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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE Giulia Zanovelli Publio de Mattos Curso de Jornalismo - 2º semestre/2012 Profª: Ângela Schaun Turma J Videoclipe Estudo sobre o videoclipe ‘Diário de um detento’ do grupo de Racionais mc’s Resumo O artigo trata de um estudo breve do videoclipe brasileiro e um aprofundamento sobre o videoclipe dos Racionais mc’s da música ‘Diário de um detento’ contando a história de como foi produzido, analisando o impacto que a letra tem sobre a música e repercussão que o clipe teve no Brasil. Palavras-chave: Videoclipe, Mano Brown, Racionais mc’s e ‘Diario de um detento’. Introdução Com a popularização da televisão o rádio começou pouco a pouco a perder o seu espaço. Porém a música sempre foi presente na vida de todas as pessoas, como por exemplo, o fato de todo país ter o seu hino nacional. Com a necessidade de uma linguagem que unisse algo sonoro com imagens, ou seja uma linguagem audiovisual surge a partir da década de 80 do século XX o videoclipe. Algo que representava nada mais nada menos que uma oportunidade de diretores apresentarem a sua capacidade criativa com os mais recentes recursos da era digital do momento. O videoclipe é entendido como uma forma de arte, uma manifestação humana, tem um grande alcance e é capa de suscitar os mais variados sentimentos. Como retrata o autor Walter Salles Jr, o qual diz que o videoclipe é uma forma não-narrativa, não linear. “O que importa é menos a intenção de se contar uma história e mais o desejo de se passar uma overdose de sensações.” Quando um público assiste um videoclipe ele já esta preparado para ver algo que não tem uma conexão direta com a música, que não tenha um significado perceptível. É diferente de um público que assistem um filme, onde é esperado um começo, um meio e um fim. Porém o público que consome videoclipe espera algo que seja harmônico com a música. Como explica o autor Arlindo Machado. Já para a autora Marina Sinhorini “O poder da imagem por si só é muito forte, quando unido então com a essência de uma boa canção só tente a causar o que toda verdadeira obra de arte proporciona: um inteiro encontro com si mesmo e sem limites, em uma esfera que nosso pensamento racional esta longe de compreender”. Segundo o autor Roy Armes o videoclipe não é somente a representação de uma canção mas um campo relativamente livre, cheio de possibilidades para o diretor criar e através desse recurso visual ultrapassam barreiras e conquistam lugares que passam do limite da canção. É limitado do seu próprio jeito. Arlindo Machado define então o videoclipe como uma linguagem moderna. Mas o videoclipe não pode ser considerado somente uma forma de arte, pois ele também tem muito conteúdo publicitário, tendo em vista que, o objetivo é a divulgação de uma música, de uma banda ou de um cantor. É uma forma de atingir um numero maior de pessoas, conquista-las de uma forma diferente e que muitas vezes é eficaz. Como define Luiz Tatit que diz que “o ouvinte reconhece o seu próprio discurso oral nas entrelinhas do tratamento estético musical” Ele chama isso que essa indústria cultural faz de “persuasão passional”. Videoclipe no Brasil: Guilherme Bryan saliente que os principais exercícios de relacionar músicas e imagens gerando filmes cantantes, números musicais de programas de auditório na televisão e apresentação de festivais da música popular, que tornaram possível o surgimento do videoclipe realizado no Brasil. O primeiro videoclipe brasileiro era de Ney Matogrosso da música ‘América do Sul’ exibido no programa Fantástico. A Rede Globo através do programa Fantástico era a única emissora que exibia videoclipes até o início da década de 80. Ao longo da década surgiram programas de clipes em outras emissoras como TV Cultura, Gazeta e Rede Manchete. Rodrigo Barreto divide a história do videoclipe brasileiro em três momentos distintos- a fase do Fantástico (de 1975 a 1980) expressada pelos videoclipes exibidos no programa de variedades da Rede Globo. Segundo Barreto (2005), o plano criativo e econômico trazido pelo vídeo alicerçou cada vez mais a entrada do videoclipe na televisão. O programa Fantástico, exibido aos domingos, foi um dos pioneiros, sendo que chegou a ter um bloco exclusivo para produção e exibição de videoclipes nacionais, por exemplo, o videoclipe Gita, de Raul Seixas, e o videoclipe América dos Sul, de Ney Matogrosso. A segunda fase é de programas segmentados na televisão e novas