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Reflexões Do Poeta em Os Lusíadas e Sua Análise 1

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Reflexões do poeta em Os Lusíadas

Reflexões do Poeta: críticas e conselhos aos Portugueses

O Poeta faz diversas considerações, no início e no fim dos Cantos da sua epopeia,
criticando e aconselhando os Portugueses.

Por um lado, refere os «grandes e gravíssimos perigos», a tormenta e o dano no mar,


a guerra e o engano em terra; por outro lado, faz a apologia da expansão territorial
para divulgar a Fé cristã, manifesta o seu patriotismo e exorta D. Sebastião a dar
continuidade à obra grandiosa do povo português.

Nas suas reflexões, há louvores e diversas queixas aos comportamentos. Se realça o


valor das honras e da glória alcançadas por mérito próprio, lamenta, por exemplo,
que os Portugueses nem sempre saibam aliar a força e a coragem ao saber e à
eloquência, destacando a importância das Letras. Se critica os povos que não seguem
o exemplo do povo português que, com atrevimento, chegou a todos os cantos do
Mundo, não deixa de queixar-se de todos aqueles que pretendem alcançar a
imortalidade, dizendo-lhes que a cobiça, a ambição e a tirania são honras vãs que
não dão verdadeiro valor ao homem. Daí, também, lamentar a importância atribuída
ao dinheiro, fonte de corrupção e de traições, confessando-se estar cansado de
imortalizar um povo que não reconhecia nem dava valor às suas qualidades artísticas

As suas reflexões aparecem nos seguintes cantos:

Canto I- Fragilidade da vida humana, face aos perigos enfrentados no mar e em terra

Est. 105

O recado que trazem é de amigos,(amigos/inimigos- antítese)

Mas debaixo o veneno vem coberto;(os perigos)

Que os pensamentos eram de inimigos,

Segundo foi o engano descoberto.

Ó grandes e gravíssimos perigos!

Ó caminho de vida nunca certo: (Apóstrofes)

Que aonde a gente põe sua esperança,

Tenha a vida tão pouca segurança!(Antítese)

Est. 106

No mar tanta tormenta, e tanto dano,(mar/terra- antítese) significa os perigos no mar e na

Tantas vezes a morte apercebida!Terra)


Na terra tanta guerra, tanto engano,

Tanta necessidade avorrecida!

Onde pode acolher-se um fraco humano,(fragilidade do Ser Humano)

Onde terá segura a curta vida,

Que não se arme, e se indigne o Céu sereno

Contra um bicho da terra tão pequeno?(Interrogação retórica para levar à reflexão sobre a
mesquinhez do Ser Humano)

Análise das estâncias

As traições e os perigos a que os navegadores estão sujeitos justificam este desabafo do Poeta.

Não será por acaso que esta reflexão surge no final do Canto I, quando o herói ainda tem um
longo e penoso percurso a percorrer.

Ver-se-á, no Canto X, até onde a ousadia, a coragem e o desejo de ir sempre mais além pode
levar o «bicho da terra tão pequeno», tão dependente da fragilidade da sua condição humana.

Canto V- Desprezo a que as Artes e as Letras são votadas pelos portugueses

Est. 92 a 100

Quão doce é o louvor e a justa glória

Dos próprios feitos, quando são soados! Trabalhados(frase de tipo exclamativo, linguagem
emotiva)

Qualquer nobre trabalha que em memória(As pessoas ilustres, em particular, tentam superar
os seus antepassados)

Vença ou iguale os grandes já passados.

As invejas da ilustre e alheia história

Fazem mil vezes feitos sublimados.

Quem valerosas obras exercita,

Louvor alheio muito o esperta e incita.

Resumo: Todos gostam de ouvir louvar os seus feitos gloriosos. As pessoas ilustres, em
particular, tentam superar os seus antepassados. O elogio e o louvor estimulam a acão

Não tinha em tanto os feitos gloriosos

De Aquiles, Alexandro na peleja,

Quanto de quem o canta, os numerosos(nestas estrofes faz alusão às civilizações clássicas)


Versos; isso só louva, isso deseja.

