Aconselhamento Pastoral 01
Aconselhamento Pastoral 01
Aconselhamento Pastoral 01
São Leopoldo
2010
ANA ALICE TEIXEIRA DE LIMA COELHO
Trabalho Final de
Mestrado Profissional
Para obtenção do grau de
Mestre em Teologia
Escola Superior de Teologia
Programa de Pós-Graduação
Linha de Pesquisa:
Aconselhamento Pastoral
São Leopoldo
2010
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
O abuso sexual além de ser considerado pela lei como crime é também um
problema de saúde pública, cujos resultados imediatos e tardios para as vítimas
englobam problemas físicos, emocionais, comportamentais e espirituais. O número
de casos é subestimado nas pesquisas, pois na grande maioria não há uma
denúncia oficial. A sociedade como um todo precisa se unir num esforço comum
para diminuição da violência, e este tipo de problema deve ser abordado por
diversos profissionais, de uma maneira interdisciplinar. A igreja cristã como
instituição social não pode se abster desta responsabilidade. Seu papel vai desde a
conscientização dos fieis em relação ao tema da violência até a recuperação
espiritual e emocional das vítimas, através do aconselhamento pastoral. A
redescoberta contemporânea do poder dos pequenos grupos é um desenvolvimento
interessantíssimo nas igrejas, e o uso criativo destes grupos é uma das áreas mais
promissoras do aconselhamento pastoral. Envolve não somente o pastor, mas
também líderes leigos comprometidos e treinados e ainda, a comunidade como um
todo, fazendo da igreja inteira um agente transformador das realidades sociais
vigentes. Na experiência da Comunidade Evangélica Batista Ágape, o
aconselhamento em grupo tem sido uma excelente ferramenta para ajudar vítimas
adultas de abuso sexual na infância. Os grupos aplicam o método do Ministério
REVER, que utiliza os Doze Passos dos Alcoólicos Anônimos com estudo bíblico e
os Nove Passos do GAVS (Grupos de Apoio a vitimas de Abuso Sexual) traduzidos
e organizados por Débora Kornfield, associados às ferramentas da imaginação pela
fé e aconselhamento pela oração . Para o aconselhamento pastoral das famílias a
Comunidade Ágape tem adaptado o método da terapeuta Cloé Madanes, que
consiste em vinte passos que podem aplicar-se a uma grande variedade de casos,
proporcionando apoio à vítima, aos familiares e ao abusador. Sem dúvida estas
ferramentas não são as únicas que funcionam, e seria interessante que as
comunidades disponibilizassem seus recursos para que houvesse uma troca de
experiências, aumentando ainda mais a eficiência de suas abordagens na tentativa
de diminuir o impacto negativo do abuso sexual na sociedade.
Sexual abuse is not only considered a crime before the law, is also a public-health
problem, with both immediate and later-appearing effects on the victims which
include physical, emotional, behavioral and spiritual problems. Society as a whole
needs to join in a common effort to reduce the incidence of violence, and this type of
problem needs to be addressed by people from several professions, in an
interdisciplinary manner. The Christian church, as a social institution, must not
abdicate this responsibility. Its role ranges all the way from raising the awareness of
its members concerning the issue of violence, to the vitally important spiritual and
emotional recovering of the victims across counseling pastoral. The present-day
rediscovery of the power of small groups is one of the most promising areas of
pastoral counseling. This approach involves not only the pastor but also committed
and trained lay leaders, and also the entire congregation, thus making the whole
church into an agent of change with regard to what is happening in society. In the
experience of the Ágape Evangelical Baptist Community, group counseling has been
an excellent tool for helping adults who in childhood were victims of sexual abuse.
These groups apply the method of REVER Ministry, which uses the Twelve Steps of
Alcoholics Anonymous, along with Bible study and the Nine Steps of Support Groups
for Victims of Sexual Abuse, translated and organized by Deborah Kornfield, linked
with the tools of faith imagination and prayer counseling. For the pastoral counseling
of families, the Ágape Community has adapted the method of therapist Cloé
Madanes, consisting of twenty steps which can be applied in a great variety of cases,
providing support for the victim, his/her family members and the abuser. Doubtless
these tools are not the only ones that produce results, so it would be helpful if the
communities would make available their resources so that there could be an
exchange of experiences, thus increasing even more the efficiency of their
approaches that seek to diminish the negative impact of sexual abuse on society.
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 07
4 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 70
5 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 75
6 ANEXO I................................................................................................................ 79
7 ANEXO II............................................................................................................... 82
8 ANEXO III.............................................................................................................. 99
7
INTRODUÇÃO
tão evidente e ao mesmo tempo tão sufocado. A igreja pode ser este espaço. E ela
pode influenciar a sociedade à proporção que seus membros venham a ser pessoas
saudáveis e funcionais, que consigam viver o cristianismo no dia-a-dia, num
ambiente de graça e empatia, curando vínculos machucados e revigorando
relacionamentos.
O objetivo do trabalho é também despertar o interesse de outras
comunidades que tenham experiência no assunto para um diálogo em torno do
mesmo, pois a troca de experiências bem-sucedidas promove o crescimento e
aperfeiçoamento do trabalho de assistência pastoral.
9
1.1 Definição
1
BLASI, Marcia – Violência sexual na Infância: rumo a um aconselhamento pastoral. Trabalho de Conclusão
de Curso (Bacharel em Teologia) - Faculdades EST, São Leopoldo, 1997.
2
SANTOS, Beatriz Camargo dos. PROGRAMA DE APOIO A MENINOS E MENINAS. CENTRO DE
DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE BERTHOLDO WEBER. Maus tratos e abuso sexual contra
crianças e adolescentes: perfil da situação no Estado do Rio Grande do Sul. São Leopoldo: 1998.
10
Adolescente (ECA), desde 2000. O abuso poderia ser quantificado por meio de
análise de inquéritos baseados nos artigos 213 a 218 e 226 a 228 e 234 do CP3:
(...) Estupro
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter
conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato
libidinoso:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
o
§ 1 Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é
menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos (...)
Assédio sexual
Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de
superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego,
cargo ou função.
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. (...)
o
§ 2 A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18
(dezoito) anos.
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor
de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (...)
o
§ 3 Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos (...)
Corrupção de menores
Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia
de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos
Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente
Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou
induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de
satisfazer lascívia própria ou de outrem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos.
3
CÓDIGO PENAL BRASILEIRO – Disponível em <http://www.codigopenal.adv.br/#a213> Acesso em 22 de
abril de 2010.
11
Cada pessoa sofre o abuso de um modo único, portanto pensar nas causas
da violência que vitimiza crianças e adolescentes, implica a necessidade de
compreendê-las como resultado de interações de fatores individuais (biológicos e
4
ALLENDER, Dan B. - Lágrimas Secretas - cura para vítimas de abuso sexual na infância. Mundo Cristão, São
Paulo, 1999.
13
5
NUNES, Cristina Brandt. A violência intrafamiliar contra a criança e o adolescente na perspectiva de
profissionais de saúde. Tese (Doutorado) – Programa de Pós Graduação em Ciências, Universidade Federal de
São Paulo, Escola Paulista de Medicina, São Paulo, 2007.
6
ALLENDER, 1999, p. 63
15
7
MOURA, Andreína S; KOLLER, Silvia H. A criança na perspectiva do abusador sexual. Dissertação
(Mestrado) – Instituto de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2007, p. 33
8
MOURA, 2007, p. 40
9
MOURA, 2007, p. 35
10
GABEL, Marceline. Crianças vítimas de abuso sexual – São Paulo: Summus, 1997
16
11
LANGBERG, Diane M. Abuso Sexual: aconselhando vítimas. Curitiba: Editora Evangélica Esperança, 2002,
p. 66
17
12
Panfleto elaborado pela secretaria da Justiça e Segurança/RS. Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente – CEDICA. Comissão Estadual de Conselhos Tutelares/RS
13
BLASI, 1997, p. 9
14
THOMPSON R.S., BONONI A.E., ANDERSON M., REID R.J., DIMER J.A., CARREL D., et al. Intimate
partner violence prevalence, types , and chronicity in adult women. Am J Prev Med 2006;30 (6): 447-57 apud
MOURA, Leides B A. Empoderamento Comunitário – uma proposta de enfrentamento de vulnerabilidades.
Brasília: Letras Livres, 2008.
18
número estimado algo entre 200.000 a 500.000 casos, significando que somente
20% a 50% dos casos são notificados.15
A violência sexual contra crianças e mulheres não é um fenômeno
contemporâneo, ele faz parte de diferentes culturas e épocas onde pouco se
valorizava a figura feminina e a infância. É a expressão mais cruel do abuso de
poder. A violência sexual é uma manifestação das relações de poder historicamente
desiguais entre homens e mulheres.16
A falta de dados uniformes é um obstáculo tanto para a realização de
pesquisas que se aproximem da realidade quanto para formulação de políticas
nacionais voltadas à resolução deste problema, promovendo intervenções
preventivas e terapêuticas para as crianças e adolescentes e para suas famílias.
