O Cuidado Do Terapeuta Na Clínica Fenomenológica
O Cuidado Do Terapeuta Na Clínica Fenomenológica
O Cuidado Do Terapeuta Na Clínica Fenomenológica
Resumo
A Fenomenologia permite pensar a partir e com cuidado sobre como vivemos. Heidegger diz o cuidado faz
parte da condição humana, e está dividido em ocupação – cuidado com o mundo e entes simplesmente dados
– e preocupação – cuidado com quem nos relacionamos.A Psicoterapia Existencial tem sua fundação baseada
no “cuidado”, enquanto “ser-no-mundocom-o-outro”, não se baseando em interpretações adquiridas a priori
ou explicações causais sobre a realidade vivida pelo cliente e não enquadrando-o em padrões morais.
Podemos analisar que o trabalho do terapeuta na clínica fenomenológico consiste em usar do cuidado para
com o cliente e permitir que ele restaure seu cuidado consigo e com os outros.
Nesse momento histórico, podemos refletir sobre como temos cuidado de nós mesmos,
tanto do físico quanto do psicológico, e como temos cuidado das pessoas ao nosso redor e
do ambiente que nos abarca. E a Fenomenologia, como uma forma de pensar, não deseja
apenas falar sobre o cuidado, e sim falar a partir do cuidado e com cuidado que esta área
requer (FERNANDES, 2011).
O homem não vive isolado, ele tem a necessidade de se relacionar com os outros, e,
assim, fazer parte de um grupo. Uma vez inserido nesse grupo por ele escolhido, é traçado
um caminho de acordo com suas decisões e escolhas. Existir, para o homem, é estar no
mundo em interdependência com os outros, uma vez que o homem é o único ser capaz de
escolher e, geralmente, escolhe cuidar do outro, isso ocorre porque nós nos engajamos, nos
familiarizamos e aprendemos a lidar e compreender o outro (FERNANDES, 2011;
MARTINS, 2009). Nesse sentido, podemos pensar o cuidado nos sentidos ôntico e
ontológico. Onticamente, cuidado possui os significados de atenção, cautela, zelo,
responsabilidade, assim, relaciona-se ao ente, o existente concreto da realidade; já no
sentido ontológico, o cuidado refere-se à essência de cada particularidade existente e, nessa
perspectiva, apresentando, então, o sentido de relação (PALA, 2010).
fazemos, nomeia dessa forma um modo de ser (FERNANDES, 2011). O cuidado é uma
dimensão do ser, e que Heidegger (2001) acredita ser uma condição própria do humano.
Desta forma, o cuidado é estar à frente de si mesmo e envolver-se com entes no mundo.
Cuidar constitui-se, pois, no exercício da pre-ocupação com o acontecer.
O ser humano tem em sua raiz primordial o cuidado e este é quem o norteia
durante a sua vida, não é ele que tem o cuidado, mas é o cuidado que o tem (BOFF, 1999;
FERNANDES, 2011; HEIDEGGER, 2001). O cuidado deve ser visto, segundo Boff
(1999), como uma atitude de responsabilização e de envolvimento afetivo com um ente.
Nosso tempo é ocupado pelas ocupações que temos pelas coisas quando as
trazemos para o enlace do nosso cuidado e, assim, façamos com que elas se tornem
familiares ao nosso mundo. O homem pode se construir a partir de suas ocupações, mas é
preciso cautela para que não fique de tal modo imerso no mundo das suas ocupações, que
acabe se dispersando em sua multiplicidade (FERNANDES, 2011).
Na obra Ser e Tempo, Heidegger (2001) nos apresenta uma fábula que diz que o
homem é formado por um corpo de argila que foi moldado pelo cuidado, e este pediu a
Júpiter para soprar um espírito sobre a obra criada. Júpiter, a terra e o cuidado disputavam
qual nome a criação receberia, Saturno foi o árbitro que estabeleceu que após a morte o
corpo voltasse para a terra, o espírito para Júpiter e em vida pertenceria ao cuidado, e
também escolheu o nome de homem para o ser, devido ao elemento de que consiste
(húmus).
