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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

“JULIO DE MESQUITA FILHO”


CAMPUS SÃO PAULO
INSTITUTO DE ARTES

Monica Tinoco

A materialidade da cor:
algumas concepções de pintura contemporânea brasileira

SÃO PAULO
2019
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JULIO DE MESQUITA FILHO”
CAMPUS SÃO PAULO
INSTITUTO DE ARTES

Monica Tinoco

A materialidade da cor:
algumas concepções de pintura contemporânea brasileira

Tese apresentada ao Programa de Pós


Graduação em Artes Visuais do Instituto
de Artes da Universidade Estadual
Paulista - Linha de Pesquisa Processos e
Procedimentos Artísticos, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Doutor em Artes Visuais
Orientação do Prof. Dr. Sérgio Mauro
Romagnolo

SÃO PAULO
2019
Ficha catalográfica preparada pelo Serviço de Biblioteca e Documentação do Instituto de
Artes da UNESP

T591 Tinoco, Monica (Monica Soares Tinoco Sanovicz), 1965-


m A materialidade da cor : algumas concepções de pintura
contemporânea brasileira / Monica Tinoco. - São Paulo,
2019.
67 f. : il.

Orientador: Prof.Dr. Sérgio Mauro Romagnolo


Tese (Doutorado em Artes) – Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Artes

1. Pintura moderna - Estudo e ensino. 2. Pintura


brasileira. 3. Cor na arte. I. Romagnolo, Sérgio Mauro. II.
Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes. III.
Título.

CDD 701.85

(Laura Mariane de Andrade - CRB 8/8666)


TERMO DE APROVAÇÃO

Monica Tinoco

A materialidade da cor:
algumas concepções de pintura contemporânea brasileira

––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prof. Dr. Sérgio Mauro Romagno

––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prof. Dr. José Paiani Spaniol

–––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prof. Dr. Marco Garaúde Giannotti

–––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prof. Dr. José Leonardo Nascimento

–––––––––––––––––––––––––––––––––––
Prof. Dr. Tiago Mesquita

data da aprovação ___________________


Aos
meus pais,
meus mestres,
meu marido,
meus filhos,
e meus alunos.
 
 

Agradecimentos:
Prof. Dr. José Paiani Spaniol
Prof. Dr. Marco Garaúde Giannotti
Fabiana Mie
Vera Lúcia Cozani
Fábio Akio Maeda
Comissão de organização do Festival de Pintura
Monitores da disciplina Mídia III
Resumo

A tese discute as manifestações cromáticas elaboradas por alguns artistas


contemporâneos, brasileiros e estrangeiros, que exploram as potencialidades
da cor no seu caráter físico, concreto e material, evidenciando sua
ambiguidade e propiciando inovações nos objetos pictóricos. O estudo
também apresenta a produção pictórica pessoal, realizada no período de
2006 a 2019.

Palavras-chave: Pintura. Cor. Materialidade da cor. Pintura brasileira. Pintura


contemporânea

Abstract

The thesis discusses the chromatic manifestations elaborated by some


contemporary artists, Brazilian and foreign, who explore the potential of color
in its physical, concrete and material character, showing its ambiguity and
providing innovations in pictorial objects. The study also presents personal
pictorial production, carried out in the period from 2006 to 2019.

Keywords: Painting. Color. Color materiality. Brazilian painting. Contemporary


painting
Sumário
Apresentação ................................................................................................ 8
Introdução...................................................................................................... 8
1. A materialidade da cor e o corpo pictórico ........................................... 9
1.1. Yves Klein: O estado pictórico imaterial ................................................ 10
1.2. Anish Kapoor: Pigmento puro ................................................................ 12
1.3. Lygia Clark: Superfície modulada .......................................................... 16
1.4. Hélio Oiticica: O corpo da cor ................................................................ 21
2. Algumas concepções de pintura contemporânea brasileira ............. 26
2.1. Dora Longo Bahia: Escalpos ................................................................. 26
2.2. Dudi Maia Rosa: A fibra da cor .............................................................. 30
2.3. Fernando Burjato: Rompendo a ortogonalidade do quadro .................. 35
3. A materialidade da cor: trabalhos plásticos realizados entre 2006 e
2019............................................................................................................... 39
4. Considerações finais .............................................................................. 63
Referências bibliográficas ........................................................................ 64
Bibliografia geral ........................................................................................ 65

 
  8  

Apresentação

A investigação das possibilidades de manifestação cromática nas diversas


linguagens artísticas é um dos principais objetos da pesquisa. A produção plástica
em pintura tem início em 2006, anteriormente estava focada na pigmentação mineral
de massas cerâmicas e na exploração das propriedades do registro do fenômeno
colorido na fotografia química.

Este trabalho apresenta a produção pictórica, realizada no período de 2006 a 2019,


e um estudo, iniciado em 2017, elaborado a partir das concepções de alguns artistas
e pintores contemporâneos, elencados na medida em que suas poéticas evidenciam
as potencialidades da cor em seu aspecto material e na ambiguidade de sua
fisicalidade.

Introdução

O conhecimento e a maestria na manipulação dos diversos materiais pictóricos são


fundamentais para a atuação dos pintores. A partir de meados do século XX, alguns
artistas procuram explorar as potencialidades da cor no que diz respeito a sua
materialidade, seu caráter concreto, a fisicalidade do seu meio, propiciando o
desenvolvimento de singularidades nas concepções de pintura e inovações nas
relações cromáticas e espaciais dos objetos pictóricos.

Os artistas aqui elencados desenvolvem trabalhos que partem de premissas


diferentes: cada um pondera e formaliza as questões da materialidade cromática de
maneira diversa, chegando a resultados plásticos muito distintos. Ao colocar estes
artistas juntos, não se pretende estabelecer entre eles uma afinidade poética exterior
às suas próprias, nem organizar uma linha cronológica, indicar uma hierarquia ou
atribuir juízo de valor. A aproximação pretendida se dá na medida em que os
trabalhos realizados investigam o estrato pictórico que os informa, questionam o
espaço da pintura e a migração dos suportes tradicionais para outros tipos de
suporte, ou para o espaço ao redor.
  9  

1. A materialidade da cor e o corpo pictórico

Aquilo que chamamos de cor na pintura - a tinta - é uma substancia obtida através
da combinação de pigmentos coloridos em pó - de origem vegetal ou mineral -
associados a meios fluidos - com propriedades aglutinantes e secativas - tais como
a gema de ovos, alguns tipos de óleos, resinas, vernizes e polímeros. A mistura
entre o pigmento seco e veículo líquido resulta num composto cuja materialidade
permite, não apenas que uma película colorida impermeável seja aplicada e fixada
sobre um suporte, mas também contribui para afirmar e assegurar a presença física
e concreta da cor, em relação à materialidade diversa do suporte e da espacialidade
do ambiente.

As características da percepção cromática dos pigmentos secos são alteradas pela


diversidade de caráter dos veículos aglutinantes, o que pode fornecer à substancia
colorida diversas particularidades, visuais e sensoriais, ocasionadas por
modificações em sua opacidade, brilho, viscosidade ou densidade originais, de
acordo com a variação qualitativa e/ou quantitativa dos seus componentes. É
importante considerar que a natureza da superfície do suporte do objeto pictórico,
sua porosidade, textura e regularidade, são fatores que também modificam a
aparência original da cor.

