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Terapia Familiar

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COMPREENDER A TERAPIA FAMILIAR

2012

Mónica Machado
Licenciatura em Psicologia - área de pré-especialização em Psicologia do Desenvolvimento. Mestre
em Psicologia pela Universidade de Coimbra. Psicóloga Clínica & Educacional no Gabinete de
Psicologia e Consultoria Personalidades (Portugal)

E-mail:
monicamachado@personalidades.eu

RESUMO

A terapia familiar apresenta-se como uma área de estudo pouco estudado em psicologia, devido
à própria dificuldade conceptual criada pelos diferentes modelos, ao mesmo tempo que nem sempre é
interpretada como a solução para a resolução de um problema. A terapia familiar implica a visão da
dificuldade de um individuo associada de forma direta ao seu meio familiar, centrando-se a
intervenção na família e no meio em que ele se move e não propriamente na individualidade de cada
um. Neste sentido, o presente artigo tem por base a apresentação da terapia familiar no âmbito da
terapia sistêmica, procurando desmistificar os seus construtos e promover a sua utilização em casos
que se revele como o método terapêutico mais adequado.

Palavras-chave: Terapia familiar, terapia sistémica

1. INTRODUÇÃO

Família é definida como um grupo de indivíduos unidos por laços transgeracionais e


interdependentes quanto aos elementos fundamentais da vida. Freud e seus sucessores referem-se
aos membros da família enquanto atores no desenvolvimento psíquico de um indivíduo, mas não
se referem a qualquer teoria psicanalítica da família enquanto grupo. (Doron & Parot, 2001)
Neste artigo será abordado o tema da terapia familiar, sobretudo a terapia família
sistémica que se baseia nos trabalhos de L. Von Bertalanffy, autor da teoria geral dos sistemas
que postula que os diversos domínios da atividade se modelizam por meio da noção de sistema
formal, ou seja, um conjunto de elementos ou de partes interdependentes que se constituem uma
totalidade organizada. (Doron & Parot, 2001)

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A terapia familiar baseia a sua intervenção na família enquanto sistema, composto por
elementos que possuem relações de interdependência entre si e que promovem o
desenvolvimento uns dos outros. A terapia familiar centra-se na família como um todo, não a
considerando como uma mera soma das suas partes: tudo que acontece num elemento irá afetar
os outros elementos.
Será feita uma breve exposição histórica das raízes da terapia familiar e da sua evolução
ao longo do tempo, incluindo no nosso país; o que se entende por terapia familiar; quais os seus
pressuposto teóricos e no modo como se desenrola a consulta de terapia familiar, quais as suas
vantagens e que implicações pode acarretar se a intervenção não for corretamente realizada.
Em suma, a terapia familiar pauta-se por ser um bom método terapêutico, uma vez que
permite que todos os membros que a compõem trabalhem para a resolução do problema, ao
mesmo tempo que os responsabiliza e lhe dá poder para que possam tomar as decisões
necessárias para continuarem a progredir ao longo do seu ciclo de vida.

2. UM POUCO DE HISTÓRIA: A TERAPIA FAMILIAR

“Há vinte anos começa a desmultiplicar-se a imagem do psicoterapeuta tradicional, sentando e não diretivo,
em proveito de uma equipa terapêutica, muitas vezes interdisciplinar. A aparição de operadores no terreno do
casal, da família, das redes e das instituições, fazia-se acompanhar do desenvolvimento do equipamento técnico,
vídeo e espelho unidireccional, que inquietava alguns, fazia sorrir outros e alimentava todos os fantasmas”

Rieu & Prieur, 1991, in Relvas,1999

O nascimento deste modelo ocorreu nos Estados Unidos num contexto de mudança de
paradigma: a passagem do pensamento analítico ao pensamento sistémico que tem como
principal corolário “é preciso reunir para compreender”, colocando a tónica no estudo das
relações e das interações, substituindo a causalidade linear pela causalidade circular: Assim,
torna-se impossível isolar o indivíduo do seu meio, ambos evoluem simultaneamente e mudam
reciprocamente. A importância do contexto torna-se mais clara, bem como a noção de co -
evolução, que é determinante na terapia familiar. (Relvas, 1999)
Na década de 50, a interação familiar passou a ser entendida como um processo
patológico presente na etiologia da esquizofrenia, daí que a psiquiatria e a patologia tenham dado
um enorme contributo na formação da terapia familiar. Desta forma, é esboçado um novo
conceito de doença mental em que o sintoma é visto como um comportamento lógico, coerente e
com uma função no contexto em que aparece, passando o doente a ser encarado como um dos
elos de uma cadeia interativa disfuncional de um todo (que está perturbado), no qual se assume
como portador do sintoma (paciente identificado). Assim, a disfuncionalidade do todo ficar-se-ia

