Inverno
2020
V.17, N.1.
e-ISSN: 1984-9206
TRADUÇÃO 1
0F
O FEMINISMO REPUBLICANO DE JOHN STUART MILL
[JOHN STUART MILL’S REPUBLICAN FEMINISM]
Gustavo Hessmann DALAQUA
Professor do curso de filosofia da
Universidade Estadual do Paraná
E-mail: gustavodalaqua@yahoo.com.br
Resumo
Este artigo sustenta que o compromisso com a igualdade de gênero e a percepção aguda
da subordinação das mulheres ao patriarcado levaram John Stuart Mill a elaborar uma
concepção de liberdade tributária do republicanismo. Para justificar a tese de que o
conceito de liberdade exposto em A sujeição das mulheres trilharia uma via comum entre
feminismo e republicanismo, destacam-se quatro semelhanças entre a filosofia política de
Mill e a liberdade republicana.
Palavras-chave
John Stuart Mill; feminismo; republicanismo; liberdade; igualdade.
Abstract
This paper argues that John Stuart Mill’s commitment to gender equality and acute
understanding of women’s subordination to male power led him to develop a conception of
freedom that evokes republicanism. In order to substantiate the thesis that the concept of
freedom put forth in The Subjection of Women steers a middle course between feminism
and republicanism, four similarities between Mill’s political philosophy and republican
freedom are highlighted.
Keywords
John Stuart Mill; feminism; republicanism; liberty; equality.
1
Esse texto é uma tradução de um artigo publicado no vol. 15 da Kalagatos e resulta de uma tese de
doutorado, defendida no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, em 2019. Pelos
comentários em uma versão anterior do trabalho, agradecemos Alberto Ribeiro Gonçalves de Barros, Maria
Isabel Limongi e Nadia Urbinati. Quaisquer erros que constarem são de nossa responsabilidade.
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1. Introdução
Seguindo a leitura de Isaiah Berlin (2000, p. 232), alguns acadêmicos identificam Mill
como um dos “pais do liberalismo”, que em hipótese alguma deve ser associado com a
tradição republicana. Como um crítico comunitarista afirmou recentemente, a filosofia de
Mill ilustra de maneira exemplar o conceito liberal de liberdade, cujos dois principais
atributos seriam o “individualismo” e a subordinação da “comunidade [...] à vontade de
indivíduos imperiosos” (GAIRDNER, 2008, pp. 11, 14). Visto que privatizaria a liberdade, o
liberalismo milliano não pode ser afiliado ao republicanismo, tradição de pensamento que
tende a associar a liberdade com o exercício coletivo do poder entre cidadãos que se tratam
de maneira equânime. 2 Indo contra semelhante caracterização da filosofia milliana, este
1F
artigo afirma que Mill formula uma concepção de liberdade que o aproxima do
republicanismo. A tese que se busca provar é que, ao elaborar uma concepção de liberdade
que visa à ausência de sujeição arbitrária e à igualdade de gênero, Mill formula o que
podemos chamar de feminismo republicano.
2. A sujeição das mulheres e a relevância política da igualdade de gênero
Dentre as obras do corpus milliano, A sujeição das mulheres (SM) foi, durante muito
tempo, uma das menos estudadas. Ao publicar o livro, Mill tinha ciência de que pagaria
um preço caro entre alguns círculos filosóficos de seu tempo, uma vez que o tema do
feminismo não parecia ser, naquela época, digno de um pensador “sério”. Sendo assim,
alguns críticos do século XIX consideraram a opção de Mill de redigir um livro sobre a
questão das mulheres como “o maior erro dele enquanto pensador” (BAIN, 1882, p. 146).
2
Kenneth Minogue (1988, p. 194) e Richard Bellamy (2008, p. 43) sintetizam bem a oposição entre
liberalismo e republicanismo que um número considerável de pesquisadores crê existir. Deixando de lado
os possíveis méritos que tal dicotomia possa conter, o fato é que, ao menos de uma perspectiva milliana, a
oposição entre republicanismo e liberalismo é insustentável. Portanto, deve-se reconhecer que, longe de
antitéticos, liberalismo e republicanismo se consorciam nos trabalhos de alguns filósofos modernos, dentre
os quais Mill deve ser incluído (DAGGER, 1997, cap. 1). Sobre a aliança entre liberalismo e republicanismo
na filosofia moderna, cf. também Helena Rosenblatt (2018, cap. 2).
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Foi apenas a partir da década de 1960 que o valor filosófico de SM passou a ser
reconhecido (MORALES, 2005, pp. xiii-xiv). Desde então, o reconhecimento da
importância do livro tem crescido. Trata-se, com efeito, de um texto filosoficamente
denso, pois, ao abordar o tema da desigualdade de gênero, Mill mostra como conceitos
caros da filosofia política – quais sejam, igualdade, liberdade e justiça – se imbricam
mutuamente (ROSEN, 2013, p. 246).
O liame que SM tece entre liberdade e igualdade nos permite matizar o feminismo
de Mill como republicano. Mill pode ser enquadrado como um feminista republicano, na
medida em que seu compromisso com a igualdade de gênero o levou a identificar a
liberdade com a ausência de sujeição arbitrária. Ainda que dezenas de comentadores
tenham se referido a Mill como um filósofo republicano ou filósofo feminista, até onde
sabemos, há apenas um estudo que afirma ser Mill um feminista republicano. No livro
Women’s Rights as Multicultural Claims, Monica Mookherjee (2009, p. 132) sugere que
a filosofia milliana deveria ser associada ao que ela designa de “republicanismo
feminista”. Por meio de uma análise do conceito de liberdade que subjaz ao feminismo
de Mill, este artigo busca substanciar a breve afirmação de Mookherjee.
Logo no início da SM, Mill expande o horizonte semântico da palavra “despotismo”
e qualifica de despóticas as relações entre homens e mulheres que se dão na chamada
“esfera privada”. “Nem uma palavra que se diz sobre o despotismo na família não se diz
também sobre o despotismo político” (CW XXI, p. 286). O modo como Mill emprega o
conceito de despotismo é, a um só tempo, clássico e inovador (URBINATI, 2007, p. 67).