Tradicionalmente em uma pintura1, a tela (ou outra estrutura planar) é o campo de


base que fornece o apoio e a sustentação para que o artista possa configurar uma
imagem. A articulação de diversos tipos de tintas, veículos e pigmentos - de fluidez
distintas - é o que conforma a figura, recobrindo a tela e se fixando nela, em
sucessivas lâminas amalgamadas, formando uma película fronteiriça entre o suporte
e o espaço. Tal qual uma pele, as diversas camadas sobrepostas da substância
pigmentada podem ser consideradas como um corpo independente - apesar de sua
condição parasitária - um corpo formado apenas pela cor, um corpo pictórico.

                                                                                                               
1
Para efeito deste estudo, consideraremos o método tradicional de pintura, onde a tinta é aplicada em camadas
sucessivas sobre um suporte planar.
  10  

Esquema estrutural do interior de uma pintura a óleo. Disponível em:


<http://www.picturerestorationscotland.co.uk/restoring_oilpaintings.html>
Acesso em: 19/05/2016

Alguns artistas contemporâneos desenvolveram pesquisas singulares, que procuram


questionar ou evidenciar as relações de embate - possíveis, latentes, existentes -
entre a superfície, o corpo pictórico, o suporte da pintura e o espaço onde se
inserem.

1.1. Yves Klein: O estado pictórico imaterial

O artista francês Yves Klein, em meados dos anos 1940, escolheu a cor como eixo
fundamental do seu projeto artístico. Inicialmente, suas propostas de pinturas
monocromáticas procuravam investigar o efeito visual do pigmento puro em
tonalidades de vermelho, de amarelo ou de azul.

Yves Klein. Sem título, 1959. Monocromo vermelho. Guggenheim Museum, Nova York. Disponível em:
<http://arteseanp.blogspot.com/2016/07/monocroma-vermelho.html>. Acesso em : 06/09/2018

“De 1946 a 1956, as minhas experiências monocromáticas em várias outras cores,


sem ser azul, nunca me deixaram esquecer a verdade fundamental da nossa era –
quer dizer, a forma não é mais um valor linear, mas sim um valor de impregnação.”
(KLEIN, 2006, p. 65)
  11  

No entanto, notou que quando uma cor em pó era associada ao veículo de base e
aplicada sobre a tela, a sua luminosidade e irradiação original perdia-se. Este fato o
levou a formular uma mistura de componentes que possibilitasse reproduzir
fielmente a intensidade luminosa que cada cor possuía em seu estado físico inicial.2
Com a colaboração de um químico profissional, o artista desenvolveu uma solução
azul-ultramar, extremamente saturada e luminosa, composta por éter e derivados de
petróleo, a qual também possuía a capacidade fixar o pigmento em qualquer
suporte. O pigmento azul, desenvolvido então por Klein, o chamado IKB3, produzia
uma superfície pictórica bem fosca, não refletora. Sua tonalidade luminosa,
profunda, não era nem muito clara, nem muito escura.

Yves Klein. Sem título, Monocromo azul.(IKB 82) 1959. Guggenheim Museum, Nova York. Disponível em:
<https://www.guggenheim.org/artwork/5638>. Acesso em : 06/09/2018

Na série de pinturas monocromáticas azuis realizadas pelo artista em 19574, o novo


azul foi aplicado uniformemente sobre o suporte de tela de algodão de trama bem
fina, sem qualquer tipo de modulação e nenhum vestígio de traços, com o uso de
rolo de pintura, produzindo um quadro onde aparentemente a dimensão da cor
manifestava-se pura e sem alteração5. A impressão, ao se observar as pinturas
monocromáticas da Época Azul, é de que elas eram constituídas, estruturadas e
                                                                                                               
2
WEITEMEIER, 2001, p. 8
3
A composição recebeu o nome de International Klein Blue (IKB) e sua formula foi patenteada por Yves Klein em
19 de maio de 1960.
4
Propostas Monocromáticas: Época Azul é o título da exposição realizada por Yves Klein na Galeria Apollinaire
de Milão, entre 2 e 12 de janeiro de 1957, na qual o artista apresentou 11 monocromos azuis idênticos. A
exposição foi apresentada posteriormente em Paris, Dusseldorf e Londres.
5
WEITEMEIER, 2001, p.15
  12  

conformadas apenas por pigmento, como se a cor pudesse prescindir de suporte e


materializar-se sozinha no espaço.

A tonalidade das pinturas impregnava o espectador, provocando-lhe uma sensação


de completa imersão na cor6. Esse efeito visual atmosférico – como se a cor não
tivesse forma, nem limites - dotava o espaço pictórico, o quadro, de uma qualidade
infinita onde a unificação cromática adquire o poder de diluir fronteiras e se realiza
como um vazio7, saturado de cor.

Entre 1956 e 1957, o artista se dedicou a desenvolver e a apresentar aquilo que ele
chamou de sensibilidade pictórica imaterial8: um estado que diz “respeito ao
indefinível na pintura” (KLEIN, 2006, p. 65). Porém, de maneira paradoxal, nos
monocromos azuis, Yves Klein pondera o vazio, o estado imaterial, justamente na
medida em que afirma, com o uso do IKB, a natureza fundamentalmente material da
cor no espaço pictórico.

1.2. Anish Kapoor: Pigmento puro

A dimensão ambígua da materialidade da cor também é assunto desenvolvido em


alguns trabalhos do artista anglo-indiano Anish Kapoor. Entre 1979 e 1985, após
uma viagem de retorno à Índia, Kapoor realizou um conjunto de obras intituladas
1000 Names, composto por múltiplas peças de formatos variados, constituídos de
gesso, madeira, cal e pigmento puro, nas cores vermelho, amarelo, azul, preto e
branco.

                                                                                                               
6
Ibid.
7
No sentido do termo void em inglês
8
KLEIN, 2006, p. 63.
  13  

Anish Kapoor, 1000 Names, 1979-1980. Madeira, pigmento e gesso,


Disponível em: <http://anishkapoor.com/356/1000-names-9>. Acesso em: 06/09/2018

As obras que compõem a série 1000 Names são inspiradas nas pirâmides de
pigmento coloridos encontrados nos mercados e nos templos Indianos, utilizados em
rituais da cultura ancestral local9. As peças se assemelham às pilhas de pigmento
puro, em cores vibrantes, de variados formatos esculturais, as quais aparentemente
irradiam cor desde o seu interior, devido a sua saturação cromática.

Cada peça é constituída internamente por um bloco de madeira ou gesso, com um


formato específico (geométrico ou mais orgânico) que é então recoberto com uma
espessa camada de pigmento em pó polvilhado, como se fosse empanada pela cor,
conformando um objeto de materialidade granulada e vaporosa. Devido a esta
estrutura micro granular, o observador se torna incapaz de identificar o substrato
formal que os enforma, acreditando serem apenas constituídos por cor.

Algumas das peças se posicionam na parede, como um quadro ‘volumoso’, outras


são colocadas no chão. Nos dois casos, o pigmento pulverizado sobre a peça é
também salpicado ao seu redor, na continuidade da parede ou do piso, de modo a
criar a sensação da peça como que brotando ou surgindo, a partir da superfície
plana.

