Caracterização Microbiológica de Bivalves Vivos - Efeito Do Transporte e Variação Temporal Entre Espécies
Caracterização Microbiológica de Bivalves Vivos - Efeito Do Transporte e Variação Temporal Entre Espécies
Caracterização Microbiológica de Bivalves Vivos - Efeito Do Transporte e Variação Temporal Entre Espécies
2017
Lisboa
UNIVERSIDADE DE LISBOA
2017
Lisboa
Agradecimentos
Foram diversas as pessoas que contribuíram para a realização deste trabalho, às quais desejo
expressar os meus sinceros agradecimentos.
Ao Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), I.P. pela disponibilidade das condições
logísticas e humanas indispensáveis à elaboração do trabalho, e em particular à Dra. Narcisa
Bandarra como coordenadora da DivAV (Divisão de Aquacultura e Valorização).
Ao meu co-orientador, Professor Doutor Fernando Afonso, por me ter indicado o local de
estágio, pela orientação e apoio dados, por estar sempre disponível para esclarecer dúvidas e
pela confiança depositada em mim.
À minha mãe e avô materno, sem os quais nunca teria sido possível realizar o mestrado e esta
dissertação, por me terem incentivado desde a minha infância a chegar o mais longe possível
nos estudos e terem acreditado sempre nas minhas capacidades para tal. Ao meu pai e avó
ii
paterna, que mesmo estando longe sempre acreditaram que tudo ia correr bem. À minha avó
materna, que já não está presente mas será sempre o meu maior alento.
A minha amiga Ana Lúcia, por ter sempre acreditado em mim e por ter sido a pessoa com mais
fé, agradeço muito.
Ao restante da minha família e aos meus amigos que proporcionaram sempre momentos de
distração quando não deviam, mas que sempre me incentivaram na realização deste trabalho.
Ao Diogo de Matos, não existem palavras que consigam exprimir o que tenho de lhe agradecer,
foi quem mais me motivou, quem disse sempre que ainda tinha tempo, que eu era capaz, que ia
fazer um bom trabalho, em suma disse tudo o que precisava ouvir. Esteve sempre do meu lado
e ajudou-me em tudo o que conseguiu, e mais um pouco.
iii
Resumo
Caracterização Microbiológica de Bivalves Vivos: Efeito do Transporte e Variação
Sazonal Entre Espécies
A produção e o consumo de moluscos bivalves são importantes a nível nacional, assim como
em muitos outros países. Os bivalves acumulam microrganismos e são consumidos crus ou
levemente cozinhados, como consequência podem ser vetores de diversos agentes nocivos.
Neste trabalho foi avaliado o efeito de armazenamento/transporte às temperaturas de 1 °C e 10
°C, durante 24 e 48 h na qualidade microbiológica de bivalves vivos. Foram estudadas sete
espécies, nomeadamente, Ruditapes decussatus, Ruditapes philippinarum, Venerupis
corrugata, Callista chione, Ensis sp., Mytilus edulis e Crassostrea gigas. Os parâmetros
microbiológicos determinados foram: a contagem de microrganismos viáveis totais e
quantificação de coliformes e de E. coli. Também se avaliou o efeito temporal e da espécie na
qualidade microbiológica de Callista chione, Donax trunculus e Ensis sp. provenientes de uma
zona de produção no litoral e com a mesma data de colheita. Procedeu-se à determinação de
microrganismos viáveis totais, coliformes, E. coli, estreptococos fecais, esporos sulfito-
redutores, pseudomonas e vibrios.
Não foram observadas diferenças significativas nos níveis de E. coli nas condições testadas,
pelo que o transporte de moluscos bivalves vivos destinados a ensaios microbiológicos de
acordo com a ISO 6887-3 (2017) são adequadas para o controlo oficial das zonas de produção.
No entanto, devido a uma multiplicação significativa (p <0,05) de microrganismos viáveis
totais a 10 °C, o transporte de bivalves vivos para comercialização deve ser realizado abaixo de
10 °C.
Verificou-se que no inverno ocorriam os menores níveis de contaminação para a maior parte
dos parâmetros avaliados, enquanto no verão foram registados os teores mais elevados de
coliformes, E. coli, pseudomonas e vibrio. Assim recomenda-se que os moluscos bivalves
capturados no verão sejam refrigerados com a maior brevidade possível.
Callista chione apresentou os menores níveis de contaminação para a maior parte dos
parâmetros avaliados. Por outro lado, Ensis sp. foi a espécie que apresentou maiores níveis de
contaminação. Assim, é recomendável que a monitorização microbiológica da zona de
produção estudada continue a incluir as três espécies estudadas.
iv
v
Abstract
No significant differences were observed in E. coli levels at the tested conditions. So the
transport of bivalve samples for official control of harvesting areas according to ISO 6887-3
(2017) is adequate. However, due to a significant growth (p <0.05) of total viable
microorganisms at 10 °C, transport of live bivalves for marketing should be performed below
10 ºC.
During winter lower levels of microbiological contamination were detected. During summer
higher levels of faecal contamination, pseudomonas and vibrio, were observed. So rapid
refrigeration after bivalve capture is recommended during summer.
Callista chione presented the lower levels of contamination for the tested parameters; on
contrary, Ensis sp. showed the higher levels. So, the microbiological monitoring of this species
in the studied production area is advised.
vi
vii
Índice
Agradecimentos ........................................................................................................................ii
Resumo ..................................................................................................................................... iv
Abstract .................................................................................................................................... vi
Índice de Figuras ...................................................................................................................... x
Índice de Tabelas ....................................................................................................................xii
Introdução ................................................................................................................................. 1
1. Revisão Bibliográfica ........................................................................................................ 5
1.1 Importância dos Moluscos Bivalves ............................................................................ 5
1.2 Bioecologia dos Bivalves ............................................................................................. 8
1.3 Qualidade Microbiológica ......................................................................................... 13
1.4 Classificação e Monitorização Microbiológica das Zonas de Produção ................... 16
1.5 Depuração, Afinação e Transformação...................................................................... 22
2. Materiais e Métodos ........................................................................................................ 27
2.1 Materiais .................................................................................................................... 27
2.2 Parâmetros Microbiológicos ...................................................................................... 29
2.3 Tratamento de Resultados .......................................................................................... 35
3. Resultados e Discussão .................................................................................................... 37
3.1 Ensaio I ...................................................................................................................... 37
3.2 Ensaio II ..................................................................................................................... 42
Conclusão ................................................................................................................................ 53
Bibliografia .............................................................................................................................. 55
viii
ix
Índice de Figuras
Figura 1 Volume e valor da produção mundial de aquacultura de plantas e animais aquáticos
(1995-2014). ............................................................................................................................... 6
Figura 2 Produção global de moluscos. ...................................................................................... 7
Figura 3 Estrutura do volume de produção em aquacultura, por espécie (2014-2015). ............. 8
Figura 4 Esquema de um molusco bivalve. ................................................................................ 9
Figura 5 Ciclo de vida de um bivalve. ........................................................................................ 9
Figura 6 Litoral Setúbal - Sines (L6) ........................................................................................ 19
Figura 7 Centro de depuração. .................................................................................................. 23
Figura 8 Imagens das espécies de bivalves ensaiadas. ............................................................. 28
Figura 9 Abertura da amostra em assepsia. .............................................................................. 29
Figura 10 Placa de Petri (90 mm) com crescimento de microrganismos viáveis totais. .......... 31
Figura 11 Placa de Petri com meio seletivo para o crescimento diferenciado por cores de E.
