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Teste Cesário

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Grupo I

Lê atentamente o poema que se segue e responde às questões formuladas:

O sentimento dum Ocidental

A Guerra Junqueiro

I – Ave Marias E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!


De um couraçado inglês vogam6 os escaleres7E
   Nas nossas ruas, ao anoitecer, em terra num tinir de louças e talheres
Há tal soturnidade1, há tal melancolia, Flamejam, ao jantar, alguns hotéis da moda.
Que as sombras, o bulício2, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.     Num trem de praça arengam8 dois dentistas;
Um trôpego arlequim braceja numas andas;
O céu parece baixo e de neblina, Os querubins9 do lar flutuam nas varandas;
O gás extravasado enjoa-me, perturba; Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!
E os edifícios, com as chaminés, e a turba3
Toldam-se duma cor monótona e londrina.     Vazam-se os arsenais e as oficinas;
Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;
    Batem os carros d'aluguer, ao fundo, E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,
Levando à via férrea os que se vão. Felizes! Correndo com firmeza, assomam as varinas.
Ocorrem-me em revista exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!     Vem sacudindo as ancas opulentas!
Seus troncos varonis recordam-me pilastras;
    Semelham-se a gaiolas, com viveiros, E algumas, à cabeça, embalam nas canastras
As edificações somente emadeiradas: Os filhos que depois naufragam nas tormentas.
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.     Descalças! Nas descargas de carvão,
Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;
    Voltam os calafates, aos magotes, E apinham-se num bairro aonde miam gatas,
De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos; E o peixe podre gera focos de infeção!
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões4, por becos,
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.
    E evoco, então, as crónicas navais:
Mouros, baixéis5, heróis, tudo ressuscitado!
Luta Camões no mar, salvando um livro a nado!
Singram soberbas naus que eu não verei jamais!
   

1
Soturnidade: qualidade do que é soturno (tristonho,
sombrio).
2 6
Bulício: rumor prolongado. Vogar: navegar.
3 7
Turba: multidão Escaler: pequeno barco para serviço de navio ou de
4
Boqueirão: rua ou travessa que dá acesso ao cais de um repartição marítima.
8
rio ou canal. Arengar: discutir; rezingar.
5 9
Baixel: embarcação; pequeno navio. Querubim: anjo.
1
1. O primeiro verso do poema identifica o momento do dia em que ocorre a deambulação do sujeito
poético.
1.1. Transcreve três expressões que referem o momento do dia em que o passeio tem lugar,
relacionando-o com o subtítulo desta primeira parte – “Ave Marias”. (1,5 valores)
2. O sujeito poético, à medida que deambula pelas ruas junto ao Tejo, descreve vários espaços
citadinos.
2.1. Refere os diferentes espaços. (1,5 valor)
3. A cidade é descrita através daqueles que a habitam.
3.1. Identifica e caracteriza os figurantes que povoam esse espaço (2 valores)
4. Ao longo do poema, podemos encontrar dois planos – o da realidade e o da fantasia – que
alternam entre si.
4.1. Transcreve os versos que evidenciam o plano da fantasia. (1,5 valor)
5. Transcreve passagens que exprimem as sensações visuais, olfativas, auditivas e de movimento
vivenciadas pelo sujeito poético (dois exemplos para cada sensação). (4 valores)
6. Para conseguir um efeito impressionista, Cesário usa variados processos estilísticos. Assinala, nas
estrofes oito e nove, um exemplo de metáfora, colocação do adjetivo antes do nome e sinestesia. (1,5
valores)

Grupo II (8 valores)

Elabora um breve comentário acerca do poema “Nós”, a seguir transcrito, em que sintetizes o seu
conteúdo e os tópicos abordados ao longo do poema. Relaciona-o, também, com o seu título. O teu
comentário não deverá exceder as cento e cinquenta palavras.

