Elizabete Volkman
Elizabete Volkman
Elizabete Volkman
ELIZABETE VOLKMAN
PONTA GROSSA
2017
ELIZABETE VOLKMAN
PONTA GROSSA
2017
Dedico este trabalho aos meus filhos Rafael e
Arthur por compreenderem as minhas
necessárias ausências.
AGRADECIMENTOS
Aos meus filhos Rafael e Arthur, pela compreensão nos momentos em que
não consegui dedicar-me a vocês durante a realização desta pesquisa.
Ao meu marido Alvir, que sempre esteve ao meu lado, participando dos
meus sonhos e encorajando-me a vencer os obstáculos para alcançar meus
objetivos.
E por fim, mas não por último, às minhas amigas Gabriele Granada Veleda,
pelos momentos de discussões e partilha em nossas viagens para Ponta Grossa e
Lizie Mendes Clock, pelo auxílio no exame de qualificação.
Agradeço a todos!
Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem
aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo
e retocando o sonho pelo qual se pôs a caminhar.
Paulo Freire
VOLKMAN, Elizabete. Licenciatura em Matemática e a preparação para a
docência: o que dizem os licenciandos. 2017. Dissertação (Mestrado em Educação)
– Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa.2017.
RESUMO
ABSTRACT
Teaching and professional development are processes that occur throughout the life
of the teacher. The initial training in undergraduate courses forms the basis of a
formal and systematized process of teaching and the teaching profession, and is an
important period of (re) construction and consolidation of practices and conceptions
around being a teacher.In this way, the present research has as object of study the
conceptions of the math graduates on teaching and on their preparation for teaching.
The main objective of this study was to analyze the conceptions of the undergraduate
students in Mathematics about teaching and their preparation for teaching.We seek
to discuss the concepts and principles of teacher education, teaching and the
contributions of studies on teacher knowledge for initial training. In order to base
analyzes on power relations and hierarchies between disciplines within the university
field, we rely on Pierre Bourdieu's concepts of habitus, field and cultural capital.The
research is part of the qualitative approach and the data were collected through
questionnaires (N = 39) and semi-structured interviews (N = 8) with graduates of the
fourth year of the degree course in Mathematics belonging to two state public
universities of Paraná. As a methodological procedure we also performed the
documentary analysis of the Pedagogical Project of the Mathematics Course of the
researched universities. For data organization and analysis we adopted Content
Analysis (BARDIN, 2011) and Cluster Analysis. Our results point out that the
professional choice by the Mathematics graduates involve subjective questions such
as affinity for the area, willingness to be a teacher and teaching as a second option
and that the training process experienced in the degree affects this process of
professional choice. The licensees investigated also emphasized the lack of specific
contents for the teaching in the Degree in Mathematics.
AC Análise de Conteúdo
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
EAD Educação a Distância
IES Instituição de Ensino Superior
PPC Projeto Pedagógico do Curso
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................14
INTRODUÇÃO
1
Devo ressaltar que as situações em sala de aula são diversas e muito complexas e que a
indisciplina não tem apenas uma causa e sim vários fatores.
15
2
As Universidades participantes das pesquisas serão denominadas Universidade 1 (U1) e
Universidade 2 (U2).
17
3
Concepção: do latim conceptĭo,ōnis,compreensão, faculdade de perceber, é o ato ou efeito de
conceber (Fonte: Dicionário Eletrônico Houaiss, 2009). Segundo Cury (1994), Thompson (1992) é
quem primeiro discorre sobre os problemas de conceitualização entre crenças e concepções. Para
Thompson (1992), o sistema de crenças pode ser conceituado como convicções, não sendo
consensuais e dependem das experiências pessoais, assim as concepções abrangem o sistema de
crenças.
19
4
Profissionalização é concebida como processo externo que se refere ao profissionismo ou
profissionalismo e diz respeito à reivindicação de status dentro da divisão social do trabalho, que
requer negociações por parte de um grupo de atores no intuito de reconhecimento perante a
sociedade das qualidades específicas, complexas e difíceis de serem aprendidas (ANDRÉ et al.,
2012, p.106).
5
O paradigma da ciência moderna se refere ao modelo de racionalidade que se constituiu a partir da
Revolução científica do século XVI e foi desenvolvida nos séculos seguintes, basicamente sob o
domínio das ciências naturais (SANTOS, 2008, p. 20). Para o autor, a ciência moderna desconfia
sistematicamente das evidências da nossa experiência imediata (p. 24). Ver Santos, Boaventura de
Sousa (2008) “Um discurso sobre as ciências”.
20
CAPÍTULO I
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
6
O campo educacional parte da ideia de campo de Bourdieu (2008), que será discutido no final do
capítulo I.
22
mais tarde, em 1930. Durante o período colonial, com os colégios jesuítas, passando
pelas aulas régias e as reformas pombalinas até a criação dos cursos superiores em
1808, não há uma preocupação explícita com a questão da formação docente
(SAVIANI, 2009).
Segundo Saviani (2011), é a partir do século XIX que a preocupação com a
formação docente emerge, com a instauração dos sistemas de ensino. Até o século
XVIII, segundo o autor, os professores recebiam alguma formação, mas baseada no
princípio do “aprender fazendo”.
Com a lei das escolas de primeiras letras em 1827, aparece pela primeira
vez a preocupação com a formação dos professores. Ao determinar em seu artigo 4º
que os professores deveriam ser treinados nas capitais, a lei incide explicitamente
sobre a formação docente, no entanto, a formação ocorreria às expensas do próprio
professor. A lei das escolas de primeiras letras determinava a criação de escolas
primárias nas províncias e o ensino era pelo método mútuo7.
A partir do século XVIII, com a necessidade de universalizar a instrução
elementar, emerge o problema de formar professores para atuar nessas escolas. O
caminho escolhido para a questão da formação docente neste período, segundo
Saviani (2011), foi a criação de escolas normais, de nível médio, para formar os
professores primários, aqueles que atuariam nas escolas primárias (equivalente hoje
às séries iniciais do ensino fundamental), enquanto o nível superior tinha a
incumbência de formar professores para atuar na educação secundária (o que
equivale hoje às últimas séries do ensino fundamental e o ensino médio).
Em 1834, o Ato adicional promulgado neste período delegou a instrução
primária às províncias e estas adotaram para a formação dos professores a criação
de Escolas Normais, método que era utilizado nos países europeus (TANURI, 2000).
A primeira escola normal implantada no País foi no Rio de Janeiro em 1835, as
demais províncias seguiram o mesmo caminho. Segundo Tanuri (2000), as primeiras
Escolas Normais eram destinadas exclusivamente aos homens, excluindo-se as
mulheres, mesmo no ensino primário existia esta exclusão, ao passo que o currículo
para as mulheres contemplava o ensino para trabalho doméstico.
7
O método mútuo foi criado para atender classes numerosas, o professor orientava um aluno, que
era o mentor, e esse orientava outros alunos. Cada mentor orientava em média dez alunos, os
alunos com bom rendimento eram escolhidos para serem os mentores.
23
para todo o País. Assim, houve um deslocamento nos currículos das Escolas
Normais, a preocupação central passou a ser com os conteúdos pedagógicos e não
mais com os conteúdos a serem ensinados no ensino primário (TANURI, 2000).
O modelo pedagógico-didático das Escolas Normais,no entanto, não obteve
avanços significativos para o preparo docente e o modelo até então dominante,
centrado na preocupação com o domínio dos conteúdos a serem ensinados para os
alunos, voltou a vigorar (SAVIANI, 2009).
Com o decreto de 1932, Anísio Teixeira transformou a Escola Normal do
Distrito Federal em Escola de Professores, e modificou o currículo, incluindo a
prática de ensino. As Escolas de Professores posteriormente foram chamadas de
Institutos Superiores. A criação dos Institutos Superiores de Educação (1932-1939),
em Brasília por Anísio Teixeira e em São Paulo por Fernando de Azevedo em 1933,
ambos inspirados no ideário da escola nova, reforçam a preocupação com a
formação de professores no País.
Saviani (2009) ressalta que no contexto de expansão do ensino e exigência
de professores para atuar nas escolas (século XIX), a formação docente abarcou
dois modelos de formação: modelo dos conteúdos culturais cognitivos, que
privilegiava a cultura geral e o domínio dos conteúdos da área de conhecimento que
o professor iria lecionar e o modelo pedagógico-didático, que privilegiava a
preparação pedagógica e didática do professor. Na história da formação docente,
segundo o autor, o modelo do conteúdo cultural cognitivo predominou nas
universidades e nos Institutos Superiores de Educação, que eram responsáveis pela
formação de professores secundários.
Com a implantação dos Institutos Superiores de Educação uma nova fase se
inicia, buscando aliar o ensino à pesquisa. A implantação dos Institutos Superiores
“[...] foram pensados e organizados de maneira a incorporar as exigências da
pedagogia, que buscava se firmar como um conhecimento de caráter científico”
(SAVIANI, 2009, p. 146). Mais tarde os Institutos Superiores foram elevados a nível
universitário, tornando-se a referência para os estudos superiores no País. Neste
período foram criadas as primeiras universidades que agruparam os Institutos
Superiores já existentes. O Instituto de São Paulo foi incorporado à Universidade de
São Paulo e o da capital à Universidade de Brasília. Foi diante deste cenário que se
organizou os cursos de formação de professores para as escolas secundárias.
