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Tese Fernao Lopes PDF

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS
DEPARTAMENTO DE
LINGUÍSTICA GERAL E ROMÂNICA

‘NOVIDADE DE PALLAVRAS’
NO
PORTUGUÊS DO SÉCULO XV
Mário José Silva Meleiro
DOUTORAMENTO EM LINGUÍSTICA
(Linguística Histórica)

Tese orientada pelo


Prof. Doutor Ivo Castro

2011
A ti, Ana, a ti, Tomás,
pelas horas de ausência,
novamente obrigado.
Agradecimentos

Ao Professor Doutor Ivo Castro,


por todas as orientações e sábios ensinamentos, mas
sobretudo pela disponibilidade apresentada para os
partilhar, o meu profundo e sincero agradecimento.
Também pela compreensão e apoio demonstrados nos
momentos em que a investigação não evoluiu como seria
de esperar.

Aos meus professores e colegas que, de alguma forma,


estiveram presentes, sem referir nomes, não vá algum,
inconscientemente, ser ignorado, o meu obrigado por
todo o apoio.

À professora Maria Teresa Brocardo, pela


disponibilização, em suporte papel, mas sobretudo
informático, da Crónica de Zurara, o meu reconhecido
obrigado.

À FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia, pelo


apoio com o subsídio de manutenção mensal.
Resumo:
O enriquecimento do léxico, quer através da importação, quer de recursos morfológicos internos, é
um processo intemporal na língua. E se não há dúvida que Camões é o grande mentor com a introdução
de novas palavras na língua, sobretudo latinismos, também as não há de que antes dele outros
contribuíram para o seu engrandecimento. A prova de que este é um processo intemporal temo-la com
vários autores anteriores e posteriores ao Renascimento. Porém, existe a convicção de que é a partir do
século XV que tal processo se começa a evidenciar, para atingir o seu auge no século XVI, consequência
natural do Renascimento e da importância que as leituras dos clássicos então alcançaram. No entanto, um
século antes, quer a prosa didáctica, levada a cabo pela produção régia, quer a histórica, pelos cronistas,
haviam já aberto o caminho.
O corpus de partida para este estudo é, então, a Crónica de D. Fernando, de Fernão Lopes, e a
Crónica do Conde D. Pedro de Meneses, de Zurara, das quais apresento um Índice Analítico, a partir do
qual será possível identificar os neologismos que elas contêm. Utilizando as palavras do próprio Fernão
Lopes, o objectivo é procurar “novidade de pallavras”, daí o título da tese. Num primeiro capítulo abordo,
ainda, os principais conceitos de formação de palavras e o papel da tradução na sua importação. Pretendo
também tentar mostrar a falsa modéstia assumida pelo próprio Fernão Lopes, relativamente à qualidade
lexical, morfológica e sintáctica da sua obra.

Abstract
The enrichment of the lexicon, either from imports or from internal morphological
characteristics, is a timeless process in the Portuguese language. If there is no doubt that Camoes is
the great introducer of new words in the portuguese language, especially Latinisms, there is also no doubt
that before him others contributed to its enrichment.
But this is a timeless procedure. Throughout the ages, many classical forms have entered the
language. Evidence that this is a timeless process is given by several authors before and after the
Renaissance. However, there is the conviction that it is from the fifteenth century that this process starts,
reaching its peak in the sixteenth century, the natural consequence of the Renaissance and the importance
of the readings of the classics then reached. However, a century before, either didactic prose, undertaken
by royal production, or history, by the chroniclers, had already opened the path.
The corpus of departure for this study is, then, the Chronicle of D. Fernando, by Fernão Lopes,
and the Chronicle of the Earl D. Pedro de Meneses, by Zurara of which I present an analytical index,
enabling the identification of the earliest records they contain. Using the words of the chronicler, the
objective is to seek “novidade de pallavras", hence the title of the thesis. The first chapter also contains an
approach to the main concepts of word formation and the role of translation in its import process.

Palavras-chave: Linguística Histórica, Português Médio, Primeiras Datações, Fernão Lopes, Zurara-
Key-Words: Historical Linguistics; Middle Portuguese, Earliest Records, Fernão Lopes, Zurara.
Índice Geral

Índice Geral

Índice geral 11
Siglas e abreviaturas 13

Introdução 15
I. Inovação Lexical 21
1. Formação e importação de palavras: principais conceitos 25
II. Datação das palavras 31
1. Os Dicionários Históricos-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM) 31
2. A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2) 43
3. Índice analítico conjunto da Crónica de D. Fernando e da Crónica do Conde
D. Pedro de Meneses (Anexo I) 51
3.1. Conclusões 56
III. Novidade de palavras no século XV 57
1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de Giuliano Macchi 59
2. A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara. Edição de Teresa Brocardo 61
3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando 65
3.1. Comentários: 113
4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV 115
Metodologia – ficha de palavra 115
4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de Dom Fernando 119
4.1.1. Comentários: 165
4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses 167
4.2.1. Comentários: 212
Conclusão 213
Referências Bibliográficas 215

ANEXO
Índice Analítico da Crónica de D. Fernando e da Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

11
Siglas e Abreviaturas

Siglas e abreviaturas

SIGLA OBRA

AGC Dicionário Etimológico do Português Medieval, de Antônio G. da Cunha


BENF O Livro da Virtuosa Benfeitoria
BLem Lematização de textos medievais portugueses, edição de J. Barbosa
Machado
BOSC Boosco Deleitoso
CAVA Livro da Ensinança de Bem Cavalgar toda Sela
CDPM Crónica do Conde D. Pedro de Meneses
CESA Vida e Feitos de Júlio César
CF Cândido Figueiredo
CGE Crónica Geral de Espanha (1344)
CHP Clíticos na História do Português
ChPortDuarte Chancelarias Portuguesas de D. Duarte 1-2
ChUniPort Chartularium Universitatis Portugalensis
CIPM Corpus Informatizado do Português Medieval
CITR Livro de citraria
COND Crónica do Condestabre de Portugal
CORDE Corpus Diacrónico del Español
CP Castelo Perigoso
Cron1419 Crónica de 1419
CSM Cantigas de Santa Maria
DESC Descobrimentos Portugueses
EER Evangelhos e Epístolas com suas Exposições em Romance
ELOY A vida de Santo Eloy
FRAD Crónica da Ordem dos Frades Menores
GenEst General Estoria
GRAL A Demanda do Santo Graal
HG-P História do Galego-Português
IVPM Índice do Vocabulário do Português Medieval, de Antônio G. da Cunha

13
Siglas e Abreviaturas

JPM3 Dicionário Etimológico do Português Medieval, de José Pedro Machado


LEAL Leal Conselheiro
LOPF Crónica de D. Fernando
1
LOPJI Crónica de D. João I, 1ª parte
2
LOPJI Crónica de D. João I, 2ª parte
LOPP Crónica de D. Pedro
MD-CF Corpus do Português de Mark Davis e Michael Ferreira
OFIC Livro dos Ofícios
ORTO Orto do Esposo
PPart, SPart, Primeira Partida, Segunda Partida, Terceira Partida
TPart
REIS Crónicas dos Cinco Primeiros Reis de Portugal
REIX Crónicas dos Sete Primeiros Reis de Portugal
RLor Sobre Cronologia do Vocabulário Galego-Português, de Ramon Lorenzo
SACR Sacramental
TROY Crónica Troiana
VERT O Livro das Tres Vertudes
VH-CPM Vocabulário Histórico-Cronológico do Português Medieval
VITA O Livro de Vita Christi em Lingoagem Português
VLA Vestigios da Lingoa Arabica em Portugal, de João de Sousa
VocGV Vocabulário Ortográfico e Remissivo da Língua Portuguesa, de G. Viana
VocRG Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, de Rebelo Gonçalves
ZURC Crónica da Tomada de Ceuta
ZURD Crónica do Conde D. Duarte de Meneses
ZURG Crónica dos Feitos da Guiné
ZURP Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

14
Introdução

Introdução

“A última regra, que na lembrança deve ser a primeira,


seja que trabalhemos sempre por investigar a origem
dos vocábulos. Porque pela etimologia deles, se sabe a
ortografia e pela boa ortografia a etimologia.”
Duarte Nunes de Leão (1576). Origem, e Orthographia
da Lingoa Portugueza, p. 189 (regra XX).

Em trabalho realizado anteriormente1, cimentou-se o interesse pelo estudo do léxico. No


meio do regozijo, foram, no entanto, as dúvidas levantadas em determinadas situações que me
levaram agora a optar pelo mesmo tipo de tema, mas a um nível diferente de complexidade.
Diferente porque tive, algumas vezes, a sensação de ter começado o estudo in medias res. Por
diversos momentos fiquei na incerteza se determinado latinismo utilizado por Ricardo Reis
seria, de facto, criação dele ou se, pelo contrário, já teria sido utilizado por outro autor do
Renascimento ou mesmo da época que imediatamente o precedeu e preparou, sobretudo pela
grande transformação que provocou na história da língua portuguesa. Na altura, a inexistência
de um dicionário que registasse a data da entrada da palavra na língua dificultou o trabalho e
obrigou-me a ser cauteloso com algumas afirmações proferidas. Uma consulta a muitos
glossários tornou-se uma tarefa hercúlea, em alguns casos mesmo infrutífera. Se hoje o
problema não está totalmente resolvido, está, pelo menos, bastante minimizado com o
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, referência base de datação das palavras para esta
investigação.
Perante um estudo lexical mais exaustivo, imediatamente algumas questões se me
colocaram: Que época? Que autores? Que textos? A solução foi ir recuando e assim cheguei ao
século antes de Camões. Antes de Camões porque se não há dúvida que é ele o grande
introdutor de latinismos na língua, também as não há de que antes dele outros contribuíram para
o seu enriquecimento. Entre esses humanistas eruditos encontra-se Damião de Góis, Jerónimo
Osório, Aquiles Estaço, André de Resende e até mesmo Gil Vicente. Mas este não foi só um
procedimento do português médio. Ao longo das épocas, formas eruditas ou semieruditas
entram na língua. A prova de que esse é um processo intemporal temo-la com vários autores

1
Dissertação de Mestrado Latinização do léxico e da sintaxe nas odes de Ricardo Reis.

15
Introdução

posteriores ao Renascimento, como os Neoclássicos Filinto, Garção, Quita, Bocage, ou mais


recentemente Antero de Quental, Eugénio de Castro e Fernando Pessoa.
Existe, no entanto, a convicção de que é a partir do século XV que tal processo se começa
a evidenciar para atingir o seu auge no século XVI, consequência natural do Renascimento e da
importância que as leituras dos clássicos então alcançaram. Mas um século antes, quer a prosa
didáctica, levada a cabo pela produção régia, com clara preocupação pedagógica, ética e social,
quer a histórica, pelos cronistas, haviam já aberto o caminho. Assim, chegado ao século XV, e
refeito do impacto de tamanho corpus existente, foi com algum aprazimento que concluí que
também aqui tinham de existir truncações e chegar a uma eleição. Entre a prosa didáctica e a
histórica, a escolha recaiu nesta última. O corpus de partida para este estudo estava, assim,
encontrado: a Crónica de D. Fernando, de Fernão Lopes e a Crónica do Conde D. Pedro de
Meneses, de Zurara. A possibilidade de edições informatizadas não foi alheia à escolha.
Após as primeiras pesquisas, tendo apenas como referência o vocabulário clássico,
rapidamente concluí que quer as obras, quer a época eram próprias à entrada de palavras
provenientes de outras culturas, nomeadamente a arábica. Da pesquisa de latinismos e
helenismos, foi um pequeno passo para a procura de primeiras atestações. Além das obras,
estava também identificado o objectivo central da tese: levantamento de neologismos na Língua
Portuguesa do século XV, com base em duas crónicas dos dois primeiros cronistas portugueses.
Utilizando as palavras do próprio Fernão Lopes, o objectivo é procurar “novidade de
pallavras”2, daí o título da tese.
Num primeiro capítulo, de abordagem aos principais conceitos sobre formação de
palavras, com base em processos morfológicos regulares (I.1), é também intenção destacar o
papel da tradução na importação de palavras (I.2), ambos como forma de enriquecimento
vocabular.
Num segundo, não sendo um capítulo secundário, pretende-se, claramente, preparar o
terreno para aquele que procurará trazer mais novidade à investigação, o terceiro. Assim, antes
do ponto fundamental deste segundo capítulo, a elaboração de um Índice Analítico (II.3), farei
uma análise aos materiais utilizados para chegar ao referido Índice (II.1,2). Numa altura em que
proliferam os índices directos das palavras de variadas obras, tarefa facilitada pelas
digitalizações e um número significativo de programas informáticos para o efeito, ganha força o
qualificativo ‘analítico’. Assim, mais do que uma lista, pretendo construir um glossário das
“palavras pertencentes a classes principais e que admitem formação morfológica de neologia

2
Fernão Lopes, Crónica de D. João I, Prólogo, p. 3 (para esta obra sigo a edição organizada por Salvador
Dias Arnaut para a Civilização Editora, indicando o capítulo e a página).

16
Introdução

(i.e. adjectivos, nomes, verbos e advérbios em -mente)”3, muito ajudado pela máquina, é certo,
mas em que a última palavra é do homem.
Posteriormente, e já com os resultados obtidos no capítulo anterior, é neste terceiro
capítulo que pretendo apresentar a “novidade de pallavras”, registadas pela primeira vez na
Crónica de D. Fernando, de Fernão Lopes (III.4), e a Crónica do Conde D. Pedro de Meneses,
de Zurara (III.5), após uma breve análise às edições de Giuliano Macchi e Teresa Brocardo
(III.1,2) que serviram de base a este estudo lexical. Se para algumas a certeza se petrificou após
a consulta de dicionários e obras de diversa tipologia, para outras, sobretudo as que apresentam
atestação em obras da época de Avis, tendo em conta a sua produção ou tradução, não foi
possível tal solidificação. Para estas foi criada uma primeira lista onde se apresentam os
possíveis neologismos de Fernão Lopes (III.3).
Por fim, num quarto capítulo, e resultante da análise as duas Crónicas, procurarei fazer
um estudo comparativo / conclusivo entre os dois primeiros cronistas régios e analisar as
afirmações proferidas por Fernão Lopes no Prólogo da primeira parte da Crónica de D. João I,
que dão o título à tese, no sentido de perceber se são falsa modéstia, ou se, na verdade, são uma
prova de consciência linguística, no sentido em que o cronista do povo demonstra
conhecimentos superiores à grande maioria, mas muito aquém daqueles que seriam necessários
para fazer germinar e acompanhar os embriões do renascimento, nomeadamente através da
leitura e tradução dos clássicos, que os próprios príncipes fariam em secretária paralela à dele.

Do ponto de vista literário, é comummente aceite que Fernão Lopes é o primeiro grande
prosador português. Nas palavras de Zurara, Fernão Lopes era “uma notável pessoa (…) homem
de comunal ciência e grande autoridade”4, apesar da eventual crítica implícita à sua instrução
que estas palavras possam acarretar. Que era conhecedor das obras dos clássicos, porventura
lidas na biblioteca de D. Duarte, mostram-no as referências a alguns autores como Tito Lívio,
Ovídio, Cícero5, Santo Agostinho6 e até Aristóteles7. A utilização do Latim por Fernão Lopes,
ainda que em frases feitas8, demonstra alguma formação. Todavia, quer pela eventual crítica

3
Cf. Villalva, in Mateus (62004:949).
4
Cf. Crónica da Tomada de Ceuta, cap. III.
5
Cf. LOPP 6.80 (para a Crónica de D. Pedro sigo a segunda edição de Giuliano Macchi – Teresa Amado.
Lisboa: IN-CM, 22007, com a sigla LOPP e indicação da página e linha).
6
Cf. LOPJI1 cap. CLXXV, p. 373; LOPJI2, cap. CXCIX, p. 452.
7
Cf. LOPP, cap. XXIX, p. 136.
8
Cf. LOPJI2, Cap. XLI p. 103, (cf. também Evang. S. João, 1:14):
“Ho Arçebispo de Braguua ouutro sy semdo bẽ armado, avia amte sy a cruz de Braguua alevamtada
com que costumava visitar as Igrejas e nnaõ quedava de prover amdamdo huũs e os ouutros,
esforçamdo e absolvemdo todos, comfirmamdo lhe as perdoamças que o Papa Urbano seisto
outorguava comtra os cismaticos increos revees a Samta Igreja, dizemdo a todos quue tamto que
começasẽ ferirnos imiguos quue fosẽ membrados de dizer [ameude] et verbum caro factũ est
(sublinhado meu); e alguũs simplez inoramtes quue esto naõ emtẽdiaõ pergumtavaõ que queria dizer
aquilo, e ouutros por sabor respomdiaõ que queria dizer muy carofeito hee este.”
ou ainda LOPJI2, Cap. CXCIX p. 452:

17
Introdução

anterior, quer também pelas referências clássicas, parece ficar aquém em Zurara. A análise
lexical paralela, resultante do Índice Analítico das duas obras, permitirá tirar conclusões. Numa
primeira abordagem, se ao nível da utilização dos recursos internos da língua para formação de
novas palavras parece não haver diferenças, ao nível da introdução de novos termos latinismo,
mas sobretudo arábicos, elas deixam antever uma clara supremacia de Zurara. Não será alheio a
este factor a diferença de erudição dos cronistas, e muito menos a deslocação da acção do
território nacional para o norte de África.
Nas crónicas destes dois cronistas, a Língua Portuguesa abandona os simples relatos
históricos dos cronicões, para se embrenhar com a literatura. O recurso, por exemplo, a
comparações9, metáforas10, entre tantos outros recursos estilísticos, catapultam-nos já para uma
esfera totalmente diferente da tradição cronística anterior. Com um discurso que procura ser
claro onde predomina uma linguagem corrente, sobretudo em Lopes, são muitas as marcas de
oralidade ao longo dos textos. Resultará daqui, a designação de contador de histórias11.
O relato dos feitos de determinado herói, que tem exemplo esporádico na primeira metade
do século XV com Crónica do Condestabre, dá lugar em Lopes a uma narração de
acontecimentos do reino sempre com a preocupação de “escprever verdade, sem outra
mestura”12, apesar de tais relatos serem feitos passado meio século. A procura desta verdade
parece mesmo ser levada ao extremo quando afirma “que logar nos ficaria pera a fremosura e
afeitamento das pallavras, pois todo nosso cuidado em isto despeso, nom abasta pera hordenar
a nua verdade”13. Assim, a busca da verdade, parece ser truncadora na procura da beleza de
expressão, donde resulta a passagem para segundo plano dos valores literários. No entanto, quer
ao nível do léxico, quer da sintaxe, mesmo num estado de intensa flutuação, são já muitas as

“E quoamdo taes pesoas sabiam que avia de vir aquelle luguar homde asy viviam, fogiam dali para
outros luguares atee que se dali partia; e delles perbom geito fazia casar com as mamcebas que
tinhã, asy quebem se compria em sua casa e terra o dito que Samto Agostinho dizem que fallava a
seus frades: Si nom castus tamen cautũ.” (sublinhado meu).
9
Veja-se, a título meramente exemplificativo, esta passagem em LOPP 41.59-71, em que Lopes compara a
justiça a uma teia de aranha:
“Assi que bem podem dizer deste rrei dom Pedro, que nom sairom em seu tempo certos os ditos de
Salom filosopho e doutros algũus, os quaaes disserom que as leis e justiça eram taaes como a tea da
aranha, na quall os mosquitos pequenos caindo, som rreteudos e morrem em ella, e as moscas
grandes e que som mais rrijas, jazendo em ella, rrompem-na e vaan-sse; e assi diziam elles que as
leis e justiça, se nom compria senom em-nos pobres, mas os outros, que tiinham ajuda e acorro,
caindo em ella rrompiam-na e escapavam. El-rei Dom Pedro era muito per o contrairo, ca nẽnhũu,
per rrogo nem poderio, avia d’escapar da pena merecida, de guisa que todos rreceavam de passar
seu mandado.”
10
Entre tantos outros exemplos, veja-se esta passagem da LOPJI2, cap. XLI, p. 102:
“…quue os portuugueses nnaõ pareçiaõ mais amte eles que ho lume de huũa pobre estrela amte
claridade de lua em seus perfeitos dias”.
ou ainda a metáfora da pomba, em ZURP 251-252.68-89.
11
A classificação de Teresa Amado, transformada em título de livro, fundamenta-se em frases de começo de
alguns capítulos, por exemplo, LOPJI2, cap. XLIII, p. 195, em que prefere utilizar o verbo ouvir em detrimento de
ler: “Vos ouvistes no primeiro capitollo desta estória,”
12
LOPJI1, Prólogo, p. 2.
13
LOPJI1, Prólogo, p. 3.

18
Introdução

preocupações em tornar a Língua Portuguesa um instrumento de comunicação mais sólido, mais


rigoroso, mais criativo, no fundo, mais literário.
Com Zurara, privilegia-se de novo o herói individual em detrimento do colectivo. Como
historiador do reino, também ele garante a veracidade dos relatos, pois “do que rreallmemte
pertemçee a sustamçia nõ pode em outra parte ser mais verdadeyramemte escripta que aquy,
leixamdo as particullaridades em que nunca se pode achar verdadeira çertydão no que de
neçessydade per muitos há de ser sabido”14. À semelhança de Lopes, também ele afirma E por
çerto que em este livro tyve eu muito comtrayro cuidado do que allgũs outros estoriaes ẽ suas
obras teverão, espiçiallmemte os gregos, os quaes supriam com fermosas pallavras o que na
gramdeza dos feitos mimgoava, e a mỹ foy neçessario forneçer a mimgoa das pallavras com
gram-deza dos feitos 15.
Claro que a pertinência destas reflexões se revela mais ao nível da literatura. E a nível
linguístico, ou para ser mais preciso, ao nível lexical e da própria morfologia da história da
língua portuguesa? No já referido prólogo da Crónica de D. João I, Fernão Lopes afirma que
não vale a pena “buscar fremosura e novidade de pallavras”16. Numa primeira análise, estas
palavras parecem não fazer muito sentido, uma vez que na sua obra, e na Crónica de D.
Fernando em particular, parece encontrar-se um número significativo de primeiras atestações.
Procurarei verificar se tal registo inicial não será mais pela sua actividade de cronista e,
sobretudo, pela posição privilegiada da conjectura cultural em redor da corte de Avis. E quanto
a Zurara? O estudo e a edição da sua obra mostra-nos que tem sido constantemente remetido
para segundo plano. Se nas suas palavras anteriores existe alguma espécie de crítica ao seu
antecessor, será de esperar uma supremacia da sua obra, quer seja visível através de
conhecimentos e referências aos clássicos, quer do ponto de vista da estrutura e sistematização
da língua, quer do enriquecimento lexical.
Os resultados, que espero profícuos, serão no final apresentados.

14
ZURP (186.295-299).
15
ZURP (179.134-139).
16
LOPJI1, Prólogo, p. 3.

19
I. Inovação Lexical

I. Inovação Lexical

“Se temos de pedir a alguma bolsa


Termos que nos faleçam, seja à bolsa
De nossa Mãe Latina, que já muito
Nos acudiu em pressas mais urgentes,
Quando em bronca escassez já laborámos,
Ao sairmos das mãos de bruta gente17”.
Filinto Elísio (1998).Obras Completas, vol. I, p. 31.

A linguagem humana caracteriza-se pela mudança. Como que por reacção, todas as
línguas terão então de acompanhar esta mudança e evoluir para não entrar no rol das chamadas
línguas mortas. Além de factores estritamente linguísticos, outros, como os históricos, sociais
ou políticos, podem condicionar esta mudança, sem esquecer, claro está, que a língua “é um
sistema em perpétua adaptação às necessidades expressivas dos seus utentes”, mostrando que
“existem fases de permanência que alteram com fases de grande alteração (Cardeira 2005:33 e
65). O século XV, ou melhor, a passagem do português antigo para o português médio, mais
precisamente a passagem da dinastia de Borgonha para a de Avis, sobretudo no meio século de
reinado de D. João I e D. Duarte (1385-1433 e 1433-1438, respectivamente), parece ser uns
desses momentos de alteração, se não o grande momento de alteração de toda a história da
língua portuguesa. Estamos, pois, a falar da transição do ciclo de formação da língua para o
ciclo da expansão da língua, nas palavras de Ivo Castro. Esperança Cardeira considera, no
entanto, que este marco da batalha de Aljubarrota é tardio, uma vez que “as mudanças
inovadoras já ocorriam antes dessa data”18 em ‘franjas de separação’ entre o português antigo e

17
“Godos e mouros que estiveram longo tempo de posse de Portugal”.
18
Cardeira (2005:291).

21
I. Inovação Lexical

o português médio, em expressão que Magalhães Godinho, onde deve estar incluída a segunda
metade do século XIV.
A evolução de uma língua pode verificar-se a vários níveis, mas aquele que terá maior
importância neste estudo prende-se, fundamentalmente, com a evolução do léxico da língua
portuguesa. É que, como refere Correia Garção, também ao tempo estão sujeitas as palavras19.
Esta mutação linguística verifica-se quer ao nível das unidades que deixam de ser utilizadas, os
arcaísmos, quer ao nível das unidades que vão entrando na língua, os neologismos, contribuindo
para o seu enriquecimento e respectivo aumento do acervo lexical. Os arcaísmos, não
desaparecendo da língua, são um valiosíssimo “património lexical”20 que apenas deixam de
estar disponíveis na consciência dos falantes, mas que a eles recorrem em diversas situações,
sobretudo literárias, quando se pretendem representar e identificar épocas passadas. Quanto aos
neologismos, o processo parece ser idêntico, na medida em que todos ficam registados no léxico
da língua, mas onde nem todos ultrapassam o período probatório para ter registo nos
dicionários.
A “necessidade de denominar novos conceitos e novas realidades” (Correia 2005:9),
juntamente com a vontade de enriquecer a língua, vem de há muito tempo atrás. João de Barros,
por exemplo, no seu Diálogo em Louvor da nossa Linguagem, preconiza o enriquecimento da
língua através da criação de neologismos e revitalização de arcaísmos. Assim, ao vocabulário
designado como hereditário foram-se juntando novos termos resultado do contacto com outras
línguas. Foram vários os factores que colocaram o português em contacto com outras línguas,
dando início a um enriquecimento que chega até aos nossos dias. Como refere Rosa Virgínia,
“desde os inícios da formação de Portugal, havia contactos com a área franco-provencal:
lembre-se que o conde dom Henrique, pai de Afonso Henriques, era borgonhês”21.
Sabe-se que o léxico português apresenta vocábulos provenientes de sistemas linguísticos
muito variados. Não tendo aqui como objectivo aquela parte do léxico original, ou seja, os
vocábulos designados por hereditários, aqueles que segundo Bechara “viviam no léxico da
língua quando deixou de ser latim para ser identificada como português, numa passagem
ininterrupta no tempo e no espaço”22, procurarei tecer algumas considerações sobre os restantes
vocábulos, ou seja, aqueles que a língua absorve posteriormente de outros sistemas linguísticos
com vista ao seu enriquecimento, designados por empréstimos. Mas não é objectivo desta
investigação fazer o levantamento de todos os sistemas linguísticos que se encontram
representados no léxico português, mas sim tentar perceber algumas das razões que estão na
base da sua importação. Porque é que se importam palavras? Estará o léxico originário
19
Correia Garção, sátira II, dirigida ao Conde de S. Lourenço. Sobre a criação de novas palavras a que
Garção alude, vide etiam os versos 58-62 e 70-72 da Arte Poética de Horácio.
20
Correia (2005:11).
21
Matos e Silva (2008:99).
22
Bechara (2002:217-218).

22
I. Inovação Lexical

desprovido de tal termo? E como é que esses novos termos chegam? Por exemplo, no caso das
línguas clássicas, será por conhecimento directo dessas línguas, ou será através de traduções de
outros sistemas linguísticos? E relativamente ao português, se é verdade que recebeu muitas
palavras alienígenas, também o é que serviu para enriquecer outros sistemas linguísticos. Numa
época como a dos descobrimentos, em que Portugal se afirmava ao mundo, era natural a
absorção de lusitanismos. O sistema linguístico espanhol, por exemplo, de alguns deles se
serviu.
Serão estas as questões a que procurarei responder nas linhas que se seguem e das quais
apresentarei no final as conclusões.

23
I.1. Formação e importação de palavras: principais conceitos

1. Formação de palavras: principais conceitos

Segundo Robert Verdonk, a entrada de palavras novas numa língua pode acontecer a dois
níveis, ou seja, a nível formal e a nível semântico, sendo que o primeiro pode ocorrer por dois
processos: empréstimos de outras línguas (vivas ou mortas) e formação de novas palavras, por
composição ou derivação23. Em palavras similares, Correia (2005:23) refere que para incorporar
palavras novas, os léxicos das línguas dispõe basicamente de três mecanismos distintos: a
construção de palavras, recorrendo a regras da própria língua; a reutilização de palavras
existentes, atribuindo-lhes novos significados e a importação de palavras de outras línguas.
Menciona ainda que além destes mecanismos, considerados os mais produtivos, pode ainda
considerar-se uma outra forma de criar novas palavras, a chamada ex nihilo, sem dúvida o
procedimento menos usual em qualquer estádio da língua. De qualquer forma, o que para este
trabalho se torna pertinente não é nenhum em particular, embora possam surgir justificações
pontuais, mas sim todos como um conjunto, na medida em que contribuem para o
enriquecimento da língua. A percentagem que caberá a cada um será o resultado da análise dos
dados recolhidos.
Ora, para um trabalho desta natureza, torna-se imprescindível um dicionário que registe a
entrada das palavras na língua. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa é, sem dúvida, um
importantíssimo elemento de trabalho. Porém, quando reparamos nos instrumentos de que
dispõem os linguistas espanhóis é que verificamos, apesar dos enormes progressos dos últimos
anos, o caminho que ainda nos falta percorrer. Até há poucos anos, para um estudo linguístico
desta natureza, dispunham eles de um dicionário de referência obrigatória: Corominas. Porém,
graças à informática, foram criadas grandes bases de dados e uma delas merece destaque:
CORDE, ou seja, Corpus Diacrónico del Español, criada pela Real Academia Española24.
Robert Verdonk, no capítulo “Cambios en el léxico del español durante la época de los
austrias”, inserido na Historia de la Lengua Española, coordenada por Rafael Cano25, a
propósito do confronto entre dicionários históricos e esta base de dados refere: “De esta
confrontación resulta que una parte importante de las voces que hasta ahora se vienen

23
Cf. Rafael Cano (coord.) (2004). Historia de la Lengua Española. Madrid: Ariel, p. 895.
24
Pode consultar-se esta base de dados em http://corpus.rae.es/cordenet.html
25
Rafael Cano (coord.) (2004). Historia de la Lengua Española. Madrid: Ariel. O capítulo referido é o 34,
páginas 895-916.

25
I.1. Formação e importação de palavras: principais conceitos

considerando préstamos o creaciones de los siglos de Oro, en realidad ya están atestiguadas en


el siglo XV o incluso antes”26.
Como mero exemplo desta desactualização dos dicionários, nomeadamente de
Corominas, fui procurar a palavra cisterna, que também se encontra atestada na Crónica de D.
Fernando (11.14)27. O Dicionário regista o seguinte: “tomado del lat. cĭstĕrna íd., derivado de
cĭsta ‘cesta’. 1ª doc. cistierna, h. 1350: Poema de Alfonso XI, 1963; cisterna, 1570, C. de las
Casas (en Apal. 78d figura solamente como voz latina)”. Ora, o CORDE regista três ocorrências
anteriores da referida palavra: em 1200 (Almerich, na obra La fazienda de Ultra Mar); em 1250
(Anónimo, na obra Vidal Mayor) e em 1275 (Alfonso X, na obra General Estoria. Primera
parte)28.
Assim, apesar de ser no Renascimento que se verifica a grande entrada de latinismos na
Língua Portuguesa, nomeadamente com Camões, não é menos verdade que muitos outros
faziam já parte do léxico do século XV. Partindo dos latinismos apresentados por Corrêa da
Silva29, e num levantamento rápido, verifiquei que em Fernão Lopes já se encontram atestados
avondoso, contrairo, fruta, inimigos, mover, pacificamenente, potência e em Zurara, por
exemplo, feroz, fuzilar, humano, ou vulgar. Depois, tendo por base o Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa, parece que algumas palavras aí registadas com datação do século XVI já
estão nos autores do XV. Estou a falar de palavras, por exemplo, como begue, que Houaiss
regista como entrada de Frei António de Gouveia na obra Relaçam, em que se tratam as guerras
e as grandes victorias que alcançou o grande Rey da Persia Xá Abbas do grão Turco
Mahometano, & seu filho Amete. Lisboa, 1608, embora refira que esta palavra tem ocorrências

26
Idem, Ibidem, p. 896.
27
Todas as referências são feitas pela edição crítica de Giuliano Macchi, IN-CM, 22004. Serão sempre feitas
pela indicação da página, seguida da linha.
28
Cf. o texto de Afonso X, General Estoria. Primera parte. Publicación de Pedro Sánchez Prieto-Borja,
Universidad de Alcalá de Henares (Alcalá de Henares), 2002:
“E fueron sueltas por ende las ataduras de los sos braços e de las sus manos, una vez cuando oyestes quel
prisieran sos hermanos yl ataron las manos yl echaron en el pozo seco, a que llama el latín cisterna otra vez de
cuandol fizo prender en Egipto e echarle en la cárcel aquella doña Zulaima, muger de Futifar su señor, con la quel
casó después el rey Faraón su señor, como es ya contado ante d'esto, e libról d'estas prisiones Dios, que siempre fue
él poderoso de Jacob su padre de Josep”.
29
Carlos Eugénio Corrêa da Silva (1972). Ensaio sobre os Latinismos nos Lusíadas. Lisboa: IN-CM. Não
deixa, no entanto, de questionar: “Como é que se pode escrever um trabalho definitivo sôbre os latinismos dos
Lusíadas, isto é, sôbre a contribuição que Camões trouxe ao enriquecimento da nossa língua literária, se nós não
sabemos com exactidão qual era o grau de enriquecimento dessa língua na fase imediatamente anterior à publicação
do poema?!” (1772:63). Passadas quatro décadas os estudos linguísticos já provaram que era maior do que aquele que
o próprio Corrêa da Silva imaginava, se atendermos ao número de latinismos por ele identificados em Camões com
registo anterior. Não estarão, no entanto, todos identificados, como aparentam as primeiras pesquisas deste trabalho.

26
I.1. Formação e importação de palavras: principais conceitos

anteriores, porém com outras formas30. No entanto, a forma begue encontra-se já atestada em
Fernão Lopes, na Crónica de D. Fernando31.
Em determinados momentos de produção escrita, poderá o autor sentir necessidade de
criar uma nova palavra para representar determinada ideia. Os passos a seguir são os
anteriormente enumerados e a eleição de um deles, ou de mais do que um, será garantidamente
de carácter pessoal. Por exemplo, Fernando Pessoa, exímio conhecedor da língua e literatura
latinas, recorria, por hábito, a perífrases verbais e a perfeitos decalques do Latim, neste caso do
particípio futuro como morituros.
Filinto Elísio, por exemplo, recorre constantemente à construção de novas palavras com
recurso a processos morfológicos que a língua lhe permite, mas que não aceitou e, por isso,
caíram em desuso. Sobre a formação de palavras de Filinto recordo a opinião de Rodrigues
Lapa: “julgou dar relevo ao seu estilo, forjando compostos à custa do grego e do latim. Como
era homem de mau gosto, saíram-lhe coisas arrevesadas como estas, que a língua justamente
repudiou: «septi-cole Roma», «flamivono alento», «regos frigíferos», «ebri-festante sumo»,
«ali-potente cisne», etc.”32. Ainda sobre a alteração semântica introduzida pelo prefixo, refere o
mesmo estudioso: “(...) Filinto Elísio (...) para acentuar ainda mais a ideia de negação, escrevia:
in-consolado, separando por hífen o prefixo da palavra, a fim de lhe dar maior relevo”33. Mas a
grande explicação sobre poesia guardou-a quase para o fim da vida, Numa longa carta a Brito34,
considerada uma verdadeira Arte Poética, mas repleta de versos mui secos, mui gramático-
prolixos35, não se coíbe de deixar o seguinte apelo: “De termos já sabidos formai novos / (Força
é que eu vo-lo diga, e que rediga) / Juntando-os com primor em laço estreito, / E sereis de bons
Mestres aprovados.36 Francisco Solano Constâncio, revisor das Obras e seu amigo, havia já
salientado que Filinto “foi procurar à língua Latina os vocábulos de que carece a nossa, ora
mudando-lhe as desinências, conforme o requer a analogia das duas línguas, ora formando
palavras compostas”37. Muitos dos neologismos de Filinto, mesmo que tenham passado por um
período probatório, foram apenas unidades de discurso, não chegando a entrar para o sistema da
língua, nem tendo, portanto, registo nos dicionários. Parecem ter sido meras necessidades

30
Cf. Houaiss: “s.m. (1608 cf. Pérsia) ÍND título honorífico entre os maometanos, posposto ao nome próprio,
correspondente a 'dom' ou 'senhor'. ETIM persa-tur. beg; Crooke deriva-o do ant. persa baga, relacionando-o com o
sânsc. bhaga 'senhor'; há diversas grafias desta pal. muito anteriores: cojibequy (1513), byqym (1520), indobeque
(1552), cogebequi (1563), bec (1571); há ainda assadbegue e begue (1608), beg (1718), bei (1789), beque (1884) etc.
SIN/VAR beque”.
31
Cf. 21.22:
“e de França eram hi estes cavalleiros: monssé Beltram de Claquim e o mariscall de França e o begue de
Vilhenes”.
32
Lapa (111984: 97-98).
33
Idem, Ibidem, p. 101.
34
Carta ao Senhor F. J. M. D Brito, Filinto I, pp. 27-95.
35
Filinto I, p. 94.
36
Filinto I, p. 79-80.
37
Filinto I, p. 15.

27
I.1. Formação e importação de palavras: principais conceitos

comunicativas pontuais e individuais, alguns deles mesmo considerados hápax, tanto quanto
pude observar em estudo anterior.
Voltando ao século XV, é comummente aceite que o embrião do Renascimento está já a
germinar. E se é verdade que muitos cultismos aparecidos nesta altura não vingaram, como
conhecente em vez de ‘conhecido’, emburilharem vez de ‘embrulhar’, descerdo em vez de ‘sem
cerco’, antreconhecer-se em vez de ‘conhecer-se reciprocamente’, duçor em vez de ‘doçura’,
acuitilar em vez de ‘ferir com cuitelo’, antredito em vez de ‘interdito’38, também o é que muitos
outros tiveram largo uso durante vários séculos, alguns deles mesmo até aos nossos dias, como
satisfação, malícia, circunstância, abstinência, infinito, fugitivo, evidente, intelectual, abranger,
apropriar ou reduzir39. A estes latinismos introduzidos na língua um século antes de Camões,
procurarei acrescentar outros a partir das duas crónicas em análise.
O que se verifica é uma clara consciência com língua que necessita de ser valorizada e
dignificada, quer do ponto de vista sintáctico, quer lexical. E este princípio pode ocorrer por
simples necessidade de denominação de realidades ou objectos novos, ideia já bem antida
vincada pelo infante D. Pedro, “consiirando os antigos que o nome de cada hũa cousa he o
primeiro conhecimento que sse della pode aver e per elle devem seer as propeiedades do seu
significado mostradas trabalharom-sse de poer nomes aas cousas, per que ellas en algũa guisa
fossem declaradas”40, ou por necessidades pontuais, resultantes das inúmeras traduções que
começaram a florescer na primeira metade de quatrocentos. É conhecida a afirmação de D.
Duarte no Leal Conselheiro: “que nom ponha pallavras latinadas, nem doutra lynguagem, mas
todo seja [em] nosso lynguagem scripto, mais achegadamente ao geral boo custume do nosso
falar que se poder fazer”41. Sobre o Livro da Vertuosa Benfeytoria, escreve logo no início da
introdução Adelino Calado (1994:VII): “distingue-se como um marco linguístico pela sua
posição liminar numa fase crucial do enriquecimento vocabular da língua portuguesa”.
Esta vontade de enriquecimento da língua, no entanto, nem sempre foi possível de
manter. Um povo invasor, naturalmente que traz consigo novas técnicas, instrumentos ou
produtos e com eles as suas designações originais (Cardeira 2006:32). Os empréstimos lexicais
da língua portuguesa são disso um exemplo e a Crónica de Zurara parece apresentar bons
indicadores que comprovem este princípio, não por relatar os feitos de um povo invasor do
nosso país, mas precisamente pelo contrário. E se porventura mais empréstimos ela não
incorpora na língua, terá sido pelo facto de lhe ter sido negada a possibilidade de os relar in
loco.

38
Termos indicados por Mira Mateus, obtidos a partir de Vida e Feitos de Júlio César.
39
Cf. Cardeira “Revisitando a periodização do português: o português médio” in Domínios da Lingu@gem –
Revista Electrônica de Linguística, ano 3, nº 2, 2º semestre 2009 (www.dominiosdelinguagem.org.br). Para
satisfação, malícia e intelectual, Houaiss apresenta, no entanto, o século XIV.
40
Cf. Livro da Vertuosa Benfeyturia, Calado (1994:19,23-27).
41
Cf. Piel (1942:373:1-3).

28
I.1. Formação e importação de palavras: principais conceitos

Também os descobrimentos portugueses permitiram a entrada de novas palavras na língua


pelo facto dos portugueses trazerem novos produtos com o respectivo nome de origem. Mas o
ciclo destas novas palavras não termina em Portugal, pois ao exportá-los para diversos países
europeus, exporta também o seu nome.
As traduções de obras, sobretudo latinas contribuíram igualmente para a introdução de
um grande número de palavras cultas na língua. Para este enriquecimento, a geração dos
Príncipes de Avis teve um contributo inquestionável. O interesse dos príncipes Avis pela
cultura, pelo gosto da leitura e pela tradução impulsionou o incremento da historiografia,
levando D. Duarte a criar o cargo de cronista-mor e entregá-lo a Fernão Lopes. Ora, só
escrevendo é que a língua ganha maturidade. Essa foi a herança deixada pela ínclita geração. É
esta maturidade que possibilita e abre caminho à reflexão linguística para, sensivelmente um
século depois, se chegar a uma normalização que muito pouco difere da de hoje, passados que
estão quase seis séculos. Mas, se é verdade que a tradução é um dos processos de
enriquecimento da língua, também o é que tal facto nem sempre se verifica. Para Tarrío, o
poeta-tradutor demonstra um enorme empenho em provar a suficiência da língua materna42.

42
Tarrio (2001: 157-170).

29
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

II. Datação de palavras

1. Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM


(CD-ROM)

31
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

Descrição do CD-ROM

O Vocabulário Histórico-Cronológico do Português Medieval (VH-CPM), publicado em


CD-ROM em Abril de 2007, conta já com alguns antecedentes ao longo dos tempos. Podemos
encontrar o seu embrião em 13 de Agosto de 197743, embrião este que sofreu, naturalmente,
evoluções, mas também metamorfoses. Do agigantado e minucioso projecto de 1979, com vista
a uma grande publicação em papel de um Vocabulário Histórico-Cronológico do Português
Medieval (VPM), nasceu esta versão informatizada. Pelo meio pudemos assistir à apresentação
“de um projecto alternativo, bem menos ambicioso”44, do Índice do Vocabulário do Português
Medieval (IVPM), também em papel, cuja finalização se apontava para 1990, mas que apenas
viu publicados três volumes (Letra ‘A’ em 1986, letra ‘B-C em 1988 e letra ‘D’ em 1994), e
pudemos assistir também à primeira versão em CD-ROM do Vocabulário do Português
Medieval, em 2002.
No menu Ajuda > Créditos, localizado na barra de menus, podemos encontrar,
precisamente, o percurso deste projecto apresentado em quatro fases (1979-1989, 1999-2000,
2001-2002 e 2003-2006), com a respectiva indicação do coordenador e da restante equipa.
Neste mesmo menu podemos ainda encontrar “informações que podem auxiliar tanto na
utilização do programa, quanto no esclarecimento do conteúdo do vocabulário”45.
A vantagem de uma pesquisa electrónica face à consulta manual em dicionários,
glossários e obras afins é inegável. Se por outras razões não fosse, pela rapidez com que se
obtém informação, ficava justificada a afirmação anterior. Esse mérito, além de outros,
evidentemente, o VH-CPM alcançou.
Das suas principais características, e no campo das qualidades, destaco sobretudo duas,
além da possibilidade de comutar o modo da pesquisa entre o ‘português actual’ e ‘português
medieval’, recurso sempre útil para o confronto entre dois estádios da língua portuguesa.
A primeira diz respeito ao facto de ser possível ir digitando as letras e acompanhar as
possibilidades gráficas de vários verbetes na coluna da nominata. Se para o português actual tal
situação não é relevante, ela reveste-se de extrema importância nas pesquisas do português
medieval, tal é a variedade de formas, por vezes apresentada para cada entrada. Assim, de um
recurso actualmente comum para pesquisas em dicionários e corpora informatizados, passamos
a ter uma enorme ajuda, pois é possível ir vendo os vários resultados, à medida que vamos
digitando caracteres, e escolher/encontrar o pretendido.

43
Cf. Cunha (1986), Índice do Vocabulário Português Medieval, vol. 1:A, p. IX (“Da razão do título e dos
objectivos da publicação”), embora os trabalhos tenham apenas começado em Janeiro de 1979, com um pequeno
grupo de colaboradores, como se pode ler menu Ajuda > Apresentação.
44
Cf. Idem, ibidem, p. IX.
45
Cf. menu Ajuda > Manual do usuário > separador Conteúdo > Menu Ajuda.

33
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

A segunda, porventura a mais importante, diz respeito à opção Pesquisas que se encontra
na barra de ferramentas. Ao clicar neste menu abre-se uma nova janela onde temos à disposição
três possibilidades. A inicial, pesquisas por Nominata, permite fazer pesquisas de palavras
iniciadas e/ou terminadas por qualquer letra ou letras, com preenchimento dos campos em
simultâneo (1ª opção/possibilidade), ou apenas com o preenchimento de um dos campos, desde
que sejam introduzidas pelo menos duas letras (2ª e 3ª opções/possibilidades). Esta
possibilidade reveste-se de extrema importância para quem pretende fazer pesquisas por radicais
ou mesmo por afixos, se bem que não seja possível a pesquisa de radicais internos do tipo -terr-,
em palavras como aterragem, aterrar, enterrar ou -caval-, em palavras como encavalgar,
encavalgadura ou descavalgar.
A seguinte, pesquisas por Classe, permite fazer uma pesquisas por vocábulo iniciado por
e/ou terminado por, com a respectiva classificação gramatical seleccionada. De entre as
possibilidades apresentadas para a categoria gramatical, são catorze as seleccionáveis: adjetivo,
advérbio, artigo, conjunção, contracção, expressão, interjeição, locução, numeral, particípio
adjectivo, preposição, pronome, substantivo, verbo.
A terceira e última, pesquisas por Texto, permite fazer pesquisas de forma a encontrar a
palavra desejada, por exemplo (cronica, coronica, cronyca) nas abonações de toda a base de
dados do VH-CPM. Este é um recurso de inegável utilidade. Necessita, no entanto, de uma
maior focalização por parte do utilizador na pesquisa pretendida, pois permite testar a utilização
de uma determinada palavra/grafia em diferentes obras, ou verificar as suas possíveis acepções
semânticas. Estes resultados não são, no entanto, directos, uma vez que só são visíveis numa
nova janela e depois de clicar num dos verbetes listados à esquerda. Esta pesquisa implica, nesta
situação, clicar em todos os verbetes resultantes da pesquisa.
Tendo em conta a sua denominação -Vocabulário Histórico-Cronológico do Português
Medieval- e mesmo as palavras da Apresentação onde se afirma que “visa contribuir, de
maneira efectiva, para o melhor conhecimento da evolução histórica do léxico português,
estabelecendo um dos elos – e dos mais importantes – da cadeia evolutiva que, a partir do latim
vulgar, chegou até o português de nossos dias”, parece haver, no entanto, algumas arestas a
limar. Um dicionário que inclui no título a designação de Histórico-Cronológico não pode
esquecer tal indicação e listar as ocorrências de uma palavra pesquisada por ordem alfabética.
Tal situação seria minimizada se houvesse uma opção que permitisse elencar os termos
cronologicamente, ferramenta que me parece possível e de introdução fácil nos tempos actuais.
É verdade que o VH-CPM apresenta uma hipótese de pesquisa por datação cronológica. Porém,
ela refere-se apenas à primeira datação de cada verbete, não permitindo ordenar os vários
registos de datação que dentro dele se encontram.

34
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

Por exemplo, ao procurar informações sobre o verbo adorar, tendo seleccionada a opção
Português Actual, o que nos é apresentado é uma lista de 42 abonações, com datação alternada
entre o XV e o XIV, para chegar à 43ª e 44ª, precisamente penúltima e última, e perceber que,
afinal, o verbo adorar, também tem registo no século XIII, nas CSM. O modelo seguido no CD-
ROM não teve, pois, em conta o esquema a que Cunha tinha dado preferência no IVPM,
claramente cronológico e não alfabético, como se pode verificar na informação obtida do
mesmo verbo adorar, onde apresenta os registos cronologicamente, iniciando, precisamente,
pelo século XIII.
Foram mais as opções que divergiram do trabalho de Cunha. Por exemplo, no que diz
respeito a informações semânticas de entradas homónimas que constam no IVPM, elas foram
simplesmente ignoradas, agrupando agora o VH-CPM tudo na mesma entrada. Repare-se, por
exemplo, na informação pertinente que foi eliminada no caso da palavra ala, em que no IVPM
são apresentadas três entradas, cada uma com um significado diferente (‘fila, fileira, lado’;
‘asa’; ‘lá’), e que o VH-CPM, pura e simplesmente, agrupa e mistura numa só entrada,
preferindo uma ordenação alfabética (ala, alas, alla, allas), sem qualquer indicação do
respectivo significado. Também as acepções de ‘venerado’ e ‘doente, cheio de dores’ que
constam no IVPM para as entradas separadas de adorado não resistiram à evolução tecnológica.
Numa análise mais rigorosa, mas não exaustiva, é ainda possível verificar algumas
situações que necessitam de intervenção em versões futuras, agrupadas pelos tópicos que se
seguem46.

A) Palavras não averbadas

a) Já com registo no IVPM

Numa primeira situação, o VH-CPM simplesmente elimina as palavras que provêm ou do


Elucidário (V3) ou de Morais (M2):

ABADENGO (IVPM, 1311 V3).


ABALROAR (IVPM, sXV M2).
ABARREGAR: (IVPM, aberregaar 1345 V3)47.

O VH-CPM eliminou também as palavras ou abonações que se encontravam atestadas em


obras que faziam parte do corpus de extracção do IVPM. Na análise ao CD-ROM não
encontrei qualquer explicação para este facto. Encontram-se entre estas obras o Libro de
Monteria (MONT), os Documentos das Chancelarias Reais anteriores a 1531 relativos a

46
As indicações são feitas tendo por base a pesquisa Português Atual uma vez que é sob este lema que são
apresentadas todas as formas.
47
Regista, no entanto, abarregado, na forma abarregada, em abonação de CONF.

35
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

Marrocos… (MARR), El Cancionero de Joan airas de Santiago (CJA), algumas vezes


Descobrimentos Portugueses (DESC), Diário da Viagem de Vasco da Gama (DIAR)48.

ABATO: (IVPM, sXIII CJA 1508).


ARNESADO: (IVPM, 1439 MARR I.506.28).
ARREMETIDA: (IVPM, sXV MONT 112.20).
ATRELAR: (IVPM, sXV atrelar MONT, 48.3; atraelar MONT, 81.3; atreelar
MONT, 101.12).
CARTEAR: (IVPM, c1499 DIÁR 75.13).
CORROBORAÇÃO: (IVPM, 1460 DESC 572.15).
DESEMBARCAMENTO: (IVPM, SXV ZURC 187.1).

b) Por a obra não fazer parte do corpus de extracção

PRÍNCIPE
Para esta entrada, o VH-CPM apenas apresenta uma única abonação de REIX. Perdem-se,
assim, quatro formas históricas com ocorrência em ZURP: priçipe, primçipe, príncipe,
prymçipe.
Encontram-se nesta situação todas as palavras que têm ocorrência apenas em ZURP, por
comparação com as fontes utilizadas pelo IVPM e VH-CPM, entre as quais, abreviador,
acuitar, alar, amaçarocado, arnesado, azambujal, azeitoni, azervada49.

c) Com ocorrência em LOPF

PRINCÍPIO
O VH-CPM não regista esta entrada, cuja ocorrência se verifica em LOPF:

Onde sabee que seu feo nacimento, muito d’avorrecer, ouve principio em este modo.
(385.14)

Após consulta em Houaiss, verifica-se que a datação é para o século XIV, cuja
proveniência vem, precisamente, do FichIVPM50.

48
Algumas destas palavras não têm ocorrência nas obras em análise. A sua indicação, que não resulta sequer
de uma pesquisa, apenas tem como objectivo mostrar o não aproveitamento de informação já recolhida pelo IVPM.
49
Apenas se indicam as iniciadas pela letra -A-. Para as outras letras veja-se a lista de Neologismos em
ZURP, capítulo III.5, sempre que nos registos não se encontrar a indicação VH-CPM.
50
Além deste exemplo podemos ainda encontrar outras palavras que têm ocorrência em LOPF e que não se
encontram averbadas no VH-CPM como frontar (frontando em LOPF), fulame (fullame), gaja (gajas), prior,
sanhudamente, sanhudo (sanhudos), serventia, vereador, vestido, ou vergonhosa.

36
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

TERREI
O VH-CPM não regista esta forma verbal do verbo ter, mas apresenta a forma terrey,
registada em COND. Não deixa de ser curioso é que a frase onde ocorrem é claramente
uma das marcas do aproveitamento que Lopes fez de COND.

e quãdo esto for eu terrey mays razõ e aazo de vos fazer mercees... (COND, 9c32)

e quando esto for, terrei eu mais rrazom e aazo de vos fazer mercees… (LOPF, 438.47-48)

B) Palavras Averbadas

a) Sem abonação de LOPF

LÁSTIMA
Um Vocabulário Histórico-Cronológico, não tendo como obrigatoriedade a indicação do
registo da palavra em todas as obras, deve, pelo menos, fazendo jus ao nome, procurar
indicar as formas históricas, preferencialmente, de forma cronológica. Para esta entrada, o
VH-CPM apresenta uma única abonação de INFA, com a forma lastema, mas não há
qualquer referência a LOPF, obra amplamente trabalhada51. Consultando apenas o VH-
CPM fica-se com a informação de que foi Fr. João Álvares o seu introdutor na língua,
quando, na verdade, já Lopes a tinha registado com a variante actual52.

Esta messagem foi ouvida com grande door e lastima, (LOPF, 438.47-48)

b) Com classificação gramatical errada

FEITICEIRO, Substantivo em vez de adjectivo (séc. XIV, TEST, 222.22)


[...] catade-me hũa molher feiticeira, que saiba ressucitar homem morto [...].

ATENDER, Substantivo em vez de verbo (séc. XV, LOPJ, II.18.38)


E a[a] Porta de Miragaya, homde o estauom atemdemdo como disemos, sayo el-Rey em
terra per huuma larga e espaçossa pramcha [...].

C) Palavras mal averbadas

a) Palavras com gralhas por falta de letras ou letras trocadas

TRAZIMENTO, regimento em vez de:


Na criaçom e ragimento dos gaados mandava que nẽhũu nom trouvesse gaados seus nem
alheos [...]. (LOPF, 89.139)

51
Pus a hipótese de ter sido identificada como forma verbal, mas também na entrada lastimar não há qualquer
referência.
52
Esta é uma situação que se verifica em mais palavras. Repare-se no caso de arrais apenas com abonação de
2
LOPJI II.264.19, mas com datação em Houaiss de 1298 (cf. IVPM); de armador apenas com abonação de ZURG
87.6, mas com datação em Houaiss de 1394 (cf. IVPM); de agomia apenas com duas abonações de ZURD 189.8 e
268.8, mas com datação em Houaiss de 1325 (cf. JM3);

37
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

ESPAÇAR, eapaçar em vez de espaçar:


[...] estando el rrei dom Fernando em Lixboa, aconteceo de vĩir a sua corte [...] dona
Lionor Tellez [...] por eapaçar algũus dias com dona Maria sua irmãa [...]. (LOPF, 57.41)

D) Palavras mal lematizadas

EIBADO
Fazendo uma pesquisa na opção ‘Português Medieval’, o VH-CPM regista a palavra
eibado e remete para a palavra actual elvado. Pelo que pude observar esta palavra não
existe. O termo correcto será eivado, de eivar, com o significado de ‘perder o vigor,
enfraquecer-se’.

E) Obras trocadas

LANÇADOR
Apresenta uma abonação como sendo do prólogo de LOPP, P.16, mas, na verdade, é do
prólogo de LOPF:

Era cavallgante e torneador, grande justador e lançador e tavollado [...]. (3.15-16).

CAMANHO
Apresenta uma abonação como sendo do prólogo de LOPF, II.234.1, mas, na verdade, é
de LOPJI2:

[...] ficou tamto aaquem delle que camanho golpe pemsou que lhe daua, tamanho deu
comsigo [...]. (cap. CXI).

F) Datação errada de obras

No menu Ajuda > Siglas das obras, para a sigla LEAL (Leal conselheiro), podemos ler
“O texto é parte do códice do século XV da Biblioteca Nacional de Paris”; para a sigla
OFIC (Livro dos Ofícios), podemos ler “Manuscrito do Códice C/66, do século XV, da
Academia Real de História de Madrid”; para a sigla VERT (O livro das três vertudes),
podemos ler “Manuscrito 11.515 do século XV, da Biblioteca Nacional de Madrid”;
Não é, no entanto, a data apresentada nas abonação da palavra tesourar, torrão e
trigança:

TESOURAR (séc. XIV, LEAL, 114.25):


[...] nem desejo de thesourar na terra, onde os ladrooens o furtam, ratos o comem,
ferrugem e traça o gastam [...].

38
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

TORRÃO (séc. XIV, OFIC, 139.34):


E mais louuo hũũs poucos de terrões sem temor ca os canpos e as herdades de Lidia cheos
de medo.

TRIGANÇA (séc. XIV, VERT, 56.41):


E esta temperança se demostra em todos os semtimentos da senhora assi como nos feitos e
abitos de fora porque ella dara o oolhar tardinheiro e sem trigança.

G) Abonações em falta

ACONTIADO
Esta entrada está averbada no IVPM com seis abonações, todas do século XV, uma de
REIX, duas de LOPF e três de DESC, obra que se encontra indicada menu Ajuda > Sigla
das obras do VH-CPM. No entanto, este apenas apresenta três abonações, eliminando
todas as de DESC (1405, 1436 e 1460) apresentadas no IVPM. Uma dessas indicações é
mesmo a mais antiga, reiterada por Houaiss53.

BRACEIRO
Para esta entrada, Houaiss indica o século XIII e remete para o IVPM, que apresenta
abonações do século XIII, XIV e XV. Porém, no VH-CPM apenas são apresentadas duas
abonações do século XV, uma de LOPF e outra de ZURG. Para um dicionário Histórico-
Cronológico, faltam dois séculos de existência gráfica à palavra braceiro.

BISCOITO
Para biscoito, Houaiss indica o ano de 1317 e remete para o IVPM, que apresenta duas
abonações do século XIV e onze do XV. Porém, no VH-CPM apenas são apresentadas
cinco abonações, todas do século XV, uma de Lopes e quatro de Zurara54.

H) Palavras mal datadas

BARROCA
Para a palavra barroca, o VH-CPM apresenta quatro abonações, todas do século XV,
uma de LOPF. Mas aqui a falha parece não ser só do VH-CPM, pois mesmo não
copiando, ipsis verbis, o que está no segundo volume do IVPM (letras B-C, de 1988),
acrescenta mais uma abonação de ZURD 259.27, mas retira, erradamente, a de LOPJ1

53
Veja-se a mesma situação para baía, apenas com abonações de ZURD e ZURG no VH-CPM, mas com
1456 DESC no IVPM.
54
Foram eliminadas todas as abonações provenientes de MARR (vide supra p.33), e MMM (Monumenta
Missionária Africada).

39
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

I.42.1455, e corrige, com acerto, a indicação da fonte LOPP 136.52 no IVPM para
LOPF136.52)56. No entanto, o que é de registar é que tanto o IVPM como VH-CPM
apresentam o século XV como datação mais antiga. Ora, na segunda edição do Dicionário
Etimológico de Cunha, de 1986, mas não no Suplemento, ou seja, já com registo na
primeira edição de 1982, na entrada barro, está indicada a palavra barroca, com o
significado de ‘monte de barro’, com datação de século XIII, século que também Houaiss
confirma com indicação de ocorrência em Inq. (Inquisitiones. In PMH). O cruzamento de
obras do mesmo autor parece, pois, ser deficitário.

Ainda no que concerne a datações, vale a pena observar as divergências entre o VH-CPM
e o IVPM, relativamente à primeira atestação, na lista abaixo apresentada:

VH-CPM HOUAISS

acalmar, v. séc. XV 1370 cf. IVPM


adua, s.f. séc. XV 1375 cf. IVPM
alão, s.m. séc. XV 1209 cf. JM3
amarrado, adj. séc. XV 1344 cf. IVPM
arrais, s.m. séc. XV 1298 cf. IVPM
castão, s.m. séc. XV sXIII cf. IVPM
coroar, v. séc. XIV sXIII cf. IVPM
debalde, adv. séc. XV sXIV cf. IVPM
deixar, v. séc. XV 1209 cf. JM3
divisão, s.f. 1272 1270 cf. IVPM
esquipações, s.f. séc. XV sXIII cf. FichIVPM
fanega, s.f. séc. XV sXIV cf. FichIVPM
fateixa, s.f. séc. XV sXIV cf. FichIVPM
2
febre, adj.2g. febre(3), séc. XV febre,1372 cf. Eluc57
florim, s.m. séc. XV sXIV cf. IVPM
fornecer, v. séc. XV sXIV cf. FichIVPM
fretamentos, s.m. séc. XV sXIV cf. FichIVPM
fuzil, s.m. séc. XV sXIV cf. IVPM
gascão, adj. séc. XV sXIII cf. FichIVPM

55
A palavra barroca tem 12 ocorrências em LOPJ1, 7 delas como nome próprio, referindo-se a frei João da
Barroca, e as restantes 5 como nome comum.
56
Tal alteração dever-se-á mais a uma correcção do próprio Cunha no Suplemento ao IVPM, como se indicou
na página 36, sobre a palavra acontiado.
57
Os números 3 e 2 que acompanham a palavra febre identificam a mesma acepção em dicionários diferentes.

