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Anexo

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João Flávio / João gregório / Antônio Maximiano /

Nathanael Rinald

CURSO DE

OBREIROS

MÓDULO 02 / CAP. 19
Fabrício A. de Marque

MÓDULO 02 / CAP. 19

São Paulo
IBITEK - Instituto Bíblico Teológico Kenosis
2022
MÓDULO 02 / CAP. 19

Capa / Diagramação: Egnaldo Martins


Instagram: @egnaldomk
Sumário

MÓDULO 02 / CAP. 18:


TEOLOGIA PASTORAL .......................................................................................................5

TEOLOGIA PASTORAL........................................................................................................6

AS FUNÇÕES DO PASTOR..................................................................................................7

A VIDA PESSOAL DO PASTOR........................................................................................15

O PASTOR E O CULTO.......................................................................................................24

CONCLUSÃO.......................................................................................................................31

CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS.........................................................................................32
1. O excesso de atividades pode nos desviar daquilo que é realmente importante. ....32
2. Deus tem mais interesse em quem somos do que em nosso desempenho. ..............33
3. O culto público é uma amostra das glórias do céu. .....................................................33

BIBLIOGRAFIA....................................................................................................................34
MÓDULO 02 / CAP. 19
HERMENÊUTICA BÍBLICA

MÓDULO 02 / CAP. 19 5
HERMENÊUTICA BÍBLICA

Hermenêutica é a ciência da interpretação das


Escrituras.1 A interpretação é uma característica
presente em todas as pessoas, sem exceção. Ainda
que muitos não conheçam as regras técnicas de
interpretação, todos praticam a interpretação,
consciente ou inconscientemente. Engana-se quem
pensa que praticamos a interpretação somente quando
estamos com o livro aberto. Vemos a interpretação em
atividade quando buscamos compreender uma notícia
no jornal ou uma mensagem no celular.
A hermenêutica não é uma disciplina exclusiva
da teologia. Há vários outros tipos de hermenêutica,
pertencentes a outras áreas do conhecimento
humano. Dessa forma, temos a Hermenêutica
Jurídica, Hermenêutica Cultural, Hermenêutica
Fenomenológica, e várias outras.
Algumas perguntas sobre o caráter da hermenêutica
são levantadas. A hermenêutica é somente uma ciência,
ou podemos olhá-la sob outra perspectiva? Grant
Osborne fala sobre três perspectivas da hermenêutica:

Primeira, a hermenêutica é uma ciência, uma vez


que faz uma classificação lógica e ordenada das leis
da interpretação. [...] A segunda perspectiva é a de
que a hermenêutica é uma arte, uma vez que é um
1 ERICKSON, Millard J. p. 91.

6 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


conhecimento que se adquire e exige tanto imaginação
quanto competência para aplicar as “leis” às passagens
selecionadas ou aos livros. É uma arte que não pode
ser simplesmente aprendida numa sala de aula, mas é
consequência de uma prática constante em sua área de
atuação. [...] A terceira e mais importante perspectiva
é a de que a hermenêutica, quando utilizada para
interpretação das Escrituras, é um ato de caráter
espiritual realizado na dependência da direção do
Espírito Santo.2

No presente módulo, falaremos sobre alguns


aspectos particulares da Palavra de Deus que
requerem uma abordagem hermenêutica específica.
Daremos atenção à interpretação literal, contextual,
intertextual, gramatical, histórica e cultural.
Evidentemente, não esgotaremos todo o escopo da
disciplina hermenêutica. Há muitas informações que
ficarão de fora por razões óbvias. Contudo, o leitor
pode buscar aprofundamento consultando as fontes
bibliográficas usadas para compor esse módulo.

A INTERPRETAÇÃO LITERAL

A interpretação literal da Palavra de Deus procura


entender a mensagem conforme o sentido natural
das passagens. Isso não quer dizer que o sentido das
2 OSBORNE, Grant. R. p. 26.

MÓDULO 02 / CAP. 19 7
palavras sempre será literal. Se as palavras exigem do
leitor outro sentido, então deve-se respeitar os limites
do texto e interpretá-lo conforme pretendeu o autor
original.
Isso é importante para não sairmos em busca de
algum sentido “oculto” no texto. Infelizmente, é isso
que faz o método alegórico de interpretação:

Alegorizar é procurar um sentido oculto ou


obscuro que se acha por trás do significado mais
evidente do texto, mas lhe está distante e na verdade
dissociado. Em outras palavras, o sentido literal é
uma espécie de código que precisa ser decifrado para
revelar o sentido mais importante e oculto. Segundo
este método, o literal é superficial, e o alegórico é que
apresenta o verdadeiro significado.3

Na Palavra de Deus, há passagens alegóricas,


como o conhecido texto de Gálatas 4.21-31 em que
Paulo fala que Sara e Agar simbolizam duas alianças.
Mas perceba que a Bíblia fornece uma explicação
detalhada da alegoria, ao invés de deixar que o leitor
busque o significado por si mesmo.
Além de passagens alegóricas, a Bíblia também
possui passagens cujo sentido é figurado. De modo
geral, é o contexto bíblico que fornecerá o caminho
para compreendermos o sentido figurado também.
3 ZUCK, Roy B. p. 34.

