FORTIFICAÇÕES E TERRITÓRIO NA PENÍNSULA IBÉRICA E NO MAGREB
I
ISBN 978-989-689-374-3
FORTIFICAÇÕES
E TERRITÓRIO
NA PENÍNSULA
IBÉRICA E NO MAGREB
(SÉCULOS VI A XVI)
Coordenação de
Isabel Cristina F. Fernandes
Vol. I
Biblioteca Nacional de Portugal
– Catalogação na Publicação
FORTIFICAÇÕES E TERRITÓRIO NA PENÍNSULA IBÉRICA E NO MAGREB
(SÉCULOS VI A XVI)
Fortificações e território na Península Ibérica e no Magreb
(séculos VI a XVI) / coord.
Isabel Cristina Ferreira Fernandes. – (Extra-colecção)
1º v. – 472 p. – ISBN 978-989-689-374-3
I – FERNANDES, Isabel Cristina F., 1957CDU 904
Título: Fortificações e Território na Península Ibérica e no Magreb
(Séculos VI a XVI) – Volume I
Coordenação: Isabel Cristina Ferreira Fernandes
Edição: Edições Colibri/Campo Arqueológico de Mértola
Capa e separadores: DCCT – Câmara Municipal de Palmela
Revisão dos textos: I. C. Fernandes; J. F. Duarte Silva; Patrice Cressier
Depósito legal: 368 239/13
Lisboa, Dezembro de 2013
Os sistemas defensivos da Guarda Medieval. Contributos para o seu conhecimento
VÍTOR PEREIRA
Câmara Municipal da Guarda
ALCINA CAMEIJO
Agência para a Promoção da Guarda
1. Contextualização histórica
D
EVE-SE a Duarte de Armas a primeira vista
conhecida da cidade da Guarda1. Apesar de o
famoso debuxador e escudeiro da corte de
D. Manuel não ter aparentemente visitado a cidade, a
vista do castelo e das muralhas da Guarda vislumbra-se no plano de fundo do desenho de “Vilar mayor
tirado [do] naturall da bamda do norte”, do famoso
Livro das Fortalezas “que sam setuadas no estremo
de portugall e castella”2 (Armas, 1997: 2). O que
representa Duarte de Armas? No cume de um monte
muito penhascoso surge um típico castelo medieval,
ou melhor, uma cerca amuralhada devidamente
ameada, contendo no centro uma pujante torre de
menagem, de altura muito destacada do conjunto,
assinalada pela bandeira com as quinas do Reino de
Portugal, galhardamente hasteada das suas ameias. A
vontade de clareza do famoso desenhador leva-o –
segundo uma boa prática, muito sua, de legendar tudo
o que é relevante em cada vista – a legendar este
pormenor do desenho. Com efeito, sobre o desenho
minúsculo deste conjunto fortificado lá surge a
legenda respectiva: “a guarda”.
Como avaliar esta vista da Guarda? Ela enquadra-se nas representações típicas do grande desenhador,
entre o convencionalismo típico de algumas perspectivas e representações (a figuração de certos aspectos
da natureza, serranias, barrocais, rios, ou a figuração,
muito convencional, das manchas de casario, por
exemplo) e o maior rigor na representação. Este
assinala-se, com efeito, tanto nos grandes conjuntos
paisagísticos representados, como nos elementos
naturais e construídos, como ainda nos mais diversos
pormenores construtivos que mereceram a atenção do
olhar curioso e rigoroso de Duarte de Armas. A vista
de “a guarda”, apesar de muito pequena, representa
uma cidade inteiramente amuralhada a que a destreza
do desenhador na manipulação sábia e muito engenhosa das escalas dá uma dimensão verdadeiramente
monumental. A cidade surge nesta vista rodeada de
muralhas, com a torre de menagem bem no centro da
representação. As muralhas estão pontuadas por
quatro torres, das quais três são facilmente identificáveis: as duas do lado esquerdo parecem ser as de
apoio às Portas da Covilhã e dos Ferreiros, respectivamente. A seguinte parece corresponder à protecção
da Porta da Erva ou de reforço de um pano indeterminado de muralha (embora não conheçamos teste
munhos documentais da sua eventual existência).
Enfim, a última torre, que surge no flanco direito
destas muralhas, não pode deixar de ser a Torre
Velha, estrutura arquitectónica e defensiva muito
ancestral que acabaria por dar ao sítio o nome, muito
popular na cidade, de Torreão – sítio entretanto
empobrecido e tornado periférico.
Estas muralhas que, a crer em Duarte de Armas,
permaneciam intactas em 1509, com a sua coroa
contínua de ameias, abrigavam uma cidade fundada
pelo Rei D. Sancho I, o Povoador. Muito menos
conhecida é a complexa história, em grande parte por
fazer, desta cerca amuralhada, construída em diversos
momentos entre os séculos XII a XIV, a partir de um
núcleo defensivo inicial. Este primitivo núcleo
fortificado foi o centro do povoado original, que
gozaria de uma evidente expansão – no quadro das
dinâmicas urbanas da cidade, vividas ao longo de
todo o século XIII – consagrada por novas e ambiciosas obras de fortificação datáveis da entrada do
século XIV, isto é, da época do Rei D. Dinis3. As
páginas que se seguem pretendem apreender alguns
aspectos desta história que ainda está longe de ser
plenamente conhecida.
