número de ilhas CpG e de repetições em sequência, com menor número
de short interspersed nuclear elements (SINEs) (KHATIB et al., 2007).
A maioria dos genes imprinted codifica proteínas, mas alguns genes produzem um
RNA não codificador, como o H19 (RUVINSKY, 1999; SASAKI et al., 1995; YOUNG;
FAIRBURN, 2000). O imprinting dos genes é específico em tecidos e estádios do
desenvolvimento e nem todos os genes imprinted numa espécie o são em outra, o que
indica aquisição evolutiva (RUVINSKY, 1999). Assim, de 63 genes imprinted de humanos e
camundongos, só 26 são conservados em ambas as espécies (ZAITOUN; KHATIB, 2008),
enquanto de 22 genes imprinted em humanos ou em camundongos, apenas 14 são
imprinted em bovinos (KHATIB et al., 2007).
• CDKN1C e p57KIP2.
• GNAS, GS-ALPHA, GNASXL e NESP.
• GTL2 e MEG3.
• IGF2R e M6PR.
• ITUP1, MIM1, MIMT1 e IMPO1.
• MEST e PEG1.
• PEG11 e RTL1.
• PEG11-AS, antiPEG11 e RTL1-AS.
• PHLDA2, TSSC3 e IPL.
• A regulação do crescimento fetal, por IGF2, IGF2R e H19 (DEAN et al., 1998;
KENDREW, 1994; SASAKI et al., 1995; WATSON et al., 1992).
• O suprimento sanguíneo e a formação da placenta, por IGF2R, INS2 e MASH2
(LOI et al., 1998; TANAKA et al., 1999; YOUNG; FAIRBURN, 2000).
• A inativação do cromossomo X pelo XIST (YOUNG; FAIRBURN, 2000).
• O comportamento materno, pelo MEST (LEFEBVRE et al., 1998).
• A aprendizagem pelo XRL3B (DAVIES et al., 2005).
Durante a fase migratória, em que as PGCs migram do epiblasto e passam pelo saco
vitelino e pelo mesoderma intraembrionário, ou durante a fase gonadal, depois de atingirem
a crista gonadal, as PGCs passam por uma onda global de desmetilação que apaga as
marcas epigenéticas nos genes imprinted. A perda de metilação nas PGCs provavelmente
ocorre por um mecanismo ativo de excisão de base, no qual a 5-metil-citosina (5mC) é
convertida em 5-hidroxi-metil-citosina (5hmC) pelas enzimas Tet (STROGANTSEV;
FERGUSON-SMITH, 2012), conforme o que foi visto no Capítulo 2.
Nos gametas em formação, o processo de metilação de novo restabelece as marcas
epigenéticas nas DMRs que identificam a origem parental do alelo. De acordo com o que
foi visto no Capítulo 2, a metilação de novo é promovida pelas metiltransferases de DNA
(DNMTs) 3A e 3B. Nas linhagens germinativas, a DNMT3A forma um complexo com a
DNMT3L, que interage com a H3K4 desmetilada ou com transcritos e com as proteínas
ZFP57/KAP1 e promove a metilação de novo (CHOTALIA et al., 2009; STROGANTSEV;
FERGUSON-SMITH, 2012).
Os imprints são apagados e restabelecidos em momentos diferentes ao longo da
formação dos gametas masculinos ou femininos a partir das PGCs. Por sua vez, a
regulação de diferentes genes imprinted na mesma linhagem germinativa (masculina ou
feminina) também é assincrônica. A desmetilação dos genes imprinted é precedida por
modificações nas marcas epigenéticas de histonas, em especial, por diminuição acentuada
dos níveis de H3K9me2 e pela elevação dos níveis de H3K27me nas PGCs migratórias
(HAJKOVA et al., 2008). Os níveis de metilação do DNA nas PGCs decrescem ainda mais
durante a fase migratória e na fase gonadal e geralmente a linhagem germinativa masculina
reprograma, epigeneticamente, os genes imprinted antes da linhagem germinativa feminina
(BIERMANN; STEGER, 2007).
Em suínos, por exemplo, a perda da metilação na DMR do gene IGF2R ocorre
aproximadamente aos 22 dias do desenvolvimento em machos e entre os dias 29 e 31 em
fêmeas, enquanto para a ICR do IGF2-H19, o decréscimo da metilação ocorre entre os
dias 22 e 42, com retomada da metilação aproximadamente aos 35 dias em machos e
depois de 42 dias em fêmeas (HYLDIG et al., 2011; PETKOV et al., 2009).
Quanto ao momento em que as marcas epigenéticas são restabelecidas nos imprints,
a variação temporal entre gêneros é bastante evidente em camundongos. De um total de
21 DMRs estabelecidas durante a gametogênese, 17 são metiladas no alelo materno após
o nascimento, no oócito em crescimento, e ocorrem em regiões promotoras, enquanto 4
são metiladas no alelo paterno ainda nas células germinativas e ocorrem em regiões
intergênicas (STROGANTSEV; FERGUSON-SMITH, 2012). Assim, nos machos, os
imprints são estabelecidos na fase pré-natal, nos espermatócitos ainda diploides, enquanto
nas fêmeas, os imprints são estabelecidos no estádio do diplóteno da meiose (MURPHY;
JIRTLE, 2003).
O mecanismo usado na identificação parental do alelo para a metilação ainda não é
completamente conhecido, mas deve envolver a participação da estrutura da cromatina, de
sítios de microRNA, de sítios hipersensíveis à DNaseI (BOYANO et al., 2008), de
espaçamento ótimo entre os dinucleotídeos CpG, de modificações de histonas (o alelo
metilado apresenta H3K9me3 e H3K20me3, enquanto o alelo ativo possui H3K3me2 e
H3K9ac, além de outras histonas acetiladas) (MONK et al., 2008; SINGH et al., 2010) e de
transcrição gênica (CHOTALIA et al., 2009). Além desses elementos em cis – que ocorrem
no próprio cromossomo – pode ocorrer a participação de fatores em trans, como as
proteínas de ligação de metil (MeCP2, MBD1 e MBD3) (MCMURRAY; SCHMIDT, 2012).
As etapas de desmetilação e de metilação de novo – descritas anteriormente – são
específicas para a linhagem germinativa e, nesses eventos, os genes imprinted são
reprogramados de modo diferencial entre os alelos maternos e paternos. Uma segunda
onda de desmetilação global, que promove a reprogramação epigenética de todos os
demais genes (exceto os imprinted), ocorre logo após a fecundação, e o restabelecimento
do padrão de metilação acontece no estádio de blastocisto, em camundongos, ou no
estádio de 8 a 16 células, em bovinos (REIK et al., 2001; MANN; BARTOLOMEI, 2002).
