Material para Impressão - 1º Ano
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Mito: Mythos, em grego, significa “palavra”, “o que se diz”, “narrativa”. A consciência mítica é predominante em
culturas de tradição oral, quando ainda não há escrita. Filosofando, Pág. 26
O Que é Mito?
Mito é um modo ingênuo, fantasioso, anterior a toda reflexão, e não-crítica de estabelecer algumas verdades
que não só explicam parte dos fenômenos naturais ou mesmo a construção cultural, mas que dão também as diretrizes
da ação humana. Deve-se salientar, entretanto, que, não sendo teórica, a verdade do mito não obedece a lógica nem a
verdade científica.
O Mito nasce do desejo de entender o mundo, para afugentar o medo e a insegurança.
O pensamento mítico está muito ligado à magia, ao desejo, ao querer que as coisas aconteçam de um
determinado modo. Temas de Filosofia, Pág. 62/63
A Consciência Mítica surgiu a partir da necessidade dos vários povos e das civilizações de encontrar respostas
a suas indagações fundamentais, ou seja, aquilo que confere sentido a sua existência. O Mito é, portanto, uma intuição
compreensiva da realidade, uma forma espontânea de o homem situar-se no mundo em que se encontra inserido. É
importante salientar que não havia clara distinção entre real e sobrenatural nas narrativas míticas, tratava-se de um
terreno onde a ficção e a história se encontravam essencialmente ligadas. Eureka, Pág. 21/22
“Mas vamos ser claros. Não queremos dizer que os mitos, para os antigos, pertenciam à fantasia gratuita e que,
inventados de ponta a ponta ao sabor de um imaginário individual ou coletivo, não poderiam, no plano religioso, ter
pretensões de maior seriedade ou suscitar maior credibilidade do que os contos da carochinha. Pretendemos, ao
contrário, convidar o leitor, se desejar penetrar na mitologia grega, a sair dos quadros de pensamento que lhe são
costumeiros: entre a literatura e a religião, bem como entre a narrativa fictícia e a verdade do que é contado, entre a
fabulação do mito e a autenticidade do divino implicado na narração, não existia nos tempos arcaicos da Grécia esse
corte, essa incompatibilidade que que somos levados a estabelecer.” (VERNANT, 2002, p. 230)
Funções do Mito
Além de acomodar e tranquilizar o ser humano diante de um mundo assustador, dando-lhe a confiança de que, através
de suas ações mágicas, o que acontece no mundo natural depende, em partes, dos seus atos, o Mito também fixa
modelos exemplares de todas as funções e atividades humanas.
Características do Mito
Uma das características do Mito é o fato de ser sempre dogmático (verdade incontestável), isto é, apresenta-se como
verdade que não precisa ser provada e que não admite contestação. A sua aceitação se dá, então, por meio da fé e da
crença. E por não ser uma aceitação racional, o mito não pode ser provado nem questionado.
O Mito na Grécia
Para os gregos, o Mito era um discurso pronunciado para os ouvintes que recebiam como verdadeira a narrativa, porque
confiavam naquele que narrava. Trata-se de uma narrativa pública, que se baseava na confiabilidade da pessoa do
narrador ter presenciado os acontecimentos narrados ou ter recebido a narrativa de quem, de fato, presenciou-os.
Quem narra o Mito? O poeta. Quem é ele e qual é sua autoridade? Entre os gregos, existia a crença de que os poetas
eram pessoas escolhidas pelos deuses, que lhes permitiam acesso aos mistérios que cercavam a organização da
natureza, bem como a origem de todos os seres. A palavra dos poetas – o Mito – era sagrada, pois vinha de uma
revelação divina, e esse caráter divinal fazia com que ela fosse inquestionável e incontestável.
Antes do nascimento da Filosofia, muito mais do que em outros povos, os poetas tiveram imensa importância na
formação espiritual e na educação do homem entre os gregos. Apesar de fantásticos e com elevada dose de sabedoria
e conhecimento sobre o universo humano, com suas paixões e seus problemas existenciais, bem como da necessidade
da existência de regras que possibilitassem a vida em comum. Eureka, Pág. 23
“O que chamamos de Mitologia Grega? Grosso modo e essencialmente, trata-se de um conjunto de narrativas que
falam de deuses e heróis, ou seja, de dois tipos de personagens que as cidades antigas cultuavam. Neste sentido a
mitologia está próxima da religião: ao lado dos rituais, de que às vezes os mitos tratavam de forma muito direta [...] ao
lado dos diversos símbolos plásticos que, ao atribuírem aos deuses formas figuradas, encarnam sua presença no centro
do mundo humano, a mitologia constitui, para o pensamento religioso dos gregos, um dos modos de expressão
essenciais. Se a suprimirmos, talvez façamos desaparecer o aspecto mais apropriado para nos revelar o universo divino
do politeísmo, uma sociedade com um além múltiplo, complexo, ao mesmo tempo rica e ordenada (VERNANT, 2002,
p. 229)
Os Deuses Gregos
A civilização grega teve início por volta do século XX a.C. (entre 2000 e 1900 a.C.), quando invasores de origem
indo-europeia ocuparam o continente, dando início à civilização aqueia (ou micênica). Nessa época a Grécia ainda se
chamava Hélade e era constituída por diversas regiões autônomas, mas que mantiveram a língua e a unidade cultural.