Clássico porque o associa com o domínio absoluto de uma pessoa sobre o arbítrio de
outra (despotes era o termo que os gregos usavam para se referir ao dono de escravos)
e inovador porque amplia sua utilização a fim de abarcar relações de submissão que os
antigos viam como naturais. Ao classificar de despótica a relação entre marido e mulher,
Mill vai contra a antiga ideia de que as relações praticadas no âmbito privado da casa
(oikos) não poderiam ser objeto de regulamentação política. Ao exigir dos poderes
políticos de seu tempo a criação de leis que impossibilitassem a sujeição das mulheres
no âmbito doméstico, o filósofo põe em questão a dicotomia público vs. privado e
prenuncia o lema feminista de que o privado é público. 3 O despotismo exercido sobre
2F
3 “Mill, ao contrário da maioria dos liberais, estava disposto a pensar a ideia da igualdade e da não-hierarquia
no âmbito da ‘esfera privada’ e a demolir a ideia de que essa esfera deveria ser imune à regulamentação
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as mulheres na esfera privada é de relevância pública porque a manutenção de relações
desiguais no interior da casa inviabiliza a igualdade no âmbito político (MACIEL, 2014,
p. 54).
O emprego sui generis do termo “despotismo” permite a Mill apontar para a
necessidade de se politizar áreas da vida humana consideradas até então imunes à
interferência pública. A descrição da relação conjugal em termos políticos denuncia uma
estratégia maior do texto, qual seja, a de expandir a manutenção das relações
igualitárias para um âmbito no qual os cidadãos modernos passam cada vez mais
tempo: a casa.
No capítulo quatro da SM, Mill contrasta o estilo de vida dos homens modernos
com a ética cavalheiresca. Em comparação com os homens de antigamente, os
modernos passam mais tempo em casa com a família. Por isso mesmo, é necessário
garantir a existência de relações livres no ambiente doméstico, uma vez que a
convivência prolongada com relações domésticas desiguais estorva o exercício da
liberdade do cidadão. Noutras palavras, não é possível manter “um governo livre” sobre
a estrutura do “despotismo” familiar (CW XXI, p. 292). 4
3F
As comparações entre o mundo político e o ambiente doméstico são recorrentes
ao longo da SM. Primeiro, Mill estabelece que, de maneira análoga à política, o meio
doméstico também é perpassado por relações de poder e que, tal qual aquela, sua
divisão de “poderes e responsabilidades” deveria ser feita consensual e não
despoticamente (CW XXI, p. 291). Em seguida, apresenta a tese de que “a família,
constituída de maneira justa”, cumpriria a mesma função que a “cidadania” exerce: ser
uma “escola da sociedade da igualdade” e “das virtudes da liberdade” (CW XXI, p. 295).
Mais adiante, afirma que “a relação entre marido e mulher é muito similar àquela entre
senhor e vassalo” (CW XXI, p. 325). No último capítulo, ademais, explica que a
experiência familiar pode ensinar uma “faculdade de governo” fundamental para a
política (CW XXI, p. 339).
jurídica” (NUSSBAUM, 2005, p. 108). Sobre a problematização da dicotomia público vs. privado feita pelo
feminismo milliano, ver Keith Burgess-Jackson (2005) e Maria Morales (2007, p. 46).
4 Seguindo uma prática comum entre os comentadores de Mill, quando nos referirmos à edição dos
Collected Works of John Stuart Mill, usaremos a abreviação CW, enumerando, em seguida, o volume e a
página (ex: CW XXI, p. 292 equivalerá a Collected Works, volume XXI, página 292).
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“A lei da servidão no casamento é uma contradição monstruosa a todos os
princípios do mundo moderno e a toda a experiência através da qual esses princípios
foram gradual e dolorosamente conquistados” (CW XXI, p. 323). A igualdade e as
instituições livres, implementadas pelos setores democráticos da sociedade, não foram
conquistadas de maneira fácil. O fato de “as tendências da sociedade humana” serem
contra “o sistema de desigualdade de direitos” não é obra do acaso (CW XXI, p. 272).
A capacidade de cooperar para um propósito comum, até então um instrumento
de poder monopolizado nas mãos das classes mais altas, é agora um instrumento
formidável nas mãos das classes mais baixas. Sob estas influências, não é
surpreendente que a sociedade tenha feito, em dez anos, mais avanços em
direção ao nivelamento das desigualdades do que ultimamente se fez em um
século, ou antes disso, em três ou quatro [séculos] (CW XVIII, p. 51).
Quando há desigualdade, os que estão no topo dificilmente consentem em abrir
mão de seus privilégios. Os que estão em cima julgam natural o poder que têm para
dominar os de baixo, sendo este o motivo que levava a maioria dos homens vitorianos
a nutrir “uma verdadeira antipatia” para com a ideia de que o casamento deveria ser
uma relação entre iguais (CW XXI, p. 281). Ao deparar-se com semelhante atitude, Mill
dispara: “Acaso já houve alguma dominação que não parecesse natural àqueles que a
praticavam?” (CW XXI, p. 269).
A pergunta retórica do autor faz parte de uma estratégia argumentativa que um
leitor razoavelmente familiarizado com o corpus milliano consegue discernir. Se, no
terceiro capítulo de Sobre a liberdade (SL), o objetivo era mostrar como a opressão
contra as minorias era prejudicial à própria maioria que as oprimia, em SM, um dos
propósitos de Mill é mostrar como a sujeição das mulheres é prejudicial para os homens.
O que o leitor atento é capaz de perceber, tanto em SL quanto em SM, é uma
característica retórica muito própria dos textos engajados, a saber, a adoção de um tom
de convencimento. No afã de gerar maior impacto prático, Mill procura persuadir os
perpetuadores da sujeição das mulheres a mudar de atitude. Além do tom que utiliza, o
próprio momento em que decidiu publicar SM indica o anseio do autor em contribuir para
uma mudança efetiva na situação das mulheres. Segundo Stefan Collini (1984, p. xii),
Mill manteve o manuscrito da SM na gaveta por oito anos porque desejava publicá-lo
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naquele que julgava ser o momento mais propício para a defesa pública da causa
feminina.
