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Análise Exegética

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CVQ – Centro Vocacional Quadrangular

1° ANO – SABÁDO
Disciplina: Hermenêutica

Aluno: Amarildo Pupo de Souza


Professor: Sandro Roberto Gonçalves

Método Histórico Gramatical

Introdução
1. Delimitação do texto de interesse
Gálatas 3. (23-25) 26-29

No livro aos Gálatas Paulo adota um estilo de comunicação bem específico. Ele é abundante no uso
de figuras de linguagem. Fala, por exemplo, da função do aio (3.24); de revestir-se de Cristo (3.27);
de sofrer as dores do parto (4.19); de correr bem (5.7). Paulo traz também um bom número de
perguntas retóricas, distribuídas especialmente nos cap. 3 e 4, nos quais encontram-se sua
exposição doutrinária central. Os cinco primeiros versículos do cap. 3 são apresentados em forma de
cinco perguntas. Outra característica de Paulo é que ele adota, em diferentes momentos da epístola,
uma linha dura (2.4; 3.1); é enfático (1.6; 4.17); mas todavia amoroso (3.15; 4.12, 28)

2. Comparação entre versões

A partir desse inter-relacionamento da tendência religiosa da filosofia grega e o cristianismo de certa


maneira ainda emergente, surgem intelectuais gregos que defendem a religião cristã a partir da
razão. Com isso, passaram a construir argumentos e sistemas teológicos que pudessem ter
penetração no contexto cultural grego. Essa contribuição foi, sem dúvida, importante para o avanço
do cristianismo entre os povos onde a cultura grega estava presente. Com isso, o cristianismo
ultrapassou a cultura judaica. O próprio Paulo se declarava como enviado aos gentios (Gl 2.7-10).
Como consequência, as primeiras comunidades cristãs desenvolveram-se doutrinariamente com
algumas características diferenciadas em relação às comunidades judaico-cristãs (Wendland, p.
55). As características das comunidades judaico-cristãs baseavam-se mais na lei, entendendo-se
como cristãs, mas continuavam praticando antigos ritos judaicos. Nessa concepção, elas exigiam,
inclusive, a prática desses ritos aos novos ingressos no cristianismo (Goppelt, p. 265). Enquanto
isso, nas comunidades de origem helênica desenvolvia-se um cristianismo livre de leis, mas
fundamentado na fé. Essas duas teologias permeiam grande parte das cartas paulinas e do NT. O
confronto chega ao auge na visão que Pedro tem em At 10.9ss. Esse confronto entre as
concepções de origem judaica e grega foi, na verdade, o grande tema da controvérsia que Paulo
teve que enfrentar em muitas comunidades e, especialmente, na dos Gálatas.
3. Análise do contexto literário:

Na Epístola aos Gálatas existe um conflito de fundo facilmente perceptível. A carta surgiu motivada,
em boa medida, por causa desse conflito estabelecido na comunidade dos Gálatas. Paulo fala da
existência de pessoas que estão se inclinando para o outro evangelho (1.6). Esses cristãos que
proclamam esse outro evangelho perturbam a paz constituída e querem perverter o evangelho de
Cristo (1.7). São pessoas que pretendem que a Igreja adote normas antigas, como a circuncisão e a
obediência à lei (3.2; 5.4; 6.12), mas eles mesmos não as obedecem (6.13). Na sua intervenção,
Paulo não fornece novos elementos doutrinários daqueles anteriormente apresentados, mas reafirma
e enfatiza o que já havia dito às pessoas que estão deixando se levar por esse outro evangelho.
Segundo Kümmel (p. 389), os adversários gálatas representavam o legalismo judaico e eram judeus
cristãos que queriam que as leis judaicas fossem observadas também no cristianismo.

