Boletim 22
Boletim 22
Boletim 22
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SUMÁRIO
· Editorial
· Colônia de Pescadores da Praia da Raposa - J. M. Rodrigues
· Viva o Imperador! Viva! - Deborah Baesse
· As Religiões Afro-Brasileiras no Maranhão - Mundicarmo Ferretti
· Toque de ìndio no Terreiro "Uma luz no meu caminho" - Jacyara de Melo
· O Divino Espírito Santo - Carlos de Lima
· Terreiro do Justino Casa Fé, Esperança e Caridade - Marilande Abreu
· Preservação e Sustentabilidade do Folclore - Maria do Socorro Araújo
· Andarilho das Imagens - Márcia Mendes
· Os Passos Sacros - Nizeth Medeiros
· Notícias
· Perfil Popular
Nhozinho - Zelinda Lima
DIRETORIA:
Presidente: Sérgio Figueiredo Ferretti
Vice-presidente: Carlos Orlando de Lima
Secretária: Izaurina Maria de Azevedo Nunes
Tesoureira: Maria Michol Pinho de Carvalho
CORRESPONDÊNCIA:
CENTRO DE CULTURA POPULAR DOMINGOS VIEIRA FILHO
Rua do Giz (28 de Julho), 205/221 – Praia Grande.
CEP 65.075–680 – São Luís – Maranhão
Fone: (098) 231-1557 / 231 9361
As opiniões publicadas em artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores, não comprometendo a CMF.
CONSELHO EDITORIAL:
Sérgio Figueiredo Ferretti
Carlos Orlando de Lima
Izaurina Maria de Azevedo Nunes
Maria Michol Pinho de Carvalho
Mundicarmo Maria Rocha Ferretti
Zelinda de Castro Lima
Roza Santos
EDIÇÃO:
Izaurina Maria de Azevedo Nunes
ENDEREÇO ELETRÔNICO:
www.cmfolclore.ufma.br
E-MAIL:
cmfolclore@ufma.br
Editorial
Estamos lançando o número 22 do Boletim da Comissão Maranhense de Folclore - CMF durante a realização, em São Luís, do 10º Congresso Brasileiro
de Folclore, organizado pela CMF e pela Comissão Nacional de Folclore e que conta com a participação das diversas Comissões Estaduais de Folclore e com o
apoio do Governo do Estado do Maranhão, através da Fundação Cultural do Maranhão - FUNCMA e de outros órgãos locais.
O Congresso tem como temática central as relações entre folclore e turismo. No mundo globalizado de hoje sabemos que as culturas locais enfrentam
problemas que exigem reflexão dos interessados em discutir relações entre tradição e modernidade no campo da cultura popular.
Os assuntos a serem discutidos no Congresso inserem-se nas preocupações atuais de nossa sociedade, com o incremento do turismo, especialmente com
o turismo ecológico e cultural. Este 10º Congresso objetiva reunir estudiosos da cultura popular em seus múltiplos aspectos, enfatizando, ainda, a problemática
das relações entre turismo e a mídia.
São Luís, recentemente reconhecida pela UNESCO como patrimônio da humanidade pelo seu acervo arquitetônico e pela riqueza de seu folclore,
certamente será local oportuno para sediar o 10º Congresso Brasileiro de Folclore. A época escolhida, que antecede o período junino, é igualmente propícia
para congregar estudiosos e pesquisadores do folclore brasileiro interessados em debater os temas a serem tratados.
No Congresso irão se reunir grupos de trabalhos discutindo diversos temas relativos a problemas variados do folclore e da cultura popular. Serão
oferecidos um curso de folclore e oficinas de trabalho sobre temas diversos, ministrados por especialistas de várias regiões do país e do exterior. Haverá, ainda,
mesas redondas e conferências para debater os temas centrais do evento.
Durante o Congresso serão premiados trabalhos sobre folclore redigidos por estudantes maranhenses de diferentes níveis de ensino. Igualmente, serão
concedidos prêmios a autores de filmes e vídeos sobre cultura popular. A programação paralela incluirá lançamento de livros e discos, exposições de arte,
projeção de vídeos e filmes e apresentações de grupos folclóricos. O Comissão Organizadora do Congresso espera reunir mais de três centenas de estudiosos,
especialistas e interessados em debater problemas do folclore no mundo de hoje.
O Boletim da Comissão Maranhense de Folclore se apresenta como um meio de divulgar trabalhos de estudantes de graduação e pós-graduação e de
profissionais da cultura popular e de áreas afins. Nosso boletim, além da divulgação impressa é também divulgado através da internet, com quase todos os
números já disponíveis para consulta.
A Comissão Maranhense de Folclore sente-se honrada com a presença dos participantes do 10º Congresso Brasileiro de Folclore, vindos de diferentes
regiões do país.
Damos boas vindas a todos e almejamos um excelente ambiente de debates sob a proteção dos santos juninos.
Esperamos que o clima das festas juninas, as diversas danças, a culinária maranhense e as belezas da cidade encantem a todos que vierem e que serão
recebidos de braços abertos.
Sergio Ferretti
Presidente da Comissão Maranhense de Folclore
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COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE http://www.cmfolclore.ufma.br/Htmls/Boletim%2022.htm
Vivendo da pesca, cerca de 4.000 pessoas, entre pescadores e seus familiares, habitam as imediações formando a colônia que leva o nome da praia:
Colônia de Pescadores da Raposa.
Os primeiros que por lá se instalaram foram os cearenses que escapavam dos freqüentes contratempos impostos pela agressividade do clima de sua
terra e pela exploração sofrida nas mãos dos latifundiários. A pesca abundante e o abandono das terras maranhenses vieram despertar naquele povo a
esperança de uma vida melhor. Por isso, ainda hoje, a maior parte dos moradores da Colônia da Raposa é constituída de cearenses e a atividade da pesca
tornou-se a grande motivação de suas vidas.
Os instrumentos de trabalho representam a própria sobrevivência da colônia. Por isso, a participação de todos é indispensável para a sua confecção e
manutenção.
O trabalho artesanal das rendeiras é vendido no local a raros visitantes ou entregue a intermediários para a revenda no comércio da cidade. Desta
forma cumprem sua parcela de responsabilidade para o sustento das famílias.
Sem consciência de classe e assustados pelo insucesso de experiências anteriores com o cooperativismo, os pescadores preferem trabalhar
individualmente ou em pequenos grupos que se desfazem após o cumprimento da jornada. A colônia é, portanto, mais um núcleo residencial nas proximidades
de uma fonte extrativista que uma associação de esforços em favor da comunidade.
A natureza da região é pródiga e as maneiras de capturar os frutos do mar ficam por conta da imaginação e criatividade dos pescadores.
O curral de pesca constitui-se na forma básica de sustentação econômica da colônia. Construído em forma de funil com malhas feitas de varas e arames
é estrategicamente implantado no solo de modo a aprisionar cardumes dirigidos pelos movimentos das marés.
Pelas tradições culturais dos pescadores, este tipo de engenho apresenta-se em dois modelos distintos: o curral do cearense e o do maranhense. O
primeiro, por suas características, tem maior capacidade de retenção de pescado que o segundo.
Além das atividades para fins comerciais, desenvolve-se a pesca de subsistência, onde os mais pobres obtêm o alimento diário por meio de pequenas
armadilhas construídas a baixo custo. Os restos das grandes pescarias servem de isca para bagres e uritingas, peixes de couro muito apreciados na região.
Na pesca é o mar que indica a hora do trabalho. Qualquer hora é hora de atividade desde que a maré assim o determine. A cada dia, pela freqüência
habitual das marés, o horário dos pescadores é atrasado em cinqüenta e cinco minutos. Desta forma, a atividade sugerida por determinado estágio dos
movimentos do mar se repete, dia após dia, num ciclo que termina por envolver cada uma de suas 24 horas.
O movimento das marés atinge aos 6 metros e meio no desnível entre a cheia e a vazante. Esta importante marca associada ao suave declive da
plataforma da região é responsável pela mudança diária de toda uma paisagem e pelo condicionamento das colônias de pesca instaladas à beira-mar.
A cada 5 horas e 45 minutos, a maré cheia, que freqüentemente destrói os barrancos costeiros com a violência de suas ondas, esvazia-se deixando
descobertas enormes extensões de areia. O processo ocorre de maneira inversa em tempo idêntico.
Quando as águas baixam deixando à mostra as malhas dos currais, as equipes de pesca dirigem-se a seus barcos para a rotineira operação de
despescagem. Despescar é o termo usado pelos pescadores, para o recolhimento dos peixes capturados pelos currais. O percurso é longo e, para espantar o
tédio, durante a viagem são contadas estórias e entoados repentes, enquanto o barco navega.
A despescagem dos currais repete-se na rotina diária dos pescadores da Praia da Raposa. O produto desta operação não deverá ultrapassar, em muito,
as expectativas de consumo, pois a ausência de frigoríficos e indústrias pesqueiras nas proximidades poria a perder todo o pescado excedente.
A natureza oferece o necessário para o sustento dos homens. Estes, com seu trabalho, extraem apenas o que lhes é suficiente. O relacionamento não é
predatório.
Na praia da Raposa, na Ilha de São Luís, Maranhão, pelo que ainda pode ser visto, a natureza convive com trabalho do homem.
Meu primogênito nasceu em 03 de maio de 1990. Sempre foi uma criança linda e tranqüila desde os tempos em que, ainda na barriga, conversávamos
longamente sem precisar das palavras, guiados pela emoção e suas linguagens.
Mas, voltando ao nascimento, foi naquela linda madrugada de maio que, já no apartamento da maternidade, com a família curiosa em volta do novo
rebento, vovó Zelinda anunciou:
- Graças a Deus e ao Divino Espírito Santo é um meninão! Nasceu com saúde e muita tranqüilidade. Fiquem logo sabendo que temos uma dívida de
promessa. Assim como Ana Clara e Camila, João Pedro será Imperador do Divino Espírito Santo, em sinal de nossa gratidão por sua proteção. Meus netos
nascem com a pomba do Divino sobre a cabeça e serão acolhidos em suas asas, por toda a vida!
A profecia estava anunciada: João Pedro cresceria sob a proteção do Divino e, aos cinco anos, vovó Cecé (Celeste Rodrigues – Casa das Minas)
anunciaria que era chegada a hora de cumprir a obrigação com o Santo, dando início à carreira Imperial. Assim, em 1998, João Pedro é aceito na tribuna como
Mordomo Baixo, iniciando-se no ritual da festa e, mais do que isso, abraçando a oportunidade de vivermos, ele e nós, familiares, uma experiência inesquecível,
que marcaria nossas vidas para sempre!
A Festa do Divino Espírito Santo na Casa das Minas é um rito muito sério e profundo, que se inicia bem antes do chamado domingo grande, o Domingo
de Pentecostes. Para um futuro Imperador, como era o caso de João Pedro, a festa tem início no último dia do ano em que são passadas as posses dos Impérios
para os Mordomos Régios, que, no ano seguinte, serão Imperadores.
Nesse processo de passagem de posses, os Mordomos Régios viram Imperadores e os Mordomos Baixos sobem para o cargo de Régios, abrindo-se a vaga
para o acesso de novos integrantes. Foi assim que, em 1999, João Pedro iniciou sua carreira.
Esse último dia da festa, dia em que após a passagem das posses, se encerra a tribuna para só reabrí-la na festa do ano seguinte, é marcado por muita
emoção. O choro dos que deixam e recebem o Império e a comoção dos que são introduzidos enchem aquela minúscula sala do altar de sentimentos que se
confundem: alegria, tristeza, choro e riso, paz de espírito e sensação de missão cumprida, ansiedade e medo frente ao desafio de enfrentar tão importante
missão, honrando-a a altura. Assim foi conosco. João Pedro tão pequeno, os olhinhos brilhando assustados. Ainda sem entender muito bem o que tudo aquilo
significava. Tímido, sem conhecer as demais crianças, ficou muito quieto, como que tentando relacionar as inúmeras explicações prévias dos avós e pais sobre a
festa, com toda aquela confusão vivenciada! Vovó Cecé, orgulhosa, sentou-o no trono de Mordomo Baixo, sacramentando o compromisso.
