Formação Do Fisioterapeuta e Sua Intersecção Com A Saúde Mental Percepções Dessa Realidade
Formação Do Fisioterapeuta e Sua Intersecção Com A Saúde Mental Percepções Dessa Realidade
Formação Do Fisioterapeuta e Sua Intersecção Com A Saúde Mental Percepções Dessa Realidade
http://dx.doi.org/10.28998/2175-6600.2020v12n27p266-284
1 INTRODUÇÃO
O exercício da fisioterapia no Brasil data do início do século XX, com a fundação do Departamento
de Eletricidade Médica pelo Professor Raphael de Barros da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (MARQUES; SANCHES, 1994).
A profissão teve respaldo legal em 1969 por meio do Decreto - Lei nº 938, a partir deste foi
estabelecida, dentre várias normas, a necessidade de formação do fisioterapeuta por uma Instituição de
Ensino Superior (IES), excluindo qualquer condição de técnico em saúde, além da caracterização das
atividades privativas do fisioterapeuta (BRASIL, 1969).
No decorrer dos poucos anos de existência, a fisioterapia firmou-se como ciência da saúde,
presente em diversas áreas e ambientes profissionais, inclusive com atuação na educação e promoção da
saúde, descaracterizando-se da sua condição de profissão puramente reabilitadora, impregnada devido ao
contexto histórico de sua criação (SILVA, 2007). Na atualidade, o fisioterapeuta possui perfil tanto para
atuar em centros de referência em reabilitação, clínicas especializadas, hospitais, universidades; quanto em
serviços comunitários e generalistas realizando sua função de educação, promoção e reabilitação em saúde
nos mais diversos dispositivos da saúde (DIBAI FILHO; RODRIGUES, 2010).
As Diretrizes Curriculares Nacionais/Fisioterapia (DCN) apontam que a atuação do profissional
deve ser multiprofissional, interdisciplinar e transdisciplinar. Portanto, a formação acadêmica do
fisioterapeuta deve considerar essa indicação e proporcionar conhecimento teórico e prático para este fim.
Além disso, esta deve propiciar ao fisioterapeuta construir competências teórico-práticas para atuar em
todos os níveis de atenção à saúde, com uma visão global e ampla da pessoa e do coletivo (TEIXEIRA,
2005).
Aqui se utiliza a conceituação de competências relacionada à ética, para tanto, o profissional da
saúde deve saber fazer bem e, para isso, esse saber além de estar articulado à dimensão técnica e política
também, necessariamente, deve estar articulado à ética, sendo esta a mediadora entre as demais
dimensões (RIOS, 2006).
Destarte, o ensino e formação desses profissionais têm que acompanhar as mudanças conceituais
do cuidado e comportamentais da sociedade, tendo como perspectiva o indivíduo que sofre como um
todo, ou seja, não apenas considerando a sua doença física, mas partindo de uma olhar mais amplo,
compreendê-la em seu sentido subjetivo, uma vez que, de acordo com os princípios da psicomotricidade,
mente e corpo estão intimamente ligados por ações reflexas. Por conseguinte, o fisioterapeuta,
conhecedor dessas ciências, deve promover um olhar histórico, humano e social sobre as ações de saúde
e de prevenção.
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A assistência em saúde mental no Brasil e no mundo tem passado por significativas mudanças
decorrentes dos movimentos advindos das novas tecnologias de atenção. Estas consistem na
transformação de saberes e práticas em relação à loucura, na percepção da complexidade do objeto de
intervenção bem como na presença de um novo olhar sobre o sofrimento psíquico. Incorpora-se ao
tratamento o sentido de cuidado, envolvendo para isso a família, a comunidade e o próprio usuário
(RIBEIRO, 2014).