Erigido no cume do último contraforte da Serra da
Estrela, no alto dos seus 1056 m de altitude, da Torre
de Menagem do castelo da Guarda domina-se visualmente grande parte do Planalto Beirão. Os restos
imponentes do conjunto do sistema defensivo medieval, que envolvia e protegia o núcleo central da
cidade e do qual se destaca a Torre de Menagem da
desaparecida alcáçova medieval, ainda hoje proporcionam alguns dos monumentos arquitectónicos mais
emblemáticos da cidade.
Fig. 1 – Torre de Menagem do Castelo da Guarda (imagem de
Arménio Bernardo | CMG).
Fortificações e Território na Península Ibérica e no Magreb (Séculos VI a XVI), Lisboa, Edições Colibri & Campo Arqueológico
de Mértola, 2013, p. 435-443.
436
Há muito classificado como Monumento Nacional,
do castelo medieval da Guarda ainda é possível observar diversos lanços de muralha e algumas torres e
portas de acesso à cidade. Todavia, as reconstruções, a
ruína, o desmonte e rasgamento de alguns panos de
muralha, bem como o seu encobrimento pelas habitações adjacentes levaram à descaracterização e à ocultação da maior parte da fortificação medieval4.
Ao longo de diversos anos de escavações arqueológicas no núcleo histórico, promovidas pelo Município da Guarda5, foi possível confirmar que a ocupação desta área recua apenas à Idade Média6, não se
tendo verificado – até ao momento – vestígios de
ocupação de períodos anteriores7.
É já em Plena Idade Média que o castelo da Civitas
de A guarda se vai tornar num dos centros geoestratégicos da Beira. Recebendo Carta de Foral – outorgada
por D. Sancho I – a 27 de Novembro de 11998, a
cidade da Guarda cedo se converteu num importante
foco urbano a que a transferência da sede de Diocese
da antiga Egitania, em 1202, por Inocêncio III (RODRIGUES, 1977: 69), confere significado acrescido.
Todavia, sobre o castelo da Guarda pouco sabemos. As fontes escritas referem que em 1221 (GOMES, 1987: 35) as obras no castelo já tinham sido
iniciadas, o que coloca a questão da inexistência de
uma estrutura defensiva no burgo medieval e episcopal inicial pelo menos durante os seus primeiros anos,
desde a fundação da cidade àquela data, que parece
poder ser dada como a do início da construção do
castelo9. Merece nota a falta de referências escritas a
estruturas defensivas do povoado primitivo. Com
efeito, a concessão do Foral em 1199 exigiu ou
suscitou uma organização administrativa e eclesiástica local plenamente estruturada, que justificaria a
condição e o título de civitas, atribuído a uma comunidade urbana então muito jovem. Sabemos, de facto,
que a Guarda depressa ganharia uma grande relevância urbana, de nível regional, uma vez que já em 1260
surgem referências a sete Igrejas paroquiais no
interior e no exterior do perímetro amuralhado10.
A nossa investigação teve em consideração todas
estas questões. O presente artigo pretende apresentar
os resultados e conclusões provisórias de uma escavação arqueológica iniciada em 2004 na área Norte
do núcleo histórico da cidade da Guarda, no lado
oposto à alcáçova medieval. Tentámos então confirmar a existência de uma primeira fortificação medieval, atestada nas fontes documentais, mas que a
inexistência de escavações arqueológicas não permitia comprovar11. A natureza daquelas referências
escritas e a existência de uma torre defensiva aparentemente mais antiga – embora inserida no pano de
muralha mais recente – e a sua função original no
quadro da complexa história da fortificação da cidade
– foram o ponto de partida de um projecto de investigação que se pautou pela recolha de informações
históricas sobre aquele sítio que, pensamos, pode
corresponder à implantação urbana primitiva da
cidade da Guarda. Através da discussão dos resultados de diversas intervenções em distintos sítios da
cidade pretendemos tecer algumas considerações
Vítor Pereira e Alcina Cameijo
sobre a evolução do complexo e obscuro sistema
defensivo da Guarda medieval.
Fig. 2 – Planta da cidade da Guarda: localização das duas alcáçovas, a datável do Século XII a Norte e a pertencente ao Castelo
Gótico, a Sul.
2. A fortificação românica
Uma das primeiras referências à existência de um
“reduto” defensivo na área Norte do núcleo histórico,
conhecido localmente como Torreão, recua a 1758,
às Memórias Paroquiais, quando um dos priores das
igrejas da cidade que responderam ao Inquérito então
ordenado pelo Marquês de Pombal refere a existência
de uma torre com reduto12, de construção anterior à
muralha da cidade (CHORÃO, 2002: 30).
