Autoestima em GT
Autoestima em GT
Autoestima em GT
COMPREENDENDO A AUTO-ESTIMA NO
ENFOQUE DA GESTALT TERAPIA
Brasília
Novembro de 2007
MARIA LIDIA DE CARVALHO
COMPREENDENDO A AUTO-ESTIMA NO
ENFOQUE DA GESTALT TERAPIA
Brasília
Novembro de 2007
FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
CURSO DE PSICOLOGIA
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Brasília
Novembro de 2007
A todos que, descobrindo-se merecedores de um
viver saudável e pleno, passaram a cuidar de sua
auto-estima, abandonando velhos e repetitivos
padrões de comportamentos improdutivos,
permitindo o aparecimento de novas formas de
crença e ação, e assim, tornaram-se eles mesmos.
Agradecimentos
Aos meus pais que, amorosamente, possibilitaram minha vinda a este mundo. Meu pai, im
memoriam, que me ensinou a busca por um viver digno. Minha mãe, muito me ensinou ao
produzir sua revolução silenciosa com sua sabedoria maternal, força moral conjugada com
simplicidade e dignidade. Ambos, com todas as dificuldades, muito lutaram para me oferecer
apoio e suporte afetivo e espiritual, para que eu pudesse seguir em frente na caminhada que
juntos iniciamos.
Aos meus irmãos e irmãs pelo que há de especial e único em cada um.
A Carlene Maria Tenório Dias, professora e orientadora que, com competência, “paciência de
Jó”, “sabedoria de Salomão” e bom humor, ajudou-me na elaboração deste trabalho que me
possibilitou vislumbrar condições para libertar-me das teias que rompem o fluxo natural da
vida em busca de um viver mais pleno.
Às amigas que ganhei na faculdade, Maria de Fátima dos Santos e Orides Alves da Fonseca,
pela amizade e colaboração ao longo do curso e por mostrar-me, com bondade, que novas e
verdadeiras amizades são possíveis e necessárias.
A todos professores e colegas com quem convivi na faculdade, dos quais ganhei novos e
valiosos ensinamentos, e guardarei carinhosas lembranças.
Aos clientes, que me aceitaram e que me ajudaram nos meus primeiros passos desta profissão,
a minha gratidão e carinho especiais.
Aos colegas de trabalho, pelo apoio, amizade e torcida pelo sucesso deste novo caminho.
A todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 1
DESENVOLVIMENTO
CONCLUSÃO ............................................................................................................... 55
Nenhum ser humano traz consigo, ao nascer, qualquer conceito ou sentimento a seu
respeito e muito menos idéias sobre bem ou mal, bom ou ruim, feio ou bonito, grande ou
pequeno, mas, em pouco tempo, consegue perceber se é amado ou não, se é aceito ou não pelo
seu meio. Na opinião de Silva e Marinho (2003), não há geração espontânea de sentimentos,
eles resultam das interações sociais e ambientais.
A auto-estima é um sentimento de valoração oriundo de percepções do indivíduo, de
como ele é recebido pelas pessoas de sua convivência e de como elas reagem diante de suas
manifestações no ambiente, o que pode resultar tanto em um conceito positivo como negativo
de si mesmo.
Muitas vezes o indivíduo se depara com um mundo complexo em que os principais
elementos, que o ajudarão na construção do conceito de si mesmo e de sua auto-imagem, nada
mais são que um emaranhado de bem-me-quer, mal-me-quer, bem-me-quer, mal-me-quer,
que, além de contribuir para a formação distorcida do auto-conceito, constituem-se
experiências de dores emocionais profundas.
A formação da auto-imagem depende das interações com o meio e de como os outros
recebem e reagem às manifestações do indivíduo, no decorrer de seu desenvolvimento. Se a
criança é amada, respeitada e aprovada pelos outros, desenvolverá por si bons sentimentos. Se
é rejeitada, dificilmente terá um conceito positivo de si, na maioria das vezes passará a se ver
como inadequada, inferior, valendo menos que os demais.
O estudo do desenvolvimento da auto-estima, no enfoque da Gestalt Terapia é a
proposta deste trabalho e tem como base os conceitos delineados por esta abordagem que
apontam como fator determinante da construção do auto-conceito individual a participação
ambiental, familiar e social, especialmente os acontecimentos ocorridos nos primeiros anos de
vida, quando a criança está sob total dependência de cuidados por parte dos adultos.
Nessa fase, a abordagem gestáltica mostra como as necessidades da criança podem
não ser atendidas e como, na maioria das vezes, ela é obrigada a engolir, sem mastigar,
experiências incompatíveis com as suas necessidades, elementos tóxicos que vão contribuir
para a alienação de partes importantes de sua personalidade.
O conceito de contato, que na sua gênese é a forma como a pessoa se relaciona com
ela mesma e com o mundo exterior, é um conceito de grande abrangência na abordagem
2
Comportamento
Letras de Lisboa (2001), o sinônimo de auto-estima é apreço, consideração que uma pessoa tem
por si própria; e como é possível observar, ambos os dicionários mantêm o mesmo sentido do
termo. É por essa idéia relacionada ao sentimento de consideração por si mesmo, que este
percepção que o indivíduo tem de si mesmo. A autora associa o conceito de auto-estima com o de
autoconceito devido a uma certa semelhança e dependência entre os dois. Diz a autora: “Formou-
se assim um certo consenso de que o autoconceito é a percepção que a pessoa tem de si mesma,
ao passo que auto-estima é a percepção que ela tem do seu próprio valor” (p. 18).
Para Sheehan (2005), a auto-estima pode ser analisada por meio da escala de valores que
nos atribuímos. É formada pela autoconsciência que emerge de nós mesmos resultante de nossas
experiências sociais, assim “passamos a nos enxergar como as pessoas nos enxergam”. (p.12).
Além disso a autora salienta que este sentimento torna as pessoas excessivamente
cautelosas e hesitantes diante da vida, o medo do fracasso não lhes permite correr riscos. Outro
aspecto crítico que empobrece a vida dos indivíduos com baixa auto-estima é a dificuldade de
lidar com criticas e elogios. Assim, pessoas com este sentimento freqüentemente encontram-se
4
numa posição desvantajosa: “como desaprovam seu próprio comportamento, acham difícil aceitar
Origina-se de todas as idéias, sensações e experiências que reunimos a respeito de nós mesmos
durante a vida” (p. 15). A autora enfatiza que ao se observar o comportamento apresentado pela
criança, é possível saber como está sua auto-estima; se ela se auto-recrimina ou se suas atitudes
consigo mesmo, com os outros e o aproveitamento escolar. Nesse ponto é importante observar a
presença de um certo movimento circular: uma baixa auto-estima produz baixo rendimento
Segundo Branden (1997), a auto-estima pode ser comparada a uma espécie muito
(...) a sensação de que somos competentes ao lidar com os desafios da vida e somos
vida, nenhum é mais importante do que aquele que fazemos sobre nós mesmos.
Esse autor considera a auto-estima como um dos sentimentos mais profundos que os
indivíduos podem ter sobre eles mesmos, que não depende de habilidade especial e nem de
conhecimentos específicos. Considera também, que a baixa auto-estima está relacionada aos
enquanto os indivíduos com a auto-estima elevada buscam novas fronteiras, aqueles com baixa
fala de Scheehan: “os indivíduos com baixa auto-estima estão mais propensos a encarar as coisas
pelo lado pessoal e considerar as atitudes dos outros como ataques” (p.67). Tais indivíduos
O termo auto-estima significa o senso inato de valor pessoal. Não é o mesmo que
responsável pela nossa visão de mundo e das outras pessoas (p. 133).
contexto terapêutico. O acesso a este sentimento, antes adormecido, é considerado por ele como
um importante “meio pelo qual” o individuo pode vir a resolver seus problemas atuais e outros
próprio valor. No caso de uma criança, ela necessita de informações sobre si mesma, que são
extraídas de fatores externos e internos a ela mesma. Tanto as opiniões alheias verbalizadas
quanto as sutis, colhidas aqui e ali, as reações de alegria, elogios, incentivos e aprovação ou
Moysés (2001) comenta que criança geralmente ouve das pessoas do seu convívio que é
comportamentos em relação à criança, vão sendo incorporados conceitos alheios à sua própria
estrutura cognitiva. Desta forma, aquilo que inicialmente era um processo interpessoal é
apropriado e assimilado como seu. Como resultado vai, ela mesma, se aplaudir ou se recriminar
formação dos conteúdos mentais, próprios da criança: não ocorre automática e diretamente.
