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A centralidade da ficção televisiva: TV Paga e
VOD no Brasil (2005 - 2019)1
The centrality of television fiction: Pay TV and VOD
in Brazil (2005 - 2019)
Ligia Prezia Lemos
Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, ECA – USP. São
Paulo, Brasil. E-mail: ligia.lemos@gmail.com
Resumo:
O objetivo deste artigo é apresentar uma visão panorâmica das alterações que
ocorreram na TV Paga e em VOD no Brasil, no período de 2005 a 2019, e que
acarretaram mudanças na produção, transmissão/distribuição, recepção, circulação e
interação com a audiência da ficção televisiva seriada brasileira. Foram
transformações estruturais que ocorreram a partir do incremento do Fundo Setorial do
Audiovisual e da Lei 12.485/2011, chamada Lei do Serviço de Acesso Condicionado
e que, em nosso país, surgiram quase em paralelo à propagação da tecnologia
streaming, que suporta o VOD, em conjunto com maior velocidade e possibilidades
de acesso à banda larga. Segundo levantamento e análise de dados, concluímos que a
conjuntura deste ambiente comunicacional requer análises da ficção televisiva seriada
a partir da alteração de sua polaridade situacional, ou seja, de acordo com sua cada vez
maior e relevante centralidade.
Palavras-chave:
Ficção Televisiva Brasileira; TV Paga; VOD; Centralidade da Ficção Televisiva
Seriada.
Abstract:
The objective of this work is to present a panoramic view of the changes that occurred
on Pay TV and VOD in Brazil, from 2005 to 2019, that led to alterations in the
production, transmission/distribution, reception, circulation and interaction with the
Brazilian serial television fiction audience. These were structural transformations that
occurred because of the budget increase of the Fundo Setorial do Audiovisual
(Audiovisual Sectorial Fund) and Law 12,485/2011, called Serviço de Acesso
Condicionado (Conditional Access Service Law) and that, in Brazil, took shape almost
in parallel with the propagation of streaming technology, which supports VOD,
together with greater speed and broadband access availability. According to data
survey and analysis, we conclude that the conjuncture of this communicational
environment requires examination of serial television fiction from the alteration of its
situational polarity, meaning according to its increasing and relevant centrality.
Keywords:
1
Artigo ancorado em pesquisa de pós-doutorado realizada na ECA-USP, com bolsa PNPD-Capes. Uma
versão reduzida foi apresentada no 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
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Brazilian Television Fiction; Pay TV; VOD; Centrality of Serial Television Fiction.
1 Introdução
O ambiente de produção, transmissão/distribuição, recepção, circulação e
interação com a audiência da ficção televisiva seriada como um todo vem já há alguns
anos passando por transformações substanciais no mundo inteiro. Em nossos estudos,
tivemos a oportunidade de testemunhar um período excepcional no Brasil que
certamente merece pesquisas e análises acadêmicas específicas e aprofundadas,
notadamente por seu teor impactante em termos de categorias teóricas de análise,
modificadoras e reorganizadoras de metodologias e técnicas de pesquisa em nosso
campo de estudos.
Em vista disso, o objetivo do presente artigo é compartilhar alguns achados de
nossa pesquisa referentes à produção brasileira de ficções televisivas seriadas para
além da TV aberta, isto é, na TV Paga e em VOD2, no Brasil. Em termos
metodológicos, o período temporal observado abrange 15 anos – de 2005 a 2019.
Realizamos levantamento, cruzamento de dados, mapeamento e análise de um lócus
de alta complexidade em que se insere a ficção televisiva seriada brasileira, cuja
circulação indica movimentos por inúmeras redes que se interpenetram e geram
cenários heterogêneos, pouco explorados, para abrigar gêneros e formatos antes
restritos às mídias analógicas. Atualmente o espaço midiático reticular vem se
fortalecendo cada vez mais, reformulando – e criando – recipientes (continentes) por
onde passou a circular a ficção televisiva (o conteúdo).
Este ambiente televisivo nos instigou a observar mutações a partir de análise
de sua complexidade, que certamente inclui a TV aberta, mas que também propõe
distintas configurações de produção, transmissão/distribuição, circulação, recepção e
interação com a audiência. Assim, trazemos a seguir breve estruturação teórica,
seguida de argumentação empírica relativa aos achados do estudo.
2
O VOD, video on demand – no Brasil também chamado de vídeo sob demanda – é um sistema de
distribuição de mídia que potencializa a circulação de conteúdo e consumo audiovisual para usuários
de tecnologias móveis, TVs e computadores pessoais.