O ano seguinte foi de fato o primeiro ano em que João Pedro, já Mordomo Baixo, participaria de todo o ritual da festa: abertura da tribuna e buscamento
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do mastro, o famoso e já tradicional almoço da cultura, levantamento do mastro, visitas e, finalmente, o domingo grande. No final desse primeiro ano, João
Pedro já se sentia à vontade, integrado com as outras crianças participantes e com as caixeiras.
Veio então o segundo ano. Agora Mordomo Régio, João Pedro vivia a expectativa de, no último dia, receber as posses de Imperador, realizando o sonho,
por dois anos acalentado, de botar as mãos naquela maravilhosa espada que tanto lhe enchia os olhos e o coração. Em 20 de maio de 2001, teria início a tão
aguardada festa. Para nós, aquela era uma temporada muito especial. Era a festa do NOSSO IMPERADOR! Altamente imbuído do cargo e de sua
responsabilidade, João Pedro abriu sua festa, participando do buscamento do mastro, subindo o Beco das Minas, sentado sobre o mesmo. Ao lado de sua prima
Camila, a Imperatriz, era só vaidade! A cada encontro com vovó Cecé, apresentava sempre a mesma questão: - E a espada, que dia eu vou receber vovó?
Vivemos juntos intensamente cada detalhe: a confecção da roupa, a compra dos gêneros alimentícios doados pelo Imperador à festa, a escolha das
lembrancinhas e do bolo. João Pedro participava de tudo, ávido por aprender e cada vez entendendo melhor cada gesto, cor e sentimento daquele belo ritual.
Como educadora que sou, não posso omitir aqui a riqueza pedagógica dessa vivência. João Pedro conviveu com limites e possibilidades, apreendeu lições
de respeito às tradições e ao conhecimento dos mais velhos, valorizando não apenas o novo e consumível que nos é imposto pelo tal mundo moderno
globalizado. Descobriu que o poder de um cargo é passageiro quando, ao final de sua festa, chorou a passagem de suas posses ao sucessor, vivendo tal qual
Cinderela a quebra do encanto, o fim do Conto de Fadas e a transformação da carruagem em abóbora novamente. Aprendeu que reinados acabam, restando de
fato, no final, apenas as amizades sinceras construídas ao longo deles. Fortaleceu valores fundamentais, tornando-se mais gente e mais humilde.
Lembro o quanto ficou impressionado com as esmolas que, como Imperador, distribuiu aos pobres! De noite, em casa, sob o efeito de todos aqueles
estímulos, e exaustos do dia de emoções, me disse, quase dormindo:
- Mamãe, se um dia eu for um Imperador de verdade, não vou deixar ninguém ser pobre, precisando de esmolas! Vamos rezar para o Divino ajudar
eles?
Meu Imperador enfrentava as contradições do mundo adulto, refletidas em sua festa!
Foi esse João Pedro novo, renascido forte, sensível e maduro dessa experiência única, que eu vi chorar no abraço de despedida a suas caixeiras, ao som
de:
Era 04 de junho de 2001. Sua festa acabara. A missão estava cumprida e era chegada a hora de passar ao colega a coroa, o cetro, o capote e, o mais
doído, a espada! Choramos todos a emoção da despedida!
A mim, restava apenas esperar Paloma, sua irmãzinha, crescer, e me dar a alegria de reviver a emoção de mãe dos Impérios do Divino Espírito Santo. E
Viva Imperador, Viva!
* Pedagoga
Mundicarmo Ferretti
O termo religião afro-brasileira engloba uma variedade de manifestações religiosas existentes no Brasil, algumas originadas há muitos anos de religiões
africanas tradicionais, outras organizadas no Brasil há algumas décadas, onde o culto a entidades espirituais africanas, o transe mediúnico e a integração de
elementos do catolicismo são bastante conhecidos. Entre elas podem ser citadas: o Candomblé, surgido na Bahia e hoje encontrado em muitas cidades
brasileiras; o Tambor de Mina, organizado no Maranhão e muito difundido em Belém do Pará e em São Paulo; e a Umbanda, hoje difundida em todas as regiões
do país e absorvida por terreiros das mais diversas denominações religiosas afro-brasileiras.
A diversidade da religião afro-brasileira começou no tempo da fundação dos primeiros terreiros, pois os africanos que vieram para o Brasil pertenciam a
diversas etnias. Embora os estudos sobre as origens do negro do Maranhão não tenham avançado muito, sabe-se que, na capital do estado, os escravos da
Costa da África (daomeanos e yorubanos) eram mais numerosos e que Codó recebeu mais negros banto (angolanos, congoleses) e senegaleses do que da Costa
da África (EDUARDO, 1948; MEIRELES, 1994). A memória de pais-de-santo maranhenses registra a vinda para o estado de negros bijagó, cambinda, fanti-
ashanti, mandinga, taipa, caxias e outros.
Apesar da existência, em São Luís, de dois terreiros de Mina desde meados do século XIX (a Casa das Minas-Jeje/daomeana e a Casa de
Nagô/yorubana), a tradição religiosa afro-brasileira do Maranhão só começou a ser mais conhecida cerca de 100 anos depois, com a divulgação do livro A Casa
das Minas, de Nunes Pereira (PEREIRA,1979); do relatório de trabalho em São Luís da Missão de Pesquisa Folclórica, criada em São Paulo por Mário de Andrade
(ALVARENGA,1948); e de tese sobre aculturação do negro no Maranhão, defendida, nos Estados Unidos, pelo antropólogo Octávio da Costa Eduardo
(EDUARDO, 1948).
Embora no Tambor de Mina do Maranhão a tradição Jeje tenha sido mais preservada do que a nagô e dessa ter sido bastante influenciada por aquela, os
terreiros da capital apresentam mais elementos da Mina-Nagô do que da Mina-Jeje, o que pode ser constatado pelo uso generalizado, nos terreiros da capital,
dos instrumentos musicais da Mina-Nagô: abatás (tambores horizontais de duas membranas), agogô (ferro) e xequerê (cabaça). Mas a maioria dos terreiros da
capital integram também à Mina elementos de outras tradições de origem africana (taipa, cambinda, caxias e outras) que foram deixadas por terreiros já
desaparecidos. Alguns deles integram, ainda, elementos do Terecô, também conhecido por Tambor da Mata, tradição afro-brasileira que parece ser mais
influenciada pela cultura banto, encontrada por Costa Eduardo no interior do Maranhão, mais precisamente no povoado de Santo Antônio dos Pretos,
pertencente a Codó.
Existem, ainda, em São Luís e em outras cidades maranhenses, como Cururupu, numerosos terreiros conhecidos como de curador, onde a religião
afro-brasileira se apresenta bem mais associada a práticas terapêuticas e onde podem ser identificados, claramente, elementos da pajelança, de origem
indígena, encontrada também em salões de curadores e terreiros de caboclo da capital separada do Tambor de Mina. Nos rituais dos terreiros de Cururupu, os
tambores são acompanhados pelo ferro e pelas cabaças, tocados na Mina e no Terecô, e também por duas tabocas (pedaços de bambu), que são percutidas no
solo, conferindo a eles grande singularidade.
Nos últimos anos, devido ao grande prestígio de terreiros da capital baiana, alguns terreiros do Maranhão têm adotado também, ou introduzido, alguns
elementos do Candomblé em seu sistema religioso. Outros, principalmente quando filiados à Federação de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros, adotaram a
Umbanda ou estão se umbandizando. Contudo, mesmo adotando o Candomblé ou a Umbanda, aqueles terreiros continuam homenageando suas entidades
espirituais com festas e rituais do catolicismo e do folclore maranhenses como: a Festa do Divino Espírito Santo, o Tambor de Crioula e o Bumba-Boi.
Como falamos anteriormente, no Maranhão existem dois terreiros de Mina fundados por africanos em funcionamento: a Casa das Minas, consagrada ao
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vodum Zomadonu, e a Casa de Nagô, ao orixá Xangô. Essa última foi tombada em 1985 pelo Patrimônio Histórico estadual e a primeira encontra-se em
processo de tombamento na esfera federal, o que atesta o reconhecimento da importância delas na cultura maranhense e impede ou dificulta a destruição ou
venda do imóvel onde estão sediadas. Essas Casas realizam, durante o ano, várias festas religiosas, algumas com mais de uma noite de toque de tambor,
sempre apresentando um extenso repertório de músicas cantadas em línguas africanas repassadas por suas fundadoras. As Casas das Minas e de Nagô, como
vários outros terreiros de Mina de São Luís, têm recebido, nos últimos anos, ajuda do governo, quando realizam festas incluídas na programação folclórica,
como a festa do Divino Espírito Santo.
Apesar das Casas das Minas e de Nagô serem muito prestigiadas, a preservação de seus conhecimentos tradicionais encontra-se ameaçada pelo mesmo
fechamento que permitiu a elas chegar aos nossos dias com um índice tão alto de preservação de tradições africanas. Embora só os terreiros de nação Jeje
sejam conhecidos como muito fechados e tradicionalistas, a Casa de Nagô do Maranhão vem se comportando de modo semelhante à Casa das Minas (Jeje) no
que diz respeito à integração de novos membros e ao repasse do saber aos que dela participam. Em relação à participação daqueles terreiros em atividades
culturais promovidas pelos órgãos de cultura do Estado, a Casa das Minas apresenta maior grau de integração do que a de Nagô, uma vez que, através de Dona
Celeste, responsável pela Festa do Espirito Santo, tem marcado a sua presença em quase todos os eventos promovidos por aqueles órgãos. Mas,
inegavelmente, o tradicionalismo e fechamento da Casa das Minas é mais apregoado do que o da Casa de Nagô e tem alimentado grandes discussões entre
pesquisadores (FERRETTI, S. 1996; AMORIM, C. 2001) e religiosos.
Apesar da Casa das Minas ser o terreiro de Mina mais antigo, o que melhor preserva a tradição africana deixada por sua fundadora, e continuar
realizando suas obrigações e festas algumas delas levando ao terreiro grande número de pessoas (como é o caso da festa de São Sebastião, quando realiza a
obrigação para Acossi; do Arrambã ou Bancada, na Quarta-feira de Cinzas; e da Festa do Espírito Santo, no Domingo de Pentecostes), encontra-se em risco de
extinção por contar com um número muito pequeno de vodunsis (filhas-de-santo) e de quase todas elas terem mais de 75 anos.
Por razões ainda não muito esclarecidas, as Casas das Minas e de Nagô deixaram de fazer iniciação completa de suas filhas desde 1914 e têm recebido
poucas vodunsis. Mas, pelo menos a Casa das Minas não parece muito preocupada com essa questão. Dona Deni, chefe daquele terreiro, não admite a
possibilidade de sua extinção com o desaparecimento das vodunsis atuais, pois está convencida de que as vodunsis são trazidas pelos voduns e que, ao serem
possuídas por eles, cantam na língua deles e se comportam de acordo com os padrões da Casa, daí porque, nas coisas essenciais, não precisam ser ensinadas
pelas mais velhas.
Embora a Casa de Nagô não encoraje a abertura de outras casas, talvez porque ficou sem funcionar durante algum tempo, algumas de suas filhas
abriram, em São Luís, outros terreiros de Mina entre o final do século XIX e início do século XX. Atualmente só um deles continua funcionando, o do sítio do
Justino, na Vila Embratel, mas existem várias casas que foram abertas por pessoas que dançaram em terreiros que saíram daqueles abertos por nagoenses e
que podem ser considerados nagô de terceira ou quarta geração, como mostrou Maria do Rosário Carvalho Santos (SANTOS, 1989, p. 37). Apesar da Casa das
Minas continuar sem autorizar a abertura ou reconhecer outro terreiro Jeje, uma de suas dançantes abriu, no Rio de Janeiro, um terreiro que funcionou ali por
algum tempo, adotando a identidade Jeje (PEREIRA, M. 1979, p. 225).