Mesmo assim, os levantamentos sobre ocorrências no Brasil mostram números
impressionantes.
Os resultados têm apontado que a maioria dos abusos sexuais contra
crianças e adolescentes ocorre dentro da casa da vítima e configuram-se como
abusos sexuais incestuosos, sendo que o pai biológico ou padrasto aparece como
principal perpetrador. Ocorre, também, uma maior prevalência em meninas,
principalmente entre os abusos incestuosos. Os meninos, em geral, são as maiores
vítimas dos maus-tratos, do abandono e da violência física.
A idade de início é bastante precoce, sendo que a maioria se concentra
entre os 5 e os 8 anos de idade. A mãe é a pessoa mais procurada na solicitação de
ajuda e a maioria dos casos é revelada, em geral, pelo menos um ano depois do
início do abuso sexual.17
Em Porto Alegre, uma análise realizada em 71 processos jurídicos do
Ministério Público do Rio Grande do Sul, no período entre 1992 e 1998, por violência
sexual, apontou a maioria das vítimas do sexo feminino (80,9%), com idades entre
cinco e dez anos (36,2%). Os pais foram os agressores em 57,4%%, seguidos pelos
padrastos ou pais adotivos (37,2%) das vítimas. A violência sexual foi denunciada
pela mãe da vítima em 37,6% dos casos, pela própria vítima em 29% dos casos, por
15
SANTOS, Hélio de Oliveira. Crianças Violadas. CENTRO BRASILEIRO PARA A INFÂNCIA E
ADOLESCÊNCIA. Brasília: CBIA, CRAMI, 1991.
16
MURARO, Rose Marie – A Mulher no Terceiro Milênio: uma história da mulher através dos tempos e suas
perspectivas para o futuro – 2 ed. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992.
17
HABIGZANG, Luísa F.; KOLLER, Silvia H.; AZEVEDO, Gabriela A; MACHADO, Paula X. Abuso Sexual
Infantil e Dinâmica Familiar: Aspectos Observados em Processos Jurídicos – Psi.: Teor. E Pesq., Vol. 21 n.3,
Brasília, set-dez 2005, pg. 341-348
19
ambiente familiar. A violência sexual foi predominante no sexo feminino dos 7 aos 12
anos de idade e teve como principal agente perpetrador o padrasto, seguido pelo
pai.23
23
NUNES, 2007, p. 13
21
24
SANTOS, 1991, p. 40
25
GABEL, 1997, p. 62
26
GABEL, 1997, p. 63
22
27
GABEL, 1997, p. 67
28
SANTOS, 1991, p. 41
29
GABEL, 1997, p. 63
30
Cf. FERENCZI, 1936 apud GABEL, 1997, p. 45-47
23
31
GABEL, 1997, p. 45-47
24
32
LANGBERG, 2002, p. 69-71
25
Diante disso, o que acontece é que a grande maioria das vítimas procura
ajuda apenas quando já estão adultas e com muitas dificuldades em lidar com os
desafios do seu cotidiano e com seus relacionamentos devido ao trauma sofrido no
passado.
33
Cf. Anexo 1
34
KORNFIELD, Débora. Vítima, Sobrevivente e Vencedor! Perspectivas sobre abuso sexual. São Paulo: Sepal,
2000.
35
Se um conselheiro decidir usar esta lista de forma diagnóstica, ele não deve de forma alguma sugerir para o
aconselhado que está suspeitando de abuso sexual. Se o abuso de fato aconteceu, o aconselhado irá se lembrar
dele, e vai lembrar-se por si só, na hora e na maneira adequada a seu caso.
26
36
LANGBERG, 2002, p. 257-260
28
37
CLINEBELL, Howard J. Aconselhamento Pastoral. 4. ed. São Leopoldo: Sinodal, 2007.
38
A BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Sociedade Bíblica Internacional, 2000. Cf. I João
3:18
30
Assim como você não deveria tentar curar os olhos sem curar a cabeça, ou
a cabeça sem o corpo, da mesma foram você não deveria tentar curar o
corpo sem curar a alma (...) porque uma parte nunca pode estar bem a
menos que o todo esteja bem. (...) Por isso, se quiser que a cabeça e o
corpo estejam bem, você deve começar curando a alma. – Platão
39
BLASI, 1997, p. 28-29
31
40
CLINEBELL, 2007, p. 108-109
41
PRADO, Adélia. A faca no peito, p. 12
42
Cf. Livro de Jó - NVI
32
Deus se revela no amor. E o amor tem que ser experimentado, tem que
brotar da confiança e do relacionamento. Se na fé cristã Deus é chamado de “Pai”,
fica evidente que experiências marcantes com o pai humano, ou figuras paternas,
tais como educadores, sacerdotes, tutores se transferem inconscientemente para a
imagem de Deus Pai. Quanto mais cedo isso acontece na infância mais intensa a
projeção. Fato que explica o questionamento de muitos, que ao escutarem falar do
Deus amoroso, indagam onde está Deus, se são permitidas fome, guerra, morte e
injustiças?
O sofrimento faz parte da vida do ser humano. Raramente podemos
compreender suas causas. Mas não há como fugir dele e nem como poupar alguém
de experimentá-lo. O abuso sexual provoca um grande sofrimento no corpo, na alma
e no espírito de quem o experimenta. O sentimento de ser abandonado por Deus é
muito forte. O ser humano se depara com o “silêncio” de Deus. Porém, é na maneira
com que o ser humano responde diante do sofrimento que se define o nível de sua
relação com Deus.43
Jó era inocente e estava sofrendo muito. Ele foi corajoso em expressar sua
revolta diante de Deus. Esparramou inconformidade com sua situação diante dele.
Mesmo que Deus permanecesse em silêncio e aparentemente distante, Jó não se
afastou, mas trouxe sua dor em toda intensidade diante de seu Criador. Jó não
aceitou a idéia de que seu sofrimento fosse retribuição às suas ações e não se
conformou com as acusações dirigidas a ele. Jó representa a crise espiritual da alma
inocente que sofre.
É praticamente impossível para uma vítima de abuso não se perguntar “onde
estava Deus naquele momento?” e o seu principal inimigo acaba sendo a recusa de
confiar em Deus. Esse foi o grande desafio de Jó. Confiar em Deus apesar do
sofrimento e descobrir o amor incondicional de Deus através do sofrimento.
Quando Deus resolve reagir aos protestos desesperados de Jó, Ele não o
faz trazendo respostas, mas sim, lançando perguntas. Nas suas perguntas, Deus
leva Jó a perceber o quão pequeno ele é diante do mundo criado pelo Deus Todo
Poderoso. A prova de sua bondade está na maneira como ele cuida da criação e Jó
43
ARAUJO, Viviane Brunhilde Jung; MUELLER, Enio R. Quando Deus se esconde: o desafio da presença
solidária a partir do livro de Jó. Monografia (Pós-Graduação em Psicologia e Aconselhamento Pastoral) –
Programa de Pós Graduação em Teologia, Faculdades EST, São Leopoldo, 2004
33
faz parte dela.44 Resta a Jó aceitar os caminhos de Deus e confiar nele. A crise pode
ser o caminho para o colo de Deus, onde fomos gestados.45
Jó reconhece Deus em toda sua grandeza e majestade, e esta é a resposta
que ele precisa. Não há mais necessidade de justificar Deus nem explicar suas
ações. Jó não sabe tudo de Deus, mas reconhece seu amor sobre todas as coisas,
inclusive sobre sua própria vida; e que as ações de Deus são determinadas pelo seu
amor infinito. As chagas continuam, mas a crise acabou.
O trauma do abuso sexual causa no coração humano, de maneira simplista,
um ambiente propício à tentação de se convencer que Deus não é bom! A escolha
por desconfiar de Deus deve ser confrontada com a possibilidade que o sofrimento
intenso tem de levar as pessoas a fazerem escolhas erradas. Se falhar a confiança
em Deus, essa confiança será desviada inevitavelmente para outra coisa ou pessoa,
que acaba se tornando um “deus”. Esta propensão para a idolatria está
profundamente enraizada no coração humano.