coli e coliformes. ...................................................................................................................... 32
Figura 12 Placa de Petri com crescimento de estreptococos fecais em meio KF. .................... 33
Figura 13 Placa de Petri com crescimento de colonias (amarelas e verdes) características de
Vibrio. ....................................................................................................................................... 34
Figura 14 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de microrganismos viáveis totais
obtidos no inverno, primavera e verão. .................................................................................... 42
Figura 15 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de coliformes obtidos no inverno,
primavera e verão. .................................................................................................................... 43
Figura 16 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de E. coli obtidos no inverno,
primavera e verão. .................................................................................................................... 44
Figura 17 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de estreptococos fecais obtidos no
inverno, primavera e verão. ...................................................................................................... 45
Figura 18 Frequência dos teores de esporos sulfito-redutores obtidos no inverno, primavera e
verão. ........................................................................................................................................ 45
Figura 19 Frequência dos teores de pseudomonas obtidos no inverno, primavera e verão. .... 46
Figura 20 Frequência dos teores de vibrio obtidos no inverno, primavera e verão. ................. 46
Figura 21 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de microrganismos viáveis totais
em ameijola, conquilha e longueirão. ....................................................................................... 47
Figura 22 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de coliformes em ameijola,
conquilha e longueirão.............................................................................................................. 48
Figura 23 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de E. coli em ameijola, conquilha e
longueirão. ................................................................................................................................ 49
Figura 24 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor estreptococos fecais em ameijola,
conquilha e longueirão.............................................................................................................. 49
Figura 25 Frequência dos teores de esporos sulfito-redutores em ameijola, conquilha e
longueirão. ................................................................................................................................ 50
Figura 26 Frequência dos teores de pseudomonas em ameijola, conquilha e longueirão. ....... 50
Figura 27 Frequência dos teores de vibrios em ameijola, conquilha e longueirão. .................. 51
x
xi
Índice de Tabelas
Tabela 1 Teores de microrganismos viáveis totais (UFC/100g) obtidos nos moluscos bivalves
vivos armazenados/transportados a duas temperaturas. ........................................................... 38
Tabela 2 Teores de coliformes totais (NMP/100g) obtidos nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados a duas temperaturas ...................................................................... 39
Tabela 3 Teores de E. coli (NMP/100g) obtidos nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados a duas temperaturas. ..................................................................... 40
Tabela 4 Teores de microrganismos viáveis totais (UFC/100g) nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados durante dois períodos de tempo. .................................................. 40
Tabela 5 Teores de coliformes totais (NMP/100g) nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados durante dois períodos de tempo. .................................................. 41
Tabela 6 Teores de E. coli (NMP/100g) nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados durante dois períodos de tempo. .................................................. 41
xii
Introdução
Em Portugal, a apanha, captura e comercialização de moluscos bivalves vivos são atividades
relevantes, dada a sua elevada importância socio económica e o seu interesse gastronómico
(Nunes, 2008).
Os moluscos bivalves são invertebrados de corpo mole não segmentado, cobertos por uma
concha constituída por duas peças (valvas) que se articulam dorsalmente, exclusivamente
aquáticos, maioritariamente marinhos, bênticos infaunais ou epifaunais, geralmente sésseis, que
se encontram distribuídos por todo o globo a várias profundidades. Os bivalves são animais
poiquilotérmicos, filtradores, de regime micrófago (suspensívoros ou detritívoros),
alimentando-se maioritariamente de fitoplâncton e partículas orgânicas em suspensão (Gosling,
2004). No processo de filtração, os bivalves podem concentrar vários contaminantes, incluindo
microrganismos patogénicos (Solic, Krustulocvic, Jozic & Curac, 1999). Esses microrganismos
podem ter origem humana ou de outros animais homeotérmicos, provenientes de águas
residuais, escorrências urbanas ou até da fauna selvagem. O consumo pelo Homem destes
animais crus ou insuficientemente cozinhados, colhidos em zonas de águas contaminadas, pode
causar doenças como gastroenterites e ainda originar surto de doenças infeciosas (Lees, 2000).
Uma vez que este género alimentício pode constituir um importante vetor de transmissão de
doenças infeciosas de origem entérica, é possível recorrer à utilização de indicadores de
contaminação fecal, como a concentração em coliformes fecais, pois estes, sendo naturais da
microflora intestinal de seres homeotérmicos, têm a mesma origem que os microrganismos
patogénicos entéricos humanos (Frost, Craun & Calderon, 1996). A Escherichia coli é uma
bactéria coliforme fecal e foi estabelecida como um indicador de contaminação fecal, sendo a
sua ausência em produtos alimentares indicadora de condições sanitárias adequadas (Baylis,
Uyttendaele, Joosten & Davies, 2011).
1
Há poucas informações sobre se as diferentes concentrações de indicadores microbianos
observadas em bivalves refletem alterações reais no teor provável de patogénicos. Embora os
aspetos relacionados com a atividade biológica específica de cada espécie possam afetar os
indicadores de contaminação microbiológica e os agentes patogénicos de forma semelhante,
sabe-se também que as taxas de depuração são marcadamente diferentes para indicadores
bacterianos e agentes patogénicos virais, inviabilizando qualquer relação entre acumulação de
bactérias indicadoras e a acumulação de agentes patogénicos virais (Lees, 2000).
De modo a que nos vários Estados Membros da EU os resultados analíticos dos controlos
oficiais sejam comparáveis e o nível da proteção do consumidor seja equivalente, encontram-
se estabelecidos no Reg. nº 2073/2005 os métodos de referência para os critérios
2
microbiológicos. O método para a deteção e quantificação de E. coli em moluscos bivalves é o
método do número mais provável (NMP) segundo a ISO 16649-3 (International Organization
for Standardization, 2015).
No entanto, a concentração de E. coli nas amostras de bivalves vivos pode variar durante o
transporte, devido às condições de armazenamento. Esta variação pode afetar a qualidade
microbiológica da amostra e, consequentemente, o estatuto sanitário da zona de produção, e
desse modo, influenciar o nível de proteção de saúde pública concedido aos consumidores
(Centre for Environment, Fisheries and Aquaculture Science, CEFAS, 2017). Por outro lado,
durante o transporte dos bivalves vivos para os vários circuitos comerciais, em particular para
os centros de depuração e expedição, é essencial assegurar, além da respetiva viabilidade, que
não há deterioração da respetiva qualidade microbiológica. De facto, o modo de
acondicionamento utilizado para o transporte de moluscos pode também afetar a sua
viabilidade. A orientação da embalagem das ostras e vieiras tem, tradicionalmente, sido com a
valva convexa para baixo, de forma a permitir a retenção da água dentro da cavidade do manto
(Duncan, 1993). Por outro lado, é importante realçar que a sobrevivência das bactérias nos
bivalves depende, em parte, da atividade bactericida da hemolinfa destes animais (Canessi et
al., 2013).
Do ponto de vista laboratorial, a ISO 6882-3 (2017) estabelece que o transporte ou conservação
de amostras de bivalves vivos destinadas a ensaios microbiológicos deve ser realizado no
intervalo de temperatura de 0 °C a 10 °C e que as análises devem ser iniciadas até 24 h após a
colheita das amostras. Adicionalmente, o Laboratório Europeu de Referência para as
contaminações bacterianas e virais dos moluscos bivalves (CEFAS, Weymouth, Reino Unido)
recomenda que o transporte das amostras de bivalves vivos destinadas a ensaios
microbiológicos, seja realizado a temperaturas entre 0 °C a 10 °C, com início dos ensaios até
48 horas após a captura dos exemplares (CEFAS, 2017).
Apesar dos teores de E. coli não tenderem a aumentar em bivalves vivos armazenados até 10ºC
durante 72 h (Cook & Ruple, 1989), o armazenamento prolongado a baixas temperaturas pode
resultar em reduções nas contagens de E. coli (Lee & Murray, 2010). Relativamente a outras
espécies e grupos bacterianos, alguns com características psicrotróficas, desconhece-se o
respetivo comportamento nas condições específicas na ISO 6887-3 (2017).
Tendo em consideração o exposto, este trabalho teve como objetivo avaliar: o efeito do tempo
e temperatura de transporte de bivalves vivos na respetiva qualidade microbiológica, assim
como caracterizar a variação temporal e entre espécies de bivalves vivos da respetiva qualidade
microbiológica. O presente trabalho teve como objetivos específicos:
3
1. Quantificar os teores de microrganismos viáveis totais, coliformes e E. coli em
amostras de sete espécies de bivalves vivos, simulando temperaturas de transporte a 1
°C e a 10 °C, durante 24 h e 48 h.
2. Determinar o teor de microrganismos viáveis totais, coliformes, E. coli, estreptococos
fecais, esporos sulfito-redutores, pseudomonas e vibrios em três espécies de bivalves
provenientes da mesma zona de produção, durante três estações do ano (inverno,
primavera e verão).
No capítulo 1, faz-se uma revisão bibliográfica sobre a bioecologia das principais espécies de
bivalves, abordam-se os principais aspetos da qualidade microbiológica destes animais,
nomeadamente no que se refere aos principais parâmetros indicadores de contaminação, a
importância das condições de transporte das amostras deste género alimentício destinadas a
ensaios microbiológicos, e, por fim, classificação das zonas de produção de moluscos bivalves.
4
1. Revisão Bibliográfica
1.1 Importância dos Moluscos Bivalves
De acordo com a Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO), a
aquacultura é o “cultivo de organismos aquáticos, incluindo peixes moluscos, crustáceos e
plantas aquáticas”. Nas duas últimas décadas, o crescimento da produção em aquacultura
impulsionou o consumo médio de peixes e produtos da pesca a nível global. A mudança para
um consumo relativamente maior de espécies cultivadas em comparação com o peixe selvagem
atingiu um marco em 2014 quando o contributo do setor de produção de espécies cultivadas
para o consumo humano superou pela primeira vez as espécies selvagens. Isto representa um
aumento significativo, uma vez que a participação da aquacultura na oferta total evoluiu de 7
% em 1974, para 26 % em 1994 e para 39 % em 2004 (FAO, 2016), sendo que em 2014 foi
superior a 52 %.