Segundo Gatti (2010), no início do século XX começa a preocupação com a
25
8
Equivalente hoje aos quatro últimos anos do Ensino Fundamental.
26
9
A política neoliberal se baseia pela lógica do mercado capitalista, da competitividade e eficácia. Os
investimentos em educação seguem a prerrogativa do avanço e do progresso, minimizando a ação
do Estado frente à educação (FREITAS, 2002).
30
10
Parte deste texto foi apresentado na XI Reunião Científica Regional da ANPED (ANPED Sul) com o
título "Preparação para a docência: um estudo com alunos concluintes de um curso de Licenciatura
em Matemática" (2016).
31
Para Tozetto (2014, p.17), o ato de ensinar requer “sólido conhecimento por
parte de quem ensina”. Nesse mesmo sentido, Imbernón (2011, p. 63) enfatiza que a
formação inicial deve “[...] dotar o futuro professor ou professora de uma bagagem
sólida nos âmbitos científico, cultural, contextual, psicopedagógico e pessoal,
capacitá-lo a assumir a tarefa educativa em toda sua complexidade [...]”.
Tozetto (2014) também ressalta que ensinar é um ato “ambivalente”, “[...]
pois o professor também aprende quando ensina; é um processo interativo, uma via
de mão dupla [...]” (p.17). Do mesmo modo, a docência é uma atividade complexa
que requer um sólido conhecimento por parte dos formadores.
Educar é formar e “[...] formar é mais do que treinar o educando no
desempenho de destrezas”. Transformar a educação em treinamento técnico é “[...]
amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu
caráter formador” (FREIRE, 1996, p. 33).
Para Tardif (2012), um dos desafios para a formação dos professores seria
abrir espaço para o conhecimento dos “professores de profissão” dentro do próprio
currículo dos cursos de licenciatura. O autor supracitado ressalta que a formação
docente ainda baseia-se em conteúdos e lógicas disciplinares, e não profissionais.
[...] espera-se que esse sujeito tenha um saber sobre o que é ser professor,
sobre o conteúdo, sobre a matéria que irá lecionar e que, além disso, ele dê
conta da sala de aula e da turma que estará sob sua responsabilidade.
Enfim, para ocupar-se o “lugar” de professor, o sujeito precisa receber uma
formação adequada para isso e desenvolver alguns saberes que lhe darão
a base e a sustentação no exercício desse ofício (BACCON; ARRUDA,
2015, p. 466).
11
Limites na formação inicial pode ser entendido como um “limite que a formação inicial apresenta”,
não conseguindo dar conta de resolver tal questão sozinha, somente na IES, sem eleger a escola
como “agência formadora da docência” (MIZUKAMI, 2013, p.27).
39
de dons. A ação do privilégio cultural não é percebida na maior parte das vezes,
apenas sob as formas mais “grosseiras”, “[...] como recomendações ou relações,
ajuda no trabalho escolar ou ensino suplementar, informação sobre o sistema de
ensino e as perspectivas” (BOURDIEU, 2008, p. 41).
As famílias transmitem certo capital cultural e certo ethos12 aos seus filhos,
no entanto, esta transmissão acontece mais por via indireta que direta. O autor
considera que a transmissão do capital cultural pelas famílias está relacionada
diretamente com o êxito escolar dos alunos, ou seja, “[...] é o nível cultural global do
grupo familiar que mantém a relação mais estreita com o êxito escolar da
criança”(BOURDIEU, 2008, p. 42). Essa premissa permite concluir que “[...] a ação
do meio familiar sobre o êxito escolar é quase exclusivamente cultural” (p. 42).
Com as considerações sobre o capital cultural, Bourdieu e Passeron (1992)
criticam o sistema escolar, alegando que o mesmo contribui para a reprodução da
sociedade, ao ignorar as diferenças culturais entre os estudantes e legitimar os
interesses da classe dominante. Dentro do sistema escolar existe uma forma de
reprodução das desigualdades culturais. Segundo Bourdieu e Passeron (1992), o
próprio sistema escolar contribui para essa reprodução. A seleção de significações,
ou seja, da “cultura” que será ensinada na escola é arbitrária, pois representa a
classe dominante. A seleção do que será ensinado na escola é produto de uma
relação de poder entre as classes.
Segundo Bonnewitz (2003, p.115), “a seleção das disciplinas ensinadas,
assim como a escolha dos conteúdos disciplinares é o produto de relações de força
entre grupos sociais”. Segundo a teoria bourdieusiana, fundamentar os critérios de
excelência em determinadas disciplinas é arbitrário. Um exemplo disso é valorizar as
destrezas da área da matemática ou o domínio da língua culta, que são mais
facilmente apreendidas pelos alunos com maior capital cultural. Nesse sentido a
cultura escolar não pode ser considerada neutra. Se considerarmos o campo
universitário podemos notar que este não se diferencia muito do sistema escolar
básico, pois também atribui a certas áreas de conhecimento maior prestígio
enquanto outras são menos valorizadas.
12
Sistema de valores implícitos e profundamente interiorizados, que contribui para definir, entre
outras coisas, as atitudes em face do capital cultural e à instituição escolar (BOURDIEU, 2008,
p.42).
46
13
A crise do paradigma dominante se refere à crise dos padrões da ciência moderna. “Hoje são
muitos e fortes os sinais de que o modelo de racionalidade científica [...] atravessa uma profunda
crise. A crise do paradigma dominante é o resultado interactivo de uma pluralidade de condições”
(SANTOS, 2008, p.41). Ver Santos, Boaventura de Sousa (2008) “Um discurso sobre as ciências”.
47
14
O Canônico é um adjetivo que caracteriza aquilo que está de acordo com os cânones, com as
normas estabelecidas ou convencionadas (Fonte:Dicionário Eletrônico Houaiss, 2009). Nesta
perspectiva Bourdieu conceitua as disciplinas canônicas como aquelas que estão de acordo com
as normas da época, ou seja, as disciplinas dominantes como a Filosofia.
51
CAPÍTULO II
LICENCIATURA EM MATEMÁTICA
15
Para D‟Ambrosio (2005), a matemática indígena é considerada uma Etnomatemática, ou seja,
diferentes formas de matemática próprias de grupos culturais. Para o autor os indígenas possuíam
diferentes conhecimentos matemáticos como a geometria e aritmética.
53
ensino da matemática influencia diretamente na sua forma de ensinar, “[...] por trás
de cada modo de ensinar se esconde uma particular concepção de aprendizagem,
de ensino, de matemática e de educação”. Para Stamato (2003), o ensino da
matemática está vinculado à concepção epistemológica assumida pelo professor.
Nesse sentido, as concepções de ensino e em particular do ensino da matemática,
advêm do processo formativo do professor e de sua história de vida (NÓVOA, 1995).
A trajetória do ensino da matemática no Brasil nos faz pensar sobre os
processos de formação do professor de Matemática, já que o ensino da matemática
encontra-se atrelado ao processo de formação do profissional desta área. Na
próxima seção vamos discutir sobre a legislação que orienta os cursos de
licenciatura e a formação do professor de matemática.
O Artigo 12 das DCN cita que a duração dos cursos será definida em
resolução específica. A Resolução CNE/CP2, de 19 de fevereiro de 2002, define a
duração e carga dos cursos de licenciatura.
16
[...] somente quando ensinam em sala de aula é que adquirem o conhecimento prático da docência.
Como estudante estruturam o habitus do “ofício” que operam: o habitus estudantil, e não o
professoral. E o último será estruturado somente com o e no exercício da docência como docente,
e não como futuro docente ou estudante da docência. O que vimos mostrando é que tanto o aluno
quanto o professor, “ao praticarem seus ofícios”, o fazem por meio da constituição de um habitus.
Todavia, como são sujeitos posicionados em lugares específicos, desenvolvem o habitus de
acordo com as respectivas posições, mas sempre imbricada e simultaneamente: habitus
professoral e habitus estudantil. [...] que significa que quando os alunos dos cursos de formação de
professores estão realizando sua formação inicial nas universidades eles podem apenas
desenvolver o habitus estudantil e não o habitus professoral (SILVA, 2011).
61
realizados pela autora, apenas 2% dos jovens estudantes do Ensino Médio almejam a
carreira docente. Este é um dado preocupante que se reflete também na forma como as
IES organizam o PPC dos cursos de licenciatura, como, por exemplo, propor
alternativas para evitar a evasão dos alunos da licenciatura em Matemática. Importante
ressaltar que a U1 oferta, além dos cursos de licenciaturas, vários outros cursos de
graduação em áreas muito diversificadas, além de cursos em nível médio.
Prosseguindo na análise, observamos que o PPC da U1 expressa uma
concepção de matemática “enquanto uma ciência em construção” (p. 5). Nesse
sentido a matemática não se configura como uma ciência pronta e acabada, mas
que está sempre em evolução. Em consonância com o conceito de matemática
expresso no texto, o PPC da universidade ressalta o tripé ensino, pesquisa e
extensão, que deve ser vivenciado durante a formação inicial no curso de
licenciatura em Matemática. O estímulo à construção de novos conhecimentos está
em sintonia com o conceito de professor expresso pelo documento que assim se
posiciona: “O professor, essencialmente pesquisador de seu saber e de seu fazer,
vai instituir-se como aquele que media os processos formativos a fim de cultivar,
também no aluno, a postura de pesquisador sobre a matemática e seu ensino” (PPC da
U1, p. 5;6). A concepção de professor expressa pelo documento vem ao encontro dos
objetivos do curso:
17
A distribuição da carga horária do curso de acordo com o número de horas das disciplinas foi
baseada no estudo de Gatti e Barreto (2009) e no PPC da U2.