Os troféus de Melcíades famosos

Temístocles despertam só de inveja,

E diz que nada tanto o deleitava

Como a voz que seus feitos celebrava

Resumo: Tanto Alexandre, como Temístocles, embora apreciassem os seus heróis, gostavam
ainda mais de ouvir louvar os versos que sobre eles se faziam)

Trabalha por mostrar Vasco da Gama

Que essas navegações que o mundo canta

Não merecem tamanha glória e fama(Vasco da Gama ao sobrevalorizar os feitos do seu povo,
ao falar ao Rei de Melinde, tentando mostrar que as suas navegações são mais gloriosas do
que as dos antigos))

Como a sua, que o céu e a terra espanta.(hipérbole e antítese)

Si; mas aquele Herói, que estima e ama(mitificação do herói coletivo)

Com dons, mercês,.favores e honra tanta

A lira Mantuana, faz que soe

Eneias, e a Romana glória voe.(comparando a civilização portuguesa com as outras da


Antiguidade Greco Latina, estas últimas nada valem)

Dá a terra lusitana Cipiões,(em Portugal também há célebres guerreiros)

Césares, Alexandros, e dá Augustos;

Mas não lhe dá contudo aqueles dois

Cuja falta os faz duros e robustos.(Porém pela sua rudeza, estes não possuem como os outos,
os dons necessários para apreciarem a poesia ou para fazerem versos)

Octávio, entre as maiores opressões,

Compunha versos doutos e venustos.

Não dirá Fúlvia certo que é mentira,

Quando a deixava Antônio por Glafira,


Vai César, sojugando toda França,

E as armas não lhe impedem a ciência;

Mas , numa mão a pena e noutra a lança, (“pena” simboliza a sabedoria, a eloquência

Igualava de Cícero a eloquência. E a “lança” simboliza a valentia)

O que de Cipião se sabe e alcança,

É nas comédias grande experiência.

Lia Alexandro a Homero de maneira

Que sempre se lhe sabe à cabeceira.

Resumo: César, Cipião e Alexandre eram grandes homens de armas, mas também gostavam de
ler e apreciar grandes autores. Alexandre apreciava tanto os versos de Homero que os tinha
sempre à cabeceira)

Enfim, não houve forte capitão,(“Enfim” é um conector com valor conclusivo,

Que não fosse também douto e ciente,(o poeta sente vergonha, pelo facto de Portugal ser a
única nação em que a valentia não se liga à cultura))

Da Lácia, Grega, ou Bárbara nação,(enumeração assindética)

Senão da Portuguesa tão somente.

Sem vergonha o não digo, que a razão

De algum não ser por versos excelente,

É não se ver prezado o verso e rima,

Porque, quem não sabe arte, não na estima.

Resumo: O poeta chega à conclusão que em toda a parte, exceto entre os portugueses, houve
capitães ilustres que nunca deixaram de apreciar a cultura. Os portugueses não o fazem
porque não a conhecem)

Por isso, e não por falta de natura,(“ por isso” conector com valor conclusivo)

Não há também Virgílios nem Homeros;

Nem haverá, se este costume dura,

Pios Eneias, nem Aquiles feros.

Mas o pior de tudo é que a ventura

Tão ásperos os fez, e tão austeros,(hipérbato), anáfora e paralelismo anafórico


Tão rudos, e de engenho tão remisso,

Que a muitos lhe dá pouco, ou nada disso.

Resumo: Da mesma forma que não há capitães célebres, também não há grandes poetas ou
heróis célebres no nosso país. O mais grave é que a muitos isso importa pouco.

Às Musasagardeça o nosso Gama(as musas eram a fonte inspiradora)

O muito amor da pátria, que as obriga( patriotismo do poeta)

A dar aos seus, na lira, nome e fama

De toda a ilustre e bélica fadiga;

Que ele, nem quem na estirpe seu se chama,

Calíope não tem por tão amiga(plano mitológico, no recurso às deusas)

Nem as filhas do Tejo, que deixassem

As telas d'ouro fino e que o cantassem(metáfora)

Porque o amor fraterno e puro gosto

De dar a todo o Lusitano feito

Seu louvor, é somente o pros[s]uposto(hipérbato)

Das Tágides gentis, e seu respeito.