Primeiro acontece uma interação dos conteúdos produzidos pela relação com o meio externo com
os conteúdos já existentes na mente da criança, pois esta já traz consigo marcas de sua
individualidade, e são essas marcas que vão determinar como se dará a internalização dos
conteúdos psicológicos. Só então ocorrerá uma mescla do que é social com o que é do individual.
pelo contexto sócio-econômico e cultural, passando pelo grupo familiar e suas interações,
chegando até a organização de classe como grupo, para se compreender como se dá a formação
da auto-estima de uma criança. Nesse sentido, a autora chama a atenção para a problemática
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sofrida pela criança em função dos relacionamentos de âmbito educacional, a qual, pela crueldade
presente nas referências negativas de certas brincadeiras, pode minar lenta e gradualmente a auto-
Em sua opinião, a tendência inicial de todo ser humano quando bebê é estar bem consigo
e conviver com o mundo que lhe rodeia. A qualidade dos relacionamentos é fator de grande
importância, pois é nessa época em que “são plantadas as sementes” da auto-estima. Daí a
formação. Quanto mais saudáveis forem essas interações, mais resultará em sentimento positivo
sobre si mesmo. Vale ressaltar que o oposto também é verdadeiro. Se houver fracasso nessa
tentativa de construção de laços afetivos, que geralmente é com a mãe, possivelmente terá como
Sheehan (2005) lembra que a maneira de ser da criança, levando tudo ao pé da letra, sem
introjetará as mensagens recebidas da pessoa que tiver o papel significativo em sua vida, não
importando se a pessoa também demonstra amor, se quis implicar com ela de modo sério ou de
brincadeira, ou por que teve um dia ruim. A criança precisa receber mensagens diretas, claras e
Neste sentido, Rogers, (citado em Shultz e Shultz 2004), trabalha com o conceito de
“pessoas critério”. São pessoas que fazem parte do convívio da criança e das quais ela precisa
receber amor e consideração positiva incondicional. A maioria das pessoas critério geralmente
estabelece condições de merecimento, às quais a criança tem que corresponder para merecer sua
consideração positiva.
consideração positiva incondicional, como o próprio nome lembra, não há condições para o bebê
8
receber amor, aprovação e esta é melhor representada pela figura materna. Já na consideração
positiva condicional, são impostas várias condições para que a criança receba as aprovações de
que necessita, caso a criança não as cumpra, não terá a aprovação desejada.
Rudio (2003) descreve várias pessoas que uma criança pode eleger como significativas ou
pessoas-critério: em primeiro lugar, os pais, depois uma professora, um amigo. Mais tarde isso é
transferido para um namorado, noiva, esposa ou algum profissional de sucesso.. Segundo esse
autor, “durante toda nossa vida, necessitamos dessas pessoas-critério e procuramo-las” (...)
Geralmente temos mais de uma pessoa critério e, muitas vezes, continuamos a tê-la como
Entende Rogers, (citado em Shultz e Shultz 2002), que, como as crianças dependem da
aprovação e do amor dos pais, ou pessoas critério, ao buscá-los, elas podem desenvolver
comportamentos direcionados para ganhar a afeição destes e assim, “aprendem a evitar outros
comportamentos que poderiam ser pessoalmente satisfatórios. Portanto, não agem de forma
espontânea” (p.321).
auto-estima, pela qual a pessoa depende da aprovação externa, por não sentir segurança, não
sentir confiança em si mesma e em suas ações diante das escolhas que a vida lhe impõe.
Sobre as escolhas inevitáveis na vida adulta, Cukier (1998) refere-se ao encolhimento das
as decisões que as crianças tomam ao longo de sua vida, principalmente aquelas frente a
Estudos de Rogers, (citado em Shultz e Shultz 2002), mostram que o comportamento dos
pais afeta a auto-imagem da criança: “pais que aceitavam seus filhos de modo incondicional (...)
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tinham filhos com maior auto-estima e maior segurança emocional que pais que fracassavam em
aceitar seus filhos e demonstravam comportamento autoritário” (p.330). Estes estudos indicaram
também que invariavelmente, pais de crianças com baixa auto-estima se mantinham muito
distantes, eram pouco ou nada afetuosos e freqüentemente propensos à punição como forma de
educar.
Sheehan (2005) também ressalta a importância que tem a auto-estima dos pais na vida
dos filhos. É um fator de grande influência, é como se fosse transmitida diretamente, tendo em
vista o aprendizado da criança ocorrer com base na imitação do comportamento dos pais e
insegurança dos pais em relação às suas próprias capacidades pessoais, pode afetar a criança,
levando-a a não se sentir boa o bastante naquilo que faz, construindo desde cedo a insegurança
ambos, ao chegar à vida adulta poderá construir o hábito de se criticar impiedosamente diante da
não obtenção de resultados almejados, mantendo assim a sua auto-estima em nível muito baixo,
conseqüentemente trazendo para si mesma muitos prejuízos. A autora cita ainda fatores como a
educação, maus-tratos, violência sexual, traumas, aparência física, e fatos corriqueiros entre as
Para Silva e Marinho (2003) o bebê ao nascer não traz consigo uma noção de eu, começa
a adquiri-la na relação com os pais, os quais são responsáveis diretos pela sua sobrevivência e
carente, depende absolutamente dos cuidados dos pais, os quais irão suprir ou não suas carências
Sobre a origem dos sentimentos, Silva e Marinho (2003) propõem: “os sentimentos são
ou ruins, descritas como sentimentos, são respostas discriminativas das ações do ambiente sobre
auto-estima do indivíduo.
Para estes autores, a construção da referência individual tanto negativa como positiva,
acontece por meio da interação com o ambiente e sempre dependerá do tipo de reforçadores: os
sensações desagradáveis que farão com que a criança se sinta desprotegida, carente, inadequada.
estima da pessoa e será decisiva em suas escolhas e atitudes perante a vida, das quais dependerá o
auto-estima é o contexto escolar. A questão das inevitáveis brincadeiras de mau gosto recheadas
de racismo vindas de seus colegas, as discriminações de todo tipo, aquelas que silenciam na alma,
com as quais a criança/jovem tem que conviver, é algo que vai se fixando em seu íntimo até o
ponto em que ela mesma incorpora como seu, passando a se comportar e a sentir-se como tal.
a auto-estima da criança é influenciada pela auto-estima dos pais e professores, que a reação
emocional dos pais, mesmo não expressada, influencia o comportamento da criança. Para
saudável, já que temos a capacidade de pensar e essa é a nossa fonte básica de competência.
Apesar disso, assimilação de mensagens negativas que vêm dos outros geralmente corrói esta
capacidade e cria um campo para a baixa auto-estima, em que predominam “o medo da realidade,
sucesso” (p.77) .
Diferentemente dos outros autores, Adler defende a idéia de que toda criança possui,
ouve ou assimila de seus pais. Presente nas crianças de tenra idade, este seria, inicialmente, um
para ele, “Ser um ser humano significa sentir-se inferior” (idem, p. 118). Neste sentido, o
sentimento de inferioridade seria uma força motivadora comum a todos e que levaria os seres
humanos a lutarem por níveis mais altos de desenvolvimento. Ele se refere também ao sentimento
de inferioridade derivado de alguma deficiência física e o quanto essa situação pode gerar um
enorme desejo de superação. É possível constatar a veracidade de tais afirmações, tendo como
Adler fala também do complexo de inferioridade, que é formado quando a criança não
consegue compensar seu sentimento de inferioridade, e que, devido a esse complexo, ela pode ter
o seu desenvolvimento prejudicado, influenciando, inclusive, a sua vida adulta, devido a uma
sentimento de baixa auto-estima, objeto deste trabalho, tendo em vista sua formação acontecer
pelas mesmas razões e causar os mesmos prejuízos, pois uma vez instalados, trarão limitações
Tal como os autores citados anteriormente, Adler valoriza a questão da interação social
falta de confiança em si, em suas próprias habilidades, e que estas pessoas tornam-se dependentes
Sobre a falta de amor para com as crianças ou rejeição, Adler diz ser, provavelmente, o
que mais pese na constituição da personalidade de indivíduos, que ao se tornarem adultos tendem
Neste caso, a única coisa que se destaca é que, quando crianças, foram maltratados.
Desenvolveram, assim, dureza de caráter, inveja e ódio; não podiam suportar ver os
Assim, os conceitos expressados por diversos autores concordam que o ser humano é
social por excelência e que a força das interações sociais é um fator fundamental na formação do
diversas, descrito por vários autores, que a auto-estima se desenvolve, se alicerça, formando,
assim, um indivíduo com alta capacidade de enfrentar obstáculos, por ter confiança em si mesmo
ou, ao contrário, uma pessoa que, por não saber quem verdadeiramente é, qual sua real
vida, tendo que conviver com uma eterna falta de confiança em suas próprias habilidades, com
indivíduo de diversos modos e uma delas é o jeito envergonhado de ser. Ambas, baixa auto-
autoconfiança e de merecimento ser amado e respeitado, próprios da pessoa que, por não saber
qual seu verdadeiro eu, constrói uma auto-imagem idealizada em um viver introjetivo e
confluente.
importa para esse trabalho o sentido de timidez, acanhamento, de sentimento penoso de desonra
ou humilhação perante outrem. Mais precisamente a vergonha que a pessoa tem em se expressar,
de apresentar-se diante dos outros, devido à falta de confiança em si própria e no seu auto-valor.