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2 Estruturação teórica
Em termos gerais, há uma necessidade de ancorar nossa pesquisa em visões
estruturais – e não apenas factuais – para realizar uma busca por novos "lugares
metodológicos" (MARTÍN-BARBERO, 2001, p. 4). Estamos, portanto, aportados em
um lócus específico no mapa das mediações proposto por Martín-Barbero (2009b) em
que as lógicas de produção mobilizam indagações sobre estruturas empresariais,
competências comunicativas e concorrência tecnológica. Através desse mapa,
compreendemos que as estruturas empresariais (dimensões econômicas, ideologias
profissionais e rotinas produtivas) estão relacionadas a uma geografia de redes e
cenários complexos, que já se encontram quase que totalmente transformados. As
competências comunicativas (capacidade de construir públicos, audiências e
consumidores), em diálogo com a dimensão anterior, também se mostram
confortavelmente instaladas em espaços amplamente digitalizados. E a dimensão da
competitividade tecnológica, fundamental para a inovação dos formatos industriais por
meio das tecnicidades, estimula ainda mais o persistente giro desta roda.
As mediações das tecnicidades motivam experiências em sistemas semióticos,
pois tecnologia vai além de meios e processos, e relaciona-se às próprias dinâmicas
sociais, sendo um “âmbito” potente de linguagens e de ações, tanto de “dinâmicas
sociais, políticas e culturais, quanto de interrogações sobre o que significa ‘o social’
hoje” (MARTÍN-BARBERO, 2009a, p. 148). Por essa razão, “estamos necessitando
pensar o lugar estratégico que passou a ocupar a comunicação na configuração dos
novos modelos de sociedade” (MARTÍN-BARBERO, 2009b, p. 13). Sabemos que a
ficção televisiva brasileira provém da matriz cultural do melodrama, gênero que passa
pelas lógicas de produção envolvidas em sua concepção e apresenta uma relação que
está em intenso processo de transformação entre essas e seus formatos industriais. Para
Martín-Barbero (2009b), a intermedialidade, a fronteira, são locais da comunicação,
nascedouros de novas linguagens que se testam e se experimentam. A ficção televisiva
seriada brasileira – com significados que ultrapassam a narrativa audiovisual,
atingindo conversas e discussões permanentes, on-line e off-line, sem distinção entre
as pessoas quanto a classe, idade, sexo ou região a que pertence – coloca em circulação
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conversas e debates no cotidiano contemporâneo do país e, recentemente, passou a se
expandir e a se experienciar em telas e plataformas múltiplas.
Diante de um fenômeno em que paradigmas anteriores parecem não mais
alcançar, nos vimos em busca de contemplar nosso objeto a partir de maior
complexidade (MORIN, 1991; 2000; 2009); (SANTOS, s/d); (BAUMAN, 2001). O
processo de convergência tecnológica (JENKINS, 2009); (CASTELLS, 2003a; b; c);
(BAUMAN, 2001); (WOLTON, 2000) inaugurou novas relações entre atores sociais
– individuais e coletivos – no que se refere aos meios de comunicação, especialmente
em termos de linguagem das mídias que dinamizam uma profusão de campos sociais.
Vivemos e atuamos em um ambiente de plenitude de convergência de mídias e, além
disso, de associação entre os setores de telecomunicações e audiovisual (LADEIRA,
2017a), com certa reorganização do discurso audiovisual a partir de possibilidades
oferecidas por software, essencial ao processo de digitalização. Ora, não é possível
pensar em streaming3, por exemplo, sem pensar em uso de tecnologias e suas
consequências, amplas inclusive em termos de narrativas. Historicamente, houve uma
dependência tecnológica para o cinema, da fotografia; e para a televisão, dos pulsos
elétricos. Atualmente, com reorganizações no interior dos discursos audiovisuais, as
alterações são para uma dependência de software, instrumento essencial ao processo
de digitalização, em ambos os meios, cinema e televisão: “a reorganização
proporcionada pelo vínculo intensivo com tecnologias de informação irá depender não
dos serviços com origem na televisão, mas de empreendimentos de telecomunicações
e dos recursos que manuseiam” (LADEIRA, 2017a, p. 5). Por isso, a televisão tende
irremediavelmente a ser um negócio totalmente digital e on-demand. Em termos de
estudos de produção estamos diante do que Ladeira (2017b, p. 3) considera “uma
dimensão do audiovisual que se desdobra a partir de formas pregressas, já bem
constituídas, em direção a outras, em um processo de tentativa e erro” que considera
uma região turva em que uma variedade de personagens está interessada em atuar.
