REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 20, Nº 44: 5-10 NOV. 2012
DOSSIÊ “O CENTENÁRIO DE SOCIOLOGIA DOS PARTIDOS
POLÍTICOS, DE ROBERT MICHELS”
Apresentação: Robert Michels, Gramsci e a ciência política contemporânea
“Quem diz organização, diz oligarquia”
(Robert Michels)
I. OS DIAGNÓSTICOS DE MICHELS
Em 2011 comemoramos um século da
publicação da obra clássica de Robert Michels
(1876-1936). Desde sua primeira edição, sua
Sociologia dos partidos políticos vem contribuindo
para estimular um intenso debate sobre a relação
entre democracia, partidos políticos e a
organização das instituições representativas. Seu
centenário é uma boa ocasião para voltarmos a
esse livro a fim de rever suas presunções e
proposições fundamentais.
No Prefácio que René Rémond escreveu à
republicação da tradução francesa em 1971 de
Zur Soziologie des Parteiwesens in der modernen
Demokratie (Untersuchungen über die
oligarchischen Tendenzen des Gruppenlebens), ele
observou que apesar de todas as insuficiências
desse livro – em termos empíricos, geográficos,
ideológicos e metodológicos –, Robert Michels
acertou em cheio em seus diagnósticos e em seu
pessimismo. Talvez fosse o caso então de dizer
que nunca uma lei social elaborada a partir de um
único caso foi tão previdente.
Rémond lembra que o ensaio de Michels traz,
em comparação com o feitio dos trabalhos mais
contemporâneos de ciência política sobre o
assunto, pouquíssimos dados estatísticos, nada
sobre o financiamento voluntário dos partidos,
nenhum estudo dos estatutos e escassas
informações sobre os conflitos internos entre as
cúpulas dirigentes (RÉMOND, 1971, p. 10). De
acordo com a reprovação de Max Weber, a obra
é uma mistura confusa entre fatos e julgamentos
de valor produzida por um adepto desiludido da
esquerda do SPD (Partido Social-Democrata da
Recebido em 1° de setembro de 2012.
Aprovado em 29 de outubro de 2012.
Alemanha). Michels teimava quase que apenas em
reprovar os defeitos internos mais expressivos e
urgentes dos socialdemocratas. Ele denunciava
obsessivamente seu eleitoralismo (preocupação
exclusiva em ganhar as eleições), seu
parlamentarismo (a idéia segundo a qual a política
se resume à atuação no parlamento) e o
oportunismo pessoal dos líderes, focados nas
próprias carreiras e vantagens advindas da posição
de direção na organização partidária. Além disso,
como se recorda, Michels estudou
exclusivamente a esquerda socialista, deixando de
lado os liberais democratas, a direita conservadora,
os monarquistas, os republicanos, os católicos,
etc. Seus exemplos incluíram só o norte da Europa
e, secundariamente, a Itália. “A bem dizer”,
enfatiza Rémond, “a tese de Michels é [tãosomente] uma extrapolação a partir [do caso] da
social-democracia na Alemanha guilhermina”
(idem, p. 11). Com base nessa falácia ecológica,
nada nos garante que a sua famosa sociologia dos
partidos políticos não seja enfim uma sociologia
política dos partidos de massa da esquerda alemã
em princípios do século XX. E que suas assertivas
pessimistas sobre a política partidária dos
socialistas não se resumam, afinal de contas, em
“um amável ceticismo de salão ou de café
reacionário” animado pelo juízo “epigramático de
um polemista” (GRAMSCI, 1984, p. 110).