Actualmente, o espaço do Torreão é dominado
pelas ruínas de uma imponente torre, integrada no
pano de muralhas. Rita Costa Gomes cita um documento de 1395, do Tombo da Comarca da Beira, que
refere a construção de um muro novo em direcção à
Torre Velha13. Assim, a referência a uma torre velha
pressupõe a sua antiguidade face ao muro novo
documentado em 1395, que inflectia o seu traçado
(com a orientação Norte-Sul) para se encontrar e
articular com a referida Torre Velha.
Em fins do século XIV, tendo em conta a ruína do
pano original de muralha nesta área do núcleo amuralhado, é construído um novo pano de muralha, com
uma orientação diferente da antiga (direcção SE-NW), confluente com a torre primitiva existente.
Daqui resultou a construção do muro novo de 1395,
acabado de referir, em direcção à torre velha, reaproveitando as pedras da muralha mais antiga (provavelmente em ruínas e então desmontada) nesta nova
estrutura, que assim ganhava uma orientação e
traçado diferentes dos da cerca primitiva.
Tendo em conta estas considerações, a intervenção
arqueológica na zona Sul da Torre Velha, permitiu-nos
Os sistemas defensivos da Guarda Medieval. Contributos para o seu conhecimento
uma sequência estratigráfica marcada pela existência
de distintos períodos de ocupação e ainda a definição
da provável fortificação primitiva, existente aquando
da fundação da cidade da Guarda, que pensamos
inserir-se na tipologia do chamado castelo românico.
437
Esta primitiva fortificação faria parte da primeira
linha defensiva da Beira, juntamente com os castelos
de Trancoso, Celorico da Beira e Linhares, muito
próximos da linha de fronteira com Castela, que nesse
período – anterior ao Tratado de Alcanises16 – era
definida pelo traçado do Rio Côa. Com efeito, a
existência de um castelo na Guarda, na segunda
metade do século XII, deverá ser analisada no contexto da fundação de castelos em sítios estratégicos,
numa lógica de domínio e de controlo do território, de
organização administrativa do mesmo e de defesa das
comunidades locais em vias da sua organização em
concelhos. Mas a discussão da existência de um
castelo deve também considerar o seu papel de
controlo das vias de comunicação e das amplas terras
de intensa vocação agro-pecuária circundantes.
O núcleo urbano inicial da Guarda assentou numa
plataforma orográfica regular, limitada por duas elevações, uma a Norte, onde foi implantado o castelo
românico, e outra a Sul, de maior altitude, a 1056 m,
onde mais tarde foi construído o castelo gótico. Em
ambos os extremos, Norte e Sul, as vertentes escarpadas
contíguas criavam imponentes redutos naturais defensivos, inerentes às características geográficas da área. No
caso do sítio da Torre Velha, ainda hoje as suas vertentes contíguas, a Este, Norte e Leste, apresentam elevados desníveis17, apesar das sensíveis alterações topográficas sofridas por este sítio durante o século XX.
A intervenção arqueológica permitiu identificar
neste local um castelo adaptado às condições geográficas desta área, com uma Torre de Menagem implantada no ponto mais elevado da plataforma, assente
sobre o afloramento rochoso, atingindo os 6 m acima
do nível inferior.
Fig. 3 – Planta hipotética do castelo do Século XII, reconstituída na
malha urbana actual.
O avanço da Reconquista está associado à emergência de fortificações que se integram no que se tem
chamado de “castelo românico”, assente na estratégia
de defesa passiva14, em torno de uma Torre de Menagem, tipologia defensiva introduzida em Portugal pela
provável influência dos Templários (BARROCA,
2001: 107). Um bom exemplo é a Torre de Menagem
do vizinho castelo de Longroiva (Meda), cuja construção recua a 1174 (BARROCA, 2002: 538). Este
modelo de arquitectura militar, constituído por uma
torre central e um perímetro amuralhado, servido
apenas por uma porta principal, rapidamente se difundiu e em fins do século XII era já comum nos primeiros castelos portugueses (BARROCA, 1994: 60).
Consideramos que a Torre Velha da Guarda foi o
que restou do antigo castelo românico da cidade, cuja
construção deverá recuar a fins do século XII, inserida no âmbito da estruturação e organização administrativa e religiosa do território da Beira. A serem
correctas as nossa deduções, a Torre Velha integrava
um complexo defensivo-militar caracterizado pela
presença de uma torre, no centro de um pátio delimitado por uma linha de muralha, de planta tendencialmente ovalada15.
Fig. 4 – Perfil da alcáçova Norte.
A localização desta torre, no centro da fortificação,
tal como as torres idênticas conhecidas na região18,
insere-se no conceito de defesa passiva, o último
reduto de defesa e protecção face aos ataques de tropas
inimigas, uma vez rompida a muralha circundante.