Para convencer os homens a aderir à causa feminina, Mill reserva uma parte
significativa do livro para mostrar que a desigualdade de gênero é ruim tanto para as
mulheres quanto para os homens. Foi por isso que lemos acima que a servidão das
mulheres representava uma contradição “monstruosa” aos princípios democráticos (CW
XXI, p. 323). A existência de relações despóticas no interior da casa é monstruosa
porque distorce a natureza e o caráter dos seres nela envolvidos (CW XXI, pp. 276, 305).
Mill chega a afirmar que a sujeição feminina é mais prejudicial às mulheres do que aos
homens:
E é verdade que a servidão, exceto quando brutaliza, apesar de ser corruptora a
ambos, o é menos para os escravos do que para os senhores. É muito mais
revigorante para a natureza moral ser refreado [...] do que ser permitido exercer
poder arbitrário sem qualquer freio (CW XXI, pp. 320–1).
142
Esta tese, apresentada de passagem no capítulo três da SM, é retomada de
maneira mais elaborada no início do capítulo quatro:
Todas as propensões egoístas, a egolatria e a preferência injusta a si próprio, que
existem entre os homens, têm sua fonte e raiz [...] na constituição atual da relação
entre homens e mulheres. Pense o que é para um garoto crescer na crença de
que, sem qualquer mérito ou esforço próprio, e mesmo que ele possa ser o mais
frívolo e vazio ou o mais ignorante e apático da humanidade [mankind], pelo
simples fato de ter nascido homem, ele é de direito superior [...] à metade da raça
humana. [...] Qual deverá ser o efeito desta lição no caráter dele? [...] A relação
entre marido e mulher é muito similar àquela entre senhor e vassalo, com a
exceção de que a mulher é submetida a uma obediência muito mais ilimitada do
que o vassalo. Por mais que o caráter do vassalo possa ter sido afetado, para
melhor ou pior, por meio de sua subordinação, quem não consegue ver que o
caráter do senhor foi muito mais afetado para o pior? (CW XXI, pp. 324–5).
Tendemos a pensar que a manutenção de relações servis é deletéria apenas para
o servo. No entanto, o que se sustenta acima é que as relações servis são mais nocivas
para o senhor do que para o servo. A tese de que as relações de dominação corrompem
mais o senhor do que o dominado fez fortuna na literatura abolicionista do século XIX.
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O livro de memórias de Frederick Douglass, abolicionista que, aos vinte anos, fugiu de
seu senhor e iniciou uma vida como homem livre, em uma cidade grande no norte dos
EUA, é exemplar a esse respeito. Em Narrative of the Life of Frederick Douglass (1845),
o antigo escravizado testemunha de forma pungente como a escravidão corrompeu o
caráter daqueles que o escravizaram. Em carta dirigida a Harriet Taylor, Mill faz menção
à militância de Douglass e, com entusiasmo, aprova a coalização de forças entre
abolicionistas e feministas, orquestrada, nos EUA, com o intuito de promover a causa
da liberdade (CW XIV, p. 49).
A aliança entre a militância feminista e a abolicionista não surpreende, uma vez
que tanto esta quanto aquela pleiteavam uma pauta comum: a defesa da igualdade e
da liberdade de todos os indivíduos. Não é à toa, então, que abolicionismo e feminismo
se consorciem em SM, haja vista Mill ser partidário de ambos. A analogia entre a mulher
e o escravo ocorre várias vezes ao longo do livro; “nenhum escravo é um escravo em
tamanha medida, e em um sentido tão completo da palavra, como a esposa o é” (CW
XXI, p. 284). 5
4F
Mill retratava a situação feminina em termos tão negativos porque acreditava que
a sujeição das mulheres “escraviza[va] o espírito delas”, algo que, segundo ele, não
acontecia com os escravizados africanos (CW XXI, p. 271). As mulheres eram ensinadas
a aceitar passivamente a ausência de igualdade e liberdade e a amar sua submissão.
Compreende-se, pois, que “ser atraente aos homens” fosse “a estrela polar da educação
e formação do caráter femininos” (CW XXI, p. 272). Assim, não era preciso que o
despotismo dos homens se traduzisse em repressão física, pois as próprias mulheres,
em muitos casos, consentiam em ser subjugadas e não ofereciam resistência alguma.
“O despotismo [em Mill] designa relações de poder marcadas pela ausência de
consenso formado autonomamente, e não pela ausência de qualquer tipo de consenso”
(URBINATI, 2007, p. 85). A ausência de resistência e a presença de consenso não
5
A um primeiro olhar, a asserção de Mill pode parecer hiperbólica. Contudo, cabe lembrar que, antes de
Mill, a situação da mulher já havia sido aproximada da escravidão por Mary Wollstonecraft (2016),
representante do republicanismo inglês do final do século XVIII. Ao longo dos séculos XVII, XVIII e XIX, o
termo escravidão era usado em um sentido distinto do nosso. “A palavra ‘escravidão’ se utilizava então, em
um sentido muito mais amplo, para descrever qualquer situação de dependência ostensivamente
intolerável” (ROSANVALLON, 2011, p. 41). Em um livro escrito no final do século XVII, Algernon Sidney
(1996, p. 17) ilustra bem este sentido amplo do termo escravidão ao afirmar: “Depender do arbítrio [will] de
outro homem é escravidão”.
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bastam para constatar a existência de relações livres. Para averiguar a existência de
liberdade, seja na esfera familiar ou política, é necessário analisar o processo de
formação do consenso. A resistência organizada contra qualquer tipo de dominação
depende da disponibilidade de mecanismos discursivos e esquemas interpretativos que
permitam aos dominados enquadrar sua dominação como fonte de obstrução da
liberdade. Se a educação de uma sociedade não dá ferramentas para que os dominados
constatem o cerceamento de sua liberdade, a resistência contra o despotismo tende a
não ocorrer.
Nas últimas páginas da SM, Mill escreve que um dos propósitos de seu manifesto
foi trazer à luz “a diferença entre uma vida de sujeição ao arbítrio de outrem e uma vida
de liberdade” (CW XXI, p. 336). Semelhante contraste é digno de nota, porque nos
permite pôr em xeque as interpretações que veem em Mill o epítome do conceito
negativo de liberdade. Como veremos no próximo item, SM oferece uma concepção de
liberdade qua ausência de sujeição arbitrária que aproxima Mill do republicanismo (cf.