Os moluscos bivalves por serem filtradores pouco exigentes em termos de alimentação e por
requererem técnicas de maneio simples, são ideais para produzir em aquacultura (Nunes, 2008).
O aumento da produção de moluscos na aquacultura e, como consequência, o declínio relativo
do preço, contribuiu para o aumento da disponibilidade anual per capita de 0,8 kg em 1961
para 3,1 kg em 2013 (FAO, 2016).
A produção em aquacultura em 2014 ascendeu a 73,8 milhões de toneladas, sendo 49,8 milhões
de toneladas de peixe, 16,1 milhões de toneladas de moluscos, 6,9 milhões de toneladas de
crustáceos e 7,3 milhões de toneladas de outros animais aquáticos. Na Fig. 1 temos a evolução
da massa e valor da produção de aquacultura de 1995 a 2014 (FAO, 2016).
5
Figura 1 Massa e valor da produção mundial de aquacultura de plantas e animais aquáticos
(1995-2014).
Fonte: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2016 (adaptado).
Fonte: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2012 (adaptado).
Em Portugal, a produção de aquacultura em 2015 (9 561 toneladas) gerou uma receita de 54,1
milhões de euros. Estes resultados traduzem uma diminuição em quantidade de cerca de 14,8
%, mas um acréscimo em valor de cerca de 4,0 % relativamente a 2014 (Direção Geral de
Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, DGRM, 2016).
7
Figura 3 Estrutura do volume de produção em aquacultura, por espécie (2014-2015).
No final de 2015, existiam 1504 estabelecimentos licenciados em aquacultura para águas doces,
salgadas e salobras, menos 17 unidades em relação a 2014. Em termos de área total houve um
aumento de 4,0 % da dimensão média, sendo agora de 3,28 hectares por estabelecimento
aquícola. Em termos do tipo de estabelecimento, a estrutura manteve-se com cerca de 87,7 %
de viveiros para produção de moluscos bivalves (DGRM, 2016).
8
e banha as brânquias onde ficam retidos o fitoplâncton, outros microrganismos e as partículas
orgânicas que se encontram em suspensão. (Silva, Costa & Rodrigues, 2008).
9
Os moluscos bivalves filtradores retêm partículas pequenas da corrente de água usando as
branquias dilatadas e as adaptações especiais do mecanismo de limpeza do muco. Nas várias
espécies de bivalves existem diferenças na taxa de acumulação devido às diferentes eficiências
de absorção, atribuíveis à morfologia do filtro e taxas variáveis de digestão e eliminação
(Bernard, 1989).
Os hemócitos são responsáveis pelos mecanismos de defesa celular (fagocitose, produção das
espécies reativas intermédias de oxigénio e libertação de enzimas lizossomais). A capacidade
das diferentes bactérias sobreviverem à atividade microbicida da hemolinfa depende da sua
sensibilidade a esses fatores combinados (Duperthuy et al., 2011).
10
Os moluscos bivalves que habitam a zona intertidal estão sujeitos a períodos regulares de falta
de água. Para os animais localizados nos pontos mais altos da zona intertidal, os períodos em
que se encontram emersos são mais longos e, consequentemente, esses indivíduos são
frequentemente submetidos a temperaturas extremas e a dessecação. Os limites de distribuição
superiores para uma espécie são definidos pela sua capacidade de tolerar tais extremos através
de vários mecanismos fisiológicos (Gosling, 2004).
A prevenção da dessecação durante o transporte dos bivalves vivos a seco, também foi
reconhecida como um fator relevante pela indústria do setor. A dessecação pode contribuir para
a mortalidade, reduzindo a eficiência respiratória, devido à desidratação das superfícies
respiratórias, ou a alterações fisiológicas nas células, resultantes do aumento da concentração
osmótica de fluido extracelular causada pela perda de água (Duncan, 1993).
A emersão dos bivalves pode também originar a acumulação de produtos metabólicos tóxicos
finais. Os bivalves produzem amoníaco como o principal composto de produtos azotados. Em
condições de imersão, a toxicidade desta substância é rapidamente reduzida por diluição à
medida que os compostos amoniacais são excretados na água circundante. No entanto, quando
emersos, produtos excretados tóxicos, incluindo amónia, podem acumular-se na cavidade do
manto dos bivalves (Vooys & Zwann, 1978), com implicações potenciais para a sobrevivência.
11
O biótopo da amêijoa-macha, Venerupis corrugata (Gmelin, 1791), estende-se desde a zona
entre marés até cerca de 40 metros de profundidade, prefere zonas abrigadas com correntes
fracas ou moderadamente fortes e vive em fundos de areia, lodo ou cascalho. Distribui-se pelo
mar Mediterrâneo e desde a Noruega até Africa do Sul (Sea Life Base, 2017).
A ameijola, Callista chione (Linnaeus, 1758), encontra-se distribuída por todo o mar
Mediterrâneo e pela costa atlântica do sudoeste das ilhas britânicas a Marrocos, incluindo as
Ilhas Canárias, da Madeira e dos Açores. Este bivalve habita em areia lodosa de 10 a 130 m de
profundidade, e em algumas áreas é o filtrador proeminente das espécies bivalves em termos
de biomassa (Poppe & Goto, 1993, citado por Martínez-Pita, Sánchez-Lazo, Prieto & Moreno,
2011). Foi relatado (Charles et al., 1999, citado por Metaxatos, 2004) que C. chione ingere
microalgas a uma taxa 5 a 6 vezes maior que as bactérias e que as bactérias livres provavelmente
cobrem apenas uma pequena parte dos seus requisitos energéticos.
A conquilha, Donax trunculus (Linnaeus, 1958), habita entre a marca da maré baixa e 20 m de
profundidade, em fundos arenosos. Distribui-se no litoral europeu atlântico e no Mediterrânio
(Silva, Costa & Rodrigues, 2008).
O longueirão, Ensis sp., é encontrado desde o sul da Noruega até África do Norte, incluindo o
Mediterrâneo. Tem como habitat substratos arenosos nos limites inferiores da maré até cerca
de 40 m de profundidade (Tuck, 2000).
O mexilhão representa uma componente dominante das comunidades rochosas nas águas mais
frias dos hemisférios norte e sul. O mexilhão azul, Mytilus edulis (Linnaeus, 1758), é a espécie
deste género com maior distribuição, sendo encontrada de regiões subtropicais leves ao Ártico,
desde regiões estuarinas a condições totalmente marinhas e de praias abrigadas e expostas a
altas ondas (Gosling, 2004). M. edulis tem uma tolerância à salinidade entre 4 e 40 ppm (Bayne,
1976).
A ostra gigante, Crassostrea gigas (Thunberg, 1793), é nativa da região do Pacífico Ocidental,
mas por causa das introduções bem-sucedidas na costa do Pacífico da América do Norte,
Europa Ocidental e Austrália, possui uma distribuição global. C. gigas é comumente encontrada
em estuários protegidos e rasos, tolera baixas salinidades (23-28 ppm) e prefere os fundos de
rocha dura, concha ou areia, não se instalando em fundos lamacentos (Gosling, 2004).
12
alterações climáticas, uma vez que as espécies Vibrio crescem preferencialmente em águas
quentes (> 15 °C) e com baixa salinidade (< 25 ppm). No entanto, a aquacultura global é
conduzida em grande parte por pequenos e médios aquicultores com capacidade limitada para
controlar as condições dos sistemas de criação (FAO, 2016). Adicionalmente, a existência de
vários poluentes na água, exercem efeitos adversos sobre a imunidade, afetando a resistência
às infeções, o que influencia a sobrevivência dos bivalves (Gosling, 2004). Os hidrocarbonetos
aromáticos policíclicos (HAP), que entram no meio marinho a partir de uma variedade de fontes
industriais, inibem a fagocitose em hemócitos de M. edulis e a estabilidade da membrana dos
lisosomas, que desempenham um papel central na degradação do material fagocitado, é
interrompida (Grundy, Ratcliffe & Moore, 1996). Outros poluentes, como o petróleo bruto,
reduzem a produção de espécies reativas intermédias de oxigénio (ROS) pelos hemócitos
(Gosling, 2004).
13
Organismos de índice e modelo – grupo ou espécie indicativa de presença e
comportamento de patogénicos, respetivamente, como E. coli como indicadora de
salmonela e colifagos de F-RNA como modelos de vírus entéricos humanos.