Jesus ensina às pessoas sobre Deus dizendo: “Olhem para mim! Quem me
vê, vê o pai”.46Através da experiência com Cristo, sua vida e suas obras, filtram-se
as experiências concretas com pais humanos, a fim de estabelecer a ponte de
relação amorosa com Deus Pai.47
A vida de Cristo girou em torno de sofredores de seu tempo. Ele era, para
estas pessoas, o rosto amoroso de Deus revelado, em contraste com um sistema
religioso e político que os fazia sofrer. Depois, ele morreu como Redentor para todas
as pessoas, as que sofrem e as que fazem sofrer, e implantou uma nova realidade a
partir de seu Reino, que é a razão da esperança de quem crê e a motivação da vida
amorosa e solidária do discípulo de Jesus. Foi em Jesus Cristo que Deus veio a nós
e se colocou ao nosso lado em nossa luta diária, chorando a dor daqueles que
sofrem, lamentando a corrupção humana. Ele é Emanuel- Deus conosco48.
O Filho de Deus nos ensinou que o falar de Deus deve passar pela
experiência da cruz. Jesus encontrou o desamparo e a morte justamente porque
44
ARAUJO, 2004, p. 29-32
45
WONDRACECK, Karin e HERNANDÉZ, Carlos – Aprendendo a Lidar com Crises – São Leopoldo: Sinodal,
2004, p. 39
46
Cf. João 14:9
47
RINKLIN, Ruth. A fé cristã como auxílio na recuperação da dignidade humana em vítimas de abuso sexual.
Monografia (Pós Graduação em Aconselhamento e Psicologia Pastoral), Programa de Pós Graduação em
Teologia, Faculdades EST, São Leopoldo 2004.
48
Cf. Mateus 1: 23
34
revelou Deus com amor. A negativa dos homens em aceitar esta mensagem leva
Jesus à morte. Suas últimas palavras “Meu Deus, meu Deus, por que me
49
abandonaste?” expressam a dor e a solidão de quem se sente abandonado da
mão de Deus. Ao gritar seu abandono com o começo do Salmo 22, Jesus torna seu
todo o texto. Este Salmo expressa a cruel solidão que pode experimentar uma
pessoa que crê profundamente: “Todavia Tu és o Santo, o entronizado para louvor
de Israel”.50Na Bíblia, a queixa não exclui a esperança.51
Sentimentos negados ou reprimidos com relação ao pai abusador ou a quem
quer que seja que tenha cometido o abuso precisam ter a sua hora de vir à tona. A
raiva, o ódio, o desespero, o medo, e outros sentimentos ruins que estão guardados
precisam ser reconhecidos e colocados ao pé da cruz, para que os bons
sentimentos possam fluir em relação a Deus. As vítimas de abuso precisam de um
lugar acolhedor em que isso possa acontecer sem que sejam consideradas hereges
ou rebeldes.
O ódio que a filha empenha em se destruir, em se defender é uma força de
vida enorme. Compreendi que precisava desviá-lo, transformá-lo em força
criadora. Sei apenas que é possível. A cada uma das que estão às voltas
com seus demônios interiores, tenho vontade de dizer: acreditem em vocês,
52
tentem! Procure sua solução, sua saída, ela existe!
A pessoa vítima de abuso sexual não precisa de uma boa experiência cristã
e nem de bagagem teológica, mas sim de ter um encontro real, afetivo e pessoal
com Deus. A glória da cruz reside no fato de que apesar de cada atitude,
pensamento ou sentimento manchado pela queda, nossas atitudes regeneradas são
limpas quando colocadas sob a justiça do sacrifício de nosso Irmão mais velho.53
A vivência da cruz – metáfora da morte de nossos anseios e ideais – pode
ser a etapa inicial de transformação operada em nosso ser pela esperança
da ressurreição, isto é, pela biologia da ressurreição. Sim, queremos
expressar a dinâmica cruz- ressurreição nessa linguagem híbrida, pois a
vivência da fé transforma nossa corporalidade de forma que as redes
neurais, o pulsar do coração, o ritmo da respiração, a cadência do passo, o
amar e o trabalhar são transformados quando assumimos a esperança
contida na promessa da ressurreição... Superar a crise é um pálido reflexo
54
da ressurreição.
49
Cf. Mateus 27: 46 e Marcos 15: 34
50
Cf. Salmos 22:4
51
GUTIÉRREZ, Gustavo. FALAR DE DEUS a partir do sofrimento do inocente – uma reflexão sobre o livro de
Jó. Vozes: Petrópolis, 1987
52
THOMAS, Eva. A violação do silêncio. Martins Fontes, 1988, p. 182
53
Cf. Efésios 5:2 e Hebreus 10:12
54
WONDRACECK, 2004, p. 76-77
35
55
WONDRACECK, 2004, p. 55
56
Cf. II Coríntios 12:9
57
WONDRACECK, 2004, p. 55
36
58
Cf. Jó 42: 1-6
59
ALLENDER, 1999, p. 184
60
ALLENDER, 1999, p. 243
37
5. Não devo manter segredo ou ter vergonha do meu passado, mas não sou
obrigado a compartilhá-lo com alguém que eu julgue indigno de confiança ou
insensível.
61
ALLENDER, 1999, p. 265
62
ALLENDER, 1999, p. 112
38
O perdão liberta a alma para viver livre do dano do passado. Perdoar não é
esquecer. A única forma de fazer isto seria através de uma negação não bíblica.
Obviamente apegar-se a uma lembrança com o propósito de exigir retificação ou
justificar um distanciamento cheio de ódio, também não é bíblico. O perdão bíblico
não é minimização ou esquecimento.
Perdoar é consentir num convite de Deus para assistir ao milagre da sua
graça. Perdoar é poder escolher de novo, livrando-nos da armadilha repetitiva
contida no humano desejo de vingança. Perdoar é aceitar. Aceitar que tanto as
imperfeições do outro como as nossas precisam ser perdoadas e que todos vivemos
sob a graça de Deus.
Aqui começa o desvio pedregoso que pode transformar em labirinto e
aprisionar: ao não perdoarmos, amarramos as faltas do outro a nosso ser e,
pouco a pouco, essas lembranças doloridas se transformam em pedras que
nos cercam e imobilizam. A mágoa pode paralisar; e ao invés de abrir
caminhos com perdões, fechamos o acesso com pedrões, que formam
64
muralhas entre nós e os outros.
O perdão não é algo que deve ser empurrado para a vítima. É um dos
aspectos do processo de cura, mas não deve ser imposto. Pode levar anos; não
existe um cronograma padrão para a maturidade espiritual.
A grande maioria das vítimas sofre com uma profunda rejeição de si mesma.
Sofrem frequentemente com sentimentos negativos como vergonha, ira e medo. No
entanto o sentimento mais difícil de lidar é com a culpa. Perdoar a si mesmo é
desligar-se da culpa sentida pelo abuso sofrido. Mesmo conscientes de que não
poderiam ter feito diferente, a maioria das vítimas sofre um longo processo para se
livrar da culpa. O importante é reforçar que se Deus ama incondicionalmente a
pessoa, ela precisa entender que manter-se presa com a culpa é negar esse amor
incondicional.
Jesus Cristo, que estando na cruz solicita o perdão de Deus aos seus
abusadores “porque não sabem o que fazem”,65 é o exemplo maior de que o amor
intenso não anula a necessidade da justiça, mas ele a entrega ao Pai, abrindo
definitivamente o espaço para a restauração do homem.
63
THOMAS, 1988, p. 186
64
WONDRACECK, 2004, p. 34
65
Cf. Lucas 23:34
39
66
Cf. Mateus 7:1-2
67
Cf. Mateus 6:15
68
WALSH, Froma. Fortalecendo a Resiliência Familiar. São Paulo: ROCA, 2005, p. 273
40
4. Utilizar o púlpito como local de ensino bíblico com aplicação prática nas
questões de violência, usando linguagem apropriada. Deve-se nomear o
abuso sexual como pecado e pregar sobre o tema.
69
FEDERAÇÃO LUTERANA MUNDIAL. Departamento de Missão e Desenvolvimento; SINGH, Priscilla. As
Igrejas dizem "não" à violência contra a mulher: plano de ação para as Igrejas. Genebra: Federação Luterana
Mundial, 2005.
70
HEGGEN, Carolyn Holderread. Abuso sexual en los hogares cristianos y la Iglesia. Bogotá: Ediciones
Clara, Guatemala: Ediciones Semilla, 2002, p. 180
71
HEGGEN, 2002, p. 226
41
9. Cuidar dos líderes para que sejam modelos de uma vida sexual saudável e
equilibrada.
Carolyn Heggen cita, em seu livro “Abuso Sexual en los hogares cristianos y
la iglesia”, o depoimento de uma vítima a respeito de como se sente em sua
comunidade religiosa e que demonstra a realidade encontrada em muitos casos72:
A veces creo que preferiría estar en una silla de ruedas que sufrir una pena
mental o emocional. Si hubiese quedado inválida por culpa de un conductor
ebrio sería fácil para otros entender por qué estoy aún en una silla de
ruedas o por qué necesito de una cirugía una y otra vez. La gente no diría:
‘Eso ya está en el pasado, debes sobreponerte’, porque la silla de ruedas
sería la clara evidencia de que aunque la falta está en el pasado, las heridas
están presentes.
