ANAIS ELETRÔNICOS DO I
ENCONTRO NACIONAL
VIVARIUM: OLHARES SOBRE A
ANTIGUIDADE E
O MEDIEVO
Universidade Federal da Bahia - 1, 2 e 3 de outubro de 2013
MARCELO PEREIRA LIMA
MARINA REGIS CAVICCHIOLI
MÁRCIO RICARDO COELHO MUNIZ
(Orgs)
Salvador
2014
ANAIS ELETRÔNICOS DO I ENCONTRO NACIONAL VIVARIUM: OLHARES SOBRE A
ANTIGUIDADE E O MEDIEVO
Organização Geral
Marcelo Pereira Lima
Marina Regis Cavicchioli
Márcio Ricardo Coelho Muniz
Apoios
ABREM
Associação Brasileira de Estudos Medievais
FFCH/UFBA
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA
ILUFBA
Instituto de Letras da UFBA
PPGH/UFBA
Programa de Pós-Graduação em História da UFBA
PPGF/UFBA
Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFBA
PPGLitCult/UFBA
Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura da UFBA
PROHIS
Programa de Pós-Graduação em História da UFS
PPGHIS/UFMT
Program a de Pós-Graduação em História da UFMT
PPGH/UFAL
Programa de Pós-Graduação da UFAL
NALPE
Núcleo de Antigüidade, Literatura e Performance
CMAC
Cultura Material, Antiguidade e Cotidiano
Patrocínio
EDITAL PROPCI-PROPG-PROGRAD-AAI UFBA 01/2013-PRÓ-EVENTOS
Realização
E56
Encontro Nacional Vivarium (1.: 2014 : Salvador, BA)
Anais Eletrônicos do I Encontro Nacional Vivarium: olhares sobre a antiguidade e
o medievo. / Marcelo Pereira Lima, Marina Regis Cavicchioli, Márcio Ricardo Coelho
Muniz, organizadores. – Universidade Federal da Bahia, 2014.
398 p.: il.
Anais dos trabalhos apresentados no Encontro Nacional
Vivarium realizado pela UFBA, e editado eletronicamente.
ISBN: 978-85-8292-027-5
1. Antiguidade. 2. Idade Média - História. 3. Abordagem interdisciplinar do
conhecimento. I. Lima, Marcelo Pereira.
II. Cavicchioli, Marina Regis. III. Muniz, Márcio Ricardo Coelho. IV. Universidade
Federal da Bahia. V. Título.
CDD: 940.1
I ENCONTRO NACIONAL VIVARIUM: OLHARES SOBRE A
ANTIGUIDADE E O MEDIEVO
VIVARIUM. LABORATÓRIO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE E DO
MEDIEVO
UFBA, UFS, UFAL, UFMT, UFTM
Coordenação Geral
Marcelo Pereira Lima (UFBA)
Márcio Ricardo Coelho Muniz (UFBA)
Marina Regis Cavicchioli (UFBA)
Comissão Organizadora
Bruno Gonçalves Alvaro (UFS)
Claudia Regina Bovo (UFTM)
Juliana Ortegosa Aggio (UFBA)
Leandro Duarte Rust (UFMT)
Marco Aurélio Oliveira da Silva (UFBA)
Marcus Silva Cruz (UFMT)
Raquel de Fátima Parmegiani (UFAL)
Monitores
Beatriz Galrão Abrantes (UFBA)
Cleide Teixeira dos Santos (UFBA)
Danilo de Sousa Villa (UFBA)
Lêda Maria Paraguassú (UFBA)
Lucas Vieira de Melo Santos (UFBA)
Lucila Vieira (UFBA)
Marcelo José Santana Costa (UFBA)
Mayara Rosa Lima de Souza (UFBA)
Pedro Silva (UFBA)
Rafael de Jesus Dantas de Oliveira (UFMT)
Renata Brito dos Reis (UFBA)
Robson Freitas Cerqueira da Paixão (UFBA)
Rodolfo Luís Cajaíba Nunes França (UFBA)
Sara Cristina Santos (UFBA)
Solange Santos Santana (UFBA)
Stephanie Nereu (UFBA)
Telma Ferreira de Carvalho (UFBA)
Thiago Souza de Jesus (UFBA)
Verônica Cruz Cerqueira (UFBA)
Capista
Paulo Soto
SUMÁRIO
Prefácio..................................................................................................p. 5
Apresentação..........................................................................................p. 7
Comunicações
Airles Almeida dos Santos
A “Invenção” da Morte na Idade Média: Considerações de uma pesquisa em
desenvolvimento ......................................................................................................p. 9
Andrey Augusto Ribeiro dos Santos
A Terra Média e o Medievo imaginado por Tolkien..............;................................p. 19
Caio César Flávio Gonçalves
Rita de Cássia Mendes Pereira
A composição social portuguesa em fins da Idade Média: o olhar de Gil
Vicente.....................................................................................................................p. 33
Cinthia M. M. Rocha
O panorama artístico em Castela no século XV.......................................................p. 47
Denis Correa
Sólon de Atenas e a memória da democracia............................................................p.64
Flávia Roberta Benevenuto de Souza
Virtù e História em Maquiavel..................................................................................p.84
Guilherme Jacinto Schneider
O Cristianismo através dos Bestiários Medievais.....................................................p.94
Jacquelyne Taís Farias Queiroz
Tróia em chamas: honras aos mortos e ostentação entre os vivos (Troianas, de
Eurípedes)..............................................................................................................p. 104
Jamyle Rocha Ferreira Souza