8 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


Consideremos ainda o sentido simbólico de
certas passagens bíblicas. O pão e o vinho da Ceia,
por exemplo, simbolizam o corpo de Cristo e o Seu
precioso sangue vertido na cruz do Calvário. O próprio
Senhor mostrou que há um significado simbólico nos
elementos:

“Enquanto comiam, Jesus tomou o pão e,


abençoando-o, partiu-o e o deu aos discípulos,
dizendo: Tomai e comei; isto é o meu corpo. E,
tomando um cálice, rendeu graças e o deu a eles,
dizendo: Bebei dele todos; pois isto é o meu sangue,
o sangue da aliança derramado em favor de muitos
para perdão dos pecados.” (Mateus 26.26-28, A21)

Perceba, mais uma vez, que o significado


simbólico também é dado pela própria Bíblia. Não
temos o direito de atribuir o sentido que julgarmos
mais interessante ou mais “espiritual”.
Diante disso, é importante tomarmos alguns
cuidados quando formos interpretar literalmente
uma passagem bíblica. Hélder Cardin diz que não
devemos interpretar a Bíblia literalmente nas seguintes
situações:4

1. Quando é impossível compreender a passagem


literalmente. O salmista afirmou: “Compadece-te de
4 CARDIN, Hélder. pp. 83-84.

MÓDULO 02 / CAP. 19 9
mim, ó Deus, compadece-te de mim, pois me refugio
em ti; eu me refugiarei à sombra das tuas asas, até
que passem as calamidades” (Salmos 57.1). Você
consegue conceber Deus possuindo asas? É evidente
que Deus não as possui. Neste caso, então, entender a
expressão literalmente não faz qualquer sentido.

2. Quando o próprio texto e as expressões


utilizadas nele demonstram que se trata de um emprego
de figura de linguagem. Jesus disse: “Eu sou o pão
da vida; quem vem a mim jamais terá fome, e quem
crê em mim jamais terá sede” (João 6.35). Será que
Jesus falava sobre fome e sede literais? É evidente que
não. A “fome” é saciada quando as pessoas vão a Ele,
e a “sede” é saciada quando as pessoas creem nEle.
Diante disso, Jesus não pode estar falando literalmente.
O Senhor está falando sobre identificação com Sua
Pessoa, obra e mensagem.

3. Quando o sentido literal, se levado aos seus


efeitos finais na compreensão do texto, exigir alguma
crença ou conduta incompatíveis com a moral cristã
e com as demais passagens das Escrituras que falam
sobre o assunto em questão. Jesus declarou: “Em
verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a
carne do Filho do homem, e não beberdes o seu
sangue, não tereis vida em vós mesmos” (João
6.53). Tomar as palavras de Cristo e interpretá-las

10 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


literalmente nos levará ao canibalismo. Sem dúvida,
essa conclusão é um tremendo absurdo. Sendo assim,
tal possibilidade deve ser descartada.

4. Quando o sentido literal do texto for contrário


ao sentido presumido pelo contexto em que a
passagem se encontra. Jesus afirmou: “Eu sou a
porta. Se alguém entrar por mim, será salvo. Entrará
e sairá, e achará pastagem” (João 10.9). Jesus não
é literalmente uma porta, seja de madeira ou de ferro.
Através dessa figura de linguagem Jesus está dizendo
que Ele é o meio pelo qual uma pessoa encontra
alimento para sua alma.

Assim, a interpretação literal reconhece a presença


de outros elementos na mensagem divina. Muitas
seitas, por não respeitarem os limites da interpretação
literal, cometeram erros grosseiros:

O desafio da interpretação literal é levar-nos


à compreensão do que, no passado, o texto bíblico
quis comunicar para os primeiros leitores, os quais
entenderiam a mensagem sem procurar aspectos
fantasiosos, alegóricos ou ocultos em suas palavras.5

5 Ibid. pp. 79-80.

MÓDULO 02 / CAP. 19 11
A INTERPRETAÇÃO CONTEXTUAL

Todo versículo deve ser analisado dentro de seu


contexto. O contexto é importante até mesmo quando
pensamos em conversas informais. Toda sorte de
absurdos são propagados por causa do abandono
do contexto. Até as conhecidas “Fake News”6, tão
espalhadas pelas mídias sociais, existem devido ao
desprezo pelo contexto. Quando a Palavra de Deus
é interpretada dentro de seu contexto original, a
mensagem divina começa a fazer sentido:

Depois que alguém começa a ler a Bíblia lendo


um livro por vez, rapidamente reconhece que os
versículos tomados fora de seu contexto quase sempre
querem dizer algo diferente quando lidos em seu
contexto. De fato, não podemos fingir que a maioria
dos versículos se entendem sem ter que ler os seus
contextos. Isolar versículos de seu contexto é falta de
respeito à autoridade das Escrituras, posto que este
método de interpretação não pode ser aplicado de
maneira coerente a toda a Escritura. O que este faz
é tomar versículos que parecem explicar, a si e por
si mesmos, porém deixa de um lado a maior parte da
Bíblia, e a faz incapaz de ser usada da mesma maneira.
Pregar e ensinar a Bíblia de maneira que ela nos
convide a interpretá-la – em seu contexto original –
6 Notícias falsas.