Outras coisas também contaram contra esse
livro pioneiro. O fato de ele ter sido publicado em
1911 só evidencia que o autor perdeu o melhor
da festa: a ascensão do partido nazista e do partido
fascista, a criação e a burocratização do partido
comunista da URSS, o monopólio da direção da
Section Française de l’Internationale Ouvrière
Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 20, n. 44, p. 5-10, nov. 2012
5
APRESENTAÇÃO
(SFIO) por um único indivíduo por quase um
quarto de século, para ficarmos no principal e
irmos só até a metade do século. E, contudo, o
mais irônico é que todos esses exemplos são uma
validação espetacular das principais proposições
de Michels a respeito das conhecidas
“extravagâncias das oligarquias partidárias”
(POUTHIER, 1993, p. 812).
Uma contraposição rápida entre os achados
de Michels e as proposições de Gramsci tendo
como pano de fundo a democracia política e a
democracia no interior dos partidos políticos
ajudam a destacar a oportunidade de retornar ao
nosso autor.
II. MICHELS FACE A GRAMSCI
Nas sociedades democráticas modernas, o
partido político é por excelência o canal da
representação. Os partidos são (ou foram no
passado, a discutir) os mecanismos institucionais
mais importantes da vocalização política. É através
deles que os grupos sociais costumam exprimir,
de modo mais ou menos completo, suas
reivindicações e interesses, assim como participar,
de modo mais ou menos eficaz, da formação das
decisões públicas. O problema da representação
põe, contudo, uma questão política essencial e
que diz respeito à sua possibilidade, natureza e
grau: como a representação poder ser efetiva,
genuína e legítima? Nesse tema, A sociologia dos
sistemas partidários na moderna democracia (na
tradução literal do título) tornou-se um clássico
da Ciência Política e da Sociologia Política. E um
clássico porque a pergunta de fundo desse livro
não cessa de nos interpelar: a democracia é, enfim,
viável (cf. MICHELS, 1971, p. 18-19; REMOND,
1971, p. 14; POUTHIER, 1993, p. 812)?
Esse grande problema pode ser desdobrado,
teoricamente e empiricamente, em pelos menos
outros três: a) se o partido (qualquer partido)
engendra, necessariamente, uma oligarquia, que
forma política seria a mais adequada para
organizar as diferentes correntes de opinião, visões
de mundo e interesses sociais nas sociedades
modernas? b) Se nesse contexto institucional
impera a delegação do poder das massas aos
burocratas da organização, como viabilizar, de um
lado, a verdadeira representação e a participação
efetiva e, de outro, o controle social sobre os
comissários? c) Qual a capacidade real das massas
agirem politicamente de maneira consciente e
6
responsável (“racionalmente”, nós diríamos) sem
a tutela de um líder, seja ele o partido ou o chefe
carismático?
Essas três indagações constituíram boa parte
da agenda dos estudos políticos ao longo do século
XX e preocuparam, com ênfases diferentes,
elitistas, pluralistas, radicais, liberais,
institucionalistas e marxistas. Entre esses últimos,
vale lembrar aqui a discussão de um grande
pensador como Antonio Gramsci, cuja teorização
sobre o partido revolucionário inspirou mais de
uma geração de militantes socialistas1.
O problema do qual Gramsci parte é: como
construir um mecanismo político mediante o qual
uma classe, ou uma aliança de classes, pode
conquistar o poder de Estado e impor, pela via da
revolução social, uma nova hegemonia? Esse
desafio teórico e político, complexo por si
mesmo, desdobra-se em outros. Em termos
gerais, trata-se do “problema dos modos e formas
[políticos] que possibilitarão organizar toda a
massa de trabalhadores italianos numa hierarquia
que organicamente culmina no partido”. Mas não
a qualquer preço, e sim sob certas condições
limitantes. Construir o socialismo implica apostar
na “construção de um aparelho estatal que,
internamente, funcione de maneira democrática,
isto é, garanta liberdade a todas as tendências
anticapitalistas, [isto é, garanta] a possibilidade
de [todas essas tendências políticas] se tornarem
partidos do governo proletário”. Por outro lado,
o socialismo exige que esse Estado-partido “seja
externamente uma máquina implacável que
esmague as organizações do poder industrial e
político do capitalismo” (Antonio Gramsci apud
MILIBAND, 1979, p. 139; sem grifos no original).
