O Resgate Da Fé Cristã
O Resgate Da Fé Cristã
O Resgate Da Fé Cristã
confiáveis para elas. Por essa razão, este livro está na pequena lista
de obras que recomendo aos que me perguntam por uma
introdução à filosofia e apologética cristãs.
— Vincent Cheung
Autor de Questões últimas
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Henry, Carl F. H.
Carl F. H. Henry
PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA
Carl F. H. Henry
1. Vivendo no Fundo de um Poço
Não faz muito tempo que viajei à Purdue University
[Universidade de Purdue] para falar em uma reunião de almoço na
faculdade arranjado por mais ou menos uma dúzia de crentes
locais; pelo que se constatou, cerca de cem docentes
compareceram.
Antes, nessa manhã, eu havia voado de Washington a
Dayton (Ohio), onde então peguei um voo regional com escala para
Indianápolis. Lá fui encontrado por um professor de Purdue, um
especialista em engenharia; este, em um Cessna de quatro lugares,
transportou a mim e a seu pastor, outrora meu estudante, no último
trecho da viagem ao campus Lafayette. Mal havíamos alcançado
4000 pés de altitude quando o professor-piloto observou de forma
lacônica que o spotter do avião acabara de deixar de funcionar.
Não ficando em nada mais confortável, próximo da morte
aparentemente inesperada a quase mil e quinhentos metros no céu,
meu amigo clérigo perguntou: “O que isso significa?”. “Problema
nenhum”, respondeu o professor-piloto: “Apenas significa que agora
ninguém pode dizer onde estamos”.
Parece-me que esse diálogo sucinto descreve em certo
sentido, com pertinência, nossa presente condição. O Ocidente
perdeu o rumo da bússola moral e epistêmica. Ele não possui
nenhum critério comum para julgar se os seres humanos estão se
movendo para cima ou para baixo, se permanecem parados, ou se
apenas se movem sabe Deus para onde.
Por muitos séculos o mundo ocidental reconheceu uma
norma absoluta, a saber, a vontade do Deus autorrevelado,
publicada nas Escrituras inspiradas. A Bíblia podia nos contar “onde
estamos”, “de onde viemos”, e “aonde vamos”. Graças a seu
comprometimento com as Escrituras, o Ocidente deixou para trás o
passado pagão.
No entanto, a perspectiva atual do neopaganismo nos
confronta em todos os lugares. Não mais estão os pagãos
escalando os muros da vida moderna só aqui e ali; eles entraram na
corrente cultural predominante, dançam nas ruas e até estabelecem
uma agenda completa para o futuro.
Qualquer pessoa que conheça a história das ideias percebe
que as características singulares do ponto de vista ocidental sobre a
vida e o cosmo estão grandemente arraigadas nas Escrituras
hebraico-cristãs e, além disso, no Deus sobrenatural da Bíblia.
Separado dessas raízes, os distintivos não têm mais perspectiva
real de sobrevivência. Um recente aviso dessa conexão essencial
advém até do crítico social agnóstico Allan Bloom em The Closing of
American Mind [O fechamento da mente americana].[22] A Bíblia, diz
ele, forneceu o modelo do ponto de vista abrangente da ordem
cósmica. No entanto, a perda contemporânea de importância
pública das Escrituras nega a necessidade e a possibilidade da
interpretação bíblica do mundo. A busca de um modelo alternativo
está cercada de confusão, e a sociedade ocidental está indecisa e à
deriva em direção ao caos. Os acadêmicos ocidentais parecem
incapazes de nos dizer onde estamos.
“Eles viviam no fundo de um poço”, lê-se em uma fascinante
linha em Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Arrisco-me
a sugerir que em termos da história das ideias o “eles” da frase pode
significar “nós” mesmos; para a nossa assediada geração, o poço
ficou seco. Outrora ele esteve cheio até a borda; outrora nutria a
vida de uma sociedade espiritual e moral inigualada na história da
humanidade. O teísmo hebraico, escreve Eric Voegelin, precipitou
“uma quebra no padrão do curso das civilizações”, “um novo gênero
de sociedade”; na verdade, a antiga nação de Israel começou em
um nível em que outras sociedades respeitáveis “têm dificuldade
ainda no término”.[23] Mas agora nos encolhemos no fundo de um
poço seco — um poço que oferece pouca perspectiva, apenas
estagnação e decadência.
Proponho o exame da custosa supressão de Deus, depois de
Jesus Cristo vir ao mundo e a igreja primitiva lançar a era cristã,
colocando o paganismo greco-romano na defensiva. A subsequente
sufocação de Deus por fim aliciou o pensamento ocidental para o
neopaganismo — para um naturalismo cru que sufoca tanto cada
vestígio de transcendência que quase toca as raias das antigas
ideias pré-cristãs de mudança e determinismo fatalista. Até o
paganismo dos tempos do Novo Testamento, disse C. S. Lewis em
sua palestra inaugural na Universidade de Cambridge, tinha mais
em comum com o cristianismo que o antigo paganismo tem com o
crasso neopaganismo emergente de nossos dias.
A geração mais jovem hoje mal se dá conta do tremendo
débito que o pensamento ocidental tem para com a herança bíblica
ou de quão longe a cultura moderna vagueia à deriva, para longe
das fundações das Escrituras, mesmo que muitos pais e avós ainda
se apeguem a fragmentos quebrados dessa herança. À visão
judaico-cristã devemos as seguintes crenças: O universo é uma
criação divina com propósito;
Toda vida humana é sagrada, e os seres humanos têm igual
dignidade; A história é linear e se move rumo ao objetivo
final;
A natureza é um sistema ordenado, e o homem é seu
mordomo responsável; A justiça triunfará contra o mal na
conquista decisiva final;
A vida terrena não exaure a existência; apenas olha para
frente, para a ressurreição dos mortos e para o juízo final e
completo da humanidade e das nações.
Numerosas autoridades — tanto seculares quanto cristãs —
aquiescem e sublinham essas afirmações e muitas mais. Pensa-se
de imediato no historiador Frederick A. Foakes-Jackson, que traça a
origem de todos os movimentos humanitários do Ocidente na
teologia da Cruz; do cientista político John Hallowell, que afirma que
a perda da doutrina bíblica da criação do homem na imago Dei nos
deixa hoje sem nenhum argumento firme para a igualdade humana;
de Alfred North Whitehead e Stanley Jaki, que declaram que a
busca do comportamento detalhado da natureza pela ciência
moderna foi acalentada pela visão cristã de Deus como o Criador
metódico e Preservador soberano do cosmo; de Ernst Bloch e
Johannes Metz, que traçam a origem do anelo revolucionário
moderno por uma utopia política na ênfase bíblica no futuro reino
final de justiça, mesmo que (permita-me acrescentar) a teologia da
libertação dê a tal esperança uma forma reacionária.
Com certeza, não é só nos tempos modernos, ou apenas na
Idade Média, que o cristianismo tem de contender com a diluição de
sua mensagem. Não apenas por seus inimigos, mas igualmente por
alguns de seus amigos professos o conteúdo nuclear do
cristianismo tem sido muitas vezes anuviado. Os cristãos primitivos
enfrentaram delinquentes e deformadores espirituais, bem como
outros semelhantes a nós mesmos, como as cartas de Paulo aos
coríntios nos lembram. Por sua anterior desobediência, os antigos
hebreus foram mandados para o exílio babilônico.
No entanto, semelhante apostasia não invalidou no passado
e não invalida no presente o monoteísmo hebreu-cristão e a
revelação bíblica. A Bíblia não fica desacreditada, e o teísmo bíblico
não é minado, mesmo pelas frivolidades dos televangelistas. As
Escrituras declaram, sem pedir desculpas, e com insistência, que só
Jesus Cristo jamais pecou e que todos os seres humanos são
pecadores; os televangelistas populares com certeza não
constituem exceção à regra. Mas as Escrituras também alertam que
a difamação deliberada do testemunho cristão por aqueles de nós
que em seu papel devem ser modelos não é ofensa leve.
Mesmo antes da Idade Média o cristianismo foi politizado e a
revelação bíblica posta em risco por meio da elevação da autoridade
eclesiástica. Os reformadores protestantes lutaram contra: A
adição medieval de lendas e mitos ao cristianismo bíblico; A
distorção da justificação pela compreensão equivocada de “fé e
obras” que abarcava a salvação sacramental; A contração do
papel da revelação divina e das consequências noéticas e
volicionais do pecado, bem como a promoção, em seu lugar, da
teologia natural e da “prova” empírica da existência de Deus.
Desde seus primórdios em 1600, com o filósofo jesuíta
Descartes, a filosofia moderna substituiu o teísmo bíblico da
revelação pelo teísmo especulativo. Ela separou o argumento em
prol da existência de Deus, encontrado na revelação divina especial,
da encarnação singular de Deus em Jesus Cristo e do ensinamento
profético-apostólico inspirado. Em lugar disso, a filosofia moderna
confiava na argumentação filosófica a partir do não Deus, isto é, a
partir da natureza, ou do padrão da história, ou da humanidade —
sobretudo a partir da mente e da consciência do homem.
Sem dúvida, a filosofia moderna inicial reteve muitas
características notáveis do conceito do Deus revelado na Bíblia. Ela
falava de Deus como o Pai onipotente e de personalidade infinita,
em contraste com os filósofos gregos, para os quais a personalidade
de certa maneira restringe a infinitude, considerando, portanto, a
personalidade e a infinitude alternativas incompatíveis. Ademais, os
teístas filosóficos modernos tendiam a falar de Deus desde o início
como uma mente sobrenatural e uma vontade ativa em vez de
considerarem o sobrenatural nomeadamente em termos de ideias
ou formas eternas.
Como os pensadores clássicos gregos pré-cristãos, os
filósofos modernos enfatizaram a prioridade do mundo espiritual, a
singularidade da essência do homem e o caráter objetivo da
verdade e do bem. Entretanto, teístas e idealistas modernos —
Descartes, Leibniz, Hegel e outros — produziram opiniões sobre
Deus altamente conflitantes; o fantasma sobrenatural tornou-se
cada vez mais de difícil definição.
Ainda, em contraste com os gregos, em cuja direção pendiam
mais e mais, os pensadores modernos iniciais preservaram de
maneira inconsciente certas ênfases peculiares à revelação judaico-
cristã: A matéria não mais era vista como eterna, mas de algum
modo (apesar de a criação ser por vezes concebida em termos de
emanação ou evolução); A matéria e o corpo não mais eram
considerados maus. O conceito platônico do corpo mau deu lugar à
doutrina paulina da “carne”, que pressupunha o corpo e a alma
divinamente dotados que, devido a uma queda humana voluntária
no pecado, está ora a serviço de disposições não regeneradas; A
era de ouro da história não mais estava associada só com os
primórdios humanos, mas estava situada no futuro como um reino
final consumador da justiça.
Por tudo isso, os filósofos modernos se distanciaram do Deus
da Bíblia, o qual se autorrevela, e não puderam resistir às
concessões ulteriores ao naturalismo. Lenta e seguramente, a
despeito de suas intenções teístas antigas, a filosofia moderna
passou a afirmar: Só a natureza é a realidade definitiva;
O homem é em essência um animal complexo;
A verdade e o bem são relativos e mutáveis.
Sem dúvida, de início apenas a elite do século XIX subiu
nessa plataforma; esses pontos de vista não se haviam tornado
ainda, como no passado recente, a conceitualidade dissimulada que
subjaz ao aprendizado das artes liberais.
No entanto, a despeito da acelerada revolta contra a posição
cristã, mesmo o naturalismo do século XIX, como o teísmo
especulativo já repudiado, também reteve, inadvertidamente, certos
elementos da visão bíblica: A natureza, por ele declarada a
realidade definitiva, era identificada como intrinsecamente racional,
isto é, como um sistema ordenado de maneira lógica; A espécie
humana reputada como ponto culminante e o ápice do mundo
natural e capaz de discernir o inerente fundamento lógico da
realidade cósmica; A verdade e o bem, conquanto mutantes,
considerados relativamente duráveis.
O ponto de vista bíblico penetrou de maneira tão profunda no
pensamento ocidental que tanto o idealismo moderno quanto a sua
duplicata rebelde, o naturalismo, a despeito da desaprovação da
herança cristã, apegou-se a elementos significativos do teísmo
ortodoxo, embora de uma forma bastante contemporizada.
No começo do século XX, o naturalismo despojou-se mais
inteiramente dessas influências bíblicas sobreviventes. Os cientistas
falavam menos sobre a racionalidade objetiva da natureza e mais
sobre os modelos criativos mediante os quais o observador
representa a natureza e a história. A teoria existencial localizava a
distinção da espécie humana na capacidade de decisão, em vez da
capacidade conceitual de discernir o padrão objetivo na natureza.
Tão logo Deus é banido, Jesus Cristo e a Bíblia tornam-se órfãos
cognitivos. Não só a história e a natureza são tornadas irreligiosas,
de modo que podem ser prontamente assimiladas pelo
determinismo mecânico ou pelo caos; não apenas a humanidade é
tornada ateia, ficando livre para desempenhar o papel de divindade
ou passar a se considerar meras partículas de poeira cósmica sem
alma; também os mais básicos pontos referentes do cristianismo
tornam-se enigmas embaraçosos. A Bíblia é declarada livro
dissonante e carente de qualquer centro coesivo, de difícil
compreensão e portando um testemunho ambíguo; sua textualidade
está coordenada com uma pluralidade de significados que seu
caráter revelatório é esvaziado para a categoria da literatura geral.
Amanhece agora o século descrito por George R. Beasley-Murray,
em que prevalece pela primeira vez a aguda “incerteza quanto a
quem era Jesus” e até sobre o que Jesus pensava de si próprio e de
sua missão.[24]
Por volta da metade do século XX, o humanismo secular, que
repudiava todas as verdades reveladas e os mandamentos divinos,
tornara-se a metafísica moldadora das artes liberais do Ocidente.
Ela enfatizava que: Toda a realidade é redutível a processos
impessoais e eventos de energia; Toda a vida, incluindo-se a vida
humana, é transitória, e seu destino final é a morte; A verdade e o
bem são distinções condicionadas pela cultura, projetadas pela raça
humana sobre o cosmo e a história.
A implicação é clara: a chegada da era da humanidade exige
a rejeição de toda a transcendentalidade definida e de toda a
autoridade final.