40
II.1 Os Dicionários Histórico-Cronológicos: o VH-CPM (CD-ROM)

jeitoso, adj. séc. XV sXIV cf. FichIVPM


laranjeira, s.f. séc. XV 1258 cf. JM3
marear, v. séc. XV sXIII cf. FichIVPM
mourisco, adj. séc. XV sXIII cf. FichIVPM
paul, s.m. séc. XV sXIII cf. AGC
porra, s.f. séc. XV 1209 cf. Leges
princípio, s.m. não regista sXIV cf. FichIVPM
sacador, adj.s.m. séc. XV sXIII cf. AGC
sala, s.f. séc. XV 969 cf. JM3
soluço, s.m. séc. XV sXIV cf. AGC
tiro, s.m. séc. XV sXIII cf. AGC
trabalhoso, adj. séc. XV sXIV cf. AGC
trigo, s.m. séc. XIII 1081 cf. JM3
trom, s.f. séc. XIV sXIII cf. FichIVPM
trombeta, s.f. séc. XV sXIV cf. AGC
vestidura, s.f. séc. XV sXIII cf. FichIVPM
vinteneiro, s.m. séc. XV vintaneiro adj. e s.m. 1361 cf. Desc
vozaria, s.f. séc. XV 1192 cf. JM3

Para finalizar esta breve análise do VH-CPM, importa referir e destacar a sua utilidade
enquanto instrumento de trabalho lexicográfico com a apresentação de um número significativo
de verbetes do português medieval. Assim, de forma rápida, é possível navegar por vários
séculos e verificar algumas das diferentes grafias de cada palavra, bem como identificar o seu
registo em determinadas obras. Fica, no entanto, aquém das expectativas se tivermos em conta a
sua finalidade de ser um Vocabulário Histórico-Cronológico, pois apresenta informação
desactualizada, uma vez que foi publicado depois de obras de referência, como o Dicionário
Houaiss, os Dicionário Etimológicos de José Pedro Machado e Antônio Geraldo da Cunha,
onde já consta informação correta e bem mais antiga, em algumas situações, como é o caso, por
exemplo, da palavra sala, com cinco séculos de diferença.
Em resumo, a ideia que mais prevalece é a de o VH-CPM parecer uma simples
digitalização, aqui e ali deficitária, das fichas do vasto acervo de Antônio Geraldo da Cunha,
sem qualquer intervenção crítica por parte da equipa que o produziu. A não inclusão de algumas
obras no corpus de extracção, como é o caso da Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de
Zurara, permite também algumas antedatações, quer ao VH-CPM, porque o IVPM não a
utilizou, quer ao próprio Houaiss, que seguiu o mesmo princípio.

41
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

2. A elaboração de um Índice Analítico: o programa


Lexicon (versão 5.2)58

O avanço da tecnologia e o crescente interesse pela lexicografia produziram, nas últimas


décadas, um sem número de materiais de trabalho, desde dicionários on-line, corpora
informatizados59, índices directos de formas de variadas obras60 ou lematizações de textos
antigos61, bem como programas informáticos específicos para a realização destes dois últimos.
Um desses programas informáticos - Lexicon- é apresentado pelos seus autores (Projecto
Vercial) como sendo “um programa que serve para listar todas as palavras de um texto e
verificar o número de ocorrências de cada uma delas”. É, sem dúvida, um programa útil “para
quem pretenda fazer um estudo estatístico-lexical ou morfológico de determinada obra ou
conjunto de textos”. Sendo esta já a versão 5.2, o programa permite já “a identificação das
classes gramaticais e a flexão verbal, quer em textos atuais, quer em textos antigos”62.
No ponto 3, sobre Método de Trabalho, que se encontra no Menu Ajuda > Ajuda, podem
ler-se, ainda, as seguintes indicações:

3.9. O utilizador pode ainda proceder à identificação das classes gramaticais. Esta
identificação poderá ser morosa, dependendo da quantidade de palavras
existentes ou da velocidade do processador do PC. O utilizador deverá, no
menu Ferramentas, seleccionar a opção Verificar Classes Gramaticais.
Aparecerá uma janela com duas opções: Texto em Português Actual e
Texto em Português Antigo. O utilizador deverá seleccionar aquela que
melhor convém ao texto em análise.
3.9.1. A base de dados dispõe de 95.700 formas diferentes para o
português actual e 123.800 para o português antigo.
3.9.2. Certamente haverá palavras dos textos a analisar que não serão
identificadas gramaticalmente. A essas, o programa marca-as com a
expressão desconhecida.
3.9.3. Recomenda-se que no final o utilizador verifique os casos de palavras
homónimas e que pertençam a várias classes gramaticais.

58
Para os comentários a este programa foi apenas utilizada a Crónica de D. Fernando.
59
Cf. bibliografia.
60
O Centro de Estudos de Linguística Geral e Aplicada (CELGA) dispõe neste momento de várias obras para
consulta em http://www.uc.pt/uid/celga/recursosonline/cecppc
61
Uma das lematizações utilizadas neste trabalho é a Lematização de Textos Medievais Portugueses (versão
4.0), edição de José Barbosa Machado, UTAD, 2002-2007. Cf. infra p. 45.
62
Cf. http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/lexicon/index.html

43
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

A base de dados do programa Lexicon, constituída pelas 123.800 formas diferentes para o
português antigo, é formada a partir de várias obras, listadas abaixo:

Abreviatura Descrição
AP Auto de Partilhas (1192)
CBAN Crónica Breve do Arquivo Nacional
CDG Crónica do Descobrimento e Conquista de Guiné, de G. E. de Zurara (séc.
XV)
CDM Crónica do Conde D. Duarte de Meneses, de Gomes Eanes de Zurara (séc.
XV)
CPM Crónica do Conde D. Pedro de Meneses, de Gomes Eanes de Zurara (séc.
XV)
CDAH Crónica de El-Rei D. Afonso Henriques, de Duarte Galvão (início do s. XVI)
CDD Crónica de D. Dinis (início do séc. XVI)
CDF Crónica de D. Fernando, de Fernão Lopes (séc. XV)
CJ1 Crónica de D. João I - Parte I, de Fernão Lopes (séc. XV)
CJ2 Crónica de D. João I - Parte II, de Fernão Lopes (séc. XV)
CDP Crónica de D. Pedro I, de Fernão Lopes (séc. XV)
CDS Constituições de D. Diogo de Sousa (1497)
CGE Crónica Geral de Espanha (1344)
CP Castelo Perigoso (séc. XIV)
CRP Crónica dos Primeiros Sete Reis de Portugal (1419)
CT Crónica Troiana (meados do séc. XVI)
CTC Crónica da Tomada de Ceuta, de Gomes Eanes de Zurara (séc. XV)
DSG A Demanda do Santo Graal (séc. XIV)
EER Evangelhos e Epístolas com suas Exposições em Romance (1497)
EV Estoria do mui nobre Vespesiano emperador de Roma (1496)
FCR Foros de Castelo Rodrigo (séc. XIII)
FR Foro Real de Afonso X (finais do séc. XIII)
LC Leal Conselheiro, de D. Duarte (séc. XV)
LE Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela, de D. Duarte (séc. XV)
MP Livro das Confissões, de Martín Pérez (1399)
LHB Livro das Histórias da Bíblia (séc. XV)
LMP Livro de Marco Polo (1502)
NT Notícia de Torto (1206)
OE Orto do Esposo (séc. XV)
PMP Penitencial de Martim Pérez (séc. XV)
RP Regimento Proveitoso contra a Pestenença (1495?)
S Sacramental, de Clemente Sanchez de Vercial (1488)
SG Sumário das Graças (1488?)
TAII Testamento de D. Afonso II (1214)

44
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

TC Tratado de Confissom (1489)


TM Testamento Medieval (1193)
TP Tempo dos Preitos (séc. XIII)
VDT Vida de D. Telo (séc. XV)
VJII Vida e Feitos de D. João II, de Garcia de Resende (1533)
VSA Vidas de Santos (Manuscrito alcobacense – séc. XIII-XIV)
VST Vida de São Teotónio (séc. XV)

Como o programa tem na base de dados todas as palavras destas obras e as trata
simultaneamente, a disparidade de classificações gramaticais seria inevitável, apresentando em
alguns casos classificações duplas ou mesmo, por vezes, triplas. Porém, se é verdade que podem
aparecer classificações gramaticais que fazem sentido numa determinada obra, noutra elas estão
claramente erradas. Veja-se o quadro seguinte:

lema palavra classe conjug. verbal


alvo alvo nomc63 / adj
amar (amo) amo vb / nomc pres ind
baixar (baixo) baixo vb / adj pres ind
Beira Beira nomc / nomp
caminhar Caminha vb / nomp pres ind
cavar cava vb / nomc / adj pres ind
juntar junta vb / nomc / adj pres ind

Relativamente à utilização do Lexicon e ao resultado da sua listagem para o texto da


Crónica de D. Fernando, e pormenorizando o que acabo de referir, os resultados permitiram
chegar a algumas conclusões, elencadas nos seguintes tópicos:

a) Casos em que está errado o lema:

lema palavra classe conjug. verbal


área (areia) area nomc
cantar (catar) catados vb part
celada (cilada) cellada nomc
cuitela (cutela) cuitellas nomc
enlição (eleição) enliçom nomc

63
As palavras e classificações que não se encontram em LOPF vão assinaladas a negrito e itálico. Dentro de
parêntesis é indicada a forma correcta.

45
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

b) Casos em que está errada a classe gramatical:

lema palavra classe conjug. verbal


baio bayo adj (nomc)
cão caãos nom (e adj)
cismático cismatico nomc (adj)
claro claro adj (adv)
corda corda nomc(e adj.)
cumpridoiro compridoiro nomc (adj)

c) Casos em que está errada a conjugação verbal:

lema palavra classe conjug. verbal


achar achavom vb imperf conj (imperf ind)64
cair caera vb fut imperf (pret m-q-p)
ver veerom vb fut imperf (pret perf)
viver viva vb / adj pres ind (imper)

d) Casos em que estão erradas todas as classificações, excepto a própria palavra:

lema palavra classe conjug. verbal


alçar (alçada) alçadas vb (nomc) patr
alvo (alva) alva adj (nomc)
apostar (aposto) aposta vb/nomc (adj) pres ind / part
apor (aposto) aposto vb (adj) part
arrancar (arrancada) arancada vb (nomc) part
buscar (busca) busca vb (nomc) pres ind
calmo (calma) calmas adj (nomc)
cunhada (cunhar) cunhada nomc (vb) (part)
extremo (estremar) estrema nomc/adj (vb) (prés ind)
fundar (funda) funda vb/adj (nomc) pres ind
gançar (gança) gaanças vb (nomc) pres ind
ser (serão) seraão vb (nomc) fut imperf
ver (verão) veraão vb(nomc) fut imperf

64
Esta é uma eventual falha de formatação do programa que, em LOPF, à excepção de apenas 4 formas com
indicação de imperfeito do indicativo (abastavom, conselhavom, coutavom, escaramuçavom) considera todas as
outras terminações -avom como sendo do imperfeito do conjuntivo.

46
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

Perante a apresentação de resultados tão divergentes, fruto de trabalho mecânico, o passo


seguinte será eliminar as várias hipóteses, identificando com rigor a sua classificação em
determinados contextos e contribuindo para uma apresentação o mais rigorosa possível das
várias listagens de cada texto. Por palavras mais práticas, é distinguir que forom juntos (291.50)
deve ser identificado como o pretérito perfeito do verbo ir e o adjectivo junto ‘em companhia
de’ e a mesma expressão forom juntos (428.33 e 559.7) como o pretérito perfeito do verbo ser e
o particípio do verbo juntar65. É procurar distinguir as três acepções com que guarda ocorre:
‘vigilante’, ‘vigilância, protecção’ e ‘cumprimento, respeito; conservação, preservação’.
Apresento, no esquema abaixo, uma amostra mais significativa de palavras onde se verifica
necessidade de intervenção após o resultado do processamento do programa.

lema palavra classe conjug. verbal


além aallem nomc / advl
acha achas vb / nomc pres ind
acontecer acontecera vb pret m-q-p / fut imperf
acontiado aconthiado desconhecida (nomc)
acontiado aconthiados adj (nomc)
acontiado acontiados adj (p. adj. e nomc)
acordar acordo vb / nomc pres ind
açor açores nomc / nomp
acorrer acorrerdes vb infp / fut conj
acorrer acorro vb / nomc pres ind
acrescentar acrecentardes vb infp / fut conj
adiantar adeantado vb (nomc) part
adiantar adeante vb / advl pres conj
afogar afogara vb pret m-q-p / fut imperf
aguçar aguça vb / nomc pres ind
ajudar ajuda vb / nomc pres ind
ajudar ajudas vb / nomc pres ind
alçar (Alçada) Alçada vb / nomp part
alçar (alçada) alçadas vb / nomc part
além allem nomc / advl
alvo (alva) alva adj (nomc)
alvo alvo nomc / adj
amar (ameia) amea vb + pronp (nomc) imper
ameaçar (ameaça) ameaça vb / nomc pres ind

65
Ocorrem mais três situações deste tipo, mas com introdução de advérbios ou complementos no seu interior:
forom alli juntos (365.14); forom depois juntos (373.121) e forom em Santarem juntos (589.8-9).

47
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

amar (alva) amo vb / nomc pres ind


apostar aposta vb / nomc pres ind / part
apor (aposto) aposto vb (adj) part
área (areia) area nomc
armar (arma) arma vb / nomc pres ind
armar armada vb / nomc (os dois) part
armar armadas vb (também nomc) part
arrancar (arrancada) arrancada vb (nomc) part
sossegar (sossego) asessego vb / nomc pres ind
sossegar (sossego) assessego vb / nomc pres ind
até (hasta) asta prep / nomc
avé (haver) avee inter (vb) (imper)
haver (advir) aveher vb inf
haver (advir) avehera vb fut imperf (pret m-q-p)
haver (advir) avehesse vb imperf conj
haver (advir) aveho vb + pronp (vb) pres ind (pret perf)
avir (advir) avenha vb pres conj
haver (haveres) averes vb (nomc) infp
aventureiro (Avetureiras) Avetureiras adj (nomp)
avindo (advir) aviindo adj (vb) (ger)
avindo (avir) aviindo adj (vb) (part)

Como conclusão, posso dizer que o programa Lexicon é uma ferramenta essencial para
uma primeira listagem das palavras de um qualquer texto. A sua interface é de fácil percepção e
permite uma escolha de entre várias hipóteses, donde se destaca possibilidade de, no menu das
Ferramentas, verificar o número de ocorrências, mas sobretudo todas as Classes Gramaticais.
Esta elencação, que por vezes desvirtua completamente a pesquisa, exige um trabalho redobrado
e minucioso na sua correcção. Apresenta ainda erros de classificação, uma vez que todos os
pretéritos imperfeitos do indicativo terminados em -avom, à excepção de quatro, são
classificados como pretéritos imperfeitos do conjuntivo. Apesar destas particularidades, este foi
o programa escolhido para a listagem de todas as palavras o que implicou seguir à risca as
recomendações do ponto 3.9.3 dos seus autores (Recomenda-se que no final o utilizador
verifique os casos de palavras homónimas e que pertençam a várias classes gramaticais). O
programa Lexicon é, sem dúvida, um excelente instrumento de trabalho, mas é também um
instrumento de trabalho para manusear com algum cuidado.

Relativamente à Lematização de Textos Medievais Portugueses (versão 4.0), edição de


José Barbosa Machado, UTAD, 2002-2007, ela apresenta-se sobretudo como um material

48
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

extenso, pela quantidade de obras que fazem parte do corpus de extracção, e automaticamente
da listagem de todas as palavras nelas contidas. É neste tipo de lematizações que se vê o
resultado, puro e duro, do que os referidos programas são capazes de fazer em segundos, talvez
minutos devido às suas extensões (neste caso são 6451 páginas), antecipando os resultados em
um intervalo de tempo incomensurável quando feito à mão, numa leitura e análise tão rigorosas
e cansativas, quase como desesperantes.
A existência destes trabalhos contribuem para o enriquecimento do estudo do português
médio e são uma mais-valia para os investigadores, na medida em que passam a dispor de mais
ferramentas de trabalho. O único senão dirá respeito à confiança progressiva que vamos
depositando nas máquinas, esquecendo as recomendações do ponto 3.9.3 dos autores do
programa Lexicon.
A este propósito veja-se, por exemplo, na Lematização de Barbosa (BLem) a
classificação do advérbio eramá, atestado em LOPF sob a forma eramaa, como imperfeito do
indicativo de ser, com a indicação de vb+pronp (p. 5612); a classificação do substantivo
follosa66, como feminino do adjectivo foloso (p. 3061); fferragem e fforragem ambas
lematizadas para ferragem (p. 2989-2990); escaramuçamdo lematizado para escapar (p. 2619);
bulhom lematizado para bulhar como sendo forma verbal no presente do indicativo, ou mesmo a
classificação do adjectivo husavees, como imperfeito do indicativo do verbo usar (p. 6171).
Como uma lematização deste tipo tem sempre por base um programa informático (presumo que
o Lexicon) que lista as palavras segundo uma base de dados previamente carregada a partir de
um determinado número de obras, verificam-se sempre algumas incoerências. Tais
discrepâncias podem dizer respeito a classificações pontuais, ou mesmo a todos ou quase todos
os campos apresentados, incluindo a própria palavra, como se verifica no seguinte quadro da
Lematização de Barbosa:

lema palavra classe conjug. verbal


ansejo (ensejo) amçejo nomc
doer (de) doe (de) vb (prep) pres conj
liçenca lecenca (lecença) nomc
cuidar(condado) coindado (condado) vb / nomc part

Relativamente a esta situação, ela só parece ser possível, presumo, devido a uma
digitalização deficitária da Crónica de D. Fernando, em princípio a de uma versão em
CD-ROM levada a cabo pela Biblioteca Nacional – Biblioteca Virtual de Autores Portugueses
(1999), que teve por base a edição impressa pela IN-CM e organizada por Giuliano Macchi, em

66
Cf. infra, entrada FELOSA, p. 41.

49
II.2 A elaboração de um Índice Analítico: o programa Lexicon (versão 5.2)

1975. Um forte argumento a favor de que seria esta a edição de partida é o facto de muitos dos
erros aí presentes se repetirem na Lematização de Textos Medievais Portugueses (versão 4.0)
como é o caso de alũus em vez de algũus (p. 368), Castellla por Castella (p. 1123), coindado
por condado (1757), contrario67 por contrairo (1634), Fernanado por Fernando (p. 2986),
lecenca por licença (p. 3798), lsabell por Isabell (p. 3863), valllessem por vallessem (p.
6198),com a indicação de que têm ocorrência exclusivamente em LOPF. No entanto, e porque a
lematização engloba vários textos, há outros erros coincidentes com a edição da Biblioteca
Nacional, mas porque têm registo noutras obras além de LOPF, não é possível afirmar, com
tanto rigor como para aqueles, que têm a mesma proveniência. Refiro-me a palavras como
irmano em vez de irmaão (p. 3562), fronteira por fronteiro (p. 3104), Franca por França (p.
3087), fortaleza por fortalleza (p. 3080), doe por de (2269), ciquo por cinquo (p. 1303), castelos
por castelos (p. 1127), cosmo por colmo (p. 1702).
Na Crónica de D. Fernando, digitalizada no referido CD-ROM, encontram-se ainda as
seguintes gralhas, corrigidas na Lematização de Barbosa, Casteila por castella; cheoou por
chegou; Conçallvez po Gonçallvez; depôs por depós; donzelllas por donzellas; eel-rrei por el-
rrei; eeteencom por eeteençom; Femando por Fernando; lrmaão por Irmaão; milll por mill;
villla por villa68.

67
Esta seria a única forma com metátese em LOPF face às restantes 31 contrairo(s).
68
Esta comparação é feita tendo por base a segunda edição da IN-CM, organizada por Giuliano Macchi –
Teresa Amado, em 2004.

50
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

3. Índice analítico conjunto da Crónica de D. Fernando e


da Crónica do Conde D. Pedro de Meneses (Anexo I)

“faltam glossários organizados para todas as crónicas


[de Fernão Lopes]”
G. Macchi (2004). Crónica de D. Pedro I, p. LXIX.

A dificuldade de encontrar e perceber determinados significados, ajudado pelo mote de


Macchi, avultou o interesse pela elaboração de um Índice Analítico, não de todas as obras de
Lopes, para já, mas pelo menos da Crónica de D. Fernando. Seria, pois, mais fácil, partindo
duma lista de palavras trabalha e não simplesmente elencada, chegar àquelas que foram
introduzidas pelo cronista.
Quem opta por trabalhar um determinado texto medieval, uma das primeiras dificuldades
com que se depara é a falta de um ‘bom’ glossário, de preferência geral. Digo geral, porque,
apesar de em cima da mesa estarem vários, o que se verifica é uma dupla sensação. Primeiro,
porque aquela palavra que tanto se procurava, finalmente está registada em determinado
glossário, gáudio. Segundo, porque, afinal, o significado não é bem este, ou não é mesmo nada
este, melancolia. Um bom exemplo para o que acabo de referir é o caso da palavra aguça
(LOPF 44.101; 73.7), que no glossário da Vida e Feitos de Júlio César, elaborado por Maria
Helena Mira Mateus, com nova publicação pela Fundação Calouste Gulbenkian (Mateus 2010,
III volume), tem o significado de ‘pau aguçado’ e na Crónica de D. Fernando o de ‘cuidado,
interesse, diligência’. É o caso da palavra adúbio (LOPF 321.68) que o IVPM remete para
‘adubo’, apresentando este duas acepções com o significado de ‘adorno, ornamento’ e
‘condimento, tempero’, bem diferentes daquele que ocorre na crónica de Lopes, ‘arranjo,
reparação’. Assim, o que se verifica é que cada glossário regista apenas a acepção que mais se
adequa ao contexto da obra.
Acontece também outra situação com algumas palavras, como é o caso de grave. Está
registada nos glossários como adjectivo, ‘duro, penoso’, mas o que para mim é pertinente é
encontra-la registada como substantivo. E, depois, quando se encontra com essa classificação,

51
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

verificamos que ainda não é bem essa que faz sentido no texto em análise. É aqui que a
investigação é produtiva e permite acrescentar algo de novo ao glossário que se vai construindo.
Assim, depois de redobradas duplas sensações, e encorajado pela observação de Macchi
sobre a “falta de glossários organizados para todas as crónicas [de Fernão Lopes]” (LOPP, IN-
CM, 2004, p. LXIX), autor incontornável para o estudo do português médio, aprofundou-se a
vontade de elaborar um Índice Analítico da Crónica de D. Fernando.
Normalmente, os glossários que acompanham os textos raramente constituem uma base
suficientemente ampla de trabalho. E se o que acompanha a segunda edição da Crónica de D.
Pedro I69, elaborado por Macchi, é um recurso importante para o leitor da actualidade menos
familiarizado com o português médio, ele fica muito aquém daqueles que, por variadíssimas
razões, necessitam de um trabalho mais exaustivo. A simples listagem de programas
informáticos fica igualmente distante das verdadeiras acepções de cada palavra.
Exemplificando: a forma aviindo ocorre duas vezes na Crónica de Fernando, lematizadas por
Barbosa Machado70 para advir e classificadas como adjectivos. Ora, uma delas pertence, de
facto, ao verbo advir, ‘suceder, acontecer’, e está no gerúndio; a outra pertence ao verbo avir
‘reconciliar’, e está no particípio.
Como esta, muitas outras formas são iguais, mas remetendo para classificações e
acepções diversas, pelo que é pertinente a sua desambiguação, tarefa a aplicar ao longo do
Índice Analítico.
Algumas observações sobre este Índice Analítico.
Foram eliminados todos os Antropónimos. Assim, por exemplo, para a forma do
adjectivo clara, apenas foram contabilizadas duas ocorrências, retirando a terceira – Clara. O
mesmo para outras siruações: covas – Covas; cruz – Cruz; curral – Curral; donzela – Donzella;
duque – Duque; façanha – Façanha; faria – Faria; ferro – Ferro; furtado – Furtado; ilha – Ilha;
leis – Leis; mercadores – rrua dos Mercadores; moor – Moor; novo – Novo; nova – (rua) Nova;
novas – (Torres) Novas; outeiro – Outeiro; paredes – Paredes; pedra – Pedra; ponte – Ponte (de
Lima); porto – Porto; santa – Santa (Maria); vaca – Vaca; velho – Velho; vitoria – Vitoria.
Foram eliminados todos os Topónimos.
Apenas se apresenta a primeira localização para cada palavra, com significado
inequívoco. Há casos em que o sentido é diferente, mas também aqui o objectivo é indicar a
ocorrência dessa diferença, pelo que se apresenta apenas uma localização (conto, grave, corda,
coroa, correr, comprida(s), comprido(s), cunhada, defeso, descendo, divido, …).

69
A Crónica de D. Fernando apenas possui um índice Onomástico.
70
Cf. Lematização de Textos Medievais Portugueses (versão 4.0), edição de José Barbosa Machado, UTAD,
2002-2007.

52
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

Por vezes, nem sempre se afigurou, de forma clara, a classificação gramatical, sobretudo
na distinção entre o particípio passado e o adjectivo verbal71. Assim, optei por considerar apenas
particípio (vb P) as formas que integravam quer tempos compostos, como “e emmendar os
danos e malles que os d’estes rregnos ham rrecebidos ataa o tempo d’ora” (LOPF 594.38-39),
“depois que ouve armadas viinte gallees pera mandar em ajuda d’el-rrei de França” (LOPF
405.5-6), “E temdo jaa açertada sua rremdiçã e de XV cristãos” (ZURP 623.1050-1051) ou “E
tinham acordado de lhe tomaar a terra e as outras barquetas que ficassem largas” (ZURP
448.121-122), quer verdadeiros particípios absolutos, como “A molher que o posera dentro,
acabadas estas rrazoões, disse estonce ao iffante:” (LOPF 358.107-109), “Estas rrazões assy
acabadas, ell rrey mãdou llogo lamçar pregão” (ZURP 208.851-852). Para todos os outros
casos adoptei a classificação de adjectivo verbal (adj vb), como em “e veendo como todos
estavom alvoraçados” (LOPF 214.27-28), ou “E assy forã abastados ate que lhe levarã o
mamtymemto destes rregnos”(ZURP 575.1021-1022).72
Quando se trabalha com um número significativo de palavras, obrigatoriamente tem de se
recorrer a programas informáticos que façam uma primeira classificação. O programa atrás
descrito, Lexicon (versão 5.2), foi o utilizado nesta tarefa. Como normalmente para as
terminações -ado(a)/(s) é atribuída a classificação de particípio73, procurei fazer todas as
desambiguações. Certamente ter-me-ão passado algumas.
No caso dos verbos, foi acrescentada a classificação gramatical do modo e tempo, onde
optei pela classificação já utilizada pelo CIPM. De referir que dentro de cada entrada verbal, e
para uma mais rápida localização, sobretudo em verbos com um elevado número de formas (dar
(33), dizer (43), fazer (46), haver (55), preferi elencar as formas por ordem alfabética em
detrimento de uma ordem modo-temporal, como se poderá verificar, por exemplo, com as
formas fezera e fizera, hiis, vaamos e vou, ou penso e pensso. As reduções utilizadas são as
seguintes:

71
A distinção levanta interrogações. Veja-se Ana Maria Brito in Mateus (62004:374 e 727) e Cunha
10
( 1994:493).
Mira Mateus, no pormenorizado Glossário da Vida e Feitos de Júlio César (vol. III), elenca dentro da entrada
do verbo, apenas as formas de particípio que são utilizadas nos tempos compostos (ter e haver) e as de particípios
absolutos (cf. s.v. acabar). Apresenta depois, em entrada à parte, a classificação de adjectivo verbal (adj. v.), para as
restantes (cf. s.v. acabado). Casos como abraçado e ceso são considerados apenas adjectivos (adj.), apesar de origem
verbal. Não é este, porém, o entendimento de José Carlos de Azeredo (32004: 242-243), que apresenta uma distinção
mais simples: “O particípio é sintaticamente uma forma do verbo apenas quando, invariável e com sentido ativo,
integra os chamados tempos compostos ao lado do auxiliar ter. Fora daí, o particípio se torna um adjetivo [...], tanto
pela forma - já que é variável em gênero e número -, quanto pelas funções, pois, assim como o adjetivo, pode ser
adjunto adnominal (cf. o livro novo/livro rabiscado) ou complemento predicativo, quando constitui a chamada voz
passiva (cf. Estas aves são raras/Estas aves são encontradas apenas no pantanal)”.
72
Mesmo com esta distinção, não deixaram de existir casos de difícil interpretação, como na frase “Pera
coelhos, rraposas e lebres e outras semelhantes salvajẽes monteses” (5.59.60), optei por considerar os três adjectivos,
subentendendo animais. No VH-CPM monteses é classificado como substantivo.
73
Cf. BLem adeantado, vb part (s.v. adeantar) em vez de substantivo; alçadas, vb part (s.v. alçar) em vez de
substantivo; arrancada, vb part (s.v. arrancar) em vez de substantivo; CIMP arrenegados, PP m.p., (s.v. arrenegar)
em vez de substantivo. O mesmo para as terminações -oso/a(s), normalmente classificadas como adjectivo. Veja-se
infra a entrada FELOSA, p. 87.

53
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

vb IP presente do indicativo vb CF futuro do conjuntivo


vb IPI imperfeito do indicativo vb C condicional
vb IPP pretérito perfeito do indicativo vb I imperativo
vb IP+ pretérito m-q-p do indicativo vb INF infinitivo
vb IF futuro imperfeito do indicativo vb INFL infinitivo pessoal
vb CP presente do conjuntivo vb P particípio
vb CPI imperfeito do conjuntivo vb G gerúndio

Na listagem das formas verbais, foram eliminados os pronomes enclíticos, pelo que
formas do tipo de fazendo-a, achou-ho, mandou-nos, acolherom-sse, dar-lhe, apenas são
grafadas fazendo, achou, mandou, acolherom, dar. Registam-se, porém, os casos em que a
eliminação desse pronome deixaria a forma verbal numa terminação não característica,
resultado, precisamente dessa pronominalização. Estão nesta situação palavras como, por
exemplo, abrian-as, armaren-se, assentaron-o, casá-lla, mantee-llo, combatê-lla, fornece-llas,
hirde-vos, vaamo-nos. Manteve-se também o pronome em todos os casos de mesóclise, em
formas como aqueentar-nos-emos, dizer-vos-hiam, gradecer-vo-llo-á, lança-llas-hia, chegar-
me-hei, decer-m’ei.

O índice está organizado por ordem alfabético da cabeça do lema74, mantendo assim
agrupadas, na coluna da palavra, à direita, todas as suas variantes. Nesta coluna, a forma
redonda serve para indicar proveniência de LOPF e a forma itálica para indicar a de ZURP.
Uma organização alfabética de toda esta segunda coluna seria mais pertinente para uma rápida
localização das formas medievais, mas afastaria as diferentes grafias da mesma entrada, um dos
objectivos deste índice. Assim, houve necessidade de fazer remissões de todas as palavras que
se encontravam em entradas alfabéticas diferentes, como daga (cf. adaga), fouto (cf. afouto),
bem como algumas dentro da própria letra, como avondar (cf. abundar) fame (cf. fome). Para
outras, pela fácil percepção, como christaão, deçiplina, emderemçar, ezquerda, imigos,
majestade, philosofo, não foi feita qualquer remissão.
No caso destas entradas remissivas, desde que se verifique a sua ocorrência efectiva, é
sempre apresentado o masculino do singular para os nomes masculinos e adjectivos e o
feminino do singular, para os nomes femininos, como bastecimento (cf. abastecimento),
omrroso (cf. honroso), fouteza (cf. afouteza). Nos restantes casos mantém-se a forma registada

74
Na coluna da lematização, apresenta-se, em maiúsculas, por norma, a forma actual da cabeça de lema. Há,
no entanto algumas excepções (ẽnader, membrar, mostrança, nembrança…).

54
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

nos textos, como em amoestaçoões (cf. admoestação)75ou frorõoes (cf. furão), apenas com
ocorrências no plural. Para os verbos foi utilizado o infinitivo, como aviir (cf. advir), bastecer
(cf. abastecer), mesmo este não tendo ocorrência na obra, como asolver, assolver (cf. absolver).
Foram também feitas remissões entre as entradas relacionadas, como acostumar (cf. costumar) /
costumar (cf. acostumar); acoutar (cf. coutar) / coutar (cf. acoutar); apenhar (cf. penhorar) /
penhorar (cf. apenhar); ajuntamento (cf. juntamento) / juntamento (cf. ajuntamento);
aportalecer (cf. portalecer) / portalecer (cf. aportalecer);
Nos casos em que para a mesma entrada ocorrem classificações gramaticais e/ou
significados diferentes e simultaneamente um grande número de ocorrências, pese embora
algumas vezes tenham sido tratados, nestes casos é apresentado o número dentro de parênteses
rectos, indicando que a desambiguação não foi feita. Indicam-se, no entanto, as localizações das
respectivas classificações e significações. Em alguns casos, o trabalho seria demorado e,
eventualmente, pouco profícuo, pois, em vez de um número (75) para duas classificações de
poder, nome e verbo, teríamos dois, por hipótese, 50 nomes e 25 verbos.
Casos como da/da; se/se, que podem ser ‘prep’ e ‘vb’ não foram trabalhados.
Nos casos de desambiguação entre as preposições e os nomes, por exemplo par(por)/par,
e os advérbios e adjectivos, por exemplo preto (perto)/ preto, o número de ocorrências dos
segundos é efectivo, ou sejam, foram excluídos da contagem as preposições e os advérbios.
Assim, das 6 ocorrências de par, apenas se indica 1 para o nome (LOPF 508.30)76 e das 13 de
preto, apenas se indicam as 3 que têm, efectivamente, a função de adjectivo (LOPF 166.22;
460.32; 592.40).
No campo da localização é apresentada a primeira ocorrência, salvo se o significado não
for claramente explícito na classificação gramatical ou significação. Nestes casos, procurei
apresentar uma localização inequívoca. Por exemplo, no caso de cuidado, classificado
gramaticalmente como nome com o significado de ‘preocupação’, entre a primeira ocorrência –
eviinham os falcoeiros e outros que de fazer aves tiinham cuidado. (4.41-42) – e a segunda – El-
rrei de Navarra, posto em gram cuidado por a promessa que feita avia a el-rrei dom Henrrique
(19.3-4) –, preferi esta última.
Regra geral, foram eliminados os advérbios. Em alguns casos, quando homónimos com
outra classe gramatical, como claro, ou no caso de eramá, por se verificar datação anterior à
registada em Houaiss e passamente, por ter origem em substantivo, mantiveram-se. Mantêm-se,

75
Neste caso em particular, amoestaçoões, a lematização para o masculino do singular seria sempre uma
escolha minha, elegendo uma forma gráfica não atestada no texto, em detrimento de outras perfeitamente possíveis:
amoestação, -çom, -çõ, -çãm, ou -çã…
76
Nos casos em que o nome faz parte de uma locução, esta desambiguação foi também feita, neste caso, a
par de, com 3 ocorrências (509.19; 510.34; 523.14).

55
II.3 Índice Analítico de LOPF e ZURP

no entanto, os advérbios de modo, derivados de adjectivo77, no sentido de perceber se têm


atestação antes do próprio adjectivo.
Foram, ainda, eliminados todos os numerais, quer cardinais quer ordinais, consciente de
alguns deles terem clara utilização como adjectivo (LOPF 15.7). Mantive, no entanto, quinto
com o significado de ‘imposto’, terça ou nona como horas canónicas.

3.1.Conclusões

77
Foram portanto eliminados os advérbios de modo aadur, asinha, debalde e toste.

56
III.1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de Giuliano Macchi

III. Novidade de palavras no Português do século XV

1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de


Giuliano Macchi

A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes, cuja data de produção não ultrapassará o


ano de 144378, teve apenas no século XIX a sua primeira edição79. Digo apenas porque se
atendermos a que a Crónica de D. João I teve a sua também primeira edição dois séculos antes
(1644) e a de Crónica de D. Pedro foi estampada em 1735, facilmente se percebe que não foi a
predilecta dos editores. Não se pretende aqui fazer um levantamento, nem superficial nem
exaustivo, das suas edições, nem tão pouco o estudo dos 40 códices conhecidos que constituem
a sua tradição manuscrita. Essa tarefa foi já exemplarmente feita por Giuliano Macchi, na
introdução80 da edição crítica que levou a cabo em 1975, publicada numa segunda edição pela
IN-CM, em 2004, com revisão do texto por ele próprio e Teresa Amado. Interessa antes
perceber e analisar algumas das opções na fixação do texto que serve de base a este trabalho de
investigação: ‘novidade de palavras’ na Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes.
Não querendo meter a foice em seara alheia, ficam sem qualquer observação as opções
que dizem respeito à transcrição do manuscrito. A sega aos bravos segadores, merecedores de
todos os elogios, que depois de ceifadas as volubilidades e as contradições81, nos possibilitam
uma leitura mais descansada de tantos textos medievais, muitos deles de valor incalculável e
valores bem actuais, património cultural riquíssimo para o estudo da formação e solidificação da
língua e do país. Só a análise das fontes e um profundo conhecimento do usus scribendi do
cronista permitirá, com autoridade, optar por uma variante em detrimento de outra. Assim, as
minhas observações, mais do que com as escolhas da selecção de variantes, prender-se-ão com
as opções para o critério gráfico da edição, elencadas na introdução, sobretudo as que dizem
respeito à alinha g), introdução de “apóstrofos e alguns acentos, sobretudo para distinguir
futuros e homógrafo”82, entraves a quem pretende fazer um estudo do seu vocabulário,
resultantes dessas mesmas opções.

78
Segundo Teresa Amado (Tavani 1993: 179, s.v. Crónica de D. Fernando).
79
Chronica do Senhor Rei D. Fernando, Nono rei de Portugal, in «Collecção de Livros Ineditos de Historia
Portugueza, dos reinados de D. Dinis, D. Afonso IV, D. Pedro I e D. Fernando publicados de ordem da Academia
Real da Sciencias de Lisboa pela comissão de Historia da mesma Academia», tomo IV, Lisboa, 1816
80
Cf. Introdução, sobretudo pp. XI-XXX, em Lopes, Fernão (22004). Crónica de D. Fernando. Edição de
Giuliano Macchi. Lisboa: IN-CM.
81
Idem, ibidem, pp. XXXI.
82
Idem, ibidem, pp. LXVIII.

57
III.1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de Giuliano Macchi

Do ponto de vista lexicográfico, é até pertinente registar todas as grafias que


determinadas palavras conheceram da pena do cronista/copista, única forma hoje possível de
estudar quer a sua evolução em particular, quer a da língua em geral. No entanto, com a
intenção de dissipar dificuldades de leitura, o editor tem, por vezes, necessidade de fazer
intervenções nesse sentido. É aqui que surgem divergências nas edições.
Assim, ao nível da introdução de acentos, se o critério era distinguir o mais-que-perfeito
face ao futuro (em casos de pronominalização, como é o caso de gradecer-vo-llo-á, que não se
confunde com o pretérito, não faz sentido), conforme acontece em duas situações na edição,
como livrará (499.53) / livrara (66.46) e mostrará (239.56) / mostrara (227.16; 255.116;
287.134; 413.9), ele deveria ter sido aplicado a todas as outras. Mas, na verdade, apenas são
distinguidos esses dois casos referidos. Em primeiro, porque as seguintes palavras - perdoará
(498.41), herdará (414.40), encaminhará (526.31) e seguirá (246.49) ocorrem uma só vez, pelo
que não seria necessária a sua acentuação. Em segundo, porque se os verbos são irregulares, não
faz sentido o acento, uma vez que o futuro difere do mais-que-perfeito: dará (78.31; 415.86;
511.68; 518.44; 594.40) /der; saberá (596.89) / souber; poderá (220.49) / pudera; prazerá
(232.45), / prouvera; será (259.58; 275.16, 21; 475.17; 502.44; 256.31; 572.34) / for; dirá
(492.26) / dissera; hirá (330.35) / fora (também ocorre a 2ª sg. ‘hirás’ (508.28)); fará (58.38;
151.53; 242.36; 246.41; 330.35; 359.116) / fizera; teerá (239.54,58) / tivera. O que se pode
concluir é que este princípio não foi utilizado com rigor em todos os casos. E se uma possível
justificação encontra argumentos no facto de se querer manter a forma original, tal entende-se
para palavras como gaanhara (ganhará) (309.81), o mesmo não se pode entender em formas
como chamara (31.6), espantara (443.10), passara(á) (37.7; 255.130) / passara (71.63; 283.11;
356.46; 366.37,39; 493.51; 502.49; 504.45), levara(á) (255.131) / levara (108.37; 174.37;
281.68; 577.71), devera (357.78; 411.59).
Relativamente à forma verbal serám (513.18), 3ª sg. do futuro do indicativo, como clara
distinção da homógrafa seraão (112.25; 128.28; 337.60, 72; 591.6), compreende-se a
acentuação, mas já não se compreende tão bem, embora se aceite, a acentuação da forma verbal
do futuro sofrerám (484.25), como distinção da forma do pretérito perfeito, uma vez que este
tempo não ocorre na obra. É mais pertinente, assim, a distinção entre formas como tirarom
(112.24; 477.1; 505.66), 3ª pl. do pretérito perfeito, e tiraróm (610.20), 3ª pl. do futuro do
indicativo.
Porém, esta distinção temporal ficou por fazer relativamente às formas homógrafas das
primeiras pessoas do plural do presente e do pretérito perfeito do indicativo. E se é verdade que,
em certa medida, parte dos argumentos apresentados se esvanecem em palavras como contamos
(235.10; 279.20; 325.14; 385.4; 541.5), enviamos (410.49), fallamos (518.23; 609.10), ficamos
(17.3), nomeamos (88.48), porque só ocorrem no pretérito perfeito, ou em palavras como

58
III.1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de Giuliano Macchi

curamos (22.48; 178.28; 229.48; 286.108; 310.90; 327.75; 353.75; 392.30; 401.65440.26;
551.128), desejamos (483.20-21), esperamos (572.46), ousamos (410.54), protestamos
(410.44), rrogamos (28.46; 32.40), porque só ocorrem no presente, eles avivam-se em casos
onde, claramente, são homógrafas, condição referida pelo editor, como achamos (142.45;
343.3), 1ª pl. do presente, e achamos (47.67; 128.26; 138.39; 275.18; 325.15; 418.25; 425.3), 1ª
pl. do pretérito perfeito, leixamos (35.73; 159.57; 182.105; 236.32; 340.44-45), 1ª pl. do
presente, e leixamos (15.5; 69.4; 399.4), 1ª pl. do pretérito perfeito. Também nos casos de
pronominalização a utilização do acento circunflexo não foi utilizada de forma regular, como de
pode verificar na forma fornece-llos (11.15-16) fornece-llas (262.45) face a metê-llos
(266.41)83, prendê-llo (380.48), combatê-lla (129.11-12), entre outros.
A utilização da acentuação para diferenciar homógrafas, como refere Macchi, é
fundamental para uma melhor leitura e mais fácil interpretação do texto. Essa aplicação verifica-
se certeira na grande maioria dos casos, como em às (19.7), único caso registado com acento
grave na contracção, face aos 59 de aas, para se distinguir do artigo definido feminino as. O
mesmo se pode dizer de outras homógrafas, nomeadamente de allá (33 ocorrências)84 / alla (6
ocorrências) com distinção do advérbio de lugar do substantivo ala (lado). No entanto, não
fazem sentido as quatro formas de já, com acento, face às 160 que aparecerem de ja, sem
acento, uma vez que não há qualquer pertinência na distinção. Não é, também, coerente a
utilização relativamente à distinção da forma verbal há do artigo definido feminino ha. Para há
verificam-se 20 ocorrências e para ha 7. Todavia, considerando as frases assi por proveito / dos
poboos quecada hũu de vós ha de rreger comopor / espiciall amor e boa voontade que vos tem
(237.19-21) e e consiirando eu como o meestre de Santiago de Castella / vos há feitos algũus
deserviços em esta guerra, (437.17-18), verifica-se uma ausência clara de acentuação, o que
deverá aumentar o número de 20 para 22 das ocorrências verbais e diminuir para 5 o do
determinante. Não é também coerente a utilização do acento agudo por três vezes na forma alló:
e enquanto aquell escudeiro alló esteve (562.39); e contou a el-rrei e aa rrainha todo o que lhe
alló avehera. (562.44); e nom podia alló hir. (573.64), deixando uma por acentuar: e el-rrei
dom Fernando por fraqueza de sua door nom podia / allo hir, (559.7), sendo o sentido o
mesmo. Igualmente na utilização do pronome pessoal da primeira pessoa nós, “Nem nós nom
achamos que el-rrei dom Henrrique” (142.44-45) face a “Nos nom achamos que Gonçallo
Vaasquez d’Azevedo” (343.3), das homógrafa porque e porquê, “mas porque vio o logar fraco e
nom deffenssavell” (113.58) e “e nom moiramos assi sem porque!” (135.56), bem como na
distinção da locução à pressa, “assi que alli era toda a pressa da batalha,” (35.54-55) face a

83
Neste caso, entom mandou tomar duas barcas e metê-llos frades todos em ellas sem barqueiros,
pronominalização com o próprio complemento directo expresso. Na edição da Bibliotheca de Classicos Portuguezes
(1895) metter os frades.
84
A forma alá ocorre apenas uma vez (343.21).

59
III.1. A Crónica de D. Fernando de Fernão Lopes. Edição de Giuliano Macchi

“como souberom que era perdida partirom a pressa caminho de Saragoça” (50.42.43). A forma
mice, com apenas uma ocorrência, destoa das catorze micé.

Relativamente à acentuação de àquell (305.55)85, sendo o único caso de registo com


acento grave na contracção, face às 11 ocorrências da forma aaquell, aceita-se a colocação, se
bem que a interpretação da frase não gera dúvidas, pelo facto de se perceber que pratica a acção:
e o fidallgo / tornasse o quelhe dera àquell com que vivia (bem diferente de e ao fidallgo /
tornasse o que lhe dera aquell com que vivia).
Por fim, na Crónica de D. Fernando verificam-se ainda alguns casos, quanto ao número
de ocorrências das palavras, que merecem um comentário. Na linha 2 da página 599 está
registada a forma Lisboa, única na Crónica, face às restantes 128 com a grafia Lixboa. Esta
excepção ganha mais relevo quando consultado o índice onomástico (p. 621) e se verifica que
não há qualquer registo dessa forma. Aparece sempre Lixboa com a indicação de todas as
localizações, onde se inclui a 174.2, (indicação do capítulo e da linha, modelo do autor, igual a
599.2, com a indicação da página e da linha).
Outras situações semelhantes acontecem com as formas: mays (498.23)86, com apenas
este registo, face aos 477 da forma mais; houve (472.31), com apenas este registo, face aos 135
da forma ouve (ter87); merce (23.69) com apenas este registo, face aos 108 da forma mercee;
sooldos (194.51) com apenas este registo, face aos 77 da forma solldo(s).
Assim, se não há dúvidas, porque as não há, que a utilização da acentuação gráfica é uma
mais-valia para a leitura e compreensão da obra, os critérios aplicados neste pequeno número de
situações encontradas, poderia ter tido uma aplicação mais uniforme.

85
Na organizada por Dias Arnaut para a Civilização Editora, aquel, (cap. LXXXVII, p. 230).
86
Cf. o aparato crítico. O sentido é claramente de quantidade, apesar do registo mas em algumas edições,
como na organizada por Dias Arnaut, (cap. CXLII, p. 393).
87
A forma homónima ouve, do verbo ouvir, não aparece registada.

60
III.2. A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara. Edição de Teresa Brocardo

2. A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara.


Edição de Teresa Brocardo

A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses, de Gomes Eanes de Zurara, sucessor de


Fernão Lopes como Guarda-Mor da Torre do Tombo a partir de 1454, é um longo texto
repartido por dois livros onde o novo cronista do reino relata os factos ocorridos em Ceuta.
Praça portuguesa desde 1415, teve no Conde Pedro de Meneses, homem que amdava desejoso
de se allevamtar naquello que lhe seu nobre e gramde samgue rrequeria (ZURP 198.588-
590)88, ao ponto de, perante as recusas dos seus antecessores89, se oferecer como primeiro
capitão, dando assim início à aventura africana. É esta capitania de 22 anos, até à sua morte em
1437, no norte de África que Zurara relata quase em exclusivo, tão poucas são as mudanças de
cenário90, satisfazendo a vontade do Africano, D. Afonso V.
Escrita no final da sexta década do século XV, açerca de 1458 e 1460, e passado quase o
mesmo período temporal da acção da Crónica, Zurara tem a vantagem, face a Lopes, dos factos
a relatar serem muito mais recentes. Não só por esta razão, deixa o cronista claro logo no
primeiro capítulo que, também ele, deixará na sua obra a ideia do que rreallmemte pertemçee a
sustamçia nõ pode em outra parte ser mais verdadeyramemte escripta que aquy (ZURP
186.295-297).
O interesse pelo estudo desta crónica, face às demais de Zurara, sobretudo à Crónica da
Guiné, foi sendo colocado em segundo plano. Se atendermos ao estudo lexical feito para o
português do século XV, e mais particularmente ao processo de datação de palavras da língua
portuguesa, perceber-se-á ao longo deste trabalho que muitas dessas datações são tardias,
precisamente porque estudos desta natureza, desde a década de oitenta, principalmente A. G.
Cunha, e mais recentes como o Dicionário Houaiss, não a tiveram em consideração.
Mais do que qualquer crítica textual à edição de Teresa Brocardo, até porque não sendo
esse o propósito, esta é uma área de interesse recente e ainda a sistematizar conceitos, o intuito
passa por parcos contributos no sentido de melhoramento do texto, resultantes de quem tem
como objectivo fazer um índice directo de todas as palavras da crónica para, assim, poder obter
material de trabalho. É graças à informática que tal tarefa se torna simples, quanto olhada a
umas décadas atrás.

88
Citam-se as páginas seguidas das linhas.
89
Cf. capítulo quinto: O Condestabre, porque além da idade tinha temçom de se apartar pera serviço de
Deus, Gomçallo Vaz Coutinho, também por idade e por outras cousas que ho ympidiã e Martỹ Affomso de Mello,
por pressões dos que o acompanhavam.
90
Cf. Brocardo (1997:10).

61
III.2. A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara. Edição de Teresa Brocardo

Quando se edita uma obra em português de uma fase pretérita da língua, podem ser vários
os objectivos que a norteiam. No caso da Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara,
eles são explicados por Teresa Brocardo na respectiva introdução, onde não pretende editar um
texto no sentido de se destinar exclusivamente “ao leitor estudioso da história da língua”, mas
também “a muitos outros leitores” dada a importância do seu conteúdo. E termina afirmando
que se trata “portanto, também de dar a ler o texto da Crónica, agora de forma
propositadamente mais abstracta, a um público menos restrito. Este segundo objectivo,
determinaria, ao contrário do primeiro, a introdução de alterações na transcrição”91. São estas
alterações gráficas, da exclusiva responsabilidade do editor, que nos mostram, portanto,
variações da mesma palavra em diferentes edições, que é diferente de variação e instabilidade
da forma gráfica à época ou mesmo a registo de de outra palavra por opção do copista. A este
respeito, e sobretudo para os estudos linguísticos, ganha pertinência o qualificativo crítica,
quando passamos a ter edições que no aparato apresentam as respectivas variantes. Foi o que
aconteceu com esta edição de Teresa Brocardo, apesar de ela própria afirmar que “esta não é
uma edição crítica”92 onde se podem acompanhar as variantes do manuscrito G (Manuscrito
146.B.7 da Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa) que não sendo apenas gráficas,
revestem-se da maior importância para um estudo linguístico da forma “morfologicamente
diferente”, como os exemplos referidos por Teresa Brocardo “chorades” / “choraes”;
descreudos” / “descridos”93. A estes procurarei adicionar outros.
Ainda sobre as opções do editor ao procurar uma fixação do texto, se bem que não a
única, são por vezes tomadas decisões no sentido de preservar ao máximo o manuscrito. Nada a
opôr. Todavia, em trabalhos lexicais deste tipo, ajuda-nos o computador a isolar palavras, aqui
entendidas como uma sequência gráfica delimitada por dois espaços em branco. Daqui
resultaram duas situações de difícil percepção. A primeira, çea-voga, para a qual não encontrei
solução rápida ocorre nesta passagem: Emquamto a galle girou pera hyr de çea-voga sobre a
barca, as fustas pequenas forã logo dereitamemte a ella e começarã de a combater,
(421.829[826]). Não tendo dúvidas que o elemento voga ‘remada’, criação, aliás, de Zurara, era
a base deste suposto, e não havendo informação no aparato, a solução passou pelo confronto
com a edição publicada nos Inéditos da História Portuguesa, onde as palavras se encontram
separadas: Emquamto a galle girou pera hyr deça voga sobre a barca, (vol. II, p. 399)94.
Melhorou, mas a ajuda foi pouca, pois a leitura continuava sem sentido. Duas hipóteses, a partir

91
Cf. Brocardo (1997:155).
92
Cf. Brocardo (1997:154).
93
Cf. Brocardo (1997:170).
94
deça voga é também o registo que se encontra na edição Fac-similada da ed. do Abade Correia da Serra,
1792, Academia das Ciências de Lisboa, Porto, 1988.

62
III.2. A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses de Zurara. Edição de Teresa Brocardo

da entrada voga, registada em Morais, ambas locuções: dar voga ‘remar para diante’, mais
difícil, e de uma voga ‘de uma remada’95, mais aceitável.
O outro caso prendeu-se com a palavra gramsolla. Neste caso, a dúvida dissipou-se mais
facilmente, também com a ajuda de Morais4: “Lè-se esta palavra como uma só nos Ined. II. 402.
Mandarom o bergantim a filhar a guarda, e quando forom dentro acharom grançolla, pelo qual
nom ousarom de sair fora: deve ler-se gran folla, grande marulhada, turvação, do mar. V.
Folla”96.
Neste tipo de trabalhos, por norma, as classes gramaticais fechadas não são alvo de
desambiguação, tal é o seu elevado número de ocorrências. Depois, à medida que a leitura vai
sendo apurada para determinadas palavras, vão surgindo casos que mereciam um tratamento
diferenciado, como entre o artigo e a interjeição nesta passagem: O companha pusylanyma de
corações molharigos e afiminados, dezei-me por que chorades. He porvemtura com themor
daquelles mouros que ally estam fora amedoremtados e espamtados? (218.77-80).
Para satisfazer os dois objectivos a que se propôs, e procurando conciliar conservação e
legibilidade, Teresa Brocardo introduz a respectiva pontuação e conserva as grafias do
manuscrito, incluindo as geminadas, as etimológicas ou não, a alternância entre <i> e <y> para
representar a semivogal e as diferentes representações da nasalidade, sobretudo o <m>, o qu, de
facto, se veio a revelar uma das características de Zurara comparado com Lopes, como melhor
se poderá observar no Índice Analítico das duas obras.
Uma das questões sensíveis na edição de textos antigos prende-se com a acentuação.
Tornar um texto quatrocentista legível “a muitos outros leitores” implica, como seria de esperar,
introduzir acentos gráficos que os ajudassem em desambiguações, sobretudo de homógrafas. A
este respeito, apenas duas observações. Sendo a forma verbal do presente do indicativo do verbo
ser quase sempre grafada <he>, não recebeu acento gráfico por não se confundir com a
conjunção, mas acentuou, mas “há em todo o manuscrito apenas três ocorrências desta forma
grafada <e> que se acentuaram”97. Com a informática a serviço da linguística, verifica-se que
são quatro as ocorrências, em 207.812, 420.823[820]98, 543.241 e 691.481. Quanto às formas
verbais, acentuaçam-se “as formas da segunda pessoa do plural dos verbos em “-er” com crase,
como <devês>, <fazês>, <poderês>, que são bastante frequentes no manuscrito”. Este é um
procedimento que também se estende aos verbos da primeira conjugação, pelo que pude apurar
em formas como aballês (256.174), acabassês (678.158), acharês (292.1081; 654.604),
ẽbaratês (359.378), guardês (499.278[279]), mãdarês (531.1090[1089]), pemsês (204.728) e
tomassês (562.699[698]).

95
Em Morais em duas vogas ‘em duas remadas’, com abonação de Couto, 5.4. I.
96
Cf. Morais4 s.v. gransolla.
97
Cf. Brocardo (1997:158).
98
Verifica-se em alguns capítulos uma deficiente numeração das linhas no formato em papel pelo que o
número entre parêntesis rectos diz respeito à edição informatizada, utilizada com muito maior frequência e rapidez.

63
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D.


Fernando

Nesta lista de palavras apenas se apresenta uma abonação de LOPF para cada entrada,
pois o objectivo é assinalar a sua ocorrência na obra. No entanto, vão indicadas todas as
localizações onde podem ser encontradas.
Outra indicação base desta lista são as atestações simultâneas de obras que surgiram ou
poderão ter surgido na mesma época. E se em alguns casos, pela datação das obras, podemos
apresentar alguma certeza nas afirmações, noutros a dúvida de quem foi o introdutor faz algum
sentido. Assim, perante a ocorrência de uma palavra em várias obras, podemos identificar três
situações:
1º. Pela sua datação anterior a Lopes, por exemplo LOPF, face a AVES, GRAL ou
ORTO. Nestes casos, com datação anterior segura, a palavra é automaticamente
excluída deste trabalho de investigação.
2º. Pela datação das obras em que a palavra ocorre percebe-se que o introdutor deverá ter
sido Lopes. Por exemplo um registo em LOPF, face a CONF, PAUL ou ZURP, que
são posteriores, a palavra faz parte da lista posterior (novidade em LOPF).
3º. Pela datação das obras, quer apresente uma informação mais geral, como apenas o
século XV, ou mais exacta, quando se conhecem limites temporais ou mesmo o ano,
não podemos afirmar que tenha sido Lopes o primeiro a registá-la na língua. Assim,
para o conjunto das obras/autores que se encaixam num período de mais ou menos 20
anos, entre 1418 (nomeado guarda-mor)99 e finais da quarta década 1438-40, o
máximo 1443 (data limite para a publicação da crónica de D. Fernando100) estaria
reservada esta alínea, como salvaguarda/possibilidade de também poderem ter sido os
introdutores de determinada palavra na língua (no fundo, estamos a falar dum período
da renovação do léxico em redor da época dos príncipes de Avis). Por exemplo, se
uma palavra aparece registada em obras com uma datação mais exacta como CAVA,
LEAL, OFIC e LOPF, e sabendo da ligação de Lopes à corte, como se pode afirmar
que o introdutor é Lopes e não D. Duarte ou D. Pedro? Ou mesmo o contrário, por que

99
Mais correctamente seria a data de 1415, incluindo também o Livro de Montaria, uma vez que se aponta
como data inicial da sua feitura (1415-1433), pois D. João de Portugal já acrescenta ao seu título “Señor de Ceuta”,
conquistada precisamente a 21 de agosto de 1415. No entanto, esta não é uma edição trabalhada para efeitos de
datação das palavras. Para mais esclarecimentos vide a entrada TRELA, p. 158.
100
Segundo Teresa Amado, in Tavani 1993:179.

65
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

razão não teria sido Lopes, atendendo à proximidade e envolvência na corte, a


‘introduzir/sugerir’ determinado termo?

Para esta terceira situação é importante o contributo da época de Avis na renovação


lexical. Num ambiente cultural propício que primava pela produção textual (escrevia-se e
mandava-se escrever, traduzia-se e mandava-se traduzir), é difícil falar em vocabulário de D.
Duarte, D. Pedro ou mesmo de Fernão Lopes. Será antes mais correcto falar de vocabulário de
Avis, pois se um dos autores desta época não deixou a palavra grafada pela sua pena, conhecia-a
certamente. É como se a palavra fosse regularmente utilizada oralmente, até ao momento
oportuno de se tentar perpetuar pela escrita. Veja-se por exemplo o caso do verbo agasalhar,
com registo desde o século XIII. É nesta época de renovação lexical, não só por influências
externas ou de traduções, mas também graças aos recursos internos da língua, que surgem um
sem número de derivados. A partir deste verbo encontramos dois derivados formados no século
XV, precisamente com registo em obras do círculo de Avis: agasalhamento e agasalhador. Por
razões difíceis de explicar, D. Duarte regista o primeiro no Leal Conselheiro e Fernão Lopes o
segundo da Crónica de D. Fernando. Será injusto, e até imprudente, dizer que o monarca
conhecia apenas um e o cronista apenas o outro. Numa situação oposta, o que se verifica é o
registo nas duas obras da mesma palavra, como primeira atestação, desencarregamento. É este
deambular de um conjunto de palavras nesta época específica, vocabulário de Avis, que torna
desnecessária uma atribuição a um autor, mas a um conjunto deles. Se por razões lexicográficas
de primeira atestação tem de haver a identificação de uma obra, trata-se, então, mais de um
factor cronológico do que léxico-cultural. No final desta lista se tirarão as respectivas
conclusões.

A listagem das obras dos dois grupos que interessam a este trabalho acima referidos é a
que se encontra a seguir. Para a primeira, aquela que contém as obras pertencentes a um círculo
mais restrito e de mais provável conhecimento, as siglas que as identificam serão apresentadas
na entrada ‘atestações simultâneas’ a negrito101. Para a segunda, que contem obras com datação
mais genérica, as siglas serão apresentadas em itálico. À excepção de LOPF, cujas localizações
são indicadas por mim (página e linha, 2ª edição de Macchi), todas as outras, regra geral, são as
que constam no IVPM e no VH-CPM. Os casos divergentes serão indicados. Apenas se indicam
as localizações das obras das primeiras quatro letras, correspondentes aos três volumes

101
Apesar de algumas palavras como ala, avanguarda, cubelo, defensável, desabafado, escaramuça,
escaramuçar, esquerdo, forragem, frontaria, fronteiro, ladeira, maçar, reguarda, requesta, requestar, salvo-conduto,
tranca, virotão, vistoso, terem ocorrências em COND, esta obra é aqui considerada apesar de se verificar um
“aproveitamento sistemático por Fernão Lopes (…) que a elegeu como importante modelo de discurso narrativo”, cf.
T. Amado (Tavani 1993:186-188). Da eventual evolução gráfica das formas coincidentes se retirarão conclusões.

66
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

publicados do IVPM, no sentido de poder fazer uma comparação com o VH-CPM. Da letra -E-
à -Z-, apenas se indica a obra onde a palavra tem ocorrência.
No campo da etimologia, para as palavras formadas por derivação, apresenta-se em letra
redonda a base e em itálico os afixos. Para a composição ambos os elementos em itálico.