Auto da fé e o dialeto saiaguês: Hay aqui tanto que ver que me siento
atibobado.................................................................................................................p.117
Lêda Maria Guedes Araújo Paraguassú
Representações de poder feminino-monárquico em Guerra dos Tronos: Televisão,
Representação, Gênero e Poder..............................................................................p. 131
Lívia Cristina de Souza Sigliani
A redistribuição no Antigo Egito: debates e controvérsias................................ p. 155
Lucas Vieira de Melo Santos
Apropriações e (re)produções de um medievo mítico no RPG Dungeons & Dragons:
notas preliminares...................................................................................................p.168
Luís Henrique Marques
A santidade nas hagiografias visigodas a serviço da hegemonia cultural da Igreja
Católica nos meios rurais da Península Ibérica.......................................................p.196
Márcia Santos Lemos
O optĭmus princeps e o tirano injusto na Roma Antiga.........................................p. 215
Marco Aurélio Oliveira da Silva
Considerações sobre o De Unitate Intellectus, de Tomás de Aquino.....................p.229
Rafael Bosch
As interpretações sobre a “Reforma Monástica” e a proposta reformadora de Pedro
Abelardo..................................................................................................................p.239
Robson Freitas Cerqueira da Paixão
“Das lendas para os consoles”: A (re)produção das representações do cavaleiro
medieval em jogos eletrônicos...............................................................................p. 251
Sávio Queiroz Lima
Thor: da mitologia nórdica ao mercado de quadrinhos ........................................p. 285
Telma Ferreira de Carvalho
Testemunhos de um cenário alimentar sagrado e profano: análise iconográfica do
universo pompeiano ..............................................................................................p. 305
Thais Rocha da Silva
As cartas demóticas e os estudos de gênero: os desafios de uma nova
Egiptologia..............................................................................................................p.316
Thiago Souza de Jesus
O religioso em meio ao fantástico: representações de religiões e religiosidades em A
Guerra dos Tronos.................................................................................................p. 333
Vitor Moraes Guimarães
As práticas pagãs no reino visigodo dos séculos V e VI........................................p. 361
Wanderson Henrique Pereira
A utilização do paternus affectus na política régia capetíngia segundo Gilberto de
Tournai (séc.
XIII).........................................................................................................................p.372
.
Cinthia M. M. Rocha
O PANORAMA ARTÍSTICO EM CASTELA NO
SÉCULO XV
Cinthia M. M. Rocha1
Resumo: O objetivo deste artigo é levantar questões acerca das mudanças no panorama
artístico de Castela no século XV, especialmente no que diz respeito à arquitetura. Tendo sido
esse um momento de intensas transformações no cenário internacional, convém debater o
processo que, em Castela, levou ao fortalecimento do Gótico Tardio e do estilo que ficou
conhecido como hispano-flamenco. O artigo é parte da pesquisa de doutorado, intitulada
“Construindo uma imagem: arte e os projetos políticos de Castela no século XV”, realizada no
Programa de Pós-Graduação em História, da Universidade Federal Fluminense.
Palavras-chave: arquitetura; Castela; século XV
O século XV foi um período de intensas mudanças no panorama
político e artístico da Europa. Aqueles anos marcaram o fim do Grande Cisma
do Ocidente e da Guerra dos Cem Anos. Na Inglaterra, a Guerra das Duas Rosas
viria a transformar o cenário político do reino. Em Portugal, a navegação pelo
Atlântico era uma realidade cada vez mais presente. Constantinopla caiu sob os
turco-otomanos e Granada sob os reis de Castela e Aragão. Colombo chegou à
América. Na Itália, as ideias de Giotto ganham popularidade, enquanto no Norte
imperava o estilo Perpendicular e o Flamboyant. É o século de Donatello, Jan
Van Eyck, Rogier van der Weyden, Botticelli, Leonardo da Vinci.
Em Castela, o século XV também foi culturalmente bastante rico.
Na literatura se destacaram pensadores, cronistas e poetas, como Íñigo Lopez de
Mendoza – o Marquês de Santillana ─, Alfonso de Madrigal e Alfonso de
1
Cinthia Rocha é doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense
e mestre em História Social pelo Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (2010).