12 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


nos explica a Bíblia de maneira precisa e, por sua vez,
provê aos ouvintes um bom exemplo de como estes
podem aprender melhor da Bíblia por si mesmos.7

Muitos já ouviram a frase “texto fora de contexto


vira pretexto”. Isso é muito verdadeiro. Às vezes,
um pretexto é criado sem a intenção de espalhar
uma mentira ou um erro teológico. Contudo, boas
intenções não são suficientes, pois uma pessoa pode
estar sinceramente enganada. A boa intenção não
impedirá que o erro inventado cause confusão.
Por isso, para que interpretemos a Bíblia
corretamente, consideremos, em primeiro lugar,
as esferas de contexto. Quando recebemos uma
mensagem no celular, não lemos apenas a primeira
linha da mensagem. Quando estamos lendo um livro,
não devemos isolar um capítulo e dizer que aquele
capítulo é o todo do livro. Devemos sempre considerar
o contexto maior daquilo que estamos lendo. Muitas
pessoas leem versículos isolados da Palavra de Deus,
sem considerar que aquele versículo possui um
contexto maior.
Além disso, ler alguns versículos antes e depois do
versículo em análise não é suficiente. O contexto que
merece nossa atenção é um pouco mais abrangente.
Considere que cada versículo bíblico se encontra
dentro de um parágrafo maior. O parágrafo maior
7 KEENER, Craig. p. 11.

MÓDULO 02 / CAP. 19 13
se encontra dentro de um capítulo. E o capítulo, por
sua vez, se encontra dentro de um livro inteiro. Daí a
importância de termos uma noção geral de todo o livro
em questão, antes de interpretarmos o significado de
determinada passagem.
Nessa altura, é importante fazer um
esclarecimento. Originalmente, a Bíblia não possuía
versículos nem capítulos. Esse sistema foi criado muito
tempo depois para facilitar a consulta das passagens.
Por isso, não considere os números dos capítulos e
versículos inspirados por Deus. Em algumas Bíblias,
encontramos também títulos no cabeçalho, mostrando
qual é o assunto em questão. Esses títulos também
não são inspirados. Os tradutores colocam esses
títulos para facilitar a leitura da Bíblia. No entanto,
é importante tomar cuidado para que a interpretação
da Bíblia não fique limitada a essas informações. O
conselho que damos é que você leia o livro inteiro, de
uma só vez, para que o contexto maior fique claro em
sua mente.
Outro ponto que devemos dar atenção é o inter-
relacionamento dos parágrafos. A seguir, seguem
dois princípios para identificarmos os parágrafos e
também o inter-relacionamento entre eles:8

1. Identifique os limites do parágrafo.


Lembre-se de que o parágrafo é um bloco de
8 CARDIN, Hélder. p. 91.

14 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


pensamento formado por uma ou mais orações, sendo
composto, em geral, por um assunto central e por
ideias menores que sustentam ou desenvolvem tal
assunto.
Preste atenção no uso de expressões como: ora,
então, depois, portanto, por esta causa, entre outras,
pois elas costumam indicar o início de um novo
parágrafo ou ideia.
Perceba a mudança de personagens e diálogos
ou mesmo a mudança temporal de uma narrativa (no
evangelhos, em especial, a mudança de dia ou de
ambiente/localidade marca o surgimento de um novo
parágrafo).

2. Note o que vem antes e depois do parágrafo,


percebendo a relação entre estas três unidades:
parágrafo anterior > parágrafo sendo estudado >
parágrafo posterior.
Com base na análise do texto propriamente
dito, de que maneira o parágrafo anterior prepara o
parágrafo em questão?
Existe o estabelecimento de alguma relação de
causa e efeito entre os parágrafos? (Isso acontece
várias vezes nas epístolas, quando, após alguma
exposição teológica mais densa, o autor faz a conexão
de tais verdades teológicas com a vida prática de seus
ouvintes/leitores).
De que maneira o parágrafo seguinte dá sequência

MÓDULO 02 / CAP. 19 15
natural ao fluxo de pensamento, amplia a ideia ou
muda o rumo da história ou argumentação, em relação
à exposição do parágrafo anterior?

A INTERPRETAÇÃO INTERTEXTUAL

A interpretação intertextual, à semelhança da


interpretação contextual, também valoriza o contexto
das Escrituras. A diferença, porém, é que na interpretação
intertextual o contexto da Bíblia inteira é levado em
consideração, e não somente um parágrafo, um capítulo
ou um livro. A Bíblia toda é a melhor intérprete de
passagens particulares. Esse conceito é conhecido como
Analogia da Fé. Nas palavras de R. C. Sproul:

Analogia da fé significa que as Escrituras


interpretam as Escrituras: Sacra Scriptura sui interpres
(As Sagradas Escrituras são seu próprio intérprete). Em
termos simples, isto significa que nenhuma passagem
das Escrituras pode ser interpretada de tal forma que
o significado alcançado seja conflitante em relação
ao ensino claramente exposto pela Bíblia em outras
passagens. Por exemplo, se um versículo pode apresentar
duas interpretações diferentes sendo que, uma delas é
contrária ao ensino da Bíblia como um todo, enquanto
a outra está em harmonia com este ensino, então esta
última deve ser adotada e a anterior descartada.9
9 SPROUL, R. C. pp. 48-49.