Em uma breve seção dos Quaderni (“Roberto
Michels e os partidos políticos”), o comunista
italiano comenta alguns escritos esparsos de
1 O próprio pensamento de Gramsci, assim como o de
Lênin, sobre os problemas da organização revolucionária
sofreu, entre 1919 e 1935, transformações importantes.
Enquanto os artigos publicados nos anos que precederam
a fundação do Partido Comunista Italiano (PCI) (1921)
no Ordive Nuovo e no Avanti expressam soluções para as
questões organizatórias em termos quase idênticos ao
“espontaneísmo” luxemburguista, os Cadernos do Cárcere
(1929-1935) contêm uma visão completamente nova da
política revolucionária e do Partido (cf. LÖWY, 1962, p.
151-152).
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Michels e as questões colocadas por esse último
aos políticos socialistas2.
Gramsci insiste que é preciso diferenciar as
coisas. Um problema é a democracia interna (ou,
precisamente, a falta de democracia interna) da
organização partidária, fenômeno ressaltado por
Michels; outro, bem diferente, é o objetivo
estratégico da organização política comunista, isto
é, o Estado verdadeiramente democrático. E que
“para conquistar a democracia no Estado pode
ser necessário (ou melhor, quase sempre é
necessário) um partido fortemente centralizado”
(GRAMSCI, 1984, p. 108), como, aliás, ensinounos Lênin3. Só que, assim pensada, essa fórmula
de Gramsci apenas adia o problema – em nome
da eficácia política dos meios e da justeza dos
fins pretendidos – sem absolutamente resolvê-lo.
A dificuldade aqui, como se percebe, é evidente:
como garantir que essa organização “fortemente
centralizada”, isto é, hierárquica, desigual e
despótica, vá perseguir um fim – a igualdade –
que é o exato oposto da sua natureza? Ou ainda:
como exatamente uma vez no poder, essa
organização antidemocrática poderá ser
democraticamente controlada?
A outra crítica de Gramsci é, surpreendentemente, mais incongruente ainda. Ele argumenta
contra Michels que a diferença entre a democracia
e a oligarquia (supõe-se, pelo contexto, que ele
esteja falando de relações democráticas e relações
2 “Ao todo, Gramsci escreveu 14 parágrafos com alguma
referência a Michels”. São eles: Quaderni 2, § 45, § 75 e §
93; Q 3, § 59; Q 6, § 97; Q 7, § 12 e § 64; Q 8, § 148; Q 9,
§ 142; Q 11, § 25, § 26 e § 66; Q 13, § 29 e Q 13, § 33.
“Dentre estes parágrafos existem sete nos quais há
referência à obra de Michels, sendo que alguns só
apresentam uma referência ocasional e em outros já há um
debate da obra do autor. E os outros sete parágrafos são
aqueles nos quais Gramsci só fez referência a algum
conceito de Michels – na sua maior parte, ao conceito de
chefe carismático. Entre estes textos, há apenas um texto
A, oito textos B e cinco textos C. A principal nota crítica
de Gramsci a Michels, é um texto B, do Caderno 2 (§ 75),
escrito entre 1929 e maio de 1930” (FERNANDES, 2011,
p. 17). Como meu comentário não tem uma função
exegética, utilizo a edição temática dos Quaderni,
especificamente o volume publicado no Brasil como
Maquiavel, a política e o Estado moderno (GRAMSCI,
1984, p. 103-111).
3 Tomo como referência para essa ideia os trabalhosb
Que fazer? (1902) e Um passo à frente, dois passos atrás
(1904).
oligárquicas no interior do partido socialista)
resulta, no essencial, da “diferença de classe
[existente] entre chefes e seguidores”. Exemplo
onde isso ocorreria? Naqueles mesmos sindicatos
e partidos social-democratas analisados por
Michels. Ora, se hipoteticamente não há, ou
melhor, quando não houver, no futuro, diferença
de classe entre dirigentes e dirigidos, as relações
ordinárias no partido, prevê Gramsci, se
converterão apenas em questões administrativas,
já que decorrerão tão só das exigências práticas e
da divisão do trabalho interno da organização, isto
é, elas serão um problema “puramente técnico”.