A lista do corpus das atestações simultâneas é a que se segue:

BENF: Livro da Virtuosa Benfeitoria, D. Pedro, (entre 1418-1425).


CART: Livro dos Conselhos de El-Rei D. Duarte (Livro da Cartuxa), D. Duarte, (1428-
1438)
CAVA: Livro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela, D. Duarte, (<1438)
LEAL: Leal Conselheiro, D. Duarte, (1428-1438)
LOPP: Crónica de D. Pedro, Fernão Lopes (1430-1440)
MONT: Livro de Montaria, D. João I (1415-1433)
OFIC: Livro do Ofícios de Cícero, D. Pedro (trad.) (1433-1438)
VITA: Vita Christi (trad.) (<1428-1438)
CESA: Vida e Feitos de Júlio César (trad.) (<1466)

SALA: Documentos Gallegos de los siglos XIII al XVI, Andrés Martínez Salazar.
DESC: Descobrimentos Portugueses, (1057-1460)
MARR: Documentos das Chancelarias Reais anteriores a 1531 relativos a Marrocos,
(1415-1540)
CITR: Livro de citraria e experiencias de algús caçadores (séc. XV)
CONF; Tratado de Confissom (Chaves, 8-8-1489)
CONT: Contemplaçom que fez o santo sam Bernardo segundo as seis oras canonicas do
dia, (séc. XV)
ESOP: Livro de Esopo (trad.) (séc. XIV?/XV)
FRAD: Crónica da Ordem dos Frades Menores (séc. XV)
MMA: Monumenta Missionaria Africana, (?)
REIS: Crónica dos cinco Reis (Crónica de Portugal de 1419), Códice do Porto
REIX: Crónica dos sete Reis (Crónica de Portugal de 1419),Códice de Muge
ROBI: Diálogo de Robin e do Teólogo, (séc. XV)
SBER: Vida de S. Bernardo (trad.) (séc. XV)

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III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

SINA: Livros de Sinais, (séc. XV) [SIGNAIS que pertencem aa egreja. Edição de Mário
Martins. Boletim de Filologia, Lisboa: Centro de Estudos Filológicos, t. 17, p. 311-
326, 1958. Reprodução de parte do códice alcobacense 218, do século XV]
SOLI: Livro do Solilóquio de Sancto Agostinho (trad.) (antes de 1415-com certeza antes
de 1437)
TERS: Trasladação dos corpos de são Bento e sua irmã santa Escolástica, (séc. XV)
VERT: Livro das Três Vertudes (trad.) (séc. XV)
YSAC: Livro de Ysaac (séc. XV)

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III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ABASTADAMENTE, adv. (3) ‘de forma abastada’.102


e estes faziam vĩir e enviavom do rreino grandes e grossas mercadarias, em guisa que fora
as outras cousas de que em essa cidade abastadamente carregar podiam, (6.98).

Outras ocorrências: 29.51; 93.15.


Etimologia: abastado + -mente.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas103: VITA 24b13, 61c40; CESA III.14§28.2; FRAD 27.31104.
Obs.: Segundo MD-CF, com registo em ChUniPort (vol. 3, 1420-1460).
O adjectivo está atestado no século XIV.

ABRAÇO, s.m. (1) ‘ato de abraçar, de apertar entre os braços; amplexo’.


Proposto d’aver despenssaçom pera casarem ambos, eram os jogos e fallas antr’elles tam
a meude, mesturados com beijos e abraços e outros desenfadamentos de semelhante preço,
(198.36).

Etimologia: regr. de abraçar.


Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: BENF 47.1; LEAL 195.2; VITA 23.47; FRAD II.23.23.
Obs.: MD-CF e BLem registam também a sua ocorrência em CP.
O verbo está atestado em 1255.

ABREVIAMENTO, s.m. (1) ‘ato ou efeito de abreviar; abreviatura’.


declarando logo certas condiçoões quando hũu d’elles morresse primeiro, com clausullas
que por abreviamento dizer nom curamos.(548.34-35).

Etimologia: abreviar + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF 138.2; VITA 113d13; SEGR 15v; YSAC 80.9.
Obs.: O verbo está atestado no século XIV.

102
Por norma, os advérbios deadjectivais (+ -mente) não são averbados nos dicionários, pese embora algumas
excepções (em Houaiss, por exemplo, absolutamente, certamente, chãmente, efetivamente, felizmente…, entre
outros). Assim, o interesse do registo aqui destes advérbios, mais do que uma possível primeira datação, procurará
encontrar eventuais situações em que se verifique uma datação do advérbio anterior ao adjectivo, mostrando o uso
oral corrente deste último na língua, apesar do registo gráfico posterior.
103
Todas as localizações indicadas são as que constam no IVPM (letras -A- a -D-) e no VH-CPM (-E- a -Z-).
O objectivo desta rubrica não passa por fazer o levantamento de todas as obras onde a palavra possa ter ocorrência,
mas simplesmente provar que ela tem registo em alguma das que cumpre o requisito apresentado na introdução deste
ponto, ou seja, datadas da primeira parte do século XV, preferencialmente entre 1418-1443. Naturalmente que se
surgirem ouras localizações, provenientes quer de corpora informatizados, quer de lematizações, elas serão indicadas
no campo das observações.
104
Nas localizações do IVPM, o segundo número arábico, o que indica a linha, está sempre em itálico
(IVPM), ao passo que no VH-CPM está em redondo. Assim, por exemplo, numa indicação como FRAD I.3.5,
I.91.28, II.152.17, a primeira e última localização provêm da edição em papel e a do meio do CD-ROM. Se os
registos forem os mesmos, apenas se apresentam os do IVPM, todos em itálico. Será possível, assim, retirar
conclusões no final deste capítulo sobre a utilização, ou não utilização, das diferentes abonações apresentadas nas
duas obras.

69
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ADORADO, adj. (1) ‘cheio de dores, doente’.


veendo el-rrei cada dia mais adoorado, e temia-sse que fallecendo per morte, (376.50).

Etimologia: de a- + dor (dŏlŏr, ōris) + -ado.


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Atestações simultâneas: VITA 94b49, 159d26.
Obs.: Com o significado de ‘venerado’, do século XIII, não ocorre em LOPF.
O substantivo está atestado no século XIII.

AFERRAR, vb. (4) ‘investir contra, abalroar, atacar’.


e Joham Focim capitam, que hia em hũua naao, quisera que aferrarom com ellas,
certeficando que as veenceriam, (262.26).

Outras ocorrências: 262.37; 263.63; 444.27.


Etimologia: de a- + ferro + -ar.
Tipo de unidade: derivação parassintética.
Atestações simultâneas: REIS 128.16, 129.14; REIX I.129.23, II.264.19; CESA II.6§9.1.
Obs.: As duas abonações de REIS não constam no IVPM.
O substantivo está atestado em 1136.

FOUTAMENTE, adv. (3) ‘afoitamente, corajosamente’.


Gill Fernandez, a que natureza proveera de boom esforço e ardimento, foutamente
começou de dizer: «Amigos, esforçaae e nom ajaaes temor; (124.25).

Outras ocorrências: 134.43;181.76.


Etimologia: de fouto + -mente.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: INFA 99.10; LOPJI2 173.11; VITA 181c35.
Obs.: O adjectivo afouto está atestado no século XIV.

FOUTAR, vb. (1) ‘afoitar; tornar-se ousado, atrever-se’.


aalem d’esto, que as gentes simprezes eram muito enganadas com ellas, tomando hũuas
moedas por outras, e muitos se foutavam de as falssarem fora de sua terra e as tragiam
depois ao rreino, e andavom todas de mestura. (193.10).

Etimologia: de fouto + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LOPJI2 36.37; VITA 137d34.
Obs.: As atestações simultâneas são para a forma afoutar.
O adjectivo afouto está atestado no século XIV.

FOUTEZA, s.f. (4) ‘afoiteza, coragem, atrevimento’.


e per fouteza desordenada, com cobiiça de gaanhar honrra, dar a avantagem que tiinha
por ssi em ajuda de seus emmiigos? E ja nom he de negar que pellejando tantas por tantas
cada hũus averiam que fazer por sua honrra; moormente aazar que cobrassem os outros
tall melhoria sobr’elles, isto certamente nom foi fouteza mas foi sandia prosunçom,
(443.12, 18).

Outras ocorrências: 476.35; 534.30.

70
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: de fouto + -eza.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: OFIC 40.3; REIX II.233.12.
Obs.: O adjectivo afouto está atestado no século XIV.

AFOUTO, FOUTO, adj. (2) ‘corajoso, ousado, destemido’.

e como era muita gente de pee sahindo afouto por o acostumado huso que tiinham,
hordenouo prioll de lhe lançar hũa cellada; (478.34).
portanto fallou assi fouto contra os do seu consselho, (420.87).

Etimologia: do lat. fautum, supn. do v. favēre.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: GRAAL 92a26; VERT 108.9; CESA II.2§14.4.
Obs.: Houaiss regista afouto com data do século XIV e com indicação de menos usado que
afoito com datação, em itálico, do sXVI. A datação de afouto tem por base o IVPM, onde Cunha
apresenta uma abonação de GRAAL, classificada como texto do século XIV105. O VH-CPM
elimina esta abonação, indicando apenas as obras do século XV106. A questão parece não ser
pacífica sobre o tratamento de obras que garantidamente são anteriores às cópias conhecidas.
Além de GRAAL, o mesmo acontece, por exemplo com O Livro da Montaria (do século XV,
mas conservado em manuscrito do XVI), Livro do Esopo, Livro de Citraria ou Castelo
Perigoso.

AGASALHADOR, s.m. (2) ‘hospitaleiro, acolhedor’.


Amava justiça, e era prestador e graado, muito liberall a todos, e grande agasalhador dos
estrangeiros. (3.19)

Outras ocorrências: 347.19.


Etimologia: rad. do part. agasalhado+ -or.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: VERT 132.38.
Obs.: Apesar do radical ser do XIII, só passado dois séculos se assiste à formação deste
derivado em ‘-dor’. O mesmo se pode dizer para agasalhamento, que não tendo registo em
LOPF, ocorre em LEAL.
Tendo em conta a única ocorrência em VERT, e se atendermos ao facto de, como refere Mª. de
Lurdes Crispim107, o incipit do manuscrito de VERT da Biblioteca de Madrid se referir que foi
traduzido “por «mandado» da rainha D. Isabel, mulher de D. Afonso V (1447-1455)”, seria
mais adequado atribuir a primeira atestação a LOPF108.
O adjectivo está atestado no século XIII.

105
Cf. p. XIX da introdução do primeiro volume, letra -A-.
106
Com esta alteração, parece que o VH-CPM foi mais do que uma digitação das fichas constantes no
fichário da casa Rui de Barbosa, como se pode ler na apresentação: “Tivemos, assim, oportunidade de, no espaço de
quase dois anos, rever todo o trabalho, com o concurso de especialistas, procurando, sempre que possível, expurgá-
lo de imperfeições decorrentes do fato de não termos podido contar até o final com a orientação firme e experiente
de seu autor”.
107
Pisan (2002:31) e Tavani (1993:244), s.v. Espelho de Cristina.
108
Agasalhador figura nesta lista pela hipótese também levantada por Crispim (cf. Pisan 2002:33) da tradução
ter sido efetuada fora de Portugal entre 1430 e 1455.

71
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ALA, s.f. (8) ‘fila, fileira, lado’.

pôs el-rrei em hũa alla que fossem a cavallo o conde dom Tello seu irmaão e dom Gomez
Pirez de Porras prior de Sam Joham e outros fidallgos ataa mill de cavallo, em que hiam
muitos cavallos armados. Na outra alla da maão dereita d’os que hiam tambem de pee,
(22.35, 38).

Outras ocorrências: 25.11; 34.42,46; 35.51; 71.61; 532.27.


Etimologia: do lat. āla, ae.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: MONT 19.12; REIX I.114.66; CESA II.18§64.2.
Obs.: Apesar da sua utilização com o valor semântico apresentado por Cunha no IVPM de
‘asa’109 e também o advérbio de lugar ‘lá’, para tais situações não encontrei registo em LOPF. O
VH-CPM omite a abonação de MONT, obra retirada do corpus de extracção do dicionário.

ALCÁÇOVA, s.f. (2) ‘castelo, fortaleza’.


ca el, como Lixboa foi cercada, mandou logo rrepayrar a alcaceva de Santarem de boa e
fremosa cerca com que foi mui deffensavell, (310.88).

Outras ocorrências: 469.12.


Etimologia: do ár. al-qaşba.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Atestações simultâneas: REIX I.134.29; CESA III.5§12.1.
Obs.: Houaiss, na forma histórica (f. hist.), além de datar do séc. XV as formas alcaçova,
alcaçeua, alcaceva, alcaçoua, apresenta a data de 1136 para a forma alcazeua. A não ser uma
gralha, até porque na entrada do verbete apresenta a datação do séc. XV, não a consegui
localizar.

ALIADO, adj. vb. (1) ‘partidário, cúmplice’.


foi grande alvoroço em-na cidade por esta sospeita, dizendo o poboo contra algũus
moradores d’ella que eram da parte d’el-rrei de Castella, por aazo de Diego Lopez, cujos
servidores e alliados eram, (265.11).

Etimologia: part. de aliar (do lat. adlĭgō, ās,āre,āvi,ātum).


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: CESA II.3§6.4; BENF 215.16, 237.3; OFIC 156.13.
Obs.: A segunda abonação de BENF não consta no IVPM.
MD-CF apresenta para alyado duas abonações da Crónica de Afonso X (Manuscrito P) in CGE.
Antedatação face a Houaiss.

AMAINAR, vb. (1) ‘diminuir a força de (vento, mar); afrouxar; arriar’.


«Senhor, boas novas, ca aqui teendes a frota de Castella que viimos buscar». Elle amainou
logo, e todallas outras gallees callarom as vellas; (441.64).

Etimologia: segundo Houaiss, de origem obscura, provavelmente do catalão amainar. CF2


apresenta como etimologia o latim hyp. ad-maniare.
Tipo de unidade: importação (catalão).
109
Para este significado o IVPM, e também o VH-CPM, apresenta duas abonações: FRAD, II.159.1 e ESOP,
23.17.

72
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Atestações simultâneas: CESA III.14§3.3.

AMAVIOSO, adj. (1) ‘que demonstra delicadeza, afável, amável’.


Foi gram criador de fidallgos e muito companheiro com elles; e era tam amavioso de
todollos que com elle viviam que nom chorava menos por hũu seu escudeiro quando morria
come sse fosse seu filho. (3.10).

Etimologia: de amavio + -oso. Segundo Houaiss, de origem controversa, mas certamente da


base amar. CF2 apresenta, com interrogação, a etimologia do lat. amibilia, pl. de
amabilis?
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF 62.16, 103.9,107.33; OFIC 192.15; VITA 6d48; VERT 79.33.
Obs.: O substantivo está atestado no século XV.

AMORIO, s.m. (9) ‘sentimento de amizade, simpatia’.


«Senhor, el-rrei dom Henrrique de Castella meu senhor me envia a vós com sua messagem,
como aquell que deseja aver boa paz e amorio convosco e seer vosso verdadeiro amigo
sem nẽhũu engano: (12.48)

Outras ocorrências: 13.70; 179.22; 180.42; 237.19; 242.47; 250.31; 294.36;


546.37.
Etimologia: de amor + -io.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF 113.6, 143.18; REIX II.275.30; VITA 110.24; 1447 DESC
451.41; ESOP 63.5; FRAD I.71.17.
Obs.: O VH-CPM não regista a data de 1447 DESC constante no IVPM e em Houaiss (que
remete para RL). De qualquer forma, MD-CF apresenta para amorio uma abonação da CGE.
Antedatação face a Houaiss.
O substantivo está atestado em 1275.

APOSENTADORIA, s.f. (1) ‘hospedagem, hospedaria’.


E pera sse esto melhor fazer, mandou que todollos bispos e meestres e comendadores e
quaaesquer outras pessoas a que ouvessem de dar pousadas de pousentadaria, que
tevessem casas nas villas e logares de seu senhorio, que as corregessem todas ataa certo
tempo, (9.171).

Etimologia: de aposentador + -ia.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL 294.27.
Obs.: Houaiss apresenta a data de 1451 DESC, remetendo para o IVPM, onde são, no entanto,
também apresentadas mais abonações, e mais antigas, como é o caso de LEAL e LOPF. Esta
opção encontra-se explicada no ponto 4.2.2.4, do detalhamento dos verbetes110. Para este estudo
em particular, o interesse recai precisamente nas obras anteriores a 1451. Como este é um
procedimento que ocorre com mais palavras, passarei a classificá-las como ‘palavras com data e
forma gráfica anteriores’.
O adjectivo está atestado em 1344.

110
Ponto 4.2.2.4: “No caso de haver várias formas históricas datadas do mesmo século, indicou-se a data da
grafia correspondente à actual, para evitar mal-entendidos”.

73
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

APROVAÇÃO, s.f. (1) ‘confirmação de ato; consentimento’.


e partirom o meestre de Santiago e algũus fidallgos de Portugall pera Badalhouce, honde
el-rrei estava, pera veerem a aprovaçam que fazia das cousas que forom hordenadas per
seu procurador. (565.8)

Etimologia: do lat. apprŏbātio, ōnis.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX 332.124; VITA 81c14.
Obs.: Houaiss apresenta a data de 1460 DESC, remetendo para o IVPM. Das cinco obras aqui
apresentadas, todas são de datação anterior a 1460, pelo que esta é, também, uma ‘palavra com
data e forma gráfica anteriores’111.
MD-CF também regista aprouaçam, no ChUniPort (vol. 1, 1300), e aprouaçom, em
ChPortDuarte.
Antedatação face a Houaiss.

ARAUTO, s.m. (3) ‘o que conduzia mensagens; portador, correio’.


El-rrei dom Pedro e o principe com sas gentes partirom do Gronho e veheron pera
Navarrete; e d’alli enviou o principe a el-rrei dom Henrrique hũu seu arauto com hũua
carta (27.11).

Outras ocorrências: 31.4,12.


Etimologia: do fr. héraut. Para CF25 do baixo lat. haraldus.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: BENF 290.25; CART 104; REIX II.189.28; 1439 MARR I.56.21.
Obs.: O VH-CPM omite as abonações de CART e 1439 MARR, apresentadas no IVMP. Esta
última obra, foi retirada do corpus de extracção do dicionário.

ARVOREDO, s.m. (1) ‘aglomeração de árvores’.


Os alaãos, com as treellas cortas, forom filhar o porco em hũu espesso arvoredo, (353.64).

Etimologia: do lat. arbŏrētum, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: MONT 191.43.
Obs.: Para Houaiss1452 LOPO. Como ocorre em MONT e LOPF, é mais uma ‘palavra com
data em obra anterior’. O VH-CPM omite a abonação mais antiga, MONT. Para Kremer
1485112.

111
Parece, no entanto, não se aplicar o princípio enumerado no ponto 4.2.2.4, referido na nota anterior, uma
vez que das formas históricas registadas aprouaçam (LOPJI2), aprouação (REIX e VITA), aprouaçom (1460 DESC)
e aprovação (LOPF) a forma escolhida não será a que mais corresponde à actual. O que se verifica, em várias
situações, é uma preferência por obras com data expressa, face a obras para as quais, normalmente, se indica apenas o
século. É o caso aqui, mas também o de aposentadoria, arvoredo, defensável. Excepção é o caso de depósito (cf. s.v.
DEPÓSITO).
112
KREMER, Dieter (2004). Primeiras datações. Trabalho não publicado. Apenas apresenta o ano de registo
da palavra, sem a fonte. De qualquer forma, e para esta palavra em concreto, a datação é tardia.

74
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

BOMBARDA, s.f. (1) ‘máquina de guerra que arremessava, por meio de cordas e molas,
grandes pedras’.
e alli mandou fazer engenhos e carros e bombardas e outros percebimentos de guerra.
(473.58).

Etimologia: do it. bombarda (1311).


Tipo de unidade: importação (italianismo).
Atestações simultâneas: LEAL 149.27; 1439 MARR I.66.25; CESA III.15§37.2.

BROLADO, adj. vb. (3) ‘bordado’.


ca el-rrei dom Fernando a seu rrequerimento lhe enviou estonce em presente seis allaãos e
seis sabujos, todos com collares brollados e foziis de prata dourados, e as treellas d’elles
d’ouro fiado, (142.37).

Outras ocorrências: 166.23; 460.36.


Etimologia: part. de bordar. Segundo Houaiss “do germ. *bruzdôn> lat. *brosdare, com alt. do
grupo raro -sd- para -sl-, donde port. medv. broslar, depois, com troca de -sl- por -
rl-, brorlar e, por dissimilação, broslar; daí, com assimilação do -s- ao -l-,var. do
sXV brollar e sXVI bordar, sempre no sentido de ‘ornar (pano, estofo, tela) com
fios de algodão, lã, ouro etc.’; as var. broslar e bordar coexistem até o sXVIII,
quando broslar e der. caem em desuso; na tradição lexicográfica port., este v.
bordar e o v. homônimo der. de 1borda + -ar ‘seguir junto à borda de, orlar,
margear, delimitar as margens’ reúnem-se sob um mesmo verbete; o elo semântico
entre os dois voc. não justifica, porém, que se deixe de levar em conta suas orig.
distintas”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: CESA II.18.90.1.

BULADO, adj. vb. (1) ‘determinado ou manifestado por bula’.


gaanhando d’elle que podessem enleger confessor que os compridamente asolvesse,
avendo d’esto leteras bulladas de que husarom em foro de conciencia, (397.55).

Etimologia: part. de bular (de bula+ -ar).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: FRAD I.20.19113; II.31.14; II.84.13.
Obs.: O substantivo está atestado no século XV.

BULHÃO, s.m. (3) ‘espécie de punhal’.


Em aquell dia aa tarde, depois que dançarom e ouverom vinho e fruita, mandou o conde
por hũua cota muito louçaã e hũu bulhom bem guarnido, a guisa de basalarte, e por hũua
faca mui fremosa que lhe trouverom de Ingraterra, (365.18).

Outras ocorrências: 372.98,101.


Etimologia: segundo Houaiss, de origem obscura.
Tipo de unidade: (?)
Atestações simultâneas: 1410 DESC 224.20; CART 15v.

113
No VH-CPM, como FRAD I.2019.

75
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Apesar da abonação de uma obra com data expressa anterior a 1418114, engloba-se nesta
lista pelo seu significado. Houaiss apresenta três entradas para esta palavra. Na primeira, datada
de 1440, consta na terceira acepção o significado de ‘peça das guarnições dos arreios das
mulas’, igual à que consta no IVPM com data de 1410115. Para a segunda, datada de 1899, com
proveniência de CF1, apresenta o significado de ‘espécie de punhal’. Apesar de no IVPM não
constar com esta acepção, parece-me ser a que faz aqui sentido.
Antedatação a Houaiss, para a acepção 3.

CAMAREIRA, s.f. (1) ‘serviçal encarregada da manutenção dos aposentos de uma rainha’.
Era de gram casa de donas e donzellas e camareiras e outra gente meuda, desi
d’escudeiros e muitos officiaaes, e graada e prestador a todos: (355.19).

Outras ocorrências: 371.54; 559.21; 583.69.


Etimologia: do lat. cămĕrārĭus, ĭi (fem. de camareiro)
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD I.273.29; VERT 61.26.
Obs.: MD-CF e BLem registam também a sua ocorrência em CP. O masculino camareiro
(36.80; 406.27; 524.42; 579.11) está atestado no século do XIV.

CANONICAMENTE, adv. (1) ‘de acordo com os cânones’.


e escrevendo suas cartas ao emperador e rreis e principes christaãos como este dom
Bertolameu aviam enlegido e criado canonicamente em papa por verdadeiro pastor da
Egreja? (396.45)

Etimologia: do gr. kanonikós, ê, ón (> lat. cănŏnĭcus, a, um).


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SBER 125.9.
Obs.: MD-CF regista duas ocorrências para este advérbio, uma nos Textos Notariais
(Documentos Notariais dos Séculos XII a XVI, 1300-1400) e outra em CHP (1402-1499).
BLem regista também uma ocorrência no Livro das Confissões, de Martín Pérez, que data de
Alcobaça, 1399. Assim, tal como o adjectivo, também o advérbio tem ocorrência no século
XIV, antedatando o IVPM e o VH-CPM.

CARDEALADO, s.m. (1) ‘dignidade de cardeal’.


e nẽhũu nom foi perant’elle: por a quall rrazom os escomungou da mayor escomunhom e
os privou dos cardeallados, e fez outros cardeaaes de novo, (393.55).

Etimologia: do lat. medieval cardinalātus.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD II.77.28; II.259.16.
Obs.: As duas ocorrências de FRAD são variantes cardealadego e cardenaladego
respectivamente.

114
Cf. p. 60, ponto 3.
115
Para a discrepância destas datas, veja-se o ponto 4.3 do detalhamento dos verbetes.

76
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

CARIDOSA, adj. (1) ‘que tem ou que demonstra caridade’.


Era ainda de muita esmolla e muito caridosa a todos, mas quanto fazia todo danava,
(230.76).

Etimologia: de caridade + -oso.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: OFIC 129.14; VITA 2c39; VERT 47.5.
Obs.: MD-CF apresenta também uma abonação de ELOY.
O substantivo está atestado no século XIII.

CARRIAGEM, s.f. (3) ‘quantidade de carros; carraria’.


e porque entenderom que ainda podiam hir sem empacho dos emmiigos ataa Elvas,
hordenarom que todollos homẽes de pee e carriagem fossem pello caminho dereito ante a
avanguarda, (430.27).

Outras ocorrências: 430.35; 430.41.


Etimologia: segundo Houaiss, de “orig. contrv.; AGC deriva do it. carriagio (a1363) ‘bagagem,
equipamento que um exército levava em viagem’; há quem suponha vir do provç.
carriatge ou do fr. ant. charriage ‘objetos carregados, bagagem’, com infl. de
carro”.
Tipo de unidade: importação (?)
Atestações simultâneas: REIS, 119.31; REIX I.115.74; CESA II.5§3.3, II.8§4.6.
Obs.: A abonação de REIS não consta no IVPM.

CAUTELA, s.f. (1) ‘precaução, cuidado, prudência’.


e d’hi em diante poserom em ssi grande guarda e rregimento, vellando a cidade de noite e
de dia, teendo cautella e avisamento grande em todos seus feitos e defenssom. (266.34).

Etimologia: do lat. cautēla, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: BENF 30.23; LEAL 193.10, 360.6; REIX II.159.121, II.314.27;
VITA 134.16, 142d12, 181d37; FRAD I.3.5, I.91.28, II.152.17; SEGR 7v, 19;
VERT 66.24;
Obs.: As três abonações de VITA, bem como a segunda de FRAD, não constam no IVPM.
MD-CF apresenta uma abonação de BOSC e outra, tal como BLem, da CGE.
Antedatação face a Houaiss.

CAVALEIROSO, adj. (2) ‘próprio de cavaleiro, valoroso’.


Nun’Allvarez, veendo que os seus nom davom volta e que os castellaãos chegavom acerca
d’onde ell estava, aderençou contra elles com gram virtude cavalleirosa, a algũus
impossivell de creer, (484.49).

Outras ocorrências: 524.40.


Etimologia: de cavaleiro + -oso.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF 109.8, 190.21; OFIC 27.1, 39.11; LEAL 250.18; CESA
III.18§8.3.

77
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Pelas obras em que se encontra, claramente pertencente ao vocabulário de Avis.


O substantivo está atestado em 1277.

CAVALGANTE, adj. (1) ‘que anda a cavalo; cavaleiro, cavalgador’.


Era cavallgante e torneador, grande justador e lançador a tavollado; 3.15;

Etimologia: de cavalgar + -nte.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: FRAD II.137.3.
Obs.: O verbo está atestado em 1262.

CENSURA, s.f. (1) ‘crítica, condenação’.


sometendo os ditos rreis e seus rreinos a censsura e sentença ecclesiastica hindo contra
esto per algũua guisa. (183.112).

Etimologia: do lat. censūra, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX II.56.51.
Obs.: MD-CF regista uma ocorrência nos Textos Notariais (Documentos Notariais dos Séculos
XII a XVI, 1300-1400), outra em CHP (1402-1499) e outra ainda em ChPortDuarte.
Antedatação face a Houaiss.

CISMÁTICO, adj. (3) ‘dissidente; aquele que se separou da comunhão duma igreja’.
por a quall rrazom os escomungou da mayor escomunhom e os privou dos cardeallados, e
fez outros cardeaaes de novo, dando-os por cismaticos e membros talhados da Egreja,
(393.56).

Outras ocorrências: 459.11; 532.46.


Etimologia: do gr. skhismatikós, ḗ, ón ( > lat. ecl. schismătĭcus, a, um).
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SBER 95.9, 114.28, 142.6; ROBI 200.12, 200v5.
Obs.: O VH-CPM não regista nenhuma abonação de ROBI.

COMUNICADO, adj. vb. (1) ‘transmitir, passar (conhecimento, informação, opinião) a


alguém’.
nós isto fazer nom podemos, porque nas obras dos antiigos que ante de nós fezerom
estorias taaes cousas nom achamos nas escripturas a nós per elles comunicadas; (47.68).

Etimologia: do lat. commūnĭcō, ās, āre, āvī, ātum.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX I.108.26; VITA 7b17, 21d24, 133d15; SEGR 68v; SBER 83.2,
91.27.
Obs.: As duas primeiras abonações de VITA não constam no IVPM.

CONCLAVE, s.m. (7) ‘reunião cardeais’.


E este segredo que os cardeaaes antre ssi tragiam de enleger nom foi porém tanto
guardado que o cardeall de Grifollio, ante per dias que entrassem ao conclavi, nom disse

78
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

hũu dia a este dom Bertollameu que cedo poeria sobre seus hombros hũu mui grande
carrego; (387.62).

Outras ocorrências: 387.68; 387.70; 388.107; 389.124; 392.34; 396.34.


Etimologia: do lat. conclāvĕ, is.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: VITA 4c4.
Obs.: Provável introdução na língua pela tradução, a partir de VITA.

CONJECTURA, s.f. (1) ‘hipótese, presunção, suposição’.


O iffante, preso per maginaçom e posto mui firme so jugo do amor, per congeitura das
cousas que viia tiinha em gram preço e desejava muito as que nom pareciam; (359.123).

Etimologia: do lat. conjectūra, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: MONT 193.1.
Obs.: O VH-CPM omite a abonação de MONT.

COTA, s.f. (4)


1. ‘espécie de corpete’.
e hũu grande roby golpado em castom d’ouro com grandes graãos d’aljofar arredor, e
rreligairos e anees d’ouro e camafeus e outras joyas de gram preço, afora sayas e cotas e
cipres de dona, (166.30).

2. ‘revestimento da parte superior da armadura de um cavaleiro’.


As armas mandou el-rrei mudar a esta guisa: do cambais mandou que fezessem jaque; e da
loriga, cota;e da capelina, barvuda com camalhom; e os que eram bem armados haviam de
teer barvuda com seu camalho e estofa e cota e jaque e coxotes e canelleiras franceses e
luvas e estoque e daga e grave.(305.58, 61).

3. ‘tipo de gibão, muito usado pelos homens nobres; espécie de casaco curto,
semelhante ao colete’.
Em aquell dia aa tarde, depois que dançarom e ouverom vinho e fruita, mandou o conde
por hũua cota muito louçaã e hũu bulhom bem guarnido, a guisa de basalarte, e por hũua
faca mui fremosa que lhe trouverom de Ingraterra, e deu todo ao iffante. (365.17).
Etimologia: do fr. cotte.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: CART 180; LEAL 224.23 (acepção 2); CESA III.15§34.2 (acepção
1); VERT 112.33 (acepção 1).
Obs.: Para a acepção 1 e 3, parte superior da indumentária feminina e masculina,
respectivamente. Para a acepção 2, de carácter mais militar. O IVPM apenas indica a terceira
acepção, onde engloba todas as obras. Houaiss, para todas as acepções (cf. 4cota), apresenta o
séc. XVI, remetendo para AGC. No IVPM, o próprio Cunha apresenta 11 abonações, todas do
século XV. O VH-CPM omite a abonação de CART, LOPO e MMM.
Antedatação face a Houaiss.

79
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

COURAÇA, s.f. (2) ‘zona de defesa, protecção; resguardo’.


em tanto que com a muita beestaria foi o combato tam grande per hũua parte, que
Abenfallos, capitam mouro que hi viinha, cobrou a coiraça que dizem de Callaforra, e
tomarom o alcaçar velho e fezerom em elle seis portaaes, (66.26).

Outras ocorrências: 370.31.


Etimologia: do lat. cŏrĭācĕa (fem. do adj. cŏrĭācĕus, a, um)
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIS 145.9, 147.31; REIX I.158.1.
Obs.: Em LOPF não se regista o sentido de ‘armadura de metal’, que serve para proteger as
costas e o peito dos golpes.

COVAL, s.m. (1) ‘divisão da terra em diversas covas para sementeira’.


O pam de todollos covaaes era carretado pera a villa e gaados afastados dos estremos
pera dentro do rreino; (101.12).

Etimologia: de cova + -al.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas:
Obs.: Parece ser possível aceitar dois significados para esta palavra. Em época de guerra
tornava-se necessário recolher o maior número de mantimentos (neste caso pam) para as vilas.
Donde vinha esse trigo? Das covas ‘à superfície’, ou seja, das terras divididas em partes (covas)
que estavam plantadas e era necessário ceifá-las, debulhar o trigo e transportá-lo para local
seguro ou das covas ‘subterrâneas’, isto é, do “Celleiro subterraneo, a que antigamente
chamavão Silo” onde se conserva “o trigo talvez por cinco, seis, ou mais annos, sem a mais leve
corrupção” 116, como refere Viterbo. Neste segundo caso, não seria mais do que um restabelecer
as reservas da vila, estando o produto (pam) disponível, mas extramuros. A origem latina de
covus, a, um, var. arc. do lat. cavus, a, um ‘cavado, oco’ também parece fortalecer esta hipótese.
MD-CF é o único a indicar uma ocorrência em Estoria de Dom Nuno Álvares Pereira117, o que
indica a provável fonte de onde Lopes a recebeu. O registo que se verifica na CGE é como
topónimo (E fez hûa trasnoytada e passou Tupuel e foy pousar a Espinal de Coval).
O substantivo está atestado em 1128.

CUBELO, s.m. (1) ‘torreão em forma de cubo que havia em antigas fortificações, substituído
pelo baluarte’.
Entom moverom os batees com os rreis em dereito do cubello (290.49).

Etimologia: de cubo + -elo.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: COND 28c18.
Obs.: Houaiss apresenta para esta palavra datação do século XVI, segundo Morais2.
O substantivo está atestado em 1297.

116
Cf. explicação mais pormenorizada em Viterbo, s.v. cova.
117
Na edição de Mendes dos Remedios, couaães de (1911:208); na de Adelino de Almeida Calado covaaes
(1991:200,15): “mandava-o todo encovar polla terra em bõos covaaes”.

80
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

CUNHO, s.m. (1) ‘peça para marcar moedas’.


scilicet, florĩis taaes como el-rrei tiinha husança de mandar fazer, e reaaes de prata dos
sinaaes e cunho d’el-rrei dom Pedro de Castella, de quatro maravidiis cada hũu rreall.
(170.25).

Etimologia: do lat. cŭnĕus, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: 1422 SALA 135.7 (L1)
Obs.: Esta palavra é um bom exemplo da confusão de datações: Houaiss apresenta a data de
1422, remetendo para o IVPM). O IVPM regista três abonações, uma de LOPF (cunho), outra
de 1500 CAMI (crunho) e a data de 1422 SALA (cuño), data esta apresentada em RLor, como
observação ao dicionário de Machado. Mais uma vez, Lorenzo é remetido para segundo plano
por Houaiss quando, na verdade, é ele o autor desta antedatação. Por fim, como o VH-CPM
apenas apresenta a abonação de LOPF, se se consultar apenas esta obra, fica-se com a noção de
que Lopes é o introdutor.
O verbo cunhar, por sinal, é datado por Houaiss no séc. XIV, remetendo para o IVPM. Ora, o
IVPM e também o VH-CPM apresentam o séc. XV, ambos com uma abonação de PAUL,
datada, segundo os próprios autores na explicação da respectiva sigla, de 1502118, século XVI,
portanto. Quanto a AGC, que apresenta para este verbo o ano de 1813, na 3ª edição, 2ª
impressão, de 2007,bem como no Suplemento que a acompanha (portanto posterior a Houaiss,
ao IVPM e ao VH-CPM) não vem qualquer correcção. Esta3ª edição, na verdade, mais não é do
que uma simples reimpressão da 2ª, de 1986, desactualizada. Na página da editora Lexikon119
aparece já referência à quarta edição, à qual ainda não tive acesso.
MD-CF regista também uma abonação em ChPortDuarte.

DEBATE, s.m. (3) ‘discussão; altercação’.


E sobre estas cousas ouve muitos debates, fallando-sse todo per aquelles de que fiavom,
(42.52).

Outras ocorrências: 298.32; 334.24.


Etimologia: do fr. débat.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: BENF 134.3; OFIC 137.19; CAVA 61.31; CESA Pról.§2.1, II.12§7.1;
VERT 75.31; FRAD II.188.6.
Obs.: MD-CF regista também uma abonação na GenEst.

DEFENSÁVEL, adj. (5) ‘defendível, defensível’.


Quando el-rrei dom Henrrique chegou a Guimaraães, achou o logar mais defensavell e
melhor percebido que Bragaa, (111.4).

Outras ocorrências: 113.58; 307.19; 310.89; 521.79.


Etimologia: do lat. dēfensābĭlis, e.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: CESA II.4§29.1, III.5§31.4; 1447 DESC 456.11.

118
Pode ler na explicação da sigla PAUL “conforme a impressão de Valentim Fernandes, feita em Lisboa em
1502”.
119

http://www.lexikon.com.br/index.php#[request_source]livro_ficha.php|col_esquerda|chave=&pagina=1&id=5

81
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: ‘Palavra com data e forma gráfica anteriores’. Houaiss prefere a obra com data expressa
(a1447 DESC)120, remetendo para o IVPM, onde são apresentadas abonações de obras mais
antigas, como COND, e LOPF. O VH-CPM omite a abonação de 1447 DESC.

DEGOLAÇÃO, s.f. (1) ‘decapitação’.


E quando veo aos dezenove dias do mes d’agosto, na festa da degollaçom de Sam Joham
Baptista, (459.18).

Etimologia: do lat. dēcollātĭo, ōnis.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD II.112.21, II.185.18.
Obs.: O IVPM apresenta a abonação FRAD II.112.21 e o VH-CPM de FRAD II.185.18. MD-
CF confirma as duas.

DEPÓSITO, s.m. (1) ‘armazenamento, poupança’.


segundo ouvistes compridamente, por aazo de gram despesa da guerra começada assi per
mar como per terra, todo sse gastava que nom ficava nẽhũua cousa pera deposito,
(191.125).

Etimologia: do lat. dēpŏsĭtum, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LOPP 12.35; 1438 DESC S.504; VERT 129.31.
Obs.: Neste caso em particular, Houaiss prefere a indicação do século XV em detrimento da
data exacta de 1438, remetendo para o IVPM. Neste caso nem se coloca a questão abordada no
ponto 4.2.2.4, do detalhamento dos verbetes, uma vez que a forma histórica é a mesma.
MD-CF regista ainda duas abonações em ChPortDuarte e uma de LOPP. BLem regista também
uma ocorrência no Livro das Confissões, de Martín Pérez (1399).
Antedatação face a Houaiss.

DESACORRIDO, adj. vb. (2) ‘sem auxílio, socorro; abandonados.


e el rrespondia aos fidallgos que lhe em isto fallavom que os seus aviam casas e terras em
que abastadamente podessem viver, e os que viinham desacorridos aviiam mester bem
apousentados e fazer-lhes muitas mercees; (93.16).

Outras ocorrências: 94.21.


Etimologia: part. de desacorrer (des- + acorrer).
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Atestações simultâneas: SBER 133.4.
Obs.: BLem e MD-CF apresentam abonações da CGE. Antedatação face a Houaiss.
O verbo está atestado no século XIII.

DESCARGA, s.f. (1) ‘retirar a carga da embarcação, descarregamento’.


e estando hũua naao e hũua barcha ante a villa aa descarga, veherom outros navios dos
emmiigos e tomarom a naao (105.7).

120
Também aqui a escolha pela forma histórica que mais se aproxima da actualidade parece não fazer
sentido, defenssauees (a1447 DESC) face a defensavell ou defensável (LOPF), por exemplo. Verifica-se, sim, a
preferência por obras com data expressa.

82
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: segundo Houaiss, “f. snc. divg. do port. medv. descarrega (pronunciado
[descárrega]), regr. de descarregar”.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas:
Obs.: Encontra-se em Houaiss a informação de ocorrência nas Ordenações Afonsinas, mas já
indicada em JPM3: “descarga está por descarrega, der. regressivo de descarregar. Séc. XVI
(Morais2). Descárrega no séc. XV: «…navio, que for achado aas oras da guarda da Cidade,
filhãdo carrega, ou descarregaa…», Ord., I, tít. 62º, § 18, p. 357”. Informação proveniente de
RLor “1445?-1447?: descarregua: “«qualquer naujo…filhando carrega ou descarregua ou
metendo homeens» (Desc. Port. 156.5)”. Este apresenta ainda uma abonação para a forma
descarga “1489 «sobre rarason da barcajeen e pasajee e carga e descarga» (Ferro 197.4)”.
O verbo está atestado em 1228.

DESCASAR, vb. (1) ‘separar(-se),divorciar’.


E per aazo de taaes consselhos, jamais o iffante nom perdeo cuidado de casar com sua
sobrinha e descasar-se de dona Maria per morte; (363.73).

Outras ocorrências: 200.83; 379.10.


Etimologia: de des- + casar.
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Atestações simultâneas: REIX 198.19.
Obs.: Houaiss não leva em consideração a datação de RLor, de 1105, “pro suis filiabus casare
uel descasar” (Ferreiro III,62.18), ao apresentar o séc. XV, remetendo para o IVPM.
Também para o verbo casar prefere a data de 1192, proposta por JPM2 “et si ista mulier militis
casauerit cum pedone, faciat forum de pedite” (Leges, p. 483) à de RLor 929 “suos muros
petrineos et suo casare uel suo exito” (Dipl. 22).
O verbo está atestado em 1192.

DESCIMENTO, s.m. (1) ‘descida, queda’.


dizendo que seu talante era que os mercadores de sua terra fossem rricos e abastados e
nom lhe fazer cousa que fosse em seu perjuizo e decimento de sua honrra. (7.124).

Etimologia: de descer + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: CESA III.15§21.3.
Obs.: MD-CF apresenta uma abonação de BOSC.
O verbo está atestado em 1244.

DESCONTENTAR, vb.(1) ‘ficar insatisfeito; desagradar(-se), desgostar(-se)’.


ca de corpo e geesto natureza lhe dera tam boa parte que nẽhũu senhor se descontentaria
de a aver por molher: (175.49).

Etimologia: de descontente + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL 279.30; VITA 25d26, 29c40, 30.27/28, 135c7, 135c9, 138c21;
VERT 111.11.
Obs.: O VH-CPM apresenta mais três abonações de VITA que não constam no IVPM.
O substantivo está atestado no século XV.

83
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

DESCULPAÇÃO, s.f. (1) ‘desculpa’.


e como em semelhantes feitos muito de rrecear nom se esguarda nẽhũua desculpaçom nem
espaço de saber a verdade, forom sem mais deteença todos metidos a tormento, (265.18).

Etimologia: de desculpar + -ção.


Tipo de unidade: derivação sufixal
Atestações simultâneas: LEAL 46.20.
Obs.: JPM3 faz referência a esta forma numa observação dentro do verbo desculpar: “Parece ter
existido um v. desaculpar, como se verifica pela presença de desaculpação no séc. XV: «…filha
por sua desaculpaçom dizer que he homem», L. Cons., cap. 13, p. 46”.
O verbo está atestado em 1352.

DESEMPACHADO, adj. vb.(1) ‘desobstruído, aliviado, livre’. Cf. DESEMPACHADO.


e matando-o elle morreria sem porque, com gram pecado de minha alma, e eu era per
força leixar o rreino e me hiria fora d’elle, e per esta guisa seeria ella desempachada de
mim. (518.33).

Etimologia: part. de desempachar (des- + acorrer).


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Atestações simultâneas: OFIC, CAVA, LOPP.
Obs.: O verbo está atestado no século XV.

DESENCARREGAMENTO, s.m. (2) ‘alívio de culpa; absolvição’.


mas porém que oolhando ell em esto serviço de Deus e desencarregamento de sua
conciencia e proll de seu poboo, pois a Deus aprouguera de o poer em paz com seus
contrairos, (193.18).

Outras ocorrências: 281.70.


Etimologia: de desencarregar + -mento.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL371.8.
Obs.: Com registo apenas nestas duas obras pelo que se considera vocabulário de Avis.
O verbo está atestado em 1269.

DESGARRADO, adj. vb. (1) ‘separado, extraviado, tresmalhado; sem vigor, entusiasmo (?)’.
e que quanto mais entrasse pello rreino, alçando-lhe os mantiimentos, que tanto viinriam
mais desgarrados e melhores de desbaratar. (251.20).

Etimologia: part. de desgarrar (des- + garra + -ar)


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Atestações simultâneas: a1436 DESC 356.3.
Obs.: Este particípio serve de datação ao verbo121, mas serve também para mostrar o registo de
um derivado anterior à sua base, pois garra apenas é datada 1567122. O significado é figurativo.
O VH-CPM não indica a abonação de DESC.
O substantivo está atestado em 1567.

121
Cf. detalhamento dos verbetes, ponto 4.3.3.1.
122
Cf. o mesmo procedimento para agarrar.

84
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

DESPACHADAMENTE, adv. (1) ‘de maneira despachada, com despacho’.


e entom desembargou-lho, e foi entregue de todas estas cousas, as quaaes lhe o duque fez
aver muito despachadamente. (54.41).

Etimologia: de despachado + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL 93.12; CAVA 107.26; VITA 98d3.
Obs.: O adjectivo também é do séc. XV. Pelas obras em que ocorre, percebe-se a importância
das obras traduzidas no enriquecimento vocabular. D. Duarte, no Leal Conselheiro, “reproduz
no capítulo 87 uma parte dum capítulo de Vita Christi”123. É também neste círculo cultural que o
cronista se movimenta e disso deixa registo. Vocabulário de Avis.
O adjectivo está atestado no século XV.

DESPEDIR, vb. (1) ‘despedir-se, separar-se de’.


Alli sse despedirom d’el-rrei todollos senhores e fidallgos portugueeses, e ell tornou-sse
pêra Badalhouce e elles ficarom com a rrainha em Ellvas. (577.76).

Etimologia: do port. ant. espedir (sXIII) (do lat. expetĕre < petĕre, com mudança de pref.)
Tipo de unidade: derivação prefixal
Atestações simultâneas: REIX II.56.56, II.243.46, II.243.53, II.150.136; FRAD I.375.3,
I.70.22.
Obs.: O VH-CPM apresenta mais quatro abonações para esta variante de espedir do que as que
constam no IVPM provenientes, certamente do Suplemento ao IVPM. No entanto, como Cunha
não regista a abonação de LOPF, ela continua sem figurar no VH-CPM
O verbo tem, no entanto, registos anteriores na CGE, como o provam MD-CF, BLem e o CIPM,
mas também em CSM e CHP (1260-1300), para o CIPM.
Antedatação face a Houaiss.
O verbo espedir está atestado no século XIII, e pedir em 1152.

DISTINTA, adj. (2) ‘extinta, sem continuidade de sangue; separada, interrompida’.


assi que a dereita linha da erança fosse de todo destinta, que estonce o rregno ficasse
desembargado aa iffante dona Beatriz e que os naturaaes do rregno fezessem todos
menagem que em tall caso ouvessem ella por sua rrainha e senhora. E morrendo ella
primeiro que seu marido, nom ficando em Portugall filho ou neto d’el-rrei dom Fernando,
assi que a erança fosse destinta sem herdeiro d’ell ou d’esta iffante, (548.46, 51).

Etimologia: do lat. distinctus, a, um.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: VITA 7Bb29; FRAD I.11.15.
Obs.: MD-CF regista também cinco abonações (destinta [1], destinto [1] destintos [2], distintos
[1]) em ChPortDuarte e doze (destintas [7], destinto [1], destintos [1],distinta [1],distinto [2])
em Corte Enperial.
Antedatação face a Houaiss.

123
Cf. Tavani 1993:685.

85
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

DITADO, s.m. (3) ‘título de propriedade emitido ou recebido pelos reis de Portugal no
sXVI’.124
e o ditado do duque, como sse entom chamava, era este: «Dom Joham, pella graça de Deus
rrei de Castella e de Leom e de Tolledo e de Galliza e de Sevilha e de Cordova e de
Mollina e de Geem e do Algarve e d’Aljazira, duque d’Allancastro e senhor de Mollina»;
(236.34).

Outras ocorrências: 282.79; 593.10.


Etimologia: do lat. dictātus, a, um.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: OFIC 2.7; VITA 7c12; BENF 22.21.
Obs.: Com várias ocorrências anteriores como se verifica em MD-CF: ditado em SACR e
BOSC; ditados em TPart e CGE; ditada em CHP; ditadas em TROY; dictadas em ORTO. No
entanto, com este significado apenas ocorre em LOPF e SACR.
O VH-CPM apresenta mais a abonação de BENF.

DIVISA, s.f. (1) ‘emblema simbólico’.


que o conde hordenou por guarda das quintãas e casaaes que cada hũu tevesse senhos
pendoões de sua devisa, (465.24).

Etimologia: do fr. devise.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: BENF 24.5; VITA 5c16; VERT 41.30.
Obs.: BLem e MD-CF apresentam uma abonação da CGE, mas com o significado de ‘ideia,
sentença’ (“E a esto cada hũũ dava sua divisa, segundo seu entender”).

EMPACHO, s.m. (5) ‘obstáculo, embaraço, impedimento, estorvo’.


ca me parece, se vo-llo per outrem mandara dizer, que nom fora minha voontade
desabafada; ca asaz d’empacho ouverees vós d’aver, mandardes-me demandar como se eu
fosse hũua dona de mui maa fama». (358.95).

Outras ocorrências: 376.49; 414.44; 430.25-26; 526.34.


Etimologia: regr. de empachar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: BENF, OFIC, LEAL, CESA, REIS, REIX, LOPP, VITA, FRAD,
VERT, CONT.125
Obs.: Pela quantidade de obras e ocorrências, palavra usual na época de Avis, registada em
todas as principais obras. De notar o antónimo desempacho, em MONT 100.39 e LEAL 271.16.
O verbo está atestado no século XV.

EMPACHAR, vb (3) ‘obstruído, entravado; sobrecarregado’. Cf. DESEMPACHADO.


E a enteençom d’el-rrei era que esta frota jouvesse aa entrada do rrio de Sevilha pera
embargar que nẽhũu navio podesse hir nem vĩir com mercadarias nem outros mantiimentos

124
Segundo Houaiss.
125
A partir da letra -E-, as atestações simultâneas provêm do VH-CPM, pelo que não serão indicadas as
localizações. No entanto, sempre que se justifique, serão indicadas outras localizações no campo das observações
(Obs.). O levantamento, tal como se disse na introdução deste capítulo, não pretende ser exaustivo, mas sim indicador
de ocorrências simultâneas.

86
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

pera a dita cidade; e empachado longamente aquell porto per esta guisa, que Castella
rreceberia tam gram perda e dano por esta rrazom que seeria a el mui grande avantagem
pera comprir sua voontade. (137.16).

Outras ocorrências: 143.6; 258.52.


Etimologia: do provç. ant. empachar (do fr. ant. empeechier)
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: OFIC, CAVA, CESA, REIX, VERT.

EMPARAMENTADA, adj. vb. (1) ‘decorar com paramentos; colocar adornos ou enfeites’.
A cama era bem emparamentada, e a cubricama d’hũu tapete preto com duas grandes
figuras de rrei e de rrainha na meatade, (460.31-32).

Etimologia: part. de emparamentar (em- + paramento + -ar).


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Atestações simultâneas: BENF, VERT.
Obs.: Houaiss regista apenas paramentar com datação de 1516 (cf. DBLiv).
BLem e MD-CF registam emparamẽtasse com abonação da CGE.
Verbo derivado com antedatação anterior face à base registado por Houaiss.
O substantivo está atestado no século XIII.

ENCAMINHAR, v. (24) ‘dirigir(-se)’.


e passando acerca da villa do Gronho, que tiinha da parte d’el-rrei dom Pedro, nom a
pôde cobrar, e encaminhou pera a cidade; (61.6).

Outras ocorrências: 85.19; 86.34; 115.7; 154.58; 151.50; 165.7; 169.16; 246.47;
250.29; 254.86; 259.58-59; 284.34; 357.61, 62; 362.36; 370.35;
383.6-7; 384.37; 440.49-50; 451.8; 478.32; 505.69; 526.31.
Etimologia: de en- + caminhar.
Tipo de unidade: derivação prefixal
Atestações simultâneas: BENF, OFIC, LEAL, CAVA, CESA, REIS, REIX, LOPP, VITA,
VERT, SBER.
Obs.: A abundância de localizações em VITA pode indicar o primeiro registo da palavra e a
influência que teve nas obras de Avis, bem como nas de Lopes. A ser assim, estaríamos perante
o primeiro registo numa obra traduzida, revelando ser este um dos mecanismos de
enriquecimento vocabular.
O verbo está atestado no século XV.

ENCAMINHAMENTO, s.m. (3) ‘acção de encaminhar’.


pois el espalhava todas suas gentes, e se poinha em poder e consselho do conde dom
Joham Affonsso Tello e d’outros, que por covardo encaminhamento lhe faziam entender
que sse non triguasse a poer batalha, (121.56).

Outras ocorrências: 308.33-34; 384.33.


Etimologia: de encaminhar + -mento.
Tipo de unidade: derivação sufixal
Atestações simultâneas: OFIC, LEAL, CAVA, CESA, VITA, VERT.
Obs.: Cf. obs. s.v. ENCAMINHAR.
O verbo está atestado no século XV.

87
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ENFIM, adv. (1) ‘por fim, finalmente’.


Sobr’esto ouve muitos conselhos, e enfim acordarom que a fosse cercar, pollas muitas
viandas que n’aquella comarca avia; (63.17).

Etimologia: prep. em + fim (do lat. fīnis, is)


Tipo de unidade: composição.
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, REIX, LOPP, CESA, TERS.
Obs.: BLem e MD-CF apresentam abonações da CGE.
A preposição está atestada em 1152 e o substantivo no século XIII.

ESCABELADO, adj. vb.(1) ‘despenteado, desgrenhado’.


As donas e donzellas que eram na cidade, veendo aquesto, sahiam aas rruas e praças,
chorando escabelladas, (66.32).

Etimologia: part. de escabelar (de es- + cabelo + -ar).


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Atestações simultâneas: CESA.
Obs.: MD-CF apresenta também, para escabelada, uma abonação da Demanda do Santo Graal,
texto proveniente do CIPM. A esta forma corresponde estavelada, tanto em BLem como na
edição de Piel - Irene Nunes.
O substantivo está atestado no século XIII.

ESCARAMUÇA, s.f. (6) ‘1 combate, luta, conflito’.


e nom teverom jeito de cercar a cidade salvo como quem pousa de caminho, como quer que
foi feita hũua escaramuça na ponte em que forom presos algũus portugueses: (252.42).

Outras ocorrências: 267.2; 269.2, 13; 481.7, 11.


Etimologia: do it. scaramuccia.
Tipo de unidade: importação (italianismo)
Atestações simultâneas: REIX, CESA.
Obs.: BLem e MD-CF apresentam abonações da CGE.
Houaiss data este substantivo do século XIV, remetendo para o FichIVPM. No entanto, o VH-
CPM, digitalização desse fichário, regista apenas abonações do XV.

ESCARAMUÇAR, vb. (5) ‘combater ou lutar em escaramuça’.


e os de dentro sahiam fora, assi de cavallo come de pee, e escaramuçavom com elles;
(111.12-13).

Outras ocorrências: 267.14, 18; 269.3, 6.


Etimologia: de escaramuça + -ar.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: REIS, REIX, CESA, VITA.
Obs.: Houaiss data este verbo do século XV, com remissão para o FichIVPM, mas BLem e
MD-CF apresentam abonações da CGE, pelo que se trata de uma antedatação face a Houaiss.
O substantivo está atestado no século XIV.

88
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ESCUSAMENTE, adv. (11) ‘escondidamente, ocultamente’.


e nom quis tornar com este rrecado a Carmona, mas mandou a pressa, o mais
escusamente que sse fazer pôde, tirar a molher e os filhos do logar, ante que fosse
cercado; (152.89).

Outras ocorrências: 203.3; 213.2; 214.30; 357.56, 70; 463.15; 467.76, 78; 533.21;
591.8.
Etimologia: de escusa + -mente.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, REIS, REIX, LOPP.
Obs.: O adjectivo é do século XIII. Pelas obras em que ocorre, faz parte do vocabulário de
Avis.
O substantivo está atestado no século XIII.

ESQUERDO, adj. (3) ‘do lado esquerdo’.


Aa maão ezquerda da batalha, honde estavom os que hiam de pee, pôs el-rrei em hũa alla
que fossem a cavallo o conde dom Tello seu irmaão (22.33).

Outras ocorrências: 34.39; 413.21.


Etimologia: segundo Houaiss, “orig. duv.; prov. de uma língua pré-romana hispano-pirenaica,
da mesma orig. do basco ezker(r); é possível que o voc. se tenha estendido de uma
zona de língua basca, na época visigótica; cp. esp. izquierdo, cat. esquerre.”
Tipo de unidade: importação (?)
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, CAVA, REIS, REIX, CESA, FRAD, SEGR.
Obs.: A abonação do século XIV da CGE, apresentada por BLem e MD-CF diz respeito a nome
próprio: “que era alcaide, que avya nome Esquerdo”.

ESTANDARTE, s.m. (1) ‘insígnia, bandeira’.


e mais a gallee rreall, que era hũua grande e fremosa gallee em que avia largas e
espaçosas camaras, a quall el-rrei mandou mui nobremente guarnecer d’estendarte e
muitos pendoões e tenda e aparelhos de cordas de seda, onde avia de vĩir a iffante;
(165.15).

Etimologia: do fr. ant. estendard.


Tipo de unidade: importação (galicismo)
Atestações simultâneas:
Obs.: A informação de ocorrência nas Ordenações Afonsinas encontra-se em JPM3: “«e em a
maão seestra hum estendarte das nossas armas em signal de seu daudilhamento», Ord., I, título
54, § 4, p. 321”.

ESTOFA, s.m. (1) ‘espécie de capacete de tecido, couro, malha ou similar, usado por baixo do
elmo; coifa’.
e os que eram bem armados haviam de teer barvuda com seu camalho e estofa e cota e
jaque e coxotes e canelleiras franceses e luvas e estoque e daga e grave. (305.60).

Etimologia: do fr. ant. étoffe.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: CESA.

89
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

FACA, s.f. (3)


1. ‘espécie de cavalgadura de porte médio; hacaneia’.
e pagavom de solldo ao de cavallo tari com faca armado aa guisa, trinta solldos por dia,
que eram oito dobras por mes, e ao genete viinte, que eram por mes cinquo dobras, e ao de
cavallo sem faca quinze solldos. (119.17, 20).

Etimologia: segundo Houaiss, “orig. contrv.; ger. tido como red. do port. medv. facanea, actual
hacanéia; segundo JM, pode provir directamente do esp. ant. haca, hoje jaca, de
mesmo sentido 'cavalgadura'”.
2. ‘instrumento cortante, constituído de lâmina e cabo
Em aquell dia aa tarde, depois que dançarom e ouverom vinho e fruita, mandou o conde
por hũua cota muito louçaã e hũu bulhom bem guarnido, a guisa de basalarte, e por hũua
faca mui fremosa que lhe trouverom de Ingraterra, e deu todo ao iffante.(365.18).
Etimologia: segundo Houaiss, “orig. contrv.; os étimos propostos abrangem, entre outros, o lat.
fălcŭla, ae, dim. de falx, falcis ‘foice, roçadeira, garra ou cutelo de podar’
(Adolpho Coelho); um ár. hsp. farha ‘filhote, rebento novo’, a que se atribui, p.
ext., o signf. ‘faquinha’, não doc.; o fr. hache ‘archote, facho’, para o qual se supõe
evolução divg. de signf. para faca, justificado pela semelhança da correspondência
fonética entre o fr. roche e o port. roca, o fr. vache e o port. vaca; para Mansur
Guérios, um afr. sudanês faka, faga, baka etc.) ou banto i-vaka, ni-vaka etc. todos
com signf. ‘objeto cortante’; as várias hipóteses parecem difíceis de justificar
quanto a aspectos fonéticos ou insuficientes quanto a aspectos semânticos”. Para
Aurélio “de faca2, com alter. semântica, por metáfora giriesca, poss.”126
Tipo de unidade: importação (?)
Atestações simultâneas: CITR.
Obs.: O significado de ‘cavalgadura’ é o que se encontra na abonação de CAVA, com
ocorrência também em LOPJI. Tendo em conta a passagem nesta última obra: “cada huum bem
armado de (hum) bom caualo, e mais huma mulla hou rocim hou faca como mylhor podesse
[...]”, parece ser também este aqui o caso, onde se diferencia o pagamento, mediante os animais
apresentados. Outra interpretação possível será entender faca como uma marca que era aplicada
aos melhores cavalos, distinguindo-os assim dos restantes, e recebendo mais por essa qualidade.
MD-CF apresenta também uma abonação do Livro de Falcoaria do Emperador Enrique da
Alemanha, do século XV.
A antedatação que BLem apresenta com o registo de duas abonações em Vidas de Santos -
Manuscrito Alcobacense, portanto do século XIII/IV, parece ser um erro mecânico, pois as três
localizações que encontrei são: “nem per ventuyra ẽ este spaço ho ẽmiigo cruel me revolva e
faca husar de meos maaos feitos que ante husava”; “e de sua penitẽcia com o qual nos Deos
faca vivere” e “- O filha nõ chores nem facas planto”.127

126
Para faca2 apresenta: do fr. ant. haque < ingl. med. hakeney (actual hackney), pelo esp. ant. haca (actual
jaca).
127
Exemplos extraídos de CIPM, VS3.

90
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

FACHO, s.m. (1) ‘material inflamável que se acende; archote (?)’.


