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Apostila Ludoterapia

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A LUDOTERAPIA E A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR:


REFLEXÕES DE UMA EDUCADORA DE INFÂNCIA.

Existe uma forma de terapia destinada a


crianças que usa o brincar como forma de
ajudar os mais pequenos a resolver situações
ou dificuldades: a ludoterapia.
A palavra ludoterapia é derivada da palavra
inglesa play-therapy, podendo ser literal-
mente traduzida como terapia pelo brincar.
No entanto, este brincar é diferente do brin-
car que a criança tem em casa ou com os
amigos na creche.
Podemos definir a ludoterapia como “… uma
relação interpessoal dinâmica entre a criança
e um terapeuta treinado em ludoterapia que
providencia a esta um conjunto variado de
brinquedos e uma relação terapêutica segura
de forma que possa expressar e explorar ple-
namente o seu self (sentimentos, pensamen-
tos, experiências, comportamentos) através
do seu meio natural de comunicação: o brin-
car.” (Landreth, 2002, p. 16).
Em primeiro lugar a criança encontra-se com preender o impacto que estas têm na sua possibilitam a sua expressão emocional
um ludoterapeuta que está treinado para vida. É frequente não saberem o que sentem criativa, dá-se um passo para a expressão e
promover durante a sessão um ambiente de nem como as controlar, uma vez que ainda exploração do seu self – sentimentos, pen-
aceitação, empatia e compreensão. não estão suficientemente desenvolvidas ao samentos, experiências, comportamentos,
Depois, o brincar de que aqui falamos não nível emocional, cognitivo e linguístico. dificuldades, que vão potenciar a mudança
é semelhante ao brincar em que geralmente No entanto, estando na presença de um terapêutica.
observamos as crianças, uma vez que a ludo- adulto que as tenta compreender de for- Nesta exploração, a criança enfrenta os seus
terapia simplesmente se apropria do brincar ma empática, proporcionando segurança e sentimentos de frustração, agressividade,
enquanto gesto natural da criança para ex- utilizando brinquedos seleccionados e que medo, insegurança, confusão, entre tan-
primir as suas preocupações em reacção a si-
tuações de vida, utilizando objectos familia-
res à sua volta para compreender situações
de stress ou novas aprendizagens.
Na sala de ludoterapia, é a criança que con-
duz a brincadeira, quando quer e como quer,
escolhendo os brinquedos. Não se parte do
princípio de que se vai transformar a crian-
ça ou fazer coisas para ela. O ludoterapeuta
está com a criança plenamente, utilizando os
seus conhecimentos e técnicas para compre-
ender a criança, através do seu próprio olhar.
Será como perguntar: “Como sente as coisas
aquela criança?”
Não tentará resolver os seus problemas, mas
sim compreender a criança.
Assim, podemos encarar a ludoterapia para
as crianças como a psicoterapia para os adul-
tos. As crianças poderão sentir dificuldades
na expressão das suas emoções e em com-
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tos outros, aprendendo a controlá-los ou a


abandoná-los, ao mesmo tempo que vai per-
cebendo que é uma pessoa autónoma e com
direito a sentir todas essas emoções.
Assim, o brincar é a forma natural de a crian-
ça se expressar, tal como falar é a forma na-
tural de o adulto se expressar. Na sala dos
brinquedos, estes são usados como palavras
e o brincar é a linguagem da criança.
Percebemos a importância do brincar para a
criança, não só pela sua utilização num con-
texto terapêutico, mas também pela impor-
tância da brincadeira em todas as dimensões
da vida da criança.
Mas em que consiste, de facto, o brincar?
Uma ideia difundida popularmente limita o
acto de brincar a um simples passatempo,
sem funções mais importantes que entre-
ter uma criança com actividades divertidas.
Sabe-se actualmente que esta ideia está
completamente errada.
Bergman (1998) afirma que o brincar é
uma forma de linguagem. A maior parte
das características desta linguagem pode
ser constatada logo nos primeiros contac-
tos das crianças com os seus pais ou com
aqueles que cuidam delas. As mães ou as
pessoas responsáveis pelos cuidados dos
bebés ajudam-nos a brincar, desde muito
pequenos, quando interagem com eles.
Através de uma atitude e de uma linguagem
segura, esses adultos estabelecem com os
bebés laços de confiança que possibilitam o
início do brincar.

Este é considerado como uma linguagem, O processo do brincar é apreciado tal como é
uma vez que permite às crianças comunicar pela criança e o produto final do brincar não
com as outras pessoas e iniciar a compre- é o mais importante desta actividade.
ensão, desde muito cedo, de que podem A maioria dos adultos é capaz de expressar
suportar e representar a ausência temporá- sob a forma verbal os seus sentimentos,
ria das pessoas que amam, substituindo-as frustrações e angústias; no entanto, a crian-
pelas primeiras brincadeiras. ça, por ainda não ter facilidade cognitiva e
«Há meninos que não sabem onde há médicos». Manuel