SKINNER, 1999, p. 9).
144
3. O feminismo republicano de Mill
“A tradição republicana é unânime ao descrever a liberdade como o oposto da
escravidão” (PETTIT, 1997, p. 31). A antítese entre liberdade e escravidão, central à
argumentação da SM, revela que a concepção de liberdade milliana possui matizes
republicanos:
A característica mais marcante destas definições [republicanas de liberdade] é
que elas devem toda sua fraseologia à análise da liberdade e da escravidão feita
no início do Digesto do direito romano. Lá, somos informados, primeiro, que “a
divisão fundamental do direito [...] é que todos os homens e as mulheres são livres
ou escravos”. Em seguida, dá-se uma definição formal da escravidão. “A
escravidão é uma instituição do ius gentium pela qual alguém é, contra a natureza,
sujeito ao domínio de outrem”. Isto, por sua vez, fornece uma definição para a
liberdade individual. Se todos em uma associação civil são cativos ou livres, então
um civis ou cidadão livre deve ser alguém que não está sob o domínio de outrem,
mas sim sui iuris, capaz de agir em direito próprio. Segue-se, outrossim, que não
ter o status de cidadão livre significa não estar sui iuris e, em vez disso, estar sub
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potestate, sob o poder ou sujeição ao arbítrio de outrem (SKINNER, 2002, pp.
248–9).
Uma das maiores características dos pensadores republicanos é que, na
contramão da concepção de liberdade formulada por Hobbes (1996, pp. 145–6), eles
não pensam que a ausência de interferência basta para assegurar a liberdade. Como a
citação acima deixa entrever, é a ausência de sujeição arbitrária, e não a ausência de
interferência tout court, que indica a presença de liberdade. Essa seção buscará
destacar as afinidades entre a concepção de liberdade apresentada em SM e a tradição
republicana, evidenciando, pois, o feminismo republicano de Mill.
Na filosofia política contemporânea, o republicanismo tem sido objeto de diversos
estudos. Ao explicar a singularidade do conceito de liberdade republicano, esses
estudos, via de regra, resgatam a célebre dicotomia que, na década de 1950, Berlin
postulou entre liberdade negativa e liberdade positiva:
A liberdade nesse sentido [negativo] diz respeito à área de controle, não à sua fonte.
Assim como a democracia pode, com efeito, alienar o cidadão individual de muitas
liberdades que em outro tipo de sociedade se teria, é perfeitamente possível que
um déspota esclarecido conceda a seus súditos grande liberdade individual. [...] A
liberdade nesse sentido não está logicamente associada com a democracia ou o
autogoverno. [...] não há ligação necessária entre liberdade individual e governo
democrático. A resposta para a pergunta “Quem me governa?” é logicamente
distinta da questão “Quão longe vai a interferência do governo sobre minha
conduta?” Ao fim e ao cabo, é nisto que consiste a diferença que contrasta,
profundamente, os dois conceitos de liberdade positiva e negativa (BERLIN, 2000,
pp. 201–2).
Segundo Berlin, a liberdade é positiva quando se associa com a presença de um
regime político específico, qual seja, a democracia. A liberdade negativa, por seu turno,
remete apenas à ausência de interferência. Dada a caracterização, não surpreende que
alguns estudiosos do republicanismo, hoje, afirmem que a liberdade republicana é negativa,
no sentido em que também associa a liberdade com uma ausência: a ausência de
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dominação (PETTIT, 1997, p. 27). 6 A afirmação, contudo, deve ser lida com cautela, pois a
5F
liberdade republicana
[...] é marcada pela presença de algo, já que não ser dominado implica em livrar-se
da incerteza e da vulnerabilidade de situações de dependência. No pensamento
republicano, a liberdade não é avaliada apenas pelo campo de não interferência,
nem pela extensão da ação permitida aos indivíduos, mas leva em conta o grau de
segurança contra intervenções arbitrárias. Desse modo, ela é mais ampla do que a
liberdade negativa, porque objetiva não apenas proteger os indivíduos de
interferências, mas também dar garantias desta proteção, emancipando-os das
condições de precariedade que caracteriza a submissão a um poder discricionário
(BARROS, 2015, p. 28).
A ausência de sujeição arbitrária não ocorre espontaneamente e requer a presença
de mecanismos que permitam aos cidadãos vigiar, contestar e penalizar a conduta dos
agentes com os quais interagem em relações de poder. Além da contenção do poder
arbitrário, o republicanismo exige a manutenção de canais que concedam aos indivíduos o
exercício do poder político: “O regime republicano não propõe apenas que o poder seja
contido por leis e se exerça para o povo, em vista do bem comum, mas exige ainda que
seja exercido, de algum modo, por todo o povo” (CARDOSO, 2004, pp. 46–7). Sendo assim,
podemos dizer que a oposição berliniana entre liberdade negativa e liberdade positiva
enquadra mal a liberdade republicana. Outrossim, também enquadra mal a liberdade
milliana (SIMÕES, 2008, p. 29). Na esteira do republicanismo, Mill entende que a liberdade
requer canais tanto de contenção quanto de exercício do poder político.
Todavia, cabe destacar que, em um dos primeiros artigos que publicou sobre a
liberdade, Mill de fato apresenta uma concepção negativa de liberdade:
A liberdade [...] significa liberdade contra restrição [restraint]. Nesse sentido, toda
lei, toda regra de conduta, é contrária à liberdade. Um déspota, que se encontra
inteiramente emancipado de ambos, é a única pessoa cuja liberdade de ação é
completa (CW I, p. 296).
6 Quentin Skinner (1998) usa “dependência” no lugar de “dominação”. A diferença, entretanto, é apenas
vocabular, pois, como Phillip Pettit (2002, p. 341) reconhece, ambos os termos descrevem o mesmo
fenômeno.