A falta de repasse dos conhecimentos tradicionais, reclamada pelos membros mais novos daqueles terreiros, é também motivo de conflito entre eles e
terreiros de Mina mais novos, ávidos por ampliar seus fundamentos africanos. Talvez porque as chefes e vodunsis das Casas das Minas e de Nagô não
receberam iniciação completa, aqueles terreiros ou alguns de seus sacerdotes não estão acolhendo pais e filhos-de-santo de fora que, em determinado
momento de suas trajetórias, sentem necessidade de iniciação ou de confirmação na religião afro-brasileira, como tem ocorrido em Salvador, Recife e em
outras cidades brasileiras. Na Casa das Minas, fala-se que todos os que pertencem a terreiro têm uma raiz superficial ou profunda e não podem crescer
abandonando essa raiz. A Casa admite que se uma pessoa tinha um vodum de uma nação e em vez de cultuá-lo está há anos recebendo outra entidade, não
tem como desfazer esse erro e passar a receber o seu vodum, pois quando isso acontece ele se afasta dela para sempre.
Além de não estar preparando novas vodunsis e de não autorizar a abertura de outro terreiro Jeje, a Casa das Minas tem rejeitado vários convites para
gravação de CDs e realização de documentários que permitam que no futuro o seu saber seja retomado. No caso da gravação de CD, além da afirmação de que
a sua música tradicional não pode ser tocada em qualquer momento e em qualquer lugar, a Casa considera-a uma exclusividade sua e, embora não faça nada
para impedir que sejam cantadas por outros terreiros, não aprova tal procedimento. É preciso lembrar que a Casa não acredita na vinda, em outras casas, da
maioria dos voduns nela assentados. Por essa razão, procura evitar que seus cânticos e rituais sejam documentados, pois sabe que, de posse de tal
documentário, fica mais fácil alguém se dizer ligado a ela sem ser e, utilizando o seu nome, proceder de uma forma que ela não admite e jamais seria aprovada
pelos voduns. Assegurar esse direito não é fácil, principalmente porque alguns pais-de-santo de terreiros de Mina questionam atualmente tal exclusividade e
reivindicam o direito à herança cultural deixada por daomeanos no Maranhão (FERRETTI, M. 2001).
Apesar do prestígio do Candomblé e do avanço da Umbanda em todo o Brasil e, embora muitos terreiros maranhenses estejam se apresentando como de
Umbanda e incorporando elementos do Candomblé, a Mina - religião afro-brasileira típica do Maranhão - continua dominante na capital e muitos terreiros
maranhenses continuam sendo conhecidos como de Terecô ou de Curador. Mas, como a Mina, além de mais antiga e hegemônica na capital, foi mais estudada,
o Maranhão é sempre lembrado como terra de Mina. No entanto, o Tambor de Mina do Maranhão não é um campo religioso homogêneo. Sua divisão em nações
reflete diferenças culturais existentes entre os africanos que fundaram os primeiros terreiros e também a valorização atual da África em terreiros abertos por
afro-descendentes (como a Casa Fanti-Ashanti).
Como as Casas das Minas e de Nagô foram fundadas por africanas, o que lhes garante uma posição vantajosa no campo religioso constituído pelos
terreiros que se definem como Mina, não é de se estranhar que continuem procurando manter as tradições deixadas por suas fundadoras e que resistam à
integração de elementos de outras tradições (africanas ou afro-brasileiras). Por essa razão, embora existam, fora do estado, casas mais prestigiadas, elas
permanecem únicas e diferenciadas. Também não é de se estranhar que terreiros mais novos que aqueles sejam mais inclinados a mudanças e, quando
fundados por afro-descendentes que se definem como tal, procurem se africanizar absorvendo conhecimentos em bibliografia produzida por pesquisadores e
líderes religiosos ou buscando fundamentos africanos ou maior legitimação fora do estado, em terreiros mais prestigiados (como ocorreu com a Casa Fanti-
Ashanti). A busca de iniciação na religião afro-brasileira ou da confirmação de pais e filhos-de-santo junto a sacerdotes de terreiros mais prestigiados é um
processo bem antigo, principalmente em direção à Bahia. Não sabemos se esse processo ainda vai atingir as centenárias Casas das Minas e de Nagô do
Maranhão, pois, além de muito fechadas e de nelas só as mulheres receberem voduns e orixás, deixaram, há muito, de fazer iniciação completa hoje tão
exigida no Candomblé.
Os terreiros de Mina, Terecô e Cura maranhenses menos africanizados ou menos empenhados na afirmação de uma identidade africana estão
procurando maior legitimação e aceitação na sociedade mais ampla junto à Umbanda, sendo um dos primeiros passos nesse processo a sua filiação à Federação
de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros do Maranhão.
Embora, quando se fala em difusão das tradições religiosas afro-brasileiras do Maranhão para outros estados, só se costume fazer referência à expansão
do Tambor de Mina nas cidades de Belém e de São Paulo - a primeira no estado vizinho do Pará, e a segunda pólo de atração de migrantes nordestino - a Mina
tem chegado também a outras cidades e regiões e tem levado consigo muitos elementos do Terecô, já há muito incorporados a ela em terreiros de São Luís.
Mas, fora da capital maranhense, ela aparece mais frequentemente integrada ou confundida com a Umbanda, devido ao espaço por ela destinado aos caboclos e
ao catolicismo popular e, nos terreiros menos africanizados, ao grande número de músicas cantadas em português e várias outras características encontrados
na Umbanda.
No que diz respeito à preservação e repasse dos conhecimentos tradicionais em terreiros maranhenses, as casas mais antigas concentram o saber na
mão de poucas e essas só procuram repassá-los no fim da vida, o que tem acarretado muitas perdas. A maioria das vodunsis (filhas-de-santo) aprende quase só
o que viram e ouviram em suas permanências no terreiro em períodos de festas e obrigações e, na maioria das vezes, das vodunsis incorporadas com suas
entidades espirituais. Por essa razão, a Casa das Minas tem rejeitado convites, inclusive de órgãos de cultura do Estado, para documentar em discos e vídeos os
seus cânticos e rituais. Por isso, terreiros mais novos e mais influenciados por tradições que não existiam no Maranhão até algumas décadas atrás tem maior
visibilidade na mídia e aparecem ao grande público como os principais herdeiros dos africanos que iniciaram a Mina do Maranhão.
Bibliografia Citada
ALVARENGA, Oneida. Tambor de Mina e Tambor de Crioulo. São Paulo: Biblioteca Pública Municipal, 1948 (Registros Sonoros de Folclore Nacional Brasileiro II).
AMORIM, Cleides Antônio. A Casa das Minas do Maranhão: vozes que calam, o conflito que se estabelece. Dissertação: mestrado em Antropologia Social. UFRS,
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COMISSÃO MARANHENSE DE FOLCLORE http://www.cmfolclore.ufma.br/Htmls/Boletim%2022.htm
EDUARDO, Octávio da Costa. The negro in Northern Brazil, a study in acculturation. New York: J.J. Augustin Publisher, 1948.
FERRETTI, Sergio. Querebentã de Zomadônu: etnografia da Casa das Minas do Maranhão. 2ª ed. ver. Atual. São Luís: EDUFMA, 1996.
MEIRELES, Mário M. Os Negros no Maranhão. In: MEIRELES, Mário M. Dez estudos Históricos. São Luís, Alumar, 1994, p 152-160.
PEREIRA, Manuel Nunes. A Casa das Minas: contribuição ao estudo das sobrevivências do culto dos voduns, do panteão Daomeano, no Estado do Maranhão-
Brasil. 2 ed., Petrópolis: Vozes, 1979. (1 ed., de 1947).
SANTOS, Maria do Rosário e SANTOS NETO, Manuel. Boboromina: Terreiros de São Luís, uma interpretação sócio-cultural. São Luís: SECMA/SIOGE, 1989.
O processo de escravização dos negros no Brasil contribui para que muitos elementos da cultura africana, principalmente a religião – entre elas: a
Umbanda, o Candomblé - se estabelecessem em nosso país; todavia, consoante Silva (1994), ressignificados e sincretizados com elementos da cultura européia
e indígena existente aqui. Portanto, as religiões trazidas pelos escravos africanos incorporaram aspectos de outras religiões presentes no cenário brasileiro,
dando origem às chamadas religiões afro-brasileiras, segundo Lody (1987). O desenvolvimento das religiões foi resultado do contato entre grupos raciais e
sociais formadores da sociedade brasileira; a Umbanda, por exemplo, no Brasil, cultua entidades africanas, caboclos (espíritos ameríndios) e santos católicos,
entre outras.
Conforme Durkheim (1989), a religião é um sistema de crenças e práticas relativas a coisas sagradas que unem pessoas, ou seja, as crenças religiosas
são elementos de coesão de uma sociedade ou grupo, isto é, são elementos de identidade. Os negros reuniam-se em batuques noturnos, nas confrarias, como a
do Rosário, segundo Bastide (1971), nos candomblés, para manterem vivos os costumes e as cerimônias que seus pais lhes ensinaram e que constituíam parte
de sua identidade.
A Umbanda teve sua origem por volta de 1920 e 1930, de acordo com Silva (1989), quando kardecistas de classe média, no Rio de Janeiro, São Paulo e
Rio Grande do Sul, passaram a utilizar, em suas práticas religiosas, elementos das tradições afro-brasileiras. Defendiam o sincretismo ... que comanda a
escolha e depois ordena, dentro de seu quadro, o objeto escolhido. (BASTIDE apud ORTIZ,1994). Assim, por exemplo, Santa Bárbara é Iansã na medida em que
existe uma memória africana que escolhe, entre as santas católicas, aquela que apresenta um elemento analógico à divindade africana: a chuva. Contudo, isso
não significa, conforme Ortiz (1994), que o sistema africano de classificações se confunda com o sistema católico.
As origens afro-brasileiras da Umbanda relacionam-se ao culto às entidades africanas, aos caboclos, aos santos católicos, entre outras divindades. Os
umbandistas, ao identificarem–se com os cultos afro, propunham uma religião brasileira. Essa religião, conforme Silva (1994), representa a necessidade de
conhecimento dos segmentos marginalizados e a acomodação de seus anseios naquele contexto sócio-histórico.
A organização burocrática do terreiro umbandista funciona de acordo com um estatuto da casa que estabelece os cargos, as funções dos membros, os
horários de funcionamento e de atendimento ao público etc. A hierarquia religiosa é formada por um líder espiritual (o pai ou mãe de santo), que é auxiliado
por assessores (cambonos, tocadores de atabaques e outros) e pelos filhos de santo.
Visitamos o terreiro umbandista Uma Luz no meu Caminho e assistimos a um dos seus rituais, a saber: um Toque de Índio, no dia 28 de outubro de
2000. Esse terreiro foi fundado em 20 de janeiro de 1968, localiza-se na rua Paulo Frontin, no bairro Monte Castelo, em São Luís. Suas principais festas são:
São Sebastião, em 20 de janeiro, dia do aniversário de fundação do terreiro; Menino Jesus de Praga, de 28 de abril a 9 de maio, no aniversário de Tóia Zezinho
Floriano – entidade que revelou, segundo a mãe de santo da casa, D. Mariazinha, o nome do terreiro -, quando há somente rezas e não toque (tambores) como
nas outras, e distribui-se alimentos para crianças carentes; Santana ou Iansã ou festejo de Ana Nana Boroquê, em 26 de julho; Santo Expedito, de 21 a 31 de
outubro.