                                                                                                               
9
Ver ANFAM, David. To fathom the abyss, In: ANFAM, 2009, p. 92.
  14  

Anish Kapoor, 1000 Names, 1983. Técnica mista e pigmento.


Disponível em: < http://anishkapoor.com/427/1000-names-3>. Acesso em: 06/09/2018

A ilusão de corporificação da cor elaborada por Kapoor nos objetos pictóricos da


série 1000 Names - onde a forma interior aparenta estar se materializando
externamente e se conformando naquele instante, a partir da solidificação e da
aglutinação dos grãos do pigmento puro - têm o frescor de um nascimento. Faz
alusão a um estado do ser onde tudo é possível: aquele instante de origem, o qual
dá inicio ao processo de mutação e a forma passa a habitar o mundo.

A instalação Void Field (1989), apresentada pelo artista na Bienal de Veneza de


1990, consiste em uma série de grandes blocos de pedras marrons, dispostos ao
longo de uma sala. Cada bloco possui, na face superior, um pequeno orifício circular
preenchido de pigmento azul-escuro. O observador oscila em identificar os círculos
como superfície ou concavidade (o que de fato são)10. A indecisão produzida faz
com que os pequenos círculos adquiram uma intensidade surpreendente11, pois o
aspecto etéreo do pigmento puro proporciona a exacerbação da ilusão perceptiva.

                                                                                                               
10
Ver NAVES, R. Anish Kapoor: ainda arte e ilusão. In: NAVES, 2007. p. 409.
11
Ibid. p.409-410.
  15  

Anish Kapoor. Void Field, 1989. Pedra e pigmento. Disponível em: <http://anishkapoor.com/73/void-field>.
Acesso em: 06/09/2018

O pequeno buraco circular, recoberto de pigmento, produz uma fenda, não apenas
em cada uma das pedras, mas em todo o ambiente, já que o espaço ao redor da
obra parece escorrer um pouco para o interior de cada orifício12. O observador é
instigado a se aproximar da pedra para investigar o interior do buraco, como se cada
pequeno círculo fosse um portal aberto a um caminho que leva ao interior da pedra,
ao seu âmago. Funcionando como um poço, um vazio, um buraco negro que ‘suga’
o espaço exterior para o interior, a obra Void Field articula a ambiguidade entre
superfície e profundidade através do uso consciente da cor e da materialidade do
pigmento puro.

Na IX Documenta de Kassel, em 1992, Kapoor apresenta a instalação Descent into


Limbo (1992) e, com ela, dá um passo adiante neste jogo de ambiguidade. A obra
consiste em um pavilhão de concreto nas dimensões cúbicas de 6 x 6 x 6 metros,
cuja laje superior deixa vazar a luz no interior do prédio apenas no perímetro ao
longo das paredes. No centro do pavilhão, há somente um círculo negro no piso,
configurado por pigmento em pó negro, de 1 metro de diâmetro, e nada mais. A
superfície circular delineada no solo sugere a ilusão de um oco, um espaço vazio,
que desafia os sentidos e as noções de superfície, volume e profundidade.

                                                                                                               
12
Ver DANTAS, M.; FARIAS, A. 2006. p. 35.  
  16  

Anish Kapoor. Descent into Limbo, 1992. Concreto, estuque e pigmento. Disponível em:
<http://anishkapoor.com/75/descent-into-limbo>. Acesso em: 06/09/2018

A incerteza visual proposta pelo artista nesta obra produz no observador uma
interrogação em torno daquilo o que está a seus pés13, proporcionando um enigma,
quase metafísico, da existência de uma interioridade para além do solo, a qual é
inacessível e não se pode antever. O pigmento de tonalidade muito escura, com sua
materialidade fosca e porosa, contribui para exacerbar a sensação de presença de
um buraco negro, uma caverna, um vazio formal. O círculo negro no chão
representa uma membrana, a borda exterior de tal interioridade, uma via de mão
única que, ao ser atravessada, configura um ponto sem retorno, onde acontece a
suspensão da vida e da temporalidade: o local da transmutação daquilo que é
material em imaterial.

1. 3. Lygia Clark: Superfície modulada

As investigações do espaço planar articuladas e desenvolvidas por Lygia Clark entre


1952 e 1959, criam uma ilusão pictórica que aparenta expandir os limites da
estrutura original do suporte da pintura. Em relação a esses trabalhos, Ferreira
Gullar chama a atenção para um fenômeno importante: “a tentativa de superar os
princípios da arte concreta – que esbarra na contradição insolúvel figura-fundo –
levou à destruição do quadro de cavalete, da superfície retangular bidimensional”
(GULLAR, 1964, p.255). Na medida em que a representação da figura foi eliminada
da tela, a partir de Mondrian, o próprio quadro, como objeto material, se tornou o
                                                                                                               
13  NAVES, op. cit., p. 411.  
  17  

objeto da pintura. Mas Mondrian, como Malevitch, ainda trabalham a superfície


bidimensional e, por isso, sua pintura ainda guarda certo grau de figuração. A arte
concreta defrontou-se com a contradição aludida: um quadrado colorido sobre um
fundo branco conserva a condição figura-fundo, “o quadro permanece como apoio
para a representação de figuras, embora geométricas”. (GULLAR, 1964, p.255)
Partindo da experiência concretista, Lygia Clark dá um passo adiante, ao romper “a
unidade da superfície e, progressivamente, fazendo-a degradar-se como tal, para
integrar-se totalmente no espaço real, tridimensional”. (GULLAR, 1964, p.255)

A preocupação formal de Clark com a exploração da borda da composição e da


moldura da pintura se manifesta inicialmente em alguns trabalhos intitulados
Composição14 (1952). Porém, a pesquisa espacial se desenrola efetivamente a partir
de 1954, pela observação de uma linha que “aparecia entre uma colagem e o passe-
partout, quando a cor era a mesma, e desaparecia quando havia duas cores
contrastantes” (CLARK, 1969, p.89). Esta linha à qual se refere, não é um traçado
ou uma linha gráfica, é resultado do vão existente na junção entre duas superfícies
planares contíguas: uma linha espaço15, que a artista passou a denominar de linha
orgânica, e que fica evidente quando as duas superfícies adjacentes são pintadas da
mesma cor. Quando as duas superfícies são pintadas em matizes diferentes, esta
linha, ou espaço existente entre as duas superfícies, é percebida apenas como
borda, e se confunde com os limites do campo pintado em cor.

Clark passou a “explorar essa linha, fazendo quadros (ainda com tela e moldura) em
que a preocupação era de arrebentar o núcleo do quadro (tela) levando a cor desta
para a moldura” (CLARK, 1969, p. 89). Nas obras Descoberta da linha orgânica
(1954) e Quebra da moldura (1954) a própria espessura da moldura já entra como
elemento plástico16 e são pintadas de maneira a integrar cromaticamente a
composição, evidenciando a diferenciação e a percepção da linha orgânica.

