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Tito Brandsma - Um Homem para o Nosso Tempo

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Morreu no dia 27 de julho de 1943, aos 61 anos.

Foi beatificado pelo Papa João


Paulo II,
no dia 3 de novembro de 1985.
Sua vida e vocação

Tito nasceu na Holanda, no dia 23 de fevereiro de 1881. Era de família camponesa.


No lar, havia seis filhos, quatro mulheres e dois homens. Todos tornaram-se
religiosos, menos uma. Esta casou-se e com o marido cuidaram dos pais e do sítio.

Tito era um menino franzino, muito atencioso e perspicaz. Aos 11 anos, tomou o trem
para chegar, por uma longa viagem, ao seminário franciscano. Era brilhante nos seus
estudos. Chamou a atenção dos professores seu interesse em conhecer e aprofundar o
sentido da vida. Um dia o reitor o chamou e lhe disse: “Sabe de uma coisa, Tito?”.
“O que, senhor reitor?” – respondeu Tito. Tito recebe como resposta: “Você deve
tornar-se jesuíta”.

Não é clara a razão pela qual ele finalmente não ingressou na Ordem franciscana e
não se tornou jesuíta. Há várias hipóteses a respeito. Uma delas é o testemunho
vocacional de Frei Casemiro, carmelita e parente dele. Esse lhe falou da beleza da
vida de Nossa Senhora, a Mãe de Jesus e Mãe e Irmã dos carmelitas. No dia 17 de
setembro de 1898, ingressa no Carmelo. Como frei ainda noviço, apaixonou-se pela
vida de Santa Teresa de Jesus. Elaborou um belo florislégio das obras dela. É
ordenado sacerdote em 17 de junho de 1905. É enviado para Roma para doutorar-se em
filosofia. Ao mesmo tempo, segue um curso de sociologia. Conquista o título de
doutor, mas esse título não lhe tira a humildade. Mais tarde, já professor
universitário vê pela janela um pobre trabalhador empurrando com dificuldade sua
carroça carregada de bananas morro acima. Tito lhe vem ao encontro, joga sua maleta
de livros sobre a carroça e, juntos, empurram a carroça. Chegando em nível plano,
os dois se despedem com cumprimentos fraternos, um indo para a feira e outro para
dar aula de espiritualidade e mística na Universidade. Esse gesto de ajuda do Frei
Tito é muitíssimo significativo porque havia entre o povo a nítida ideia que pobres
e professores não se misturam.

“Entrego-me de corpo
e alma à causa de Deus”
AÇÃO EVANGELIZADORA

De volta de Roma para a Holanda, Tito foi nomeado professor de Filosofia de alguns
frades carmelitas. Seu entusiasmo de trabalhar pela evangelização do povo não lhe
permitiu limitar-se aos estudos de professor. Quer fazer parte de uma Igreja em
saída. Envolve-se na pastoral da juventude, criando escolas, fundando uma
biblioteca pública e escrevendo artigos nos jornais da cidade. Ele não se limita
apenas à pastoral da cidade, mas torna-se um pastor sem fronteiras. Funda em
conjunto com outros professores a primeira Universidade Católica do seu país.
Torna-se professor titular de teologia e mística da mesma Universidade. Sua maior
preocupação era a imagem de Deus mais apropriada para o mundo de hoje:

“Entre as muitas interrogações que me coloco, nenhuma me ocupa tanto como o enigma
do homem que, blefando do seu progresso, afasta-se de Deus. É decepcionante
constatar como a profanação e a negação de Deus se alastram como doença contagiosa.
Como ficou obscurecida a imagem de Deus, a ponto de não significar mais nada para
muita gente! A falha é destas pessoas ou cabe a nós, de melhor formação, irradiar
uma luz mais clara sobre a imagem dele, poder alimentar a esperança de uma nova
imagem dele e assim pelo menos amenizar o maior de todos os problemas? Não é minha
intenção fazer defesa do conceito sobre Deus que por muitos é refeitado, pois já
existem apologias demais. Aliás, no decurso da história, costumamos seguir o
caminho da defesa e da argumentação, enquanto que é muito mais nobre e proveitoso
irradiar a verdade sobre Deus, de maneira mais positiva, na sua própria luz, a qual
encanta a mente humana. Creio que a nossa missão é a de olhar ao nosso redor e
rever o conceito que temos de Deus. Nele há uma riqueza tão grande e tantas facetas
que devemos precaver-nos de nos apegarmos demais a representações tradicionais.
Novos tempos exigem novas formulações. A imagem de Deus deve ser vivamente renovada
e atualizada, indo ao encontro da cultura moderna e colocando em evidência aqueles
aspectos da grandeza de nosso Deus, que mais fascinam a humanidade, hoje”, escreveu
Frei Tito.

