Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                

A Reacao de Maillard Nos Alimentos e Medicamentos 2009 61pp

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 61

A Reação de

Maillard
nos
Alimentos e Medicamentos

Aderson de F. Dias, Ph. D.

2009
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

A Reação de Maillard
nos Alimentos e Medicamentos

01 – Introdução
02 – A química da reação de Maillard
03 – Formação do N–Glicosídeo: Aldose/Cetose + Grupo amina
04 – Rearranjo de Amadori
05 – Degradação de Strecker
06 – Formação da Acrilamida via degradação de Strecker da Metionina
07 – Fluxograma da reação de Maillard
08 – Melanoidinas de Maillard e Substâncias Húmicas
09 – Reação intrínseca de Maillard em produtos farmacêuticos
10 – Reação de Maillard no leite e derivados
11 – Reação de Maillard no Café
12 – Reações de Maillard no Colágeno do Cristalino
13 – Inibidores da Reação de Maillard: promovendo a saúde
14 – A estrutura química do aroma e do sabor dos alimentos

1
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

1 – Introdução

Em 1912 o francês Louis-Camille Maillard 1 comunicou à Academia Francesa a


razão pela qual os alimentos perdem a cor e escurecem ou endurecem quando são
aquecidos ou armazenados por longo tempo: Era devido à ligação química do açúcar
(glicose) às proteínas presentes no alimento.

Em seu experimento pioneiro, ele misturou 1 parte do aminoácido glicina com


4 partes de glicose, adicionou 4 partes de água e aqueceu no “bain-marie” por dez
minutos. A mistura se torna amarela, acelerando para tons de marron-escuros e
finalmente o líquido começa a espumar pela liberação de CO2 proveniente da
decomposição do aminoácido. A reação foi generalizada para outros aminoácidos
(Fig.1) – alanina, valina, leucina, tirosina e os açúcares (Fig. 2) – xilose, glicose,
manose, lactose, sacarose e maltose 2 . Em seu comunicado, Maillard enfatiza sobre
as conseqüências desses fatos em vários campos da Ciência, em especial na
fisiologia e patologia humanas.

1
Maillard, L.-C., Action des acides amines sur les sucres; formation de melanoidines par voie méthodique,
Compt. Rend. Acad. Sci. Ser. 2, 154, 66-68 (1912).
2
Existem apenas três dissacarídeos com abundante ocorrência natural de importância para o metabolismo de
plantas e animais: lactose (leite), sacarose (plantas verdes) e trehalose ou “açúcar dos cogumelos” (fungos e
insetos). Maltose não é encontrada na natureza, mas é produzido pela hidrólise do amido (goma). Fonte: Metzler,
David E., Biochemistry: The Chemical Reactions of Living Cells, 2nd Ed. vols. 1, 2 Elsevier, Academic Press
(2001).

2
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O O NH2 O O O
H3C H2N HO
OH H3C OH HN NH OH OH OH
NH2 NH2 NH2 O NH2 O NH2
L-Alanina Ácido L-Aminobutírico L-Arginina L-Asparagina Ácido L-Aspártico
(Ala) (Abu) (Arg) (Asn) (Asp)
O
O O O NH2 O
O N
OH
HS OH HO OH O OH H2N
OH N NH2
NH2 NH2 NH2
H
L-Cisteina Ácido L-Glutâmico L-Glutamina Glicina L-Histidina
(Cys) (Glu) (Gln) (Gly) (His)
O CH3 O O O O
HS H3C H3C H2N S
OH OH OH OH H3 C OH
NH2 NH2 CH3 NH2 NH2 NH2
L-Homocisteina L-Isoleucina L-Leucina L-Lisina L-Metionina
(Hcy) (Ile) (Leu) (Lys) (Met)
O O O O O
H3C
H3C OH OH H2N OH OH OH
NH2 N
NH2 NH2 NH2
H
L-Norleucina L-Norvalina L-Ornitina L-Fenilalanina L-Prolina
(Nle) (Nva) (Orn) (Phe) (Pre)
O CH3 O O O CH3 O

HO OH HO OH OH OH H3C OH
NH2 NH2 NH2 NH2 NH2
NH HO
L-Serina L-Treonina L-Triptofano L-Tirosina L-Valina
(Ser) (Thr) (Trp) (Tyr) (Val)

Figura 1 – Diversidade estrutural dos aminoácidos, os reagentes químicos com os quais a


natureza constrói o mundo orgânico. Ao aquecê-los com substratos carbonílicos, como
açúcares redutores, uma quantidade inimaginável de compostos são produzidos, os quais dão o
toque final na cor, odor, aroma, textura e valor nutricional dos alimentos. De todos a glicina é o
mais reativo dos aminoácidos. Substituintes longos e grupos mais complexos reduzem a taxa
de escurecimento. Na série dos ω−aminoácidos (Lisina) a velocidade aumenta com o aumento
da cadeia carbônica. Ornitina acastanha mais rapidamente que lisina. [deMan, John M. (1999)]

2 – A química da reação de Maillard

A reação de Maillard de açúcares redutores com aminas tem profundas


implicações químicas com as propriedades organolépticas dos alimentos e com a
biodisponibilidade de aminoácidos. No processamento industrial dos alimentos, a
reação confere aspectos positivos, como a formação do odor e sabor, mas trás
conseqüências negativas como a perda de aminoácidos essenciais e a geração de
substâncias mutagênicas e cancerígenas. 3 Na visão atual da ciência, os produtos da
reação de Maillard estão associados à formação dos chamados “Produtos Finais da

3
Glomb, Marcus A., and Pfahler, C.: Synthesis of 1-deoxy-D-erythro-hexo-2,3-diulose, a major hexose Maillard
intermediate, Carbohydrate Research 329 515–523 (2000).

3
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Glicosilação Avançada” – PFGA (Advanced Glycation End-product, AGE), de


estrutura química polimérica, bem como forte contribuição a muitas doenças
progressivas da velhice, incluindo doenças vasculares (tais como aterosclerose,
hipertensão pulmonar e baixa circulação capilar), doenças renais, enrijecimento das
juntas e da pele, catarata, retinopatia diabética, neuropatia, Doença de Alzheimer,
incontinência urinária, cardiomiopatias e diabetes mellitus. 4

AGEs se formam por modificação dos resíduos de arginina e lisina, ancorados


nas proteínas, grupos amina de fosfolipídeos (fosfatidiletanolamina e fosfatidilserina)
e guanil nucleotídeos do DNA. Típicos AGEs (Fig. 3) são hidroimidazolonas de
proteínas e imidazopurinonas derivados do DNA, bis(lisil)-imidazólio (agentes de
ligação cruzada de proteínas: GOLD, MOLD e DOLD), vesperlisinas A, B e C,
produtos fluorescentes de proteínas (pentosidina e argpirimidina), derivados N-(1-
carboxalkil)amino (Nε-carboxi-metil-lisina e Nε-carboxetil-lisina de proteínas; N-
carboximetilfosfatidiletanolamina de fosfolipídeos; N2-(1-carboxietil) desoxiguanilato
do DNA), pirralina – um derivado pirrol de proteínas, entre outros (Fig. 4). 5

4
Monnier, V. M.; Sell, D. R.; Wu, X., and Rutter, K.: The prospects of health and longevity from the inhibition
of the Maillard reaction in vivo, International Congress Series 1245, 9-19 (2002); Graham, L., Biochimica et
Biophysica Acta, 1297, 9-16 (1996); Araki, N., Shibayama, R., Ejima, Y., Nagai, R., Araki, T., Saya, H.,
Horiuchi, S., International Congress Series 1223 49-58 (2001).
5
Thornalley, Paul J.: Biochemistry of Advanced Glycation Endproduct generation and its inhibition, in:
SYMPOSIUM “Advanced Glycation End Products (AGEs)” May 12 – 14, 2000, Jena, Germany

4
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Termina redutor
HO OH
OH O OH
2 1 HO O O H
O β H H
HO O OH OH α
1 4 OH OH
3 O
1 4 HO OH
OH HO HO
HO
Ligação α−1,4-glicosídica
Ligação β−1,4-glicosídica
β-D-Galactose α-D-Glicose α-D-Glicose α-D-Glicose
α−Lactose: Maltose:
4-O-α−D-Glicopiranosil-β−D-glicopiranose
O-β−D-Galactopiranosil-(1,4)-α−D-glicopiranose

OH
O H HO
HO OH O
HO H α-D-Glicose O OH
1 1 α 1
α HO
HO OH OH O
O Ligação 1α,2β− HO
OH
O β glicosídica Ligação α,α−glicosídica
H HO 2 HO
HO β-D-Frutose α-D-Glicose α-D-Glicose
OH H OH α,α−Trehalose:
Sacarose: α−D-Glicopiranosil-α−D-glicopiranosideo
β−D-Frutofuranosil-α−D-glicopiranosideo
β
OH OH O O
1 6
OH CH2
O β HO 3 1 OH H O
HO 2 OH 5
HO O HO HO 4 2
O HO 1 H
1 4 HO 3
OH OH OH
Ligação β−1,4-glicosídica Ligação β−1,6-glicosídica OH
β-D-Glicose β-D-Glicose β-D-Glicose β-D-Glicose
Celobiose: Gentiobiose:
4-O-β−D-Glicopiranosil-D-glicose 6-O-β−D-Glicopiranosil-D-glicose

Figura 2 – Estrutura química de alguns dissacarídeos: Lactose (leite), sacarose (plantas verdes)
e trehalose (fungos e insetos) são os três dissacarídeos com abundante ocorrência natural
fundamentais para o metabolismo de plantas e animais (a maltose, açúcar do Malte, é um
produto da hidrólise do amido; tem 1/3 do poder adoçante da sacarose). Note que sacarose e
trehalose são açúcares não-redutores, pois o grupo redutor do monossacarídeo foi usado na
ligação glicosídica. Esses dissacarídeos não sofrem mutarrotação em solução e nem reduzem o
reagente de Fehling. Dissacarídeos não-redutores reagem apenas após hidrólise. Os demais
são hemiacetais e portanto açucares redutores. A celobiose é obtida através da hidrólise da
celulose, é desprovida de qualquer sabor e é indigesta para humanos. Trehalose tem um sabor
distinto, mas gentiobiose é amarga. Fonte: deMan, John M., Principles of Food Chemistry, 3rd
Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999).

A importância da reação de Maillard in vivo foi reconhecida pela primeira vez


com a detecção de elevados níveis de hemoglobina no sangue diabético. Evidências
posteriores sugeriam que os produtos finais da glicosilação avançada (AGEs) podiam
estar implicados na etiologia de várias complicações diabéticas e o envelhecimento. 6

6
Fatima, S.; Jairajpuri, D. S., and Saleemuddin, M.: A procedure for the rapid screening of Maillard reaction
inhibitors, J. Biochem. Biophys. Methods, 70, 958–965 (2008).

5
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

HO
O O O OH OH
CH3
H3C CH3
+ + +
H N N H N H N OH +
N N N N
H H H H
HN HN HN N
H

H2N O O
H2N O H2N O H2N
HO HO HO OH
Argpirimidina
G-Arg MG-Arg 3DG-Arg (2MG + Arginina)

Figura 3 – Formação de produtos finais da glicosilação avançada (AGEs) através de


modificações na cadeia lateral da arginina: Imidazolonas formadas via reação do glioxal (G-
Arg), metilglioxal (MG-Arg) e 3-desoxiglicosona (3DG-Arg) com a cadeia lateral da arginina.
Argpirimidina é formada pela reação de duas moléculas de metilglioxal e arginina ligada a
peptídeo.

O termo “Advanced Glycosylation (Glycation) End product” (AGE) apareceu na


literatura através do trabalho de Vlassara et al. 7 com o propósito de descrever
estruturas químicas amarronzadas, fluorescentes e que apresentam cruzamento
covalente nas ligações entre as cadeias moleculares, resultando numa complexa
rede polimérica e que são formados no estágio avançado das reações de Maillard
entre açúcares e proteínas in vivo. Atualmente, o emprego do termo AGE (PFGA)
abrange uma ampla gama de produtos avançadas da reação de Maillard, detectados
na proteína dos tecidos, incluindo Nε−(Carboximetil)-lisina (CML), Nε−(Carboximetil)
hidroxi-lisina (CMhL), Crossline (um par de compostos epiméricos derivados da
glicose por reação cruzada lisina-lisina) e pirralina, 8 compostos que não apresentam
cor ou fluorescência e nem cruzamento de ligações entre cadeias moleculares das
proteínas. Porém, como a pentosidina (produto de condensação da lisina, arginina e
um precursor originado de açúcar redutor), CML, CMhL se acumulam no colágeno
com a idade, particularmente no colágeno da pele em diabéticos, onde ocorre em
maior concentração, estando implicados com a patofisiologia da velhice. Não se sabe
se a pirralina se acumula nas proteínas com a idade avançada, mas no diabético sua
concentração na proteína plasmática se encontra com índices elevados. Já se sabe

7
Vlassara, H., Brownlee, M., & Cerami, A., J. Exp. Med. 160, 197-207 (1984)
8
Pirralina (ε-2-(formil-5-hidroximetil-pirrol-1-il)-L-norleucina) é um produto avançado da reação de Maillard
derivado da reação de glicose com o grupo amina da lisina presente nas proteínas .

6
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

que tanto o CML quanto a Pentosidina se formam a partir de uma ampla gama de
carboidratos, incluindo glicose, ascorbato, pentoses e tetroses, sugerindo um
intermediário comum. 9

A habilidade dos AGEs de formar ligações cruzadas intermoleculares nos


tecidos, capturando quimicamente proteínas solúveis como as lipoproteínas,
inativando óxido nitroso, NO, e interagindo com proteínas especificas para induzir
permeabilidade vascular, acumulo de matriz extracelular (ECM), estresse oxidativo e
estado de pró-coagulação sugerem um papel relevante desses AGEs na disfunção
vascular diabética. Essa observação já foi enfatizada e reforçada em estudos usando
inibidores específicos da glicosilação, tais como aminoguanidina que além de
prevenir o acumulo de AGEs melhora as complicações do diabético. 10

1 1 OH
R R H 2 1 1
R R H H R H H OH
N N N N N
N H N N N N N
2 2
HO N HO H R R OH
2 N N HO OH
N R N
H3C OH
HO
HO
Glicosepane OH DOGDIC MODIC GODIC +
N
R N
1 1 1 1 R
R R R R
N N + H Crosslines
N OH N H
N
+ + HOCH2 +
N N
N 1 N 2 Crossline-A: [C9 R]
1 R 1 N R
R CH3 R
HO R = (CH2)CH(NH2)COOH
GOLD MOLD DOLD Pentosidine
Crossline-B: [C9 S]
NH2 NH2 R = (CH2)CH(NH2)COOH
HOOC
HOOC N COOH N COOH
H H
O
CML: Nε-Carboxi-metil Lisina CEL: Nε-Carboxi-etil Lisina
R1 = H2N
OH
Lys Lys OH
+ + Lysine (Lys) NH2
N H3C N
HOCH2 CHO + NH2 O
N N
HO N HO N N R2 =
Lys HN NH OH
R
Lys Lys Lys
Arginine (Arg) NH2
Pirralina Vesperlisinas A, B e C

Figura 4 – Estrutura de alguns dos principais compostos avançados que formam uma rede de
ligações cruzadas covalentes com as proteínas. MOLD = metilglioxal-lisina dímero; GOLD =
glioxal-lisina dímero (a lente do cristalino do olho humano atacado pela catarata, há níveis

9
Reddy, S.; Bichler, J.; Wells-Knecht, K. J.; Thorpe, S. R., and Baynes, J W.: Nε−(Carboxymethy1)lysine is a
Dominant Advanced Glycation End Product (AGE) Antigen in Tissue Proteins? Biochemistry, 34, 10872-10878
(1995)
10
Cooper, Mark E.; Bonnet, F.; Oldfield, M., and Jandeleit-Dahm, K.: Mechanisms of Diabetic Vasculopathy:
An Overview, Amer. J. Hypertension, 14, 475–486 (2001).

7
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

significativamente altos de MOLD e GOLD); GODIC, DOGDIC, MODIC, são produtos da


condensação cruzada (cross-links) de lisina–arginina: GODIC (condensação cruzada de lisina–
arginina + glioxal), MODIC (condensação cruzada de lisine–arginine + metilglioxal), DOGDIC
(condensação cruzada de lisine–arginine + 3-desoxiglicosulose); Vesperlisinas A, B e C =
condensação de duas moléculas de lisina e glicose. 11

A glicosilação e a formação de ligações covalentes cruzadas entre as cadeias


moleculares das proteínas reduzem sua flexibilidade, sua elasticidade e a sua
funcionalidade. Além disso, as modificações químicas nas proteínas resultantes da
glicosilação e das ligações cruzadas, podem disparar reações inflamatórias e auto-
imunes. A glicosilação foi observada no colágeno do tecido conectivo, no colágeno
arterial, na membrana basal do glomérulo renal, na lente do cristalino ocular, na
mielina das fibras nervosas e no LDL (low density lipoprotein) circulante do sangue. 12
O principal agente de condensação cruzada (cross-links) de proteínas,
especialmente do colágeno de humanos idosos e do cristalino ocular, o glicosepane
(6-[2-[(4S)-4-amonio-5-óxido-5-oxopentil]amino-6,7-dihidroxi-6,7,8,8a-tetra-hidro-
imidazo[4,5-b]azepin-4(5H)-il]-L-norleucinato (Fig. 4), é derivado da estrutura régio-
isomérica N6-(2,3-diidroxi-5,6-dioxohexil)-L-lisina,demonstrado experimentalmente
com D-Glicose marcada no C1 13 (Fig. 5). O glicosepane é um PAGF cuja formação
confere enrijecimento continuo de artérias, juntas e lente cristalina no diabético.

11
Silván, José M; Lagemaat, J. van de; Olano, A., and Castillo, M. Dolores del: Analysis and biological
properties of amino acid derivates formed by Maillard reaction in foods, J. Pharmaceutical and Biomedical
Analysis, 41, 1543-1551 (2006); Bailey, Allen J.; Paul, R. Gordon, and Knott, L.: Mechanisms of maturation and
ageing of collagen, Mech. Ageing Dev., 106, 1–56 (1998);
12
Bucala, R., Cerami, A., Adv. Pharmacology, 23, 1-34 (1992); Karachalias, N., Babaei-Jadidi, R., Ahmed, N.,
and Thornalley, P. J.: Accumulation of fructosyl-lysine and advanced glycation end products in the kidney, retina
and peripheral nerve of streptozotocin-induced diabetic rats, Biochem. Soc. Transactions, 31, 1423-1425 (2003).
13
Reihl, O.; Biemel, K. M.; Lederer, M. O., and Schwack, W.: Pyridinium-carbaldehyde: active Maillard reaction
product from the reaction of hexoses with lysine residues, Carbohydrate Research 339, 705–714 (2004).

8
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O
NH2
6 H2N H
CH2OH O CH2OH OH OH OH
HO 1 HO ∗ N
HO ∗ H HO
CH=O (Lys) NH2 OH OH
OH OH OH ∗ O
- H2O HO
OH
D-Glicose Aldose
HO

NH
NH2
C NH2
NH2 H2N N Hε OH
N
H OH
N H 1 ∗ OH O
Aminoguanidine O
OH ∗ OH N O
N O
− 4H2O OH
O NH2 6
HO N NH2 H HO Didesoxiosona
L-Lisina Aminotriazina: N6-[4-(3-amino-1,2,4
-triazin-5-il)-2,3-di-hidroxibutil]-L-lisine
Ataque
− H2O intramolecular
do εN ao C6=O
N H NH2 O
N HO
HO N O HN NH OH 1
HO
N OH ∗ +
NH2 N
HO
NH2
NH2 Arginine (Arg) 6
O
Glicosepane L-Arginina OH
Aldimina
O

Figura 5 – Mecanismo de formação do glicosepane. Glicose marcada no C1 reage com lisina


presente nas proteínas formando o produto de Amadori. Após sucessivos deslocamentos do
grupo carbonila ao longo do esqueleto carbônico do açúcar, o intermediário α-dicarbonílico
didesoxiosona é formado. Sua existência é experimentalmente confirmada através da reação
com o reagente de captura aminoguanidina que produz a aminotriazina. O intermediário α-
dicarbonílico sofre ataque intramolecular do εN ao grupo carbonila em C6, dando a aldimina, um
precursor plausível para o agente de ligações cruzadas Lys-Arg, glicosepane (baseado em
Schwack, 2004).

O Oxigênio é um poderoso catalisador das reações de Maillard entre glicose e


proteína. Todos os PFGA conhecidos por se acumular na proteína dos tecidos
(pentosidina, CML, CMhL), requerem condições autoxidativas (oxigênio molecular e
catálise por íons de metais de transição) para sua formação a partir de glicose, nos
modelos estudados em laboratório. Na ausência do oxigênio o processo de formação
desses compostos é inibido, o mesmo ocorrendo em condições aeróbicas na
presença de agentes quelantes, redutores e bloqueadores de radicais livres
(antioxidantes). Por essa razão, esses produtos que requerem glicosilação e
oxidação na sua formação foram designados produtos da “glicoxidação”. A
glicoxidação é um complexo processo in vitro, envolvendo oxidação direta da glicose
(glicosilação autoxidativa) e autoxidação da base de Schiff e produtos de Amadori,

9
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

rotas conhecidas como Wolff, Namiki e Hodge. 14 Produtos da glicoxidação se


acumulam irreversivelmente das proteínas durante a reação de Maillard. 15

Uma constelação de fatores exerce seu comando no curso da reação, entre os


quais se incluem variada gama de compostos carbonílicos (açúcares redutores 16 ,
entre outros), amônia, grupos amina (presentes nos aminoácidos, peptídeos,
proteínas), pH, temperatura, umidade, íons de metais pesados, luz e sulfitos, para
citar os mais evidentes. 17

Na reação de Maillard, o grupo amina (–NH2) dos aminoácidos desaparece.


Quimicamente, esse grupo é o responsável pelas propriedades alcalinas dos
aminoácidos e de outras classes de compostos nitrogenados. Conseqüentemente, o
pH inicial do meio terá efeito decisivo no comportamento da reação de Maillard, pH-
dependente. O acastanhamento (browning) diminui quando o pH aumenta podendo-
se afirmar que essa reação é auto-inibitória à medida que o acastanhamento
progride, em razão do desaparecimento dos aminoácidos (deMan, 1999).

14
Na etapa inicial da reação de Maillard, glicose reage com uma amina para formar a base de Schiff, a qual se
rearranja para o produto de Amadori (ver Fig. 2). A base de Schiff é muito susceptível à oxidação e produção de
radicais livres, o que leva à formação de oxaldeidos, glioxal e metilglioxal, ou seja, a assim chamada rota de
Namiki da reação de Maillard. Esta forma da glicoxidação também pode provir da autoxidação da glicose
catalisada por metais, que leva à formação de glioxal e arabinose. D-glicosona se decompõe rapidamente em
ribulose e por isso não é observada in vivo. Nesse processo, H2O2 é liberado. Essa é a chamada rota de Wolff da
reação de Maillard e é um processo importante in vitro, observado durante incubação de longa duração de
proteínas com açúcares redutores em tampão fosfato. É atribuído à presença de íons dos sais de Cu2+ e Fe3+,
contaminantes de todos os tampões baseados em fosfato. Fonte: Monnier, Vincent M.: Intervention against the
Maillard reaction in vivo, Arch. Biochem. Bioph., 419 1–15 (2003). A rota de Hodge é a via clássica da reação de
Maillard, na qual a base de Schiff reversível e os produtos de Amadori se rearranjam gradualmente resultando
em modificações químicas permanentes em proteínas. Fonte: Metz, T. O.; Alderson, N. L.; Thorpe, S. R., and
Baynes, John W., Pyridoxamine, an inhibitor of advanced glycation and lipoxidation reactions: a novel therapy
for treatment of diabetic complications, Arch. Biochem. Biophys., 419, 41-49 (2003).
15
Litchfeld, John E.; Thorpea, Suzanne R., and Baynes, John W.: Oxygen is not required for the browning and
crosslinking of protein by pentoses: relevance to Maillard reactions in vivo, International J. Biochem. & Cell
Biol., 31 1297-1305 (1999)
16
Um açúcar redutor é capaz de reduzir determinados agentes oxidantes, dois dos quais são usados em métodos
analíticos. Um é o sulfato de cobre alcalino (CuSO4 em tartarato de sódio e potássio – solução de Fehling) ou
cloroamina-T (CH3C6H4SO2NClH). Um açúcar com um grupo aldeído, cetona, hemi-acetal ou um hemicetal é
um açúcar redutor. Sem um desses grupos, é um açúcar não-redutor.
17
Montgomery, M. W. and Day, E. A., J. Food Sci., 30, 828-832 (1965).

10
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

A complexa química por trás dessas transformações somente começou a ser


desvendada no início dos anos 50, quando Hodge 18 publicou o primeiro esquema
reacional compreensível da reação de Maillard. Uma das características da reação é
a sua difícil controlabilidade, em razão da miríade de produtos e intermediários.
Muitos desses produtos já foram caracterizados e o mecanismo de sua formação
compreendido.

Em termos nominais, a reação consiste numa condensação entre a função


carbonila (grupo ceto, >C=O) de um açúcar redutor 19 como a glicose e o grupo –NH2
(ou amônia, um aminoácido, peptídeo ou uma proteína) de uma amina biológica
(freqüentemente o grupo ε-amina da lisina de uma proteína é o mais reativo dos
aminoácidos que incluem no grupo além da lisina, a glicina, o triptofano e a
tirosina 20 ), formando um produto de condensação (imina ou base de Schiff, Fig. 6).
Uma série de reações tem lugar a seguir, incluindo ciclizações, desidratações, retro-
aldolizações, rearranjos, isomerizações e mais condensações culminando com a
formação de polímeros castanhos nitrogenados conhecidos como melanoidinas. 21

3 – Formação do N–Glicosídeo: Aldose/Cetose + Grupo amina

CH2 OH CH2 OH CH2 OH CH2 OH


OH O RCHNH2 CH2 R CH2 R
OH
O
OH OH OH OH OH NH OH OH N
H
HO H HO HO H - H2O HO
OH OH OH OH
D-Glucose Imina
(Base de Schiff)
CH2 OH H+
CH2 R CH2OH
O CH2OH CH2OH
OH NH CH2 R
HO O H
HO OH O
HO HO NH + HO
HO N HO
OH OH CH2 R
OH OH
D-Glicosamina NHCH2 R
(N-glicosídeo) α-anômero Íon imônio β-anômero

18
Hodge, J. E.: Chemistry of browning reactions in model systems J. Agric. Food Chem., 1, 928-943 (1953).
Agricultural and Food Chemistry, 1(15), 928–943.
19
Carboidrados não redutores tais como manitol, sacarose e trehalose não sofrem a reação de Maillard.
20
Ashoor, S. H. and Zent, J. B., J. Food Sci., 49, 1206-1207 (1984).
21
Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439
(1998)

11
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Figura 6 – Primeiras etapas da reação de Maillard: Um açúcar redutor (seu tautômero cíclico
está em equilíbrio com sua forma aldeídica, –CHO, mais reativa) e um aminoácido primário
reagem com perda de uma molécula de água para formar uma imina (base de Schiff) a qual
sofre ciclização dando a D-glicosamina. Os anômeros alfa e beta do N-glicosídeo existem no
equilíbrio (mutarrotação) 22 como resultado de uma isomerização por catálise ácida, via o íon
imônio.

4 – Rearranjo de Amadori 23
CH2OH CH2OH CH2OH
H OH Rearranjo H H
H OH OH Enolização
HO de Amadori HO HO
+ N N
HO N HO HO CH2R
CH2R CH2
OH CH2R
O H+ H O
H
Íon imônio 1,2-Enolamina 1-amino-1-desoxicetose:
Produto de Amadori
CH2OH CH2OH
H H CH2OH H
OH O2 OH O2
HO N HO N OH HO N CH2R
HO
CH2 CH2R CH2 CH2R
OH +
O O
OH OH O O

Enol α-Dicarbonila

Figura 7 – Ao invés de ciclizar, o íon imônio sob catálise alcalina, poderá sofrer o rearranjo de
Amadori, formando o produto de Amadori. Enolização e clivagem oxidativa da aminocetose
(ou produto de Amadori) formam vários produtos de pesos moleculares inferiores.

22
A D-Glicose em solução aquosa produz, por mutarrotação, uma mistura equilibrada de anômeros nas formas
α e β. A D-glicose de cadeia aberta está em equilíbrio com os dois hemiacetais cíclicos e duas formas
furanosídicas (ao todo, 4 tautômeros). Devido à reatividade química do grupo aldeído da forma aberta, a glicose
existe em solução aquosa nesta forma numa diminuta quantidade (0,0026%) que reage formando β−D-glicose a
qual existe no equilíbrio numa quantidade duas vezes maior (64%) que a α−D-glicose (36%). É a forma aberta
que reage com grupos amina de aminoácidos e proteínas presentes nos alimentos. Logo que o grupo aldeído
reage, o equilíbrio se desloca para formar mais D-glicose de cadeia aberta, que continua reagindo até o consumo
total dos reagentes. α−D-glicose e β−D-glicose como sólidos cristalinos possuem rotação especifica +112,2º e
+18,7º respectivamente e diferem entre si na solubilidade, forma cristalina, higroscopicidade e poder adoçante.
Quando dissolvidos em água a rotação especifica de ambos gradualmente se converte ao valor de +52,7º, que
corresponde à rotação especifica da mistura em equilíbrio. Essa mudança na rotação especifica é chamada de
mutarrotação. Fontes: Bruice, Paula Y., Organic Chemistry, 4th Ed. (2003).
CH2OH O CH2OH O
CH2OH OH
HO
H HO HO OH β (equatorial)
HO CH=O HO
OH HO OH OH
HO α (axial) A conformação da β-D-Glicose é mais estável
H
α-D-Glicose 0,0026% β-D-Glicose que a α-D-Glicose; há mais espaço para
(36%) (64%) substituintes em equatorial que em axial.
CH2OH Mutarrotação CH2OH Para surpresa geral, na formação da
HO C H O OH HO C H D-glicose a configuração que se forma
O preferencialmente é o α−Glicosídeo
OH OH (substituinte em axial: é o efeito anomérico.
Furanosideo
OH
CH2 OH O CH2 OH O
0,14% HO HO OCH2 CH3
OH OH HO
H
HO
OH OH
OCH2 CH3 H
Um α−Glicosídeo Um β−Glicosídeo
23
M. Amadori, Atti Accad. Nazl. Lincei, 2 (6), 337 (1925)

12
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O aparecimento do produto de Amadori (aminocetose, Fig. 7) introduz uma


nova variável na equação química. Por ser reativo o produto de Amadori reage com
vários dos diversos intermediários que se formam na cadeia de reações que tem
lugar a seguir e cada uma das novas moléculas formadas por sua vez se condensam
com outros compostos numa vasta rede de combinações, cada qual dependendo das
condições precisas encontradas no meio. Além do grande número de compostos de
baixo peso molecular já identificados em reações modelo, é evidente a formação de
material polimérico de alto peso molecular durante a fase final da reação de Maillard.
Tais compostos notoriamente difíceis de caracterizar, são conhecidos genericamente
sob a denominação de Melanoidinas. 24

A lisina envolvida nos estágios iniciais do processo de acastanhamento,


incluindo a base de Schiff, possui biodisponibilidade. Esses derivados iniciais são
hidrolisados no estômago em lisina e açúcar. Entretanto, para além do estágio da
cetosamina (produto de Amadori) ou aldosamina (produto de Heyns 25 ), a lisina não é
mais biodisponível, devido à baixa absorção desses derivados do estômago. Estudos
com misturas de glicose e aminoácidos mostraram que os produtos de Maillard de
lisina e cisteína são mutagênicos, enquanto aqueles do triptofano, tirosina, glutamina,
ácido aspártico e asparagina não o são. Note que os produtos da pirólise de
triptofano e glicose (na carne grelhada e assada) também são mutagênicos. Quando
proteínas são aquecidas acima de 200º, temperatura comum na superfície dos
alimentos assados e fritados, os resíduos de aminoácidos das proteínas sofrem
decomposição e pirólise. Muitos desses produtos da pirólise foram isolados e
identificados de carnes assadas e fritadas e possuem alta mutagenicidade, de
acordo com o teste de Ames. Os produtos com maior índice de carcinogenicidade-
mutagenicidade são formados pela pirólise do triptofano e do ácido glutâmico (Glu).
Compostos mutagênicos são produzidos na carne a temperaturas entre 190-200ºC,
sendo conhecidos como amino-imidazoazarenos (AIA). Uma importante classe de

24
Martins, Sara I. F. S.; Jongen, Wim M. F. and van Boekel, Martinus A. J. S.: A review of Maillard reaction in
food and implications to kinetic modelling, Trends in Food Science & Technology 11, 364-373 (2001)
25
Cetoses, como a frutose, reagem com amines para formar aldosaminas, isto é conhecido como a reação de
Heyns: [Heyns, K.; Stute, R., and Paulsen, H.: Braunungsreaktionen und Fragmentierungen von Kohlenhydraten.
Die flüchtigen Abbauprodukte der Pyrolyse von D-Glucose, C arbohydrate Res., 2, 13249 (1966)].

13
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

compostos mutagênicos é a das imidazo-quinolinas (IQ), produtos da condensação


de creatinina 26 com açúcares e certos aminoácidos, tais como glicina, tirosina,
alanina e lisina. Os três mais potentes mutágenos desta classe formados na carne e
no peixe assados são mostrados na Fig. 8 (Fennema, O. R., 1996).

NH2 NH2 NH2


N N N
N CH3 N CH3 H3C N N CH3

N N CH3 N CH3

3-methyl-3H-imidazo[4,5- 2-Amino-3,4-dimetil-3H-imidazo 3,4,8-trimethyl-3H-imidazo


f]quinolin-2-amine [4,5-f]quinolina (MeIQ) [4,5-f]quinoxalin-2-amine

Figura 8 – Compostos mutagênicos imidazo-quinolínicos presentes carne do peixe assado


(Fennema, O.R., 1996)

Dessas aminas heterocíclicas aromáticas (HAA, Heterocyclic Aromatic


Hydrocarbons) mutagênicas e carcinogênicas, o PhIP (2-Amino-1-metil-6-fenil-
imidazo[4,5-b]piridina, Fig. 9) é o representante mais importante sendo encontrado,
além da carne e peixe assados, também no condensado da fumaça do cigarro, do
escapamento dos automóveis, na cerveja e no vinho: 27

CH3
O O
HN Calor durante o N NH2
OH cozimento
+ N OH
N
NH2 H2N CH3
N

L-Fenilalanina (Phe) Creatinina PhIP: 2-Amino-1-metil-6-fenil-1H-


imidazo[4,5-b]piridina

Figura 9 – Estrutura química do PhIP, substancia carcinogênica encontrada em alimentos ricos


em proteína submetidos a altas temperaturas, mas também na fumaça do cigarro, na cerveja e

26
Nome químico: N-(Aminoiminomethyl)-N-methylglycine; fórmula molecular: C4H7N3O =113.1; CAS: 60-27-
5. Substância endógena encontrada principalmente nos músculos esqueletais dos vertebrados. Investiga-se seu
uso terapêutico no tratamento de um grupo de desordens degenerativas progressivas que afetam os neurônios
motores no cérebro e da medula espinhal (doença motora dos neurônios; exemplo: esclerose lateral amiotrófica
ou doença de Lou Gehrig), da distrofia muscular de Duchenne e da doença de Huntington (Martindale: The
Complete Drug Reference, 2007 The Pharmaceutical Press).
O
HN
N OH
H2 N CH3
Creatinina
27
Skog, K. I.; Johansson, M. A. E., and Jägerstad, M. I., Carcinogenic heterocyclic amines in model systems and
cooked foods: A review on formation, occurrence and intake, Food Chem. Toxicol., 36, 879-896 (1998).

14
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

no vinho. Seu principal precursor é a creatinina, aminoácidos livres e açúcares. Sua formação
aumenta com o aumento da temperatura e tempo de cozimento

As aminas heterocíclicas aromáticas devem ser ativadas metabolicamente


antes de se tornarem carcinogênicas. A ativação metabólica ocorre via o complexo
enzimático P450 no fígado, através de N-hidroxilação pela isoenzima específica
CYP1A2. O mesmo complexo enzimático P450 ativa os hidrocarbonetos policíclicos
aromáticos (PAH – policyclic aromatic hydrocarbons), antes que se tornem
carcinogênicos. 28,29 A ativação do PAH se dá no reticulo endoplasmático da célula e
é catalisada pelo sistema Citocromo-P450 ancorado na membrana. Isoenzimas
específicas co-atuam no processo. Um dos mais conhecidos PAH é o benzopireno –
Benzo[a]pireno, BaP. Sua ativação metabólica é mostrada na figura 10:

CYP450−Monooxi-
O
genase dependente

HO
Epoxi-
hidrolase OH (+)-BaP-7,8-diol−
9,10-epóxido−2
O
HO
(+)-BaP-7,8-Epóxido
OH O

CYP450−Monooxi- (-)-BaP-7,8− CYP450−Monooxi-


genase dependente diidrodiol genase dependente
HO
12 1
OH (−)-BaP-7,8-diol−
11 2
9,10-epóxido−1
10
3
9

8 4
7 6 5 O
CYP450−Monooxi-
Benzo[a]pireno, BaP genase dependente

CYP450−Monooxi- HO
genase dependente OH (+)-BaP-7,8-diol−
Epoxi- 9,10-epóxido−1
hidrolase

HO O
OH
(+)-BaP-7,8− CYP450−Monooxi-
O diidrodiol
(−)-BaP-7,8-Epóxido genase dependente HO
OH (−)-BaP-7,8-diol−
9,10-epóxido−2

Figura 10 – Mecanismo da ativação metabólica do Benzo[a]pireno (BaP). A distribuição dos


isômeros cancerígenos opticamente ativos é desigual, uma conseqüência das propriedades

28
Schut, H. A., J. and Snyderwine, E. G., DNA adducts of heterocyclic amine food mutagens: implications for
mutagenesis and carcinogenesis. Carcinogenesis, 20, 353-368 (1999).
29
Turesky, R. J.; Lang, N. P.; Butler, M. A.; Teitel, C. H., and Kadlubar, F. F.: Metabolic activation of
carcinogenic heterocyclic aromatic amines by human liver and colon, Carcinogenesis, 12, 1839-1845 (1991).

15
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

estereosseletivas do complexo Citocromo-P450-isoenzimas. As principais rotas de ativação do


BaP são as que formam (+)-BaP-7,8-diol-9,10-epóxido-2 e (+)-BaP-7,8-diol-9,10-epóxido-1. 30

Aminocetoses foram encontrados em alimentos aquecidos ou armazenados,


em frutas desidratadas, produtos lácteos em geral, legumes, molhos de soja.
Soluções contendo misturas de açúcar e aminoácidos usadas na alimentação
parenteral (autoclavadas ou estéreis) também contem aminocetoses. Esses
compostos são também encontrados no corpo humano e especialmente no diabético
eles se encontram em profusão. 31

Os mais importantes sintomas das reações de Maillard nos produtos da


industria alimentícia incluem a formação da cor e a descoloração, a formação do
aroma e o fedor, a produção de compostos com atividade anti-oxidante, a redução do
valor nutricional e a formação de compostos com potencial propriedades tóxicas. 32
Produtos da reação de Maillard, compostos de Amadori, α-dicarbonílicos, furanos,
pirralinas e melanoidinas estão presentes em alimentos assados como carnes e
peixes; panificação e pastelaria como torradas, cream-crackers e chips de batata e
artigos da luxúria, como açúcar, café, cerveja e molhos de tomate. 33

5 – Degradação de Strecker

A reação de Strecker se refere a reações entre compostos α-dicarbonílicos,


como a desoxiozona formada na reação de Maillard e aminas. Ocorre sob condições
drásticas, requerendo altas temperaturas ou pressão. Transaminação ocorre numa
das etapas da reação que produz aminocetonas, aldeídos e dióxido de carbono. O
aldeído formado, chamado aldeído de Strecker, produz odores fortes. Aldeídos de
Strecker mais comuns incluem o etanal, CH3CHO (aroma doce das frutas),

30
Rojas, M.; Cascorbi, I.; Alexandrov, K.; Kriek, E.; Auburtin, G.; Mayer, L.; Kopp-Schneider, A.; Roots, I. and
Bartsch, H.: Modulation of benzo[a]pyrene diolepoxide-DNA adduct levels in human white blood cells by
CYP1A1, GSTM1 and GSTT1 polymorphism. Carcinogenesis, 21, 35-41 (2000).
31
Ledl, F. und Schleicher, E., Angew. Chem.102, 597-626 (1990)
32
Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439
(1998)
33
Hayase, F.; Takahashi, Y.; Sasaki, S.; Shizuuchi, S., and Watanabe, H.: 3-Deoxyosone-related advanced
glycation end products in foods and biological systems, International Congress Series, 1245, 217–221 (2002)

16
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

metilpropanal, (CH3)2CHCHO (aroma de malte) e 2-feniletanal, PhCH2CHO (aromas


florais do mel).
Aldeídos voláteis que desempenham um importante papel no aroma do chá
preto, do cacao fermentado ou torrado, no buquet do vinho e do café é formado
parcialmente pela degradação de Strecker de aminoácidos. 34
CH2 OH
H
CH2 OH OH
H O CH2 OH HO N
OH OH H
N CH2 CH2R
HO
CH2 CH2R + R
OH HO
OH N
O N
CH2 CH2R - H2O
O O NH2
O N R H R
H COOH
α-Dicarbonila Aminoácido
COOH Base de Schiff
CH2OH CH2 OH
H H CH2 OH
OH OH H
HO N + H2O HO N OH O
CH2 CH2R CH2R N H R
CH2 HO CH2R R
N R H O: R CH2
HO 2 HO HN
O H NH2 + H O - CO2
O
O O
COOH
COOH α-Amino-cetona Aldeido de Strecker

Figura 11 – Mecanismo da degradação de Strecker.

CH2OH H CH2 OH
O H
OH OH
HO N
CH2 R + R
OH
HO N
CH2 R
- CO 2
O O NH2 O N R
α-Dicarbonila Aminoácido

CH2 OH CH2 OH O O H
H H CH2 OH
OH H2 O OH H
HO N HO N R H OH
HO N
CH2 R CH2 R + CH2 R
N N H O
HO H O NH2
O
H2O: Aldeido de
R R O Strecker Aminocetona:
Autocondensação
H
forma Pirazinas

Figura 12 – Degradação de Strecker de aminoácidos: O composto dicarbonílico reage com o


aminoácido com perda inicial de CO2, adição de água e desproporcionamento em aminocetona
e o aldeído de Strecker.

6 – Formação da Acrilamida via degradação de Strecker da Metionina

34
Flament, Ivon; Coffee Flavor Chemistry, John Wiley & Sons, Ltd., England (2002)

17
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

H3C S H2O:
H3C S
CH3 O O R1 N N
S
OH + O R1 H R1
OO - CO2
NH2 O R2 HO
H
R2 R2
Metionina α-Dicarbonila

H3C S H H3C S H2N


O R1

H2 O NH O + O
H R1 H R2
O Metional Aminocetona:
H R2 (Aldeido de Strecker) Autocondensação
forma Pirazinas

R1 R2
O NH3 O O + CH3SH + NH3 +
H2N HO H O O
Acrilamida Acroleina

Figura 13 – Degradação de Strecker de Metionina: 35 O mecanismo é semelhante ao anterior


para aminoácidos em geral, porém aqui se ilustra o caminho da degradação de Strecker
partindo da metionina ou da asparagina para a formação da acrilamida, produto neurotóxico e
também um agente suspeito de carcinogenicidade. 36

Há mais de 150 anos a batata frita constitui talvez o mais popular petisco do
mundo. Recentemente, pesquisadores da Swedish Food Safety Agency (órgão da
vigilância sanitária Sueca) anunciaram num relatório a presença da acrilamida (Fig.
13) em alimentos fritos e supercozidos, em especial a batata frita (níveis de 30-2300
μg/kg), tendo causado grande expectativa tanto entre cientistas da área de alimentos
quanto consumidores, em vista da acrilamida se encontrar na lista dos agentes
suspeitos de carcinogenicidade 37 . Além de causar câncer em animais, também
causa lesão ao Sistema Nervoso e afeta o sistema reprodutivo. Como a acrilamida
não foi detectada em alimentos cozidos na água, acredita-se que seu aparecimento
se deva às altas temperaturas da fritura a que são submetidos os alimentos,

35
Stadler, R. H., Blank, I.; Varga, N.; Robert, F.; Hau, J.; Guy, F. A.; Robert, M. C.; Riediker, S., Acrylamide
from Maillard reaction products, Nature 419, 449-450 (2002)
36
Dickson, S.; Heenam, M.; Caiens, S.; Sage, H.; Bergmak, E. 9th Annual Report on Carcinogens. TIAFT
Abstracts 035 (1999); Coughlin, L. 116th Annual International AOAC Meeting, Los Angeles, CA., USA (2002).
37
Tareke, E.; Rydberg, P.; Karlsson, P.; Eriksson, S. and Törnqvist, M.: Analysis of Acrylamide, a Carcinogen
Formed in Heated Foodstuffs, J. Agric Food Chem., 50, 4998 –5006 (2002).

18
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

disparando as reações não-enzimáticas 38 de Maillard responsáveis pelo atraente


“douramento” do produto mas também pela formação de substâncias tóxicas
oriundas da degradação térmica (pirólise). 39

Os pesquisadores ingleses Donald S. Mottram e Bronek L. Wedzicha 40 da The


University of Readings, UK e Richard H. Stadler 41 do Nestlé Research Center na
Suíça descobriram que o aquecimento da asparagina (Fig. 1) com a glicose a 185oC
produz quantidades significativas de acrilamida (Fig. 13).

Na tecnologia dos alimentos a reação de Maillard desempenha um papel


crucial no desenvolvimento do aroma, da cor, odor, textura e valor nutricional. 42 Por
milênios a reação tem sido usada para produzir alimentos com aparência, sabor e
aroma atrativos, desde que o homem passou a cozê-los. A moderna indústria
alimentícia se baseia na reação de Maillard para produzir alimentos que possuem a
cor, o odor e o sabor exigidos pelo consumidor. 43

Em processos tradicionais tais como a torrefação do café e do cacau, a


fabricação do pão e do bolo, o preparo das carnes, do churrasco, a reação de
Maillard controla uma rede complexa de transformações químicas que influem
diretamente no paladar, no aspecto, na digestibilidade, além de estar associada à
formação de compostos tóxicos, suspeitos de carcinogenicidade, como a acrilamida
mencionada anteriormente. 44 São conhecidos mais de 1000 compostos químicos

38
As assim chamadas reações de acastanhamento de Maillard, para diferenciá-la daquela catalisada por enzima
que freqüentemente acontece com notável rapidez em frutos e vegetais recentemente cortados, como maçãs e
batatas (fonte: Fennema, Owen R., 1996).
39
Pedreschi, F.; Kaack, K.; Granby., K., Lebensm.-Wiss. u.-Technol. April 2004 (in press)
40
Mottram, D. S.; Wedzicha, B. L.; Dodson, A. T., Acrylamide is formed in the Maillard reaction, Nature, 419,
448 (2002).
41
Stadler, R.H., Blank, I., Varga, N., Robert, F., Hau, J., Guy, P.A. , Robert, M-C, Riediker, S., Acrylamide from
Maillard reaction products, Nature, 419, 449-450 (2002).
42
Friedman, M.: Food browning and its prevention: an overview, J. Agric. Food Chem., 44, 631-653 (1996).
43
Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439
(1998)
44
Stadler, R. H.; Blank, I.; Varga, N.; Robert, F.; Hau, J.; Guy, P.A.; Robert, M-C.; Riediker, S., Acrylamide
from Maillard reaction products, Nature, 419, 449-450 (2002).

19
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

voláteis no café torrado. 45 Quase 350 compostos heterocíclicos, incluindo tiofenos,


tiazóis, pirróis, pirazinas e furanos foram identificados no aroma do café. 46

CH2 R CH2R CH2R

H N H N N
HO HO H OH
HO HO Ox
NH2 O N
OH OH OH N OH
OH - 2H2O OH
O H2N N HO N OH
CH2 OH CH2 OH
OH H2C OH H2C
N H N H OH H
CH2 R N
CH2 R
CH2R
α-Amino-cetonas Condensação Pirazina

Figura 14 – Autocondensação de duas aminocetonas formando derivados de pirazinas, que


também são compostos com grande poder sensório aromático. As pirazinas são geralmente
consideradas importantes componentes flavorizantes, ou seja, substâncias que conferem ou
que intensificam o sabor e o aroma dos alimentos.

Nos seres humanos a reação de Maillard contribui para o aumento da


fluorescência, da cor e das ligações cruzadas 47 das proteínas extracelulares durante
o envelhecimento normal. A aceleração destas reações tem implicações no
desenvolvimento de complicações diabéticas e em processos inflamatórios
relacionados a doenças degenerativas e aterosclerose. As reações de Maillard que
tem lugar espontaneamente no corpo (in vivo) chamadas coletivamente de
glicosilação protéica ocorrem numa velocidade menor em vista da menor
temperatura existente no corpo, mas seus produtos se acumulam durante o
envelhecimento afetando especialmente os tecidos que contem proteínas de vida
longa, como as lentes do cristalino (colágeno estrutural), colágeno da pele, artérias
(colágeno vascular, exemplo: endurecimento da aorta – aterosclerose – devido à
formação de produtos finais da glicosilação avançada, AGE, alguns dos quais

45
Yanagimoto, K., Lee, K.-G., Ochi, H., Shibamoto, T., International Congress Series 1245, 335–340 (2002)
46
Flament, I., Chevalier, C., Chem. Ind. 592-596 (1988).
47
Exemplo de ligações cruzadas entre compostos α-dicarbonílicos e o aminoácido das proteínas (Fennema, O.
R., 1996):
P-NH2 + OHC-CH2-CHO P-N=CH-CH2-CH=N-P
Proteina Malonaldeido Ligações cruzadas

20
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

enrijecem as fibras do colágeno 48 ), tendões, pulmões, cartilagem, membrana basal


(exemplo, perda da permeabilidade da membrana basal dos rins) e cérebro (doença
de Alzheimer 49 ). As reações são irreversíveis e alteram as funções das proteínas.
Essas alterações são responsáveis pelos fenômenos associados ao envelhecimento
do corpo, sendo as rugas o sintoma mais visível. 50

Um estudo apresentado no encontro anual da Diabetes Association de São


Francisco, Califórnia, mostrou que a ingestão de alimentos escuros pode causar
ataque cardíaco, derrame cerebral e dano nervoso. Há anos se sabe que aquecer
proteínas com açúcar na ausência de água forma os produtos da glicosilação
avançada (AGE) que podem causar danos aos tecidos do corpo. O diabético sofre de
alta incidência de danos arterial, nervoso e renal porque os altos níveis de açúcar no
sangue aceleram as reações químicas de Maillard que formam esses produtos. Ao
contrário, o cozimento dos alimentos na água impede que o açúcar se ligue às
proteínas. 51
Entre os numerosos produtos finais da glicosilação avançada (PFGA)
descritos, o que se acha melhor caracterizado é o CML (Nε-Carboximetil lisina)
cujos níveis são usualmente mais elevados que os demais.