produtoras (de 1981 a 1989) quando o rock and roll brasileiro se consolida e aparecem outros produtores de videoclipe; por ultimo, a fase que começou em 1990 caracterizada pela disseminação dos videoclipes uma vez que são exibidos por uma emissora de televisão dedicada a eles- MTV Brasil. A MTV Brasil estreou em 20 de outubro de 1990 já com programas para vários segmentos musicais como programa, destinado ao hip-hop e rap, outro voltado para o universo alternativo, e um dedicado ao heavy metal e hard rock. Seu canal era voltado para um público jovem de 12 a 35 anos e foi a terceira versão da MTV a ser lançada no mundo atrás da MTV EUA e a MTV Europeia. Atualmente a exibição de videoclipe atingiu uma nova mídia, a internet que através de canais como Youtube permitem o fácil acesso aos clipes e maior disseminação deste audiovisual. História da banda: O grupo foi formado em 1980 mas somente em 1988 atuam lançando duas músicas numa coletânea chamada “consciência black” a qual foi elaborada por Zimbabwe Records ( produtora especializada em música negra). O nome da banda foi inspirado no disco “Racional” de Tim Maia. O grupo de rap possui seis discos gravados e em suas musicas abordam temas como violência policial, preconceito racial, miséria presentes nas periferias da cidade de São Paulo, entre outros. De 1988 a 1992 os Racionais mc’s gravaram dois LPs e em 1992 o grupo participa do projeto “RAPensando a Educação” o qual, com diligência da Secretaria da Educação, tinha o propósito de falar sobre racismo, violência e criminalidade. É nessa época então que os Racionais vão se tornando mais conhecidos. No ano seguinte gravam o terceiro disco chamado Raio x do Brasil e participam de um projeto realizado no Teatro das Nações (SP). É neste ano também que o compositor e cantor Mano Brown se firma entre os grandes compositores do Brasil ganhando um prêmio Sharp de cantor revelação. Em 1994 os mc’s foram presos, durante um show realizado na Vale do Anhangabaú- centro de São Paulo, acusados de incitar a violência em suas músicas. Tal fato não interferiu na carreira pois eles continuaram fazendo show e em 1997 o grupo lança o disco ‘Sobrevivendo num inferno’ por meio da produtora Cosa Nostra -produtora independente criada pelo próprio grupo. Com esse disco que incluía a faixa ‘Diário de um detento’ venderam 500 mil cópias por meio de distribuição do cd feita pelo próprio grupo que deixava nas bancas de jornal, festas, clubes, shows e camelôs. Dessa forma oficialmente eles deixavam de ser famosos somente na periferia paulistana para fazer sucesso entre outros grupos sociais. O grupo ganhou prêmios como ‘Escolha da Audiência’ – equivalente ao atual ‘Artista do Ano’ no VMB através do videoclipe da música ‘Diário de um detento’. Em 2002 eles lançam o álbum ‘Nada como um dia após o outro’ que possuía disco duplo e receberam críticas positivas a respeito do disco. Somente em 2006 vão lançar o primeiro dvd chamado ‘1000 trutas, 1000 tretas’ que continha 15 músicas gravadas durante shows realizados durante quatro anos de sucesso. Desde 2009 então ficaram sem lançar novos discos. Todavia, ao que tudo indica, um novo disco será lançado brevemente sendo que algumas músicas já caíram na internet. Ganharam grande repercussão com a música ‘Mil faces de um homem leal’ (Mariguella) sendo que o videoclipe desta música concorreu ao prêmio VMB de melhor clipe do ano em 2012. História da música e do videoclipe Diário de um detento: Música A música ‘Diário de um detento’ teve seus versos escritos por Josemir José Fernandes Prado, o Jocenir, como é chamado por amigos e parentes. Jocenir é ex-detento do Carandiru que cumpria pena pela condenação de seis anos e três meses por formação de quadrilha e nesse tempo além de escrever cartas, registrava tudo o que via na prisão, além das histórias contadas por colegas detentos. A música que aborda a questão referente ao massacre na Casa de Detenção, onde morreram 111 presidiários, por exemplo, é fruto da memória de oito colegas de cela, sobreviventes da rebelião, em outubro de 1992. O encontro entre Jocenir e Mano Brown aconteceu durante uma visita do cantor ao complexo Carandiru enquanto Jocenir cumpria pena. Após ler o poema escrito pelo ex-detento, Mano Brown gostou e resolveu usa-lo como música. A canção foi classificada em 52º lugar na lista das 100 maiores músicas brasileiras publicada pela revista Rolling Stone na edição de outubro de 2009. Videoclipe Dirigido por Mauricio Eça, Marcelo Corpanni e Tony Tiger, o videoclipe ‘Diário de um detento’ tem uma história interessante. Odorico Mendes recebe a proposta para gravar o videoclipe dos Racionais, mas não aceita fazer uma vez que o grupo queria gravar no Carandiru. Dessa forma Odorico propõe a Mauricio Eça (seu assistente) que gravasse tal videoclipe e o diretor aceita. Para decidir detalhes, na sala de reunião, Mano Brown reafirma que “tem que filmar no Carandiru, porque, se não filmar, não tem clipe. Tem que ser de verdade.”