JORNALISTA PERIGOSO

Em 1938, reuniu em 170 álbuns uma coleção de 16.000 fotos de textos de


espiritualidade e mística, tiradas de mais ou menos 60 manuscritos. Esta “coleção
Tito Brandsma” é guardada até hoje com muito carinho na Universidade. Como
jornalista, escreveu em mais de 20 jornais, 104 artigos sobre os mesmos temas. O
jornalismo, em todas as suas facetas, foi a paixão da sua vida. Ele o viu como um
caminho privilegiado de levar Deus aos homens. Pôs em relevo o lado positivo e
construtivo da vida. O anúncio da verdade era uma questão de justiça para ele.

Em 1935, foi nomeado pelo arcebispo diretor espiritual da união dos jornalistas
católicos do seu país. Nesta função, entra cada vez mais em choque com a ideologia
nazista, que tornou-se o assunto em suas aulas de 1938 a 1939. Foi profeta da
liberdade de expressão. Denunciou o sistema ateu. Tinha diante de si o profeta
Elias, homem de fogo com sua espada chamejante na mão, conhecido por seu lema:
“Entrego-me de corpo e alma à causa de Deus”. Tito viveu esse lema, defendendo a
liberdade do ensino e da imprensa. Seu carisma carmelita e sua pastoral adquiriram
força na oração e na renúncia.

Também não se calou diante do nazismo, que chamava de paganismo moderno. Defendia
nas suas aulas na universidade uma civilização de amor contra a ideologia do
nazismo opressor. Tito tornou-se logo conhecido pela polícia nazista alemã, que
elaborou de imediato um extenso relatório sobre a sua vida e atuação.

Ao aceitar, em 1942, a missão do arcebispo de Jong, convenceu os jornalistas


católicos a não publicarem artigos ou propaganda nacional-socialista. Tito foi
imediatamente visado pela polícia secreta. Após ser investigado em 1942, foi
caracterizado por ela como “muito perigoso e cérebro de propaganda anti-nazista”.
Pouco antes de ser preso no dia 19 de janeiro de 1942, compadeceu-se de um garoto
que ficara órfão, procurando um casal de padrinhos para adotar o menino.

“Sofrer não faz mal, desde


que nos sintamos amados.”
NA PRISÃO

Tito, prisioneiro, foi interrogado pelo comandante Hardegen. Ele não se deixa
amedrontar pelo Movimento Nacional Socialista. O comandante lhe pergunta: “É certo
que a Igreja quer sabotar as ordens das Forças de Ocupação alemãs para desta
maneira pôr em perigo a paz na Holanda e impedir que o Movimento Nacional
Socialista encontre acesso ao povo holandês”? Tito, com risco da própria vida,
responde:

“A Igreja católica na Holanda atem-se às ordens da Forças de Ocupação, desde que


estejam em consonância com o seu pensamento. Se houver razões fundamentais em
contrário, a Igreja Católica recusa sua colaboração, com todas as consequências que
disso possam provir. Caso aconteça esta tomada de posição e a consequência seja
colocar em perigo a unidade política do país, a Igreja o lamentará profundamente,
mas não se sentirá responsável por isto. O mundo de ideias nacional-socialistas é
combatido por ela por razões que estão ancoradas na sua visão do mundo e na sua
convicção religiosa. Do meu ponto de vista, é lamentável as Forças de Ocupação
promoverem a ideologia do Movimento Nacional Socialista, pois o povo holandês e, em
particular, o clero, não quer saber nada dos líderes deste Movimento. A Igreja
católica vê como sua missão fortalecer as atitudes de todas as personalidades
católicas, que têm função de liderança.”

