Cultivo in Vitro de Plantas - 4a - Edicao
Cultivo in Vitro de Plantas - 4a - Edicao
Cultivo in Vitro de Plantas - 4a - Edicao
Embrapa
Brasília, DF
2015
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Parque Estação Biológica
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Presidente: Maria Isabela Lourenço Barbirato Secretário-executivo: Thales Rocha
Lima Membros: Jonny Everson Scherwinski-Pereira, Lucília Helena Marcelino,
Lígia Sardinha Fortes, Marcio Sanches, Samuel Rezende Paiva, Vânia Cristina
Rennó Azevedo.
1ª edição
1ª impressão (2010): 1.000 exemplares
2ª edição
E-book (2012)
3ª edição
1ª impressão (2014): 1.000 exemplares
4ª edição
E-book (2015)
Todos os direitos reservados.
Para uso exclusivo de #NOME#. A reprodução não autorizada desta publicação,
no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610).
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Embrapa Informação Tecnológica
© Embrapa 2015
Autores
Ana Cristina Miranda Brasileiro Engenheira-florestal, Ph.D.
em Biologia Molecular e Celular Vegetal, pesquisadora da
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Brasília, DF
Don J. Durzan
Fisiólogo de plantas, Ph.D. em Metabolismo do Nitrogênio, professor da
University of California, Davis, Califórnia, EUA Eurico Eduardo Pinto de Lemos
Engenheiro-agrônomo, Ph.D. em Biotecnologia, professor da Universidade
Federal de Alagoas, Maceió, AL
Francisco J. L. Aragão
Engenheiro-agrônomo, Ph.D. em Biologia Molecular e Celular, pesquisador da
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Brasília, DF
Explante
A cultura de tecidos de plantas é um termo que exprime o
conceito de que uma ampla gama de tipos de tecidos da
planta pode ser cultivada, sob condições assépticas e in
vitro, visando micropropagação, melhoramento,
armazenamento ou limpeza clonal. A micropropagação é
um termo usado exclusivamente para referir-se à
propagação in vitro a partir de alguma parte específica da
planta – chamada explante –, baseada na capacidade
morfogenética e totipotencial das células (VASIL;
HILDEBRANDT, 1965).
Qualquer parte separada da planta destinada ao uso in
vitro denomina-se explante. A lista de possíveis explantes
é longa e variada, e os seguintes exemplos podem ser
citados: fragmentos de raízes, hipocótilos, epicótilos,
cotilédones, flores e folhas. Além desses, grãos de pólen,
embriões, óvulos, nós, gemas axilares ou apicais também
podem ser usados como explantes.
A escolha do explante poderá ser influenciada por vários
fatores, tais como: disponibilidade de material, nível de
contaminação, juvenilidade do tecido e estação do ano.
Nem todos os explantes reagem da mesma forma a uma
determinada condição in vitro. Dessa forma, em
Saussurea obvallata (planta medicinal e ornamental),
verificou-se que os explantes foliares reagiram mais
satisfatoriamente que raízes, hipocótilo e cotilédones, em
termos de indução de calos e de organogênese (DHAR;
JOSHI, 2005).
Os requerimentos nutricionais também poderão variar
conforme o explante. Assim, pólen, embriões, bulbilhos,
entre outros, poderão ter suas próprias exigências. Da
mesma forma, o nível morfológico do explante também
poderá influir nesse processo, já que, se o material inicial
for um fragmento foliar, para virar calo, deverá
desdiferenciar-se. Uma vez na forma de calo, esse
fragmento deverá rediferenciar-se produzindo embriões
somáticos ou gemas adventícias. Tudo isso ocorre de
acordo com requerimentos nutritivos e hormonais
particulares, seja adicionando alguns ingredientes seja
reduzindo outros, pois a morfogênese, em um caso ou em
outro, passará de células vacuoladas parenquimatosas do
calo para células mais totipotentes ou embriogênicas,
com núcleo proeminente, denso citoplasma, pequenos
vacúolos e intensa síntese de RNA. Esse aspecto
nutricional será abordado um pouco mais adiante.
A viabilidade do explante também é um aspecto vital a
ser considerado, já que muitos embriões, especialmente
de sementes recalcitrantes (da seringueira, do café, etc.),
podem estar em condições não viáveis para seu uso in
vitro. Nesse caso, o cloreto de 2,3,5 trifeniltetrazólio (TTC),
ou simplesmente tetrazólio, é usado como auxiliar para
detectar rapidamente a viabilidade do material. O
tetrazólio produz uma coloração avermelhada quando o
tecido está viável. Notadamente, essa coloração é muito
nítida no ápice radicular e apical dos embriões. Em uma
semente do tamanho do feijão, não é necessária a
utilização de lupa para que se observe a coloração
vermelha que demonstra viabilidade. No entanto, em
sementes de orquídea e de eucalipto, em vista de seu
pequeno tamanho, o uso de microscópio estereoscópico
faz-se necessário (Figura 1).
Figura 1. Sementes de orquídea (Oncidium phimatochilum)
submetidas ao teste do tetrazólio (0,1% por 24 horas em
temperatura de laboratório) para avaliação de sua viabilidade após
algum tempo de armazenamento em refrigerador.
Foto: L. Pedro Barrueto Cid
Assepsia
Historicamente, este conceito foi desenvolvido a partir do
século 19 em trabalhos pioneiros do médico húngaro
Ignácio Semmelweis, do inglês Joseph Lister e do francês
Louis Pasteur. Antisséptico é qualquer substância ou
agente capaz de inibir ou combater microrganismos ou
patógenos. Imbuído dessa ideia, Semmelweis usou as
propriedades antissépticas do cloro (água de cloro) como
profilático, para reduzir a morte nos hospitais por febre
puerperal que, na ocasião, alcançava índices alarmantes,
e preconizou a lavação das mãos e dos instrumentos com
esse tipo de composto. Já Lister e Pasteur envolveram-se
mais com a ideia global de microrganismos do ar como
causadores de infecções e de doenças. Em termos
profiláticos, Lister usou o ácidocarbólico, e Pasteur
desenvolveu a técnica que ficou conhecida como
pasteurização. Mais tarde, em 1878, Kock, na Alemanha,
reconheceu a utilidade do vapor quente para esterilizar
instrumentos.
A desinfestação, ou seja, a remoção de contaminantes
existentes na superfície do explante oriundo de material
de campo ou de casa de vegetação, é um passo inevitável
na cultura in vitro. Pode ser alta ou baixa, controlável ou
não, constituída por fungos ou bactérias. As
contaminações por vírus já são mais difíceis de
diagnosticar.
No geral, o procedimento da assepsia começa com a
limpeza da câmara de fluxo laminar com álcool 70%. Após
a imersão em álcool 95%, o bisturi e as pinças que forem
utilizados em processo de excisão devem ser flambados.
Os discos de papel-filtro e as placas de Petri de vidro,
assim como a vidraria em geral, precisam ser esterilizados
em autoclave por 20 minutos, a 121 ºC e em pressão de
uma atmosfera.
A assepsia dos explantes é frequentemente realizada por
meio de alvejantes comerciais à base de cloro, embora
diferentes substâncias possam ser utilizadas para essa
finalidade. O teor de cloro ativo desses alvejantes varia de
2,0% a 2,5% e, geralmente, sua fonte é o hipoclorito de
sódio (NaOCl), embora incluam também hidróxido e
carbonato de sódio, sem especificar sua concentração, o
que é uma limitação, ainda que não crítica. O NaOCl
poderá ser também encontrado em uma formulação mais
concentrada (10% a 12%), porém com menos outros
produtos misturados. Nesse caso, dada a alta
concentração, o produto deverá ser usado numa forma
mais diluída. Outra formulação comercial para a assepsia
dos explantes é o hipoclorito de cálcio (CaOCl2) a 7%
(p/v), contudo, nesse caso, é necessário previamente
filtrar o produto.
Em sua aplicação prática, o delineamento experimental do
uso do hipoclorito pode ser simples e reduzido a uma
concentração em que há vários tempos de imersão, como
por exemplo, 0,0; 5,0; 10; 15; 20 minutos, etc. É
conveniente que, durante esse tempo, os explantes
fiquem sob agitação e que o hipoclorito contenha também
algumas gotas de Tween 20 para facilitar a ação
superficial do desinfetante. Depois desse tratamento, os
explantes devem ser lavados com água esterilizada para
que o hipoclorito residual seja removido.
Mesmo tomando todas as providências de uma assepsia
rotineira, às vezes não é possível contornar
completamente a contaminação por esta ter uma base
endógena (Figura 2).
Meio nutritivo
A técnica da micropropagação ocupa um lugar chave na
chamada “segunda revolução verde”, na qual o rearranjo
gênico manual (DNA recombinante) está sendo usado
para melhorar a qualidade dos produtos agrícolas.
Nessa perspectiva, os meios nutritivos e a sua
composição operam o “milagre” da vida, ou seja, a
conversão dos explantes em plântulas e das plântulas em
mudas, as quais têm o caráter clonal embutido em sua
natureza e, por isso, possuem caráter de genótipo
superior. São muitos os fatores que estão envolvidos em
um protocolo eficiente de regeneração: tipo de meio
básico de cultura, seguido do suplemento de reguladores
de crescimento, concentração de sacarose, iluminação,
explante, etc. (ZHANG et al., 2003). Se o meio nutritivo
falhar, ou não for adequado em virtude de alguns de seus
ingredientes, a obtenção de clones falha. Portanto, o
conhecimento a respeito do meio nutritivo é da máxima
importância.
Os ingredientes tradicionais de um meio nutritivo são:
compostos inorgânicos, orgânicos, inertes e complexas
substâncias naturais.
Os sais inorgânicos proveem os macronutrientes (cálcio,
magnésio, enxofre, potássio, fósforo e nitrogênio) e os
micronutrientes (zinco, ferro, cobre, manganês, cloro,
molibdênio e boro). Outros elementos, como selênio,
níquel e silício, não têm requerimento universal entre as
plantas; por isso, não são considerados essenciais, ou
seja, na sua ausência, as plantas podem crescer e
desenvolver-se normalmente.
As plantas são concentradoras naturais de minerais
(cálcio, fósforo, potássio, ferro, etc.) nos seus tecidos,
especialmente em seus frutos, sementes e bulbos. No
caso do selênio, por exemplo, existem plantas indicadoras
desse elemento (Astragalus pectinatus), porque crescem
em lugares em que a concentração desse elemento no
solo é muito alta, como é o caso de algumas regiões
áridas ou semiáridas (STADTMAN, 1974).
Em geral, as plantas retiram do solo altas concentrações
de elementos essenciais, por isso a agricultura requer
altas doses de adubo. De igual modo, a cultura de tecidos
necessita incluir tais elementos no meio nutritivo. No caso
do bulbo da cebola, por exemplo, a quantidade de
macroelementos e de microelementos extraídos do solo é
ilustrativa. As quantidades de macroelementos extraídos
são: 69,7 kg ha-1 de N; 14,50 kg ha-1 de P; 57,09 kg ha-1
de K; 24,67 kg ha-1 de Ca; 4,47 kg ha-1 de Mg. Por sua
vez, os microelementos são: 749,23 g ha-1 de Fe; 265,76 g
ha-1 de Zn; 150,26 g ha-1 de B; 30,18 g ha-1 de Cu
(VIDIGAL et al., 2002).
A água também forma parte do grupo de inorgânicos, e
não poderia ser diferente já que, como solvente universal,
por ter caráter bipolar, ela é indispensável para dissolver
os sais e formar uma solução. É interessante que, apesar
de a água ser um dipolo, não é uma substância iônica por
excelência, visto que se dissocia muito pouco: 1 x 10-7 M.
Ou seja, em cada 10 milhões de moléculas de água, uma
está ionizada a 25 oC. No entanto,
pH = - log [ H+] ⇒ - log (1x 10-7)
demonstra que o pH da água pura, em teoria, é 7 (pH =
7), portanto é neutra. Quando se trata de cultura de
tecidos, a água usada não deve ser retirada diretamente
da torneira, porque esta contém muitos sais. Em vez
disso, deve-se utilizar água destilada, ou bidestilada, ou
ainda água deionizada (ultrapura). São necessários alguns
cuidados no que diz respeito ao seu armazenamento, para
evitar que ela não reaja com as paredes do container,
portanto esses recipientes devem ser de boa qualidade, e
recipientes de vidro ou plástico comum não devem ser
utilizados para essa finalidade. Nessa mesma linha de
raciocínio, deve-se evitar a carbonatação da água, o que
pode acontecer em recipientes abertos.
Existem várias formulações de meios nutritivos, entre os
quais estão: o meio MS (MURASHIGE; SKOOG, 1962); o
WPM (LLOYD; McCOWN, 1980); o B5 (GAMBORG et al.,
1968); e o SP (BARRUETO CID, 2005). A escolha de um
desses meios, em geral, é baseada na literatura, na
experiência com cada espécie vegetal ou por tentativa e
erro. Ademais, quando se tratar de requerimentos
nutricionais específicos, vai depender da espécie ou do
explante. Por exemplo, a germinação do pólen in vitro
poderá incluir boro e cálcio em maior concentração,
enquanto a indução de brotos a partir de um calo poderá
exigir menos nitrato de amônia (PIERIK, 1987). Todavia,
nos testes de avaliação de tolerância de algum genótipo,
ambos poderão exigir a presença de NaCl ou de alumínio
(BASU et al., 1997; GANDONOU et al., 2006), o que não é
usual em qualquer meio nutritivo para planta.
A seguir, serão destacados os ingredientes dos meios
nutritivos mais importantes para a cultura de tecidos.
Sacarose
A presença deste tipo de composto é essencial para o
crescimento das plantas, visto que a fotossíntese da
planta, ou do explante, é limitada. A sacarose é um dos
carboidratos mais usados na preparação de meios
nutritivos. Sua concentração mais usual varia de 2% a 3%;
no entanto, ocasionalmente, ela pode ser usada em
concentrações maiores, de até 6%, como no caso de
embriões, na indução de bulbilhos de alho ou na
tuberização em raízes de mandioca. Além disso, a
sacarose é parcialmente hidrolisada na sua passagem
pela autoclave em glicose e em frutose. Nessa reação, o
pH, ou ainda o carvão ativado, que também é
frequentemente utilizado, podem ser importantes fatores,
e a glicose ou a frutose raramente são incluídas nos
meios. Na autoclave, o açúcar pode ainda experimentar a
reação de Maillard, que dá ao meio uma coloração
amarelo-escura, que varia de intensidade conforme a
magnitude do fenômeno. Trata-se de uma reação entre
açúcares e peptídeos, forçada pela alta temperatura. Do
ponto de vista químico, essa reação é diferente da
caramelização, que é outro exemplo de browning, em que
apenas açúcares participam. Essa reação é altamente
complexa, além de ser indesejável na cultura de tecidos.
Ela ocorre quando os açúcares são aquecidos acima de
seu ponto de fusão, o que leva à formação do 5-
hidroximetil-furfuralaldeído.
Vitaminas
As vitaminas usadas na cultura de tecidos pertencem ao
grupo das hidrossolúveis ou grupo B. Esse grupo é
constituído pelas seguintes vitaminas: B1 (tiamina), B2
(riboflavina), B6 (piridoxina), ácido pantotênico, ácido
nicotínico (niacina), ácido fólico, ácido ascórbico, biotina e
cobalamina. Desse elenco, a tiamina, o ácido nicotínico e
a piridoxina são encontrados na maioria dos meios
nutritivos. A biotina e o ácido pantotênico, no entanto, são
de uso mais restrito.
Em geral, as vitaminas atuam como um fator não proteico
dentro de enzimas, coenzimas, além de serem cruciais
para que essas enzimas possam catalisar reações
importantes dentro do metabolismo primário da célula.
Assim, por exemplo, a tiamina atua na descarboxilação de
α-cetoácidos; a piridoxina, na transferência de grupos
aminos; o ácido nicotínico, em reações de óxido-redução;
a biotina, na transferência de CO2; o ácido pantotênico, na
transferência de grupos acila, entre outros (LEHNINGER,
1988).
As vitaminas do grupo das lipossolúveis, tais como as
vitaminas A, D, E e K, não são usadas. Não se tem
conhecimento, por exemplo, de que a vitamina A participe
de alguma reação dentro da planta. Ela se origina a partir
dos betacarotenos, os quais são de origem isoprenoide,
isto é, derivados do isopreno, um hidrocarboneto com
cinco carbonos chamado também de 2-metilbutadieno.
As vitaminas E, K e D também são de origem isoprenoide,
porém a vitamina D possui um caráter mais esteroidal. Os
esteroides são moléculas complexas relacionadas ao
colesterol.
Pelo fato de as vitaminas serem sintetizadas pela planta,
fica a dúvida em relação a seu requerimento pelo
explante. Contudo, do ponto de vista fisiológico, não há
como saber se um explante em particular (raiz, hipocótilo,
etc) teria ou não a capacidade de sintetizar tiamina, ou se
essa capacidade ficaria restrita a outros órgãos que
poderiam exportar esse tipo de metabólito. Por exemplo, a
capacidade de produzir tiamina varia conforme as
espécies. Assim, nos frutos, a goiaba-vermelha e a
graviola podem ter muito mais tiamina do que no mamão
maduro e na manga. A inclusão de algumas vitaminas ao
meio nutritivo parte dos seguintes pressupostos: o
explante, por definição, é uma parte separada da planta;
e, na planta, a produção de vitaminas é diferente nos
órgãos. Portanto, a inclusão das vitaminas no meio
nutritivo torna-se necessária para nutrir o explante.
Inositol
Este composto orgânico de baixo peso molecular (180 g),
e solúvel em água, é rotineiramente usado na preparação
de meios. Em muitos casos, tem um efeito benéfico e não
se conhecem respostas inibitórias ou essenciais nas
concentrações utilizadas (50 mg L-1 a 100 mg L-1).
Hormônios
Os hormônios são biomoléculas produzidas pela planta,
cuja finalidade é induzir respostas fisiológicas, tais como
indução de raízes, indução de brotos, alongamento de
entrenós, etc.
A interação do hormônio com a membrana celular está
sob intensa pesquisa, cujo objetivo é conhecer melhor as
características do receptor (números de domínios, tipo de
inserção na membrana celular, relação com a proteína G,
ubiquitinação, etc.), bem como canalizar o estímulo ou o
sinal até o núcleo das células-alvo (WOODWARD; BARTEL,
2005).
Nas plantas, existem vários tipos de hormônios, tais
como: as auxinas, as citocininas, as giberélicas, o etileno,
o ácido abscísico e o ácido jasmônico.
De um modo geral, as moléculas que têm seu efeito
parecido com o dos hormônios são denominadas
reguladores de crescimento (RC). A diferença é que os
hormônios não são sintéticos, ou seja, são produzidos
pelas plantas. Incluem-se nos RC o Picloram, a
Benzilaminopurina, o TDZ, entre outros.
Os RCs e os hormônios atuam em baixíssimas
concentrações, na ordem de mg (miligramas) ou µM
(micromolares), isto é, 10-6 molar.
É oportuno frisar que:
1 molar = 1 mol L-1 = 1 M
1 milimolar = 0,001 mol L-1 = 1 mM
1 micromolar = 0,000001 mol L-1 = 1 µM
(Um mol de qualquer substância orgânica tem o mesmo número de moléculas
por volume.)
Auxinas
As auxinas, em seu significado etimológico, exprimem a
ideia de crescimento, ou seja, desencadeiam vários
processos fisiológicos, entre os quais está a formação do
fruto (PANDOLFINI et al., 2007). Entre as auxinas
hormonais, o ácido 3-indolacético (AIA) é o mais
conhecido. Foi isolado pela primeira vez em 1934 na urina
de mulheres grávidas. Alguns anos depois, na mesma
década, foi isolado em leveduras e em culturas de
Rhizopus suinus. Em 1946, foi extraído de grãos de milho
imaturos e, posteriormente, de muitas outras plantas
(HOPKINS, 1999).
Na cultura de tecidos, as auxinas são frequentemente
usadas na indução de calos a partir de um explante e no
enraizamento a partir de brotos. São exemplos de
auxinas: o AIA (PM 175,2); o ácido indolbutírico (PM
203,2); o ácido naftalenoacético (PM 186,2); o 2,4-
diclorofenoxiacético (PM 221,0); e o Picloram ou ácido 4-
amino-3,5,6-tricloro-picolínico (PM 241,5). Alguns RCs têm
uma posição ambígua, pois atuam como auxina ou como
citocinina. Esse é o caso do Tidiazuron ou TDZ [1-fenil-3-
(1,2,3-tiadiazol-5-il) ureia].
A concentração usada depende da finalidade, que pode
ser, por exemplo, a indução de calo ou o enraizamento.
Em geral, na indução de calos, a concentração é maior,
porém isso também depende do tipo de composto usado.
Assim, o ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D) e o
Picloram são mais potentes como auxina que o ácido 3-
indolacético (AIA) e o ácido naftalenoacético (ANA).
A indução de calos em alho foi alcançada por meio de
uma mistura de 2,4-D e de Picloram, na ordem de 5 µM
cada (BARRUETO CID et al., 1994). No entanto, em café, o
Picloram foi usado sozinho, na ordem de 4 µM (BARRUETO
CID et al., 2004). Para o enraizamento de brotos de
eucalipto, utilizaram-se 2,5 µM de ácido indolbutírico (AIB)
(BARRUETO CID, et al., 1999). Todavia, na indução de
calos, quando o carvão ativado estiver presente no meio
nutritivo básico, a concentração de auxina ainda é mais
elevada, podendo chegar a 100 mg L-1 (REYNOLDS;
MURASHIGE, 1979). Isso ocorre porque o carvão ativado
tem propriedades adsorventes (MOHAMED-YASSEEN,
2001).
As auxinas se comportam como ácidos fracos e não são
solúveis em água, por isso um aspecto importante em
relação a elas é a necessidade de que sejam dissolvidas
para serem incorporadas ao meio. Na prática, elas se
dissolvem bem em meio básico (KOH ou NaOH 0,1 N ou
1,0 N). É recomendável trabalhar com soluções estoques
guardadas no refrigerador e, a partir daí, usá-las para a
preparação do meio básico. Essas soluções estoques
devem manter-se livres de quaisquer impurezas, portanto
devem apresentar-se transparentes e límpidas. O TDZ é
um pouco refratário e, uma vez dissolvido, após alguns
dias, volta a cristalizar-se. Por isso, é recomendável
prepará-lo e, em seguida, estocá-lo em freezer,
mantendo-o congelado. O TDZ, embora seja um derivado
da ureia, também pode agir como citocinina.
Citocininas
As citocininas pertencem a um grupo de substâncias que
promovem a divisão celular, e sua origem está
relacionada com a adenina. Historicamente, o
descobrimento das citocininas está ligado ao DNA
autoclavado de esperma do arenque. As citocininas na
cultura de tecidos, em geral, são usadas para promover a
indução de brotos adventícios a partir de calos ou para
induzir multibrotação a partir de gemas axilares ou apicais
(BARRUETO CID et al., 1994); no entanto, podem inibir a
indução de raízes em plântulas. De um ponto de vista
mais fisiológico, elas inibem a senescência foliar e a
dominância apical.