                                                                                                               
14
Ver BUTLER , 2014, p.18
15
“Em 1956, achei a relação desta linha (que não era gráfica) com as linhas de junção de portas e caixilhos,
janelas e materiais que compõe um assoalho, etc. Passei a chamá-la “linha orgânica”, pois era real, existia em si
mesma, organizando o espaço. Era uma linha espaço, fato que eu só viria a perceber mais tarde.” (CLARK,
1969, p.89)
16
Ver CLARK, 1969, p.89
  18  

Lygia Clark - Quebra da moldura. Composição nº 5, 1954 – óleo sobre madeira e tela (106,5 x 92 x 2cm) – In:
BUTLER, Cornelia; PÉREZ-ORAMAS, Luis. Lygia Clark: The abandonment of art, 1948-1988. New York: MoMA,
2014, p.81

A partir destes trabalhos, a linha-espaço passa “a ser realmente o módulo construtor


dos planos e era respeitada, agindo como delimitadora da própria cor” (CLARK,
1969, p. 89). As investigações da artista se desenvolvem em uma série de pinturas,
chamadas Superfícies moduladas (1955-1958), onde os planos de cor aparentam
ser fisicamente distintos e claramente separados um dos outros por linhas abertas,
fissuras incisas (não desenhadas)17, “aberturas e intervalos realizados no interior
das pinturas, rompendo a unidade da superfície pictórica’’(BUTLER, 2014, p.19). As
pinturas deste período não são mais realizadas sobre tela, Clark passa a utilizar
suportes de madeira aglomerada onde as incisões podem ser levemente escavadas
e outras partes modulares são agrupadas, formando diversas seções e campos
geométricos de cor, que são “pintados com esmalte industrial dando a impressão de
que estamos olhando para um ajuntamento de placas individuais” (BARRUECO,
2014, p.107). O verso dos trabalhos, a exemplo da Superfície modulada (1955), “nos
ajudam a entender o raciocínio dimensional e matemático desenvolvido pela artista
na construção destas pinturas” (BUTLER, 2014, p.19).

                                                                                                               
17
Ver PÉREZ-ORAMAS, 2014, p.33
  19  

Lygia Clark – Superfície modulada, 1955 – Frente e verso – tinta industrial sobre madeira (114 x 77cm) –In:
BUTLER, Cornelia; PÉREZ-ORAMAS, Luis. Lygia Clark: The abandonment of art, 1948-1988. New York: MoMA,
2014, p.95, p.42

Em 1957 Clark passa a empregar somente “o preto, branco e cinza, querendo evitar
que a interferência de outras cores expressasse qualquer espaço ótico” (CLARK,
1969, p. 89). Em 1958, com a série Planos em superfície modulada, “o espaço
passou a ser expresso através de uma relação de positivo e negativo (preto e
branco)” (CLARK, 1969, p. 89). A artista opera deslocamentos dos eixos ortogonais
das formas geométricas, aproveitando-se do contraste explicito promovido pela
oposição binária das cores, no sentido de tensionar o plano, não apenas procurando
criar a ilusão de tridimensionalidade, mas buscando também uma não distinção
daquilo que está dentro ou fora dos limites do quadro pintado: “A medida que o
espaço de fora, real, começou a ser utilizado, pensei em usá-lo compondo com o
que chamo de linha-externa”(CLARK, 1969, p.89).
  20  

Lygia Clark – Planos em superfície modulada nº1, versão 01, 1957 – tinta industrial sobre madeira (87 x 59,8 x
1cm) –In: BUTLER, Cornelia; PÉREZ-ORAMAS, Luis. Lygia Clark: The abandonment of art, 1948-1988. New
York: MoMA, 2014, p.107

Nestes trabalhos já se faz presente o raciocínio da dobradura, o qual a artista irá


desenvolver em seguida na série Casulos (1959) que são “obras em metal que se
projetam no espaço, a pesar de ainda serem exibidas na parede” (BARRUECO,
2014, p.107). Os volumes e recortes das áreas de cor, configurados na estrutura de
metal, alternadamente pintadas de preto ou de branco, dão origem a sombras e
sobretons na superfície, variando as diferentes tonalidades, obtidas de acordo com a
iluminação do ambiente. Deste modo, a dimensão cromática da obra é ampliada,
incorporando a matiz pintada à cor refletida. As características dos materiais
utilizados pela artista - metal e tinta esmalte industrial, ambos altamente reflexivos –
são de importância fundante na constituição e concepção destes trabalhos.

Lygia Clark – Casulo nº2, 1959 – metal galvanizado pintado (12 x 30 x 30 cm) –In: BUTLER, Cornelia; PÉREZ-
ORAMAS, Luis. Lygia Clark: The abandonment of art, 1948-1988. New York: MoMA, 2014, p.149
  21  

1.4. Hélio Oiticica: O corpo da cor

Uma concepção de corporificação da cor foi desenvolvida pelo artista brasileiro Hélio
Oiticica (1937-1980) em obras realizadas entre 1956 e 196918. Oiticica procura
conscientemente relacionar-se com a história da arte moderna, especificamente com
o paradigma do monocromo como origem e limite da pintura19.

Os Metaesquemas – conjuntos de retângulos pintados em guache sobre cartão a


partir de 1956 - apresentam figuras coloridas de aparência inquieta. Causam um
efeito ótico que evidencia a tentativa de subverter a grade ortogonal que organiza o
espaço pictórico e de romper a bi dimensionalidade do quadro. Esses trabalhos são
um prenúncio do salto da cor para o espaço20 investigado pelo artista nas obras de
anos posteriores.

Hélio Oiticica, Metaesquema, guache sobre cartão, 1958.


Disponível em: <http://www.tate.org.uk/art/artworks/oiticica-metaesquema-t12416>. Acesso em: 15/06/2016

Em seguida, realiza a série Branca (1958) – uma versão das pinturas em branco
sobre branco de Kazimir Malevich (1878-1935), de 1918 –, na qual quadrados com
diversos níveis de saturação de pigmento criam uma diferenciação tonal entre os
brancos, deslocando a ênfase de uma abstração purificada para o encontro
experiencial21 promovido pela percepção da cor.

                                                                                                               
18 E também amplamente conceituada em seus escritos reunidos no livro Aspiro ao grande labirinto (Rio de
Janeiro: Rocco, 1986).
19 Ver SMALL, 2017, p. 256.
20 BRAGA, 2013, p. 21.
21 Ibid.
  22  

Hélio Oiticica, Série vermelha, óleo e caseína sobre madeira, 1959. Disponível em:
<http://www.tate.org.uk/whats-on/tate-modern/exhibition/helio-oiticica/helio-oiticica-exhibition-guide/
helio-oiticica-2>. Acesso em: 15/06/2016

Nas pinturas monocromáticas das séries Vermelha (1959) e Amarela (1959), Oiticica
procura variar as qualidades da pintura e produz estruturas geométricas de madeira
pintadas que investigam relações entre a interação da luz e a fisicalidade da cor. A
tinta é aplicada em camadas de tonalidades bem próximas, com pinceladas que
mudam de direção de modo que a mesma cor assume aspectos diferentes22, de
acordo com a incidência da luz. Nesses trabalhos, a cor pode ser percebida
simultaneamente como sendo única ou tendo várias intensidades. As obras são
denominadas Invenções, já que afastam a pintura da parede e deste modo
antecipam as possibilidades de inovação que o artista desenvolve a seguir, com os
Bilaterais (1959) e os Relevos espaciais (1960), nos quais a estrutura geométrica
que suporta a cor é efetivamente “solta” no espaço.

