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1 Polianna Santos Advogada Parecer técnico Ref.: Participação da mulher na Política – Proposições e justificativas. Análise do quadro atual e proposições para a promoção do aumento da participação das mulheres na política. 1. Sobre a importância de tratar sobre a Participação da Mulher na Política A igualdade na participação política é uma premissa democrática: é necessário reconhecer ao maior número de adultos a possibilidade de participar das decisões políticas, com igualdade de forças, e real possibilidade de influenciar na formação da agenda e na tomada das decisões1. Além disso, a participação da mulher na política, no exercício de cargos eletivos, é indicador de qualidade da democracia2 3. As mulheres foram um dos últimos contingentes sociais a conquistar direitos políticos nas democracias contemporâneas. No Brasil o direito ao voto somente foi regulamentado em 1932, com o primeiro Código Eleitoral. Enquanto o art. 2º definia como eleitor o cidadão maior de Código , o art. anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste estabelecia a facultatividade do voto feminino, ao estatuir que os homens maiores de sessenta anos e as mulheres em qualquer idade podem isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral BRAS)L, . Para se candidatar era necessário ser eleitor e possuir quatro anos de cidadania, não havendo nenhuma restrição legal de gênero para o exercício dos direitos políticos passivos das mulheres a partir desse momento4. DAHL, Robert A. Beatriz Sidou (trad.). Sobre a democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001. 2 LIJPHART, Arend. Modelos de democracia: desempenho e padrões de governo em 36 países. Editora Record, 2003. 3 MOISÉS, José Álvaro; SANCHEZ, Beatriz Rodrigues. Representação política das mulheres e Qualidade da democracia: o caso do Brasil. In: o congresso nacional, os partidos políticos e o sistema de integridade. p. 89. 2014 4 SANTOS, Polianna Pereira; BARCELOS, Júlia Rocha de. Direitos Políticos das Mulheres e a Regulamentação Legal das Cotas de Gênero: Resultados em Bolívia, Peru e Brasil. Espaço Jurídico: Journal of Law de Editora Unoesc. No prelo. 1 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 2 A despeito de não mais subsistirem empecilhos legais para a participação política feminina (ativa ou passiva), a presença das mulheres nos parlamentos brasileiros é ínfima. As mulheres são maioria da população brasileira (IBGE, 2010), maioria do eleitorado (TSE, 2014), e a participação das mulheres na população economicamente ativa (PEA) foi 46,1% em 2011 (IBGE, 2012), mas a presença feminina nas Casas Legislativas não chega nem próximo aos percentuais indicados: alcançaram apenas 9,94% das vagas na Câmara dos Deputados e 13,58% no Senado nas últimas eleições (TSE, 2014). De acordo com o ranking sobre o percentual de mulheres nas Casas Legislativas realizado pelo Interparlamentary Union com dados atualizados até 1º de novembro de 2016, dos 193 países listados, o Brasil ocupa a 154ª posição5, atrás inclusive, de países como o Afeganistão. O resultado nas Eleições Municipais de 2016 mantém esse baixo percentual de mulheres eleitas6, e chama atenção pelo elevado número de mulheres candidatas em todo território nacional que não obtiveram voto algum – nem mesmo o seu próprio. Em números gerais, em 2016 apenas 14% dos vereadores eleitos eram mulheres, apesar de elas serem 31% dos candidatos aptos nesse pleito. Dentre as capitais, verificou-se que em 10 deles houve um aumento do número de mulheres eleitas7, em 13 uma diminuição8, e em 3 não houve alteração9. De todo modo, tem-se que em muitos casos o percentual ainda é menor do que 10% dos membros da Casa Legislativa10. Além disso, é importante destacar que o Brasil é o 5º país em número de feminicídios11. É essencial ter em mente a relação entre a baixa representação política da Disponível em: < http://www.ipu.org/wmn-e/classif.htm>. Acesso em: 20/11/2016. Dados disponibilizados pelo TSE, e compilados pelo Projeto Visibilidade Feminina. 7 Segundo dados disponibilizados pelo TSE, o número de vereadoras eleitas foi mais nas eleições de 2016 nos municípios de Natal (RN), Curitiba (PR), São Paulo (SP), Porto Velho (RO), Salvador (BA), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Palmas (TO), Belo Horizonte (MG), Florianópolis (SC). 