As principais divindades cultuadas do terreiro Uma Luz no meu Caminho são: Oxalá, Cosme e Damião, Nossa Senhora do Livramento, São Jorge, Xangô,
Nossa Senhora da Guia, Santo Expedito, Santana, Nossa Senhora da Conceição, Santo Onofre, São José da Laranjeira, São Benedito, São Sebastião, Menino
Jesus de Praga, Sagrado Coração de Maria, Sagrado Coração de Maria e de Jesus, Oxumaré, São João, Tapindaré e Tóia Zezinho.
A festa para Santo Expedito e o aniversário da entidade Tapindaré realizaram em 28 de outubro de 2000. Todos os filhos e filhas-de-santo
preparavam-se num quarto, no qual se vestiam, conversavam, faziam rezas. A mãe-de-santo estava num quarto privado, onde somente era permitida a
entrada da sua cambono, ou auxiliar, sua neta e suas filhas, também filhas-de-santo.
O salão de dança estava repleto de pessoas sentadas ou em pé, mas o desconforto não era problema diante de uma grande festa. A fé e o ritual
permeavam o coração e a mente de todos. Eram crianças, jovens, adultos e velhos de ambos os sexos. Vieram homenagear Santo Expedito e Tapindaré. Antes
de começar o toque, foram distribuídos folhetos com o retrato do Santo para os presentes. Os abatazeiros começaram a se posicionar em seus devidos lugares:
fitas verde e amarela estava em seus braços e uma pana amarrada do ombro até a cintura nas cores amarela, vermelha e branca.
O toque teve início, aproximadamente, às 22:30h. A mãe-de-santo, vestida de saia e blusa vermelhas com pena na cabeça, fazendo referência à
entidade nela incorporada (Tapindaré), entrou no salão pela porta da frente. Logo atrás dela, as filhas-de-santo estavam com saias nas cores amarela, verde e
vermelha, com uma pana no braço com as cores de suas entidades. Cada uma delas com uma fita na testa. Todos possuíam um cordão de miçangas brancas,
com obrigatoriedade de uso, simbolizando Oxalá, e cordões de acordo com suas divindades de adoração.
Nesse terreiro é permitido dançar na roda no máximo três homens de cada vez. Nesse toque, quatro homens revezavam-se na roda de dançantes de
acordo com o toque para suas divindades de devoção. Cada um usava vestimenta consoante a entidade que homenageava, a saber: a) um filho-de-santo com
as cores verde e amarela e fita vermelha na cabeça e no braço, com pana amarela; b) outro com blusa verde, calça branca e fita verde na cabeça e no braço; c)
um filho-de-santo com calça branca sem camisa e fita verde amarrada na cintura e branca com listas vermelha e verde no braço; d) por fim, um pai-de-santo
de calça branca e blusa vermelha.
A mãe-de-santo posicionava-se de frente para o altar e os filhos-de-santo (mulheres e um ou dois homens de cada vez) estavam em filas paralelas,
também voltados para o altar. Para direita e para esquerda eles dançavam por todo o salão, girando no sentido horário do relógio, com suas belas saias que se
abriam à medida que giravam. Em momentos alternados, os abatazeiros paravam de tocar e cantar para que a mãe-de-santo entoasse um novo canto e o toque
voltasse. Isso se repetiu durante toda a festa.
Em dado momento, faziam um círculo no meio do salão, no qual, um por um dos filhos-de-santo, entravam e dançavam, à medida que as entidades
neles incorporavam. E cantavam:
Os abatazeiros exclamavam com maior intensidade, em muitos momentos, Obatá, que, segundo os fiéis, significa pedido de força para a entidade com a
finalidade de continuarem firmes no toque até o seu término. Eles se revezavam para descanso e para tomar uma bebida denominada Jurema ou bebida de
caboclo, feita da folha da jurema ou de gengibre ardoso(ver receita de gengibirra), afirmou-nos a mãe-de-santo do terreiro. A bebida serve para renovar as
forças e aliviar a garganta.
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No fim do toque, todos em fila saíram do salão, sendo a mãe-de-santo a última pessoa da fila, para uma outra sala, na qual, encontravam-se duas mesas
decoradas, com bolos e artesanato do Pará, e caboclos de pena. A mãe-de-santo posicionava-se ao lado de uma das mesas e todos cantavam parabéns para a
entidade Tapindaré. No salão continuavam os abatazeiros tocando os tambores e cantando. A festa se estendeu até o amanhecer por volta de cinco horas.
As festas religiosas, sejam elas das religiões afro-brasileiras ou cristãs, reforçam a crença específica de um dado grupo em determinadas divindades.
Cada comunidade religiosa cria e recria, segundo Durkheim (1989), as formas de manter e consolidar na consciência coletiva os seus mitos e ritos, visando
reforçar os seus laços de identificação, ou seja, a coesão do grupo.
Os negros lutaram e resistiram ao processo de desagregação religiosa que a escravização lhes impunha, para poderem expressar seus valores e hábitos.
O protesto religioso foi, conforme Bastide (1971), um protesto racial. As religiões afro-brasileiras são formas de resistência cultural contra o massacre
dominante dos brancos e as festas reforçam essa identidade.
Bibliografia
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo. Paulinas. 1989.
BASTIDE, Roger. As religiões africanas no Brasil. São Paulo. Pioneira editora. 1971
LODY, Raul. Candomblé- religião e resistência cultural. São Paulo. Ática. 1987.
MONTES, Maria Lúcia. Raça e identidade: entre o espelho, a invenção e a ideologia. In: SCHARWZC, Lilia e QUEIROZ, Renato S. Raça e diversidade. São Paulo.
EDVSP.1996.
ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo. Brasiliense. 1994.
SILVA, Vagner Gonçalves da. Candomblé e umbanda – caminhos da devoção brasileira. São Paulo. Ática. 1994
A festa do Divino Espírito Santo, celebração religioso-profana, de início praticada pela nobreza e pela gente rica, chegou mais tarde à população mais
modesta, que dela se apropriou. Parece ter tido origem numa instituição criada por Oto IV, Duque da Baviera, para socorrer os pobres de seu império, arrasado
pela fome, no século XIII, daí espalhando-se pela Europa, para chegar a Portugal em 1296.
Segundo Marcelino Lima (Anais do Município da Horta) [Açores], existiam na Alemanha associações de beneficência sob a invocação do Espírito Santo,
destinadas a socorrer os indigentes em ocasiões de penúria. Em França, no ano de 1.160, fundou-se a Ordem do Espírito Santo, que se dedicava ao exercício da
caridade para com os pobres e doentes.
Câmara Cascudo chama a atenção para o fato de que as marcas do travestimento imposto pela igreja aos antigos cultos agrários foram por muito tempo
perceptíveis: o Mês de Maria veio substituir as festas a Afrodite, quando os portugueses penduravam nas portas das casas as giestas para comemorar o
reflorescimento da natureza e a fartura. Desde D. João I, em 1385, comemorava-se o Divino Espírito Santo propositadamente no mês de Maio como um
substituto da Maia, festa popular portuguesa celebrada a 1o. de maio, que caiu em desuso no século XIX, por proibição governamental.
Foi a rainha Isabel, a Rainha Santa, canonizada pelo Papa Urbano VIII em 25 de maio de 1625, quem iniciou em Portugal o culto, com a construção da
igreja do Espírito Santo, em Alenquer, ainda no século XIII.
De começo nada mais era que um simples bodo, distribuição de esmolas aos pobres, alegria caridosa e não bailarina, na expressão de Câmara Cascudo.
Assim, com sentimento de profunda religiosidade por parte de reis, e depois de nobres, tiveram início estas festividades, com a permissão para que se fizesse
uma réplica da coroa portuguesa – a Coroa Real do Divino Espírito Santo.
Outros, porém, afirmam ter sido em Coimbra o princípio, e se deu quando D. Diniz (9-10-126 / 7-1-1325) fez sentar no trono real um mendigo e
coroou-o, servindo-lhe o próprio rei de condestável e os cavaleiros da corte de pajens e escudeiros, cerimônia presidida pelo Bispo de Coimbra, enquanto era
cantado o Veni Creator Spiritus. E ainda Francisco Brandão, em sua Monarquia Lusitana concordando que a rainha Isabel o instituiu, afirma que foi em Cintra e
não em Alenquer, o que, afinal de contas, não tem grande importância. Antigos cronistas, como Frei Manuel da Esperança (História Seráfica) e o Bispo D.
Fernando Correia de Lacerda, confirmam a origem em Alenquer.
Paulatinamente o costume estendeu-se a todo o território de Portugal, para fixar-se especialmente das ilhas dos Açores, dado o isolamento em que por
muito tempo esteve aquela região. Todavia, tendo origem no continente, ainda permanece vivo em Portalegre, Marvão e Nisa, Cardigos e Beira Baixa.
A pia instituição veio aos Açores trazida pelos capitães-donatários, devotos e crentes da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, os nobres, os
navegantes e o povo agrícola e artífice que se estabeleceram nas diversas ilhas. Introduzida pelos primeiros povoadores, em meados do século XV, discute-se
se ocorreu inicialmente em Santa Maria, a primeira ilha descoberta e povoada, ou na Terceira, com os primeiros colonos, questão esta, aliás, irrelevante.
Ao que parece, o aparecimento de tais festas verificou-se na ilha de Santa Maria, a primeira povoada, onde se construiu uma ermida sob tal invocação.
Em Angra do Heroísmo, no coração mesmo da Ilha Terceira, tem lugar, em 1492, a criação do Império dos Nobres; em Vila Franca do Campo, na ilha de São
Miguel, por motivo do terremoto de 1522, inicia-se o culto, com a exposição das coroas dos nobres sobre estrados forrados com as mais belas colchas, e na ilha
de S. Jorge, um violento abalo de terra faz surgir a devoção.
As festas, como as vemos ainda hoje, datam do século XVII, com D. João IV, fundador da dinastia de Bragança, quando do início da Guerra da
Restauração, que libertaria Portugal do jugo espanhol, de 1640 a 1668. Mas quem popularizou o título de imperador foi Carlos V, Imperador do Sacro Império
Romano (24-2-1500 – 21-9-1558), genro de D. Manuel, o Venturoso.
A coroa do Imperador do Divino, tão divulgada nos domínios insulares portugueses e impositivo da autoridade divina simbólica, é a velocidade inicial que
irá influir em todos os folguedos brasileiros onde existir personagem coroado. (C. Cascudo).
As festas do Espírito Santo, tradição nos Açores, pouco a pouco foram chegando às camadas populares, com os primitivos povoadores, vindos do
continente. Decorrem do Domingo da Pascoela (imediato ao domingo da Páscoa) ao dia de Pentecostes e até ao Domingo da Santíssima Trindade e são formas
do cumprimento de promessas para agradecer as graças recebidas; naturalmente diferentes em seus rituais, de um lugar para outro. Nos Açores,
caracterizam-se pela existência de um Império e a respectiva Irmandade. O império (Com o desenvolvimento da festa a palavra império passou também a
designar a corte do Imperador, isto é, os personagens participantes – imperador, mordomos, etc.) é uma construção semelhante a uma ermida, ostentando na
fachada uma espécie de frontão triangular onde está esculpida uma pomba ou coroa, e destinada exclusivamente a louvar o Espírito Santo. Na Ilha Terceira,
estes pequenos edifícios alcançam maior brilho com criações decorativas e elaborados esquemas cromáticos. No seu interior, ergue-se o altar onde a coroa,
enfeitada com flores, brilha à luz das velas - o símbolo maior da festa juntamente com o cetro. Ao lado do império, fica um outro edifício, a despensa de onde
saem cestos de pão de cabeça e cântaros de vinho. Às pessoas respeitáveis e aos forasteiros oferecem-se rosquinhas fofas de pão doce, a massa sovada.
A coroa, toda de prata, é insígnia da realeza do Imperador; possui quatro ou seis braços imperiais e tem como arremate, no topo, uma pomba. O cetro,
também de prata, compõe-se de um punho (onde se amarra um grande laço de fita) e uma haste de uns 40 centímetros, aproximadamente, igualmente
enfeitado com flores e fitas.