16 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


Tendo em vista esse princípio, as passagens
obscuras da Bíblia devem ser interpretadas por outras
passagens que sejam mais claras em seu significado.
Tomemos como exemplo Atos 2.3: “Respondeu-
lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja
batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos
vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo
(ARA). Com base nessa passagem isolada, algumas
pessoas têm defendido a ideia de que o batismo é
necessário para a salvação ou perdão dos pecados.
A fim de refutar essa ideia claramente antibíblica,
devemos recorrer à Analogia das Escrituras. Que
texto bíblico pode clarear a nossa compreensão acerca
desse assunto? Considere Marcos 16.16: “Quem
crer e for batizado será salvo; quem, porém, não
crer será condenado (ARA). Para que uma pessoa
seja condenada, o que é suficiente? É suficiente que
a pessoa não creia em Cristo. Ademais, podemos
mencionar ainda um dos ladrões que fora crucificado
ao lado de Jesus. Mesmo sem ter passado pelas águas
do batismo, Jesus disse que o ladrão estaria no paraíso
naquele mesmo dia (Lc 23.43).

Textos Paralelos

Com certeza você já percebeu que muitos


versículos aparecem na margem ou no rodapé de
sua Bíblia. Esses versículos são chamados de textos

MÓDULO 02 / CAP. 19 17
paralelos, porque eles têm alguma relação com
outros versículos. O problema é que nem sempre os
comentaristas relacionam as passagens umas com as
outras corretamente. Por isso, precisamos entender
que existe pelo menos dois tipos de textos paralelos.
O primeiro tipo chama-se paralelos lexicais.
Muitas palavras se repetem na Bíblia. Uma delas é a
palavra amor. Se você consultar uma concordância,
verá as inúmeras ocorrências dessa palavra na Bíblia.
O problema é que uma mesma palavra pode assumir
sentidos diferentes, dependendo do contexto em que
ela está inserida. Em outras palavras, a palavra amor
não tem o mesmo significado sempre que aparece na
Escritura. O alerta de Hélder Cardin é oportuno:

A fim de evitar esse mau uso, devemos analisar


o campo semântico, lexical, contextual e também
teológico de uma palavra ou expressão para não
cometermos injustiças com o texto, atribuindo-lhe um
significado que não fora o pretendido por seu autor
original.10

O segundo tipo de textos paralelos chama-


se conceituais. Textos dessa natureza são menos
frequentes do que os lexicais. O que acontece é o
seguinte: palavras ou expressões podem não aparecer
no paralelismo conceitual, mas acontece uma repetição
10 CARDIN, Hélder. p. 95.

18 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


das ideias e dos conceitos. Identificar os paralelos
conceituais é mais trabalhoso, porém, é um trabalho
necessário para a tarefa hermenêutica.
Diante disso, reproduzimos alguns princípios para
o uso de textos paralelos e alguns cuidados a serem
tomados. Essas informações estão disponíveis no
excelente livro de Hélder Cardin sobre hermenêutica
bíblica.11

1. Interprete primeiramente o texto conforme a


compreensão que os leitores originais teriam, sem
todas as informações ou conceitos que textos paralelos
dariam.
2. Atente para as referências de textos paralelos nas margens
e rodapés das Bíblias de estudo, porém faça isso sempre com
muita cautela, analisando cada texto antes de afirmar ser ele um
texto complementar.
3. Analise o contexto maior do texto paralelo verificando
se, apesar de usar uma mesma expressão o vocábulo, tal contexto
favorece um relacionamento de ideia e conceituação entre as duas
ou três passagens estudadas.
4. Procure notar se o princípio eterno ensinado e transmitido
é correspondente nos textos bíblicos paralelos. Não sendo
correspondente, não utilize o texto, que, em essência, não é
paralelo quando pensamos de um ponto de vista homilético ou
prático.
5. Não imponha um conceito a determinado autor ou texto
bíblico a partir de textos paralelos. É possível que nem todos os
autores bíblicos conhecessem todos os documentos dos demais
autores. A fim de estabelecer ou não conexões com outras

11 Ibid. pp. 95-96.

MÓDULO 02 / CAP. 19 19
passagens, respeite a teologia bíblica dos livros em que os textos
estão circunscritos, atentando, inclusive, para o propósito autoral
de determinado texto.
6. Conheça muito bem a Bíblia. Dedique-se à sua leitura
e estudo diário, seguindo o exemplo de Salmos 1.2, em que o
prazer do salmista estava na meditação da lei de Deus. A prática
dessa disciplina espiritual ajudará no conhecimento mais amplo e
profundo da Escritura Sagrada.

Revelação Progressiva

Aqui, cabe uma palavra sobre o progresso da revelação. A


revelação que Deus entregou ao homem não ocorreu de uma só
vez. Deus Se revelou progressivamente na história, concedendo
porções parciais acerca de Sua vontade e de Sua identidade.
Nesse sentido, os autores do Novo Testamento receberam porções
maiores da revelação do que os autores do Antigo Testamento.
Compreender o progresso da revelação é importante para
não cometermos equívocos. Por exemplo, Gênesis 3.15 menciona
pela primeira vez a promessa de redenção do homem que ocorreria
através da “semente da mulher”. Sabemos disso, porque vivemos
no período posterior dessa promessa, ou seja, já contemplamos
o seu cumprimento. No entanto, quando Adão e Eva ouviram da
boca de Deus essa promessa pela primeira vez, eles não tinham
noção de que Deus estava falando de Jesus.
Entender o progresso da revelação nos ajudará no exercício
de interpretação. Assim, aquilo que o escritor inspirado disse deve
ser compreendido dentro dos limites da revelação que Deus havia
dado para as pessoas daquele período.