A religião dos gregos era politeísta. Os deuses, habitantes do Olimpo, eram imortais, embora tivessem
comportamentos semelhantes aos dos homens, sendo às vezes benevolentes e também agindo por inveja ou vingança.
Entre as obrigações a eles devidas, como oferendas, preces e sacrifícios, destacam-se as peregrinações aos grandes
santuários, tais como Delfos, onde se consultava o oráculo. Filosofando, Pág. 30
Os deuses gregos são:
1) Zeus: deus dos deuses;
2) Hera: deusa do matrimônio, do parto;
3) Hades: deus do submundo, deus dos mortos;
4) Poseidon: deus dos mares, dos oceanos;
5) Apolo: deus do Sol, da arte, da música;
6) Atena: deusa da sabedoria, da guerra estratégica;
7) Ártemis: Irmã gêmea de Apolo, deusa da caça, da vida selvagem;
8) Ares: deus da guerra;
9) Hermes: o mensageiro dos deuses, era o responsável por levar os mortos até o submundo de Hades;
10) Dionísio: deus das festas, do vinho, do teatro;
11) Hefesto: deus do ferro, ferreiro dos deuses;
12) Afrodite: deusa do amor e da beleza;
13) Deméter: deusa da agricultura.
Homero
Da vida de Homero praticamente nada se sabe com segurança, embora dados semilendários sobre ele fossem
transmitidos desde a Antiguidade. Sete cidades gregas reivindicaram a honra de ter sido sua terra natal. História das
Grandes Ideias do Mundo Ocidental – Os Pensadores – Pág. VI
Os Mitos gregos surgiram quando ainda não havia escrita e eram transmitidos por poetas ambulantes chamados aedos
e rapsodos, que os recitavam de cor em praça pública. Nem sempre é possível identificar a autoria desses poemas, por
serem produção coletiva e anônima.
Atribuem-se a Homero, um desses poetas, dois poemas épicos, as epopeias Ilíada e Odisseia, escritos entre o século
X e o VIII a.C.
Na vida dos gregos, as epopeias desempenharam um papel pedagógico significativo. Descreviam a história grega –
o período da civilização micênica – e transmitiam os valores culturais mediante o relato das realizações dos deuses e
dos antepassados. Filosofando, Pág. 30/31
Além de informar sobre a organização da polis arcaica, as epopeias homéricas são a primeira expressão documentada
da visão mito-poética dos gregos. A intervenção, benéfica ou maléfica, dos deuses está no âmago da psicologia dos
heróis de Homero e comanda suas ações. Com efeito, a Ilíada e a Odisseia apresentam-se marcadas pela presença
constante de poderes superiores que interferem no desenrolar da luta entre gregos e troianos (tema da Ilíada) e nas
aventuras de Ulisses ou Odisseu (tema da Odisseia).
Mesmo quando representam forças da natureza, os deuses homéricos revestem-se de forma humana; esse
antropomorfismo atribui-lhes aspecto familiar e até certo ponto inteligível, afastando os terrores relativos a forças
obscuras.
Os deuses homéricos são fundamentalmente deuses da luz (de díos provém tanto “deus” quanto “dia”) e seu
antropomorfismo não diz respeito apenas à forma exterior, semelhante à dos mortais: os deuses são também animados
por sentimentos e paixões humanas. Os pensadores, História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental, Pág. VII – VIII
É por oposição aos homens que os deuses homéricos se definem: ao contrário dos humanos, seres terrenos, os deuses
são princípios celestes; à diferença dos mortais, escapam à velhice e à morte. Escapam à morte, mas não são eternos
nem estão fora do tempo: em princípio pode-se saber de quem cada divindade é filho ou filha. A imortalidade, esta
sim, está indissoluvelmente ligada aos deuses que, por oposição aos humanos mortais, são frequentemente designados
de “os imortais” e constituem, na sua organização e em seu comportamento, uma sociedade imortal de nobres celestes.
Os pensadores, História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental, Pág. X – XI
Os dois grandes poemas homéricos, Ilíada e Odisseia, parecem ter sido concluídos por volta de 800 a.C. A Guerra de
Troia, tema dos poemas, aconteceu pouco depois de 1200 a.C. Assim, temos um relado pós-dórico de um
acontecimento pré-dórico. Bertrand Russell – História do Pensamento Ocidental – Pág. 15/16
Hesíodo
Hesíodo, outro poeta que teria vivido por volta do final do século VIII e princípios do VII a.C., produziu uma
obra com particularidades que tendem a superar a poesia impessoal e coletiva das epopeias.
Tudo que sabe, com segurança, sobre a vida de Hesíodo, é narrado por ele próprio em seus poemas. Seu pai
habitava Cumes, na Eólia, onde possuía uma pequena empresa de navegação. Arruinado, atravessou o mar Egeu e
retornou à Beócia, berço de sua raça. Aí, em Ascra, dedicou-se às atividades campesinas e aí nasceu, viveu e morreu
Hesíodo (meados do século VIII a.C.).
