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Vozes guardadas
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E-book494 páginas4 horas

Vozes guardadas

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Sobre este e-book

Com a delicadeza, a sensualidade, a inteligência e o humor que marcam a sua criação artística, os versos deste Vozes guardadas revelam amores contidos e outros obscenos, um mundo vasto de espantos, lágrimas, risos e paixões. Ao entregar ao público mais uma leva das "multidões de vozes" que a habitam, a poeta se despede dessas vozes guardadas para dividi-las com todos, fazendo delas nossas próprias vozes. Penetrar no universo dos poemas de Elisa Lucinda exige estancar o tempo e a correria da vida: um delicioso e irrecusável convite.
IdiomaPortuguês
EditoraRecord
Data de lançamento16 de dez. de 2016
ISBN9788501108821
Vozes guardadas

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    Pré-visualização do livro

    Vozes guardadas - Elisa Lucinda

    2012)

    Livro primeiro

    Jardim das cartas

    Palavras têm raízes na minha infância.

    Manoel de Barros

    Dedico este livro ao jardim de minha casa. Como é avarandado e suspenso, seu lustre teve a honra de receber um inquilino passarim. Isso só pra dizer o mínimo deste templo de onde nasceram tantas palavras. Divino lugar. Ao me reconstruir, germinei um jardim inteiro que germinou em mim uma profusão de palavras com as quais ergo o meu castelo.

    Eis o serviço da terra em mim.

    Fértil terreno donde brotaram essas cartas que usam este livro como carteiro.

    O destinatário é você que me escuta, que me entende, que me vê. Flores palavras venho lhe oferecer.

    "Ai, palavras, ai palavras,

    que estranha potência, a vossa!

    Ai, palavras, ai palavras,

    sois de vento, ides no vento,

    no vento que não retorna,

    e, em tão rápida existência,

    tudo se forma e transforma!"

    Cecília Meireles

    I

    Carta guardada no decote

    Como um diamante meu amor se perfaz, indestrutível.

    Adélia Prado

    Carta devolvida

    Se não gostar mais de mim

    não me responda nada

    não me diga nada

    não quero que fiquem gravadas

    as palavras do não querer.

    Se não gostar mais de mim

    ninguém precisa saber

    nem eu.

    Se não gostar mais de mim

    seja breve seja leve seja zen

    silêncio de ioga e Sidartha.

    Mas se ainda sonhar comigo,

    por favor, meu amor,

    devolva essa carta.

    A doce angústia

    Que queria estar totalmente feliz

    mas que totalmente feliz, agora,

    era uma viagem, uma ilusão.

    Que achava um jogo peri-gozo

    embora cheio de emoções.

    Que tinha de noite pensamentos de mim, ereções.

    Que dormia sem mim

    mas que era de mim que tinha fome.

    Que tinha medo de, à noite,

    em meio ao sono insone,

    do lado da outra,

    pronunciar alto, bem alto, o meu nome.

    Paisagens

    Um dia eu vi nossa estrada pra frente,

    antevi a lonjura do profundo percurso.

    Mas a vida é rio,

    e rio que é rio

    uma hora muda seu curso.

    No dia de hoje

    vejo nossa estrada pra trás,

    olho o caminho andado:

    andei muito, corri demais.

    Passei do ponto daquela espécie de paz.

    (Noite alta sacopã, banheiro,

    17 de outubro. Dia da asa/2007)

    Carta guardada

    Mãos secas,

    peitos tristes,

    tudo isso reboa nesta manhã dissoluta

    desta paulista vista sem você

    na janela da possibilidade.

    Meu amor, meu amor, meu amor,

    grita burro o coração por detrás da verdade.

    Ninguém responde.

    Sei no entanto que me amas escondido,

    no avesso do orgulho,

    embaixo da linha da vaidade.

    Lágrimas renitentes,

    coração doído,

    meu corpo pede o nosso encaixe e teu abrigo.