As dificuldades vividas pela pessoa que tem baixa auto-estima não são poucas e muitas
vezes não fica claro se elas fazem o indivíduo sentir-se inferior, ou se é o sentir-se inferior que
leva ao medo de fazer feio/errar; ao sentir-se culpado, porque fez tudo o que podia pelos outros,
mas parece que não fez o suficiente; à inadequação frente a ambientes e pessoas não costumeiras;
afirmar, de estar “mal-arrumada” mesmo que esteja como os outros, de se expor. Por ser o
14
subproduto da baixa auto-estima mais referido, a autora se propôs a entender melhor como a
negativas de si próprio, para o que se é, como se é e para com o que se faz” (p.368).
inadequada ou ruim, traz à tona uma energia afetiva intensa que é quase intolerável” (idem).
Yontef ressalta que à medida que a vergonha vai sendo terapeuticamente trabalhada, a auto-
estima aumenta, já que as reações à vergonha são sempre uma redução da auto-estima.
tais como: incompetente, inadequado, tola, estúpida, desajeitada, fraca, humilhada e insuficiente.
sentido de vergonha está vinculado a uma idade anterior à da memória nítida, isto é, sua base se
encontra “nas vontades e experiências interpessoais mais precoces da criança e do bebê” (p.369).
ambiente propício, se infiltra por osmose e vem de todos os lados como os sons do quarto: “a
expressão no rosto de um genitor, o som de sua voz, o ritmo dos movimentos parentais, como é
tocada ou não” (p.370), o sentimento predominante para a criança é de que ela não é um motivo
de alegria para os pais. Desde o início, a vergonha se mistura com um sentimento de defeito ou
inferioridade, que se traduz num sentimento de não estar apto para ser amado e merecer respeito.
O mesmo autor ressalta que o sentimento de não ter direitos ou de não merecer amor,
respeito, realizações nasce e cresce através das interações com as pessoas significativas do
ambiente. Para este autor, o abandono, principalmente pelos pais, é uma das fontes da formação
da vergonha crônica; “todas as formas de amor não retribuídas trazem vergonha” (p.371). Nesse
15
reconhecimento por suas realizações como também as ridicularizações diante de outras pessoas.
A relação da vergonha e a auto-imagem idealizada é muito estreita e por isso esta auto-
imagem, nas pessoas dominadas pela vergonha, é muito rígida excluindo de seu repertório
inadequação e incompetência. Dessa forma, estar consciente de estar envergonhado, por exemplo,
se, dada uma dessas situações é experienciada como evidência de inferioridade. Além disso, a
vergonha tem aparência, assim, ela aparece na face enrubescida, no constrangimento, no impulso
de se esconder. Pode ser expressa também por um encolhimento físico, pela cabeça pendente e
Bradshaw (1988) em seu livro “Curando a Vergonha que Impede de Viver” faz um amplo
estudo sobre a vergonha e concluiu que existe a vergonha saudável e a vergonha tóxica, esta
última está presente em quase todas as áreas da vida da pessoa e exige o disfarce de um falso eu:
“como sentimos que nosso eu é defeituoso e imperfeito, precisamos de um falso eu que não seja
assim” (p.12). O autor considera que o ambiente em que se desenvolve este tipo de sentimento
está carregado de uma das mais danosas formas de violência. Como a origem da vergonha é pré-
verbal, fica difícil definir o que seja este sentimento que leva o indivíduo a uma constante e
No dia a dia, a vergonha se faz presente em vários momentos, por conta deste sentimento,
não se fala da necessidade de companhia, não se pede um ou outro favor, não se admite tentativas
de auto-afirmação, não se interage sem medo, não se aventura além do pequeno mundo pessoal,
enfim, por conta da vergonha, o auto-valor decresce formando assim um círculo vicioso, que
2. 1 Conceituando o Self
variável, um segundo grupo defende o seu aspecto estrutural e invariável que se originaria antes
desenvolve a partir dos contatos que estabelece com o meio, dessa forma, “o Self é o sistema de
estabelecer contatos confere as características que formam um sistema - Self - pelo qual o
indivíduo se percebe como sendo ele mesmo e não uma outra pessoa.
fronteira de contato em funcionamento, sua atividade é formar figuras e fundos” (p. 49), o
significado de Self não existe por si mesmo, isto é, sem a relação com o meio. Acontece também
um ajustamento do Self às experiências vividas, assim ele sempre varia de acordo com as
O Self estrutural é, por sua vez, visto como um núcleo ou sistema central que não varia.
Tobin (1982, citado em Tenório 2003), diz que o Self “é um sistema contínuo localizado não na
fronteira, mas no centro, é como nós sentimos que somos, de certa forma, a mesma pessoa que
17
sempre fomos” (p.8). No entanto, Tenório (2003) explica que a identidade do Self é construída
Tenório (2003) reúne as idéias dos dois primeiros grupos e refere-se ao Self como “uma
definição de Self é bem mais abrangente, pois reúne os aspectos elaborados pelos teóricos da
Gestalt Terapia e de outras abordagens psicoterápicas, na medida em que, neste ponto de vista, o
Para Kiyan (2001), o Self não pode ser considerado uma instância, mas “um sistema cuja
busca sua satisfação” (p.170). Ampliando ainda mais a concepção de Self, a autora enfatiza que o
A autora concorda com a posição assumida por Perls, Hefferline e Goodman (1969/1997)
fronteira de contato a qual serve para delimitar, distinguir o indivíduo do meio e, ao mesmo
tempo, colocá-lo em contato com este meio. Sua condição de fronteira do organismo faz com que
18
o mesmo seja o mediador na promoção dos ajustamentos criativos: “o self propicia e age como
Latner (1985, p.127, citado em Kiyan 2001) propõe outra definição de Self, cuja
simplicidade é ressaltada por Kiyan: “O Self é nossa maneira particular de estarmos envolvidos
em qualquer processo, nosso modo de expressão individual em nosso contato com o meio (...)
Ele é o agente de contato com o presente, que permite nosso ajustamento criador” (p.171). Assim
A plasticidade do Self permite que ele assuma as funções de Ego, Id, e Personalidade.
que a pessoa tem de si e do meio. Quando é, por exemplo, a função Id que prevalece, a
necessidade de estar consciente é mínima, pois o que requer atenção são as necessidades vitais,
Na função ego, conforme bem explica Kiyan (2001), ocorrem deliberações por parte do
indivíduo, tanto para assimilar como para rejeitar as situações que se apresentam. Ao tomar
compatíveis com sua auto-imagem e evita aquelas que não são compatíveis, visando manter sua
integridade (Tenório 2003). A autora explica que, nessa função, o Self “organiza, integra e
19
sintetiza todas as suas formas de atuação no campo em um único Eu que pensa, sente e age de
maneira coerente com seu próprio auto-conceito e auto-imagem” (p. 23). Este processo de
estruturação resulta na própria identidade, a qual poderá ser rígida ou flexível, o que dependerá
dos padrões ou atitudes utilizados para atuar no mundo. Tenório (2003) resume assim a função
personalidade do Self:
Eu, que pensa sente e age de maneira única e mais ou menos estável, cuja unidade é
preservada pela identificação com as vivências, que são compatíveis com seu auto
O Self, de acordo com Tenório (2003), tem como função básica completar gestalten, ou
seja, satisfazer as necessidades que emergem na fronteira de contato. “Fazer contatos com o
meio, no sentido de satisfazer suas necessidades, promover sua auto regulação e seu
desenvolvimento é, portanto, a principal função do Self” (p.15). A autora enfatiza que, ao se fazer
um contato, várias forças organísmicas físicas e psíquicas entram em interação para que a gestalt
pondera que o mesmo pode ser visto como um macrossistema, cuja função primordial seria
vividas na relação com o meio são integradas e sintetizadas em um único todo coerente
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significativo, cuja forma, configuração ou estrutura corresponde à noção que cada um tem de si
mesmo a qual é fixada pelo Self como forma de preservação da própria identidade. Quando a
pessoa vivencia experiências nas quais ela se percebe como sendo inferior, incapaz ou impotente,
auto-estima.
marcadas por situações nas quais o Eu é vivido como algo indigno, ou sem valor, a imagem de si
mesmo que emerge como figura, nas diversas situações em que o Eu comparece como sujeito, é
uma imagem negativa, que favorece o sentimento de baixa auto-estima. A questão básica é
sugeriu Freud)? Uma coisa que o neurologista pode localizar no cérebro? O organizador das
nossas ações? O capitão da minha alma? Nada disso... o eu é experiência da figura em primeiro
Ribeiro (1994) dá uma das respostas disponíveis nas teorias: “Enquanto o Self é um
ações adequadas ou inadequadas. Está a serviço do Self.” (p. 18). Na sua obra “O Ciclo do
contato”, Ribeiro (1997) fala mais claramente dessa função de executor do eu:
O eu é um executor do Self. Quando ele percebe o que o Self quer ou sente, entra em
corpo que ele se faz visível, revelando o centro das coisas, emoções, sensações, o
Por sua vez, Tenório (2004) fala que o Eu é uma unidade existencial que “representa a
organização e integração dos aspectos e experiências contatadas pelo Self” (p. 26). Visto como
uma configuração psíquica dinâmica, o Eu estaria continuamente se reorganizando por meio dos
14).
O eu, segundo Polster e Polster (1993/2001), apresenta um senso de limitação entre ele e
o outro, entre ele e algum objeto ou mesmo entre ele e algum aspecto novo dele próprio.