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a dever ao jogo de movimentos homeostáticos que o “todo” poria em marcha, com o objetivo da
sua manutenção. (Relvas,1999)
A terapia familiar vai buscar à teoria geral dos sistemas a sua noção básica, isto é, a noção
de sistema que se aplica tanto à compreensão da família como ao processo terapêutico. Da
cibernética retira os conceitos de regulação, funcionamento e evolução do sistema familiar, tanto
no sentido da explicação da normalidade, como da patologia. Das teorias da comunicação retira
uma grelha de análise para a compreensão e intervenção sobre o que se passa na família em
termos de interação. (Relvas, 1999)
Entre os mais importantes autores no âmbito da terapia familiar e do seu
desenvolvimento, encontramos: Milton Erikson (psiquiatra americano) que desenvolveu a
história clínica e uma forma muito particular de fazer terapia assente numa invulgar intervenção
terapêutica. Embora nunca se tenha centrado no trabalho terapêutico com as famílias, influenciou
em muito as ideias dos homens de Palo Alto. Também não devemos ignorar as contribuições de
Bateson (1904-1980), que depois de formações em biologia, trabalhos de cibernética com
Foerster, N. Wiener e K. Lewin, vai para Palo Alto, com um convite para participar num projeto,
aplicando os conceitos sistémicos à comunicação, e desta à psicopatologia e psicoterapia da
esquizofrenia. (Relvas, 1999)
Da equipa de Bateson fizeram parte Jay Haley e Jonh Weakland, que desenvolvem uma
importante atividade de psicoterapeutas e participam nos estudos sobre a “doble-mind”. Mais
tarde, Haley deixa Palo Alto (1967) e junta-se a Minuchin, incorporando uma perspetiva
estratégica de abordagem estrutural. Por seu turno, Don Jackson (psiquiatra e psicanalista) chega
a Palo Alto, onde se dedica ao estudo de conceitos como a homeostase familiar, retroação
positiva e negativa, e causalidade circular. (Relvas, 1999)
Desta forma, podemos encontrar três orientações básicas na investigação conduzida por
este grupo, que corresponde, de certo modo, aos períodos de desenvolvimento da terapia familiar:
1) a partir de 1949 estudo da comunicação humana centrada nos trabalhos e autores referidos
anteriormente; 2) em 1959, Don Jackson, funda o Mental Research Institute (MRI), consagrado à
investigação, formação de terapeutas e prática do trabalho clínico com famílias; 3) em 1967 é
recriado por R. Fish, J. Weakland e P. Watzlawick o Brief Therapy Center, para a investigação
das ideias estratégicas ericksonianas. (Relvas, 1999)
Em 1961, surge a revista Family Process e dá-se um novo passo: o seu primeiro número
foi inteiramente dedicado à terapia familiar. Ainda ao longo da década de 60, Salvador Minuchin
e Murray Bowen desenvolvem e apresentam os seus próprios modelos sistémicos de
compreensão e intervenção familiares. Em 1967, Palazzoli cria em Milão o primeiro centro de
terapia familiar da Europa. (Relvas, 2002)
Em 1991, Rey e Prieur, afirmaram que a imagem do psicoterapeuta tradicional estava a
desvanecer-se em proveito da equipa terapêutica, muitas vezes interdisciplinar. A aparição de

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operadores no terreno do casal, da família, das redes e das instituições, acompanhado pelo
desenvolvimento de equipamento técnico, vídeo e espelho unidirecional. (Relvas, 2002)
Foi nos anos 80 que ocorreu um regresso à origem das preocupações sistémicas, isto é,
começa a criar-se a tendência de “sair” da família e considera-la como um contexto entre outros
significativos incluindo na intervenção clínica e na compreensão do problema. Pode-se dizer que
“na terapia familiar se avançou da despatologização para a desfamiliarização”.(Relvas, 1999,
cit in Relvas, 2002), isto é, aquele que intervém tem que pontuar o contexto que lhe parece mais
relevante na definição/ descrição do problema e no qual deverá ocorrer a intervenção, que pode
não ser obrigatoriamente na família, mas sim na escola, empresa ou bairro. Daqui depreende-se
os motivos para se falar, cada vez mais, em abordagem e intervenção sistémica ou consulta de
sistemas (Relvas, 2002).
Outro aspeto evolutivo prende-se com a vertente teórica e epistemológica: a partir dos
anos 80 ocorre a reconceptualização da terapia familiar que tem como objetivo o respeito
renovado pela complexidade sistémica. Autores de outras disciplinas (Maturana e Varela,
Prigogine, Von Foerster) facilitaram a transformação deste modelo, reforçando a base ecológica,
social e comunicacional da compreensão das dificuldades com a introdução da noção da auto
referência do terapeuta no processo. Os sistemas descritivos-explicativos da patologia são cada
vez menos aceites e o termo problema substitui o de disfuncionamento, em que a preocupação do
terapeuta não é a patologia da criança ou a disfuncionalidade familiar, mas sim em todos.
(Relvas, 2002)
Hoje em dia a terapia familiar pode ser caracterizada por integrar uma epistemologia, um
corpo teórico e uma abordagem terapêutica. A epistemologia particular, não causalista e
sistémica, que estipula que os problemas humanos não têm apenas um sentido, mas também
possuem uma função no contexto mais alargado em que ocorrem. (Relvas, A. P., 1999)

“Há mais de uma década, quase duas, que a terapia familiar atingia a sua própria
adolescência. Como qualquer adolescente sentiu, então, a necessidade de se questionar (e há sua
família) sobre a sua história, passada e futura! Desenvolveu esse questionamento no seio do
mundo atrás do espelho (de visão num só sentido) povoado, entre outras coisas, por ideias,
técnicas, teorias e, principalmente, por terapeutas. Descobriu, aí, a inevitabilidade solidária e
complementar de juntar dois irmãos até há data muitas vezes desavindos: o “saber-fazer” e o
“saber-pensar”. Mas, para que tudo corresse bem, era preciso juntá-los sob a orientação e
ajuda de um terceiro irmão, em boa verdade um pouco esquecido pela família: tratava-se do
“saber-ser”.
Seguia assim o conselho de um velho e sábio avô Bateson, redescobrindo o padrão que
liga, ou seja, o caminho da sua história rumo à maturidade que, secretamente, deseja que nunca
venha a ser completamente alcançada para nunca cair na tentação de se acomodar e acreditar
que já tudo sabe”(Relvas, 2000 cit in Relvas, 2002).

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Enquanto que a terapia familiar se desenvolvia e ia aprimorando as suas técnicas no


Estados Unidos e na Europa, aqui em Portugal ainda tinha um longo caminho a percorrer. Só
acerca de vinte e cinco anos atrás é que a terapia familiar chegou a Portugal, apadrinhada por um
grupo de técnicos de saúde mental (Relvas, 2002).
Foi há mais ou menos vinte anos atrás que descobriram a terapia familiar em Portugal, em
que alguns profissionais procuraram estabelecer relações com os grandes fundadores da terapia
familiar nos Estados Unidos, ou a Itália, ter com Maurizio Andolfi e a sua mulher para descobrir
como fazer terapia com a família. Daniel Sampaio e José Gameiro escreveram o primeiro livro
português sobre a terapia familiar., ao mesmo tempo que promoveram formações com os grandes
mestres da terapia familiar sistémica (Andolfi, Fontaine, Caillé, Onnis, Siméon, Ausloos,
Boscolo, Cecchin, Elkaim, Prieur, entre outros). Entretanto, a Sociedade Portuguesa de Terapia
Familiar tinha definido e estabelecido objetivos específicos de formação e surgiram cursos (cinco
a seis anos) que credenciavam os formandos com titulo de terapeuta familiar ou interventor
sistémico (Relvas, 2002).
A terapia familiar, em Portugal e no mundo, foi alvo de inúmeras transformações,
expandindo-a para áreas que pouco tinham a ver com a família, fazendo de outros sistemas o seu
alvo de atuação. Neste processo de crescimento descobriu-se que era útil que os técnicos de
saúde mental pudessem interagir com outros profissionais que tinham interesse nas propostas
sistémicas. Médicos de família, enfermeiros, juristas, professores foram alguns a quem a
formação e as propostas metodológicas de intervenção com vista a uma abordagem sistémica da
realidade têm conduzido ao frutuoso enlace com os psicólogos. (Relvas, 2002)
Atualmente, a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar (sediada em Lisboa) iniciou um
processo de descentralização, abrindo delegações em outras zonas do país (nomeadamente
Coimbra e Porto). Hoje, os seus programas de formação encontram-se voltados não só para a
certificação de terapeutas familiares ou interventores sistémicos, mas também para a
possibilidade de dotar os técnicos das mais diversas áreas de intervenção psicossocial,
permitindo-lhes desenvolver uma postura, compreensão e visão sistémicas das realidades
específicas com que lidam, isto é, tornar a terapia familiar extensível às mais diversas áreas de
aplicação (Relvas, 2002).
Presentemente, a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar continua a fornecer estes
cursos para os mais diversos técnicos com formação superior. Geralmente os cursos são de três
anos, em que o primeiro e o segundo ano são de sensibilização e de formação básica, à qual se
atribui um certificado. Por seu turno, o terceiro ano é só para aqueles que desejam a supervisão,
isto é, trabalhar em casos de intervenção sistémica e de terapia familiar, que é a dita prática
clínica (Relvas, 2002).
Concluindo, o balanço destes vinte e tal anos de terapia familiar em Portugal apresenta
um “saldo positivo”, embora seja importante continuar a pensar no futuro, ou seja, “acreditando

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que assim vamos, todos (terapeutas e clientes), conjuntamente, descobrindo e altivando os


recursos e as competências que ainda não descobrimos que tínhamos…” (Ausloos, 1996; Relvas
& Alarcão, 2001 cit in Relvas, A. P., 2002).

2.1. A (s) terapia (s) familiar (es)


A terapia familiar surgiu dos problemas da clínica psiquiátrica ligados a certos impasses
pragmáticos que a realidade quotidiana colocava aos terapeutas. Aparece como um recurso diante
de realidades inextrincáveis por meio da criação de acontecimentos singulares; inscrevendo-se no
tempo e no espaço; modificando a evolução espontânea da família; estabelecendo uma conexão
entre a semiologia do corpo e a do espírito; dos modos de conduta, emoção e pensamento de
microssistemas familiares em sofrimento A terapia familiar é composta por vários modelos, em
que cada um deve ser visto como um sistema em si mesmo que funcionam como uma espécie de
quadro, de guia de leitura e intervenção que fixa o objeto de estudo sem se confundir com ele
(Miermont,, 1994).
As terapias familiares correspondem a tratamentos psicoterapêuticos ou socioterapêuticos
da família que apresenta dificuldades ligadas a um ou mais pacientes reconhecidos socialmente
como doentes. A conjunção-disjunção dos aspetos psíquicos e sociais reflete-se nas divergências
de pontos de vista entre modelos psicanalíticos e (sócio) sistémicos, sem que seja possível
permanecer muito tempo num envolvimento puramente dicotómico, maniqueísta e exclusivo da
ação e da reflexão a esse respeito (Miermont, 1994).
O termo remete para um conjunto de práticas e de teorias no contexto das quais são
colocados problemas individuais, familiares e sociais; transtornos do comportamento, actos de
delito; violência familiar e social; confrontos interinstitucionais ou transculturais. A finalidade da
terapia familiar é atender as pessoas doentes em conjunto com a sua família, tratar da família, dos
seus membros e do seu ambiente (Miermont, 1994).
Enquanto entidade, a terapia familiar é atravessada por inúmeras correntes aparentemente
contraditórias (psicanalíticas, sistémicas, comportamentais, gestálticas, etológicas, sociológicas,
etc.), supondo sempre um trabalho prévio de indicações e contra-indicações, depreendo-se daí
um vasto leque de práticas. Da estrutura interna da terapia familiar podemos salientar três aspetos
unificadores:

♣ A necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da família que tem de ter
sempre em consideração a dinâmica familiar e o seu processo de mudança; a
organização das relações interpessoais e uma conceção sobre a saúde mental vs
patologia da família, à qual se irão ajustar os procedimentos técnicos (Vetere, 1987, cit
in Gameiro, 1992);

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♣ O processo terapêutico pode ser definido como a psicoterapia de um sistema social


natural, tendo, frequentemente, na base a entrevista interpessoal conjunta. Aqui o
terapeuta deve assinalar quais os elementos da família que participam na entrevista, em
função do seu posicionamento teórico ou da própria fase e vicissitudes do processo
terapêutico. O ritmo, periodicidade, número, duração e espaçamento das sessões variam
em função dos modelos (Relvas, 1999);

♣ O setting especifico da terapia familiar converte-se num instrumento terapêutico por


excelência. O suporte instrumental do terapeuta engloba: técnicas particulares; suporte
de análise do caso e do processo e ainda na formação e supervisão. (Fontaine, 1993;
Bleandonu, 1986, Heivil, 1984).
Assim sendo, as várias escolas da terapia familiar foram sendo reconcetualizadas, mas hoje
em dia a atual a terapia familiar é designada de 2ª ordem ou pós-moderna. De entre as escolas de
terapia familiar, encontramos:

♣ A teoria e terapia dos sistemas familiares de Murray Bowen: elaborou um modelo


teórico de compreensão do sistema familiar e patologias “explicáveis”, em que o seu
paradigma é sistémico, postulando que é necessário compreender o indivíduo através da
forma como se põe e relaciona com o sistema. A importância atribuída à família deriva
do facto de a considerar como um “lugar de criação e sucessão para as gerações
humanas”, em que o ser humano é definido como “familiar e potencialmente criador”.
A sua teoria “estende-se” das relações do indivíduo consigo próprio, com a família
nuclear, às famílias de origem e à sociedade. (Relvas, 1999)
♣ A terapia familiar estratégica, a escola de Palo Alto: existe uma certa dispersão de
abordagens desta terapia familiar estratégica, pela grande quantidade de autores que
fizeram parte desta escola. De qualquer forma, os elementos unificadores desta escola,
para além das conceções dos vários autores que parecem interligar-se, encontramos: a
importância atribuída à comunicação e aos efeitos que os seus paradoxos exercem
sobre o comportamento, em termos de compreensão da patologia e da sua utilização
terapêutica; a componente estratégica que se refere ao terapeuta que define objetivos
claros que incluem a resolução dos problemas apresentados; e o ressaltar do papel
diretivo do terapeuta que implica que ele seja considerado “agente de mudança e
responsável pela promoção da estratégia planificada com vista a resolução do
problema” (cit Relvas,1999). Um outro ponto é o facto de se tratar de um modelo
estratégico, ou seja, considera-se mais esta corrente uma prática do que uma teoria, em
que esta afirmação será tanto mais correta se falar em teoria da mudança, que postula
que os sistemas estão em permanente mudança e é nela que se centra a génese dos
problemas. (Relvas, 1999)
♣ A terapia familiar estrutural constitui uma escola que afirma que uma estrutura é
desenvolvida por uma personalidade original que se elaborou como um todo coerente.

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Possui uma conceção e prática adaptadas a pacientes e a um método particular, de onde


emerge um conjunto de conhecimentos equacionados e organizados com a preocupação
de serem transmitidos. O seu principal representante é Salvador Minuchin e defende
que a família deve ser entendida como uma organização de sujeitos, que comporta
transições funcionais evolutivas (ciclo vital) que implicam definir limites e hierarquias,
alianças e distanciamentos, bem coligações, ou seja, trata-se da aplicação da noção de
estrutura ao grupo familiar em estreita ligação com o sistema (Relvas, 1999).
♣ Por fim a terapia familiar de 2ª ordem, que engloba as implicações decorridas da
evolução dos modelos de terapia familiar anteriormente referidos e equacionados a dois
níveis: a própria visão sistémica da família e da concepção da intervenção,
particularmente no que se refere à criação do sistema terapêutico formado por
terapeutas e famílias (Relvas, 1999).
Apesar das várias teorias subjacentes na área da terapia familiar, esta continuou a ser vista
como um sistema que integra influências externas, mas que não está dependente delas, ao mesmo
tempo que existem forças internas que contribuem para a sua regulação, conferindo-lhe uma
capacidade auto - organizativa, coerência e consistência no jogo de equilíbrios dinâmicos
interior-exterior. Quanto à criação do sistema terapêutico: o terapeuta deixa de ser um mero
observador neutro e exterior ao sistema, passando a ser encarado como um observador-
participante na realidade em construção de acordo com a teoria dos sistemas, implicando sempre
uma acoplagem de dois sistemas (terapeuta e família) que se perturbam mutuamente (Relvas,
1999).
Para concluir, resta-me dizer que a terapia familiar, embora formada por várias correntes,
com conceções muito diferentes entre si, não se descurou do seu elemento principal: a família,
enquanto agente de mudança e com poder para mudar o seu funcionamento e progredir ao longo
do seu ciclo vital. Hoje, sabe-se que a família é entendida como um sistema em constante
transformação e mudança, devendo estes dois pontos nunca ser esquecidos numa situação de
intervenção terapêutica. A família é um todo que não pode, nem deve, ser dissociado das suas
partes, em que todos os seus elementos contribuem, de igual modo, para o seu desenvolvimento e
bom funcionamento. (ver anexo 1)

3. A TERAPIA FAMILIAR SISTÉMICA: ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS

Devido ao facto da terapia familiar possuir várias correntes e, como tal, várias teorias e
metodologias de intervenção, eu decidi centrar-me na terapia familiar sistémica, que teve a sua
origem na escola de Palo Alto. A terapia familiar sistémica assenta numa teoria comportamental
da comunicação e numa estratégia pragmática. Esta abordagem privilegia a observação, no seio
da família, das condutas interativas e das trocas comportamentais manifestas das quais se tende a

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denunciar os efeitos patogénicos. A terapia sistémica possui as suas próprias técnicas


(contraparadoxo, conotação positiva, desqualificação, redefinição, reenquadramento e
provocação) para clarificar a comunicação perturbada no sistema familiar (Doron & Poirot,
2001).
Para se falar em terapia familiar deve-se ter em atenção quais são os conceitos básicos em
que assenta esta teoria, bem como a sua importância para a intervenção terapêutica. Entre os
principais conceitos, encontram-se: a noção de família e a ideia de mudança.
A noção de família é o conceito-chave da terapia familiar. Andolfi (1995) considera a
família como um sistema de interacção que supera e articula dentro dela os vários componentes
individuais e, deste modo, a exploração das relações interpessoais e das normas que regulam a
sua vida como grupo. Esta exploração das relações e das normas são necessárias para a
compreensão do comportamento dos membros que a formam, bem como para a formulação de
intervenções eficazes.
Então, a família pode ser considerada como um sistema aberto, social e auto-organizado
constituído por várias unidades ligadas no conjunto, por regras de comportamento e por funções
dinâmicas em constante interação e com trocas com o exterior. A família é um sistema entre
sistemas, essencial à exploração das relações interpessoais e das normas que regulam a vida dos
grupos significativos a que o indivíduo pertence para que seja possível compreender o
comportamento dos membros e formulação de interações eficazes. (Andolfi, 1995)
A família é como um sistema ativo regulado por regras desenvolvidas e modificáveis no
tempo através de tentativas e erros que irão permitir aos vários membros experimentar o que é
permitido na relação e aquilo que não é. Por outras palavras, a formação de uma unidade
sistémica é apoiada em modalidades relacionais peculiares ao próprio sistema e susceptíveis de
novas formulações e adaptações no tempo. A família não é um ser passivo, mas sim um sistema
intrinsecamente activo, em que cada mudança no seu interior (intrasistémica: nascimento dos
filhos, separação, luto, divórcio), ou no seu exterior (intersistémica: mudanças de trabalho ou
contexto, de valores) irá repercutir-se no sistema de funcionamento familiar, exigindo um
processo constante de adaptação (Andolfi, 1995)

Também é um sistema aberto em interação com outros sistemas (escola, emprego,


bairro): as relações intrafamiliares mantêm uma relação dialéctica com as relações sociais: irão
condicioná-las ao mesmo tempo que será condicionada pelas normas e valores da sociedade onde
se encontra, procurando estabelecer um equilíbrio dinâmico. Levi- Strauss refere que tal relação
“não é estática como a parede e os tijolos que a compõem. É antes um processo dinâmico de
tensão e oposição com um ponto de equilíbrio extremamente difícil de encontrar, porque a sua
localização exata é submetida a infinitas variações que dependem do tempo e da sociedade.”
(Levi Strauss, 1967).