Assim, o tráfego de conteúdo extrapola o televisor e se apropria de técnicas e
ferramentas antes restritas apenas aos computadores; e o protocolo de internet (IP)
possibilita a expansão e onipresença da imagem (MANOVICH, 2001; 2005). Antes de
3
Streaming é a transmissão e fluxo de dados pela internet, a partir de conexão de alta velocidade. A
tecnologia do streaming é amplamente utilizada para consumo de música, jogos e VOD.
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pensar em expansão mesma do conteúdo, Manovich (2013) já pergunta o que é afinal
a mídia depois do software.
As plataformas de streaming tendem a expandir continuamente a ficção
televisiva seriada para novos mercados consumidores, além de estimularem nos polos
produtores o surgimento de estratégias criativas como, por exemplo, o uso de temáticas
locais, com aspectos de universalidade. A era da televisão distribuída pela internet
(LOTZ, 2018) vem transfigurando a forma como os conteúdos televisivos são
produzidos, distribuídos, consumidos e, principalmente, como nos relacionamos
socialmente considerando os avanços das tecnologias de comunicação. Se, para Lotz
(2007), desde os anos 90 a Post-Network Era indicava “novos modos de criação,
produção e distribuição das narrativas ficcionais seriadas” hoje este ambiente já
extrapolou todas as previsões e essa outra ordem, outra lógica, estranha à anterior, se
amplia ainda além das relações tecnológicas para uma autêntica acepção de
tridimensionalidade, que envolve ativamente o espectador desde sua estrutura, no
sentido em que Eliseo Verón (2003, apud CAVENAGHI et al, 2016, p. 374) considera
que o telespectador “dá as cartas” do contrato comunicativo, a partir de seus modos de
reconhecer o discurso. Sobre este ponto, Orozco Gómez pontua que a mediação
comunicacional contemporânea leva as audiências da recepção para criação, produção
e também emissão. Porém, ressalta que desigualdades “culturais e políticas, de gênero
e de idade” fazem com que alguns setores da audiência se situem “mais em uma
dimensão do que outras, enquanto outros se localizam em todas” (2014, p. 55-56).
Os paradigmas metodológicos, consequentemente, também pedem um olhar
mais atento. Por essa razão, as técnicas de observação, coleta e visualização de dados
de tal objeto de estudo necessitam, não de ser revisadas, mas sim, recriadas. Buscamos,
assim, estar em consonância com reflexões teóricas acuradas, quase clássicas, no
sentido de abarcar o conteúdo da ficção televisiva brasileira, esparso e expandido,
fragmentado, sem que nos percamos por encruzilhadas de diferentes mídias e
plataformas (BORDWELL, 2009; LACALLE, 2010; SCOLARI, 2009; FECHINE,
2014).
Cumpre sublinhar que, pela particularidade do objeto, poderíamos crer que a
produção e a exibição de ficção televisiva seriada brasileira nos canais de TV Paga e
em VOD possam ter um caráter diferenciado, voltado para uma audiência muito
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restrita em conformidade com o conceito de distinção de Bourdieu (2007). Porém, em
nosso país, a obrigatoriedade do cumprimento das cotas da Lei do SeAC4, aliada à
circulação de conteúdos inclusive pela TV aberta, nos leva e relativizar tal fato. Caso
contrário, seria de se esperar que o conteúdo de qualidade, o melodrama de qualidade,
só seria acessível na TV Paga, o que no Brasil não corresponde à realidade, tendo em
vista a reconhecida e competente produção da TV aberta. O que temos são novos
modos de assistir ficção televisiva e que, no caso de nosso objeto de estudo, em
algumas dessas ocasiões, solicita investimento financeiro da audiência. Outro ponto
relacionado seria o investimento em qualidade do conteúdo (GRECO, 2013; RUBIN,
1981, 1984; XUE, 2014), pois a alta dispersão de possibilidades de assistência
estimularia o mercado a competir também nesse aspecto.
A problemática de nosso objeto de estudo, entretanto, envolve uma
aproximação de cunho eminentemente metodológico de levantamento, categorização,
manuseio e visualização de dados ainda não devidamente testado e aprofundado, a
ponto de podermos indicar que a literatura produzida no Brasil resulta pequena.
Com isso em mente, propomos como resultados da análise de dados de nossa
pesquisa algumas conclusões:
(1) Comprovação do impacto da Lei 12.485 na produção de ficção televisiva
brasileira ano a ano e consequente desenvolvimento das produtoras
independentes – e incremento do mercado de trabalho.