O tempo necessário para realizar testes para organismos indicadores estimulou a pesquisa em
métodos mais confiáveis e mais rápidos. Um resultado dessas pesquisas é o uso de compostos
cromogénicos, que podem ser adicionados aos meios convencionais utilizados para o
isolamento das bactérias indicadoras, essas substâncias cromogénicas são modificadas por
enzimas (que são típicas para as bactérias respetivas) ou por metabolitos bacterianos
específicos. A substância cromogénica altera a sua cor, possibilitando assim uma fácil deteção
das colónias que exibem a capacidade metabólica, desta forma, estas substâncias podem ser
utilizadas para evitar a necessidade de isolamento de culturas puras e testes de confirmação. O
tempo necessário para a determinação de diferentes bactérias indicadoras pode ser reduzido
entre 14 a 18 horas (Ashbolt et al., 2001).
As características de alguns indicadores analisados neste trabalho são (Ashbolt et al., 2001):
14
mais adequado como indicador de contaminação fecal com origem em animais
homeotérmicos.
Estreptococos fecais: bactérias gram-positivas, anaeróbias facultativas, não
esporoladas, catálase-negativas que crescem em meio seletivo com azide dextrose a 45
°C. São provenientes de fezes de animais homeotérmicos, sendo relativamente
específicos como indicadores de contaminação fecal.
Clostrídios sulfito-redutores: bactérias com forma de bacilo, gram-positivas,
formadoras de esporos, não móveis, anaeróbias obrigatórias. São organismos capazes
de reduzir o sulfito, e devido à precipitação do sulfureto de ferro ocorre o enegrecimento
do meio de cultura à sua volta permitindo, assim, identificar facilmente a sua presença.
Esta espécie pode ser encontrada no solo, na água e nos sedimentos aquáticos, podendo
também ser isolada a partir do conteúdo intestinal de vertebrados e de invertebrados.
Dado que nenhum grupo indicador satisfaz, por si só, simultaneamente todas as condições
desejadas e por isso nenhum pode ser considerado como indicador universal da presença dos
15
organismos patogénicos, deve-se recorrer a um conjunto de indicadores que apresentem a
melhor correlação com os riscos de saúde associados com a contaminação de um determinado
género alimentício, como é o caso dos moluscos bivalves vivos (Ashbolt et al., 2001).
“Para minimizar os riscos para a saúde pública nos vários Estados-Membros da União
Europeia, as zonas de produção em que a colheita de moluscos bivalves vivos está
autorizada devem ser controladas quanto à sua qualidade microbiológica e classificadas
em diferentes estatutos sanitários pela autoridade competente. De acordo com o nível
de contaminação fecal observado ao longo do tempo, as zonas são classificadas em três
categorias (A, B e C), por ordem crescente de risco de contaminação dos bivalves por
patogénicos, que determinam o destino e tratamento posterior dos mesmos” (Pedro,
2007, p. 161).
O Reg. (CE) nº 854/2004 estabelece regras específicas de organização dos controlos oficiais de
produtos de origem animal destinados ao consumo humano. No anexo II determina que os
Estados-Membros devem assegurar que a produção e a colocação no mercado de moluscos
bivalves vivos sejam submetidas a controlos oficiais e que a autoridade competente classifique
as zonas de produção em que autoriza a colheita em três categorias diferentes em função do
nível de contaminação fecal, nomeadamente no teor de E. coli por 100 g de carne e líquido
intravalvar. O método de referência para a análise da concentração de E. coli é o teste do número
mais provável (NMP) de 5 tubos e 3 diluições especificado na norma ISO 16649-3 (2015).
16
exame dos dados obtidos e com um número de amostras, uma distribuição geográfica dos
pontos de colheita de amostras e uma frequência de amostragem que assegurem que os
resultados da análise sejam tão representativos quanto possível para a zona em questão, tendo
em vista classificar uma zona de produção ou de afinação.
A contaminação fecal pode ser originária de uma variedade de fontes, incluindo descargas de
esgoto (contínuas ou descontínuas), animais de produção, vida selvagem e transporte marítimo.
O impacto será afetado pela capacidade de diluição da fonte de contaminação na água recetora
e pela forma como as correntes arrastam a contaminação para as zonas de apanha de moluscos
bivalves. As fontes de contaminação numa área podem mudar com o tempo, devido à
implementação de esquemas de melhoria de esgoto ou mudanças nas práticas agrícolas (Anon,
2017).
A autoridade competente, de acordo com o Reg. (CE) nº 854/2004, classifica como pertencendo
à Classe A as zonas onde os moluscos bivalves vivos podem ser colhidos para consumo humano
direto. Os bivalves provenientes dessas zonas devem cumprir as regras sanitárias fixadas e,
quanto à contaminação fecal, não devem exceder, em 80 % das amostras recolhidas durante o
período de revisão, 230 E. coli por 100 g de tecido muscular e líquido intravalvar, não podendo
nenhuma amostra apresentar teores superiores a 700 E. coli/100 g (Reg. no 853/2004; Reg. no
854/2004; Reg. nº 2285/2015).
São classificadas como pertencendo à Classe B, as zonas a partir das quais os moluscos bivalves
vivos podem ser colhidos e colocados no mercado para consumo humano unicamente após
tratamento num centro de depuração ou após afinação, de modo a cumprir as regras sanitárias.
Os bivalves provenientes dessas zonas não devem exceder, em 90 % das amostras, 4600 E.
coli/100 g, não podendo nenhuma amostra, apresentar teores superiores a 46000 E. coli/100 g.
17
Os moluscos bivalves vivos provenientes de zonas classificadas como C não devem exceder
46 000 E. coli/100 g, e devem passar por um período de afinação prolongado ou serem
transformados. Zonas onde o limite de 46 000 E. coli/100 g é excedido a apanha é proibida.
Geralmente, aceita-se uma frequência mensal para a monitorização de E. coli nos moluscos
bivalves vivos, com análise anual do histórico de resultados, recorrendo habitualmente a séries
temporais referentes a três anos, que contenham pelo menos 24 resultados (CEFAS, 2017).
Dado que podem ser observadas diferenças nos resultados entre os anos secos e húmidos, um
período de revisão de longo prazo pode ajudar a reduzir essa variação. Há também a necessidade
de rever os dados quando há uma mudança conhecida de entradas de contaminantes para uma
área de colheita, certos eventos de contaminação considerados improváveis de se repetir podem
ser ignorados ao considerar a classificação de longo prazo de uma área (OMS, 2010).
No Despacho n.º 1851/2017 o Conselho Diretivo do IPMA atualizou a classificação das zonas
de produção de moluscos bivalves vivos em Portugal continental.
A nível nacional, as zonas de produção de moluscos bivalves distribuem-se por regiões litorais,
de estuário e lagunares. Os locais mais próximos de urbanizações, como acontece com as zonas
de produção dos estuários têm teores de contaminação mais elevados, tal como acontece nos
sistemas lagunares, devido à reduzida circulação da água. As zonas estuário-lagunares estão
maioritariamente classificadas como B ou C, estando ainda algumas consideradas proibidas. As
zonas litorais estão maioritariamente classificadas como A, com algumas espécies classificadas
como B, tendo em conta a circulação da água e a capacidade de diluição (Despacho nº
1851/2017).
18
A zona litoral de Setúbal - Sines designada por L6, compreendida entre os paralelos 38.52222N
e 37.45167N (a norte da foz da ribeira de Seixe) e entre a costa, incluindo a zona intertidal e a
batimétrica dos 70 metros (Despacho nº 1851/2017), como se observa na Fig.6, encontram-se
bancos naturais das seguintes espécies: amêijoa-branca (Spisula solida), ameijola (Callista
chione), conquilha (Donax trunculus), lapa (Patella spp.), longueirão (Ensis spp.) e mexilhão
(Mytilus edulis), encontrando-se ocasionalmente pé-de-burrinho (Chamelea galina) e pé-de-
burrico (Venus casina) (IPMA, 2017b).
Num estudo realizado por Gaspar, Moura e Pereira (2015), constatou-se que as espécies mais
representativas em termos de número de indivíduos capturados por arrasto, nesta zona litoral,
foram o longueirão (7026 ind.) e a amêijoa-branca (4011 ind.) enquanto em biomassa, a espécie
comercial mais representada foi o longueirão (61,5 kg) seguida da ameijola (43,8 kg). Estes
autores observaram também que a ameijola habita em profundidades de 12, 18, 20 e 25 m, e a
maioria dos seus indivíduos habitam a 25 m de profundidade; a conquilha situa-se entre os 3 e
20 m de profundidade, sendo encontrada em maiores quantidades aos 4 m de profundidade; o
longueirão encontra-se entre os 3 e 13 m de profundidade, estando em maior quantidade entre
as batimétricas dos 6 e 11 m.