Nessa segunda onda de desmetilação global do genoma – que ocorre durante o
desenvolvimento do concepto – os genes imprinted são protegidos e permanecem
metilados (JAENISCH, 1997; RUVINSKY, 1999) (ver Capítulo 7). A proteção dos genes
imprinted contra a desmetilação ativa é mediada pelos fatores PGC7/Dppa3/Stella que
são recrutados pela H3K9me2, enquanto a prevenção da ocorrência da desmetilação
passiva ocorre pela manutenção da DNMT1 e da DNMT específica do oócito (DNMT1o) no
núcleo (FAULK; DOLINOY, 2011; NAKAMURA et al., 2012; STROGANTSEV; FERGUSON-
SMITH, 2012).
Além da metilação do DNA, as modificações de histonas e a expressão de transcrito
antisense ou RNA não codificador também constituem mecanismos de controle de
imprinting (KENDREW, 1994; RUVINSKY, 1999; YOUNG; FAIRBURN, 2000; SPAHN;
BARLOW, 2003). Dos 6 genes imprinted descritos em marsupiais, só 2 são regulados por
metilação nas DMRs, enquanto os demais genes são controlados por marcas de histonas
(H3K9me, H3K27me, H3K4me e acetilação) (DAS et al., 2012).
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Capítulo 7
Introdução
Neste capítulo, serão abordadas as modificações genéticas e epigenéticas que
ocorrem durante o desenvolvimento normal dos mamíferos, desde a formação dos
gametas (gametogênese e foliculogênese), passando pela fecundação, pela formação do
zigoto e pela progressão do desenvolvimento embrionário (ativação do genoma
embrionário, formação de blastocisto e inativação do cromossomo X em fêmeas) até a
diferenciação tecidual, o crescimento pós-natal e o envelhecimento.
Uma segunda onda de reprogramação epigenética ocorre após a fusão dos gametas,
nos primeiros ciclos celulares do desenvolvimento embrionário, evento esse que será
abordado mais adiante, neste capítulo.
Nas PGCs que atingem a crista gonadal, o evento de desmetilação global, seguido de
metilação de novo, além de permitir o estabelecimento do padrão de imprinting específico
para os gametas de cada sexo (ver Capítulo 6), apaga possíveis epimutações acumuladas
durante a vida, reativa os genes específicos da linhagem germinativa e compatibiliza o
cenário epigenético com o restabelecimento da totipotência, que ocorrerá após a
fecundação (CANTONE; FISHER, 2013; HACKETT et al., 2013).
Nesse processo, além da desmetilação, há também perda da histona de ligação H1 e
das marcas de histonas H3K27me3, H3K9me3, H3K9ac e H2A/H4 R3me2, além da
reativação do cromossomo X nas fêmeas. A diminuição de H3K9me2, desencadeada pela
redução da metiltransferase Ehmt1, pode ser necessária para que a desmetilação do DNA
ocorra, associada à diminuição de DNMT3A, de DNMT3B e de UHRF1 (proteína que
recruta DNMT1) (CANTONE; FISHER, 2013). Entretanto, alguns genes, principalmente
aqueles de elementos repetitivos, podem ser resistentes à desmetilação nas PGCs, o que
permite a ocorrência da herança epigenética transgeracional (HACKETT; SURANI, 2013).
Durante a gametogênese, podem-se destacar:
Espermatogênese
O processo da espermatogênese consiste na transformação das células germinativas
masculinas de espermatogônia a espermatozoides (Figura 1). As células-tronco masculinas
ou espermatogônias multiplicam-se várias vezes por divisões de mitose e dão origem a
novas espermatogônias ou a espermatócitos primários, que sofrem divisão meiótica e
resultam nas espermátides. As espermátides passam por modificações estruturais
(espermiogênese) e dão origem aos espermatozoides (ALBERTS et al., 1997; JOHNSON
et al., 1999).
Figura 1. Processo de espermatogênese para produzir o gameta masculino: as
espermatogônias diploides multiplicam-se por mitose e formam os espermatócitos
primários; um espermatócito primário sofre a primeira divisão da meiose e forma dois
espermatócitos secundários haploides. Na segunda divisão meiótica, cada espermatócito
secundário resulta em duas espermátides, que se diferenciam em espermatozoides.
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
Oogênese
A produção de gametas femininos (Figura 2) ocorre pela divisão mitótica das PGCs,
no ovário embrionário, e pela formação das oogônias. Ainda durante o desenvolvimento
fetal, ocorre a primeira divisão da meiose (Meiose I), sendo interrompida na fase de
dictiato, e o oócito permanece no estádio de vesícula germinativa (VG) por vários meses
ou até anos. Assim, por ocasião do nascimento, já existe um número máximo de folículos
que pode chegar à ovulação. A Meiose I – que só é retomada na puberdade, após o
estímulo pré-ovulatório do hormônio luteinizante (LH) – consiste na progressão do estádio
de prófase I a metáfase II (MII), etapa de maturação oocitária nuclear, que resulta na
ovulação do gameta feminino (oócito) haploide. A segunda divisão da meiose (Meiose II)
nos oócitos – da maioria das espécies mamíferas – só ocorre após a fecundação pelo
espermatozoide (GORDON, 2003; HAFEZ, 1995).
Figura 2. Processo de oogênese para produzir o gameta feminino: a oogônia diploide
diferencia-se em oócito primário; a primeira divisão da meiose tem início, mas é
interrompida na fase de dictiato, e o oócito permanece em estádio de vesícula germinativa;
antes da ovulação, ocorre a retomada da Meiose I e a formação do oócito secundário
haploide e do primeiro corpúsculo polar (CP), na etapa de maturação nuclear; a segunda
divisão da meiose só acontece após a fecundação e leva à formação do oócito fecundado
ou ovo e à extrusão do segundo CP; durante a Meiose II, o primeiro CP também pode se
dividir.
Ilustração: Simone Cristina Méo Niciura.
Foliculogênese
O crescimento folicular ocorre de maneira ordenada. A partir do terço inicial do
desenvolvimento fetal, há formação dos folículos primordiais por meio de mitoses
sucessivas das células germinativas. A passagem do estádio de folículo primordial para
primário compreende o crescimento e a multiplicação das células da granulosa.
A retomada do desenvolvimento folicular para que ocorra a ovulação envolve:
• A síntese de RNA.
• A proliferação das células da granulosa.
• O aumento do tamanho do oócito.