2
Nós Uma iluminação a azeite de purgueira,
Foi quando em dois verões, seguidamente, a Febre De noite amarelava os prédios macilentos. 
E a Cólera também andaram na cidade, Barricas de alcatrão ardiam; de maneira
Que esta população, com um terror de lebre,  Que tinham tons de inferno outros armamentos.
Fugiu da capital como da tempestade.  
Porém, lá fora, à solta, exageradamente 
Ora, meu pai, depois das nossas vidas salvas Enquanto acontecia essa calamidade,
(Até então nós só tivéramos sarampo). Toda a vegetação, pletórica, potente, 
Tanto nos viu crescer entre uns montões de malvas  Ganhava imenso com a enorme mortandade!
Que ele ganhou por isso um grande amor ao campo!
  Num ímpeto de seiva os arvoredos fartos, 
Se acaso o conta, ainda a fronte se lhe enruga:  Numa opulenta fúria as novidades todas, 
O que se ouvia sempre era o dobrar dos sinos;  Como uma universal celebração de bodas,
Mesmo no nosso prédio, os outros inquilinos Amaram-se! E depois houve soberbos partos.
Morreram todos. Nós salvámo-nos na fuga.  
  Por isso, o chefe antigo e bom da nossa casa,
Na parte mercantil, foco da epidemia,  Triste de ouvir falar em órfãos e em viúvas,
Um pânico! Nem um navio entrava a barra, E em permanência olhando o horizonte em brasa,
 A alfândega parou, nenhuma loja abria, Não quis voltar senão depois das grandes chuvas.
E os turbulentos cais cessaram a algazarra.  
 
Ele, dum lado, via os filhos achacados,
Pela manhã, em vez dos trens dos batizados,
Um lívido flagelo e uma moléstia horrenda!
 Rodavam sem cessar as seges dos enterros. 
Que triste a sucessão dos armazéns fechados!  E via, do outro lado, eiras, lezírias, prados,
Como um domingo inglês na city, que desterros! E um salutar refúgio e um lucro na vivenda!
   
Sem canalização, em muitos burgos ermos  E o campo, desde então, segundo o que me lembro,
Secavam dejeções cobertas de mosqueiros.  É todo o meu amor de todos estes anos!
E os médicos, ao pé dos padres e coveiros,  Nós vamos para lá; somos provincianos,
Os últimos fiéis, tremiam dos enfermos! Desde o calor de Maio aos frios de Novembro!

Bom trabalho! 
Catarina Marcelino

Proposta de correção
1.1. Ave-Marias é o toque do sino de manhã, ao meio-dia e à tardinha. Neste caso, logo no 1º
verso, se esclarece que Ave-Marias refere o fim do dia: “Nas nossas ruas, ao anoitecer”. Na 7ªa
estrofe há mais duas referências: “o fim da tarde” (v. 25); “ao jantar” (v. 28).
2.1. O sujeito poético percorre as ruas de Lisboa e embrenha-se “por boqueirões, por becos” (v.
19) ou erra “pelo cais” (v. 20).
3.1. Os “mestres carpinteiros” assemelham-se a morcegos (estrofe 4); os calafates apresentam-se
“De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos” (estrofe 5); dentistas rezingões; arlequim que
caminha em andas; crianças (querubins do lar) às varandas; lojistas aborrecidos (estrofe 8);
obreiras apressadas; varinas “hercúleas, galhofeiras”.
5.1. “Ocorrem-me em revista exposições, países:/Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!”
(vv. 11 e 12); “E evoco, então, as crónicas navais:/ Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!/ Luta
Camões no mar, salvando um livro a nado!/ Singram soberbas naus que eu não verei jamais!” (vv
21-24).
6. Sensações visuais: as sombras, o aspeto do céu, a cor “monótona e londrina” (v. 8) dos
edifícios, a cor do rio que “reluz, viscoso” (v. 34), o brilho de alguns “hotéis da moda” (v. 28);
Sensações olfativas: o cheiro da maresia e o enjoo provocado pelo “gás extravasado” (v. 6);
Sensações auditivas: o barulho provocado pela “turba” no regresso a casa, os carros de aluguer, o
“tinir de louças e talheres” (v. 27). Por outro lado, este mesmo ambiente que incomoda o sujeito
poético também o inspira.
Sensações de movimento: o “bulício” provocado pela saída apressada do trabalho.
7. Alguns exemplos:
a) metáfora – “os querubins do lar”;
b) adjetivo antes do nome – “um trôpego arlequim”; “viscoso, o rio”; “hercúleas, galhofeiras […] as
varinas”.
c) “Reluz, viscoso, o rio”

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