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Geometria Piccioni

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MAT-230: Geometria e Desenho Geométrico I

Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. Ricardo Bianconi

2o Semestre de 2001

1. Introdução: O objetivo desta disciplina é discutir os fundamentos da geometria eu-


clideana (o quê e o porque das construções geométricas estudadas). Vamos fazer isto introduzindo
definições dos vários objetos a serem estudados e postulados, que vão definir e restringir as pro-
priedades de tais objetos e “regulamentar” as construções geométricas permitidas. Vai ser muito
importante o estudo do Postulado das Paralelas (que diz que dada uma linha ` e um ponto P fora
dela, então exite uma única linha passando por P e paralela a `). Desde os tempos de Euclides (em
torno de 300 AC) até o século XIX, diversos matemáticos tentaram provar este postulado a partir
dos outros. Estas tentativas foram extremamente frutı́feras no sentido de se descobrirem várias
construções geométricas importantes, bem como novas geometrias em que não vale o postulado.
Estas novas geometrias é que permitiram Einstein formular a Teoria da Relatividade Geral (como
ele mesmo reconheceu).
Neste texto estão incluı́dos vários exercı́cios. Os desenhos explicativos irão surgir numa edição
posterior deste texto. Convido os leitores a fazerem seus próprios desenhos, tentando entender o
que está escrito.

2. Postulados de Incidência: Vamos começar definindo o contexto de nosso tra-


balho. Uma geometria (plana) de incidência é um conjunto π que chamamos de plano, cujos
elementos são chamados de pontos e com alguns subconjuntos de π chamados de linhas. Os
postulados de incidência impõem as primeiras restrições sobre as linhas:
Postulado 1: Dados dois pontos distintos P e Q, existe uma única linha contendo P e Q, que
←→
podemos denotar como P Q
Postulado 2: Cada linha contém pelo menos dois pontos.
Postulado 3: Existem pelo menos três pontos não colineares (ou seja, não numa mesma linha).
Com isto ainda temos uma classe muito grande de possibilidades, inclusive geometrias finitas.
Por exemplo, π = {A, B, C} um plano com três pontos, tendo como linhas `1 = {A, B}, `2 = {A, C}
e `3 = {B, C}. É claro que valem os três postulados para esta geometria.

Exercı́cio 1: Dada uma linha `, mostre que existe um ponto P fora de `. (Que postulados
garantem isto?)

1
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Exercı́cio 2: Uma Geometria Projetiva Plana é uma geometria de incidência que também
satisfaz mais dois postulados: cada linha tem pelo menos três pontos e, dadas duas linha distintas
`1 e `2 , existe um único ponto comum às duas linhas. Mostre que π = {A, B, C, D, E, F, G} com
`1 = {A, B, C}, `2 = {A, D, E}, `3 = {A, G, F }, `4 = {C, G, D}, `5 = {C, F, E}, `6 = {B, G, E} e
`7 = {B, D, F } é uma geometria projetiva. (Verifique se valem todos os postulados.)

Exercı́cio 3: O plano da Geometria Analı́tica é o conjunto R2 dos pares ordenados de


números reais. As linhas são as retas {(x, y) ∈ R2 : ax + by = c}. Mostre que esta é uma geometria
de incidência. (Verifique se valem os postulados: para o primeiro, ache a equação da reta que passa
pelos pontos P e Q em termos de suas coordenadas, verificando que a reta é única; para o segundo
verifique que cada reta tem pelo menos dois pontos, dando exemplos particulares; dê exemplo de
três pontos não colineares.)

Exercı́cio 4: O plano da Geometria Hiperbólica é o conjunto H = {(x, y) ∈ R2 : y > 0}.


As linhas são de dois tipos: verticais `a = {(x, y) ∈ H : x = a} ou arcos de circunferência `p,r =
{(x, y) ∈ H : (x − p)2 + y 2 = r2 }. Mostre que esta é uma geometria de incidência. (Verifique se
valem os postulados: para o primeiro, ache a equação da linha que passa pelos pontos P e Q em
termos de suas coordenadas, verificando que é única; separe em dois casos, P = (a, b) e Q = (a, c),
mesma abscissa e P = (a, b) e Q = (c, d) com a 6= c; para o segundo verifique que cada linha tem
pelo menos dois pontos, dando exemplos particulares; dê exemplo de três pontos não colineares.)

Exercı́cio 5: O plano de Moulton é o conjunto R2 , com linhas das forma `a = {(x, y) ∈ R2 :


x = a} (verticais), ou `m,b = {(x, y) ∈ R2 : y = mx + b}, com m < 0 (linhas retas de inclinações
negativas) ou da forma `∗m,b = {(x, y) ∈ R2 : y = 2mx + b, se x < 0 e y = mx + b se x ≥ 0}, com
m ≥ 0, (linhas quebradas e de inclinacoes positivas quando passam pelo eixo Oy). Mostre que esta
também é geometria de incidência.

Exercı́cio 6: O plano “rasgado” é o conjunto π = {(x, y) ∈ R2 : x < 0 ou x ≥ 1} e suas linhas


são da forma {(x, y) ∈ π : ax + by = c}. Mostre que esta é uma geometria de incidência.

3. Postulado da Régua - Exemplos: Agora vamos restringir mais nossas ge-


ometrias. Vamos impor que cada linha tem uma régua graduada, ou seja, a cada ponto da linha
associaremos um número real (o número que aparece na régua, logo abaixo do ponto). Mais formal-
mente:
Postulado 4: (Postulado da Régua) Para cada linha `, existe (pelo menos) uma função
f : ` → R bijetora, chamada de régua de ` (ou seja, f é uma regra que associa a cada ponto P de `
um único número real f (P ) e, dado um número real r ∈ R, existe um único ponto Q de ` associado
a r, f (Q) = r.)
É como se as linhas fossem traçadas com uma régua graduada (talvez um pouco torta, depen-
dendo da geometria). A ponta do lápis em cada instante estará em cima de um ponto de ` e o
número que aparece na régua nesse lugar é o valor associado ao ponto.
Uma Geometria Métrica é uma geometria com régua graduada em que fizemos a escolha de
uma régua para cada linha e usamos estas réguas para definir uma distância d(P, Q) = |f (P ) −
←→
f (Q)|, sendo f a régua escolhida para a linha P Q .
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IMPORTANTE: Daqui em diante, todas as geometrias consideradas serão métricas, ou seja,


as réguas já foram previamente escolhidas e uma distância compatı́vel determinada.

Exercı́cio 7: Na geometria analı́tica, dada uma reta p ` de equação ax + by = c, escolhemos dois


pontos arbitrários P = (x0 , y0 ) e Q = (x1 , y1 ) tais que (x1 − x0 )2 + (y1 − y0 )2 = 1; qualquer outro
ponto R = (x, y) desta reta é determinado obtendo um número real t tal que (x, y) = (x0 , y0 ) +
t(x1 − x0 , y1 − y0 ). Neste caso, definimos f (R) como o valor t obtido. No caso de R = P , temos que
t = 0 e se R = Q, t = 1. Mostre que f é uma régua para `.
Verifique que a distância entre os pontos
p U = (u1 , v1 ) e V = (u2 , v2 ) (definida a partir da régua)
nesta geometria é d(U, V ) = dE (U, V ) = (u2 − u1 )2 + (v2 − v1 )2 .
Solução e/ou Sugestão: Primeiro vamos mostrar que para cada ponto (x2 , y2 ) da reta ax+by =
c existe um único t tal que (x2 , y2 ) = (x0 , y0 ) + t(x1 − x0 , y1 − y0 ). Com isto, obtemos um sistema
linear de duas equações a uma incógnita t

(x1 − x0 ) t = x2 − x0
(y1 − y0 ) t = y2 − y0

e precisamos mostrar que tem uma única solução. Como P 6= Q, então ou x1 6= x0 , ou y1 6= y0 .


No primeiro caso, podemos isolar t da primeira equação, obtendo t = (x2 − x0 )/(x1 − x0 ). Daı́,
substituı́mos na segunda equação para ver se é um sistema possı́vel de resolver; usando a equação
da reta ax + by = c, como x1 6= x0 , a reta não pode ser vertical. Por isso, o coeficiente b 6= 0 e
podemos isolar y em função de x, obtendo y = (c − ax)/b; assim temos que y2 = (c − ax2 )/b e
y0 = (c − ax0 )/b. Portanto, substituindo t na segunda equação, temos

(x2 − x0 ) (y2 − y0 ) a
(y1 − y0 )t = (y1 − y0 ) = (x2 − x0 ) = − (x1 − x0 ) = y2 − y0 ,
(x1 − x0 ) (x1 − x0 ) b

ou seja, o sistema é possı́vel e determinado e portanto tem uma única solução. No caso em que
x0 = x1 , devemos ter que y0 6= y1 , e argumentamos de modo análogo.
Agora, dado r ∈ R, precisamos mostrar que o ponto R de coordenadas (x3 , y3 ) = (x0 , y0 )+r(x1 −
x0 , y1 − y0 ) está na reta ax + by = c, ou seja, ax3 + by3 = c. Substituindo x3 por x0 + r(x1 − x0 ) e
y3 por y0 + r(y1 − y0 ), e usando o fato que P e Q estão nesta reta, temos

ax3 +by3 = a[x0 +r(x1 −x0 )]+b[y0 +r(y1 −y0 )] = (1−r)(ax0 +by0 )+r(ax1 +by1 ) = (1−r)c+rc = c,

ou seja, R = (x3 , y3 ) também está na reta.


Para verificar a fórmula da distância, sejam r = f (U ) e s = f (V ) os valores da régua correspon-
dentes. Então U = (u1 , v1 ) = (x0 , y0 )+r(x1 −x0 , y1 −y0 ) e V = (v1 , v2 ) = (x0 , y0 )+s(x1 −x0 , y1 −y0 )
e d(U, V ) = |r −s|. Subtraindo as duas equações, obtemos (u1 −v1 , u2 −v2 ) = (r −s)(x1 −x0 , y1 −y0 ).
Elevendo ao quadrado cada coordenada e somando as duas, temos (u1 − v1 )2 + (u2 − v2 )2 =
(r−s)2 [(x1 −x0 )2 +(y1 −y0 )2 ] = (r−s)2 , pois escolhemos P e Q de modo que (x1 −x0 )2 +(y1 −y0 )2 = 1;
tirando as raı́zes quadradas, temos
p p
d(U, V ) = |r − s| = (r − s)2 = (u1 − v1 )2 + (u2 − v2 )2

que é o que querı́amos mostrar.


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Exercı́cio 8: A Geometria do Taxista tem o plano e as linhas da geometria analı́tica mas


com as réguas definidas por f (P ) = y se ` é uma reta vertical (de equação x = a) e (a, y) são as
coordenadas de P e f (P ) = (1 + |m|)x se ` for uma reta não vertical, de equação y = mx + b, e
(x, y) forem as coordenadas de P . Verifique que nos dois casos f é realmente uma régua.
Verifique que d(P, Q) = |x1 − x0 | + |y1 − y0 | nesta geometria, sendo P = (x0 , y0 ) e Q = (x1 , y1 ).

Exercı́cio 9: Na geometria hiperbólica, dada uma linha da forma `a = {(x, y) ∈ H : x = a},


defino f (P ) = | ln(y)|, sendo que (a, y) é a coordenada de P , e para uma linha da forma `p,r =
{(x, y) ∈ H : (x − p)2 + y 2 = r2 }, defino
 
x−p+r
f (P ) = ln ,
y

sendo (x, y) as coordenadas de P . Mostre que em ambos os casos f é uma régua. No caso de `p,r ,
dado o número real t, o ponto P tal que f (P ) = t tem coordenadas (x, y) com x = p + r tgh (t) e
y = r sech (t), sendo que
et − e−t 2
tgh (t) = t −t
e sech t = t
e +e e + e−t
Verifique que a distância nesta geometria é dada por d(P, Q) = | ln(d/b)| se P tem coordenadas
(a, b) e Q tem coordenadas (a, d) (estão na mesma linha vertical) e por
 
d(a − p + r)
d(P, Q) = ln ,
b(c − p + r)

se P tem coordenadas (a, b) e Q tem coordenadas (c, d), com a 6= c (estão na mesma linha `p,r ).

Exercı́cio 10: No plano de Moulton, definimos f : ` → R por f (P ) = y se ` é uma linha vertical


(de equação x = a) e (a, y) são as coordenadas de P , f como na geometria analı́tica para `m,b com
m < 0 e por  √
a√1 + 4m2 se a < 0
f (P ) =
a 1 + m2 se a ≥ 0,
sendo que P tem coordenadas (a, b) e está na linha quebrada `∗m,b = {(x, y) ∈ R2 : y = 2mx + p se
x < 0 e y = mx + p se x ≥ 0} (com m ≥ 0). Verifique que f é régua e, neste caso, a distância entre
P = (a, b) e Q = (c, d) é

dE (P, (0, p)) + dE ((0, p), Q) se ac < 0
d(P, Q) =
dE (P, Q) caso contrário,

sendo que dE é a distância da geometria analı́tica (ou euclideana). Observe que a condição ac < 0
significa que os pontos P e Q estão em lados opostos do eixo Oy.

Exercı́cio 11: No plano rasgado, definimos f : ` → R por f (P ) = y se ` é uma linha vertical


(de equação x = a) e (a, y) são as coordenadas de P e por
 √
a 1 +√ m2 se a < 0
f (P ) =
(a − 1) 1 + m2 se a ≥ 1,
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sendo que P tem coordenadas (a, b) e está na linha quebrada {(x, y) ∈ R2 : y = mx + p e x < 0 ou
x ≥ 1}. Verifique que f é régua e, neste caso, a distância entre P = (a, b) e Q = (c, d) é

dE (P, (0, p)) + dE ((1, m + p), Q) se a < 0 e c ≥ 1, ou c < 0 e a ≥ 1
d(P, Q) =
dE (P, Q) caso contrário,

sendo que dE é a distância da geometria analı́tica (ou euclideana). Observe que as condições a < 0
e c ≥ 1, ou c < 0 e a ≥ 1 significam que os pontos P e Q estão em lados opostos da faixa
{(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x < 1}, retirada de R2 .

4. Relação de Ordenação de Pontos: Numa geometria métrica, podemos


estabelecer uma noção de ordem entre os pontos de cada linha, emprestada da régua correspondente.
Sejam P , Q e R três pontos de uma linha ` e seja f : ` → R sua régua. Dizemos que P − Q − R (Q
está entre P e R) se f (P ) < f (Q) < f (R) ou f (R) < f (Q) < f (P ).

Exercı́cio 12: Mostre que numa geometria métrica, dada uma linha ` e sua régua f : ` → R,
então:
(a) se A é ponto de ` e g, h : ` → R são definidas por g(P ) = f (P )−f (A) e h(P ) = −f (P )+f (A),
então g e h também são réguas de ` compatı́veis com a distância;
(b) se k : ` → R é uma régua compatı́vel com a distância, então existe um ponto A de ` tal que
k = g ou k = h do item anterior;
(c) se P − Q − R pela régua f então P − Q − R por qualquer outra régua g de ` compatı́vel com
a distância.
Solução e/ou Sugestão:
(a) Temos que mostrar que se P e Q estão em `, d(P, Q) = |g(P ) − g(Q)| = |h(P ) − h(Q)|.
Sabemos que d(P, Q) = |f (P ) − f (Q)|. Com isto, temos |g(P ) − g(Q)| = |[f (P ) − f (A)] − [f (Q) −
f (A)]| = |f (P ) − f (Q)| = d(P, Q) e |h(P ) − h(Q)| = |[−f (P ) + f (A)] − [−f (Q) + f (A)]| = |f (P ) −
f (Q)| = d(P, Q), como querı́amos mostrar.
(b) Seja A em ` tal que k(A) = 0. Então, para cada ponto P de `, d(A, P ) = |k(P ) − k(A)| =
|k(P )| = |f (P ) − f (A)|. Tirando os módulos, ou k(P ) = f (P ) − f (A) = g(P ) ou k(P ) = −[f (P ) −
f (A)] = h(P ), como querı́amos mostrar.
(c) Suponhamos que f (P ) < f (Q) < f (R). Então, dado um ponto A de ` e subtraindo o
número real f (A) de cada termo, temos f (P ) − f (A) < f (Q) − f (A) < f (R) − f (A), ou seja
g(P ) < g(Q) < g(R); se multiplicarmos por −1, invertemos as desigualdades, obtendo −f (R) +
f (A) < −f (Q) + f (A) < −f (P ) + f (A), ou seja h(R) < h(Q) < h(P ). Em ambos os casos,
permanece a relação P − Q − R, como querı́amos mostrar.

Exercı́cio 13: Dados A e B dois pontos distintos de uma linha `, mostre que existe uma régua
f de ` tal que f (A) = 0 e f (B) > 0.

Exercı́cio 14: Mostre que se P , Q e R são pontos distintos de uma linha `, então:
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(a) Se P − Q − R então R − Q − P ;
(b) Exatamente um dos casos ocorre: P − Q − R, ou P − R − Q, ou Q − P − R;
(c) se P − Q − R e Q − R − S, então P − Q − S e P − R − S;
(d) P − Q − R se, e somente se, d(P, R) = d(P, Q) + d(Q, R).

Solução e/ou Sugestão:


(a) Se P − Q − R, então f (P ) < f (Q) < f (R) ou f (R) < f (Q) < f (P ) para a régua de `. Mas
isto também se aplica para R − Q − P .
(b) sendo os três pontos distintos, os valores f (P ), f (Q) e f (R) são distintos; estes admitem
uma única ordem em R; se f (P ) < f (Q) < f (R) ou f (R) < f (Q) < f (P ), então nehuma das
desigualdades restantes são possı́veis: nem f (Q) < f (R) < f (P ), nem f (P ) < f (R) < f (Q), nem
f (R) < f (P ) < f (Q) e nem f (Q) < f (P ) < f (R).
(c) se P − Q − R e f (P ) < f (Q) < f (R), como Q − R − S, a única possibilidade é f (Q) <
f (R) < f (S) e portanto f (P ) < f (Q) < f (R) < f (S), donde decorre que P − Q − S e P − R − S;
se f (R) < f (Q) < f (P ), como Q − R − S, a única possibilidade é f (S) < f (R) < f (Q) e portanto
f (S) < f (R) < f (Q) < f (P ), donde novamente decorre que P − Q − S e P − R − S.
(d) se P − Q − R, então f (P ) < f (Q) < f (R), donde decorrem as desigualdades 0 < f (Q) −
f (P ) < f (R) − f (P ) e 0 < f (R) − f (Q), e d(P, R) = |f (P ) − f (R)| = f (R) − f (P ) = f (R) −
f (Q) + f (Q) − f (P ) = |f (R) − f (Q)| + |f (Q) − f (P )| = d(P, Q) + d(Q, R); ou f (R) < f (Q) < f (P ),
donde decorrem as desigualdades 0 < f (Q) − f (R) < f (P ) − f (R) e 0 < f (P ) − f (Q) e d(P, R) =
|f (P ) − f (R)| = f (P ) − f (R) = f (P ) − f (Q) + f (Q) − f (R) = |f (P ) − f (Q)| + |f (Q) − f (R)| =
d(P, Q) + d(Q, R), como querı́amos mostrar.
Para a recı́proca, suponhamos que d(P, R) = d(P, Q) + d(Q, R). Como os três pontos são
distintos, as únicas ordens comp-atı́veis com tal fórmula são f (P ) < f (Q) < f (R) ou f (R) < f (Q) <
f (P ), pois, por exemplo, se f (R) < f (P ) < f (Q), então d(P, R) = f (P ) − f (R) < f (Q) − f (R) =
d(Q, R) < d(Q, R) + d(P, Q). (Verifique as outras possibilidades.)

Exercı́cio 15: Mostre que dados dois pontos distintos A e B numa linha `, existem pontos C,
D e E de L tais que C − A − D e D − B − E. (Use uma régua de ` para obter tais pontos.)