47
Cinthia M. M. Rocha
Cartagena. Na arquitetura e nas artes plásticas, o período marcou a chegada de
vários mestres estrangeiros, responsáveis por impulsionar o Tardogótico, que na
região ganhou matizes únicos ao mesclar-se com o estilo mudéjar. Nomes como
o de Juan Guas, Enrique Egas, Diego de Siloé e Simón de Colonia constavam
nas construções de maior destaque do período, erguidas sob diversos
mandatários. Reis, nobres e a Igreja foram importantes incentivadores das artes,
uma vez que investiram grande quantidade de recursos para a execução de obras
como mosteiros, igrejas, castelos e palácios. Percebe-se que a dedicação de
recursos para as artes, especialmente para as empresas arquitetônicas, ganhou
atenção ao longo do século. No artigo, buscaremos traçar um panorama das artes
no Reino, procurando avaliar como a historiografia até então vem analisando os
estilos e as transformações verificadas no século XV.
A arte castelhana é caracterizada pelas múltiplas influências
recebidas ao longo dos séculos por sociedades que coabitaram aquele espaço e
que imprimiram suas marcas culturais. Romanos, visigodos e muçulmanos, por
exemplo, têm sua presença marcada na região através dos diversos vestígios
culturais que ainda podem ser encontrados em suas áreas de ocupação. A
influência muçulmana, acompanhando seu longo período de domínio sobre o
território, teve uma permanência bastante duradoura, sendo observada com um
traço característico da arte espanhola por muitos séculos subsequentes. O
influxo de tendências de outras áreas da Europa também teve um importante
papel na formação do que chamamos de arte castelhana.
A partir do século X, principalmente com o aumento da
peregrinação pelo Caminho de Santiago, é possível perceber uma maior
aproximação dos reinos cristãos ibéricos com relação às demais áreas da
Cristandade, o que contribuiu enormemente para a apropriação de estilos vindos
de além dos Pirineus. Sob influência dos monges da ordem de Cluny (IOGNA48
Cinthia M. M. Rocha
PRAT, 1998, p. 106) foram erguidas as primeiras construções românicas da
Península, com grande destaque para a Catedral de Santiago de Compostela. É
interessante observar a influência também da Reconquista nesse processo. A
participação do clero foi fundamental para a atividade de repovoamento, através
da criação e restauração de dioceses nas áreas conquistas e da construção de
monastérios, que seguiam o processo de expansão territorial. Por isso, é possível
perceber o momento de domínio de determinada região através da observância
da Ordem que nela prevalece, uma vez que eram beneficiadas as que, naquele
momento particular, estavam mais fortalecidas perante a Cristandade. Assim, no
norte encontramos mais freqüentemente mosteiros da ordem de Cluny; ao
centro, da ordem de Cister, e ao sul, das ordens mendicantes. O estilo adotado
para cada construção seguia o mesmo movimento, uma vez que era influenciado
pelos membros dessas ordens, muitos vindos de outras regiões do continente,
especialmente da França.
A introdução do Gótico na Península ocorre nesse mesmo contexto.
Segundo Azcárate, a partir do século XII, se produz na Europa uma “profunda
renovação da cultura”
2
(AZCÁRATE, 2007, p. 1), na qual está incluído o
surgimento do novo estilo. A influência francesa é a que mais se observa em
Castela, com a apropriação de vários modelos construtivos. Rafael Cómez
conclui que “nas oficinas hispânicas nos encontramos diante das mesmas
práticas efetuadas para a construção das catedrais góticas francesas” 3 (CÓMEZ,
2009, p. 125). O século XIII representa um período de intenso desenvolvimento
construtivo. É o momento da construção de importantes catedrais, como a de
Burgos, Toledo e León, grandes exemplares do chamado Gótico Clássico em
Castela. Esse fato é acompanhando – e invariavelmente vinculado – ao avanço
“profunda renovación de la cultura” (Tradução Nossa).
"en los talleres hispánicos nos hallamos ante las mismas prácticas efectuadas para la construcción de las
catedrales góticas francesas" (Tradução Nossa).
2
3
49
Cinthia M. M. Rocha
da Reconquista e ao impulso centralizador por parte dos reis do período,
processos que demandavam um domínio não apenas físico do território ocupado,
mas também ideológico, especialmente nas áreas urbanas. A Capela Real da
Catedral de Santa María de Sevilha nos oferece um importante exemplo dessa
questão. Após a conquista de uma cidade pelos cristãos, era de vital importância
para a consolidação da empreitada – em esfera simbólica – que a aljama local
fosse consagrada catedral, pois a apropriação dos espaços religiosos era a
própria marca da apropriação do território conquistado. Diversas alterações eram
realizadas no edifício, como a colocação do Pendão Real no alto do minarete
(JIMÉNEZ MARTÍN, 2006, p. 22) e a reorientação espacial do local de culto.
Em Sevilha, uma importante modificação foi a criação da Capela Real.
Conforme informações de alguns cronistas que escreveram sobre a mesquita
muçulmana no momento da conquista, o rei Alfonso X a teria divido em duas
partes, fixando a nave central como limite (ORTIZ DE ZÚÑIGA, 1795, p. 55).