Paralelamente, até o humanismo secular foi incapaz de se
separar por completo da herança bíblica. Ele injetou em suas
crenças controladoras naturalísticas uma agenda de preocupações
sociais envolvendo a justiça universal, os direitos humanos, os
assuntos ecológicos e a compaixão aos pobres e fracos. Contudo,
preconizar dessa forma uma agenda de imperativos sociais
estabelecidos com clareza contradiz a suposição básica do
humanismo — os princípios morais são relativos à cultura e
inconstantes. Como assinalaram os críticos conservadores como
David Elton Trueblood, as preocupações sociais humanistas não se
originam da cosmovisão naturalista; foram antes tomadas de
empréstimo da herança judaico-cristã pela metafísica relutante em
reconhecer sua dívida. Ao mesmo tempo, os naturalistas mais
radicais admitiram que sua ênfase — a saber: de que a realidade se
reduz a elementos impessoais e elementos naturais e forças
inconstantes — não pode acomodar absolutos morais imutáveis. Em
uma ocasião, quando o presidente Frank Rhodes da Universidade
de Cornell disse a uma audiência de Harvard que os campi
precisavam assumir pelo menos alguma responsabilidade pelo bem-
estar moral e intelectual dos estudantes, foi confrontado por
ouvintes críticos querendo saber que tipo de moralidade seria, ou
deveria ser, ensinada.
O debate hoje focaliza a propriedade ou impropriedade do
papel da transcendência no universo concebido apenas em termos
de processos impessoais e eventos quânticos. O pretenso debate
cristão-marxista radicalmente secular, a cultura contemporânea da
droga e o surgimento da filosofia desconstrucionista refletem todos,
de três modos diferentes, a corrente luta contra os vestígios
desvanecidos do ensinamento bíblico.
No diálogo secular entre os supostos radicais cristãos e
marxistas, ambos os lados rejeitam o sobrenatural e aderem à
cosmovisão naturalista. O centro do debate é a tradicional afirmação
marxista do determinismo econômico e do inevitável triunfo histórico
do proletariado. O progressivo descumprimento das promessas
comunistas e das expectativas de utopia promoveu o ceticismo
sobre o determinismo e a inevitabilidade.
Os “cristãos seculares” radicais insistem no fator da
transcendência pessoal e na importância da ação e da práxis
humanas a fim de consumar a revolução comunista. Ao contrário de
muitos filósofos gregos e de Spinoza e Hegel, que consideram o
mundo uma realidade autossuficiente, esses radicais apoiam a
ênfase cristã de que o universo não está selado contra a
possibilidade de transformação e de uma nova criação. O destino do
homem está ligado, dizem eles, à decisão e ação humanas, mesmo
que o chamado debate cristão-marxista seja perversamente travado
no contexto da teoria de camada única da realidade, a ontologia
naturalista que exclui o Deus sobrenatural. Não obstante, ao discutir
sobre o homem os “cristãos seculares” invocam categorias além da
física e da biologia, bem como da psicologia e da sociologia. No
entanto, nas margens, onde o naturalismo se torna místico e
ambíguo, são privados das próprias realidades teísticas que
iluminam o finito. Ao excluir a presença e o propósito sobrenaturais
na natureza e na história, não podem resistir de modo convincente
ao antigo conceito de que a história humana é um grande ciclo em
que a realidade, como mecanismo eterno autossustentador, não só
carece de sentido definido mas também, depois de uma série de
eventos pré-determinados, regressa afinal ao estado primitivo.
A onda contracultural da droga representa um esforço ainda
mais conspícuo para impulsionar a individualidade humana à
transcendência. Rejeitando o cientificismo tecnológico como chave
do sentido da vida, ela busca significação pessoal mediante a
experiência íntima que explode a consciência. Contornando os
baluartes do empirismo científico, promove o que considera o
sacramento recreador “fora do corpo” do acontecimento
intensamente pessoal, semirreligioso, da espécie antimaterialista.
Alguns viciados descrevem a experiência nos termos do
renascimento interno. O número estimado de americanos que usam
drogas ilegalmente, de forma casual e como vício, é de
aproximadamente 60 milhões; alguns observadores acreditam que
uns 40 milhões continuam envolvidos, estando mais de um milhão
viciados em cocaína ou crack.
Pensa-se que os cristãos evangélicos nos EUA que alegam
ter “nascido de novo” espiritualmente ora atinjam o número superior
a 60 milhões. Muito antes do recente movimento contracultural, os
evangélicos enfatizavam que a experiência consciente de todo dia
da espécie humana é, em certos aspectos, anormal; que a
individualidade presente da humanidade está enviesada e requer
um novo tipo de vida; e que nenhuma alternativa gratificante existe à
parte do elo vital com o reino transcendente por meio da experiência
interna dinâmica da regeneração espiritual.
A ênfase no novo nascimento espiritual e na vida eterna é um
elemento essencial no ensino de Jesus e nos escritos do Novo
Testamento. Contudo, as modernas denominações centradas na
experiência, mais notavelmente o movimento pentecostal, tendem a
isolar essa ênfase da herança orientada de forma confessional e
são teologicamente menos precisas que as igrejas do tronco
histórico principal. Mesmo que o pentecostalismo esteja, com
certeza, afastado de qualquer busca de uma “vida melhor” por meio
da química, certos aspectos do pentecostalismo são muito similares
aos fenômenos psicodélicos, visto que a ênfase recai sobre a
experiência pessoal intensa, independente da comunidade orientada
em sentido confessional, ocorrendo em um contexto teologicamente
impreciso. As características experimentais do pentecostalismo,
além disso, são usufruídas para destroçar a linguística universal e
os limites conceituais.
No entanto, uma diferença admirável distancia a experiência
pentecostal dos eventos “semirreligiosos” da cultura da droga; do
corrente movimento desconstrucionista na filosofia, que rejeita de
modo deliberado o teísmo metafísico e toda existência estruturada
no logos; e dos pretensos marxistas cristãos que abandonam o
sobrenatural. Ainda que ao pentecostalismo falte uma teologia
sistemática e suas crenças não estejam estruturadas de modo
confessional, ele insiste, porém, na existência objetiva do Deus
trino, no senhorio de Jesus Cristo, o Deus-homem, na realidade
pessoal do Espírito Santo e na autoridade da Bíblia. Em suma, a
oferta pentecostal do modo alternativo de vida promove um contra-
argumento à cultura secular da droga. O desconstrucionismo,
entrementes, na rejeição do logos e da racionalidade, bem como do
Deus de existência objetiva, ontologicamente estende, por assim
dizer, implicações extrarracionais específicas ao fenômeno
psicodélico.
Em contraste com a precisão confessional do
sobrenaturalismo cristão histórico, a exploração psicodélica envolve
o relacionamento cognitivamente amorfo com o transcendente; ela
produz o misticismo induzido pelas drogas em que a
autotranscendência com certeza não está em contato com a
realidade além da própria individualidade de alguém. O mundo
supostamente mais elevado, em que o eu está imerso, não tem
caráter e é indefinível; é transracional ou super-racional, fora do
domínio da formulação propositiva. O que constitui a autorrealização
de quem passa pela experiência é tão obscuro quanto o que
constitui a autotranscendência. Por conseguinte, defrontamo-nos
com abordagens diametralmente opostas à transcendência: seja a
experiência psicodélica expandidora da consciência ou a revelação
divina propositiva.
Muitos, como alguns praticantes, retratam o prazer das
drogas alucinógenas como uma espécie de experiência religiosa,
pervertendo, na verdade, a psiquê humana e fazendo pouco caso
da imagem de Deus à qual os seres humanos são criados. A
experiência é separada não só dos critérios racionais, mas também
das preocupações morais pelo relaxamento dos imperativos éticos
universais há muito reverenciados. Ela não manifesta ao
Transcendente nenhuma resposta inteligivelmente fundada e é
destituída de sentido, virtude e dever compartilháveis com o público.
O êxtase induzido por meio da química é a volta à mágica; as
vibrações substituem os silogismos e a farmacologia substitui a
teologia como contexto. Dizer que a experiência psicodélica é
análoga ao sacramento espiritual apenas aumenta a ambiguidade
contemporânea concernente à definição da religião e da experiência
religiosa.
O atual enaltecimento da experiência interna como dimensão
definitiva não se dá sem estar relacionada à ignorância cultural e
teológica dos dias atuais. No ponto em que vai de encontro à cultura
da droga, o cristianismo subteológico, todavia, na maior parte
oferece uma contraexperiência elementar demais para registrar
consequências profundas na sociedade. Há o risco adicional de que
a geração de viciados em drogas repute a conversão ao cristianismo
apenas como uma troca de um conjunto de sentimentos por outro.
Uma quantidade demasiadamente grande de americanos crê, como
observa Russell Hittinger, “que a experiência religiosa a contento
pode ser tida sem se preocupar com verdades proposicionais”.[25]
Esse contraste ampliador entre a experiência espiritual privada e a
verdade compartilhável em público, ampliador até o ponto de
ambiguidade quando diz respeito a um objeto religioso
transcendente, junto com a ênfase na criatividade pessoal em
relação à metafísica, tem implicações de longo alcance. O
conhecimento revelacional mediado é desvalorizado; além disso, o
termo revelação é aproveitado no caso de alguém, pela mera
ingestão de algum composto químico em particular, buscar por
relacionamentos internos imediatos com o mundo supremo e por
alguma coisa sentida de forma direta e divina (em sentido místico).
Semelhante procedimento não é diferente do empenho de
mergulhar a si mesmo em um mundo novo e diferente mudando
para os canais de televisão eróticos em busca de orgasmo psíquico.
Na ausência de controles epistêmicos e éticos fixados, a geração
delirante e dependente de drogas está fadada à existência sem
direção. Desprendida da racionalidade e da moralidade, sua
chamada experiência religiosa logo desmorona para o sub-racional
e subético. Submergir Deus em dados inexprimíveis é o primeiro
passo para levar a deidade à morte. Tão logo Deus é empurrado
para a beira da linguagem, o cristianismo será criticado, e não
surpreendentemente, por tentar defini-lo.[26] O que está em jogo
aqui não é só o valor e o sentido individuais, bem como o propósito
do universo, mas também alguma compreensão da existência de
Deus, o Criador e Preservador transcendental da vida, da própria
natureza e do destino da humanidade.
Por repudiarem de forma deliberada os últimos traços de
transcendência compostos mesmo que em termos subcristãos, os
filósofos desconstrucionistas nos fazem mergulhar em direção ao
fundo do poço teológico. Ao passo que a experiência psicodélica
sonda a perspectiva da realidade sobrerracional transcendente, a
perspectiva que desvaloriza o cognitivo universal e as categorias
éticas, e ao passo que o diálogo cristão-marxista radical pressupõe
uma ontologia de um nível só e, dentro dela, explora possibilidades
de transcendência histórica além do determinismo cósmico, o
ateísmo pós-teísta, ou desconstrucionismo, tenta subverter toda a
história do pensamento ocidental tornando-o desatado de Deus e da
lógica, de critérios verificadores e de significação verbal partilhada.
O desconstrucionismo rejeita qualquer resto de transcendência que
se derive genética e logicamente da herança judaico-cristã. Ao
expressar o desejo de uma era pós-metafísica, ele luta pelo fim do
teísmo e da metafísica. Os desconstrucionistas querem eliminar do
pensamento ocidental qualquer ênfase em uma deidade existente
de modo objetivo. Um comentarista descreve o movimento como a
“dança da morte sobre a tumba de Deus”.
O ateísmo pós-teísta sem dúvida tem uma queixa legítima
contra a longa sucessão de concepções de deidade conflitantes e
rivais que abarrotaram o pensamento ocidental do tempo de Platão
até o dos filósofos do processo de hoje. Propostos como alternativas
ao Deus autorrevelador da Bíblia, tal panorama de deuses
conjecturais há muito apresenta uma desanimadora crise de
identidade. Logo, não surpreende que a filosofia do século XX feche
o segundo milênio cristão culminando na admissão de que a
alternativa durável não é o Deus de Platão, de Aristóteles, dos
estoicos, de Descartes, de Leibniz, de Kant, de Hegel, de Whitehead
ou de uma centena de outros.
Embora os desconstrucionistas filosóficos juntem-se na
tentativa de tirar tais divindades doentes da miséria, ao mesmo
tempo são em especial hostis para com o ponto de vista da
revelação judaico-cristã, considerando-o irretratável ou
irrecuperável. Sua intensa animosidade para com o teísmo bíblico,
entretanto, inconscientemente reconhece o incomparável domínio
da ortodoxia cristã sobre as massas.
A redução desconstrucionista do cristianismo é ousada no
interesse da reconstrução filosófica com ênfase na contribuição
criativa[27] do conhecedor humano para o conteúdo de
conhecimento, e propõe o regresso aos antigos filósofos cósmicos
gregos para um novo começo na história das ideias. Os marxistas
aplaudem essa desconstrução da filosofia ocidental com o objetivo
de promover sua teoria socialista que liga o naturalismo
contemporâneo ao materialismo pré-cristão, pré-socrático e
rebaixador do teísmo a mito.
Por essa colossal inversão os modernos eruditos têm que
culpar a si mesmos. A progressiva diluição dos pontos essenciais do
teísmo bíblico, mediante concessões a uma e depois outra neotérica
teoria especulativa, prejudicou com seriedade as crenças nucleares
judaico-cristãs. Os acadêmicos da universidade avidamente
truncaram o Deus vivo da Bíblia, separando-o da natureza e da
história e dando só tributo temporário e de má vontade a esse ou
aquele bocado sobrevivente da herança cristã ocidental. Repetida
deferência às novidades, às quais os conceitos escriturísticos eram
rotineiramente ajustados, fizeram a iniciativa cognitiva perder seu
direito para as contemporâneas alternativas conjecturais à visão
bíblica.
Durante a primeira metade do século XX, o anti-
intelectualismo inundou a teologia que se professava cristã, de
maneira mais notável nas concepções religiosas de Rudolf
Bultmann e de Karl Barth no início. Mesmo que Barth por fim
rejeitasse a redução existencial das crenças cristãs por Bultmann,
os desconstrucionistas acolheram de Barth a elevação da realidade
de Deus acima da lei lógica da contradição; eles a veem como uma
contribuição inconsciente à afirmação deles de que o Deus
objetivamente existente é apenas um subproduto da imaginação
humana.
Em particular nas universidades seculares do Ocidente pouca
atenção foi prestada às concepções religiosas mediadoras. Os
meio-deuses de uma geração logo passam a ser o objeto do ridículo
da geração seguinte. O Logos miniaturizado cedeu ao humanismo
secular como a metafísica mascarada da modernidade. Agora a
maré está mudando para o paganismo puro. O termo deus está
despido de significação metafísica; não se reconhece nenhum
critério objetivo para distinguir o certo do errado ou a verdade do
erro. No fundo do poço os últimos lampejos de luz estão diminuindo.