Porém não deixe, enfim, de ter disposto

Ninguém a grandes obras sempre o peito:

Que, por esta ou por outra qualquer via,

Não perderá seu preço e sua valia.

Análise das estrofes

O Poeta começa por mostrar como o canto, o louvor, incita à realização dos feitos; dá
exemplos do apreço dos Antigos pelos seus poetas, bem como da importância dada ao
conhecimento e à cultura, que levava a que as armas se encontrassem em paralelo com a
sabedoria.

Não é, infelizmente, o que se passa com os portugueses: não se pode amar o que não se
conhece, e a falta de cultura dos heróis nacionais é responsável pela indiferença que
manifestam pela divulgação dos seus feitos. Camões critica a pouca ou nenhuma importância
que em Portugal se dá às artes e às letras, lamentando que sendo os portugueses tão
corajosos, não sejam também cultos. Apesar disso, o Poeta, movido pelo amor da pátria,
reitera o seu propósito de continuar a engrandecer, com os seus versos, as «grandes obras»
realizadas.

Manifesta, desta forma, a vertente pedagógica da sua epopeia, na defesa da realização plena
do Homem, em todas as suas capacidades

Canto VI – O esforço heróico que permite alcançar a fama e a glória, quando alcançadas pelo
mérito, pela determinação, sacrifício e humildade e não pela herança ou por bens
mundanos. Fala também do modo de atingir a imortalidade, através de valores elevados.
Mais tarde, no Canto IX, também vai reforçar esta sua reflexão

Est. 95 a 99

Por meio destes hórridos perigos,

Destes trabalhos graves e temores,( É através de muito esforço que se consegue atingir a fama
e a imortalidade)

Alcançam os que são de fama amigos

As honras imortais e graus maiores;

Não encostados sempre nos antigos (e não através dos que nos deixaram os nossos
antepassados)

Troncos nobres de seus antecessores;

Não nos leitos dourados, entre os finos

Animais de Moscóvia zibelinos;

96

Não cos manjares novos e esquisitos,

Não cos passeios moles e ouciosos,(Anáfora, com o objetivo de realçar que não é com os
prazeres mundanos)

Não cos vários deleites e infinitos,

Que afeminam os peitos generosos;

Não cos nunca vencidos apetitos,

Que a Fortuna tem sempre tão mimosos,

Que não sofre a nenhum que o passo mude

Pera algũa obra heróica de virtude;


97

Mas com buscar, co seu forçoso braço,(“ mas”, articulador discursivo com valor de oposição)

As honras que ele chame próprias suas;(hipérbato, de modo a mostrar que é com as honras,
coragem e valentia dos nossos esforços, ultrapassando todos os perigos)

Vigiando e vestindo o forjado aço,

Sofrendo tempestades e ondas cruas,

Vencendo os torpes frios no regaço

Do Sul, e regiões de abrigo nuas,

Engolindo o corrupto mantimento

Temperado com um árduo sofrimento;

98

E com forçar o rosto, que se enfia,

A parecer seguro, ledo, inteiro,

Pera o pelouro ardente que assovia

E leva a perna ou braço ao companheiro.(companheirismo)

Destarte o peito um calo honroso cria,

Desprezador das honras e dinheiro,

Das honras e dinheiro que a ventura(crítica à ambição e cobiça)

Forjou, e não virtude justa e dura.

99

Destarte se esclarece o entendimento,

Que experiências fazem repousado,

E fica vendo, como de alto assento,

O baxotrato humano embaraçado.

Este, onde tiver força o regimento

Direito e não de afeitos ocupado,


Subirá (como deve) a ilustre mando,

Contra vontade sua, e não rogando.(atingirá a imortalidade)

Análise das estrofes

Nestas estrofes do canto VI podemos notar os conceitos de valor, sofrimento,


companheirismo, mérito e recompensa.

