Do Populismo Classico Ao Neopopulismo TR PDF
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RESUMO: O foco central do artigo é a crítica de Angela de Castro Gomes à utilização dos
conceitos de populismo e neopopulismo na caracterização de determinados períodos da
vida política brasileira, notadamente 1930-1964. Pelo fato de esta historiadora ter por
inspiração teórica a História dos Conceitos, achamos por bem reconstituir o trajeto de crítica
à tradicional História das Ideias, bem como expor as principais formulações acerca do
populismo com os quais Castro Gomes irá dialogar e rejeitar. Por fim, expomos sua
proposta de adoção do termo trabalhismo em substituição ao populismo.
ABSTRACT: The central focus of the article is the Angela de Castro Gomes’ review to the
use of populism and neopopulism concepts for characterization certain periods of Brazilian
political life, notably 1930-1964. Because this historian have been theoretical inspirited by the
History of Concepts, we well found reconstructed the review’s path of the traditional History
of Ideas, as well to expose the mains populism’s formulation that Castro Gomes will both
dialogue and reject. Finally, we show her proposal adoption of labourism’s term instead of
populism.
Introdução
1
Este artigo resulta da apresentação de um seminário sobre populismo na disciplina “Vertentes da historiografia
política e cultural da América Latina” do Programa de Pós-Graduação em História e Sociedade da FCL-
Assis/Unesp, ministrada pelos professores doutores Carlos Alberto Sampaio Barbosa e José Luis Bendicho
Beired, no primeiro semestre de 2012.
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DO POPULISMO “CLÁSSICO” AO NEOPOPULISMO: trajetória e crítica de um conceito – por Otávio Erbereli Júnior
progressivo2. Este percurso faz-se necessário devido ao fato de que, como veremos na
última seção deste artigo, Angela de Castro Gomes, subsidiada pela História dos Conceitos,
irá criticar a tradição historiográfica que se utiliza do conceito de populismo para caracterizar
determinado período da vida política brasileira.
Na seção seguinte, abordaremos alguns dos estudos sobre o populismo na política
brasileira. Iniciaremos com o que aqui chamamos de populismo “clássico”, ou seja, aquelas
primeiras formulações acerca do fenômeno populista, notadamente as formulações dos
sociólogos argentinos Gino Germani e Torcuato di Tella, juntamente com o sociólogo
brasileiro Octavio Ianni. A famosa formulação de Francisco Weffort, hegemônica nos anos
70 do século passado, será tratada no tópico seguinte, uma vez que Angela de Castro
Gomes estabelece com ela profícuo diálogo. Também abordaremos as formulações caras
aos anos 80 e 90, bem como contemporaneamente, ou seja, o que se convencionou chamar
de neopopulismo ou populismo neoliberal, também rejeitadas por Angela de Castro Gomes.
Após este percurso, exporemos as principais críticas de Angela de Castro Gomes às
formulações anteriores e sua proposta de substituir o conceito populismo por trabalhismo.
Por fim, teceremos algumas considerações em nível final.
2
Dividimos esta seção em vários itens, cada um tratando de determinado autor à fim de que suas ideias não se
confundam. Tal procedimento foi sugerido pelo parecerista deste artigo. Mesmo sem conhecê-lo, deixamos aqui
nosso agradecimento.
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Iniciaremos aqui com Quentin Skinner, pelo fato de que foi o primeiro historiador da
Escola de Cambridge a sistematizar o método que ficou conhecido por “contextualismo
lingüístico”. Em texto “fundador” intitulado Meaning and Understanding in the History of Idea,
publicado em 1969 na History and Theory, Skinner irá criticar a tradicional História das
Ideias e ao mesmo tempo sistematizar o método do contextualismo lingüístico3.
Em primeiro lugar, iniciaremos com as críticas de Skinner às Histórias das Ideias
praticadas até o momento em que escreve seu texto. Em um segundo instante, exporemos
sua proposta metodológica, bem como seus principais contatos4. Seu principal intento no
texto será demonstrar a natureza anacrônica da História das Ideias praticada até então, uma
vez que esta historiografia buscava estudar uma obra filosófica ou literária com o propósito
de se extrair delas demandas atemporais na forma de ideias universais e uma sabedoria
sem tempo com uma pretensa aplicação universal.