20 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


A INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL

A interpretação gramatical estuda as palavras


propriamente ditas. É aqui que entrar a importância de
conhecer, ainda que instrumentalmente, as línguas originas
da Bíblia: hebraico, aramaico e o grego. Essas línguas
bíblicas não são mais faladas atualmente; são consideradas
como línguas “mortas” no sentido conversacional. No
entanto, elas ainda estão bem “vivas” para o estudante
que pretende compreender a Bíblia corretamente.
Os vocábulos bíblicos podem ser estudados em
pelo menos três dimensões: (1) etimologicamente –
conhecendo os componentes de uma palavra e sua
formação; (2) Comparativamente – analisando a
ocorrência da palavra em vários lugares nas Escrituras;
e (3) Historicamente – avaliando o uso da palavra na
Bíblia hebraica, no grego clássico, na Septuaginta,
no período Interbíblico ou até mesmo na literatura
patrística antiga.12
No estudo dos vocábulos, precisamos nos atentar
ao sentido denotativo e conotativo. O primeiro, sentido
denotativo, tem a ver com o sentido primário de
determinada palavra. O segundo, sentido conotativo,
refere-se ao sentido secundário que uma palavra
possui. Antes de apresentar um exemplo bíblico sobre
esses dois sentidos, vejamos como o dicionário define
os termos “denotar” e “conotar”:
12 Ibid. p. 103.

MÓDULO 02 / CAP. 19 21
Denotar: “Fazer referência aos vocábulos, seres,
objetos ou quaisquer coisas que, por convenção, estão
unidos aos seus respectivos significantes, dentro de
uma mesma língua; significar”.13

Conotar: Transmitir um sentido metafórico,


cultural ou de alguma forma relacionado ao sentido
literal de uma palavra ou conceito.14

Posto isso, vejamos agora um exemplo bíblico em


que uma mesma palavra é usado no sentido denotativo
e conotativo:

“Levantou-se então um grande vendaval, e as


ondas arremessavam-se contra o barco, de modo
que ele já estava inundando. Jesus, porém, estava na
popa, dormindo sobre uma almofada. Os discípulos
o despertaram e lhe perguntaram: Mestre, não te
importas que pereçamos?”
(Marcos 4.37-38, A21)

O texto diz que Jesus estava dormindo. O verbo


“dormir” é usado no sentido conotativo, ou seja, no
sentido primário e significa exatamente o que está
escrito: Jesus estava literalmente dormindo sobre uma
13 Disponível em https://www.dicio.com.br/denotar/. Acesso em
12 de março de 2021.
14 Disponível em https://www.dicio.com.br/conotar/. Acesso em
12 de março de 2021.

22 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


almofada. Agora, observe o uso da mesma palavra em
outro sentido:

“Não queremos, porém, irmãos, que sejais


ignorantes com respeito aos que dormem, para não
vos entristecerdes como os demais, que não têm
esperança” (1 Tessalonicenses 4.13, ARA)

O mesmo verbo “dormir” é utilizado aqui, mas


ele não tem o mesmo sentido do exemplo anterior.
Paulo, ao afirmar que há irmãos que “dormem”,
ele está dizendo que esses irmãos estão fisicamente
mortos. Dessa forma, o verbo “dormir” é usado no
sentido secundário, isto é, conotativo.
Outro exemplo encontra-se no uso da palavra
“carne”. Especialmente as versões antigas da Bíblia
trazem essa palavra. E, assim como a palavra “dormir”
é usada em mais de um sentido, a palavra “carne”
também é. Há pelo menos três sentidos distintos dessa
expressão:

(1) Ascendência humana – “Com respeito a seu


Filho, o qual, segundo a carne, veio da descendência
de Davi” (Romanos 1.3).

(2) Corpo físico – “Porque não é judeu quem o


é apenas exteriormente, nem é circuncisão a que é
somente na carne” (Romanos 2.28).

MÓDULO 02 / CAP. 19 23
(3) Natureza pecaminosa – “Porque, quando
vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas
postas em realce pela lei operavam em nossos
membros, a fim de frutificarem para a morte”
(Romanos 7.5).

De acordo com Hélder Cardin15, para o estudo


lexical seguro, o estudante poderá seguir os seguintes
conselhos:
1. Leia o texto em duas ou três versões diferentes,
especialmente quando não tiver acesso ao conhecimento primário
das línguas originais ou léxicos gregos e hebraicos.
2. Compare as traduções, buscando identificar outros
significados possíveis para uma mesma palavra ou expressão.
No entanto, cuidado com termos sinônimos, pois, embora eles
possam até lhe parecer semelhantes, não foram os termos usados
pelo autor bíblico na origem do texto. Respeite e compreenda os
termos que o autor utilizou, e não simplesmente os que ele poderia
ter usado.
3. Perceba se a palavra ou expressão é usada em seu sentido
denotativo conotativo. Caso seja no sentido conotativo, será
fundamental exercitar a hermenêutica de figuras de linguagem.
4. Quanto à terminologia bíblica ou teológica, pesquise seu
significado em dicionário bíblicos, tendo o cuidado de não usar
apenas dicionários comuns da língua portuguesa, como Aurélio
ou Houaiss. O uso de dicionários bíblicos específicos auxilia na
compreensão do sentido original da palavra e de como ela foi
usada no passado.
5. Pesquise o sentido sincrônico da palavra, i.e., o sentido que
ela tem no período histórico na porção textual em que é utilizada.

