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Súmula ll.

35
SÚMUIAN.35

Incide correção monetária sobre as prestações pagas, quando de sua restitui-


ção, em virtude da retirada ou exclusão do participante de plano de consórcio.

Referências:
Lei n. 5.768/1971, arts. 7D. e 8D..
Decreto n. 70.951/1972, arts. 31, I, e 39.

Precedentes:
REsp 5.383-RS (3 a T, 04.12.1990 - DJ 04.02.1991)
REsp 5.924-RS (4a T, 27.08.1991- DJ 30.09.1991)
REsp 6.419-PR (3 a T, 28.06.1991 - DJ 12.08.1991)
REsp 7.297-RS (3 a T, 21.06.1991-DJ 12.08.1991)
REsp 7.326-RS (4a T, 23.04.1991-DJ 13.05.1991)
REsp 8.125-RS C4a T, 04.06.1991-DJ 02.09.1991)
REsp 9.609-RS (3 a T, 21.06.1991-DJ 26.08.1991)

Segunda Seção, em 13.11.1991


DJ 21.11.1991, p. 16.774
RECURSO ESPECIAL N. 5.310-RS (1990/0009708-8)

Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo


Recorrente: Sinosserra - Administrações e Participações Ltda
Recorrido: Gennaro Cariello
Advogados: Drs. Sérgio Haas e outro, Izabel Rodriguez Marques e outros

EMENTA
Direito Civil. Consórcio de veículos. Desistência. Incidência da cor-
reção monetária. Recurso não provido.
I - Constituindo a correção monetária mera atualização do valor
da moeda corroída pelo processo inflacionário, incide a mesma sobre
eventuais devoluções de cotas de consórcio.
II - Admitida a correção monetária nas parcelas pagas pelo consor-
ciado, por imperativo lógico há de ser afastada qualquer disposição
contratual ou regulamentar que impeça sua aplicação, sob pena de se
comprometer a justa composição dos danos e o fiel adimplemento das
obrigações.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do re-
curso e, no mérito, por maioria, negar-lhe provimento, nos termos do relatório e
notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Athos Carneiro e Fontes
de Alencar, vencido o Sr. Ministro Barros Monteiro. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 23 de abril de 1991 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator

DJ 27.05.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: O recorrido ajuizou ação pretendendo
sua exclusão de grupo de consórcio para a aquisição de veículo, administrado pelo
recorrente.
Ar. sentença julgou procedente o pedido, determinando fossem devolvidas as
parcelas pagas, após o encerramento do consórcio, com a devida correção de seu
valor.
SUPERlOR TRlBUNAL DE JUSTIÇA

Apelou o réu, sem lograr êxito, havendo a egrégia Quinta Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao desprover o recurso, lançado a seguin-
te ementa:
"Consórcio - Exclusão de consorciado. Devolução das importâncias
pagas. Incidência da correção monetária. O mesmo critério estabelecido para
a purgação da mora, que se faz em moeda corrigida, aplica-se à devolução
das prestações do consorciado excluído, apesar do regulamento. Não viola o
ato jurídico perfeito o arredar-se cláusula iníqua de conteúdo eminentemente
leonino, matriz de enriquecimento ilícito; o mandar-se corrigir as prestações
pagas, na devolução, porquanto a correção monetária não é pena nem lucro,
mas capenga atualização do poder liberatório da moeda, em face de crônica
e ascendente inflação".
Alegando dissídio jurisprudencial com aresto do egrégio Tribunal de Justiça
do Paraná, interpôs o recorrente recurso especial, admitido na origem pela alínea c
do permissivo constitucional.
Contra-arrazoado o apelo, subiram os autos.
É o relatório.

VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): Recorre-se na espécie, de deci-
são que teria discrepado de solução dada por outro Tribunal a caso semelhante.
Cuida-se de contrato de consórcio para aquisição de automóvel que o autor,
ora recorrido, pretendeu resolver, retirando-se do grupo.
Sustenta a empresa administradora do consórcio, ora recorrente, que três ques-
tões no decisum configuram o dissenso interpretativo:
a) o acórdão recorrido assegurou ao consorciado, de maneira individual,
o direito de verificar as contas, aplicações, acompanhar à dinâmica do con-
sórcio. Já o aresto paradigma só admite esse direito perante a assembléia dos
condôminos;
b) o acórdão recorrido determina a devolução das parcelas com corre-
ção, ao considerar a cláusula regulamentar leonina e iníqua. O paradigma
convalida a devolução das parcelas sem correção;
c) o acórdão recorrido não considera violado o contrato com o afasta-
mento da cláusula exorbitante. O julgado dissidente determina a aplicação da
cláusula, sob pena de afrontar o avençado.
Quanto ao primeiro fundamento da impugnação recursal, não é admissível,
na estreita via do recurso especial, a análise de cláusulas contratuais e os reflexos
delas decorrentes (direitos e obrigações do consorciado), posto que a controvérsia
não se afigura como questão federal relevante, circunscrita que está ao âmbito da
esfera de interesses exclusivos das partes. Assim sendo, compete soberanamente às
instâncias ordinárias o desate do mérito, incidindo, na espécie, o Enunciado n. 5 da
jurisprudência sumulada desta Corte.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Ainda que assim não fosse, a meu ver se houve com acerto a v. decisão recor-
rida, merecendo destaque o seguinte trecho colhido da r. sentença, que bem de-
monstra o direito do consorciado de "situar-se diante do consórcio", verbis:
"... o valor desembolsado pelo A. a ele pertence. Embora se constitua de
uma quantia, que em função de um contrato, tem uma destinação específica,
nem por isto perde ela a característica de pertencer a um valor constituído
pelos recursos do A. Na verdade, é quase que uma poupança constituída para
um determinado fim: É em atenção a esta natureza peculiar dos valores
dispendidos pelo consorciado que o Estado, vislumbrando o interesse público
emergente deste tipo de contrato, que lida com a poupança pública, exerce
fiscalização e regulamentação diretas" (fls. 53/54).
Como consectário do direito de propriedade do consorciado, impõe-se reco-
nhecer-lhe, como o fez o douto voto condutor do acórdão, o direito às contas, a
conhecer a dinâmica do consórcio, a situar-se e verificar aplicações e documentos,
direito esse exercitável de per si ou em condomínio, nas assembléias. Vale regis-
trar, no entanto, pela sua objetividade e clareza, o seguinte trecho da r. sentença:
''A primeira questão que deve ser colocada em matéria de consórcio diz
com a natureza, origem e finalidade do patrimônio constituído pelas presta-
ções pagas pelos consorciados aderentes. O sistema de consórcios constitui-se,
na verdade, em um autofinanciamento feito pelos consorciados. Através dele,
um número X de consorciados, durante um número de meses igual ao seu
número, contribuem com uma importância que possibilite, a cada mês, a
aquisição de um ou mais bens objeto do contrato. Assim, ao final das contri-
buições, deverão ter sido entregues tantos veículos quantos forem o número de
participantes do consórcio.
O segundo aspecto que convém ser entendido é o de que o patrimônio
constituído pelo consórcio pertence com exclusividade aos consorciados. Na
aquisição dos bens, a administradora não dispende qualquer importância sua,
mas utiliza tão-somente os recursos que lhe são postos à disposição pelos
consorciados.
Postas estas questões prévias, a primeira afirmativa que é mister fazer-se
no caso concreto é a de que o valor desembolsado pelo A. a ele pertence.
Embora se constitua de uma quantia que em função de um contrato, tem uma
destinação específica, nem por isto perde ela a característica de pertencer a
um valor constituído pelos recursos do A. Na verdade, é quase que uma pou-
pança constituída para um determinado fim. É em atenção a esta natureza
peculiar dos valores dispendidos pelo consorciado que o Estado, vislumbrando
o interesse público emergente deste tipo de contrato, que lida com a poupança
pública, exerce fiscalização e regulamentação diretas.
Assim sendo, a retirada do consorciado, via de regra não é vedada pelo
contrato ou pelo regulamento é até admitido, o que se constitui em quebra da
rigidez do princípio do pacta sunt servanda. Se se admitir a devolução
sem o reajustamento das prestações já pagas, não há que fugir que a adminis-
tradora se forrará no valor da correção monetária impaga. É que as prestações

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

pagas pelo A. o foram com base no valor atualizado do bem e foram empre-
gadas para a aquisição do referido bem. Vale aqui repetir o raciocínio mate-
mático. Se eram dez os consorciados para comprar dez veículos em dez pres-
tações, teríamos ao final do grupo um total de cem prestações pagas equiva-
lentes a dez veículos. Se um consorciado pagar só cinco prestações e retirar-se
do grupo, o resultado a que se chega ao final do grupo é o de que foram pagas
noventa e cinco prestações, relativas a nove veículos, o que resulta num supe-
rávit de cinco prestações. Pretender a administradora a devolução destas cinco
prestações sem correção monetária, significa, matematicamente, em deferir-
se a ela o lucro da correção monetária.
Tendo o consórcio a natureza que tem, o contrato que, sem justa causa,
deferir à administradora, valor pertencente ao consorciado é, no particular,
leonino. Trouxe aos autos o A. precedente jurisprudencial que, em caso de
exclusão por mora deferiu ao consorciado o direito de receber as presta-
ções pagas devidamente atualizadas. Ora, se assim é, em caso de exclusão
por inadimplemento culposo do consorciado, com mais razão se há de
deferir esse reajustamento se não se cogita de culpa contratual do consor-
ciado.
Tampouco está em cogitação se houve ou não culpa contratual da R.,
desde que o contrato prevê a possibilidade da retirada, não há como fugir-se
ao direito do retirante em reembolsar-se dos valores que lhe pertencem. O
contrato subordina este pagamento apenas ao prazo de trinta dias após a
finalização do grupo que é a forma de evitar o prejuízo aos demais consor-
ciados. No caso concreto é o que a sentença deverá dispor."
Quanto aos demais fundamentos, a matéria tem precedente nesta Corte, con-
soante se constata do REsp n. 5.383, oriundo do mesmo Estado, Relator o eminente
Ministro Waldemar Zveiter, que estampa a seguinte ementa:
"Civil- Consórcio de automóvel- Desistência - Devolução das cotas
pagas após encerramento do plano - Correção monetária.
I - Pelo fundamento da alínea a, tocante à alegada ofensa ao Regula-
mento Geral dos Consórcios e à Portaria n. 330/1987, não cabe em sede do
especial examiná-la, por não serem eles Tratado ou Lei Federal.
II - A jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça está orienta-
da no sentido de estender a correção monetária a todos os débitos, seja de que
natureza forem, no que diz respeito àqueles resultantes de decisão judicial,
com a edição da Lei n. 6.899/1981. Essa matéria sobre ser possível ou não a
incidência da correção monetária não pode inibir o julgador de, adequando
sua interpretação à realidade social ou econômica, entregar a prestação a que
faz jus o jurisdicionado.
IH - Recurso não conhecido pelo fundamento da alínea c." (DJ de
04.02.1991).
Admitida a incidência da correção monetária nas parcelas pagas pelo consor-
ciado, por imperativo lógico há de ser afastada qualquer disposição contratual ou
SÚMULAS - PRECEDENTES

regulamentar que impeça sua aplicação, sob pena de se comprometer ajusta com-
posição dos danos e o fiel adimplemento das obrigações.
Em face do exposto, conheço do recurso, mercê da comprovação do dissídio
jurisprudencial, mas o desprovejo.

VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Senhor Presidente, tenho em pauta caso similar
a este, que é o Recurso Especial n. 4.273-RS. Penso que a única distinção fática entre
os dois feitos é com relação à forma de exclusão do consorciado. Na espécie relatada
pelo eminente Ministro Sálvio de Figueiredo ocorreu a desistência do interessado, ao
passo que naquela em que figuro como Relator se deu uma situação peculiar, que é o
atraso no pagamento das prestações e a conseqüente exclusão do consorciado.
Nesse voto, digo:
"Esta Turma, em reiteradas oportunidades, tem assentado que a corre-
ção monetária não é um plus, mas um minus que se evita. Seu objetivo é
recompor a identidade da moeda em face do processo de corrosão inflacioná-
ria por que de há muito vem padecendo a Nação.
Em condições normais, por aplicação do princípio que veda o enriqueci-
mento sem causa, a restituição das prestações pagas pelo participante do
consórcio dar-se-ia de maneira atualizada.
A espécie retrata, porém, u'a situação peculiar: o autor atrasou-se no
pagamento de sua obrigação pecuniária e viu, em conseqüência, seu nome
cancelado do grupo consorciado. Daí a aplicação pela ré - ora recorrente -
do art. 29 do Regulamento Geral para formação de grupos de consórcios para
a aquisição de veículos de preços ponderados, que assim se enuncia:
'O participante que desistir do consórcio ou for dele excluído,
inclusive seus herdeiros ou sucessores, receberá de volta as quantias já
pagas, sem juros ou correção monetária, dentro de 30 dias do encerra-
mento do grupo, deduzida a taxa de administração correspondente ao
período de sua permanência no grupo' (fl. 22).
O punctum saliens da presente controvérsia diz com a validade ou
não da supramencionada norma regulamentar, que nada mais é do que uma
cláusula penal:
'A cláusula penal ou pena convencional- stipulatio penae dos
romanos - é uma cláusula acessória, em que se impõe' sanção econômica,
em dinheiro ou outro bem pecuniariamente estimável, contra a parte
infringente de uma obrigação' (Caio Mário da Silva Pereira, 'Institui-
ções de Direito Civil', voI. lI, 9,aed., Forense, Rio de Janeiro, 1988, p. 100).
É exatamente o caso dos autos, em que o demandante, excluído do con-
sórcio por inadimplência, está sujeito à sanção cominada do art. 29 do Regu-
lamento Geral, vale dizer, receber em restituição os valores despendidos sem
juros e sem correção, após o encerramento de seu grupo.