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A definição de liberdade, apresentada nesta passagem, foi escrita quando Mill tinha
dezesseis anos e tipifica de maneira exemplar o conceito negativo de liberdade. Liberdade
significa ausência de restrição e, já que a função de todas as leis é restringir, livre é quem
do jugo delas consegue se emancipar. A menção do déspota como exemplo de ser livre é
significativa, pois mostra a distância que separa este artigo de adolescência do pensamento
posterior de Mill sobre a liberdade. Como observaremos, Mill afirma na SM que o déspota
não é livre porque se encontra privado da relação entre iguais.
No último capítulo da SM, Mill associa a liberdade com o autogoverno, isto é, com “a
liberdade de cada um para governar sua conduta [...] por meio daquelas leis e restrições
sociais a que sua própria consciência pode subscrever” (CW XXI, p. 336). Autogoverno,
aqui, não significa que todas as pessoas devem exercer um cargo governamental ou
trabalhar dentro de alguma instituição estatal. A capacidade de governar, no sentido aqui
empregado, refere-se ao exame crítico de uma consciência política participativa. A
participação política não deve se restringir àqueles que ocupam um cargo governamental.
A participação – i.e., o poder de influenciar os rumos da política – deve estar presente
também no exercício do voto, no debate público, nas passeatas, petições, greves etc. (cf.
CW XIX, p. 535). Ao guiar suas palavras e atos por meio do escrutínio crítico das regras
sociais e leis governamentais que o circundam, o indivíduo realiza um ato político.
Mill encoraja a participação política porque acredita ser por meio dela que se evita a
sujeição arbitrária. Quando as pessoas não participam da vida pública, elas cedo ou tarde
acabam se vendo à mercê de um poder arbitrário. No segundo capítulo de Considerações
sobre o governo representativo, Mill indica compreender a política “tal qual os antigos a
concebiam”: “não podemos esquecer que há, nos assuntos humanos, uma corrente
incessante que sempre flui em direção ao pior” (CW XIX, p. 388). Na tradição republicana,
é comum a ideia de que a corrupção é um perigo sempre à espreita, de que a melhor das
instituições políticas pode, na ausência de cidadãos virtuosos que a vigiam, degringolar
para a pior das tiranias. 7
6F
Para Mill, não menos do que para grande parte dos pensadores alinhados ao
republicanismo, o despotismo, sujeição arbitrária ou tirania – isto é, a ausência de liberdade
7 Sobre o conceito de virtude em Mill e sua relação com o republicanismo, ver Bernard Semmel (1984, p.
110). A respeito do tema da corrupção na tradição republicana, cf. Newton Bignotto (2008).
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– não consiste apenas na interferência em si. Todo o tempo em que não há garantias contra
a disposição de um agente em interferir de maneira arbitrária sobre a conduta de outro
constitui, a rigor, um tempo sem liberdade. Nessa perspectiva, uma mulher sob o jugo de
um marido ou pai magnânimo, que não interfere em suas ações, permanece sem liberdade.
Como se sabe, magnanimidade é o termo que se emprega para caracterizar o agente que,
tendo o poder de fazer mal a outrem, por ora decide não fazê-lo. O problema é que, quando
o bom ânimo cessa, a magnanimidade tende a desaparecer. Quando o sujeito que se
encontra sob sujeição arbitrária se apercebe disto, ele começa a policiar seus atos e
palavras, a fim de evitar que eles despertem a ira do senhor – o que, não obstante,
permanece um modo bastante imperfeito de assegurar a não interferência, pois nada
garante que o senhor fique de mau humor e, subitamente, resolva oprimi-lo.
Não é à toa que os republicanos de outrora associassem esse autopoliciamento,
decorrente da sujeição arbitrária, com a feminilidade; de fato, argumenta Mill, esse tipo de
comportamento permanecia presente entre as mulheres vitorianas. Não por conta de uma
suposta natureza feminina, mas sim porque elas se encontravam sob sujeição arbitrária:
148
Quando consideramos em conjunto [...] a dependência completa da mulher ao
marido – todo privilégio ou prazer que ela tem é um presente ou algo que depende
inteiramente do arbítrio dele – e, por fim, o fato de que os principais objetos de busca
e estima humanas, assim como todos os objetos de ambição social, podem, em
geral, ser obtidos por ela apenas graças a ele, [compreendemos que] seria um
milagre se a capacidade de ser atraente aos homens não houvesse se tornado a
estrela polar da educação e formação de caráter femininos (CW XXI, p. 272).
A bajulação e a deferência servil – assim como a duplicidade que quem precisa
agradar um superior se vê obrigado a cultivar – seriam exemplos de traços “femininos”
presentes em todos os que vivem sob sujeição arbitrária. No caso das mulheres, a
dependência ao arbítrio do homem, acoplada a um conjunto de regras que fazia esta lhes
parecer natural, criava um círculo vicioso que as levavam a modelar seus gestos, roupas,
palavras – em resumo, suas vidas inteiras – com o desígnio de agradar o senhor que as
dominava.
Na leitura republicana, viver sem liberdade é viver sob dependência do arbítrio
alheio. Isso vale mesmo quando tal submissão se dá voluntariamente. Com efeito, vale
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ainda mais para os casos em que o oprimido se submete à sujeição arbitrária de bom grado,
pois semelhante comportamento revela que suas emoções e desejos foram manipulados
de modo a fazê-lo aceitar a opressão que sofre. Para Mill, o que há de perverso na sujeição
feminina é que, além de oprimidas, as mulheres eram ensinadas a amar sua sujeição. Isso
é comum a outros grupos subalternizados que são expostos à sujeição arbitrária: em vez
de resistir à dominação, eles internalizam a visão depreciativa de si próprios que o mestre
lhes imputa e reproduzem os padrões inventados para oprimi-los. A escravidão atinge seu
ápice quando os grupos escravizados deixam de se considerar subjugados e passam, a
todo custo, a tentar se conformar aos padrões que o opressor inventou para subjugá-los.