Considerando-se o aspecto químico, as citocininas são
compostas por um anel adenílico e por uma cadeia lateral
isoprenoide, a qual se origina a partir do ácido
mevalônico, e, depois, converte para isopentenil
pirofosfato (∆3 -iPP). Este último, por sua vez, converte-se
em dimetilalil-pirofosfato (∆2 -iPP ou DMAP). Existem
outras derivações do ∆3 -iPP, a saber: o geranil pirofosfato,
que dá origem aos monoterpenos (mentol); o farnesil
pirofosfato, que origina os sesquiterpenos (ác. abscísico);
e o geranilgeranil pirofosfato, que origina os diterpenos
(como giberelinas) ou os tetraterpenos (como
carotenoides).
Entre as citocininas naturais, encontram-se a zeatina
(ZEA) e o isopentenil adenina (IPA) ({9R-5’P} IPA) (Figura
4). Entre as citocininas sintéticas, destacam-se a cinetina
(CIN) (6-furfurilaminopurina) e a 6-benzilaminopurina
(BAP). Nesse caso, a cadeia lateral isoprenoide foi
substituída por um anel cíclico de caráter furfural
(cinetina) ou benzênico (6-benzilaminopurina).
Giberelinas
As giberelinas (AG) são hormônios de natureza
diterpenoide (C-20), originadas do geranilgeranil
pirofosfato. Estão relacionadas, notadamente, com o
crescimento caulinar das plantas e com a produção de a-
amilase em sementes de gramíneas.
As giberelinas são um grupo vasto de compostos, que
hoje chegam a uma quantidade de aproximadamente 120.
No entanto, na cultura de tecidos, a mais usada é a AG3
(PM 384,5 g). Mesmo assim, seu uso na cultura de tecidos
é restrito e está relacionado com o alongamento de brotos
(BARRUETO CID, 1999).
Etileno
O etileno (C2H4) é um hormônio de caráter gasoso capaz
de influenciar a morfogênese das plantas em muitos
aspectos (KUMAR et al., 1998). Não é frequentemente
usado na cultura de tecidos, porém pode ser produzido
pelo explante.
No tecido, pode promover efeitos indesejáveis, tais como:
oxidação fenólica, queda foliar, hiperhidricidade
(vitrificação). Portanto, afeta negativamente as duas
maiores vias de regeneração de plantas: a organogênese
e a embriogênese somática. Contudo, o etileno também
pode favorecer esse tipo de morfogênese (HATANAKA et
al., 1995; KUMAR et al., 1998).
O metabolismo e a fisiologia do etileno foram
desenvolvidos tanto a partir das pesquisas relacionadas
com duas enzimas de sua rota metabólica – a ACC sintase
e a ACC oxidase (MCKEON et al., 1995) – quanto com o
uso de inibidores de sua síntese, tais como: a aminoetoxi-
vinil-glicina (AVG), o ácido salicílico, o cloreto de cobalto
(CoCl2), etc.; além de inibidores de sua ação, tais como: o
nitrato de prata (AgNO3), o tiossulfato de prata (Ag2S2O3),
o CO2 e o 2,5-norbornadieno. Essas pesquisas visavam
melhorar a performance da regeneração, como em
Brassica campestri (CHI; PUA, 1989). Por sua vez, o uso de
cefotaxima, de cefalosporina e de inibidores do etileno
melhorou o potencial regenerativo de calos de Pennisetum
americanum (PIUS et al., 1993). Nessa mesma linha de
trabalho, é oportuno mencionar o incremento da
regeneração de plântulas por inibição da ACC oxidase, por
meio da construção antisense em plantas transgênicas de
Brassica juncea (PUA; LEE, 1995), por meio da qual foi
possível verificar o papel regulatório do etileno na
organogênese.
Finalmente, é bom lembrar que as auxinas, em geral, têm
a propriedade de induzir síntese de etileno em muitas
espécies. Em cultura de tecidos, usam-se frequentemente
auxinas na fase de indução de calos, porém é bom ter em
mente que elas poderão estimular a síntese de etileno e,
com isso, oxidar o explante ou o calo ou, até mesmo,
inibir a embriogênese somática, fato que ocorreu em
Daucus carota, por meio do uso de ethefon (TISSERAT;
MURASHIGE, 1977).
O ethefon, ou ácido 2-cloroetilfosfônico, é um composto
que, em pH alcalino, libera etileno. Em escala comercial,
por exemplo, é usado pelos produtores de abacaxi
(Ananas comosus) para antecipar e uniformizar a floração.
Na seringueira (Hevea brasiliensis), o ethefon é utilizado
para aumentar a produção de látex.
Brassinosteroides (BRs)
Os brassinosteroides, ou brassinas, são hormônios
vegetais de mesma natureza dos fitoesteroides
polioxigenados e são dotados de atividade reguladora de
crescimento vegetal (ZULLO; ADAM, 2002). Entre esses
fitoesteroides, cabe mencionar o sitosterol e o
campesterol, os quais foram descobertos, nas décadas de
1970 e de 1980, no pólen de algumas plantas, como por
exemplo, da espécie Brassica napus. Os BRs
caracterizam-se por sua capacidade de promover
alongamento no eixo caulinar da planta e promover a
formação de traqueídes, por exemplo, neste caso, em
Zinnia elegans sob condições in vitro.
A partir da técnica de isolamento e de purificação, desco‐
briram-se brassinas em muitas famílias de plantas, entre
as quais as crucíferas, as leguminosas, as fagáceas, as
rutáceas, etc. Sua presença já foi verificada em 27
famílias de plantas superiores (SASSE, 2003).
Em geral, os efeitos das brassinas não têm sido muito
relatados na cultura de tecidos, porém alguns esparsos
trabalhos que mostram estimular a regeneração têm sido
publicados (LU et al., 2003; SASAKI, 2002).
Triacontanol
Outro composto de caráter hormonal, mencionado com
pouca frequência na cultura de tecidos é o triacontanol
(TRIA). Tal composto é um álcool de 30 carbonos {CH3
(CH2)28 CH2OH} e é um componente natural da cutícula de
alfafa e de outras plantas. Algumas publicações relatam
umh efeito positivo na regeneração de plantas in vitro
(REDDY et al., 2002; TANTOS et al., 2001).
Ácido jasmônico
O ácido jasmônico, seu metil-éster e derivados estão
amplamente distribuídos no reino vegetal. São
sintetizados a partir do ácido linolênico e desempenham
papéis importantes no desenvolvimento das plantas e nas
respostas destas aos estresses ambientais (PEÑA CORTÉS,
2000). O uso desses compostos não tem sido
frequentemente relatado na literatura sobre cultura de
tecidos. Seu efeito parece mais indireto sobre a
organogênese, porém apresenta uma ação mais direta
sobre a produção de metabólitos secundários, como o
diterpenoide paclitaxel (taxol), ou em calos induzidos por
Picloram (FURMANOWA et al., 1997).
Misturas complexas
Com respeito a outros ingredientes que podem estar
presentes no meio nutritivo, vale a pena mencionar
alguns de estrutura complexa, tais como o hidrolisado de
caseína, (50 mg L-1 a 500 mg L-1), a água de coco (5% a
20% v/v), o extrato de malte (400 mg L-1 a 500 mg L-1), o
extrato de levedura (100 mg L-1 a 500 mg L-1) e a banana
passada no liquificador (10% a 50% v/v), etc. Alguns,
como a água do fruto do coqueiro, podem ser
esterilizados por filtração e depois adicionados ao meio já
autoclavado. Esse tipo de ingrediente, com quantidade e
composição não conhecidas (aminoácidos, sais, vitaminas,
elementos minerais, etc.), é usado para complementar os
meios nutritivos normais quando estes falham em
produzir os resultados esperados.
Ágar
O ágar é um polissacarídeo de alto peso molecular usado
na cultura de tecidos para dar suporte a explantes e a
plantas mantidas in vitro. O ágar oferece a vantagem de
ser solúvel em água, além de fundir-se a 100 oC e de
permanecer semissólido à temperatura ambiente.
Ademais, é um produto relativamente inerte e pode
conter impurezas orgânicas e inorgânicas, entre as quais
estão o sódio e o cloro (SCHOLTEN; PIERIK, 1998). Por isso,
às vezes é necessário lavá-lo com água antes de utilizá-lo.
Pode ser usado numa faixa de concentração que varia de
0,5% a 0,7%, embora, na faixa de 0,5% a 0,6%, o
explante acomode-se melhor. Também existem registros
de uso em concentrações mais altas, como 1,1%, com o
objetivo de evitar vitrificação do material. Nesse caso,
porém, a regeneração foi afetada (DEBERGH, 1983).
A concentração tem sua importância porque, em níveis
mais altos, ela pode afetar a disponibilidade e a difusão
dos ingredientes. Além disso, existe a possibilidade de
ocorrer um efeito osmótico. O pH é um fator que pode
afetar a estabilidade do ágar gelificado. Em valores de 4
ou abaixo de 4, sua solidificação é dificultada, ou
impossibilitada.
O ágar pode ser substituído pelo Gelrite, que é um
polissacarídeo obtido de bactérias, altamente puro e
transparente quando solidificado. Sua consistência (gel
strength) no meio de cultura está relacionada à
concentração de cátions, como cálcio e magnésio. A faixa
de concentração a ser usada na preparação de meios
pode variar de 0,15% a 0,25%.
Uma alternativa para o uso de agentes gelificantes, como
o ágar e o Gelrite, são as pontes de papel ou suportes de
espuma de plástico, usados em meios líquidos; embora o
uso de amido de milho também tenha sido relatado
(BARRUETO CID et al., 1994).
Luz
Em um laboratório de cultura de tecidos, é necessário
cuidar da energia radiante para promover um bom
desenvolvimento de culturas in vitro.
Em relação à luz, existem três características principais
que devem ser observadas: fotoperíodo, irradiância e
composição espectral. O fotoperíodo necessita ser
previamente ajustado para 12/12, 14/10 ou 16/8 (relação
de horas de luz/escuro) (MORINI et al., 1991).
Normalmente, os tubos fluorescentes comuns são usados
como fontes luminosas. Eles são mais eficientes que as
lâmpadas incandescentes, embora sejam mais caros.
Além disso, as lâmpadas fluorescentes perdem menos
energia na forma de calor.
É necessário colocar de três a cinco lâmpadas no teto das
prateleiras dos armários metálicos que são usados. O vão
entre as prateleiras deve ser de aproximadamente 50 cm.
Nessas condições, geralmente a irradiância no nível das
placas ou tubos de ensaio é de aproximadamente 30 µmol
m-2 s-1. Essa é uma quantidade de energia suficiente para
os requerimentos normais de carbono das plantas, já que
a outra parte é complementada pela sacarose do meio
nutritivo. A energia que é emitida nessa irradiância deve
conter radiação fotossinteticamente ativa (PAR, em
inglês), correspondente à faixa de 400 nm a 700 nm
(nanômetros), que são os comprimentos mais efetivos
para a fotossíntese.
A questão da composição espectral está relacionada à
característica dos tubos fluorescentes que serão usados,
ou seja, de sódio ou de mercúrio. A descarga elétrica, em
síntese, passa através das partículas de vapor que estão
dentro dos tubos e causam emissão de luz branca com
predominância de algum tipo de comprimento de onda:
alaranjada, no caso do sódio, e azulada, no caso do
mercúrio.
A luz é uma forma de energia radiante e resulta da
superposição de campos magnéticos elétricos que se
propagam como ondas ou como “partículas” ou fótons. Os
fótons têm diferentes valores de energia. Assim, os fótons
da região ultravioleta são mais energéticos que os da
região vermelha (Tabela 1). Um mol de fótons de qualquer
comprimento de onda tem 6,023 x1023 fótons.
Temperatura
A temperatura é um fator ambiental que regula o
crescimento das plantas. Esse controle ocorre de
diferentes maneiras e depende do tipo de planta, ou seja,
se ela é de clima temperado ou tropical. No entanto, no
que diz respeito às culturas in vitro, essas diferenças são
minimizadas, pois as condições experimentais são
padronizadas nos laboratórios.
No laboratório de cultura de tecidos, é conveniente que a
temperatura seja mantida o mais estável possível. Em
geral, a faixa de temperatura a ser usada pode variar
entre 23 °C e 27 °C, portanto é necessário dispor de um
sistema de refrigeração com controle automático de
temperatura, justamente para reduzir ao mínimo essas
variações de temperatura entre o dia e a noite. Ademais,
embora não seja frequente, existem laboratórios que
usam temperaturas diferentes durante o dia e a noite: 26
°C e 20 °C, respectivamente.
A uniformidade da temperatura dentro da sala de cultura
constitui um dos princípios básicos da experimentação – o
controle local –, que garante um tratamento térmico
semelhante ao do material dentro das unidades
experimentais ou das parcelas durante a experimentação,
visando sua maior precisão. O controle local não somente
deve ficar restrito à temperatura senão também à
irradiância nas prateleiras. Os outros dois princípios
básicos da experimentação são a repetição e a
casualização.
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Oxidação fenólica,
vitrificação e variação
somaclonal
L. Pedro Barrueto Cid
João Batista Teixeira
A oxidação fenólica
A oxidação fenólica, responsável pela cor marrom do
explante, é um fenômeno frequente em frutas
climatéricas, como a banana, a manga e a maçã. Porém,
em frutas não climatéricas, como o morango, o limão e a
uva, não se observou o problema.
O pardeamento é atribuído à polifenoloxidase (PPO), uma
enzima cobre dependente, que catalisa a reação de orto-
difenóis (ácido clorogênico), por exemplo, para orto-
diquinonas, as quais, ao se polimerizarem, dão a cor
escura ou parda aos produtos (Figura 1) (MAYER, 1987).
Sabe-se que tal reação é desencadeada no processo de
senescência ou por injúria dos tecidos. Contudo, a
fisiologia da enzima é um enigma e, do ponto de vista
genético, parece ser codificada por dois genes (ZHOU et
al., 2003), cuja transcrição e regulação são a chave para
sua expressão e entendimento. Por isso também, o gene
que codifica a PPO tem sido clonado com o objetivo de
avaliar o efeito da baixa temperatura na pós-colheita de
abacaxi.
Figura 1. Células de banana em suspensão. À esquerda, elas estão
completamente oxidadas; à direita, seu aspecto é normal. Ambas
estavam em similares condições experimentais.
Foto: Kazumitsu Matsumoto
Vitrificação ou hiper-hidricidade
A vitrificação (Figura 2) é uma desordem fisiológica e
morfológica (KEVERS et al., 2004), que, no momento da
propagação in vitro, pode afetar tanto plantas herbáceas
como lenhosas. Não é um fenômeno frequente, e depende
muito das condições in vitro para que ocorra e se
expresse em diferentes graus (PEREZ TORNERO et al.,
2001).
Figura 2. Plântulas de mamão obtidas com aproximadamente 1 µM
de BAP (A). Brotos vitrificados de mamão obtidos com 10 µM BAP (B).
Em ambos os casos, foi usado meio SP.
Fotos: L. Pedro Barrueto Cid
Variação somaclonal
A cultura de tecidos oferece diferentes modalidades de
metodologias, tais como: indução de calos, indução de
gemas adventícias, células em suspensão, cultura de
protoplastos, etc. Porém, em todas essas modalidades,
existe o risco de ocorrer variação genética nas células ou
nas plantas regeneradas. Tal fenômeno, na literatura
sobre cultura de tecidos, denomina-se variação
somaclonal. O termo somaclone exprime a ideia de
qualquer planta originada sob condições in vitro (LARKIN;
SCOWCROFT, 1981). O termo mutação é utilizado quando
a causa dessa variação é conhecida e hereditária. Quando
a causa não está determinada ou não é conhecida, o
termo variante é usado.
Além disso, pode ocorrer a variação fenotípica, mas esta
pode não ser hereditária, se a transmissão não acontecer
durante a meiose. Nesse caso, trata-se de uma variação
de natureza transitória, denominada variação epigenética.
Uma possível causa relacionada a esse fenômeno é a
metilação do DNA no nível de 5-metil deoxicitosina (5-
mdC), que pode ocorrer pela influência de alguns fatores
(ambiente, idade da cultura in vitro, etc.), bem como pela
ação da variação somaclonal no genoma da planta
(VALLEDOR et al., 2007).
A variação somaclonal induzida ou espontânea deve ser
rastreada em várias gerações das plantas propagadas por
sementes, a partir de R0 (planta obtida in vitro), e deve
continuar em R1, R2, R3, seja em casa de vegetação seja
em campo. Se, já na R1, não existir mais tal variação,
conclui-se que se trata de uma variação epigenética. Por
exemplo, por uma questão de microambiente, uma planta
in vitro (R0) pode conter diferentes números e formas de
estômatos, de espessura de cutícula, de morfologia, etc.;
porém, se depois, na casa de vegetação, esses fatores se
estabilizarem, trata-se de um fenômeno epigenético.
Somando-se a isso, no que diz respeito à não manutenção
de uma característica na geração R1, pode-se afirmar que
a autopolinização de R0, ou seja, o processo sexual, serve
como peneira (screening) contra a variação somaclonal,
oferecendo, assim, uma resistência à mudança em virtude
de uma homeostase gênica (CUSTERS et al., 1990).
A variação genética ou somaclonal ocorre menos
frequentemente quando as plantas obtidas são originadas
de gemas nodais ou axilares. No entanto, o risco aumenta
quando as plantas são adventícias, ou seja, originam-se
por meio de calo, de suspensão celular, de protoplastos e
de embriogênese somática. Não se trata, porém, de um
fenômeno previsível. Em Pisum sativum, por exemplo, a
análise de calos de quatro genótipos, após 45 dias,
mostrou uma altíssima proporção de calos diploides em
relação aos triploides, tetraploides, octoploides e
aneuploides, e parte da explicação relacionada com essa
variação foi atribuída aos reguladores de crescimento
(KUMAR; MATHUR, 2004). Ademais, calos haploides de
gérbera (Gerbera jamesonii) oriundos de óvulos foram
capazes de regenerar majoritariamente plântulas
haploides (80%), e, em menores proporções, plantas
diploides (15%) e plantas mixoploides (4%) (MIYOSHI;
ASAKURA, 1996).
Como mencionado anteriormente, a variação somaclonal
existe, mas não é automática nem inevitável. Em Vitis
vinifera, por exemplo, plantas regeneradas a partir de
folhas via embriogênese somática apresentaram apenas
2,5% de variação somaclonal (tetraploides), sendo o
restante diploide, conforme mostrou a contagem de
cromossomos (KUSOVA et al., 1997).
Parece que o genótipo também tem sua importância, já
que cultivares de uma mesma espécie – Dieffenbachia
(Araceae) – apresentaram diferentes taxas de variação
somaclonal (SHEN et al., 2007). A variabilidade do
somaclone pode ter mais probabilidades de ocorrer se o
explante não for inicialmente diploide. Sabe-se que, na
planta, nem todos os tecidos são rigorosamente diploides.
Por exemplo, o parênquima cortical da raiz ou mesmo as
células da endoderme apresentam frequentemente
tetraploidia ou octoploidia (STREET; ÖPIX, 1970). Ademais,
é conhecida a natureza poliploide de cultivos
agronomicamente importantes, como a batata, o trigo, a
banana, a mandioca, a cana-de-açúcar, etc. Contudo, do
ponto de vista da cultura de tecidos, tal característica
(poliploidia) pode favorecer a instabilidade genética dos
calos ou do material regenerado. Tal situação pode ser
ainda mais agravada com o uso de altas concentrações de
BAP, como, por exemplo, 22 µM ou 67 µM, mesmo que as
plantas de banana tenham sido originadas de gemas
apicais (SHEPHERD; SANTOS, 1996; GIMENEZ et al.,
2001).
Em geral, os poliploides são originados de progenitores
geneticamente diferentes. Mesmo assim, na agricultura,
como já mencionado, existe uma gama ampla de
poliploides. Apesar da grande quantidade de poliploides
na agricultura, eles não são de fácil obtenção nem muito
viáveis na natureza. Assim, algumas plântulas originadas
de sementes em viveiros de Pinus elliottii apresentaram
crescimento raquítico e baixa fertilidade em virtude de
carregarem uma natural poliploidia (MERGEN, 1958). Com
isso, observou-se que plantas poliploides não são de fácil
equilíbrio ou balanço genético, ainda que sejam muito
propensas à evolução dentro de uma população
mendeliana, isto é, dentro de um grupo de indivíduos que
habitam em uma mesma área geográfica e que se
reproduzem entre si. Esse fato ocorre porque os
mecanismos de impedimento ou as barreiras naturais em
nível citológico (inibição do crescimento do tubo polínico,
despareamento de cromossomos, etc.) tornam-se
operantes, isolando o mutante de seu correspondente
biótipo. É interessante observar que as angiospermas, em
geral, apresentam mais tendência à poliploidia que as
gimnospermas. Nestas últimas, esse fenômeno é raro
(MERGEN, 1958).
Às vezes, nas células dos calos, especialmente após muito
tempo de cultivo, acontece endorreduplicação seguida de
mitose. Isso provoca a variação no número de
cromossomos e, consequentemente, a formação de
poliploides, ou seja, de células possuidoras de vários
complementos cromossômicos: YY⇒YYYYYY (células
triploides, tetraploides, octoploides, etc).
Na natureza, os poliploides podem ser autopoliploides ou
alopoliploides. No primeiro caso, os indivíduos surgem por
não redução meiótica na autofecundação. No segundo
caso, por não redução meiótica no cruzamento
interespecífico entre dois indivíduos com genomas
diferentes. Na agricultura, são exemplos de poliploides
(tetraploides): o café, derivado do cruzamento sem
redução meiótica entre duas espécies; o amendoim; a
alfafa; algumas espécies de banana, etc. São exemplos de
alopoliploides naturais: a mandioca, o algodão, o fumo, a
cana-de-açúcar, o trigo, a aveia, o morango, algumas
espécies de bananas, etc. No laboratório, podem-se
induzir artificialmente tetraploides por meio da colchicina,
que inibe a formação do fuso acromático durante a
anáfase e, consequentemente, promove a duplicação do
número de cromossomos da célula (EECKHAUT et al.,
2004; GU et al., 2005; EWALD et al., 2009).
No entanto, a poliploidia ou a aneuploidia (neste último
caso, o indivíduo pode ser 2n + 1 ou 2n - 1) não são
visivelmente notadas em calos. Além disso, quando
produzidas, observa-se uma falta de correlação positiva
entre poliploidia e/ou aneuploidia e o potencial
organogênico, o que representa uma séria dificuldade
para iniciar novos órgãos a partir do calo (STREET; ÖPIX,
1970; TAHA; FRANCIS, 1990).