Nom seguio el-rrei dom Fernando, depois que teve esta paz firmada por sempre, o dito do
profeta Isayas n’aquell logar honde disse que fariam das espadas fachos e das lanças
podadeiras (303.6)128.

Etimologia: do lat. vulg. *fascŭlo (der. do lat. fax, făcis).


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SEGR.
Obs.: MD-CF apresenta uma abonação de Contemplacao de Sam Bernardo, na passagem “A
uirgem maria segundo se diz comeo por ceea tres grããos de facho”.

FALTA, s.f. (1) ‘falha, erro, engano’.


que assi a ell como aos outros senhores e gentes d’armas que alli eram fossem pagadas
suas gajas e estados e solldo a cada hũu sem nẽhũua fauta que em ello ouvessem. (41.7).

Etimologia: do lat. *fallĭta (fem. de *fallitus ‘faltado’, por falsus, part. pas. de fallĕre).
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: VERT.
Obs.: MD-CF apresenta oito abonações em TROY, todas na locução sem/sen falta, além de
várias outras que data do século XV, como no Livro de Falcoaria do Emperador Enrique da
Alemanha, ou no Miragre de Santiago.
Antedatação face a Houaiss.

FAVORIZAR, s.f. (1) ‘favorecer’.


Segundo ouvistes em seu logar, el-rrei dom Fernando tiinha declarado por aquell que sse
chamava Clemente septimo, cuja parte favorizava el-rrei de França e el-rrei de Castella e
algũus outros senhores. (459.5).

Etimologia: de favor + -izar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL, VITA.
Obs.: Pelas obras em que ocorre será mais um dos termos a contribuir pata o enriquecimento
lexical com o vocabulário de Avis.
O substantivo está atestado no século XIV.

FELOSA, s.m. (1) ‘pequeno pássaro’.


em guisa que nẽhũua ave grande nem pequena se levantar podia, posto que fosse grou e
abetarda, ataa o pardall e pequena follosa, que ante que suas ligeiras penas a podessem
poer em salvo, primeiro era presa do seu contrairo: (5.55).

Etimologia: de origem obscura


Tipo de unidade: (?)
Atestações simultâneas: CESA.
128
Esta seria uma das máximas bíblicas conhecidas por Fernão Lopes, a ponto de a citar. No entanto, ou
houve um lapso no termo facho, ou ele, de facto, tem também na época o significado de ‘arado’, pois a passagem de
Isaías refere “Ele julgará as nações, e dará as suas leis a muitos povos, os quais das suas espadas forjarão relhas de
arados, e as suas lanças, foices. Uma nação não levantará a espada contra outra nação, e não se adestrarão mais a
guerra (Isaías 2:4). Passagem, aliás contrariada na própria bíblia em Joel “Proclamai isto entre as nações: Declarai a
guerra! (...) Forjai espadas das relhas dos vossos arados, e lanças das vossas foices. Mesmo o enfermo diga: Eu sou
guerreiro (JI 4:9-10).

91
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Houaiss tem averbadas as duas formas folosa e felosa, sendo que apenas apresenta
datação para esta última, indicando CF1 (a1899), ou seja, antes de 1899, mas sem localizar a
obra onde ocorre. A identificação de follosa como adjectivo, lematizado para foloso, por parte
de BLem é claramente erro informático.

FLECHA, s.f. (1) ‘seta’.


e eram as frechas tantas alli honde o corpo de Deus estava e pellos outros logares
d’arredor que temor grande os fazia d’alli partir. (521.75).

Etimologia: do fr. flèche. Segundo Houaiss, “a forma frecha é mais ant. e mais vulg. em
Portugal, mais tarde substituída pela forma erudita retomada do fr. flèche”.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: VERT, CESA.
Obs.: Houaiss data a forma flecha do século XV, apresentando na f. hist. a variante frecha. No
entanto, o VH-CPM, para a palavra frecha apresenta 8 atestações, todas do XV, e para a
variante flecha apresenta apenas 2 sob a forma frecha, sendo uma repetida, a de ZURC, e a
outra do séc. XIV, de TROI. No entanto, a passagem onde se encontra registada, mays tragiã
todos frechas et seetas de moytas maneyras, não coincide com a edição consultada, mays tragíã
todos saetas feytas de moytas maneyras. Aqui se verifica como a opção dos editores pode
alterar a datação de determinados termos.

FOLGADAMENTE, adv. (1) ‘de maneira folgada; largamente’.


de guisa que muito aginha foi feita hũua grande e espaçosa ponte, lastrada de terra e
d’area, tall per que folgadamente podiam hir a través seis homẽes a cavallo; (115.24).

Etimologia: de folgado + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LEAL, CAVA, FRAD.
Obs.: MD-CF apresenta ainda duas abonações de BOSC e uma da Cron1419 e BLem apenas
desta última.
O adjectivo está atestado no século XIII.

FORRAGEM, s.f. (1) ‘erva para alimentação do gado’.


Nos lugares honde pousavom, ao termo d’elles hiam aa forragem, fazendo gram dano em
paães e vinhos e gaados, (467.72).

Etimologia: do fr. fourrage.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: REIS, REIX, CESA.

FOUTO, adj. cf. AFOUTO

FRONTARIA, s.f. (16) ‘fortificação situada na fronteira’.


e seguindo seu caminho, passou pello rreino de Navarra e chegou a vista de Callaforra, na
frontaria de Castella, (59.64).

Outras ocorrências: 106.27; 117.67; 119.7; 121.66; 142.46; 169.11; 251.9; 427.8,
22; 431.74; 433.5; 467.61; 525.9, 17; 256.44.

92
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: de fronte + -aria.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: REIS, REIX.
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

FRONTEIRO, s.m. (28) ‘Capitão duma praça de guerra situada na fronteira’.


e el-rrei, veendo esto, leixou seus fronteiros n’aquella comarca e encaminhou pera
Tolledo, que ja tiinha sua voz d’elle; (86.34).

Outras ocorrências: 108.30; 119.1, 10; 123.13; 124.29; 125.1, 3; 126.32; 127.4, 16;
253.62; 326.45; 421.21; 423.22; 425.3, 6; 427.1; 428.33; 429.1,
3, 8; 463.4; 475.5, 7, 19; 477.1, 19.
Etimologia: de fronte + -eiro.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: REIX.
Obs.: Houaiss apresenta as duas classificações gramaticais, mas a data que apresenta é para o
adjectivo, não dando qualquer indicação para o substantivo, o que normalmente costuma
fazer129. A sua ocorrência parece ser, no entanto, posterior, pois apenas aparece registada com
dez abonações da CGE (MD-CF), donde nove como substantivo e uma como adjectivo, além
das várias ocorrências em obras já do XV. Faltará, assim, a indicação da primeira datação para o
substantivo em Houaiss, à semelhança do que acontece, por exemplo com, 1alvo, andar.
O substantivo está atestado no século XIII.

GANHA-DINHEIRO, s.m. (1) ‘trabalhador a quem se paga jornal (salário por um dia de
trabalho); jornaleiro’.
Nos logares hu sse costuma d’aver gaanhadinheiros, que sse escusar nom podem,
mandava leixar per numero certo os que ss’escusar nom podessem, (315.130).

Etimologia: de ganhar + dinheiro.


Tipo de unidade: composição.
Atestações simultâneas: CONT.
Obs.: Houaiss não apresenta data nem etimologia para esta palavra. O VH-CPM apresenta uma
abonação de CONT, do séc. XV. MD-CF apresenta ainda duas abonações de Constituições do
Bispado do Porto, de 1497.
O verbo está atestado no século XIII e o substantivo em 1269.

GALEOTA, s.f. (3) ‘pequena galé de até 20 remos’.


hũu d’aquelles cavalleiros que sse veherom de Castella pera el-rrei dom Fernando, o quall
se partio primeiro com seis gallees e duas galliotas aos quinze dias de junho, (137.12).

Outras ocorrências: 439.7; 441.68.


Etimologia: do it. galeotta. Segundo Houaiss, “para Nasc, orig. vern. dim. de galé”.
Tipo de unidade: importação (italianismo).
Atestações simultâneas: REIX.

129
Ponto 3.3.1.3 do detalhamento dos verbetes: “Quando o verbete apresentava classe dupla (por exemplo,
"adj.s.m.") e a datação correspondia a uma dessas classes apenas, fez-se o registro da data no seu campo próprio, mas
informou-se, dentro do campo da etimologia, a qual das classes a data correspondia”, s. v. divisor ou timor.

93
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Houaiss apresenta o século XIV, remetendo para o FichIVPM. Todavia, o que o VH-
CPM regista são apenas obras do século XV.

GASTAMENTO, s.m. (1) ‘gasto, despesa, dispêndio’.


Dous grandes malles rrecebeo o rreino por esta guerra que el-rrei dom Fernando com el-
rei dom Henrrique começou, de que os poboos depois teverom grande sentido: o primeiro,
gastamento em grande cantidade d’ouro e prata que antiigamente pellos rreis fora
entesourado, (187.6).

Etimologia: de gastar + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: VERT.
Obs.: BLem indica a sua ocorrência em LEAL, bem como MD-CF, de que apresenta três
abonações, e ainda uma do ChUniPort (vol. 3, 1400).
O verbo está atestado no século XIV.

GASTO, s.m. (1) ‘despesa, dispêndio’.


Dous grandes malles rrecebeo o rreino por esta guerra que el-rrei dom Fernando com el-
rrei dom Henrrique começou, de que os poboos depois teverom grande sentido: o primeiro,
gastamento em grande cantidade d’ouro e prata que antiigamente pellos rreis fora
entesourado, do quall, por aazo d’ella, foi a Aragom levada mui gram soma d’ouro, como
ja teendes ouvido; o segundo, isso meesmo foi gasto de muita multidom de prata por a
mudança das moedas que el-rrei fez por satisfazer aas grandes despesas dos solldos e
pagas das cousas necessarias aa guerra; (187.9).

Etimologia: part. dito irreg. de gastar (lat. vastō, ās, āre, āvī, ātum).
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX, LOPP, VITA.
Obs.: MD-CF apresenta ainda uma abonação de ChPortDuarte.

GOVERNANÇA, s.f. (4) ‘governação’.


moormente que pera tall governança compria d’aver pessoas que soubessem as
condiçoões dos poboos, (549.77).

Outras ocorrências: 550.87; 551.126; 602.26.


Etimologia: de governar + -ança.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, OFIC, LEAL, CAVA, CESA, REIX, VITA, TERS, VERT.
Obs.: Segundo BLem e MD-CF, também com registo em CP.
O verbo está atestado no século XIII.

GRANDIOSO, adj. (1) ‘extraordinário, que impressiona’.


El-rrei dom Fernando era grandioso de voontade e querençoso d’aquello que todollos
homẽes naturallmente desejam, (91.3).

Etimologia: do esp. grandioso (1599).


Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Atestações simultâneas: VERT.

94
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: AGC e JPM3 mantêm a data do século XVI, Houaiss antedata para o XV (cf. FichIVPM).
Quanto à data apresentada por Houaiss para a etimologia espanhola (1599), ela é tardia, apesar
da observação130. No CORDE é possível identificar este vocábulo numa poesia de Alfonso de
Villasandino (Cancionero de Baena), entre 1379 - a 1425: “Conde, non de los menores / mas
igual de los mayores, / por que los estorvadores / vean cómo es grandioso / el alto Rey
dadivoso / e virtuoso”.
BLem e MD-CF apresentam uma ocorrência da CGE.
Antedatação face a Houaiss.

GUIA, s.f. (2) ‘pessoa que guia, orienta outros’.


e elles alli, esteve a guia queda e disse contra o iffante: «Estas som as casas que vós
demandaaes». (370.40).

Outras ocorrências: 380.46.


Etimologia: regr. de guiar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: REIX, VITA, FRAD.
Obs.: O verbo está atestado no século XIII

IGNORANTE, adj. (1) ‘que não sabe’.


e nom como algũus autores ignorantes da verdade poserom em seus livros, (331.55).

Etimologia: do lat. ignōrans, āntis (part. pres. do v. lat. ignōrō, ās āre, āvī, ātum).
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: BENF, REIX, VERT, SEGR.
Obs.: Segundo BLem, também com registo em CP. JPM3 mantém o século XVII, com
indicação proveniente de RLor de que anteriormente se encontram as formas anarante (Gil
Vicente) e inhorante (Sá de Miranda).
O verbo ignorar, segundo Houaiss, apenas está datado em 1563 (HPint I 41), verificando-se,
assim, uma entrada na língua do adjectivo participial anterior ao verbo.

IMPETRAR, vb. (1) ‘pedir, implorar, rogar, suplicar’.


e lhe apresentarem rrotullos e soplicaçoões, impetrando d’elle graças na forma que sse
costuma demandar, (396.50).

Etimologia: do lat impĕtrō, ās, āre, āv ī, ātum.


Tipo de unidade: importação (latinismo)
Atestações simultâneas: BENF, REIX, VITA, SBER.
Obs.: Com ocorrências em outras obras como CP, segundo MD-CF e BLem, Virgeu de
consolaçon e ChPortDuarte, em MD-CF e 1454 Desc. Port., em RLor.

130
Cf. introdução a Houaiss, campo da datação, ponto 4.3.5 “Em casos isolados, haverá discrepância entre a
data apurada para um vocábulo português e aquela dicionarizada para o seu étimo numa língua estrangeira. Quando
tal coisa sucedeu, o campo da datação foi preenchido e, por vezes, fez-se a enumeração das formas históricas
documentadas, admitindo que o fato talvez se devesse a diferenças entre as fontes do português e as fontes da língua
estrangeira usadas para a determinação da etimologia:” e campo da etimologia, ponto 44.6: “Na etimologia de
vocábulos provenientes de outras línguas que não o latim e o grego, registra-se o étimo próximo em itálico, com
inserção, entre parênteses, em redondo, da data de sua primeira ocorrência na língua estrangeira (se a data se encontra
consignada nas fontes consultadas)”.

95
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

IMPOSSÍVEL, adj. (3) ‘que não tem possibilidade; irrealizável’.


posto que gram desejo d’esto ouvessem, hũua tall contradiçom que nẽhũu penssava seer
cousa pera acabar, posto que começada fosse, e quasi impossivell de seer. (308.29).

Outras ocorrências: 484.40,49.


Etimologia: do lat. impossĭbĭlis, e.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LEAL, REIX, VERT, SBER, FRAD.
Obs.: RLor apresenta ainda 1436 Desc. Port.

INDIGNAMENTE, adv. (1) ‘de forma não digna’.


rrequerido no começo d’esta guerra per el-rrei dom Henrrique que lhe desse tregoa, per
nẽhũua guisa lha quis outorgar, teendo que ell endinamente ocupava os rreinos de
Castella que per herança dereita conviinham aas filhas d’el-rrei dom Pedro seu irmaão,
(141.17).

Etimologia: de indigno + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: VERT.
Obs.: MD-CF e BLem registam também a sua ocorrência em CP e em LEAL.
O adjectivo está atestado no século XIV.

INTRÍNSECO, adj. (1) ‘inerente; peculiar’.


a primeira, porque aquello que em algũus he causa intrinseca das outras maneiras de
sandice he em estes causa de taaes amores: (220.41).

Etimologia: do lat. tar. intrinsĕcus, a, um.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX, SEGR, SBER.

ITÁLICO, adj. (9) ‘relativo ou pertencente à Itália antiga’.


Elle morto, ficarom em Rroma dezeseis cardeaaes, scilicet, doze ultramontanos e os outros
itallicos, aos quaaes perteencia o dereito de enleger; (386.31).

Outras ocorrências: 386.44; 387.51, 52, 53; 388.81;392.36; 395.20; 396.35.


Etimologia: do lat. ītălĭcus, a, um.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SBER, SEGR.
Obs.: BLem e MD-CF com indicação da forma Ytalica em CGE, como nomp.

JAQUE, s.m. (2) ‘espécie de saio militar’.


As armas mandou el-rrei mudar a esta guisa: do cambais mandou que fezessem jaque; e da
loriga, cota; e da capelina, barvuda com camalhom; e os que eram bem armados haviam
de teer barvuda com seu camalho e estofa e cota e jaque e coxotes e canelleiras franceses e
luvas e estoque e daga e grave. (305.58, 61).

Etimologia: do fr. ant. jaque. Segundo Houaiss, “a tradição lexicográfica costuma apontar
como orig. do fr. o esp. antigo jaque (mod. jaco) ‘4cota de malha de manga curta’ <

96
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ár. xaqq, étimos rejeitados no TLF [Trésor de la Langue Française], dic. em que se
diz que o fr. é que foi o idioma irradiador do voc. para as outras línguas românicas;
s.v. jaque, Corominas não registra a acp. jaco; afirma apenas que na acp. aragonesa
‘cada uma das duas bolsas dos alforjes’, o voc. tem uma var. jeque ‘id.’ que
provém do ár. xiqq ‘metade de uma coisa, parte de um todo’, der. do v. ár. xaqq
‘rachar, dividir’; segundo o autor, o subst. ár. xaqq ‘entre pernas’, der. da mesma
raiz, tem tb. o sentido nuclear de ‘divisão em duas partes’ ”131.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: CESA.
Obs.: Viterbo refere que na “Na Baixa Latinidade se disse Jacke, ou Jacque”132.

LADEIRA, s.f. (1) ‘inclinação de terreno; encosta de montanha’.


e hindo assi cuidando, oolhou por deante pello caminho contra hũuas aldeas altas que
ssom acerca de Villa Boim, e vio nas ladeiras a carriagem e homẽes de pee que hiam
hordenados como compria; (430.35).

Etimologia: fem. substv. de ladeiro.


Tipo de unidade: derivação imprópria.
Atestações simultâneas: LEAL, COND.
Obs.: O adjectivo está atestado no século XIV133.

LANÇADOR [lançador a tavolado], s.m. (1) ‘praticante de exercício militar antigo que
consistia em lançar por terra um castelo de madeira com tiros de arremesso’.134
Era cavallgante e torneador, grande justador e lançador a tavollado; (3.16).

Etimologia: rad. do part. lançado + -or.


Tipo de unidade: derivação sfixação.
Atestações simultâneas: CAVA.
Obs.: JPM não regista este vocábulo e AGC propõe no suplemento à segunda edição, para a
forma lançador, a data de 1634 (MNor 52.16). Por sua vez, Houaiss antedata AGC (1597 cf.
DioD5), mas ainda em data muito posterior a LOPF. RLor, a propósito da entrada tavolado, na
correcção a JPM, apresenta a seguinte abonação da Cronica Troiana: “bufurdando et lançando a
trauado” (II. 242.13), o que vem provar tal prática muito antes de LOPF. Assim, será de crer
que a designação do executante de tal exercício, o lançador, não seja apenas criação na época de
Avis, mas sim de registo mais antigo. BLem e MD-CF apresentam, por exemplo, a forma
allançador, com atestação na CGE. Por outras palavras, se o verbo lançar está atestado no
século XIII, e na língua dessa altura já se verificava, embora em menor quantidade, a formação
de palavras derivadas por sufixação, nada garante que este derivado não fosse de utilização oral
corrente, muito anterior, em redor desta temática.
O VH-CPM apresenta esta palavra com uma abonação trocada de LOPP em vez de LOPF.135
O verbo está atestado no século XIII.

131
Em CF2 encontramos “de Jacoh, n. p., segundo Körting”.
132
Cf. Viterbo, s.v. jaqueta.
133
Houaiss e AGC apenas apresentam o século. BLem indica apenas obra, CGE. A localização completa
encontra-se em RLor, que corrige JPM: “«e guyouhos muy bem o pastor per hũa costa ladeira» Cr.1344 (281aV)”.
134
Cf. Morais4, s.v. tavolado.
135
Cf. p. 35, alínea E).

97
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

LANÇAMENTO, s.m. (1) ‘entrada’.


Outros afirmam este lançamento do conde dom Fernando dentro na villa muito pello
contrairo, (112.48).

Etimologia: de lançar + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: SEGR, SBER.
Obs.: MD-CF com indicação de atestação também em VITA.
O verbo está atestado no século XIII.

LAVRAMENTO, s.m. (1) ‘cunhagem de moeda’.


e per tall lavramento gaanhava el-rrei em cada marco de prata quatro livras e quatorze
solldos, e d’aqui pagavom os custos. (189.58).

Etimologia: de lavrar + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: VERT136.
Obs.: O verbo lavrar está atestado em 1209.
MD-CF não regista a abonação de LEAL, mas apresenta uma abonação de Gomes:Vitoria14
(Mosteiro de Santa Maria da Vitória no século XV).
O verbo está atestado no século XIII.

LEGÍTIMO, adj. (5) ‘concebido no matrimónio; lídimo, verdadeiro’.


que pois el-rrei dom Pedro era morto, que el ficava erdeiro nos rreinos de Castella e de
Leom, ca era bisneto legitimo d’el-rrei dom Sancho de Castella, (101.22).

Outras ocorrências: 210.46; 549.57; 554.41; 611.23.


Etimologia: do lat. lēgĭtĭmus, a, um.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, REIX, LOPP, SOLI, FRAD.
Obs.: Houaiss não leva em consideração a proposta de AGC, do século XIII, nem a correcção
apresentada por RLor a JPM3 (sem indicação), do século XVI para o XIII em Foro Real,
abonação também constante em BLem. Segundo MD-CF, também atestado em Primeira
Partida e Terceira Partida de Afonso X e ChUniPort (vol. 1, 1300).

LIGA, s.f. (6) ‘aliança, pacto, ligação’.


e lhe rrequerio que pollo gram divedo de linhagem que antre as casas d’Ingraterra e de
Castella ouverom em hũu, desi pollas ligas e amizades que com o dito rrei meu senhor e
comigo tiinha feitas, o quisesse ajudar a cobrar seu rreino e senhorio. (28.34).

Outras ocorrências: 238.45; 297.17; 298.26; 344.38; 409.15.


Etimologia: regr. de ligar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: LOPP.

136
O VH-CPM, além da abonação de LOPF, apresenta uma outra como sendo de LEAL, o que na verdade
corresponde a VERT, com o significado de ‘bordar’: “E trabalharssea dauer muy fremosos lençõoes bem largos e
bem obrados de lauramento [...].”.Cf. p. 35, alínea E).

98
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Em BLem todas as ocorrências lematizadas para o verbo ligar, com indicação da
possibilidade de vb/nomc.
O verbo está atestado no século XIII.

MAÇAR, vb. (1) ‘golpear, dar pancada com maça ou maço’.


ca o corpo era bem armado de hũuas assaz cortes solhas, de guisa que os golpes maçavom
o corpo e nẽhũu damno faziam na carne: (485.60).

Etimologia: de maça + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, COND.
Obs.: JPM3 apresenta uma abonação de REIS “«… (…) e outros tomauão della & tostauanna e
maçauanna & bebiaõ della…», Reis5, p. 99”. BLem e MD-CF com indicação de atestação em
CGE (maçou).
O substantivo está atestado no século XIV.

MANADA, s.f. (1) ‘rebanho de gado, especialmente bovino, cavalar ou muar’.


e como forom em seu poder, trautavom-nas de tall guisa que hũu levava depois viinte e
trinta ante ssi, como manada de mansso gaado. (457.62).

Etimologia: Para Houaiss “de orig. contrv.; do esp. manada, segundo Corominas, der. de mano
'mão' (< lat. mănŭs, ūs) + suf. -ada, orign. 'o que cabe na mão, punhado', depois
'ajuntamento, grupo, conjunto de pessoas ou animais reunidos' e, com restrição de
sentido, 'ajuntamento de animais, esp. gado'; na tradição de Leite de Vasconcelos,
propõe-se tb. o lat. medv. *manuata, fem. substv. de mănŭātus, a, um, part. pas. de
mănŭāri 'rapinar, roubar', der. do lat. mănŭs, ūs 'mão'”.
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Atestações simultâneas: FRAD, SBER, VERT, CONT.
Obs.: Houaiss data esta palavra do século XV (cf. FichIVPM). BLem apresenta uma abonação
da CGE, também referida por MD-CF, que acrescenta ainda VITA e ELOY. RLor, no entanto,
antedata o século XVI proposto por JPM para 1222 “(trad.) «ao da manada das ovelhas quatro
quarneiros e da manada das vaquas huma vaqua» (Leges 590); 1223 (trad.) «da manada das
ovelhas… da manada da uacas» (id. 596)”.

MARÉ, s.f. (1) ‘movimento periódico das águas do mar’.


mas taaes avia hi dos mareantes que eram muito contrairos a esto, dizendo que as gallees
per esta guisa hiam em muito gram periigo, porque quando vehesse a jusante da maree
lança-llas-hia em poder da frota de Portugall, (143.20).

Etimologia: do fr. marée.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: LEAL.
Obs.: Houaiss, que apresenta o século XV (cf. FichIVPM), não leva em consideração a data de
AGC de maree XIV, nem a de JPM3 que apresenta uma abonação de 1377 “«se ujerem quatro
ou çinquo baixees de hũũa maree», Desc., I, S., p. 53”, sem fazer qualquer referência a RLor,
que corrige o século XVI apresentado na primeira edição. BLem apresenta ainda a indicação de
ocorrência em CP.
O VH-CPM não indica a abonação de LOPF.

99
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

MEDIANEIRO, s.m. (1) ‘mediador’.


vos rrogamos e rrequirimos da parte de Deus e do martir Sam Jorge que sse vos praz que
nós sejamos boom medianeiro antre o dito rrei dom Pedro e vós, que no-llo façaaes saber,
(29.48).

Etimologia: de mediano + -eiro.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, REIX, FRAD, VERT.
Obs.: Houaiss data esta palavra, como adj.s.m., do século XV (cf. FichIVPM), com indicação
de que a datação é para o adjectivo. No entanto, JPM3 apresenta já o século XIV, indicando a
proposta de RLor: “«ou rrazõ medianeyra ontre os omẽs», versão galega da General História,
260,33”. Para o substantivo, RLor apresenta ainda uma abonação de VITA.
Para o adjectivo mediano, está registado o século XVII em JPM3, que RLor não corrige137, o XV
em AGC e Houaiss e, segundo MD-CF, o XIV, com várias abonações da GenEst.
O adjectivo está atestado no século XV.

MINGUADAMENTE, adv. (1) ‘de modo minguado; escassamente’.


e depois a leixou, e viveo mingoadamente, morrendo mui afastada do que a sua honrra
perteecia. (186.42).

Etimologia: de minguado + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: SEGR.
Obs.: O adjectivo está atestado no século XIII.

MONSTRO, s.m. (1) ‘qualquer ser ou coisa contrária à natureza; anomalia’.


e d’esta guisa, por nossos peccados, foi estonce o corpo mistico da Egreja feito com duas
cabeças, assi como corpo monstruu, que era fea cousa de veer. (411.71).

Etimologia: do lat. monstrum, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: CESA.
Obs.: Para JPM3 do século XVI, sem correcção de RLor, com abonação d’ Os Lusíadas
“«…olha o assento / De Pegu, que já môstros pouoaram, / Mõstros filhos do feo ajuntamento /
Dhũa mulher & e um cão», Lus., X, 122”

MORGADO, s.m. (1) ‘bens vinculados em certos sucessores de uma família, a quem vão
passando sem se poderem vender ou dividir’.
Joham Lourenço da Cunha, filho de Martim Lourenço da Cunha, senhor do moorgado de
Poombeiro. (198.23).

Etimologia: do lat. medv. maioricātus (der. do lat. mājor/maior, ōris ‘mais velho’).
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LOPP.

137
RLor apresenta antedatação a JPM para medianeiro com uma abonação de GenEst, mas não para mediano,
com várias ocorrências nesta mesma obra, segundo MD-CF.

100
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: JPM3 apresenta uma datação anterior para a forma maiorgado, em 1317: “«E assi deuent
herdar o dicto feu, per maneyra de mayorgado…», em Desc., I, p. 28), forma histórica que
Houaiss não tem em consideração. BLem apresenta também a indicação de registo em CP.
Para Kremer 1397.

MOSTRANÇA, s.f. (3) ‘mostra, aparência’.


e todos lhe conselharom que todavia posesse a batalha, ca sse soomente fezesse mostrança
e possese duvida em nom querer pellejar, que os mais do rreino se partiriam d’elle e se
hiriam pera el-rrei dom Pedro, (23.64).

Outras ocorrências: 400.33; 443.4.


Etimologia: de mostrar + -ança.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: OFIC, LEAL, CAVA, REIX, VERT, SEGR.
Obs.: Sem registo em Houaiss. Segundo MD-CF, também atestado em VITA, com a forma
mostrança e em ChPortDuarte com plural mostranças. JPM3 apresenta uma abonação de 1426
(Desc., I, S., p.107) “«com mostranças fingidiças e non uerdadeiras»”, sem fazer qualquer
referência a RLor, que a acrescentou à sua primeira edição.
O verbo está atestado no século XIII.

MUDA, s.f. (1) ‘o processo de troca parcial ou total da plumagem’.


ca ell mandava chamar todos seus monteiros, no tempo pera ello perteencente, e nom sse
partiam de sua casa ataa que os falcoões sahiam da muda, (4.40).

Etimologia: regr. de mudar.


Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: CITR.
Obs.: Relativamente a CITR, a informação mais generalizada é que é um texto do século XV
conservado em um manuscrito do século XVI. MD-CF apresenta também uma abonação de
Livro de Falcoaria do Emperador Enrique da Alemanha.
O verbo está atestado em 1262.

MULTIPLICAÇÃO, s.f. (1) ‘acto ou efeito de multiplicar’.


e davam-lhe por ella viinte e sete livras, que eram viinte e sete barvudas, nom parando
mentes aa fraqueza da moeda mas aa multiplicaçom das livras. (190.98).

Etimologia: do lat. multĭplĭcātio, ōnis.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: REIX, SEGR, VERT, FRAD.

NEBRI, adj. (1) ‘espécie de falcão usado em altanaria’.


Quando mandava fora da terra por aves, nom lhe tragiam menos de cinquoenta antre
açores e falcoões nevris e girofalcos, todos primas. (4.48).

Etimologia: prov. esp. neblí. Segundo Houaiss, para “Corominas, prov. alt. de *niblo, pal. irmã
do it. nibbio 'milhafre' < lat.vulg. nibŭlus < *milvŭlus, dim. de milvus 'id.'; o
vocábulo alterou-se na Espanha muçulmana por haver sido popularmente
relacionado com o nome da cidade de Niebla”.

101
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Tipo de unidade: importação (castelhanismo).


Atestações simultâneas: CITR.

OBJECTO, s.m. (2) ‘tudo o que é perceptível por qualquer dos sentidos’.
he tam doente em taaes homẽes que nom julga o ogeito da cousa que vee tall quall elle he
mas tall quall a elle parece; ca ell jullga a ffea por fremosa, e aquella que traz damno seer
a elle proveitosa; e portanto todo juizo da rrazom he sovertido acerca de tall ogeito,
(220.45, 48).

Etimologia: do lat. objectŭs, ūs.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: BENF.
Obs.: Também atestado em VITA, segundo MD-CF.

PASSEAR, vb. (2) ‘andar a passo, mover-se devagar’.


E andando-sse Joham Fernandez passeando pella camara com aquell veeo na maão, ficou-
sse em joelhos ante ella, (488.32).

Outras ocorrências: 571.23.


Etimologia: de passo + -ear.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LOPP, CAVA.
Obs.: O substantivo está atestado em 1008138.

PASTA, s.m. (1) ‘porção de matéria sólida aglutinada’.


e que levou dezooito quintaaes d’ouro em pasta pera dar a el-rrei d’Aragom por este
casamento, (157.20).

Outras ocorrências: 162.36.


Etimologia: do lat. pāsta, ae.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LEAL.
Obs.: BLem, para a forma pastas, apresenta ainda uma ocorrência em CAVA, o que se veio a
verificar uma troca do ‘a’ pelo ‘o’: “O primeiro, temor das penas do inferno e das leix presentes
postas per os senhores ou per aquelles que sobre nos teem poder e regimento” (Piel 1986:93).

PEDINTE, s.m. (2) ‘aquele que pede’.


e segundo ainda dito dos santos mais justa cousa he castigar o pedinte sem necessidade
que lhe dar esmolla, (314.84, 109).

Outras ocorrências: 314.109.


Etimologia: de pedir + -nte.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, SEGR.
Obs.: O verbo está atestado em 1152.

138
Houaiss indica, indevidamente, a data a partir de JPM3, uma vez que este não faz qualquer referência à
correcção que RLor lhe faz, pois a datação da primeira edição era de 1084 (RLor 1968:272).

102
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

PEJADO, adj. vb. (1) ‘que tem a capacidade completa; repleto, pesado’.
Em esto encherom-sse as gallees de Castella de tantos homẽes que as faziam mais de
pejadas que de ligeiras, e começarom de rremar contra as naaos e gallees dos portugueses.
(262.53)

Etimologia: part. de pejar (de peia).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: CAVA.
Obs.: Com o significado primitivo de peia, no sentido de tal situação provocar ‘embaraço,
impedimento, empecilho’.
O substantivo está atestado em 1111.

POIMENTO, s.m. (1) ‘acção de pôr ou depositar’.


efoi-sse pera elle, de que foi bem rrecebido e dos senhores da corte, e pôs-lhe el-rrei
grande poymento de dinheiros e deu-lhe terras e fortellezas, (384.36).

Etimologia: de poêr + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: LOPP, SEGR.
Obs.: Primeira atestação em LOPP, segundo RLor. Com registo em CF.
O verbo está atestado no século XIII.

POLÍCIA, s.m. (1) ‘cultura, civilização.139


E feito hũu dia juntamente de todos pera ouviir porque eram chamados, propôs hũu por
sua parte dizendo que antre todallas obras da pollicia e rregimento do mundo nom fora
achada nẽhũua arte melhor nem mais proveitosa pera mantiimento e vida dos homẽes que
era a agricultura. (311.17)

Etimologia: do lat. pŏlītīa, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: BENF, VERT.
Obs.: Termo utilizado na verdadeira acepção do grego politeía, as.

POTÊNCIA, s.f. (1) ‘faculdade; virtude’.


porque a virtude extimativa, que he emperatriz das outras potencias da alma acerca das
cousas senssivees, he tam doente em taaes homẽes que nom julga o ogeito da cousa que vee
tall quall elle he mas tall quall a elle parece; (220.43).

Etimologia: do lat. pŏtentĭa, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LEAL, FRAD, TERS, SEGR.
Obs.: Em MD-CF também com indicação de VITA.

139
Segundo Morais: “cultura, perfeiçoamento de nação culta, e politica, ou polida, nas obras de mecanica, no
saber, artes liberais, racionais, no governo, e administração interna da Republica, principalmente no que respeita ás
comodidades, i.é, limpeza, aceyo; fartura de viveres, e vestiaria; e á segurança dos Cidadãos”. Veja-se ainda o
seguinte verso d’ Os Lusíadas: “Na polícia da vossa Europa rica” (VII.12.8).

103
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

PRASMADO, adj. vb. (5) ‘censurado admirado’.


a estes assiinadamente mostrava el-rrei grandes gasalhados e partia com elles muito
graadamente, entanto que era prasmado d’os de sua terra, (93.12).

Outras ocorrências: 120.50; 254.107; 534.41, 596.88-89.


Etimologia: part. de prasmar (do cast. blasmar).
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Atestações simultâneas: OFIC, LEAL, CAVA, COND, REIX.
Obs.: Cf. nota sobre o significado de PRASMAR.

PRASMAR, vb. (4) ‘censurar, acusar’140.


tall que nẽhũua por estonce era a ella semelhavell em bem parecer e dulcidom de falla,
sofrendo-nos porém de a prasmar d’algũuas cousas em que nom onesto e muy solltamente
fallarom. (227.9)

Outras ocorrências: 230.79; 255.113; 443.11.


Etimologia: segundo CF25 do cast. blasmar (do lat. blasphēmō, ās, āre, -, -).
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, CAVA, OFIC, LOPP, VERT.
Obs.: Ainda sem registo no CIPM.

PRASMO, s.m. (2) ‘censura, acusação’.141


«Senhor, bem vos diz minha senhora, rrecebe-a vós, pois aqui estaaes, ca vos nom he
prasmo nẽhũu: (358.110).

Outras ocorrências: 363.70.


Etimologia: regr. de prasmar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: BENF, CAVA, OFIC, LEAL, REIX, LOPP, VERT.
Obs.: O verbo está atestado em 1344.

PRECATAR, vb. (1) ‘acautelar(-se), prevenir(-se)’.


que por covardo encaminhamento lhe faziam entender que sse non triguasse a poer
batalha, ca onde sse nom percatasse, toda Castella lhe obedeeceria; (121.58);

Etimologia: segundo Houaiss, de origem obscura. AGC e JM acreditam estar relacionado a


precaver, já Nascentes relaciona ao espanhol percatar ‘advertir, considerar’, com
troca de prefixo (per por pre). Este verbo espanhol, composto de per + catar,
segundo o Diccionario de la Lengua Española, apresenta, no entanto, significados
mais próximos do contexto de LOPF do que os apresentados, como ‘advertir,
considerar, cuidar’ e ‘darse cuenta clara de algo, tomar conciencia de ello’.
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Atestações simultâneas: ESOP.

140
Segundo Morais: “reprehender de algum vício, ou acção malfeita” e Viterbo: “vituperar, arguir, estranhar,
criticar, repreheder, abominar”.
141
Segundo Morais: “censura, repreensão, nota” e Viterbo: “nota, mancha, culpa, defeito, censura, vituperio”.

104
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: A propósito do Livro do Esopo, Ivo Castro refere que Leite de Vasconcelos, “observa que
o manuscrito, sendo paleograficamente datável do século XV, apresenta alguns arcaísmos de
linguagem que levam a supor seja cópia de uma tradução mais antiga (século XIV)”142.
Ainda sem registo no CIPM.

PRINCESA, s.f. (1) ‘mulher de príncipe’.


El-rrei dom Pedro, mui ledo da rreposta, foi entanto veer a princesa sua molher em hũua
villa que dizem Guchesma, (17.12).

Etimologia: do fr. princesse.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Atestações simultâneas: BENF, VERT143.
Obs.: Pelas obras em que está atestado, e mesmo pela etimologia, é tentador considerar-se este
termo mais próximo do francês do que do latim. Atribuir-lhe, no entanto, a certeza de ser
através da tradução para português do Le Livre de Trois Vertus de Christine de Pizan que entra
na língua é algo mais difícil de sustentar. A possível proximidade da versão para português e
mesmo da relação entre estas144, dificulta a tarefa. Se para a Vertuosa Benfeytoria, Adelino
Calado (1994:XX, XXXVIII, XL) situa a sua feitura entre 1418-1425, como mais provável
1429145, Mª de Lourdes Crispim, que elabora esta edição crítica das Tres Vertudes, apresenta
algumas hipóteses mais conjecturais (p. 35), sobre esta tradução, de qualquer forma posteriores.
Em uma delas figura a possibilidade de não ter ocorrido em Portugal, mas sim na corte de
Borgonha entre 1430-1455 e enviada, posteriormente, à corte portuguesa (p.33). Não querendo
fazer depender, exclusivamente, informações lexicais como um caminho a ter em conta na
possível datação de textos medievais, neste caso até forçado, o facto é que tais elementos podem
revelar-se um contributo importante. Uma coisa é certa, existe um número razoável de palavras
que apenas ocorre, por exemplo em CESA e VERT que não deverão deixar de ser levados em
conta no enriquecimento, directo, do léxico do português.

PROSSEGUIMENTO, s.m. (2) acto de prosseguir’.


Desi trabalhou logo d’encaminhar com os fidallgos que maneira aviam de teer no
proseguimento da guerra e por que preço cada hũu, (169.17).

Outras ocorrências: 177.13.


Etimologia: de prosseguir + -mento.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, OFIC.
Obs.: O verbo está atestado no século XIV.

QUERENÇOSO, adj. (3) ‘que sente afecto, amor; afectuoso, amoroso’.


El-rrei dom Fernando era grandioso de voontade e querençoso d’aquello que todollos
homẽes naturallmente desejam, que he acrecentamento de sua boa fama e honrroso estado:
(91.3-4).

142
Cf. Tavani 1993: 408, s.v. Livro do Esopo.
143
Podem ainda ser encontradas mais duas ocorrências em História dos Reis de Portugal in Crónica Geral de
Espanha de 1344, segundo MF-CF.
144
Cf. Tavani 1993: 683.
145
Em MF-CF as datas apresentadas são de 1430-1443.

105
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Outras ocorrências: 348.54; 351.3.


Etimologia: de querença + -oso.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF.
Obs.: Houaiss (tal como RLor) apresenta a Crónica de D. Pedro I, de Lopes, como primeira
datação (cf. FLCron). O VH-CPM apresenta uma abonação de BENF que ainda não consegui
localizar.
O substantivo está atestado no século XIII.

RATIFICAR, vb. (2) ‘confirmar, validar’.


e el-rrei dom Pedro mandou outra vez Joham de Cayom seu alcaide-moor que chegasse a
el-rrei dom Fernando e lhe rrequerisse que rratificasse outra vez a amizade que feita
aviam; (47.52-53)

Outras ocorrências: 401.68


Etimologia: do lat. medv. ratificare.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD.
Obs.: Houaiss não leva em consideração a antedatação de 1409, indicada em JPM3, proposta
por RLor, com a variante retificar “«delle Retificar o dicto testemoyo» (Ferreiro VII, 32.5)”.
Eventualmente, o excerto é curto para deduzir o significado preciso146, ficando a hipótese de ter
considerado esta uma variante do verbo re(c)tificar. Tal hipótese não se vem a confirmar, uma
vez que o data do século XV, remetendo para o FichIVPM147. O substantivo ratificação tem
ocorrência anterior, em REIX.

RECLAMAR, vb. (1) ‘opor-se por meio de palavras; queixar-se’.


presente a rrainha dona Johana e outros muitos que dizer nom curamos, rreclamou os
esposoiros e casamento que avia feito com o conde, (336.34-35).

Etimologia: do lat. rĕclāmo, ās, āre, āvī, atum.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD.
Obs.: A datação para este verbo é posterior ao seu derivado nominal reclamação, com datação
proposta por RLor para 1409.

REGUARDA, s.m. (2) ‘retaguarda’.


sem mais deteença se foi rrijamente à rreguarda, onde viinha Gonçallo Vaasquez
d’Azevedo, e deu-lhe aquellas meesmas novas; (431.56).

Outras ocorrências: 532.26.


Etimologia: do it. retroguardia.
Tipo de unidade: importação (italianismo).
Atestações simultâneas: REIX, COND.
Obs.: Em Houaiss é possível verificar, na entrada retaguarda, a indicação “registram-se as f.
reguarda e retroguarda no sXV”. No Elucidário, podemos encontrar a seguinte explicação: “era
o que hoje dizemos Retaguarsa, que he o ultimo esquadrão na batalha. Nella costumavão pôr os
146
Veja-se, a este propósito, a observação de Mateus (2010:98, III vol., nota 2)
147
No VH-CPM apenas ocorre uma abonação de REIX.

106
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

soldados, de quem se fazia menos confidencia. Entre os grandes Privilegios que ElRei D. Diniz
concedeo aos Cavalleiros da Villa de Aljazur no Alemtejo foi, que nunca na Oste tivessem o
lugar da Reguarda, por ser o menos perigoso.”

REPARTIR, vb. (6) ‘dividir(-se) em partes, separar’.


e por o gram pesar que el-rrei d’esto ouve, se partio assi e se foi pera a villa de Touro; e
d’alli rrepartio suas gentes aa frontaria de Graada, (117.66).

Outras ocorrências: 143.14; 195.71; 320.36; 327.64; 430.23.


Etimologia: de re- + partir.
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Atestações simultâneas: OFIC, LEAL, REIX, COND, LOPP, FRAD, VERT.
Obs.: O verbo está atestado no século XIII.

REPOSTEIRO-MOR, s.m. (1) ‘fidalgo que serve um rei, rainha, ou pessoa nobre, em seus
aposentos’
E sse alguem disser quem husava ante das cousas que a estes cavalleirosos officios
perteence, dizee-lhe que fazia todo o alferez-moor; e o officio que agora he do camareiro-
moor suhia de seer do rreposteiro-moor. (524.42).

Etimologia: do lat. *repositarius.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LOPP.
Obs.: O VH-CPM apresenta, em entrada separada, reposteiro, com abonações de REIX e 1365
CAMP. O mesmo se verifica em Houaiss, com datação de 1320 (cf. RLor) e com três acepções:
1 cortinado que serve para substituir ou dissimular uma porta; 2 pano ou peça de estofo que, a
modo de cortina, cobre as portas interiores dos palácios, de casas, igrejas etc. 3 (1552) criado do
paço a quem compete cerrar os reposteiros”. Confrontando o significado da terceira acepção
com aquele que apresenta para a entrada reposteiro-mor (‘fidalgo que, nas grandes solenidades,
descobria a cadeira dos soberanos e colocava almofadas para que eles se ajoelhassem’), sem
datação, parecem ser muito restritos, tendo em conta a própria justificação textual de Lopes.

REPOUSAR, vb. (1) ‘descansar’.


e chegou el-rrei a hũa villa do iffante dom Pedro que dizem Arrens, e alli esteve dous dias
rrepousando; (59.52)

Etimologia: do lat. rĕpausō, ās, āre, -, -.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: LEAL, OFIC, COND, TERS, VERT.
Obs.: Ainda sem registo no CIMP.

REQUESTA, s.m. (8) ‘querela, briga, contenda’.


eu nom errei em me armar contra vós, salvo contra el-rrei dom Pedro, cuja he a rrequesta
d’esta batalha». (38.38).

Outras ocorrências: 434.27,44; 435.1; 437.1; 438.42,49,52.


Etimologia: regr. de requestar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.

107
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Atestações simultâneas: COND, VERT.


Obs.: O verbo está atestado no século XV.

REQUESTAR, vb. (4) ‘procurar, buscar, granjear’.


Como Nun’Allvarez mandou rrequestar Joham d’Azores, filho do meestre de Santiago, e a
rrazom por que sse demoveo (433.1).

Outras ocorrências: 433.16,22; 437.22.


Etimologia: do lat. vulg. *requaesitāre. Segundo Houaiss, “v. freq. do lat. vulg. requaerere ou
do lat. cl. rĕquīro, īs, ĕre, quīsīvī, quīsītum, ‘buscar, procurar, por muito tempo’ ”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: OFIC, COND.
Obs.: Ainda sem registo no CIMP.

RIA, s.m. (1) ‘canal ou braço do mar’.


e rremarom pera a outra parte d’aalem contra Rribatejo e meterom-sse em certas rrias que
hi há, onde nom podiam rreceber nojo ainda que as gallees dos emmiigos as seguir
quiseram. (263.60).

Etimologia: do esp. ria (1495).


Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Obs.: O VH-CPM apenas apresenta uma abonação de LOPF, mas Houaiss apresenta a data de
1416 (cf. Desc), provavelmente de RLor, que corrige o séc. XVII apresentado por JPM, segundo
Morais.
Quanto à data apresentada por Houaiss para a etimologia espanhola (1495), ela é tardia. No
CORDE é possível identificar este vocábulo na Crónica de veinte Reyes, no ano de 1325: “e el
rio dende que es fuerte e peligroso, e si se non adobasen esta, puede que seria grant dapño de
toda esa ria e grant peligro de aquellos que por ende pasasen”.

ROMPIMENTO, s.m. (1) ‘abertura’.


e fezerom a pressa correger mui bem aquell rrompimento do muro, porque em outro dia
esperavom semelhante e muito moor combato, (66.44).

Etimologia: de romper + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: CAVA, REIX, FRAD.
Obs.: O verbo está atestado em 989.

RÓTULO, s.m. (1) ‘rolo de pergaminho em que se escrevia’.


E sse o por medo enlegerom e nom aviam por verdadeiro papa, quem os costrangeo a
gaanhar d’elle graças e beneficios pera ssi e pera seus servidores e amigos, e lhe
apresentarem rotullos e soplicaçoões, impetrando d’elle graças na forma que sse costuma
demandar, (396.49).

Etimologia: do lat. rŏtŭlus, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SEGR.

108
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

SAGEZA, s.f. (1) ‘sabedoria, prudência’.


Este conde dom Joham Affonsso que dissemos era estonce o moor privado que el-rrei dom
Fernando avia e de que moores cousas fiava por sua discriçom e sajeza, e seeria de hidade
de saseenta anos. (165.5).

Etimologia: de sage + -eza.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: SBER, VERT.
Obs.: O adjectivo está atestado no século XIII.

SACRISTIA, s.f. (1) ‘asa anexa a uma igreja’.


Os seus, quando virom que el esto mandava fazer aos frades, quiserom rroubar a
sancristia, (266.45).

Etimologia: do lat. medv. sacristia, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: SINA.
Obs.: Houaiss apresenta uma entrada mais antiga sancristia (XV cf. FichIVPM) remetendo para
sacristia, com data, em itálico, de 1651, sem qualquer remissaõ à anterior. Seria pertinente,
pois, a informação da f. hist. do século XV sancristia.

SEGUIMENTO, s.m. (1) ‘consequência, resultado; continuação’.


E pois elle e el-rrei dom Henrrique eram na Espanha dous fiees defenssores da ffe, que
nom quisessem tam a meude arder em guerra, por seguimento de nom justas voontades,
(284.23).

Etimologia: seguir + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, CAVA, SEGR.
Obs.: O verbo está atestado no século XIII.

SEM-RAZÃO, s.f. (5) ‘injustiça, injúria, afronta, ultraje’.


e que, pois elle era theudo de manteer seus poboos em dereito e justiça, que rrecebendo
elles damno e semrrazom, e ell hi nom tornasse, que daria a Deus d’ello grave conta.
(8.156).

Outras ocorrências: 9.184; 326.29-30; 465.18; 518.29.


Etimologia: de sem + razão.
Tipo de unidade: composição.
Atestações simultâneas: REIX.
Obs.: Apenas com registo anterior em REIX, o que do ponto de vista também lexical, reforça a
atribuição de autoria desta crónica a Fernão Lopes.
A preposição e o substantivo estão atestados no século XIII.

SERVENTIA, s.f. (1) ‘trabalho de servente, serviço’.


e alli faziam audiencia a todollos que andavom servindo que demandados eram por
quaaesquer cousas, por nom seerem torvados da serventia. (309.74).

Etimologia: de servente + -ia.

109
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Tipo de unidade: derivação sufixal.


Atestações simultâneas: Desc.
Obs.: Houaiss apresenta o século XV remetendo para o FichIVPM. O IV-PMV não regista,
porém, esta palavra148, apesar de ter registo em AGC e Houaiss e este remeter para o FichIVPM.
AGC, à semelhança de Houaiss, apenas apresenta o século. Só RLor apresenta a data e a
abonação com identificação da obra, informação aproveitada por JPM3: “1422 «…eram
seruemtias», em Desc., I, S., p. 101; em 1427: «…os lavradores desse termo ham tantas
persseguiçooes com cepta e ssysas e seruintijas pera as torres», idem, p. 479”. MD-CF
apresenta ainda ocorrências em ChPortDuarte, Foraes149.

SOLENIZAR, vb. (1) ‘comemorar ou celebrar publicamente; tornar solene’.


Mas que ora, em cima de seus dias, posto atras seu desprezamento do mundo que ante
mostrava, aceptara a enliçom que lhe fora feita, seendo coroado e sollemnizado por papa
como nom devia, querendo seguir a vãagloria do mundo, sem curando da saude de sua
alma nem do poboo cristaão: (392.45).

Etimologia: de solene + -izar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: FRAD.
Obs.: Para RLor, 1448 em CDGH150.
Ainda sem registo no CIMP.
O substantivo está atestado no século XIV.

TARI, adj. (1) ‘tipo de freio que faria parte do arreio a ginete’.
e pagavom de solldo ao de cavallo tari com faca armado aa guisa, trinta solldos por dia,
(119.17).

Etimologia: (?)
Tipo de unidade: (?)
Atestações simultâneas: CAVA.
Obs.: Apenas registado em CF, com esta abonação de LOPF, mas sem significado.

TREMOÇO, s.m. (1) ‘grão de tremoceiro, planta leguminosa’.


e compravom com ella hũua mealha de mostarda ou d’alfelloa ou de tramoços e
semelhantes cousas: (188.38).

Etimologia: do gr. thermós ‘quente’ (falando-se de banho, bebida, alimento etc.), pelo ár.
turmūs f. vulg. de turmus. Corominas, (do hispanoárane turmûs (ár. túrmus) e este
do grego thermós apresenta como primeira documentação a forma altarmuz em
1328-35 (Conde Luc.). Indica ainda tremoço, como forma portuguesa, e entremoço
ou atramoz como castelhana, uma vez que o norte conservou o romance llobí de
lŭpīnus.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Atestações simultâneas: CITR151.
148
Se pesquisarmos a palavra audiência, reparamos que a abonação engloba a palavra serventia no final: “[...]
alli faziam audiencia a todollos que andavom servindo que demandados eram por quaaesquer cousas, por nom seerem
torvados da serventia. (sublinhado meu)”. Não se compreende, pois, a sua não inclusão.
149
Obra apresentada sem qualquer outra indicação.
150
Colección Diplomática de Galicia Histórica. Santiago de Compostela. Vol. I, 1901 (91.7,9).

110
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

TRASFEGO s.m.(1) ‘ação ou efeito de trasfegar, trasfega, trasfegadura’.


Dona Maria avia ja ante d’esto rrecebidas novas d’algũus de casa d’el-rrei, assi parentes
como criados, hũus d’ouvida e outros de presumçom, do trasfego que sse começava
d’ordenar antr’ella e o iffante, percebendo-a que sse avisasse; e seendo torvada por taaes
rrazoões, estonce o foi muito mais quando vio o rrecado do filho; (366.44).

Etimologia:, regr. de trasfegar, mas de origem obscura, segundo Houaiss. Corominas, com
dúvida, propõe como hipótese dois étimos para o esp. trasegar (1493) antes
trasfagar, o mesmo que o port. trasfegar, o lat. vulg. *transfricāre ‘roçar
prolongadamente, manusear’ com dissimilação do segundo -r-, ou o lat. vulg.
*transfaecāre ‘revolver as fezes’, de faex, faecis ‘fezes’.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Atestações simultâneas: 1436 (Desc. Port.c349.31).152
Obs.: Houaiss dá a indicação de “s.m. (sXVI cf. DNLeFern) m. q. trasfega (s.f. (1858 cf. MS6)
acção ou efeito de trasfegar; trasfegadura, trasfego”, pelo que se trata de uma antedatação. Para
Kremer em 1366.
O verbo está atestado no século XIV.

VASILHA, s.f. (1) ‘vaso para guardar líquidos; pipa, tonel, barril’.
e aas portas paredes travessas e pontes levadiças e cadafaises, e fornece-llos d’armas e
cubas e d’outras vasilhas, segundo os logares honde cada hũus eram. (11.16).

Etimologia: do b. lat. vasilĭa (do lat. vās, vāsis).


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: FRAD.

VIROTÃO, s.m. (2) ‘grande seta’.153


O iffante com as gallees ante Lixboa, como os da cidade conhecerom que eram de Castella,
começarom de lhe tirar aos trõos e viratoões, e quiseram armar sobr’ellas; (450.43).

Outras ocorrências: 485.57.


Etimologia: de vira + -ote.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: REIX.
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

VISTOSO, adj. (1) ‘que atrai a vista; agradável de ver’.


Avia bem composto corpo e de rrazoada altura, fremoso em parecer e muito vistoso, (3.7).

Etimologia: vista + -oso.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: BENF, LEAL, OFIC.
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

151
Indicação também referida por JMP3, s.v. tremoço: Livros de Falcoaria, no B.F.1, I, p. 224.
152
Segundo JPM3, embora sem o referir, após correcção de RLor.
153
Aumentativo de virote ‘seta pequena’, de vira ‘tipo de seta muito aguda’.

111
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

VOLTAR, vb. (4)


1. ‘virar’.
e que estonce Fernam Sanchez de Thoar, que era hũu dos cavalleiros que el-rrei dom
Henrrique consigo levava, tirou el-rrei dom Pedro de cima, e voltou el-rrei dom Henrrique
sobre elle, (83.80).

2. ‘regressar, retomar’.
e os castellaãos que tiinham ja vencidos os primeiros, voltarom sobr’elle, e foi vencido e
preso. (272.32).

Outras ocorrências: 351.20; 430.46.


Etimologia:, do lat. *voltāre. Segundo Houaiss do “lat. vulg. *volvitare, freqüentativo de
volvĕre ‘rolar, revirar, rodar; enrolar; fazer decorrer (o tempo), passar; falar
(continuamente); pensar, meditar etc.’ ”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Atestações simultâneas: CAVA.
Obs.: Ainda sem registo no CIMP.

ZOMBEIRO, adj. (1) ‘que ou aquele que ri de alguém ou de algo, zombador’.


e fallou em isto tantas vezes e assi de praça que o ouve el-rrei de saber, e disse aos que hi
estavom que nom curassem de seus ditos, ca era hũu villaão zombeiro, filho de hũu azemell
de seu padre. (255.120).

Etimologia: de zombar + -eiro.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Atestações simultâneas: OFIC; VERT.
Obs.: Além do adjectivo ‘zombeiro’ encontra-se ainda atestado no séc. XV o verbo ‘zombar’
em VERT, e o substantivo ‘zombaria’ em LEAL, OFIC e VERT.
Sem regista em Houaiss.
O verbo está atestado no século XV.

112
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

3.1. Comentários

Ao longo da lista de possíveis neologismos (1ª atestações) foram sendo indicadas dois
tipos informação que agora se revela mais pertinente: o tipo de unidade apresentado pela
palavra e, no campo das observações, a data da primeira atestação, sempre que se estava perante
um termo formado por derivação.
Assim, é agora possível perceber que o mecanismo de enriquecimento vocabular, através
da importação de palavras, nomeadamente latinismo, demonstra a capacidade de renovação do
léxico (pré-renascimento), bem como forma novos derivados quer da mesma época, como
mediano e medianeiro (XV), mas também com vários séculos de distanciamento, como pedir
(1152) e pedinte (XV), romper (989) e rompimento (XV). Algumas palavras, como conclave,
poderão ter entrado na língua através da tradução, pois ocorrem, pela primeira vez, em obras
desta natureza.
O VH-CPM demonstra um procedimento contraditório, os seja, em muitas situações
omite abonações que constam nos três volumes publicados por Cunha, como em ala (MONT)
amorio (1447 DESC) arauto (CART, 1439 MARR), cismático (ROBI), cota (CART, LOPO e
MMM), defensável (1447 DESC), desgarrado (a1436 DESC), maré (LOPF). No caso de
arvoredo e conjectura, apenas com ocorrência em LOPF e MONT, a não utilização desta última
obra no corpus de extracção154 atribuem, assim, a LOPF a primeira atestação. Para tal facto não
encontrei explicação. Para muitas outras insere localizações que não constam nos três volumes
publicados por Cunha, como em aferrar (REIS), aliado (BENF), carriagem (REIS), cautela
(VITA e FRAD), cismático (SBER), comunicar (VITA), descontentar(VITA), ditado (BENF),
espedir (REIX, VESP e FRAD), Partindo do facto de este dicionário ser apenas a digitalização
do Fichário, tais referências constarão no Suplemento elaborado pelo próprio Cunha (cf. e
remeter para esta explicação).
Seria exaustivo, e linguisticamente pouco proveitoso, fazer o levantamento de todas as
entradas que JPM3 aproveita de RLor. No entanto, uma conclusão é possível retirar: há, em
muitas delas, um “inconfesso furto”155. Se é verdade que em muitas palavras consta no final da
entrada a indicação (Lorenzo), como em trela, ouriçar, reedificar, em muitas outras tal não se
verifica, como em legítimo, maré, ria. Esta opção de indicar Lorenzo parece prender-se com o
facto de tais palavras terem todas, ou quase todas, ocorrência em obras castelhanas ou galegas.
Parece, assim, que Machado assume como importante a contribuição de datas provenientes de

154
Outras obras que não fazem parte do corpus de extracção do VH-CPM, além de MONT, são CART,
MARR, MMM.
155
Classificação atribuída por Telmo Verdelho ao Elucidário de Viterbo sobre o aproveitamento dos
trabalhos de Fr. Bernardo da Encarnação (Verdelho e Silvestre 2007:26)

113
III.3. Eventual novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

obras externas, eventualmente de mais difícil acesso, mas não sente necessidade de indicar as
internas, eventualmente porque também seria capaz de as encontrar. Tudo passaria como facto
irrelevante, não fossem obras posteriores de referência como o Dicionário Houaiss, ao atribuir a
datação à quase totalidade das suas entradas a indicação da fonte de muitas dessas palavras156. O
seu a seu dono, e não é isso que se verifica em muitos casos. Ou seja, Houaiss apresenta como
primeira datação para palavras como boroa157, cunho, a origem em JM3, e casar, ao IVPM,
quando, na verdade, elas já tinham sido antedatadas por Lorenzo, no caso de JPM3 muitas vezes
sem qualquer referência.
Ao longo deste levantamento foram surgindo palavras cuja datação se verificou anterior à
época estabelecida para as atestações simultâneas, sobretudo provenientes de pesquisas
efectuadas em MD-CF. Mantiveram-se na lista para tratamento de dados relativamente a
antedatações a Houaiss.

156
No detalhamento dos verbetes, campo da datação, ponto 4.1., percebe-se a importância desta minha
observação ao ler-se: “Para a datação do vocabulário medieval, até o século XV, nossas principais fontes foram o
Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, do filólogo José Pedro Machado (JM), retrodatações levantadas por
estudiosos, como o Prof. José Alves Fernandes (JAFernC), da Universidade Federal do Ceará, e abonações
documentadas por Antônio Geraldo da Cunha e colaboradores”.
157
Após RLor ter corrigido JPM com uma abonação da CSM 55 (“«pan, mais non de borõa» (53)”), as três
obras de Cunha (AGC, IVPM, VH-CPM, nestes dois últimos com forma barõa (?)) passaram a registar esta
ocorrência apenas, até chegar a Houaiss e atribuir a datação a JM3.

114
III.4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV

4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV.

Metodologia – ficha de palavra

O resultado do Índice Analítico elaborado foi uma listagem de palavras que foram sendo
eliminadas ou porque a sua datação, tendo por base o Dicionário Houaiss, era anterior à Crónica
de D. Fernando ou à Crónica do Conde D. Pedro de Meneses, consoante os casos, ou porque
eram de registo simultâneo e, por isso, englobaram-se na lista anterior. Para as restantes, pelo
que pude apurar, encontram a sua primeira atestação em uma destas crónicas de Lopes e Zurara.
Assim, foi elaborada uma ficha de palavra constituída pelos seguintes pontos:

ENTRADA, classificação gramatical (nº de ocorrências) ‘significado’


Etimologia:
Tipo de unidade:
Registos:
Obs.:

Entrada:
Para a entrada de cada palavra são apresentadas quatro informações, respeitando a
seguinte linearidade: lema da forma, normalmente, no português actual em maiúsculas,
‘ALFÉLOA’; classificação gramatical ‘s.f.’; o número de ocorrências entre parêntesis curvo
‘(1)’ e, por último, o significado ‘massa de açúcar’. A seguir a cada entrada apresenta-se a
respectiva abonação. Para as restantes ocorrências apenas se indica a localização.