8 Municípios em que houve uma diminuição no número de mulheres eleitas para o cargo de vereadoras: Maceió (AL), Boa Vista (RR), Fortaleza (CE), Rio de Janeiro (RJ), Rio Branco (AC), Porto Alegre (RS), Macapá (AP), Teresina (PI), Manaus(AM), São Luís (MA), Belém (PA), Campo Grande (MS), Cuiabá (MT). 9 Recife (PE), Aracaju (SE), Vitória (ES). 10Belo Horizonte (MG),Manaus(AM),São Luís (MA),Belém (PA), Aracaju (SE), Campo Grande (MS),Vitória (ES), Florianópolis (SC), Cuiabá (MT). 11 Waiselfisz, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2015: Homicídio de mulheres no Brasil Disponível em www.mapadaviolencia.org.br. Acesso em 20.11.2016. 5 6 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 3 mulher e o alto índice de violência contra a mulher no Brasil12. Ambos os casos se relacionam ao papel culturalmente reservado às mulheres, o que está certamente relacionado aos diferentes processos de socialização pelos quais passam os homens e as mulheres13. Desse modo, é necessário ainda identificar, portanto, a importância de aumentar a presença das mulheres em espaços de poder, sobretudo nos espaços públicos, para que as mulheres possam passar a ser reconhecidas e a se reconhecer nesses espaços. )mportante destacar a importância da gênese social da identidade , isto é, a construção da identidade como experiência de um reconhecimento intersubjetivo14. Nessa perspectiva, impera pontuar a necessidade que o ser humano tem de ser reconhecido pelos outros. A partir desse reconhecimento é que se pode dizer que se formam, entre outros, a autoconfiança e a autoconsciência, elementos que serão desenvolvidos de formas distintas entre homens e mulheres, em virtude dos diferentes processos de socialização, conforme sobredito15. A respeito da importância da participação da mulher na política para o fortalecimento da democracia agência Patrícia Galvão publicou uma pesquisa realizada pelo IBOPE com os seguintes dados16: i. 71% dos entrevistados consideram a reforma política muito importante/ importante para garantir 50% de homens e 50% de mulheres nas listas de candidaturas dos partidos. ii. 74% dos entrevistados acreditam que só há democracia de fato com a presença de mais mulheres nos espaços de poder e de tomada de decisão. Pereira dos Santos, Polianna, Rocha de Barcelos, Júlia y Maia Gresta, Roberta. Debates on female participation in brazilian parlament: under-representation, violence and harassment. Politai: Revista de Ciencia Política, Año 7, primer semestre, Nº 12: pp. 59-77. Disponível em: < http://revistas.pucp.edu.pe/index.php/politai/article/viewFile/15213/15682>. Acesso em 20.11.2016. 13 SACCHET, Teresa. Capital social, gênero e representação política no Brasil. Opinião Pública, v. 15, n. 2, p. 306-332, 2009. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/op/v15n2/02.pdf>. Acesso em: 20.11.2016. 14 HONNET, Axel. Luiz Repa (trad.) Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais. São Paulo: Ed, v. 34, 2003. 15 SANTOS, Polianna Pereira; BARCELOS, Júlia Rocha de. Direitos Políticos das Mulheres e a Regulamentação Legal das Cotas de Gênero: Resultados em Bolívia, Peru e Brasil. Espaço Jurídico: Journal of Law de Editora Unoesc. No prelo. 16 Pesquisa Ibope / Instituto Patrícia Galvão 2013. Mais Mulheres na política. Base: amostra (2.002). Disponível em: http://agenciapatriciagalvao.org.br/wpcontent/uploads/2013/07/mais_mulheres_politica.pdf. Acesso em: 17/04/2016. 12 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada iii. 4 78% concordam que os partidos deveriam apresentar uma lista de candidatos composta por metade de homens e metade de mulheres. iv. 8 em cada 10 entrevistados consideram que, sendo as mulheres hoje mais da metade da população, deveria ser obrigatória a participação de metade de mulheres e metade de homens nas Câmaras de Vereadores, Assembleias Legislativas Estaduais e no Congresso Nacional. Na mesma linha, a Procuradoria da Mulher, no Senado Federal realizou uma pesquisa pelo DataSenado entre agosto e setembro de 2014 questionando o eleitor sobre intensão de voto e gênero, e os resultados indicam que a baixa representatividade feminina na política não está relacionada, a rigor, a preconceito de gênero por parte do eleitorado17: i. 83% responderam que na hora de escolher alguém para votar, o sexo do candidato não faz diferença; ii. 79% já votaram em candidatas mulheres; iii. 62% das mulheres entrevistadas responderam que se candidatariam se acreditassem ter chances de serem eleitas; iv. 41% das mulheres e 36% dos homens responderam que o principal motivo que leva uma mulher a NÃO se candidatar para um cargo político é a falta de apoio dos partidos políticos. Desse modo, temos que o aumento da participação da mulher na política mediante preenchimento de cargos eletivos é essencial para aumentar a qualidade de nossa democracia, já que esse é um importante indicador de qualidade da democracia. É importante em termos de representação de mais da metade da população brasileira, e em termos de reconhecimento dessa população, com provável repercussão na redução da violência contra a mulher. 