Aços Avançados de Alta Resistência: Microestrutura E Propriedades Mecânicas
Aços Avançados de Alta Resistência: Microestrutura E Propriedades Mecânicas
Aços Avançados de Alta Resistência: Microestrutura E Propriedades Mecânicas
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RESUMO
As chapas feitas com os chamados aços avançados de alta resistência (A.H.S.S., Advanced High
Strength Steels) vêm sendo desenvolvidas há mais de quarenta anos. Eles são uma das principais
respostas da siderurgia mundial ao desafios impostos por seus clientes em sua busca por maior
competitividade e atendimento às restrições ao consumo de energia e preservação do meio ambi-
ente. O caso da indústria automobilística é emblemático, já que ela precisa reduzir cada vez mais
o peso de seus produtos para minimizar seu consumo de combustível, diminuindo assim o custo
e a agressão ecológica associados a seu uso. Chapas mais finas de aço com maior resistência
mecânica permitem reduzir significativamente o peso de peças feitas com aços convencionais
sem perda de suas características originais. Contudo, no caso de aços com microestrutura ferrít i-
ca ou ferrítica-perlítica, um aumento na resistência mecânica fatalmente leva à redução na con-
formabilidade do material, o que afeta a liberdade de design das peças a serem produzidas. A
solução para esse impasse foi a aplicação de efeitos microestruturais complexos para conciliar,
tanto quanto possível, essas duas características mecânicas aparentemente contraditórias. Este
trabalho apresenta uma revisão sobre as microestruturas dos aços e sua relação com as proprie-
dades mecânicas, com ênfase nos novos aços avançados de alta resistência que estão sendo de-
senvolvidos: bifásicos, TRIP, de fases complexas, martensíticos e parcialmente martensíticos,
TWIP e com tamanho de grão ultra-fino.
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1. INTRODUÇÃO
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aplicações específicas, cuja evolução histórica pode ser apreciada na figura 1 [Wuppermann
2007]. A partir da década de 1990 todos esses novos aços foram englobados numa só família,
designada como Aços Avançados de Alta Resistência (Advanced High Strength Steels – AHSS).
A figura 2, já clássica, permite comparar as características de resistência mecânica e ductilidade
dessa nova família de aços. Pode-se deduzir a partir dessa figura que o aumento do nível de re-
sistência mecânica do produto leva quase inevitavelmente à redução de seu alongamento total,
ou seja, de sua estampabilidade. Contudo, o uso de microestruturas adequadas permite minimizar
a perda de ductilidade sob maiores níveis de resistência mecânica. Essa mesma figura mostra
ainda que ligas leves à base de alumínio e magnésio são inferiores aos aços quando se considera
simultaneamente resistência mecânica e conformabilidade [Schröder 2004].
O objetivo deste trabalho é efetuar uma revisão sobre o papel dos mecanismos microestru-
turais dos aços na definição desses novos perfis de propriedades mecânicas e conformabilidade.
Figura 1: Evolução dos diversos tipos de Aços Avançados de Alta Resistência (AHSS) ao longo
das últimas três décadas [Wuppermann 2007].
Figura 2: Relação entre limite de resistência e alongamento total entre os vários tipos de Aços
Avançados de Alta Resistência (AHSS) [Schröder 2004].
ktg (1)
tg
d
onde d é o diâmetro médio dos grãos e ktg é uma constante. Este é o único mecanismo de endu-
recimento que aumenta tanto a resistência mecânica como a tenacidade dos metais. Por esse mo-
tivo o refino de grão geralmente é o primeiro mecanismo de endurecimento cogitado ao se defi-
nir processos metalúrgicos de conformação e tratamento térmico de aços estruturais.