Etimologia:
Sobre o campo da etimologia, são quatro os dicionários de referência para a pesquisa:
Houaiss, Machado, Cunha e Corominas, não descurando eventuais informações de outras obras.
No entanto, a etimologia apresentada é a que costa em Houaiss, uma vez que, regra geral, reúne
informações apresentadas pelos outros autores. Um exemplo ilustrativo deste procedimento
verifica-se na entrada peitoril, “ETIM lat. *pectorile, segundo AGC, JM e Nascentes”, ou, de
forma mais pormenorizada, em sobressalente, cuja primeira atestação se verifica em ZURP,
“ETIM orig. contrv.; AGC registra, com dúvida, “talvez de um *sobressaliente < sobre- +

115
III.4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV

saliente”; Nascentes deriva do esp. sobresaliente (1575) ‘que sobressai’, do v. sobresalir


‘sobressair, exceder’; JM oscila entre uma form. vern. sobre- + saliente e o cast. sobresaliente”.

Tipo de unidade:
Neste campo será registado o tipo de unidade que a palavra apresenta. O objectivo é
poder tirar conclusões de dois tipos: em primeiro, perceber a quantidade, e a respectiva origem,
de palavras importadas, para assim perceber eventuais influências; em segundo, detectar
mecanismos internos da língua na formação de novas palavras, nomeadamente a derivação e a
composição. O que se pretende mostrar é a evolução do léxico derivado, ou seja, verificar o
espaçamento temporal entre o registo da palavra primitiva e o seu derivado, mas também o
inverso, como me parece acontecer.

Registos:
Neste ponto, o objectivo é apresentar toda a informação encontrada sobre o registo das
palavras que são novidade em LOPF e ZURP.
Num trabalho desta natureza, o ideal era ter um Tesouro da Língua Portuguesa,
instrumento de trabalho há muito ambicionado. Um dicionário desta natureza, teria de ter, como
sabe quem trabalha com datações, várias actualizações, pois novas datas vão sendo apresentadas
constantemente. Mateus (1974:8), num dos primeiros inventários das palavras de uma obra, a
propósito das “palavras atestadas nos dicionários históricos como tendo aparecido nos textos
literários em época posterior ao século XV” apresenta, sobre a palavra artéria, a seguinte
indicação: “está assinalada no Dicionário Etimológico de José Pedro Machado, como tendo
entrado na língua no século XVI. O seu emprego na obra que estou a analisar [Vida e Feitos de
Júlio César] prova que podemos antecipar de um século a sua utilização em textos literários”.
Ora, desde 1974158, muitas outras obras, literários e não só, foram analisadas, o que permitam,
constantemente, novas antedatações. Nas palavras finais de Mateus (1974:8), “Quando o
inventário das palavras começadas por uma única letra do alfabeto nos propõe formas como as
indicadas acima, que vêm enriquecer os materiais organizados que possuímos para o estudo da
língua portuguesa arcaica, muito mais podemos esperar de um levantamento exaustivo do
léxico, não apenas deste texto mas de toda a produção literária portuguesa”. E assim foi. Como
o desenvolvimento de meios mecânicos, nomeadamente informáticos, foi possível a
digitalização de inúmeras obras e a consequente elaboração de listas de palavras. O passo
seguinte foi uma catapulta de antedatações. A este propósito refere Robert Verdonk, no capítulo
“Cambios en el léxico del español durante la época de los austrias”, inserido na Historia de la

158
Agora com segunda edição (Mateus 2010)

116
III.4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV

Lengua Española159, coordenada por Rafael Cano, a propósito do confronto entre dicionários
históricos (Corominas) e a base de dados CORDE, Corpus Diacrónico del Español, criada pela
Real Academia Española: “De esta confrontación resulta que una parte importante de las voces
que hasta ahora se vienen considerando préstamos o creaciones de los siglos de Oro, en realidad
ya están atestiguadas en el siglo XV o incluso antes”160.
Outra hipótese, ainda, era ter todas as obras medievais disponíveis, informatizadas, para
uma consulta rápida e objectiva. Para lá caminharemos. O responsável pela Biblioteca de
Amsterdão, numa entrevista concedida após a decisão de digitalizar todas as obras, a começar
pelas mais antigas, respondeu peremptoriamente: “dentro de alguns anos, se não estiver na
internet não existe”. Como nenhuma das duas é possível, torna-se imperativo recorrer a obras da
área, desde dicionários etimológicos, cronológicos, vocabulários, lematizações, corpora
informatizados ou programas informáticos de concordância.
Assim, o que se pretende neste campo é apresentar as ocorrências de cada palavra cuja
primeira atestação ocorra em LOPF ou em ZURP. Serão também, adicionalmente, indicadas as
ocorrências nas outras obras de Lopes (LOPP, LOPJI1 e LOPJI2) e Zurara (ZURC, ZURG e
ZURD), deixando de fora todas as indicações referentes a obras posteriores. Para tal, sirvo-me,
particularmente, de nove obras/trabalhos161 para confirmar a efectividade do primeiro registo em
LOPF e ZURP. São eles:
JPM3: Dicionário Etimológico de José Pedro Machado, 3ª edição.
RLor: Sobre cronologia do vocabulário Galego-Português - Anotação ao ‘Dicionário
etimológico’ de José Pedro Machado, de Ramon Lorenzo (1968).
AGC: Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de Antônio Geraldo da Cunha, 3ª
edição, 2ª impressão (2007).
IVPM: Índice do Vocabulário do Português Medieval, de Antônio Geraldo da Cunha, (os
três volumes publicados: letra A, 1986; letras B-C, 1988 e letra D, 1994).
VH-CPM: Vocabulário Histórico-Cronológico do Português Medieval, edição em CD-
ROM (versão 1.0), publicado pela Casa Fundação Rui Barbosa, tendo por base o
projecto do IVPM de Antônio Geraldo da Cunha (2007).
BLem: Lematização de textos medievais portugueses (versão 4.0), edição de José
Barbosa Machado, UTAD, 2002-2007.

159
Cano, Rafael (coord.) (2004). Historia de la Lengua Española. Madrid: Ariel. O capítulo referido é o 34,
páginas 895-916.
160
Idem, Ibidem, p. 896.
161
Para além destes, considerados principais, foram também consultados outros glossários e corpora
informatizados, bem como o programa informático Phrasis - versão 2.2, edição do Projecto Vercial, 1999-2009. Ao
Corpus Lexicográfico do Português (DICIweb), recorreu-se sempre que uma palavra não foi encontrada, na
expectativa de que tivesse ocorrência nos dicionários do século XVI.

117
III.4. Novidade de ‘pallavras’ no português do século XV

MD-CF: Mark Davies e Michael Ferreira, O Corpus do Português:


www.corpusdoportugues.org/x.asp.
CIPM: Corpus Informatizado do Português Medieval, da FCSH-UNL, mais
propriamente o DVPM - Dicionário de Verbos do Português Medieval:
http://cipm.fcsh.unl.pt/verbos/indiceverbos.jsp
Houaiss: Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, CD-ROM (versão 2.0).

Por vezes, parecerá informação repetida, mas o que se pretende é poder tirar conclusões
que resultam do confronto entre as três obras de Cunha (AGC, IVPM, VH-CPM), confronto
entre JPM3 e RLor, informação nova de MD-CF e BLem e, por fim, perceber se é possível
antedatar a informação que consta em Houaiss.
Como nem todos os estes trabalhos registam todas as palavras que, pelo que apurei, tem a
sua primeira atestação nas duas Crónicas em análise, só serão indicados aqueles onde tal
vocábulo se encontra averbado, evitando assim informação repetida do tipo ‘não registado’.
Por fim, uma última informação relativa à apresentação das palavras. Antes de cada
forma histórica162 indicada é apresentado o século, seguido da fonte e localização, se tal se
confirmar na obra/trabalho de origem163. Dado verificarem-se algumas discrepâncias nas siglas
das obras adoptadas por parte dos vários autores, uniformizei todas as que dizem respeito às
obras em estudo de Fernão Lopes (LOPF) e Zurara (ZURP). Os casos em que tal não se verifica
é porque se encontram dentro de citações. Para todos os outros casos se mantêm as siglas
adoptadas por cada autor, devendo consultar-se a respectiva tabela de siglas onde se apresenta a
devida discriminação. Esta simples apresentação permitirá ter uma visão mais exacta e crítica
sobre os trabalhos apresentados, ou seja, aqueles mais minuciosos nas informações, localizações
apresentadas, face àqueles mais gerais, mais informatizados.

Observações (Obs.:)
Este é um campo reservado a considerações que se julguem pertinentes sobre cada
entrada. Nele serão registadas todas as informações que possam contribuir para qualquer
esclarecimento de determinada palavra.

162
Para o IVPM e Houaiss apenas se indicam as formas históricas do século XV e desde que diferentes na
que se verifica na respectiva entrada. Apresentam-se, no entanto, as formas posteriores se a própria palavra datada
por Houaiss apresentar uma primeira datação tardia face a LOPF ou ZURP.
163
AGC, por exemplo, só no suplemento à segunda edição passou a introduzir a localização de cada palavra.
Assim, nos casos em que tal se verificar, sabemos de antemão que tal informação se encontra so Suplemento. Por sua
vez, BLem apresenta apenas a obra onde tal palavra ocorre, sem a localização, mesmo quando introduz abonações.

118
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Numa primeira análise, foram identificadas algumas palavras com primeira atestação em
LOPF, sobretudo provenientes de obras como JPM3, AGC, IVPM, VH-CPM e Houaiss, mas
que com o decorrer do confronto entre elas, da consulta de corpora informatizados ou
lematizações (sobretudo MD-CF, CIPM e BLem) e dicionários ou glossários (sobretudo
Viterbo, Morais) se veio a confirmar ocorrência em obras anteriores. Assim, de tais palavras que
se vieram a revelar falsas primeiras atestações em LOPF, apenas se apresenta informação que
comprova tal antedatação. Encontram-se nesta situação palavras como:

apenhar (apenhar, apenhavom):


Houaiss, XV (cf. IVPM): 1364 em RLor, proveniente do Vocabulário português do
século XIV, de Machado, publicado na Revista de Portugal (RP XXVII,
235.31).
camalho (camalho, camalhom):
Houaiss, XV (cf. IVPM): 1359 em Viterbo, com a seguinte abonação de Doc de
Pendorada de 1359, “Ficou a Gil, Pelo costume do Porto, o cavallo do dito
Vasco de Sousa, seu Padre, e huma espada, e huma lança, e huma loriga de
cavallo, e duas ffalhas, e huum elmo com sseu camalho, e humas luvas d’aço, e
huuns coixotes, e caneleiras velhas de coiro, e huum escudo, e çapatos de ferro
huuns”.
comendadeira (comendadeira):
Houaiss, XV (cf. IVPM): 1396 em JPM3, s. f. de comendador (o masculino em 1214)
com indicação de ocorrência em Desc., I, S., p. 442, N.º 588.
confusamente (confusamente):
IVPM, LOPF 48.6164: com atestação em Corte Enperial, segundo MD-CF.
femençar (femençando):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): 1344 em MD-CF e BLem, com atestação na Cronica Geral
de Espanha, com a forma femençava, mas também com várias formas da
variante afemençar.165

164
Houaiss, por norma, não regista advérvios de modo. Este é um dos casos. Cf., no entanto, nota 102.
165
Cf. as formas afemẽçada, afemeçou, afemẽçouha, afemençada, afemençalla, afemençar, afemençou,
affemẽçando, affemençado, affemençouhas.

119
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

fornada (fornadas):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): séc. XIII em JPM3 e AGC. Sobre a palavra primitiva forno,
Houaiss data-a de 897, segundo JM3. Ora, como RLor corrige JPM (que na 1ª
edição apresenta a data de 977, corrigida agora para 897, com abonação de
Dipl. 8), este, na terceira edição, aproveita a informação de RLor, sem a citar166,
e Houaiss, que segue esta terceira edição, atribui-lhe a localização.
grou (grou):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): AGC XIV e JPM3: XI, “segundo L. V., na Rer. Lus., III, p.
265. Séc. XI: «Quomodo uadit ad nium de grou», Leges, p. 347”. Houaiss não
leva em consideração a data apresentada por JPM3 para grou, mas leva-a para a
forma nium, como primeira datação para ninho, embora interrogada.
milanês (millaneses):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): 1357 em JPM3, com proveniência omitida de RLor,
“«…aos mercadores mjlaneses», Desc., I, 106”.
miradoiro (miradoiro):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): 1141 em JPM3, “«…ad foce de arrugio quod uenit de
pousada et inde ad petram de miradoiro», em Chanc., p. 152.
rigoroso (rrigoroso):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): em Boosco Deleitoso, segundo MD-CF, “e se he rigoroso
em a justiça, dizem que he cruel” e ainda “e outros dizem que he cruel e
rigoroso”.
usável (husavees)167:
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): 1272 em JPM3, com proveniência omitida de RLor: “«da
usauil moeda», em Portel, p. 71”.
veludo (velludo):
Houaiss, XV (cf. FichIVPM): 1415 em JPM3, “«…panos douro e de sseda e de sirgo
Escudos de gustar e chapeletas de prumas e veludos e penas pera pera empenar
roupas…», em Desc., I, S., p. 463”.

166
Se é verdade que JPM refere muitas vezes que a informação provém de RLor, como mantel, nomeação,
perna, remanescente, remanescer, remate, remir, remissão, repicar, sobreventa, sobrevir, solenizar, vela, tornear1,
trancar, trela, (sobretudo se são de obras castelhanas) outras há em que essa informação não é indicada, como em
arrancar, fugir, usável, mal-crente, mantéu, milanês, palanco, pontifical, postar, pousentador (*RLor), prestar,
propor, resíduo, rude, *sacadaria, sacador, *seitosamente, teso, *torneamento…
167
Houaiss não apresenta datação para esta palavra.

120
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ALFÉLOA, s.f. (1) ‘massa de açúcar’.


e compravom com ella hũua mealha de mostarda ou d’alfelloa ou de tramoços e
semelhantes cousas, (188.38).

Etimologia: do ár. al-halāua ou al-haluā. Corominas apresenta, primeiramente,


‘matalahuva’,*batalhalúa, do hispano-árabe al-hábbat al-hulûwa ‘el grano doce’,
com a informação de que em português antigo ocorre o registo ‘batafaluga’ 1318
(cf. Michaëlis, RL XIII, 268-9) e, depois, outro descendente da raiz árabe hulw,
com indicação de registo em português de alféloa, ‘masa de azúcar o melaza’. Nos
Vestigios da Lingoa Arabica em Portugal é apresentada a indicação que deriva de
heluon ‘doce’168.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, alféloa (“«e taaes hi avia que sse mantinha em alfelloa», F.L., J., Iª parte, cap. 148,
p. 306”)169.
- AGC: XV, alfelloa170.
- IVPM: XV, alfelloa (LOPF 55.38; LOPJI1 269.25)171.
- VH-CPM: XV, alfelloa (LOPF, 55.38; LOPJI1, 269.25)172.
- BLem: XV, alfelloa (LOPF; LOPJI1)173.
- MD-CF: XV, alfelloa (LOPF).
- Houaiss: XV, alfelloa174 (cf. IVPM).
Obs.: Na Orthographia de Feijó, além do significado apresentado, é feita uma advertência a
eventuais utilizações erradas por metátese: “Alfeloa. massa de assucar branco, que se faz a
modo de páosinhos delgados, e compridos: e naõ Alfeola” 175.
Apesar de Viterbo não registar alféloa, regista o seu derivado alfeloeiro, com a indicação clara
de ocorrência no século XV, embora posterior a LOPF. “Alfeloeiro. O que fazia doce de
qualquer qualidade. Hoje chamamos Alféloa ao doce de assucar, ou melaço posto em ponto.
Por huma Lei d’El-Rei D. Manoel de 1496 se determina, ‘que não haja Alfeloeiros, e que pena
haverão’. Delles trata a Orden. nova, e antiga L. V. tit. 101” 176.

168
Sigo a edição Fac-símile de 2004, da livraria da Alcalá - Vestigios da Lingoa Arabica em Portugal de
João de Sousa, p. 40.
169
JPM, para as obras de Lopes, indica o número da parte em algarismo romano e os números do capítulo
seguido da página em arábicos.
170
Na primeira edição do seu Dicionário Etimológico (1982), A. G. Cunha apresenta apenas a datação para
cada palavra. No suplemento para a segunda edição (1986), além da datação, passou a introduzir a obra com a
respectiva localização. Para o registo desta obra apenas se apresentam as formas históricas diferentes da actual.
171
O IVPM, para as obras de Lopes, indica o número da parte, em algarismos romanos, e os números do
página (em redondo) e da linha (em itálico) em arábicos.
172
O VH-CPM, para as obras de Lopes, indica o número da parte, em algarismos romanos, e os números do
página e da linha em arábicos.
173
BLem, na sua lematização, apenas indica as obras em que cada vocábulo tem ocorrência. Só em alguns
casos apresenta abonações, mas também só com a indicação da obra, sem a localização. Apresenta, separadamente
(cf. lista p. 40), uma lista de todas as obras utilizadas e a respectiva datação.
174
Por norma, Houaiss indica a(s) forma(s) histórica(s) de cada palavra com grafia(s) diferente(s) da actual
(cf. justificação apresentada, Tomo I, p. XXX (ed. em 6 vol. Círculo de Leitores), para a versão em papel, e em Ajuda
> Conhecendo o Dicionário > Detalhamento do verbete > Campo da datação [4.2 e segs.]), para a versão em CD-
ROM).
175
Feijó, João de Morais Madureira (101824). Orthographia, ou Arte de Pronunciar com Acerto a Lingua
Portugueza. Lisboa: Na Impressão Régia, p. 171-172
176
Sigo a edição de 1798/1799. As localizações são dadas pelo nº romano para o volume e arábico para as
páginas: I.84.

121
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

De resto, esta palavra tem ainda registo em vários dicionários, Morais assinala alféloa e remete
para alfenim: “massa delicada de assucar mui alvo”177, e vocabulários, Rebelo Gonçalves
apresenta-a com a indicação da variação arféloa178.
Myriam Benarroch, na sua tese de doutoramento sobre o contributo dos arabismos no português
do século XVI, regista esta palavra com a indicação de que se encontra atestada pela primeira
vez na Crónica de D. Fernando179. Não é pertinente, pois, a datação do ano de 1500 que Kremer
apresenta, provavelmente a Carta de Pêro Vaz de Caminha a El-Rei D. Manuel180.

ALMÁRCOVA, s.f. (1) ‘espécie de arma, tipo cutelo’.


lhe deu com hũua almarcova na maão do cavallo, o quall cahiu logo com elle (126.25).

Etimologia: Provavelmente de origem árabe.


Tipo de unidade: importação (arabismo(?)).
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 38.25).
- VH-CPM: XV, almarcova (LOPF, 38.25).
- BLem: XV, almarcova (LOPF).
- MD-CF: XV, almarcova (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Sem registo em três das obras base (JPM3, RLor e AGC). Em todas as outras, o que se
verifica é sempre a apresentação de uma única abonação, precisamente a de LOPF181.

ALROTAR, vb. (1) ‘fazer barulho, pedir esmola aos gritos’.


porém mandou el-rrei que quaaesquer homẽes ou molheres que andassem alrrotando e
pedindo e nom husassem de mester, que taaes como estes fossem vistos e catados pellas
justiças de cada hũu logar; (314.87).

Etimologia: Houaiss apenas indica que “segundo JM, var. de arrotar”. Já para este verbo
apresenta a seguinte explicação: “orig. contrv.; deve provir do lat. eructo, ās, ǎvi,
ǎtum, āre ‘ter arrotos, arrotar, vomitar’, ou mais prov., do v. lat. ructāre ‘arrotar,
dar golfadas’ (fonte de eructāre e de ructus ‘arroto’, com a- protético); segundo
AGC, proviria do v. lat. *eruptāre (formado a partir de eruptus, part. pas. de
erumpĕre ‘sair impetuosamente, fazer uma saída arrebatada, precipitar-se, romper,
fazer rebentar’), em lugar de (e)ructāre ‘arrotar’ ”182. Corominas remete também
para o verbo erumpere ‘precipitarse afuera’.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, remete para o verbo arrotar, onde depois regista a forma alrotar dando a seguinte
informação “ant., deve ser var. deste v. [arrotar]; séc. XV?: «Mandamos, que… assy homeẽs ,

177
Sigo a 4ª edição, de 1831. As localizações são dadas pelo nº romano para o volume e arábico para as
páginas: I.83.
178
Gonçalves, Rebelo (1940). Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional de
Lisboa, p. 43. Em nenhum outro local encontrei esta variação.
179
BENARROCH, Myriam (2000). Des premiers dictionnaires (Jerónimo Cardoso) aux textes: l’apport
lexical des arabismes dans la langue portugaise du XVIe siecle. Universite Paris III – Sorbonne Bouvelle, tomo 2, p.
510.
180
KREMER, Dieter (2004). Primeiras datações. Trabalho não publicado.
181
Cf. também Morais4 e CF25.
182
Para uma informação mais pormenorizada, consultar em Houaiss, s.v. arrot-, onde se verifica que AGC
seguiu o Dicionário da Academia (1976).

122
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

como molheres, que andarem alrotando, e pedindo, nom usando d’outro mester, sejão vistos e
catados pelas Justiças de cada huum lugar», Ord., livro IV, título 81, § 9, p. 288; hoje ainda se
emprega, mas raramente; cf. Morais10”.
- IVPM: XV, alrrotar (LOPF 89.87).
- VH-CPM: XV, alrrotando (LOPF, 89.87).
- BLem: XV, alrrotando (LOPF).
- MD-CF: XV, alrrotando (LOPF).
- Houaiss: XV, alrrotar (cf. IVPM).
Obs.: RLor não antedata JPM que indica o séc. XV, com interrogação. De qualquer forma, com
abonação posterior a LOPF.
Para Kremer 1435.

ANGUADO, s.m. (1) ‘espécie de alamar; cordão’ (?).


ca el-rrei dom Fernando a seu rrequerimento lhe enviou estonce em presente seis
allaãos e seis sabujos, todos com collares brollados e foziis de prata dourados, e as
treellas d’elles d’ouro fiado, e trinta azcumas todas com contos e anguados de pratas
dourados, que levavom quareenta e seis marcos de prata em guarnimento; (142.39).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- IVPM: XV, s.m. (?) (LOPF 43.39).
- VH-CPM: XV, subst. anguados (LOPF, 43.39).
- BLem: XV, adj. anguados (LOPF).
- MD-CF: XV, anguados (LOPF).
Obs.: Sem registo em JPM3, RLor, AGC e Houaiss. Parece não haver consenso nem de classe
gramatical nem de género. Nos dicionários consultados, apenas encontrei registado o
substantivo feminino anguada183, o que explica a interrogação do IVPM e contraria a certeza do
VH-CPM. Quanto à proposta de BLem, o adjectivo será apenas resultado de classificação
mecânica, eventualmente resultante da terminação -dos. No entanto, e apesar de na maioria das
edições da Crónica de Dom Fernando aparecer o substantivo masculino na frase “trinta
azcumas todas com contos e anguados de pratas dourados”, o feminino encontra-se registado
na edição da Biblioteca de Clássicos Portugueses, de 1895: “trinta azarmas, todas com contas e
anguadas de prata douradas”184, o que pode mostrar dupla interpretação do manuscrito. Na
edição de Macchi, o aparato crítico não faz qualquer referência a esta alternância.

APAVESADO, adj. vb. (3) ‘protegido com paveses (armação protectora, constituída de escudos
ou tábuas, que se colocava na borda das embarcações); empavesado’.
e as mayores naaos estavom deante todas com as alcacevas contra o mar, armadas e
apavesadas, percebidas de trõos e outros arteficios pera sse defender; (469.12)
A frota como pousou ante a cidade, lançarom todos os batees fora armados e pavesados,
(475.15).

Outras ocorrências: 475.18.

183
CF25 regista a forma feminina anguada com indicação de forma antiga e com o significado de ‘espécie de
alamar’, com indicação de ocorrência em Fernão Lopes, Crónica de D. Fernando. Também com registo feminino em
VocRG, p. 65, e VocGV, p. 77.
184
LOPES, Fernão (1895). Chronica de El-Rei D. Fernando, Lisboa: Escriptorio, vol. I, p. 131.

123
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: part. de apavesar (de a- + pavês + -ar).


Para Houaiss a origem está no “it. pavese (1340), proveniente da locução (scudo)
pavese ‘(escudo) de Pávia, cidade da Itália’; para o verbo ‘pavesar’ apresenta a
etimologia do it. pavesare (pavezare 1376) ‘ornar com paveses’, o que torna o
verbo denominal.
Em Corominas a explicação, sendo semelhante, é mais completa: “palabra comum
a todos los romances y lenguas europeas, tomada del it. pavee íd., de origen
incierto, al parecer idéntico a Pavese, ‘perteneciente a Pavía”, donde se supone que
se fabricaron primero los paveses. 1ª doc.: 2º cuarto S. XV. (…) Por la misma
época aparece el port. pavês; (…) Como em Itália es más antiguo que en los demás
países y allí es sumamente frecuente desde el S. XIV, el origen italiano puede darse
por seguro.” Corominas apresenta, ainda alguns derivados, como pavesada,
pavesina, empavesar, empavesado.
Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- JPM3: XV, apavesar: “«…e as mayores naaos estavom deante todas com as alcacevas contra o
mar, armadas e apavesadas…», F. L., J., vol. II, cap. 133, p. 111”185.
- AGC: XV, (LOPF 133.12).
- IVPM: XV, part. adj. (LOPF 133.12).
- VH-CPM: XV, part. adj. apavesadas (LOPF, 133.12), pavesados (LOPF, 135.15)186.
- BLem: XV, adj. apavesadas (LOPF); vb. pavesados (LOPF; LOPJI1; LOPJI2)187.
- MD-CF: XV, apavesadas (LOPF); pavesados (LOPF)188.
- CIPM: apavesadas (LOPF).
- Houaiss: XV, adj. apavesado, apauesado (cf. IVPM).
Obs.: Segundo Houaiss, confirmando a informação anterior de Corominas, o substantivo pavês
tem registo também no séc. XV (f. hist. paueses, pauues) com o significado de ‘escudo,
protecção’ e só em 1553 (pavezes) aparece com o significado de ‘bandeira, galhardete’. De
acordo com BLem, de todas as obras apresentadas em que pavês tem ocorrência (LOPJI1,
ZURD, RP), verifica-se que o primeiro registo é de Lopes na Crónica de D. João I. Assim, o
que se confirma é o registo gráfico, em LOPF, de palavras derivadas, apavesadas e pavesados,
antes da primitiva.
Parece, então, que o primeiro a utilizar o a- (em apavasadas, LOPF) e o em- (em empavesada
LOPJI1) protéticos na parassíntese foi Fernão Lopes, denotando perfeita consciência da
construção de palavras, como forma de enriquecimento da língua, com variações da palavra
primitiva.
O substantivo está atestado no século XV.

185
JPM3 troca a obra, pois a abonação que apresenta é da Crónica de D. Fernando e não da de D. João I.
186
VH-CPM também regista pauesados como substantivo: LOPJI2, 71.35 e 148.2. JPM3 também já havia
dado essa indicação, embora de forma confusa. Na entrada do verbo pavesar, apresenta uma abonação com um
substantivo, com a seguinte observação: “Pavesado já também ocorria no mesmo século: «…e hordenarom sua
pavesada pera escaramuçar com os Castellaãos…», (F. L., J., I, cap. 113, p. 217).
187
BLem regista ainda o verbo pavesar, com as formas pavesada (LOPJI1; LOPJI2; ZURP) e pavesadas
1
(LOPJI1) e também o verbo empavesar com a forma empavesada (LOPJI ).
188
O Corpus do Português MD-CF não trabalha a Crónica de D. João I de Fernão Lopes, pelo que se
justifica, assim, a ausência do seu registo.

124
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

APREGOAMENTO, s.m. (2) ‘pregão; proclamação, divulgação’.


E tornou ell outra vez alta voz dizendo: «Arreall, arreall», assi como ante dissera. E elles,
a que pouco prazia de tall apregoamento, nẽhũua cousa rresponderom mais que da
primeira, (606.35).

Outras ocorrências: 609.4-5.


Etimologia: de apregoar + -mento.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 176.35).
- VH-CPM: XV, apregoamento (LOPF, 176.35).
- BLem: XV, apregoamento (LOPF).
- MD-CF: XV, apregoamento (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: JPM, RLor e AGC registam apenas o verbo apregoar, 1269, 1265 e séc. XIII,
respectivamente. Lorenzo apresenta ainda o advérbio apregoadamente na Crónica de Castilha.
O verbo está atestado no século XIII.

ARRAIA, s.f. (1) ‘a camada social mais baixa da sociedade; plebe, ralé, arraia-miúda’.
«Prendestes-me como nom deviees, disse elle, mas pois assi he, leixaae vĩir a arraya
meuda das vinhas, ca elles me tiraróm d’aqui». (609.19).

Etimologia: do ár. ar-raHýa ‘rebanho’, p. ext. ‘ovelhas (da igreja), súbditos, plebe’.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, arraia1 “No séc. XIV, por cit. de F. L., (J., I, cap. 43, p. 86): «Desta guisa… se
levamtarom os poboos em outros lugares, seemdo gramde cisma e divisom amtre os gramdes e
os pequenos. O qual ajumtamento dos pequenos poboos, que se estomçe assi jumtava,
chamavom naquell tempo arraya meuda…» Deste passo parece deduzir-se que no tempo de F.
L. a locução teria menos uso; hoje, porém, é corrente, pelo menos em Lisboa.”
- IVPM: XV, arraya meuda (LOPF 177.19; LOPJI1 75.22).
- VH-CPM: XV, arraia (LOPF, 177.19; LOPJI1, 75.22).
- BLem: XV, arraya (LOPF; LOPJI1; LOPJI2); arraia (LOPJI2).
- MD-CF: XV, arraya (LOPF).
- Houaiss: XV, arraya meuda (cf. IVPM).
Obs.: Com este significado, a primeira utilização deste vocábulo parece ser na expressão arraya
meuda, nas duas obras de Lopes. JPM3 destaca a antiguidade do uso oral face ao registo escrito,
com a dedução acima apresentada. Esta é uma boa palavra para demonstrar como o VH-CPM
não aproveitou informação contida no IVPM. Neste, Cunha apresentou a palavra arraia com
quatro entradas diferentes, dando o respectivo significado para cada uma (‘fronteira’, ‘peixe’,
‘povo, gente’ e ‘embarcação antiga’) e a(s) correspondente(s) abonações. No VH-CPM, tudo foi
foi reduzido a uma entrada, com omissão de dois significados e respectivas abonações:

125
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ARRANCADA, s.f. (2) ‘partida súbita e violenta; arrancamento, arrancadela’.


E quando o porco assi naceo, o outro alaão Rrabez deu hũua arrancada, e o Bravor teve-
sse quedo; e quando Rrabez vio que sse o porco saya e que o nom desatreellavom, fez hũua
grande arrancada per hũu mesto mato, levando após ssi o page e o outro alaão. (353.55,
57).

Etimologia: fem. substv. de arrancado, part. de arrancar. Sobre este verbo, de origem
controversa, Houaiss refere que é “voc. hsp., doc. desde as origens do port.; há
várias hipóteses de etim., principalmente a partir do germ. hring ‘romper as fileiras
(de soldados)’, daí, ‘debandar, separar, desenraizar’;” informação proveniente de
Corominas, como menciona na entrada arranc-.
Tipo de unidade: derivação imprópria.
Registos:
- AGC: XV.
- IVPM: XV, (LOPF 99.57).
- VH-CPM: XV, arrancada (LOPF, 99.57).
- BLem: XV, vb. part. arrancada (LOPF).
- MD-CF: XV, arrancada (LOPF).
- Houaiss: XV, rancada (cf. IVPM).
Obs.: BLem não faz a distinção e junta esta forma às do particípio do verbo arrancar. Tal
junção elimina três séculos entre a datação da base e o nome deverbal criado por Lopes. Ainda
sobre a datação do verbo arrancar, Houaiss indica as datas de 1188-1230, remetendo para
JPM3, e apresenta na f. hist. rancauerit, como sendo a mais antiga atestação, além de duas
outras, uma do séc. XIII, arrãcar, e outra do séc. XIV, arincar. São evidentes as diferenças de
registo entre estas formas, com a primeira a evidenciar ainda marcas claras do sistema verbal
latino. A serem estas marcas, de cariz evidentemente latino, consideradas para datações de
palavras da língua portuguesa, deveria Houaiss ter levado em conta a informação apresentada
por RLor (p. 29), que JPM3 aproveita sem citar, ao antedatar este mesmo verbo para o ano de
1114, com abonação do mesmo documento “qui autem arrancauerit armas in uilla perdat eas”
(Leges 360.10).
O verbo está atestado em 1188-1230.

ARREPICAR, vb. (1) ‘repicar, tocar’.


E assi foi de feito, ca logo como souberom na villa que elle era preso meterom maão a
arrepicar os signos, (610.21).

Etimologia: JPM3, RLor, AGC e Houaiss apenas apresentam o verbo repicar, de re- + picar,
com registo desde o séc. XIV189, e não a variante precedida do a- protético,
fenómeno com representação ao longo dos vários períodos da língua, aqui registada
pela primeira vez em LOPF. Sobre a etimologia do verbo picar, encontra-se em
Houaiss uma completa explicação: “voc. de criação expressiva, formado a partir de
uma base onom. *pic- (ou *picc-) ‘golpe’ + -ar; como se trata de palavra espalhada
por quase todas as línguas românicas (exceto o romeno), a sua form. expressiva
deve remontar ao lat.vulg.; AGC reitera a criação expressiva do voc. e afirma que o
v. deve remontar, prov., ao lat. vulg. *piccare, de *pīccus, forma expressiva de
pīcus,i ‘picanço (ave)’, cuja orig. tem a mesma raiz, alusiva aos golpes a que esse

189
RLor 1968:315.

126
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

pássaro se dedica; da idéia de ‘golpear’ passou-se à de ‘ferir’; Corominas observa


que a onom. foi criada duas vezes, em lat. e em romance; uma, com -c (pic-) e
outra com -cc (picc-); cp. esp. picar (sXII), fr. piquer (sXII) ‘demolir com golpes
de objeto pontudo’ e it. piccare ‘morder, espicaçar, picar’ e picchiare (1353) ‘bater
repetidamente, golpear’;”
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 177.21).
- VH-CPM: XV, arrepicar (LOPF, 177.21).
- BLem: XV, arrepicar (LOPF).
- MD-CF: XV, arrepicar (LOPF).
Obs.: Para o verbo repicar, o VH-CPM continua a apresentar três abonações, todas do séc. XV,
(LOPJI2, 331.31; ZURD, 155.19; ZURD, 52.23), mesmo com informações de datação do séc.
XIV registadas já em RLor, AGC e Houaiss.
O verbo picar está atestado em 1269.

ARVORADO, adj. vb. (1) ‘subido, espigado (referente a mastro, mastaréu)’.


Hindo elles assi d’esta guisa, seendo ja horas de meo dia, virom os mastos das gallees de
Castella que jaziam longe arvorados, em hũu lugar que chamam Saltes; (441.61).

Etimologia: part. de arvorar. Sobre a etimologia deste verbo, arvorar (de árvore + -ar), pode
ler-se em Houaiss a seguinte indicação: “AGC considera de orig. contrv. a acp.
‘içar, levantar’; nesta acp. arvorar seria var. de 1alvorar e esta, por sua vez,
proviria do it. alberare ‘guarnecer de árvores (plantar), pôr mastro numa nave’;
assim, 1alvorar não só teria etim. ligada ao voc. it., mas tb. remissão a arvorar
como f. divg.;”.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, arvorar1 “No séc. XV, o adj. arvorado: «virom os mastos das gallees de Castella,
que jaziam lomge arvorados», F.L., F., II, cap. 124, p. 92”.
- IVPM: XV, (LOPF 124.61).
- VH-CPM: XV, arvorado (LOPF, 124.61).
- BLem: XV, vb. arvorados (LOPF).
- MD-CF: XV, arvorados (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: A forma verbal alvorando tem registo em CAVA, com o significado de ‘levantar-se,
empinar-se’: “Pera tras me pode [sc. o cavalo] derribar alvorando, pulando, saltando, logo no
começo começando a correr [...].”190 Assim, o significado que aqui se verifica é diferente, é
precisamente o da forma divergente, como refere Houaiss na etimologia.
O substantivo está atestado em 984.

AZINHAL, s.m. (1) ‘aglomerado de azinheiras’.


ajuntou suas companhas e foi-sse apousentar acerca de Sam Domingos da Calçada, em
hũu azinhall mui grande que hi está; (21.8).

Etimologia: de azinha + -al.

190
CAVA, ed. de Piel, p. 21, linha 17.

127
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Tipo de unidade: derivação sufixal.


Registos:
- JPM3: XV, azinhal (“«…e ele disse que na Lemtisqua no azinhall d’Arronches…», F. L., J., II,
cap. 157, p. 342”).
- AGC: XV, azinhall.
- IVPM: XV, azinhall (LOPF 5.8; LOPJI1 174.8).
- VH-CPM: XV, azinhal (LOPF, 5.8; LOPJI1, 174.8).
- BLem: XV, azinhall (LOPF; LOPJI1; LOPJI2).
- MD-CF: XV, azinhall (LOPF); 1498, azinhall (Cortes Portuguesas); 1498, azinhal (Cortes
Portuguesas).
- Houaiss: XV, azinhall (cf. IVPM).
Obs.: Houaiss indica, por gralha, o século XIV, remetendo para o IVPM. No entanto, o que o
IVPM apresenta, bem como o VH-CPM, é o século XV, com duas abonações de Lopes. No séc.
XIV encontra-se atestado azinha e no XIII azinheira, o que é indicativo do registo escrito de
uma palavra derivada antes da primitiva.
Esta é uma palavra onde se nota a importância da dimensão e variedade do corpus de extracção
e de obras consultadas para a elaboração de um Dicionário Cronológico. Assim, se
pretendêssemos averiguar as ocorrências da palavra azinhal no séc. XV, teríamos JPM3 só com
referência a LOPJI2, o IVPM e o VH-CPM só com referência a LOPF e LOPJI2, MD-CF só com
referência LOPF e Cortes Portuguesas e BLem só com referência às três obras de Lopes, LOPF;
LOPJI1; LOPJI2. Em nenhuma se encontram as cinco referências identificadas. Isto não permite,
como é óbvio, quão arriscado seria, garantir que cinco é o número total de ocorrências desta
palavra no séc. XV.
O substantivo está atestado no século XIV.

BARROCAL, s.m. (1) ‘lugar onde há muitos barrocos (monte de terra ou pedra); barranco’.
cobrindo-sse ell e os seus o melhor que podiam antre as vinhas e barrocaaes que hi avia
muitos, (482.26).

Etimologia: de barroca + -al.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1680, (AOCad I.71).
- IVPM: XV, barrocaaes XV (LOPF 137.26).
- VH-CPM: XV, barrocaaes XV (LOPF, 137.26).
- BLem: XV, barrocaaes XV (LOPF).
- MD-CF: XV, barrocaaes (LOPF).
- Houaiss: XV, barrocaaes (cf. IVPM).
Obs.: JPM3 e RLor não registam esta palavra. Houaiss indica o séc. XV e remete para o IVPM
que confirma, tal como o VH-CPM, a única ocorrência em LOPF. AGC, não apresentando a
palavra na 1ª edição (1982), apresenta-a no Suplemento à 2ª edição (1986, p. 15), datando-a de
1680. Cunha corrige mais tarde (em 1988, no IVPM, volume 2: B-C, p. 7) esta data, com a
abonação de LOPF, atestação mais antiga até agora encontrada. A ‘terceira’ edição do seu
Dicionário Etimológico, elaborado pela Lexikon em 2007, mantém o data/erro da segunda
(1680), o que prova a ligeireza com que se utilizam os termos ‘edição’ e ‘reimpressão’. Não
houve, pois, correcções.

128
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

A palavra primitiva barroca, ‘monte de barro’ é datada do séc. XIII por JPM3, AGC e Houaiss,
mas, incompreensivelmente, do XV para IVPM e, por defeito, para o VH-CPM. Repare-se que
o vocábulo é introduzido no suplemento à segunda, em 1986, mas não é actualizado no segundo
volume do IVPM (letra B-C), em 1988.
O substantivo está atestado no século XIII.

BASALARTE, s.m. (1) ‘espada pequena, adaga’.


Em aquell dia aa tarde, depois que dançarom e ouverom vinho e fruita, mandou o conde
por hũua cota muito louçaã e hũu bulhom bem guarnido, a guisa de basalarte, e por hũua
faca mui fremosa que lhe trouverom de Ingraterra, e deu todo ao iffante.(365.18).

Etimologia: Para Corominas: “voz de existencia dudosa. 1ª doc. hasta 1300”.


Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 102.18).
- VH-CPM: XV, basalarte (LOPF, 102.18).
- BLem: XV, basalarte (LOPF).
- MD-CF: XV, basalarte (LOPF).
Obs.: JPM, RLor, AGC e Houaiss não registam esta palavra.
O IVPM apresenta o significado de ‘veste’, mas, neste caso, penso aplicar-se mais a acepção de
‘arma de guerra’, como se verifica no Glosario de voces de Armería191, em que se apresenta o
significado de ‘arma punzante’, com duas abonações do Cancionero de Baena, e como refere
também Salvador López Quero192: “Es poco relevante la variedad de armas en el Cancionero.
Se han podido documentar las seguientes: azcona, basalarte, cañas, destral, gorguz, quadrillo y
venablo. (…) En cuanto a las armas restantes, basalarte, ‘espadín o espada corta’, se
documenta por vez primera en el Cancionero”
O corpus electrónico CORDE apresenta uma ocorrência para basalarte, também nas poesias do
Cancionero de Baena, datadas entre 1406 e 1435. A entrada na língua portuguesa parece, pois,
ser por via castelhana.

BEGUE, s.m. (2) ‘título (ou cargo) honorífico correspondente a dom ou senhor’.
e de França eram hi estes cavalleiros: monssé Beltram de Claquim e o mariscall de França
e o begue de Vilhenes (21.22).
o conde da Ilha e dom Bernall conde de Ossona e o bastardo de Bearmem e monssé Berni
de Villamur e el-begue de Vilhenes; (57.19).

Etimologia: Houaiss deriva-o do persa-tur. beg, com indicação de que “Crooke deriva-o do ant.
persa baga, relacionando-o com o sânsc. bhaga ‘senhor’”193.
Tipo de unidade: importação (persa).
Registos:
- JPM3: 1513, begue “«Despemdeo em ir arrecadar os seis centos pardaos de Cojibequy que
devia a El Rey», Afonso de Albuquerque, Cartas, V, p. 48”.

191
Glosario de voces de Armería, apuntes reunidos por D. Enrique de Leguina, Madrid, Librería de Filipe
Rodríguez, 1912, p. 375.
192
“Léxico militar en el Cancionero de Baena” in Juan Alfonso de Baena y su Cancionero. Actas del I
Congreso Internacional sobre el Cancionero de Baena (Baena, del 16 al 20 de febrero de 1999). Eds. Jesús Luis
Serrano Reyes and Juan Fernández Jiménez. Baena: Ayuntamiento de Baena / Diputación de Córdoba. pp. 259-278.
193
Exposição mais pormenorizada encontra-se em JPM3, vol. I, p. 409-410.

129
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- AGC: 1513, cojibequy.


- IVPM: XV, (LOPF 5.22; 16.19).
- VH-CPM: XV, begue (LOPF, 5.22), el-begue (LOPF, 16.19).
- BLem: XV, begue (LOPF).
- MD-CF: XV, begue (LOPF), el-begue (LOPF).
- Houaiss: XV, (1608 cf. Pérsia).
Obs.: Houaiss apresenta diversas grafias desta palavra muito anteriores à data apresentada,
embora com grafias diferentes: cojibequy (1513), byqym (1520), indobeque (1552), cogebequi
(1563), bec (1571); há ainda assadbegue e begue (1608), beg (1718), bei (1789), beque (1884).
No entanto, tendo em conta só a grafia begue, é possível antedatar a indicação de Houaiss em
cerca de um século e meio, na obra de Lopes.

BICADA, s.f. (1) ‘borda, ponta, extremidade de uma serra, monte’.


Em este comeos sobreveo o gram porco, seguro e desacompanhado de sabujos e d’alaãos,
exudrado por a gram calma que fazia, e veo nacer per a bicada de hũu monte junto com a
armada hu jazia o iffante e seu page dormindo. (352.46).

Etimologia: Para Houaiss do fem. substv. do part. bicado, de bicar (bico + -ar). Corominas, na
entrada bico, refere “ ‘parte saliente de la cabeça de las aves’; según muestran el
port. y ast. bico e las formas análogas de muchos dialectos franceses,
retorromances y sardos, no se trata de un derivado del verbo PICAR, sino del celta
beccus194 íd. (de donde cat., oc., fr., bec, it., becco195), que en muchas partes sufrió
progresivamente el influjo fonético de aquel verbo.”
Tipo de unidade: derivação imprópria.
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 99.46).
- VH-CPM: XV, bicada (LOPF, 99.46).
- BLem: XV, bicada (LOPF).
- MD-CF: XV, bicada (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Houaiss, data o verbo bicar do século XV (a.sXV cf. IVPM), mas com a indicação de ser
“datado a partir do feminino substantivo do particípio” onde se pode verificar que o particípio,
ou outras formas verbais, servem como datações para os verbos196. Verifica-se também a
situação em que os femininos substantivados de adjectivos participiais podem ser datados de
qualquer das formas flexionadas do verbo, acrescentando-se, no final da etimologia, a
indicação: ‘datado a partir do (particípio ou verbo)’, de acordo com o caso. Ora, aqui, a situação
é algo especial, pois a forma feminina substantivada, é datada a partir do seu particípio
masculino. Assim, o verbo é datado a partir do seu particípio, mas que não é particípio, porque
foi substantivado na forma do feminino bicada. As formas verbais de bicar (nominais e
flexionais) só passados quatro séculos, segundo os corpora utilizados, é que encontram registo
na língua, como se pode verificar na f. hist. apresentada por Houaiss: sXV bicada, 1858 bicado,
1881 bicar.

194
Cf. Houaiss s.v. bic- do lat. imp. beccus, i ‘bico, sobretudo o do galo’.
195
Cf. Ortographia, Leão, onde regista ‘bico, becco’ como “vocábulo que tomamos dos Italianos”, p. 52.
196
Cf. detalhamento dos verbetes, ponto 4.3.3.1.

130
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

BÓIA, s.f. (1) ‘objecto flutuante sobre a água’.


E hindo ellas assi aas vellas com minguado vento que todas aviam, por fortuna encaminhar
o que d’ellas hordenado tiinha, deu estonce tam gram vista a algũus pescadores que a duas
e tres legoas virom boyas de rredes que no mar jaziam; (440.52).

Etimologia: do fr. ant. ou dial. bouée ‘sinal flutuante’, prov. do frânc. *baukan ‘sinal, bóia’.
Para Corominas, donde esta informação provém, “no está bien estudada la história
del vocablo en francés”197.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: XV, bóia “«Sospiros por fengidores / Aguyar lhe fez cantigua / sabendo que nos amores
/ sam boyas dos desfavores…» C. Ger., I, p. 76”.
- AGC: XV, boya.
- IVPM: XV, boya (LOPF 124.52).
- VH-CPM: XV, boyas(LOPF, 124.52).
- BLem: XV, boyas (LOPF).
- MD-CF: XV, boyas (LOPF).
- Houaiss: XV, boya (cf. IVPM).
Obs.: Segundo JPM3, o verbo boiar provém de bóia, ambos datados do séc. XV. Houaiss, que
também apresenta este procedimento, verbo denominal, portanto, data-o do séc. XIII, remetendo
para o IVPM e este, por sua vez, para RLor. Significa isto que a palavra primitiva só encontra
registo escrito dois séculos depois da derivada, precisamente em LOPF.

BOIANTE, adj. (1) ‘que bóia, flutuante’.


As gallees de Purtugall que andavom pella costa, tomarom algũuas naaos boyantes e hũu
barco no rrio de Pontevedra, (105.14).

Etimologia: Para Houaiss de boiar + -nte. Para Corominas é precisamente de boiante que se
forma o “ingl. buoyant íd. [1578], to buoy ‘boyar’ [1596], que se tomaría
directamente del castellano o del portugés en lá época de los grandes
descubrimientos, pues en francés no existen formas semejantes”198.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: XV, boyante (LOPF, 31.14).
- IVPM: XV, boyante (LOPF 31.14), (1441 MARR I.534.24).
- VH-CPM: XV, boyantes (LOPF, 31.14).
- BLem: XV, boyantes (LOPF)199.
- MD-CF: XV, boyantes (LOPF).
- Houaiss: 1441, boyante (cf. IVPM).
Obs.: JPM3 e RLor não registam esta palavra. Houaiss apresenta a data de 1441 remetendo para
o IVPM. Ora, aqui são apresentadas duas abonações: uma de LOPF e outra de MARR, datada,
precisamente, de 1441. Isto leva-me a concluir que Houaiss considera a Crónica de D.
Fernando posterior a esta data. Se tivermos em consideração que, não havendo uma data exacta,
os estudos indicam que ela deverá ter sido escrita “nos finais da quarta década do século XV ou

197
Para um maior aprofundamento, cf. s.v. boya.
198
Cf. s.v. boya.
199
Forma identificada como adjectivo, mas lematizada para boante, talvez bo[i]ante.

131
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

no início da seguinte, em qualquer caso antes de 1443”200, ficamos com uma margem de dois
anos para a elaboração de LOPF.
O VH-CPM omite a abonação de 1441 MARR, apresentada no IVMP, o que vem confirmar a
discrepância entre estes dois elementos de trabalho. Aliás, O VH-CPM omite todas as
abonações referentes a esta obra (cf. arauto e bombarda), o mesmo é dizer que omite a própria
obra.
O verbo está atestado no século XIII.

BOFAR, vb. (1) ‘expelir pela boca; golfar’.


e ella levantou outra voz e disse: «Jesu filho da Virgem, acurre-me»: e esta foi sua
postumeira pallavra, dando o sprito, e bofando muito sangue d’ella. (372.104).

Etimologia: Para Houaiss de bofe + -ar, com a seguinte explicação “segundo Corominas, orign.
var. gráf. de bufar, firma-se depois como f. divg., de mesma orig. onom.”.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, bofando (LOPF).
- MD-CF: XV, bofando (LOPF).
Obs.: À excepção de BLem, que lematiza o gerúndio para bofar, AGC, VH-CPM e IVPM
indicam o verbo bufar para a forma bofando. O IVPM menciona mesmo bofar, remetendo para
bufar. JPM3 regista apenas bufar, sem indicação em LOPF, e RLor não apresenta nenhum
registo.
Se atendermos à explicação de Corominas acima apresentada, percebemos que é um verbo que
diverge de bufar. Para este, Houaiss apresenta a datação do séc. XV (com a f. hist. bofar) e com
o significado de ‘expelir (ar, sopro, vapor ou outra emanação) com força’. Para bofar,
Corominas apenas indica que se forma depois, sem especificar quando é esse depois, mas a que
Houaiss atribui data recente (a1913 cf. CF2), com o significado de ‘expelir pela boca; golfar;
sair às golfadas’, precisamente o que me parece que ocorre em LOPF. A utilização do ‘o/u’
parece, pois, ser distintiva na matéria expelida.
O substantivo está atestado no século XV.
Ainda sem registo no CIPM.

CABO, s.m. (1) ‘ponta ou porção de continente que avança mar adentro’.
e levava cem mill livras pera pagar solldo aa frota de Portugall; e a través do cabo de
Santa Maria de Faarom chegarom a ella as gallees de Castella e matarom o meestre com
outros e d’elles cativarom, e queimarom a naao e tomarom os dinheiros. (145.62).

Etimologia: do lat. caput, ĭtis ‘cabeça, parte superior, bico, ponta, cabo, extremidade’, com o
seguinte complemento “através do lat. vulg. capus, i, do qual se orig. os voc.
român. correlatos romn. cap, it. capo, engad. ko, friul. kaf, fr. chef, provç. cat. cap,
esp. port. cabo, todas com ampla diversificação semântica”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- Houaiss: XV, 2cabo (acepção 6).

200
Cf. Teresa Amado, in G. Tavani e G. Lanciani (1993). Dicionário da Literatura Medieval Galega e
Portuguesa, Lisboa: Caminho, p. 179.

132
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Esta palavra tem registo em todos os trabalhos que fundamentam esta pesquisa, com
datações a partir do séc. XIII, e com várias acepções apresentadas, mas sem lhes fazer as
respectivas abonações.201 A excepção é feita ao IVPM que apresenta uma distinção bastante
detalhada. Assim, regista cabo como ‘acidente geográfico’ e apresenta duas abonações de
Zurara (ZURD, 250.21 e ZURG, 5.18). No entanto, com este mesmo significado aparece antes,
em ZURP, obra não incluída no seu corpus de extracção, e aparece ainda antes, em LOPF,
como se atesta no exemplo acima. Por defeito, o VH-CPM também não atesta esta acepção em
LOPF.

CALUGA, s.f. (1) ‘cachaço e espádua do porco’.


e entom foi feita a mais fremosa azcumada de seu braço que atá ali fora vista nem ouvida
antre monteiros, porque as cuitellas da azcuma entrarom pellos polpoões da coxa e
cortarom os ossos e as juntas e sahirom as cuitellas com toda a asta pello conto da azcuma
da outra parte da calluga da espalda. (353.72).

Etimologia: (?)
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- IVPM: XV, calluga (LOPF 99.72).
- VH-CPM: XV, calluga (LOPF, 99.72).
- BLem: XV, calluga (LOPF).
- MD-CF: XV, calluga (LOPF).
Obs.: JPM3, RLor, ACG e Houaiss não registam esta palavra. O significado é retirado de CF25.

CANELO, s.m. (1) ‘pedaço de ferradura; ferradura velha, gasta’.


e em cahindo assi ambos, começou o cavalo bullir rrijamente com as maãos e com os pees;
e perneando assi rrijamente, acertou o canello da ferradura da maão ho tecido d’hũua
fivella das solhas de Nun’Allvarez, (485.66).

Etimologia: de canela, do fr. ant. canele, com a seguinte explicação em Houaiss: “(…) para a
acp. ‘parte anterior da perna’, a orig. é contrv.: AGC e JM relacionam a cana, prov.
cana + -ela, e segundo Nasc., do lat. *cannella, em vez de cannŭla, ae ‘pequena
cana’ ”.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, canelo “«As ferraduras leves e curtas de canellos fazem melhoramento», António
Galvão, Tratado da Cavalaria de Gineta, p. 45”.
- AGC: XVI, canello.
- IVPM: XV, canello (LOPF 138.66).
- VH-CPM: XV, canello (LOPF, 138.66).
- BLem: XV, canello (LOPF).
- MD-CF: XV, canello (LOPF).
- Houaiss: XV, canello (cf. IVPM).
Obs.: RLor não propõe antedatação para o séc. XVI apresentado por JPM.
MD-CF regista ainda canello em Bento Pereira, Tesouro da lingua portuguesa 1, (1697), com o
significado de ‘pedaço de ferradura’.

201
BLem apresenta 38 obras em que ocorre a palavra cabo(s).

133
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

CARNAGEM, s.f. (1) ‘matança de animais para alimentação’.


e chegarom muito mais acima aas leziras d’Aalbaçotim e d’Alcoelha, e alli matavom
muitos gaados e faziam carnagem tragiam pera a frota. (476.47).

Etimologia: de carnar202 + -agem.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, carnagem “«… õde todas fazerã aguoada, lenha & carnagẽ de lobos marinhos…»,
Góis, I, cap. 35, p. 68”.
- IVPM: XV, (LOPF 135.47).
- VH-CPM: XV, carnagem (LOPF, 135.47).
- BLem: XV, carnagem (LOPF).
- MD-CF: XV, carnagem (LOPF)203.
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: RLor não propõe antedatação. AGC não regista.
No corpus MD-CF são apresentadas cinco abonações para carnagem, uma de LOPF, duas da
Estoria de Dom Nuno Alvares Pereyra e duas do Diário de bordo de Fernão de Magalhães. E
se esta última obra, porque posterior a LOPF, não merece análise, o mesmo já não de pode dizer
da Coronica do Condestabre, o que, neste caso, provocaria antedatação. Após confirmação na
edição204, verifiquei que a forma carnagem nas passagens em causa, “e a carnagem demostrava
que era muyta gente posta em batalha” e “andando de hûa parte a outra fazendo passar toda
carnagem, que era maa de passar, pella ponte” correspondia à forma carriagem, quer na
edição de 1911, de Mendes dos Remedios205, quer na de 1991, de Adelino de Almeida
Calado206. O significado apresentado no vocabulário da edição de 1911 é de ‘o mesmo que
multidão ou serie de carros’ e no glossário da de 1991 é de ‘grande número de carros para
transporte’, bem diferente, portanto, desta passagem de LOPF.
Para Kremer 1507.
O verbo carnar não apresenta datação em Houaiss, mas o substantivo carne está atestado no
século XIII.

CECEAR, vb. (1) ‘pronunciar as consoantes sibilantes apoiando nos dentes a ponta da língua’.
E foi sua morte viinte e tres dias de março de mill e quatrocentos e sete, avendo entom de
sua hidade trinta e cinquo anos e sete meses: homem de boom corpo, branco e rruivo, e
ceceava hũu pouco na falla; (85.11).

202
Carnar (carne + -ar): ‘Proceder à matança de animais para fazer reserva alimentícia de carne’. Este
significado justifica a formação da palavra por via latina (de caro, carnis, ‘carne’), como sugere Corominas. JPM
apresenta, no entanto, proveniência do francês: “Do fr. carnage, tirado do picardo ou do normando; o ant. fr. Tinha
charnage, der. de char. Quanto ao lat. carnaticu-, vj.: Henry F. Muller, L’Époque Mérovingienne, p. 260”.
203
No MD-CF podem ainda encontrar-se mais duas ocorrências para carnagem na Estoria de Dom Nuno
Alvares Pereyra
204
No MD-CF não são apresentadas quaisquer indicações sobre capítulo ou página. Aqui se pode verificar a
importância da informática em estudos linguísticos desta natureza. Alguns segundos e as localizações estão feitas.
205
Cf. p. 18, linha 31 e p. 163, linha, 31. No final da edição é apresentado um vocabulário onde se pode
encontrar a palavra carriagem (p. 217), com indicação de três ocorrências. Duas delas são as assinaladas, a outra é
também na p. 18, linha 20.
206
Cf. p.17, linha 24 e p. 156, linha 24.

134
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: de cê + cê + -ar, com justificação de “talvez pelo esp. cecear (1272-1284), der. do
nome da letra, com a acp. ‘pronunciar o s como c’ ”, informação retirada de
Corominas207.
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Registos:
- JPM3: XV, cecear “«…homem de boom corpo, bramco, e ruivo, e çeçeava huum pouco na
falla», F. L., F., cap. 24, p. 69”.
- AGC: XV, çeçear.
- IVPM: XV, (LOPF 24.11).
- VH-CPM: XV, ceceava (LOPF, 24.11).
- BLem: XV, ceceava (LOPF).
- MD-CF: XV, ceceava (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Um dos problemas de pesquisa dos corpora informatizados, como o MD-CF ou o
CORDE, é que só reconhecem a palavra exacta, pelo que se torna difícil procurar formas
flexionadas dos verbos. O mesmo se pode dizer relativamente a palavras mais antigas que
apresentam várias grafias. Só o seu conhecimento exacto permite a sua pesquisa. Neste ponto,
mérito para o VH-CPM que, tanto na pesquisa para o português actual, como para o português
medieval, é possível ver o surgimento das várias formas, à medida que vão sendo digitadas as
letras.
Ainda sem registo no CIPM.

CIPRE, s.m. (1) ‘perfume de Chypre(?)’.


e rreligairos e anees d’ouro e camafeus e outras joyas de gram preço, afora sayas e cotas e
cipres de dona, (166.31).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- IVPM: XV, (LOPF 49.31).
- VH-CPM: XV, cipres (LOPF, 49.31).
- BLem: XV, cipres (LOPF).
- MD-CF: XV, cipres (LOPF).
Obs.: Apenas registado em CF2, com dúvidas no significado e na atribuição de género, “m. (ou
f.?)”, e cita a abonação de LOPF.

COBRICAMA, s.f. (1) ‘coberta da cama’.


A cama era bem emparamentada, e a cubricama d’hũu tapete preto com duas grandes
figuras de rrei e de rrainha na meatade, todas d’aljofar graado e meaão, (460.32).

Etimologia: segundo Houaiss, “agl. do snt. cobre cama determinada pela perda de tonicidade
do el. cobre, o que levou a ser grafado com -i em lugar de -e”.
Tipo de unidade: composição.
- IVPM: XV, (LOPF 130.32); (1452 LOPO 19.7).
- VH-CPM: XV, cubricama208 (LOPF, 130.32).

207
Cf. s.v. ce, linhas 14 a 23, onde Corominas apresenta a data [1272-84, Gral. Est. I, 302b1].
208
Lematizado para cobrecama.

135
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- BLem: XV, cubricama (LOPF).


- MD-CF: XV, cubricama (LOPF).
- Houaiss:
Obs.: No IVPM e no VH-CPM, que omite a abonação de LOPO, estão, precisamente
lematizadas para cobrecama, sem perda da tonicidade do primeiro elemento, como refere
Houaiss na etimologia. Este não apresenta, no entanto, datação para esta palavra.
O verbo e o substantivo estão atestados no século XIII.

COLMEIRO, s.m. (1) ‘molho de colmo ou de palha’.


e ventando estonce hũu vento soaão, tomou hũu d’aquelles que estavom fora hũu collmeiro
aceso posto em hũua lança e deitou-ho dentro em cima das choças, e começarom d’arder.
(274.41).