Denominando estes limites de fronteiras do eu, estes autores o relacionam com o conceito de
contato: “a fronteira do eu em uma pessoa é a fronteira daquilo em que, para ela, o contato é
de ser da pessoa.
O contato é um conceito essencial para a Gestal Terapia, tanto que, segundo Ribeiro
(1977) esta abordagem está centrada no “conceito contato e na natureza das relações de contato
da pessoa consigo mesma e com o mundo exterior” (p.15). Entendido como um jeito de ser e
uma forma própria de se expressar, o contato “me faz visível aos outros”, “nós somos o contato
que fazemos”, “o self só pode ser descoberto em contato” (Mc Leod p.26 em Ribeiro 1977, p.27)
22
Ressaltando que o Eu não representa a totalidade do Self, Tenório (2003) esclarece que o
do Self, esta condição o torna unitário em si mesmo, mas ao mesmo tempo múltiplo, já que revela
muitas facetas do Self, na medida em que, a cada situação, emergem aspectos diferentes do Self,
que compõem os diferentes papéis assumidos pelo Eu em seu processo de adaptação ao meio e
meio.
Nas manifestações pessoais, sejam interações consigo mesmo ou com os outros, em que a
inibição das sensações presentes, o ignorar das necessidades que emergem no aqui e agora. Isto
acontece nas neuroses, quando, segundo Perls, Hefferline e Goodman (1969/1997), as funções
Diante de todas essas definições e explicações sobre as funções do Eu, fica claro que este
se estrutura e atua no campo organismo-meio através da função ego do Self. Neste sentido, falar
necessidade organísmica mais importante que é a fome e segundo Tenório (2003) é por meio dela
que o organismo se relaciona com o mundo nutriente, na busca pela sua sobrevivência e
crescimento.
23
Perls (em Tenório 2003) denomina de agressividade oral a forma utilizada pelo organismo
para interagir com essa necessidade básica. No seu entender, o desenvolvimento saudável de uma
personalidade passa por estágios que podem ser relacionados com o nascimento dos dentes.
Para maior compreensão, Perls (idem) dividiu este processo em estágios, ou seja, o pré-
mastigação. Cada estágio apresenta características que vão exigir da criança um progressivo
envolvimento de suas próprias capacidades, diferentes momentos em que ela passa da recepção
passiva de alimentos líquidos para enfrentar os novos desafios do consumo de alimentos sólidos,
O emprego correto dos dentes corresponde para Perls (idem), “na principal representação
biológica de uma resistência oral saudável feita pelo contato ou pela agressão, e não de uma
resistência neurótica, feita pela evitação do contato ou interrupção deste”. (p. 36). Nesse sentido,
verifica-se que, para a Gestalt Terapia, a agressividade oral é quem propicia o crescimento e a
integração do eu, pois é ela quem opera a seleção, a transformação e assimilação dos estímulos
externos.
Tenório (2003) apresenta os problemas que podem aparecer nos estágios nomeados por
Perls: no pré-dental pode ocorrer incoerência entre necessidade e desejo de satisfação, o mesmo
que não diferenciação entre necessidade e desejo de satisfação, exemplificado na situação comum
Entre os 6-18 meses a criança já pode morder e tentar obter do meio o que necessita, mas
também aí ela pode não ser atendida; o meio pode apresentar resistências às necessidades dela e
à sua natural agressividade oral. Ao passar para a fase molar, que vai dos 18 aos 36 meses, a
desde que ela possa recusar o que não lhe agrada. O problema nessa fase é a desconfirmação da
24
pessoa.
físico como o psicológico, não é mastigado e como não pode ser assimilado, permanece como um
corpo estranho dentro do organismo. O eu que se constitui sobre material introjetado agradável e
assimilável tem a seu favor a possibilidade real de um desenvolvimento saudável ao passo que
introjetos tóxicos são elementos que levam a conflitos internos, à alienação da verdadeira
Ribeiro (2006) explica e dá ao termo agressividade sua real dimensão. No senso comum
Ampliar o entendimento do que vem a ser a agressividade e o seu papel na vida dos indivíduos é
de grande utilidade por desmistificar o uso de um instinto vital e abrir perspectivas para uma vida
mais plena.
pessoas ou coisas diferentes entre si, Ribeiro (2006) a define como um “instinto a favor da vida
que mora em cada um de nós”, que atua internamente levando o organismo a atualizar-se a todo
momento; externamente sua atuação se dá em forma de respostas adequadas “aos estímulos que
O autor reitera que falar de agressividade não é o mesmo que referir-se a uma pessoa
instinto da agressividade”, neste caso, este adoecimento se traduz em sintomas pelo não
25
doenças.
Como foi dito anteriormente, o eu é a forma pela qual o self emerge na fronteira de
presente dentro deste campo. O resultado da organização e integração de todas estas experiências
valor e significado, para o organismo, foram distorcidos pela interferência do outro considerado
Por outro lado, se o Eu tem sua estrutura composta por experiências com significação não
Portanto, para Tenório (2003), existem dois tipos de eu secundário. O primeiro tipo é
acordo com as circunstâncias desse campo e assumindo um papel que é requisitado pela situação,
no sentido de promover sua adaptação e seu ajustamento criativo à realidade do aqui e agora. Este
características inerentes ao organismo, ou seja, pode ter como base (ou fundo) o Eu primário ou
um Eu introjetado estruturado com base em experiências cuja significação para o organismo foi
do contato. Nessa fronteira “o Eu primário atua e se mostra de várias formas, cada uma delas
representada por um ‘eu secundário’ diferente, em situações também diferentes” (p.27). Desse
como máscaras do “Eu primário”, ou seja, cada “eu secundário” assume um papel específico que,
segundo a autora, são derivações do “eu primário” e são criadas como formas do indivíduo se
adaptar e ou se integrar ao seu contexto ambiental e que podem estar ou não de acordo com o Eu
primário.
determinadas pelo outro, que são tomados para si e são vivenciados como se fossem próprios do
Self. Quando a atuação e o conceito de Eu estão baseados e refletem aspectos introjetados que
não foram integrados à totalidade do Self, esse eu torna-se incompatível com o Eu primário,
atuando como um dominador introjetado, que sabota e anula o eu primário, ou não introjetado, o
Para Tenório (2003), o Eu, enquanto configuração psíquica do Self, tem a característica
móvel e dinâmica, devido a sua contínua reorganização através dos contatos estabelecidos com o
meio. São esses contatos e o conseqüente processo de integração e organização das experiências
vividas, que dão um sentido de Eu para o Self, ao mesmo tempo que criam também uma noção de
mundo. “Dessa forma, tanto o eu quanto o mundo são criados e recriados a partir da relação entre
eles” (p.26).
Segundo a mesma autora, vários são os eus secundários que derivam de um Eu primário
construídos a partir da introjeção das relações vividas com os outros no mundo externo, como por
exemplo, o eu dominado e o eu dominador, que são resultantes da relação da criança com pais
27
autoritários. Os externalizados são aqueles que atuam no mundo externo como executores do self
psíquico, tentando fazer os ajustamentos criativos e possíveis em cada situação vivida no campo.
É a necessidade de ajustar-se, criativamente, ao meio, que faz com que a função ego do Self
desenvolva formas específicas de ser no mundo, compatíveis às realidades presentes, as quais são
entendidas por Tenório (2003) como eus secundários externalizados. A integração desses vários
eus secundários forma o Eu, enquanto imagem ou conceito de si mesmo, que pode estar em
entre “eu real” e “eu ideal”, introjetado e não introjetado ou original.. Tenório (2003) refere-se a
essa diferença dizendo que enquanto o eu real apresenta-se como flexível, irracional e
espontâneo, o eu ideal representa uma imagem idealizada de si mesmo, incluindo nesta todas as
dos pais, no período da infância, e, por esse motivo, passam a ser confundidas com desejos e
necessidades genuínas, que forçam a pessoa a realizá-las a qualquer custo. Quando isto ocorre,
esse eu ideal introjetado, faz o papel de um eu dominador que sabota o eu real, gerando conflitos
principalmente com base nas “potencialidades, motivações e aspirações intrínsecas ao Self, que
ainda não foram plenamente realizadas, ou foram bloqueadas por dificuldades internas ou
externas” (p.29). Movido por necessidade de perfeição e plenitude inerentes à natureza própria da
pessoa, esse eu ideal está ligado a uma auto-imagem de realização e satisfação da pessoa consigo
mesma.
28
Por outro lado, construído obrigatoriamente pela introjeção de valores e padrões impostos
pelas figuras de autoridade, às quais a criança teve que se submeter para garantir sua aceitação e
aprovação, tem-se o “eu ideal introjetado”, o qual vai funcionar em substituição às figuras de
autoridade. Como a própria palavra diz, é ideal, quer dizer, não real, e além disso, introjetado. É
algo que veio de fora e tomou posse, independente da escolha do indivíduo, mas devido à
O Eu real primário, não introjetado, e o eu real introjetado apresentam uma diferença bem
específica entre eles: o Eu original ou autêntico “não se enquadra em molduras rígidas ou padrões
fixos de comportamento”, portanto, prima pela flexibilidade e espontaneidade, por sua vez o eu
real introjetado é o resultado do processo de internalizar passivamente “experiências que não são
originalmente suas, por esse motivo assume valores e significados distorcidos” (Tenório 2003,
p.29). No entanto, é denominado real, por ser vivenciado como se fosse próprio do indivíduo.