3
Este texto de Skinner apareceu primeiramente com o polêmico título On the Unimportance of the Great Texts to
the History. Aqui, utilizaremo-nos da seguinte versão: SKINNER, Quentin. Significado y comprensión en la
historia de las ideas. Prismas: revista de historia intelectual, n. 4, 2000, p. 149-191.
4
Poderíamos ter utilizado aqui o termo influência, mas sabemos quão controverso é seu uso e o quanto este tem
sido contestado. Por isso escolhemos utilizar o termo contato a fim de expressar as principais tradições
presentes em determinado autor.
3
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Para ele, a História das Ideias é marcada por duas posturas metodológicas
principais: a contextualista e a textualista. “La primera (...) insiste en que el contexto “datos
factores religiosos, políticos y económicos” [sic] determina el sentido de cualquier texto
dado, y por ello debe proporcionar “el marco decisivo” [sic] para cualquier intento de
comprenderlo” (SKINNER, 2000: 149). O textualismo, a vertente de maior aceitação e que
Skinner mais critica em seu texto, “insiste en la autonomia del texto mismo como la única
clave necesaria ¿eso sentido, y por lo tanto desecha cualquier Miento de reconstruir el
“contexto total” [sic] como “gratuito e inconcluso algo peor”? [sic]”. (SKINNER, 2000: 149).
Estas posturas, para Skinner (2000), não poderiam produzir histórias, mas sim o que ele
denominou de mitologias.
A primeira mitologia apontada por Quentin Skinner é a “mitologia das doutrinas”.
Nesta mitologia o historiador buscaria sistematizar as várias ideias de determinado autor
clássico que, em um primeiro momento, estariam dispersas ao longo de seu texto ou de sua
obra, em doutrinas, imputando ao autor algo que ele não pretendeu fazer. “La mitología más
persistente se genera cuando el historiador es movido por la expectativa de comprobar que
cada autor clásico (...) enuncia alguna doctrina sobre cada uno de los tópicos juzgados
constitutivos de su matéria”. (SKINNER, 2000: 153). A segunda mitologia é denominada por
Skinner de “mitologia da coerência”. Neste caso, esta mitologia é facilmente derivada da
primeira. Se esta última traz consigo a necessidade de se buscar nos autores clássicos
doutrinas que seriam formuladas ex post, aqui – nesta segunda mitologia – busca-se dotar
de coerência e sistemática um pensamento que não o é. Skinner nos dá um exemplo deste
tipo de mitologia bastante comum nos estudos sobre David Hume:
aproximando o universo do autor de seu próprio universo. Skinner aponta ainda para um tipo
especifico de “localismo”: o “localismo conceitual”. “Siempre existe el peligro de que el
historiador conceptualice un argumento de manera tal que sus elementos extraños se
disuelvan en una familiaridad aparente pero engañosa”. (SKINNER, 2000: 169). Ele também
nos dá um bom exemplo de como isso pode ocorrer.
Austin distingue três dimensões dos atos de fala: a dimensão locucionária, relativa
ao conteúdo proposicional do proferimento e manifesta no ato de dizer (of saying)
algo; a dimensão ilocucionária, relativa ao que o agente está fazendo ao dizer (in
saying) algo, e a dimensão perlocucionária, relativa aos efeitos produzidos pelo
ato de fala na audiência, aquilo que ocorre por dizer-se (by saying) algo (SILVA,
2009: 309).
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É a teoria dos atos de fala. Todas estas inspirações teóricas de Skinner servem
como subsidio para compreendermos seu método de interpretação de textos.
Resumidamente, o método proposto por Quentin Skinner baseia-se nos atos de fala,
onde sua mera enunciação, seja através da escrita ou da fala, pode desembocar em uma
ação. Daí a necessidade, central para Skinner, de se conhecer quais eram as intenções do
autor, ou, em outras palavras, o que o autor estava fazendo. Estas intenções podem se
concretizar em uma ação sobre o auditório em que o discurso é emitido, ou não.
Todo enunciado hecho u outra acción realizada debe presuponer una intención de
hacerlo – si les gusta, llámenla causa – , pero también una intención al hacerlo,
que no puede ser una causa pero debe aprehenderse si se pretende que la acción
misma se caracterice correctamente y, de esse modo, se entienda (SKINNER,
2000: 185).
A parole, ou seja, os atos de fala emitidos por um sujeito podem modificar a langue.