Etimologia: de colmo + -eiro. Corominas apresenta alguma relutância em relação a esta


origem: “quizá del lat. cŭlmus ‘tallo o caña del trigo’, pero más bien parece tratarse
de un * Cŏlmos afín, perteneciente a outra lengua indoeuropea, probablemente el
céltico”209.
Tipo de unidade: drivação sufixal.
Registos:
- RLor: 1206, *colmeiro “«colmeeiro de mea liura de cera» Leges 535)210”.
- IVPM: XV, collmeiro (LOPF 79.41).
- VH-CPM: XV, collmeiro (LOPF, 79.41).
- BLem: XV, collmeiro (LOPF).
- MD-CF: XV, collmeiro (LOPF).
Obs.: JPM, AGC e Houaiss não registam esta palavra.
O substantivo está atestado em 1277.

COXIA, s.f. (1) ‘nas antigas galés, corredor por entre os remadores onde ficavam os comitres a
vigiá-los’.
e mandou poer por nobreza muitos e grandes dentes de porcos monteses, encastoados ao
longo da coxia d’amballas partes da galee, e todollos rremos pintados, e outros logares
por fremosura. (166.18).

Etimologia: Para Houaiss do it. corsia (1492), com a seguinte explicação: “ ‘corrente de água,
corredor us. como passagem ao longo de espaços laterais ocupados’, der. do lat. tar.
cursīvus ‘que percorre’, do lat. cursus, us ‘corrida, caminho, percurso’ ”;
Tipo de unidade: importação (italianismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«…e com a lamça nas maãs pella coxia ao longo…», F. L., J., I, cap. 139, p. 278”.
- RLor: XV, “«leixou a galle… e com a lamça nas maãs pella coxia ao longo» (D. João I, I,
278) 211”.

209
Cf. s.v. cuelmo.
210
Como JPM não regista esta palavra na primeira edição, nem na terceira, RLor apresenta-a antecedida de
asterisco. Parece, no entanto, haver alguma confusão de significados entre a palavra abonada colmeeiro e a sua
lematização para colmeiro. Como se verifica em Morais ou em Viterbo, os significados são diferentes. Para colmeiro,
‘o que colma as casas; o feixe de colmo para as cobrir’ e ‘pavêa, braçado, molho, não só de Colmo, ou palha centêa;
mas tambem de palha triga, painça, ou milha’, respectivamente. Para colmeeiro, ‘o que cuida das colmeyas’ e ‘o que
trata de Colmêas’, também respectivamente.

136
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- AGC: XV.
- IVPM: XV, (LOPF 49.18).
- VH-CPM: XV, coxia (LOPF, 49.18).
- BLem: XV, coxia (LOPF, LOPJI1).
- MD-CF: XV, coxia (LOPF).
- Houaiss: XV, coxia, coxya (cf. IVPM).
Obs.: A data apresentada por Houaiss para a etimologia italiana (1492), ela é tardia212.

CRAVEIRO, s.m. (2) ‘chaveiro, claviculário; frade que, nas Ordens militares, tinha a chave do
convento’.213
e mandou aas villas e logares da hordem d’Alcantara que ouvessem por logoteente do
meestre d’essa hordem Garcia Perez do Campo craveiro. (98.35).
e outro dia aa quarta-feira mandarom toda sua presa de gaado e prisoneiros pera
Badalhouce, e os meestres com sua companha partirom pera as Broças, por teer o caminho
ao prior do Crato e ao Craveiro, que lhes era dito que as tiinham cercadas; (424.38).

Etimologia: segundo CF2, por claveiro214 do lat. clāvis.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, clavário “«ouuimos depois a Luis de Sousa, claueiro d’ordem de Christo», Ceuta,
cap. 41, p. 127. No séc. XIV como antr. F. L., J., I, cap. 93, p. 175; cap. 95, p. 182”.
- AGC: 1813.
- IVPM: XV, craueiro (LOPJI2 150.19), craueyro (LOPJI2 268.8).
- VH-CPM: XV, craueiro (LOPJI2, 150.19), craueyro (LOPJI2, 268.8).
- BLem: XV, craveiro (LOPF; LOPJI1; LOPJI2).
- MD-CF: XV, craveiro (LOPF).
- Houaiss: XV, craueiro, craueyro. (cf. IVPM).
Obs.: O IVPM apresenta para esta palavra a primeira atestação em LOPJI2, como substantivo
masculino. Para JPM3, clavário, claveiro, craveiro “formações cultas sobre o lat. clāvis”,
remetendo para Viterbo, que apresenta o seguinte significado: “Era propriamente hum
Mordomo, Despenseiro, ou Porteiro-Mór, a quem estavão cometidas as chaves das principaes
Officinas da Communidade”215. Em Morais: “Officio no Covento do Carmo, do Padre que cuida
das contas da Communidade. Claveiro, ou alias Craveiro. Elucidar.”216.
Na primeira ocorrência fica em aberto a utilização de antropónimo217, mas não descarta a
utilização de adjectivo, referindo-se às funções de Garcia Perez do Campo. Na segunda, a
utilização como substantivo, apesar de maiúscula, com o significado apresentado por Viterbo
parece ser aceitável.

211
RLor corrige a data apresentada por JPM, (s.v. correr: “coxia, do it. corsia, este do lat. tardio cursīvu-,
pelo que é divergente de cursivo; séc. XVI, segundo Morais2; a passagem –rs- > ss- > x- ter-se-ia verificado em port.?
Cf.: Gonçalves Viana, Apostilas, I, p. 337”) do séc. XVI, para o XV com uma abonação de LOPJI1, precisamente a
que Machado apresenta na terceira edição. Verifica-se, pois, que algumas palavras antedatas por RLor foram tidas em
consideração por Machado para a terceira edição do seu dicionário (como esta), mas outras mativeram a datação
errada. De qualquer forma, a palavra coxia aparece registada em LOPF, anterior a LOPJI1.
212
Cf. introdução a Houaiss, ponto 44.6.
213
Segundo CF2. Com indicação de “por claveiro, do lat. clāvis”.
214
Do b. lat. clavarius.
215
Viterbo, s.v. clavario.
216
Morais4, s.v. clavario.
217
Grafado com maiúsculas na edição de 1895.

137
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

A data de AGC, sem significado, é inexacta e em Houaiss, pese embora as duas entradas, uma
como substantivo e outra como adjectivo, penso nenhuma delas se aplicar às passagens de
LOPF.

DESATRELAR218, vb. (1) ‘soltar da trela; desprender’.


E quando o porco assi naceo, o outro alaão Rrabez deu hũua arrancada, e o Bravor teve-
sse quedo; e quando Rrabez vio que sse o porco saya e que o nom desatreellavom, fez hũua
grande arrancada per hũu mesto mato, levando após ssi o page e o outro alaão. (353.56).

Etimologia: de des- + atrelar.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- AGC: 1836, (SC).
- IVPM: XV, desatreellar (LOPF 99.56).
- VH-CPM: XV, desatreellavom (LOPF, 99.56).
- BLem: XV, desatreellavom (LOPF).
- MD-CF: XV, desatreellavom (LOPF).
- Houaiss: XV, desatreellar (cf. IVPM).
Obs.: JPM regista apenas trela 1474, depois de correcção de RLor (p. 363), e atrelar do séc.
XVI: “Quero ila atrelando…” (Eufr., II, 6, 96). A data de AGC é tardia.
O verbo está atestado no século XV, tal como o substantivo trela que lhe dá origem.
Ainda sem registo no CIPM.

DESAZADO, adj. vb. (1) ‘sem aptidão, inábil, negligente, desmazelado’.


os outros disserom que aquell cardeall era desaazado e nom apto pera os trabalhos do
papado por muitas rrazoões, e nom fallarom mais em elle. (388.99).

Etimologia: part. de desazar (de des- + azar).


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- AGC: XVI.
- IVPM: XV, desaazado (LOPF 107.99).
- VH-CPM: XV, desaazado (LOPF, 107.99).
- BLem: XV, vb. desaazado (LOPF).
- MD-CF: XV, desaazado (LOPF).
- Houaiss: XV, desaazado (cf. IVPM).
Obs.: O verbo está atestado no século XIV, tal como o substantivo arzo que lhe dá origem.

DESCENTE, adj. (1) ‘descendente, que descende, que desce’.


E acontecendo que a iffante dona Beatriz morresse sem filho ou filha que d’el-rrei ouvesse
ou outros legitimos decentes de linha direita, que os rregnos de Portugall se tornassem a
algũua outra filha, (549.57).

Etimologia: de descer + -nte.


Tipo de unidade: derivação sufixal.

218
Cf. TRELA.

138
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Registos:
- IVPM: XV, decente (LOPF 158.57).
- VH-CPM: XV, decentes (LOPF, 158.57).
- BLem: XV, decentes (LOPF).
- MD-CF: XV, decentes (LOPF).
- Houaiss: XV, descente, deçemte, decente (cf. IVPM).
Obs.: JPM3, RLor e AGC apenas registam o verbo descender, no séc. XIII. Houaiss, que averba
descente, remetendo para IVPM, não aproveita, no entanto, o significado lá constante de
‘descendente, que descende, que desce; descida’.
O verbo está atestado em 1244.

DESEMBARCAR, vb. (2) ‘sair de uma embarcação’.


Depois partirom e desembarcarom em Vallença, cidade d’Aragom, e tornarom-sse as
naaos e gallees pera Portugall e trouverom conssigo dom Martinho castellaão, que era
bispo do Algarve. (301.54).

Outras ocorrências: 418.37.


Etimologia: de des- + embarcar.
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- RLor: XV, desembarcar “«alli desembarcou o Meestre com os que levava» (D. João I, I, 356),
«ata aquell logar hu desembarcara» (id.)”.
- AGC: XV.
- IVPM: XV, desembarcarom (LOPF 86.54).
- VH-CPM: XV, (LOPF, 86.54).
- BLem: XV, desembarcarom (LOPF), desembarcou (LOPF, LOPJI1), desembarcara (LOPJI1),
desembarquara (LOPJI2).
- MD-CF: XV, desembarcarom (LOPF).
- Houaiss: XV, desembarcar, desenbarcar (cf. IVPM).
Obs.: O verbo está atestado no século XIV, enquanto o substantivo barca que lhe dá origem
ocorre já em 911.
Ainda sem registo no CIPM.

DESNATURAMENTO, s.m. (1) ‘desnaturalização; perda da nacionalidade e dos direitos


adquiridos por naturalização).
Estas vinte e cinco cidades e Touro e Madride e Exarez e Caceres e outras muitas villas
que seeria longo de dizer, fezerom entom per seus procuradores preitos e menagẽes e
desnaturamentos por guarda das fianças antre os rreis postas, as quaaes em cima ja
teendes ouvidas. (584.98).

Etimologia: de desnaturar + -mento.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- AGC: XVI.
- IVPM: XV, (LOPF 169.98).
- VH-CPM: XV, desnaturamentos (LOPF, 16998).
- BLem: XV, desnaturamentos (LOPF).
- MD-CF: XV, desnaturamentos (LOPF).

139
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- Houaiss: XV, (cf. IVPM).


Obs.: Esta é uma das muitas formas que têm por base o radical natur-, registado desde o séc.
XIII, por exemplo em natural. Segundo Morais, o desnaturamento verificava-se “quando os
vassalos ficavão por garantes, e asseguradores dos Contratos dos seus Reis desnaturavão-se
para poderem ir contra o seu Rei, que faltasse ao contrato, sem incorrerem, ou caírem no caso
de traição, e deslealdade a seus Reis, e Senhores”219
O verbo está atestado no século XIV, enquanto o substantivo natura que lhe dá origem ocorre já
no XIII.

DESTRANCAR220, vb. (1) ‘soltar ou retirar a tranca de; abrir’.


Hora assi aveo, como suas tristes fadas mandarom, que o iffante com os seus aa porta, e
hũua molher que aviia de lavar rroupa destrancou as portas e abrio-as de todo; (370.44).

Etimologia: de des- + trancar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1813.
- IVPM: XV, (LOPF 103.44).
- VH-CPM: XV, destrancou (LOPF, 103.44).
- BLem: XV, destrancou (LOPF).
- MD-CF: XV, destrancou (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Da base da palavra tranca encontram-se em Lopes duas derivadas: o verbo destrancar,
aqui registado, e o adjectivo trancado (cf.), o que demonstra facilidade de construção de
palavras com recurso a processos internos da língua. A data de AGC é tardia.
O verbo está atestado no século XV, tal como o substantivo tranca que lhe dá origem.
Ainda sem registo no CIPM.

EIVADO, adj. vb. (1) ‘enfraquecido; infectado, contaminado’.


Hũus dizem que vendo-sse el-rrei dom Fernando eibado de doores, que ja tempo avia,
(533.13).

Etimologia: do part. de eivar (de eiva + -ar).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, eibado “«…ante que o figuado e bucho seja eivado logo o falcão será guarido,
mas se o falcão tiver o figuado e o bucho eivado, está en duvida se guarnecerá», P. M., p. 55;
noutra versão da mesma obra: «e sabe sse esto ffor ffecto ante que o bucho e o fígado sejam
eibados…», mesma p.”
- AGC: XVI.
- VH-CPM: XV, elbado (LOPF, 154.3)221.
- BLem: XV, eibado (LOPF).
- MD-CF: XV, eibado (LOPF)..
- Houaiss: XV, eibado (cf. FichIVPM).

219
Cf. Morais4 s.v. desnaturamento.
220
Cf. TRANCADO
221
Cf. p. 35, palavras mal lematizadas.

140
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Houaiss não apresenta datação para eivado como adjectivo, mas identifica esta forma
como particípio de eivar. Para este verbo, o primeiro registo apresentado é precisamente a
forma do particípio eibado.
A datação de AGC é tardia quer para esta forma, quer para o verbo eivar, que data de 1881.
Também em JPM3 a data é tardia. RLor não propõe antedatação.
O substantivo está atestado no século XV.

EMANQUECER, vb. tr. (1) ‘tornar(-se) coxeante, manco’.


Das cavallgadas e do seu quinto mandava el-rrei que tomassem o dizimo e mais hũu dia
de solldo de todollos que em algũu mester fossem, pera pagua dos cavallos dos
aconthiados que emmaquecessem ou morressem. (305.71).

Etimologia: de en- + manquecer.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- JPM3: XV, emanquecer “«E se lhe morrerem seus cavallos, ou lhe emmanquecerem de tal
manqueira, ou door, que nom sejam pera servir…», Ord., I, título LXXI, cap. 6, p. 489”.
- AGC: c1608, enmanquecer (NOReb 150.22).
- VH-CPM: XV, emmaquecessem (LOPF, 87.71).
- BLem: XV, emmaquecessem (LOPF).
- MD-CF: XV, emmaquecessem (LOPF).
- Houaiss: 1576, emmanquescer (DNLeO fº 45).
Obs.: As datações de AGC e Houaiss são tardias, pelo que o verbo manquecer está aí atestado
em c1555, enquanto o substantivo manco que lhe dá origem ocorre já no XIII.
Ainda sem registo no CIPM.

EMPICOTAR-SE, vb. (1) ‘colocar-se no pico’.


aconteceo hũu dia que o iffante se encontrou com hũu mui grande husso, e juntou-sse tanto
a elle pollo ferir amantenente que o husso firmou bem seus pees e levantou os braços por o
arrevatar da sella; e o iffante quando esto vio, empicotou-sse tanto sobre a sella que foi de
todo sobre o arçom deanteiro, (351.14).

Etimologia: de em- + picota ou picoto + -ar.


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- VH-CPM: XV, empicotou-sse (LOPF, 99.14).
- BLem: XV, empicotousse (LOPF)222.
- MD-CF: XV, empicotou-sse (LOPF).
- Houaiss: 1899, (cf. CF1).
Obs.: A datação de Houaiss é tardia.
Os substantivos picota e picoto estão atestados em 1145 e 1107, respectivamente.
Ainda sem registo no CIPM.

222
Em BLem, eventualmente para uma lematização mais uniforme, foram eliminados todos os hífenes, o que
em alguns casos causa ambiguidade, difícil de desfazer, uma vez que apenas apresenta a obra sem indicar a
localização. Torna-se, assim, imprescindível ter as obras informatizadas, de outra forma é impossível localizar os
passos e detectar diferentes significados.

141
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ENCALHAR, vb. (2) ‘apoiar directamente a quilha da embarcação no fundo do meio em que
flutua ou em algum obstáculo’.
E seis gallees d’el-rrei de Graada estavom encalhadas em seco, com medo d’as de
Bellamarim, e ouverom conhecimento das naaos que eram de Portugall per algũuas
pinaças que hiam deante, e juntarom-sse todos, e forom sobre as gallees de Bellamarim e
fezeram-nas tanto encalhar em terra que as defendiam os mouros de cima do muro.
(300.46, 50).

Etimologia: de en- + calhar.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- JPM3: XVI, encalhar (cf. Morais2).
- RLor: XV, encalhar “aa frota de Portugall que jazia emcalhada acerca dos muros” (D. João I,
I, 275)
- AGC: XVI.
- VH-CPM: XV, encalhadas (LOPF, 86.46), encalhar (LOPF, 86.50).
- BLem: XV, encalhadas, encalhar (LOPF); emcalhada (LOPJI1)223.
- MD-CF: XV, encalhadas, encalhar (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: A antedatação de RLor a JPM, com uma abonação de LOPJI1, mas não a de LOPF, vem
justificar a pertinência dos corpora informatizados224. Para Kremer 1510.
O verbo calhar está atestado em 1611, enquanto o substantivo calha que lhe dá origem ocorre
em c1580, pelo que se verifica o registo gráfico do derivado antes da primitiva.
Ainda sem registo no CIPM.

ENFEITIÇAR, vb. (2) ‘submeter a acção de feitiço; seduzir, embruxar’.


nem el nom avia por que lhe teer esto a mall, ca nom quiriam perder hũu tam boom rrei
como elle por hũua maa molher que o tiinha enfeitiçado. (210.50).

Outras ocorrências: 232.35.


Etimologia: de en- + feitiço + -ar.
Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- AGC: 1614, (SGonç I.354.15).
- VH-CPM: XV, enfeitiçado (LOPF, 60.50).
- BLem: XV, enfeitiçado (LOPF).
- MD-CF: XV, enfeitiçado (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: É um dos casos em que se utiliza primeiro o particípio e só depois as formas finitas do
verbo225. Segundo o VH-CPM, feitiço, como substantivo, encontra-se atestado no século XIV
(TROY, 17.39 e PART, IV.938), embora Houaiss não indique datação (o mesmo para feiticeira,
REIX, II.158.98 no VH-CPM), uma vez que o século XV apresentado é para a classificação de

223
Forma lematizada para o verbo encalçar.
224
Veja-se a opinião de Robert Verdonk, face ao CORDE, p. 23.
225
A f. hist. do verbo enfeitiçar comprova esta situação. Cf. introdução de Houaiss, ponto 4.3.3.1.

142
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

adjectivo. JPM3 havia já indicado o mesmo século226. A data de AGC continua tardia, corrigida
de 1813, na 1ª edição, para 1614, no suplemento da 2ª.
O substantivo está atestado no século XV.

ENSECAR, vb. (1) ‘pôr ou ficar (embarcação) em seco; encalhar’227.


Joham Focim, quando vio que as gallees rremavom pera terra e que o almirante nom
curava d’aferrar com ellas, desejoso de bem fazer terreou tanto por dar em hũua gallee
ante que ensecasse que sse ouvera de perder, e nom lhe pode fazer nojo; (262.38).

Etimologia: de en- + seco + -ar.


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- RLor: XV, “«terreou tanto por dar em huuma gallee, ante que emsecasse» D. Fernando
(I,192)”.
- VH-CPM: XV, ensecasse (LOPF, 74.38).
- BLem: XV, ensecasse (LOPF).
- MD-CF: XV, ensecasse (LOPF).
- Houaiss: XV, emsecar (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor apresenta a obra de LOPF como primeira atestação para o verbo ensecar com a
indicação de que JPM não apresenta documentação para a palavra averbada (“1956b: sem
doc.”)228. Em JPM3 não se encontra averbada a entrada ensecar.
O adjectivo está atestado no século XIII.
Ainda sem registo no CIPM.

ENTESOURAR, vb. (2) ‘guardar como tesouro, acumular’.


o primeiro, gastamento em grande cantidade d’ouro e prata que antiigamente pellos rreis
fora entesourado, do quall, por aazo d’ella, foi a Aragom levada mui gram soma d’ouro,
como ja teendes ouvido; (187.7).

Outras ocorrências: 191.126.


Etimologia: de en- + tesouro + -ar
Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- AGC: XVI229.
- VH-CPM: XV, entesourado (LOPF, 55.7); enthesoura (SEGR, 18v).
- BLem: XV, entesourado (LOPF).
- MD-CF: XV, entesourado (LOPF).

226
Cf. JPM3 s.v. feitiço (vol. III, p. 32) “Como adj. no séc. XV: «…e como sse queria trabalhar d’aver chaves
feitiças pera abrir as portas de noite…», F. L., J., Iª parte, cap. 157, p. 334; na mesma época como s.: «…huu me falla
em estrollomia, outro me falla em semelhança de feitiços», Ceuta, p. 58”. Não se percebe o porquê da nota 1 aí
apresentada, dependente da classificação de adjectivo: “No séc. XIV a var. feitiço: «e pera esto ha de ter o dicto
samcristam huum cesto grande feetiço em que andem os monges quando cortarem os dictos matos», no Boletim da
Segunda Classe da Academia das Ciências de Lisboa, V, p. 335”. Falta contexto à frase, mas a interpretação como
substantivo também não me parece descabida.
227
Cf. os vários significados com as respectivas abonações de Morais4 s.v. ensecar.
228
Cf. RLor, p. 149 e JPM II.1956b, s.v. seco.
229
Com indicação de que “no port. med., na acepção de entesourar, ocorrem as formas tesourar e
thesaurizar, ambas no XIV”. O VH-CPM indica estas duas formas com abonações de ORTO, 106.6 (E a molher
casou cõ outro e lograrõ os bẽẽs que tesourou o auarẽto) e ORTO, 2.13 (Aprende hu he a prudencia, [...] hu som os
principes que das gentes que thesaurizam a prata e ho ouro [...]).

143
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- Houaiss: XV, entesourado (cf. FichIVPM).


Obs.: Nesta entrada entesourar, o VH-CPM apresenta ainda uma abonação de LEAL (114.25)
para o verbo tesourar, abonação que repete na entrada entesourar, agora datando LEAL do
século XIV230.
O substantivo está atestado em 1214.
Ainda sem registo no CIPM.

ERAMÁ, adv. (1) ‘em má hora’.


«Bem sabia eu que muito eramaa ca vehemos, pero ante lho eu dixe». (431.60).

Etimologia: da loc. em hora má.


Tipo de unidade: composição.
Registos:
- JPM3: 1505, eramá “«Nam ouço com a cainçada, / rapaz dalhe hũa pedrada / ou fartos eramaa
de pan», Gil Vicente, Quem tem Farelos?, na Copilaçam, fl. 193; notar agora na mesma obra
(fl. 194) este passo onde coexistem duas formas, a anterior e a resultante: «Que, ma ora
começara / os que maa sayda lhe sya / hi eramaa cantar aa praya». a var. aramá, também em
Gil Vicente (em 1534): «Ora tu nã ves que he grilo / vay te di arama vas / que eu nam ey
mester ouuido», Mofina Mendes, na Copilaçam, fl. 25 b”.
- RLor: “F. da Sylveira «conhecê-uos eera ma» (Crest. Arc. 495); G. Vicente «andar,
muytieramá» (62b3), «guarde-te Deos, earamá» (104a30), «dá-me essa mão, eyeramá. / Tir-
te, tir-te, eramá lá!» (303a18,19); «corremos a yramá» (407a34), etc.”
- VH-CPM: XV, eramaa (LOPF, 120.60).
- BLem: XV, vb + pronp eramaa (LOPF)231.
- MD-CF: XV, eramaa (LOPF).
- Houaiss: 1505, (cf. GVic).
Obs.: JPM3 e RLor apresentam várias formas que este advérbio assumiu, sobretudo em Gil
Vicente. JPM3 apresenta a data mais antiga como 1505, sendo que RLor faz referência ao poeta
palaciano Francisco da Sylveira, como primeira atestação. Houaiss, na entrada eramá, que data
de 1505, com a indicação de primeira ocorrência em Gil Vicente, apresenta ainda as seguintes
variações: aramá (d1441 cf. FLJoa), earamá (a1534), eremá (sXVI), ieramá (1502-c1536 cf.
GVic). De qualquer forma, todas posteriores a LOPF, uma vez que a indicação de ocorrência da
forma aramá em LOPJI, se tivermos em conta a sua cronologia, é a última a ser escrita pelo
cronista. A edição da organizada por Dias Arnaut para a Civilização Editora regista era maa e a
da Bibliotheca de Classicos Portuguezes, de 1896 (3º vol), hora má.
O substantivo e o adjectivo estão atestados no século XIII.

ESTIMATIVO, adj. (1) ‘relativo a estima (sentimento de apreço)’.


a primeira, porque aquello que em algũus he causa intrinseca das outras maneiras de
sandice he em estes causa de taaes amores: a segunda porque a virtude extimativa, que he
emperatriz das outras potencias da alma acerca das cousas senssivees, he tam doente em
taaes homẽes que nom julga o ogeito da cousa que vee tall quall elle he mas tall quall a
elle parece; (220.43).

Etimologia: de estimado, sob a f. rad. estimat- + -ivo.

230
Cf. supra p. 35.
231
Cf. supra p. 51.

144
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Tipo de unidade: derivação sufixal.


Registos:
- JPM3: XVI, estimativo (cf. Morais2).
- AGC: XVI.
- VH-CPM: XV, extimativa (LOPF, 63.43).
- BLem: XV, extimativa (LOPF).
- MD-CF: XV, extimativa (LOPF).
- Houaiss: XV, extimativo, 1532 jstimativo (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não propõe antedatação para a data apresentada por JPM, corrigindo, corrigindo
apenas a datação para o verbo estimar, de 1349 para 1264.
O adjectivo está atestado no século XIII.

EXSUDAR, vb. (1) ‘suar, transpirar’.


Em este comeos sobreveo o gram porco, seguro e desacompanhado de sabujos e d’alaãos,
exudrado por a gram calma que fazia, e veo nacer per a bicada de hũu monte junto com a
armada hu jazia o iffante e seu page dormindo. (352.45).

Etimologia: do lat. exsūdō, ās, āvī, āre, ātum232.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: 1864, “«O potro exsudava a torrentes e tremia convulsivamente», Camilo, Vinte Horas
de Leitura, cap. 9, p. 93”.
- AGC: 1881.
- VH-CPM: XV, exudrado (LOPF, 99.45).
- BLem: XV, exudrado (LOPF).
- MD-CF: XV, exudrado (LOPF).
- Houaiss: XV, exudrado, 1706 exsudar (cf. FichIVPM).
Obs.: Verbo datado a partir do particípio. As datações apresentadas por AGC e JPM3 são
tardias. RLor não propõe antedatação para a data apresentada por JPM.
Ainda sem registo no CIPM.

FEMENTIDO, adj. / s.m. (3) ‘que é desleal, que não cumpre a palavra, falso’233
e o principe, quando o vio, chamou-lhe treedor e fementido que merecia morte; e o
mariscall rrespondeo dizendo: «Senhor, vós sooes filho de rrei, e nom vos rrespondo como
poderia em este caso, mais eu nom ssom treedor nem ffementido». E o principe disse que
quiria estar a juizo de cavalleiros, e que lho provaria, e ell disse que ssi: e forom juizes
doze cavalleiros de desvairadas naçoões. E disse o principe contra elle que na batalha de
Piteus, que ell vencera, hu fora preso el-rrei de França, fora elle seu prisoneiro e posto a
rrendiçom, e lhe fezera preito e menagem, so pena de traiçom e ffementido, (37.10, 13,
19).

Etimologia: de fé + mentido (part. de mentir).


Tipo de unidade: composição.

232
JPM3 apresenta etimologia intermédia “do fr. exsuder, este do lat. exsudāre” (cf. p. 519).
233
O significado apresentado por Morais4 é mais literal: “Que mente e falta à fé dada, à fidelidade” (s.v.
fementido)

145
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Registos:
- JPM3: XV, adj. “«…e o Prinçipe, quamdo o vio, chamoulhe treedor e fementido que merecia
morte, e o mariscal rrespondeo dizemdo: «Senhor… mais eu nom som treedor, nem
fementido…», F. L., F., cap. 10, vol- I, p. 35”.
- AGC: XV, adj. e s.m..
- VH-CPM: XV, adj. e s.m. fementido (LOPF, 10.10); ffementido (LOPF, 10.13,19)
- BLem: XV, vb. fementido, ffementido, (LOPF).
- MD-CF: XV, fementido, ffementido, (LOPF).
- Houaiss: XV, adj. fementido, ffementido (cf. FichIVPM).
Obs.: Parece haver alguma confusão na classificação gramatical desta palavra. Das três
ocorrências registadas em LOPF, e apresentadas acima, em nenhuma situação se verifica a
utilização como verbo, como sugere BLem. AGC e o VH-CPM identificam, correctamente, a
classe de adjectivo nas duas primeiras ocorrências, e de substantivo na última. É verdade que
esta classificação parece forçada, mas se tivermos em conta o significado de ‘má fé,
infidelidade’, parece aceitável. Falta pois a JPM3, e sobretudo a Houaiss, a introdução desta
classificação.
O substantivo está atestado em 1111 e o verbo no século XIII.

FLECHEIRO, s.m. (5) ‘soldado que fazia uso de arco e flecha, seteiro’.
assi que eram per todos dez mill homẽes d’armas e outros tantos frecheiros: (25.19).

Outras ocorrências: 26.41; 43.79; 421.14; 453.61.


Etimologia: de flecha + -eiro.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: c1539, frecheiro (JCasD 90.8).
- VH-CPM: XV, frecheiros (LOPF, 6.19).
- BLem: XV, frecheiros (LOPF, LOPJI2, LOPJI2).
- MD-CF: XV, frecheiros (LOPF).
- Houaiss: XV, frecheiro (cf. FichIVPM).
Obs.: Em JPM3 apenas o registo e a indicação na entrada flecheiro “s. De flecha”.
O substantivo flecha está atestado no século XV, embora a sua variante frecha, da qual depende
este derivado seja do XIV.

FORREJAR, vb. (2) ‘o mesmo que forragear; ceifar forragem’.


e per esta guisa os capitaães que com el-rrei dom Henrrique viinham estendiam-sse pellos
termos da cidade a forrejar, sem torva que de nẽhũu ouvessem, (270.28).

Outras ocorrências: 467.61.


Etimologia: do fr. fourrager, segundo Morais4.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- BLem: XV, forrejar (LOPF).
- MD-CF: XV, forrejar (LOPF).
Obs.: O VH-CPM não apresenta qualquer forma ou variante deste verbo. Houaiss, AGC e JPM3
apenas registam o verbo forragear, datando-o todos do séc. XVII, mas JPM3 refere que
“forrejar no séc. XVI era considerado antiquado (vj. Duarte Nunes de Leão, Origem da Língua

146
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Portuguesa, cap. 17, p. 301, ed. De 1945)”234. Esta mesma observação, com a explicação do
significado do verbo forrejar encontra-se em Morais: “(do francês: fourrager.) Talar, roubar,
fazer damno, como quasi sempre se faz pelos que vão forragear na terra inimiga. Leão, Orig. c.
17 pag. 105. col. 1. V. Forragear”235 e também em Viterbo “Furtar, roubar, andar á pilhagem.
Hoje se diz Forragear: por buscar, e conduzir o pasto para as bestas do exercito; e a este pasto
chamão Forragem. E como este provimento de fenos, palhas, cevadas, &c. com muita
frequência se fazia nas terras dos inimigos, cujos campos se procuravam talar, roubar, e destruir,
foi muito fácil a translação da palavra”236.
Ainda sem registo no CIPM.

FORTES, s.m. (2) ‘moeda antiga’.


D’outras moedas que el-rrei dom Fernando fez, assi como fortes de prata, que valliam dez
solldos, e outros de viinte, (191.116).

Outras ocorrências: 194.35.


Etimologia: do lat. fortis, is.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- BLem: XV, adj. forte (LOPF).
- MD-CF: XV, fortes (LOPF).
Obs.: Como substantivo, com a acepção de ‘moeda antiga’, encontra-se em Viterbo e Morais
com a seguinte explicação: “Moeda de prata d’El-Rei D. Dinis com o valor de 40 réis, e meio
Forte com o de 20 réis. De huma parte tinha a Commenda de Christo com o nome de Rei na
orla, e da outra o Escudo Real com a Letra: Adjutorium nostrum in nomine Domini. El-Rei D.
Fernando fez bater meios Fortes com o valor de 29 réis cada hum, e dois ceitis. Depois ele
mesmo a rebaixou a 16 réis”237 e “Moeda delRei D. Fernando que valia 29 reis, e 2 seitis, ou
ceitis”238, respectivamente.
Quanto às obras/trabalhos que servem de suporte a esta pesquisa, nenhuma a regista como
substantivo, com a acepção de ‘moeda antiga’. BLem engloba todas as formas na classificação
de adjectivo e MD-CF, como corpus de português, apenas apresenta as passagens da obra. O
VH-CPM averba forte como adjectivo e advérbio, mas sem nenhuma abonação de LOPF239.

FUGIMENTO, s.m. (1) ‘fuga, saída, retirada’.


em guisa que per frio e fame e comer desacostumadas viandas veherom muitos a morte e
fraqueza e continuadas doores; e sse algũus per morte ou fugimento falleciam da frota,
logo era comprido o conto d’outros tantos que novamente tragiam a ella; (138.53).

Etimologia: de fugir + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, fugimento (LOPF, 42.53).
- BLem: XV, fugimento (LOPF).

234
JPM3, s.v. forragear.
235
Morais4, s.v. forrejar.
236
Viterbo, s.v. forrejar.
237
Viterbo, forte II.
238
Morais4, s.v. forte, s.m..
239
Em LOPF com 14 ocorrências como adjectivo. Cf. Índice Analítico.

147
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- MD-CF: XV, fugimento (LOPF).


Obs.: Substantivo apenas averbado em CF2.
O verbo está atestado em 1224.

HENRICADO, adj. (2) ‘relativo a pessoa chamada Henrique’.


E quando el-rrei dom Fernando chegou a terra antre os seus, disse com geesto ledo contra
elles: «Quanto eu hanrricado venho!». E esto dezia elle porque a todollos que tiinham com
el-rrei dom Henrrique chamavom hanrricados; (291.62, 64).

Etimologia: do antr. de Henrique + -ado.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, hanrricados (LOPF, 83.64)..
- BLem: XV, hanrricado, hanrricados (LOPF)
- MD-CF: XV, hanrricado, hanrricados (LOPF).
Obs.: Houaiss regista apenas as variantes henriquenho (a1899 cf. CF1).) e henriquino (1899 cf.
CF1).
O antropónimo Henrique (1334-1379), rei de Castela.

ORFANDADE, s.f. (1) ‘ausência de amparo, desamparo, privação’.


e sse novamente chegavom algũus, posto adeparte todo fingimento, fazia seu planto com
elles, mostrando-lhe a horphaindade do marido que perdera, com salluços e grandes
lagrimas; (594. 27-28).

Etimologia: de órfão sob a f. rad. orfan- + -dade.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV/XVI, orfandade “«…soo com saudade, / & sua gram orfyndade», C. Ger., V, pp.
360-361”
- RLor: XV/XVI, orfandade, “G. de Resende «e sua gram orfyndade» (Cr. Arc. 502)”.
- AGC: XV, horphaindade (LOPF 173.27), orfimdade (LOPJI2 197.33).
- VH-CPM: XV, horphaindade (LOPF, 173.27), orfimdade (LOPJI2, 197.33).
- BLem: XV, horphaindade (LOPF), orfỹdade (LOPJI2).
- MD-CF: XV, horphaindade (LOPF).
- Houaiss: XV, horphaindade, orfimdade (cf. FichIVPM).
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

JUSANTE, s.f. (1) ‘vazante, baixa, descente’.


mas taaes avia hi dos mareantes que eram muito contrairos a esto, dizendo que as gallees
per esta guisa hiam em muito gram periigo, porque quando vehesse a jusante da maree
lança-llas-hia em poder da frota de Portugall, (143.19).

Etimologia: do fr. jusante.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: 1513, “«…porque no Mar Roxo não há aí correntes de água, senão montante e jusante,
que entra para dentro e sai para fora», Afonso de Albuquerque, Cartas, p. 210, ed. dos
Clássicos Sá da Costa”.

148
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- AGC: XVI.
- VH-CPM: XV, jusante (LOPF, 44.19).
- BLem: XV, jusante (LOPF).
- MD-CF: XV, jusante (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não corrige JPM.

LÁSTIMA, s.f. (1) ‘compaixão, dó’.


Esta messagem foi ouvida com grande door e lastima, (383.16).

Etimologia: regr. de lastimar.


Tipo de unidade: derivação regressiva.
Registos:
- AGC: 1549, (SNor 96.21).
- VH-CPM: XV, lastema (INFA, 91.15).
- BLem: XV, lastima (LOPF).
- MD-CF: XV, lastima (LOPF)240.
- Houaiss: XV, lastema (cf. FichIVPM).
Obs.: JPM3 apenas regista o verbo lastimar, após observação de RLor, com indicação de tal
proveniência, com abonação da Crónica Troiana. VH-CPM não indica esta ocorrência em
LOPF.
O verbo está atestado no século XIV.

LASTRAR, vb. (1) ‘espalhar lastro/balastro (cascalho ou saibro que se coloca no leito das
estradas)’ ou ‘acrescentar peso a algo, para torná-lo mais firme’.
de guisa que muito aginha foi feita hũua grande e espaçosa ponte, lastrada de terra e
d’area, tall per que folgadamente podiam hir a través seis homẽes a cavallo; (115.23).

Etimologia: de lastro + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…e porque a naao nom era lastrada, e a gemte emtrou mais da que devera, nom
podia rreger com compria», F. L., J., I, cap. 133, p. 261”.
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, lastrada (LOPF, 35.23).
- BLem: XV, lastrada (LOPF, LOPJI1)241.
- MD-CF: XV, lastrada (LOPF).
- Houaiss: 1958, (cf. CABr).
Obs.: Houaiss apresenta duas entradas para lastrar. A primeira (d1441 cf. FLJoa), embora mais
relacionada com termos náuticos, aceitável neste contexto com a ideia de ‘espalhar lastro,
camada na base de algo’. A segunda, datada de apenas 1958 (de lastro/balastro, de 1836), com
o significado de ‘cascalho ou saibro que se coloca nas estradas’, é talvez até aquele que melhor
se verifica aqui.
O substantivo, para a primeira acepção, está atestado em 1440 e, para a segunda, de 1836.
Ainda sem registo no CIPM.

240
Forma classificada como vb / nomc, lematizada para o verbo lastimar.
241
Forma identificada como particípio, mas lematizada para o verbo lançar.

149
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

LEVADIÇO, adj. (1) ‘que se pode baixar ou levantar com facilidade’.


E isso meesmo fez veer os castellos de que guisa estavom, e mandou-hos rrepairar de
muros e torres e cavas d’arredor e poços e cisternas onde compriam; e aas portas paredes
travessas e pontes levadiças e cadafaises, e fornece-llos d’armas e cubas e d’outras
vasilhas, segundo os logares honde cada hũus eram. (11.15).

Etimologia: de levado + -iço.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«…porque sobem ás casas per hũas levadiças de canas, que como são em cimaas
poẽ ao longo das paredes & ficão muyto seguros…», Cast., VI, cap. 67, p. 142”.
- AGC: XV, (LOPF 1.15).
- VH-CPM: XV, levadiças (LOPF, 1.15).
- BLem: XV, levadiças (LOPF).
- MD-CF: XV, levadiças (LOPF).
- Houaiss: XV, levadiças, leuadiça. (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não corrige JPM.
O adjectivo está atestado no século XIII.

LUGAR-TENENTE, n.2g. (1) ‘quem fica no lugar de outrem; pessoa que secunda um chefe e
o substitui em caso de ausência’.
e mandou aas villas e logares da hordem d’Alcantara que ouvessem por logoteente do
meestre d’essa hordem Garcia Perez do Campo craveiro. (98.34).

Etimologia: da loc. lat. locum tenens, tenentis 'o que ocupa um lugar', de locus, -i 'lugar' e de
tenens, -entis, part. pres. de tenēre 'ter'.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: regista “logo-tenente, s. Vj. lugar-tenente”. Mas depois não há entrada para lugar-
tenente. Regista também locotenente, XVII “«Porém em quanto senhor do mundo com o
governo de todos os animais, era locotenente do mesmo deus», Sermões, V, 6, § 4, 320, p.
352”.
- VH-CPM: XV, logo-teente (LOPF, 28.34).
- BLem: XV, logoteente (LOPF)242.
- MD-CF: XV, logoteente (LOPF; ChUniPort, 1420-1460); logo teente (ChUniPort, 1420-
1460).
- Houaiss: XV, logo teente, (cf. FichIVPM).
Obs.: São várias as formas para este composto. Houaiss, em entrada separada, locotenente (cf.
OrdAf), regista as formas históricas 1446 locotenente, 1446 loguo-teenente, 1446 logo-teente,
todas posteriores a LOPF. No entanto, MD-CF apresentam possível antedatação a LOPF.
Sobre o plural deste composto, Houaiss regista lugares-tenentes, mas não era esse o
entendimento de Morais na altura: “«os Reis são lugarestenentes de Deus» Pinto Ribeiro,

242
Esta palavra tem também uma ocorrência em ZURD, aqui não registada por ser posterior. Como BLem
não a identifica e como ele trabalha a obra, tinha de existir uma razão. A explicação reside no facto de, em ZURP, a
palavra composta aparecer separada, ou seja, em vez dos dois elementos estarem juntos ou separados por hífen,
ocorre um espaço em branco. O computador assume duas palavras e logo está classificado como advérbio e teente
como presente do conjuntivo do verbo ter. O mesmo acontece com pee terra.

150
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Relaçao 1. §. 47. Lugartenente diz Arraes, 5.2. e melhor; porque o lugar de Deus, que elles tem,
é só um, e tal é a analogia nos vocabulos compostos, v.g. olhibrancos; eripedes, manietados,
pern’altos, etc.; alias dizemos os vice, e não os vicesgerentes, e hoje de ordinario se diz as
Republicas, e não Respublicas, com affectação pascassia”243.

MACHAFÊMEAS, s.f. (1) ‘dobradiça, charneira, gonzo’244.


ca el-rrei mandou tirar d’aquella torre do aver, que estava no castello da cidade, hũua
coroa d’ouro feita de machafemeas, obrada com pedras de grande vallor e grossos graãos
d’aljofar em muitos logares (166.26).

Etimologia: de macha + fêmea.


Tipo de unidade: composição.
Registos:
- JPM3: XVI, “«E quanto nisto se aventura, o tempo o aprua, não sem magoa, & escândalo:
machafemea de amizades vidrentas, & e mal forjadas», Aulrg., fl. 92”.
- VH-CPM: XV, machafemeas (LOPF, 49.26).
- BLem: XV, machafemeas (LOPF).
- MD-CF: XV, machafemeas (LOPF).
- Houaiss: 1452, (cf. ZT).
Obs.: RLor não corrige JPM. Houaiss regista duas variantes: macha-fêmea, sem datação, e
machafêmea para a qual dá uma data diferente do VH-CPM, de 1452 ZT. Tendo em conta que
LOPF é escrito “nos finais da quarta década do século XV ou no início da seguinte, em qualquer
caso antes de 1443245, e que o VH-CPM é a digitalização do FichIVPM, a que Houaiss recorre
várias vezes, a data por ele apresentada é tardia. Para Kremer, forma ‘macho-fêmea’, 1544.
O substantivo macho246 está atestado no século XIII e fêmea no XIV.

MALDESDITO, adj. (1) ‘desafortunado, desventurado; difamado’.


O almirante por esta rrazom foi muito culpado e maldesdito, (263.66).

Etimologia: de mal + desdito.


Tipo de unidade: composição.
Registos:
- VH-CPM: XV, maldesdito (LOPF, 74.66).
- BLem: XV, maldesdito (LOPF).
- MD-CF: XV, maldesdito (LOPF).
Obs.: Sem registo nos dicionários. O significado, com duas negações, mostra alguma
irregularidade de formação face ao significado do contexto onde se encontra.
O advérbio está atestado e 1255 e o adjectivo no XIV.

MANTEEIRO, s.m. (1) ‘funcionário responsável pela guarda dos mantéis da casa real’.
e elles hindo pello caminho, acharom hũu Fernam Gallego seu manteheiro que lhes disse
como o iffante era partido e de que guisa, (383.8).

243
Cf. Morais4 s.v. lugartenente.
244
Cf. Morais4 s.v. machafemea: “Dobradiças, ou visagras de duas peças, n’uma das quaes há um macho,
eixo, que se embebe na fêmea, ou cano da outra”.
245
Cf. T. Amado in Tavani, p. 179.
246
Para a entrada isolada macha ‘peça de dobradiça encaixável na outra, a fêmea’, Houaiss não apresenta
datação.

151
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Etimologia: de mantel + -eiro (com síncope do -l-).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, manteheiro (LOPF, 106.8), mantieiro (LOPJI2, 220.14).
- BLem: XV, manteheiro (LOPF) mantyeiro (LOPJI2).
- MD-CF: XV, manteheiro (LOPF).
- Houaiss: manteeiro.
Obs.: Houaiss não apresenta datação para esta palavra.
Para Kremer 1402.
O substantivo está atestado em 1365.

MESTO, adj. (1) ‘lúgubre; espesso, basto’.


E quando o porco assi naceo, o outro alaão Rrabez deu hũua arrancada, e o Bravor teve-
sse quedo; e quando Rrabez vio que sse o porco saya e que o nom desatreellavom, fez hũua
grande arrancada per hũu mesto mato, levando após ssi o page e o outro alaão. (353.57).

Etimologia: do lat. maestus (ou moestus), a, um.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«Em virtude do Rei, da pátria mesta, / Da lealdade ja por vos negada», Lus., IV,
19”.
- AGC: 1572.
- VH-CPM: XV, mesto (LOPF, 99.57).
- BLem: XV, mesto (LOPF).
- MD-CF: XV, mesto (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Houaiss não regista o segundo significado, mas parece-me ser o adequado.
RLor não corrige JPM, que o regista nesta 1º ed. como: “Mesto, adj. Do lat. maestu-, «abatido,
profundamente aflito; severo, sombrio; que causa tristeza, fúnebre, sinistro»; por via culta. Séc.
XVI: «Em virtude do Rei, da pátria mesta, / Da lealdade ja por vos negada», Camões, Lusíadas,
IV, 19”. AGC apresenta também a datação d’ Os Lusíadas e ao contrário de outros casos, neste
não propõe correcção no suplemento para a segunda edição, situação que normalmente se
verifica.

NOTORIAMENTE, adv. (1) ‘de forma notória’.


Outrossi mandava que quaaesquer que achassem andar vaadios, chamando-sse escudeiros
e moços d’el-rrei ou da rrainha e dos iffantes e de quaaesquer outros senhores, e nom
fossem notoriamente conhecidos por seus ou mostrassem certidom como andavom por
serviço d’aquelles cujos se chamavom, que fossem loguo presos e rrecadados pellas
justiças dos logares hu andassem (314.99).

Etimologia: de notório + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, notoriamente (LOPF, 89.99).
- BLem: XV, notoriamente (LOPF).
- MD-CF: XV, notoriamente (LOPF).

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III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Geralmente, RLor regista os advérbios de modo que JPM não apresenta, como
notavelmente (Ofícios), novamente (Cr. Gal.). Neste caso isso não se verifica, embora JPM
registe notório dentro da entrada nota247.
O adjectivo está atestado no século XV.

PALANCAR, vb. (2) ‘defender (um lugar) com palancas’.


Outros diziam que era bem que pallancassem todallas rruas que sahiom ao rressio da
cidade e que per alli a defendessem que nom entrassem os castellaãos em ella, (258.38).

Outras ocorrências: 258.49.


Etimologia: de palanca + -ar.
Tipo de unidade:derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, pallancar (LOPF, 73.49; LOPJI2, 62.30); pallancassem (LOPF, 73.38).
- BLem: XV, pallancar, pallancassem (LOPF); palamquar (LOPJI2); pallamcado (LOPJI1).
- MD-CF: XV, pallancar, pallancassem (LOPF).
- Houaiss: XV, pallancassem (cf. FichIVPM).
Obs.: Parece não existirem dúvidas sobre a formação deste verbo: do nome palanca mais o
sufixo -ar. Estamos, portanto, perante um verbo denominal, cuja primeira atestação parece ser
em LOPF. A questão que se coloca é que o nome de origem espanhola, palanca, que está na
base da sua formação, só encontra registo, segundo Houaiss, quase três séculos mais tarde no
vocabulário de Bluteau (1716 cf. RB). Assim, ou estamos perante um registo gráfico bastante
tardio de palanca, em dicionário e não em obra, ou, então, a sua formação poderá ser de
palanque248, do mesmo radical palanc-, forma preferida do português face ao espanhol, embora
também assuma significado diferente: ‘estrado com degraus, para espectadores de festas ao ar
livre; tablado’. Houaiss, no entanto, para palanque, regista também a acepção “m. q. 1palanca
(‘fortificação’)”, portanto, mais aceitável na formação deste verbo.
O substantivo palanca está atestado em 1716 e palanque no século XV.
Ainda sem registo no CIPM

PÉ-TERRA, s.m. (2) ‘pequena moeda de ouro do tempo de D. Fernando’.


O ouro que el-rrei lá mandou nom foi em pasta mas todo em moedas d’as que elle mandara
fazer quando novamente começou de rreinar, scilicet, dobras das primeiras que chamavom
pee terra, (162.39).

Outras ocorrências: 189.77.


Etimologia: de pé + terra.
Tipo de unidade: composição.
Registos:
- VH-CPM: XV, pee terra (LOPF, 57.7).
- MD-CF: XV, pee terra (LOPF).

247
Cf. também peitoril, s.v. peito; peirnear, s.v. perna; teso, s.v. tender. Este é um processo que mistura as
entradas quer por ordem alfabética, quer por bases ou raízes. Será por esta razão que RLor diz que “a colocação das
palavras é absurda no seu Dicionário e feita duma forma peregrina, o que faz perder muito tempo ao investigador.” p.
II)
248
Com registo em REIX, INFA, LOPJI, ZURD.

153
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Apenas encontrei registo em CF25 e Morais4, embora este remetesse para Viterbo. Em
BLEM não aparece registo porque a grafia é em duas palavras249, tal como a locução adverbial a
pee terra, também com quatro registos em LOPF250. Esta mesma locução é também identificada
uma vez pelo VH-CPM, com registo de ocorrência em REIX, e com a indicação do significado
de ‘a pé’. MD-CF mostra-se o mais completo ao apresentar 16 registos de pee terra, onde é
possível identificar 14 locuções (3 na Crónica do Condestável Nuno Alvarez Pereira, 1 na
Cronica de Portugal de 1419, 5 na Estoria de Dom Nuno Alvares Pereyra e 5 em LOPF) e os
dois substantivos do nome da moeda, precisamente em LOPF.
Os substantivos estão ambos atestados no século XIII.

PEITORIL, s.m. (1) ‘parapeito’.


e no dereito onde entendeo que aviam de vĩir derribou casas dentro na cidade, e fez encher
cubas de terra e pedra, e grande bastida de madeira com peitoriis de portas das casas em
ella, percebendo-sse do damno que lhe rrecrecer podia. (129.24).

Etimologia: do lat. *pectorile251.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«…levando já os mouros diante, apesar de seu dano, té um peitoril que se fazia a
maneira de terreiro soberbo sobre a praia», Déc., II, III, cap. 2, p. 110”.
- AGC: XVI.
- VH-CPM: peitoriis (LOPF, 40.24).
- BLem: XV, peitoriis (LOPF); peitorill (LOPJI1).
- MD-CF: XV, peitoriis (LOPF).
- Houaiss: XV, peitoril, peitoriis (sXV cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não corrige JPM (s.v. peito: “peitoril do lat. *pectorīle- (vj. Gonçalves Viana,
Apostilas, II, p. 255); séc. XVI: «…levando já os mouros diante, apesar de seu dano, té um
peitoril que se fazia a madeira de terreiro soberbo sobre a praia», João de Barros, Décadas, II,
III, cap. 2, p. 110”). AGC apresenta datação tardia sem correcção no suplemento.

PERNEAR, vb. (1) ‘agitar convulsivamente as pernas; espernear’.


e em cahindo assi ambos, começou o cavalo bullir rrijamente com as maãos e com os pees;
e perneando assi rrijamente, acertou o canello da ferradura da maão ho tecido d’hũua
fivella das solhas de Nun’Allvarez, (485.66).

Etimologia: de perna + -ear.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«…sogigandolhe ho pescoço de modo que ele não era poderoso pera se levantar
e perneando dava assopros e rinchos», Memorial, cap. 35, p. 232”.
- VH-CPM: XV, perneando (LOPF, 138.66).
- BLem: XV, perneando (LOPF).
- MD-CF: XV, perneando (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).

249
Cf. supra nota 242.
250
Cf. LOPF, 22.33; 25.4; 33.15 e 304.22.
251
Houaiss justifica esta etimologia “segundo AGC, JM e Nascentes”.

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III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: RLor, que corrige a datação de perna, não corrige JPM em pernear, que se encontra na
entrada perna (“pernear no séc. XVI: «…sogigandolhe ho pescoço de modo que elle não era
poderoso pera se levantar e perneando dava assopros e rinchos», Jorge Ferreira de Vasconcelos,
Memorial da Távola Redonda, cap. 35, p. 232, ed. de 1867”) e AGC apenas regista espernear,
primeiro em 1844 e depois, no suplemento, 1836 SC.
Ainda sem registo no CIPM.
O substantivo está atestado no século XIII.

PETITE, adj. (1) ‘espécie de tornês que D. Fernando mandou cunhar; pequeno, secundário’.
D’outras moedas que el-rrei dom Fernando fez, assi como fortes de prata, que valliam dez
solldos, e outros de viinte, e torneses primeiros d’oito solldos, e torneses petites, e
dinheiros novos avalliados a oito graãos, (191.118).252

Etimologia: do francês petit253.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- VH-CPM: XV, petites (LOPF, 55.118).
- BLem: XV, petites (LOPF).
- MD-CF: XV, petites (LOPF).
Obs.: Sem registo na maioria dos dicionários. Morais4 apresenta: “adj. antiq. Torneses: torneses
pequenos, moeda del-Rei D. Fernando. Severim, Not. f. 179”254.

PILARTE, s.m. (4) ‘antiga moeda portuguesa’’.


Fez lavrar mais outra moeda que chamavom pillartes, que eram de dous dinheiros de lei,
(190.110).

Outras ocorrências: 191.111; 194.28,34.


Etimologia: segundo Houaiss, “alusão aos soldados franceses que auxiliaram D. Fernando I
(1345-1383) na guerra contra Castela”.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- VH-CPM: XV, pillartes (LOPF, 55.110).
- BLem: XV, pillartes (LOPF; LOPJI1).
- MD-CF: XV, pillartes (LOPF).
- Houaiss: XV, pillartes (cf. FichIVPM).
Obs.: Em Viterbo, além da palavra averbada no segundo tomo (II.218), com indicação de
também se dizer pilastre, pilhastre e pillastre, podemos encontrar uma pormenorizada descrição
no suplemento, incluindo a sua origem: “(…) Lavrou-se em memoria dos pagens que traziam as
Celadas, ou Barbudas dos soldados estrangeiros, que o vierão auxiliar na guerra, aos quaes em
Francez chamavam Pilartes.(…)”, (II.Sup.55).

252
Cf. com LOPP: “e valia o tornês grande sete soldos e o pequeno tres soldos e meo, e chamavam a estas
moedas dobra e mea dobra e tornês e meo tornês (11.55)”. Segundo o VH-CPM, s.v. tornês, também a antiga moeda
de prata tornês é de origem francesa.
253
Segundo CF25.
254
Cf. Morais4 s.v. petites.

155
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

POGEJA, s.f. (1) ‘moeda antiga, o mesmo que mealha’.


E d’estes dinheiros velhos, quem quiria fazer moeda mais pequena, cortava hũu dinheiro
pella meatade com hũua tesoira ou o britava com os dentes, e aa meatade d’aquell
dinheiro chamavom mealha ou pogeja, e compravom com ella hũua mealha de mostarda
ou d’alfelloa ou de tramoços e semelhantes cousas: (188.37).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- VH-CPM: XV, pogeja (LOPF, 55.37).
- BLem: XV, pogeja (LOPF).
- MD-CF: XV, pogeja (LOPF).
Obs.: Palavra registada em Viterbo, Morais e CF25, com a forma pojeja, mas sem nunca indicar
a sua origem.

POLPÃO, s.m. (1) ‘parte mais carnuda das coxas’.


e entom foi feita a mais fremosa azcumada de seu braço que atá ali fora vista nem ouvida
antre monteiros, porque as cuitellas da azcuma entrarom pellos polpoões da coxa e
cortarom os ossos e as juntas e sahirom as cuitellas com toda a asta pello conto da azcuma
da outra parte da calluga da espalda. (353.70).

Etimologia: de polpa + -ão.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, polpoões (LOPF, 97.70).
- BLem: XV, polpoões (LOPF).
- MD-CF: XV, polpoões (LOPF).
Obs.: Segundo Morais4, aumentativo de polpa (a parte mais carnosa do corpo animal, sem
ossos), com abonação de LOPF255. Houaiss regista apenas polpa, para a qual apresenta a datação
de 1563, o que prova o registo gráfico de um derivado antes da primitiva.

PRESTADOR, adj. (3) ‘que presta, que faz bem; prestável’.


Amava justiça, e era prestador e graado, muito liberall a todos, e grande agasalhador dos
estrangeiros. (3.18).

Outras ocorrências: 347.20; 355.20.


Etimologia: do lat. praestātor, ōris.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, (segundo Morais2).
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, prestador (LOPF, P. 18; 98.20; 100.20; LOPJI2, 128.23).
- BLem: XV, prestador (LOPF; LOPJI1; LOPJI2).
- MD-CF: XV, prestador (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).

255
Cf. Morais4 polpão.

156
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Primeira abonação dada por Morais. Se há palavras que com o passar do tempo, e com o
estudo e conhecimento de mais obras, vão sendo antedatadas, outras há que são identificadas
logo como primeiras atestações, como é o caso desta que conta com quase dois séculos.

PROPOEDOR, s.m. (1) ‘aquele que propõe, proponente’.


os quaaes, fallando em esto, forom tanto per seu feito em deante que sse firmarom todos em
consselho de lho dizer, enlegendo logo por seu capitam e propoedor por elles hũu alfayate
que chamavom Fernam Vaasquez, homem bem rrazoado e geitoso pera o dizer: (210.27).

Etimologia: de propor (propoer) + -dor.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, propoedor (LOPF, 60.27).
- BLem: XV, propoedor (LOPF).
- MD-CF: XV, propoedor (LOPF).
Obs.: Bom exemplo para reforçar a ideia de domínio das regras de formação de palavras com
base em processos internos da morfologia.
O verbo está atestado no século XIII.

RECOSSO, s.m. (2) ‘de recuo (?)’.


ca honde aa primeira eram tantas por tantas e mais cinquo de rrecosso que as de Portugall
tiinham, ficarom estonce todas iguaaes e cinquo de melhoria aos castellaãos. (443.8).
tragia as gallees todas em escalla, iguaaes em batalha, e el na meatade; e como chegarom
hũuas aas outras, aferrou cada hũua com sua, e duas de cada parte afastarom-sse de
rrecosso, e honde compria mostravom sua ajuda. (444.28).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, rrecosso (LOPF).
- MD-CF: XV, rrecosso (LOPF).
Obs.: Em CF25 com a indicação de “Provavelmente o m. q. recoice. Cf. Fernão Lopes, Crón. D.
Fernando”. Em Morais4 aparece registado “*Recosso, s.m. V. Recoso, Ined. IV. f. 400 e
401”256. Para recoso regista “antiq. Duas barcas que andão a recoso. Ined. II, f. 345. Talvez
recovo, á carga, ganhando fretes, escrito com s por f affim de v.”. Estas duas localizações
indicadas por Morais são, precisamente, as ocorrências nas obras em análise, uma em LOPF e
outra em ZURP. O VH-CPM não regista esta palavra.

RESUMIR, vb. (1) ‘condensar em poucas palavras, sintetizar’.


hũus contam que foi em Vallada, seendo el-rrei doente, outros dizem que foi em Portallegre
em muito grande segredo, escrevendo isto per largos fallamentos que rresumir nom
curamos; (377.68).

Etimologia: do lat. rĕsūmō, ĭs, ĕre, resumpsī, resumptum.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
256
No início da quarta edição do dicionário de Morais podemos encontrar a seguinte explicação: “Os
asteriscos designão os Artigos que não pertencem a Morais”, cf. I.XIV.

157
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

- JPM3: XV, “«Senhor, vos mandaaes fazer esta carta, rresumindolhe quegenda era…», F. L., J.,
1ª parte, cap. 3, p. 8”.
- AGC: XV, rresumir.
- VH-CPM: XV, rresumir (LOPF, 104.68).
- BLem: XV, rresumir (LOPF); resumidas (LOPOJI2); rresumimdolhe (LOPOJI2).
- MD-CF: XV, rresumir (LOPF).
- Houaiss: XV, resomiir, rresumir (cf. FichIVPM).
Obs.: Ainda sem registo no CIPM.

RIFÃO, s.m. (1) ‘adágio vulgar, provérbio’.


assi que todo seu feito era de Santarem pera Coimbra, e depois tornar a Lixboa, em guisa
que ja as gentes tragiam por rriffam em escarnho dizendo: «Ex-vo-llo vai, ex-vo-llo vem,
de Lixboa pera Santarem». (121.63).

Etimologia: de refrão, através da forma dissimilada *refão.


Tipo de unidade: dissimilação regressiva.
Registos:
- JPM3: XVI, «…Affonso Lopez çapayo Christam nouo, que viuia em Tomar, fez hum rifam
andaua no cancioneyro Portugues…», Gil Vicente, na Copilaçam, fl. 259 a”.
- AGC: XV, rriffam (LOPF 36.63).
- VH-CPM: XV, rriffam (LOPF, 36.63).
- BLem: XV, rriffam (LOPF).
- MD-CF: XV, rriffam (LOPF).
- Houaiss: XV, rifam, rriffam (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não propõe antedatação.
O substantivo refrão está atestado no século XIV.

SEITOSO, adj. (1) ‘traiçoeiro’.


e porque ella era muito seitosa e tiinha mortall odio aaquelles que forom em estorvo de tall
casamento, (282.93).