• O envolvimento do folículo pelas células da teca.
Nessa fase, o hormônio folículo estimulante (FSH) atua em sinergismo com o estradiol
e, após o pico de LH, ocorre a ovulação do folículo dominante e a formação do corpo lúteo
(HAFEZ, 1995).
Por sua vez, o gene FIGLA contribui para o início da foliculogênese no ovário pós-
natal; o NOBOX participa no desenvolvimento, além do estádio de folículo primordial; e os
genes GDF9 e BMP15 estão ligados ao desenvolvimento além do estádio de folículo
primário (BONNET et al., 2008; MINAMI; TSUKAMOTO, 2006).
A expressão da aromatase – enzima da biossíntese de estrógeno codificada pelo
gene CYP19 – aumenta nos folículos grandes para promover a síntese de 17-β-estradiol,
necessário para o desenvolvimento folicular e a maturação, diminuindo após a lutenização
(MONGA et al., 2011). Essa regulação da expressão do gene CYP19 pode ser explicada
pelo estado de metilação em seu promotor proximal específico de ovário (MONGA et al.,
2011):
A segunda onda de reprogramação, a qual ocorre logo após a fusão dos gametas e a
formação do zigoto, envolve desmetilação ativa do genoma paterno e desmetilação passiva
do genoma materno, mas, em ambos os genomas, os locos imprinted são preservados
durante essa onda, de modo que as marcas epigenéticas que determinam os imprints – e
que foram herdadas dos gametas – mantêm-se preservadas. Nas regiões de imprinting,
há um mecanismo protetor da metilação similar àquele que evita a desmetilação ativa no
pronúcleo feminino: PGC7/Dppa3/Stella liga-se a H3K9me2 e evita a hidroximetilação
(KANG et al., 2013; NAKAMURA et al., 2012). Além disso, as proteínas ZFP57 e TRIM28
– que recrutam SETDB1 que promove trimetilação de H3K9 – e a DNMT1 protegem os
genes imprinted da desmetilação passiva durante as clivagens (DENOMME; MANN, 2013).
Formação do blastocisto
Os oócitos fecundados e em processo de clivagem são transportados pela tuba
uterina até o útero, onde atingem o estádio de blastocisto, e a totipotência das células é
perdida à medida que as clivagens progridem. As principais proteínas que participam da
polarização e da compactação dos embriões são os componentes das junções adesivas e
oclusivas, os complexos de divisão e as proteínas quinases atípicas (DURANTHON et al.,
2008). Assim, no estádio de mórula, há aumento da expressão de genes do citoesqueleto,
da adesão celular e de proteínas de junção celular (CUI et al., 2007). No estádio de
blastocisto, há aumento da expressão de genes envolvidos em canais de íons, tráfego de
membranas, proteínas carreadoras ou de transferência e metabolismo de lipídeos,
provavelmente envolvidos na formação da blastocele (CUI et al., 2007). O blastocisto é o
primeiro estádio do desenvolvimento em que há evidente diferenciação morfológica entre
os tipos celulares (HAFEZ, 1995; GORDON, 2003):
O gene PPARγ1 é expresso em baixos níveis nos pré-adipócitos, mas sua expressão
aumenta durante a adipogênese, concomitantemente ao aumento nos níveis da marca ativa
H3K4me3 no seu promotor (GE, 2012).
Em estudo com ESCs, com células progenitoras neurais e com fibroblastos
embrionários murinos, foi observado que H3K4me3 (catalisada por Tritorax; marca de
ativação) e H3K27me3 (por PcG; marca de silenciamento) em promotores discriminam
genes expressos, pausados (possuem as duas marcas, ou seja, são bivalentes) e
reprimidos, e refletem o estado celular e o potencial de linhagem (PRESSER et al., 2007).
As ESCs possuem maior número de promotores bivalentes que as células diferenciadas
(HAWKINS et al., 2010), o que assegura a resposta mais rápida frente a estímulos
(FISHER; FISHER, 2011).
A metilação do DNA é importante para manter o estado gênico reprimido em várias
gerações celulares, até mesmo durante toda a vida do indivíduo, e algumas ilhas CpG
sofrem metilação de novo específica de tecido durante o desenvolvimento (BERGMAN;
CEDAR, 2013). Assim, após a implantação, não há mudanças globais na metilação do
DNA, mas eventos epigenéticos que ocorrem em sequências-alvo específicas.
Envelhecimento e longevidade
O envelhecimento, processo lento e gradual de deterioração das capacidades
funcionais que predispõe a doenças e resulta na morte, consiste de complexas mudanças
anatômicas, fisiológicas, bioquímicas, genéticas e epigenéticas nos organismos durante a
vida (CALVANESE et al., 2009; D’AQUILA et al., 2013). Assim, a variação existente na
longevidade em humanos, determinada principalmente por fatores ambientais (DEELEN
et al., 2013) e evidente em gêmeos monozigóticos (FRAGA, 2009), pode ser controlada
por alterações específicas nos estados de cromatina (GREER et al., 2010).
Em cultivo, as células possuem limitada vida proliferativa e deixam de progredir no
ciclo celular, na chamada senescência replicativa, que reflete in vitro e em nível celular o
processo de envelhecimento (DIMAURO; DAVID, 2009). Em humanos, os seguintes genes
ou cascatas foram associados à longevidade (DEELEN et al., 2013):
Alguns dos eventos epigenéticos que ocorrem durante o envelhecimento (BAUR et al.,
2004; CALVANESE et al., 2009; D’AQUILA et al., 2013; DIMAURO; DAVID, 2009;
GENTILINI et al., 2013) estão relacionados à:
Metilação do DNA – Perda de metilação global; hipermetilação em sítios específicos
de ilhas CpG em alguns locos (genes de receptor de estrógeno, RNA ribossomal,
supressor de tumor, desenvolvimento de estruturas anatômicas e regulação de
transcrição); hipometilação de elementos repetitivos do DNA e do cromossomo X inativo e
em locos de genes de processos biológicos (resposta inflamatória aguda, regulação
positiva de tradução/sinalização e resposta de defesa a bactérias).
Atividade de metiltransferases de DNA (DNMTs) – Aumento de DNMT3B,
diminuição de DNMT3A e DNMT1.
Acetilação de histonas – Diminuição de H3K9ac.
• Diminuição de HDAC-1.
• Diminuição das acetiltransferases p300 e CBP.
