Acta bot. bras. 23(2): 376-388. 2009.
Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e
reprodutivos de Anacardiaceae1
Ana Paula Stechhahn Lacchia2,4 e Sandra Maria Carmello Guerreiro3
Recebido em 27/09/2007. Aceito em 11/08/2008
RESUMO – (Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos de Anacardiaceae). Neste trabalho foi
estudado o desenvolvimento e a ultra-estrutura dos canais do floema dos ápices vegetativos de Spondias dulcis G. Forst., a ultra-estrutura
dos canais floemáticos dos ápices vegetativos de Tapirira guinanensis Aubl., bem como, a ultra-estrutura e o desenvolvimento dos canais
florais e a ultra-estrutura dos canais do fruto desta mesma espécie Os canais florais e do fruto de Anacardium humile St.Hil. também foram
estudados ultra-estruturalmente. Os canais dos ápices vegetativos de S. dulcis formam-se de modo esquizolisígeno e os florais de T. guianensis
desenvolvem-se, de modo esquizógeno. As células epiteliais dos canais de S. dulcis e T. guianensis possuem retículo endoplasmático rugoso,
ribossomos livres, plastídios alongados, de diferentes formatos, com presença de inclusões osmiofílicas e dictiossomos com produção de
vesículas. Estas organelas estão envolvidas na secreção de um exsudato heterogêneo composto por substâncias hidrofílicas e lipofílicas. As
células epiteliais do fruto de A. humile apresentam plastídios, em grande quantidade, de forma arredondada com sistema de membranas
circular, que estão envolvidos na síntese de substâncias lipofílicas. Os resultados das análises ultra-estruturais das células epiteliais
corroboram com os resultados previamente obtidos por estudo histoquímico, através deste estudo, substâncias lipídicas e hidrofílicas foram
identificadas nos canais de T. guinanensis e S. dulcis e apenas substância lipídicas nos canais de A. humile. Baseado nos aspectos ultraestruturais dos canais secretores de T. guianensis e S. dulcis nós pudemos concluir que os plastídios das células epiteliais dos canais das duas
espécies são diferentes, apesar destes secretarem exsudatos de composição semelhante. Um registro novo para a família é a presença de um
grande número de plastídios circulares em células epiteliais do fruto de A. humile. O padrão encontrado entre os canais secretores das
espécies estudadas é o modo écrino de liberação da secreção.
Palavras-chave: Anacardiaceae, canais secretores, desenvolvimento, ultra-estrutura
ABSTRACT – (Ultra-structural aspects of secretory canals in vegetative and reproductive organs of Anacardiaceae). The study
assessed phloem canal development and ultra-structure in shoot apices of Spondias dulcis G. Forst., phloematic canal ultra-structure in
shoot apices of Tapirira guianensis Aubl., and floral canal ultra-structure and development and fruit canal ultra-structure of the latter
specie. The flower and fruit canals of Anacardium humile St.Hil. were also studied ultra-structurally. The canals in shoot apices of
S. dulcis show schizo-lysigenous formation and the floral canals of T. guianensis show schizogenous development. Epithelial cells of
S. dulcis and T. guianensis canals have rough endoplasmic reticulum, free ribosomes, elongated plastids of several shapes with osmiophilic
inclusions and dictyosomes with production of vesicles. Such organelles participate in the secretion of a heterogeneous exudate, which
is comprised of hydrophilic and lipophilic substances. The epithelial cells of the fruit of A. humile present elongated plastids with
circular membrane system, which are involved in the synthesis of lipophilic substances. The results of the ultra-structural analyses of
the epithelial cells corroborate the results previously obtained in a histochemical study. In the histochemical study, lipophilic and
hydrophilic substances were identified in the canals of T. guinanensis and S. dulcis and only lipophilic substances were identified in the
canals of A. humile. Based on the ultrastructural aspects of the secretory canals of T. guianensis and S. dulcis we concluded that the
plastids of the epithelial cells of the two species are different although they produce secretion of similar composition. A new record for
the family is the presence of a great number of circular plastids in epithelial cells of the fruit of Anacardium humile. The pattern found
in the secretory canals of the studied species is the ecrine type of secretion release.
Key words: Anacardiaceae, development, secretory canals, ultra-structure
Introdução
Anacardiaceae está incluída na Ordem Sapindales
(APG 2003) sendo composta por 70 gêneros com
aproximadamente 600 espécies, principalmente de
1
2
3
4
distribuição pantropical, com poucas de regiões
temperadas (Judd et al. 1999). Esta família está dividida
em cinco tribos, sendo que no Brasil estão representadas
as tribos Anacardiëae, Rhoëae e Spondiadeae (Falcão
1966).
Parte da Tese de Doutorado da primeira Autora, Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal, Universidade Estadual de Campinas
Universidade Estadual da Paraíba, Departamento de Biologia, Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Campus Universitário Bodocongó,
8109-790 Campina Grande, PB, Brasil
Universidade Estadual de Campinas, Departamento de Botânica, C. Postal 6109, 13083-970 Campinas, SP, Brasil
Autor para correspondência: lacchia@hotmail.com
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
A peculiaridade anatômica marcante das
Anacardiacaeae é a presença de canais/cavidades
secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos
(Metcalfe & Chalk 1950). Esses canais/cavidades
produzem substâncias de uso medicinal, industrial e com
efeitos alergênicos (Judd et al.1999).