Tito foi apontado oficialmente como um “homem de firmeza de caráter e perigoso para
o sistema”. É preso. Durante sua permanência na prisão, entrega-se à meditação e à
oração, seguindo uma disciplina conventual. Começa a escrever uma nova biografia de
Teresa d´Ávila nas entrelinhas de um livro. Os guardas, de todas as maneiras o
humilhavam, mas ele não perdia a paz. Impressiona os demais presos por suas
palavras de esperança. Seu lema é: “Sofrer não faz mal, desde que nos sintamos
amados”.

Muitos dos presos lembraram-se mais tarde da sua meditação sobre a Paixão do
Senhor, na Sexta-feira Santa. Tito não pregava teoria, mas falava de coração, de
sua própria experiência e fazia uma analogia entre o sofrimento de Cristo e o dele
na prisão. Posteriormente, foi transportado para o campo de extermínio em Dachau.
Quem fosse para lá, sabia que não haveria retorno. Suas roupas são trocadas por
roupas listradas de prisioneiro. Raparam-lhe os cabelos e recebeu o número de preso
– 30.492. Agora passa a ser apenas um número.

Dachau é um lugar conhecido pela violência brutal dos guardas. A partir de seu
sentimento de superioridade, esses soldados alemães tinham profundo desprezo por
todos os que não eram alemães. Frequentemente é punido por partilhar sua parca
refeição com os outros presos, como por exemplo, entregar uma folhinha de alface a
um companheiro. Os prisioneiros percebiam como Tito bebia da Fonte de água viva que
é o próprio Deus. Tito suporta o sofrimento e em plena comunhão com Cristo sofredor
oferece sua vida em favor de mundo mais justo e fraterno.

AMOR À EUCARISTIA

Só ao clero alemão era permitido celebrar a Eucaristia no bloco 26. Outros


religiosos eram excluídos, mas, de maneira secreta, a santa comunhão chegava a
eles. Certa noite o confrade de Tito, Rafael, levou a comunhão para ele. Tito a
envolveu num papelzinho branco e a escondeu debaixo do cinto.

O guarda do dormitório, ao inspecionar o local, via a cama dele vazia. Foi à


procura dele. Antes de chegar perto, Tito, em adoração, conseguiu guardar a hóstia
no seu estojo de óculos e escondê-la sob a axila esquerda. O guarda se levantou
grosseiramente contra ele insultando e espancando-o. Tito rolou pelo chão, mas
conseguiu ainda arrastar o seu corpo por cima do degrau do dormitório. Frei Rafael
o socorreu e o pôs sobre a cama e lhe perguntou se sentia fortes dores no que ele
respondeu: “Ó irmãozinho, você não sabia quem eu carregava comigo”? Rafael caiu num
profundo silêncio e, juntos, adoraram o Senhor. Rafael quis ajoelhar-se, mas Tito
advertiu: “Cuidado! Eles podem nos ver rezando”.

Baixinho, professaram a sua fé na Eucaristia: “Ó Deus, Vos adoramos com fé,


escondido e realmente presente sob as aparências de pão. A Vós, nosso coração todo
se confia. Contemplando-Vos, tudo desfalece”. Tito deu a bênção e os dois se
deitaram, sem terem sido incomodados pelos guardas.

“Quem quiser ganhar o mundo para Cristo,


deve ter a coragem de entrar em conflito
com esse mundo.”
FRATERNIDADE CARMELITA

Todos os dias os prisioneiros deviam marchar por um caminho lamacento de uma


distância de três quilômetros para trabalhar com sol ou chuva numa plantação de
verduras. Tito não mais aguentou. Estava totalmente esgotado e com os pés feridos
pelos tamancos de madeira cobertas de couro duro. Ele foi carregado por dois
carmelitas (OCD) Frei Hilário Tanuszewski e Alberto Urbanski novamente ao barracão.
PERDÃO À ENFERMEIRA

Seu estado de saúde estava piorando visivelmente. Foi colocado na enfermaria. Antes
de a enfermeira lhe aplicar, obedecendo ordens, uma injeção letal, Tito lhe
entregou o terço, mas ela lhe disse que não sabia rezar. Tito respondeu: “Reza pelo
menos a última parte: rogai por nós, pecadores”. Ela deu risada. Mais tarde se
converteu ao Cristianismo e no dia da beatificação de Tito deu o seu testemunho
sobre ele.