A Torre Velha, que de há muito está rodeada de habitações a Sudoeste e a Oeste, perdeu a sua fachada
virada a Nordeste. De planta tendencialmente quadrangular, as suas paredes possuem 2 m de espessura e as
paredes exteriores da torre medem 10,40 m (no pano
Sudoeste) por 10.05 m. Recorde-se que a Torre de Menagem de Longroiva, por exemplo, possui 8.25 m de
lado, enquanto a de Marialva detém 7.90 m por
11.15 m. A Torre Velha foi construída com duplo paramento, com aparelho pseudo-isódomo, de alvenaria
regular, mas com silhares de diferentes comprimentos,
de formato tendencialmente sub-rectangular. Não
438
apresenta siglas ou marcas de canteiro, indiciando
maior antiguidade (BARROCA, 1994: 17) relativamente às outras estruturas defensivas do Castelo da Guarda.
Fig. 5 – Alçados da Torre Velha.
Vítor Pereira e Alcina Cameijo
século XII, ao reinado de D. Sancho I, época a que
remontará a Torre de Menagem do castelo de Numão,
datada de 1189 (BARROCA, 2000: 222). A nossa
proposta de datação para a torre da Guarda é fundamentada pelos resultados de uma sondagem arqueológica na área Sul da primitiva alcáçova, junto ao
pano de muralha, que nos permitiu identificar um
contexto assente sobre o afloramento rochoso e que
consideramos estaria associado à construção desta
estrutura defensiva. Marcado pela presença de escassos fragmentos cerâmicos, datados da segunda
metade do século XII, destacamos diversos fragmentos de bordo e de fundo de uma panela de tradição
islâmica, com vidrado interno, de coloração esverdeada. A presença desta peça não representa um nível
de ocupação islâmica, mas antes o resultado de
contactos ou razias nas regiões a Sul do Rio Tejo, até
porque os restantes materiais arqueológicos associados a esta peça apresentam características de pastas
de fabrico local, de tipologias autóctones (PEREIRA,
CAMEIJO, MARQUES, 2011: 270).
Fig. 6 – Imagem da face interna virada a Sudeste da Torre Velha,
observando-se as pedras salientes.
Como acontece com outras torres românicas da
região, a Torre Velha, para lá das funções de defesa,
detinha também funções residenciais e de armazenamento, como o comprovam as pedras salientes
existentes na fachada interna virada a Sudeste. Relativamente niveladas entre si, estas pedras tornavam-se
numa espécie de mísulas muito grosseiras, servindo
de apoio a um primeiro pavimento sobradado da
torre. Este primeiro sobrado separava o piso térreo da
torre (nível um, sem qualquer abertura para o exterior)
de um primeiro piso superior (nível dois). Sobre o
sobrado que rematava este segundo piso, erguer-se-ia
um terceiro (nível três), onde se situava a porta de
acesso ao interior da torre. O acesso a esta porta
(monumentalizada ou não), era efectuado por uma
escada exterior e móvel, de madeira que, em caso de
perigo, podia ser retirada a partir do interior da torre,
isolando-a e tornando-a praticamente inexpugnável
(BARROCA, 1994: 60).
Actualmente com seis metros de altura na fachada
virada a Sudeste, a ruína desta torre não nos permite
conhecer a sua altura total original. Presentemente
temos vestígios de apenas dois pisos. Contudo, tendo
por base os exemplares localizados na região (BARROCA, 2001: 108), considera-se que esta torre teria
entre 3 a 4 pisos, num total de 9 a 12 metros de altura.
Naturalmente a ligação entre estes três ou quatro pisos
originais da torre era feita por uma escada interna, de
madeira, articulada com um sistema de alçapões, mais
ou menos engenhosos, cujo fim era o de protegerem e
impedirem o acesso indesejado aos depósitos localizados nos dois níveis inferiores da torre.
É possível que a construção da Torre de Menagem
do castelo românico da Guarda recue a finais do
Fig. 7 – Alçado da muralha do Castelo Românico.
Fig. 8 – Alçado da muralha do Século XIII/XIV.
Os sistemas defensivos da Guarda Medieval. Contributos para o seu conhecimento
A Torre Velha e o pátio/terreiro envolvente eram
rodeados por uma linha de muralha, de planta sensivelmente ovalada, da qual apenas resta um fragmento
de pano, virado a Sudeste, com um aparelho construtivo muito semelhante ao da Torre Velha, o que
mostra serem coetâneas. A sua construção implicou o
desbaste do afloramento rochoso, criando uma
plataforma regular para assentamento dos silhares.
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Tratando-se de uma estrutura inserida numa estratégia de defesa passiva, geralmente a espessura destes
lanços de muralha atingia os 3 metros19, dimensões
que também se verificam na muralha da Guarda, cuja
construção recorreu à utilização de silhares de granito, com duplo paramento, exibindo fiadas de alvenaria regulares, de média e grande dimensão, de formato sub-rectangular. A muralha era coroada pelo
adarve ou caminho de ronda. O carácter defensivo
deste lanço é também assinalado pela inexistência de
uma fundação saliente, pela sua verticalidade e pela
sua elevada dimensão original, de que actualmente
apenas restam 4 metros de altura20.