Nem sempre a variação somaclonal pode acontecer por
macrodesarranjos cromossômicos (quebra do
cromossomo, inversão, aumentos nos complementos
cromossômicos ou diminuição). Às vezes, a mutação pode
ser bem mais pontual em nível de base do DNA. Por isso,
esse fato pode refletir-se em nível de aminoácidos, e as
células poderiam, então, ser deficitárias numa via
metabólica, ou seja, não podem crescer num meio
nutritivo básico porque a enzima de tal passo metabólico
estaria alterada ou ausente. Trata-se de linhas de células
auxotróficas, isto é, deficientes na síntese de um
determinado metabólito. Porém, quando esse metabólito
está presente no meio, a multiplicação celular é
reiniciada.
A variação somaclonal tem dado origem a uma estratégia
de seleção de mutantes. Nesse caso, as células que não
sofreram mutação são seletivamente mortas, porque elas,
pela sua necessidade de crescer e de se multiplicar,
incorporariam algum ingrediente tóxico para elas. Por
exemplo, se um análogo de aminoácido ou de base púrica
fosse colocado deliberadamente no meio, as células
auxotróficas detidas na sua multiplicação não
absorveriam tal composto. As células auxotróficas então
poderiam ser transferidas ou subcultivadas em outro meio
que contenha a presença de determinado composto
essencial para elas (aminoácido, vitamina, etc.).
Portanto, de acordo com a cultura de tecidos, seria
possível obter mecanismos de manipulação de variação
somaclonal visando a trabalhos em melhoramento de
plantas, e não trabalhos de micropropagação, porque esta
última é uma atividade conservativa. Baseando-se nesse
ponto de vista, a cultura de tecidos pode ser uma eficaz
aliada da genética. Como exemplo disso, é possível obter,
via variação somaclonal, plantas de milho que contenham
triptofano, que está normalmente ausente na zeína,
proteína que representa cerca de 35% do total de
proteínas do grão. Outro exemplo de como a variação
somaclonal pode produzir impacto na agricultura diz
respeito à diminuição ou à eliminação do período de frio,
requerido pela cenoura para florir, o que facilitaria sua
cultura em regiões mais tropicais.
Ainda dentro da linha de pesquisa da variação somaclonal
no campo da cultura in vitro, progênies de Capsicum
annum, oriundas de somaclones, foram avaliadas em
relação a várias características, tais como: altura da
planta, dias para florir, comprimento do fruto, peso de
fruto, cor do fruto, número de sementes, etc. A maior
variação foi encontrada na forma e na cor dos frutos,
sugerindo desse modo que a variação somaclonal desse
órgão poderia ser uma promissora linha de pesquisa,
embora, para os melhoristas do ramo, isso talvez não
fosse prioridade (ANU et al., 2004).
Uma linha de pesquisa a partir da variação somaclonal
espontânea dentro do marco experimental da cultura in
vitro pode ser muito demorada. Por isso, para que sejam
obtidos mutantes por uma via mais rápida, costuma-se
usar agentes mutagênicos, tais como etilmetanosulfonato
(EMS), UV, raios X ou gama, para favorecer a indução de
mutações (ARNOLD et al., 1998). Em Brassica napus, a
resistência a Sclerotinia sclerotiorum foi induzida via EMS,
e o ácido oxálico foi usado como repórter ou indicador da
resistência dos calos obtidos (LIU et al., 2005).
É oportuno ressaltar que nem toda variação somaclonal é
útil. Pode suceder que a variação esteja relacionada à
forma ou à borda da folha, ao comprimento do pecíolo,
etc. Além disso, nem toda variação é estável ou previsível.
Pode-se afirmar ainda que nem toda variação genética
dos somaclones está associada a um fenótipo. Em
bananas, isso tem sido observado frequentemente no
campo. Ademais, as diferenças nos padrões
isoenzimáticos muitas vezes não têm estado associadas a
mudanças morfológicas. Isso levanta a questão da
necessidade de se detectar com mais propriedade a
variação somaclonal (KLERK, 1990). Tal necessidade
provém do fato de que esse fenômeno gera muita
expectativa dentro da cultura de tecidos quando a palavra
de ordem é melhoramento (breeding), especialmente em
culturas altamente heterozigóticas, vinculadas a
programas de melhoramento, os quais visam melhorar a
resistência, como no caso de Fusarium oxysporum
(THAKUR et al. 2002), a produtividade ou o colorido das
flores (CHEN; HENNY, 2006).
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Embriogênese somática
Miguel Jordan Zimmermannn
Características de células
somáticas embriogênicas e
embriões
As características estruturais que representam as células
somáticas embriogênicas são relativamente mais simples
e muito mais conhecidas do que a definição dos
parâmetros moleculares que as constituem, os quais são
até hoje muito pouco conhecidos. O estudo das formas
precoces tem sido facilitado mediante técnicas especiais
de detecção, como imagens digitalizadas de contorno,
biovolume, perímetro e área de projeção embrionária, que
permitem distinguir entre os diferentes estágios de
desenvolvimento dos embriões. Além disso, possibilitam
sua separação de forma (CHI et al., 1994, 1996; VITS et
al., 1992; ZHANG et al., 1996).
Estruturalmente, as células embriogênicas são pequenas,
esféricas e agregadas, contêm um denso citoplasma e
vacúolos pequenos, e/ou contêm poucos vacúolos,
núcleos grandes com abundantes organelas e paredes
celulares grossas (ALY et al., 2002; FEHÉR et al., 2002;
HALPERIN, 1970; HALPERIN; JENSEN, 1967; NOMURA;
KOMAMINE, 1985). As células embriogênicas mostram, em
geral, acúmulo de amido e forte coloração com azul de
toluidina, o que indica um alto teor de proteínas
(PASTERNAK et al., 2002; YEUNG, 1995). Além disso, em
alguns casos, podem evidenciar “fenolização”, tornando-
se de cor escura como no caso de Coffea arabica (QUIROZ
FIGUEROA et al., 2006). A fase anterior de sua formação
correspondeu a células com grandes vacúolos que
empreenderam uma divisão celular desigual (JONG et al.,
1993) dando origem, assim, a uma célula embriogênica,
com citoplasma mais denso e/ou núcleo proeminente, e a
outra parenquimática. A divisão desigual indicada seria
explicada pelo condicionamento de um padrão eixo
apical-basal polar posterior, com uma expressão gênica
específica e diferente que controlaria a manutenção da
polaridade do embrião semelhante ao controle na
formação dos futuros meristemas apical e da raiz (TAIZ;
ZEIGER, 2006). Os embriões somáticos denotam
bipolaridade, assim como os embriões zigóticos, ao
possuir um polo radical e caulinar que dá origem a ambos
os órgãos ainda em condições in vitro. A polaridade deve
ser normalmente mantida e, em parte, com a eliminação
e/ou redução de 2,4-D do meio depois do estado pré-
globular, bem como com o aumento do estímulo elétrico
polar, favorece-se a embriogênese (FEHÉR et al., 2003).
Ademais, com o estabelecimento da polaridade, permite-
se ainda o fluxo de auxina na direção ao pólo radical pela
presença de carreadores do tipo PIN1 (GELDNER et al.,
2001; TAIZ; ZEIGER, 2006). Para a condição polar
embrional, postulou-se, além disso, a presença e a
distribuição de canais de cálcio (PETITPREZ et al., 2005;
VALLEE, 1997).
Estresse
Para a indução do processo, seja em monocotiledôneas
seja em dicotiledôneas, considerou-se necessário que
exista uma série de fatores, que corresponde a uma
situação de estresse celular, uma condição geral que pode
ocorrer por diversos fatores que envolvem a condição das
células em cultivo, bem como todas as condições de
cultivo in vitro. O estresse resulta em dano celular na
extração do explante. A inserção do explante em um meio
de cultivo diferente da planta mãe e a alta concentração
de alguns sais levam a um estresse osmótico. A indução
de mudanças endógenas do nível hormonal de auxinas e
citocininas, sem considerar a demanda ou presença de
hormônios próprios, podem provocar diversas reações
particulares. Por exemplo, Smith e Krikorian (1990)
conseguiram induzir a ES a partir de embriões zigóticos
danificados, em meios nutritivos livres de hormônios,
somente com a aplicação de NH4 como única fonte de
nitrogênio. Ademais, em um meio livre de auxina, o
peróxido de hidrogênio (H2O2) aparece como o fator causal
da indução da ES em calos de Lycium barbarum, em que
se detectou, além disso, a presença de novas proteínas
(entre 35~55 kDa). Ambas as respostas podiam, por sua
vez, ser revertidas mediante aplicação de cicloheximida e
actinomicina D (KAIRONG et al., 2002). Adicionalmente, a
presença de vários íons de metais pesados (CoCl2, NiCl2,
ZnCl2, e CdCl2) também pode levar a uma indução da ES
(KIYOSUE et al., 1990). Recentemente, Katou et al. (2007)
demonstraram que, frente a um dano mecânico ou ferida,
é induzida uma fosfatase MAPK que se liga à calmodulina
(CaM) – uma proteína que liga cálcio – que, por sua vez,
regula as atividades de outras cinases em regiões
danificadas, além de intervir na produção do processo
embriogênico (ANIL; RAO, 2000; JANSEN et al., 1990;
PERERA; ZIELINSKI, 1992; SANDERS et al., 1999). O cálcio,
por sua vez, afeta os canais de K+, e isso aparentemente
poderia provocar uma adaptação das células diante dos
altos níveis de Na+ (KASUKABE et al., 2006), uma
condição que ocorre durante o processo de desinfestação
do material, em que usualmente é utilizado hipoclorito de
Na. As poliaminas também poderiam ter um efeito
antiestresse, com um papel protetor em face da
salinidade que afeta a membrana plasmática (ROY et al.,
2005). Adicionalmente, as poliaminas induzem
rapidamente a formação de óxido nítrico ou ON (TUN et
al., 2006), que pode ativar vários efeitos, entre os quais o
de ser citoprotetor em vez de tóxico, uma vez que atua
como antioxidante, prevenindo, assim, a morte celular
programada (PCD). Por sua vez, a presença de sinais de
ON nas plantas poderia implicar também a ativação de
proteínas cinases e de outras enzimas por meio da
indução intracelular de cálcio (DE STEFANO et al., 2006;
NEILL et al., 2006). Recentemente, foi descrito que, em
tabaco, as lesões causam uma rápida ativação de várias
proteínas cinases, a saber: proteínas cinases ativadas pelo
mitógeno MAPKs; proteínas cinases relacionadas com
lesão (Wounding protein kinases – WIPK); proteínas
cinases ativadas por ácido salicílico (SIPK), que afeta
níveis de ácido jasmônico e de ácido salicílico (SEO et al.,
2007); hormônios que também poderiam estar
relacionados com as repostas indutivas da ES, pelo fato
de estimularem a síntese de H2O2 e/ou afetar os níveis de
etileno, os quais também podem promover ou inibir o
processo (LAMB; DIXON, 1997; QUIROZ FIGUEROA et al.,
2006).
Reguladores de crescimento
O ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D) é o principal e
mais eficiente regulador sintético indutor da ES descrito
na literatura. Deve ser utilizado por tempo indutivo
determinado, que varia de 3 a 7 dias, de acordo com a
espécie, e, logo após, retirado do meio de cultivo, na
presença ou não de outros reguladores. Sua função
primordial é a de induzir a ES. Além disso, tem o papel de
produzir um aumento dos níveis endógenos de auxina, ou
seja, do ácido indolacético (PASTERNAK et al., 2002).
Também conduz a funções do tipo fosforilação, que serão
indicadas mais adiante.
Hormônios do tipo auxina são essenciais para que se
alcance a fase de formação de massas celulares
proembriônicas (PEMS), bem como a de transição de
proembriões do estado globular para o de coração. As
auxinas levam à síntese de novos produtos gênicos, ainda
não estabelecidos na fase anterior. Aparentemente, a
partir da primeira divisão assimétrica que conduz a uma
condição polar, a presença de auxinas nessa fase é
fundamental para mediar um transporte polar e para
síntese de DNA (FUJIMURA; KOMAMINE, 1980). Juntamente
com a demanda por auxinas, ressalta-se igualmente a
importância da presença de citocininas (BAP ou TDZ)
combinadas ou seguidas com auxinas. Por exemplo, em
arroz, que não mostrava respostas depois da aplicação de
2,4-D, a adição posterior de TDZ e/ou BA permitiu tanto a
formação de embriões somáticos como também a de
brotos (GAIRI; RASHID, 2004). Similarmente, a citocinina
4-CPPU, N-(2-cloro-4-piridil)-N´-fenilureia, aparece como
indutora da ES e é administrada em uma larga faixa de
concentrações (FIORE et al., 2002). Além disso, vários
derivados da difenilureia também podem induzir a ES em
citros, alguns com maior eficiência do que em BAP (CARRA
et al., 2007).
Em geral, as células mais novas, além de serem as mais
competentes, são também as mais sensíveis à aplicação
de auxinas exógenas. Mesmo que as auxinas sejam
requeridas durante a proliferação das massas de células
proembriogênicas (derivadas de calos embriogênicos),
nem sempre a sua presença é indispensável para o
desenvolvimento de embriões somáticos como já foi
demonstrado em cenoura (VRIES et al., 1988a). A função
precoce da auxina é aparentemente a de reprogramar o
desenvolvimento das células que irão produzir a
embriogênese assexuada (DUDITS et al., 1991), de
maneira que se manifeste a expressão de células não
organizadas (DUDITS et al., 1995). Grosset et al. (1990),
Pasternak et al. (2002) e Fehér et al. (2003) indicam que a
presença de fitormônios pode ativar um processo de
fosforilação atribuído a proteínas cinases (MAPK), as
quais, em conjunto, conduzem tanto a uma resposta de
diferenciação, como a um efeito em nível de pós-indução
do embrião somático (ROITSCH, 1999; HIRT, 2000).
Durante o desenvolvimento dos embriões somáticos,
observou-se também um incremento da atividade da N-
acetilglutamato cinase (NAGK) – uma enzima do ciclo da
ornitina – que está relacionada ao aumento de alguns
aminoácidos, como arginina, glutamina e glutamato, nos
estágios globular e de torpedo (LOHMEIER; VOGEL et al.,
2005).
Além disso, foram relatadas também respostas
embriogênicas sem a presença de hormônios, apesar de
estarem relacionadas à inclusão de sacarose ou de
compostos que induzem estresse osmótico ao meio
(KAMADA et al., 1993), condição essa que conduz
geralmente à ESD. O AAB também tem sido considerado
um hormônio indutor da ES pelo fato de iniciar o processo
de formação embrionária pré-globular em células de
cenoura (NISHIWAKI et al., 2000) e em Nicotiana
plumbaginifolia (SENGER et al., 2001). Em cenoura, a
deficiência do hormônio provocou malformações, en‐
quanto sua adição posterior reverteu o processo
embriogênico para a normalidade (NISHIWAKI et al.,
2000). Ademais, existe maior evidência com respeito ao
requerimento do AAB na fase final de amadurecimento do
embrião somático, apesar do requerimento osmótico. Por
isso, devem-se empregar altas concentrações de
sacarose, maltose, dextranas ou polietilenoglicol (PEG), a
fim de aumentar o potencial osmótico, satisfazendo,
assim, a demanda por estresse hídrico (GUTIERREZ-
PESCE; RUGINI, 2004; LECOUTEUX et al., 1993;
STRICKLAND et al., 1987).
Aparentemente, o grupo das coníferas requer
concentrações muito mais altas de AAB do que as
angiospermas: cerca de 15 mg L-1 (Informação verbal)1.
Com o amadurecimento, o nível de AAB nos cotilédones
aumenta por causa do armazenamento de compostos de
reserva. Assim, a germinação é reprimida, o que leva a
tolerância à dessecação (THOMAS, 1993), que, pela
produção de proteínas do tipo LEA geradas pela presença
de AAB e pela expressão de genes induzidos por estresse
hídrico (DODEMAN et al., 1997), conduzem os embriões a
um certo estado de inatividade metabólica mesmo que
esse não seja o caso para todas as espécies. Segundo
Anandarajah e McKersie (1990), um incremento de
sacarose no meio também aumenta o vigor dos embriões
somáticos. Em alguns casos, a glutamina também parece
favorecer a síntese de proteínas de armazenamento dos
embriões somáticos durante o processo da dessecação
(LAI et al., 1992). Finalmente, para possibilitar uma rápida
germinação durante a fase final do desenvolvimento de
torpedo dos embriões somáticos, a aplicação de
reguladores de crescimento é geralmente requerida, uma
vez que existem trabalhos, por exemplo, mostrando o uso
de GA3 (ZLENKO et al., 2002). Em coníferas é frequente o
uso da glutamina e do hidrolisado de caseína.
As poliaminas (putrescina, cadaverina, espermidina e
espermina) são outros compostos de possível ação
hormonal, os quais têm sido indicados pelo fato de
estimularem a ES na presença de outros hormônios
(KAKKAR; SAWHNEY, 2002; KEVERS et al., 2002; LI;
BURRIT, 2003). Entre elas, a putrescina aparece como
tendo maior relevância em algumas espécies (BASTOLA;
MINOCHA, 1995; SAKHANOKHO et al., 2005). As
poliaminas têm dois ou mais grupos amino primários que
atuam como fatores de crescimento em células
eucarióticas. Sua função não está totalmente esclarecida,
mas assume-se que está relacionada com sinais de
transdução, como o fluxo de cálcio (THOMAS et al., 1993),
com proteína cinase (DATTA et al., 1987) e também com
reguladores de crescimento (TONON et al., 2001). Para
algumas poliaminas, em especial a espermidina, tem-se
atribuído também um papel antiestresse, que protege do
efeito de salinidade tanto a membrana plasmática quanto
a H-ATPase ligada a ela (ROY et al., 2005). Isso pode
ocorrer no final do processo na fase de dessecação.
Paralelamente, como se indicou antes, o AAB acumula-se
nos embriões zigóticos sob condições normais e provocam
um efeito de dessecação (ATTREE et al., 1995). O AAB
participa da última fase de formação do embrião, ou seja,
da maturação, por meio da produção de proteínas do tipo
LEA. Além disso, ele suprime a formação de embriões
secundários e aberrantes, sincroniza o cultivo e impede a
germinação precoce (AMMIRATO, 1983). Recentemente,
Steiner et al. (2007) relataram que, em Araucaria
angustifolia, as poliaminas por si só favorecem o
crescimento de embriões somáticos e, ao mesmo tempo,
a putrescina e a espermidina induzem um aumento dos
níveis endógenos de AIA e de AAB.
Genes e proteínas
Na maioria das espécies estudadas, muitos são os tipos
de células que podem chegar a ser embriogênicas. Isso
depende da sua capacidade de reprogramar a expressão
gênica (competentes) para assumirem diferentes
mudanças estruturais semelhantes aos embriões
zigóticos, em meios de cultivo sob determinadas
condições in vitro. Esse dado diz respeito aos programas e
aos graus de diferenciação celular em plantas (SULTAN,
2000). Durante a indução da ES e, em cada um dos
diferentes estágios de diferenciação embriogênicos
(globular, estado de coração e de torpedo), a expressão
gênica também varia, e esse é o padrão presente durante
o processo de desenvolvimento completo da planta
(ZIMMERMANN, 1993). Entretanto, deve-se considerar
também que, em cada fase do estágio do
desenvolvimento embriogênico, junto à síntese de novas
proteínas, ocorre, da mesma maneira, a eliminação de
polipeptídios de estágios anteriores, os quais, nesse
momento, são desnecessários (SALLANDROUZE et al.,
1999). Aparentemente, a transição da condição somática
para a embriogênese implica, em maior escala, o
silenciamento de genes quando comparada a sua
atividade ou expressão (QUIROZ FIGUEROA et al., 2002).
Durante todo o processo de embriogênese, recapitula-se
uma diferente expressão de genes, em que são ativadas
mudanças complexas, em nível estrutural, semelhantes
àquelas encontradas nos processos de formação dos
embriões zigóticos normais in vivo, tais como a síntese de
novos mRNA e proteínas. Vários genes que são ativados
e/ou expressos durante as diferentes etapas do processo
da ES têm sido recentemente caracterizados e
comparados aos fenômenos que ocorrem nas células não
embriogênicas. Além disso, a expressão de uma série de
genes vinculados à divisão celular e à formação de
membranas e de parede celular tem sido caracterizada.
De igual modo, os efeitos causados por mudanças e/ou
gradientes de metilação do DNA (ativados pela presença
de fitormônios) são específicos para o desenvolvimento da
ES. Particularmente, as auxinas naturais e sintéticas
afetam fortemente o nível da 5-metil-citosina no DNA em
células de cenoura, enquanto a aplicação de drogas
específicas, que induzem a hipometilação, inibe a ES (LO
SCHIAVO et al., 1989). Parece ainda que certo grau de
metilação no DNA (SANTOS; FEVEREIRO, 2002), bem
como a alteração nos níveis de fenóis solúveis de
proteínas e a atividade de peroxidases na parede celular
estão associados à indução da resposta embriogênica
(CAUSEVIC et al., 2005). No entanto, nem para o evento
inicial, vinculado à desdiferenciação celular é conhecido
claramente o papel da expressão de genes específicos,
uma vez que vários produtos codificados pelos genes
expressos correspondem a proteínas com diversas
funções. Apesar disso, recentemente foi descrito um gene
de expressão muito precoce, o C-ESE1 (Carrot Early
Somatic Embryogenesis), que ocorre nas células
primordiais do embrião somático após a retirada do
fitormônio (2,4-D) do meio. O C-ESE1 codifica uma
proteína com domínios de aglutinina e o lócus de glico-
proteínas, os quais se encontram associados com a
deposição de novos polissacarídeos nas paredes a serem
formadas nas células embriogênicas, assumindo um papel
de associação/comunicação célula-célula (TAKAHATA et
al., 2004). Esses genes expressos, possivelmente ligados
a oligossacarídeos, além de serem derivados da hidrólise
de paredes celulares, poderiam também atuar na
regulação da ES (MALINOWSKI; FILIPECKI, 2002).
Entre as principais enzimas, distingue-se a SERK, uma
proteína cinase receptora que contém domínios ricos em
leucina (LRR) e cuja expressão está relacionada à
interação com outras moléculas sinalizadoras (HECHT et
al., 2001), determinando assim a condição de células
competentes no processo da ES (FEHÉR et al., 2003;
NOLAN et al., 2003; SCHMIDT et al., 1997). Observou-se
que, em Daucus carota e em Dactilys glomerata, a única
célula capaz de expressar o gene SERK possui a
habilidade de gerar um embrião somático (SCHMIDT et al.,
1997; SOMLEVA et al., 2000). Segundo Thomas et al.
(2004), transcritos do gene SERK foram observados em
girassol muito precocemente durante os primeiros dois
dias de cultivo, e estão diretamente associados ao
desenvolvimento da competência para a iniciação da ES.