Os canais dos órgãos vegetativos de Anacardiaceae
podem ser encontrados no floema primário, secundário
e medula (Metcalfe & Chalk 1950) e produzem: resina
(Morretes 1967; Paula & Alves 1973; Gibson 1981;
Sawidis et al. 2000), goma-resina (Fahn & Evert 1974;
Joel & Fahn 1980a; b; Nair et al. 1983; Bhatt & Mohan
Ram 1992; Vassilyev 2000), goma (Venkaiah 1992) ou
látex (Venning 1948).
Canais estão descritos para os frutos de algumas
espécies de Anacardiaceae (Harada 1937; Lozano 1986;
von Teichman 1987; 1998; von Teichman & van Wyk
1991; Pienaar & von Teichman 1998; Carmello-Guerreiro
& Paoli 2000; Carmello-Guerreiro & Paoli 2005) e
cavidades já foram descritas para frutos de espécies do
gênero Anacardium, para frutos de Protorhus
namaquensis Spraque e Schinus terebinthifolius Raddi
(Paula & Alves 1973; Paula & Heringer 1978; von
Teichman & van Wyk 1994; Machado & CarmelloGuerreiro 2001). Oleorresina (Paula & Heringer 1978;
Paula & Alves 1973) e resina (Joel & Fahn 1980c; Lozano
1986) foram caracterizados como produto de secreção
dos canais e das cavidades dos frutos de algumas
espécies de Anacardiaceae.
Além da descrição dos canais e de suas secreções,
a estrutura e a formação dos canais/cavidades em
Anacardiaceae foram descritas para algumas espécies
(Mc Nair 1918; Harada 1937; Venning 1948; Paula &
Alves 1973; Fahn & Evert 1974; Joel & Fahn 1980a; b;
c; Nair et al. 1983; Carmello et al. 1995; Machado &
Carmello-Guerreiro 2001). O modo de formação dos
canais/cavidades em diferentes espécies e órgãos desta
família é amplamente variado (Carmello et al.1995). Os
pesquisadores, freqüentemente, sustentam idéias
contraditórias a respeito da formação do lume dos
canais/cavidades, sendo os modos de formação mais
freqüentes o lisígeno, o esquizógeno e o esquizolisígeno
(Fahn 1979).
Apesar de existirem trabalhos que relatam à
composição da secreção dos canais/cavidades de
Anacardiaceae, poucos são aqueles que relacionam a
composição da secreção detectada com os aspectos e
características ultra-estruturais apresentados pelas
células epiteliais (Fahn & Evert 1974; Joel & Fahn
1980b; c; Nair et al. 1983; Bhatt & Ram 1992; Carmello
et al. 1995; Machado & Carmello-Guerreiro 2001).
Estudos detalhados incluindo-se ontogênese, estrutura,
histoquímica e ultra-estrutura constituem em cada caso,
377
importantes auxílios, pois fornecem dados relacionados
com várias transformações bioquímicas e morfo-ultraestruturais das células secretoras (Fahn 1979; Joel &
Fahn 1980a; b; c; Monteiro et al. 1998; Carmello et al.
1995).
Dando prosseguimento aos estudos ultra-estruturais
e aos estudos do modo de formação em canais/cavidades
secretores em espécies de Anacardiaceae brasileiras
(Carmello et al. l995; Machado & Carmello-Guerreiro
2001) selecionamos Anacardium humile St.Hil., Spondias
dulcis G. Forst. e Tapirira guianensis Aubl. As principais
classes de substâncias dos exsudatos, dos canais
secretores destas espécies, foram previamente
detectadas por testes histoquímicos; compostos
lipofílicos e hidrofílicos foram detectados nos canais
associados ao floema, dos ápices vegetativos de S. dulcis
e nos canais dos ápices vegetativos, flores e frutos de
T. guianensis; nos canais do fruto de A. humile foram
detectadas apenas substâncias lipofílicas (A.P.S. Lacchia,
dados não publicados).
Devido às controvérsias existentes entre os modos
de formação dos canais/cavidades secretoras e aos
poucos estudos ultra-estruturais dos canais, que
relacionam as células epiteliais com suas secreções, nesta
família, o objetivo deste trabalho foi caracterizar ultra estruturalmente as células epiteliais dos canais secretores
das três espécies de Anacardiaceae brasileiras
selecionadas, bem como, identificar o modo de formação
dos canais floemáticos dos ápices vegetativos de S. dulcis
e dos canais florais de T. guianensis.
Material e métodos
As espécies estudadas, seus órgãos analisados, bem
como, suas localidades de coleta de estão sumarizados
na Tab. 1.