De acordo com o Despacho nº 1851/2017, que estabelece a classificação das zonas de produção
de moluscos bivalves, apesar de a zona ser a mesma, a ameijola e a conquilha têm classificação
A enquanto o longueirão tem classificação B.
19
Para a realização da avaliação do efeito temporal e da espécie na qualidade microbiológica dos
bivalves vivos, foram utilizadas três espécies desta zona de produção, nomeadamente a
ameijola, a conquilha e o longueirão.
O uso de espécies indicadoras reduz o número de amostras que precisam ser tomadas numa
área, no entanto, se uma ou mais espécies indicadoras forem usadas, deve-se tomar uma
abordagem conservadora para proteger a saúde pública. Isto significa que as espécies
indicadoras devem produzir resultados pelo menos tão altos quanto os das outras espécies para
as quais atua como indicador (CEFAS, 2017).
A amostragem pode ser aleatória ou direcionada, sendo que a aleatória destina-se a refletir o
estado geral de contaminação de uma área, enquanto a amostragem direcionada se destina a
concentrar-se nas condições suscetíveis de produzir os resultados mais elevados. Ambas as
abordagens podem ser difíceis de implementar na prática, para a amostragem direcionada deve
20
ser realizada uma análise detalhada em relação aos vários fatores ambientais que podem afetar
os resultados e podem não estar disponíveis dados suficientes. Na União Europeia, nenhuma
das abordagens é explicitamente identificada na diretiva, mas geralmente supõe-se que a
amostragem é direcionada (OMS, 2010).
Cada amostra deve ser colocada em separado num saco de plástico intacto com um rótulo
impermeável para garantir a rastreabilidade. Os sacos apropriados protegem da contaminação,
evitando que ocorra contaminação cruzada com outras amostras e dos recipientes de transporte
(CEFAS, 2017).
Os critérios de transporte de amostras devem estar em conformidade com a norma ISO 6887-3
(2017), que indica:
É importante que a concentração de E. coli nos moluscos recebidos pelo laboratório de testes
reflita aquelas que existiam no momento da amostragem. O desenvolvimento e a mortalidade
de microrganismos nos géneros alimentícios estão relacionados com a temperatura e o tempo
decorrido entre a amostragem e o processamento da amostra, portanto os protocolos de
amostragem especificam uma temperatura inferior a 10 °C (sem congelamento) para o
21
transporte e um tempo máximo entre a amostragem e o início da análise de 24 horas (CEFAS,
2017).
Cook e Ruple (1989) relataram que não foram observadas alterações nas concentrações de
coliformes fecais e de E. coli em ostras (Crassostrea virginica) armazenadas a 10 °C, enquanto
o armazenamento a 22 °C produziu um aumento da concentração em ambos os indicadores em
3 dias. Experiências iniciais realizadas no Reino Unido com vista à definição de protocolos para
a amostragem, mostraram que não existe efeito significativo na concentração de E. coli quando
a amostra é armazenada a 4 °C, 10 °C ou 13 °C até 72 h (Lart & Hudson, 1993). O efeito do
armazenamento a 19-22 °C diferiu entre três espécies: numa espécie de mexilhão não
apresentou alterações, noutra espécie de mexilhão a E. coli apresentou um desenvolvimento
significativo em 48 horas. Por sua vez, nas ostras apresentou algum declínio. Experiências
subsequentes realizadas mostraram que houve uma tendência geral para que os níveis de E. coli
diminuíssem no armazenamento a 2-8 °C até 72 horas (Cefas, 2006).
Relativamente ao transporte, a legislação apenas refere que “Os operadores que transportam
moluscos bivalves vivos, incluindo equinodermes, gastrópodes marinhos e tunicados, devem
assegurar que estes são mantidos a uma temperatura que não seja prejudicial à sua segurança
ou viabilidade”. De facto, muitos retalhistas apresentam como critério para a aceitação dos
bivalves vivos a respetiva viabilidade e frescura, não exigindo requisitos de temperatura à
chegada da matéria-prima. Não obstante, num entreposto nacional de pescado fresco, foi
observado entre outubro de 2011 e janeiro de 2012, que os valores de temperatura dos moluscos
22
bivalves à chegada ao cais de receção variavam entre 5 e 12,8 °C, com um valor médio de 7,9
°C (Félix, 2012).
Depuração
A depuração foi desenvolvida originalmente como um dos vários meios para enfrentar o
problema de focos de doença associados ao consumo de bivalves, como foi o surto de febre
tifoide, no final do século XIX e início do século XX (Lee, Lovatelli & Ababouch, 2008).
Em geral, todas as espécies de moluscos bivalves podem ser submetidas à depuração para
remover os microrganismos. Os mais amplamente submetidos ao processo incluem ostras,
23
mexilhões e amêijoas. Algumas espécies, como berbigões, vieiras e longueirões, representam
desafios específicos para a depuração, por exemplo, a mobilidade de vieiras torna difícil conte-
las em cestos e evitar que agitem detritos sedimentados. Embora a depuração possa ser a única
estratégia de mitigação para as espécies comidas cruas, como ostras, muitas outras espécies de
bivalves são apenas levemente cozinhadas e a depuração proporcionará uma proteção adicional
(Lee et al, 2008).
Uma vez colocado no sistema, as condições fisiológicas devem ser de modo a maximizar a
atividade dos animais. Existem limites superiores e inferiores absolutos fora dos quais os
bivalves não operam adequadamente, estes limites variam consoante as espécies e a origem. Os
requisitos fisiológicos da mesma espécie variam acentuadamente com a região e a localização
específica (por exemplo, em relação à salinidade). Os critérios que são relevantes para que a
depuração seja eficaz e seja mantida a viabilidade dos indivíduos são (Lee et al, 2008):
A depuração é um processo complexo que envolve uma série de variáveis interativas que afetam
a atividade dos bivalves. Embora garanta uma melhoria da qualidade microbiológica e do valor
económico, causa stress fisiológico e traumático indutor de perdas significativas e alterações
na composição nutricional do produto final. Esta questão tem sido discutida na indústria como
uma desvantagem do método. Longos períodos de depuração dos bivalves estão associados à
perda de uma percentagem considerável do índice corporal e das reservas lipídicas, o que se
traduz numa diminuição da qualidade nutricional. Os valores de condição corporal ao longo de
72 horas de depuração mostram uma diminuição considerável em todas as espécies estudadas,
como consequência da inanição imposta pela depuração (Ruano, Ramos, Quaresma, Bandarra
& Fonseca, 2012).
Afinação
Transformação
Os moluscos bivalves vivos provenientes de zonas com classe B ou C, que não tenham sido
sujeitos a depuração ou afinação, são enviados para um centro de transformação onde deverão
ser submetidos a um tratamento destinado a eliminar os microrganismos patogénicos. Os
25
tratamentos autorizados são a esterilização em recipientes hermeticamente fechados e
tratamentos térmicos que envolvam (Reg. nº 853/2004):
Imersão em água a ferver durante o tempo necessário para que a temperatura interna da
carne dos moluscos atinja, no mínimo 90 °C e mantenha essa temperatura durante um
período mínimo de 90 segundos;
Cozedura a vapor sob pressão em recipiente fechado que satisfaça os requisitos relativos
ao tempo de cozedura e à temperatura interna da carne dos moluscos.
26
2. Materiais e Métodos
No presente capítulo apresentam-se os materiais e as metodologias utilizados no ensaio I em
que se simularam condições de armazenamento/transporte a 1 e 10 °C durante 24 e 48 h, assim
como as usadas no ensaio II em que se avaliou a variação da qualidade microbiológica em três
espécies de bivalves provenientes da mesma zona de produção durante três estações do ano,
nomeadamente, inverno, primavera e verão. Todas as amostras foram constituídas por 10 a 25
indivíduos, tendo sido transportadas para o laboratório a cerca de 4 °C, sendo analisadas num
período inferior a 24 horas após a amostragem.
2.1 Materiais
Ensaio I
Foram estudadas entre março e julho do ano de 2017, sete espécies de bivalves (Fig. 8), colhidas
em triplicado, nomeadamente:
27
Figura 8 Imagens das espécies de bivalves ensaiadas.
Ensaio II
Foram avaliadas três espécies de bivalves (Fig. 8), nomeadamente, ameijola, conquilha e
longueirão, provenientes da zona de produção do litoral Setúbal-Sines (L6), mais precisamente
da Comporta, colhidas no mesmo dia. Os bivalves foram colhidos durante três estações do ano,
inverno (janeiro), primavera (abril) e verão (junho).