Em Ocotea, a expressão de SERK se evidencia depois de 7
dias de cultivo em agregados celulares que resultam em
embriogênicos quando são tratados com 2,4-D, mas não
se expressa em células não tratadas com esse regulador,
as quais tampouco derivam em embriogênicas (SANTA
CATARINA et al., 2004). Igualmente, uma alta expressão
de SERK foi observada em calo embriogênico de cacau
(Theobroma cacao) em seus estados iniciais. A diferença
está também no fato de que foram observados sinais mais
fracos, ou ausência de sinal, em outros órgãos (SANTOS et
al., 2005). A adição de auxinas e de citocininas, além de
favorecer a transcrição de SERK, conduz a uma maior e
complexa expressão de outros genes pela presença de
diversos mRNAs. Outras proteínas descritas são: as
proteínas associadas à parede, as relacionadas com
patógenos, as do tipo heat-shock do tipo globulinas, as
histonas, as proteínas ribossomais e, no final da fase de
desenvolvimento, aquelas relacionadas ao
armazenamento, juntamente com outras proteínas
embriogênicas (ECP31), as quais estão associadas à
dessecação e à tolerância à dessecação do embrião, como
é o caso das proteínas do tipo LEA (late embryogenesis
abundant proteins) (BABU et al., 2007; KIYOSUE et al.,
1992) indicam que as proteínas do gene HVA1,
relacionado ao grupo das proteínas LEA, conferem
tolerância à desidratação em arroz e protegem a
membrana plasmática. De igual forma, o gene C-LEC1 em
cenoura também está vinculado ao amadurecimento nos
embriões somáticos e zigóticos (YAZAWA, 2004). Entre
outras proteínas detectadas, pode-se mencionar as de
transferência de lipídeos (LPT), que possuem função de
transporte de fosfolipídios para várias organelas (KADER,
1996). Essas proteínas estão relacionadas igualmente às
defesas, à adaptação ao estresse hídrico e, além disso, à
regulação da expansão celular (DODEMAN et al., 1997),
que ocorre por efeito do grupo de alérgenos de pólen
relacionados tanto a proteínas do tipo expansinas
(COSGROVE et al, 1997) quanto à síntese e à deposição
de calose (DUBOIS et al., 1990). Vários outros fatores
estão vinculados ao desenvolvimento normal do embrião,
os quais medeiam sinais de transdução durante a
morfogênese. Podem ser citados, por exemplo, em
primeiro lugar, o Ca2+ vacuolar e a calmodulina; a
deficiência de Ca2+ provoca clara inibição da ES (ANIL;
RAO, 2000; JANSEN et al., 1990; PERERA; ZIELINSKI, 1992;
SANDERS et al., 1999). Segundo Mahalakshmi et al.
(2007), a resposta indutiva de 2,4-D sobre a ES em
Triticum aestivum parece ser mediada por cálcio, dado
que aplicações com quelantes sequestradores inibem
essa resposta. Esses autores indicam, além disso, uma
expressão variável de três genes regulados por cálcio,
entre os quais a proteína cinase dependente de
calmodulina, a proteína cinase dependente de cálcio e,
provavelmente, a proteína ligante de cálcio durante o
processo.
Compostos extracelulares
excretados para o meio de cultivo
Várias proteínas, além de arabinogalactanas (AGPs), têm
sido relacionadas à interação planta-patógeno e à
degradação de calose durante o desenvolvimento
(CHAPMAN et al., 2000). As AGPs possuem um alto
conteúdo de polissacarídeos (aproximadamente 90%
w/w), em que domina a galactose, a arabinose e, em
menor escala, o ácido glucurônico, junto a uma pequena
porção proteica, correspondente a 10% w/w (CLASSEN,
2007). Estão presentes em membranas e em paredes
celulares, e aparecem expressando-se amplamente na
etapa transitória do estado de torpedo e, por isso, são
essenciais para a ES de cenoura. Sua particularidade é o
fato de se encontrarem liberadas no meio de cultivo,
como sinais que precedem a reformação da parede (VAN
HENGEL et al., 2001). Particularmente, as AGPs agregadas
ao meio de cultivo de cenoura restauram o potencial
morfogênico de células que tinham perdido tal capacidade
(KREUGER; VAN HOLST, 1993).
A fitosulfokina (PSK) – um pequeno peptídeo sulfatado em
tirosina que atuaria como ligante extracelular nos
primeiros estágios de desdiferenciação celular, de
proliferação e de rediferenciação – é outro fator de
crescimento de ação promotora da ES em algumas
espécies. Seu papel é manter a capacidade de divisão
celular e o estado juvenil das células embriogênicas
(HANAI et al., 2000; IGASAKI et al., 2003; KOBAHASHI et
al., 1999). Sua ação indutora é muito potente e aumenta
em presença de polietilenoglicol (PEG), uma molécula que
também aparece como promotora da ES (ATTREE et al.,
1995; MARUYAMA et al., 2002). Além disso, a PSK aparece
vinculada de forma precoce ao estabelecimento da
polaridade, sinalizando e promovendo o desenvolvimento
das células embriogênicas (FEHÉR et al., 2003).
Outros sinais em forma de moléculas solúveis que podem
atuar sobre o controle da diferenciação durante a ES são
as endocitinases, os citin oligossacarídeos lipofílicos
(LCOs) e outras proteínas glicosiladas extracelulares
secretadas para o meio nutritivo (JONG et al., 1992; VRIES
et al., 1988b). É notável que meios condicionados usados
preliminarmente, os quais contêm alguns desses
componentes, têm demonstrado igualmente que podem
levar à indução de embriões somáticos (HARI, 1980). Os
LCOs têm sido encontrados nos meios condicionados de
cultivos embriogênicos de Picea abies (DYACHOK et al.,
2002).
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Organogênese
Eurico Eduardo Pinto de Lemos
A organogênese e o balanço
hormonal
É de conhecimento geral, há mais de 50 anos, que as
auxinas podem induzir a formação de raízes em culturas
de tecidos. Esse fenômeno foi demonstrado no clássico
trabalho de Skoog e Miller (1957) no qual se observou que
a formação de brotos e raízes pode ser regulada pela
relação auxina/citocinina (Figura 3). Raízes são
rotineiramente induzidas em resposta à aplicação de
auxinas dentro de estratégias de regeneração de plantas,
de transformação e de enraizamento de estacas, mas
menos atenção tem sido dada ao estágio de morfogênese
(CALLIS, 2005). Sachs (1993) descreveu auxina como um
sinal correlativo que coordena tanto o desenvolvimento
com diferenciação vascular quanto outros processos de
desenvolvimento vegetal. Ao que tudo indica, o fluxo de
auxina é o determinante da canalização da diferenciação
de tecidos vasculares.
Cauligênese
A organogênese em tecidos vegetais, cujo resultado
visível é a produção de novas gemas e brotos, é chamada
de cauligênese. Esse é um dos tipos mais comuns de
organogênese procurada em cultura de tecidos pela sua
grande aplicação na produção massal de mudas. Ela
ocorre em resposta à manipulação de reguladores de
crescimento exógenos aplicados ao meio de cultura.
Dependendo das forças de equilíbrio entre os níveis
endógenos e exógenos de hormônios aplicados, sobretudo
das citocininas e das auxinas, as respostas podem ser
cauligênese ou rizogênese.
Meristemas de brotos formados diretamente em tecidos
de explantes são frequentemente iniciados 48 horas após
o começo da divisão celular em cultura de tecidos. Cada
mitose preliminar é rapidamente seguida por novas
divisões no ciclo celular até que se formem os primórdios
meristemáticos. Esses primórdios aparecem de forma
aparentemente aleatória nos tecidos, mas observa-se que
posteriormente eles tendem a uma equidistância uns dos
outros. Algumas vezes, o novo núcleo meristemático
surge de um conjunto de células-mãe que se dividiram
dando origem a várias outras com o mesmo potencial, as
quais juntas formam um meristemoide. Outras vezes, a
origem do novo órgão é unicelular e pode ser confirmada
pela elevada incidência de plantas mutantes puras que
surgem de um tecido submetido a tratamento
mutagênico. Se as plantas fossem originadas de várias
células, então um grande número de quimeras poderia
aparecer.
Os meios de cultura e os reguladores de crescimento que
favorecem a rápida proliferação celular e a formação de
calos em um explante nem sempre são os mesmos que
conduzem a meristemas morfogênicos – que resultam na
formação de brotos ou de raízes. Calos mantidos
prolongadamente em um mesmo meio de cultura
terminam por produzir organogênese a partir de centros
meristemáticos ali formados. Caso sejam frequentemente
subcultivados, tais calos permanecem indiferenciados e
nunca chegam a formar órgãos. De forma oposta, alguns
calos somente produzem órgãos quando são removidos
do meio de indução e transferidos para meios de
regeneração com ou sem reguladores de crescimento
(LEMOS; BAKER, 1998).
Os meristemoides podem ser originários da
reprogramação de células desdiferenciadas dos calos ou,
mais comumente, de células que retêm a competência
para a morfogênese já existente no tecido original (Figura
5). Em alguns casos, tais brotos são, na verdade, parte de
embriões somáticos inadvertidamente induzidos na massa
calosa (GEORGE, 1993).
Figura 5. Cauligênese indireta em folhas jovens de Anthurium sp.
Fotos: Eurico Eduardo Pinto de Lemos
Florescimento
Os meristemas fornecem novas células para que a planta
produza órgãos durante toda a sua vida, e sua atividade
contínua depende de genes reguladores que equilibram a
proliferação de células meristemáticas com as células
recrutadas para a organogênese. Durante o
desenvolvimento floral, esse balanço é modificado para
privilegiar a organogênese, o que causa a terminação do
meristema após produzir determinado número de órgãos
(SABLOWSKI, 2007).
A indução de flores in vitro é um fenômeno interessante
do ponto de vista científico, uma vez que pode trazer à luz
as melhores condições fisiológicas para que tal evento
ocorra na natureza. Os hormônios vegetais influenciam
vários processos do desenvolvimento, desde a
germinação das sementes até a produção de brotos, de
raízes e de flores. O importante papel da auxina na
indução floral e no desenvolvimento tem sido descrito em
vários trabalhos com ervilha (FRANKLIN et al., 2000),
Vigna radiata (AVENIDO; HAUTEA, 1990) e com Vigna
mungo (IGNACIMUTHU et al., 1997). No entanto, para
algumas espécies, a auxina ora não produz qualquer
efeito (RASTOGI; SAWHNEY, 1987) ora é inibidora
(DEATON et al., 1984) do desenvolvimento floral. Zhang
(2007) observou que a necessidade de auxina para o
florescimento in vitro de Perilla frutescens foi variável.
Entre as auxinas testadas, o AIB foi mais eficiente do que
o ANA e o AIA na indução de flores. A adição de 1 mg L-1
de AIB ao meio induziu a produção de raízes em 65,6% de
flores normais, de forma que algumas delas chegaram à
produção de frutos e de sementes viáveis. No entanto,
concentrações superiores a 2 mg L-1 de AIB não induziram
flores, mas calos. A presença de raízes foi fundamental
para a produção de flores in vitro de P. frutescens, o que
indicou que a formação das raízes tem um papel
importante nesse fenômeno. A presença de ANA ou de AIA
no meio melhorou a produção de raízes, mas foi
ineficiente para produzir flores in vitro.
A necessidade de citocinina para o crescimento de flores
tem sido descrito para mono e dicotiledôneas (WANG et
al., 2001; ZHONG et al., 1992; ZHOU et al., 2004). Zhang
(2007) observou que, quando todos os outros parâmetros
estavam nos níveis ótimos, a melhor concentração de BA
para a indução floral de P. frutescens foi de 1 mg L-1, na
qual 86,2% dos explantes produziram flores normais.
A concentração de sacarose também é um fator que pode
influenciar a organogênese de flores in vitro. A presença
de concentrações próximas de 30 g L-1, em geral são tidas
como apropriadas para a indução floral em batata (AL-
WAREH et al., 1989), e ginseng (LEE et al., 1989) e em
Vigna mungo (IGNACIMUTHU et al., 1997).
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Poliembriogênese
Don J. Durzan
Apomixia e poliembrionia
Apomixia é a substituição da reprodução sexual por vários
tipos de reprodução assexual, nos quais não há fusão dos
gametas. As causas da apomixia e da poliembrionia são
geralmente atribuídas a um substrato comum (MOGIE,
1992). A poliembrionia é uma característica hereditária
controlada por um ou por mais genes recessivos, os quais
atuam juntos durante a recombinação.
Em biotecnologia, a apomixia visa fixar o vigor híbrido,
poupando tempo, trabalho e dinheiro no estabelecimento
de cultivares ou variedades. Contudo não é fácil
estabelecê-la.
A poliembronia foi reportada primeiramente por
Leeuwenhoek, em 1719, em sementes de Citrus. Em
1878, Strassburger estudou as origens adventícias desses
embriões e referiu-se a eles como “poliembronia
esporofítica”. Ademais, o resgate de ESM a partir de
sementes é inicialmente um produto da meiose e da
fertilização, isto é, da reprodução sexual, e suas células
têm a capacidade de reter seu potencial para gerar
múltiplos embriões geneticamente iguais por
poliembriogênese. A falta de uma adequada identificação
da poliembriogênese tem levado ao uso inadequado do
termo indução na literatura da embriogênese somática.
É importante entender a diferença entre MCP e simples
poliembrionia. Esta última poderia ser chamada mais
propriamente de poliembrionia polizigótica. Nesse caso,
múltiplos embriões são originados de zigotos diferentes, o
que os torna geneticamente diferentes. A poliembrionia
polizigótica é encontrada tanto em gimnospermas quanto
em angiospermas. Em Pinus spp., um simples óvulo pode
ter potencial para produzir de 1 a 200 embriões
geneticamente diferentes por poliembrionia polizigótica.
Modelos de desenvolvimento na
poliembriogênese
Diferentes modelos de poliembriogênese têm surgido em
coníferas, dos quais um está baseado no desenvolvimento
da semente em estádios ou em etapas iniciais, com ou
sem MCP, segundo foi formulado por Dogra (1979). É um
modelo complexo, derivado do desenvolvimento
morfológico de um proembrião, o qual apresenta células
embrionais primárias inferiores (pE) e superiores (pU),
como proposto por Doyle (1963). Nesse modelo, um
zigoto carente de núcleo é formado depois da fertilização,
o qual produz um proembrião primário que contém
embriões iniciais. Doyle e Looby (1939) observaram que,
no embrião primário, cada célula apresenta potencial para
ser um “embrião inicial”, além de possuir a capacidade de
autorregenerar-se. Embriões iniciais como esses dão
origem a embriões independentes com características
próprias, fato esse que foi negligenciado por um longo
período.
A capacidade de desenvolvimento dos proembriões num
estádio muito precoce depende do número variável de
mitoses anucleares (free-nuclear mitoses), do número de
embriões iniciais e dos fatores nutricionais do gametófito
feminino haploide, durante o processo de formação da
semente. A proembriogenia (ou proembrionia) envolve
todos os estádios que antecedem à elongação do
suspensor. Todas as etapas que ocorrem depois da
elongação do suspensor, mas antecedem o
estabelecimento do meristema radicular, são referidas
como embriogenia precoce (SINGH, 1978).
Conforme Dogra (1979), a morfogênese do embrião é
particionada ou dividida em uma camada terminal de
células embrionárias (E), em uma outra do suspensor (S) e
em uma terceira camada de células primárias superiores
(U). A camada de células do suspensor deriva da terceira
camada e se manifesta depois de divisões internas no
proembrião primário, isto é, a nutrição do embrião
processa-se por meio do suspensor, via citoplasma do
óvulo. Posteriormente, o embrião dominante e outros
produzidos por MCP são nutridos a partir da região de
erosão do gametófito feminino haploide. Mais tarde, essa
região será chamada também de endosperma.
Finalmente, embriogenia refere-se ao processo de
formação do embrião com seus cotilédones durante o
estabelecimento da semente.
Dogra (1967, 1979, 1984), baseando-se em dissecação e
em análise de raios X de sementes, também classificou o
desenvolvimento precoce do embrião em dois tipos. Um
tipo é representado por Picea, por Pseudosuga e por
outras coníferas, as quais não mostram MCP (Figura 1A).
Outro tipo é representado por Pinus spp., em que a MCP é
iniciada pela subdivisão de um zigoto, que resulta em um
grupo de embriões competentes e geneticamente iguais
(Figura 1B), os quais poderiam ou não tornar-se
independentes uns em relação aos outros (Figuras 2A e
2B).
Figura 1. Poliembriogênese. (A) Embrião não clivado de sementes de
Pseudosuga menziesii em meio semissólido. Esse embrião pode ser
multiplicado por MCP por meio de cultura líquida; (B) Embriões
juvenis, formados por ESM e por clivagem múltipla, oriundos de
sementes de abeto-da-noruega; (C) Embriões de Pinus lambertinana
cultivados em meio semissólido incrementam a produção de mais
embriões via MCP; (D) Cultura em suspensão em frascos do tipo
Nippled, com rotação de 1 rpm e em ambiente escuro, incrementa de
forma intensiva a poliembriogênese. A uniformidade dos embriões
juvenis pode ser alcançada por um procedimento denominado
gradiente de densidade; (E) Placa de Petri com embriões
poliembriogênicos em suspensão, formando parte de um
experimento com diferentes tratamentos, que visam à otimização do
seu desenvolvimento; (F) População uniforme de embriões
poliembriogênicos juvenis (iniciais), tingidos com carmim acético
(MCP) e azul de Evan (suspensor anucleado).
Fotos: Don J. Durzan
Embriogênese somática e
poliembriogênese em coníferas
A embriogênese somática foi induzida primeiramente em
embriões imaturos de Picea abies, abeto-da-noruega
(CHALUPA 1985, HAKMAN et al., 1985). Por sua vez, a
poliembriogênese somática, em termos de clivagem e de
sistema embrião-suspensor, foi primeiramente observada
em células em suspensão (DURZAN; GUPTA, 1987; GUPTA;
DURZAN, 1986a, 1986b, 1987a, 1987b,). Utilizaram-se
diferentes níveis de ácido abscísico nesses estudos com a
finalidade de separar embriões clivados e de recuperar
embriões individuais em espécies com ou sem clivagem
embrionária (BOULAY et al., 1988, DURZAN; GUPTA,
1988a, 1988b). Ademais, estudos sobre a suscetibilidade
do ácido abscísico e o desenvolvimento da expressão
genética no processo da maturação de embriões
somáticos têm sido conduzidos em Pinus taeda (VALES et
al., 2007).
Desde 1990 até 1995, a embriogênese somática e a MCP
de material diploide e haploide foram descritas em Larix
sp. (BONGA et al.,1995). Na maioria dos casos, o sucesso
foi alcançado com explantes de duas semanas de idade
após a fertilização (mês de junho). A embriogênese
somática de cotilédones foi também induzida com um
sucesso variável.
Para Psudosuga menziesii, a melhor época para induzir
satisfatoriamente células ESMs de sementes em
desenvolvimento do tipo não clivadas deu-se logo após a
fertilização (HONG et al.,1991). Da mesma forma, células
em ESMs foram obtidas e cultivadas sem maiores
problemas a partir de calos, e o material clonal obtido a
partir de células em suspensão foi satisfatoriamente
transferido para o solo (DURZAN, 1988a; DURZAN; GUPTA,
1987). Essa situação novamente provou o potencial
latente dos embriões iniciais em espécies cuja
poliembriogênese (MCP) não era conhecida. Sementes de
Pinus lambertiana (do tipo clivagem) com apenas um
embrião – bem desenvolvido –, quando armazenadas por
5 anos, apresentaram EMSs (sistema embrião-suspensor)
e foram capazes de originar não somente embriões mas
também plântulas sob condições in vitro (GUPTA;
DURZAN, 1986a).
As informações fornecidas até aqui foram uma breve
recapitulação histórica da poliembriogênese. Contudo, é
importante reconhecer que muitos outros pesquisadores
têm demonstrado esse fenômeno numa ampla variedade
de coníferas, por meio da utilização de diferentes métodos
de cultura. Assim sendo, uma ampla gama de
pesquisadores tem dado uma apreciável contribuição para
que seja possível compreender a poliembriogênese em
plantas lenhosas.
Especificidade de diagnósticos e
criopreservação de genótipos
A separação de células em suspensão por meio da
centrifugação e do fracionamento melhorou a geração de
linhagens celulares, de MCP e de maturação embrionária.
A reinoculação dessas células incrementou sua cultura e
permitiu que houvesse uniformidade e sincronização
durante sua produção em massa (Figuras 1D e 1E)
(DURZAN; CHALUPA, 1976). Ademais, a coloração dupla
com aceto, carmim e azul de Evans (Figura 1F) permitiu
visualizar bem as células proembrionais e diferenciá-las
das células do suspensor. Esse fato, igualmente, permitiu
avaliar a qualidade de ESMs depois da criopreservação
em nitrogênio líquido (GUPTA et al.,1987a). A
criopreservação tem sido repetida por outros autores por
meio do uso do modelo da proliferação de massas
proembriogênicas (PEM) e de suas consequentes
variações para o armazenamento de germoplasmas.
Antibióticos específicos para ubiquitina PCNA (proliferating
cell nuclear antigen) e para ensaios com TUNEL1 (nick end
labeling) foram usados para seguir o recâmbio das
proteínas regulatórias, a síntese de DNA, o ciclo celular e
a apoptose (DURZAN, 1996; DURZAN et al., 2006; HAVEL;
DURZAN, 1996a, 1999). Com todas essas técnicas, e com
a distribuição de proteínas nas camadas celulares axiais,
foi possível estabelecer um paralelo entre os diferentes
perfis de proteínas obtidos por gel de poliacrilamina
(DURZAN, 1996).
Ativas e mecanicamente estressadas, as células das
coníferas no meio de cultura rapidamente liberam ON, o
qual precede à produção de etileno (MAGALHÃES et al.,
2000) (Figuras 2C e 2F). O ON é um radical livre que
podze ter efeitos benéficos ou lesivos. Em baixos níveis,
pode reduzir o dano que as diferentes espécies de
oxigênio reativo podem causar. Em baixos níveis, ele
também participa do sistema de sinalização celular dentro
do âmbito da defesa da planta. Em altos níveis celulares,
o ON contribui para o envelhecimento, causa danos ao
DNA e leva à apoptose (MAGALHÃES et al., 2000;
PEDROSO et al., 2000). O ON é originado a partir da
arginina por meio de reação parcial no ciclo da ureia
(DURZAN; PEDROZO, 2002; DURZAN; STEWARD, 1983;
DURZAN et al., 2006). Por um lado, a arginina é também
precursora de guanidinas monossubstituídas, que são
inibidoras naturais da óxido nítrico sintase. Por outro lado,
ela está envolvida na síntese de ureia, de ornitina, de
agmatina, bem como na acumulação de prolina sob
condições de estresse.
Filonova et al. (2002) tem proposto que a morte celular
programada (programmed cell death – PCD) é o principal
mecanismo responsável pela eliminação competitiva de
embriões secundários em sementes poliembrionais. A PCD
é tida como um mecanismo importante que possibilita a
competição entre os vários embriões monozigóticos,
garantindo a sobrevivência de um só. Isso ocorre por meio
de um programa autocatalítico de autodestruição ainda
não definido.
Esse programa, que ainda não está definido, não explica
as várias outras formas de apoptose nem a poliembrionia
modificada em Pinus spp., na qual a tal eliminação não
acontece (SIMAK, 1973).