(2) Comprovação de que o crescimento e desenvolvimento das produtoras
independentes e da produção de ficção televisiva na TV Paga preparou o
mercado produtor para atender rapidamente às demandas criadas pelo
VOD, o que permitiu uma resposta rápida do setor em termos de produção.
(3) Proposta metodológica da centralidade da ficção televisiva como ponto
fulcral de desdobramento metodológico para análises de criação,
“No dia 12 de setembro de 2011, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 12.485 (nova Lei de
TV por Assinatura ou Lei do Serviço de Acesso Condicionado - SeAC) que criava novas regras para o
serviço de TV Paga, alterando radicalmente o mercado. A nova lei previa mais canais com conteúdo
brasileiro além de cotas de produção nacional em canais brasileiros e estrangeiros. Os objetivos eram
“aumentar a produção e circulação de conteúdo audiovisual brasileiro, diversificado e de qualidade,
gerando emprego, renda, royalties, mais profissionalismo e o fortalecimento da cultura nacional”
(BARROS e RICHTER, 2013, p. 317). A regulação e fiscalização das atividades de programação e de
empacotamento do SeAC ficaram a cargo da ANCINE (Agência Nacional do Cinema)” (LEMOS, 2015,
p. 7).
4
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distribuição, circulação e de interatividade com a audiência, o que indica
que utilizar apenas as antigas classificações baseadas nos meios ou
plataformas de exibição estão aos poucos se tornando obsoletas.
Com o objetivo de explanar sobre essas conclusões da pesquisa, trazemos a
seguir argumentação – com base empírica – relativa aos três pontos apresentados
acima.
3 Caminhos empíricos
Para pesquisadores da ficção televisiva seriada, é notável que a antiga
estabilidade das produções realizadas e transmitidas usual e historicamente apenas
pela TV aberta deu lugar a um ambiente televisivo que certamente a inclui, mas que
também propõe distintas configurações de produção, transmissão/distribuição,
recepção, circulação e interação com a audiência. Em termos amplos a ficção televisiva
pode ser produzida e transmitida/distribuída: a. Pelos próprios canais de TV aberta,
isoladamente ou em coproduções; b. Pelos canais brasileiros e estrangeiros de TV
Paga, isoladamente ou em coproduções; c. Na web, pelos sites e aplicativos da TV
aberta e da TV Paga; pelos canais e aplicativos on-demand (VOD), como a Netflix
(SVOD), por exemplo; ou redes sociais de compartilhamento de vídeo, como YouTube
ou Vimeo, por exemplo; d. Pelas produtoras independentes, isoladamente, em
coproduções, ou por meio de editais públicos para produção e distribuição.
No que se refere à TV Paga, é relevante frisar que nos últimos anos todas as
operadoras no Brasil vêm continuamente perdendo assinantes e ainda não é possível
prever a recuperação deste mercado, inflado de regulações, restrições e alguns modelos
de negócio ultrapassados. Por outro lado, uma dessas regulações, as cotas de conteúdo,
se converteram no principal estímulo para o crescimento das produtoras independentes
e, consequentemente, para o desenvolvimento quantitativo da ficção televisiva
brasileira, principalmente na TV Paga, conforme apontam nossos dados.
Lamentavelmente, as cotas de conteúdo estão previstas para durarem apenas até
setembro de 20235.
5
POSSEBON, Samuel. Qual o futuro da TV Paga no Brasil? Teletime, 04/02/2020. Disponível em:
<https://teletime.com.br/04/02/2020/qual-o-futuro-da-tv-paga-no-brasil/>. Acesso em: 08/02/23.
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Mas, o cenário em que se insere nosso estudo passa constantemente por
alterações. Lembramos que, depois de um período de cinco anos (de 2010 a 2014) de
crescimento constante e de ampliação do acesso de assinantes das classes C e D, o
mercado de TV Paga no Brasil demonstrou nos cinco anos seguintes (de 2015 a 2019)
um importante decréscimo em sua base de assinantes residenciais, que perdura até
hoje. Essa queda na base de assinantes – com números em 2019 semelhantes aos do
ano de 2012 – estaria relacionada aos seguintes fatores: a. concorrência com serviços
de VOD, mais baratos e sem que o assinante tenha compromisso com a grade de
horários; b. implantação da TV digital, que oferece a TV aberta com melhor qualidade
de som e imagem (no país, muitos assinavam a TV Paga para ter melhor qualidade de
imagem dos canais abertos); c. queda de poder aquisitivo da população brasileira; d.
maior facilidade de pirataria de conteúdo; e. novos hábitos de consumo; f. inadequação
da própria TV Paga como produto direcionado às atuais características do mercado.