No lado ocidental, foram colocados o altar maior e o coro da catedral, enquanto
o lado oriental foi todo destinado à Capela Real, que serviria de panteão para
abrigar o corpo dos falecidos monarcas. A construção de uma capela de tão
grandes proporções coincide com o momento em que a monarquia, na figura do
rei D. Alfonso, se colocava à frente da administração do reino e criava para si
uma identidade que era, ao mesmo tempo, pessoal – representada pelo próprio
rei em seu “corpo natural” e por sua dinastia – e política, representada pelo
“corpo político” da instituição. Assim, “o simbolismo da sobrevivência do Rei a
despeito da morte do rei” (KANTOROWICZ, 1998, p. 253) era representado
pela efígie do monarca que, juntamente com seus pertences mais característicos
(como a espada, no caso de Fernando III), figurava como peça central da Capela
Real. Assim, se organizou esse espaço
50
Cinthia M. M. Rocha
não só para conter os restos mortais dos monarcas e suas famílias, mas
também todo um símbolo da monarquia ao dotá-lo das formas e da
teatralidade adequadas a exaltação dos reis fundadores.4 (ALMAGRO
GORBEA, 2007, p. 33)
A Reconquista deixou, ainda, outras marcas na arte castelhana. O
contato com as áreas islamizadas tem grande influência sobre obras que passam
a ser desenvolvida no período. A batalha de Las Navas de Tolosa, em 1212,
marcou uma virada significativa para os cristãos em relação à hegemonia na
Península Ibérica. Em 1264, todo o sul da Península já estava sob domínio
cristão, com a conquista de importantes áreas, como Cáceres (1229, Córdoba
(1236) e Sevilha (1248). A região de Al-Aldaluz expôs aos cristãos magníficas
construções, como as mesquitas das últimas duas cidades mencionadas, e os
colocou em contato com novos métodos, materiais e construtores com grande
domínio de técnicas que foram paulatinamente incorporadas pelos arquitetos
cristãos. A arte que se denominou mudéjar 5 era, portanto, a mescla de
influências distintas, vindas do mundo Oriental e Ocidental e, para Azcárate,
caracterizou-se como a “mais genuína expressão artística hispânica” 6
(AZCÁRATE, 2007, p. 71).
1. O Tardogótico
O Gótico e o mudéjar tiveram uma longa permanência na arte
castelhana e foram os estilos predominantes até princípios do século XVI,
quando foram paulatinamente substituídos pelo “estilo romano”. Nos séculos
“no sólo a contener los restos mortales de los monarcas y sus familiares, sino a ser todo un símbolo de la
monarquía al dotarlo de las formas y la teatralidad adecuadas para la exaltación de los reyes fundadores.”
(Tradução Nossa)
5
Mudéjar é um termo que deriva da palavra em árabe [ مد ّجنmudaǧǧan] que significa "doméstico" ou
"domesticado" e que se utiliza para designar os muçulmanos que permaneceram vivendo em território cristão,
mantendo suas práticas religiosas e culturais.
6
“más genuina expresión artística hispánica”. (Tradução Nossa)
4
51
Cinthia M. M. Rocha
XIV e XV, o Gótico ganhou um novo e forte impulso em diversas partes da
Europa. Muitos historiadores analisam as mudanças que podem ser observadas
no período e concordam que se trata de um momento de renovação no estilo:
Argan chega a falar em um neogótico (ARGAN; FAGIOLO, 1994, p. 63).
Embora mantenha determinadas características estruturais típicas do Gótico
Clássico – como os arcos ogivais e os arcobotantes –, uma atenção distinta é
dada à ornamentação, que se torna mais efusiva e refinada. Na Inglaterra, o
estilo é chamado de Perpendicular, enquanto na França ganha a alcunha de
Flamboyant.
A historiografia espanhola atual tem utilizado o termo Tardogótico
para se referir à arte do século XV nessa região (ALONSO RUIZ, 2006). Pouca
atenção foi dada ao estudo sistemático desse estilo como um movimento
específico e particular, tendência que tem se revertido nas últimas décadas
devido a recentes investigações levadas a cabo por historiadores e historiadores
da arte espanhóis7. Também na Península Ibérica o estilo é caracterizado pela
atenção à decoração.
É a tendência ao esplendor decorativo nota distintiva, cobrindo os
parâmetros com tracerias decorativas, assim como a desvirtuação da
funcionalidade dos elementos construtivos, bem como arcos falsos
tecnicamente fracos ou, inclusive, recarregando a decoração das
abóbadas ou também as perfurando e incluindo nervuras ornamentais,
como de combados, que não respondem a uma função elementar de
reforço ou de sustentação.8 (AZCÁRATE, 2007, p. 3)
7
Existe atualmente um grupo de investigação formado por pesquisadores de diversas universidades espanholas e
que se dedicam ao estudo da arquitetura do século XV. Coordenado pela professora Begoña Alonso Ruiz, da
Universidad de Cantabria, o Grupo de Investigación de Arquitectura Tardogótico mantém uma ativa página com
o objetivo de difundir trabalhos sobre o tema, que pode ser visitada no endereço www.tardogotico.es.