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SUPERlOR TRlBUNAL DE JUSTIÇA

A cláusula ora em testilha apresenta-se como perfeitamente válida e efi-


caz. Não atenta, em primeiro lugar, contra a lei, a ordem pública e os bons
costumes. Tem sido lembrado nestes autos que a cláusula penal é suscetível de
abranger até mesmo a perda das parcelas pagas, item usual em promessas de
venda e compra de bem imóvel. Nesta pendência, o autor é penalizado com a
expunção dos juros e correção monetária.
Segundo escólio de Carvalho Santos, o quanrum da cláusula penal,
em regra, também fica ao arbítrio das partes, admitindo o Código, como
exceções, ser lícito ao juiz reduzir a importância estipulada, nestas hipóteses:
a) quando o valor da pena exceder ao da obrigação; b) quando o devedor
tiver cumprido parcialmente a obrigação; c) quando a cláusula acede a com-
promisso arbitral, caso em que o seu valor não pode exceder ao da terça parte
do pleito (vide arts. 920, 924 e 1.040 do Código Civil) ('Código Civil Brasilei-
ro Interpretado', vol. XI, p. 305, 12a ed.). Verifica-se na hipótese sub judice
que a penalidade vem adstrita ao limite imposto pela lei. Ainda conforme
magistério de Philadelpho Azevedo, os pontos fundamentais de nosso sis-
tema concernente à cláusula penal são três: 'máximo pelo principal; - redu-
ção proporcional à execução por partes; - repulsa às alegações de excesso
ou de falta de prejuízo' ('Da Cláusula Penal, in Revista de Jurisprudência
Brasileira', vol. XIX, fasc. 55, p. 19).
A questionada cláusula é, por conseguinte, inteiramente válida, inclusive
por acatamento ao princípio da autonomia da vontade. Estabelecendo um
vínculo jurídico entre os litigantes, diz-se que o contrato faz lei entre as partes,
não podendo ser ele afrontado mesmo em caso como no presente feito, em que
se cuida de contrato de adesão.
Transparece nítido o gravame que sofre o grupo consorciado com a de-
fecção de um de seus integrantes. A criação do "fundo de reserva e a eventual
possibilidade de transparência a terceiro não o põem indene de um prejuízo
concreto na obtenção de suas finalidades. De notar-se que ao autor era facul-
tado trespassar a sua quota, de que, todavia, não cuidou, preferindo reclamar
pura e simplesmente a devolução dos valores por ele pagos, atualizados e com
juros, apesar de inadimplente e conhecedor da pena cominada.
Penso que, a contemplar-se o suplicante com restituição da forma
pleiteada, estar-se-ia desfigurando o consórcio, transformando a administra-
dora em instituição financeira que não é, com inegáveis vantagens para o
consorciado faltoso, que passa aí a não correr qualquer risco, mesmo que se
torne inadimplente.
Não há que se falar, outrossim, em enriquecimento ilícito do grupo. Para
que tal se caracterize é de rigor que não haja culpa do empobrecido, o que não
se dá na espécie em tela, em que o autor se desligou do consórcio, consciente da
sua falta de capacitação econômica para prosseguir no empreendimento.
A propósito, colhem as duas objeções lançadas pelo parecer da lavra do
ilustre jurista Humberto Theodoro Júnior, que se acha encartado nos
autos, in verbis:
SÚMULAS - PRECEDENTES

'a) se se trata de punir uma infração contratual, não há que se falar


em enriquecimento sem causa dos contratantes prejudicados pelo com-
portamento ilícito daquele que praticou o inadimplemento. A pena.
contratual incide, in casu, independentemente do quantum efetivo do
dano segundo princípio tradicional do direito das obrigações;
b) a previsão de juros e correção monetária para o consorciado que
purga a mora pressupõe o saneamento de uma infração cometida e a
necessidade de recompor o patrimônio do credor (o grupo) de forma
cabal. Ora, o grupo que devolve as prestações do consorciado desistente
não praticou falta alguma e, ao contrário, foi vitima de falta grave co-
metida pelo contratante inadimplente. Não há como, portanto, entrever
simetria entre as duas situações, para sujeitar o Consórcio a uma pena
Ouros e correção monetária) que só se justifica pela conduta contratual
irregular do associado moroso' (fls. 195/196).
Aliás, observa ainda o ilustre parecerista que:
' ... se ditas prestações devolvidas foram aplicadas temporariamen-
te em operações financeiras e renderam alguma espécie de juros ou cor-
reção' o produto apurado terá ficado retido na conta de reserva e, na
medida da disponibilidade, reverterá em favor justamente dos consorci-
ados desistentes, como dispõe expressamente o art. 51 da Portaria n.
330/1987, do Ministério da Fazenda. É, pois, com esse rateio final, na
proporção das contribuições recolhidas, que se pode pensar em compen-
sar o uso das prestações dos sócios desistentes, e nunca por meio de
esdrúxula correção monetária, que nenhuma pertinência teria com um
negócio civil, sem índole especulativa e sem infração a indenizar por
parte do Grupo em face dos desistentes' (fls. 198/199).
Não há que se cogitar, assim, de cláusula leonina, o autor é quem deu
causa ao rompimento do vinculo contratual, sujeitando-se, conseqüentemen-
te, à pena prevista no Regulamento. Conquanto tal matéria atinente à corre-
ção das prestações, não seja pacífica nesta Casa (Cf REsp n. 5.383-RS, Relator
Ministro Waldemar Zveiter), penso que nada há na legislação pátria que
obstaculize a eficácia de referida disposição contratual, razão por que, conhe-
cendo do recurso, aplico a tese do acórdão colacionado como modelo, de
conformidade com o qual se afigura lícita a norma regulamentar do consór-
cio, ora em apreciação".
Adequados que são os mesmos fundamentos ao caso em tela - Recurso Espe-
cial n. 5.310-RS -, pois a desistência do consorciado lhe acarreta a exclusão do
grupo por responsabilidade sua, data venia do Sr. Ministro-Relator, conheço do
recurso e dou-lhe provimento.

VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Eminentes Colegas, como consta do voto do
eminente Relator, Ministro Sálvio de Figueiredo, o recorrido Gennaro Cariello ajuizou

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ação pretendendo sua exclusão de um grupo de consórcio para aquisição de veícu-


lo, administrado pela recorrente, Sinosserra - Administrações e Participações Ltda.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por sua Quinta Câmara Cível,
manteve a decisão de primeiro grau, que julgara procedente o pedido. Na ementa
do acórdão lê-se que:
"Não viola o ato jurídico perfeito o arredar-se cláusula iníqua de conteú-
do eminentemente leonino, matriz de enriquecimento ilícito; o mandar-se cor-
rigir as prestações pagas, na devolução; porquanto a correção monetária não
é pena nem lucro, mas capenga atualização do poder liberatório da moeda,
em face de crônica e ascendente inflação." (fl. 77).
O recurso especial foi interposto pela alínea c. O eminente Ministro Sálvio de
Figueiredo conheceu do apelo, mercê da comprovação do dissídio jurisprudencial,
mas negou-lhe provimento. Na parte final de seu voto lê-se o seguinte:
'~dmitida a incidência da correção monetária nas parcelas pagas pelo
consorciado, por imperativo lógico há de ser afastada qualquer disposição
contratual ou regulamentar que impeça sua aplicação, sob pena de se com-
prometer a justa composição dos danos e o fiel adimplemento das obriga-
ções."
E mencionou, outrossim, o aresto da egrégia Terceira Turma no Recurso Espe-
cial n. 5.383, também oriundo do Rio Grande do Sul, aresto de que foi Relator o
eminente Ministro Waldemar Zveiter e no qual se lê o seguinte, em sua ementa:
'~jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça está orientada
no sentido de estender a correção monetária a todos os débitos, seja de que
natureza forem, no que diz respeito àqueles resultantes de decisão judicial,
com a edição da Lei n. 6.899/1981. Essa matéria sobre ser possível ou não a
incidência da correção monetária não pode inibir o julgador de, adequando
sua interpretação à realidade social ou econômica, entregar a prestação a que
faz jus o jurisdicionado." .
O eminente Ministro Barros Monteiro, proferindo voto, reportou-se a caso
similar no Recurso Especial n. 4.273, de que S. Exa . é Relator, e lembrou o voto
proferido naquele recurso, com larga fundamentação, no sentido da aplicação do
regulamento que dispõe sobre a devolução das prestações sem correção monetária.
Menciona S. Exa . ao final do voto que:
"Não há que se cogitar, assim, de cláusula leonina. O autor é quem deu
causa ao rompimento do vínculo contratual, sujeitando-se, conseqüentemen-
te, à pena prevista no Regulamento. Conquanto tal matéria atinente à corre-
ção das prestações, não seja pacífica nesta Casa (CE REsp n. 5.383-RS, Relator
Ministro Waldemar Zveiter), penso que nada há na legislação pátria que
obstaculize a eficácia de referida disposição contratual, razão por que, conhe-
cendo do recurso, apiico a tese do acórdão colacionado como modelo, de
conformidade com o qual se afigura lícita a norma regulamentar do consór-
cio ora em apreciação."
SÚMULAS - PRECEDENTES

Rogando vênia, eminentes Colegas, ao eminente Ministro Barros Monteiro,


acompanho o voto do eminente Relator e o faço, inclusive, pelos fundamentos que
largamente expendi nesta sessão, como Relator do Recurso Especial n. 7.326-RS.
Aliás, vale sublinhar que o posicionamento da egrégia Terceira Turma foi reiterado
no Recurso Especial n. 7.229-RS, Relator o eminente Ministro Waldemar Zveiter, e
no qual figura como recorrente a mesma Sinosserra - Administrações e Participa-
ções Ltda.
Menciono apenas a ementa a ser lançada no Recurso Especial n. 7.326-RS,
supramencionado:
"Consórcio de Automóveis. Devolução de prestações já pagas pelo parti-
cipante desistente ou excluído. Correção monetária.
Ao participante de consórcio que dele se afasta é devida, quando do
encerramento do plano, a devolução das prestações pagas, com correção
monetária. A cláusula do contrato de adesão, que exclui a atualização da
quantia a ser restituída, é de ser considerada leonina e sem validade, impor-
tando em locupletamento da Administradora; não pode ser tida, outrossim,
como cláusula penal, pois esta exige estipulação inequívoca e deve ser pro-
porcional à gravesa do inadimplemento contratual. A correção monetária
não é um plus que se acrescenta ao crédito, mas um minus que se evita.
Juros moratórios cabíveis somente após a mora da Administradora, en-
cerrado o plano e não devolvidas corretamente as prestações.
Conhecimento do recurso da Administradora apenas pelo dissídio juris-
prudencial, negando-se-lhe provimento."
Pelos motivos assim expostos, eminentes Colegas, acompanho o voto do emi-
nente Relator, conhecendo do recurso, mas negando-lhe provimento.

VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Senhor Presidente, declaro-me em condições
de proferir meu voto, porque caso semelhante foi apreciado nesta sessão. Manifes-
to-me acompanhando o voto do Relator.

RECURSO ESPECIAL N. 5.383-RS (1990/0009873-4)

Relator: Ministro Waldemar Zveiter


Recorrente: Guaraplan - Administradora de Consórcios S/C Ltda
Recorrido: Getúlio Fuga
Advogados: Drs. Lilian Caruso dos Santos Rocha e outros, e Plínio Seibel
e outro

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERlOR TRlBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA
Civil- Consórcio de Automóvel- Desistência - Devolução das
cotas pagas após encerramento do plano - Correção monetária.
I - Pelo fundamento da alínea a, tocante à alegada ofensa ao Regu-
lamento Geral dos Consórcios e à Portaria n. 330/1987, não cabe em
sede do Especial examiná-la, por não serem eles Tratado ou Lei Federal.
II - A jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça está
orientada no sentido de estender a correção monetária a todos os débi-
tos, seja de que natureza forem, no que diz respeito àqueles resultantes
de decisão judicial, com a edição da Lei n. 6.899/1981. Essa matéria
sobre ser possível ou não a incidência da correção monetária não pode
inibir o julgador de, adequando sua interpretação à realidade social ou
econômica, entregar a prestação a que faz jus o jurisdicionado.
IH - Recurso não conhecido pelo fundamento da alínea c.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do
recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos,
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, com9 de lei.
Brasília (DF), 04 de dezembro de 1990 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Waldemar Zveiter, Relator

DJ 04.02.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Trata-se de ação ordinária de cobrança
proposta por Getúlio Fuga contra Guaraplan - Administradora de Consórcios S/C
Ltda, julgada parcialmente procedente para condenar a ré a restituir ao autor as
prestações pagas, "acrescidas de correção desde as datas dos pagamentos, com
base nos rendimentos da poupança nesse período, juros legais, desde a citação,
após deduzida a taxa de administração contratada (10%) e a cláusula penal de
10% ad valorem" (fls. 86/90).
Irresignada, apelou a ré (fls. 91/93). A Quinta Câmara Cível do colendo Tri-
bunal de Alçada do Rio Grande do Sul, examinando o feito, à unanimidade, deu
provimento, em parte, à apelação, para que a correção incidisse" de conformidade
com a variação do preço do bem objeto do contrato ... " (fls. 105/110).
Inconformada, ainda, interpôs a apelante recurso especial, com base no art.
105, UI, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência dos arts. 29 do
SÚMULAS - PRECEDENTES

Regulamento Geral de Consórcios; 51 da Portaria n. 330/1987, e via de conseqüência


os arts. 8íl, I, da Lei n. 5.768/1971; 39, do Decreto n. 70.951/1972, e 515 do Cpc.
Sustenta, também, divergência jurisprudencial (fls. 116/146).
O nobre Presidente daquela Corte o admitiu, apenas, pelo fundamento da
letra c (fls. 183/184).
Devidamente processado, subiram os autos a este egrégio Superior Tribunal
de Justiça.
É o relatório.