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(As varas são insígnias dos mordomos, ou vereadores, e dos convidados ilustres – respectivamente vereadores da coroa e vereadores da bandeira,
aqueles mais categorizados do que estes.) Mordomos são os irmãos escolhidos ou eleitos para a festa e pajem da coroa, ou vedor é o que conduz a coroa,
coloca-a, ou tira-a, da cabeça do Imperador e lhe dá o cetro a beijar.
Após a missa solene, no domingo, procede-se à coroação do Imperador (normalmente uma criança) e nova procissão leva todos à sede do Império, onde
se fará a distribuição da comida, enriquecida, adornada e alterada em termos de forma e tamanho: grandes pães ou roscas, vésperas (Vésperas – Bolos
marcados com o símbolo do Espírito Santo: coroa, pomba, flor, etc.) etc.
Nesta refeição comunitária são servidas as sopas do Divino Espírito Santo, o que implica no sacrifício de um bovino para sua confecção: o pão de trigo é
colocado em terrinas onde é despejado o caldo da carne cozida em caldeirão de ferro, temperado com hortelã e canela. De acompanhamento podem ser
servidos legumes. Em alguns lugares há um segundo prato que consiste em carne assada acompanhada de massa sovada. Como sobremesa também a massa
sovada, o arroz doce, e, em São Jorge, os coscorões.( Coscorões – Filhós doces). A refeição é regada com vinho de cheiro. O almoço oferecido aos Irmãos, suas
famílias e à população, preparado pela mestra da função, e oferecido de toalha ao pescoço pelas moças, revela o sentimento da solidariedade, da caridade e da
esperança.
A par do caráter religioso da celebração há a parte profana, antigamente a cargo dos foliões, que cantavam loas ao Espírito Santo ao som de viola,
pandeiro, rabeca, tambor e ferrinhos (Ferrinho – triângulo ), conduzindo uma grande bandeira de tecido vermelho, tendo bordada uma pomba de asas abertas,
hoje substituídos pelas bandas filarmônicas.
Os foliões tiveram origem nas festas pagãs. Na Grécia antiga, nas bufonias, celebrações em honra de Júpiter, nas quais se sacrificavam bois,
distribuindo-se a carne pelos necessitados, os bufonos eram os matadores dos bois. Tal designação veio através dos tempos a resultar em português na palavra
bufão, significando jogral, bobo, folião. Assim, os foliões do Divino, nos Açores, em número variável de uma ilha para outra, eram pessoas que se divertiam (e
divertiam os demais) usando indumentária própria, a mais freqüente e característica, uma opa de chita estampada e uma mitra idêntica, na cabeça.
Outro aspecto interessante é, também, a competição acirrada dos partidos, todos empenhados em fazer coroação de estalo: terroristas versus saiotes,
animados por altercações e briguinhas quizilentas (que) não só enchiam os cavacos de tenda, sociedades de recreio, adro e barbearia, como adornavam o
falatório das mulheres, disparado de janela a janela e barrelado nas pias do chafariz , conforme a deliciosa descrição da festa, feita por Àlamo Oliveira.
(Terroristas, os rebeldes, liderados pelo ex-presidente da Junta, Antônio Cana-Verde, tidos como excomungados; Saiotes, os obedientes ao padre, almas
de eleição.Tudo por haver o bispo proibido bailes e jogos e obrigado as comissões do Império a prestar-lhe contas do dinheiro arrecadado, dos quais tirar-se-ia
uma percentagem para os fundos diocesanos. – O Espírito Santo não é de igreja! É da gente! Dizia o Cana-Verde arrebanhando adeptos. Do enfrentamento
nas ruas resultou terem os terroristas inutilizadas as fardas dos músicos, os instrumentos amassados; no dia seguinte tomaram vingança os saiotes
destroçando os belos vestidos de tule e lantejoulas com que se preparavam as meninas para rivalizar com o luxo das fardas brancas de botões dourados da
banda dos adversários).
O Ti Francisco Florindo diz que, hoje, as festas do Espírito Santo, na freguesia, já não têm sabor. Falta-lhes o sal dos partidos e a pimenta das brigas.
Festa da nobreza, o povo dela apropriou-se e foi-lhe produzindo modificações, existindo hoje variantes de ilha para ilha e até de freguesia para
freguesia. As diferenças estendem-se também quanto aos instrumentos: em S. Miguel usam rabeca, viola de arame e sistros (chocalhos); noutras localidades,
tambor e ferrinhos; em Santa Maria, Flores e Corvo, testos, que são uma espécie de pratos metálicos.
Cada folia tem uma bandeira com a pomba do Divino e um dos que trazem pandeiro puxa a cantiga, quase sempre improvisada, que os demais repetem.
Tais cantigas costumam ser não só de devoção religiosa como de jocosa crítica social.
Na ilha do Faial, em 24 de abril de 1672, por ter o povo sobrevivido a uma violenta erupção vulcânica, nasceu o Império dos Nobres, que tomou a si a
obrigação de distribuir esmolas todos os anos enquanto o mundo durar; desde então a Câmara promove a procissão que, saindo da igreja Matriz, recolhe-se à
igreja da Misericórdia, onde se canta a missa com sermão a que assiste a edilidade, fazendo-se gasto e despesa à custa dela, em ação de graças.
Antigamente fazia-se uma arramada no meio da rua (posteriormente substituída pelo Império, do qual já tratamos) e no teatro (tablado abrigado do sol
por uma cobertura de ramagens) expunha-se a coroa, oferecendo o Imperador um jantar aos Irmãos. Debaixo da ramada fazia-se a distribuição das esmolas.
Mas os excessos que os ricos introduziram na festividade tornou-a inacessível aos remediados, que não podiam imitá-los, esquivando-se à obrigação de
imperadores. Estabeleceu-se, então, que o imperador seria obrigado a contribuir com tudo o que fosse necessário para o serviço de sua mesa no teatro, mas tal
se fundasse em um só serviço de doce, e no que respeita às esmolas que o dito imperador deve dar aos pobres, de pão não será menos de um moio de trigo,
carne proporcionada ao dito pão repartido em esmolas, e não terá obrigação de contribuir com mais cousa alguma.
Em 1597 mandou El-Rei acabar com as festas de bodo, pois diversos imperadores gastam com elas o que não têm, sujeita a desobediência à pena de
multa.
No desempenho das várias funções relacionadas ao desenvolvimento da festa serviam como copeiro, trinchante (ou viador) e porta-estandarte, pessoas
gradas como o capitão-da-guarda e oficiais da milícia, que conduziam as lanternas e pegavam as varas do pálio. Algumas festas deixaram registro na história
como as promovidas pelo cônsul francês Sérgio Pereira Ribeiro, em 1812; a do morgado Jorge da Cunha, em 1822 e 1831; da baronesa de Alagoa, D. Francisca
de Paula. Nesta, feita em cumprimento de uma promessa, quando da prisão política de seu marido, coroou seu filho José, servindo de pajem o outro filho,
Manuel. Vestiram-se doze pobres; o bodo foi abundantíssimo e pejada de iguarias a mesa do teatro. A residência do morgado, que era ali mesmo, esteve
engalanada de ricas colgaduras e de bandeiras. Houve um baile esplêndido, que ficou memorável e também iluminação em toda a rua da Misericórdia. (Anais
do município da Horta, Marcelino Lima).
Outra vez, porém, o Império esteve a extinguir-se por não haver quem quisesse ser Imperador, mesmo porque o jacobinismo de então achava que o
progresso implicava na libertação das peias religiosas. Em 1825 a Câmara determinou que não se fizesse despesa com império e foliões, o dinheiro arrecadado
fosse todo distribuído aos pobres, ao fim da missa. Mas, doze anos depois, já a Câmara devolvia a promoção da festa ao Império de Reconhecimento e
Beneficência.
A República, toda entufada de critério, atirando vassouradas a velharias e praxes, e o Município, seu digno representante, repudiaram afanosamente o
compromisso dos antepassados, feito numa hora sagrada de penúria e de angústia, expressão da mais pura beleza moral – a Caridade. (...) Presentemente é de
novo a Câmara, regressada ao bom senso, que se incumbe da festividade religiosa e serviços do império, contribuindo de mãos dadas com alguns particulares
para as despesas do bodo. Normalmente distribuem-se 800 a 1.000 esmolas.
Mas de significação em significação, o Império dos Nobres, a não ser o pão e a carne que dá, já pouco, muito pouco representa do que foi no início.
No Domingo de Pentecostes – o primeiro Domingo do Espírito Santo, depois que a coroa e o cetro são impostos a uma criança, ou ao imperador, é
distribuído pão e vinho a toda gente participante. Esta partilha em lembrança de que todos são iguais perante Deus é também o cumprimento de uma
promessa, promessa que ao invés de sacrifício é de alegria. O próprio Imperador, ao contrário dos habituais poderes terrenos, recebe por um dia, não o direito
de ter benesses, mas o formidável poder de dar a todos.
Festejos como estes e irmandades como estas existiram na Europa Medieval, nomeadamente na Itália, França e Espanha. Em Portugal foi a própria
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realeza a apoiar os festejos e as esmolas dadas. Mas, se até mesmo nos inícios do século XIX há ocorrência de festas em diversos pontos do país, estas se
desvaneceram a ponto de hoje se pensar que são caracteristicamente açorianas e nada mais.
Um estandarte abre o cortejo da coroação empunhado pelo alferes; o pajem conduz a Coroa numa salva de prata, ladeado por quatro vereadores que
sustêm as varas ornadas com flores artificiais. Tais emblemas conservam-se cada uma das sete semanas em casa de um imperador para serem expostos no
domingo e na segunda-feira do bodo, no império ou teatro. A sexta-feira é chamada dia do bezerro; no sábado faz-se a distribuição das esmolas e o domingo é
o domingo da coroação. No terreiro, os lavradores reúnem seus carros de bois, cobertos de sebes de toldo e moças distribuem os serviços de alfenim, de
espécies e de limões.
Receber o Espírito Santo em casa é uma honra e uma alegria. Da casa sai um grupo de moças e senhoras ao encontro do cortejo, sobre o qual lançam
pétalas de flores. Ao meio da sala está armado um trono com sanefas, onde ficarão expostas as insígnias – a coroa e o cetro. Durante sete dias reza-se o terço,
seguido de um serão de descantes e folguedos.
Na sexta-feira, chamado dia do bezerro, sacrifica-se um boi, que chega enfeitado de fitas e flores, em cumprimento de promessa, recebido com a
cantoria do Pezinho (Pezinho – Canto e dança do folclore português ) pelos tocadores de viola e os afamados repentistas – a Folia dos Bezerros. À porta do
imperador obriga-se o touro a ajoelhar-se para ser tocado na testa com o cetro, depois do que é sacrificado e a carne distribuída em esmolas de quilo ou
meio-quilo, dispostas em pratos ao lado de pães de cabeça, com uma flor espetada, em cavaletes atoalhados em frente da porta do imperador, na tarde de
sábado. Os contemplados são os pobres do lugar.
No domingo, depois da missa, realiza-se a coroação, e nas cidades o pároco tem que esperar dois ou mais cortejos antes de subir ao altar. Vem à porta
do templo para recebê-los e aspergi-los. Coroadas as crianças designadas pelos imperadores ao som do Veni Creator, o padre acompanha-os de novo até o
adro, entoando o Magnificat.
Findas as festas, reorganiza-se o cortejo, o Imperador coroado à frente, de volta para casa, onde se processa a descoroação, seguida do jantar e, pois, a
mudança, de que já falamos, isto é, a entrega das insígnias ao próximo imperador.
À porta do Império procede-se o leilão das promessas (galinhas, pombos, coelhos, bezerros, etc.) cujo produto reveste em favor da festa do bodo, mas
onde também aparecem ex-votos (braço, perna, cabeça, etc.) feitos de alfenim e correspondentes às partes afetadas pelas doenças, e procede-se à extração do
pelouro. É o fim da festa e o recomeço dela.