“O historiador deve mover-se de langue para parole, do aprender as linguagens para o
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determinar os atos de enunciação que foram efetuados “dentro” [sic] delas”. (POCOCK,
2003: 66).
Pocock acrescenta à proposta de Skinner de se conhecer as intenções de um autor,
a necessidade de se saber se o mesmo tinha consciência ou não do que pretendia. “Mas
também achamos possível perguntar se um autor “sabia o que estava fazendo” [sic],
sugerindo, com isso, a possibilidade de uma lacuna entre intenção e efeito, ou entre a
consciência do efeito e o efeito propriamente dito.” (POCOCK, 2003: 29). Pocock ainda
descreve a prática do historiador do discurso político à semelhança do arqueólogo. E mais:
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(...) não se tratava apenas de restituir o pensador (...) ao seu contexto lingüístico e
social de produção como desejaria um historiador da política como Quentin
Skinner. O historiador espera intervir no debate político contemporâneo a partir de
uma história das ressonâncias entre nossa experiência e o passado (OLIVEIRA
JÚNIOR, 2012: 175).
A história conceitual alemã surgiu no final dos anos 1960 com Otto Brunner (1898-
1982), Werner Conze (1910-1986) e Reinhart Koselleck, quando este deixava a
condição de discípulo para assumir a liderança do movimento. Ela se erigiu em
torno da produção de duas obras fundamentais: Geschichtliche Grundbegriffe –
Historisches Lexikon zur politisch-sozialen Sprache in Deutschland (Conceitos
básicos de história – um dicionário sobre os princípios da linguagem político-social
na Alemanha) publicado em Stuttgart entre 1972-1997 em nove volumes e o
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Comumente refere-se a Gino Germani como um sociólogo argentino. Destarte o fato de que nasceu em Roma
em 1911, muito cedo chegou à Argentina, fugido do regime de Mussolini. Seu papel na institucionalização da
sociologia na Argentina é muito reconhecido.
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transformar a estrutura social; a segunda diz respeito a uma pré-condição destas massas na
aliança com aquelas elites: a necessidade de certo grau de participação efetiva. Para
Germani, “esta libertad se ejerce en el grado inmediato de la experiência personal”
(GERMANI, 1973: 33).
Destarte este caráter autoritário, em alguns casos, como aponta Germani para a
Argentina de Perón e o Brasil de Vargas, encontramos o direito ao voto. Mas no geral, “esta
participación no se produce a través de los mecanismos de la democracia representativa:
derechos individuales de expresión, de organización, etc., y ejercicio del derecho de voto”
(GERMANI, 1973: 33).
Portanto, para Gino Germani, a chave deste regime nacional-popular é a participação
popular e como esta se efetiva. Para ele, não há uma relação estreita entre a sensação de
participação das massas populares e melhoras de caráter econômico que estes regimes
seriam capazes de realizar. “A pesar de la opinión general de que la adhesión de las clases
populares se obtiene gracias a promesas económicas demagógicas, el fundamento real del
apoyo popular es la “experiência de participación” [sic], lo que hemos intentado describir”.
(GERMANI, 1973: 35). Dentro das preocupações de Skinner e Pocock, em nenhum
momento do texto Germani se utiliza do termo “populismo”. Contudo, já este estava
disponível na linguagem política do momento, uma vez que o texto de Torcuato di Tella que
iremos adentrar, é do mesmo ano, ou seja, 1965.
adecuado, han sido a menudo designados con el concepto múltiple de ‘populismo’ [sic]” (DI
TELLA, 1973: 39).
Para di Tella, o conceito de populismo abarca uma série de variações e
possibilidades e destaca que o mesmo tem sido utilizado em um sentido pejorativo. Di Tella
aponta ainda que não é o caráter meramente subdesenvolvido destes países que os
conduzem ao populismo, mas a forma de inserção na economia internacional. Di Tella
parece inspirado pelas formulações da CEPAL, especialmente quanto ao constructo centro-
periferia, pois afirma que os países subdesenvolvidos “no solo son pobres en términos
absolutos, sino que constituyen la periferia que rodea a zonas más ricas y centrales”. (DI
TELLA, 1973: 40). Ocorre que quando estas economias subdesenvolvidas ou em
desenvolvimento – di Tella utiliza ambos os termos – atingem algum nível de
desenvolvimento e de inserção no mercado mundial, ocorre o que ele denomina “efecto
demostración”, ou seja, alguns grupos de maior poder de compra são atraídos pelos
padrões de consumo dos países desenvolvidos e querem imitá-los.