A modificação do colágeno das cartilagens pelos produtos finais da


glicosilação avançada como o CEL (Nε-Carboxietil lisina), o CML (Nε-Carboximetil
lisina) e a pensosidina (Fig. 4) foi apontada como responsável pela rigidez das
articulações com a idade avançada, a qual, juntamente com esses produtos,
representam um mecanismo molecular aceitável para o desenvolvimento da

48
Slatter, David A.; Avery, N. C., and Bailey, A. J.: Collagen in its fibrillar state is protected from glycation, Int
J. Biochem. Cell Biol., 40, 2253-2263 (2008).
49
Nagaraj, Ram H.; Sarkar, P.; Mally, A.; Biemel, K. M.; Lederer, M. O., and Padayattia, P. S.: Effect of
pyridoxamine on chemical modification of proteins by carbonyls in diabetic rats: characterization of a major
product from the reaction of pyridoxamine and methylglyoxal, Arch. Biochem.Biophys., 402 110–119 (2002).
50
Daniel, S.; Reto, M. and Fred, Z., Cosmetics and Toiletries Manufacture Worldwide, 118-124 (2002)
51
Vlassara, H., Picower Institute for Medical Research in Manhasset, N.Y. Annual Meeting of the American
Diabetes Association, San Francisco, June, 1996. (http://www.drmirkin.com/archive/6847.html ADVANCED
GLYCATION END PRODUCTS)

21
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

osteoartrite. 52 Carboximetil-lisina é o principal produto final da glicosilação avançada


(AGE) no colágeno e na lente do cristalino humano. 53

Um mecanismo global para a formação dos produtos finais da glicosilação


avançada (PFGA), é mostrado na figura 15. 54

No diabetes mellitus, os elevados níveis de glicose resultam numa taxa de


produção do sorbitol em velocidade mais rápida que a sua oxidação a frutose e o
acúmulo de sorbitol nos vasos sanguíneos, nervos, lente do cristalino, retina e rins
podem causar um efeito hiperosmótico, levando a alterações na permeabilidade das
membranas e ao estabelecimento de patologia celular (ver fig. 8). A hiperglicemia
prolongada resulta na formação dos AGEs nos tecidos do corpo. As complexas
moléculas fluorescentes de AGEs formadas durante a reação de Maillard podem
levar a ligações cruzadas entre proteínas e contribuir para a progressão de sérias
complicações diabéticas, tais como a neuropatia periférica, catarata, dificuldade de
sarar as feridas, dano vascular e endurecimento da parede arterial. 55

52
Verzijl, N., Degroot, J., Oldehinkel, E., Bank, R. A., Thorpe, S. R., Baynes, J. W., Bayliss, M. T., Bijlsma, J.
W. J., Lafeber, F. P. J. G. and Tekoppele, J. M., Age-related accumulation of Maillard reaction products in
human articular cartilage collagen, Biochem. J., 350, 381-387 (2000).
53
Monnier, V. M., Sell, D. R., Wu, X., and Rutter, K.: The prospects of health and longevity from the inhibition
of the Maillard reaction in vivo, International Congress Series, 1245, 9-19 (2002).
54
Takeuchi, M., Watai, Sasaki, N., Choei, H., Iwaki, M., Ashizawa, T., Inagaki, Y., Yamagishi, S.-I., Kikuchi,
S., Riederer, P., Saito, T., Bucala, R., and Kameda Y., J. Neuropathology and Experimental Neurology: 62, 486–
496 (2003).
55
Wirasathiena, L.; Pengsuparpa, T.; Suttisria, R.; Uedab, H.; Moriyasub, M., and Kawanishib, K.: Inhibitors of
aldose reductase and advanced glycation end-products formation from the leaves of Stelechocarpus cauliflorus
R.E. Fr., Phytomedicine, 14, 546–550 (2007); Kador, P. F.; Kinoshita, J. H., and Sharpless, N. E.: Aldose
reductase inhibitors: a potential new class of agents for the pharmacological control of certain diabetic
complications. J. Med. Chem., 28, 841–849 (1985); Wautier, J. L., and Guillausseau, P. J.: Advanced glycation
end products, their receptors and diabetic angiopathy, Diabetes Metab., 27, 535–542 (2001); Aronson, D.: Cross-
linking of glycated collagen in the pathogenesis of arterial and myocardial stiffening of aging and diabetes, J.
Hypertens., 21, 3–12 (2003);

22
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

H N P P NH2
NH2
P C AGE5
H O C
C H O
Glioxal CML
C monoalquilimina
H O
Glioxal
P NH2
D-Glicose
HC N P AGE3
[O] AR
CH2OH
Glicolaldeido Sorbitol
alquilimina
H O [O] H N P
P SHD
C C CH2 NH P

H C OH H C OH C O P NH2 Frutose
HO C H P NH2 HO C H HO C H AGE1
3-PK
H C OH H C OH H C OH

H C OH H C OH H C OH Frutose-3-fosfato
CH2OH CH2OH CH2OH
Imina Produto de
D-Glicose (Base de Schiff) Amadori

Glicólise AGE2
H O
C
H O H O H O
C C C O
C P NH2
CH2OH O- CH2OH CH2OH HO C H AGE6
CH2 O P O CH2 OH H C OH
CH3
O- H C OH
Gliceraldeido Gliceraldeido Metil Glioxal
3-fosfato CH2OH
GO-I
3-Desoxi
P

glucosona ALR CH2 OH


GO-II NH2
MOG AR C O
O- O
C
AGE4 HO C H

CH2OH CH2 OH CH2 OH H C OH


AR
CH3 CH2OH C O H C OH
CEL
D-Lactato CH3 CH3 CH2OH
1,2-Propano Acetol 3-Desoxi
diol frutose

Figura 15 Rotas alternativas para a formação de AGEs imunologicamente distintos in vivo. Os


produtos finais da glicosilação avançada (PFGA) se originam da decomposição dos produtos
de Amadori (AGE-1), glicogenólise do intermediário gliceraldeido (AGE-2), fragmentação da
base de Schiff do glicolaldeido (AGE-3), fragmentação da triose-fosfato e do produto de
Amadori metilglioxal (AGE-4), auto-oxidação da glicose a glioxal (AGE-5) e decomposição dos
produtos de Amadori e frutose-3-fosfato a 3-Desoxi glicosona (AGE-6). CML, Nε-carboximetill-
lisine; CEL, Nε- (carboxetil-lysine; H2N-P, resíduo livre do aminoácido da proteína. AR, aldose
redutase; SDH, sorbitol desidrogenase; 3-PK, frutose-3-fosfoquinase; ALR, aldeido redutase;
GO, glioxalase; MOG, mono-oxigenase (Baseado no trabalho de Takeuchi, M e al., 2003)

23
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

7 – Fluxograma da reação de Maillard

O mecanismo da reação de Maillard mostrado esquematicamente na figura


16, é geralmente dividido em três estágios para melhor compreensão: Inicial,
avançado e final. 56

Grupo Fig. 1
Aldose Glicosamina
-CHO + Amina, NH2 N-Substituida + H2O
A
B
Rearranjo de Amadori
Fig. 2
1-amino-1-desoxicetose
(Produto de Amadori)
-3H2O
C C -2H2O D
Base de Schiff de
hidroximetilfurfural
Açúcar Produtos de fissão (acetol, diacetil, piruvaldeidos, etc)
ou furfural
+ Aminoácidos
-H
Redutonas Desidro-redutonas E - CO2
- Substrato (Degradação
aminado +H de Strecker) Fig. 3 a 6
+ H2O E
F Aldeidos
F
F
Hidroximetilfurfural F Aldois e polímeros
ou furfural não nitrogenados G G

G + Compostos G + Compostos
aminados
G + Compostos + Compostos + Compostos
aminados aminados aminados aminados

Melanoidinas - Polímeros castanhos nitrogenadas e co-polímeros

Figura 16 – Esquema da complexa rede de transformações químicas envolvidas na reação de


Maillard (baseado no trabalho de Hodge, Ref. 7).

A – Fase Inicial
O estágio inicial envolve a condensação amino-açúcar e o rearranjo de Amadori. Os
compostos de Amadori não alteram nem a cor nem a fluorescência e tampouco a
absorbância no U.V. próximo. Com o aquecimento prolongado, os produtos de
Amadori sofrem desidratação e fissão dando redutonas incolores (Fig. 17) e

56
Mauron, J.: The Maillard Reaction in Food – a Critical Review from the Nutritional Standpoint, Prog. Food
Nutr. Sci., 5, 5-35 (1981); Morales, J. F., and van Boekel, M. A. J. S.: A study on advanced Maillard reaction in
heated casein/sugar solutions: Fluorescence accumulation, Int. Dairy Journal 7, 675-683 (1997).

24
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

substâncias fluorescentes, algumas das quais coloridas (Hodge). Compostos


carbonílicos insaturados aumentam sua concentração nesta fase. Aldeídos formados
pela degradação de Strecker é uma fonte adicional do acastanhamento em vista de
sua reatividade, sofrendo autocondensação, reagindo com açúcares, com furfural e
com outros produtos dando pigmentos castanhos. Principais reações:
Condensações, enolização e rearranjo de Amadori. O rearranjo de Amadori é
considerado etapa chave na formação dos principais intermediários que tomarão
parte nas reações de formação dos produtos castanhos (browning reactions). Glicose
e grupos amina livres se combinam com proteínas numa proporção 1:1 (produto
incolor).

R1 R1
NH NH
CH3 CH3
CH2 O CH2 OH O O
C Ceto - C C C
enolização Ceto -
H C OH C OH C O enolização C OH
- R-NH2
H C OH H C OH H C OH C OH

R2 R2 R2 R2

1-amino-1-desoxi-2-cetose
(Rearranjo de Amadori) 2,3-enodiol Desidroredutona Redutona

OH
H O
CH2 OH H C H C
R-NH2 OH
C O C H C NH R1
NH R1
H C OH - H2O H C OH
H C OH

R1 R1 R1
2-Amino-2-desoxi-1-aldose
(Intermediário de Heynes)

Figura 17 – Reações de Maillard da fase inicial.

B – Fase Intermediária

O estágio avançado (intermediário) da reação de Maillard nos alimentos e nas


reações modelo proteína-açúcar a formação de pigmentos é monitorada pela de
absorção a 420 nm após digestão enzimática e extração com água. Principais
reações desta fase: Desidratação e fragmentação (do açúcar a 3-desoxiglicosona e

25
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

seus 3- e 4-enos derivados, Hidroximetil furfural (HMF), formação de compostos α-


dicarbonílicos, chamadas de redutonas – substancias com propriedades redutoras),
degradação de aminoácidos via reação de Strecker, ciclizações, retro-aldolizações,
rearranjos, isomerizações e mais subseqüentes condensações conduzem esta fase à
etapa final, com o aparecimento dos produtos escuros, castanhos (melanoidinas). O
teste de Élson-Morgan para amino-açúcar é positivo nesta fase.

OH OH - OH
H H HO
OH Enolização OH condições OH
HO N HO N alcalinas HO
HO HO N
CH2R CH2R - CH2R H O
H OH HO O 2
H O H H H H
1-amino-1-desoxicetose: 1, 2-Enolamina 2,3-Enolamina
Produto de Amadori
OH OH OH OH
Eliminação do H
OH H grupo amina OH OH O
HO HO HO
N H −H2O −H2O
CH2R CHO CHO CH=O
H O H
O
O H H O H
O
3-Desoxihexulose α-dicarbonílico
OH OH
O O
HOCH2 CHO
O
CH=O −H2O CH=O
H OH Hidroximetil-Furfural

Fig. 18 – Mecanismo de formação do hidroximetil-furfural (HMF) do estágio avançado


intermediário. Note a presença da 3-desoxihexulose (3-desoxiglicosone), importante
precursor de 2-furaldeidos.

C – Fase final

Grande parte da cor (vermelho castanho e marron escuro) é formada nessa


fase. A cor aparece devido à formação de compostos poliméricos de alto peso
molecular (>12.000 Daltons), conhecidos como melanoidinas. A cor observada é o
resultado de elevada concentração de espécies ativas no UV. Nela se formam os
produtos poliméricos, as Melanoidinas. Principais reações: condensações aldólicas,
polimerizações, degradação de Strecker de alfa-aminoácidos a aldeídos e N-
heterociclos a elevadas temperaturas. Evolução de gás carbônico é um indicativo
desta fase final. Aqui aparecem os aromas da torração em geral. Melanoidinas
coloidais e insolúveis se formam.

26
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Em termos práticos, a reação de Maillard in vivo pode ser dividida em três


compartimentos cinéticos, consistindo de “stressores”, isto é, fontes de agentes
carbonílicos que podem dar início à reação, “propagadores”, entidades carbonílicas
reativas provenientes dos “stressores” precedentes e “produtos finais” que sinaliza o
processo do envelhecimento molecular resultante da reação de Maillard. Essa visão
geral facilita a concepção de estratégias para interferir contra a reação de Maillard, 57
abordadas na seção 13, inibidores da reação de Maillard. A figura 19 dá uma tomada
panorâmica do processo inteiro:

Stressores Propagadores Produtos finais


Amino-acetona CEL, MOLD
Treonina
MG-Hidroimidazolona
Metilglioxal Tetraidropirimidina
Frutose 3-P Argpirimidina
Glicólise MODIC

Glicosona DOGDIC
1-Desoxiglicosona
Lisina
DOLD
Ox. 3-Desoxiglicosona
Glicose Base de 1,4-Didesoxi-5,6-
Amadori Glicosepan
Schiff dioxoglicosona
O2 / Mn+ Nimiki Ox.
Wolff Pentosidina
Ox.

Ox.
Fragmentação CML, GOLA
Lipideos
Glioxal / GOLD, GALA
Glicolaldeido
Ox. G-Hidroimidazolona
Inflamação GODIC
Modificação da lisina
Legenda Modificação da arginina
Lisina - arginina

Figura 19 – Rotas químicas selecionadas e produtos finais da glicosilação avançada de


relevância para a reação de Maillard in vivo. CEL, carboxietil-lisina; MOLD: dímero
metilglioxal-lisine; MG, metilglioxal; MODIC: derivado metilglioxal imidazolina agente de
ligação cruzada (cross-link); DOGDIC: derivado 3-desoxiglicosona imidazolina agente de
ligação cruzada; DOLD: dímero 3-desoxiglicosona lisina (lisil-lisina); CML: carboximetil-
lisina; GOLA: bis-Lisinamidas (glioxal lisinamida); GOLD: dímero glioxal lisina; GALA:
ácido glioxílico lisinamida; G: glioxal; GODIC: derivado glioxal imidazolina agente de
ligação cruzada (Monnier, 2003).

8 – Melanoidinas de Maillard e Substâncias Húmicas

57
Monnier, Vincent M.: Intervention against the Maillard reaction in vivo, Arch. Biochem. Bioph., 419 1–15
(2003).

27
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Os processos degradativos “espontâneos” que ocorrem na natureza


provavelmente seguem uma rota semelhante à reação de Maillard. De fato, alguns
autores encontraram notável semelhança entre as melanoidinas de Maillard e
substâncias húmicas obtidas por síntese entre carboidratos e aminoácidos. 58
Genericamente, substâncias húmicas (ácido húmico, ácido fúlvico, humina) são
biopolímeros que se formam durante a degradação de material biológico e são
constituintes essenciais para a agricultura.

Pouquíssimos autores se aventuraram em propor uma estrutura química para


os ácidos húmicos. De fato, uma estrutura definitiva ainda não existe, havendo
apenas blocos estruturais que nos ajudam a compreender suas propriedades físicas
(Fig. 20-23).
O
O N
OH
CHO
N NH2 COOH
OH
COOH O CH3
NH2
Lisinopirralina Maltosina Maltol

O-Gal O-Gal
O-Gal O O-Gal
O

OH CH3
CH3 COCH3
O O OH O
CH3 OH
OH OH

β-Piranona 3-Furanona Ciclopentenona Galactosil-Isomaltol


O-Gal
N H NH2

N
COCH3 NH COOH
N N+ N
2 NH2
H

COOH COOH

Acetilpirrol Pentosidina

Figura 20 – AGE (Advanced Glycation End) produtos finais da glicosilação avançada (PFGA)
na reação de Maillard encontrados no leite aquecido (perda de Lisina e lactose – dissacarídeo
de glicose e galactose – e da proteína caseína. No estágio final no qual as Melanoidinas
(pigmentos castanhos) são formados e onde ocorre a polimerização das proteínas, o
mecanismo é ainda em parte obscuro. 59

58
Benzing-Purdie, L.; Ripmeester, J. A.; Preston, C. M. J.: Elucidation of the nitrogen forms in melanoidins and
humic acid by nitrogen-15 cross polarization-magic angle spinning nuclear magnetic resonance spectroscopy,
Agric. Food Chem., 31, 91 (1983).
59
Van Boekel, M. A. J. S., Effect of heating on Maillard reactions in milk, Food Chemistry, 62, 403-414 (1998).

28
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

COOH
COOH

HO

H O
H O
O
O
OH
HO O
OH
HO
O OH
O
O
O
HOOC R H N
COOH COOH O
O
HO N O NH2

HN
O
HO O O
OH OH O R

Figura 21 – Modelo estrutural hipotético do ácido húmico de Stevenson (1982). 60 Os ácidos


húmicos são complexas macromoléculas que incorporam aminoácidos, peptídeos, amino-
açúcares e grupos alifáticos nos anéis aromáticos, os quais exibem vários padrões de
oxigenação na forma de quinonas, fenóis e ácidos carboxílicos quelados ou livres.

OH
OH COOH
HOOC
COOH
O CH3
HOOC OH
COOHOH
COOH
O

Figura 22 – Modelo estrutural hipotético de Buffle do ácido fúlvico, contendo tanto estruturas
aromáticas quanto alifáticas. O húmus do solo das florestas é caracterizado por um elevado
conteúdo de ácidos fúlvicos enquanto no solo de turfas e de gramíneas é marcante a presença
de elevada teor de ácidos húmicos (baseado do trabalho de Weber, ref. 33).

Ácidos húmicos foram identificados no trato gastro-intestinal de humanos e


animais, na circulação sanguínea e no condensado da fumaça do cigarro. Crê-se que
o ácido húmico exista nos pulmões do fumante de cigarros devido à combustão
incompleta do tabaco. 61

60
Weber, Jerzy, “Properties of humic substances”, Agricultural University of Wroclaw, Institute of Soil Science
and Agricultural Environment Protection, Grunwaldzka, 53, 50-357 Wroclaw, Poland.
<http://www.ar.wroc.pl/~weber/humic.htm#start>. Online. June 9, 2004
61
Paciolla, M. D.; Davies, G., and Jansen, S., Environ. Sci. Technol., 33, 1814-1818 (1999)

29
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

OH
HO
OH O
O O OH
O
COOH
O
HO COOH
CH3 OH
HO
HO COOH HOOC COOH
OH OH
OH
HO CH3
O COOH
O
HO
HO COOH H OH
COOH O H O
MeO O

O COOH
H2N O
OH
HO
HOOC COOH
OH

Figura 23 – Fragmentos modulares de ácido húmico (Paciolla, 1999).

As melanoidinas são substâncias escuras, amarronzadas, de estrutura


química polimérica, alto peso molecular (>12.000 Daltons) e de difícil caracterização
química. Numerosas tentativas foram empreendidas para isolar e purificar
melanoidinas de alimentos como café, cerveja preta e molhos de soja. Identificação
de estruturas coloridas, após cuidadosa hidrólise do esqueleto protéico fornece
informação química útil sobre os grupos cromóforos responsáveis pela cor. A
estrutura química de uma melanoidina chamada pronil-L-lisina (Fig. 24) foi
identificada como um antioxidante, formado durante o tratamento térmico de misturas
em reações do tipo Maillard. Essa espécie química resulta da reação entre a cadeia
lateral da lisina e acetilformoina (CH3COCH(OH)COCOCH3), tendo sido detectado e
quantificado na crosta e no miolo do pão por HRGC–MS (High-Resolution Gas
Chromatography–Mass Spectrometry, cromatografia gasosa de alta resolução
acoplada à um espectrômetro de Massa), no modo de ionização química. Foi
confirmado que pronil-L-lisina modula uma enzima quimiopreventiva da fase II, a
glutation S–transferase (GST). A indução dessa enzima pela pronil-L-lisina
representa uma estratégia promissora na prevenção ao câncer. Recentemente,

30
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Melanoidinas do pão e café foram descritas como ingredientes potenciais prebióticos


(Castillo, 2006).
HO O HO O

H3C OH H3C OH
N NH2 N
CH3 CH3

HO OH
CH3 O R H O H O H O H O
N N N N
N N N N N
HO
R H O R H O R H O R H O R
CH3

Figura 24 – Pronil L-Lisina ancorado em proteína.