Os ápices vegetativos foram obtidos de indivíduos
masculinos e femininos de Tapirira guianensis e de
indivíduos femininos de Spondias dulcis que continham
primórdios foliares medindo até 0,5 mm e folhas jovens
medindo até 0,8 mm de comprimento. As coletas foram
realizadas de setembro/2002 a dezembro/2005. Os
materiais testemunha foram herborizados e serão
incorporados ao Herbário UEC: A. humile St.Hil.:
BRASIL, SÃO PAULO, Botucatu, 14/IX/2004, A. Lacchia
13; Moji Guaçu, 9/IX/2003, A. Lacchia 8; 6/X/2004,
A. Lacchia 18, 19, 20, 21; S. dulcis G. Forst.: BRASIL,
SÃO PAULO, Campinas, 15/II/2005, A. Lacchia 20, 21,
22; T. guianensis Aubl.: BRASIL, SÃO PAULO, Moji
Guaçu, 9/XI/2002, A. Lacchia 4, 1/V/2003, A. Lacchia
7; Pratânia, 3/IX/2002, A. Lacchia 1, 23/IX/2002,
A. Lacchia 2, 13/X/2002, A. Lacchia 3, 18/III/2004,
A. Lacchia 10. A confirmação da identificação das
378
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
Tabela 1. Espécies de Anacardiaceae estudadas
Espécies estudadas
Órgãos analisados
Localidades de coleta
Anacardium humile St.Hil.
Flores perfeitas
Frutos
Spondias dulcis G. Forst.
Tapirira guianensis Aubl.
Ápices vegetativos
Ápices vegetativos
Flores pistiladas
Frutos
Reserva Biológica e Estação Experimental de Moji-Guaçu (22°15’16”S e 47°8’12” W)
Fazenda Palmeira da Serra em Pratânia (22°48’S e 48°40’W)
Distrito de Rubião Júnior em Botucatu (22º44’S e 48º34’W)
Fragmento Florestal na Fazenda Santa Eliza (Campinas-SP) (22°51’20” S e 47°05’34”W)
Reserva Biológica e Estação Experimental de Moji-Guaçu (22° 18’S e 47°20’W)
Fazenda Palmeira da Serra em Pratânia (22°48’S e 48°40’W)
Distritode Rubião Júnior em Botucatu (22º44’S e 48º34’W)
espécies foi realizada pelo professor Jorge Tamashiro,
da Universidade Estadual de Campinas.
Para o estudo da ultra-estrutura do canal secretor,
os ápices caulinares de Spondias dulcis e Tapirira
guianensis, as flores pistiladas de T. guianensis e as
perfeitas de Anacardium humile e os frutos de
T. guianensis e A. humile, em vários estádios de
desenvolvimento, foram fragmentados e imediatamente
fixados em glutaraldeído 2,5% (tampão fosfato 0,1M
pH 7,2), pós-fixados em tetróxido de ósmio (1% tampão
fosfato 0,1M pH 7,2), e processados segundo métodos
usuais (Roland 1978). As secções ultrafinas foram
contrastadas com acetato de uranila (Watson 1958) e
citrato de chumbo (Reynolds 1963), recobertas por filme
plástico (Formvar) e observadas em microscópio
eletrônico de transmissão (Philips E.M. 301).
Para o estudo estrutural do desenvolvimento dos
canais secretores, ápices vegetativos de Spondias dulcis
foram fixados em FAA por 24 horas (Johansen 1940) e
em FNT por 48 horas (Lillie 1965). Após esses períodos,
o material foi desidratado em série butílica e incluído em
“Paraplast”, seccionado transversal e longitudinalmente
com 12 a 14 µm de espessura em micrótomo rotativo
Microm HM340E. As secções foram coradas com
safranina e azul de astra (Gerlach 1984) e montadas em
resina sintética. No material fixado em FNT foi aplicado
o reagente preto de Sudão B (Pearse 1985).
Resultados
Nas espécies selecionadas para nosso estudo
pudemos verificar que as estruturas secretoras são em
todas elas e em todos os órgãos, canais, por
apresentarem lume alongado em secções longitudinais.
Ápices vegetativos (Spondias dulcis e Tapirira
guianensis) – Em S. dulcis e T. guianensis os canais
secretores foram encontrados associados ao floema
(Fig. 1-4, 8, 11) e na medula. Os canais secretores,
associados ao floema, dos ápices caulinares de S. dulcis
desenvolvem-se da região procambial. As células
precursoras do canal secretor mostram sucessivas
divisões nos planos periclinais, anticlinais e oblíquos
dando origem a células de tamanhos e formas variadas,
arranjadas em uma roseta (Fig. 1-2). O lume do canal
tem origem a partir do afastamento de algumas células e
da degeneração de uma ou mais células desta roseta
(Fig. 3). Posteriormente ocorre também a dissolução da
lamela média entre as paredes anticlinais das células
epiteliais, o que acaba por promover a separação destas
(Fig. 4, 8).
Células epiteliais em diferentes estádios do
desenvolvimento foram observadas em um mesmo canal
secretor, associado ao floema dos ápices vegetativos de
Spondias dulcis e de Tapiria guianensis (Fig. 10-11).
Algumas células epiteliais observadas eram arredondadas
e suas paredes periclinais voltadas para o lume
apresentavam contorno sinuoso (Fig. 5, 9). Nas células
em estádio senescente, as paredes voltadas para o lume
são retas, possuem grandes vacúolos e citoplasma
periférico (Fig. 10-11). Geralmente essas células eram
mais elétron-densas que as células parenquimáticas
subjacentes, devido ao citoplasma rico em organelas, à
presença de material osmiofílico e aos inúmeros
ribossomos livres (Fig. 5, 8, 11, 13).