    Meu amor, meu amor, meu amor,

    geme louca minha poesia Sherazade.

    O sono do amor deixou órfãs as mil e uma noites,

    legou açoites ao desejo e à vontade.

    Tudo isso judiando,

    debaixo do manequim da saudade.

    (Sampa, 7 de março de 2005)

    O segredo

    É madrugada.

    Ninguém sabe de mim.

    Ninguém sabe o que penso.

    Ninguém sabe de nada.

    Sou da esgrima da palavra.

    Valente espadachim em pensamento.

    Nada pode me deter,

    nem eu, enfim.

    Por isso penso em você

    escondido de mim.

    (Primavera de flor)

    O castelo

    Por causa dos meus erros

    e de outras mazelas,

    e só porque a aurora não me pareceu tão bela,

    esborrou de mim a velha angústia, aquela.

    Moradora do existencial humano,

    habitante de seu manancial,

    desde o tempo das cavernas.

    Ó velha angústia de variados temas,

    questões, habituais problemas;

    sem contar os pontuais:

    o que comer,

    onde morar,

    o que vestir,

    como chegar

    e num sei que mais.

    Dói porque o dia não raiou

    exatamente bom

    depois da difícil noite em que

    fantasmas me açoitaram o pensamento

    com sua foice e martelo.

    Só fiquei boa no fim da tarde,

    quando tirei da alma o velho chinelo

    e nele entrei, como num palácio de ouro e de renda belo.

    Entrei no palácio de ouro do meu vestido amarelo.

    Ressaca de quase amor

    O Rio de Janeiro expande seus esplendores na minha cara.

    O filme daquela doce madrugada

    passada no clarão da Guanabara

    não cansa de passar aqui

    e meu olhar vai se perdendo sobre a cidade.

    Não mais te lembrar, meu quase amor,

    agora é a minha dificuldade.

    O rio de pandeiro percursiona suas ilusões no meu Saara.

    Poesias, canções, trocadilhos, piadas.

    Tinha beijo e era muito noite.

    Era quase tarde.

    Memórias, encantos, saudades.

    Embora pareça finito o que nem sequer chegou a ser realidade,

    mesmo assim,

    meu quase amor,

    vou te esquecendo de má vontade.

    (Verão apressado de 2009vembro)

    Delícia retórica

    — Que peito macio!

    — São teus lábios.

    Provocação

    Na intenção de acender o vulcão,

    procuro suas lavas.

    Procuro onde provocar dentro delas

    a deliciosa combustão.

    Mas, o que quer a pequena menina?

    Pergunta a tarde que a tudo assiste cintilante.

    Quero acordar o gigante,

    despertar labaredas,

    provocar o poeta,

    chamá-lo à consciência

    revolucionária da própria força,

    insuflar nele a paixão...

    Quero o fogo,

    a ardente chama da emoção.

    Futuco então suas lavas.

    Quero acordar o vulcão.

    (Outono ardente)

    Chispa

    Sai daqui com este olhar,

    esta boca que eu adoro,

    esses risos lindos leves,

    essa cara incrível de Cecília Meireles,

    essa espécie de poesia

    que há nos seus contornos breves.

    Sai daqui com sua poesia que ainda se atreve a atrair meu coração.

    Vai embora com seu beijo,

    o vulcânico tesão.

    Faz muito tempo que não te vejo,

    deixa em paz meu coração!

    Vai embora com seu desejo,

    sai daqui com esta canção,

    seu oráculo, o velho realejo.

    Aproveita o ensejo,

    recolha o fogo, o cortejo

    e leva daqui os enredos dessa incrível paixão.

    Faz tempo que não te vejo,

    e foi ontem o princípio da ilusão.

    Carta sensação

    Você me amaria de tarde

    numa tarde como esta?

    Assim na hora da sesta

    me amaria com fervor,

    me abraçava por trás numa hora como esta?

    Você chegaria neste vento

    como uma sorrateira

    inesperada estação?

    Me agasalharia estrada afora

    no meio do inverno

    fazendo em mim noite de verão?

    Responde, luar de agosto:

    você me beijaria o rosto

    nesta noite fria

    e nela me diria eu te amo,

    esquentando minha mão

    entre as suas?

    Me conduziria pelas ruas da cidade

    ao bairro da possibilidade

    onde faremos a revolução?

    As perguntas têm dois gumes

    e talvez desfilem em vão.

    Uma ponta indaga,

    a outra quer solução,

    uma lâmina fala

    a outra não quer mais nada não.

    Por um lado pergunta,

    do outro quer apenas das palavras

    a real sensação.

    Sabe que o que chamamos

    de fala vem revestido

    de uma fina camada de ilusão.

    Fecho os olhos,

    sinto sua resposta

    percorrer meu corpo

    em forma de mão.

    Socorro

    Não posso ver teu nome escrito.

    Futuca meu peito,

    materializa-se um apito anunciando pra geral que eu ainda te amo.

    Teu nome acende em mim

    um susto, um grito, um espanto.

    Tudo com a força de um impacto, mas pro lado bom.

    Teu nome incendeia meus sentidos,

    enche meu desejo de alegria.

    O nome aparece portando o homem,

    símbolo, linguagem, alegoria!

    Não posso ver teu nome escrito.

    Cutuca meu coração,

    me derrete em poesia.

    Acabam-se as guerras

    tudo soa como uma grande canção,

    um louvor à alegria.

    Já falei.

    Está dito:

    não dou conta de ver teu nome escrito.

    Carta no decote

    Vítor voltou a me escrever!

    Hoje recebi mais uma de suas cartas,

    sempre escritas durante as manhãs.

    Estavam lá, como ele mesmo prometera na véspera.

    São cenas escritas, descritas de nosso amor,

    tecidas sob a mais alta combustão da lucidez.

    Vítor escreve embriagado de uma realidade apaixonante

    e tão palpável que parece delírio.

    Descreve o nosso amor em detalhes e de modo tão íntimo,

    que nem posso contar aqui.

    Ele escreve o sentimento de um homem.

    O mundo todo tilinta e cintila quando o acontecimento

    emocional é a letra de um homem para uma mulher!

    A letra masculina dedicada a ela.

    Ô, meu São Benedito,

    a Terra muda seu giro diante dessa confissão!

    Nos converte a uma outra sensibilidade.

    Trata-se da subjetividade daquele que mete,

    e muda a manobra de Eva.

    Ai, ai... o pensamento romântico masculino me deixa muito molinha,

    Chapeuzinho acreditando nas palavras lindas,

    nas instruções do lobo.

    Nada disso.

    Não há lobo nem garotinhas perdidas em florestas.

    Há, sim, o parque dos namorados se estabelecendo no meu peito.

    Iluminando a cena.

    Eu, com a carta dele impressa na mão,

    guardo-a entre os seios.

    Fala mais, meu amante!

    Grita seu macaco pensante,

    prega em mim a palavra fecunda!

    Sou tua, está posto.

    Fala mais, quero ouvir a voz de teus belos olhos,

    o som de tua mirada, aqui,

    quero aqui.

    Assim, rente ao cangote,

    ao pé do meu ouvido.

    Fala. Enche o meu decote!

    Esparrama sua narrativa sobre o nosso combinado.

    Vem, são palavras queimando, ardendo no tacho.

    Ler-te faz esquentar meu ventre.

    Ai, que o verbo é macho!

    (Lagoa do segredo, 8 de junho)

    Na boca da palavra

    Abri a carta do Vítor com pressa,

    ânsia, quase aflição.

    Rasguei o envelope afoita como

    se o remetente estivesse ao vivo ali,

    prestes a me abraçar, a me envolver

    gostoso com sua letra bem traçada,

    a me ter com ela.

    E estava.

    A caligrafia bela dele

    me leva às cordilheiras mais sagradas

    encoberta pela mais densa névoa

    pra ninguém saber.

    Li.

    Fiquei tão feliz, tão alterada de sensações,

    que tudo ficou tonto,

    muito parecido com o passar mal.

    Não era. Era o contrário,

    Era o bem de Vítor em mim, suas palavras de amor

    dispostas em ato, compostas em um gesto inteiro,

    em verbo doce e duro pra calar minha fome.

    Sim.

    De longe,

    é com palavras que Vítor me come.

    Página

    Nasceu diante de mim sua presença,

    seu texto que eu adoro,

    o sotaque carinhoso que eu amo,

    tua voz de encantamento

    o timbre que chama minha fêmea,

    agita meu compasso

    teu cheiro que só você tem.

    Tão gostoso, o toque,

    a pele, o contato.

    Você dentro de mim,

    o maravilhoso fato,

    o criativo jeito,

    o divertido charmoso estilo

    passo a passo.

    Chegou, realizou a história

    como se fosse o esperado,

    um destino, uma sorte,

    o encontro marcado.

    Agora, olha eu aqui atordoada,

    envolvida numa história bizarra,

    sem saber como sair dela,

    sem saber direito como nela entrei.

    Sonhei!?

    Não, pior: eu te inventei.

    Carta no chão

    Era como se fosse abismo,

    cada vez que mais no fundo

    você me tocava.

    Era como se fosse lirismo

    cada vez que mais a fundo

    você me amava.

    Deitei costas e ombros no seu peito,

    álibis e armas depositei sobre os escombros

    da saudade ali se debatendo,

    embora longe ainda de estar morta.

    Com cuidado e com o pé

    encostei a porta da entrada.

    Foi com a palavra do olhar e quase louca

    que abri a outra.

    A coisa

    Preciso ir onde está a lua.

    Se ficar em casa vou fazer besteira.

    As mídias estão à mão.

    Posso tudo, há tantos modos de te acessar

    que temo a mim mesma.

    Estará tudo vigiado?

    Todas as fronteiras, espaços aéreos e marítimos?

    Tudo controlado? Todos os atalhos?

    Os detalhes, as beiras líricas dos precipícios?

    Não sei. Quero calar o meu hospício.

    Se ficar em casa vou acabar fazendo asneira.

    Posso telefonar, camicase, suicida,

    mulher-bomba explodindo tudo, a inconsequente.

    Posso não resistir esta noite à fúria da saudade

    Posso querer gritar seu nome agora pela cidade

    para além das vergonhas, acima da vaidade.

    Gritar seu nome alto, bem alto,

    a esta hora da noite para toda a rua.

    Capetas me testam.

    Preciso ir onde está a lua.

    (Lua cheia noite de maio ardente)

    II

    Carta declarada

    Onde estiver o seu coração aí está o seu tesouro.

    Juarez Nogueira, Ninauá (O índio)

    "Por mais que longe pareça,

    ides na minha lembrança,

    ides na minha cabeça,

    valeis a minha Esperança."

    Cecília Meireles

    Carta declarada

    Num átimo já é janeiro de 2007.

    Passa a boiada.

    Escrevo em homenagem à vida, em louvor à

    querida vida e aos seus ensinamentos!

    Escrevo à vida e seus movimentos,

    sua gira que não cessa de mexer,

    que não para de virar.

    É uma roda:

    a gente leva a vida enquanto deixa ela levar.

    E assim:

    como um barco apaixonado por sua vela,

    como uma vela enamorada do vento,

    como um vento emocionado do seu ar,

    como um ar mancomunado com o universo,

    como um universo coroado de galáxias,

    como galáxias devotas da lua,

    como uma lua, mulher luminosa do astro rei,

    te venero, vida!

    E em seu nome bordo letras,

    prolifero boas-novas nos cadernos,

    nos infernos e nos escarcéus da alma humana.