Hélio Oiticica, Bilateral Equali e Relevo Espacial 036, madeira pintada, 1959.
Disponível em: < http://inspiringlandestudio.tumblr.com/post/47798514522/crematorie-h%C3%A9lio-oiticica-
bilateral-equali>;<http://www.tate.org.uk/art/artworks/oiticica-spatial-relief-red-rel-036-t12763>
Acesso em: 15/06/2016

                                                                                                               
22 OITICICA, op. cit., p. 16.
  23  

Os Núcleos (1960) – instalações espaciais compostas por diversas placas


geométricas de madeira pintada, de tamanhos variados, suspensas em diferentes
alturas e arranjos e expostas em conjunto – ampliam a noção de espaço da cor. O
espectador é convidado a adentrar a estrutura de placas coloridas, participando do
desdobramento cromático promovido pela experiência de percorrer o trabalho de
arte, causando alterações sutis na experiência perceptiva da cor.

Hélio Oiticica, Grande Núcleo, 1960-66.


Disponível em: < http://www.tate.org.uk/whats-on/tate-modern/exhibition/helio-oiticica/helio-oiticica-exhibition-
guide/helio-oiticica-4>. Acesso em: 15/06/2016

Com a participação do espectador, as obras adquirem um fluxo contínuo que as


aproxima mais de um organismo vivo, como um corpo, um corpo da cor23, do que de
um quadro, um objeto estático.

Hélio Oiticica Grande Núcleo, 1960-66. Disponível em:


<http://54.232.114.233/extranet/enciclopedia/ho/index.cfm?fuseaction=detalhe&pesquisa=simples&cd_verbete=4
377>;<http://54.232.114.233/extranet/enciclopedia/ho/index.cfm?fuseaction=Detalhe&pesquisa=simples&
CD_Verbete=4374>. Acesso em: 15/06/2016.

                                                                                                               
23 OITICICA, op. cit., p. 23.
  24  

Entre 1963 e 1966, Oiticica realiza uma série de caixas – de madeira e diversos
tipos de vidros – intituladas Bólides. Nessas obras, o artista coloca o espectador em
contato com estruturas que se abrem como escaninhos, de onde emana uma
luminosidade interior e se abrem perspectivas, através de pranchas que se
deslocam, apresentando gavetas cheias de terra ou de pó colorido que podem ser
manipuladas pelo participador.

Hélio Oiticica, B11 Bólide caixa 09, pigmento em pó, madeira e vidro pintados, 1964.
Disponível em: <http://www.tate.org.uk/art/artworks/oiticica-b11-box-bolide-09-t12452>. Acesso em:
15/06/2016.

Nestes trabalhos, a cor se manifesta em diferentes fisicalidades, seja na película de


tinta que recobre a caixa ou outras partes de madeira, seja no pó dispersado no
interior dos compartimentos que se abrem ou nos líquidos coloridos que preenchem
o interior das cavidades de vidro. Cada elemento cromático interage com os outros,
de acordo com a ativação e manipulação do espectador, possibilitando contrastes
simultâneos das cores e também contrastes entre os sucessivos contatos dos
diversos estágios das materialidades cromáticas24. Na concepção dos trabalhos, fica
evidente a natureza ambígua da cor, que adquire um caráter duplo de atuação
pictórica, alterando seus efeitos ora no domínio das impressões visuais, ora no
domínio das impressões hápticas ou táteis25.

Nos Bólides, Hélio Oiticica utiliza propositadamente o pigmento bruto em forma de


pó, afastando-se da convenção da tinta como o principal veículo da cor26. O
pigmento dissociado da tinta mobiliza um estado material anterior à realização física
                                                                                                               
24 PEDROSA, M. Arte ambiental, arte pós moderna, Hélio Oiticica. In: OITICICA, op. cit., p. 12
25 Ibid. p. 11.
26 SMALL, op. cit., p. 258.
  25  

da pintura e, consequentemente, do suporte pictórico como um pré-requisito para a


sua construção27.

Os Parangolés28 (1965) surgem como decorrência de todas as investigações de


superação do quadro realizadas pelo artista até então29. Neles, a percepção
cromática lança-se ao espaço em forma de capas – não um vestuário a ser trajado,
mas uma extensão do corpo daquele que a porta.

Hélio Oiticica, P32 Parangolé, Capa 25, NY,1972 e Parangolé, 1967.


Disponível em: < https://br.pinterest.com/pin/484066659929114271/>;
<https://www.pinterest.com/vagalumebranco/h%C3%A9lio-oiticica/>. Acesso em: 15/06/2016.

A partir da referência das escolas de samba cariocas, essas capas coloridas fazem
a cor dançar, ganhando vida e presença espacial. Nos Parangolés, os giros e pulos
da dança conferem à cor uma mobilidade esvoaçante, como se fossem uma nova
pele aderida ao corpo, ou uma parte do corpo formado pela cor, no qual o
participador e a capa, juntos, na dança do samba que os integra, são capazes de
alargar a percepção e a vivência corpórea numa experiência estética de êxtase. A
obra passa a ser o efeito sensorial causado pela integração entre o corpo do
participador, a cor e o ambiente, na temporalidade da experiência, em oposição à
aceitação contemplativa da obra de arte como espetáculo.
                                                                                                               
27 Ibid. p. 258.
28 A palavra “parangolé” é uma gíria carioca, adotada pelos jovens da época. Perguntar a alguém “qual é o
parangolé?” tem o mesmo sentido que dizer: “O que é que há?”; “como vão as coisas?”
29 “A chegada à cor única, ao puro espaço, ao cerne do quadro, me conduziu ao próprio espaço tridimensional,
já aqui com o achado do sentido do tempo. Já não quero o suporte do quadro, um campo a priori onde se
desenvolva o ‘ato de pintar’, mas que a própria estrutura desse ato se dê no espaço e no tempo. A mudança não
é só dos meios mas da própria concepção da pintura como tal; é uma posição radical em relação à percepção do
quadro, à atitude contemplativa que o motiva, para uma percepção de estruturas-cor no espaço e no tempo,
muito mais ativa e completa no seu sentido envolvente.” OITICICA, op. cit., p. 51.
  26  

Hélio Oiticica, P32 Parangolé, Capa 25, NY,1972 e Parangolé, 1967.


Disponível em: < https://br.pinterest.com/pin/484066659929114271/>;
<https://www.pinterest.com/vagalumebranco/h%C3%A9lio-oiticica/>. Acesso em: 15/06/2016.

Hélio Oiticica nos convida a andar na beirada, a ser marginal e olhar para o entorno
com atenção, não somente exercitando nossas percepções da arte dentro de
museus ou galerias. Assim, faz uma proposta de trânsito constante entre meios,
conceitos, práticas e suportes. O artista sugere que a obra de arte seja um motivo de
se agir no mundo, uma forma de comportamento e um processo que transfigura o
corpo em obra.