17 Procuradoria Especial da Mulher/ DataSenado. 2014. Pesquisa DataSenado. Mulheres na Política. Base: amostra (1091). Disponível em: < http://www12.senado.gov.br/institucional/procuradoria/procpublicacoes/cartilha-mulheres-na-politica>. Acesso em: 17/04/2016. Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 5 Por essas e outras razões, é essencial discutir e pensar alternativas viáveis para a maior participação da mulher na política. 2. Das políticas atuais em prol do aumento da participação da mulher na política Atualmente no Brasil são adotadas as seguintes iniciativas no intuito de promover a participação da mulher na política: a. Cota de 30% por gênero na lista de candidatos apresentados pelos partidos políticos ou coligações b. Reserva de tempo de propaganda partidária para a promoção da participação das mulheres na política c. Utilização de no mínimo 5% das verbas recebidas pelo Fundo Partidário em programas de promoção e difusão da participação política das mulheres (artigo 44, V, Lei nº 9096/95) d. Direcionamento do percentual mínimo de 5% e máximo de 15% do montante do Fundo Partidário ao financiamento de campanhas eleitorais de suas candidatas18, incluídos nesse valor ainda a criação e manutenção de programas de difusão da participação política das mulheres. A despeito da adoção destas medidas, vemos que o impacto em termos de conversão do número de mulheres candidatas em mulheres eleitas é muito baixo. Apesar da previsão de cotas de gênero na lista de candidatos dos partidos datar de 1997, Foi proposta a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5617 a pedido do vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, e do procurador regional eleitoral em Minas Gerais, Patrick Salgado Martins. Nela, o procurador-geral da República pede que seja concedida liminar para suspender os efeitos do artigo 9º da Lei 13.165/2015 e, no mérito, declarar inconstitucionais os limites máximo e mínimo impostos para o financiamento das campanhas de candidatas. Notícia disponível em: < http://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr/pgr-e-contra-norma-que-limita-financiamento-para-campanhaeleitoral-de-mulheres>. Acesso em: 20.11.2016. 18 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais 6 Polianna Santos Advogada não é possível identificar mudanças significativas na representação feminina na política antes e depois da implementação das contas, como é possível verificar no Gráfico 1: Gráfico 1: Percentual de mulheres eleitas no Brasil entre 1990 e 2014 – Casa Baixa 15 10 Percentual de mulheres eleitas 5 0 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014 Fonte dos dados: )nter-Parliamentary Union Destaca-se, novamente, que a exigência legal das cotas de gênero nas listas de candidatos foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro em 1997 para as eleições gerais, e o que se identifica é na verdade uma queda de representatividade entre o pleito de 1994 e 1998: de 6,23% para 5,65%, com a implementação das cotas. A alteração do art. 10, §3º da Lei das Eleições que levou à virada da jurisprudência na interpretação sobre a forma de respeitar o percentual mínimo (em vistas da quantidade de candidatos que poderiam ser apresentados ou da quantidade de candidatos efetivamente apresentados pelos partidos) ocorreu em 2009. Interessante notar que em 2010 houve, tal qual 1998, queda de representação feminina: de 8,77% de mulheres na Câmara dos Deputados passou-se à 8,54% em 2010. Nem mesmo para as eleições realizadas em 2014 o impacto foi significativo: a participação feminina passou para 9,94% dos membros da Câmara dos Deputados. A bem da verdade, tem-se que entre a representação obtida no pleito de 1990 – em que não havia nenhum mecanismo oficial de apoio à candidatura feminina – e no pleito de 2014 – com a exigência legal de reserva mínima de 30% para apresentação de candidatos por gênero sob pena de indeferimento do DRAP do partido/coligação – a variação é de meros 3,98% (em 1990 5,96% dos eleitos para a Câmara dos Deputados eram mulheres, e em 2014 esse índice subiu para 9,94%)19. SANTOS, Polianna Pereira dos; CAMPOS, Adriana. Participação Política Feminina E A Regulamentação Legal Das Cotas De Gênero No Brasil: Breve Análise Das Eleições Havidas Entre 1990 E 2014. Teorias da democracia e direitos políticos [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara; coordenadores: Adriana Campos Silva, Armando Albuquerque de Oliveira, José Filomeno 19 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 7 É essencial, portanto, pensar outras alternativas viáveis para alcançar o objetivo de realmente aumentar o percentual de mulheres ocupando cargos eletivos. Para tanto é muito importante, primeiramente, compreender as prováveis razões para essa subrepresentação. 3. Das razões da sub-representação da mulher na política A sub-representação feminina no Parlamento brasileiro decorre, principalmente, das seguintes razões: i. Dificuldade de acesso aos cargos de direção partidária, sendo historicamente alijadas das tomadas de decisão intrapartidária, inclusive as de destinação dos recursos do Fundo Partidário, reservados por lei, ao incremento da participação feminina na política, que não vem sequer sendo cumpridos20; ii. Dificuldade de acesso a fontes de financiamento de sua campanha, públicos e privados21 22; iii. Dificuldade na obtenção de tempo de propaganda, uma vez que o partido político tem autonomia para distribuir o tempo de propaganda eleitoral entre seus candidatos e não há nenhuma limitação no sentido de distribuir esse tempo proporcionalmente entre candidatos homens e mulheres; iv. São preteridas, em regra, na ocupação cargos executivos, de gestão na cota de indicação governamental dos Partidos (Ministérios e Secretarias, de Moraes Filho – Florianópolis: CONPEDI, 2015. Disponível em: < http://www.conpedi.org.br/publicacoes/66fsl345/0wgz69fe/YQ8Bx03xH12IjKG0.pdf>. Acesso em 20.11.2016. 20 Bolognesi, Bruno. 2012. A cota eleitoral de gênero: política pública ou engenharia eleitoral? Paraná Eleitoral. v. 1, n. 2. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/pe/article/view/42736>. Acesso em 20.11.2016. 21 Sacchet, Teresa; Speck, Bruno. 2010. Financiamento eleitoral e representação política: o peso do dinheiro e o desequilíbrio de gênero nas esferas legislativas. In: Congresso da ANPOCS, Caxambu. 22 Segundo o site www.asclaras.org.br, as 15 maiores doadoras de campanhas de deputados federais, em 2014, destinaram R$325.447.961,00 para homens e R$41.829.384,00 para mulheres, ou seja, somente 10% do destinado às candidaturas masculinas. Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais 8 Polianna Santos Advogada p. ex.), o que lhes retira a possibilidade de implementação das políticas públicas e de demonstração sua competência e capacidade políticas23; v. Ineficácia do atual sistema de cotas de candidaturas, sem qualquer incentivo ou apoio partidário que permitam sua competitividade, o que resulta no estimulo às candidatas laranjas . Esses fatores, e muitos outros, explicam o fato de as mulheres, apesar de serem a maioria do eleitorado e terem cotas reservadas nas candidaturas, não possuírem representação correlata no Legislativo. Os dados empíricos são alarmantes: Média de representação feminina no Parlamento. No mundo: 21%. Nas Américas: 25%. No Brasil: 10%24. Tendo em vista que as cotas de gênero com simples reserva de vaga para candidatas por si só não geraram impacto no sentido de viabilizar o aumento da participação feminina, destacando-se que as chances de sucesso na disputa eleitoral não acompanham o percentual da reserva, faz-se necessário testar outras formas, outros métodos, outras políticas públicas na busca dessa maior participação feminina. É importante defender a paridade entre mulheres e homens na política, com a utilização de mecanismos necessários para obtenção deste resultado. A paridade na política já é realidade de alguns países. A Bolívia, por exemplo, alcançou excelentes resultados após uma alteração legislativa: A Lei , de , Ley del Régimen Electoral , novamente destacando o princípio da igualdade em seu art. º, passou a estabelecer, em seu art. 11, cotas de 50% e obrigatoriedade de apresentação de listas de candidatos intercalando-os em razão do sexo. Importa lembrar que a Bolívia25 adota lista fechada, que permite esse controle sobre o impacto das cotas de candidatos sobre os resultados das eleições, eis que aliado SPM. Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2014. Disponível em: <http://www.spm.gov.br/assuntos/poder-e-participacao-politica/dados/tabelas-1>. Acesso em: 2/08/2015. 24 UNION Inter-Parliamentary. Women in the parliament in 2013 – The year in review. 2014. Disponível em: <http://www.ipu.org/pdf/publications/WIP2013-e.pdf>. Acesso em 20.11.2016. 25 Bolívia adota Sistema Eleitoral Misto de Correção (NICOLAU, 2004, p. 73). Existem, portanto, duas formas de candidatura, para cadeiras de representação majoritária e para cadeiras de representação proporcional. 23 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 9 à cota de 50% de candidatos por gênero, exige-se que os nomes sejam lançados nas listas intercalando-se homens e mulheres. O Brasil, por outro lado, adota o sistema proporcional de lista aberta para o legislativo (à exceção do Senado), de forma que não seria possível adotar a referida estratégia boliviana, que neste aspecto é a mesma argentina, porém com percentuais diferentes (30%). Considerando que a mudança do sistema eleitoral no país ensejaria um debate além do que inicialmente proposto, passou-se a considerar estratégias viáveis com o nosso sistema e suas peculiaridades. Após essa breve digressão sobre o quadro atual, passa-se à análise de propostas para o aumento do número de mulheres ocupando cargos eletivos no Brasil. 4. Propostas para o aumento da representação feminina na política i. Sistema de Cotas de Representação – reserva de cadeiras As professoras Eneida Desiree Salgado e Renata Caleffi propõem extrapolar a reserva de vagas para candidatura existente atualmente (e ineficiente) para assegurar um percentual de mulheres efetivamente eleitas26. A proposta seria aplicada em duas frentes diferentes, no âmbito do legislativo, de acordo com o tipo de sistema eleitoral adotado para a definição dos candidatos eleitos. a. Cargos do Poder Legislativo – Sistema proporcional Já está sendo encaminhada e discutida a Proposta de Emenda à Constituição nº 134-A, que tem por escopo o estabelecimento de cláusula de reserva de vagas para cada gênero na Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas, Câmara Legislativa do Distrito Federal e nas Câmaras Municipais, nas três legislaturas seguintes, em percentuais crescentes – de 10% a 16%. SALGADO, Eneida Desiree; CALEFFI, Renata. Propostas para aumentar participação feminina na política brasileira. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2015-mai-02/propostas-aumentar-participacaofeminina-politica>. Acesso em: 20.11.2016. 26 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais 10 Polianna Santos Advogada A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania aprovou parecer favorável à Proposta em de junho de , e das PEC’s e , que lhe foram apensadas. A Comissão Especial constituída na Câmara dos Deputados elaborou parecer da Relatoria da Deputada Soraya Santos favorável à PEC 134-A e pela rejeição das PEC’s Esse parecer foi aprovado à unanimidade em 10 de novembro de 2016. e . A PEC 134-A, com as modificações decorrentes das duas emendas propostas no Relatório da Comissão Especial, estabelece: Art. 101. É assegurado a cada sexo, masculino e feminino, percentual mínimo de representação nas cadeiras, nos termos da lei, vedado patamar inferior a: I – 10% (dez por cento) das cadeiras na primeira legislatura; II – 12% (doze por cento) das cadeiras na segunda legislatura; e III – 16% (dezesseis por cento) das cadeiras na terceira legislatura. § 1º Caso o percentual mínimo por ente federativo de que trata o caput não seja atingido por determinado sexo, as vagas necessárias serão preenchidas pelos candidatos desse sexo com a maior votação nominal individual dentre os partidos que atingiram o quociente eleitoral. § 2º A operacionalização da regra prevista no § 1º dar-se-á, a cada vaga, dentro de cada partido, com a substituição do último candidato do sexo que atingiu o percentual mínimo por ente federativo previsto no caput pelo candidato mais votado do sexo que não atingiu o referido percentual. § 3º Serão considerados suplentes os candidatos não eleitos do mesmo gênero dentro da mesma legenda, obedecida a ordem decrescente de votação nominal. Assim, sua aplicação se dará da seguinte forma. Após a distribuição das cadeiras de acordo com as normas do sistema proporcional brasileiro (cálculo do quociente eleitoral, cálculo do quociente partidário, verificação do percentual mínimo de votação nominal dos candidatos, e distribuição das sobras segundo o critério de maiores médias), será necessário verificar, em cada ente federativo de forma separada, se seguindo o cálculo normal o percentual mínimo exigido para aquela eleição segundo a PEC foi observado. Se um Município alcança naturalmente na primeira eleição o percentual de 10% de mulheres, nada precisará ser feito pois terá ele atingido o percentual mínimo exigido para a primeira legislatura após a promulgação da Emenda. Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 11 Se, no entanto, um Município não alcançar esse percentual, será necessário observar as normas contidas nos parágrafos do art. 101, de modo que todos os partidos que alcançaram o quociente eleitoral (§1º) deverão fazer a alteração de seu resultado, com a substituição do último candidato do sexo que atingiu o percentual mínimo por ente federativo previsto no caput pelo candidato mais votado do sexo que não atingiu o referido percentual . Não se fale em violação à representatividade decorrente do voto, eis que será mantida a representação partidária. Isso porque, conforme se expôs, a substituição dos candidatos em atenção ao percentual mínimo por sexo será realizada no âmbito do partido que logrou obter representação político partidário por meio do voto, com a devida consideração dos cálculos de quociente eleitoral e partidário. Desse modo, sim, haverá uma modificação real nos resultados das eleições nas três legislaturas que se seguires à promulgação da PEC nas eleições municipais e regionais. Espera-se que com tais modificações, temporárias, seria possível estimular uma modificação na formação cultural do povo, promover conscientização, viabilizar o exercício democrático permitindo o ingresso de um percentual significativo da população que segue em grande medida alijado da participação mais direta na esfera pública. b. Cargos do Poder Legislativo – Sistema majoritário As professoras Eneida Desiree Salgado e Renata Caleffi propõem, para o Senado, o seguinte: considerando-se que cada Estado possui atualmente três vagas, renovadas parcialmente 91/3 e 2/3, a cada quatro anos, propõe que a cota seja aplicada na renovação de 2/3, quando necessariamente deveria ser eleita uma mulher. Desse modo, um dos candidatos a ser registrado pelo partido ou coligação deverá ser uma mulher, que irá disputar com outras mulheres. Para a outra vaga não haveria reserva de gênero. Conforme notícia divulgada em 20.11.2016, a Senadora Marta Suplicy está articulando um projeto para a previsão de reserva de cadeiras para as mulheres no Senado Federal, nos mesmos moldes da proposta das supracitadas professoras27. Disponível em: < http://www.brasil247.com/pt/247/brasilia247/266279/Marta-articula-projeto-paracota-feminina-no-Senado.htm> Acesso em 20.11.2016. 27 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 12 Verifica-se, ainda, que o Projeto de Lei nº 132/2014 do Senador Aníbal Diniz trata exatamente desse assunto, e está em andamento no Senado Federal. A proposta é no sentido de acrescentar o art. 83-A à Lei nº 4.737, de julho de1965 (Código Eleitoral) para reservar, quando da renovação de dois terços do Senado Federal, uma vaga para candidaturas masculinas e outra vaga para candidaturas femininas28. ii. Regulamentar a atuação dos Partidos Políticos com relação às mulheres a. cotas de gênero para os cargos de direção partidária, como adotado, por exemplo, no Peru29; b. regulamentação sobre a distribuição do horário de propaganda eleitoral e financiamento de campanha pelo Partido entre os gêneros; c. fiscalização efetiva sobre o cumprimento, pelos Partidos Políticos, das normas referentes à participação política feminina. iii. Reserva de tempo de propaganda eleitoral para as candidatas Um dos maiores problemas das candidatas mulheres é a falta de visibilidade. Não é possível esperar que o eleitor vote em uma candidata que ele sequer conheceu. Isso porque via de regra as mulheres pouco aparecem na propaganda eleitoral. A exigência de observância de um percentual mínimo de tempo de propaganda partidária para promoção da participação política precisa de um mecanismo correlato no tempo da propaganda eleitoral. É essencial que haja, ao menos, uma divisão proporcional do tempo de propaganda eleitoral entre os candidatos homens e as candidatas mulheres. Se ao menos 30% das candidatas devem ser mulheres, ao menos 30% do tempo de propaganda eleitoral deve ser assegurado às candidatas mulheres, durante a campanha eleitoral. O mesmo se diga com relação à distribuição de verbas do fundo partidário. Disponível em: < http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/116990>. Acesso em: 20.11.2016. 