Considerações finais
Em todas suas etapas, o desenvolvimento dos mamíferos (formação dos gametas,
fecundação, desenvolvimento embrionário, crescimento pós-natal e envelhecimento)
envolve controle orquestrado de efeitos genéticos e epigenéticos. As modificações
epigenéticas mais marcantes ocorrem durante o início do desenvolvimento:
Primeira modificação – Onda global de desmetilação que ocorre nas células
germinativas primordiais e apaga as metilações de todos os genes, incluindo os genes
imprinted.
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Capítulo 8
Introdução
Há algumas décadas, acreditava-se que muitas das doenças não infecciosas que
surgiam na população eram provocadas por fatores genéticos; atualmente, a epigenética
traz explicações para algumas dessas questões. Neste capítulo, será mostrado o
envolvimento de eventos epigenéticos mensuráveis – como a metilação do DNA, as
modificações de histonas e os RNAs não codificadores – na etiologia de doenças em
humanos.
Como perspectivas futuras, o conhecimento dos eventos epigenéticos envolvidos nas
desordens patológicas pode:
Esquizofrenia
A esquizofrenia é um transtorno caracterizado por apatia, comportamento catatônico,
ilusões, alucinações e enfraquecimento cognitivo, e a maioria dos pacientes manifesta os
primeiros sinais clínicos na fase adulta jovem (PERRIN et al., 2010).
Sipos et al. (2004), em estudos conduzidos na Suécia, demonstraram o maior risco de
geração de descendentes com esquizofrenia com o aumento da idade paterna,
provavelmente por causa da ocorrência de mutações genéticas na linhagem germinativa
masculina. A idade avançada do avô materno (mas não do avô paterno), também foi
associada ao maior risco de descendentes com esquizofrenia, o que sugere a contribuição
da segregação do cromossomo X para a patologia (FRANS et al., 2011).
Transtorno bipolar
O transtorno bipolar é uma doença mental crônica, caracterizada por oscilações de
humor e que apresenta duas fases principais, com padrão de comportamento opostos:
Enquanto essas fases são separadas por períodos normais de humor, em alguns
pacientes a depressão e a mania podem se alternar rapidamente (VIETA et al., 2011).
O transportador de serotonina ou 5-hidroxitriptamina, o 5-HTT, do inglês, 5-
hydroxytryptamine transporter, é um neuromodulador do sistema nervoso central. O 5-HTT
humano é codificado pelo gene SLC6A4, localizado na banda 11.1-12 do braço longo do
cromossomo 17 (17q11.1-12). Esse transportador é responsável por regular a magnitude e
a duração da neurotransmissão serotoninérgica (WATANABE et al., 2011). Portanto,
acredita-se que as funções alteradas no 5-HTT, em algumas regiões cerebrais,
desempenham papel central na patofisiologia do transtorno bipolar, principalmente nos
episódios depressivos (CANNON et al., 2007).
Sugawara et al. (2011) procuraram estudar os eventos epigenéticos envolvidos nas
diferenças entre gêmeos monozigóticos discordantes em relação ao transtorno bipolar.
Na comparação entre um irmão sadio e um irmão com a enfermidade, foram demonstradas
diferenças na metilação do DNA nas ilhas CpGs no promotor do gene SLC6A4, com
hipermetilação associada à diminuição da expressão gênica no indivíduo com transtorno
bipolar (SUGAWARA et al., 2011).
Além disso, tem sido proposto que em neurônios GABAérgicos do telencéfalo e das
camadas corticais I, II e IV de pacientes com transtorno bipolar, há alta expressão de
DNMT1. Isso resulta em inibição transcricional de genes como o reelin, uma proteína da
matriz extracelular que regula eventos glutamaérgicos, e a descarboxilase de ácido
glutâmico 67 (GAD67, do inglês glutamic acid decarboxilase 67), uma das duas
descarboxilases que sintetiza o GABA. Os promotores do reelin e do GAD67 são
constituídos de grandes ilhas CpG e apresentam padrão específico de metilação. Assim, o
aumento na expressão da DNMT1 resulta em aumento de metilação do DNA nos
promotores e na diminuição da expressão desses genes, com consequente redução na
transmissão GABAérgica e hipoplasticidade neuronal. Além disso, o defeito na plasticidade
é provavelmente responsável pelas anormalidades de falta de sincronização da população
neural, que resulta em disfunções de aprendizado e em desordens de pensamento nos
pacientes psicóticos (COSTA et al., 2007; VELDIC et al., 2007).
Mal de Alzheimer
O mal de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa, caracterizada pela redução no
aprendizado e na atividade, e por alteração do comportamento. Embora o principal agente
causador dessa demência seja o processo neurodegenerativo, existe complexa interação
entre fatores biológicos, sociais e psicológicos (STELLA et al., 2011). No mal de Alzheimer,
são possíveis fatores de risco (PHILIPSON et al., 2010):
• Idade.
• Histórico familiar da doença.
• Sexo feminino.
• Traumas na cabeça.
• Hipertensão arterial.
• Doenças cardiovasculares.
• Dietas com altos níveis de colesterol.
Para a forma mais comum dessa doença – que se inicia mais tardiamente na velhice –
até o momento, o fator de risco identificado foi o alelo ε4 do gene da apolipoproteína E
(APOE) (HAMILTON et al., 2011). A APOE liga-se à β-amiloide, o que altera sua
deposição ou remoção no cérebro, e torna-se um componente das placas senis
(PHILIPSON et al., 2010).
Para muitos casos de mal de Alzheimer, a causa genética não foi estabelecida, o que
determinou que efeitos epigenéticos e ambientais fossem investigados. Comparados às
causas genéticas, provavelmente os fatores epigenéticos são mais apropriados para
explicar as anormalidades no mal de Alzheimer do tipo tardio, pois o padrão epigenético
aberrante pode se acumular com o passar dos anos (WANG et al., 2008).
Pacientes com mal de Alzheimer mostram altos níveis de homocisteína e baixos níveis
de vitamina B12 e folato no sangue, sugerindo falha na regulação da S-adenosil-L-
metionina (SAM), que é o doador universal de metil para o processo de metilação do DNA
(ZAWIA et al., 2009). A metionina fornecida pela dieta pode ser convertida em
homocisteína pela transformação em SAM, desmetilação em S-adenosil-L-homocisteína
(SAH) e hidrólise em homocisteína. No mal de Alzheimer, os níveis de SAM reduzem em
concomitância com a diminuição na metilação do DNA e o aumento nos níveis de β-
amilase. Em baixas concentrações de SAM e de déficit de metionina, a homocisteína
segue a cascata metabólica de transmetilação e forma a metionina pela ação da metionina
sintase (MTR, do inglês, 5 methyltetrahydrofolate-homocysteine methyltransferase), uma
enzima dependente de B12. Uma mutação no gene MTR já foi associada à patogênese do
mal de Alzheimer (DORSZEWSKA et al., 2007). Da mesma maneira, uma mutação no
gene que codifica a 5,10-metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR), outra enzima
envolvida na remetilação da homocisteína em metionina, resulta no aumento da
concentração de homocisteína e foi associada a essa doença (DORSZEWSKA et al.,
2007).