A formação das melanoidinas, de um ponto tecnológico, é essencial ao sabor,


cor e textura dos alimentos. Vários estudos demonstraram a alta capacidade
antioxidante das melanoidinas, que contribuem substancialmente para a vida de
prateleira (validade) dos produtos alimentícios termicamente tratados e de processos
fisiológicos in vivo. As propriedades antioxidantes das melanoidinas foram
demonstradas através de um mecanismo de quebra da cadeia, captura de oxigênio e
quelação de metais sem mostrar efeitos citotóxicos. Atualmente se supõe que as
melanoidinas presentes, por exemplo, no café ajam como antioxidantes mas também
na ativação quimiopreventiva de enzimas. Ademais, vários compostos de Maillard
identificados como constituintes de melanoidinas inibem o crescimento de células
tumorais (Castillo, 2006).

9 – Reação intrínseca de Maillard em produtos farmacêuticos

A reação de Maillard é de importância crucial na industria farmacêutica, visto


que muitos medicamentos contem o grupo amina na sua estrutura química.
Um exemplo disto é o largo empregado da lactose, um açúcar redutor, como
excipiente ou diluente em formulações farmacêuticas de cápsulas e tabletes que
freqüentemente incluem compostos contendo o grupo amina, devido ao baixo preço
e às suas características físico-químicas (alta pureza, excelente compressibilidade e
estabilidade).

31
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

A primeira dificuldade nesta área é a produção de cápsulas transparentes


devido à reação intrínseca de Maillard na gelatina, de origem animal (bovino, suíno).
A sensibilidade térmica e a umidade de cápsulas estruturadas em gelatina é uma
questão que complica o seu uso em regiões quentes e úmidas, necessitando de
embalagem especial e armazenamento que assegure a estabilidade do produto.
Gelatinas tendem a formar ligações cruzadas quando em contato com aldeídos,
62, 63
acarretando problemas de solubilidade.

No encapsulamento da vitamina C (ácido ascórbico, 64 um açúcar da série L), o


aparecimento freqüente de cor indesejável se deve à reação de Maillard com grupo
funcional amina (–NH2) do material.

Um estudo recente sobre a cinética da reação de Maillard entre o fármaco


metoclopramida 65 (um anti-emético) e a lactose no estado sólido revelou que a
reação é controlada pela mobilidade molecular. A reação é de segunda-ordem
apenas quando a proporção açúcar-amina é unitária (1:1), sendo uma cinética de
ordem-zero o fenômeno mais comum. Em solução, ela é de primeira ou segunda
ordem, dependendo da proporção dos reagentes, isto é, da amina e do açúcar. 66 A
natureza bimolecular da reação de Maillard no estado sólido é um importante
fenômeno que pode ser analiticamente acompanhado pelo desaparecimento do
fármaco, cuja conseqüência primária é a validade do produto (Fig. 25).

62
Babel, W., Pharmaceut. Manuf. Packing Sourcer, 6, 63–66 (2000).
63
Reich, G., Formulation and physical properties of soft capsules, Chapter 11, pp. 201-212, in: Pharmaceutical
Capsules, 2nd Edition (Editors: Fridrun Podczeck and Brian E. Jones), Pharmaceutical Press, London/Chicago
2004.
64
As funções bioquímicas precisas do ácido ascórbico ainda não estão bem definidas e na maioria dos animais
não é uma vitamina. Especificamente, o ascorbato reage com metaloenzimas, reduzindo o metal ativo, além disso
captura radicais livres na fase aquosa de plasma e células (Abraham, Donald J., Burger's Medicinal Chemistry &
Drug Discovery, v.4. 6th Ed., Autocoids, Diagnostics, and Drugs from New Biology (1998), John Wiley and
Sons, Inc.).
65
Nome químico: 4-Amino-5-chloro-N-(2-diethylaminoethyl)-2-methoxybenzamide; fórmula molecular:
C14H22ClN3O2 = 299.8; cloridrato mono-hidratado: C14H22ClN3O2,HCl, H2O = 354.3; CAS: 364-62-5.
66
Q., Zhihui; Stowell, J. G.; Morris, Kenneth R.; Byrn, Stephen R.; and Pinal, Rodolfo, Kinetic study of the
Maillard reaction between metoclopramide hydrochloride and lactose, Int. J. of Pharmaceutics, 303, 20-30
(2005)

32
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

OH N HO
OH Cl
O OH
OH HO N
+ HN O
O HCl
O O OH NH
OCH3 HO O OH N
OH
OH HO OCH3 O
HO OH
Cl
OH
NH2 HCl Base de Schiff
L-Lactose Metoclopramida HCl

HO
OH H Cl
HO N
O HCl
NH
HO O O N
OH HO OCH3 O

Cetosamina
(produto de Amadori)

Figura 25 – Reação de Maillard entre Metoclopramida e L-lactose

Outro estudo 67 realizado com o fármaco Fluoxetine 68 (princípio ativo do


Prozac, usado no tratamento da depressão) mostra que essa amina secundária
exibe o mesmo comportamento químico que a amina primária metoclopramida 69 ,
mencionada anteriormente, reagindo com o excipiente lactose usado em sua
formulação (Fig. 26).

OH
H CH3
O OH N HO
OH OH CH3

O O OH HO N O
O
OH Ph O
+ Ph
HO OH HO O O CF 3

OH OH OH

CF 3
Cetosamina
L-Lactose Floxetine HCl (produto de Amadori)

Figura 26 – Reação de Maillard entre Fluoxetine e L-lactose

67
Wirth, David D.; Baertschi, Steven W.; Johnson, Ross A.; Maple, Steven R.; Miller, Marybeth S.; Hallenbeck,
Diana, K.; and Gregg, Stephen M., Maillard Reaction of Lactose and Fluoxetine Hydrochloride, a Secondary
Amine, J. Pharm. Sci., 87 (1), 31 -39, 1998.
68
Nome químico: (±)-N-Methyl-3-phenyl-3-(α,α,α-trifluoro-p-tolyloxy)propylamine hydrochloride; fórmula
molecular: C17H18F3NO,HCl = 345.8; CAS: 54910-89-3 (fluoxetine); 59333-67-4 (fluoxetine hydrochloride)
69
Nome químico: 4-Amino-5-chloro-N-(2-diethylaminoethyl)-2-methoxybenzamide; fórmula Molecular:
C14H22ClN3O2 = 299.8; CAS: 364-62-5.

33
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

10 – Reação de Maillard no leite e derivados

O carboidrato característico do leite 70 é a lactose, único açúcar presente no


leite de todas as espécies de mamíferos que o produzem, não ocorrendo em outro
lugar, com raras exceções. O nome sistemático da α−Lactose (Fig. 27) é: O-β-D-
galactopiranosil-(1→4)-α-D-glicopiranose e da β−Lactose: O-β-D-galactopiranosil-
(1→4)- β-D-glicopiranose). A forma α da lactose existe tanto no estado anidro
(C12H22O11 = 342.3) como no mono-hidratado (C12H22O11,H2O = 360.3) enquanto a
forma β existe apenas no estado anidro. 71 No leite em pó a lactose é o constituinte
principal representando cerca de 50% dos sólidos totais. No leite de vaca in natura o
conteúdo em lactose se situa na faixa dos 5% enquanto no dos humanos é de cerca
de 7%. 72 Devido à instabilidade do carbono anomérico C1 a configuração ali varia
(mutarrotação) entre α e β na lactose em solução (ver explicações na nota 22).
β
Ligação β−1,4-glicosídica α Ligação β−1,4-glicosídica
HO H HO OH OH
OH O
OH O OH
2 1 O 2 1
O
HO O OH OH HO O OH H
3 1 4 3
1 4
OH OH HO
HO
β-D-Galactose α-D-Glicose β-D-Galactose β-D-Glicose
α-Lactose β-Lactose
O-β−Galactopiranosil-(1 4)-α-D-Glicopiranose O-β−Galactopiranosil-(1 4)-β-D-Glicopiranose

β (1 4) β (1 4)
O O O OOH
Carbono β
O O
α anomérico
OH
Galactose Glicose Galactose Glicose

Figura 27 – Estrutura conformacional da α− e β−lactose

70
O leite de vaca contém traços de outros oligossacarídeos, formados de 2, 3 ou 4 unidades de lactose, glicose,
galactose, ácido neuramínico, manose e acetil glicosamina (deMan, John M., 1999). O leite humano contém cerca
de 0,3–0,6% de oligossacarídeos que contem o dissacarídeo lactose na sua estrutura química, alguns dos quais
são importantes fontes de energia para o crescimento de uma variedade específica do Lactobacillus bifidus,
microrganismo predominante da flora intestinal dos recém-nascidos na fase da amamentação – fator Bifidus. A
utilização da lactose como fonte de energia deve ser precedida de sua hidrólise nos constituintes monossacarídeos
D-glicose e D-galactose (Fennema, Owen R., 1996).
71
Sweetman, S. C. (Ed), Martindale: The Complete Drug Reference, London: Pharmaceutical Press (2007).
72
deMan, John M., Principles of Food Chemistry, 3rd Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999).

34
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

No leite a lactose (um dissacarídeo de galactose e glicose, ligados através de


uma ligação β-1,4 glicosídica) reage com o aminoácido lisina da caseína durante o
processamento e o armazenamento, dando, na sua fase inicial, o produto do
rearranjo de Amadori (lactulosilisina, Fig. 28), cuja degradação leva à formação de
todos os produtos avançados da reação de Maillard, tais como lisilpirralina,
pentosidina, 73 hidroximetilfurfural, metilfurfural, furfural, maltol e ácido fórmico (Fig.
30). A fase avançada da reação de Maillard dá lugar ao estágio final no qual se
formam os pigmentos marrons – as melanoidinas (Van Boekel, 1998). Nessa fase, de
grande complexidade química, ocorrem reações de polimerização das proteínas,
dando produtos de pesos moleculares da ordem de milhares de Daltons.

O
HO OH OH HO OH
HO O OH OH H2N α
O O CH=O OH
HO O OHH HO O OH ω
NH2
OH HO OH HO
Lisina (livre ou
α-Lactose ligada à proteina) NH
NH2 2
H
OH H OH
HO OH N HO OH OH OH N+
OH OH H
O O O O
HO O OH OH HO O
-H2O OH
OH HO OH HO
Base de Schiff
(sofre o rearranjo de Amadori)
NH2
H OH HO OH OH NH2
OH
HO OH OH OH N O OH
O O HO O N
O
HO O OH H O
OH HO
OH HO
Enol-amina Lactulosillisina
(Produto de Amadori)

Figura 28 – Reação de Maillard no leite levando ao produto de Amadori Lactulosilisina


destruindo o aminoácido livre ou tornando a proteína a qual a lisina estava ligada inviável
para o processo digestivo (Adaptado de van Boekel, 1998)

Duas conseqüências indesejáveis da lactose:


Intolerância – causada por uma insuficiência em β-galactosidase intestinal, na
qual a lactose não é completamente hidrolisada no intestino delgado e como
dissacarídeos não são absorvidos ela passa para o intestino grosso onde provoca
um afluxo de líquido resultando em diarréia e fermentação por microrganismos

73
Pentosidina, um produto fluorescente de ligações cruzadas lisina-arginina que se acumula no colágeno e na
lente do cristalino com a idade, foi o primeiro PFGA caracterizado quimicamente em 1989 por Vincent M.
Monnier e David R. Sell (J. Biol. Chem. 264, 21597-21602.)

35
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

levando a cólicas e flatulência. Uma pequena proporção de bebês nascem com uma
deficiência em β-galactosidase e são incapazes de digerir a lactose. Em recém-
nascidos normais a atividade especifica da β-galactosidase intestinal alcança um
máximo no pós-parto, declinando na infância, estimando-se que em 70% da
população mundial essa diminuição é suficiente para causar intolerância nos adultos.
A capacidade de metabolizar a lactose diminui após os 70 anos de idade levando à
catarata (Fox, P. F. & McSweeney, 1998), e
Galactosemia, incapacidade de metabolizar a galactose devido a uma
deficiência hereditária em galactokinase, enzima cuja falta causa acúmulo de
galactose no sangue e nos tecidos. O acúmulo de galactose força o metabolismo a
usar outras vias resultando em outros produtos, como o galactol, que se acumula no
cristalino dos olhos causando a catarata em humanos em 10 a 20 anos, se o
consumo de produtos com galactose (leite, legumes) for continuado. A falta de uma
segunda enzima da seqüência enzimática do metabolismo, a galactose-1-phosphate
(Gal-1-P):uridyl transferase, causa o acúmulo de galactose e Gal-1-P. Este último
interfere na biossíntese de glicoproteínas e glicolípideos (essenciais às membrana,
por exemplo, das células do cérebro) e resulta em retardamento mental irreversível
dentro de 2 a 3 meses se o consumo de alimentos contendo galactose não cessar
(Fox, P. F. & McSweeney, 1998).

Furosina e furfural são dois dos produtos da reação de Maillard usados como
indicadores dos efeitos do aquecimento (leite UHT – Ultra-High-Temperature) na
qualidade do leite. A lactulose 74 (Fig. 29) é uma das modificações químicas induzidas
pelo processo de esterilização do leite. Trata-se de um epímero da lactose, no qual o
fragmento glicose do dissacarídeo foi isomerizado a frutose. A lactulose não ocorre
na natureza mas pode ser obtida sob condições alcalinas através da reação de Lobry
de Bruyn–Alberda van Ekenstein 75 ou como um produto secundário de baixo

74
Nome Químico: 4-O-β-D-Galactopyranosyl-d-fructose; fórmula molecular: C12H22O11=342.3, CAS: 4618-18-2
Fonte: Sweetman, S. C. (Ed), Martindale (2007)
75
Um dos mais importantes rearranjos que sofrem monossacarídeos redutores em solução alcalina é esse descrito
por Lobry de Bruyn e Alberda van Ekenstein numa série de artigos de 1890. A pesquisa teve origem numa
observação feita por de Bruyn [De Bruynl, Obryr: Rec. Trav. Chim. 14, 156 (1895)] segundo a qual o poder
rotatório óptico de soluções diluídas de glicose contendo hidróxido de sódio, em baixa concentração, diminuía de

36
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

rendimento, como resultado da ação da β-galactosidase sobre a lactose. A sua


presença é um indicador da severidade do aquecimento. A lactulose não está
presente no leite in natura nem no leite HTST (High Temperature Short Time)
pasteurizado. A lactulose é mais doce que a lactose e menos que a sacarose (até
62% do poder adoçante desta). Não é metabolizada pelas bactérias da flora bucal e
portanto não é cariogênica. Não é hidrolisada pela β-galactosidase intestinal,
atingindo o intestino grosso onde pode ser metabolizada por bactérias do ácido
láctico (do gênero Lactobacillus), incluindo Bifidobacterium ssp, servindo como um
fator bifidus. Por esta razão, a lactulose atraiu considerável atenção como um meio
de modificar a microflora intestinal, reduzindo o seu pH e prevenindo o
desenvolvimento de bactérias da putrefação indesejáveis. Atualmente é adicionada à
formulas infantis para estimular as propriedades da bifidogênese do leite humano.
Relatos científicos indicam também que a lactulose tem a propriedade de inibir o
crescimento de certas células tumorais. 76
6
HOCH2 OH
O
HO H HO 5 HO 2
OH Isomerização OH
OH O 4 3
1 da Glicose
O β 2 O CH2OH
OH OH 1
HO O HO O
3 Processo UHT
1 4 1
OH HO OH

β-D-Galactose α-D-Glicose β-D-Galactose α-D-Frutose

α-Lactose Lactulose

Figura 29 – Isomerização da lactose em lactulose durante tratamento térmico esterilizante


no leite UHT.

valor ao longo de um período de tempo finalmente alcançando o valor zero: em solução alcalina suave glicose era
convertida em manose e frutose. Ou seja, demonstraram experimentalmente que esses três açúcares, Glicose,
Manose e Frutose são reciprocamente convertíveis um no outro (Fonte: Evans, W. Lloyd, Chem. Rev. 31, 544
(1942):
H O HO H
C C CH2 OH CH OH CH O Projeção de Fischer da
H C OH C OH C O HO C HO CH
estrutura de açúcares
mostrando as Interrelações
HO C H HO C H HO C H HO C H HO C H de isomerização entre
H C OH H C OH H C OH H C OH H C OH
D-glicose, D-manose e
D-frutose em meio
H C OH H C OH H C OH H C OH H C OH levemente alcalino,
CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH
trabalho pioneiro de L. De
Bruyn e A. van Ekenstein,
D-Glicose Trans-enediol D-Frutose Cis-enediol D-Manose no final do século XIX.
76
Fox, P. F. & McSweeney, P. L. H. Dairy Chemistry and Biochemistry (1998), Thomson Science, London, UK

37
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Furfural e seus derivados 77 são compostos intermediários na formação dos


pigmentos (melanoidinas) no estágio mais avançado da reação de Maillard. O
conteúdo em furosina varia de 65,48 a 310,58 mg/100g da proteína nos produtos
“longa-vida”. Esse tratamento térmico UHT introduz alterações químicas e
bioquímicas no leite, principalmente nas proteínas (por exemplo, insolubilização das
proteínas do soro), nos carboidratos e vitaminas, uma conseqüência da reação de
Maillard. Essas alterações afetam o valor nutricional do leite, formando compostos
tóxicos que modificam suas propriedades organolépticas e funcionais. Todo esse
tratamento térmico (UHT, esterilização, evaporação, etc) empregado para garantir a
segurança do leite e prolongar sua vida, além das condições de armazenamento,
favorecem a reação de Maillard. 78

5C da
Ribose L-Arginina
H O CH2OH
N O
NH O H OH
+ NH
N OH H OH OH
H OH OH OH
NH2 CH2OH
D-Ribose
L-Lisina NH2 O O
O H2N
NH2 HN NH OH OH
OH NH2 NH2
Pentosidina L-Arginina L-Lisina

OH O
OH
O CH3
CHO
O O O
CH3 O O CH3
Furfural Furilmetilcetona Isomaltol Maltol
COOH

CHO NH2
H3C CHO HOCH2 N
O O O
O H
Metil-Furfural Hidroximetil-Furfural Furosina

Fig. 30 – Produtos da reação de Maillard encontrados no Leite termicamente tratado

77
O grupo furfural inclui: Furfural, metilfurfural, hidroximetilfurfural e furilmetilcetona. Ver estrutura química
no texto.
78
E. Ferrer, A. Alegría, G. Courtois and R. Farré, High-performance liquid chromatographic determination of
Maillard compounds in store-brand and name-brand ultra-high-temperature-treated cows’ milk, J. Chromatogr.
A, 881, 599-606 (2000).