Com respeito à eliminação competitiva, o papel dos necro-
hormônios produzidos por células moribundas
(HABERLANDT, 1922; HAVEL; DURZAN, 1996a) e da
degeneração de núcleos remanescentes eliminados desde
a população de embriões ocorre em virtude de lesões ou
mutações somáticas. A apoptose contribui para a
formação de embriões apomíticos em células em
suspensão no abeto-da-noruega (BELL, 1994). Vale
considerar que as células apomíticas são reabsorvidas
durante a formação da megáspora, e essa reabsorção tem
sido considerada uma forma de canibalismo no processo
de propagação das coníferas, pois isso tende a reduzir o
número de indivíduos (HAIG, 1992). Ademais, com
respeito ao tamanho e à viabilidade das sementes,
importante informação tem sido reportada por Xiao et al
(2006a, 2006b).
Em Pinus taeda, um sistema de nove estádios baseado na
morfologia do embrião tem sido formulado para comparar
a expressão gênica em embriões zigótenos e somáticos.
Como exemplo pode-se citar a transcrição reversa que
ajudou a encontrar a cópia de um gene para
aquagliceroporina, o qual foi abundantemente expresso
no suspensor de embriões zigóticos e somáticos dessa
espécie (CIAVATTA et al., 2001). No entanto, sua fisiologia
permanece ignorada. Em virtude disso, ainda são
necessários mais esforços para melhorar critérios de
avaliação no tocante a características fenotípicas e
genéticas (DURZAN, 1989a).
Protoplastos e engenharia
genética
Depois de 15 semanas, uma população de dez
protoplastos oriunda do sistema embrião-suspensor
(ESM), em Pinus taeda, desenvolveu mais de cem
embriões somáticos (GUPTA; DURZAN, 1987a). Em
trabalhos subsequentes, protoplastos de embriões do
abeto-branco produziram plântulas (ATTREE et al.,1989).
Protoploastos originados de suspensão celular via ESMs
de Pseudosuga menziesii e de Pinus taeda foram usados
para introduzir genes com resistência a insetos via
eletroporação (GUPTA et al.,1988). Tentativas similares
têm sido realizadas com luciferase; entretanto, árvores
transformadas com genótipo estável não têm sido
obtidas.
Poliembronia em sementes e
fatores ambientais
Condições climáticas adversas podem induzir a morte
tardia do embrião e, consequentemente, ocasionar o
aparecimento de sementes não viáveis (DOGRA, 2001). As
condições climáticas severas no Ártico, notadamente na
Escandinávia e na Rússia, contribuem para um pobre
desenvolvimento da semente, porém esse fato pode
estimular a poliembrionia (SIMAK, 1973). O pobre
desenvolvimento está correlacionado tanto com a baixa
temperatura quanto com uma estação curta de
crescimento. As temperaturas baixíssimas estão
relacionadas de forma positiva com o fenômeno da
poliembronia. Os últimos estádios do desenvolvimento
são inibidos de modo que apenas um embrião consiga se
estabelecer. A falta de dominância entre os múltiplos
embriões foi considerada uma semelhança de
comportamento em relação ao ápice terminal e aos brotos
laterais nas árvores. Se o broto do meristema apical perde
a dominância, uma competição é desenvolvida em nível
de brotos colaterais para estabelecer uma nova liderança.
Na floresta natural, onde predomina o fenômeno da
autopolinização e sua respectiva carga genética, os genes
letais ou semiletais podem eliminar completamente
indivíduos originados por esse fenômeno. Sementes
vazias ou embriões imaturos são frequentemente
encontrados, assim sendo a poliembrionia pode
contrabalançar a excessiva perda por autofecundação.
Ademais, se algum embrião no óvulo, que se origina por
autofecundação, morrer por incompatibilidade, a semente
ainda tem o recurso de desenvolver algum outro embrião
por conceito de fertilização cruzada. Porém, esse
fenômeno é pouco frequente (HAGMAN, 1975).
Embriões haploides algumas vezes também podem ser
encontrados em sementes poliembriônicas (ILLIES, 1964;
SIMAK et al., 1968). Nesse caso, genes letais recessivos
são diretamente expressos no haploide; no entanto, os
embriões não sobrevivem. No material sobrevivente
remanescente haploide, a duplicação de cromossomos via
colchicina poderia oferecer embriões diploides, os quais
seriam depurados dos fatores letais.
Os diferentes genótipos também podem variar na sua
habilidade de liberar etileno em cultura (JOKINEN;
DURZAN, 1994). Altos níveis de etileno podem facilmente
afetar de forma negativa outras células genotípicas com
bom potencial morfogenético, caso elas se encontrem nas
mesmas condições de cultura daquelas células de alta
produção de etileno, a menos que a produção de etileno
seja removida por algum meio.
Desafios futuros
Não se pode negar o tremendo impacto da cultura de
tecidos, bem como da embriogênese somática no campo
da agricultura e nos empreendimentos florestais.
Contudo, restam problemas biológicos subjacentes que
precisam ser esclarecidos, de modo que seja possível
controlar e manipular com mais precisão o processo
embriogenético, com o objetivo de melhorar a
mecanização e a automatização para que se obtenha uma
participação no mercado mais eficiente e competitiva. É
evidente que isso será alcançado com o maior progresso
das ciências básicas e das condições in vitro, nas quais os
sistemas clonais mais robustos e flexíveis sejam
desenhados dentro do âmbito do melhoramento florestal
de coníferas com vistas na adaptação a diferentes
ambientes.
Referências
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CAPÍTULO 6
Biorreatores para
produção de mudas em
larga escala
João Batista Teixeira
L. Pedro Barrueto Cid
Características do equipamento
características básicas são as seguintes:
Descrição do equipamento
Figura 1. Biorreator de imersão temporária desenvolvido pela
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, composto de cinco
prateleiras com oito pares de frascos cada. (A) Kit de biorreator com
40 pares de frascos; (B) Frasco de meio (esquerda) e frasco de cultivo
(direita); (C) Compressor de ar, filtros, válvulas solenoides e
temporizadores.
Fotos: João Batista Teixeira
Funcionamento do equipamento
O ar do tanque do compressor entra no sistema, passando
inicialmente pelo filtro de ar seco, para remover óleo e
partículas sólidas por meio da válvula solenoide
comandada pela programação do temporizador. O ar, em
seguida, passa pelo frasco de borbulhamento, que contém
água deionizada, para uma segunda filtragem e
umidificação do ar. Depois disso, o ar entra na
canalização, passa pelo filtro de esterilização e faz
pressão no interior dos frascos de meio de cultura. Com
isso, o meio é pressionado a passar para os frascos de
cultivo, o que resulta na imersão do material e na
renovação do ar no interior dos frascos. Após alguns
minutos, há inversão do fluxo de ar, e a pressão é
exercida nos frascos de cultivo. Com isso, o meio de
cultura retorna ao frasco de meio, completando o ciclo.
Depois de determinado intervalo de tempo
preestabelecido pela programação dos temporizadores, o
ciclo recomeça. Normalmente, o tempo de imersão é de
alguns minutos, o que é suficiente para a transferência
total do meio para o frasco de cultivo. Por sua vez, o
intervalo entre os períodos de imersão varia de 2 a 6
horas, dependendo da espécie e do material que está
sendo cultivado. O equipamento aqui descrito, além de
funcionar no sistema de imersão temporária, pode ser
adaptado para funcionar sob regime de imersão contínua.
O período de borbulhamento sob regime de imersão
contínua pode ser programado de acordo com a
necessidade do explante em cultivo.
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Conservação em campo
Em virtude das razões mencionadas anteriormente, o método de
conservação ex situ em condições de campo tem sido tradicionalmente o
mais utilizado e preferido para as espécies de propagação vegetativa.
Todavia, essa forma de conservação apresenta inconvenientes que
limitam sua eficácia e ameaçam a segurança e a estabilidade dos
recursos genéticos conservados (RAZDAN, 2003; WITHERS; ENGELMANN,
1998). Entre as desvantagens comumente reportadas estão as perdas
ocasionadas por pragas, condições ambientais adversas, erro humano e
vandalismo. Soma-se a essas o fato de os bancos de germoplasma em
condições de campo apresentarem altos custos de manutenção. Também
não se pode esquecer de possíveis perdas de acessos conservados no
caso de limitações ou cortes orçamentários. Além disso, esse tipo de
conservação requer consideráveis áreas de terra, mão de obra e manejo
(PANIS; LAMBARDI, 2006). Concomitantemente, existem também os
problemas relacionados às etapas de coleta e ao intercâmbio dos
recursos genéticos, uma vez que, para culturas propagadas
assexuadamente, o material utilizado constitui-se geralmente de partes
vegetativas que nem sempre sobrevivem quando excisadas da planta
mãe (matriz), além de apresentarem o potencial de disseminar pragas e
doenças, que são limitações importantes para o intercâmbio de
germoplasma (WITHERS; ENGELMANN, 1998).
Técnicas clássicas
Tempo Tempe‐
Explante de ratura Outras
Espécie Referência
utilizado conser‐ condições
vação (oC)
Brotos
MS 50% sais + BAP
apicais e
12 a 18 (0,89 µM) + ABA (5 Negri et al.
Maçã segmentos 4
meses µM), em ambiente (2000)
nodais
escuro
simples
20 e 10
Menta (Mentha
Explantes (por três
spp.)(diploides, MS sem reguladores Islam et al.
nodais e 6 meses semanas) e
tetraploides e de crescimento (2003)
apicais 2 (por seis
octaploides)
meses)
MS ½ + sacarose Divakaran
Orquídea 360
Brotos 2 (15 g L-1) + manitol et al.
(Vanilla spp.) dias
(15 g L-1) (2006)
MS + sacarose (60 g
Segmentos L-1) + manitol (20 g Gonçalves
Drosophyllum
com dois 8 meses 5 L-1) + zeatina (0,91 e Romano
lusitanicum
nós µM), em ambiente (2007)
escuro
(1) Outros acessos necessitam de transferências para meio de cultura fresco a cada 60 dias, o que
mostra a grande variabilidade entre os acessos testados (400). Os autores verificaram ainda que
bananas selvagens diploides são mais difíceis de serem conservadas por longo período, em prejuízo
de bananas comestíveis triploides e tetraploides.
Utilização de substâncias reguladoras de crescimento (ABA,
ancimidol, ácido acetil salicílico, etc.) e de reguladores
osmóticos (manitol, sorbitol, sacarose, etc.)
Técnicas alternativas
Algumas técnicas constituem alternativas para os métodos de
criopreservação e de armazenamento a frio. Entre elas, incluem-se as
alterações na atmosfera de cultivo (proporção dos gases O2 e CO2),
conseguidas por meio da redução na quantidade de O2 disponível. Essa
redução é obtida pelo recobrimento do material propagativo com óleo de
querosene, óleo mineral ou meio líquido, ou, ainda, pelo uso de
atmosfera modificada. O sucesso no uso desses métodos depende do
tipo de material e da espécie vegetal. Além disso, há relatos de sua
eficiência na redução do crescimento de pera (Pyrus communis), café
(Coffea sp.) e genótipos de gengibre (Zingiber officinale), embora
problemas como a hiper-hidratação e baixas taxas de restabelecimento e
sobrevivência dos explantes também tenham sido relatadas em alguns
casos (WITHERS; ENGELMANN, 1998).
Acrescenta-se ainda que, no sistema em que a pressão atmosférica que
circunda os tecidos cultivados é reduzida, tem-se a vantagem da redução
da atividade microbiana (RAZDAN, 2003). Ademais, a conservação em
médio prazo, utilizando-se pouco oxigênio à temperatura ambiente, pode
ser interessante para espécies tropicais, as quais são sensíveis ao frio,
embora os resultados estejam ainda em âmbito experimental (WITHERS;
ENGELMANN, 1998).
Tempo
Tempe‐
Explante de Refe‐
Espécie ratura Sobrevivência/Conversão
utilizado conser‐ rência
(oC)
vação
Bonnier
Lilium 25
28 e Van
longiflorum e Bulbinhos Satisfatória
L. henryi
meses ºC(1) Tuyl
(1997)
25 Naidu e
Embriões 24
Café 70% Sreenath
zigóticos meses ºC(2) (1999)
Batata
25 ºC ± Fortes e
(Solanum Microestacas
9 meses 76% Pereira
tuberosum L., de batata 2 ºC(3) (2001)
cv. Macaca)
Curcuma 25 °C ± Tyagi et
Ápices 12
longa cv. 56% a 50% al.
Prathibha
caulinares meses 2 °C(4) (2007)
(1) Material cultivado em meio MS ¼, adicionado de sacarose (90 g L-1), 16 h de luz (10 µmol m-2 s-
1 a 20 µmol m-2 s-1).
(2) Material cultivado em meio MS, suplementado de ABA filtrado (18,9 µM), mantido no escuro.
(3) Material cultivado em meio MS, suplementado com sacarose (87,6 mM) e AAS (0 mg L-1 a 120
mg L-1), mantido a 16 h de luz.
(4) Material cultivado em meio MS, acrescido de BAP (2,5 mg L-1), açúcar comercial ou em cubos,
Tempo Tempe‐
Explante de ratura Refe‐
Espécie Sobrevivência/Conversão
utilizado conser‐ rência
vação (oC)
Cedro Maruyama
Ápices 12
(Cedrela 12 80% et al.
caulinares meses
dorata) (1997)
Maruyama
Guazuma Ápices 12
25 90% et al.
crinita caulinares meses
(1997)
Maruyama
Jacaranda Ápices
6 meses 20 70% et al.
mimosaefolia caulinares
(1997)
Orquídea
[Geodorum
4e6 Datta et al.
densiflorum Protocormos 4 86% e 71,6%
meses (1999)
(Lam)
Schltr.]
Morangueiro Lisek e
Ápices
e 9 meses 4 ≤ 60% Orlikowska
caulinares
framboeseira (2004)
Cedrela
Ápices Nunes et
fissilis 6 meses 25 44%
caulinares al. (2003)
Vellozo
Batata
(Solanum Ápices 360 Nyende et
tuberosum 4 51% a 71%
caulinares dias al. (2003)
L.)(1)
Malabadi e
Embriões
Pinus patula 3 meses 4 73% Staden
somáticos
(2005)
Divakaran
Orquídea Brotos e 10
22 Satisfatório et al.
(Vanilla spp.) protocormos meses
(2006)
Kavyashree
Gemas 1a4
Amoreira 4 46,5% a 40,2% et al.
axilares meses
(2006)
Tempo Tempe‐
Explante de ratura Refe‐
Espécie Sobrevivência/Conversão
utilizado conser‐ rência
vação (oC)
(1) Esses autores utilizaram o sistema conhecido por dupla camada (hollow beads), o qual será
descrito posteriormente (PATEL et al., 2000).
Criopreservação
Historicamente, apesar de a técnica de criopreservação ser
relativamente antiga e bem estudada na área microbiológica e ani-mal,
os estudos com vegetais superiores têm sido conduzidos apenas durante
os últimos 40 anos, e duas principais linhas de pesquisa são seguidas: a)
o melhor entendimento dos processos fisiológicos e bioquímicos
envolvidos no processo de congelamento; b) a conservação de material
vegetal sob condições viáveis (WITHERS; ENGELMANN, 1998). No caso
específico da conservação in vitro, o rápido desenvolvimento nas últimas
décadas, de novas tecnologias de criopreservação tem permitido que se
ampliem em longo prazo as possibilidades de armazenamento de
espécies cultivadas, florestais e daquelas em risco de extinção (PANIS;
LAMBARDI, 2006).
Em princípio, a criopreservação é um método baseado na manutenção do
metabolismo do material vegetal (explantes) sob condições de ausência
de divisão celular ou de metabolismo zero. Para isso, os explantes são
submetidos a temperaturas ultrabaixas (temperatura do nitrogênio ou
NL: -196 °C ou -150 °C), na presença ou ausência de substâncias
crioprotetoras. Tanto a temperatura do NL quanto a energia cinética
molecular e a difusão são extremamente baixas e, assim, todas as
divisões celulares e os processos metabólicos ocorrem muito lentamente
ou são totalmente paralisados, o que permite a conservação por um
período de tempo teoricamente ilimitado. Desse modo, a variabilidade
genética e a deterioração do material armazenado são teoricamente
inexistentes. Aliado a esses aspectos, o armazenamento em um banco
criogênico custa mais barato que outros sistemas disponíveis, o que se
deve ao fato do material criopreservado necessitar de pequeno volume,
permitir a manutenção da sanidade do germoplasma preservado e
requerer um mínimo de manutenção (ENGELMANN, 2004; SANTOS,
2004).
Nesse contexto, embora os estudos sobre os custos da criopreservação
sejam ainda incipientes, estimativas têm confirmado vantagens
financeiras quando se usa a criopreservação para a conservação de
germoplasma. Por exemplo, os custos de manutenção anual de um
acesso de fruteira temperada são de US$ 77,00 no campo, US$ 23,00 sob
condições de crescimento lento in vitro e somente US$ 1,00 quando se
utiliza a criopreservação. Já os custos anuais para conservar coleções de
mandioca no Ciat (International Center for Tropical Agriculture, Cali,
Colômbia), que inclui 5 mil acessos, chegam a cerca de US$ 5 mil sob
criopreservação, ao passo que sob crescimento lento in vitro chegam a
US$ 30 mil (ENGELMANN, 2004).
Além de sua capacidade de permitir o armazenamento de tecidos de
maneira indefinida, com baixos riscos ao material conservado (RAZDAN,
2003), outra vantagem da criopreservação é a preservação, por
prolongado período, de tecidos com características específicas, como
linhagens de células medicinais e produtoras de alcaloides, cultura de
pelos radiculares, tecidos geneticamente transformados e linhagens
competentes a transformação (PANIS; LAMBARDI, 2006). Todavia, a
criopreservação não é aplicável apenas à conservação de germoplasma.
Ela pode ser também utilizada para os seguintes procedimentos:
erradicação de vírus, fato demonstrado para as culturas da ameixeira, da
bananeira e da videira (BRISON et al., 1997; HELLIOT et al., 2002; PANIS;
LAMBARDI, 2006); criosseleção (seleção de amostras com propriedades
especiais na população congelada); propagação de espécies em larga
escala, baseada no processo de embriogênese somática, como no caso
das coníferas, além da manutenção da juvenilidade de tecidos vegetais
(ENGELMANN, 2004).
Desde 1975, o progresso obtido com essa tecnologia na área vegetal tem
possibilitado a regeneração de plantas completas a partir de células, de
meristemas e de embriões congelados e armazenados por longos
períodos de tempo, quase indefinidos. Atualmente, a criopreservação
tem sido utilizada com sucesso na conservação de germoplasma de um
amplo número de culturas comercialmente importantes, como a
mandioca (Manihot esculenta), a ervilha, o arroz, o coco, a cana-de-
açúcar, a banana e o morango, além de outras espécies de uso
medicinal, que se encontram ameaçadas de extinção (RAZDAN, 2003).
Ademais, para espécies que possuem sementes recalcitrantes, tem-se
observado menor avanço na pesquisa, possivelmente por causa do alto
número de espécies, principalmente das selvagens, cada qual com
características distintas, além do limitado nível de atividades de pesquisa
envolvendo a conservação dessas espécies (ENGELMANN, 2004).
Sem dúvida, a criopreservação é atualmente a técnica de conservação in
vitro que mais tem sido estudada. O aprimoramento de tecnologias
voltadas para essa técnica tem promovido tanto a diversificação de seus
métodos quanto a ampliação de seus usos (WITHERS; ENGELMANN,
1998). Tal fato deve-se muito provavelmente aos significativos
progressos que têm sido realizados na área nos últimos 15 anos, com o
desenvolvimento de procedimentos baseados no fenômeno da
vitrificação (ENGELMANN, 2004). No entanto, embora existam vários
procedimentos criogênicos para um crescente número de espécies
produtoras de sementes recalcitrantes e de órgãos/tecidos in vitro, o
emprego rotineiro da criopreservação na biodiversidade vegetal é ainda
considerado limitado (PANIS; LAMBARDI, 2006).
De modo geral, materiais como sementes ortodoxas ou brotos dormentes
podem ser criopreservados sem qualquer pré-tratamento, o que é
atribuído ao processo natural de desidratação desses materiais. Porém, a
maior parte dos explantes criopreservados (suspensão de células, de
calos, de ápices caulinares e de embriões) é constituída de altas
quantidades de água celular livre, o que os torna mais sensíveis a danos
durante o congelamento. Por essa razão, as células necessitam sofrer
desidratação artificial para protegerem-se dos danos ocasionados pela
cristalização da água intracelular em gelo, o que pode ser conseguido
pelo uso de protocolos de criopreservação clássicos e por aqueles
baseados na vitrificação, este último muitas vezes mais eficiente (MIAJA
et al., 2000). Na Tabela 4, citam-se alguns exemplos do uso da
criopreservação em larga escala para diferentes tipos de materiais,
tolerantes ou não a desidratação (ENGELMANN, 2004).
Tropical Agricultural
Espécies produtoras de sementes Sementes de 80 acessos de Research and Higher
intermediárias Coffea arabica Education Center (Catie,
Costa Rica)
Fonte: Adaptado de Malaurie (2001), Panis e Lambardi (2006) e Keller et al. (2006).
Quanto aos fatores que determinam o sucesso da criopreservação, cita-
se a proteção dos explantes contra injúrias durante o congelamento, as
quais podem ocorrer em virtude da formação de cristais de gelo dentro
das células que causam o rompimento das organelas e da própria célula
(lise celular). Nesse sentido, o estado da água e o equilíbrio osmótico
relacionado aos movimentos da água dentro e fora das células são
parâmetros de particular importância para a criopreservação, uma vez
que a água removida possui papel vital na prevenção da injúria pelo
congelamento e na manutenção da viabilidade pós-descongelamento,
essencial para o restabelecimento e para o crescimento do material
criopreservado. Outra fonte potencial de dano às células está relacionada
ao incremento na concentração de solutos intracelulares em níveis
tóxicos, ou a perdas de solutos vitais durante o congelamento
(GONZALEZ-ARNAO et al., 2008; RAZDAN, 2003).