2. Algumas concepções de pintura contemporânea brasileira

2.1. Dora Longo Bahia: Escalpos

A artista Dora Longo Bahia, em suas pinturas realizadas desde a década de 1990,
aborda temas como violência, sexo e morte30. No conjunto de serigrafias,
combinadas à água-tinta, da série Imagens Infectas (1999) ela apresenta imagens
cotidianas deterioradas e alteradas como que pela ação de fungos, evidenciando a
atuação do tempo sobre as lembranças.31 Estes trabalhos afirmam a impossibilidade
de se preservar a memória e manter intactos os registros dos nossos momentos, e

                                                                                                               
30
Ver: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa10511/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.
31
Ibid.
  27  

nos alertam que “toda a matéria traz dentro de si o germe da sua decadência e
desaparição futuras.”32

Dora Longo Bahia, Imagens infectas, 1999, serigrafia e agua-tinta.


Disponível em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

De acordo com o crítico de arte, curador e professor Agnaldo Farias, a peculiaridade


de sua abordagem consiste “em lembrar que também a fotografia, graças à sua
dimensão física, está condenada à extinção (...), a fotografia sempre necessitará de
um corpo que, como todo e qualquer corpo, será vitimado pela ação do tempo”.33

Dora Longo Bahia, Escalpo Paulista, 2004, acrílica sobre parede.


Disponível em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

                                                                                                               
32
FARIAS, Let it Bleed, p. 5.
33
Ibid.
  28  

A partir dos anos 2000, Dora inicia uma série de pinturas as quais denominou
Escalpos, cujo significado do nome já inclui o conceito de sua elaboração: a
dimensão antropomórfica incorpora o processo de execução.

Dora Longo Bahia, Escalpo Africano, 2004, acrílica sobre papel.


Disponível em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

Nesta série, a imagem pictórica é inicialmente pintada pela artista em camadas


espessas de tinta acrílica sobre uma superfície lisa, de plástico brilhante. Depois de
seca, a película de tinta - sendo também constituída de matéria plástica e portanto
não aderindo permanentemente à superfície em que foi configurada - é
cuidadosamente ‘descolada’ e retirada do suporte original, quando então é aplicada
e colada sobre um outro suporte planar34.

                                                                                                               
34
FARIAS, op. cit., pg. 5.
  29  

Dora Longo Bahia, Escalpo 5063, 2009, acrílica sobre o piso. 28ºBienal Internacional de São Paulo Disponível
em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

Segundo a artista, em depoimento ao curador colombiano José Rocca:

Os escalpos são uma série de pinturas "sem carne". Arranco a película de


tinta de seu suporte original e aplico-a sobre um outro lugar: uma parede,
uma página de jornal, um tapume de madeira, uma placa de cimento, um
pedaço de papelão, ou, no caso da bienal, o chão. Escolho imagens
paradigmáticas de lugares controversos, tiradas de cartões postais, jornais
ou livros, que são amassadas e mutiladas ao serem arrancadas e
reaplicadas sobre outro corpo. Quero que a pintura revele a perversidade da
35
fascinação pela imagem, pela aparência, pelo espetáculo.

Dora Longo Bahia, Escalpo Ferrado (Paquistão), 2010, acrílica sobre ferro velho.
Disponível em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

                                                                                                               
35
LONGO BAHIA, 2008.
  30  

Nas obras desta série, a película de tinta - aquilo a que a artista se refere como
‘escalpo’ - na transposição entre o suporte onde originalmente foi configurado e o
suporte onde finalmente é colocado, sofre alterações em sua fisicalidade.
Acontecem rasuras, corrosões e rupturas as quais transformam a imagem pictórica
original, deixando marcas na sua aparência e corporeidade final, como se fossem
cicatrizes do processo de descolamento e deslocamento a que foram submetidas.
Deste modo, a artista denuncia a fragilidade e a vulnerabilidade do corpo da obra,
não apenas através da imagem representada em suas pinturas, mas também na
materialidade do próprio corpo pictórico.

Dora Longo Bahia, Escalpo Carioca, 2006, acrílica sobre tapumes.


Disponível em: <http://www.galeriavermelho.com.br/pt/artista/75/dora-longo-bahia>. Acesso em: 24/06/2016.

2.2. Dudi Maia Rosa: A fibra da cor

Os trabalhos iniciais em pintura do artista paulistano Dudi Maia Rosa recorreram a


quadros em formatos não convencionais. Maia Rosa realizava pinturas em tinta
acrílica, óleo e esmalte, sobre tela e recortes de madeira. Como era ele quem tinha
que construir o suporte para as pinturas, visto que não era possível encontrar tais
formatos já prontos, começou a produzir armações em resina e fibra de vidro, já que
os processos construtivos dos moldes para a fundição da resina proporcionavam
uma ampla liberdade de experimentação formal.

Em 1983, após um breve curso introdutório da técnica, o artista passa a construir


quadros estruturados em mantas de fibra de vidro e resina líquida, misturadas aos
  31  

pigmentos coloridos. O artista explica e justifica o seu interesse pelo processo da


resina de fibra de vidro:

Vi um pessoal trabalhando com fibra, fazendo um carro, e pensei que seria


fácil fazer com esse material uns chassis com uma forma livre, pois era isso
que vinha tratando no momento. Fiz um curso de duas horas sobre o
material e já imediatamente fiz [o] primeiro trabalho. O processo de inversão
me encantou, tinha a ver com a gravura e a transparência. Foi uma
novidade que me fez pensar o lado de dentro. Como ele era transparente
para o outro lado, me fez considerar uma construção da estrutura. (...)
Então a resina veio como desafio para reformular o trabalho. E mais, que o
36
suporte, a ‘tinta’ e o pigmento se fizeram uma coisa só!

Os quatro primeiros trabalhos realizados naquele ano recorrem a estruturas de


formas geométricas básicas, opacas e monocromáticas: diamante azul, oval verde,
triângulo equilátero e círculo vermelhos.

Dudi Maia Rosa, Sem Título, 1983. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 170x492 cm. Coleção Renata
Mellão. Sem Título, 1983. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 200x574 cm. Coleção Gema Giaffone. In:
COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, pg. 62

Dudi Maia Rosa, Sem Título, 1983. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 200x200 cm. Coleção João Leão
Sattamini/Comodato Museu de Arte Contemporânea de Niteroi. Sem Título, 1983. Resina poliéster, pigmento e
fibra de vidro, ø 210 cm. Coleção Augusto Livio Malzoni. In: COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as
mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, pg. 63

                                                                                                               
36
DUDI MAIA ROSA in: COSTA, 2005, p. 58
  32  

Em seguida, o artista realiza uma sucessão de monocromos em novas formas:


paralelogramos, semicírculos, triângulos retângulos e formas parecidas com as
letras M, N, O e T, e um trabalho completamente transparente inspirado no formato
de uma janela.