E como as massas, sem qualquer treinamento
técnico, poderão participar das tarefas dirigentes
do partido agora socialmente nivelado? A
incapacidade das massas para a direção poderá
ser resolvida graças à educação prática e ao
aprendizado adquirido graças à “participação ativa
dos seguidores na vida intelectual (discussões) e
organizativa do partido” (idem, p. 109). Todo
problema aqui é saber como e por que a igualdade
social, numa esfera da vida, transformará, ipso
facto, as questões organizativas, que pertencem
a outro domínio, ao domínio interno da vida dos
partidos, em questões meramente administrativas,
abolindo o conflito e a separação política entre as
ordens que constituem uma organização. Em
segundo lugar, seria preciso que Gramsci
explicasse qual seria e de onde viria o interesse
das cúpulas partidárias “proletárias” (mas ainda
assim cúpulas) em promover a participação ativa
dos filiados nas dicussões políticas e estratégicas
da organização. Qual seria a motivação das
minorias dos funcionários do partido não para
repartir tarefas administrativas, mas para
compartilhar voluntariamente o poder?
A terceira dificuldade enfrentada por Gramsci
quando comenta as análises de Michels, repletas
de “palavras vazias e imprecisas”, diz respeito ao
desenvolvimento, nos “partidos avançados”, ou
seja, nos partidos socialistas burocraticamente
estruturados, de uma camada de intelectuais que
concentram e monopolizam muitas funções
políticas. A saída para isso seria criar, nesses novos
partidos, uma grande camada intermediária entre
os chefes políticos e as massas “capaz de servir
de equilíbrio para impedir os chefes de se
desviarem” da linha correta “nos momentos de
crises radicais e de elevar sempre mais [o nível e
o poder da] massa” (ibidem). Novamente, essas
palavras não refutam, por si mesmas, as ideias
7
APRESENTAÇÃO
“bastante confusas e esquemáticas” (ibidem) de
Michels sobre os partidos, exatamente porque não
mostram como uma organização mais complexa
ainda pode produzir um resultado oposto àquele
minuciosamente descrito na obra pioneira do seu
contemporâneo. Tudo somado, as respostas que
Gramsci ensaia contra as teses de Michels
parecem ser, a bem dizer, ora uma reafirmação
de raciocínios baseados em desejos, princípios e
conjecturas, ora uma aposta miraculosa no
interesse da organização e dos seus comandantes
em sabotar voluntariamente o seu próprio poder.
III. O SEMINÁRIO “O CENTENÁRIO DE SOCIOLOGIA DOS PARTIDOS POLÍTICOS,
DE ROBERT MICHELS”
Para refletir sobre a contribuição e o estatuto
teórico de Sociologia dos partidos políticos4, foi
realizado no segundo semestre de 2011, no
Programa de Pós-Graduação em Ciência Política
da Universidade Federal de São Carlos, o seminário
“O centenário de Sociologia dos partidos
políticos, de Robert Michels”5.
4 Esse é o título do livro em português adotado neste
dossiê por razões de uniformidade. A tradução disponível
no Brasil foi feita pela editora da Universidade de Brasília
(UnB) em 1982 a partir da edição francesa. A primeira
versão do livro em francês apareceu em 1914 e essa
tradução foi feita tendo como base a primeira edição italiana
do texto. Falta aí toda uma parte e a totalidade das notas
(a tradução estadunidense da Free Press, de 1962, também
tem como base a edição francesa abreviada). Em 1971 a
editora Flammarion reeditou o livro conservando o título
de 1914 – Les Partis politiques. Essai sur les tendances
oligarchiques des démocraties – que é um tanto diferente
do original alemão: Zur Soziologie des Parteiwesens in
der modernen Demokratie (Untersuchungen über die
oligarchischen Tendenzen des Gruppenlebens) [Sobre a
sociologia do sistema de partidos na democracia moderna
(estudos das tendências oligárquicas de vida em grupo)].