8
“Es la tendencia a la fastuosidad decorativa nota distintiva, cubriendo los parámetros con tracerías decorativas,
así como la desvirtuación de la funcionalidad de los elementos constructivos, bien como arquerías falsas
técnicamente débiles o incluso recargando la decoración en las bóvedas o bien perforándolas y añadiendo
nervios ornamentales como los combados, que no responden a una función elemental de refuerzo o de
sostenimiento.” (Tradução Nossa).
52
Cinthia M. M. Rocha
José María Azcárate, em obra publicada pela primeira vez em 1990,
se refere a esse período como “a fase barroca do estilo gótico em Espanha”
9
(AZCÁRATE, 2007, p. 3), numa expressão que tinha a intenção de reforçar o
monumentalidade e a ornamentação faustuosa que vai ser característica da
arquitetura nesse momento. Azcárate também destaca a importante influência de
Borgonha e Flandres na arte castelhana, o que ele atribui às estreitas relações
entre as regiões e a aceitação por parte da nobreza de Castela do modo de vida
borgonhês. O estilo – que teria surgido a partir da fusão das formas flamencas e
islâmicas – teria dado origem ao que chama de “hispano-flamenco”, termo
considerado inapropriado por pesquisadores como Begoña Alonso Ruiz, porque,
como afirma, “não se trata de uma simbiose de ambas culturas arquitetônicas,
mas uma referência ao trabalho em nosso país de artistas bretões, flamencos e
germânicos”10 (ALONSO RUIZ, 2006, p. 23).
A presença de construtores estrangeiros não foi um dado novo e
tampouco um fato isolado no panorama ibérico, ainda que seja difícil atribuir
com exatidão a origem de mestres importantes, como, por exemplo, Martín,
Ricardo, Enrique y Petrus Petri (MARTÍNEZ DE AGUIRRE, 2009. pp. 127164). Porém, o século XV registra a presença desses artistas forâneos como um
fenômeno de grandes consequências para o desenvolvimento artístico da região:
Martínez de Aguirre nos fala de uma “irrupção generalizada de artistas
estrangeiros em Espanha durante a segunda metade do Quatrocento”
(MARTÍNEZ DE AGUIRRE, 2009. P. 163), que pode ser observada através de
diversas ordenanças municipais. De fato, a chegada em Castela de diversos
artistas vindos do norte europeu foi o marco de profundas transformações nas
artes visuais, com grande ênfase para a arquitetura, porque, ao redor dos
“la fase barroca del estilo gótico en España” (Tradução Nossa).
“no se trata de una simbiosis de ambas culturas arquitectónicas, sino que hace referencia al trabajo en nuestro
país de artistas bretones, flamencos y germanos” (Tradução Nossa).
9
10
53
Cinthia M. M. Rocha
principais mestres foram criadas oficinas responsáveis pela formação de
gerações subsequentes de construtores, mantendo a influência do Gótico de
origem flamenca e germânica até meados do século XVI. Muitos discípulos
eram unidos a seus mestres por relações de parentesco, criando verdadeiras
dinastias de construtores. Destacam-se, especialmente a partir do primeiro terço
do século XV, dois principais focos: o burgalês e o toledano.
2. O foco burgalês
Um forte impulso ao desenvolvimento artístico de Burgos está
relacionado ao Bispo Alonso de Cartagena, que teria sido responsável pela ida
de um importante grupo de artistas de origem alemã para a cidade. Cartagena
havia participado do Concílio da Basileia (1431-1445), no qual havia entrado
em contato com o Tardogótico alemão durante sua estadia na região e ao viajar à
Breslávia, na Boêmia (atual Polônia), em missão diplomática (GARCÍA
CUETOS, 2006, p. 99-100). O estilo desenvolvido pela oficina burgalesa tem
grande influência germânica e caracteriza-se pela solidez de estrutura e um
maior comedimento na decoração, ponto no qual se diferencia da oficina
toledana (GARCÍA CUETOS, 2006, p. 99-100).
Os principais nomes entre os construtores são Juan e Simón de
Colônia, pai e filho. Os dois trabalharam juntos em diversas construções de
destaque do período. Foram, ambos, Mestres Maiores da Catedral de Burgos e
corresponde a eles o zimbório, já destruído, a Capela da Concepção e a Capela
da Visitação, local de enterramento de Alonso de Cartagena. Juan de Colônia
iniciou a construção da Cartusiana de Miraflores e do Palácio dos Condestáveis
(Casa del Cordón), pertencente à família Velasco. A obra prima de Simón de
Colônia também pertenceu à mesma família: trata-se da Capela dos
Condestáveis, no interior da Catedral de Burgos, de planta octogonal, “na qual
54
Cinthia M. M. Rocha
se nota o conceito espacial grandioso da arquitetura gótica germânica”11
(AZCÁRATE, 2007. p. 125). Duas fachadas muito representativas do
Tardogótico também são obras de Simón: a Igreja de Santa María de Aranda de
Duero e o Convento de San Pablo de Valladolid.