Cuando Jesús curó a una mujer inválida, los fariseos se molestaron con él
por sanar en el día de reposo. Hay momentos en que siento que las
personas no aceptan lo método de mi sanidad o el tiempo que me toma.
Pero Jesús dijo: -¿No debe esta mujer que es hija de Abraham, a quien
72
HEGGEN, 2002, p. 180
42
Satanás mantenía atada desde hace dieciocho años, ser liberada de esta
73
atadura, aunque fuera en sábado?(Lucas 13:16)
73
“Às vezes creio que preferia estar em uma cadeira de rodas a sofrer um problema mental ou emocional. Se
tivesse ficado inválida por culpa de um motorista bêbado seria fácil para outros entenderem porque ainda estou
numa cadeira de rodas ou porque necessito de uma cirurgia de vez em quando. As pessoas não diriam: ‘Isto já
passou, deve superá-lo’, porque a cadeira de rodas seria a evidência clara de que ainda que o problema tenha
ocorrido no passado, as feridas estão presentes no hoje. Quando Jesus curou uma mulher inválida, os fariseus se
incomodaram com ele por curar num dia de descanso. Há momentos que sinto que as pessoas não aceitam o
método de minha restauração ou o tempo que me toma. Mas Jesus disse: ‘Não deve esta mulher que é filha de
Abraão, a quem Satanás mantinha presa há dezoito anos, ser liberta, mesmo sendo no sábado?’. Lucas 13:16”
(tradução nossa)
74
Cf. Mateus 18:6
43
falar sobre algo que esteja acontecendo com ela e que a deixe confusa, medrosa e
retraída.
Os facilitadores de grupos infantis deverão ficar atentos aos sinais de
possível abuso sexual que já foram citados anteriormente, para abordar o assunto
de maneira gentil, de forma que consiga a confiança da criança para se abrir sobre o
que está acontecendo com ela.
Todas as forças operarão para a criança se calar. Especialmente se ela faz
parte de uma família de risco. Muitas vezes será preciso escutá-la a sós, com o
intuito de acreditar no que ela disser.75 É preciso sustentar a palavra dela e
reconhecer o quanto ela é frágil em tal situação. O risco de que se feche para
grande alívio de todos é grande, porque ela já passou pela experiência do abuso de
poder dos adultos e da ausência de respeito pela sua pessoa.
A confirmação do abuso pela criança é uma situação bastante delicada, pois
uma vez revelado o assunto, é necessário abordar a família da criança. Se os pais
frequentam a comunidade, isso pode facilitar, mas quando só a criança está inserida
neste contexto, a questão torna-se bem mais complicada, especialmente se o
abusador é o pai ou padrasto ou o responsável por ela. Assim como no caso dos
profissionais de saúde, a comunidade religiosa pode ser acusada pela família de ter
“criado” o abuso. A situação da criança em seu contexto familiar pode piorar,
dependendo da abordagem.
Denúncias anônimas ao Conselho Tutelar podem ser feitas, mas
infelizmente o sistema ainda possui muitas falhas e isto não garante a segurança e o
cuidado com a criança. Então, o que fazer nestes casos? Não existe nenhuma
resposta que não seja acompanhada de riscos. É importante ver as particularidades
de cada situação, compartilhar com a liderança da comunidade religiosa, orientar a
criança e apoiá-la, procurar ajuda de outros profissionais relacionados e tomar a
melhor decisão.
75
GABEL, 1997, p. 59
44
76
Cf. I Pedro 5:7
45
77
HEGGEN, 2002, p. 104-122
46
Algumas igrejas assumem que pessoas que sofreram abuso sexual são
oprimidas pelo diabo. Acreditam que as lembranças podem ser uma trama de
demônios, o que anula a veracidade do abuso; ou as lembranças são eventos reais
colocados na mente pela entidade maligna que habita na pessoa. Em ambos os
casos a estratégia é expulsar o demônio através do ritual do exorcismo.
A intenção não é aprofundar este assunto, mas sublinhar que muitas vítimas
passam por várias sessões vexatórias de exorcismo, na falsa esperança que curas
rápidas possam resolver problemas profundos. Na grande maioria das vezes, ao
perceberem que o problema continua, acabam enfraquecendo na fé.
A cura rápida não é exclusividade de um único grupo. Muitos oferecem
soluções para emoções ou lembranças indesejadas através da tentativa de abordar
o problema de uma forma “positiva”. O resultado pode ser uma negação dos fatos e
um bloqueio emocional atrapalhando o processo de cura. O anseio pela cura é tão
intenso que muitas vítimas acabam buscando estas alternativas.
Portanto, seguem alguns cuidados que pastores e comunidades cristãs
devem ter ao atender vítimas de abuso sexual e suas famílias, bem como
abusadores:78
1. Com a incredulidade (não acreditar que o abuso ocorre na comunidade),
78
RIQUELME MARTINEZ, 1999, p. 93
47
79
BLASI, 1997, p. 25
80
Cf. Mateus 9: 1-8, Marcos 2:1-11 ou Lucas 5: 17-26
48
81
SCHEUNEMANN, Arno V. Pequenos grupos: um caminho que viabiliza a comunidade terapêutica na
comunidade cristã. IGREJA LUTERANA, São Leopoldo, vol. 57, n. 2, p. 175-186, 1998.
50
82
Apud FOSTER, Richard J. Oração – O Refúgio da Alma. 2 ed. Campinas: Cristã Unida, 1996 p. 217
83
Tiago 5: 16
84
MUELLER, Enio R. Caminhos de Reconciliação – A mensagem da Bíblia. São Leopoldo: Grafar, 2010, no
prelo
85
MUELLER, 2010, p. 169
52
um novo horizonte. O amor de Deus reconcilia o ser com sua história, e a sua
história pode ser vista como aquilo que sempre foi: parte da história de Deus.86
86
MUELLER, 2010, p. 171
87
COELHO, Ana Alice Teixeira de Lima; HOCH, Lothar Carlos. Aconselhamento em grupos na igreja local.
2008. 47 f. TCCP (Especialização em Aconselhamento e Psicologia Pastoral) - Escola Superior de Teologia,
Programa de Pós-Graduação, São Leopoldo, 2008
53
88
KORNFIELD, David. Aprofundando a Restauração da Alma através de Grupos de Apoio. São Paulo: Mundo
cristão, 2008
54
89
COELHO, 2008
90
KORNFIELD, 2000.
91
O livro se chama Helping Victims of Sexual Abuse, da Bethany House Publishers, Minneapolis, cujos passos
foram extraídos e traduzidos por Débora Kornfield em seu livro p. 171-196.
55
É uma ferramenta semelhante aos Doze Passos dos AA. Para a sua
aplicação é necessária a presença de um facilitador, que pode ser inclusive uma
pessoa que sofreu abuso sexual e que já passou pelo processo de receber
restauração de seus relacionamentos e cura emocional e espiritual. Os encontros
são semanais e os participantes precisam preencher as tarefas e executá-las em
grupo durante o processo. Os passos se resumem assim92:
1. Reconheço que estou impotente diante das mágoas consequentes do
incesto. Não consigo me curar. Eu me submeto a Deus para que Ele me
sare.
2. Afirmo que o plano de Deus para minha vida inclui vitória sobre as
consequências do abuso sexual.
92
Os passos bem como as tarefas propostas podem ser encontrados no Anexo 2.
56
importantes para leigos e equipes pastorais que façam ou desejem fazer este tipo de
trabalho são: 93
1. Garantir à vítima apoio durante o doloroso caminho das recordações.
5. Escutar cuidadosamente enquanto ela tenta buscar razão para sua dor e
questiona com dureza.
Muitas vítimas têm sido beneficiadas ao passar por esse “trilho”. Estar com
outras vítimas de abuso nesta dolorosa, mas necessária caminhada, reconhecer e
acreditar que o seu problema pode ser superado e encontrar-se com elas num
ambiente acolhedor tem proporcionado resultados impressionantes em muitas vidas
e nas igrejas que se dispuseram a trabalhar com este tipo de grupo.