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A conceção de família até aqui apresentada respeita a atual noção de sistema entendido
como um conjunto ativo, estruturado, que se define em função das diferenças que apresenta na
relação com os contextos em que vive e nas finalidades que constituem a sua razão de existir.
Relação e organização são as palavras-chave deste conceito, correspondendo, respectivamente, às
capacidades interativas (circularidade, retroatividade) e auto - organizativa dos sistemas (Relvas,
2000).
A terapia familiar mostrou que a família deve ser entendida na sua globalidade, ou seja,
como sistema que cria através de relações e interações algo único e não sobreponível à soma das
pessoas que a compõem. Por outras palavras, permitiu descobrir como os indivíduos, as suas
famílias e o seu sofrimento não podem ser isolados ou desligados dos contextos de vida em que
participam, quer eles sejam privados ou mais sociais e comunitários. Não se deve ignorar que
tudo isto deve ser relacionado com o presente, ao mesmo tempo que não pode ser dissociado da
sua própria história individual e familiar (Relvas, 2002).
A família é um sistema em constante transformação e que se adapta às diferentes
exigências das diversas fases do seu ciclo de desenvolvimento, assim como às mudanças e
solicitações sociais com o fim de assegurar a continuidade e o crescimento psicossocial dos seus
membros. Esta continuidade e crescimento desenvolvem-se através de um equilíbrio dinâmico
entre duas funções: a tendência homeostática e a capacidade de transformação, isto é, circuitos
retroativos agem através de um mecanismo de feedback em direção à manutenção da
homeostasia (retroação negativa) ou em direção à mudança (retroacção positiva). (Andolfi,
1995)
Esta ideia da família como um sistema em constante transformação remete para a ideia de
mudança , ou seja, cada família vai-se transformando ao longo do seu tempo de vida em três
aspetos fundamentais: estrutural, interaccional e funcional. Cada família nuclear percorre um
ciclo vital, marcado por etapas desenvolvimentais, caracterizado pela prossecução de objetivos
específicos que concorrem para a obtenção de um único objetivo: a sobrevivência do sistema
familiar. A mudança é um conceito fundamental para se perceber a família numa perspetiva
sistémica, aparecendo associada ao fator tempo processual e familiar, no qual os diversos
momentos estruturais da família se vão articulando progressivamente. Não se trata de uma
mudança oposta à não mudança, já que a estabilidade não significa uma paragem na evolução da
vida do sistema familiar, dado que estabilidade e mudança são duas faces da mesma moeda: uma
família encontra-se em mudança permanente (Relvas, 2000).
Assim sendo, os momentos de mudança correspondem às chamadas crises, definidas por
Minuchin (1974) como uma ocasião de evolução e risco de patologia. As crises, embora
impliquem stress, não se relacionam com o carácter agradável ou desagradável, nem com a carga
afetiva negativa de determinada situação ou etapa da vida familiar. As crises podem relacionar-se
com as exigências de mudanças internas ou externas, com as tarefas normativas do evoluir
familiar (etapas do ciclo vital) ou com situações e fontes de stress acidentais que, de algum

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modo, intersectam ou colidem com o caminho da família ao longo do seu ciclo de vida (Relvas,
2000).
Em suma, terapia familiar teve o mérito de fornecer todo um conjunto de técnicas
específicas de intervenção que, acopladas à entrevista familiar conjunta baseada na circularidade,
se constituiu como um meio para a atualização de estratégias que se propõem a perseguir os
objetivos terapêuticos definidos pelo conjunto de clientes e terapeuta.

3.1. A escolha da intervenção sistémica: a consulta psicológica da terapia familiar


A terapia familiar, no âmbito da consulta psicológica, irá atravessar diversas etapas que vão
conduzir à concretização de um determinado objetivo. Optar por uma intervenção sistémica leva
a que a família deva ser entendida e analisada como um todo, em que se um membro tem um
determinado problema, toda a família contribui para a sua manutenção ou resolução. Ao
contrário do que se possa pensar, a terapia familiar não passa logo para uma abordagem centrada
na família: irá partir do particular, do individual, do paciente identificado para delinear uma
intervenção centrada e para a família.
Partindo dos pressupostos sistémicos, torna-se necessário ressaltar as razões pelas quais se
deve partir de uma abordagem individual para uma abordagem familiar. Significa que terá que
ser adotado um modelo conceptual que nos leva do mundo interior, dos processos intrapsíquicos,
para um mundo de comportamentos interativos observados no seu contexto temporal e espacial.
A abordagem sistémica está mais virada para o estudo dos acontecimentos e das pessoas em
detrimento da dinâmica interactiva e não tanto para os seus significados intrínsecos (Andolfi,
1995).
Ao adotar os pressupostos sistémicos, toda a família irá ser concebida como um ser vivo,
um sistema autónomo, auto-organizado que tenta progredir ao longo do seu ciclo de vida. Este
“organismo” está em estreita relação com outros sistemas, cada um composto por diferentes
elementos: escola, grupo cultural ou social, nação, bairro, emprego. Desta forma, quando uma
pessoa chega à consulta com algum problema, este encontra-se em toda a família, ou seja, dela
dependerá a forma como ele será resolvido e quais os recursos que dispõe para que tal seja
possível (Sidelski, 2000).
Desta forma, a intervenção sistémica defende que o terapeuta deve convocar toda a família,
procurando estabelecer, desde logo, uma atmosfera de cooperação e confidencialidade (Andolfi,
1995). Falar do processo terapêutico em terapia familiar é um pouco complexo e quase
impossível de fazer de modo genérico, ou seja, o sistema constituído pelo todo teórico-
epistemológico previamente referido compõe-se de vários subsistemas com pressupostos
particulares e técnicas específicas. Dentro destes modelos encontramos: modelo estrutural de
Salvador Minuchin; o modelo estratégico associado à escola de Palo Alto, e o modelo extensivo.
(Relvas, 2000)