Dudi Maia Rosa, Sem Título, 1984. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, sem dimensões. Coleção Kim
Esteve. Sem Título, 1984. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, sem dimensões. Coleção Conrado
Malzoni. Sem Título, 1984. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, sem dimensões. Coleção particular. In:
COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, pg. 70-71

Dudi Maia Rosa, Janela Antroposófica, 1983. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 210x246 cm. Coleção
João Leão Sattamini/Comodato Museu de Arte Contemporânea de Niteroi. In: COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi
Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, pg. 65

Os métodos usados por Maia Rosa para moldar resina foram se transformando ao
longo do tempo37. Inicialmente construía uma fôrma com ripa de plástico flexível
sobre o chão de concreto do estúdio, protegendo tudo com uma substância

                                                                                                               
37
COSTA, op. cit., p. 58
  33  

desmoldante. Em seguida, despejava resina líquida misturada com pigmento dentro


da fôrma, diretamente sobre o piso. Ao secar a primeira camada de cor de resina, o
artista forrava o interior da peça com mantas de fibra de vidro e cobria tudo com uma
outra camada de resina incolor. As mantas de fibra de vidro e a resina se fundiam na
secagem, resultando numa estrutura inteiriça, plana, rígida, colorida e
transparente38: um quadro, que podia então ser retirado do molde.

O processo de elaboração desses trabalhos obriga o artista a trabalhar as cores por


trás, realizando a pintura por dentro do quadro e originando uma superfície frontal
totalmente transparente, através da qual se vê a trama delicada das mantas,
dependendo da cor e da intensidade do pigmento utilizado.

Nos primeiros anos, adicionava por trás da estrutura um esqueleto de canaletas de


fibra de vidro para dar maior rigidez às obras.39

Dudi Maia Rosa em seu estudio. Foto: Bob Toledo


In: COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, págs.
188/189.

Aos poucos, o artista foi experimentando novas técnicas e incorporando novos


materiais. Em 1993, passa a derramar a resina pigmentada sobre uma folha de
celofane, enrugando a superfície exterior do trabalho40. No ano seguinte passa a
fechar o trabalho por trás, como uma caixa.41

                                                                                                               
38
Ibid.
39
Ibid.
40
COSTA, op. cit., p. 113
41
Ibid., p. 121
  34  

Dudi Maia Rosa, Aos polignanenses, 1994. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 215 x 300 cm. Coleção
Zeca Revoredo. In: COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros,
2005, pg. 120.

Para realizar a obra Aos polignanenses (1994), o artista delimitou, ao centro, uma
área retangular sobre a folha de celofane. Ali despejou 20 litros de resina
pigmentada. Ao secar, a resina da área central puxou a folha em direção a si,
criando rugas.42Em seguida, despejou resina na área restante e ao final, selou o
trabalho por trás com uma folha de resina da mesma cor, transformando-o em uma
caixa.43

Dudi Maia Rosa, esquema para a confecção da obra Aos polignanenses, 1994.
In: COSTA, Oswaldo Corrêa da. Dudi Maia Rosa e as mortes da pintura. São Paulo, Metalivros, 2005, pg. 120.

                                                                                                               
42
COSTA, op. cit., p. 121
43
Ibid.
  35  

Na exposição intitulada Vrido (Galeria Millan, São Paulo, 2016), o artista apresenta
uma série de trabalhos os quais incorporam ao quadro a representação da moldura.

Dudi Maia Rosa, Sem título, 2016. Resina poliéster, pigmento e fibra de vidro, 18 x 21,3 cm.
Disponível em: <http://www.galeriamillan.com.br/ptBR/exposicoes/busca?utf8=%E2%9C%93&tipo_evento
=Galeria+Millan&data=&commit=ok>. Acesso em: 27/06/2016.

Nestas obras, a tinta, a tela, o chassi, até a moldura, são uma coisa só,
amalgamada44. O artista funde um quadro inteiriço no qual os quatro elementos –
aqueles que caracterizam tradicionalmente uma pintura – se unem, transformando
todo o conjunto num único corpo pictórico.

2.3. Fernando Burjato: Rompendo a ortogonalidade do quadro

Nas pinturas de Fernando Burjato, camadas sucessivas de tinta aplicadas em faixas


contíguas de cores diferentes extravasam o suporte ortogonal, fazendo com que a
matéria pictórica se prolongue para além dos limites da tela e invada o ambiente ao
redor do quadro.

                                                                                                               
44
OSWALDO CORRÊA DA COSTA. A pintura falando de si: sobrevida do pictórico em Dudi Maia Rosa,
Ilustríssima 3, Folha de São Paulo. São Paulo, 05 de junho de 2016.
  36  

Fernando Burjato, Sem Título, 2010, óleo sobre tela. In: FERNANDO CIDADE BROGGIATO. Pintura e objeto,
Dissertação de mestrado. São Paulo, Unesp, 2011, pg. 15. Disponível em:
<http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/86968/broggiato_fc_me_ia.pdf?sequence=1>. Acesso em:
26/06/2016

O artista, em sua dissertação de mestrado, descreve assim os trabalhos:

“Em muitas de minhas pinturas recentes, acúmulos de tinta extravasam os


limites do suporte e dão aos quadros contornos irregulares. Essas rebarbas,
que às vezes se dobram e pendem diante do quadro, contrastam com a
estrutura simples das composições, constituídas sobretudo por faixas
verticais” (BROGGIATO, 2011, p. 14)

No processo de elaboração das pinturas, tiras de isopor de espessura idêntica à tela


são colocadas ao redor do quadro, criando uma moldura. As faixas de cores são
então aplicadas sobre a superfície da tela e também sobre a moldura de isopor,
avançando o campo cromático de listas para fora do espaço delimitado pelo quadro,
ignorando as divisões de suas fronteiras. Ao secar a tinta, a moldura de isopor é
retirada, preservando as rebarbas de película pictórica, que pendem por sobre a
tela.
  37  

Fernando Burjato, esquema de execução de uma pintura. In: FERNANDO CIDADE BROGGIATO. Pintura e
objeto, Dissertação de mestrado. São Paulo, Unesp, 2011, pg. 21. Disponível em:
<http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/86968/broggiato_fc_me_ia.pdf?sequence=1>. Acesso em:
26/06/2016

Nestes trabalhos, a camada de tinta se apresenta como ‘coisa’ (BROGGIATO, 2011,


p. 14), denunciando que a matéria da pintura e o seu suporte não são o mesmo
corpo. O procedimento aproxima o estrato pictórico da condição de objeto. Segundo
o artista, “a tinta se mostra como algo sólido, que se coloca à frente da superfície – e
a pintura, como uma superfície coberta, e não uma janela para uma abertura na
parede” (BROGGIATO, 2011, p. 14)

Fernando Burjato, Sem Título, 2008, óleo sobre tela. In: FERNANDO CIDADE BROGGIATO. Pintura e objeto,
Dissertação de mestrado. São Paulo, Unesp, 2011, pg. 17. Disponível em:
<http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/86968/broggiato_fc_me_ia.pdf?sequence=1>. Acesso em:
26/06/2016

Nota-se o caráter parasitário do corpo da tinta, já que a parte que extrapola os


limites do suporte, não tendo o apoio necessário ao seu amparo e sustentação,
  38  

pende e dobra-se sobre os contornos do suporte. A cor materializa-se para fora do


quadro e escoa, vazando para além dos limites do quadro.