93
HEGGEN, 2002, P. 178-180
57
conhecidos que atuam nesta área encontramos Agnes Sanford, Anne White,
Catherine Marshall, Ruth Carter Stapleton, Francis MacNutt, Michael Scanlan, Reg
East e Roger Moss.94
Ruth Stapleton explica este processo como uma “reconstrução emocional
experimentada sob a orientação do Espírito Santo”, e acrescenta que “não há
nenhuma tentativa de suplantar a psiquiatria ou subestimar a sabedoria da
95
psicologia secular” . O que há é a pressuposição de que, para Deus, o passado é
um livro aberto, no qual é possível voltar por suas páginas sentindo a companhia de
Cristo, revelando aqueles parágrafos borrados que se haviam esquecido e cujas
ilustrações trazem vergonha.
A experiência da cura interior inicia-se quando uma circunstância, como uma
experiência espiritual, uma olhada para dentro, provocada por algum método
curativo, psicológico ou espiritual, ou a vontade de se curar, ocorre. Este último fator,
a vontade de se curar, é a base de toda experiência verdadeira96. Ruth Stapleton
diz:
A vida de sua mente é parte maravilhosa do universo. Todo aquele que se
jactar de compreendê-la nada conhece da sua profundidade. Deus pode
devolver a mente à vida; nós não podemos, assim como não podemos criar
novo tecido cerebral. Mas, no que diz respeito a esse sentido da vida que o
amor de Jesus Cristo traz, podemos entregar-nos à tarefa de extirpar as
recordações doentes e substituí-las por novas e ricas imagens, no fundo da
mente. Essas novas imagens levarão a uma vida sã e construtiva. Remover
o material velho e substituí-lo por outro, mais novo, é o objetivo total da cura
97
das recordações.
94
HURDING, Roger F. A ÁRVORE DA CURA – modelos de aconselhamento e psicoterapia. Edições Vida
Nova: São Paulo, 1995, p. 416
95
STAPLETON, Ruth C. A CURA PELA FÉ. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora RECORD, 1976.
96
STAPLETON, 1976, p. 21
97
STAPLETON, 1976, p. 22
58
98
HURDING, 1995, p. 417
99
Cf. Anexo 3
100
Maxwell Malt apud STAPLETON, 1976, p. 58
101
CLINEBELL, 2007, p. 124
102
Provérbios 23:7
103
WHITE, Anne S. HEALING ADVENTURE – the real meaning of Divine Healing. Plainfield, N.J.: LOGOS
INTERNACIONAL, 1969
59
curando a pessoa, ou visualizar a pessoa curada por Jesus. Eles também devem ser
sensíveis às cicatrizes emocionais que requeiram a viagem da imaginação pela fé.
Quão libertador é ajudar a pessoa a experimentar a presença de Jesus Cristo em
seu sofrimento e transformar suas dores por meio do amor de Deus, recebendo sua
graça, sua paz e seu perdão104.
Num clima de oração, o Espírito Santo é capaz de guiar a pessoa a uma
atitude aberta e humilde de espírito para resolver seus sentimentos negativos, suas
culpas falsas e verdadeiras e serem curadas pelo amor perdoador de Cristo. Os
intercessores são canais pelos quais a graça de Deus chega à pessoa ferida. A
105
presença de Jesus Cristo “levando sobre si as nossas feridas” transforma a
experiência dolorosa e faz com que o sofrimento tenha um novo sentido para a
pessoa.
Além dos grupos de oração, é comum estimular a prática da oração com a
imposição de mãos e unção com óleo, baseado no texto de Tiago “para que estes
orem sobre ele e o unjam com óleo”. A prática da confissão de pecados junto a uma
pessoa treinada também é estimulada como parte do processo de cura106.
Quando as pessoas estão presas ao passado elas não conseguem se liberar
dele sem a ajuda de outras pessoas. O conselheiro pastoral deve orar para que os
obstáculos que estão bloqueando a cura sejam removidos tanto da vida da pessoa
necessitada como de sua própria vida. A maioria destes obstáculos são sentimentos
de medo, ciúmes, ressentimento e mágoa, orgulho, autopiedade, ingratidão e
sentimentos de culpa.
It is evident that we, as individuals, are quite capable of setting up very
effective "road blocks" on the highway to healing, but it is often too painful
remove these barriers alone! How much the emotionally distressed and
physically ill need "listening posts" and prayers partners - God's servants (be
they ministers or trusted Christian friends) who are not too busy to listen.
Under the guidance of the Holy Spirit with prayer, patience and a more
objective point of view, they can help the confused to sort out real from
fantasy problems before it is too late. There is a ministry of the laity awaiting
those who in faith and love will choose to be chosen by our Lord to serve
Him in fulfilling this need. (...) many found the courage to face old memories,
"hidden in the basement of the house of life", to let the Love of Jesus purify
the musty rooms. If we are trusting in Him to show us how and where, our
107
Lord will bring those who need to experience His healing Love through us.
104
KORNFIELD, 2008, p. 194-197
105
Isaías 53: 3-5. NVI.
106
Tiago 5: 13-16 e I João 1: 8-10
107
WHITE, 1969 p. 101-102
“É evidente que nós, individualmente, somos bem capazes de levantar barreiras muito eficientes na estrada que
leva à cura, mas a tentativa de remover, sozinhos, essas barreiras frequentemente é dolorosa demais. Como os
60
emocionalmente atribulados e os fisicamente doentes precisam de locais onde sejam escutados e de parceiros de
oração – servos de Deus (sejam ministros ou amigos cristãos que mereçam confiança) que não estejam tão
atarefados que não possam escutar. Sob a orientação do Espírito Santo, com oração, paciência e um ponto de
vista mais objetivo, eles podem ajudar os confusos a distinguir entre a realidade e os problemas imaginários,
antes que seja tarde demais. Existe um ministério para leigos aguardando aqueles que, em fé e amor, escolherem
ser escolhidos pelo nosso Senhor para servir a Ele no preenchimento dessa necessidade. (…) Muitos
encontraram coragem suficiente para encarar memórias antigas, “escondidas no porão da casa da vida”, para
permitir que o Amor de Jesus purificasse as salas emboloradas. Se confiarmos nEle para nos mostrar o como e o
aonde, nosso Senhor trará as pessoas que estejam precisando experimentar, por nosso intermédio, o seu Amor
curador”. (tradução nossa)
61
108
Salmo 139: 23-24
109
LANGBERG, 2002, p. 121
110
LANGBERG, 2002, p. 128
111
LANGBERG, 2002, p. 128
62
112
Cloé Madanes formou-se em Psicologia pela Universidade de Buenos Aires em 1965. Foi para os Estados
Unidos onde estudou Terapia Familiar Sistêmica em Palo Alto. Foi contratada por Salvador Minuchin para
trabalhar na Filadélfia com famílias latinas e atualmente é co- diretora do Family Therapy Institute de
Washington. É docente e supervisora em psicoterapia há mais de 15 anos, autora de vários livros, numerosos
artigos e vídeos. Publicado por Héctor Pablo Label em Perspectivas Sistêmicas n.1 e recuperado pelo site
http://www.redsistemica.com.ar/articulo1-8.htm
63
113
MADANES, Cloé. Sexo, amor y violência: estrategias de transformación. Barcelona: Paidós, 1993.
114
______; KEIM, James P.; SMELSER, Dinah. Violencia masculina. Barcelona: Granica, 1997.
64
vítima e para outros familiares. Estabelece publicamente, perante toda a família, que
a vítima não tem culpa de nada que aconteceu, e que não está obrigada a perdoar.
Passo 8: Pedir à mãe que se desculpe.
O terapeuta pede à mãe (especialmente quando o agressor é o pai ou
padrasto) e aos outros familiares envolvidos que se ajoelhem diante da vítima e
expressem seu arrependimento por não havê-la protegido o suficiente. É uma forma
também da vítima entender que os adultos deveriam cuidar dela e de que não é
culpa sua o ocorrido.
Ao se deparar com uma mulher que parece estar “falhando” no seu
papel de protetora, muitos terapeutas ficam tentados a se concentrar na sua
deficiência e torná-la um objeto de mudança. Mães “cúmplices” do abusador, que
não acreditam em suas filhas (o mais comum) podem facilmente se tornar alvos de
recriminação e a terapia pode reforçar isto.
Na verdade, essas mulheres são parte de um sistema que inclui a diferença
de poder entre homens e mulheres. A melhor maneira de ajudá-las seria fazê-las
construírem realidades nas quais pudessem contestar os abusos de poder. A
continuidade do poder masculino no contexto do abuso sexual contra crianças
depende de as mulheres continuarem a distorcer suas próprias realidades, de tal
forma que não existe uma concordância entre elas (mães e filhas) quanto à natureza
de sua experiência.115
Passo 9: Analisar as consequências de possíveis futuros delitos.
Discutir com os pais quais serão as consequências se algo semelhante
voltar a acontecer. O terapeuta estimula estabelecerem-se consequências duras:
expulsão do seio familiar, internação, prisão.
Passo 10: Ouvir a vítima a sós.