Em Tapirira guianensis, as células epiteliais
apresentaram vacúolos de vários tamanhos, que
continham material elétron-denso (Fig. 11), material
floculado elétron-denso (Fig. 15-16), além de gotas
elétron-opacas (Fig. 13-14) e restos de membrana
(Fig. 14). Estas células, bem como, as dos canais de
Spondias dulcis também apresentavam plastídios de
formatos variados (Fig. 6-8, 14, 16), mitocôndrias
(Fig. 6, 8), dictiossomos (Fig. 8, 15), ribossomos livres
(Fig. 6, 15) e retículo endoplasmático rugoso (Fig. 6, 8,
15). Alguns plastídios estavam envolvidos por retículo
endoplasmático rugoso, aqui denominado de retículo
periplastidial (Fig. 6, 14) e em alguns plastídios de
T. guianensis observou-se a presença de pequenas gotas
de material elétron-denso (Fig. 14, 16), além da fusão e
divisão destes (Fig. 14). Corpos paramurais foram
observados no espaço periplasmático das células epiteliais
(Fig. 18) e uma bainha de células com material elétron-
Acta bot. bras. 23(2): 376-388. 2009.
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Figuras 1-8. Fotomicrografias (1-4) e elétron-micrografias (5-8) dos canais secretores do floema dos ápices caulinares de Spondias dulcis
G. Forst. 1-4. Material fixado em FNT e tratado com preto de Sudão B. 1-2. Canais em formação. 3. Canal em formação com lume e célula
central em lise. 4. Canal totalmente formado; células epiteliais afastadas. 5. Canal secretor com células epiteliais de citoplasma denso e
organelas (plastídios e vacúolos); bainha do canal composta por idioblastos. 6. Detalhe da célula epitelial; plastídio com retículo periplastidial
(seta grossa), RER (seta fina) e mitocôndria (m). 7. Plastídios. 8. Células epiteliais com dissolução da lamela média entre as paredes anticlinais;
complexo de Golgi (seta branca), RER (seta preta), plastídios (p) e mitocôndrias (m). Barras = 30 µm (1-4); 10 µm (5); 5 µm (6-8).
380
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
Figuras 9-14. Elétron-micrografias dos canais secretores do floema dos ápices caulinares de Spondias dulcis G. Forst. (9-10) e Tapirira
guianensis Aubl. (11-14). 9. Detalhe de uma célula epitelial com parede periclinal externa de contorno sinuoso e gota de material elétronopaca sendo liberada para o lume. 10. Células epiteliais senescentes com citoplasma periférico; lume do ducto com secreção elétron-opaca (5).
11. Células epiteliais (c) em diferentes fases de secreção; bainha de cobertura formada por idioblastos (I). 12. Secreção floculada elétron-densa
e homogênea elétron-opaca (seta) no lume do canal. 13. Células epiteliais (c) com vacúolos (v) com gotas elétron-opacas (cabeça de seta);
lume (l) com secreção floculada elétron-Densa. 14. Células epitelial com plastídios (p) envoltos por retículo periplastidial (seta curva), RER
(seta fina), vacúolos (v) com figuras osmiofílicas (f) e gotas elétron-opacas (cabeça de seta); plastídio com constrição (seta branca).
Barras = 2,5 µm (9); 5 µm (10-11); 2 µm (12-14).
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denso pôde ser observada em alguns canais das duas
espécies estudadas (Fig. 5, 11). Material elétron-denso
foi observado disperso no citoplasma em forma de gotas
(Fig. 6, 15) ou acumulado na periferia das células epiteliais
(Fig. 18). No estádio final da atividade secretora do canal
observou-se que as células epiteliais apresentavam um
grande vacúolo central como uma fina camada
citoplasmática periférica (Fig. 10)
Em Tapirira guianensis a secreção encontrada no
lume dos canais, associados ao floema, possuía aspecto
heterogêneo (duas fases), com material elétron-opaco
de aspecto homogêneo e material elétron-denso floculado
(Fig. 12), os canais medulares apresentaram no lume
uma quantidade muito maior de secreção (Fig. 17),
quando comparados aos canais associados ao floema
(Fig. 12). Essa secreção profusa era de material
homogêneo elétron denso, elétron opaco e de floculado
elétron-denso (Fig. 17). Em Spondias dulcis, a secreção
no lume dos canais do floema era elétron-opaca e de
aspecto homogêneo.
Flores e frutos – Tapirira guianensis e Anacardium
humile - No mesofilo ovariano floral e no mesocarpo do
fruto T. guianensis; os canais secretores estão associados
ao floema; canais isolados também podem ser observados
próximos à epiderme externa ovariana e próximos ao
exocarpo, no mesocarpo. Nas flores e nos frutos de
Anacardium humile os canais foram observados somente
associados ao floema.
Nas flores de Tapirira guianensis, os canais
associados ao floema iniciam sua formação a partir da
flor em antese e desenvolvem-se nas regiões adjacentes
ao procâmbio do mesofilo ovariano. As células
precursoras do canal sofrem sucessivas divisões,
originando grupos de células dispostas em roseta; no
centro da roseta, ocorre a formação de um pequeno
espaço intercelular triangular iniciando-se assim o lume
(Fig. 19). O lume dos canais é formado como resultado
da separação das células centrais por dissolução da lamela
média (Fig. 19-20).