29 , a Lei dos Partidos Políticos, Lei nº de , em seu art. , estabelece que: En las listas de candidatos para cargos de diréccion del partido político, así como para los candidatos a cargo de elección popular, el número de mujeres u hombres no puede ser inferior al 30% del total de candidatos” . 28 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada iv. 13 Reserva de verbas do partido político para as candidatas Para que as mulheres tenham chances reais de serem eleitas elas precisam ser conhecidas pelos eleitores. Para tanto é essencial a regulamentação do tempo de propaganda na televisão e no rádio, mas também é necessário que essas candidatas tenham acesso à verba partidária para realizar suas propagandas. Desse modo, é importante que, das verbas destinadas às candidaturas pelos partidos, ao menos 30% seja direcionada às campanhas das candidatas mulheres, proporcionalmente à exigência legal das cotas de candidaturas. v. Dos requisitos para distribuição das verbas do Fundo Partidário aos Partidos – alteração dos parâmetros legais A advogada Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro apresenta uma proposta muito interessante para fazer como que os partidos tenham o real interesse em aumentar o número de mulheres eleitas sob suas siglas: inserir esse fator como elemento determinante na distribuição das verbas do fundo partidário. Segundo a autora30: Nesse contexto, é de toda pertinência que as autoridades legislativas reflitam sobre a possibilidade de condicionar a integral percepção das quotas do fundo partidário e o total desfrute do direito de antena ou mesmo do tempo de rádio e televisão destinado à divulgação de candidaturas ao atendimento, pelas agremiações partidárias, do direito fundamental que se posiciona no centro de todo o ordenamento jurídico-constitucional: o da igual dignidade de todos, independentemente do sexo. Desse modo, além de considerar a divisão dos 95% do fundo partidário na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, nos termos do art. 41-A, II, da Lei 9096/95, deveriam ser considerados o número de mulheres eleitas como critério de maior peso para essa distribuição. PINHEIRO, Maria Claudia Bucchianeri. O problema da (sub)representação política da mulher: um tema central na agenda política nacional.Direito Eleitoral e Democracia – Desafios e Perspectivas, coordenação de Marcus Vinícius Furtado Coelho e Walber de Moura Agra. Editora do Conselho Federal da OAB, gestão 2010/2013. 30 Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais Polianna Santos Advogada 5. 14 Conclusão É essencial que sejam adotadas políticas públicas que possam repercutir de fato na conversão do número de mulheres candidatas em mulheres eleitas, conforme se demostrou. Neste documento foram apresentadas propostas com essa finalidade precípua, abaixo relacionadas: a) Regulamentação de Sistema de Cotas de Representação por meio de reserva de cadeiras no Poder Legislativo, para os cargos obtidos pelo Sistema Proporcional e Majoritário, observadas as suas especificidades; b) Regulamentação no âmbito intrapartidário no sentido de facilitar o ingresso das mulheres na vida política, entre os quais: adoção de cotas para os dirigentes partidários, distribuição proporcional de tempo de propaganda eleitoral e verbas para financiamento de campanha entre os gêneros e maior fiscalização dos partidos no cumprimento das regras já existentes (tempo de propaganda partidária e utilização de verbas do Fundo Partidário); c) Reserva de tempo de propaganda eleitoral para as candidatas mulheres, de forma proporcional ao mínimo de candidaturas por gênero legalmente estabelecido; d) Reserva de verbas partidárias para as candidatas mulheres, de forma proporcional ao mínimo de candidaturas por gênero legalmente estabelecido; e) Modificação dos requisitos para distribuição das verbas do Fundo Partidário aos Partidos, inserindo como parâmetro legal para a distribuição do FP o número de mulheres eleitas pelos Partidos Políticos. Belo Horizonte, 20 de novembro de 2016. Polianna Pereira Dos Santos Advogada - OAB/MG 121907 Mestre em Direito Político pela UFMG. Especialista em Ciências Penais pelo IEC/PUC Minas. Co-fundadora do Projeto Social Visibilidade Feminina. Professora de Direito Eleitoral - pós-graduação PUC/Minas e ESA/OAB. Membro Fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político - ABRADEP. Advocacia e Consultoria Direito Eleitoral e Crimes Eleitorais