Mais especificamente, o que existe é um conflito evidente entre o pensamento dos cristãos de origem
judaica e a interpretação de influência grega. As duas concepções, em alguns momentos das cartas
paulinas, são praticamente excludentes. Essa dificuldade de convivência entre as duas
interpretações está bem presente no livro aos Gálatas. O motivo da influência judaica no cristianismo
é óbvio. A contribuição helênica, mesmo não sendo tão explícita, é, no entanto, marcante em
diversos textos no Novo Testamento.

No início do desenvolvimento do cristianismo, uma tendência filosófica grega encontrava-se em


efervescência devido a intensificação de sua reflexão no aspecto doutrinário-religioso (Spinelli, p. 63).
Esse fato levou filósofos platônicos ao extremo da contemplação espiritual. Os princípios que esses
filósofos apresentavam constituíam-se no esforço de buscar um aprofundamento e renovação
religiosa através da construção intelectual. Esse quadro facilitou uma aproximação e envolvimento da
religiosidade filosófica helênica com o cristianismo. Até porque naquele momento o cristianismo se
constituía na grande novidade religiosa.

4. Análise do contexto histórico: Dicionários e Comentários;

Há dúvidas com relação a data em que a epístola foi escrita. A hipótese mais comum é de que ela
teria sido escrita no ano de 49 D.C., após o retorno do apóstolo Paulo de sua primeira viagem
missionária, quando ele permaneceu por um tempo em Antioquia. Durante essa
viagem Paulo passou pelas cidades de Antioquia da Pisídia, Icônio, Listra e Derbe, todas localizadas
na província da Galácia. Outra hipótese é de que ela poderia ter sido escrita por volta dos anos
de 55-60 D.C., durante a terceira viagem missionária, logo após Paulo ter escrito a Epístola aos
Romanos, devido a semelhança entre as duas cartas.

5. Análise do contexto geográfico:

O povo da Galácia era de base celta, que na primeira metade do século III a.C. abriram caminho
pela Europa e migraram para a região central da Ásia Menor, fixando-se ao norte da península, que
recebeu o nome de Galácia – o país dos gauleses. Em 278 a.C. os denominados Gálatas vieram à
Ásia Menor a convite de Nicomedes, rei da Bitínia, e fixaram-se em Ancyra; cerca de dez mil
guerreiros, que traziam consigo mulheres, crianças, viúvas e idosos. Era uma espécie de nação em
busca de um lugar para morar.
Sabe-se que a região era grande produtora de lã de carneiro e em algumas pedras tumulares da
mesma época de Paulo foram encontradas figuras da roca de e o carretel para fiar, demonstrando a
importância de tal atividade na região.