É importante destacar também o papel exercido pelo escultor Gil de
Siloé. Não se sabe a origem do entalhador, ainda que Yarza Luaces supusesse se
tratar de um artista de origem nórdica, mas de formação hispânica, graças ao
estilo que desenvolveu, bastante apegado às formulas góticas desenvolvidas em
Burgos (YARZA LUACES, 2007. p. 18). Atuou nas últimas décadas do século
XV e, mesmo em um curto espaço de tempo, deixou uma vasta obra produzida
em grande variedade de materiais. Entre suas principais obras estão o retábulo
Santa Ana, feito sob encargo de Luis de Acuña, bispo de Burgos que sucedeu a
Alonso de Cartagena, os sepulcros do rei Juan II, sua mulher Isabel de Portugal
e do Infante Alfonso, na Cartusiana de Miraflores, além do retábulo da mesma
capela, encomendados por Isabel, a Católica.
3. O foco toledano
De uma maneira geral, podemos caracterizar o estilo da oficina
toledana como bastante aproximada da fórmula do Gótico Flamejante, o que se
pode atribuir à origem de seus mestres, oriundos de Flandres e Bretanha. A
chegada à Toledo de grandes construtores flamencos parece estar também
diretamente ligada a um religioso, o Bispo Cerezuela, irmão de Álvaro de Luna,
que, na época, era Condestável de Castela. Por influência de Luna, o Bispo
Cerezuela aparece vinculado a duas das principais arquidioceses do reino,
Sevilha e Toledo. Em 1433, Luna, durante um dos momentos áureos de sua
atuação como valido de Juan II, em que seu prestígio era indiscutível, teria sido
11
"en la que se acusa el concepto espacial grandioso de la arquitectura gótica germánica." (Tradução Nossa).
55
Cinthia M. M. Rocha
capaz de interceder junto ao papado para que o então arcebispo de Sevilha,
Diego de Anaya Maldonado, um dos clérigos mais importantes de Castela, fosse
retirado da Sede e, em seu lugar, fosse nomeado Juan de Cerezuela y Luna, seu
meio-irmão. Cerezuela permaneceu em Sevilha apenas um ano e logo foi
transladado à arquidiocese de Toledo (SUÁREZ FERNANDEZ, 2005. p. 217218). Quando assumiu a Mitra toledana, já existia um grupo de artistas
flamencos trabalhando na capela de seu irmão e no Castelo de Escalona,
pertencente a Luna, mas o grande impulso construtivo foi dado a partir de seu
período como arcebispo.
Em 1448 é registrada a presença de artistas como Hanequin de
Bruxelas e Pedro Guas (ALONSO RUIZ, 2006. p. 32-33). Ao redor deles
desenvolveu-se uma ampla oficina de escultores e entalhadores, responsável
pela formação de nomes como Juan Guas, filho de Pedro, e os irmãos Antón e
Enrique Egas. Hanequin foi, segundo Alonso Ruiz, discípulo de Jean van
Ruisbroeck e Mestre Maior da Catedral de Toledo, responsável, entre outras
obras, pela Porta dos Leões. É considerado o introdutor das formas flamencas
em Toledo e trabalhou no Castelo de Cuéllar, de Beltrán de la Cueva e, junto
com o irmão, Egas Coeman, na Catedral de Cuenca.
Juan Guas é, talvez, o principal nome entre os arquitetos do
período. Alcançou grande êxito ao combinar as formas flamencas e mudéjares,
apreendidas em Toledo, já que recebeu influência da primeira graças à oficina
onde obteve sua formação e, da segunda, através da observação do conjunto
arquitetônico da cidade (AZCÁRATE, 2007. p. 117-122). Alonso Ruiz afirma
que a
simbiose de ambas as linguagens é a essência do estilo criado por
Guas em que, por exemplo, as pontas de diamante e as traçarias
flamejantes foram empregadas com o mesmo critério decorativo,
56
Cinthia M. M. Rocha
criando uma hábil combinação entre ornamentação e escultura.12
(ALONSO RUIZ, 2006. p. 33)
Sua obra pode ser vista em diversas construções, entre religiosas,
como as catedrais de Ávila e Segóvia, e civis, como o Palácio do Infantado e na
fachada do Colégio de San Gregorio de Valladolid. Guas é responsável por uma
série de construções elencadas para a presente pesquisa, como o Castelo Novo
de Manzanares el Real e o já mencionado Palácio do Infantado (Guadalajara), da
família Mendoza, o Mosteiro de El Parral (Segóvia), mandado construir pelo rei
Enrique IV, e o Mosteiro de San Juan de los Reyes (Toledo), construído sob o
patrocínio de Isabel I para ser mausoléu real.