Todavia, até os conhecedores intelectualmente inventivos da
modernidade, obsedados com o mito da ilimitada criatividade,
hesitam em ver a si próprios como meros eventos quânticos e como
dentes de engrenagem em uma rede de processos impessoais. A
consciência continua a aclamar seus objetos diante da realidade
transcendental e nutre a inquieta suspeita de que no final de seu
limite filosófico o Cão do Céu[28] a quem negaram pode, em vez
disso, ter nos encurralado no próprio fundo do poço. Uma Presença
invisível de modo esporádico rompe o silêncio; uma voz
desconcertantemente reconhecível faz a mesma pergunta
embaraçosa — que primeiro ressoou no Éden depois da queda:
“Adão, onde tu estás?”. Alguém parece, afinal, conhecer onde
estamos. Pelas profundezas acres da cadente cultura ecoa um
lamento outrora ouvido por Jeremias: “Porque o meu povo cometeu
dois delitos: eles me abandonaram, a fonte de águas vivas, e
cavaram para si cisternas, cisternas furadas, que não retêm água”
(Jr 2.13).
2. Pressupostos e Método Teológico
O empirismo está muito em voga na teologia evangélica
recente. Embora não se force ao ponto de fazer da observação
sensorial e da verificação em laboratório os únicos meios confiáveis
de conhecimento, ele incentiva o apelo teológico aos detalhes na
busca de um universal, em vez de postular um princípio explanatório
universal sujeito a teste. Por conseguinte, qualquer exposição
dedutiva do cristianismo é desacreditada.
A moderna perda de interesse na história da doutrina tem
parte no descrédito da teologia dedutiva. Muitos seminários
evangélicos, na verdade, sequer oferecem o curso de teologia
histórica. Logo, a maioria dos cristãos conservadores não tem
ciência de que a teologia sistemática mais antiga da cristandade
começava com Deus como axioma básico e derivava desse
princípio explanatório o conteúdo da religião cristã. Foi Orígenes
(250 d.C.) que, no Peri archon (traduzido para o latim como De
principiis), expôs as implicações da inteligência e simplicidade
divinas — em oposição à projeção neoplatonista da transcendência
radical — e deduziu o conhecimento teológico da criação e da
salvação.
Desde o começo da era cristã, a metodologia da teologia
sistemática tem sido principalmente dedutiva. Agostinho e Anselmo
advogaram a dedução teológica. Até Tomás de Aquino propor uma
alternativa empírica no século XII, o método dedutivo não foi
seriamente posto em dúvida; em alguns aspectos ele prevaleceu até
o século XIX, quando Schleiermacher o desafiou de modo decisivo.
Os reformadores protestantes empregaram a dedução, apesar de os
evidencialistas tornarem isso problemático ao misturarem a ênfase
dos reformadores na revelação geral com uma abordagem empírica.
Em contraste com a afirmação de seus ancestrais sobre a
dedução, os evidencialistas advogam a indução; isto é, procedem
da natureza e do homem enquanto efeitos para a existência da
Causa Primeira inteligível e moral do universo. As supostas provas
ou evidências são declaradas esteios lógicos que promovem e
apoiam o teísmo.
Os teólogos que começam a priori com Deus como axioma
ou princípio explanatório abrangente do qual deduzem tudo o mais
são ridicularizados pelos evidencialistas como pressuposicionalistas
que apenas brincam com pressupostos mentais. Os evidencialistas
subestimam os pressuposicionalistas como simples fideístas que
apelam só à fé e se desvencilham de forma deliberada da razão e
da evidência, por eles depreciadas, supondo de antemão o que
qualquer acadêmico responsável se sentiria obrigado a “provar”. Os
fideístas meramente anunciam uma conclusão — a reclamação feita
é assim — sem primeiro chegarem a ela de modo racional; ademais,
rejeitam de propósito a necessidade subsequente de algum teste
racional objetivo.
É fácil e, no entanto, intelectualmente irresponsável,
desprezar todos os pressuposicionalistas evangélicos como meros
fideístas. A alguns a queixa pode se ajustar, mas qualquer crítica
radical apenas acalenta a falsa opinião que desprende a fé da razão
e a liga à presunção. Uma vez que essa concepção errônea é
firmada, qualquer pessoa reflexiva retrocederia diante da fé; em seu
lugar, intelectuais sutis prefeririam a razão como antídoto bem-
vindo.
O conceito de que a verdade na religião repousa “sobre a fé
em vez do raciocínio ou da evidência”, o filósofo Richard H. Poplin
imputa ao apóstolo Paulo.[29] Paulo indubitavelmente rejeita o
raciocínio filosófico ou a sabedoria mundana como o maneira cristã
de conhecer e — ao contrário dos evidencialistas — não confirma a
existência de Deus sobre bases empíricas. O que Poplin não
consegue notar, entretanto, é que o apelo de Paulo à fé de jeito
algum repudia a razão pública ou a lógica.
Mais propriamente rotulados de fideístas são Søren
Kierkegaard e certos teólogos neo-ortodoxos que descartam a razão
pública e os testes racionais por serem irrelevantes aos anúncios de
verdade religiosa. Ao reafirmar a Bíblia no lugar do Alcorão, do
Bhagavad gita ou de O capital como ponto de partida, Karl Barth,
como reclama Peter Berger, concomitantemente rejeita o alcance da
razão universal como teste externo de verdade.[30] Os escritos
primitivos de Barth — se não também seus últimos — dão crédito à
queixa de Berger.
Tais teses não devem ser confundidas, no entanto, com a
ortodoxia evangélica. Os teístas evangélicos consideram inaceitável
qualquer afirmação irracionalista de que o absurdo intelectual torne
crenças religiosas dignas ou de que a obediência espiritual
demande um “salto de fé” indiferente às considerações racionais.
Da mesma forma, rebaixar alguns teístas evangélicos a
fideístas apenas pela rejeição da validade das provas empíricas
padrões favoráveis à existência de Deus é patentemente
injustificado. Tal depreciação, sustento eu, tira o teísmo bíblico de
modo indesculpável do compromisso com a mais competente
argumentação que a ortodoxia evangélica pode montar.
Minha premissa é a legitimidade da teologia dedutiva e a
invalidade da alternativa evidencialista. As pretensas provas teístas,
assevero, não fornecem nenhuma demonstração conclusiva da
existência do Deus autorrevelador da Bíblia. Falar com mais
modéstia sobre “evidências” em vez de “provas” requer o recuo às
probabilidades. Se o argumento evidencialista “estabelece” a
probabilidade de alguma realidade divina, ele mais fantasia uma
deidade não baseada na Escritura que reforça o teísmo bíblico.
Os evidencialistas que menosprezam a primazia da fé não
prestam à teologia evangélica nenhum serviço especial. Declarar a
prioridade da fé não precisa significar, como rotineiramente acusam
os evidencialistas, que todos os pressuposicionalistas aderem à fé
sozinha à parte de, em vez de ou contrário à razão. Sustentar que a
fé precede o raciocínio especulativo no estabelecimento de certas
verdades básicas não exige em absoluto o descarte da razão e da
evidência como irrelevantes à fé autêntica.
Deve-se contrastar a fórmula agostiniana credo ut intellegam
(“creio a fim de entender”) não só com a fórmula de Tomás de
Aquino (“entendo a fim de crer”), mas igualmente com a chamada
fórmula tertuliana credo quia absurdum (“creio por [ser] absurdo”). O
moderno avivamento neo-ortodoxo do lema de Tertuliano não se
deu sem estar relacionado com a insistência existencialista no
absurdo supremo do mundo, ideia não bíblica nem evangélica.
Os pressuposicionalistas evangélicos — como os empiristas
ou evidencialistas evangélicos agora os rotulam de modo pejorativo,
com frequência — repudiam a concepção católica romana oficial
formulada por Tomás de Aquino e aprovada pelo Concílio de Trento.
O parecer tomista afirma que a existência de Deus e a existência e
imortalidade da alma têm de ser confirmados pela evidência
empírica e pela razão desajudada, não pela primazia da revelação
ou da fé.
Ao se oporem ao pressuposicionalismo, os empiristas
evangélicos inclinam-se pesadamente à “prova quíntupla” de Tomás.
Eles ignoram o fato de que o próprio Tomás adota a abordagem
pressuposicional ou dedutiva em relação às doutrinas
reconhecidamente reveladas como a da Trindade e da ressurreição
corporal: As outras ciências não argumentam em vista de demonstrar seus
princípios, mas para demonstrar a partir deles outras verdades de seu campo.
Assim também a doutrina sagrada não se vale da argumentação para provar
seus próprios princípios, as verdades da fé; mas parte deles para manifestar
alguma outra verdade, como o Apóstolo, na primeira Carta aos Coríntios, se
apoia na ressurreição de Cristo para provar a ressurreição geral.
Contudo, é preciso considerar que nas ciências filosóficas, as
ciências inferiores não somente não provam seus princípios, como
também não disputam contra aqueles que os negam, deixando
esse cuidado a uma ciência mais elevada. Pelo contrário, a
metafísica, a mais elevada de todas, disputa com quem nega seus
princípios, desde que este conceda algo; e se não concede nada,
ela não pode discutir com ele, mas pode refutar seus argumentos.
A Sagrada Escritura, por conseguinte, não tendo outra que lhe
seja superior, terá de disputar com quem nega seus princípios. Ela
o fará valendo-se da argumentação, se o adversário concede algo
da revelação divina; como quando invocando as “autoridades” da
doutrina sagrada disputamos contra os hereges, e artigos de fé
para combater os que negam outro artigo. Mas se o adversário
não acredita em nada das verdades reveladas, não resta nenhum
modo de provar com argumentos os artigos da fé: pode-se apenas
refutar os argumentos que oporia à fé. Como a fé se apoia na
verdade infalível, e é impossível demonstrar o contrário do
verdadeiro, fica claro que as provas trazidas contra a fé não são
verdadeiras demonstrações, mas argumentos que se podem
refutar. (“A Doutrina Sagrada”, Suma Teológica, Artigo 8, “Esta
doutrina se vale de argumentos?”)[31]
Se o pressuposicionalismo indica que quem pensa faz
pressuposições, então eu sou, assumidamente, um
pressuposicionalista evangélico. Na verdade, até um empirista ou
evidencialista que professe estar livre de pressuposições as nutre,
por mais encoberta ou inconscientemente que seja.
Além disso, acho o fideísmo não mais convidativo ou
consolador que o empirismo. O cristianismo evangélico tem tão
pouco a ganhar da teoria que — repudiando a razão pública e os
critérios lógicos (incluindo a lei da contradição) — simplesmente
aceita o fato de Deus existir como verdade, quanto o tem da
concepção que presume derivar Deus do não Deus (sejam quais
forem os aspectos do mundo finito que ela proponha invocar).
Principiar a apresentação das ideias de alguém com
afirmações apriorísticas e o apelo à fé não é mais irracional ou
intelectualmente desacreditado em teologia do que o é na filosofia
ou na ciência natural.
A experimentação e a observação não vão a lugar algum
deixando de lado pressuposições tácitas. A ciência empírica deve
rotineiramente tomar como certo o que não pode provar, incluindo
princípios como os da completa unidade, harmonia e inteligibilidade
do universo, da prevalência de alguma espécie de continuidade
causal na natureza e da necessidade de honestidade na
experimentação e na pesquisa científica. Sem previamente supor
semelhantes postulados, a ciência empírica nem mesmo pode se
iniciar. Nenhum físico pode provar a existência de real afinidade
entre suas teorias e a condição objetiva da natureza. A explicação
científica do que ocorreu no primeiro momento do tempo depende
de um ato de fé, a saber, a confiança no princípio da uniformidade.
A retrogradação crítica da teologia cristã de seu status
anterior como ciência foi por muito tempo fundada no falso conceito
de que a genuína ciência evita pressupostos. Os cientistas
empíricos modernos de início professavam com ousadia estarem
livres de suposições. Mas, tão logo ficou óbvio que ciência alguma
pode existir sem pressupostos, os críticos modernistas advogaram
que, em vez de simplesmente herdarem suas pressuposições como
sacrossantas, a ciência pelo menos as questiona e se mantém
pronta para seu teste e revisão. Os cristãos ortodoxos simplesmente
acomodam a tradição encanecida como verdade, insinuaram os
críticos, ao passo que só o método empírico de observação e
verificação em laboratório pode validar alegações da verdade;
assim, a ciência moderna não proporciona ao sobrenaturalismo
cristão nenhum conforto.
Os evidencialistas teológicos, e de igual forma outros
teólogos, começam com admissões apriorísticas de hipótese. O
evidencialista pode estar menos disposto que seus colegas teólogos
a admitir que a mente abriga pressuposições, porém, até a errada
pressuposição de que idealmente os argumentos em favor de Deus
são expostos sem pressupostos invalida seu repúdio a suposições
operativas. O fato é: nada deixará a mente sem rumo ficar mais
infrutífera que a ausência de todos os postulados; de fato,
semelhante ausência leva à inanidade em menos tempo que leva
para pensar. Resumindo: sem fé a ciência, a filosofia e a teologia
não podem progredir.
Para se empenhar na verdade autêntica o cristianismo não
precisa subscrever afirmações seculares de como deve conduzir a
perquirição teológica de forma ideal. A religião cristã não é obrigada
a, com antecedência, aceitar teorias da verdade alheias ou
acomodá-las como alternativa própria — como o preço da
elaboração e discussão metafísicas sérias. Os cristãos não
necessitam vindicar os dogmas cristãos e os remover da suspeita
secular submetendo-os a critérios restritivos e enquadrando-os nas
concepções rivais imperiosamente asseveradas por neokantianos,
positivistas lógicos, existencialistas ou outros. Sancionar a
“credibilidade” da investigação cristã, exibindo em primeiro lugar sua
compatibilidade com teorias estranhas, significa apenas mercadejar
a singularidade do cristianismo. Damos a kantianos e positivistas
liberdade para a enunciação de suas suposições; de fato, estamos
ávidos para ouvir o que dizem. De modo similar, os cristãos devem
apresentar sua distintiva maneira de ver a verdade, que engloba o
Deus que cria e ilumina nossos mecanismos formadores de crença.
Os cristãos não devem sentir compulsão alguma para afinar sua
epistemologia teística transcendente para coincidir com as
preferências de filósofos hostis.
O intelectual estará totalmente nos limites da legitimidade
filosófica e teológica caso creia na existência de Deus e assevere
sua existência mesmo na ausência de prova empírica. Não existe
base racional para restringir as proposições críveis só às que
envolvem evidências do tipo que impressionam em especial os
físicos ou antropólogos. A propriedade epistêmica da crença em
Deus independe de considerações empíricas ou comprobatórias de
suporte.
Por toda a sua longa história, a filosofia sempre reconheceu a
legitimidade de, sem prova, admitir a hipótese de um axioma
filosófico ou princípio postulatório como base inicial de raciocínio.
Demócrito jamais demonstrou que a substância consiste em
partículas indivisíveis e imperceptivelmente pequenas; ele postulou
a premissa e tentou explicar toda a existência de modo consistente
em seus termos. Platão nunca demonstrou a existência
independente do mundo invisível das Ideias Eternas; ele arrazoou
que a existência inferior nelas participa ou as espelha. Ademais, é
provável que ele teria rejeitado como sofista e não merecedor de
atenção quem, na ausência de provas empíricas da existência das
Ideias Eternas, privasse-o de ser ouvido.
Ao tentar explanar o todo da realidade e da vida, a história da
filosofia em grande medida gira em torno de princípios explanatórios
abrangentes postulados por uma sucessão de filósofos. As teorias
seculares que emulam o teísmo cristão são divergentes e instáveis.
Muitas são incoerentes em sentido autorreferencial. Sequer
conseguem satisfazer aos padrões ou testes epistêmicos propostos
pelos promotores para distinguir a verdade da falsidade; ou seja,
nem mesmo podem justificar os próprios princípios básicos pelos
critérios especificados. Suas especulações acerca da verdade e sua
verificação não devem ser consideradas autorizadas de forma
autoevidente; elas apenas gozam de aceitação convencional.
Kant, por exemplo, não inferiu suas formas de pensamento
transcendentais da teoria epistêmica, que identificava todo o
conhecimento como coproduto de conteúdo sensorial e formas
apriorísticas. Pelo fato de as formas apriorísticas não serem
perceptíveis aos sentidos, Kant deve tê-las postulado de maneira
independente da teoria.
Não há como o naturalista filosófico “provar” a verdade
declarada de sua cosmovisão cientística senão confiando nas
próprias suposições da teoria. A evidência há muito citada — a
saber, que a teoria “funciona” — é largamente disputada por quem
observa na verdade o desapontamento causado pelo cientificismo,
já que não oferece nenhum ponto de vista significativo do futuro, da
moralidade ou do propósito.
Por fim, a própria ciência moderna reconhece a importância
precedente de modelos teóricos para interpretar dados empíricos.
Nesse sentido Frederick Suppe fornece um profícuo panorama de
como aconteceram mudanças no pensamento científico moderno
recente.[32] De 1920 a 1950 a teoria científica foi dominada em
grande escala pelo positivismo lógico e pela análise empírica, que
repudiava os anúncios em prol de verdadeira teoria científica;
hipóteses científicas eram vistas como aproveitáveis apenas para
predizer fenômenos observáveis. Então, entre 1950 e 1970, quando
a teoria científica ainda não fora declarada explanatória e definitiva,
apenas histórica e relativa em sentido cultural, as cosmovisões
científicas abrangentes emergiram por meio das cosmologias de
filósofos da ciência influentes como Thomas Kuhn, Paul Feyerabend
e Stephen Toulmin. Foi entre 1970 e 1977, no entanto, na chamada
era do “realismo crítico-histórico”, que as alegações científicas
tornaram-se mais dogmáticas. Os cosmólogos falaram com mais
confiança sobre entidades transcendentes não observáveis; além
disso, alegaram maiores poderes explanatórios, e perseguiram
possibilidades de reafirmar a verdadeira teoria científica. Na
presente década, entretanto, as perspectivas de cosmovisão mais
uma vez se tornam sociológica e historicamente orientadas. A teoria
científica agora emprega modelos conjecturais e invoca com
generosidade a analogia e a metáfora, embora a possibilidade de
falsificação empírica seja admitida e aceita como característica da
autêntica ciência empírica.
Ao lado dessas perspectivas científicas mutantes, William A.
Rottschaefer monitora um movimento paralelo de pontos de vista
religiosos.[33] Ele relaciona a investigação empírica com o realismo
crítico, isto é, com a tese de que a experimentação — seja
naturalista ou teísta — produz entendimentos cognitivos e crescente
poder explanatório. Concentrando-se na experiência religiosa, ele
conclui que a ciência e a religião possuem um caráter epistêmico
similar.
Essa opinião é desafiada pelos naturalistas científicos de
forma contínua; para eles a mutável teoria científica é muitas vezes
mais instrumental que objetivamente cognitiva e explanatória.
Contudo, dizem os teístas religiosos, seja o que for que possamos
deduzir a mais da experiência religiosa, permanece o fato de que os
artigos do Credo apostólico não foram destilados da experiência
universal. Além disso, acrescentam que a experiência progressiva e
ampliadora não pode acomodar nenhuma finalidade não passível de
revisão. Em contraste, os teístas cristãos afirmam que a realidade
cristológica é a mesma “ontem, hoje e para sempre”, uma fé “de
uma vez por todas confiada” [NVI].
Fundado por Schleiermacher, o modernismo teológico
considerava o empirismo científico a via confiável do conhecimento
e como consequência depreciava os milagres como não científicos e
pré-científicos. Ele ancorava a argumentação a favor de Deus na
experiência religiosa universal. Conquanto afirmasse a existência de
Deus, um dos resultados foi a desaprovação modernista da
finalidade na definição da natureza divina. Substituir a atestação das
doutrinas nucleares cristãs por considerações empíricas, como
fazem os evidencialistas, traz altos riscos. Além do que, faz-se uma
asserção impossível de cumprir se, na busca pela certeza
demonstrável, espera-se de sua metodologia mais que elevada
probabilidade. O ponto de vista cristão sobre Deus e o mundo fica
bem servido pela metodologia que, quando muito, pode afirmar com
95 por cento de probabilidade que Jesus morreu pelos pecadores ou
90 por cento de probabilidade de que ele ressurgiu corporalmente
da tumba?
Dissemos que o metafísico especulativo que postule um
princípio primordial explanatório bem pode descartar como bastante
arbitrária qualquer exigência de que ele primeiro proveja alguma
legitimidade empírica externa para seu princípio como o preço a ser
pago antecipadamente pelo direito de projetar seu axioma
controlador. Mesmo na ciência do século XX, importantes
desenvolvimentos emergiram por meio de projeções criativas
quando os eruditos, em vez de extrapolarem seus postulados
explanatórios da observação empírica, apenas aplicaram postulados
criativos aos dados à mão. Alguns dos progressos mais dramáticos
ocorrem quando novas suposições cognitivas destituem teorias há
muito entrincheiradas. É irrelevante para o poder explanatório de um
axioma se o seu promotor chegou ou não a ele por observação
empírica, conjectura filosófica, meditação religiosa, revelação
privada ou mesmo pelo que ele ou ela considera simplesmente um
pressentimento.
O axioma ontológico primário do cristão é o único Deus
vivente, e seu axioma epistemológico primário é a revelação divina.
Desses axiomas básicos dependem todas as crenças nucleares do
teísmo bíblico, incluindo a criação divina, o pecado e a queda, a
promessa e a provisão de redenção, a encarnação de Deus em
Jesus de Nazaré, a igreja regenerada como uma nova sociedade e
também uma escatologia abrangente.
Todavia, a visão metafísica que professe decifrar toda a
realidade e a vida e envolva a vindicação da verdade universal deve
aduzir alguma justificação epistemológica caso tenha de evitar ser
rejeitada como fideísmo ou fé pura que derroga a razão.
A discussão de Agostinho sobre a verdade apoiada pela fé é
precedida pela investigação intelectual da verdade; a inquirição
racional expõe a necessidade de aceitar certas crenças ou
princípios básicos mediante a fé. Além disso, ele reconhece a
necessidade de demonstrar que seus compromissos não são
ilógicos. Para Agostinho, a fé é o modo de conhecer da mente.
Trata-se de pensar em vista de uma autoridade revelatória divina
mais alta reforçada pelo assentimento da vontade. A fé é a certeza
de que, à luz da autoridade mais elevada, sonda e analisa o que é
crido e estipula seu conteúdo.
Só com atenção cuidadosa para com o papel dos
pressupostos o desastre de suspender a verdade cristã em
considerações empíricas será evitado. Todo esforço de falar em
sentido dogmático a respeito de Deus apenas com base na
percepção sensorial ou na experiência humana é vulnerável e
malfadado. Schleiermacher defendia a realidade de Deus baseado
no senso do homem de absoluta dependência, mas os críticos com
rapidez mostraram que a experiência humana não é um comentário
sobre a teologia, mas sim sobre a antropologia. O método empírico
lida com a realidade fenomenal, não com a numenal; ele não pode
adjudicar a existência e a natureza do sobrenatural. Pior ainda,
apenas produz conclusões experimentais e revisáveis; ele não pode
apresentar um veredicto irreversível sobre coisa alguma. Assentar o
argumento pró-cristianismo em um apelo empírico não só não é
promissor como metodologia, mas é também de caráter teológico
arriscado.
Todavia, o pressuposicionalista evangélico não aceita a
caracterização do axioma como arbitrário. O fiel cristão conhece
com segurança que seus postulados e crenças controladoras não
estão fundados em conjectura, mas ancorados na autoexistência e
na autorrevelação do Deus trino. O cristão sabe ser Deus a fonte de
toda a verdade; a verdade é o que Deus pensa e diz. O cristianismo
nunca ficou desconcertado com a centralidade do Logos na
Trindade; o Logos e a sabedoria são intrínsecos à Divindade. O
cristão reafirma que seus axiomas são pressupostos fundamentais
de todo pensamento e ser; eles são básicos à estrutura noética
humana. Todo ser humano deve supor tais axiomas, sustenta ele, a
fim de explicar a realidade e a inteligibilidade da existência. Ele
insiste que seus princípios explanatórios estão, em última análise,
alicerçados na eternidade no Logos de Deus. Destaca ainda que a
doutrina cristã da criação oferece uma garantia transcendente da
unidade, ordem, inteligibilidade e estabilidade dos processos
naturais; provê igualmente uma base para a crença na existência de
alguma imbricação racional entre as imagens explanatórias e os
objetos da experimentação.
Além disso, o cristão conhece que é apenas pela graça divina
que ele, com fé, participa das realidades epistêmicas e ônticas
declaradas pela herança bíblica.
Entretanto, ele não afirma que a verdade do cristianismo só
pode ser conhecida pelos convertidos. Ateus, agnósticos, panteístas
ou deístas — se atentos aos dados — podem apreender as
doutrinas cristãs essenciais apenas por meio da leitura da Bíblia. A
expiação substitutiva e a ressurreição corporal de Jesus, o perdão
divino dos pecados e a necessidade que a humanidade tem do novo
nascimento para lograr participação no Reino de Deus são
afirmações confessionais solenes que mesmo escolares podem
compreender. A ortodoxia evangélica não defende que se deva
primeiro apropriar-se da verdade bíblica para entendê-la. Fosse
esse o caso, a distribuição de Bíblias, o evangelismo e a apologética
fariam pouco sentido. Bem ao contrário, a Bíblia avisa do castigo
divino que se aproxima por causa da deliberada negligência da
verdade da qual os humanos sabem até mesmo no estado não
regenerado.
Com certeza, muitas escolas de pensamento não bíblicas
opõem-se com vigor à ideia cristã de Deus e do mundo. A história
da filosofia oferece muitos princípios primordiais rivais — dos
átomos democríticos às mônadas leibnizianas e o Absoluto
Hegeliano, da evolução terrestre darwiniana por meio da mutação
lenta, gradual, quase imperceptível, aos genes primitivos de Hoyle
que emergem de uma sopa estelar e montam nas caudas dos
cometas para invadirem nosso cosmo. De modo semelhante, a
história das religiões oferece muitas alternativas globais, do Brama
mundo-alma impessoal do hinduísmo ao fundamentalismo xiita
iraniano, dos princípios Soka Gakkai no Japão ao êxtase
(enthusiasm) da Nova Era nos EUA, e muito mais.
Muitas dessas opções de fé sequer se interessam pela
verdade objetiva e eterna. Não é verdade que todas as religiões ou
filosofias exerçam de fato a pretensão de verdade universal. Os que
apelam apenas à decisão subjetiva ou consideram a verdade
culturalmente relativa, ou os que em sentido místico transcendem a
distinção entre verdade e falsidade, não podem mesmo, com
legitimidade, fazer alegações de verdade.
A inconsistência lógica embaraça as alegações de qualquer
sistema especulativo, e o faz do modo mais destrutivo quando os
princípios básicos parecem instáveis. Os positivistas lógicos
postulam que apenas premissas verificáveis pelos dados sensoriais
podem ser significativas ou verdadeiras. Neste caso, porém, a
própria premissa — em si mesma não verificável empiricamente —
não pode ser julgada significativa ou verdadeira. Os proponentes da
“teologia da revolução” olham para o êxodo hebreu da opressão
egípcia como paradigma e legitimação bíblica da utilização de
violência para promover a transformação social. No entanto, já que
os proponentes da revolução abraçam opiniões críticas da Escritura,
com que base podem eles, de forma peremptória, invocar o registro
do Êxodo? E mais, os hebreus nunca subverteram o governo
egípcio; a força deles não jazia na violência, mas na obediência
espiritual a Yahweh.
Embora seja corrente nos círculos interconfessionais
ecumênicos o conceito de que a revelação é encontrada em todas
as religiões, o fato é que a doutrina da revelação divina racional é
muito incomum entre as religiões e as filosofias do mundo, muito
mais incomum que os eruditos da Religionsgeschichte nos querem
fazer crer. É digno de nota que entre todas as grandes religiões
mundiais, apenas o judaísmo, o cristianismo e o islã assegurem “o
Deus que fala”; além disso, até onde o islã o assevere, sua
dependência da herança prévia judaico-cristã, bíblica, é indiscutível.
Não pode haver escolha decisiva entre opções se negamos
qualquer referente externo para julgar as afirmações de verdade. A
questão crucial não é se um estudioso deve iniciar com a fé; antes,
a questão crítica é se essa fé se trata de uma crença não racional. A
razão e a evidência públicas são em absoluto relevantes às
alegações de verdade teológica e, no caso afirmativo, qual é
exatamente o papel das duas?
Ao apelar à revelação transcendental como axioma
epistêmico básico, o cristianismo lança sua vindicação de verdade
de maneira abrangente sobre todas as áreas da vida humana. O
fato de o cristianismo postular princípios primordiais e afirmar
crenças nucleares fixas não exclui a propriedade dos testes
racionais. Nem a adequabilidade do teste racional implica que o
cristianismo deva ser reputado apenas como hipótese.
Um teste externo eficaz de validade universal e de verdade é
a consistência lógica. A inconsistência lógica sacrifica a
plausibilidade; um sistema logicamente inconsistente não pode ser
válido ou verdadeiro. A consistência lógica não pode comprovar de
forma decisiva a verdade das alegações intelectuais; entretanto, é
um potente teste negativo.