VOTO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): Sustenta, em síntese, o recorrente,
que o v. acórdão recorrido teria violado os arts. 29 do Regulamento Geral dos
Consórcios, e 51 da Portaria n. 330/1987, e, via de conseqüência, os arts. 8íl, I, da
Lei n. 5.768/1951 e 39 do Decreto n. 70.951/1972, que a regulamentou.
Contudo, improsperável a pretensão.
Tocante ao Regulamento e à Portaria suso mencionados, não cabe aqui em
sede de Especial examiná-los, por não serem eles Tratado ou Lei Federal, a teor do
disposto no art. 105, III, a, da Carta Magna vigente.
Ainda que tanto assim não fosse, incabível seria o recurso, com fulcro na letra
a, eis que tanto esses quanto os dispositivos do art. 8íl, I, da Lei n. 5.768/1951, e 39
do Decreto n. 70.951/1972, não foram sequer objeto de debate na decisão recorrida
e nem suprida a omissão através dos embargos declaratórios, o que impõe a inci-
dência do Enunciado das Súmulas ns. 282 e 356, do Pretório excelso. Por isso,
inadmissível o recurso pelo fundamento da letra a.
Nesse mesmo sentido, confira-se, pois: Ag n. 5.974-RS, DJ de 22.10.1990; Ag
n. 6.799-RS, decisão proferida em 20.11.1990, ambos de minha relatoria; REsp n.
5.313-RS, Relator o Senhor Ministro Nilson Naves, sessão do dia 23.10.1990 (DJ de
03.12.1990).
Quanto ao dissídio, resultou comprovado (art. 255, parágrafo único, do RISTJ).
Traz o recorrente à colação arestos que esposam entendimento, segundo o qual, ao
consorciado desistente ou inadimplente, a devolução das cotas pagas, sem juros e
correção, é lícita porque não é vedada em lei e nem fere os bons costumes.
Todavia, a matéria não é pacífica, mas inclino-me à corrente que admite que
a melhor solução que se ajusta à situação jurídica em tela, é a que devam ser as
parcelas pagas restituídas comjuros e corrigidas monetariamente.
Essa questão sobre ser possível ou não a incidência da correção monetária, em
tais circunstâncias e mesmo em outras nas quais se argumenta com violações
legislativas arcaicas, porque superadas pelos fatos sociais, não pode inibir o julgador
de adequando sua interpretação à realidade social ou econômica, entregar a prestação
jurisdicional a que faz jus o interessado, notadamente, fiel ao princípio de justiça, que
deve prevalecer sobre os conceitos do Direito, quando este se constitui anacrônico e
distanciado, na mora do legislador, aos fins sociais a que se o constituiu.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERlOR TRlBUNAL DE JUSTIÇA

No entender de Ives Gandra ela é sempre devida porque "a atualização do


valor da moeda ... ", é necessária "... em face de sua perda de substância corroída
pela inflação".
Tal como já afirmaram os eminentes Ministros Pádua Ribeiro e Carlos Velloso,
este hoje membro da Suprema Corte:
''A incidência da correção monetária vem atender ao clamor de justiça, mor-
mente nos dias de hoje, em que os índices mensais de inflação alcançam patamares
próximos aos 40%. Não a admitindo, estar-se-á consagrando o enriquecimento sem
causa, que a teoria geral do Direito não acolhe ... " (Incidente de Uniformização de
Jurisprudência na Apelação Cível n. 114.925-RJ, TFR).
Nesse mesmo sentido, consignou o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo, no
acórdão proferido, quando do julgamento do REsp n. 2.122-MS:
"Consoante já tive oportunidade de assinalar em outra ocasião, a exem-
plo do fenômeno ocorrido na Alemanha, em termos de correção do valor da
moeda, também no Brasil a jurisprudência, embora com marcante timidez,
vinha suprindo a inércia do legislador, sem embargo de textos legais isolados.
Paulatinamente a correção foi ganhando terreno nos Tribunais e fortalecendo-
se na doutrina, editando a excelsa Corte o Verbete n. 562 da sua Súmula
muito tempo após a orientação agasalhada na expressiva maioria dos demais
Pretórios do País, sendo de notar-se que a Lei n. 6.899/1981, ao ser editada,
representou, de certa forma, inegável retrocesso em face dos avanços já então
abrigados na doutrina e na jurisprudência (a propósito, REsps ns. 803 e 1.189,
DJ de 20.11.1989 e 11.12.1989), que aos poucos relegavam até mesmo a
distinção entre dívidas de valor e dívidas de dinheiro.
Na verdade à época da entrada em vigor da Lei n. 6.899/1981, não mais
se exigia, para a incidência da correção monetária, a prévia existência de lei
autorizativa. A nossa realidade econômica, com elevação progressiva da infla-
ção e conseqüente desvalorização do valor da moeda, foi impondo, pouco a
pouco, a adoção da correção monetária como imperativo indispensável àjusta
composição dos danos e ao fiel adimplemento das obrigações. 'Tomou-se neces-
sário, segundo Arnoldo Wald (RF 270/359), fazer com que a sensibilidade
dos magistrados e o seu senso de justiça permitissem que fossem superados a
tradição nominalista da qual estavam impregnados e o mito de estabilidade
monetária que ainda dominava a nossa sociedade', acrescentando esse mesmo
autor que o Supremo Tribunal Federal, ainda que um tanto tímido, passou a
construir uma revisão de conceitos, para remediar a lentidão do legislador,
aceitando por fim a correção monetária como única forma possível de manter
ajustiça comutativa e permitir o convívio relativamente harmonioso da econo-
mia nacional com a inflação, assegurando ao credor o recebimento integral do
débito e ao lesado a indenização cabal, proclamado, em seu famoso 'Diagnóstico',
de 1975, a imprescindibilidade da correção monetária" (DJ de 11.06.1990).
Bem de ver, o acórdão recorrido decidiu, corretamente, a controvérsia, com
respaldo na doutrina e na jurisprudência firmada nos Tribunais.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Ainda que tanto não tivesse ocorrido, incabível seria, também, o recurso, eis
que, a questão sobre a incidência ou não da correção monetária implicaria em
interpretação de cláusula contratual, o que encontra óbice no disposto na Súmula
n. 05, deste egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Embora configurado o dissídio, não conheço do recurso porque nele não se
controverte matéria versante a direito federal.

RECURSO ESPECIALN. 5.924-RS (1990/11183-8)

Relator: Ministro Barros Monteiro


Recorrente: Consorbrás - Consórcio Nacional de Veículos Ltda
Recorrido: Aparício de Matos Esmeraldino
Advogados: Drs. Antonio Celso Bastian Weber e Raul Ferri e outros

EMENTA
Consórcio. Exclusão de consorciado. Juros e correção monetária.
Ambas as Turmas da Segunda Seção do STJ assentaram que a devolução
das parcelas pagas é de ser acrescida da correção monetária.
Os juros moratórios são cabíveis após o trigésimo dia contado do
encerramento do grupo, ou seja, desde quando caracterizada a mora da
administradora.
Recurso especial conhecido pelo dissídio pretoriano e provido
parcialmente.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do re-
curso e dar-lhe parcial provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas
constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas,
como de lei.
Brasília (DF), 27 de agosto de 1991 (data do julgamento).
Ministro Fontes de Alencar, Presidente
Ministro Barros Monteiro, Relator

DJ 30.09.1991

389
RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005 1
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Aparício de Matos Esmeraldino ajuizou esta
ação contra Consorbrás - Consórcio Nacional de Veículos Ltda, objetivando a
rescisão do contrato de adesão, de auto financiamento, para aquisição de veículo
Ford-Escort/GL através do grupo consorciaI, além da devolução das parcelas pa-
gas, acrescidas de juros e correção monetária.
Acolhendo o pedido, o MM. Juiz de Direito condenou a ré a restituir as presta-
ções pagas, corrigidas monetariamente, com juros de 6% ao ano, a partir da cita-
ção.
A Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
negou provimento ao apelo da demandada, em acórdão que registra a seguinte
ementa:
"Consórcio para aquisição de veículos. Ao consorciado excluído por
inadimplemento, assegura-se a restituição do que houver pago em moeda corrigida,
e não pelo valor histórico." (FI. 130)
Daí o recurso especial manifestado pela vencida com fulcro nas alíneas a e c
do permissivo constitucional, alegando negativa de vigência dos arts. 51 e 52 da
Portaria n. 330/1987 do Ministro de Estado da Fazenda, bem como divergência
jurisprudencial com arestos emanados dos Tribunais de Justiça do Rio de Janeiro,
Goiás e Paraná.
Admitido o apelo extremo na origem, subiram os autos com as razões e con-
tra-razões.
É o relatório.

VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Descabido afigura-se o apelo excep-
cional pela alínea a do art. 105, III, da Lei Maior. Consoante tem decidido este
Tribunal, portaria ministerial não pode ser tida como tratado ou Lei Federal (REsp
n. 5.383-RJ, Relator Ministro Waldemar Zveiter; REsp n. 7.227-RS, Relator Ministro
Athos Carneiro; REsp n. 5.313-RS, Relator Ministro Nilson Naves).
Penso, de outro lado, que o dissenso pretoriano se põe à mostra de maneira
manifesta no caso em tela diante dos decisórios paradigmas carreados pela recor-
rente, onde se assentou que a restituição das parcelas pagas pelo consorciado ex-
cluído se fará sem juros, nem correção monetária.
Nesse particular, tenho mantido isolada posição, que não mais se justifica a
esta altura em virtude dos pronunciamentos reiterados de ambas as Turmas das
Segunda Seção desta Corte, todos no sentido de que são cabíveis os juros e a corre-
ção monetária (cf. REsps ns. 5.383-RS, Relator Ministro Waldemar Zveiter; 5.381-
RS, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira; 6.419-PR, Relator Ministro
Eduardo Ribeiro; 7.297-RS, Relaltor Ministro Nilson Naves; 7.227-RS, Relator Ministro
Athos Carneiro; 7.326-RJ, Relator Ministro Athos Carneiro).
SÚMULAS - PRECEDENTES

Conhecendo, portanto, do recurso, julgo a causa, aplicando o direito à


espécie (art. 257 do RISTJ). Reformulando a diretriz com ressalva de meu ponto
de vista pessoal, em face do supra-exposto, considero que as parcelas em ques-
tão devem ser devolvidas, corrigidas monetariamente a partir dos respectivos
desembolsos, tal como assentaram as instâncias ordinárias, e acrescidas dos
juros moratórios, estes, porém, contados do 300. dia após o encerramento do
grupo, uma vez que só a partir de então passa a caracterizar-se a mora da
administradora (REsps ns. 4.273-RS e 7.326-RS, ambos da relatoria do Ministro
Athos Carneiro).
Tocante ao percentual relativo à taxa de administração, trata-se de matéria
preclusa, não objeto de apreciação pelo acórdão recorrido.
Ante o exposto, conheço do recurso pela alínea c do permissivo constitucional
e lhe dou provimento parcial, a fim de que os juros de mora sejam computados tão-
só a partir do trigésimo dia após o encerramento do grupo.
É o meu voto.

RECURSO ESPECIAL N. 6.419-PR (1990/0012276-7)

Relator: Ministro Eduardo Ribeiro


Recorrentes: Silvestre Karacheenski e outros
Recorrido: Consórcio Nacional Garibaldi Administradora de Consórcio
S/C Ltda
Advogados: Drs. Elias Mattar Assad e outros, e SidneyMarcos Miranda e outro

EMENTA
Consórcio - Desistência ou exclusão - Correção monetária.
A devolução das importâncias pagas, a ser efetuada na época con-
tratualmente estabelecida, far-se-á com correção monetária.
Hipótese em que não se tem como configurada cláusula penal.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso especial e lhe dar provimento, em parte, na forma do relatório e notas
taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado. Custas, como de lei.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Brasília (DF), 28 dejunho de 1991 (data do julgamento).


Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Eduardo Ribeiro, Relator

DJ 12.08.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Silvestre Karacheenski e outros, qualificados
como consorciados desistentes, ajuizaram ação contra Consórcio Nacional Garibaldi
S/C Ltda, com quem teriam firmado contrato de adesão para aquisição de veículo.
Pretende-se a devolução das importâncias pagas, com correção monetária.
A ação foi julgada improcedente, condenando-se os autores em custas e hono-
rários. Entendeu o decisum que a devolução seria tão-só dos valores pagos, "sob
pena de se premiar a inadimplência".
A Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, à unanimidade,
negou provimento ao recurso, estando a decisão assim ementada:
'~ção declaratória - Consórcio de automóveis - Desistência do consor-
ciado - Devolução das quantias pagas mas sem juros e correção monetária
- Cláusula penal.
Este Colegiado já proclamou, em mais de uma oportunidade, que 'havendo
desistência ou exclusão do participante de consórcio de automóveis, ser-Ihe-
ão devolvidas as quantias já pagas, semjuros e correção monetária, nos trinta
dias subseqüentes ao encerramento do grupo respectivo', e que, 'a cláusula
contratual assim disposta não é leonina, mas penal, por isso que não se trata
somente de disposição entre as partes, mas de regra geral destinada a regular
o sistema de consórcio em todo o País, com o objetivo maior de proteger o
interesse coletivo dos grupos de consorciados' (Acórdãos ns. 6.401 e 6.403, de
05 de setembro de 1989).
Portanto, em sendo essa a espécie dos autos, só há que se confirmar o
decisório monocrático que deu pela improcedência da ação declaratória, ajui-
zada pelos apelantes.
Recurso improvido."
Foi interposto recurso especial, com base nos arts. 105, III, a e c, da Constitui-
ção Federal, c.c. o RISTJ, art. 13, Iv, a e c, sustentando-se negativa de vigência da
Lei n. 5.768/1971 e do Decreto n. 70.951/1972, além de dissídio jurisprudencial.
Admitido o recurso, subiram os autos a este Superior Tribunal de Justiça.
É o relatório.

VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: A questão em debate - correção monetária
das importâncias a serem devolvidas ao consorciado excluído ou desistente - já foi
SÚMULAS - PRECEDENTES

objeto de exame por esta Corte em diversas oportunidades, firmando-se ajurispru-


dência no sentido de que devida aquela atualização. Assim, entre outros, o acórdão
no REsp n. 5.383, Relator Ministro Waldemar Zveiter, e no REsp n. 7.326, Relator o
Ministro Athos Carneiro.
Em verdade, a cláusula a excluir correção monetária, com os índices de
inflação que ainda persistem, corresponde a fazer ínfima a importância a ser
devolvida, reduzindo-a a perto de nada, em certas circunstâncias. A avença que
isso estabelece merece ser qualificada de leonina, inaceitável em contrato de
adesão.
Alega-se tratar-se de cláusula penal. Embora não se exija, para semelhante
pacto, o uso de expressões sacramentais, indispensável que resulte certo ter-se pre-
tendido assim convencionar. Ora, não se coaduna com a natureza da cláusula fazê-
la tanto maior quanto mais amplamente adimplida a obrigação.
Não me parece, entretanto, que a correção deva ser concedida nos termos
pretendidos na inicial, ou seja, em percentual sobre o valor do bem que seria adqui-
rido. Este não o foi parcialmente, de maneira a justificar que importância corres-
pondente seja tida em conta. A correção far-se-á na forma comum. Não poderá
ultrapassar, entretanto, a que resultaria do acolhimento do pedido.
Conheço do recurso, posto demonstrada a divergência e dou-lhe provi-
mento parcial para determinar a incidência da correção monetária nos termos
acima.