O endurecimento por segunda fase y decorre da presença de mais de uma fase ou cons-
tituinte na microestrutura do aço – como a perlita, por exemplo. No caso específico de uma mi-
croestrutura ferrítico-perlítica a resistência mecânica pode ser calculada em função da lei de mis-
turas:
y X 1f / 3 yf (1 X 1f / 3 ) yp (2)
3. AÇOS MICROLIGADOS
5,9 X p
ppt ln( 4000 x ) (3)
x
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Os aços microligados também podem apresentar o endurecimento por discordâncias
disc, o qual ocorre se a microestrutura desse material apresentar constituintes formados sob
temperaturas relativamente baixas como, por exemplo, ferrita acicular ou bainita. A ferrita acicu-
lar, ao contrário da poligonal, contém discordâncias em sua estrutura que aumentam sua resistên-
cia mecânica. O efeito de endurecimento é diretamente proporcional à raiz quadrada da densida-
de de discordâncias presente na microestrutura:
(a) (b)
Figura 3: a) Representação esquemática da topologia da microestrutura bifásica [Hornbogen
1980]; b) Comparação entre as curvas tensão versus deformação, determinadas por en-
saio de tração, para os aços ao C, microligado e bifásico [Gorni 1990].
Durante a produção dos aços bifásicos, tanto através da laminação de tiras a quente co-
mo de recozimento contínuo, a matriz ferrítica se forma em primeiro lugar, enriquecendo a aus-
tenita remanescente com C e outros elementos de liga. Esta, por sua vez, ganha temperabilidade
suficiente para se transformar mais tarde em martensita, sob temperaturas bem mais baixas. Essa
transformação atrasada da martensita induz tensões residuais de compressão na matriz ferrítica,
as quais facilitam o processo de escoamento e, dessa forma, reduzem o valor do limite de escoa-
mento e suprimem a ocorrência de patamar. Um resfriamento lento após a formação da martensi-
ta pode proporcionar a redução da fragilidade da martensita recém-formada através de efeitos de
revenido. Durante a deformação plástica o escoamento da matriz ferrítica macia através das “i-
lhas” de martensita dura encrua significativamente o material, contribuindo para aumentar sua
resistência mecânica. A figura 4 mostra esquematicamente o efeito dos vários parâmetros micro-
estruturais sobre as propriedades mecânicas do aço bifásico [Maid 1988].
Nos aços ferríticos com baixo C, com alta estampabilidade, as correlações entre propri-
edades mecânicas e microestrutura são relativamente simples, já que esta é caracterizada apenas
através do tamanho e formato de seus grãos, bem como de sua textura cristalográfica. A situação
se complica no caso dos aços bifásicos, já que a caracterização estereológica de sua microestru-
tura é mais complexa, envolvendo parâmetros como tamanho de grão das duas fases, a razão
entre suas durezas, o caminho livre médio da ferrita e o grau de contigüidade entre as duas fases
[Gorni 1995]. Em primeiro lugar, a relação de Hall-Petch é ligeiramente diferente no caso dos
aços bifásicos: o caminho livre médio disponível para migração das discordâncias é delimitado
pelos contornos ferrita-martensita e não mais pelos contornos de grão ferríticos [Maid 1988].
Assim sendo, a equação de Hall-Petch continua válida, só que o valor do tamanho de grão d deve
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ser substituído pela distância livre ferrítica média L, o que foi demonstrado experimentalmente
[Lanzilotto 1982,Gorni 1992].
O cálculo do limite de resistência para o caso dos aços bifásicos também deve levar em
conta o encruamento ou endurecimento por discordâncias disc que ocorre no material. Foi
constatado que esse encruamento pode ser expresso através do modelo de Ashby [Ashby
1964,Lanzilotto 1982],
f
disc k (5)
d
Em meados da década de 1980 foi desenvolvida uma variante de aço bifásico, onde a
martensita presente como segunda fase na martensita foi substituída pela bainita. Essa evolução
foi motivada pelo fato de que a microestrutura ferrítica-bainítica apresenta menor número de
locais onde ocorre concentração de tensão e deformação, uma vez que é mais uniforme do que a
ferrítica-martensítica. Isso proporciona melhores características de ductilidade e tenacidade à
chapa, fato de grande importância em aplicações como a fabricação de rodas automotivas, em
função da maior capacidade de expansão de orifício desse material. Um aço ferrítico-bainítico
ideal para esta aplicação deve apresentar microestrutura ferrítica com 10 a 15% de bainita, a qual
proporciona limite de escoamento entre 450 e 550 MPa, limite de resistência entre 550 e 650
MPa, razão elástica menor ou igual a 85% e alongamento total mínimo de 25%. Um exemplo
desse material, obtido através de laminação a quente, apresenta a seguinte composição química:
0,05% C, 1,60% Mn, 0,49% Si, 0,033% Al e 0,025% Nb [Sudo 1983,Gorni 2007a].