Em cinco estofes apenas, Camões fala-nos destas cinco valiosas coisas e de como é
importante que as admiremos. Começando pelos valores que cada um de nós deve ter,
passando pelo sofrimento e companheirismo, que tais valores às vezes implicam, e acabando
no mérito e recompensa, é-nos dada uma crítica há sociedade por esta se concentrar
demasiado nas coisas supérfluas que para nada interessam sem ser para as aparências. Temos
passagens como: "Não encostados sempre nos antigos troncos nobres dos seus antecessores"
- reconhecidos pelos seus feitos e não elogiando-se daquilo que os seus antepassados fizeram,
lutando pelo que queriam; "Desprezando honras e dinheiro" - pessoas com verdadeiros
valores não se interessam pelo dinheiro; "Sofrendo tempestades e ondas cruas (...) temperado
com hum árduo sofrimento" - sofrendo para alcançarem aquilo em que acreditam, cuidam uns
dos outros, ajudando-se. O companheirismo é marcado pelo sofrimento de perder os seus.
"As honras que ele chame “própriassuas”; vigiando e vestindo o forjado aço" - tudo o que
alcançaram pertences-lhes, lutaram para tê-lo, o mérito é todo deles. Devido aos seus valores
e ao sofrimento pelo qual tiveram de passar, serão recompensados. Alcançaram tais feitos, tais
grandiosidades que a sua recompensa terá de ser divina. Qualquer coisa abaixo disso seria
menosprezar os seus feitos gloriosos. "subirá, como seve, a ilustre mando" - aqueles que se
dignificam pela capacidade de luta e sofrimento alcançam a eternidade pelos seus esforços,
pelo mérito e pelos valores que carregam consigo. Tais feitos e tais pessoas nunca serão
esquecidos. Continuando a exercer a sua função pedagógica e moralizadora, o Poeta defende
um novo conceito de nobreza, espelho do modelo renascentista: a fama e a imortalidade, o
prestígio e o poder adquirem-se pelo esforço - na batalha ou enfrentando os elementos,
sacrificando o corpo e sofrendo pela perda dos companheiros; não se é nobre por herança,
permanecendo no luxo e na ociosidade, nem pela concessão de favores se deve alcançar lugar
de relevo.

A mesma reflexão faz o poeta no Canto IX

Mas a Fama, trombeta de obras tais,

Lhe deu no Mundo nomes tão estranhos

De Deuses, Semideuses, Imortais,

Indígetes, Heróicos e de Magnos.

Por isso, ó vós que as famas estimais,( apóstrofe aqueles que querem ser imortais)

Se quiserdes no mundo ser tamanhos,


Despertai já do sono do ócio ignavo,(aspetos negativos que não levam à fama.

Que o ânimo, de livre, faz escravo. Verbo no Imperativo “despertai” com função apelativa )

E ponde na cobiça um freio duro,

E na ambição também, que indignamente (no imperativo, para chamar a atenção dos vícios a
que estamos sujeitos, nomeadamente, a ambição, tirania e cobiça)

Tomais mil vezes, e no torpe e escuro

Vício da tirania infame e urgente;

Porque essas honras vãs, esse ouro puro,

Verdadeiro valor não dão à gente:

Milhor é merecê-los sem os ter,(quiasmo. tipo de trocadilho)

Que possuí-los sem os merecer.

Ou dai na paz as leis iguais, constantes,(articulador com valor de alternância, como forma de
superar os vícios)

Que aos grandes não dêem o dos pequenos,

Ou vos vesti nas armas rutilantes,

Contra a lei dos imigos Sarracenos:

Fareis os Reinos grandes e possantes,

E todos tereis mais e nenhum menos:

Possuireis riquezas merecidas,

Com as honras que ilustram tanto as vidas.

E fareis claro o Rei que tanto amais,

Agora cos conselhos bem cuidados, (anáfora)

Agora co as espadas, que imortais

Vos farão, como os vossos já passados.

Impossibilidades não façais,


Que quem quis, sempre pôde; e numerados

Sereis entre os Heróis esclarecidos

E nesta «Ilha de Vénus» recebidos-(Ilha dos Amores, símbolo de recompensa de todos os


perigos que os portugueses passaram, ficando imortais)

Canto VII- Tristeza sobre a ingratidão dos seus contemporâneos, que não lhe reconhecem
nenhum valor

Um ramo na mão tinha... Mas, ó cego,(apóstrofe)

Eu, que cometo, insano e temerário,

Sem vós, Ninfas do Tejo e do Mondego

Por caminho tão árduo, longo e vário!