Somada à condição de subdesenvolvimento e de dependência externa, di Tella
destaca ainda 3 fatores que, unidos, contribuem para o surgimento do populismo: o primeiro
deles é “una élite ubicada en los niveles médios o altos de la estratificación y provista de
motivaciones anti-statu quo”; o segundo, “una masa movilizada formada como resultado de
la ‘ revolución de las aspiraciones’ [sic]”; e o último, “una ideología o un estado emocional
entre líderes y seguidores que cree un entusiasmo colectivo”. (DI TELLA, 1973: 48). Este
último fator abre espaço para a atuação do líder personalista e carismático.
Di Tella irá sistematizar sua exposição na forma de tabelas e esquemas a fim de
conseguir abarcar as várias possibilidades e tipos de ocorrência do populismo. Ele irá tratar
dos países menos desenvolvidos e não somente da América Latina, mas também irá citar os
casos da Índia, da Turquia, do Iraque etc. Conforme tabela constante na página 50, temos 4
tipos possíveis de populismo, de acordo com as várias combinações de classe. Um primeiro
tipo seria composto por elementos da burguesia, do exército ou do clero, legitimados dentro
de suas próprias classes. Este seria o tipo mais moderado de populismo, podendo até
mesmo perder seu caráter populista e transformar-se em conservador. O segundo tipo
possível de populismo seria aquele que incluiria somente elementos das classes mais
baixas ou intelectuais, todos com legitimação oriunda de suas respectivas classes. Esta
tendência se inclina a buscar soluções dentro da ordem legal. Contudo, com duras criticas a
ordem social vigente. O terceiro tipo de movimento populista possível seria aquele onde a
burguesia, o exército ou o clero não contam com a legitimação interna de sua respectiva
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vez maiores de migrantes do campo. Com isso, a burguesia industrial se firma como
principal classe social.
Así, poco a poco, crecen los grupos de empresarios y obreros. Al mismo tiempo
aumenta el número de empleados en los transportes y comunicaciones, en la
administración pública, en el sistema de enseñanza. La expansión del sector
industrial provoca efectos dinâmicos en el sector terciário, al mismo tiempo que
hace crecer la demanda de productos agropecuários y también minerales (IANNI,
1973: 100).
Porém, a fim de que a burguesia industrial possa atingir o poder e nele se perpetuar,
faz-se imprescindível que a nova leva de trabalhadores também seja incorporada ao poder
político. Pari passu, as organizações trabalhistas vão se formando e se fortalecendo,
principalmente em torno dos sindicatos. “En este contexto los trabajadores de la
construcción, los obreros industriales y los empleados de transportes (...) adquieren una
mayor relevância en el cuadro general de las relaciones de producción y de las relaciones
políticas” (IANNI, 1973: 106).
O populismo, desta maneira, é formado por uma aliança tática ou tácita, onde a
classe trabalhadora cujos inimigos são tradicionalmente a burguesia, ludibriados pela
possibilidade de ascensão social e pela inclusão no mundo do consumo, acabam por adotar
os mesmos inimigos da própria burguesia nacionalista, ou seja, o capital estrangeiro e as
tradicionais oligarquias, protelando seu papel revolucionário. “La lucha contra la oligarquia,
la burguesia agrario-exportadora y el imperialismo, es apresentada como la lucha principal,
consumiendo la mayor parte de la movilización y de los recursos políticos del proletariado”.
(IANNI, 1973: 142). As antigas organizações de trabalhadores, anarco-sindicalismo,
sindicatos comunistas e socialistas são transformados pelas mudanças estruturais e pela
incorporação dos trabalhadores provenientes do campo, passando de revolucionários a
reformistas. Em função disso, “la visión del mundo de las masas permanece en un atraso
relativo a su situación real, a su posición en el proceso productivo”. (IANNI, 1973: 146).