Suas obras ainda refletem o interesse pela crença nos Mitos. Em Teogonia, Hesíodo relata as origens do mundo e dos
deuses, em que as forças emergentes da natureza vão se transformando nas próprias divindades. Por isso a teogonia é
também uma cosmogonia, na medida em que narra como todas as coisas surgiram do Caos para compor a ordem do
Cosmo.
Por exemplo, do Caos surgiu Gaia, ou Geia (a Terra, elemento primordial), que, sozinha, deu origem a Urano
(o Céu). Em seguida, uniu-se a Urano, gerando os deuses e as divindades femininas. Um de seus filhos é Cronos
(Tempo), que toma o poder do pai e é destronado pelo filhos Zeus. Filosofando, Pág. 32
A Teogonia de Hesíodo enumera três gerações de deuses: a do Céu, a de Cronos e a de Zeus. A interpolação
dos episódios de Prometeu e de Pandora na sequência da Teogonia – episódio depois retomados em Os Trabalhos e os
Dias – serve a Hesíodo para justificar a condição humana: Prometeu rouba o fogo de Zeus para dá-lo aos homens e
atrai para si e para os mortais a ira do suserano do Olimpo. Zeus condena Prometeu à tortura de ter o fígado
permanentemente devorado por uma águia. Aos mortais Zeus reserva não menor castigo: determina a criação de ser à
imagem das deusas imortais e entrega-o, como presente de todos os habitantes do Olimpo, a Epimeteu, irmão de
Prometeu. Pandora – a mulher – leva em suas mãos uma jarra que, destampada, deixa escapar e espalhar-se entre os
mortais todos os males. Na jarra, prisioneira, fica apenas a esperança. As duras condições de trabalho de sua gente
sugerem assim a Hesíodo uma visão pessimista da humanidade, perseguida pela animosidade dos deuses. Os
pensadores, História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental, Pág. XV
Cosmogonia e Teogonia
Vemos, portanto, que o Mito narra a origem das coisas por meio de lutas, alianças e relações sexuais entre forças
sobrenaturais que governam o mundo e o destino dos seres humanos. Como os Mitos sobre a origem do mundo são
genealogias, diz-se que são cosmogonias e teogonias.
A Filosofia não é uma cosmogonia, e sim uma cosmologia, pois é uma explicação racional sobre a origem do mundo
e sobre as causas das transformações e repetições das coisas.
2. O Mito narrava a origem por meio de genealogias e rivalidades ou alianças entre forças divinas sobrenaturais e
personificadas. A Filosofia, ao contrário, explica a produção das coisas por causas naturais e impessoais, com base em
elementos naturais primordiais.
3. O Mito não se importava com contradições, com o fabuloso e o incompreensível. Não só porque esses eram traços
próprios das narrativas religiosas, como também porque a confiança e a crença no Mito vinham da autoridade religiosa
do narrador. A Filosofia, ao contrário, não admite contradições, fabulação e coisas incompreensíveis, mas exige que a
explicação seja coerente, lógica e racional. Convite à Filosofia, Pág. 36
Mitos Criacionais
O Mito Hoje
Hoje em dia, os meios de comunicação de massa estimulam os desejos e anseios que existem na nossa natureza
inconsciente e primitiva.
O super-heróis dos desenhos animados e dos quadrinhos, bem como os personagens de filmes como Rambo, passam
a encarnar o bem e a justiça e assumem a nossa proteção imaginária, exatamente porque o mundo moderno, com sua
crise econômica, seus segmentos criminosos (sequestro, assassinatos, roubos, etc.), e a instabilidade no emprego,
especialmente nos grandes centros urbanos, revela-se cada vez mais um lugar extremamente inseguro.
Até a novela, ao trabalhar a luta entre o bem e o mal, está lidando com valores míticos, pré-reflexivos, que se
encontram no interior de todos nós. Nas novelas o casamento também é transformado em mito: é o grande anseio dos
jovens enamorados, é a solução de todos os problemas, o apaziguamento de todas as paixões e conflitos. Por isso,
quase todas terminam com um verdadeiro festival de casamentos.
Costuma-se dizer que os primeiros filósofos foram gregos e surgiram no período arcaico, nas colônias gregas. Embora
reconheçamos a importância de sábios que viveram na mesma época em outros lugares, suas doutrinas ainda estavam
mais vinculadas à religião do que propriamente à reflexão filosófica.
Alguns autores chamaram de “milagre grego” a passagem da mentalidade mítica para o pensamento racional e
filosófico destacando o caráter repentino e único desse processo. Outros estudiosos, no entanto, criticam essa visão
simplista e afirmam que a filosofia na Grécia não é fruto de um salto, do “milagre” realizado por um povo privilegiado,
mas é a culminação do processo gestado ao longo do tempo.
Por enquanto, fiquemos com alguns fatos do período arcaico que ajudaram a alterar a visão mítica predominante e
contribuíram para o surgimento do filósofo:
a) a invenção da escrita;
b) o surgimento da moeda;
c) a lei escrita;
d) o cidadão da polis;
e) a consolidação da democracia.