Este pano de muralha prosseguia para Norte, o
que é confirmado pelas fundações do respectivo
prolongamento. Aquando da reconstrução da muralha
e a construção do muro novo, no Século XIV, a
maioria das pedras da muralha antiga foi certamente
reaproveitada nessa nova estrutura, mantendo-se
contudo as fundações do primitivo lanço, então
demolido, que ainda hoje se podem observar.
Fig. 9 – Perspectiva da muralha com o arranque e muro novo.
Fig. 11 – Muralha do Século XII (à esquerda) e a justaposição
de muralha do Século XIII (à direita).
Fig. 10 – Articulação de muralha do Século XIII (pano novo),
à esquerda, com o pano de muralha do Século XII (à direita).
A este pano antigo de muralha vai encostar o pano novo de muralha (proveniente da Porta da Erva, na
direcção SW-NE), que exibe um aparelho construtivo
com características mais tardias21. O mesmo resultado
foi possível confirmá-lo através de uma das sondagens da intervenção arqueológica, verificando-se o
prolongamento do pano de muralha mais antigo para
Oeste, onde é interceptada pela muralha nova, que se
encosta à primeira.
440
Com o passar do tempo, também as portas de
acesso desta primitiva estrutura amuralhada desapareceram. Assim, ainda não foi possível identificar o
local exacto por onde se acedia ao interior do perímetro amuralhado inerente ao primitivo castelo. Pensamos, porém, que a abertura da cidadela românica
estivesse voltada a Sul, para o local de mais fácil
acesso ao exterior, onde se encontrava o casario
primitivo e sobretudo o traçado da estrada que de
Castela conduzia à Estrada da Beira, a Coimbra e a
Lisboa. Pensamos, com efeito, que a entrada da
cidadela estaria no alinhamento do principal eixo
viário do povoado primitivo, a actual Rua do Torreão, que daria acesso ao terreiro fronteiro à cidadela
e à sua porta e que se prolongava pelo interior da
cidadela acastelada, conduzindo directamente à torre,
orientada, como pensamos, não de acordo com as
curvas de nível mas para a porta da cidadela. Assim,
pensamos também que a porta de entrada da torre
(localizada provavelmente no seu terceiro piso, como
vimos) estaria na sua fachada Sudoeste, proporcionando assim a sua fachada principal, orientada para a
porta da cidadela.
Os castelos românicos eram também caracterizados pela existência da chamada Porta da Traição,
pequenos postigos rasgados na muralha, geralmente
localizados na área de acesso mais difícil, íngreme e
menos visível, permitindo a entrada e a saída de
moradores, soldados, mercadores ou mesmo emissários e mensageiros nas mais diversas circunstâncias,
nomeadamente em caso de cerco (BARROCA, 1994:
60). Uma vez mais recorrendo às fontes, nomeadamente às Memórias Paroquiais de 1758, consideramos possível que a denominada porta pequena
(CHORÃO, 2002: 30) ou Porta do Curro (GOMES,
1987: 34), localizada na área Norte do sistema defensivo medieval22, pudesse corresponder à Porta da
Traição do castelo primitivo, não só pela sua localização – no fim da antiga Rua Direita – mas também
por não apresentar as características construtivas que
encontramos nas outras portas do sistema defensivo,
como a Porta d’El Rei ou a Porta da Erva, e por dar
acesso ao exterior, aqui de relevo muito acidentado.
Segundo as Memórias Paroquiais ainda existia no
século XVIII, nas proximidades da Torre Velha
(CHORÃO, 2002: 30), sendo possivelmente destruída, juntamente com todo esse pano de muralha, em
1847 (RODRIGUES, 2000: 78).
3. O castelo gótico
Já nos fins do século XIII, na época de D. Dinis,
vão verificar-se profundas alterações na arquitectura
militar. Estas alterações coincidem com a estabilização da linha de fronteira na região das Beiras, ocorrida com a assinatura do Tratado de Alcanises, em
1297. É então que a coroa portuguesa vai centrar a
sua atenção na fortificação das vilas e cidades do
reino e, em particular, nos castelos localizados quer
junto à linha de fronteira (BARROCA, 1994: 70),
quer nos que se localizavam junto dos grandes eixos
de circulação do Reino. Era este o caso da cidade, do
Vítor Pereira e Alcina Cameijo
castelo e das fortificações da Guarda – guardiões
seculares de uma das principais entradas no Reino –
que então foram ampliadas, reforçadas e sobretudo
profundamente actualizadas.