9
5. AÇOS MULTIFÁSICOS
Em 1967 Zackay e outros mostraram que é possível obter altos valores de alongamento
num aço austenítico se, durante o processo de deformação sob temperatura ambiente, ocorrer
transformação contínua da austenita para martensita. Esse fenômeno foi atribuído à dilatação que
ocorre durante a transformação da austenita CFC para a ferrita CCC, e foi designado pela sigla
TRIP: Transformation-induced-plasticity, ou plasticidade induzida por transformação [Zackay
1967].
O desenvolvimento bem sucedido das chapas de aço bifásico motivou a busca por ou-
tros recursos microestruturais que promovessem aumento na ductilidade em aços com alta resis-
tência mecânica. No final da década de 1980 Matsumura e outros mostraram, pela primeira vez,
que era possível aplicar o conceito TRIP para aumentar a ductilidade em chapas de aço de baixo
C ao Si e Mn, processadas por recozimento contínuo, de forma a apresentar até 20% de austenita
retida em sua microestrutura. O principal desafio metalúrgico nesse caso foi conseguir estabili-
zar, sob temperatura ambiente, uma quantidade considerável de austenita que permitisse elevar
significativamente o alongamento do material. Isso pode ser feito submetendo-se o material a um
ciclo de resfriamento a partir de seu estado austenítico que permitisse permanência durante um
período significativo de tempo dentro do campo bainítico do diagrama TRC, de forma a propor-
cionar suficiente enriquecimento de carbono à austenita remanescente para estabilizá-la sob tem-
peratura ambiente. Este material pode ser produzido diretamente da laminação de tiras a quente,
onde o resfriamento lento da bobina garante o enriquecimento de C da austenita remanescente,
ou a partir de recozimento contínuo, onde o resfriamento da tira deve incluir um tratamento adi-
cional de superenvelhecimento com esse mesmo objetivo. A redução do tamanho de grão da aus-
tenita retida também contribui para elevar sua estabilidade, através do abaixamento da tempera-
tura Ms. Ao final desse processo tem-se uma microestrutura multifásica, geralmente constituída
de 50 a 60% de ferrita, 25 a 40% de bainita e 5 a 15% de austenita retida, que proporciona a esse
material limites de resistência da ordem de 600 a 800 MPa. É interessante notar que frações de
austenita retida superiores a 20% degradam a conformabilidade a frio dos aços TRIP. A figura 5a
mostra a maior resistência mecânica e ductilidade do aço TRIP em relação aos microligados e
bifásicos [Matsumura 1987,Bleck 2001,Hulka 2003,Bleck 2004].
A deformação provocada pela transformação da austenita retida em martensita não ex-
plica totalmente os altos valores de alongamento uniforme obtidos nos aços TRIP, os quais osci-
lam entre 15 e 30%. Nos aços de baixo C com efeito TRIP essa transformação promove defor-
mação por tração de apenas 2%, em função das frações muito baixas de austenita retida presentes
na microestrutura. A maior contribuição para a ductilidade desse material é o maior coeficiente
de encruamento devido à formação progressiva de martensita dura ao longo de toda a deforma-
ção, conforme mostrado na figura 5b. As discordâncias criadas pela transformação martensítica
na ferrita também possuem papel importante na definição da ductilidade dos aços TRIP, pois
também contribuem para o encruamento.
Se, por acaso, a transformação ocorrer inteiramente logo no início da deformação a frio,
o material não apresentará alta ductilidade. É necessário que a austenita se mantenha estável até
serem atingidos altos graus de deformação a frio, já que essa fase retarda o processo de estricção
que ocorre sob solicitações de tração através de sua transformação à martensita nos pontos do
material onde ocorre concentrações de tensão. Ou seja, é importante retardar a transformação da
austenita retida até os estágios finais da deformação, quando ocorre acúmulo significativo de
danos no aço. É justamente nesse ponto que o benéfico efeito TRIP pode ser maximizado. Por
esse motivo, a adição de Si e o enriquecimento adequado de C da austenita retida são vitais para
assegurar um nível adequado de estabilidade na austenita retida e garantir a alta ductilidade desse
material. A presença de martensita de alto C não-revenida (e, portanto, frágil) num material com
alta ductilidade, como é o caso dos aços TRIP, parece ser uma contradição. Isso pode ser expli-
cado pelo pequeno tamanho de grão da austenita retida, o qual torna difícil a transferência de
carga desde a matriz da microestrutura multifásica até a martensita frágil que se forma durante a
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deformação a frio. Portanto, o refino da microestrutura dos aços TRIP é duplamente importante,
garantindo simultaneamente a estabilidade da austenita retida e imunidade à fragilidade que po-
deria ser induzida pela presença de martensita não-revenida [Bhadeshia 2002,Hulka
2003,Chatterjee 2006].