15 Ibid. pp. 106-107.

24 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


6. Caso haja uma palavra recorrente no documento ou usada
com frequência por seu autor, a compreensão desse uso mais
amplo pode trazer boas conclusões. Uma concordância bíblica
auxiliará muito nessa tarefa.
7. Atente para progressão ou o desenvolvimento histórico do
sentido da palavra, observando as possíveis no grego clássico e
Koinê, no texto hebraico e também na Septuaginta — se possível,
até em línguas correlatas, no caso de palavras hebraicas.

O Estudo Sintático

Para encerrar esse tópico, é preciso falar rapidamente sobre


o estudo sintático das palavras. Segue uma definição do que é
sintaxe:

A sintaxe é a parte da gramática que estuda


a disposição das palavras na frase e das frases no
discurso, incluindo a sua relação lógica, entre as
múltiplas combinações possíveis para transmitir um
significado completo e compreensível.16

No estudo sintático, temos os seguintes elementos


gramaticais:

a) Verbo – Classe de palavras que indica ação,


processo, estado ou alteração de um estado, sendo o
núcleo do predicado.17
Exemplo: “Também disse Deus: Façamos
16 Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Sintaxe. Acesso
em 12 de março de 2021.
17 Disponível em https://www.dicio.com.br/verbo/. Acesso em 12
de março de 2021.

MÓDULO 02 / CAP. 19 25
o homem à nossa imagem, conforme a nossa
semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes
do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais
domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis
que rastejam pela terra” (Gênesis 1.26).

b) Substantivo – Classe de palavras com que se


atribui nome aos seres, ações, objetos, características,
sentimentos, estados.18
Exemplo: “Este é a imagem do Deus invisível, o
primogênito de toda a criação” (Colossenses 1.15).

c) Adjetivo – Palavra que qualifica, caracteriza


ou classifica, um substantivo, quando localizada ao
lado deste.19
Exemplo: “E, pondo-se Jesus a caminho,
correu um homem ao seu encontro e, ajoelhando-se,
perguntou-lhe: Bom Mestre, que farei para herdar
a vida eterna?” (Marcos 10.17).

d) Advérbio – Palavra invariável que modifica


o sentido de um verbo, de um adjetivo, ou de outro
advérbio, indicando circunstâncias, como de modo,
lugar, tempo e intensidade.20
18 Disponível em https://www.dicio.com.br/substantivo/. Acesso
em 12 de março de 2021.
19 Disponível em https://www.dicio.com.br/adjetivo/. Acesso em
12 de março de 2021.
20 Disponível em https://www.dicio.com.br/adverbio/. Acesso em

26 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


Exemplo: “Viu Deus tudo quanto fizera, e eis
que era muito bom. Houve tarde e manhã, o sexto
dia” (Gênesis 1.31).

e) Preposição – Palavra invariável que une dois


elementos numa oração, ou frase, criando e mantendo
uma relação entre esses dois termos.21
Exemplo: “No suor do rosto comerás o teu
pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado;
porque tu és pó e ao pó tornarás” (Gênesis 3.19).

f) Conjunção – Palavra ou locução invariável que


liga duas orações ou dois termos de mesma função
gramatical numa mesma oração.22
Exemplo: “Pois o Senhor ama a justiça e
não desampara os seus santos; serão preservados
para sempre, mas a descendência dos ímpios será
exterminada” (Salmos 37.28).

12 de março de 2021.
21 Disponível em https://www.dicio.com.br/preposicao/. Acesso
em 12 de março de 2021.
22 Disponível em https://www.dicio.com.br/conjuncao/. Acesso
em 12 de março de 2021.

MÓDULO 02 / CAP. 19 27
A INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA

A Bíblia foi escrita dentro de um contexto histórico


específico e antigo. Neste contexto, muitos fatores
devem ser considerados com seriedade e cautela.
Muitos intérpretes, na pressa de aplicar a Bíblia
para o contexto contemporâneo, acabam ignorando
esses fatores importantes. O resultado disso sempre
será uma compreensão superficial ou distorcida da
passagem.
Berkhof23 nos apresenta alguns pressupostos
básicos para a interpretação histórica:

a. A Palavra de Deus teve a sua origem de um modo


histórico e, consequentemente, só pode ser entendida
à luz da História. Isso não significa que tudo o que
ela contém possa ser historicamente explicado. Como
revelação sobrenatural de Deus, ela, naturalmente,
abriga elementos que transcendem os limites do
histórico. Significa que os conteúdos da Bíblia são,
em grande medida, historicamente determinados e
que, nessa medida, podem ser explicados na História.

b. Uma palavra nunca é completamente até ser


apreendida como palavra viva, isto é, originada da
alma do autor. Isso implica a necessidade do que
é chamado de interpretação psicológica, que é, na
23 BERKHOF, Louis. pp. 87-88.