. Após conseguir autorização do governador Mario Covas para a filmagem, ela aconteceu com concessão do diretor do presídio para utilização de poucos equipamentos e poucas pessoas para a filmagem. Eles entraram no presídio sobre permissão dos presos, pois estes admiravam o trabalho dos Racionais de retratar a realidade que eles mesmo viviam. Inclusive, muitos detentos queriam aparecer no clipe. Devido à dificuldade de gravação no presídio foram gravados também cenas em estúdio, no Capão Redondo e foram pegas imagens de fotógrafos que retrataram o massacre para complementar o clipe. Analisando o videoclipe podemos detectar uma filmagem lenta, em ritmo de observação que se alia muito bem à letra. O diferencial desse material é que a letra bem marcada com as imagens as vezes chocantes e pesadas retratam uma realidade que era pouco falada. O fato de esse clipe ser a primeira grande filmagem no Carandiru (foi feita antes do filme Carandiru) trouxe essa linguagem documental. Mesmo sendo extenso e ocupando espaço para dois videoclipes, ‘Diário de um detento’ entrou no Disk MTV, ganhou em duas categorias do VMB como prêmio de “melhor videoclipe de Rap” e “melhor videoclipe do ano”, participou do festival Rio Cine e do É Tudo Verdade como documentário, foi considerado o clipe brasileiro mais importante da história da MTV e devido sua importância entrou na amostra Made in Brasil do Itaú Cultural. Conclusão ‘Diário de um detento’ foi um marco não só como desabafo do preso, mas a questão é de cunho nacional uma vez que a realidade das imagens aliada a veracidade da letra imprimiu uma concepção chocante e fiel do Carandiru antes desconhecida pela população. A importância desse videoclipe para a música em si está conciliado com a busca da verdade como fotos do massacre e a gravação dentro do presídio. Além disso, a maneira como foi estruturado o videoclipe com filmagem lenta acompanhando a letra pesada veio no momento certo em que a população vivia num marasmo brasileiro. Creio que um dos motivos de sucesso do clipe foi porque a música e a imagem dão visibilidade ao detento e tal fato é raro de acontecer pois eles são vistos como seres marginalizados e invisíveis a sociedade. O clipe foi uma maneira democrática de mostrar uma vertente que poucos conhecem e ousar dando voz aos esquecidos. Bibliografia: Sites: MTV- De 1988 a 2012: Conheça a história do Racionais MC's http://mtv.uol.com.br/programas/mtv1/noticias/de-1988-a-2012-conheca-a-historia-do-racionais-mcs Racionais Mc’s – História Completa – Artigo Especial http://rapbrasil.net/racionais-mcs-historia-completa-artigo-especial/ Istoé Gente- Reportagem Memórias do cárcere http://www.terra.com.br/istoegente/96/reportagem/memorias_carcere_jocenir.htm Revista Rolling Stone: Edição 37 - Outubro de 2009- N°52 - Diário de um Detento http://rollingstone.com.br/edicao/37/noticia-4023 Mestres da História: Carandiru http://mestresdahistoria.blogspot.com.br/2009/11/intertexto-massacre-do-carandiru.html Teses e Livros: BARRETO, Rodrigo Ribeiro. A fabricação do ídolo pop: análise textual de videoclipes e a construção da imagem de Madonna. Dissertação de Mestrado. UFBA, 2005. HOLZBACH, Ariane Diniz- Excesso, esquizofrenia, fragmentação e outros contos: A história social de surgimento do videoclipe. Artigo Científico. Universidade Federal Fluminense, 2010. CALDAS, Carlos Henrique Sabino. Os novos caminhos do videoclipe: interatividade e participação na era digital. Unesp, 2011. BRYAN, Guilherme. A autoria do videoclipe brasileiro: estudo da obra de Roberto Berliner, Oscar Rodrigues Alves e Mauricio Eça. Tese de Doutorado. USP, 2011. PRYSTHON, Ângela. “O videoclipe, ou a forma cultural do pós-modernismo”. In: SOARES,Thiago. Videoclipe: o elogio da desarmonia. Recife: Livro Rápido, 2004. SALLES, Filippe. Imagens Musicais ou Música Visual: um estudo sobre as afinidades entre o som e a imagem, baseado no filme Fantasia (1940), de Walt Disney. Dissertação de Mestrado. SOARES, Thiago. Videoclipe: o elogio da desarmonia. Recife: Livro Rápido, 2004.