De seguida, pesou-se, numa balança com tara automática (PJ3000 Mettler) 25 g de bivalve e
líquido intervalvar mais 225 g de Maximum Recovery Diluent (MRD, Oxoid LTP, Basingstoke,
Hampshire, England) para um saco Stomacher (Seward) e onde foi homogeneizado durante um
minuto num Stomacher 400 Circulator (Seward), obtendo-se assim a suspensão-mãe (diluição
10-1). Posteriormente efetuaram-se as diluições decimais adicionando 1 ml da suspensão
anterior a 9 ml de MRD.
28
Figura 9 Abertura da amostra em assepsia.
Nas amostras destinadas ao ensaio de vibrio foi efetuada nova pesagem de 25 g, sendo o MRD
substituído por água peptonada alcalina (APW). A APW foi preparada com cloreto de sódio
(Merck) e peptona bacteriológica (Oxoid), na proporção de 10 g de cada um dos elementos para
um litro de água. Acertou-se o pH a 8,5. Após autoclavagem a 121º C, durante 15 minutos,
verificou-se o pH final, de acordo com procedimento interno do IPMA (Procedimento Técnico
Auxiliar de Laboratório, PTAL 10).
Ensaio I
Neste ensaio foram avaliados três parâmetros microbiológicos nas amostras de bivalves,
nomeadamente, a contagem de microrganismos viáveis totais e a quantificação de coliformes e
de E. coli.
Ensaio II
No presente ensaio foram avaliados sete parâmetros microbiológicos nas amostras de bivalves,
nomeadamente, a contagem de microrganismos viáveis totais, a quantificação de coliformes e
de E. coli, quantificação de estreptococos fecais, contagem de esporos sulfito-redutores,
contagem de pseudomonas e pesquisa e contagem de vibrio.
29
Procedeu-se à contagem total de microrganismos viáveis totais segundo a ISO 4833-2 (2013)
adaptada. Inoculou-se, numa câmara de segurança biológica (Bio Safe 2 Ehert) 0,1 ml da
suspensão-mãe (10-1) preparada como descrito em cima, por espalhamento à superficie numa
placa de Petri de 90 mm de diâmetro contendo meio de cultura tryptic soy agar (TSA, Merck
KGaA, Darmstadt, Germany) com 2 % de sal marinho (adaptação do meio para multiplicação
de bactérias de origem marinha). Repetiu-se este procedimento para as diluições 10-2 e 10-3.
Para caracterização, repicaram-se cinco colónias isoladas por amostra para placas de TSA com
2 % de sal, foram incubadas a 22 ± 1º C durante 24 horas, período após o qual se realizaram
testes bioquímicos de confirmação:
Teste do Hidróxido de Potássio (KOH): teste para diferenciar colónias gram positivas
e negativas, o teste considera-se positivo quando o KOH destrói a parede celular de
bactérias gram-negativas e liberta material cromossomático de consistência viscosa. As
bactérias gram-positivas não sofrem qualquer reação na presença do KOH (Health
Protection Agency, 2004).
Teste da ID Color catálase (bioMerieux SA, Marcy I’Etoile, France): para as colonias
gram-positivas realizou-se este teste para confirmar se possuem a enzima catálase
responsável pela degradação do peróxido de hidrogénio. Esta enzima existe
principalmente em bactérias aeróbias e aeróbias facultativas e na presença de H2O2
degradam esta molécula, libertando água e oxigénio visível com a formação de bolhas
(Health Protection Agency, 2006).
Teste da oxidase (Becton, Dicknson and Company, 7 Loveton Circle Sparks, MD
21152, USA): utiliza-se para determinar se o microrganismo possui a enzima citocromo
oxidase. O sistema citocromo está presente em organismos aeróbios com capacidade
de utilizar o oxigénio como recetor final de hidrogénio (Health Protection Agency,
2005).
30
Figura 10 Placa de Petri (90 mm) com UFC de microrganismos viáveis totais.
Na câmara de segurança biológica (Ehret) inocularam-se três séries de cinco tubos: na primeira
série semeou-se 10 ml da suspensão-mãe (10-1), em cada tubo contendo 10 ml de solução de
glutamato modificado com minerais (MMGB, Oxoid) de concentração dupla; na segunda série,
semeou-se 1 ml da suspensão-mãe em cada tubo, contendo MMGB de concentração simples e
na terceira 1 ml da diluição 10-2 nos tubos com MMGB de concentração simples. Incubaram-
se os tubos semeados no banho de incubação a 37 ± 1º C durante 24 horas.
Consideraram-se suspeitos os tubos que apresentaram produção de ácido (viragem da cor lilás
do meio para amarelo), procedendo-se à confirmação por repicagem dos tubos suspeitos, na
câmara de segurança biológica (Biohazard Braun 2,4 micro), utilizando ansas de 10 μl, para
placas (90 mm) contendo meio de cultura chromocult coliform agar (CHR, Merck), na ISO o
meio utilizado é o tryptone bile x-glucuronide medium (TBX), este só permite confirmar a
presença de E. coli pelo que se utilizou o CHR. Incubaram-se as placas na estufa (Heraeus) a
37 ± 1º C durante 24 horas.
A quantificação de estreptococos fecais foi efetuada de acordo com a ISO 7899-1 (1998)
adaptada (Procedimento Técnico de Métodos Analíticos do Laboratório de Microbiologia,
PTMA/MIC 04a., 2014). Inocularam-se três séries de três tubos: na primeira semeou-se 10 ml
da suspensão-mãe (10-1) em cada tubo, contendo 10ml de solução de azide dextrose broth
(Rothe, Oxoid) de concentração dupla; na segunda série, semeou-se 1 ml da suspensão-mãe em
cada tubo, contendo meio de concentração simples e na terceira série 1 ml da diluição 10-2.
Posteriormente, os tubos suspeitos (que apresentação precipitado roxo) foram repicados para
placas de Petri contendo meio de cultura Kenner Fecal (KF) streptococcus agar (Merck). Após
48 horas de incubação das placas a 37 ± 1º C procedeu-se às leituras registando-se o número de
tubos que apresentaram reação positiva, ou seja, crescimento de colónias castanhas (Fig. 12).
Registou-se o número de tubos que apresentavam reação positiva (em cada série) e utilizou-se
a tabela do número mais provável (NMP), presente na ISO 7218, 2007/Amd.1,2013, para o
cálculo do NMP em 100 g de amostra.
32
Figura 12 Placa de Petri com colonias de estreptococos fecais em meio de cultura.
Seguindo a ISO 15213 (2003) adaptada (PTMA/MIC 15a., 2014), procedeu-se à contagem de
esporos sulfito redutores. As várias diluições decimais, foram inativadas a 80 ºC durante 15
minutos, seguindo-se um choque térmico em banho de água fria. Inocularam-se, na câmara de
segurança biológica (Braun), por incorporação em placas (90 mm) 1 ml da solução 10-1 e 1 ml
da diluição10-2, com o meio de cultura perfringens agar base (tryptose sulphite cycloserine e
shahadi ferguson perfringens, Oxoid). Incubaram-se as placas a 37 ± 1º C durante 48 horas em
anaerobiose (em caixas fechadas com um indicador de presença de oxigénio e um reagente
gerador de anaerobiose). Determinou-se o número de esporos por contagem direta das colónias
pretas e os resultados foram expressos em UFC/g.
Realizou-se a contagem de Pseudomonas spp. de acordo com o método da ISO 13720 (2010).
Inoculou-se, na câmara de segurança biológica (Braun), por espalhamento à superficie 1 ml da
solução-mãe em duas placas de Petri de 120 mm de diâmetro (0,5 ml de inóculo em cada)
contendo meio de cultura seletivo de pseudomonas - Cetrimida e Ácido Nalidíxico ou
Cetrimida, Fucidina e Cefaloridina (Merck) agar mais suplemento Cetrimida, Fucidina e
Cefaloridina (Oxoid), e 0,1 ml da suspensão-mãe numa placa com 90 mm de diâmetro. As
placas foram incubadas na estufa a 22 ± 1º C durante 48 horas. Foram repicadas colónias
características para a realização do teste do KOH e oxidase. Também foi confirmado o tipo
respiratório (oxidativo ou fermentativo) em meio O/F de Hugh e Leifson (Merck), adicionado
de uma solução de glucose, esterilizada por filtração, de modo a que a concentração final deste
hidrato de carbono no meio seja de 1 %. São consideradas características as colónias com reação
positiva aos testes do KOH e oxidase e com reação negativa à fermentação da glucose.
33
Foi calculada a proporção de colónias características a partir da contagem total, sendo os
resultados expressos em UFC/g.