Ao considerar que os problemas de saúde mental estão cada vez mais presentes na vida cotidiana,
o Ministério da Saúde aponta que, no Brasil, 23 milhões de pessoas, ou seja, 12% da população necessitam
de algum atendimento em saúde mental (BRASIL, 2017). Embora os transtornos mentais sejam
responsáveis por mais de um terço do número total de incapacidades nas Américas, os investimentos
atuais estão muito abaixo do necessário para minimizar este problema de saúde pública (OPAS, 2018).
No contexto do conhecimento da funcionalidade humana, reconhecer as distintas e
complementares visões sobre o usuário em saúde mental pode fazer do fisioterapeuta e da fisioterapia
importantes componentes no conjunto de profissionais e ações de cuidado sobre os indivíduos que
apresentam, em suas trajetórias de vida, as suas funções interrompidas ou alteradas devido a transtornos
de ordem mental. Considerando que a atenção exercida por estes profissionais pode incluir mudanças em
aspectos físicos, cognitivos e sociais, é preciso que os profissionais e as universidades estejam com um
olhar definido para esta temática (DALTRO; GARCIA, 2016).
Para Oliveira e Dorneles (2005), a saúde mental não deve ser concebida como disciplina estanque,
mas integradora de diferentes abordagens. Não deve, ainda, confundir-se com um conjunto de técnicas
isoladas ou com tecnologias terapêuticas em um sentido estritamente médico.
Com o novo paradigma introduzido pela Reforma Psiquiátrica no campo da saúde mental, o da
Atenção Psicossocial, diferentes abordagens se apresentam nesse cenário – considerando que há
dificuldades teóricas em definir o que é bem-estar, estabelecer os limites sobre normalidade e patologia,
além das divergentes formas de compreender o sofrimento – seja ele físico ou mental. Aponta-se que essa
realidade dinâmica reflete na escolha de conhecimentos pertinentes à complexidade do cuidado em saúde
mental, gerando tantas concepções quantas forem as compreensões e práticas envolvidas nesse cuidado,
conformando-se num saber de caráter interdisciplinar.
Nesse contexto, na medida em que se deixa de ocupar com a doença e passa-se ocupar com o
sujeito, amplia-se as possibilidades materiais para esses sujeitos, o que implica na construção de práticas de
cuidado alicerçadas na conceituação do que é interdisciplinaridade:
3 METODOLOGIA
inclusive, que foram resguardados o sigilo e o anonimato dos participantes, e que para isso seus nomes
foram trocados por uma sequência de letra e números.
O instrumento utilizado para a produção dos dados foi a entrevista semiestruturada, guiada por
um roteiro contendo questionamentos específicos pertinentes a cada categoria entrevistada, os quais
buscavam conhecer as percepções dos participantes tanto sobre saúde mental, no que se refere à
preparação do aluno de fisioterapia para atuar nesse campo, quanto referente à participação do
fisioterapeuta nas rotinas de atendimento do serviço ao atender a demandas de pacientes de saúde mental
em um hospital geral de doenças infectocontagiosas no Estado de Alagoas e questões relacionadas à
formação em saúde mental de um curso de graduação de Fisioterapia do estado de Alagoas.
A entrevista foi gravada em forma de arquivo de áudio, mediante autorização prévia e,
posteriormente, transcrita, o que permitiu uma análise de dados mais fidedigna. Para preservar a identidade
dos participantes foi atribuído às falas um código composto pela letra inicial da categoria do entrevistado
(Aluno, Profissional e Docente), seguido do número referente à ordem em que ocorreram as entrevistas
em respeito aos participantes e às Resoluções 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional de Saúde, do
Ministério da Saúde.