Tipo de
Considerações gerais sobre o método
congelamento
Inicialmente relatado para células vegetais por Uragami et al. (1989) e Langis
et al. (1989), tem sido o método escolhido em larga escala para conservar
tecidos vegetais por longos períodos (HELLIOT et al., 2002). A técnica é
baseada no fenômeno de vitrificação, que se caracteriza por um processo
Vitrificação
físico definido como a transição da água diretamente da fase líquida para
uma fase sólida amorfa (solução supersaturada e de alta viscosidade), obtido
normalmente pela exposição a soluções crioprotetoras altamente
concentradas, em que não há formação de gelo cristalino no congelamento
c) Descongelamento
Consiste na imersão dos materiais criopreservados em água, à
temperatura de 37 ºC a 40 ºC, que corresponde a um rápido
descongelamento (de 500 ºC min-1 a 750 ºC min-1). Dessa maneira, as
células são protegidas dos efeitos danosos decorrentes da formação de
cristais de gelo, o que enfatiza a necessidade de se reduzir o conteúdo de
água das células a um nível ótimo antes do congelamento.
d) Restabelecimento
Esta fase – considerada chave para o sucesso de qualquer protocolo de
criopreservação – consiste em submeter o material descongelado ao
restabelecimento do crescimento sob condições padrões. Isso porque
todo material criopreservado deve necessariamente ser capaz de
restabelecer seu padrão de crescimento e, com isso, ser utilizado para os
devidos fins, caso contrário todo o material será perdido. Para tal, os
materiais descongelados são lavados, normalmente por várias vezes5,
para remoção das substâncias crioprotetoras utilizadas, as quais podem
provocar injúria às células. Em seguida, os materiais são restabelecidos
em meio de cultura fresco, o qual pode conter ou não substâncias
reguladoras de crescimento, composição nutricional diferenciada, entre
outras modificações, o que vai depender do material criopreservado
(meristemas, plantas organizadas, calos, etc.).
e) Determinação da viabilidade
Após a criopreservação, é também importante que o material possua a
capacidade de ser utilizado. Para isso, sua viabilidade pode ser
rapidamente avaliada logo após a fase de descongelamento. Com esse
intuito, algumas técnicas podem ser utilizadas, tais como: submissão do
material criopreservado a testes de coloração com Fluorescein Diacetate
(FDA) ou cloreto de 2,3,5-trifeniltetrazolium (TTC) (RAZDAN, 2003);
observações morfológicas sob microscópio de luz (expansão e
esverdeamento de primórdios foliares, por exemplo) (MIAJA et al., 2000);
observações em microscópio eletrônico, além de observações de fatores
associados a estabilidade genética, os quais serão abordados
posteriormente.
Protocolos de criopreservação
De modo geral, atualmente existem dois tipos de protocolos que são
considerados para criopreservação: os convencionais ou clássicos, e
aqueles baseados no processo de vitrificação, os quais diferem em seus
mecanismos físicos.
Técnica de Tempo de
Espécie Explante Referência
criopreservação armazenamento
Batata-doce
Pennycooke
[Ipomoea
Droplet vitrification – e Towill
batatas (L.) (2000)
Lam.]
‘Troyer’
citrange
[Poncirus Apenas imersão
Encapsulamento- Ápices Wang et al.
trifoliata (L.) em NL por
vitrificação caulinares (2002)
Raf. × Citrus algumas horas
sinensis (L.)
Osbeck.]
Batata-doce
Hirai e
[Ipomoea Encapsulamento-
– Sakai
batatas (L.) vitrificação
(2003)
Lam.]
Crisâtemo
(Dendranthema Ápices Halmagyi et
Várias –
grandiflora caulinares al. (2004)
Ramat.)
Encapsulamento-
Framboesa
vitrificação e Ápices Wang et al.
(Rubus idaeus –
encapsulamento- caulinares (2005b)
L.)
desidratação
Dendê Elaeis Imersão rápida Sementes 7 dias Camillo et
guineensis al. (2009)
Orquídea Vendrame
(Híbridos de Vitrificação Sementes – et al.
Dendrobium) (2007)
Colocasia
Ápices Sant et al.
esculenta var. Droplet vitrification –
caulinares (2008)
esculenta
Estudos fisiológicos
Como citado anteriormente, estudos estruturais e fisiológicos podem ser
realizados a partir de observações de microscopia de luz e de
microscopia eletrônica, incluindo aqui a varredura e a transmissão,
conforme relatado nos trabalhos de Wang et al. (1998), de Helliot et al.
(2003) e de Wilkinson et al. (2003). Por sua vez, aspectos do estado
fisiológico dos materiais têm sido estudados basicamente por meio de
exames visuais, com o intuito de verificar a hiper-hidratação, a
vitrificação e a flacidez. Estes dois últimos são frequentemente
verificados em microplantas de batata conservadas por longos períodos
sob restrição de crescimento utilizando estresses osmóticos (SARKAR et
al., 1999).
Estabilidade genética
De modo semelhante ao que é exigido para a propagação clonal, a
conservação de recursos genéticos vegetais in vitro deve permitir que a
espécie em questão seja mantida. Além disso, deve possibilitar que sua
regeneração apresente fidelidade genotípica, o que é de especial
importância no caso de espécies raras e em extinção, cujo tamanho da
população pode ser extremamente baixo e nas quais qualquer perda
adicional de material por causa da degradação genética pode ser
inaceitável e danosa (WITHERS; ENGELMANN, 1998; WILKINSON et al.,
2003). Todavia, poucos trabalhos com conservação in vitro abrangem os
aspectos relacionados à fidelidade genética do material preservado
(PANIS; LAMBARDI, 2006).
Dessa forma, a escolha do método de conservação a ser utilizado deve
considerar a ocorrência de variação somaclonal, que pode estar
associada também à natureza do material vegetal e às substâncias
empregadas (WITHERS; ENGELMANN, 1998). Com esse intuito, os
pesquisadores têm utilizado várias técnicas, entre as quais se incluem: 1)
marcadores morfológicos e características agronômicas; 2) marcadores
citológicos incluindo descrição do cariótipo em nível cromossomal; 3)
marcadores bioquímicos, incluindo análises de isoenzimas, eletroforese
de proteína e produtos secundários; 4) marcadores de DNA (SARKAR et
al., 2001; TYAGI et al., 2007; URBANOVÁ et al., 2002; WILKINSON et al.,
2003). Este último tem como vantagem o fato de toda variação
genotípica ter um efeito permanente e herdável sobre a espécie; ao
contrário das variações fenotípicas, que podem ser reversíveis de acordo
com as repostas ao estresse. Ademais, ressalta-se o fato de que a
importância da estabilidade genética não pode ser subestimada e,
quando possível, uma combinação de técnicas podem assegurar os
resultados obtidos (WILKINSON et al., 2003).
Algumas das ameaças à estabilidade genética podem surgir de reações
particulares (formação de radicais livres e danos moleculares por causa
da radiação ionizante), as quais podem ocorrer, por exemplo, à
temperatura de -196 °C (GROUT, 1990 citado por PANIS; LAMBARDI,
2006), ou mesmo em decorrência do uso de determinados crioprotetores,
como o DMSO em determinadas concentrações (PANIS; LAMBARDI,
2006).
Nesse contexto, Harding (1994) observou a hipermetilação de DNA em
microplantas de batata mantidas por longos períodos e submetidas a
estresses osmóticos pelo uso de manitol, resultante provavelmente de
uma resposta adaptativa das células. Por sua vez, Sarkar et al. (2001), ao
avaliarem os efeitos do ancimidol na conservação de microestacas de
batata por meio de marcadores RAPD (Random Amplified Polymorphic
DNA), não constataram nenhuma instabilidade genética detectável após
16 meses de armazenamento. Já Wilkinson et al. (2003), ao utilizarem
AFLP (Amplified Fragment Length Polymorphism), não observaram
variações genéticas de C. atrosanguineus armazenados em NL por 12
meses. Nesse mesmo contexto, brotos de espécies de Vanilla, cultivados
em meio MS ½ suplementado com sacarose (15 g L-1) e com manitol (15
g L-1), e mantidos a 2 ºC por mais de sete anos com subcultivos anuais,
não mostraram qualquer variação no DNA, quando avaliados por
marcadores moleculares (DIVAKARAN et al., 2006).
Santos (2004) relata ainda que, pelo fato de embriões zigóticos serem
sistemas altamente organizados, e por conterem tecidos meristemáticos
e produzirem de forma direta plantas completas, sua utilização implica
em um menor risco de variação somaclonal. Por isso, podem ser
utilizados com sucesso para criopreservar germoplasma de muitas
espécies que apresentam sementes recalcitrantes ou intermediárias.
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CAPÍTULO 8
De uma maneira geral, o diagnóstico molecular tem como base moléculas que podem
ser proteínas ou sequências gênicas específicas. Essas moléculas são caracterizadas,
estudadas e analisadas previamente, de forma que possam ser correlacionadas com
situações fisiológicas específicas constituindo um biomarcador. Muitas são as
metodologias utilizadas para distinguir um possível biomarcador. Por exemplo, pode-se
citar a eletroforese em duas dimensões: a reação de polimerase em cadeia do DNA (PCR)
e as várias ferramentas da engenharia genética.
Com um determinado biomarcador, pode-se realizar um diagnóstico molecular. Esse
diagnóstico pode também ter como base diversas técnicas, tais como: a PCR; a
eletroforese em uma ou em duas dimensões; o Western blot; o ensaio enzimático do tipo
Enzyme-Linked Immunosorbent Assay (ELISA), que utiliza anticorpos específicos ou não;
os marcadores moleculares do tipo Random Amplified Polymorphic DNA (RAPD); os
Simple Sequence Repeats (SSR); o Reverse Transcription PCR (RT-PCR); o Real Time
quantitative PCR (RTqPCR); os microarranjos de DNA; entre outros.
Os diagnósticos moleculares de biomarcadores previamente selecionados utilizam
metodologias que devem identificá-los de maneira que possam ser aplicadas quatro
principais exigências: a sensibilidade, a reprodutibilidade, a especificidade e a distin‐
guibilidade.
Neste capítulo, será dada ênfase a dois aspectos particulares do diagnóstico molecular
utilizado na cultura de tecidos vegetais: a variação somaclonal e a detecção de plantas
transgênicas.
Variação somaclonal
A variação somaclonal é um fenômeno que ocorre frequentemente na cultura de tecidos
vegetais. Constitui uma alteração genética com relação ao material inicial. Em geral, é
uma variação não desejável para quem trabalha com o objetivo de, por exemplo,
micropropagar plantas em larga escala ou produzir plantas transgênicas que devem ser
distintas apenas em um aspecto genético em relação à planta-mãe. As variações
somaclonais podem ser de dois tipos: genética e não genética (epigenética) (JORDAN,
2005; LÓPEZ et al., 2004). Para mais detalhes, ver o capítulo 2 deste livro.
Primeiramente, é necessário esclarecer que a variação somaclonal pode ser identifcada
por meio de marcadores fenotípicos e moleculares. Variações epigenéticas são, hoje,
mais bem observadas por caracteres fenotípicos, enquanto as variações em nível
genético podem ser observadas facilmente por ferramentas como: RAPD, Inter Sequence
Simple Repeats (ISSR), SSR e Amplified Fragment Length Polymorphism (AFLP).
Os marcadores moleculares mais usuais na identificação de variações somaclonais
genéticas são: RAPD, ISSR e SSR (GUO et al., 2006; MARTINS et al., 2004). Esses
marcadores representam uma cobertura total do genoma da planta, por isso podem mais
facilmente identificar nele pequenas alterações. No caso desses marcadores
moleculares, não é necessária a caracterização de um biomarcador específico, pois são
observadas alterações diretas no genoma da planta que podem ser facilmente
detectadas por meio da amplificação diferencial de bandas (fingerprinting). Os
marcadores RAPD e SSR são duas ferramentas que estão baseadas na técnica de PCR
(ROCHA C., 2005).
A PCR é uma técnica com a qual se pode amplificar em progressão geométrica
fragmentos de DNA, específicos ou não (Figura 2). De uma maneira geral, esse processo
ocorre em três fases distintas que se repetem em ciclos de número e de tempo variáveis.
A primeira fase é chamada de etapa de desnaturação do DNA, a segunda é chamada de
etapa de anelamento do oligonucleotídeo iniciador (primer) e a terceira é chamada de
etapa de polimerização das novas cadeias do DNA. Com respeito às técnicas de
marcadores moleculares que utilizam a PCR e são utilizadas para o diagnóstico de
variações somaclonais, pode-se dizer que uma das principais diferenças é o fato de que,
em RAPD ou ISSR, utiliza-se um único primer de sequência não especificada, enquanto os
SSR utilizam dois primers específicos, caracterizados previamente para a espécie
estudada. Além disso, os SSR são considerados marcadores codominantes, isto é,
reconhecem a presença de alelos dominantes e recessivos. Esse fato permite reconhecer
variações genéticas do tipo mutagênese nos diferentes alelos. Os marcadores RAPD ou
ISSR não possuem essa característica por serem considerados dominantes, ou seja,
apenas reconhecem alelos de caráter dominante (LÓPEZ et al., 2004).
As principais técnicas diagnósticas que podem ser utilizadas com plantas transgênicas
são: Southern blot, PCR, Western blot e ELISA. Porém, a mais utilizada, pela sua
praticidade, é a PCR. As demais são utilizadas na pesquisa científica relacionada.
O Southern blot tem como base a técnica de eletroforese de DNA em gel de agarose. Os
fragmentos de DNA separados nesse gel são transferidos para uma membrana de nylon
e fixados nela. Posteriormente, ocorre hibridização com uma sequência específica que
pode ser marcada, por exemplo, com radioatividade, quimioluminescência ou
fluorescência (Figura 4) (SAMBROOK et al., 1989). Essa é uma técnica que oferece boa
reprodutibilidade, distinguibilidade e especificidade. Ademais, sua sensibilidade aumenta
com a utilização da fluorescência. Essa técnica necessita mais expertise do operador e
sua realização envolve mais etapas de trabalho. Por isso, é mais lenta do que o PCR.
Figura 4. Esquema geral de uma análise em Southern blot.
Ilustração: Maria Cristina Rocha Cordeiro.
Tanto o Western blot quanto o ELISA são técnicas muito específicas, distinguíveis,
sensíveis e reprodutíveis. Porém, são técnicas que requerem grande expertise por parte
do operador, além de requerer a produção de anticorpos primários específicos
(monoclonais). Mesmo no caso da possível utilização de anticorpos primários não
específicos (policlonais), sua produção, embora mais fácil, ainda é necessária. Por causa
deste último aspecto, tanto o custo quanto o tempo de obtenção de resultados
aumentam bastante quando comparados à técnica de PCR. A Tabela 1 apresenta um
resumo das principais características, vantagens e desvantagens das técnicas
diagnósticas.
Tempo
para
Metodologia Sensibilidade Distinguibilidade Reprodutibilidade Especificidade Custo obtençã
de
resultado
Microarranjos
+++++++ +++ +++ +++ +++++ ++
de DNA
Todas essas metodologias são muito sensíveis. A escolha entre uma ou outra depende do
custo, da expertise e da velocidade com que se deseja obter resultados.
As metodologias empregadas para o diagnóstico molecular de plantas transgênicas
descrito acima também podem ser utilizadas para o diagnóstico de outros organismos
geneticamente modificados (OGMs), como animais e microrganismos transgênicos.
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CAPÍTULO 9
Introdução de genes em
células vegetais mediada
pelo processo biobalístico
Francisco J. L. Aragão
Ana Cristina Miranda Brasileiro
O processo biobalístico
O processo biobalístico (do inglês biolistic), também
conhecido por aceleração de partículas ou
bombardeamento de partículas, foi desenvolvido
inicialmente por J. Sanford, N. Allen, T. Klein e E. Wolf, da
Cornell University, (EUA) (SANFORD, 2000; SANFORD et
al., 1987, 1993), como uma alternativa para introdução
direta de material genético no genoma nuclear de plantas
superiores. Desde então, sua universalidade de aplicações
tem sido avaliada, demonstrando ser um processo efetivo
e simples para a introdução e a expressão de genes em
bactérias, protozoários, fungos, algas, insetos, tecidos
vegetais e animais, além de organelas isoladas, como
cloroplastos e mitocôndrias (ARAGÃO et al., 1992, 1993;
BAILEY et al., 1993; BARRETO et al., 1997; BOGO et al.,
1996; BOYNTON et al., 1988; DANIELL et al., 1991;
HARRIER; MILLAM, 2001; JOHNSTON et al., 1988; KLEIN;
FITZPATRICK-MCELLIGOTT 1993; RECH et al., 1996;
SANFORD, 2000; SANFORD et al., 1993; VAINSTEIN et al.,
1994).
O método consiste na aceleração de partículas com 0,2
µm a 3 µm de diâmetro, que atravessam a parede celular
e a membrana plasmática, de forma não letal, carreando
substâncias adsorvidas para o interior da célula (KLEIN et
al., 1987; SANFORD, 1988). Embora moléculas de DNA,
RNA ou proteínas possam ser carreadas, o processo
biobalístico tem sido mais empregado para introduzir
moléculas de DNA (nas formas circular ou linear) no
citoplasma ou nas organelas, como o núcleo e o
cloroplasto. Várias modificações têm sido introduzidas, o
que aumenta a eficiência e possibilita a obtenção de
plantas transgênicas de diversas espécies, que até então
não haviam sido transformadas por meio de outras
metodologias (ARAGÃO et al., 1996, 2000; BIRCH;
FRANKS, 1991; CHRISTOU, 1995; LUTHRA et al., 1997;
RECH et al., 2008).
Os sistemas de transformação mediados por
Agrobacterium são eficientes e têm sido utilizados com
sucesso para um grande número de espécies. Entretanto,
para algumas espécies, em virtude dos sistemas de
cultura de tecidos existentes, não é possível ainda realizar
a transformação mediada por Agrobacterium. Nesses
casos, a técnica de biobalística, graças à sua
versatilidade, deve ser empregada, uma vez que pode
transformar diferentes tipos de tecidos e de células,
independentemente do genótipo. Além disso, trata-se de
uma técnica rápida, que envolve menos manipulação das
células em cultura, quando comparada a outros métodos.
Vários tipos de explantes e de células podem ser
utilizados para a transformação por biobalística, tais como
folhas, calos, caule, etc.
Para aumentar a eficiência de transformação, a
biobalística pode também ser utilizada juntamente com a
inoculação com Agrobacterium em tecidos bombardeados
cujos microferimentos ampliam a área de infecção
(BIDNEY et al., 1992; BRASILEIRO et al., 1996). Nesse
caso, ou o tecido pode ser bombardeado com partículas
nuas para, em seguida, ser submetido a uma cocultura
com Agrobacterium, ou as bactérias podem ser
previamente misturadas às partículas que, então, são
aceleradas.
A obtenção eficiente de plantas transgênicas de muitas
espécies economicamente importantes, incluindo
monocotiledôneas, dicotiledôneas e gimnospermas,
somente tem sido possível mediante o processo de
biobalística (ARAGÃO; CAMPOS, 2007; CHRISTOU, 1995;
JAEHNE et al., 1995). Plantas transgênicas de mais de 300
espécies já foram obtidas com a utilização dessa técnica.
A técnica de biobalística pode ainda ser aplicada ao
estudo da expressão gênica transiente, em que uma
sequência de DNA introduzida em uma célula pode vir a
ser transcrita, mesmo sem ser integrada ao genoma. A
maior intensidade da expressão gênica transiente é
geralmente observada no período de 24 a 72 horas após a
transferência, e não é praticamente detectada após uma
semana. A análise da expressão transiente foi, e ainda é,
bastante utilizada para otimização dos parâmetros
envolvidos no processo de bombardeamento. No entanto,
recentemente tem sido mais utilizada em estudos de
regulação gênica e para a avaliação de sequências
regulatórias (promotores). Nesses casos, constroem-se
genes quiméricos, como as sequências regulatórias
ligadas a genes marcadores (principalmente gus e gfp). As
construções são utilizadas para bombardeamento de tipos
celulares específicos. Para esse tipo de estudo, a
biobalística apresenta vantagens sobre as técnicas que
utilizam protoplastos (eletroporação ou transformação
mediada por polietileno glicol – PEG), uma vez que os
tipos celulares são transformados sem necessidade de
manipulações in vitro mais sofisticadas. A expressão
gênica pode ser analisada em células intactas e em
tecidos organizados, o que é essencial para o estudo de
promotores tecido-específicos. Além disso, a técnica de
biobalística é simples e mais rápida.
Sistemas
Diferentes sistemas capazes de acelerar micropartículas
cobertas com ácidos nucleicos, a velocidades superiores a
1.500 km h-1, têm sido desenvolvidos e construídos. Todos
eles baseiam-se na geração de uma onda de choque com
energia suficiente para deslocar uma membrana
carregadora que contém as micropartículas cobertas com
DNA (RECH et al., 1996, 2008) (Figuras 1 e 2). A onda de
choque pode ser gerada das seguintes formas: por meio
de uma explosão química (pólvora seca) (SANFORD et al.,
1987); por uma descarga de hélio a alta pressão (ARAGÃO
et al., 1996, 2000; SANFORD et al., 1991); pela vapo‐
rização de uma gota de água por meio da descarga
elétrica com alta voltagem e baixa capacitância
(CHRISTOU, 1993; McCABE et al., 1988, McCABE;
CHRISTOU, 1993), ou baixa voltagem a alta capacitância
(ARAGÃO et al., 1992, 1993; RECH et al., 1991); ou por
uma descarga de ar comprimido (MORIKAWA et al., 1989).
Outros sistemas não exigem a utilização de uma
membrana carreadora (ARAGÃO et al., 1995; FINER et al.,
1992; SAUTTER et al., 1991; TAKEUCHI et al., 1992; VAIN
et al., 1993) (Figuras 1 e 2). Os sistemas que utilizam alta
pressão de gás hélio e descarga elétrica têm demonstrado
que possuem um amplo espectro de utilização, além de
serem mais eficientes para a obtenção de altas
frequências de transformação.
Figura 1. Esquema do princípio básico dos principais sistemas
biobalísticos para transformação genética de plantas. Nesses
sistemas, as micropartículas (1), geralmente de ouro ou de
tungstênio, são recobertas pelo DNA que contém os genes a serem
inseridos. As partículas são aceleradas a velocidades supersônicas (2)
e penetram nas células vegetais de forma não destrutiva (3). Os
sistemas diferem basicamente na geração de energia para
movimentar as partículas e no suporte em que elas são depositadas,
que pode ser de quatro tipos: (A) gás hélio com alta pressão, com as
partículas depositadas sobre um suporte plástico (membrana
carreadora de kapton ou mylar); (B) descarga elétrica para
vaporização de uma gota de água, com as partículas depositadas
sobre um suporte plástico; (C) gás hélio com baixa pressão, com as
partículas presas por capilaridade (em suspensão em um meio
líquido) em uma tela de metal (PIG); (D) gás hélio com baixa pressão,
com as partículas depositadas (secas) no interior de um tubo fino de
plástico. Nos sistemas com gás hélio com alta pressão e com
descarga elétrica (A e B), a membrana carreadora fica retida em uma
tela, por meio da qual as partículas atravessam em direção às
células-alvo.
Ilustração: Francisco J. L. Aragão.
Figura 2. Equipamentos de biobalística desenvolvidos para
transformação genética de plantas. (A) equipamento elétrico; (B)
equipamento baseado em fluxo de hélio através de tubos plásticos;
(C) PIG (Finer´s gun); (D) equipamento de alta pressão de gás hélio
(Sanford´s gun); (E) equipamento com cartucho de pólvora; (F)
equipamento portátil (hand-held gun).
Fotos: Francisco J. L. Aragão.
As micropartículas
Micropartículas de distintas naturezas podem ser
empregadas como carreadoras de DNA, desde que não
degradem ou causem quebras em ácidos nucleicos,
tenham alta densidade, tamanho e formato adequados.