Contudo, em períodos de profunda crise, as massas são alijadas do poder e a
burguesia se une a seus aliados tradicionais: o exército ou a Igreja. “En las ocasiones de
crisis las fuerzas armadas, el clero y el grueso de la clase media reaparecen como fuerzas
políticas de estabilización”. (IANNI, 1973: 143). Foi o que ocorreu em 1955 na Argentina de
Perón e em 1964 no Brasil de João Goulart. Exatamente no momento em que as massas,
através dos trabalhadores, intelectuais e estudantes se conscientizaram de seu papel
revolucionário, as armas lhes foram negadas e as mesmas foram alijadas do processo
político. Concluindo, Ianni afirma que “la verdad es que las transformaciones sociales y
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Para o citado Kurt Weyland, “populist politics survived the assault and experience a
stunning resurgence in the 1980s and 1990s in a different socioeconomic context”.
(WEYLAND, 2001: 6-7). Para ele, o neopopulismo ou populismo neoliberal é um subtipo do
populismo, pois o neopopulismo preservaria as características políticas do populismo
clássico, porém em um novo contexto econômico: do neoliberalismo. Em texto de 2003, Kurt
Weyland procura demonstrar as “synergies and affinities between neoliberalism and
neopopulism”. (WEYLAND, 2003: 1097). Para ele, no início das profundas reformas de
mercado preconizadas pelos neoliberais, as lideranças personalistas tiveram papel
fundamental na superação do modelo econômico anterior e ambos possuíam um sentimento
anti-elite e pró populações mais pobres comum. Estes programas de redução da pobreza
são bem vistos pelos neoliberais, uma vez que lhes garantem estabilidade política. A
confluência de interesses não para por aí, pois
they maintain distance from trade unions, professional associations and even
many organized [sic] business groups, which personalistic plebiscitarian leaders
see as fetters on their autonomy and power and which neoliberal experts condemn
as rent-seeking ‘special interests’ [sic] who seek to interfere with the market
(WEYLAND, 2003: 1098).
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Thus, the very success of neoliberal populists in ending the initial crisis came to
weaken their political standing over time and to cause a growing tension and
divergence between the political interests of neopopulist leaders and the economic
discipline enforced by neoliberal experts and the international financial institutions
(WEYLAND, 2003: 1108).
(...) the mediocre economic performance of the new market model and the frequent
need for new rounds of adjustment limit the resources that presidents can
distribute to their mass followers. On the other hand, the widespread acceptance of
the market model diminishes sharp political conflict and allows these leaders to
gain support by ‘unifying the people’ [sic] and focusing on pragmatic solutions to
concrete problems (WEYLAND, 2003: 1113).
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Críticas e proposta
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trabalhadores não possui consciência de seu estado espoliativo, sendo, portanto, uma
classe trabalhadora que não atingiu a tão desejada consciência de classe do marxismo
ortodoxo. A segunda demarca a nova condição política da classe dirigente do país, que
tendo perdido representatividade/poder, se vê na necessidade de buscar o apoio das
massas para a efetivação de seus projetos políticos. O terceiro ingrediente desta tríade, diz
respeito exatamente ao tipo de político responsável por encabeçar este processo: a figura
do líder carismático, com poder de mobilização das massas.
Outro diálogo estabelecido por Castro Gomes, e a quem irá se contrapor, é com
Francisco Weffort. Castro Gomes se debruça sobre o artigo O populismo na política
brasileira.
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atingem certo nível de consciência, ter-se-ia que efetivar as reformas de base. No entanto, o
que houve foi a supressão destas mesmas reformas, bem como da participação popular.
A partir deste momento se pensaria em redemocratização e, por conseguinte, o
período pós 1945 assumiria papel-chave, através da análise das relações entre Estado e
sindicatos. O debate acerca da impossibilidade de uma negociação e da necessidade de
realização das reformas toma foro central nas ciências sociais em fins dos anos 1970 e
inicio dos anos 1980. Neste contexto, Castro Gomes também irá dialogar com o texto de
Regis de Castro Andrade, intitulado Perspectivas no estudo do populismo brasileiro, de
1979. O mote central do texto de Regis de Castro Andrade é flexibilizar a manipulação como
sustentáculo central do Estado populista, conforme preconizado por Weffort. Mas, a
despeito destas revisões, o que Angela de Castro Gomes quer destacar é a “hegemonia” do
conceito, sem alternativas de maior volume.
Castro Gomes irá dialogar com sua própria tese de doutorado, como tentativa de se
contrapor ao uso do conceito de populismo. Explicita o principal intento de sua tese:
“assumindo uma perspectiva interdisciplinar, produzir uma interpretação histórica alternativa,
fundada em pesquisa empírica mais demorada e iluminada pelas novas contribuições da
produção internacional sobre a formação da classe trabalhadora.” (GOMES, 2001: 45).
