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DEBATES SOBRE A PARTICIPAÇÃO FEMININA NO PARLAMENTO BRASILEIRO: SUBREPRESENTAÇÃO, VIOLÊNCIA E ASSÉDIO1 Debates on female participation in brazilian parliament: under-representation, violence and harassment Polianna Pereira dos Santos Júlia Rocha de Barcelos Roberta Maia Gresta Resumo: As mulheres foram um dos últimos contingentes sociais a conquistar direitos políticos nas democracias contemporâneas. A despeito de não subsistirem empecilhos legais para a participação política feminina (ativa ou passiva), a presença nos parlamentos brasileiros é ínfima. Na Câmara dos Deputados, após as eleições de 2014 – 19 anos após a regulamentação de cotas de gênero no Brasil –, as mulheres ocupam menos de 10% das cadeiras. Diante disso, neste breve estudo são revisadas variáveis culturais, sociais e institucionais que são comumente apresentadas como justificativa para a sub-representação feminina no Brasil. Após essa análise, serão tratadas situações de violência de gênero ocorridas na Câmara dos Deputados e seu encaminhamento. Ademais, na tentativa de obter uma ideia das relações entre gênero, representação, violência, assédio no campo político, foram enviados questionários aos Deputados e Deputadas Federais, tendo em vista os dois casos-paradigma que serão estudados nesse trabalho, envolvendo os membros da Câmara dos Deputados. Também nessa tentativa foi entrevistada a Vice-Governadora do Piauí, Margarete Coelho, uma mulher que pode fornecer uma perspectiva do poder executivo sobre o tema. A análise desses resultados – inclusive a respeito de percentual de retorno das respostas – deve suscitar a relação entre violência de gênero na política e sub-representação feminina. Palavras-chave: Democracia. Direitos políticos. Gênero. Violência. Abstract: Women were one of the last social groups to conquer political rights in contemporary democracies. Although there are no more legal obstacles for female (active and passive) political participation, women’s presence in Brazilian parliaments is minimal. In the Lower House of Parliament (Câmara dos Deputados), after 2014 Elections – that is, 19 years after gender quota regulations in Brazil – women still occupy less than 10% of the seats. That being the case, in this brief study we revisit cultural, social and institutional variables which are commonly presented as a justification for female under-representation in Brazil. Subsequently, we address gender violence situations which took place in Brazil’s Lower House of Parliament, as well as how they were dealt with by this house. Furthermore, in attempt to better understand the relations between gender, representation, violence and harassment in the political field, questionnaires were sent to representatives in the Lower House of Parliament, where the two paradigmatic cases which are object of this study took place. In this attempt, we also interview the Vice-Governor of the Brazilian state of Piauí, a woman who can provide the perspective of the executive branch on the matter. These results’ analysis – including the percentage of answers – should allow us to raise a connection between gender violence in politics and female under-representation. Keywords: Democracy. Political rights. Gender. Violence. 1 Uma versão desse artigo, em língua inglesa, foi publicada na POLITAI – Revista de Ciência Política, v. 12, p. 59-77, 2016. Artigo recebido em 15 jul. 2019 e aprovado em 19. ago. 2019. 22 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... 1 Introdução É importante ter em mente que a compreensão de democracia variou largamente. Com efeito, há não muito tempo, não se questionaria a característica democrática de um governo em que se assegurasse tão somente aos homens o direito ao voto e à participação política de um modo geral. É apenas após o fim da Primeira Grande Guerra que as mulheres começam a conquistar esse espaço, a partir do importante trabalho das sufragistas2. Diante disso, este estudo leva em consideração o conceito de Robert Dahl para uma democracia ideal, que consiste em cinco critérios, dentre os quais está a inclusão dos adultos. De acordo com tal concepção, considera-se a inclusão das mulheres na esfera política como um requisito para a democracia. Demais disso, deve-se destacar que a participação da mulher na política é indicador de qualidade da democracia (MOISÉS E SANCHEZ, 2014). No Brasil, contudo, os números da participação política das mulheres como detentoras de mandatos eletivos são muito baixos. Isso a despeito do fato do eleitorado feminino ser numericamente superior ao masculino desde pelo menos 2002. A baixa representação feminina nas casas legislativas se manteve no Brasil mesmo após a adoção da política de ações afirmativas, com a fixação das cotas de candidatos por gênero. Com isso em mente, e tendo em vista a pequena variação percentual na ocupação de assentos na Câmara dos Deputados de 1990 a 2014, analisaremos as mudanças legislativas relacionadas à política de cotas. Serão analisadas, ainda, algumas das razões para essa sub-representação, conforme sugeridas pelo senso comum e por estudos relacionados. Dentre as variáveis socioculturais, serão revisitados fatores referentes ao recebimento de salários menores pelas mulheres, aos níveis mais baixos de educação formal, à dupla jornada de trabalho, ao processo de socialização diferenciada (priorizando a vida privada), e ao preconceito do eleitor. Como variáveis institucionais, surgem o papel dos partidos políticos, a existência de cotas e o sistema eleitoral. 2 Conforme esclarece Dahl (2001, p. 13): “(…) há cerca de quatro gerações – por volta de 1918, mais ou menos ao final da Primeira Guerra Mundial –, em todas as democracias ou repúblicas independentes que até então existiam, uma boa metade de toda a população adulta sempre estivera excluída do pleno direito de cidadania: a metade das mulheres”. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 23 Após apontamentos sobre a baixa representação feminina nos espaços de poder, especificamente no Congresso Nacional, serão analisados dois casos de violência contra as mulheres nesse local, diretamente relacionados às suas atuações políticas. Procura-se analisar a possibilidade de traçar paralelos sobre a baixa representação feminina, a violência e o assédio político que as poucas mulheres que ocupam espaços de tomada de decisão na política sofrem. Serão considerados casos emblemáticos havidos na história política recente do Brasil, especialmente os casos que envolvem os Deputados Federais Jair Bolsonaro e Maria do Rosário, em 2010; e, em 2015, os Deputados Jandira Feghali, Roberto Freire e Alberto Fraga. Na abordagem dos casos, serão analisados dados primários obtidos a partir das respostas aos questionários sobre violência de gênero enviados aos Deputados e Deputadas Federais, bem como as informações fornecidas pela Vice-Governadora do Piauí, Margarete Coelho, que foi entrevistada especificamente para este estudo. A análise desses resultados, inclusive a respeito de percentual de retorno das respostas, deve suscitar a relação entre violência de gênero na política e na sub-representação feminina. 2 Democracia e participação feminina Sem desconhecer as divergências teóricas e doutrinárias a respeito da definição de democracia, adotamos para o presente estudo a concepção de democracia de Robert A. Dahl, bem como seus elementos e requisitos essenciais. Com uma democracia ideal em mente, o autor aponta cinco critérios a que um “processo para o governo de uma associação teria que corresponder, para satisfazer a exigência de que todos os membros estejam igualmente capacitados a participar nas decisões da associação sobre sua política”: participação efetiva, igualdade de voto, entendimento esclarecido, controle do programa de planejamento3 e inclusão dos adultos4 (DAHL, 2001, p. 49-50). 