É neste contexto que se vão implementar profundas reformas, relacionadas com a renovação e o
progresso da estratégia militar, de que decorre o
chamado castelo gótico, caracterizado por novas
preocupações defensivas, em que ganha um relevo
inédito a chamada defesa activa. É então que as torres
de menagem ganham uma nova localização na
alcáçova, com funções mais activas na defesa dos
respectivos castelos (BARROCA, 1994: 70).
Como atrás dissemos, é também em fins do século
XIII que se vão verificar profundas alterações no
castelo primitivo da Guarda. Através da referida
intervenção arqueológica na área Sul da Torre Velha
foi possível verificar que a todo este espaço, primitivamente amuralhado, foi então atribuída uma nova
funcionalidade, a habitacional. É possível que a
cidadela românica do Torreão já não correspondesse
às necessidades defensivas próprias da Idade Média
Plena, perdendo com o passar do tempo a sua função
de ponto nevrálgico na estrutura defensiva do castelo
da Guarda. Foi então que o pano de muralha virado a
Sul e a Poente foi desmontado praticamente até ao
afloramento rochoso, sendo as pedras da muralha,
então demolida, reaproveitadas na nova estrutura,
tendo a cerca do antigo castelo sido “urbanizada” e
ocupada por habitações e pelos arruamentos contíguos, detectando-se no sítio inúmeros fragmentos de
cerâmica doméstica comum, datável do século XIII
(PEREIRA, CAMEIJO, MARQUES, 2011: 271).
Perdida a cidadela primitiva, a nova função urbana do sítio do Torreão só foi possível graças à prévia
construção de uma nova alcáçova, desta vez no ponto
mais elevado da cidade, de onde dominava a urbe
medieval. Assim, pelo menos a partir do século XIV,
a Torre Velha perdeu a sua precedência e a sua antiga
importância estratégica, própria de uma Torre de
Menagem, passando a ter uma modesta função de
simples torre inserida nos novos panos de muralha
que nela confluíram e a ela se justapuseram.
A partir deste momento a construção do castelo gótico da Guarda dará início a um novo capítulo da
história da fortificação medieval da cidade. Como já
vimos, a construção deste novo complexo fortificado
deverá recuar aos fins do século XIII, possivelmente ao
reinado de D. Dinis, período a partir do qual surgem
em Portugal as torres de planta pentagonal23, de que é
exemplo a nova Torre de Menagem da Guarda.
Do castelo gótico da cidade pouco conhecemos,
uma vez que deste complexo militar e palaciano apenas
resta a Torre de Menagem. Ao longo dos últimos dois
séculos todos os elementos construtivos que faziam
parte da alcáçova, ainda existentes em meados do
século XVIII e, como tal, referidos nas Memórias
Paroquiais, desapareceram, desde a casa do alcaide
(RODRIGUES, 1977: 45), à cisterna (CHORÃO,
2002: 29) ou aos panos de muralha contíguos.
Só em 1997, após uma intervenção arqueológica
dirigida por Lídia Fernandes (1999: 41), foi possível
Os sistemas defensivos da Guarda Medieval. Contributos para o seu conhecimento
reconstituir parte do lanço de muralhas que rodeava a
alcáçova do castelo, bem como comprovar a existência dos respectivos edifícios do complexo fortificado.
Fig. 12 – Torre de Menagem, fachada virada a Norte (imagem de
Arménio Bernardo | CMG).
a responsabilidade de um dos signatários do presente
artigo, foi desenvolvido um amplo programa de sondagens arqueológicas, no qual foi possível recuperar a
planta dos imóveis localizados na plataforma envolvente à Torre de Menagem, confirmando-se a fraca
potência estratigráfica do local. Surgiram então, em
contextos mal conservados, diversos materiais arqueológicos de distintos períodos, desde a Idade Média
ao Século XVIII. Entre os materiais exumados salientamos o armamento neurobalístico: duas pontas de
flecha (Figs. 17 e 18), duas pontas de virote de besta
(Figs. 14 e 15) e uma ponta de seta (Fig. 16), todas
elas em ferro. As primeiras, apesar de muito desgastadas, permitem confirmar que teriam grandes dimensões, sendo uma de secção circular e a outra de
secção rectangular, maciça, de cabeça muito pontiaguada. As duas pontas de virote de besta apresentam
elevada semelhança com duas outras recolhidas no
mesmo local por Lídia Fernandes (BARROCA,
MONTEIRO, 2000: 396-397), todas elas datadas do
Século XV. Os exemplares por nós recolhidos apresentam entre 5 e 6 cm de comprimento e são compostos por alvado longo, de secção circular (onde encaixaria a haste de madeira), acentuadamente mais largo,
com ponta de 3 a 4 gumes, de arestas vivas, pontiagudas. O último exemplar, a ponta de seta, apresenta
perfil piramidal alongado, maciço, de secção circular,
com alvado longo e cabeça pontiaguda.
Fig. 13 – Torre de Menagem, fachada virada a Poente.