66
18
No Quadro 3 apresentamos o perfil dos professores que compõem o departamento de matemática
e que lecionam no curso de Licenciatura em matemática há pelo menos quatro anos.
68
(Continuação)
MESTRADO Nº %
Matemática 5 33,3
Educação 3 20
Ciências da computação e matemática computacional 2 13,3
Métodos numéricos e engenharia 2 13,3
Ensino de ciências 1 6,6
Matemática e computação 1 6,6
Física 1 6,6
DOUTORADO Nº %
Matemática 2 20
Engenharia elétrica 2 20
Estatística 1 10
Ensino de ciências 1 10
Engenharia mecânica 1 10
Física 1 10
Educação científica e tecnológica 1 10
Ciências da computação 1 10
PÓS-DOUTORADO Nº %
Não especificado 1 6,6
DESENVOLVE PESQUISAS NA ÁREA DE: Nº %
Na área das exatas (Probabilidade e estatística; Homogeneização; Análise 11 73,4
numérica; Tecnologias e métodos numéricos; Programação linear)
Ensino de matemática/Educação matemática 5 33,3
Formação de professores 3 20
VÍNCULO INSTITUCIONAL Nº %
Efetivo 15 100
EXPERIÊNCIA COMO DOCENTE NA EDUCAÇÃO BÁSICA Nº %
Não possui experiência como docente na Educação Básica 11 73,4
Possui experiência como docente na Educação Básica 4 26,6
TOTAL DE MESTRES 15 100
TOTAL DE DOUTORES 10 66,6
Fonte: a autora com base no Currículo Lattes dos professores formadores da U1
19
Como os dados não foram coletados por meio de entrevistas e sim por meio do currículo Lattes dos
professores, servem como dados estimativos, por não possuírem uma precisão exata, considerando
que os currículos podem estar desatualizados ou os professores podem ter omitido alguns dados.
69
dados, todos os formadores com pelo menos quatro anos de atuação na licenciatura
em Matemática da U1 são efetivos, ou com dedicação exclusiva ou quarenta horas.
Os dados coletados do currículo Lattes também revelam que a maioria dos
professores não tem experiência como docente na Educação Básica, no entanto
isso não significa que nunca tiveram contato com a escola, pois muitos professores
formadores desenvolvem projetos nesta modalidade de ensino.
Uma análise geral do PPC da U1 nos permite inferir que o curso de
licenciatura em Matemática privilegia a formação do pesquisador em seus objetivos,
mas não contempla essa formação para a pesquisa na grade curricular do curso.
Na análise do PPC da U2 verificamos que o curso de licenciatura em
Matemática é ofertado somente no período noturno, sendo a forma de ingresso por
meio de vestibular e PSS (Processo Seletivo). Cabe ressaltar que a U2 oferta
somente cursos de licenciatura.
O PPC do curso expressa uma concepção de Educação Matemática
embasada nos pressupostos de Schulman (1986) e considera que o ensino da
matemática requer “conhecimentos diferentes daqueles exigidos para os
matemáticos”. O PPC do curso de licenciatura em Matemática da U2 adota a
concepção de professor como “mediador, capaz de orientar o processo de
aprendizagem de seus alunos conscientes de seu papel na formação de cidadãos
críticos”. O curso de licenciatura em Matemática da U2 objetiva formar profissionais
para atuar na educação Básica e/ou exercer atividades como autônomos,
ministrando aulas particulares ou reforço de aprendizagem, bem como atividades de
assessoria que envolvam atividades ligadas às áreas da matemática. Note-se que o
PPC da U2 segue o que orientam as Diretrizes para os cursos de matemática no
que se refere ao campo de atuação do licenciando e do matemático.
Conforme o PPC da U2, para concluir o curso de licenciatura em Matemática
os acadêmicos deverão cumprir um total de 3.564 horas em disciplinas obrigatórias,
conforme o Quadro 4:
70
20
Elegemos como professores formadores os professores que atuam há pelo menos quatro anos no
curso, no entanto quando fomos aplicar este critério para os formadores da U2, somente três
formadores se encaixavam neste perfil, assim não foi possível aplicar o critério escolhido na U2.
72
CAPÍTULO III
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA INVESTIGAÇÃO
Para Bogdan e Biklen (1994), o termo “dados” refere-se aos materiais brutos
que os investigadores recolhem sobre o fenômeno que se encontram a estudar e
constituem a base de análise da pesquisa. Os dados incluem os materiais que os
investigadores registram, ou podem ser materiais que outros criam e o investigador
usa para análise, como documentos oficiais. Dessa forma os dados utilizados na
presente pesquisa incluem questionários, entrevistas e análise documental. Os
dados são, segundo Bogdan e Biklen (1994), simultaneamente “as provas e as
pistas”, ligam-se ao mundo empírico e incluem os elementos necessários para
pensar de forma adequada e profunda acerca dos aspectos do fenômeno que se
pretende desvelar.
Para a coleta de dados foram utilizados três instrumentos para desvelar a
concepção dos licenciandos sobre a docência e a preparação para a mesma. Com
os sujeitos investigados foram utilizados dois instrumentos: questionário e entrevista
semiestruturada. O terceiro instrumento foi a análise documental, utilizada para
analisar a Matriz Curricular e aspectos do Projeto Pedagógico (PPC) do curso de
Licenciatura em Matemática.
Foram selecionadas do questionário 18 questões, sendo que 9 tinham como
objetivo caracterizar o perfil dos licenciandos, e 9 eram perguntas relacionadas à
temática da investigação sobre a concepção dos licenciandos sobre a docência e a
preparação para a docência. Antes da aplicação do questionário aos licenciandos, o
mesmo foi discutido e analisado no Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Políticas
80
Quais os motivos que o levaram pela escolha do Escolha pelo curso de licenciatura
curso?
Qual a maior dificuldade encontrada na O curso prepara para ser professor
graduação?
Você acha que o teu curso de licenciatura oferece Ser professor
subsídios suficientes para você atuar em sala de
aula? Justifique. Articulação entre as disciplinas
Você sente-se preparado para o exercício da pedagógicas e específicas
docência? Sim, Não. Por quê?
Para você as práticas do professor formador Estágio Curricular – contribuições
influenciam na sua formação como professor? Se
sim, como? Influência dos professores formadores
Qual a contribuição do Estágio Supervisionado (práticas; visões de mundo)
para a sua formação?
Houve articulação entre as disciplinas específicas Saberes docentes
e as disciplinas pedagógicas? Se sim, como?
Qual o papel do professor?
Para você o que o professor precisa saber para
atuar em sala de aula?
Fonte:a autora
sujeitos investigados foram informados sobre o tema de estudo, optando ou não pela
participação. As assinaturas dos termos foram coletadas antes da realização das
entrevistas com a garantia de anonimato dos investigados.
O uso de mais de um tipo de instrumento para a coleta de dados torna-se
oportuno e vem ao encontro do objetivo da pesquisa, visto que cada instrumento tem
suas potencialidades e limitações. A utilização de questionário, entrevista e análise
documental é apropriada, pensando na abordagem de pesquisa qualitativa, por
subsidiar-nos múltiplas perspectivas para análise do fenômeno que nos propusemos
a investigar. A opção por tópicos, nas entrevistas semiestruturadas, por parte da
pesquisadora, justifica-se pela possibilidade de os sujeitos da investigação
discorrerem sobre a temática, estimulando os entrevistados a falarem livremente
sobre o tema, não cerceando a conversa.
com base nas informações prestadas nos questionários, nos conhecimentos que as
pesquisadoras possuíam do fenômeno a ser investigado e da teoria que embasa a
ação do investigador (TRIVIÑOS, 2007).
O roteiro com os tópicos sobre a temática “a docência e a preparação para a
docência”, foi conduzido de acordo com as respostas dos entrevistados. Para
Bogdan e Biklen (1994), o processo de entrevista requer flexibilidade.Ser flexível
significa responder à situação imediata, ou seja, aproveitar as respostas dos sujeitos
para extrair dos mesmos as percepções sobre o tema investigado. Para os autores,
os entrevistadores qualitativos têm o papel de compreender os pontos de vista dos
sujeitos e as razões que os levaram a assumi-los, tentando ao máximo não julgar a
opinião dos sujeitos e não emitir juízos de valor. Nesse sentido, as entrevistas foram
conduzidas de maneira a extrair as concepções dos sujeitos entrevistados, sem
constranger os mesmos e sem julgamentos, aproveitando a fala dos sujeitos para
extrair as concepções dos mesmos sobre a docência e a preparação para a mesma,
à medida que as respostas fossem surgindo.