Já no final do século XV e início do XVI, os principais seguidores
de Juan Guas foram Antón y Enrique Egas, sobrinhos de Hanequin de Bruxelas,
filhos de Egas Cueman. Ambos foram responsáveis por manter a tradição do
Gótico Tardio presente nos ateliês toledanos, enquanto em outras regiões se
observava o paulatino florescimento do estilo “romano”. Enrique Egas, por
exemplo, é encarregado em 1512 da Capela Real de Granada e em seu projeto
repete a fórmula criada por Juan Guas para o Mosteiro de San Juan de los Reyes
(AZCÁRATE, 2007. p. 123), projeto esse modificado posteriormente por Juan
Gil de Hontañon e Juan de Ruesga (ALONSO RUIZ, 2006. p. 35), que
introduziram inovações.
4. As renovações do final do século XV
A introdução do Renascimento na Península Ibérica foi paulatina e
bastante tardia, se comparada a outras regiões meridionais europeias. A chegada
“La simbiosis de ambos lenguajes es la esencia del estilo creado por Guas en el que, por ejemplo, las puntas
de diamante y las tracerías flamígeras fueron empleadas con el mismo criterio decorativo, creando una hábil
combinación entre ornamentación y escultura”. (Tradução Nossa).
12
57
Cinthia M. M. Rocha
do estilo está diretamente vinculada aos Mendoza. Helen Nader analisa a
importância dessa família para a literatura renascentista, cuja influência,
segundo ela, se fez sentir já no século XV com o Marquês de Santillana e,
posteriormente, com o Segundo Conde de Tendilla (NADER, 1979). A primeira
construção em estilo “romano” em Castela que temos notícia é o sepulcro de
Pedro González de Mendoza – o Gran Cardenal Mendoza - enterrado na
Catedral de Toledo, onde era arcebispo (TORMO, 1917, pp. 51-65). A capela
mandada construir por Diego Hurtado de Mendoza, seu sobrinho e arcebispo de
Sevilha, na Catedral Hispalense segue o mesmo estilo. Em um documento em
que o clérigo ordena a continuação das obras no local, encontra-se um trecho
interessante. Ele pede que se faça uma porta da Sacristia que “sera rico al modo/
romano” (JIMÉNEZ MARTÍN, 2006. p. 87). Um pedido semelhante é feito em
1505, três anos após a morte do clérigo, pelo Conde de Tendilla, que escreve ao
cabido cobrando a obra da tumba de Dom Diego e afirma que sua vontade “es
que no se mezcle con la otra obra ninguna cosa françisa ni alemana ni morisca
syno que todo sea romano” (JIMÉNEZ MARTÍN, 2006. p. 93).
O pedido tem razão de ser, uma vez que o que se notava com mais
frequência na arquitetura do final do século XV e início do XVI era uma mescla
de elementos Tardogóticos, mudéjares e Renascentistas. Sob o reinado dos Reis
Católicos, o Gótico passou por uma profunda renovação e as construções feitas
no novo estilo passaram a ser chamadas de “modernas”. Segundo Víctor Nieto,
Na Espanha desde o final do século XV se dizia que um edifício
estava realizado a “lo romano” quando sua arquitetura era
renascentista, reservando-se o qualificativo de “moderno” para
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denominar aquelas obras realizadas de acordo com o sistema
construtivo gótico.13 (NIETO, MORALES, CHECA, 2009, p. 13)
Várias denominações foram utilizadas para designar o estilo
adotado nesse momento: “Isabelino”, “estilo Reis Católicos”, “Gótico
arcaizante”, “Protorenascimento”, “Plateresco”. A própria indefinição na
nomenclatura indica a dificuldade que a historiografia vem tendo para
caracterizar as obras daquele período. Os dois primeiros termos fazem referência
ao período histórico, identificando as construções a um contexto específico
ligado
à
monarquia
dos
Reis
Católicos.
“Gótico
arcaizante”
e
“Protorenascimento” enfatizam, ainda que com focos distintos, as duas
principais influências que o estilo adotado recebeu: o Gótico Tardio, que vinha
sendo realizado ao longo de todo o século, e os novos elementos italianos que
passam a ser assimilados. O termo “Plateresco” é o mais comumente utilizado.
Foi cunhado pela primeira vez no século XVII pelo cronista Diego Ortiz de
Zúñiga (ORTIZ DE ZÚÑIGA, 1795) enquanto analisava a Capela Real e o
Ayuntamiento de Sevilha.
Desde então, tem recebido uma dupla acepção.
Autores como Camón Aznar (CAMÓN AZNAR, 1945) utilizam o termo
Plateresco para designar o que considera um estilo específico, enquanto outros,
como Víctor Nieto (NIETO, MORALES, CHECA, 2009), defendem que o
termo designaria apenas uma forma de decoração. De fato, se observarmos a
estrutura construtiva desses edifícios, perceberemos que se segue utilizando
largamente as fórmulas do Gótico, enquanto a decoração e ornamentação vão,
paulatinamente, assimilando elementos Renascentistas, ainda que não haja
muitas interferências na divisão espacial. Para Alonso Ruiz, o Plateresco “não é
“En España desde finales del siglo XV se decía que un edificio estaba realizado a ‘lo romano’ cuando su
arquitectura era renacentista, reservándose el calificativo de ‘moderno’ para denominar aquellas obras realizadas
de acuerdo con el sistema constructivo gótico”. (Tradução Nossa).