Vosso favor invoco, que navego(de novo a invocação às ninfas para que não o desamparem,
pois tem receio que a sua obra não chegue ao fim, enumerando em seguida, os perigos a que
se vê sujeito)

Por alto mar, com vento tão contrário

Que, se não me ajudais, hei grande medo

Que o meu fraco batel se alague cedo.

Olhai que há tanto tempo que, cantando

O vosso Tejo e os vossos Lusitanos,

A Fortuna me traz peregrinando,

Novos trabalhos vendo e novos danos:

Agora o mar, agora experimentando

Os perigos Mavórcios inumanos,

Qual Cánace, que à morte se condena,

Nũa mão sempre a espada e noutra a pena; ( “espada, símbolo de luta nas guerras e a “pena,
símbolo de ter vindo sempre a cantar os feitos dos portugueses)
Agora, com pobreza avorrecida,

Por hospícios alheios degradado;

Agora, da esperança já adquirida,

De novo mais que nunca derribado;(anáfora do deítico temporal “agora” para reforçar os
desânimos pelo que está a passar)

Agora às costas escapando a vida,

Que dum fio pendia tão delgado

Que não menos milagre foi salvar-se

Que pera o Rei Judaico acrecentar-se.

E ainda, Ninfas minhas, não bastava(anástrofe)

Que tamanhas misérias me cercassem, (evidencia as misérias pelas quais tem passado e todos
os perigos que tem corrido)

Senão que aqueles que eu cantando andava(crítica aos seus contemporâneos)

Tal prémio de meus versos me tornassem:

A troco dos descansos que esperava,

Das capelas de louro que me honrassem,

Trabalhos nunca usados me inventaram

Com que em tão duro estado me deitaram.

Vede, Ninfas, que engenhos de senhores (Verbo no Imperativo com função apelativa) e
Apóstrofe às ninfas, musas inspiradores, para observarem o desinteresse dos seus
contemporâneos sobre as Letras)

O vosso Tejo cria valerosos,

Que assi sabem prezar, com tais favores,

A quem os faz, cantando, gloriosos!

Que exemplos a futuros escritores,

Pera espertar engenhos curiosos,Crítica do poeta, em relaçãoao não poderem existir novos
poetas que imortalizem o povo português
Pera porem as cousas em memória

Que merecerem ter eterna glória!

Pois logo, em tantos males, é forçado

Que só vosso favor me não faleça,

Principalmente aqui, que sou chegado

Onde feitos diversos engrandeça:

Dai-mo vós sós, que eu tenho já jurado (Verbo no Imperativo, com valor de súplica, como fez
no Canto I, na Invocação às Tágides (ninfas do Tejo) e Apóstrofe em “Vós”

Que não no empregue em quem o não mereça,

Nem por lisonja louve algum subido,

Sob pena de não ser agradecido.

Análise das estrofes

Percorrido tão difícil caminho, é momento para que, na chegada a Calecut, o Poeta faça novo
louvor aos Portugueses. Exalta, então, o seu espírito de Cruzada, a incansável divulgação da Fé,
por África, Ásia, América, «E, se mais mundos houvera, lá chegara», assim inserindo a viagem à
Índia na missão transcendente que assumiram e que é marca da sua identidade nacional. Por
oposição, critica duramente as outras nações europeias - os«Alemães, soberbo gado», o «duro
inglês», o «Galo indigno», os italianos que, «em delícias, / Que o vil ócio no mundo traz
consigo, / Gastam as vidas» - por não seguirem o seu exemplo, no combate aos infiéis.

Numa reflexão de tom pessoal, o Poeta exprime um estado de espírito bem diferente daquele
que o caracterizava, no Canto I, na Invocação às Tágides - «cego, […] insano e temerário»,
percorre um caminho «árduo, longo e vário», e precisa de auxílio porque, segundo diz, teme
que o barco da sua vida e da sua obra não chegue ao fim. Uma vida que tem sido cheia de
adversidades, que enumera: a pobreza, a desilusão, perigos do mar e da guerra, «Nũa mão
sempre a espada e noutra a pena;».