Para Triviños (2007), a duração de uma entrevista é flexível e depende dos
objetivos do estudo e das circunstâncias que rodeiam o informante e o teor do
assunto. Nas entrevistas realizadas com os licenciandos, a duração foi calculada
previamente, porém foi flexível, respeitando o tempo dos sujeitos investigados. Em
média as entrevistas tiveram a duração entre 25 e 45 minutos. As entrevistas foram
transcritas e analisadas o mais breve possível para que as informações não verbais
não fossem prejudicadas, pois as entrevistas gravadas foram acompanhadas por
anotações gerais sobre os entrevistados.
quantidade de informações sobre leis [...]”. Bardin (2011, p. 46) define análise
documental como “[...] um conjunto de operações visando representar o conteúdo de
um documento sob uma forma diferente do original, a fim de facilitar num estado
ulterior a sua consulta e referenciação”. Para a autora, a análise documental
enquanto tratamento das informações contidas nos documentos, tem por objetivo
dar forma conveniente e representar de maneira diferente a informação, por
intermédio de procedimentos de transformação. Nesse sentido as pesquisadoras
acharam necessária a análise dos documentos oficiais das instituições de ensino
superior onde foi realizada a coleta de dados com os sujeitos participantes da
pesquisa. A análise documental justifica-se por buscar compreender os elementos
estruturantes do curso, sendo apresentados de maneira a buscar inferências nas
falas dos sujeitos pesquisados.
Para a presente pesquisa, a análise documental será realizada para os
seguintes documentos oficiais: Matriz curricular do curso de Licenciatura em
Matemática das universidades investigadas e alguns aspectos do PPC dos referidos
cursos, de acordo com o que elencamos como pertinentes ao propósito da pesquisa.
As DCN serviram de apoio para a análise do PPC e da Matriz Curricular dos cursos.
consiste nos documentos que serão submetidos a essa análise. A escolha do corpus
consiste na utilização de escalas, seleções e regras. Bardin (2011) destaca algumas
regras para a seleção dos documentos: Regra da exaustividade; Regra da
representatividade; Regra da homogeneidade e Regra de pertinência.
Resumidamente, a regra da exaustividade consiste na escolha de todos os
elementos do corpus; a da representatividade, numa amostra do corpus; da
homogeneidade, obedecem critérios precisos de escolha, devem ser homogêneos;
da pertinência, o corpus deve ser adequado, ou seja, obedecer ao objetivo que
suscita a análise. Na escolha dos documentos seguimos a regra da homogeneidade
e exaustividade, pois os elementos do corpus obedeceram a regras precisas de
escolha, foram analisados exaustivamente os elementos pertinentes para responder
à questão norteadora da pesquisa.
A formulação das hipóteses e dos objetivos é uma fase da pré-análise onde
o analista vai formular hipóteses e estabelecer os objetivos gerais. A partir da leitura
“flutuante” podem surgir intuições, que podemos formular em hipóteses. Segundo
Bardin (2011), a hipótese consiste em uma “suposição” que se origina da intuição
que fica em suspensão até que seja submetida a análise propriamente dita. Nem
sempre temos uma hipótese, às vezes o estudo é seguido “às cegas”, sem uma
ideia de resultado, assim como pode o analista ser guiado por hipóteses implícitas.
Ainda segundo a autora, as hipóteses nem sempre são estabelecidas na pré-
-análise, em nossa pesquisa não foram estabelecidas hipóteses a priori. Para Bardin
(2011), o objetivo é a finalidade geral a qual nos propusemos a investigar
determinado fenômeno, em nosso estudo fomos guiados pela questão de pesquisa:
“Qual a concepção dos licenciandos sobre a docência e sobre a sua preparação
para a docência?”.
Na elaboração dos indicadores parte-se da premissa de que os textos
podem conter índices que a análise vai “fazer falar”, o trabalho preparatório será o
da escolha e organização desses índices, em função da hipótese, caso haja.
Escolhidos os índices, procede-se à construção dos indicadores. Os indicadores que
fundamentam a análise final podem ser testados em algumas passagens ou
elementos dos textos (pré-teste de análise).
Na pré-análise realizamos também a preparação formal do material, que
inclui as transcrições das entrevistas, recorte de textos, anotações em fichas etc.
88
uma análise das respostas dos alunos para revelar (e depois examinar) padrões e
tendências e encontrar temas comuns emergentes deles (BATTAGLIA; DI PAOLA;
FAZIO, 2016). Utilizamos a Análise de Conteúdo (AC) para agrupar as respostas
descritivas do questionário em categorias, que podem ser consideradas como as
“estratégias de resposta” típicas postas em ação pelos licenciandos. Dessa forma foi
possível resumir todo o conjunto de respostas dadas ao questionário e entrevistas
em número limitado de estratégias de resposta, facilitando a análise subsequente.
Uma vez identificadas as categorias relevantes utilizadas pelos respondentes do
questionário e entrevista, a Análise de Clusters busca agrupar os respondentes em
grupos (clusters) de similaridade quanto às respostas ao questionário e das
entrevistas de forma que os respondentes que pertencem a um mesmo cluster
apresentam mais similaridades entre si do que membros que pertencem a clusters
diferentes.
As categorias originadas com os dados (questionário e entrevistas) foram
organizadas em tabelas por meio de códigos/gabaritos e posteriormente no Excel
para a submissão ao Software Mathematica®.
Para a codificação utilizamos os componentes1 e 0, onde 1 significa que o
aluno usou uma determinada estratégia de resposta para responder a uma pergunta
do questionário e 0 significa que ele não usou, ou seja, que ele não respondeu
positivamente. Esse procedimento será melhor explicado no capítulo 4.4.
Após a categorização dos dados por meio da AC e análise descritiva, foi
realizado um trabalho de criação de algoritmo programado no Software
Mathematica®. Para fazermos a Análise de Clusters, contamos com o auxílio do
professor, já referenciado, Dr. José Tadeu Teles Lunardi, que também colaborou na
interpretação dos resultados dos clusters. Os dados originados com a utilização do
software serão apresentados após a apresentação dos dados originados com os
questionários e entrevistas.
No próximo capítulo apresentamos os dados obtidos com os questionários e
as entrevistas e os resultados da análise de clusters, bem como a interpretação e
análise dos mesmos.
92
CAPÍTULO IV
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
21
Significantes são palavras e expressões que, apesar de não serem iguais, apresentam o mesmo
sentido ou significado.
93
(Continuação)
Para você o que o professor precisa saber Saberes necessários para a prática pedagógica
para atuar em sala de aula? do professor
Fonte: a autora
docência ressaltam que ainda faltam conteúdos e discussões sobre a escola, como
podemos observar nos significantes das falas dos licenciandos.
(Continua)
100
(Continuação)
B – Não se sentem Significantes: Falta de
preparados atividades voltadas para a
L3; L7; L8; L9;
escola; O curso não foca na
L11; L12; L16;
licenciatura; Poucas
L17; L18; L22;
disciplinas voltadas para o
L23; L25; L32;
ensino; Não há um preparo
L35; L36; L37; 48,6%
específico para a docência;
L39;
Nos construímos professores
durante toda a nossa carreira.
Tenho consciência que o
aprendizado não acaba; Não
temos disciplinas relacionadas
com a matemática básica; Não
temos conhecimento de como
ensinar determinados
conteúdos;
Fonte: dados do questionário
22
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência. Este Programa tem como objetivo a
“concessão de bolsas de iniciação à docência para alunos de cursos de licenciatura e para
coordenadores e supervisores responsáveis institucionalmente pelo PIBID e demais despesas a
ele vinculadas”(CAPES). No programa os licenciandos iniciam sua prática docente por meio de
aulas de reforço, auxílio ao professor etc. (CAPES. Disponível em:
<http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid>. Acesso em: 23 set. 2016).
101
(Continua)
104
(Continuação)
CATEGORIA SUBCATEGORIAS SIGNIFICANTES LICENCIANDOS %
Significantes: Não ajuda muito;
Escola como Vamos aprender dar aula
B – Estágio como L1; L17; L25;
lócus de quando formos professores e
experiência L28; L30; L31;
não estagiando; Quase
formação negativa L33; L35; L38;
nenhuma contribuição; A
realidade da escola é bem
25,7%
diferente do estágio; O estágio
nos moldes de hoje torna-se
dispensável; O estágio foi um
momento muito traumático; Não
é algo bom; Durante o estágio
vivemos um “faz de conta”.
Fonte: dados do questionário
(Continua)
105
(Continuação)
B – Mediador Significantes: Ser mediador do 3
conhecimento; Fazer a ponte L2; L7; L8; L10; 33,3%
entre o aluno e o conhecimento, L13; L17; L18;
mediando este caminho; L24; L25; L32; 35;
Mediador; Ser mediador e L37; L39;
modelador do pensamento do
aluno; Mediar o conteúdo.
C – Auxiliar na Significantes: Instigar seus
construção do alunos a aprender; auxiliar na 20,5%
L3; L6; L12; L15;
conhecimento construção do conhecimento;
L29; 30; L31; 38;
Processo de reflexão sobre o
conhecimento; Propiciar
ambiente propício para a
construção do conhecimento;
Despertar no aluno o interesse
pelo conhecimento.
Fonte: dados do questionário
para ensinar. A partir dos significantes foi possível agrupar duas subcategorias: A –
Domínio da matemática; B – Conhecimento pedagógico. Vejamos no Quadro 17:
(Continuação)
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS SIGNIFICANTES LICENCIANDOS
Mediador Significantes: Tem que ser mediador; L15E; L12E;
Mediar o conhecimento; Mediar o
conhecimento até o aluno; Ser o
mediador; Mediar o conhecimento até
o aluno.