Já no que se refere aos serviços de VOD, avançando em sentido oposto, o
número de plataformas no Brasil se amplia continuamente, conquistando cada vez
mais oportunidades e, se em 2012 eram 19, no ano de 2019 já havia 85 plataformas de
VOD registradas na Ancine. Vale abrir um parêntesis para mencionar que, apesar do
evidente crescimento, o setor segue até o presente esbarrando em contínuos e
aparentemente insolúveis problemas regulatórios e de tributação.
Assim, a ficção televisiva brasileira em 2020 encontrava espaço e se difundia
digitalmente, tanto de maneira relacionada com a produção da TV aberta, em forma
de conteúdo expandido de telenovelas e séries, como no GloboPlay, por exemplo;
quanto de forma independente em webseries, como no YouTube ou Vimeo e; ainda,
por serviços de filmes e séries via streaming, como Netflix, HBOMax, GooglePlay,
entre outros. Este polo produtor múltiplo e entrelaçado alimenta uma pluralidade de
opções de consumo de produções audiovisuais e é resultado direto da expansão da
internet e tecnologias reticulares.
No período observado, a conformação da ficção televisiva seriada brasileira
para além da TV aberta esteve majoritariamente relacionada a questões ligadas ao
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Fundo Setorial do Audiovisual (FSA)6 em conjunto com a Lei 12.485, pois estas
reorganizaram o mercado audiovisual em nosso país, com novas experiências, projetos
e iniciativas independentes.
Avançando em nossa análise, quanto ao primeiro ponto – a comprovação do
impacto da Lei 12.485 na produção de ficção televisiva seriada brasileira ano a ano
e consequente desenvolvimento das produtoras independentes, com incremento do
mercado de trabalho – podemos afirmar que, no decorrer dos 15 anos observados,
houve um período excepcional para a ficção televisiva brasileira. Este período ocorreu
entre 2011 e 2019, na TV Paga e, a partir de 2016, como sua clara e expressiva
consequência, em VOD em nosso país. Um desenvolvimento capaz de impactar
categorias teóricas e, principalmente, metodológicas de análise.
É preciso enfatizar que a Lei 12.485 criou novas regras para o serviço de TV
Paga, alterando radicalmente o mercado, que foi obrigado a ir se ajustando pouco a
pouco, conforme as etapas da Lei iam sendo aplicadas. Assim, se até 2011 tínhamos
na TV Paga brasileira de dois a cinco canais brasileiros e estrangeiros produzindo e/ou
exibindo ficção televisiva brasileira, com a Lei, esse número teve um crescimento
importante, e em 2018 já tínhamos 14 canais oferecendo ficção televisiva seriada
brasileira, conforme podemos observar no Gráfico 1.
Uma perspectiva interessante que circunda a questão diz respeito à Legislação
como fator criador de cultura. Pois a questão das cotas de conteúdo na TV Paga alterou
profundamente o setor produtivo e as produtoras independentes, seus artistas e técnicos
passaram por fortes mudanças em termos de quantidade e qualidade de trabalho. Para
Bitelli (2004, p. 60), “o direito, quer enquanto ciência, quer enquanto norma, não deixa
de se configurar numa manifestação cultural de um povo dotado de uma nação”. Por
outro lado, os aspectos legais vindos com a criação da Ancine, do FSA e da Lei 12.485
geraram também o surgimento e crescimento de novas audiências. Tal movimento
dinâmico, constante e ascendente foi interrompido em um primeiro momento por
alterações de cunho político e institucional e, em um segundo momento pela pandemia
6
O Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) foi instituído pela Lei 11.437, de 28 de dezembro de 2006;
regulamentado pelo Decreto 6.299, de 12 de dezembro de 2007; e lançado em 4 de dezembro de 2008,
pelo Ministro da Cultura Juca Ferreira e pelo Diretor Presidente da Ancine, Manoel Rangel.
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da Covid-19. Tal interrupção, certamente, gerará consequências cuja visão panorâmica
poderá ser melhor analisada em um futuro próximo.
Gráfico 1 – Canais/plataformas produtores/exibidores de ficção televisiva brasileira
– TV Paga e VOD –
Fonte: Própria autora.