O terapeuta se encontra com a vítima para falar sobre o abuso, seus
sentimentos, seus medos e sua dor. Expressa simpatia e aceitação para superar o
trauma e estimula a ter esperança e dar enfoque ao seu crescimento como pessoa.
Esse passo pode ocorrer paralelamente aos outros.
Passo 11: Encontrar um protetor.
115
PERELBERG, Rosine J., MILLER, Ann C. (Orgs.) Os sexos e o poder nas famílias. Rio de Janeiro: Imago,
1994. p. 151-161
66
terapeuta deve reforçar que lembrar o passado é uma maneira de não repeti-lo;
portanto as lembranças têm um caráter terapêutico, desde que não ocupem todo o
seu pensamento. Dedicar-se a obras de caridade, preferentemente de forma
anônima, poderá fazê-los sentirem-se melhor consigo mesmos.
Estes passos podem ser adaptados num contexto de aconselhamento
pastoral; inclusive somados aos recursos da oração, intercessão e leitura bíblica,
têm produzido bons resultados no acompanhamento de famílias com esse problema.
Eles também podem ser usados, como já dito anteriormente, nos casos de vítimas
adultas que desejarem esclarecer sua situação com os pais e familiares.
Em cada caso deve-se usar de bom senso e adaptar conforme a
necessidade. Este método foi idealizado para casos onde tenha havido violência e
violação. Há situações, por exemplo, como de dois irmãos que se envolveram num
jogo sexual, onde não houve nem violência e nem violação. Aplicar todos os passos
neste caso criaria mais problemas do que soluções. O terapeuta poderia dar uma
explicação clara sobre os problemas do incesto e discutir sobre maneiras saudáveis
de expressar a sexualidade.
Outro aspecto interessante deste método é que ele inclui o cuidado com o
abusador. As vítimas sofrem muito com o abuso sexual, e as sequelas são graves e
influenciam vários aspectos de suas vidas. Mas se existem tantas vítimas como foi
citado no primeiro capítulo, existem muitos abusadores. É tarefa do conselheiro
pastoral oferecer ajuda ao abusador quando ele se apresenta no processo. Pensar
na criança que há em cada abusador, que pode ter sido maltratada e violentada,
torna mais fácil criar empatia para com ele.116
O aconselhamento em grupos do REVER pode ser utilizado para auxiliar na
recuperação não somente de vítimas, mas também do abusador. Não é incomum
que ao caminhar pelos Doze Passos e desejar uma vida honesta diante de Deus e
dos companheiros de grupo, um abusador se revele. Estar em um grupo de apoio,
lidando com as emoções negativas de sua história, e ser confrontado quanto às
suas responsabilidades, permite ao abusador sentir a graça e o amor de Deus e
receber cura emocional e espiritual.
116
GABEL, 1997, p. 60
69
117
HEGGEN, 2002, p. 172
“As congregações devem trabalhar com as vítimas e os transgressores até levá-los ao ponto que se propicie a
reconciliação. Este é um assunto importante do Reino de Deus, e também é um trabalho muito satisfatório.
Poucas experiências são tão poderosamente comovedoras como chegar ao verdadeiro arrependimento e perdão
até a reconciliação. Os anjos e o céu devem dar piruetas de gozo eufórico quando duas pessoas que estavam
distanciadas e isoladas em sua própria dor se abraçam em amor, reconciliação e uma relação renovada”.
(tradução nossa)
70
CONCLUSÃO
Para isso é preciso que os adultos se declarem prontos a ouvir esse tipo de
coisa, pois definitivamente só encontraremos a violência – e a violência sexual em
particular – se a buscarmos.
A convivência da criança ou do adolescente com o agressor, o qual na
maioria dos casos não é denunciado, e que tem como papel ser protetor e provedor,
pode levar a um estado permanente de medo e estresse, podendo desencadear
como consequências doenças físicas e sofrimento mental.
As sequelas emocionais podem incluir ataques de ansiedade, fobias,
depressão e pensamentos de suicídio, desespero e falta de esperança.
Descontentamento geral com a vida, paralisia emocional ou entorpecimento,
dificuldades com a raiva, e angústia profunda.
Pode haver muitos efeitos somáticos do abuso na infância, como
enxaquecas, tensão muscular, problemas com a articulação mandibular, problemas
gastrointestinais, anorexia, bulimia, compulsão por comida. Disfunções sexuais são
comuns: aversão ao sexo, distúrbios no desejo, confusão quanto à identidade
sexual, compulsão por sexo, ninfomania, masturbação compulsiva,
sadomasoquismo e prostituição.
Acrescentando-se a violência e a confusão do abuso sexual a um contexto
familiar caótico e negligente, fica claro que um ambiente desses deixará sua marca
na identidade, recordação, cognição e fisiologia da criança em desenvolvimento. As
vítimas são pessoas que passarão sua juventude, e porque não dizer a vida,
marcadas pelo horror destes momentos traumáticos.
A violação sexual de uma criança também pode trazer muitas
consequências espirituais. Uma imagem distorcida de Deus, conjugada com uma
imagem distorcida do si–próprio, cria diversas barreiras para experimentar o amor e
a graça de Deus. Viver abaixo do padrão para o qual alguém foi feito é trair a alma,
de modo tão grave quanto aquilo que foi feito pelo abuso. Essa deve ser uma boa
razão para escolher trilhar o doloroso caminho da mudança e da cura.
Quando se trata de ajudar as vítimas a se recuperarem espiritualmente das
sequelas do abuso, a igreja possui inúmeros recursos que possibilitem isto. Através
do convívio num ambiente acolhedor, da oração, da intercessão, da leitura bíblica,
da meditação, do estudo bíblico, etc., o amor de Deus pode fluir nos corações aflitos
e a pessoa se vê capaz de superar suas dificuldades.
72
Em grande parte dos casos, a igreja pode ser o único espaço terapêutico da
vida da pessoa, especialmente se suas condições financeiras não permitem a
procura por um profissional liberal. Esta realidade indica a importância que devemos
dar ao fato e que devemos buscar cada vez mais estratégias para incrementar a
dinâmica de cura das relações humanas cotidianas e suas crises no ambiente
eclesiástico.
Capacitar comunidades e lideranças para este olhar perceptivo e atento às
necessidades sociais a partir das demandas pessoais é um longo e árduo caminho
que está apenas começando. Não podemos negar que em nossa comunidade, e
consequentemente em nossas igrejas, existam crianças sendo abusadas e vítimas
adultas de abuso na infância. Não vivemos à parte da sociedade, mas somos parte
dela e, portanto, sofremos com o que a sociedade sofre.
Quando líderes cristãos não acreditam na grande quantidade de vidas
vitimadas pelo abuso sexual, isso significa que ele é mantido em segredo, porque
muitas destas pessoas sofredoras possivelmente não acreditam que poderão
encontrar algum tipo de ajuda na igreja. Quando o problema não é prioridade, ele
acaba sendo visto como “raro”. Uma pequena e simples sugestão para estes líderes
é que, sempre que forem falar, considerem simplesmente o acréscimo da palavra
abuso sexual a qualquer lista de problemas pelos quais os fieis possam estar
lutando. As vítimas sairão do esconderijo!
Métodos de assistência e aconselhamento em grupo constituem o recurso
mais fecundo para a ampliação e o aprofundamento do ministério de cura e
crescimento de uma igreja. Abordagens em grupo, aplicadas a um amplo espectro
de crises e questões de vivência, podem permitir que a igreja seja um agente na
prevenção de problemas de personalidade através do estímulo ao cuidado integral
do ser, ajudando-o a restaurar sua identidade à imagem do Criador.
Compartilhar sentimentos, dificuldades e experiências, num grupo que se
propõe respeito e compreensão mútua, também faz nascer autocompreensão,
respeito próprio, e motiva a vivência comunitária. Assim o compromisso de cuidado
mútuo em grupos ao passar por sofrimento, é comunhão na busca da cura e da
transformação de estruturas, modelos e paradigmas.
Na experiência da CEBA o cuidado de vítimas adultas de abuso sexual na
infância tem ocorrido mais intensamente através do aconselhamento em grupos. Os
modelos utilizados são vários: o modelo do ministério REVER, que utiliza os Doze
73
REFERÊNCIAS
CERVO, Amado L.; BERVIAN, Pedro A. Metodologia Científica. 5. ed. São Paulo :
Person Prentice Hal, 2002.
GABEL, Marceline. Crianças vítimas de abuso sexual – São Paulo: Summus, 1997.