Auxiliar na Significantes: Tem que ajudar o aluno L30E; L31E;
construção do a construir seu conhecimento; Auxiliar
conhecimento o aluno para construir o conhecimento;
Proporcionar oportunidades para que
ele construa o conhecimento.
Fonte: dados das entrevistas
(Continuação)
Estágio Supervisionado Significantes: O estágio é um L30E; L31E;
como experiência “simulado” e não contribui muito,
negativa você sabe o trabalho mesmo como
professor não seria assim; Não
acho que contribui tanto, o PIBID é
bem melhor.
Fonte: dados das entrevistas
(Continuação)
Significantes: A gente nota quando o
professor diz coisa que não existe na
educação básica; A gente nota quando
o professor já passou pela educação
Experiência na
básica, principalmente depois do
Professor educação básica
estágio; Existe diferença entre os que já
formador
atuaram na educação básica, a gente
L15E; L14E;
percebe; Eu acho que tem diferença
L12E; L17E;
sim, ele [professor formador] não vai
L13E; L10E;
perceber que tipo de aluno está
L30E; L31E;
recebendo, ele acha que o aluno vem
pronto; Se o professor trabalhar lá atrás
ele vai saber das dificuldades da rede
pública, ele vai saber da dificuldade dos
alunos na matemática básica; o
professor que já trabalhou na Educação
Básica sabe o que acontece lá.
Fonte: dados das entrevistas
feita uma nova análise denominada Análise de clusters que será apresentada a
seguir.
L1 1 1 0 0 1 0 1 0 0 1 1 0 1 0 0 1 1 0 0 1 0
pelos códigos 0 e 1, como no exemplo da Tabela 2 com o typical das respostas dos
licenciandos do cluster 1:
consideram que o professor precisa dominar o conteúdo que irá ensinar, mas
também precisa possuir conhecimento sobre didática e metodologias de ensino.
Quanto à preparação para a docência, os licenciandos que compõem o C2
consideram que na licenciatura em Matemática faltam discussões e conteúdos
voltados para a docência e que as áreas do conhecimento específico e pedagógico
são desarticuladas e encaixotadas.
Os sujeitos do C2 também enfatizam que o curso não foca na licenciatura e
sim nos conteúdos matemáticos, ressaltando o caráter bacharelesco da licenciatura
em Matemática. Para os licenciandos da C2, na licenciatura em Matemática existe
uma valorização maior das disciplinas específicas e que os mesmos percebem uma
espécie de “disputa” entre áreas de conhecimento matemático e pedagógico. Nesse
sentido, os licenciandos enfatizam que os professores ao valorizarem mais os
conteúdos matemáticos acabam menosprezando os conteúdos pedagógicos que
buscam por espaço dentro do curso. A maioria dos licenciandos do C2 considera
que o professor formador influencia positivamente na formação dos futuros
professores de Matemática e que percebem quando o professor formador não tem
experiência na educação básica, que segundo os licenciandos diferencia
positivamente a prática pedagógica do professor.
O Cluster 3 (C2) agrupa dois licenciandos, que se identificam pelas
dissimilaridades de respostas em relação ao C1 e C2. Podemos observar que os
licenciandos que compõem o C3 são oriundos da U2. Podemos considerar, de
acordo com as respostas dos licenciandos agrupados no C2, associado às
categorias e subcategorias que deram origem aos clusters, que os sujeitos deste
cluster escolheram a licenciatura como uma segunda opção e que não se identificam
com a carreira docente. Os sujeitos deste cluster consideram que para o exercício
da docência é necessário o domínio do conhecimento matemático e pedagógico e
que o professor deve auxiliar o aluno na construção do conhecimento. Para os
licenciandos do C3 na licenciatura em Matemática faltam conteúdos voltados para a
docência, mas o curso procura articular os conteúdos matemáticos e pedagógicos
em algumas disciplinas como Modelagem Matemática. Podemos observar também
que de acordo com o dendrograma os licenciandos 7 e 8 pertencentes a U2
ficaram em um único clusters o que evidencia o distanciamento das respostas dos
alunos da U1 em relação aos alunos da U2.
128
Com a submissão dos dados das entrevistas, foi possível perceber com a
Análise de Clusters que os licenciandos foram agrupados ou não de acordo com a
instituição de ensino. Assim emergiu um dado interessante, os licenciandos das
duas instituições se diferem quanto às suas opiniões a respeito da sua preparação
para a docência, apesar de compartilharem opiniões sobre alguns pontos como: a
escolha pela docência e as influências do professor formador.
Comparando os clusters, percebemos que os licenciandos do C2, assim
como os do C3, não se identificam com a carreira docente, apenas os licenciandos
do C1 escolheram a docência por se identificarem com a carreira. Os licenciandos
do C1 consideram que o professor precisa ser mediador do conhecimento e que
precisa possuir conhecimento matemático, além do saber sobre didática e
metodologias de ensino. Os licenciandos do C2 e C3, também acham que para o
exercício da docência é necessário o domínio do conhecimento matemático e
pedagógico, mas para o C3 o professor deve auxiliar o aluno na construção do
conhecimento. Na opinião dos licenciandos dos três Clusters (C1, C2 e C3), na
licenciatura em Matemática ainda faltam discussões e conteúdos voltados para a
docência e que as áreas do conhecimento específico e pedagógico são
desarticuladas. Os licenciandos do C1 e C2 relatam que o curso procura articular os
conteúdos matemáticos e pedagógicos em algumas disciplinas. Nas falas dos
licenciandos do C2 ficou mais evidenciada a disputa entre as disciplinas. Na seção
4.5 os resultados dos Clusters serão mais bem discutidos e analisados, juntamente
com os resultados e discussões das categorias finais.
Na seção seguinte apresentaremos as categorias finais que foram
organizadas com o agrupamento das categorias originadas com os questionários e
entrevistas, as análises das mesmas com os resultados e discussões.
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS
(2010) que ressalta como uma das novas demandas ao trabalho do professor
formador a relação que os alunos dos cursos de licenciatura estabelecem com a
docência, “[...] perceber no aluno, futuro professor, a falta de motivação para a
docência e de um movimento de autoimplicação no seu próprio processo formativo
constitui um desafio e consome tempo e energia dos docentes [...]” (p.130). Esses
alunos ingressam na licenciatura sem se identificarem com a carreira, isso traz
prejuízos à identidade e profissionalização docente (GATTI, 2010).
Outra possibilidade de escolha se relaciona com o desejo de ser professor,
que podemos observar nos fragmentos de falas abaixo:
23
“A profissionalidade é entendida como um processo interno do professor, que consiste na aquisição
de conhecimentos que são mobilizados nas atividades docentes. São saberes próprios da profissão
docente que englobam os saberes disciplinares e pedagógicos” (ANDRÉ et al., 2012, p.106).
136
L15E – [...] eu acho que o papel do professor vai muito além do ensinar
matemática, muitas vezes eu escuto colegas na minha sala de aula dizendo
que o professor não tem o papel de psiquiatra, de psicólogo, muito pelo
contrário, ele não pode direcionar o aluno como os psicólogos, porém, ele
pode trazer o aluno pra perto pra conversar muito mais do que o psicólogo,
então não é só ensinar matemática, mas ele esquece que para que ele
atinja o objetivo da matemática ele tem que saber qual é a dificuldade do
aluno e muitas vezes não é regra decimal, não é uma equação, mas é o que
está acontecendo na realidade dele, em casa, na escola, no trabalho, se ele
é excluído pelos colegas ou não, eu acho que o objetivo do professor vai
além de ensinar.
L14E – Ser professor não é só dar aulas, tem que ter amor, tem que saber
ensinar.
L12E – O professor precisa saber o conhecimento de metodologias, de
como lidar com os alunos porque é muito difícil a relação professor-aluno,
acaba não tendo essa relação e fica distante dos alunos e isso é muito
complicado, eu acho que o professor tem que ter essa relação [...].
L30E – [...] hoje em dia a gente está desfocando um pouco, o professor está
tendo que ensinar a ser justo, corretos, ensinar valores que não são trazidos
de casa, hoje em dia o papel do professor também é orientar, hoje em dia
querendo ou não a gente tem é isso, problemas sociais que trazem pra
dentro da escola.
Para esses licenciandos o professor assume tarefas que vão muito além de
apenas ensinar os conteúdos aos alunos. O professor precisa lidar com situações
muito complexas e imprevisíveis. As falas dos licenciandos revelam uma concepção
de ensino coerente com o enfoque hermenêutico ou reflexivo, que considera o
ensino como “uma atividade complexa que ocorre em cenários singulares
claramente determinadas pelo contexto” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p.185).
Os licenciandos investigados enfatizam a dimensão relacional envolvida na
docência (ANDRÉ et al., 2012). Segundo Roldão (2007), quando ensinamos sempre
ensinamos algo a alguém, isso envolve a dimensão pessoal e profissional. A
interatividade da docência também é enfatizada por Soares e Cunha (2010). Para as
autoras a docência se constitui como uma atividade complexa e interativa, que
envolve a relação do professor com os saberes docentes e com o outro, ou seja,
envolve a contrapartida do outro. Como afirma Tozetto (2014, p.17),“é uma via de
mão dupla”, o objetivo do professor é o ensino e para que se atinja esse objetivo
interagimos com pessoas. A interatividade da docência implica considerar que “o
processo formativo se desenvolve num contexto grupal, em que pessoas com
histórias de vida distintas se implicam mutuamente” (SOARES; CUNHA, 2010, p.