É assim que se compreende melhor a desaparecida
alcáçova, integrada na já referida estratégia de defesa
activa, com a Torre de Menagem localizada sobre o
pano de muralha da mesma, na área de mais fácil
acesso – aqui na sua vertente ocidental – desempenhando um papel activo na respectiva defesa. O acesso
original ao seu interior era efectuado por uma porta
localizada ao nível do seu segundo piso, através do
adarve da muralha (OLIVEIRA, 1940: 8) ou a partir
da habitação do alcaide (RODRIGUES, 1977: 45).
A intervenção arqueológica de 1997 possibilitou
recuperar também a planta da alcáçova, caracterizada
pela exiguidade do espaço, com uma planta alongada,
pontilhada pela presença de 3 torreões de planta
rectangular24, cuja utilização se generalizara a partir
da emergência e difusão do modelo do castelo gótico
(BARROCA, 1994: 70). No decorrer daquela intervenção foram ainda identificados diversos edifícios
de apoio à guarnição militar e de armazenamento de
material bélico (FERNANDES, CARVALHO,
JULIÃO, 1999: 66), atestados por alguns dos materiais então recuperados no local, como pontas de virote
(BARROCA, MONTEIRO, 2000: 396-397).
Em 2008, no âmbito de um projecto de requalificação do espaço envolvente à Torre de Menagem, sob
441
Fig. 14 – Ponta de virote de besta.
Fig. 15 – Ponta de virote de besta.
Fig. 16 – Ponta de seta.
442
Fig. 17 – Ponta de flecha.
Fig. 18 – Ponta de flecha.
3. Considerações finais
Durante o século XIII a expansão urbana da cidade da Guarda exigiu o início da construção de panos
de muralha em torno do seu casario, aglomerado à
volta das suas Igrejas e ao longo das suas principais
ruas e praças. As muralhas eram estrategicamente
rasgadas por portas, a Porta d’El Rei, a Porta da
Erva, a Porta dos Ferreiros (com a sua entrada em
cotovelo, protegida pela imponente torre no lado
exterior da muralha), ou a desaparecida Porta Nova, a
antiga Porta da Covilhã, com a contígua Torre do
Mirante do futuro Convento das Freiras de Santa
Clara, também demolida25.
Vítor Pereira e Alcina Cameijo
A Norte, o pano da muralha do castelo gótico encostou-se à muralha pré-existente no Torreão, como
já referimos. A Sul, o traçado da muralha alcançava
ou circunscrevia a alcáçova do castelo gótico, não nos
sendo possível conhecer o seu traçado integral, em
parte devido aos níveis de destruição do sítio, muito
desabrigado e erodido.
As intervenções arqueológicas realizadas nos últimos anos no núcleo urbano da Guarda têm permitido identificar outras estruturas também relacionadas
com a estrutura defensiva da Guarda, até então
desconhecidas. Veja-se o exemplo de uma intervenção realizada nas proximidades da Porta da Erva, em
2006, onde foi detectada uma estrutura monumental
interpretada como uma barbacã de porta, paralela ao
pano de muralha, com 30 m de comprimento, uma
largura entre os 1,80 m e os 2,20 m, e uma altura
máxima actual de 3,10 m, construída com blocos
graníticos de média e grande dimensão (PEREIRA,
CAMEIJO, MARQUES, 2011: 273 e ss.).
Deve dizer-se, finalmente, que o projecto de investigação e de intervenção arqueológica a que este
artigo se refere não se encontra ainda concluído, pois
novas intervenções arqueológicas noutras áreas desta
fortificação medieval da cidade poderão acrescentar
novos dados e trazer novos contributos, quer para o
conhecimento do castelo primitivo da Guarda (de que
aqui propusemos uma primeira tentativa de reconstituição), quer para o da nova cerca defensiva da
cidade, que urge conhecer melhor.
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NOTAS
1
Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, Intr. de Manuel da
Silva Castelo Branco, Arquivo Nacional da Torre do Tombo e
Edições INAPA, 2.ª Edição, Lisboa, 1997. Já o professor
Adriano Vasco Rodrigues (2002: 14) tinha notado a representação da cidade na vista da folha 68 do Livro das Fortalezas.
2
Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, Intr. de Manuel da
Silva Castelo Branco, Arquivo Nacional da Torre do Tombo e
Edições INAPA, 2.ª Edição, Lisboa, 1997, p. 2.
3
O início do reinado deste monarca português começa em 16
de Fevereiro de 1279 e termina a 7 de Fevereiro de 1325.
4
Para mais informações sobre o desmonte dos panos de
muralha da Guarda veja-se OLIVEIRA, 1940: 8-9. Mais
recente, veja-se CAETANO, 2011: 262-263.
5
Não queremos aqui deixar de prestar um agradecimento à Drª
Maria do Carmo Borges, Presidente do Município quando
iniciámos a intervenção, em 2004, e ao Arquitecto António
Saraiva, Gestor Urbano da Agência para a Promoção da
Guarda, pelo apoio a esta intervenção arqueológica, que
encararam desde o primeiro momento como uma acção
indispensável para um melhor conhecimento da História Local.