HERBES, Nilton Eliseu. Manchas roxas: violência contra a mulher. TCC (Bacharel
76
NOÉ, Sidnei Vilmar; HOCH, Lothar Carlos; WONDRACEK, Karin Hellen Kepler;
SIMPÓSIO DE ACONSELHAMENTO E PSICOLOGIA PASTORAL 1. 2002. São
Leopoldo, RS. Comunidade terapêutica: cuidando do ser através de relações de
ajuda. São Leopoldo: Escola Superior de Teologia, Sinodal, 2003.
PERELBERG, Rosine J.; MILLER, Ann C. (Orgs.) Os sexos e o poder nas famílias.
Rio de Janeiro: Imago, 1994.
STAPLETON, Ruth C. A CURA PELA FÉ. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora RECORD,
1976.
118
Extraído e traduzido do livro Secret Survivers de E. Sue Blume, Cf. KORNFIELD, 2000, p. 163 - 166
80
20. Padrão de ser a vítima (inclusive autovitimização depois de ser vitimado (a)
pelos outros), especialmente na área sexual; falta de percepção de seu
próprio poder e habilidade de estabelecer e manter limites saudáveis e dizer
“não”; padrão de relacionamento com pessoas muito mais velhas (começa na
adolescência).
21. Sentir-se obrigado (a) a produzir e ser amado, fazendo como por instinto o
que os outros querem ou precisam; relacionamentos significam ter que dar
muito para receber pouco (o “amor” é exigido, não opcional).
22. Sentimentos profundos de abandono.
23. Falta total de memória quanto a certo(s) período(s) da infância ou
adolescência; inabilidade em lembrar-se de certa pessoa ou de certo lugar.
24. Sentimento de estar carregando um segredo horrível; forte desejo de expô-lo
ou medo de expô-lo; certeza de que ninguém vai escutar ou acreditar em sua
versão; geralmente fechado (a), não querendo se abrir; sentimento de que o
próprio corpo está traindo “o segredo”.
25. Sentimento de loucura; sentimento de ser diferente de todo o mundo;
sentimento de ser irreal e o resto do mundo real, ou vice-versa, criando um
mundo de fantasias, de relacionamentos ou identidades ( especialmente as
mulheres imaginando-se homens e portanto não mais vulneráveis a eles).
26. Negação: falta total de percepção; repressão de memórias; fingimentos;
minimizando (não foi na realidade tão horrível assim...); autoconvencimento
de que as lembranças são apenas imaginações; reações fortemente
negativas a uma pessoa, um lugar ou um evento; flashes sensoriais
(sentimentos físicos) sem significância identificada; lembrança de um lugar,
sem recordar-se do que aconteceu lá.
27. Assuntos sexuais: sentimento que o sexo é “sujo”; intolerância ao ser tocada
(o), inclusive por médico, e especialmente no exame ginecológico; aversão
muito forte a (ou carência de) certos comportamentos sexuais; sentimento de
traição do próprio corpo; dificuldade de integrar sexualidade com emoções;
confusão entre afeto, sexo, agressividade e violência; necessidade de
domínio e controle na área sexual (mulheres: autoabuso e manipulação;
homens: abuso de outros); ou compulsivamente sedutor (a) ou totalmente
assexuado (a); tem que ser o(a) agressor(a) sexual, ou não pode tomar
iniciativa sexual; sexo impessoal e promíscuo com pessoas desconhecidas
junto com inabilidade de ter relação sexual num relacionamento íntimo
(conflito entre sexo e amor); prostituta(o); “símbolo sexual”; envolvimento com
pornografia; uso do sexo para expressar raiva ou vingança; vício sexual;
negação total da sexualidade; “congelamento” de sentimentos sexuais; choro
pós-orgasmo; todo envolvimento sexual parece violação; sexualizar qualquer
relacionamento significativo; reação erótica a abuso ou raiva; fantasias
sexuais de dominação ou estupro.
28. Padrão de relacionamentos ambivalentes ou intensamente conflituosos;
inabilidade de manter relacionamentos íntimos.
29. Tendência a evitar espelhos (ligado ao desejo de ser “invisível”, vergonha e
baixa auto-estima; falta de confiança na imagem do corpo).
30. Desejo de mudar de nome (de não ter mais ligação com o agressor, ou de
assumir controle de si através de poder se autonomear).
31. Baixa tolerância do sentimento de bem-estar; fuga deste sentimento;
inabilidade de confiar nele.
81
32. Aversão a fazer barulho (inclusive no ato sexual; choro; riso; qualquer outra
função do corpo); hipervigilância da fala (escolhendo as palavras com maior
cuidado); uso de tom de voz baixa, especialmente quando precisa ser ouvida
(o).
33. Adultos: furto (tentativa inconsciente de se vingar de tudo que foi roubado de
si). Na infância: furtos e incêndios.
34. Síndrome de personalidades múltiplas.
82
119
Extraído e traduzido do livro Helping Victims of Sexual Abuse, da Bethany House Publishers, Minneapolis,
Cf. KORNFIELD, 2000, p. 171 - 196.
83
“Ficar”:
- idade em que começou
- freqüência
- número de parceiros
- tipos de atividades
Relações Sexuais:
- freqüência
- número de parceiros
- sexo do parceiro (igual ou
87
oposto)
- tipos de parceiros (cônjuge,
noivo, namorado, prostituta,
outro)
Sentimentos a respeito de
relações sexuais extraconjugais
Uso de pornografia:
- freqüência
- tipos
- lugares
PARA HOMENS Eu Minha esposa/ outra
pessoa
Você se sente masculino?
- beijos
- “ficar”
- “transar”
- número de parceiros
Casamento:
- relações sexuais antes do
casamento
- a lua de mel (gostosa /
aborrecida)?
Cônjuge cuidadoso?
Complicações (dor, frigidez,
impotência)?
Sexo no casamento:
- satisfação de um modo geral
- perspectiva da satisfação do
cônjuge de modo geral
- sexo extraconjugal?
Agora, escreva a respeito de outras mensagens que você tenha recebido quanto à
sexualidade, tanto verbais (explícitas) quanto não-verbais (implícitas). Quais são as
coisas que se fala a respeito de sexo, no meio em que você vive (por exemplo: “sexo
é sujo”, ou “sexo faz bem à saúde”, etc.)? Você de alguma forma chegou a pensar
dessa forma? Como você avalia essas “crenças populares” agora?
Uma advertência importante sobre o que você deve compartilhar acerca disso
tudo no grupo de apoio: O valor da maior parte deste exercício talvez seja orientá-
lo a avaliar sua experiência sexual e chegar a conclusões que o ajudem. Estas
conclusões talvez sejam apropriadas para compartilhar no grupo, mas não o
conteúdo todo. Antes de divulgar informações detalhadas quanto às suas
experiências, leve seriamente em consideração os traumas/sensibilidades/feridas
dos outros componentes de seu grupo. Se você sentir necessidade, será melhor
procurar uma conversa à parte com alguém fora do grupo, e/ou com seu cônjuge,
lembrando sempre que o propósito não é o de escandalizar ou traumatizar, e muito
menos divertir alguém, mas sim, encontrar perdão e libertação de atitudes e atos
pervertidos, sejam estes responsabilidade sua ou de outra pessoa. De forma
nenhuma queremos entrar numa “brincadeira” de comparação de experiências
sexuais com os outros membros do grupo.
Passo 4 : Descobrindo Minha Própria Identidade: Minha identidade verdadeira
está em Deus e em Sua Palavra. Estou ativamente procurando minha
identidade como uma pessoa amada, que tem valor.
“Só Deus tem a autoridade de dizer definitivamente que eu tenho valor, e isso
devido a dois fatores: Ele é meu Criador e Ele é meu Salvador. Ele demonstrou Seu
amor por mim ao morrer na cruz para me redimir. Já fui traído pelas pessoas que
mais deveriam ter me amado. Só Deus é absolutamente confiável. A graça dEle é a
única fonte de cura verdadeira. Eu era vítima. Agora, sou filho(a) amado(a).
Reconheço, pouco a pouco, a diferença que isto faz em cada área da minha vida”.
1. Como defino “identidade própria”?
2. Quais os termos eu uso para me definir ou descrever?
3. Se tivesse o poder de fazê-lo, o que gostaria de mudar em mim?
4. Quais as coisas de que eu gosto em mim?
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5. Com quais pessoas me sinto amado (a) e valioso (a)? Como é que eles
conseguem fazer com que eu me sinta assim?
6. Com quais pessoas me sinto defeituoso/a, inadequado/a, sentindo que
nunca vou ser “bom/boa o suficiente”? Como é que eles conseguem fazer
que eu me sinta assim?
7. O que eu faço para conquistar outras pessoas, a fim de que elas me
encarem como pessoa valiosa?
8. Como é que eu me protejo para que outros não saibam como realmente
me sinto a meu respeito?
9. Até que ponto meu comportamento ou minha autoproteção tem me
ajudado a desenvolver uma autoimagem saudável?