A) A Invenção da Escrita
Em seu ressurgimento, a escrita assumiu função diferente. A escrita gera nova idade mental porque a postura de quem
escreve é diferente daquela de quem apenas fala. Como a escrita fixa a palavra para além de quem a proferiu, exige
maior rigor e clareza, o que estimula o espírito crítico. Portanto, a escrita surge como possibilidade maior de abstração,
de uma reflexão aprimorada que tenderá a modificar a própria estrutura do pensamento.
B) O Surgimento da Moeda
O comércio nasceu da própria necessidade dos seres humanos conviverem harmoniosamente na sociedade. O seu
desenvolvimento deu-se, inequivocamente, ao surgimento da moeda, pois, com seu uso, as riquezas começaram a
circular muito mais rapidamente, pois o seu transporte tornou-se muito mais simples e prático do que transporte tornou-
se muito mais simples e prático do que transportar mercadorias para troca.
Nasceu, assim, a economia de mercado e, com ela, a figura do comerciante, que se coloca entre o produtor e o
consumidor, ou seja, torna-se aquele que compra e vende mercadorias, cujas diferenças de valores atingem seu
objetivo: o lucro.
Na época da aristocracia rural, de riqueza baseada em terras e rebanhos, a economia era pré-monetária. Os objetos
usados para troca vinham carregados de simbologia afetiva e sagrada. As relações sociais, impregnadas de caráter
sobrenatural, eram fortemente marcadas pela posição social de pessoas consideradas superiores, devido à origem divina
de seus ancestrais.
Entre os séculos VIII e VI a.C., deu-se o desenvolvimento do comércio marítimo, decorrente da expansão do mundo
grego, com a colonização da Magna Grécia (atual sul da Itália e Sicília) e da Jônia (hoje litoral da Turquia). O
enriquecimento dos comerciantes acelerou a substituição de valores aristocráticos por valores da nova classe em
ascensão.
A moeda inventada na Lídia – região da atual Turquia –apareceu na Grécia por volta do século VII a.C., vindo a
facilitar os negócios e impulsionar o comércio. Com o recurso da moeda, os produtos que antes se restringiam ao seu
valor de uso, passaram a ter valor de troca, isto é, transformaram-se em mercadoria. Emitida e garantida pela polis, a
moeda fazia reverter seus benefícios para a própria comunidade.
Além desse efeito político de democratização de um valor, a moeda sobrepunha aos símbolos sagrados e afetivos o
caráter racional de sua concepção: a moeda representa uma convenção humana, noção abstrata de valor que estabelece
a medida comum entre valores diferentes. Nesse sentido, a invenção da moeda desempenha papel revolucionário, por
vincular-se ao nascimento do pensamento racional-crítico.
C) A Lei Escrita
É preciso destacar a importância de legisladores como Drácon (Séc. VII a.C.), Sólon e Clístenes (Séc. VI a.C.), que
sinalizaram uma nova era: a justiça, até então dependente da interpretação da vontade divina ou da arbitrariedade dos
reis, tornou-se codificada numa legislatura escrita. Regra comum a todos, norma racional, sujeita à discussão e à
modificação, a lei escrita passou a encarnar uma dimensão propriamente humana.
Segundo Jean- Pierre Vernant, Helenista e pensador francês, “os que compõem a cidade, por mais diferentes que sejam
por sua origem, sua classe, sua função, aparecem de uma certa maneira ‘semelhantes’ uns aos outros. Se de início a
igualdade existia apenas entre os guerreiros, ‘essa imagem do mundo humano encontrará no século VI sua expressão
rigorosa num conceito, o de isonomia: igual participação de todos os cidadãos no exercícios do poder.”
D) O Cidadão da Polis
Para Vernant, o nascimento da polis (por volta dos sécs. VIII e VII a.C.) é um acontecimento decisivo que “marca um
começo, uma verdadeira invenção”, por ter provocado grandes alterações na vida social e nas relações humanas.
A originalidade da polis é que ela estava centralizada na ágora (praça pública), espaço onde se debatiam os problemas
de interesse comum. Separavam-se na polis o domínio público e o privado: isso significava que ao ideal de valor de
sangue, restrito a grupos privilegiados em função do nascimento ou fortuna, se sobrepunha a justa distribuição dos
direitos dos cidadãos como representantes dos interesses da cidade.
Desse modo era elaborado o novo ideal de justiça, pelo qual todo cidadão tinha direito ao poder. A noção de justiça
assumia um caráter político, e não apenas moral, ou seja, não dizia respeito apenas ao indivíduo e aos interesses da
tradição familiar, mas à sua atuação na comunidade.
A polis se fez pela autonomia da palavra, não mais a palavra mágica dos mitos, palavra dada pelos deuses, e, portanto,
comum a todos, mas a palavra humana do conflito, da discussão, da argumentação. Expressar-se por meio do debate
fez nascer a política, que permite ao indivíduo tecer seu destino na praça pública. Da instauração da ordem humana
surgiu o cidadão da polis, figura inexistente do mundo da comunidade tribal e das aristocracias rurais.
E) A Consolidação da Democracia
Embora os regimes oligárquicos não tenham sido extirpados, em muitas poleis consolidaram-se os ideias democráticos.
Entre elas, Atenas é um modelo clássico. O apogeu da democracia ateniense ocorreu no século V a.C., quando Péricles
governava.