Em casos de mal de Alzheimer de início tardio, análises da metilação do DNA
revelaram grande variabilidade epigenética em genes que participam do processamento do
peptídeo β-amiloide (PSEN1 e APOE) e da homeostase de metilação (DNMT1 e MTHFR).
Assim, a deriva epigenética, que ocorre com o passar dos anos e com a exposição a
diferentes fatores ambientais, pode constituir um mecanismo de predisposição dos
indivíduos a essa enfermidade de início tardio (WANG et al., 2008).
Desordens de imprinting
As desordens relacionadas ao imprinting ocorrem por alteração de dosagem, em
decorrência de dissomias uniparentais (UPD), duplicações cromossômicas ou deleções, ou
por epimutações (padrão aberrante de metilação do DNA na região de controle de
imprinting – ICR) de genes imprinted (ISHIDA; MOORE, 2013).
• Hipotonia.
• Dificuldades em se alimentar, por causa da fraca capacidade de sucção.
• Hipogonadismo e hipogenitalismo em ambos os sexos.
• Hiperfagia.
• Obesidade infantil.
• Baixa estatura causada pela deficiência de hormônios de crescimento.
• Pés e mãos pequenos.
• Desabilidade intelectual.
• Problemas comportamentais.
Aproximadamente 70% dos casos da PWS são causados por alteração genética
(deleção da região 15q11-13 paterna); cerca de 25% dos casos resultam de UPD materna,
e 1% a 3% dos casos devem-se a epimutações (BOWDIN et al., 2007; BUTLER, 2011;
ISHIDA; MOORE, 2013). Recentemente, foram identificados indivíduos com PWS
decorrente de mutações no alelo paterno do gene MAGEL2 (SCHAAF et al., 2013).
A AS é causada pela deficiência na expressão da cópia materna do gene UBE3A em
decorrência de uma das quatro possíveis etiologias (BOWDIN et al., 2007; GENTILE et al.,
2010; HORSTHEMKE; WAGSTAFF, 2008; ISHIDA; MOORE, 2013):
Na SRS, que ocorre 1 caso em 3 mil a 100 mil nascimentos, as características mais
comuns incluem:
Figura 2. Regulação de duas regiões de controle de imprinting (ICR1 e ICR2), modificadas por metilação ou
ligação do fator CTCF no cromossomo humano 11. Síndrome de Beckwith-Wiedemann (BWS) –
hipermetilação na ICR1 no cromossomo materno (M) com silenciamento de H19 e expressão de IGF2; BWS –
hipometilação na ICR2 em M com expressão do RNA não codificador LIT1 e silenciamento de CDKN1C e
KvLQT1. Síndrome de Silver-Russell (SRS): hipometilação na ICR1 no cromossomo paterno (P) com
expressão de H19 e silenciamento de IGF2.
Fonte: modificado de Eggermann et al. (2008) e Weksberg et al. (2010).
Na BWS, 15% dos casos são da forma herdável, decorrentes de mutações no gene
CDKN1C e de variações no número de cópias (CNVs), por causa de duplicações ou
deleções na região cromossômica 11p15.5 (BASKIN et al., 2014). Os 85% dos casos
restantes constituem a forma esporádica da desordem (sem histórico familiar) e ocorrem
por perda de regulação de genes imprinted localizados no cromossomo 11p15.5 (ISHIDA;
MOORE, 2013):
A BWS é esporádica, mas 15% dos casos são familiares, dos quais 40% estão
associados à mutação no gene CDKN1C (ISHIDA; MOORE, 2013). Aproximadamente, de
35% a 65% dos casos de SRS ocorrem por hipometilação da ICR1 paterna no
cromossomo 11p15.5 e 10% por UPD materna do cromossomo 7 (ISHIDA; MOORE,
2013).
Assim, os indivíduos com BWS apresentam defeitos epigenéticos heterogêneos que
podem afetar um ou ambos os domínios do 11p15.5. O ganho de metilação do DNA e a
inibição da ligação do CTCF na ICR1 materna resultam em expressão bialélica do gene
IGF2 e silenciamento do gene H19 (Figura 2) (DE CRESCENZO et al., 2011). A perda de
metilação no alelo materno na ICR2 resulta em expressão bialélica do RNA não codificador
LIT1 e em perda de expressão dos genes CDKN1C e KvLQT1 (Figura 2) (LIM et al.,
2009).
Na SRS, a perda de metilação na ICR1 do cromossomo paterno permite a ligação do
CTCF e resulta em expressão bialélica do gene H19 e em ausência de expressão do gene
IGF2 (ISHIDA; MOORE, 2013; MOORE, 2011).
Assim, em ambas as síndromes, BWS e SRS, foram observadas modificações
epigenéticas de histona, de ligação do CTCF nas ICRs e de metilação do DNA,
correlacionadas com a estrutura da cromatina altamente organizada nesses locos. Em
células de indivíduos normais, foram encontradas:
• Marcas repressivas de histona, H3K9me3 e H4K20me3, associadas com a ICR1
metilada no cromossomo paterno.
• Marcas bivalentes (marcas simultâneas de ativação e de repressão na
cromatina), H3K4me2/H3K27me3, junto com H3K9ac e CTCF associadas com
o cromossomo materno não metilado.
Câncer
O câncer é uma doença caracterizada por progressiva aberração genética e
epigenética, promovendo a instabilidade genômica. Na maioria dos tipos de câncer, têm
sido identificadas as seguintes alterações epigenéticas (KELLY et al., 2010; ROUKOS,
2011):
Terapias epigenéticas
Ao contrário das mutações de DNA, as modificações epigenéticas são reversíveis e
podem ser modificadas de maneira favorável, por meio de tratamentos que visem à
correção de erros epigenéticos. Na terapia epigenética, as principais categorias de
quimioterápicos são (HO et al., 2013; KELLY et al., 2010; LAIRD, 2005; SORIANO et al.,
2013; VERVERIS et al., 2013):
miRNAs
Inibição da superexpressão ou restabelecimento da perda de expressão de
miRNAs – Bloqueio individual com oligonucleotídeo antisense (chamado de anti-miRNA,
antagomir ou antimir).