A sujeição arbitrária rouba dos indivíduos um componente essencial da liberdade
milliana – qual seja, o desenvolvimento pleno das faculdades humanas – porque quem se
encontra sob jugo arbitrário tem o desenvolvimento de seus talentos e potencialidades
frustrado. Esta, com efeito, era uma das queixas de alguns republicanos antigos contra a
sujeição arbitrária. No início da Bellum Catilinae, elogiando o governo livre em oposição à
monarquia tirânica, Salústio observa:
149
[Os romanos] tinham uma constituição fundada na lei [...] que, de início, tendia a
preservar a liberdade e fazia o Estado prosperar [...]. Naquele tempo, os homens
começaram a voltar sua cabeça para cima e a ter seus talentos [ingenium] mais
desenvolvidos, pois os reis costumam ter os bons em maior suspeita do que os
ruins, e para eles o mérito alheio sempre representa perigo [...]. Porém, uma vez
conquistada a liberdade, o Estado cresceu incrivelmente forte e grandioso, em um
período excepcionalmente curto, tamanha a sede de glória que se apossou do
espírito dos homens [...]. O jogo mais desafiante pela glória se dava um com o outro;
cada homem esforçava-se para ser o primeiro a derrubar o inimigo, a escalar uma
muralha e a ser observado enquanto fazia semelhante ação (SALÚSTIO, 1931, pp.
13, 15).
Salústio indica que, ao passo que a sujeição arbitrária leva as pessoas a não
desenvolverem seus atributos para não despertar a desconfiança do rei, a liberdade
salvaguardada pela república configura uma atmosfera convidativa ao desenvolvimento dos
talentos humanos. Para Salústio, assim como para os republicanos de modo geral, a
liberdade não se confunde apenas com a ausência de interferência e reclama a
manutenção de relações igualitárias, que permitam aos cidadãos se olharem de cabeça
erguida, sem necessidade de portar-se de modo servil. O relato de Salústio revela, assim,
que a república constituía o reverso do despotismo: enquanto este se caracterizava pela
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duplicidade e desconfiança das pessoas, aquela gerava uma forma de liberdade em que a
igualdade diante da lei permitia a cada um expressar sua singularidade perante os demais.
Embora, ao tematizar a liberdade como ausência de sujeição arbitrária, Mill não cite
Salústio, é possível especular que esta ideia do republicanismo salustiano – segundo a qual
a ausência de sujeição arbitrária gera uma atmosfera conducente ao desenvolvimento dos
talentos humanos – influenciou seu pensamento, pois, conforme consta na autobiografia do
filósofo, Mill estudou na juventude “toda a obra de Salústio” (CW I, p. 14).
Seja como for, o fato é que a ideia de que a liberdade implica a ausência de sujeição
arbitrária marca presença na filosofia milliana. É a garantia desta liberdade, e não da
segurança tout court, que caracteriza o bom governo:
Olhe para o governo de Napoleão Bonaparte: se a segurança contra roubos e
assassinatos constituísse um bom governo, nunca houve melhor governo que o
dele. Todavia, a segurança contra ladrões e assassinatos é uma parte pequena de
um bom governo e compreende apenas aquele departamento subordinado que se
chama de polícia. Por que consideramos o governo de Bonaparte ruim? Porque,
ainda que a pessoa e a propriedade estejam seguras contra os indivíduos, elas não
o estão contra o déspota. Ele suprimiu todos os ladrões e assassinos, mas não a si
próprio (CW XXVI, p. 282).
Em última instância, quem se encontra sujeito a um poder despótico nunca tem
segurança, pois a propriedade sobre seus bens e sua própria pessoa pode, arbitrariamente,
ser violada pelo déspota. Um governo autoritário, que promete segurança no lugar da
participação política do povo, não consegue entregar o que promete porque deixa seus
súditos à mercê de um poder discricionário. “Eu preferiria, se precisasse escolher, ser
tributado amiúde do que viver sob o medo constante de que toda minha propriedade fosse
usurpada de supetão pelo decreto de um déspota” (CW XXVI, p. 346). Um Estado cheio de
leis é preferível a um Estado despótico que não tributa os súditos. O “governo da Lei é
sempre preferível a um governo arbitrário” (CW XXVI, p. 346). Mill queria acabar com os
dois componentes básicos da arbitrariedade: a imprevisibilidade e a discricionariedade.
“Mal posso imaginar leis tão ruins as quais eu não preferiria me submeter do que ao
capricho de um homem” (CW XXVI, p. 346). Reivindicação constante na tradição
republicana, o Império da Lei é bem-quisto por Mill, porque confere previsibilidade à vida
das pessoas e impede que o capricho do tirano substitua a lei.
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Mill era contra a interferência arbitrária, e não contra a interferência em si; “ele não
pensava que as restrições impostas por leis não arbitrárias fossem, nelas mesmas, uma
ofensa contra a liberdade” (URBINATI, 2002, p. 168). Urbinati haure daí que Mill é tributário
do republicanismo e, além disso, associa a discussão com o princípio do dano. Esse
segundo passo merece atenção porque, em verdade, o princípio do dano afasta Mill do
republicanismo, porquanto em sua base jaz um conceito inexistente entre os antigos: o da
individualidade. A categoria da individualidade e a ideia de direitos individuais não existiam
no mundo antigo (BOBBIO, 1992, pp. 58–60). Enquanto na tradição republicana as
muralhas contra a sujeição arbitrária erigiam-se em torno de grupos constituídos
politicamente, na filosofia de Mill a proteção contra a interferência arbitrária remete ao
conceito da individualidade. 8
7F
Sem dúvida, não se trata de uma diferença desprezível. Afinal, é justamente por não
restringir sua teoria da liberdade aos grupos constituídos politicamente que Mill consegue
estender o clamor pela liberdade como ausência de sujeição arbitrária a indivíduos que não
estão organizados em grupos e que nem sequer atuavam como cidadãos no espaço público
(como, por exemplo, as mulheres de outrora). O próprio fato de Mill politizar a esfera privada
e afirmar que o poder público deveria intervir nas relações entre marido e mulher, a fim de
permitir que esta pudesse ser livre e igual perante os demais, seria inadmissível para os
antigos republicanos. Como o próprio Mill reconhece, a igualdade defendida na SM difere
da igualdade apregoada pelo republicanismo antigo. “Assim era nas repúblicas livres da
Antiguidade [:] mesmo na melhor delas, os iguais limitavam-se aos cidadãos livres
masculinos; escravos, mulheres, e os residentes que não tinham o sufrágio encontravamse sob o jugo da força” (CW XXI, p. 294). O republicanismo antigo restringia a cidadania
aos homens livres. Sendo assim, o feminismo republicano moderno, inevitavelmente,
sinaliza uma ruptura perante o republicanismo dos antigos (HALLDENIUS, 2015, p. 24;
PHILLIPS, 2000, p. 279; VEGA, 2008, p. 158).