A autorrevelação de Deus é desvelamento inteligível; a
revelação divina é uma atividade mental. O Deus que fala — que
torna sua natureza e vontade conhecidas por meio de enunciados
proposicionais inteligíveis — articula de maneira verbal a verdade. A
consistência é uma perfeição divina. Ao convencer os seres
humanos de sua pecaminosidade, o Espírito Santo usa a verdade
como meio de persuasão. Por fim, a humanidade regenerada será
plenamente conformada à mente e santidade de Cristo.
Portanto, a ortodoxia evangélica não tem motivo algum para
evitar a lógica; tem ela toda a razão para de forma aberta exibir
premissas que se derivem com consistência de seus axiomas
básicos — a saber, a criação divina do mundo e dos seres humanos
à imagem de Deus; o domínio da humanidade sobre o cosmo, bem
como a mordomia desse; a queda de Adão e de sua posteridade na
revolta moral; a oferta divina de redenção a pecadores penitentes; o
pacto de Yahweh com Israel e o exílio punitivo dos hebreus; o
misericordioso dom da salvação mediante Jesus Cristo, que, como o
crucificado-ressurreto, encabeça uma nova sociedade regenerada; a
missão global de evangelismo e a promoção da justiça social por
parte da igreja; o iminente retorno de Cristo para julgar a
humanidade e as nações; a vindicação de retidão e a completa
derrota do mal; e o destino dual da humanidade baseado na reação
espiritual e moral do indivíduo.
Uma rotineira queixa evidencialista contra os
pressuposicionalistas é a de que eles estão trancados em suas
admissões de hipótese, ao passo que os evidencialistas estão
preocupados com evidência externa. Contudo, essa reclamação é
tão falaciosa quanto a insistência evidencialista de que os
evidencialistas estão livres de suposições. De modo algum todos os
pressuposicionalistas consideram as evidências irrelevantes às
asserções da fé, nem todos os pressuposicionalistas reputam a fé
hostil à razão. Os pressuposicionalistas insistem que a evidência
objetiva relevante existe externamente aos axiomas cristãos básicos
e suas implicações. Tal evidência com certeza não se baseia em
dados empíricos da espécie em que os evidencialistas confiam na
tentativa de demonstrar a existência de Deus a partir do não Deus.
Antes, a evidência decisiva é inspirada na Escritura; a Bíblia é o
princípio verificador acreditado da teologia cristã.
Por meio da observação sensorial é impossível provar que
Deus criou o universo ex nihilo; que todos os seres humanos portam
a imagem divina; que toda a humanidade é culpada em Adão; que
Jesus nasceu de uma virgem e viveu sem pecado nos dias de sua
carne; que ele morreu pelos pecados da humanidade; que após a
crucificação ele ressurgiu corporalmente, para nunca mais morrer —
as primícias da ressurreição geral vindoura; e que os seres
humanos estão destinados à vida futura que envolve um
impressionante destino dual na eternidade. Tais doutrinas não são
empiricamente dedutíveis; elas são corroboradas pelo ensino
escriturístico inspirado.
A mais notável confiança em fatores empíricos por parte dos
teólogos de mentalidade evidencialista jaz na promoção de “provas”
— alguns prefeririam dizer com mais modéstia “evidências” — da
existência de Deus. Malgrado tais argumentos partilharem muita
coisa em comum com a chamada prova quíntupla de Tomás de
Aquino, os círculos protestantes habitualmente as identificam como
os argumentos cosmológico, teleológico e antropológico. Essas
formulações começam com o universo — ou seja, o cosmo e o
homem — e prosseguem de forma indutiva até Deus como a causa
pessoal, inteligível e moral de toda a existência finita. Inversamente
a Tomás, mesmo os evangélicos de maior orientação empírica
anuem ao fato de que as “provas” não são demonstráveis pela
lógica; antes, defendem que as “evidências” indicam a alta
probabilidade da existência de Deus, uma probabilidade tão
irresistível que torna a incredulidade da humanidade imoral.
Não repetirei aqui as críticas a essa tese, já detalhadas em
God, Revelation and Authority [Deus, revelação e autoridade],
volume I.[34] O esforço evidencialista é uma variante da teologia
natural. Mas, se as provas são conclusivamente demonstrativas,
elas conduzem a uma realidade divina que é inferior a ou mesmo
outra que não o Deus da Bíblia. Não se pode elaborar um
argumento decisivo em prol da infinita deidade apenas por extensão
do não Deus; por principiar com a existência finita e prestar estrita
atenção a procedimentos lógicos chegar-se-á ao infinito só por meio
de um salto de fé não racional. Assim, por mais que o
evidencialismo invista suas provas da aura de razão,
inconscientemente cai sob o mesmo juízo que ele gratuitamente
emite sobre o pressuposicionalismo — a saber, o de promover a fé
sem a razão. Como o tomismo, o evidencialismo introduz a
revelação divina na discussão tarde demais para ser aproveitável.
Isso não é descartar a ordem cósmica e a razão e consciência
humanas como de nenhum significado para o teísmo; a ênfase
sobre o design, bem como sobre a racionalidade e a moralidade,
podem ter utilidade bem outra do que demonstrar a existência de
Deus.
Pior ainda, muitos empiristas evangélicos agora confundem a
revelação geral com a teologia natural. Eles direcionam textos que
trazem a revelação universal de Deus na natureza, na história e na
consciência para apoiar a tese bastante contestável de que, a
despeito da queda, sobrevive em toda a humanidade um conjunto
compartilhado de doutrinas teológicas e moral. Essa teoria não só
disfarça as divergências cognitivas, mas pressupõe da mesma
forma uma ideia por demais otimista da condição da humanidade
depois da queda.
Que o Deus vivo continua a se revelar em todo o universo na
natureza e na história, na e à mente e consciência do homem, não
se debate aqui. Nem se põe em dúvida a lucidez da revelação
universal, tampouco sua potência em verdadeiramente, em todos os
lugares, penetrar a razão e a consciência humanas. Não devemos
culpar a revelação divina universal como defeituosa em sentido
epistêmico. Não há na revelação divina nenhuma necessidade
inerente dessa distorção epistêmica.
Antes, a falta se localiza na humanidade. A frustração da
revelação divina geral se deve à obstinada e instável volição
humana. Na própria recepção da revelação de Deus, os seres
humanos caídos e rebeldes querem “deitar por terra” e suprimir a
revelação; eles a distorcem, pervertem e afinam ao que é mais
compatível e agradável à vontade alienada. Essa reação intelectual
revoltosa é atestada entre os intelectuais pela multiforme história da
filosofia e, ainda de modo mais genérico, pelas múltiplas religiões
mundiais e suas muitas crenças particulares.
Todavia, por meio da imago Dei, dada na criação, todo ser
humano recebe o conhecimento inerradicável da existência de
Deus, de outros egos e do mundo interior também. Para início de
conversa, todo ego humano sabe ser genuína e inescapável a
distinção entre Deus e o não Deus, a distinção entre o bem e o mal,
e a distinção entre a verdade e a falsidade. Além disso, todo ser
humano está a par de que conhecer a verdade e o bem coloca
alguém em contato com a humanidade. No entanto, não só os seres
humanos todos compartilham sim esses aspectos formais da imago,
mas também conhecem instintiva e intuitivamente que Deus sem
dúvida existe, que o mundo existe de fato, e que na verdade existem
outros egos. O teísta cristão não carece de argumentos indutivos
para saber que Deus existe, ou que ele mesmo existe, ou que o
cosmo e outros egos existem.
Ademais, no pensamento e na consciência, todo ser humano
mantém-se de forma inevitável e perpétua nos relacionamentos
divino-humanos que carregam alguma consciência da natureza de
Deus e da bondade e verdade essenciais. A imago Dei não apenas
possui conteúdo formal; ela igualmente possui conteúdo material.
Ninguém se encontra de todo sem luz, e todo ego humano é
culpável de revolta contra a luz.
Dada a rebelião volicional do ego humano, a luz da revelação
geral pode sobreviver em distintos contextos e em diferentes
padrões e intensidades, dependendo do grau e da profundidade da
animosidade humana. Entretanto, a revelação tem uma presença
inextinguível, uma presença que torna a espécie humana culpável
de revolta contra a deidade em sentido moral e espiritual.
Por causa das relações espirituais flutuantes e fugazes da
humanidade caída, a busca da certeza não é promissora. Alguém
está duplamente mal-orientado quando se volta às considerações
empíricas e experimentais como o fundamento da fé ou como prova
demonstrável. Quase todas as preocupações humanas do cotidiano
estão classificadas no domínio das probabilidades; a probabilidade é
a regra da vida. Mesmo nosso sistema legal no julgamento dos
criminosos fia-se em evidências circunstanciais.
Não obstante, temos sede de mais do que a mera
probabilidade respeitante ao destino humano. A teologia cristã
satisfaz a demanda por certeza com o lembrete de que a certeza
não tem conexão necessária com a verdade; ela pode ser mais
emocional ou volitiva que cognitiva. Algumas pessoas têm certeza
sobre a data precisa do regresso do Senhor; outras estão certas de
que comer toranja alivia enxaqueca, ou de que vinagre cura
verrugas. A fé cristã não oferece certeza matemática ou
especulativa, e sim convicção espiritual. A autoridade divina elimina
a lacuna racional entre a probabilidade e a certeza. Semelhante
segurança está baseada, não em probabilidades empíricas, mas no
testemunho sobrenatural do Espírito Santo que aviva a Escritura
objetivamente inspirada de forma individual. O Espírito emprega a
verdade como instrumento de persuasão, a verdade atestada pela
Escritura e que pode ser provada pela consistência lógica.
Portanto, o cristianismo em nada receia a razão pública; ele
não é fideísta nem empirista, tampouco racionalista. O cristianismo
não tem menos direito de afirmar seus princípios explanatórios
definitivos que as outras visões do mundo e da vida. Alguém
persuadido com base em outros fundamentos não precisa dos
argumentos empíricos nem dos existenciais e especulativos para
expor sua argumentação. Sugerir que alguém é irracional caso
defenda o teísmo sem primeiro subscrever às demandas do
empirismo ou de algum outro “ismo” é dar-se à propaganda em vez
de ao exercício lógico.
Enquanto fé alicerçada na revelação e inteligível, o
cristianismo parte da prioridade ontológica do Deus vivo e da
prioridade epistemológica da revelação divina. Desses postulados
básicos ele infere e desenvolve todas as doutrinas nucleares da
religião cristã. Entre essas está o dom divino da fé salvadora que
atrai o ego inteiro no amor, na adoração e no serviço obediente do
Criador e Juiz infinito da humanidade e das nações. A teologia
dedutiva chama a atenção dos incrédulos à consistência lógica
como teste negativo da verdade e à verificação das Escrituras. As
asserções da teologia dedutiva são inteligíveis a qualquer pessoa
que dê atenção à lógica, seja crente ou não. Contudo, como uma de
suas doutrinas, o cristianismo afirma o Espírito de Verdade como a
realidade dinâmica pela qual o Deus vivo nutre de modo soberano a
fé salvadora na vida do penitente. O cristão pode conservar
elevados a cabeça e o coração se, sobre o próprio fundamento — e
de maneira bem independente de Platão, Aristóteles, Hume ou
Hegel — ele diz com Paulo: “Eu sei em quem tenho crido e estou
certo…” (2Tm 1.12).
3. Os Axiomas do Teísmo Bíblico
Toda teologia ou filosofia ou ciência tem um ponto inicial que
a habilita a começar.
A clássica obra de Euclides sobre Os Elementos, escrita por
volta de 300 a.C., enunciou os cinco postulados ou princípios não
provados concernentes a linhas, ângulos e figuras das quais ele
deduziu a geometria. Ele postulou, por exemplo, que entre dois
pontos quaisquer pode-se traçar uma linha reta, e que todos os
ângulos retos são iguais. Além dos cinco postulados, ele aduziu
cinco outros princípios não provados, denominados axiomas. Os
postulados tratam de modo específico de assuntos geométricos,
enquanto os axiomas lidam mais genericamente com grandeza. Os
matemáticos e lógicos modernos agora usam os termos axioma e
postulado de forma intercambiável.
A partir de seus postulados, axiomas e definições, Euclides
deduziu os teoremas que enunciam o conteúdo do plano e da
geometria sólida. Mais tarde os geômetras contestaram certos
teoremas dele e debateram se a geometria euclidiana é baseada em
verdades necessárias ou hipóteses empíricas. Todavia, até as
geometrias de Nikolai I. Lobachevsky e de Georg F. B. Riemann são
formalmente consistentes com aquela, a elas se podendo dar um
modelo euclidiano. “Qualquer hipótese, predição ou explanação que
pode ser expresso em um desses esquemas descritivos”, comenta
Stephen F. Barker, “pode ser expresso com a mesma precisão no
outro”.[35]
Philip Kitcher sustenta que o conhecimento matemático é em
essência empírico; isto é, suas verdades e provas estão fundadas
na experiência.[36] No entanto, seus argumentos não são
persuasivos. Como Joseph W. Dauben observa, Kitcher apenas
salta sobre as dificuldades das abordagens empiristas da
matemática: ele ignora muitos trabalhos recentes (e.g., os de Bos,
Barn, Grabiner, Fleckenstein, Hofmann, Manning, Scriba, Westfall,
Whiteside) simplesmente ao avaliá-los como “tendenciosos” em
sentido a priori.[37]
Exatamente como a geometria possui axiomas básicos dos
quais fluem seus teoremas, também os sistemas teológicos e
filosóficos têm axiomas governantes. Axiomas são os princípios
regentes com os quais qualquer sistema de pensamento começa.
Eles jamais são deduzidos ou inferidos de outros princípios, apenas
pressupostos. A nenhum axioma se chega por raciocínio; como
ponto inicial, portanto, o axioma, na natureza da argumentação, está
fora do alcance de prova.
A lógica em si mesma repousa sobre o princípio
empiricamente não provado de que, em todo esforço para
comunicar de modo inteligível, deve-se presumir ― e.g., o princípio
da não contradição.
Desses axiomas controladores os teoremas de todo sistema
são deduzidos de forma subsequente. Mesmo que os empiristas o
possam negar, e de fato o neguem, todos os sistemas estão
baseados em axiomas; sem axiomas iniciais nada se pode
demonstrar. A ciência natural é impossível se não se tiver por certa
a correspondência entre as leis do pensamento e a ordem do
mundo exterior.