Para algumas das desordens patológicas abordadas neste capítulo, serão detalhadas
aqui terapias epigenéticas disponíveis ou em estudo. O VPA é uma droga neurativa usada
como anticonvulsivante e estabilizador de humor no tratamento de transtorno bipolar, mas
não resulta em melhora da cognição em pacientes com esquizofrenia (HASAN et al., 2013).
Para tratamento do mal de Alzheimer, ainda não há agentes modificadores
epigenéticos aprovados para uso. Entretanto, pesquisas em modelos animais têm
comprovado efeito terapêutico de inibidores de doadores de metil e de HDACs sobre a
recuperação da memória e do declínio cognitivo (ADWAN e ZAWIA, 2013). Os tratamentos
são (ADWAN; ZAWIA, 2013; URDINGUIO et al., 2009):
Considerações finais
A alteração epigenética de genes, incluindo de genes imprinted, ou as mutações
genéticas em genes envolvidos nas cascatas de modificações epigenéticas podem levar ao
desenvolvimento de diversas patologias em homens, além de predispor para a formação
de tumores. Assim, a compreensão da participação do controle epigenético na etiologia
dessas desordens patológicas e nas possibilidades de correção pode trazer grandes
benefícios à saúde humana.
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Capítulo 9
Introdução
Conforme já mencionado anteriormente, o desenvolvimento embrionário e o
crescimento pós-natal envolvem diversas modificações epigenéticas, que incluem a
metilação do DNA e as modificações pós-traducionais das histonas. Neste capítulo, serão
abordadas as implicações dessas modificações epigenéticas em biotecnologias da
reprodução e em produção animal.
Figura 2. Transferência nuclear de célula somática (TNCS): A) enucleação do oócito receptor: remoção do
primeiro corpúsculo polar e da placa metafásica, evidenciados sob luz ultravioleta (imagem ampliada); B)
transferência do núcleo doador ao oócito receptor enucleado.
Fotos: Simone Cristina Méo Niciura
Embora existam vários relatos de avanços na clonagem, nos últimos anos, verifica-se
ainda baixa eficiência desse procedimento. A baixa viabilidade dos embriões clonados é
principalmente expressa pela redução na taxa de implantação, pelo aumento da
mortalidade fetal e perinatal, e pelas diversas anomalias observadas nos animais recém-
nascidos. Diversos estudos buscam investigar as razões pelas quais a clonagem apresenta
resultados insatisfatórios, e muitos têm destacado o papel dos eventos epigenéticos nas
falhas de desenvolvimento dos animais clonados. As alterações observadas nos clones não
são transmitidas para a prole, corroborando com a origem epigenética das falhas
observadas (ZHANG et al., 2004).
Figura 3. Desmetilação ativa e metilação de novo precoce do genoma do núcleo doador em embriões bovinos
clonados por transferência nuclear de células somática.
Fonte: modificado de Mann e Bartolomei (2002).
Em bovinos, Ding et al. (2008) demonstraram que a combinação da TSA com a 5-aza-
Dc resultou em maior produção de blastocistos e número de células embrionárias,
sugerindo que a associação de agentes promotores de hiperacetilação de histonas e de
agentes desmetilantes é benéfica para reprogramar embriões clones.
Assim como uma modificação numa base do DNA, a metilação do DNA numa única
posição de um sítio CpG, chamada de posição de metilação variável, pode ser
considerada um polimorfismo (GONZÁLEZ-RECIO, 2012).
• Em ovinos da raça Texel, foi demonstrado que a existência de uma transição G >
A na região 3’ UTR cria um sítio alvo para microRNAs que inibem a tradução do
gene da miostatina e contribuem para a hipertrofia muscular (CLOP et al.,
2006).
• Em suínos, uma mutação G>A no íntron 3 do gene IGF2 leva à perda de
interação com um fator nuclear ou elemento silenciador e à metilação, que
resulta em menor expressão do gene e em menor crescimento muscular em
adultos (ANDERSSON; GEORGES, 2004).
• Em bovinos de corte, o imprinting já foi associado a dez caracteres de carcaça
(NEUGEBAUER et al., 2010); a expressão do gene IGF2, bialélica após o
nascimento, foi associada ao aumento da área de olho de lombo (GOODALL;
SCHMUTZ, 2007); os efeitos da origem parental sobre a expressão gênica
foram evidenciados nos genes não imprinted da leptina (NICIURA et al., 2012),
que regula consumo alimentar, gasto de energia e homeostase corpórea
(KONONOFF et al., 2005); KCNJ11 (CATOIA et al., 2012; SOUZA, 2012),
associado ao crescimento muscular (BERNARD et al., 2009) e à maciez da
carne (TIZIOTO et al., 2012).
• Em bovinos de leite, a origem parental do gene não imprinted DGAT1 afetou a
produção de leite (KUEHN et al., 2007), e a presença de SNPs nos genes
imprinted CALCR, GRB10, PEG3, RASGRF1, ZIM2 e ZNF215 (MAGEE et al.,
2010), além de GNAS (SIKORA et al., 2011) foi associada a vários caracteres
fenotípicos, como: porcentagem de proteína e gordura no leite, contagem de
células somáticas no leite, peso e conformação da carcaça da progênie, escore
de condição corporal, dificuldade de parto, entre outros.
Tabela 1. Caracterização dos tipos de imprinting com base nos efeitos aditivos e de dominância.
Por mapeamento fino, um iQTL com efeito sobre massa muscular no SSC2, foi
mapeado num segmento cromossômico de ~250 kb que contém os genes de expressão
paterna INS e IGF2 (NEZER et al., 2003).
Em camundongos (CHEVERUD et al., 2008; CLAPCOTT et al., 2000; KAERST et al.,
2012; LI et al., 2012), foram identificados:
• Peso ao nascimento.
• Peso à desmama.
• Peso ao sobreano.
• Peso ao abate.
• Peso da carcaça quente.
• Espessura de gordura subcutânea, explicando 1,4% a 5,1% da variação
fenotípica.
Considerações finais
O cultivo in vitro e as manipulações de gametas e embriões, no momento em que o
imprinting e o padrão epigenético são estabelecidos ou mantidos, são estímulos em
potencial à indução de erros, que podem levar a anomalias e contribuir para a baixa
eficiência observada em muitas das biotecnologias utilizadas em humanos e em animais.
Além disso, o conhecimento dos mecanismos epigenéticos envolvidos na determinação
de características fenotípicas de interesse comercial ou de patologias pode ser útil para a
seleção animal e para sua modificação de maneira favorável por estratégias de manejo
adotadas à produção animal.