No mesofilo ovariano da flor de Tapirira guianensis,
a indicação da formação dos canais foi o aparecimento
no centro deles, de um espaço resultante da dissolução
da lamela média e da progressiva separação das paredes
celulares (Fig. 19). Como resultado da dissolução parcial
das paredes celulares anticlinais, bem como, da relativa
dissolução das paredes periclinais externas (Fig. 20)
foram observadas substâncias floculadas elétron-densas
no espaço intercelular formado (Fig. 20). As células
epiteliais do canal secretor apresentaram, nesta fase,
citoplasma elétron-denso (Fig. 19) rico em ribossomos
livres (Fig. 21), retículo endoplasmático rugoso
(Fig. 20), mitocôndrias (Fig. 20), vacúolos de diverso
tamanhos com material floculado elétron-denso (Fig. 19)
ou com restos de membrana (Fig. 19, 23), dictiossomos
(Fig. 20) e plastídios com estroma elétron-denso
(Fig. 22-23). Alguns destes plastídios estavam envolvidos
parcial ou totalmente pelo retículo periplastidial (Fig. 22)
e, muitas vezes, apresentavam gotas elétron-densas
(Fig. 23). Corpos paramurais foram encontrados no
espaço periplasmático das células epiteliais (Fig. 23).
Em canais em estádio mais avançado a secreção
preenchia todo o lume e podia ser composta somente
por material elétron-opaco de aspecto homogêneo
(Fig. 24) ou por material elétron-denso floculado,
adicionado a material elétron-denso de aspecto
homogêneo e a material elétron-opaco de aspecto
homogêneo com fino floculado elétron-denso (Fig. 25).
Nos canais do fruto de Tapirira guianensis,
observaram-se células epiteliais com grandes vacúolos
preenchidos por material elétron-denso (Fig. 26, 28),
retículo endoplasmático rugoso, ribossomos livres
(Fig. 29) e inúmeros plastídios de diferentes formatos
(Fig. 28-29), que podiam estar total ou parcialmente
envoltos por retículo endoplasmático rugoso (retículo
periplastidial) e apresentavam sistema interno de
membranas pouco desenvolvido. Nas células epiteliais
também foram observadas inúmeras gotas de material
elétron-opaco próximas à parede periclinal externa
(Fig. 27-28).
Nas flores de Anacardium humile, os canais, em
estádio de desenvolvimento final, apresentaram secreção
preenchendo o lume e muitas células epiteliais com
citoplasma periférico (Fig. 30). Nos frutos de A. humile
pôde-se constatar canais em diferentes fases secretoras;
alguns canais possuíam células epiteliais com grande
vacúolo central, restringindo o citoplasma à periferia
celular (Fig. 31) e outros possuíam células epiteliais com
citoplasma denso, rico em vesículas, vacúolos; inúmeros
plastídios de forma arredondada com sistema de
membranas circular (Fig. 32-33) e gotas elétron-opacas
dispersas no citoplasma (Fig. 32). No lume dos canais
do fruto de A. humile foi observada secreção de aspecto
floculado elétron-denso (Fig. 32).
Discussão
Nossas observações estruturais e ultra-estruturais
revelam que os canais secretores dos ápices vegetativos
de Spondias dulcis desenvolvem-se pelo processo
esquizolisígeno e que os canais florais de Tapirira
guianensis desenvolvem-se pelo processo esquizógeno.
A formação dos canais pelo processo esquizolisígeno
e esquizógeno, como constatado para as espécies
estudadas, foi anteriormente descrita para outras espécies
da família Anacardiaceae. Paula & Alves (1973), Bhatt
& Mohan Ram (1992) e Machado & Carmello-Guerreiro
382
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
Figuras 15-21. Elétron-micrografias dos canais secretores dos ápices caulinares (15-18) e flores (19-21) de Tapirira guianensis Aubl. 15-16 e
18. Canal do floema. 17. Canal medular. 15. Célula epitelial com vacúolos (v), RER (seta branca), Complexo de Golgi (seta preta cheia),
vesículas (seta vazia) e gotas elétron-densas (cabeça de seta). 16. Plastídios de diversos formatos (p) com gotas elétron-densas (seta fina
branca). 17. Canal medular com secreção heterogênea composta por material elétron-opaco homogêneo (estrela), elétron-opaco com
granulações elétron-densas (asterisco), elétron-denso floculado e elétron-denso homogêneo; células epiteliais de paredes periclinais externas
retas (c) e células parenquimáticas subjacentes (p). 18. Detalhe da célula epitelial com corpos paramurais no espaço periplasmático. 19. Canal
em início de desenvolvimento com lume (L) reduzido e células epiteliais com citoplasma denso. 20. Célula epitelial (c) com Complexo de Golgi
(G), RER (seta) e mitocôndrias (M); material elétron-denso no espaço formado pela separação das paredes periclinais. 21. Plastídios com gotas
elétron-densas. Barras = 0,5 µm (15-16, 21); 5 µm (17); 2,5 µm (18-19); 1 µm (20).
Acta bot. bras. 23(2): 376-388. 2009.