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Contudo, existem alguns elementos que se podem ressaltar do todo que é a terapia familiar:
a necessidade que o terapeuta tem de se apoiar numa teoria da família e deve satisfazer os
seguintes requisitos:
1. Descrever e explicar a estrutura familiar, a sua dinâmica, processo e mudança;
2. Descrever as estruturas interpessoais e as dinâmicas emocionais dentro da família;
3. Ter em conta a família como ligação entre o individual e a cultura;
4. Descrever o processo de individuação e a diferenciação dos membros da família;
5. Prever a saúde e a patologia dentro da família, isto é, ter um conjunto de hipóteses
acerca do funcionamento familiar e das causas da disfunção;
6. Prescrever estratégias terapêuticas para lidar com a disfunção familiar. (cit. em
Gameiro, 1992)
Então, o processo terapêutico pode ser definido como a psicoterapia de um sistema social
natural, a família, utilizando como técnica base a entrevista interpessoal conjunta (cit. Relvas,
2000: 29). A família e o terapeuta passam a formar o sistema terapêutico, numa acoplagem em
que cada qual mantém intacta a sua organização e autonomia. Desta forma, a psicoterapia vai-se
desenrolando através da realização de diversas entrevistas com os elementos da família,
pontuados pelo terapeuta como importantes no contexto em que surge o sintoma. O terapeuta
pode trabalhar diretamente com um só indivíduo, com um ou mais subsistemas. O ritmo e
periodicidade das entrevistas variam conforme o terapeuta, podem ser mais ou menos espaçadas,
regulares ou não. Ao longo de todo este processo, vão-se utilizando técnicas próprias de cada
modelo, aplicadas de forma pessoal por cada terapeuta, tendo como objetivo ultimo a mudança
da estrutura da família, ou seja, a mudança da forma como mantém a sua organização. (Relvas,
2000)
Quanto ao papel do terapeuta e à formação, nas palavras de Andolfi (1980) será sempre um
“encenador do drama familiar” no sentido em que, conjuntamente com a família e aproveitando
o seu potencial de mudança, vai reestruturando o “guião” que esta lhe apresenta, relativo ao seu
vivido familiar, num cenário à partida modificado pela sua inclusão de um novo elemento da
cena. Exerce um papel ativo, mas que não procura impor à família uma realidade que é dele.
Rigorosamente, deve-se falar em terapia com a família e nunca de uma terapia da família.
(Relvas, 2000). Assim sendo, a atitude do terapeuta não é a de tentar explicar um indivíduo,
observado isoladamente, sobre o qual realizará inferências, mas sim de um participante num
processo ativo que parte das observações das interações entre os membros da família e entre esta
com os outros sistemas que com ela interagem. (Andolfi, 1995). É este terapeuta, como agente de
mudança, que favorece a amplificação das flutuações do sistema, de modo a que este, através da
reestruturação, evolua para um novo nível de estabilidade: mais diretivo, provocador e consultor
(Relvas, 2000).

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O terapeuta deve observar o indivíduo no seu contexto de interação (família, escola, bairro),
nos quais o seu comportamento “diferente” pode assumir um outro significado. O terapeuta
prescinde da necessidade de reconstruir uma história e uma evolução clínica com fins amnésicos,
preferindo começar do zero, analisando as relações no aqui e no agora entre o individuo e o
sistema interativo num único ato de observação. Assim, a família passa a ser considerada um
sistema interativo, não como uma soma de uma série de comportamentos individuais desligados
entre si. (Andolfi, 1995)
O terapeuta não deve ignorar o facto de a vinda da família à consulta como grupo poder ser
ligeiramente embaraçante, em que qualquer um dos familiares pode estar ali contra a sua
vontade. A verdade é que aquele que é apresentado como “perturbado” é o que se sente mais
melindrado com esta situação, já que sabe que é a razão da vinda à consulta. Andolfi (1995)
refere que cabe ao terapeuta criar um contexto terapêutico tranquilizante e colaborante, evitando
pôr-se no papel de juiz que deve emitir um veredicto, ou no papel de um aliado ou defensor de
quem parece débil.
A grande maioria dos familiares é enviada para a terapia já com um diagnóstico formulado,
daí que seja condicionados, no desespero de tal ocorrência, a raciocinar segundo a lógica da
delegação absoluta para o técnico, ou seja, consideram que cabe ao terapeuta modificar o que não
funciona no doente ou fornecer algumas indicações para saírem do problema, não esperando um
pedido de participação na promoção da resolução do problema. Ao contrário do que a maioria
das famílias pensa, a solução do problema não está nas indicações do médico ou na intervenção
farmacológica, mas sim na análise sistémica dos problemas reais da família e na ativação de
todas as valências positivas e auto - terapêuticas que cada núcleo social possui no seu interior.
Será o sistema familiar a tomar a seu cargo a gestão dos problemas de interação pouco a pouco
evidenciados, funcionando como o eixo do processo terapêutico (Andolfi, 1995).
O papel deste terapeuta relacional será, numa primeira fase, ser o consultor dos problemas
que da família e depois o supervisor dos esforços desenvolvidos por ela no decorrer da terapia.
Para que tal seja possível concretizar há que começar a fazer parte do sistema familiar, com a sua
bagagem técnica de experiência, personalidade, sentido de humor e capacidade de sentir as
emoções dos outros, renunciando à ideia de mágico, de alguém de “ferro”. Deve ser capaz de
avaliar se a intervenção é correta, negando a terapia quando o problema é resultante de
contradições sociais, mascarado por um sintoma psiquiátrico ou no caso da família se mostrar
constrangida em aceitar uma intervenção imposta por outrem (escola ou instituição) (Andolfi,
1995).
Assim, o problema daquele que levou ao pedido será considerado, mas o terapeuta também
se interessará pelo problema em termos interacionais, ou seja, saber como, quando, onde, com
quem e porquê do comportamento, ao mesmo tempo que explora os efeitos desse nos outros
membros da família e até fora desta (professores, vizinhança, parentes, etc.), bem como ver como
os comportamentos destes últimos se repercutem no comportamento da pessoa apresentada como