Os cidadãos livres, ricos ou pobres, tinham acesso à assembleia. Tratava-se da democracia direta, em que não eram
escolhidos representantes, mas cada cidadão participava ele mesmo das decisões de interesse comum.
No entanto, quando falamos em democracia ateniense, é bom lembrar que a maior parte da população se achava
excluída do processo político, tais como os escravos e os estrangeiros (metecos), mesmo que estes fossem prósperos
comerciantes.
Aliás, quanto mais se desenvolvia a ideia de cidadania, com a consolidação da democracia, a escravidão representava
ainda mais um contraponto indispensável, já que ao escravo eram reservadas as tarefas dos trabalhos manuais e das
atividades diárias de sobrevivência.
É difícil fazer o cálculo demográfico de Atenas, mas no decorrer do século V a.C. a população variou entre meio
milhão a 250 mil habitantes, dos quais a maioria era constituída por escravos. Excluídos os estrangeiros, as mulheres
e as crianças, restavam apenas entre 10 a 14% de cidadãos propriamente ditos capacitados para participar das
discussões na ágora e decidir por todos.
Apesar disso, o que vale enfatizar é a mutação do ideal político e uma concepção inovadora de poder, a democracia.
O hábito da discussão pública, na ágora, estimulava o pensamento racional, argumentativo, mais distanciado das
tradições míticas. Filosofando, Pág. 37/38/39
Podemos apontar como principais condições históricas para a formação da filosofia na Grécia:
As viagens marítimas dos gregos. Graças a elas, os gregos não só descobriram que não havia monstros e seres fabulosos
nos mares, mas também que os locais onde habitariam deuses, titãs e heróis eram, na realidade, habitados por outros
seres humanos. As viagens produziram o desencantamento ou a desmitificação do mundo, que passou a exigir uma
nova explicação sobre sua origem;
A invenção do calendário, que é uma forma de calcular o tempo segundo as estações do ano, as horas do dia, os fatos
importantes que se repetem. Isso revela uma capacidade de abstração nova, ou uma percepção do tempo como algo
natural, e não como uma força divina (o deus Cronos) incompreensível.
A invenção da moeda, que permitiu uma forma de troca que não se realiza como escambo ou em espécie (isto é, coisas
trocadas por outras). Esse cálculo do valor semelhante de coisas diferentes revela uma nova capacidade de abstração e
de generalização;
O desenvolvimento da vida urbana, na qual predominam o comércio e o artesanato. Isso levou ao aprimoramento de
técnicas de fabricação e de troca e à diminuição do prestígio da aristocracia proprietária de terras, por quem e para
quem os mitos foram criados. Além disso, como a emergente classe de comerciantes ricos precisava encontrar pontos
de poder e de prestígio para suplantar o velho poderio da aristocracia de terras e de sangue, muitos procuravam o
prestígio pelo patrocínio e estímulo às artes, às técnicas e aos conhecimentos. Consequentemente, criou-se um
ambiente favorável ao desenvolvimento da filosofia;
A adoção da escrita alfabética, que, como a do calendário e a da moeda, revela o crescimento da capacidade de
abstração e de generalização. Isso porque, em vez de representar cada coisa que precise ser dita por meio de uma
imagem diferente – como os hieróglifos dos egípcios ou os ideogramas dos chineses –, as escritas fonéticas oferecem
uma pequena gama de sinais ou de signos abstratos que, combinados, representam os sons das palavras;
A invenção da política, que introduz três aspectos decisivos para o nascimento da filosofia:
a) A ideia da lei como expressão da vontade de uma coletividade humana que decide por si mesma o que é melhor para
si e como ela definirá suas relações internas.
b) A constituição de um espaço público, que faz aparecer um tipo de discurso diferente daquele que era preferido pelo
mito.
c) A noção de discussão pública das opiniões e ideias. Convite à Filosofia, Pág. 38/39
Democracia e Filosofia
Na Grécia, entre os séculos VIII e V a.C., empreende-se a busca pela construção de uma sociedade justa e de um
pensamento racional, livre de preconceitos. Dessa procura originam-se, de um lado, a democracia e, de outro, a
filosofia.
A democracia grega, principalmente a de Atenas, é o resultado de lutas sucessivas. Primeiro, entre os ricos
comerciantes sem acesso ao poder e a aristocracia hereditária, que o monopolizava; em seguida, entre essas duas
camadas, que já compartilham o poder, e as classes mais pobres. A democracia representa um frágil e tenso equilíbrio
entre as várias camadas sociais. E, apesar das divergências que as separam, adquirem todas o direito de participação
política.
Diante da democracia, a filosofia mantém uma postura nem sempre favorável, mesmo porque na Grécia o pensamento
alcança um grau maior de elaboração quando esse regime já havia entrado em decadência. A despeito disso, uma e
outra têm raízes comuns: as condições históricas do mundo grego.
A sociedade grega, ao contrário de outras civilizações de seu tempo, desconhece castas sacerdotais que tenham o
monopólio dos livros sagrados e da verdade revelada. Tampouco a escrita é segredo de governantes e escribas. Ao
contrário, é de domínio comum, e isso possibilita a ampla difusão e a discussão de ideias.