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Figuras 22-27. Elétron-micrografias dos canais secretores das flores (22-25) e dos frutos (26-27) de Tapirira guianensis Aubl. 22. Plastídios
com retículo periplastidial (seta). 23. Célula epitelial com plastídios (p) com gotas elétron-densas (seta) e vacúolos com restos de membrana.
24. Canal com secreção elétron-opaca (EO) no lume. 25. Canal com secreção heterogênea composta por material elétron-denso homogêneo
(ED), elétron-denso opaco com granulações elétron-densas (EDI) e material elétron-denso floculado. 26. Canal com células epiteliais de
parede periclinal externa côncava; vacúolos com material elétron-denso. 27. Detalhe da figura 26; célula epitelial com vacúolos de secreção
elétron-densa (v), plastídios e gotas elétron-opacas (seta). Barras = 2 µm (22, 25); 0,5 µm (23); 5 µm (24); 10 µm (26); 2,5 µm (27).
384
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
Figuras 28-33. Elétron-micrografias dos canais secretores dos frutos (28-29) de Tapirira guianensis Aubl. e das flores (30) e dos frutos (31-33)
de Anacardium humile St.Hil. 28. Célula epitelial com vacúolos de material elétron-denso, plastídios (p) e gotas elétron-opacas. 29. Plastídios
(P) com retículo periplastidial (seta curva) e RER (seta fina). 30. Canal secretor com células epiteliais (c) de parede periclinal externa reta e
citoplasma periférico; secreção elétron-opaca no lume (l). 31. Células epiteliais de parede periclinal externa côncava, citoplasma periférico
e vacúolo central. 32. Célula epitelial com plastídios (seta), vesículas, vacúolos e gotas elétron-opacas (seta branca); secreção elétron-densa
floculada no lume (l). 33. Plastídios circulares com membranas internas circulares e vesículas. Barras = 2,5 µm (28, 30); 0,5 µm (29); 5 µm
(31,-32), 1 µm (33).
Acta bot. bras. 23(2): 376-388. 2009.
(2001) constataram que em Anacardium, Rhus, Cotinus,
Semecarpus anacardium L.f. e Schinus terebinthifolius
Raddi o início de formação dos canais é esquizógeno e o
desenvolvimento é lisígeno, formando, então, canais
tipicamente esquizolisígenos. Outros trabalhos, como os
de Mc Nair (1918), Venning (1948), Fahn e Evert (1974)
e Nair et al. (1983) relataram o desenvolvimento
esquizógeno, em órgãos de algumas espécies de
Anacardiaceae, como em Rhus diversiloba, em Schinus,
em Rhus glabra e em Anacardium occidentale.
As células ao redor do espaço formado (lume), tanto
dos canais dos ápices de Spondias dulcis, que se formam
de modo esquizolisígeno, quanto dos canais das flores
de Tapirira guianensis, que se formam de modo
esquizógeno tornam-se altamente especializadas em
secreção, fato comprovado pela microscopia eletrônica
de transmissão com a presença de organelas como: RER,
ribossomos, mitocôndrias, plastídios e dictiossomos.
Através de testes histoquímicos prévios (A.P.S.
Lacchia, dados não publicados) constatou-se que todos
os canais estudados possuem como parte da secreção
lipofílica óleos essenciais ou resinas, ou ambos,
acreditamos que não só os plastídios, mas também outras
organelas como RE, mitocôndria e o próprio citosol
possam estar envolvidos na produção de uma parte da
secreção lipofílica contida nestes canais. A inferência de
que outras organelas, além dos plastídios, estão
envolvidas na produção de monoterpenos em nossas
espécies, está baseada no estudo feito por Turner &
Croteau (2004) que localizaram em tricomas glandulares
de Mentha enzimas para a produção de monoterpenos
no retículo endoplasmático, na mitocôndria e no citosol
Nas células epiteliais dos canais secretores do ápice
caulinar de Spondias dulcis, do ápice, da flor e do fruto
de Tapirira guianensis e do fruto de Anacardium humile
observou-se plastídios com matriz densa. Em S. dulcis
e T. guianensis os plastídios possuem formas variadas,
estão parcial ou totalmente envoltos pelo retículo
endoplasmático periplastidial e possuem sistema interno
de membranas pobremente desenvolvido. Em A. humile,
os plastídios são arredondados e apresentam internamente um sistema de membranas disposto de forma
circular. A observação de um grande número de plastídios
de forma arredondada, em células epiteliais, está sendo
pela primeira vez registrada para células epiteliais de
membros da família Anacardiaceae.
Nas células epiteliais dos canais secretores florais e
do ápice de Tapirira guianensis detectou-se a presença
de plastídios com inclusões osmiofílicas, sugerindo que
esta organela tenha um papel na atividade secretora de
lipídios. Nas células secretoras de substâncias lipofílicas,
a característica ultra-estrutural mais comum é a
ocorrência de material osmiofílico nos plastídios (Fahn
1988; Duke & Paul 1993; Sacchetti et al. 1996; Monteiro
385
et al. 1998) o que corrobora nossa sugestão.