(a) (b)
Figura 5: Comparação entre a) curvas tensão versus deformação b) coeficientes diferenciais de
encruamento n determinadas através ensaios de tração de aços ARBL, bifásico e TRIP
com níveis similares de limite de escoamento [Bleck 2001].
6. AÇOS MARTENSÍTICOS
Os aços martensíticos de baixo C, eventualmente designados pela sigla MART (de Mar-
tensitic), apresentam, como se depreende de seu nome, microestrutura constituída predominan-
temente de martensita. Sua alta resistência mecânica os qualifica para uso em componentes vitais
para a segurança de automóveis, como pára-choques e barras contra impactos laterais, a exemplo
dos aços de fase complexa. Contudo, a microestrutura desses aços também pode conter outros
constituintes, tais como martensita auto-temperada, bainita, ferrita acicular e/ou austenita retida;
por esse motivo, algumas de suas variantes são designadas pela expressão parcialmente martensí-
tico (Partially Martensitic, PM). A martensita desse aço apresenta morfologia em ripas, já que o
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teor de C desses aços encontra-se abaixo de 0,2%. Esse produto é obtido através de Laminação
de Tiras a Quente, sendo necessário manter taxas de resfriamento altas o suficiente no final da
conformação e temperaturas de bobinamento abaixo do ponto Ms. Uma vez que o teor de C desse
material é relativamente baixo, seu ponto Ms é elevado, da ordem de 300 a 400°C, fazendo com
que a martensita passe por um processo de auto-revenido durante o resfriamento lento da bobina
[Spindler 2004].
O nível de resistência desse material também pode ser ajustado pelo teor de C, já que o
principal mecanismo de endurecimento da martensita decorre do efeito da solução sólida desse
elemento. As demais fases presentes na microestrutura são usadas para um ajuste fino das carac-
terísticas mecânicas. Por exemplo, maiores frações de martensita auto-temperada reduzem a re-
sistência mecânica do aço, ao mesmo tempo em que melhoram sua conformabilidade. O tamanho
de grão da austenita que dá origem à martensita também altera as características mecânicas. Ou-
tra possibilidade de influenciar as propriedades mecânicas dos aços martensíticos consiste no
endurecimento a partir da precipitação de elementos de micro-liga. As propriedades típicas das
chapas de aço martensítico são: limite de escoamento de 1150 MPa, limite de resistência de 1360
MPa, razão elástica de 0,85 e alongamento total de 5%. A conformabilidade por dobramento
desse material é muito boa, apesar da baixa ductilidade observada no ensaio de tração: o raio
mínimo de curvatura é da ordem de 1,5 vezes a espessura da chapa [Spindler 2004].
A microestrutura martensítica também pode ser obtida após a conformação da chapa no
cliente final. Nos últimos anos vem-se constatando um aumento da fabricação de componentes
automotivos através de estampagem a quente seguida de têmpera na própria matriz usada na con-
formação mecânica. O aço usado deve ser auto-temperável, o que virtualmente obriga ao uso de
ligas ao B, podendo-se citar as seguintes faixas típicas de composição química: 0,20-0,25% C,
1,00-1,30% Mn, 0,20-0,25% Si, 0,025% P máx; 0,015% S máx; 0,15-0,25 Cr e 0,0015-0,0050%
B [Akerstrom 2006].