A diferença existente entre o “eu ideal original” e o “eu ideal introjetado” também está
ligada à forma de atuação de um e de outro: o original é movido “por uma tendência atualizante”
(como é definida por Rogers, citado em Schultz e Schultz 2002), e o introjetado, ou falso, atua
a disputa entre o que Perls (1971/1973) classificou de “eu dominador” e “eu dominado”.
severo, sempre sabe o que o dominado deve fazer, mas, ao mesmo tempo não dispõe de muitos
meios para forçá-lo a cumprir suas exigências. O dominado nunca está seguro de si e por isso luta
1971/1973).
29
perde totalmente sua liberdade e espontaneidade, porque acredita que vai perder seu valor e a
consideração dos outros, caso não atenda às exigências do seu “eu idealizado introjetado”. Esta
perceber que não consegue chegar ao ideal que o dominador quer impor, a pessoa sente que não
tem valor e assume comportamentos coerentes com seu sentimento de baixa auto-estima.
30
organismo-meio: “a Gestalt Terapia afirma que a pessoa deve ser vista como um todo, sou seja,
que seu comportamento só se torna compreensível a partir de sua visão dentro de um determinado
campo com o qual ela se encontra em relação” (Ribeiro 1985 p.95). Essa abordagem considera o
indivíduo uma função do campo organismo-meio e seu comportamento um reflexo de sua ligação
dentro desse campo e por isso, concebe-o tanto como indivíduo, quanto como ser social. (Perls
1973/1988).
Perls (1975/1977) considera que o ser humano é dotado de um impulso natural em direção
ao equilíbrio chamado por ele de auto-regulação, a qual se dá através dos processos de formação
e destruição de figuras. Esse processo acontece num ciclo espontâneo, no qual uma figura
meio, e desaparece novamente após satisfação ou fechamento, dando lugar a uma nova figura.
Nesse sentido, a Gestalt Terapia vê o homem como uma interação do indivíduo com seu
meio se dá pela sua própria natureza e pelo que o indivíduo lhe faz; por isso, as formas e técnicas
de interação deste devem ser necessariamente fluidas e mutáveis para garantir sua sobrevivência.
(Perls 1973/1988).
busca satisfazer suas necessidades de modo mais pleno possível, através da interrupção e do
contato com o meio, visando a manutenção do equilíbrio ou o estado saudável e para isso é,
situação que é oferecida pelo meio, pois a novidade mesmo sendo nutritiva, nem sempre é
31
assimilada em sua totalidade pelo organismo, este, numa ação transformadora, faz o ajustamento
criativo da parte que lhe interessa que é assimilada, visando um comportamento adequado ao
metabolismo mental que é, segundo Yontef (1998), uma metáfora para explicar o
conceitos, mensagens referentes à pessoa e oferecidas pelo meio. Explicando melhor o que isso
apropriado, seja comida, idéias ou relacionamentos” (p.28). É na mastigação que o indivíduo vai
descobrir se o que foi ingerido é tóxico ou nutritivo, neste caso, o organismo com funcionamento
intelectual, moral, e social por parte da personalidade se torna o fato central em seu
Verifica-se então que a entrada de elementos não condizentes com as necessidades do Self
mesmo de desintegração.
socializantes nos primeiros momentos da vida deste. A impossibilidade de rejeitar o que vai
contra as suas necessidades reais é que o leva a ingerir sem assimilar, gerando o que o autor
32
chama de “regulação deverística”, ou seja, uma forma de atuar baseada em deverias que “dizem
ao indivíduo como regular seu comportamento por padrões externos, isolados de suas
introjeção ou inibição da agressividade oral (engolir sem, mastigar) e esta, tanto a benéfica como
a maléfica, é uma conseqüência da total dependência que as crianças têm dos pais. Com o
propósito de explicar a causa dos introjetos tóxicos, Delisle (1999, citado em Tenório 2003) diz
que: “a introjeção foi a única alternativa de sobrevivência do organismo diante de uma situação
mesmo tempo inevitável – não resta à pessoa outra saída, senão engolir o que lhe é imposto,
O contexto ambiental que leva a criança a engolir introjetos tóxicos, em vez de lhe
oferecer condições de bom desenvolvimento, acaba criando bases para o empobrecimento de sua
personalidade pois este tipo de introjeto faz com que ela seja impedida de desenvolver sua
própria maneira de ser, como é explicado por Perls (1981 citado por Tenório 2003): “a pessoa
que introjeta nunca tem oportunidade de desenvolver sua própria personalidade, porque está
muito ocupada em ficar com os corpos estranhos alojados em seu sistema” (p.48).
A dificuldade, portanto, surge quando o material que o meio disponibiliza para a criança
além de ser desagradável, é incompatível com as necessidades da criança e com sua capacidade
para transformá-lo e assimilá-lo. No entanto, muitas vezes ela não tem outra opção, senão a de
introjetar, ou engolir sem mastigar. Neste caso, a criança passa a conviver com algo tóxico dentro
dela, não condizente com a sua natureza. O resultado disso será a divisão do Self em duas
estruturas conflitantes: o dominado e o dominador, que atuam como vozes internas. O dominador
33
diminuindo assim, o potencial de vida do ser humano (Tenório 2003). Assim, a introjeção, ou
processo pelo qual a pessoa se relaciona com o outro e consigo mesmo no qual envolve as
meio.
outro alternam como figura e fundo, quando a pessoa se volta para o outro, sua fronteira se abre
para este outro e ela própria torna-se fundo. Quando este movimento se inverte, o contato maior é
desenvolvimento de uma personalidade é ressaltada por Yontef (1998) que diz: “a fronteira deve
ser mantida permeável o bastante para permitir trocas, porém suficientemente firme para gozar de
autonomia” (p.28). A perda da permeabilidade para o autor é o mesmo que a “perda da distinção
34
entre o Self e o outro” (idem), configurando um distúrbio de contato que geralmente se manifesta
contato com o outro e consigo mesmo. Para a Gestalt Terapia, os elementos básicos
indivíduo incapaz de alterar suas técnicas de manipulação e interação tão necessárias para
As interrupções fixadas, sejam na abertura sejam no fechamento, são tidas pela Gestalt
Terapia como mecanismos de defesa do ego e estão na base de uma gama de comportamentos
neuróticos. Os processos de interrupção de contato mais estudados por esta abordagem são a
e a fixação.
Swanson e Crocker (1988 citados em Tenório 2003) acreditam que “a experiência humana
dois tipos de personalidade: se elas são fixadas no contato estão abertas para a aproximação
personalidade fixada no fechamento apresenta-se como mais introvertida ou voltada para dentro,
porque mantém suas fronteiras fechadas para o mundo externo. Do outro lado, encontra-se a
fechamento, são formas de funcionar que contrariam a flexibilidade ideal e optam por
são mecanismos de defesa do ego e estão na base de todas as neuroses, embora umas apareçam
como figuras enquanto outras permanecem como fundo em cada tipo de personalidade. A leitura
atenta da descrição dos comportamentos que são comuns a cada um dos mecanismos utilizados
por indivíduos fixados na abertura parece indicar que o indivíduo com baixa auto-estima tem suas
Dias (1994, citado em Tenório 2003) descreve o indivíduo que interage a partir da
introjeção como o que faz tudo para se sentir aceito; nunca discorda de nada nem de ninguém;
procura agradar mesmo com sacrifício próprio, a opinião dos outros é quem baliza suas decisões
e escolhas; assume, sem reclamar, tarefas que os outros lhe impõem chegando a se sentir culpado
quando pensa que não atendeu as expectativas; os valores e normas da sociedade são seguidos
sem avaliação crítica; abre mão de seus interesses e necessidades; é conservador por excelência
cultivando com afinco os valores de sua família; aceita a vida como ela é e não tenta modificá-la.