8
Seria equivocado associar a individualidade milliana com o atomismo. Como mostra Catherine Audard
(2009, pp. 86–7), Mill na maior parte das vezes preferia usar o termo “individualidade”, pois tinha ciência de
que o termo “indivíduo” evocava o atomismo. Não obstante, Mill em algumas ocasiões emprega o termo
“indivíduo”, mas não em um sentido atomístico. Seguindo o vocabulário de Mill, empregamos os termos
“indivíduo” e “individualidade” de maneira indiscriminada. Sobre a constituição social da individualidade
milliana, cf. Dalaqua (2018).
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O feminismo republicano de Mill difere do republicanismo clássico, pois se baseia
em uma concepção de igualdade mais abrangente. Ademais, sua doutrina da liberdade é
tipicamente moderna na medida em que se ancora na individualidade. Em SL, Mill afirma
que a liberdade requer ausência de “dano”, obstáculo que o indivíduo experimenta não só
quando alguém interfere sobre sua conduta, como também quando o desenvolvimento de
suas capacidades é atrofiado por causa de arranjos políticos deficientes. Em vários casos,
o dano decorre da omissão ou ausência de interferência. Nesse sentido, o princípio do dano
ecoa o republicanismo, pois afirma que alguns tipos de interferência são constitutivos da
liberdade (URBINATI, 2002, p. 165). A lei civil que resulta do consentimento dos cidadãos
é um exemplo a que os republicanos frequentemente recorrem para ilustrar esse ponto:
longe de resultar em sujeição arbitrária, a interferência que ela representa é fundamental
para a liberdade.
Segundo Urbinati, o conceito de liberdade como ausência de sujeição arbitrária,
defendido por Mill, traz à luz a distinção entre interferência legítima e interferência arbitrária
[...] e transforma a reivindicação para ser deixado em paz em uma reivindicação por
emancipação. Enquanto o clamor pela ausência de interferência resulta em um
clamor pelo silêncio da lei, o clamor pela ausência de sujeição culmina no clamor
por uma lei justa. O primeiro clamor presume uma pessoa que se encontra isolada
dos outros, e o segundo, uma pessoa que se percebe como um ser relacional
(URBINATI, 2002, p. 156).
A grande diferença da liberdade negativa com a liberdade republicana é que a
primeira postula tão somente uma política de contenção do poder. A liberdade republicana,
por sua vez, demanda uma cidadania ativa, um povo enérgico e arredio que está sempre
disposto a vigiar o governo e a exigir a remoção de possíveis fontes de poder arbitrário.
Além da compreensão da liberdade como ausência de sujeição arbitrária, outro matiz
republicano, presente em Mill, é a junção entre liberdade e igualdade. Com efeito, na
tradição republicana, a liberdade “implica uma condição de igualdade” (SPITZ, 1995, p. 194;
cf. VIROLI, 1998, p. 120). Conquanto já apareça em SL, a fusão entre igualdade e liberdade
é mais proeminente na SM, obra segundo a qual o objetivo maior da luta feminina seria
garantir a “igual liberdade das mulheres” (CW XXI, p. 281). De acordo com o capítulo dois
da SM,
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[...] a verdadeira virtude dos seres humanos é a aptidão para viver juntos como
iguais, não reivindicando para si nada a não ser o que livremente concedem para
todos os outros; considerando qualquer tipo de comando como uma necessidade
temporária; e preferindo, sempre que possível, a sociedade daqueles com quem
o governo e a obediência possam ser alternados e recíprocos (CW XXI, p. 294).
Uma “aproximação” a esta “sociedade entre iguais”, segundo o autor, ocorrera “nas
repúblicas livres da Antiguidade” (CW XXI, p. 294). Ali, governar e ser governado
constituíam atos recíprocos e alternados, e a liberdade não era senão o nome que se
dava para o exercício do poder entre iguais. De acordo com Mill, “a liberdade de cada um
não tem nenhuma segurança sólida senão a igual liberdade de todos os outros” (CW XIX,
p. 610). Conforme mostra Gregory Claeys (2013, p. 171), Mill teria herdado do
republicanismo “a dependência da liberdade de um indivíduo à manutenção da liberdade
dos demais [...]. A concepção de igualdade dele, em última instância, almejava suplantar
a servidão por completo”.
“Ao apresentar a comparação entre a família e a escravidão e definir o marido como
um mestre e despot, Mill reavive as representações [...] da oikos como exemplo de tirania
política, a fim de reforçar o valor do governo cívico” (URBINATI, 2005, p. 169). Ao matizar
o despotismo doméstico como o avesso da liberdade, o autor de SM alinhar-se-ia a
“Aristóteles e Cícero, que insistiam que o tirano, assim como os escravos, era sozinho e
não livre, haja vista suas relações se darem com homens cativos” (URBINATI, 2005, p.
169). Para os antigos republicanos, a liberdade praticava-se na relação com homens que
se tratavam como iguais. Logo, ao assumir domínio sobre outrem, o tirano ou déspota
destruía não só a liberdade dos outros, como também a sua própria, porquanto se privava
da relação com os pares em cuja companhia poderia desfrutar da liberdade.