38
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O acastanhamento não-enzimático produzido pela reação de Maillard é um


dos mais importantes fatores na deterioração dos alimentos. Essas reações
dependem da atividade da água (water activity, aw) 79 ou de alguma umidade no
produto. O escurecimento do leite em pó mantido a 40º por 10 dias em função da
água é um exemplo, assim como o desaparecimento da lisina, o mais reativo dos
aminoácidos (ε−NH2 livre), como resultado das reações que tornam o produto
amarronzado. A destruição da lisina, um aminoácido essencial, reduz o valor
nutricional do produto. 80
Esse “amarronzado” nos produtos alimentícios pode ser desejável ou
indesejável. Na crosta dos pães é desejável, mas no leite evaporado e esterilizado é
indesejável.

NH2 NH2
NH2
H OH H OH
H OH HO OH OH OH N+ HO OH OH N
HO OH OH OH N H H2O O H OH
O O O
O O HO O -H+ HO O OH
HO O OH OH -Lisina
OH OH HO OH
OH + HO
HO H H
HO OH OH OH H HO OH OH OH
H
HO OH OH OH H
1,2-enolização O O OH
HO O O HO O O O
Condições ácidas OH OH HO O
OH 3 - H2O OH
OH HO HO OH
HO OH OH H H NH2 HO OH OH H HO OH
OH OH
O OH O O CHO CHO
N R
HO O O
N HO O
O HO OH + OH
NH2 + O
+ 3 O Desidratação
OH HO H H O OH OH COOH
3-Desoxosona Galactose Lisinopirralina Furfurais
Lactulosillisina
(Produto de Amadori)

Rota 1
NH2 HO OH OH
HO OH OH HO OH OH OH NH2 OH
OH O
O 2 OH O OH HO O
HO O N HO O N - Lisina
3
OH
OH OH OH
OH H O OH H O
O
OH OH

HO OH OH O-Gal O-Gal O O-Gal O-Gal O


2,3-enolização OH 1
O CH3
Condições neutras HO O + + + +
O CH3 COCH3 CH3
OH OH O O
O OH
HO OH OH NH2 O CH3 OH OH
OH
OH Galactose = O-Gal
O 2 OH β-Piranona 3-Furanona Galactosil-Isomaltol Ciclopentenona
HO O N 1-Desoxosona OH
3 O OH HO OH
OH HO H O CH3
H HO + HO
O
OH
OH
Lactulosillisina OH
OH
(Produto de Amadori) Redutona Galactose

Rota 2

79
Atividade da água (aw) é definida como a razão da pressão de vapor da água pura e uma solução: aw = p/po,
onde p = pressão parcial da água no alimento e po = pressão de vapor da água na mesma temperatura. Um
material com alto conteúdo de umidade, quando este excede a quantidade do sólido, aw é próximo ou igual a 1,0.
Esse valor nos dá um parâmetro seguro para comparar processos químicos e bioquímicos. Exemplo: crescimento
de microrganismos é zero quando aw = 0,2; bolores e leveduras começam a crescer quando aw se situa entre 0,7 e
0,8; crescimento bacteriano tem lugar quando aw alcança 0,8. Reações não-enzimáticas ou de Maillard, que
formam produtos coloridos, não ocorrem na camada da água ligada (água de Langmuir), na faixa em que a aw =
0,0 a 0,25. Fonte: deMan, John M. (1999).
80
deMan, John M.; Principles of Food Chemistry, 3rd Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999).

39
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

HO OH OH NH2 NH2
OH OH OH H H NH2
O OH OH OH
N OH OH
HO O O _ N
Galactose O N
OH H O H O
HO H O O
H H O H
-
4-Desoxosona O
HO OH H NH2
OH H NH2 2 OH
Condições alcalinas 1
OH O N
OH _ 3
N OH- O
OH 4 H
H
H O O 4-Desoxiaminoredutona
HO OH OH NH2
OH O
O OH
HO O N OH
O NH2
OH HO H O OH H NH2 OH
H OH 1 N
OH 2
Lactulosillisina N 3 4 5
O O
(Produto de Amadori) O
H O
O OH
4-Desoxosona 5-desidro-3-hidroxipiridona

Rota 3
Figura 31 – Estágio avançado da Reação de Maillard, no qual o produto de Amadori
(lactulosilisina, Fig. 27) sofre degradação via duas rotas: a rota da 3-desoxosona via
formação de 1,2–enol que ocorre em pH menor que 7 e a rota da 1-desoxosona via
formação de 2,3-enol que se dá em meio neutro. Em vista do pH do leite (pH = 6,6) a
degradação dos compostos de Amadori deve ocorrer principalmente pela via da 2,3–
enolização. Uma terceira rota via 4-desoxosona tem importância para dissacarídeos
apenas em condições levemente alcalinas. Todas as rotas levam à formação de
intermediários muito reativos, as desoxosonas (adaptado de Boekel, 1998).

11 – Reação de Maillard no Café

O café é a segunda bebida mais consumida no mundo após a água. 81 Como


conseqüência os produtos da reação de Maillard formados durante o processo de
torrefação dos grãos tem um impacto global sobre o bem estar da humanidade. Essa
aceitabilidade mundial parece ser creditada ao aroma único do café torrado, uma
conquista das reações de Maillard inicialmente baseada no olfato que logo se
associou aos prazeres do efeito farmacológico da bebida. Embora, segundo a lenda
vinda do Yêmen, o hábito de comer os grãos de café tenha se iniciado após
observar o comportamento inquieto de cabras com insônia após ingerirem os frutos
nas pastagens – o que atraiu seus observadores ao cardápio estimulante – parece
óbvio que os animais foram seduzidos pelo cheiro.
Num longo e minucioso tratado sobre o café publicado inicialmente em 1922,
William H. Ukers, 82 nos conta que a primeira menção segura sobre propriedades e
usos da planta é de autoria de um médico Árabe (El Razi, 850-922 A.D.) do final do
século 9 A.D., aparecendo posteriormente como planta selvagem na Abissínia e no

81
Nehlig, Astrid (editor): Coffee, Tea, Chocolate, and the Brain, CRC Press, (2004).
82
Ukers, William H.; All About Coffee, 2nd Ed., The Tea and Coffee Trade Journal Company, New York (1935)

40
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Yêmen (distrito da Arábia). Outras autoridades acreditam que o primeiro cultivo do


café foi no Yêmen e data de 575 A.D. Aos Árabes é concedido o crédito pela
descoberta e promoção do café como uma bebida (qahvah, que através do Turco
kahveh deu café), bem como a sua propagação, que se espalhou pelo mundo nos
séculos seguintes.
O prazer associado ao consumo do café se deve aos efeitos produzidos no
cérebro pelos alcalóides da bebida, um grupo de compostos heterocíclicos com o
esqueleto carbônico das purinas, as metilxantinas, das quais a cafeína é o principal
componente e o mais importante (Fig. 32).

CH3 CH3 CH3


O N N O N N O N N O NH N
3
9
1
N 6 7 N HN N
H3C N H3C N N H3C N
H H CH3 CH3
O O O O
Cafeina Teofilina Teobromina Paraxantina
CH3 CH3 CH3 CH3
O N N CH3O N N CH3O N N
O O O
N N N
H3C N H3C N H3C N
CH3 H CH3
O O O
Teacrine Liberina Metilliberina

Figura 32 – Alcalóides do café exercem notável efeito sobre o cérebro que se manifesta
no humor, performance, memória, sono e na cognição. Potenciais e incomuns efeitos
terapêuticos relatados pelas pesquisas desta década incluem a doença de Parkinson,
isquemia, epilepsia e até mesmo o câncer. Fonte: Flament, Ivon (2002).

Sendo a segunda bebida mais ingerida, a cafeína é também a substância


psico-ativa mais consumida do mundo (Flament, I., 2002), juntamente com milhares
de outros compostos já caracterizados. Os constituintes não-cafeínicos formam uma
plêiade de compostos de baixo peso molecular, entre os quais os mais conhecidos
são os ácidos clorogênicos, ésteres derivados dos ácidos quínico, caféico e ferrúlico.
A figura 33 mostra a estrutura química de alguns ácidos clorogênicos identificados no
café torrado, sendo o primeiro deles, o ácido 5-cafeoil-quínico (5-CAQA) o mais
abundante. (Nehlig, A., 2004).

41
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O O
O
HO O
HO O OH
O COOH
HO OH
HO OH
HO
OH 3-Cafeoil-1,5-quinida
Ácido 5-Cafeoilquinico (3-CAQ)
(5-CAQA) O O
O O
O
O HO OH HO O OH
OH
HO O O
HO
OH
HO
4-Cafeoil-1,5-quinida 4-Dicafeoil-quinida O
(4-CAQ) (DICAQ)

Figura 33 – Ácido clorogênico e quinidas (lactonas com atividade antimorfínica, i.é.,


bloqueio dos efeitos da morfina) presentes café torrado (ver Nehlig, A. 2004).

O café e a cafeína são mutagênicos a bactérias e fungos. O efeito mutagênico


do café torrado, instantâneo ou descafeinado em vários microrganismos foi alvo de
estudos através do teste de mutagenicidade de Ames em variadas condições. O
efeito mutagênico do café também foi observado em cultura de células de
mamíferos, embora essa mutagenicidade apareça apenas num estágio especifico da
mitose. A interação do café e de alguns de seus componentes, com outras
substâncias mutagênicas, podem potenciar ou inibir o efeito de um grande número
de agentes mutagênicos. Por exemplo, café e cafeína aumentam sinergisticamente a
citotoxidade dos Raios-X, a cafeína potencia aberrações cromossômicas e aumenta
o número de replicações. Por outro lado, em varias cepas de microrganismos, café e
cafeína foram capazes de inibir o efeito mutagênico de numerosos fatores, como a
luz ultravioleta, 4-nitroquinolina-1-óxido, etilmetanosufonato, ácido nitroso, 9-amino-
acridina, nitrosaminas, e benzo[a]pireno, entre outros. É importante notar que o grão
de café verde não é mutagênico, tornando-se assim após o processo de torrefação
que introduz substâncias como metilglioxal, glioxal, maltol, diacetil e peróxido de
hidrogênio, compostos ativos no teste de mutagenicidade de Ames. Outros
compostos presentes no café, como a cafeína, o ácido clorogênico e flavonol, são
suspeitos de contribuir diretamente para o efeito mutagênico do café. Contudo, a
maior parte dos dados sobre indução de dano cromossômico foi obtida com uma
concentração 100 vezes maior que a dose esperada para grandes bebedores de
café e numa magnitude muitas vezes maior que a dose letal de cafeína estimada
para humanos (Nehlig, A., 2004).

42
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Durante o processo de torrefação mais de 500 compostos são formados,


predominantemente via degradação de Strecker e reações de Maillard. As reações
envolvendo açucares redutores e aminoácidos ou peptídeos de baixo peso molecular
resulta na formação de compostos contendo nitrogênio e enxofre, em particular
compostos heterocíclicos como pirróis, tiofenos, oxazóis e tiazóis. 83 O uso de
equipamentos de alta sensibilidade analítica ampliou consideravelmente o número de
compostos identificados. Até o final do ano 2000 haviam mais de 850 compostos
voláteis identificados no aroma do café, mas estima-se atualmente em mais de 1000.

Os carboidratos são essenciais para a formação dos compostos que dão o


aroma ao café, através da caramelização de açúcares de baixo peso molecular e
pela reação de Maillard com aminoácidos. No grão verde eles representam 50% do
peso (baseado na matéria seca) e formam uma complexa mistura de açúcares
redutores e não-redutores, variando entre mono-, oligo- e polissacarídeos, sendo
este último o mais abundante. Entre os monossacarídeos encontrados no grão verde
estão xilose, arabinose, ribose, glicose, galactose, manose, ramnose, frutose e
psicose (pseudofrutose, uma ribohexulose) e durante o processo da torrefação mais
de 99% dos açucares são degradados (Flament, I., 2002).

12 – Reações de Maillard no Colágeno do Cristalino

As relevantes alterações físico-químicas na estrutura da lente dos olhos


(cristalino) e o desenvolvimento da catarata que ocorrem com a idade, incluem o
amarelecimento, uma rede cruzada de ligações covalentes e acúmulo de produtos
fluorescentes ligados às proteínas. Crê-se que as reações não-enzimáticas de
Maillard entre aldeídos, cetonas e aminoácidos ligados às proteínas, sejam
responsáveis pelas alterações que levam ao envelhecimento e à formação da
catarata na lente dos olhos. Evidências imunológicas e químicas indicam que as
reações de Maillard ocorrem nas lentes de humanos e animais de laboratório e

83
Flament, Ivon: Coffee Flavor Chemistry, John Wiley & Sons, Ltd., England (2002)

43
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

acredita-se que o acúmulo progressivo de produtos finais da glicosilação avançada


(PFGA) no cristalino contribui para acelerar a cataratogênese. O nível de PFGA
parece estar diretamente relacionado com a pigmentação amarela na lente humana.
Igualmente o grau de glicemia está diretamente relacionado ao conteúdo de PFGA
em cães diabéticos. Ácido ascórbico, como ascorbato, e glicose mostram ser os
principais agentes da glicosilação das proteínas da lente do cristalino humano. Esses
carboidratos geram espécies de alta reatividade química, entre eles, compostos α-
dicarbonílicos que propagam as reações de Maillard. Um desses compostos é o
Metilglioxal (MG), CH3COCHO. A lente do cristalino humano normalmente contém 20
vezes mais MG que no plasma, porém no diabético a concentração de MG na lente é
maior que a de indivíduos normoglicêmicos. MG é extremamente reativo com
proteínas, dando não só PFGA, mas também radicais livres durante sua formação. 84

Ácido Ascórbico está presente na lente do cristalino em quantidades


relativamente elevadas (até 2 mM) onde, segundo estudos, sofre degradação
oxidativa com a idade contribuindo para a formação da catarata. Vários produtos da
reação de Maillard foram identificados na lente humana, entre os quais, pentosidina e
carboximetil-lisina formados a partir de ascorbato. Estudos mostraram que o
desenvolvimento da catarata pode ser impedido em animais com diabetes, induzida
experimentalmente, através da inibição da reação de Maillard. Outro produto
importante gerado via reação de Maillard entre proteínas e ascorbato é o Oxalato
Mono-Alquilamida (OMA): 85
COOH

HO O
HO
O O O HOOC O
HO O HO O R NH2
[Ο]
H OH
H
H OH N O
HO OH O O
CH2OH R R = Lisina

Ácido L-ascórbico Ácido L-Desidro-ascórbico 2,3-Dicetogulonato Oxalato Mono-Alquilamida

84
Shamsi, Farrukh A.; Sharkey, E.; Creighton, D.; and Nagaraj, R. H.: Maillard Reactions in Lens Proteins:
Methylglyoxal-mediated Modifications in the Rat Lens, Exp. Eye Res., 70, 369-380 (2000)
85
Nagaraj, H. R.; Shamsi, F. A.; Huber, B., and Pischetsrieder, Monika: Immunochemical detection of oxalate
monoalkylamide, an ascorbate-derived Maillard reaction product in the human lens, FEBS Letters, 453, 327-330
(1999).

44
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

Figura 34 – Possível rota para Oxalato de Mono-Alquilamida (OMA) que foi identificado
como um produto final da glicosilação avançada (PFGA) formado pela reação de Maillard
entre ácido ascórbico e proteínas.

Compostos α-dicarbonílicos provenientes de várias rotas metabólicas, como o


glioxal (CHO-CHO) e o metilglioxal (CH3COCHO) foram reconhecidos como os
principais intermediários e precursores na formação dos PFGA. Alguns desses PFGA
que se derivaram diretamente do metilglioxal foram isolados, entre os quais estão a
imidazol-lisina, Nε−carboxietil-lisina (CEL) e 5-hidroxi-imidazolona, detectados em
proteínas in vivo. Quantidades significativamente maiores de imidazol-lisina MOLD e
GOLD (Fig. 35) foram encontradas na lente do cristalino em humanos com
catarata. 86
O
Proteina
H2N -
O
Lisina +
NH3

- O O -
O + + O
NH3 H H3N
H3C
H H
O O
O Glioxal O Metilglioxal

+ +
N N

N H3C N

GOLD MOLD
Glioxal-Lisina Metilglioxal-Lisina

+ +
H3N O NH3
O
- -
O O

Figura 35 – Formação de ligações cruzadas intra- e intermoleculares envolvendo


espécies α-dicarbonílicas altamente reativas (Glioxal e Metilglioxal) resultando na
formação dos chamados produtos finais da glicosilação avançada (PFGA).

Outros intermediários α-dicarbonílicos altamente reativos tanto in vivo quanto


nos alimentos e que estabelecem ligações cruzadas entre proteínas, são mostrados
na Fig. 36. Esses PFGA podem ativar receptores celulares. 87

86
Chellan, P. and Nagaraj, R. H.: Protein Crosslinking by the Maillard Reaction: Dicarbonyl-Derived
Imidazolium Crosslinks in Aging and Diabetes, Arch. Biochem.Biophys., 368, 98-104 (1999).
87
Reihl, O.; Rothenbacher, T. M.; Lederer, M. O., and Schwack, W.: Carbohydrate carbonyl mobility––the key
process in the formation of α-dicarbonyl intermediates, Carbohydrate Research, 339, 1609–1618 (2004).