Uma segunda edição alemã aumentada apareceu em 1925
e este é o texto estabelecido. Em 1966 foi publicada uma
tradução italiana a partir dessa última edição: La sociologia
del partito politico nella democrazia moderna (Bologna:
Il Mulino) com um importante prefácio de Juan Linz. As
informações bibliográficas foram obtidas a partir de
Pouthier (1993, p. 814-815).
5 Esse seminário ocorreu no dia 28 de agosto de 2011 e
contou com a participação dos colegas André Marenco
(Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs)),
Rachel Meneguello (Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp)), Valeriano Costa (Unicamp), Mário
Grynszpan (Fundação Getúlio Vargas (FGV)), Cláudio
Couto (Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP)),
Pedro Ribeiro (Universidade Federal de São Carlos
8
Nessa ocasião foi lançado o desafio de
publicarmos os trabalhos aí apresentados para
marcar a data, o qual foi muito bem aceito pelos
editores da Revista de Sociologia Política, já que
a Sociologia Política de Michels tem tudo a ver
com o perfil e o foco do periódico. Como
resultado desse esforço, resultou esse dossiê que
conta com valiosas contribuições que ora
passamos a apresentar, destacando e sumarizando
os principais aspectos analisados nos textos.
O artigo de Mario Grynszpan procura mostrar
como a história da ciência política nos Estados
Unidos pode ser compreendida a partir da história
da recepção das edições, traduções e comentários
críticos do principal livro de Robert Michels. A
partir de uma competente e acurada Sociologia
Histórica da circulação e da recepção de
Sociologia dos partidos políticos, Grynszpan
revela quando e como o pessimismo sociológico
de Michels converteu-se em realismo científico e
como esse realismo pôde construir uma base para
o pluralismo democrático.
Pedro Floriano Ribeiro apresenta minuciosa
análise a respeito das principais concepções e
influências teóricas e políticas de Michels na
construção de sua obra. Busca também identificar
as mais relevantes mudanças entre a primeira
edição, de 1911, e a segunda, de 1925. Ademais,
realiza interessante análise genética desse estudo
pioneiro, contextualizando-o e indicando alguns
fatos biográficos prévios à sua publicação e no
intervalo entre as duas edições.
Já Cláudio Couto tem como principal foco
discutir a utilidade científica do conceito de
“oligarquia” originalmente criado por Michels,
buscando uma definição ao mesmo tempo mais
precisa e mais operacionalizável desse termo. Para
isso Couto retoma a contribuição micheliana
fundamental, partindo de um conceito
essencialmente descritivo e não normativo de
oligarquia, aproveita trabalhos posteriores sobre
(UFSCar)) e Maria do Socorro Braga (Ufscar). Para a
realização desse evento foi fundamental o financiamento
da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível
Superior (Capes). Para a divulgação contamos ainda com
o apoio da Associação Brasileira de Ciência Política
(ABCP), do Departamento de Ciência Política da
Universidade de São Paulo (USP), do Núcleo de Pesquisa
de Políticas Públicas (Nupps) da USP e da Revista de
Sociologia Política da Universidade Federal do Paraná
(UFPR).
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o assunto e elabora um modelo institucional de
análise que permite examinar processos de
oligarquização de organizações sociais e políticas.
balanço da literatura que busca alternativas ao viés
hoje dominante contra a forma partido e
antissocialista.