O Espírito Santo continua a ser a mais intensa e castiça afirmação comunitária da existência nas Ilhas dos Açores. Sob o ponto de vista exterior
verificam-se as procissões, as danças, os banquetes; quanto ao religioso, as penitências, obras de caridade (os petitórios, as esmolas) refletem a fé robusta das
gentes, a vivência espiritual das orações.
Estas são, em traços gerais, as comemorações açoreanas ao Paráclito, descrição baseada nos textos do Dr. Francisco dos Reis Maduro Dias, entre outros.
O Terreiro do Justino é uma casa de Tambor de Mina fundada em 10 de agosto 1896 por Maria Cristina, filha-de-santo da Casa de Nagô, que resolveu
abrir seu próprio terreiro quando aquella Casa fechou por um certo período. Na capital maranhense, apenas 02 Casas de Mina fundadas por africanas de nação
(nascida na África) conseguiram sobreviver até os nossos dias: a Casa das Minas Jeje e a Casa de Nagô. Sendo mais antigas e prestigiadas, essas Casas
exercem grande influência, principalmente, nos terreiros do perímetro urbano fundados há mais tempo(Mundicarmo Ferretti, 39, 1985).
O terreiro localiza-se no bairro da Vila Embratel desde a sua fundação, quando o local era de difícil acesso e se chegava lá apenas de canoa, pois na
frente do sítio existia um rio. É conhecido como Terreiro de Justino porque esse era o nome do marido de Maria Cristina e o local é chamado de Santo Antônio
do Monte Alegre. Veio ter o nome de Casa Fé, Esperança e Caridade já na atual gestão, quando a chefe começou a realizar seções de Mesa Branca.
A Casa teve, até os dias atuais, 04 mães-de-santo: Dona Maria Cristina, fundadora da Casa que morreu (Dona Mundica não lembra por quanto tempo
Dona Maria Cristina governou a casa e em que ano ela morreu. Mas segundo soubemos em conversas com estudiosos, ela teria morrido entre os anos de 1945
a 1947.) com 130 anos e tinha como chefe, Averequete; Dona Antônia da Silva Raposo (A chefe da casa não lembra qual o ano de falecimento de Dona Antônia
da Silva Raposo.), que governou a Casa por sete anos e tinha como guias Averequete e Joãozinho; Dona Otávia Enedina Serrão (dona Tatá), que chefiou a
Casa por 27 anos, faleceu em 1979 e tinha como guias Rei do Junco, seu Salineiro e Averequete; e Dona Raimunda Venância Sousa Viegas, chefe da Casa
desde 1979 que tem como chefes Joãozinho e Bárbara Soeira, como contra-guias Salineiro (que costuma descer todas as terças-feiras para conversar e fumar
charutos de rico) e Iemanjá e como contra-chefe Rei Sebastião, que Dona Mundica descreve como forte, bom, corajoso, de força e chefe de todas as Gumas.
Além destes, recebe Averequete, Nenê e outros.
O chefe da casa é Averequete e por isso todas as chefes recebem essa entidade. O local onde está localizado o terreiro é registrado no nome de dona
Antônia da Silva Raposo (segunda chefe), que o comprou (legalizou) quando ainda era somente filha-de-santo e Dona Maria Cristina era a chefe.
As festas mais importantes da casa são as festas do Divino e de São Benedito. Além das festas de seu calendário (ver quadro), a casa realiza sessão de
Mesa Branca duas vezes por mês no horário das 19:00h. Esse ritual foi iniciado no terreiro somente quando Dona Mundica Estrela passou a chefiá-lo, há mais
ou menos 20 anos.
O terreiro tem 51 filhas-de-santo, sendo que somente 17 estão participando das atividades do terreiro. Das 34 filhas afastadas, duas estão no Rio de
Janeiro; duas em São Paulo; cinco em Belém; uma em Brasília; e uma em Imperatriz. Algumas dessas filhas dançam em terreiros das cidades onde residem,
mas sempre que vêm a São Luís participam de atividades no terreiro do Justino. Das demais, oito senhoras da casa trocaram o Tambor de Mina por religiões
evangélicas e 17 estão afastadas do Terreiro, mas a Chefe não sabe o motivo desse afastamento.
A última senhora que passou por todo o processo de iniciação foi Dona Raimundinha em 1980, e desde esse período não houve mais iniciação, mas
somente firmeza de algumas senhoras para dançarem no terreiro. Dona Mundica nos disse que esse é um ritual com proporções menores que a iniciação e
serve para esperar enquanto a pessoa se decide pela iniciação. Como isso não tem acontecido, algumas filhas-de-santo da casa estão somente com a cabeça
firmada no terreiro.
Apesar de um grande número de mulheres estarem afastadas do grupo, a Casa tem conseguido realizar todas as atividades e continua sendo um dos
Terreiros de Tambor de Mina mais antigos de São Luís, pois tem 105 anos de existência e uma longa história de resistência e tradição, como outros antigos
terreiros de São Luís.
Raimunda Venância Sousa Viegas, mais conhecida como Mundica Estrela, tem 75 anos. Nasceu no bairro do Itaqui, em São Luís, e, desde criança (oito a
nove anos) recebia invisível e tinha algumas visões, razão pela qual sua mãe levou-a ao terreiro de Dona Maximiana.
Quando lá chegaram, Dona Maximiana pegou na mão de Dona Mundica e disse: Essa menina é de nascença, não tem quem tire; e ela é de linha de
chefe. Voltaram para casa e não mais falaram nisso, pois sua família não acreditava.
Anos depois, quando estava com 13 anos, foi convidada por suas vizinhas para ir assistir a um toque no Terreiro do Justino, que ficava perto de sua
casa. Quando chegou, sentiu medo de entrar e, depois que entrou, sentiu medo de sentar, mas sentou em cima de um baú de Dona Maria Cristina, que estava
num canto do salão, e, de repente, caiu e ali dançou a noite inteira, pela primeira vez, com Bárbara Soeira. No outro dia, pela manhã, foi até a casa de suas
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vizinhas e pediu que elas fossem ao terreiro entregar o pano que ela usou na cabeça na noite anterior. As vizinhas responderam que não poderiam fazer isso e
que somente ela poderia devolvê-lo. Então ela se dirigiu ao terreiro e novamente caiu e dançou a noite toda. Essa foi a sua primeira experiência na Mina.
Meses depois, quando já morava no Centro, na rua Cândido Ribeiro, tinha uma vizinha que se chamava Conceição e foi com ela a uma cura e a uma
matança de boi. Quando chegou na cura, assim que Dona Conceição começou a cantar, Dona Mundica caiu e foi agarrada por Dom João. Depois de mais ou
menos uma hora ele saiu e ela passou a noite inteira dançando com Joãozinho. No outro dia, Dona Mundica soube que tinha caído e que tinha recebido Dom
João, chefe de Dona Conceição.
Depois desse episódio, Dona Conceição falou que precisavam começar a iniciação de Dona Mundica e esta respondeu que não queria e que se um dia
tivesse que ser iniciada seria no Terreiro do Justino, onde dançou pela primeira vez. Depois disso passou 13 anos sem pisar num terreiro e, quando foi visitar o
Terreiro de Geninho, Dom João quis lhe pegar novamente, mas ela logo se retirou. Nesse período, sem ir a terreiros, ela começou a receber em casa o caboclo
Salineiro. Ela nos disse que ele chegava quando ela menos esperava, fazia compras, tomava cerveja e rasgava todo seu vestido.
Depois de alguns anos, quando já estava com 26 anos, retornou ao Terreiro do Justino, conversou com a chefe, que na época era Dona Otávia, e
marcaram sua preparação na Mina e na Cura. A chefe do Terreiro do Justino lhe deu uma lista de material e marcaram o dia do retorno de Dona Mundica para
sua preparação. Ela estava casada e, como seu marido não gostava, falou para ele que iria no Terreiro tomar um purgante e teria que ficar lá por 40 dias.
Depois de 10 dias, seu marido, preocupado, foi até o Terreiro procurar pela esposa. A chefe o recebeu e lhe disse que Dona Mundica estava no quarto purgado,
que eles poderiam conversar, mas ele não poderia tocá-la. Quando conversavam no quarto, seu chefe apareceu e disse para ele que ela estava ali para ser
preparada na Mina e não para tomar purgante. Dona Mundica então falou a verdade e ele aceitou, pois sempre soube que ela tinha essas coisas. Nesses 40 dias
(Estas são as únicas informações que obtivemos a respeito da iniciação, pois este é um ritual secreto.), ela ficava trancada no quarto e somente nos 10 últimos
dias ia às outras dependências da casa para conversar com Dona Otávia, quando não tinham pessoas estranhas (visitas) na casa.
Dona Mundica já estava iniciada na Cura e na Mina quando: comecei a ver astros, espíritos e guias; eu morava na Vila Embratel e era lá que via
espíritos dando passes e tinha visões. (Depoimento colhido em 06/12/2001).
Um dia ela estava no Terreiro contando para a mãe-de-santo sobre essas visões quando sentiu novamente a presença de espíritos. Dona Otávia, a chefe
da Casa, então lhe disse que ela pertencia ao astral e que iria levá-la numa sessão astral. Até então não se realizava sessão e não se tinha contato com Mesa
Branca no Terreiro do Justino. Passaram-se três meses e Dona Tatá (Dona Otávia) não mais falou em levá-la a uma Mesa Astral como havia prometido. Por
isso, a própria Dona Mundica foi a uma Casa de umbanda que ficava perto da Casa de Jorge Babalaô.
Quando chegou nessa Casa, a mãe-de-santo, cujo nome não se lembra, lhe disse: Problema? A senhora não tem problema nenhum. A senhora tem
poder pra botar sessão. Dona Mundica então lhe respondeu que queria alguém para resolver seu problema e não queria botar nada.
Decidiu então não retornar àquela Casa e foi procurar Dona Totó, que tinha um terreiro de tambor e fazia sessão no bairro da Coréia. Convidou outra
dançante da Casa para lhe acompanhar. Quando chegaram à Casa de Dona Totó, esta as recebeu, ouviu Dona Mundica e lhe disse para retornar no Sábado, às
16:00h, pois esse era o dia de Mesa Branca. No sábado, Dona Mundica voltou ao Terreiro de Dona Totó, desta vez sozinha. Assistiu à sessão e nela as senhoras
receberam sete espíritos, que disseram ser os perseguidores de Dona Mundica. Na sessão ela recebeu, pela primeira vez, o seu guia na Mesa Branca: Dom
Pedro dos Astros.
Depois da sessão, Dona Totó lhe passou um remédio e lhe disse que esse remédio deveria ser feito pela própria Dona Mundica, pois, do contrário, não
teria efeito. A partir desse dia, Dona Mundica passou a freqüentar a Casa de Dona Totó todos os sábados durante mais ou menos um ano. Depois desse período,
Dona Totó teve que viajar para o Rio de Janeiro e por isso a Mesa Branca foi suspensa.
Nesse período de suspensão da Mesa Branca na Casa de Dona Totó, Dona Mundica adoeceu. Sentia dores de cabeça fortes e dores nas pernas, chegando
a ficar paralítica por alguns meses. Nisso, Dona Totó retornou, mas como Dona Mundica não andava, não podia freqüentar as sessões como outrora, pois não
tinha como se deslocar até a Casa de Dona Totó.
Dona Totó e Dona Mundica conversaram e decidiram que estava na hora de Dona Mundica fazer sessão na sua residência. Depois que iniciou as sessões,
ficou boa de saúde e voltou a andar novamente. As sessões eram realizadas na sua residência e, quando passou a ser chefe da Casa, em 1979, as sessões
passaram a ser realizadas no Terreiro, pois mudou-se de vez para lá.