Exercı́cio 16: Verifique que se P = (−3, 3), Q = (1, 5) e R = (4, 4) estão em H, então P − Q − R
na geometria hiperbólica.

Exercı́cio 17: Verifique que se P = (−1, −3), Q = (0, −1) e R = (1, 0) então P − Q − R no
plano de Moulton. (Ache m > 0 e b ∈ R tais que estes pontos estejam na linha `∗m,b .)

Dados dois pontos distintos A e B, seja ` a linha que os contém. Definimos a semi-reta
−−→
AB como sendo o conjunto {P ∈ ` : não vale P − A − B} e o segmento AB como o conjunto
−−→
{P ∈ ` : P = A, ou P = B, ou A − P − B}. Observe que AB = {P ∈ ` : P = A, ou A − P − B, ou
P = B, ou A − B − P }.
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Exercı́cio 18: Mostre que se A e B são pontos distintos em uma linha `, mostre que exite uma
−−→
régua f de ` tal que AB = {P ∈ ` : f (P ) ≥ 0}.

Exercı́cio 19: Mostre que se A e B são pontos distintos, então:


(a) AB = BA;
−−→ −−→
(b) AB 6= BA ;
−−→ −−→
(c) AB = AB ∩ BA ;
−−→ −−→ −−→
(d) se C ∈ AB e C 6= A, então AB = AC ;
−−→ −−→
(e) se C − A − B então AB ∩ AC é o ponto A.

Solução e/ou Sugestão:


(a) Observe que A − P − B é o mesmo que B − P − A. Olhe para a definição de segmento.
−−→ −−→
(b) Mostre que existe um ponto C em AB mas não em BA . Sabemos que existe C tal que
A − B − C (por quê?). Mostre que tal C serve.
(c) Escreva o que significa P estar em AB e o que significa P estar em cada uma das semi-retas
−−→ −−→
AB e BA .
−−→ −−→
(d) Escreva o que significa P estar em cada uma das semi-retas AB e AC e mostre que se está
em uma, tem que estar na outra, e vice-versa.
−−→ −−→
(e) Novamente, escreva o que significa P estar em cada uma das semi-retas AB e AC .

5. Congruência de Segmentos: Outra noção importante numa geometria métrica


é a de congruência de segmentos: dizemos que AB ≡ CD (o segmento AB é congruente ao
segmento CD) se d(A, B) = d(C, D).

Exercı́cio 20: Mostre que d(A, B) ≥ 0 e d(A, B) = 0 se, e só se, A = B.


Solução e/ou Sugestão: Seja f uma régua numa linha ` contendo A e B. Então d(A, B) =
|f (B) − f (A)| ≥ 0 (por definição de valor absoluto). Se d(A, B) = 0, então f (A) = f (B) e, como f
é uma função bijetora, isto implica que A = B. Reciprocamente, se A = B, então f (A) = f (B) e,
portanto d(A, B) = 0.

Exercı́cio 21: Mostre que ≡ é uma relação de equivalência, ou seja, mostre que valem as
três propriedades que a caracterizam:
(a) AB ≡ AB;
(b) se AB ≡ CD então CD ≡ AB;
(c) se AB ≡ CD e CD ≡ EF , então AB ≡ EF .
Solução e/ou Sugestão: Use a definição de ≡ e as propriedades da igualdade.
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Exercı́cio 22: Mostre que se A e B são dois pontos distintos, então existe um único ponto C
tal que A − C − B e AC ≡ CB (isto é, C é o ponto médio de AB.
Solução e/ou Sugestão: Basta tomar uma régua f tal que f (A) < f (B) e tomar o ponto C
←→
na linha AB tal que f (C) = (f (A) + f (B))/2. (Por quê existe tal f e tal ponto C?)

Exercı́cio 23: Mostre que se A e B são dois pontos distintos, então existem pontos C, D e E
tais que A − C − D, D − E − B, e AC ≡ CD ≡ DE ≡ EB.

Exercı́cio 24: Mostre que dados A e B distintos e um segmento CD, então exite um único
−−→
ponto P em AB tal que AP ≡ CD.

Exercı́cio 25: Mostre que dados A e B distintos e um segmento CD, então exitem exatamente
←→
dois pontos P e Q em AB tais que AP ≡ CD e AQ ≡ CD. (Nos dois lados de A.)

Exercı́cio 26: Mostre que dados A e B distintos e um segmento CD, então:


−−→
(a) (Soma de segmentos) exite um único ponto P em AB tal que A − B − P e BP ≡ CD.
(Podemos dizer que AP é a soma do segmento AB com CD.)
−−→
(b) (Diferença de segmentos) exite um único ponto P em BA tal BP ≡ CD. (Podemos
dizer que AP é a diferença entre os segmentos AB e CD.)
←→
(c) Mostre que dados A e B distintos e um segmento CD, exite uma régua f de AB tal
que f (A) = 0, f (B) > 0 e f (P ) = f (B) + d(C, D), no caso da soma dos segmentos e f (P ) =
f (B) − d(C, D), no caso da diferença dos segmentos.
Solução e/ou Sugestão: Ache primeiro a régua f tal que f (A) = 0 e f (B) > 0 (exercı́cio
anterior) e mostre que os pontos P tais que f (P ) = f (B) + d(C, D) ou f (P ) = f (B) − d(C, D)
resolvem o problema.
−−→
Dados três pontos não colineares A, B e C, definimos o ângulo ∠ABC como o conjunto BA ∪
−−→
BC . O ponto B é o vértice do ângulo.

Exercı́cio 27: Dados três pontos não colineares A, B e C, mostre que


(a) ∠ABC = ∠CBA;
(b) ∠ACB 6= ∠ABC e ∠BAC 6= ∠ABC;
−−→ −−→
(c) se P está em BA , P 6= B e Q em BC , Q 6= B, então ∠ABC = ∠P BQ.
Solução e/ou Sugestão:
−−→ −−→ −−→ −−→
(a) ∠ABC = BA ∪ BC = BC ∪ BA = ∠CAB;
−−→ −−→ −−→ −−→
(b) ∠ABC = BA ∪ BC 6= AB ∪ AC = ∠BAC, etc.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 9

−−→ −−→ −−→ −−→


(c) decorrem do fato que BA = BP e BC = BQ .

6. Postulado de Separação do plano: Vamos introduzir agora mais um pos-


tulado que restringirá mais as geometrias permitidas. Para isto precisamos definir alguns conceitos.
Um conjunto A do plano é convexo se, para todos os pares de pontos P e Q em A, o segmento
P Q está todo contido em A.

Exercı́cio 28: Mostre que a interseção de dois conjuntos convexos é um conjunto convexo.
Solução e/ou Sugestão: Sejam A e B convexos. Para mostrar que A∩B é convexo, precisamos
tomar dois pontos arbitrários P e Q na interseção A ∩ B e mostrar que todos os pontos do segmento
P Q etsão nesta interseção.
Se P, Q ∈ A ∩ B, então P, Q ∈ A e, portanto, todos os pontos de P Q estão em A; mas P, Q ∈ B
também, portanto todos os pontos do segmento P Q estão em B. Portanto P Q está contido em
A ∩ B.

Exercı́cio 29: Mostre que são conjuntos convexos:


(a) o plano todo e o conjunto vazio;
(b) uma linha `;
−−→
(c) uma semi reta AB ;
−−→
(d) uma semi reta AB menos seu vértice A;
(e) um segmento AB;
(f ) o interior do segmento AB (isto é, o segmento menos os pontos A e B).

Postulado 5: (Postulado de Separação do plano) Dada uma linha `, existem conjuntos H1


e H2 (chamados de lados de `) tais que:
(a) H1 e H2 são convexos;
(b) H1 ∩ ` = ∅, H2 ∩ ` = ∅ e H1 ∩ H2 = ∅ e cada ponto do plano está em H1 , ou em H2 ou em
`;
(c) se P ∈ H1 e Q ∈ H2 então o segmento P Q intersecta a linha ` num ponto R.

Exercı́cio 30: Mostre que numa geometria métrica satisfazendo o postulado da separação do
plano os conjuntos H1 e H2 não são vazios.
Solução e/ou Sugestão: Observe que o postulado não garante que H1 e H2 não sejam vazios;
o item (c) apenas diz que se existirem pontos P ∈ H1 e Q ∈ H2 então etc. Para mostrarmos que
existem tais pontos precisamos apelar para o postulado 3, que diz que existem pelo menos três
pontos não colineares. Isto implica que deve existir pelo menos um ponto A fora de `. Então A
deve estar em H1 ou H2 . Digamos que esteja em H1 . Precisamos mostrar que existe pelo menos
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 10

←→
um ponto em H2 . Para isto, seja B ∈ ` um ponto qualquer e seja C ∈ AB tal que A − B − C (tal
←→
ponto existe pelo postulado da régua). Como A 6∈ `, ` 6= AB e portanto C 6∈ `. Como o segmento
AC encontra ` no ponto B e sendo H1 convexo, C 6∈ H1 . Portanto C ∈ H2 , ou seja H2 6= ∅.

Exercı́cio 31: Mostre que nas geometrias analı́tica, hiperbólica, do taxista e do plano de Moulton
vale o postulado da separação do plano.
Solução e/ou Sugestão: Para cada uma delas, dada uma linha `, verifique que ela separa o
plano em dois conjuntos H1 e H2 ; mostre que estes conjuntos são convexos; mostre que vale sempre
o item (c).

Este postulado tem conseqüências importantes. Para expô-las, definiremos algumas figuras
geométricas. Um triângulo é um conjunto 4ABC = AB ∪ AC ∪ BC, a união de três segmentos
determinados por três pontos A, B e C não colineares, chamados de vértices. Cada segmento AB,
AC e BC é um lado do triângulo. Um quadrilátero é um conjunto ABCD = AB∪BC∪CD∪DA,
a união dos quatro segmentos determinados pelos pontos A, B, C e D (seus vértices), três a três
não colineares. Cada segmento AB, BC, CD e DA é um lado do quadrilátero e os segmentos AC e
BD são suas diagonais. Mais geralmente, um polı́gono A1 A2 . . . An = A1 A2 ∪ . . . An−1 An ∪ An A1 ,
e cada um destes segmentos é um de seus lados e cada ponto Ai (1 ≤ i ≤ n) seu vértice.

Exercı́cio 32: Mostre que 4ABC = 4ACB e que ABCD 6= ACBD, ou seja, se o polı́gono
tem mais de três vértices, a ordem destes vértices é importante ao escrever A1 A2 . . . An .

Exercı́cio 33: Mostre que se vale o postulado da separação do plano:


(a) dado o 4ABC, se ` é uma linha que intersecta o lado AB, mas A 6∈ ` e B 6∈ `, então `
intersecta (pelo menos) um dos outros dois lados;
(b) dado o 4ABC, se ` é uma linha que intersecta o lado AB, A 6∈ `, B 6∈ `, C 6∈ ` e ` intersecta
AC então ` não intersecta BC.
Solução e/ou Sugestão:
(a) Sejam H1 e H2 os lados de `. Como o segmento AB intersecta ` e A, B 6∈ `, então A e B
estão em lados opostos de `. Podemos ter três situações: ou C ∈ ` e, neste caso AC intersecta `, ou
A e C estão em lados opostos de ` e, também neste caso ` intersecta AC, ou A e C estão do mesmo
lado de ` e, portanto B e C estão em lados opostos de ` e, portanto, ` intersecta o lado BC.
(b) Suponhamos que ` intersecte os três lados do 4ABC, sem passar pelos seus vértices. Sejam
P ∈ AB, Q ∈ AC e R ∈ BC os pontos de interseção de ` com o 4ABC. Podemos ter três casos,
P −Q−R, ou P −R−Q, ou Q−P −R. Vamos apenas considerar o caso em que P −Q−R, deixando
←→
os outros como exercı́cio. Então os pontos A, P e R estão do mesmo lado de BC , pois, sa A e P
←→
estivessem de lados opostos, o segmento AP encontraria BC e o único ponto em que isto ocorreria
só pode ser B. Mas isto implicaria que A − B − P , contradizendo o fato de que P ∈ AB. O mesmo
←→
tipo de raciocı́nio garante que R e A também não podem estar em lados opostos de BC . Como
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 11

←→
cada lado de BC é convexo e P e R estão do mesmo lado, o segmento P R não poderia encontrar a
←→
linha BC no ponto Q. Esta contradição termina a prova.

Exercı́cio 34: Mostre que a geometria do plano rasgado não vale o postulado da separação do
plano.
Solução e/ou Sugestão: Use o exercı́cio anterior, obtendo um triângulo 4ABC e uma linha
` que não intersecta seus vértices, mas intersecta apenas um de seus lados.

Exercı́cio 35: Sem assumir o postulado da separação do plano, mostre que são equivalentes:
(a) O postulado da separação do plano;
(b) O Postulado de Pasch: Dados uma linha ` e um triângulo 4ABC, se D ∈ ` é um ponto
tal que A − D − B, então ou ` intersecta AC ou ` intersecta BC.
Solução e/ou Sugestão: Já provamos que (a) implica (b). Vamos mostrar que (b) implica (a).
Alguns detalhes serão deixados aos leitores.
Suponha (b). Seja P 6∈ ` (que existe pelo postulado 3) e definimos H1 = {Q : Q = P ou
P Q ∩ ` = ∅} e H2 = {Q : Q 6∈ ` e P Q ∩ ` 6= ∅}. Então H1 ∩ H2 = H1 ∩ ` = H2 ∩ ` = ∅, e todo
ponto do plano ou está em ` ou em H1 ou em H2 . Falta mostrar que H1 e H2 são convexos e que
dados A ∈ H1 e B ∈ H2 , o segmento AB intersecta `.
Vamos mostrar que H1 é convexo. Para isto, sejam A, B ∈ H1 , A 6= B, e suponhamos que A 6= P
e B 6= P (os casos em que A = P ou B = P ficam para os leitores). Queremos mostrar que todos
←→
os pontos de AB estão em H1 . Se A, B e P estão numa mesma linha AB , então ou A − B − P ou
A − P − B ou B − A − P . Mostre que em nenhum destes casos, AB pode ter ponto nem de H2 e
nem de `. Se A, B e P não são colineares, seja D ∈ AB tal que A − D − B. Sabemos que ` não
intersecta nem AP e nem BP (por quê?). Se D ∈ ` então ` intersectaria AB, e por Pasch, deveria
intersectar AP ou BP . Portanto D 6∈ `. Se D ∈ H2 , então ` intersecta DP . Por Pasch, aplicado aos
triângulos 4ADP e 4BDP , terı́amos que ` intersectaria AP ou BP (por quê?), uma contradição.
Portanto, todos os pontos de AB estão em H1 .
Vamos mostrar agora que H2 é convexo. Para isto, sejam A, B ∈ H2 , A 6= B. Precisamos
mostrar que todos os pontos de AB estão em H2 . Novamente temos dois casos, a saber, A, B e P
são colineares. Então ou A − B − P ou B − A − P . (Mostre que não pode ocorrer A − P − B.) Se
←→ ←→
A − B − P , pela definição de H2 existe um ponto R ∈ ` ∩ BP , tal que B − R − P . Como AB = BP ,
←→
o único ponto de encontro de ` com AB é R. Como A − B − R, os pontos de AB estão todos em
H2 (por quê?). Suponhamos agora que A, B e P sejam não colineares. Consideremos o triângulo
4ABP . Pela definição de H2 , ` intersecta ambos os lados AP , no ponto R e BP , no ponto S.
Vamos mostrar que nenhum ponto de AB pode estar em `. Seja T ∈ AB, A − T − B. Se T ∈ `,
podemos ter R − S − T , R − T − S ou S − R − T . Vamos considerar o caso R − S − T , deixando os
←→ ←→ ←→ ←→
outros dois para os leitores. Consideremos o 4ART , com a linha BP ; temos que BP 6= AT = AB
←→ ←→ ←→ ←→
e BP 6= AR = AP (pois A, B e P não são colineares); portanto BP não encontra nem AR e nem
AT (por quê?); como encontra RT no ponto S, temos uma contradição ao postulado de Pasch.
Aplicando Pasch aos triângulos 4AT P e 4T BP , temos que T P intersecta ` (por quê?) e, portanto
T ∈ H2 , pela definição de H2 . Portanto H2 é convexo.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 12

Agora sejam A ∈ H1 e B ∈ H2 . Precisamos mostrar que AB intersecta ` num ponto R. Se


A = P , pela definição de H2 , AB = P B intersecta `. Se A, B e P não são colineares, como BP
intersecta ` e AP não intersecta ` (por quê?), por Pasch no triângulo 4ABP , AB intersecta ` num
ponto R, como querı́amos. Se A, B e P são colineares, como BP intersecta ` (pela definição de H2 ),
←→
seja R este ponto em comum. Temos que B − R − P e, como A ∈ BP , A ∈ H1 , A 6= P , A 6= R e
A 6= B, temos que, ou P − R − A (que não pode ocorrer, pois A ∈ H1 , que é convexo), ou P − A − R,
ou A − P − R, o que implica que AB encontra ` em R, como querı́amos.

Importante: Daqui em diante assumimos que as geometrias consideradas são geometrias


métricas que satisfazem o postulado da separação do plano. Estas geometrias são chamadas de
Geometrias de Pasch.

Exercı́cio 36: Dado o 4ABC e pontos D e E, tais que B − C − D e A − E − C, mostre que


←→
exite um ponto F ∈ DE , tal que A − F − B e D − E − F .

Exercı́cio 37: Dado o 4ABC e pontos D e F , tais que B − C − D e A − F − B, mostre que


←→
exite um ponto E ∈ DF , tal que A − E − C e D − E − F .

Exercı́cio 38: Dado o 4ABC e pontos D e E, tais que B − E − C e A − D − B, mostre que


←→ ←→
AE e CD se intersectam.

7. Interiores e o Teorema das Barras Cruzadas: O resultado mais


útil que é uma conseqüência do postulado da separação do plano é o chamado Teorema das Barras
Cruzadas. Ele permite provar que diagonais de quadriláteros, ou duas medianas de um triângulo,
etc, se intersectam. Para prová-lo, precisamos de alguns conceitos e resultados preliminares.
−−→ −−→ −−→
Definimos o interior de uma semi reta AB como o conjunto int (AB ) dos pontos P ∈ AB
tais que P 6= A (a semi reta menos o vértice); interior de um segmento AB como o conjunto
int (AB) dos pontos P ∈ AB tais que P 6= A e P 6= B; e o interior do ângulo ∠AOB como o
←→
conjunto int (∠AOB) obtido pela interseção H1 ∩ H 1 , sendo H1 o lado de OB contendo A e H 1 o
←→
lado de OA contendo B.

−−→ −−→ −−→ −−→


Exercı́cio 39: Mostre que se ∠AOB = ∠CP D então O = P e OA = P C e OB = P D , ou
−−→ −−→ −−→ −−→
OA = P D e OB = P C . Mostre também que, se int (∠AOB) = int (∠CP D), então ∠AOB =
∠CP D.

Exercı́cio 40: Mostre que se ∠AOB = ∠CP D então o int (∠AOB) = int (∠CP D).

Exercı́cio 41: Seja W um conjunto não vazio e convexo do plano e ` uma linha não encontrando
W . Mostre que todos os pontos de W estão do mesmo lado de `.
−−→
Exercı́cio 42: Mostre que, dados A ∈ ` e B 6∈ ` dois pontos, então todos os pontos de int (AB )
estão do mesmo lado de `.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 13

←→ −−→
Exercı́cio 43: Dados A 6= B, C e D em lados opostos de AB , mostre que AC não intersecta
−−→
BD .
−−→ ←→
Solução e/ou Sugestão: Todos os pontos do interior de AC estão do mesmo lado de AB que
−−→ ←→
C (por quê?); todos os pontos ponto do interior de BD estão do mesmo lado de AB que D (por
quê?), que é oposto a C. Portanto as semi retas não se encontram (por quê?).