Depois de terem sido feitas experiências médicas sobre o corpo dele, morreu no dia
26 de julho, na festa de Sant´Ana. Realizou-se o que ele afirmara em vida: “Quem
quiser ganhar o mundo para Cristo, deve ter a coragem de entrar em conflito com
esse mundo. É duro o conflito com o mundo: fez Cristo morrer na cruz”.

Depois seu corpo foi cremado nos fornos existentes no campo. Em sua cremação, uniu-
se a milhões de outros que tiveram a mesma sorte. Seu espírito perdoou as
crueldades da vingança nazista e a enfermeira. Em 1955, começou o processo de
beatificação e, em 3 de novembro de 1985, foi beatificado por João Paulo II.

Nos periódicos e nas publicações internacionais, por ocasião de sua beatificação,


foi ressaltado de modo particular seu trabalho de jornalista. Chamaram-no o
primeiro jornalista mártir e elogiaram sua força de ânimo, seu sofrimento, o seu
perdão oferecido à enfermeira assassina. Frei Kylian Healey, antigo Prior Geral dos
Carmelitas, chamou Tito de um novo Elias, porque ele, totalmente penetrado do
espírito do Carmelo e inteiramente consagrado a Deus, ardia de amor pelo Deus Vivo
e pela humanidade. Vida transformada, vida renovada.

SANTO, MAS AINDA À ESPERA DE UMA CANONIZAÇÃO

Que Frei Tito é santo, ninguém duvida. Frei Tito foi beatificado pelo Papa João
Paulo II na presença de muitos cardeais, bispos, sacerdotes, religiosos e
religiosas, em Roma. Mais que 12.800 lotaram a Basílica de São Pedro.

Para Tito poder ser canonizado, exige-se um milagre. Agora aconteceu o seguinte: um
confrade nos Estados Unidos estava com câncer bem avançado. O bispo local com o
povo pediram a Deus sua cura pela intercessão do Beato Tito. O frade se recuperou
de sua enfermidade. O bispo montou um processo para o Vaticano reconhecer a cura
como milagre. Se for reconhecido, Tito será canonizado.

Recentemente, o núncio apostólico na Holanda, Pe. Geral da Ordem do Carmo, Frei


Fernando Romeral, e o ex-Padre Geral, Frei Falco Thuis, se encontraram para falar
sobre o andamento do processo. Escreve Frei Falco: “A conversa com o núncio foi
muito boa. Em breve, ele falará com o Papa Francisco sobre o andamento do processo
de canonização. Naturalmente, devemos aguardar um pronunciamento oficial da Igreja,
mas as chances são boas”.

DIVULGAÇÃO

O Papa João XXIII, certa feita, passou toda uma noite em claro, sem poder
reconciliar o sono, não obstante a sua proverbial facilidade para dormir. A causa?
Ele próprio a explicou na manhã seguinte: “A vida de Frei Tito Brandsma, um
carmelita holandês, escrita por Fausto Vallainc, não me deixou dormir a noite
inteira, visto que a sua leitura é tão emocionante que eu não pude interrompê-las;
só consegui parar depois de havê-la concluído”.

Na nossa língua, existe o livro: “O caminho de Tito Brandsma no tempo de Hitler”,


de 104 páginas, que pode ser adquirido com o autor deste artigo, Frei Gabriel
Haamberg O. Carm. (gabrielocarm@uol.com.br)
Diante de Jesus, na dor.
(Escrito por Frei Tito na prisão)

Ó Jesus, quando Te contemplo,


eu redescubro a sós contigo
que Te amo e que teu coração
me ama como a um dileto amigo.

Ainda que a descoberta exija


coragem, faz-me bem a dor.
por ela me assemelho a Ti,
pois é esse o caminho redentor.

Na minha dor, me rejubilo:


já não a julgo sofrimento,
mas sim predestinada escolha
unido a Ti num mesmo sentimento.

Deixa-me, pois, nessa quietude,


malgrado o frio que me alcança.
presença humana não permitas,
que a solidão já não me cansa.

Pois de mim sinto-Te tão próximo


como jamais antes senti.
Doce Jesus, fica comigo,
que tudo é bom junto de Ti.

Texto de:
Frei Gabriel Haamberg O. Carm

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