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o portador do problema, ou seja, levar em conta o contexto geral em que estas interações têm
lugar (Andolfi, 1995).
Neste sentido, o auto defende que a função do terapeuta é, ainda, a de compreender o
problema em termos e interação através do contributo de todos os membros da família, traçando
na sua mente um mapa da estrutura familiar com base nas interações mais significativas intra e
extrafamiliares, ou seja, pode-se pedir a todos os membros da família que definam objetivos que
conduzam a uma mudança estável e à solução do problema Aqui o terapeuta deve realizar um
mapa do tempo decorrido desta família, isto é, realizar o mapa vital, no qual será realizado uma
descrição dos obstáculos com que se podem deparar na resolução do problema e para passar com
êxito para a próxima etapa (Sidelski, D., 2000). Desta forma, a terapia deixa de ter o seu quê de
mistério, passando a revelar um compromisso de colaboração entre todos (família e terapeuta),
em que o terapeuta apresenta um papel privilegiado: o de ativador e mediador da família. Este
pressuposto aplica-se quer ao contexto familiar, quer ao extrafamiliar, para o qual pode ser
necessário propor soluções e ativar comportamentos. (Andolfi, 1995)
Por fim, não devemos esquecer o setting: os meios técnicos audiovisuais, como o espelho
unidireccional ou o equipamento de vídeo, que se convertem num importante instrumento
terapêutico ou de suporte de trabalho. Além de sustentarem algumas técnicas particulares, como
reforço da delimitação de sub-sistemas ou play-back, são ainda utilizadas formalmente no
processo terapêutico, quer como auxiliares dos terapeutas para uma posterior reflexão e estudo do
caso, quer como meio de funcionamento da equipa terapêutica (Relvas, 2000).
A instalação e utilização deste equipamento implica sempre uma organização adequada do
espaço físico: o espaço terapêutico deve ser dividido em duas salas contíguas (de entrevista e
observação), separadas pelo espelho unidirecional e com comunicação através de um sistema de
som. No mobiliário da sala de entrevista não devem ser esquecidos os brinquedos e jogos para
crianças. Aqui, é de salientar que este setting terapêutico deve ser de imediato apresentado à
família, explicando quais as razões da sua disposição e composição, nunca esquecendo de
solicitar à família a autorização para utilizar o material (sobretudo o de gravação) (Relvas, 2000).
Quanto às implicações terapêuticas da terapia familiar encontramos: razões que legitimam
fazer psicoterapia com a família enquanto totalidade, em que o comportamento sintomático é
entendido como uma mensagem e um comportamento interaccional adequado ao contexto em
que se manifesta. Por exemplo, quando na intervenção se assume que o que está em jogo é o
aspeto relacional, é precisamente sobre a relação que se vai intervir através da implementação da
mudança dos processos comunicacionais nela implicados. Desta forma entende-se que a terapia
da família não tem de ser obrigatoriamente feita com toda a família, pelo que se justifica que se
possa falar de uma intervenção sistémica junto do indivíduo, do casal, da instituição, etc. (Relvas,
2000)

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A própria conceção de mudança acarreta implicações importantes para o processo


terapêutico, bem como para o próprio papel do terapeuta. Por outras palavras, faz com que a
noção de cura adotada pelos modelos causalistas lineares seja substituída pela de mudança, ou
seja, o objetivo não é o retrocesso a um estádio anterior de funcionamento onde o comportamento
problemático era inexistente, mas sim uma evolução para um novo estádio. Esta evolução para
um novo estádio permite uma resolução adequada e eficaz da situação problemática ou de crise e,
obviamente, de novas possibilidades de evolução (Relvas, 2000).
Tal como Bateson formulou, a terapia é considerada um processo descritivo de deutero -
aprendizagem, ou seja, o organismo “aprende a aprender”, percebe e assimila um contexto de
interações, o que lhe permite ultrapassar o nível de acolhimento puro e simples de uma
informação, acolhendo novos modos relacionais e novos contextos interaccionais por um
processo de ensaios e erros, permitindo-lhe corrigir os seus fracassos. O objetivo da terapia não é
apenas mudar, mas fundamentalmente aprender a mudar: a mudança é condição dessa
aprendizagem, pois é necessário que o sistema mude para aprender a mudar. O próprio terapeuta
faz parte deste processo, no qual ele próprio se transforma, isto é, incluído no sistema
terapêutico, utiliza-se a si próprio não como um regulador homeostático, mas como um agente
ativador da mudança. Cada terapeuta terá uma representação particular do modo como o fará
(Relvas, 2000).
Assim, uma abordagem interativa sistémica requer uma formação séria e aprofundada,
aproximando-se da família e desta forma poderá revelar conflitos que não pareciam tão evidentes
aos olhos desta, ao mesmo tempo que liberta o doente identificado da sua condição de bode
expiatório. Por outras palavras, para aprender uma abordagem sistémica, o terapeuta em treino
deve trabalhar não só com a família, mas também em contacto directo com a comunidade, em
que o conhecimento teórico dos processos interaccionais tem de ser implementado pela
experiência em campo, ou seja, a dissolução duma divisão rígida tradicional dos papéis
profissionais, ensinando o terapeuta a lidar com novas responsabilidades, requerendo uma
competência genuína e efetiva (ver anexo 2) (Andolfi, 1995).

3.2. Contra- indicações da terapia familiar


Tal como qualquer modalidade de intervenção, também a terapia familiar apresenta os seus
pontos fracos, sejam ao nível da metodologia, seja ao nível da intervenção. Não se tratam de
desvantagens, mas sim casos em que ela parece ser contra - indicada e em que se deve optar por
uma psicoterapia individual. Falar em contra-indicação prende-se com razões de ordem
pragmática, sobretudo no que concerne ao papel que pode exercer no âmbito da terapia familiar.
As ditas contra-indicações são a favor da capacidade que o terapeuta possui de se aliar há
famílias e de as manter em tratamento, bem como com o consentimento que o sistema familiar dá
para que possa ocorrer a mudança (Bloch, 1979).