13
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outra coisa que arquitetura tardogótica vestida com roupa romana” 14 (ALONSO
RUIZ, 2006. p. 43).
Entre os “modernos”, há que se destacar a obra de Juan Gil de
Hontañón e de seu filho, Rodrigo Gil de Hontañón, já mais associado ao
Plateresco. Juan Gil trabalhou na obra de diversas catedrais, como as de Sevilha,
Salamanca e Segóvia. Também realizou importantes construções civis,
especialmente para a família Velasco. Seu estilo se caracterizava pela simbiose
entre as oficinas burgalesa e toledana, unindo as tradições germânicas e
flamencas que caracterizavam cada uma delas (ALONSO RUIZ, 2006. p. 39).
De fato, a arquitetura desse período se produz por “um processo de indefinição,
incerteza e ambiguidade estilística”15 (NIETO, MORALES, CHECA, 2009, p.
58). As formas puramente Renascentistas vão vigorar apenas no segundo terço
do século XVI, o que não significa que não tenha havido profundas mudanças
nas décadas anteriores. O desejo de modernidade era um sentimento presente no
final do século XV, ainda que não tenha se plasmado em uma total recriação do
estilo, mas em pequenas alterações em fórmulas já conhecidas.
5. Conclusão
Como vimos, o período do Tardogótico em Castela coincide com o
aumento exponencial do investimento em Arte. Reis, nobres e a Igreja tiveram
um papel central na questão, uma vez que dedicaram grandes recursos para a
execução de obras, como mosteiros, igrejas, castelos e palácios. Novas
construções foram erguidas, como a Catedral Gótica de Sevilha, a Cartuxa de
Miraflores, o Castelo de Manzanares el Real, e o palácio conhecido como Casa
del Cordón, em Burgos, para citar apenas alguns exemplos. Outras foram
14
15
“no es otra cosa que arquitectura tardogótica vestida con ropa romana.” (Tradução nossa).
“un proceso de indefinición, incertidumbre y ambigüedad estilística” (Tradução nossa).
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ampliadas e reformadas, como é o caso da Catedral de Toledo e do Mosteiro
Real de Santa Maria de Guadalupe. Todas as obras têm em comum a
grandiosidade e imponência, tendo demandado elevados investimentos sociais e
econômicos. Segundo nos afirma Cristóbal de Villalón, em 1539, “Pues en la
Architectura no han faltado varones en estos tiempos que se ayan señalado en
edificios” (VILLALÓN, 1896).
Politicamente, observamos um duplo processo. O período é
marcado pelo crescimento da centralização do poder nas mãos do rei, através do
controle da potestade legislativa e manifestado pela fórmula que passou a ser
cada vez mais comum na documentação de Castela: “de mi poderío real
absoluto, motu propio e cierta ciência” (NIETO SÓRIA, 1999. p. 38). Ao
mesmo tempo e sobremaneira vinculado ao processo anterior, a nobreza,
formada por muitas linhagens que emergiram após o início da dinastia
Trastâmara, adquiria e concentrava em si um enorme poder social e econômico,
consolidando sua hegemonia perante o reino. A distribuição de privilégios e
mercês, garantidas pela ampliação do poder real, viria a fortalecer mutuamente
monarquia e nobreza, o que fez com que o século XV fosse marcado pelo total
predomínio dessa aristocracia, que passou a exercer o controle econômico – pela
posse da terra e o controle de seus benefícios – e político – pelo domínio de
diversas esferas do poder governamental.
Por essa razão, seu papel enquanto classe dominante precisava ser
e, de fato, era sustentado pelo controle das práticas sociais, das quais a arte é
uma parte fundamental. Dentro dessa conjuntura, não surpreende que os
principais investimentos em arte tivessem vindo dos próprios reis e das famílias
mais proeminentes e centrais dentro das contendas políticas de sua época. É
possível traçar a vinculação dos construtores mais destacados do Tardogótico a
um número mais que significativo de grandes linhagens, como é o exemplo de
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Cinthia M. M. Rocha
Juan Guas, que foi arquiteto real, arquiteto da Casa dos Mendoza, além de ter
trabalhado na construção do Castelo de Belmonte, de Juan Pacheco, Marquês de
Villena, e do Castelo de Cuéllar, de propriedade de Beltrán de la Cueva.
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Abstract: The purpose of this article is to raise questions about changes in the artistic
panorama of Castile in the 15th century, especially regarding to architecture. This was a
moment of intense transformations in the international scenario, and, therefore, it is
convenient to discuss the process that, in Castile, let to the strengthening of the Late Gothic
and of the style that was known as Spanish-flamenco. This article is part of the doctoral
research, entitled "Building an image: art and the political projects of Castile in the 15th
century", held at the Programa de Pós-Graduação em História, of the Universidade Federal
Fluminense.
Key-words: Architecture; Castile; 15th century
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