6. Análise teológica:

No livro aos Gálatas, encontramos um certo dualismo entre lei e fé. Para Paulo está claro que a fé
tem relevância maior do que a lei. Ao mesmo tempo, ele dá uma conotação nova à lei diante daquilo
que era sua interpretação corrente no universo judaico-cristão. A lei tem a função de servir como
auxílio, para que a pessoa se encontre com a fé, pois a partir da fé ela se torna livre para servir e não
necessita mais da tutela da lei. Essa liberdade que a fé trouxe diante da lei é tematizada por Paulo
numa compreensão puramente teológica, pois é uma liberdade concedida pela graça de Deus aos
seus filhos. Por sua natureza, o ser humano não tem acesso à liberdade que vem da fé, mas é
chamado por Deus (5.13) a usufruir dessa liberdade. A lei não exerce mais uma relação de
subordinação para quem se encontra na condição de filho de Deus. Essa liberdade perante a lei, no
entanto, não é uma liberdade para o pecado, mas para o amor, isto é, para o serviço ao próximo
(5.14ss.). Segundo Wendland, isso significa que o cristão também está livre da sujeição ao próprio eu
(Wendland, p. 68), que é uma característica do pecado e da carne. Cristãos pertencem a Cristo e
para ele vivem, portanto, não mais para si mesmos. Nesse sentido, a vida em liberdade significa a
prática do serviço a Cristo, pois Cristo mesmo ocupou o lugar da lei. E, nesse aspecto, somente é
possível ser servo de Cristo se a pessoa for de fato livre (3.13). A lei perdeu o seu poder, tanto de
condenar o pecador como de regular a ação das pessoas. No lugar da condenação pela lei aparece a
graça pela fé. Com isso Paulo não quer absolutamente rejeitar a lei, entendida como orientação
divina, mas colocá-la como um auxílio que pode levar à fé. Paulo considera o período anterior a
Cristo como o tempo da lei. O próprio apóstolo, com sua experiência de vida, foi levado a reconhecer
que a lei mantém o ser humano na prisão, desperta o pecado e leva a pessoa a procurar a
autojustificação perante Deus. Nessa relação, a pessoa transforma-se em escravo da lei (Gl 3.23). A
lei não concede vida ao ser humano, e pelas suas obras ninguém se tornará justo, mas a justificação
somente será possível pela fé como graça de Deus. A redenção de Cristo perante a lei significou a
libertação do ser humano (Gl 5.lss.; 4.4ss.). Em Paulo, a lei ritual e cúltica do AT não serve mais
como ponte entre a comunidade e Cristo. A lei foi substituída pela fé. Persiste, contudo, a submissão
à lei dos Dez Mandamentos, mas numa relação intermediada pelo amor. É no amor que se cumpre
toda a lei (Gl 5.14). Diante da humanidade pecadora, tanto para judeus como para gregos, continua
valendo a lei com o seu poder condenatório. Somente a fé em Cristo e o batismo podem libertar do
juízo da lei. Diante da fé e do batismo, a lei é transformada no mandamento da graça que auxilia e
ampara. A função da lei, por intermédio da fé, mantém os cristãos vinculados à vontade de Deus e
lhes proporciona acesso à liberdade, de tal modo que não pode mais ser para o pecado (Gl 5.13),
mas uma liberdade que se concretiza na prática do amor ao próximo.
7. Análise do significado de palavras e frases importantes

3,26: Todos pois vós sois filhos de Deus, mediante a fé em Cristo Jesus; 3,27: Todos quantos pois
em Cristo fostes batizados , Cristo vos revestistes; 3,28a: Não há judeu nem grego; 3,28b: não há
escravo nem livre; 3,28c: não há homem e mulher; 3,28d: todos pois vós sois um em Cristo Jesus.
A palavra pois, no início do verso 26, indica que Paulo via uma conexão direta entre esse verso e o
anterior. Da mesma forma que o filho de um senhor estava sob um pedagogo apenas enquanto ele
era menor de idade, Paulo disse que os que alcançaram a fé em Cristo já não mais eram menores;
sua relação com a lei havia sido alterada, porque agora eram ‘filhos’ adultos de Deus. O termo filho
evidentemente não é exclusivo dos homens; Paulo claramente inclui mulheres nessa categoria (Gl
3:28). A razão pela qual ele usa a palavra filhos (no masculino) em vez de uma palavra neutra (por
exemplo, crianças) é que ele tinha em mente a herança da família que era passada para os
descendentes do sexo masculino, além do fato de que a expressão ‘filhos de Deus’ era a
designação especial de Israel no Antigo Testamento (Dt 14:1; Os 11:1). Em Cristo, os gentios
passaram também a desfrutar da relação especial com Deus que havia sido exclusiva de Israel.