Na filosofia, o axioma que subjaz ao ateísmo naturalista é o
de que o processo e os eventos físicos constituem o todo da
realidade. O empirismo repousa sobre o axioma de que todo o
conhecimento tem sua fonte apenas na sensação. O axioma
governante de Kant é que o conhecimento constitui-se no produto
conjunto de formas inatas e conteúdo sensorial. O positivismo lógico
parte do axioma de que só proposições verificáveis pela experiência
sensorial podem ser verdadeiras ou significativas.
O empirismo não pode justificar empiricamente sua premissa
governante. Da experiência sensorial, à qual ele ensinava limitar o
conteúdo de todo o conhecimento, Kant não pôde deduzir
informação sobre as formas de pensamento inatas. Pelo fato de o
positivismo lógico não poder verificar de forma sensitiva a própria
tese de verificação, ele não consegue se isentar da falta de sentido.
Cada cosmovisão tem um ponto inicial distintivo ou tese de
critério para tentar unificar e explanar a experiência humana. O
filósofo cristão, portanto, não está sob nenhuma compulsão
intelectual para aceitar premissas rivais, por mais que sejam da
moda, como o ponto inicial para desenvolver sua cosmovisão teísta.
E o incrédulo não pode objetar que os axiomas do teísmo cristão
são deduzidos de outra fonte que não a experiência sensorial, a
intuição mística ou a conjectura filosófica. A confiança do evangélico
na capacidade abrangente de explicação do teísmo bíblico é tão
legítima como a admissão pré-filosófica da hipótese para formular
sua asserção quanto o é o conceito do positivismo lógico de que
apenas a confirmabilidade empírica salva o termo Deus da falta de
sentido.
O que distingue os axiomas cristãos dos axiomas rivais não é
que os primeiros sejam a priori; todos os axiomas o são. “Ninguém
pode objetar com consistência”, escreve Gordon H. Clark, “ao fato
de o cristianismo estar baseado em um axioma não demonstrável.
Se os secularistas exercem seu privilégio de fundamentar seus
teoremas sobre axiomas, então também o podem os cristãos. Caso
os primeiros recusem-se a aceitar nossos axiomas, então eles não
têm nenhuma objeção lógica à nossa rejeição dos deles”.[38]
Os filósofos cristãos estão mal aconselhados se, para
tornarem o teísmo bíblico tão palatável quanto possível aos filósofos
seculares, conformam as afirmações cristãs aos princípios alheios e
amiúde hostis dos pensadores não bíblicos. A validade do teísmo
cristão não depende de os incrédulos acharem aceitáveis seus
pressupostos, ou de esposarem só as crenças que os filósofos
dissidentes aprovam. Como Alvin Plantinga expressa: “[o] filósofo
cristão está inteiramente dentro de seus direitos ao principiar
partindo da crença em Deus… Ele tem o direito de aceitar como
verdadeira a existência de Deus e daí prosseguir em sua obra
filosófica exatamente como os outros filósofos tomam por certo a
existência do passado, da fala ou das outras pessoas, ou as
asserções básicas da física contemporânea”.[39]
Plantinga rejeita até a concepção de alguns filósofos cristãos
de que eles devem se envolver com os filósofos ateus ou agnósticos
“na busca comum pelas posições filosóficas corretas em face da
questão de haver um ser como Deus”, como se o filósofo cristão
devesse mostrar por suas premissas que sua opinião é provável ou
justificada.[40]
O filósofo secular contemporâneo com frequência insiste em
que a busca do conhecimento científico ou histórico exige que os
acadêmicos avaliem de forma crítica todas as crenças, mas em
seguida continua aceitando os próprios pressupostos como
verdadeiros e exigindo que os outros revisem suas suposições para
se conformarem com as dele.
Mas o filósofo cristão não precisa afinar suas convicções para
se ajustarem às do antagonista como o preço do engajamento
filosófico. Nas palavras de Plantinga: “O filósofo cristão, bem
propriamente, começa da existência de Deus, e a pressupõe no
trabalho filosófico, possa ou não demonstrá-la provável ou plausível
em relação às premissas aceitas por todos ou pela maioria dos
filósofos nos grandes centros contemporâneos de filosofia”.[41] Ele
tem o direito e mesmo a obrigação de enunciar sua argumentação
sobre o próprio fundamento, quer os contemporâneos céticos
creiam ou não nela. Se não agir assim, ele simplesmente joga fora
seus argumentos. Em vez de ficar intimidado pelas exigências
inconsequentes de quem não concede nenhuma plausibilidade aos
princípios cristãos e insiste no aplauso apenas das proposições
passíveis de tratamento por um sistema filosófico não cristão
entrincheirado, é de todo legítimo ao filósofo cristão iniciar com o
que ele sabe como cristão.
O cristão deve sistematizar, aprofundar-se e aplicar suas
convicções pré-filosóficas a fim de testá-las para obter poder
explanatório e congruência lógica. Até os cientistas empíricos
postulam modelos conceituais nos esforços para explicar o cosmo.
Por muito tempo eles falaram de “leis” da natureza, mas se as suas
numerosas fórmulas estivessem fundadas de fato na natureza, os
cientistas não teriam a necessidade de revisá-las com constância.
Por muito tempo eles falaram de causalidade, mas as causas estão
além da verificabilidade empírica; em consequência, agora os
cientistas falam com mais cautela das consequências preditivas.
Segundo Huston Smith, a suposição básica da cosmovisão
contemporânea é a de que “a realidade é desordenada em todos os
sentidos objetivos que a mente do homem pode discernir”.[42] Muitos
comentários correntes presumem que o mundo exterior ou
transcendente é intrinsecamente não estruturado, ou que o homem
contribui de maneira criativa e decisiva para o nosso conhecimento
a respeito dele. Baseados nessa abordagem, os princípios
definitivos são pleiteados pela utilidade ou proveito em vez da
verdade objetiva.
Teoricamente é tão legítimo para o teísta considerar Deus a
causa (quiçá a causa final) do universo quanto para o ateísta
considerar a natureza um caos que o homem “ordena”.
Os axiomas básicos da religião cristã são dois. O axioma
ontológico básico é o Deus vivo; o axioma epistemológico básico é a
revelação divina. Esses axiomas podem ser afirmados de modo
mais completo e preciso quando se diz que o Deus trino é o axioma
básico e se declara que as verdades da revelação constituem o
axioma epistemológico básico. Tais axiomas implicam um ao outro.
Sem o Deus vivo não haveria revelação divina. Sem
autodesvelamento inteligível não saberíamos que Deus existe.
Construindo sobre as teses de Barbour, Avery Dulles fala de
modelos teológicos de maneira muito semelhante à dos filósofos da
ciência quando falam de modelos científico-teóricos.[43] Ian G.
Barbour contrasta modelos científico-teóricos imaginativamente
projetados com modelos científico-experimentais usados em
laboratórios; os primeiros, nota ele, são modelos interpretativos
criativos para tratar do que não é observável.[44] Os modelos
teóricos, enfatiza Barbour, não conseguem representar a realidade
com literalidade. Todavia, essa distinção é artificial. Eis o fato: a
física também é operacional; nenhuma das leis da física constitui
uma verdade assentada. Em geral, toda ciência opera de forma
análoga, pois as conclusões e afirmações científicas sobre o mundo
físico são apenas empíricas e revisáveis.
Se os modelos teológicos apenas recaem nessa mesma
classe, então a verdade das afirmações teológicas permanece em
dúvida. Norman Malcolm observa que “os filósofos acadêmicos dos
dias correntes estão muitíssimo mais propensos a desafiar as
credenciais da religião que as da ciência”.[45] Muito do pensamento
religioso recente reputa a interpretação teológica intrinsecamente
experimental e vê a teologia como um empreendimento fadado à
perpétua revisão. Ele pressupõe que em teologia nenhum modelo
explanatório decisivo pode ser oferecido ou deve ser esperado.
Postular o teísmo cristão como modelo teórico junto com
outros modelos teóricos não precisa sugerir, entretanto, que o
cristianismo seja apenas um construto especulativo projetado para
explicar o homem e o mundo. Sem dúvida, muitos não cristãos
consideram o teísmo bíblico um modo conjectural de pensar acerca
da vida e da existência. Todos os pensadores especulativos tendem
a reputar as opiniões rivais em termos pejorativos, enquanto
aplaudem a própria opção. Todavia, o cristianismo não reafirma
seus axiomas só como uma abordagem teórica improvisada sobre o
mundo exterior intrinsecamente sem sentido ou os postula apenas
por sua utilidade; ele defende que os axiomas iluminam a realidade
de maneira literal e factual.
O cristão insiste que a doutrina bíblica da revelação não é
uma conquista do raciocínio filosófico. “Se a revelação não fosse
necessária para conhecer a revelação”, observa com competência
Dulles, “daria a impressão de que ela não seria em absoluto
necessária”.[46] C. S. Lewis afirma de outra maneira: o cristianismo é
“a religião que ninguém poderia ter adivinhado”.[47] O cristão sabe
que os axiomas de sua fé estão fundados em realidades
transcendentes e não em fabricação especulativa. A concepção
bíblica é a de que a razão humana não tem nenhum papel
normativo e criador no tocante à verdade. Deus é a verdade e a
fonte de toda a verdade. No entendimento cristão, a mente e a
vontade de Deus são a fonte de toda a verdade, da matemática, da
lógica, da lei e da ordem cósmica.
O impulso negativo do iluminismo tinha em vista promover a
razão humana suprimindo a revelação sobrenatural. Como observa
Reinhold Niebuhr: “o racionalismo humanístico, esquecendo-se de
que tanto a razão humana quanto a existência física humana são
uma realidade derivada, dependente/criada e finita, transforma-a em
um princípio de interpretação do sentido da vida”.[48] No entanto, o
iluminismo conseguiu sufocar a razão e a revelação, em vez de
reconhecer que a razão é a aliada, não a inimiga, da revelação
divina. Essa firme característica da filosofia moderna é ora
considerada com crescente suspeita e, como Nicholas Wolterstorff
intui, os acadêmicos “estão desejosos de perguntar outra vez sobre
a relação entre razão e revelação”.[49]
Conquanto os termos postulado e axioma sejam bastante
usados de maneira intercambiável, o primeiro é por vezes aplicado
com imprecisão aos dogmas ou doutrinas essenciais que fluem dos
axiomas básicos. Assim, em The Christian View of God and the
World [A visão cristã de Deus e do mundo] James Orr, delineando
as doutrinas bíblicas principais, escreveu sobre os postulados da fé
cristã tais como Deus, a natureza e o homem, e o pecado.[50] Sobre
o fundamento da revelação divina especial, o cristianismo
promulgou suas doutrinas da existência do Soberano sobrenatural,
da criação ex nihilo, da imagem divina do homem e da mordomia da
terra por esse, do relacionamento do homem com o Criador que foi
violado pelo homem, da salvação das criaturas caídas provida por
Deus, da inspiração especial dos profetas e apóstolos, da
encarnação em Jesus de Nazaré, do papel da igreja no mundo, bem
como do destino dual da humanidade na eternidade.
Em oposição à atestação cristã da revelação como o axioma
epistemológico básico, os filósofos seculares apresentam princípios
explanatórios rivais. Os empiristas exaltam a observação e a
experiência acima do raciocínio filosófico como meio de
conhecimento; todavia, mesmo os empiristas divergem entre si.
Muitos saúdam o moderno método científico — observação e
verificação sensorial — como o mais fidedigno sobre a realidade. Os
empiristas estritos questionam a realidade do sobrenatural,
porquanto as preocupações metafísicas e morais caem fora do
campo de ação empírico. Outros dilatam o sentido da experiência
além do conhecimento perceptível para abarcar relacionamentos
diretos com outros egos e com Deus. Uma teologia do “encontro”
funda a crença na realidade de Deus em confrontação íntima divino-
humana. Os místicos apelam à experiência imediata a favor de um
deus além do bem e do mal, além da verdade e do erro, e fora do
tempo e do espaço. Sem dúvida a experiência não interpreta a si
mesma; não raro, a interpretação torna-se colorida pela perspectiva
religiosa, filosófica e cultural dominante. E as experiências não
autenticam a si mesmas nem são infalíveis. Descartaremos então
todas as crenças religiosas e filosóficas por seu relativismo cultural?
Alguns dizem que a experiência religiosa é inexprimível na
linguagem. Mas nesse caso não se pode instar mais ninguém a ter a
mesma experiência. Se a experiência é indefinível, realmente se
conhece o que ela é? O caráter expressivo da proposição é, com
certeza, uma pré-condição para a avaliação de qualquer sistema. O
sistema que não se expressa por meio de proposições torna
desnecessárias afirmações de verdade compartilháveis e de modo
algum pode ser testado. De qualquer forma, pode-se mesmo ter a
experiência de outra pessoa? Ou essa interrogação apenas se
oculta atrás do predicamento egocêntrico e faz supor que uma
experiência deve ser minha se tenho de tê-la? Seja como for, a
experiência é incompleta e vulnerável à contínua suplementação e
correção. Além disso, algumas religiões — em especial o judaísmo
e o cristianismo — insistem que Deus não se relaciona com o
universo ou mesmo com todos os seres humanos de maneiras
totalmente uniformes. Pode alguém então realmente relatar a
verdade não qualificada acerca de Deus falando só com base na
experiência pessoal?
Em gerações anteriores, os empiristas alegavam que as
hipóteses explanatórias surgem dos dados experimentais
acumulados e princípios indutivos, as quais a experiência ulterior
pode então, na sequência, verificar. Contudo, não se experimenta
nem se pode experimentar o mundo físico de forma direta; nossos
dados experimentais consistem em sensações e impulsos
neurológicos. Alega-se, entretanto, que o mundo físico seja a causa
dessas sensações. A argumentação em prol da existência de outros
egos — humano e divino — estava semelhantemente baseada em
inferências oriundas das experiências conscientes.
Muitas vezes o argumento empírico passa dos dados da
experiência para realidades ou fatos além da experiência; do
mesmo modo, ele atribui a essas entidades transcendentes
qualidades não observadas por meio de experiências. O físico
raciocina partindo de leituras métricas nas câmaras das nuvens até
partículas subatômicas, ou partindo do projeto da natureza e indo
em direção a um Arquiteto divino onipotente. No entanto, ele tem tão
pouca experiência empírica imediata dos átomos quanto o tem de
Deus.
As “provas” da existência de Deus procediam da ordem da
natureza, ou de um padrão percebido de acontecimentos históricos
(sejam excepcionais ou recorrentes). Tal linha de argumentação foi
cada vez mais solapada, com a maior eficácia, por David Hume.
Hume advogou que os dados empíricos não podem verificar a
existência de Deus, a existência das causas, a existência do mundo
físico, até mesmo a existência a individualidade de alguém.