Exercı́cio 44: Mostre que P ∈ int (∠AOB) se, e somente se, A e P estão do mesmo lado de
←→ ←→
OB e P e B estão do mesmo lado de OA .

Exercı́cio 45: Dado o 4ABC, mostre que se A − P − C, então P ∈ int (∠ABC) e int (AB) está
contido em int (∠ABC).

−−→
Exercı́cio 46: (O Teorema das Barras Cruzadas) Se P ∈ int (∠ABC) então BP intersecta
AC num único ponto F com A − F − C.
Solução e/ou Sugestão: Seja E tal que E − B − C (tal ponto existe pelo postulado da régua).
←→
A linha BP cruza o lado EC do triângulo 4ACE pelo ponto B. Portanto deve cruzar outro lado
−−→ −−→ ←→
deste triângulo. Os interiores das semi retas BP e AE estão em lados opostos de AB , portanto
não se encontram. Seja Q um ponto tal que P − B − Q. Então A e Q estão em lados opostos de
←→ ←→ −−→ −−→ ←→
BC = EC (por quê?). Portanto as semi-retas BQ e EA não se encontram. Isto é, a linha BP não
−−→ −−→ ←→
intersecta o segmento AE = AE ∩ EA . Portanto existe um único ponto F ∈ AC∩ BP . Temos
←→
que F 6= A, pois BP não intersecta AB e F 6= C, pois B, P e C não são colineares (por quê isto
−−→
implica que F 6= C?). Portanto A − F − C. Só falta mostrar que F ∈ BP . Mas isto decorre do
←→ ←→
fato que P e Q estão em lados opostos de BC e A e P estão do mesmo lado de BC (por quê?).

O interior do triângulo 4ABC é o conjunto int (4ABC) = H1 ∩ H 1 ∩ H̃1 , sendo que H1 é o


←→ ←→ ←→
lado de BC contendo A, H 1 é o lado de AC contendo B e H̃1 é o lado de AB contendo C. Um
←→
quadrilátero ABCD é um quadrilátero convexo se A e B estão do mesmo lado de CD , B e C
←→ ←→
estão do mesmo lado de AD , C e D estão do mesmo lado de AB e A e D estão do mesmo lado de
←→
BC . Um polı́gono convexo é definido de modo análogo (todos os outros vértices deverão estar
←→
do mesmo lado de Ai Aj , se 1 ≤ i < j = i + 1 ≤ n ou i = n e j = 1).

Exercı́cio 47: Dados 4ABC e pontos D, E e F , tais que B − C − D, A − E − C e B − E − F ,


mostre que F ∈ int (∠ACD).
←→
Exercı́cio 48: Mostre que se A − D − B e C e E estão do mesmo lado de AB , então ou
−−→ −−→
DE ∩ AC 6= ∅, ou DE ∩ BC 6= ∅.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 14

−−→
Exercı́cio 49: Dados ∠ABC e um ponto P , mostre que se BP ∩ int (AC) 6= ∅, então P ∈
int (∠ABC). (Uma recı́proca das Barras Cruzadas.)

Exercı́cio 50: Mostre que se ` ∩ int (4ABC) 6= ∅ então ` encontra 4ABC em exatamente dois
pontos.

Exercı́cio 51: Mostre que um quadrilátero ABCD é convexo se, e somente se, cada vértice
está no interior do ângulo oposto. (Por exemplo, A está no interior de ∠BCD, etc.)

Exercı́cio 52: Mostre que as diagonais de um quadrilátero convexo se intersectam.

Exercı́cio 53: Prove a recı́proca, ou seja, se as diagonais de um quadrilátero se intersectam


então ele é convexo.

8. Medida de Ângulo: Agora vamos introduzir mais um instrumento de medidas, o


transferidor, que mede ângulos. Isto será feito através de um postulado dizendo como ele funciona.
Postulado 6: (Postulado do Transferidor) Existe um número real positivo r0 e uma função
m que a cada ângulo ∠ABC associa um número real m(∠ABC), tal que
(a) 0 < m(∠ABC) < r0 ;
(b) se D ∈ int (∠ABC), então m(∠ABC) = m(∠ABD) + m(∠DBC);
←→
(c) se H1 é um lado de BC e x é um número real tal que 0 < x < r0 , então existe um ponto A
−−→ −−→
em H1 tal que m(∠ABC) = x e se P ∈ H1 também satisfaz m(∠P BC) = x, então BA = BP (ou
seja, ∠ABC = ∠P BC).
O número r0 vai depender de que medida de ângulo estamos usando. Por exemplo, na geometria
analı́tica, r0 pode ser 180 (se medirmos em graus) ou π (se medirmos em radianos), ou qualquer
outro valor que nos aprouver. Neste texto, vamos usar a medida em graus.

Exercı́cio 54: Na geometria analı́tica, sejam A = (a1 , a2 ), B = (b1 , b2 ) e C = (c1 , c2 ) não


colineares. Definimos m(∠ABC) como o arco α entre 0 e 180 que tem cosseno

(A − B) · (C − B) (a1 − b1 )(c1 − b1 ) + (a2 − b2 )(c2 − b2 )


cos α = =p p
|A − B| · |C − B| (a1 − b1 )2 + (a2 − b2 )2 (c1 − b1 )2 + (c2 − b2 )2

Mostre que m é medida de ângulo. (Tem que satisfazer as três condições. Se necessário, consulte
um livro de Vetores e Geometria.)

Exercı́cio 55: Na geometria do taxista, mostre que a medida m da geometria analı́tica é medida
de ângulo.

Exercı́cio 56: Na geometria hiperbólica, dados P = (a, b) e Q = (c, d), se a = c, P e Q estão


−−→
caso, definimos o vetor vP Q = (Q − P )/|P − Q| = (0, ±1) para a semi reta P Q ,
na linha `a ; neste p
sendo |P − Q| = (c − a)2 + (d − b)2 = |d − b|; se a 6= c então P e Q estão numa linha `p,r ; esta
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 15

linha consiste nos pontos (x, y) que satisfazem x = p + r tgh t e y = r sech t, para algum t; nesta
linha temos a régua f que associa ao ponto de coordenadas (x, y) o valor t; seja t0 = f (P ); mostre
−−→
que neste caso, a semi reta P Q é o conjunto {R ∈ `p,r : f (R) ≥ f (P )}, se f (Q) > f (P ) e, neste
caso, definimos o vetor vP Q = u, ou o conjunto {R ∈ `p,r : f (R) ≤ f (P )} e, neste caso, definimos o
vetor vP Q = −u, sendo que
!
sech t0 tgh t0
u= p ,− p
(sech t0 )2 + (tgh t0 )2 (sech t0 )2 + (tgh t0 )2

lembrando que t0 = f (P ).
Agora, dados A, B e C não colineares, definimos a medida de m(∠ABC) como sendo o arco α
entre 0 e 180 (graus) cujo cosseno seja vBA · vBC (produto escalar). Mostre que esta medida satisfaz
as três condições.
Solução e/ou Sugestão: Todo este trabalho em definir os vetores vP Q foi para introduzir a
medida do ângulo ∠ABC como a medida entre as retas tangentes às linhas correspondentes, com
os vetores apontando na direção das semi retas. O item (a) é fácil. Os itens (b) e (c) exigem mais
trabalho. (Se necessário, consulte um livro de Vetores e Geometria.)
Outro modo de obter o vetor vP Q no caso em que P = (a, b) e Q = (c, d) estão numa linha
`p,r , é definir um vetor auxiliar uP Q = (b, p − a), que é perpendicular ao vetor P − (b, 0) = (a − p, b)
(o raio de `p,r , partindo do centro (p, 0) e chegando no ponto P ) e tomar vP Q = uP Q /|uP Q | se c > a
(Q está à direita de P ), ou vP Q = −uP Q /|uP Q | se c < a (Q está à esquerda de P ).

Exercı́cio 57: No plano de Moulton, definimos m(∠ABC) como sendo a medida da geometria
analı́tica de ∠P BQ, se B não está no eixo Oy e P e Q estão no mesmo lado que B em relação ao
eixo Oy; se B está no eixo Oy, dados b ∈ R e P = (x, y) ∈ R2 um ponto, definimos o ponto Pb por

(x, 2y − b) se x > 0 e y > b,
Pb =
(x, y) caso contrário.

Definimos então m(∠ABC) = mE (∠Ab BCb ), sendo mE a medida euclideana de ângulo. Observe
∗ −−→
que nesta medida de ângulo nós “desentortamos” as linhas lm,b que suportam as semi retas BA e
−−→
BC que definem o ângulo ∠ABC. Verifique que esta medida satisfaz os três itens do postulado.

9. Congruência de Ângulos e Perpendiculares: Tendo uma medida de


ângulos, podemos comparar ângulos.
Dizemos que ∠ACB ≡ ∠DEF (o ângulo ∠ABC é congruente ao ângulo ∠DEF ) se m(∠ACB) =
←→
m(∠DEF ). Dados A − B − D e C fora da linha AB , dizemos que os ângulos ∠ABC e ∠DBC são
suplementares.

←→
Exercı́cio 58: Sejam C e D dois pontos do mesmo lado de AB , com A 6= B; mostre que
m(∠ABC) < m(∠ABD) se, e somente se, C ∈ int (∠ABD).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 16

Solução e/ou Sugestão: Suponha que C ∈ int (∠ABD); então, pelo postulado, m(∠ABC) +
m(∠DBC) = m(∠ABD) e, como m(∠DBC) > 0, m(∠ABC) < m(∠ABC) + m(∠DBC) =
m(∠ABD).
−−→ −−→
Se C 6∈ int (∠ABD), ou BC = BD e, neste caso, m(∠ABC) = m(∠ABD), pois ∠ABC =
∠ABD, ou D ∈ int (∠ABC) e, neste caso, m(∠ABD) < m(∠ABC). Portanto, se m(∠ABC) <
m(∠ABD), então C ∈ int (∠ABD).

←→
Exercı́cio 59: Dados A − B − D e C fora de AB , mostre que m(∠ABC) + m(∠CBD) = 180
(ou seja, a soma das medidas de ângulos suplementares é o número r0 do postulado, o que neste
caso é 180).
←→
Solução e/ou Sugestão: Sejam H1 o lado de AB contendo C, α = m(∠ABC) e β =
m(∠CBD). Temos que mostrar que α + β = 180. Para isto, vamos mostrar que tanto α + β < 180
quanto α + β > 180 implicam uma contradição.
−−→
Se α + β < 180, então existe uma única semi reta BE , cujo interior está em H1 , tal que
m(∠ABE) = α + β. Como α < α + β, C ∈ int (∠ABE). Como m(∠ABC) + m(∠EBC) =
m(∠ABE), m(∠EBC) = β. Como E ∈ int (∠DBC) (por quê?), m(∠DBE) + m(∠EBC) =
m(∠DBC), ou seja, m(∠DBE) + β = β, o que implica que m(∠DBE) = 0, contradizendo o item
(a) do postulado do transferidor. Portanto α + β ≥ 180.
Agora suponha que α+β > 180. Como α, β < 180, temos que α+β < 360. Daı́, se γ = α+β−180,
então 0 < γ < 180. Pelo postulado do transferidor, existe E ∈ H1 tal que m(∠ABE) = γ. Como
β < 180, temos que β − 180 < 0 e, portanto, γ = α + β − 180 < α. Portanto E ∈ int (∠ABC). Mas
α = m(∠ABC) = m(∠ABE)+m(∠EBC) = γ+m(∠EBC), portanto m(∠EBC) = α−γ = α−(α+
β − 180) = 180 − β, o que implica que m(∠DBE) = m(∠DBC) + m(∠EBC) = β + (180 − β) = 180,
o que contradiz o item (a) do postulado do transferidor.
Portanto α + β = 180.

Observação: Como conseqüência disto temos que “ângulos opostos pelo vértice são congru-
entes”, ou seja, se A−B−D, E−B−C e A, B e C não são colineares, então m(∠ABC) = m(∠DBE),
pois m(∠ABC)+m(∠DBC) = 180 = m(∠DBC)+m(∠EBC) e, portanto, m(∠ABC) = m(∠EBD).
O caso em que m(∠ABC) = 90 é muito interessante, pois todos os quatro ângulos formados
←→ ←→
assim são congruentes (todos medem 90). Neste caso, dizemos que as linhas AB e BC são per-
−−→ ←→
pendiculares , que a semi reta BC , ou mesmo o segmento BC, é perpendicular a AB e chamamos
←→ ←→ −−→ ←→ ←→
o ponto B de pé da perpendicular; nestes casos, denotamos AB ⊥ BC , AB ⊥ BC e AB ⊥ BC ,
etc.

Exercı́cio 60: Mostre que, se m(∠ABC) + m(∠CBD) = m(∠ABD), então C ∈ int (∠ABD).
←→
Solução e/ou Sugestão: Mostre primeiro que C e D estão do mesmo lado de AB , mostrando
←→ ←→
que não podem estar em AB e nem em lados opostos de AB (para este caso, considere as possibil-
←→ ←→
idades A e D do mesmo lado de BC e em lados opostos de BC ).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 17

←→
Exercı́cio 61: Mostre que, se A e D estão em lados opostos de BC e m(∠ABC)+m(∠CBD) =
180, então A − B − D. (Ou seja, mostre que neste caso os ângulos são suplementares.)

Exercı́cio 62: Na geometria hiperbólica, dada a linha `0,5 = {(x, y) ∈ H : x2 + y 2 = 25} e o


ponto B = (3, 4) ∈ `0,5 , ache a linha ` contendo B e perpendicular à linha `0,5 .
Solução e/ou Sugestão: A resposta é a linha `p,r , com p = 25/3 e r = 20/3.

10. O Postulado LAL: Até então não temos nenhuma relação entre as várias réguas e
transferidores de nossa geometria. Vamos agora fazer isto por meio do postulado LAL (o conhecido
critério de “congruência de triângulos” Lado-Ângulo-Lado). Para isto precisamos definir certos
conceitos.
Dadas duas triplas ordenadas de pontos não colineares (A, B, C) e (D, E, F ), dizemos que a
correspondência A 7→ D, B 7→ E, C 7→ F é uma congruência de triângulos entre 4ABC
e 4DEF (aqui a ordem em que aparecem os pontos é importante), se AB ≡ DE, AC ≡ DF ,
BC ≡ EF , ∠BAC ≡ ∠EDF , ∠ABC ≡ ∠DEF e ∠ACB ≡ ∠DF E. Denotamos este conceito por
4ABC ≡ 4DEF e insistimos que dizer 4ABC ≡ 4DEF é diferente de dizer 4ACB ≡ 4DEF .
Postulado 7: (LAL) Dadas duas triplas ordenadas de pontos não colineares (A, B, C) e
(D, E, F ), se AB ≡ DE, AC ≡ DF e ∠BAC ≡ ∠EDF , então 4ABC ≡ 4DEF .

Exercı́cio 63: Mostre que a geometria analı́tica satisfaz o postulado LAL.


Solução e/ou Sugestão: Defina os vetores u1 = B − A, v1 = C − A, u2 = E − D, v2 = F − D,
w1 = u1 − v1 = B − C e w2 = u2 − v2 = E − F . Relembremos o produto escalar u · v = |u| |v| cos α,
sendo α o ângulo entre os vetores. A hipótese do LAL implica que |u1 | = |u2 |, |v1 | = |v2 | e
u1 · v1 = u2 · v2 . Então |w2 |2 = w2 · w2 = (u2 − v2 ) · (u2 − v2 ) = u2 · u2 − u2 · v2 − v2 · u2 + v2 · v2 =
|u2 |2 − 2 u2 · v2 + |v2 |2 = |u1 |2 − 2 u1 · v1 + |v1 |2 = |w1 |2 , ou seja, BC ≡ EF . Para as congruências
∠ABC ≡ ∠DEF e ∠ACB ≡ ∠DF E, basta então verificar que u1 · w1 = u2 · w2 e v1 · w1 = v2 · w2
(por quê?), o que é uma conta simples.

Observação: É possı́vel, mas bem trabalhoso, mostrar que a geometria hiperbólica também
satisfaz o postulado LAL. Para isto, precisamos fazer as contas do exercı́cio a seguir. Isto é um
tópico opcional (ou seja, não cai na prova!).
√ fazer isto, identificamos cada par (x, y) ∈ H com o número complexo z = x + iy (sendo
Para
i = −1). Dada uma matriz  
a b
M=
c d
com ad − bc 6= 0 e um número complexo z = x + iy, definimos as transformações
   
a b az + b ∗ a b az̄ + b
w = ϕM (z) = z= ; e w̃ = ϕM (z) = z̄ =
c d cz + d c d cz̄ + d

sendo que z̄ = x − iy. (Estas são chamadas de Transformações de Möbius.)


MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 18

Exercı́cio 64: Verifique que se w = M1 z e v = M2 w, então v = M z, sendo M o produto de


matrizes M1 M2 .

Exercı́cio 65: Verifique que se c 6= 0,


     
a b (ad − bc)/c a/c 0 −1 c d
=
c d 0 1 1 0 0 1

Exercı́cio 66: Verifique que, dados A, B e C em H não colineares, se D = M A, E = M B


e F = M C (transformações de Möbius), então d(A, B) = d(D, E) e ∠ABC ≡ ∠DEF . Para isto,
use a decomposição do exercı́cio anterior e verifique apenas nos casos em que M tem uma das duas
formas    
0 −1 c d
M= , ou M =
1 0 0 1
e considere os dois tipos de transformações, ϕM e ϕ∗M .

Exercı́cio 67: Para finalizar, mostre que dados os triângulos 4ABC e 4A0 B 0 C 0 em H, tais que
AB ≡ A0 B 0 , AC ≡ A0 C 0 e ∠BAC ≡ ∠B 0 A0 C 0 , então existe uma transformação ϕM ou ϕ∗M levando
A em A0 , B em B 0 e C em C 0 . (Para isto, construa primeiro uma transformação que leve A em
A0 = (0, 1), B em B0 = (0, b), b = d(A, B); com isto C é levado a algum C0 ∈ H; faça o mesmo com
A0 , B 0 e C 0 ; com isto, obtemos 4ABC ≡ 4A0 B0 C0 ≡ 4A0 B 0 C 0 .)
Com isto acabamos de esboçar a prova de que vale o LAL na geometria hiperbólica. (Com isto
também acabou o tópico especial; o que vem daqui por diante cai em prova!)

Exercı́cio 68: Mostre que no plano de Moulton não vale LAL.


Solução e/ou Sugestão: Considere os pontos A = (1, 0), B = (0, 0) e C = (1, 1). Mostre que
a correspondência A 7→ A, B 7→ C, C 7→ B satisfaz as hipóteses mas não a conclusão do postulado
LAL.

Exercı́cio 69: Mostre que na geometria do taxista não vale LAL.


Solução e/ou Sugestão: Considere os pontos A = (1, 0), B = (0, 0) e C = (1/2, 1/2). Mostre
que a correspondência A 7→ A, B 7→ C, C 7→ B satisfaz as hipóteses mas não a conclusão do
postulado LAL.

Exercı́cio 70: Na geometria hiperbólica, sejam A = (−1, 1), B = (0, 1), C = (1, 1), D = (−2, 2),
E = (0, 2) e F = (2, 2). Mostre que 4ABC ≡ 4DEF . (Use o LAL.)

Exercı́cio 71: Na geometria hiperbólica, dado o segmento AB, em que A = (a, b) e B = (c, d) e
dado um número real t > 0, sejam C = t A = (t a, t b) e D = t B = (t c, t d). Mostre que AB ≡ CD.
(Para isto, calcule d(A, B) e d(C, D).)