8. Comentário explicativo:

Os verdadeiros cristãos desfrutam de grandes privilégios sob o evangelho; e não são mais servos,
mas filhos; agora não mantidos a tal distância e sob restrições como os judeus. Tendo aceitado a
Cristo Jesus como seu Senhor e Salvador, e confiando somente nele para justificação e salvação,
eles se tornam filhos de Deus. Mas nenhuma forma ou profissão externa pode garantir essas
bênçãos; pois, se alguém não tem o Espírito de Cristo, ele não é dele. No batismo, colocamos em
Cristo; aí professamos ser seus discípulos. Sendo batizados em Cristo, somos batizados em sua
morte, para que, quando ele morreu e ressuscitou, assim morremos para o pecado e andemos em
novidade e santidade da vida. A colocação de Cristo de acordo com o evangelho consiste não em
imitação externa, mas em um novo nascimento, uma mudança inteira. Aquele que faz dos crentes
herdeiros os proverá. Portanto, nosso cuidado deve ser o de cumprir os deveres que nos pertencem
e todos os outros cuidados que devemos lançar sobre Deus. E nosso cuidado especial deve ser para
o céu; as coisas desta vida são apenas insignificantes. A cidade de Deus no céu, é a parte ou parte
da criança. Procure ter certeza disso acima de todas as coisas.

9. Aplicação da mensagem para a

atualidade

Creio que um dos maiores desafios que temos como Igreja na atualidade é o de aterrissar a nossa
teologia na realidade brasileira. Por mais que o esforço aconteça, muitas vezes não se sente o
retorno na mesma proporção da energia investida. As causas podem ser diversas. Vejo, de uma
maneira mais clara em todo o livro aos Gálatas, um indicativo que pode auxiliar a nossa reflexão
sobre esta temática. Seguindo a hipótese de um inter-relacionamento entre o cristianismo e a
corrente filosófica religiosa grega, temos, como resultado desse diálogo, uma proposta teológica com
grande inserção entre os povos influenciados pela cultura helênica, enquanto o cristianismo de
tradição judaica ficou com sua ação localizada, a reflexão não deva ser somente de âmbito cultural e
nem estar nela localizada de modo prioritário. O foco central, a exemplo de Paulo, deve ter como
objeto de avaliação o diálogo entre a teologia e as ciências afins.

10. Conclusão

O cristianismo proposto por Paulo não quer levar a uma uniformidade, mas à igualdade. Na
uniformidade todos seriam nivelados a partir de um protótipo idealisticamente perfilado e
perderiam, com isso, justamente aquilo que têm de mais precioso, isto é, a individualidade.
Na igualdade, essa individualidade é preservada e até reforçada. Na ideia paulina de que
não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher;
porque todos vós sois um em Cristo (v. 28), os dons, a capacidade individual, as aptidões
não se desdobram como diferenciação social na esfera de unia sociedade competitiva, mas
as especificidades são exatamente preservadas. Parte-se do pressuposto de que tanto
judeus quanto gregos têm potencial que deve ser valorizado de modo igualitário.

Essa compreensão paulina constitui-se, na verdade, numa crítica forte contra a diferenciação
social, em que uma das causas é a maximização de alguns dons ou capacidades de certa
parcela da população em detrimento de outras qualidades da grande maioria. A moderna
tecnologia da informática e as ciências jurídicas, só para citar dois exemplos, são casos
típicos em que ganha valorização aquele profissional que sabe executar, relacionar dados,
normas ou regras segundo um código de normas ou um programa existente. Em última
análise, o que vale é a capacidade de interpretar o código jurídico ou os programas de
computador que alguém produziu movido por certa intenção e interesse. A moderna
informática não estimula a reflexão, mas somente a relação de dados. É considerado um
bom profissional aquele que sabe executar bem o que outros já pensaram e elaboraram
anteriormente, com vistas a um determinado resultado econômico e de monopólio de poder.

Referências

 GOPPELT, Leonhard. Teologia do Novo Testamento. 2. ed. São Leopoldo : Sinodal;


Petrópolis : Vozes, 1983.

 GUTHRIE, Donald. Gálatas : introdução e comentário. São Paulo : Mundo


Cristão/Vida Nova, 1984.

 KÜMMEL, Werner G. Síntese teológica do Novo Testamento. 3. ed. São Leopoldo :


Sinodal, 1983.

 SPINELLI, Miguel. Filosofia & Ciência. São Paulo : Edicon, 1990.

 WENDLAND, Heinz D. Ética do Novo Testamento. 2. ed. São Leopoldo : Sinodal,


1981.

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