Os plastídios encontrados nos canais dos ápices
vegetativos de Spondias dulcis possuem sistema de
membranas interno pobremente desenvolvido, quando
comparados com os plastídios de Tapirira guianensis e
com o modelo típico de sistema de membranas interno,
bem desenvolvido, proposto por Cheniclet & Carde
(1985). Ainda em relação à produção de monoterpenos,
Cheniclet & Carde (1985) sugeriram que há uma relação
entre a estrutura dos plastídios e seus envolvimentos na
síntese de monoterpenos. Segundo os autores, quando
os óleos essenciais contêm quantidades significativas de
monoterpenos, as células secretoras possuem leucoplastos típicos, que segundo estes, são organelas
destituídas de ribossomos, de tilacóides e de sistemas
internos de membranas desenvolvidos. Ao contrário,
quando a fração volátil não contém monoterpenos ou
contém apenas uma pequena quantidade, os plastídios
mostram várias características estruturais como
tilacóides, ribossomos e redes tubulares de membranas
bem desenvolvidas.
Desta forma, acredita-se que os plastídios de
Spondias dulcis estão muito próximos estruturalmente
aos leucoplastos típicos, e assim, apresentam uma
quantidade relativamente superior de monoterpenos em
relação aos outros constituintes, que podem estar
presentes em sua fração lipofílica e em relação à secreção
produzida pelos canais de Tapirira guianensis.
Os plastídios encontrados nos frutos de Anacardium
humile assemelham-se estruturalmente aos encontrados
nos idioblastos oleíferos de Piper, Cannanga e Magnolia
por Cheniclet & Carde (1985); estes plastídios possuem
estroma bem denso, membranas lamelares dispostas em
círculos, e produzem em seus óleos essenciais pequenas
quantidades de monoterpenos hidrocarbonados e uma
maior quantidade de sesquiterpenos hidrocarbonados.
Assim, infere-se que a secreção lipofílica detectada
previamente por histoquímica (A.P.S. Lacchia, dados
não publicados), nos canais do fruto de A. humile, possui
uma pequena fração de monoterpenos quando comparada
aos outros constituintes da secreção.
Os plastídios das células epiteliais de Spondias dulcis
e de Tapirira guianensis foram encontrados parcialmente
ou completamente envolvidos por retículo endoplasmático periplastidial, como em muitas células produtoras
de material lipofílico, (Fahn & Evert 1974; Joel & Fahn
1980b; Pedro et al. 1991; Bhatt & Mohan Ram 1992;
Carmello et al. 1995; Ascensão et al. 1997; Machado
et al. 2006).
Retículo endoplasmático rugoso (RER) e ribossomos
livres também foram encontrados nas células epiteliais
de Spondias dulcis e Tapirira guianensis. Para Fahn
(2000), o retículo endoplasmático participa na síntese
de substâncias lipofílicas e pode também auxiliar no trans-
386
Lacchia & Guerreiro: Aspectos ultra-estruturais dos canais secretores em órgãos vegetativos e reprodutivos...
porte intracelular deste material. O RER, segundo Bhatt
& Mohan Ram (1992) é uma fonte bem conhecida de
proteínas e fosfolipídios e para Pridgeon & Stern (1983)
este é o responsável tanto pela síntese como pelo transporte das substâncias nos osmóforos de Restrepia. Bhatt
& Mohan Ram (1992) também sugeriram que o RER
poderia estar envolvido no processo de formação da
goma-resina dos ductos secretores de Semecarpus
anacardium, além dos ribossomos livres revelarem a presença de maquinaria de síntese protéica nas células
epiteliais.
Através de testes histoquímicos, substâncias
hidrofílicas (polissacarídeos) também foram detectadas
na secreção dos canais dos ápices vegetativos de Spondias
dulcis e de Tapirira guianensis e dos canais florais e dos
frutos de T. guianensis (A.P.S. Lacchia, dados não
publicados). Assim como as células epiteliais das espécies
estudadas, as células dos canais de Boswellia serrata
Roxb. sintetizam e secretam no lume substâncias
polissacarídicas em adição as substâncias lipídicas (Nair
& Subrahmanyan 1998).
Muitos tecidos secretores de material lipofílico
podem também produzir substâncias adicionais. Os
tricomas secretores de Inula viscosa Ait e espécies de
Fagonia, por exemplo, secretam polissacarídeos e
proteínas em adição ao material lipofílico (Werker &
Fahn 1981; Fahn & Shimony 1988).
O envolvimento dos dictiossomos na síntese e
transporte de polissacarídeos está bem estabelecido em
plantas (Fahn 1979; Trachtenberg & Fahn 1981; Sedgley
& Blesing 1985; Bhatt 1987). Ainda, segundo alguns
autores, dictiossomos e vesículas translúcidas podem
estar relacionadas à produção dos componentes
hidrofílicos da secreção (Figueiredo & Pais 1992; Jian
et al. 1997; Machado et al. 2006), bem como,
envolvidos na glicosilacão dos compostos, especialmente
alguns componentes tóxicos dos óleos essenciais
(Venkaiah 1992; Figueiredo & Pais 1994).
A importância de organelas, como os dictiossomos,
na produção de polissacarídeos também foi observada em
ductos gomosos-resiníferos de Mangifera indica (Joel &
Fahn 1980c) e Lannea coromandelica (Venkaiah 1992).