Uma pessoa que se sabe com baixa auto-estima e que venha a fazer uma análise honesta quanto
(2003), como todos os outros processos de bloqueio do contato, torna-se praticamente uma
maneira de ser. Ribeiro (1997) faz uma síntese desse tipo de defesa descrevendo as atitudes dos
indivíduos confluentes são sintetizadas na frase: “nós existimos, eu não”. Dessa forma, a
Processo pelo qual, a pessoa se liga fortemente aos outros, sem diferenciar o que é
seu do que é deles, diminui as diferenças para sentir-se melhor e semelhante aos
sociedade e dos pais. Gosta de agradar os outros, mesmo não tendo sido solicitada e,
antigo, aceitando até que decidam por ela coisas que lhe desagradam (p.49).
geral da pessoa com baixa auto-estima, já que esta não se vê à altura das outras pessoas, que
que as pessoas sejam como o proflector deseja que elas sejam. As suas características parecem
com Ribeiro (1997), ao “eu existo nele”, isto é, o indivíduo não se reconhece “como sua própria
fonte de nutrição” e daí volta-se para o outro sempre querendo algo em troca, por não conhecer
outra forma de interagir ele vive o sofrimento de não ser correspondido em suas expectativas e
Tenório (2003) traça um retrato psicológico do indivíduo que interage a partir de sua
fixação na abertura. Com base nas características da introjeção, confluência e proflexão; a autora
(...) o indivíduo aceita tudo e não se opõe a quase nada que lhe é imposto. Engole
inteiro quase tudo que é compatível com sua estrutura introjetada de “eu”. Evita
esperado pelos outros, abrindo mão de seus próprios interesses e necessidades. Não
consegue tomar suas próprias decisões e fazer suas escolhas com base em sua própria
experiência. Precisa do outro para saber o que quer e para definir o que é melhor para
outro e se sente completamente dependente deste. Não tem capacidade para atuar de
forma agressiva, que é necessária a todo contato com o novo, uma vez que sua
agressividade foi amplamente diminuída. Ele não sabe lutar, discordar ou pedir
suficiente auto-apoio, ele é extremamente voltado para os outros, pois acredita que
só através destes é possível encontrar sua própria felicidade. Por esse motivo ele
investe toda sua energia em agradá-los e satisfazer suas expectativas, para que lhe
proporcione aquilo que ele precisa, sem saber como conseguir o que deseja através
Tenório (2003) esclarece que tanto a fixação na abertura como no fechamento das
fronteiras de contato “constituem formas de defesa desenvolvidas pela função ego do Self, no
sentido de evitar conflitos na relação com seu próprio mundo interno ou externo” (p. 67). Os
padrões de comportamento em qualquer das fixações se caracterizam pela rigidez que visa
Dias (1994, em Tenório 2003) separa os mecanismos que mais atuam no fechamento da
fronteira daqueles cujas interrupções são próprias de seu funcionamento fixado na abertura.
38
• Projeção: Processo pelo qual a pessoa, tendo dificuldade de identificar o que é seu,
observar, de ter consciência exagerada de seus objetivos e do que precisa fazer para
envolver com o outro, de se entregar, de fluir espontaneamente nesse contato, por medo
de perder seus próprios limites. Presença de fronteira rígida que separa o eu do outro, e
• Retroflexão: Função hermafrodita em que a pessoa volta para si o que ele gostaria de
fazer a outrem, ou faz a si mesmo o que gostaria que os outros lhe fizessem. Sua
Tenório (2003) ressalta que todos esses mecanismos são típicos da personalidade
afetiva; e a fixação, enquanto tendência à rigidez e ao apego exagerado às pessoas, coisas, idéias,
pensamentos, emoções, lembranças, etc, apresentam características neuróticas comuns aos dois
No conjunto de experiências vividas desde que a pessoa nasce é que estão as raízes para o
tipo de personalidade que vai predominar e se esta terá um funcionamento saudável ou neurótico.
ser fixado na abertura ou no fechamento da fronteira. Nos dois casos são utilizadas certas formas
artificial de outras” (p.79). O autor argumenta que geralmente a criança não tem oportunidade de
desenvolver plenamente suas potencialidades, pois mesmo pais bem intencionados acabam
moldando estas potencialidades em algo que eles e a sociedade aprovem, ele constata que neste
caso “a personalidade espontânea está sendo substituída por uma deliberada” (idem).
40
logram sufocar as potencialidades que todo indivíduo traz ao nascer. No entender da Gestalt
Terapia, estas situações desagregadoras da personalidade podem ser vivenciadas pela criança
desde seus primeiros contatos com o processo de alimentação fisiológica o qual, para esta
estreita ligação entre a satisfação não ideal deste instinto e as dificuldades posteriores enfrentadas
pelas pessoas em termos de contato consigo e com os outros no decorrer de suas vidas. No
entendimento desse autor, nesse momento decisivo é que são implantadas as principais atitudes
negativas. Estas mensagens causam cisão na personalidade, que passa a funcionar a partir de duas
partes distintas: a parte verdadeira é suprimida e a parte falsa torna-se dominante, regulando
sentimentos e emoções. Tenório (2003) exemplifica esta condição: o dominador, diante de uma
experiência de raiva, determina que a pessoa diga para si mesma “não devo sentir raiva”
sensação de serem próprias da pessoa suas escolhas e ações, mas na verdade, não são, encontram-
se calcadas nas atitudes introjetadas advindas do meio externo. O segundo, o eu ideal introjetado,
41
é como a própria palavra diz, um ideal que não é formado pelos anseios naturais da pessoa, cujo
valor está apoiado nos desejos das figuras significativas para ela, os quais ela obedece com o fim
de receber aprovação, da qual depende para sobreviver. Ambos tornam-se semelhantes no ponto
em que, possuindo características alheias, interferem na maneira de ser da pessoa e por esse
não tem como enfrentar, sua condição de individuo dependente e o seu inerente instinto de
assumindo para si o que é dos outros. Tenório (2003). Para a GT, viver é estar em contato e a
redução do contato consigo mesmo e com o meio leva ao empobrecimento desse viver, pois, ao
tanto de si como do meio, sou seja, um padrão neurótico de atuar. Tenório (2003) explica o
movimento da fronteira de contato dizendo que este se dá pela formação e destruição de figuras e
que os indivíduos podem apresentar disfunção nesse movimento por meio da busca ou da
salienta que muito se tem escrito sobre a superestrutura da auto-estima com nomes diferentes tais
consegue separar a camada de confusão que separa o si-mesmo da auto-estima” (pp. 62-63).
42
Neste caso, o indivíduo sente esta confusão como algo muito desagradável e por isso se mobiliza
para não entrar em contato com suas áreas de confusão mantendo intocadas suas dificuldades
Sobre a influência que os pais exercem na constituição da auto-estima de seus filhos Perls
(1973/1988) fala que essa influência, quando negativa, acontece de duas maneiras: os pais podem
mimá-los interrompendo assim suas tentativas de descobrir seus próprios pontos de apoio ou
podem superprotegê-los destruindo sua confiança nas habilidades que as crianças querem testar.
dependentes e as mimadas só aparentemente auto-suficientes, mas tanto umas como as outras não
de uma pessoa, Ribeiro (1999) refere-se às conseqüências das lesões que podem ocorrer aí:
alguém que teve lesada, por completo, “sua unidade funcional” de auto-estima terá o
funcionamento de seu organismo perturbado como um todo e como atitude preponderante poderá
expressar“ (Ribeiro 1997 p.24) - verifica-se que a pessoa cujas interações são permeadas pelo
sentimento de valer menos terá “seu jeito de ser” engessado por uma visão distorcida de si
mesma, essa distorção é explicada pela Gestalt Terapia como um resultado de experiências
interferem nos contatos feitos no presente por promover um tipo de significação da realidade
O modo de viver da pessoa que tem baixa auto-estima está contaminado por uma forma
de sentir que Perls, Hefferline e Goodman (1969/1997) descrevem como cheia de auto-
reprimendas, pesar, frustrações e culpa por ser inadequada. Todas estas atitudes diminuem ainda
mais o autovalor, pois este sentimento não pode ser construído em cima de justificativas e auto-
acusações mas sim por meio da ação, pelo fazer algo de fato e pelo ser o que se é.
A auto-imagem idealizada ocupa um espaço muito grande na vida das pessoas e Perls
(1969/1977) considera que a maioria delas vive apenas em função de sua imagem. Onde algumas
pessoas têm um Self, “a maioria tem um vazio, pois estão muito ocupadas em parecer isto ou
aquilo. Isto, outra vez, é o tormento do ideal, o tormento de que você não deve ser o que é”
seja, em vez de realizarem a si mesmas, as pessoas realizam a concepção do que os outros e elas
A perda da distinção entre o Self e o outro e a auto-estima precária criam uma necessidade
visceral de apoio externo, que por sua vez precisa vir sem críticas por conta da sensibilidade
exarcebada do indivíduo com baixa auto-estima: “A auto-estima precária faz com que o indivíduo
se torne muito sensível à crítica real ou imaginária” (Perls 1973/1988 p. 61). Sua necessidade
que leva a comportamentos adaptativos; assim quando o valor atribuído a si mesmo tende a ser
elevado vão estar presentes a auto-confiança e atitudes assertivas. A menos valia ou sentimento
de baixa auto-estima, por sua vez, deixam evidentes as dificuldades para se realizar contatos
verdadeiros seja consigo mesmo, seja com os outros: “ao faltar o apoio fornecido pela auto-
estima, o resultado é uma necessidade constante de apoio externo: a necessidade de ser estimado
A atuação desatualizada tem sua origem na perda das iniciativas que foram suprimidas há
muito tempo, Perls, Hefferline e Goodman (1969/1997) demonstram este processo: ao mesmo
objetivos simples, como por exemplo, quando leva um tapa por ser “atrevida”, o resultado é o
medo de tentar e a conseqüência é o abandono do apetite: “de modo geral, há a redução a uma
cuidado, sem entender como. Isto leva a uma insegurança e inferioridade persistentes” (p.51)
(1975/1977) ressalta que se esta dependência estiver relacionada com a auto-estima tudo se torna
muito mais difícil: “se você necessita que todos lhe dêem elogios encorajadores, tapinhas nas
Terapia, pode ser facilitada pela análise do processo de auto-regulação organísmica e sua função
distorção; se todos têm mais valor que o indivíduo com baixa auto-estima, este terá suas
tentativas de contato contaminadas pelo medo de não ser aceito e pela necessidade incontrolável
45
de agradar, condição mais que suficiente para abortar suas possibilidades de construir relações
satisfatórias.