3 Segundo o autor, o controle do programa de planejamento de uma associação democrática deve estar nas mãos de seus membros, que “devem ter a oportunidade exclusiva para decidir como, e se preferirem, quais as questões que devem ser colocadas no planejamento”. (DAHL, 2001, p.49) 4 Numa democracia deve ser reconhecido ao maior número possível de pessoas o direito de cidadãos, de poder interferir na tomada de decisões, sem limitações como as havidas no século passado, referentes a critérios de renda, formação, etnia ou sexo para a obtenção de Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 24 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... Para o presente estudo, merece destaque a cidadania inclusiva, instituição política da democracia, que, segundo Dahl (2001, p. 106), é necessária para satisfazer os critérios democráticos do entendimento esclarecido, controle do programa e plena inclusão. Diante disso, seria necessária à configuração da democracia à inclusão de todos os adultos em um estado democraticamente governado, à exceção apenas dos que estão de passagem e dos que são incapazes de cuidar de si mesmos (DAHL, 2001, p. 94). Para tanto, é necessário reconhecer os direitos políticos desses adultos, o que, somado à educação cívica5, permitiria um governo democrático embasado na igualdade política6. No que concerne à compreensão do tema sob o prisma da qualidade da democracia, utilizamos como base os estudos de Diamond e Morlino (2004). Estes autores desenvolveram uma linha metodológica, dentro da teoria da qualidade da democracia, que tem, como pressuposto o fato de que aprofundar os estudos sobre democracia é um imperativo, e que reformas para melhorar a qualidade da democracia são essenciais, mesmo para democracias estabilizadas. Os autores sugerem oito dimensões em que as democracias variam em qualidade e que podem, por essa razão, ser utilizados como indicadores para avaliação da qualidade da democracia. Algumas são dimensões procedimentais (princípios concernentes a regras e práticas): o Estado de Direito (Rule of Law), a Participação, a Competição, o Accountability vertical e o Accountability horizontal. E algumas são dimensões substanciais: respeito por liberdades civis e políticas, e a progressiva implementação de maior direitos políticos. Segundo o autor, “Todos, ou, de qualquer maneira, a maioria dos adultos residentes permanentes deveriam ter o pleno direito de cidadãos implícito no primeiro de nossos critérios [participação efetiva]”. (DAHL, 2001, p.50) 5 As pessoas devem ser informadas para tomar decisões políticas (votar, acompanhar os governantes...). 6 Essa igualdade política efetiva depende, sobremaneira, de virtude cívica, que é cultural, transmitida de geração em geração e pode ser obtida mediante educação cívica. Segundo DAHL (2001, p. 204), “(...) em critério essencial para o processo democrático é a compreensão esclarecida: dentro de razoáveis limites de tempo, cada cidadão deve ter oportunidades iguais e efetivas de aprender sobre políticas alternativas pertinentes e suas prováveis consequências”. Essa aprendizagem vem com a ampliação da população alfabetizada, a oferta de informação obtida por fontes alternativas e independentes (liberdade de expressão e manifestação). Esses dados estão intrincados com a participação efetiva e a influência no planejamento político (DAHL, 2001, p. 110-111). Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 25 igualdade política (social e econômica). Por fim, fazendo uma ligação entre as dimensões procedimentais e substanciais, a Responsividade. Para o presente estudo, merecem destaque os indicadores de participação, respeito por liberdades civis e políticas e igualdade política. Sobre o tema, Moisés e Sanchez (2014, p. 98) são precisos ao esclarecer que: Por insistir na conexão analítica entre representação e participação, a abordagem da qualidade da democracia desloca a ênfase das teorias minimalista e procedimentalista da dimensão formal das instituições democráticas para os modos – inclusive informais – através dos quais direitos efetivos devem assegurar o princípio de igualdade política. Direitos fundamentais dependem do primado da lei, cuja efetividade assegura que os valores da liberdade e da igualdade se realizem; mas isto só se concretiza com a efetiva inclusão política dos diferentes segmentos sociais, o que permite articular dois componentes fundamentais do sistema político, o funcionamento das instituições e o seu contexto social. Nesse sentido, supondo que o equilíbrio na distribuição de recursos de poder – organização e dinheiro – é um fator essencial da estabilização do sistema de partidos políticos e do bom funcionamento da democracia, a igualdade de oportunidades na disputa pelo voto e a inclusão política assumem papel fundamental para a mensuração da qualidade do regime democrático. Nesse sentido, a discriminação que exclui as mulheres da democracia representativa, independente de ser formal ou informal, rebaixa a qualidade da democracia e, no caso do Brasil, compromete a inclusão requerida pelo princípio de igualdade política. Dito isso, resta claro que a inclusão política das mulheres e a igualdade efetiva de chances são fatores que devem ser levados em consideração na aferição da qualidade de uma sociedade democrática. 3 Direitos políticos das mulheres O exercício dos direitos políticos das mulheres somente foi obtido após uma luta histórica em diversas nações, destacando-se o papel das sufragistas. Na América Latina, o direito ao voto foi implementado entre os anos de 1929, a começar pelo Equador, e 1961, encerrando-se com Paraguai e Uruguai, conforme dados disponibilizados pela Inter-Parliamentary Union (2006). Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 26 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... No Brasil, o direito ao voto das mulheres somente foi regulamentado em 24 de fevereiro de 1932, com o primeiro Código Eleitoral. Enquanto o art. 2o definia como eleitor “o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código”, o art. 121 estabelecia a facultatividade desse voto ao estatuir que “os homens maiores de sessenta anos e as mulheres em qualquer idade podem isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral” (BRASIL, 1932). Para se candidatar, era necessário ser eleitor e possuir quatro anos de cidadania, não havendo nenhuma restrição legal de gênero para o exercício dos direitos políticos passivos das mulheres a partir desse momento. Nada obstante, já se verifica uma grande diferença de tratamento evidenciada pela facultatividade do feminino. Em 1995, foi realizada a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, pela Organização das Nações Unidas. Deste encontro, resultou a elaboração de um documento, a Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial Sobre a Mulher, que potencializou o momento de discussões sobre promoção dos direitos da mulher em todo o mundo, e impactou, via de consequência, na definição de políticas para aumentar a participação feminina (VIOTTI, 1995). Considerando a importância do tema, a Inter-Parliamentary Union produziu uma tabela a partir da compilação de dados fornecidos pelos Parlamentos de 191 países até 1o de fevereiro de 2016, classificando esses países de acordo com o percentual de mulheres que compõem a Casa Baixa ou Única, em ordem decrescente. Nessa tabela, o Brasil aparece em 154o lugar, com somente 9,9% de presença feminina na Câmara dos Deputados e 16% no Senado. É importante observar que o primeiro percentual é inferior à metade da média mundial7. Para compreender esse fenômeno, algumas explicações são importantes. Assim, nos tópicos seguintes, analisaremos as leis brasileiras que regulamentam a política de cotas para mulheres, bem como a situação atual no que tange à participação política feminina. Iremos estudar, ainda, as variáveis socioculturais e institucionais, para tentar compreender, de forma mais abrangente, a questão da sub-representação feminina no Parlamento brasileiro. 7 A média mundial atinge 22,7%, de acordo com a Inter-Parliamentary Union, 2016. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 27 4 Participação política feminina no Brasil: regulação legal das cotas e situação atual A primeira lei no Brasil a tratar das cotas de gênero foi a Lei no. 9100, de 1995, que estabelecia normas para a realização das eleições municipais de outubro de 19968. Essa lei não foi consequência de grandes debates políticos, nem é decorrência direta da atuação de grupos feministas. Trata-se de projeto de iniciativa da então Deputada Federal do PT, Marta Suplicy (ARAÚJO, 2003, p. 80). A norma dispunha, em seu art. 11, §3o, que “vinte por cento, no mínimo, das vagas de cada partido ou coligação deverão ser preenchidas por candidaturas de mulheres”. Observa-se que, no caput deste mesmo dispositivo legal, o número total de candidatos a ser apresentado por partido ou coligação aumentou para 120% das vagas disputadas (BRASIL, 1995). A Lei 9504/97 (Lei das Eleições) também tratou do tema, com maior abrangência: trata-se da lei que estabelece as normas gerais das eleições, e deve ser observada em todas as esferas. A Lei das Eleições passou a exigir um percentual mínimo de 30% por gênero (art. 10, §3o), ao mesmo tempo em que aumentou o percentual de candidatos que poderiam ser apresentados pelo partido ou coligação para 150% das cadeiras em disputa (art. 10, caput) (BRASIL, 1997). A simultaneidade dessas medidas – aumento da quantidade máxima de candidatos a serem apresentados pelo partido ou coligação, e inserção (Lei 9100/95) ou ampliação (Lei 9504/97) das cotas mínimas por gênero – tem um impacto significativo. Afinal, passou a ser possível apresentar um quantitativo maior de candidatos, e o atendimento da cota mínima por gênero praticamente não chegou a exigir que qualquer candidato do sexo masculino fosse preterido para a inclusão de candidatas mulheres. Outro ponto importante se refere à observância do percentual exigido pela lei pelos partidos e coligações. Nesse caso, a forma com que a norma será interpretada pode trazer efeitos muito diferentes. O §3o do art. 10 da Lei 9504/97, em sua redação original, previa que “do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação 8 Interessa notar que, antes da edição da Lei 9504, em 1997, a chamada Lei das Eleições, previamente a cada eleição eram editadas as normas aplicáveis. Deste modo, a primeira norma sobre cotas de gênero no Brasil seria aplicável tão somente às eleições municipais realizadas no ano de 1996. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 28 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... deverá reservar o mínimo de trinta por cento e o máximo de setenta por cento para candidaturas de cada sexo” (BRASIL, 1997). A expressão utilizada é ‘deverá reservar’. Com isso, passou-se a considerar que bastaria ao partido ou coligação reservar um percentual de 30% por gênero, que poderia ou não ser preenchido, sem qualquer sanção cabível. É dizer que, se os partidos e as coligações poderiam apresentar candidatos em quantidade referente a até 150% das cadeiras em disputa, caso não obtivessem 30% de candidatas mulheres, bastava não apresentar o total das candidaturas permitidas pela norma. A interpretação enfraqueceu os efeitos da cota de gênero ao ponto que o IDEA – Institute for Democracy and Electoral Assistance, identificou que, após a edição da Lei das Eleições, o percentual de candidatas mulheres à Câmara dos Deputados permaneceu inferior à cota: 10,4% em 1998 e 11,5% em 2002 (ARAÚJO, 2003, p. 83). O mesmo se verificou com relação às eleições de 2006, em que apenas 12,7% dos candidatos à Câmara dos Deputados eram mulheres (BRASIL, 2006). Em 2009, com a edição da Lei 12.034 – minirreforma eleitoral –, o o §3 do art. 10 foi modificado, e passou a prever que “do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo” (BRASIL, 2009). A expressão “deverá reservar” foi substituída por “preencherá”. Essa modificação na norma motivou a alteração na jurisprudência sobre o tema, de modo que o Tribunal Superior Eleitoral passou a considerar a necessidade de observância do número de candidatos efetivamente apresentados9 pelo partido ou coligação para fins de cálculo do percentual mínimo por gênero exigido pelo ordenamento10. 9 Cabe destacar, por rigor técnico, que a base de cálculo para a incidência do percentual não foi alterado: continuou-se a indicar que a reserva fosse feita sobre o “número de vagas resultante das regras previstas neste artigo”, a saber, o número máximo de candidaturas e, não, o número de candidaturas efetivamente lançadas. 10 Neste sentido: candidatos para as eleições proporcionais. Preenchimento de vagas de acordo com os percentuais mínimo e máximo de cada sexo. 1. O § 3o do art. 10 da Lei no 9.504/97, na redação dada pela Lei no 12.034/2009, passou a dispor que, “do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo”, substituindo, portanto, a locução anterior “deverá reservar” por “preencherá”, a demonstrar o atual caráter imperativo do preceito quanto à observância obrigaResenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 29 A observância desse percentual foi aferida na análise do Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários – DRAP – apresentado pelo partido ou coligação. A inobservância do percentual mínimo de candidatos por gênero implica no indeferimento do DRAP, o que prejudica a análise de todas as candidaturas que lhe são vinculadas. É dizer, inexistindo no Brasil a candidatura avulsa, uma vez que seja indeferido o DRAP, que todos os candidatos apresentados pelo respectivo partido ou coligação terão seu pedido de registro indeferido. A despeito da alteração da lei e da forma de sua interpretação pelos Tribunais Superiores, é possível constatar nas Estatísticas oficiais referentes à eleição de 2010 que, dentre os candidatos ao cargo de Deputado Federal, apenas 22,7% eram mulheres (BRASIL, 2010). Ademais, embora tenha se aproximado da exigência legal, em 2014, as candidatas ao cargo de Deputado Federal se limitaram a 29,2%. Mantém-se, destarte, a violação aos percentuais mínimos estabelecidos por lei. Uma explicação possível tória dos percentuais mínimo e máximo de cada sexo. 2. O cálculo dos percentuais deverá considerar o número de candidatos efetivamente lançados pelo partido ou coligação, não se levando em conta os limites estabelecidos no art. 10, caput e § 1o, da Lei no 9.504/97. 3. Não atendidos os respectivos percentuais, cumpre determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional Eleitoral, a fim de que, após a devida intimação do partido, proceda-se o ajuste e a regularização na forma da lei. Recurso especial provido.(Recurso Especial Eleitoral no 78432, Acórdão de 12/08/2010, Relator(a) Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 12/8/2010 RJTSE – Revista de jurisprudência do TSE, Volume 21, Tomo 3, Data 12/8/2010, Página 62); Registro de candidaturas. Percentuais por sexo. 1. Conforme decidido pelo TSE nas eleições de 2010, o § 3o do art. 10 da Lei no 9.504/97, na redação dada pela Lei no 12.034/2009, estabelece a observância obrigatória dos percentuais mínimo e máximo de cada sexo, o que é aferido de acordo com o número de candidatos efetivamente registrados. 2. Não cabe a partido ou coligação pretender o preenchimento de vagas destinadas a um sexo por candidatos do outro sexo, a pretexto de ausência de candidatas do sexo feminino na circunscrição eleitoral, pois tornar-se-ia inócua a previsão legal de reforço da participação feminina nas eleições, com reiterado descumprimento da lei. 3. Sendo eventualmente impossível o registro de candidaturas femininas com o percentual mínimo de 30%, a única alternativa que o partido ou a coligação dispõe é a de reduzir o número de candidatos masculinos para adequar os respectivos percentuais, cuja providência, caso não atendida, ensejará o indeferimento do demonstrativo de regularidade dos atos partidários (DRAP). Recurso especial não provido.(Recurso Especial Eleitoral no 2939, Acórdão de 06/11/2012, Relator(a) Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 06/11/2012 ). Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 30 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... para esse fato diz respeito à possibilidade de renúncia das candidatas mulheres, após o término do prazo para substituição de candidaturas11. Apesar da razoabilidade da previsão, verifica-se, em muitos casos, que diversas mulheres filiadas a partidos políticos acabam sendo apresentadas como candidatas sem o seu conhecimento nem o seu consentimento, com a formalização do que se tem chamado de “mulher laranja”. Em alguns casos, verifica-se a falsificação da assinatura da suposta candidata nos documentos. Em outros, os representantes do partido ou coligação assinam tais documentos sem a necessária apresentação de procuração com outorga de poderes especiais12. Além da previsão de cotas de gênero para a candidatura, existem outras normas voltadas ao fomento da participação política das mulheres que devem ser mencionadas. Nesse sentido, a Lei 12034/2009 modificou a Lei 9096/1995, referente aos partidos políticos, estabelecendo a necessária aplicação de, no mínimo, 5% do total das verbas recebidas pelo Fundo Partidário “na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres conforme percentual que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária” (BRASIL, 2009). A inobservância do preceito legal pode levar à desaprovação das contas do partido, com eventual aplicação de multas, obrigação de restituição ao erário e suspensão de repasse de cotas. Outra modificação implementada por tal lei foi a inserção do art. 45, IV, na Lei 9096/1995, obrigando as agremiações a “promover e difun11 Nesse sentido: representação. Eleição proporcional. Percentuais legais por sexo. Alegação. Descumprimento posterior. Renúncia de candidatas do sexo feminino. 1. Os percentuais de gênero previstos no art. 10, § 3o, da Lei no 9.504/97 devem ser observados tanto no momento do registro da candidatura, quanto em eventual preenchimento de vagas remanescentes ou na substituição de candidatos, conforme previsto no § 6o do art. 20 da Res.-TSE no 23.373. 2. Se, no momento da formalização das renúncias por candidatas, já tinha sido ultrapassado o prazo para substituição das candidaturas, previsto no art. 13, § 3o, da Lei no 9.504/97, não pode o partido ser penalizado, considerando, em especial, que não havia possibilidade jurídica de serem apresentadas substitutas, de modo a readequar os percentuais legais de gênero. Recurso especial não provido. (Recurso Especial Eleitoral no 21498, Acórdão de 23/05/2013, Relator(a) Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 117, Data 24/06/2013, Página 56). 12 Diante desses fatos, a Procuradoria Regional Eleitoral de Minas Gerais extraiu cópias dos registros de candidatura de mulheres com indícios de irregularidade e enviou aos Promotores Eleitorais com atribuição para investigar eventual crime de falsidade praticado pelos delegados de partido que formalizaram os pedidos de registro de forma irregular. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 31 dir a participação política feminina, dedicando às mulheres o tempo que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 10% (dez por cento)” (BRASIL, 2009). A inobservância do dispositivo pode acarretar diminuição ou perda do tempo de propaganda partidária, conforme o § 2o do dispositivo legal. Questiona-se, contudo, a relevância dessa norma, considerando que a propaganda partidária, diferentemente da propaganda eleitoral, tem como finalidade obter apoio ao partido, entre outras coisas, com o aumento do número de filiados. Assim, o partido tem autonomia para distribuir entre seus candidatos o tempo de que dispõe no horário eleitoral gratuito13. Não há nenhuma garantia de que, uma vez constando como candidata, a mulher tenha apoio real de seu partido para sua candidatura. Nesse cenário, a despeito do fato de as mulheres representarem a maioria (51,03%) da população brasileira (IBGE, 2010), maioria (52,13%) do eleitorado (TSE, 2014), mais do que 40% dos filiados nos partidos políticos no Brasil (ALVAREZ, 2008) e comporem 46,1% da População Economicamente Ativa (IBGE, 2012), esse percentual não se replica proporcionalmente quando observamos a ocupação de cargos eletivos. Nas eleições de 2014, das 15.918 candidaturas apresentadas, apenas 6.470 eram mulheres, o que equivale a apenas 28,90% (BRASIL, 2014, p.20). Quando são considerados os candidatos eleitos, contudo, esse percentual é ainda inferior. Do total de 1.627 cadeiras em disputa, apenas 178 foram ocupadas por mulheres, o que representa 10,94% do total dos eleitos nas eleições gerais de 2014 no Brasil (BRASIL, 2014). É preciso, portanto, destacar que apesar de 19,77% dos candidatos ao Senado e 20,02% dos candidatos à Câmara dos Deputados serem mulheres, apenas 18,52% dos eleitos para o Senado Federal e 9,94% dos Eleitos para a Câmara dos Deputados são mulheres14. Essa correlação desproporcional entre mulheres candidatas e eleitas foi identificada por Moisés e Sanchez (2014, p. 101) a partir da análise 13 Não há qualquer previsão legal que permita exigir do partido que distribua seu tempo de propaganda eleitoral (a propaganda destinada ao convencimento do eleitorado acerca de qual ou quais candidatos votar) entre candidatos de ambos os gêneros, sequer de forma proporcional. Compreende-se que a distribuição do tempo de propaganda fica a cargo do partido e se insere em sua autonomia partidária, nos termos do art. 17, par. único., da Constituição da República. 14 Percentuais podem variar de acordo com a fonte: IPU ou TSE. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 32 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... dos dados disponibilizados pelo TSE, por meio da qual se verificou que, apesar de ter havido um implemento no número de candidaturas de mulheres, essas candidaturas, na maior parte das vezes, não foram convertidas em cadeiras nos parlamentos. Com efeito, das 6.470 mulheres que concorreram a algum cargo eletivo no Brasil em 2014, somente 178 foram eleitas. Por essa razão, percebe-se que, apesar da regulação das cotas e do considerável eleitorado feminino no país, o número de mulheres em cargos eletivos ainda não é proporcional. Sendo assim, para melhor entender a presente situação, é fundamental analisar as variáveis socioculturais e institucionais envolvidas na questão15. 4.1 Variáveis institucionais Dentre as variáveis institucionais comumente apontadas como justificativa para a sub-representação feminina, surgem a já mencionada existência de cotas, o papel dos partidos políticos e o sistema eleitoral. Conforme explicitado na seção anterior, a regulação de cotas no Brasil não foi bem sucedida em superar a sub-representação. De acordo com dados históricos disponibilizados pela Inter-Parlamentary Union, é possível comparar o percentual de participação feminina na Câmara dos Deputados entre os anos de 1990 e 2014 (UNION, 2014). 15 Importante frisar que não se pretende apontar como fatores determinantes as variáveis estudadas, senão verificar se as justificativas usualmente apresentadas para o insucesso – ou a baixa taxa de sucesso – de mulheres ao se candidatarem têm fundamento ou não. É dizer que não partimos do pressuposto de que tais variáveis são fixas e determinantes – como o processo de socialização, por exemplo. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 33 Primeiramente, deve-se notar que a exigência legal foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro em 1997 para as eleições gerais, e o que se identifica é, na verdade, uma queda de representatividade entre o pleito de 1994 e o de 1998: de 6,23% para 5,65%, com a implementação das cotas. A alteração do art. 10, § 3o da Lei das Eleições, que levou à virada da jurisprudência, ocorreu em 2009. Interessante notar que, em 2010, houve, tal qual em 1998, queda de representação feminina: de 8,77% de mulheres na Câmara dos Deputados, passou-se a 8,54%, em 2010. Nem mesmo para as eleições realizadas em 2014 o impacto foi significativo: a participação feminina passou para 9,94% dos membros da Câmara dos Deputados. A bem da verdade, tem-se uma variação de meros 3,98%16 entre a representação obtida no pleito de 1990 – em que não havia nenhum mecanismo oficial de apoio à candidatura feminina – e aquela alcançada no pleito de 2014 – com a exigência legal de reserva mínima de 30% para apresentação de candidatos por gênero sob pena de indeferimento do DRAP do partido/coligação. Como observa Bruno Bolognesi (2012, p. 114), as “chances de eleição são um aspecto importante do ponto de vista do impacto e do sucesso de uma ação afirmativa tomada como política pública”. Esse aspecto, contudo, não é considerado pela legislação brasileira sobre cota de candidaturas para mulheres. Por isso, é possível afirmar que o aumento da presença de mulheres no legislativo, comparando os dados referentes à Câmara dos Deputados, representa tão somente um crescimento vegetativo, natural, em nada impulsionado pela inserção de uma política de cotas no ano de 1997, que teve mudanças em sua formulação em 2009. A própria atuação dos partidos reforça a compreensão de que a política de cota de gênero, tal como formulada atualmente no Brasil, não é eficaz. Isso porque os partidos se dedicam a cumprir formalmente a exigência legal de apresentar o percentual mínimo de mulheres, mas não se ocupam em desenvolver o capital político dessas mulheres, ou em assegurar a existência de chances reais de elegibilidade. Aliás, em alguns casos, como apontado anteriormente, para cumprir a norma apresentam pedidos de registro de candidatura de mulheres que sequer concordaram em ser candidatas. Dessa forma, os próprios partidos políticos aparentam ser a principal instituição a atuar contra a participação feminina nas candidaturas 16 Em 1990, 5,96% dos eleitos para a Câmara dos Deputados eram mulheres e, em 2014, esse índice subiu para 9,94%. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 34 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... políticas. Esse fato se afigura notadamente nas inúmeras situações em que eles “tapeiam” a lei de cotas, como afirma Fernanda Feitosa (2012, p. 164): Os partidos políticos são as instituições mais resistentes a abrir-se à participação política das mulheres. Existe uma correlação de forças, uma natural disputa por espaços de poder, uma vez que cada vaga que se abre a uma mulher implica a redução da participação masculina. Dessa forma, a inserção da mulher na política brasileira acontece não por meio da política formal, mas sim pela sua atuação em instituições da sociedade civil. Além disso, os estudos feitos nos últimos anos constataram que os eleitores estão mais dispostos a votar tanto em homens como em mulheres em igualdade de condições, enquanto os partidos e, sobretudo, as elites políticas, mostram um conservadorismo exacerbado. Por fim, insta ainda considerar que o Brasil adota o sistema eleitoral proporcional17 de lista aberta uninominal para escolha dos seus parlamentares, à exceção da formação do Senado Federal, sendo-lhe adotado o sistema majoritário18. Neste modelo de sistema proporcional, o eleitor escolhe seu candidato entre aqueles apresentados em lista não ordenada por um partido político ou uma coligação. Os eleitores no Brasil podem optar por votar nominalmente em seu candidato19, ou somente na legenda partidária (NICOLAU, 2004, p. 57). Os partidos podem ainda se coligar, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal (EC 52/2006, art. 17, § 1o CR/8820). 17 Art. 45 da Constituição da República e art. 84 do Código Eleitoral: “Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.” “Art. 84. A eleição para a Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, obedecerá ao princípio da representação proporcional na forma desta lei”. 18 Art. 83, do Código Eleitoral: “Art. 83. Na eleição direta para o Senado Federal, para Prefeito e Vice-Prefeito, adotar-se-á o princípio majoritário”. 19 Os eleitores votam em um candidato apenas, por isso a denominação lista aberta uninominal. 20 § 1o É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária. (Redação dada pela Emenda Constitucional no 52, de 2006). Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 35 Dessa forma, uma vez apresentada a lista não ordenada de candidatos, o cidadão é livre para votar em qualquer candidato ou partido (voto de legenda), ou em candidato algum (voto nulo/branco), de modo que não seria possível assegurar a eleição de nenhum percentual de candidatas mulheres a partir da conformação de nossa lei de cotas, somada ao nosso sistema eleitoral. Tendo analisado assim o impacto das variáveis institucionais na participação política feminina, partimos para o estudo das variáveis socioculturais. 4.2 Variáveis socioculturais Considerando as justificativas que são comumente apresentadas para a baixa representação feminina no Brasil, inclusive aquelas indicadas pelo senso comum, são apontadas variáveis socioculturais referentes ao recebimento de salários menores pelas mulheres, aos níveis mais baixos de educação formal, à dupla jornada de trabalho, ao processo de socialização diferenciada (priorizando a vida privada) e ao preconceito do eleitor. O Censo Demográfico do IBGE de 2010 confirma o primeiro ponto entre essas variáveis: os salários das mulheres configuram cerca de 67,60% dos rendimentos dos homens21. Comparando-se os dados do censo de 2010 com o de 2000, verifica-se ainda ter havido um aumento da desigualdade entre homens e mulheres no mercado formal de trabalho. Ademais, apesar de haver diminuído historicamente a diferença entre os rendimentos de homens e mulheres, é importante ter em mente que a redução dessa diferença é pequena e, no ritmo que tem ocorrido, as mulheres levarão ainda muitos anos para ter igualdade de rendimentos com os homens22. 21 Segundo informações obtidas no sítio eletrônico do IBGE, esse cálculo é obtido a partir da razão entre o rendimento médio das mulheres e o rendimento médio dos homens, sendo que o rendimento médio das mulheres é a soma do rendimento mensal das mulheres dividido pelo total de mulheres e o rendimento médio dos homens – soma do rendimento mensal dos homens dividido pelo total de homens. São considerados, nesse caso, todas as idades, todas as cores e raças, no ano de 2010. Informação disponível em: http://www. ibge.gov.br/apps/snig/v1/?loc=0&cat=-2,-3,128&ind=4721. Acesso em: 25 mar. 2016. IBGE, Censo 2010: Estatísticas de Gênero. 22 Sobre o tema: http://www1.folha.uol.com.br/asmais/2015/09/1675183-no-ritmo-atual-fim-da-desigualdade-entre-homens-e-mulheres-demoraria-240-anos.shtml. Sugerimos ainda a leitura do artigo “Diferenças de rendimento do trabalho de homens e mulheres com educação superior nas metrópoles”, de autoria de Eugenia Troncoso Leone e Paulo Baltar, 2006. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 36 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... A alegação de que as mulheres possuem níveis mais baixos de instrução formal, contudo, é uma falácia. O Censo Demográfico do IBGE de 2010 identificou uma baixa diferença entre os níveis de instrução formal entre os gêneros. Verifica-se, no entanto, que o número de mulheres com ensino médio completo e superior incompleto, bem como com ensino superior completo, é maior que o de homens. Entre as pessoas sem instrução e com ensino fundamental incompleto, os homens são maioria. É o que pode ser observado no Gráfico 2. A dupla jornada de trabalho atribuída à mulher está certamente relacionada à variável referente ao processo de socialização, muito diferente do processo de socialização pelo qual passam os homens. Em geral, as mulheres passam por um processo de socialização voltado para a vida familiar: responsabilidades referentes ao lar, família, filhos, etc., enquanto os homens passam por um processo de socialização que destaca a vida pública, carreira, noções de competitividade, etc. Teresa Sacchet (2009) procura analisar a formação de capital social entre homens e entre mulheres, com base na compreensão de Putnam, para quem capital social é definido como as conexões existentes entre os indivíduos de uma comunidade: suas redes e as normas de reciprocidade e confiança que derivam delas23. Inicialmente, Sacchet (2009, p. 327) constata que homens e mulheres possuem padrão semelhante com relação à quan23 Segundo esclarece Putnam, em uma entrevista feita por Rory J. Clarke (2004), “social capital refers to social networks and the associated norms of reciprocity”. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 37 tidade de capital social formado, mas há uma grande variação no que diz respeito ao tipo de capital social: A análise dos dados demonstrou que os homens tendem a participar mais em associações de caráter público, que envolve atividades da esfera pública, são mais heterogêneas e que tratam de temas diversos. As mulheres, por outro lado, participam em grupos mais homogêneos ligados ao cuidado e ao bem estar da família e da comunidade. A existência de padrões associativos distintos entre homens e mulheres resulta no estabelecimento de redes diversas pelos dois grupos que trariam diferentes benefícios. Não obstante o déficit de tempo característico às mulheres, elas acabam criando meios que possibilitam a sua participação cívica – normalmente se beneficiando de um CS do tipo privado, que envolve a ajuda de outras mulheres, como suas mães, sogras, filhas e vizinhas, em “suas” atribuições. Mas, tendo em vista as dificuldades que elas encontram para influenciar as estruturas formais da política, e o papel social que desempenham, elas priorizam a participação em grupos e atividades que lidam mais diretamente com questões do seu dia a dia, que podem ser mais receptivos às suas formas específicas de manifestações políticas e mais adequados às suas possibilidades de participação. Como nem todo tipo de CS é igualmente eficaz para gerar retorno político-eleitoral, o fato de os homens participarem mais em atividades e associações ligadas ao mundo da política, do trabalho e do lazer pode facilitar a formação de redes estratégicas para a geração de recursos eleitorais como, por exemplo, conhecimento político e apoio político e financeiro, potencializando, assim, suas chances eleitorais. De acordo com essa análise, portanto, o tipo de capital social pode interferir, por exemplo, na chance de sucesso político das mulheres. Com relação ao preconceito do eleitor, a primeira pesquisa a ser destacada foi realizada pela Agência Patrícia Galvão, juntamente com o IBOPE (2013). A pesquisa tem por tema a participação política feminina e concluiu que a maioria dos brasileiros apoia uma reforma política para garantir a maior participação das mulheres: 74% dos entrevistados entendem que só há democracia de fato com mais mulheres nos espaços de tomada de decisão e poder, e 80% deles concordam que “as leis brasileiras deveriam mudar para garantir que haja o mesmo número de mulheres e homens em todos os cargos políticos, tais como deputado, vereador e senador”. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 38 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... Outra pesquisa, realizada pela Procuradoria Especial da Mulher e pelo DataSenado (2014), constatou que os entrevistados concordam com uma maior participação política da mulher: 83% deles afirmaram que o sexo do candidato não importa na hora de escolher em quem irão votar. Com base nesses dois estudos, podemos concluir que não há um preconceito do eleitor, ou seja, o eleitor não deixa de votar em um candidato pelo simples fato de ser mulher. Todavia, importa lembrar que, dentre outras dificuldades, a candidata mulher costuma encontrar maiores barreiras para obter financiamento de campanha, seja de seu partido ou por doações. Em estudo sobre o tema, Tereza Sacchet e Bruno Speck (2010) identificaram que a chance de sucesso eleitoral é diretamente proporcional à quantia de recurso financeiro utilizada pelo candidato em sua campanha. Eles também observaram que as mulheres recebem menos recursos de financiamento que os homens em todas as frentes, mesmo no caso de mulheres com experiência política similar à dos homens. Nesse sentido, segundo o site www.asclaras.org.br, as 15 maiores doadoras de campanhas de deputados federais, em 2014, destinaram R$ 325.447.961,00 para homens e R$ 41.829.384,00 para mulheres, ou seja, aproximadamente 13% do destinado às candidaturas masculinas. Com essa consideração, concluímos o estudo das variáveis socioculturais relacionadas à participação política feminina e nos encaminhamos à análise das situações de violência de gênero ocorridas na Câmara dos Deputados, bem como das respostas dos questionários enviados aos Deputados e Deputadas Federais, que deverão permitir suscitar uma conexão entre sub-representação, violência e assédio político. 5 Violência de gênero na Câmara dos Deputados O primeiro caso emblemático de violência de gênero na Câmara dos Deputados a ser analisado teve origem quando o Deputado Federal Jair Bolsonaro disse à Deputada Federal Maria do Rosário que “não a estupraria porque ela não merecia”. A fala ocorreu durante uma entrevista dada pelo Deputado para a Rede TV, sobre a redução da maioridade penal. Durante a entrevista, a Deputada afirmou que Jair Bolsonaro promovia violência, momento em que ele interrompeu a entrevista para responder “então eu sou estuprador?”. No caos formado após essa fala, a Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 39 Deputada – que não havia feito tal afirmação – acabou respondendo “sim” aos questionamentos do Deputado. Nesse contexto, o Deputado respondeu dizendo que não a estupraria por que ela não merecia, a empurrou e a chamou de vagabunda. A confusão foi então apartada por seguranças na Sala Verde do Congresso. A Deputada se afastou chorando e não quis dar entrevistas. Toda a discussão foi gravada e é facilmente encontrada em vídeos do Youtube (2008). Apesar da polêmica, não foi possível localizar, no sítio eletrônico da Câmara dos Deputados, no âmbito da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar, qualquer procedimento em andamento ou arquivado contra o Deputado Jair Bolsonaro sobre o fato narrado. Durante a Sessão realizada no Plenário da Câmara em 09 de dezembro de 2014, o Deputado Jair Bolsonaro relembrou o episódio de 2003 e agrediu novamente a Deputada, nos seguintes termos: “Não sai daqui não, Maria do Rosário. Fica aí, fica. Há poucos dias você me chamou de estuprador, no Salão Verde, e eu falei que não ia estuprar você porque você não merece. Fica aqui pra ouvir”. No dia seguinte, quatro partidos representaram conta Bolsonaro perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar (Representação no 36/2014). Um processo foi então iniciado em 16 de dezembro de 2014 (Processo no 20/2014). Contudo, ele foi arquivado pouco tempo depois, ao fundamento de que a legislatura havia se encerrado. Não obstante o resultado institucional na Câmara dos Deputados, o Tribunal Regional Federal condenou o Deputado a pagar dez mil reais por danos morais, além de publicar uma retratação de modo ostensivo24. O segundo caso ocorreu em 06 de maio de 2015, durante a Sessão de votação das Medidas Provisórias 654 e 655, na qual a Deputada Jandira Feghali foi agredida fisicamente pelo Deputado Roberto Freire, e verbalmente pelo Deputado Alberto Fraga. Durante a fala, no púlpito, de um deputado de sua bancada, a Deputada Jandira Feghali se colocou ao seu lado, barrando, com o braço, a interferência de outros Deputados. Neste momento o Deputado Roberto Freire se aproximou, e forçou o braço da Deputada para baixo, momento em que houve uma reclamação, pela própria Deputada, em virtude da agressão física que sofrera. 24 http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2015/dezembro/turma-aumenta-condenacao-de-deputado-por-ofensas-a-outra-parlamentar. Acesso em 20 maio 2016. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 40 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... Em reação a esta reclamação, o Deputado Alberto Fraga se manifestou, dizendo que a Deputada não poderia reclamar da violência, eis que “mulher que bate como homem deve apanhar como homem”. Neste momento, a sessão da Câmara foi interrompida, em virtude da confusão gerada. No retorno da Sessão, o Deputado Alberto Fraga pediu a palavra e disse, ao microfone: Ninguém pode se prevalecer da posição de mulher para querer agredir quem quer que seja. E eu digo sempre que mulher que participa da política e bate como homem tem que apanhar como homem também. É isso mesmo, presidente. (...) E aqueles que são mais valentes me procurem logo após aqui. Neste cenário, foram propostas duas representações perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar: a Representação 02/2015 contra o Deputado Alberto Fraga (BRASIL, 2015) e a Representação 03/2015 contra o Deputado Roberto Freire (BRASIL, 2015). É interessante indicar que, na primeira dessas representações, há uma “carta de solidariedade” assinada por outras Deputadas. Nesta, elas apresentam alguns outros casos de violência de gênero ocorridas na Câmara, tal como declarações ofensivas e preconceituosas feitas pelo Deputado Duarte Nogueira sobre a vida pessoal da Deputada Manuela D’Ávila. Segundo a carta, em uma ocasião a Deputada Alice Portugal foi interrompida abruptamente em seu discurso, teve seu microfone cortado e quase foi fisicamente atingida por seu agressor – um funcionário da Câmara – que foi impedido por colegas. Elas apontam ainda que a Deputada Janete Capiberibe foi interrompida e intimidada pelo Deputado Roberto Góes enquanto fazia um discurso. A carta conclui afirmando que “a Câmara dos Deputados está impregnada com as piores referências de conservadorismo, machismo e misoginia”. Muitas outras entidades, incluindo a presidente Dilma Rousseff, também manifestaram seu apoio à Deputada. Essa representação, contudo, foi arquivada em 18 de novembro de 2015, ao fundamento de que a atitude do Deputado não seria contrária ao Decoro Parlamentar. Segundo o parecer aprovado, ele somente estaria falando figurativamente e não teria tido a intenção de machucar ninguém. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 41 “Bater” e “apanhar”, nesse contexto, seriam somente expressões de debate político, conforme o parecer. A Representação 03/2015, contra Roberto Freire, foi também arquivada em março de 2016. Os argumentos apresentados no parecer aprovado devem ser destacados aqui: Ali, no empurra-empurra, para se equilibrar e transitar no aglomerado de parlamentares, é até possível que o Deputado do PPS tenha tocado ou, até mesmo, puxado o braço de Jandira, que começou a gritar de forma agressiva, afirmando que estava sendo agredida por um homem. Acusou o “machismo” de Freire e sua suposta truculência. Nesse momento, aliás, o Deputado Alberto Fraga (DEM-DF) foi a um microfone em defesa de Freire. Afirmou que estava ao lado, que assistiu a tudo e que o deputado do PPS não havia agredido ninguém. Senhores do Conselho, Roberto Freire é um dos mais respeitados e influentes políticos brasileiros. Deve ser ressaltado, primeiramente, que a referência utilizada, como testemunha do que ali ocorrera, foi precisamente Alberto Fraga, que agrediu verbalmente a deputada. Ademais, o Conselho que arquivou ambas as representações era formado somente de representantes homens. Esse fato nos permite questionar a relação entre a sub-representação feminina e a tolerância à violência de gênero. 5.1 Questionários sobre violência de gênero Foram enviados e-mails para todos os 513 Deputados e Deputadas da Câmara contendo um questionário sobre “política e violência de gênero”. Este consistia em três itens de identificação – nome, estado representado e número de mandatos exercidos – três questões objetivas sobre violência de gênero em cargos eletivos, duas questões a respeito das experiências vividas relacionadas à violência de gênero e dois itens em relação à possibilidade de utilizar as informações fornecidas neste estudo. Infelizmente, somente oito Deputados e Deputadas – todos os quais haviam exercido mais de um mandato – responderam. Embora este seja um fator a ser considerado como resultado, o contexto no qual a pesquisa foi realizada deve igualmente ser levado em consideração. O cenário político recente é sabidamente problemático: a presidente passou por um Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 42 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... processo de impeachment 25 com grande envolvimento parlamentar, de sorte que não é possível afirmar que o número de respostas obtidas representa indiferença. Dito isso, é interessante apontar que uma das Deputadas que forneceu respostas é justamente Jandira Feghali, que foi vítima de um dos episódios analisados. Sua resposta abarcou precisamente tal episódio e o arquivamento da Representação 02/2015 que, conforme ela destacou, ocorreu exatamente na semana do “Dia Internacional para a Erradicação da Violência contra a Mulher”. De acordo com ela, o parecer exarado “banalizou a violência praticada contra a mulher e, particularmente, a atuação política delas. Essa decisão também coloca uma questão que só tomou relevo pela luta de mulheres corajosas, como uma coisa menor”. Ao explicar os ataques verbais e físicos por ela sofridos, afirmou que a declaração de Alberto Fraga foi clara e pode ser assim traduzida: “Se as mulheres se atrevem a entrar na política e defender com veemência suas opiniões, estão assumindo um comportamento que é próprio dos homens e, portanto, devem ser tratadas como ele julga normal tratar outro homem, na violência”. Ela também destaca as severas consequências e repercussões desse discurso em um país em que duas mil mulheres são assassinadas por seus parceiros ou ex-parceiros a cada ano. A Deputada Jô Moraes também destacou o caso de Jandira como uma situação de violência de gênero por ela testemunhado. Também ela considerou que os Deputados cometeram atos de violência – e instigação de violência – contra a Deputada e, quando o caso foi levado ao Conselho de Ética, ele foi minimizado, havendo ainda uma tentativa de culpar Jandira pela situação. Outra situação considerada relevante por ela ocorreu entre a Deputada Alice Portugal e um funcionário da Câmara dos Deputados que a desrespeitou de maneira tão absurda que este deixou de considerar as mais básicas regras de conduta da Casa. Por fim, a Deputada achou importante acentuar que o preconceito de gênero está profundamente enraizado em nossa sociedade e pode se 25 A escolha do termo não representa nenhuma posição das autoras relacionada à regularidade ou à irregularidade do processo. Ele foi escolhido aqui para identificar o procedimento adotado, do qual os parlamentares foram parte, e para situar a turbulência no cenário político. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 43 manifestar nos menores atos. Narrou então que, em uma reunião política de Líderes Partidários, ela e a Deputada Luciana Genro foram deixadas de pé. No mesmo contexto, a pessoa responsável por servir o café ignorou a presença das Deputadas e serviu somente os homens presentes. A Deputada Luciana Santos também alerta para o fato de que a discriminação de gênero pode ser muito sutil. Por esta razão, ela não considera que todas elas possam ser classificadas como agressão, embora sejam claramente expressão do machismo enraizado na sociedade. Os deputados que responderam o questionário, por sua vez, não se alongaram em suas respostas. Um deles afirmou ter testemunhado agressão verbal em razão de gênero por diversas vezes em seu mandato. Dois deputados afirmaram que eles testemunharam tal fato uma vez e outros dois alegaram nunca terem presenciado tal situação. Dentre as deputadas, uma afirmou ter sofrido agressão verbal em razão do gênero inúmeras vezes em seus mandatos e duas outras apontaram ter vivenciado tal situação ao menos uma vez. No que diz respeito à agressão física com motivação de gênero, dois deputados disseram ter testemunhado tal situação ao menos uma vez, e três outros negaram ter presenciado tal fato em seus mandatos. Somente uma das três deputadas respondeu ter sido vítima dessa agressão. Todos os homens entrevistados responderam nunca haverem sido preteridos em suas atividades políticas em razão do gênero, e somente uma das mulheres afirmou ter sido preterida. Encerrando assim a apresentação dos resultados da pesquisa entre os membros do legislativo nacional, focamos agora na entrevista que revela um novo ponto de vista, de um membro do executivo. 6 Entrevista com a vice-governadora do Piauí Margarete Coelho se envolveu com a política quando ainda estava na Faculdade de Direito. Aos dezenove anos, ela já era parte da campanha política do homem que mais tarde se tornou seu marido e com quem ela começou a construir um projeto político. Ela era vista como referência em seu partido, tendo trabalhado como advogada voluntária e presidido muitas coligações, e já tinha sido convidada a ser candidata diversas vezes quando seu partido a escolheu para concorrer à Assembleia Legislativa do Piauí. Ela foi eleita com sucesso e terminou seu mandato com ótima avaliação, que foi a razão pela qual ela foi convidada a concorrer à Vice-Governadora do estado. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 44 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... Abordando o assunto da violência de gênero, ela aponta que esta é, de certo modo, “invisível”, pois nos tornamos acostumadas a ela. Como ocupante de cargo eletivo, ela passou por duas situações relacionadas a seu gênero, ambas envolvendo um jornal. Na primeira vez, ela teve que substituir o Governador do estado e uma festividade foi organizada para celebrar a primeira mulher a deter o Governo estadual. No dia seguinte, o jornal publicou a seguinte frase: “De que vale ter uma mulher governadora, e o palácio estar com o mármore encardido e os jardins malcuidados?” Na vez seguinte em que ela teve que ocupar o lugar do Governador, o Estado do Piauí passava por uma séria crise. Neste momento, ela foi entrevistada por um jornalista que lhe perguntou, entre outras coisas, uma questão política – não relacionada à situação do estado. Este jornalista publicou então uma notícia cujo título dizia: “De que basta ter uma mulher no governo e ter mulheres morrendo na maternidade e rebeliões nos presídios se ela está falando só de política?” A vice-governadora fez duas reflexões a respeito desses episódios: primeiro, eles claramente demonstram a expectativa de que mulheres não se envolvam na política, mas se mantenham no âmbito doméstico; em segundo lugar, quanto mais mulheres lutam e se empenham para tomar parte na vida política, mais é como se o “portão” fosse sempre empurrado para frente. A informação fornecida por essa entrevistada mostra outro aspecto do assédio ao qual as mulheres podem ser submetidas ao ocupar o espaço político: o assédio da mídia. 7 Um breve apontamento sobre violência de gênero Segundo Lima e Méllo (2012, p. 191), “gênero deve ser concebido como uma relação de poder e não uma posição fixa atribuída às pessoas”, de forma que a violência contra mulheres deve ser compreendida neste contexto (CARLOTO, 2001, p. 205). Ademais, “tal violência ocorre motivada pelas expressões de desigualdades baseadas na condição de sexo” (BANDEIRA, 2014, p. 450). Assim sendo, deve-se destacar que existem diversas formas de violência contra mulheres, das quais a física é somente a mais aparente. Existe, por exemplo, a violência moral, identificada por Bandeira (2014, p. 459) como a “argamassa para todos os outros tipos de violência de gênero, poResenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 45 dendo ocorrer sem ofensa verbal explícita, por meio de gestos, atitudes ou olhares, uma vez que se inscreve no ambiente costumeiro.” Esta pode ser ilustrada por ambos os casos emblemáticos abordados em seção anterior, e principalmente como pelo modo como a Câmara dos Deputados lidou com eles, arquivando todas as representações. Um dos modos pelos quais tal violência se revela é o chamado gaslighting: a naturalização da mulher como emocionalmente descontrolada. Quando o parecer exarado na Representação no 03/2015 apresenta o Deputado Freire como um modelo político e a Deputada Feghali como uma pessoa agressiva, podemos perceber tal violência. Outra forma de violência de gênero brevemente tangenciada neste estudo é conhecida por mainterupting: situações nas quais uma mulher não consegue encerrar uma fala porque ela é constantemente interrompida, normalmente por um homem, que podem ser ilustradas com os casos Janete Capiberibe e Alice Portugal. 8 Considerações finais Nesse estudo, abordamos duas importantes perspectivas a respeito da participação política feminina. A primeira delas, relacionada ao porque da participação ser tão baixa; e a segunda – conforme se evidenciará – demonstra porque é importante aumentá-la. As razões identificadas para a sub-representação, no que tange às variáveis institucionais, foram o sistema eleitoral brasileiro, sua ineficaz política de cotas e a posição dos partidos políticos. Dentre as variáveis socioculturais, apontamos – sem pretensão de esgotar a discussão – o processo de socialização da mulher e a formação de um capital social diferenciado, voltado à esfera privada, bem como a dificuldade de obter financiamento de campanha. A importância de aumentar a participação política feminina pode ser deduzida das teorias que indicam a igualdade como um critério para democracia, ou daquelas que consideram a participação feminina como um indicador autônomo da qualidade da democracia. Ademais, verificou-se que há uma importante relação entre a sub-representação e a violência contra a mulher em espaços políticos. Tal relação é evidenciada pelos casos emblemáticos de violência na Câmara dos Deputados, bem como pela forma como a Casa lidou com eles. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 46 Debates sobre a Participação Feminina no Parlamento... É de certa maneira surpreendente como não percebe nenhuma vergonha na prática dos atos de violência e assédio em um espaço público e político tão relevante. É ainda mais assustador como os agressores encontraram apoio entre seus colegas, que optaram por arquivar todas as representações apresentadas, baseando-se em pareceres sintéticos e simplistas, em que o agressor pode aparecer quase como uma vítima e a afirmação da mulher é desacreditada como um “exagero” (especialmente na Representação n. 03/2015). Conforme apontado, as decisões pelo arquivamento foram tomadas por uma Comissão composta inteiramente de Deputados. Assim sendo, tais decisões são representativas de uma apropriação do discurso pelo homem, que acaba com a palavra final em uma violência relacionada a gênero e, portanto, a poder. Em relação aos questionários sobre violência de gênero, podermos identificar uma clara diferença na percepção das situações entre os Deputados. Ainda que todos eles tenham participado ao menos de uma legislatura juntos – aquela na qual ocorreu o caso Jandira Feghali – alguns deles consideraram nunca ter vivenciado uma situação de violência de gênero. No que tange as deputadas, o mais importante a ser extraído é o reconhecimento de violência de gênero – não importa o quão pequena – no contexto político em que estão inseridas. Outra conclusão relevante diz respeito à percepção de que, para pelo menos uma parte da mídia, o papel da mulher é restrito ao ambiente privado: ainda que no cargo de Governadora em exercício, a mulher deveria se preocupar mais com a limpeza do espaço físico. A metáfora apresentada ilustra a luta da mulher pela inserção no espaço político, em que o portão parece sempre se distanciar. Sob tais considerações, podemos nos questionar sobre qual a mensagem recebida pela sociedade quando a violência contra a mulher ocorre em locais públicos de poder e permanece impune. A reação à violência de gênero ocorrida no Parlamento é representativa do papel atribuído à mulher na sociedade brasileira, que precisa urgentemente ser repensado. Com isso em mente, o aumento de participação feminina na política aparece mais uma vez como fator essencial: à medida que a sociedade se acostuma a ver mulheres em posições de poder, isso não somente impacta o modo pelo qual estas são percebidas e tratadas, como também permite que estas tomem decisões no espaço político – como, por exemplo, no Conselho de Ética. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019 Polianna Pereira dos Santos, Júlia Rocha de Barcelos e Roberta M. Gresta 47 Referências ÁLVAREZ, Maria Luzia Miranda. 2008. Mulheres brasileiras em tempo de competição eleitoral: seleção de candidaturas e degraus de acesso aos cargos parlamentares”. Dados – Revista de Ciências Sociais, Vol. 51, no 4, p. 895-939. ARAÚJO, Clara. 2003. Las cuotas para mujeres en el sistema legislativo Brasileño. 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Júlia Rocha de Barcelos - Mestra em Direito Político pela UFMG. Pós-graduada em Direito Constitucional pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático (IDDE). Bacharela em Direito pela UFMG. Assessora Jurídica no Tribunal Superior Eleitoral. Diretora Tesoureira da Associação Visibilidade Feminina. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP). E-mail: jrdbl@hotmail.com. Roberta Maia Gresta - Doutora em Direito Político pela UFMG. Mestre em Direito Processual pela PUC Minas. Especialista em Direito Processual pelo IEC-PUC Minas. Coordenadora Adjunta da Especialização em Direito Eleitoral da PUC-Minas Virtual. Professora de Graduação em Direito na Faculdade Arnaldo. Professora de pós-graduação. Assessora Jurídica no Tribunal Superior Eleitoral. Instrutora colaboradora na EJE-TRE/ MG. Membro fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP). E-mail: robertamg@ufmg.br. Resenha Eleitoral (Florianópolis), v. 23, n. 1, p. 21-50, 2019