O livre desenvolvimento do pensamento também é facilitado pela ausência, quer na religião olímpica quer nas crenças
mais místicas, de uma teologia elaborada que forneça explicações coerentes do mundo. Os deuses gregos, ao contrário,
têm características humanas e muito pouco servem de inspiração para um pensamento mais elaborado.
De uma perspectiva política, uma religião tão frágil em fundamentos é ineficiente como instrumento de poder. Dessa
maneira, já no período homérico, a ideia de rei divino desaparece, cedendo espaço para que a política e o governo se
tornem cada vez mais um assunto e uma atividade essencialmente humanos. (O homem seria definido, mais tarde, por
Aristóteles, como zoón politikón, isto é, animal político).
A reduzida dimensão das unidades políticas do mundo grego contribuiu para o surgimento dessa concepção
dessacralizada de política. A Grécia Antiga não é um império cujo domínio se estende a vastas regiões e a diversas
comunidades. Ao contrário, cada comunidade é uma cidade-Estado autônoma, com dimensões de um pequeno
município.
A ideia de que a soberania é da lei – não dos deuses ou de algum rei – constitui o fundamento da democracia grega.
Até chegar a ela, os atenienses passaram por vários sistemas de governo. Diante de sérios conflitos entre grupos sociais
que disputavam o poder, chegaram mesmo a escolher tiranos (que então significavam “árbitros”) para servir de
mediadores dos diversos interesses, encarnando a autoridade da lei. Por fim, na democracia, a lei tornou-se impessoal,
obra coletiva, resultado da decisão tomada por todos, reunidos em assembleia pública. Mas bem entendido: todos
menos mulheres, crianças, estrangeiros e escravos – aos quais era negado o direito à cidadania.
Essa organização política, até então inédita, possibilitou o desenvolvimento, em um modo sistemático de pensamento,
de concepções difusas, presentes na cultura helênica desde os tempos de Homero e de Hesíodo. O governo da cidade
como esforço coletivo e exclusivo dos cidadãos é a tradução política da ideia de que os deuses abandonaram os homens.
E a fatalidade, superior aos deuses, tem seu equivalente na visão democrática de que a lei está acima dos indivíduos.
Nesse ambiente iria desenvolver-se a filosofia, um modo de pensar que busca uma lei universal, acima de todas as
coisas, e que as explique sem recorrer a forças místicas e divinas. História da Filosofia, - Os Pensadores – Pág. 21/22/23
Os Pré-Socráticos
Que terá levado o homem, a partir de determinado momento de sua história, a fazer ciência teórica e filosófica? Por
que surge no Ocidente, mais precisamente na Grécia do século VI a.C., uma nova mentalidade, que passa a substituir
as antigas construções mitológicas pela aventura intelectual, expressa através de investigações científicas e
especulações filosóficas? História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental – Os Pensadores – Pág. I
Introdução
Uma nova maneira de pensar e de conceber o mundo origina-se e se desenvolve na Grécia clássica, um mosaico de
pequenas comunidades independentes que se espalhavam junto ao Mediterrâneo – da Jônia, na Ásia Menor, até o sul
da Itália. No centro estava a Grécia propriamente dita. Essa dispersão resultou das muitas invasões de povos em busca
de terras cultiváveis. Ali tomam corpo, no século VI a.C., as primeiras ideias sobre as quais vai se erigir o pensamento
ocidental.
Apesar de geograficamente dispersa, a Grécia Antiga tem uma vida cultural relativamente homogênea, que se
expressa na língua comum, em formas de organização política, em crenças religiosas semelhantes. Essa unidade – a
civilização helênica – resultou da fusão e da difusão das diversas culturas trazidas por povos variados, que
sucessivamente invadiram a Grécia, misturando-se aos habitantes mais antigos. História da Filosofia, Os pensadores,
Pág. 15
Esse novo modo de pensar, racional e filosófico, é considerado oposto ao pensamento mítico. É como se na Grécia
do século VI a.C. o homem tivesse se libertado das fantasias da mitologia e da religião para se afirmar e se desenvolver
racionalmente. Na verdade, porém, a relação entre o mito e o logos é muito mais complexa. Como aponta Jean-Pierre
Vernant, os “filósofos não precisam inventar um sistema de explicação do mundo: acharam-no pronto”.
Tome-se como exemplo a descrição da origem do universo feita por Hesíodo, no poema Teogonia. Os primeiros
filósofos, assim como Hesíodo, buscam uma explicação para a relação entre o caos e a ordem do mundo. A maneira
de entender essa relação é que muda. Enquanto o poeta vê os deuses como os responsáveis por tudo o que há, os antigos
pensadores preferem partir das formas da natureza que esses deuses representam (terra, água, ar) para entender a vida.
Há, porém, uma diferença fundamental entre o pensamento mítico e o pensamento racional dos primeiros filósofos.
A mitologia exprimia na forma divina e celestial todo o conjunto de relações, quer dos homens entre si, quer entre o
homem e a natureza. Assim como os deuses são criadores do mundo, o rei é o criador da ordem social, o regulador do
ciclo da natureza. O universo divino, as relações sociais e o ritmo da natureza confundem-se, submetidos todos ao
comando do rei. Por isso, a mitologia apenas narra a sucessão de fenômenos divinos, naturais e humanos. Ela não os
explica, pois a explicação já está dada pelo poder real.