27). Esta “trama invisível que impacta os processos de ensino e aprendizagem”
137
educativa evoluiu, no entanto sem quebrar com as “linhas diretrizes que lhes foram
atribuídas em sua origem: centralista, transmissora, selecionadora e individualista”
(p. 7). Nesse sentido podemos inferir que para se repensar a questão do ensino,
tanto na Educação Básica como no Ensino Superior é preciso que se repense as
próprias instituições e seus modelos de ensino.
Nesta mesma subcategoria identificamos que alguns dos licenciandos
investigados consideram o saber específico importante, mas não desconsideram os
conhecimentos da didática e metodologias de ensino, como podemos observar nos
discursos:
iniciação à docência (PIBID) como importantes para sua preparação docente como
podemos observar nos discursos:
24
De acordo com a legislação vigente, que orienta o desenvolvimento dos estágios no interior das
licenciaturas (Lei 11.788/2008), fica a critério das IES celebrarem convênios com as redes de
Educação Básica (BRASIL, 2008).
146
L15E – Acho que o estágio deveria ser desde o primeiro ano, para o aluno
se dar conta do que vai enfrentar, já nos anos iniciais, porque muitos
chegam no quarto ano e dizem “ah eu não quero dar aula, eu não quero ser
professor”, mas aí deixou pra ver isso só no quarto ano, pra ver que não
quer?...o problema não é se ele vai dar aula ou não depois que ele sair da
graduação, mas que tipo de aluno esse professor que não quer dar aula,
que não quer ser professor, que tipo de aluno ele vai formar?
L12E – Uma questão importante da grade curricular é a questão do estágio
que é a partir do terceiro ano, eu acho que seja pelo menos só uma
observação deveria ter, mesmo com uma carga horária reduzida, mas eu
acho que o aluno deveria estar em sala de aula desde o primeiro ano do
curso, pois é um curso de licenciatura, se fosse dessa forma seria muito
mais fácil fazer as metodologias, você estaria na escola vendo o que
acontece, conseguiria fazer um paralelo né...
L17E – O estágio é bom, mas deveria ter mais coisa, poderia ter mais
contato antes com os alunos, fica dois anos sem ter contato, deveria ter
logo nos primeiros anos porque é uma licenciatura, porque é importante
isso, mas eu também acho que de certa forma no primeiro ano, acho que no
primeiro ano contato, observação, não chegar a uma intervenção porque a
gente não tem bagagem nenhuma. Seria importante até para ter uma
seleção, porque muita gente que entra pra uma licenciatura, mas não é isso
que querem e vai ver isso muito tarde.
L13E – [...] uma diferença que eu vejo é os colegas que fazem o PIBID e os
que não fazem, os que fazem estão a mil anos na nossa frente porque têm
a experiência desde o primeiro ano, eu acho isso muito importante, [...] valia
apena você investir numa disciplina que pudesse pôr o aluno lá, não precisa
fazer docência, só observação, [...] mas está ali vivenciando a experiência
pra no terceiro ano não levar aquele susto.
de avaliação de seus graduandos (Art. 7º). Nesse sentido, Gatti (2014) critica a
forma como os estágios são organizados nas licenciaturas. Para a autora, os
estágios “mostram-se, em sua maioria, sem um planejamento que diga de suas
propostas e ações” (p. 40). A autora acrescenta ainda que fica evidente nas
pesquisas que as IES ou ignoram ou desconhecem a lei que orienta os estágios (lei
11.788/2008).
Os dados de nossa pesquisa revelaram ainda que as universidades
investigadas propõem ações para a melhoria dos estágios na licenciatura em
Matemática. Uma das universidades investigadas elaborou um documento
específico, com normas bem definidas para os estágios e celebrou convênios com a
rede de ensino de seu município. No entanto, todos os esforços propostos pela
universidade para a melhoria dos estágios, a nosso ver, não surtiram os efeitos
desejados25. Com os resultados da Análise de Clusters percebemos, na fala da
maioria dos alunos da licenciatura em Matemática desta instituição, o
descontentamento com o modelo de estágio proposto. Com base nos discursos dos
licenciandos foi possível inferir que alguns licenciandos desta universidade
acabaram se afastando da docência por vivenciarem experiências negativas nos
estágios.
Os licenciandos precisam sentir-se acolhidos nos estágios, precisam saber
que têm o apoio dos formadores e que em qualquer dificuldade serão orientados e
não julgados como em um tribunal. Gatti (2014) lembra, apropriadamente, que “os
estagiários ainda são estudantes, o papel dos supervisores de estágio é crucial na
orientação dos mesmos e na criação de condições de reflexão, análise e diálogo
com as realidades educacionais e as contribuições das teorias” (p. 42-43).
Pimenta e Lima (2006) ressaltam que compete ao estágio possibilitar que os
licenciandos possam compreender a complexidade da docência e das ações
praticadas por seus profissionais como um meio de se preparar para a sua inserção
na carreira docente. Nesse sentido, a função do estágio não consiste em selecionar
os licenciandos com base apenas em sua atuação nas práticas de estágio. A lei que
orienta os estágios nas instituições de ensino salienta que o “estágio obrigatório é
25
Logicamente que precisariam de estudos mais aprofundados para afirmar efetivamente que o
modelo proposto pela U2 não alcançou seus objetivos. No entanto, os resultados alcançados com
nossa pesquisa nos permitem inferir que ainda há uma limitação no que se refere aos estágios.
151
aquele definido como tal no projeto do curso, cuja carga horária é requisito para
aprovação e obtenção de diploma” (BRASIL, 2008, Art. 2º § 1°).
Ainda nesta categoria de análise, nos relatos ficou evidente que os
licenciandos percebem que o estágio é uma forma de articulação entre os
conhecimentos científicos adquiridos na academia com as práticas profissionais em
sala de aula.
L2 – Muito válido, sem ele (estágio) não teria conhecimento dos meus
anseios e medos na hora de efetivamente aplicar meus conhecimentos em
sala de aula como professora.
L5 – Ajuda muito para se inserir na sala de aula, colocando um pouco na
prática as teorias e vendo como é a realidade da escola.
L8 – Para mim foi de grande importância pela inserção no ambiente escolar
durante a graduação e poder colocar em prática a teoria vista em sala de
aula.
L37 – Adquirir uma visão do modo como o ensino ocorre na prática. No
curso estudamos metodologias e concepções as quais temos a
oportunidade de validar no estágio de maneira a buscarmos determinar
quais tornam o ensino vantajoso.
L13E – [...] Muitos professores, que vêm de muitos anos, vêm na maneira
tradicional, infelizmente vai chegar uma hora que vai esbarrar na gente, [...]
um exemplo, eu tive uma professora de desenho que dava uma aula
diferenciada, tinha oficinas, eu espero seguir os passos dela, mas na minha
turma tem pessoas que vão seguir o tradicional, que é mais fácil, você
prepara a aula, passa, o aluno copia, repete [...].
L30E – Eu acho que os professores influenciam na prática pedagógica, a
gente tinha uma visão quando a gente começou o curso que todo professor
que não reflete, não discute é a tendência de uma cópia de outro professor.
Foi possível perceber nos discursos dos licenciandos que os mesmos têm
consciência de que são influenciados por seus formadores, tanto positiva quanto
negativamente. Alguns acadêmicos percebem que são influenciados não só pelos
professores na universidade, mas também pelos professores da Educação Básica.
Para Silva (2011), a docência pode ser considerada uma profissão apreendida “pela
vivência da discência”, ou seja, os licenciandos aprendem a ser professores na
condição de aluno e assim são influenciados pelo ensino de seus formadores. “Os
licenciandos avaliam seus formadores constantemente e estes passam a ser
modelos de aprendizagem da profissão” (CARTAXO, 2014, p. 99).
Nos discursos do sujeito da pesquisa também percebemos que os
formadores servem de referência e influenciam na decisão do licenciando em seguir
ou não na docência. A pesquisa de André et al. (2012) levanta um aspecto
importante do papel do professor formador citado pelos sujeitos da nossa pesquisa:
a escolha pela docência. De acordo com o autor supracitado, o papel que o
formador desempenha no estímulo aos estudantes para seguirem a docência é
muito relevante. O formador desempenha um papel central na formação dos futuros
professores: “são os mestres modelos que com sua forma específica de dar aula e
de se relacionar, contribuem efetivamente para a aprendizagem dos licenciandos,
assim como deixam marcas indeléveis para a sua profissão”(ANDRÉ et al., 2012,
p.110).
Para os licenciandos que participaram de nossa pesquisa as práticas do
professor formador servem de exemplo e podem ser seguidas, mesmo as práticas
consideradas tradicionais. Para Soares e Cunha (2010), o modelo de docente
universitário tradicional, baseado na erudição, ainda predomina nas universidades
brasileiras. Este modelo de professor universitário “remonta às origens da
universidade, na Idade Média, mas manteve seus traços essenciais quando a
universidade abraçou a ciência moderna positivista” (SOARES; CUNHA, 2010, p.