28 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


verdade, uma subdivisão da interpretação histórica.

c. É impossível entender um autor e interpretar


corretamente suas palavras sem que ele seja visto à
luz da sua experiência histórica. É verdade que uma
pessoa, num certo sentido, controla as circunstâncias
de sua vida e determina seus aspectos; mas é
igualmente verdadeiro que ela é, num grau elevado, o
produto do seu ambiente histórico. Por exemplo, ela é
filha do seu povo, de sua terra e de sua época.

d. O lugar, o tempo, as circunstância e a visão


prevalecentes do mundo e da vida em geral irão
naturalmente alterar os escritos produzidos sob essas
condições de tempo, lugar e circunstâncias. Isso
também se aplica aos livros da Bíblia, particularmente
aos históricos e aos de caráter ocasional. Em toda a
extensão da literatura, não há livro que se iguale à
Bíblia quanto à tocar a vida em cada aspecto.

Além dos pressupostos acima, é muito importante


lançar perguntas sobre o texto, a fim de buscarmos
pistas acerca de seu significado. Quando buscamos
respostas, simplesmente fazemos perguntas. Mas não
basta fazer qualquer tipo de pergunta. Precisamos fazer
as perguntas certas. Assim sendo, há dois elementos
históricos que nos ajudarão na compreensão do texto
bíblico.

MÓDULO 02 / CAP. 19 29
Em primeiro lugar, as informações relacionadas
ao texto e à escrita. Neste ponto, considere os
seguintes fatores: autoria e circunstâncias de vida do
autor; data de composição e escrita do documento;
motivo ou ocasião da escrita; propósito da escrita e
destinatários.24
Em segundo lugar, considere as informações
relacionadas à situação e às características políticas,
geográficas, religiosas, etc. Aqui, o estudante deve
dar atenção aos seguintes fatores: a época em que
determinado evento ocorreu; as circunstâncias ao
redor que influenciaram o conteúdo do documento;
o estado espiritual e religioso do povo de Deus; os
componentes políticos, econômicos, sociais, etc.;
a época em que determinados discursos foram
proferidos (as parábolas de Jesus, por exemplo); as
características culturais, sociais e políticas de cada
cidade e igreja.25
Todas essas informações nem sempre serão
respondidas pelo texto bíblico. Por isso, o estudante
pode consultar obras teológicas de referência para
auxiliá-lo na pesquisa.

24 CARDIN, Hélder. p. 113.


25 Ibid.

30 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


A INTERPRETAÇÃO CULTURAL

Não é possível subestimar a importância dos


fatores culturais presentes na Palavra de Deus. Além
de ter sido escrita em um período histórico específico,
a Bíblia foi composta dentro de uma gama cultural
também. Os autores bíblicos, influenciados pelos
fatores culturais de sua época, reproduziram tais
fatores em seus escritos. E isso, é claro, não é uma
prova que pesa contra a inspiração da Palavra de
Deus. Visto que os fatores culturais são de grande
importância, alguns cuidados devem ser tomados pelo
estudante. Seguem alguns cuidados, apresentados por
Hélder Cardin.26

Desconsiderar a importância do estudo cultural;


Impor ao texto bíblico uma mentalidade
ocidental, julgando inválidos ou irrelevantes alguns
dos costumes ou expressões culturais passadas;
Condenar ou prejulgar a cultura antiga, à luz de
nosso atual sistema legal, religioso e econômico;
Desconsiderar a diversidade cultural (judaica,
egípcia, cananeia, assíria, babilônica, grega ou
romana) presente na Bíblia, bem como os vários
momentos históricos e cronológicos retratados e
desenvolvidos ao longo dela (a Bíblia compreende
um intervalo cronológico de pelo menos 1.500 anos
26 Ibid. p. 118.

MÓDULO 02 / CAP. 19 31
— tempo suficiente para haver mudanças dentro da
própria cultura);
Ser descuidados quanto ao processo de
transferência do princípio espiritual a ser aplicado
nos dias atuais.

Algumas pessoas, de maneira descuidada,


acabam normatizando aspectos da cultura do século
1, como se existisse uma cultura ordenada por Deus.
Esse equívoco ocorre pela dificuldade em distinguir
os aspectos culturais dos aspectos morais. Fee &
Stuart foram precisos em suas palavras:

[...] devemos estar dispostos a distinguir entre


aquilo que o próprio Novo Testamento vê como algo
inerentemente moral e aquilo que não é. Aqueles itens
que são inerentemente morais são, portanto, absolutos
e permanecem para cada cultura; aqueles que não
são inerentemente morais são, portanto, expressões
culturais e podem ser alterados de uma cultura para
outra. As listas de pecados compostas por Paulo, por
exemplo, nunca contêm itens culturais. De fato, alguns
dos pecados podem prevalecer mais em uma cultura
do que na outra, mas nunca há situações em que eles
possam ser considerados como atitudes ou ações
cristãs. Dessa forma, a imoralidade sexual, o adultério,
a idolatria, a embriaguez, a prática homossexual, o
furto e coisas semelhantes (1Co 6.9,10) são sempre

32 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


errados. Não se quer dizer com isso que os cristãos não
tenham sido culpados por algum desses pecados, em
uma ou outra ocasião. Mas não são escolhas morais
viáveis. Afinal, Paulo continua: “Alguns de vós éreis
assim. Mas fostes lavados...”.27