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Capítulo 10
Epigenética em plantas
Bianca Baccili Zanotto Vigna
Natália Sousa Teixeira-Silva
Mateus Mondin
Introdução
Assim como os animais, as plantas também estão sujeitas ao controle epigenético.
Isso sugere que a origem desses processos seja anterior à separação desses dois grupos
tão distintos de seres vivos. O surgimento dos organismos com cromossomos
individualizados e núcleo organizado está intimamente correlacionado com o aparecimento
dos mecanismos epigenéticos de controle da cromatina, tal como seu empacotamento nas
histonas, formando o nucleossomo e sua dinâmica durante a expressão dos genes em
diferentes fases do desenvolvimento e do funcionamento do núcleo durante o ciclo celular.
Embora os primeiros estudos que demonstraram fenômenos epigenéticos tenham sido
feitos com plantas, os avanços mais significativos em volume de publicações ocorreram
somente nos últimos anos. As plantas apresentam características interessantes no estudo
da epigenética, contribuindo para os avanços na área. Já em 1928, a distinção entre
heterocromatina e eucromatina, descrita por Heitz no musgo (Pellia epiphylla) (DILLON,
2004), foi importantíssima, pois pela primeira vez, estabeleceu a evidência de que pelo fato
de a heterocromatina permanecer condensada durante todo o ciclo celular, isso sugeria a
inatividade desta do ponto de vista gênico.
Posteriormente, outra descoberta que contribuiu para os avanços da epigenética de
plantas ocorreu quando Brink (1956) descreveu o fenômeno da paramutação, ao estudar o
loco R em milho como a interação entre alelos de genes que levam a alterações herdáveis
na expressão gênica. A paramutação desafia os paradigmas tradicionais sobre como os
genes são regulados e herdados e representa um marco nos estudos epigenéticos. Outro
exemplo é o loco b1 em milho, sobre o qual detalhes do mecanismo, bem como uma
revisão sobre paramutação podem ser obtidos em Chandler e Stam (2004) e Chandler
(2007).
Além disso, a primeira descrição de imprinting parental num único gene foi
demonstrada no mesmo loco R em milho (KERMICLE et al., 1970), tendo sido
posteriormente descrito em mamíferos (KÖHLER et al., 2012). Imprinting parental é um
fenômeno epigenético no qual genes autossômicos apresentam expressão gênica
diferencial, dependendo se a herança do alelo ocorreu via gameta feminino ou masculino.
Detalhes sobre o mecanismo em plantas podem ser encontrados em Gehring (2013),
principalmente no endosperma de fanerógamas.
Outra descoberta fundamental para elucidar os mecanismos moleculares da
epigenética foi apresentada em 1990, no seminal trabalho de Carolyn Napoli, Christine
Lemieux e Richard Jorgensen, que, pela primeira vez, descreveram, em petúnia (Petunia
hybrida), os mecanismos de silenciamento gênico e reativação em transgênicos para um
gene quimérico da chalcone synthase (NAPOLI et al., 1990). Em seguida, esse
mecanismo foi detalhado com a descoberta de pequenos RNAs, com 20 a 25 nucleotídeos,
associados ao silenciamento por RNA em plantas (HAMILTON; BAULCOMBE, 1999),
juntamente com a descoberta de que um dsRNA induz a degradação do RNA no
nematódeo Caenorhabditis elegans (FIRE et al., 1998).
As principais características das plantas que favorecem o estudo epigenético,
tornando-as modelos interessantes, são:
Enzima que
Enzima
Modificação Sítio remove a Função
modificadora
modificação
Metilação de DNA
Gene CpG Manutenção: ROS1, DME Regula a
MET1 expressão
gênica
Estabelecimento:
DRM2
Transposon Cpg, CpNpG, CpNpN Manutenção: ROS1, DME Reprime a
MET1, CMT3, ativação de
DRM2 transposons
Estabelecimento:
DRM2
Modificação de histonas
Acetilação H2AK5ac Desconhecida HDACs, Ativa a
superfamília expressão
H2BK6ac Desconhecida RPD3-like, gênica, controla
H2BK11ac Desconhecida família HD- o
tuin, família desenvolvimento
H2BK27ac Desconhecida sirtuína das plantas e a
H2BK32ac Desconhecida defesa a
estresses
H3K9ac Desconhecida
H3K14ac HAG1
H3K23ac Desconhecida
H3K27ac Desconhecida
H4K5ac HAM1, HAM2
H4K8ac Desconhecida
H4K12ac HAG2
H4K16ac Desconhecida
H4K20ac Desconhecida
Metilação H3K4me1/2/3 Classe de AtJmj4, ELF6 Controla a
metiltransferases repressão de
de histonas TrxG genes
específicos
H3K4me1 Desconhecida LDL1
H3K4me2 ATX1, CLF LDL1
H3K4me3 ATX1, -
EFS/SDG8, CLF
H3K9me1/2/3 Classe de HMTs, HDMs tipo
SDG714Su(var) LSD1 e
domínio JmjC
H3K9me1 SUVH2, SUVH4 -
(KYP), SUVH5,
SUVH6
H3K9me2 SUVH2, JMJ706
SUVH4,
SUVH6, SUVR4
H3K9me3 SDG8 JMJ706
H3K27me1/2/3 Desconhecida -
H3K27me1 ATXR5, ATXR6 -
H3K27me2 SUVH2 -
H3K27me3 CLF, SWN, -
MEA, SUVH2
H3K36me1/2/3 Domínio HMTs HDMs tipo
domínio JmjC
H3K36me1 Desconhecida -
H3K36me2 EFS/SDG8 -
H3K36me3 SDG8 -
H3K20me1/2/3 Desconhecida HDMs tipo
domínio JmjC
H3K20me1 SUVH2 -
H3K20me2 Desconhecida -
H3K20me3 Desconhecida -
Fosforilação H2AS129ph, Quinases Fosfatases Mitose e
H2AS141ph, apoptose celular
H2AS145ph,
H2BS15ph, H3T3ph,
H3T11ph, H3S10ph,
H3S28ph
Ubiquitinação H2BK143ub1 Ligases E3 tipo SUP32/UBP26 Controla o
anel HUB1, desenvolvimento
HUB2, UBC1, das plantas e a
UBC2 defesa a
estresses
Fonte: Chen et al. (2010).