Dona Mundica separou-se do marido e depois de três anos foi morar com seu João, amigo da Casa que costumava lhe fazer alguns favores como vigiar o
Terreiro, ajudar nos preparativos das festas etc. Depois de um tempo juntos, casaram-se no civil e no religioso e moram na Casa (Terreiro) até hoje. Tiveram
três filhos, que morreram, e atualmente ela e o marido vivem de aposentadoria e moram sozinhos, mas sempre recebem muitas visitas das filhas-de-santo ou
amigos da Casa.
Dona Mundica dedicou toda sua vida ao Terreiro e nos disse que assim que foi iniciada na Mina, tornou-se o braço direito de Dona Otávia e, às vezes,
passava mais tempo no Terreiro do que em sua casa. Quando mudou-se de vez para o sítio Santo Antônio do Monte, já estava preparada para ser a chefe, pois
Dona Otávia a preparou para isso ao longo dos anos.
Mês Festa
Janeiro Festa para São Sebastião e queimação de palhinhas
Fevereiro Quarta-feira de Cinzas: Bancada de Tobossis
Abril Abertura da tribuna da festa do Divino que acontece com três dias de toque
Junho Festa de São João e São Pedro
Julho Festa do Divino
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Convidamos você leitor para entrar nesta festa e dançar noite a fio, ao som do repicar das matracas, do rufar dos tambores-onça e da vibração dos
pandeirões. Alegremente venha sentir conosco a força e a energia desse batalhão pesado que brinca em São Luís do Maranhão. É o boi da Ilha! Viva São João,
São Pedro e São Marçal!
Para falarmos dessa temática achamos importante fazer um rápido comentário da história do bumba-meu-boi do Maranhão como forma de inseri-lo na
discussão sobre a preservação e sustentabilidade do folclore.
Supõe-se que o bumba-meu-boi tenha surgido no início do século XVIII e que foi muito perseguido até meados do século XX pelos aparatos de repressão
da burguesia, mas conseguiu sobreviver e se manter vivo até os dias atuais.
Pouco se sabe sobre sua história. O que se tem a respeito são alguns registros, uns escritos por cronistas em jornais daquela época, outros relatos
através da memória oral. Observe:
Existe pelo menos uma referência mais antiga, que encontrei num jornal maranhense. Trata-se de uma carta enviada para um jornal no final do ano de
1820, que contém uma breve descrição na qual o bumba-meu-boi era pintado como numa perigosa assembléia indígena noturna (uma maloca de 40-50
pessoas) que tinha tanto o caráter marcial (as pessoas estavam armadas com instrumentos de fogo) quanto o caráter festivo e alegre, e estava explicitamente
associado à ameaça de revolução. (ASSUNCAO, 1999:11).
A Maioba (Bairro da zona rural de São Luis ) hoje tem a felicidade de dizer que é uma brincadeira centenária. Tivemos a felicidade de nos preocupar com
isso. Uma brincadeira tão antiga dita pelos nossos avós, antepassados... Mãe Rita que era maiobeira centenária que lembrava da história, da vivência, né?...
Ela foi primordial nesse ponto porque ela conseguiu ainda bastante lúcida dar depoimentos que realmente foram muito importantes para nós... mãe Rita
faleceu no ano seguinte às comemorações do centenário, em 1998. (Entrevista com o presidente do Boi da Maioba, 2000)
A memória oral e escrita possibilita o resgate da história de uma localidade, de uma manifestação através dos registros e das lembranças de vivências
passadas, que também já foram transmitidas oralmente de outras gerações.
Pois bem, essas referências permitem que façamos uma leitura sobre o bumba-meu-boi, que, embora perseguido e discriminado pela burguesia (em
1861 foi proibido e só foi reconsiderado em 1868, quando o Semanário Maranhense faz saudação a sua volta depois de um período de repressão policial,
(ARAÚJO 1986: 55), conseguiu sobreviver e manter vivo o sentimento de identidade e o fazer coletivamente. Ao chegar ao século XXI, pode-se sentir e
vivenciar o vigor dessa brincadeira na cultura maranhense.
Claro que no decorrer dos séculos houve alterações no bumba-meu-boi, alterações que foram necessárias e inevitáveis, visto que houve também
inúmeras modificações no modo de viver e agir das classes sociais. O boi como parte integrante de uma sociedade dinâmica precisa adaptar-se à realidade, para
poder estar vivo, ou melhor, se atualizar para ser preservado no contexto da sociedade contemporânea.
O presidente do boi da Maioba (2000) coloca: a brincadeira passou por vários estágios, inclusive o início dessa brincadeira na Maioba passou pelo boi de
cofo2 para chegar ao que é hoje.
Éster Marques (2000:7) diz: a atualização deve ser conseqüência natural da tradição, não a fragmentação dela ou a sua recusa, de tal forma que,
apesar das mudanças, nós possamos reconhecer o folguedo como bumba-meu-boi nos próximos 100 ou 200 anos ainda como parte da memória presente.
Tais colocações nos levam a perceber que nesse processo de mudança, determinados aspectos vão se modificando e sendo recriados outros, abrindo um
espaço para as novas produções de acordo com as exigências da sociedade moderna.
Como diz Magnani (1990:121) a cultura não são cultos e costumes, mas as estruturas de significados, através dos quais os homens dão forma as suas
experiências.
Essas experiências são adquiridas no cotidiano pelo sentir fazer individual e coletivo. É através desse fazer que se expressam as realizações humanas
que devem ser respeitadas e preservadas pelas suas significações.
Quando se fala em preservação, queremos dizer que preservar não é só guardar uma coisa, um objeto, uma construção, um miolo histórico de uma
grande cidade velha. Preservar também é gravar depoimentos, sons, músicas populares e eruditas. Preservar é manter vivos, mesmo que alterados, usos e
costumes populares... (PELLEGRINI, 1993:45)
Acrescentamos dizendo que preservar é contar a nossa história para que se conheça e não se torne esquecida. É mostrar e divulgar as nossas festas
para que crie um orgulho cultural nas pessoas. É valorizar as criações, recriações e experiências coletivas.
Preservar é a não destruição do nosso patrimônio histórico, cultural e natural. É fazer com que esse patrimônio se torne sustentável, permitindo que as
gerações futuras usufruam também das riquezas do meio ambiente.
Sustentabilidade significa desenvolver sem degradar, sem destruir os recursos que tornam esse desenvolvimento possível. (Manual da Embratur 1996
:1).
Esse desenvolvimento sustentável possível implica em ações que possibilitem a melhoria da qualidade de vida das classes populares (saúde, educação,
moradia, emprego etc.). É necessário que essas classes tenham condições mínimas de sobrevivência.
No caso específico da cultura popular, muitas vezes acontece o desaparecimento de determinadas manifestações, não pela vontade dos grupos que as
fazem, mas em função das condições sociais e econômicas em que vivem.
O Presidente do Boi da Maioba (2000) fala das dificuldades de sobrevivência do bumba-meu-boi dizendo.
Nós tamos fazendo aí um levantamento para fazer contenção de despesa e essa contenção de despesa vai afetar a brincadeira... porque tá tudo muito
difícil... e as dificuldade na verdade são imensa. Nossa sobrevivência, a sobrevivência da associação é só a venda das cerveja nos ensaio e apresentações. Tem
sido muito difícil... por isso nós antecipamo a nossa temporada, cê vê que a maioria dos grupos só ensaiam 3, 4 vezes, nós ensaiamos 10, 11 até 12 vezes... se
sobra R$ 100,00, R$ 200,00, R$300,00 por ensaio é o que ajuda para nós poder fazer a brincadeira.
Como podemos observar, essa brincadeira que vem sendo passada de geração a geração há mais de 100 anos resiste pela força da cultura, isto é, pela
vivência coletiva que é permeada de significados. As dificuldades dos grupos muitas vezes alteram determinadas formas de produções originais por exigência
das relações capitalistas junto às classes populares, logo as políticas e práticas que sustentam os padrões de vida atual devem ser refeitas porque se baseiam
na deterioração das bases produtivas e da diminuição de sobrevivência das próprias gerações.
No discurso da sociedade contemporânea, a sobrevivência das manifestações populares deve estar baseada na proposta de sustentabilidade. Para que se
concretize essa proposta é necessário estimular ações criando instrumentos de construção de uma consciência coletiva cultural e ambiental.
Essa questão não pode ser vista e tratada isoladamente. É importante a participação da sociedade no seu conjunto, num processo de planejamento e
gestão das políticas onde o gerenciamento dos recursos e ações envolvam a comunidade para que ela se sinta participando do processo e, desta forma, possa
proteger os seus recursos naturais e culturais assegurando continuidade das diversidades existentes nas localidades.
Bibliografia
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ASSUNÇÃO, Matias Rohrig. A formação de Cultura Maranhense. Algumas Reflexões Preliminares. In: Comissão Maranhense do Folclore. Boletim nº 14. São
Luís, 1999.
FERRETTI, Mundicarmo. Terra de Caboclo. Plano Editorial SECMA, São Luís, 1994.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. Patrimônio Cultural. In: Folclore e Cultura Popular. São Paulo: Coordenação de Comunicação Social USP, 1990.
MARQUES, Éster. Tradição e Modernidade no Bumba-meu-boi. In: Comissão Maranhense de Folclore. Boletim nº 17, 2000.
PELLEGRINNI FILHO, Américo. Ecologia, Cultura e Turismo. São Paulo: Papirus, 1993.
Fotografia, arte que tem as suas origens na Grécia e tem como característica maior a capacidade de revelar imagens descritivas de universos humanos,
naturais e artísticos.
Datam do século XVI o aparecimento das primeiras revelações através do enegrecimento do cloreto de prata por ação da luz. Leonardo da Vinci, em seus
estudos científicos, nos deixou uma importante contribuição que serviu de base para os tempos atuais: foram os desenhos retratados numa câmara escura que
seriam revelados através de uma chapa de prata submetida a vapores de mercúrio (daguerreótipo). Isso demonstra o quão foram significativos esses
experimentos para a fotografia.
De acordo com estudos de Sólon Ribeiro, a fotografia popular, denominada ferrotipo, constitui-se uma das modalidades que surgiram a partir do século
XIX vindo contrapor-se às técnicas mais complexas utilizadas até então, verificando-se a sua prática na Europa, Estados Unidos e América Latina.
Por ser uma atividade simples, de baixo custo e de rápida revelação, foi muito utilizada nas festas populares da França, onde instalou-se como elemento
integrante das feiras populares e quermesses.
Essa atividade serviu também como instrumento demonstrativo de divisão da sociedade, haja visto que a fotografia, a principio, atingia somente uma
classe privilegiada.
È certo que não podemos considerar a fotografia popular como uma das mais perfeitas porque as próprias condições de revelação não lhes permite
qualidade total, porém, dentro do contexto das festas populares, estas exerceram papel significativo no universo popular como bem é retratado numa das cenas
do filme brasileiro "Central do Brasil".
No Brasil, a fotografia popular teve um papel importante em quase todo o território nacional, pois não só abrilhantaram as nossas manifestações
populares, como também foi utilizado para outros fins pela população de baixa renda. Nesse contexto, os dois lados beneficiaram-se, pois, os profissionais dessa
arte, sem desmerecer os seus conhecimentos, na sua maioria eram semi-analfabetos e não tinham condições de acompanhar o mercado formal de trabalho.
A característica maior desses profissionais é o seu equipamento, que constitui-se de uma caixa de madeira posta sobre um tripé, lentes, tecido escuro,
papel fotográfico, substâncias de revelação e a luz solar, fator essencial e determinante da sua jornada de trabalho.
No Brasil, esses profissionais foram denominados de "lambe-lambe", sendo que a origem desse nome é bastante controvertida, pois várias versões foram
dadas dentre as quais, citarei algumas: o processo de lavagem das placas de vidro que, devido à rapidez do serviço, alguns fotógrafos utilizavam sua saliva
para limpeza destas; outros atribuem o brilho da fotografia às lambidas do fotógrafo. Outra é proveniente da Praça XV, no Rio de Janeiro, que, no intuito de
arrumar os cabelos dos seus clientes, os fotógrafos besuntavam–os com brilhantina, daí a origem também da expressão cabelo lambido.