Para André Marenco e Maria Izabel Noll a
predição de Robert Michels sobre a inevitabilidade
da conversão de todas as organizações partidárias
em oligarquias estaria temporalmente delimitada
a um contexto específico, marcado pela expansão
do sufrágio universal e pela integração na
competição eleitoral de candidatos populares,
combinado a reformas eleitorais (em especial, a
substituição do voto majoritário pela
representação proporcional). A validade da lei
férrea micheliana, portanto, estaria circunscrita
apenas ao período de predomínio dos partidos de
massa, e seria estruturada em um tripé formado
pelo a) ativismo voluntário, b) finanças coletivas
e c) ideologias partidárias como vantagens
comparativas na competição eleitoral e sua
disponibilidade oligopólica por dirigentes
partidários.
Por fim, Maria do Socorro Sousa Braga busca
resgatar os pressupostos da tese de Michels a
respeito da dinâmica organizacional dos partidos
políticos marcada por duas tendências
supostamente antagônicas: a propensão à
concentração de poderes nas mãos de uma
oligarquia, de um lado, e, de outro, a aspiração de
participação pelos demais integrantes nas decisões
intrapartidárias. Além disso, discute como a obra
de Michels influenciou estudiosos do fenômeno
partidário vinculados à perspectiva organizacional
contemporânea.
Já Ingrid Sarti revisita o tema da alternativa
entre participação e representação e como ele
impactou a história e a doutrina dos partidos
socialistas. No contexto atual, em que o anúncio
da crise e do esgotamento da forma “partido” é
cada vez mais insistente, como ler Michels? E,
principalmente, como ler Michels depois que, no
clima ideológico da Guerra Fria, sua obra foi
assimilada pela crítica liberal como um diagnóstico
mais do que fiel do partido único da União
Soviética? O artigo de Sarti faz um importante
Em síntese, cem anos depois, a tese da “lei de
ferro da oligarquia”, cunhada por Michels, segue,
conforme os artigos arrolados neste dossiê, como
referência controversa, porém fundamental não
só nos debates sobre a democracia interna dos
partidos políticos, mas também nas discussões
sobre a possibilidade alcançarmos uma
democracia substantiva em outras organizações
(sindicatos, associações de classe, grêmios de
estudantes, clubes políticos) e na gestão dos
próprios Estados nacionais contemporâneos. A
reflexão plural e crítica sobre essa obra clássica
e duradoura desenvolvida durante o seminário de
São Carlos, seguida por sua publicação nesse
dossiê, com certeza é uma excelente mostra da
persistência das questões que esse livro de 1911
levanta ainda hoje entre os cientistas políticos.
Adriano Codato (adriano@ufpr.br) é Doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), Professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e coordenador do
Observatório de elites políticas e sociais do Brasil (http://observatory-elites.org).
Maria do Socorro Sousa Braga (msbraga2009@gmail.com) é Doutora em Ciência Política pela
Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FERNANDES, R. C. F. 2011. Oligarquia e
transformismo: a crítica de Gramsci a Michels.
Campinas. Dissertação (Mestrado em Ciência
Política). Universidade Estadual de Campinas.
GRAMSCI, A. 1984. Roberto Michels e os
partidos políticos. In: _____. Maquiavel, a
política e o Estado moderno. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira.
LÖWY, M. 1962. Consciência de classe e partido
revolucionário. Revista Brasiliense, São Paulo,
n. 41, maio-jun.
9
APRESENTAÇÃO
MICHELS, R. 1971. Les Partis politiques. Essai
sur les tendances oligarchiques des
démocraties. Paris: Flammarion.
MILIBAND, R. 1979. Marxismo e política. Rio
de Janeiro: Zahar.
10
View publication stats
POUTHIER, J.-L. 1993. Michels, Roberto, 18761936. In: CHATELET, F. ; DUHAMEL, O. &
PISER, E. (orgs.). Dicionário de obras
políticas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
RÉMOND, R. 1971. Préface. In: MICHELS, R.
1971. Les Partis politiques. Essai sur les
tendances oligarchiques des démocraties.
Paris: Flammarion.