O desaparecimento do “rei divino” altera esse cenário. A polis surge como criação da vontade humana. Os
acontecimentos do mundo antes considerados realizações do rei (e dos deuses) perdem a base de compreensão.
Tornam-se problemas. Para resolvê-los, o homem deve servir-se do meio que ele próprio desenvolveu ao criar a polis:
o logos, a razão. História da Filosofia, Os pensadores, Pág. 18/19
Embora a questão do início histórico da filosofia e da ciência teórica ainda contenha pontos controversos e continue
um “problema aberto” – na dependência inclusive de novas descobertas arqueológicas –, a grande maioria dos
historiadores tende hoje a admitir que somente com os gregos começa a audácia e a aventura expressas numa teoria.
Às conquistas esparsas e assistemáticas da ciência empírica e pragmática dos orientais, os gregos do século VI a.C.
contrapõem a busca de uma unidade de compreensão racional, que organiza, integra e dinamiza os conhecimentos.
História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental – Os Pensadores – Pág. II
O resultado das invasões dóricas, a partir do século XII a.C., é a ruína dos reinos micênicos, com sua estrutura de base
agrária, patriarcal e gentílica. Fugindo aos invasores e tentando salvaguardar sus tradições, muitos aqueus são forçados
a emigrar para as ilhas e as costas da Ásia Menor. Aí os jônios fundarão cidades, como Mileto e Éfeso, que se
transformarão em grandes centros econômicos e culturais. As principais atividades econômicas das colônias gregas da
Ásia Menor tornam-se, por força mesma da sua localização, o comércio e o artesanato. E, enquanto se intensificam as
relações com outros povos, cada vez mais distantes vão ficando as velhas tradições remanescentes da sociedade
micênica. A acelerada dinâmica social das polis jônicas corrói as antigas instituições e os valores arcaicos, fazendo
emergir uma nova mentalidade, fruto da valorização das individualidades que se afirmam nas circunstâncias e
iniciativas presentes.
Durante o século VII a.C., as novas condições de vida das colônias gregas da Ásia Menor acentuam-se devido à
revolução econômica representada pela adoção do regime monetário. A moeda, facilitando as trocas, vem fortalecer
econômica e socialmente aqueles que vivem do comércio, da navegação e do artesanato, marcando definitivamente a
decadência da organização social baseada na aristocracia de sangue. A partir de então e sobretudo no decorrer do século
VI a.C., a expansão das técnicas – já desvinculadas da primitiva concepção que lhes atribuía origem divina – passa a
oferecer ao homem imagens explicativas dotadas de alta dose de racionalidade, conduzindo à progressiva rejeição e à
substituição da visão mítica da realidade. A técnica que o homem consegue compreender e dominar a ponto de realizá-
la com suas próprias mãos, repeti-la e sobretudo ensiná-la apresenta-se como um processo de transformação e de
criação. Por que não seria semelhante àquele, o processo que teria produzido o universo atual e dentro dele continuaria
a operar mudanças?
Natural, portanto, que ocorressem nas colônias gregas da Ásia Menor as primeiras manifestações de um pensamento
dotado de tamanha exigência de compreensão racional que, depois de produzir as epopeias homéricas (entre o século
X e o VIII a.C.), eclodiu, no século VI a.C., sob a forma de ciência teórica e filosofia. É bem verdade que, já no século
VIII a.C., Hesíodo expusera em suas obras poéticas uma síntese de relatos míticos tradicionais, vinculando-os pelo
nexo causal das genealogias que ligavam deuses e mortais. Mas, a partir do século VI a.C., esse tipo de construção
cedeu lugar a uma nova e mais radical forma de pensamento racional, que não partia da tradição mítica, mas de
realidades apreendidas na experiência humana cotidiana. Fruto da progressiva valorização da “medida humana” e da
laicização da cultura efetuada pelos gregos, despontou, nas colônias da Ásia Menor, uma nova mentalidade, que
coordenou racionalmente os dados da experiência sensível, buscando integrá-los numa visão compreensiva e
globalizadora. Dentro desse espírito surgiram, na Jônia, as primeiras concepções científicas e filosóficas da cultura
ocidental, propostas pela escola de Mileto. História das Grandes Ideias do Mundo Ocidental – Os Pensadores – Pág. 6
No curto espaço de dois séculos os gregos produziram na arte, na literatura, na ciência e na filosofia uma assombrosa
torrente de obras-primas que estabeleceram os padrões gerais na civilização ocidental. Bertrand Russell – História do
Pensamento Ocidental – Pág. 13
A filosofia dos gregos revela, através das suas etapas, a influência de um certo número de dualismos. Sob uma ou
outra forma, estes continuaram sendo tópicos sobre os quais os filósofos escrevem ou discutem. Na base de todos eles
está a distinção entre verdade e falsidade.