As entrevistas iniciaram no mês de junho de 2018, sendo encerradas no mês de novembro do
mesmo ano. Foram realizadas pelo próprio pesquisador, assim como a gravação e transcrição das mesmas
em sua totalidade e seu conteúdo analisado à luz da Análise de Conteúdo na modalidade temático-
categorial para promover imersão nas mesmas (BARDIN, 2011). Por meio de incursões nos discursos, foi
possível apreender a realidade que se esboça na prática diária destes participantes. A partir da
decomposição dos textos em blocos organizados, com seus significados correspondentes e leitura
exaustiva dos mesmos, foi possível a identificação de temas/ categorias de análise e logo se seguiu a fase
de inferência dos resultados e interpretação dos mesmos, chegando assim à atribuição de significados aos
conteúdos analisados, indo além do material coletado, sendo adotados referenciais teóricos próprios do
ensino em saúde, bem como da especificidade da área da saúde mental.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Atende um público específico da doença infectocontagiosa, mas essas questões da saúde mental
são muito recorrentes, não é esse o motivo que traz o paciente pra cá, mas talvez seja esse o
motivo que faz ele não ter adesão ao tratamento, porque a gente não conseguiu entender como
é a dinâmica dele e como a gente poderia orientá-lo (P3).
multiprofissional, responsável por serviços que compõe à saúde pública. As falas abaixo ilustram como os
participantes da pesquisa percebem a necessidade de ampliação da práxis profissional e a importância da
saúde mental no contexto da formação:
A gente tem visto hoje que a saúde mental, os transtornos mentais, eles tem sido muito presente
e muito prevalente [...] A questão de saúde mental pode trazer muitas comorbidades e é uma
questão de saúde pública, então enquanto profissional da saúde eu preciso lidar também com a
saúde mental (A4).
importante porque quando vamos para os estágios, a gente se depara com pacientes que tem
problemas mentais, distúrbios mentais e como nós não tivemos nenhum preparo durante a
formação acadêmica, é nosso primeiro contato, a gente fica sem saber o que fazer (A1).
[...] fisioterapeutas em hospitais psiquiátricos, fisioterapeutas indo pros CAPS, fisioterapeutas indo
pro Melhor em Casa, fisioterapeutas do NASF que precisam ter alguns conhecimentos dessa
situação do ponto de vista da mente humana (D3).
O cuidado, portanto, tem sido desejado, por meio da capacitação de todos os envolvidos nesse
processo, porém, como relatado, os fisioterapeutas ainda precisam estreitar os conhecimentos à prática
em saúde mental. E nesse aspecto cabem às Universidades, que são responsáveis pela formação destes
profissionais, inserirem em seus currículos o estudo da saúde mental de forma crítico-reflexivo, associando-
se os conteúdos teóricos com a prática desenvolvida no território, como forma de colaborar e exercer
seu papel na sociedade.
Hoje eu posso dizer isso que não é algo de se direcionar apenas para um profissional e sim que
todo mundo entenda pra dentro da sua atuação, tratar da mesma maneira, ou da maneira mais
adequada. Afinal quando o paciente nos indaga, durante o nosso atendimento, sobre questões
pertinentes a algum fator relacionado à saúde mental, eu como profissional tenho o dever moral
de dar alguma resposta, ou pelo menos que eu possa entender aquele sofrimento e correlacioná-
lo com as alterações físico – funcionais que estou tratando (P 5).
O cuidado em saúde mental decorre de uma intrínseca relação entre os serviços de saúde, seus
profissionais, o paciente e sua família, considerando as particularidades de cada contexto cultural, social e
econômico. O domicílio é um espaço em que pessoas portadoras de doenças crônicas e outras afecções
podem viver com boa qualidade de vida e manter a estabilidade da doença (CARDOSO; GALERA, 2011),
desde que a família receba orientação e suporte dos serviços de saúde para isso.
As pessoas têm sofrido com alterações de cunho psiquiátrico e/ou psicológico decorrente das
mudanças e novas exigências da vida em sociedade. Necessitando de intervenções multiprofissionais para
a sua recuperação. A fala acima indica que a assistência em saúde mental tem abordado novas tecnologias
de cuidado, exigindo compromissos diferenciados dos profissionais que lidam cotidianamente com o
sofrimento mental. Essas tecnologias devem considerar a ampliação do cuidado para além dos serviços,
entendendo o sujeito dentro do seu contexto de vida.