154
quando “gostam dele”, este acaba sendo uma referência e os alunos acabam
seguindo seu exemplo, mesmo considerando sua prática pedagógica desapropriada.
Percebemos nas falas também que a maioria dos licenciandos que relataram
desaprovarem práticas de seus formadores tenta “se policiar” para não seguir tais
práticas. Para André et al. (2012), os formadores são vistos pelos licenciandos como
“modelos” e a forma como estes atuam é percebida “como fontes de referência” para
as práticas pedagógicas dos futuros professores.
A pesquisa de André et al. (2012) revela também que alguns professores
formadores são vistos pelos estudantes como “modelos às avessas”, ou seja,
“oferecem exemplos de como não se deve ser o trabalho do professor” (p.113).
Discutir as práticas pedagógicas dos professores formadores não é nada trivial, mas
acreditamos que estas sofrem influências das relações de poder no campo
universitário (BOURDIEU, 2013) e das questões ligadas ao ensino, bem como da
formação do professor formador.
A docência universitária na visão de Soares e Cunha (2010, p. 23) tem
pouca visibilidade, “haja vista que os critérios para avaliação e progressão na
carreira docente são essencialmente relacionados à pesquisa”. As questões sobre o
ensino, nesse sentido, sofrem certa desvalorização. O ensino torna-se um capital
menos valorizado dentro do campo universitário, ao passo que é o acúmulo de
capital institucionalizado e puro que confere aos docentes universitários um maior
status e poder de decisão sobre o campo (BOURDIEU, 2013). O habitus
institucionalizado no campo universitário confere às atividades de pesquisa um
reconhecimento maior do que as atividades de ensino. Estas questões sobre o que
se valoriza no campo universitário refletem não só na forma como são vistas as
questões sobre o ensino e a docência universitária, mas também influenciam na
formação do professor formador.
A formação profissional dos professores universitários não tem seu foco no
ensino. Em sua maioria, os professores universitários são especialistas em áreas do
conhecimento diferentes das que compõem os conhecimentos necessários para a
atuação docente (GATTI, 2014). Segundo a autora, a maioria dos professores
formadores não teve uma formação didática e uma parcela deles não teve a
perspectiva de que atuariam como formadores de professores. Gatti (2014, p.46)
acrescenta ainda que a formação disciplinar do professor formador, assim como a
formação para a pesquisa, podem ser consideradas satisfatórias, mas “o mesmo não
156
26
Esta escolha pode estar relacionada com a exigência das IES em seus processos de seleção de
docentes. A maioria das IES exige nos editais dos concursos públicos que os docentes possuam a
graduação e Pós-Graduação na mesma área específica em que o docente irá atuar. Por exemplo,
para atuar na licenciatura em Matemática é exigida (na maioria das IES) a graduação e Pós-
-Graduação na área da Matemática, dificilmente as IES exigem licenciatura ou Pós-Graduação na
área de educação ou ensino para se atuar nas licenciaturas, exceto para atuar no curso de
pedagogia, basta olhar os editais dos concursos para docentes universitários.
157
L1E – Tem diferença entre professor que já atuou na escola, mas não dá
pra generalizar, eu tive professor que passou pelo ensino fundamental e
não deram aula muito bem, acho que desmotivou. Eu acho que tem
diferença sim, [...] mas não são todos, [...] eu acho que tem muitos
professores que não passaram e dão aula muito bem, um tipo de esforço
pessoal talvez.
L2 – Me sinto preparada, mas sei que os estudos não cessam, pois tudo o
que é visto no período da graduação, em se tratando de matérias
específicas, apenas aumenta o meu saber específico, mas aplicá-lo no dia a
dia numa escola não é viável, terei que pesquisar e me preparar para
ministrar aulas.
L3 – Eu me sinto preparada, mas não cem por cento, ainda tenho que me
aperfeiçoar mais.
L8 – Sinto que estou preparada, com os estágios concluídos e com a
preparação que tivemos durante o curso acredito que estou preparado.
L9 – Sinto que estou preparado, a universidade deu oportunidade de
participar do PIBID, onde não apenas me deu certeza que quero ser
professor, como me deu a base e a experiência de como atuar na escola. O
estágio também ajudou.
L12 – Com a experiência obtida no estágio e com as docências terminadas,
acredito que a única coisa que falta é a experiência, como um “quase”
formado acredito que está bom para um professor.
L29 – Sinto que necessito me aprofundar mais, especialmente em
metodologias de ensino para determinados conteúdos.
L32 – Já tenho feito estágios, tendo algumas aulas PSS e tendo participado
do PIBID, me sinto preparada, mas tenho consciência de que meu
aprendizado não acaba com a graduação, posteriormente preciso de
atualização.
L35 – Estou preparada, nosso curso por mais que seja difícil e rigoroso tem
uma boa preparação e bons professores, mas ainda acho que para que eu
seja uma boa professora preciso me especializar melhor para que minhas
aulas sejam as melhores e os alunos aprendam efetivamente.
Para esses licenciandos o contato coma escola proporciona essa “experiência” que
eles consideram importante para se sentirem preparados. Os relatos discentes
evidenciam que o desconhecimento sobre a realidade da escola proporciona aos
licenciandos insegurança e a sensação de despreparo. Para Mendes, Clock e
Baccon (2014, p. 2), a aprendizagem da docência na licenciatura deve ser pensada
como “uma preparação para que os saberes e os conhecimentos apreendidos pelos
alunos com as aulas e estágios possam fornecer segurança e apoio para o tempo
complexo e decisivo do profissional de ingresso na carreira”. Isso possibilita a
segurança necessária para a vivência de fases posteriores na carreira docente.
O processo de socialização discente vivenciado na licenciatura,pode ser
considerado, nos termos de Bourdieu (2004b), um processo de incorporação do
habitus, ou seja, os licenciandos incorporam em seu habitus as disposições
advindas das experiências como acadêmico. Nesse sentido o habitus dos
licenciandos acaba se reestruturando e adquirindo novas disposições de acordo com
as vivências na licenciatura, visto que o habitus se estrutura pelo campo, pois é o
resultado da incorporação das necessidades desse campo (BOURDIEU, 2004b).
Nesse sentido, os agentes que integram o campo universitário são dotados de
habitus parecidos (BOURDIEU, 2004b).
Foi possível perceber também nos discursos, que os licenciandos têm
consciência de que a licenciatura é apenas o início de um processo de formação
docente e que os mesmos devem seguir se aperfeiçoando. Esta perspectiva de
formação expressa pelos licenciandos corrobora com o entendimento de formação
docente e desenvolvimento profissional como um continuum (MIZUKAMI, 2002), um
processo que não se esgota na formação inicial.
Os dados de nossa pesquisa revelaram que grande parte dos licenciados da
Matemática não se sente preparada para o exercício da docência, e citam a falta de
conteúdos voltados para o ensino, como podemos observar nos discursos:
L18 – [...] o curso deveria ter disciplinas voltadas para como ensinar
determinados conteúdos.
L25 – Por se tratar de um curso de licenciatura sinto falta de disciplinas
voltadas para a área.
L20 – Não sinto que estou preparada porque não há um preparo específico
aqui na universidade para começar o exercício da docência.
L25 – O curso não prepara, temos que correr atrás se quisermos ser bons
professores.
L34 – A minha formação em licenciatura não me deixa preparada para
lecionar, e esta não é uma opção que pretendo seguir.
L31 – Mesmo encontrando dificuldades ao lidar com algumas situações que
surgem em sala de aula que não são tratadas na graduação, acredito que o
curso procura abordar e intensificar a relação entre teoria e prática,
universidade e escola
L33 – Acredito que exercer a docência indica que muitos desafios deverão
ser vencidos e entre esses desafios alguns como: Como dar uma boa aula?
Como lidar com situações difíceis? Não são sequer citados na graduação.
Particularmente quando comecei a dar aula me senti muito perdida.
L12E – Eu acho que os acadêmicos não saem tão preparados assim, eu
acho que falta um pouco de conhecimentos da escola e falta de como
aplicar algumas coisas,eu me vi em várias situações em que os alunos
vinham me perguntar as coisas e eu não sabia como explicar para eles,
talvez nessa parte falte um pouco no curso, falta ligação.
matemático. Com a Análise de clusters foi possível identificar que os relatos sobre a
falta de identidade do curso se concentravam nas falas dos licenciandos da U1.
Autores da área de formação docente como Gatti (2013, 2008), Gatti e
Barreto (2009) e Diniz-Pereira (1999) enfatizam que nas licenciaturas ainda se
verifica a predominância do oferecimento de uma formação focada na área
disciplinar específica, com espaço reduzido para a formação pedagógica.
A dicotomia entre bacharelado e licenciatura ainda não se encontra resolvida
nos cursos de Matemática, interferindo na identidade desses cursos. Sobre a
identidade da licenciatura em Matemática, ressaltamos que as Diretrizes Nacionais
para os cursos de Matemática definem as especificidades dos cursos de licenciatura
e bacharelado, conferindo às licenciaturas identidade própria. Segundo as Diretrizes,
a licenciatura em Matemática deve focar no educador matemático, os licenciandos
precisam adquirir habilidades relacionadas ao ensino da matemática. Mas essas
considerações muitas vezes não se concretizam nos currículos das licenciaturas. O
que se observa “são cursos de licenciatura com identidade de bacharelado”
(JUNQUEIRA; MANRIQUE, 2012, p. 47) como podemos verificar nos depoimentos
dos discentes das licenciaturas em Matemática investigadas neste estudo.