No início do desenvolvimento da tecnologia biobalística,
testaram-se micropartículas de vários materiais, tais como
metais com alta densidade, como platina e irídio, além de
vidro, de sílica e de outros. Os testes resultaram em baixa
frequência de transformação genética (SANFORD et al.,
1993). Recentemente, a prata tem sido utilizada em uma
técnica chamada de diolística (ROIZENBLATT et al., 2006).
Atualmente, os microprojéteis mais empregados como
microcarreadores têm sido partículas de ouro ou de
tungstênio, cujas principais características são: 1)
micropartículas de tungstênio têm formato irregular e
medem de 0,2 µm a 3,0 µm; são potencialmente tóxicas
para alguns tipos de células (ARMALEO et al., 1990;
RUSSELL et al., 1992) e sujeitas à oxidação rápida com
consequente efeito negativo sobre o DNA; seu custo é
bastante reduzido; 2) micropartículas de ouro são
biologicamente inertes e possuem formato esférico; seu
diâmetro mede de 1,0 µm a 7,5 µm; são mais uniformes
que as de tungstênio e têm um custo mais elevado. Além
disso, experimentos com células animais têm
demonstrado que partículas de ouro maiores são mais
adequadas (CHENG; JOHO, 1994; RECH et al., 1996).
Células desidratadas de Escherichia coli e de
Agrobacterium tumefaciens, funcionando como uma
forma natural de encapsulação de DNA, foram utilizadas
com sucesso no lugar das micropartículas cobertas de
DNA, para a transferência de genes em suspensão celular
de fumo e de milho (RASMUSSEN et al., 1994).
O tipo apropriado de micropartículas varia de acordo com
o tamanho das células a serem transformadas. Como
regra geral, demonstrada empiricamente, as
micropartículas devem possuir em torno de um décimo do
tamanho da célula-alvo. Portanto, para células de
microrganismos (células bacterianas e esporos fúngicos),
micropartículas com diâmetro em torno de 0,2 µm (M5,
Sylvania) são mais apropriadas. Para células de plantas,
partículas com diâmetro de 0,2 µm a 1,5 µm (M10,
Sylvania) são as mais indicadas. Mazus et al. (2000)
mostraram evidências de que partículas de tungstênio
podem interagir com plasmídios e causar quebras na
molécula de DNA gerando moléculas lineares. É
interessante notar que o tungstato de sódio, o óxido de
tungstênio IV e o cloreto de tungstênio VI não causaram
qualquer dano ao DNA. Além do mais, o fenômeno é
dependente de pH (MAZUS et al., 2000). Para células
animais, que apresentam maior tamanho, recomendam-se
partículas de ouro, pelo fato de não apresentarem toxidez.
As partículas de ouro (com diâmetro de 1 µm a 3 µm)
também podem ser utilizadas para determinados tipos de
células vegetais (ARAGÃO et al., 1993).
Diversas características relativas às micropartículas
influem na eficiência de transformação, pela interação
com o DNA ou com a célula. Dessa forma, estudos que
avaliam o efeito de diferentes tamanhos, formatos,
homogeneidade e tipo de material das partículas podem
contribuir para a otimização do processo de biobalística.
Recentemente, micropartículas com formato de rosca, em
forma de tubos e com cavidades, têm sido desenvolvidas
e podem ser bastante úteis.
Diversos protocolos de precipitação de DNA sobre as partí‐
culas têm sido descritos (SANFORD et al., 1993). O
método mais
utilizado, desenvolvido inicialmente por Klein et al. (1987),
emprega cloreto de cálcio e espermidina. As partículas
com o DNA adsorvido são lavadas e ressuspendidas em
etanol absoluto e distribuídas sobre a membrana
carreadora. O etanol evapora rapidamente, e as partículas
com o DNA permanecem secas sobre o macrocarreador.
Como o etanol absoluto e a espermidina são muito
higroscópicos, as partículas com o DNA tendem a
absorver umidade, formando agregados. Esses agregados
de micropartículas danificam as células quando as
atingem e resultam em baixa frequência de
transformação. O experimento de Smith et al. (1992)
mostrou claramente que a umidade relativa do ar no
momento da deposição das micropartículas na membrana
é um fator muito importante. Esse fator é tanto mais
importante quanto menor for o diâmetro das partículas
utilizadas e menor for a célula-alvo. Por sua vez, DNA em
excesso ou preparações impuras também causam a
aglomeração das partículas (ARAGÃO et al., 1993; KLEIN
et al., 1988). Variações nas metodologias de precipitação
de DNA sobre as micropartículas, bem como protocolos
alternativos, podem diminuir os problemas associados aos
métodos disponíveis, principalmente pela redução da
formação de agregados e na reprodutibilidade dos
experimentos.
Desenho de vetores
O processo biobalístico é bastante influenciado por
algumas das características dos vetores empregados, com
efeitos marcantes sobre a introdução e a integração dos
genes exógenos nas células. O DNA plasmidial pode ser
precipitado sobre micropartículas, acelerado e introduzido,
tanto na forma circular quanto na linear. O tamanho do
vetor, de per si, aparentemente não é um fator limitante
(LACORTE et al., 1997; SANFORD et al., 1993). Entretanto,
há uma limitação da massa de DNA que poderá ser
adsorvida pelas micropartículas, uma vez que, em
grandes quantidades, o DNA tende a gerar aglomerados
de micropartículas (ARAGÃO et al., 1993, LACORTE et al.,
1997). Teoricamente, 400 a 800 cópias de um plasmídio
de 10 kb são adsorvidas em uma micropartícula com 1,2
µm de diâmetro médio. Esses aglomerados causam danos
às células por causa de suas dimensões e de sua massa.
Demonstrou-se que o número de cópias dos genes
introduzidos é um fator importante para sua expressão
transiente (LACORTE et al., 1997). No entanto, a influência
sobre a integração ainda necessita ser investigada.
Finalmente, como o tamanho do vetor (DNA plasmidial) é
diretamente proporcional à sua massa e inversamente
proporcional ao número de cópias possível de ser
precipitado sobre as micropartículas, deve-se então dar
preferência a vetores pequenos, entre 2 kg e 15 kb. As
frequências de transformação estável (isto é, a obtenção
de plantas transformadas) parecem ser um pouco
reduzidas no momento da utilização de vetores lineares
(BONFIM et al., 2007; VIANNA et al., 2004). Entretanto, em
virtude de questões de biossegurança, pode-se optar pela
utilização de vetores lineares, os quais são produzidos
após a remoção (pela digestão com enzimas apropriadas)
de sequências gênicas que conferem resistência a
antibióticos presentes nos vetores circulares. É
recomendável que o vetor circular possua um sítio para
uma enzima que permita a digestão e a eliminação de
genes desnecessários para o processo de transformação
genética. É possível a cotransformação, por meio da
utilização de dois ou três vetores simultaneamente. Isso
permitirá a segregação dos transgenes nas gerações
seguintes. As frequências de cotransformação para genes
presentes em um único vetor chegam a cerca de 100%,
enquanto para genes presentes em vetores distintos são
de aproximadamente 50% (ARAGÃO et al., 1996).
Ao contrário dos vetores de Agrobacterium, os plasmídios
utilizados no processo biobalístico não necessitam de
nenhuma sequência moduladora da sua integração no
genoma vegetal. Em levedura (ORR-WEAVER et al., 1981)
e em algumas espécies de Synechococcus (WILLIAMS;
SZALAY, 1983), a integração do
DNA exógeno ocorre em virtude de sequências homólogas
ao DNA cromossomal (recombinação homóloga). No
entanto, a integração do DNA exógeno, introduzido por
métodos diretos no genoma de células vegetais, parece
ser diferente. Aparentemente, sua integração independe
de presença de sequências homólogas no genoma vegetal
(IIDA et al., 1990; MORIKAWA et al., 1994). Entretanto, o
mecanismo de integração ainda necessita ser mais bem
compreendido.
Transformação via
bombardeamento de meristemas
apicais
Com o surgimento dos processos biobalísticos, abriu-se a
possibilidade de transformação direta in situ das células
do meristema apical. Dessa forma, vislumbrou-se a
possibilidade de obtenção de plantas transgênicas por
meio da transformação de celulas-mãe do meristema
apical. No final dos anos de 1980, obteve-se a primeira
planta transgênica (soja) pelo processo biobalístico. O
processo ocorreu a partir de células transformadas do
meristema apical (McCABE et al., 1988).
Embora a transformação mediada por Agrobacterium
também possibilite a transformação de células
meristemáticas (ULIAN et al., 1988), essa técnica não tem
sido eficiente (BRASILEIRO et al., 1996). A combinação
biobalística-Agrobacterium também já foi empregada
(BIDNEY et al., 1992; BRASILEIRO et al., 1996), embora,
de igual modo, não tenha demonstrado ser um método
muito eficiente.
O meristema apical vem sendo alvo de um grande
número de estudos, dos quais a maioria tem investigado a
função das diferentes células que o compõem. Existe
alguma confusão quanto aos termos utilizados para
denominar determinados tecidos da região apical, que é
constituída do meristema apical propriamente dito, dos
primórdios dos órgãos laterais e da região de maturação,
onde a diferenciação se torna aparente (CUTTER, 1965).
Em feijão, ela é composta basicamente pelo meristema
apical, pelos primórdios foliares e pelas folhas primárias.
As diferentes partes do meristema apical são definidas
por dois conceitos distintos: por camadas e por zonas
(MEDFORD, 1992). Segundo Satina et al. (1940), a
primeira define três camadas distintas: L1, L2 e L3 (Figura
3). A camada L1 é a mais externa e forma a epiderme das
regiões diferenciadas. A camada L2 divide-se
preferencialmente no plano anticlinal (perpendicular à
superfície), e também no plano periclinal (paralelo à
superfície), no momento da formação dos órgãos. A
camada L3 divide-se tanto no plano anticlinal quanto no
periclinal. O segundo conceito baseia-se na divisão do
meristema em zona (ESAÚ, 1977; STEEVES; SUSSEX,
1989). Há uma zona central, uma zona periférica e a
medula (Figura 3). A zona central inclui todas as três
camadas. Suas células dividem-se com menor frequência
e, embora deem origem às demais células do meristema
apical, não são permanentes (RUTH et al., 1985). As
células periféricas têm como função a formação das
regiões laterais. Vários estudos demonstraram que os
brotos diferenciados são originados de novo em camadas
subepidérmicas (L2 e L3) do meristema apical, embora a
camada L1 também possa participar de sua formação
(FRANKLIN et al., 1991; MALIK; SAXENA, 1992; McCLEAN;
GRAFTON, 1989; MOHAMED et al., 1992). Esses brotos são
formados nas regiões periféricas do meristema apical
(ARAGÃO; RECH, 1997).
Figura 3. Eixo embrionário após a retirada das folhas primárias e
detalhe da estrutura do meristema apical, dividido em camadas (L1,
L2 e L3) e em zonas. ZC – zona central; ZP – zona periférica; M –
medula.
Ilustração: Francisco J. L. Aragão.
Transformação cloroplasmática
A transformação cloroplasmática (inserção do transgene
no genoma do cloroplasto), em certos casos, tem algumas
vantagens em relação à transformação do genoma
nuclear. As principais vantagens apontadas são: altos
níveis de expressão heteróloga (DE COSA et al., 2001;
TREGONING et al., 2003); contenção do transgene, pois,
para a maioria das plantas superiores, o genoma
cloroplasmático tem herança materna (BIRKY, 2001; RUF
et al., 2001; SVAB; MALIGA, 1993); ausência do efeito de
posição, pelo fato de ser possível direcionar a integração
para uma região específica (STAUB; MALIGA, 1992); e
diminuição dos problemas de silenciamento gênico,
quando múltiplos genes devem ser inseridos, visto que a
maquinaria traducional dos cloroplastos tem a capacidade
de traduzir transcritos policistrônicos (DE COSA et al.,
2001; KANAMOTO et al., 2006; STAUB; MALIGA, 1995).
Com o advento da biobalística, foi possível inicialmente
transformar uma alga verde (Chlamydomonas) (BOYNTON
et al., 1988). Entretanto, apesar de todas essas
vantagens, quase uma década foi necessária até que essa
tecnologia fosse desenvolvida para plantas superiores
(SVAB et al., 1990; YE et al., 1990). Apesar de ser possível
transformar cloroplastos por meio de outras metodologias
(eletroporação e mediada por PEG), o processo de
biobalística tem sido mais presente na literatura.
Diolística
O processo de biobalística também é utilizado para
introduzir substâncias fluorescentes ou coloridas
(corantes) em células. Essa técnica é chamada de
diolística (O’BRIEN; LUMMIS, 2004). É possível encontrar
uma revisão sobre o assunto em O’Brien e Lummis (2007).
Nesse processo, os corantes aderem-se às micropartículas
ou aos filtros e, então, são “bombardeados” para
penetrarem nas células. A utilização desses corantes não
tóxicos, como carbocianina, os quais podem ser
transportados pela célula, tem permitido a marcação de
muitos tipos celulares e permanecem funcionais por um
longo período (O’BRIEN; LUMMIS, 2007). A diolística tem
vantagens sobre outras técnicas, como a microinjeção e a
eletroporação, por ser mais simples, rápida e por poder
marcar um maior número de células ao mesmo tempo.
Além disso, a técnica de microinjeção pode dialisar o
conteúdo celular e, dessa forma, causar ruptura em
componentes celulares vitais, o que afeta o
funcionamento da célula.
A técnica de diolística tem se mostrado muito útil para
estudos da arquitetura e morfologia em células animais
(O’BRIEN; LUMMIS, 2007), mas ainda é pouco utilizada
para o estudo de células vegetais. Recentemente,
corantes ligados ao cálcio têm sido utilizados para estudar
oscilações na concentração de Ca+2 em células-guarda de
Commelina communis, em células da alga verde
Chlamydomonas reinhardtii e em zigotos da alga marrom
Fucus serratus (BOTHWELL et al., 2006). Essa técnica
também tem sido proposta para introdução de
nanossensores óticos, que são aparatos de cerca de 1.000
nm de diâmetro, os quais podem “perceber” e transmitir
informações sobre eventos químicos e biológicos (BUCK et
al., 2004).
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Protoplastos: tecnologia e
aplicações
Leonardo Soriano
Introdução
Os protoplastos são células vegetais desprovidas de
parede celular devido à ação de enzimas específicas que
degradam as fibras de celulose, hemicelulose e a matriz
de pectina. Por serem osmóticamente sensíveis, os
protoplastos são considerados os explantes vegetais mais
atrativos à biotecnologia, sobretudo por conta da sua
imediata resposta a estímulos externos, notável
capacidade de fusão celular, extração de organelas e
incorporação de materiais desejáveis, como DNA exógeno.
Por meio da totipotência celular, característica inerente às
células vegetais, é possível regenerar uma planta
completa a partir de um protoplasto. Esse notável sistema
tem estimulado estudos de expressão de genes isolados e
sua regulação, promovendo avanços nas áreas de
genômica, proteômica e metabolômica (XIAO et al., 2012).
Além disso, a obtenção de uma planta completa a partir
de uma única célula assegura a sua fidelidade genética
(DAVEY et al., 2003) e, por isso, os protoplastos são
comumente empregados em programas de melhoramento
genético de espécies de plantas de interesse agronômico.
Isolamento e cultivo de
protoplastos
O primeiro relato da obtenção de protoplastos foi em 1892
por meio do isolamento mecânico (KLERCKER, 1892). No
entanto, a técnica proposta disponibilizava poucas células
intactas, e seu rendimento era muito baixo. Somente em
1960, Cocking (1960) conseguiu isolar protoplastos da
ponta da raiz de tomateiro utilizando a enzima celulase,
extraída do fungo Myrothecium verrucaria, aumentando
consideravelmente o rendimento do processo. Dez anos
mais tarde, utilizando o corante fluorocromo calcoflúor
branco, Nagata e Takebe (1970) observaram a
regeneração da parede celular e as primeiras divisões
mitóticas ao estudarem protoplastos de mesofilo de
Nicotiana tabacum. No ano seguinte, a primeira planta de
N. tabacum, utilizando essa técnica, foi completamente
regenerada (NITSCH; OHYAMA, 1971).
Os protoplastos podem ser isolados a partir de mesofilo
(GROSSER; GMITTER JUNIOR, 1990), raiz (COCKING, 1960),
pecíolos (BIDNEY; SHEPARD, 1980), calos (KOBAYASHI et
al., 1983), suspensões celulares (MIZUHIRO et al., 2001),
embriões somáticos (NOMURA et al., 1982), hipocótilos
(SINHA et al., 2003), cotilédones (DOVZHENKO et al.,
2003), frutos (BROWN et al., 1997), coleóptilos (HALL;
COCKING, 1971), pedicelos florais (FLICK; EVANS, 1983),
segmentos caulinares (GNANASAMBANDAM; BIRCH,
2006), grãos de pólen (DUHOUX, 1980), ou seja,
praticamente a partir de qualquer tipo de tecido vegetal.
O sucesso do isolamento está vinculado à espécie, estado
fisiológico da planta, tipo e idade do explante, meio de
cultura e fatores ambientais (MATSUMOTO, 2006), os
quais influenciam na capacidade de protoplastos e células
derivadas expressarem sua totipotência e desenvolverem-
se em plantas viáveis.
Atualmente, há diversos protocolos de isolamento de
protoplastos disponíveis na literatura, incluindo tanto para
plantas monocotiledôneas quanto para dicotiledôneas,
sobretudo por meio de enzimas pectocelulolíticas em
conjunto com estabilizadores osmóticos (açúcares e
poliálcoois) e estabilizadores de membrana (cálcio e
fósforo) (CARNEIRO et al., 1998; DAVEY et al., 2003).
Entretanto, os procedimentos de isolamento mecânico são
raramente utilizados para o isolamento de protoplastos,
mas ainda são úteis para estudos que exigem baixas
concentrações celulares (BINDER et al., 2003).
Por conta da eficaz capacidade de degradar
separadamente a celulose, a hemicelulose e outros
polissacarídeos constituintes da parede celular, sem
danificar a membrana plasmática, a escolha e a
concentração das enzimas pectocelulolíticas variam de
acordo com a composição e espessura da parede celular e
da origem do tecido utilizado. As enzimas mais
empregadas mundialmente nos laboratórios são extraídas
de microrganismos saprófitas e possuem atividades
pectinolíticas e celulolíticas, as quais atuam na
despolimerização da celulose e descristalização de
cadeias (CARNEIRO et al., 1998). Dentre as enzimas
destacam-se as celulases Onozuka R10 e Driselase, a
pectinase Macerase R10 e a pectoliase Y-23. A formulação
da solução enzimática a ser empregada, bem como a
concentração de cada enzima (0,1% a 5%), pode diferir
sensivelmente até para cultivares da mesma espécie
(CASTRO et al., 2011).
O período de incubação necessário para a digestão
completa da parede celular varia de acordo com a espécie
(14 a 20 horas). Recomenda-se que o tecido vegetal
esteja em contato com a mistura enzimática sob agitação
suave (20 rpm a 40 rpm), com pH (5,4 a 6,2) e
temperatura (20 °C a 30 °C) que favoreçam a ação da
solução na obtenção de protoplastos viáveis. Nessa etapa
de isolamento, alguns aminoácidos como a glicina (0,1 M)
podem ser adicionados à solução enzimática para
maximizar a liberação de protoplastos (SUTIOJONO et al.,
2002).
Após o período de incubação, a purificação dos
protoplastos é realizada, verificando-se em microscópio
óptico invertido a ocorrência de digestão da parede
celular. A suspensão de isolamento é geralmente filtrada
em peneiras de nylon (45 μm) e sucessivamente
centrifugada (800 rpm a 1.000 rpm por 10 minutos)
separando os protoplastos de restos celulares, impurezas
e da solução enzimática. Em seguida, a cultura de
protoplastos é plaqueada em meio líquido ou semissólido,
cuja otimização da formulação é preponderante para as
próximas etapas de divisão celular, formação de
microcolônias e microcalos (ERIKSSON, 1985).
Para o cultivo de protoplastos e sua posterior
regeneração, a maiora dos meios de cultura encontrados
na literatura é baseada nos meios MS (MURASHIGE;
SKOOG, 1962), B5 (GAMBORG et al., 1968), SH (SCHENK;
HILDEBRANDT, 1972), KM (KAO; MICHAYLUK, 1975) e MT
(MURASHIGE; TUCKER, 1969), cujas formulações contêm
macro e micronutrientes, vitaminas, mio-inositol, açúcares
e ácidos orgânicos, em concentrações que proporcionam
uma alta viabilidade e eficiência de plaqueamento.
Para evitar o acúmulo de amido e induzir as primeiras
divisões celulares, os protoplastos são cultivados na
ausência de luz e temperatura entre 20 °C e 30 °C. A
regeneração da parede celular ocorre de acordo com a
fonte de protoplastos e as condições de cultura, podendo
variar de 1 a 72 horas (KLEIN et al., 1981; NAGATA;
TAKEBE, 1970; SIM et al., 1988). Para estimular a divisão
celular de protoplastos recalcitrantes de beterraba (Beta
vulgaris L.), Majewska-Sawka et al. (1997) recomendam a
adição das poliaminas espermidina, espermina e
putrescina (44 μM), associadas aos fitoreguladores ANA
(ácido naftaleno acético – 5 μM) e BAP (6-
benzilaminopurina – 2 μM), no meio de cultura.
A renovação do meio de cultura com a redução gradual da
pressão osmótica deve ser realizada pela diluição com
agentes osmóticos como o manitol, o sorbitol, a glicose, a
celobiose e a sacarose, em concentrações de 0,3 M a 0,8
M. Essa etapa é essencial para a manutenção da divisão
mitótica e, por conseguinte, a formação de microcolônias.
Os períodos de renovação do meio de cultura e de
desenvolvimento das etapas sequenciais dependem do
genótipo e estão relacionados ao estado fisiológico,
eficiência de plaqueamento e integridade do protoplasto.
Em cítrus, após uma semana de cultivo, é possível
verificar células em divisão (KOBAYASHI et al., 1983); aos
30 dias, microcolônias (VARDI et al., 1975); e, após 8 a 10
semanas, microcalos (GROSSER; GMITTER JUNIOR, 1990).
A partir desse estágio, dependendo da espécie, o
processo de regeneração pode ocorrer tanto pela via
embriogênica (GRAMBOW et al., 1972) quanto pela via
organogenética (BOURGIN et al., 1979).
Hibridação somática
A hibridação somática via fusão de protoplastos não é um
evento dirigido, o qual permite a combinação total ou
parcialmente de genomas nucleares e citoplasmáticos,
sem perda significativa do vigor, aos níveis
interespecíficos e intergenéricos para contornar
incompatibilidades pré e pós-zigóticas, permitindo a
produção de plantas híbridas com genes de resistência a
pragas e doenças ou a estresses abióticos (LIU et al.,
2005). Trata-se de um processo aditivo de protoplastos e
tem sido uma ferramenta efetiva no melhoramento
genético de espécies economicamente importantes, como
batata, trigo, arroz e cítrus (JOHNSON; VEILLEUX, 2001).