No período de 15 anos observado, portanto, o número de canais na TV paga
que exibem ficção televisiva brasileira cresceu uma média de 550%, com uma curva
predominantemente ascendente, sendo que o pico se deu no ano de 2018 com os 14
canais mencionados acima, brasileiros e estrangeiros: Canal Brasil, Comedy Central,
Disney Channel, Fox, GNT, HBO, History Channel, Multishow, Prime Box Brasil,
Sony Brasil, Space, TBS, TNT, Universal.
O ano inaugural da produção de ficção televisiva seriada brasileira inédita em
VOD foi 2016, quando iniciamos o monitoramento. Então, apenas duas plataformas
as exibiam: Netflix e Globoplay, situação que perdurou pelos dois anos seguintes. Em
2019 registramos crescimento e, aos dois grandes em nosso país, se somaram Prime
Video, HBOGo, Multishow Play e HistoryChannel.
A expansão da ficção televisiva brasileira pelos canais brasileiros e
estrangeiros da TV Paga, e pelos canais e plataformas de VOD nos estimulou a
questionar práticas metodológicas referentes ao levantamento da circulação dessa
ficção televisiva brasileira expandida. Por essa razão, utilizamos como vetor de entrada
em nossa classificação a data de estreia em determinada plataforma ou canal: uma
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produção que fosse distribuída/transmitida por diferentes meios, teve, então, sua data
de estreia considerada como basilar para que fosse inserida em nosso levantamento
como pertencente à TV Paga ou VOD.
Quanto ao segundo ponto – a comprovação de que o crescimento e
desenvolvimento das produtoras independentes e da produção de ficção seriada
televisiva na TV Paga preparou o mercado produtor para atender às demandas do
VOD, o que permitiu uma resposta rápida do setor em termos de produção – a ficção
televisiva brasileira encontra espaço e passa a se difundir digitalmente, tanto de
maneira relacionada com a produção da TV aberta ou por serviços de VOD de filmes
e séries via streaming ou mesmo de forma independente. Neste sentido, o número de
serviços de VOD no Brasil se amplia e conquista cada vez mais oportunidades
competitivas.
No que diz respeito ao crescimento do número de obras de ficção televisiva
seriada brasileira nos canais da TV Paga (Gráfico 2), a série histórica mostra uma curva
ascendente, com crescimento médio de 1200% neste período de 15 anos. Desde a
tramitação no Congresso Nacional do Projeto de Lei 29 (PL-29) que em 2007
propunha reformas na TV Paga brasileira – e que resultaria na Lei 12.485 – já
começávamos a observar os primeiros experimentos e testes no sentido do crescimento
da produção e exibição de conteúdo nacional na TV Paga. O canal Multishow da
Globosat, por exemplo, lançou ainda em 2005 a série Cilada (que perdurou por seis
temporadas, até 2009) e no mesmo ano, a HBO também coproduziu a série brasileira
Mandrake. Em 2008, já eram quatro canais investindo em ficção televisiva brasileira,
e isso antes da implantação da Lei: Multishow, com a quinta temporada de Cilada;
HBO, com Alice; Fox, com 9mm São Paulo; e GNT, com Dilemas de Irene. Com a
Lei então já em vigor, no ano de 2014 computávamos a notável estreia de 34 ficções
televisivas seriadas brasileiras inéditas distribuídas por 10 canais da TV Paga
brasileira: Multishow, GNT, HBO, Fox, Sony, Viva, MGM, MTV7, Canal Brasil, e
+Globosat. Os dados comprovam a relevância do estímulo à produção nacional e
independente alcançados com as políticas de cotas de conteúdo.
7
A MTV surge como TV Paga após a devolução da marca MTV pelo Grupo Abril, que a manteve no
ar na TV aberta no Brasil por 23 anos, pela extinta MTV Brasil. No ano de 2014 o canal levou ao ar a
série Copa do Caos.
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Ligia Prezia Lemos. A centralidade da ficção televisiva: TV Paga e VOD no Brasil (2005 - 2019). p. 67-85.
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Gráfico 2 – Ficção Televisiva Seriada Brasileira – TV Paga e VOD – no Brasil, por ano
Fonte: Própria autora.
Quanto à presença da ficção televisiva seriada brasileira em plataformas de
VOD, a pequena série histórica, de apenas quatro anos, já revelava sua força e
vitalidade. Com duas produções exibidas no primeiro ano – 3% (Netflix, 2016) e
Supermax (Globoplay, 2016) – já saltou para 27 em 2019, número de ficções superior
ao da TV Paga naquele ano. Em outras palavras, a ficção televisiva brasileira em VOD
cresceu 1250% em quatro anos, desenvolvimento que a TV Paga demorou muito mais
tempo para conquistar.