4. Conclusão
Este trabalho argumentou que Mill pode ser considerado um feminista republicano,
na medida em que seu compromisso com a igualdade de gênero e sua percepção aguda
da sujeição das mulheres ao patriarcado o levaram a elaborar uma concepção de liberdade
alinhada ao republicanismo. Assim como outros “–ismos” da filosofia, o republicanismo
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abarca diferentes matrizes (cf. BIGNOTTO, 2013). A declaração de Mill, proferida em 1826,
de que seu pensamento político era tributário do “republicanismo” não nos permite afirmar
que a liberdade milliana seja idêntica, por exemplo, à liberdade de Aristóteles ou Cícero
(CW XXVI, p. 358). A matriz do republicanismo na qual Mill se insere é aquela que
predominava na Inglaterra vitoriana – matriz esta que, em verdade, é pouco estudada entre
nós. 9 Tal negligência talvez explique por que, não raramente, nos deparemos com análises
8F
que tratam liberalismo e republicanismo como doutrinas absolutamente incompatíveis entre
si. O republicanismo e o liberalismo são correntes filosóficas polifônicas. Como a filosofia
de Mill mostra, houve um momento na história das ideias em que este e aquele cruzaram
entre si.
Ainda que guarde semelhanças com relação à liberdade pensada pelos autores
republicanos da Antiguidade, a doutrina da liberdade milliana difere do republicanismo
clássico porque tem como âncora a individualidade. Ao passo que no republicanismo
clássico a liberdade se referia apenas a grupos politicamente constituídos, na filosofia de
Mill a liberdade tem o indivíduo como seu ponto de remissão último. É justamente esta
ruptura com a filosofia política antiga que permite a Mill mobilizar uma concepção
republicana de liberdade em prol da luta feminista. Ao não restringir a liberdade a grupos
politicamente constituídos, Mill conseguiu expandir a reivindicação pela liberdade a
pessoas que nem sequer eram consideradas cidadãs (caso das mulheres de outrora).
A fim de justificar a tese de que feminismo e republicanismo se consorciam na teoria
da liberdade milliana, quatro semelhanças entre a filosofia política de Mill e a liberdade
republicana foram destacadas. Em primeiro lugar, a teoria da liberdade em Mill evoca o
republicanismo porque associa a liberdade com a ausência de interferência arbitrária. Para
Mill, é a ausência de sujeição arbitrária, e não a ausência de interferência tout court, que
manifesta a presença de liberdade. No limite, todo tempo que se vive na ausência de
garantias contra a interferência arbitrária constitui um tempo sem liberdade. Portanto, uma
mulher que vive sob o jugo de um marido magnânimo permanece cativa, pois, ainda que
seu mestre nunca decida importuná-la, o simples fato de ela ter um mestre basta para
atestar a ausência de liberdade.
A segunda similaridade é que Mill, na esteira de outros filósofos republicanos, põe
em relevo o tormento psicológico que acomete os que vivem sob sujeição arbitrária. Depois
9
Sobre a matriz republicana presente no pensamento político vitoriano, cf. Robert Gossman (1962).
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que tomam ciência da sua situação, as pessoas à mercê de um poder discricionário passam
a policiar seus atos e palavras com o intuito de não despertar a ira do senhor. Por
conseguinte, elas não desenvolvem suas potencialidades (cf. SALÚSTIO, 1931, pp. 13–5).
Não é à toa, então, que a duplicidade e a bajulação tendam a ser apanágio dos povos
subjugados. Os antigos republicanos caracterizavam este apanágio de “feminino”; como
Mill relata na SM, as mulheres do século XIX eram obrigadas a agir com duplicidade e a se
autopoliciar toda hora, pois tinham de agradar um grande número de mestres: os homens.
Segundo Mill, uma parte significativa das mulheres sentia prazer em se sujeitar aos
homens, haja vista a educação delas ter moldado seus desejos e emoções de modo a fazêlas aceitar a situação opressora em que viviam. De acordo com o filósofo, o que há de
especialmente perverso na sujeição das mulheres é que elas são ensinadas a amar a
opressão que sofrem. Porém, ainda que sinta prazer em ser submissa e aceite ser
escravizada, uma mulher permanece cativa. Isso vale não apenas para as mulheres, mas
também para outros grupos subalternizados que, ao internalizarem a visão depreciativa de
si próprios, propagada pelos opressores, acabam por se tornar partícipes da opressão que
sofrem. A escravidão atinge seu ápice quando grupos vivendo à mercê de um poder
arbitrário deixam de se considerar cativos e viram cúmplices de sua opressão.
A terceira semelhança é que Mill pensava que a liberdade exigia tanto a ausência
quanto a presença de algo. Como argumentamos, tal similaridade revela que a liberdade
milliana não deve ser reduzida ao conceito negativo de liberdade. A ausência de sujeição
arbitrária não emerge espontaneamente e requer a presença de instrumentos e instituições
que permitam aos indivíduos monitorar, contestar e punir a conduta daqueles com quem
interagem em relações de poder. A ausência de interferência, por si só, não cria a liberdade.
Como o princípio do dano milliano mostra, alguns tipos de interferência são constitutivos da
liberdade. O dano – i.e., a obstrução da liberdade – é frequentemente causado pela
ausência de interferência legítima. Para Mill, enquanto a interferência arbitrária inibe a
liberdade, a interferência legítima a promove. A lei civil que resulta do consenso popular
ilustra isso muito bem: longe de gerar sujeição arbitrária, a interferência que ela provoca
constrói a base da liberdade política. O ideal republicano do Império da Lei – o qual, como
se mostrou, Mill defendia – salvaguarda a liberdade porque elimina o principal traço da
arbitrariedade, nomeadamente, a imprevisibilidade. Ao regular as ações humanas com
padrões comuns, aplicáveis igualmente a todos, a lei civil confere previsibilidade à vida das
pessoas.
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A quarta semelhança é que Mill entendia que a liberdade só se exercia entre cidadãs
e cidadãos que se tratam como iguais. Isto o alinha ao republicanismo, pois o consórcio
entre liberdade e igualdade é característico do republicanismo. Mill afirmava que as
pessoas podiam desfrutar da liberdade apenas na presença entre iguais (CW XIX, p. 610).
A liberdade reclama não apenas a ausência de interferência arbitrária como também a
presença de relações igualitárias que possibilitem aos cidadãos e cidadãs encarar uns aos
outros de cabeça erguida, sem ter de agir de maneira dúplice, servil ou bajuladora.
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DE JOHN STUART MILL. Kalagatos, Fortaleza, Vol.17, N.1, 2020,
p. 137-159.
Recebido: 01/2021
Aprovado: 08/2021
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