Inspirada nas formulações de Edward Palmer Thompson, Castro Gomes (1987) irá conceber
a classe trabalhadora de outra maneira. Não como era concebida nos consagrados estudos
sobre o populismo: como uma massa sem consciência, que, em um marxismo ortodoxo,
havia se desviado de seu caminho rumo a uma consciência de classe. Castro Gomes quer
quebrar com este teleologismo na análise e pensar a classe trabalhadora como heterogênea
e como um sujeito histórico que pode realizar escolhas diante de um horizonte de
possibilidades. O Estado também é repensado. Não é tido somente como aquele “ente” que
interferi e desvia a classe trabalhadora de alcançar seu status de consciência de classe,
mas sim como um agente de interlocução. Agora, Castro Gomes (2001) deixa explicitado o
porquê da rejeição do conceito de populismo em sua tese. Para ela, a utilização do conceito
implicaria aceitar exatamente a compreensão de classe trabalhadora que estava procurando
rejeitar, ou seja, de uma massa de trabalhadores que nem mesmo poderiam ser
compreendidos enquanto classe. Também o termo cooptação é rejeitado pela autora, posto
que este traz consigo uma relação unilateral, onde o cooptado seria completamente passivo.
Em substituição a “cooptação”, utiliza o termo “pacto trabalhista”, que, destarte o fato de
realmente estabelecer uma relação entre desiguais, demarca que esta é uma relação entre
sujeitos, que se não são autônomos, ao menos tem escolhas e possibilidades. Por fim,
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Castro Gomes aponta que as origens deste pacto devem ser buscadas na Primeira
República e que o período pós-30 apenas o ressignifica, sendo, portanto, que esta tradição
do trabalhismo não é algo novo e original dos assim chamados “anos populistas”.
Em texto de 2002 publicado na revista Varia História Angela de Castro Gomes vai
dar continuidade às suas reflexões de 2001, agora por conta de um convite para uma
palestra sobre culturas políticas em um seminário da UFMG. Reitera que o caminho mais
uma vez por ela escolhido é o da História dos Conceitos. Continua por explicitar suas
escolhas, no sentido das motivações que a fizeram rejeitar o conceito de populismo em sua
tese e adotar o trabalhismo. E aqui temos novos esclarecimentos. O trabalhismo remontava
ao contexto do Estado Novo durante a II Guerra Mundial e à tradição política inglesa, sendo
mais ancestral que o populismo, original dos anos 1950. Ademais, o uso do trabalhismo
permitia uma aproximação maior com novos e iluminadores trabalhos, como o sempre
citado Edward Palmer Thompson e de Barrington Moore.
Castro Gomes cita o livro intitulado Na luta por direitos: estudos recentes em história
social do trabalho. Destaca a entrevista ao final do livro dos pesquisadores Daniel James e
Jonh French. O que chama a atenção de Castro Gomes nesta entrevista é que os autores
realizam um balanço acerca da recente produção em torno de populismo e trabalhismo. O
que fica evidente para ela é que “questões acadêmicas são tratadas como questões
políticas, associadas a interesses de partidos ou organizações sindicais.” (GOMES, 2002:
60). Para Castro Gomes, a partir de excertos da entrevista, fica claro que o debate procura
culpabilizar ou absolver lideranças como Getúlio Vargas e a preocupação não é com o
alcance da implantação da legislação trabalhista, mas sim há o predomínio de certo
teleologismo, posto que se concebe que toda esta legislação trabalhista foi de antemão
pensada para ser um grande engodo e não para ser realmente implementada. Em segundo
lugar, como decorrência do que foi dito anteriormente, os intelectuais e políticos por trás
desta formulação da legislação trabalhista são vistos apenas como manipuladores
inescrupulosos e que agem de má fé. Nesse sentido, estudos que criticam o uso do
populismo, mas que ao mesmo tempo se preocupam com o alcance desta legislação,
seriam taxados de textos não-acadêmicos. No que tange ao trabalhismo, este se
remontaria, como dissemos, à Primeira República.