Epigenética e poliploidia
A poliploidia é resultado da duplicação de um genoma completo (autopoliploidia) ou da
combinação de dois ou mais genomas diferentes, mas relacionados (alopoliploides)
(GRANT, 1981). A poliploidia é uma característica muito comum em plantas, com
estimativas de ocorrência em até 80% das angiospermas (LEITCH; BENNET, 1997), e
desempenha papel importante na origem e na evolução de plantas silvestres e cultivadas
(SCHIFINO-WITTMANN, 2004, TATE et al., 2005). Estima-se que toda espécie de planta
tenha passado por ciclos de poliploidia durante sua evolução, embora só se possa
reconhecer os eventos mais recentes (WENDEL, 2000).
A poliploidia apresenta impactos significativos na estrutura, na organização e na
composição do genoma e, consequentemente, na fisiologia e na ecologia das plantas. As
alterações no genoma envolvem mecanismos genéticos (inserções e deleções,
duplicações, aneuploidia, recombinação homeóloga, crossing-over desigual e ativação de
transposons) e epigenéticos (metilação do DNA, modificação de histonas, interferência por
RNA e compensação na dosagem dos alelos) (TATE et al., 2005). Os mecanismos
epigenéticos provocam o silenciamento ou a ativação de genes e (retro)transposons e,
consequentemente, resultam em alterações fenotípicas (COMAI, 2000). Os processos
epigenéticos têm papel importante na adaptação e na evolução das plantas, ao influenciar
a diversidade fenotípica primária na interface entre a genética e o ambiente (PAUN et al.,
2010).
Pesquisas em epigenética de poliploides têm sido conduzidas, principalmente, em
organismos-modelo, face à disponibilidade de recursos genômicos nessas espécies. Além
disso, para melhor entendimento das consequências imediatas da poliploidização, são
necessários poliploides naturais de formação recente ou sintéticos, os quais são mais
facilmente obtidos nesses organismos. Assim, são muitos os trabalhos com Arabidopsis
(LEE; CHEN, 2001; WANG et al., 2004) e Brassica (CHEN; PIKAARD, 1997; GAETA et al.,
2007). Mais recentemente, poliploides naturais têm sido estudados, como em Tragopogon
mirus (KOH et al., 2010), a fim de elucidar os mecanismos epigenéticos em poliploides.
A formação de alopoliploides gera instabilidade genômica e reestruturação, causadas
pela recombinação de cromossomos homeólogos e pela ativação de transposons
(retroelementos, transposons de DNA e repetições heterocromáticas relacionadas). Outros
fenômenos observados em alopoliploides consistentes com a ativação de transposons são
a movimentação meiótica e a expansão dos cromossomos. Tudo isso gera (COMAI, 2000):
• Inativação de genes.
• Alterações na expressão gênica por desmetilação de DNA.
• Dominância nucleolar.
Essas regiões são compostas pelo arranjo dos genes ribossomais, organizados in
tandem. Em algumas espécies de plantas, o número de repetições desse arranjo pode
chegar até alguns milhares. A característica marcante da NOR é sua subdivisão entre
regiões de genes inativos, formando a heterocromatina-NOR (cromatina condensada e
constitutiva) e a cromatina ativa, onde os genes estão realmente ativos (cromatina
distendida). Essa característica permite estudar, num mesmo loco, as indexações
epigenéticas de genes ativos e inativos.
Estrutura nucleolar
Basicamente, o nucléolo é constituído de três componentes:
Considerações finais
Embora se tenha conhecimento da epigenética das plantas há algumas décadas, só
nos últimos 20 anos é que esse assunto vem ganhando a atenção dos pesquisadores.
Muitos resultados indicam que há certa conservação dos padrões de indexação ou mesmo
da dinâmica das modificações de histonas nos diferentes grupos de plantas. Entretanto, a
enorme variabilidade do conteúdo de DNA mostra que é preciso que cada espécie receba
atenção especial, uma vez que algumas indexações epigenéticas aparecem
correlacionadas com o tamanho do genoma.
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Notas
Capítulo 2
1 Disponível em: <http://www.urogene.org/methprimer/index1.html>.
Capítulo 4
3 Disponível em: <http://www.mirbase.org>.
Capítulo 6
4 ASCL2 (MASH2): achaete-scute complex homolog 2 (expressão materna); BEGAIN:
brain-enriched guanylate kinase-associated protein 2B (expressão paterna); CDKN1C
(p57KIP2): cyclin-dependent kinase inhibitor (expressão materna); COPG2: gamma2
subunit of the coatomer protein complex (expressão materna); DAT: DLK1-associated
transcripts (expressão paterna); DIRAS3: GTP-binding RAS-like 3 (expressão paterna);
DLK1: delta-like 1 (expressão paterna); GNAS (GS-ALPHA, GNASXL, NESP): guanine
nucleotide binding protein, alpha stimulating (expressão materna em feto e paterna em
membrana corioalantoide); GRB10 (MEG1): growth factor receptor-bound protein 10
(expressão materna); GTL2 (MEG3): gene trap locus 2 (expressão materna); H19: H19
gene (expressão materna); IGF2: insulin-like growth factor 2 (expressão paterna); IGF2-
AS: IGF2-antisense (expressão paterna); IGF2R (M6PR): insulin-like growth factor 2
receptor (expressão materna); ITUP1 (MIM1, MIMT1, IMPO1): MER1 repeat-containing
imprinted transcript 1 (expressão paterna); MAGEL2: melanoma antigen, family L, 2
(expressão paterna); MEG8: maternally expressed gene 8 (expressão materna); MEST
(PEG1): Mesoderm-specific transcript (expressão paterna); NAP1L5: nucleosome
assembly protein 1-like 5 (expressão paterna); NESP55: neuroendocrine secretory
protein (expressão materna); NNAT: neuronatin (expressão paterna); PEG3: paternally
expressed gene 3 (expressão paterna); PEG10: paternally expressed gene 10
(expressão paterna); PEG11 (RTL1): paternally expressed gene 11 (expressão paterna);
PEG11-AS (antiPEG11, RTL1-AS): antisense transcript from PEG11 (expressão
materna); PHLDA2 (TSSC3, IPL): pleckstrin homology-like domain, family A, member 2
(expressão materna); PLAGL1: pleiomorphic adenoma gene-like 1 (expressão paterna);
SASH2 (ASCL2, MASH2): sheep achaete scute homolog 2 (expressão materna);
SGCE: epsilon-sarcoglycan (expressão paterna); SNRPN: small nuclear
ribonucleoprotein polypeptide N (expressão paterna); TSSC4: tumor-suppressing
subchromosomal transferable fragment 4 (expressão materna); USP29: ubiquitin
specific peptidase 29 (expressão paterna); XIST: X (inactive)-specific transcript
(expressão paterna).