Nascimento (2010) analisa esta fábula dizendo que primazia do cuidado proposta
por Heidegger está direcionada a um ser que é composto de corpo e espírito; que o homem
tem esse nome não pelo seu ser, mas pela matéria de que se constitui. Ayres (2004) também
123 - Caderno de texto – IV Congresso de Fenomenologia da Região Cenro-Oeste.
reflete sobre a mesma e acha curioso o fato do cuidado ter achado a argila para moldar
enquanto se movia sobre o leito do rio, o que ele relaciona com a formação da identidade
do humano, que também é fruto do movimento da vida, que faz com que ela seja
construída no e pelo ato de viver, e esta se faz na presença do outro.
O cuidado não é o Ser, mas é só através dele que este pode existir; ele não é o
espírito nem a matéria, mas é a causa de relação entre eles; o cuidado é uma dádiva do
tempo, mas este só existe graças a ele (AYRES, 2004). Heidegger (2001) sugere que o
cuidado seja a categoria possibilitadora de colocar em sintonia esse plano sem começo nem
fim, no qual o ser do humano seria o resultado de sua ocupação de si como resultado de si.
apresenta ao ser desde o momento da sua concepção. Uma mulher deve cuidar do ser que
está gerando para que este possa nascer com saúde. Somos muito frágeis ao nascer, sem
que hajaum cuidador não seria possível um pleno desenvolvimento físico e cognitivo, pois
precisamos de alguém que nos ensine como podemos nos tornar humanos. Quando já
indivíduo pode não ser capaz no momento de tomar decisões e precise que alguém o ajude
nisso, ele pode não ser capaz ainda de aprender a pescar, mas em certo momento, ele
deverá tomar novamente as rédeas. A anteposição também pode forçar o indivíduo a se
deparar com barreiras que ele não está pronto para suportar, então é preciso usar prudência
(PALA, 2010).
O cuidado trás uma nova dimensão à prática psicológica, pois o cuidado diz de um
acolhimento que é buscado pelo sujeito que vai até a clínica, e, portanto precisa ser
escutado (SILVA, 2001; DUTRA, 2004). Nesse sentido a clínica psicológica “devolve ao
homem o cuidado por sua existência, ou seja, a sua própria tutela” e no exercício da clínica
fenomenológico-existencial o clínico acolhe o outro como ele se mostra, suspendendo
todos os esclarecimentos prévios, inclusive diagnósticos (FREJOO e PROTASIO, 2010).
Anais do Congresso de Fenomenologia da região Centro-Oeste
Caderno de textos - IV Congresso de Fenomenologia da região Centro-Oeste - 19 – 21 de Setembro de 2011
SESSÃO DE COMUNICAÇÕES
“cabe ao terapeuta cuidar do ser e ensiná-lo a cuidar de si e não somente tratar a doença”
(REHFELD, 2000).
O terapeuta deve atuar como um jardineiro que cultiva uma planta. O jardineiro
não produz a planta como se produz um automóvel, não cria a terra nem a semente, nem
somos seres do cuidado e Fernandes (2011) nos mostra que precisamos sempre cuidar do
nosso cuidado, e é isso que o terapeuta fará com o cliente: ajudará que este encontre uma
forma de cuidar do seu cuidado, verificando como andam as ocupações do cliente, se ele
deixou que suas ocupações fizessem-no se afastar de si mesmo, se ele anda se preocupando
muito com as pessoas que o cercam e esquecendo-se de si mesmo. Com isso será feito um
processo de aragem do solo, de busca de uma boa iluminação, um ambiente com clima
favorável.
O resultado da terapia perpassando por todas essas formas de cuidado deve ser um
cliente que tenha condições de cuidar do seu destino, que saiba se ocupar daquilo que faz
bem para si, mas sempre dando manutenção a esse cuidado para que ele não fique
desgastado. O cuidado terapêutico permite ao corpo recompor-se e alcançar sua saúde
(FERNANDES,2011), que deve ser o estado natural do homem. O cliente também será
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capaz de se preocuparde forma sadia das pessoas que estão ao seu redor, sem fazer
substituições que possam tomaro lugar do outro, nem anteposições que possam causar
frustrações nos outros ao forçar além do que estes são capazes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: