Terapia Familiar
Terapia Familiar
Terapia Familiar
pt
Docum ent o produzido em 20- 05- 2012
2012
Mónica Machado
Licenciatura em Psicologia - área de pré-especialização em Psicologia do Desenvolvimento. Mestre
em Psicologia pela Universidade de Coimbra. Psicóloga Clínica & Educacional no Gabinete de
Psicologia e Consultoria Personalidades (Portugal)
E-mail:
monicamachado@personalidades.eu
RESUMO
A terapia familiar apresenta-se como uma área de estudo pouco estudado em psicologia, devido
à própria dificuldade conceptual criada pelos diferentes modelos, ao mesmo tempo que nem sempre é
interpretada como a solução para a resolução de um problema. A terapia familiar implica a visão da
dificuldade de um individuo associada de forma direta ao seu meio familiar, centrando-se a
intervenção na família e no meio em que ele se move e não propriamente na individualidade de cada
um. Neste sentido, o presente artigo tem por base a apresentação da terapia familiar no âmbito da
terapia sistêmica, procurando desmistificar os seus construtos e promover a sua utilização em casos
que se revele como o método terapêutico mais adequado.
1. INTRODUÇÃO
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A terapia familiar baseia a sua intervenção na família enquanto sistema, composto por
elementos que possuem relações de interdependência entre si e que promovem o
desenvolvimento uns dos outros. A terapia familiar centra-se na família como um todo, não a
considerando como uma mera soma das suas partes: tudo que acontece num elemento irá afetar
os outros elementos.
Será feita uma breve exposição histórica das raízes da terapia familiar e da sua evolução
ao longo do tempo, incluindo no nosso país; o que se entende por terapia familiar; quais os seus
pressuposto teóricos e no modo como se desenrola a consulta de terapia familiar, quais as suas
vantagens e que implicações pode acarretar se a intervenção não for corretamente realizada.
Em suma, a terapia familiar pauta-se por ser um bom método terapêutico, uma vez que
permite que todos os membros que a compõem trabalhem para a resolução do problema, ao
mesmo tempo que os responsabiliza e lhe dá poder para que possam tomar as decisões
necessárias para continuarem a progredir ao longo do seu ciclo de vida.
“Há vinte anos começa a desmultiplicar-se a imagem do psicoterapeuta tradicional, sentando e não diretivo,
em proveito de uma equipa terapêutica, muitas vezes interdisciplinar. A aparição de operadores no terreno do
casal, da família, das redes e das instituições, fazia-se acompanhar do desenvolvimento do equipamento técnico,
vídeo e espelho unidireccional, que inquietava alguns, fazia sorrir outros e alimentava todos os fantasmas”
O nascimento deste modelo ocorreu nos Estados Unidos num contexto de mudança de
paradigma: a passagem do pensamento analítico ao pensamento sistémico que tem como
principal corolário “é preciso reunir para compreender”, colocando a tónica no estudo das
relações e das interações, substituindo a causalidade linear pela causalidade circular: Assim,
torna-se impossível isolar o indivíduo do seu meio, ambos evoluem simultaneamente e mudam
reciprocamente. A importância do contexto torna-se mais clara, bem como a noção de co -
evolução, que é determinante na terapia familiar. (Relvas, 1999)
Na década de 50, a interação familiar passou a ser entendida como um processo
patológico presente na etiologia da esquizofrenia, daí que a psiquiatria e a patologia tenham dado
um enorme contributo na formação da terapia familiar. Desta forma, é esboçado um novo
conceito de doença mental em que o sintoma é visto como um comportamento lógico, coerente e
com uma função no contexto em que aparece, passando o doente a ser encarado como um dos
elos de uma cadeia interativa disfuncional de um todo (que está perturbado), no qual se assume
como portador do sintoma (paciente identificado). Assim, a disfuncionalidade do todo ficar-se-ia
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a dever ao jogo de movimentos homeostáticos que o “todo” poria em marcha, com o objetivo da
sua manutenção. (Relvas,1999)
A terapia familiar vai buscar à teoria geral dos sistemas a sua noção básica, isto é, a noção
de sistema que se aplica tanto à compreensão da família como ao processo terapêutico. Da
cibernética retira os conceitos de regulação, funcionamento e evolução do sistema familiar, tanto
no sentido da explicação da normalidade, como da patologia. Das teorias da comunicação retira
uma grelha de análise para a compreensão e intervenção sobre o que se passa na família em
termos de interação. (Relvas, 1999)
Entre os mais importantes autores no âmbito da terapia familiar e do seu
desenvolvimento, encontramos: Milton Erikson (psiquiatra americano) que desenvolveu a
história clínica e uma forma muito particular de fazer terapia assente numa invulgar intervenção
terapêutica. Embora nunca se tenha centrado no trabalho terapêutico com as famílias, influenciou
em muito as ideias dos homens de Palo Alto. Também não devemos ignorar as contribuições de
Bateson (1904-1980), que depois de formações em biologia, trabalhos de cibernética com
Foerster, N. Wiener e K. Lewin, vai para Palo Alto, com um convite para participar num projeto,
aplicando os conceitos sistémicos à comunicação, e desta à psicopatologia e psicoterapia da
esquizofrenia. (Relvas, 1999)
Da equipa de Bateson fizeram parte Jay Haley e Jonh Weakland, que desenvolvem uma
importante atividade de psicoterapeutas e participam nos estudos sobre a “doble-mind”. Mais
tarde, Haley deixa Palo Alto (1967) e junta-se a Minuchin, incorporando uma perspetiva
estratégica de abordagem estrutural. Por seu turno, Don Jackson (psiquiatra e psicanalista) chega
a Palo Alto, onde se dedica ao estudo de conceitos como a homeostase familiar, retroação
positiva e negativa, e causalidade circular. (Relvas, 1999)
Desta forma, podemos encontrar três orientações básicas na investigação conduzida por
este grupo, que corresponde, de certo modo, aos períodos de desenvolvimento da terapia familiar:
1) a partir de 1949 estudo da comunicação humana centrada nos trabalhos e autores referidos
anteriormente; 2) em 1959, Don Jackson, funda o Mental Research Institute (MRI), consagrado à
investigação, formação de terapeutas e prática do trabalho clínico com famílias; 3) em 1967 é
recriado por R. Fish, J. Weakland e P. Watzlawick o Brief Therapy Center, para a investigação
das ideias estratégicas ericksonianas. (Relvas, 1999)
Em 1961, surge a revista Family Process e dá-se um novo passo: o seu primeiro número
foi inteiramente dedicado à terapia familiar. Ainda ao longo da década de 60, Salvador Minuchin
e Murray Bowen desenvolvem e apresentam os seus próprios modelos sistémicos de
compreensão e intervenção familiares. Em 1967, Palazzoli cria em Milão o primeiro centro de
terapia familiar da Europa. (Relvas, 2002)
Em 1991, Rey e Prieur, afirmaram que a imagem do psicoterapeuta tradicional estava a
desvanecer-se em proveito da equipa terapêutica, muitas vezes interdisciplinar. A aparição de
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operadores no terreno do casal, da família, das redes e das instituições, acompanhado pelo
desenvolvimento de equipamento técnico, vídeo e espelho unidirecional. (Relvas, 2002)
Foi nos anos 80 que ocorreu um regresso à origem das preocupações sistémicas, isto é,
começa a criar-se a tendência de “sair” da família e considera-la como um contexto entre outros
significativos incluindo na intervenção clínica e na compreensão do problema. Pode-se dizer que
“na terapia familiar se avançou da despatologização para a desfamiliarização”.(Relvas, 1999,
cit in Relvas, 2002), isto é, aquele que intervém tem que pontuar o contexto que lhe parece mais
relevante na definição/ descrição do problema e no qual deverá ocorrer a intervenção, que pode
não ser obrigatoriamente na família, mas sim na escola, empresa ou bairro. Daqui depreende-se
os motivos para se falar, cada vez mais, em abordagem e intervenção sistémica ou consulta de
sistemas (Relvas, 2002).
Outro aspeto evolutivo prende-se com a vertente teórica e epistemológica: a partir dos
anos 80 ocorre a reconceptualização da terapia familiar que tem como objetivo o respeito
renovado pela complexidade sistémica. Autores de outras disciplinas (Maturana e Varela,
Prigogine, Von Foerster) facilitaram a transformação deste modelo, reforçando a base ecológica,
social e comunicacional da compreensão das dificuldades com a introdução da noção da auto
referência do terapeuta no processo. Os sistemas descritivos-explicativos da patologia são cada
vez menos aceites e o termo problema substitui o de disfuncionamento, em que a preocupação do
terapeuta não é a patologia da criança ou a disfuncionalidade familiar, mas sim em todos.
(Relvas, 2002)
Hoje em dia a terapia familiar pode ser caracterizada por integrar uma epistemologia, um
corpo teórico e uma abordagem terapêutica. A epistemologia particular, não causalista e
sistémica, que estipula que os problemas humanos não têm apenas um sentido, mas também
possuem uma função no contexto mais alargado em que ocorrem. (Relvas, A. P., 1999)
“Há mais de uma década, quase duas, que a terapia familiar atingia a sua própria
adolescência. Como qualquer adolescente sentiu, então, a necessidade de se questionar (e há sua
família) sobre a sua história, passada e futura! Desenvolveu esse questionamento no seio do
mundo atrás do espelho (de visão num só sentido) povoado, entre outras coisas, por ideias,
técnicas, teorias e, principalmente, por terapeutas. Descobriu, aí, a inevitabilidade solidária e
complementar de juntar dois irmãos até há data muitas vezes desavindos: o “saber-fazer” e o
“saber-pensar”. Mas, para que tudo corresse bem, era preciso juntá-los sob a orientação e
ajuda de um terceiro irmão, em boa verdade um pouco esquecido pela família: tratava-se do
“saber-ser”.
Seguia assim o conselho de um velho e sábio avô Bateson, redescobrindo o padrão que
liga, ou seja, o caminho da sua história rumo à maturidade que, secretamente, deseja que nunca
venha a ser completamente alcançada para nunca cair na tentação de se acomodar e acreditar
que já tudo sabe”(Relvas, 2000 cit in Relvas, 2002).
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♣ A necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da família que tem de ter
sempre em consideração a dinâmica familiar e o seu processo de mudança; a
organização das relações interpessoais e uma conceção sobre a saúde mental vs
patologia da família, à qual se irão ajustar os procedimentos técnicos (Vetere, 1987, cit
in Gameiro, 1992);
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Devido ao facto da terapia familiar possuir várias correntes e, como tal, várias teorias e
metodologias de intervenção, eu decidi centrar-me na terapia familiar sistémica, que teve a sua
origem na escola de Palo Alto. A terapia familiar sistémica assenta numa teoria comportamental
da comunicação e numa estratégia pragmática. Esta abordagem privilegia a observação, no seio
da família, das condutas interativas e das trocas comportamentais manifestas das quais se tende a
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A conceção de família até aqui apresentada respeita a atual noção de sistema entendido
como um conjunto ativo, estruturado, que se define em função das diferenças que apresenta na
relação com os contextos em que vive e nas finalidades que constituem a sua razão de existir.
Relação e organização são as palavras-chave deste conceito, correspondendo, respectivamente, às
capacidades interativas (circularidade, retroatividade) e auto - organizativa dos sistemas (Relvas,
2000).
A terapia familiar mostrou que a família deve ser entendida na sua globalidade, ou seja,
como sistema que cria através de relações e interações algo único e não sobreponível à soma das
pessoas que a compõem. Por outras palavras, permitiu descobrir como os indivíduos, as suas
famílias e o seu sofrimento não podem ser isolados ou desligados dos contextos de vida em que
participam, quer eles sejam privados ou mais sociais e comunitários. Não se deve ignorar que
tudo isto deve ser relacionado com o presente, ao mesmo tempo que não pode ser dissociado da
sua própria história individual e familiar (Relvas, 2002).
A família é um sistema em constante transformação e que se adapta às diferentes
exigências das diversas fases do seu ciclo de desenvolvimento, assim como às mudanças e
solicitações sociais com o fim de assegurar a continuidade e o crescimento psicossocial dos seus
membros. Esta continuidade e crescimento desenvolvem-se através de um equilíbrio dinâmico
entre duas funções: a tendência homeostática e a capacidade de transformação, isto é, circuitos
retroativos agem através de um mecanismo de feedback em direção à manutenção da
homeostasia (retroação negativa) ou em direção à mudança (retroacção positiva). (Andolfi,
1995)
Esta ideia da família como um sistema em constante transformação remete para a ideia de
mudança , ou seja, cada família vai-se transformando ao longo do seu tempo de vida em três
aspetos fundamentais: estrutural, interaccional e funcional. Cada família nuclear percorre um
ciclo vital, marcado por etapas desenvolvimentais, caracterizado pela prossecução de objetivos
específicos que concorrem para a obtenção de um único objetivo: a sobrevivência do sistema
familiar. A mudança é um conceito fundamental para se perceber a família numa perspetiva
sistémica, aparecendo associada ao fator tempo processual e familiar, no qual os diversos
momentos estruturais da família se vão articulando progressivamente. Não se trata de uma
mudança oposta à não mudança, já que a estabilidade não significa uma paragem na evolução da
vida do sistema familiar, dado que estabilidade e mudança são duas faces da mesma moeda: uma
família encontra-se em mudança permanente (Relvas, 2000).
Assim sendo, os momentos de mudança correspondem às chamadas crises, definidas por
Minuchin (1974) como uma ocasião de evolução e risco de patologia. As crises, embora
impliquem stress, não se relacionam com o carácter agradável ou desagradável, nem com a carga
afetiva negativa de determinada situação ou etapa da vida familiar. As crises podem relacionar-se
com as exigências de mudanças internas ou externas, com as tarefas normativas do evoluir
familiar (etapas do ciclo vital) ou com situações e fontes de stress acidentais que, de algum
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modo, intersectam ou colidem com o caminho da família ao longo do seu ciclo de vida (Relvas,
2000).
Em suma, terapia familiar teve o mérito de fornecer todo um conjunto de técnicas
específicas de intervenção que, acopladas à entrevista familiar conjunta baseada na circularidade,
se constituiu como um meio para a atualização de estratégias que se propõem a perseguir os
objetivos terapêuticos definidos pelo conjunto de clientes e terapeuta.
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Contudo, existem alguns elementos que se podem ressaltar do todo que é a terapia familiar:
a necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da família e deve satisfazer os
seguintes requisitos:
1. Descrever e explicar a estrutura familiar, a sua dinâmica, processo e mudança;
2. Descrever as estruturas interpessoais e as dinâmicas emocionais dentro da família;
3. Ter em conta a família como ligação entre o individual e a cultura;
4. Descrever o processo de individuação e a diferenciação dos membros da família;
5. Prever a saúde e a patologia dentro da família, isto é, ter um conjunto de hipóteses
acerca do funcionamento familiar e das causas da disfunção;
6. Prescrever estratégias terapêuticas para lidar com a disfunção familiar. (cit. em
Gameiro, 1992)
Então, o processo terapêutico pode ser definido como a psicoterapia de um sistema social
natural, a família, utilizando como técnica base a entrevista interpessoal conjunta (cit. Relvas,
2000: 29). A família e o terapeuta passam a formar o sistema terapêutico, numa acoplagem em
que cada qual mantém intacta a sua organização e autonomia. Desta forma, a psicoterapia vai-se
desenrolando através da realização de diversas entrevistas com os elementos da família,
pontuados pelo terapeuta como importantes no contexto em que surge o sintoma. O terapeuta
pode trabalhar diretamente com um só indivíduo, com um ou mais subsistemas. O ritmo e
periodicidade das entrevistas variam conforme o terapeuta, podem ser mais ou menos espaçadas,
regulares ou não. Ao longo de todo este processo, vão-se utilizando técnicas próprias de cada
modelo, aplicadas de forma pessoal por cada terapeuta, tendo como objetivo ultimo a mudança
da estrutura da família, ou seja, a mudança da forma como mantém a sua organização. (Relvas,
2000)
Quanto ao papel do terapeuta e à formação, nas palavras de Andolfi (1980) será sempre um
“encenador do drama familiar” no sentido em que, conjuntamente com a família e aproveitando
o seu potencial de mudança, vai reestruturando o “guião” que esta lhe apresenta, relativo ao seu
vivido familiar, num cenário à partida modificado pela sua inclusão de um novo elemento da
cena. Exerce um papel ativo, mas que não procura impor à família uma realidade que é dele.
Rigorosamente, deve-se falar em terapia com a família e nunca de uma terapia da família.
(Relvas, 2000). Assim sendo, a atitude do terapeuta não é a de tentar explicar um indivíduo,
observado isoladamente, sobre o qual realizará inferências, mas sim de um participante num
processo ativo que parte das observações das interações entre os membros da família e entre esta
com os outros sistemas que com ela interagem. (Andolfi, 1995). É este terapeuta, como agente de
mudança, que favorece a amplificação das flutuações do sistema, de modo a que este, através da
reestruturação, evolua para um novo nível de estabilidade: mais diretivo, provocador e consultor
(Relvas, 2000).
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O terapeuta deve observar o indivíduo no seu contexto de interação (família, escola, bairro),
nos quais o seu comportamento “diferente” pode assumir um outro significado. O terapeuta
prescinde da necessidade de reconstruir uma história e uma evolução clínica com fins amnésicos,
preferindo começar do zero, analisando as relações no aqui e no agora entre o individuo e o
sistema interativo num único ato de observação. Assim, a família passa a ser considerada um
sistema interativo, não como uma soma de uma série de comportamentos individuais desligados
entre si. (Andolfi, 1995)
O terapeuta não deve ignorar o facto de a vinda da família à consulta como grupo poder ser
ligeiramente embaraçante, em que qualquer um dos familiares pode estar ali contra a sua
vontade. A verdade é que aquele que é apresentado como “perturbado” é o que se sente mais
melindrado com esta situação, já que sabe que é a razão da vinda à consulta. Andolfi (1995)
refere que cabe ao terapeuta criar um contexto terapêutico tranquilizante e colaborante, evitando
pôr-se no papel de juiz que deve emitir um veredicto, ou no papel de um aliado ou defensor de
quem parece débil.
A grande maioria dos familiares é enviada para a terapia já com um diagnóstico formulado,
daí que seja condicionados, no desespero de tal ocorrência, a raciocinar segundo a lógica da
delegação absoluta para o técnico, ou seja, consideram que cabe ao terapeuta modificar o que não
funciona no doente ou fornecer algumas indicações para saírem do problema, não esperando um
pedido de participação na promoção da resolução do problema. Ao contrário do que a maioria
das famílias pensa, a solução do problema não está nas indicações do médico ou na intervenção
farmacológica, mas sim na análise sistémica dos problemas reais da família e na ativação de
todas as valências positivas e auto - terapêuticas que cada núcleo social possui no seu interior.
Será o sistema familiar a tomar a seu cargo a gestão dos problemas de interação pouco a pouco
evidenciados, funcionando como o eixo do processo terapêutico (Andolfi, 1995).
O papel deste terapeuta relacional será, numa primeira fase, ser o consultor dos problemas
que da família e depois o supervisor dos esforços desenvolvidos por ela no decorrer da terapia.
Para que tal seja possível concretizar há que começar a fazer parte do sistema familiar, com a sua
bagagem técnica de experiência, personalidade, sentido de humor e capacidade de sentir as
emoções dos outros, renunciando à ideia de mágico, de alguém de “ferro”. Deve ser capaz de
avaliar se a intervenção é correta, negando a terapia quando o problema é resultante de
contradições sociais, mascarado por um sintoma psiquiátrico ou no caso da família se mostrar
constrangida em aceitar uma intervenção imposta por outrem (escola ou instituição) (Andolfi,
1995).
Assim, o problema daquele que levou ao pedido será considerado, mas o terapeuta também
se interessará pelo problema em termos interacionais, ou seja, saber como, quando, onde, com
quem e porquê do comportamento, ao mesmo tempo que explora os efeitos desse nos outros
membros da família e até fora desta (professores, vizinhança, parentes, etc.), bem como ver como
os comportamentos destes últimos se repercutem no comportamento da pessoa apresentada como
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o portador do problema, ou seja, levar em conta o contexto geral em que estas interações têm
lugar (Andolfi, 1995).
Neste sentido, o auto defende que a função do terapeuta é, ainda, a de compreender o
problema em termos e interação através do contributo de todos os membros da família, traçando
na sua mente um mapa da estrutura familiar com base nas interações mais significativas intra e
extrafamiliares, ou seja, pode-se pedir a todos os membros da família que definam objetivos que
conduzam a uma mudança estável e à solução do problema Aqui o terapeuta deve realizar um
mapa do tempo decorrido desta família, isto é, realizar o mapa vital, no qual será realizado uma
descrição dos obstáculos com que se podem deparar na resolução do problema e para passar com
êxito para a próxima etapa (Sidelski, D., 2000). Desta forma, a terapia deixa de ter o seu quê de
mistério, passando a revelar um compromisso de colaboração entre todos (família e terapeuta),
em que o terapeuta apresenta um papel privilegiado: o de ativador e mediador da família. Este
pressuposto aplica-se quer ao contexto familiar, quer ao extrafamiliar, para o qual pode ser
necessário propor soluções e ativar comportamentos. (Andolfi, 1995)
Por fim, não devemos esquecer o setting: os meios técnicos audiovisuais, como o espelho
unidireccional ou o equipamento de vídeo, que se convertem num importante instrumento
terapêutico ou de suporte de trabalho. Além de sustentarem algumas técnicas particulares, como
reforço da delimitação de sub-sistemas ou play-back, são ainda utilizadas formalmente no
processo terapêutico, quer como auxiliares dos terapeutas para uma posterior reflexão e estudo do
caso, quer como meio de funcionamento da equipa terapêutica (Relvas, 2000).
A instalação e utilização deste equipamento implica sempre uma organização adequada do
espaço físico: o espaço terapêutico deve ser dividido em duas salas contíguas (de entrevista e
observação), separadas pelo espelho unidirecional e com comunicação através de um sistema de
som. No mobiliário da sala de entrevista não devem ser esquecidos os brinquedos e jogos para
crianças. Aqui, é de salientar que este setting terapêutico deve ser de imediato apresentado à
família, explicando quais as razões da sua disposição e composição, nunca esquecendo de
solicitar à família a autorização para utilizar o material (sobretudo o de gravação) (Relvas, 2000).
Quanto às implicações terapêuticas da terapia familiar encontramos: razões que legitimam
fazer psicoterapia com a família enquanto totalidade, em que o comportamento sintomático é
entendido como uma mensagem e um comportamento interaccional adequado ao contexto em
que se manifesta. Por exemplo, quando na intervenção se assume que o que está em jogo é o
aspeto relacional, é precisamente sobre a relação que se vai intervir através da implementação da
mudança dos processos comunicacionais nela implicados. Desta forma entende-se que a terapia
da família não tem de ser obrigatoriamente feita com toda a família, pelo que se justifica que se
possa falar de uma intervenção sistémica junto do indivíduo, do casal, da instituição, etc. (Relvas,
2000)
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4. CONCLUSÃO
Quem somos nós sem família? Quem somos nós sem o seu apoio, sem o seu carinho, sem o
seu acolhimento? Nunca nos devemos esquecer que somos um pouco da família onde crescemos,
do meio em que vivemos, das pessoas com que interagimos.
A terapia familiar procura colocar a família no centro das atenções. As relações que se
estabelecem no seu meio podem ser a justificação para o problema, ao mesmo tempo que pode
proporcionar a solução mais vantajosa para a sua resolução. Por vezes, aquele que se apresenta
como perturbado é aquele que não apresenta nenhum problema, sendo só o reflexo da família em
que se insere.
Mas falar de terapia familiar não é falar só de família e do que acontece no seu seio, mas
sim mostrar que as interações que esta vai estabelecendo com o meio social e cultural que a
rodeia irá exercer influência no modo como os seus membros irão reagir face aos problemas e até
com a forma como esses “distúrbios” poderão surgir. Trata-se de inserir a família na terapia, co -
responsabiliza-la das decisões a tomar e dos objetivos a alcançar, em que o terapeuta deve apenas
ser um mediador, mostrando à família que ela possui capacidades próprias para a resolução
daquilo que a perturba.
Para concluir, a terapia familiar não é só um modelo, embora aqui tenha falado
predominantemente no modelo de terapia familiar sistémico existem outros de orientação
cognitivo comportamental. Este tipo de terapia é utilizado para cobrir uma grande parte de
intervenções com crianças e adolescentes com problemas de ordem psíquica e mental de modo a
realizar uma reestruturação cognitiva. A terapia cognitivo-comportamental centra-se, sobretudo,
no desenvolvimento da criança ou adolescente, em que os pais serão participantes ativos na
resolução dos seus problemas. (Bolton, D., 2002 in Graham, P., 2002)
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BIBLIOGRAFIA
Graham, P. (2002). Cognitive- Behaviour Therapy for children and families. (Cap. II).
Cambridge: Cambridge University Press
Relvas, A. P., (2000). Por detrás do espelho: da teoria à terapia com a família.(p. 21-33).
Coimbra: Quarteto
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Anexo 1
Elementarista/ analítico
T. F. Comunicacional T. F. Psicodinâmica
Holista
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