45
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O R R
H O O N H N
O H3C HO H
O O OH
OH HO H
HO OH HO
OH HO OH O O
6 6
3-Desoxi 1-Desoxi N -(5,6-Dihidroxi-2,3- N -(2,3-Dihidroxi-5,6
hexos-2-ulose hexo-2,3-diulose dioxohexil)-L-lisina -dioxohexil)-L-lisina

R
R
N
HO H N O
HO H
O O R = - CH2 OH
H H3C NH2
O O
frag. lisina
N6-(2-Hidroxi-4,5- N6-(2-Hidroxi-3,4-
dioxopentil)-L-lisina dioxopentil)-L-lisina

Figura 36 – Intermediários dicarbonílicos responsáveis pelas ligações cruzadas intra- e


intermoleculares nas proteínas. Em todos, o Nε da lisina se liga diretamente ao C1 do
açúcar envolvido. N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina não só é essencial na
formação do principal agente de ligação cruzada de Maillard, o glicosepane (Fig. 1), mas
representa o intermediário chave para outros produtos de Maillard (Schwack, 2004).

O
NH2
H2N
CH2OH O CH2OH OH OH OH
HO HO 1 N
1 H CH=O (Lys) NH2 OH OH
HO HO O
OH OH OH
- H2O HO
D-Glicose OH
Aldose Base de Schiff
HO
NH2 NH2
H OH H OH
N N
OH OH OH OH
O O
HO HO OH
O - H2O
HO Rota A Rota B
Produto Amadori
OH R R
H H
H R H R N N
N N OH OH OH OH

HO OH HO OH HO O HO OH
OH OH

HO HO OH OH
OH O
H R H R
H R N N
H R N OH
N OH O
OH HO
O HO OH OH
HO OH
OH
O OH O
HO OH R
OH
H R H R H R N
N N N
HO H
HO O HO OH O OH OH
OH OH OH
- H2O
HO HO
OH OH OH O O
N6-(2,3-Dihidroxi-5,6
-dioxohexil)-L-lisina
(Didesoxiosona)

Figura 37– Duas rotas prováveis para a formação do precursor do glicosepane (Fig. 1), o
intermediário N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina, α-dicarbonílico, de alta

46
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

reatividade química. A identificação desses intermediários α-dicarbonílicos só é possível


mediante reações de captura, nas quais derivados estáveis são produzidos. Os mais
conhecidos reagentes de captura de compostos α-dicarbonílicos são o-fenilenodiamina,
que forma quinoxalinas estáveis e a aminoguanidina, que forma derivados triazínicos. Os
diversos intermediários que levam ao precursor do glicosepane através das rotas A e B,
se equilibram entre diferentes etapas de desidratação e ceto-enolizações, culminando no
tautômero final, a didesoxiosona. (Schwack, 2004).

Devido à reatividade química dos compostos α-dicarbonílicos, gerados tanto


nos organismos vivos quanto nos alimentos, eles só puderam ser identificados após
conversão em derivados estáveis por meio de reagentes de captura.
Aminoguanidina 88 e o-fenilenodiamina (possui propriedades genotóxicas) são dois
reagentes de captura para compostos α-dicarbonílicos, o primeiro forma quinoxalinas
e o segundo, triazinas, compostos estáveis que podem ser analisados pelos métodos
usuais de identificação física. Todas as hexoses produzem a mesma didesoxiosona,
o precursor do glicosepane (Schwack, 2004). Outros reagentes de captura
largamente empregados incluem O-aril e O-alquil hidroxilaminas (NH2OR, exemplo:
O-metil hidroxilamina, R = CH3, produz oximas), hidrazinas (NH2NHR, exemplo: o
Reagente T de Girard, R = COCH2N(CH3)3Cl, cloro hidrazida de carboximetil-
trimetilamônio, produz osazonas) e cisteamina (H2NCH2CH2SH, 2-amino etanotiol,
produz tiazolidinas): 89

88
Curiosamente, a aminoguanidina (CH6N4), um produto farmacêutico, inibe a formação de proteínas
glicosiladas (AGE ou PFGA) e da aldose redutase. A enzima aldose redutase catalisa a conversão da glicose em
sorbitol (D-Glucitol, C6H14O6). Teorizou-se que o acúmulo de sorbitol em certas células, ocorrência dependente
de condições de hiperglicemia que tem um efeito hiperosmótico, pode estar envolvido na patogênese de algumas
complicações diabéticas (Fonte: Sweetman, S. (Ed), Martindale: The complete Drug Reference. London:
Pharmaceutical Press. Electronic version, (2007).
89
Glomb, Marcus A., and Tschirnich, R.: Detection of α-Dicarbonyl Compounds in Maillard Reaction Systems
and in Vivo, J. Agric. Food Chem., 49, 5543-5550 (2001).

47
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O
S
1
R 2
R
N
H
Tiazolidinas

NH2
- H2O Cisteamina
NH
1 SH
R N C NH2 H2N
NH H2N N
2 H2N
R N NH2 H 1
+ Aminoguanidine O O o-Fenilenodiamina R N
1
R N NH2 2 1 - 2H2O 2
- 2H2O R R R N
2 NH Quinoxalinas
R N H2N OCH 3 H
N
O-Metilhidroxil H2N N(CH 3) 3
Triazinas
amina - 2H2O - 2H2O O
Reagente T de Girard
O
1
1 2
R N N(CH 3) 3
R R NH

2 NH
H 3CO N N OCH 3 R N N(CH 3) 3
O
Oximas Osazonas

Figura 38 – Reagentes de captura e seus diversos produtos após reação com uma
espécie α-dicarbonílica genérica – eventualmente uma didesoxiosona ou
desoxiglicosona (Adaptado de Glomb, 2001).

Em vários artigos publicados entre 1992-1995, Feather 90 relatou em seu


trabalho pioneiro que derivados de açúcar α-dicarbonílicos reagem rápida e
irreversivelmente com aminoguanidina dando derivados estáveis 3-aminotriazinicos.
A reatividade da aminoguanidina foi originalmente testada com várias “osonas”,
concluindo-se que todos os derivados dicarbonílicos examinados reagiram
rapidamente, em questão de minutos, dando triazinas substituídas. Apenas com D-
glicose a aminoguanidina reage lentamente e de forma reversível.

90
Hirsch, J.; Mossine, V. V., and Feather, Milton S.: The detection of some dicarbonyl intermediates
arising from the degradation of Amadori compounds (the Maillard reaction), Carbohydrate Research, 273, 171-
177 (1995) e referencias 8 e 9 ali citadas.

48
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O
O O CH3
H

OH + OH
O

HO CH2OH HO CH2OH
3-desoxi-D-eritro-hexos-2-ulose 1-Desoxi-2,3-D-eritro-hexodiulose
(3-Desoxiglucosone) (1-Desoxiglucosone)

NH

C NH2
H2N NH
Aminoguanidina
N N NH2
H3C N NH
NH
NH
HO
N NH2
+ N NH2 + N
OH OH
HO HO
OH
OH OH OH

Figura 39 – Formação de aminotriazinas via reação de aminoguanidina com


desoxiglicosonas.

13 – Inibidores da Reação de Maillard: promovendo a saúde

Após haver estudado as múltiplas possibilidades de alvos moleculares em


plantas, animais e microrganismos na promoção do bem estar físico e mental do
homem, sem haver encontrado o elixir da juventude eterna, a ciência agora se volta
para procurar nos vilões alimentares, no fruto produzido pela indústria, 91 vestígio de
algo benéfico à saúde. Quem procura, acha. Assim, vários produtos favoritos da
humanidade vem sendo minuciosamente investigados, numa frenética busca pelo
lado bom dos vilões. Na área dos alimentos, o café é talvez o mais pesquisado, por
ser a segunda bebida mais consumida no mundo, depois da água. O patrocínio das
pesquisas é indiretamente assegurado pela rede industrial do café. Ao descobrir
propriedades benéficas num produto, todas as demais propriedades maléficas são
esquecidas, um triunfo dos noticiários da mídia mundial sobre a vontade de todos. O
consumo explode e essa é uma boa razão para se investir na ciência. O tabaco foi
alvo dessa investigação, numa tentativa de justificar seu consumo.

91
“If man made, don´t eat it” – Se é feito pelo homem, não coma! diz o slogan eco-correto Americano.

49
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O principal alvo da reação de Maillard nos alimentos é torná-lo palatável,


estimular o apetite e o crescimento. Crê-se que o processamento dos alimentos crus
através do fogo a temperaturas altas desempenhou um papel crucial na evolução
permitindo aos humanos extrair grandes quantidades de calorias de sementes das
angiospermas, de outra forma tóxicas ao consumo. 92

Uma evidência, descoberta ao acaso, para o papel dos produtos de Maillard


no controle do peso corporal e da glicemia mostra que indivíduos diabéticos
submetidos a uma dieta com baixo conteúdo em AGEs (PFGA), por um período de 6
semanas, tiveram uma queda de peso corporal estatisticamente significativa, além do
impacto na média da taxa glicêmica, resultando numa redução de 20%. Esses
resultados evidenciam que restrições alimentares levam a uma diminuição no
estresse carbonílico e por conseguinte nas proteínas modificadas de vários tecidos
que se refletirá numa diminuição dos produtos de Amadori, carboximetil lisina (CML)
e pentosidina, no colágeno da pele, enfim, na longevidade. Galinhas tratadas com a
restrição alimentar mostraram diminuição da pentosidina no colágeno e melhora nos
índices de firmeza do colágeno de tendão (Monnier, 2003).

Métodos de prevenção ao “escurecimento” de produtos na indústria


alimentícia se baseiam no controle da umidade, temperatura, pH, uso inibidores. Um
dos mais efetivos inibidores é o dióxido de enxofre (SO2). Dióxido de enxofre
combina-se com o grupo carbonila de uma aldose dando um produto de adição:

NaHSO3 + RCHO Æ RCHOHSO3Na

Acredita-se que o dióxido de enxofre reaja com os produtos de degradação


dos amino-açúcares impedindo a formação das melanoidinas. Uma grande
desvantagem no uso do dióxido de enxofre é que ele reage com tiamina (Vitamina
B1, atua como uma coenzima – cocarboxilase – agindo no metabolismo dos

92
Monnier, Vincent M.: Intervention against the Maillard reaction in vivo, Arch. Biochem. Bioph., 419 1–15
(2003).

50
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

carboidratos) e proteínas reduzindo o valor nutricional dos alimentos, não sendo


permitido o seu uso nos produtos onde a tiamina esteja presente. (REFERENCIA)

O acúmulo de AGEs pode ser prevenido através de intensa terapia da


hiperglicemia, eliminação da cetose e prevenção da peroxidação de lipídeos e o
estresse oxidativo por meio de terapia antioxidante. O acúmulo de AGEs pode ser
prevenido através da captura de alfa-oxoaldeidos com aminoguanidina e compostos
similares. 93

Estudos experimentais in vitro indicam que a administração de antioxidantes


eficientes resulta na prevenção ao aumento da acumulação dos produtos finais da
glicosilação avançada (AGEs) e do cruzamento de ligações no colágeno em animais
de laboratório. A incubação de colágeno com glicose sob reduzida concentração de
oxigênio ou sob condições antioxidativas resultam na inibição da formação de
carboximetil-lisina (CML – principal AGE do colágeno e lente) e pentosidina. 94

Reagentes de captura de compostos α−dicarbonílicos

Inibidores dos produtos finais da glicosilação avançada, PFGA, piridoxamina


(PM) e aminoguanidina (AM), são nucleófilos que capturam instantaneamente os
precursores de AGEs no momento que são gerados in vivo ou in vitro. O aspecto
característico desses inibidores é a presença do grupo funcional nucleofílico amina
ou hidrazina que pode interceptar compostos carbonílicos reativos, interrompendo a
cadeia de reações que leva aos AGEs. Outros inibidores, tais como quelantes de
íons metálicos como DTPA (ácido dietilenotriaminopentacético) e antioxidantes de
captura de radicais livres, R-tocoferol e ácido ascórbico, exercem sua atividade
limitando a aceleração oxidativa da glicosilação. Piridoxamina (PM) foi identificado
como um inibidor de AGE do estágio final da glicosilação (Pós-Amadori) e como um

93
Thornalley, Paul J.: Biochemistry of Advanced Glycation Endproduct generation and its inhibition,
SYMPOSIUM “Advanced Glycation End Products (AGEs)” May 12 – 14, 2000, Jena, Germany
94
Sajithlal, G. B.; Chithra, P., and Chandrakasan, Gowri: Effect of Curcumin on the Advanced Glycation and
Cross-linking of Collagen in Diabetic Rats, Biochem. Pharmacol. 56, 1607–1614 (1998)

51
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

inibidor de ALE (Advanced Lipoxidation End Products, produtos finais da lipoxidação


avançada, PFLA). Por exemplo, PM diminui significativamente a formação de AGEs
fluorescentes, especificamente diminuindo o rendimento de Nε-carboximetillisina,
(CML). PM é menos ativo como quelante de íons de metais que outros inibidores de
AGEs conhecidos, porém há evidencia de que PM tem a habilidade de capturar
compostos dicarbonílicos como glioxal e metilglioxal. 95 Além disso, PM é capaz de
prevenir as complicações diabéticas em animais de laboratório com maior eficácia
que aminoguanidina, tem um efeito hipolipidêmico e é um potente eliminador dos
produtos da peroxidação de lipídeos (Monnier, 2003). Figuras 40, 41 e 42 mostram o
comportamento hipolipidêmico da PM e os produtos de adição detectados.
O O OH O
O2
H3C OH H3C 13 1 OH
Ácido Linoleico 13-HPODE: Ácido hydroperoxioctadecadienóico
CH3
NH2
OH OH
H
O OH N OH
O2 OH CH3 + H
H N CH3 OH
H3C O N H
Piridoxamina OH O
O
2-Heptanal (cetaldeido) N CH3 O

N CH3

OH O OH
O

H NH O CH3 H NH O CH3
CH3 CH3

HO N HO N

Figura 40 – Piridoxamina (PM) tem uma forte atividade na redução dos níveis de lipídeos
em animais de laboratório, além de protegê-los contra o desenvolvimento de nefropatias
e inibir o desenvolvimento de retinopatia e neuropatia em ratos diabéticos. Baynes 96
sugere o mecanismo acima para as reações inibição dos produtos finais da glicosilação
e da lipoxidação avançadas (AGE/ALE). Os dois produtos de adição e rearranjo da PM ao
cetaldeido são detectados na urina e em modelos experimentais (in vitro).

95
Culbertson, Sean M.; Enright, G. D., and Ingold, K. U.: Synthesis of a Novel Radical Trapping and Carbonyl
Group Trapping Anti-AGE Agent: A Pyridoxamine Analogue for Inhibiting Advanced Glycation (AGE) and
Lipoxidation (ALE) End Products, Org. Lett., 5, 2659-2662 (2003)
96
Metz, T. O.; Alderson, N. L.; Thorpe, S. R., and Baynes, John W., Pyridoxamine, an inhibitor of advanced
glycation and lipoxidation reactions: a novel therapy for treatment of diabetic complications, Arch. Biochem.
Biophys., 419, 41-49 (2003).

52
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

O OH

O OH

O H O O O

N N N N
H H H H
OH OH OH OH
HO HO HO HO

N CH3 N CH3 N CH3 N CH3

FAPM: N-formil- HAPM: N-hexanoil- PDAPM:N-pentanedioil- NDAPM: N-nonanedioil-


piridoxaminia piridoxamina piridoxamine monoamida piridoxamina monoamida

Figura 41 – Produtos da adição de PM detectados em reações in vitro e na urina de ratos


diabéticos tratados com piridoxamina. FAPM é em geral derivado de ácidos graxos
polinsaturados; HAPM é derivado da porção terminal dos ácidos linoleico e aracdônico;
PDAPM deriva-se do ácido aracdônico e NDAPM é derivado do ácidos linolênico ou
linoleico (Baynes, 2003).
O O OH O
O2 Mn+
H3C OH H3C 13 1 OH
Mn+ − H2O
13-HPODE: Ácido hydroperoxioctadecadienóico
Ácido Linoleico NH2
OH
OH OH O − H+
13
O O N CH3
11 9 7 5 3 H3C 1 OH
NH Mn+1 Mn+
H3C 13 1 OH Piridoxamina OH
13-KODE: Ácido 13-Ceto-octadecadienóico OH
Carbinolamina
-
O O O N CH3
H O O2
H3C OH H3C N OH
NH ?
OH Radical alcoxi CH3 + HC OH
OH +
HO N
H
N CH3

Figura 42 – Mecanismo de captura de intermediários reativos pela piridoxamina durante a


peroxidação de lipídeos (Baynes, 2003).