Nos parece evidente que a indústria produtiva do audiovisual brasileiro passou
por alterações importantes depois da implantação da Lei, especialmente pela
obrigatoriedade de cotas para produção nacional e para produtoras nacionais
independentes que, desde meados da década de 2010, passaram a apresentar
expressivo crescimento e investimento na qualidade de algumas produções. A partir
da Lei, portanto, foi possível observar transformações estruturais tanto no mercado de
trabalho, com a migração de profissionais da publicidade e do cinema para a TV e com
o aumento de estágios, cursos técnicos e de especialização em áreas como roteiro,
interpretação, direção, iluminação, efeitos especiais; quanto no fortalecimento da
criação e exibição do formato de ficção televisiva seriada no país.
Quanto ao terceiro ponto – proposta metodológica da centralidade da ficção
televisiva seriada como ponto fulcral de desdobramento metodológico para análises
referentes à criação, distribuição/transmissão, circulação e interação com a
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audiência, o que indica que utilizar apenas as antigas classificações baseadas nos
meios ou plataformas de exibição estão aos poucos se tornando obsoletas –
entendemos que os paradigmas metodológicos pedem um olhar mais atento,
principalmente se levarmos em conta questões que envolvem a digitalização/software
e as novas formas de recepção e circulação da ficção televisiva seriada.
Enfatizamos a necessidade de documentar processos relacionados à
disseminação da ficção televisiva seriada brasileira por e em diferentes ecossistemas
midiáticos, ou seja, descrever tal expansão por um ambiente mutável, fragmentado e
entretecido. A presente pesquisa está amparada na percepção de que há atualmente
uma centralidade do conteúdo (a ficção televisiva brasileira) extrapolando a
categorização usual, ancorada apenas na mídia per se, por exemplo, a TV8.
Segundo a Kantar Ibope Media, entre os 10 conteúdos originais de VOD que
mais geraram impressões no Twitter no ano de 2019 – quando fechamos o estudo –
estava a série brasileira Coisa mais linda (Netflix, 2019); e entre os gêneros que mais
geraram impressões, séries e novelas estavam em segundo e terceiro lugar,
respectivamente. A potência da ficção televisiva seriada brasileira, e da telenovela em
particular, segue apresentando números impressionantes e, ao acompanhar o
movimento da TV aberta em direção a soluções e estratégias de VOD, pode-se
dimensionar com mais precisão a tendência futura do setor. Qualquer telenovela
inédita ou em reprise, pode estar disponível em transmissões pela TV aberta, analógica
ou digital; em certos casos, ter seus capítulos no YouTube; pode estar disponível em
canais da TV Paga, como o Canal Viva, por exemplo; e acessível em plataformas de
VOD. As ramificações de produção, assistência e acesso derivam da própria ficção, e
não mais dos canais e horários fixos de exibição.
A metodologia de monitoramento das obras de ficção televisiva seriada precisa
ser repensada para englobar a experiência transmídia que faz parte dos conteúdos
atuais e que os encaminha para essa centralidade que propomos. As ramificações da
Sendo que, atualmente, nem a própria TV permanece a mesma: “atualmente a TV é uma fusão de
experiências audiovisuais oferecidas por PCs, laptops, smartphones, tablets, consoles de games, set-top
boxes e DVRs conectados à Internet – sem esquecer, claro, dos televisores em si. Além disso, essas
experiências são oferecidas de modo linear, com serviços de time-shifting, place-shifting, catch-up TV
e TV sob demanda”. Ver: ASQUITH, Richard. Da TV para… a TV. Kantar Ibope Media. Artigos &
Papers. 04/11/2016. Disponível em: <https://kantaribopemedia.com/conteudo/artigos-papers/da-tvpara-a-tv/>. Acesso em: 30/01/2023.
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ficção seriada televisiva englobam produção, distribuição, recepção e, principalmente
circulação e interatividade. Apenas para exemplificar uma das obras que integram o
período pesquisado neste estudo trazemos a série Me chama de Bruna (Fox Premium,
2016). O primeiro ponto que nos chama a atenção na própria escritura deste artigo é a
quão redutora pode ser essa informação entre parêntesis, logo após o título que nos
comunica o canal de TV Paga e o ano de estreia da obra. Me chama de Bruna estreou
em 08/10/2016 na Fox Premium. Inspirada na vida de Raquel Pacheco (interpretada
pela atriz Maria Bopp), retrata a história de uma adolescente de classe média que foge
de casa e passa a trabalhar em um bordel em São Paulo. Ambição, novas emoções e
busca por independência, levam Raquel a se transformar em Bruna Surfistinha, uma
das garotas de programa mais conhecidas da cidade. A segunda temporada estreou em
22/10/2017, a terceira, em 07/12/2018 e a quarta temporada, lançada já no fim do
período pesquisado, estreou em 13/12/2019. Todas as temporadas tiveram oito
episódios cada. A série estreou em VOD em 2019 no GloboPlay e FoxPlay.