Fernando Burjato, Sem Título, 2009, óleo sobre tela. In: FERNANDO CIDADE BROGGIATO. Pintura e objeto,
Dissertação de mestrado. São Paulo, Unesp, 2011, pg. 20. Disponível em:
<http://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/86968/broggiato_fc_me_ia.pdf?sequence=1>. Acesso em:
26/06/2016
  39  

3. A materialidade da cor: trabalhos plásticos realizados entre 2006 e 2019

sem título 2006 acrílica sobre tela 30x40 cm

sem título 2006 acrílica sobre tela 40x50 cm


  40  

sem título 2006 acrílica sobre tela 50x40 cm. sem título 2006 acrílica sobre tela 50x40 cm. sem título
2006 acrílica sobre tela 50x40 cm

sem título 2006 acrílica sobre tela 50x40 cm. sem título 2006 acrílica sobre tela 50x40 cm
  41  

sem título 2007 óleo sobre papel 64x48 cm cada

sem título 2007 óleo sobre papel 40x30 cm cada


  42  

sem título 2007 óleo sobre papel 40x30 cm cada

sem título 2007 óleo sobre papel 40x30 cm cada Coleção particular
  43  

sem título 2012 acrílica sobre tela 20x20 cm cada

sem título 2012 acrílica sobre tela 20x20 cm cada Coleção particular
Obra participante da exposição coletiva Abstração como Imagem, Galeria Tato, 2015
  44  

sem título 2012 acrílica sobre tela 20x20 cm

sem título 2016 acrílica sobre tela 12x9 cm. sem título 2016 acrílica sobre tela 12x9 cm
  45  

depois do Maurício 2012 acrílica sobre tela 30x20 cm

depois do Rodrigo 2012 acrílica sobre laminado plástico 40x40 cm. Coleção particular
  46  

concretismo #1 2012 acrílica sobre laminado plástico 40x40 cm

concretismo #1/ #5 2012 acrílica sobre laminado plástico 40x40 cada


  47  

Safari #1 2012 acrílica sobre laminado plástico 20x90 cm. 37º Salão de Arte de Ribeirão Preto Nacional –
Contemporâneo

Safari #3 2012 acrílica sobre laminado plástico 25x25 cm. 37º Salão de Arte de Ribeirão Preto Nacional –
Contemporâneo. sem título 2019 acrílica sobre laminado plástico 30x40 cm
  48  

sem título 2012/2018 acrílica sobre pelúcia 12x9 cm. Coleção particular

Safari #2 2012 acrílica sobre pelúcia 40x40 cm. 37º Salão de Arte de Ribeirão Preto Nacional –
Contemporâneo
  49  

Safari #5 2012 acrílica sobre camurça sintética 100x120 cm

sem título 2012 acrílica sobre laminado plástico 20x30 cm


  50  

sem título 2012 acrílica sobre laminado plástico 20x30 cm cada

                     
sem título 2012 acrílica sobre laminado plástico 20x30 cm. sem título 2012/2019 acrílica sobre laminado
plástico 30x40 cm
  51  

sem título 2012 acrílica sobre tecido 80x60 cm

sem título 2012 acrílica sobre tecido 80x60 cm


  52  

sem título 2012 acrílica sobre laminado plástico 40x40 cm cada

sem título 2012/2019 acrílica sobre veludo sintético 20x30 cm


  53  

sem título 2012 acrílica sobre tela, acrílica sobre tecido 40x30 cm cada. Coleção particular

sem título 2013 acrílica sobre tela 40x40 cm cada


  54  

sem título 2012 acrílica sobre tela 24x18 cm cada. Coleção particular

vista da exposição coletiva Imagem Mi(g)rante Zipper Galeria 2012


sem título (série filmecolagens) 2009/2012 cibacrome, c-print e acrílica sobre tela
  55  

sem título 2013 acrílica sobre tela 188x118 cm


  56  

sem título 2013 acrílica sobre tela 80x60 cm cada. Coleção particular

vista da exposição individual Nova Abstração Nova


Zipper Galeria Projeto Zip’up 2013
  57  

sem título 2017 massa modelar sobre compensado 45x36 cm. sem título 2017 massa modelar sobre
compensado 45x36 cm

sem título 2019 acrílica sobre tela 30x20 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 40x30 cm
  58  

sem título 2016 acrílica sobre tela 20x20 cm cada. Coleção particular

sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017
acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm

sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017
acrílica sobre tela 20x20 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 20x20 cm
  59  

sem título 2018 acrílica sobre tela 25x25 cm. sem título 2017 acrílica sobre tela 19x27 cm

sem título 2019 acrílica sobre tela 40x40 cm. sem título 2012/2019 acrílica sobre tela 40x30 cm
  60  

sem título 2019 acrílica sobre compensado 20x20 cm. sem título 2019 acrílica sobre compensado 20x20
cm. sem título 2019 acrílica sobre compensado 20x20 cm

sem título 2019 acrílica sobre compensado 20x15 cm. sem título 2019 acrílica sobre compensado 20x15
cm
  61  

a recreativa 2018 guache e aquarela sobre jornal dimensões variáveis

a recreativa 2018 guache e aquarela sobre jornal (detalhes)


  62  

sem título 2019 acrílica sobre tela 70x50 cm

sem título 2019 cianotipia e acrílica sobre tecido 40x40 cm


  63  

4. Considerações finais

A manifestação cromática, em todas as esferas do conhecimento humano, é um


fenômeno que não está completamente compreendido cientificamente, estando
ainda bastante inexplorado. Nas linguagens artísticas - plásticas e visuais - as
inovações tecnológicas, diferentes aplicações para componentes já conhecidos e o
uso de novos materiais, promovem a ampliação das possibilidades de pesquisa para
os artistas, renovando seu interesse na articulação dos elementos que compõem a
sua prática, especialmente no caso da pintura.

O processo de renovação de interesse é dinâmico e errático: cada experimentação


realizada com as cores abre novas perspectivas, direciona outros caminhos,
engana-se, encontra desvios e retornos. E nesta movimentação caótica e
desordenada, o embate com a frustração, com o fracasso e com a dúvida
frequentemente acontece. Não foi diferente no caso da produção pictórica
apresentada neste estudo.

Apesar da aparente assertividade na escolha das cores e no modo de aplicação das


massas de tinta acrílica colorida sobre as diversas superfícies utilizadas, a incerteza,
a impulsividade e a vontade de estabelecer um diálogo se mostram presentes nos
trabalhos, no sentido de procurar pensar, ponderar e relacionar a pintura com a
própria pintura e com outras pinturas, sem a intensão paródica ou irônica. No fazer
dos trabalhos há um compromisso com uma certa alegria e um prazer ingênuo, mas
existem também os fantasmas, aqueles que apavoram e bloqueiam.

É sempre difícil considerar que um trabalho esteja terminado, a pesquisa em arte


tem como caráter principal ser eternamente inconclusiva, e quanto mais se averigua
aquilo que foi realizado, mais se constata o quanto faltaria ou quantas outras coisas
poderiam ter sido feitas. Especialmente na questão cromática, onde as relações
perceptivas e multissensoriais se estabelecem, se intercruzam e se modificam,
incessantemente. É preciso fazer escolhas, priorizar os interesses, temporariamente
abrir mão de outros caminhos.
  64  

Neste sentido, o recorte da discussão da materialidade da cor aqui apresentado é


apenas uma das possibilidades, configura um ponto de partida, um momento inicial,
entre outros tantos momentos, a serem sucessivamente explorados.

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