Pior ainda, como notou Hume, a argumentação empírica a
respeito de um Projetista onipotente parte de modo encoberto do
princípio de que o universo originou-se por meio da criação. Mas a
exclusão de outras possibilidades sobre a origem só se justifica
caso se tenha a experiência prévia da origem dos mundos.
Ademais, a existência do mal no mundo pode indicar um Deus finito
em vez de infinito. O projeto da natureza pode também ser a obra
de múltiplos poderes espirituais. (Mais tarde Darwin sugeriu a
variação por acaso e a seleção natural.) Embora não haja consenso
filosófico sobre como se deve definir a experiência, os limites do
empirismo científico (ou da observação laboratorial) estão agora tão
amplamente reconhecidos que os empiristas estritos admitem que o
método não pode fornecer veredicto algum sobre entidades
teológicas e imperativos morais. A observação empírica lida com o
fenomenal, com nossas percepções sensoriais da realidade. As
técnicas indutivas padrões não nos permitem ir além dos dados
percebidos.
No entanto, o que ocasiona as percepções sensoriais? A
escrivaninha assemelha-se a um objeto sólido, todavia, os físicos
dizem que ela é composta de eventos imperceptíveis. Bertrand
Russell observou: se “não podemos estar seguros da existência
independente de outros corpos humanos e, por conseguinte, menos
ainda da mente deles […] a totalidade do mundo exterior não seria
mais que um sonho, e só nós existimos”.[51]
Ao exame de “provas” empíricas a favor da existência de
Deus, muitos mestres nos cursos de filosofia da religião declaram
que ele não existe ou, caso exista, difere muito do Deus da Bíblia.
Nenhum teísta deve ficar aturdido pelas modernas declarações da
invalidade das supostas provas teístas. A importância dos
argumentos filosóficos empíricos, até o ponto em que são
construtivos, não é a capacidade de provar com demonstrações a
existência de Deus, mas sim que podem remover obstáculos à
incredulidade. Nenhuma das pretensas provas da existência de
Deus gera fé. Nem a experiência nem a história fornecem uma
concepção da realidade verdadeiramente completa; ambas
permanecem abertas ao amanhã. Um sistema explanatório
consistente não pode ser alcançado por método empírico algum.
As crenças básicas não são inferidas de forma empírica.
Dados experimentais são filtrados através das lentes cognitivas; não
se captam dados sensoriais vazios ou neutros. Compreende-se a
experiência no contexto de um arcabouço interpretativo de crenças,
de princípios em estrutura, ou de um mundo-figura basilar que
trazemos à experiência e dentro do qual, como um Weltbild ou
sistema de último plano, para citar Ludwig Wittgenstein, “todo teste,
toda confirmação e não confirmação de uma hipótese acontece”.[52]
O papel decisivo dos pressupostos está cada vez mais
evidente à erudição científica do século XX. Os grandes avanços na
teoria científica moderna recente surgiram por intermédio de
postulação criativa em vez de observação indutiva. Como diz Leslie
Newbigin: “a fórmula credo ut intelligam é fundamental à ciência”.[53]
A física contemporânea fala de construtos teóricos como Big Bang,
partículas subatômicas e campo magnético não com base na
indução experimental, mas na intuição e imaginação. “Os métodos
de um cientista podem ser completamente empíricos”, escreve
Stephen Toulmin, “todavia, suas investigações não terão direção
nenhuma sem a orientação de um corpo de ideias preexistentes”.[54]
As deduções tiradas de hipóteses criativas passam por testes
laboratoriais subsequentes, e sua credibilidade depende de uma
série de confirmação ou não confirmação.
As teorias empíricas são sempre aceitas na ausência de
prova empírica. Não raro, elas ganham curso antes mesmo de
verificação empírica estar disponível. Algumas vezes os cientistas
até corroboram a existência de coisas antes que haja qualquer
observação delas (e.g., a lista estendida de partículas subatômicas;
buracos negros).
É comum os físicos mencionarem de forma rotineira a “visão”
de partículas subatômicas. Mas, como comenta Richard Morris, o
que eles observam de fato são bolhas de hidrogênio. A estas eles
igualam partículas “pequenas demais para serem observadas
diretamente, mesmo pelos mais poderosos microscópios de elétron.
Prótons e nêutrons, léptons, fótons e quarks” são inferidos: “os
físicos creem nelas porque podem ser usadas para explanar
muitíssimas coisas observadas em laboratório… São conceitos que
podem ser usados para codificar uma enorme quantidade de dados
sobre fenômenos naturais”.[55] Niels Bohr observou uma geração
atrás, que, embora leituras laboratoriais em ponteiros e mostradores
sejam “reais”, elétrons e partículas subatômicas são modelos úteis.
[56]
Em 1985, cientistas desenvolveram em Zurique um novo tipo
de microscópio capaz de aumentar um objeto 300 milhões de vezes
e de proporcionar retratos de átomos individuais que compõem a
superfície de objetos ordinários. Os átomos aparecem como bolas
indistintas ou protuberanciazinhas tão minúsculas que 4 bilhões
deles enfileirados mediriam uma polegada. Mesmo assim, o estudo
dos componentes internos postulados pelos físicos — um núcleo de
prótons e nêutrons com uma nuvem de elétrons orbitando — ainda
continua a ser feito. Na verdade, muitos físicos afirmam que os
elétrons existem apenas como abstrações, como construtos
pragmáticos úteis que permitem aos cientistas apresentar suas
concepções da natureza de maneira sistemática. Em suma, os
elétrons são apenas postulados ou modelos teóricos que facilitam a
interpretação dos dados pelo experimentador.
A reflexão lógica e a imaginação criativa — alguns escritores
a chamam de “um salto no escuro” ou “conjetura inspirada” — se
encontram de forma plena, e até mais do que isso, na base das
ousadas novas teorias da ciência que a observação e a análise
experimentais. Com certeza Stephen Toulmin rejeita a ilação de
Arthur Koestler de que os cientistas tropeçam nas explanações
como sonâmbulos e, à parte do cálculo lógico e dos procedimentos
formais, “fazem descobertas teóricas por intuição cega e não
racional”.[57] O fato é que as teorias científicas são agora vistas com
menos frequência no contexto da verdade e consideradas mais
vezes construtos estéticos provenientes da contemplação mística
imaginativa mediante a qual os acadêmicos abordam a natureza e,
com criatividade, organizam os dados experimentais em um padrão
ordenado. Richard Morris sugere que a ciência teórica não é
diferente da arte; trata-se da “atividade que impõe ordem a toda a
miríade de aspectos da experiência humana”.[58] A essas
postulações teóricas não raro se confere peso maior que os dados
de laboratório, já que as teorias explicam fenômenos relevantes e
são capazes de aduzir algum apoio experimental.
Não mais os cientistas alegam identificar as próprias “leis da
natureza”. Muitos só falam sobre aproximações de leis semelhantes
e alguns, em vista de modelos que mudam com constância,
perguntam-se até que ponto a própria mente humana impõe à
natureza a ordem que professamos descobrir com criatividade.
Morris observa: “Há um sentido em que mésons, quarks e glúons
são sonhos… Eles existem ‘de verdade’? Com quase certeza
absoluta não”. Não obstante, “eles são reais no sentido de que nos
fornecem um quadro vívido e frutífero desse mundo… A ciência
busca criar retratos da ordem na natureza… tão logicamente
elegantes que não podemos duvidar que sejam verdadeiros”.[59]
Alguns acadêmicos cristãos usam essa abordagem da
postulação para promover a verdade provável do cristianismo. David
Elton Trueblood defende que o teísmo cristão enquanto princípio
cognitivo é o que melhor explica a experiência científica, ética,
estética, histórica e religiosa do homem.[60] Ele acredita que o
teísmo bíblico emprega uma asserção de verdade de alta
probabilidade por apresentar o cosmo ordenado (que pode ser
investigado pela ciência) e a ordem moral objetiva. Edward John
Carnell afirmou que o teísmo cristão comporta uma alegação
superior de verdade por explicar com lógica o mundo da existência e
da experiência com consistência e coerência maiores que a dos
rivais intelectuais.[61]
No entanto, David Wolfe alerta que o teísmo cristão torna-se
muito vulnerável se, como os postulados científicos, condiciona-se a
fatores que o tornam “mais provável ou menos provável” baseado
na verificação progressiva. Os credos da cristandade não afirmam a
encarnação divina com 60 por cento de probabilidade, ou mesmo
uma cosmovisão mais provável que qualquer alternativa. Wolfe
insiste, com correção, que a fé cristã encontra a própria autoridade
em outro lugar.[62]
Pelo lado negativo, Wolfe admite a impossibilidade da
verificação completa. Contudo, ele também insiste na argumentação
de Karl Popper sobre a igual impossibilidade da prova decisiva de
não validade, de sorte que qualquer discurso sobre “grau de
verificação” ou de probabilidade é problemático.[63] Na pesquisa de
dados naturais e históricos, o que constitui um fato ou
acontecimento e sua probabilidade de ocorrência (e.g., a de um
milagre) não é determinado à parte da perspectiva teórica do
intérprete.
As crenças explanatórias de alguém, nós dissemos, não
estão destiladas de dados não interpretados. Antes, nossa
experiência se torna possível por meio de um aparato conceitual
através do que interpretamos toda a existência e a vida. Em resumo,
esse arcabouço interpretativo é o que torna a experiência possível;
de resto, situamos alegações de dados nebulosos em um mapa
metafísico.
A crença em Deus é básica à tese cristã, e nenhum
argumento dedutivo partindo do não Deus é necessário para
justificá-la. Um intelectual pode estar correto, dentro dos limites da
propriedade epistêmica, caso subscreva à existência de Deus
mesmo na ausência de qualquer evidência empírica. Em contraste
com os esforços medievais para justificar a fé na existência de Deus
com base na teologia natural, os reformadores protestantes
sustentavam, sem qualquer argumentação racional, que a crença na
existência de Deus é racional e admissível. Nem por isso eram
fideístas: eles não defendiam a existência de Deus como uma
matéria de fé pura e contrária à razão.
Plantinga está certo quando insiste que a crença dos
reformadores não era sem fundamento, tampouco gratuita ou
arbitrária em sentido epistêmico, mas racionalmente justificável. Os
reformadores davam ênfase à autorrevelação inteligível de Deus e
ao fato da inescapável consciência humana. Eles sustentavam que,
por ser um aspecto da revelação divina geral, a verdade da
existência de Deus foi concedida na constituição da natureza
humana. Reafirmavam que ninguém escapa da convicção da
existência do Deus que se autorrevela. O cético pode dissentir
dessa ênfase. No entanto, o repúdio não altera a insistência dos
reformadores de que a crença em Deus é epistemicamente fundada
e justificável e, ademais, básica a todas as outras asserções de
verdade. E os reformadores não julgavam necessário “provar” a
existência de outros egos ou do cosmo. Não só o argumento
empírico é desnecessário para provar a existência deles, como
também nenhum argumento do tipo é válido.
A questão crucial relativa ao teísmo bíblico não se encontra
na correção e razoabilidade da crença aposta à evidência. É antes a
questão da evidência apropriada para confirmar com exatidão a
existência de Deus. Apenas os escritos dos ateístas devem ser
lidos? Ou a restrição deve abranger a leitura das obras dos
filósofos? Ou deve-se ler também a Bíblia e estudar a vida de
Jesus? A Bíblia, de modo notório, começa com o Deus vivo; ela não
o introduz tardiamente como conclusão de um silogismo
estabelecido sobre a observação meticulosa do não Deus.
Com certeza os ateus dizem que a fé na existência de Deus é
ilógica, e alguns teístas pusilânimes consideram a crença na
deidade judaico-cristã incompatível com a natureza do homem e do
cosmo. No entanto, acadêmicos esclarecidos não serão abatidos
por afirmações semelhantes.
No debate sobre o status ontológico de entidades não
observáveis de maneira científica, o positivismo lógico insistia que
os enunciados teóricos sobre as coisas não observáveis postuladas
devem ser definidos ou explicados nos termos das que se podem
observar. A alegação de que a expressão “Deus existe” é vazia em
termos cognitivos por não ser verificada pelos sentidos era
destrutiva como autorreferência; afinal, ela produziu a percepção de
que o princípio de verificação do positivismo desacreditava o
positivismo, não o teísmo. Alguns cientistas justificavam as coisas
não observáveis, não nos termos das regras lógicas, mas do
comportamento antecipado ou da estética. Outros esforços para
demonstrar o disparate lógico do teísmo cristão, como o argumento
de que, se Deus é um espírito incorpóreo, ele não pode agir no
mundo, repousam sobre a superficialidade filosófica.
Alguns filósofos analíticos, de forma mais destacada Alvin
Plantinga nos EUA e Peter Geach e Richard Swinburne na Grã-
Bretanha, insistem que as afirmações centrais do cristianismo são
coerentes segundo a lógica e racionalmente defensáveis. Stephen
T. Davis segue a ênfase de Plantinga de que os atributos de Deus
afirmados pela Bíblia não tornam a tese judaico-cristã incoerente.[64]
Toda cosmovisão objetiva assegura que podemos conhecer
algo que todos os outros podem conhecer e no qual têm que crer. E
se professamos ter conhecimento compartilhável, essa crença nos
envolve em relacionamentos ulteriores às leis do pensamento, em
especial com as leis de identidade, de não contradição e do meio
excluído. O cristianismo não desdenha dos cânones da
racionalidade. Ele oferece uma rede lógica e completa de crenças.
Testes legítimos podem ser aplicados às alegações de
verdade dos divergentes modelos metafísicos que propõem explicar
toda a existência e a vida. Os axiomas de qualquer sistema são
passíveis de teste de consistência ou inconsistência com que
explicam os dados relevantes. Os axiomas perdem poder de
explicação caso se demonstre que os teoremas deles deduzidos
são logicamente inconsistentes.
A contradição e a inconsistência lógica expõem a invalidade
de muitas alegações de crenças. Visto que a segunda invalida
qualquer silogismo, a consistência lógica é um teste de verdade
negativo.
Contra essa ênfase na consistência lógica precisamente
como teste negativo da verdade teológica, John Warwick
Montgomery advoga a verificação empírica. No universo
contingente, argumenta Montgomery, um sistema até então não
detectado pode se provar mais consistente que a alegação cristã de
revelação. Uma demonstração da incoerência lógica de todos os
sistemas não cristãos existentes não ajuda muito, insiste ele, posto
que “sempre pode haver, no universo contingente, um sistema x + 1
contra o qual contender”, de maneira que o teólogo
pressuposicionalista se defronta com um empreendimento
infindável.[65]
Mas podemos nos agarrar apenas a sistemas conhecidos;
não somos convocados a inventar alternativas hipotéticas e
consistentes que ninguém até então postulou. Se Montgomery
conhece um sistema mais consistente que o teísmo bíblico, deve
aduzi-lo. A verdade do sistema cristão não é forçada a receber um
status empírico por um malogro no exame de todos os tipos de
possibilidades imaginárias inexistentes como possíveis opções. Isso
sem dúvida seria uma tarefa sem fim e de todo ilegítima.