verbal, utiliza os brinquedos como palavras. em que a criança realiza, constrói e se apropria criadas e respeitadas as regras. Conviver com
Podemos mesmo dizer que quando a criança de conhecimentos das mais diversas ordens. outra pessoa exige que se respeitem limites:
brinca, o seu ser está totalmente presente. Eles possibilitam, igualmente, a construção os limites impostos pelo outro.
Entende-se então que o brincar é realmente de categorias e a ampliação dos conceitos Surgem por isso alguns conflitos, sendo que
uma forma de actividade complexa, que en- das várias áreas do conhecimento. é nesta fase que cresce nas famílias a preo-
volve a criança física, mental, social e emo- Num contexto de creche (neste caso, 2 e 3 cupação com a possibilidade de o seu filho
cionalmente, revelando os seus sentimentos, anos), as crianças brincam imenso ao longo ser uma criança violenta. Normalmente não
experiências e reacções a essas mesmas ex- do dia, tanto mais quanto lhes for dado es- há motivo para preocupação, as crianças es-
periências (desejos, receios, percepção de si paço para isso. É também curioso perceber tão apenas a crescer e a aprender cada vez
própria, entre outros). que, num grupo alargado de crianças, há al- mais sobre o comportamento humano!
Através do brincar, a criança conhece o Mun- gumas que procuram bastante a atenção do A imaginação começa a dominar e brincam
do, e com ele, conhece as pessoas, as rela- adulto e brincar com ele, enquanto outras se muito ao faz-de-conta. Representam pa-
ções e regras sociais; pode imitar o adulto, envolvem completamente nas brincadeiras, péis, recriam situações, agradáveis ou não.
expressando conflitos, além de, ao brincar, individualmente e em grupo. Quando a criança recria estas situações, fá-
serem transmitidos conhecimentos educa- Cabe ao educador mediar estas situações, lo duma forma que ela é capaz de suportar,
cionais e este ser igualmente um indicativo aproveitando para interagir e transmitir co- não correndo riscos reais. É comum ver, por
do desenvolvimento da criança: as brincadei- nhecimentos através da brincadeira que ali exemplo, uma criança que é a “mãe” ralhar
ras duma criança podem ser indicativas de se desenrola, uma vez que o lúdico possibi- com o bebé – “Senta-te bem na cadeira! E
alguma dificuldade ou desenvolvimento tar- lita uma das actividades mais significativas come a papa toda!” –, à semelhança do que
dio em determinado aspecto, visível aos pais para a aprendizagem. Diríamos até a mais ela experimenta na realidade.
e outros adultos que contactam diariamente significativa! Através do faz-de-conta, a criança traz para
com a criança. Nesta faixa etária, as crianças já desenvol- perto de si uma situação vivida, adaptando-a
O brincar está muito presente no dia-a-dia veram capacidades emocionais e cognitivas à sua realidade e necessidades emocionais.
duma educadora de infância. É o instrumen- para incluir outras pessoas nas suas brinca- Percebemos então a importância das brin-
to principal pelo qual as crianças aprendem deiras. Anteriormente, brincavam ao lado do cadeiras na casinha e na garagem, como os
coisas novas e crescem a cada dia, a todos outro, mas não com o outro. E é perceben- “pais e as mães”, o “médico”, o “supermerca-
os níveis: cognitivo, emocional, linguístico, do a presença do outro que começam a ser do”, “a oficina”, entre tantas outras.
social e motor. É imprescindível haver este
espaço para que as crianças se possam de-
senvolver.
Além de fonte de lazer, o brincar é simulta-
neamente fonte de conhecimento. É esta
dupla natureza que nos leva a considerar o
brincar como parte integrante da actividade
educativa, sobretudo no pré-escolar. Infeliz-
mente, a brincadeira começa a ganhar cada
vez menos importância, à medida que as
crianças crescem, começando a haver cada
vez mais exigências a nível intelectual.
No dia-a-dia da sala de creche, o brincar, para
além de possibilitar o exercício daquilo que é
próprio no processo de desenvolvimento e
aprendizagem, possibilita situações em que
a criança constitui significados, sendo uma
forma de assimilação dos papéis sociais e
de compreensão das relações afectivas que
ocorrem no seu meio, assim como para a
construção do conhecimento.
O jogo e a brincadeira são sempre situações
Portanto, a brincadeira e as situações de Como forma de conclusão, é importante sa- compreendidas da forma que elas melhor são
jogos são fundamentais para a vida saudá- lientar mais uma vez a importância do brin- capazes de se expressar: através do brincar.
vel da criança e, por que não dizê-lo, para o car e do lúdico, que começam a ter cada vez
adulto também. mais relevância, apesar de ainda haver um
Pode-se em relação a isto acrescentar que, en- grande caminho a percorrer.
volvidos em brincadeiras com as crianças, os Não só educadores e outros profissionais
adultos sentem-se igualmente divertidos, mais que trabalham com crianças, mas também
descontraídos e felizes, o que é benéfico para os pais ajudariam bastante os seus filhos ao
o clima e ambiente na sala, onde deve existir serem esclarecidos e orientados sobre a ne-
cumplicidade e harmonia. E é igualmente be- cessidade de brincar com as crianças.
néfico para os adultos como pessoas, se pen- Como educadores de infância, é importante
sarmos no conceito de playfulness, associado, contribuirmos para esta mudança, alertando
entre outros, ao bom humor, capacidade lúdica os pais e os outros profissionais sobre estas
e descontracção. Algo que deveríamos manter questões, começando a construir um caminho
como seres humanos depois da infância! para que, cada vez mais, as crianças possam ser

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