A universidade tem um local de estágio, que é o hospital psiquiátrico, que a gente nunca foi
atuante, a gente nunca mostrou interesse, porque nunca trabalhou mesmo (D2).
Interessante pontuar que, mesmo com as transformações atuais sobre o cuidado e os serviços de
saúde mental, as falas acima, tanto de acadêmicos quanto de docentes, referem como desejo de campo
de prática um hospital psiquiátrico, indicando que falta não só na formação, mas no próprio corpo docente,
conhecimento mais aprofundado sobre a Política Nacional de Saúde Mental.
Dessa maneira, faz-se necessário repensar mais momentos e estratégias de aproximação dos
estudantes com a comunidade, pois a formação deve estar em consonância com as necessidades da
população, e para que isto ocorra, deve haver a aproximação entre ambos, sendo esses profissionais,
portanto, conhecedores dessas necessidades
Ao serem indagados sobre a inserção curricular e desenvolvimento da temática da saúde mental
na formação dos fisioterapeutas, evidencia-se as seguintes ponderações:
A matéria de introdução à psicologia que seria, digamos, uma tentativa de colocar a psicologia
aplicada ao atendimento profissional [...] só que foi assim, uma abordagem que não colaborou
com o que seria importante, falava sobre Freud, história da psicologia [...] quanto à abordagem
do profissional de saúde diante de um paciente que tem uma alteração psicológica, a gente não
tem essa base, não (A4).
Essa inserção é feita pontualmente, porque assim, a gente tem alguns eixos, então em cada eixo
tem algumas aulas pontuais abordadas sobre o tema, porque na verdade a gente não tem um
módulo transversal que trate da saúde mental. No estágio na comunidade, no estágio nos hospitais
é aí que ele vai ter a experiência e a prática com o preceptor do estágio, mais durante a sua
formação isso realmente é muito pontual (D5).
Eu vejo como uma limitação da nossa matriz, então a gente precisa preparar o nosso aluno pra
isso e como essa é uma área que tem ganhado muito espaço na fisioterapia, ela tem que fazer
parte da formação do nosso aluno [...] (D3).
Florêncio, (2015) afirma que a organização curricular precisa oportunizar, desde cedo, a inserção
do discente nos cenários de atuação profissional, considerando-se que o processo de trabalho em saúde
é coletivo e envolve: comunidade, profissionais de saúde, universidade e indivíduo. Desta forma torna-se
imprescindível a inserção do discente nos serviços de saúde durante os primeiros anos do curso,
construindo-se um saber crítico e reflexivo em suas ações profissionais.
Nas entrevistas com os docentes que compõe o NDE do curso de Fisioterapia da universidade
alguns reconhecem a deficiência na formação do estudante, no tocante à integralidade na área da saúde
mental, como se observa nas seguintes falas:
A gente não é, pelo menos aqui na instituição, preparado pra atuar de forma integral nessa área.
A gente não tem essa formação aqui. É uma deficiência que a gente tem (D2).
Eu sempre trabalhei a parte que me cabia, no caso, os distúrbios respiratórios e motores, o foco
nunca foi à visão psiquiátrica. Eu confesso nunca ter pensado nessa possibilidade de abordagem
(D4).
As falas dos participantes do estudo evidenciam que a abordagem do tema saúde mental no curso
de Graduação em Fisioterapia ainda é escassa, e isso reflete na dificuldade que os discentes e profissionais
da área possuem em argumentar sobre o assunto. Ao tentar fazê-lo, observa-se um conhecimento
superficial e sempre reforçando sentimentos preconceituosos trazidos pela sociedade, corroborando com
a exclusão desses pacientes, conforme podemos constatar nas falas a seguir:
A gente foi assistir a uma palestra no hospital psiquiátrico e aí tivemos que passar por entre os
pacientes e a sensação era de medo. Um profissional da saúde com medo de um paciente?A
fisioterapia precisa ter na matriz curricular a disciplina de saúde mental, e ela não deve ser
trabalhada como uma disciplina de base móvel não deve ser trabalhada de forma diferente [...] eu
acredito que seria de forma sempre correlacionando a saúde mental com o fazer do fisioterapeuta
(A10).
Eu não me sinto não seguro em atender a esses pacientes, por questão de algum tipo de violência
ou acidente de trabalho, então eu tenho muito receio em atender a estes pacientes aqui na
enfermaria [...] deles cometerem alguma agressão e gerar alguma contaminação com a gente (P8).
Eu mesma tenho dificuldade, às vezes eu tenho medo. Se o paciente tiver em surto, eu não sei o
que fazer e eu confesso que tenho medo, inclusive pela minha integridade física, [...] (P12).
Após a escuta, leitura e análise dos conteúdos, percebe-se que o estigma em relação ao paciente
com demanda em saúde mental é consequência da falta de conhecimento específico sobre o tema, além
de preconceito, baseado nas concepções culturais que ainda permeiam na sociedade atual. Além da
incompreensão gerada pela falta de conhecimentos sobre essa questão, consequentemente o acolhimento
a essa pessoa fica prejudicado (CANDIDO, 2012).
Santos et al. (2016), ao apresentarem estudo desenvolvido em universidades do estado da Bahia
com docentes responsáveis por disciplinas de saúde mental nos cursos de Graduação em Medicina e
Enfermagem, apontam o mesmo resultado, indicando que o estigma referente à pessoa com transtorno
mental é um dos entraves, principalmente porque ainda é atribuída as características de periculosidade e
agressividade a essas pessoas.
O fisioterapeuta deve estar consciente de seu papel humanizador no cuidado aos usuários
acometidos por qualquer que seja a doença, atentando para as suas reações psíquicas ante a enfermidade
(SILVA; SILVEIRA, 2011). Apesar de não receberem um preparo específico para lidar com pessoas em
sofrimento mental durante a graduação, o discente de fisioterapia e os profissionais muitas vezes, deparam-
se com a situação durante as aulas práticas e/ou estágios curriculares, assim como em suas atividades
laborais, que exigem conhecimento na área. Conforme vemos nos fragmentos seguintes:
Então, o primeiro contato que eu tive com paciente que tinha distúrbio mental, eu literalmente
não soube como agir, fiquei meio em pânico e até hoje na verdade eu tenho essa dificuldade. Eu
acredito que se tivesse algum curso, se tivesse sido preparada desde a faculdade isso iria me ajudar
muito. Infelizmente eu não tive (P1)
Eu não tenho segurança para abordar especificamente as questões de saúde mental. Na maioria
das vezes, eu me restringi de fato à questão da funcionalidade global, físico, funcional [...]. Apesar
de enxergar essa necessidade. Mas era algo que eu não me sentia a vontade para fazer, não me
sentia e não me sinto preparada pra fazer [...] (P4).
Isso me causou muitas dificuldades em lidar com esses pacientes, a gente já pegou, assim de cara,
tem que saber lidar, não tem outra opção, você não tem como dizer: não quero não atender,
vou atender outro. Tem que aprender a curto prazo, mesmo sem ter passado por um processo,
atrapalha muito [...] a gente não ter tido nenhuma matéria nesse sentido(A6).
É importante pelo menos que a gente implante no curso uma experiência, porque campo de
estágio a gente tem (D4).
Deste modo, a formação deve capacitá-lo para a resolução de problemas nos mais diferentes
níveis: prevenção, promoção e recuperação da saúde, visando o atendimento integral e o respeito aos
direitos do usuário (MACIEL, et al., 2005). Para isso, o profissional deve estar preparado para lidar com a
solução dos problemas sociais e para o mercado de trabalho (TEIXEIRA, 2004). Para que haja mudança
na formação profissional, entretanto, além da transformação dos currículos de seus cursos, é necessário
também que haja novas práticas de formação em saúde (FADEL; BALDANI, 2013).
Portanto, é fundamental repensar os currículos das instituições formadoras do fisioterapeuta, no
sentido de abranger o cuidado à saúde das pessoas em sua integralidade, considerando que o profissional
deve estar preparado para lidar com as mais diversas situações, subjetividades e singularidades das pessoas
que se apresentam nos espaços onde o fisioterapeuta pode estar inserido.
A maioria dos pacientes que eu peguei, eles já foram usuários de drogas, tinham quadros de
abstinência, [...] e aí foi bem difícil, porque não é a realidade que o acadêmico de fisioterapia, pelo
menos passa durante a graduação [...] nas práticas, nas vivencias... não é uma coisa que ele vê no
dia a dia, então é bastante chocante na verdade, um impacto( A10).
Relatou que tava como se fossem uns mosquitos mordendo ele [...] e [...] tipo ele não realizou a
fisioterapia nesse dia justamente por isso e [...] foi passado pra mim que poderia ser uma crise de
abstinência (A6).
E a gente como profissional que não vimos nada disso durante a graduação, fica muito difícil de
entender tal situação, até mesmo para ajudar ao outro, é difícil (D7).
A formação do fisioterapeuta deverá estar voltada ao cuidado integral do usuário, ou seja, não
somente do ponto de vista físico, mas também social ético e humano (SILVA; SILVEIRA, 2011). Além disso,
a integralidade abrange a interação entre os usuários e os profissionais de saúde para a execução de terapias
ajustadas na compreensão da pessoa e de suas necessidades (OLIVEIRA; ANDRADE; GOYA, 2012). Logo,
o fisioterapeuta, precisa ter o conhecimento e a compreensão acerca da humanização, integralidade e
particularidade do ser humano, como também qual é a sua função diante dos usuários dos serviços,
aceitando-os com suas reações psíquicas e atitudes ante a enfermidade (SILVA; SILVEIRA, 2011).
O fisioterapeuta deve então entender o indivíduo como um todo, pois, independentemente de
sua situação de saúde-doença, seu corpo fala. O fato dos transtornos psiquiátricos terem uma origem
psicológica não quer dizer que não se manifestem em sintomas físicos reais (DALTRO; GARCIA, 2016).
O entendimento das repercussões que os quadros de sofrimento mental produzem é importante,
tanto para a parte clínica quanto para a questão social na fisioterapia (GARCIA, 2008). O profissional que
se queixa da sua carência na formação em saúde mental, exerce muitas vezes a função de
professor/preceptor dos discentes que, também, apresentam a mesma deficiência em sua matriz curricular.
(SILVA, et al, 2015).
Com a análise das falas dos participantes da pesquisa, pode-se inferir que nas três categorias
participantes do estudo, o ponto de intersecção esteve voltado para o déficit na formação em saúde mental
na graduação, o que contribuiu para o distanciamento científico nesta área. E o que se percebe também é
que no curso de Fisioterapia estudado, essa defasagem na formação ainda ocorre. E em relação à inserção
do tema na matriz curricular, a maioria dos docentes que compõem o NDE do curso, ainda apresenta
soluções distanciadas e abstratas. Implicando com isso, uma continuidade deste processo formativo
incompleto, na perspectiva da integralidade.
Deste modo, as Universidades devem exercer seu papel formador e orientador quanto à
integralidade do cuidado e isso perpassa também pela formação acadêmica e profissional. O fisioterapeuta
precisa ter o conhecimento quanto ao seu papel no contexto do cuidado em saúde mental, visando
contribuir para a reinserção social das pessoas em sofrimento mental e para a reorientação dos modelos
de atenção em saúde.
5 CONCLUSÃO
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