No Maranhão, tivemos um bom número de representantes desses profissionais a exemplo dos senhores Abdias, André, Paraíba e José Cordeiro da Rocha,
com quem tive oportunidade de conversar. O seu Cordeiro, como é mais conhecido, tem 74 anos de idade e é natural de Parnaíba / PI. Cursou até a 4ª série do
primário e começou a trabalhar aos 16 anos como comerciário em sua terra natal. Aos 22 anos, a convite de um amigo, o senhor Raimundo foi trabalhar com
fotografia, onde, observando o seu amigo, logo aprendeu. Fascinou-se pela profissão não só pelo ganho do dinheiro mas também pelas conquistas amorosas.
Aos 30 anos, mudou-se para São Luís, onde conheceu o senhor Xavier, fotógrafo lambe-lambe que trabalhava na avenida Magalhães de Almeida, no
Centro da capital, onde alguns desses profissionais fixavam-se. Iniciou o seu trabalho com umas das máquinas do amigo. Não demorou muito tempo, comprou o
seu equipamento passando a trabalhar por conta própria. A partir daí, além da capital, passou a viajar por quase todo o Maranhão, pois eram nas quermesses,
festejos de Santos e nas desobrigas que ganhavam mais dinheiro. Durante suas atividades, ele recorda ter trabalhado para campanhas políticas tirando retratos
não só dos candidatos como também dos seus eleitores, fotos de defunto que a principio tinha medo e que com o tempo acostumou-se.
Uma das características desses profissionais é a sua vida de andarilho, facilitada pelos próprios instrumentos de trabalho que constituíam-se da máquina,
que era desmontada durante as viagens, e os materiais utilizados para a revelação, que eram levados em vidrinhos. O senhor Cordeiro confessou-me que,
algumas vezes, para deslocar-se de um lugar para outro ia a cavalo.
A sua vida de lambe-lambe perdurou até 1999, quando se viu engolido pela tecnologia do mundo atual, concorrendo fortemente com sua maneira
artesanal de trabalhar. Com o aparecimento dos estúdios mais bem equipados e das fotos coloridas, em detrimento das fotos em preto e branco, acentuou-se
ainda mais a brevidade do desaparecimento dos lambe-lambe.
* Historiadora
Desobriga: Peregrinações que os padres faziam realizando missas, casamentos e batizados nos mais diversos povoados do interior do Maranhão. Nessas
desobrigas iam caravanas de vendedores ambulantes, vendedores de comida e fotógrafos lambe-lambe, que se instalavam em frente aos locais dessas missas
para oferecerem seus serviços.
Bibliografia
RIBEIRO, Sólon. Lambe-Lambe. Pequena História da Fotografia Popular. Fortaleza Imprensa Universitária.136p.1997.
Curso de Fotografia. Divulgação Brasileira de Cursos.
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Os passos sacros
Nizeth Medeiros*
São Luís guarda em seu passado muitos costumes e tradições. Alguns já desapareceram enquanto outros continuam vivos na memória do povo e se
renovam a cada época graças à iniciativa de órgãos públicos ou grupos particulares que se organizam no sentido de passarem às gerações mais novas
conhecimentos culturais tão importantes.
Um ritual que desapareceu foi a abertura dos Passos da Quaresma, que acontecia com a procissão do Senhor dos Passos, na Semana da Paixão. A
destruição da imagem do Senhor dos Passos pela ação dos cupins que nela se instalaram foi o principal motivo do desaparecimento desse ritual sacro.
Os Passos eram locais que representavam algumas das Estações da Via Sacra. Externamente tinham a característica de uma pequena capela e
internamente eram constituídos de um altar confeccionado em alvenaria da época onde, além da Estação representada por um quadro, podiam ser observados
adornos de flores, velas e mais alguns detalhes da época.
O roteiro da procissão que saía da Catedral era organizado de forma que, ao longo do percurso, ia passando em frente a cada um dos Passos onde eram
exercitadas reflexões sobre a caminhada de Jesus para o Calvário. No Passo localizado no Largo de São João, acontecia o encontro de Jesus com Nossa
Senhora, momento em que também se ouvia o cântico da Verônica.
Assim, o cortejo ia prosseguindo até que todos os Passos fossem visitados e então a procissão encerrava-se na Igreja do Carmo.
Embora desativados, dois desses Passos podem ainda ser observados na íntegra; são eles o da rua João Vital de Matos, localizado entre a rua da Palma e
a rua 28 de Julho, e o da rua Direita canto com a rua Formosa. Os outros, localizados à rua Grande nº 87, ‘Largo de São João e rua D. Francisco nº 280, estão
transformados em estabelecimentos comerciais.
Notícias
De 18 a 22 de junho de 2002
Curso de Folclore
Oficinas de Trabalho
Oficina 01
Tema: Lúdica Infantil - Aglaé Fontes de Alencar (CSF)
Número de Vagas: 30 vagas
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 02
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Oficina 03
Tema: Marketing Cultural - Severino Alves de Lucena Filho
Número de Vagas: 50 vagas
Local: Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho
Oficina 04
Tema: Das Histórias Tradicionais à Contemporaneidade - Beliza Áurea de Arruda Melo (CPBF)
Número de Vagas: 50 vagas
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 05
Tema: Ritmos e Percussão Maranhense - Arlindo Carvalho e Francisco Pinheiro (MA)
Número de Vagas: 30 vagas
Local: Escola de Música
Oficina 06
Tema: Danças Maranhenses - Cláudio Adão (GDAM - MA)
Número de Vagas: 30 vagas
Local: Escola de Arquitetura
Tarde
Manhã
· Grupos de Trabalho
· Curso de Folclore
Oficinas de Trabalho
Oficina 01
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 02
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 03
Local: Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho
Oficina 04
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 05
Local: Escola de Música
Oficina 06
Local: Escola de Arquitetura
Tarde
Conferência "Evolução dos Conceitos de Folclore e Cultura Popular" - Cássia Frade (CFF)
Hora: 17:00 às 19:00 horas
Manhã
· Grupos de Trabalho
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· Curso de Folclore
· Oficinas de Trabalho
Oficina 01
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 02
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 03
Local: Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho
Oficina 04
Local: Escola de Arquitetura
Oficina 05
Local: Escola de Música
Oficina 06
Local: Escola de Arquitetura
Tarde
· Conferência "Feito a mão: uma discussão sobre artesanato e arte popular" - Gilmar de Carvalho (UFC)
Hora: 17:00 às 19:00 horas
Noites
· Livre para participar de festas nos arraias juninos da cidade de São Luís e programação paralela.
Programação Paralela
· Apresentações de grupos folclóricos
· Lançamento de livros e discos
· Mostra de livros, discos e artesanato
· Exposições de fotografias ,peças e outros elementos componentes do universo do folclore
· Projeção de vídeos e filmes ligados a temática folclórica
Perfil Popular
Nhozinho
Zelinda Lima*
Antônio Bruno Pinto Nogueira (Nhozinho), último filho de uma prole de quatro de Sebastião José Nogueira e Marcolina Pinto Nogueira, nasceu em 17 de
maio de 1904, em Bacuripanã, no distrito do município de Cururupu (MA), e faleceu em São Luís, em 23 de, maio de 1974, no bairro de Alemanha.
Artista excepcional, desde pequeno dedicou-se a fazer papagaios de papel (pipas), animais, árvores etc. Diga-se, porém, que seus papagaios não eram
papagaios comuns; não, eram de desenho caprichado, de quadros, de listras, de estrelas, numa combinação de cores, dignos de tela de inspirado pintor.
Com a idade de 12 anos, começou a manifestar-se a moléstia que lhe deformaria horrivelmente os membros inferiores, braços e mãos, culminando por
sacrificar-lhe irremediavelmente ambas as pernas e uma das vistas, condenado-o a locomover-se em um carrinho de madeira, por ele mesmo fabricado.
Certa vez, já residindo em São Luís, na rua Jacinto Maia, confeccionou 50 costureiros (caixas de guardar material de costura) - encomenda da Loja
Singer. De começo, trabalhava a madeira, passando depois para o buriti, mais maleável, com o qual construiu verdadeiramente sua obra maior - as célebres
rodas de bumba-meu-boi, constantes de acervos de colecionadores nacionais e estrangeiros, do Museu Histórico e Artístico do Maranhão e tendo figurado em
exposição de arte popular realizada no Centro Domus de Milão, na Itália, em 1972.
Comparado ao Aleijadinho, ambos vítimas de mutilações, enquanto o mestre mineiro do Barroco produzia imagens religiosas de grande expressão
dramática em material de maior durabilidade, nosso Nhozinho, no frágil buriti "empenhou-se na recriação visual de tipos populares em festa - caso particular
das figuras do bumba-meu-boi; elementos predominantes no vasto conjunto de sua obra". Porque as figuras do bumba-meu-boi de Nhozinho tinham alma, que
ele expressava nos traços fisionômicos, nos gestos, nas atitudes mais espontâneas e naturais.
A propósito, transcrevemos trecho da entrevista que demos ao saudoso Roldão Lima, constante de seu magnífico livro "Vida e arte de Nhozinho", editado
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- Esse aqui vinha da feira, esse aqui vinha do boi. Eles se encontraram o que tava brincando boi disse:
Então para todos os bonecos que ia fazendo, criava uma historinha, às vezes pro conjunto de três, quatro: eram pessoas conversando, que iam pro boi,
ou que vinham de lá; o amo ralhando com os vaqueiros ou explicando alguma coisa; ou era Catirina brigando com Chico... Ele gostava muito desses dois
personagens, que apareciam de várias maneiras: um homem brigando porque não queria se vestir de mulher para representar Catirina, ou então eram Catirina
e Chico brigando com o Amo, ou com o dono do boi ou eram conhecidas dos brincantes, e por ali se encontravam casualmente.
Por último, Nhozinho conseguiu fazer seus bonecos com um movimento espetacular! As posições eram as mais variadas possíveis: abaixados, com os
braços pra cima, a perna suspensa, copo e garrafa de cachaça nas mãos... Uma riqueza!
Era um artista excepcional mesmo devido ao seu estado físico e emocional - uma pessoa fora de série. Complemente deformado, sofrido. Se esse homem
não fosse doente não sei o que ele poderia fazer!"
Ele tinha a volúpia da minúcia, do detalhe; peças que muito me agradam são as rendeiras, onde ele se extremava, colocando ao lado delas um
banquinho que não tinha mais do que três centímetros e em cima do qual punha uma bilha e um copinho minúsculo!
Dr. Pedro Gomes de Alcântara, engenheiro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, dá o seguinte depoimento:
"Guardei muitas impressões de Nhozinho e tenho minha opinião sobre sua obra. Ele tinha uma grande vida interior. (...) Para mim foi um exemplo
extraordinário de vontade de viver. A vida aparentemente tirou-lhe tudo e ele retribuiu-lhe com essa garra de viver -- expressa em sua imensa obra."
Este o grande, o inolvidável Nhozinho - Antônio Bruno Pinto Nogueira! Que homenageamos com muito orgulho e saudade neste Perfil.
RECEITA DE GENGIBIRRA
INGREDIENTES
1 kg de gengibre
2 litros de água
Açúcar a gosto
MODO DE FAZER
Coloque o gengibre de molho por um período de três dias para facilitar a remoção da pele, que deve ser feita raspando-se com uma faca. Cortar em pedaços
para bater no liquidificador com um pouco de água. Depois de batida, esprema para separar o suco do bagaço com o auxilio de uma peneira. Junte o restante
de água e o açúcar.
Caso fique forte (o ardor) coloque mais água.
Sirva bem gelada
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