O processo de estampagem a quente se inicia protegendo-se a superfície da tira com um
revestimento especial à base de AlSi para protegê-la da descarbonetação e oxidação durante o
aquecimento e conformação. O material é desbobinado e entra num forno contínuo com 23 me-
tros de comprimento, saindo do mesmo sete minutos depois sob temperaturas entre 850 e 950°C.
A seguir ele é encaminhado à matriz de estampagem, onde é conformado e resfriado na própria
matriz, a qual possui um sistema de resfriamento interno onde circula água a 10°C. Eventual-
mente a matriz pode ser feita com ligas de cobre, cuja melhor condutividade térmica aumenta a
severidade de têmpera. A seguir a peça é retirada da matriz e desrebarbada [Akerstrom
2006,Nicholas 2005,Nicholas 2006].
Naturalmente a estampagem a quente de chapas seguida de têmpera para obtenção de mi-
croestrutura martensítica é indicada para a fabricação de autopeças com resistência mecânica
extrema, com limites de resistência da ordem de 1.500 MPa, que geralmente são usadas como
proteção contra colisões – como, por exemplo, pára-choques e seus suportes, reforços para as
colunas “A”, “B” e “C”, reforço interior de portas, túnel da transmissão, etc. Uma vantagem ine-
rente a esse processo é a alta reprodutibilidade geométrica dos componentes conformados, que
apresentam precisão dimensional da ordem de 0,5 mm, já que o processo de estampagem a
quente não induz tensões residuais na peça acabada. Elas são anuladas em função da alta tempe-
ratura em que o material se encontra durante sua conformação.
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ção na estrutura cristalina e na densidade do metal. Há ainda um terceiro modo de deformação,
através de maclação mecânica, na qual a estrutura cristalina do aço é preservada, mas a região
maclada é reorientada durante a deformação plástica. Este último mecanismo deu origem a ligas
ferrosas com ductilidade extraordinária, com plasticidade induzida por maclação, designadas
pela sigla TWIP (Twinning Induced Plasticity) [Honeycombe 2006].
Essa plasticidade induzida por maclação, ou seja, T, é observada em aços altamen-
te ligados, com 15 a 25% de Mn mais 2 a 4% de Si e Al. Esses materiais eventualmente também
podem apresentar um efeito TRIP mais sofisticado, através da ocorrência de múltiplas transfor-
mações martensíticas: CFC hc Ms
tcc
Ms
. Os aços TWIP são austeníticos e continuam a sê-lo
após a deformação plástica. É interessante notar que os teores relativamente altos de Si e Al que
se fazem necessários neste tipo de aço reduzem sua densidade de 7,8 g/cm³ para 7,3 g/cm³
[Frommeyer 2003,Honeycombe 2006].
O mecanismo TWIP ocorre na austenita metaestável quando a energia livre de Gibbs
G da reação martensítica CFC hc
Ms
é positiva, variando entre 110 e 250 J/mol, e a energia
de falha de empilhamento CFC é relativamente baixa, assumindo um valor crítico da ordem de
25 mJ/m². Já o efeito TRIP se revela na austenita metaestável quando a energia livre de Gibbs da
reação martensítica, G, é negativa e igual a aproximadamente –220 J/mol ou menos, depen-
dendo da composição química do aço; neste caso a energia de falha de empilhamento CFC é
muito baixa, menor ou igual a 16 mJ/m², o que implica na formação preferencial de uma fase
com reticulado HC. Geralmente adições de Al a ligas de Fe com alto teor de Mn aumentam a
energia de falha de empilhamento da austenita e suprimem a reação martensítica CFC hc Ms
,
enquanto que o Si diminui a energia de falha de empilhamento e promove a transformação da
fase martensítica.
O efeito TRIP em aços com alto Mn eleva não só o coeficiente de encruamento n, que
atinge valor máximo igual a 0,8, como também o limite de resistência, de aproximadamente
1100 MPa; e o alongamento total, que pode chegar a até 55%. Já o aço TWIP apresenta limite de
escoamento relativamente baixo, da ordem de 280 MPa, e um moderado limite de resistência,
igual a 650 MPa. Contudo, seu alongamento total é extremamente alto, da ordem de 95%, e sua
absorção específica de energia chega a ser o dobro dos aços convencionais com estampabilidade
extra-profunda. O aço TWIP, por ser austenítico, possui alta tenacidade, mantendo fratura dúctil
na faixa de temperaturas entre –196°C e 400°C.