Exercı́cio 72: Na geometria hiperbólica, dados A, B e C não colineares e t > 0, sejam D = t A,


E = t B e F = t C. Mostre que ∠ABC ≡ ∠DEF . (Para isto, ache os vetores vAB , etc.)
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 19

Exercı́cio 73: Mostre que se vale LAL então também valem


(a) ALA (Ângulo-Lado-Ângulo) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF , se AB ≡ DE, ∠BAC ≡
∠EDF e ∠ABC ≡ ∠DEF então 4ABC ≡ 4DEF .
(b) Dado o triângulo 4ABC, mostre que AC ≡ BC se, e somente se, ∠BAC ≡ ∠ABC. (Tal
triângulo é chamado de isósceles.)
(c) LLL (Lado-Lado-Lado) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF , se AB ≡ DE, AC ≡ DF e
BC ≡ EF então 4ABC ≡ 4DEF .
Observação: Também vale o LAAo (Lado-Ângulo-ângulo oposto), mas isto vais ser feito mais
adiante.
Solução e/ou Sugestão:
(a) Construı́mos um triângulo 4DEG ≡ 4ABC, com AC ≡ DG e ∠BAC ≡ ∠EDG e G e F
←→ ←→
do mesmo lado de DE . Queremos mostrar que G = F . Como ∠BAC ≡ ∠EDG, G ∈ DF . Então
ou D − G − F , ou D − F − G, ou G = F . Vamos mostrar que não podem ocorrer nem D − G − F e
nem D − F − G. Se D − G − F , então G está em int (∠DEF ) e, portanto m(∠DEG) < m(∠DEF )
uma contradição à hipótese de que ∠ABC ≡ ∠DEF e ∠ABC ≡ ∠DEG (esta última por LAL).
O mesmo tipo de coisa acontece se supusermos que D − F − G (faça isto). Portanto G = F , como
querı́amos mostrar.
(b) Se ∠BAC ≡ ∠ABC, por ALA, 4ABC ≡ 4ACB (perceba a ordem dos pontos) e, portanto
AC ≡ BC. Se AC ≡ BC, por LAL (considerando o ângulo ∠ACB entre os lados AC e BC, que é
congruente a si mesmo), 4ABC ≡ 4ACB, e portanto ∠BAC ≡ ∠ABC.
(c) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF tais que AB ≡ DE, AC ≡ DF e BC ≡ EF , seja
←→
C0 oposto a C em relação a AB tal que AC 0 ≡ DF e ∠BAC 0 ≡ ∠EDF . Ou seja, construı́mos
um triângulo 4ABC 0 congruente ao 4DEF , “do lado de baixo” do 4ABC. Vamos mostrar que
←→ ←→
4ABC ≡ 4ABC 0 , o que implica que 4ABC ≡ 4DEF . Seja G ∈ AB o ponto de encontro de AB
com BB 0 (por quê existe tal ponto?). Então, ou G − A − B, ou G = A, ou A − G − B, ou G = B, ou
A − B − G. Vamos considerar apenas o caso em que G − A − B, deixando os outros como exercı́cio.
Neste caso, os pontos C, C 0 e G não são colineares. Pelo item (b) deste exercı́cio, 4BAB 0 é isósceles
(pois AC ≡ DF ≡ AC 0 ) e, portanto, ∠ACG ≡ ∠AC 0 G. Também temos que 4CBC 0 é isósceles
(pois BC ≡ EF ≡ BC 0 ) e, portanto, ∠BCG ≡ ∠BC 0 G, donde segue que ∠BCA ≡ ∠BC 0 A (por
quê?). Por LAL, 4ABC ≡ 4ABC 0 (por quê?).

Exercı́cio 74: Dado o quadrilátero convexo ABCD, mostre que, se AB ≡ CD e BC ≡ DA,


então ∠DAB ≡ ∠BCD e ∠ABC ≡ ∠CDA. (Considere os triângulos 4ABD e 4BCD, etc.)

Exercı́cio 75: Dado o quadrilátero convexo ABCD, mostre que, se AB ≡ CD ≡ BC ≡ DA


e AC ≡ BD, então ∠DAB ≡ ∠BCD ≡ ∠ABC ≡ ∠CDA.

Exercı́cio 76: Dado o polı́gono convexo ABCDEF (um hexágono), suponha que AB ≡ DE,
BC ≡ EF , CD ≡ F A e ∠F AB ≡ ∠CDE, mostre que ∠ABC ≡ ∠DEF e ∠BCD ≡ ∠EF A.
(Considere os triângulos 4F AB e 4CDE, etc.)
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 20

←→
Exercı́cio 77: Dados A e B dois pontos distintos, `1 e `2 duas linhas perpendiculares a AB e
tais que A ∈ `1 e B ∈ `2 , mostre que `1 e `2 são paralelas (isto é, não têm ponto comum). (Para
isto, suponha que exista um ponto C ∈ `1 ∩ `2 ; então mostre que C 6∈ `, tome D ∈ `1 tal que
D − A − C e AC ≡ AD; mostre que 4ABC ≡ 4ABD, e conclua que C − B − D, uma contradição
a alguma hipótese.)

Exercı́cio 78: Dados os pontos A, B, C e D, tais que A 6= B, C e D estão em lados opostos de


←→ ←→ ←→
AB e ∠ABC ≡ ∠BAD. Mostre que AC e BD são paralelas. (Novamente, suponha que não são
paralelas e considere os triângulos pertinentes.)

Exercı́cio 79: Mostre que dada uma linha ` e um ponto P fora de `, então existe pelo menos
uma linha `0 contendo P e paralela a `. (Olhe o exercı́cio anterior.)

Exercı́cio 80: Ainda não é possı́vel provar a unicidade da paralela: Mostre que as linhas
`0 = {(x, y) ∈ H : x = 0} e `0,1 = {(x, y) ∈ H : x2 + y 2 = 1} contêm o ponto P = (0, 1) e
são paralelas à linha `1 = {(x, y) ∈ H : x = 1}. (É só mostrar que as linhas não se intersectam,
mostrando que as equações pertinentes não têm solução comum em H.)

Exercı́cio 81: Dada uma linha ` e um ponto P fora de `, mostre que existe uma única linha
passando por B e perpendicular a `.
←→
Solução e/ou Sugestão: Seja A ∈ ` um ponto qualquer. Se AB for perpendicular a `, então
←→
AB é a linha procurada. Caso contrário, seja C o ponto do lado de ` oposto a B e tal que
AB ≡ AC e ∠DAB ≡ ∠DAC, sendo D um outro ponto de `. Seja G o ponto de encontro entre
BC e `. Então 4AGB ≡ 4AGC, por LAL e, portanto, ∠AGB ≡ ∠AGC. Como B − G − C,
←→
m(∠AGB) + m(∠AGC) = 180, donde m(∠AGB) = 90, ou seja, BC ⊥ `. A unicidade segue do fato
que se `1 ⊥ ` e `2 ⊥ ` e `1 6= `2 , então `1 e `2 são paralelas.

←→
Exercı́cio 82: Dados os pontos A, B, C e D tais que A − B − D e C fora de AB , mostre que
m(∠DBC) > m(∠BAC) e m(∠DBC) > m(∠BCA). (Isto é, cada ângulo externo de um triângulo
é maior que os dois ângulos internos não adjacentes.)
←→
Solução e/ou Sugestão: Seja E do mesmo lado que C em relação a AB e tal que ∠BAC ≡
←→ ←→ ←→
∠DBE. Então AC e BE são paralelas (por quê?). Portanto C e A estão do mesmo lado de BE
←→
e E e A estão em lados opostos de BC (por quê?), ou seja, E ∈ int (∠DBC), donde segue que
m(∠DBC) > m(∠DBE) = m(∠BAC). Agora, seja D0 tal que C − B − D0 . Então ∠ABD0 ≡
←→
∠CBD, pois são opostos pelo vértice. Seja F do mesmo lado que D0 em relação a AB e tal que
∠D0 BF ≡ ∠BCA. Pela mesma argumentação acima, concluı́mos que m(∠DBC) > m(∠BCA)
(preencha os detalhes).

Exercı́cio 83: LAAo (Lado-Ângulo-Ângulo oposto) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF , tais
que AB ≡ DE, ∠BAC ≡ ∠EDF e ACB ≡ ∠DF E, mostre que 4ABC ≡ 4DEF .
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 21

←→ ←→
Solução e/ou Sugestão: Seja G ∈ DF , do mesmo lado de F em relação a DE e tal que
DG ≡ AC. Por LAL, 4ABC ≡ 4DEG e, protanto ∠DGE ≡ ∠ACB. Queremos mostrar que
G = F . Para isto, temos que descartar as possibilidades D−G−F e D−F −G (por quê só estas?). Se
D − G − F , o ângulo ∠DGE é externo ao triângulo 4GF E e, portanto, m(∠ACB) = m(∠DGE) >
m(∠DF E), mas, por hipótese, m(∠ACB) = m(∠DF E), uma contradição à desigualdade. Se
D − F − G, o ângulo ∠DF E é externo ao triângulo 4GF E e, portanto, pelo mesmo raciocı́nio,
chegamos a uma contradição. Portanto G = F , como querı́amos mostrar.

Exercı́cio 84: Dado o triângulo 4ABC, mostre que d(A, B) > d(B, C) se, e somente se,
m(∠ACB) > m(∠BAC).
Solução e/ou Sugestão: Se d(A, B) > d(B, C), seja D tal que A − D − B e BC ≡ BD.
Então m(∠ACB) > m(∠BCD), pois D ∈ int (∠ACB) e m(∠BCD) > m(∠BAC), pois ∠BCD
é externo ao triângulo 4ADC. Portanto m(∠ACB) > m(∠BAC). Reciprocamente, suponha
que m(∠ACB) > m(∠BAC). Então d(A, B) = d(B, C) implica que m(∠ACB) = m(∠BAC), pois
4ABC seria isósceles e d(A, B) < d(B, C) implica que m(∠ACB) < m(∠BAC), pela argumentação
acima. Ou seja, d(A, B) ≤ d(B, C) leva a contradições à hipótese m(∠ACB) > m(∠BAC). Portanto
d(A, B) > d(B, C).

Exercı́cio 85: Mostre que ALA implica LAL.

Exercı́cio 86: Mostre que para todo triângulo 4ABC são equivalentes:
(a) Todos os lados são congruentes entre si.
(b) Todos os ângulos internos são congruentes entre si.
−−→
Observação: A bissetriz de um ângulo ∠AOB é a semi reta OC tal que C ∈ int (∠AOB)
e ∠AOC ≡ ∠COB. Dado o triângulo 4ABC, seja M o ponto médio de BC; o segmento AM é
chamado de uma mediana de 4ABC; a linha ` contendo M e perpendicular ao lado BC é chamada
de mediatriz de BC.

Exercı́cio 87: Mostre que as três bissetrizes dos ângulos de um triângulo 4ABC se encontram
num ponto no interior de 4ABC. (Para isto, mostre que duas bissetrizes se encontram num ponto
P no interior de 4ABC, desça perpendiculares de P aos três lados de 4ABC e use congruência
com os triângulos convenientes.)

Exercı́cio 88: Mostre que se duas mediatrizes se encontram num ponto P , então e terceira
mediatriz também passa por P . (Ligue P ao ponto médio do terceiro lado e use congruência de
triângulos, com os triângulos convenientes. O próximo exercı́cio mostra que precisamos da hipótese
de que duas das mediatrizes se encontram.)

Exercı́cio 89: Mostre que as mediatrizes do triângulo 4ABC na geometria hiperbólica são
paralelas, sendo que A = (0, 4), B = (−6, 4) e C = (6, 4) são pontos de H. (Para isto, mostre que
as mediatrizes são as linhas `0 , `3 e `−3 .)
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 22

Exercı́cio 90: Mostre que num triângulo isósceles as três medianas se encontram num ponto.
(Mostre que duas se encontram num ponto P e ligue este ponto ao ponto médio do terceiro lado,
etc.)
←→
Exercı́cio 91: Dados A − B − C e D e E do mesmo lado de AB , mostre que se m(∠EBC) <
−−→ −−→
m(∠DAC), então as semi retas AD e BE não se encontram. (Construa um ângulo ∠F BC ≡
←→
∠DAC com F do mesmo lado que E em relação a AC , etc.)
←→ ←→
Exercı́cio 92: Dado o triângulo 4ABC, seja P ∈ BC o pé da perpendicular a BC , passando
por A. Mostre que, se m(∠ABC) < 90 e m(∠ACB) < 90, então B − P − C.

Exercı́cio 93: Mostre que num triângulo isósceles, cujos ângulos internos não sejam maiores
que 90, as três alturas se encontram num ponto no interior do triângulo.

Exercı́cio 94: Mostre que existe em H um triângulo isósceles com um ângulo maior que 90,
cujas alturas não se encontram em H. (Considere 4ABC, A = (0, 2), B = (−1, 1) e C = (1, 1);
quais são suas alturas?)

Exercı́cio 95: Dado o quadrilátero convexo ABCD, tal que AB ≡ AD e BC ≡ CD, mostre
←→ ←→
que AC é perpendicular a BD .

Exercı́cio 96: Dado o quadrilátero convexo ABCD, tal que AB ≡ CD e m(∠BAD) =


m(∠CDA) = 90, sejam M e N os pontos médios de AD e BC, respectivamente. Mostre que M N
é perpendicular a AD e a BC. (Para isto, primeiro mostre que ∠ABC ≡ ∠DCB. Este tipo de
quadrilátero é chamado de quadrilátero de Saccheri e vai ser importante posteriormente, quando
formos estudar paralelismo.)

11. Desigualdades Geométricas:


Vamos desenvolver algumas desigualdades envolvendo ângulos e medidas de segmentos. Para
facilitar o entendimento, vamos estabelecer algumas notações relativas a comparações de tamanhos
de segmentos e ângulos.
NOTAÇÕES: Se d(A, B) < d(C, D), escreveremos AB < CD (sem as barras); se d(A, B) ≤
d(C, D), escreveremos AB ≤ CD; se AB ≡ CD, escreveremos AB = CD; se d(A, B) = d(C, D) +
d(E, F ), escreveremos AB = CD+EF ; se m(∠AOB) < m(∠CP D), escreveremos ∠AOB < ∠CP D
e se m(∠AOB) ≤ m(∠CP D), escreveremos ∠AOB ≤ ∠CP D.

←→
Exercı́cio 97: Dados A − B − D, e C fora de AB , mostre que ∠BAC < ∠DBC e ∠ACB <
∠DBC.
Solução e/ou Sugestão: Seja M o ponto médio de BC, e seja E tal que A − M − E e
AM ≡ M E. Então 4AM C ≡ 4EM B (por quê?) e E está no interior de ∠DBC (por quê?).
Como ∠ACB ≡ ∠EBC, ∠ACB < ∠DBC.
Para a outra desigualdade, seja F tal que C − B − F . Então ∠DBC ≡ ∠F BA. Pelo mesmo
argumento acima, mostramos que ∠BAC < ∠DBC (faça isto!).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 23

Exercı́cio 98: Mostre que se dois lados de um triângulo não são congruentes, então os dois
ângulos opostos a estes lados também não são congruentes. Mostre que o maior entre estes dois
ângulos é oposto ao maior entre os dois lados em questão.
Solução e/ou Sugestão: Dado o triângulo 4ABC, suponha que AB > AC. Seja D o único
ponto tal que A − C − D e AD ≡ AB. Então o triângulo 4ABD é isósceles e ∠ADB ≡ ∠ABD.
Como C está no interior de ∠ABD, ∠ABC < ∠ABD ≡ ∠ADB < ∠ACB (por quê?).

Exercı́cio 99: Mostre a recı́proca do exercı́cio anterior, ou seja, se dois ângulos de um triângulo
não são congruentes, então os lados opostos a estes ângulos também não são congruentes e o maior
destes lados é oposto ao maior destes ângulos.

Exercı́cio 100: (Desigualdade Trangular I) Dado o triângulo 4ABC, mostre que d(A, C) <
d(A, B) + d(B, C) (ou seja AC < AB + BC).
Solução e/ou Sugestão: Seja D tal que C − B − D e AB ≡ BD. Então ∠BAD ≡ ∠BDA.
Como B está no interior de ∠CAD, ∠BDA ≡ ∠CAD > ∠BAD e, portanto, pelo exercı́cio acima,
AC < AD = CB + BD = AB + BC.

Exercı́cio 101: (Desigualdade Trangular II) Dados os pontos A, B, e C, mostre que


d(A, C) ≤ d(A, B) + d(B, C). (Considere os vários casos em que A, B e C são colineares, etc.)

Exercı́cio 102: Dado os triângulos 4ABC e 4DEF tais que AB ≡ DE, BC ≡ EF e ∠ABC >
∠DEF , mostre que AC > DF .
Solução e/ou Sugestão: Para isto, construı́mos o triângulo 4HBC ≡ 4DEF , com H do
←→
mesmo lado que A em relação a BC (por quê podemos construı́-lo e por quê é único?). Como
−−→
∠ABC > ∠DEF , temos ∠ABC > ∠HBC. Pelas barras cruzadas, a semi reta BH cruza AC num
ponto K. Podemos ter três casos, a saber, B − H − K, ou H = K, ou B − K − H. Construı́mos um
triângulo auxiliar 4ABM tal que M é o ponto em AK que está na bissetriz do ângulo ∠ABH (pelas
barras cruzadas). Por LAL e usando a hipótese AB ≡ DE ≡ BH, temos que 4ABM ≡ 4HBM e,
portanto AM ≡ HM . Pela desigualdade triangular, HC ≤ HM + M C. Nos casos em que K 6= H,
temos HC < HM + M C, ou seja, DF = HC < AM + M C = AC. No caso em que H = K, a
desigualdade DF = HC < AC decorre do fato que A − H − C.

Exercı́cio 103: Dado um triângulo 4ABC, tal que AC ≤ AB, se B − D − C, mostre que
AD < AB. (Para isto, mostre que ∠ABC < ∠ADB, etc.)

Exercı́cio 104: Dado o triângulo isósceles 4ABC (tal que AB ≡ AC), mostre que m(∠ABC) <
90.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 24

Exercı́cio 105: Mostre que qualquer triângulo tem pelo menos dois ângulos internos agudos
(isto é, medem menos que 90).

12. Triângulos Retângulos: Um triângulo é chamado de triângulo retângulo


se um de seus ângulos internos for reto (ou seja, se medir 90). Os lados adjacentes ao ângulo reto
são os catetos e o lado oposto a hipotenusa. Veremos que o famoso teorema de Pitágoras só vale
na geometria euclideana.

Exercı́cio 106: Mostre que o Teorema de Pitágoras vale na geometria analı́tica, isto é, mostre
que dado o triângulo retângulo 4ABC, com ângulo reto ∠BAC, mostre que BC 2 = AB 2 + AC 2 .
(Use o produto escalar de vetores.)

Exercı́cio 107: Mostre que o Teorema de Pitágoras não vale na geometria hiperbólica. (Con-
sidere o triângulo 4ABC em H tal que A = (0, 5), B = (0, 7) e C = (3, 4); calcule d(A, B), etc.)

Exercı́cio 108: Mostre que a hipotenusa é maior do que os catetos. Use isto para mostrar que
o ponto de uma linha ` mais próximo de um ponto P fora de ` é o pé da perpendicular a ` que passa
por P .

Observação: Definimos a distância do ponto P à linha ` como d(P, `) = d(P, Q), sendo que
P = Q, se P ∈ `, ou Q é o pé da perpendicular a ` passando por P . Dado um triângulo 4ABC
←→ ←→
qualquer, seja D ∈ AB o pé da perpendicular a AB passando por C. O segmento CD é uma altura
de 4ABC.

Exercı́cio 109: Mostre que d(P, `) ≤ d(P, R), se R ∈ ` e d(P, `) = d(P, R) se, e somente se,
←→
P Q ⊥ `.

Exercı́cio 110: Mostre que se AB é o maior lado de 4ABC e CD é uma altura sobre o lado
AB, então A − D − B. (Compare ângulos opostos aos lados convenientes.)