Etimologia: de seita + -oso257.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, seitosa (LOPF, 81.93).
- BLem: XV, seitosa (LOPF).
- MD-CF: XV, seitosa (LOPF).
Obs.: Em JPM3 na entrada seitosamente refere: “Não consegui encontrar o adj. seitoso em que
assenta esta palavra. Segundo Piel, em nota ao passo abonatório adiante apresentado, o
correspondente vocábulo no texto latino original é insidiose. Séc. XV: «que se nom faça algũa
cousa seitosamente nem fingidamente…», Ofícios, p. 180”. Machado não encontra este
adjectivo porque utiliza a segunda edição do dicionário de Morais. Na quarta edição, esta
palavra é acrescentada (com asterisco antes, portando)258, por Theotonio José de Oliveira Velho.
Esta mesma abonação é adicionada por RLor a JPM, informação não referida.

257
Segundo CF25.
258
Cf. nota supra 256.

158
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Pelo que pude apurar para esta época, é um adjectivo apenas utilizado em LOPF, mas que tem
em OFIC a utilização do advérbio seitosamente, o que mostra o registo de uma palavra derivada
antes da primitiva.259
O substantivo está atestado no século XIII.

SESSENE, s.m. (2) ‘antiga moeda castelhana’.


Como el-rrei dom Henrrique cercou a cidade de Leom, e mandou lavrar a moeda dos
sessenes (63.2).

Outras ocorrências: 64.31.


Etimologia: (?)
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Registos:
- VH-CPM: XV, sessenes (LOPF, 18.2,31).
- BLem: XV, sessenes (LOPF).
- MD-CF: XV, sessenes (LOPF).
Obs.: Apenas registada em CF25 com a indicação de ‘antiga moeda castelhana’.

SOBREVELA, s.f. (1) ‘reforço de sentinelas’260.


Começou el-rrei dom Fernando a guerra, e pôs seus fronteiros pellas comarcas, desi nos
logares que sua voz tiinham, e mandava que todollos logares fossem vellados de certas
pessoas em cada vella, e outras sobrevellas que as rrequeriam; (101.6).

Etimologia: de sobre + vela.


Tipo de unidade: composição.
Registos:
- VH-CPM: XV, sobrevellas (LOPF, 30.6).
- BLem: XV, sobrevellas (LOPF)261.
- MD-CF: XV, sobrevellas (LOPF).
Obs.: A base da palavra vela, ‘vigia, sentinela’, é de 1314, segundo RLor, mas a construção
desta palavra, pelo que pude apurar, é de LOPF.
A preposição está atestada no século XIII e o substantivo em 1314.

SOL-LEVADO, s.m. (1) ‘nascer do sol’.


e como era sol-posto, fechavam as portas de cada logar, e abrian-as sol-levado; (101.8).

Etimologia: de sol + levado (part. de levar).


Tipo de unidade: composição.
Registos:
- VH-CPM: XV, s.m., sol-levado (LOPF, 30).
- BLem: XV, part., sollevado (LOPF).
- MD-CF: XV, sol-levado (LOPF).

259
Cf. introdução a Houaiss, campo da datação, ponto 4.3.3.3. “Quando tivemos em mãos datação de um
advérbio de sufixo -mente anterior à de seu adjetivo formador, estendemo-la ao adjetivo, inserindo, no campo da
etimologia, além das formas históricas, o comentário "datado a partir do adv.”, s.v. súbito.
260
Segundo CF25 e o VH-CPM.
261
Forma identificada como infinito pessoal/futuro do conjuntivo, seguida da forma de pronome, lematizada
para o verbo sobrever.

159
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Obs.: Além da grafia diferente, podemos verificar para esta palavra também classificações
distintas. O VH-CPM apresenta a classificação de substantivo e BLem, para a forma solevado, a
de particípio do verbo sublevar. Na verdade, esta é a ideia geral, ou seja a de ‘mover de baixo
para cima; erguer, elevar, sobrelevar’. A dúvida está na classificação, uma vez que a construção
é elíptica. Assim, podemos entender esta forma como particípio se subentendermos que abriam
as portas [quando o sol estava] levantado, erguido, ou então, com mais acerto, como
substantivo, até pela antítese com sol-posto262, ou seja, abrian-as [ao nascer do sol].
O substantivo está atestado no século XIII e o verbo em 1022-1065.

SUBDUQUE, s.f. (2) ‘subcomandante militar’.


e o so-duque de Latram e Tomas Simom alferez do duque d’Alancastro que trazia sua
bandeira (453.55).
E os capitaães eram estes: hũu filho bastardo d’el-rrei de Ingraterra que avia nome... o
canom de Rrabi Sallas, o so-duc de lla Trava, mossé Joham Falconeth e outros; (519.10).

Etimologia: de sub- + duque.


Tipo de unidade: derivada prefixação.
Registos:
- VH-CPM: XV, so-duc (LOPF, 149.10); so-duque (LOPF, 128.55).
- BLem: XV, soduc, soduque (LOPF).
- MD-CF: XV, soduc, soduque (LOPF).
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

TAVARENHO, adj. (1) ‘(?)’.


e o husso tendendo as pontas das maãos pollo filhar alcançou o arçom derradeiro da sella
tavarenha, segundo estonces husavom, e arrancou o arçom com hũua grande aljava da
anca do cavallo; (351.17).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- VH-CPM: XV, tavarenha (LOPF, 99.17).
- BLem: XV, tavarenha (LOPF).
- MD-CF: XV, tavarenha (LOPF).
Obs.: Apenas encontrei este adjectivo averbado em CF2 com uma abonação de LOPF, mas sem
indicação de significado.

TERREAR, vb. (1) ‘aproximar-se da terra, navegando’.


Joham Focim, quando vio que as gallees rremavom pera terra e que o almirante nom
curava d’aferrar com ellas, desejoso de bem fazer terreou tanto por dar em hũua gallee
ante que ensecasse que sse ouvera de perder, e nom lhe pode fazer nojo; (262.37).

Etimologia: de terra + ear.


Tipo de unidade: derivação sufixal.

262
Houaiss data sol-posto do séc. XV, segundo o FichIVPM, mas o VH-CPM apresenta três abonações do
séc. XIV, uma delas do Horto do Esposo: “Poucas vezes comem ante do sol posto”, cf. ed. de Irene Freire Nunes,
Colibri, 2007, p. 203, linhas 13-14.

160
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Registos:
- JPM3: 1813, (segundo Morais2).
- VH-CPM: XV, terreou (LOPF, 74.37).
- BLem: XV, terreou (LOPF)263.
- MD-CF: XV, terreou (LOPF).
Obs.: BLem regista esta palavra em LOPF, mas indica como forma verbal do ver ‘ter’264. RLor
não corrige JPM (s.v. terra: “terreal no séc. XIV: «nõ ousei a dizer meu pecado ante os
terreaes», cit. por J. J. Nunes na Rer. Lus., XXVII, p. 74, s.v.”)
O substantivo está atestado no século XIII.
Ainda sem registo no CIPM.

TESO, s.m. (1) ‘monte íngreme; cimo de monte’.


Veendo Nun’Allvarez que por entom lhe nom podia fazer mais damno, rrecolheo ante ssi os
que hiam com elle e foi-sse poer em hũu teso ante a porta do moesteiro de Santos, logar
onde os bem viiam os da frota; (314.95).

Etimologia: segundo Houiss, da mesma origem que teso (tensus, a, um ‘estendido, esticado,
tenso’), “do qual diverge porque reduzido da locução monte teso ‘monte muito
íngreme, difícil de subir’ e porque substv. com o signf. da loc.”.
Tipo de unidade: derivação imprópria.
Registos:
- JPM3: 1107, adj. “«et in anplo habet IIIes cubitos tesos », em D.M.P. III, p. 223”.
- RLor: 1107, “«et in anplo habet IIIes cubitos tesos», (DMP 223.9)”265.
- AGC: XV, adj. teso.
- VH-CPM: XV, subs. teso (LOPF, 138.6 ); tesso (LOPJI2, 148.13). XIV, adj. teso (GREG,
1.2.14); tesos (VERT, 65.40); XV, adv. teso (LOPJI2, 10.24).
- BLem: XV, adj. teso (LOPF; LOPJI1; LOPJI2); tesa (LOPJI1)266.
- MD-CF: XV, teso (LOPF; ChPortDuarte); tesas (Tratado de cozinha portuguesa).
- Houaiss: XIV, adj. 1teso: XV tesso (cf. FichIVPM); s.m. 2teso: 1552 (cf. JBarD).
Obs.: JPM3, RLor, AGC e BLem apenas registam esta palavra como adjectivo, datado para
RLor (JPM3 não cita) de 1107 e para Houaiss do séc. XIV. A utilização em LOPF é, no entanto,
como substantivo que Houaiss também regista e data de 1552, mais de um século depois. O
VH-CPM, além de adjectivo e de substantivo, apresenta ainda a classificação de advérbio267,
com o significado de ‘impetuosamente; rijamente’. MD-CF registam ainda a ocorrência em
ChPortDuarte.
Para Kremer 1464.

263
Forma identificada como pretérito perfeito, lematizada para o verbo ter.
264
Cf. BLem 2007: 5932.
265
RLor antedata esta palavra que JPM apresentava do séc. XIV-XV, s.v. tender: “teso do lat. tensu-, pelo
que é divergente de tenso; no séc. XIV-XV: «hũu dia caeu hũu grande penedo de cima d’ũu monte so que estava o
sseu mosteiro e, vijndo muy teso pera destroyr todo o moesteiro…», Diálogos de S. Gregório, p. 7, ed. de 1950”
266
A forma tesa, identificada como adjectivo em CGE é, todavia, topónimo.
267
LOPJI2, 100.24: “E mouendo teso contra huma parede, deu com as maãos nas façes [...]”.

161
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

TORNEADOR, adj. (2) ‘aquele que anda em torneio ou justa’268.


Era cavallgante e torneador, grande justador e lançador a tavollado; era muito braceiro,
que nom achava homem que o mais fosse; cortava muito com hũua espada e rremessava
bem a cavallo. (3.15).

Outras ocorrências: 348.46.


Etimologia: do rad. de torneado + -or.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, adj. torneador (LOPF, P.15).
- BLem: XV, nomc. torneador (LOPF).
- MD-CF: XV, torneador (LOPF).
- Houaiss: XV, adj. s.m. torneador (cf. FichIVPM).
Obs.: Houaiss indica que a datação é para o adjectivo, mas BLem prefere a classificação como
substantivo, à semelhança de Morais: “s.m. O que sabe torneyar. Chron. Del-rey D. Fern. «era
grande torneyador»”269.
O verbo está atestado no século XIV, enquanto o substantivo torneio que lhe dá origem ocorre
no século XIII.

TOSSIDO, s.m. (1) ‘Acto de tossir voluntariamente, para dar qualquer sinal ou exprimir algum
sentimento.
O conde dom Alvoro Perez de Castro, quando esto ouvio, deu hũu tossido e disse: «Arreall,
arreall, cujo for o rregno leva-llo-á»: (603.58).

Etimologia: part. de tossir (do lat. tussĭo, is, īre, īvi, ītum).
Tipo de unidade: derivação imprópria.
Registos:
- VH-CPM: XV, subs. tossido (LOPF, 175.58).
- BLem: XV, part. tossido (LOPF)270.
- MD-CF: XV, tossido (LOPF).
- Houaiss: XIII, adj. tossido (cf. FichIVPM). XV, s.m. tossido: XIII tossindo, XV tossido
Obs.: o verbo e o adjectivo são do século XIII, pelo que parece ser Lopes a introduzir o
substantivo no XV, com recurso à derivação imprópria.

TRELA271, s.f. (5) ‘correia de couro, cordel ou guia’.


ca el-rrei dom Fernando a seu rrequerimento lhe enviou estonce em presente seis allaãos e
seis sabujos, todos com collares brollados e foziis de prata dourados, e as treellas d’elles
d’ouro fiado, (142.38).

Outras ocorrências: 352.43; 353.5; 353.62,3.


Etimologia: do lat. *tragella dim. de tragŭla272.
Tipo de unidade: importação (latinismo).

268
Na Idade Média, jogo público e militar entre cavaleiros, em se que imitavam as escaramuças da guerra.
269
Morais4 torneyador.
270
Forma identificada como particípio do verbo tossir.
271
Cf. DESATRELAR.
272
Para CF2 “Talvez contr. de tarela”.

162
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

Registos:
- JPM3: XV, “«Hũas trelas outras seguem / leuam varedas ezquerp[d]as», Alvaro de Brito, no C.
Ger., I, p. 219. (…). Trenla em 1474: «hua corda e hua treenla», na Coí[l]ección Diplomática
de Galiçia Histórica, p. 71 (Lorenzo).”
- RLor: 1474, “«hua corda e hua treenla» (CDGH 71.22).
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, treelas (LOPF, 99.43)273.
- BLem: XV, treellas (LOPF).
- MD-CF: XV, treellas (LOPF).
- Houaiss: XV, treellas274 (cf. FichIVPM).
Obs.: O Livro da Montaria foi eliminado do VH-CPM, bem como todas as localizações que
Cunha tinha apresentado nos primeiros três volumes do IVPM, como por exemplo, ala,
arvoredo, conjectura. Ora, sendo este um livro didascálico, nas palavras de Manuel Simões275,
sobre ‘o melhor e mais proveitoso dos jogos’ - a caça -, seria de esperar que tal palavra lá viesse
registada, e vem276. Acontece que o Livro da Montaria nunca foi impresso e apenas se conhece
uma cópia de finais do séc. XVIII, inícios do XIX, feita por F. A. C. que se encontra na
Biblioteca Nacional, de uma outra cópia, crê-se, de 1626, feita pelo bacharel Manuel Serrão de
Paz, de um manuscrito que existia na Livraria do Colégio da Companhia de Jesus em Monforte
de Lemos, na Galiza. De facto, desde a sua produção até à cópia conhecida, que segundo o
escrivão moderno só não copiou os borrões para não lhos atribuirem a ele (estaremos, portanto,
a crer nestas palavras, na presença de uma cópia isenta de intervenção)277, a língua sofreu
inúmeras alterações autóctones, mais aquelas que a cópia conhecida já possui, com clara
influência da língua castelhana ou introduzidas pelo bacharel ou por outro copista, na hipótese
da cópia da Bibliotec Nacional não ter provindo directamente da de 1626278. Estamos a falar de
palavras como tamaño por tamanho, palzer por prazer, naturaleza por natureza, entre outras279.
Eventualmente, será este o facto que estará na origem do seu afastamento dos corpora
informatizados, como fonte para datar determinadas palavras do séc. XV. Neste caso em
concreto, a palavra trela, atribuída a LOPF, deverse-á mais ao infortúnio de muitos
pergaminhos, para o qual contribuiu a passagem do tempo, mas também a incúria dos homens,
do que ao seu conhecimento exclusivo do vocábulo ou capacidade de trasladar palavras, neste
caso do castelhano para o português.
Este é um bom exemplo para demonstrarmos que o uso oral da palavra trela seria vulgar nas
primeiras décadas do séc. XIV, mas apenas se considera o seu primeiro registo em LOPF.

273
Eventual gralha tree[l]las.
274
Normalmente, Houaiss apresenta todas as formas históricas registadas. Neste caso, falta a forma trella, que
ocorre em ZURP, obra não trabalhada por AGC.
275
Cf. Tavani 1993:412.
276
Cf. Livro da Montaria, edição de Francisco Maria Esteves Pereira, Coimbra: Imprensa da Universidade,
1918, p. (LXIV, onde refere este facto) e p. 88,1 ‘treela’. À semelhança de muitas outras que têm a ver com esta
temática, como espécies de cães, alão e sabujo, e mesmo armas, como ascuma ou ascumada.
277
Cf. idem, p. 428.
278
Francisco M. E. Pereira, na introdução, alerta para o facto de esta cópia ter sido feita numa altura em que
Portugal estava sob o domínio de Espanha e aponta como hipótese para estas alterações Manuel Serrão da Paz, até
pelo nome, ser originário de Portugal a viver em Monforte de Lemos, ou então ter existido outra cópia feita ou por
um português com domínio da língua castelhana, ou um castelhano que deixou transparecer para a escrita de um
documento em português as particularidades da sua língua.
279
Cf. idem, pp. 11-12.

163
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

ULTRAMONTANO, adj. (3) ‘que ou o que está além dos montes; transmontano’
E no mes de março, aos viinte e sete dias da era seguinte de mill e quatrocentos e dezeseis,
morreo este papa Gregorio em Rroma. Elle morto, ficarom em Rroma dezeseis cardeaaes,
scilicet, doze ultramontanos e os outros itallicos, aos quaaes perteencia o dereito de
enleger; e juntarom-sse estes cardeaaes em algũus logares fallando apartadamente, e aas
vezes juntos, quall d’elles socederia em seu logo, e nom concordavam em eleger pessoa
ultramontana, scilicet, de França ou de Ingraterra ou das Espanhas. E faziam os
ultramontanos de ssi duas partes; (386.31, 35, 36-37).

Etimologia: de ultra- + montano280.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- JPM3: XVII, (segundo Morais8).
- VH-CPM: XV, ultramontana (LOPF, 107.35), ultramontanos (LOPF, 107.31).
- BLem: XV, ultramontana, ultramontanos (LOPF).
- MD-CF: XV, ultramontana, ultramontanos (LOPF) (LOPF).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: RLor não propõe antedatação.
Houaiss regista ultramontano como adj. e s.m. no sXV, mas alerta para o facto de a datação ser
para o adjectivo, embora na última ocorrência desta abonação se possa entender a sua utilização
como substantivo, pese embora o nome cardeais estar subentendido. O adjectivo montano, sem
prefixo, está atestado, segundo Houaiss, apenas em 1561 (cf. GBarCor), o que prova que o
registo escrito está muito aquém do uso oral de determinadas palavras. Também JPM3 e AGC
registam montano com datação do XVI.

280
Para Houaiss do lat. montānus, a, um e para JPM3 do it. ultramontano.

164
III.4.1. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica de D. Fernando

4.1.1. Comentários

165
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

E por çerto que em este livro tyve eu muito comtrayro


cuidado do que allgũs outros estoriaes ẽ suas obras teverão,
espiçiallmemte os gregos, os quaes supriam com fermosas
pallavras o que na gramdeza dos feitos mimgoava, e a mỹ
foy neçessario forneçer a mimgoa das pallavras com gram-
deza dos feitos.

Gomes Eanes de Zurara,


Crónica do Conde D. Pedro de Meneses (179.134-139).

ABALROAR, vb. (1) ‘atracar um navio a outro com balroas, para combate de abordagem’.
E se porvemtura nos todos allcamçarẽ, aballrroemos hũa com a outra, e atemo-llas ambas,
(547.336).

Etimologia: de a- + balroar.
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…abalroemos huma coma a outra, e atemo-las ambas», P. Men., II, cap. 5, p.
495 (Alex.)”.
- AGC: XV.
- IVPM: XV, (M2)281.
- BLem: XV, aballrroemos, (ZURP).
- MD-CF: XV, aballrroemos, (ZURP).
- CIPM: XV, aballrroemos, (ZURP).
- Houaiss: XV, abalroar (cf. IVPM).
Obs.: O VH-CPM não regista este verbo, eventualmente porque no IVPM apenas está averbado
com indicação de registo em Morais2, faltando pois abonação para apresentar.
Os substantivos abalroa e balroa apenas aparecem atestados em 1552 e 1553, respectivamente,
segundo Houaiss, pelo que se verifica a atestação de um derivado antes da primitiva.

281
O IVPM, bem como o VH-CPM, não trabalham esta Crónica de Zurara, pelo que o registo de quaisquer
palavras nela constantes será sempre indicação com referência a outras fontes e não de forma directa. Por acréscimo,
também Houaiss se inclui nestas circunstâncias, embora esta seja uma obra que conste na lista da ‘Bibliografia de
datação e etimologia’ indicada no dicionário (DPMen). Houaiss apresenta mesmo como primeira datação para
bombordo esta crónica de Zurara. Atendendo ao grande número de primeiras antestações que nela se verificam, será
este um caso esporádico de consulta.

167
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ABREVIADOR, adj. (1) ‘resumidor’282.


o começo é a metade [e] mais que a metade da cousa, e nõ menos o rreza Vallerio Maximo,
abreviador de Tito Livio. (543.243).

Etimologia: do lat. abbrĕvĭātŏr, ōris.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: 1517, “«…como o fizera todo outro abreviador ou letrado», no Corpo Dipl. Port., I, p.
493 (C)”.
- AGC: XVI.
- BLem: XV, abreviador, (ZURP).
- MD-CF: XV, abreviador, (ZURP).
- Houaiss: 1517, abreuiador (CDP I 493).
Obs.: Antedatação face a Houaiss.

AÇALMO, s.m. (2) ‘provisão, abastecimento’.


e, que elle all nõ faça senã mamdar desses catyvos que tẽ, por elles lhe daram açallmo com
que se possa mamter. (530.1076[1077]).

Outras ocorrências: 715.1090.


Etimologia: de origem controversa. Para JPM de um árabe hispânico *aç-çalam.
Tipo de unidade: importação (arabismo) (?).
Registos:
- JPM3: regista açalmo, mas apenas apresenta datação para o verbo, 1370.
- IVPM: XV, açalmo (ZURD 106.5).
- VH-CPM: XV, açalmo (ZURD, 106.5).
- BLem: XV, açallmo (ZURP).
- MD-CF: XV, açallmo (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor.

ACUITAR, vb. (1) ‘agravar, agudizar’.


E estamdo sobre o çerco, acuito-se a ymfirmidade do comde, (716.1111).

Etimologia: Para Houaiss, de origem obscura; para o CIPM, talvez do lat. *acuitare; para CF
de coitar (de coita ‘desgarça’ < cast. cuita).
Tipo de unidade: importação (latinismo) (?).
Registos:
- BLem: XV, acuitose (ZURP).
- MD-CF: XV, acuito-se (ZURP)283.
- CIPM: acuito (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. InedHist)284.

282
Segundo Morais s.v. abreviador, ‘que resume matéria mais larga a menos razões’.
283
Lematizada para o verbo acoitar.
284
Em Houaiss, o volume da Collecção de Livros Inéditos de História Portuguesa referido na bibliografia de
datação e etimologia parece ser o primeiro, pela indicação da publicação em 1970, correspondente aos reinados de D.
João I, D. Duarte, D. Afonso V, e D. João II, e onde se incluem três obras, Livro da Guerra de Ceuta, por Mestre

168
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ADIBE, s.m. (1) ‘lobo, chacal’.


e hũas anymallias que há naquella terra que se chamã adibes começarã de ouvar,
(686.360).

Etimologia: do ár. adh-dhīb (ad-dīb).


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “em port. só o consigo documentar nos princípios do séc. XVI: «…honde nom he
ousado ninguem de ho tocar, e aly ho comem aues e hos adibes», Barbosa, 323 (cit. de
Dalg.)”.
- AGC: XV; XVI, adiue.
- IVPM: XV, adibe (ZURD 87.11).
- VH-CPM: XV, adibes (ZURD, 87.11).
- BLem: XV, adibes (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, adibes (ZURP)285.
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor.

ADUAR, s.m. (7) ‘povoação provisória e móvel dos mouros; acampamento’286.


Loguo neste mesmo mes o comde mamdou Diogo Vazquez de Porto Carreiro em hũ seu
bragamtim a avisar hũ aduar que hera ẽ terra de Benyçaide, (344.4).

Outras ocorrências: 344.15; 378.839; 401.365[364]; 402.385[384]; 420.815[812];


673.47.
Etimologia: do ár. ad-dūar (JPM), ad-dawwar (AGC) dawwār (Corominas).
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«…lhe trouxerom as escuitas recado, como em outro aduar que se chamava
Beluazem, que era naquela mesma serra…», D. M., cap. 11”.
- AGC: XV.
- IVPM: XV, aduar (ZURD 72.29).
- VH-CPM: XV, aduar (ZURD, 72.29).
- BLem: XV, aduar (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, aduar (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor, já segundo JPM3.

Mattheus de Pisano, Chronica d’elRey D. Duarte, por Ruy de Pina e Chronica d’elRey D. Affonso V., pelo mesmo
autor, como se pode ler no “Index’. Não há qualquer referência ao segundo volume, publicado em 1792,
correspondente aos mesmos reinados, mas onde se inclue a Chronica d’elRey D. João II, por Ruy de Pina e a
Chronica do Conde D. Pedro de Meneses, por Gomes Eanes de Zurara, bem como a referida forma verbal acuitou-se
nesta última obra. Também em Morais é possível confirmar a ocorrência neste segundo volume: “«acuitou-se a
doença do Conde.» Ined. 2. 624. no Tom. 3. f. 80. diz erradamente «se acoutou a door no Conde tanto, perque
conheceu em si sinaes de fallecimento»”.
285
O MD-CF não trabalha a Crónica do Conde D. Duarte de Meneses.
286
Segundo Morais, s.v. aduar, “povoação movel de Arabios errantes. B. Tenreiro, cap. 4 consta de 50. a
100. tendas”. Já com registo no Dict. Latinolusitanicum, 1569-70, de Jerónimo Cardoso, s.v. cateia(ae) e maga(ae).

169
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

AGOMER, s.m. (2) ‘arrais’.


E os mouros que nelle jaziã cuydaram que hera o lenho d’Allcaçer, e começou hũ delles a
dezer “agomer, agomer”, que quer dezer em nosso lymgoagẽ "arraez, arraez".
(408.529[526]).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- BLem: XV, agomer (ZURP).
- MD-CF: XV, agomer (ZURP).
Obs.: Pelo que consegui apurar será arabismo utilizado como hápax nesta única abonação.

AGRURA, s.f. (1) ‘aspereza’.


porque vio que sua gemte nõ podia seguyr avamte pella agrura do monte, (569.894).

Etimologia: de agro + -ura.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«Podem passar a pé enxuto ao longo desta agrura de penedia», Déc., I, 3, cap.
8”.
- AGC: XV.
- IVPM: XV, agrura (ZURD 225.28).
- VH-CPM: XV, agrura (ZURD, 225.28).
- BLem: XV, agrura (ZURP, ZURD, CP287).
- MD-CF: XV, agrura (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor.
O adjectivo está atestado em 1344.

ALAR, vb. (1) ‘rebocar, puxar’.


e porque ho comde soube que aquella barca hera de Castella e que costramgidamemte fora
ally trazida, o que se mostrou bem ao tempo que os mouros salltaram em terra que a
quiseram allar fora por hũa corda, (403.414[413]).

Etimologia: do fr. haler.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«…a quizerom allar fóra por uma corda, o Arraes lha cortou…», P. Men., em
Ined. Hist., I288, p. 386 (Alex.)”.
- AGC: XV, allar.

287
Também com indicação de ocorrência em Castelo Perigoso (CP) que não consegui localizar, datado do
século XIV, XV para o CIPM.
288
A Crónica do Conde D. Pedro de Meneses aparece no segundo volume dos Inéditos da História
Portuguesa. No entanto, há algumas discrepâncias, quer na omissão, quer na indicação dos volumes. Cf. as entradas
ABALROAR (simplesmente P. Men., II), ALAÚDE (P. Men., nos Ined. Hist., I), ALBATOÇA (P. Men., nos Ined. Hist.,
II), CALA (P. M., nos Ined. Hist., II), ESCOL (P. Men., I, nos Ined. Hist., I), VELEIRO (P. Men., I, nos Ined. Hist.,
II).

170
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- BLem: XV, allar (ZURP).


- MD-CF: XV, allar (ZURP).
- CIPM: allar (ZURP).
- Houaiss: 1529, (ATenr 85).
Obs.: Antedatação a Houaiss, já segundo JPM3.

ALBATOÇA, s.f. (1) ‘embarcação de vela e remo’


E fazemdo-se logo prestes de pelleja, conheçerom que hera albetoça, a quall nõ poderam
ẽcallçar senão tam perto da terra (305.57).

Etimologia: prov. do ár. al-batāsa ou ár. batāx.


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, “já se documenta no séc. XV: «…e seendo jaa sobre o quarto da alva sentiram voga
de navio… e fazendo-se logo prestes de peleja conhecerom que era albetoça», P. Men., cap.
32, nos Ined. Hist., II, p. 311”.
- IVPM: XV, albetoça (ZURD 156.24).
- VH-CPM: XV, albetoça (ZURD, 156.24).
- BLem: XV, albetoça (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, albetoça (ZURP).
- Houaiss: XV, m. q. albatoça (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor, já segundo JPM3.

ALGAZARRA, s.f. (1) ‘gritaria’.


E nõ fezerom hii cousa nenhũa, somemte amdarã fazemdo suas allgazaras e dapnarão
allgũ pãao que ally estava. (599.446).

Etimologia: do ár. al-gazārâ.


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “As formas antigas eram algazara e algaziar, documentáveis no séc. XVI: «todos
os algazares destes de se fazerem liberais é fofo», Ulís., I, 6; «E sobre isto derão huma grande
grita, fazendo suas algazarras, dobrando os braços, segundo elles costumão», Déc., I, 8, 7”.
- AGC: XV, algazara; XVI, algazar.
- IVPM: XV, algazaras (ZURD 128.24).
- VH-CPM: XV, algazaras (ZURD, 128.24).
- BLem: XV, algazaras (ZURD); allgazaras (ZURP).
- MD-CF: XV, allgazaras (ZURP).
- Houaiss: XV, algazara (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor.

AMAÇAROCADO, adj. vb. (1) ‘emaranhado; embaraçado’.


e avia a cara gramde e allva, e os cabellos louros e amaçarocados, (520.818[817]).

Etimologia: part. de amaçarocar (a- + maçaroca + -ar).

171
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Tipo de unidade: derivação parassintética.


Registos:
- BLem: XV, amaçarocados (ZURP).
- MD-CF: amaçarocados (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Para este derivado, bem como para os verbos maçarocar e amaçarocar, Houaiss não
apresenta nenhuma datação.
O substantivo maçaroca está atestado no século XV.

ANAZÃO, adj. (1) ‘de tamanho diminuto; anão’.


O seu capitã, que hera Mulley Bucar, amdava ẽ hu cavallo anazã, (709.928).

Etimologia: de anão, sob a forma do radical anã- + -z- + -ão289.


Tipo de unidade: derivação sufixal
Registos:
- BLem: XV, anazã (ZURP).
- MD-CF: XV, anazã (ZURP).
Obs.: Vocábulo não encontrado. Pelo contexto, o significado parece ter na base anão. As
referências mais próximas que consegui foram o verbo anãzar em JPM3 e Houaiss (ambos com
abonações de Camilo) com remissão, por este, para ananicar. É possível ainda em Houaiss
encontrar averbado ananzar e anãzado, com remissão para ananzado. Em todos, o significado
está relacionado com grego nános ‘anão’, pelo lat. nanus., com os respectivos afixos (a-
protético e sufixo derivacional).
O substantivo está atestado no século XIV.

APORTALECER, vb. (1) ‘aportar, entrar no porto’.


Os descubridores comprirã o que lhe foy mamdado, mas nõ acharão o feito assy ligeiro
como elles pẽsarã, porque aymda elles bem nõ aportalleçiã quamdo hos mouros
emdereçarã a elles, (663.810).

Etimologia: de a- + portal + -ecer.


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- IVPM: XV, aportellecyam (ZURD 70.14).
- VH-CPM: XV, aportellecyam (ZURD, 70.14).
- BLem: XV, aportalleçiã (ZURP), aportellecyã (ZURD), aportellecyam (ZURD).
- MD-CF: XV, aportalleçiã (ZURP).
- CIPM: aportalleçiã (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem datação em Houaiss, apesar do registo em IVPM.
O substantivo está atestado no século XI.

289
Por similitude com anãzar: anã- + -z- + -ar. Sufixo masculino aumentativo,com flutuação entre -ã, -õ, -ão,
conforme barã (666.887), barõ (638.181) e barão (217.70).

172
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ARNESADO, s.m. (1) ‘que possui arnês, armadura’.


E a Bertollameu Affomso foy dada a guarda dell rrey, a Fernam Barreto ficou a guarda da
Allmina, com ha quall ficarão os arnesados de Lixboa, que passarão de çemto afora gemte
de pee, (202.686).

Etimologia: part. de arnesar (arnês + -ar).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1439, (MARR I.506.28).
- IVPM: 1439, p. adj. (MARR I.506.28).
- BLem: XV, adj. arnesados (ZURP).
- MD-CF: XV, arnesados (ZURP).
- Houaiss: 1439, adj. (cf. IVPM).
Obs.: apenas registado como adjectivo, mas em ZURP como substantivo. O VH-CPM não
regista este vocábulo, uma vez que não trabalha MARR.
O substantivo está atestado em 1379.

ARREADO, adj. vb. (1) ‘provido de arreios, arneses; adornado’.


Dom Duarte vio como herã homẽs bem corregidos e que traziã os cavallos bẽ arreyados;
(708.916).

Etimologia: part. de arrear (do lat.vulg. *arredāre).


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«De modo senhor que que vossa dama he fea & quereyla arrayar do alheo?»,
Auleg., II, cena 10, fl. 77 vs.; em sentido metafórico: «Terçados, agomias guarnecidas de ouro
e prata, anneis, e joias, de que se elles arreão»; Déc., II, 2,3”.
- IVPM: XV, arreyado (ZURD 266.24).
- VH-CPM: XV, arreyado (ZURD, 266.24).
- BLem: XV, arreyado (ZURD); arreyados (ZURP)290.
- MD-CF: XV, arreyado (ZURP).
- Houaiss: XV, arreyado; 1450-1516 riado (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação em obra do mesmo autor.

ASTUCIOSO, adj. (1) ‘que revela astúcia; astuto, ardiloso’.


homẽ de gramde coraçã, pero a mayor parte de suas obras heram astuçiosas. (658.699).

Etimologia: de astúcia + -oso.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, (Morais2).
- AGC: XVI; XV, astucjoso (ZURD 111.32).
- IVPM: XV, astucyoso (ZURD 112.32).
- VH-CPM: XV, astucyoso (ZURD, 112.32).
- BLem: XV, astuçiosas (ZURP); astucyoso (ZURD).

290
Como particípio do verbo arreigar.

173
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- MD-CF: XV, astuçiosas (ZURP).


- Houaiss: XV, astucjoso (cf. IVPM).
Obs.: Antedatação em obra do mesmo autor.
O substantivo está atestado no século XV.

ATEMORIZADO, adj. vb. (1) ‘assustar, amedrontar’.


E como quer que se os mouros ajumtassẽ pellas serras, tam atemorizados estavã jaa dos
dapnos que cada hũ dia rreçebiã, que nõ ousavã deçer a fumdo. (716.1101).

Etimologia: part. de atemorizar (a- + temor + -izar).


Tipo de unidade: derivação parassintética.
- AGC: XVI.
- IVPM: XV, atymorizado (ZURD 106.14).
- VH-CPM: XV, atymorizados (ZURD, 106.14).
- BLem: XV, atemorizados (ZURP); atymorizados (ZURD).
- MD-CF: XV, atemorizados (ZURP).
- Houaiss: XV, atymorizado (cf. IVPM)291.
Obs.: Antedatação em obra do mesmo autor.
Ainda sem registo no CIPM.
O substantivo está atestado no século XIII.

AZAGAIAR, vb. (1) ‘alvejar com golpes de azagaia’.


E os mouros vierom ally e azagayarã tres bois. (608.660).

Etimologia: de azagaia + -ada.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- IVPM: XV, azagayar (ZURD 26.30).
- VH-CPM: XV, azagayarã (ZURD, 260.30).
- BLem: XV, azagayarã (ZURP); azagayarem, azagayarẽ (ZURD).
- MD-CF: XV, azagayarã (ZURP).
- CIPM: azagayarã (ZURP).
- Houaiss: XV, azagayada (cf. IVPM).
Obs.: JPM3 apenas regista azagaia, remetendo para zagaia.
Antedatação em obra do mesmo autor.
O substantivo está atestado no século XIV.

AZAMBUJAL, s.m. (1) ‘extenso aglomerado de azambujos, zambujeiros’.


E os nossos começarã de hos seguyr per hũ azambujall basto, (703.776).

Etimologia: de azambujo + -al.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, azambujall (ZURP).

291
Cf. s.v. atemorizar. Verbo datado a partir do particípio.

174
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- MD-CF: XV, azambujall (ZURP).


- Houaiss: 1540, açambujaes (FÁlv 18).
Obs.: Houaiss indica na etimologia, como base deste derivado, o masculino azambujo, que, no
entanto, apresenta datação tardia (c1508), ocorrendo o mesmo com azambujal (1540).
Estaríamos perante o registo gráfico de um derivado que precede a base que lhe dá origem. Por
conseguinte, atendendo a que a datação apresentada para a variante feminina azambuja se
encontra atestada em 1222, em JPM e utilizada por Houaiss, será preferível indicar esta forma
como base. Regista ainda as variantes sem a- protético, zambujo e zambujal, de 1611 e 1765,
respectivamente. JPM3 regista zambujo, com a seguinte informação, s.v. zambujo: “Tal como
azambujo, é var. de azambuja (q.v.). O voc. berber donde todas estas formas derivam é zabbūj;
vj. cast. acebuche. No séc. XVII, no Dicionário de Barbosa”. A história da base desta palavra
não deixa de ser ainda mais curiosa se tivermos em consideração que a forma azambujeiros está
atestada em 1086 em Houaiss, segundo JPM3, s.v. azambuja: “«quomodo diuimus cum sanson
gudiniz per illum uallezinum de illis azambujeiros usque plicat in…», Dipl., doc. N.º 668, p.
399”.

AZEITONI, adj. (1) ‘da cor da azeitona; ligeiramente esverdeado; oliváceo’.


O seu capitã, que hera Mulley Bucar, amdava ẽ hu cavallo anazã, com hũa barreta
guarneçida de ouro na cabeça e hũ pellote de velludo azeytony (709.929).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, azeytony (ZURP).
- MD-CF: XV, azeytony (ZURP).
Obs.: Forma averbada em Morais: “Comic. Azeitona. Cancioneiro. Como adj. «veludo
azeitoni;» cor de azeitona. Ined. 2. 618”.

AZERVADA, s.m. (1) ‘cerca de troncos e galhos usada como defesa’.


E ally quiseram fazer hũa azervada, em que pemsavã de se sallvar, (396.224).

Etimologia: de azerve + -ada.292


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, azervada (ZURP).
- MD-CF: XV, azervada (ZURP).
- Houaiss: XV293.
Obs.: A datação em itálico de sXV apresentada por Houaiss mostra que, efectivamente, o grande
número de datações provêm de JPM3 e dos trabalhos de A. G. Cunha. No caso desta palavra em
particular, JPM3 não a regista, verificando-se o mesmo com Cunha, até porque este não trabalha
ZURP. Sendo assim, Houaiss não tem informação294. Todavia, encontra-se averbada em Morais,

292
Para Morais, “talves de acervo”, mas remetendo para azerve, indicado como termo agricula, com o
significado de “paravento feiro de ramos para emparar as eiras. Blut. Vocab.”.
293
Datação em itálico, como data provável.
294
Cf., no entanto, a palavra infra BOMBORDO.

175
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

precisamente com esta passagem de ZURP: “Cerca de madeiras á pressa para defensivo. Ined. 2.
380. E ali quizerom fazer huma azervada, em que pensavam de se salvar”295.
O substantivo está atestado no século XV.

BASTURA, s.f. (1) ‘que é espesso, basto’.


em que rreçebia a mulltydão das seetas e pedras que lhe de çima heram llamçadas, nõ sẽdo
menos ajudado da bastura dos rramos da arvore que ho sosteve, (569.874).

Etimologia: de basto + -ura.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, bastura (ZURP).
- MD-CF: XV, bastura (ZURP).
Obs.: apenas Houaiss regista a palavra, com indicação de pouco usada, remetendo para
bastidão, também sem datação.
O adjectivo está atestado no século XIV.

BOMBORDO, s.m. 1) ‘lado esquerdo de uma embarcação ou aeronave, olhando-se de ré para


vante’.
Mas nõ tardou muito que lhe aquelle rrogo foy comprido, porque a galliota de Allvaro
Affomso ẽvestio de babordo pella popa perlomgãdo (601.520).

Etimologia: do fr. bâbord.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- BLem: XV, babordo (ZURP).
- MD-CF: XV, babordo (ZURP).
- Houaiss: XV, babordo (cf. DPMen).
Obs.: Houaiss apresenta como primeira atestação desta palavra, precisamente, ZURP.
Atendendo ao número de primeiras atestações em ZURP que Houaiss não leva em
consideração, só poderá ser uma referência esporádica, tendo em conta que Cunha não a incluiu
nos seus trabalhos.

BORDAR, vb. (1) ‘beirar, margear, orlar’.


E ouverão tempo, e passarão da outra bamda, e vieram bordar a Allycamte, e dahy
trouxeram a costa de lomgo ate Gibralltar. (371.665).

Etimologia: de borda + -ar. JPM3 propõe também a hipótese do fr. border ou broder.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, segundo Morais2, “De borda, isto é, «guarnecer a borda a»”.
- BLem: XV, bordar (ZURP).
- MD-CF: XV, bordar (ZURP)296.

295
Cf. Morais4 azervada.

176
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- Houaiss: 1789, (cf. MS1).


Obs.: Com esta atestação em ZURP, o verbo bordar tem ocorrência simultânea ao seu
homónimo bordar ‘ornamentar pano ou estofo com fios’, antedatando em mais de três séculos a
data apresentada por Houaiss, proveniente de Morais1.
Ainda sem registo no CIPM.
O substantivo está atestado no século XV.

BRAGA, s.f. (1) ‘grilheta, calceta; argola de ferro fixada ao tornozelo dos prisioneiros, e
que se ligava à sua cintura por meio de uma corrente de ferro ou ao pé de
outro prisioneiro’.
Ex vem o cristão em forma de catyvo, com sua braga de ferro, (417.750[747]).

Etimologia: Segundo Houaiss do lat. brāca, ae297.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “o sentido de «grilheta», (…), «…nove crianças de seis atè oito anos, todos com
bragas nas pernas, & algemas nas mãos…», Pereg., cap. 43, vol. II, p. 48”.
- AGC: XVI, braga, ‘grilheta’.
- IVPM: XV, bragua (INFA 47.19).
- VH-CPM: XV, braga (INFA, 47.19).
- BLem: XV, Braga (ZURP)298.
- MD-CF: XV, braga (ZURP).
- Houaiss: XV, bragua (cf. IVPM).
Obs.: As ocorrências registadas dizem apenas respeito à acepção ‘grilheta’299, datada por JPM,
AGC e Houaiss do século XVI. O IVPM apresenta nove abonações do século XV, mas todas
para a acepção ‘calça(s) curta(s) e larga(s)’. O VH-CPM, que não indica qualquer significado,
tem a vantagem de apresentar a abonação, ao invés da simples localização do IVPM. Assim, é
possível ler na que corresponde a INFA: “Naquele dia forom a todos lançados feros em anbalas
pernas, a maneira de braga, e o Ifante foy o postumeiro que ferarom.” Verifica-se, portanto, que
esta abonação não se engloba dentro no conjunto apresentado por Cunha no IVPM e,
inconscientemente, antedata em um século as propostas conhecidas. Assim, com esta ocorrência
no Trautado da vida e feitos do muito vertuoso sor. ifante D. Fernando, escrito por de Frei João
Álvares entre 1451-1460, mais do que a primeira atestação em ZURP, será adequado colocá-la
em simultaneidade com este Trautado300.
Morais apresenta uma abonação da Historia da India, governanda-a D. Luiz de Ataide, de
António Pinto Pereira, donde penso provirem todas as datações.

296
No corpus MD-CF, no século XIV, ChUniPort (1300), encontra-se mal digitalizada a forma bordem:
“Johanes doctor legum Dom Joham pella graça de deus filho do moy nobre Rey dom Pedro meestre da caualaria da
bordem daujs”. São mais os casos da troca do ‘h’ pelo ‘b’: “E, como lhe comtasse por bordem todo o que avia
passado” (FRAD), “ilhos de dom frey Nuno de goyos prior da bordem do espital Carta” (ChPortDuarte).
297
JPM3 sugere também a forma mais antiga brax, brācis, mais usada no plural braces, com eventuais
reminiscências no inglês braces ‘suspensórios’, neste caso em particular, ‘suspensórios de ferro’.
298
Classificada como nome próprio.
299
RLor corrige a datação de JPM para a acepção de ‘espécie de calças’, do século XV para 1083 “et unas
brakas nobas cum sua inbragatoria” (Dipl. 369), mas que Houiss não leva em consideração.
300
Existem outros casos com ocorrência simultânea em INFA e ZURP que não serão trabalhados, como
elche, passante.

177
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

BRENSEDA, s.f. (1) ‘vento com neblina, e escuridão’.


Ora tornamdo ao comto dos primeiros, elles assy partidos da çidade, como jaa dissemos,
amdarão quamto poderõ em aquella noite, mas a gramde aspereza da terra e a bremseda
da noite não comsemtyo que chegassem sobre as alldeas senão parte do dia passado,
(328.638).

Etimologia: do ital. Brezza (?).


Tipo de unidade: importação (italianismo (?)).
Registos:
- BLem: XV, bremseda (ZURP).
- MD-CF: XV, bremseda (ZURP).
Obs.: Com registo em Viterbo, precisamente com esta abonação de ZURP, e com os seguintes
significados: “multidão de brenhas, silvados, matagais, brejos, paûis. Andárão quanto poderão,
mas a grande aspereza da terra, e a brenseda da noite (i.e. que naquela noite passárão) (…)”301.
A mesma abonação também em Morais, penso que com significado mais apropriado, e com a
seguinte dúvida: “(talvez do Italiano, Brezza, alterado em brenza, e brenseda, deriv. Como
olivedo, azeredo, jaspedo, etc. alameda, figueredo, ou figueiral, etc.) vento com nebrina, e
escuridão”302.

BROA, s.f. (2) ‘canal, estreito’.


Ouve o comde sabedoria como se em Tamger armava hũa galleota e, porque rrecebesse
primeiro o dapno que temtasse de o fazer, mamdou armar outra e dous bragamtis, os
quaes, partidos da çidade naquella mesma noite, jazẽdo ẽ mea broa do mar em rroda,
vyram como vinha hũ carevo de comtra Gibralltar e seguya pera Tamgere. (380.869;).

Outras ocorrências: 381.890.


Etimologia: de origem controversa.
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, broa (ZURP).
- MD-CF: XV, broa (ZURP).
Obs.: Os dicionários consultados apenas apresentam a acepção mais comum ‘pão de milho’303.
Morais, além do significado, apresenta a indicação de termo antigo de Roteiros304, com duas
abonações, embora posteriores a ZURP: “Por meya bròa; i.é, por meyo canal. Cast. 2.62.
«arribando por meia boròa.» Chron. J. III. P. 4. c. 98. «indo os galeões a meia boròa, e a
armada de remo de longo da costa»”. A

301
Viterbo, s.v. brenseda.
302
Morais4, s.v. brenseda.
303
Para Houaiss, a forma mais antiga boroa ocorrem em 1174 (JPM3) e a forma broa, apenas em 1652 (cf.
Agiólogo). No MD-CF, com abonação de Textos notariais (sd,1243-1300) in Docs. Notariais dos Séculos XII a XVI
(CIPM), pode encontrar-se já a forma broa: “sentindo-se agravados por lhes deitarem muita água no vinho e lhes
diminuirem a ração de broa”.
304
Em Houais, s.v. roteiro: “publicação com descrição minuciosa de pontos e acidentes geográficos de
regiões costeiras ou ilhas, com indicação de correntes, ventos, marés, faróis, cidades litorâneas, sugestão de rotas para
cada época do ano etc., cujo conhecimento é necessário para se fazer uma viagem marítima”.

178
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

CABIL, s.m. (3) ‘almirante’.


E por comtarmos nossa estoria ẽ nossa dereyta ordenamça, diremos aquy como hũ mouro
que se chamava Caçome Bomcane, que fora arraez [cabill] daquella çidade, fugio de noite
per hũ cano - e arraiz cabill amtre os mouros he assy como allmyramte amtre os cristãos.
(476.798[797],799[798]).

Outras ocorrências: 474.767.


Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, cabill (ZURP).
- MD-CF: XV, cabill (ZURP).
Obs.: Pelo que consegui apurar da pesquisa em vários dicionários, será ocorrência única, que
forma com arraez o composto arrais-cabil, pois a classificação de adjectivo parece-me forçada.

Caçoar, s.f. (1) ‘?’


E elle trazia dous cristãos que filhara a traves das Areas Gordas em hũ barco e, porque hũ
delles lhe dissera que lhe daria hũa caçoar, levava-o comsygo, (622.1034).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, caçoar (ZURP).
- MD-CF: XV, caçoar (ZURP).
Obs.: Normalmente registado como verbo. Como substantivo, apenas em Morais classificada de
s. f. ant., precisamente com esta abonação de ZURP, mas com um ponto de interrogação.

CALA, s.m. (16) ‘pequeno porto ou enseada muito estreita, com margens íngremes ou entre
rochedos’.
as quaes amte menham deram escalla em terra omde se acaba o muro d’Allmina, em hũa
calla que he da parte do llevamte. (346.59).

Outras ocorrências: 335.803; 344.5,9; 356.305; 434.1159[1156]; 435.1183[1180];


437.1221[1218]; 453.246; 346.57; 370.640; 377.814; 446.88;
473.732; 490.72; 624.1086.
Etimologia: Segundo Houaiss, “de orig. contrv.; do ár. kallá ‘ancoradouro protegido; margem
do rio’ ou de orig. pré-romana”.
Tipo de unidade: importação (arabismo (?)).
Registos:
- JPM3: XV, “«levando porem assy o Bragantim arrombado até Mançor, em cuja cala
demostrarárom de noite a carrega, e estancarom sua Fusta…», P. M., cap. 59, em Inéd. Hist.,
II, p. 408”305.
- AGC: XV.

305
Esta é uma sigla atribuída ao Livro de Falcoaria de Pero Menino (P. M.), cf JPM3, Abreviaturas e Siglas
(1995:18). No entanto, a abonação é claramente de ZURP. Cf. obeservação, nota 288, s.v. ALAR.

179
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- BLem: XV, calla306, callas307 (ZURP).


- MD-CF: XV, calla calla (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. InedHist).
Obs.: O IVPM e o VH-CPM não aproveitam a informação constante em AGC, pois não
apresentam entrada para esta palavra. Embora em alguns casos se justifique esta ausência, pois
são apresentadas datações do século XVI e mesmo posteriores308, noutras a indicação dada é do
século XV, como neste caso309.

CANAVEAR, vb. (1) ‘ferir, torturar, enfiando lascas de cana sob as unhas’.
comtanto que não sejam daquelles que se lamçarã per suas vomtades, porque taes nõ
tomaria senão pera hos canavear. (417.741[738]).

Etimologia: origem duvidosa. Segundo Houaiss, “há quem proponha a form. a- + 2cânave + -
ar; Nascentes deriva de cânave < lat. cannăbis,is e cannăbus,i ‘linho, cânhamo’,
por sua vez, do gr. kánnabis e kánnabos,os; há, ainda, os que associam a cânave
(desusado) ‘cana’ que, segundo DV, s.v. canáve, seria proveniente de canna, infl.
na forma por canave, do lat. cannăbis ‘cânhamo’ alguns relacionam ao ant.
canavea, do qual tb. procederia canavial, antes canaveal;”
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«… que lá seja prêso, com tanto que não sejam daqueles, que se lamçarom per
suas vontades, porque taes nom tomaria senão pera os cannavear», P. Men., cap. 56, em Inéd.
Hist., II, p. 396. A var. acanavear do séc. XVI: «… ẽ dous dias que ho martyrizarã, atado ẽ
hua cruz feita ẽ aspa, em que ho acanauearã», Gois, IV, cap. 8, p. 19”.
- BLem: XV, canavear (ZURP).
- MD-CF: XV, canavear (ZURP).
Obs.: Houaiss apenas apresenta a variante acanavear, com indicação de que “JM registra no
sXV um v. canavear, com uma var. acanavear no sXVI”. É precisamente esta Houaiss utiliza
com ocorrência em 1567 DGóis IV 21.
Ainda sem registo no CIPM.
O substantivo está atestado em 1338.

CÁRAVO, s.m. (57) ‘embarcação moura de vela latina, usada no Mediterrâneo’.

Estamdo jaa pera partir, vyram llargo ao maar, pera comtra omde elles estavã, hũa vella
latyna, a quall rreconheçemdo que hera caravo vogaram a elle. (344.18).
Caravo caravos carevo carevos

Outras ocorrências310: 320.436; 346.54; 380.865.

306
Forma classificada como vb / nomc e lematizada para o verbo calar.
307
Lematizada para calha.
308
Cf. abreviador (XVI), expedição (XVI), quilate (XVI), recosto (XVI), alar (XVII), meda (XVII),
muralha (XVII), entuna (XVIII), correspondente (1813), ladrilhado (1813), recrescimento (1813)..
309
Cf. sobretudo, a partir da letra -E-, para o VH-CPM, palavras como escol, espadim, falca, fragura.
310
Das 57 ocorrências em ZURP, além de caravo, apenas apresento o registo das três formas diferentes:
caravos, carevo, carevos.

180
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Etimologia: do lat. tar. carăbus, i.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, s.v. Cárabo “«… forão sobre o Porto de Tamger, e não achárom nenhuma cousa,
senão num Caravo, que fezeraõ encalhar sobre huns penedos…», P. Men., cap. 42, em Inéd.
Hist., II, p. 349. Antes, na p. 194, a var. cárevo: «a fusta… com hum carevo»”
- AGC: XX.
- IVPM: XV, careuo (ZURD 168.24).
- VH-CPM: XV, careuo (ZURD, 168.24 e 203.26).
- BLem: XV, caravo, caravos, carevo, carevos (ZURP); careuo (ZURD);
- MD-CF: XV, caravo, caravos, carevo, carevos (ZURP).
- Houaiss: XV, careuo (cf. IVPM).
Obs.: A data tardia apresentada por AGC é esclarecedora da investigação levada a cabo para
efeitos de datação de palavras. Consta na primeira edição do seu dicionário etimológico, de
1982, sem correcção no Suplemento à segunda edição, 1986. Passados dois anos, no segundo
volume do IVPM, 1988, é antedata cinco séculos com atestação em ZURD.

CARRASQUEIRA, s.f. (1) ‘carrasqueiro, carrasco’.


E, semdo a gemte fora, pareçe que os pastores jaziã dormyndo sob hũa carrasqueira,
(358.344).

Etimologia: de carrasco + -eiro.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: 1555, “adj. De carrasco1. (…) como apelido ou alcunha”.
- BLem: XV, carrasqueira (ZURP).
- MD-CF: XV, carrasqueira (ZURP)311.
- Houaiss:
Obs.: A indicação de JPM3 não se aplica neste contexto. Houaiss apenas regista a variante masculina,
carrasqueiro, sem datação, cuja etimologia remete para o substantivo carrasco, datado de 1553 (cf.
Susque III fº 60)312. Verifica-se pois, o registo gráfico de um derivado antes da primitiva,
situação também comprovada pela indicação de carrascal, na forma carascaes, em AGC, com
data do século XV.

CLIMA, s.m. (s.f.) (2) ‘conjunto de condições atmosféricas que caracterizam uma região’.
porque, emtramdo o sol no sygno da virgem, he naquella crima a força do Estio, omde
todallas fruytas tẽ sua primçipall sazão. (225.246).

Outras ocorrências: 687.376.


Etimologia: do fr. climat.
Tipo de unidade: importação (galicismo).

311
Em ChPortDuarte como topónimo.
312
Para JPM3 de 1275 “«Petrus iulianj dictus carrasco», Portel doc. N.º 201, p. 116 da separata; cf. também
p. 117. (…)”.

181
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Registos:
- JPM3: XVI, “«… tem passados / na viagem, tam asperos perigos, / Tantos Climas & Ceos
experimentados», Lus., I, 29. A variante Crima no séc. XVI (…)”
- AGC: 1572.
- IVPM: XV, clima (ZURD 87.22).
- VH-CPM: XV, clima (ZURD, 87.22).
- BLem: XV, crima (ZURP); clima (ZURD).
- MD-CF: XV, crima (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. IVPM).
Obs.: Houaiss não apresenta a forma histórica crima, uma vez que não trabalha ZURP. Porém,
ela estava já identificada por JPM3 no século XVI, embora tardiamente face a ZURP. A datação
do século XV indicada em Houaiss é de ZURD, proveniente do IVPM, com a forma clima.
Antedatação a Houaiss em obra do mesmo autor.

CORRESPONDENTE, adj. (1) ‘adequado’.


Elle avia o corpo de bõa gram-dura, cõ nẽbros correspomdemtes a sua gramdeza,
(520.816).

Etimologia: de corresponder + -nte.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: 1813 Morais2.
- AGC: 1813.
- BLem: XV, correspondente (ZURP).
- MD-CF: XV, correspondente (ZURP).
- Houaiss: 1563, (HPint I).
Obs.: Apesar de antedatar Morais, a abonação da Imagem da Vida Christam de Frey Hector
Pinto, apresentada por Houaiss, continua a ser tardia.
O verbo prefixado corresponder está atestado no século XV, derivado de responder já em 1152.

COVOADA, s.f. (1) ‘série de covas; depressão no terreno’


E emtão emcaminho tras elles, os quaes allcamçou em çima do porto, ẽ hũa covoada que
ally há, omde fez fazer synall a todos que deçessem e que dessem çevada a seus cavallos,
(384.967).

Etimologia: do rad. desnasalizado de covão sob a f. covo- + -ada.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- IVPM: XV, covada, (ZURD 183.11).
- VH-CPM: XV, couoada, (ZURD, 183.11).
- BLem: XV, covoada (ZURP); couoada (ZURD).
- MD-CF: XV, covoada (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Parece haver alguma oscilação no registo desta forma. O IVPM apresenta covada e o VH-
CPM couoada, para a mesma abonação, ambas registadas por Houaiss, datando a primeira do
século XV com base no IVPM, e deixando esta última sem datação.

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III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

DESIGUALEZA, adj. (3) ‘desigualdade’.


Porem, comprimdo vosso mamdado, me despus aa dita obra, pedimdo aaquelle Deus que
em sy mesmo, com eternall ordenamça, ẽ persoall ternario sem desygualleza, (181.181).

Outras ocorrências: 444.39; 635.121.


Etimologia: de des- + igualeza.
Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- VH-CPM: XV, desygualleza (ZURD, 52.33); desigualleza (ZURD, 171.33).
- BLem: XV, desygualleza (ZURP); desigualeza, desigualleza (ZURD).
- MD-CF: XV, desygualleza (ZURP).
Obs.: Houaiss, AGC e JPM3 apenas registam igualeza, este último com abonação de VITA,
oriunda de RLor sem o referir.
O substantivo igualeza está atestado no século XV313, derivado de igual já desde o XIII.

DESPEJADAMENTE, adv. (1) ‘livremente; sem impedimento’.


E os de cavallo ouveram llugar de sahir hũs e hũs, e assy como hiam saymdo assy hiam de
rrosto aos comtrarios, e começavã de pellejar com elles, de guysa que os segundos, e
terçeiros, e assy os outros sayam jaa mais despejadamemte (692.506-507).

Etimologia: de absoluto + -mente.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- IVPM: XV, despeiadamente (ZURD 90.27).
- VH-CPM: XV, despeiadamente (ZURD, 90.27).
- BLem: XV, despejadamente (ZURP); despeiadamente (ZURD).
- MD-CF: XV, despejadamente (ZURP).
Obs.: O adjectivo está atestado no século XV.

DOBREL, s.m. (1) ‘bornal (?)’.


O comde mamdou que dessẽ aaquelle mouro muy bem de comer e em fim lhe fez emcher hũ
dobrell que trazia de bõ pão allvo, (419.794[791]).

Etimologia: do fr. doublier.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- BLem: XV, dobrell (ZURP).
- MD-CF: XV, dobrell (ZURP).
Obs.: Apenas registado em Morais com esta passagem de ZURP, e com o significado de pano
de mesa, ou guardanapo.

313
Para Houaiss no século XIII, remetendo para o FichIVPM. No VH-CPM apenas são registadas abonações
do XV. Atendendo à datação de RLor, eventual gralha de Houaiss.

183
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

EMBRANDECER, vb. (1) ‘enfraquecer’.


posto que nos queiramos [defemder] per força de nosso samgue, o temor do gramde
poderio e esperamça de comtinuaçom, com a mimgoa da necessydade, he neçessaryo que
faça embradeçer nossos nembros e emfraquemtar nossas forças, (212.957).

Etimologia: de en- + brando + -ecer.


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- BLem: XV, embradeçer (ZURP)314.
- MD-CF: XV, embradeçer (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem data em Houaiss. O VH-CPM apresenta a variante brandecer, com abonação de
Primeira Partida de Afonso X.
O substantivo está atestado no século XIII.
Ainda sem registo no CIPM.

EMPIDOSO, adj. (1) ‘impedido, bloqueado; impidoso315‘.


Desy comtarão-lhe toda a maneira da terra açerca dos caminhos e lugares empidosos pera
aquelles de cavallo que lla ouvessem de hir. (310.198).

Etimologia: talvez da base latina pēs, pedis ‘pé’, com o prefixo de negação im- e o sufixo
adjectival -oso ‘que não pode por o pé, que não pode andar’.
Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- BLem: XV, empidosos (ZURP).
- MD-CF: XV, empidosos (ZURP).
Obs.: Apenas registado em Morais.

EMPREITA, s.f. (1) ‘tira de esparto com que se fazem esteiras’.


A primeira porque pareçee, segumdo diz sam Geronimo, que se eu fezera empreita
d’esparto ou esteiras de jumco, que o ganho fora pouco, (178.112).

Etimologia: Segundo Houaiss, de origem controversa “segundo Nasc., de em- + *preita, este do
gr. plektê ‘corda entrelaçada’, pelo lat. vulg. plecta; para A. G. Cunha e JM, do lat.
*implicta, por implicĭtus, a, um ‘entrançado, enlaçado, enroscado’ e, para JM,
talvez pelo esp. empleita (sXVII), do mesmo lat.vulg. plecta”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«…se eu fezera empreita d’esparto, ou esteiras de jumco…», P. Men., cap. 2, nos Inéd.
Hist., II, p. 117.”
- BLem: XV, empreita (ZURP).
- MD-CF: XV, empreita (ZURP; Foraes).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da remissão de Houaiss para o FichIVPM.

314
Forma lematizada para embranhar.
315
Segundo Morais4 s.v. empidoso.

184
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ENCARAPUÇADO, adj. vb. (1) ‘que tem carapuça; acarapuçado’.


Emderençarão tras elles ate que os emcallçarão, caa os mouros nunca os vyrã nẽ
semtyram, assy hiam emcarapuçados por causa da chuiva. (440.1286[1283]).

Etimologia: part. de encarapuçar (en + carapuça + -ar).