A pesquisa e contagem de Vibrio foi realizada de acordo com a ISO 21872-1 (2017) adaptada
(PTMA/MIC 11a., 2017). Para a realização da contagem de vibrios, inoculou-se, na câmara de
segurança biológica (Ehret), por espalhamento à superfície 1 ml da suspensão-mãe de APW em
duas placas de 120 mm de diâmetro (0,5 ml de inóculo em cada) e 0,1 ml numa placa de 90 mm
contendo meio de cultura cholera médium Thiosulphate Citrate Bile salts Sucrose (TCBS,
Oxoid). Após incubação a 37 ± 1º C durante 24 horas realizou-se a contagem das colónias
características verdes e amarelas.
As colónias características foram repicadas para TSA com 2 % de sal, e incubadas nas mesmas
condições. Foi realizado o teste do KOH e da oxidase (oxidase reagente droppers, Becton,
Dicknson and Company, 7 Loveton Circle Sparks, MD 21152, USA). São consideradas
características as colónias com reação positiva aos dois testes.
34
2.3 Tratamento de Resultados
Todos os resultados do ensaio I foram analisados estatisticamente, após transformação log10
(x+1), através do programa informático “STATISTICA 6” (Statsoft, Inc., Tulsa, OK74104,
USA). Todos os valores obtidos com < foram transformados em metade do respetivo valor
numérico. O modelo linear da Anova unidirecional foi utilizado para determinar diferenças
estatísticas (p <0,05) entre várias condições, seguido por um teste de comparação múltipla
(Tukey HSD).
Foi realizada uma análise estatística descritiva aos dados obtidos no ensaio II, quando aplicável,
com recurso a medidas de tendência central e de dispersão, respetivamente mediana, intervalo
interquartil (IQ) e amplitude.
35
36
3. Resultados e Discussão
3.1 Ensaio I
Observou-se alguma variação na qualidade microbiológica inicial dos diferentes bivalves vivos
estudados no presente ensaio.
Os bivalves apresentavam níveis médios de contaminação por coliformes entre 1,3 e 3,2 Log10
NMP/100g (Tabela 2). O valor guia proposto para este parâmetro é 2,5 Log10 NMP/100g
(Diretiva CEE 91/492). Este limite foi ultrapassado nas amostras de amêijoa-boa, amêijoa-
japonesa e longueirão. Era de esperar que a ameijoa-japonesa e a ameijoa-boa tivessem níveis
globais de contaminação mais elevados pois provinham de zonas de produção classificadas
como B/C. Adicionalmente, o longueirão, também era originário de uma zona litoral
classificada como B.
37
estudadas, ensaiadas à chegada ao laboratório, e após simulação de armazenamento/transporte
a 1 °C ou 10 °C durante 24 e 48 h.
Tabela 1 Teores de microrganismos viáveis totais (LOG UFC/100g) obtidos nos moluscos
bivalves vivos armazenados/transportados a duas temperaturas.
Temperatura 1 ± 1 °C 10 ± 1 °C
inicial
Amêijoa-boa 8,0 ± 0,8𝑎 7,3 ± 1,0𝑎 7,8 ± 0,9𝑎
Amêijoa-japonesa 7,4 ± 0,5𝑎 7,3 ± 0,3𝑎 7,8 ± 0,5𝑎
Amêijoa-macha 7,3 ± 0,2𝑎𝑏 7,2 ± 0,1𝑎 7,8 ± 0,6𝑏
Ameijola 6,6 ± 0,4𝑎 6,7 ± 0,5𝑎 7,3 ± 0,7𝑎
Longueirão 6,4 ± 0,6𝑎𝑏 6,3 ± 0,6𝑎 7,4 ± 0,8𝑏
Mexilhão 6,5 ± 0,4𝑎 6,5 ± 0,6𝑎 6,9 ± 0,6𝑎
Ostra 7,6 ± 0,2𝑎 7,2 ± 0,4𝑎 7,5 ± 0,6𝑎
Os resultados apresentados correspondem à média ± o desvio padrão. Valores com diferentes
letras na mesma linha são significativamente diferentes (p <0,05).
38
Tabela 2 Teores de coliformes totais (NMP/100g) obtidos nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados a duas temperaturas
Temperatura 1 ± 1°C 10 ± 1°C
inicial
Amêijoa-boa 2,7 ± 0,7𝑎 3,0 ± 0,7𝑎 2,9 ± 1,0𝑎
Amêijoa-japonesa 2,8 ± 1,1𝑎 3,0 ± 0,9𝑎 3,1 ± 1,0𝑎
Amêijoa-macha 2,2 ± 0,4𝑎 3,5 ± 0,4𝑏 2,6 ± 0,5𝑎
Ameijola 2,3 ± 1,2𝑎 2,4 ± 1,2𝑎 2,6 ± 1,3𝑎
Longueirão 3,2 ± 0,7𝑎 3,3 ± 0,5𝑎 3,5 ± 0,7𝑎
Mexilhão 1,9 ± 0,8𝑎 2,1 ± 0,9𝑎 2,6 ± 1,0𝑎
Ostra 1,3 ± 0,7𝑎 2,5 ± 0,5𝑎 2,0 ± 0,7𝑎
Os resultados apresentados correspondem à média ± o desvio padrão. Valores com diferentes letras
na mesma linha são significativamente diferentes (p <0,05).
39
Tabela 3 Teores de E. coli (NMP/100g) obtidos nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados a duas temperaturas.
Temperatura 1 ± 1 °C 10 ± 1 °C
inicial
Amêijoa-boa 1,2 ± 0,4𝑎 1,3 ± 0,4𝑎 1,3 ± 0,4𝑎
Amêijoa-japonesa 2,0 ± 1,2𝑎 1,9 ± 1,1𝑎 1,9 ± 1,2𝑎
Amêijoa-macha 1,9 ± 0,5𝑎 1,8 ± 0,4𝑎 1,5 ± 0,3𝑎
Ameijola 1,0 ± 0,0𝑎 1,0 ± 0,1𝑎 1,1 ± 0,2𝑎
Longueirão 1,5 ± 0,9𝑎 1,5 ± 0,8𝑎 1,5 ± 0,8𝑎
Mexilhão 1,2 ± 0,4𝑎 1,1 ± 0,3𝑎 1,2 ± 0,3𝑎
Ostra 1,3 ± 0,7𝑎 1,6 ± 0,5𝑎 1,5 ± 0,6𝑎
Os resultados apresentados correspondem à média ± o desvio padrão. Valores com diferentes letras
na mesma linha são significativamente diferentes (p <0,05).
Neste contexto, o armazenamento/transporte dos bivalves vivos destinados a ensaios
microbiológicos, durante 24 a 48 h, na gama de temperatura recomendada, entre 0 °C a 10 °C
(ISO 6887-3, 2017), não influencia os resultados E. coli, obtidos para o controlo oficial das
zonas de produção.
Efeito do tempo de armazenamento/transporte
Nas tabelas 4, 5 e 6 apresentam-se, respetivamente, os resultados obtidos para os
microrganismos viáveis totais, coliformes e E. coli nas sete espécies de bivalves vivos
estudadas, ensaiadas à chegada ao laboratório, e após simulação de armazenamento/transporte
entre 1 e 10 °C durante 24 h ou 48 h.
Tabela 4 Teores de microrganismos viáveis totais (UFC/100g) nos moluscos bivalves vivos
armazenados/transportados durante dois períodos de tempo.
0H 24 H 48 H
Amêijoa-boa 8,0 ± 0,8𝑎 7,4 ± 1,1𝑎 7,7 ± 0,9𝑎
Amêijoa-japonesa 7,4 ± 0,5𝑎 7,4 ± 0,4𝑎 7,7 ± 0,5𝑎
Amêijoa-macha 7,3 ± 0,2𝑎 7,3 ± 0,1𝑎 7,8 ± 0,6𝑎
Ameijola 6,6 ± 0,4𝑎 6,7 ± 0,5𝑎 7,1 ± 1,0𝑎
Longueirão 6,4 ± 0,6𝑎 6,7 ± 0,7𝑎 7,1 ± 1,0𝑎
Mexilhão 6,5 ± 0,4𝑎 6,4 ± 0,6𝑎 7,0 ± 0,2𝑎
Ostra 7,6 ± 0,2𝑎 7,3 ± 0,5𝑎 7,3 ± 0,2𝑎
Os resultados apresentados correspondem à média ± o desvio padrão. Valores com diferentes letras na
mesma linha são significativamente diferentes (p <0,05).
40
Após análise dos resultados verificou-se que o tempo de armazenamento/transporte não teve
efeito nos teores médios de microrganismos viáveis totais, coliformes totais ou E. coli em
nenhuma das espécies estudadas.