O conceito de contato, que na sua gênese é a forma como a pessoa se relaciona com ela
Para esta abordagem, as interrupções de contato podem se tornar a base do sentimento de baixa
auto-estima, na medida em que este sentimento impede o individuo de ter um contato saudável
com o meio externo, o que vai impossibilitar tanto suas realizações como o seu bem estar.
o objetivo inconsciente de evitar o abandono. Como depende dos outros, ou seja, o aspecto
vulnerabilidade. Tenório (2003) esclarece que tal condição é fruto da fraca definição da própria
identifica facilmente com ele transfere para este todo o poder e responsabilidade em promover
condição de um desenvolvimento sadio, a criança aprende a usar seus próprios recursos na busca
do equilíbrio, ficando livre para usar, na prática, seu potencial inato. Em oposição a este
comportamento maduro, que favorece a liberdade do uso das capacidades inatas, esta abordagem
terapêutica considera neurótica a pessoa que é incapaz de conquistar sua independência do meio
em que vive. Neste contexto, o indivíduo não consegue assumir a responsabilidade por si mesmo
e passa a buscar, no ambiente, um apoio fraudulento, dando ordens, pedindo ajuda, explicações e
respostas, sem conseguir pôr em prática recursos próprios com vistas à sua autonomia. Observa-
se que, em ambos os casos, o indivíduo aparece como um elemento ativo do seu processo de
desenvolvimento, mesmo quando ainda depende completamente de cuidados por parte dos
adultos. Polster & Polster (1973/79 em Tenório 2003) falam que, se o ambiente é benéfico e
oferece bases confiáveis ao desenvolvimento sadio da criança, ela recebe coisas de boa qualidade,
que a nutrem e contribuem para seu bem estar e seu crescimento natural.
Por outro lado, o indivíduo que desde seus primeiros anos de vida recebe em seu interior
vivencia um constante desconforto que ele busca constantemente resolver ou modificar. Visto
como um sintoma, este desconforto é, na visão de Ribeiro (1997), “uma forma desesperada,
que nos últimos tempos houve um crescimento exponencial na compreensão que o homem tem
das coisas e de si mesmo. O autor observa que, no entanto, isso não foi acompanhado da
47
capacidade de usar esse conhecimento em interesse próprio e, no seu ponto de vista, entender-se
apenas como manobra intelectual não tem utilidade para a vida cotidiana: “o homem pode viver
uma vida mais plena e rica do que a maioria vive agora (...) O homem não começou ainda a
Nesse sentido, a mudança, para Perls (1973/1988), passa necessariamente pela mudança
de postura, em vez de um mero exercício intelectual, ela requer envolvimento prático com o auto-
compreender nem entender o que fazemos, não podemos pretender resolver nossos
problemas nem esperar viver vidas gratificantes. Porém tal compreensão do Self
sensibilidade (p.17).
A integridade, segundo Perls (1973 /1988), é a verdadeira natureza do homem e por este
motivo, só na integração entre espontaneidade e propósito ele pode fazer uma escolha existencial
eficiente. Funcionando como parte de sua natureza essas duas forças levam o homem a “se dar
conta e se responsabilizar pelo campo total, pelo si mesmo tanto quanto pelo outro“ (p.62). Dessa
dos indivíduos.
De acordo com Perls (1973 /1988) as pessoas tornaram-se fóbicas em relação à dor e ao
sofrimento e a atitude de fugir das frustrações dolorosas é, a seu ver, um impedimento para o
crescimento. Receando ser mal compreendido, Perls ressalta que não está falando de masoquismo
desagradáveis” (p.132).
48
Perls (1973 /1988) ressalta que o indivíduo introjetivo sempre procura atalhos e tem
muita preguiça de assimilar o mundo e em função de tudo isso seu crescimento e auto-realização
tendência humana para o emprego da lei do menor esforço: “a tríade impaciência, preguiça e
ambição faz surgir impedimentos poderosos para elaborar o material introjetado, para mastigá-lo
Perls (1969/1997) enumera vários sintomas que impedem o crescimento de uma pessoa e
redução do potencial humano, a perda da habilidade de responder” (p.11), e por último, como o
saturação que aqui tem o sentido de esforço contínuo para transcender o suporte ambiental,
substituindo-o pelo auto-suporte, o que significa uma crescente redução das dependências.
A mudança para Perls, Hefferline e Goodman (1951/1997) requer do indivíduo que ele
recobre a flexibilidade da relação figura/fundo e ele só chega a isso trabalhando com o óbvio:
dos problemas que afligem os indivíduos e a permissão que se dá ao organismo para se auto-
regular, suaa conclusão é de que a grande maioria das pessoas é regulada pelo meio social e por
No entanto, tais indivíduos são responsáveis por grande parte dos seus problemas e só eles
poderão resolvê-los: “muitas condições, tanto objetivas como subjetivas podem e devem ser
49
mudadas (...) há sempre reações regulatórias do próprio organismo que ajudam a restaurar o
awareness, importante conceito da Gestalt Terapia que é definido por Ribeiro (2006) como ” a
consciência da própria consciência ou como um processo pelo qual me torno consciente de minha
própria consciência aqui e agora no mundo” (p. 74). Assim, Hycner (idem) considera que a
pessoa “investe na experiência atual, sem exigências para mudá-la e sem julgamentos de que não
mas Hycner (1995/1997) lhes confere um outro status: “nossas dificuldades são nossa força vital”
organismo busca a auto-regulação e para que isto ocorra, a vida providencia para que aquilo que é
evitado acumule mais e mais forças até que não possa mais ser ignorado. Dessa forma, a rejeição
conseqüências vão se manifestar por meio de sintomas e adoecimentos caso não haja mudanças.
descoberta. Embora todo indivíduo tenha o objetivo básico de realizar-se naquilo que é, as
Quando este indivíduo aprende/descobre que ele não é aquilo que lhe disseram que deveria ser,
conquista uma nova realidade que é o prazer de andar sobre os próprios pés.
Ribeiro (1999) mostra sua confiança no ser humano quando fala da capacidade que toda
pessoa tem de mudar o rumo de sua existência. O autor ressalta que fazer uso desta capacidade
50
depende exclusivamente da pessoa mas que o medo de correr riscos pode inibir e até paralisar a
pessoa que prefere o desconforto e o sofrimento conhecidos do que confrontar seus conflitos
interiores. Querer mudar significa, para o autor, estar disponível para assumir riscos, surpresas,
prazeres e compromissos que a vida pode apresentar. Por ser uma escolha, a mudança não ocorre
por acaso e nem por decreto, é uma escolha: “para que a mudança ocorra é preciso que a pessoa
queira mudar, saiba o que deseja mudar e de onde e para onde deseja se locomover” (p.46).
Lewin, (citado em Ribeiro 1999), confere ao ser humano a responsabilidade pela sua
A pessoa humana não é vítima de si mesma, não é determinada a priori pelos seus
responsável pelo seu destino, pela sua liberdade e passa a correr o risco de existir por
contato no que se refere ao seu ritmo de trocas. Se as fronteiras são rígidas tornam-se um
dificultador com grande poder para impedir mudanças. Perls (1973/1988) ressalta que é grande a
quantidade de pessoas afundadas na alienação; na maioria das vezes, suas possibilidades de uma
vida mais rica estão soterradas por forças que elas desconhecem.
Ribeiro (1999) fala das dificuldades e das possibilidades de mudança determinadas pela
ou menor dependendo das forças que atuam neste campo. Dependendo do grau de
toda mudança passa pela experiência do contato, apesar de não haver uma automática
dinâmico, na produção do efeito ocorrido. Ribeiro (idem) afirma que o processo de mudança
segue a mesma lógica do adoecimento: assim como é a totalidade que adoece - o sintoma surge
apenas como um grito de dor da parte mais lesada - também é a totalidade que precisa ser
mudada, pois é por ela que se pode perceber como o sintoma foi estruturado.