Tipo de unidade: derivação parassintética.
Registos:
- BLem: XV, emcarapuçados (ZURP).
- MD-CF: XV, emcarapuçados (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem data em Houaiss.
O substantivo está atestado 1452.

ENLEAMENTO, s.m. (1) ‘enleio, embaraço’.


O comde, vemdo o emlheamemto de sua guia, fez estar quedos os de cavallo e assy os de
pee, (384.974).

Etimologia: de enlear + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, emlheamento (ZURP).
- MD-CF: XV, emlheamento (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem data em Houaiss.
O verbo está atestado no século XV.

ENTUNA, s.m. (1) ‘entranha’.


E bem assy como os velhos liões levã os filhos aas ẽtunas316 das anymalias por lhe fazerẽ
perder o temor, assy pareçia o comde dom Pedro, que amdava cõ allgũs daquelles nobres
homẽs mostramdo-lhe como se danavão os ymigos. (554.515).

Etimologia: de en- + tuna317.


Tipo de unidade: derivação prefixal.
Registos:
- AGC: XVIII.
- BLem: XV, ẽtunas (ZURP).
- MD-CF: XV, ẽtunas (ZURP).
- Houaiss: XVIII, (cf. AGC).
Obs.: O significado apresentado por Houaiss, proveniente de AGC, ‘caminhada pelos montes,
caçando ou vagueando’, figurativamente, também parece fazer sentido nesta comparação do
conde D. Pedro com os leões.
O substantivo está atestado em 1721.

316
No manuscrito G entranhas.
317
Em Houaiss,+ 1tuna, em vez de 2tuna.

185
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ENXABEQUE, s.m. (2) ‘tipo de embarcação muçulmana’.


E Allvaro Fernamdez ficava na fusta com XV., e vierã a ella hũa fusta e seys emxabeques
(633.69).

Outras ocorrências: 642.290.


Etimologia: alt. de xaveco, do ár.vulg. xabbak.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, s.v. enxabeque: “veja-se xávega. Em 1873, D.V., mas deve ser mais ant. Há a
variante enxávega”. Em entrada separada para xaveco é que se pose encontrar a datação do
século XV com esta mesma abonação de ZURP.
- BLem: XV, emxabeque, emxabeques (ZURP)318.
- MD-CF: XV, emxabeque, emxabeques (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem data em Houaiss, que remete para xaveco (1836 cf. SC).

ENXURRAR, vb. (5) ‘atacar de enxurrada; limpar a área (embarcação) de forma rápida’.
Porẽ aquelles bõs capitães cõ allgũs que se estremaram amtre os outros cristãos salltarão
em hũa fusta dos mouros e ẽxullarã-na toda, que nõ ficou nenhũ homẽ vivo sobre cuberta.
E em esto os outros cristãos que estavã na proa emxorarã as outras ate çerca da metade.
(577.1092,1094).

Outras ocorrências: 577.1080; 578.1102; 627.1158.


Etimologia: de enxurro + -ar.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, emxorarã, emxorarão, emxorada (ZURP)319.
- MD-CF: XV, emxorarã, emxorarão, emxorada (ZURP).
- Houaiss: 1836 (cf. SC).
Obs.: O verbo enxorar, encontra-se registado em Morais também com uma abonação de
ZURP320. A base deste verbo321, enxurro ‘enxurrada’, que se encontra registado no VH-CPM
com uma abonação de ZURC, e as formas emxullarã e ẽxullarã, preferidas por Brocardo,
levam-me preferir a lematização para o verbo enxurrar, com a troca entre as líquidas <ll> por
<rr>.
O substantivo está atestado em 1450322.
Ainda sem registo no CIPM.

318
Forma lematizada para emxabeque.
319
Forma lematizada para enxorar.
320
S.v. enxorar: “Os nossos tomarão hum afusta, e enxorarom-na toda, antre os que matarão, e os que
fizeram saltar ao mar”. Confronte-se esta mesma passagem com a edição de Brocardo “Os nossos salltarão em hũa
das fustas e emxullarã na toda amtre os que matarão e os que fezerã salltar ao maar”.
321
A etimologia proposta por JPM3 para o verbo enxorar, de xó!, interjeição para espantar aves, não se aplica
neste contexto.
322
Em Houaiss com datação exacta para a Ceuta.

186
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ESCOL, s.m. (2) ‘elite’.


Caa ẽ este mesmo lugar foy jaa desbaratado o escoll dell rrey, (564.751[750]).

Outras ocorrências: 566.807[806].


Etimologia: regr. de escolher.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Registos:
- JPM3: XV, “«…estes som tais, que com pouca ajuda de seus vizinhos desbaratarom jaa o
escoll D’El-Rrey de Castella…», P. Men., I, cap. 9, nos Inéd. Hist., I, p. 509”.
- AGC: XV.
- BLem: XV, escoll (ZURP).
- MD-CF: XV, escoll (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da ocorrência em AGC e remissão de Houaiss para o
FichIVPM.
O verbo está atestado no século XIII.

ESPADIM, s.m. (1) ‘antiga moeda portuguesa’.


e se comtará mais adiamte omde fa-llarmos na mudaçõ que fez este rrey dom Affomso, que
este llyvro mamdou escrever, destes rreays brãcos ẽ outra moeda mais bayxa a que
chamarão espadĩs. (525.943[942]).

Etimologia: de espada + -im.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…fez este Rey Dom Affomso, que este Livro mamdou escrepver, destes rreaes
brancos em outra moeda mais baixa, a que chamarom Espadins.…», P. Men., cap. 81, nos
Inéd. Hist., II, p. 447”.
- AGC: XV.
- BLem: XV, espadĩs (ZURP).
- MD-CF: XV, espadĩs (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Em AGC forma lematizada para espada, mas apenas com significado de ‘arma branca’ e
sem registo no VH-CPM, apesar da remissão de Houaiss para o FichIVPM.
O substantivo está atestado em 954.

ESPIGÃO, s.m. (1) ‘parte mais elevada, topo’.


Gomçallo Velho como vio que hera socorrido tornou llogo a coyraça, omde achou jaa hũ
mouro sobre ho espigam do muro, (472.722).

Etimologia: de espiga + -ão.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«…hũa villa… cercada de tijollo, com espigões por cima do muro…», Pereg.,
cap. 90, vol. II, p. 76”.
- AGC: XVI.

187
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- VH-CPM: XV, espigam (ZURD, 352.13).


- BLem: XV, espigam (ZURP); spigã, spigam (ZURD).
- MD-CF: XV, espigam (ZURD).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: AGC, com uma primeira datação igual a JPM3, corrige depois no FichIVPM.
O substantivo está atestado no século XIII.

ESPÍRICO, adj. (1) ‘curva formada pela secção de um cilindro; em espiral’323.


E, como quer que esta nação abitasse per toda Espanha, eu diria, segumdo a nobreza dos
feitos passados, que, dos quatro rregnos cristãos inclusos nesta espirica rredomdeza,
(460.421).

Etimologia: do grego speirikós.


Tipo de unidade: importação (helenismo).
Registos:
- JPM3: 1873324.
- BLem: XV, espirica (ZURD).
- MD-CF: XV, espirica (ZURD).
Obs.: Um dos poucos helenismos directos encontrados, apenas registado em Morais sob a
forma feminina do adjectivo espírico registado por JPM3.

ESPORÃO, s.m. (1) ‘saliência reforçada na proa de um navio, usada para danificar o casco da
embarcação inimiga’.
E sendo assy aferrados dous navios a hũ, porque o Rraposo hera aymda ao largo, como
semtyo a pelleja voltou sobr’elles e emvestio hũa das fustas assy rrijo que meteo os
esporoes todos em ella, em tall guysa que a mayor parte da gemte foy ao mar. (576.1065).

Etimologia: Segundo Houaiss, do “provç. ant. esporon, der. do gót. ou do a.-al. ant. esporo; JM
pressupõe a existência de uma f. lat. *sporōne, com orig. no gót.”.
Tipo de unidade: importação (provençal).
Registos:
- AGC: c1539, esporam JCasD 122.3.
- VH-CPM: XV, sporoões (ZURD, 288.17).
- BLem: XV, esporoes (ZURD).
- MD-CF: XV, esporoes (ZURD).
- Houaiss: XV, sporoões, 1570 sporão (cf. FichIVPM).
Obs.: Em JPM3 apenas como topónimo em 1267. Claro exemplo de sucessivas antedatações de
Cunha, desde a primeira edição em AGC (sporão 1570), passando pelo suplemento à segunda,
(JCasD 122.3) até ao IVPM, com a abonação de ZURD.

323
Segundo Morais, s.v. espirica.
324
Segundo o Grande Dicionário Português ou Tesouro da Língua Portuguesa, pelo Dr. Frei Domingos
Vieira.

188
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

ESTRUGIMENTO, s.m. (1) ‘estrondo, estardalhaço; tontura, desmaio’


E quamdo a companha vio seu capitam derribado, rrefusou atras. Mas Gomçallo Vazquez,
semdo fora daquelle estorgimemto que rreçebera, assy da queda como dos golpes das
pedras, levamtou-se com gramde esforço e foy-se a poupa, (444.30).

Etimologia: de estrugir + mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, estorgimemto (ZURP).
- MD-CF: XV, estorgimemto (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem datação em Houaiss.
O verbo está atestado no século XV.

EXPEDIÇÃO, s.f. (1) ‘despedida’.


Por çerto, aymda que eu quisesse, eu nom poderia escrever sem lagrimas a espidiçam que
estas gemtes fezerão hũas das outras, (210903).

Etimologia: do lat. expeditĭo, ōnis.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, (Morais2).
- AGC: XVI.
- BLem: XV, espidiçam (ZURP).
- MD-CF: XV, espidiçam (ZURP).
- Houaiss: 1501, espediçam, 1505 expediçam, 1513 expidiçam, 1539 espydiçam (CDP I 2)
Obs.: Em nenhum dos registos apresentados se verifica a acepção de ‘despedida’. De qualquer
forma, são todos do século XVI.

FALCA, s.f. (1) ‘tábua superior do costado de embarcação miúda; pedaço de madeira’.
E os mouros de sua parte começarã de se poer a pomto, metemdo rremos e fallcas pera
averẽ mais allta defemsõ, (601.515).

Etimologia: do ar. falqâ, em vez de filqâ ‘pedaço, bocado’.


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«…e os Mouros de sua parte começarom de se poer a pomto metemdo rremos, e
falcas pera averem mais alta defemom.…», P. Men., cap. 16, nos Inéd. Hist., II, p. 536”.
- AGC: XV.
- BLem: XV, fallcas (ZURP).
- MD-CF: XV, fallcas (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: sem registo no VH-CPM, apesar da remissão de Houaiss para o FichIVPM.

189
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

FEROZ, adj. (2) ‘bravio, selvagem; violento’.


Como diz Vegeçio que os cavalos que comtinuã as guerras se fazẽ mais ferozes (325.569).

Outras ocorrências: 521.848[847].


Etimologia: do lat. fĕrox, ōcis.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, “Outro estrago & victoria clara & bella / Na gente, assim feroz como infinita, / Que
entre o Tarteso & Goadiana habita», Lus., VIII, 29; o latinismo feroce na mesma obra: «Posto
que a rica Arabia, & que os feroces / Eniocos, & Colcos, cuja fama / O Veo dourado
estende…», III, 72”.
- AGC: 1572.
- VH-CPM: XV, ferozes (ZURP, 350.15).
- BLem: XV, ferozes (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, ferozes (ZURP, ZURD).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: O grande contributo de Camões para a renovação do léxico iniciara-se já um século antes,
neste caso em concreto pela pena de Zurara.

FOLAR, s.m. (1) ‘fogaça’.


e assy se partyram com aquelles follares cada hũ pera sua parte. (323.515).

Etimologia: Segudo Houaiss “ligado a fogaça, prov. de uma base lat. fovicŭla, à qual se
prendem as f. snc. focŭla, ōrum ‘braseiro’ e focŭlus, ī dim. de fŏcus, ī ‘fogo’ ”.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “na Origem da Língua Portuguesa de Duarte Nunes de Leão, cap. 16, p. 294, ed.
de 1945”.
- BLem: XV, follares (ZURP).
- MD-CF: XV, follares (ZURP).
- Houaiss: 1606, (cf. DNLeP).
Obs.: Antedatação face a Houaiss, com datação igual em JPM3.

FOTO, s.m. (1) ‘(estar em foto) estar a boiar, flutuar’.


E porque ho mar é ally todo per allto, em tall guisa que a galle podia bem dar escalla em
terra em estar ẽ foto, (420.824[821]).

Etimologia: de orig.obsc.
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, froto (ZURP).
- MD-CF: XV, foto (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: Sem datação em Houaiss apesar da abonação de ZURP em Morais4.

190
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

FRAGOSIDADE, s.f. (2) ‘aspereza de caminho; fragura’.


Os mouros, vemdo como desfalleçiam cada vez mais e que a estreitura e fragosydade da
terra nõ lhe podia tamto aproveitar como elles cuydarão, começarão de se sahir (367.575).

Outras ocorrências: 377.806.


Etimologia: fragoso + -i- + -dade.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1813.
- VH-CPM: XV, fragosydade (ZURD, 79.14, 188.22, 227.10); fragosidade (ZURD, 237.12,
305.15).
- BLem: XV, fragosydade (ZURP, ZURD); fragosidade (ZURD).
- MD-CF: XV, fragosidade (ZURP).
- Houaiss: XV, fragosidade, fragosydade (cf. FichIVPM).
Obs.: O adjectivo está atestado no século XIII em Houaiss, mas em 1127 e 969 em JPM3,
corrigido por RLor.

FRAGURA, s.f. (1) ‘declive da montanha, com muitas fragas; aspereza, fragosidade’.
pello quall os mouros em breve foram na serra, tiramdo seu gado o mais que podiam pera
o sallvarem na fragura daquella momtanha. (332.737).

Etimologia: de fraga + -ura.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…em breve foraõ na Serra tiramdo seu gado, e o mais que podiam, pera o
salvarem na fragura daquella momtanha…», P. Men., cap. 38, nos Inéd. Hist., II, p. 332”.
- AGC: XV.
- BLem: XV, fragura (ZURP).
- MD-CF: XV, fragura (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da remissão de Houaiss para o FichIVPM.
O substantivo está atestado em 1228.

FUMADA, s.f. (3) ‘fumo utilizado como meio de sinalização; fumaça’.


Porẽ muitos herã fora do lugar que amdavã fazemdo suas fumadas cõ que avisavõ seus
vezinhos do trabalho ẽ que estavã. (675.94).

Outras ocorrências: 512.626[625]; 513.635[634].


Etimologia: Segundo Houaiss, do fem.substv. de fumado. Para JPM3 de fumo + -ada.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…Porem muitos eram fora do lugar, que amdavam fazemdo suas fumadas, com
que avisavam seus vizinhos do trabalho…», P. Men., II, cap. 82, nos Inéd. Hist., II, p. 593”.
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, fumadas (ZURD, 178.15).
- BLem: XV, fumadas (ZURP, ZURD).

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III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

- MD-CF: XV, fumadas (ZURP).


- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: O substantivo está atestado no século XIII.

FURÃO325, s.m. (1) ‘instrumento pontiagudo de ferro usado nas embarcações para abalroar,
fazer buracos nos inimigos’.
Outrossy tomo Allvaro Affomso outro carevo, em que ouve XII mouros e duas negras, o
quall se perdeo, porque, do emvestir que a fusta fez ẽ elle no quartell da popa com hos
frorõoes, alagou-se. (641.264).

Etimologia: do rad. do v. furar sob a f. fur- + -ão.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1614, forões pl. (SGonç I.407.23).
- BLem: XV, froroões (ZURP).
- MD-CF: XV, frorõoes (ZURP).
- Houaiss:
Obs.: A acepção apresentada em 1166 por JPM, corrigido por RLor, não se aplica neste
contexto. Sem data em Houaiss, ou melhor, com data de c1967, mas com a ressalva de que é
para outra acepção.

FUZILAR, vb. (1) ‘emitir luz’.


E semdo tamto avamte como Bulhões, hũ daquelles navios a que chamavã o Rraposso hia
largo ao mar, e as outras seguyam atras e pouco amte sy virã fuzillar. (578.1049).

Etimologia: de fusil + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«Mas para o Ceo Vulcano fuzilando, / A frota co as bombardas o festeja», Lus.,
II, 106”.
- AGC: 1572.
- BLem: XV, fuzillar (ZURP).
- MD-CF: XV, fuzillar (ZURP).
- Houaiss: 1572, (cf. IAVL).
Obs.: Primazia pela datação de Camões, já tardia em Houaiss. Sem registo no VH-CPM.
O substantivo está atestado no século XIV.
Ainda sem registo no CIPM.

GIRAR, vb. (5) ‘descrever um círculo, rodar para voltar’.


e sobre todo porque Diogo Vazquez vio muitos mouros na praya e conheçeo que, se fossẽ
demtro, que o bragamtym nom poderia girar. (351.174). 406.466.

Outras ocorrências: 406.468[466]; 378.819; 421.829[826]; 622.1026.

325
Eventualmente FLORÃO (Houais, 1624 cf. FrElis), com o significado figurativo de ‘ferro’ da acepção
gráfica de ‘ferro de dourador, usado para estampar ornato que imita flor ou folhagem’. De qualquer forma
antedatação.

192
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Etimologia: do lat. gýro, as, āre, āvi, atum.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«e acaeceo-se ao diamte como a foruna gira seus aquecimemtos», P. Men., cap.
54, nos Inéd. Hist., II, p. 387”.
- AGC: XV
- BLem: XV, gira, girar, girou (ZURP).
- MD-CF: XV, gira, girar, girou (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da remissão de Houaiss para o FichIVPM.
Ainda sem registo no CIPM.

AGOMER, s.m. (2) ‘arrais’.


E os mouros que nelle jaziã cuydaram que hera o lenho d’Allcaçer, e começou hũ delles a
dezer “agomer, agomer”, que quer dezer em nosso lymgoagẽ "arraez, arraez".
(408.529[526]).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- BLem: XV, agomer (ZURP).
- MD-CF: XV, agomer (ZURP).
Obs.: Pelo que consegui apurar, trata-se de um hápax.

JOB, s.m. (3) ‘o alto da proa de uma fusta’.


e escapou hũa fusta daquella mesma villa que lhe nõ quebrou senã a bamda de hũ cabo e
ho job da proa. (393.169).

Outras ocorrências: 628.1170 (2x).


Etimologia: Segundo Morais, do castelhano joba.
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Registos:
- BLem: XV, job (ZURP).
- MD-CF: XV, job (ZURP).
Obs.: Apenas registado em Morais e Viterbo, este com a indicação de locução de job a job “de
popa á proa”326.

LADEAR, vb. (2) ‘acompanhar perseguindo’.


E perque atras elles vinham allgũs outros mouros que os vinhã ladiamdo327, fez dom
Samcho volta sobr’elles de guisa que hos fez afastar lomge de sy. (478.691).

Etimologia: de lado + -ear.


Tipo de unidade: derivação sufixal.

326
Cf. Viterbo, s.v. job, suplemento, II volume.
327
No manuscrito G, nas duas ocorrências ladrando.

193
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Registos:
- JPM3: XV, “«E porque atras elles vinham alguns outros Mouros, que os vinham ladeamdo, fez
Dom Samcho volta sobr’elles», P. Men., I, cap. 35, nos Inéd. Hist., II, p. 604”.
- AGC: XV.
- BLem: XV, ladiando, ladiamdo (ZURP).
- MD-CF: XV, ladiando, ladiamdo (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. AGC).
Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da ocorrência em AGC e da remissão de Houaiss.
O substantivo está atestado em 1280.
Ainda sem registo no CIPM.

LADRILHADO, adj. vb. (1) ‘revestido com ladrilhos’.


Oo! Quem nõ averia piadade de ver a destroição de tamta nobreza? Porque ally cayam
torres forradas d’oliveis pimtados, e crastas ladrilhadas de marmores, e lladrilhos ydrados
em que avia diversos lavores, (236.526).

Etimologia: part. de ladrilhar (ladrilho + -ar).


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1813.
- BLem: XV, ladrilhadas (ZURP).
- MD-CF: XV, ladrilhadas (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. InedHist).
Obs.: Sem registo no VH-CPM.
O substantivo está atestado em 1188.
Ainda sem registo no CIPM.

LEVADIA, s.f. (1) ‘agitação das águas do mar’.


e o tempo começou-lhe de vemtar ao ponemte, e, porque omde ho carevo ficara se metya
gramde levadia, nõ tor-narã laa, (603.560).

Etimologia: de levado + -ia.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«…arrebatou o mar de levadia, com tanto ímpeto que soçobrou o batel»,
Francisco de Andrade, Crónica de D. João III, II, cap. 64, p. 413; vj levadio”.
- AGC: XVI,
- BLem: XV, levadia (ZURD).
- MD-CF: XV, levadia (ZURD).
- Houaiss: 1557, (cf. AAlbCom).
Obs.: AGC apenas regista levadio, do século XVI, adjectivo para o qual também JPM3 remete.
O particípio levado está atestado no século XIII, derivado de levar já de 1022-1065.

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III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

MEDA, s.f. (1) ‘amontoado de feixes de trigo’.


E tamto que teverdes allgũa cousa feita, o fogo seja logo posto pella terra de todallas
partes, espiçiallmemte aos paes que esteverẽ pellas medes, (411.606[603]).

Etimologia: do lat. mēta, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- AGC: XVII.
- BLem: XV, medes (ZURP)328.
- MD-CF: XV, medes (ZURP).
- Houaiss: a1608, (cf. DNLeD).
Obs.: JPM3 apenas apresenta esta palavra como topónimo em 1059.

MILHEIRADA, s.f. (1) ‘aglomerado de milheiros; milharada’.


E ymdo assy, por acertamemto foram dar em hũa milheirada de milho zaburro. (681.239).

Etimologia: de milheiro + -ada.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, milheirada (ZURD).
- MD-CF: XV, milheirada (ZURD).
- Houaiss: 1899, (cf. CF1).
Obs.: JPM, AGC e VH-CPM registam milharada (ZURD 83.25), opção também do manuscrito
G, apresentada no aparato.
O substantivo está atestado em 1712.

MINHOTEIRA, s.f. (1) ‘ponte, que consta de uma, ou duas tábuas, ou de uma trave, para
passar uma cava, ou brejo, etc’329.
E tamto que foy fora da agua, pos-se a pee e chamou os outros, e despejarão o porto muyto
asynha, e assy passaram todolos de cavallo, caa os de pee passavã pellas minhoteiras, que
hi avia muytas. (391.110).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, minhoteiras (ZURP).
- MD-CF: XV, minhoteiras (ZURP).
Obs.: O registo apresentado por JPM3 apenas diz respeito a minhoto, de Minho.
Morais apresenta três abonações para esta entrada, Chro. J. 1. c. 69. Cast. L.7. c. 20. H. Naut. 2.
f. 301. Duas destas abonações são claramente do século XVI, Castanheda e História Trágico-
Marítima, mas uma da Crónica de D. João I, que não consegui localizar, nem encontrei nos
corpora informatizados.

328
Forma lematizada para o advérbio medês.
329
Segundo Morais4

195
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

MISSIVO, adj. (2) ‘que se envia ou remete’.


E esto primçipallmemte foy porque aquelles que primeiramemte começarã d’ajumtar estes
feitos nõ forom pellas heras, nẽ costumavã naquelle tempo poer hera nas cartas messyvas,
(634.94).635.104

Outras ocorrências: 635.104.


Etimologia: de lat. medv. missivus, a, um.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«…assi com zargunchos, frechas, espingardas, e outras armas messivas, e
principalmente com artelharia», Déc., II, 3, cap. 6, p. 135”.
- BLem: XV, messyvas (ZURP)330.
- MD-CF: XV, messyvas (ZURP).
- Houaiss: 1553, (cf. JBarD).
Obs.: Antedatação a Houaiss.

MIUDEZA, s.f. (1) ‘pequenez’.


por ẽ não curamos de escrever a miudeza de seus feitos. (422.858[855]).

Etimologia: de miúdo + -eza.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«E se me eu detive agora em particularizar as miudezas destes trabalhos, foy pelo
sucesso que elles tiveraõ…», Peregr., cap. 202, vol. VI, p. 131”.
- AGC: XVI.
- BLem: XV, miudeza (ZURP).
- MD-CF: XV, miudeza (ZURP).
- Houaiss: 1544, (cf. Palm).
Obs.: Antedatação a Houaiss.
O substantivo está atestado em 1269.

MURALHA, s.f. (2) ‘muro extenso, alto e espesso’.


de guysa que quamdo os nossos ally chegarã jaa ally hera hũa gramde peça delles
aparelhados pera defemder a fraqueza de sua muralha. (426.972[969]).

Outras ocorrências: 486.1064[1063].


Etimologia: do it. muraglia.
Tipo de unidade: importação (italianismo).
Registos:
- JPM3: XVII, “«…resolveu desalojar os Mouros… primeiro que… chegassem a avistar as
muralhas de Goa, cidade dominante», Jacinto Freire de Andrade, Vida de D. João de Castro,
IV, 58, p. 263”.
- AGC: XVII.
- BLem: XV, muralha (ZURP).
- MD-CF: XV, muralha (ZURP).
- Houaiss: 1690, (cf. AVSerm).

330
Forma lematizada para missiva, classificada como nomc.

196
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

NUMIDIANO, s.m. (2) ‘relativo à Numídia, antigo país do Norte da África’.


porque elles, como vẽ daquella amtiga geração dos numydanos, assy todas suas pellejas se
passam per escara-muças. (542215).

Outras ocorrências: 686.343.


Etimologia: do lat. numidiānus, a, um.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- VH-CPM: XV, numydyanos (ZURD, 86.29).
- BLem: XV, numydanos, numidanos (ZURP); numydyanos (ZURD).
- MD-CF: XV, numydanos, numidanos (ZURP).
- Houaiss: XV, numydyano (cf. FichIVPM).
Obs.: JPM3 e AGC apenas registam numida.
Antedatação em obra do mesmo autor.

ODOROSO, adj. (1) ‘que exala um odor, odorante’.


Porque ally cayam torres forradas d’oliveis pimtados, e crastas ladrilhadas de marmores,
e lladrilhos vydrados em que avia diversos lavores, tamtas arvores frutiferas e odorosas,
(236.527).

Etimologia: de odor + -oso.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: 1873, D. V.
- BLem: XV, odorosas (ZURP).
- MD-CF: XV, odorosas (ZURP).
- Houaiss: c1750-1799, (cf. CSilPoes).
Obs.: Antedatação em três séculos face a Houaiss.
O substantivo está atestado no século XIII.

OURIÇAR, vb. (1) ‘eriçar-se’.


e, quamdo foy jumto com hũ oytero que he çerca de ho caminho que vem de Barbeche pera
a çidade, açertou-se que hia amt’elle hũ gallgo de Lopo Vazquez, e pareçee que semtyo os
mouros e começou de se em ouriçar, (373.696).

Etimologia: de ouriço + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«tem os caminhos / de palhetos ouriçados / que andam como porcos espinhos»,
Sá de Miranda, 76, 31 (Lorenzo)”.
- RLor: Sá de Miranda, ouriçado.
- AGC: XVI, ouriçado.
- BLem: XV, ouriçar (ZURP).
- MD-CF: XV, ouriçar (ZURP).
- Houaiss: 1521-1558, ouriçaro, c1560 ouriçar (cf. MirOp).

197
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Obs.: O substantivo está atestado no século XV.


Ainda sem registo no CIPM.

PALMITAL, s.m. (1) ‘aglomerado de palmitos (gomo terminal comestível do caule das
palmeiras)’.
E estamdo assy ẽ sua vella vyram vir hũ mouro mamçeebo, que seria de XXII ate XXIII
annos, e trazia hũa soma de vacas amte sy, o quall, desviamdo seu gaado comtra hũs
pallmitaes, Diogo Vazquez de Porto Carreiro, que ally hera, emcaminhou a elle e o filhou.
(382.913).

Etimologia: de palmito + -al.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “…o qual desviamdo o seu gado contra huns palmitaes…», P. Men., cap. 50, nos
Ined. Hist., II, p. 370”.
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, palmitaaes (ZURD, 274.26).
- BLem: XV, palmitaaes (ZURD, 274.26).
- MD-CF: XV, pallmitaes (ZURP).
- Houaiss: XV, palmitaaes (cf. FichIVPM).
Obs.: Sem registo em BLem, eventual gralha de digitalização.
O substantivo palmito331 está atestado em 1500.

PALOMEIRA, s.f. (1) ‘cabo, fio’.


E com este acordo foram viagẽ do porto, e a fusta e hũ carevo estavã largos, e outro jazia
em [terra]. E Diego Vazquez vogou a elle e emvesty-o, desy salltaram demtro e cortaram-
lhe as pallomeiras. (407.503[500]).

Etimologia: de paloma + -eira.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “…forom viagem do porto, e a Fusta, e hum Caravo estavam largos, e outro jazia
em terra, e Diogo Vazquez vogou a elle, e envestio, des y faltaram dentro, e cortaraõ-lhe as
palomeiras», P. Men., cap. 55, nos Ined. Hist., II, p. 388-389”332.
- AGC: XV.
- BLem: XV, pallomeiras (ZURP).
- MD-CF: XV, pallomeiras (ZURP).
Obs.: Houaiss apenas regista paloma, entre outras, com uma acepção marítima datada de 1720,
e com o significado de ‘pedaço de cabo preso à verga, no qual se fixa a extremidade do cabo ou
corrente ou a talha com que se iça a mesma verga’.
O substantivo está atestado no século XIII.

331
JPM3 observa nesta entrada “só documento este voc. no séc. XVI, mas deve ser bastante anterior, como se
deduz da abonação de palmital”. Houaiss confirmou parte das suspeitas ao apresentar data de 1500, proveniente de
ACG. Metade da outra parte ficam aqui confirmadas, ficando a outra metade a aguardar eventual confirmação.
332
Cf. a fixação do texto da edição que JPM3 segue com a abonação retirada da de Teresa Brocardo.

198
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

PERNADA, s.f. (2) ‘passada larga’.


Mas aymda esta nõ acabava de fazer sua chegada, quamdo outro beesteyro que estava
jumto com aquelle emviou outra, com que lhe ferio o cavallo em hũa ylharga, o qual con
ha dor da ferida começou de llamçar muy gramdes pernadas (317.380).

Outras ocorrências: 592.287.


Etimologia: de perna + -ada.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, segundo Morais2.
- VH-CPM: XV, pernadas (ZURD, 354.28).
- BLem: XV, pernadas (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, pernadas (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Antedatação em obra do mesmo autor.
O substantivo está atestado no século XIII.

PILOTAGEM, s.m. (1) ‘acção de pilotar, de conduzir seguramente uma embarcação no mar’.
- Ora - disse o comde - se vos quiserdes filhar ẽcarrego desta pillotagẽ e emtrar com hũa
nossa barca de mer-cadoria de dia no porto, (423.889[886]).

Etimologia: de pilotar + -agem.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: XVI.
- BLem: XV, pillotagẽ (ZURP).
- MD-CF: XV, pillotagẽ (ZURP).
- Houaiss: 1552, (cf. JBarD).
Obs.: JPM3 apenas regista piloto.
O verbo está atestado em 1881.

PORTALECER, vb. (1) ‘aparecer no alto de uma portela (passagem estreita entre montanhas)’.
E em esto chegarão outros mouros e rremessaram-lhe o cavallo, e matarã-ho, e, em
caymdo, foram os mouros sobre ho escudeyro e premderã-no. Mas Deus pareçee que se
quis lembrar delle e quis que ho comde portalleçesse, naquella hora, omde ho tinhã, pello
qual em breve foy leixado dos ymigos. (614.822).

Etimologia: de portela + -ecer.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, portalleçesse (ZURP).
- MD-CF: XV, portalleçesse (ZURP).
- CIPM: portalleçesse (ZURP).
Obs.: Importância do estudo lexical de obras ainda não trabalhadas e dos corpora
informatizados nas antedatações.
O substantivo está atestado em 919.

199
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

PUSILÂNIME, adj. (2) ‘fraqueza moral; covarde, medroso’.


O companha pusylanyma de corações molharigos e afiminados, dezei-me por que
chorades. (218.78).

Outras ocorrências: 460.415


Etimologia: do lat. pŭsillănĭmis, e (do comp. do lat. pŭsillus, a, um ‘pequenino’ + ănĭma, ae
‘alma’.
Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«E, separados os pusilânimes (que todavia houve alguns, como são maus de trocar
costumes frouxos e liberdades envelhecidas, os quais em poucos anos se extinguiram e
acabaram), decaída e desmaiada que estava a Ordem…», Arceb., III, cap. 13, vol. III, p. 122,
ed de 1946. Não consegui verificar este passo em exemplar de 1-ª ed. da obra onde ele ocorre;
sei, no entanto, que a forma corrente no séc. XVI era pusilânimo (…) «Os pusilanimos sintm
isso assi», Eufr., p. 128”.
- AGC: XV, pusillanime 1573 GLeão 333.18.
- BLem: XV, pusylanyma, pusylanymo (ZURP).
- MD-CF: XV, pusylanyma, pusylanymo (ZURP).
- Houaiss: c1543, pusilanimos, 1567 pusilanime (cf. JFVascE).
Obs.: O substantivo pusilanimidade tem registo anterior, com a forma pusalamidade em LEAL
(VH-CPM) e pusilanimidade em CP (BLem e MD-CF).

QUILATE, s.m. (1) ‘unidade de medida de peso’.


e a mayor parte daquellas dobras heram feitas ẽ Tunez e herã XXIII quillates e terço de
peso. (525.936[935]).

Etimologia: do ár. qirāt.


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XV, “«Mãdou laurar… hos Portugueses douro, de dez cruzados de valor cada hũ de
vintequatro quilates, que era úa mesma lei dos cruzados…», Góis, cap. 86, p. 211”.
- AGC: XVI.
- BLem: XV, quillates (ZURP).
- MD-CF: XV, quillates (ZURP).
- Houaiss: XV.
Obs.: Dúvida de Houaiss, com a data em itálico, esclarecida com o registo em ZURP.

RACHADA, s.f. (2) ‘fenda ou racha na terra; passagem estreita encovada’.

E quando os vyram vyr mãdou Gomçallo Vazquez os cavallos e prisyoneiros diamte, e peça
de homẽs com elles, ate passar hũa rrachada pequena que estava ao fumdo do porto,
comtra Bulhões. (413.652[649]).

Etimologia: fem. substv. de rachado, part. de ranchar.


Tipo de unidade: derivação imprópria.

200
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Registos:
- BLem: XV, rachada (ZURP)333.
- MD-CF: XV, rachada (ZURP).
Obs.: Entrada apenas averbada em Houaiss, mas com acepção diferente.
O verbo está atestado em 1344334.

RAMALHAR, vb. (1) ‘fazer sussurrar os ramos’.


e, quãdo semtio os passos dos escuitas e o rrama-lhar que faziã pello milho, cuydou que
herã os porcos que vinhã comer, (681.241-242).

Etimologia: de ramalho + -ar.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “E quando sentiu os panos dos escuitas, e o ramalhar que faziaõ pello milho,
cuidou que eraõ os porcos que lho vinhaõ comer», D. M., cap. 13, nos Ined. Hist., III, p.
53”335.
- AGC: XV.
- VH-CPM: XV, rramalhar (ZURD, 83.27).
- BLem: XV, rramalhar (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, rramalhar (ZURD).
- Houaiss: XV, rramalhar (cf. FichIVPM).
Obs.: Antedatação em obra do mesmo autor.
O substantivo ramalho está atestado em 1616, derivado de ramo já no século XIII.
Ainda sem registo no CIPM.

RECOSTO, s.m. (1) ‘terra elevada em encosta; escarpa’.


E quys Deus que hymda ganharão ho porto e hũ rrecosto que se hy fazia, (597412).

Etimologia: regr. de recostar.


Tipo de unidade: derivação imprópria.
Registos:
- JPM3: XVI, segundo Morais2.
- AGC: XVI.
- BLem: XV, rrecosto (ZURD).
- MD-CF: XV, rrecosto (ZURD).
- Houaiss: 1597, (cf. MonLus).
Obs.: Houaiss remete para a forma feminina recosta, datada do século XIII segundo o
FichIVPM, registo também comprovado pelo VH-CPM. Ambas as formas são derivadas do
verbo recostar cuja datação é de 1572. O que se verifica, no caso da forma feminina, é um
registo de três séculos antes da forma derivada antes da primitiva.

333
Forma classificada como vb part e lematizada para o verbo rachar.
334
Para Houaiss século XV.
335
Passagem repetica em ZURP. Cf. abonação (681.241-242).

201
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

RECRESCIMENTO, s.m. (1) ‘aumento’.


Porẽ, porque o comde semtio que elle nom poderia tambem sahyr, pello rrecreçimemto dos
mouros, (283.863).

Etimologia: de recrescer com alt. da vogal temática -e- > -i- + -mento.
Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: 1813.
- BLem: XV, rrecreçimemto (ZURP).
- MD-CF: XV, rrecreçimemto (ZURP).
- Houaiss: 1562 (cf. JC).
Obs.: O verbo está atestado em 1275.

REEDIFICAR, vb. (1) ‘tornar a edificar, construir’.


E pervemtura, se vos leixasseys esta çidade e os mouros a tornassẽ a rrehedeficar, que
elles averiam em breve tempo bõa emmenda de todo seu dano, (193.450).

Etimologia: de lat. rĕaedĭfĭcō, ās, āre, āvī, ātum.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: 1473, “«e foi o que raedificou e casi fizo com a sua torre», na Colección Diplomatica de
Galicia Histórica, p. 31 (Lorenzo)”.
- RLor: 1473, “«e foi o que raedificou e casi fizo com a sua torre», (CDCH 31.8).
- AGC: XV.
- BLem: XV, rrehedeficar (ZURP).
- MD-CF: XV, rrehedeficar (ZURP).
- Houaiss: 1473, (cf. RLor).
Obs.: AGC e o VH-CPM registam reedificaçam (reedificar + -ção) no século XIV, com
abonação de TEST.
Ainda sem registo no CIPM.

RETRAIMENTO, s.m. (1) ‘acanhamento’.


Os fidallgos emtemderam bẽ que ho mouro vinha assy cautellosamemte por fimgir allgũ
emgano, empero foram a elle por semtyrẽ o que queria fazer, o quall ẽ seu rretraimemto se
mostrou mais temeroso do que ho caso rrequeria, (238.568).

Etimologia: de retrair + -mento.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, rretraimemto (ZURP); retraymento (EER).
- MD-CF: XV, rretraimemto (ZURP); retraymento (EER; Pina:Duarte).
- Houaiss: 1563, retrahimento (cf. JBarD).
Obs.: O verbo está atestado no século XIII.

RUTO, s.m. (1) ‘percurso, viagem; rota’.

202
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

E daquella vez soube o comde como se a frota dell rrey de Grada corregia pera vyrem
çercar a çidade, ca o sabiam estes pellos messageiros que cada dia passavão a fazer seus
rrutos336 de hũ rrey pera outro, o que se claramemte mostrou nos feitos que se seguiram
adiamte. (353.466).

Etimologia: do castelhano rota (?).


Tipo de unidade: importação (castelhanismo) (?).
Registos337:
- MD-CF: XV, rrutos (ZURP).
Obs.: Apenas encontrei esta palavra com registo em Morais, precisamente com esta passagem
de ZURP, com a seguinte observação: “será caminho de route Francez? E neste sentido a ouvi
no Brasil, ou de Ruta Hespanhol derrota, viagem, jornada”. Para a entrada rota, Houaiss indica
também esta origem francesa de route, “do latim rupta (via) ‘caminho rasgado, desbravado’,
fem. substv. do adj. ruptus, part. pas. do v. lat. rumpĕre ‘romper’ ”. A entrada directa do latim
não será de excluir.

SACERDOTISA, s.f. (1) ‘mulher que exercia as funções de sacerdote’


e assy amdavão de hũa parte a outra como homẽs fora de syso, queremdo em allgũa
cousa pareçer aaquella saçerdotisa Edonis, (225.257).

Etimologia: de sacerdote + -isa. Para AGC do lat. sacerdōtissa, ae.


Tipo de unidade: derivação sufixal / importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«»uma flaminica ou sacerdotisa teve (Évora) nobilíssima, ha qual non somente
era flaminica de Evora, mas também de toda a Lusitania», André de Resende, História da
Antiguidade da cidade de Evora, cap. VII”.
- AGC: XVI.
- BLem: XV, saçerdotisa (ZURP).
- MD-CF: XV, saçerdotisa (ZURP).
- Houaiss: 1574-1590, (cf. NaufSep).
Obs.: Será difícil atribuir a primazia a uma das opções do tipo de unidade.
O verbo está atestado no século XIII.

SAQUINHO, s.m. (1) ‘pequeno saco’.


E hũs e hũs se partyam, caa hos mais delles são homẽs de pouca fazemda, senão hũ
saquinho de passas e de farinha, e assy lhe fica pouco cuydado da fardagẽ,
(486.1047[1046]).

Etimologia: de saco + -inho.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, saquinho (ZURP).
- MD-CF: XV, saquinho (ZURP).
- Houaiss: 1720, (cf. RB).

336
No manuscrito G tratos.
337
Sem registo em BLem. Regista, no entanto, a variante tratos em ZURP.

203
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Obs.: Derivado sem registo na maioria das obras consultadas. Antedatação de quase três séculos
face a Houaiss
O substantivo está atestado no século XIII.

SARAMAGO, s.m. (1) ‘nabiça, nabo’.


E porque ho comde avia novas que hũa ẽcullca de Gibralltar hera demtro na çidade, que
hera hũ mouro naturall destes rreynos o qual fallava muyto bem assy o nosso lyngoagem
como o castelhano, e pemsou que podya ser aquelle, ynda que hera pello comtrario,
porque hera hũ besteiro que hia buscar saramagos e verga pera covõos (438.1246[1243]).

Etimologia: Segundo Houaiss, “prov. do ár. sarmaq. ‘armolão’, por sua vez do persa; a
primeira forma esp. xaramago é de 1490, sendo o esp. jaramago do sXVII, o port.
saramago é também do sXVIII, tardio, pois, em relação ao étimo, razão por que o
admitem do esp., que dialetalmente ocorre como zaramago ‘erva-armoles’ ”.
Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: XVII, segundo Morais2, “Do ár. sarmaq, (…) de origem persa, não parecendo
impossível que o voc. nos tenha chegado por intermédio do ant. cast. xaramago (hoje
jaramago). ”
- AGC: XVII. “Do ár. sarmaq, com provável interferência do castelhano antigo çaramago (hoje
jaramago)”.
- BLem: XV, saramagos (ZURP).
- MD-CF: XV, saramagos (ZURP).
- Houaiss: 1708, (cf. MBFlos).
Obs.: Com a atestação em ZURP, fica assim excluída a interferência do castelhado, e deixa de
ser tardio em relação ao étimo como indica Houaiss.

SERTÃO, s.m. (9) ‘região agreste, distante das povoações ou das terras cultivadas’.
E logo de começo se foy dereitamemte a çidade com seys ou sete de cavallo e pareçeo assy
sobre a carreira que se fazia amtre as portas que sayam da çidade pera o sertam,
(237.552).

Outras ocorrências: 337.861; 427.986[983]; 469.638; 484.1017[1016];


499.276[275]; 501.329[328], 331[330]; 522.864[864].
Etimologia: Segundo Houaiss, de orig. obsc., com a seguinte observação de JPM “na opinião
de certos autores, o voc. seria evolução do lat. *desertānu-, com operações
fonéticas ainda não suficientemente esclarecidas”.
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- JPM3: XV, “«…esta jemte traz hũas cabaças grandes en que leuam do mar pera o sertaõo agoa
salgada», Diário, fl. 14. Sartão na mesma obra: «…jas hũu rio que vem de dentro do sartãoo»,
fl. 3 (e também nas 19 e 35)”.
- AGC: XV, sertaõo, sartão
- BLem: XV, sartão, sertam, sertão (ZURP).
- MD-CF: XV, sartão, sertam, sertão (ZURP).
- Houaiss: XV, (sXV cf. FichIVPM).

204
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Obs.: Sem registo no VH-CPM, apesar da ocorrência em AGC e remissão de Houaiss para o
FichIVPM.

SOBRESSELENTE, adj. (2) ‘que está a mais e é próprio para suprir faltas; de reserva’.
Mas o patrão della, com hũa agumia, e outros ofyçiaes que o ajudavão cortavã braços e
maãos a todos aquelles que viam travar nas bordas pera pojar açima, ou per outra
quallquer parte comtra sua hordenamça, de guysa que com pouco mais de çimquoemta
sobressallemtes começou de vogar o mais a pressa que pôde (518.765[764]).

Outras ocorrências: 603.557.


Etimologia: segundo Houaiss, de orig. contrv.; com a indicação de três opiniões: “AGC
registra, com dúvida, “talvez de um *sobressaliente < sobre- + saliente”;
Nascentes deriva do esp. sobresaliente (1575) ‘que sobressai’, do v. sobresalir
‘sobressair, exceder’; JM oscila entre uma form. vern. sobre- + saliente e o cast.
sobresaliente;
Tipo de unidade: importação (castelhanismo).
Registos:
- JPM3: 1512, “«…estas galés hão-de ser esquipadas de jáos, e sobressalentes vinte e cinco até
trinta homens», Afonso de Albuquerque, Cartas, p. 52, ed. dos Sá da Costa”.
- AGC: XVI.
- VH-CPM: XV, sobressallemte, sobressallemtes, sobressallentes (ZURD, 284.16)
- BLem: XV, sobressallemte (ZURP); sobressallentes (ZURP, ZURD).
- MD-CF: XV, sobressallemte, sobressallentes (ZURP).
- Houaiss: XV, sobressallentes, sobresalentes (cf. FichIVPM).
Obs.: Com a data apresentada por Nascentes, 1575, a derivação do espanhol ficaria excluída
com a atestação em ZURP. No entanto, no CORDE, é possível verificar 25 atestações
anteriores, sendo a mais antiga de cerca de 1348-1379 da Gran Crónica de Alfonso XI.

SOVA, s.f. (2) ‘rasto, trilho’.


E por ẽ acordou de hyr açima daquella guysa que sohia hyr quamdo se a guarda [tinha]
em çima, e que, achamdo-lhe a sova da passagẽ, emtemdia que lhe nõ podiam escapar,
(587175).

Outras ocorrências: 588.180.


Etimologia: regr. de sovar.
Tipo de unidade: derivação regressiva.
Registos:
- JPM3: XV, “«…achando-lhe a sova da passagem, entendia, que lhe nom podiam escapar…»,
P. Men., II, cap. 13, nos Ined. Hist., II, p. 525. O sentido de «pancada» é, evidentemente,
posterior.”
- AGC: XV.
- BLem: XV, sova (ZURP).
- MD-CF: XV, sova (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. InedHist).
Obs.: O verbo está atestado em 1552338.

338
Sobre esta datação, JPM3, s.v. sova, observa que “pela data desta palavra deduz-se que o uso do v. deve
ser mais ant. do que a data para ele antes indicada [XVI, Déc.]”.

205
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

SOBCOIXA, s.f. (1) ‘(?)’.


Partio todavia Joham Martiz cõ seu barinell essa noyte e foy a amaynar aalẽ a sobcoixa do
momte. (353.233).

Etimologia: (?).
Tipo de unidade: (?).
Registos:
- BLem: XV, sobcoixa (ZURP).
- MD-CF: XV, sobcoixa (ZURP).
Obs.: Apenas encontrei esta palavra com registo em Morais, com esta abonação de ZURP, mas
sem a atribuição de qualquer significado.

SURGIR, vb. (3) ‘ancorar, fundear’339.


E sendo amtre Larache e a Mamora quiseram aver terra por tomar sallto, e a folla do mar
hera tamta que o nõ poderõ fazer. E afastamdo-se por ẽ da terra, surgirã, e não passou
gramde espaço quamdo vyram sahyr de Larache hũa vella. E Allvaro Fernamdez vogou a
ella e filhou-ha, e hera hũ carevo, em que tomarã tres mouros, e muita louça de Mallaga, e
pano, e outra mercadoria. E em tornamdo-se pera domde partyrã, queremdo surgir outra
vez, virã como a fumdo de Larache amdava hũa barca. (601.502,507).

Outras ocorrências: 603.559.


Etimologia: do cat. sorgir.
Tipo de unidade: importação (catalão).
Registos:
- JPM3: Fins do XV, “«…e ao sol posto obra de bj legoas de terra surgimos amcoras em XIX
braços…», Cam. Fl 1 vs”.
- AGC: XV, surgir.
- BLem: XV, surgido, surgir, surgirã (ZURP)
- MD-CF: XV, surgido, surgirã (ZURP); surgir (ZURP);
- Houaiss: XV (cf. AGC)
Obs.: Ainda sem registo no CIPM. Uma vez que AGC não indica a fonte, presume-se que, pelas
ocorrências registadas, seja também ZURP.
Ainda sem registo no CIPM.

SURTO, adj. vb. (1) ‘ancorado, fundeado’.


E, leyxamdo ho carevo surto sobre ferro, vogarão a barca, (601.508).

Etimologia: part. de surgir (lat. surgō, ĭs, gĕre, surrēxī, rectum).

339
A justificação deste significado, bem como da etimologia, encontra-se em Houaiss: “no port. inicialmente
o voc. era exclusivamente us. no campo da náutica e significava 'estar fundeada, aportar (falando de embarcação),
lançar âncora'; nessas acp. o voc. vem do cat. sorgir (sXIII) e, este, do lat. surgĕre; segundo Corominas, a evolução
semântica do lat. surgĕre 'levantar-se, erguer-se' teria seu começo em frases como esta em lat. navis surgit in portu 'a
nave está erguida no porto', donde 'a nave está quieta, daí a nave está fundeada'; deste sentido com aspecto durativo
passaria para outro, de aspecto pontual: a nave surgiu a âncora 'a nave lançou a âncora'; outra evolução semântica
para este verbo foi 'fazer-se a nave ao mar, partir'; tal acp. parece vir do fr. ant. sourdre (< lat. surgère) e,
diferentemente das primeiras, é bem próxima do significado do v. lat.”

206
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Tipo de unidade: importação (latinismo).


Registos:
- JPM3: 1513, “«Estivemos ali surtos até pela manhã…», Afonso de Albuquerque, Cartas, p.
168, selecção dos clássicos Sá da Costa”.
- AGC: XVI, surto.
- BLem: XV, surto (ZURP, Sacramental).
- MD-CF: XV, surto (ZURP).
- Houaiss: 1553, adj. (cf. JBarD). 1616, s.m.
Obs.: Antedatação face a Houaiss.

TAMARGAL, s.m. (1) ‘extenso aglomerado de tamargas, tamargueiras (arbusto)’.


E os outros escaparão em hũ tamagall,340 ẽ tall guisa que os de cavallo lhe nõ poderã
ẽpeçer. (598.433).

Etimologia: de tamarga + -al.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- AGC: XV, tamargual.
- BLem: XV, tamagall (ZURP).
- MD-CF: XV, tamagall (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. InedHist).
Obs.: JPM3 apenas regista esta palavra como topónimo, no século XV. Segundo AGC, também
citado por Houaiss, tamarga (s.f. tamargueira) está documentado no século XX, pelo que se
verifica a ocorrência da derivada cinco séculos antes da primitiva.

TENÊNÇIA, s.f. (1) ‘força, vigor; tenacidade, afinco)’.


Pero o mouro fez ally sua fim, não por çerto come homẽ villão nẽ que avia o coraçam fraco
nẽ femenill, porque todas suas feridas foram por diamte, e jaa lhe a força de todo
desfalleçia, jazemdo no chão e aynda com tenemça de comtemder pera os comtrairos.
(367.567).

Etimologia: do lat. *tenentia, ae.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVII, segundo Morais8.
- AGC: XVII, tenência.
- BLem: XV, tenemça (ZURP).
- MD-CF: XV, tenemça (ZURP).
- Houaiss: 1624, (cf. MSFarD).
Obs.: a datação e o significado apresentados por AGC são para ‘cargo e/ou habitação de
tenente’. Às datas apresentadas por Houaiss corresponde, para a primeira, os significados de
‘antiga repartição do tenente-general de artilharia’ e ‘posto de tenente’ e, para a segunda, ‘local
onde habita o tenente’. Apresenta, no entanto, sob a indicação de B infrm., na acepção 7, o
significado de ‘vigor, firmeza, força’, que penso ser o correcto nesta passagem de ZURP.

340
No manuscrito G tamargall.

207
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

TERÇADO, s.m. (1) ‘espada curta e larga’341.


O mouro hera mamçeebo e de gramde força e, jumtamdo o desejo da vimgamça com ho
temor da morte que via muy açerca de sy, llevamtou seu terçado queremdo errar o mais
que podesse a seu ymigo. (569.887).

Etimologia: de terço + -ado.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XVI, “«Por armas tem adagas, & tarçados», Lus., I,47. Terçado pela mesma época
«traziam huas touquas… & terçados mouriscos cingidos…», Góis, I, cap. 36, p. 73”.
- AGC: XVI, tarçado.
- VH-CPM: XV, terçados (ZURD, 185.21); traçado (ZURD, 156.1).
- BLem: XV, traçado (ZURD)342; terçado (ZURP); terçados (ZURD).
- MD-CF: XV, terçado (ZURP)343
- Houaiss: XIV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Houaiss apresenta o século XIV, remetendo para o FichIVPM. O VH-CPM apenas regista
as duas abonações de ZURD, do XV, como entradas separadas e sem qualquer remissão entre
elas. Pelas consultas realizadas, eventual gralha de Houaiss.

TIMBRE, s.m. (1) ‘insígnia colocada sobre o escudo das armas’.


e que trouxesse as armas do comde em quarteyrões e ho tymbre que o comde trazia sobre
as armas, que hera hũa cabeça de çervo com sua pelle, (645351).

Etimologia: do fr. timbre.


Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: XVI, “«eu vi ja cavaleiram dos da guarda, antigo como espada de lobo, contar por
timbre de suas façanhas que tirara freira de moesteiro per chamine», Eufr., p. 14”.
- AGC: XVI, timbre.
- BLem: XV, trymbre (ZURP).
- MD-CF: XV, trymbre (ZURP).
- Houaiss: c1543, (JFVascE).
Obs.: A abonação de JPM3 não se aplica neste contexto, uma vez que o seu significado é
figurativo ‘orgulho, honra’. A datação apresentada por Houaiss é para a “acp. fig. ‘orgulho
legítimo’ ”.

TRAÇAR, vb. (1) ‘que se verifica como traçado, planeado; ocorrer, acontecer’.
o que leda-memte se pos em obra, porque allem da homrra sempre se lhe seguya proveito
quãdo lhe os feitos traçavã como elles queriã. (431.1091[1088]).

341
Segundo Bluteau, referido por Houaiss, assim chamada por ser uma espada curta e larga, à que faltava a
terça parte de uma espada de marca, isto é, de uma espada de dimensões normais.
342
Como forma verbal de traçar.
343
Com 40 abonações de Foraes (obra sem qualquer outra indicação), sempre como adjectivo e com o
significado de ‘misturado’ (do século XIV), 39 em pam terçado e 1 em casal terçado.

208
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Etimologia: do lat. *tractiāre, de tractus, a, um.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- JPM3: XVI, segundo D.V.
- AGC: XVI, traçar.
- BLem: XV, traçavã (ZURP)344.
- MD-CF: XV, traçavã (ZURP).
- Houaiss: 1540, (JBarJ).
Obs.: Antedatação a face a Houaiss.
Ainda sem registo no CIPM.

TROÇO, s.m. (1) ‘pedaço, de madeira ou ferro’.


e meteo a llamça toda em elle, de guysa que ao cayr do mouro nõ ha pôde tyrar e demtro
lhe ficou o ferro cõ hũ troço da aste. (703773).

Etimologia: de orig.controversa. Houais, s.v. troç- indica, no entanto, que “é, porém, bastante
seguro que se relacione com o fr. ant. e dialetal trous ‘tronco de planta; fragmento
de lança, parte do fuste’ ”.
Tipo de unidade: importação (galicismo).
Registos:
- JPM3: 1553, “«…e com troços de escadas quebradas, atadas umas nas outras, pudemos
socorrer aos do muro com uma escada», Afonso de Albuquerque, Cartas, p. 177, na selecção
dos Clássicos Sá da Costa”.
- AGC: XVI, troço.
- BLem: XV, troço (ZURP).
- MD-CF: XV, troço (ZURP).
- Houaiss: 1513, (AAlbCar).
Obs.: Antedatação face a Houaiss.

TUNISINO, adj. (1) ‘relativo a Túnis, capital da Tunísia’.


E soube como ell rrey Buamar partyra de casa dell rrey de Tunez com DCC de cavallo e
hũa carrega de dobras tuniçiz, (605602).

Etimologia: do top. Túnis + -ino.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: 1572, “Houve também a forma tuneci; «…e assi mesmo sabera dourar hũas estribeiras
tuneciis de cobre de oiro moido…», em Livro dos Regimentos dos Oficiais Mecânicos, p. 27,
ed. de 1926”.
- AGC: XVI, tuneciis.
- BLem: XV, tuniçiz (ZURP).
- MD-CF: XV, tuniçiz (ZURP).
- Houaiss: XVI, tuneciis (cf. AGC).

344
BLem inclui, mecanicamente, no lema verbal traçarduas formas nominais: traçado ‘terçado; espada curta
e larga’ (ZURD) e traçom ‘pedaço, fragmento’ (LOPF).

209
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

Obs.: A datação de AGC e Houaiss é para a variante tunesino.

VALEDIA, s.f. (1) ‘moeda mourisca’.


semdo naquelle tempo o vallor da coroa vellha do cunho de Frãça çem rreays e novemta, e
as valledias, que hera moeda mourisca, LXXX novemta, (524.929[928]).

Etimologia: do rad. de valido com recuperação da vog. temática -e- + -io.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- BLem: XV, valledias (ZURP).
- MD-CF: XV, valledias (ZURP).
Obs.: JPM3 (XV) e Houaiss (1446 (OrdAf)), registam apenas o adjectivo valedio.

VELEIRO, adj. (1) ‘que se desloca com rapidez, veloz’.


O iffamte mamdou llogo avisar todos da maneira que aviam de ter ẽ sua sahida e desy que
nenhũ não tomasse avemtagẽ da sua naao, por velleyra que fosse. (510.565[564]).

Etimologia: de vela + -eiro.


Tipo de unidade: derivação sufixal.
Registos:
- JPM3: XV, “«…e des y que nenhum non tomasse ventagem da sua Náo, por velleyra que
fosse», P. Men., I, cap. 78, nos Inéd. Hist., II, p. 465”.
- AGC: XV, velleira.
- BLem: XV, velleyra (ZURP).
- MD-CF: XV, velleyra (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. AGC).
Obs.: A datação de AGC e Houaiss do século XV é para ‘navio que anda à vela’. Para a
acepção de ‘que se desloca com rapidez ou facilidade; ligeiro, veloz’, a que se verifica nesta
passagem de ZURP, Houaiss apresenta a data de 1721, antedatação, portanto.

VILANAMENTE, adv. (1) ‘indignamente, sem honra; grosseiramente’.


dezemdo que amte se queriam lleyxar morrer que se deyxarẽ tã villanamemte cativar.
(610-611.736-737).

Etimologia: do lat. vulg. *villānus.


Tipo de unidade: importação (latinismo).
Registos:
- BLem: XV, villanamemte (ZURP).
- MD-CF: XV, villanamemte (ZURP).
Obs.: Advérbio formado directamente do termo latino. Houaiss e VH-CPM apenas registam a
forma mais vulgar vilãmente.

210
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

VOGA, s.f. (3) ‘acto ou efeito de remar; remada’.


E sendo jaa sobre o quarto da allva, semtyrã voga de navio que seguia per açerca delles,
(305.55).

Outras ocorrências: 509.535[534]; 509.539[538].


Etimologia: regr. de vogar.
Tipo de unidade: derivaçaõ regressiva.
Registos:
- JPM3: XVI, “«arremeteraõ de voga arrancada hũs aos outros», Pereg., cap. 32, vol. I, p. 123.
Pela mesma época corria a var. boga: «…mandou remar auante a boga arrancada…», Cast., II,
cap. 70, p. 233”.
- AGC: XVI, voga.
- BLem: XV, voga, vogas (ZURP).
- MD-CF: XV, voga, vogas (ZURP).
- Houaiss: 1552 (cf. FCastH).
Obs.: Antedatação face a Houaiss.

ZABURRO, adj. (1) ‘milho de grão avermelhado’.


E ymdo assy, por acertamemto foram dar em hũa milheirada de milho zaburro. (681.239).

Etimologia: do persa gaures, através do ár. xaures.


Tipo de unidade: importação (arabismo).
Registos:
- JPM3: Nos princípios do séc. XVI, em Valentim Fernandes, segundo L.V., Etnografia
Portuguesa, II, p. 82.
- AGC: XVI, zaburro.
- VH-CPM: XV, zaburro (ZURD 83.25).
- BLem: XV, zaburro (ZURD, ZURP).
- MD-CF: XV, zaburro (ZURP).
- Houaiss: XV, (cf. FichIVPM).
Obs.: Em Houaiss apenas como substantivo, mas com a indicação de “empregado também
apositivamente”.

211
III.4.2. Novidade de ‘pallavras’ na Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

4.2.1. Comentários

212
Conclusão

Conclusão

A análise lexical da Crónica de D. Fernando e da Crónica do Conde D. Pedro de


Meneses permitiu verificar a existência de um número significativo de primeiras
atestações, comprovando ser esta uma época de clara antecipação do Renascimento.
Uma corte favorecedora à cultura, nas palavras de Rosa Virgínia345, não pode ficar
subvalorizada na subida de mais um degrau346 para a transição entre o português antigo
e o português moderno, contribuindo não só para um cada vez maior enriquecimento do
léxico, mas também para uma maior sistematização da própria língua.
Ao longo dos pontos 3 4 e 5 do capítulo III foram sendo recolhidos dados, como a
origem da importação das palavras ou a sua formação com recursos próprios da língua,
que precisam de um tratamento exaustivo. A demora no tratamento desses dados,
conjugada com o cumprimento de datas, impede-me, por agora, de realizar tal tarefa. Na
defesa deste trabalho, em que “muy muytas cousas achey em elle que pareciam bem
dignas de emenda e muitas mais que, a meu entender, en elle deviam seer
acrecentadas”347, dela procurarei dar conta.

345
Matos e Silva (2008.41).
346
Cardeira (2005:35).
347
Cf. Livro da Vertuosa Benfeyturia, Calado (1994:3,18-20).

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ANEXO

Índice analítico da Crónica de D. Fernando e da Crónica do Conde D. Pedro de Meneses

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