Um modo de formação da goma sugerido por (Nair
& Subrahmanyan 1998), no qual, as substâncias
polissacarídicas do lume são resultado da fragmentação
parcial da parede tangencial foi observado em algumas
espécies, dentre elas, quatro espécies de Anacardiaceae:
Rhus glabra, Anacardium occidentale, Semecarpus
anacardium e Lannea coromandelica (Fahn & Evert 1974;
Nair et al. 1983; Bhatt & Mohan Ram 1992; Venkaiah
1992).
Perante o exposto, infere-se que a porção hidrofílica
encontrada nos canais de Spondias dulcis e Tapirira
guianensis possa ter advindo tanto dos dictiossomos,
devido à presença destes e de suas vesículas nas células
epiteliais, quanto da degeneração da parede celular
tangencial interna, devido sua aparência ondulada e
frouxa e à sua fragmentação e desintegração parcial
claramente observável nas espécies estudadas.
Corpos paramurais foram observados no espaço
periplasmático das células epiteliais dos canais de Tapirira
guianensis. Estas estruturas são freqüentemente
observadas no estágio inicial de diferenciação dos canais,
como visto nos canais da flor de T. guianensis. Os corpos
paramurais também foram encontrados em ductos
gomosos resiníferos de outras espécies de Anacardiaceae,
tais como Anacardium occidentale (Nair et al.1983) e
Lannea coromandelica (Venkaiah 1992). Segundo Hall
et al. (1984), a abundância de corpos paramurais no
citoplasma periférico de células epiteliais pode estar
relacionada com processos de dissolução da lamela média,
uma vez que, estas estruturas participam da síntese e
eliminação de enzimas líticas.
Algumas evidências como a presença de grumos
de material elétron-denso dispersos no citoplasma
periférico e no espaço citoplasmático sugerem que a
eliminação da secreção ocorra por mecanismo écrino
(Fahn 1979). Segundo Bhatt & Mohan Ram (1992), o
material osmiofílico em associação com a parede
tangencial interna pode passar através do plasmalema
por perfusão, diretamente como um resultado da
concentração de gradiente, ou mesmo por um processo
ativo caracterizando, deste modo, um processo écrino
de liberação de resina. Nesta espécie (Bhatt & Mohan
Ram 1992), bem como, em Schinus terebinthifolius
(Machado & Carmello-Guerreiro 2001) os autores
relataram a possibilidade de co-existência de padrões
écrinos e holócrinos na secreção de resina operando na
célula epitelial.
Devido à presença de material osmiofílico em
grumos, na periferia das células epiteliais, bem como, a
ausência de material secretado em vesículas, infere-se
que nos ductos de Tapirira guianensis, Spondias dulcis
e Anacardium humile o mecanismo de eliminação da
secreção seja preferencialmente écrino.
Os resultados das análises ultra-estruturais das
células epiteliais dos canais estudados corroboram com
os resultados positivos obtidos pelos testes histoquímicos
no lume dos canais, para substâncias hidrofílicas e
lipofílicas em Spondia dulcis e Tapirira guianensis e para
substâncias lipofílicas em frutos de Anacardium humile
(A.P.S. Lacchia, dados não publicados), uma vez que,
as células epiteliais de S. dulcis e T. guianensis possuem
as organelas necessárias (RE, ribossomos, plastídios e
dictiossomos) para a produção de substâncias hidrofílicas
e lipofílicas e que as células epiteliais do fruto de A. humile
apresentam plastídios, que são organelas primordiais na
secreção de substâncias lipofílicas. A formação dos canais
Acta bot. bras. 23(2): 376-388. 2009.
por meio de processo esquizolisígeno nos ápices de
S. dulcis e por meio esquizógeno nas flores de
T. guianensis, bem como, as modificações estruturais e
ultra-estruturais relacionadas à formação destes canais
são condizentes com o modo de formação dos canais
de outras espécies da família Anacardiaceae.
Pelos dados ultra-estruturais das células epiteliais
dos canais secretores das três espécies estudadas
podemos constatar que existem diferenças ultraestruturais em suas células epiteliais, como por exemplo,
o tipo de plastídio; embora os canais secretores de
Spondias dulcis e Tapirira guianensis produzam secreção
de composição semelhante. Um fato novo, em
Anacardiaceae, em relação aos aspectos ultra-estruturais
dos canais secretores, é a presença de um grande número
de plastídios de forma arredondada, nas células epiteliais
dos frutos de Anacardium humile. Em relação à formação
dos canais, embora tenhamos feito somente o estudo
em ápices de S. dulcis e em flores de T. guianensis,
pudemos verificar, através de registros de formação dos
canais em outras espécies de Anacardiaceae, que o tipo
de processo de formação dos canais não é um caráter
unificador na família, mas um caráter que pode variar
enormente entre indivíduos de diferentes espécies e entre
órgãos de uma mesma espécie. Um caráter comum
observado entre as três espécies estudadas é o modo de
liberação da secreção, que para as três espécies estudadas
é preferencialmente écrino.
Agradecimentos
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo pela Bolsa de Doutorado à primeira Autora
(proc. 03/13556-5) e suporte ao projeto temático
(Biota/FAPESP proc. 00/12469-3 e 02/13532-6).
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Versão eletrônica do artigo em www.scielo.br/abb e http://www.botanica.org.br/acta/ojs