Em virtude de não existir segregação meiótica na
hibridação somática, os genes recessivos deletérios nos
genitores permanecem mascarados nos híbridos
somáticos (GROSSER; GMITTER JUNIOR, 1990).
Após o procedimento, podem ocorrer três resultados: a
fusão completa dos núcleos dos genitores ou cariogamia;
a perda cromossômica de um ou de ambos os núcleos; e a
perda total do núcleo de um dos genitores (BENGOCHEA;
DODDS, 1986). Este último ocorre em menor frequência,
com a perda de um dos núcleos parentais e com apenas o
intercâmbio aleatório de conteúdos citoplasmáticos
(SAITO et al., 1993). O material resultante desse
fenômeno é denominado como cíbrido, e, por manter
intacto um dos genomas, é objeto de estudos para
aumento da atividade fotossintética, taxas respiratórias
entre outras reações metabólicas.
Após sucessivos testes quanto à composição de soluções
e meios de cultivo, o primeiro relato de fusão de
protoplastos bem sucedido foi por meio da utilização de
altas concentrações de cálcio no meio de cultura, cuja
atividade está fortemente relacionada à manutenção da
estabilidade da membrana plasmática (KELLER;
MELCHERS, 1973). No ano seguinte, com a descoberta do
polietilenoglicol (PEG) e suas propriedades fusogênicas, a
técnica se notabilizou como uma importante ferramenta
para o melhoramento genético (KAO; MICHAYLUK, 1975).
Desde então, foi explorado o potencial considerável em
ampliar o conjunto de genes de culturas, e diversos
trabalhos foram realizados produzindo híbridos
interespecíficos (CARLSON et al., 1972; HELGESON et
al.,1998; MATSUMOTO et al., 2002; OHGAWARA et al.,
1985) e intergenéricos (KISAKA et al., 1998; LIU et al.,
1999; OZMINKOWSKI JUNIOR; JOURDAN, 1994; ZHOU et
al., 2001).
O processo de fusão pode ser resultante de tratamentos
químicos ou físicos. No tratamento químico, a membrana
plasmática dos protoplastos, após a etapa de isolamento,
possui carga elétrica negativa, e, para induzir o contato
íntimo entre as membranas plasmáticas, é necessária a
neutralização das cargas da superfície da membrana pelo
uso de policátions, como o polietilenoglicol (PEG), o qual
atua como agente aglutinador e tem se mostrado um
método simples e eficiente (BINSFELD, 1999; MOURÃO
FILHO et al., 1996). A ação fusogênica do PEG pode ser
visualizada em três etapas apresentadas na Figura 1. Por
sua vez, o tratamento físico consiste no uso de uma
corrente elétrica alternada de baixa voltagem, sob a qual
os protoplastos são submetidos e alinhados. Em seguida,
são aplicados pulsos curtos de corrente contínua, gerando
poros temporários nas membranas, permitindo assim a
fusão entre as células adjacentes (SHIMIZU et al., 1999).
Visando ao aumento da eficiência da técnica, métodos
mais refinados foram desenvolvidos, como a fusão
eletroquímica, que incorporou a indução química à
aplicação de pulsos de corrente elétrica (OLIVARES-
FUSTER et al., 2005).
Figura 1. Fusão química de protoplastos. A) Protoplastos
provenientes de calos de laranja-doce (cinzas) reunidos com
protoplastos de mesofilo de tangerina (esverdeados). B) Fusão dos
protoplastos pela ação do polietilenoglicol (PEG). C) Protoplastos pós-
fusão, podendo ser observadas células híbridas. Barras: 20 μm.
Foto: Leonardo Soriano
Transformação genética de
protoplastos
Diferentemente de hibridação somática, a transformação
de protoplastos é um evento dirigido, sendo possível a
inserção de DNA exógeno específico diretamente através
da membrana plasmática por meio de processos químicos
e físicos. Essa técnica de transformação é rápida e
fornece base para estudos de transformação nuclear
transiente e estável (GUO et al., 2012), e também para
transformação de organelas.
Destacada por sua eficiência e simplicidade metodológica,
a transformação de protoplastos tem sido empregada em
cultivares recalcitrantes ao processo de transformação
convencional (FLEMING et al., 2000; KOBAYASHI;
UCHIMIYA, 1989). Além disso, a transformação de
protoplastos é vantajosa por não apresentar quimeras,
pois a regeneração se dá a partir de uma única célula
isolada, sendo essa característica importante para a sua
utilização em programas de melhoramento e estudo da
expressão de genes (GUO et al., 2012).
Protoplastos têm sido empregados em experimentos de
transformação direta com plasmídios bacterianos desde
Davey et al. (1980), com a integração de genes exógenos
de forma aleatória no genoma da planta. Na
transformação direta, um gene de interesse é agrupado
em um cassete de expressão, contendo basicamente o
promotor seguido de uma sequência codificadora, um
gene marcador e um sinal de poliadenilação (terminador),
que é inserido em um plansmídeo bacteriano e transferido
diretamente em protoplastos, sem um vetor
intermediário, como Agrobacterium tumafaciens
(transformação indireta).
Novas técnicas fazem uso da síntese de peptídeos
cellpenetrating peptides (CPPs), os quais auxiliam na
condução de macromoléculas para o interior celular. No
caso, os CPPs ajudam o plasmídio a atravessar a
membrana plasmática dos protoplastos, aumentando a
eficiência de transformação (MÄE et al., 2005).
De forma geral, a metodologia de transformação direta
assemelha-se muito com a hibridação somática, com a
desestabilização da membrana dos protoplastos por
tratamento químico com polietilenoglicol (PEG) ou físico
via eletroporação. Ao invés da união dos protoplastos
genitores, é adicionada a suspensão plasmidial (0,8 µg
plasmídio µL-1 a 1,0 µg plasmídio µL-1) contendo o DNA
exógeno de interesse na suspensão de protoplastos numa
concentração em torno de 2x106 protoplastos mL-1 (OMAR
et al., 2008). Os genes de interesse são acompanhados
por genes de seleção, que conferem resistência a
antibióticos. Além desses, genes-repórteres como o β-
glucuronidase (GUS) e o green fluorescent protein (GFP)
são muito eficazes na detecção visual de células
transformadas (GUO et al., 2012; PAOLI et al., 2007).
Normalmente a frequência de transformação, no entanto,
é baixa; por isso, é necessário um sistema eficiente de
seleção de células e regeneração de tecidos. Tratamentos
térmicos prévios no DNA plasmidial e irradiação dos
protoplastos receptores podem aumentar a eficiência de
transformação, possivelmente pelo aumento da
recombinação de DNA genômico com o DNA exógeno
(DAVEY et al., 2003; TIWARI et al., 2001).
O protocolo de regeneração de plantas a partir da
transformação de protoplastos é basicamente o mesmo
que foi estabelecido na hibridação somática. Após a
seleção, é possível detectar a integração de gene de
interesse na planta regenerada por meio da combinação
com os genes-repórteres, por citometria de fluxo
(MADDUMAGE et al., 2002) e, principalmente, por meio de
análises moleculares, como PCRs convencionais e
quantitativas em tempo real (GUO et al., 2012) ou sondas
específicas (TIWARI et al., 2001).
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CAPÍTULO 11
O sistema Agrobacterium:
do solo para o laboratório
Ana Cristina Miranda Brasileiro
Francisco J. L. Aragão
O gênero Agrobacterium
As agrobactérias (Agrobacterium spp.) são bactérias
tipicamente do solo, do tipo bacilo Gram-negativo e
aeróbico. Todavia, alguns isolados, quando se encontram
nos tecidos vegetais, conseguem sobreviver sob
condições reduzidas de oxigênio. Suas células apresentam
um tamanho que varia de 0,6 µm a 1,0 µm x 1,5 µm a 30
µm, ocorrem isoladas ou aos pares e não formam esporos.
As agrobactérias são móveis na rizosfera por causa de
dois flagelos polares e de dois a quatro filamentos laterais
que permitem sua movimentação a aproximadamente 60
μm/segundo. Sua temperatura de crescimento está na
faixa de 25 °C a 28 °C, com colônias geralmente
convexas, circulares, lisas, apigmentadas ou de coloração
creme (HOLT et al., 1994).
Agrobacterium tumefaciens é considerada a espécie-tipo
do gênero Agrobacterium e foi descrita pela primeira vez
como Bacillus tumefaciens por Smith e Townsend (1907).
Posteriormente, o gênero Agrobacterium foi proposto por
Conn e enquadrado na família Rhizobiaceae que agrupa,
entre outros, os gêneros Rhizobium, Bradyrhizobium,
Phyllobacterium e Azorhizobium que são bactérias
fixadoras de nitrogênio (HOLT et al., 1994, KERSTERS; DE
LEY, 1984). No gênero Agrobacterium (do grego agros =
campo e bakterion = bastonete), estão descritas, além de
Agrobacterium tumefaciens, que causa a doença
conhecida como galha-da-coroa (crown-gall), outras
quatro espécies, que diferem entre si pela sintomatologia
e especificidade de hospedeiro, quais sejam: a) A.
rhizogenes (Riker) Conn., que provoca a síndrome da raiz
em cabeleira (do inglês hairy root); b) A. rubi (Hildebrand)
Starr & Weiss, que induz tumores em Rubus spp.; c) A.
vitis Ophel e Kerr, que induz tumores em Vitis spp.; d) A.
radiobacter (Beijejerinck & van Delden) Conn., que são
bactérias saprófitas, não patogênicas.
Além da classificação baseada em sua fitopatogenicidade,
as espécies de Agrobacterium estão subdivididas em pelo
menos três biovares, de acordo com suas características
bioquímicas, fisiológicas e nutricionais, determinadas
pelos genes cromossomais (ANDRADE et al., 2003).
Entretanto, a divisão em biovares nem sempre é possível,
uma vez que várias linhagens apresentam características
intermediárias. Dessa forma, nos últimos anos, a
classificação das agrobactérias vem sofrendo uma série
de críticas e tem recebido sugestões de alterações, de
modo que a taxonomia do gênero Agrobacterium continua
ainda controvertida (BERIAM et al., 1996; HOLT et al.,
1994; KERSTERS; DE LEY, 1984). Além do mais, o recente
sequenciamento completo dos plasmídios Ti e Ri mostrou
que eles são altamente conservados, mesmo entre
espécies diferentes, o que pode ser o ponto de partida
para uma reclassificação do gênero (MORIGUCHI et al.,
2001; SUZUKI et al., 2000; WOOD et al., 2001; ZHU et al.,
2000).
Ocorrência da doença
As agrobactérias encontram-se distribuídas em todo
mundo, em solos cultivados ou não, e, mais
especificamente, na rizosfera das plantas contaminadas.
Nestas últimas, são encontradas nas galhas, nas raízes ou
no solo adjacente. As agrobactérias patogênicas ocorrem
com maior frequência em regiões de clima frio. Essa
preferência, provavelmente, está ligada à sensibilidade
que elas têm a altas temperaturas, e à sensibilidade
térmica do processo de infecção (LIPPINCOTT et al., 1981).
Mesmo em solos com elevada incidência da galha-da-
coroa, os isolados de A. radiobacter (não patogênicos) são
de 10 a 100 vezes mais numerosos que os das outras
espécies patogênicas (KRIMI et al., 2002).
Mais de 600 espécies vegetais são conhecidamente sus‐
ceptíveis à infecção por A. tumefaciens e A. rhizogenes. A
maioria delas pertence à classe das angiospermas
dicotiledôneas (>60%) e das gymnospermas, e, mais
raramente, às angiospermas monocotiledôneas (DE
CLEENE; DE LEY, 1976; ESCOBAR; DANDEKAR, 2003). Na
Europa, a doença conhecida como galha-da-coroa
provocada por espécies de Agrobacterium fitopatogênicas
é conhecida desde a Antiguidade, quando foi
primeiramente observada em videiras por Aristóteles e
por seu estudante Teofrasto. Embora sua incidência seja
baixa, a galha-da-coroa pode tomar proporções
devastadoras em certas culturas, principalmente em
países temperados, o que conduz à perda quase total da
produção, em particular para algumas espécies
ornamentais, frutíferas e florestais, que são propagadas
vegetativamente.
No Brasil, os primeiros relatos sobre doenças causadas
por espécies de Agrobacterium surgiram na década de
1930 em pessegueiro. Posteriormente, a galha-da-coroa
foi relatada em várias outras espécies, como castanheira,
videira, ameixeira, alface, chuchu, mandioca, entre outras
(BARROS et al., 2004; BERIAM et al., 1996; GOMES et al.,
1998). Em Minas Gerais, a galha-da-roseira surgiu
primeiramente em algumas propriedades. Posteriormente,
as práticas agronômicas adotadas para essa cultura,
como a propagação vegetativa e a enxertia, contribuíram
para uma rápida disseminação do patógeno (ROMEIRO,
1995).
Além de plantas, Agrobacterium pode transformar, em
condições de laboratório, uma vasta gama de organismos
eucarióticos, desde fungos filamentosos, levedura,
cogumelos cultivados a ouriços-do-mar e células humanas
(BULGAKOV et al., 2006; LACROIX et al., 2006b). Essas
descobertas abriram a possibilidade de utilização de
Agrobacterium como um vetor universal de transformação
genética que pode ser explorado como uma nova
ferramenta biotecnológica para a engenharia genética de
todos os organismos eucarióticos.
O plasmídio Ti
Uma vez que a ligação inicial bactéria-planta esteja
estabilizada, as moléculas-sinal sintetizadas em resposta
ao ferimento da planta vão ativar a expressão de genes
de virulência que estão localizados em um plasmídio de
alto peso molecular (200 kb a 800 kb), conhecido como
plasmídio Ti (do inglês tumor-inducing). Em determinadas
linhagens, o plasmídio Ti pode representar 50% do
genoma (ALLARDET-SERVENT et al., 1993). Esse plasmídio
está presente somente em linhagens patogênicas de
Agrobacterium, em um baixo número de cópias, e de
poder ser transferido, via conjugação, para outras
bactérias (VAN LAREBEKE et al., 1974; WATSON et al.,
1975).
Duas importantes regiões funcionais no plasmídio Ti, que
estão envolvidas diretamente no processo de indução
tumoral, foram identificadas: a região-T, que corresponde
ao segmento de DNA transferido para a célula vegetal, e a
região de virulência, ou região vir, que contém genes que
codificam enzimas responsáveis pela excisão e
transferência da região-T (STACHEL; NESTER, 1986; VAN
LAREBEKE et al., 1974).
O plasmídio Ti possui, além da região-T e da região vir,
outras três regiões funcionais que não estão diretamente
envolvidas com o processo de indução tumoral. Essas
regiões são conhecidas como: a) região de transferência
conjugativa (loci tra e trb), responsável pela transferência
conjugativa do plasmídio Ti entre linhagens de
Agrobacterium spp. ou para outras bactérias Gram-
negativas; b) região de absorção e catabolismo de opinas
(região opc), envolvida na síntese de mais de 40 enzimas
específicas responsáveis pela absorção das opinas para
dentro da célula e pelo seu posterior catabolismo pela
bactéria; c) região de replicação (região rep), que é
necessária para a replicação e para as funções ligadas à
manutenção do plasmídio Ti dentro da bactéria
(estabilidade), ao controle do número de cópias durante a
divisão celular e à incompatibilidade entre bactérias. A
maioria dessas regiões é conservada entre os diferentes
tipos de plasmídio Ti, principalmente aquelas perten‐
centes à mesma classe de opina.
Essas cinco regiões cobrem aproximadamente dois terços
do plasmídio Ti. No restante, identificaram-se outros
genes ligados à determinação do espectro de hospedeiro,
aos genes reguladores (repressores, antagonistas,
ativadores, etc.) da expressão de outros genes do
plasmídio Ti e às outras funções ainda desconhecidas, as
quais, aparentemente, não estão diretamente envolvidas
na formação de tumores (ZHU et al., 2000).
A síntese da fita-T
A região-T é definida e delimitada por duas sequências
repetidas de 23 pb, conhecidas como extremidades direita
e esquerda. O processo de reconhecimento, de clivagem e
de transferência da região-T inicia-se graças à atividade
dos operons virD e virC, que reconhecem e clivam dentro
desses 23 pb que delimitam a região-T.
As proteínas VirD1 e VirD2 parecem atuar em duas etapas
no processo de corte da região-T (Figura 1B). Assim, VirD1
poderia reconhecer as extremidades da região-T e, ao
mesmo tempo, converter o DNA para a forma relaxada,
por meio de sua atividade topoisomerase. Isso expõe as
sequências específicas de clivagem para a proteína VirD2,
uma proteína com atividade endonucleásica, que também
reconhece, especificamente, os 23 pb de cada
extremidade da região-T (YANOSFSKY et al., 1986).
Após a clivagem, a proteína VirD2 mantém-se
covalentemente ligada à extremidade 5’ da região-T
(HERRERA; ESTRELA et al., 1988; PANSEGRAU et al.,
1993), enquanto uma segunda clivagem ocorre na
extremidade 3’ esquerda, o que leva a liberação da fita
inferior da região-T. Durante essa liberação, uma cópia da
fita é sintetizada a partir da extremidade direita, na
direção 5’→ 3’, utilizando-se a fita de DNA superior da
região-T como molde, o que mantém assim a fita superior
em forma duplex. A síntese da fita inferior continua até
atingir o sítio de clivagem da extremidade 3’ esquerda. A
molécula de DNA linear, fita simples, gerada a partir do
deslocamento da fita inferior da região-T foi denominada
de fita-T. Dessa forma, o deslocamento da fita-T ocorre na
direção 5’ → 3’ da fita inferior da região-T, iniciando na
extremidade direita e terminando na extremidade
esquerda, o que indica a existência de polaridade no
processamento da fita-T (ZAMBRYSKI et al., 1989).
As proteínas VirC1 e VirC2, codificadas pelo operon VirC,
ligam-se a uma sequência conservada, localizada próxima
à extremidade direita, denominada overdrive (ou região
ode). Acredita-se que essa ligação favoreça a correta
orientação do complexo proteico VirD1/VirD2 para o
reconhecimento dos sítios de clivagem, e, dessa forma,
aumenta a eficiência no processo de clivagem e de
transferência da fita-T (TORO et al., 1989). Várias outras
enzimas, como helicases, polimerases e enzimas de
reparo, são também necessárias para a produção da fita-T
e são codificadas, provavelmente, por genes do
cromossomo bacteriano (ZAMBRYSKI, 1992).
O movimento intercelular do
complexo-T
Após sua formação, a fita-T deixa a célula bacteriana,
penetra na célula vegetal e integra-se ao DNA nuclear da
planta (Figura 1C). Para isso, a fita-T precisa atravessar a
membrana interna bacteriana, seu periplasma e a
membrana externa bacteriana. Supõe-se que a fita-T é
transportada da bactéria para a célula vegetal, como um
complexo nucleoproteico conhecido como complexo-T
imaturo, que é formado pela fita-T protegida na
extremidade 5’ pela VirD2 (CITOVSKY et al., 1989).
O transporte do complexo-T da agrobactéria para o
citoplasma da célula vegetal indica a necessidade de se
formar uma estrutura funcionalmente similar a um pilus,
ou poro celular, e ocorreria por meio da interação das
proteínas do operon virB com o complexo-T (WARD et al.,
1988; ZUPAN et al., 1998). O operon virB contém 11
genes, e a maioria das proteínas VirB está localizada nas
membranas interna e externa da bactéria, além de estar
diretamente ligada à formação do canal VirB ou ao
fornecimento de energia (atividade ATPase), que é
necessária tanto para a formação do canal VirB quanto
para o processo de exportação das moléculas (CASCALES;
CHRISTIE, 2004; MCCULLEN; BINNS, 2006).
A proteína VirD4, uma proteína ancorada na membrana
interna da bactéria, seria o produto que intermediaria a
ligação do complexo-T ao canal VirB, auxiliando na
translocação entre a bactéria e a célula hospedeira. O
complexo proteico formado por VirB e VirD4, associado às
membranas da bactéria, vai permitir a translocação do
complexo-T imaturo para o citoplasma da célula vegetal
por meio de um sistema secretório do tipo IV (T4SS)
(CHRISTIE, 2004). As proteínas VirB2, VirB5 e,
provavelmente, VirB7 formam o pilus-T, que é um
filamento extracelular que intermedeia a ligação do canal
VirB/VirD4 à parede (ou membrana) da célula vegetal
(MCCULLEN; BINNS, 2006).
Além do complexo-T imaturo, o canal VirB/VirD4 é
responsável pelo transporte de outras proteínas Vir, como
VirE2, VirE3, VirF e VirD5, que são exportadas de forma
independente para a célula vegetal (VERGUNST et al.,
2005). Essas proteínas efetoras participam também do
processo celular necessário tanto para a infecção quanto
para a transformação genética por Agrobacterium, mas
sua verdadeira função ainda não está completamente
desvendada.
Sabe-se que, uma vez no citoplasma, a maturação do
complexo-T é finalizada por sua associação com as
proteínas efetoras exportadas pela bactéria, em particular
com VirE2 (GELVIN, 2003). A proteína VirE2 é uma Single
Strand Binding (SSB) Protein e liga-se covalentemente e
de maneira não específica à fita-T (CHRISTIE et al., 1988;
GIETL et al., 1987). Por ocorrer com certa abundância e
por apresentar alta afinidade com DNA fita simples,
sugere-se que a ligação da proteína VirE2 à fita inferior do
T-DNA, além de evitar o seu dobramento, poderia protegê-
la da degradação de nucleases durante seu transporte
através dos poros nucleares (CITOVOSKY et al., 1989).
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Capítulo 3
1 Don Durzan em comunicação pessoal.
Capítulo 5
1 Um método para detectar fragmentação de DNA em
consequência de apoptose.
Capítulo 7
1 Unidade encapsulável é qualquer tipo de explante,
embriogênico ou não, que apresente tamanho reduzido
(até 7 mm) e tenha a capacidade de manter a viabilidade
e converter-se em planta normal, sob condições
adequadas, mesmo depois de ter sido encapsulado por
meio de uma matriz de encapsulamento. São exemplos de
unidades encapsuláveis: embriões somáticos, embriões
zigóticos, ápices caulinares, brotos, gemas axilares
(microestacas), células em suspensão, etc.
2 Endosperma artificial é uma matriz de encapsulamento
biodegradável, constituída pela mistura de um agente
geleificante (alginato de sódio) dissolvido em água ou que
contenha elementos minerais, fonte(s) de carbono,
vitaminas, aminoácidos e/ou reguladores de crescimento,
entre outros elementos necessários à correta manutenção
da viabilidade do material vegetal encapsulado
(STANDARDI; PICCIONI, 1998; MALABADI; STADEN, 2005),
o que irá depender do tipo de explante e da espécie
vegetal utilizada.
3 Esta fase consiste na formação propriamente dita das
sementes sintéticas e decorre da troca iônica dos íons
sódio (Na+) pelos íons cálcio (Ca2+), resultando na
produção de cápsulas firmes e isodiamétricas, as quais
são insolúveis, exceto na presença de nitrato de potássio
(KNO3) (NAIK; CHAND, 2006).