No pensamento grego esses conceitos estão estreitamente vinculados aos dualismos do bem e do mal, e da harmonia
e da discórdia. Em seguida vem o dualismo da aparência e da realidade, muito vivo nos dias de hoje. Junto com eles
temos as questões da mente e da matéria, da liberdade e da necessidade. Além disso, existem as questões cosmológicas,
que se referem a se as coisas são uma ou muitas, simples ou complexas, e, finalmente, os dualismos do caos e da
ordem, do ilimitado e do limite.
A maneira pela qual esses problemas foram abordados pelos primeiros filósofos é instrutiva. Uma determinada escola
se dedicava a um dos lados de um dualismo; em seguida, outra lhe faria críticas e adotaria o ponto de vista oposto.
Afinal, surgiria uma terceira escola, que produziria uma espécie de compromisso, substituindo as duas opiniões
anteriores. Ao observar essa batalha pendular entre doutrinas rivais de filósofos pré-socráticos, Hegel desenvolveu pela
primeira vez a sua noção de dialética. Bertrand Russell – História do Pensamento Ocidental – Pág. 19/20
Os primeiros filósofos gregos em geral escreveram pouco, e em condições que a rigor nos são mal conhecidas. Por
exemplo, não sabemos como intitularam seus escritos, ou mesmo se os intitularam, em circunstâncias que não eram
certamente as de uma publicação regular. [...] Os escritos desses primeiros filósofos na íntegra se perderam todos,
como a maior parte da riquíssima literatura grega. O que sobrou deles foram pequenos trechos, às vezes o
correspondente a uma página, às vezes pedaços de frases, às vezes uma palavra, inseridos em textos que séculos
depois (IV a.C. a VI d.C.) se escreveram e que, alguns por acaso, se salvaram. Sobraram também muitas notícias
sobre a vida e a doutrina deles. E sobretudo sobrou, podemos dizer assim, uma interpretação que logo se tornou
definitiva, oficial, e que fixou a posição desses pensadores na história da filosofia: enquanto primeiros filósofos, eles
começaram um discurso racional, que justamente por estar no início forçosamente não se desenvolveu em todos os
planos e articulações, que ele só veio a alcançar numa época de maturidade, por exemplo na obra de Aristóteles, já
devidamente articulada numa lógica, numa ética, numa física e numa metafísica. Os Pensadores – Pré-Socráticos –
Pag. 35/36
A noite segue o dia. As estações do ano sucedem-se uma à outra. As plantas e os animais nascem, crescem e morrem.
Diante desse espetáculo cotidiano da natureza, o homem manifesta sentimentos variados – medo, resignação,
incompreensão, espanto e perplexidade. E são precisamente esses sentimentos que acabam por levá-lo à filosofia. O
espanto inicial traduz-se em perguntas intrigantes: o que é essa natureza, que apresenta tantas variações? Ela possui
uma ordem ou é um caos sem nexo? Em suma: o que é a physis?
A palavra grega physis pode ser traduzida por natureza. Mas seu significado é mais amplo. Refere-se também à
realidade, não aquela pronta e acabada, mas a que se encontra em movimento e transformação, a que nasce e se
desenvolve. Nesse sentido, a palavra significa gênese, origem, manifestação. Saber o que é a physis, assim, levanta a
questão da origem de todas as coisas que constituem a realidade, que se manifesta no movimento. Procura saber se há
um princípio único (Arkhé, que também quer dizer “comando”) que dirija e ordene todas as coisas do mundo, em seus
diversos aspectos. É desse tema que vão se ocupar os primeiros filósofos. História da Filosofia, Os pensadores, Pág.
24
Os Naturalistas
O período pré-socrático estende-se pelos séculos VII e VI a.C., quando os filósofos oriundos das colônias gregas
como a Jônia (atual Turquia) e Magna Grécia (sul da Itália e Sicília) iniciaram o processo de desligamento entre
filosofia e o pensamento mítico.
Enquanto nos relatos míticos a natureza era explicada a partir da geração dos deuses, os filósofos pré-socráticos
investigavam essa origem de maneira racional. Para eles, o princípio (a arkhé, em grego) não se encontra na ordem do
tempo mítico, mas trata-se de um princípio teórico, fundamento de todas as coisas. Filosofando, Pág. 15
Dentre os objetivos desses primeiros filósofos, destaca-se a construção de uma cosmologia – explicação racional e
sistemática das características do universo – que substituísse a antiga cosmogonia – explicação sobre a origem do
universo baseada nos mitos.
Assim, com base na razão e não na mitologia, os primeiros filósofos gregos tentaram encontrar o princípio
substancial ou substância primordial (a arkhé, em grego) existente em todos os seres, a “matéria-prima” de que são
feitas todas as coisas. Fundamentos de Filosofia, Pág. 208
Arkhé (Princípio): Ponto de partida e fundamento de um processo qualquer. Os dois significados, “ponto de partida”
e “fundamento” ou “causa”, estão estreitamente ligados na noção desse termo, que foi introduzido em filosofia por
Anaximandro.
O termo princípio (arkhé) às vezes é assumido como o elemento constitutivo das coisas ou dos conhecimentos. Este,
provavelmente, era um dos sentidos da palavra entre os pré-socráticos, às vezes utilizado pelo próprio Aristóteles.
Dicionário de Filosofia, Pág. 928/929