Um agradecimento também de reconhecimento pela motivação
e pelo interesse no desenvolvimento das escavações na cidade
da Guarda nos últimos anos ao Dr. Virgílio Bento, Vice-Presidente e Vereador do Pelouro da Cultura do Município da
Guarda e à Drª Alexandra Isidro, Chefe de Divisão da Cultura.
6
Para mais informações veja-se PEREIRA, 2003.
7
Estes podem encontrar-se nas proximidades da capela românica
da Póvoa do Mileu, onde, em 1951, foram detectados importantes vestígios arqueológicos dos séculos I / IV d.C., bem como da
Idade Média (PEREIRA, 2005; PEREIRA, 2008).
8
Confira-se COELHO; MORUJÃO, 1999.
9
Esta temática volta a ser abordada por Rita Costa Gomes, que
em 1987, num estudo de algum modo pioneiro, defendeu a
existência de um núcleo de povoadores em período anterior à
concessão do foral, em torno de uma vigia ou torre (GOMES,
1987: 26). Refira-se contudo, que a autora considera pouco
provável a existência de uma cidadela no torreão, resumindo-se
a primitiva fortificação, segundo aquela autora, a uma torre
isolada, em torno do qual existiria um pequeno núcleo de
povoadores. A torre, datada, sensivelmente, da segunda metade
do século XII, seria, para Rita Costa Fomes, o último vestígio
desse núcleo pré-urbano, (GOMES, 1987: 38).
10
“Divisão das egrejas e rendas da diocese da Guarda entre o
bispo D. Rodrigo Fernandes I e o cabido egitaniense em 19 de
Julho de 1260”, em CASTRO, 1902: 493.
11
Em meados do século XX, Carlos Oliveira (1940: 6), um
erudito local, fala de uma cidadela, de menores dimensões mas
semelhante ao castelo que hoje conhecemos, defendendo que a
sua construção deveria recuar ao reinado de D. Sancho I.
Também João de Almeida (1943: 44), um famoso general,
natural do Concelho da Guarda, conhecido nomeadamente
pelos seus estudos de fortificações militares portuguesas, refere
a existência de uma fortificação neste local, traçando o seu
hipotético perímetro defensivo.
12
“[…] e a Torre Velha, acima dita, foi, segundo parece, mais
antiga do que a cerca da cidade, e que tinha reduto, porque não
muito distante dela se vê a muralha arrimada a outra que vem da
torre e se mostra fazia volta para ela.” (CHORÃO, 2002: 30).
13
Como refere a autora, “[…] Jtem hũa tore que ellRey ha na dicta
vila hũa tore ǭ chamã A tore velha ǭ esta na maetade do muro
nouo per onde ora he a vylla departida.” (GOMES, 1987: 36).
14
Para o conceito de defesa passiva veja-se, por exemplo,
Almeida, 1989: 38 e ss., ou Barroca, 2001: 88 e ss.
15
Este traçado apresenta elevada semelhança, por exemplo,
com o Castelo de Melgaço (http://www.monumentos.pt,
acedido em 21 de Maio de 2012).
16
Para mais informações sobre estes castelos confira-se Mário
Barroca, 2000.
17
Desníveis que impediram a urbanização do sítio da respectiva encosta.
18
Uma torre em tudo semelhante, até pelas suas dimensões,
parece ser a Torre de Menagem do Castelo de Sortelha (Sabugal), construída sobre um maciço rochoso imponente, ou ainda
a torre de Moreira de Rei (Trancoso), da qual apenas restam as
fundações.
19
Embora nos locais de substrato rochoso granítico a espessura
pudesse ser apenas de 2 metros (BARROCA, 2001: 102).
20
Apesar de geralmente estes panos apresentarem maior altura,
entre 8 a 12m, no caso em que o substrato geológico era o
granito poderia apresentar menores dimensões (BARROCA,
2001: 102).
21
O tipo construtivo deste pano de muralha, construído com
pedras de menores dimensões, é distinto do de período românico, adaptando-se ao relevo de substrato granítico, que mostra
elevado desnível.
22
Note-se a existência de uma outra porta falsa rasgada no
pano de muralha, na área Sudoeste, nas proximidades da Torre
de Menagem de finais do Século XIII.
23
A Torre de Menagem de planta pentagonal é já um exemplar
tardio, à semelhança da do castelo do Sabugal.
24
Apesar de terem desaparecido, a intervenção arqueológica
coordenada por Lídia Fernandes permitiu verificar o desbaste e
regularização do afloramento rochoso nos ângulos da muralha
da alcáçova, onde a defesa seria mais vulnerável. Correspondiam a pequenos bastiões maciços, de planta quadrangular
(FERNANDES, CARVALHO, JULIÃO, 1999: 68).
25
Para mais informações sobre a construção deste pano de
muralha veja-se GOMES, 1987: 38.