RECURSO ESPECIAL N. 7.297-RS (1991/004910)

Relator: Ministro Nilson Naves


Recorrente: Sinosserra - Administrações e Participações Ltda
Recorrido: Luiz Alberto Silveira Guasque
Advogados: Drs. Sérgio Haas e outros, e José Henrique de E Valle e Silva
e outros

EMENTA
Consórcio de automóveis. Desistência. Restituição da quantia paga, após
encerrado o plano, com correção monetária. 1. Cabimento da restituição, de
acordo com os índices oficiais de atualização da moeda. 2. Ineficácia da
cláusula contratual que prevê a não-incidência dessa correção. 3. Exame dos
princípios que informam os contratos. 4. Precedentes do STJ, quanto ao alcance
da correção monetária. 5. Recurso especial conhecido pelo dissídio mas
improvido.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso especial, pela alínea c, mas lhe negar provimento, na forma do relatório e
notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 21 dejunho de 1991 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente e Relator

DJ 12.08.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Confirmando a sentença de procedência parcial
da ação proposta por consorciado contra a administradora do consórcio ("posto
isto, julgo procedente em parte a presente ação para o fim de determinar que, findo
o prazo contratualmente avençado, a Ré devolva as importâncias percebidas devi-
damente atualizadas pelos índices da correção monetária, deduzida a taxa de
administração."), o acórdão, da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do
Rio Grande do Sul, reportou-se à AC n. 190023556, com essa ementa:
"Consórcio de veículos - Devolução corrigida das prestações pagas pelo
desistente.
a) Correntes jurisprudenciais sobre o matéria;
b) exegese da Portaria n. 330/1987 do Ministério da Fazenda: interpreta-
ção sistemática da portaria em tela com a legislação vigorante sobre o tema,
que leva à resultante da devolução corrigida das prestações pagas;
c) estruturação administrativa e operacional dos planos para aquisição
de bens em consórcio que neutraliza a possibilidade de prejuízos para o grupo
de consorciados, com essa devolução corrigida;
d) descaracterização da cláusula que prevê a devolução sem correção do
que foi pago, como pena convencional, por não revestir as características
estruturais da stipulatio poenae;
e) redutibilidade da cláusula penal afastada pela cominação da perda
integral do que se pagou - que é o que equivale a devolver sem correção em
moeda inflacionada - afrontando dispositivo de ordem pública, in casu o
art. 924 do Código Civil;
f) o controle jurisdicional das cláusulas gerais de negócio. Substituição
do 'déficit de vontade contratual pelo controle judicial de verificação do con-
teúdo justo dessas cláusulas';
g) inaplicabilidade das denominadas cláusulas vexatórias ou de intensa
prejudicialidade para o aderente em contratos de adesão;
SÚMULAS - PRECEDENTES

h) perda de tudo o que se pagou que mais se afina com o pacto comissório,
vedado pelo CCB, do que com a cláusula penal;
i) o prejuízo como pressuposto da reparação nas esferas contratual e
extracontratual; inexistência desse pressuposto na hipótese da devolução corrigida
das prestações e tampouco com a simples retirada do consorciado do plano;
j) outras sanções, como a perda da taxa de inscrição e dos 10% corres-
pondentes à taxa de administração, além do diferimento no tempo da devolu-
ção para 30 dias após o encerramento do plano, que implicam suficiente
penalização para se desestimular a inadimplência e as desistências nos planos
de consórcio, sem se recorrer à injurídica pretensão de se apropriar do que foi
pago pelo desistente.
1) o índice de correção para as prestações a serem devolvidas será o
oficial incidente e não o de variação do preço do bem objeto do consórcio;
m) princípios gerais do direito e dispositivos legais que também condu-
zem ao acolhimento da pretensão do autor."
2. Veio então o recurso especial, pela alínea c, apresentando dissídio, entre
outros, com o julgado proferido naAC n. 944/1989, do Tribunal de Justiça do Paraná
(Quarta Câmara Cível), com essa ementa:
"Consórcio de automóveis - Desistência ou exclusão do consorciado -
Devolução das quantias pagas, sem juros e correção monetária, nos trinta
dias subseqüentes ao encerramento do grupo respectivo - Havendo desistên-
cia ou exclusão do participante de consórcio de automóveis, ser-lhe-ão devol-
vidas as quantias já pagas, sem juros e correção monetária, nos trinta dias
subseqüentes ao encerramento do grupo respectivo. A cláusula contratual as-
sim disposta não é leonina, mas penal, por isso que não se trata somente de
disposição entre as partes, mas de regra geral destinada a regular o sistema
de consórcio em todo o País, com o objetivo maior de proteger o interesse
coletivo dos grupos de consorciados."
3. Foi o recurso admitido por este despacho do Presidente João Loureiro Ferreira:
"Trata-se de recurso especial, fundado no art. 105, inciso III, letra c, da
Constituição Federal, interposto de decisão proferida em ação ordinária que
visa à devolução, com correção monetária, do valor pago à empresa de con-
sórcio de veículos.
O recorrente alega que a decisão impugnada divergiu de outros tribu-
nais do País, na parte em que entendeu assegurado, ao consorciado desistente,
o direito à correção monetária das prestações a serem devolvidas.
O tema ora discutido lavra dissídio, tendo o recorrente trazido decisões
que adotam posição oposta à da Câmara, entendendo ser lícita a cláusula que
prevê a devolução das quantias pagas ao consorciado desistente, sem atuali-
zação monetária.
Diante do exposto, admito o recurso."
É o relatório.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Comprovado o dissídio, conheço do re-
curso especial.
2. Entre as duas teses, fico com a tese exposta no acórdão recorrido, que se
reportou a AC n. 190023556, em aresto de que fora Relator o Juiz Jauro Duarte
Gehlen, nesses termos:
'~ssim expostas as soluções jurisprudenciais para a situação, de imedia-
to afasto aquela que entende indevida a correção monetária.
Com efeito, se a Portaria n. 330/1987 ordenou a aplicação dos sal-
dos das contas vinculadas diariamente em operações do mercado aberto
(art. 28), autorizando a devolução do saldo remanescente do fundo de
reserva proporcionalmente aos pagamentos feitos pelos desistentes (arts.
29 e 31), está, ipso facto, determinando seja a devolução efetuada com
correção.
Sem eficácia, portanto, a cláusula contratual que prevê a não-incidên-
cia dessa correção, também por colidir com a determinação daquele órgão
governamental (Ministério da Fazenda), que detém a competência reguladora
sobre os consórcios.
Não bastasse esse argumento, outros existem, dentro do plano doutriná-
rio dos contratos, que autorizam a devolução corrigida das prestações pagas
pelos desistentes, tendo em vista: 1. a peculiar situação da nossa economia e
2. os procedimentos operacionais adotados nos consórcios.
No concernente à economia basta a constatação do índice inflacionário
de 1.764,86% acumulado em 1989, e que só nos meses de janeiro e fevereiro
do fluente chegou ao alarmante patamar de 169,72% - ensejando a adoção
de mais um plano de estabilização econômica, agora denominado de 'Plano
Collor' ou 'Plano Brasil Novo'. Basta isso, repito, para se ver a summa inju-
ria que se consubstanciaria na devolução das prestações pagas sem correção
monetária, ao fim do respectivo plano do consórcio. Figure-se a hipótese em
que se tenha pago 18 das 36 mensalidades quando da retirada do consorciado.
Quem já havia pago o correspondente a, exemplificativamente, 'meio auto-
móvel' objeto do plano, receberia um ano e seis meses depois o que carreou ao
grupo no seu valor nominal apenas, com o que nem um pneu de bicicleta
poderia adquirir. No caso concreto citado na Apelação Cível n. 589029511,
que aqui tomo a trazer por ser mais eloqüente do que qualquer outro argu-
mento, o consorciado que pagara o correspondente a 45% do valor do auto-
móvel Fiat Uno, teria o direito à devolução de NCz$ 39,00 à época do aresto,
junho do ano pretérito, na qual sequer se encerrara o plano!
Daí a expressiva sentença supra transcrita: pagar em época de juros ban-
cários de 10.000% a.a. sem a atualização da moeda é não pagar, pelo que de
imediato se afasta a pretensão da validade da cláusula que afasta a correção
monetária, por consagrar a iniqüidade da devolução do nada.
SÚMULAS - PRECEDENTES

E no plano da sistemática administrativa e operacional dos consórcios,


constata-se pelo menos três circunstâncias que, ainda se tomadas isoladamente,
levariam à rejeição da pretendida não-incidência da correção monetária.
Primeiramente, o espaço deixado pelo consorciado desistente ou eliminado
do grupo é, regra geral, imediatamente ocupado por um novo aderente ao
plano. E este de imediato tem que desembolsar o total correspondente a todas
as prestações já vencidas, ao valor atualizado. Isto é, não recebe o novo par-
ticipante nenhum 'presente' representado pelas prestações já pagas pelo
consorciado que se afastou. Ora, se paga esse novo integrante,
exemplificativamente, o correspondente a 20% do valor atualizado do bem
objeto do consórcio, igualando-se aos demais consorciados, aquilo que o
desistente pagou sobeja, no cômputo geral dos aportes de dinheiro para o
plano.
Em segundo lugar, e como ressaltado na Apelação Cível n. 589055680
da colenda Quinta Câmara Cível, do TJRGS, 'como o valor real da prestação
continuou sendo o mesmo - pois todas foram atualizadas de acordo com o
preço de tabela do veículo - no final restará o quantum da contribuição do
desistente, que se manteve sempre corrigido, e que não será destinado à aqui-
sição de um bem porque houve a desistência. Logo, esse valor deve ser entregue
a ele, pois se tivesse continuado no grupo e pago as demais prestações venci-
das a partir da sua retirada, no último mês deveria existir capital suficiente
para a expedição de carta de crédito correspondente à sua participação. Como
faltaram as últimas prestações, em face da sua retirada, o que sobejar está
atualizado na proporção das contribuições feitas. Se não for pago esse valor
ao desistente, engordará a receita da administradora, pois não se tem notícia
de que os aportes dos desistentes tenham sido redistribuídos aos consorciados
remanescentes' (sic, julgado mencionado, Relator o eminente Desembargador
Ruy Rosado de Aguiar Jr.).
E em terceiro, porque ainda que não se plantasse a situação susoesclarecida,
há expressa determinação para que se aplique em investimentos nas operações
do mercado aberto tudo o que restar de saldo dos aportes de recursos para o
plano. Ora, o retirante não é obrigado - e nem seria justo isso - a deixar o
que pagou em benefício de outros que não pagaram mas ainda permanecem
no plano, ou, o que é pior, para a administradora. E se todos pagaram as suas
quotas, terão de sobrar, ao final, as prestações recolhidas pelo desistente.
Como tais saldos obrigatoriamente tem de ser investidos, nos termos da Porta-
ria n. 330/1987, art. 29, a presunção natural é a de que pelo menos a correção
monetária oficial é devida quando da devolução das prestações pagas pelo
retirante.
Aliás, argumenta mutatis mudantis nesse passo o eminente colega
Talai Selistre, com lógica irrebatível: se a administradora do consórcio é
obrigada a investir os saldos do plano, diariamente, como reza o dispositivo
citado, até poderá ter com isso lucros extras, na medida em que, obrigada a
devolver o minimum minimorum que é a correção da moeda pelo índice

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

oficial a tal fim aplicável (OTN, BTN, IPC etc .... ), lhe restará ainda disponível
o que exceder a esse índice mínimo de correção, consabido que vários são os
investimentos que remuneram bem acima dele. Agora, se não investiu, ou se
investiu mal, imputet sibi os ônus daí decorrentes, vez que o consorciado -
que não tem ingerência nessas aplicações -, tem direito a receber, insisto,
pelo menos esse mínimo dos mínimos, que é o que pagou corrigido pelo índi-
ce oficial incidente.
Nem se argumente que os pagamentos feitos pelo desistente integrarão o
fundo de reserva, para fazer face a eventuais acidentes de percurso do plano
em andamento. Se houver, exemplificativamente, uma brusca majoração do
bem dele objeto, ou outro imprevisto qualquer, são os remanescentes do plano
que serão chamados (e aí até mesmo aqueles que já foram contemplados e,
em especialíssimas situações, mesmo os que já pagaram todas as suas quotas,
embora não encerrado o plano, como se colhe na jurisprudência majoritária
sobre o tema) para cobrir o que estiver a descoberto. Não se pode confiscar
pura e simplesmente as prestações do desistente, para usá-las em benefício de
quem quer que seja, consorciados ou administradora.
Se no plano fático se impõe a incidência da correção monetária, autori-
zada por qualquer uma das situações supra-examinadas - máxime à soma
das três - também no jurídico, especificamente nos princípios que informam
os contratos no plano do direito obrigacional, a resultante deve ser a mesma.
Em princípio, e com a devida vênia, ouso divergir dos ven. acórdãos que
conceituam o dispositivo contratual que prevê a devolução das prestações sem
a correção monetária, como sendo cláusula penal, pelo que não poderia o
Judiciário deixar de aplicá-la, presente o princípio pacía sunt servanda,
nem mesmo reduzi-la a níveis menos onerosos.
Além de não se enquadrar tal disposição contratual dentro do sentido
estrito que se confere à stipulatio poenae, tenho que na hipótese concreta
esbarraria ela no disposto no art. 924 do Código Civil. Veja-se que ao contrá-
rio do que comumente ocorre com a pena convencional, aqui não se estipulou
uma importância certa ou pelo menos um percentual determinado, que
corporificaria dita penalização.
Se entendida na sua concretude, a cláusula contratual em questão seria
esta: ao consorciado que se afastar ou for afastado do plano, impõe-se a pena
de perda do que pagou até a retirada. Aos níveis da inflação da nossa moeda,
isso é o que representa restituir sem correção ao cabo de dois ou três anos, ou
até mais, pois como é o normal em tais casos de desistência, raramente se
desiste próximo do término do plano.
Assim, perder-se tudo quanto se pagou, e não apenas a metade, o terço, o
vigésimo, o décimo, equivaleria a negar vigência ao já mencionado art. 924 do
CCB. Pois se colocado o problema no campo do inadimplemento contratual-
que só este ensejaria a incidência de cláusula penal- há que se ver que tendo
o consorciado pago até o momento do afastamento as suas prestações, até ali
foi adimplente.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Leve-se o argumento adiante, exemplificando-se com o pagamento de 30


prestações em um total de 36, ou de 45 em um total de 50, vigindo altíssima
taxa inflacionária nesses cinco ou seis últimos meses dos exemplos, para se
ver a extrema injustiça na aplicação pura e simples dessa pretendida
penalização.
Em situação jurídica consimili, decidiu o egrégio Tribunal de Justiça
de São Paulo, em sede de embargos infringentes apreciados pelas suas Câma-
ras Cíveis Reunidas, que 'ainda se entendia a expressão glosada como pacto
contratual destinado a obrigar o juiz, ainda assim são acolhíveis os embar-
gos. O art. 924 do CC tem o vigor de preceito de ordem pública. Observa
Manuel Arauz Castexem 'LaLeyde OrdenPublica' (E. Aires, 1945, p. 84),
que a eqüidade e a justiça social têm levado o direito moderno a restringir
cada vez mais a liberdade contratual. Neste capítulo, da cláusula penal, o
controle da vontade individual é aceito sem tergiversações, jamais se negou
validade ao limite do art. 920 do Código Civil, que coincide com o valor da
obrigação principal: outrossim, o teto mais apertado ainda, de 10% para os
contratos feneratícios, tem sido aplicado constantemente, desde que se pro-
mulgou a Lei da Usura. Razão não há, pois, para se acoroçoarem as estipula-
ções com que as partes pretendam fugir ao abrandamento que o Judiciário
pode e deve ditar, para coibir os excessos com que as cláusulas penais amea-
cem agredir o equilíbrio social, ensejando injusto enriquecimento de uma par-
te, ainda que à custa do inadimplente.' (In ~urisprudência das Obrigações',
Darcy Arruda Miranda Jr., vol. l, p. 56, ed. RT, 1976).
No caso concreto apreciado pelo aresto susotranscrito, tratava-se de com-
pra e venda, avençada ali a perda das prestações pagas se inadimplente o
adquirente. Com maior razão impõe-se a solução dele na espécie dos autos,
quando presente a espécie do contrato sub oculis, que é para a maioria a de
adesão, ou de formação de 'sociedade civil de caráter transitório' (Antônio
Chaves, 'Tratado de Direito Civil', ed. 84, voI. lI, p. 1.386), constatando-se
qualquer que seja a sua nomenclatura, a existência neles das denominadas
'condições gerais do negócio', constantes ou de texto em separado ou de 'regu-
lamento' impresso no verso do texto contratual.
E quando se está frente a essas 'condições gerais' previamente impostas
pela parte mais forte, já não mais se autoriza a solução do eventual conflito
com remissão à regra do pacta sunt servanda, que consubstancia o pri-
mado absoluto da vontade no contrato. Mesmo porque, como adverte Dieter
Schwab, eminente catedrático de direito civil na Universidade de Ratísbona
(em conferência oportunamente traduzida pelo Professor Peter Walter
Ashton e publicada in Ajuris n. 41), 'passou -se a ter a compreensão de que
em tais circunstâncias de submissão contratual às condições gerais dos
negócios, o elemento da liberdade contratual, da volição individual de assim
pactuar, está em cheque e apresenta certos defeitos, quando contraposto ao
paradigma do contrato individual livremente negociado em todos os seus
aspectos e detalhes' (op. cit., p. 10).

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Daí por que, prossegue o conferencista, justificar-se um severo controle


de conteúdo dessas cláusulas gerais, ainda que previamente conhecidas do
aderente, por 'existirem dúvidas a respeito da teoria da sujeição contratual
espontânea, passando-se nos Tribunais alemães a substituir o déficit de vonta-
de contratual por um controle judicial de verificação do conteúdo justo' (id.
p. 11). Daí a conclusão da conferência: 'O controle das condições gerais
de negócios Judiciário continua sendo, sob qualquer hipótese, importan-
te e irrenunciável' p. 20).
se está a sustentar, abro
parêntesis, valendo-me do magistério de que após assen-
tar que 'a infração é necessária e seu estudo pertence ao mundo fenomenal'
Ccom isso colocando na normalidade da vida jurídica o inadimplemento obri-
gacional - e não como exceção à fenomenologia contratual), adverte que
'em nenhum outro campo depara o juiz melhor oportunidade de exercitar o
poder discricionário, que a lei lhe concede, a cada passo. Aliás, ao predomí-
nio da casuística há de corresponder o do arbítrio. C... ) Mas o arbítrio de que
aqui falamos, não é o que se relaciona com a chamada escola do direito livre.
Nós estamos falando do arbítrio inevitável, isto é, daquele que o juiz usa ao
aplicar a norma flexível, praticando a chamada eqüidade individualizadora,
e não daquele arbítrio que pode importar desprezo pelos critérios objetivos'
('Da Inexecução das Obrigações e suas Conseqüências', auto cit., ed. Saraiva,
1955, p. 15, n. 3). É o que aqui se faz.
Assim, ainda que de cláusula penal se tratasse aquela condição geral do
contrato de consórcio, insisto que esbarraria ela com o já mencionado artigo
do Código Civil, por prever a perda das prestações - que é isso o que equivale
devolver em economia agudamente inflacionada sem correção monetária -
sem levar em conta a redutibilidade eqüitativa com o adimplemento parcial.
Tivesse se estipulado que a desistência implicaria na multa correspon-
dente à retenção de 10% do que se pagou - ajustando-se por analogia o
contrato de consórcio aos feneratícios - e ainda se poderia tolerar a
penalização. É essa totalidade da perda, essa apropriação praticamente inte-
gral da prestação do contratante que bateu em retirada por não poder fazer
frente ao contínuo aumento do preço dos bens objeto do consórcio, até atingir
nível incompatível com a sua situação financeira Ce é isso o que ocorre o mais
das vezes, todos o sabem), é essa perda absoluta por parte do aderente que
não se pode tolerar, repito.
Ressalte-se também, com Cunha Gonçalves, que 'a cláusula penal é
usada, sobretudo, nos contratos cuja pontual execução é de absoluta necessi-
dade, tais os de fornecimento de matérias-primas ou outras mercadorias ur-
gentes, sendo quase formulária nos contratos de usura e outros que tenham
prazo improrrogável' ('Tratado de Direito Civil', voI. IV tomo lI, p. 560, n.
531, Ed. Max Limonad, SP). Aqui, concessa venia maxima, não se vê
essa urgência capaz de autorizar, eticamente inclusive, a inserção da
poenae em contratos de consórcios. E a razão já ficou esclarecida
SÚMULAS - PRECEDENTES

supra: ficam as prestações pagas retidas, para que não se descapitalize o


grupo, até o encerramento do plano, acrescendo-se que a vaga assim aberta
acaba sendo ocupada por novo consorciado que se obriga a atualizar todo o
débito remanescente.
Essa apropriação integral dos valores pagos (continuo repisando que
devolver sem redunda nisso concretamente) mais se afina com o
pacto comissório do que com a pena convencional, embora de garantia algu-
ma se trate.
A possibilidade de ficar o credor com o bem - no caso a integralidade
do que se pagou - esbarra na mesma censura que à lex comissoria faz o
autor do nosso Código Civil: 'A proibição do pacto comissório funda-se em um
motivo de ordem ética. O Direito protege o fraco contra o forte, impedindo
que a pressão da necessidade leve o devedor a convencionar o abandono do
bem ao credor... O imperador Constantino, impressionado pelas manobras
capciosas dos pactos comissórios, cuja aspereza crescia assustadoramente,
decretou-lhes a nulidade, e as legislações modernas aceitaram essa condena-
ção' (Clóvis 'Código Civil'. Comentado, voI. III, p. 358, ed.
1942).
Afastada a qualificação legal de pena convencional, ou ainda, que, ab
U:I.1ilelnt,mdtllm admitida essa seja a naUlreza jurídica da cláusula
U U U....lHA,

em epígrafe, mas inviável a sua aplicação por estabelecer a irredutibilidade


quando o oposto se prevê no estatuto civil pátrio, cabe indagar-se se viável o
enquadramento dela pelo menos na alta concepção do direito à indenização
decorrente do inadimplemento contratual.
Penso que ainda aqui não teria respaldo jurídico a pretensão da adminis-
tradora do consórcio à apropriação das mensalidades pagas - sempre frisan-
do que isso é o que na prática ocorrerá com a devolução delas sem correção.
É princípio geral que a inexistência do prejuízo é óbice à pretensão de
uma reparação, aliás sem objeto, pois isso 'redundaria em mera punição do
devedor, com invasão do Direito Penal (. .. ). Ausente o dano 'a indenização
imposta em benefício de quem nada sofreu, ou além do que tenha sofrido,
importará enriquecimento injustificado, e para quem pagasse seria uma pena
e não uma indenização' op. p. 197).
Como argumenta o jurista citado na sua preciosa monografia, 'suposto o
dano, quer no terreno contratual, quer no extracontratual, o que se procura é
ressarcir o credor, não na medida do grau de culpa do violador do direito,
mas na medida do prejuízo verificado' (p. 129), visto que 'o Direito Civil não
visa, em geral, fins preventivos ou repressivos, mas o restabelecimento do
estado anterior' Traité des Obligations en Général, voI. IV n.
385).
Na espécie, porém, como supra se demonstrou, a apropriação das pres-
tações, se como pena convencional não pode ser acolhida, muito menos o será
à conta de indenização pelo simples fato do descumprimento contratual, se

RSSTJ, a. 1, (2); 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

prejuízo concreto não ocorreu para o grupo e a administradora - nem isso na


verdade nos autos se alegou ou demonstrou. Aliás, se entendida corno
poenae, e torno a trazer a hipótese ad ar'gtul1le1I1t'iln.dtlm
"'~A~'UA, ainda assim a inexistência desse prejuízo obstaria a incidência da-
quela condição geral. Corno preleciona Orlando Gomes, embora a cláusu-
la penal se apresente na sua função genuína corno meio de se delimitar, de
a responsabilidade pela inexecução culposa do contrato, está ela
'em estreita relação com o ressarcimento dos prejuízos resultantes do
inadimplemento culposo de obrigação contratual' ('Obrigações, Ed. Forense,
1981, p. 183). Ora, seria um truísmo desnecessário afirmar-se que só se ressarce
se há prejuízo, pois os termos indenização e ressarcimento contêm embutida a
idéia do dano precedente, nas suas próprias estruturas semânticas. Aí vem à
baila, exemplificativamente, o mandato para que alguém interrompa prescrição
em andamento e não o faz. Mas embora completada esta o devedor cumpre a
obrigação.
Evidente que aí não se cogitaria de aplicar cláusula penal prevista no
contrato de mandato, por ausência do prejuízo. É, insisto, a situação dos
autos, onde a vaga aberta é preenchida por um novo aderente ao plano, que
paga atualizadamente tudo o que já vencera, recolhendo uma outra taxa de
inscrição para a administradora, mais 10% contratuais. É só deixar-se o di-
nheiro já pago pelo desistente, para que não se descapitalize o grupo nesse
interregno, fazendo saldo de caixa até o encerramento dele, para que ne-
nhum, mas absolutamente nenhum prejuízo em termos concretos, se apresente
para justificar eventual ressarcimento, seja a que título for.
Finalmente, além desses fundamentos, outro há, ligado aos princípios
informadores da interpretação do contrato no direito pátrio, que levariam ao
entendimento aqui esposado, por igual. Excelentemente foi o terna abordado
na Apelação Cível n. 589055680, da Quinta Câmara Cível do egrégio Tribu-
nal de Justiça rio-grandense, supramencionado: 'A existência, na ordemjurí-
dica, de conceitos indeterminados, de conceitos normativos, de cláusulas dis-
cricionárias e de cláusulas gerais, de que são exemplos os princípios gerais do
direito' do art. 4Jl da Lei de Introdução ao Código Civil; o 'bem comum' do art.
5Jl da mesma lei; o 'bem público' do art. 21, III, do Código Civil; o 'perigo
iminente' do art. 160, II, do Código Civil; o 'ato necessário' do art. 160, pará-
grafo único; o justo motivo' do art. 932 do Código Civil; a 'circunstância do
caso' do art. 1.080 dõ Código Civil, a regra do art. 154 da Constituição Fede-
ral (obs. - refere-se à Emenda Constitucional de 1969; na atual, o terna do
abuso do poder é abordado no art. 173, § 4Jl e art. 14, § 9Jl e § 10), permitindo
a aplicação do 'direito eqüitativo', o jus aequum, para descobrir o direito
do caso concreto (Engisch, 'Introdução ao Pensamento Jurídico', p. 206).
Assim também na interpretação dos contratos de adesão e das cláusulas ge-
rais de negócio, deve o juiz pautar a sua decisão segundo as exigências da
eqüidade, para fixar o justo tempo entre os interesses e as pretensões das
partes contratantes, preenchendo o vazio dos conceitos indeterminados e
fazendo a valoração dos conceitos normativos de modo a atender à exigência
SÚMULAS - PRECEDENTES

maior de justiça' (Relaor o eminente Desembargador Ruy Rosado de Aguiar


Jr.).
Esse também o entendimento de Caio Mário: 'O capitalismo desenvolto,
com a industrialização crescente e a criação das grandes empresas, conduziu
à defasagem entre os contratantes. E o negócio que realizam sofre a influência
dessa diferenciação. Conseqüentemente, o contrato, com as vestes de um ato
emanado de vontades livres e iguais, contém muitas vezes uma
desproporcionalidade de prestações ou de efeitos, em tal grau, que ofende
aquele ideal de justiça que é a ultima ratio da própria ordem jurídica. c. .. )
Ante tais influências, medrou no direito moderno a convicção de que o Estado
tem de intervir na vida do contrato, seja mediante a aplicação de leis de
ordem pública, que estabelecem restrições ao princípio da autonomia da von-
tade em benefício do interesse coletivo, seja com a adoção de uma intervenção
judicial na economia do contrato, instituindo a contenção dos seus efeitos,
alterando-os ou mesmo liberando o contratante lesado, por tal arte que logre
evitar que por via dele se consume atentado contra a justiça. Todo esse movi-
mento pode enquadrar-se na epígrafe do dirigismo contratual ou intervenção
do Estado na vida do contrato, que conflita com as noções tradicionais da
autonomia da vontade e defende aquela das partes que se revela contratual-
mente inferior contra os abusos dos poderosos, que uma farisaica compreen-
são da norma jurídica antes cobria de toda proteção' ('Instituições de Direito
Civil', voI. III, p. 20, Ed. Forense, 1963).
E mais adiante, abordando especificamente a hipótese dos contratos de
adesão, e tendo em vista as particularidades que o distinguem daqueles outros
onde a vontade se faz presente na elaboração das cláusulas respectivas, o ilustre
civilista adverte que, em se tratando do contrato de adesão, 'não se chega, na
análise do seu mecanismo jurídico, ao ponto de inquirir da vontade real; basta,
como requisito mínimo, que acentue a possibilidade de conhecer as cláusulas
gerais e preestabelecidas e sua adesão a elas para que se tenha formado o
contrato obrigatório. Por isso mesmo, excluem-se de coercitibilidade, as cha-
madas cláusulas vexatórias, isto é, as demasiado onerosas ou inconvenientes.'
(id. ib., p. 52).
Aqui se caracterizou, com base no precedente das Câmaras Cíveis Reuni-
das do egrégio Tribunal de São Paulo, como de ordem pública a disposição do
art. 924 do CCB; e todos os demais citados no excerto do voto do eminente
Desembargador Ruy Rosado de Aguiar Jr. também são aqui expressamente
invocados como substrato legal da interpretação dada à cláusula sub oculis.
Tampouco me parece convincente o argumento de justificar-se aquela
cláusula geral do negócio, como fator de desestímulo à inadimplência dos
consorciados.
Veja-se que em tais hipóteses o desistente acaba perdendo a taxa de
inscrição, bem como a taxa de administração de 10%. E também acaba per-
dendo a disponibilidade imediata das prestações pagas, que só lhe serão
devolvidas 30 dias após o encerramento do plano, o que demanda por vezes

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


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mais de dois anos. Isso é mais do que suficiente, até mesmo sob o aspecto
punitivo - que, insisto, não se insere dentro da órbita do direito privado -
para desestimular as desistências que se fazem ao mero sabor das conveniên-
cias da aplicação do dinheiro, máxime porque, também já se enfatizou isso
aqui, regra geral o desistente se afasta do plano por não ter condições finan-
ceiras para acompanhar os reajustes constantes dos preços dos bens, ante a
defasagem notória entre aqueles e a política salarial.
O último ponto que se apresenta a exame é o do fator de correção do que
foi pago.
Como se viu no início do voto, pelo menos três existentes: a correção
pelos índices oficiais a tal efeito estabelecidos pelo Governo Federal; a corre-
ção feita através do rateio do saldo de caixa aplicado às operações do mercado
aberto; e a correção de acordo com o reajuste das prestações na conformidade
do valor do bem objeto do consórcio.
Penso, como já expus acima, que o primeiro deles é o mais equânime.
Primeiro, porque a lei que instituiu a correção monetária o contempla. Depois,
porque a variação de acordo com o preço do bem objetivado pelo consórcio é
sempre mais elevada do que os índices inflacionários. Se o consorciado desis-
tiu do plano, não mais terá direito a obter como referencial da correção do
que pagou, os reajustes constantes das prestações, pois não mais o integra. A
correção deverá ser, pois, de acordo com os índices oficiais, que refletem o da
inflação da moeda. O que se objetiva com ações desse jaez, é obter-se a devo-
lução do que se pagou, razão pela qual, repito, não mais se há de cogitar do
valor do bem que se queria adquirir com o ingresso no plano. Pode-se argu-
mentar que, hipoteticamente, os reajustes das prestações sejam inferiores ao
da inflação. Em princípio, isso seria uma negação da evidência. As propagan-
das dos consórcios, ao contrário, estatisticamente procuram demonstrar que
sempre os valores dos bens são superiores aos níveis inflacionários da moeda.
Isto é, são os preços desses bens que acabam aumentando a própria inflação,
que lhes segue, numa realimentação constante desse fenômeno patológico da
economia. Porém, mesmo que essa circunstância ocorra, isto é, o aumento
dos bens abaixo da inflação, ainda assim tenha-se presente que as aplicações
se farão no mercado financeiro aberto. E evidentemente, não pagará o merca-
do pelo dinheiro menos do que o índice inflacionário existente. Corrigir-se
pelo valor do bem objeto do consórcio poderá, aí sim, representar estímulo ao
abandono do plano, pois embora os inconvenientes acima citados, ainda se
teria uma correção de ordinário superior aos índices oficiais da correção
inflacionária.
Destarte, e sob todos os ângulos que se possa enfocar o tema, chega-se
sempre à resultante aqui preconizada, qual a da correção monetária sobre as
prestações a serem devolvidas quando do encerramento do plano.
Nesses termos, dou provimento ao apelo para, reformando a r. sentença
recorrida, julgar procedente em parte a ação, determinando a devolução
corrigida das prestações pagas pelo autor, após os 30 dias que se seguirem à

"o o o '; <" o" o'o,'j


I'"
SÚMULAS - PRECEDENTES

data do encerramento do plano de consórcio respectivo. O fato de se diferir o


direito à restituição no tempo, para após o término do plano, não apresenta
decaimento substancial do pedido, pelo que resta sem efeitos na sucumbência.
Por isso, limito-me a inverter os ônus a tal título fixados na r. sentença apelada."
3. Pelo que sei, julgamos, nesta Turma, dois casos envolvendo consórcios,
assim ementados:
- "Consórcio de automóveis. Desistência, por incapacidade financeira.
Restituição da quantia paga, após encerrado o plano, com correção monetá-
ria. 1. Pela alínea a do permissivo, aplicação das Súmulas ns. 282 e 356-STE
A expressão 'tratado ou Lei Federal' (CF, art. 105, m, a) não compreende
portaria ministerial. 2. Pela alínea c, dissídio não comprovado, por se tratar,
o padrão, de caso ocorrido antes do encerramento do plano. 3. Recurso espe-
cial não conhecido." (REsp n. 5.313, em 23.10.1990, Sr. Ministro Nilson Na-
ves).
- "Civil - Consórcio de automóvel - Desistência - devolução das
cotas pagas após encerramento do plano - Correção monetária.
I - Pelo fundamento da alínea a, tocante à alegada ofensa ao Regula-
mento Geral dos Consórcios e à Portaria n. 330/1987, não cabe em sede do
especial examiná-la, por não serem eles tratado ou Lei Federal.
II - Ajurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça está orienta-
da no sentido de estender a correção monetária a todos os débitos, seja de que
natureza forem, no que diz respeito àqueles resultantes de decisão judicial,
com a edição da Lei n. 6.899/1981. Essa matéria sobre ser possível ou não a
incidência da correção monetária não pode inibir o julgador de, adequando
sua interpretação à realidade social ou econômica, entregar a prestação a que
faz jus o jurisdicionado.
IH - Recurso não conhecido pelo fundamento da alínea C." (REsp n. 5.383,
em 04.12.1990, Sr. Ministro Waldemar Zveiter).
4. No REsp n. 5.313, porque não conhecido, a questão federal deixou de ser
analisada, mas, no REsp n. 5.383, embora por igual não conhecido, o Sr. Ministro
Waldemar Zveiter, ao votar, externou o seu modo de ver a questão, nessas palavras:
"Todavia, a matéria não é pacífica, mas inclino-me à corrente que admite
que a melhor solução que se ajustd à situação jurídica em tela, é a que devam
ser as parcelas pagas restituídas comjuros e corrigidas monetariamente.
Essa questão sobre ser possível ou não a incidência da correção monetá-
ria, em tais circunstâncias e mesmo em outras nas quais se argumenta com
violações legislativas arcaicas, porque superadas pelos fatos sociais, não pode
inibir o julgador de adequando sua interpretação à realidade social ou econô-
mica, entregar a prestação jurisdicional a que faz jus o interessado, notada-
mente, fiel ao princípio de justiça, que deve prevalecer sobre os conceitos do
direito, quando este se constitui anacrônico e distanciado, na mora do legisla-
dor, aos fins sociais a que se o constituiu."

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Na mesma linha de seu pensamento, S. Exa . declinou a posição dos Srs.


Ministros Pádua Ribeiro e Carlos Velloso, em acórdão proferido no extinto Tribunal
Federal de Recursos, na AC n. 114.925, bem como do Sr. Ministro Sálvio de
Figueiredo, neste Tribunal Superior, no REsp n. 2.122.
Sobre a incidência, de modo geral, da correção monetária, deixei exposto o
meu pensamento, ainda no Tribunal Federal de Recursos, quando do julgamento
dos EIAC n. 110.446, em 14.12.1988. Por se tratar de posição semelhante à lembra-
da pelo Sr. Ministro Waldemar Zveiter, no REsp n. 5.383, àquele julgamento me
reporto, neste momento.
5. Quanto à cláusula penal, cuido irrepreensível o acórdão daAC n. 190023556,
na excelente exposição de seu Relator, cujos fundamentos adoto, bem como a sua
conclusão.
6. Conheço do recurso especial pelo dissídio, como disse, mas lhe nego provi-
mento.

VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: A questão em debate - correção monetária
das importâncias a serem devolvidas ao consorciado excluído ou desistente - já foi
objeto de exame por esta Corte em diversas oportunidades, firmando-se ajurispru-
dência no sentido de que devida aquela atualização. Assim, entre outros, o acórdão
no REsp n. 5.383, Relator Ministro Waldemar Zveiter, e no REsp n. 7.326, Relator o
Ministro Athos Carneiro.
Em verdade, a cláusula a excluir correção monetária, com os índices de infla-
ção que ainda persistem, corresponde a fazer ínfima a importância de ser devolvida,
reduzindo-a a perto de nada, em certas circunstâncias. A avença que isso estabelece
merece ser qualificada de leonina, inaceitável em contrato de adesão.
Alega-se tratar-se de cláusula penal. Embora não se exija, para semelhante
pacto, o uso de expressões sacramentais, indispensável que resulte certo ter-se
pretendido assim convencionar. Ora, não se coaduna com a natureza da cláusula
fazê-la tanto maior quanto mais amplamente adimplida a obrigação.
Acompanho o Relator.

RECURSO ESPECIAL N. 7.326-RS (1991/0000585-1)

Relator: Ministro Athos Carneiro


Recorrente: Guaraplan Administradora de Consórcios S/C Ltda
Recorrida: Maria Otília Ceratti da Silva
Advogados: Drs. Carlos Alberto do Amaral e outros e Hugo Antônio de
Bitencourt e outro
SÚMULAS - PRECEDENTES

EMENTA
Consórcio de automóveis. Devolução de prestações já pagas pelo
participante desistente ou excluído. Correção monetária.
Ao participante de consórcio que dele se afasta é devida, quando do
encerramento do plano, a devolução das prestações pagas, com correção
monetária. A cláusula do contrato de adesão, que exclui a atualização
da quantia a ser restituída, é de ser considerada leonina e sem validade,
importando em locupletamento da administradora; não pode ser tida,
outrossim, como cláusula penal, pois esta exige estipulação inequívoca
e deve ser proporcional à graveza do impedimento contratual.
A correção monetária não é umplus que se acrescenta ao crédito,
mas um minus que se evita.
Juros moratórios cabíveis somente após a mora da administradora,
encerrado o plano e não devolvidas corretamente as prestações.
Conhecimento do recurso da administradora apenas pelo dissídio
jurisprudencial, negando-se-lhe provimento.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencido o Sr. Ministro
Barros Monteiro, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taqui-
gráficas precedentes que integram o presente julgado. Participaram do julgamento,
além do signatário e do Sr. Ministro que ficou vencido, os Srs. Ministros Fontes de
Alencar e Sálvio de Figueiredo. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 23 de abril de 1991 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente em exercício e Relator

DJ 13.05.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Cuida-se de ação com pedido de devolução
atualizada de prestações pagas, aforada por Maria Otília Ceratti da Silva, que
desistira de participar do consórcio para compra de automóvel, contra Guaraplan
Administradora de Consórcios S/C Ltda o juízo monocrático condenou a ré a resti-
tuir à autora as prestações com correção monetária desde as datas de pagamento,
e juros legais desde constituição em mora, deduzidas a taxa de administração e a
cláusula penal de 10% (fls. 112/116 - In volume).
Apreciando as apelações das partes, a egrégia Terceira Câmara Cível do Tribu-
nal de Alçada do Rio Grande do Sul, à unanimidade, negou provimento ao apelo da
ré, determinando que os juros fossem contados após o prazo de 30 dias do encerra-

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

mento do grupo consorciado. Quanto ao apelo da autora, entendeu o Tribunal a quo


de manter a correção monetária nos índices oficiais, deduzida a taxa de administra-
ção, mas excluindo a cláusula penal a que fora submetida. (Fls. 172/177)
Irresignada, interpôs a ré recurso especial, sob o art. 105, III, letras a e c, da
Constituição Federal, alegando negativa de vigência aos arts. 70. e 80., I, da Lei n.
5.768, de 20.12.1971; 31, I, e 39 do Decreto n. 70.951/1972, e 51 da Portaria n.
330/1987. Alega, ainda, dissídio com arestos proferidos pelas Terceira e Quarta
Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Paraná, como da Primeira Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, e da Segunda Câmara do Tribunal de
Justiça de Goiás. Aduz a recorrente, em síntese, que a correção monetária e os juros
legais seriam devidos a partir do ajuizamento da ação, deduzido o percentual de
10% relativo à taxa de administração. Invoca a recorrente as normas prefixadas
pelo órgão governamental competente (fls. 180/209, voI. 2).
A autora, ora recorrida, em contradita (fls. 248/251) sustenta o caráter ilícito
e leonino da cláusula contratual que prevê a restituição das quotas sem juros e sem
correção monetária. Salienta, outrossim, a inadequação do recurso especial ao
caso concreto, sob a orientação firmada no REsp n. n. 1.445, in "LEX-Jurisp. do
STJ e TRF", 6/195.
O ilustre Presidente do Tribunal a quo julgou configurado o dissídio, admi-
tindo o recurso pela letra c do permissivo constitucional (fls. 253/254).
É o relatório.

VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro (Relator): Não encontrei contrariedade à norma
de Lei Federal. Os arts. 70. e 80. da Lei n. 5.768/1971 dispõem que dependem de
autorização do (antigo) Ministério da Fazenda "as operações conhecidas como con-
sórcio", e que cabe a esse Ministério, em tais operações, "fixar limites de prazos e
de participantes, normas e modalidades contratuais". Os arts. 31, I, e 39 do Decreto
n. 70.951, repetem tais normas. Já o art. 51 da Portaria n. 330, de 23.09.1987,
sempre do Ministério da Fazenda, tem a seguinte redação:
"O participante que desistir do consórcio ou que dele for excluído, inclu-
sive seus herdeiros ou sucessores, receberão de volta as quantias já pagas,
dentro de 30 (trinta) dias do encerramento das operações do grupo, deduzida
a taxa de administração e acrescidas do saldo remanescente no fundo de
reserva, proporcionalmente às contribuições recolhidas." (FI. 190)
Já o art. 46 do Regulamento Geral de Consórcios introduz a expressão "sem
juros ou correção monetária", após as palavras "quantias já pagas", no mais repe-
tindo o art. 51 da Portaria supratranscrita.
Segundo a recorrente, a violação de Lei Federal se deu "por via de conseqüên-
cia", verbis:
"Ora, o apelo interposto pela ora recorrente buscava, evidentemente,
modificar a sorte da demanda, - que lhe fora adversa, - para o efeito de
SÚMULAS - PRECEDENTES

eximir-se da obrigação, imposta pelo julgado de primeiro grau, de efetivar a


devolução dos valores pagos pela autora corrigidos monetariamente, o que no
entendimento da recorrente vulnera de modo frontal o dispositivo do art. 46
de seu Regulamento Geral de Consórcios, devidamente aprovado pelo Ministé-
rio da Fazenda, nos termos da Portaria n. 330/1987, que também restou
agredida, em seu art. 51, e, com ela, via de conseqüência, o art. 8D., I, da Lei
n. 5.768, de 20.12.1971, e o art. 39 do Decreto n. 70.951/1972, que a regula-
mentou." (FL 186)
Todavia, a violação da Lei Federal, nesta expressão compreendidos também
os decretos regulamentares, há de ocorrer de forma direta e explícita, não por via
indutiva. Aliás, a própria recorrente delimita o âmbito de sua inconformidade, ao
afirmar taxativamente que "a questão toda se resume, portanto, à interpretação
sobre a possibilidade de aplicação do supratranscrito art. 46 do Regulamento Geral,
nos exatos termos em que se encontra consignado".
Destarte, na determinação do v. aresto, de que a devolução das quantias pagas
seja feita com correção monetária, não encontro ofensa alguma à Lei Federal, mas
sim mera apreciação da legitimidade de cláusula de contrato de adesão.
O apelo, destarte, não é de ser conhecido sob o amparo da letra a do permis-
sivo constitucional.
Merece, todavia, admissão pelo dissídio pretoriano, ante os arestos trazidos
de fls. 210 e ss., segundo os quais a cláusula questionada seria lícita, "porque não
é vedada por lei nem fere os bons costumes" (fl. 210), assim tendo sido mandado
processar o recurso pela decisão de fls. 253/254.
Conhecendo, pois, da irresignação extrema, pelo confronto jurisprudencial,
nego-lhe, todavia, provimento.
Sustenta a recorrente, com invocação a parecer de mestre Humberto
Theodoro Júnior, que a correção monetária somente seria admissível: a) quando
instituída por lei; b) quando estipulada no contrato; c) nas dívidas de valor, prove-
nientes do ato ilícito contratual ou extracontratual. Embasa o parecerista suas
conclusões na orientação do Pretória excelso, com remissão a inúmeros julgados
da mais alta Corte.
Todavia, impende sublinhar que, afastando o princípio nominalístico da moeda,
os tribunais brasileiros, ante a persistência e gravidade do fenômeno inflacionário,
foram passo a passo aceitando, embora de início com restrições extremas, a insti-
tuição da correção monetária, como forma adequada a garantir a comutatividade
contratual ou a reparação plena dos danos. A própria hábil distinção entre dívidas
de valor e dívidas de dinheiro, aquelas sempre atualizáveis, estas somente corrigíveis
ante previsão legal ou contratual, tal distinção na atualidade já cumpriu seu obje-
tivo e se encontra superada, ante o conceito dominante do que se entende, em
verdade, por correção monetária. A correção, reitero, não é um plus que se adicio-
na ao crédito, mas um minus que se evita. Quem paga com correção, não paga
mais do que deve, paga rigorosamente o que deve, mantendo o valor liberatório da
moeda. Quem recebe sem correção, não recebeu aquilo que por lei ou pelo contrato

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

lhe era devido; recebeu menos do que o devido, recebeu quiçá quantia meramente
simbólica, de valor liberatório aviltado pela inflação.
Assim, a própria Portaria n. 51 do (antigo) Ministério da Fazenda, ao mandar
que ao participante de consórcio, no caso de desistência ou exclusão, fossem devol-
vidas as "quantias já pagas", pode e deve ser entendida como facultando a correção
de tais quantias, sob pena de a devolução não mais ser da quantia já paga, mas de
quantia com poder liberatório - e na moeda o que interessa econômica e juridica-
mente é o seu poder liberatório -, com poder liberatório tomado mesquinho e até
irrisório. Ainda mais em se considerando cuidar-se, na hipótese, de contratos de
adesão, em que o participante não pode discutir ou negociar o conteúdo de suas
cláusulas.
Sustenta-se, em sede doutrinária, que a exclusão da correção monetária cons-
tituiria uma "autêntica cláusula penal, cuja validade e eficácia são indiscutíveis",
sublinhando-se que para instituir tais cláusulas se não exigem palavras sacramen-
tais (parecer de Sylvio Capanema de Souza, in "Doutrina em Consórcio", t. 1,
v. 1, pp. 125 e ss.).
Sem dúvida, nos contratos não são exigíveis fórmulas sacramentais, porém
a intenção inequívoca de estabelecer uma cláusula penal, em seu caráter básico
de prefixação das perdas e danos, esta é inafastável. E não parece que a aplicação
rígida do princípio nominalístico da moeda, tal como previsto no questionado
Regulamento, tenha tal objetivo. Muito ao contrário. Impende ressaltar que a
cláusula penal é de certa forma vinculada, em seu montante, à graveza do
inadimplemento (CC, art. 924); ora, nos casos de consórcio, o participante que
pagou apenas umas poucas prestações iniciais, e as tiver restituídas pelo valor
nominal, estará menos prejudicado do que o participante que adimpliu a maioria
das prestações e as tiver 'devolvidas', quando do encerramento do contrato, com
o aviltado minus representado pela não-atualização de seu valor nominal. O
maior prejuízo será daquele que mais adimpliu; o menor prejuízo, o daquele que
se afastou do consórcio, ou dele foi excluído, logo ao início. Isso sem falar de que
o valor da cláusula penal, Código Civil, art. 920, não pode exceder o da obriga-
ção principal, e a imposição de restituição de valores desatualizados implicará,
sem dúvida, em descumprimento desta norma de limitação, aliás muito mais
rigorosa em previsões legais hodiernas.
A respeito do tema, desejo reportar-me ainda a acórdão de excelência máxi-
ma proferido pela Quarta Câmara Cível do TARS, na Apelação Cível n. 190023556,
da qual foi Relator o eminente juiz J auro Duarte Gehlen, do qual destacarei e adoto
as considerações que seguem:
';A.ssim expostas as soluções jurisprudenciais para a situação, de imediato
afasto aquela que entende indevida a correção monetária.
Com efeito, se a Portaria n. 330/1987 ordenou a aplicação dos saldos
das contas vinculadas diariamente em operações do mercado aberto (art. 28),
autorizando a devolução do saldo remanescente do fundo de reserva
proporcionalmente aos pagamentos feitos pelos desistentes (arts. 29 e 31),
está, ipso facto, determinando seja a devolução efetuada com correção.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Sem eficácia, portanto, a cláusula contratual que prevê a não-incidência


dessa correção, também por colidir com a determinação daquele órgão go-
vernamental (Ministério da Fazenda), que detém a competência reguladora
sobre os consórcios.
Não bastasse esse argumento, outros existem, dentro do plano doutriná-
rio dos contratos, que autorizam a devolução corrigida das prestações pagas
pelos desistentes, tendo em vista 1. a peculiar situação da nossa economia e 2.
os procedimentos operacionais adotados nos consórcios.
No concernente à economia, basta a constatação do índice inflacionário
de 1. 764,86%, acumulado em 1989, e que só nos meses de janeiro e fevereiro
do fluente chegou ao alarmante patamar de 169,72% - ensejando a adoção
de mais um plano de estabilização econômica, agora denominado de 'Plano
Collor' ou 'Plano Brasil Novo'. Basta isso, repito, para se ver a summa injuria
que se consubstanciaria na devolução das prestações pagas sem correção
monetária, ao fim do respectivo plano do consórcio. Figura-se a hipótese em
que se tenha pago 18 das 36 mensalidades quando da retirada do consorcia-
do. Quem já havia pago o correspondente a, exemplificativamente, 'meio
automóvel' objeto do plano, receberia um ano e seis meses depois o que carreou
ao grupo no seu valor nominal apenas, com o que nem um pneu de bicicleta
poderia adquirir. No caso concreto citado na Apelação Cível n. 589029511,
que aqui torno a trazer por ser mais eloqüente do que qualquer outro argu-
mento, o consorciado que pagara o correspondente a 45% do valor do auto-
móvel Fiat Uno, teria o direito à devolução de NCz$ 39,00 à época do aresto,
junho do ano pretérito, na qual sequer se encerrara o plano!
Daí a expressiva sentença supratranscrita: pagar em época de juros ban-
cários de 10.000% a.a., sem a atualização da moeda é não pagar, pelo que de
imediato se afasta a pretensão da validade da cláusula que afasta a correção
monetária, por consagrar a iniqüidade da devolução do nada.
E no plano da sistemática administrativa e operacional dos consórcios,
constata-se pelo menos três circunstâncias que, ainda se tomadas isoladamente,
levariam à rejeição da pretendida não-incidência da correção monetária.
Primeiramente, o espaço deixado pelo consorciado desistente ou eliminado
do grupo é, regra geral, imediatamente ocupado por um novo aderente ao
plano. E este de imediato tem que desembolsar o total correspondente a todas as
prestações já vencidas, ao valor atualizado. Isto é, não recebe o novo partici-
pante nenhum presente representado pelas prestações já pagas pelo consorciado
que se afastou. Ora, se paga esse novo integrante, exemplificativamente, o
correspondente a 20% do valor atualizado do bem objeto do consórcio, igualan-
do-se aos demais consorciados, aquilo que o desistente pagou sobeja, no cômputo
geral dos aportes de dinheiro para o plano.
Em segundo lugar, e como ressaltado na Apelação Cível n. 589055680
da colenda Quinta Câmara Cível, do TJRGS, 'como o valor real da prestação
continuou sendo o mesmo - todas foram atualizadas de acordo com o preço
de tabela do veículo - no final restará o quantum da contribuição do

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

desistente, que se manteve sempre corrigido, e que não será destinado à aqui-
sição de um bem porque houve a desistência. Logo, esse valor deve ser entre-
gue a ele, pois se tivesse continuado no grupo e pago as demais prestações
vencidas a partir da sua retirada, no último mês deveria existir capital sufici-
ente para a expedição de carta de crédito correspondente à sua participação.
Como faltaram as últimas prestações, em face da sua retirada, o que sobeja
está atualizado na proporção das contribuições feitas. Se não for pago esse
valor ao desistente, engordará a receita da administradora, pois não se tem
notícia de que os aportes dos desistentes tenham sido redistribuídos aos con-
sorciados remanescentes (sic, julgado mencionado, Relator o eminente De-
sembargador Ruy Rosado de Aguiar Jr.).
E em terceiro, porque ainda que não se plantasse a situação susoesclarecida,
há expressa determinação para que se aplique em investimentos nas operações
do mercado aberto tudo o que restar de saldo dos aportes de recursos para o
plano. Ora, o retirante não é obrigado - e nem seria justo isso - a deixar o
que pagou em benefício de outros que não pagaram, mas ainda permanecem
no plano, ou, o que é pior, para a administradora. E se todos pagaram as suas
quotas, terão de sobrar, ao final, as prestações recolhidas pelo desistente.
Como tais saldos obrigatoriamente têm de ser investidos, nos termos da Porta-
ria n. 330/1987, art. 29, a presunção natural é a de que pelo menos a corre-
ção monetária oficial é devida quando da devolução das prestações pagas
pelo retirante.
Aliás, argumenta mutatis mudantis nesse passo o eminente colega
Talai Selistre, com lógica irrebatível: se a administradora do consórcio é
obrigada a investir os saldos do plano, diariamente, como reza o dispositivo
citado, até poderá ter com isso lucros extras, na medida em que obrigada a
devolver o minimum minimorum que é a correção da moeda pelo índice
oficial a tal fim aplicável (OTN, BTN, IPC etc .... ), lhe restará ainda disponível
o que exceder a esse índice mínimo de correção, consabido que vários são os
investimentos que remuneram bem acima dele. Agora, se não investiu, ou se
investiu mal, imputet sibi os ônus daí decorrentes, vez que o consorciado -,
que não tem ingerência nessas aplicações -, tem direito a receber, insisto,
pelo menos esse mínimo dos mínimos, que é o que pagou corrigido pelo índice
oficial incidente.
Nem se argumente que os pagamentos feitos pelo desistente integrarão o
fundo de reserva, para fazer face a eventuais acidentes de percurso do plano
em andamento. Se houver, exemplificativamente, uma brusca majoração do
bem dele objeto, ou outro imprevisto qualquer, são os remanescentes do plano
que serão chamados (e aí até mesmo aqueles que já foram contemplados e,
em especialíssimas situações, mesmo os que já pagaram todas as suas quotas,
embora não encerrado o plano, como se colhe na jurisprudência majoritária
sobre o tema) para cobrir o que estiver a descoberto. Não se pode confiscar
pura e simplesmente as prestações do desistente, para usá-las em benefício de
quem quer que seja, consorciados ou administradora.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Se no plano fático se impõe a incidência da correção monetária, autori-


zada por qualquer uma das situações supra-examinadas - máxime à soma
das três - também no jurídico, especificamente nos princípios que informam
os contratos no plano do direito obrigacional, a resultante deve ser a mesma.
Em princípio, e com a devida vênia, ouso divergir dos ven. acórdãos que
conceituam o dispositivo contratual que prevê a devolução das prestações sem
a correção monetária, como sendo cláusula penal, pelo que não poderia o
Judiciário deixar de aplicá-la, presente o princípio pacta sunt servanda,
nem mesmo reduzi-la a níveis menos onerosos.
Além de não se enquadrar tal disposição contratual dentro do sentido
estrito que se confere à stipulatio poenae, tenho que na hipótese concreta
esbarraria ela no disposto no art. 924 do Código CiviL Veja-se que ao contrário
do que comumente ocorre com a pena convencional, aqui não se estipulou uma
importância certa ou pelo menos um percentual determinado, que corporificaria
dita penalização.
Se entendida na sua concretude, a cláusula contratual em questão seria
esta: ao consorciado que se afastar oufor afastado do plano, impõe-se a pena
de perda do que pagou até a retirada. Aos níveis da inflação da nossa moeda,
isso é o que representa restituir sem correção ao cabo de dois ou três anos, ou
até mais, pois como é normal em tais casos de desistência, raramente se
desiste próximo do término do plano.
Assim, perder-se tudo quanto se pagou, e não apenas a metade, o terço, o
vigésimo, o décimo, equivaleria a negar vigência ao já mencionado art. 924 do
CCB. Pois se colocado o problema no campo do inadimplemento contratual-
que só este ensejaria a incidência de cláusula penal- há que se ver que tendo
o consorciado pago até o momento do afastamento as suas prestações, até ali
foi adimplente.
Leve-se o argumento adiante, exemplificando-se com o pagamento de 30
prestações em um total de 36, ou de 45 em um total de 50, vigindo altíssima
taxa inflacionária nesses cinco ou seis últimos meses dos exemplos, para se ver
a extrema injustiça na aplicação pura e simples dessa pretendida penalização."
Quanto aos juros moratórios, o correto acórdão recorrido bem os fixou a partir
do trigésimo dia após o encerramento do plano, quando entendeu verificada a mora.
Pelo exposto, conheço do recurso pela alínea c, mas ao mesmo nego provi-
mento.
É o voto.

VOTO -VENCIDO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, reportando-me ao voto que
proferi no Recurso Especial n. 4.273, também do Rio Grande do Sul, peço vênia
para conhecer do recurso e dar-lhe provimento.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL N. 8.125-RS (1991/0002256-0)

Relator: Ministro Fontes de Alencar


Recitante: Sinosserra - Administrações e Participações Ltda
Recitado: Elias Pacheco Neto
Advogados: Drs. Sérgio Haas e outros e Paulo Roberto Sangoi e outro

EMENTA
Consórcio de automóvel. Devolução de prestações. Correção monetária.
- Firme é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido
de que a devolução das prestações pagas pelo consorciado há de ser efetuada
com correção monetária.
- Princípio da Súmula n. 286 do Supremo Tribunal Federal.
- Recurso especial não conhecido.
Maioria.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, não conhecer do re-
curso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 04 de junho de 1991 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente
Ministro Fontes de Alencar, Relator

DJ 02.09.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Trata-se de recurso especial interposto com
fundamento no art. 105, III, c, da Constituição Federal, contra decisão proferida
pela egrégia Quarta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande
do Sul, que ao negar provimento à apelação, manteve a sentença de la instância no
sentido de que, no consórcio de automóveis em caso de retirada voluntária do
consorciado, ou sua eliminação por inadimplência, cabe a devolução das impor-
tâncias pagas corrigidas monetariamente e com juros.
O vencido traz como divergente aresto do Tribunal do Paraná, além de outros
julgados através de ementas.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Pelo despacho de fls. 188 e 189, foi o recurso admitido, subindo os autos a
esta Corte.
É o relatório.

VOTO
o Sr. Ministro Fontes de Alencar (Relator): Discute-se nos presentes autos se a
desistência ou exclusão do participante de consórcio de automóveis implica na
devolução das quantias já pagas com juros e correção monetária, como entendera
o aresto recorrido.
Imprestável, no caso, é o dissídio jurisprudencial, porquanto a discrepância se
acha superada, pois ambas as Turmas que compõem a Segunda Seção desta Corte
já decidiram na mesma linha do aresto recorrido.
Assim se pronunciou a Terceira Turma no REsp n. 7.229, relatado pelo emi-
nente Ministro Waldemar Zveiter, em aresto que guarda a seguinte ementa:
"Civil- Consórcio de automóvel- Desistência - Devolução das cotas
pagas após encerramento do Plano - Correção monetária.
1- Ajurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça está orienta-
da no sentido de estender a correção monetária a todos os débitos, seja de que
natureza forem, no que diz respeito àqueles resultantes de decisão judicial,
com a edição da Lei n. 6.899/1981.
Essa matéria sobre ser possível ou não a incidência da correção monetá-
ria não pode inibir o julgador de, adequando sua interpretação à realidade
social ou econômica, entregar a prestação a que faz jus o jurisdicionado.
II - Recurso não conhecido pelo fundamento da alínea c."
De igual modo, decidiu esta Turma no REsp n. 5.310, relatado pelo preclaro
Ministro Sálvio de Figueiredo.
Incidem, pois, neste particular, os princípios da Súmula n. 286 do Supremo
Tribunal Federal.
Em face do exposto, não conheço do presente recurso.
É o meu voto.

VOTO
o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Também não conheço do recurso, pelos
mesmos fundamentos do Ministro-Relator.
Entendo, conforme acentuou S. Exa ., que não seria aplicável propriamente o
Enunciado n. 286 da súmula, mas os princípios que a informam, que nos levam à
conclusão de que, manifestando-se as Turmas no mesmo sentido, não haveria
necessidade do pronunciamento da Seção.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Gostaria de ressalvar que somente não acompanhei S. Exa ., na sessão anterior,


quando propôs esta medida, porque naquela oportunidade estava com um caso a
ser julgado, na matéria, a cujo respeito havia solicitado vista para melhor exame.
Realizado aquele julgamento, ponho-me de acordo com a tese do Relator.

VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, persisto no meu entendimento
no sentido de que não se pode invocar o princípio contido na Súmula n. 286 do STE
Embora concorde que a matériajá esteja definida neste órgão fracionário do Tribu-
nal, na Terceira Turma o número de julgados até o momento ainda não é, a meu
ver, suficiente para garantir a tranqüilidade necessária a respeito do tema.
Peço vênia ao eminente Ministro-Relator para conhecer do recurso e dar-lhe
provimento.

VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Bueno de Souza (Presidente): Senhores Ministros, tendo em
vista os fundamentos do douto voto do Sr. Ministro-Relator, não conhecendo do
recurso, muito embora compreenda o seu elevado sentido e até mesmo me dispo-
nha a subscrevê-lo quando as circunstâncias forem suficientemente definidas (e por
entender que não é este o caso), com a devida vênia, acompanho o Sr. Ministro
Barros Monteiro. Como bem esclareceu o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, na
sessão passada, em caso semelhante, apresentavam-se razões de decidir peculiares
à espécie. Neste caso também outras ocorrem, agora apontadas pelo Sr. Ministro
Barros Monteiro, como a falta de unanimidade nos julgados da Quarta Turma; ou,
pelo menos, o escasso número de precedentes da Terceira Turma.
Estou de acordo em vencer o formalismo e assumir que o Tribunal já tem
posição predominante sobre o tema; mas não me parece que essa boa doutrina seja
aplicável a um caso como o presente, em que, na verdade, somente nos últimos
meses temos emitido alguns julgamentos. Seria prematuro, data venia, lidarmos
com esta razão de não conhecer.
Assim, acompanho o Sr. Ministro Barros Monteiro, conhecendo do recurso
para desprovê-lo.

RECURSO ESPECIAL N. 9.609-RS (1991/60453)

Relator: Ministro Dias Trindade


Recorrente: GauchacarVeículos e Peças Ltda
Recorrida: JussaraAguida Silveira Noronha
Advogados: Drs. Carlos Alberto Bencke e outros, Cláudio Araújo Santos dos
Santos e outros e Hugo Mósca
SÚMULAS - PRECEDENTES

EMENTA
Civil. Administração de consórcio. Devolução de prestações pagas.
Sobre as prestações pagas pelo consorciado, ao se retirar ou ser
excluído do grupo, incide correção monetária.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso especial, pela alínea c, mas lhe negar provimento, na forma do relatório e
notas taquigráficas, constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 21 de junho de 1991 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Dias Trindade, Relator

DJ 26.08.1991

RELATÓRIO
O Sr. Ministro Dias Trindade: Gauchacar Veículos e Peças Ltda interpõe recurso
especial, com fundamento no art. 105, III, c, da Constituição Federal, de acórdão
proferido pela Quarta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul,
que negou provimento à apelação interposta em autos de ação movida por Jussara
Aguida Silveira Noronha, visando receber corrigidas monetariamente prestações já
pagas de consórcio, do qual desistiu.
Sustenta a recorrente dissídio jurisprudencial com julgados do Tribunal de
Justiça do Paraná.
Processado o recurso, vieram os autos a este Tribunal.
É como relato.

VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade (Relator): Adoto as razões constantes do voto
que proferi no REsp n. 7.289-RS a propósito do tema em discussão no presente,
relacionado com devolução de prestações de consórcios para aquisição de bens
duráveis, por desistência ou exclusão do consorciado.
Tenho porque, no caso presente, se acha comprovado o dissídio, posto que os
acórdãos, trazidos por cópias autenticadas, decidiram em sentido contrário ao
recorrido, a respeito da incidência de juros e correção monetária sobre as presta-
ções devolvidas.
Isto posto, voto no sentido de conhecer do recurso e lhe negar provimento.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade (Relator): Não vejo razão nos argumentos da
recorrente de que o acórdão recorrido tenha negado vigência ao art. 8íl da Lei n.
5.768, de 20 de dezembro de 1971, que contém regra de supervisão do sistema de
consórcios para a venda de bens duráveis, porque, em realidade, a infração é a
cláusula do contrato padrão da empresa recorrente, autorizada a funcionar.
Dita cláusula, indicada no art. 29 do intitulado Regulamento Geral, estabele-
ce modo e tempo da restituição dos valores recebidos pela administradora, nos
casos de desistência ou de exclusão do consorciado, na qual resta estabelecido que
essa devolução será feita pelos valores nominais dos pagamentos efetuados, sem
juros e sem atualização monetária.
Não é porque tenha o plano da recorrente sido aprovado pelo Poder Público
que se há de converter em lei a cláusula em comento.
E a própria recorrente não esconde, por expressamente sustentar, que a infra-
ção direta seria à cláusula contratual e para daí tirar a conseqüência de que, indi-
retamente, estaria violada a lei de intervenção nesse sistema de vendas.
Nem por conter a Portaria n. 330, de 1987, do Ministro da Fazenda, regra de
restituição de prestações pagas, que silencia a respeito de correção monetária,
significa violação à norma federal, no sentido que lhe empresta o art. 105, III, a, da
Constituição, para ensejar a interposição de recurso especial.
Do mesmo passo, os acórdãos com que a recorrente pretende demonstrar di-
vergência jurisprudencial sobre o tema em exame, o fazem apenas em função da
cláusula contratual, tida por eles como da natureza penal, sem que importe em
interpretação de Lei Federal alguma.
E dá motivo ao uso do recurso especial apenas o dissídio sobre interpretação
de Lei Federal, como consignado no item c, do art. 105, UI, da Constituição.
Demais disso, não serve o recurso especial para discutir interpretação de
cláusula contratual, como está na Súmula n. 05 da jurisprudência deste Tribunal.
Isto posto, voto no sentido de não conhecer do recurso.

VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: A questão em debate - correção monetária
das importâncias a serem devolvidas ao consorciado excluído ou desistente - já foi
objeto de exame por esta Corte em diversas oportunidades, firmando-se ajurispru-
dência no sentido de que devida aquela atualização. Assim, entre outros, o acórdão
no REsp n. 5.383, Relator Ministro Waldemar Zveiter, e no REsp n. 7.326, Relator o
Ministro Athos Carneiro.
Em verdade, a cláusula a excluir correção monetária, com os índices de infla-
ção que ainda persistem, corresponde a fazer ínfima a importância a ser devolvida,
reduzindo-a a perto de nada, em certas circunstâncias. A avença que isso estabelece
merece ser qualificada de leonina, inaceitável em contrato de adesão.
SÚMULAS - PRECEDENTES

Alega-se tratar-se de cláusula penal. Embora não se exija, para semelhante


pacto, o uso de expressões sacramentais, indispensável que resulte certo ter-se
pretendido assim convencionar. Ora, não se coaduna com a natureza de cláusula
fazê-la tanto maior quanto mais amplamente adimplida a obrigação.
Acompanho o Relator.

RSSTJ, a. 1, (2): 373-419, dezembro 2005


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