10. Conforme Efésios, capítulos 1 a 3:
a. O que Deus diz que eu sou?
b. O que eu digo que sou?
11. Imagine um copo de vidro com água suja e escura pela metade. Usando
só um conta-gotas, você precisa encher esse copo com água limpa e
cristalina até que a água do copo não pareça mais sombria. Depois das
primeiras gotas você vê pouca diferença. Não desista! Pouco a pouco,
gota a gota, continue a acrescentar água limpa. Logo você começará a ver
a diferença. A água do copo parecerá um pouco menos suja. À medida
que você for colocando suas gotas de água limpa, mais clareza verá no
copo. Mesmo que ali tenha havido resíduos de sujeira por muito tempo, a
situação irá melhorar bastante. De forma parecida, conforme
incorporarmos em nossas mentes a Palavra de Deus, os conceitos falsos
colocados lá pelo inimigo começarão a se dissipar, até que possamos nos
avaliar de modo equilibrado e verdadeiro.
expressar, não só verbalmente, mas por escrito. Se verbalmente for difícil, comece
de outra forma.
O que importa aqui não é o talento artístico, e sim o sucesso no identificar e
expressar sentimentos. O desenho pode ser uma ajuda para que o sobrevivente
consiga se expressar ao grupo de apoio, descrevendo o que está acontecendo no
desenho, como resposta à seguinte pergunta: “Como isso fez você se sentir?”
Os desenhos podem ser bem simples, fazendo uso de “figuras-pau” ou então de
símbolos para representar pessoas e eventos.
Um exercício que às vezes ajuda é desenhar a planta da casa onde aconteceu o
abuso, identificar o(s) lugar (es) específico(s) e então descrever o que acontecia lá e
como se sentiu a respeito.
Desenhe a planta da casa
Escultura familiar
No encontro do grupo de apoio, um dos membros cria uma cena representando seu
sistema familiar, usando os outros do grupo para representar membros de sua
família. O “escultor” coloca as pessoas em posturas e arranja-as no espaço físico
para expressar relacionamentos e assuntos tais como poder, controle, passividade,
impotência, intimidade ou distância emocional, etc. O “escultor” então explica a
cena, quem é quem e como eles se relacionam um com o outro e com ele mesmo, e
como ele se sente a respeito.
A cena pode ser utilizada então para um tipo de DRAMATIZAÇÃO, em que o
“escultor” fala com cada membro da “família” como se sente a respeito dele(a). Pode
modificar a cena para mostrar como o escultor gostaria que sua família se
relacionasse, ou indicar ações que um ou outro poderia ter feito.
De novo, sentimentos profundos e amargos podem ser despertados através desta
atividade. O grupo tem de estar pronto para oferecer apoio e compreensão dos
sentimentos do “escultor” (e até de membros do grupo, pois a cena e sua descrição
podem testificar dos sentimentos de outros também). Se possível, alguém
experiente deve participar do grupo para prevenir uma situação que o grupo não
saiba contornar.
Este passo pode demorar várias semanas, dando assim oportunidade a cada
membro de se expressar conforme queira. Não force nem pressione. Se alguém não
estiver pronto para este passo agora, deixe aberta a opção dele (a) voltar a este
passo num encontro futuro, quando ele(a) se achar pronto(a).
Escudos de Autodefesa
Estude o seguinte material sobre mecanismo de defesa e “escudos de autodefesa”.
Depois, responda às perguntas no final:
Mecanismos de defesa comumente utilizados:
• Racionalização: o convencimento de que a situação não é o que parece ser.
• Supressão: tentativa de esquecer ou ignorar as coisas que são difíceis de
contornar
• Repressão: bloqueio de lembranças dolorosas da memória consciente
• Negação: recusa de admitir/aceitar a realidade
• Deslocamento: trocar o objeto de uma reação emocional (em vez de chutar o
chefe, chutar o gato)
• Formação de reação: substituir uma emoção exagerada, mas aceitável, por
um sentimento oposto inaceitável
• Projeção: atribuição de seus próprios sentimentos e atitudes aos outros
Todos empregam mecanismos de defesa, uma vez ou outra, mas quando estes se
tornam hábitos, passam a ser doentios e disfuncionais. A criança indefesa teve de
fazer uso destes (ou de outros) mecanismos para sobreviver. Mas, eis que chega a
hora em que eles são barreiras, prevenindo nossa maturação e atuação apropriadas
como pessoas adultas.
“Escudos de autodefesa” são padrões de comportamentos desenvolvidos da
mesma forma que os mecanismos de defesa: para sobreviver numa situação
intolerável. Também podem ter sido aprendidos através dos comportamentos de
outras pessoas, especialmente dentro da família, enquanto éramos crianças. Assim
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a. Pedir ajuda?
b. Recusar um pedido?
c. Expressar meus sentimentos a respeito de algo importante para
mim?
6. Em quais desses relacionamentos me sinto menos à vontade para
fazer essas coisas?
Relacionamentos:
1. Descreva seu relacionamento com Deus. O que gostaria de mudar?
2. Descreva os relacionamentos atuais mais importantes de sua vida.
3. Como tenho amadurecido nestes relacionamentos até aqui no meu
processo de cura?
4. Estou envolvido(a) em relacionamentos doentios? O que eu poderia
mudar?
atenção.
2. Acho difícil tomar decisões.
3. Sou abertamente crítico (a) às idéias, opiniões e
comportamentos de outros.
4. Eu reclamo em voz alta quando alguém toma meu lugar
na fila.
5. Eu evito pessoas ou situações por medo de ser
envergonhado/a.
6. Tenho confiança no meu próprio juízo.
7. Insisto que meu cônjuge/companheiro de quarto
cumpra com sua parte do serviço de casa.
8. Tenho tendência a perder a calma.
9. Quando um vendedor se esforça, tenho dificuldade em
dizer “não”, mesmo quando o produto não seja o que
quero.
10. Quando alguém que chega depois de mim é servido
primeiro, chamo atenção à situação.
11. Não gosto de afirmar minha opinião numa discussão ou
debate.
12. Se alguém demora em devolver dinheiro ou alguma
coisa que tomou emprestado, chamo sua atenção ao
fato.
13. Continuo a argumentar meu ponto de vista, mesmo
quando a outra pessoa não quer discutir mais.
14. Geralmente expresso o que sinto.
15. Fico irritado se alguém me observa trabalhando.
16. Se alguém persiste em bater ou chutar meu assento no
cinema, peço que ele pare.
Acho difícil encarar quando converso com alguém.
17. Em um bom restaurante, quando a refeição não é bem
preparada ou servida, peço que o garçom corrija a
situação.
18. Quando descubro que algo que comprei é defeituoso,
devolvo a mercadoria.
19. Demonstro minha raiva com palavrões ou xingando.
20. Numa festa, tento fazer parte da parede ou dos móveis.
21. Insisto que o mecânico, técnico de aparelhos elétricos,
etc. cumpram com suas responsabilidades.
22. Eu assumo responsabilidade pelas decisões de outros.
23. Posso abertamente expressar amor e afeição.
24. Posso pedir aos meus amigos favores e ajuda.
25. Sinto que sempre tenho a resposta certa.
26. Quando divirjo de alguém a quem respeito, consigo
afirmar minha perspectiva.
27. Consigo recusar pedidos pouco razoáveis de amigos e
membros de minha família.
28. Tenho dificuldade em elogiar a outros.
29. Quando me sinto irritado(a) por alguém que esteja
fumando perto de mim, consigo afirmar isso.
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Passo 9: Ministrando a Outras Pessoas: Quero ser usado(a) por Deus como
instrumento de cura e restauração na vida de outros
“Reconheço a diferença entre o ‘dar’ motivado pelo desejo de receber e o dar
por amor. Reconheço que minha aceitação por Deus não depende de minha ajuda a
outros. Não vou ‘ganhar pontos’ com Deus ministrando a outros. Ajudar outras
pessoas não vai me curar: Deus é quem me cura. Eu não vou curar ninguém: Deus
é quem os cura. Servir como vínculo da graça de Deus na vida de alguém é um
privilégio que Ele pode me dar, dentro de minha comunhão com Ele”.
1. Quem tem sido instrumento de restauração na minha vida?
2. Quais as áreas da minha vida onde vejo cura (comportamentos, caráter,
reações, pensamentos, interação com os outros, etc.)?
3. Quais as áreas que ainda precisam passar pela experiência de cura?
4. Como podem minhas experiências capacitar-me para encorajar, aceitar e
servir como instrumento de restauração na vida de outra pessoa?
5. Tenho vontade de ser usado (a) como instrumento de cura na vida de outras
pessoas?
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Extraído de STAPLETON, 1976, p. 45