É demais esperar que cada um de nós avalie exatamente
todas as posições metafísicas com igual meticulosidade. Todavia,
devemos pelo menos investigar opções cativantes que atraem as
massas humanas de forma perene. Não devemos, como propõe
Wolfe, investigar a autoridade de qualquer esquema que ofereça “a
visão mais rica, a esperança maior e os valores mais poderosos”?
[66]
[1] Bob E. Patterson, Carl F.H. Henry (Peabody, MA: Hendrickson, 1983).
[2] Admiring the Sistine Chapel: Reflections on Carl F.H. Henry's God,
Revelation and Authority. Themelios 25.2 (2000): 48-58.
[3] Na excelente autobiografia, Henry diz o seguinte: “Não havia orações com
a família, nenhum agradecimento à mesa e nenhuma Bíblia em nossa casa”.
V. Carl F. H. Henry, Confessions of a Theologian: An Autobiography (Waco:
Word books, 1986), p. 17-8.
[4] A família Henry havia se mudado para Long Island em 1920, adquirindo
uma pequena fazenda ali.
[5] Timothy George e David S. Dockery (eds.), Theologians of the Baptist
Tradition. Nashville: B&H Publishing, 2001, p. 280.
[6] Confessions of a Theologian, p. 66.
[7] Timothy George e David S. Dockery (eds.), Theologians of the Baptist
Tradition. Nashville: B&H Publishing, 2001, p. 280-1.
[8] Southern Baptist Journal of Theology 8, no. 4 (2004).
[9] Henry foi para Universidade de Cambridge em setembro de 1968,
dedicando meio ano de pesquisa ao livro sobre epistemologia que escreveria
e outra metade do ano ao livro sobre ontologia.
[10] As diversas palestras, proferidas em 1989, foram publicadas com o
formato de livro pela Zondervan em 1990 intitulado: Evangelical Affirmations.
A palestra de Henry foi publicada com o título “Who are the Evangelicals?”.
Entre outros autores, destacam-se James I. Packer, David F. Wells, Donald A.
Carson e Os Guinness.
[11] House, Remaking the Modern Mind.
[12] A obra apareceu em três séries de 2 volumes entre 1976 e 1983. Em 1999
a Crossway Books reimprimiu os volumes e esses foram pela primeira vez
vendidos como coleção.
[13] “Happy 100th Birthday Carl F.H. Henry”, publicado em 20/1/2013, no site
http://www.russellmoore.com/.
[14] Recovering Classic Evangelicalism: Applying the Wisdom and Vision of
Carl F. H. Henry (Wheaton, IL: Crossway Books, 2013).
[15] Recovering Classic Evangelicalism, p. 24.
[16] Wissenschaft é uma palavra alemã que designa o estudo ou a ciência que
envolve a pesquisa e o estudo sistemáticos, incorporando ciência,
aprendizado, conhecimento e erudição. [N. do R.]
[17] De acordo com Thornbury, Toward a Recovery of Christian Belief se
encontra entre as obras menos conhecidas de Henry (p. 41).
[18] Carl Henry dedicou o livro Remaking the Modern Mind ao que chamou “Os
três homens de Atenas”: Gordon Haddon Clark, Cornelius Van Til e William
Harry Jellema. V. Carl F. H. Henry, Confessions of a Theologian, p. 111.
[19] God, Revelation and Authority, Volume 1. Wheaton, IL: Crossway Books,
1999, p. 10.
[20] Problemas nas teologias sistemáticas surgidas após a publicação dos seis
volumes, como concessão de essenciais evangélicos mediante o recurso à
teologia narrativa e ao pós-modernismo.
[21] Ibid., p. 8.
[22] The Closing of the American Mind: How Higher Education Has Failed
Democracy and Impoverished the Souls of Today's Students (New York:
Simon and Schuster, 1987).
[23] Israel and Revelation, Volume 1 de Order and History. Baton Rouge, LA:
Louisiana State University Press, 1956, p. 316.
[24] Jesus and the Kingdom of God (Grand Rapids: Eerdmans/Paternoster),
1986.
[25] “Psychodelia and American Religion”, The World & I, August 1988, p. 588.
[26] Cf. Paul Van Buren, The Edges of Language: An Essay in the Logic of a
Religion (New York: Macmillan, 1972).
[27] O impacto desconstrucionista está agora evidente também na esfera da
literatura. A seita francesa da crítica literária, regulada por Roland Barthes,
promove de maneira enérgica a ideia de que o autor de um poema ou
romance é apenas o instante iniciador a ser movido pela postura criativa do
leitor (S/Z, Paris, 1970). Tal desenvolvimento, como observa David L. Jeffrey,
envolve a “destruição” do autor, a obliteração do texto real e por fim a
liquidação da literatura (“Caveat lector: Structuralism, Deconstructionism, and
Ideology”, Christian Scholar's Review, XVII:4 [June 1988], p. 436-48, p. 437).
A linguagem desarticula-se do sentido, com sua redução a um “livre jogo de
explicadores”, tornando-se o embasamento para, nas palavras de Jeffrey, “um
movimento-crítico inerentemente comprometido com a destruição da
valoração transcendente ou referencial na literatura — e, desse modo, com
eficácia, erradicar a iniciativa acumulada de 2000 anos de investigação na
hermenêutica ocidental” (ibid., p. 443). A retórica e ideologia monológicas
substituem o discurso inteligível e a verdade compartilhável. Assim, Jacques
Derrida tornou-se o controverso precursor de um grupo de críticos literários,
incluindo Jonathan Culler, Paul deMan, Michael Riffaterre e Barbara Johnson.
Um movimento afim, conhecido como desconstrutivismo, surgiu entre
arquitetos que rejeitam a forma e a simetria clássicas. Herbert I. London nota
que eles deliberadamente desenham prédios “que parecem fragmentados e
acidentais” — paredes inclinadas, chãos em declive e mesmo paredes e
soalhos que não se tocam. “O edifício justifica a meta do criador quando
parece estar à beira do colapso”. (“Architectural Anarchy”, American Arts
Quarterly, verão de 1988, p. 16s.).
[28] O “Cão do Céu” (Hound of Heaven) é um poema religioso de 182 linhas
escrito pelo poeta inglês Francis Thompson. De início, choca o título — Cão
do Céu — dado ao Onipotente, pois o autor associa a perseguição incessante
de um cão de caça à presa com a busca sem cessar empreendida pelo Deus
gracioso atrás da alma perdida. [N. do T.]
[29] “Fideism”, em The Encyclopedia of Philosophy, Paul Edwards (ed.). New
York: Macmillan, 1967, vol. 3, p. 201.
[30] The Heretical Imperative: Contemporary Possibilities of Religious
Affirmation (Garden City, NY: Doubleday/Anchor Press, 1979).
[31] Trecho extraído da edição brasileira publicada pela Edições Loyola,
Volume 1, 2ª edição, janeiro de 2003. [N. do R.]
[32] The Structure of Scientific Theories (East Lansing, MI: Michigan State
University Press, 1977).
[33] “The New Interactionism Between Science and Religion”, Religious
Studies Review, Vol. 14, # 3 (July 1988), p. 218-24.
[34] Carl F. H. Henry, God, Revelation and Authority, 6 Volumes (Waco, TX:
Word Books, 1976-1984). Volume 1: God Who Speaks and Shows:
Preliminary Considerations.
[35] “Geometry”, in The Encyclopedia of Philosophy, 8 volumes, ed. Paul
Edwards (New York: Macmillan, 1967), volume 3, p. 285-90, p. 290.
[36] The Nature of Mathematical Knowledge (New York: Oxford University
Press), 1983.
[37] “Mathematics as Empirical”, Science, volume 225, Number 4664 (August
24, 1984), p. 825ss. (Revisão de Kitcher, The Nature of Mathematical
Knowledge).
[38] “Atheism”, The Trinity Review, July/August 1983, p. 1-4, p. 4.
[39] “Advice to Christian Philosophers”, Faith and Philosophy, Volume 1,
Number 3 (July 1984), p. 253-71, p. 260.
[40] “Advice to Christian Philosophers”, p. 260.
[41] Ibid., p. 261.
[42] Beyond the Post-Modern Mind (New York: Crossroad), 1982.
[43] Models of Revelation (Garden City, NY: Doubleday), 1983, p. 30ss.
[44] Myths, Models and Paradigms (New York: Harper & Row, 1974), p. 30ss.
[45] Thought and Knowledge: Essays. Ithaca, NY & London: Cornell University
Press, 1977, p. 212.
[46] Models of Revelation, p. 14.
[47] Mere Christianity. New York: Macmillan, 1945, p. 33. [Publicado no Brasil
com o título Cristianismo puro e simples (São Paulo: WMF Martins Fontes,
2009)].
[48] Christianity and Power Politics (Hamden, CT: Shoestring Press/Archon
Books, 1969), p. 207.
[49] Rationality in the Calvinian Tradition, eds. Hendrik Hart, Johan Van der
Hoeven & Nicholas Wolterstorff. Lanham, MD: University Press of America,
1983, p. 67.
[50] Edinburgh: Andrew Elliot, 1970; reimpr., Grand Rapids, MI: Eerdmans).
[51] The Problems of Philosophy. New York: Oxford University Press, 1912, p.
17.
[52] On Certainty, G. E. M. Anscombe & G. H. von Wright (eds.), transl. D. Paul
& G. E. M. Anscombe (New York: Oxford University Press, 1969), par. 105.
[53] Foolishness to the Greeks: The Gospel and Western Culture. Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1986, p. 71.
[54] The Return to Cosmology: Postmodern Science and the Theology of
Nature. Berkeley, CA: University of California Press, 1982, p. 25ss.
[55] Dismantling the Universe. New York: Simon and Schuster, 1983, p. 203.
[56] Atomic Theory and the Description of Nature. New York: Macmillan, 1934.
[57] The Return to Cosmology, p. 132. Cf. Arthur Koestler, The Sleepwalkers
(New York: Macmillan, 1959).
[58] Dismantling the Universe, p. 206.
[59] Ibid., p. 207.
[60] Philosophy of Religion (New York: Harper and Brothers, 1957), p. 74ss.
[61] An Introduction to Christian Apologetics (Grand Rapids, MI: Eerdmans,
1956), p. 89ss.
[62] Epistemology: The Justification of Belief (Downers Grove, IL: InterVarsity
Press, 1982), p. 35ss.
[63] Conjectures and Refutations: The Growth of Scientific Knowledge (New
York: Harper & Row, 1968), p. 33ss.
[64] Logic and the Nature of God (Grand Rapids, MI: Eerdmans), 1983.
[65] Where is History Going? A Christian Answer to Secular Philosophies of
History. Grand Rapids, MI: Zondervan, 1969, p. 177.
[66] Epistemology, p. 68.
[67] Classical Apologetics: A Rational Defense of the Christian Faith and a
Critique of Pressupositional Apologetics. Grand Rapids, MI: Zondervan, 1984,
p. 72ss.
[68] Citado em Daniel J. Boorstin, The Discoverers (New York: Random House,
1983), p. 471ss.
[69] “Let There Be Light: Modern Cosmogony and Biblical Creation”, em Is God
a Creationist? The Religious Case Against Creation Science, ed. R. M. Frye.
New York: Scribner, 1983, p. 133.
[70] “The Universe: Past and Present Reflections”, Engineering Science,
novembro de 1981, p. 8-12.
[71] “Let There Be Light”, p. 132, 135.
[72] Ibid., p. 136.
[73] Epistemology, p. 57.
[74] Ibid., p.15.
[75] Religion and the One: Philosophers East and West. New York: Crossroad,
1982, p. 38.
[76] São Paulo: Cultura Cristã, 2012.
[77] Brasília: Editora Monergismo, 2013.
[78] Dorothy Emmet, The Nature of Metaphysical Reality (New York:
Macmillan, 1967).
[79] Epistemology, p. 53ss.
[80] Ibid., p. 55.
[81] On Knowing God: Directions for the Future of Theology. Philadelphia:
Westminster, 1981, p. 144.
[82] Foolishness to the Greeks, p. 64
[83] Ibid., p. 148.
[84] Religion and the One, p. 252.
[85] Ibid., p. 254.
[86] Ibid., p. 255.
[87] Reason With the Bounds of Religion. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1976,
p. 71.
[88] Ibid., p. 113, n. 38.
[89] An Ecumenist's Plea for a Public Theology, This World, 8 (Spring/Summer
1984): 47-79, p. 75.
[90] Carl F. H. Henry, “Theology and Philosophy”, em Henry, God, Revelation,
and Authority, 6 volumes (Waco, TX: Word, 1976-1984), Volume 1: God Who
Speaks and Shows: Preliminary Considerations, p. 181-201.
[91] Carl F. H. Henry, “The Method and Criteria of Theology” em ibid., p. 213-
44.
[92] Em réplica a Marcião, Tertuliano escreve sobre as doutrinas cristãs como
ofensivas à razão: “Pois o que é mais indigno de Deus, o que mais
provavelmente causaria rubor de vergonha, que ele devesse nascer, ou que
devesse morrer? Que ele devesse levar a carne, ou a cruz? Ser circuncidado
ou ser crucificado? Estar no berço ou estar no ataúde? Ser posto em uma
manjedoura, ou em uma tumba? […] Tu não serás ‘sábio’ a menos que te
tornes um ‘tolo’ para o mundo, crendo nas ‘coisas estultas de Deus’… O Filho
de Deus foi crucificado; eu não fico envergonhado disso. E o Filho de Deus
morreu; nisto se deve crer absolutamente, porque é absurdo. E ele foi
enterrado, e ressurgiu; o fato é certo, pois que é impossível” (De Came
Christi, 6.1, 4 [Corpus Christianorum, Series Latina, Turnhout, 1953ss., Vol. I,
p. 800, linhas 2-9, p. 881, linhas 26-29]). Oskar Skarsaune repara que a
citação é muitas vezes abreviada para credo quia absurdum “causando o mal-
entendido de que Tertuliano foi um racionalista só no início. Nada disso. Seu
argumento era bem racional. O caráter inverossímil da doutrina cristã da
encarnação revela que ela não foi resultado de cuidadosa consideração [a
dupla negativa é intencional]; em outras palavras, deve ser verdadeira”.
(Incarnation — Myth or Fact?, trad. inglesa do norueguês por Trygve R.
Skarsten [St. Louis: Concordia, 1990], Capítulo 1, n. 16)