    Vida minha, soberana,

    senhora doidivanas.

    Vida-céu,

    verso eterno,

    menestrel.

    (1º de janeiro de 2007)

    Ao pai do fruto

    a Zanandré Avancini

    Porque me escreveste

    as primeiras belas cartas de amor,

    meu amor escritor,

    porque me deste o primeiro voo,

    a primeira cópula,

    a primeira adulta vida,

    porque me deste palavras novas,

    pensamentos raros,

    Mautner, Ravel, Bidu Sayão, Carmina Burana.

    Pelos sons inimagináveis,

    risadas, ervas, saídas,

    tudo coisa de quem ama.

    Porque me deste passeios à beira de bucólicos rios,

    quintais, vilas e varandas

    e a primeira casa de eu crescida

    e muito tesão movendo a cama,

    porque me deste o tesouro

    do amor-amor e do amor-amigo nesta vida,

    por teres sido cúmplice do meu sonho mais antigo,

    pelo que de mim fizeste,

    toda a minha gratidão merece,

    pois me fizeste milionária

    pelo filho que me deste.

    O filme original

    a Juliano Gomes

    O que amanhecera soberano

    era o céu de um azul tão perene e indubitável,

    que já anunciava o que a iluminada tarde traria.

    Mas ainda não se sabia.

    Esperava-se o luminoso acontecimento para um mês depois daquele dia.

    Não se havia lido o sinal de que se anteciparia.

    O que se chamava manhã atendia por um celeste tão divino que havia quem apostasse que era de vidro

    a fina camada anil sem sombra de nuvens que nos cobria.

    A boniteza quente dos janeiros deixou que sua estrela nos apontasse o caminho da praia das conchas, entre altas pedras,

    onde como um peixe ou sereia, fui me recriar.

    A barriga imensa e marrom contra o fundo turquesa e a luz solar eram parte de fora do planeta ventre, a epiderme castanha, cor de barro e cobre

    onde o menino, deus e gente,

    já se despedia de morar.

    Na água clara brilhava a pele prata dos peixes

    e o pai vibrava ao pescar.

    Contemplação. Voos de aves, cantos sutis e breves dos colibris.

    A calma.

    Chega então a tarde quieta.

    O silêncio que a tarde arquiteta entre matos, ventos, grilos, ondas, envolveu tudo em perspectivas, o plano sequência da lírica das formas a brindar as esferas,

    e tudo saiu na foto:

    em primeiro, a cabeça inspirada da fêmea completa,

    em segundo o peito túrgido,

    em terceiro o ventre fúlgido,

    em depois a montanha imensa emergida do mar,

    garantindo a firmeza das quimeras

    para quem nasceria de e para o reino do sonhar.

    Maravilhosa paisagem.

    A mãe recebia os raios do astro rei deitada sobre a pedra

    com seus riscos de cinzas e purpurinas minerais.

    De volta à casa, depois da praia, com amigos

    no jardim de girassóis, a alegria reinava e cobria a horta de hortelãs

    continuada pelo quintal de inhames e aipins.

    Raízes capixabas reverberavam ali naquela hora magna.

    A tarde,

    joia consagrada aos inocentes, apesar de sua brandura,

    começara a alternar-se em espasmos no corpo materno,

    cada vez mais frequentes.

    Mesmo assim cozinhava feliz entre cólicas e apreensões naturais;

    Piadas, deliciosas gargalhadas geniais, brilhavam naquelas brincadeiras palavras que nunca sairiam dos nossos

    animados festivais: festas, conversas, trocadilhos, música

    tudo era já o trilho no qual andaria

    aquela vida nova que nos deu a honra de recebê-la na beira do mundo.

    Vai chegando um doce poente,

    laranja é a cor do firmamento incandescente.

    A mãe deixa com os peixes no fogão a frigideira quente,

    e corre com o pai e cúmplices para o leito onde logo logo

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