Mas a crítica aumenta de tom na parte final, quando são enumerados aqueles que nunca
cantará e que, implicitamente, denuncia abundarem na sociedade do seu tempo: os
ambiciosos, que sobrepõem os seus interesses aos do «bem comum e do seu Rei», os
dissimulados, os exploradores do povo, que não defendem «que se pague o suor da servil
gente».

No final, retoma à definição do seu herói - o que arrisca a vida «por seu Deus, por seu Rei».

Canto oitavo- crítica ao materialismo que corrompe


Nas naus estar se deixa, vagaroso,

Até ver o que o tempo lhe descobre;

Que não se fia já do cobiçoso

Regedor, corrompido e pouco nobre.(Rei Catual)

Veja agora o juízo curioso

Quanto no rico, assi como no pobre,

Pode o vil interesse e sede imiga

Do dinheiro, que a tudo nos obriga.

A Polidoro mata o Rei Treício,

Só por ficar senhor do grão tesouro;

Entra, pelo fortíssimo edifício,

Com a filha de Acriso a chuva d' ouro;

Pode tanto em Tarpeia avaro vício

Que, a troco do metal luzente e louro,(metáfora do dinheiro)

Entrega aos inimigos a alta torre,

Do qual quási afogada em pago morre.

Este rende munidas fortalezas;

Faz trédoros e falsos os amigos;(consequências negativas do dinheiro, ambição, utilizando para


isso, a anáfora do deítico espacial “este”)

Este a mais nobres faz fazer vilezas,

E entrega Capitães aos inimigos;

Este corrompe virginais purezas,

Sem temer de honra ou fama alguns perigos;

Este deprava às vezes as ciências,

Os juízos cegando e as consciências.


Este interpreta mais que sutilmente

Os textos; este faz e desfaz leis;

Este causa os perjúrios entre a gente

E mil vezes tiranos torna os Reis.

Até os que só a Deus omnipotente

Se dedicam, mil vezes ouvireis

Que corrompe este encantador, e ilude;

Mas não sem cor, contudo, de virtude!

Análise das estrofes

A propósito da narração do suborno do Catual e das suas exigências aos navegadores, são
agora enumerados os efeitos negativos do ouro - provoca derrotas, faz dos amigos traidores,
mancha o que há de mais puro, deturpa o conhecimento e a consciência; os textos e as leis são
por ele condicionados; está na origem de difamações, da tirania dos Reis, corrompe até os
sacerdotes, sob aparência de virtude.

Retoma a função pedagógica do seu canto, o Poeta aponta um dos males da sociedade sua
contemporânea, orientada por valores materialistas

Canto X- Decadência da Pátria numa “austera, apagada e vil tristeza”

Nô mais, Musa, nô mais, que a Lira tenho

Destemperada e a voz enrouquecida,

E não do canto, mas de ver que venho

Cantar a gente surda e endurecida.

O favor com que mais se acende o engenho

Não no dá a pátria, não, que está metida

No gosto da cobiça e na rudeza

Dũa austera, apagada e vil tristeza

Análise da estrofe

Os últimos versos de «Os Lusíadas» revelam sentimentos contraditórios - desalento, orgulho,


esperança.

«No mais, Musa, no mais […]» o Poeta recusa continuar o seu canto, não por cansaço, mas por
desânimo. O seu desalento advém de constatar que canta para «gente surda e endurecida […]
metida / No gosto da cobiça e na rudeza / Dhũa austera, apagada e vil tristeza.». É a imagem
que nos dá do Portugal do seu tempo. Por contraste, o orgulho naqueles que continuam
dispostos a lutar pela grandeza do passado e a esperança de que o Rei saiba estimular e
aproveitar essas energias latentes para dar continuidade à glorificação do «peito ilustre
lusitano» e dar matéria a novo canto.(estrofes seguintes, onde pede ao rei D. Sebastião para
olhar pelo seu povo, pois tem obrigação disso) O poema encerra, pois, com uma mensagem
que abarca o passado, o presente e o futuro. A glória do passado deverá ser encarada como
um exemplo presente para construir um futuro grandioso

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