Exercı́cio 111: (LLA para triângulos retângulos) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF ,
tais que ∠BAC e ∠EDF sejam retos, AB ≡ DE e BC ≡ EF , mostre que 4ABC ≡ 4DEF .
←→
Solução e/ou Sugestão: Seja G ∈ DF tal que G − D − F e GD = AC. Por LAL, 4ABC ≡
4DEG (por quê?). Como BC = EF , EF = BC = EG e, portanto, o triângulo 4EF G é isósceles,
com ∠DF E ≡ ∠DGE. Por LAAo, 4DEF ≡ 4DEG ≡ 4ABC (por quê?).

Exercı́cio 112: Nem sempre vale o critério LLA para triângulos não retângulos, isto é, dado o
triângulo 4ABC não retângulo e tal que BC < AC, existe um triângulo 4DEF , tal que ∠BAC ≡
∠EDF , AB ≡ DE e BC ≡ EF , mas 4ABC 6≡ 4DEF . Em que casos vale este critério? Basta
acrescentar a hipótese de que BC > AB?
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 25

←→
Solução e/ou Sugestão: Para isto, seja AG uma altura, com G ∈ BC . Então, ou A − G − C,
ou A − C − G, pois G 6= A e G 6= C, por não ser triângulo retângulo, e G − A − C implicaria que
←→ −−→
BC > AC (por quê?). Seja E ∈ AC tal que E − G − C e EG = CG. Então E ∈ AC , pois se
−−→
E 6∈ AC , novamente terı́amos BC > AC (por quê?). Também temos que E 6= A (por quê?). Os
triângulos 4ABC e 4ABE satisfazem as hipóteses ∠BAC ≡ ∠BAE, AB ≡ AB e BC ≡ BE, mas
não são congruentes (por quê?).

Exercı́cio 113: Dados os triângulos 4ABC e 4DEF , tais que ∠BAC e ∠EDF sejam retos,
BC ≡ EF e ∠ABC ≡ ∠DEF , mostre que 4ABC ≡ 4DEF .
Solução e/ou Sugestão: Use LAAo.

Exercı́cio 114: Dados A 6= B, seja M ∈ AB o ponto médio e seja ` contendo M e perpendicular


←→
a AB e seja P um ponto qualquer. Mostre que AP = BP se, e somente se, P ∈ `. (Isto é, a mediatriz
do segmento AB é o conjunto dos pontos do plano equidistantes de A e B.)
←→ ←→
Solução e/ou Sugestão: Mostre que se P ∈ AB então P = M ∈ ` e se P 6∈ AB , desça uma
←→ ←→
perpendicular a AB passando por P , seja N ∈ AB o pé da perpendicular. Mostre que 4P N A ≡
4P N B e conclua que N = M e, portanto P ∈ `.

−−→ −−→ −−→


Exercı́cio 115: Seja BD a bissetriz de ∠ABC e sejam E ∈ BA e F ∈ BC os pés das
perpendiculares passando por D. Mostre que DE = DF .

Exercı́cio 116: Mostre que 4ABC é isósceles se, e somente se, quaisquer duas das seguintes
figuras são colineares:
(a) uma mediana de 4ABC;
(b) uma altura de 4ABC;
(c) uma mediatriz de 4ABC;
(d) uma bissetriz de 4ABC.
Solução e/ou Sugestão: São seis casos a serem considerados, (a) e (b), ou (a) e (c), ou etc.
Por exemplo, seja M o ponto médio de BC e suponha que a mediana AM também é uma altura.
Por LAL, 4AM B ≡ 4AM C, etc.

13. Circunferências: Dado um ponto C e um número real r > 0, o conjunto C =


{P : d(P, C) = r} é chamado de circunferência, sendo C chamado de seu centro e r o seu
raio. Se A, B ∈ C são tais que A − C − B, então o segmento AB é chamado de diâmetro de
C e CA de segmento radial ou, por um abuso de linguagem, também chamaremos de raio de
C; o interior de C é o conjunto int (C) = {P : d(P, C) < r}; o exterior de C é o conjunto
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 26

ext (C) = {P : d(P, C) > r}. Vamos estudar algumas propriedades de circunferências usando apenas
os postulados até agora listados (isto é, até o LAL).
NOTAÇÃO: Caso precisemos especificar o centro e o raio de C, escreveremos CC,r .

Exercı́cio 117: Mostre que o conjunto A = {(x, y) ∈ H : x2 + (y − 5)2 = 16} é a circunferência


de centro (0, 3) e raio ln 3 na geometria hiperbólica. Ou seja, a circunferência hiperbólica coincide
com a euclideana, mas com seu centro deslocado para baixo. (Para isto, tome um ponto (a, b) ∈ A
e mostre que d((a, b), (0, 3)) = ln 3; divida em casos a = 0 e a 6= 0; neste último, ache `p,r tal que
(a, b) ∈ `p,r e (0, 3) ∈ `p,r , para calcular a distância; não esqueça de usar a equação x2 + (y − 5)2 = 16
para o ponto (a, b).)

Exercı́cio 118: Esboce a circunferência de centro (0, 0) e raio 1 na geometria do taxista. (Mostre
que a equação que a define é |x| + |y| = 1.)

Exercı́cio 119: Verifique que a circunferência de centro (−1, 0) e raio 2 nop


plano de Moulton
2 2 2
é descrita por {(x, y) ∈ R : (x + 1) + y = 4, se x ≤ 0 ou y ≤ 0 e 4x + 8 = (x + 2)2 + 4y 2 +
p
x2 + y 2 (2 − x)2 , se x > 0 e y > 0}.

Exercı́cio 120: Voltando às geometrias que satisfazem LAL, dados três pontos P , Q e R
não colineares e tais que as mediatrizes de P Q e QR se encontram, mostre que existe uma única
circunferência C contendo estes pontos.
Solução e/ou Sugestão: Seja C o ponto de encontro das mediatrizes e r = d(C, P ). Por
congruênciade triângulos (quais?), CP = CQ = CR e, portanto P, Q, R ∈ C = CC,r . Para mostrar
a unicidade de C, suponha que P, Q, R ∈ CD,s , para um ponto D e um número real s > 0. Sejam M
o ponto médio de P Q e N o ponto médio de QR. Então, por congruências de triângulos (quais?),
DM é perpendicular a P Q e DN é perpendicular a QR. Portanto D = C e s = r (por quê?).

Exercı́cio 121: Mostre que se A e B são dois pontos da circunferência CC,r , mostre que C está
na mediatriz de AB.

Exercı́cio 122: Mostre que uma circunferência C pode ser circunscrita num triângulo 4ABC
(isto é, seus vértices A, B e C estão em C) se, e somente se, suas mediatrizes se encontram num
ponto (e este ponto é chamado de circuncentro de 4ABC). Observe que na geometria hiperbólica
existem triângulos em que isto não acontece.

Exercı́cio 123: Mostre que int (CC,r ) é convexo. (Para isto, sejam A, B ∈ int (CC,r ), A 6= B,
e seja D ∈ AB; mostre que D ∈ int (CC,r ); considere dois casos: C ∈ AB e compare distâncias;
C 6∈ AB e considere os triângulos 4ABC e 4ABD e compare os lados.)

Exercı́cio 124: Uma linha ` é dita uma tangente à circunferência C se ` ∩ C contém um único
ponto. Mostre que se A ∈ C e C é o centro de C, então a linha ` perpendicular a CA e passando
por A é uma tangente a C. (Para isto, mostre que se B ∈ ` e B 6= A, então CB > CA.)
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 27

Exercı́cio 125: Uma linha ` é dita uma linha secante de C, se ela intersecta C em mais de
um ponto. Mostre que neste caso ` encontra C em exatamente dois pontos A e B. (Separe em dois
casos: ` contém o centro e ` não contém o centro.)

Exercı́cio 126: Mostre que se ` é uma tangente à circunferência C passando pelo ponto A ∈ C,
então ` é perpendicular a AC, sendo C o centro de C.

Exercı́cio 127: Mostre que para qualquer triângulo 4ABC, existe uma única circunferência C
inscrita em 4ABC (isto é, C é tangente aos três lados de 4ABC). (Mostre que o centro desta
circunferência, chamado de incentro de 4ABC, é o ponto de encontro das bissetrizes de 4ABC.)

Exercı́cio 128: Seja f : ` → R uma régua e P 6∈ ` um ponto. Seja h : R → R a função definida


por h(x) = d(P, Q), sendo que Q ∈ ` e f (Q) = x. Mostre que h é contı́nua.
Solução e/ou Sugestão: Precisamos mostrar que para cada x ∈ R, dado ε > 0 existe δ > 0
tal que, para todo t ∈ R tal que 0 < |t| < δ, temos |h(x + t) − h(x)| < ε. (Lembre-se que isto é a
definição de continuidade de uma função.)
Sejam x ∈ R, Q ∈ `, tal que f (Q) = x, ε > 0, R, S ∈ ` tais que R−Q−S e d(R, Q) = d(S, Q) = ε.
Se T ∈ int (RS), então d(T, Q) < ε (Q é o ponto médio de RS). Pela desigualdade triangular aplicada
aos pontos P , Q e T , temos P Q + T Q ≥ P T e P T + T Q ≥ P Q. Destas duas desigualdades obtemos
P T − P Q ≤ T Q e P Q − P T ≤ T Q, donde segue que |P Q − P T | ≤ T Q. Traduzindo isto em
termos da função h, temos |h(Q) − h(T )| < d(T, Q). Seja t = f (T ) − f (Q); então f (T ) = x + t e
d(T, Q) = |t|; portanto |h(Q) − h(T )| < |t|. Se fizermos δ = ε, obtemos que se |t| < δ = ε então
|h(Q) − h(T )| < ε, como querı́amos mostrar.

←→ ←→
Exercı́cio 129: Dados A, B e C não colineares e tais que AC ⊥ AB , e dado r ∈ R tal que
−−→ −−→
d(A, C) < r, mostre que existe um ponto D ∈ AB tal que d(C, D) = r. (Para isto, seja E ∈ AB
tal que d(A, E) = r; mostre que d(C, E) > r; use a função do exercı́cio anterior para obter o
resultado desejado; lembre-se do Teorema do Valor Intermediário, que diz que se f : [a, b] → R é
contı́nua, e f (a) < f (b), se f (a) ≤ r ≤ f (b) então existe c ∈ [a, b] tal que f (c) = r.)

Exercı́cio 130: Mostre que se ` contém algum ponto do interior da circunferência C, então ` é
uma linha secante de C. (Para isto, desça uma perpendicular do centro C de C a `; seja A o pé da
perpendicular; use o exercı́cio acima.)

Exercı́cio 131: Mostre que dada a circunferência C = CC,r e P ∈ ext (C), então existem
exatamente duas linhas passando por P e tangentes a C.
Solução e/ou Sugestão: Seja A o ponto de interseção entre o segmento P C e a circunferência
C. Seja s = d(P, C); observe que s > r. A linha ` perpendicular a P C pelo ponto A contém o
ponto A, que está no interior de D = CC,s e, portanto intersecta D em exatamente dois pontos R
e S. Seja B o ponto de interseção de C e CR e D o ponto de interseção de C e CS. Por LAL,
←→ ←→ ←→ ←→
4CBP ≡ 4CDP ≡ 4CAR (por quê?). Portanto P B ⊥ CB e P D ⊥ CD, ou seja, P B e P D são
tangentes a C e são duas linhas distintas.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 28

Vamos mostrar agora que não existe outra linha tangente a C, passando por P . Para isto,
observe que se X ∈ C, X 6= A e X 6= B, então X ∈ int (∠BP D) (por quê?). Portanto, se ` contém
P mas não intersecta int (∠BP D), então também não intersecta C. Se ` intersecta int (∠BP D),
pelas barras cruzadas, ` intersecta BD, num ponto F tal que B − F − D. Mas F ∈ int (C) (por
←→ ←→
quê?) e, portanto ` é uma linha secante de C. Portanto, só P B e P D são tangentes a C.

Exercı́cio 132: Sejam 4ABC e 4DEF dois triângulos retângulos, com ângulos retos nos
vértices A e D, respectivamente, tais que BC = EF , AB > DE. Mostre que AC < DF .
−−→ −−→
Solução e/ou Sugestão: Sejam G ∈ DE e H ∈ DF tais que 4ABC ≡ 4DGH. Como
AB > DE, temos que D − E − G. Queremos mostrar que D − H − F e, portanto AC = DH < DF .
Para isto, vamos mostar que tanto H = F quanto D − F − H levam a uma contradição. Suponha
que H = F ; como ∠DEH é agudo (por quê?), o ângulo suplementar ∠GEH é obtuso e, portanto
é o maior ângulo de 4GEH, o que implica que o lado oposto GH é o maior dos lados de 4GEH.
Mas isto contradiz o fato que GH = GF = BC = EF . Se D − F − H, usando o triângulo 4GF H,
pelo mesmo tipo de argumentação, obtemos uma contradição (como?).

Exercı́cio 133: Dada a linha `, A ∈ `, r > 0 e H1 , um dos lados de `, seja h a função


h(x) = d(P, X), sendo que X ∈ ` é tal que f (X) = x, sendo f : ` → R uma régua de ` tal que
f (A) = 0 e P ∈ C = CA,r está em H1 ou em ` e também na linha perpendicular a `, passando por
X. Mostre que o domı́nio de h é o intervalo fechado [−r, r] e que h é contı́nua neste intervalo.
Solução e/ou Sugestão: Se P ∈ C, P 6∈ `, e X é o pé da perpendicular a ` passando por P ,
então X está no interior de C (por quê?) e, portanto, |f (X)| = |f (X) − f (A)| = d(X, A) < r. Se
P ∈ C ∩ `, então |f (P )| = r; finalmente, se X ∈ ` e d(X, A) > r, então a linha perpendicular a ` e
contendo X não intersecta a circunferência C. Portanto o domı́nio de h é [−r, r]. Sejam B, C ∈ `
tais que f (B) = −r e f (C) = r.
Para mostrar que h é contı́nua em cada x ∈ [−r, r], dividiremos em dois casos, a saber, −r ≤
x ≤ 0 e 0 ≤ x ≤ r.
Consideremos o caso em que −r ≤ x ≤ 0. Observe que se −r ≤ t < u ≤ 0, então h(t) < h(u),
pois se T, U ∈ ` são tais que f (T ) = t, f (U ) = u, sejam P, Q ∈ C ∩ H1 , tais que P T ⊥ ` e
QU ⊥ `. Pelo exercı́cio anterior, considerando os triângulos retângulos 4AT P e 4AU Q, temos que
T P < U Q (por quê?). Portanto h(t) = d(T, P ) < d(U, Q) = h(u). Por outro lado, dado s ∈ R, tal
que 0 = h(−r) < s < h(0) = r, existe X ∈ ` tal que h(x) = s, pois se D ∈ H1 é tal que DA ⊥ ` e
−−→
d(D, A) = s, seja X ∈ AB tal que d(X, D) = r (por quê tal ponto existe?). Então, considerando
o triângulo retângulo 4DAX, temos que AX < DX = AB (por quê?), ou seja, B − X − A. Seja
R ∈ C ∩ H1 tal que RX ⊥ `. Por LAL, 4DAX ≡ 4RXA e, portanto h(x) = d(X, R) = s,
sendo x = f (X). Ou seja, provamos que h é estritamente crescente em [−r, 0] e que, para cada
s ∈ [0, r] = [h(−r), h(0)], existe algum x ∈ [−r, 0], tal que h(x) = s. Vamos usar isto para mostrar
que h é contı́nua em cada x ∈ [−r, 0].
Primeiro, consideremos x ∈] − r, 0[. Dado ε > 0, sejam a, b ∈] − r, 0[, a < h(x) < b, |h(x) − a| < ε,
|h(x) − b| < ε e t, u ∈] − r, 0[, tais que h(t) = a e h(u) = b. Então, como provamos que h é crescente
em [−r, 0], temos que t < x < u. Seja δ = min{|x − a|, |x − b|}. Então se |x − w| < δ, temos que
a < w < b, e portanto, |h(x) − h(w)| < max{|h(x) − a|, |h(x) − b|} < ε (por quê?).
Ficam para os leitores tratarem dos casos em que x = −r, x = 0 e x ∈ [0, r].
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 29

Exercı́cio 134: Mostre que se 0 < r, s < d(A, B) < r + s, então as circunferências A = CA,r e
B = CB,s se encontram em dois pontos.
Solução e/ou Sugestão: Escolhemos um lado H1 de ` e definimos funções hA : [−r, r] → R
e hB : [b − s, b + s] → R (com domı́nio deslocado de b = f (B), sendo f uma régua de ` tal que
f (A) = 0 e f (B) > 0), hA (x) = d(X, P ), sendo x = f (X), P ∈ A ∩ (H1 ∪ `) e P X ⊥ ` e
hB (y) = d(Y, Q), sendo y = f (Y ), Q ∈ B ∩ (H1 ∪ `) e QY ⊥ `, como no exercı́cio anterior. Como
0 < r, s < d(A, B) = b < r + s, temos b − s < r, ou seja, a função h(x) = hA (x) − hB (x) está definida
no intervalo [b − s, r]. Neste intervalo, hA é decrescente e hB é crescente (por quê?). Temos que
h(b − s) = hA (b − s) − hB (b − s) = hA (b − s) > 0 e que h(r) = hA (r) − hB (r) = −hB (r) < 0. Como
h é contı́nua (pois é diferença de duas funções contı́nuas) e muda de sinal, existe x ∈ [b − s, r], tal
que h(x) = 0. Se x = f (X), X ∈ `, então os pontos P ∈ A ∩ H1 e Q ∈ B ∩ H1 , tais que P X ⊥ ` e
QX ⊥ ` são tais que d(P, X) = d(Q, X). Portanto P = Q. O outro ponto de encontro de A e B é o
←→
ponto R ∈ P X tal que P − X − R e P X = XR (por quê?).

Observação: O exercı́cio anterior descreve uma propriedade importante do instrumento de


desenho que traça circunferências, que é o compasso. De certo modo, podemos dizer que uma
circunferência é uma curva contı́nua. Sua utilidade será explorada nos exercı́cios a seguir.

14. Primeiras Construções com Régua e Compasso: Um ponto im-


portante em geometria, principalmente em aplicações práticas, são construções com réguas não grad-
uadas e compassos. Alguns dos problemas mais famosos de tais tipos de construções são construções
de polı́gonos regulares (isto é, todos os lados são congruentes e todos os ângulos são congruentes).
Muitas das construções são válidas apenas na geometria analı́tica ou na geometria hiperbólica e out-
ras são impossı́veis. Por exemplo, na geometria analı́tica, o matemático francês E. Galois descobriu
um critério geral de construtibilidade, estudado em cursos sobre a Teoria de Galois (por exemplo,
Álgebra III do bacharelado). Vamos apenas descrever algumas construções possı́veis comuns a todas
as geometrias em que valem os postulados enunciados até agora (até LAL).

ATENÇÃO: Nesta seção, descrever as construções usando apenas uma régua não graduada e um
compasso. Por exemplo, para construir uma linha, contruir dois pontos dela. Descrever as construções
e mostrar que são corretas.

Exercı́cio 135: (Construção de Triângulos) Dados a, b, c ∈ R, a > 0, b > 0, c > b e


a < c < a + b, mostre que existe um triângulo 4ABC, tais que seus lados medem a, b e c. (Para
isto, seja ` uma linha, A, B ∈ ` dois pontos tais que d(A, B) = c e seja H1 um dos lados de `. Sejam
A = CA,b e B = CB,a as circunferências de centros A e B e raios b e a, respectivamente; etc.)