Para a maioria dos licenciandos investigados a organização curricular do
curso prioriza o ensino da matemática “pura”, com pouco espaço para as questões
sobre o ensino. Os acadêmicos investigados enfatizam ainda que os conteúdos que
compõem os currículos da educação básica também deixam de ser abordados no
curso. Lembrando que as Diretrizes para os cursos de Matemática orientam que as
IES incluam nos currículos das licenciaturas em Matemática os conteúdos
matemáticos presentes na educação básica, assim como os conteúdos das ciências
da educação, história da educação, filosofia das ciências e da matemática (BRASIL,
2002c). No entanto, o que se verifica é “o esquema de superioridade dos
conhecimentos disciplinares sobre os conteúdos pedagógicos” (GATTI, 2013).
Pesquisa de Gatti e Barreto (2009) e Gatti (2010), que analisou os currículos
e ementas curriculares das licenciaturas com maior carga horária nos currículos da
educação básica (Letras, Matemática e Ciências Biológicas), revelou que as
licenciaturas em Matemática são as que mais buscam um equilíbrio entre os
“conhecimentos específicos da área” e os “Conhecimentos específicos para a
docência”, embora na maioria das IES se mantenha ainda um maior número de
horas para as disciplinas relacionadas aos conhecimentos específicos, “espelhando
165
L15E – [...] muitos professores que são da parte das matérias pedagógicas
também não proporcionam o que deveriam proporcionar, ou pelo menos do
que está na ementa.
L12E – Eu acho que ensina mais os conteúdos específicos (o curso), eu
acho assim que poderia ter uma articulação um pouco melhor [...] as
matérias pedagógicas e articuladoras eu acho que sejam trabalhadas de
uma maneira um pouco errada, por exemplo, a professora chega te coloca
um texto e você faz um resumo e acabou [...] talvez se fosse um trabalho
mais prático, mais didático [...].
L13E – Eu acho que tinha que ter mais disciplinas pedagógicas, mas
deveria ser mais focado, uma disciplina complementa a outra, tudo bem,
mas a gente acaba vendo a mesma coisa em duas ou três disciplinas [...]
agora, por exemplo, eu pego um cálculo diferenciado integral, se eu não fui
bem no primeiro ano, no segundo eu já estou enroscando, é tudo uma
linhagem, e já a visão do aluno para disciplina pedagógica é “eu só vou ler”.
docência. O futuro professor precisa ocupar o seu “lugar” como educador (BACCON;
ARRUDA, 2015) e “para ocupar-se o „lugar‟ de professor, o sujeito precisa receber
uma formação adequada e a sustentação no exercício desse ofício” (p. 466), o que
será possível com o conhecimento teórico-prático necessário para se atuar como
docente.
A dimensão teórico-prática na licenciatura, de acordo com as DCN para a
formação de professores, deve ser articulada nas disciplinas por meio da Prática
como Componente Curricular, não ficando a prática centralizada nos estágios, todas
as disciplinas devem ter a dimensão prática. Nessa perspectiva, as disciplinas
específicas, assim como as pedagógicas, devem articular os conhecimentos
matemáticos e os conhecimentos práticos, que fazem parte da ação educativa.
Sobre essa articulação vejamos o que dizem alguns discentes:
L15E – O curso para melhorar primeiro de tudo, é feita tanta reunião pra
coisas inúteis, deveriam sentar e se preocupar, deveriam analisar disciplina
por disciplina [...] o que está errado, deveria ser uma reunião para todos,
não só da parte pedagógica, mas como um todo, vamos melhorar e tirar
este espírito de bacharel, não é só isso, [...] o que acontece, o professor que
é bacharel ele vai puxar o quê? “farinha para saco dele”, “eu vou formar o
pesquisador, já que esse povo da pedagógica”... e o da pedagógica
também, “vou puxar só pra parte pedagógica, porque a matemática não é
tão importante”.
L14E – Os professores que são das específicas puxam tudo para lado
deles, agora aqueles que são formados na licenciatura, ensinam
licenciatura, depende do professor isso, tem que ter amor, gostar. A gente
vê quando levam tudo para bacharelado, alguns focam na licenciatura
outros não.
os agentes buscam legitimar a sua posição dentro do campo, bem como valorizar as
suas áreas de conhecimento. Assim o campo universitário não se configura como
um espaço neutro de se elencar conteúdos importantes para a formação docente, a
construção do PPC e da matriz curricular pode ser considerada um espaço de lutas
e conflitos que buscam legitimar a posição dos agentes dentro do campo
universitário (BOURDIEU, 2013). Dessa forma, as diferentes hierarquias ocupadas
pelos professores e pelas disciplinas dentro do campo universitário se refletem na
construção dos Projetos Pedagógicos e nos currículos dos cursos.
Nesse sentido, o campo universitário pode ser considerado um campo de
lutas e conflitos travados pelos agentes que nele se inserem, constituindo-se em
uma estrutura em que os agentes ocupam determinadas posições de acordo com o
acúmulo de capital científico adquirido ao longo da trajetória acadêmica.
Os acadêmicos visualizam na prática a dicotomia e as relações de força nas
áreas de conhecimento que compõem as disciplinas do curso. Nos relatos dos
discentes foi possível perceber que os formadores da área da Matemática defendem
seu campo de conhecimento e deixam transpassar para os alunos certo privilégio
que goza a disciplina da Matemática em relação às disciplinas pedagógicas no
interior do campo. Ao conferir maior valor aos conteúdos matemáticos, os
formadores contribuem, mesmo que não percebam, e de forma implícita, para a
desvalorização das áreas pedagógicas por parte dos licenciandos.
Os licenciandos enfatizam também que alguns acadêmicos da licenciatura
desvalorizam as matérias pedagógicas, conferindo maior valor aos conteúdos
matemáticos, os depoimentos abaixo evidenciam essa posição:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
permaneceram em aberto, seja porque não era nosso objetivo de estudo e por conta
da imensa quantidade de dados à qual nos deparamos, o que não nos possibilitou
analisar tudo. Podemos citar alguns pontos que permanecem em aberto: o
compromisso social e a função da universidade pública na formação docente; como
o perfil do professor formador influencia nas práticas formativas na licenciatura; as
experiências do professor formador e a influência na prática pedagógica na
licenciatura. Esses pontos nos despertam, como pesquisadora, o desejo de
continuar pesquisando e contribuindo para as reflexões e possíveis avanços na
formação de professores no Brasil.
180
REFERÊNCIAS
BOURDIEU, P. Para uma sociologia da Ciência. Trad. Pedro Elói Duarte. Lisboa,
Portugal: Edições 70, 2004b.
NÓVOA, A. (org.) Profissão Professor. 2.ed. Porto, Portugal: Ed. Porto, 1995.
ROSSO, A. J.; BRANDT, C. F.; CERRI, L. F.; CAMPOS, S. X. de; FREIRE, L. I. F.;
TOZETTO, A. S. Novas diretrizes curriculares nacionais para a formação de
professores e algumas novas ficções na leitura da escola. Ensaio: avaliação e
políticas públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 18, n. 69, p.821-842, out./dez.
2010.
Caro(a) Acadêmico(a):
Eu,_______________________________________________________,RG_____________a
cadêmico do curso de licenciatura em matemática, aceito participar da pesquisa e acredito ter sido
suficientemente informado(a) a respeito da participação neste estudo.
Ficou claro para mim que minha participação é isenta de despesas e que tenho garantias de
acesso aos resultados e direito de esclarecer minhas dúvidas a qualquer momento. Entendo que
minha identidade será confidencial e que posso sair do estudo a qualquer momento, antes ou durante
o mesmo, sem penalidade ou prejuízo.
O termo de consentimento livre e esclarecido será feito em duas vias, sendo um de posse
do(a) entrevistado(a) e outro do pesquisador.
___________________________________
Assinatura do participante da pesquisa
_____________________________________
Assinatura do pesquisador responsável RG _____________________Fone________________
Ponta Grossa, _____ de _____________________de ___________.
190
Prezado acadêmico:
1- Sexo: ( ) M. ( ) F. Idade_______________________
2- Você cursou o Ensino Médio em escola:
( ) Pública
( ) Particular
3- Estado civil:
( ) Casado(a)
( ) Solteiro(a)
( ) Viúvo(a)
( ) Divorciado(a)
4- Tem filhos?
( ) Sim
( ) Não
( ) Sim ____________________________
( ) Não
6- Renda Familiar:
Por quê?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________________________________________________________________
10- Para você o que o professor precisa saber para atuar em sala de aula?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________________________________________________________________
17- Você acha que o seu curso de licenciatura oferece subsídios suficientes
para você atuar em sala de aula? Justifique.
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_________________________________________________________________
( ) Não
( ) Sim
Nome: ______________________________________________________
E-mail:_______________________________________________________
Telefone: ____________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________
195
ROTEIRO DA ENTREVISTA–TÓPICOS
Ser professor
Saberes docentes
197
ANEXO 1
ANEXO 2