Um estudo feito com três tipos de aço, TRIP, TRIP/TWIP e TWIP, cujas composições
químicas podem ser vistas na tabela I, mostram que o mecanismo TWIP é bastante promissor,
uma vez que aumenta simultaneamente a resistência mecânica e ductilidade dos aços. Basica-
mente a definição do comportamento mecânico das ligas estudadas foi função do seu teor de Mn.
A figura 6a mostra as curvas tensão versus deformação obtidas através de ensaios de tração
feitos com os três aços. Pode-se observar que a curva correspondente ao aço TRIP apresentou
uma inflexão para deformação real igual a aproximadamente 0,15, a qual foi decorrente da trans-
formação da austenita retida presente na microestrutura. Os demais aços, TRIP/TWIP e TWIP
não apresentaram tal inflexão, mantendo coeficiente de encruamento menor que o do aço TRIP,
mas alongamento total bem maior. A alteração microestrutural provocada pela deformação plás-
tica ocorrida durante esses ensaios de tração pode ser vista na figura 6b: a liga TRIP caracteri-
zou-se pela transformação da austenita retida e martensita HC em martensita TCC; a microestru-
tura final foi uma mistura de ferrita, martensita TCC e austenita retida, tendo a martensita HC
sumido completamente. Fato similar ocorreu para a liga TRIP/TWIP, mas aqui parte da marten-
sita HC manteve-se na estrutura após deformação. Já na liga TWIP a austenita manteve-se está-
vel após a deformação a frio, tendo sofrido apenas maclação. Já a figura 7 mostra as proprieda-
des mecânicas determinadas através de ensaios de tração para as ligas TRIP, TRIP/TWIP e
TWIP. Como se pode observar, a liga TRIP apresentou máxima resistência mecânica, com limite
de escoamento 440 MPa e limite de resistência de 920 MPa; esses valores caíram respectivamen-
te para 300 MPa/840 MPa para a liga TRIP/TWIP e 260 MPa/640 MPa para a liga TWIP. Por
13
sua vez, os resultados de ductilidade foram inversos: a liga TRIP apresentou alongamento uni-
forme de 38% e alongamento total de 45%; por sua vez, a liga TRIP/TWIP apresentou valores
de, respectivamente, 70% e 80%; a liga TWIP apresentou 80% e 95%.
LIGAS C Mn Si Al Constituintes
Antes da Depois da
Deformação Deformação
TRIP 0,02 15,8 3,0 2,9 Austenita CFC Austenita CFC
Ferrita CCC Ferrita CCC
Martensita HC Martensita TCC
TRIP/TWIP 0,04 20,1 2,8 2,9 Austenita CFC Austenita CFC
Martensita HC Martensita HC
Martensita TCC
TWIP 0,03 25,6 3,0 2,8 Austenita CFC Austenita CFC
Tabela I: Composição química das ligas TRIP, TRIP/TWIP e TWIP estudadas e constituição da
microestrutura antes de ensaio de tração efetuado sob temperatura ambiente e velocidade
de deformação igual a 10-4 s-1 [Frommeyer 2003].
a) b)
Figura 6: a) Curvas tensão versus deformação de aços TRIP, TRIP/TWIP e TWIP obtidas através
de ensaio de tração a 20°C e velocidade de deformação igual a 10-4 s-1; b) Frações vo-
lumétricas das fases coexistentes nas ligas TRIP, TRIP/TWIP e TWIP (ferrita, marten-
sita HC, martensita TCC e austenita) antes e após a deformação aplicada pelo ensaio de
tração [Frommeyer 2003].
A superioridade dos aços TWIP em termos do balanço entre resistência mecânica e ductili-
dade é incontestável, conforme mostram os dados que acabaram de ser apresentados. Sua posi-
ção no diagrama da figura 2 mostra que eles quebram o paradigma do antagonismo entre essas
duas características mecânicas, abrindo novas possibilidades para o desenvolvimento de aços
para a indústria automotiva. Seu nível de resistência mecânica não chega a ser excepcional, mas
seus valores de ductilidade são inéditos para ligas ferrosas, com valores típicos de materiais po-
liméricos [Schröder 2004]. Além disso, sua alta absorção de energia específica, da ordem de 0,5
J/mm³, sua alta tenacidade, mesmo sob altas taxas de deformação, e a ausência de temperatura de
transição dúctil-frágil, permitem prever muitas aplicações potenciais na indústria automobilísti-
ca, construção civil e criogenia. Um campo particularmente promissor são os componentes au-
tomotivos destinados à proteção contra colisões [Frommeyer 2003]. Foi constatado que a relação
de Hall-Petch é válida no caso dos aços TWIP, já que sua estrutura é integralmente austenítica.
Constatou-se também que sua ductilidade diminui com o refino microestrutural, já que microes-
14
truturas com pequeno tamanho de grão deram origem a baixos valores do coeficiente de encrua-
mento n [Scott 2006].
Figura 7: Diagrama de barras mostrando as propriedades mecânicas dos aços TRIP, TRIP/TWIP
e TWIP: a) limite de escoamento a 0,2% (LE) e de resistência (LR); b) alongamento
uniforme (un) e total (f). Parâmetros obtidos através de ensaio de tração efetuado a
20°C e velocidade de deformação de 0,0001 s-1 [Frommeyer 2003].
A aplicação prática bem sucedida dos aços TWIP requer a observância das seguintes dire-
trizes: o material deve permanecer plenamente austenítico sob todas as temperaturas de trabalho,
ou seja, entre –100°C e 300°C; não deve apresentar formação de carboneto sob condições nor-
mais de processo; e deve ser compatível com os processos convencionais de lingotamento contí-
nuo e laminação a quente. De acordo com os resultados obtidos nas experiências industriais da
Posco, o principal fator de custo para esse tipo de aço é seu teor extraordinariamente alto de Mn.
Isso ocorre não só em função do maior custo associado às grandes quantidades de adições de Mn
que se fazem necessárias, bem como em função do maior período de tempo necessário para o
refino do aço líquido, que a princípio deve ser feito usando-se fornos elétricos a arco, bem menos
produtivos que os conversores LD [Scott 2006,Kim 2007].
Também é necessário comprovar na prática que a alta ductilidade no ensaio de tração de-
monstrada pelos aços TWIP realmente se traduzirá em chapas com alta estampabilidade sob
condições práticas. Os primeiros resultados parecem ser promissores [Scott 2006,Kim 2007].
Também já se pode prever que o uso destes aços TRIP/TWIP requererá a alteração no projeto
dos componentes automotivos, uma vez que estes materiais apresentam menor módulo de rigidez
que os aços comuns em função de seu alto teor de elementos de liga [Schröder 2004].
Figura 8: Curvas tensão versus deformação de um aço de baixo C para dois diferentes tamanhos
de grão. É possível verificar que, para menor tamanho de grão, ocorreu aumento nos
limites de escoamento e resistência, bem como na razão elástica, mas os alongamentos
uniforme e total declinaram [Song 2004].
Tabela II: Comparação entre as propriedades de bobinas a quente para aplicação em longarinas
automotivas feitas com o novo aço Super HSLA (com grão ultra-fino) e com aço
convencional [Sakata 2003].
9. CONCLUSÕES
10. REFERÊNCIAS
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CURRÍCULO DO AUTOR
Editor Técnico das Revistas Plástico Industrial (desde 1998) e Corte e Conformação de Metais
(desde 2005), da Aranda Editora; participação no Corpo Editorial da Revista Tecnologia em Me-
talurgia e Materiais, da Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração (desde 2009)
Autor de mais de 190 trabalhos técnicos publicados no Brasil e exterior, nas áreas de aciaria,
fundição, laminação a quente, tratamentos térmicos, polímeros, modelamento matemático e inte-
ligência artificial
Prêmios da Associação Brasileira de Metalurgia e Materiais (ABM): COSIPA (1992, 1996), Lu-
iz Dumont Villares (1997 e 1999), Paulo Lobo Peçanha (1999), Usina Presidente Vargas (2000)
Outros Prêmios (ligados à área de patentes): Prêmio Talento Brasileiro, Fase Estadual (1994 e
1998); Prêmio Estadual FIESP de Conservação e Uso Racional de Energia (1998); Prêmio Go-
vernador do Estado (1999).
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