Exercı́cio 136: (Construção de Perpendiculares I) Dada uma linha ` e um ponto P ∈ `,


←→ ←→
construir com compasso e régua uma linha AP ⊥ `. (Para achar um ponto A tal que AP ⊥ `, seja
r ∈ R, r > 0, sejam B, C ∈ `, tais que B − P − C e B, C ∈ CP,r ; seja A ∈ CB,2r ∩ CC,2r ; por quê tal
←→
A existe e AP ⊥ `?)
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 30

Exercı́cio 137: (Construção de Perpendiculares II) Dada uma linha ` e um ponto P 6∈ `,


←→
construir com compasso e régua uma linha AP ⊥ `. (Escolha um ponto C ∈ ` e trace a circunferência
de centro P , contendo C, etc.)

Exercı́cio 138: Dado o segmento AB, construir com régua não graduada e compasso o ponto
médio de AB.

Exercı́cio 139: Dado o triângulo 4ABC, achar o ponto D tal que ABCD seja um quadrilátero
convexo com CD = AB e AD = BC.

Exercı́cio 140: Dado o ângulo ∠AOB, achar sua bissetriz.

Observação: Nos Elementos de Euclides, os instrumentos de desenho são uma régua não grad-
uada e um compasso que colapsa (se o tiramos do papel, perdemos sua abertura). Portanto só
podemos construir uma circunferência se conhecermos seu centro e um ponto dela. Com isto, não é
−−→
imediato construir um ponto B na semi-reta AP tal que AB seja congruente a um segmento CD
dado. Por isso, as três primeiras Proposições dos Elementos, descrevem como obter tal segmento. A
primeira descreve como obter um triângulo equilátero 4ABC, conhecendo seu lado AB; a segunda
descreve como obter um segmento AB, dado o ponto A e congruente ao segmento CD também
−−→
dado; por fim, a terceira descreve como construir AB ≡ CD, com B ∈ AP , sendo dados CD e
−−→
AP . Vamos descrever tais construções no exercı́cio seguinte.
−−→
Exercı́cio 141: São dados o segmento CD e a semi-reta AP . Construir um ponto E tal
que 4ACE seja equilátero (usando o exercı́cio acima). Com centro em C, traçar a circunferência
−−→
A = CC,r , sendo r = d(C, D). Seja G o ponto de encontro entre EC e A (por tal ponto quê existe
−−→
e é único?). Seja B = CE,s , sendo que s = d(E, G). Seja F ∈ EA ∩ B (por tal ponto quê existe e
−−→
é único?). Mostre que AF ≡ CD. Seja D = CA,t , sendo t = d(A, F ) e seja B ∈ AP ∩ D. Observe
que AB ≡ CD.

15. Geometria Absoluta: A teoria de geometria baseada nos postulados 1 a 7,


enunciados até agora é chamada de Geometria Absoluta ou Geometria Neutra. Estes postulados
ainda não são suficientes para caracterizar a geometria euclideana (ou analı́tica), pois vimos que
tanto na geometria euclideana, como na hiperbólica, valem os postulados 1 a 7. Veremos mais adiante
que o postulado das paralelas é o que falta para tal caracterização. Mas antes, vamos apresentar
a primeira formulação da geometria absoluta, feita por D. Hilbert em 1900, que é equivalente á
geometria métrica (com Pasch e LAL), apresentada nestas notas e que foi desenvolvida por G. D.
Birkhoff em 1933. São postulados:
(A) Postulados de Incidência:
Postulado I: Dados dois pontos distintos P e Q, existe uma única linha contendo P e Q.
Postulado II: Toda linha contém pelo menos dois pontos.
Postulado III: Existem pelo menos três pontos não colineares.

Observação: Nos exercı́cios desta seção, usar somente os postulados enunciados aqui.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 31

Exercı́cio 142: Mostre que existem pelo menos três linhas distintas não concorrentes (isto é,
existem `1 , `2 e `3 distintas e que não contêm um mesmo ponto P .)

Exercı́cio 143: Mostre que dado um ponto P , existem pelo menos duas linhas distintas contendo
P.

(B) Postulados de Ordem (ou ”Estar Entre”):


Postulado IV: Se A − B − C, então A, B e C são colineares e dois a dois distintos.
Postulado V: Se A − B − C, então C − B − A.
←→
Postulado VI: Dados B 6= D, existem A, C, E ∈ BD tais que A−B −D, B −C −D e B −D−E.
Postulado VII: Dados A, B, C ∈ `, pontos distintos, então exatamente uma das relações A −
B − C, ou A − C − B ou B − A − C é verdadeira.
Postulado VIII: (Pasch) Dados três pontos A, B e C não colineares, um ponto F e uma linha
←→
`, tais que F ∈ `, ` 6= AB e A − F − B, então existe um ponto G ∈ `, tal que ou A-G-C, ou B-G-C,
ou G = C. (Isto é, se a linha ` cruza o lado AB em F , então ` cruza um dos outros dois lados.)
Lembre-se que este postulado é equivalente ao postulado da separação do plano.

←→ −−→ −−→ −−→ −−→


Exercı́cio 144: Dados A e B distintos, mostre que AB = AB ∪ BA e que AB = AB ∩ BA .

Exercı́cio 145: Dados A − B − C e A − C − D, mostre que B − C − D e A − B − D.


←→ −−→ −−→
Exercı́cio 146: Dados B − A − C e P ∈ AB , mostre que ou P ∈ AB , ou P ∈ AC .

Exercı́cio 147: Dados A − B − C, mostre que AC = AB ∪ BC e que B é o único ponto comum


aos segmentos AB e BC.
−−→ −−→
Exercı́cio 148: Dados A − B − C, mostre que AC = AB e que B é o único ponto comum às
−−→ −−→
semi-retas BA e BC .

(C) Postulados de Congruência:


−−→
Postulado IX: Dados dois pontos distintos P e Q e uma semi-reta AB , existe um único ponto
−−→
C ∈ AB tal que AC ≡ P Q.
Postulado X: Dados A, B, C, D, E e F , temos AB ≡ AB e, se AB ≡ CD e AB ≡ EF , então
CD ≡ EF .
Postulado XI: Se A − B − C, P − Q − R, AB ≡ P Q e BC ≡ QR, então AC ≡ P R.
−−→ ←→
Postulado XII: Dados o ângulo ∠AOB, uma semi-reta P Q e um dos lados H1 de P Q , existe
−−→
uma única semi-reta P R tal que R ∈ H1 e ∠AOB ≡ ∠RP Q.
Postulado XIII: Dados os ângulos ∠ABC, ∠DEF e ∠GHI, temos ∠ABC ≡ ∠ABC e, se
∠ABC ≡ ∠DEF e ∠ABC ≡ ∠GHI, então ∠DEF ≡ ∠GHI.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 32

Postulado XIV: (LAL) Dados os triângulos 4ABC e 4DEF , se AB ≡ DE, AC ≡ DF e


∠BAC ≡ ∠EDF , então 4ABC ≡ 4DEF .

Exercı́cio 149: Dados A − B − C, P − Q − R, tais que AB ≡ P Q e AC ≡ P R, então BC ≡ QR.

Exercı́cio 150: Dados AB ≡ CD, mostre que dado P , A − P − B, então existe um único ponto
Q, tal que C − Q − D e AP ≡ CQ.

Exercı́cio 151: Mostre que cada linha tem infinitos pontos {An : n ∈ Z} tais que An−1 An ≡
An An+1 . (Comece com dois pontos A0 , A1 ∈ `, que existem pelo postulado II; obtenha A2 e A−1
em `, tais que A−1 − A0 − A1 e A0 − A1 − A2 , e A−1 A0 ≡ A0 A1 ≡ A1 A2 , usando o postulado IX e
o postulado VI, para a existência das semi-retas necessárias, etc.)

Exercı́cio 152: Mostre que suplementos de ângulos congruentes são congruentes. (Cuidado:
←→ ←→
aqui não temos medida de ângulos.) Para isto, sejam D − A − B, C 6∈ AB , H − E − F e G 6∈ EF ,
tais que ∠BAC ≡ ∠F EG. Mostre que ∠DAC ≡ ∠HEG. (Podemos escolher os pontos de modo
que AB ≡ EF , AC ≡ EG e AD ≡ EH; por LAL nos triângulos 4ABC, 4EF G, 4BCD, 4ACD
e 4EGH, obtenha o resultado.)

Exercı́cio 153: Mostre que ângulos opostos pelo vértice são congruentes. (Cuidado: aqui não
temos medida de ângulos; use o exercı́cio anterior.)

Exercı́cio 154: Mostre que existem ângulos retos (isto é, congruentes a seus suplementares.)
(Para isto, use a construção de perpendiculares, construindo um triângulo isósceles conveniente.)

Exercı́cio 155: Mostre que cada ângulo admite uma bissetriz, isto é, dado ∠AOB, existe
C ∈ int (∠AOB), tal que ∠AOC ≡ ∠BOC. (Cuidado: aqui não temos medida de ângulos.)

(D) Postulado de Continuidade:


Postulado XV: Dada uma linha `, suponha que X e Y são conjuntos não vazios de pontos de
`, tais que X ∩ Y = ∅, X ∪ Y = `, e para todos os pontos A, B, C ∈ `, se A − B − C e A, C ∈ X
então B ∈ X e se A − B − C e A, C ∈ Y , então B ∈ Y . Então, neste caso, existe um ponto O ∈ ` e
−−→ −−→ −−→ −−→
semi-retas OA e OB , tais que A − O − B, int (OA ) ⊂ X, int (OB ) ⊂ Y e O ∈ X ou O ∈ Y .

Exercı́cio 156: Mostre que para cada linha existe uma régua f : ` → R, tal que, se d(P, Q) =
|f (P ) − f (Q)|, então d(P, Q) = d(R, S) se, e somente se, P Q ≡ RS. (Problema muito difı́cil.)
Solução e/ou Sugestão: Pelo exercı́cio acima, conseguimos obter uma seqüência de pontos An ,
−−−−−→
tais que An−1 An ≡ An An+1 ; para tais pontos, definimos f (An ) = n. Para cada P ∈ `, P 6∈ A0 A−1
e k ∈ N, k > 1, definimos o ponto kP como sendo o ponto Pk , sendo que P0 = A0 , P1 = P , P2
é tal que P0 − P1 − P2 e P0 P1 ≡ P1 P2 , etc. Para definirmos f (P ), se para algum k ∈ N, k ≥ 1,
kP = An , então definimos f (P ) = n/k. No caso em que kP 6= An , para todo k e todo n, definimos
f (P ) = r = limj→∞ (nj /kj ), sendo que kj , nj → ∞ são tais que Anj − kj P − Anj +1 (por que tal
coisa converge?). Com isto, pelo postulado XV e pela propriedade do supremo de números reais,
−−−−→
definimos f uma bijeção entre A0 A1 e [0, ∞[⊂ R, etc.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 33

Exercı́cio 157: Mostre que existe uma medida de ângulos m tal que satisfaz o postulado do
transferidor. (Aqui também usamos a propriedade do supremo de números reais. Também é muito
difı́cil.)
Conclusão: A geometria absoluta e a geometria métrica com Pasch e LAL são equivalentes, ou
seja, podemos provar os mesmos teoremas nas duas geometrias.

16. Teoria das Paralelas: Já vimos que tanto na geometria euclideana como na
hiperbólica valem todos os postulados até agora enunciados (1 a 7, ou, I a XV). Também vimos
que na geometria hiperbólica, dada uma linha ` e um ponto P fora de `, existem mais de uma
paralela a ` passando por P . Isto mostra que esta propriedade não pode ser demonstrada a partir
dos postulados 1 a 7 (ou mesmo de I a XV). Este problema, que já preocupava os geômetras desde
a Antigüidade, só foi resolvido no séc. XIX, com os trabalhos de Gauss, Lobatchevski e Bolyai, com
a descoberta da geometria hiperbólica, em que não vale o postulado das paralelas. Vamos estudar
aqui vários resultados conectados com este problema.
Lembramos que duas linhas `1 e `2 são paralelas se não têm pontos em comum. Lembramos
também que os postulados 1 a 7 garantem a existência de paralelas. (Voltaremos a trabalhar com
geometrias métricas com Pasch e LAL.)
Relembramos também a definição de um quadrilátero de Saccheri, que é uma quadrilátero
s ABCD, tal que AB ≡ CD, e os ângulos ∠DAB e ∠ADC são retos (ver o exercı́cio 97, em que
também foi provado que ∠ABC ≡ ∠BCD).
Estes quadriláteros foram as figuras principais do estudo do paralelismo desenvolvido pelo jesuı́ta
italiano Gerolamo Saccheri (1667-1733) na tentativa de demonstrar o quinto postulado de Euclides.
a partir dos outros. Este postulado é enunciado na forma: dadas as linhas `1 , `2 e `3 , sejam
←→
A − B − C em `1 , D − E − F em `2 , B e E em `3 e A e D estão do mesmo lado de `3 = BE ,
se m(∠ABE) + m(∠DEB) < 180, então as linhas `1 e `2 se encontram num ponto P do mesmo
lado que A e D em relação à linha `3 . Muitos geômetras achavam que este enunciado era muito
complicado (ou seja, não “auto evidente”) para ser proposto como postulado e imaginavam ser
possı́vel demonstrá-lo a partir dos outros postulados de Euclides, ou seja, na linguagem de hoje, numa
geometria métrica com Pasch e LAL. Houve várias supostas demonstrações que sempre falhavam no
uso de alguma hipótese que na verdade era equivalente a este postulado. Em sua obra Euclides ab
omni naevo vindicatus (Euclides justificado de toda falha), publicada em Milão em 1733, Saccheri
também apresenta uma prova falha deste postulado. O que distingue esta obra é que existem muitos
resultados corretos e úteis no desenvolvimento posterior das chamadas geometrias não euclideanas
(principalmente a hiperbólica). A idéia de Saccheri era de supor que este postulado era falso e tentar
daı́ provar alguma contradição. Ele partiu de quadriláteros de Saccheri s ABCD, e considerou três
hipóteses, a saber, ∠ABC é reto (a hipótese do ângulo reto), ou ∠ABC é obtuso (a hipótese do
ângulo obtuso), ou ∠ABC é agudo (a hipótese do ângulo agudo). Ele então mostrou que a hipótese
do ângulo reto era equivalente ao quinto postulado; a do ângulo obtuso era contraditória, mas
do ângulo agudo teve muitas dificuldades para chegar a uma contradição. Estudiosos da obra de
Saccheri acham que no final de sua obra ele “provou” o quinto postulado (numa gritante falha de
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 34

argumentação, completamente fora da fineza dos argumentos anteriores), devido ao medo da censura
da Igreja.
Posteriormente, Johann Heinrich Lambert (1728-1777) também escreveu um trabalho sobre a
teoria das paralelas em que aprofundou mais os resultados de Saccheri, mas também tentando
provar o postulado por contradição. Por fim, os resultados de Nikolai I. Lobatchevskii (1793-1856)
e Johann Bolyai (1802-1860), publicados em torno de 1824, introduziram a geometria hiperbólica,
mostrando assim que o postulado das paralelas não pode ser provado a partir dos outros postulados
da geometria euclideana.
Vamos explorar os resultados de Saccheri (ele provou mais de trinta proposições e alguns corolários),
de Lambert, Bolyai e de Lobatchevskii, mas no nosso contexto moderno.
Lambert usou também um tipo de quadrilátero, chamado hoje de quadrilátero de Lambert,
l ABCD, tal que AD ⊥ AB, BC ⊥ AB e CD ⊥ AD. As três hipóteses acima referem-se ao
ângulo ∠BCD para os quadriláteros de Lambert.

Exercı́cio 158: Sejam `1 e `2 duas linha distintas, `1 6⊥ `2 , f : `1 → R uma régua, e h : R → R,


h(x) = d(P, Q), sendo que P ∈ `2 , Q ∈ `1 , P X ⊥ `1 e x = f (P ). Mostre que h é função contı́nua.

Exercı́cio 159: Mostre que se M é o ponto médio de AD e N o ponto médio de BC, então
ABCD é quadrilátero de Saccheri se, e somente se, AM N B é quadrilátero de Lambert.

Exercı́cio 160: Mostre que os quadriláteros de Saccheri e de Lambert são quadriláteros con-
vexos.
←→
Exercı́cio 161: Sejam M o ponto médio de BC, N 6∈ BC , tal que M N ⊥ BC, ` 3 N , M N ⊥ `,
A, D ∈ `, tais que AB ⊥ ` ⊥ DC. Mostre que ABCD é quadrilátero de Saccheri.

Exercı́cio 162: (Saccheri, Prop. I) Dado o quadrilátero ABCD, mostre que se AB ≡ CD e


∠BAD ≡ ∠ADC, então ∠ABC ≡ ∠BCD. (Use LAL nos triângulos 4ABD e 4DCA e, depois,
LLL nos triângulos 4ABC e 4BCD.)

Exercı́cio 163: (Saccheri, Prop. II) Dado o quadrilátero ABCD, tal que AB ≡ CD, ∠BAD ≡
∠ADC, se A − M − D e B − N − C, AM ≡ M D e BN ≡ N C, mostre que M N é perpendicular a
AD e a BC.

Exercı́cio 164: (Saccheri, Prop. III e IV) Dado o quadrilátero de Saccheri s ABCD (com
AB ≡ CD e os ângulos ∠DAB e ∠ADC são retos), seja α = m(∠ABC). Usando as desigualdades
geométricas convenientes, mostre que
(a) α < 90 se, e só se, BC > AD;
(b) α = 90 se, e só se, BC = AD;
(c) α > 90 se, e só se, BC < AD.

Exercı́cio 165: (Variante do anterior) Dado o quadrilátero de Lambert l ABCD, seja α =


m(∠BCD). Usando as desigualdades geométricas convenientes, mostre que
(a) α < 90 se, e só se, AB < CD;
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 35

(b) α = 90 se, e só se, AB = CD;


(c) α > 90 se, e só se, AB > CD.

Exercı́cio 166: (Saccheri, Prop. V, VI e VII) Sejam s ABCD um quadrilátero de Saccheri e


α = m(∠ABC). Mostre que, se valer uma das hipóteses, α < 90, ou α = 90, ou α > 90, então, para
todo quadrilátero de Saccheri s EF GH vale a mesma hipótese.
Solução e/ou Sugestão: Comece com a hipótese do ângulo reto. Seja s ABCD um quadrilátero
←→ ←→ ←→
de Saccheri tal que m(∠ABC) = 90. Sejam P ∈ BC e Q ∈ AD tais que P Q ⊥ AD . Se-
←→ ←→
jam P1 , P2 ∈ BC e Q1 , Q2 ∈ AD tais que P1 − C − P , CP1 ≡ CP , P2 − B − P , AP2 ≡ AP ,
←→
P1 Q1 ⊥ AD ⊥ P2 Q2 . Mostre que s QP Pi Qi (isto é, QP Pi Qi é de Saccheri), para i = 1, 2.
Mostre que estes quadriláteros também satisfazem a hipótese do ângulo reto. Finalmente, sejam
s ABCD que satisfaz a hipótese do ângulo reto e s EF GH um outro quadrilátero de Saccheri.
←→
Seja s E 0 F 0 G0 H 0 congruente a s EF GH, tal que E 0 H 0 ⊂ AD o ponto médio de E 0 H 0 coincide com
←→
o ponto médio de AD e F 0 , G0 do mesmo lado que B e C em relação a AD . Pode ser que E 0 = A, ou
←→
E 0 − A − D − H 0 , ou A − E 0 − H 0 − D, etc. Por exemplo, se E 0 − A − D − H 0 , sejam K ∈ H 0 G0 ∩ BC
←→
e L ∈ E 0 F 0 ∩ BC (por que existem tais pontos?). Pelo argumento acima, temos que s E 0 LKH 0
e que ∠K ≡ ∠L são retos. Depois, use o mesmo argumento com l M N G0 H 0 , sendo que M é o
ponto médio de E 0 H 0 e N o ponto médio de F 0 G0 . (Faça os outros casos.)
Para o caso da hipótese do ângulo agudo, sejam s ABCD tal que valha a hipótese α < 90, M
←→
o ponto médio de AD e N o ponto médio de BC. Pelo exercı́cio anterior, M N < CD. Se P ∈ BC ,
←→ ←→ ←→
P 6= N , seja Q ∈ AD tal que P Q ⊥ AD . Mostre que se P Q ≤ M N então existem R ∈ BC e
←→ ←→ ←→
S ∈ BC tais que R 6= M , S 6= N e BC ⊥ RS ⊥ AD . Conclua daı́ que s ABCD tem que satisfazer
a hipótese do ângulo reto. Portanto M N < P Q, etc.
Para o caso da hipótese do ângulo obtuso, faça o mesmo.