A proposta de Castro Gomes nesta palestra é analisar o populismo como um mito e
o trabalhismo como uma tradição, ambos inseridos na cultura política brasileira – ela
também aponta que a própria noção de cultura política é datada e passível de críticas. Para
ela o estatuto mítico do populismo atingiria o mesmo nível que o mito da democracia racial
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brasileira e do “país bonito por natureza”. Aqui, ela vai se servir do livro de Raul Girardet
intitulado Mitos e mitologias políticas de 1987. Castro Gomes (2002) dialoga com a análise
de Marilena Chauí, também citada em seu texto de 1996. Para Marilena Chauí e a tradição
dos estudos do populismo como mito da cultura política brasileira, a conformação das
características populistas, de líderes e elites manipuladoras e de um povo ingênuo e
manipulável, remontaria à formação do povo brasileiro e por sua vez ao século XVI, sendo,
portanto, ontológica. Castro Gomes é mais otimista e custa a pensar a sociedade brasileira
de forma tão rebaixada. Mais uma vez justificando as motivações que a levaram a rejeição
do conceito de populismo.
Quanto à tradição do trabalhismo, Castro Gomes (2002) reconhece que não possui a
mesma profundidade e capacidade de arraigamento do mito, mas o considera mais útil para
se pensar a cultura política brasileira – cultura política aqui é pensada no sentido empregado
por historiadores e antropólogos, tendo como referência básica o texto de Serge Berstein no
livro de Sirinelli e Rioux Por uma História Cultural de 1997 – pois sua historicidade é
diferente do mito e podemos datá-lo e circunscrevê-lo. Para ela, obviamente que o
trabalhismo possui raízes no período da Primeira República, mas em seu contexto
originário, ou seja, pós-1930 é reapropriado e reformulado, tanto pelas elites como pela
classe trabalhadora, e no pós-1945 também adquire outras características. Contudo,
trabalhismo é datado e não algo que se remontaria ao século XVI, ou à formação do povo
brasileiro, sendo dotado de grande historicidade.
Considerações finais
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DO POPULISMO “CLÁSSICO” AO NEOPOPULISMO: trajetória e crítica de um conceito – por Otávio Erbereli Júnior
populismo na caracterização da vida política brasileira pós 1930 até o golpe militar de 1964.
Como rejeitam o populismo para este período, tampouco aceitam as novas formulações em
torno do neopopulismo.
O fato é que as formulações “clássicas” do populismo, principalmente com Gino
Germani, Torcuato di Tella e Octavio Ianni, procuram dar conta do fenômeno populista com
uma grande amplitude no tempo e no espaço. Esta é uma característica das formulações
sociológicas, ao mesmo tempo em que perdem na análise das nuances mais especificas.
Outra questão relevante e apontada pelos críticos é que realmente a consagrada formulação
do cientista político Francisco Weffort tem uma concepção um tanto quanto tacanha da
classe trabalhadora, bem distante das recentes contribuições da História Social inglesa.
Contudo, deveríamos abandonar completamente o conceito de populismo? E mais:
deveríamos adotar o conceito, categoria ou termo – não fica claro o que é, pelo menos nos
estudos de Angela de Castro Gomes que expusemos acima – trabalhismo, que seria,
segundo Angela de Castro Gomes, muito mais ancestral que o próprio populismo enquanto
fenômeno político? Não temos respostas prontas e tampouco queremos fechar a questão,
tamanha a complexidade e duração da mesma. Propusemos sim, algumas questões, cujas
reflexões podem conduzir a alguns esclarecimentos.
Fato é que esta rejeição ao conceito de populismo se baseia na análise de casos
específicos e muito bem estabelecidos no tempo e no espaço, não tendo as pretensões dos
modelos de maior alcance dos sociólogos. Com isso, a precisão aumenta, mas também se
perde qualquer articulação com o todo e com movimentos mais amplos. Ademais, a
proposta de adoção do trabalhismo não procuraria ressignificar a herança Vargas, dado o
“lugar social”6 que muitos destes historiadores ocupam, principalmente em torno da
Fundação Getúlio Vargas (FGV)? Ou esta postura se deve simplesmente ao fato de que o
trabalhismo foi mais presente na cultura política carioca do que em outras partes do Brasil,
como São Paulo, onde predominou a interpretação dos sociólogos uspianos? Ficam as
questões.
Referências bibliográficas
6
No sentido empregado por Michel De Certeau em sua operação historiográfica. Ver: CERTEAU, Michel De. A
escrita da história. 3º edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011, p. 45-111.
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