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Assim sendo, entre as principais contra - indicações da terapia familiar encontram-se:


quando o paciente identificado sofre de pequenos delírios e comportamentos e ações de menor
porte, o mais adequado é utilizar uma psicoterapia individual, centrando-se única e
exclusivamente no indivíduo identificado, dado que ele próprio possui capacidade para resolver o
seu problema. No entanto, a terapia familiar é extremamente adequada em casos de
esquizofrenia, paranoia grave, situações de conflito conjugal e familiar (Bloch, 1979).
Um outro entrave à terapia familiar pode prender-se com o facto de existir uma relação de
extrema dependência entre os membros da família, em que esta funciona como um conjunto
protector, manipulador, directivo e desequilibrado. Nesta situação de nada servirão os esforços
do terapeuta, dado que este tipo de família tende a defender-se e a fechar as suas fronteiras a
forças e elementos exteriores a si, contribuindo para a manutenção do problema (Bloch1979).
A terapia familiar pode não ser útil em quadros de patologia complicados, sobretudo com as
ditas “não-familias”, dado que se pautam por ser um aglomerado de pessoas, com uma estrutura
similar à de uma família, mas na qual não existem relações afectivas entre os seus membros.
Neste caso, a terapia torna-se inútil dado que irão evitar qualquer tipo de intervenção, relação
com o terapeuta, não deixando que acedam ao seu interior e não caminhando para a resolução do
problema. Em determinados casos, a própria tentativa de levar a que a família se comprometa na
resolução do problema pode conduzir ao fracasso. Muitas das vezes, o paciente identificado é o
único que espera que o seu sistema possa mudar, quando na verdade o sistema não se predispõe
para a mudança, resignando-se à condição em que se encontra (Bloch, 1979).
Por fim, deve-se ter em atenção o facto de uma família chegar à consulta após infrutíferas
tentativas de resolução do problema, fosse através de outros técnicos ou através das suas
capacidades, sentindo que esta procura de ajuda no exterior seja uma confirmação da sua
incapacidade de resolver, de modo autónomo, os seus problemas. (Andolfi, 1999)
Dadas todas as contra - indicações, é importante ressaltar que antes de propor a realização
de uma consulta familiar, o terapeuta deve possuir conhecimentos acerca do que trouxe aquela
família à consulta e se será relevante uma intervenção ao nível do sistema familiar. Por vezes, a
psicoterapia individual pode ser a solução para o problema e a terapia familiar pode vir a piora-
lo. Assim, trata-se de escolher, de modo cauteloso, qual o modelo de intervenção a adotar,
analisando de forma concisa os pós e contras de cada escolha, ao mesmo tempo que deve facilitar
a resolução do problema.
Quando se trata de terapia familiar com crianças: de facto esta pode ser muito vantajosa,
dado que a crianças se sentirá mais acolhida e protegida se a sua família a acompanhar no
tratamento. Aqui o terapeuta também pode agir sobre o local onde a criança se encontra
diretamente inserida, isto é, a escola, jardim-de-infância ou bairro, para que esta não evolua para
um quadro patológico ainda mais problemático. (Bloch, 1979)

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4. CONCLUSÃO

Quem somos nós sem família? Quem somos nós sem o seu apoio, sem o seu carinho, sem o
seu acolhimento? Nunca nos devemos esquecer que somos um pouco da família onde crescemos,
do meio em que vivemos, das pessoas com que interagimos.
A terapia familiar procura colocar a família no centro das atenções. As relações que se
estabelecem no seu meio podem ser a justificação para o problema, ao mesmo tempo que pode
proporcionar a solução mais vantajosa para a sua resolução. Por vezes, aquele que se apresenta
como perturbado é aquele que não apresenta nenhum problema, sendo só o reflexo da família em
que se insere.
Mas falar de terapia familiar não é falar só de família e do que acontece no seu seio, mas
sim mostrar que as interações que esta vai estabelecendo com o meio social e cultural que a
rodeia irá exercer influência no modo como os seus membros irão reagir face aos problemas e até
com a forma como esses “distúrbios” poderão surgir. Trata-se de inserir a família na terapia, co -
responsabiliza-la das decisões a tomar e dos objetivos a alcançar, em que o terapeuta deve apenas
ser um mediador, mostrando à família que ela possui capacidades próprias para a resolução
daquilo que a perturba.
Para concluir, a terapia familiar não é só um modelo, embora aqui tenha falado
predominantemente no modelo de terapia familiar sistémico existem outros de orientação
cognitivo comportamental. Este tipo de terapia é utilizado para cobrir uma grande parte de
intervenções com crianças e adolescentes com problemas de ordem psíquica e mental de modo a
realizar uma reestruturação cognitiva. A terapia cognitivo-comportamental centra-se, sobretudo,
no desenvolvimento da criança ou adolescente, em que os pais serão participantes ativos na
resolução dos seus problemas. (Bolton, D., 2002 in Graham, P., 2002)

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BIBLIOGRAFIA

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Bloch, D. (1979). Techniques de base en thérapie familiale. (p.21-49). Paris : Jean-Pierre


Delarge

Doron, R. & Parot, F. (2001). Dicionário de Psicologia. Lisboa: Climepsi

Gameiro, M. (1992): Voando sobre a Psiquiatria. Porto: Edições Afrontamento.

Graham, P. (2002). Cognitive- Behaviour Therapy for children and families. (Cap. II).
Cambridge: Cambridge University Press

Miermont, J. (1994). Dicionário de terapias familiares: teoria e prática. (p. 33-39;


545- 546; 551-553). Porto Alegre: Artes Médicas

Nichols. M. P. (1985). Terapia Familiar: Conceitos e Métodos. Porto Alegre: Artmed


Editores.

Relvas, A. P.(1999). Conversas com famílias: discursos e perspectivas em terapia familiar.


(p. 11-38). Porto: Afrontamento

Relvas, A. P., (2000). Por detrás do espelho: da teoria à terapia com a família.(p. 21-33).
Coimbra: Quarteto

Relvas, A. P. (2002). A terapia familiar em Portugal. Psychologica (nº 31).Coimbra:


Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação

Sampaio, D. & Gameiro, M. (1995). Terapia Familiar. Porto: Edições Afrontamento.

Sidelski, D. (2000). III Congreso de la Sociedad Española para el Estudio de la Ansiedad y


el Estrés. www.sexovida.com

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Anexo 1

Classificação dos terapeutas familiares segundo o Modelo Bidimensional de Foley (1974)


(adaptado de Nichols, 1984: 99)

Terapeuta com papel activo

Teoria sistémica Teoria analítica


(orientação interpessoal) (orientação individual)

Terapeuta com papel de observador

Extensão da classificação paradigmática das teorias da terapia familiar: Ritterman, 1977


(adaptado de Nichols, 1984: 103)

Elementarista/ analítico

T. F. Comunicacional T. F. Psicodinâmica

Grupo (externo/ objetivo) Indivíduos (interno/ subjetivo)

T. F. Estrutural T. F. Existencial (experiencial)

Holista

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