Exercı́cio 167: (Saccheri, Prop. VIII) Sejam s ABCD um quadrilátero de Saccheri, G−A−B,
H − A − C, α = m(∠ABC), β = m(∠DCA) e γ = m(∠GAH). Mostre que
(a) se α < 90, então β < γ;
(b) se α = 90, então β = γ;
(c) se α > 90, então β > γ.

Exercı́cio 168: (Saccheri, Prop. IX) Sejam s ABCD um quadrilátero de Saccheri, α =


m(∠ABC), β = m(∠DCA) e γ = m(∠DAC). Mostre que
(a) se α < 90, então β + γ < 90;
(b) se α = 90, então β + γ = 90;
(c) se α > 90, então β + γ > 90.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 36

←→
Exercı́cio 169: (Saccheri, Prop. X) Dados A − B − C e D fora de AB e tal que BD ⊥ AC,
mostre que DC > DA se, e só se, BC > BA.

Exercı́cio 170: (Saccheri, Prop. XIV) Mostre que que a hipótese do ângulo obtuso é contra-
ditória, mostrando que para todo s ABCD, AD ≤ BC. (Para isto, sejam A0 = A, B0 = B,
←→
A1 = D, B1 = C, An ∈ AD , n ≥ 2, tais que An−1 − An − An+1 e An An+1 ≡ AD, Bn , n ≥ 2,
←→ ←→
tais que Bn e B estão do mesmo lado de AD e AD ⊥ Bn An ≡ AB; mostre que d(A0 , An ) =
nd(A, D) ≤ 2 d(AB) + n d(BC), usando n vezes a desigualdade triangular; fazendo n → ∞ em
d(A, D) ≤ d(B, C) + (2/n)d(A, B), conclua que AD ≤ BC e portanto não pode valer a hipótese do
ângulo obtuso.)

Exercı́cio 171: (Teorema de Saccheri) Dado o 4ABC então mostre que m(∠A) + m(∠B) +
m(∠C) ≤ 180. (Suponha que BC é o maior lado do 4ABC; seja B −P −C, tal que AP ⊥ BC e seja
←→
Q do mesmo lado que A em relação a BC , tal que s P AQB; como P B ≤ AQ, ∠ABQ ≥ ∠BAP ;
portanto m(∠A) + m(∠B) + m(∠Q) ≤ 180, etc.)

Dado um triângulo 4ABC, dizemos que o número real δ(4ABC) = 180 − m(∠A) − m(∠B) −
m(∠C) é a deficiência de 4ABC; dado um quadrilátero convexo ABCD, dizemos que o número
real δ(4ABC) = 360 − m(∠A) − m(∠B) − m(∠C) − m(∠D) é a deficiência de ABCD

Exercı́cio 172: Dados 4ABC e B − D − C, mostre que δ(4ABC) = δ(4ABD) + δ(4ACD).


(Calcule cada termo e use que ∠ADB e ∠ADC são suplementares.)

Exercı́cio 173: Dados ABCD convexo e C − E − D, mostre que δ(ABCD) = δ(4BCE) +


δ(ABED). (Parecido com o anterior.)

Exercı́cio 174: Dado ABCD convexo, mostre que δ(ABCD) = δ(4ABD) + δ(4BCD).

Exercı́cio 175: (Saccheri, Prop. XV) Mostre que


(a) se existe um triângulo 4ABC tal que δ(4ABC) > 0, então para todo triângulo 4DEF ,
vale δ(4DEF ) > 0;
(b) se existe um triângulo 4ABC tal que δ(4ABC) = 0, então para todo triângulo 4DEF ,
vale δ(4DEF ) = 0.
Solução e/ou Sugestão: Suponhamos que o maior lado de 4ABC seja BC. Seja D tal que
←→
B − D − C e AD ⊥ BC. Sejam G e H do mesmo lado que A em relação a BC e tais que s BGAD
e s CHAD. Agora é só aplicar a Prop. IX de Saccheri (ver acima).

Exercı́cio 176: (Saccheri, Prop. XVIII) Seja C fora do segmento AB, mas na circunferência C
tal que AB seja um diâmetro. Então
(a) ∠ACB é reto se, e somente se, valer a hipótese do ângulo reto;
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 37

(b) ∠ACB é agudo se, e somente se, valer a hipótese do ângulo agudo.
Solução e/ou Sugestão: Seja M o ponto médio de AB e r = d(A, M ). Então C é a cir-
cunferência CM,r . Os triângulos 4M AC e 4M BC são isósceles (por quê?); ∠M AC ≡ ∠M CA
e ∠M BC ≡ ∠M CB. Temos que δ(4ABC) = δ(4M AC) + δ(4M BC). Como m(∠ACB) =
m(∠M CA) + m(∠M CB), temos que m(∠ACB) = 90 − δ(4ABC)/2. O resto segue da Prop. XV
de Saccheri.

Exercı́cio 177: (Saccheri, Prop. XIX e XX) Dado 4ABC, com ∠C reto, seja M o ponto médio
←→ ←→
de AB, N ∈ AC tal que M N ⊥ AC e L ∈M N tal que BL ⊥M N . Mostre que
(a) a hipótese do ângulo agudo implica que AC < 2 AN e BC > 2 M N ;
(b) a hipótese do ângulo reto implica que AC = 2 AN e BC = 2 M N .
Solução e/ou Sugestão: Observe que l N LBC e (por LAAo) 4AN M ≡ 4BLM . Portanto
LN = 2 M N . A Prop. XIV de Saccheri implica que AC ≤ 2 AN e BC ≥ 2 M N (por quê?) e os
itens (a) e (b) seguem disto. (Faça os detalhes.)

−−→
Exercı́cio 178: (Saccheri, Prop. XXI) Dados r > 0 e ∠AOB, mostre que existe C ∈ OA tal
←→ −−→
que d(C, OB ) > r. (Para isto, tome An ∈ OA tais que A0 = A, An−1 −An −An+1 e An An+1 ≡ OA,
←→ ←→
Bn ∈ OB tais que An Bn ⊥ OB ; use o exercı́cio anterior para escolher algum dos An para ser o ponto
C.)

Exercı́cio 179: Mostre que, com a hipótese do ângulo agudo, se ` e `0 são linhas distintas e
que têm uma perpendicular comum, então dado um número real r > 0, existe P ∈ `0 , tal que
d(P, `0 ) ≥ r. (Sejam M ∈ `, N ∈ `0 tais que ` ⊥ M N ⊥ `0 ; sejam R ∈ `0 e S ∈ ` tais que R 6= N e
RS ⊥ `; seja `00 ⊥ `0 tal que R ∈ `00 ; use o exercı́cio anterior para provar que existe P ∈ `0 , tal que
d(P, `) ≥ d(P, `00 ) > r.)

Exercı́cio 180: (Saccheri, Prop. XXXI) Mostre que dados o número real r > 0, a linha ` e
A 6∈ `, existe `0 contendo A e com perpendicular comum com `, tal que d(`, `0 ) ≤ r, sendo que
d(`, `0 ) = d(M, N ), para M ∈ `, N ∈ `0 tais que ` ⊥ M N ⊥ `0 . (Construa `00 tendo perpendicular
comum com ` e tal que d(`, `00 ) ≤ r; ache A0 ∈ `00 tal que d(A0 , `) = d(A, `), usando o exercı́cio anterior
(como?); construa a figura conveniente e congruente à construı́da para terminar o exercı́cio.)

Exercı́cio 181: (Saccheri, Prop. XXIX, XXXII) Com a hipótese do ângulo agudo, mostre que
dados `, A 6∈ ` e B ∈ `, com AB ⊥ `, existe α ∈ ]0, 90[ tal que para todo ponto D 6= A
←→
(a) se 0 < m(∠DAB) < α, AD intersecta `;
←→
(b) se m(∠DAB) = α, AD e ` não se intersectam e não têm perpendicular comum;
←→
(c) se α < m(∠DAB) ≤ 90, AD e ` não se intersectam e têm perpendicular comum.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 38

←→
Solução e/ou Sugestão: Seja α = inf {β ≤ 90 : m(∠DAB) = β, AD e ` têm perpendicular
comum}. Tal α existe, pois o conjunto do lado direito da igualdade é limitado inferiormente e não
vazio.
Observe que se D ∈ ` e m(∠DAB) = β1 , então se D0 ∈ ` e D0 − D − B, então m(∠D0 AB) > β1 ,
←→
portanto se m(∠DAB) = α, AD não intersecta ` (por quê?).
←→ ←→
Se m(∠DAB) = β2 < 90 e AD0 e ` têm perpendicular comum, sejam R ∈ ` e S ∈AD0 , tais
←→
que s RSAB. Note que m(∠SAB) = β2 . Sejam T ∈ ` e U ∈AD0 tais que T − R − B e T U ⊥ `.
Então T U > AB (por quê?). Seja V ∈ T U tal que T V ≡ AB. Então s T V AB e m(∠V AB) < β2 .
←→
Portanto, se m(∠DAB) = α, AD e ` não têm perpendicular comum.
Portanto, valem (a), (b) e (c) (por quê?).

Exercı́cio 182: (Saccheri, Prop. XXV) Mostre que no caso (b) do exercı́cio anterior, dado
←→ ←→
o número real r > 0, existe P ∈ AD tal que d(P, `) < r. (Ache uma linha `0 =AD0 , tal que
←→
α < m(∠D0 AB) < 90 e d(`0 , `) ≤ r e ache P ∈ AD tal que d(P, `) < d(`0 , `).)

Observação: Tal número α é chamado de ângulo de paralelismo da linha ` e do ponto


←→
A. Pelo que foi exposto, podemos concluir que α só depende de d(A, `). As linhas AD tais que
m(∠DAB) = α são chamadas de paralelas assintóticas a ` (pois elas “tendem a `”) e as linhas
←→
AD tais que 90 ≥ m(∠DAB) > α são chamadas de hiperparalelas a `.
Os trabalhos de Lambert, Lobatchevskii e Bolyai complementam estes resultados com o dos
exercı́cios seguintes.

Exercı́cio 183: Supondo a hipótese do ângulo agudo, mostre que, dados A − B − D, A − C − E,


tais que AD = 2 AB, CB ⊥ AD e ED ⊥ AD, então vale δ(4ADE) > 2 δ(4ABC).

Exercı́cio 184: Supondo a hipótese do ângulo agudo, mostre que, dado ∠AOB agudo, existe
−−→ −−→
` ⊥ OA tal que ` não intersecta OB . (Suponha que não ocorra; construa uma seqüência de
triângulos 4An Bn Cn , tais que δ(4An+1 Bn+1 Cn+1 ) > 2 δ(4An Bn Cn ) e chegue numa contradição.)

Exercı́cio 185: Supondo a hipótese do ângulo agudo, mostre que, dado 0 < α < 90, existem
` e A 6∈ ` tais que α é o ângulo de paralelismo de ` e A. (Comece com ∠AOB medindo α, use
−−→ −−→ −−→
o exercı́cio anterior para obter `1 ⊥ OA com `1 ∩ OB = ∅; seja d0 = inf {d(A, `0 ) : `0 ⊥ AO e
−−→ −−→
`0 ∩ OB = ∅}; mostre que se ` é tal que ` ⊥ AO e d(A, `) = d0 , então α é o ângulo de paralelismo
de ` e A.)

Exercı́cio 186: (A função crı́tica de Lobatchevskii) Seja Π : ]0, ∞[→ R a função Π(d) = α,
sendo que existem ` e A tais que d(A, `) = d e α é o ângulo de paralelismo de ` e A. Mostre que
(a) se existe d > 0 tal que Π(d) = 90, então Π é constante (igual a 90);
(b) supondo a hipótese do ângulo agudo, mostre que Π é estritamente decrescente e sua im-
agem é o intervalo ]0, 90[ (e, portanto, Π é uma função contı́nua, chamada de função crı́tica de
Lobatchevskii).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 39

Exercı́cio 187: Na geometria hiperbólica, quais as relações de paralelismo assintótico ou hiper-


paralelismo entre `1 , `2 , `0,1 e `−1,2 ?

17. Formas equivalentes do postulado das paralelas:


Vamos provar várias formas equivalentes do chamado postulado das paralelas. É possı́vel mostrar
que toda proposição que pode ser provada com este postulado, mas não sem ele, na verdade é
equivalente a este postulado. Por exemplo, toda a teoria de semelhança de triângulos depende deste
postulado e, portanto, todas as proposições desta teoria serão equivalentes ao postulado.

Exercı́cio 188: Mostre que são equivalentes


(a) (O Postulado de Euclides) Dados A, B ∈ `1 , C, D ∈ `2 e B, C ∈ `3 , tais que A e D estão
do mesmo lado de `3 e m(∠ABC) + m(∠DCB) < 180, então `1 e `2 se encontram num ponto P no
mesmo lado que A em relação a `3 .
←→
(b) (Euclides, Elementos, Livro I, Prop. 29) Se A e D são pontos do mesmo lado de BC e
←→ ←→
AB é paralela a CD , então m(∠ABC) + m(∠DCB) = 180.
(c) (Euclides, Elementos, Livro I, Prop. 30) Para todas as linhas `1 , `2 e `3 , se `1 é paralela
a `2 e `2 é paralela a `3 , então `1 é paralela a, ou coincide com, `3 .
(d) (Euclides, Elementos, Livro I, Prop. 31: O Postulado de Playfair) Dada uma linha
` e um ponto P 6∈ `, existe uma única `0 3 P paralela a `.
(e) Existem uma linha ` e um ponto P 6∈ `, tal que existe uma única `0 3 P paralela a `.
(f ) (Euclides, Elementos, Livro I, Prop. 32) Para todo 4ABC vale m(∠A) + m(∠B) +
m(∠C) = 180.
(g) Existe um 4ABC tal que vale m(∠A) + m(∠B) + m(∠C) = 180.
(h) Todo quadrilátero de Saccheri é um retângulo (isto é, todos seus ângulos internos são
retos).
(i) Existe um retângulo.
(j) Todo quadrilátero de Lambert é um retângulo.
(k) Para todo quadrilátero convexo ABCD, vale m(∠A) + m(∠B) + m(∠C) + m(∠D) = 360.
(l) Existe um quadrilátero convexo ABCD, tal que m(∠A)+m(∠B)+m(∠C)+m(∠D) = 360.
(m) (Teorema de Tales) Se C 6∈ AB mas C está na circunferência de diâmetro AB, então
∠ACB é reto.
(n) Se ∠ACB é reto, então C está na circunferência de diâmetro AB.
(o) Existem A, B 6= A e C 6∈ AB tais que ∠ACB é reto e C está na circunferência de diâmetro
AB.
(p) Se C 6∈ AB mas A, B e C estão numa circunferência de centro O e O e C estão do mesmo
←→
lado em relação a AB , então m(∠AOB) = 2 m(∠ACB).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 40

Solução e/ou Sugestão: As equivalências entre (f), (g), (h), (i), (j), (k), (l) e (m) e (n) já
foram provadas anteriormente (onde?) e as implicações (d) ⇒ (e), (k) ⇒ (l), (m) ⇔ (n) ⇒ (o) são
fáceis (verifique).
←→ ←→ ←→
(a) ⇒ (b): se A e D são pontos do mesmo lado de BC e AB é paralela a CD , por (a),
m(∠ABC)+m(∠DCB) ≥ 180. Mas se m(∠ABC)+m(∠DCB) > 180 seus suplementares satisfazem
←→ ←→
a hipótese de (a) e, portanto AB não pode ser paralela a CD . Portanto m(∠ABC) + m(∠DCB) =
180.
(b) ⇒ (c): suponhamos que `1 , `2 e `3 sejam três linhas distintas, tais que `1 é paralela a `2
e `2 é paralela a `3 . Sejam B ∈ `1 , C ∈ `2 e E ∈ `3 distintos e colineares (por que existem tais
pontos?). Então ou B − C − E, ou B − E − C, ou C − B − E. Trataremos apenas o caso em
que B − C − E, sendo os outros análogos. Sejam A ∈ `1 , D ∈ `2 e F ∈ `3 do mesmo lado em
←→
relação a BC . Por (b), m(∠ABC) + m(∠DCB) = 180 e m(∠DCE) + m(∠F EC) = 180, e como
m(∠DCB) + m(∠DCE) = 180, m(∠ABC) + m(∠F EC) = 180, ou seja, `1 é paralela a `3 (por
quê?).
(c) ⇒ (d): sabemos que, dada uma linha ` e um ponto P 6∈ `, existe pelo menos uma `0 3 P
paralela a `, por exemplo, se Q ∈ ` é tal que P Q ⊥ `, podemos tomar `0 ⊥ P Q e P ∈ `0 . Neste
caso, se `00 3 P não é perpendicular a P Q, então, por (c), `00 não pode ser paralela a ` (por quê?).
Portanto `0 é a única paralela a ` e contendo P .
←→
(d) ⇒ (a): Sejam A e D pontos do mesmo lado de BC , e suponha que m(∠ABC)+m(∠DCB) <
←→ ←→
180. Por (d), AB e CD não podem ser paralelas (por quê?) e portanto se encontram no mesmo
←→
lado de BC em que ocorrem estes angulos alternos internos (por quê?).
(e) ⇒ (i): sejam ` e P 6∈ `, tal que existe uma única `0 3 P paralela a ` e seja Q ∈ ` tal que
←→
P Q ⊥ `. Seja R ∈ `, R 6= Q e seja S tal que s QP SR. Então P S é paralela a ` e por (e), s QP SR
é um retângulo (por quê?).
(h) ⇒ (d): parecido com o caso (e) ⇒ (i). (Faça.)
(o) ⇒ (g): Se O é o ponto médio de AB, compare os ângulos de 4OAC, 4OBC e 4ABC.
(f) ⇒ (p) ⇒ (g): compare os ângulos de 4ACB e 4AOB.

Exercı́cio 189: (Semelhança de triângulos) Dois triângulos 4ABC e 4DEF , tais que
∠A ≡ ∠D, ∠B ≡ ∠E e ∠C ≡ ∠F são ditos semelhantes, em sı́mbolos, 4ABC ∼ 4DEF .
Mostre que 4ABC ∼ 4DEF se, e somente se, AB/DE = AC/DF = BC/EF .
Solução e/ou Sugestão: Temos que 4ABC ≡ 4DEF se, e somente se, AB/DE = AC/DF =
BC/EF = 1.
Se 4ABC 6≡ 4DEF e 4ABC ∼ 4DEF , construindo cópia congruente de 4DEF , podemos
−−→ −−→
supor que A = D, E ∈ AB e F ∈ AC , são tais que 4ABC ∼ 4ADE, mas 4ABC 6≡ 4ADE.
Então BCF E é convexo e a soma de seus ângulos é 360 (por quê?). Ou seja, (a) implica o exercı́cio
189 (l), que é equivalente ao exercı́cio 189 (k).
Suponha que 4ABC ∼ 4DEF e que AB/DE = r ∈ Q, r 6= 1. Vamos mostrar que AB/DE =
−−→
AC/DF = BC/EF = r. Escreva r = m/n, e sejam A0 = A, C0 = A, Ak+1 ∈ AB , tal que
−−→
Ak−1 − Ak − Ak+1 e d(Ak , Ak+1 ) = (1/n)d(A, B), Ck+1 ∈ AC , tal que ∠AAk Ck ≡ ∠ABC (por que
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 41

existem tais pontos?). Então 4Ai Ai+1 Ci+1 ∼ 4ABC (por quê?). Por indução em n, mostre que
Ak A/A1 A = Ck A/C1 A = k.
Suponha que 4ABC ∼ 4DEF e que AB/DE = r 6∈ Q. Aproxime r por rn ∈ Q e use a parte
acima.

Exercı́cio 190: Mostre que os seguintes enunciados também são equivalentes ao postulado das
paralelas:
(a) Existem dois triângulos 4ABC e 4DEF semelhantes e não congruentes.
(b) Para todo par de triângulos 4ABC e 4DEF , ∠A ≡ ∠D, ∠B ≡ ∠E se, e somente se,
AB/DE = AC/DF = BC/EF .
(c) Para todo par de triângulos 4ABC e 4DEF , se ∠A ≡ ∠D, ∠B ≡ ∠E, então ∠C ≡ ∠F .
−−→ −−→ −−→
(d) (Homotetia) Dados 4ABC, um ponto O e r > 0, sejam D ∈ OA , E ∈ OB e F ∈ OC
tais que OD = r OA, OE = r OB e OF = r OC. Então AB/DE = AC/DF = BC/EF .
Solução e/ou Sugestão: Suponha (a) e sejam 4ABC e 4DEF triângulos semelhantes e não
−−→
congruentes. Construindo cópia congruente de 4DEF , podemos supor que A = D, E ∈ AB e
−−→
F ∈ AC , são tais que 4ABC ∼ 4ADE, mas 4ABC 6≡ 4ADE. Então BCF E é convexo e a
soma de seus ângulos é 360 (por quê?). Ou seja, (a) implica o exercı́cio 189 (l).
(c) ⇒ (a): dado 4ABC, seja D um ponto tal que A − D − B, e seja E ∈ AC, tal que ∠ADE ≡
∠ABC (por que existe tal ponto?). Por (c), 4ABC ∼ 4ADE, mas 4ABC 6≡ 4ADE.
Pelo exercı́cio anterior, (b) ⇔ (c) ⇔ (d) são simples (faça).

Exercı́cio 191: Mostre que os seguintes enunciados também são equivalentes ao postulado das
paralelas:
(a) Se `1 ⊥ `2 , `2 ⊥ `3 e `3 ⊥ `4 , então `1 ∩ `4 contém pelo menos um ponto.
−−→ −−→
(b) Se ∠AOB é agudo e O 6∈ ` ⊥ OA , então ` intersecta OB .
(c) Se `1 e `2 são concorrentes e distintas e se `3 ⊥ `1 e `4 ⊥ `2 , então `3 e `4 são concorrentes.
(d) Existe um ângulo ∠AOB agudo, tal que, para todo P ∈ int (∠AOB), existe linha ` 3 P que
intersecta ambos os lados do ângulo, mas não o vértice.
(e) Para todo 4ABC, as suas mediatrizes são concorrentes.
(f ) Todo triangulo pode ser inscrito numa circunferência.
(g) Para todo 4ABC, as suas alturas são concorrentes (no ponto chamado de ortocentro de
4ABC.
Solução e/ou Sugestão: Primeiro provaremos que o Teorema de Tales (exercı́cio 189 (m))
−−−→
implica (a). Sejam `1 ⊥ `2 , `2 ⊥ `3 , `3 ⊥ `4 , A ∈ `2 ∩ `3 , M ∈ `1 ∩ `2 , N ∈ `3 ∩ `4 , B ∈ AM ,
−−→
A − M − B e AM = M B, C ∈ AN , A − N − C e AN = N C. Então 4ABC é retângulo em ∠A.
Pelo Teorema de Tales, A está na circunferência de diâmetro BC. Se O ∈ BC é o ponto médio,
este também é o centro da tal circunferência. Considerando os triângulos 4OAB e 4OAC, que são
isósceles, `1 e `4 encontram-se em O (por quê?).
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 42

−−→
(a) ⇒ (b): Suponha que não vale (b), ou seja, existe um ângulo ∠AOB agudo e O 6∈ ` ⊥ OA ,
−−→
tal que ` não intersecta OB . Podemos supor que A ∈ `. Sejam C − O − A, CO = OA, e D do
←→ ←→ −−→
mesmo lado que B em relação a OA . Seja `0 ⊥ OA e C ∈ `0 . Então `0 não encontra OD (por
quê?). Se G ∈ ` e H ∈ `0 são tais que s AGHC, então vale a hipótese do ângulo agudo (por quê?).
Usando o exercı́cio 186, podemos então encolher um ângulo ∠A0 O0 B 0 , tal que m(∠A0 O0 B 0 ) ≤ 45 e
−−−→ −−−→
tal que existe `00 ⊥ O0 A0 que não encontra O0 B 0 . Usando o exercı́cio 185, podemos concluir que
não vale (a).
(b) ⇒ (a): Suponha que não vale (a). Sejam `1 ⊥ `2 , `2 ⊥ `3 e `3 ⊥ `4 , mas `1 ∩ `4 = ∅.
Podemos supor que se A ∈ `1 ∩ `2 , B ∈ `2 ∩ `3 e C ∈ `3 ∩ `4 , então AB ≡ BC (por quê?). Portanto,
−−→
se D ∈ int (∠ABC) e m(∠ABD) = 45, então `3 ∩ BD = ∅ (por quê?), e portanto não vale (b).
(b) ⇒ (c): podemos supor que A ∈ `1 ∩ `2 e que A não esteja nem em `3 e nem em `4 . Sejam
B ∈ `1 ∩ `3 e C ∈ `2 ∩ `4 . Se m(∠BAC) = 90 então (a) implica (c). Se m(∠BAC) > 90 tanto `3
como `4 encontram a bissetriz de ∠BAC, por (b). Conclua que `3 ∩ `4 6= ∅. Se m(∠BAC) < 90, por
−−→
(b), `3 encontra AC , formando um ângulo agudo. Portanto deve encontrar `4 . (Faça os detalhes.)
(d) ⇒ (b): Se não valesse (b), como acima exposto, valeria a hipótese do ângulo agudo, portanto,
dado ∠AOB agudo, existe ` tal que α = m(∠AOB)/2 é o ângulo de paralelismo de ` e O. Isto
−−→ −−→
implica que se `0 3 O e `0 ∩ OA 6= ∅, então `0 ∩ OB = ∅ (por quê?).
(b) ⇒ (d), (c) ⇔ (e) ⇔ (f) e (c) ⇔ (g) são simples (faça).

Exercı́cio 192: Mostre que os seguintes enunciados também são equivalentes ao postulado das
paralelas:
(a) (Teorema de Pitágoras) Dado 4ABC, com ∠A reto, temos AB 2 + AC 2 = BC 2 .
(b) (Lei dos Cossenos) (Dado ∠AOB, se for reto, definimos cos(∠AOB) = 0, se for agudo,
fazemos a construção 4P OR, com d(O, R) = 1 e P R ⊥ OR e definimos cos(∠AOB) = d(O, P ); se
∠AOB for obtuso, definimos cos(∠AOB) = − cos(∠BOC), sendo ∠BOC o suplementar de ∠AOB.)
A Lei dos Cossenos diz: dado 4ABC, temos AB 2 − 2 AB AC cos(∠BAC) + AC 2 = BC 2 .
(c) Dado 4ABC, com ∠A reto, seja D ∈ BC, tal que AD ⊥ BC, então AD2 = BD · DC.
(d) (Euclides, Prop. I-48) Dado 4ABC, se AB 2 + AC 2 = BC 2 , então ∠A é reto.
Solução e/ou Sugestão: (b) ⇒ (a) ⇔ (c) é simples. (Faça.)
(a) implica um caso da recı́proca do Teorema de Tales (exercı́cio 189 (o)). Sejam B − D − C,
BD ≡ BC, seja A fora de BC e tal que AD ⊥ BC e ∠BAC seja reto (por que existe tal ponto?).
Então 4ABC é isósceles (prove que AB ≡ AC) e retângulo em ∠A. Por (a), 2 AB 2 = AB 2 +AC 2 =
BC 2 = 4 BD2 . No 4ADB, que é retângulo em ∠D, por (a), AB 2 = AD2 + BD2 , donde segue que
AD ≡ BD, ou seja, A está na circunferência de diâmetro BC.
(a) ⇒ (b): Das equivalências do exercı́cio 190, concluı́mos que se 4ABC tem ∠A reto, então
cos(∠B) = AB/BC. Vamos mostrar que isto implica (b). Para isto, dado 4ABC, qualquer, com
←→ ←→
∠A agudo; seja D ∈ AC tal que BD ⊥ AC . Usando (a) nos triângulos convenientes, obtemos (b).
(a) ⇒ (d): Seja D tal que ∠CAD é reto e AD ≡ AB. Por (a), AB 2 + AD2 = BD2 , ou seja
BD ≡ BC. Por LLL, 4ABC ≡ 4ADC e, portanto ∠BAC é reto.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 43


(d) ⇒ (a): Dado 4ABC, com ∠A reto. Seja d = AB 2 + AC 2 . Então d < AB +AC e, portanto
existe um triângulo 4DEF tal que DE = AB, DF = AC e d = d(E, F ). Por (d), D é reto. Por
LAL, 4ABC ≡ 4DEF . Portanto AB 2 + AC 2 = BC 2 .
Para terminar as equivalências, mostre que o exercı́cio 191 (b) implica (d).

18. Mais construções com régua e compasso:


A partir de agora assumimos o postulado das paralelas.
Postulado 8: Dada uma linha ` e um ponto A fora de `, existe uma única linha `0 3 A paralela
a `.
Com isto, valem todas as proposições equivalentes a este postulado, citados na seção anterior.
Dado um segmento OE de tamanho 1, dizemos que um ponto A é construtı́vel (com régua e
compasso) se o segmento OA for obtido de OE com um número finito de operações de intersecção
de linhas e/ou circunferências determinadas por pontos construtı́veis. (Uma circunferência é deter-
minada por seu centro e por um ponto dela.) Um ângulo ∠AOB é construtı́vel se O é construtı́vel
e existem pontos construtı́veis C e D tais que ∠AOB = ∠COD.
Na geometria analı́tica, dizemos que o ponto A = (a, b) é construtı́vel se for construtı́vel a partir
de OE, sendo que O = (0, 0) e E = (1, 0).
Vamos estudar primeiramente uma caracterização algébrica de construções com régua e compasso
e depois veremos algumas construções tiradas dos Elementos de Euclides.

Exercı́cio 193: Mostre que na geometria analı́tica, o ponto (0, 1) é construtı́vel.

Exercı́cio 194: Mostre que na geometria analı́tica, o ponto A = (a, b) é construtı́vel se, e
somente se, o ponto (b, a) é construtı́vel.

Exercı́cio 195: Mostre que na geometria analı́tica, o ponto A = (a, b) é construtı́vel se, e
somente se, os pontos (a, 0) e (b, 0) são construtı́veis.

Exercı́cio 196: Mostre que na geometria analı́tica o ângulo ∠AOB é construtı́vel se, e so-
mente se, o ponto (cos α, sen α) é construtı́vel, sendo α = π m(∠AOB)/180 (medida de ∠AOB em
radianos).

Podemos reduzir o problema de determinar o que é construtı́vel na geometria analı́tica simples-


mente dizendo quais elementos de R podem ser coordenadas de pontos construtı́veis.
Dizemos que x ∈ R é construtı́vel se for coordenada de um ponto construtı́vel.
Um subconjunto K ⊂ R é um corpo se 1 ∈ K e, para todo a, b ∈ K, a ± b ∈ K, ab ∈ K e se
a 6= 0, 1/a ∈ K. Por exemplo, Q é um corpo e se K ⊂ R é corpo, então Q ⊆ K (verifique isto). Um
polinômio p(x) com coeficientes num corpo K é irredutı́vel (sobre K) se não puder ser fatorado
como produto de dois polinômios não constantes e com coeficientes em K. Dados um corpo K e
um polinômio p(x) = xn + a1 xn−1 + . . . + an irredutı́vel sobre K, suponha que α ∈ R é uma raiz de
p(x). Definimos K(α) como o conjunto de todos os números da forma b1 αn−1 + b2 αn−2 + . . . + bn ,
com bi ∈ K.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 44

Exercı́cio 197: Dados um corpo K e um polinômio p(x) = xn + a1 xn−1 + . . . + an irredutı́vel


sobre K e α ∈ R, uma raiz de p(x), mostre que K(α) é um corpo.

Exercı́cio 198: Dados um corpo K e um polinômio p(x) = xn + a1 xn−1 + . . . + an irredutı́vel


sobre K e α ∈ R, uma raiz de p(x), mostre que se b1 αn−1 + b2 αn−2 + . . . + bn = 0 para bi ∈ K, então
todos os bi = 0. (Neste caso, dizemos que os números 1 = α0 , α, α2 , . . . , αn−1 são linearmente
independentes sobre K.)

Dados corpos K ⊂ L ⊆ R, se existem Pn α1 , . . . , αn ∈ L linearmente independentes sobre K e tais


que todo elemento de L é da forma i=1 ai αi , com ai ∈ K, então chamamos o conjunto {α1 , . . . , αn }
de base de L sobre K e o número n de dimensão de L sobre K e é denotado por [L : K] = n. Se
L1 = K(α1 ), . . . , Ln = Ln−1 (αn ), então denotamos Ln = K(α1 , . . . , αn ).

Exercı́cio 199: Mostre que se L tem base sobre K com n elementos, então toda base de L sobre
K tem n elementos.

Exercı́cio 200: Mostre que se L tem base sobre K com n elementos e F tem base sobre L com
m elementos, então F tem base sobre K com mn elementos. (Tome o produto dos elementos das
duas bases, dois a dois.) Ou seja, [F : K] = [F : L][L : K].

Exercı́cio 201: Mostre que se a, b ∈ R são construtı́veis, então a + b, a − b, ab e a/b (se b 6= 0)


são construtı́veis.

Exercı́cio 202: Mostre que se a > 1 é construtı́vel então a é construtı́vel. (Para isto, construa
um triângulo retângulo com hipotenusa medindo (a + 1)/2 e um cateto medindo (a − 1)/2.)

Exercı́cio 203: Mostre que se 0 < a < 1 é construtı́vel então a é construtı́vel.

Exercı́cio 204: Mostre que se a ∈ Q, então a é construtı́vel.

Exercı́cio 205: Mostre que K = {x ∈ R : x é construtı́vel} é corpo.


Exercı́cio 206: Mostre que a ∈ K se, e somente se, existem a1 ∈ Q, a1 > 0, ai+1 ∈ Q( a1 ),
√ √
ai+1 > 0, 0 < i < n, e a = an . Portanto, neste caso, tomando o menor n possı́vel, [Q( a1 , . . . , an ) :
Q] = 2n .
Solução e/ou Sugestão: Suponha que a ∈ R seja construtı́vel e que a 6∈ Q. Mostre que existe
a seqüência a0 , . . . , an acima usando intersecções de circunferências e linhas, etc, o que significa
que temos que resolver equações de segundo grau. Os coeficientes destas equações dependem das
equações das retas e circunferências envolvidas.
A recı́proca é simples. (Faça.)

Exercı́cio 207: Mostre que se o polinômio p(x) = x3 + a x2 + b x + c com coeficientes racionais


não tem raiz racional, então suas raı́zes não são construtı́veis. (Para isto, mostre que se α é uma
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 45

raiz de p(x), então [Q(α) : Q] = 3; se fosse construtı́vel, estaria em algum corpo L tal que [L : Q]
seria uma potência de 2; etc.) Mostre que um ângulo de 20 graus não é construtı́vel.

Agora vamos estudar algumas construções com régua e compasso que valem na geometria eu-
clideana (e só nela), como expostos nos Elementos de Euclides, nos Livros III e IV. Para isto,
começamos com algumas propriedades de circunferências (dos Livros II e III).
Observação: Todas as construções no resto desta seção são com régua não graduada e compasso.
Lembramos que um polı́gono regular é um polı́gono convexo com todos os lados congruentes e
todos os ângulos congruentes.

Exercı́cio 208: Dado o segmento AB, determine (com régua e compasso) C ∈ AB, tal que
AC 2= AB · CB. (Para isto, construa um segmento AD ⊥ AB, tal que AB = 2 AD, e E, tal que
D − A − E, e DE ≡ BD; seja A − C − B, tal que AC ≡ AE; mostre que este é o ponto procurado.)

Exercı́cio 209: Dados A, B ∈ CC,r e A − D − B, mostre que AD · DB = r2 − CD2 . (Use o


Teorema de Pitágoras nos triângulos convenientes.)

Exercı́cio 210: Dados A, B, Q ∈ CC,r e P no exterior de CC,r , tais que A − B − P , mostre que
são equivalentes:
(a) AP · BP = P Q2 ;
←→
(b) P Q é tangente a CC,r .

Exercı́cio 211: Mostre que se ABCD é convexo e A, B, C, D ∈ CP,r , então m(∠A)+m(∠C) =


m(∠B) + m(∠D) = 180. (Para isto, mostre que ∠DAC ≡ ∠DBC, ∠CAB ≡ ∠CDB, etc.)
←→
Exercı́cio 212: Dados A, B, Q ∈ CC,r e P no exterior de CC,r , tais que A − B − P e P Q é
tangente a CC,r , mostre que ∠P QB ≡ ∠BAQ. (Para isto, considere primeiro o caso em que AQ é
um diâmetro e depois use o exercı́cio anterior, no caso genérico.)

Exercı́cio 213: Construir um triângulo isósceles cujos ângulos da base medem o dobro do
terceiro ângulo. Para isto, dado o segmento AB, ache C tal que A − C − B e AC 2 = AB · CB; seja
D ∈ CA,d(A,B) , tal que d(A, C) = d(B, D); mostre que o triângulo procurado é 4ABD. (Para esta
última afirmação, seja CO,s a circunferência circunscrita ao 4ABQ; mostre que ∠P QB ≡ ∠BAQ,
∠AP Q ≡ ∠AQP , ∠P BQ ≡ ∠BP Q e, portanto ∠AQB ≡ ∠BAQ, etc.)

Exercı́cio 214: Dada uma circunferência CP,r , mostre que um pentágono regular inscrito em
CP,r (todos os vértices na circunferência) é construtı́vel. (Construa primeiro um triângulo isósceles
com ângulos da base medindo 72, 4RST , inscrito em CP,r ; mostre que a base deste triângulo é o
lado do pentágono procurado.)

Exercı́cio 215: Dada uma circunferência CP,r , mostre que um pentágono regular circunscrito
a CP,r (todos os lados são tangentes a CP,r ).

Exercı́cio 216: Mostre que um hexágono regular de lado construtı́vel dado é construtı́vel.
MAT-230: Notas de Aula e Exercı́cios - Prof. R. Bianconi 46

Exercı́cio 217: Mostre que um polı́gono regular de 15 lados inscrito em CP,r é construtı́vel.
(Inscrever 4ABC equilátero e um pentágono regular com um dos vértices A, etc.)

Vamos finalizar com alguns problemas mais complicados, resolvidos no Séc. XIX. (Se necessário,
consulte a apostila “Introdução à teoria dos grupos e à teoria de Galois” de Paulo A. Martin,
Publicações do IME-USP.)
Atenção: Estes problems não caem em prova.

Exercı́cio 218: (K. F. Gauss, Séc. XIX) Mostre que um polı́gono regular de 17 lados é con-
strutı́vel.

Exercı́cio 219: Mostre que se um polı́gono regular de n lados é construtı́vel, então um polı́gono
regular de 2n lados é construtı́vel.

Exercı́cio 220: Mostre que polı́gonos regulares de 7, 9, 11, 13 e 15 lados não são construtı́veis.

FIM - UFA!

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