Assim, para que haja uma noção melhor acerca


dos aspectos culturais presentes na Palavra de Deus,
mencionamos, a seguir, alguns desses aspectos28:

Organização sociofamiliar: lei do levirato


(Gn 38.8; Dt 25.5ss); direitos e deveres do filho
primogênito (Nm 3.12,13; Lc 2.23);
Vida social ou doméstica, relacionamentos
interpessoais e familiares: cuidados contra
saqueadores (Lc 10.4); aliança entre pessoas (Rt
1.16,17); procedimentos na recepção de convidados
a um jantar especial (Lc 7.36-50);
Costumes alimentares, de saúde e higiene:
cuidados para com o leproso (Lv 13.44,45);
processo de cuidado com o corpo de mortos antes
do sepultamento (Mt 27.59); usos e significados do
fermento (Mc 8.14-16); uso do vinho com propósitos
medicinais (1Tm 5.23);
Sistema de governo ou política: prática do
resgatador (Rt 4.1,2); monarquia em Israel e povos
27 FEE, Gordon D.; STUART, Douglas. p. 100.
28 A lista está longe de ser exaustiva. Antes, o objetivo é apenas
apresentar alguns exemplos.

MÓDULO 02 / CAP. 19 33
circunvizinhos (1Sm 8.5); apelo ao benefício de um
direito romano (At 25.11);
Religião: prostituição cultual diante de postes-
ídolos (Jz 3.7); expressões do judaísmo na sinagoga
(Lc 4.16-30); venda de comidas sacrificadas a ídolos
no mercado público (1Co 10.25,28);
Economia: expressão de selar acordos (Rt 4.8);
pagamento de tributos ao imperador (Lc 20.21-26);
Agricultura: malhar o trigo no lagar como sinal
de desespero (Jz 6.11,12); informação de que onde
havia folhas deveriam existir frutos (Mc 11.12-14);
cultura agropastoril (Jo 10).29

CONCLUSÃO

No presente módulo, estudamos vários fatores


indispensáveis para a tarefa de interpretação bíblica.
Analisamos a interpretação literal, contextual,
intertextual, gramatical, história e cultural. Com
dedicação e paciência no estudo, seremos fieis
à Palavra de Deus e ensinaremos com aptidão,
conduzindo as pessoas pelo caminho do verdadeiro
crescimento.

CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS

29 CARDIN, Hélder. pp. 119-120.

34 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA


1. Não estamos sozinhos na tarefa árdua de
interpretar a Bíblia.

Às vezes, agimos de forma independente, como


se o trabalho hermenêutico, do começo ao fim,
dependesse de nossa capacidade intelectual. Todavia,
o melhor intérprete é o Espírito Santo, e ele habita
em cada homem nascido de novo. Sem o papel do
Espírito Santo de iluminar a nossa compreensão, todo
empreendimento hermenêutico será em vão. Portanto,
estudemos a fundo, mas, sobretudo, dependamos do
Autor das Escrituras.

2. O objetivo final da interpretação bíblica é a


obediência a Deus.

Não devemos estudar hermenêutica para encher


a mente de informações e de regras interpretativas.
Compreender corretamente a Bíblia deve nos levar à
obediência adequada, pois não é possível fazer o que
Deus requerer, sem primeiro entender o que Ele disse.
Obedeçamos a Palavra de Deus, porque aqueles que
recebem maior entendimento, certamente têm maiores
responsabilidades.

MÓDULO 02 / CAP. 19 35
3. A interpretação correta deve nos conduzir ao
serviço ao próximo.

Deus levantou mestres no Corpo de Cristo.


Todo cristão genuíno possui o Espírito Santo, mas
nem todo cristão genuíno possui os mesmos dons do
Espírito Santo. Isso significa que nos completamos
mutuamente. Aqueles que receberam o dom do
ensino devem servir através do ensino. Os mestres
precisam instruir os seus irmãos, trazendo luz sobre o
entendimento deles e, sobretudo, ajudando-os a serem
fieis ao Senhor por meio da obediência correta.

BIBLIOGRAFIA

BERKHOF, Louis. Princípios de Interpretação


Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
CARDIN, Hélder. Curso Vida Nova de Teologia
Básica: Hermenêutica. São Paulo: Vida Nova, 2017.
ERICKSON, Millard J. Dicionário Popular de
Teologia. São Paulo: Mundo Cristão, 2011.
FEE, Gordon D.; STUART, Douglas. Entendes o
que Lês? Um guia para entender a Bíblia com auxílio
da exegese e da hermenêutica. São Paulo: Vida Nova,
2011.
KEENER, Craig. A Bíblia em Seu Contexto:
como aprimorar seu estudo das Escrituras. Natal:
Carisma, 2016.

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OSBORNE, Grant R. A Espiral Hermenêutica:
uma nova abordagem à interpretação bíblica. São
Paulo: Vida Nova, 2009.
SPROUL, R. C. O Conhecimento das Escrituras:
passos para um estudo bíblico sério e eficaz. São
Paulo: Cultura Cristã, 2003.
ZUCK, Roy B. A Interpretação Bíblica: meios de
descobrir a verdade da Bíblia. São Paulo: Vida Nova,
1994.

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38 / CURSO MÉDIO DE TEOLOGIA
MÓDULO 02 / CAP. 19

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