O mecanismo bioquímico ligando hiperglicemia às complicações diabéticas


não está ainda bem compreendido. É geralmente aceito que o desenvolvimento de
complicações diabéticas seja um processo multifatorial, no qual a glicosilação não-
enzimática (o fenômeno Verzar 97 ) tem uma participação significativa. Até

97
O primeiro estudo experimental sério sobre o envelhecimento animal foi realizado por Fritz Verzar, cientista
Húngaro trabalhando na Basiléia em meados do século XX. Ele descreveu o envelhecimento molecular pós-
sintético no colágeno do tendão em cauda de ratos. Ele mediu a força mecânica à retração térmica das fibras de
colágeno e encontrou um aumento exponencial com o avanço da velhice. Essa relação entre resistência à
desnaturação pelo calor e a idade das fibras de colágeno foi examinada desde a rã até o homem. Verzar atribuiu
isto ao aumento, idade-dependente, no cruzamento de ligações entre as fibras de colágeno. Há hoje um consenso
geral de que atribui o fenômeno de Verzar à reação de Maillard, ao aumento progressivo da glicosilação não-

53
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

recentemente acreditava-se que a reação de Maillard in vivo era um processo


inteiramente não-enzimático e unidirecional, isto é, irreversível. Contudo, essa
perspectiva mudou após a descoberta de uma enzima desglicosilante nos eritrócitos
humanos (FN3K, frutosamina-3-kinase que age sobre as cetosaminas) a qual
especificamente reconhece e metaboliza produtos de Amadori ligados à proteína.
Esse achado sugere que a reação de Maillard pode ser reversível in vivo através de
um mecanismo ativo de desglicosilação que recupera aminas glicosiladas das
proteínas, prevenindo a formação dos AGEs. 98
O
NH2 NH2
OH OH H3C N NH2
S OH OH Cl
OH OH
N N+ NH

N CH3 (CH3)2N N CH3 CH3


Cl
Piridoxamina: Tiamina:
4-Aminometil-5-hidroxi-6 6-Dimetilamina 3-(4-Amino-2-metilpirimidin-5-ilmet Diclofenac: Ácido
-metil-3-piridinemetanol Piridoxamina il)-5-(2-hidroxietil)-4-metiltiazolio 2-(2,6-Dicloroanilino)fenil] acético

COOH NH2
COOH COOH O O
O CH3 HN
H
O O
HS N N N
N
H
CH3 CH3 H O H N

Captopril: Ramipril:
Aspirina: Ácido 1-[(2S)-3-Mercapto-2- Ácido(2S,3aS,6aS)-1-{N-[(S)-1-Etoxicarbonil-3-fenilpropil] Hidralazina:
O-Acetilsalicilico metilpropionil]-L-prolina L-alanil}peridrociclopenta[b]pirrol-2-carboxilico 1-Hidrazinoftalazina

NH CH3 H S S
O O
C NH2 N N NH2 N+ CH3
N+
H2N N H3C C -
Br
CH3
H NH NH
Metformina: PTB: N-Fenacil-1,3-tiazolio, ALT-711, ALAGEBRIUM:
Aminoguanidine 1,1-Dimetilbiguanida brometo de N-Fenacil-4,5-dimetil-1,3-tiazolio, cloreto de

H H
H3C O N COOH
N N O
H3C N N N
S H NH2
NH
O
OPB 9195 Carnosina

Figura 43 – Estrutura química de alguns inibidores dos produtos finais da glicosilação


avançada (AGE) mais representativos. Esses inibidores podem ser classificados em três
classes diferentes: 1 – Reagentes de captura carbonílica, que atenuam o estresse
carbonílico; 2 – quelantes de íons metálicos, os quais suprimem reações de glicosilação
e 3 – Bloqueadores de condensação cruzada, que revertem o cruzamento de AGEs.
Aminoguanidina foi o primeiro inibidor de AGEs a iniciar ensaios clínicos, mas devido a
efeitos colaterais (causa depleção da vitamina B6) foram interrompidos. Aminoguanidina
inibe a formação de AGEs via reação com o produto de Amadori. Piridoxamina e ALT-711
são inibidores de AGEs. Os sais de Tiazolio OPB-9195 e ALT-711 são bloqueadores de

enzimática de grupos amina nas proteínas, particularmente o εNH2 da lisina, seguida pela formação de compostos
aromáticos policíclicos, designados como “Advanced Glycosylation End Product” (AGEs) Fonte: Robert, L.:
Cellular and Molecular Mechanisms of Aging and Age Related Diseases, Pathol. Oncol. Research, 6, 3-9 (2000).
98
Szwergold, B.; Manevich, Y.; Payne, L., and Loomes, K., Fructosamine-3-kinase-related-protein
phosphorylates glucitolamines on the C-4 hydroxyl: Novel substrate specificity of an enigmatic enzyme
Biochem. Biophys. Res. Commun., 361 870–875 (2007).

54
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

condensação cruzada de AGEs. Piridoxamina, OPB-9195 e carnosina são quelantes de


ions metálicos, atenuando o estresse oxidativo e suprimindo a glicoxidação
subseqüente. OPB-9195 previne a neuropatia diabética e reduz os níveis de AGEs e
carnosina é usada para reverter e prevenir a catarata senil. Metformina, um fármaco
normalmente usado no diabetes também age como inibidor de AGEs. Tiamina: atividade
bloqueadora de AGEs; Diclofenac: fármaco antinflamatório (Voltaren), inibidor dos
produtos de Amadori; aspirina: retarda a catarata e diminui a glicosilação do cristalino in
vivo e in vitro, diminui a pentosidina na pele; captopril: diminui a fluorescência associada
com a glicosilação das proteínas; ramipril: inibe a fluorescência dos AGEs; hidralazina:
fármaco anti-hipertensivo, reduz a pentosidina renal, captura carbonila, quelante de
metais de transição. (Reddy, 2006; Monnier, 2003). 99 ALT-711, um poderoso rompente de
AGE-condensação cruzadas, tem a habilidade de reverter mesmo a condensação cruzada
já formada. Administração oral de ALT-711 resulta em rápida melhora na elasticidade do
miocárdio endurecido em animais de laboratório. 100

14 – A estrutura química do aroma e do sabor dos alimentos

A reação de Maillard nos alimentos ocorre quando proteínas desnaturadas na


superfície da carne, por exemplo, se recombina com açúcares presentes. A
combinação cria o odor característico da carne assada ou cozida e a cor se altera. A
reação se dá prontamente numa temperatura entre 150-260º C. Os odores mais
marcantes aparecem na superfície. Na década de 40 notou-se a ligação entre a
reação de douramento e o odor. Durante a Segunda Guerra Mundial, os soldados
reclamavam do pó de ovo da ração, que se tornava escuro e com um odor pouco
atrativo. Pesquisadores descobriram que o sabor alterado e o odor abominável eram
devido à reação de Maillard. Mesmo mantendo o produto à temperatura ambiente a
concentração de aminoácidos e açúcares na mistura desidratada eram altos o
suficiente para iniciar a reação. Grande parte das pesquisas realizadas entre 1940-
1950 se centrou na prevenção desta reação. Esse esforço científico resultou na
descoberta do papel que a reação de Maillard desempenha na criação de aromas e
sabores. 101 A indústria moderna do pó de ovo desidratado se tornou possível quando
se encontrou um método prático para eliminar a glicose do albúmem. A presença da
glicose na clara do ovo leva ao rápido escurecimento, perda da solubilidade e
desenvolvimento de fluorescência. A prevenção destas alterações indesejáveis no pó

99
Reddy, V. Prakash, and Beyaz, A.: Inhibitors of the Maillard reaction and AGE breakers as therapeutics for
multiple diseases, Drug Discovery Today, 11, 646-654 (2006).
100
Vasan, Sara; Foiles, P., and Founds, H.: Therapeutic potential of breakers of advanced glycation
end product–protein crosslinks, Arch. Biochem. Biophys., 419, 89–96 (2003).
101
http://www.exploratorium.edu/cooking/meat/activity-maillard.html

55
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

de ovo desidratado, foi possível comercialmente submetendo-se a clara do ovo a um


processo de fermentação bacteriana antes de desidratá-la. Desta forma o produto se
torna mais estável. 102

A estrutura química do odor do “açúcar queimado” associado a produtos como


caramelo, algodão-doce, fruta assada como abacaxi ou torrado como o café e a
chicória apresentam similaridade molecular estrutural, notadamente um sistema
carbonílico α,β-insaturado, com grupo –OH no carbono-α, é um aspecto comum.
Maltol (3-hidroxi-2-metil-4H-piran-4-ona, Fig. 44), uma importante substância
intensificadora do sabor e do aroma de alimentos e bebidas (flavorizante) está
presente no cacao, caramelo, chicória, café, leite, malte torrado e pão, entre outros.
O odor é comumente identificado como de “algodão-doce”. O análogo, etilmaltol (3-
hidroxi-2-etil-4H-piran-4-ona) é 4-5 vezes mais ativo que o maltol.

Furaneol 103 ou 2,5-dimetil-4-hidroxi-2H-furan-3-ona é um dos principais


princípios organolépticos do abacaxi. O furaneol desempenha um papel essencial na
flavorização de inúmeras frutas, como goiaba, lichia, acabaxi, framboesa, morango,
tomate, entre outras, bem como em produtos torrados como café, bife cozido, malte,
avelã, amêndoa torrada e pipoca.
Ciclotene ou 3-Metil-2-ciclopenten-2-ol-1-ona ocorre no cacao, café, raiz de
licorice (Glycyrrhiza glabra, família Fabaceae), malte, amêndoa torrada e em quase
todos os produtos torrados que continham açúcar.
O O
O OH CH3 OH
OH OH O OH
CH3
CH3 CH3 CH3 O
O CH3 O O CH3 O

Maltol Etil Maltol Furaneol Ciclotene Maple furanona


3-hidroxi-2-metil- 3-hidroxi-2-etil- 2,5-Dimetil-4-hidroxi 3-Metil-2-ciclo- 5-Etil-3-hidroxi-4-metil-
4-pirona 4-pirona -2H furan-3-ona penten-2-ol-1-ona 5H-furan-2-ona

Figura 44 – Estrutura química de alguns importantes compostos cujo aroma é


característico dos produtos dos quais eles exalam. Maltol: Cacao, café, pão, malte;

102
Reilly, James M.: Role of the Maillard, or “Protein-Sugar” Reaction in Highlight Yellowing of Albumen
Photographic Prints, http://albumen.stanford.edu/library/c20/reilly1982a.html
103
Marca comercial da Firmenich & Cia, Genebra, Suíça.

56
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

furaneol: abacaxi; ciclotene: amêndoa torrada, licorice; xarope de maple 104 (bordo):
furanona.

Furanona de bordo ou 5-Etil-3-hidroxi-4-metil-5H-furan-2-ona é sem duvida o


mais extraordinário dos flavorizantes modernos, sendo 3 milhões de vezes mais
potente que ciclotene. É o mais potente flavorizante conhecido. 105

2-Acetil-1-pirrolina e 2-acetil-3,4,5,6- tetrahidropiridina (Fig. 45) foram


identificados como os mais importantes aromas do arroz cozido e do pão. Essas
substâncias exalam o cheiro agradável semelhante ao pão. O análogo que contem
enxofre no anel é a 2-acetil-2-tiazolina, exala um odor semelhante aos anteriores
correspondente a pipoca, foi detectada na carne assada e na sopa de carne. A 1,3-
tiazina é um flavorizante artificial, com odor de arroz, pão e bolor. 2-Propionil-1-
pirrolina e 2-propionil-2-tiazolina foram recentemente incluídos na lista de aromas
naturais admitidos como flavorizantes em formulações da industria de alimentos. 106

S S S
CH3 CH3
N N CH3 CH3 CH3 CH3
N N N N
O O O O
O O
2-Acetil-1- 2-Propionil- 2-Acetil-3,4,5,6- 2-Acetil-2- 2-Propionil- 2-Acetil-5,6-dihidro-
pirrolina 1-pirrolina tetra-hidropiridina tiazolina 2-tiazolina 4H-1,3-tiazina

Figura 45 – Estrutura química de alguns aromas de produtos do consumo cotidiano.

O gosto e aroma da carne provem de uma centena de compostos que


influenciam sua palatabilidade. Até mesmo a dieta dos animais tem um papel crucial
no sabor e aroma da carne. O sabor é o mais importante fator em ação a afetar o
hábito de comprar carne e a preferência dos consumidores. Compostos de aroma e
sabor encontrados na carne formam uma coleção com ampla gama de estruturas
químicas de hidrocarbonetos, aldeídos, cetonas, álcoois, furanos, tiofenos, pirróis,

104
Árvores de grande porte (30-40 metros de altura) da família Aceraceae, produtoras de seiva de sacarose o qual
é comercialmente explorado, incluem, por exemplo, Acer saccharum (Açúcar), A. saccharinum (Prata), nativas
do leste dos Estados Unidos. Sua grande popularidade como árvore ornamental em parques e avenidas dá um tom
característico ao outono local com sua folha trilobada, principal símbolo da bandeira do Canadá (Encyclopædia
Britannica. Ultimate Reference Suite. Chicago: Encyclopædia Britannica, 2009).
105
Leffingwell, John C.: http://www.leffingwell.com/cooler_than_menthol.htm
106
Fuganti, C.; Gatti, Francesco G., e Serra, S.: A general method for the synthesis of the most powerful
naturally occurring Maillard flavors, Tetrahedron, 63 4762–4767 (2007).

57
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

piridinas, pirazinas, oxazóis, tiazóis, entre muitos outros. Compostos carbonílicos e


sulforosos parecem ser os contribuintes predominantes do aroma da carne. 107
CH3 O CH3 CH3 CH3
CH3
CH3 CH3 CH3
H CH3 CH3 CH3
H H
O CH3 H
O CH3 1,3-Bis(1,1-dime
2,2,6-Trimetil
Benzaldeido Butenal CH3 CH2 tiletil)benzeno
3-Carene ciclohexanona
Aroma de óleo de Aroma do Aroma doce e pungente Limoneno
Aroma de
amêndoas; sabor malte; da terebentina, casca de Aroma da hortelã Aroma do limão, carne cozida
aromático ardente assado laranja, limão. terebentínico,
OH O cítrico
CH3 OH
H OH
CH
OCH3 3 1-Octanol
O
O
O Odor aromático
2-Pentilfurano 2,4-Heptadienlal Ciclobutanol Salicilato de metila 2-Nonanona penetrante, gordura,
Sabor do feijão Aroma de nozes, Odor do Leite quente, cera, óleo, noz,
verde, manteiga gordura Aroma torrado Sensação refrescante sabão, floral químico, queimado
CH3 CH2
H
OH CH2
OH
CH2 O
CH3
1-Octeno-3-ol Pentanal 1-Pentanol α−Pineno β−Pineno Estireno
Odor de cogumelos. Essa Odor da amêndoa, Odor suave, Odor do pinheiro, Odor do pinho, Odor
substancia é excretada por malte, penetrante, óleo fúsel, frútico, cítrico, frútico, cítrico, penetrante,
várias espécies de insetos . amargo bálsamo terebentínico resina, terebentínico cheiro doce
CH3 O CH3 H
NH2 OH OH
CH3 CH3 CH3 O
6-Metil-2-heptanona sec-Butilamina Decanal Hexanol 2-Hexen-1-ol
Odor do cravo- Odor de Odor forte, Odor de madeira, grama Odor de de verdura,
da-Índia, mentol, frutos do aldeídico, cera, cortada, químico-vinho aguçado, folhas, frútico,
eugenol. mar, alho cascas cítricas . frútico, metal (fraco) banana verde

Figura 46 – Estrutura química de alguns compostos identificados no bife de carne bovina


e seus respectivos aromas e sabores (Calkins, C. R., 2007).

A reação de Maillard desempenha um papel crucial na geração do aroma


durante o processo de cozimento da carne. Além da tiamina, ribose e cisteína são
importantes precursores do aroma da carne. Entre outros compostos, os tióis 2-Metil-
3-furanotiol, 2-Furfuriltiol e 3-Mercapto-2-pentanona compõem os mais importantes
compostos com impacto no aroma durante a reação térmica da ribose com a
cisteína, um modelo experimental. As moléculas 2-Metil-furano, Tiazol e 2-Metil-
tiofeno são também encontradas na carne cozida, bem como em flavorizantes
comerciais de carne. 108

107
Calkins, C. R., and Hodgen, J. M.: A fresh look at meat flavor, Meat Science 77, 63–80 (2007).
108
Cerny, Christoph and Davidek, T.: Formation of Aroma Compounds from Ribose and Cysteine during the
Maillard Reaction, J. Agric. Food Chem., 51, 2714-2721 (2003).

58
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

A nota do aroma no bife assado é em parte produzido pela 2-acetil-1-pirrolina


(Fig. 45) e 2-acetiltiazol (Fig. 47). Muitos compostos que contribuem para o cheiro e o
sabor da carne são produtos da decomposição de lipídeos. Ácidos graxos como
linoleico e aracdônico se autoxidam a 9-hidroperóxido e 11-hidroperóxido,
respectivamente, que podem formar 2,4-decadienal, 2-nonenal, 1-octen-3-ona, 2,4-
nonadienal e 2-octenal via beta-cisão com 2-nonenal e 2,4-decadienal que tem um
valor igual aos compostos de enxofre que contribuem para o aroma característico da
carne. (Calkins, C. R., 2007).

SH O O
N N
SH CH3
CH3 CH3 CH3
O O SH O S S S

2-Metil-3-furanotiol 2-Furfuriltiol 3-Mercapto-2-pentanona 2-Metil-furano Tiazol 2-Metil-tiofeno 2-Acetiltiazol

Figura 47 – Compostos formados durante a reação térmica da ribose com a cisteína


(Calkins, C. R., 2007).

CHO CHO
O
2,4-decadienal 2-nonenal 1-octen-3-ona

CHO CHO CHO

2,4-nonadienal 2-octenal 12-Metiltridecanal

Figura 48 – A decomposição de lipídeos contribui para o cheiro e o sabor da carne. 12-


metil-tridecanal é responsável pelo cheiro de gordura semelhante ao bife (Calkins, C. R.,
2007).

A oxidação do β−caroteno (Fig. 49), 109 possivelmente presente na alimentação


dos animais de corte, produz a β−ionona com intensas propriedades aromáticas.

109
Cerca de 500 carotenóides já foram encontrados e caracterizados em vegetais e frutos usados como alimento
humano, porém o mais conhecido e o mais intensamente estudado dos carotenóides é o β-caroteno (fonte:
Pokorny, Jan; Yanishlieva, N., and Gordon, M. [Editor]: Antioxidants in Food - Practical Applications, CRC
Press, Cambridge, England (2001)

59
Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos

CH3 CH3 CH3 CH3


CH3 CH3 CH3 CH3 [Ox]
O

CH3 CH3 CH3 CH3 CH3


CH3
β-carotene β−Ionona
Cheiro da mata, violeta
(flor), frútico; framboeza
silvestre (quando diluido)

Figura 49 – Formação da β−ionona à partir de β−caroteno via degradação oxidativa.

60

Você também pode gostar