Uma vez que as condições de armazenamento/transporte dos bivalves vivos são também
importantes para a sua comercialização afigura-se que as temperaturas e tempos testados são
41
adequados para o armazenamento/transporte destes animais vivos para os centros de
depuração/expedição. Não obstante, dado que em duas espécies armazenadas/transportadas a
10 ± 1 ºC foram registados teores de microrganismos viáveis totais significativamente
superiores (p <0,05) aos observados a 1 ± 1 ºC, é recomendável que o
armazenamento/transporte dos bivalves vivos para fins comerciais seja realizado a temperaturas
de refrigeração inferiores a 10 °C, de modo a evitar alterações na qualidade microbiológica.
3.2 Ensaio II
No presente ensaio observou-se alguma variação na qualidade microbiológica nas três estações
do ano avaliadas (inverno, primavera e verão) e nas três espécies estudadas (ameijola, conquilha
e longueirão).
Nas figuras seguintes apresentam-se os gráficos dos vários parâmetros estudados agrupados por
estação do ano.
Da análise do intervalo interquartil (IQ) para as estações do ano, inverno, primavera e verão
concluiu-se que 50% das observações registadas nos bivalves, quanto ao teor em
microrganismos viáveis totais (Fig. 14), situavam-se entre 9,3x 105-3,3x106, 4,2x106-2,5x107 e
1,2x107-1,3x107 UFC/100g, respetivamente, verificando-se níveis de contaminação mais
elevados na primavera e no verão.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
adaptado de 5 x 107 UCF/100 g (International Commission on Microbiological
Specifications for Foods, 1986) por uma linha verde.
No verão registou-se uma menor dispersão dos resultados do que nas outras estações,
possivelmente devido à ausência de episódios de precipitação que levam à escorrência de
contaminação para o meio marinho (Pedro, Cachola, Castilho & Sobral, 2008c)
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
de 300 NMP/100 g (Diretiva 91/492) por uma linha verde.
Quanto ao teor em E. coli, verificou-se que nas estações do ano estudadas, inverno, primavera
e verão, as medianas foram de 40, 9 e 9, respetivamente (Fig. 16). No verão foram observados
os níveis máximos de contaminação por E. coli, que ultrapassaram o valor guia de 230
NMP/100 g, recomendado para este parâmetro nos bivalves provenientes de zonas com classe
A e destinados ao consumo humano direto (Reg. nº 854/2004). Esta constatação pode estar
associada a atividades de lazer sazonais, tais como, a utilização das águas balneares.
43
Figura 16 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de E. coli obtidos no
inverno, primavera e verão.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia de
230 NMP/100 g (Reg. 864/2004) por uma linha verde.
Como era esperado, estes bivalves provenientes de uma zona litoral (L6) apresentavam níveis
de contaminação de origem fecal baixos.
44
Figura 17 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de estreptococos fecais
obtidos no inverno, primavera e verão.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
adaptado de 1000 NMP/100 g (Ribeiro, 1974) por uma linha verde.
Relativamente aos esporos sulfito-redutores, observou-se (Fig. 18) que a classe de maior nível
de contaminação entre 100 e 1000 UFC/g só ocorreu no inverno e em 33 % das amostras. O
facto de se terem obtido teores de esporos mais elevados nesta estação do ano pode estar
associado a uma maior agitação marítima com ressuspensão na coluna de água de formas
esporuladas presentes no sedimento.
45
A família das Pseudomonas representa um dos grupos de microrganismos dominantes na
microflora dos bivalves (Cao, Xue & Liu, 2009), encontrando-se bem adaptadas ao meio
aquático, pelo que estas bactérias foram detetadas nas três estações do ano testadas.
46
Relativamente aos microrganismos viáveis totais, a análise do IQ para as espécies de bivalves
estudadas, demonstrou que 50% das observações registadas na ameijola, conquilha e
longueirão, situavam-se entre 1,4x106-4,8x106, 1,1x107-9,2x107 e 7,3x107-1,7x107 UFC/100g,
respetivamente (Fig. 21).
A conquilha apresenta uma maior dispersão dos resultados, que pode dever-se à sua localização,
uma vez que esta espécie está mais próxima da costa, pelo que está mais exposta a
contaminações de origem antropogénica e telúrica.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
adaptado de 5 x 107 UCF/100 g (International Commission on Microbiological Specifications
for Foods, 1986) por uma linha verde.
Quanto ao teor em coliformes totais, as medianas registadas para a ameijola, conquilha e
longueirão, eram de 70, 44 e 85 NMP/100g, respetivamente (Fig. 22). O longueirão foi a espécie
que apresentou níveis mais elevados de contaminação por coliformes, com algumas amostras a
ultrapassarem o valor guia recomendado para este parâmetro de 300 NMP/100 g (Ribeiro, 1974;
Diretiva 91/492).
47
Figura 22 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de coliformes em ameijola,
conquilha e longueirão.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
de 300 NMP/100 g (Diretiva 91/492) por uma linha verde.
É de realçar que o teor máximo de 330 NMP/100g foi obtido no longueirão, o qual ultrapassa
o valor guia de 230 NMP/100g para as zonas de produção classificadas como A. Não foi
detetada E. coli em nenhuma amostra de ameijola. De facto, as espécies estudadas foram
provenientes da zona de produção litoral, designada como L6, em que a ameijola e a conquilha
estão classificadas como A, enquanto o longueirão está classificado como B, em que o valor
máximo para contaminação por E. coli é 4600 NMP/100 g (Despacho n.º 1851/2017).
Como os dados históricos da monitorização desta zona pelo IPMA demostram a existência de
uma diferença entre os teores de E. coli apresentados pelo longueirão e os das outras duas
espécies, possivelmente devido à maior capacidade de bioacumulação do longueirão (Carro,
García, Ignacio & Mouteira, 2012), e tendo em consideração os resultados obtidos, é
recomendável que a monitorização microbiológica desta zona inclua as três espécies.
48
Figura 23 Diagrama de extremos e quartis relativo ao teor de E. coli em ameijola,
conquilha e longueirão.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
de 230 NMP/100 g (Reg. 864/2004) por uma linha verde.
Mais uma vez foi constatado que a ameijola apresentava teores mais baixos deste grupo de
bactérias do que as restantes espécies.
A mediana está representada por um quadrado amarelo, o IQ por um polígono e o valor guia
adaptado de 1000 NMP/100 g (Ribeiro, 1974) por uma linha verde.
No caso dos esporos sulfito-redutores, observou-se (Fig. 25) que a conquilha foi a espécie que
apresentou teores mais elevados de contaminação, que foram registados em 25 % das amostras.
O facto de se ter obtido teores de esporos mais elevados na conquilha, pode advir da sua maior
49
proximidade à região costeira onde existe maior agitação marítima com eventual ressuspensão
de partículas do sedimento. Apenas 25 % das amostras de ameijola exibiam contaminação por
esporos sulfito-redutores, em baixos teores (102 UFC/g).
Quanto ao teor de pseudomonas verificou-se (Fig. 26) que foi a ameijola a espécie a apresentar
menor contaminação, não tendo sido detetado este grupo de bactérias em 25 % das amostras.
Nas restantes espécies, os teores de pseudomonas foram superiores a 103 UFC/g em 50 % das
amostras.
50
Figura 27 Frequência dos teores de vibrios em ameijola, conquilha e longueirão.
Uma vez que o vibrio persiste no ambiente marinho, associado as espécies de fitoplâncton e
zooplâncton (OMS, 2010), os níveis de contaminação observados no longueirão podem dever-
se, eventualmente, a hábitos alimentares específicos.
51
52
Conclusão
As condições de transporte de moluscos bivalves vivos destinados a ensaios microbiológicos a
temperaturas entre 0 °C e 10 °C durante 24 a 48 h (ISO 6887-3, 2017) são adequadas para o
controlo oficial das zonas de produção de bivalves, uma vez que não foi observado qualquer
efeito da temperatura ou do tempo nos teores de E. coli dos bivalves vivos, os quais determinam
o estatuto sanitário das zonas de produção.
Apesar dos tempos de armazenamento/transporte dos bivalves vivos testados (entre 24 a 48 h),
não terem influenciado os resultados de coliformes ou microrganismos viáveis totais, é
recomendável que estes animais vivos sejam transportados para o seu destino comercial com
maior brevidade possível de modo a manterem uma boa viabilidade.
Verificou-se que no inverno ocorriam os menores níveis de contaminação para a maior parte
dos parâmetros avaliados. No verão foram registados os teores mais elevados de coliformes, E.
coli, pseudomonas e vibrio, sendo recomendável que os moluscos bivalves capturados nesta
estação do ano sejam refrigerados com a maior brevidade possível, de modo a evitar o aumento
dos teores destas bactérias.
Por outro lado, o longueirão foi a espécie que apresentou maiores níveis de contaminação, em
particular, para os parâmetros de coliformes, E. coli, estreptococos fecais e vibrio.
53
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