Atualmente está disponível no Star+ e Prime Video. Antes da série tivemos o filme
Bruna Surfistinha (TV Zero, 2011) em que a personagem foi interpretada pela atriz
Deborah Secco. O filme foi baseado no best-seller autobiográfico O Doce Veneno Do
Escorpião: o Diário de uma Garota de Programa, de Raquel Pacheco, que, por sua
vez, foi inspirado no Blog da autora, iniciado em 2005 e também chamado de Bruna
Surfistinha, onde ela contava seu dia a dia como garota de programa. Este último ainda
inspirou uma série de três vídeos, lançados em DVD em 2006, chamado 3X com Bruna
Surfistinha. Em 2006 e 2007 a autora lançou dois outros livros. Temos, portanto, o que
podemos chamar de universo narrativo Bruna Surfistinha (Figura 1).
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Figura 1 – Universo Bruna Surfistinha – produtos e mídias/plataformas
Fonte: Própria autora.
Neste universo, se observarmos apenas os produtos audiovisuais, temos a
presença de dois formatos, sendo dois filmes e uma série; e quatro janelas diferentes
de exibição, (1) salas de cinema, (2) DVD, (3) dois canais de TV Paga e (4) quatro
serviços de VOD. Até aqui estamos abordando apenas o polo da produção. Se
adentrarmos em recepção e interatividade com usuários, em fandoms e redes sociais
abertas, com expressivo conteúdo gerado pelo usuário o universo narrativo se amplia
exponencialmente.
Face ao exposto, entendemos que o ambiente que se apresenta em termos de
distribuição, circulação e interatividade – e que se ampliou sobremaneira durante e
depois da pandemia de Covid-19 – necessita de estudos metodológicos que permitam
encontrar abordagens acadêmicas cada vez mais abrangentes e realistas. Estamos
frente a um ambiente comunicacional que requer análises a partir de certa alteração de
polaridade situacional, ou seja, de acordo com a presente e relevante centralidade do
vídeo e, consequentemente, da ficção televisiva seriada.
4 Considerações Finais
Por meio de nossa investigação, compreendemos que os processos de
crescimento e estabilização da produção de ficção televisiva seriada brasileira na TV
Paga e em VOD significaram uma espécie de bolha de desenvolvimento e distribuição
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desses conteúdos brasileiros. O período de 15 anos estudado, de 2005 a 2019, se inicia
com os primeiros passos no sentido de estimular o setor e se encerra em um momento
de vitalidade e pujança de todos os atores envolvidos no processo – apesar do início
de certo desmonte no setor, por razões políticas (as quais não nos deteremos neste
artigo). Desafortunadamente, essas políticas somadas à pandemia de Covid-19 que se
instalou logo a seguir ao período estudado trouxeram consigo alterações nas tendências
e projeções que vinham sendo desenvolvidas e causaram reviravoltas referentes à
expansão da ficção televisiva seriada brasileira por diferentes mídias e plataformas.
Para Morin (2020) as futurologias do século XX fracassaram e, diante de momentos
de excepcionalidade, para compreender o presente, é preciso ativar em nós as
qualidades do pensamento complexo, ou seja, confrontar, selecionar e organizar os
conhecimentos de forma adequada, ao mesmo tempo religando-os e integrando-os às
incertezas. Hoje, um desafio que se apresenta se refere a analisar com profundidade se
a centralidade do conteúdo e a instituição e expansão da ficção televisiva seriada
brasileira pela TV Paga e plataformas de VOD significaram um alargamento do acesso
para a audiência brasileira em geral ou se apenas se referem a uma fragmentação das
mídias, que seguiria perpetuando modelos anteriormente já vistos.
Para encerrar, podemos afirmar que a pandemia realmente encerrou o ciclo que
vínhamos pesquisando e inaugurou outro, que certamente merecerá novos estudos e
pesquisas. Porém, o certo é que já estávamos diante de um fenômeno em que
paradigmas metodológicos anteriores pareciam não mais alcançar.
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