Esse autor considera importante o fechamento das gestalten e não somente a destruição
das mesmas; no seu entender este é o caminho para a saúde, ou seja, fechar gestalts significa
“encontrar o próprio sentido, a própria fisionomia: é tornar-se senhor de si mesmo” (p. 38). Nesse
sentido, o autor considera que fatores de cura ou fatores psicoterapêuticos, quando ocorridos em
psicoterapia, têm um alto potencial de alterar comportamentos, provocar mudanças e até mesmo
A estrutura da personalidade, portanto, deve ser vista, no nosso contexto, como algo
sofrendo as influências do meio e das variáveis não psicológicas, estando assim, ela
outra vez enfatiza a importância do processo terapêutico, no que se refere a um tipo diferenciado
dos quais se tornou momentaneamente sem habilidade para lidar com sua mudança,
A mudança tem outras formas de ser promovida e Ribeiro (idem) menciona a experiência
plena de cada passo do ciclo do contato, que permite à pessoa continuar sua busca de contato
para mudar. Tendo em vista que mudança não ocorre sem que haja uma busca
sintoma. Nessa busca, o indivíduo deve estar envolvido com as dúvidas, certezas e
• Uma consciência emocionada: para a mudança, não basta o pensar, é necessário que o
pensamento aconteça junto com a emoção e a ação; os três elementos juntos possuem a
força da mudança.
precede sempre a consciência plena. Quando a pessoa alcança a totalidade, esta a leva à
consciência que, por sua vez, provoca a intencionalidade que predispõe para a mudança e
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Para facilitar o entendimento desse processo, Ribeiro (1997) cita o exemplo de uma
pessoa que ao ouvir no grupo alguém falar de sua dor, impotência e sofrimento, entende não ser
a única a ter os mesmos sofrimentos e a partir dessa compreensão, vem o alívio, a esperança e a
coragem para mudar. Segundo o autor, esse sentimento é capaz de produzir mudança e até
mesmo cura e por isso é chamado de fator de cura. Em resumo, a mudança, a cura em Gestalt
terapia é concebida “como função do contato, como algo relacional entre pessoa-mundo e
Entende Beisser (1971//1973), que embora Perls não tenha delineado uma teoria de
mudança, esta se encontra subentendida em grande parte de sua obra, mais especificamente
implícita na prática das técnicas. É uma mudança que ocorre quando a pessoa é o que “é” e não
(...) a mudança ocorre com a dedicação de tempo e esforço pelo indivíduo de ser o
que é e não através de tentativa coercitiva que possa vir de si mesmo ou de outra
encontra-se em conflito com, no mínimo, duas facções intrapsíquicas que guerreiam entre si: uma
é o que deveria “ser” e a outra, o que pensa que “é”, “nunca se identificando plenamente com
muda, cresce ou desenvolve se for espicaçada ou com aplicação da lei da palmatória. O autor
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defende que as terapias gestálticas, quando bem aplicadas e coerentes com a teoria, desmentem
radicalmente essa crença, provando que a verdade está do outro lado: “na crença de que o ser
pela mudança, assim, Ribeiro (1998) mostra o efeito benéfico: o indivíduo, ao se aceitar e ser
aceito por pessoas significativas para ele, pára de se julgar e levar em conta julgamentos alheios
experimentar o novo, para a aventura de viver; torna-se mais livre passando a ter a opção de se
manter como é, se isso for melhor, ou para mudar, se houver sentido nessa mudança.
nos comportamentos fixados. Ribeiro (1998) esclarece que a opção por não mudar pode ocorrer
devido ao medo da incapacidade de lidar com o novo, com o instável. Neste caso, o individuo
opta por se conservar nos velhos padrões adquiridos, obstruindo ou desviando o fluxo interativo e
necessário como droga forte que alivia a sua dor mas tira dele o poder.
Concluindo, fica claro que, para a Gestalt Terapia, curar não significa solucionar
problemas, mas entrar em contato consciente com o sábio que cada um tem dentro de si e, a partir
daí, fazer o que este sábio decidir, como disse Fritz Perls. Em outras palavras: “curar é acreditar
com ‘A maiúsculo’, em nosso sábio e, portanto, em nós mesmos e, como decorrência lógica,
Conclusão
apresenta correspondência no que se refere às formas e meios que utiliza para conduzir seus
membros desde o nascimento até a idade adulta. A simples observação de si mesmo e daqueles
que estão próximos seja na família, na escola, no trabalho ou em outros contextos sociais mostra
o quanto o ser humano experiencia o viver como uma luta carregada de angústia e
desconhecimento das próprias potencialidades. Neste contexto a Gestalt Terapia e seu arcabouço
pessoa tem sobre si mesma. A formação do auto-conceito, tanto positivo como negativo, é um
processo complexo e dinâmico, que é constantemente alterado pelo sistema das relações
interpessoais.
por diversos tipos de abuso e pelo abandono, cujo desdobramento, no decorrer da vida, limitam
Para a G.T, a existência da baixa auto-estima se dá em razão de a pessoa não ser aceita da
forma que ela é, tanto pelas pessoas significativas para ela, quanto por si mesma. Essa não
seu contexto existencial, às quais a pessoa não teve possibilidade de rejeitar, por uma questão de
sobrevivência, para não perder o amor e a consideração das pessoas das quais dependia.
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A fuga, submissão e aceitação passiva das ordens e das mensagens vindas dos pais e de
outras fontes, sem contestação, sem questionamentos, são tipos de introjeção que, por sua vez,
geram conflito, porque a pessoa passa a ter dentro de si aspectos que não são seus, são os
introjetos tóxicos, os quais que ela de fato não aceitou, passando, por isso, a não se aceitar
também.
Tendo introjetado todo um material não condizente com sua real natureza, a pessoa passa
a conviver com um grande conflito resultante da luta entre o eu ideal introjetado, aquele
construído pela introjeção de valores e padrões impostos pelas figuras de autoridade, aquele
composto das mensagens “você deve, você tem que” e o eu real, o que é composto dos reais
valores e necessidades do indivíduo e que não se enquadra em molduras rígidas ou padrões fixos
de comportamento.
Esse eu ideal introjetado vai fazer o papel de um dominador interno que cobra, exige e
dominador. Essa dinâmica se faz necessária sempre que ela se encontra frente a situações
A existência desse eu ideal introjetado, de uma imagem idealizada à qual a pessoa pretende
corresponder, faz com que ela sinta baixa auto-estima, por estar sempre insatisfeita e achando-se
muito aquém desse ideal que, na verdade, não é seu, foi imposto pelos outros. Desse modo, a
pessoa torna-se muito confusa, por não saber quando suas atitudes serão aprovadas ou não, se
está agindo certo ou errado, sempre de acordo com a opinião alheia é claro, e não com a sua.
Isso acontece com a criança que não foi suficientemente valorizada, amada, considerada
positivamente e de forma incondicional, ela passa a introjetar uma imagem de si de que não é
boa, que não tem valor. Então, nessas experiências de ser cobrada, maltratada, rejeitada,
abandonada, humilhada, terá sempre implícita uma mensagem de não merecimento, de não ser
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amada, valorizada, de não ser boa o suficiente, de haver algo errado consigo mesma, mas não
com o meio, e por conseqüência, maneiras limitadas de expressão e atuação em seu meio
Esse modo de viver lhe traz muita insatisfação consigo mesma por estar sempre buscando
corresponder a uma imagem idealizada que foi construída a partir do que os outros esperam dela,
do que os outros exigiam dela, e por ser introjetada, torna-se dominadora. Diferentemente, a
pessoa que se baseia numa imagem idealizada, num eu idealizado não introjetado que é mais
condescendente, mais compreensivo, que aceita melhor suas limitações, não tem que conviver
com o conflito interno entre seu eu ideal introjetado e seu eu ideal não introjetado, autêntico;
pode surgir muito facilmente, o que pode levar o indivíduo à cristalização de um comportamento
obsoleto, tornando-o incapaz de atender suas necessidades pessoais e sociais. Assim, a opinião
distorcida sobre si mesma pode levar a pessoa desenvolver um modo confluente e proflectivo de
se relacionar com as pessoas, no qual, por medo de ficar só e através da submissão, abre mão de
seus próprios interesses, não luta, não discorda, isto é, não exercita sua agressão sadia, não
mudar, tornar-se uma nova pessoa, possuidora de alta estima por si, necessita, antes de tudo, ter a
coragem de se conscientizar no aqui e agora, do que ela sente exatamente, sem nenhuma
que é causado por si mesmo ou pelos outros. Essa consciência deve ser emocionada, pois não
basta pensar; pensamento e emoção andam juntos, o que a envolverá em dúvidas, incertezas e
Nessa busca pela elevação da auto-estima, a pessoa deve dedicar tempo e esforço em busca
de sua essência, em busca do que é, e não do que os outros querem que seja. Deve aprender a
ouvir seus próprios sentimentos, pensamentos e desejos, descobrindo o que lhe agrada e o que lhe
desagrada, visando reduzir o conflito entre o eu dominador e o eu dominado. Deve agir com
acolhimento. É desintrojetando, conscientemente e aos poucos, todo o material tóxico que a vida
mudando sua maneira confluente e proflectiva, própria de quem é fixado na abertura; é buscando
percorrer inteiramente o ciclo do contato, que a pessoa pode caminhar rumo ao seu crescimento.
Finalizando, a Gestalt Terapia, entende que o individuo deve buscar um contato saudável com
o meio externo, o que vai possibilitar tanto suas realizações como o seu bem estar, desenvolvendo
tal como é, e, conseqüentemente, ser aceito por pessoas significativas para ele, deve parar de se
experimentar o novo, para a aventura de viver; tornar a ser mais livre, passando a ter a opção de
decidir o melhor para sua vida, sempre apoiado pelo seu sábio interior.
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Artigo de Periódico: